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SER E ESTAR

SER E ESTAR

Gustavo Bemvenuto

GRU P O MU LTI FO CO
Rio de Janeiro, 2017
Copyright © 2017 Gustavo Bemvenuto

edição e preparação Márcia Vilas Bôas


projeto gráfico Erica Oldemburg
revisão Emanoelle Veloso
capa Anna Lila May
impressão e acabamento Gráfica Multifoco

direitos re servad os a

G R U P O M U LT I F O C O
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Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sob quaisquer
meios existentes sem autorização por escrito dos editores e autores.

Ser e Estar
BEMVENUTO, Gustavo

1ª Edição
Novembro de 2017
ISBN: 978-85-5996-742-5
Este livro é dedicado à doce lembrança de
meu avô Alfredo Bemvenuto
Análise simultânea sobre o tudo e o nada

Voltando do nada
Indo pra sempre
Em tão descontente
Infeliz caminhar
De nada me vale o tudo de novo
Que nunca remete ao ser e estar
Vagando em vias
Expressas, lotadas
Num contrafluxo hostil
Que nunca parece saber aonde levar
Não é tarde para o café
Pois durmo no acordar
O mundo gira e eu giro
Se para, eu sigo
Não paro, nem sinto que devo parar
Aonde vou já não sei
O mundo gira e eu giro
Pareço perdido
Mas vou me encontrar.

g u s ta v o b e m v e n u t o 7
Reminiscências de uma vida futura

Abro os olhos e fecho


Se os abro nada vejo
Apenas o conformismo pobre de que tudo é como está
O mesmo caminho que leva sempre ao mesmo lugar
O tempo passa, nada muda
O tempo para
Velocidade... Negativa
O cenário não agrada, pois a cena nunca muda
Sente-se e acomode-se
Levante-se e incomodai-vos
Tá correndo um boato
De que tem água não sei aonde
Uns ouviram falar da água
Outros beberam da água
Outros mergulharam na água.

8 s e r e e s ta r
Carne Vale (O Bloco)

Mesmo querendo viver tão assim


Percebo que parte de mim
Inveja o teu eu tão normal
E quer brincar teu carnaval
De que vale a vida sem cor?
De que vale a vitória sem dor?
Não posso, não quero, mas devo
Meia noite em casa
Noite inteira fora
Lar doce lar
O perímetro acolhedor
Aqui a chuva não entra
O silêncio ensurdecedor
A chuva me alimenta
O bloco vai passando
Estou faminto e sedento
Pulam, cantam e dançam
Na água da chuva que é benta
Assisto a tudo sem som
Assisto a tudo à distância
O bloco passou
Eu fiquei.

g u s ta v o b e m v e n u t o 9
Sobre a Velocidade Estática

Uma imagem já não vale mais


As mil palavras de outrora
As manchetes dizem tudo o que eu preciso saber
Sempre ao alcance dos dedos
Dos olhos
Mas nunca da alma
Acabei de chegar de Paris
Sem nem ao menos ter estado lá
Preciso saber de tudo
Preciso que todos saibam de mim
Ontem foi há muito tempo atrás
Sento e ligo a máquina
Do tempo, da vida
Do tempo da vida
O mundo passa à minha frente
Acompanho o ritmo frenético
No quarto, na sala
No quarto-sala
A vida bate à porta
Contudo, estou muito ocupado para atender
A vida se vai
Eu fico
No limbo
Que é a galáxia digital.

10 s e r e e s ta r
Nova Língua Morta

A palavra que pinga da tinta e escorre


Da gota se escreve a mesma palavra
Mais curta, mais grossa
Que tenta passar
A ideia
De um poema traduzido
Tão frio que arde
Corta
Desliza e arranha
Não há espaço
Como quem narra um filme mudo
Explica a arte abstrata
Hj ja nao se ve
Pois td eh mais rapido
A vida em full time
Full time empty
A fala sem voz
Assente
Que sim e que não
Absorto, se comunica com o mundo
Porém não com aquele que, à mesa
Lhe pede para passar o açúcar.

g u s ta v o b e m v e n u t o 11
Poema do Café com Leite

Me lembro quando criança


O gosto amargo do café nunca foi meu favorito
Carecia de uma metade fria e albina
Lacta
No futebol, pique-esconde
Minha presença nunca contava de fato
Hoje, não me vejo sem o ouro negro, ébano, extra-forte
Talvez por isso chamem assim as crianças
Por não estarem ainda preparadas
Para a ''vida café puro''
Contudo, em uma tarde fria de terça-feira
Sempre me rendo ao gosto, acalentador
De ser criança novamente.

12 s e r e e s ta r
Manual da Padronização

Ando pela rua como um peixe


Que nada pela terra
Usando sempre o mesmo feixe como direção
Ando sempre deste mesmo lado
Pois do outro lado lá vem ele
Tatuado
Com a carpa e o dragão
Sempre que ele passa
O mundo inteiro perde a graça
Já não mais se sabe ao certo
Se é herói ou se é vilão
Ando sempre deste mesmo lado
Pois do outro lado vão aqueles
Que seguem à risca
O manual da padronização.

g u s ta v o b e m v e n u t o 13
14 s e r e e s ta r

Amanhã será um novo começo


Para os que aqui estão
Terão uma nova chance de fazer
Tudo exatamente igual
Ao que fazem todos os dias
Eu mesmo, sem pensar duas vezes
Irei buscar o pão e o jornal
Em seguida, mergulharei no mar dos que não questionam
E tentarei, vorazmente, conseguir minha cota de coisa
qualquer
Amanhã será um novo começo
E ainda assim poucos perceberão
Pois estarão muito ocupados
Em suas rotinas.

g u s ta v o b e m v e n u t o 15
Tempo Bom

A semana passou cinza


Os chatos de plantão reclamando do tempo
Ventania, raios e trovoadas
Sábado, porém, ele chega
Para pintar nos rostos
Sorrisos tropicanos

Poucos sabem apreciar a vida que cai dos céus


E ressuscita o mundo já tão morto de tudo
E eu no meio de tudo isso me ponho a pensar
Bom mesmo,
É o tempo que não volta.

16 s e r e e s ta r
Paôlo

Paôlo gritava
O mais alto que podia
Contudo, ninguém o ouvia
Paôlo tirava
Do bolso, as chaves
E as punha em cima da mesa
Em casa, Paôlo cantava...ninguém o ouvia
Paôlo bebia em grandes goladas
Aquilo que cria que lhe iria salvar
No entanto, Paôlo afundava
Debatia-se em pânico
Paôlo não sabia nadar
Submerso, Paôlo gritava
Pedia socorro, ninguém o ouvia
Aos poucos o desespero passava
Aos poucos Paôlo morria.

g u s ta v o b e m v e n u t o 17
Quando a consciência não fala mais por si
Quando tudo está tão turvo e já não mais se pode ver
Ainda sou capaz de encontrar meu caminho de volta pra
casa
E te perdoar
A cada segunda-feira.

18 s e r e e s ta r
De tudo que tive
Pouco me resta
Um pouco de tudo
Do nada que é meu
Pois nada me encanta
Desse tudo que brilha
E desse nada que sente
Finjo ser dono de tudo que tenho
De tudo aquilo que chamo de meu
Mas tomo emprestado do mundo
E uso até acabar
O mundo me empresta a vida
Eu uso até acabar
Outro dia tive um sonho
Vivo sonhando acordado
Era Vincent da Silva Van Gogh
Louro, ruivo, mulato.

g u s ta v o b e m v e n u t o 19
In The Depths Of The Self

Inconformado,
Não querendo encarar a realidade
Que, em mim, esbarra por todos os lados
Durmo e acordo
O relógio gira em um ciclo infinito
E o tempo que dizem passar
Pra mim só gira
Parado no mesmo lugar
Os objetos parecem rir de mim
Jamais provarão da profunda dor de ser
Se sofro parado, me movo
De um lado pro outro
Tentando esquecer
De nada adianta
De um lado pro outro
Rastejo,
Como um cão moribundo
Em busca do lugar mais adequado para morrer.

20 s e r e e s ta r
Medeleine

Medeleine me perguntou uma vez


Antes que ela soubesse da verdade
Antes de ter ouvido os boatos
E agora se arrepende profundamente
Foi embora pensando em como as coisas poderiam ter sido
Não, eu não quero te ouvir dizer
Que não há outro jeito a não ser o seu
Medeleine é uma menina
Que acha que o mundo gira em torno de si
Jamais se permite qualquer coisa
E ainda assim acha que terá alguma diversão.

g u s ta v o b e m v e n u t o 21
22 s e r e e s ta r
O tempo venta
Escorre entre os dedos
Líquido no mármore
O uniforme impecável
Dia após dia
Gélido, inflexível
A chuva é a prova de que não estamos sozinhos
Passo um café e olho através da janela
Os que vão e os que vêm
Os que não cantam nem pintam
Molhados, praguejam
A vida que os tocam
E da janela vizinha
Canta, feliz, a menina
Para todos que sabem
Que cinza é a cor da razão.

g u s ta v o b e m v e n u t o 23
Valsa Urbana Semi-Consciente

A cidade brilha
Emite seus sons e odores
Contido, vagueio
Conforme a música
O bonde corta as ruas
Levando de um canto ao outro, a boemia
Entorpecidos pelo cheiro da noite
Vagamos lado a lado, aos tropeços
Até o ponto onde só o céu
Testemunhará a lascívia iminente
Eis que pouco a pouco surge a luz
Para nos revelar estranhamente tão íntimos
A única evidência da noite passada
Escrita em nossos corpos
Em códigos universalmente inteligíveis
Como em uma proibida forma de arte pagã
Não, eu não quero o para sempre
Eu apenas não quero cortar a linha
E ver-te à deriva distanciando-se de mim
Hoje, tudo o que eu mais quero
É me livrar deste escudo
Que só me protege
De todas as coisas pelas quais eu quero ser atingido.

24 s e r e e s ta r
Eu e as Paredes

Tento preencher o vazio que está por toda a parte


Penduro quadros e luminárias
O eco responde meu grito de socorro
Em caixas ocres jazem os fragmentos
Achados e perdidos
De tudo que restou da minha vida até agora
Prontos para a próxima parada
Pela janela, vejo postes enfileirados
Que só iluminam o caminho para lugar nenhum
Encontro lugar para os souvenirs que compro para ninguém
Provo de um café
Amargo
Como a dor de saber
Que para mim
A palavra ''home''
Estará sempre entre aspas.

g u s ta v o b e m v e n u t o 25
A Ressaca do Mar Morto

Hoje não quero mais o que tive


Volto para o mesmo canto de sempre
Frio, calado, vazio
Não triste, pois tenho o ar que me infla
O fogo que me inflama. In flames
Sei que essa água não presta
Pois já provei da fonte
E o sabor é indescritível

Encho o copo...Transbordo
Afogando em um mar etílico
Salve-se quem puder
Até amanhã!
Se o amanhã vier
De volta à tona, arfo
A boca salgada
Seca, amarga
Brindo meu copo vazio
Morto de sede e de sade.

26 s e r e e s ta r
Realização...
Nunca pensei ser tão feliz
De tudo que almejei
Que mais posso querer?
Me cercam todos aqueles que amo
Em meu castelo a reinar
Um quartinho com banheiro
Pra mim e pra Dadá.

g u s ta v o b e m v e n u t o 27
Muro do Milho Doente

Fujo da tua árvore infértil


Que só gera uma sobra fria e cinzenta
Corro em busca do Sol
Domingo é dia de dormir por inteiro
Confuso, tento abrir as janelas
Todas parecem lacradas
Em um jardim escuro e lamacento
Rastejam os vermes
Lânguidos e caolhos
À tua procura para parasitar
Moscas a zumbir
Em cima de algo que não se sabe se vive ou morre
Estendo-te a mão em socorro
Elas nunca se tocam
Não. A vida não está aqui
Seguir é preciso
Livrar-me desta pele que já não me cabe mais
Por hora sigo nu
No frio cortante
Sempre em direção ao norte.

28 s e r e e s ta r
Eu que já não caibo mais em mim
Esvaio-me pelas emendas
Deságuo em solos inférteis
E me resolvo razoavelmente bem
Nesta solitude imposta.

g u s ta v o b e m v e n u t o 29
30 s e r e e s ta r
Em meio à penumbra
Pescoços, braços e costas a transpirar
A eternidade encapsulada
2:43
Mucosa,
Mucosa,
Mucosa.

g u s ta v o b e m v e n u t o 31
Ainda existe em alguma página perdida
O mapa que eu mesmo fiz
O caminho que cruzava toda a cidade
Aquela vez em que eu me perdi
E acabei dentro de um cemitério
Em horas tarde e frias da noite
Voltando pelo caminho
Que agora era capaz de encontrar de olhos fechados

O único lugar para se estar


Dentro de ti
Fora, dentro
A luz da manhã não perdoa ninguém
Estou lá e aqui
Estou onde você estiver
Estou fora.

32 s e r e e s ta r
Erotik

O frio que corta


Opaco o olhar que reluz
O respirar que aquece um ao outro
A língua tingida de roxo
Envolve por inteiro
Ao compasso
De uma descompassada dança horizontal
Provando teu gosto
Teu corpo despido
E me despeço
Da luz que me açoita
E ilumina
Meu único caminho de volta pra casa.

g u s ta v o b e m v e n u t o 33
Depois da última música
Vejo tudo o que antes não podia ver
Partimos, então, para a valsa urbana semiconsciente
Olhares que se encontram
Sorrisos fáceis sorriem
Como uma corrente elétrica
A fome mostra o caminho mais curto
Tudo ficou mais fácil depois do dia em que eu aprendi a
sorrir
A maior distância que eu já percorri
Entre mim e a máquina de café
Guiados pelo cheiro
Como nos desenhos animados
O cheiro, o qual eu nunca me confundo
E me alimenta
Eu me alimento do cheiro
Olhares sacanas a te olhar
A te iludir
A te enganar
Carnívoro
O sabor da carne que eu não matei
Incerta a dúvida que diz sim ou não?
Eu sei que não
Mas que tal o vermelho de novo?

34 s e r e e s ta r
Cotidiano Asfixiante

Pairando na banalidade morna de cada dia


A manhã plácida e fria
Me cai no colo como uma folha em branco
A manhã envolta em virgens possibilidades
Algumas das quais jamais se concretizarão
Adentramos nus o palco
Café, jornal, semáforo
Será hoje o grande dia?
Pois já não aguento mais esperar
Pelo fogo que virá consumir
Essa manhã plácida e fria
E finalmente nos libertar
Da mesmice mórbida de cada dia
Não fui eu quem acendeu esse fogo
Tampouco quem o irá apagar.

g u s ta v o b e m v e n u t o 35
Ainda pior que a verdade que dói
Que a morte súbita
É a tortura lenta e cruel
A dúvida que corrói
Puta.

36 s e r e e s ta r
Mergulho fundo no escuro
Para salvar as almas perdidas
Que gritam em socorro
Do fundo do poço
Garrafas vazias
Verde, transparece a realidade
Agora que podem respirar
Relatam o ocorrido
Não compreendo, porém
Concordam entre si
E eu a pensar
Verde, de roxo a manchar
Essas almas vazias
De pequeno sonhar
Que suplicam
Impaciente,
As envio de volta ao fundo do poço
Dosando
Pausadamente
As 750 ml do meu pesar.

g u s ta v o b e m v e n u t o 37
38 s e r e e s ta r
Urbes

Imerso nessa realidade bêbada


Descompensada
Andando pelas ruas
E o asfalto a me empurrar para cima
O asfalto é meu amigo
Sempre me segura em caso de uma queda
Não quer me ver no underground
O underground é quente e terrível
O asfalto é meu amigo
Assim como o meio-fio
Meio-fio de água
Que sempre me escora
Caso eu tombe para um lado
Ou para o outro
Não quer me ver na sarjeta
Asfalto, meio-fio de um lado
E do outro
Assim sigo em frente
Seguindo a linha
A pavimentação me comporta
E me suporta
Me mostrando com setas
Qual direção seguir
Se diz PARE, eu sigo
Não paro, nem sinto que devo parar
Sigo esse caminho tortuoso
No qual vez ou outra

g u s ta v o b e m v e n u t o 39
Encontro algo que me distraia
E que me levará sabe-se lá para aonde.

40 s e r e e s ta r
Sub-urbes

Preso estou
No vácuo
Atrás dessas paredes de vidro
Que só te permitem enxergar
Não sinto o cheiro, não ouço, não brindo
Devolvo o sorriso
De dentro do aquário vazio em que vivo
Preso estou
Nessas sextas-feiras altas
Altas e distantes
A coletar combinações numéricas
Criando assim
Um grande banco de dados do nada
Preso estou
Nessa realidade descompensada
Que já lá pelas tantas
Só te fazem querer regurgitar
Cada uma das gotas que te trouxeram até aí
À rua do meu segundo grande sonho
Preso estou
No abismo
Das infinitas possibilidades
Que existem
Entre o sim e o não.

g u s ta v o b e m v e n u t o 41
O Paradoxo do Vida

Pendida, os olhos apatece


Àqueles que têm fome
Ao baixo, perecem
Uma vez alcançada e mordida
A maçã que, proibida, tenta
Confunde-lhe a mente
Envenenada, alimenta

II

Redenção, a única maneira de livrar-se de uma tentação


Rendidos, então, sucumbimos
Ao pecado original
O qual a pena máxima é a vida
Que inquieta, grita
Arranhando as paredes internas do teu ser

III

E com a história prestes a ser escrita


Encher-se-á do Espírito Santo e falará em língua diferente
Estou pronto para aprender este novo idioma
E aprender a sorrir novamente

42 s e r e e s ta r
Finale

Sedento,
Provo da água que mina
Da tua fonte sagrada
O pórtico úmido da vida
Cuja mesma fenda de entrada
É a de saída.

g u s ta v o b e m v e n u t o 43
Pegando atalho na corrente
O peixe sem alma
Desgarrado
Indiferente
O brilho dos olhos
Apagado

Que pagou com a vida


Que passou inteira pagão
Em uma Sexta-feira Santa
Joelhos que nunca tocaram o milho
Lábios que nunca beijaram o chão.

44 s e r e e s ta r
O meu castigo é sentir a cada dia
O teu perfume que evapora
E vai embora morar no vento
O inferno é o aqui, o agora
Ao relento

E se o destino cruzar nossos caminhos


Ainda que por engano
Eu aceitarei minha sina
E irei te admitir mais uma vez em meu antro

Eu dormirei em ti
E acordarei em ti

Beijo tua doce face sem nome


Guardo na boca o gosto da fome
E me delicio
A cada intervalo em que a tua pele diz não.

g u s ta v o b e m v e n u t o 45
Olhos tão fundos olham para o nada
E tocam o nada
E mancham de branco a tua alma encardida
Refletem no resto de água
Que jaz no fundo do poço
E voltam
Sempre voltam a ver a mesma cena
Os olhos escalam o poço
E voltam a ver tudo como antes
A vista cansada
Dessa cena ensaiada
Que se repete a cada dia
Em prantos, a retina deságua
E afoga as mágoas

Olhos certos no alvo


Esses olhos mortos de fome vão à caça
E encontram a tua carne fraca
A inveja que atravessa a alma
Dos meus olhos agora drenados
Nem mesmo perto chegam
Do meu corpo fechado
Refletem no brilho dos recém polidos
Olhos apaixonados
E caem de volta, e morrem afogadas
Em suas fétidas fossas
De águas rasas, podre e parada.

46 s e r e e s ta r
Aim Higher

Caio no baixo de um voo rasante


Rastejo
Destino distante
Amargo, guardo o gosto
Na minha boca seca
Que anseia pela língua tua
Que leve o tempo que for
Pois se aponto para o alto
Acerto o céu, o sol ou a lua.

g u s ta v o b e m v e n u t o 47
48 s e r e e s ta r
A luz que brilha e ofusca
Faz cegos os olhos que não querem ver
É muito para registrar
Melhor esquecer
E viver no escuro
Do abismo que há entre eu e você.

g u s ta v o b e m v e n u t o 49
Catando os restos
Pratos e copos vazios
Despedaçados ao chão
Sentado ao canto
E o eco dos dentes a bater
Na sombra
Onde já não há mais nada para se ver
Além da tua dança sóbria
Nada
Além da tua ausência a me fazer companhia
Pois a solidão é viver no buraco
Entre o nada e o algo
É morrer afogado
Em uma piscina vazia.

50 s e r e e s ta r
Blizzard

Chuva fraca e fina


Que perfura a pele
E faz sangrar branco
Albina
Escorre pelo rosto e narinas
Manchando de alvo o céu da noite
Lua triturada
Alcalina
Neve fofa e intacta
Sublime naftalina
Dos meus heróis que ainda vivem
E escrevem a história
Em linhas retas, brancas e finas.

g u s ta v o b e m v e n u t o 51
Antropocentrismo

Em meus braços tenho os cinco sentidos


Sincronizados, nos banhamos nas ondas da vida
Da vida que vem e que vai
Que entra e que sai

Perdido na ressaca desse mar


Grito em socorro para o barco que vai rumo ao sol
Boio na tua densa água
No sal
Aqui onde a minha sede é imortal

Exausto,
Encontro abrigo no teu torso
Até que possa respirar novamente
Normalmente, sem esforço
E dou-me conta da minha pequenez
Diante do teu impávido colosso.

52 s e r e e s ta r
Amanhecer, despertar
Preparar para ser
Caminhar
Até onde o teu ser vai estar
À espera de mais um
Acender
Apagar

Fricciono o frio
Até esquentar
A água do rio
Que nasce do vazio
Do teu ser
Até desaguar
Em mim
Até transbordar.

g u s ta v o b e m v e n u t o 53
Metade do Caminho de Volta

Agora passou
A poeira abaixou
É um olhando para a cara do outro
Lembra naquela hora
Em que eu disse que ia
Você disse ''não demora''
Eu me perdi, me encontrei
Fui embora
Voltei
Você disse ''não demora''
Eu voltei
E agora?
É um olhando pra cara do outro
Mais uma vez
Igual naquela hora
Que você disse ''não demora''
Eu voltei
E agora?

54 s e r e e s ta r
Sexta-Feira Santa

O dia começa em silêncio


Que os sinos não quebrarão
Me encaro no espelho
Que não reflete a minha face coberta de roxo
Na casa de Deus
Estômago vazio
O luto estampado no rosto
Hoje é dia de sofrer calado, pedir perdão
Agradecer de joelhos
Olhar para cima
Partilhar da dor
Matar a fome na tua carne branca que não sangra
E no pão.

g u s ta v o b e m v e n u t o 55
Sábado de Aleluia

Choram ao mesmo tempo que sorriem


Como chuva que chove em dia de sol
Em jejum passarão em claro a noite
À espera do fogo novo que virá arder
A luz que virá lhes cegar
E enfim poderão ver

Resignados
Chorarão o pranto mudo
E o silêncio só será quebrado
Pelos relatos de onde esteve tua carne pecaminosa
Que serão escritos e expostos
Lidos em voz alta
Em praça pública
E depois queimados
Glória, Glória, Aleluia!

56 s e r e e s ta r
Domingo de Páscoa

A ressurreição que virá lhe salvar


E ajudar na tua travessia
Que o libertará
De ti a ti mesmo
Fadado a brindar
O vinho tinto
E provar do sal
Às três da tarde
Batata, chocolate, bacalhau.

g u s ta v o b e m v e n u t o 57
O Preço da Vida

Pagar pelo dia de hoje


O futuro a perder de vista
E por mais que o pai insista
Que tenha tido talento para mágico, equilibrista
Viverá o sempre à sombra da própria existência minimalista
Alheio a todas as outras possibilidades
Que talvez existam

O contentamento barato
Que não ousa pensar
Além daquilo que foi combinado
Recosta-se e espreguiça-se
Apreciando a paisagem
Através da janela
Tela plana

O saldo negativo
A hipoteca
O feriado dobrado
A vaga de estacionamento privado
O preço da comida
Vender a alma para pagar a vida.

58 s e r e e s ta r
Burgo

Por detrás das paredes do forte


Acumulava-se trancafiado
O puro sumo do ser
A essência da alma, herdeira do trono
Que, atrofiada, vivia dentro dos limites
Que lhe impediam crescer
Incumbidos, traziam de longe os ventos
Nuvens carregadas
A força sobrenatural
A qual o homem é incapaz de bulir
Que não há no mundo muro capaz de impedir
E fazia chover no topo da torre de marfim
Infiltradas, as paredes escorriam
E os tetos pingavam
E a virgem herdeira, hidratavam
Que, na água, sua fome matava
Em cada gota afogada
Despertando a inveja
Dos que estão na chuva, mas não se deixam molhar
Dos que estão no fogo, mas não se deixam queimar
E com o núcleo dissoluto
Se expande
E em uma chuva de prata se explode
Para além dos limites do forte
Diluindo o veneno
Que, bem dosado
Não levará à morte.

g u s ta v o b e m v e n u t o 59
60 s e r e e s ta r
Fastio Pós-Coito

Depois da escalada
Só resta calar-se
E admirar a vista estonteante
Inútil é tentar adjetivar
A cena
Que em breve o vento levará

Depois da descida
Tenta-se, inutilmente, reproduzir
A vista vista
Na mente registrada
Provando da carne recém temperada
Em um fastio pós-coito
Tentando equacionar
nada vezes nada
Vezes nada.

g u s ta v o b e m v e n u t o 61
Fade

De ontem sobraram apenas as marcas


As manchas
Os cheiros foram embora com o vento
Foram lavados pela chuva
Que também ajudou a desbotar
A tua imagem registrada em minha mente

Como é difícil pra mim, minha pequena


Fadado a este eterno presente
Trazer de volta o foco do teu sorriso
Que aos poucos se vai
Criar por aí novos sorridentes

E agora é como assoprar o ar


Para dentro de um balão estourado
Na esperança de que um dia
Este presente se torne passado.

62 s e r e e s ta r
Chega devagar
E sua presença já não é mais uma dúvida
Depois de toda a expectativa criada
É apenas um espectro
Daquilo que eu já vi mil vezes de olhos fechados
O sabor que, distante, provei
De lábios molhados
E o desejo ardente que deixa a desejar
Essa combustão infindável

Quero teu sorriso no meu rosto


Da tua alegria provar o gosto
Ouvir apenas com os olhos
Tua súplica muda
E nada mais
Tomar-te em meus braços
E amar-te como só um mamífero é capaz.

g u s ta v o b e m v e n u t o 63
64 s e r e e s ta r
A Sombra de Um Sonho

Tentando jogar para cima


A gravidade que só me puxa para baixo
Me agarro aos últimos pingos de esperança
Que pingam
Que, no entanto, falham em suportar meu peso
Com um ''baque'' caio
No chão, que é a cama do mundo
Que dorme um uníssono sono profundo
E sonha um sonho requentado
O sonho que por outrem já foi sonhado
Levanta-te e anda!
Por cima dos cadáveres
Que, sem paz, jazem
Na cama do mundo, o chão asfaltado
Sobre a qual se projeta a sombra de um sonho sonhado.

g u s ta v o b e m v e n u t o 65
Dama da Noite

Ela deixava atrás de si o cheiro das frutas que só se vê no


natal
O cheiro que diz que algo de muito bom está prestes a
acontecer
Aquelas frutas estranhas que não se come
Só se vê
Que dizem que não vale a pena ir dormir ainda
Que o amanhã terá de esperar até meia-noite
Para lhe despir a fita vermelha
E eu, em jejum, esperarei a noite inteira
Entorpecido pelo aroma dessa fruta
Cujo nome eu não sei pronunciar
Cuja polpa é tudo o que eu mais quero provar
Vencido, já lá pelas tantas caio no sono
Ouço vozes ao longe, que nada me dizem
Acordo para embrulhos rasgados
Surpresas expostas
E um gosto amargo na boca
Dos morangos que eu nunca provei.

66 s e r e e s ta r
Une Jour Sans Toi C'est Pas La Même

Hoje as linhas da faixa de pedestre me confundem


Atravesso para o lado em que não quero estar
A sinto por perto
Um perto que meus olhos não podem chegar
Hoje as sombras dos prédios ficam paradas no mesmo lugar
Enquanto o sol se move
E a água só faz aumentar minha sede
Que não compreende do que é feito esse buraco que há
entre eu e mim mesmo
Hoje o oxigênio me sufoca
E minha alma se contorce a cada tique do ponteiro dos
segundos
Hoje à noite eu tenho uma febre e você morre de frio.

g u s ta v o b e m v e n u t o 67
Une Jour Sans Toi Je Ne Suis Plus Moi

Ontem não sei se dormi


Na verdade não sei se ainda é hoje
Tudo é apenas uma ininterrupta repetição do agora
Essa maldita chuva que chove e não me molha
Que não traz sequer uma gripe para curar
Caí no buraco que ainda há entre eu e mim mesmo
E não sei mais como voltar.

68 s e r e e s ta r
Lust

Já há dias que ardo


Sangro
A vida é uma doença sem cura
Ela me escuta urrar
E me traz a fome para alimentar
Em sua forma mais pura
Nossos fluidos se confundem
Nessa simbiose febril
Que não quero curar
Já que nunca é o bastante
Me farto
Agora mais do que antes
Sem nunca me saciar
Eu sou feito da fome e da sede
Da água que escorre
E evapora antes mesmo de pingar
Ela alimenta meus contornos
O meu pecado é a gula
Que cega, não vê
Só sente
Tateia
Até encontrar
E cravar nela, os dentes
Ela é doença da qual eu quero morrer
E renascer, só para poder morrer novamente
Pois enquanto houver vida
Haverá

g u s ta v o b e m v e n u t o 69
O desejo de tapar o buraco
O buraco que só a morte irá tapar.

70 s e r e e s ta r
O Centro de Todas As Coisas

Essas duas partes iguais formam um todo


Que só é completo quando dividido
E ao meio se parte
Admitindo a outra metade

Eu a tive em meu epicentro


E tendo agora evaporado, o momento
Sinto esse inquietante desejo de tocá-la o outro lado
Como quando uma de minhas mãos, por acidente, esbarra
em alguma coisa
E a outra também quer esbarrar
Mas nela, toquei com meu meio
Não havendo lado oposto para tocar
Restando, assim, apenas o seu avesso
O lado de dentro.

g u s ta v o b e m v e n u t o 71
Sapir-Whorf

Quando o corpo fala mais alto


A língua se cala
E só as vogais têm vez
Só o silêncio tem voz
Para expressar aquilo que só possível sentir
E traduzir no olhar
O que só o corpo é capaz de falar

Como é chato e limitador ser humano


Em momentos que a natureza selvagem fala tão mais alto
E precisamos nos ajustar à beleza do incompreensível
Que selvagens então sejamos
E brindemos nosso cálice profano

Eu vejo e gosto, mas não a entendo


Eu estou aficionado
Mas não a compreendo
Pois é bela como um mosaico visto através de um
caleidoscópio
Como uma música cantada em um idioma que eu não
compreendo
Indecifrável
Mas ainda assim absorvida pelo meu ser

Conhecimento é liberdade
Já eu, quero ser escravo de sua ignorância
Viver em suas masmorras escuras onde a luz não entra

72 s e r e e s ta r
Apenas a água da chuva
Que mina e me alimenta

E eu a encontrarei
Nas coordenadas sob as quais o sol nunca me tocou
Afinal de contas, estamos escondidos debaixo do mesmo céu
E nossas línguas irão se calar
E o silêncio de nossos corpos,
Gritar.

g u s ta v o b e m v e n u t o 73
74 s e r e e s ta r
De tudo que me faz achar que dessa vez será diferente
Nada de fato me convence
Ainda assim experimento a voz
Que, calada há tempos, sai rouca e torta
Experimento falar
A língua
Que, afiada, corta
Ricocheteia
E se reconstitui, como o rabo de uma lagartixa
Pálida e asquerosa
Eu preciso provar da dor de saber como é não te ter
Pois nenhuma vez é igual a outra
Nenhuma vez é igual a outra
Exausto,
Esperando pelo abismo que nunca chega
Destilo essa realidade pouco convincente
E me reconstituo
Como o rabo de uma lagartixa.

g u s ta v o b e m v e n u t o 75
26 de Outubro de 2007 (O Eterno Retorno)

Tão perto, tão longe


Nunca o bastante
Agora pensando
Quanto tempo durou?
Que raiva do tempo
Levou-me o momento
Furtou-me o deleite
Fulminante se foi
Por pouco me escapa
Aos dedos e vai
Doar para outros
Um pouco de si
Contudo, não lamento
Outras sextas-feiras hão de chegar
Trazidas pelo vento
Criando o cenário para outros momentos
Que mais uma vez
O maldito do tempo
Me irá roubar.

76 s e r e e s ta r
Intrinsicabilidade

Eu quero a tua indivisa atenção


A alma mora em um lugar aonde não se pode chegar sozinho
Eu preciso que você venha
E juntos encontraremos o caminho
Aonde a ponta dos dedos não chega
Onde um mergulho razo não afogará
A tua tua superfície gélida e sintética
Que alimentada por essas imagens mudas que nada dizem
Sem vida, sobreviverá

Eu preciso da tua humanidade morna e afável


Pois daqui, te adoro à distância
Como um Monet
Que em deleite, aprecio
Sem nunca pode tocar

Mas não
Já não me interessam os teus traços tão únicos
Copiosamente multiplicados sem qualquer critério
Como um espelho estilhaçado
Que desvendam todo o mistério
E não reflete nada
Além do eco
Que ecoa no vazio do teu ser.

g u s ta v o b e m v e n u t o 77
O Monólogo da Vida

Adorava um café morno


Vivia tudo sempre mais ou menos
A chama sempre branda
O mantinha vivo quase que por pena
Trajando sempre o mesmo cinza, a cor dos que sobrevivem
Fazia sempre o mesmo caminho
Não tinha tempo para amigos
Temia os próprios sonhos
De um dia poder realizá-los
A vida ía passando em branco
O tempo não espera por ninguém
Sempre sozinho nas fotos
Há quem diga que foi feliz assim
Acostumado a fazer tudo pelo meio
Viveu pela metade até o fim.

78 s e r e e s ta r
Ecdise

Essa cara que me cobre


É apenas um manto fino
Que por mais que pareça um cristal limpo e nobre
No fundo não passa de um vidro encardido, barato e torpe

Ela me toca a superfície


E tão logo descobre
Que o cristal limpo e nobre
É apenas um vidro encardido, barato e torpe

Não consigo me esquivar


Da realidade que me atinge em cheio
E me faz rachar
Desaguando em seu meio

Eu não quero o teu perdão


Eu quero pagar o preço
Que é muito mais caro que o recomeço
Revirar o teu lixo, rastejar no teu chão
Quero em mim a fúria que faz arder o teu rosto
Dessa noite quero o gosto
Da boca salgada que só me diz não.

g u s ta v o b e m v e n u t o 79
Homeostase

O cheiro desperta a vontade


A vontade inquietante
Que é cega
Que nunca é o bastante
É o que alivia a sua dor
A dor que é ser
Agora que nada será como antes

Do corpo revestido pela pele morta


Não sobra nem a sombra
Cansado de carregar o próprio peso
E de ouvir falar a língua que corta

Desvia da vida que jorra


Já não importa agora
Ao relento
Que me traz o inverno
Quando o inferno de fora é pior que o de dentro.

80 s e r e e s ta r
Nesse cenário inóspito
Percorro o caminho de volta
Onde só o frio me aquece
E nem minha própria sombra me reconhece
Sigo nesse beco, sem vontade, sem rumo
E quem irá aparecer para iluminar o meu escuro
É a tua face tão fácil de esquecer
Que irá pintar no vazio do meu quadro
Sussurrar o grito mudo
Arranhar o céu até o amanhecer

Eu vou beber do gargalo


Trocar o dia pela noite
Me alimentar das migalhas
Acordar com o teu açoite
Neste cativeiro ornado que também é lar
Que nada tem de doce
Além do féu
Que só faz amargar
Os lábios que há pouco riam
E se as paredes pudessem falar
Nada diriam.

g u s ta v o b e m v e n u t o 81
Atormentado pela tua presença
Nada digo
Apenas sinto teu olhar a atravessar-me
E tento domar meu olfato
Alheio ao fato
De que onde se ganha o pão não se come a carne

Olhos certos no alvo


Esses olhos mortos de fome vão à caça
E encontram a tua carne fraca
O estômago ronca vazio
E a cada calafrio que pelo corpo todo passa
A paciência inquieta escorre
Baixa, a resistência consome
Comendo com os olhos
Até que possa matar, em ti, minha fome.

82 s e r e e s ta r
g u s ta v o b e m v e n u t o 83
Mosaico Bizarro

Me encaro de frente
E o espelho não me diz nada do que quero escutar
Ignoro os conselhos
E mergulho na noite para tentar te salvar
Sigo o teu cheiro
O perfume e o cigarro que pairam no ar
Refaço teus passos
Caminhos tortuosos que irão me levar
Junto à beira do cais
Onde os sonhos e os pesadelos são reais
Você irá me chorar uma lágrima de sal
E o vento irá cortar
Até evaporar
A língua afiada me corta o pescoço
E a julgar pelo gosto não faz mal em cortar
A alma se encolhe e o frio nega um gole para acalantar
E o que a noite te deu
São os restos que sobraram do dia que morreu
Eu já não quero entender
Agora que eu sei que a melhor atração do teu circo é pegar
fogo
Até o amanhecer.

84 s e r e e s ta r
A Dor do Quase

Foi quando o vento ventou


E te levou para longe do meu alcançar
E como uma âncora, sobre mim pesou
A dor do quase
Do que por pouco não foi nem tampouco será
E se por ventura o vento te ventar de volta
Direi ao vento que volte
Vade retro
Para nunca mais voltar.

g u s ta v o b e m v e n u t o 85
Sigo como em um barco a velas
A velejar pelo asfalto
Onde o teu vento é o meu norte
Chame isto de destino ou sorte
Nada é pior que a tua calmaria
A indiferença plácida e fria

E já não sei aonde essas ruas sem nome irão me levar


Se para longe
Onde não possa te ver, sentir ou tocar
Continuarei condenado a mim mesmo
Em busca de porto para atracar

O meu céu é a Terra


Por onde rastejo
Em busca da tua fonte
Para que possa afogar minha sede
Pois é doce a água do teu mar.

86 s e r e e s ta r
1° edição Novembro de 2017
for m at o 14x21cm
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