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Liderança de pessoas em contexto Lean

Filipe J. P. Morins e Felipe D.B. Cunha

Relatório do Projeto Final

Orientadora na CLT: Dr.ª Christiane Tscharf

COMUNIDADE LEAN THINKING

2015 Janeiro 31
Resumo

Este relatório que sintetiza o trabalho efetuado no âmbito da realização do


projeto final da XV Pós-Graduação em Lean Management, ministrado pela CLT,
norteou-se pelo seguinte racional:
As empresas cuja liderança decide ao nível da organização, seja por razões de
perda de competitividade face à sua concorrência, seja por pressão dos
mercados, mercados estes que desejam ver satisfeitas as suas necessidades de
produtos e/ou de serviços inovadores, seja por razões internas, resultantes da
pressão dos seus stakeholders, criar as condições necessárias para a
implementação de um novo modelo de negócio baseado na filosofia Lean; uma
restrição que nos impusemos porque é este o âmbito da formação a que fomos
sujeitos na Pós-Graduação, normalmente no curto prazo consegue como
resultado dessa decisão o aparecimento de resultados positivos nas suas
operações, com melhorias de performance muito significativas. Com o decorrer
do tempo, no entanto, a liderança começa a aperceber-se de um retrocesso
difícil de explicar, pois além de um regresso às condições de partida que
estiveram na origem da decisão de provocar a mudança, cristalizam-se
mecanismos de resistência ao nível cultural e uma rigidez estrutural que tornam
mais difícil futuros ajustamentos; em consequência, esta rigidez reforçada da
organização gera dificuldades de adaptação face às dinâmicas do mercado e à
pressão da concorrência, tornando a organização especialmente sensível às
dinâmicas do contexto em que está inserida, com o risco de sobrevivência
aumentado face à turbulência que hoje é caraterística da atividade económica.
A questão anterior levou à seguinte, que é a de procurar perceber quais as
causas da situação explicitada anteriormente. As ferramentas da caixa de
ferramentas disponível, no âmbito da filosofia operacional Lean, suficientemente
conhecidas e com resultados provados parecem, por si sós, não oferecerem
respostas adequadas aos problemas que se procuram resolver. O que falta
então e se assume ser suficientemente relevante para que a sua inexistência
inviabilize processos de transformação, se não no curto prazo, pelo menos no
médio e longo prazos?
A procura de respostas para esta questão assentou fundamentalmente numa
pesquisa bibliográfica, que se quis o mais abrangente possível no que se refere
às questões abordadas, na informação que ao longo da Pós-Graduação nos foi
facultada, nos trabalhos de pesquisa que fomos realizando e na própria
experiência profissional dos autores do trabalho.
Os temas sobre que se realizaram as pesquisas incidiram sobre as questões
relacionadas com Liderança, com Cultura Organizacional e com aspetos
relativos ao Coaching, tendo como pano de fundo a empresa Toyota e a sua
cultura, dado ser considerada o paradigma da excelência operacional. As obras
e a experiência de Jeffrey Liker, Mike Rother, de E.Schein, Ken Blanchard e de
muitos outros autores permitiu-nos perceber a génese, o crescimento e a
consolidação de uma cultura organizacional e o porquê de uma organização
como a Toyota, ainda nos dias de hoje, se manter viva, dinâmica e em
aprendizagem permanente, condições para que a mesma se mantenha como
referência no domínio da excelência organizacional, independentemente das
crises recentes que a assolaram.
A partir do estudo realizado sobre a Toyota, no que se refere à sua cultura
organizacional, designada por Toyota Way e da compreensão do modo como
essa cultura se pode caraterizar aplicando o modelo de E. Schein, conclui-se
que uma cultura de sucesso tem na sua origem uma liderança forte que a cria,
baseada em valores, e que é condição necessária para a sua sustentabilidade
no tempo haver consistência na manutenção desses mesmos valores, com
lideranças ativas na linha da frente e com os colaboradores na organização a
pautarem o seu comportamento por esse mesmos valores, com motivação,
empenho e sentido de propriedade.
Agradecimentos

Os autores deste trabalho agradecem à CLT – Comunidade Lean Thinking, a


todos os seus colaboradores, em especial os seus formadores, pela
oportunidade que nos foi propiciada de podermos aceder a fontes de
conhecimento tão enriquecedoras, tanto profissional como pessoalmente,
sempre apoiados pelo corpo formador numa relação mestre-aprendiz que nos
levou para um caminho de auto aperfeiçoamento, que não vai mais parar.

Agradecemos à nossa orientadora Dr.ª Christiane Tscharf, pelo apoio e


orientação sábios e pela paciência com que nos ouviu e aconselhou nos
momentos de maior perturbação.

Filipe Morins agradece ao Presidente do Conselho de Administração, Dr.


António Maçarico, pela possibilidade que lhe deu de crescer enquanto
profissional ao serviço da empresa que dirige e que muito facilitou a imersão
neste domínio de conhecimento tão complexo quanto é o Lean Thinking.
Agradece também à sua filha Teresa e ao seu marido Rutger pelo apoio e
paciência que manifestaram nos momentos mais exigentes deste processo.
Liderança de pessoas em contexto Lean

Índice de Conteúdos

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Liderança de pessoas em contexto Lean
Liderança de pessoas em contexto Lean

1 Introdução………………………………………………………………………………………..……1

2 Cultura organizacional - Definição e caraterísticas………………………………………..…….6

3 Liderança……………………………………………………………………………………...…..…11

4 Coaching…………………………………………………………………………………………….16

5 Processos de transformação cultural - Filosofia Lean…………………………………………20

6 Estudo de caso……………………………………………………………………………………...34

7 Conclusões………………………………………………………………………………………….37

8 Referências e Bibliografia…………………………………………………………………………39

ANEXO A: Mapa Mental………………………………………………………………………….…..42

1 Introdução

No decorrer da Pós-Graduação em Lean Management, que os autores do


presente relatório frequentaram, uma questão subjacente foi ficando cada vez
mais evidente:
O contexto económico atual, a dinâmica dos mercados e dos grupos sociais
pressionam cada vez mais as empresas, sejam fornecedoras de produtos ou de
serviços, públicas ou privadas, com ou sem fins lucrativos, a serem
organizações eficazes e eficientes, com reconhecimento social pelas suas
práticas éticas e de respeito pela sociedade e com comportamentos
responsáveis no domínio da utilização dos recursos e da relação com o
ambiente.
As empresas que não são capazes de atuar neste domínio de constrangimentos,
ou porque desenvolveram culturas que as tornaram rígidas, burocráticas e
fechadas sobre si mesmas, ou porque as suas lideranças não foram capazes de
influenciar essas culturas através de uma atuação oportuna e adequada ao nível
da formação e da criação de um ambiente adequado e motivador para os seus
colaboradores que, sem uma liderança eficaz, centrada numa visão de longo
prazo e em valores coerentes, foram criando subculturas que, digladiando-se por
se basearem em pressupostos básicos culturais diferentes, levaram a
organização a perder o seu foco inicial, com a consequência do resultado final
desta falta de foco ser o seu desaparecimento ou uma existência sem
esperança.
Muitas empresas, no entanto, através das suas lideranças atentas a estas
situações, procuraram adaptar-se implementando processos de transformação
cultural, no sentido de poderem reencontrar posicionamentos competitivos que
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assegurassem a sua sobrevivência.


Essas empresas, com lideranças atentas ao ambiente competitivo em que se
integravam e que procuraram conhecer as empresas onde, de uma forma
generalizada, se reconheciam modelos organizacionais de excelência, para as
estudarem e de seguida, seja internamente ou com recurso ao apoio de
entidades externas, lançarem projetos de reestruturação, no sentido de
implementarem nos seus sistemas internos o que consideraram serem as
melhores práticas operacionais reconhecidas no momento.
O resultado destas iniciativas resultou, em muitos casos e no curto prazo, em
melhorias significativas verificadas na eficiência dos seus sistemas
organizacionais, na satisfação dos respetivos stakeholders e com os resultados
consequentes a serem muito significativos, servindo como fator de publicitação e
propagação dessas práticas e de confirmação da possibilidade real de
transformação organizacional, pois aparentemente, bastava integrar as
metodologias adequadas nos sistemas a reestruturar, utilizando as ferramentas
corretas a partir de um catálogo de ferramentas disponíveis e sem a
preocupação de se valorizarem os aspetos culturais mais profundos existentes
na cultura a sofrer a transformação. No entanto, com a passagem do tempo, no
médio e longo prazo, o que se pôde apreciar foi que, em muitos casos, existiu
uma regressão para as situações de partida e a criação de bloqueios ao nível da
cultura, que funcionaram como elementos de resistência aquando da procura de
novas soluções no domínio do desempenho para essas empresas.
E foi em consequência desta constatação que colocámos a pergunta que nos
motivou para o trabalho de pesquisa desenvolvido: Porque é que só
aproximadamente 40 % das empresas que encetam processos de
transformação organizacional conseguem sustentabilidade no médio e longo
prazos (João Paulo Pinto, 2014: 239) e as restantes regridem nos seus esforços
para alcançarem as condições de sustentabilidade?
A partir do momento em que nos lançámos no trabalho de pesquisa outra
pergunta se colocou: O que é que é necessário existir como condições básicas,
para que os processos de transformação nas empresas, que além da sua
componente técnica, devem ser fundamentalmente de ordem cultural, se
possam sustentar no médio e longo prazos, contendo em si os mecanismos que
lhes permitam sobreviver, mantendo-se como organizações de referência,
integradas em contextos com dinâmicas imprevisíveis e turbulentas.
O resultado do trabalho realizado, cujo relatório aqui se apresenta visou, assim,
encontrar respostas para as questões que foram levantadas e que dada a
complexidade dos temas em causa será sempre um trabalho inacabado.
A metodologia de trabalho que se utilizou, cujo mapa mental pode ser apreciado
no anexo A, assentou na informação fornecida no âmbito da Pós-Graduação,
particularmente no módulo Lean Coaching, que os autores frequentaram, no livro
de João Paulo Pinto (2014), Pensamento Lean: A filosofia das organizações
vencedoras e em pesquisa bibliográfica, incidindo sobre temas vários, como
seja, Cultura Organizacional, particularmente Cultura em Organizações Lean,
Liderança, Coaching, com incidência o conceito Toyota Kata, nas suas duas
componetes, Improvement Kata e Coaching Kata.
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Liderança de pessoas em contexto Lean

A estrutura do trabalho concretizou-se numa sequência de temas que


procurámos que complementassem o racional do trabalho ou seja, que
condições de base ao nível da sua cultura devem as organizações procurar
estabelecer e consolidar, para que seja possível suportar e sustentar, no médio
e longo prazo, processos de transformação que se concretizam em resultados
operacionais de excelência e cuja operacionalização é técnica, assente
fundamentalmente na eliminação de desperdício e criação de valor para todos
os stakeholders. É essa estrutura que passaremos a descrever.
- Cultura Organizacional
Numa tentativa de percebermos o que existe de diferente entre a empresa
Toyota e as restantes empresas começámos por estudar o conceito de cultura
das organizações, em sentido geral e, de seguida, analisar a cultura da Toyota.
A informação recolhida, além da que encontrámos no âmbito das atividades da
Pós-Graduação, da obra de João Paulo Pinto já referida, incidiu no estudo da
obra de autores de referência neste campo, como sejam, entre outros, E.
Schein, Jeffrey Liker, Pascale Dennis e David Mann.
No que respeita à caraterização da empresa Toyota e como forma de tentar
compreender a sua força e consistência analisámos a declaração de princípios
emitida pela liderança desta empresa denominada Toyota Way 2001.
- Liderança
Nesta parte do trabalho procurou-se a compreensão do significado de Liderança,
enquanto elemento catalisador e integrador das componentes de uma cultura, o
seu papel crucial no sucesso de um processo de mudança da cultura
organizacional de umas empresas e as relações que se podem estabelecer
entre as lideranças das empresas, os seus colaboradores e o estabelecimento
consolidado de uma cultura baseada na filosofia Lean.
A empresa Toyota serviu-nos como modelo de referência.
Neste domínio estudámos as obras de Ken Blanchard, Jeffrey Liker, Kouzes &
Posner, Miguel Pita e Cunha e Arménio Rego.
- Coaching
Uma empresa, atualmente, para poder sobreviver no longo prazo ao ambiente
resultante das condições externas e também internas, mutáveis e muitas vezes
agressivas, a ponto de porem em causa a própria sobrevivência da empresa,
tem que ser uma empresa que contém em si a capacidade de aprender e
integrar essa aprendizagem em conhecimento, com a integração contínua no
seu capital de conhecimento, das lições aprendidas em resultado da interação
com o contexto em que se situa, e são os seus colaboradores os fieis
depositários desse conhecimento, que se concretiza ao nível da sua atividade
diária.
Para que os seus colaboradores possam exercer a sua atividade ao mais alto
nível, em sintonia com os objetivos da empresa, que decorrem de uma visão e
missão estabelecidas para a mesma pela sua liderança, têm os seus líderes em
todos os níveis da organização, de serem capazes de concretizar o potencial de
todos os colaboradores que lideram, criando as condições de partida e de
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Liderança de pessoas em contexto Lean

manutenção, que vão permitir que cada colaborador e que cada equipa possa
dar o seu contributo de um modo ativo e participado para o desenvolvimento
sustentável da organização em que se inserem.
As soft skills que estes líderes devem manifestar nas suas relações
interpessoais e o conhecimento das ferramentas a utilizar na formação de
equipas de elevada performance, ou seja, as suas capacidades de atuarem
como professores e coaches levaram-nos a abordar este tema que se torna
fundamental na gestão destes processos de transformação.
Para desenvolvermos os conhecimentos nesta área além da informação da Pós-
Graduação em Lean Coaching, estudámos Richard Bandler, Daniel Goleman,
Carol Dwek, Marcia Hughes, James B. Terrell, entre outros.
- Processos de transformação cultural
Procura-se neste ponto do trabalho caraterizar o modelo de cultura
organizacional da Toyota, a partir dos três níveis que E. Schein define para a
caraterização de uma cultura e da abordagem que é possível realizar a partir do
estudo de M. Rother do modelo cultural da Toyota e da sua evolução e
consolidação no longo prazo, a partir da análise do significado na atividade real
da organização dos conceitos representados pelas designações Toyota Way e
Toyota Kata, este último nas suas componentes, Improvement Kata e Coaching
Kata.
Procura-se finalmente o estabelecimento de uma metodologia para um processo
de transformação cultural, como ponto de partida para uma abordagem à
concretização da ideia que norteou este trabalho e que é a de que só pode haver
sucesso na implementação de um processo de transformação cultural, com um
horizonte temporal de médio e longo prazo, se existirem as condições para que
as lideranças, capazes de estabelecerem uma visão e definirem uma missão
para as organizações que lideram, preparadas para as dificuldades que estes
processos contêm, e aplicando as metodologias adequadas de avaliação de
uma cultura, os processos de preparação da organização para o atingimento de
metas nos pontos definidos da linha de tempo, curto, médio e longo prazo,
através da circulação da informação por todos os níveis da organização, de uma
forma planeada e controlada, para se poder alcançar um estado de congruência
e de motivação de todos os atores do processo e com o conhecimento das
ferramentas de produtividade disponíveis, possam efetivamente desafiar as
respetivas culturas organizacionais, liderando-as e induzindo as condições que
facilitem a integração e consolidação de valores como o respeito pelas pessoas
e a melhoria contínua, que são os pilares em que assenta toda a filosofia
operacional da Toyota e que podem ser considerados como valores absolutos.
- Estudo de caso
Procura-se aqui evidenciar a importância de realizar transformações culturais,
neste caso orientadas à concretização de uma cultura lean, por meio da
descrição de um exemplo de transformação das condições de eficácia e de
eficiência de uma pequena unidade orgânica de uma empresa, por meio da
alteração dos pressupostos culturais básicos do grupo integrado na unidade, da
consolidação de valores, do ensino de novas abordagens funcionais e,

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Liderança de pessoas em contexto Lean

fundamentalmente, pela criação de condições para que a unidade funcionasse


com base nos valores de respeito mútuo, melhoria contínua, com
autorresponsabilização de cada um dos seus elementos pela sua atividade e
participação ativa no desenho das condições operacionais.
Este processo foi liderado por um dos autores, liderando o processo de alteração
dos pressupostos básicos, passando em seguida para o desenvolvimento de um
papel de coach na fase de apoio ao desenho de uma nova arquitetura
operacional.
- Conclusões
Termina-se o trabalho concluindo que qualquer processo de transformação
cultural, no nosso caso uma transformação cultural para uma cultura baseada na
filosofia lean tem de assentar num conjunto de condições prévias que dão
suporte e consistência a esse processo e que referimos de seguida:
A partir do estudo realizado por Liker sobre a Toyota, no que se refere à sua
cultura organizacional e modus operandi, a designada Toyota Way e da
compreensão do modo como essa cultura se pode caraterizar, aplicando o
modelo de E. Schein, somos levados às considerações seguintes no que se
refere à liderança de um processo de mudança de uma organização para um
modelo baseado no modelo de referência Toyota, nos aspetos que podem e
devem ser integrados culturalmente e com os ajustamentos necessários
decorrentes das diferenças culturais:
-Uma cultura de sucesso tem na sua origem uma liderança que a cria, baseada
em valores, que só se sustenta no tempo se houver consistência na manutenção
dos valores que a suportam, com lideranças ativas na linha da frente e com os
colaboradores na organização a pautarem o seu comportamento por esse
mesmos valores, com motivação, empenho e sentido de propriedade.
- Que exista uma liderança preparada para a jornada sem fim que é a de
conduzir a organização para um objetivo ideal, em que a procura da excelência
operacional através da melhoria contínua é a sua situação normal.
- Que a liderança conheça profundamente os pressupostos básicos culturais que
vão ter que ser substituídos pelos que vão suportar a mudança e consolidação
da nova cultura e esteja motivada para o exercício de um esforço permanente e
sem tréguas no sentido de caminhar para esse objetivo, numa viajem sem fim.
- Que a liderança tenha uma visão e estabeleça a missão e objetivos que vão
nortear o processo de mudança.
- Que a liderança tenha condições para manter a jornada que a organização vai
realizar centrada no seu Norte Verdadeiro.

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Liderança de pessoas em contexto Lean

2 Cultura organizacional – Definição e caraterização

Definição
De acordo com E. Schein, cultura é o padrão de pressupostos básicos que um
determinado grupo inventou, descobriu ou desenvolveu na aprendizagem
decorrente de se confrontar com os seus problemas de adaptação externa ou
integração interna e que funcionou suficientemente bem para ser considerado
válido e, em consequência, ser ensinado aos novos membros como a forma
correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas.
E. Schein desenvolveu um modelo representativo de uma cultura, que é uma
pirâmide com três níveis, cada um dos níveis com caraterísticas específicas e
em que cada nível suporta os níveis mais elevados, que se pode descrever do
seguinte modo:
-Na base encontram-se os Pressupostos Culturais Básicos, que são tudo aquilo
em que as pessoas acreditam profundamente e sobre o qual atuam. São as
crenças inconscientes tomadas como garantidas acerca da organização e o seu
trabalho/propósito acerca das pessoas, recompensas e castigos.
-No nível intermédio existem as Normas e os Valores que representam a filosofia
da empresa, as suas normas e justificações. É o que é dito ser a razão por que
as coisas são como são e assim devem ser.
-Por último, no nível superior, aparecem os Artefactos e o Comportamento que
são aquilo que nós vemos, i.e. o código de vestuário, os organigramas, a
estrutura física, os graus de formalidade, os logotipos, as declarações de
missão, etc.

Diferenças culturais ocidente – oriente


O psicólogo holandês Geert Hofdstede e a sua equipa identificaram 5 dimensões
primárias que diferenciam as culturas nacionais:
1. Distância hierárquica, que significa a aceitação da desigualdade de poder
por alguém, que a essa desigualdade é submetido.
2. Individualismo e coletivismo, que expressa o grau de liberdade de um
indivíduo em relação ao grupo.
3. A quantidade na vida versus a qualidade de vida; a quantidade na vida
refere-se ao grau de prevalência de valores como a agressividade, a
busca por dinheiro e bens materiais e a competitividade; a qualidade de
vida refere-se ao grau em que as pessoas valorizam os relacionamentos e
mostram sensibilidade e preocupação com o bem-estar dos outros.
4. A redução da incerteza que se refere ao grau de tolerância que uma
cultura pode aceitar face à ansiedade provocada por eventos futuros.
5. A orientação curto prazo, longo prazo. Os valores associados ao curto
prazo são o respeito pelas tradições e o cumprimento das obrigações
sociais; ao longo prazo estão associados os valores da economia e
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Liderança de pessoas em contexto Lean

perseverança.
Em termos fundamentais verifica-se que a cultura do ocidente assenta na baixa
aceitação da distância hierárquica, no individualismo, na quantidade de vida,
uma baixa preocupação com a redução da incerteza e com uma orientação ao
curto prazo.
A cultura no oriente assenta na alta aceitação da distância hierárquica, no
coletivismo, na qualidade de vida, numa alta preocupação com a redução da
incerteza e com uma orientação ao longo prazo.

Cultura organizacional da empresa Toyota


Origem
A Toyota surgiu de uma empresa produtora de teares mecânicos automáticos
criada em 1926 e fundada por Sakichi Toyoda que, ao aperceber-se da violência
do trabalho de tecelagem, com base em teares mecânicos de madeira, que as
mulheres da sua família e amigas, numa pequena comunidade rural
desenvolviam, se preocupou em encontrar soluções para a melhoria do
funcionamento dos teares, que aliviassem a sua carga de trabalho, que se
exercia em condições de violência física.
A partir desta preocupação de procurar beneficiar as pessoas, melhorando
continuamente as condições de trabalho e da utilização das máquinas,
máquinas essas que foram evoluindo através de uma atividade baseada em
tentativa e erro, com atuação direta sobre o equipamento, lançou os
fundamentos sobre os quais se construiu a cultura da Toyota.
O propósito da empresa assentou em dois pressupostos fundamentais: O
benefício da sociedade e simultaneamente o benefício dos membros da equipa,
que constituíam a estrutura da empresa.
O seu filho Kiichiro Toyoda, que resignou após uma grave crise financeira que
motivou a saída de centenas de trabalhadores da empresa e o seu primo Eiji
Toyoda que lhe sucedeu, deram continuidade ao espírito do fundador, o que se
pode apreciar na crença fundamental que “As pessoas são o ativo mais
importante da Toyota e o elemento determinante na subida e queda da Toyota”.
Os líderes contemporâneos da Toyota mantiveram o foco no desenvolvimento
da cultura interna baseada nos valores de respeito pelas pessoas e da melhoria
contínua, mantendo ao mesmo tempo e em termos externos a intenção de
realizar contribuições positivas para a sociedade e o mundo, no sentido mais
lato.

A declaração Toyota Way 2001


Na Toyota, até à publicação do documento Toyota Way 2001, não existiam
registos escritos, que suportassem as operações da empresa e que refletissem
a sua cultura.
A cultura da empresa resultava de valores e crenças aceites, que eram

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Liderança de pessoas em contexto Lean

transmitidos oralmente. A integração dos novos colaboradores realizava-se ao


nível do treino e da atividade no posto de trabalho, sendo estes colaboradores
imersos no ambiente cultural, por ação dos seus líderes diretos, que no âmbito
das suas funções tinham como responsabilidade o desenvolvimento dos seus
colaboradores.
Em consequência da sua expansão tanto no Japão, como para outros países,
com outras culturas, muitas das quais baseadas em valores significativamente
diferentes, a Toyota sentiu a necessidade de produzir um registo escrito, que
permitisse descrever de uma forma clara, as caraterísticas essenciais da sua
cultura a todos os stakeholders da empresa, como forma de facilitar a sua
integração numa cadeia de valor alargada e onde fosse possível desenvolver
uma filosofia operacional, que permitisse à Toyota manter o seu rumo em
direção à excelência ou seja, ao seu Norte Verdadeiro.
A declaração Toyota Way 2001 consubstancia num modelo o modo de ser e de
estar da Toyota, a sua cultura designada por Toyota Way e foi publicitada
internamente em 2001, após intenso debate e decisão baseada em consensos,
refletindo também o modo de atuar da própria empresa. Este documento gerou
alguma preocupação internamente por ser considerado uma fotografia de um
determinado momento da cultura da empresa, logo algo estático, quando a
cultura é um estado imaterial e em permanente evolução, em consequência da
interação que se realiza entre a própria organização e o meio envolvente.
O modelo desenvolvido representa um edifício em que o teto, que é a
declaração Toyota Way 2001, é suportado por dois pilares, respeito pelas
pessoas e a melhoria contínua, que na Toyota é um imperativo para todos os
colaboradores, em qualquer nível, de aplicação sem questionamento, no seu
trabalho diário e nas interações com os restantes colaboradores.
- O pilar Respeito pelas pessoas significa que todos na Toyota devem respeitar
todos aqueles que têm uma qualquer relação com a Toyota, o que significa, no
fundo, todos sem exceção, até ao nível da sociedade em geral. O valor Respeito
pelas pessoas apoia-se em dois outros valores, um dos quais é o Respeito que
significa o respeito pelos outros, a procura da compreensão mútua, da
responsabilização própria e do dar o melhor para construir uma relação de
confiança mútua; o outro valor de suporte é o Trabalho em equipa em que se
estimula o crescimento pessoal e profissional e a partilha de oportunidades de
desenvolvimento e se maximizam as performances dos indivíduos e das
equipas.
- O outro pilar é a Melhoria contínua que reflete o valor que permitiu o
crescimento da empresa desde os tempos iniciais em que era uma empresa de
produção de teares e que se define como, nunca se estar satisfeito com a
posição em que se está, melhorando continuamente o negócio, aplicando com
vigor as melhores ideias e esforços. Este pilar apoia-se em três valores; Desafio,
Kaizen e Genchi Genbutsu.
Desafio significa visão de longo prazo, atacando os desafios com coragem e
criatividade, para a realização dos sonhos que se têm.
Kaizen significa a melhoria permanente das operações do negócio procurando a

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Liderança de pessoas em contexto Lean

inovação e evolução, continuamente.


Genchi Genbutsu significa que se acredita que só se alcançam objetivos o mais
rapidamente possível indo ao local onde as coisas acontecem, para se apurarem
os factos em primeira mão, a fim de se tomarem as decisões corretas através do
estabelecimento de consensos.
Respeito, trabalho em equipa, desafio, kaizen e genchi genbutsu estão no nível
fundacional que suporta o edifício, existindo para cada um destes valores
conceitos operacionais e técnicos, que permitem que sejam satisfeitos na
atividade corrente da empresa.

A empresa Toyota e as outras empresas – O que as distingue


As empresas, enquanto entidades económico-sociais, existem num contexto
cultural multinível e como tal, além de se poderem caraterizar pelos três níveis já
referidos anteriormente; os artefactos, as crenças e os valores e os
pressupostos culturais básicos, não deixam de ser influenciados por outros
domínios culturais como sejam as culturas industriais e as culturas nacionais.
Como se pôde apreciar anteriormente ao analisar as caraterísticas fundamentais
das culturas dos países, a cultura da Toyota é a mistura da cultura do Japão,
das condições particulares do local de origem, a prefeitura de Aichi, uma
comunidade rural remota, com características sociais baseadas na proximidade,
confiança e entreajuda, e também da influência da família Toyoda, das
lideranças excecionais que passaram pela Toyota e pelas características da
própria industria automóvel.
A cultura da Toyota, entre muitas fontes possíveis, pode avaliar-se através da
obra de Liker (2004), Toyota Way.
Toyota Way explicita os princípios de gestão da Toyota, num modelo baseado
numa pirâmide de 4 níveis, designados da base para o topo por Filosofia (
Philosophy), Processo (Process), Pessoas e Parceiros (People and Partners) e
Resolução de Problemas (Problem Solving), daí conhecida por 4P’s, das iniciais
dos termos em inglês e por 14 princípios, que nada mais são que declarações
de crenças e valores, que se integram nos 4 níveis e que se explicitam de
seguida.
-Filosofia - reflete o pensamento da empresa a longo prazo.
Princípio 1: Basear as decisões de gestão numa filosofia de longo prazo,
mesmo à custa de objetivos financeiros de curto prazo.
-Processo – implementação de um processo lean, que se concentra na
diminuição do lead time por eliminação do desperdício.
Princípio 2: Criar um processo de fluxo contínuo, para se trazerem os
problemas à superfície.
Princípio 3: Usar sistemas puxados a partir do cliente, para se evitar a
sobreprodução.
Princípio 4: Nivelar a carga de trabalho (heijunka).

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Liderança de pessoas em contexto Lean

Princípio 5: Criar uma cultura, no nível operacional, de paragem do processo


para resolução de problemas, para se conseguir qualidade à primeira.
Princípio 6: Normalizar as tarefas e os processos, para se implementar a
melhoria contínua e o empowerment dos colaboradores.
Princípio 7: Usar controlos visuais para se evidenciarem os problemas
ocultos.
Princípio 8: Usar tecnologia fiável e testada que sirva as pessoas e os
processos.
-Pessoas e Parceiros – desenvolver e desafiar os colaboradores e parceiros em
relações de longo prazo.
Princípio 9: Desenvolver líderes que, de um modo profundo, compreendam o
trabalho, vivam a filosofia da empresa e a ensinem aos outros.
Princípio 10: Desenvolver os colaboradores e equipas excecionais, que
sigam a filosofia da empresa.
Princípio 11: Respeitar os fornecedores, desfiando-os e auxiliando-os a
melhorar.
-Resolução de problemas – resolução de problemas e melhoria contínua são a
base da construção da learning enterprise.
Princípio 12: Genchi Genbutsu, vai e vê, para compreenderes profundamente
a situação.
Princípio 13: Decidir lentamente por consenso, considerando todas as
opções; implementa rapidamente as decisões tomadas.
Princípio 14: Criar a learning enterprise, por meio de reflexão sem descanso (
hansei) e de melhoria contínua (kaizen).

As empresas integradas na cultura ocidental, em concordância com as


caraterísticas já enunciadas anteriormente no que se refere às caraterísticas da
cultura ocidental em geral, têm uma orientação para o curto prazo, consideram
que o ambiente operacional é controlável e no sentido de compreender e
predizer o mundo tendem a acreditar no uso das regras da lógica formal. Estas
considerações levam-nas a considerar que para se alcançarem resultados
extraordinários, como os que se podem observar na Toyota, caso das reduções
de custo e redução de inventários, por exemplo, numa lógica de definição de
relações de causa e efeito, basta aplicar as ferramentas corretas de um catálogo
que se conhece e os resultados expetáveis ocorrerão.
Pelas diferenças que observamos no modo como se desenham as arquiteturas
entre a Toyota e as outras empresas podemos concluir que a criação de uma
cultura e respetivas condições de sustentabilidade, impõe à partida que se
devam considerar os aspetos culturais, como fatores críticos de sucesso, tanto
as suas forças como as suas fraquezas, aspetos esses que no caso da Toyota,
quando se procura perceber o que tem de diferente, não são percebidos, pois
estão integrados no nível mais profundo da sua cultura e que, no caso da
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Liderança de pessoas em contexto Lean

maioria das empresas, por não estarem integrados como elementos


fundamentais de criação de uma transformação cultural, onde se utilizam
ferramentas de produtividade, contaminam logo à partida as possibilidades de
sucesso e inviabilizam a manutenção de uma performance de exceção,
sustentável a longo prazo.

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Liderança de pessoas em contexto Lean

3 Liderança
Definição
Ken Blanchard (2007) define liderança como a capacidade de influenciar os
outros, libertando o poder e o potencial dos indivíduos e das organizações para
alcançar o bem superior.
Um nível superior de liderança vai muito mais longe do que apenas conseguir
por meio de influência, a realização de objetivos, sendo que ao considerar-se
alcançar um bem ou objetivo superior, se concretiza um processo de alcançar
resultados válidos, agindo ao mesmo tempo com respeito, preocupação e
justiça, para com o bem-estar de todos os envolvidos. Nestas condições uma
liderança em proveito próprio é uma impossibilidade, sendo um líder um servidor
no cumprimento da missão de criar as condições necessárias e motivação para
que aqueles que o rodeiam alcancem esse bem superior.
A liderança, na sua essência, exerce-se sempre no seio de um grupo, que se
agrupa em torno de um líder, no sentido de, através do esforço concertado do
mesmo, se conseguir alcançar algo que está em primeiro nível colocado no líder
e que é transmitido ao grupo, por meio de uma visão e do estabelecimento de
uma missão, que são compartilhados e aceites e que têm caraterísticas
fundacionais de um modo de estar.
É no seio deste grupo que se desenvolve uma cultura, conceito abstrato que
iremos abordar de seguida.

Liderança e cultura organizacional


De acordo com E. Shein liderança e cultura são as duas faces de uma mesma
moeda.
A cultura numa organização é resultado do comportamento de uma liderança
inicial, que ao atuar em função de um conjunto de valores que são os seus,
molda o modo como interagem os elementos dessa organização, mas ao
mesmo tempo e de um forma dinâmica desenvolve-se um conjunto de rotinas,
normas e estruturas, que dão corpo à necessidade que o grupo tem no exercício
da sua ação de encontrar um significado para o que faz.
Dado que o fenómeno de criação de uma cultura no grupo não é independente
do contexto em que o mesmo se encontra integrado, em consequência das
reações ao contexto envolvente, que são ou ameaças ou fatores favoráveis, cria
-se uma dinâmica no grupo, que o faz evoluir no sentido de criar cada vez
melhores condições de adaptabilidade a essas forças pressionando, por sua
vez, a liderança a ajustar-se também a essa evolução cultural.
Pode-se assim afirmar que a liderança induz a cultura que evolui e é, por sua
vez, condicionada por ela, ao longo da sua evolução.

Liderança e processos de transformação da cultura organizacional


Um processo de transformação cultural ocorre numa cultura estabelecida, que
xvii
Liderança de pessoas em contexto Lean

não contém em si mecanismos de defesa e de adaptação, para fazer face às


ameaças que sofre tanto do exterior como do interior. O processo é despoletado
pela liderança que ao avaliar e perceber as limitações que a cultura da
organização tem procura criar as condições para de um modo adaptativo a fazer
evoluir no sentido de, no interior dessa mesma cultura serem criadas as
condições de renovação da mesma.
Vamos de seguida abordar, de um modo sintético, um modelo de liderança para
a mudança.
Pat Zigarmi e Judd Hoekstra (Ken Blanchard, 2007) desenvolveram um Modelo
Estratégico para a Mudança, que assenta em oito estratégias que passamos a
definir:

Estratégia 1: Alargar a s oportunidades de envolvimento e influência.


O resultado esperado é a ADESÃO daqueles a que se está a pedir a
mudança, criando as condições para que as suas preocupações venham à
superfície para, em consequência e ao longo do processo poderem ser
resolvidas.

Estratégia 2: Explicar o argumento económico para a mudança.


O resultado esperado é um ARGUMENTO PERSUASIVO PARA A
MUDANÇA que ajuda as pessoas a perceberem a mudança proposta, os
seus fundamentos lógicos e por que é que o status quo deixa de ser uma
opção.

Estratégia 3: Visualizar o futuro


O resultado esperado é uma VISÃO INSPIRADORA que motiva os
colaboradores da organização e liberta o seu poder e potencial. Esta
estratégia tem o significado da existência do Norte Verdadeiro na Toyota e
permite desenvolver um sentido de pertença e de partilha, entre todos os
colaboradores sujeitos ao processo de mudança.

Estratégia 4: Experimentar para garantir o alinhamento


O resultado esperado é uma VOZ E INFRAESTRUTURA ALINHADAS. O
envolvimento dos colaboradores, nos vários níveis de planeamento e na
experimentação de soluções, incentivam um esforço colaborativo e ajudam a
construir a infraestrutura necessária para suportar a mudança.

Estratégia 5: Capacitar e encorajar


O resultado esperado são NOVAS COMPETÊNCIAS E COMPROMISSO para
as pessoas que vão estar sujeitas ao processo de mudança, o que significa
um empenhamento mais profundo de todas as pessoas, logo um

xviii
Liderança de pessoas em contexto Lean

enraizamento mais profundo nas várias etapas do processo de mudança.

Estratégia 6: Executar e apoiar


O resultado esperado é RESPONSABILIZAÇÂO E RESULTADOS
ANTECIPADOS, criando líderes nos colaboradores que, por sua vez, vão
descobrir a sua própria razão de ser no desfio partilhado e na divulgação do
apelo e da visão da mudança.

Estratégia 7: Inscrever e expandir


O resultado esperado são RESULTADOS SUSTENTÁVEIS, pois o reforço da
mudança em cada momento e antes do passo seguinte ser dado implica a
existência de consistência global no processo.

Estratégia 8: Explorar possibilidades


O resultado esperado é a existência de OPÇÕES com os colaboradores
envolvidos de um modo ativo, estando sempre informados do que é
necessário mudar. Só assim se pode esperar por parte dos envolvidos no
processo de mudança uma grande flexibilidade e capacidade de reação às
condições com que a organização se vai confrontando no seu percurso e que
impõem ajustamentos rápidos à nova realidade.

Liderança na Toyota
Do mesmo modo, na Toyota a definição acima referida, na sua essência, serve
perfeitamente, pois do mesmo modo o objetivo último da empresa é alcançar o
bem superior ou seja satisfazer da forma mais completa os seus stakeholders,
com uma visão de longo prazo, acreditando que só assim pode dar
sustentabilidade ao negócios pelo que, de cada membro da empresa, seja um
líder seja um membro de equipa, espera-se que a sua contribuição para a
consecução de um bem superior esteja presente em todas e em cada uma das
suas atividades.

Na Toyota a liderança exerce-se, ao contrário do que acontece na maior parte


das organizações ocidentais e também japonesas, tendo como base uma
compreensão profunda e uma vivência dos valores fundamentais da empresa,
num contexto de trabalho de equipa, em que tanto a liderança como o
desenvolvimento da liderança são aspetos intimamente ligados á filosofia da
própria empresa, que encara como essencial a procura permanente de líderes
dentro da sua organização e o seu desenvolvimento permanente, num quadro
de relação para a vida entre o colaborador e a empresa. Ao contrário nas
empresas ocidentais, em geral, a motivação principal é a realização de
resultados financeiros de curto prazo para os seus acionistas, o que
naturalmente induz uma filosofia de comando e controlo, em que os

xix
Liderança de pessoas em contexto Lean

colaboradores acabam por ser considerados como ativos descartáveis,


reduzidos a uma função de produção passiva e desmotivadora; nestas
condições, a liderança exerce-se centrada na vontade de ver cumpridas de um
modo acéfalo as suas orientações.
Continuando o percurso no entendimento dos valores fundamentais em que
assenta o exercício da liderança na Toyota ou o seu Norte Verdadeiro e, de
acordo com Liker e Convis (2012), consideram-se os seguintes valores:
Sentido de desafio: Valor que esteve na génese da empresa de teares, que
originou a Toyota e que motiva os colaboradores permanentemente na procura
da perfeição. O desenvolvimento de líderes resulta da colocação
fundamentalmente ao nível da operação, pelos professores e coaches e
ultrapassagem pelos potenciais lideres, de desafios cada vez maiores, em que a
aprendizagem é permanente em todas as situações, que no decurso do tempo
vão surgindo, seguindo um método formal, baseado no ciclo PDCA.
Mentalidade kaizen: Kaizen significa mudar para melhor e contêm implícito o
conceito de que todos os sistemas reais são imperfeitos, logo passíveis de
melhoria. A consequência desta mentalidade é uma pulsão para o
aperfeiçoamento contínuo e metódico da realidade envolvente, que se altera
dinamicamente e pode ser melhorada.
Ir e ver para compreender profundamente (Genchi Genbutsu): Valor que
reflete a importância que a Toyota dá ao trabalho em que se acrescenta valor e
significa que compreender profundamente as causas da geração de desperdício
ou de valor não acrescentado só é possível no gemba ou local onde as coisas
acontecem, e que toda a organização deve zelar para que os que, pela sua
atividade realizam trabalho em que acrescentam valor para os stakeholders
estejam permanentemente apoiados, no sentido de poderem contribuir com a
sua maior capacidade para a realização dessa condição.
Trabalho em equipa: Este valor resume a crença de que só o valor do
trabalho em equipa pode ter sucesso, ainda que a cada um dos seus membros
individualmente, seja propiciado um ambiente seja de formação seja de desafio,
que permite o seu crescimento quer pessoal quer profissional, sempre dentro
dos valores considerados fundacionais da empresa.
Respeito pelas pessoas: Este valor é o mais importante e difuso de todos,
porque é o tecido sobre o qual se desenvolve todo o processo de decisão. Este
valor reflete o desejo da Toyota em satisfazer as necessidades dos seus clientes
com os melhores produtos e serviços, gerando o máximo valor para todos os
stakeholders,

O modelo de desenvolvimento da liderança na Toyota, de acordo com Liker e


Convis (2012), assenta numa estrutura multiestágio ou modelo em diamante.
-No coração do diamante temos os valores do Norte Verdadeiro, descritos
acima, que são os seguintes:
-Sentido de desafio.
-Mentalidade kaizen
xx
Liderança de pessoas em contexto Lean

- Ir e ver (Genchi Genbutsu)


-Trabalho em equipa
-Respeito pelas pessoas

-No estágio 1, Compromisso com o autodesenvolvimento


O que distingue os líderes potenciais é a sua motivação para procurarem
melhorar continuamente, eles próprios e as suas competências. Este processo
deve evoluir, no entanto, por meio do estabelecimento de desafios que motivem
o seu autodesenvolvimento, acompanhado pelo apoio de coaches, que são os
seus chefes ou gestores mais experientes.
Deve ser uma aprendizagem dos valores do Norte Verdadeiro, por meio de
ciclos de aprendizagem repetidos ou kata.
-No estágio 2, Atuar como coach e desenvolver os outros
Ver e desafiar o potencial dos outros por meio de ciclos de aprendizagem em
autoaprendizagem.
O melhor modo de aprender algo é ensiná-lo e assim, enquanto se apoia o
desenvolvimento dos outros, melhora-se a competência de quem ensina.

-No estágio 3, Apoiar ações diárias de kaizen


Construir capacidades e competências locais através de gestão local e kaizen.
Neste estágio começa-se a desenvolver uma liderança institucional, com as
equipas focadas nos valores do Norte Verdadeiro, que fornece uma visão clara
e estável de para onde deve a empresa estar orientada; a visão é um alvo não
negociável.
Nesta fase os líderes devem manter as suas equipas capazes de realizarem
kaizen de manutenção – resolver as questões relativas à atividade diária e
manter os processos a funcionar dentro das normas correntes aprovadas e
kaizen de melhoria – elevando o nível de performance de cada processo a partir
das normas aprovadas.

-No estágio 4, Criar uma visão e alinhar os objetivos


Criar uma visão do Norte Verdadeiro e alinhar os objetivos vertical e
horizontalmente.
Nesta fase realiza-se o hoshin kanri, que é o processo do estabelecimento, por
consenso, de objetivos de melhoria no longo prazo e decidir da melhor alocação
de esforços e recursos, para se alcançarem esses objetivos.
Nesta fase alinham-se todos os esforços kaizen, no sentido da integração com
os objetivos globais da empresa i.e., os fluxos top-down e botton-up encontram-
se e conciliam-se.

xxi
Liderança de pessoas em contexto Lean

Em conclusão podemos afirmar que as condições de sustentabilidade no longo


prazo que uma organização, sujeita a um processo de transformação, que é
sempre fundamentalmente cultural, dependem fortemente de uma liderança que
conhece profundamente a cultura da mesma, que tem uma visão e estabelece
uma missão, que são assumidas e compartilhadas por todos aqueles que na
medida das suas capacidades atuam como agentes de mudança e que tem a
flexibilidade suficiente para manter os equilíbrios das subculturas existentes,
sem pôr em causa os valores que servem de fundação à construção dessa
organização.

xxii
Liderança de pessoas em contexto Lean

4 Coaching

Definição
Com o objetivo de iniciarmos este tema vamos expor algumas definições que
nos parecem as mais ajustadas ao contexto deste trabalho.
Uma das definições da Global Coaching Community é:
Coaching é uma metodologia de desenvolvimento humano, onde se cria um
contexto transformacional para o alcance de um estado desejado.
Outras definições são:
A arte de facilitar o desempenho, a aprendizagem e o desenvolvimento de um
outro (Downey, 2003) [tradução livre do inglês].
Coaching está diretamente relacionado com a melhoria imediata do
desempenho e do desenvolvimento de competências por um método de tutoria
ou instrução (Parsloe, 1995) [tradução livre do inglês].

O método de gestão operacional na Toyota, que M. Rother (2010) designa por


Toyota Kata, assenta em duas componentes designadas Improvement Kata e
Coaching Kata, em que o termo kata neste contexto, significa o exercício de
rotinas de liderança e de melhoria, que ocorrem de um modo sistemático e
contínuo no processo de gestão das pessoas na atividade corrente da Toyota e
cujo resultado tem sido uma operacionalidade de excelência ao longo do tempo,
de um modo sustentado e que se materializa, como consequência, em
resultados não comparáveis com empresas do mesmo setor de atividade.
A componente de gestão designada por Improvement Kata, que tem a ver com o
processo de concretizar o conceito de melhoria contínua, por meio de uma rotina
ou kata será tratada posteriormente; a componente Coaching Kata que tem a ver
com as rotinas associadas ao ensino e coaching do Improvement Kata em toda
a organização vai ser tratada a seguir.
Avaliando estas definições verificamos que, no caso da Toyota, os valores do
Norte Verdadeiro implicam um modelo de organização, que pressupõe o
desenvolvimento das pessoas e a melhoria contínua, o que significa a existência
de uma malha de inter-relações, tanto vertical como horizontalmente, entre todas
as funções e colaboradores que só se mantem coesa se houver um
compartilhamento permanente dos valores, cimentado nas relações mestre-
aluno que se vão desenvolvendo dinamicamente e sempre orientadas a um
objetivo seja de grupo seja individual.
É esta situação que vamos procurar perceber no desenvolvimento do estudo da
componente Coaching Kata, do modelo de Rother (2010), Toyota Kata, no
modo de operar da Toyota e do impacto que tem na consolidação da sua cultura
que, como sabemos, tem caraterísticas que a tornam diferente das restantes
culturas industriais.
xxiii
Liderança de pessoas em contexto Lean

Toyota Kata – Coaching Kata


Na Toyota, um dos conceitos chave na sua filosofia operacional é a melhoria
contínua e a capacidade de adaptação do seu processo de negócio bem como o
desenvolvimento das pessoas, que se expressa através da aplicação do
conceito de Improvement Kata, que ocorre continuamente em todas as
operações diárias e em todos os níveis.
Koichi Shimizu na análise do sistema produtivo da Toyota verificou que só 10%
da atividade de melhoria dos processos resulta da intervenção dos operadores
dos processo (membros de equipa); os restantes 90% estão nas mãos dos
líderes de equipa, líderes de grupo e engenheiros.
Que comportamento organizacional foi então desenvolvido no tempo, no sentido
de, ao mesmo tempo que os membros das equipas procuram manter as
operações que realizam dentro das especificações definidas ao nível das
normas de trabalho, os seus líderes e gestores atuam como professores e
coaches, no sentido de desenvolverem os membros das suas equipas e,
concomitantemente, criarem as condições para a implementação com sucesso
do conceito de Improvement Kata?
As rotinas do Improvement Kata são uma atribuição dos gestores e líderes, que
as ensinam aos seus membros de equipa, nas práticas diárias das diversas
atividades e as mantêm ativas com eficácia, numa relação mentor-mentee ou
mestre-aprendiz pois, como parece evidente, se não houver ninguém a observar
os comportamentos na operação e a realizar feedback aos membros das
equipas, muito provavelmente algumas rotinas erradas na operação serão
internalizadas, com consequências penalizadoras para a eficiência global das
operações.
Assim sendo pode-se afirmar que o papel principal dos gestores e líderes é
aumentar a capacidade dos membros das equipas, em sentido lato e de
introduzir de um modo sistemático, melhoria nos processos que controlam,
sendo assumido que esta capacidade é uma das forças competitivas principais
da empresa. Os gestores e os líderes desenvolvem os colaboradores e estes por
sua vez melhoram os processos por meio da aplicação do Improvement Kata.
As rotinas do Improvement Kata, nada mais são do que um conjunto de linhas
de ação comportamentais, que se aprendem por meio de uma prática repetida,
assistida por um mentor, que se internalizam e se tornam uma segunda
natureza, o que pressupõe a existência por parte dos gestores e líderes, na sua
atuação como professores e coaches, por um lado, de um conhecimento
profundo da prática do Improvement Kata e por outro lado, de terem uma grande
capacidade de atuarem no gemba (o local onde as coisas acontecem).
O que foi referido significa a assunção de que aprender, treinar e fazer, são
várias facetas de um comportamento que procura alterar uma realidade que é
imperfeita, caótica e dinâmica e que só se pode influenciar gradualmente
desenvolvendo os colaboradores e melhorando os processos sistematicamente
com os colaboradores como elementos ativos, fundamentais no processo de

xxiv
Liderança de pessoas em contexto Lean

mudança, sendo permanentemente apoiadas pelos seus líderes, que além de


atuarem como professores e coaches, também são interventores nesta procura
permanente da excelência.
Nas suas tarefas de ensinar e fazer coaching os gestores e líderes da Toyota
seguem uma rotina no sentido de também se desenvolverem como pessoas e
melhorarem as suas competências. Esta rotina designa-se por Coaching Kata.
Na Toyota, o Coaching Kata é a rotina que se aplica para se ensinar o
Improvement Kata e baseia-se no resultado da interação e do diálogo mentor-
mentee, que mais à frente se explica. Assim na Toyota, em consequência, todos
os colaboradores têm um mentor.
Uma kata é fundamentalmente uma prática ou rotina, baseada sempre nas
mesmas sequências, que tem como objetivo para quem a pratica de um modo
sistemático alcançar a mestria num domínio de ação.
Assim cada elemento de uma equipa, no chão de fábrica, tem um mentor que é
o seu líder de equipa; este líder de equipa por sua vez tem um mentor que é o
líder de grupo e assim sucessivamente ao longo da estrutura hierárquica, de
modo a conseguir-se que cada mentor possa ter pelo menos também um
mentor.
É esta relação mentor-mentee que cria as condições para o desenvolvimento de
todos os colaboradores e para o aperfeiçoamento das suas competências ao
longo do seu percurso na estrutura hierárquica, com a aplicação do Improvement
Kata e do Coaching Kata.
O diálogo mentor-mentee é similar ao processo tradicional de transmissão de
conhecimento técnico específico, baseado na relação mestre-aprendiz, em que o
aprendiz, através da colocação pelo mestre de questões e desafios, vai
evoluindo por si só na descoberta do caminho que o leva ao objetivo proposto
que é a mestria no domínio desse conhecimento técnico.
Na relação mentor-mentee, no tratamento de uma questão a resolver e a partir
de uma proposta do mentee, desenvolvem-se vários ciclos de atividade
condicionados por desafios colocados pelo mentor, que levam a que o mentee
aprofunde a sua análise dessa questão até o mentor considerar ter sido
alcançado o objetivo, que é a manifestação objetiva da evidência do mentee ter
percebido de um modo profundo a questão em causa. Os passos seguintes,
sempre com a supervisão do mentor, são a análise da situação, a definição do
objetivo a alcançar (target condition), o plano de ação a implementar e o
desenvolvimento dos vários ciclos PDCA (Plan, Do, Check e Act) a concretizar.
No decorrer destas várias atividades o mentee justifica ao mentor todas as suas
ações e define antecipadamente os resultados esperados com cada ação; o
mentor avalia o mentee e aprecia, o quê e como pensa o mentee e também
como este se aproxima da questão em aberto.
O mentor ensina ao mentee a rotina do Improvement Kata fornecendo-lhe
orientação, passo a passo, em função das reações e das respostas do mentee
no evoluir do processo.
A medida da realização do mentor neste processo no âmbito da sua atividade
xxv
Liderança de pessoas em contexto Lean

está ligada à capacidade que o mentee evidencia, ao alcançar a target condition


de um modo independente.
Um aspeto também muito importante na relação mentor-mentee tem a ver com a
responsabilidade pelo resultado da ação realizada. A responsabilidade do fazer
é do mentee, tendo o mentor que o acompanhar sem fornecer a solução. Se o
mentee falhar é o mentor que é responsabilizado, porque se assume que se o
estudante falhou é porque o mestre não soube ensinar. Esta partilha de
responsabilidade no processo de, sistematicamente, se implementar o
Improvement Kata, na procura e alcance da target condition definida, desenvolve
uma relação de confiança muito forte entre o mentor e o mentee, que gera uma
melhoria importante na eficácia do processo de desenvolvimento de ambos.
Um último aspeto na relação mentor-mentee tem a ver com a aprendizagem que
resulta das lições aprendidas a partir da análise dos pequenos erros cometidos
pelo mentee, erros esses que se procura que não ponham em risco a relação
com o cliente. Neste ponto o mentor deixa o mentee cometer pequenos erros, o
que por um lado permite ao mentor conhecer as necessidades de coaching que
o mentee necessita e por outro lado, permite ao mentee analisar os erros
cometidos, aplicando as ferramentas que estão disponíveis e evoluir
(desenvolvimento pessoal) na aplicação do Improvement Kata.
As vantagens para o desenvolvimento dos colaboradores resultantes do
estabelecimento de relações mentor-mentee estabelecem-se a seguir:
Os líderes podem avaliar o modo como o mentee pensa sobre a situação dos
processos e, em consequência, definir o passo seguinte e também que
competências necessita o mentee de exercitar para se tornar um solucionador
de problemas melhor. A intervenção dos mentores deve ser orientada à
pesquisa das necessidades dos colaboradores em competências orientadas à
resolução de problemas, pelo que se devem abster de lhes dizer o que fazer.
Aprender fazendo por tentativa e erro, sob orientação de um mentor, é o método
mais eficaz de haver desenvolvimento do colaborador.
A aproximação mentor-mentee desenvolve a responsabilidade e iniciativa
individual, mantendo o alinhamento entre os objetivos da empresa e os
comportamentos no local de trabalho. Ela fornece foco, direção e controlo,
permitindo no entanto que os colaboradores desenvolvam as suas próprias
capacidades.
As necessidades formação do mentee e a situação real determinam a ação
seguinte do mentor, no que se refere ao treino e ações de mentoring.
Esta situação reflete a situação do fluxo de informação, que sobe e desce na
estrutura, permitindo a sincronização entre as decisões estratégicas e a situação
ao nível do processo, no fundo, exercitando as condições para que o hoshin
kanri possa ser transformado numa rotina de gestão.

xxvi
Liderança de pessoas em contexto Lean

xxvii
Liderança de pessoas em contexto Lean

5 Processos de transformação cultural – Cultura Lean

Um processo de transformação cultural, normalmente, gera resistências que, do


ponto de vista coletivo, têm raízes nos pressupostos básicos culturais e que, do
ponto de vista individual, resultam de angústias resultantes da incerteza de um
futuro que nos afasta da nossa zona de conforto.
Nas situações em que o processo terminou numa situação de insucesso parcial
ou total, a análise das causas do insucesso aponta fundamentalmente para os
aspetos que estão escondidos nos níveis mais profundos da cultura que se
deseja mudar, ou seja os pressupostos básicos culturais.
É nossa convicção que, em consequência do que foi referido aquando da
preparação da decisão de transição de uma determinada cultura para uma
cultura baseada numa filosofia lean, em condições de se poder razoavelmente
assegurar a sua manutenção no longo prazo e porque acreditamos que as
ferramentas disponíveis só podem gerar eficiência operacional quando utilizadas
num tecido cultural que garanta a sua integração a ponto de serem consideradas
como artefactos culturais, há uma condição fundamental que tem que estar
satisfeita, que é o reconhecimento dos elementos culturais que podem bloquear
o processo e a existência de contramedidas no terreno para inibirem o
desenvolvimento desses elementos.
Pensamos que, assumindo que os resultados que se desejam para a
organização são os que suportam a filosofia lean, i.e., a criação de valor para
todos os stakeholders da empresa, de um modo sustentável a longo prazo, por
eliminação do desperdício em toda a cadeia de valor, a primeira preocupação
que a liderança tem que ter é a realização de uma avaliação tão profunda
quanto possível à cultura existente, no sentido de nesta fase se poderem extrair
conclusões sobre as forças e as fraquezas que essa cultura contém e cujo
reconhecimento será determinante para se poderem alavancar as forças e inibir
as fraquezas no processo de transformação.
As ferramentas que poderão ser utilizadas na operacionalização do modelo de
atividade que se vai querer alcançar, devem ser utilizadas dentro de um contexto
cultural que facilitará a sua integração no modo como as coisas se fazem,
contexto esse que evoluirá e se consolidará até se poder afirmar que um novo
paradigma comportamental existe.
Tem que estar permanentemente presente neste processo evolutivo, que
falamos de sistemas dinâmicos, em que não se pode ter a presunção de que se
vai poder alcançar um objetivo ideal bem definido no futuro. O objetivo é um
limite para o qual a organização tende, como o caso do Norte Verdadeiro na
Toyota e as trajetórias que se vão estabelecendo na sua procura vão sendo
ajustadas em função dos constrangimentos externos e também internos, que
irão condicionar esses caminhos de procura.
Abordaremos, mais à frente, como a Toyota desenvolveu rotinas internas que
permitem, em permanência, na sua atividade diária, manter o processo
transformacional ativo e alinhado com a procura dos seus objetivos ideais, o seu
Norte Verdadeiro, objetivos esses que resultaram das convicções dos líderes
xxviii
Liderança de pessoas em contexto Lean

iniciais e que foram sendo integrados culturalmente ao longo das décadas de


vida da empresa e reforçados pelo sucesso contínuo que a empresa evidenciou.
Falamos do conceito Toyota Kata.
Vamos tratar agora, da revisão dos aspetos culturais a ter em consideração na
fase de preparação da decisão de mudar culturalmente, seguindo o pensamento
de E. Schein, um psicólogo social com quem nos identificamos no que se refere
à problemática da cultura organizacional corporativa.
E. Schein define cultura como o padrão de pressupostas básicos que um
determinado grupo inventou, descobriu ou desenvolveu na aprendizagem
decorrente do confronto com os seus problemas de adaptação externa ou
integração interna e que funcionou suficientemente bem para ser considerada
válida e, em consequência, ser ensinada aos novos membros como a forma
correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas.
E. Schein define três níveis culturais, Artefactos e Comportamento no nível
superior, os aspetos mais evidentes da cultura organizacional, Normas e Valores
num nível intermédio, mais difícil de interpretar e a que se acede através das
pessoas na justificação dos seus comportamentos e Pressupostos Culturais
Básicos, o nível mais profundo, que são tudo aquilo em que inconscientemente
as pessoas acreditam, nas crenças inconscientes, que as conduzem sem que
estas tenham uma perceção clara dessa ação.
Quando existe a intenção de lançar uma iniciativa de transformação cultural,
neste caso falamos de uma cultura emergente da vontade de concretização de
uma filosofia lean, tem que se minimizar o risco de surgirem forças
inconscientes, que muitas vezes bloqueiam qualquer possibilidade de progresso
no processo de transformação.
Uma metodologia para evidenciar as caraterísticas culturais existentes, tanto as
positivas como as negativas, esboça-se a seguir, com o objetivo de apoiar a
preocupação de melhorar as possibilidades de sucesso no processo de
transformação através da criação de condições culturais facilitadoras. Uma
abordagem mais profunda consegue-se a partir do estudo da obra de E. Schein,
The Corporate Culture, Survival Guide (Jossey-Bass, 2009).
Os pressupostos culturais básicos são partilhados, tácitos e inconscientes. Para
que os possamos tornar evidentes reunimos numa sala com paredes disponíveis
para a colocação de folhas de flip-chart, 10 a 15 pessoas da organização,
escolhidas por consenso entre o líder do processo de mudança e um facilitador
e que atuam em vários níveis hierárquicos e funções, que representam as áreas
da organização sobre que vai incidir fundamentalmente o processo de mudança,
i.e., o problema a resolver para a organização.
O processo de análise das caraterísticas culturais desenvolve-se como segue:
- Definição do problema a resolver; que é passagem para uma cultura
baseada numa filosofia lean, por meio de um processo transformacional, a partir
da cultura existente (30min).
- Revisão do conceito de cultura e os seus três níveis (15min).
- Identificação e listagem pelo grupo dos Artefactos e Comportamentos
xxix
Liderança de pessoas em contexto Lean

(60min).
- Identificação pelo grupo dos Valores a que organização aderiu (30min).
- Comparação entre Valores e Artefactos (60min).
- Avaliação dos Pressupostos Culturais Básicos (45min).
- Decisão do próximo passo a seguir levando a uma de três possibilidades
(45min):
- Repetir o processo anterior com outros grupos escolhidos para o efeito.
- Prosseguir com o programa de transformação cultural com suporte nas
forças culturais.
- Prosseguir com o programa de transformação cultural para ultrapassar as
barreiras culturais.

Ultrapassada esta fase do processo sabe-se com algum rigor onde se


encontram as barreiras culturais que se concretizam em ações de resistência à
mudança, efetuadas por pessoas, individualmente ou agregadas em funções, e
em consequência que plano(s) se podem colocar em ação no sentido de se
poder desenvolver e concretizar um plano de ação, para o realinhamento dessas
pessoas, com os novos objetivos definidos para a organização ou, no caso de tal
não ser possível, de se poder neutralizar essa ameaça.
Também se ficam a conhecer as forças culturais que podem alavancar os
esforços de mudança, introduzindo uma energia adicional num processo que,
por ter um horizonte de implementação de muito longo prazo, requer um esforço
intenso e continuado, sob pena de existir um regresso a uma situação de
partida.
Antes de se apresentar uma proposta de metodologia a aplicar num processo de
transformação cultural iremos abordar o modo como na Toyota se dá
consistência a uma transformação cultural continuada, que foi integrada desde o
início no seu DNA, por meio das duas declarações chave de valor que são:
Respeito Pelas Pessoas e Melhoria Contínua.

Caraterização do modelo cultural da Toyota

Toyota Kata
Toyota Kata refere um estado organizacional específico da Toyota, que tem
duas componentes, Improvement Kata e Coaching Kata.
Iremos tratar o primeiro dos dois, Improvement Kata.

Improvement Kata
A Toyota é um caso de estudo há mais de 20 anos, devido ao seu extraordinário
sucesso continuado, ao nível dos resultados e do seu pensamento e práticas de
xxx
Liderança de pessoas em contexto Lean

gestão.
Todavia, mesmo considerando todos os estudos realizados e a replicação das
práticas e técnicas, profundamente conhecidas, que a Toyota aplica na sua
organização, nenhuma organização fora do grupo de empresas Toyota, foi
capaz de se aproximar dos resultados extraordinários que esta,
consistentemente, apresenta. Esta situação leva a interrogações sobre o que
existirá mais na sua organização, que a torna mais capaz que as outras
organizações de melhorar continuamente e de se adaptar com sucesso, às
condições internas e externas, dinâmicas e imprevisíveis.
Mike Rother, em consequência da sua experimentação em situação real e da
sua observação em primeira mão, tanto na Toyota como em outras
organizações, concluiu que, na Toyota, além das ferramentas e técnicas
aplicadas na resolução dos problemas diários, a parte visível, existia uma parte
invisível, que eram rotinas de pensamento e ação, particularmente na gestão,
que serviam de suporte às primeiras.
Esta parte invisível, que são conjuntos de sequências de procedimentos,
padrões de pensamento e de ação, são repetidos continuamente na atividade
diária de todas as pessoas da organização e conduzem ao resultado desejado.
Estes padrões de comportamento são o contexto dentro do qual as ferramentas
e os princípios da Toyota funcionam.
Estes padrões ou rotinas de atividade são designados no Japão, kata, podendo
também definir-se a palavra kata, como um modo de manter duas coisas
alinhadas ou sincronizadas uma com a outra.
O termo kata sugere que, embora as condições envolventes de uma
organização estejam sempre a mudar de modo imprevisível, a mesma pode ter
um método, uma kata, para lidar com essa mudança.
A nossa capacidade de controlar a realidade envolvente é limitada, no entanto,
podemos controlar o processo que nos vai permitir enfrentá-la. O controlo desse
processo realizado por um procedimento ou uma rotina, pode designar-se por
kata.
Uma kata, um modelo de comportamento, utilizada nos processos de melhoria
continua e de adaptação deve ter alguns atributos:
- Deve operar, particularmente, ao nível do processo, portanto no nível de
detalhe.
- Deve tornar-se no modo como trabalhamos ao longo do dia, pois o objetivo é
melhorar em cada processo, em cada dia, de um modo pré-definido e estável.
- Deve ter conteudo neutro, i.e, ser aplicável em qualquer situação; o método
deve ser previsto, o conteudo não, dada a imprevisibilidade das situações a
ocorrer.
- Deve ser baseada em fatos, despersonalizada, eliminando-se a
subjetividade.
- O método para a melhoria deve subsistir além de quem chefia no momento,
permanecendo estável e confiável.

xxxi
Liderança de pessoas em contexto Lean

Mike Rother, no seu estudo, identifica duas kata fundamentais na Toyota, a


Improvement Kata, que é a rotina repetida, pela qual a Toyota melhora, se
adapta e evolui, e que será tratada neste ponto e a Coaching Kata, que é a
rotina repetida, pela qual os lideres e gestores da Toyota ensinam a
Improvement Kata a todos, sem exceção, na organização. A Coaching Kata já foi
abordada anteriormente.
Este conhecimento que Mike Rother acumulou ao longo do tempo foi vertido
para uma obra sua, designada Toyota Kata, que é seguida de muito perto neste
trabalho.

Para compreender a Improvement Kata há que considerar dois aspetos do


contexto em que a mesma se desenvolve: a filosofia do negócio ou objetivo da
empresa e o seu sentido de direção global.
- O primeiro aspeto é a filosofia do negócio da empresa, que pode ser apreciada,
ao observarem-se, ao nível do chão de fábrica e não nas declarações formais, o
modo como as pessoas atuam; o que é importante para elas, o que medem,
como reagem às perturbações.
A filosofa do negócio segue fundamentalmente duas linhas: a linha centrada na
satisfação do cliente, apresentando-lhe bons produtos, sem nenhuma
preocupação que não seja o resultado e a linha centrada no envolvimento das
pessoas, na melhoria continua de todos os processos, a todos os níveis, e da
adaptação rápida aos contextos imprevistos, garantindo como resultado o
fornecimento contínuo de bons produtos ao consumidor.
Numa filosofia centrada no resultado, os processos de melhoria e de adaptação
são add-ons, algo que se realiza quando há tempo ou quando surge uma
necessidade especial. Pelo contrário, numa filosofia centrada na melhoria
contínua e na adaptação, em que os processos de melhoria e de gestão são
faces da mesma realidade, o resultado, que assegura a sobrevivência no longo
prazo da organização surge, naturalmente, como consequência; o foco está no
modo como as pessoas tratam os detalhes do processo, que é o que vai gerar o
produto e logo, o resultado.
A Toyota por meio da Improvement Kata assumiu desde o início esta segunda
filosofia, que tão bons resultados lhe tem propiciado.
- O segundo aspeto tem a ver com o sentido de direção. Uma filosofia de
melhoria ou o Improvement Kata é importante; no entanto se pensarmos em
ação como o elemento gerador de evolução, idealmente, a mesma deve conter
igualmente forma (uma rotina ou kata) e direção; como exemplo tomemos a
seguinte declaração: melhoria é igual a eliminação de desperdícios; o resultado
negativo deste tipo de pensamento tem dois elementos, um elemento que é a
dificuldade em discernir o que é importante melhorar e o outro elemento que é a
tendência que temos para maximizar a eficiência de uma área de atividade à
custa de outra, mudando o desperdício de uma para a outra, em vez de otimizar
e sincronizar o conjunto.
Uma organização humana para ser adaptativa, de um modo consciente e
xxxii
Liderança de pessoas em contexto Lean

intencional, tem de ter uma visão de longo prazo, que lhe aponte um ponto, no
futuro, onde vai querer estar, pois a visão de longo prazo é algo que podemos
escolher e definir e a adaptação às condições que irão ocorrer de um modo
aleatório não é, pelo que, para existir algo que alinhe a organização, define-se a
visão ou fornecedor de direção, que não é um objetivo quantitativo, mas uma
descrição alargada da condição em que gostaríamos de estar, num ponto
afastado no futuro.
Mike Rother (2010) define melhoria contínua e adaptação, na direção de uma
visão, como um movimento dirigido a um estado desejado, que acontece num
território desconhecido, sendo sensível a, e respondendo no terreno, às
condições existentes no momento.
Uma visão de longo prazo ou direção ajuda à focalização do nosso pensamento
e ação, porque sem ela, as nossa propostas são avaliadas independentemente,
ficando a evolução da organização dependente de forças arbitrárias e
desgarradas, em vez de se considerarem parte do esforço realizado, de um
modo disciplinado e articulado, em direção a algo.
Como exemplo do que se referiu atrás apresentamos a visão de longo prazo da
Toyota para as suas operações de produção:
. Zero defeitos
. 100 por cento de valor acrescentado
. Fluxo peça a peça, em sequência e de acordo com a procura
. Segurança para as pessoas
A Toyota considera estas condições ideais, como o modo de produzir com a
mais elevada qualidade, ao menor custo e com o menor lead time, passando
recentemente a considerar este conjunto de condições como o Norte Verdadeiro
para a produção. Este conceito Norte Verdadeiro pode ser considerado ideal e
não alcançável, mas serve como um fornecedor de direção, orientando os
esforços, no sentido de uma aproximação continuada e progressiva, por
pequenos passos, a esse fim e eliminando a perda de energia resultante das
discussões, que resultam de haver falta de orientação dirigida a uma visão.
A evolução e melhoria, nessa direção, em todas as atividades é um farol para a
produção da Toyota e não tem sido alterada. Tanto a filosofia da empresa de
procura permanente da sobrevivência, por meio da melhoria contínua, como este
fornecedor de direção ou visão, mantiveram-se consistentes,
independentemente de quem conduzia os destinos da organização.
- Como a visão está colocada longe no tempo e a trajetória em direção à mesma
é longa, pouco clara e imprevisível, a Toyota move-se na sua direção atuando
de acordo com target conditions, termo também criado por Mike Rother (2010).
As pessoas na Toyota aprendem a agir e evoluir na direção de sucessivas target
conditions, sempre com o foco na direção de uma visão a ser perseguida. Esta
condição representa, por um lado, estar um passo mais perto na direção da
visão e, por outro lado, um desafio, que normalmente vai além da capacidade
existente, obrigando ao envolvimento e aprendizagem.

xxxiii
Liderança de pessoas em contexto Lean

Uma target condition pode ser vista como um estado desejado no muito curto
prazo, muito mais claramente definido, que uma visão distante. Do mesmo modo
que uma visão, uma target condition não é um objetivo financeiro ou
contabilístico, mas a descrição de uma condição a ser alcançada.
Uma vez estabelecida, uma target condition deixa de ser opcional e facilmente
alterável, para que haja coerência na preparação e desenvolvimento das ações
para o seu alcance. O modo como se chega a uma target condition é opcional e
explora o melhor que os seres humanos apresentam em termos de criatividade e
de recursos pessoais, no sentido de se alcançarem novos níveis de
performance.
Sem um sentido de direção tendemos a utilizar análises custo-benefício, de curto
prazo, para decidir e escolher, numa abordagem caso a caso, se algo deve ser
realizado, em que direção apontar e que fazer, em vez de se trabalhar através
de dificuldades desafiantes, no caminho de um novo nível de performance.
A Toyota também aplica a análise custo-benefício (ACB), mas para determinar
como se chega a uma target condition, cuja definição é sempre a primeira ação
a ser realizada, i.e., a Toyota aplica a ACB não para decidir se algo deve ser
realizado, mas para decidir como deve ser realizado, dentro dos
constrangimentos normais do orçamento.
Em síntese, a capacidade para uma organização ser competitiva e sobreviver
reside, não só nas soluções que encontra, mas também na capacidade das
pessoas dessa organização em compreenderem as situações, desenvolverem
soluções e aprenderem acumulando conhecimento.

Iremos, de seguida, abordar o método inerente ao conceito de Improvement


Kata, recordando que esta kata, além de descrever uma rotina para a melhoria
continua, é também parte do modo como a Toyota gere as pessoas no dia a dia.
Todas as pessoas na Toyota são ensinadas a atuar de acordo com as linhas
desta aproximação sistemática.
O modo como a Toyota responde à questão: O que devemos fazer?, é o
seguinte:
A rotina Improvement Kata, repetida continuamente, concretiza-se assim:
- Considerando a visão, a direção, ou um objetivo.
- Com a situação atual apreendida em primeira mão.
- É definida a próxima target condition alinhada com a visão.
- Quando se realiza a movimentação, passo a passo, em direção à target
condition definida, revelam-se os obstáculos, que evidenciam o que é
necessário resolver, gerando, como consequência a aprendizagem, que se
vai transformando em conhecimento.
Como se pode apreciar, a target condition desempenha um papel fulcral na
Improvement Kata.
Em qualquer processo de melhoria e de gestão eficaz, por razões que têm a ver
xxxiv
Liderança de pessoas em contexto Lean

com a evolução rápida e contínua, está pressuposta a existência de uma target


condition, que focaliza os esforços das pessoas da organização nas
necessidades atuais, no que se deve fazer e não nas várias ideias e opiniões
acerca do que se pode fazer.
Uma target condition descreve um estado futuro desejado e responde a
questões como:
- Como deve este processo operar?
- Qual é o padrão normal esperado?
- Que situação esperamos ter aplicada num momento definido no futuro?
- Onde queremos estar a seguir?
É importante reconhecer a diferença entre target e target condition; a primeira é
um resultado e a segunda é uma descrição de um processo operando de um
modo - um padrão – necessário para alcançar o referido resultado.
É importante ter targets de resultados quantitativos, mas ainda mais importantes
são os meios, pelos quais se alcançam esses resultados; é aqui que a
Improvement Kata, incluindo as target conditions, se evidencia. Quando se
coloca a questão de se procurar um novo target num processo, deve-se estudá-
lo em profundidade, estabelecer a próxima target condition desse processo e, de
seguida, atacar os obstáculos que se levantam no caminho para essa target
condition, integrando o conhecimento que resulta do processo de melhoria,
Uma target condition deve conter em si um desafio, que se situe no intervalo
entre o fácil e o impossível que é onde, após ter sido alcançada, é suscitado um
sentimento de realização, de conquista e de progresso, que aumenta a
motivação e o desejo de aceitar mais desafios; estamos a falar de
comportamento humano e das suas motivações para o sucesso.
Com o tempo e a prática desenvolve-se, normalmente, um pensamento
orientado à definição de target conditions, em que, face a um obstáculo no
caminho para alcançar esse objetivo, imediatamente são colocadas uma série
de questões, do tipo:
- Face ao obstáculo, ainda não estamos lá!
- Que nos está a inibir de alcançarmos a target condition?
- A gestão é responsável, não o operário.
- Qual é o próximo passo?
Uma target condition é sempre desenvolvida fora do domínio de uma situação
corrente, por meio de observação direta e análise, emparelhada com a
compreensão da direção, visão, objetivo ou necessidade existentes. É
necessário compreender adequadamente a condição atual para se poder definir
uma target condition apropriada.
Uma target condition descreve um estado em que nós, num ponto de tempo no
futuro queremos estar, alinhados com uma visão de mais longo prazo; um fator
importante no seu estabelecimento é desenhar uma linha entre a target condition
e, em contraste, contramedidas ou passos, pois a mesma deve descrever a
xxxv
Liderança de pessoas em contexto Lean

condição desejada, mas não o modo de a alcançar. As contramedidas são o que


se desenvolve após a target condition ter sido definida, e se está já num
caminho de procura do seu atingimento.
Como um princípio básico, a target condition para um processo de produção
tende a incluir as quatro categorias, que a seguir se definem:
1- Etapas do processo, sequência e tempos
Qual a sequência de etapas necessária para se completar um ciclo ao longo
do processo. Quanto demora cada etapa e quem a conduz?
2- Caraterísticas do processo
Outros atributos do processo:
Número de operadores.
Número de turnos.
Onde está planeado o fluxo 1x1.
Onde vão ficar os buffers (incluindo a quantidade prevista).
Tamanho do lote/EPEI/Tempos de mudança de formato.
Padrões heijunka/leveling.
3. Métricas do processo
Métricas para controlar a condição do processo em incrementos de tempo
curtos, em tempo real, enquanto o processo está a correr, para apoio nos
esforços de melhoria, tais como:
Tempo de ciclo atual para cada etapa, por peça ou por quantidade normal
de peças (um tabuleiro ou uma camada)
Flutuação da quantidade de ciclo para ciclo
4. Métricas de resultado
Como exemplo:
Número de peças produzidas por incremento de tempo.
Produtividade.
Indicadores de qualidade.
Custo.
Flutuação na saída de turno para turno.

As três primeiras categorias são usadas na condução do processo de melhoria,


dia a dia, através da Improvement Kata. A quarta categoria é usada
periodicamente para avaliar o resultado dos esforços no processo de melhoria.
Nem sempre é possível ver completamente e compreender a condição atual
verdadeira, pelo que não se torna possível definir a target condition em pleno
detalhe. É assim boa prática, nestas condições, ser vago na definição da target
condition e adicionar detalhes à mesma, enquanto se caminha em território
xxxvi
Liderança de pessoas em contexto Lean

desconhecido; evita-se assim uma especificação prematura baseada em


suposições, com a consequência ineficiência resultante no processo de
melhoria.
Uma vez definida a target condition e o próximo passo, está-se em condições de
iniciar o trabalho rumo à target condition.
Com exceções, as target conditions iniciais típicas desenvolvem-se dentro das
categorias gerais que se mostram:
- Esforçar-se por desenvolver um fluxo 1x1, para o tempo de ciclo planeado,
com o número correto de operadores.
- Esforçar-se por ter um mix de produto, com lotes de tamanho pequeno.
- Esforçar-se por ligar os processos na cadeia de valor uns aos outros, via
kanban.
- Aprofundar o processo de melhoria.

Estabelecer a target condition é uma parte do Improvement Kata. Agir,


ultrapassando os obstáculos que se vão encontrar, enquanto se tenta o
progresso em direção à target condition é a outra, e onde muita da
aprendizagem toma lugar. É mais fácil definir uma target condition que alcançá-
la, dada a zona de incerteza por que se tem que passar.
A Toyota trabalha em direção à target condition em passos pequenos e rápidos,
com a aprendizagem e os ajustamentos a ocorrerem ao longo do caminho, isto
porque as condições encontradas na zona cinzenta, que é a zona de incerteza
no futuro imediato, resultam em problemas não previstos, anormalidades,
assunções falsas e obstáculos; a realidade com todas as suas não linearidades
e imprevisibilidades.
Assim, no caminho para a target condition é necessário encontrar o caminho
através de experimentação.
Isto é a aplicação do método científico, que consiste no seguinte.
-Formulação de hipóteses; realização de testes sobre essas hipóteses;
obtenção de informação a partir da observação direta; validação ou não das
hipóteses; reinício do processo. Os passos do processo de experimentação
são sintetizados pelo ciclo de Deming, PDCA, Plan-Do-Check-Act.

Um dos aspetos mais importantes na evolução em direção à target condition,


tem a ver com a permanente preocupação com o que não aconteceu de acordo
com o planeado, i.e., a apreciação e a apropriação dos pequenos problemas, em
ordem a explorar a potencialidade que eles revelam, e antes que eles afetem o
cliente. Se as pessoas se sentem ameaçadas pelos problemas tendem a
escondê-los ou a conduzir resoluções de problema pobres por, rapidamente,
saltarem para as contramedidas, sem realizarem uma análise com o detalhe e a
profundidade suficientes e, em consequência, sem compreenderem a situação.
A ideia aqui, é não estigmatizar as falhas, mas aprender com elas.

xxxvii
Liderança de pessoas em contexto Lean

Para funcionar deste modo o Improvement Kata deve ser despersonalizado e ter
um sentido de não culpabilização, positivo e desafiante.
Nesse sentido, na Toyota, uma anormalidade ou problema, não é pensado ou
julgado normalmente bom ou mau, mas uma ocorrência que pode ensinar algo
acerca do próprio trabalho. No entanto, a Toyota mantém uma atenção intensa e
crítica tanto ao problema como ao modo como as pessoas o tratam. Damos-lhe
urgência e atenção suficientes? Seguimos o Improvement Kata? são questões
que ressaltam imediatamente.
Considerando que o caminho para a target condition é realizado ao longo de
uma escada, em que cada passo corresponde a um ciclo PDCA, concluímos que
cada passo é uma hipótese, e o que aprendemos ao testar essa hipótese, pode
influenciar o passo seguinte.
Com os ciclos PDCA mais curtos, que controlam as métricas do processo,
alcança-se um nível na organização, no qual a melhoria contínua, a resolução de
problemas e a adaptação podem ser realizados eficazmente.
Como são as hipóteses refutadas, os problemas, as anormalidades e os
resultados inesperados, que mostram o caminho a seguir, na Toyota estão
altamente interessados em ver o próximo problema ou obstáculo, tão rápido
quanto possível.
Como só se consegue ver o próximo obstáculo quando se realiza um passo ( um
ciclo PDCA), deve-se dar esse passo tão rápido quanto possível.
O modelo de experimentação em ciclos rápidos, aplicado na Toyota, pode ser
observado a seguir:
1.Perguntar: O que está agora a inibir-nos de alcançar a target condition. Qual
é o próximo passo?
Selecionar só um problema. Não haver preocupação com a seleção do maior
problema.

2.Observar cuidadosamente para compreender profundamente este obstáculo

3.Introduzir uma única contramedida de cada vez.


Assegurar que se define o que se espera que aconteça (Planear)

4.Avaliar o efeito desta contramedida


O que se aprendeu?

5.Seguir para 1.
Repetir até se alcançar a condição desejada.

xxxviii
Liderança de pessoas em contexto Lean

Como o próximo passo pode ser diferente do que se espera, quando se realizam
os ciclos PDCA é necessário ter a mente aberta e com base científica, para que
o processo se desenvolva sempre com o máximo de eficiência.
Uma síntese da aproximação da Toyota à movimentação em direção à target
condition pode ser visualizada nas designadas cinco perguntas que se
descrevem a seguir:
1.Qual é a target condition? ( O desafio)
2.Qual é condição atual agora?
3.Que obstáculos estão agora a inibir de se alcançar a target condition. Qual é
o obstáculo que está agora a ser tratado?
4.Qual é o próximo passo? (Arranque do próximo ciclo PDCA)
5.Quando se pode ir e ver o que se aprendeu ao efetuar aquele passo?

Esta sequência de cinco perguntas é um dispositivo, para permitir uma rotina e


um padrão mental, de aproximação a qualquer processo ou situação e para
auxiliar na aprendizagem do Improvement Kata.
Na Toyota, o foco principal na resolução de problemas, não são as soluções,
mas a compreensão da situação atual, do sistema de trabalho profundo e em
primeira mão, de tal modo, que a solução correta, chamada contramedida, se
torna tão óbvia que praticamente cai no colo dos que envolvidos na resolução do
problema.
A maior parte do esforço na solução de problemas na Toyota é colocado no
agarrar a situação, compreender profundamente as condições que conduziram
ao problema, e não na caça por soluções avulsas.

Em conclusão, vimos como o Improvement Kata, que a Toyota aplica, é uma


aproximação determinante no modo como a organização melhora
continuamente e evolui. O Improvement Kata acontece num sentido global de
direção no longo prazo, que representa um estado ideal, que pode nunca ser
alcançado, mas que é um fornecedor de direção. No entanto, no dia a dia, o
Improvement Kata, normalmente, realiza-se no âmbito de um objetivo mais
específico ou necessidade.
Com a direção em mente, o Improvement Kata é normalmente aplicado ao nível
do processo.
Inicia-se com o desenvolvimento de uma compreensão da condição atual do
processo, o que normalmente requer uma observação e análise da situação,
diretamente. Assim, conseguido um conhecimento da condição atual e com a
direção geral ou objetivo presente, é descrita a target condition seguinte. Iniciam-
se seguidamente uma série de ciclos PDCA na direção da target condition, ciclos
estes que descobrem obstáculos não previstos, que devem ser resolvidos para
se poder alcançar a target condition. É nesta fase que a aprendizagem e a
evolução acontecem, resultantes do feedback dos ciclos PDCA. E assim se
xxxix
Liderança de pessoas em contexto Lean

continua, de um modo contínuo e persistente, sempre em direção ao objetivo de


longo prazo, com o estabelecimento de um target condition seguinte e a
aplicação dos estágios do Improvement Kata.
A integração do Improvement Kata na atividade diária permite desenvolver um
método prático universal de evolução ao longo de caminhos desconhecidos em
direção a visões de longo prazo genericamente definidas.
O Improvement Kata tem a ver com rotinas de comportamento; é uma rotina de
pensamento e ação que potencia a capacidade humana para melhorar e
resolver problemas. O padrão do Improvement Kata simplifica o trabalho dos
gestores ou líderes, porque, após terem aprendido os padrões de
comportamento, ficam em condições de saber como proceder em qualquer
situação, na gestão das pessoas.
Em conclusão, determinar como se chega a uma target condition, que é sempre
a primeira ação a ser realizada no processo do Improvement Kata significa
ensinar às pessoas um meio normalizado e consciente, científico, para se
aperceberem dos fundamentos das situações e darem uma resposta adequada
no terreno e também facilitarem as condições no sentido da compreensão cada
vez mais profunda da realidade envolvente.

Processo de transformação cultural – Uma metodologia

Raciocinando em cima dos conhecimentos adquiridos tanto ao nível da formação


havida no curso de Pós Graduação em Lean Management, ministrado pela CLT,
como da leitura da bibliografia selecionada e complementando esses
conhecimentos com a experiência profissional adquirida, vamos procurar
estabelecer de uma forma esquemática uma metodologia que nos parece poder
ser considerada como um ponto de partida para uma análise mais aprofundada
de um processo de transformação cultural de uma organização, transformação
essa resulta da constatação da existência de uma crise que ameaça a sua
sobrevivência e que a liderança deseja fazer evoluir para uma cultura baseada
numa filosofia Lean.

PLANO DE AÇÃO PARA UMA TRANSFORMAÇÃO CULTURAL


FASE 0 – PREPARAÇÃO
Avaliar com profundidade a cultura atual da organização, nos 3 níveis de E.
Schein: Artefactos e Comportamento, Valores e Crenças e Pressupostos
Culturais Básicos. Envolver nesta fase os líderes dos vários níveis para por um
lado se obter uma visão correta das forças e fraquezas culturais e por outro
prepará-los desde logo para atuarem como agentes de mudança.

Verificar a existência dos 3 pré-requisitos para a transformação:


- Situação da empresa: Quantificar o estado de crise (vendas, custos, …).

xl
Liderança de pessoas em contexto Lean

- Gestão de topo: Nível de compromisso, liderança e conhecimento em


Pensamento Lean.
- Colaboradores: Nível de conhecimento em conceitos e ferramentas Lean.
Se os pré-requisitos não se encontrarem satisfeitos realizar:
Formação em Lean em contexto de trabalho de curta duração, intensa, no
gemba, com incidência em:
- Conceitos e ferramentas Lean (eliminação de desperdícios, 5S).
- Preparação da mudança (fazer, aprendizagem contínua, teamwork).
- Motivação da gestão de topo para a liderança e suporte contínuo.
Encontrar um sensei ou facilitador (externo) e um agente de mudança (interno).
Definir métricas do processo para os vários níveis da organização.
Criar um sentido de urgência definindo objetivos SPIDER numa escala de tempo
ajustada às dificuldades a encontrar mas sem folgas. Os ciclos PDCA devem ser
de ciclo curto e frequente.

FASE 1 – PROJETO-PILOTO
Selecionar uma linha de produção a transformar atuando em passos pequenos,
possibilitando o aparecimento de vitórias rápidas e criando condições para que
para que as lições aprendidas tenham um forte efeito demonstrativo.
Selecionar equipa do projeto e o respetivo líder e definir as regras de atuação.
Avaliar a situação dos 5 precursores do Lean: estabilidade/qualidade,
disponibilidade, melhoria contínua, resolução de problemas e normalização.
Realizar VSM corrente
Realizar VSM futura.
Definir o plano de ação e os kpi’s definidos por consenso; iniciar a ação com
eliminação de defeitos e aplicação dos 5S.
Implementar o plano aplicando o ciclo PDCA; utilizar relatório A3 para todos os
relatórios; passar da fase 5S, após 3 auditorias aleatórias seguidas acima de
85%; realizar a transformação com ferramentas Lean.
Realizar 5 vezes o ciclo anterior; VSM corrente e VSM futuro, plano de ação e
ação.
Controlar estado do projeto-piloto; elaborar AAR (after action report) em A3.
Decidir passagem à fase seguinte.

FASE 2 – EXPANSÃO ÀS CADEIAS DE VALOR


Selecionar a equipa de projeto e o líder para esta fase.
Comunicar à organização as lições aprendidas e publicitar as vitórias rápidas.

xli
Liderança de pessoas em contexto Lean

Formar no modo de operar através de weeklong kaizen events e kaizen events.


Elaborar VSM atual para cada cadeia de valor.
Elaborar VSM futuro para cada cadeia de valor.
Definir o plano de ação e os kpi’s definidos por consenso; iniciar a ação com
eliminação de defeitos e aplicação dos 5S.
Implementar o plano aplicando o ciclo PDCA; utilizar relatório A3 para todos os
relatórios; passar da fase 5S, após 3 auditorias aleatórias seguidas acima de
85%; realizar a transformação com ferramentas Lean.
Aplicar as metodologias e ferramentas adequados, em função das caraterísticas
de cada cadeia de valor; fluxo contínuo, estabilidade, flexibilidade e sistema pull.
Integrar no processo as áreas comercial, logística, administrativa e I&ID.
Repetir a metodologia aplicada 5 vezes para cada cadeia de valor.
Estender a filosofia Lean aos parceiros externos (clientes e fornecedores).

FASE 3 – RUMO À EXCELÊNCIA


Liderar a organização no caminho para uma transformação orientada a
princípios, p.ex. o Modelo Shingo.
Avaliar o percurso da organização em relação às métricas de médio e longo
prazo definidas inicialmente; reavaliar o plano de ação existente com o objetivo
de detetar e corrigir os desvios encontrados.
Tornar integrado e visível, na cultura da organização, o conceito Toyota Kata:
Improvement Kata (rotinas para a melhoria contínua) e Coaching Kata (ensino e
integração das rotinas para a melhoria contínua), considerando sempre a
necessidade de adaptação a uma cultura diferente, que é a desta organização
em processo de transformação.
Iniciar o lançamento da metodologia Hoshin Kanri, desdobramento dos objetivos
estratégicos; preparar a organização para a sua implementação, através de
ações de formação e iniciativas setoriais de preparação; implementar.
Elaborar AAR em relatório A3, que se procura que seja uma análise retrospetiva
da evolução do projeto de transformação.
Reiniciar todo o processo; combater o conformismo e a complacência.
Integrar no nível mais profundo da cultura, a noção de que a jornada Lean se
reconstrói continuamente e não tem fim.

xlii
Liderança de pessoas em contexto Lean

6 Estudo de caso
No sentido de evidenciar as dificuldades e também a possibilidade de sucesso
que um processo de transformação para uma cultura baseada numa filosofia
Lean contém em si mesmo, vamos relatar um caso, numa escala pequena, onde
estão evidenciadas a maior parte das questões tratadas no decorrer deste
trabalho.

Condições à partida
O caso passa-se numa empresa, na função logística, numa das suas unidades
orgânicas, que é um armazém de produto acabado, produto este que se recebe
da unidade de produção que se encontra distanciada geograficamente.
Nesta unidade realiza-se a preparação das encomendas para distribuição no
mercado nacional e parte das encomendas para exportação.
Com o objetivo de melhorar a eficiência da operação e o controlo do inventário
foi tomada a decisão de introduzir um WMS (sistema de gestão de armazéns),
integrado com o ERP da empresa, onde todos os SKU’s são controlados, desde
a receção até à expedição, passando pela sua localização e pelas operações
de picking e envio para os clientes, por meio de identificadores em código de
barras. A operação seria realizada por via eletrónica, em ambiente wireless, com
recurso a terminais de leitura de código de barras, num conceito quase
paperless.
A equipa operacional era composta por 5 elementos.
A transição de um processo basicamente manual para um processo baseado
numa aplicação informática, que ainda teve que ser desenvolvida e ajustada às
condições particulares de funcionamento da cadeia nesta fase, implicou uma
reformulação total dos processos de trabalho, com pouco tempo dedicado aos
aspetos da formação da chefia e dos membros da equipa e com o imperativo de
não se poder degradar em nenhuma circunstância o serviço ao cliente, geraram
muitas dificuldades na adaptação da equipa à nova realidade e a criação no
grupo de um sentido forte de resistência à mudança, resultando no pedido dos
seus membros, menos um, para saírem para outras funções; o grupo teve que
ser substituído, gerando-se um período de instabilidade difícil de gerir.
Um novo grupo de trabalho foi constituído com elementos sem experiência, a
menos do elemento que ficou, e foi após a estabilização operacional deste grupo
que aconteceu a situação que este estudo procura dissecar.

Desenvolvimento
A estabilização, em termos da chefia e dos membros constituintes da equipa,
ocorreu assim já num contexto cultural e funcional totalmente diferente, em que
um elemento ainda funcionava dentro do paradigma operacional anterior e todos
os outros se encontravam sem referências culturais.

xliii
Liderança de pessoas em contexto Lean

Nesta fase iniciou-se a criação e implementação das condições básicas de


estabilidade do sistema operacional:
Definição da estrutura lógica do armazém , em consequência da análise ABC
realizada aos SKU’s, numa lógica de fornecedor e de rotação do produto.
Estruturação física do armazém para concretizar a solução encontrada para a
estrutura lógica.
Formação e envolvimento da chefia no processo anterior.
Formação dos operadores em contexto de trabalho e acompanhamento na
operação pela chefia direta, atuando esta numa relação mentor-mentee.
Na fase seguinte e na sequência de conhecimentos adquiridos na pós-
graduação em Lean Management da CLT que o líder deste processo frequentou,
particularmente nas áreas relativas ao Lean Services e ao Lean Coaching,
iniciou-se um processo visando introduzir os conceitos de valo, valor
acrescentado, 5S, gestão visual e melhoria contínua, realizando o empowerment
dos membros da equipa, pela melhoria da sua competência funcional e da sua
polivalência.
Depois de se ter confirmado que, em condições normais, existia estabilidade no
sistema e que em situações de desvio em relação aos padrões normais de
atividade, o grupo tinha capacidade para, de uma forma estruturada, realizar a
análise do problema, estabelecer um plano de ação, realizá-lo, controlar o seu
resultado e reagir, isto é, era capaz de implementar ainda que de um modo
informal e não estruturado o ciclo PDCA, avançou-se com o passo seguinte ao
nível operacional, que foi:
Realizar as três primeiras etapas da metodologia 5S, separar-identificar-
limpar, tanto no escritório, como no armazém.
Eliminar a abordagem em batch iniciando o trabalho em fluxo, encomenda a
encomenda, particularmente ao nível do picking.
Ao nível administrativo e como forma de se poderem analisar e, de seguida,
melhorar os fluxos de informação, realizou-se:
Um diagrama SIPOC, que foi realizado numa lógica de aprendizagem do
conceito e de formação em construção e desenvolvimento de equipas.
Um fluxograma SWIMLANES realizado no interface das funções logística e
comercial concorrentemente como forma de tornar conscientes situações que
sendo automáticas se mostraram obsoletas e geradoras de desperdício.
No domínio da gestão visual, para se acompanharem e controlarem os fluxos
de trabalho e de informação, introduziram-se quadros Kanban, com colunas
do tipo A Fazer, Em Operação, Feito e Observações, para o
acompanhamento de todas as atividades de picking, desde o planeamento
das operações diárias, distribuição das tarefas e acompanhamento da
evolução da execução, sendo o planeamento realizado pelo líder e todas as
outras operações realizadas pelos operadores. Introduziram-se também
quadros Kanban para acompanhamento visual da alocação das cargas às
localizações e aos meios de transporte, também as operações de registo a
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Liderança de pessoas em contexto Lean

serem realizadas pelos operadores que realizam a tarefa.


Todo este conjunto de atividades está em curso de consolidação, tendo a equipa
passado a funcionar com menos um elemento por saída de um dos membros
por razões de saúde, não havendo necessidade de ser substituído.

Objetivos futuros
Assumida a importância e o efeito da abordagem realizada informalmente neste
grupo de trabalho, é ambição da equipa iniciar uma fase de formalização que
passa pela concretização dos passos seguintes:
- Formação aprofundada do líder nos conceitos Lean e conhecimento das
respetivas ferramentas.
- Formação dos operadores em contexto de trabalho, no conhecimento das
ferramentas Lean e do ciclo PDCA, como instrumento de melhoria contínua.
- Formalização da metodologia 5S, tanto no escritório como no armazém,
enquanto componente no processo de melhoria contínua e de eliminação do
desperdício.
- Lançamento do conceito de Standard Work como ferramenta de eficiência e de
participação no processo de melhoria por parte de todos os membros da equipa.
- Definição de kpi’s, com participação de todos os membros da equipa.
- Publicitação interna formal deste caso, como elemento demonstrativo do poder
dos valores Respeito pelas Pessoas e Melhoria Continua.

Primeiras conclusões
O desenvolvimento desta sequência de atividades a que não se pode chamar
um projeto dado ter sido uma abordagem evolutiva sem etapas definidas, tendo
apenas como objetivo concretizar um caminho, caminhando em direção a um
alvo que se acredita valer a pena tentar alcançar, ou seja, realizar um objetivo
funcional enquadrado com o objetivo global da organização, em que esta função
se insere, experimentando uma nova forma de organização e de funcionamento
de uma equipa.
O resultado alcançado até hoje, quatro meses passados, já evidencia o poder
que um grupo de pessoas preparadas, com um propósito comum, com uma
liderança que os serve, com o conhecimento das ferramentas adequadas para a
sua atividade e com a possibilidade de poderem apoiar a construção do seu
futuro, manifesta ao serviço da organização que servem.

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Liderança de pessoas em contexto Lean

7 Conclusões
Ao longo deste trabalho pudemos acompanhar o pensamento de um conjunto de
pessoas que nos apoiaram na travessia de domínios do conhecimento, como
sejam a Liderança e o seu papel na construção de organizações melhores,
privilegiando sempre o papel das pessoas na concretização e consolidação de
ideais e o seu contributo enriquecedor na formação desses mesmos ideais; a
Cultura enquanto conceito ideal caraterizador dos aspetos subjacentes aos
modos de associação e resultados que os grupos de pessoas na sua procura de
ligação e de sentido concretizam; do estudo dos aspetos que permitem que
algumas organizações, no nosso caso de estudo, a empresa Toyota, tenham
resultados extraordinários, de um modo consistente e consolidado ao longo de
décadas e dos aspetos ligados à aprendizagem e ao ensino através da
institucionalização ao nível da cultura interna dessas organizações, do
estabelecimento de relações coach-coachee e mentor-mentee e do seu poder
como alavancas de desenvolvimento das pessoas e das organizações.
Com o sentido de inquietude que um tema como o do estudo do exercício da
Liderança em contexto organizacional baseado na filosofia Lean nos provoca,
vamos concretizar de seguida alguns pensamentos sobre este tema, cujos
conceitos subjacentes pensamos serem fundacionais, no que se refere ao
processo de transformação associado à transição para a criação da empresa
Lean, da criação de condições para a sua sustentabilidade no longo prazo e
desabrochamento das forças internas que vão permitir que essa empresa se
reinvente face aos contextos em que atua.
- O sucesso na implementação de um processo de mudança cultural visando
o estabelecimento de uma cultura de excelência baseada na filosofia Lean
impõe o envolvimento desde a primeira hora da liderança de topo, que é
responsável pela explicitação de um modo compreensível da visão e
formulação da missão, dos valores e objetivos da organização. O papel da
liderança não se esgota nesta primeira iniciativa antes sendo o elemento
motor ao longo de toda a jornada em direção ao objetivo último de qualquer
empresa ou organização, que é alcançar a excelência, com respeito pelos
stakeholders e criando valor para os mesmos, através da eliminação de
desperdício e da melhoria contínua.
- A criação das condições de sucesso na transformação cultural de uma
organização assenta no conhecimento profundo das condições culturais
existentes na organização, as suas forças e fraquezas, e na partilha com
todos os colaboradores das razões, dos objetivos e dos meios que dão
suporte a essa jornada, criando as condições de envolvimento e aderência,
fundamentais para que a jornada tenha o suporte necessário. É, no entanto,
determinante que os processos informacionais possam fluir e influenciar em
todos os sentidos, descendente, ascendente e horizontal, de modo a irradiar-
se por toda a organização um sentido de propriedade e uma energia que irão
constituir-se como o tecido onde assentará a nova cultura.
- Para que o que se disse atrás possa ser visível e efetivo é necessário que o
valor do respeito pelas pessoas se integre no nível mais profundo da cultura,
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Liderança de pessoas em contexto Lean

como um pressuposto básico cultural, o que significa que a sua prática tem
de, ao longo da sua materialização, ser interiorizada a ponto de se tornar
inconsciente.
- A consideração de que as pessoas trabalhando na empresa, ao vivenciarem
o sentido da sua importância enquanto parte ativa na história da mesma,
sendo construtores de um futuro e não apenas um ativo descartável, impõe a
necessidade de se encararem como parceiros numa relação de longo prazo
em que a empresa investe, apoiando-as pessoal e profissionalmente, porque
é da riqueza desta relação (win-win) que resulta uma mais-valia que se
transforma na consolidação de uma estrutura cada vez mais adaptável e
integradora de conhecimento. Esta relação do tipo mestre-aprendiz ou coach-
coachee em todos os níveis estruturais da organização é uma condição
necessária, sendo que a sua ausência ou limitação fragiliza essa mesma
estrutura.
Em síntese pode-se afirmar que as pessoas são o fator, nos processos de
transformação organizacional, em que tudo começa e tudo termina; as
ferramentas, indispensáveis para que as pessoas possam gerar contribuições
são o elemento complementar, que tem que ser dominado, não sendo todavia
o elemento fundamental e determinante do sucesso dos processos de
transformação. Daí decorre pensarmos que a baixa taxa de sucesso dos
processos de transformação cultural é consequência do facto de as pessoas
serem consideradas como os portadores de ferramentas de melhoria e não os
donos das ferramentas, integrando-as como elementos necessários na sua
vontade de contribuir ativamente para a criação de organizações onde
também encontrem um sentido para a sua existência.
É sabido que este é um tema de uma complexidade muito elevada, mas a
Toyota e o seu modelo organizacional são a prova de que é possível ter
sucesso. As organizações, como as pessoas, são todas diferentes e têm que
ser tratadas como casos únicos, pelo que a transposição pura e simples das
caraterísticas da Toyota para uma qualquer empresa só podem conduzir ao
insucesso. É fundamental conhecer, essencial e profundamente, a
organização que se pretende mudar, pois é dentro dela com o exercício de
uma liderança eficaz que está a energia que a pode transformar. Todo o
conhecimento e experiência que se puder conseguir externa e internamente é
fundamental, no entanto, só faz sentido se for permanentemente colocado
pelas lideranças ao serviço de um bem maior, como bem diz K. Blanchard.

xlvii
Liderança de pessoas em contexto Lean

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ANEXO A: Mapa Mental


Esquema de desenvolvimento do trabalho.

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