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UNIDADE DE ENSINO SUPERIOR DOM BOSCO

CURSO DE DIREITO

ANDRE CRESCENTI ABDALLA SAAD HELAL

LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA E AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL:


aspectos dogmáticos de um conflito e análise do caso
Saskatchewan H.R.C v. Whatcott, da Suprema Corte Canadense

São Luís
2014
1

ANDRE CRESCENTI ABDALLA SAAD HELAL

LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA E AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL:


aspectos dogmáticos de um conflito e análise do caso
Saskatchewan H.R.C v. Whatcott, da Suprema Corte Canadense

Monografia apresentada ao Curso de Graduação


em Direito da Unidade de Ensino Superior Dom
Bosco como requisito parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Direito.

Orientadora: Profa. Ms. Amanda Costa Thomé


Travincas

São Luís
2014
2

Helal, Andre Crescenti Abdalla Saad

Liberdade de expressão religiosa e autodeterminação sexual:


aspectos dogmáticos de um conflito e análise do caso Saskatchewan
H.R.C v. Whatcott, da Suprema Corte Canadense. / Andre Crescenti
Abdalla Saad Helal.__ São Luís, 2014.
58f.
Orientador (a): Profa. Ms. Amanda Costa Thomé Travincas
Monografia (Graduação em Direito) - Curso de Direito - Unidade
de Ensino Superior Dom Bosco, 2014.

l. Liberdade de expressão 2. Autodeterminação sexual 3. Religião


I. Título

CDU 340:372.82
3

ANDRE CRESCENTI ABDALLA SAAD HELAL

LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA E AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL:


aspectos dogmáticos de um conflito e análise do caso
Saskatchewan H.R.C v. Whatcott, da Suprema Corte Canadense

Monografia apresentada ao Curso de Graduação


em Direito da Unidade de Ensino Superior Dom
Bosco como requisito parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em ____/____/____

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________
Profa. Ms. Amanda Costa Thomé Travincas (Orientadora)
Mestra em Direito - (PUC-RS)
Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB

_____________________________________________________
Prof. Ms. Thiago Vieira Mathias de Oliveira
Mestre em Direito – UEL - PR
Professor da Escola Paulista de Direito da Fundação Getúlio Vargas
(FVG Direito SP) e da Universidade São Judas Tadeu

_____________________________________________________
2º Examinador
4

AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha mãe, por estar sempre ali para me dar suporte em toda
essa jornada, me aceitando como sou, me acolhendo e sendo um exemplo de
mulher.
Ao meu pai, Luís Fernando, por toda a noção de retidão e de caráter que
me passou; por me ensinar a sonhar com os pés no chão e nunca deixando de fazer
tudo isso com amor.
A Lucas, Fernanda e Luís Fernando Jr., os melhores irmãos que alguém
pode desejar.
Aos meus amigos, todos eles, com muito amor, por estarem ao meu lado
e serem meu porto seguro em qualquer momento de aflição.
À Lucas, Esperanza, Vitória, Thamires e Isabel, pela estabilidade e
paciência que me dão.
Ao professor Eder Fernandes, por ter-me aberto a porta do Direito
Constitucional, que me fez me apaixonar de vez pelo curso.
Aos professores Ísis Bastos e Roberto Almeida, cuja compreensão foi
essencial para que esse projeto se tornasse possível.
À professora Amanda, orientadora querida e compreensiva, que
consolidou meu amor aos direitos fundamentais e sempre me deu um puxão de
orelha, daqueles com amor, sempre que eu saía um pouco da linha.
Ao professor Roger Raupp Rios, que se abriu ao diálogo comigo, me
ajudou nessa caminhada com humildade e confiança.
E, finalmente, ao Igor, por me mostrar que o amor existe.
5

“A ideia abstrata de liberdade de expressão fez o mundo perder


o temor pelas palavras lançadas. Há um desperdício do
silêncio e um descaso pela força opressora das opiniões
expressadas. O verme vomita sua voz diante do desespero de
suas vítimas. Diverte-se na dominação, triunfa ao não temer a
ameaça, ri porque não têm medo. O descuido com as palavras
é a expressão do endurecimento da alma, a descrença na
necessária evolução da consciência moral, que denuncia o
fracasso da civilização com a gargalhada efusiva, a mistura
embaralhada de toda a potência de destruição. Livre para agir,
o destemido provoca a ira de muitos. Esquece da força de toda
palavra lançada, não percebe a repetição incessante das
palavras de maldição daqueles que sofrem.
Mesmo que triunfe, seus descendentes não passarão.
Eles dirão: por que devemos pagar pelos erros do passado?
E a maldição responderá: não há dívida, há somente cobrança!
Esta lei não falha.”
Eder Fernandes Mônica, 2014.
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RESUMO

O presente estudo traz à baila o embate entre o direito de expressar a sua própria
religião e o direito à autodeterminação sexual, quando se trata a liberdade religiosa
como fator essencial da crença e o direito do homossexual de não ser agredido por
palavras. Faz-se uma análise do caso Saskatchewan H.R.C v. Whatcott, julgado
pela Suprema Corte Canadense, para embasar a possibilidade de limitação de
liberdade de expressão quando o objeto desta é a homofobia. Discute-se,
primeiramente, o direito geral à liberdade religiosa e suas imbricações, nesse
contexto, ressaltando a importância e o perigo do proselitismo como elemento
massificador de opinião e o hate speech. Trata-se dos direitos do homossexual,
dando ênfase à proteção da liberdade e da igualdade visto que são de uma
categoria por vezes desumanizada e relegada ao segundo plano dentro da
democracia.

Palavras-chave: Liberdade de expressão religiosa. Autodeterminação sexual.


Saskatchewan H.R.C v. Whatcott.
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ABSTRACT

This study brings to the table the clash between the right of express one’s own
religion and the right to a sexual self-determination, regarding the religious freedom
as an essential requirement of the belief and the right of the homosexual to not be
abused by words. An analysis of the case, adjudicated by the Supreme Court of
Canada – Saskatchewan H.R.C v. Whatcott – is made, with the escope of giving
basis to the possibility of limitation of the freedom of expression everytime the
objective is homophobia. It is argued, first, the general right of religious freedom and
all of it’s imbrications, in this context, highlighting both the value and the harm of the
proselytism as an massifying element and the hate speech. It adresses the rights of
the homosexual, emphasizing the protection of it’s freedom and equality, given that
they are a category of persons of whom is usually dehumanized and downstaged to
a second groundwork within democracy.

Keywords: Freedom of religious expression. Sexual self-determination.


Saskatchewan H.R.C v. Whatcott.
8

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 8
2 O DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA .................... 11
2.1 Introdução a Conceitos Essenciais ....................................................... 11
2.2 A Incidência e o Alcance do Direito à Liberdade Religiosa no 16
contexto Brasileiro..................................................................................
2.3 A Liberdade Religiosa como Liberdade de Expressão: o 20
Proselitismo ............................................................................................
3 A TUTELA JURÍDICA DOS DIREITOS DE IDENTIDADE SEXUAL: A 24
AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL ...........................................................
3.1 Tutela Geral dos Direitos de Personalidade ......................................... 24
3.2 A Incidência e o Alcance do Âmbito de Proteção do Direito de 26
Autodeterminação Sexual dos Homossexuais ....................................
3.3 Homofobia, Discurso Homofóbico e Proteção do Homossexual ....... 30
4 OS LIMITES DO PROSELITISMO: UMA ANÁLISE DA DECISÃO DA 35
SUPREMA CORTE DO CANADÁ ............................................................
4.1 Uma Breve Introdução do Sistema Jurídico Canadense ..................... 35
4.2 Panfletos Religiosos Homofóbicos no Canadá – O Caso 36
Saskatchewan H.R.C. vs Whatcott ........................................................
4.2.1 A defesa de Whatcott ................................................................................ 37
4.2.2 A resposta da Suprema Corte ................................................................... 38
4.3 A possibilidade da Restrição à Liberdade de Expressão e a 42
Laicidade Estatal .....................................................................................
4.4 O rastro do Discurso Homofóbico proferido por uma Autoridade ..... 45
5 CONCLUSÃO ........................................................................................... 48
REFERÊNCIAS ........................................................................................ 50
ANEXOS ................................................................................................... 56
9

1 INTRODUÇÃO

Discussões acaloradas têm sido travadas no que diz respeito ao tema dos
direitos dos homossexuais. Não é um tema novo, mas está em evidência, pois
diversos acontecimentos vêm se dando no mundo dos fatos que refletem no Direito
como um todo. O Supremo Tribunal Federal, por exemplo, ao decidir a ADPF 132
pelo reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar, em 2011, e o
apelo da parcela da população que faz parte do grupo LGBTT por igualdade de
direitos e diminuição da sua opressão são exemplos de como tanto o Estado quanto
a sociedade têm agido em relação ao tratamento da homossexualidade como
condição pessoal no mundo das coisas.
Nesse momento que áreas mais conservadoras da população dão as
caras, mostrando o seu posicionamento acerca dos temas referentes aos direitos
dos homossexuais. Autoridades institucionais religiosas vêm, veementemente,
desconstruindo o discurso da liberdade e da igualdade com argumentos dogmáticos
de suas profissões religiosas, relegando o homossexual a uma desumanização sem
precedentes.
O poder que a religião ainda tem e reproduz a seus fiéis é enorme, logo, a
liberdade de expressão religiosa se torna uma ferramenta muito eficaz para
propagar dogmas que não coincidem com a realidade, fazendo com que uma
multidão de crentes acreditem e reproduzam tal discurso dogmático religioso em
casa, nas mesas de discussão, com os amigos, na praça pública como um todo.
E a problemática enfrentada por esse trabalho se apresenta nesse exato
momento: quando um fiel reproduz um discurso, seja com o intuito de exercer o seu
direito à liberdade de professar a própria crença, seja com intuito proselitista de
arrebanhar novos fiéis para o seu culto, acaba por desumanizar e ofender o
homossexual no seu íntimo, proferindo o chamado discurso de ódio e o entendendo
como exercício comum do seu direito de liberdade de expressão.
Começa-se por explanar algumas categorias da teoria do Direito
Constitucional e dos Direitos Fundamentais que são essenciais para a compreensão
dos fenômenos acima descritos. Perpassamos pela teoria principiológica de Robert
Alexy, do suporte fático amplo e da possibilidade de restrição de direitos
fundamentais pela regra da ponderação. Adentra-se na seara da eficácia dos
direitos fundamentais, destacando a eficácia privada destes.
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Em um segundo momento, aborda-se o direito fundamental geral à


religião, sua gênese, as formas de proteção, e os aspectos mais importantes desse
direito tão caro ao ser humano e às próprias liberdades públicas como um todo,
partindo-se do pressuposto que a secularização das sociedades ocidentais deram
azo a toda uma ressignificação do Direito e, principalmente, dos direitos
fundamentais.
Engendra-se o foco para a liberdade de expressão religiosa, com ênfase
nas práticas proselitistas, por identificar-se ali uma maior incidência do discurso de
ódio voltado contra os homossexuais. Delineiam-se algumas posições
jusfundamentais do direito geral à liberdade religiosa no que tange com mais força a
liberdade de expressão religiosa, pois, como se verá, muitos vêm que a liberdade de
expressar a sua confissão religiosa é um dos aspectos mais importantes, senão
mandatórios, das religiões atuais. No entanto, e talvez muito por isso,
hodiernamente é fácil encontrar, seja na televisão ou na internet, pessoas
professando a sua fé de uma forma que atinja a população LGBTT.
Passa-se, então, a tratar dos direitos dos homossexuais, perseguindo
uma linha de fundamentalização dos direitos de liberdade e de autodeterminação
sexuais a partir da dignidade da pessoa humana e dos direitos da personalidade,
dentro da conjuntura de Estado Democrático de Direito que a Constituição de 1988
surgiu.
Informa-se como se dá a eficácia entre privados da proteção desses
direitos, principalmente no que tange às declarações que resvalam para o ódio e a
homofobia, abrindo o conflito entre a liberdade de expressão religiosa e o discurso
de ódio voltado contra o homossexual, tendo como base a teoria de Alexy de que
nenhum direito é absoluto num caso concreto. Permeia-se pelas teorias da
autonomia privada dentro da liberdade de expressão e da necessidade de proteção
estatal aos direitos das minorias.
Num terceiro momento, é trazida para análise uma decisão da Suprema
Corte Canadense que se relaciona ao tema do embate entre liberdade de expressão
religiosa e o direito à autodeterminação sexual. A lide se dá quando um líder
religioso local distribui panfletos para a população com declarações homofóbica que
incitam o ódio no intuito de derrubar uma decisão do conselho escolar local de incluir
em sua grade curricular disciplina que trata da questão de gênero e de orientação
sexual. O caso trata da questão com o aporte da teoria dos princípios e da regra da
11

ponderação ao analisar a legislação anti-homofobia existente no Canadá. Partindo


de como se deu a decisão, se dá um envolvimento com a possibilidade de restrição
do direito de liberdade de expressão religiosa quando este transborda da profissão
da própria fé e da persuasão de possíveis novos crentes, indo para o lado do ódio e
da discriminação, o que se considera inaceitável dentro do contexto de Estado
Constitucional laico igualitário, como é o brasileiro.
Por fim, aborda-se o ponto das consequências perniciosas do discurso de
ódio homofóbico não só para o homossexual, mas para o debate democrático como
um todo, trazendo a tona elementos como o efeito silenciador desse tipo de
discurso, da vulgarização e marginalização das minorias, claramente vulneráveis no
contexto social hodierno.
12

2 O DIREITO À LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA

2.1 Introdução a Conceitos Essenciais

Direitos fundamentais têm estrutura principiológica, segundo a teoria dos


princípios de Alexy (2011). Assim, tem-se que as normas de direitos fundamentais
seguem um regime diferente das normas-regra, pois são, nas palavras de Alexy
(2011, p. 85 e seg), “mandamentos de otimização”, ou seja, são normas que devem
ser realizadas na maior medida possível, diante das condições fáticas de cada caso,
enquanto na aplicação de uma regra segue-se a máxima do tudo ou nada, não se
permitindo graduações.
Dessa definição de normas de direitos fundamentais como princípios
decorrem diversas consequências importantes. Primeiramente, há que falar na
resolução de quaisquer possíveis conflitos entre um e outro direito fundamental, que,
segundo o método desenvolvido por Alexy (2011, p. 94), a proporcionalidade ou
ponderação, são solucionados por meio de um verdadeiro sopesamento entre os
interesses em conflito, uma vez que “essa relação de tensão não pode ser
solucionada com base em uma precedência absoluta de um desses deveres, ou
seja, nenhum desses deveres [direitos fundamentais] goza, por si só, de prioridade.”
(ALEXY, 2011, p. 95).
Silva (2011a, p 45-46) explica que a ausência de tal relação de
precedência a priori de um direito fundamental sobre o outro se dá pois princípios
são normas que só garantem direitos prima facie, que só terão seus conteúdos
definitivos revelados quando da análise do caso concreto.
Uma vez que se saiba que princípios podem ser realizados em diferentes
graus, fica claro que em um eventual conflito entre direitos fundamentais um dos
dois direitos em questão poderá ser suprimido, no todo ou em parte, para que o
outro seja realizado, total ou parcialmente, daí extraindo-se a conclusão que direitos
fundamentais, por mais que sejam importantíssimos como garantias de um cidadão
no contexto de um Estado Democrático de Direito, estão sujeitos a restrições.
As restrições não podem ser, de antemão, delineadas no bojo de um
dado direito fundamental, visto que, prima facie, todas as condutas relacionadas ao
exercício de um direito fundamental estão abarcadas, no campo teórico. A categoria
do suporte fático de um direito fundamental compreende exatamente isto, ou seja,
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aquelas condutas que, quando realizadas, dão ensejo à consequência jurídica


definitiva do direito em questão (ALEXY, 2010, p. 308). Uma teoria ampla do suporte
fático de um direito fundamental, tal como defendida por Alexy (2010) e corroborada
por Silva (2011a, p. 71), preconiza que, visto que direitos fundamentais garantem
somente prima facie uma posição jurídica, não há que falar em nenhuma exclusão
de condutas a priori do âmbito de proteção de tal direito.
A acepção de um suporte fático amplo é defendida, uma vez que não se
pretende excluir quaisquer condutas, em abstrato, no que tange a liberdade religiosa
e o direito de personalidade, da proteção prima facie garantida por tais direitos
fundamentais.
Toda norma de direito fundamental é passível de limitação, através da
restrição imposta por disposições que, nos dizeres de Alexy (2010, p. 281) são
“normas que restringem uma posição prima facie de direito fundamental.” A
consequência da adoção da teoria de um suporte fático amplo é a de que as
restrições a um direito fundamental são todas de ordem externa, dependentes da
condição de cada caso concreto, rechaçando-se, assim, a teoria dos limites
imanentes dos direitos fundamentais, que preconiza que um direito fundamental tem,
em si, abstratamente, condutas que não são abarcadas dentro do seu âmbito de
proteção. Por sua vez, a teoria externa das restrições aos direitos fundamentais
parte do pressuposto completamente oposto: um princípio é, prima facie, ilimitado
(SILVA, 2011a, p. 140).
Quaisquer restrições ao exercício de um direito fundamental só serão
definidas quando da possível colisão de um direito fundamental com outro, e isso
está implícito na adoção da teoria dos princípios como marco fundamental do
desenvolvimento do estudo dos direitos fundamentais.
Diante disso, questão que se levanta é: todas as condutas abarcadas por
um direito fundamental podem ser restringidas? Para os adeptos da teoria do
conteúdo essencial absoluto, não, visto que este poderia ser representado por um
núcleo intangível de situações compreendidas dentro de um direito, não suscetíveis
a qualquer restrição a um dado direito fundamental, algo como uma garantia última e
intocável de um direito fundamental (SILVA, 2011a, p. 188-190).
Por outro lado, uma teoria do conteúdo essencial relativa, que é também
consequência do modelo de princípios proposto por Alexy (2010), se destaca. Isso
porque um conteúdo essencial relativo é aquele que permite maleabilidade e até
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esvaziamento de um direito quando ocorre uma colisão entre direitos fundamentais


(SILVA, 2011a, p. 196-202), e, num cenário onde direitos fundamentais são
princípios que podem ser realizados em diversos graus – e até grau nenhum, vê-se
que não é possível destacar parte do que é protegido por um direito fundamental e
torná-lo imutável, estático, intangível sem levar em consideração as possíveis
variáveis que podem circundar o caso concreto.
Quando se trata da dimensão da eficácia dos direitos fundamentais,
existe certo embate doutrinário sobre o tema quando se questiona a quem e como
esses direitos se direcionam.
Que os direitos fundamentais vinculam o Estado não há duvidas – a
própria gênese das primeiras teorias acerca dos direitos fundamentais sempre os
consideraram como direitos de defesa do particular em relação à Administração
Pública (PIEROTH, SCHLINK, 2012, p. 101-103). A grande questão que se põe é
acerca da chamada eficácia privada dos direitos fundamentais.
A importância desse debate é bem apontada por Sarmento (2004, p. 223),
que deixa claro que nas relações privadas também se vê, com frequência, condutas
que põem em risco os direitos fundamentais dos indivíduos, ou seja, a ameaça aos
direitos fundamentais não advêm somente de atos do Poder Público. Ubillos (1997,
p. 266, tradução livre) preconiza que “A posição de superioridade e a conseguinte
propensão ao abuso ou à arbitrariedade não é uma característica exclusiva do poder
público.”
O dilema a ser enfrentado é o de como se dá a vinculação dos
particulares aos direitos fundamentais garantidos por uma Constituição, visto que,
sob o olhar de alguns, esta colocaria em risco a autonomia privada:
O ponto nodal da questão consiste na busca de uma fórmula de
compatibilização entre, de um lado, a tutela efetiva dos direitos
fundamentais, neste cenário em que as agressões e ameaças a eles vêm
de todos os lados, e, do outro, a salvaguarda da autonomia privada da
pessoa humana. (SARMENTO, 2004, p. 224).

Da mesma forma salienta Sarlet (2013, p. 196), para quem,


indubitavelmente, há vinculação dos particulares aos direitos fundamentais, ainda
que a Constituição Federal não expresse em cláusula própria esse efeito entre
particulares.
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A teoria da eficácia mediata (ou indireta) foi suscitada primeiramente por


Dürig, Nipperdey e Schwabe (2012, p 35-42), para quem os direitos fundamentais
somente vinculariam o particular por meio de uma irradiação do direito constitucional
ao direito privado, através de cláusulas gerais e conceitos indeterminados, que
levariam o intérprete da lei, diante do caso concreto, a analisar se houve ou não
qualquer tipo de opressão a um direito fundamental dentro do exercício da
autonomia privada.
Pereira (2006, p. 467) afirma que sempre haverá a necessidade da
intervenção estatal, para os partidários desta tese, para que se verifique uma
verdadeira aplicação dos direitos fundamentais à relação privada em questão, e
essa intervenção se dará através do Poder Legislativo, quando o legislador, atento
aos ditames fundamentais constitucionais, já elabora as normas de direito privado
em conformidade com tais preceitos, ou pelo Poder Judiciário, que ocorreria no caso
em que o juiz, ao apreciar determinada situação concreta, decide pela aplicabilidade
de uma regra de direito fundamental.
O suporte teórico da doutrina que corrobora com a tese da eficácia
mediata dos direitos fundamentais nas relações entre particulares é a de que uma
aplicabilidade direta acabaria por tornar a autonomia privada estanque, fazendo com
que os indivíduos tivessem seu poder de contratar restringido por força da incidência
direta dos direitos fundamentais nas relações privadas (SILVA, 2011b, p. 96).
Silva (2011b, p. 97) explica porque essa tese não prospera: “[...] tanto
Hesse quanto Dürig, e outros que seguem a mesma orientação, confundem
aplicação direta com impossibilidade de relativização dos direitos fundamentais nas
relações entre particulares.” Ou seja, os partidários da teoria da eficácia mediata não
vislumbram que uma aplicação imediata dos direitos fundamentais não tem o
condão de aniquilar a autonomia privada, que também é um princípio, e que será
levada em consideração caso haja colisão entre direitos fundamentais numa relação
entre particulares. Tal posição fica clara nos dizeres de Sarmento (2004, p. 293):
A teoria da eficácia mediata nega a possibilidade de aplicação direta dos
direitos fundamentais nas relações privadas porque, segundo seus adeptos,
esta incidência acabaria exterminando a autonomia da vontade, e
desfigurando o Direito Privado, ao convertê-lo numa mera concretização do
Direito Constitucional.

Não é o caso, como já se viu acima. Retomando a ideia de Alexy (2010)


de direitos fundamentais como princípios, não se admite que em qualquer conflito
16

entre um direito fundamental e a autonomia privada o primeiro prosperará, pois


nenhum direito fundamental goza, a priori, de precedência em relação a outro.
A teoria da eficácia imediata encontra como primeiro expoente Nipperdey
(2012, p. 52), que baseia a sua teoria na premissa básica de que o “fundamento do
ordenamento jurídico total, portanto, também do direito privado, é a dignidade da
pessoa”, e traz como outro fundamento para a defesa da tese da aplicabilidade
direta o contrato social, pois “a vinculação do particular à comunidade resulta,
sobretudo, do principio do estado de direito social”, defendendo, então, que o
indivíduo que se submete a um Estado, independente de uma lei ou abertura
normativa que o autorize, está submetido aos direitos fundamentais garantidos pela
Constituição daquele Estado. Daí a eficácia direta dos direitos fundamentais às
relações particulares.
É também importante ressaltar que, no atual cenário constitucional de
Estado Democrático, “não há mais limites precisos que separam direito
constitucional e direito privado, não sendo possível concebê-los como
compartimentos estanques, como mundos separados, impermeáveis, governados
por lógicas diferentes.” (PEREIRA, 2006, p. 432). Logo, não se fala em “autonomia
do direito privado” significando a não submissão deste ramo do direito à
Constituição, uma vez que todo o ordenamento jurídico está “a serviço” da carta
política de um Estado (BARROSO, 2010, p. 262).
Para os adeptos da teoria da eficácia direta dos direitos fundamentais nas
relações particulares, as normas de direito fundamental tornam-se verdadeiros
direitos subjetivos oponíveis em face das pessoas privadas sem necessidade de
mediação legislativa (PEREIRA, 2006, p. 466). Quer isso dizer que, ainda que não
haja lei proibindo alguma conduta, é completamente possível que alguém que se
veja lesado em um direito fundamental por outro particular procure o Poder
Judiciário com o escopo de ver tal situação sanada, extraindo o fundamento jurídico
direto da constituição.
Sarmento (2004, p. 291) salienta, ainda, que o disposto no art. 5º, §1º da
Constituição Federal (“As normas definidoras dos direitos e garantias individuais têm
aplicabilidade imediata.”) reforça a incidência imediata das normas de direito
fundamental às relações privadas.
É possível destacar duas diferenças de grande valor entre os modelos da
eficácia mediata e imediata. A teoria da eficácia imediata, ao conferir direitos
17

fundamentais como direitos subjetivos de um indivíduo, torna desnecessária


qualquer mediação legislativa para a aplicação desses direitos, bem como também
deixa de lado as “artimanhas interpretativas” sobre as cláusulas gerais e conceitos
indeterminados dentro do âmbito do direito privado como portas de entrada para os
direitos fundamentais, tal como propôs Dürig (SILVA, 2011b, p. 89-90). Percebe-se,
então, que no modelo direto, os direitos fundamentais são simplesmente aplicáveis
de plano às relações intersubjetivas, encontrando seu limite tão somente na técnica
clássica da ponderação.
Uma última consideração acerca da teoria da eficácia direta dos direitos
fundamentais às relações entre particulares: segundo Sarmento (2004, p. 300), esta
teoria é notoriamente dominante na doutrina brasileira, encontrando com sua própria
adesão, bem como de Ingo Wolfgang Sarlet, Luis Roberto Barroso, Gustavo
Tepedino, Wilson Steinmetz e Jane Reis Gonçalves Pereira, para citar somente
alguns. Vimos aqui que essa é, também, a posição de Virgílio Afonso da Silva.
Barroso (2010, p. 372), ao citar o RE 161243/DF, o RE 158215/RS e o RE
201819/RJ, considerado o leading case da eficácia privada direta no Brasil, salienta
que “o ponto de vista da aplicabilidade direta e imediata afigura-se mais adequado
para a realidade brasileira e tem prevalecido na doutrina e na jurisprudência.” Por
essas razões, este é o modelo adotado neste trabalho.
Nesse recurso extraordinário, o STF demonstrou a adoção da teoria
imediata, como se depreende deste trecho do acórdão:
a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua
incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições
postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa
também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas,
em tema de liberdades fundamentais. (BRASIL, 2005).

Nessa senda é que se debruça ao estudo da liberdade religiosa como


direito fundamental, uma vez que é este um direito dos mais valiosos e culturalmente
caros para a sociedade, como se verá neste capítulo.

2.2 A Incidência e o Alcance do Direito à Liberdade Religiosa no contexto


Brasileiro

A proteção constitucional da liberdade religiosa teve sua gênese nos


Estados Unidos da América, quando, em 1791, a primeira emenda à Constituição de
18

1787, prelecionou: “Congress shall make no law respecting an establishment of


religion, or prohibitin the free exercise thereof”. (WEINGARTNER NETO, 2007, p.
33). Ou seja, o constitucionalista reformador norte-americano criou verdadeiro direito
de defesa do cidadão em relação ao Estado, proibindo que o parlamento se
intrometesse em qualquer matéria religiosa, que diria respeito tão somente ao
indivíduo.
A fundamentalização do direito à liberdade religiosa, segundo Machado
(1996, p. 78) foi consequência da Reforma Protestante, pois daí iniciou-se uma onda
de secularização e laicidade estatal por todo o mundo ocidental, necessitando a
religião de proteção jurídica para que continuasse institucionalmente e politicamente
forte.
A mudança de paradigma da comunidade política, de moral para
constitucional foi o principal aporte desse processo de secularização (MACHADO,
1996, p. 97), que não deve ser entendido como uma aversão à religião, mas sim,
como leciona Arendt (2010, p. 265):
[...] como evento histórico tangível, a secularização significa apenas a
separação entre Igreja e Estado, entre religião e política; e isto, do ponto de
vista religioso, implica em retorno à antiga atitude cristã de dar ‘a César o
que é de César e a Deus o que é de Deus’, e não uma perda de fé e
transcendência ou um novo e enfático interesse nas coisas deste mundo.

Para o Machado (1996, p. 97), o coração da cultura de uma sociedade


reside nas suas bases religiosas. Isso porque desde o florescer da civilização, o
homem teve sua vida permeada por aspectos místicos que mais tarde viriam a dar
azo à criação do fenômeno religioso na humanidade. Daí a importância de a ordem
jurídica de uma nação preocupar-se com a religião e suas formas de manifestar-se.
Ademais, reforçando o caráter massificador da religião como fenômeno
social e cultural dentro de qualquer sociedade, pode-se ver que a importância de um
tratamento jurídico da mesma exista, pois, segundo Weingartner Neto (2007, p. 39),
a religião é “um fenômeno de massa, de notável capacidade mobilizadora e de
grande força aglutinadora. Mais de três quartas partes da população mundial está
ligada a algum movimento religioso [...]”.
No Direito brasileiro, a Constituição Federal de 1988 trouxe, em seu rol de
direitos e garantias fundamentais do art. 5º, alguns dispositivos que compõe o que é
chamado de direito geral de liberdade religiosa: do inciso VI, da Carta Magna se
extrai: “é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre
19

exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de
culto e suas liturgias;” do inciso VII: “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de
assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;” e do
inciso VIII: “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de
convicção filosófica ou política [...]”. (BRASIL, 1988).
Da leitura dos dispositivos constitucionais e do magistério de Weingartner
Neto (2007), delimita-se alguns pontos do suporte fático do direito fundamental de
liberdade religiosa, tendo em mente que tal elemento de uma disposição
constitucional jusfundamental se relaciona com os bens jurídicos protegidos pela
norma mas “que nem sempre se afiguram de fácil identificação, especialmente em
decorrência das indeterminações semânticas presente no texto normativo
(disposições) que asseguram direitos fundamentais [...].” (SARLET, 2012a, p. 396).
Com o objetivo de demonstrar que a liberdade religiosa deve ter o seu
suporte fático entendido como o mais alargado, devido à importância que tal
liberdade pública tem na cultura e na sociedade, Pires (2012, p. 54) esclarece que
as liberdades tiveram um tratamento o mais amplo possível na Carta Magna,
mormente no que concerne à liberdade de valores e consciência individuais, uma
vez que tais aspectos se traduzem numa esfera extremamente pessoal que engloba
a vida privada íntima e a autodeterminação. Daí inferir-se uma dependência entre o
direito de liberdade de consciência, o de liberdade de religiosa, liberdade de
expressão e liberdade de pensamento, sendo esta uma interdependência complexa
e que dá azo à formação do caráter e da personalidade do indivíduo.
Não obstante tais dificuldades em conceituar a liberdade religiosa
separadamente, em trabalho minucioso e partindo do pressuposto que os
dispositivos constitucionais acima referidos dão conta de um grande direito
fundamental complexo, Weingartner Neto (2007, p. 63) o conceitua como direito
geral de liberdade religiosa.
A partir de tal conceituação, Weingartner Neto (2007) disseca o direito
geral de liberdade religiosa num catálogo de posições jusfundamentais de tal direito
– o que Alexy (2011, p 251) chama de Direito Fundamental Completo –, dividindo-o
em duas dimensões, que são, a da liberdade de expressão como direito subjetivo,
na primeira, e como vetor objetivo, na segunda (WEINGARTNER NETO 2007, p 72).
Para os fins deste trabalho, as posições que mais interessam se encontram na
primeira dimensão, a da liberdade religiosa como direito subjetivo individual, mais
20

precisamente no tocante à liberdade de professar a própria crença, de procurar


novos crentes (proselitismo), de expressar livremente pela palavra o pensamento
religioso, incluindo aí a produção de obras de cunho religioso, e a liberdade de
informar os outros acerca de sua religião.
Isso porque a prática proselitista e informadora da religião, por vezes,
pode entrar em conflito com direitos fundamentais de outrem, já que a liberdade
proclamada, pelo menos prima facie, levando em conta a teoria de Alexy (2010)
acerca dos direitos fundamentais, é irrestrita e global. A linha entre a expressão
própria da religião de um indivíduo ou de um grupo para a coletividade e a prática
discriminatória é bastante tênue, como se depreende da lição de Weingartner Neto
(2013, p. 267), pois a institucionalização do fenômeno religioso pode acabar
decaindo para a coerção e/ou discriminação, disseminando tal forma de agir pelos
seus fiéis, uma vez que a relação entre a religião e o praticante é assimétrica, tendo
o Estado Democrático de Direito tentar, da maneira mais solene possível, preservar
a convivência religiosa com outros valores, tais quais a liberdade, o pluralismo e a
dignidade.
Vê-se, então, que apesar de a Constituição Federal garantir a maior
liberdade possível no âmbito religioso, mormente no que tange a liberdade de
professar a própria crença e de cooptar novos fieis, é necessário que o Estado atue
sempre que tais práticas, apesar de constitucionalmente protegidas e defendidas,
exorbitarem da esfera dos direitos subjetivos e passem a interferir na vida de outras
pessoas.
No tocante ao contexto da coexistência de diversos tipos de pensamentos
e crenças culturais e religiosas, no aspecto do pluralismo político e cultural que a
Constituição Federal traz como próprio fundamento do Estado Democrático de
Direito em seu art. 1º, V, traz-se à baila o pensamento de Pires (2012, p. 60), para
quem o direito geral de expressão religiosa engloba as mais diversas condutas,
positivas e negativas, possíveis.
Martins Filho (2004, p. 42), ao refletir sobre as liberdades políticas –
incluindo, aí, a liberdade de expressão religiosa – deixa claro o que aqui se defende,
ao colocar que “a função do Estado é promover o bem comum” e que “o bem
comum é a soma dos bens individuais de cada integrantes da sociedade”.
A frustração da “sociedade pós-moderna absolutamente secularizada” é
constatada por Lorea e Knauth (2010, p. 33), para quem, ainda que com todas as
21

declarações de laicidade estatal, as primeiras décadas do século XXI ainda


demonstram que a religião vai bem além das relações interpessoais estritamente, se
estendendo, ainda, para o Poder e as políticas públicas, ainda que num cenário que
contextualize somente as sociedades ocidentais.

2.3 A Liberdade Religiosa como Liberdade de Expressão: o Proselitismo

Dentro das condutas abarcadas pela liberdade religiosa, temos que o fiel
detém a liberdade de professar a própria crença, procurar para ela novos crentes,
exprimir e divulgar livremente as suas crenças (WEINGARTNER NETO, 2007, p.
72). Fica evidente que tais aspectos do direito fundamental completo à religião têm
conexão com a liberdade de expressão lato senso garantida na Constituição Federal
de 1988, em seu art. 5º, IV.
Para Silva Neto (2013, p. 47), a liberdade de expressar sua religião por
meio do culto e da liturgia são mesmo fundamentos últimos da própria existência da
religião, ou seja, não se pode desatrelar a crença da sua prática sem que se
desconfigure o direito fundamental à liberdade religiosa.
Milton Ribeiro (2002, p. 26) preleciona que a liberdade só é atingida
plenamente quando o homem é capaz de realizar a sua natureza mais íntima, e, no
âmbito da religião, a liberdade de professar é essencial para tanto. Daí a proteção
constitucional que abrange a liberdade de expressão religiosa ser tão importante
para que o direito fundamental seja realizado pelo indivíduo.
É que a liberdade de expressão é, em sua essência, fundamento da
própria democracia, uma vez que serve para a formação da opinião pública sobre
temas de interesse geral (CHEQUER, 2011, p. 29). Desta forma, assinala o autor, é
que a doutrina e jurisprudência norte-americanas têm a liberdade de expressão lato
sensu como um direito preferencial prima facie, gozando de prevalência sobre outros
direitos que acaso conflitem com este.
Tomada a definição de Weingartner Neto (2007, p. 117) de proselitismo
como o discurso que sai de dentro do seio da comunidade religiosa para fora dela,
com intuito de convidar pessoas a se juntarem à religião, deve-se sempre levar em
conta quem está do lado de fora e em que medida a expressão da liberdade
religiosa alheia o atinge.
22

Nessa senda que Machado (1996, p. 49) reduz a problematização da


liberdade religiosa às situações em que há a pretensão de trazer ao âmbito jurídico e
constitucional concepções religiosas, o que obrigatoriamente causa conflito dentro
da sociedade entre aqueles adeptos da confissão religiosa dominante e os demais.
Weingartner Neto (2007, p. 118), entendido de tal possível conflito,
preleciona que a liberdade de expressão religiosa “não impede que se exija que o
proselitismo ocorra ‘dentro do respeito pelo princípio da tolerância, no respeito
escrupuloso pelos direitos fundamentais de todos os cidadãos’”.
Machado (1996, p. 227) traz à baila a problematização do modo como as
confissões religiosas praticam a expressão e o proselitismo, mormente quando se
utilizam de suportes publicitários, enfatizando que tais meios não devem ser
excluídos do âmbito da liberdade em questão, contanto que as mensagens
veiculadas estejam de acordo com a harmonização entre este direito e outros
direitos fundamentais que possam ser atingidos.
Essa discussão, ainda que relativamente antiga, pode ser trazida à tona
novamente nos dias atuais, visto que é notória a quantidade de programas de
televisão, em canais abertos, com o cunho religioso, onde se professam cultos,
ideias, dogmas e tudo o que se refere à liberdade de expressão religiosa. E aí o
alcance dessa liberdade transborda o limite do culto, da comunidade religiosa e
entra nos lares dos milhões de cidadãos que têm acesso ao conteúdo televisivo,
tendo então que o cuidado com o conteúdo ali transmitido seja redobrado, uma vez
que as proposituras religiosas dos discursos proselitistas são, muitas das vezes,
contrários aos ideais de dignidade presentes em cada cidadão.
Outro aspecto que aqui também se deve levar em conta, numa era em
que a inclusão digital está cada vez mais avançada, é a proliferação de sites e
vídeos veiculados através da internet, estes também de cunho religioso e por muitas
vezes discriminatórios. Weingartner Neto (2007, p 187) sintetiza a ideia de tais
conflitos, ao afirmar que quando da concretização da liberdade de expressão
religiosa no seio da sociedade brasileira, plural e multicultural, diversas relações
complexas são estabelecidas, advindo, com tais conexões, conflitos entre a
liberdade de expressão religiosa e outro direito que concorra com ela.
Nessa seara aparece o problema do hate speech – o discurso de ódio –
como um dos desdobramentos da liberdade de expressão religiosa
(WEINGARTNER NETO, 2007, p. 306-312). O hate speech, apesar de problemático,
23

é uma consequência inevitável, dentro da liberdade de expressar a própria religião e


do proselitismo.
O discurso de ódio deve, entretanto, ser encarado juntamente com uma
obrigação de tolerância, pois, caso assim não seja, corre-se o risco de que a
liberdade de expressão, conquistada no seio das democracias, tal qual foi o caso do
Brasil pós ditadura militar, encontre um tipo de velha censura no tocante à coibição
de palavras insultantes e vexatórias no âmbito da liberdade religiosa.
É como aponta Ommati (2014, p. 138), ao prelecionar que o maior risco
em que incorre aquele que tenta valorar o predeterminar opiniões (uma verdadeira
“doutrina de restrição de discursos de ódio”), ainda que em nome de uma política
inclusiva que não aceita discriminações de qualquer forma, pode estar pondo em
xeque o próprio direito fundamental de liberdade de expressão que é tão caro para a
manutenção de uma democracia participativa. Daí que o problema, no mais das
vezes, se dá em saber qual o alcance que deve ser dado à dita obrigação de
tolerância.
Mais importante se torna o problema ao constatarmos, segundo Ubillos
(2010, p. 264) que nem sempre há paridade jurídica entre entes particulares. A
religião e suas instituições, por exemplo, exercem autoridade sob seus fiéis, tendo a
capacidade de determinar ou condicionar, juridicamente ou de fato, as decisões
desses últimos, que se encontra em estado de sujeição em relação à instituição
religiosa, mesmo que privada. Por isso que se deve levar em conta a eficácia dos
direitos fundamentais entre particulares1.
Soma-se ao fator da sujeição, conforme Cox (1980, p. 10), a importância
do estudo do fenômeno da profissão da própria crença pois, segundo o autor, o
proselitismo, para a maioria das religiões, e em especial as cristãs, é uma prática
não só voluntária do fiel ou do ministro para o desenvolvimento de certa religião,
mas também necessária, quase que imposta para o sujeito à prática: “[...] um
homem que carrega uma crença tem uma necessidade, um dever moral, de
expressá-la.”
Nessa linha que Machado (1996, p. 223) afirma existir uma unidade
essencial entre crença e prática religiosas; não há como se garantir a primeira sem

1 Assinala Ubillos (2010, p. 265), nessa senda, que também por conta dessa assimetria entre entes
privados – no mais das vezes um é superior jurídica, econômica e/ou socialmente em relação ao
outro – que não se usa mais a expressão “eficácia horizontal”, sendo eficácia privada ou
intersubjetiva mais adequada.
24

ter a liberdade para exercer a última, essa é uma unidade essencial do direito à
liberdade religiosa. Sendo o proselitismo uma das práticas tidas como mandatórias
na maioria das confissões cristãs, a sua proteção é de extrema importância.
Entretanto, o mesmo deve ser feito dentro do já mencionado princípio da
tolerância (MACHADO, 1996, p. 229), tendo como elemento norteador o respeito,
rechaçada qualquer tipo de manifestação religiosa inescrupulosa em relação aos
direitos fundamentais dos demais cidadãos. E delinear certos limites para a prática
proselitista não tira o seu caráter essencial da religião, ficando em termos com a
sociedade plural e democrática.
Constata-se, então, que delimitar o que deve e o que não deve ser dito
dentro do espectro do proselitismo – em prol do respeito às garantias fundamentais
de terceiros – dentro de uma sociedade plural como é a brasileira não é tarefa fácil e
depende da análise de cada caso concreto. E “qualquer que seja a decisão, implica
ela um sacrifício. Num caso, o direito é sacrificado à paz; no outro, a paz é
sacrificada ao direito.” (IHERING, 2011, p. 14).
25

3 A TUTELA JURÍDICA DOS DIREITOS DE IDENTIDADE SEXUAL: A


AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL

3.1 Tutela Geral dos Direitos de Personalidade

Canotilho (2003, p. 396) é claro ao afirmar que muitos direitos de


personalidade são direitos fundamentais, incluindo, dentre eles, os “direitos
distintivos da personalidade (direito à identidade pessoal, [...])”. Essa consideração
leva a investigar a construção dos direitos de personalidade como direitos
fundamentais.
Para Almeida (2011, p. 2), foi com o passar da Segunda Grande Guerra
que tais direitos entraram em evidência, entendidos como “direitos atinentes à tutela
da pessoa humana, considerados essenciais à sua dignidade e integridade”. São
eles, para o autor, expressão da dignidade da pessoa humana nas relações
interprivadas, uma vez que tal princípio é o fundador de toda a unidade do
ordenamento jurídico brasileiro (ALMEIDA, 2011, p. 12).
A autonomia dos direitos de personalidade pós Segunda Guerra Mundial
também é reforçada por Barroso (2008, p. 94-95), que os caracteriza por serem
oponíveis tanto ao Estado quanto aos particulares, reforçando a tese da eficácia
direta dos direitos fundamentais nas relações privadas, e também acentua a
peculiaridade de que as violações aos direitos de personalidade nem sempre
acarretam qualquer tipo de dano econômico, restando a maior afronta à moral do
ofendido.
Barroso (2013, p. 78), ao tratar da dignidade da pessoa humana enquanto
valor intrínseco leciona que tal aspecto do princípio insculpido no art. 1º, III, da Carta
Magna, leva à fundamentação dos direitos de personalidade tais como à integridade
física e psíquica, esta última compreendendo em seu interior o direito à honra
pessoal e à imagem, ou seja, à liberdade que um indivíduo tem de autodeterminar
sua conduta pessoal nas mais diversas searas possíveis. É que o autor considera a
dignidade da pessoa humana “fundamento jurídico-normativo dos direitos
fundamentais.” (BARROSO, 2013, p. 64).
Compactuando com a ideia de vetor de união do ordenamento jurídico,
Sarlet (2012a, p. 92) afirma que o constituinte, ao colocar a dignidade humana como
fundamento do Estado Democrático de Direito brasileiro elevou a Constituição
26

Federal, ainda que apenas no plano do dever-ser, a uma “Constituição da pessoa


humana, por excelência”. Pinto (2012, p. 103, apud SARLET, 2012a, p. 92) conclui
que por colocar tal princípio como imperativo axiológico do ordenamento jurídico
decorreu o reconhecimento dos direitos de defesa da personalidade como direitos
fundamentais. Vai além, ainda, Sarlet (2012a, p. 103), afirmando que só se pode
admitir os direitos de personalidade como direitos fundamentais através do
postulado da dignidade humana, pois houve, “apesar da omissão do Constituinte
neste particular, a consagração - ainda que de modo implícito – de um direito ao livre
desenvolvimento da personalidade.”
Contribui para esse ponto o pensamento de Pérez Luño (apud FACHIN;
FACHIN, 2011, p. 119), para quem além de funcionar como instrumento que impede
o atentado de outrem à personalidade e orientação sexual de outrem, a dignidade da
pessoa humana também embica para o desenvolvimento pleno e livre da
personalidade de todo e qualquer cidadão.
Compreende-se então que existe um direito geral de personalidade,
partindo da fundamentação do princípio da dignidade da pessoa humana, apesar de
não estar dessa forma inscrito na Constituição Federal e que esse direto e seus
demais feixos são, sim, direitos fundamentais do cidadão, tanto quanto o direito à
vida, ao devido processo legal ou à proibição a tortura, exempli gratia.
Ainda que não explicitamente, a própria Constituição Federal, art. 5º,
incisos V (“É assegurado o direito de respostas, proporcional ao agravo, além da
indenização por dano material ou moral à imagem”), e, principalmente, o X (“São
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua
violação”) dão um norte para o que o direito geral de personalidade como direito
fundamental possa significar, ao tratarem de temas pontuais como direito à honra, à
vida privada e da possibilidade do dano causado a estes (BRASIL, 1988).
Borges (2007, p. 10), ao determinar os direitos de personalidade como
“elementos intrínsecos à ‘humanidade essencial’”, lista algumas das posições
jusfundamentais que inteiram o direito fundamental geral de personalidade, tais
como a honra, a reputação, a imagem, as características individuais que fazem um
cidadão ser reconhecido pela comunidade, a afetividade, a sexualidade, etc. Tudo
isso compõe o grande direito que é um dos componentes principais “intrínsecos à
27

pessoa como tal, em toda sua complexidade natural [...] para garantir a felicidade
humana.” (BORGES, 2007, p. 8).
Resta patente, também, para Fachin e Fachin (2011) que a capacidade
de autodeterminação sexual, para além da dignidade humana, também advém do
princípio da isonomia extraído do art. 5º, caput, da Carta Magna, pois “a escolha
sexual individual, conferida pelo constituinte, deriva da interpretação sistemática e
evolutiva do texto constitucional”. (FACHIN, FACHIN, 2011, p. 118). Ou seja, ainda
que não haja menção a tal liberdade de orientação sexual, ou mesmo de direitos de
personalidade como direitos fundamentais dentro da Constituição, é imperativo que
o intérprete constitucional, à luz dos fatos da vida atual, os insira no âmbito de
proteção jusfundamental constitucional.
O presente tópico se vale a determinar a extensão do direito à
autodeterminação sexual, bem como as suas imbricações como direito de
personalidade e direito de liberdade.

3.2 A Incidência e o Alcance do Âmbito de Proteção do Direito de


Autodeterminação Sexual dos Homossexuais

Para Costa (2007, p. 297), os direitos de personalidade são “condição


imprescindível à vida com dignidade”, daí terem características de direitos
fundamentais, tais como serem absolutos e irrenunciáveis, intransmissíveis,
ilimitados, impenhoráveis, etc. Avança o autor ao classificá-los “quanto à integridade
física, intelectual e moral, nessa última inserindo-se o direito à identidade sexual.”
Fica claro, então, que a identidade sexual é um direito fundamental que
faz parte do ser humano como indivíduo autodeterminado. Carlos Fernandes
Sessarrego (1999, p. 195 apud COSTA, 2007, p. 298), chega a afirmar que o próprio
direito à identidade sexual
[...] é um dos direitos fundamentais da pessoa humana. Esta específica
situação jurídica, subjetiva, faculta ao sujeito a ser socialmente reconhecido
tal como ele é, e, correlativamente, a imputar aos demais o dever de não
alterar a projeção comunitária de sua personalidade. [...] a identidade
sexual, considerada como um dos aspectos mais importantes e complexos,
compreendidos dentro da identidade pessoal, forma-se em estreita conexão
com uma pluralidade de direitos, como são aqueles atinentes ao livre
desenvolvimento da personalidade.

De tal forma, é possível afirmar, como o faz Dias (2005, p. 2), que “sem
liberdade sexual, o indivíduo não se realiza.” A identidade sexual e a sexualidade de
28

um cidadão integram sua personalidade de tal forma que a autora entende-os como
verdadeiros direitos naturais. Isso porque sexualidade não se trata de uma qualidade
ou opção, mas sim de característica inerente à condição humana, seja ela hétero ou
homossexual.
Cristina Dieter (2012, p. 11) enfatiza a matiz da autodeterminação sexual
como componente da autonomia da personalidade do ser humano, relacionando-a
ao direito de liberdade que cada um tem de autodeterminação, verificando que ao
deparar essa realidade com a homoafetividade, não há que falar em desrespeito ou
prejuízo a direitos de outrem, uma vez que a sexualidade de um indivíduo só cabe a
ele mesmo e as escolha que o faz em termos de afetividade são suas, e suas
somente. Isso, pois a pessoa, “para realizar-se como ser humano, deve exercer
livremente a sua sexualidade de acordo com sua orientação sexual, que dependerá
da própria pessoa e de mais ninguém.” (DIETER, 2012, p. 12).
Portanto, pode-se identificar que, dentro do direito geral de personalidade,
destaca-se o direito à autodeterminação sexual como direito fundamental autônomo,
por compor o núcleo a existência intrínseca da personalidade de um indivíduo. Vale
destacar, aqui, que como todo direito fundamental completo, a identidade sexual
coloca seu titular em diversos status, segundo a teoria de Jellinek (apud ALEXY,
2010, p. 254), que consistem em posições que o titular de um direito fundamental
pode (e deve) invocar para protegê-lo e exercê-lo com efetividade.
De um lado, tem-se o status negativo, que consiste na não intervenção
do Estado e, levando em conta a eficácia privada direta dos direitos fundamentais,
aos particulares em geral na vivência da identidade sexual em todos os seus
aspectos, criando um verdadeiro espaço de liberdade para a fruição de tal direito
(ALEXY, 2010, p. 260). De outro, tem-se o status positivo de tal direito, este voltado
para o Estado, dando ao titular a faculdade de exigir do Poder Público que aja de
forma a coibir intervenções externas ao direito fundamental à identidade sexual de
um cidadão inserido num Estado Democrático de Direito, que tem como um dos
seus fundamentos o pluralismo (CF, art. 1º, V), e também como um de seus
objetivos a promoção do bem comum sem quaisquer discriminações de qualquer
ordem, inclusive no concernente à orientação sexual (CF, art. 3º, IV) (ALEXY, 2010,
p. 265).
Corroborando tal pensamento, Fachin e Fachin (2011, p. 122) atribuem ao
Estado o encargo de zelar tanto positiva quando negativamente em prol do livre
29

desenvolvimento da identidade sexual de um cidadão. Com a contribuição da teoria


da eficácia privada direta dos direitos fundamentais, temos que também é dever do
particular não cometer ingerências na esfera pessoal, onde se encontra o direito
fundamental à identidade sexual, de outras pessoas.
Dias (2011, p. 84-85) perpassa o direito à auto determinação sexual pelas
três primeiras categorias dos direitos fundamentais, assim entendidas: 1ª categoria:
direitos de liberdade; 2ª categoria: direitos de igualdade; 3ª categoria: direitos de
fraternidade e solidariedade (onde o titular deixa de ser individual e passa a ser a
coletividade, grupos, a sociedade em geral [SARLET, 2012, p. 46 – 50]), pois, para a
Dias (2011), a sexualidade é intrínseca à personalidade humana e, desta forma,
“integra as três gerações [sic] de direitos porque está relacionada com os postulados
fundamentais da liberdade individual, da igualdade social e da solidariedade
humana.” (DIAS, 2011, p. 84).
Uma breve explicação se faz necessária sobre o uso da palavra “geração”
quando se refere aos direitos fundamentais Bonavides (2006, p. 580-586) cunha o
termo “gerações de direitos fundamentais” fazendo uma interligação entre as três
gerações com os ideais da Revolução Francesa: Liberdade, Igualdade e
Fraternidade. Entretanto, hodiernamente, a doutrina constitucionalista prefere o
termo “dimensões de direitos fundamentais”, uma vez que, ao utilizar o termo
gerações, dá-se a perceber que uma geração exclui a outra, toma-lhe o lugar.
Contudo, não é esse o entendimento correto. Segundo a doutrina moderna, bem
esposada no pensamento de Sarlet (2012b, p. 45), donde se extrai que não há
relação de alternância entre as ondas de direitos fundamentais, mas, pelo contrário,
o que há é uma complementaridade entre as dimensões de direitos fundamentais,
um aditivo. A dimensão posterior não exclui a anterior. Dimoulis e Martins (2014, p.
39) recomendam não o uso do termo “dimensões”, pois estas seriam atributos
internos de cada direito (como a dimensão objetiva, subjetiva, etc.), preferindo
categorizar os direitos fundamentais como são organizados leis e atos jurídicos em
espécie, lançando mão do termo “categoria”. Por todo o exposto, o termo “categoria”
é o adotado neste trabalho, ainda que Maria Berenice Dias prefira o termo geração.
Deve-se, por fim, relevar a posição de Alexy (2010, p. 250) de Direito Fundamental
Completo, segundo a qual se vê que não faz sentido falar em dimensões ou
geração, pois todos os direitos fundamentais agregam características de todas as
gerações ou dimensões.
30

Na esteira da primeira categoria, Dias (2011a, p. 84-85) trata a liberdade


sexual como direito de liberdade no sentido de que a sexualidade e a
autodeterminação sexual são direitos naturais, inerentes à personalidade humana.
Como direito de segunda categoria, sob o prisma da igualdade, Dias
(2011a, p. 84) traz à baila o direito fundamental de identidade sexual como direito
oponível a possíveis (e, infelizmente, muito corriqueiros na sociedade) desrespeitos
e discriminações pelo simples fato da orientação sexual de uma pessoa.
Avançando para a terceira categoria dos direitos fundamentais – numa
concepção não mais individual, mas sim, solidária e coletiva – a autora defende o
“direito do ser humano de exigir respeito ao livre exercício da sexualidade.” (DIAS
2011a, p. 84), sem o qual não se realizaria o ideal de solidariedade e o fim precípuo
dessa perspectiva do direito fundamental à identidade sexual.
Essa reflexão acerca do transpassar por todas as categorias de direitos
fundamentais é importante, pois, dessa forma, vê-se como o direito geral de
personalidade e, especificamente, o direito fundamental à identidade sexual não
contempla uma faceta única ou reduzida, demonstrando o amplo suporte fático que
se pode depreender, hermeneuticamente, do texto constitucional para dito direito.
Significa que a diversidade de condutas abarcadas pelo direito em questão é
enorme, preponderantemente por se tratar de um direito tão caro à própria
existência digna do ser humano.
Dias (2011a, p. 90), também se referindo à dignidade humana como
fundamento para a existência e amplitude do direito de livre autodeterminação
sexual, preconiza que “o direito geral de personalidade não permite influência do
Estado na vida afetiva do indivíduo, tampouco na sua orientação sexual [...]”.
Expandindo esta visão para a eficácia direta dos direitos fundamentais aos entes
privados da sociedade, tem-se que também não podem outros particulares – tais
como proselitistas de uma religião – infringir o direito à liberdade sexual do ser
humano sob pena de estar violando um princípio basilar de todo o ordenamento
jurídico, o da dignidade da pessoa humana.
É uma afronta tão grave – por ser tão caro tal direito – que Barroso (2009,
p. 197), discorrendo sobre princípio da autonomia privada e de como ele se aplica à
liberdade sexual do indivíduo, afirma que “Não reconhecer a um indivíduo a
possibilidade de viver sua orientação sexual em todos os seus desdobramentos é
privá-lo de uma das dimensões que dão sentido a sua existência.”
31

Portanto, é importante frisar que o Estado não deve adotar uma postura
inerte – levando em conta, ainda, como constata Dias (2011a, p. 84) que o
homossexual é hipossuficiente tanto social quanto jurisdicionalmente, pois ainda há
julgadores que se deixam levar por razões morais internas e se abstém de decidir de
uma forma em prol de outra, em causas que envolvem direitos dos homossexuais –
mas sim uma atitude proativa, no sentindo de incentivar a diminuição das
desigualdades e fomentar a inclusão e a dissipação dos preconceitos e
discriminações que sofre a população homossexual.

3.3 Homofobia, Discurso Homofóbico e Proteção do Homossexual

Na Grécia e em outras civilizações, durante a Antiguidade, a


homossexualidade era encarada, sob a forma de pederastia - que era uma prática
institucionalizada - necessária e até mesmo privilegiada, onde meninos eram dados
aos cuidados de homens sábios, mais velhos, para que estes últimos os educassem
nas mais diversas áreas do conhecimento, inclusive sexualmente (DIETER, 2012, p.
1-2). A relação entre pessoas do mesmo sexo era comum e tratada com
normalidade. Não havia, ainda, a repressão que há hodiernamente a qualquer tipo
de prática homoafetiva.
Apesar da tradição romana do direito ocidental, Rios (2001a, p. 384)
mostra que a segregação e o preconceito contra o homossexual remonta a tempos
longínquos na tradição jurídica brasileira, quando o Brasil ainda era colônia
portuguesa submetida às Ordenações Filipinas:
Toda pessoa, de qualquer qualidade que seja, que pecado de sodomia por
qualquer maneira cometer, seja queimado e feito por fogo em pó, para que
nunca de seu corpo e sepultura possa haver memória, e todos os seus bens
sejam confiscados para a Coroa de nossos Reinos, posto que tenha
descendência; e pelo mesmo caso seus filhos e netos ficarão inabilitados e
infames, assim como os daqueles que cometem crime de Lesa Majestade.
(ORDENAÇÕES FILIPINAS, Título XIII do Quinto Livro, 1603). (BRASIL,
2014).

A influência da Igreja Católica é marcante em tais escritos, isso é patente


(RIOS, 2001a, p. 385). Entretanto, demonstra como era tratada a dignidade do
homossexual desde a gênese do Estado brasileiro. Da mesma forma preconiza ao
defender que as raízes do discurso homofóbico persistem até hoje e são
consequência da sociedade marcada pela tradição cristã que não aceita qualquer
tipo afeto que não seja aquele entre homem e mulher.
32

A sociedade hoje se encontra num Estado Democrático de Direito. Apesar


de tais afirmações levarem à suposta conclusão de que toda forma de preconceito e
discriminação já foram superadas, não é o que se vê. Sarmento (2006, p. 54)
enfatiza que é justamente nessa sociedade atual, marcada pelo pluralismo de ideias
e opiniões, que são a marca e o fundamento da democracia, que surgem as mais
complexas questões atinentes a conflitos entre liberdade de expressão e outros
direitos, tais como o direito à autodeterminação sexual.
É que “a liberdade de expressão não existe só para proteger as opiniões
que estão de acordo com os valores nutridos pela maioria, mas também aquelas que
chocam e agridem.” (SARMENTO, 2006, p. 55). Nessa seara que surge o maior
problema no enfrentamento da questão, que é a compatibilização da liberdade de
expressão com os demais direitos conflitantes, mormente os das minorias da
sociedade.
Aparece, então, a figura do discurso de ódio (ou hate speech, como é
comumente chamado por se tratar de questão problematizada e discutida de
maneira mais incisiva na doutrina norte-americana e europeia [DWORKIN, 2006, p.
33]). Para Potiguar (2012, p. 23) o discurso de ódio não é simplesmente excesso no
exercício da liberdade e expressão, mas sim fruto de raízes mais profundas, que
remontam aos preconceitos morais inseridos na sociedade que dão azo à
discriminação das minorias pela maioria.
Para Potiguar (2012, p. 101), inclusive, “a liberdade de consciência e de
crença religiosa possui um importante papel na discussão do hate speech.” Ambas
são espécies do gênero liberdade de expressão, e dentro do seu exercício, possuem
proteção constitucional dentro do seu suporte fático para que qualquer crença seja
professada publicamente. Isso, no mais das vezes, acaba por ofender direitos
alheios, uma vez que no contexto de sociedade plural não há consenso quanto a
dogmas ou opiniões. É o caso do discurso proselitista que prega contra a
homossexualidade.
Em relação ao contentamento da liberdade de expressão junto a outros
direitos, para que o exercício da opinião ou crença não desvale para o discurso de
ódio, Dias (2011a, p. 81) preconiza que a apresentação de ideias, seja ela no
ambiente que for, aconteça de forma contida para que “não desdobrem para a
agressão gratuita aos direitos personalíssimos, tais como a honra, a intimidade, a
vida privada e a imagem.” Ou seja, é necessário o uso da proporcionalidade quando
33

da fala para que o que seria mera exposição de opinião não abuse de um direito de
personalidade de outrem.
Assim tanto é que a própria Carta Magna, no art. 220, §1º, faz referência
expressa a um limite à liberdade de expressão contido no art. 5º, X do diploma
constitucional, ou seja, da exegese dos artigos em comento pode-se ver que o
constituinte foi claro ao dizer que a liberdade de expressão não deve ser
embaraçada por lei, para evitar a censura, mas que tal vedação deve ser relativizada
quando da colisão com os direitos de personalidade, como é o direito à
autodeterminação sexual.
Sarmento (2006, p. 100-101) tem uma posição muito clara em relação ao
discurso de ódio cotejado com a autonomia e o livre desenvolvimento da
personalidade. Para o autor, é essencial para a democracia que cada um possa
exprimir suas ideias e opiniões num ambiente público; por esse viés, proibir o
discurso de ódio seria proibir a ideia que, mesmo que acoberta de agressões, se
encontra em seu cerne. Seria, sim, uma restrição à autonomia privada que é um
direito fundamental por si só.
Por outro lado, há de se pensar que o prejuízo da autonomia privada
neste sentido, ao coibir um discurso de ódio é bastante menor quando comparado
ao ganho que se tem para os indivíduos que seriam atingidos pela agressão do
discurso e para a sociedade como um todo pois:
a repetição, por exemplo, de afirmações como a de que os homossexuais
masculinos são fúteis e devassos acaba afetando a percepção que a
maioria das pessoas tem desses grupos, reforçando estigmas e
estereótipos negativos e estimulando discriminações. (SARMENTO, 2006,
p. 105).

O que isso quer dizer é que há ganho de dois lados, uma vez que as
minorias não são agredidas e a maioria, que antes não discriminava certo grupo
minoritário, não será incitada a fazê-lo.
Borrilo (2010, p. 23) divide a homofobia em dois aspectos: a) o aspecto
pessoal, de natureza afetiva, manifestado através da repulsa pelo indivíduo
homossexual e; b) o aspecto cultural, onde o alvo da discriminação não é o
homossexual, mas a homossexualidade em si. É esse segundo aspecto que
geralmente os discursos proselitistas religiosos sustentam: a repreensão à
homossexualidade em ambiente público, hoje com maior difusão por conta do
avanço dos meios de telecomunicação.
34

É muito fácil encontrar programas em redes de televisão abertas de


cunho evangélico, ou em vídeos veiculados pela internet2, que propagam a relação
entre pessoas do mesmo gênero como uma aberração, que deve ser combatida com
todas as forças, uma verdadeira anomalia social. Até mesmo documentos oficiais da
Santa Sé (VATICANO, 2014), que desencorajam e mostram como pecaminosa e
bizarra a “conduta homossexual” podem ser consultados de forma fácil.
Segundo Dias (2000, p. 5), “Qualquer discriminação baseada na
orientação sexual evidencia claro desrespeito à dignidade humana, infringindo
princípio maior consagrado na Constituição Federal.” Não cabe segundo a autora, às
religiões opinarem sobre assuntos que dizem respeito a direitos personalíssimos de
identidade sexual, sobretudo num Estado laico como é o brasileiro:
Se vivemos em um país livre – e vivemos – todos são merecedores da
tutela jurídica, sem qualquer distinção de cor, religião, sexo ou orientação
sexual. Em um Estado laico que se quer democrático de direito, o princípio
da liberdade nada mais dignifica o direito de não sofrer discriminação por
ser diferente. E ninguém mais pode ser vítima de homofobia. (DIAS, 2011b,
p. 163).

Afirma Dias (2011a, p.14) que o legislador, a Justiça e a sociedade não


podem se basear em posições de grupos majoritários, mas sim na lei e na
Constituição, que preceitua igualdade de tratamento a todos.
De forma semelhante assinala Barroso (2009, p. 181), ao dizer que as
concepções religiosas fazem parte do debate político, contudo, não podem justificar-
se na liberdade de expressão para afligir direitos de minorias tais quais a
comunidade homossexual como um todo.
Na verdade, o discurso de ódio prejudica a democracia deliberativa, que
pressupõe a liberdade de expressão como pilar precípuo de sua existência num
âmbito de diálogo da sociedade plural. Isso porque o hate speech “tende a produzir
dentre as suas vítimas ou o revinde violento ou o silêncio humilhado.” (SARMENTO,
2006, p. 95). Daí afirmar-se que deve haver um limite, uma atuação estatal no
sentido de limitar alguns conteúdos, ou pelo menos a forma como as ideias são
proliferadas dentro da sociedade.
Entra em questão, então, a tolerância diante da homofobia como discurso
de ódio proferido pelas comunidades religiosas. O problema é entender o ponto
culminante que divide a manifestação lícita da agressão. Para Sarmento (2006, p.

2
Para maiores informações, consultar: https://www.youtube.com/watch?v=0UQof5DuE2w ou
https://www.youtube.com/watch?v=U5LE0qqOVZQ
35

103), o hate speech, por envolver uma grave violação aos direitos humanos como
um todo exige do Estado o mínimo de tolerância possível, evitando a lesão ao
direito, quando possível, ou punir os culpados e amparar os destinatários agredidos.
Especificamente sobre o repúdio das igrejas à homossexualidade, Dias
(2008, p. 141) assinala que a dogmática cristã (que é a vertente absolutamente mais
difundida e com mais adeptos no Brasil) despreza o sexo pelo prazer e ignora a
noção de afeto, considerando aberração a união de parceiros do mesmo sexo pelo
fato de não poderem procriarem naturalmente. E essa visão de discriminação do
homossexual impregnou a sociedade, por serem as religiões cristãs as mais
difundidas dentre a população, daí “a dificuldade de conviver com a diferença leva à
rejeição de tudo o que foge ao modelo reconhecido como normal, pelo simples fato
de não ser a expressão da maioria”.
Pontua ainda Potiguar (2012, p. 161) acerca dos efeitos que o discurso de
ódio tem em relação às vitimas do mesmo. Segundo o autor, não sobra rastro de
autoestima após sofrerem tal tipo de violação ao seu direito, pois o discurso de ódio,
além de uma afronta jurídica, é também “um sério ataque psicológico, causando
dano emocional enorme” podendo trazer aos membros dos grupos aos quais o hate
speech é direcionado traumas psicológicos, por vezes, irreversíveis.
Sarmento (2006, p. 105) partilha de entendimento parecido, pois diz que
“[...] as manifestações de ódio, preconceito e intolerância tendem a provocar uma
babel de sentimentos negativos em suas vítimas – angústia, revolta, medo,
vergonha.”. Tais sensações, por si só, já são por demais nocivas, e ainda tendem a
estigmatizar todo o grupo minoritário, que se sente envergonhado de ser como é, o
que é inaceitável, quando se vê os direitos de personalidade e, mais
especificamente, o direito à liberdade sexual como expressão da dignidade humana.
36

4 OS LIMITES DO PROSELITISMO: UMA ANÁLISE DA DECISÃO DA SUPREMA


CORTE DO CANADÁ

4.1 Uma Breve Introdução do Sistema Jurídico Canadense

Deixou-se assentado o panorama em que convivem os direitos


fundamentais da liberdade de expressão religiosa e o direito à autodeterminação
sexual. Avançando, procede-se com um cotejamento entre os dois direitos, quando
em conflito, trazendo à baila a experiência pretoriana canadense no tocante ao
proselitismo com conteúdo ofensivo ao homossexual.
O Canadá é um Estado democrático legalmente complexo, uma vez que
as influências dos seus colonizadores França (civil law) e Grã Bretanha (commom
law) subsistem dentro de um mesmo sistema legal (ENGLER, 2011, p. 224).
Como relata Engler (2011, p. 225), a estrutura judiciária do Canadá é
composta por quatro níveis: na base, as Cortes Provinciais de julgamento de
jurisdição limitada; no segundo nível, se encontram as Cortes Superiores Provinciais
de julgamento de jurisdição geral, a Corte Federal de julgamento e o Tribunal Fiscal;
um nível acima, há os Tribunais Provinciais de Apelação e o Tribunal Federal de
Apelação; na ponta da pirâmide judiciária canadense se encontra a Suprema Corte
do Canadá, composta por nove membros.
A Constituição do Canadá foi dessa forma cristalizada como estatuto
legislativo supremo com o Constitutional Act de 1982, que, além de reafirmar
algumas normas que já estavam em vigor, trouxe consigo uma sessão exclusiva
dedicada aos direitos fundamentais, a Canadian Charter of Rights and Freedom
(Carta Canadense de Direitos e Liberdades) (CANADÁ, 1982).
De acordo com Branco (2010, p. 59), a promulgação da Carta Canadense
de Direitos e Liberdade explicitou a possibilidade do controle de constitucionalidade
dos atos legislativos no país, sempre que haja conflito entre leis e direitos
fundamentais.
Afirma ainda Branco (2010, p. 62) que o controle de constitucionalidade
das leis feito pela Suprema Corte do Canadá adotou o juízo de ponderação como
estrutura de verificação da constitucionalidade das leis.
Esse capítulo de destina a analisar uma decisão da Suprema Corte
Canadense que, ato tratar da liberdade de expressão religiosa em choque com a
37

autodeterminação sexual, delimitou a possibilidade da restrição a certos tipos de


agressões verbais, para sustentar mais ainda o estudo dogmático de tal colisão de
uma maneira geral e, particularmente, no prisma brasileiro.

4.2 Panfletos Religiosos Homofóbicos no Canadá – O Caso Saskatchewan


H.R.C. vs Whatcott

O Canadá é um dos diversos países que têm lei federal ou estadual


acerca da proibição da discriminação e do discurso de ódio com base na orientação
sexual. Na província de Saskatchewan, uma das dez componentes da federação
Canadense, há o Saskatchewan Human Rights Code, uma lei provincial vigente
desde 1979, que tem como objetivos (art. 3) a) promover o reconhecimento da
dignidade intrínseca e da igualdade inalienável de direitos de todos os membros da
família humana e b) fomentar políticas públicas em Saskatchewan para que todos os
sujeitos sejam iguais em dignidade e em direitos, e para desencorajar e eliminar
discriminação (SASKATCHEWAN, 2014).
Mais especificamente, em seu art. 14, há expressa proibição contra
publicações e discursos em quaisquer meios de comunicações com conteúdo que
venha a expor um grupo de pessoas ou um indivíduo considerado ao ódio,
ridicularização, desprezo e quaisquer afrontas à dignidade de qualquer grupo ou
pessoa.
O caso Saskatchewan H.R.C (Human Rights Comission) vs William
Whatcott foi julgado pela Suprema Corte do Canadá em 27/02/2013, constituindo
importante precedente no que diz respeito à colisão entre liberdade de expressão
religiosa e direito à autodeterminação sexual (CANADA, 2013, p. 13-19).
Entre 2001 e 2002, o Sr. Whatcott, em nome dos Christian Truth Activistis,
grupo de evangélicos fundamentalistas da nação canadense, distribuiu panfletos em
diversas residências da região contendo críticas à decisão do Conselho das Escolas
Públicas da província, que resolveu incluir na grade curricular das escolas
“informações sobre a homossexualidade”, como assenta a panfletagem (CANADA,
2013, p. 8-12).
William Whatcott se refere a tal fato com palavras tais quais “Crianças
estão mais interessadas em brincar de Barbie e Ken do que aprender como é
maravilhoso para dois homens sodomizarem um ao outro.” e “Agora os
38

homossexuais querem compartilhar sua sujeira e propaganda com nossas crianças


[...]”. (CANADA, 2013, p. 558, tradução livre). (ANEXO A).
Afirma ainda, nos panfletos, que “sodomitas e lésbicas” já foram
redimidos por Jesus Cristo. Também deixa claro que “Nossa aceitação da
homossexualidade e nossa tolerância sobre a sua promoção no sistema escolar vai
levar à morte prematura e à morbidez muitas crianças”, dentre outras afirmações
discriminatórias. (CANADA, 2013, p. 559, tradução livre). (ANEXO B).
Quatro cidadãos que receberam tais panfletos em suas residências
procuraram a Comissão dos Direitos Humanos para dar queixa, alegando que tal
material promovia o ódio em relação à orientação sexual dos indivíduos. O caso foi
levado ao Tribunal de Saskatchewan, que decidiu pela proibição da distribuição dos
panfletos ou quaisquer materiais promovendo ódio aos indivíduos por conta de sua
orientação sexual à Whatcott e aos Christian Truth Actvists, bem como imposição de
multa. Whatcott recorreu à Corte de Apelação de Saskatchewan, que manteve a
decisão, mas não entrou no mérito da constitucionalidade da lei restritiva ao discurso
de ódio (CANADA, 2013, p. 8-12).
A matéria chegou à Suprema Corte que se incumbiu de fazer o controle
de constitucionalidade da lei em questão, aplicada ao caso concreto. O relator do
caso foi o Justice Rothstein, que foi acompanhado por unanimidade pelos demais
membros da corte (CANADA, 2013, p. 13-15).

4.2.1 A defesa de Whatcott

Em sede de contestação, a defesa de Whatcott aludiu à posição da


Suprema Corte, em casos anteriores, em relação ao conceito de ódio, em duas
vertentes, a da subjetividade e a da amplitude (CANADA, 2013, p. 20).
Com base na subjetividade, alude a defesa que:
a) definição de ódio adotada pela Corte leva a resultados arbitrários e
inconsistentes, pois engloba somente expressões que o juiz
subjetivamente acha ofensiva;
b) é um conceito vago, emotivo que é intrinsecamente subjetivo e
inoperável;
c) infringe a liberdade de expressão religiosa de maneira irracional
contrariando os objetivos legais.
39

Em relação à amplitude do conceito de ódio adotado pela corte:


d) a definição de ódio adotada pela corte é mais alargada que o
necessário;
e) tem um efeito depressor no debate público, na expressão religiosa e na
cobertura midiática sobre questões de condutas morais e políticas
sociais;
f) não dá prioridade legislativa à liberdade de expressão;
g) restringe comunicações privadas;
h) deveria requerer dolo;
i) deveria ser necessária prova da ofensa ou da discriminação;
j) seria necessário que houvesse modalidades de defesa, tais como a
exceção da verdade (CANADA, 2013, p. 42-43).

4.2.2 A resposta da Suprema Corte

Em relação à subjetividade e arbitrariedade da exegese da legislação


antidiscriminatória, a Corte alude primeiramente à subjetividade inerente a qualquer
julgamento, uma vez que os juízes são pessoas, humanos, passíveis de sentimentos
e emoções (CANADÁ, 2013, p. 44).
Entretanto, salienta que a corte vem adotado formas de diminuir o grau de
subjetividade das suas decisões através de técnicas decisórias que levam mais em
conta elementos objetivos, como o que se chama de “teste da pessoa razoável”,
onde o julgador põe objetivamente a questão para observar se um indivíduo, ciente
do contexto histórico e social, iria contemplar o discurso como deflagrador de ódio
ou não (CANADA, 2013, p. 46).
A repugnância das ideias expressadas não é o bastante para justificar a
restrição, e é irrelevante se a intenção do autor da expressão era incitar
ódio ou tratamento discriminatório. O ponto chave é determinar a propensão
do efeito da expressão nos seus interlocutores, tendo em mente o objetivo
da legislação de reduzir e eliminar a discriminação. (CANADA, 2013, p. 7,
tradução livre).

Vê-se então que a Suprema Corte Canadense procede a uma análise


objetiva do discurso, focando mais no efeito que no conteúdo para a definição do
que é discurso de ódio ou não, tendo em mente sempre a existência de uma
legislação que abarque tal situação.
40

No que diz respeito à contraprodução e ao efeito depressor na liberdade


de expressão, a palavra da Corte é de que a limitação legislativa se dá no campo da
forma e do efeito do discurso proferido, e não no seu conteúdo per se, uma vez que
o mais importante é como esse discurso afeta a sociedade, tendo um efeito
potencializador do ódio dentro de segmentos sociais que serão influenciados pelas
ideias a odiar e reproduzir o mesmo hate speech contra os oprimidos (CANADA,
2013, p. 56-59).
Assim, nas palavras do relator do caso,
Discurso de ódio é, no fundo, uma tentativa de marginalizar indivíduos
baseando-se no seu pertencimento a um grupo. Usando expressões que
expõem o grupo ao ódio, o discurso de ódio procura deslegitimizar membros
do grupo aos olhos da maioria, reduzindo seu status social e sua aceitação
dentro da sociedade. (CANADA, 2013, p. 64, tradução livre).

O hate speech, então, desestabiliza a visão das minorias em relação à


maioria, trazendo à tona o efeito nefasto da rejeição.
Outro efeito vilipendioso do hate speech mostrado pela Corte é o “cut off
effect of reply.” (CANADA, 2013, p. 66, tradução livre). O discurso de ódio tira o
oprimido do debate. Este precisa antes mostrar que são merecedores de participar
da sociedade para depois expor suas ideias e contribuir para a pluralidade da
democracia.
Ainda sobre a manutenção da liberdade de expressão, a Corte mantém o
posicionamento da constitucionalidade da lei por esta somente exigir contenção no
âmbito público, podendo qualquer discussão ser conduzida no âmbito privado sem
restrições à liberdade de expressão, uma vez que não há, neste caso, perigo de
contaminação popular do ódio propagado, ou que, ao menos, este é diminuído
consideravelmente, não justificando assim a restrição à liberdade de expressão
religiosa (CANADA, 2013, p. 75).
Sustenta a Suprema Corte que:
Leis sobre hate speech não são destinadas a desencorajar ideias
repugnantes ou ofensivas. As leis não proíbem, por exemplo, expressões
que tragam ao debate os méritos de diminuir os direitos de grupos
vulneráveis na sociedade. As leis somente restringem o uso da liberdade de
expressão que expõe tais grupos ao ódio como parte do debate. A
legislação não é voltada à proibição de ideias, mas sim do modo como elas
são expressadas em público o efeito que essa maneira de expressão pode
ter. (CANADA, 2013, p. 55-56, tradução livre).
41

Para o controle de constitucionalidade da medida legislativa, a Suprema


Corte Canadense lança mão da regra da proporcionalidade muito similar à proposta
por Alexy (2010).
A regra da ponderação de Alexy (2010, p. 96) consiste no
“estabelecimento de uma relação de precedência condicionada”, ao se tratar da
colisão entre dois direitos fundamentais que, como se viu, têm estrutura de princípio.
Para tanto, a regra da ponderação perpassa por três níveis, a saber: a
adequação, onde se há de aferir se, no caso, a supressão de um direito em favor do
outro leva à concretização factual desse segundo direito; a necessidade, que se
propõe a definir se à medida que reduz a proteção do direito in casu é a menos
gravosa possível; e, por fim, a proporcionalidade em sentido estrito, onde ocorre
verdadeiro sopesamento por parte dos julgadores dos princípios em questão
(ALEXY, 2010, p. 117-119).
De forma semelhante vem procedendo a Suprema Corte do Canadá, e,
no caso, respondendo às seguintes perguntas: A limitação é racionalmente
conectada ao objetivo? Há uma maneira mais branda de limitar a liberdade de
expressão no caso? Os benefícios da lei sobrepujam os efeitos deletérios?
(CANADA, 2013, p. 105).
A resposta, para a primeira pergunta é sim.
Isso porque de fato, a conexão entre os objetivos da lei e os efeitos da
mesma é aparente. Uma vez que se proíba a expressão de discurso de ódio com
base em características pessoais de grupos ou pessoas determinadas, tais alvos
estarão protegidos legalmente de quaisquer hate speeches que venham a minar
suas experiências de vida (CANADA, 2013, p. 105).
Em relação à medida menos gravosa, Whatcott traz à baila duas
alternativas à legislação proibitiva que, segundo ele, seriam menos gravosas à
liberdade de expressão e teriam o mesmo efeito na proteção dos grupos
vulneráveis: a primeira é que deveria haver maior confiança no cidadão público
dentro de uma visão liberalista de mercado livre de ideias e outra de que o assunto
deveria ser competência somente da legislação e justiça criminais (CANADA, 2013,
p. 80).
Quanto à aversão da legislação proibitiva e a relegação à confiança da
sociedade no marketplace of ideas liberalista, a Corte demonstra que há um
paradoxo quando se deixa que tais ideias se autorregulem, uma vez que não há
42

uma igualdade ou paridade entre maioria e minoria. Enquanto a maioria experimenta


a autorrealização da busca livre pela verdade através do discurso público irrestrito,
um efeito nefasto aparece: o enclausuramento da minoria. Isso porque um dos
efeitos naturais do hate speech é o efeito silenciador da minoria, vulnerável dentro
desse mercado livre de ideias. Dessa forma, sustenta a corte que, num contexto de
Estado Democrático de Direito, não é esta uma forma decente de se enfrentar a
questão (CANADA, 2013, p. 82).
A outra alternativa aventada, a de que somente à legislação penal deveria
ser deixada a regulação do discurso de ódio, contendo ainda potencial perigo de
dano ao alvo do discurso. A Corte dispõe de entendimento de que à legislação
criminal cabe, sim, parte da proteção contra o ódio, mas tão somente àqueles atos
mais graves, tais quais incitação de genocídio e crimes contra a paz pública.
Quando se trata de dignidade, a alternativa mais saudável é a legislação civil de
direitos humanos que se destaca, por ser um meio mais acessível e mais barato à
justiça (CANADA, 2013, p. 84).
Quanto à proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, na ponderação se
os benefícios do fomento do direito à autodeterminação sexual e à proteção contra o
discurso de ódio são mais importantes que a liberdade de expressão religiosa, a
Suprema Corte Canadense exposa o entendimento de que a proibição ao discurso
de ódio, como restrição à liberdade de expressão, foi uma escolha do Parlamento na
elaboração da lei, e que essa escolha é completamente aceitável, uma vez que,
como exposto, o que se tem em mente não é a proibição de qualquer forma de
debate público moral sobre questões que envolvam minorias, tais como a que se
apresenta, mas sim de providenciar de que esse debate seja feito de maneira
saudável, contribuindo com a participação dos membros dos grupos vulneráveis. Daí
ser a restrição quanto a forma proporcional para a manutenção do direito a
autodeterminação sexual e da própria liberdade de expressão, pois fomenta o
debate público sem discriminação. O que se restringe é muito pouco diante da
proteção dos grupos vulneráveis (CANADA, 2013, p. 105-106).
A proibição constituída no Saskatchewan Human Rights Code é, então,
um limite aceitável à liberdade de expressão religiosa.
Finalmente, outro ponto importante que a decisão tange é o de que “[...] a
questão de que os direitos de um grupo vulnerável sejam matéria de atual discussão
43

não justifica a maior exposição desse grupo ao ódio e seus efeitos.” (CANADA,
2013, p. 117, tradução livre).
Dessa forma, restou patente a constitucionalidade da lei proibitiva de
discurso de ódio discriminatório.

4.3 A possibilidade da Restrição à Liberdade de Expressão e a Laicidade


Estatal

Um Estado é formado a partir de certa homogeneidade no que diz


respeito a alguns fatores tais quais o sentimental, o cultural, o religioso. Dessa
forma, estabelecem-se diversos fatores de ligação que proporcionam uma unidade
social. Tais fatores, entretanto, ao mesmo tempo em que propiciam comunhão e
identidade entre seus súditos, trazem consigo certas cargas axiológicas que
propiciam a exclusão (ROTHENBURG, 2014, p. 11).
O Estado brasileiro tem uma forte ligação com a religião, pois quando os
colonizadores portugueses se estabeleceram, ainda havia estreitos laços entre o
poder religioso e poder estatal. As missões jesuítas, mais tarde, adentraram o
território brasileiro convertendo a população indígena ao cristianismo. Daí a
perpetuação, desde muito cedo, dos dogmas cristãos na formação do Brasil (DIAS,
2008, p. 138).
O resultado, segundo Dimoulis e Lunardi (2013, p. 79) é que
modernamente os Estados tem adotado uma postura extremamente sexista,
podendo ser chamados de Estados heterossexuais, trazendo, em si, normas que
abraçam essa orientação em detrimento das orientações LGBTT.
Tal deslinde na formação do Estado propiciou e fomenta uma sociedade
ainda marcada por traços fundos de intolerância. O tema da homossexualidade no
direito é fortemente influenciado pela religião cristã e a proteção à liberdade de
expressão religiosa impressa na Carta Magna, ainda que, quando se trata de
assuntos de natureza civil, terrena, tal qual o comportamento das pessoas na
sociedade e a forma como se relacionam uma com as outras não devem sofrer
qualquer interferência de lições religiosas (OLIVEIRA, 2013, p. 148). Mas o
desenvolvimento da sociedade brasileira tomou contornos majoritariamente
heterossexuais, formando, em contraponto, uma minoria homossexual, vulnerável.
44

Mesmo num contexto de Estado liberal utilitarista, em 1859, Mill (2011, p.


42) já falava da tirania da maioria, dentro de um contexto de marketplace of ideas,
vendo desde logo a ameaça privada das opiniões:
Portanto, a proteção contra a tirania do magistrado não é suficiente; há
necessidade de proteção também contra a tirania das opiniões, contra a
tendência da sociedade em impor, por meios diversos que as penas civis
[estatais], suas próprias ideias e práticas como regras de conduta para
aqueles que discordam delas. (MILL, 2011, p. 42).

Vê-se que, muito antes de se falar em Estado Social, Mill (2011) já via a
perversidade na imposição de um comportamento considerado normal pela maioria
da sociedade, deixando à sua margem todos aqueles que não mancomunavam com
tal ideal. É uma noção antiga de tolerância que persiste e tem aplicação
hodiernamente: “Por que então a tolerância, na medida em que está em jogo o
sentimento público, deve se limitar apenas ao gosto e modos de viver que obtém
aquiescência da multidão?” (MILL, 2011, p. 130-131). Essa perspectiva de tolerância
deve ser observada sob a luz da eficácia privada dos direitos fundamentais, uma vez
que constitui uma ameaça advinda não do Estado, mas sim de setores da própria
sociedade.
Segundo Dias (2008, p. 141), a causa da discriminação e da aversão à
homossexualidade advém das raízes cristãs do Brasil, mormente do catolicismo, que
condena o sexo não reprodutivo. Daí a visão majoritária da união de duas pessoas
do mesmo gênero ser inaceitável, antinatural aos olhos da maioria, uma vez que a
visão religiosa acabou “por impregnar a sociedade, que tem a tendência de aceitar a
mesmice do igual” (DIAS, 2008, p. 142), taxando, rejeitando e, principalmente
discriminando tudo que não seja tendente ao considerado normal.
Viu-se, no caso canadense, que há bases para uma restrição da liberdade
de expressão religiosa sempre que esta se volta a incitar o ódio e a marginalizar
grupos vulneráveis e minorias. Foi aplicada a regra da proporcionalidade, pela visão
do “homem médio”, à legislação e à interpretação da lei restritiva. O valor
“dignidade”, onde se encontra intrinsecamente ligado à existência humana a
autodeterminação sexual, sobrepujou e deu azo à restrição legislativa razoável e
estreita à expressão religiosa.
É como leciona Rothenburg (2014, p. 18), referindo-se ao abuso de
linguagem no tocante à expressão religiosa: nesse caso o Estado pode – e deve –
atuar de forma a restringir o direito de liberdade de expressão religiosa para garantir
45

outros direitos e, caso não o faça, está sendo negligente e favorecendo a ilicitude na
sociedade.
É o caso de chamar o homossexual de sodomita, com clara intenção
pejorativa, combater a igualdade de direitos civis tais como o casamento igualitário e
colocá-lo como um cidadão de segunda classe, de uma casta mais baixa.
Richards (1999, p. 184) traz essas declarações como a causa formativa
de uma injustiça estrutural imposta pela maioria, que deve ser combatidas. E uma
interpretação que leva em conta a eficácia intersubjetiva dos direitos fundamentais
não pode permitir que uma sociedade se comporte de tal modo. Tal ótica, prossegue
Richards (1999, p. 189, tradução livre) põe por terra qualquer tipo de resistência e
resiliência do homossexual diante do discurso discriminatório: “Dessa forma, gays e
lésbicas não devem, pela perspectiva desta injustiça estrutural, falar e nem serem
ouvidos. Eles devem ser o que a ideologia homofóbica quer que eles sejam: não
pessoas, mas tão somente atos sexuais.” E isso não pode ser admitido num Estado
Democrático de Direito plural, tendo o Estado que reagir a tais formas
discriminatórias com urgência e robustez. Torna-se imperioso a ação do Poder
Legislativo e, na omissão deste, do Poder Judiciário combater tal injustiça através de
mecanismos de restrição pontual e legitima dessa forma de expressão religiosa.
Sustein (1995, p. 195, tradução livre), referindo-se à restrição estatal de
alguma liberdade, simplifica: “Quando o discurso contribui para a criação de um
sistema de castas, o Estado pode, legitimamente, fazer o esforço de reagir – sendo
a restrição resultante clara e nitidamente limitada.” Quer dizer isso que há uma
legitimidade estatal em proibir o discurso de ódio homofóbico, religioso ou não, e
toda a argumentação dos efeitos dos quais sofrem os homossexuais alvos desse
tipo de discurso são fontes materiais legitimadoras da validade de tais normas, pois
que são demonstradoras da justificação moral da necessidade dessa norma
restritiva (ALEXY, 2011, p. 103).
Quanto à moderna concretização de um Estado Democrático de Direito
como superação de um Estado meramente Liberal, leciona Fiss (2005, p. 60):
Um Estado mais poderoso cria perigos; não há como negar isso. Mas o
risco de que esses perigos se materializem e uma estimativa do estrago que
poderão causar deve ser sopesado com o bem que poderia realizar. Não
devemos nunca nos esquecer do potencial opressivo do Estado, nunca;
mas, ao mesmo tempo, devemos contemplar a possibilidade de que o
Estado usará seus consideráveis poderes para promover objetivos que se
situam no coração de uma sociedade democrática – igualdade e talvez a
própria liberdade de expressão.
46

Apoia essa posição da legislação proibitiva do hate speech dirigida aos


homossexuais Waldron (2012, p. 61), para quem a legislação tenta dar suporte à
“dignidade da igual cidadania” de qualquer indivíduo pertencente a qualquer grupo.
Como se viu na decisão canadense, a liberdade de expressão religiosa é
cara, valiosa e necessária, mas casos há em que ela pode e deve ser restringida
quando põe em jogo a dignidade de outro cidadão, limando-lhe a capacidade de
participar efetivamente da sociedade como igual. É a expressão da eficácia imediata
do direito à autodeterminação sexual entre privados.

4.4 O rastro do Discurso Homofóbico proferido por uma Autoridade

“A união homossexual é uma aberração. Um cachorro pode ate cheirar o


outro do mesmo sexo, mas eles não tem relação. Sem querer ofender os cachorros,
acho que isso é uma cachorrada. Esta é a opinião de Deus e da Igreja.” (D. Edvaldo
Amaral, Arcebispo de Maceió, jornal O Jornal, Maceió, 27/06/1997). (MELLO, 2005,
p. 170).
Essa foi a resposta dada por um Arcebispo, autoridade da Igreja Católica,
quando perguntado, pelo jornal, como a religião se posicionava acerca do debate
sobre a união entre pessoas do mesmo sexo. Além dessa, colacionou Mello (2005,
p. 171):
A união entre homossexuais é uma grande bobagem, uma besteira, e vai
trazer um grande prejuízo para o Brasil. Isto é uma espécie de queda do
sentido de vida e da pessoa humana. O homossexual é gente que deve ser
tratada como pessoa doente. Homossexual é uma pessoa doente: ele não
está dentro da sua configuração humana (D. Aloízo Lorscheider, arcebispo
de Aparecida, em matéria publicada no Diário de Fortaleza, em 20 de
dezembro de 1996).

Segundo Sarah Sorial (2014, p. 61) num discurso como esse, onde se
veem atributos de ódio, nojo e rejeição, não se deve levar em conta apenas o
conteúdo do discurso, pois as pessoas podem fazer estragos não só pelo modo
como falam, mas também por quem são e que status ocupam. Sorial diz (2014, p.
62) que as regulações a respeito de hate speech sempre levam em conta o
elemento incitador, o que é preocupante.
Mas ainda mais preocupante é como tal incitamento é recebido pelo
interlocutor quando quem fala tem uma autoridade, suposta ou de fato:
“Interlocutores adquirem autoridade ou legitimidade através de alguma forma de
47

suporte. Isto abarca um sem-número formas, incluindo suporte acadêmico, suporte


institucional religioso ou suporte estatal.” (SORIAL, 2014, p. 71, tradução livre). Quer
dizer, o discurso de ódio por si só já é pernicioso, mas, quando proferido por alguém
que tenha grande audiência, tanto maior é seu perigo.
Isso porque a relação entre tais autoridades e sua audiência, quando da
proferição de um discurso de ódio, além dos efeitos que já normalmente causam
(silenciado, desumanizador), os sobrepujam e formulam normas de conduta,
obrigam a fazer o que a autoridade manda ou a aceitar o que autoridade diz sobre
como verdade (SORIAL, 2014, p. 73). Uma declaração, em rede nacional, ou em um
jornal, de um líder religioso acaba por ampliar os males do hate speech.
Waldron (2012, p. 3) afirma que a finalidade do hate speech é tornar
claro, de uma forma sutil, entranhando no tecido social que compõe certa sociedade,
mensagens de exclusão. Dessa forma, o homossexual, diante da base institucional e
midiática religiosa presente no país, é oprimido de diversas formas, tendendo a se
introspectar, a se esconder.
“Quando a maioria exige que a minoria mude ou oculte sua identidade, o
direito de liberdade tornar-se privilégio de alguns, em detrimento dos direitos
demais.” (DIMOULIS; LUNARDI, 2013, p. 82). É essa a realidade atual do
homossexual no Brasil: muito se fala em liberdade de expressão religiosa, em
liberdade de opinar e de fomento do debate público, sendo pouca ou nenhuma a
importância dada para a contribuição efetiva do que se fala tanto para a democracia
quanto para as garantias dos que estão expostos aos discursos e ao julgamento da
sociedade.
Não há como se sustentar que o exercício de um direito de liberdade de
expressão religiosa possa subjugar a dignidade e a autodeterminação sexual de um
grupo mais vulnerável, nem vendo pelo viés do Direito posto, nem pela moral, como
sintetiza Schapp (2014, p. 152):
À noção de uma limitação da liberdade pelo Direito subjaz, claramente, uma
outra ideia, a de que a liberdade não é somente restringível pelo direito,
mas antes pela moral. Uma vez que é uma característica da moral que o
indivíduo siga segundo seu próprio juízo, podemos daí formular esse
modelo ético de limites da liberdade, no qual a liberdade é limitada pelos
próprios seres livres.

Homofobia, retomando o pensamento de Borrillo (2010, p. 23) pode ser


conceituada em dois vieses: a um, o viés da dimensão pessoal, afetivo, onde há a
manifestação da rejeição pela pessoa do homossexual; a dois, a homofobia
48

cognitiva, social, onde se tem uma rejeição da homossexualidade como fenômeno


social, considerando o grupo que não siga a orientação sexual como um todo. Dessa
diferenciação entre os dois conceitos unitários de homofobia que surge àqueles
grupos ou indivíduos que toleram e simpatizam com o homossexual-pessoa, mas
não consegue conceber qualquer tipo de política ou de direitos voltados ao grupo
aceitável, trazendo à tona a ditadura da maioria.
Fiss (2005, p. 47) traz à tona o chamado efeito silenciador da homofobia
como principal decorrência do discurso de ódio: este tende a diminuir a autoestima
das vítimas de tal discurso, impendido que assim a pessoa se realize integralmente,
bem como relegando quase ao nada a sua capacidade de participação da sociedade
civil e do debate público. A sociedade, que pela Constituição Federal, pretende ser
plural, perde em democracia sempre que alguém se cala por demonstração de força
de uma cultura institucionalizada como é a religiosa.
Ao homossexual resta o ostracismo do armário, da subcultura e do silêncio,
como bem afirma Sustein (1995, p. 5):
O problema fundamental para os homossexuais não é adequadamente
descrito como uma simples ausência de privacidade. Homossexuais podem
disfarçar sua orientação sexual. O “armário” pode fornecer um grau de
privacidade. Mas a possibilidade do disfarce é praticamente uma solução
incompleta para os problemas atuais. Na verdade, a possibilidade do
disfarce pode perpetuar o estigma e a desigualdade, fazendo com que as
pessoas pensem que a sua orientação sexual é repugnante, uma espécie
de segredo obscuro, algo a ser excluído da opinião pública. O resultado
provavelmente será uma forma de humilhação e de prejuízo grave para a
autoestima, de uma forma que é associada ao sistema de castas.

E no armário não há qualquer espaço para dignidade ou para cidadania.


Há de se combater esse tipo de prática de propagação de ódio dentro de uma
sociedade igualitária, mormente quando advinda de portadores de poder político ou
ordenadores de alguma forma de moral como a religiosa. Conforme Ragazzi e
Bueno (2013, p. 103), a Carta Magna de 1988 elevou a igualdade e a dignidade a
um patamar de valor máximo dentro do Estado de Direito, e o hate speech religioso
direcionado ao homossexual é uma das formas mais perniciosas de desrespeito a
esses valores.
49

5 CONCLUSÃO

Tratou-se aqui, de tema de pertinência atual, num cenário hodierno em


que se vê religiosos, parlamentares, presidenciáveis e demais autoridades
institucionais proferindo discursos que incitam o ódio e a marginalização do
homossexual dentro do seio de sua própria comunidade. Foi-se trazido aportes para
novas discussões e abordagens, dentro do Direito Constitucional, das possibilidades
de um embate entre liberdade de expressão religiosa e direitos das minorias,
mormente a autodeterminação sexual. Nessa conjuntura, algumas conclusões se
formaram.
Viu-se que toda norma de direito fundamental é passível de restrição,
uma vez que se toma a sua estrutura como principiológica, proposta por Alexy
(2011). Ainda que prima facie uma disposição jusfundamental acoberte toda e
qualquer conduta relativa àquele direito em abstrato, no caso concreto, por vezes, se
faz necessário que um direito dê lugar a outro.
A liberdade de expressar a própria religião e sua vertente mais forte e
explícita, o proselitismo, foram demonstrados como elementos essenciais de
diversas confissões religiosas, que os tratam a professão da própria crença como
elemento intrínseco, e por, vezes, obrigação moral atinente à ela.
Entretanto, confirmou-se que a o limite entre a expressão da religião de
uma pessoa e a incitação do ódio a partir da formulação de hate speeches fundados
nos dogmas de dada confissão religiosa é muito sutil, tendo então que haver certa
cautela com o conteúdo, a forma e o local da expressão religiosa, em respeito ao
princípio da tolerância.
Também restou claro que a Constituição Federal de 1988, ao elevar a
dignidade da pessoa humana como princípio supremo dentro do ordenamento
jurídico brasileiro, assentou tratamento igualitário e não discriminatório a qualquer
cidadão, por qualquer motivo.
Viu-se que o direito à autodeterminação sexual é um elemento intrínseco
à própria formação do ser humano, e que a liberdade para tanto deve ser alargada e
protegida pelo Estado, principalmente porque os homossexuais fazem parte de um
grupo vulnerável dentro da sociedade.
A liberdade sexual é um elemento essencial para a busca da felicidade e
auto-realização pessoal, não podendo qualquer ameaça, seja estatal ou privada, ser
50

tolerada, uma vez que isso pode acabar por privar o indivíduo das coisas que dão
sentido à sua própria existência.
Constatou-se que o Direito e a sociedade ainda são marcados por antigos
dogmas religiosos que propulsionaram a gênese do Estado brasileiro, e que a
laicidade declarada do Estado é algo a ser conquistado, pois ainda não foi possível
separar de forma clara estado e religião no contexto brasileiro.
Revelou-se que o discurso de ódio é perigoso em muitos aspectos, e que
ele, ao invés do que proclamam os liberalistas mais conservadores, propaga um
efeito silenciador no debate democrático. É que não se abre mão da autonomia
privada quando se tem algum tipo de limitação à liberdade de expressão: muito pelo
contrário, ela entra como direito fundamental em colisão com o direito à liberdade
sexual de quem é coagido com o hate speech.
A partir do caso canadense, é possível constatar que, mesmo num país
de tradição liberal e de commom law como é o Canadá, uma legislação que proíbe a
proliferação de discursos de ódios voltados à orientação sexual de outrem é
constitucional e aceitável, por estar em consonância com os objetivos primários
constitucionais tais quais a igualdade, a proibição da discriminação, a dignidade da
pessoa humana e a busca da felicidade individual.
Afirmou-se que, então, quando há abuso de linguagem o Estado pode e
deve atual para a proteção dos grupos mais vulneráveis, tais qual a parcela da
população LGBTT.
Demonstrou-se, ainda, que é necessário que se leve em conta a
autoridade (mesmo que artificial) de quem fala, ao analisar um discurso, pois o efeito
incitador e reprodutivo de tal discurso é muito maior nesses casos.
Por fim, advogando pela adoção do exemplo Canadense para a criação
de uma legislação que penalize e proíba a homofobia, uma vez que tal lei teria um
efeito simbólico e educativo, segue a lição de Rios, Golin e Leivas (2011, p. 31): “A
mudança no direito não apenas se segue às mudanças culturais, mas ajuda a
promovê-las.”
51

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57

ANEXOS
58

ANEXO A – Panfleto 1 – Keep homosexuality out of Saskatoon’s Public Schools!


59

ANEXO B – Panfleto 2 – Sodomites in our public schools

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