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Título:

REVOGAÇÃO, ANULAÇÃO, DESISTÊNCIA E CONVALIDAÇÃO DA LICITAÇÃO


Autor do Texto:
Diogenes Gasparini

DOUTRINA - 708/126/AGO/2004

REVOGAÇÃO, ANULAÇÃO, DESISTÊNCIA E CONVALIDAÇÃO DA LICITAÇÃO

por DIOGENES GASPARINI

Advogado. Mestre e doutor pela PUC-SP. Prof. da Escola


Superior de Direito Constitucional - SP. Ex-prof. titular e
prof. honoris causa da Faculdade de Direito de São
Bernardo do Campo - SP

Embora o normal seja a homologação da licitação, essa nem sempre acontece. Motivos variados
podem impedir a prática desse ato de controle de mérito e de legalidade de responsabilidade da
autoridade competente. A licitação, assim, nem sempre chega a bom termo. Muitas vezes, esse
procedimento, que tem por objetivo selecionar a melhor proposta para um negócio desejado pela
Administração Pública, não chega ao final face à superveniente inconveniência ou inoportunidade
da transação ou em razão da ocorrência em seu bojo de ilegalidade insanável, donde as figuras da
revogação, da anulação e da desistência. A anulação é denominada de invalidação e o
procedimento de processo, de sorte que não nos preocuparemos com tais denominações. Assim,
invalidação e anulação são expressões que se equivalem, tanto quanto procedimento e processo
são termos sinônimos.

A Lei federal nº 8.666/93, conhecida como Lei federal das Licitações e Contratos da Administração
Pública, Lei federal das Licitações e Contratos ou, simplesmente, Lei federal Licitatória, prevê, no
art. 49, a revogação e a anulação, fixando-lhes algumas regras de seus respectivos regimes
jurídicos, mas nada menciona sobre a desistência. Também não se refere, nem estabelece
qualquer disciplina sobre a convalidação de atos ilegais do procedimento licitatório e, via de
conseqüência, de seu próprio saneamento. Essas são as figuras jurídicas, os institutos de Direito
Administrativo, com suas dificuldades, desde já presentes, que pretendemos doravante versar,
alertando que as considerações adiante tecidas cabem, mudado o que deve ser mudado, para as
entidades obrigadas a licitar e submetidas a essa legislação. Para as entidades submetidas às
próprias leis, como é o caso de Estados e Municípios, essas considerações, em tese, também
valem. Ainda são prestantes para os procedimentos de contratação direta, como são os de
dispensa e inexigibilidade de licitação, consoante expressa determinação do § 4º do art. 49 dessa
lei. Por último, diga-se que são aproveitáveis no caso pregão, instituído e disciplinado pela Lei
federal nº 10.520/2002, chamada de Lei federal do Pregão, regulamentada pelo Decreto federal nº
3.555/2000, cujo art. 11 prevê a revogação e anulação dessa modalidade de licitação e lhes fixa
alguma disciplina.
REVOGAÇÃO

A autoridade competente para a aprovação do procedimento licitatório, prescreve o art. 49 da Lei


federal das Licitações e Contratos da Administração Pública, somente poderá revogar a licitação
por razões de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado,
pertinente e suficiente para justificar tal comportamento. Sendo assim, resta evidente que a
revogação somente pode ocorrer no momento da aprovação ou, como querem os arts. 38, inc. VII,
e 43, inc. VI, por ocasião da prática do ato de homologação da licitação, qualquer que seja a sua
modalidade. Daí a precisa lição de Carlos Ari Sundfeld, que assevera ter a lei reservado, “para a
fase aprobatória, a possibilidade de a Administração revogar a decisão de contratar tomada quando
da abertura do certame”.1 É, em suma, manifestação que acontece após a conclusão do
procedimento da licitação, que se entende exaurido com a adjudicação do seu objeto ao vencedor.
Essa razão levou esse autor a preferir a locução revogação da adjudicação à expressão
revogação da licitação.

Aprovação e homologação são expressões de mesmo conteúdo ou significado, ensina Carlos Ari
Sundfeld.2 Indicam, quando praticadas, a regularidade da licitação quanto à lei e ao mérito. Aprova-
se ou homologa-se porque todo o procedimento está conforme a lei e persiste o interesse público
na contratação do objeto licitado. Se assim não for revoga-se por motivo de mérito ou anula-se em
razão da ilegalidade. Portanto, após a adjudicação, a autoridade competente, conforme os motivos
presentes, pode oferecer uma das três seguintes manifestações: homologar, revogar ou anular a
licitação. Essa também é a inteligência de Lucia Valle Figueiredo 3 e de Yara Darcy Police Monteiro.
Com efeito, ensina esta última autora:

Entendido, pois, que a fase de aprovação do procedimento admite o exame de mérito e o de


legalidade, correto é afirmar que a autoridade poderá proferir três diferentes tipos de decisão:
homologar o procedimento, revogá-lo para satisfação do interesse público ou anulá-lo por
ilegalidade.4

Fundamento

O fundamento principiológico da revogação da licitação, qualquer que seja sua modalidade,


encontra-se na obrigatoriedade atribuída à Administração Pública para só buscar a satisfação do
interesse público. É o interesse público quem comanda todos os seus atos e comportamentos.
Assim, se no momento da homologação do procedimento licitatório restar evidenciado que a
contratação desejada não mais atende ao interesse público existente ao tempo de sua abertura,
em lugar de homologar deve revogar a licitação. Já o fundamento legal reside no art. 49 da Lei
federal das Licitações e Contratos, portador da seguinte redação: “A autoridade competente para a
aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de interesse público
decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar
tal conduta,...”. De forma muito semelhante prescreve o art. 18 do Regulamento do Pregão
Presencial, Anexo I do Decreto federal nº 3.555/2000, que assim estabelece: “A autoridade
competente para determinar a contratação poderá revogar a licitação em face de razões de
interesse público, derivadas de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e
suficiente para justificar tal conduta, ...”. A disciplina da revogação está, pois, substancialmente
calcada nesses dispositivos e em seus respectivos parágrafos, além, por certo, de estar presa aos
princípios jurídicos que lhe são aplicáveis, como é o princípio do interesse público.

Conceito

Pode-se, à vista do que dissemos e com base nos mencionados arts. 49, da Lei federal das
Licitações e Contratos da Administração Pública, e 18, da Lei federal do Pregão, afirmar que a
revogação é o ato administrativo que extingue licitação acabada, qualquer que seja sua
modalidade, por motivo de conveniência e oportunidade superveniente, devidamente comprovado,
pertinente e suficiente a lhe pôr fim. Luciano Ferraz assevera que:

A revogação, a seu turno, é forma de desfazimento dos atos (e procedimentos) administrativos que
envolve questões de conveniência e oportunidade (interesse público), devidamente justificados no
ato revogatório.5

Natureza

O ato de revogação da licitação é administrativo e como tal está sujeito ao regime jurídico que lhe
traça o Direito Administrativo. Há, portanto, que observar para sua validade e eficácia os
elementos: competência, finalidade, forma, motivo, objeto e causa. Sobre ser ato administrativo é
da espécie dos atos vinculados, pois verificada a inconveniência ou inoportunidade não pode a
Administração Pública deixar de decretar a revogação, ainda que dos mencionados dispositivos
legais que lhe dão sustentação se possa extrair a idéia de discricionariedade. Para Carlos Ari
Sundfeld o exame da conveniência e oportunidade pode “envolver juízo de discricionário, mas nem
sempre”.6 A tal respeito Hely Lopes Meirelles acentua que: “É erro manifesto considerar-se a
revogação ou a anulação da licitação como atos discricionários da Administração, pois ambos são
vinculados aos motivos e pressupostos legais que os consagram”. 7

Só há discricionariedade, reconheça-se, na valoração da conveniência e oportunidade.

Objeto

Entre os elementos do ato administrativo encontra-se o objeto, que é alguma coisa sobre a qual
recaem os efeitos próprios da decisão administrativa. Assim, numa permissão de uso de bem
público, seu objeto é o bem público, pois é sobre ele que incidem os efeitos próprios desse ato. O
ato de revogação da licitação tem por efeito próprio desfazê-la por motivo de mérito, pois revelou-
se inconveniente e inoportuna, embora realizada com estrita observância da lei. Portanto, os efeitos
próprios do ato de revogação incidem sobre uma licitação legal, eficaz e acabada. Esse, no caso, o
objeto do ato de revogação, qualquer que seja a modalidade licitatória. A revogação somente pode
recair sobre um procedimento licitatório dotado dessas características. Essa também é a orientação
de Hely Lopes Meirelles, ao asseverar que a revogação opera efeitos ex nunc porque o “ato ou o
procedimento era legal e válido”.8 Observe-se que não pode ser objeto de revogação ato do
procedimento licitatório, como é o ato de julgamento, pois isso equivaleria à desistência. Desse
modo, não se confunde com a anulação da licitação, cujo motivo de seu desfazimento é o fato de
ser portadora de ilegalidade insanável. Logo os efeitos próprios da anulação incidem sobre uma
licitação acabada e ilegal. Também não se confunde com a desistência, pois esta ocorre no
transcorrer da licitação por motivo de conveniência e oportunidade. Seus efeitos próprios recaem,
portanto, em licitação iniciada e não concluída.

A licitação pode ter um só objeto, ainda que composto de várias unidades: 1.000 impressoras a
tinta. Nada impede que se tenham vários objetos, cada um com uma ou mais unidades: 2
máquinas de lavar roupas, 15 microfones sem fio, 200 cestos de plásticos para escritório, 1
aparelho de ar condicionado. Nesta hipótese tem-se uma licitação por itens, ou seja, conforme
disciplinado pelo edital cada item será objeto de propostas, julgamento, adjudicação, homologação
e contratação autônomas. Assim, cada item se constituirá numa licitação, embora por medida de
economia sejam todas disciplinadas por um só edital. Em sendo assim, por certo, se admitirá mais
de um vencedor, mas pode-se ter um único vencedor ou um vencedor para vários itens e outros
vencedores para os demais, quando permitido apresentar proposta para todos os itens, cabendo ao
proponente escolher livremente aquele que mais o interessa. Tendo em vista essas características,
resta óbvio que a revogação pode incidir sobre qualquer dos itens licitados, sobre vários ou sobre
todos, valendo para cada objeto as considerações feitas e por fazer para a revogação da licitação
de um único objeto.

Motivo

Para a legalidade da revogação da licitação, o art. 49 da Lei federal das Licitações e Contratos
exige um motivo. Ainda que essa exigência seja atendida, isso não é o suficiente, pois não basta
existir um motivo qualquer. O motivo, conforme exigência desse dispositivo legal, há de ser
identificado como inconveniente e inoportuno. Há inconveniência e inoportunidade sempre que o
ato praticado não mais interessa, convém ou satisfaz ao interesse público. Sobre mais, há de ser
superveniente. Superveniente é o motivo que surgiu depois de instaurado o procedimento da
licitação. Nada que já existia ou que era do conhecimento da Administração Pública pode ser
considerado superveniente e, por conseguinte, servir de motivo para a revogação.

Destarte, a falta de recurso orçamentário não pode ser razão para a revogação, pois a lei exige, em
seu art. 38, caput, que o processo da licitação contenha a indicação desses recursos. Assim, ou
havia recurso e a licitação podia ser instaurada ou não havia e o procedimento não tinha como ser
aberto. Sendo desse modo, não há como alegar dito motivo como razão da revogação, porque de
uma ou de outra maneira ele era anterior. Em outras épocas esse motivo era reconhecido pela
doutrina e pela jurisprudência como razão legítima e suficiente para a revogação da licitação,
conforme lembra Carlos Pinto Coelho Motta.9 Hoje, assevera esse autor, esse motivo caminha para
a impossibilidade prática de sua utilização por força da Lei de Responsabilidade Fiscal. É possível
que a falta de recurso orçamentário seja decorrente de remanejamento superveniente de dotações.
Nessa hipótese, ainda que isso não devesse ocorrer, cremos estar caracterizada a superveniência
e esse fato pode servir de motivo para a revogação da licitação. Atente-se que se não deveria
ocorrer e ocorreu, faz-se necessária a apuração de responsabilidade.

Ainda que haja motivo, que seja qualificado como de mérito e que possa ser tido como
superveniente, essas circunstâncias não são o bastante para legitimar a revogação, pois a lei exige
que seja devidamente comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta. Vale dizer: o
motivo da revogação há de ser plena e satisfatoriamente explicitado para que não paire dúvida
alguma quanto a lisura dessa medida. Não se satisfaz a lei com a mera menção de que a situação
concreta encontra arrimo no art. 49 da Lei federal das Licitações e Contratos da Administração
Pública. Não se admite o exercício dessa prerrogativa sem a competente demonstração da causa
justificadora, conforme vêm decidindo os nossos pretórios. 10 O ofício recebido de um dos
convenentes ao fim de uma licitação, informando o outro que não mais poderá transferir os
recursos financeiros prometidos para atender o certame aberto em função do convênio existente, é
motivo que a torna inconveniente e inoportuna e, sem dúvida, é superveniente. Sua menção como
motivo do ato de revogação justifica plenamente essa medida. O motivo, ainda, deve ser
pertinente, ou seja, deve estar relacionado diretamente com a licitação, como é a informação
levada oficialmente à Administração Pública municipal dando-lhe conta de que o medicamento
objeto da licitação foi condenado pela agência reguladora governamental competente. Sendo
assim, é induvidoso que a simples mudança de governo não pode ser motivo para a revogação da
licitação, pois não há qualquer pertinência direta com a licitação. Atente-se que todas essas
características devem ser reconhecidas simultaneamente. O motivo deve estar marcado, ao
mesmo tempo, por todas. A ausência de uma inviabiliza a revogação, que não encontra motivo para
se legitimar. Ademais, devem estar, por exemplo, explicitadas sob a forma de considerandos
lançados no ato de revogação ou ao menos em documentos do processo licitatório, ou de
revogação, mencionados claramente no ato de desfazimento da licitação.

Competência

A revogação da licitação, por exigir um motivo de conveniência e oportunidade, é da exclusiva


competência da Administração Pública licitante. A ninguém mais cabe dita atribuição, para cujo
exercício independe de prévia autorização legislativa ou judicial. Não pode o Judiciário revogar
licitação aberta na Administração Pública direta ou indireta, ainda que para isso seja acionado, pois
não lhe cabe avaliar a conveniência e oportunidade dessa medida, embora possa, legitimamente,
julgá-las no que respeita à legalidade. Diga-se, ainda, que não encontra amparo legal a revogação,
pelo Executivo, de licitação, em fase de homologação, aberta e conduzida por uma de suas
autarquias. Portanto, qualquer tentativa nesse sentido pode ser rechaçada pela autarquia via
mandado de segurança, mesmo que se reconheça em favor da Administração Pública direta seu
poder de tutela.

Dentro da Administração Pública licitante, a revogação, ato administrativo que é, só pode ser
praticada pela autoridade competente e esta, como se sabe, é indicada em lei. A Lei federal das
Licitações e Contratos da Administração Pública mencionou essa autoridade em seu art. 49, como
também o fez o art. 18 da Lei federal do Pregão, como a competente para, respectivamente,
homologar e aprovar a licitação. Tal indicação, no entanto, só vale para a Administração Pública
federal. Não se pode imaginá-la válida quanto as demais entidades federadas, pois gozam de
autonomia administrativa, sob pena de violá-la e cometer induvidosa inconstitucionalidade. Aliás, é
o que se passa com o § 3º, do art. 86, da Lei federal das Licitações e Contratos, ao indicar o
Secretário Estadual e o Secretário Municipal como as autoridades competentes, dentro dessas
esferas governamentais, para a aplicação da sanção de inidoneidade para licitar ou contratar com a
Administração Pública.

Portanto, deve-se buscar essa autoridade analisando as competências dos agentes públicos,
vinculados à entidade responsável pela licitação que se deseja revogar. Se tal busca for infrutífera,
pode-se encontrar essa competência enfeixada nas mãos da autoridade competente para
homologar, como indicado no art. 49 dessa lei licitatória e no art. 18 da Lei federal do Pregão. A
dificuldade, salvo se determinada essa autoridade, se desloca para saber quem é a competente
para homologar, cabendo, portanto, repetir todo esse procedimento para descobri-la. Mas, se de
tudo não se conseguir identificar esse agente público, diga-se que a competência cabe à mais alta
autoridade da entidade responsável pela licitação, a exemplo do Prefeito no Município, que
mediante ato administrativo regular pode delegá-la. Na Administração estadual direta e autárquica
de São Paulo esse ato é da competência dos Secretários de Estado e dirigentes de autarquias,
conforme prescreve o art. 2º, inc. IV, do Decreto nº 31.138/90, regulamentador, em parte, da Lei
paulista nº 6.544/89, que trata das licitações e contratos da responsabilidade desse Estado da
federação brasileira. O dever-poder de revogar não é deferido ao Judiciário, ao Legislativo, ao
Tribunal de Contas ou ao Ministério Público, salvo no concernente às suas próprias licitações.
Nessas entidades, a revogação cabe aos agentes competentes consoante suas respectivas leis e
regimentos. Por fim, acentue-se que não é ato da comissão de licitação, pois em suas atribuições,
nos termos do art. 6º, inc. XVI, não está a de revogar licitações.

Efeitos

Pode-se afirmar que os efeitos do ato administrativo são os resultados jurídicos que a decisão
governamental pode proporcionar. Os efeitos de um ato administrativo são de duas espécies:
próprios e impróprios. Próprios são os efeitos para os quais o ato se preordena ou para que se
destina. São os buscados, os desejados pelo agente público em função do interesse público. São a
razão de ser do ato administrativo. É o próprio conteúdo do ato administrativo, ou seja, o que o ato
prescreve ou dispõe. Assim, o efeito próprio do ato administrativo de permissão de uso de bem
público é investir o permissionário no seu uso exclusivo. Impróprios são os efeitos que ocorrem
sem que o ato administrativo estivesse para tanto preordenado ou destinado. Não são buscados ou
desejados pelo agente público que o pratica. Não constituem a razão de ser do ato administrativo.
Derivam do conteúdo, mas não são o conteúdo. A obrigação de pagar ao Poder Público permitente
uma certa quantia mensal pelo uso do bem público é efeito impróprio do ato administrativo de
permissão, pois não foi ele praticado com essa precípua finalidade. Dita distinção é importante,
pois permite indicar que os efeitos próprios são sempre destruídos, desfeitos, sem que o mesmo,
necessariamente, ocorra com os efeitos impróprios.

O ato de revogação da licitação também tem esses efeitos. O efeito próprio da revogação é
desfazer o procedimento. É torná-lo inoperante para os fins a que estava preordenado ou
destinado, ou seja, a seleção da melhor proposta para o negócio desejado pela Administração
Pública licitante. Os efeitos impróprios desse ato são diversos. De fato, a revogação libera o
vencedor de todas as obrigações decorrentes de sua integração no procedimento da licitação, tanto
quanto impede, pelo menos em tese, a renovação do certame revogado. Esses, além de investir o
vencedor da licitação no direito de ser indenizado, são seus principais efeitos impróprios, que
alguns autores chamam de conseqüências. É inquestionável que a revogação libera o vencedor
do certame de todas as obrigações decorrentes de sua participação no procedimento da licitação
revogada pela Administração Pública licitante. Não cabe, portanto, afirmar que mesmo ante a
revogação do procedimento licitatório o vencedor só se libera com o decurso do prazo de validade
da proposta, qualquer que seja, editalício ou legal. Aquele indicado no instrumento convocatório;
este, na falta daquele, prescrito pelo § 3º, do art. 64, da Lei federal das Licitações e Contratos da
Administração Pública. A proposta, não se podendo entender de outro modo, só tem sentido lógico
e jurídico como parte integrante da licitação e se essa não mais existe por força da revogação,
aquela também não pode existir. Os demais licitantes não são atingidos pela revogação, ou seja,
não são por ela liberados dos compromissos decorrentes de sua integração nesse procedimento,
pois pela própria natureza e regime da licitação restaram, com a adjudicação do seu objeto ao
vencedor, alijados do procedimento. Por essa razão nada podem reclamar em decorrência da
revogação.

Tais efeitos, quaisquer que sejam, são considerados ou contados para o futuro, isto é, da data da
revogação para frente. São efeitos ex nunc. Não alcançam o passado, ou seja, não retroagem. Ao
contrário, respeitam os efeitos já produzidos. De fato, ensina Hely Lopes Meirelles que: “A
revogação da licitação opera efeitos ex nunc, isto é, a partir da decisão revocatória, porque o ato ou
o procedimento revogado era legal e válido até o momento da revogação”. 11 Destarte, a licitação
pode ser restaurada em razão do interesse público, pois nada do que ocorreu em todo o seu
transcorrer foi desfeito.

Objetivo

Mas o que se pretende com a revogação? Qual o seu objetivo? A revogação visa a impedir a
celebração do contrato. Essa é a resposta. Não há dúvida que a finalidade da revogação é impedir
que o contrato que dela decorreria seja consumado, dada a ausência superveniente de interesse
público na contratação de seu objeto. Com efeito, que interesse público haveria na compra de uma
moto-niveladora quando um equipamento igual foi doado à Administração Pública licitante?
Nenhum. Com efeito, se o pretendido pela Administração Pública foi alcançado, ainda que de outro
modo, não há como prosseguir com a licitação. Qualquer insistência nessa licitação seria ilegal,
pois afrontaria o interesse público já plenamente atendido com a doação desse equipamento à
Administração Pública licitante.

Retomada da licitação

Como o desfazimento da licitação teve por motivo uma razão de mérito, isto é, de conveniência e
oportunidade, é evidente que enquanto tal situação permanecer a Administração Pública não pode
retomar a licitação revogada, chamando o vencedor para com ele contratar se a tanto concordar
com os termos e condições da licitação revogada, nem mesmo se a sua proposta ainda pode ser
havida como válida. Se o motivo da revogação foi, como só pode ser, o perecimento ou a alteração
do interesse público, é inescusável que não há mais conveniência, nem oportunidade, para a
retomada do procedimento ou para a abertura de outro que tenha o mesmo objeto. Qualquer
medida administrativa que a isso levasse seria ilegal, dada a comprovada ausência ou modificação
do interesse público. Cabe afirmar, no entanto, que não se desconhece que o interesse público é
dinâmico e o que é inconveniente ou inoportuno hoje, pode não ser amanhã. Logo, se assim
acontecer, nada impede o aproveitamento da licitação revogada ou a abertura de outro
procedimento que tenha o mesmo objeto desse certame. Nesse caso, pensamos que para seu
aproveitamento ou para a instauração de nova licitação, o procedimento deve ser, também nesse
particular, devidamente justificado. É o que ocorreria quando fosse revogada uma licitação que
objetivava a seleção da melhor proposta para construção de uma escola municipal de primeiro
grau, porque no mesmo bairro o Estado pretende construir um prédio para igual finalidade e
determina a abertura da competente licitação. Posteriormente, renova-se a licitação municipal,
porque o Estado desistiu dessa empreitada.

O aproveitamento do certame revogado faz-se, via de regra, mediante a edição de ato


administrativo que tem por objeto o ato de revogação da licitação extinta, esclarecendo em seu
texto que é revogado o ato tal e restaurada a licitação qual por ele revogada. A falta dessa
prescrição no ato de revogação da revogação pode ensejar dúvida quanto à restauração da
licitação revogada. Com efeito, o § 3º, do art. 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil, aplicável aos
atos administrativos, é claro ao exigir essa cautela, pois prescreve que:

Art. 2º (...)

§ 3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido
a vigência.

Nessas hipóteses, se o proponente vencedor, quando consultado, concordar em contratar nos


termos de sua proposta, nada há de ilegal. O que não cabe à Administração Pública é impor-lhe a
contratação, dado o fato de que sua proposta ainda está formalmente válida. Entendemos, nesses
casos, como legítima a recusa do vencedor da licitação em celebrar o contrato e,
conseqüentemente, nenhuma pena pode sofrer. Sua recusa, sempre formal, permitirá à
Administração Pública licitante consultar os demais proponentes, obedecida a ordem decorrente da
classificação (art. 64, § 2º), sobre o desejo ou não de contratar nas condições do vencedor. Se a
proposta não estiver em vigor, a contratação ainda assim será possível se com ela concordar seu
autor. Caso essa tentativa de contratar, nesses termos e condições, com um dos proponentes não
der resultado, deve-se promover novo certame ou, se for o caso, contratar diretamente. A abertura
de nova licitação não oferece maiores preocupações, pois terá, salvo quanto a sua justificativa, o
tratamento e os cuidados que esse ato enseja.

Indenização

A revogação obriga a Administração Pública a decretar a indenização dos participantes do


procedimento licitatório desfeito por esse ato? A resposta é negativa, salvo quanto ao adjudicatário,
ou seja, ao vencedor do procedimento. O procedimento licitatório, dizem os autores, é de natureza
vinculada, de sorte que sua revogação obriga a Administração Pública a indenizar o vencedor. Se
isso não bastar diga-se que a Administração Pública responde objetivamente nos termos do § 6º,
do art. 37 da Constituição Federal, pelos danos que causar, devendo por tal razão indenizar os
prejudicados, inclusive, portanto, o vencedor do certame revogado. Essa responsabilidade é
objetiva, o que impõe essa obrigação mesmo que o dano decorra de atividade lícita e do interesse
público. Os demais participantes não têm igual direito, pois foram eliminados em razão da
finalidade da licitação, que busca a seleção da melhor proposta. Essa circunstância leva
inexoravelmente a um único proponente. Assumem, assim, o risco decorrente da natureza
competitiva do procedimento.

Esse direito assegurado ao vencedor da licitação revogada é sustentado pela mais abalizada
doutrina, a exemplo de Carlos Ari Sundfeld,12 Luciano Ferraz,13 Adilson Abreu Dallari14 e Celso
Antônio Bandeira de Mello.15 O dever de indenizar, ademais, tem fundamento no § 1º do art. 49 da
Lei federal das Licitações e Contratos, na medida em que não faz, quando podia fazê-lo, em
relação à revogação a mesma prescrição, segundo a qual a “anulação do procedimento licitatório
por motivo de ilegalidade não gera obrigação de indenizar”. Se o legislador desejasse vedar a
indenização no caso da revogação teria prescrito: “a anulação e a revogação...”. À vista desse
raciocínio pode-se asseverar que se o legislador podia prever a mesma prescrição e não a previu,
é porque não a desejou em relação à revogação. A mesa interpretação pode ser oferecida no que
respeita ao § 2º do art. 18 da Lei federal do Pregão. Sendo assim, quando se tratar de revogação
cabe indenização. Embora essa seja a doutrina dominante, alguns autores entendem que não se
pode punir a Administração Pública quando exerce o direito de revogar a licitação que não é
conveniente, nem oportuna, ao interesse público, mesmo ignorando a regra do § 6º do art. 37 da
Lei Maior. A indenização, nos termos e condições acima colocados, é o único direito do proponente
vencedor da licitação, pois não se lhe reconhece o direito de se manter nessa posição. Se assim
não fosse, certamente estar-se-ia prestigiando o interesse privado em detrimento do interesse
público e isto não se concebe. A assertiva não significa que não se possa contestar a veracidade
dos fatos alegados, ou seja, se efetivamente existiram, e a própria legalidade da revogação.

Mais difícil do que sustentar em relação ao vencedor o direito à indenização, no caso de revogação
da licitação, é determinar o seu quanto. Deve-se separar duas situações, pois a temática não
comporta uma única solução. Se a revogação é lícita, a indenização deve ser o suficiente para
cobrir os gastos com a participação do vencedor no respectivo procedimento, pois não se pode
ignorar que os proponentes agiram incentivados pela Administração Pública e de boa-fé. Desse
modo, não seria justo, nem jurídico, que suportassem os custos efetivados para integrar o
procedimento, pois a revogação é determinada pelo interesse público. Desse modo, o valor da
indenização é igual ao montante das despesas efetivamente realizadas e comprovadas (custo para
a elaboração dos projetos, desenhos e memoriais, digitação, taxas, cópias, viagens, certidões,
compra do edital) pelo vencedor para participar da licitação revogada. A indenização, por
conseguinte, não abrange as vantagens e o lucro como se fora celebrado e executado o contrato,
já que a este o vencedor da licitação não tem direito. Se a revogação for arbitrária ou imotivada,
cumpre ao vencedor pugnar, administrativa ou judicialmente, pela anulação da revogação,
restaurando, assim, seus direitos através da celebração do contrato com a Administração Pública.
Caso essa restauração seja impossível terá ele direito a uma indenização integral, contemplando
os danos emergentes e os lucros cessantes, como se tivesse celebrado e executado de forma
plena e a contento o ajuste. Essa inteligência é acolhida, entre outros, por Celso Antônio. 16

Contraditório e ampla defesa

A Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública assegura nos casos de
revogação da licitação o contraditório e a ampla defesa, conforme expressamente mencionado no §
3º, do seu art. 49, com a amplitude, é evidente, que a doutrina e a jurisprudência lhes garantem.
Mas, assegura a quem? Ao adjudicatário vencedor da licitação, pois o único com efetivos
interesses na permanência desse procedimento, já que através dele pode chegar ao contrato. Os
demais já foram por força da adjudicação ou outro motivo qualquer, alijados do certame e na
oportunidade tomaram as medidas que seus interesses aconselhavam. Em sendo assim, a
autoridade competente para revogar a licitação deve notificar seu vencedor que é intenção da
Administração Pública licitante revogar a licitação pelas razões que deve explicitar, para que no
prazo de cinco dias úteis, tomando-se esse prazo por empréstimo do art. 109, inc. I, dada a
ausência de outro que lhe seja próprio, exerça esses direitos, ou seja, o contraditório e a ampla
defesa. Com a juntada tempestiva dessa manifestação ao processo e concluída a instrução que
eventualmente se impuser, a autoridade competente decide ou não pela revogação da licitação.
Vale mencionar que a Administração Pública procederá desse modo mesmo que o vencedor do
certame não utilize esse direito que a lei e a Constituição lhe asseguram.

Contra esse ato que põe fim à licitação cabe recurso hierárquico, por força do próprio direito da
ampla defesa, no prazo de cinco dias úteis, tomado esse prazo por empréstimo da regra do art.
109, inc. I, e em razão do estabelecido na Lei federal das Licitações e Contratos da Administração
Pública, que também prevê esse recurso nos casos de revogação da licitação (art. 109, inc. I,
alínea “c”). Atente-se que não há como entender existente uma duplicidade de recursos
hierárquicos, um em razão do amplo direito de defesa e outro por força do estatuído no art. 109,
inc. I, alínea “c”, ou que a previsão desse recurso seja suficiente para caracterizar plenamente o
exercício da ampla defesa. A ampla defesa assegurada pelo art. 49 é muito mais que o simples
direito de recorrer, nem com ele se confunde, ensinam Sérgio Ferraz e Adilson Abreu Dallari. 17 O
disposto na alínea “c” do inc. I desse artigo deve ser entendido como reafirmação do direito de
recorrer, por implícito no exercício da ampla defesa prevista no art. 49 da Lei federal das Licitações,
embora essa cautela fosse absolutamente desnecessária. O efeito do recurso hierárquico contra o
ato de revogação é apenas devolutivo. A autoridade competente, no entanto, se presentes razões
de interesse público e motivando sua decisão, poderá recebê-lo atribuindo-lhe o efeito suspensivo,
como facultado pelo § 2º do art. 109 desse diploma legal.

Faculdade ou obrigação de revogar

Ocorrendo motivos de mérito, a Administração Pública licitante deve revogar o procedimento


licitatório, embora a Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública não pareça ser
assim tão incisiva. Com efeito, prescreve o art. 49 dessa lei que a autoridade competente para a
aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por motivos de interesse público
decorrentes de fato superveniente devidamente comprovado. Entendemos que nessas hipóteses
não há para a Administração Pública licitante qualquer discricionariedade, em que pese o uso da
palavra poderá, pois prevalece o dever de extinguir o procedimento licitatório. Com efeito, se a
manutenção da licitação afronta o interesse público, surge para a Administração Pública o dever-
poder de revogar. Portanto, a revogação da licitação não é mera faculdade, mas, ao contrário, é
dever a que está sujeita a Administração Pública licitante. A faculdade, isto sim, está na apreciação
do motivo, pois dizer se uma licitação acabada é inconveniente ou inoportuna é atribuição
discricionária. Mas, uma vez assentada sua inconveniência ou inoportunidade, emerge a obrigação
de revogar. É, pois, dever-poder de revogar.

Procedimento revocatório

Previamente à revogação, deve a autoridade competente notificar o vencedor da licitação dessa


intenção da Administração Pública. Nessa notificação deve, clara e precisamente, indicar o motivo
de interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e
suficiente para justificar a revogação, para que no prazo de cinco dias úteis, aproveitando, na falta
de outro, o prazo do art. 109, inc. I, da Lei federal das Licitações, o vencedor manifeste, exercendo
o contraditório e a ampla defesa, o que for de seu interesse. Juntada ou não essa manifestação ao
processo de revogação ou ao próprio processo licitatório e concluída eventual instrução processual,
a autoridade competente ofertará sua decisão, revogando ou mantendo a licitação. Em qualquer
caso, o processo licitatório e, quando houver, o processo de revogação devem estar à disposição
do interessado, permitindo-se a extração de cópias mediante pagamento. A prática da revogação
sem o atendimento dessas exigências é ilegal. Dessa decisão, cuja publicação é obrigatória, cabe
recurso no prazo de cinco dias úteis, contados da intimação ou publicação do ato nos termos do §
1º do art. 109 da Lei federal das Licitações e Contratos. Dito recurso pode ser recebido com efeito
suspensivo, consoante estabelece o art. 109, inc. I, alínea “c”, combinado com o disposto no § 2º,
parte final, desse mesmo dispositivo.

Publicidade

Uma vez praticado, o ato de revogação deve ser publicado na imprensa oficial da entidade
responsável pela revogação, conforme se infere do art. 109, § 1º, da Lei federal das Licitações.
Basta uma publicação para atender essa determinação legal.

Previsão editalícia

O dever-poder de revogar a licitação não precisa estar previsto no edital ou carta-convite para ser
utilizado pela pessoa licitante. Basta que a oportunidade ocorra e os motivos estejam presentes
para que a entidade licitante possa exercitá-la. Destarte, é sem propósito o item editalício,
encontrável em instrumento convocatório, que reserva à Administração Pública licitante o direito de
revogar a licitação por ele regulada.

Prescrição

Enquanto não for celebrado o contrato, cremos que a licitação pode ser revogada. Após, cremos
que se pode falar em prescrição do direito de revogar esse procedimento.

ANULAÇÃO

O art. 49 da Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública também prevê a
anulação do procedimento licitatório, chamada por alguns autores de invalidação. Essa distinção
diz respeito com o órgão responsável pelo desfazimento da licitação. Assim, diz-se anulação
quando o desfazimento se consuma na esfera judicial e diz-se invalidação quando o provimento
revocatório se perfaz no âmbito administrativo da entidade competente para assim proceder. De
sorte que, ao mencionar anulação ou invalidação já se tem por conhecida a esfera em que esse
desfazimento da licitação aconteceu. Destarte, licitação municipal pode ser invalidada pelo próprio
Município ou anulada pelo Poder Judiciário. Não obstante essa correta e útil distinção, cabe
observar que o ar. 53 da Lei federal nº 9.784/99, conhecida como Lei federal do Procedimento
Administrativo, usa a expressão anular, significando o dever que cabe à Administração Pública de
desfazer seus próprios atos administrativos por motivo de ilegalidade, e ao denominar o capítulo
que encima esse dispositivo vale-se da palavra anulação. O § 1º do art. 49 da Lei federal das
Licitações e Contratos e o § 1º do art. 18 da Lei federal nº 10.520/2002, que institui e disciplina o
pregão, também utilizam a expressão anulação, de sorte que as tomamos como equivalentes,
sinônimas. Portanto, para nós essas expressões são sinônimas e assim as usaremos, embora em
outra oportunidade tenhamos adotado essa distinção.

Fundamento

O fundamento principiológico da anulação da licitação, qualquer que seja sua modalidade,


encontra-se na observância do princípio da legalidade. A Administração Pública não convive com
atos e procedimentos ilegais e por essa razão deve restaurar a legalidade e isso é, muitas vezes,
conseguido com a anulação do ato viciado. Destarte, se no momento da homologação do certame
licitatório, restar evidenciada certa ilegalidade praticada ao longo desse procedimento, em lugar de
homologar a autoridade competente deve anular a licitação, se o ato assim viciado for insanável. Já
o fundamento legal reside no art. 49 da Lei federal das Licitações e Contratos, portador da seguinte
redação: “..., devendo anulá-la por ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros,...”. De
forma muito semelhante prescreve o art. 18 do Regulamento do Pregão Presencial, Anexo I do
Decreto federal nº 3.555/2000, que assim estabelece: “..., devendo anulá-la por ilegalidade, de
ofício ou por provocação de qualquer pessoa,...”. Toda a disciplina da invalidação da licitação está
substancialmente calcada nesses dispositivos e em seus respectivos parágrafos, além, por certo,
de estar presa aos princípios jurídicos que lhe são aplicáveis, como é o princípio da legalidade.

Conceito

No que nos interessa, com fulcro no art. 49 da Lei federal das Licitações e Contratos, no art. 18 da
Lei federal do Pregão e à vista do que já dissemos, pode-se definir a anulação como o
desfazimento administrativo ou judicial da licitação acabada, por motivo de ilegalidade. Hely Lopes
Meirelles define a anulação como sendo a “invalidação da licitação ou do julgamento por motivo de
ilegalidade”.18 Acabada é a licitação que se encontra na fase de homologação. Até a adjudicação é
procedimento em desenvolvimento, não acabado. A circunstância de ser acabada não impede a
anulação de atos administrativos que a integram, como são os atos de habilitação, de julgamento e
de adjudicação do objeto licitado ao vencedor da licitação, no momento em que se conheceu a
ilegalidade. Logo, não há necessidade de aguardar o momento da homologação para, nesses
casos, anular o ato.

Natureza

A natureza do ato que põe fim à licitação por motivo de ilegalidade é administrativa ou jurisdicional.
Será administrativa quando a extinção for praticada pela própria entidade licitante, seja ela a
Administração Pública direta ou indireta. Assim também será se ocorrer na esfera do Poder
Legislativo, do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas ou do Ministério Público, quando no
exercício de suas respectivas atividades administrativas. Será ato jurisdicional quando o
desfazimento for praticado pelo Poder Judiciário no desempenho de sua específica atribuição, a
jurisdicional. A invalidação é ato administrativo vinculado, visto que fundada numa ilegalidade que
não lhe permite optar por anular ou não anular. Exige-se, ademais, a competente demonstração
dos motivos que levaram a entidade a pôr fim ao procedimento ou, na dicção do art. 49 da Lei
federal Licitatória, “mediante parecer escrito e devidamente fundamentado”. Para a referida
distinção, nenhuma relevância tem o momento da anulação, ou seja, no transcorrer ou fim do
procedimento licitatório.

Objeto

O objeto da anulação é um procedimento licitatório acabado e ilegal, qualquer que seja sua
modalidade. A anulação somente pode recair sobre uma licitação que tenha essas características.
Ensina nessa linha de raciocínio Hely Lopes Meirelles que “anula-se o que ilegítimo” e ilegítimo é o
procedimento da licitação portador de ilegalidade.19 Daí não se confundir a anulação com a
revogação, pois nesta desfaz-se o que é legítimo e válido, mas inconveniente e inoportuno, ou seja,
afrontoso ao mérito da licitação. Nada impede que o objeto da anulação seja um ato específico do
procedimento licitatório, como é o de julgamento das propostas. A diferença entre essas hipóteses
está no número de participantes que deve, eventualmente, ser indenizado e que deve integrar o
processo de anulação, como se verá mais adiante.

A licitação pode ter um único objeto, ainda que composto de várias unidades: 1.000 impressoras a
tinta. De revés, pode-se ter uma licitação com diversos objetos, cada um com uma ou mais
unidades: 2 máquinas de lavar roupas, 15 microfones sem fio, 200 cestos de plásticos para
escritório, 1 aparelho de ar condicionado. Nessa hipótese tem-se uma licitação por itens, ou seja,
conforme disciplinado pelo edital cada item será objeto de propostas, julgamento, adjudicação,
homologação e contratação autônomas. Cada item, portanto, se constituirá numa licitação, embora
por medida de economia sejam todas disciplinadas por um só edital. Em sendo assim, por certo, se
admitirá mais de um vencedor, mas pode-se ter um único escolhido ou um vencedor para vários
itens, quando permitido apresentar proposta para um, vários ou todos os itens licitados. Tendo em
vista essas características, resta óbvio que a anulação pode incidir sobre qualquer dos itens
licitados ou sobre todos, valendo para cada item as considerações feitas e por fazer para a
invalidação do certame de um único objeto.

Motivo

Somente tem cabida a anulação da licitação se a justificá-la existir um motivo marcadamente ilegal.
Portanto, o motivo do desfazimento da licitação é a sua ilegalidade insanável. A ilegalidade pode
ocorrer tanto na fase interna como na externa do procedimento licitatório, do que são exemplos,
respectivamente, a autorização da abertura da licitação por agente público incompetente e a
habilitação de proponente que não demonstrou sua regularidade para com o INSS. Pode, assim,
ser anterior ou posterior à sua instauração, que ocorre com a publicação do aviso na generalidade
das modalidades licitatórias ou com a entrega da carta-convite aos convidados e sua afixação no
quadro de editais. Em qualquer dessas hipóteses, é relevante notar, o vício de ilegalidade há de ser
insanável ou inconvalidável, como ocorre com os atos inexistentes. Os atos administrativos
inexistentes, definidos por Celso Antônio Bandeira de Mello como as correspondentes “condutas
criminosas ofensivas a direitos fundamentais da pessoa humana, ligados à sua personalidade ou
dignidade intrínseca e, como tais, resguardados por princípios gerais de Direito que informam o
ordenamento jurídico dos povos civilizados”,20 são insanáveis, daí a vedação de sua convalidação.

Para prevalecer a invalidação da licitação, a autoridade competente deve demonstrar cabalmente a


ilegalidade, isto é, o motivo, conforme têm entendido os nossos tribunais 21 e que ela é insanável,
face ao que dispõem o art. 55 da Lei federal do Processo Administrativo. A falta de motivação pode
levar a nulidade ao ato de anulação. A ilegalidade capaz de levar à invalidação o certame tanto
pode estar relacionada com a legislação a que se subsume (Constituição, lei, regulamento,
regimento, instrução), já que não se atendeu a uma de suas exigências, ou com o instrumento
convocatório, pois não se observou, por exemplo, o critério de julgamento nele mencionado. Assim,
se afrontada a Constituição, a lei ou o instrumento convocatório, tem cabida a invalidação do
certame. Não é sem razão, portanto, o que exige o art. 49 da Lei federal das Licitações, ou seja,
parecer escrito devidamente fundamento. A anulação, evidentemente, não se fará mediante
parecer, pois ato inadequado para essa finalidade, mas por ato administrativo de natureza
decisória. É esse o sentido da palavra parecer nesse texto legal. Mais precisa, nesse particular, é a
redação do art. 18 do Decreto federal nº 3.555/2000, que regulamenta a Lei federal do Pregão, pois
exige para a anulação ato escrito e fundamentado. Como as situações reguladas são as
mesmas, não há como interpretar de outro modo a palavra parecer constante da mencionada
prescrição legal.

Competência

Não há, como ocorre com a revogação, competência exclusiva para a anulação da licitação. A
anulação, por dita razão, tanto cabe à Administração Pública responsável pelo procedimento
licitatório, como ao Judiciário. Quando promovida pela Administração Pública pode derivar de ato
ou comportamento de sua própria iniciativa ou de ato ou comportamento de terceiro. No primeiro
caso, diz-se de ofício; no segundo, provocada, consoante estabelece o art. 49 da Lei federal
Licitatória. É de ofício sempre que a entidade licitante revendo seu comportamento entende-o ilegal
e assim o declara. É provocada quando a revogação tem origem na iniciativa de terceiro, pessoa
física ou jurídica. Este, entendendo ser ilegal o comportamento da entidade licitante, o denuncia
aos órgãos competentes, como é o Ministério Público, ou contra ele interpõe a competente medida
administrativa, tal qual o recurso hierárquico, ou judicial, a exemplo da ação popular, observado em
ambos os casos o regime competencial de conhecimento.

Nas hipóteses em que cabe medida recursal administrativa, comprovada a ilegalidade e, por
conseguinte, julgado procedente o recurso, deve a entidade licitante declarar a invalidação do
certame. Dentro da Administração Pública federal licitante a competência para anular a licitação é
da autoridade a quem a lei atribuiu essa responsabilidade. Por força da regra estabelecida no
mencionado art. 49 da Lei de Licitações e Contratos, a competência anulatória é da autoridade
competente para homologar, embora não se saiba por dito dispositivo quem é essa autoridade.
Sendo assim, toca encontrá-la na legislação de organização administrativa e se de todo isso não
for possível, essa autoridade será a de maior hierarquia, como seria o Superintende dentro de certa
autarquia. Em outras entidades é da competência da autoridade mencionada na legislação
competente que a indica com liberdade. Exemplo dessa liberdade tem-se na legislação paulista.
Com efeito, na administração direta e autárquica do Estado de São Paulo a competência para
anular a licitação é dos Secretários de Estado e dirigentes de autarquias, nos termos do art. 2º, inc.
IV, do Decreto estadual nº 31.138/90, regulamento parcial da Lei nº 6.544/90. Perante o Judiciário a
anulação é sempre provocada, pois não lhe cabe atuar spont própria, salvo no que respeita às suas
próprias licitações. Julgada procedente a demanda, a sentença deve decretar a anulação da
licitação. A ação judicial cabível deve ser interposta no juízo competente.

Efeitos

O ato administrativo de anulação também tem efeitos próprios e impróprios a cujas considerações
gerais, expendidas a esse respeito no que se refere à revogação, remetemos o caro leitor. O efeito
próprio da anulação é desfazer retroativamente o procedimento licitatório, restaurando a legalidade
desde o momento em que ela foi violada. É torná-lo imprestável para os fins a que estava
preordenado, destinado, ou seja, a seleção da melhor proposta, face ao vício de ilegalidade que
encerra. A par desses efeitos, contam-se os impróprios, que são vários. De fato, a anulação libera o
vencedor de todas as obrigações decorrentes de sua integração no procedimento da licitação,
embora não o libere de certas responsabilidades, como a civil e a criminal, se deu causa para a
ocorrência da ilegalidade e, por conseguinte, à anulação do certame. Também não libera, sob o
ângulo dessas responsabilidades, qualquer integrante do procedimento que tenha propiciado a
ilegalidade. Diga-se, ainda, que a anulação não desobriga a Administração Pública, pelo menos em
tese, de indenizar os prejudicados em razão dessa medida extintiva do certame. A anulação não
impede a renovação do procedimento, pois a Administração Pública licitante, em princípio, ainda
deseja o objeto licitado. Esses são seus principais efeitos impróprios, que alguns chamam de
conseqüências.

Os efeitos do ato de anulação sejam próprios ou impróprios, são ex tunc, isto é, desde então,
valendo afirmar: retroagem para alcançar a ilegalidade no seu nascedouro e destruir o ato que a
encerra e os que lhe são subseqüentes no procedimento licitatório (art. 59), inclusive o contrato, se
celebrado, consoante estabelece o § 2º do art. 49 do Estatuto federal Licitatório. Observe-se, no
entanto, que nem todos os efeitos são destruídos, pois alguns, como é o caso da obrigação de
indenizar os licitantes de boa-fé persistem.

Objetivo

A invalidação visa restaurar a legalidade, pois com essa medida extrema extirpa-se o ato ou todo o
procedimento licitatório viciado do ordenamento jurídico. Daí não se pense que a anulação visa
impedir a contratação, pois essa, como dissemos, ainda continua de interesse da Administração
Pública licitante. Assim, anulada a licitação, inicia-se um novo procedimento sem o cometimento da
mesma ilegalidade, ou se reinicia o procedimento a partir do ato refeito, aproveitando-se, se
possível, os atos e fases não contaminados por esse vício.

Indenização

O desfazimento da licitação por invalidação ou anulação não investe qualquer licitante no direito
de ser indenizado, conforme têm decidido nossos pretórios.22 Essa firme orientação pretoriana hoje
está consignada no § 1º do art. 49 da referida Lei federal das Licitações e Contratos, sendo ainda
defendida por alguns autores. Nem mesmo o vencedor do procedimento tem qualquer direito
indenizatório, salvo se nulo o desfazimento, consoante já decidiu o Tribunal de Alçada de São
Paulo, ao julgar a Apelação Civil nº 131.446.23 Prevalece, assim, o princípio segundo o qual dos
atos nulos não surtem efeitos válidos.

Essa antes firme orientação vem sendo mitigada, pois dela escapam os terceiros de boa-fé, que
têm, assim, seus direitos respeitados com a manutenção da relação que lhes deu origem, não, por
óbvio, com a permanência da licitação ilegal, ou quando isso for impossível com a correspondente
indenização. Desse modo também deve ser tratado o vencedor da licitação se em nada contribuiu
para a ilegalidade, pois se a Administração Pública, ao anular a licitação por ele vencida, causa-lhe
prejuízo, deve responder nos termos do § 6º do art. 37 da Constituição Federal. E os proponentes,
quando alcançados pela anulação no curso da licitação, também devem ser indenizados, desde
que para a ilegalidade em nada tenham contribuído. Nessa mesma linha, diga-se que o contratado
em razão do procedimento anulado também não sofre qualquer prejuízo pelo que houver
executado até a data da decretação da nulidade, se teve seu contrato desfeito em razão da
invalidação da licitação, ex vi do art. 49, § 1º, da Lei federal das Licitações e Contratos, conquanto
não lhe seja imputável o vício. Em tal caso, não obstante a restrita previsão legal, cremos que sua
indenização há de ser plena, devendo também alcançar outros prejuízos como os danos
emergentes e o lucro cessante, decorrentes da extinção (art. 37, § 6º, da CF). Ademais, estabelece
o parágrafo único do art. 59 da Lei federal das Licitações e Contratos que o contratado deve ser
indenizado “por outros prejuízos regularmente comprovados”, contanto que lhe seja imputável, sem
óbice à responsabilização de quem deu causa à invalidade. Esses outros prejuízos a que se refere
esse dispositivo legal são, a nosso ver, os danos emergentes e o lucro cessante.

Incidindo a anulação sobre um ato do procedimento licitatório, todos os proponentes atingidos


deverão integrar, porque interessados, o processo de invalidação. Se ao contrário incidir sobre a
licitação acabada, do processo de invalidação só participará o adjudicatário vencedor. Outra
importante observação há que ser feita, pois conforme uma ou outra dessas hipóteses a obrigação
de indenizar é distinta. Assim, pode prestigiar todos os proponentes atingidos, desde que não se
lhes atribua o cometimento da ilegalidade e a anulação recaia em ato de procedimento em curso.
De revés, se a anulação alcançar a licitação acabada só o adjudicatário vencedor tem direito a uma
indenização desde que não lhe seja imputado o vício de ilegalidade. Quanto ao valor da
indenização, esta será tão só o suficiente para cobrir os custos da participação de cada um dos
proponentes atingidos. Caso a nulidade tenha sido causada por certo proponente, vencedor ou não
da licitação viciada, poderá ele ser responsabilizado.

Contraditório e ampla defesa

A Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública assegura nos casos de anulação,
tanto quanto o faz nas hipóteses de revogação da licitação, o contraditório e a ampla defesa,
conforme expressamente mencionado no § 3º, do seu art. 49, ainda que nessa disposição esteja
mencionada a palavra desfazimento, não revogação e anulação. Assegura a quem? Ao
adjudicatário vencedor da licitação, pois o único com efetivos interesses na permanência desse
procedimento, já que através dele pode chegar ao contrato e, quando for o caso, ao contratado
uma vez que este tem interesse na manutenção do ajuste decorrente da licitação anulada.
Ninguém mais tem interesse, já que por força da adjudicação ou outro motivo qualquer, foram
afastados do certame e na oportunidade tomaram as medidas que lhe pareceram as melhores. Em
sendo assim, a autoridade competente para anular a licitação deve informar de forma solene ao
seu vencedor que é intenção da Administração Pública licitante anular a licitação pelas razões que
deve explicitar, para que no prazo de cinco dias úteis, tomado por empréstimo do art. 109, inc. I,
dada a ausência de outro que lhe seja próprio, exerça, mediante petição, esses direitos, ou seja, o
contraditório e a ampla defesa. Tal direito, não se pode olvidar, deve ser assegurado a todos os
proponentes alcançados pela anulação do ato do procedimento viciado.

Com a juntada tempestiva dessa manifestação ao processo e concluída a instrução que


eventualmente se impuser, a autoridade competente, se for o caso, anula a licitação. Esse
pronunciamento também ocorrerá, ainda que tal direito não tenha sido exercido pelo vencedor. Se
assim for, esse será o único prejudicado, pois tal comportamento será considerado em seu
desfavor. Contra esse ato que põe fim à licitação cabe recurso hierárquico, no prazo de cinco dias
úteis, tomado esse prazo por empréstimo do art. 109, inc. I, dada a ausência de prazo próprio,
contados da intimação ou de sua publicação, pois decorrente direto do direito ao contraditório e à
ampla defesa. Se isso não bastasse para justificar o direito à medida recursal, cabe lembrar que
esse preceptivo prevê o recurso hierárquico contra a anulação (art. 109, inc. I, alínea “c”), sem que
essa previsão signifique o direito de recorrer novamente contra essa medida, como se fossem
possíveis dois recursos hierárquicos contra a anulação. O efeito desse recurso é apenas
devolutivo. A autoridade competente, no entanto, se presentes razões de interesse público e
motivada sua decisão, poderá recebê-lo com efeito suspensivo, como é facultado pelo § 2º do art.
109 desse mesmo diploma legal.

Faculdade ou obrigação de anular

Ocorrendo qualquer ilegalidade insanável, a Administração Pública licitante deve anular o


procedimento. Com efeito, prescreve o art. 49 dessa lei que a autoridade competente para a
aprovação do procedimento licitatório deverá anulá-lo por ilegalidade. Entendemos que nessas
hipóteses não há para a Administração Pública licitante qualquer discricionariedade, pois prevalece
o dever de extinguir o procedimento licitatório, salvo se convalidável, em homenagem ao princípio
da legalidade. Com efeito, se a manutenção da licitação em tais condições afronta, de modo
insanável, o primado da lei, surge para a Administração Pública o dever-poder de promover sua
anulação, pelo menos em princípio, pois o restabelecimento da legalidade pode ser alcançado
mediante a convalidação. À vista desse contexto, assegura Celso Antônio Bandeira Mello que a
Administração Pública perante ato inválido não dispõe de opção que lhe permita “escolher com
liberdade se o invalida ou se deixa de invalidá-lo”24 e em sendo assim deve anulá-lo, salvo se
convalidável.

Previsão editalícia

Não se exige para a anulação que o dever-poder de anular a licitação esteja previsto no edital ou
carta-convite para ser utilizado pela pessoa licitante. Basta que a oportunidade ocorra e os motivos
estejam presentes para que a entidade licitante possa exercitá-lo. Destarte, é sem propósito item
do instrumento convocatório, prática ainda encontrável em algumas entidades públicas e
governamentais, que reserva à Administração Pública licitante o direito de anular a licitação por ele
regulada. Atente-se, em abono dessa tese, que não se encontra entre os itens do edital
considerados obrigatórios pelo art. 40 da Lei federal das Licitações e Contratos nada semelhante a
essa inconsistente praxe. Ademais, se existirem os motivos justificadores da anulação esta
ocorrerá por força da lei ou do princípio da legalidade, não em razão desse item do instrumento
convocatório. Por outro lado, se inexistente a ilegalidade esse item editalício não tem qualquer valia
para a prática da anulação.

Procedimento anulatório

Previamente à anulação, deve a autoridade competente notificar o vencedor da licitação dessa


intenção da Administração Pública licitante, indicando-lhe os motivos, para que no prazo de cinco
dias úteis, emprestado esse prazo, na falta de outro, do art. 109, inc. I, da Lei federal das
Licitações, manifeste, exercendo o contraditório e a ampla defesa, o que for de seu interesse. Com
a juntada dessa manifestação e realizada, se for o caso, eventual instrução processual, a
autoridade competente decidirá pela anulação ou não do ato tido como ilegal, conforme os fatos
conduzam a decisão num ou noutro desses sentidos. Esse ato, devidamente fundamentado, há de
ser escrito. Nada altera essa inteligência o fato o art. 49 da Lei federal das Licitações mencionar a
palavra parecer. Ainda será assim quando o vencedor deixar de ofertar, dentro do prazo, sua
manifestação.

Caso a anulação seja de um ato do procedimento licitatório, como é o de habilitação, todos os


proponentes que integram-no devem receber essa notificação. Em qualquer caso, o processo
licitatório e o eventual processo de anulação devem estar à disposição dos interessados,
permitindo-se a extração de cópias mediante pagamento. A prática da anulação sem o atendimento
dessas exigências é ilegal. Dessa decisão, cuja publicação é obrigatória, cabe recurso no prazo de
cinco dias úteis, contados da intimação ou publicação do ato nos termos do § 1º do art. 109 da Lei
federal das Licitações e Contratos. Dito recurso pode ser recebido com efeito suspensivo,
consoante estabelece o art. 109, inc. I, alínea “c”, combinado com o disposto no § 2º, parte final,
desse mesmo dispositivo.

Publicidade

Uma vez praticado, o ato de anulação deve ser publicado na imprensa oficial da entidade
responsável pelo desfazimento, conforme se infere do art. 109, § 1º, da Lei federal das Licitações.
Basta uma publicação para atender essa determinação legal.

Retomada da licitação

Como o desfazimento da licitação teve por motivo a ilegalidade do procedimento, é notório que
essa circunstância não pode impedir a Administração Pública de intentar nova licitação escoimada
dos vícios que nulificaram a anteriormente realizada. Assim deve ser, pois a Administração Pública
licitante visou com a anulação recompor a legalidade não impedir a contratação, cujo objeto ainda é
de seu interesse. Para tanto deve instaurar o devido processo, observada a legislação licitatória
pertinente. Não se trata de aproveitamento da licitação anterior, eis que nula, mas de novo
procedimento. No entanto, conforme o caso, é certa a possibilidade de se dar continuidade ao
procedimento licitatório, uma vez resolvidas as ilegalidades, com o aproveitamento dos atos e
documentos não afetados pela ilegalidade. Conforme a hipótese essas circunstâncias devem ser
explicitadas no ato de anulação. Essa possibilidade é mais visível quando a anulação tem por
objeto um ato do procedimento, como é o ato de julgamento da licitação.

Prescrição

Em homenagem ao princípio da segurança jurídica há que se afirmar que o direito de anular ato
administrativo que integra certame licitatório ou o próprio certame prescreve, via de regra, em cinco
anos. Assim, enquanto esse prazo não fluir por inteiro pode a Administração Pública ou o Judiciário,
quando instado, promover a anulação do procedimento da licitação ou de atos que o integram.
Essa anulação leva, automaticamente, à anulação do eventual contrato. Uma vez prescrito esse
direito, não cabe mais a anulação.

DESISTÊNCIA

A revogação e a invalidação não se confundem com a desistência da licitação. Há desistência


quando a entidade licitante, antes do final da licitação, renuncia ao seu prosseguimento, interrompe
em caráter definitivo o seu curso. O motivo da desistência pode ser qualquer um, desde que de
interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado, pertinente e
suficiente para justificar tal medida. O regime, portanto, está muito próximo do regime da
revogação, diferenciando-se apenas no que concerne às conseqüências, valendo, por isso,
mudado o que deve ser mudado, o que dissertamos em relação à revogação. Embora seja assim,
não a chamamos de revogação. A desistência se impõe, por exemplo, quando o Município durante
o desenrolar da licitação para a aquisição de 1.200 caixas de laranjas recebe-as em doação de um
benemérito citricultor. Conseguido o objeto da licitação, mesmo que por outros meios, não há
sentido lógico, nem jurídico, para o prosseguimento da licitação. Aliás, sua continuidade em tais
casos seria ilegal dada a ausência de interesse público. Com efeito, se para a instauração do
procedimento licitatório é absolutamente indispensável o interesse público, é lógico e jurídico
afirmar-se que se no decorrer desse procedimento desaparecer ou mudar dita exigência não há
como lhe dar prosseguimento. Assim não seria se apenas ocorresse uma ilegalidade, pois sanada
essa com a anulação ou a convalidação do ato viciado, com a reaquisição da tramitação normal da
licitação. A desistência, portanto, só pode ter por motivo uma razão de mérito, ou seja, de
conveniência e oportunidade.

Na desistência, os licitantes alcançados por essa medida têm direito a uma indenização, no
montante exato dos gastos realizados e comprovados para integrar o procedimento. Licitantes
alcançados são os que no momento da desistência integravam regularmente o procedimento
licitatório. Aí outra diferença com a revogação, conforme a concebemos. Certamente, não têm
direito a tal indenização os licitantes que por um motivo qualquer foram regularmente eliminados do
procedimento e, assim, no momento da desistência não mais dele participavam. Compreende-se
que deva ser assim, pois a abertura de um procedimento dessa natureza e a conseqüente
convocação de interessados para apresentarem propostas para o negócio de seu interesse hão de
ser havidas como sérias, como de resto devem ser todos os comportamentos da Administração
Pública. Ademais, não pode a entidade licitante causar danos a alguém, sob pena de indenização
(art. 37, § 6º, da CF) e a desistência causa danos aos proponentes. Não se pode imaginar outra
solução, na medida em que a desistência se funda no interesse público, mas os prejudicados são
somente alguns licitantes certos e determinados, e isso leva à aplicação do princípio da distribuição
igualitária dos ônus e obrigações por todos os membros da sociedade. Todos, assim, devem
contribuir para o ressarcimento dos licitantes prejudicados com a desistência.

Desse modo, pode-se dizer que a desistência diferencia-se da revogação pelas seguintes notas: 1)
a desistência incide em procedimento em andamento; a revogação recai sobre procedimento
acabado; 2) na desistência todos os licitantes que participavam do certame no momento de sua
ocorrência têm direito a uma indenização; na revogação só tem direito à indenização o licitante
vencedor do certame. Com a invalidação, a desistência distingue-se: 1) na desistência o motivo é
de mérito, ou seja, conveniência ou oportunidade, enquanto na invalidação é de legalidade; 2) na
desistência, põe-se fim em definitivo ao procedimento, enquanto na invalidação, ainda que seja no
transcorrer do procedimento, refaz-se o certame.

A desistência da licitação é ato da autoridade que determinou sua abertura ou da que caberia
homologá-la ou, em suma, da indicada na legislação. Se não for possível determiná-la, a atribuição
é da mais alta autoridade da entidade licitante, que pode delegá-la, por certo. Não cabe, portanto, à
comissão de licitação, que sequer deve ser consultada para tanto, pois não lhe é próprio opinar
sobre decisões de alta administração. Contra esse ato não pode insurgir-se qualquer dos
proponentes, que apenas tem direito a uma indenização, como vimos, cujo montante não pode
ultrapassar o valor das despesas realizadas e comprovadas até esse momento em razão de sua
participação no certame. O ato de desistência, como ato administrativo, deve ser devidamente
motivado, nos termos do art. 49 da Lei federal de Licitações e Contratos e do art. 18 da Lei federal
do Pregão, conforme o caso. Contra ele cabem os recursos administrativos e judiciais pertinentes.
Se houver motivo para tanto, a desistência pode ser revogada e, se expressamente previsto, no ato
de revogação, pode ser restaurado o procedimento com o aproveitamento, no que couber, dos atos
e fases já realizados. Não obstante a restauração, os proponentes não estão obrigados a
prosseguir integrando o certame, ainda que esteja em vigor o prazo das propostas, salvo se
concordarem. A desistência também pode ser anulada, desde que a justificá-la haja uma
ilegalidade insanável. Por fim, diga-se que a desistência só tem cabida enquanto não concluído o
procedimento licitatório. Sendo assim, pode-se afirmar que tal direito está prescrito.

CONVALIDAÇÃO

Nem sempre o interesse público se compadece com a anulação de certo ato isolado ou de ato
integrante de procedimento administrativo, a cargo da Administração Pública. É preferível à
anulação, em homenagem à segurança das relações jurídicas, ao princípio da boa-fé e à economia
processual, que o ato ou o procedimento seja aproveitado, resguardando-se, assim, os efeitos já
produzidos, desde que princípios jurídicos maiores não sejam ofendidos. Tal aproveitamento faz-se
através da aplicação do instituto da convalidação, cujos efeitos retroagem à data do ato viciado. É
praticada, como é o comum das vezes, pela Administração Pública. Em certas hipóteses pode ser
levada a efeito pelo particular, quando para a edição do ato administrativo era indispensável sua
manifestação. Não é outra a ensinança de Maria Sylvia Zanella Di Pietro ao afirmar que a
convalidação é feita, em regra, pela Administração, mas eventualmente poderá ser realizada pelo
administrado, quando a edição do ato dependia da manifestação de sua vontade e a exigência não
foi observada, cabendo neste caso emiti-la posteriormente convalidando o ato. 25

Alguns autores estabelecem espécies de convalidação. Assim, denominam-na confirmação se a


correção do ato viciado é da alçada de outra autoridade. Designam-na saneamento se o ato
inválido foi praticado por particular. Nomeiam-na ratificação se a convalidação é de competência
da autoridade prolatora do ato ilegal. Nessa linha, Sérgio Ferraz e Adilson de Abreu Dallari, alertam
que também fala-se em conversão como sinônimo de convalidação ou de substituição de um ato
viciado por outro de categoria diversa.26 Exemplo dessa situação seria a substituição do ato de
nomeação de alguém sem concurso público para titularizar cargo de provimento efetivo, por
contrato celetista com fundamento no art. 37, inc. IX, da Constituição Federal. A convalidação é
impraticável em termos de procedimento administrativo onde, ensinam esses autores, todos os
atos que o integram são categoricamente homogêneos.

Fundamento

Com relação à convalidação, pode-se encontrar um fundamento principiológico e uma razão de


natureza legal para seu exercício. O primeiro desses fundamentos é o princípio da legalidade, pois
a Administração Pública não pode conformar-se com atos e procedimentos ilegais. Assim é seu
dever restaurar a legalidade violada, anulando ou convalidando o ato portador da pecha de
ilegalidade. Weida Zancaner assevera, nesse particular, que “há duas formas de recompor a ordem
jurídica violada, em razão de atos inválidos, quais sejam, a invalidação e a convalidação”. 27 Nesse
sentido, em precisa lição, acentua Celso Antônio Bandeira de Mello que:

As asserções feitas estribam-se nos seguintes fundamentos. Dado o princípio da legalidade,


fundamentalíssimo para o Direito Administrativo, a Administração não pode conviver com relações
jurídicas formadas ilicitamente. Donde, é dever seu recompor a legalidade ferida. Ora tanto se
recompõe a legalidade fulminando um ato viciado, quanto convalidando-o. 28

Portanto, mesmo antes de qualquer disciplina legal que a instituísse e a regulasse, a convalidação
podia ser praticada pela Administração Pública, desde que essa medida prestigiasse a segurança
jurídica, a boa-fé e o interesse público, sem violar princípios maiores abrigados pelo sistema
normativo. Nesses termos, permitia-se, mesmo na ausência de expressa previsão legal, a sanatória
dos atos ilegais. É oportuno mencionar que Estados e Municípios não dotados de lei que permita a
convalidação de seus atos e procedimentos administrativos, quando sanáveis, podem com base no
princípio da legalidade promover a devida convalidação.

O segundo fundamento, o legal, encontra-se no bojo de alguma lei administrativa voltada à


disciplina do processo administrativo ou à regulamentação de atos e procedimentos
administrativos, como são, respectivamente, a Lei federal nº 9.784/99, que regula o processo
administrativo no âmbito da Administração Pública federal, e a Lei paulista nº 10.177/98, que regula
os atos e procedimentos administrativos na esfera da Administração Pública estadual de São
Paulo. O art. 55 da primeira dessas leis prescreve que:

Art. 55 Em decisão na qual se evidencie não acarretarem lesão ao interesse público nem prejuízo a
terceiros, os atos que apresentarem defeitos sanáveis poderão ser convalidados pela própria
Administração.
Enquanto o art. 11 da segunda estabelece que:

Art. 11 A Administração poderá convalidar seus atos inválidos, quando a invalidade decorrer de
vício de competência ou de ordem formal, desde que:

I - na hipótese de vício de competência, a convalidação seja feita pela autoridade titulada para a
prática do ato, e não se trate de competência indelegável;

II - na hipótese de vício formal, este possa ser suprido de modo eficaz.

Essas, por evidente, são impositivas para, respectivamente a Administração Pública federal e
Administração Pública Estadual de São Paulo. Ademais, não se prestam para justificar a
convalidação de atos e procedimentos administrativos de outras entidades estaduais, distritais e
municipais. Essas, como afirmado, devem se valer para tanto do princípio da legalidade, caso
desprovidas de lei para tanto.

Conceito

Já se pode, com as simples afirmações feitas, definir a convalidação como sendo o ato da
Administração Pública ou do particular que restaura, retroativamente, a legalidade de ato
administrativo isolado ou de ato integrado a procedimento administrativo, se sanáveis.
Convalidação, segundo a precisa lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, “é o suprimento da
invalidade de um ato com efeitos retroativos”.29 A esse propósito ensina Egon Bockmann Moreira
que:

A convalidação consubstancia prática de ato administrativo com efeitos retroativos, que absorve e
prestigia os eventuais efeitos do provimento pretérito viciado. A convalidação infunde validade e
corrige o ato pretérito”.30

Portanto, somente tem sentido lógico e jurídico falar-se em convalidação em relação a um ato
isolado ou integrado a um procedimento quando revelar-se inválido ou ilegal, desde que tal vício
seja sanável.

Objeto

O objeto do ato de convalidação tanto pode ser um ato administrativo isolado, tal qual é o ato de
nomeação de servidor público, como pode ser um ato que integra um procedimento administrativo,
a exemplo do ato de adjudicação no processo da licitação, estigmatizados pela ilegalidade causada
por comportamento da Administração Pública ou do particular, quando lhe cabia oferecer
manifestação à composição do interesse público. Não há, assim, que se cogitar de convalidação de
atos válidos ou legais, pois conformados à lei e ao princípio da legalidade.

Natureza

O ato de convalidação, via de regra, é administrativo e como tal observa o regime jurídico desses
atos, mas pode ser privado, quando, então, observará o regime jurídico de tais atos. Ademais,
quando administrativo é ato vinculado, pois editado no exercício de atividade administrativa que
comporta essa qualificação. Nesse sentido são as lições de Sérgio Ferraz e Adilson de Abreu
Dallari.31 Com efeito, acentuam esses monografistas da Lei federal do Processo Administrativo que:
“Em mais um ponto afirmamos nossa adesão a Weida Zancaner: invalidação e convalidação são
atividades vinculadas”. Assim, deve ser praticado sempre que houver motivo a ensejá-lo, ensina
Celso Antônio Bandeira de Mello.32

Efeitos

Os efeitos do ato de convalidação, próprios e impróprios, são ex tunc, ou seja, retroagem para
alcançar o ato convalidando em seu nascedouro. Assim há de ser, pois a invalidade não é
adquirida, mas congênita como afirmam alguns autores. A ilegalidade nasce com o próprio ato,
como ocorreria com aquele praticado por autoridade incompetente, ou se instala com a abertura do
procedimento, como seria no caso de licitação aberta mediante a publicação do aviso sem a
observância do prazo mínimo que deve mediar essa publicação e a sessão pública de recebimento
dos envelopes de habilitação e proposta. No procedimento administrativo, cabe observar, o ato
inválido também pode estar em qualquer de suas fases, como é o ato de inabilitação de proponente
que atende a todas as exigências de habilitação. De tal sorte, não se pode imaginar o ato de
invalidação senão como dotado de efeitos retroativos, sob pena de descumprir sua precípua
finalidade.

Faculdade ou obrigação de convalidar

Na convalidação a Administração Pública exerce competência discricionária? Dito de outro modo,


cabe-lhe um desempenho facultativo ou obrigatório? Em suma: a convalidação é para a
Administração Pública que se depara com um ato ilegal isolado ou integrante de procedimento
administrativo uma faculdade ou uma obrigação? A Administração Pública não convive com ato
inválido, salvo quando o ato, para ela, assim não se revelou. Conhecido o ato inválido, cabe-lhe
tomar as medidas requeridas pelo interesse público para restaurar a legalidade. Essa decisão, por
certo não é discricionária, já que não lhe toca optar por restaurar ou não a legalidade do sistema
jurídico. A higidez do ordenamento jurídico é princípio que comanda essa decisão e a restauração
deve ser prestigiada. A restauração da legalidade do sistema, já se afirmou, pode ser alcançada,
conforme o caso, pela anulação ou pela convalidação do ato inválido. Embora seja assim, não se
pode ver nessa obrigação de restaurar a legalidade do sistema jurídico uma discrição da
Administração Pública. Não lhe cabe, pois, optar, pura e simplesmente, por anular ou convalidar o
ato ilegal isolado ou integrante de procedimento quando factível a convalidação. A convalidação
nessa hipótese é a medida de restauração da legalidade que deve ser adotada, pois abonada pelos
princípios da segurança jurídica, da boa-fé e da economicidade.

Nesse particular, oportuna como sempre é lição de Celso Antônio Bandeira de Mello ao acentuar
que:

Sendo certo que a invalidação ou convalidação terão que ser obrigatoriamente pronunciadas,
restaria apenas saber se é discricionária a opção por uma ou outra nos casos em que o ato
comporta convalidação. A resposta é que não há, aí, opção livre entre tais alternativas. Isto porque,
sendo cabível a convalidação, o Direito certamente a exigiria, pois, sobre ser uma dentre as duas
formas de restauração da legalidade, é predicada, demais disso, pelos dois outros princípios
referidos: o da segurança jurídica e o da boa-fé, se existente. Logo, em prol dela afluem mais
razões jurídicas do que em favor da invalidação.33

Cabe observar, apesar desse fato, que tanto o art. 55 da Lei federal que regula o processo
administrativo, como o art. 11 da lei paulista que regula o ato e o procedimento administrativo,
parecem atribuir, no que concerne à convalidação de atos isolados e atos integrantes de
procedimento administrativo, uma faculdade às entidades federais e estaduais aí mencionadas,
sem, contudo, aluir os fundamentos já expostos em favor da obrigatoriedade da convalidação nas
hipótese em que tal medida seja cabível. Ainda que se aceitasse, em homenagem a essas leis e a
uma interpretação literal, ter-se-ia que afirmar que sua aplicação é restrita ao âmbito federal e
estadual para os quais foram editadas.

A convalidação na prática

Na prática a convalidação consiste na edição de um novo ato administrativo, com a finalidade de


recompor a legalidade de outro, irregular ou ilegalmente editado, embora isso nem sempre seja
indispensável, pois a prescrição do dever-poder de anular pode produzir o mesmo efeito. Com o
novo ato ou por força da prescrição restaura-se a legalidade do ato inválido, integrante ou não de
um certo procedimento administrativo, pois os requisitos da convalidação são os mesmos, vez que
se trata de ato ilegal isolado ou de ato integrante de procedimento. Para que se possa validamente
convalidar atos de determinado processo administrativo, como é a licitação, é imprescindível, nas
lições de Sérgio Ferraz e Adilson de Abreu Dallari aqui acolhidas inteiramente, que: a) não tenha
havido impugnação do ato pelo interessado atingido, b) o interesse público não tenha sido lesado,
c) os interesses ou direitos de terceiros estranhos à relação processual não tenham sido atingidos,
d) do ato viciado não tenham decorridos direitos a terceiros de boa-fé estranhos à relação
processual e e) não se trate de ato inexistente.34 Portanto, a autoridade competente para decidir
sobre a convalidação de certo ato que integra um dado procedimento administrativo deve realçar
na motivação do ato convalidador a presença de todos esses requisitos. A falta de um, qualquer
que seja, impede a convalidação e a recomposição da legalidade deve ocorrer através da
anulação.

Vejamos, para bem compreender esse mecanismo, o seguinte exemplo: ao receber o processo
licitatório para fins de homologação, a autoridade competente constata que a comissão de licitação
não consignara na ata de julgamento a classificação das propostas em ordem crescente de seus
valores, conforme determina o § 3º do art. 45 da Lei federal das Licitações, mesmo assim
adjudicara o objeto licitado ao vencedor. Não houve qualquer impugnação exigindo a classificação,
nem recurso contra a ilegal adjudicação. Inexistiu qualquer lesão ao interesse público, pois o
adjudicatário era o autor da melhor proposta. Nenhum interesse ou direito de estranhos ao
procedimento foi alcançado com a irregular adjudicação. Do ato viciado não decorreu qualquer
direito em favor de terceiros de boa-fé, estranhos à licitação. Não se trata de ato inexistente.
Presentes os requisitos da convalidação, deve a autoridade competente devolver o processo,
mediante despacho assim justificado, à comissão de licitação para que proceda a classificação,
pois sem ela não se pode saber se o adjudicatário é efetivamente o vencedor, e convalide
(ratifique) a adjudicação, viabilizando, por conseguinte, a licitação, para que se for o caso seja
homologada.

Vejamos outro exemplo para bem compreender o que estamos a afirmar. Após a homologação de
certo pregão, foi celebrado com o seu vencedor o decorrente contrato sem que apresentasse
situação regular, quando o certo seria convocar outro licitante observada a ordem de classificação.
Essa irregular contratação fez com que, tempestiva e formalmente, o segundo classificado
recorresse contra esse irregular comportamento da Administração Pública licitante. No caso, o
recurso deve ser julgado procedente e anulada a licitação, pois é incabível, por evidente, a
convalidação dessa contratação, face ao recurso regularmente interposto pelo prejudicado. Assim
também seria se o recurso fosse judicial.

Prescrição

A convalidação somente pode ser exercida enquanto não estiver prescrito o direito de anular o ato
viciado passível dessa medida. Após, a convalidação ocorre pela prescrição.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1
SUNDFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 173.

2
Ibid., p. 171.

3
FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p.
468.

4
MONTEIRO, Yara Darcy Police. Licitação: fases e procedimento. São Paulo: NDJ, 2000. p. 113.

5
FERRAZ, Luciano. Licitações – estudos e práticas. 2. ed. Rio de Janeiro: Esplanada, 2002. p. 81.

6
Op. cit., p. 173.

7
MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. 13. ed., atualizada por AZEVEDO,
Eurico de Andrade; ALENCAR, Maria Lúcia Mazzei de. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 165.

8
Ibid., p. 164.

9
MOTTA, Carlos Pinto Coelho. Eficácia nas licitações e contratos. 9. ed., Belo Horizonte: Del Rey,
2002. p. 416.

10
RDA, 100:149 e 108:328; RT, 509:140 e 582:42; e MS 89.02.04343-6-RJ, DJU 09.01.1992.

11
Op. cit., p. 164.

12
Op. cit., p. 176.

13
Op. cit., p. 82.

14
DALLARI, Adilson Abreu. Aspectos jurídicos da licitação. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 185.

15
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 16. ed. São Paulo:
Malheiros, 2003. p. 558.

16
Id.

17
FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson Abreu. Processo administrativo. São Paulo: Malheiros, 2001.
p. 71.

18
Op. cit., p. 161.

19
Id.

20
Op. cit., p. 425.

21
RT, 231:661 e 350:521.
22
RDA, 52:248; RT, 415:187, 428:248 e 750:384.

23
RDA, 104:235.

24
Op. cit., p. 432.

25
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 235.

26
Op. cit., p. 200.

27
ZANCANER, Weida. Da convalidação e da invalidação dos atos administrativos. 2. ed. São
Paulo: Malheiros, 1993. p. 56.

28
Op. cit., p. 433.

29
Ibid., p. 430.

30
MOREIRA, Egon Bockmann. Processo administrativo. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 96.

31
Op. cit., p. 201.

32
Op. cit., p. 477.

33
Ibid., p. 433.

34
Op. cit., p. 200

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