Sei sulla pagina 1di 7

A Anatomia Secreta do Corpo Humano

Gaveta das Palavras Não-ditas

Há no interior do interior do corpo humano uma gaveta. Nela ficam guardadas todas
as palavras não-ditas; dessas que a gente sente, que muitas vezes nos falta habilidade, ou
vontade ou força para articulá-las. Ao contrário do que muitos acreditam, essa gaveta tem
fundo e tem paredes, e é chamada Felicidade por isso mesmo, por ser finita. A palavra
"infinito" não lhe cabe, deixa a gaveta de palavras - Felicidade - entreaberta, o "finito" dentro
dela, o "in" pendurado pra fora. Infelicidade é o nome dela quando confundida assim; é o
nome dela quando transborda.

Das coisas indizíveis

Reencontraram-se na fila do busão, mas não se cumprimentaram. Já fazia muito


tempo que seu tempo passou. Esgazearam-se ambos, lá atrás no pilhar de anos, feito balão
que se encheu de repente, e igualmente se esvaziou. Entreolharam-se por cinco segundos; e
em cinco segundos apenas, puderam muito: agradeceram-se com os olhos, num sorriso sem-
graça de quem quita uma pendência atrasada. Nunca mais se viram, é verdade, mas naquela
pequena janela, naquele intacto intervalo, o espaço entre eles se inundou com todas as
palavras ainda não inventadas pela ordem dos fonemas, e para sempre se entenderam como
nunca.

A (nem tão) NOVA DOENÇA INFECTO-CONTAGIOSA!

A ciência ainda não pôde explicar essas pessoas, e sua condição. E, ao que parece, até
mesmo muito dos próprios cientistas compartilham do mesmo mal deste meu (breve e
suposto) objeto de estudo sem nem ao menos se darem conta. Verdade que não tenho
patente para calcar minha análise; não sou nenhum cardiologista, biomédico, biólogo ou seja-
o-que-seja que me garanta qualquer patente de Doutor. Mas é preciso dizer: Elas estão por
toda a parte. Refiro-me às pessoas de coração bem pequenininho. Em sua maioria, possuem
uma dificuldade na curvatura do músculo flexor do dedo indicador e, portanto, vivem com ele
apontado pra todo lado – desde que não seja para o próprio, é claro (até onde se sabe, o
tamanho do coração não prejudica as funções neurológicas responsáveis pelo senso de
autopreservação). Pessoas que sofrem de coração apequenado tendem a acumular
compulsivamente tudo o que há pra se acumular, e – suspeita-se que por uma deficiência
cognitiva – possuem uma maior propensão a confundir coisa com gente e gente com coisa. A
lei geral é: Quanto maior o peito dessas pessoas (em que batem assim, com os punhos, numa
atitude que divide psicólogos e neurocientistas) e mais levantado mantiverem o queixo ou o
nariz, menor ainda é o coração – Cujo tamanho reduzido parece não prejudicar o sistema
cardiovascular; ao contrário, frequentemente tais pessoas aparentam ter o sangue até mais
quente, e mais rapidamente também lhes sobe à cabeça. Portanto, fique atento: Se você
suspeita que alguém próximo à você possa sofrer de Pequenismo-Cardíaco, evite contradize-
lo, pois sua condição impossibilita funções tipicamente humanas, tais como a audição, a
compreensão de sistemas complexos e, acima de tudo, a empatia. Claro que isso não cabe a
mim! Quem sou eu para esmiuçar as causas e consequências de tão misteriosa enfermidade?
O catedráticos que me perdoem, mas temo pelo bem-comum, pois acredito não termos
presenciado na história do ocidente, doença infecto-contagiosa tão perigosa à raça humana
desde a peste-negra ou o cheque especial.

Embrulho

Josias saiu com aquela caixa debaixo do braço. A criatura ficava especialmente
inquieta às segundas-feiras. Ele não a comprou, nem a achou, nem a ganhou. Ela nasceu ali,
dentro da caixa, e na caixa Josias a mantinha. Se reconfortava porque sabia que todos, maior
ou menor fosse, tinham um Desespero guardado. Se apequenava aos sábados de noite,
quando folgava às funções que lhe atribuíam os dias úteis, mas crescia e, às vezes, acreditava
incontrolável quando (como de costume) era obrigado a fazer o que lhe mandavam por uma
recompensa que de nada serve ao Desespero. Comprava camisas, calças, pagava jantares,
financiava carros, esborrifava perfumes, mas nada, absolutamente nada que pagasse acalmava
a criatura. Ia aprendendo a lidar, enquanto mantinha-o cativo, mas sabia que, ora ou outra, a
coisa ficaria feia, e ninguém mais, em todo o mundo, conseguiria controlar essa besta que se
apequena e se agiganta. Até pensava libertar esse Desespero, pois havia boatos de que, uma
vez livre, viraria Esperança e mudaria tudo que é injusto no mundo. Mas o Medo, pequeno
duende que nos sussurra aos ouvidos, está sempre nos dissuadindo. Medo; o carrasco das
Esperanças, e domador de Desesperos.

Urbe; O Corpo que se ignora

Os corpos se arrastam para as estações de metrô, calados e cambaleantes, mastigados


pela noite. Por trás dos prédios, a manhã rançosa cobre nossos corpos frustrados. Os vagões
disparando sob o concreto da cidade e suas estruturas aracnídeas de aço; os ônibus e carros
fluindo por seus contornos e ranhuras, pintando tudo de reflexos imprecisos em branco, prata,
cinza, azul, preto e uma porção de logomarcas japonesas. Eu e você e eles na simbiose do
abafado desespero urbano, transformados em Nós nas faixas de pedestres e enchendo os
copos e pontos de ônibus com os olhos sonolentos. Enquanto uns vomitam mágoas aos pés de
quem quiser ouvir, outros (a maior parte, suponho) engolem tudo a seco e limpam o queixo,
desaparecem entre os fones de ouvido e sonos intermitentes batendo suas cabeças nos vidros
do coletivo, mastigados pela noite. Uma tristeza amarga, muito sutil e quieta, empurrando
todos nós, cada qual com sua tristeza aguda desatinando em segredo, silenciosos, subindo e
descendo escadas rolantes e andaimes e elevadores. Você quase pode ouvir o ranger da
insatisfação, o ruído dos ossos e vertebras vacilando sob o peso da espoliação, do desejo, dos
olhos inflexíveis das capas de revistas de fofoca e moda e estilo de vida. E é quase tão alto
quanto as buzinas e motores e britadeiras, é quase tão alto quanto os arranha-céus e egos.
Eu.
E Você.
E Eles.
Na simbiose do abafado desespero urbano transformados.
Nós.

Química

Que professor pode explicar as químicas dos corpos? Há sementes que florescem nos
mais diversos peitos, mas que fruto nasce do encontro das almas que se desdizem? As bocas
beijarão e os corpos suarão, mas não há florescer que se possa obrigar em Árvores-almas que
se desconhecem. É a distância invisível, mas inquestionável. E nosso não-foi-dessa-vez
permanece; como permanece o mistério de seus porquês.

Aceno

Fumávamos um cigarro na esquina quando percebi, por cima do seu ombro, uma
menininha a encarando do outro lado da rua. Fiz sinal com a cabeça, e quando ela se virou, a
menina abanou a mão no ar. Ela olhou prum lado, pro outro, pra mim, e depois pra ela de
novo. Acenou de volta, meio confusa meio desconcertada. Não se conheciam. A verdade é que
ela morria de medo de crianças e de seus grandes olhinhos. Há algo inexplicável nelas, como se
lembrassem de alguma coisa que nós, adultos, esquecemos no correr dos anos. São
aterrorizantes, disse. Concordei em silêncio, por achá-las mais curiosas do que medonhas. Mas
é de se pensar, mesmo. O que será que a gente precisa desaprender pra finalmente aprender
o que nascemos sabendo?

Miudezas

Há dias em que o contato humano se faz custoso. Acordamos com nossas fragilidades
inflamadas, e o simples ato de nos vestir já fere as chagas. É quando o coração chama pra
pertinho dele, exigindo palavra, atenção, um pouco de carinho. O que entendemos por
personalidade se faz pesado, e o corpo pede claustro para nos lembrar que a existência é
delicadeza dessas que ignoramos por demais.

Metamorfose

Aos vinte e cinco anos, o rapaz nunca havia feito a barba. Fizera-se por conta própria
avolumando-se e escurecendo no rosto. Pela primeira vez a desfizera, e foi como se refizesse a
cara.
A Glândula da Saudade

Há quem diga que se localiza atrás do coração e entre os pulmões, e que, quando
inflamada, os envolve e os comprime, gerando dificuldades respiratórias e uma sensação de
apequenamento do peito. Embora seus efeitos colaterais gerem algum desconforto, dizem
que a inflamação da glândula da saudade é sinal de saúde passadística; um desdobramento
natural de todo e qualquer sentimento positivo alimentado pela visão, audição, olfato, tato,
paladar e suas hiperfunções ainda não descritas pela ciência. Também dizem que ela é
responsável por colorir lembranças, gerando também sorrisos imbecis em pontos-de-ônibus e
calçadas, e locais públicos em geral.

A Hiperfunção

Os cientistas a ignoram há décadas, afirmando ser um desdobramento subjetivo de


cada um dos sentidos humanos conhecidos, atribuindo suas causas à Dislexia-léxica, ao
Complexo Ultra-Poético, à Síndrome Compositorial, ao Musicistismo, entre tantos outros
supostos estados patológicos da mente cartesiana. Para melhor apreciação da hiperfunção
dos sentidos, é necessário um ambiente descontrolado, onde seus sentidos possam ser
estimulados em conjunto: Hoje, a escolha para uma descrição do meu objeto de estudo, foi o
Carnaval!

Um Tipo de Hiperfunção da Visão

Em meio à folia, almas solitárias e não-solitárias, por vezes caçam olhares; olhares
cruzados, olhares que se desenrolam em sorrisos, olhares cruzados que se transmutam numa
surpresa estampada nos olhares cruzados: grandes conversas sem palavras por entre as
cabeças cruzando avenidas, e ombros flutuando avenidas, e cores pintando avenidas, por
entre outros olhares entrecruzados, contatos tão significantes e breves, que inúmeras vezes
inflamam a glândula da saudade em poucos segundos, bastando apenas descolarem-se assim
os olhos arrastados pelo todo de gente. Há quem leve isso muito a sério, e trate a caça de
olhares com grande solenidade, sendo ás vezes até mais importante do que a música; ás vezes
mais importante do que o próprio carnaval – O que é uma grande besteira, já que a música e a
farra são condições fundamentais para uma caça de olhares saudável.

Um Tipo de Hiperfunção cruzada da Audição e do Tato

Os tambores ecoam muito alto, muito-muito alto, e de tão alto, lugar nenhum é
cabível, lugar nenhum o comporta, que não o peito, e lá o surdo lhe toma as batidas do
coração, tua caixa torácica ecoa por entre os prédios, o afoxé lhe escala a nuca, levantando os
pelos, como lhe coçasse todo, e o corpo estremece, os trompetes e caixas em suas têmporas;
o corpo, amplificando os som, vibrando as janelas de apartamentos e vitrines, e os pulos, as
pernas em movimento, a euforia, os esbarrões cheios de desculpas, ou sem nenhuma, onde
falam só os olhos na clara lembrança de que não-me-toques do horário comercial ficaram
guardados em casa, junto ao relatório de quinta-feira.

Um Tipo de Hiperfunção cruzada do olfato e do paladar

Um oceano de aromas e sabores onde boiar, onde cada um deles é o redemoinho que
te arrasta descarga abaixo, pelos largos ou estreitos encanamentos do tempo: O chiclete de
canela em outra boca, sabor de quinze anos, uma garota mais velha e mais experiente te
mostra funções alternativas das últimas cadeiras e da sala de cinema; o cheiro do perfume
conhecido da desconhecida que te cruza a multidão sem que você a note, percebendo sua
passagem apenas pelo cheiro que abandonou em seu colo do nada, e do nada tem dezessete
anos novamente e está ouvindo tristezas adolescentes de sua melhor amiga com quem já não
fala e nem se importa, graças ao espaço das vidas que se desdizem; o fim da farra e a noite no
centro com seu cheiro de chuva ácida e ar-condicionado e exaustores te remetendo a outra
cidade, em outro país, onde tudo o que você tinha era quase nada, o que era tudo o que
precisava; o cheiro de espetinho na esquina que você não pode pagar se quiser voltar pra casa
e que te lembra churrascos, ainda muito criança, no interior, enquanto corria e brincava e
imaginava como seria ser adulto sem se dar conta de que não havia grandeza maior do que ser
criança; e por fim, o gosto de vômito na boca que te lembra de tantas situações anteriores que
você mal pode contar, mas não te faz lembrar nada da noite anterior, além do óbvio, é claro.

Suponho que Elton John já Saiba

Com as teclas do corpo, é preciso atenção: Se as graves afundam o espírito em


mergulho íntimo, podem também arrebentar em vácuo na boca do estômago. O mesmo com
as oitavas mais agudas: por vezes ardem os ouvidos num estremecer estridente de tímpanos,
por outras, assopram gentis, arrepiando nucas em volúpia. A essa altura, cê já deve saber que
não basta ser músico estudado, uma vez que cada um guarda uma misteriosa escala em sua
carpintaria improvável e acabamento próprio. Não há regra geral para sons singulares, nem
maestria sem intimidade e amor por sua música. É o mais delicado dos órgãos, e não há
mesmo Kuhn Bösendorfer ou Steinway que se compare ao Corpo Humano.

Dito Pelo Não Dito

Ficar o dito pelo não dito: Expressão popular que significa Não chegar à conclusão nenhuma;
Algo que não está resolvido.

Dito pelo não dito: Dos Prazeres Matinais


As Pernas cruzavam as barracas coloridas, os Ouvidos registravam o anúncio do peixe e
das verduras. Mas o Nariz farejava, arrastava o corpo direto até o pastel para satisfazer sua
amante secreta. Não havia dieta que resistisse a esta conspiração entre Nariz e Boca.

Dito Pelo Não Dito: Da Literatura e da Jornada

Os olhos percorriam as linhas da página. Depois atravessavam a janela do ônibus para


muito além das portinhas de salões de beleza, botecos e quitandas que passavam. Não via
nada além do que as linhas mostraram; as linhas e a memória.

Dito Pelo não dito: Da Alegria e do Sagrado

As costas e testas escorriam o calor da noite. Os tambores pulsavam no peito. As


pernas giravam e as mãos balançavam as saias. Isso tudo era óbvio; as imagens entravam pelos
olhos e os batuques pelo ouvido, enquanto o calor saía pelos poros. Mas por onde entrava e
saia os Guias e os Orixás?

Dito pelo não dito: Da Espera e Da Mudança

As pernas tremiam de impaciência. A boca roía unhas. A mão batucava a perna. Os


dedos ensaiavam escalas sobre a mesa. Depois as pernas levavam o corpo – pra lá e pra cá, pra
lá e pra cá – com os olhos ancorados no copo de mijo e a boca cuspindo unhas. Nunca cinco
minutos tiveram tantas horas. Quando o teste revelou dois traços, os olhos se arregalaram e
escorreram torrentes. A boca tapada pela mão sentia o coração gritar. Chorava.

Dito pelo não dito: Do Casamento

Sobre a mesa, quatro mãos. Duas que procuram; uma que some, outra que esquiva.

Dito pelo não dito: Da (In)Diferença

Levava nos ombros o peso de quatro mundos; quatro crianças. Um único par de
ombros, cansados já tão novos. Quantos mundos o outro par de ombros não abandonara para
dar a si mesmo toda a leveza que se pode querer? Há ombros que simplesmente não dividem
peso; há ombros que não carregam mundos.

Dito pelo não dito: Da Desigualdade

Os pés grandes vestiam chinelos muito pequenos. Passaram para o lado do ar-
condicionado. Pararam por pouco tempo. Quatro pés vestindo sapatos lustrados os
acompanharam até a saída.

Dito pelo não dito: Do Medo e da Agressão


Malditos olhos, pensava. Malditos olhos que deslizam sobre este corpo. Sobem e
descem sobre ele sem saber ou sem se importar com permissões, pensava. Malditas as bocas
que assoviam e que disparam a dizer estranhezas, normais apenas para aqueles ouvidos que
nunca ouviram de outras bocas as mesmas intimidações, pensava. E pensava apertando as
unhas contra a palma da mão, enquanto as pernas aceleravam os passos, mais rápido, mais
rápido, até quase correr. Só seus corpos conhecem o tremor ao encontrar um corpo maior sob
as luzes alaranjadas dos postes, eu penso. E penso sem saber de nada, como já me disse uma
boca; e que bom que disse, penso. Agora penso.

Dito pelo não dito: Do extermínio Velado

As bocas diziam ser engano, mas os números não mentem. O rádio passou a descrição
e o dedo puxou o gatilho porque sente medo do medo que bota por lhe ser permitido puxar o
gatilho. Naquela noite, foi a sua pele que lhe determinou a sentença.

Dito pelo não dito: Da decisão pelo Exterminador

A boca não se continha, falava e falava e falava sem parar. Os pés sustentando a boca
lá no alto, equilibrada no palanque. Muitos olhos admiravam a eloquência das mãos e as veias
da testa, mas os pares de orelhas que escutavam atentamente sabiam; não dizia nada a boca.
Pelo menos nada de novo.

Potrebbero piacerti anche