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CURITIBA
2003
Orientador: ______________________________________________
Prof. José Carlos Cal Garcia Filho.
______________________________________________
Professor 1º Membro da Banca.
______________________________________________
Professor 2º Membro da Banca.
Curitiba, de de 2.004.
ii
DEDICATÓRIA
iii
AGRADECIMENTOS
iv
O Direito não é uma pura teoria,
mas uma força viva. Por isso, a Justiça sustenta em
uma das mãos a balança em que pesa o Direito, e na
outra a espada de que se serve para o defender. A
espada sem a balança é a força bruta; a balança sem a
espada é a impotência do Direito.
SUMÁRIO
RESUMO................................................................................................................... IX
.
1 1
INTRODUÇÃO.........................................................................................................
2 A SEGURIDADE 4
SOCIAL.......................................................................................
2.1 4
CONCEITO...........................................................................................................
2.1.1 A 6
saúde..............................................................................................................
2.1.2 A assistência 7
social............................................................................................
2.1.3 A previdência 8
social...........................................................................................
2.2 FONTES DE FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE 10
SOCIAL..............................
2.3 NATUREZA JURÍDICA DA SEGURIDADE 13
SOCIAL............................................
2.4 NATUREZA JURÍDICA DAS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS.................................. 14
3.1 PRINCÍPIO DO 15
SOLIDARISMO...........................................................................
3.2 PRINCÍPIO DA UNIVERSALIDADE DA COBERTURA E DO 16
ATENDIMENTO...
3.3 PRINCÍPIO DA UNIFORMIDADE E EQUIVALÊNCIA DAS 17
PRESTAÇÕES........
3.4 PRINCÍPIO DA SELETIVIDADE E DISTRIBUTIVIDADE NAS PRESTAÇÕES... 17
3.5 PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE DO VALOR DOS BENEFÍCIOS............... 18
3.6 PRINCÍPIO DA EQÜIDADE NA FORMA DE PARTICIPAÇÃO NO 18
CUSTEIO.....
3.7 PRINCÍPIO DA DIVERSIDADE NA BASE DE 18
FINANCIAMENTO.......................
3.8 PRINCÍPIO DA ADMINISTRAÇÃO DEMOCRÁTICA E 19
DESCENTRALIZADA....
vi
5.7 O ESTELIONATO 55
PREVIDENCIÁRIO.................................................................
8 98
CONCLUSÃO..........................................................................................................
REFERÊNCIAS......................................................................................................... 101
.
vii
LISTA DE SIGLAS
CLPS - Consolidação das Leis da Previdência Social
CNAS - Conselho Nacional de Assistência Social
CND - Certidão Negativa de Débitos
CNPS - Conselho Nacional de Previdência Social
CP - Código Penal
CPMF - Contribuição Provisória sobre Movimentação ou Transmissão de
Valores e Créditos de Natureza Financeira
CTN - Código Tributário Nacional
CTPS - Carteira de Trabalho e Previdência Social
DJU - Diário de Justiça da União
FGTS - Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
GFIP - Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social
INSS - Instituto Nacional do Seguro Social
LOPS - Lei Orgânica da Previdência Social
MPAS - Ministério da Previdência e Assistência Social
MPF-F - Mandado de Procedimento Fiscal-Fiscalização
MPS - Ministério da Previdência Social
NFLD - Notificação Fiscal de Lançamento de Débito
PCSS - Plano de Custeio e Organização da Seguridade Social
RAIS - Relação Anual de Informações Sociais
RFFP - Representação Fiscal para Fins Penais
RGPS - Regime Geral da Previdência Social
STF - Supremo Tribunal Federal
STJ - Superior Tribunal de Justiça
SUS - Sistema Único de Saúde
TIAF - Termo de Início de Ação Fiscal
TRF - Tribunal Regional Federal
viii
RESUMO
ix
1 INTRODUÇÃO
2.1 CONCEITO
2.1.1 A saúde
Conforme Sérgio Pinto MARTINS “a assistência social irá tratar de atender aos
hipossuficientes, destinando pequenos benefícios a pessoas que nunca contribuíram para
o sistema”.
É instrumento utilizado pela sociedade para auxiliar os mais carentes, prevenindo
ou remediando situações de infortúnio que surjam na vida do indivíduo. Tem por
finalidade evitar que a pessoa, desprovida de recursos mínimos necessários à
sobrevivência, seja levada à miséria, relegada à condição de indigência. Amplia os
conceitos de cidadania e de melhoria de vida para milhões de brasileiros, em especial
para os da área rural, os idosos e os portadores de deficiências, para os quais, muitas
vezes, o benefício assistencial representa a única fonte de sobrevivência.
Está prevista nos artigos 203 e 204 da Carta Magna, a qual determina que será
prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição, e fixa seus
objetivos: a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; o
amparo às crianças e adolescentes carentes; a promoção da integração ao mercado de
trabalho; a habilitação e reabilitação dos deficientes e a promoção de sua reintegração à
comunidade.
Garante o texto constitucional, ainda, nos termos da lei, benefício no valor de um
salário mínimo mensal, a título de amparo assistencial, à pessoa portadora de deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover sua própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família. Atualmente, para efeito desse benefício, é considerado
idoso aquele que tem mais de sessenta e sete anos e é tida como pessoa portadora de
deficiência aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em razão de
anomalias ou lesões irreversíveis de natureza hereditária, congênita ou adquirida.
Ensinam Carlos Alberto Pereira de CASTRO e João Batista LAZZARI que a
assistência social é prestada por entidades e organizações sem fins lucrativos, no
atendimento e assessoramento aos beneficiários da Seguridade Social, bem como pelos
que atuam na defesa e garantia de seus direitos, segundo as normas fixadas pelo
Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS, órgão responsável pela política
assistencial em âmbito federal. Na área regional, a execução das ações fica a cargo dos
poderes públicos estaduais e municipais, entidades beneficentes e de assistência social.
Já a habilitação e a reabilitação profissionais são encargos da Previdência Social, quando
decorrentes de atividade laborativa e de entidades de assistência social, quando se
referem a pessoas portadoras de deficiências congênitas.
Art 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos
termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, a
pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;
b) a receita ou o faturamento;
c) o lucro;
II - do trabalhador e demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre
aposentadorias e pensões concedidas pelo regime geral da previdência social de que trata o art.
201;
III - sobre a receita de concurso de prognósticos.
Há pessoas que têm obrigação de contribuir porque desta decorre sua condição de beneficiário do
sistema - são os segurados do regime. A obrigatoriedade de sua participação se impõe para que
possam fruir dos benefícios e serviços previstos em lei, sendo fundamental a comprovação das
contribuições – ou pelo menos do enquadramento como segurado obrigatório - para este fim.
Outras pessoas têm a obrigação de contribuir porque a lei simplesmente lhes determina tal ônus,
sem que tenham qualquer contraprestação pelo fato de verterem recursos para o sistema. O liame
obrigatório tem fundamento, nestes casos, no ideal de solidariedade que fundamenta a Previdência
Social, embasado na teoria do risco social, segundo o qual toda a sociedade deve suportar o
encargo de prover a subsistência dos incapacitados para o trabalho. É o que ocorre com as
empresas, ao contribuírem sobre a folha de pagamento de seus trabalhadores, bem como sobre o
faturamento e o lucro; também é o mesmo fundamento para se exigir do empregador doméstico e
do produtor rural que verta contribuições para ao regime. Também é o motivo invocado para a
cobrança de contribuições sobre apostas em concursos de prognósticos e, ainda, serve de base
para se exigir a CPMF - Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira de todo e qualquer
indivíduo que movimente valores em instituições financeiras.
No seguro social, tal como está estabelecido entre nós, intervêm quatro pessoas: o Instituto
Nacional da Previdência Social, o Estado, o empregador e o empregado.Destas, abstraindo-se do
poder de controle do Estado sobre as autarquias, duas somente têm obrigações, são sujeitos
passivos: o Estado e o empregador, meros contribuintes; duas têm ao mesmo tempo direitos e
obrigações: o Instituto, que tem o direito de receber as contribuições (do Estado, do empregador e
do empregado) e a obrigação de conceder os benefícios (aposentadorias, auxílios, etc), e o
empregado (substituído, em caso de morte e, às vezes, no seguro maternidade, por um ou mais
dependentes) que tem o direito de exigir a concessão dos benefícios e a obrigação de pagar a sua
contribuição, aliás, de consentir no desconto de sua contribuição do seu salário.Todas essas
obrigações resultam exclusivamente de lei e não da autonomia da vontade. Têm, portanto, caráter
estatutário e não contratual.
Com a nova Constituição, não vislumbramos razões para deixar de considerar a contribuição
previdenciária como tributo. Muito mais que na própria Constituição de 1967, na Constituição de
1988 a contribuição previdenciária se identifica com os tributos. Está no capítulo do Sistema
Tributário, sem qualquer equívoco que justifique uma interpretação restritiva de sua concepção
tributária.
Aliás, nada mais fez a Constituição do que legislar sobre o óbvio, respeitando o princípio de que a
lei não deve alterar a natureza das coisas. A contribuição previdenciária sempre foi tributo, que é,
em si mesmo, uma prestação pecuniária compulsória, exigível daqueles que incorram em
situações legalmente definidas como fato gerador ou hipótese de incidência.
Art.194 (...)
Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com
base nos seguintes objetivos:
I. universalidade da cobertura e do atendimento;
II.uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;
III.seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;
IV.irredutibilidade do valor dos benefícios;
V.eqüidade na forma de participação no custeio;
VI.diversidade da base de financiamento;
VII.caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com
participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos
colegiados.
A universalidade de cobertura deve ser entendida como a necessidade daquelas pessoas que
foram atingidas por uma contingência humana, como a impossibilidade de retornar ao trabalho, a
idade avançada, a morte, etc. Já a universalidade de atendimento refere-se às contingências que
serão cobertas, não às pessoas envolvidas, ou seja, às adversidades ou aos acontecimentos em
que a pessoa não tenha condições próprias de renda ou de subsistência. Na saúde, há
universalidade de atendimento, pois todos têm direito de socorrer-se do sistema,
independentemente do pagamento de contribuições, sendo direito da pessoa e dever do Estado
(art.196 da Constituição Federal).
Por universalidade de cobertura, entende-se que a proteção social deve alcançar todos os eventos
cuja reparação seja premente, a fim de manter a subsistência a quem dela necessita. A
universalidade de atendimento significa, por seu turno, a entrega das ações, prestações e serviços
da seguridade social a todos os que necessitem, tanto em termos de previdência social - obedecido
o princípio contributivo - como no caso da saúde e da assistência social.
O decreto nº. 89. 312, de 23 de janeiro de 1984, que aprovou a nova CLPS -
Consolidação das Leis da Previdência Social, previa, em seu artigo 146:
Art. 146. A falta de recolhimento, na época própria, de contribuição ou outra importância devida à
previdência social e arrecadada dos segurados ou do público, é punida com a pena do crime de
apropriação indébita, considerando-se pessoalmente responsáveis o titular de firma individual e os
sócios solidários, gerentes, diretores ou administradores de empresa abrangida pela previdência
social urbana.
Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributos, ou contribuição social e
qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendeiras;
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer
natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento
relativo à operação tributável;
IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou
inexato;
V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a
venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo
com a legislação.
Pena - reclusão, de 2 (dois ) a 5 ( cinco ) anos, e multa.
Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que
poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da
dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V.
Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:
I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra
fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;
II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou
cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos;
III - exigir, pagar, ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem
sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal;
IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de
imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento;
V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da
obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda
Pública.
Pena - detenção, de 6 (seis ) meses a 2 (dois ) anos, e multa.
§ 1° No caso dos crimes caracterizados nas alíneas “d”, “e” e “f” deste artigo, a pena será aquela
estabelecida no art. 5° da Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986, aplicando-se à espécie as
disposições constantes dos artigos 26, 27, 30, 31 e 33 do citado diploma legal.
§ 2 ° A empresa que transgredir as normas desta Lei, além das outras sanções previstas, sujeitar-
se-á, nas condições em que dispuser o regulamento:
a) à suspensão de empréstimos e financiamentos, por instituições financeiras oficiais;
b) à revisão de incentivos fiscais de tratamento tributário especial;
c) à inabilitação para licitar e contratar com qualquer órgão ou entidade da administração pública
direta ou indireta, federal, estadual, do Distrito Federal ou municipal;
d) à interdição para o exercício do comércio, se for sociedade mercantil ou comerciante individual;
e) à desqualificação para impetrar concordata;
f) à cassação de autorização para funcionar no país, quando for o caso.
Note-se que à exceção das alíneas d, e e f do antigo art. 95 da Lei 8.212/91, consideradas crimes de
apropriação indébita, as demais não previam o preceito secundário, ou a sanctio júris. Dizer ser
crime “deixar de incluir na folha de pagamento da empresa os segurados empregado, empresário,
trabalhador avulso ou autônomo que lhe prestem serviços” é apenas o preceito primário da norma
penal. Que tipo de crime é esse se não tem sanção? Qual a pena a ele cominada? Quais os
elementos objetivos e subjetivos do tipo? Contra essa forma de legislar penalmente é que se
revoltaram os autores, obrigando-os a negar-lhes a vigência, como Clèmerson, retrocitado, ou a
admiti-los como crime por mera semelhança, como fez Pimentel.
Cita aquele autor, ainda, que “em relação ao art. 95, vigente até o advento da Lei
nº 9.983/2000, alguns autores afirmavam que apenas as alíneas d e f poderiam ser
consideradas crimes, pois possuíam os dois preceitos, o primário e o secundário, ou seja,
a descrição típica e a sanção”.
Para Luiz Flávio GOMES:
É verdade que outros “crimes” estavam formalmente descritos nas demais alíneas do antigo art. 95
(“a”, “b”, “c”, etc), mas o legislador se “esqueceu” de impor a respectiva sanção. Como não existe
delito sem sanção, permaneceram no ordenamento jurídico (até 14.10.2000) com a natureza de
uma mera recomendação moral. Agora todas as alíneas do art. 95 referido foram expressamente
revogadas (cf. art. 3º da Lei 9.983/00). Muitas dessas alíneas antigas se transformaram em delito
na nova lei. Passaram a ser crime em 15.10.2000. Têm vigência penal, portanto, a partir desta
data. O que não se transformou em delito, “desapareceu” do ordenamento jurídico.
No que diz respeito especificamente às alíneas “d”, “e” e “f”, que já retratavam figuras delituosas,
não ocorreu nenhuma “abolitio criminis” porque todas as figuras típicas anteriores acham-se
devidamente inseridas nos novos tipos penais. Não se deu, como veremos, uma descontinuidade
normativo-típica. Ao contrário, tudo o que estava nos tipos anteriores encontra-se presente nos
novos. O fato de o art. 3º. da Lei 9.983/00 ter expressamente revogado todas as alíneas do antigo
art 95 ( Lei 8.212/91) não significa abolitio criminis porque o conteúdo da proibição anterior continua
intacto nos novos dispositivos legais.
Caso não houvesse a revogação expressa do tipo penal pela lei 9.983/00, haveria a tácita, pois na
comparação dos referidos dispositivos chegaremos à conclusão da abolitio criminis, por serem,
objetivamente, incompatíveis entre si os artigos 168-A, §1º, I e o artigo 95, “d’, da lei 8.212/91, pois
veja: 1. O dispositivo revogado falava em Seguridade Social, que compreende um conjunto
integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os
direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. A lei revogadora menciona
Previdência Social, que é a técnica de proteção social que visa a propiciar os meios indispensáveis
à subsistência da pessoa humana, quando esta não pode obtê-los ou não é socialmente desejável
que os aufira pessoalmente através do trabalho, por motivo de maternidade, nascimento,
incapacidade, invalidez, desemprego, prisão, idade avançada, tempo de serviço ou morte,
mediante contribuição compulsória distinta, proveniente da sociedade e de cada um dos
participantes.
2. Ao redirecionar o tipo penal para um enquadramento mais restrito a nova ordem legal acabou por
modificar o âmbito de atuação do ius puniendi, que agora tem outro escopo, qual seja, somente as
contribuições ou outras importâncias deixadas de recolher e destinadas à Previdência Social e não
mais à Saúde ou à Assistência Social, integrantes da Seguridade Social; 3. A nova lei tipifica
“deixar de recolher no prazo legal”, enquanto que a revogada mencionada “deixar de recolher na
época própria”. Este elemento normativo deixava margem a dúvidas quanto à norma que deveria
estipular qual seria época do recolhimento, poderia ser uma lei, um regulamento, uma portaria, etc.
A lei 9.983, de 14 de Julho de 2000, ao falar ‘no prazo legal’ aplicou técnica mais apurada, deixando
claro que somente a lei pode estipular o prazo para o recolhimento das contribuições; 4. A lei
revogadora refere-se a contribuição descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros
ou arrecadada do público. A lei revogada mencionava contribuição devida à Seguridade Social e
arrecadada dos segurados ou do público. Vê-se que a lei nova acrescentou as contribuições
descontadas de pagamentos efetuados a terceiros o que não existia no texto anterior. 5. Por fim, a
lei revogada trata de contribuição devida, a revogadora diz destinada, não mais importando se é
devida ou não, basta ser destinada à Previdência Social. A nova lei trouxe mais abrangência ao
texto anterior.
Concluindo, a lei 9.983 de 14 de Julho de 2000, revogou expressamente o artigo 95, da lei 8.212,
de 24 de Julho de 1991. Outrossim, necessário se faz a aplicação da abolitio criminis, contido no
artigo 2º do Código Penal, declarando-se a extinção da punibilidade, nos termos do artigo 107, III,
do mesmo Codex.
Tendo havido uma vacatio legis de 90 dias, entenderam alguns autores que, durante esse período,
havia-se operado a abolitio criminis e, como tal, dever-se-iam extinguir a punibilidade (art.107, III,
do Código Penal) e todos os demais efeitos penais nos termos do art. 2º do Código Penal. É bem
verdade que alguns autores consagrados entendem que já na vacatio legis uma lex mitior opera
imediatamente a abolitio criminis. Há até decisões nesse sentido. Não nos parece, contudo,
respeitando as opiniões em contrário, ser esta a melhor interpretação. Primeiro porque na vacatio
legis – até porque a nova lei não havia entrado em vigor – não se pode afirmar que tenha havido
revogação da lei anterior. Depois porque no caso da Lei 9.983/2000 houve a revogação da lei
anterior, mas as figuras delituosas permaneceram. A rigor a descrição típica não é a mesma. Mas a
conduta incriminada sim. Não é porque o novo tipo fala em previdência social e o antigo seguridade
social ou ainda deixar de recolher no prazo legal versus deixar de recolher na época própria, que os
crimes previdenciários deixaram de existir. A revogação do art. 95 da Lei 8.212/91 significou
apenas que a partir da vigência da nova lei, os crimes previdenciários estão inseridos no Código
Penal. Contudo, os fatos praticados até essa data continuam regidos pelo art. 95 da Lei 8.212/91. A
jurisprudência vem se firmando nesta posição.
PENAL – LEI 8.212/91, ART. 95, “D”, E “F” –REVOGADO PELA LEI 9.983/2000, ART. 3º, ART.171
DO CP.ABOLITIO CRIMINIS.
1. Em face de expressa revogação dos dispositivos legais (Lei 8.212/91,art,95, “d”, e “f”) que
ensejam o oferecimento da denúncia, evidentemente não há como aplicá-los nem como fazer
incidir sobre tais condutas os dispositivos da lei mais nova.
2. Necessário se faz a utilização da abolitio criminis contida no art. 2º do Código Penal, declarando-
se a extinção da punibilidade, nos termos do art. 107, III, do mesmo codex.
3. A nova definição jurídica do fato não acarreta conseqüência para hipótese tratada nos autos, sob
pena de ofensa à garantia constitucional da irretroatividade.
4. Não subsiste o crime do art. 171 do Código Penal, tendo em vista que a ilicitude referida na
denúncia foi mero instrumento para a consumação do delito ora atingido pela abolitio criminis, em
face do princípio da especialidade.
5. Extinção da punibilidade do réu, prejudicada a apelação em face da abolitio criminis, com fulcro
no art. 107, III, do Código Penal.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região editou a Súmula 69, que versa sobre a
matéria: “a nova redação do artigo 168-A do Código Penal não importa em
descriminalização da conduta prevista no art. 95, d, da Lei 8.212/91”.
Filiamo-nos ao entendimento predominante na doutrina e na jurisprudência no
sentido de que não ocorreu a descriminalização da conduta, eis que houve apenas
sucessão de normas com o mesmo conteúdo. A Lei 9.983/00 não deixou de considerar o
fato como criminoso. Ao contrário, estabeleceu a continuidade do delito, ao inseri-lo no
art. 168-A do Código Penal.
Art.327(...)
§ 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade
paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a
execução de atividade típica da Administração Pública.
Segundo a relação entre a conduta e o resultado, os delitos podem ser materiais, formais ou de
mera conduta. Delitos materiais ou causais são os que alojam, no tipo legal, um resultado
naturalístico cuja ocorrência é necessária à consumação. Exemplos: homicídio, lesão corporal,
furto, etc. Delitos formais ou de consumação antecipada são os que alojam, no tipo legal, um
resultado naturalístico cuja ocorrência, porém não é necessária à consumação. Exemplo: calúnia,
difamação, injúria, rapto, etc. Delitos de mera conduta ou de simples atividade são os que contêm
apenas a definição da conduta, não alojando, no tipo legal, nenhum resultado naturalístico.
Exemplo: reingresso de estrangeiro expulso (CP, art.338), ato obsceno (CP, art. 233) e quase todas
as contravenções.
O tema (a polêmica) merece uma acurada atenção. Há anos, em nosso país, nos crimes tributários
(fiscais) ou previdenciários, tenta o legislador encontrar um ponto de equilíbrio entre o interesse do
Estado (que primordialmente é o de arrecadar impostos, valendo-se inclusive e sobretudo da
ameaça do direito penal), do Ministério Público (que é o de processar o infrator, visando a condená-
lo criminalmente) e do contribuinte (que é o de não ver-se privado de sua liberdade nem de seus
bens, senão consoante o devido processo legal, com direito ao contraditório e à ampla defesa com
os meios e recursos a ela inerentes- CF, art. 5º, incs. IV e LV). (...) A jurisprudência dominante,
como sabemos, vem sublinhando a regra de que não é necessário o prévio exaurimento da via
administrativa nos crimes tributários ou previdenciários. Em outras palavras, a existência de
processo administrativo-fiscal, afirma-se, não impede a instauração da ação penal pelo Ministério
Público, até porque cuida-se de ação penal incondicionada (Súmula 609 do STF). Esse majoritário
entendimento, entretanto, não leva em conta que o recurso administrativo-fiscal suspende a
exigibilidade do tributo (CTN, art.151). Como então conciliar a processabilidade do contribuinte, isto
é, a instauração da ação penal que hoje é amplamente admitida pelo STF, com a inexigibilidade de
tributo, que ainda não se sabe se é devido ou indevido? No direito tributário sabe-se que a
obrigação tributária nasce quando ocorre o fato gerador (CTN, art.113). Surge o crédito tributário
quando a obrigação se torna conhecida do Fisco (CTN, art. 139). Com o lançamento, constitui-se o
crédito tributário (CTN, art.142) e, a partir daí, ele é exigível. Mas, se houver recurso, resulta
suspensa essa exigibilidade (CTN, art.151,III). Somente a decisão final constitui o crédito
definitivamente (CTN, art.174). Em suma, enquanto não há decisão administrativa definitiva, não há
crédito tributário definitivo. Sendo assim, parece inevitável que o melhor caminho, no atual contexto,
inclina-se no sentido do acolhimento da tese de prejudicialidade, suspendendo-se o processo e a
prescrição em todas as hipóteses em que esteja em jogo a exigibilidade do crédito tributário.
Aplica-se aos crimes fiscais o princípio da independência entre a instância penal e civil, bem como
entre a administrativa e judicial; a decisão judicial transitada em julgado não extingue propriamente
o crédito mas afirma que ele nunca existiu ou que foi quitado; a decisão administrativa no mesmo
sentido não vincula a ação penal, posto que relevantíssima para reconhecer-se ou negar-se a
materialidade do delito, ou, eventualmente, a extinção da punibilidade pelo pagamento. A toda
evidencia, o lançamento do tributo não é condição para a propositura da ação penal, muito menos a
representação da autoridade fiscal: desde que a materialidade do delito possa ser suficientemente
demonstrada por outros meios, não é preciso conhecer com exatidão o valor ‘apropriado’ ou
sonegado.
Nada obstante iterativas decisões do Poder Judiciário Federal, acolhida a supremacia da justiça, no
tocante ao mérito, no mínimo, os dois processos caminharão paralelamente, não se sabendo, de
antemão, o resultado de ambos. Pode-se, administrativamente, concluir-se quanto à inexistência
material do débito e, por conseguinte, não subsistir crime. Discutido no judiciário civil ou penal, da
mesma forma, todo o trabalho procedimental interno perderá sentido. O correto parece ser o
expediente prosseguir, enquanto o penal não chegar a fase de exame de mérito da inadimplência;
nesse momento, este último terá de ser sobrestado.
Art. 313-A Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir
indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração
Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
Estranho paradoxo estabeleceu o legislador. Em exegese literal do texto da lei, poderia parecer que
somente o funcionário autorizado que inserir dados falsos ou praticar as demais ações ali
estabelecidas responderá pelo crime. Aquele que não estiver autorizado a operar o sistema, ainda
que sua conduta se subsuma ao preceito, não incidirá na sanção, livrando-se da incidência da lei.
Não é exatamente o que deve ocorrer. Não sendo o funcionário autorizado, sua conduta não se
subsume apenas ao novo delito de “Inserção de dados falsos em sistema de informações”. Mas se
o legislador equiparou o funcionário público ao particular, quando não esteja autorizado a operar o
sistema, cabe então concluir que não ficará impune.
A Lei nº 9.983/00 deu nova redação ao artigo 153, sediado no Capítulo VI, Título I,
Parte Especial do Código Penal, que versa sobre crimes contra a liberdade individual,
inserindo os parágrafos 1º-A e 2º, para criminalizar a divulgação, sem justa causa, de
informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei, contidas ou não nos
sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública:
Art.153 (...)
§ 1º- A. Divulgar, sem justa causa, informações sigilosas ou reservadas, assim definidas em lei,
contidas ou não nos sistemas de informações ou banco de dados da Administração Pública.
Pena – detenção, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
§ 1º Somente se procede mediante representação.
§ 2º Quando resultar prejuízo para a Administração Pública, a ação penal será incondicionada.
Trata-se de norma penal em branco, incompleta ou aberta, pois depende de
definição em lei sobre quais são as informações consideradas sigilosas ou reservadas.
Contém um elemento normativo, sem justa causa, cuja análise da existência ou não
caberá ao julgador, no caso concreto.
O vocábulo “informações” pode ter uma abrangência exagerada, incompatível com as limitações
próprias do direito penal. Por isso, o texto legal se encarrega de limitar-se àquelas “definidas em
lei”. Assim, não bastam tarjas, faixas, carimbos ou coisa do gênero que as definam como sigilosas
para que adquiram essa condição. Faz-se necessário que o texto legal (estritamente falando, lei)
assim o defina. Caso contrário, esbarra-se na atipicidade.
César Dario Mariano da SILVA se expressa no sentido de que “haverá justa causa
se houver um motivo plausível para a divulgação do segredo, como quando há
consentimento do interessado; para a apuração de crime de ação penal pública; dever de
testemunho judicial; defesa de direito ou de interesse legítimo; comprovação do crime ou
de sua autoria,etc. Nesses casos, o fato é atípico”.
O dispositivo visa proteger tanto os segredos da Administração Pública, incluídas,
aí, as informações sigilosas ou reservadas atinentes à Previdência Social, quanto a
intimidade dos administrados que venham a ser prejudicados pela divulgação do segredo,
sem justa causa.
O crime, cuja pena varia de um a quatro anos, e multa, é comum, não havendo
exigência de que o sujeito ativo seja servidor público. Pode ser qualquer pessoa, inclusive
o particular que venha a ter acesso, ainda que por equivoco, à informação sigilosa. O
sujeito passivo é o Estado ou o administrado cuja intimidade foi devassada.
A consumação se dá com a efetiva divulgação do segredo a uma ou mais pessoas
não autorizadas a conhecê-lo, sendo possível a tentativa, quando o agente é
surpreendido prestes a divulgar a informação sigilosa.
O elemento subjetivo do tipo é o dolo genérico, não se exigindo especial fim de
agir. Deve o agente, porém, ter consciência da ilegitimidade da conduta, da qualidade
confidencial das informações e de que a divulgação poderá vir a causar dano.
É delito formal. Para a consumação, independe da produção de resultado danoso,
bastando sua potencialidade. No entanto, se ocorrer prejuízo para a Administração
Pública, a ação penal, que seria pública condicionada à representação do administrado
atingido, passa, por força do contido no § 2º, a ser incondicionada.
5.4 VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL
Art. 325. Revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou
facilitar-lhe a revelação:
Pena: detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa, se o crime não constituir crime mais
grave.
§ 1o Nas mesmas penas deste artigo incorre quem:
I - permite ou facilita, mediante atribuição, fornecimento e empréstimo de senha ou qualquer outra
forma, o acesso de pessoas não autorizadas a sistemas de informações ou banco de dados da
Administração Pública;
II - se utiliza, indevidamente, do acesso restrito.
§ 2o Se da ação ou omissão resulta dano à Administração Pública ou a outrem.
Pena – reclusão, de (dois) a 6 (seis) anos, e multa.
Contudo quer nos parecer que também nessa hipótese é possível o conatus, pois nem sempre será
possível obter o acesso imediatamente (mesmo que se trate de servidor autorizado), exigindo-se
todo um procedimento de busca, de pesquisa e de obtenção da senha secreta para ingressar no
sistema restrito e obter informações sigilosas ou reservadas. Se o servidor for surpreendido antes de
obter a informação o crime não se consuma, ficando no plano da tentativa.
Além dos selos e sinais públicos, com o inciso III, introduzido pela Lei 9.983, de 14.07.2000, o
legislador ampliou o objeto material do crime. Incorpora-lhe expressões de uso corrente: marca-
sinal especial de forma variável (letra, desenho, emblema); logotipo –reunião de duas ou mais
letras ou sinal em forma de desenho); sigla- conjunto de letras iniciais de um vocábulo, constituindo
abreviatura convencional.
Art. 297 Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público
verdadeiro:
Pena - reclusão, 2 ( dois) a 6 ( seis ) anos, e multa.
§ 1° Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a
pena de sexta parte.
§ 2º Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade
paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade comercial, os
livros mercantis e o testamento particular.
§ 3º Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir:
I - na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado a fazer prova
perante a previdência social, pessoa que não possua a qualidade de segurado obrigatório;
II - na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento que deva
produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter sido
escrita;
III - em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as obrigações da
empresa perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da que deveria ter constado.
§ 4º Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no § 3º, nome do
segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato de trabalho ou de
prestação de serviços.
O parágrafo 3º ora acrescentado ao artigo 297 do Código Penal trata das fraudes que se cometem
contra o INSS e geralmente visam à “comprovação” de um período de contribuição inexistente,
para o fim de obter benefício previdenciário; inversamente, o parágrafo 4º trata principalmente da
ocultação da prestação laboral e do contrato respectivo, quando não tiver a finalidade de suprimir
ou reduzir as contribuições do empregado e do empregador (CP, art.337-A, inciso I), bem como
outros encargos, em prejuízo da Administração Pública e do próprio trabalhador, que não recebe
seu FGTS e demais vantagens, e ainda fica à margem da Previdência Social”.
O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Se for funcionário público e cometer o
delito prevalecendo-se do cargo, a pena eleva-se em um sexto (§ 1º).
Sujeito passivo é o Estado, mais precisamente a Previdência Social, podendo
secundariamente ser o segurado e seus beneficiários que tenham sido prejudicados pela
conduta danosa.
O tipo subjetivo é o dolo simples, a vontade de falsificar ou de omitir dados no
documento, sabendo que da conduta podem decorrer prejuízos a terceiros.
É crime formal, onde é indiferente a ocorrência ou não de prejuízos para que se
consume, bastando a potencialidade lesiva do falso, e comissivo, com exceção da
conduta prevista no § 4º, que se dá por omissão.
A consumação se dá com a falsa inserção da anotação no documento ou, no
tocante à omissão de dados, quando se esgota o prazo legalmente determinado para
inseri-los. É admissível a tentativa, embora seja difícil comprová-la.
Henrique Geaquinto HERKENHOFF, quanto ao crime inserido no § 3º, observa
que, para a consumação do delito, “não é necessária a efetiva apresentação ou utilização
do documento, que poderá tipificar o uso de documento falso (CP, art.304) ou o
estelionato (CP, art 171)”.
Ainda conforme aquele autor, quanto à omissão tipificada no § 4º, “se a conduta
tem por finalidade a supressão de contribuição social, aplica-se o art. 337-A do Código
Penal”.
Ressalte-se que quem falsifica o documento para o cometimento de estelionato
responde apenas por estelionato, nos termos da súmula 17 do Superior Tribunal de
Justiça: “quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por
esse absorvido”.
Sobre o assunto, assim se manifesta Andreas EISELE:
Qualquer conduta fraudulenta que um contribuinte praticasse com o fito de cometer evasão fiscal
pela manutenção do Fisco em erro, poderia, em tese, caracterizar estelionato, sem prejuízo de
eventuais falsidades perpetradas como meio à execução, que seriam absorvidas pelo critério da
consunção, a solucionar o concurso aparente de leis. O que define a tipificação do fato em uma ou
outra norma (estelionato ou falsidade), é a modalidade de enfoque com que se considera o crime
tributário, ou seja, classificando-o como crime de dano, no qual o resultado é indispensável para
sua consumação, ou, por outro lado, tomando-o como modalidade de crime de perigo, no qual a
consumação ocorre com a prática da conduta fraudulenta que tem a finalidade específica de servir
de meio a uma evasão que pode, eventualmente, vir a se perpetrar materialmente.
Esclarece Gianpaolo Poggio SMANIO que “a lei cita o artifício, que ocorre quando
o agente emprega aparato que modifica a coisa. Exemplos: encenação, disfarce, efeitos
da luz; e o ardil, que é a insídia, a astúcia, a conversa enganosa, de caráter intelectual. E
admite qualquer outro meio fraudulento (fórmula genérica); portanto, qualquer que seja a
conduta do agente apta a enganar a vítima. Exemplo: mentira, silêncio etc”.
A súmula 24 do Supremo Tribunal Federal orienta que “aplica-se ao crime de
estelionato em que figura como vítima entidade autárquica da Previdência Social, a
qualificadora do § 3º do art. 171 do Código Penal”.
A percepção de benefício previdenciário mediante fraude é considerada
estelionato previdenciário. Outro exemplo desse crime é a utilização de uma CND-
Certidão Negativa de Débitos falsificada ou adulterada, em uma concorrência pública, no
intuito de obter-se vantagem indevida, em detrimento da Previdência Social.
O sujeito ativo, que pode ser qualquer pessoa penalmente imputável, é aquele
que induz ou mantém alguém em erro, mediante engodo. Como bem atesta Damásio E.
de JESUS:
É possível que um sujeito empregue fraude contra a vitima, enquanto outro obtém a indevida
vantagem patrimonial. Nesse caso, ambos são sujeitos ativos do delito.(...) Pode ocorrer que o
agente, empregando engano, obtenha da vítima vantagem ilícita para terceiro. O Código Penal,
definindo o fato, diz que a obtenção é para o sujeito ‘ou para outrem’. Esse terceiro cometerá o
crime na hipótese de ser destinatário doloso do proveito ilícito.
Quem, com uma só conduta fraudulenta (dotada de periculosidade ex ante), produz vários
resultados jurídicos (lesões ao bem jurídico tutelado, em contextos fáticos distintos), responde por
concurso formal de crimes (CP, art.70). A prescrição, conseqüentemente, conta-se consoante o
disposto no art. 19 do CP, que diz: “No caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade
incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente”.
Concluído o julgamento de habeas corpus em que se discutia, para fins de verificação do prazo
prescricional, a natureza do crime de estelionato imputado ao paciente – candidato a prefeito que,
em troca da promessa de voto, providenciou certidão de nascimento da eleitora com a data de
nascimento adulterada, para que esta obtivesse perante o INSS a aposentadoria por idade. Trata-
se, na espécie, de habeas corpus contra acórdão do STJ que entendera configurado o caráter
permanente da mencionada infração, por se tratar de fraude em percepção de benefício
previdenciário, que dura no tempo, devendo ser considerada como termo inicial da prescrição a
data em que cessou o recebimento indevido da aposentadoria (CP, art. 111, III). A Turma
acompanhou o voto do Ministro Marco Aurélio, relator, considerando que a mencionada conduta
caracteriza-se como crime instantâneo de resultados permanentes, e deferiu habeas corpus para
declarar extinta a punibilidade do paciente pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva a
partir do dia em que confeccionada a certidão de nascimento falsa (CP, art.111, I).
(...) é toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a
ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou excluir ou modificar suas
características, de modo a reduzir o montante do imposto devido, ou a evitar ou diferir seu
pagamento.
(...) toda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, o
conhecimento por parte da autoridade fazendária:
I - da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza e circunstâncias
materiais;
II - das condições pessoais do contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária principal ou
o credito tributário correspondente.
O crime de sonegação fiscal é o que mais diretamente está ligado com a Crise do Estado, pois os
tributos são, sem dúvida alguma, a principal fonte da receita pública direta do Estado e o maior
encargo dos particulares. A obrigação tributária é do tipo impositiva e independe da vontade das
partes. Em momentos de crise, como o atual, há uma grande tendência ao não cumprimento das
obrigações tributárias de forma espontânea, sendo extremamente necessário, por parte do Estado,
desenvolver esforços punitivos para a realização da cobrança de débitos tributários dos
contribuintes.Tal fenômeno ocorre porque o desvio de receita dos tributos coloca em xeque a
própria existência do Estado, como arcabouço social destinado a defender o interesse público e
implementar o bem estar de toda a coletividade. A utilização do arcabouço penal para punir os
ilícitos tributários independe das práticas sancionatórias no campo administrativo (multas fiscais) ou
civis (prisão por dívida e cobrança de multa moratória ou compensatória). O mesmo fato praticado
pelo agente contra a administração tributária pode ensejar sanções administrativa, cível e penal
que, no caso, são autônomas e cumulativas.
Art. 337-A Suprimir ou reduzir contribuição social previdenciária e qualquer acessório, mediante as
seguintes condutas:
I - omitir de folha de pagamento da empresa ou de documento de informações previsto pela
legislação previdenciária segurados empregado, empresário, trabalhador avulso ou trabalhador
autônomo ou a este equiparado que lhe prestem serviços;
II - deixar de lançar mensalmente nos títulos próprios da contabilidade da empresa as quantias
descontadas dos segurados ou as devidas pelo empregador ou pelo tomador de serviços;
III - omitir, total ou parcialmente, receitas ou lucros auferidos, remunerações pagas ou creditadas e
demais fatos geradores de contribuições sociais previdenciárias:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
§ 1º É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara e confessa as contribuições,
importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social, na forma definida em
lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.
§ 2º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for
primário e de bons antecedentes, desde que:
I - (VETADO)
II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido
pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas
execuções fiscais.
§ 3º Se o empregador não é pessoa jurídica e sua folha de pagamento mensal não ultrapassa R$
1.510,00 (um mil, quinhentos e dez reais), o juiz poderá reduzir a pena de um terço até a metade ou
aplicar apenas a de multa.
§ 4º O valor a que se refere o parágrafo anterior será reajustado nas mesmas datas e nos mesmos
índices do reajuste dos benefícios da previdência social.
I - tenha promovido, após o início da ação fiscal, e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da
contribuição social previdenciária, mesmo que parcelada, inclusive acessórios: ou
Sujeitos ativos do delito em análise tanto podem ser o empresário individual como aqueles que
ocupam cargos administrativos ou técnico-contábil-financeiro nas sociedades empresarias, como
os sócios gerentes, os membros do Conselho de Administração, os diretores, os contadores, os
gerentes de contabilidade, os gerentes administrativos e financeiros, os chefes de setor, de divisão
ou de departamento de emissão de documentos fiscais de interesse do INS, etc. Poderá haver
concurso de agentes dentro da empresa ou fora dela. Citem-se os exemplos de empresas
coligadas ou controladas pela mesma holding, bem como a hipótese da delegação da contabilidade
a empresa especializada. O empregador figura como sujeito passivo da obrigação previdenciária,
como contribuinte e responsável pelo recolhimento da respectiva contribuição. Não se pode
esquecer, contudo, que o sujeito passivo da obrigação previdenciária nem sempre será o sujeito
ativo do crime aqui enfocado, como na hipótese da pessoa jurídica, que sofrerá tão somente as
sanções fiscais administrativas, enquanto a ação penal será interposta contra seu administrador
e/ou funcionário que tenha praticado o delito. Aliás, não basta a comprovação de que o agente seja
diretor da empresa para que se lhe impute a prática delitiva, sendo necessário que se demonstre
que este contribuiu dolosamente com sua conduta à perpetração do crime.
Se o crime for praticado visando reduzir ou suprimir contribuição social previdenciária em favor de
firma individual, sociedade comercial, instituição financeira ou empresa de qualquer natureza, serão
pessoalmente responsáveis o titular da firma individual, os diretores, administradores, gerentes ou
funcionários responsáveis. Cabe observar, contudo, que essas pessoas devem ter participado do
ato da sonegação, ou seja, se diretor, só será responsável penalmente se exercer poderes de
gerência, por força do contrato social; se funcionário, ter contribuído para a prática delituosa.
Mesmo a pessoa que não faça parte da empresa, como sócio gerente, gerente contratado ou
empregado, poderá ser sujeito ativo do delito, em co-autoria, como, ad exemplum, o contador
responsável, nos termos do art.29.
É atípica, ao menos por esta parte, a conduta de quem pratica a omissão capaz de reduzir ou
suprimir o tributo, mas efetiva o correto lançamento; é duvidosa a existência de dolo quando o
tributo sonegado é corretamente recolhido; tais situações, por esdrúxulas que possam parecer,
ocorrem com relativa freqüência, seja por erro ou ignorância do agente, seja porque ele visava
fraudes diversas, tais como: saque indevido do FGTS, e do Seguro –Desemprego, ocultação do
acúmulo indevido de empregos, etc.”.
A natureza jurídica da sentença que concede o perdão judicial é ainda hoje questão controvertida
na doutrina e na jurisprudência. Para alguns, é condenatória, o que vale dizer que o juiz primeiro
condena e logo após deixa de aplicar a pena. Essa solução implica conseqüências de ordem penal
como maus antecedentes, lançamento do nome do condenado no rol dos culpados, reparação de
danos na esfera civil, etc. O fundamento é o artigo 120 do Código Penal, pois não teria sentido esse
dispositivo, que expressamente excluiu como efeito da sentença concessiva do perdão tão
somente a reincidência, permanecendo a contrario sensu os demais delitos secundários, Mas
outros autores, como Celso Delmanto, Heleno C.Fragoso e Alberto Silva Franco entendem que a
partir do momento em que o perdão é uma causa extintiva da punibilidade, a sentença que o
concede é declaratória, não subsistindo qualquer efeito, inclusive de natureza secundária. Hoje
ganha força este entendimento na esteira da Súmula 18 do STJ: “a sentença concessiva do perdão
judicial é declaratória de extinção de punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”.
Art. 168-A Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no
prazo e forma legal ou convencional:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem deixar de:
I - recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que
tenha sido descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;
II - recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis
ou custos relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;
III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido
reembolsados à empresa pela previdência social.
§ 2º É extinta a punibilidade se o agente, espontaneamente, declara, confessa e efetua o
pagamento das contribuições, importâncias ou valores e presta as informações devidas à
previdência social, na forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal.
§ 3º É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for
primário e de bons antecedentes, desde que:
I - tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da
contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou
II - o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido
pela previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas
execuções fiscais.
PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART. 95, DA LEI Nº 8.212/91. REVOGAÇÃO. LEI Nº 9.983/00.
ART. 168-A, DO CÓDIGO PENAL. ABOLITIO CRIMINIS.INOCORRÊNCIA. APROPRIAÇÃO
INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. CRIME OMISSIVO.
1. A Lei nº 9.983/00 não acarretou, em relação ao tipo penal do art.95, 'd', da Lei nº 8.212/91,
abolitio criminis, uma vez que o fato delituoso - deixar de recolher contribuição previdenciária
arrecadada dos segurados - permaneceu sendo considerado como crime.
2. Embora o legislador tenha dado ao tipo penal do art. 168-A o nomen juris de "apropriação
indébita previdenciária", contudo,diferentemente da apropriação indébita prevista no caput do art.
168,do Código Penal, naquela não se exige, para a realização da conduta típica, a vontade livre e
consciente de apropriar-se do bem, e não o restituir.
3. Para a configuração do delito previsto no art. 168-A, do Código Penal, basta a intenção de não
repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal,
conduta essencialmente omissiva. Precedentes da Quarta Turma deste Tribunal Regional Federal.
O tipo do art. 168 do Código Penal exige, para sua configuração típica, que o agente tenha a posse
ou a detenção, lícita evidentemente, de alguma coisa móvel (mesmo coisa fungível, como o
dinheiro) e que, em seguida, torne tal coisa sua, através de um ato apropriatório. Ora, na hipótese
da denominada apropriação indébita previdenciária, o empresário não recebe do trabalhador a
contribuição social destinada à previdência, posto que o empresário, quando paga o salário, já
desconta aquela contribuição, dela não tendo o trabalhador disponibilidade. Isso significa que o
importe dessa contribuição social permanece sempre em poder do empresário e, portanto, quando
efetua a transferência para a previdência, o valor da contribuição sai do próprio ativo da empresa.
Luiz Flávio GOMES esclarece que só se pode apropriar-se de algo que se possui,
ainda que contabilmente, e que a falta de transferência real de patrimônio não significa
ausência de lesão ao bem jurídico. Explica que uma operação contábil, uma vez
realizada, é algo que pertence à realidade e não uma ficção. Quem contabiliza um
desconto da previdência e depois não o repassa, sabendo disso e fazendo fazê-lo,
apropria-se do que deveria ter recolhido.
Como bem atesta Antonio Lopes MONTEIRO, “veja-se que o texto fala em
‘contribuições recolhidas dos contribuintes’. Por outro lado, vivemos numa época de
moeda escritural, ou mesmo digital, que trafega por meio de impulsos eletrônicos nos
sistemas informatizados dos bancos. Assim, não é possível exigir como integrante do tipo
um desconto no sentido físico, uma conduta de descontar”.
O desconto ou a retenção da contribuição previdenciária é realizado pelo
responsável tributário. O sujeito passivo da obrigação tributária divide-se em contribuinte
de fato, que é aquele que tem relação pessoal e direta com o fato passível de tributação
e em contribuinte de direito ou responsável, terceiro obrigado legalmente ao recolhimento
do tributo a cujo fato gerador esteja vinculado de forma indireta.
Sobre o assunto, ensinam Carlos Alberto Pereira de CASTRO e João Batista
LAZZARI:
A Lei nº 8.212/91 relacionava, em seu artigo 95, § 3º, revogado pela Lei nº
9.983/00, as pessoas que poderiam ser responsabilizadas pelos crimes tipificados
naquele artigo:
Tal relação não se mostrava completa. Apenas as pessoas ali citadas poderiam,
em princípio, ser punidas pelo crime de apropriação indébita previdenciária, o que
deixava de fora diversas outras, não expressamente relacionadas, tais como os
mandatários, contadores ou prepostos dessas pessoas, os síndicos dos condomínios, os
empregadores domésticos e demais pessoas que concorreram para o delito. Por outro
lado, responsabilizava objetivamente indivíduos pelo simples fato de exercerem
determinada atividade, como a titularidade ou a administração da empresa, sem adentrar
na verdadeira autoria do injusto penal. Isso foi suprido pela Lei nº 9.983/00, que não
discriminou as pessoas que podem cometer crimes contra a previdência social.
Mais adiante, prossegue aquele autor para salientar que “pode ocorrer o crime
sem a participação ou conduta dos sócios, gerentes ou administradores. Não é incomum
o proprietário da empresa, igualmente, tornar-se vítima do crime. Entregar o valor a ser
recolhido a um contador, por exemplo, para que esse execute o recolhimento; que, por
sua vez, aproveitando-se da boa fé empresário, apropria-se do valor a recolher à
previdência social”.
Na mesma esteira segue o pensamento de Carlos Alberto Pereira de CASTRO e
João Batista de LAZZARI:
A simples comprovação de que o sujeito participava da gestão da empresa não basta para
incriminá-lo; há que se demonstrar que ele tenha concorrido para a ocorrência do resultado. Deve
ser responsabilizado o administrador que, de fato, tinha o poder de mando, isto é, que decida pelo
não-recolhimento das contribuições arrecadadas. Não é suficiente para a condenação figurar o
nome do réu no contrato social ou congênere; deve ficar caracterizado ter sido ele o responsável
pelo atendimento do dever legal”.
No que concerne à redação constante no art. 95, d, da Lei n. 8212, de 1991, haveria que se
analisar, ainda, outra questão importante – que se mantém intacta mesmo com a alteração
promovida pela Lei n. 9.983, de 2000. Geralmente, tratava-se de delito cometido por integrante de
pessoa jurídica. Assim, ao realizar a fiscalização em determinada empresa, o fiscal detectava a não
quitação de valores devidos à Previdência. Portanto, haveria de se ter em mente, de modo
prioritário, que o empregador – pessoa jurídica – que não realizava o desconto tem, geralmente,
estrutura societária, em que as atribuições diversas são divididas entre os sócios (nas sociedades
de responsabilidade limitada) ou delegadas a diretores (de modo geral nas sociedades anônimas).
Assim, haveria que se verificar, diante do contrato social, a estrutura da sociedade e concluir quem,
dentre os sócios e diretores, seria responsável pelo recolhimento das contribuições. Portanto, não
basta ser sócio para ser denunciado. Somente deveria(m) ser denunciado(s) o(s) sócio(s)
responsável (is), na dinâmica da empresa, pelo recolhimento. Geralmente, trata-se do sócio que
cuida do setor administrativo. No entanto, nada obsta, como é comum em certas sociedades
limitadas - de menor complexidade- que, embora conste do contrato social que certo sócio é o
encarregado da parte administrativa, todos os sócios participem da totalidade das deliberações a
respeito da utilização do, muitas vezes, escasso numerário da empresa. Nesse caso, a prova
testemunhal será de inegável importância. No entanto, o contrato social é a prova, geralmente,
mais contundente das funções do sócio na sociedade.
Torne-se a dizer que não cabe ao auditor fiscal da previdência social que levanta
a existência do débito investigar qual foi a vontade do sujeito ativo, nem provar a autoria e
a materialidade do delito. Verificando, no exercício de suas atribuições, a ocorrência, em
tese, do crime de apropriação indébita previdenciária, elaborará Representação Fiscal
para Fins Penais a ser remetida ao Ministério Público Federal, na qual indicará quem
eram os responsáveis pela empresa no período envolvido, bem como prestará demais
informações levantadas a respeito do ocorrido.
Compete ao Ministério Público, se entender conveniente e oportuno, requisitar à
Polícia Federal a instauração de inquérito policial e propor ao Poder Judiciário a ação
penal pública, no curso da qual, como argumento de defesa, o acusado poderá produzir
prova elidindo a presunção de dolo ou da autoria.
No entanto, para que a ação penal bem se desenvolva, entendemos ser
imprescindível que o Ministério Público, apesar da discricionariedade que lhe é
concedida, antes do oferecer a denúncia, solicite à autoridade policial competente que
apure o crime, bem como sua efetiva autoria, sempre que necessário para trazer aos
autos elementos esclarecedores sobre o ilícito, em especial quanto à participação de
cada um dos administradores. A denúncia deve descrever, de maneira clara e suficiente,
a conduta dos acusados, de forma a possibilitar-lhes a ampla defesa. Afastar-se-ia,
assim, se for o caso, a responsabilidade dos administradores da empresa ou de alguns
deles que, apesar de relacionados no contrato social, não participaram do crime. Isso
evitaria a inversão do ônus da prova, que atualmente ocorre com o oferecimento da
denúncia com base apenas nas peças de informação geradas no procedimento
administrativo fiscal e na presunção legal de que a empresa seria a beneficiária primeira
do injusto penal.
Como bem destaca Antonio Lopes MONTEIRO, “aqui deve residir a preocupação
do Ministério Público e do magistrado durante a instrução criminal. É bem verdade que a
condição de sócio-gerente, diretor ou procurador é um forte indício de culpabilidade do
acusado, mas a comprovação da responsabilidade irá depender de seu envolvimento
com a administração da empresa através de outros meios de prova”.
Esse entendimento é corroborado por decisão do Supremo Tribunal Federal, “em
se tratando de crime societário, a denúncia deve discriminar a relação entre as
obrigações administrativas de cada sócio e o ato ilícito que lhe está sendo imputado, sob
pena de violar o princípio da ampla defesa”.
Análogo foi o posicionamento que constou em decisão do TRF da 2ª. Região:
Não se pode descuidar, porém, do previsto no § 2º, artigo 13, do Código Penal, no
sentido de que existe omissão penalmente relevante quando a pessoa devia e podia agir
para evitar o resultado. Como ressalta Francisco Ferreira MACIEL, “ao empresário cabe
zelar pelo cumprimento de todas as obrigações tributárias (principal e acessórias) da
empresa, vigiar o cumprimento de todas as obrigações. Se seus empregados ou
prepostos, ou contratados, terceirizados ou não, descumprem essas obrigações
tributárias, seu titular deve responder pela omissão de vigilância sobre seus subordinados
em co-autoria com estes”.
Saliente-se que, apesar do entendimento doutrinário majoritário sobre a
necessidade da identificação de cada sócio em relação às funções administrativas e ao
ilícito imputado, o Superior Tribunal de Justiça vem julgando de modo diverso:
Semelhante é a colocação do. Juiz Federal do Estado do Rio Grande do Sul, Dr.
Celso KIPPER, em brilhante artigo sobre a matéria:
A primeira constatação que se impõe da leitura da legislação passada e presente sobre a matéria é
a de que em nenhum momento o delito de falta de recolhimento das quantias descontadas dos
salários dos empregados a título de contribuição previdenciária configurou o crime de apropriação
indébita, a exigir para a sua consumação, a prática da conduta descrita no tipo do art. 168 do Código
Penal. A equiparação existente na legislação anterior à Lei nº 8.137/90 entre o delito em questão e o
de apropriação indébita foi determinada apenas para o efeito da pena ('Será punida com as penas...
' 'é punida com pena'). Aliás, nem poderia ser diferente. Em primeiro lugar, porque se os tipos penais
transcritos estivessem subsumidos no art. 168 do Código Penal, não teriam razão de existir, bastaria
verificar diretamente a presença dos requisitos necessários à configuração da apropriação indébita
nos casos de falta de recolhimento dos contribuintes previdenciárias. Em segundo lugar, as
condutas descritas nos artigos transcritos são substancialmente diferentes da conduta estipulada no
art. 168 do Código Penal, tornando-se incompatível qualquer equiparação dos elementos dos delitos.
Com efeito, o crime de apropriação indébita é comissivo, pois consiste na prática de um fato que a
norma penal proíbe (apropriar-se de coisa alheia móvel de que tem a posse ou a detenção). O delito
em exame, ao contrário, é e sempre foi omissivo, visto que se configura com a omissão (a falta de
recolhimento, deixar de recolher) de um fato que a norma penal ordena.(...) A primeira conseqüência
da estrutura omissiva do tipo do delito de não recolhimento das contribuições arrecadadas dos
segurados, e da não-equiparação ao crime de apropriação indébita, é a de que não se exige para a
consumação do primeiro o animus rem sibi habend, ou seja, o propósito de inverter o título da posse
passando a possuir a coisa como se fosse sua, com a deliberada intenção de não restituir, própria
da acepção do vocábulo apropriar-se, elemento integrativo do tipo penal do segundo delito. Havendo
o desconto dos empregados das quantias relativas à contribuição previdenciária, e a posterior
omissão no seu recolhimento aos cofres da Seguridade Social, consuma-se o delito sem que seja
preciso investigar, no animus do agente, a intenção de restituir ou não as quantias descontadas. O
dolo necessário é genérico, consistente na intenção de descontar do salário dos empregados as
quantias referidas e de deixar de repassá-las à Seguridade Social”.
No entender do juiz Amir José Finocchiaro Sarti, “a sanção penal deve ser
reservada para os espertalhões que enriquecem às custas do patrimônio alheio,
especialmente, do patrimônio público, não para quem, apesar de todos os esforços, não
consegue atender tempestivamente todas as obrigações de sua empresa. O real
empobrecimento do réu é um dos sinais eloqüentes da ocorrência da situação excludente
(ou justificante)”.
Na verdade, o que não se pode é, em princípio, estabelecer que nenhuma causa de exclusão da
antijuridicidade ou da culpabilidade não se aplica a determinado tipo penal, isso porque tais regras
são genéricas, podendo ser aplicadas a todos os crimes indistintamente, lógico que analisando-se
as circunstâncias de cada caso individualmente, seja em crimes contra a previdência social seja em
crimes de homicídio. Assim é que se espera que os doutos operadores do Direito cada vez mais
tragam ao Judiciário, na qualidade de matéria a ser discutida nos autos processuais, a
inexigibilidade de conduta diversa como causa de exclusão da culpabilidade.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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