Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Edição 100
A Bíblia Sagrada, principal fundamento da teologia cristã, é de vital importância para os filhos
de Deus. Tal assertiva, desde o século primeiro, foi tão firmemente estabelecida que hoje,
dificilmente, algum cristão minimamente maduro ousaria contestá-la. Ademais, sabemos que
esta importância, atribuída à Bíblia, reside quase exclusivamente em sua mensagem. A
despeito das imensuráveis contribuições da revelação bíblica no campo da história, da
arqueologia, da antropologia, das ciências da religião e de outros ramos do saber, o principal
mérito da Escritura encontra-se em seu discurso salvífico (Rm 15.4).
Quando se fixa esta verdade acerca dos propósitos da revelação escriturística, se estabelece,
por consequência, o fato de que uma correta interpretação da Bíblia é tão importante quanto
sua mensagem. Afinal, se a principal riqueza da Bíblia consiste na revelação do Deus
verdadeiro, a correta interpretação do discurso bíblico proporciona o correto entendimento
referente a Deus e, em última análise, nos direciona a um íntegro relacionamento com Ele.
Dessa forma, o fato de a Bíblia existir como uma unidade, composta por um só autor, nos
constrange a considerar determinadas qualidades em sua interpretação, qualidades que não
podem ser explicadas por nenhuma outra abordagem na tarefa interpretativa. Como nos diz
Berkhof: “As considerações puramente psicológicas e históricas não explicarão os seguintes
fatos: que a Bíblia é a Palavra de Deus; que ela constitui um todo orgânico, do qual cada livro
individual é uma parte integral; que o Antigo e o Novo Testamentos estão relacionados um
com o outro como tipo e antítipo, profecia e cumprimento, embrião e desenvolvimento
perfeito; e que não só as declarações da Bíblia, mas também o que pode ser deduzido a partir
dela pela lógica, constitui a Palavra de Deus”.
W. C. Kaiser Jr. e Moisés Silva, citando as considerações de Bright, autor do The Authority of
the Old Testament [A autoridade do Antigo Testamento], dizem: “Foi John Bright quem
observou que a maioria das passagens bíblicas possui algum aspecto teológico expressado de
maneira que transforma a passagem em uma parte do tecido da Bíblia como um todo. E,
ilustrando quais seriam as expressões desse 'aspecto teológico', mencionam as indicações de
uma teologia anterior dentro do texto, como ‘o uso de certos termos que já adquiriram um
significado especial dentro das Escrituras’ (e.g., servo, semente, Israel, etc), além do ‘uso de
citações de escritores que precederam o texto examinado’”. Outras expressões do citado
aspecto teológico são trazidas também por Kaiser e Silva.
Portanto, a utilização do conceito de analogia das Escrituras nos permite, em coerência com o
pressuposto da unidade fundamental da Bíblia, considerar cada texto a ser interpretado em
relação intrínseca com o conteúdo escriturístico anterior a ele.
Contudo, embora o uso da analogia das Escrituras constitua-se em uma grande ferramenta
para a interpretação teológica da Bíblia, ele — somente — não esgota as premissas por trás da
analogia da fé, que considera não apenas o montante canônico anterior ao texto, mas a
totalidade do cânon.
Dessa maneira, a própria Bíblia nos fornece o princípio pelo qual se justifica a necessidade de
uma abordagem teológica em sua interpretação: se toda a Bíblia é a Palavra de Deus, e não
apenas alguns livros ou passagens, é justo que, ao nos lançarmos na exegese de determinada
perícope, a consideremos à luz da totalidade da revelação bíblica e não somente do conteúdo
escriturístico anterior a ela. É necessário considerarmos, na exegese de cada passagem, o
cânon definitivo das Escrituras.
Convencidos da importância de uma interpretação teológica das Escrituras, devemos, neste
ponto, nos perguntar quais as consequências do uso da analogia da fé para nossa teologia.
Diante do princípio da analogia da fé, pelo qual supomos uma única Mente governante como
autora sobre a Escritura, alguns resultados devem ser considerados. Um desses resultados é o
fato de que a Escritura possui, em muitas de suas partes, um sentido místico.
Berkhof nos explica que “certas partes da Escritura têm um sentido místico que, neste caso,
não constitui num segundo sentido, mas no sentido real da Palavra de Deus”. Obviamente,
portanto, existe aqui uma dicotomia entre a consideração de um sentido místico, como único
sentido para determinadas passagens bíblicas, e a medieval interpretação quádrupla, que
enxergava quatro sentidos simultâneos em toda a Escritura.
Por fim, resta-nos abordar, de forma concisa, algumas elaborações práticas que servem como
diretrizes para uma interpretação teológica da Palavra de Deus.
Considerando isso, qualquer abordagem teológica das Escrituras deve estar sujeita à clareza e
à extensão de determinadas passagens que encerram as doutrinas pilares do cristianismo.
Além disso, como consequência direta dessa pauta de interpretação em particular, podemos
postular que somente aquilo que é ensinado de forma clara, inequívoca e ausente de
ambiguidades pode constranger a consciência do cristão. Em outras palavras, nenhuma
doutrina que constranja a consciência do crente a algo deve ser estabelecida com base em
conclusões particulares. Interpretações humanas elevadas ao nível de “escritura” devem ser
veementemente evitadas.
Em terceiro lugar, devemos estar atentos ao que está implícito na Escritura. Nem todas as
verdades que constam na Bíblia Sagrada são expressas de maneira clara em enunciados
formais. Um exemplo desse fato pode ser encontrado na própria doutrina da Trindade, que,
embora não esteja explicitada da forma como a conhecemos em nenhum texto bíblico, pode
ser deduzida da Escritura a partir da lógica. Dessa forma, temos que as conclusões doutrinárias
lógica e responsavelmente estabelecidas a partir de textos bíblicos, se verdadeiramente
deduzidas, fazem parte do pensamento de Deus e de sua revelação, tanto quanto as
declarações do próprio texto.
Por fim, mais do que a mera consulta, a congruência de passagens paralelas (as que tratam do
mesmo assunto) deve ser empreendida, para que se possa entender corretamente o
pensamento de Deus sobre determinado assunto. Somente encerrando em declarações
formais tudo o que a Bíblia diz sobre qualquer assunto é que se torna possível estabelecer
qualquer doutrina ou pensamento divino.
“Somente aquilo que é ensinado de forma clara, inequívoca e ausente de ambiguidades pode
constranger a consciência do cristão”
“Nenhuma doutrina que constranja a consciência do crente a algo deve ser estabelecida com
base em conclusões particulares”