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As pixações nos muros das cidades são constantemente encontradas e já fazem parte
da arqueologia urbana, do habitat humano e da identidade de cada município. Antes de
qualquer aprofundamento ou explanação, esclarecemos nossa escolha ao usar a palavra
pixação com ‘x’, amparadas em:
Cruz e Costa (2008) nos lembram que em nosso país as pixações surgiram com frases
de protesto e humor. Essa forma de expressão entrou em decadência durante a ditadura militar
devido à forte repressão da censura e do autoritarismo. Considerada uma prática ilegal e
subversiva, as pixações precisavam ser feitas durante a noite e com muita rapidez. Visto de
modo pejorativo, “pichar implica em maledicência. Pichação associar-se-ia, nesse sentido, à
poluição visual urbana” (RAMOS, 1994, p. 19).
Com sua popularização, novas maneiras de usar a pixação foram criadas, não mais
seguindo um caráter unicamente político e de protesto. Entre as ‘inovações’ estão as
assinaturas de nomes próprios, a utilização de símbolos e frases de amor. As assinaturas são
modos de apropriação visual do espaço urbano (SILVA, 2010). Ao assinar seu nome, apelido
ou símbolo, o pixador se apropria de determinado espaço e o identifica. No caso específico
do símbolo, ele normalmente pode ser visto em muros e prédios nos mais diversos lugares das
cidades. Os pixadores encontram nos muros uma boa tela para declarações de amor ou para
ensaiar frases de motivação pessoal. Todas essas manifestações representam as visões de
mundo do pixador, demonstrando sua maneira de pensar e de viver.
1
Ma.ni.fes.ta.ção s.f. 1. Ação ou efeito de manifestar(-se). 2. Expressão coletiva e pública de intenções, ideias,
pontos de vista, etc.
executam seu papel na presença do leitor, i.e., qualquer um desses dispositivos
sozinhos em uma sala não seriam mais do que isso, componentes físicos e
mecânicos. O mesmo não pode ser entendido com relação ao suporte da pichação?
Seguindo por esse pensamento, propomos compreender o muro como um espaço que
os grupos encontram de não apenas chamar a atenção da comunidade, mas também de desviar
o olhar do outro e tentar desmanchar certos modos de pensar tão automatizados pela rotina e
pelo social.
Entendemos que o ato de pixar é, assim como aponta Hall (1997), uma prática
cultural, já que a cultura não é unicamente um conjunto de coisas, mas sim um processo, um
aglomerado de práticas. Para o autor (1997, p. 291) “os significados moldam o que fazemos,
assim nossas ações podem estar constantemente sofrendo múltiplas (re)significações”.
Portanto, darmos ênfase às práticas culturais é de grande importância, já que somos nós que
atribuímos sentidos às coisas através dos modos que às utilizamos.
Santa Cruz do Sul é uma cidade de médio porte localizada no interior do Rio Grande
do Sul. A busca e as fotografias das pixações foram realizadas nos bairros centrais,
considerando que nessa localidade elas possuem maior visibilidade devido ao grande número
de circulação de pessoas. Ao fotografarmos essas pixações, entendemos, assim como Zanella
(2011) que a fotografia não está apenas representando uma realidade, mas também a
instituindo.
Guiados pelo método da bricolagem, que entende que “cada pesquisa é única e o seu
método deve ser construído pelo pesquisador, conforme as características singulares do seu
trabalho” (Idem, 2003, p. 36), este estudo não tem a pretensão de ser uma metodologia de
pesquisa fechada em si mesmo, mas que dá espaço para a invenção e criatividade dos
pesquisadores.
Optamos, nesse trabalho, por analisar e discutir as frases presentes nas fotografias das
pixações. Não articularemos seu senso estético por não termos apropriação e conhecimento
sobre os conceitos necessários para realizar uma boa análise gráfica. Nesse sentido,
pretendemos produzir com as imagens, e não sobre elas (TITTONI, 2011). Compreendemos,
dentro de uma perspectiva pós-moderna,
que as imagens que o mundo, principalmente social, apresenta, a rigor, ele não
apresenta isentamente, isto é, é o olhar que botamos sobre as coisas que, de certa
maneira, as constitui. São os olhares que colocamos sobre as coisas que criam os
problemas do mundo (VEIGA-NETO, 2002, p. 30).
DISCUTINDO AS PIXAÇÕES DA CIDADE
Apesar de tais categorias estarem dispostas enquanto filtros para as imagens, elas não
se opõem umas às outras, do contrário, estão entrelaçadas complementando-se, tornando
difícil a compreensão das pixações separadas por categorias. Vejamos, as minorias sofrem
preconceito, marcadas pela diferença de opor-se ou não incluir-se em padrões homogêneos,
logo constituem-se enquanto resistência, porém, o que nos tornou possível categorizar as
pixações, apesar dos marcadores estarem entrelaçados, foi aquilo que conduziu a leitura de
cada imagem nesta teia de significados.
Resistência política
A palavra “resistência” tem sofrido diferentes interpretações ao longo dos anos, como
também sobreviveu às mesmas, uma destas interpretações ocorreu e ainda ocorre na analogia
de resistência enquanto “ir contra”, “opor-se”, “revolução”, “emancipação”. Porém, na
atualidade a palavra resistência faz mais sentido como uma virtude de estar em estado de “em
luta contra” em relação ao(s) poder(es) vigente(s) (GUZZO; SPINK, 2015, p.10).
É possível identificar nas pixações que encontramos, o seu caráter político, o qual
resiste à hegemonia urbana, social e cultural de padrões limitadores e excludentes em que os
autores dessas pixações não se encaixam.
A política é a arte de organizar as relações, os coletivos, as circulações. É também
estética. Assim como a arte, a política é uma maneira de fazer que concirna às forças
que dividem e organizam o mundo social. Muitas vezes ela atua com ideias, teorias e
tratados sobre a realidade, estruturando a condição de vida das cidades, da
população, do mundo (GUZZO; SPINK, 2015, p.4).
O aspecto central, assim nos parece, reside em fazer da identidade a mola propulsora
para lutas estratégicas, sem, contudo, tornar-se presa das armadilhas identitárias que
substancializam o ser dos sujeitos e, não raramente, reproduzem mecanismos de
hierarquização e desvalorização de sujeitos com base em procedimentos sociais de
normalização e pacificação das diferenças (CÉSAR; DUARTE, 2014, p. 413).
Uma minoria não precisa ser um grupo tradicional com uma longa
história de identificação. Ela pode surgir como resultado de
definições sociais que se transformam através de um processo de
diferenciação política ou econômica. (ROSE, 1972, APUD SCOTT,
2004, p. 18).
O que pode ser mais inconveniente nas rotas urbanas centrais, circuladas por uma
população heterogênea, inscritas em um padrão homogêneo de sociabilidade, o escracho do
que é escasso a alguns e fartura para outros? Estas são as pixações enquanto visibilidade das
minorias.
Está certo que a pobreza constitui minoria. Há casos de minorias que não
necessariamente são minorias quantitativas, mas se constituem enquanto minorias devido à
invisibilidade, negligência e inferiorização da existência de alguns sujeitos.
Os eventos que determinam que minorias são minorias o fazem através da atribuição
do status de minoria a algumas qualidades inerentes ao grupo minoritário, como se
essas qualidades fossem a razão e também a racionalização de um tratamento
desigual. Por exemplo, a maternidade foi frequentemente oferecida como a
explicação para a exclusão das mulheres da política, a raça como a razão da
escravização e/ou sujeição dos negros, quando de fato a relação de causalidade se dá
ao inverso: processos de diferenciação social produzem exclusões e escravizações
que são então justificadas em termos de biologia ou de raça (SCOTT, 2004, p. 19).
César e Duarte (2014) nos recordam que, Michel Foucault sugere para pensarmos as
lutas estratégicas para a conquista de direitos para segmentos minoritários de nossas
sociedades, que tais movimentos deveriam dar um passo adiante e decisivo na direção do
questionamento das formas hegemônicas do viver em comum e nos mostra que somente
poderemos desarmar as estruturas sociais que promovem a violência e a discriminação contra
as minorias se promovermos novas formas de vida e novas relações de amizade entre os
diferentes.
Combate ao preconceito
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pixação é um artefato cultural. Ela é criada pelo homem e diz de sua cultura, afirma
modos de pensar, atravessa e é atravessada pelos discursos que circulam no social.
Entendemos, no decorrer do processo do pesquisar, que a pixação se firma também como uma
prática de significação, que constitui o sujeito e forja identidades. Essas práticas poderão
produzir sujeitos que agirão de determinadas maneiras ou se identificarão com determinadas
posições (GUARESCHI, 2008).
As pixações espalhadas pelas ruas afetam a cidade na medida em que provocam
deslocamentos no olhar daqueles que por ali caminham, no instante em que fazem vibrar um
possível estranhamento e modificam o espaço urbano. As frases que mais incomodam logo
são cobertas por nova camada de tinta e, não raro, voltam a aparecer pela cidade.
REFERÊNCIAS
CAMPOS, Ricardo. A imagem é uma arma, a propósito de riscos e rabiscos no Bairro Alto.
Arquivos da Memória, n. 5/6 (Nova Série). 2009. p. 47-71.
CASSIANO, Sara. Pichações infernizam Goiânia e desafiam a polícia. Tribuna do Planalto.
Goiânia, 12 maio 2013. Disponível em:
<http://tribunadoplanalto.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=16617:pi
chacoes-infernizam-goiania-e-desafiam-a-policia&catid=64:comunidades&Itemid=6> Acesso
em: 13 abr. 2015.
CÉSAR, Maria Rita de Assis; DUARTE, André de Macedo. Michel Foucault e as lutas
políticas do presente: para além do sujeito identitário de direitos. Psicologia em Estudo,
Maringá, v. 19, n. 3, p. 401-414. 2014. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/pe/v19n3/a06v19n3.pdf>. Acesso em: 13 abr. 2015.
CRUZ, Dayse M; COSTA, Maria T. “Grafite e pichação – Que comunicação é esta?” Linhas:
Florianópolis, v. 9, n. 2, p. 95 – 112. 2008.
RAMOS, Célia Maria Antonacci. Grafite, Pichação & Cia. São Paulo: Annablume, 1994.
SILVA, Eloenes Lima da. A gente chega e se apropria do espaço! Graffiti e pichações
demarcando espaços urbanos em Porto Alegre. 2010. Dissertação (Programa de Pós-
Graduação em Educação – Mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Faculdade
de Educação. Rio Grande do Sul, 2010.