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Sociedades, mobilidades, deslocamentos: os territórios da espera. O caso dos


mundos americanos (de ontem a hoje)

Article · November 2011


DOI: 10.4000/confins.7274

CITATIONS

3 authors, including:

Alain Musset Laurent Vidal


École des Hautes Études en Sciences Sociales Université de La Rochelle
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Confins
Revue franco-brésilienne de géographie / Revista franco-brasilera de geografia

13 | 2011 :
Numéro 13
Projet de recherche / Projeto de pesquisa

Sociedades, mobilidades,
deslocamentos: os territórios da
espera. O caso dos mundos
americanos (de ontem a hoje)
Sociétés, mobilités, déplacements: les territoires de l'attente. Le cas des mondes américains (d'hier à
aujourd'hui)

LAURENT VIDAL , ALAIN MUSSET ET DOMINIQUE VIDAL

Notes de l'auteur
Tradução: Carina Sartori (Mestranda em história - UFSC) ; revisão: Thiago Rocha
(Doutorando em geografia – UFRJ – em bolsa-sanduíche na Universidade de La Rochelle -
CRHIA)

Texte intégral

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1 Os fenômenos de mobilidade e de deslocamento se afirmam como
características essenciais das nossas sociedades contemporâneas. Para tanto, longe de
serem fluidos, homogêneos ou lineares, estes deslocamentos são pontuados de tempos,
mais ou menos longos, de espera. Tendo por origens razões técnicas, administrativas
ou políticas, tais momentos encontram bem frequentemente uma tradução espacial:
territórios acolhem estas sociedades em espera.
2 Examinar estes territórios da espera e a multiplicidade de formas com que se

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revestem, estabelecendo suas dimensões, compreendendo seus estatutos jurídicos, suas


articulações com o espaço circundante, suas temporalidades específicas, bem como a
variedade dos jogos econômicos e sociais que se desenha - é o desafio que se dá ao
grupo de historiadores, geógrafos, sociólogos e literatos, reunidos no projeto
TERRIAT1.
3 Para tal investigação, os mundos americanos, nascidos do deslocamento
(voluntário ou forçado) de populações de origens diversas que deixaram a sua marca
nos territórios de que se apropriaram, se oferecem como um terreno de estudo
particularmente adaptado. Durante muito tempo terra de refúgio para perseguidos de
todas as confissões, depois Eldorado sonhado para milhões de imigrantes, o continente
americano é, ainda hoje, o teatro de numerosos deslocamentos humanos: migrantes
deixando (ou fugindo) os campos para as cidades tentaculares, clandestinos que
cruzam os muros do medo, refugiados climáticos aglomerados dos campos de seca ou
instalações precárias (como após o Katrina).
4 Este texto é a base comum desta investigação (coletiva e interdisciplinar) que
se dá por objeto de estudo a análise dos territórios da espera nas sociedades
americanas. Apresentaremos, primeiramente, os grandes desafios heurísticos e
metodológicos desta temática, antes de propor uma reflexão sobre a respectiva
contribuição das principais disciplinas engajadas nesta análise.

1. Escrever, descrever os territórios da


espera e as identidades em trânsito:
introdução a uma pesquisa
interdisciplinar
5 O desafio para o qual convidamos é o de uma mudança de paradigma analítico:
abordar os territórios da espera significa privilegiar a observação das situações
liminares onde se experimentam os limites da sociedade, do exercício do poder do
Estado e, hoje, os limites da modernidade.

Territórios da espera: o sentido das palavras


6 Mais do que nunca, para tal investigação, é importante dar atenção especial
aos sentidos que abrangem cada um dos termos incluídos na expressão «territórios da
espera».
7 Se pensarmos as línguas do continente americano como chave de entrada,
constatamos que o francês, o espanhol e o português possuem apenas um termo:
«espera», «attente», que abrange dois sentidos claramente distintos - a imobilidade de
um lado, e a esperança do outro. A língua inglesa oferece, por seu lado, três palavras ou
expressões que permitem apreender de maneira ainda mais fina a variedade dos
sentidos que podem abranger a espera.
8 - To hold on: indica um corte, «tempo morto», uma suspensão, um entre-deux 2 , mas
deixa prever uma promessa de retomada. Do famoso «please hold-on» para o atual
onhold marketing 3.
9 - To wait for: indica uma projeção, um objetivo a atingir, um horizonte de espera. A
espera retorna aqui uma predisposição psicológica, um afetar. Cria uma tensão

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projetada para o objetivo a atingir. «A palavra “waitier” [é] uma variante normanda de
“guaitier” do francês antigo. Esperar é, também, “guaitier” ou espreitar 4 ».
10 - Standstill: ponto morto, pausa, situação na qual algo não se move ou não caminha.
Também na dimensão jurídica: prazo suspensivo nos procedimentos jurídicos.
11 Observamos que estas diferentes definições da espera contêm em germe, de
maneira implícita ou explícita, dimensões espaciais. A imobilidade é necessariamente
localizada: remete, por conseguinte, ao lugar onde se vive esta espera (que seja
fechado, saturado ou coercitivo), lugar onde o homem faz frequentemente a
experiência da tirania da espacialidade. Quanto à esperança, ela se cristaliza em torno
de um lugar desejado, imaginado, sonhado (desde a famosa cidade de Deus de Santo
Augostinho, passando pela ilha utópica de Thomas More até avatares contemporâneos
de países de abundância para os migrantes de países pobres). Este lugar distante
invade o presente, fagocita-o em certa medida, ou seja, o esvazia da sua substância
temporal e espacial5. Mede-se, a partir daí, o quanto esses territórios da espera
induzem ou constrangem a possibilidade de ação : sonhados, geram a mobilidade;
sofridos, impõem a imobilidade.
12 Daqui por diante, interessa de maneira mais precisa a noção de «território»,
como é utilizado na expressão «territórios da espera», estes aparecem, ao primeiro
olhar, sob duas formas claramente distintas:
13 - A de um espaço fechado, separado, distinto, possuindo uma forte visibilidade. É
marcado por um uso social quase exclusivo que enquadra um dispositivo jurídico
específico. É pensado para por em espera temporariamente grupos em deslocamento -
trate-se de razões administrativas ou políticas, médicas ou humanitárias - mas
também para separar os grupos em espera do resto da sociedade circundante. Citemos
aqui: as estações de quarentena (lazaretos), a hospedaria de imigrantes, a zona de
espera, o campo de exilados ou de refugiados.
14 Se fosse necessário reter uma forma que encarna estes territórios, poderia ser a ilha
(«objeto inconstante 6 » de acordo com Franck Lestringant). Com efeito, inicialmente,
são as ilhas que são privilegiadas para a instalação de quarentenas ou hospedarias de
imigrantes. A ilha apresenta a vantagem de ser espacialmente distinta do continente.
Ela cria, pois, a ilusão de um território separado, externo, espécie de peneira para
selecionar os candidatos à entrada no território nacional.
15 E muitos destes territórios fechados de espera vivem sob o modo da insularidade.
Assim o campo (de refugiados, trânsito) se apresenta e se administra sob forma de ilha,
distinta juridicamente das regras de direito comuns. Hoje, as zonas de espera são ainda
ficções jurídicas, pois permitem tratar uma pessoa que se encontra fisicamente no país
como se estivesse no exterior do país.
16 - A outra forma que tomam estes territórios é a de um espaço aberto, mas, no
entanto forçadoou saturado: aquele dos clandestinos ou dos engarrafados, por
exemplo. A situação de espera cria um uso inesperado deste espaço que vem se
sobrepor (transitoriamente) ao seu uso comum. A espera é uma das modalidades de
uso destes espaços: ela não os define. Além disso, não é enquadrada por nenhum
dispositivo jurídico específico. É difícil fazer uma lista exaustiva destas formas
territoriais mais abertas que, por um tempo ocasional ou repetitivo, acolhem grupos em
espera: ontem, o albergue e o porto, mas também a ponte do navio do emigrante; hoje,
a estação rodoviária ou o aeroporto, o check point. Vai das cidades de fronteira onde os
clandestinos procuram um meio para cruzar o muro ou os arames farpados, até a via
expressa ou a auto-estrada urbana engarrafada, ou a sala de espera de um serviço
administrativo, onde nascem solidariedades efêmeras e se instala uma economia da
espera.
17 Não fosse essa noção de certa forma mal empregada, seria possível inscrever esta

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análise na perspectiva do estudo dos «outros espaços», as famosas heterotopias cuja


importância Michel Foucault assinalava desde 1967, posto que, frequentemente, são
espaços comuns que, por um tempo (de espera) são investidos de um outro sentido
social e simbólico 7 .
18 Todos os territórios, fechados ou abertos, vivem a espera de um modo transitório. E
é precisamente nestas transições, nesses entre-deux, que tomam forma, de maneira
imprevista, inesperada, as coalescências (para retomar aqui um conceito de Emile
Durkheim que o sociólogo Henri Desroche propôs precisamente aplicar a uma
sociologia da espera 8 ). Estas coalescências, que escapam, na maior parte do tempo a
qualquer tentativa de controle, definem novas leituras do espaço e das suas
potencialidades, novas relações com o tempo, novas solidariedades… em suma, novas
identidades.

Um fato social total


19 A espera, tal qual ela se vive, se desenrola, se pratica, nos territórios da espera
deve ser apreciada como «fato social total». Põe em jogo, com efeito, múltiplas
dimensões:
20 - psíquicas: a espera pode ser inibidora ou exaltante.
21 - fisiológicas: a espera se experimenta através do corpo: seja ele um mal necessário
que se deve mascarar, esconder – o espaço do clandestino - seja ele comprimido,
maltratado, nos espaços fechados. A experiência da espera é, assim, corporal.
22 - sociais: a espera é criadora de coalescências, experiências sociais inesperadas.
23 - econômicas: atividades são pensadas em função dos tempos de espera: vendedores
ambulantes nos engarrafamentos, donos de albergues, passadores… sem falar no «on
hold marketing».
24 - jurídicas: reencontramos aqui o standstill, como efeito suspensivo, ou a noção de
estado de exceção (G. Agamben 9 ).
25 - sensíveis: a espera provoca outra percepção do tempo pela apreciação da sua
duração - este, nos recorda Bergson, é o tempo vivido, tempo elástico que se estira, se
acelera ou contrai de acordo com as situações. Nestes espaços confinados, passado,
presente e futuro são definidos de outra maneira. Com efeito, longe de ser um tempo
morto, o tempo de espera é um tempo de reinvenção da temporalidade: a situação de
crise que conduziu à espera obriga o indivíduo, o grupo, a comunidade, a reconsiderar
as categorias de tempos que lhes permitem agir sobre o presente e de se projetar para
o futuro.
26 - culturais: a espera é também um momento de aculturação.
27 - geográficas: o espaço pode ser coercitivo ou esconder recursos a se descobrir.
28 - políticas: nas zonas de exceção, o poder é exercido de outra maneira.
29 Deste ponto de vista, dar conta da espera, em outras palavras, do que acontece
quandonada acontece (ou quando nada é suposto acontecer) 10 , é endossar uma atitude
poética, dado que a poética ambiciona precisamente a compreensão global, conjunta e
instantânea de uma situação 11. E porque, então, não tomar como definição operacional
de um território da espera a fórmula de René Char: «um enclave de inesperados e
metamorfoses 12»; ou esta outra que poderia descrever a localização dos territórios: «ao
centro do desvio13». Há, também, Aimé Césaire: «o não-tempo impõe ao tempo a
tirania da sua espacialidade 14». Não se trata de tomar estas afirmações como absolutas,
mas como convites a interrogar os laços que elas sublinham, e utilizá-las como
«mediadores» (Caillois).
30 Mas importa também levantar uma dúvida sobre um outroobstáculo possível. Com

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efeito, a espera pode ser uma metáfora fácil para descrever muitas das situações
sociais. Nem tudo é espera, e nem tudo é território da espera. No âmbito deste projeto,
intitulado: «sociedade, mobilidade, deslocamentos», os territórios da espera designam
especificamente os espaços destinados voluntariamente ou servindo involuntariamente
a por em espera populações deslocadas ou em deslocamento. Há, por conseguinte, uma
dimensão coletiva necessária (e deste pontode vista, mesmo o clandestino não está
sozinho, uma vez que irá buscar activaruma rede de informações).

Campos de estudos
31 Este projeto propõe esclarecer, particularmente, três campos de estudos que
oferecem muitas oportunidades para experimentar uma mudança de foco analítico,
não mais motivada pela observação das mobilidades, dos deslocamentos e outras
migrações, mas pelos tempos de parada, de pausa e de espera que pontuam os fluxos.
No cruzamento de olhares disciplinares complementares (geografia, história, sociologia
e literatura), convém doravante descrever e compreender os territórios que acolhem
estes tempos de espera, os jogos sociais e as identidades que se constroem.
32 - Tipologia dos territórios da espera: aqui se analisam as configurações territoriais
das situações de espera comparando duas modalidades: a dramática e excepcional dos
emigrantes, de migrantes e refugiados, e a mais comum que toma lugar nas brechas
que se abrem no cotidiano das sociedades. Trata-se igualmente de elaborar uma
tipologia dos territórios que abrigam situações de espera: desde o campo -
especialmente desenhado e destinado à esta função - até via expressa urbana
engarrafada, sem esquecer as paisagens da clandestinidade. Convém, também,
descrever e compreender a evolução dessas formas no tempo. Pode-se levantar as
invariáveis ou as constantes da multiplicidade das formas espaciais que cobrem estes
territórios da espera? Quais são as formas sociais que aí se desenrolam? A partir de
quais estatutos jurídicos se erguem estes territórios?
33 - Economia da espera: aqui se interroga o comum dos dias ou das horas num lugar
de espera: quais atividades sociais ou econômicas nascem nestes lugares confinados
onde é experimentada a experiência de um «tempo elástico 15». Entre a prostituição e a
venda ambulante, importa descrever e compreender as formas espaciais do jeitinho.
Um importante questionamento se refere ao estudo das transformações sociais destes
territórios da espera: a experiência do exílio e os campos conduzem, às vezes, a uma
perturbação dos modelos sociais. Tais perturbações relativas à economia das
sociedades podem ser observadas nos campos de migrantes das Américas? Também se
trata de tomar a medida da inoperância social: Giorgio Agamben demonstra, com
efeito, quanto a inoperância pode ser percebida como um paradigma das formas
modernas de governo dos homens: os Estados modernos assim fizeram delaum modo
de gestão das multidões humanas, e nomeadamente dos migrantes16. Postos em
situação de espera, em lugares específicos, onde nenhuma atividade econômica legal
lhes é possível, sua inutilidade social se torna patente - cada indivíduo se reencontra
sozinho, nu, perante a administração de Estado. Os territórios da espera se
enriquecem, assim, dessa outra dimensão: são também espaços de inoperância. Mas
como se manifesta a gestão administrativa da inoperância?
34 - Memórias e identidades: os territórios da espera não são estes «não lugares» que
Marc Augé evocava em 1992, arranjando nesta categoria os espaços incapazes de criar
«nem identidade singular, nem relação, mas solidão e semelhança 17 »: a título de
exemplo, o autor cita o campo do trânsito. Sabemos que não é possível manter tal
definição: nestes territórios, «lugares de um possível espaço público18 », ainda que

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domine um sentimento de incerteza, identidades podem, no entanto, tomar forma.


Estas não apagam necessariamente as identidades anteriores: elas são, ao contrário,
um recurso suplementar do qual os indivíduos se apoderam em função das suas
necessidades, e das estratégias sociais que definem para fazer face a este tempo
incerto. Trata-se, assim, de descrever a variedade das identidades que nascem no
partilhamento da espera num lugar confinado, por indivíduos que não se conhecem
necessariamente, mas que subitamente são vinculados por uma comunidade de
destino. Em situação de fragilidade, esta invenção de identidade pode consistir em uma
reativação de antigos quadros – religiosos, étnicos - supostos a oferecer uma
segurança 19. De resto, os museus que foram organizados partir dos sítios de Ellis
Island, nos Estados Unidos, lugar de trânsito, de espera e esperança, descrito
minuciosamente por Georges Perec20 ou da Hospedaria dos Imigrantes em São Paulo21
testemunham a importância destes lugares na formação de identidade dos imigrantes.
35 Hoje, estes territórios da espera (afora os espaços engarrafados e os aeroportos)
majoritariamente são ocupados por homens lentoscomo diz Milton Santos22 , os pobres
do planeta, os excluídos da velocidade que a globalização impõe a todos e a qualquer
coisa. Evidentemente, não se trata de opor a espera à velocidade, isto seria um grave
erro. Ao contrário, neste mundo globalizado caracterizado por um « tempo
desorientado», os espaços de espera, dizemos, são os lugares de reformulação da
relação com o tempo. Como, então, pensar o enraizamento territorial dessas
identidades e dessas memórias?

Os territórios da espera: aportes


disciplinares
36 Esta investigação se inscreve, assim, num encontro entre dois domínios de estudos: o
das migrações e deslocamentos, e o da inscrição territorial das atividades humanas e
das identidades sociais. Perante a complexidade destes fenômenos, nenhuma disciplina
sozinha tem competência plena sobre o conjunto destas questões. Só um diálogo
interdisciplinar pode oferecer as condições para o estabelecimento de uma metodologia
adaptada ao estudo dos territórios da espera. É por isso que, a fim de assinalar ou
definir as noções, hipóteses e metodologias que estão no coração de nossa análise, se
torna indispensável fazer pontuações sobre o que cada disciplina pode contribuir em
seu domínio 23.

Por uma história social da espera


37 É preciso reconhecer de imediato: como na maior parte das disciplinas das ciências
sociais, a questão dos “territórios da espera” forma uma espécie de ângulo morto na
pesquisa em história. Este vazio historiográfico não deve, entretanto, nos proibir de
estabelecer um estado da arte. Com efeito, diversos trabalhos de historiadores
concernentes às migrações e aos deslocamentos, os campos, lugares de trânsito ou
outras formas de internamento, mas também a formação (ou negociação) das
identidades sociais, ou ainda as percepções e usos sociais do tempo, ganham luz
através deste prisma.
38 Neste conjunto heteróclito, só um obra - já antiga - poderia fazer figura de exceção -
La naissance du purgatoire 24 . Mesmo não se tratando de deslocamentos físicos,
Jacques Le Goff descreve e analisa a passagem, no Ocidente cristão, de uma concepção

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da purgação e da espera como momento indefinido para purgar penalidades, para um


lugar de trânsito entre a Terra e o Céu ou o Inferno: o Purgatório. No meio do século
XII a passagem do adjetivo ao substantivo, marca a invenção de uma geografia do Além
e da sua ocupação política. Entre as características deste Purgatório nos centraremos
em dois que nos interessam de maneira essencial. O tempo como concebido no
Purgatório é simétrico ao dos mercadores: as penitências e indulgências são uma
aplicação para o Além das novas artes de quantificar. Além disso, Le Goff insiste no
dinamismo da topografia do Purgatório, «um lugar orientado25 », ou seja, que se
percorre desde a entrada até a sua saída. Retemo-nos neste estudo, para a nossa
análise dos territórios da espera, com uma dupla necessidade: a de se interrogar sobre
a especificidade da temporalidade nestes territórios, e a de compreender a dinâmica
topográfica em curso destes territórios.
39 Por mais ricas que sejam estas pistas, elas não são por si só suficientes para
descrever o que poderia ser uma metodologia adaptada à análise histórica dos
territórios da espera. Uma primeira leitura transversal dos trabalhos que podem se
unir a este domínio de estudo, faz claramente evidenciar que quando há reflexão sobre
a espera, falta um pensamento de espaço 26 , e quando há pensamento de espaço, este
não se associa às formas da espera. É por isso que desejamos conceber este balanço
historiográfico como uma forma de prospecção a fim de medir os desafios
metodológicos e heurísticos de uma posição de correlação entre estes dois domínios de
reflexão.

Migração e territórios da espera


40 Comecemos pelos trabalhos sobre as migrações e deslocamentos. Se este campo de
estudo se interessa, em primeiro lugar, com a instalação (ou mesmo assimilação) de
migrantes na perspectiva do país de acolhimento, ele foi renovado profundamente
nestes últimos anos, voltando a dar lugar a variedades de percursos e ritmos nos
desenrolar desses deslocamentos 27 , interrogando-se sobre as condições de partida 28 .
Mas se trata de ir mais além e de se interrogar sobre os “tempos mortos”neste
trajeto.Nancy Green chamou a atenção dos historiadores para os riscos de uma leitura
teleológica do percurso migratório, convidando, ao contrário, a «historicizar os lugares
e os momentos de passagem libertando o seu profundo sentido sócio-antropológico 29 ».
Em 2005, em conclusão de sua investigação sobre o deslocamento dos habitantes da
cidade de Mazagão do Marrocos à Amazônia, Laurent Vidal convidava por uma
«história social da espera 30 »: estudar o deslocamento de uma comunidade significava
também dar conta dos tempos e dos lugares da espera, assim como das metamorfoses
que lá tomam lugar. Convidamos assim para uma mudança de paradigma analítico
afim de não destacar apenas as seqüencias ou etapas de um deslocamento, mas
também de compreender o que se cria nestes espaços intersticiais, nestes momentos de
transição.
41 Os «borderland studies» mudaram o foco sobre as fronteiras como espaço -
freqüentemente metafórico - entre dois lugares 31. Mas eles enfatizaram
demasiadamente a construção identitária dos espaços regionais em vez de entender as
fronteiras como lugares de passagem. Os trabalhos de Philippe Rygiel sobre as
migrações brancas, ao abordar «as polarizações do espaço do migrante 32», não evocam
estes territórios da espera.
42 As grandes investigações sobre o deslocamento dos homens na época moderna ou
contemporânea, bem como os portos de emigração, nunca focaram realmente na vida
cotidiana das populações em espera. Camille Marie abordou os problemas municipais

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para as cidades de passagem dos emigrados: alojamento, controle… Daniel Roche, com
seus Humeurs vagabondes 33, não interroga os territórios da espera. Enquanto ele
insiste sobre uma ligação crescente entre movimento e controle a partir do século XVI,
os lugares de inatividade não o preocupam. Evoca apenas albergues, que define como
«um espaço liminar, nem totalmente marginal, nem totalmente integrado 34 » e cujas
atividades dão relevo a uma «economia do acaso». E o mesmo para Alain Montandon,
que coordenou a obra coletiva Le livre de l’hospitalité. Accueil de l’étranger dans
l’histoire et les cultures35, que em nenhum momento visa a uma reflexão específica
sobre os lugares de espera do estrangeiro. Laurent Vidal formulou hipóteses em
Mazagão: «Seja a emigração voluntária ou organizada por um poder qualquer, o
emigrante nunca chega ao porto no mesmo dia da partida. Geralmente são dias ou
semanas que deverá esperar - uma embarcação, uma autorização… E que faz ele
durante este tempo? Onde se aloja? O que come? Com quem se encontra? Trata-se da
sua primeira experiência da cidade? Em um porto, os rumores espalhados por
marinheiros e taverneiros logo se difundem: eles conheceram ou ouviram falar do país
de destinação. Seria ilusório então pretender que a pessoa que acaba de embarcar é a
mesma que chegou alguns dias ou semanas antes: na verdade, está alimentada das
experiências da espera e do lugar de espera 36 ».
43 Neste veio de pesquisa, se integram também as investigações sobre refugiados
e clandestinos. Seja nos trabalhos sobre diásporamarraneno Novo Mundo (por Nathan
Wachtel 37 ) ou sobre os refugiados huguenotes(por Didier Poton et Bertrand Van
Ruymbeke 38 ), se encontram reflexões sobre paisagens de clandestinidade, ou sobre a
necessidade de uma história subterrânea, tantos elementos que poderiam tomar lugar
numa reflexão sobre a importância dos territórios da espera no percurso destes
clandestinos ou refugiados. Tomemos o exemplo da diáspora huguenote nas ilhas
Caraíbas, errando entre as ilhas francesas, holandesas e inglesas, em busca de
informações para uma instalação definitiva, ou um regresso possível. Estas «ilhas de
espera» que se revelam a posteriori como uma etapa igualmente decisiva num
percurso espiritual.

Das ilhas de espera aos dispositivos da espera


44 Porque não aceitar esta metáfora das ilhas da espera e aplicar igualmente aos navios
que asseguram a travessia Atlântica? Ao exemplo de Marcus Rediker, os recentes
trabalhos sobre a escravidão, rompem com uma prática historiográfica que considera
os oceanos como «imensos espaços vazios e a-históricos», insistindo pelo contrário no
sentido da experiência da passagem do meio 39 . Ainda que a pergunta da embarcação
como lugar de espera não seja jamais formulada especificamente, Rediker convida a
dar conta de um triplo movimento à obra durante a travessia - violência, resistência,
criatividade (nomeadamente social) 40. Considerando o navio negreiro como uma
espécie de paradigma analítico, Rediker tem recentemente desejado ampliar, com
outros colegas, esta análise para outras passagens do meio 41.
45 E na chegada sobre o continente americano, o que significam os dispositivos
(Agamben 42 ) instaurados para o controle dos candidatos à emigração? Há primeiro as
estações de quarentena (lazaretos) 43 que serão adaptados a partir dos primeiros
movimentos importantes de imigração (nos anos 1830-40), sendo, a partir de fim dos
anos 1850, substituídos ao longo de todo o Atlântico e do Pacífico também, pelos
hospitais de imigrantes. Lá, também, os trabalhos tiveram lugar, mas antes numa
perspectiva monográfica 44 ou em função de um grupo de imigrantes: os italianos em
Ellis Island... Mas em nenhum se tentou compreender de maneira comparada o

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aparecimento e a organização destes territórios da espera dos candidatos à


imigração 45.
46 Estas estações ou hospedarias de imigrantes merecem um estudo comparativo:
apresentam fortes semelhanças, tanto na organização da arquitetura interna (serviços
médicos, escritórios do trabalho, refeitórios, polícia das fronteiras, administração…)
como sobre o tipo de população que recebem e o ritmo cotidiano. Nesta grande época
da industrialização das sociedades, são usinas de fabricar imigrantes. Após o
acolhimento médico, os emigrantes são sujeitos a diversos procedimentos
extremamente regulamentados antes de surgirem com a condição legal de imigrantes.
Aqueles com e aqueles sem um acordo decontratoexperimentampercursos distintos; as
mulheres sozinhas ou as crianças não acompanhadas, da mesma maneira que os
velhos, possuem procedimentos específicos. Ainda que diferentes, todas as estruturas
visam ao mesmo objetivo: verificar a adequação do emigrante aos critérios nacionais
do imigrante desejado. É o enxerto de um novo elemento ao corpo da nação ao qual se
assiste: o corpo dos imigrantes. A hospedaria assegura precisamente a passagem dos
corpos individuais dos emigrantes (suas múltiplas histórias, seus diferentes projetos de
vida…) ao corpo coletivo dos imigrantes. Listados, catalogados, postos em quadros (de
múltiplas colunas e linhas infinitas) eles compõem uma nova categoria social. No
momento das estatísticas sociais nascentes, eis um grupo facilmente identificável,
perfeitamente uniformizado - como um produto industrial. Para retomar a expressão
de Jacques Le Goff, estas hospedarias de imigrantes são também «lugares orientados».
47 Quanto aos campos de refugiados ou de migrantes, ao redor das cidades nas
Américas, já foram objeto de numerosas investigações. O caso do Hoovervilles nos
Estados Unidos tornou-se famoso a partir das Vinhas da Ira de Steinbeck: estes
campos de fortuna foram construídos às pressas pelo governo para fazer face à uma
situação de emergência e impedir que se derramassem nas cidades estas populações
desfavorecidas. Steinbeck redigiu uma série de artigos sobre estes campos46 que visitou
em 1936, abrindo a via para trabalhos seguintes47 . Em Fortaleza (Brasil), o mesmo
fenômeno teve lugar, no momento da grande seca de 1932: vários campos foram
construídos para canalizar as de famílias flageladas, e impedir que viessem engrossar
os arredores da capital de Estado e de fato lhes armazenar, esperando que pudessem
voltar à sua terra48 .
48 Estes trabalhos nunca realmente abordaram a interação entre espaço e espera.
É necessário identificar estes diferentes “campos” e se interrogar sobre as formas do
jeitinho dentro destes espaços fechados, controlados e coercitivos. Denis Peschanski,
no seu estudo sobre La France des camps, consagra algumas páginas à espera,
tentando distinguir o que é da competência do horizonte de espera dos internados, e
do aborrecimento. Reconhecendo que «a vida nos campos era marcada pelo
aborrecimento e o hábito», que «a ociosidade era dominante 49 », evoca os conflitos que
nascem da promiscuidade(conflitos entre gerações, perda de intimidade…). Mas
reconhece a dificuldade para tratar tal questão: «Se os mecanismos psicológicos são
muito semelhantes na maior parte [dos internados], é bem difícil reconstituir, tão
pouca seja, a evolução geral do estado de espírito. A situação era demasiada diferente
de um campo ao outro, uma categoria a outra, para que se pudesse identificar as linhas
de força, os horizontes de expectativa eram muito diferentes para cada um50 ». Não
podemos precisamente nos satisfazer com esta observação na forma de impotência:
compreender a articulação social entre território e espera é precisamente um desafio.
49 Outro elemento, também, seria de refletir às formas aborrecimento nestes
territórios da espera. A psicologia histórica ainda não tem prestado atenção a esta
dimensão da vida social. Ora, o aborrecimento sobre a embarcação, da mesma maneira
que o aborrecimento num campo pode ser apreendido como uma forma de controle

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dos homens e dos corpos.


50 Pesquisas sobre as práticas memoriais em torno destes territórios da espera
foram efetuadas, mas ainda numa visão mais monográfica que comparada: existem
inúmeros trabalhos sobre hospedarias de imigrantes como Ellis Island (New York),
Grosse Ile (Québec), a Hospedaria dos Imigrantes de São Paulo ou o Albergue dos
Inmigrantes de Buenos Aires. O mesmo pode ser contatado para os campos de
refugiados. Ora, trata-se de saber como estes territórios da espera podem ser
considerados como lugares de memória, a exemplo dos campos da seca no Brasil cujos
descendentes das famílias de ocupantes organizam a cada ano procissões para manter a
memória.

As tarefas da história
51 Após esta rápida apresentação, pensemos o quanto uma história social da espera
deve se concentrar na análise detalhada das interações entre os territórios e sociedades
em espera. Este estado da arte nos permite definir mais precisamente quais serão as
tarefas da história nesta investigação:
52 - Inicialmente, se tratará de delimitar melhor a especificidade de cada um dos
momentos de crise que lançaram homens, mulheres e crianças sobre as estradas e os
oceanos, e que frequentemente os conduziu, sobre estes longos deslocamentos, ao seu
agrupamento, temporário ou duradouro, em territórios específicos. No prolongamento
dos trabalhos de Alain Corbin 51, importa por em destaque a historicidade das
paisagens da espera. Aqui, interrogaremos a gênese desses territórios, suas múltiplas
formas arquiteturais e suas diversas topografias. Esta análise comparada nos levará a
uma atenção específica às práticas administrativas e sociais das arquiteturas da espera.
53 - As investigações históricas levarão igualmente uma atenção específica às
temporalidades específicas aos territórios da espera: entre o tempo coercitivo da
administração, o tempo vivido, pelos que esperam, e o tempo sonhado dos múltiplos
projetos de vida, convirá se interrogar sobre os diversos conflitos temporais que tomam
forma nos territórios da espera.
54 - Um terceiro campo de análise pensará sobre a maneira como a experiência da
espera, nomeadamente quando se trata de uma espera que se instala na duração, pode
alterar (temporariamente ou duradoramente) as identidades e laços sociais.
55 - A última orientação do trabalho de historiador se referirá ao problema da memória
contemporânea desses lugares da espera, e a forma como entra na definição da
identidade dos imigrantes mas também das sociedades; nesta ótica, um lugar
específico será consagrado ao enfoque do patrimônio material ou imaterial. Será
necessário também interrogar os dois lados do Atlântico, países de emigração e de
imigração: porque, por exemplo, é mais evidente criar um museu da imigração que da
emigração?

Por uma geografia social da espera


56 Como os historiadores ou os sociólogos, os geógrafos até agora têm negligenciado os
momentos e os lugares do entre-deux para privilegiar o estudo dos fluxos, dos
deslocamentos, das dinâmicas sociais e espaciais que permitiriam escapar à armadilha
(real ou imaginária) da monografia estática – herdeira suposta, e hoje difamada, de
Vidal de La Blache. Existe assim uma geografia dos transportes que há muito tempo
tem sido considerada como um anexo da geografia econômica, mas não uma geografia

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dos tempos de parada e dos lugares da espera. Sabemos que há pontos de ruptura de
carga, mas ignora-se o que se passa quando a mercadoria ouo passageiro estão em
espera de transbordo oumudança de veículo. Além disso, esta geografia dos transportes
tende a privilegiar a escala macro-geográfica que lhe permite apreender a
complexidade das trocas mundiais ou estudar os processos de integração regional ou
intercontinental (com grande reforço de análises estatísticas) - mas é menos
interessada nas escalas locais, muitas vezes vistas como anedóticas. Ora, é esta escala
local que se situa no coração dos territórios da espera, ainda que estes se inscrevam em
sistemas de circulação muito maiores, como o demonstrou Alain Tarrius ao falar de
“territórios circulatórios” para evocar os sistemas estabelecidos pelas comunidades de
migrantes oriundos da margem sul do Mediterrâneo.
57 Mesmo Augustin Berque, cujos trabalhos se inscrevem no cruzamento da geografia e
da filosofia não utiliza a noção de espera para interrogar sobre o sentido que é
necessário ou que pode se dar ao território52. Nas suas definições de topos e chôra
fundamentados sobre os escritos de Aristóteles e Platão, ele não leva em conta a
duração da estada dos indivíduos ou dos grupos num espaço que eles irão ou não
poder (ou dever) se apropriar de maneira provisória. O «pensamento de espaço» que
caracteriza os trabalhos geográficos negligenciou, geralmente, uma dimensão essencial
da nossa condição humana e a nossa vida cotidiana - dimensão que não escapou a
Georges Perec na sua Tentativa de esgotamento de um lugar parisiense, quando se
sentou durante três dias na varanda de diferentes cafés parisienses para tentar captar a
essência do lugar de Saint-Sulpice: «O meu propósito nas páginas que seguem foi,
sobretudo, de descrever o resto: o que não se nota geralmente, o que não se observa o
que não damos importância: o que se passa quando não se passa nada, se não o tempo,
as pessoas, os automóveis e as nuvens»53.

Territórios da espera: o lugar da geografia


58 Longe de procurar estabelecer novas fronteiras entre as disciplinas universitárias e
inventar querelas entre os seus representantes, a investigação coletiva nos territórios
da espera impõe uma cooperação entre historiadores, sociólogos e geógrafos que
compartilham o mesmo objeto e não podem analisá-lo sem utilizar a bibliografia, os
instrumentos e os métodos dos seus parceiros. É por isso que parece indispensável
centrar a vertente espacial do estudo sobre uma geografia social da espera situada no
cruzamento das reflexões pluridisciplinares sobre o lugar, tempo e a sociedade.
59 O objeto da geografia social é precisamente o estudo das relações que existem entre
relações sociais e relações espaciais - estas correspondendo aos laços afetivos,
funcionais e econômicos, políticos e jurídicos ou puramente imaginários que os
indivíduos e os grupos tecem com os espaços geográficos onde vivem, que percorrem
ou em que se representam. Para a geografia social, o espaço carrega constantemente
valores que definem as culturas em toda sua variedade, pois integra uma dupla
dimensão: material e ideal. Como assinala Guy Di Méo em Géographie sociale et
territoires, as atividades sociais produzem, quase cada uma, temporalidades
específicas. As formas temporais são intrinsecamente ligadas às formas espaciais das
construções sociais e devem ser encaradas no mesmo movimento de interpretação 54.
Mais perto do indivíduo, há o tempo vivido, percebido, aquele da experiência sensível.
É tentador fazer dele o equivalente do espaço vivido, categoria essencial da geografia
social desde o trabalho pioneiro de Armand Frémont. Cada indivíduo sabe de
experiência a plasticidade do tempo, sua subjetividade, sua capacidade de se estirar,
parecer longo ou, pelo contrário, de uma extrema brevidade de acordo com a sua

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disposição afetiva ou psicológica, a sua atividade, o seu estatuto ou o seu papel a um


dado momento da sua existência. Ainda que Di Méo não aprofunde esta dimensão na
sua obra, a espera desempenha aqui um papel central. O tempo se dilata, mas tem-se a
impressão de que o espaço se retrai: não está mais na dimensão das nossas
necessidades (ou das nossas esperas). A espera induz geralmente uma sensação de
cerco.
60 Numa obra mais recente, Pascal Buléon e Guy Di Méo sublinham que, para a
geografia social, o nosso espaço é o de nossos deslocamentos, de nossos movimentos,
dos nossos projetos, de nossas representações, nossas práticas e nossa ação. Se trata
então de «apreender a relação, o movimento, as contradições produtivas entre as
diferentes esferas da atividade humana, de delimitar o caráter indivisível e, no entanto,
decodificável das espacialidades e temporalidades»55 . O problema é que os estudos
geográficos quase nunca levam em conta o momento em que «não se passa nada»
(como dizia Georges Pérec em sua Tentativa de esgotamento de um lugar parisiense),
os pontos de suspensão, os lugares de entre-deux, os interstícios do espaço e do tempo
social - os tempos e os espaços que precisamente nos interessam neste projeto.
Contudo, certas propostas de Buléon de Di Méo podem alimentar as nossas reflexões
nos territórios da espera, nomeadamente as que se unem para levar em conta o
indefinido e o improvável e para estudar o espaço de vida, ou seja, «a prática concreta
dos lugares e o vestígio necessariamente deformado que deixa nas memórias». É por
isso que é essencial reconsiderar a noção de território na construção do nosso objeto de
estudo dado que a espera se dá num sentido novo, introduzindo uma dimensão
temporal demasiada negligenciada.
61 Não é por acaso que o primeiro termo do projeto TERRIAT seja a palavra
«território». Em Géographie sociale et territoires, Di Méo, explica que este conceito é
essencial na geografia social: «é um instrumento operacional, um método sonhado para
aprofundar os fenômenos de identidade e de controle, de alteridade, de integração ou
de segregação, ou mesmo de exclusão, de equidade, de igualdade, de justa distribuição
das riquezas e meios para produzir-las» 56. Este espaço produzido, materializando o
campo de ação, é associado a um espaço percebido e representado (que integra as
modalidades de conhecimento ou de cognição), mas também a um espaço vivido
condicionado pelas modalidades de existência humana e por um conjunto (ou um
sistema) de práticas sócio-espaciais. Di Méo define assim o território de acordo com
três dimensões que nos interessam diretamente para compreender como podem ser
estudados os territórios da espera: conjunto dos lugares frequentados pelo indivíduo
(espaço de vida), as interdependências sociais que se formam (espaço social) e os
valores psicológicos que são lá projetados e percebidos (o espaço vivido desenvolvido
por Frémont). O território aparece assim como a conjunção das noções de espaço social
e de espaço vivido.
62 Tendo em conta a influência do território sobre as interações sociais e sobre a
construção das identidades (individuais e coletivas) nos permitimos passar a um nível
superior da análise sócio-espacial: a territorialidade. Uma das definições que melhor
poderia dar conta da noção de espera seria de Raffestin e Bresso que qualificam a
territorialidade como «a estrutura latente do cotidiano, a estrutura relacional, pouco
percebida ou não percebida, da cotidianidade»57 . Se o território é por excelência o
lugar onde se tecem as relações sociais e onde se desenvolvem as interações, parece
desde já necessário bem distinguir aquilo que se entende por lugar e aquilo que se
entende por território. Pascal Buléon e Di Méo sublinham assim que “se o lugar se
define, antes de mais nada, pelas funções e práticas ao mesmo tempo individuais e
sociais, o território exprime sobretudo um sistema de representações, uma ideologia e
uma autoridade”58 . A questão é saber se os lugares e os espaços de espera podem ser

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considerados como territórios. É todo o problema da identificação, da territorialização


dos atores, da construção das práticas sociais induzidas pela espera. Trata-se de «não-
lugar» como pôde definir Marc Augé, mesmo tendo ele voltado atrás quanto às suas
primeiras posições? Com efeito, dentre os não-lugares evocados pelo antropólogo,
numerosos são diretamente associados aos fatos da mobilidade e aos processos
migratórios, em particular os campos de refugiados ou as barracas provisórias erigidas
pelos migrantes, mas também os pontos de trânsito, os clubes de férias ou as cadeias
hoteleiras que repetem ao infinito a mesma estrutura, a mesma arquitetura de interior,
as mesmas paisagens, como as latas de sopa Campbell pintadas por Andy Warhol.

Os territórios de uma geografia da espera


63 Aos olhos de Guy Di Méo e Pascal Buléon, é a entrada metodológica dada pelo ator
que se revela mais fértil para analisar os conteúdos sociais dinâmicos que permitem
configurar os espaços geográficos. O ator está também no centro da reflexão organizada
por Hervé Gumuchian, Éric Grasset, Romain Lajargue e Emmanuel Roux em Les
acteurs, ces oubliés du territoire – obra que insiste na necessidade de tomar em conta
ao mesmo tempo a pluralidade das situações possíveis em um dado contexto, a
tipologia dos atores e o quadro tanto espacial quanto temporal de suas interações, afim
de identificar e de definir aquilo que é um “ator territorializado” e quais são suas
capacidades reais de ação 59. No que diz respeito ao nosso projeto, abordamos o
indivíduo ou o grupo em posição de espera. Mas o ator não é uma pessoa neutra: é por
definição uma pessoa que interage. Daí o paradoxo central que enfrentamos: nas
representações colectivas da espera, o sujeito não interage. Erroneamente é atribuída à
espera uma função passiva que não corresponde à realidade das práticas sociais, pois
os indivíduos em posição de espera e os grupos, têm múltiplas actividades que estão
alinhados ou não com a sua situação imediata. Tudo depende do tipo de espera (formal,
informal, institucional ou imprevista) e do lugar de espera (um lugar feito para a
espera, ou um espaço que se torna pela força das coisas um lugar de espera, um lugar
«por defeito»). De fato, como nos lembra Gustave-Nicolas Fischer em uma perspectiva
que responde perfeitamente às questões colocadas pelos territórios da espera: “A
função dos lugares produz significações que se manifestam concretamente em sua
utilização social , em outras palavras pelos comportamentos que se exprimem nessas
situações” 60. Os espaços institucionalizados da espera foram investidos pelo wait
marketing que leva em conta o tempo passado (perdido?) pelos indivíduos em lugares
onde se pode captar o seu interesse fazendo crer que se lhe faz passar o tempo61.
64 O lugar de espera assume então todo seu sentido e se torna uma dimensão essencial
do estudo: não é somente uma cena ou um quadro, como dizia Malte-Brun, mas um
ator integrante do processo estudado. Em suma, pode-se dizer que se os lugares são
aquilo o que fazemos deles, eles fazem também aquilo que nós somos. A este respeito,
as distinções operadas por Augustin Berque entre topos e chôra podem se revelar
muito úteis62 . A fim de compreender a formação e o funcionamento destes territórios
da espera e para encarar seu porvir, é essencial estudar as variáveis que permitem
elaborar uma tipologia a partir do caráter dos territórios (abertos ou fechados), em
função das temporalidades e de acordo com os contextos econômicos e sociais dos
atores (ao mesmo tempo a influência do estatuto social do migrante, por exemplo, e
aquela da sua origem geográfica). Os geógrafos assim como o sociólogo devem então se
interrogar sobre a durabilidade de tais territórios (vida efêmera, cíclica ou permanente)
levando em conta as evoluções que o afetam - em especial quando se trata de lugares e
espaços que participam na intensificação do fenômeno migratório.

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65 Uma segunda interrogação aborda as denominações de espaço onde se inscreve o


processo de espera. Com efeito, esta denominação se identifica a uma primeira forma
de apropriação (duradouro ou passageiro, virtual ou empírico, oficial ou informal…)
porque, de certa maneira, nomear é possuir (daí a necessidade de se interrogar sobre a
noção de territorialidade e sobre o processo de territorialização). Como sistema de
conhecimentos geográficos, a toponímia qualifica correntemente os lugares de três
maneiras mais ou menos misturadas: simbólica, memorial, prática. Ora, o sentido do
atributo espacial de um nome de lugar varia em função dos indivíduos, da sua idade,
do seu itinerário espacial. É pela denominação que o tempo vivido se inscreve no
espaço vivido. Como, então, se estabelece esta relação entre o ator (usuário, passivo,
ativo…) e o território, de acordo com o seu estatuto e com a sua cultura? Se existem
salas de esperas, grandes vestíbulos e lugares de espera reconhecidos e batizados como
tais, como se apreendem (se qualificam ou se desviam do uso) pelos que frequentam de
maneira mais ou menos provisória, de maneira mais ou menos voluntária? Trata-se,
além disso, de saber como são designados os espaços da espera que não são
concebidos para este uso e que são desviados da sua função.
66 Neste domínio, outra dimensão deve ser levada em conta: a publicidade dos lugares
da espera. Se for verdadeiro que se pode esperar nele, a espera como atividade
específica se concebe num espaço ou um lugar público que provoca interrelações com
outras pessoas em estado de espera ou com indivíduos e grupos encarregados de gerir
ou organizar a espera. Teremos então de fazer referência aos trabalhos em
psicogeografia de Abraham Moles63 , e à noção de copresença elaborada por Isaac
Joseph. Pode-se considerar a espera como um esporte solitário ou como um jogo
coletivo?
67 Atualmente, no quadro de um estudo dos territórios da espera, é sem dúvida na
noção de habitar que a geografia deve procurar pistas de investigação para
desenvolver. A obra de Olivier Lazzarotti, Habiter: La condition géographique, propõe
a esse respeito numerosas perspectivas quando afirma, por exemplo, que «habitar
repousa sobre a idéia de que ao cruzamento do «onde se está» e do «como se é lá», se
encontra o «quem somos» ou, mais precisamente, a parte geográfica desse «quem
somos», em outros termos, a parte da geografia que entra na elaboração da identidade
global dos homens, mas que, também, participa da sua construção. Isto já foi dito:
estar aqui ou lá, passar aqui ou lá, ir daqui pra lá, não é nem indiferente nem trivial
uma vez que a multiplicidade das situações reflete apenas aquela dos habitantes do
mundo»64 . Considerando-se que a mobilidade é uma das condições modernas das
formas do habitar, Mathis Stock não hesita em propor quanto a isso a noção de
“habitus mobilitário” 65, fundada sobre a capacidade dos indivíduos de fazer face a
lugares que lhes são estrangeiros e lhes tornar familiares – processos de apropriação
do espaço e de territorialização que devem efetuar os migrantes em situação de espera,
sobretudo quando sua espera se eterniza. A abordagem sensível, fenomenológica e
existencial dos lugares induzida por esse estudo das formas de habitar o espaço conduz
Olivier Lazzarotti a falar do indivíduo não somente como ator, mas também como
autor de sua geografia – em outros termos, de sua inscrição no espaço. Essa noção de
autor, inspirada em Michel Foucault 66 deve permitir melhor compreender como o
habitante de um lugar (mesmo se ele não o habita que de maneira provisória, sabendo
ou esperando que seu tempo de residência seja apenas provisório), pode aí se inscrever
de maneira ao mesmo tempo singular e sintética a partir dos instrumentos que ele
partilha como todo o mundo – ou ao menos com o grupo do qual ele faz parte 67. Essa
abordagem sensível dos lugares e dos fatos sociais pode se inscrever na perspectiva da
geografia da experiência, teorizada por Yi-Fu Tuan, geógrafo norte-americano de
origem chinesa que se interessa pela maneira pela qual os indivíduos, no seio de um

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grupo e de uma cultura, percebem e constroem sua realidade topológica graças a um


fluxo contínuo de alimentação simbólica entre memória (os lugares passados) e
antecipação ou projeção (em direção aos lugares a vir) 68 .
68 No domínio mais específico das migrações, o olhar dos geógrafos deverá, assim, se
prender à maneira como as sociedades de migrantes dão forma a territórios investidos
do tempo de todo tipo de espera - da simples parada à espera de vários meses numa
cidade fronteiriça, sem esquecer aquilo que denomina-se migração por etapas (step
migration), como sublinha Laurent Faret em seu estudo sobre os percursos dos
imigrantes mexicanos que se instalam nos Estados Unidos 69 . A step migration, que se
aplica a todos os deslocamentos que um indivíduo (ou uma família) realiza no espaço e
no tempo para atingir seu objetivo ou para responder a situações particulares, não faz
referência direta à espera como elemento estruturante de um percurso individual. No
entanto, a espera (como noção e como prática) pode explicar processos estratificados,
hierárquicos e não-lineares que combinam migração e mobilidade (geográfica e por
vezes social, para o alto ou para baixo). Que elas façam ou não parte de uma “migração
em etapas”, as circulações migratórias, longe de serem lineares e contínuas, são
semeadas de paradas e espera. Estes tempos mortos no trajeto dos migrantes podem
ser devido aos riscos das práticas e técnicas de deslocamento (mudança de meio de
transporte, de paradas, avarias…). Territóriosnascem, assim, comoresultados
dessaspausasque marcamas trajetórias: se constroem a partir das práticas dos
migrantes em espera que se apropriam de maneira temporária. Este campo de estudo
comporta um caráter inovador pelo fato de se concentrar em espaços intersticiais. Ele
se focaliza sobre um entre-deux espacial (entre lugares de partida e de chegada) e se
interessa por um tempo de incerteza que prevalece numa situação de passagem, à
intersecção entre a projeção no futuro (o destino) e a permanência de um passado mais
ou menos repelido (nomeadamente das informações identitárias) que marca a
organização das sociedades sobre o lugar… No cruzamento entre geografia e sociologia
toma lugar uma geografia social, onde a psicologia da espera determina a maneira
como os homens se apropriam de um espaço na medida (e à medida) das suas
capacidades.

Por uma sociologia dos territórios da espera


69 Se não existe, propriamente, um estudo da sociologia dos territórios da espera,
seria errado dizer que os sociólogos os ignoraram nas suas investigações. Os exemplos
são tão numerosos que desencorajam qualquer tentativa de inventário. Consideremos,
por esta razão, apenas alguns que possuem uma relação direta com os campos de
estudos do projeto TERRIAT.
70 A sociologia das migrações insistiu largamente nas perturbações que os fenômenos
migratórios provocaram tanto sobre os espaços de partida, de chegada e de viagem
quanto sobre as identidades dos indivíduos e dos grupos que lá se encontram 70 . A
aldeia de onde o migrante sai, a cidade onde se encontra o passador que pode lhe fazer
cruzar a fronteira e o lar de trabalhadores imigrados onde reside são, entre outros,
igualmente territórios da espera intrinsecamente ligados dos quais se deve
compreender os agenciamentos e temporalidades distintas. O que é para grupos
familiares viver na espera do regresso dos partidos em migração, e o que é, para os que
partiram, esperar este momento? O que vivem osrequerentes de asilo nas zonas
aeroportuárias e nos centros de refugiados onde esperam que as autoridades locais
lhes atribuam o estatuto de refugiado? Quais tipos de relações sociais se estabelecem
entre migrantes e autóctones nos espaços de trânsito? Como os lugares (associativos,

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religiosos, recreativos) frequentados nos países de recepção permitem a eles viver a


espera da realização do projeto migratório?
71 A situação de espera tem sido estudada como indicativo das diferenças de poder.
Numa obra que tornou-se um marco, Barry Schwartz estabeleceu finamente que o fato
de esperar e a capacidade de fazer esperar obedecem a princípios identificáveis
daquelas sociedades contemporâneas e que não possuem o mesmo sentido de acordo
com o estatuto social de um indivíduo71 . Convém, então, sempre se perguntar não
somente sobre o que faz esperar e quem espera, mas também sobre quem não esperar
e onde os que esperam o fazem e como. O que é esperar na emergência de um hospital,
e sob que pretexto pode-se receber atendimento antes da vez? Como se espera ser
recebido por uma autoridade, e quem pode ser imediatamente recebido por um
ministro?
72 É, contudo, no estudo das filas de espera que os sociólogos abordaram mais
diretamente, sem dúvida, a pergunta dos territórios da espera. Da forma como se
constituem e funcionam subjaz uma quantidade de análises sobre a produção e o uso
das normas sociais, indicando que tomar lugar em uma fila acaba não sendo tão trivial
como parece72 . Como observam os etnometodologistas, uma fila de espera pode existir
apenas porque é reconhecida como tal pelos que a constituem e que existe um acordo
sobre a idéia de uma ordem de passagem. Não se faz, de resto, uma fila da mesma
maneira numa caixa de um supermercado, na ópera e na frente de uma loja na manhã
da abertura das liquidações. Quem viaja também constata que não se espera
necessariamente a sua vez similarmente de um país ao outro. Aqui, a fila de espera na
frente de um guichê se ordena simplesmente pela única ação de indivíduos que se
alinham tranquilamente uns de trás dos outros. Lá, é necessário, ao contrário, um
dispositivo material (barreiras) e a presença de um terceiro (vigia) para produzir o
alinhamento e evitar a aglomeração.

Situar-se no encontro entre o que inscreve e o que separa


espacialmente
73 A sociologia, no entanto, não tirou todo o partido possível do estudo dos
múltiplos territórios da espera no mundo moderno. Este déficit analítico não se refere à
ausência de articulação entre um quadro espacial e uma temporalidade nas
investigações sociológicas, mas, como bem mostrou Jean-Samuel Bordreuil a
propósito da sociologia urbana, refere-se a uma tensão recorrente entre os estudos das
formas de inscrição espacial e aquele dos movimentos no espaço73 . De fato, os
sociólogos privilegiam o estudo dos modos de apropriação do espaço por uma
população (os bairros de imigração italiana nos Estados Unidos, por exemplo), e
tendem a fazer decorrer a construção das identidades pessoais e coletivas da
capacidade dos indivíduos de se ancorar territorialmente, negligenciando, assim,
frequentemente, aquilo que nestes processos excede o território identificado (o fato,
entre outros, de trabalhar num outro bairro, de pertencer a um grupo religioso
transnacional ou ter relações fortes com pais que residem em outras cidades). Outros
sociólogos, pelo contrário, insistem na desterritorialização crescente das relações
sociais devida ao crescimento dos deslocamentos e ao desenvolvimento das tecnologias
de comunicação, e perdem de vista, frequentemente, a inscrição espacial de muitas
atividades humanas. O entusiasmo para o estudo das redes e as mobilidades exprime
bem esta última tendência. Em um livro que poderia ser considerado como um
manifesto de reformulação do projeto disciplinar da sociologia, John Urry conclama a
abandonar a ideia de sociedade pensada em relação ao Estado-nação e se interessar

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pelo movimento e pelas diferentes formas de mobilidade (físicas, virtuais e


imaginárias)74 . As transformações das sociedades contemporâneas durante as últimas
décadas têm, argumenta ele, aumentado consideravelmente as relações que existem
entre espaços geograficamente distantes, tornando-se importante inventar novos
conceitos e novos métodos capazes de dar conta dessas transformações. Mas, aqui
ainda, insistindo em tudo aquilo que cruza as fronteiras nacionais ou as torna porosas,
Urry cede à tentação de esquecer que a ascenção de mobilidades de todo tipo está longe
de ter dissolvido a consistência do espaço físico delimitado por estruturas estatais,
como nos recordam notadamente os limites impostos para os deslocamentos dos
migrantes.
74 Ora, compete precisamente a qualquer sociologia dos territórios da espera de
ter em conjunto, de um lado, aquilo que se ergue da inscrição dos indivíduos em um
espaço e, por outro lado, o que procede das possibilidades que se tem de se extrair
deles física, virtual ou imaginariamente. Nesta perspectiva, seria necessário, prestar
atenção específica ao que hoje se faz nomear «os objetos dos territórios da espera», a
começar pelos computadores portáteis e outros smartphones, dos quais sabe-se que
dispor ou não pode alterara espera num lugar, quer esteja prevista ou não, tanto para o
viajante como para aqueles com os quais se relaciona.

Território da espera e situações de interação


75 Dar-se por objeto os territórios da espera conduz ao estudo das situações de
interação às quais eles dão forma. O que é, de fato, esperar num território se não ser
levado frequentemente a compartilhar um mesmo espaço com uma ou várias pessoas?
O encontro com a obra de Erving Goffman e os debates que ele suscitou é
incontornável aqui, especialmente quando a espera reúne indivíduos socialmente
muito distantes ou de origens diferentes. Pensemos na espantosa diversidade dos
usuários do metrô nas horas de pico, à coabitação forçada num elevador imobilizado
entre dois andares ou passageiros em trânsito tendo que coexistir em um saguão de
aeroporto num dia de greve. Quando experimentada, a espera não tem nada de uma
atividade passiva. Ela supõe, ao contrário, estar atento ao comportamento dos outros e
de cooperar para o melhor uso de um espaço raro. Mas o que se passa exatamente
nestas situações? Quais regras prevalecem então para chegar a um acordo mínimo que
permita viver da melhor forma possível conjuntamente nestes territórios da espera?
Constituindo a situação de interação em unidade de análise específica, Goffman oferece
uma chave de leitura para responder a estas perguntas 75 . Ele enfatiza particularmente
o fato de que a interação é uma ordem social integral, cujo funcionamento tem uma
autonomia relativa em relação à ordem social mais geral ou, em outras palavras, que as
normas sociais da sociedade global não determinam necessariamente o que acontece
em situações de interação. Goffman fala do «acoplamento solto» (loose coupling) entre
o nível macrossociológico e o nível microssociológico da interação. Para se ter uma
ideia melhor, tomemos o caso de uma estação onde uma pessoa de aparência idosa em
pé espera o trem. Uma regra social largamente admitida, e habitualmente lembrada em
cartazes, recomenda que pessoas mais jovens cedam o lugar nos bancos reservados
para a espera. Ora, a observação deste tipo de situação mostra que este comportamento
não tem nada de sistemático. Pode resultar de uma recordação da regra geral
(«Homem jovem, este é um lugar reservado»), um incidente entre o que continua
sentado e o que espera («não se tem mais respeito hoje em dia») ou uma advertência
de um terceiro («você poderia se levantar»). Mas pode ser que, às vezes, o passageiro
que é convidado a se sentar não o faça, seja agradecendo ao que se levanta pela sua

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intenção, seja, mais raramente, com indelicadeza, indicando-lhe ser um usuário


comum que não pediu nada («Acha que sou velho?»). Uma perspectiva goffmaniana
sobre os territórios da espera convida, em consequência, a considerá-los não como
miniaturas que refletem dinâmicas maiores, mas como espaços instáveis onde nada é
inevitavelmente desempenhado antecipadamente.
76 A ordem da interação descrita por Goffman foi objeto de numerosos
comentários para os quais não há espaço para retomar aqui. Há, contudo, pelo menos
uma referência que concerne a uma investigação interdisciplinar nos territórios da
espera: a questão da historicidade da ordem da interação. Ainda que Goffman a
apresente como universal, seus críticos sublinham que este nível de análise é
determinado largamente pelo contexto sociocultural que o cerca. Consideremos, outra
vez, a espera na estação que se propôs anteriormente. Sabe-se que existem zonas de
espera definidas em função das características dos viajantes: bancos reservados aos
brancos na África do Sul do Apartheid ou, de certa forma por toda a parte no mundo,
uma sala de espera mais confortável para os que viajam em primeira classe. É,
portanto, essencial se interrogar como as interações nos territórios da espera foram
configuradas historicamente. Para permanecer nos trilhos da ferrovia, o acesso às
plataformas das estações foi objeto de regulamentos progressivos que proibiram
vendedores ambulantes e aqueles que não adquiriam um direito específico (o «bilhete
de plataforma») para acompanhar os passageiros até a beira dos trilhos 76. Uma
investigação sociológica sobre um território da espera não poderá, assim, evitar se
perguntar se a sensibilidade à espera variou ao longo do tempo, ou quando e ao termo
de quais processos as diferentes formas de organização territorial da espera se
instauraram ou foram abolidas. Ela poderá, também, considerar que a espera se faz
num registro específico dos conjuntos sociais onde os indivíduos se consideram iguais
em direito. Porque, como nota Danilo Martuccelli, Goffman é um sociólogo da
fragilidade do mundo social que localiza no coração de sua sociologia a dificuldade da
interação nas sociedades democráticas igualitárias, onde cada um estando
fundamentado para exigir o direito à igualdade de tratamento, qualquer manifestação
de uma diferença ou de uma hierarquia ameaça romper as relações interindividuais 77 .
Seu interesse por aquilo que se representa numa fila de espera é uma evidência.
Aqueles que fazem a fila podem bem ter posições sociais diferentes, mas se arrumam
um atrás dos outros dependendo do momentode sua chegadae se esforçam parafazer
valero princípio de ordem 78. Qualquer desvio a esta forma de organização
territorializada supõe poder se justificar em circunstâncias específicas (pessoas doentes
ou fracas, mulheres grávidas, adultos acompanhados de crianças menor idade). Se as
regras de precedência determinam a ordem de passagem nos universos hierarquizados,
onde os códigos de comportamento diferem em função do status social, a auto-
organização de uma fila só é de fato possível se os participantes se reconhecem numa
situação de igualdade fundamental face aos outros.

Fazer do território da espera uma análise do social


77 A herança de Goffman convida, constata-se, a constituir os territórios da espera em
uma análise do social sem ignorar sua historicidade. Seu estudo sociológico implica,
portanto, considerá-los como unidades específicas de análise que poderiam lançar luz
sobre outras dimensões negligenciadas por outros enquadramentos espaciais e
temporais. Sem ceder ao determinismo histórico, o sociólogo da espera deverá estar
atento ao que contribuiu para a formação e a evolução de um território da espera para
poder compreender suas dinâmicas em curso. Nas investigações sobre as migrações

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internacionais, se trata de recordar os constrangimentos estruturais impostos por


políticas migratórias restritivas que limitam os deslocamentos 79 e não esquecer a
capacidade dos indivíduos de se libertar para viver em mundos que abrangem vários
Estados 80. A sociologia dos territórios da espera se inscreve, assim, na perspectiva que
Nancy Green denominou como uma “abordagem intermediária” quando chama a
superar a dicotomia entre estrutura coercitiva e vontade individual que organiza os
estudos migratórios 81 .
78 Uma investigação sociológica sobre um território da espera se esforçará em propor
uma descrição detalhada. A observação participante é sem dúvida um método de
colecta de dados a se privilegiar. Fazendo ele mesmo a experiência da espera no
território que estuda, o investigador poderá melhor mostrar os acordos e as tensões
entre os que o compõem. Deverá nesta intenção identificar os objetos, as posturas e os
conhecimentos da espera. Como se faz a espera? Como se preenche o tempo? Como se
aprende a esperar? Ou, ainda, em que momento a espera se torna insuportável? Os
territórios da espera são, assim, tão interessantes por permitirem revelar ao mesmo
tempo as rotinas sem as quais a vida social é impossível, bem como os sentimentos de
injustiça produzidos por situações de espera imputáveis à autoridades.
79 A sociologia dos territórios da espera tem também a vocação de lhes considerar
como propícios à construção identitária. Podem, a esse respeito, serem encarados sob
duas maneiras analiticamente distintas. A primeira se concentrará em destacar a
constituição de grupos nesses espaços-tempos, se interrogando sobre em quais
condições a experiência compartilhada da espera, sobre um mesmo território, facilitam
a constituição de uma identidade coletiva 82 . Quando e como o atraso regular de uma
linha de trem provoca a constituição de um coletivo de usuários? Quais fatores
conduzem uma multidão cansada de esperar o abastecimento de uma loja a saquear
suas vitrines? Ao fim de quais processos a espera de datas de liberações muito
diferentes provocam o aparecimento de um protesto comum dos prisioneiros? A
segunda abordará a construção das identidades pessoais. Há territórios da espera
propícios na elaboração de um discurso sobre si? Nessa ótica, Dominique Vidal
analisou os quartos de empregadas, onde vivem numerosas mulheres trabalhadoras
domésticas no Brasil, como «um suporte territorial da identidade pessoal 83 ». Mas
poderia-se a esse respeito igualmente pensar a espera do porteiro na portaria do
edifício ou a do prisioneiro na sua cela. Esta abordagem, que enfatiza o quanto o
significado de um determinado recurso, depende do contexto e do ator consiste em
sublinhar quanto a relação e os usos de um mesmo espaço podem sustentar formas de
construção identitária diferentes de acordo com as características sociológicas de um
indivíduo ou o sentido que ele dá à sua trajetória. Também a experiência da espera
sobre um mesmo território pode se lastrar de práticas e significados diferentes.
80 De muitas maneiras, a sociologia dos territórios da espera permite,
compreensivelmente, renovar uma perspectiva disciplinar dando um novo alento a
uma das questões que têm na sua origem a influência do social ante os
comportamentos e as práticas.
81 Ao termo desta apresentação dos desafios metodológicos e dos grandes eixos de
investigação que mobilizam uma pesquisa interdisciplinar sobre os territórios da
espera, sublinhamos dois pontos essenciais. O primeiro é que cada estudo nos propõe o
desafio de compreender o agenciamento específico, que toma forma nas múltiplas
situações de espera, entre espaço, tempo e sociedade. Este tríptico é a pedra angular de
qualquer análise dos territórios da espera: compreender a sua gênese, o seu sentido e a
sua evolução, tais são nossos desafios. O segundo ponto, decorrendo do primeiro, é que
tais investigações não podem ser empreendidas sem um diálogo interdisciplinar, sem o
empréstimo (ou mais precisamente, um deslizamento disciplinar) de conceitos ou

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metodologias. O estabelecimento de uma tipologia dos territórios da espera, da mesma


maneira que o estudo das relações entre formas de sociedades e tipos de espaços ou a
análise das identidades móveis nestes territórios da espera, necessita, assim, do diálogo
entre historiadores, geógrafos e sociólogos (sem esquecer os especialistas da literatura
que podem abrir pistas úteis de investigação, notadamente sobre os lugares de
memórias das sociedades em espera: cidades fronteiriças ou portos de partida, ponte
da embarcação ou plataforma do trem, ilhas ou muros…).
82 É, portanto, a reformulação de um paradigma analítico das sociedades
contemporâneas que ambiciona este projeto. Estas «sociedades líquidas» (para
retomar um conceito de Zygmunt Bauman 84 ) são tomadas por mobilidades
incessantes, mas elas se dotam também de dispositivos (visíveis ou invisíveis) para por
em espera e controlar as populações em deslocamento. Para uma observação implícita
destas sociedades, privilegiando as situações de desequilíbrio social, espacial e
identitário, procuramos descrever e compreender as margens da política, enclaves
onde se inventam as sociedades modernas e as suas identidades - os territórios da
espera.
83 4 Michael Edwards, Éloge de l’attente. T. S. Eliot et Samuel Beckett, Paris, Belin,
1996, p.65.
84 9 Giorgio Agamben, Homo sacer II, 1. État d’exception, Paris, Seuil, 2003
85 11 Em Approches de la poésie, Roger Caillois define a poética: « Eu chamo de
“poética” todos estes “sinais” de inteligência que , além das palavras e dos poemas,
maspara incluircomo intercessoresprivilegiadospara alémdos objetos, coisas,
emoções, situações, dátodoso espaço de umapercepção a segunda de umenigmaqueele
pediuque não ésem inocênciao único coma chave». (Paris, Gallimard, 1978, p.
254).Este sentimento depercepção completonos levaà famosatesen º
VdeWalterBenjamin: «A verdadeira imagem do passado perpassa, veloz. Imagem que
surge para apenas desaparecer no memento seguinte. A verdade imóvel que faz esperar
o investigador não corresponde ao conceito de verdade na história». (« Thèses sur le
concept d’histoire », 1940, in : Ecrits français, Paris, Gallimard, 1991, p. 341).
86 19 Jean-Claude Kaufmann, L’invention de soi, une théorie de l’identité, Paris,
Hachette, coll. Pluriel, 2005
87 21 Soraya Moura, Memorial do Imigrante. A imigração no estado de São Paulo,
São Paulo, Imprensa Oficial, 2008.
88 22 Milton Sanros, A natureza do espaço : técnica e tempo, razão e emoção, São
Paulo, Hucitec, 1996.
89 31 Ver por exemplo os trabalhos de Richard White, The Middle Ground: Indians,
Empires, and Republics in the Great Lakes Region, 1650-1815, Cambridge University
Press, 1991 ; Daniel Nordmann, Frontières de France. De l'espace au territoire XVIe-
XIXe siècle, Paris, Gallimard, Bibliothèque des histoires, 1998
90 32 Philippe Rygiel, Le temps des migrations blanches. Migrer en occident (1840 –
1940), Paris, Aux lieux d’être, 2007
91 38 Didier Poton, Bertrand Van Ruymbeke, « Elie Neaud, « galérien pour la foi »
(1662-1722) », in Mickaël Augeron, Mathias Tranchant, La violence et la mer dans
l’espace atlantique, Rennes, PUR, 2004, pp. 325-336.
92 39 Peter Linebaugh and Marcus Rediker, The Many-Headed Hydra: Sailors,
Slaves, Commoners, and the Hidden History of the Revolutionary Atlantic, Verso,
London and New York, 2000 ; REDIKER, Marcus, The slave ship : a human history,
Londres, John Murray, 2007.
93 41 Marcus Rediker, Emma Christopher, Cassandra Pybus, Many Middle Passages:
Forced Migration and the Making of the Modern World, University of California
Press, 2007

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94 45 Aprimeira tentativateve lugar (justamente nos estudos do projeto ANR


TERRIAT) com a investigação conduzida por Maria Isabel de Jesus Chrysostomo e
Laurent Vidal sobre a aplicação dashospedariasde imigrantespara o Brasilnos anos
1870-1930: «As hospedarias de imigrantes no Brasil: Um dispositivo esquecido no
caminho da emigração para o Brasil (1880’s – 1930’s) » (conferência pronunciada no
simpósio internacional do Institute for Latin American Studies, Freie Universität de Berlim,
“Brazil in Global Context (1870-1945)” 27-28 de outubro de 2011).
95 63 Abraham Moles, « Vers une psycho-géographie », in Antoine Bailly, Robert
Ferras, Denise Pumain (dir.), Encyclopédie de la géographie, Paris, Economica, 1995.
96 74 John Urry, Sociologie des mobilités. Une nouvelle frontière pour la sociologie ?,
Paris, Armand Colin, 2005 (2000).
97 80 Para uma melhor compreensão desta abordagem conferir Alain Tarrius, La
remontée des Sud. Afghans et Marocains en Europe méridionale, La Tour d’Aigues,
Éditions de l’Aube, 2007.

Notes
1 ANR TERRIAT é um projeto quadrienal (2011-2014), financiado pela Agence Nationale de
la Recherche (França) e sua dimensão é internacional e interdisciplinar - site:
http://terriat.hypotheses.org.
2 Literalmente “entre-dois”. Esta expressão evoca uma situação intermediária, instável
3 O objetivo do “on hold marketing” é de aproveitar dos tempos de espera (numa
comunicação telefônica, nos aerportos e outros lugares de espera) para a difusão de
mensagens publicitários.
5 Thomas Mann, evocandoum homem que esperapara a distribuiçãosemanal
decorreio,observou: «Dizem que é enfadonho esperar. Mas ao mesmo tempo, e mais
propriamente, é divertido, porque assim devoramos quantidades de tempo sem as viver e
explorar como tais. Podereríamos dizer que o homem que apenas espera se parece com um
comilão cujo aparelho digestivo deixa passar as massas de comida sem lhes assimilar os
valores nutritivos e proveitosos.» (La Montagne magique).
6 Franck Lestringant, Le livre des îles. Atlas des récits insulaires de la Genèse à Jules
Vernes, Paris, Droz, 2002, p. 13.
7 Michel Foucault, « Des espaces autres. Hétérotopies », in Dits et Écrits 2, Paris, Gallimard,
2001, pp. 752-762.
8 Henri Desroche, Sociologie de l’espérance, Paris, Calmann-Lévy, 1973 ; Henri Desroche,
Dieux d’hommes. Dictionnaire des messianismes et millénarismes de l’ère chrétienne.
Contribution à une sociologie de l’attente, Paris, Mouton, 1969.
10 Esta pergunta foi feita por Jean Duvignaud, Paul Virilio e Georges Perec na revista Cause
Commune (« le pourrissement des sociétés », 1975) em que Perec publica sua « tentative
d’épuisement d’un lieu parisien ».
12 René Char, Feuillets d’Hypnos, n°213 (recueil de poèmes publié en 1946).
13 René Char, Aromates chasseurs, Paris, Gallimard, 1975.
14 Aimé Césaire, Moi, Laminaire, Paris, Seuil, 1982.
15 Stéphane Beaud, « Un temps élastique », Terrain, Numéro 29, « Vivre le temps »,
septembre 1997, pp. 43-58
16 Giorgio Agamben, Homo Sacer, II, 2, Le Règne et la Gloire. Pour une généalogie
théologique de l’économie et du gouvernement. Paris, Seuil, 2008
17 Marc Augé, Non-lieux. Introduction à une anthropologie de la sur-modernité, Paris,
Seuil, 1992, p. 130.
18 Michel Agier, Gérer les indésirables. Des camps de réfugiés au gouvernement
humanitaire, Paris, Flammarion, 2008, p. 102.
20 Georges Perec, Ellis Island, Paris, POL, 1995.

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23 Para uma bibliografia geral ver oestado da artepreparado por Grégory Bériet e acessar o
blog ANR TERRIAT http://terriat.hypotheses.org/293.
24 Jacques Le Goff, La naissance du Purgatoire, Paris, Gallimard, 1981.
25 Idem, p. 453.
26 Franck Lestringant, Le livre des îles. Atlas des récits insulaires de la Genèse à Jules
Vernes, Paris, Droz, 2002, p. 31. Voir aussi Gilles Deleuze, L’île déserte et autres textes,
Paris, Editions de Minuit, 2002.
27 Camille Maire, En route pour l'Amérique, L'odyssée des émigrants en France au XIXe
siècle, Nancy: Presses Universitaires de Nancy, 1993
28 Nancy Green, François Weil, Citoyenneté et émigration : Les politiques du départ, Paris,
Éditions de l’EHESS, 2006.
29 Nancy Green, « Trans-frontières : pour une analyse des lieux de passage », Socio-
Anthropologie, Revue interdisciplinaire de sciences sociales, n° 6, Passages, 1999, p. 48.
30 Laurent Vidal, «Por uma história social da espera», in Mazagão, a cidade que atravessou
o Atlântico. Do Marrocos à Amazônia (1769-1783), São Paulo, Martins Fontes, 2008, pp. 275
– 282. Ver também: Laurent Vidal, «Cidades em espera, sociedades em espera no Brasil
colonial : alguns desafios metodológicos». In: Fania Fridman; Mauricio de A. Abreu. (Org.).
Cidades latino-americanas. Um debate sobre a formação de núcleos urbanos. Rio de
Janeiro: Casa da Palavra, 2010, p. 53-62.
33 Daniel Roche, Humeurs vagabondes: de la circulation des hommes et de l’utilité des
voyages, Paris, Fayard, 2003.
34 Idem, p. 518
35 Alain Montandon, dir., Le livre de l’hospitalité. Accueil de l’étranger dans l’histoire et les
cultures, Paris, Bayard, 2004.
36 Laurent Vidal, Mazagão, a cidade que atravessou o Atlântico. Do Marrocos à Amazônia
(1769-1783), São Paulo, Martins Fontes, 2008, p. 278.
37 Nathan Wachtel, La Foi du souvenir. Labyrinthes marranes, Paris, Editions du Seuil (La
Librairie du XXIe siècle), 2001
40 Edward Laxton (The famine ships. The Irish exodus to America, New York, Holt
Paperback, 1998) coletahistóriasde viagens, umas mais terríveisdo que outras, mas sem
qualquer reflexão sobreo barcocomo um lugar/espaço confinadoda travessia.
42 Giorgio Agamben, Qu’est-ce qu’un dispositif ?, Paris, Payot & Rivages, 2007
43 Ver a esterespeitoas hipótesesde trabalho dohistoriador Grégory Bériet e acessar o blog
ANR TERRIAT: « La quarantaine, territoire de l’attente : quelques réflexions
épistémologiques (1 et 2) » [http://terriat.hypotheses.org/75 ;
http://terriat.hypotheses.org/325]
44 Para os Estados Unidos, ver o recente estudo de Vincent J. Cannato, American Passage.
The history of Ellis Island, New York, Harper Collins, 2009. O autor reconheceem sua
introduçãotambém: « this book is a biography, not of a person, but of a place, of one small
island in New York Harbor that crystallized the nation’s complex and contradictory ideas
about how to welcome people to the New World » (14).
46 John Steinbeck, The Harvest Gypsies. On the Road to The Graps of Wrath, Berkeley,
Hayday Books, 1988.
47 John M. Crouse, Joan M. The Homeless Transient in the Great Depression: New York
State, 1929–1941, The New York University Press, 1986 ; Christina Anne Sheehan Gold,
Hoovervilles: Homelessness and Squatting in California during the Great Depression, PhD
dissertation U. of California, Los Angeles, 1998.
48 Raimundo Alves Araujo, Edvanir Maia de Silveira, « A cidade e a seca: o campo de
concentração de 1932 e as transformações urbanas em Ipú-CE », Revista da Casa de
geografia de Sobral, Sobral, vol. 8/9, n°1, pp. 99-110, 2007.
49 Denis Peschanski, La France des camps : l'internement 1938-1946, Gallimard, 2002, p.
411 et p.412
50 Idem, p. 418.
51 Alain Corbin, L’homme dans le paysage, Paris, Textuel, 2001.
52 Augustin Berque, Écoumène. Introduction à l’étude des milieux humains, Paris, Belin,

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2000, pp. 18-30.


53 Georges Pérec, Tentative d'épuisement d'un lieu parisien,Paris, Bourgois, 1975.
54 Guy Di Méo, Géographie sociale et territoires, Paris, Nathan, 1998, p. 21.
55 Guy Di Méo et Pascal Buléon, L’Espace social. Lecture géographique des sociétés, Paris,
Armand Colin, 2005, p. 10.
56 Guy Di Méo, 1998, Op. cit., p. 5.
57 Claude Raffestin, et Mercedes Bresso, « Tradition, modernité, territorialité », in Cahiers
de géographie du Québec, 1982, n°68, pp. 186-198
58 Guy Di méo et Pascal Buléon, Op. Cit., 2005, p. 88.
59 Hervé Gumuchian, Éric Grasset, Romain Lajargue et Emmanuel Roux, Les acteurs, ces
oubliés du territoire,Paris Economica, 2003.
60 Gustave-Nicolas Fischer, La psychologie de l’espace, Paris, PUF, “Que sais-je?” n° 1925,
1981, p. 96.
61 http://blogs.ecoles-idrac.com/WaitActive/Cartographie-des-lieux-d-attente
62 Augustin Berque, Écoumène. Introduction à l’étude des milieux humains, Paris, Belin,
2000, pp. 18-30.
64 Olivier Lazzarotti, Habiter. La condition géographique, Paris, Belin, 2006, p. 21.
65 Mathis stock, “L’habiter comme pratique des lieux géographique”s, EspacesTemps. Net
(http://www.espacestemps.net/document1138.html, consulté le 19 septembre 2011)
66 Michel Foucault, L’ordre du discours, Paris, Gallimard, 1971.
67 Olivier Lazzarotti, Op. Cit,, 2006, pp. 228-229.
68 Yi-Fu Tuan, Espace et lieu, la perspective de l’expérience, Paris, Infolio, 2006.
69 Laurent Faret, Les territoires de la mobilité. Migration et communautés transnationales
entre le Mexique et les États-Unis, Paris, CNRS Éditions, 2003, p. 61.
70 As obras deAbdelmalekSayadvêm à mentea este respeito. Cf. Abdelmalek Sayad, La
double absence. Des illusions de l’émigré aux souffrances de l’immigré, Paris, Seuil, 1999.
71 Barry Schwartz, Queuing and Waiting. Studies in the social organization of access and
delay, Chicago, Chicago University Press, 1975.
72 Harold Garfinkel, Eric Livingston, « Phenomenological field properties of order in
formatted queues and their neglected standing in the current situation of inquiry » Visual
Studies, 18(1), 2003, pp. 21-28.
73 Jean-Samuel Bordreuil, « La ville desserrée », in Thierry Paquot, Michel Lussault, Sophie
Body-Gendrot (eds.), La ville et l’urbain. L’état des savoirs, Paris, La Découverte, 2000, pp.
169-182.
75 Erving Goffman, «The interaction order », American Sociological Review, vol. 48, n°1,
1983, pp. 1-17.
76 Isaac Joseph (ed.), Villes en gare, La Tour d’Aigues, Les éditions de l’aube, 1999.
77 Danilo Martuccelli, Sociologie de la modernité. L’itinéraire du vingtième siècle, Paris,
Gallimard, 1999.
78 O fato de queé possívelpagar alguém paraficar na filapara ele -como tem sido
observadopor exemplona frente de algunsserviços públicosno Brasil -não significaque,
fundamentalmente,em causa o princípiode um direito deacessocom base na ordemde
chegada.É claro que épara se investigaras condiçõesde aceitabilidadede tais práticas epara
mostrar, talvez, como o contextoajuda a explicar.
79 Carolina Kobelinsky, Chowra Makaremi (eds.), « Confinement des étrangers : entre
circulation et enfermement », Cultures&Conflits, n°72, automne 2008.
81 Nancy L. Green, Repenser les migrations, Paris, PUF, 2002, p. 104.
82 Em um estudo sobre as filas de espera durante a ocupação, Paul Achard mostrou como se
constituía lugares onde se transmitiam informações e se formavam os julgamentos públicos
(La queue. Ce qui s’y disait. Ce qu’on y pensait, Paris, Mille et une nuits, 2011 [1945]).
83 Dominique Vidal, « Les supports territoriaux de l’identité personnelle. Rapport à l’espace
et construction identitaire chez les travailleuses domestiques de Rio de Janeiro », Espaces et
Sociétés, n°130, 2007, pp. 135-149.

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84 Zygmunt Bauman, Le présent liquide, Paris, Seuil, 2007

Pour citer cet article


Référence électronique
Laurent Vidal, Alain Musset et Dominique Vidal, « Sociedades, mobilidades, deslocamentos:
os territórios da espera. O caso dos mundos americanos (de ontem a hoje) », Confins [En
ligne], 13 | 2011, mis en ligne le 30 novembre 2011, consulté le 26 juin 2014. URL :
http://confins.revues.org/7274 ; DOI : 10.4000/confins.7274

Auteurs
Laurent Vidal
Coordenador do projeto (ANR) TERRIAT – Historiador - Professor da Universidade de La
Rochelle - Diretor-adjunto do Centre de Recherche en Histoire Internationale et Atlantique
(CRHIA - EA 1163).

Alain Musset
Coordenador-adjunto do projeto (ANR) TERRIAT – Geógrafo – Diretor de estudos na EHESS

Dominique Vidal
Sociólogo - Professor da Universidade de Paris VII – Diretor-adjunto da Unité de Recherche
Migrations et Société (Urmis - UMR 205).

Droits d'auteur
© Confins

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