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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Fig 1 - 1o Rebite. ............................................................................................. 21


Fig 2 - Multiplicidade de rebites contemporâneos. .......................................... 21
Fig 3 - Mineradores americanos. ..................................................................... 21
Fig 4 - Railmens, Farmworkers e práticos Overalls. ........................................ 22
Fig 5 - Cowboys dos filmes de farwest, de John Waine a Brokeback M.. ....... 23
Fig 6 - Jeans Levi’s 501 de 1922..................................................................... 25
Fig 7 - 1a empresa a adotar o ziper. ................................................................ 25
Fig 8 - Marlon Brando em O Selvagem. ......................................................... 28
Fig 9 - Easy Rider - 1969................................................................................ 30
Fig 10 - Festival de Woodstock. ....................................................................... 30
Fig 11 - Marlin Monroe na década de 1960. ..................................................... 31
Fig 12 - Jeans Stretch, 1980. ........................................................................... 31
Fig 13 - Humberto Saad e Luiza Brunet – Publicidade Dijon. .......................... 32
Fig 14 - Década de 1970. Calça pintada. ......................................................... 34
Fig 15 - Década de 1970 – Look em Jeans. ..................................................... 34
Fig 16 - Calça em Patchwork. .......................................................................... 34
Fig 17 - Punks em Paris, 1979. ........................................................................ 36
Fig 18 - Beirendonck, 1997. ............................................................................. 36
Fig 19 - Vivienne Westwood, desfile 1980. ...................................................... 37
Fig 20 - Propagandas das 1as calças jeans fabricadas no Brasil...................... 38
Fig 21 - Gisele Bündchen em shorts jeans. ...................................................... 40
Fig 22 - Martin Margiela e o desconstrutivismo no vestuário............................ 43
Fig 23 - Rei Kawakubo em 1981. ..................................................................... 43
Fig 24 - Madonna na década de 1980.............................................................. 44
Fig 25 - Brooke Shields, 1981. ......................................................................... 45
Fig 26 - Exibição do corpo através do jeans..................................................... 46
Fig 27 - Jeans Fiorucci, final de 1980............................................................... 47
Fig 28 - Calvin Klein, final de 1980. .................................................................. 47
Fig 29 - Forum, 1988. ....................................................................................... 48
Fig 30 - Calvin Klein Jeans. .............................................................................. 48
Fig 31 - Publicid. Jeans, 1990. ......................................................................... 48
Fig 32 - Armani, 2007. ...................................................................................... 48
Fig 33 - Diesel, 2007. ....................................................................................... 48
Fig 34 - Dolce Gabana, 2009. .......................................................................... 49
Fig 35 - Calvin Klein, 2009. .............................................................................. 49
Fig 36 - Relançamento Jeans Levi’s 501. ........................................................ 49
Fig 37 - Hugo Boss, 1990. ................................................................................ 50
Fig 38 - Estação de tratamento de água. ......................................................... 51
Fig 39 - Loja Eden – 1a em Jeans 100% orgânico no Brasil............................. 51
Fig 40 - Jeans Levi’s com 115 anos. O mais caro do mundo. .......................... 53
Fig 41 - Fraldas jeans para bebê...................................................................... 54
Fig 42 - Figurino para Balê. .............................................................................. 54
Fig 43 - Dolce Gabana e Louis Vuitton investem em acessórios jeans. ........... 54
Fig 44 - Capacete jeans. .................................................................................. 54
Fig 45 - Tênis Levi’s ......................................................................................... 54
Fig 46 - All Star................................................................................................. 54
Fig 47 - Poltrona. .............................................................................................. 55
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Fig 48 - Sofá em jeans. .................................................................................... 55


Fig 49 - Ronaldo Fraga desenvolve caderno em jeans. ................................... 55
Fig 50 - Painel jeans com calças resinadas. .................................................... 55
Fig 51 - Caroline Calvin com 32 calças jeans................................................... 55
Fig 52 - Quadro de Pasquale Lecreux. ............................................................. 55
Fig 53 - A experimentação enquanto produto de moda. ................................. 57
Fig 54 - Bread&Butter Barcelona 2009, Salsa jeans. ....................................... 58
Fig 55 - Exemplos de várias performances do jeans contemporâneo. ............. 59
Fig 56 - Jean Franco Ferré, 2007. .................................................................... 60
Fig 57 - J. Galliano, 2008. ................................................................................ 60
Fig 58 - Maison Martin Margiela, 2008. ............................................................ 61
Fig 59 - Chanel, primavera – verão 2008. ........................................................ 61
Fig 60 - Varios modelos de jeans nos últimos anos. ................................ 62 e 63
Fig 61 - Algodoeiro. .......................................................................................... 68
Fig 62 - Tabela de siglas das fibras Têxteis. .................................................... 70
Fig 63 - Tingimento dos fios com Índigo. .......................................................... 71
Fig 64 - Tingimento sem anti-migrante. ............................................................ 74
Fig 65 - Tingimento com anti-migrante. ............................................................ 74
Fig 66 - Esquema de tear. ................................................................................ 75
Fig 67 - Principais ligamentos. ......................................................................... 76
Fig 68 - Linha Integrada. .................................................................................. 77
Fig 69 - Efeito flamé de trama. ......................................................................... 78
Fig 70 - Efeito flamé de urdume ....................................................................... 78
Fig 71 - Controle de qualidade. ........................................................................ 78
Fig 72 - Modelagem da calça jeans modelo 5 pockets..................................... 80
Fig 73 - Digitalização do molde. ....................................................................... 80
Fig 74 - Encaixe eletrônico. .............................................................................. 80
Fig 75 - Enfêsto eletrônico................................................................................ 81
Fig 76 - Ilustração dos dois tipos de enfêsto. ................................................... 81
Fig 77 - Maquina de corte manual e profissional operando. ............................. 82
Fig 78 - Plotter de corte eletrônico. .................................................................. 82
Fig 79 - Layout de uma oficina de costura mista. ............................................. 83
Fig 80 - Oficina de costura do jeans. ................................................................ 84
Fig 81 - Sequência de montagem da calça jeans – Senai-Cetiqt. .................... 86
Fig 82 - Sequência de montagem da calça jeans - Santista............................. 88
Fig 83 - Imagem da 1ª etiqueta de couro. ........................................................ 89
Fig 84 - Exemplos de vários tags. .................................................................... 90
Fig 85 - Primeiras etiquetas traseiras. .............................................................. 90
Fig 86 - Filigrana original Levi’s. ....................................................................... 91
Fig 87 - Exemplos de filigranas contemporâneas............................................. 91
Fig 88 - Filigrana Calvin Klein Jeans. ............................................................... 91
Fig 89 - Bordado Be-extreme. .......................................................................... 91
Fig 90 - Bordado com brilho. ............................................................................ 91
Fig 91 - Be-extreme. ......................................................................................... 92
Fig 92 - Bolsos traseiros. .................................................................................. 92
Fig 93 - Lavanderia industrial. .......................................................................... 93
Fig 94 - Perna pneumática. .............................................................................. 95
Fig 95 - Processo manual de lixamento . ......................................................... 95
Fig 96 - Bricolagem e seu efeito . ..................................................................... 95
Fig 97 - Aplicação de jatos de permaganato. ................................................... 95
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Fig 98 - Resultado da aplicação de permaganato. ......................................... 95


Fig 99 - Lixado simples - processo ................................................................. 96
Fig 100 - Resultado do lixado. .......................................................................... 96
Fig 101 - Pistola de etiquetagem usada para efeitos de plissado. ................... 96
Fig 102 - Resultado: efeito plissado ................................................................. 96
Fig 103 - Desgastes por instrumentos de retífica ............................................. 97
Fig 104 - Ralados. ............................................................................................ 97
Fig 105 - Escovados. ........................................................................................ 97
Fig 106 - Pincelado. ......................................................................................... 97
Fig 107 - Patches colados. ............................................................................... 97
Fig 108 - Resinado amassado.......................................................................... 98
Fig 109 - Resinado com pigmento.................................................................... 98
Fig 110 - Efeito Rabisco. .................................................................................. 98
Fig 111 - Amassado permanente. .................................................................... 98
Fig 112 - Impressão a laser .............................................................................. 99
Fig 113 - Processos de customização Cheap Monday. ................................... 99
Fig 114 - Estação Robótica. ........................................................................... 100
Fig 115 - Processos mecânicos de obtenção de efeitos. ............................... 100
Fig 116 - Lixador Mecânico. ........................................................................... 101
Fig 117 - Base para efeitos de “bigodes” e material abrasivo. ....................... 101
Fig 118 - Procedimento de jato abrasivo. ....................................................... 101
Fig 119 - Prensa para resinados. ................................................................... 102
Fig 120 - Amostra denim 10,5Oz Co/ Pes/ El. ............................................... 104
Fig 121 - Amostra denim 12Oz 100%Co. ...................................................... 104
Fig 122 - Amostra denim 12Oz Co/ Pes. ....................................................... 104
Fig 123 - Amostra denim 10,5Oz 100%Co. ................................................... 104
Fig 124 - Jeans Bruto. .................................................................................... 105
Fig 125 - Destroyed Bread&Butter 2009. ...................................................... 105
Fig 126 - Levi’s Dirty. ...................................................................................... 106
Fig 127 - Pedras abrasivas............................................................................. 106
Fig 128 - Stone wash – Bread&Butter 2009 ................................................... 107
Fig 129 - Fire wash – Bread&Butter 2009 ...................................................... 107
Fig 130 - Acid wash – Bread&Butter 2009...................................................... 108
Fig 131 -.Medium Distressed.......................................................................... 108
Fig 132 - Second hand. .................................................................................. 109
Fig 133 - Silver Black. .................................................................................... 109
Fig 134 - Snow wash. ..................................................................................... 110
Fig 135 - Energized. ....................................................................................... 110
Fig 136 - 3D resinado. .................................................................................... 111
Fig 137 - Jeans Color. .................................................................................... 111
Fig 138 - Exemplos de metais e máquina semi-automática. .......................... 113
Fig 139 - O jeans atende a vários grupos urbanos......................................... 116
Fig 140 - Trabalhadores no metrô em Teerã. ................................................. 117
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INTRODUÇÃO

Minha vida profissional, paralela ao magistério, foi na sua quase totalidade,


voltada para o fazer moda. O pensar moda na prática, foi o início da produção
do conhecimento que hoje carrego.
Comecei na época em que não existiam escolas de moda no país. Isso
significava aprender fazendo e essa “práxis” foi evoluindo e acompanhando
minha formação quando já era estilista de várias confecções no Bom Retiro,
depois dando assessoria para tecelagens (desenvolvendo tecidos exclusivos);
para estamparias (na criação e opções de coloração); para tinturarias e
lavanderias (montando cartela de cores para as indústrias têxteis e
acompanhando os processos de lavagens de peças em denim). Mas o maior
aprendizado foi atuando na minha própria confecção, durante toda a década de
1980, com duas etiquetas: Ellyclaire (feminina) e CaraMelada (infantil).
Ampliei meus conhecimentos, nesse período, não só no que diz respeito à
criação, mas também ao gerenciamento do produto, em logística e em
marketing. Essa experiência me forneceu, ao lado das informações oriundas de
publicações e visitas técnicas aos vários setores da cadeia têxtil (fiação,
tecelagem, confecção e beneficiamento), um rico material de trabalho.
Ao iniciar o mestrado, um desafio se impôs: o pensar moda de forma
sistemática. Essa dissertação vem unir as duas formas de interagir com esse
rico universo: o fazer e o pensar, tratados de forma integrada.
Pesquisando a moda, na busca do objeto que constituiria o tema do trabalho,
uma peça me chamou atenção por ser emblemática: o Jeans. Sua trajetória
carrega uma infinidade de símbolos e signos que vão da resistência e
praticidade da roupa do trabalhador, passa pela rebeldia, arrojo e
agressividade dos movimentos contra-culturais, carrega emblemas de status e
luxo, bem como de autenticidade e estilo. Essa escolha veio, também, por uma
curiosidade pessoal de tentar descobrir o porque de uma peça do vestuário ser
tão constante no guarda-roupa da maioria das pessoas, em quase todos os
países. Mas o principal questionamento era o fato de acharmos “linda”,
“bacana”, “cool” e adquirirmos, uma peça com aspecto usado, rasgada,
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desbotada e, muitas vezes, parecendo suja, a preços que chegam algumas


vezes, a quatro dígitos.
A curiosidade sobre esses e outros aspectos me levou, a princípio, a um
levantamento histórico específico, que acabou se revelando de suma
importância nesse contexto. Sua própria história é uma história de identificação de
pequenas marcas, que ao longo da sua existência vão se somando às novas e
compondo a identidade dessa peça na contemporaneidade.
O jeans foi escolhido como objeto dessa reflexão também por ser a peça que
incorpora e exterioriza a vivência do seu usuário desde o marinheiro no século
XVII, do minerador e do cowboy, da juventude em várias ocasiões, até a
generalização do seu uso no contemporâneo.
Marcado pelo desgaste natural do vestir; pelas transformações pessoais, pelas
interferências na sua estética híbrida, pelas desconstruções no seu
acabamento, ouso chamá-lo de representante do design de moda pós-
moderno. Tendo sido o jeans o precursor na aceitação desses “signos inferiores” na
moda, (LIPOVETSKY, 1989), coloca a proposição de novos termos para a
indústria do vestuário, colaborando para outra definição de roupa: a que é
colhida de ocorrências particulares que lhes atribuem sentido (característica da
pós-modernidade), já que seu sentido não vem mais de uma concepção de
moda como discurso “totalizante” (característica da modernidade).
O estudo especifico da história do jeans vem mostrar que ele interfere diretamente
nos processos de produção, na contemporaneidade, sedimentando também um
projeto de moda que ultrapassa as fronteiras do vestuário e se insere em outros
universos: do teatro, o da decoração, dos acessórios, ou mesmo das artes plásticas.
Peça do vestuário comercializada aos milhões, sua relevância vem do fato de ser a
mais democrática do nosso guarda-roupa, atendendo praticamente todas as
estratificações etárias, sociais e econômicas, quer pela sua versatilidade,
autenticidade e estilo, quer pelos conceitos de liberdade e juventude (este último,
perseguido por todos), aos quais está indelevelmente ligada.
O raciocínio da pesquisa segue a abordagem, em primeiro lugar da gênese do
jeans, como se expandiu pelo mundo e como se relacionou com os seus
usuários. Depois a ampliação do seu conceito e as principais estratégias que
fizeram do jeans o ícone que é hoje. Falaremos do processo Criativo na
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contemporaneidade e por fim da sua materialidade, onde design e tecnologia


se unem para produzir a peça do vestuário mais consumida, depois da
camiseta.
Temos então que no primeiro capítulo – Metamorfoses do Jeans, essa dissertação
pretende, ao se apoiar na história, mostrar como o jeans, nascido para servir ao
trabalho pesado, serviu tambem de suporte para a construção de novas relações
sociais, principalmente como foi elemento de exteriorização da rebeldia juvenil,
liberada em várias ocasiões, a partir, principalmente, dos movimentos beatniks,
hippies e punks. Além disso, veremos como interferiu na construção da imagem e da
identidade da mulher contemporânea, ora dando-lhe mais liberdade, ora valorizando-
lhe as formas ou equiparando-a ao homem, do qual era submissa. Gilles Lipovetsky
(1989), Daniela Calanca (2008), Patrice Bollon (1993), Antonio José do Carmo
(2003), Eric Hobsbaum (2000), Diana Crane (2006), Frederic Jameson (2000), Stuart
Hall (1998) e tantos outros contribuiram substancialmente para essa reflexão da
moda e sua significaçào no âmbito social.
Identificaremos a partir da sua origem (subcapítulo que tratará da difusão do
jeans), como se disseminou para a Europa e como se sedimentou no Brasil,
tornando-se um dos nossos mais fortes segmentos no mercado interno e na
exportação da matéria prima.
A ampliação do conceito jeans para outros setores da moda se torna
fundamental para a compreensão da estética da moda contemporânea. As
estratégias de autenticidade e da sedução fazem parte da maioria das
campanhas publicitárias desse produto, constituindo dois dos seus principais
atributos. Ambos serão estudados aqui, desde suas primeiras manifestações
(por volta de 1970).
Em Processos Criativos, que constitui o Segundo Capítulo, abordaremos como o
jeans, que nasce na modernidade, resgata suas origens no contemporâneo, através
dos processos de produção característicos da pós-modernidade. Abre a discussão
sobre os processos de criação em moda, assim como discute a sua própria
concepção.
Tomando autores como Lipovetsky (2004), Sexe (2007), Jameson (2000), Harvey
(2003), Poynor (2002), Baudrillard (1996) e tantos outros, podemos discutir sobre o
legado da modernidade e como o jeans se insere nesse universo, bem como seu
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comportamento como coadjuvante nos processos criativos da pós-modernidade,


para entendermos a moda como um todo.
As pesquisas de campo, principalmente em empresas como Vicunha e Santista
apoiadas por Chataignier (2006) e Catálogo do Senai-Cetiqt, subsidiaram as
informações técnicas apresentadas no Terceiro Capítulo. Nele falaremos sobre
design (conceitos apoiados principalmente por Bomfim, 2002) e tecnologia,
trataremos da sua materialidade, desmembrando o processo de fabricação
desde a fibra, passando pela fiação, tecelagem e confecção.
Observaremos a seguir, os vários processos pelos quais se submete depois de
pronta, ao receber o que chamamos paradoxalmente de beneficiamento. Quais
os recursos utilizados para que os desgastes do uso, os aspectos desbotados
e os furos sejam incorporados à sua superfície, dando-lhe seu aspecto final.
Aspecto esse, que mais do que ser marcado na sua exterioridade, sob
interferências químicas e mecânicas modificam sua própria essência e vão
construindo sua identidade pós-moderna.
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I - AS METAMORFOSES DO JEANS

Um olhar mais atento a qualquer um dos aspectos das várias culturas


contemporâneas, principalmente as ocidentais, nos leva a perceber que elas
são compostas por elementos díspares, mistos, muitas vezes confusos e com
difícil definição. No que diz respeito aos sistemas de produção na moda e os
processos criativos que os engendram, vemos que esses se valem de
inúmeras referências simultaneamente, assim como nos âmbitos da música, da
arquitetura, do design, no da comunicação, etc. Sendo esse um dos
pressupostos da pós-modernidade, manifestos também no design de moda
contemporâneo, tornam presentes em sua essência, recursos de criação que
contrariam os princípios que regiam a moda até meados do século passado,
quando as diretrizes da modernidade prevaleciam.
No entanto, muito se tem discutido sobre a modernidade e a pós-modernidade,
chegando alguns autores a questionar até mesmo a existência dessa última.
Por se tratar de conceitos de amplo significado, convém uma reflexão mais
cuidadosa para o entendimento das idéias abordadas nesta dissertação.
Embora alguns princípios da modernidade entraram na obsolescência, ainda
hoje convivemos, no contexto da moda, com muito do seu espírito, quer seja na
fabricação seriada, quer em manter a essência clássica do vestuário, embora
com a possibilidade de mesclá-la a outras posturas. Na modernidade, os
criadores de moda se mantinham fiéis a um estilo, repensando a cada estação,
suas próprias referências assim como faziam os artistas plásticos e as escolas
com suas disciplinas estanques.
A modernidade pode ser entendida como vontade de construir sistemas,
teorias, interpretações totalizantes, como sistema que acredita na
racionalidade, no valor positivo da ciência e da tecnologia, acredita no
progresso do desenvolvimento histórico e do pensamento (LYOTARD, 1979).
Moderna é a sociedade criada a partir da industrialização e da produção em
série. O sujeito da modernidade era ainda a imagem do homem iluminista, visto
por Stuart Hall “como tendo uma identidade fixa e estável”, diferente do homem
pós-moderno, que foi “descentrado, resultando em identidades abertas,
contraditórias, inacabadas e fragmentadas” (HALL, 2005:13).
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Nesse cenário, foi concebido o jeans (ver glossário pág.122): uma roupa de
uso diário, uma peça destituída de preocupações estéticas, um “objeto”
funcional, um uniforme de trabalho produzido em série. Um “sujeito” de
identidade fixa e estável, com um papel e uma função definidos dentro da
sociedade.
Para alguns autores, a terminologia “pós-modernidade” tem sido substituída
pela expressão “modernidade tardia” (JAMESON, 2000) ou “modernidade
líquida” (BAUMAN, 1997) ou ainda “hipermodernidade” (LIPOVETSKY, 2004).
Apesar de ser um termo questionável, a frequência com que filósofos,
sociólogos, geógrafos, e demais pensadores contemporâneos, a favor ou
contra, discutem a pós-modernidade, nos dá a certeza de que ela existe.
Nesta reflexão, utilizaremos o conceito para identificar a alteração,
principalmente, dos processos criativos, no que diz respeito às normas de estilo
aplicadas na modernidade, bem como as alterações sociais decorrentes do
pós-guerra e do rompimento das barreiras culturais.
David Harvey relaciona os conceitos – modernidade e pós-modernidade, a
partir da afirmação que ser moderno é ver tudo novo, é a transformação de si e
do mundo. A modernidade une toda a humanidade, ultrapassando as fronteiras
da geografia, das raças, da religião, da ideologia e da nacionalidade. Ser
moderno é ser parte de um Universo. Diz ele ainda que o modernismo é uma
resposta estética a condições obtidas por um processo particular de
modernização em uma sociedade. (HARVEY, 1993). Com essa afirmação, ele
antecipa a significação do pós-modernismo, sem que, em nenhum momento,
possamos notar uma preocupação em buscar o significado do prefixo pós, no
sentido de "depois de”.
No contexto da nossa reflexão, tal passagem permite identificar que se o
conceito de criação na modernidade era considerar a “Destruição Criativa”, isto
é, a novidade tem que ser construída a partir das cinzas do antigo, na pós-
modernidade esse conceito se amplia, usando a interdisciplinaridade (ver
glossário, pg 123), mesclando o antigo e o novo, o clássico e o experimental, o
natural e o tecnológico, o local e o global, dando-nos novas e inúmeras
possibilidades de criação.
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Reforçamos essa noção, considerando que “O sujeito assume (hoje)


identidades diferentes em diferentes momentos“ (HALL, 2005), ou como nos
fala Lipovetsky, no seu livro “A era do vazio” definindo o sujeito pós-moderno:
que a pós-modernidade transforma o indivíduo, agora plural, destituído de
referências históricas, fragmentado, não mais sujeito de si, mas sujeitado pela
máquina, pelo virtual, afastado do simbólico, hedonista e preso ao mundo de
imagens (LIPOVETSKY, 1989).
Por esses termos, o jeans foi escolhido como objeto dessa reflexão por ser a
peça que exterioriza as mudanças do sujeito que o veste, ou melhor, que
incorpora a própria imagem do “sujeito” pós-moderno com suas formas
contraditórias, fragmentadas e híbridas, seus acabamentos plurais, sua estética
inacabada e desconstruída.

I.1 – GÊNESIS DO JEANS MODERNO

O Jeans, em sua origem, enquanto artefato moderno, nasce precocemente por


volta de 1600. Mas como “sujeito” pós-moderno corporifica e atualiza as ações
dos sujeitos, tanto dos que o produzem ou dos que dele fazem uso, para se
definir como ícone da moda contemporânea.
Baudrillard (1980) afirma que a modernidade introduziu simultaneamente um
tempo linear de progresso técnico da produção e da história e um tempo
cíclico: o da moda. Em mais uma contradição aparente, ele nos diz que a
tradição deixa de ser a proeminência do antigo sobre o novo; que a
modernidade dá outro sentido aos dois conceitos e que ela é sempre, ao
mesmo tempo nova, atual e retrô, fora de época. “Nossa moda é o jogo da
mudança pela mudança”, diz ele.
O jeans vive, como todo objeto de moda esse paradoxo, essa constante busca
de renovação, e que para isso se reporta constantemente ao passado, na ânsia
da novidade. Mas, no seu caso, é profundamente maior seu envolvimento com
o passado. Este legitima através das marcas deixadas pelo uso, sua estética
pós-moderna. Ele transforma, através da sua história, as relações sociais. Ele
estabelece ao longo dos anos modificações na indústria para perpetuar as
inscrições na sua superfície.
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Temos que os primeiros europeus a utilizarem essas calças, antes mesmo dos
americanos, foram os trabalhadores do porto de Gênova. O tecido era
fabricado em Chieri, uma cidade perto de Turim (Itália), por volta de 1600. Sua
comercialização se dava através desse porto, cuja cidade era a capital de uma
república independente e uma potência naval. As primeiras peças foram feitas
para os genoveses da marinha porque se prestava para todos os fins. Com
essas calças, os velejadores poderiam usar tanto no molhado como no seco, e
cuja perna poderia facilmente ser enrolada (e permaneciam assim) para facilitar
enquanto subiam no convés.
A história do uso dessa calça, no nosso ponto de vista, deve ser incorporada
para compreendermos sua estética contemporânea. Até mesmo os primeiros
processos de lavagem dessa época, já nos trazem o gênesis do que se
transformou essa peça do vestuário: estes jeans iriam ser branqueados, pois
eram arrastados em grandes redes por trás do navio. A água do mar atritava a
superfície enquanto a lixívia (ver glossário, pág.124) a deixava branca.
Segundo inúmeras fontes, o nome vem da aglutinação da expressão “de Gene”
(de Gênova) usada pelos franceses.
Muitas são as histórias sobre a primeira peça de calças jeans da modernidade,
porém a mais mencionada pelos historiadores nos reporta a Levi Strauss, que
em 1847, com a idade de 24 anos, foi da Alemanha para São Francisco para
vender produtos para mineiros na corrida do ouro. Ele tinha levado consigo as
pesadas lonas de pano que originariamente destinavam-se a fazer tendas.
Porem, os seus clientes potenciais tinham outras necessidades: realizavam um
trabalho duro e precisavam portanto de uma roupa que os ajudasse a enfrentar
os rigores que as escavações de ouro exigiam. Atendendo às suas
solicitações, fundou a empresa Levi Strauss tornando-se universalmente
reconhecido como o inventor do jeans em 1853. Em 1870 associou-se a um
alfaiate de nevada, chamado Jacob Davis, que introduziu a aplicação de rebites
(ver glossário pág.124) de cobre nas laterais dos bolsos, conferindo-lhes maior
resistência. Assim que Levi Strauss e Jacob Davis adquiriram recursos e
tecnologia industrial para a produção em série, começaram a produzir os waist
overalls (calças usadas com suspensórios), com apenas um bolso traseiro com
21

a filigrana com desenho arqueado imitando a silhueta de uma águia, um bolso


relógio, com uma fileira de botões de pressão na braguilha, os rebites de cobre
e uma cinta e botões para suspensórios.

Fig.1 - 1º rebite. Fig.2 - Multiplicidade de rebites


Fonte: Huiguang, 2008. contemporâneos. Revista Eberle.

Em 1872 registrou a patente dessa peça que conquistou os corações (e as


pernas) de milhões de pessoas ao redor do mundo.
Desde o início, todas as imagens que rodeavam o jeanswear estavam lá: o
pioneirismo, a tenacidade, a aventura americana no oeste e a acentuada
individualidade.

Fig.3 - Mineradores Americanos. Fonte: LHOTE, 2003 e 4.bp.blogspot.com

Mudando a partir de seu original em lona (tecido feito com fio resistente em
ligamento tela – ver capítulo III, em tecelagem) para as pesadas sarjas (tecido
22

tramado na diagonal), produziram-se calças que foram aprovadas não só pelos


mineradores, mas também adotadas como uniforme dos homens de trabalho
que compunham a tradição da América: os “cowboys”, os ferroviários, os
trabalhadores do campo e até mesmo, na Guerra Civil, os uniformes dos
soldados foram feitos de denim (ver glossário, pág.120) (o termo denim é uma
corruptela da expressão: sarja ”de Nimes” – cidade da França de onde era
originariamente importado o tecido). Sua coloração original era o bege e só em
meados da década de 1940, recebe o tingimento com um corante extraído da
planta vinda da Índia: o índigo (ver glossário, pág.124), passando assim pela
sua primeira maquiagem estética: o índigo blue.
Segundo Nestor Sexe (2007), tão importante foi essa transformação e tão
indelével que, até hoje, quando nos referimos ao objeto jeans, imediatamente
sua identidade se revela: nós o visualizamos em azul, o original, o mais
produzido e o mais usado. Mas essa associação nos leva a conclusões
maiores na medida em que o próprio tecido do qual é produzido, o “denim
índigo blue” perde seu lugar, pois o nome “jeans” se apropria da sua
materialidade e o significa.
No consenso a palavra aglutina três significados: matéria prima, forma e
função, criando uma identidade própria, única, de entendimento quase
universal.

Fig.4 - “railmens”, “farm workers” e práticos “overalls”.


Fonte Sportswear, ed 48
23

Fig.5 - Cowboys dos filmes de far west, de John Waine a Brokeback Mountain. Fontes:
Sportswear, ed.48 e Huiguang, 2007.

Os “waist overalls” (como eram chamadas as calças jeans a princípio)


conquistaram os cowboys e, em 1926, a Levi's lança uma calça própria para
24

eles, com as pernas mais arqueadas, mais apropriadas para a montaria, então
surgem os “cowboys overalls”.
Em pouco tempo (mais ou menos nos anos 1930) a roupa dos “cowboys”
estava nas telas do cinema através de John Wayne, com as calças jeans de
bainha virada. Os filmes de “far west” tiveram grande sucesso e os novos
ídolos espalharam o modismo no chamado “cinema western”, também
popularizado como “filmes de cowboys”. Nas décadas que se seguiram,
seriados trazendo a mesma temática como Roy Rogers e Bonanza, entre
outros, reuniam as famílias em frente aos aparelhos de TV. Hoje, os rodeios
que acontecem no interior de todo Brasil, preservam esse estilo de jeans como
seu mais legítimo representante.
As calças jeans (Levi's), que eram parte da indumentária típica dos “cowboys”,
tornaram-se sinônimo de uma vida de independência, aventura, heroísmo e
virilidade. Atualmente a saga se ampliou e vimos, como no filme “O segredo de
Brokeback Mountain", retratado o desbravamento (agora social) dos gays
americanos. E o jeans continua sendo escolhido como vestuário fundamental.
Os autênticos desbravadores do oeste americano que passavam o dia inteiro
na sela aprenderam a obter um jeito de deixar aquele tecido rígido de seu novo
jeans mais confortável: entravam na água vestidos. As calças, dessa maneira
secavam no corpo, adquirindo as formas de seu usuário. O hábito desse
primeiro processo de amaciamento e encolhimento pelos cowboys se tornou
lenda.
E já que estamos falando em lendas, algumas são realmente curiosas (embora
fossem contadas como a mais pura verdade) e que valem nos lembrarmos: —
Na construção da estrada de ferro do extremo oeste Americano, uma calça
"blue-jeans", molhada e amarrada, foi utilizada para arrastar 9 vagões de trem
carregados, subindo uma inclinação de 10 graus. E outra: Um trabalhador
texano ficou pendurado durante vários minutos por um guindaste ao ser colhido
por um dos bolsos de sua calça "denim" no gancho do mesmo.
25

Lenda ou não, há bem pouco tempo (e


isso é fato) uma moça salvou dois
trabalhadores que ficaram pendurados
em um andaime, ao sabor de um
vendaval, jogando uma jaqueta jeans
para que eles, ao segurá-la,
permanecessem próximos à janela e
assim pudessem ser resgatados. Esse
fato aconteceu num prédio comercial em
São Paulo, em abril de 2009.
Juntaram-se depois, detalhes como o
pesponto em fio torçal laranja e a

Fig.6 - Jeans Levi’s 501 de 1922. Fonte: etiqueta de couro na parte traseira
Huiguang, 2007
(introduzido em 1886). Após a Levi's
vieram outros nomes conhecidos como Lee (fundada em zonas rurais do
estado do Kansas, em 1889) e Blue Bell, Wrangler (criada em 1904). A
Wangler especializou-se em atender o trabalhador do rancho (men western),
com características estritamente funcionais: pernas mais longas e com boca
suficientemente aberta para cair naturalmente sobre as botas, um pequeno
bolso relógio, botões flexíveis, um tipo de arco pespontado nos bolsos traseiros
e os respectivos travetes (reforço em zig-zag na costura das bocas dos bolsos
em lugar dos rebites, cuja patente pertencia à Levi’s). Todos esses elementos
foram pensados para facilitar as inúmeras horas de montaria.
Somente em 1926 foi introduzido o ziper (invenção de Whitcomb Judson em
1893) pela marca Lee Cooper nas suas calças
sendo, portanto, a primeira a adotar esse tipo de
fechamento nos jeans. Um detalhe interessante é
que os modelos femininos eram fechados na
lateral das peças, pois era inadmissível, naquela
época, que a abertura fosse frontal como as
masculinas. A própria Lee, revoluciona novamente

ao adotar o ziper frontal para ambos os sexos Fig.7 - 1ª empresa a adotar o


ziper.
cincoenta anos depois (HUIGUANG, 2007). Fonte: Huiguang, 2007
26

I.2 - O JEANS PÓS-MODERNO

I.2.A - Juventude e Rebeldia (comportamento)


A revolução cultural, entendida no seu sentido mais amplo como uma
revolução dos costumes, dos modos, da maneira de desfrutar o lazer e da
comunicação comercial, teve como matriz a cultura jovem, segundo Eric
Hobsbawn (2000). E é nesse contexto que encontramos consonância ao
pensamento de Lipovetsky (2004) numa sintonia para identificar o jeans como
representante da moda, na passagem do moderno para o pós-moderno, para
se instalar como termo da moda contemporânea. Ao enumerar os elementos
que caracterizam a pós-modernidade afirma que:

É com a extensão da lógica da moda ao conjunto


do corpo social (quando a sociedade inteira se
reestrutura segundo a lógica da sedução, da
renovação permanente e da diferenciação
marginal) que emerge o mundo pós-moderno
(LIPOVETSKY, 2004:19).

Essa “pós-modernidade”, segundo o autor, tem como sustentação a revolução


cultural que se estabelece quando a parte jovem da sociedade se manifesta.
De novo vemos um deslocamento do jeans de uma esfera cultural para a outra,
resignificando sua materialidade e sua função.
Quando o mundo ocidental saiu da depressão pós-guerra e os adolescentes e
jovens adultos começaram a se divertir como nunca, estabeleceu-se o que
chamamos de anos dourados. A indústria do entretenimento e a indústria
cultural se consolidaram. A invenção da televisão abriu inúmeras possibilidades
de comunicação, divulgando novos produtos e novas modas ao lado do
cinema.
Durante décadas, a moda infantil e juvenil foram simplesmente cópia das
roupas de seus pais, porem, durante a Segunda Guerra Mundial e
imediatamente a seguir, os jovens americanos (filhos do “baby boom”)
começaram a demanda e o estabelecimento da sua própria identidade. Essa
nova identidade vem em decorrência do descontentamento à situação belicista,
27

aos extremismos totalitários, à rigidez da conduta sexual, à falta de


perspectivas profissionais e a uma nova dimensão do lazer na vida cotidiana
pela emersão da indústria cultural.
Daniela Calanca nos esclarece dizendo:
O crescimento da cultura jovem ao longo dos anos
1950 e 1960 acelerou a difusão dos valores
hedonísticos e anticonformistas, exaltando a
espontaneidade, a ironia e a liberdade. O imaginário
juvenil daqueles anos determinou a indiferença em
relação ao vestuário da haute couture, identificado como
símbolo do que era velho. Com sua grande tradição
de requinte, como seus modelos reservados a
mulheres adultas e bem de vida, essa instituição foi
desacreditada pela nova exigência do individualismo
moderno: parecer jovem (CALANCA, 2008:206).

A categoria jovem, até então era restrita ao seu tempo de escola, pois após o
aprendizado de uma profissão, já eram considerados adultos e dessa maneira
passavam a agir. “O surgimento do adolescente como ator consciente de si
mesmo, era cada vez mais reconhecido entusiasticamente pelos fabricantes de
bens de consumo”, coloca Hobsbawm (2000), mostrando aí também o
redirecionamento da indústria, que passa a olhar para a juventude como um
segmento diferenciado.
A partir de então, ser jovem ou parecer jovem passa a ser um dos paradigmas
da sociedade ocidental. O jeans entra nesse momento como um dos elementos
de exteriorização dessa condição e um dos seus símbolos mais duradouros.
Ao longo dos seus mais de 170 anos, esse ancião nunca perdeu seu papel
como legítimo representante da juventude. Foi e continua sendo a peça eleita
por ela como a fundamental, a mais usada, emblemática e insubstituível em
seu guarda-roupa.
Os jovens de classe média americana, em final da década de 1940 já haviam
começado a vestir jeans, até então considerado somente o ”uniforme dos
trabalhadores”, como o seu próprio símbolo de uniforme “fashion”. Essa
escolha foi decididamente casual, porém pela conotação vulgar do trabalho
árduo, manual e mal reconhecido ao qual estava ligado, acabou irritando os
pais, educadores e a sociedade em geral que desaprovavam a opção. Esse foi,
naturalmente, o reforço para que toda a idéia se solidificasse (Sportswear,
28

edição no 48). Passou-se mais de uma década antes que os europeus


seguissem o exemplo americano.
A partir daí, ganhando ritmo nos Estados Unidos e tendo repercussões
significantes também na Europa e no Brasil, o papel do denim como um
uniforme anti-social se estabelece. Gangues de motos que aterrorizavam
pequenas vilas californianas no fim dos anos 1940 viam-se eles mesmos como
“cowboys” século 20, que tinham trocado os seus cavalos por Harley-
Davidsons, mas mantiveram o uniforme jeans dos autênticos cowboys. O
jeans estava começando a obter uma reputação de rebeldia. Essa reputação,
posteriormente foi manipulada pela mídia para que, livre desse estigma,
pudesse atender a outros mercados.
Até o início dos anos 1950, a sua popularidade como um uniforme do jovem foi
crescendo em ritmo acelerado na América do Norte e a indústria
cinematográfica americana, cuja distribuição, nessa época era maciça, se
encarrega de disseminar suas idéias. Filmes como “A Wild One” – “O
Selvagem” (1953) e “On the waterfront” (1954), com Marlon Brando seguidos
por James Dean em “Rebel whithout a cause” (“Rebelde sem causa”, 1955)
aceleraram o processo de exportar as idéias americanas para o resto do
mundo. Esses atores simbolizavam a rebeldia contra o stablishment (ver
glossário pág. 125), a liberdade, o descomprometimento, enfim tudo que o
jovem ansiava e a decorrência natural foi a enorme legião de seguidores.

Fig.8 - Marlon Brando em “O Selvagem”


fonte: Cinema Year by year, 1996.
29

Em “A história social da moda, Daniela Calanca traça um panorama sobre esse


período, enfatizando o aspecto ”anti-moda” que se estabelece aí. Diz ela:

Ora, mesmo radicada em um contexto histórico-


cultural que não é nem um pouco unívoco, a
fragmentação da moda está ligada também, e
sobretudo, a um fenômeno histórico bem preciso, isto
é, às modas juvenis que surgiram depois da Segunda
Guerra Mundial, denominadas "antimodas", apesar
de o fenómeno da antimoda ser mais antigo.
Tornando absoluta a distância em relação a tudo o
que é conforme à regra estética e moral, o elemento
central da antimoda consiste na referência a ideais,
valores e concepções da existência radicalmente
opostos aos padrões vigentes. É um fenómeno que
assume formas e temas de diversas fontes culturais,
como a indignação contra o utilitarismo, naturalismo
salutar, protestos feministas, ceticismo conservador,
a "des-identificação" das minorias e a afronta da
contracultura. Os representantes da contracultura, os
beatniks dos anos 1950, os hippies dos anos 1960 e os
punks dos anos 1980 (com as suas subdivisões
estilísticas: skeenheads, roqueiros, metaleiros etc.)
tentam diminuir a importância dos grupos culturais
dominantes. Os cabelos compridos, os colares, os
braceletes, os tecidos floridos são símbolos que
marcam radicalmente a oposição a tudo o que é
dominante. Os estilos proclamam, por assim dizer, a
ruptura, o desprezo pelos valores comumente
aceitos. Nesse sentido, os anos 1960 são um período
de grande revolução em todo o mundo ocidental. Dos
Estados Unidos à Holanda, as jovens gerações
recusam os modelos existentes e procuram novas
formas que possam manifestar uma ruptura com a
ordem constituída. Trata-se de um fenómeno de
massa que atinge todos os âmbitos da existência
cotidiana, das relações entre os sexos à concepção de
trabalho e tempo livre ( CALANCA, 2008:191).

A década de 1960 solidifica a postura “anti-stablishment” que seus usuários


haviam adotado em meados dos anos 1950: o denim gasto, o azul desbotado,
as barras puídas podem ser vistos em imagens de festivais como o de rock de
Woodstock e filmes cult como “Easy Rider” (“Sem destino”), ambos em 1969.
30

Fig.9 - “Easy Rider” -1969) Fig.10 - Fest. de Woodstock. Fonte:


Fonte: sportswear ed.48 countryjoe.com/hires

E a história da rebeldia do jeans não se esgota aqui. Ela segue paralela ao da


sua disseminação pelo mundo, como trataremos no capítulo: Difusão do Jeans.

I.2.B - Identidade da mulher (construção social do gênero)


O jeans entra também como adjunto na elaboração da nova identidade
feminina, que a partir daí se constrói: mais atuante e mais liberta.
O primeiro passo para que essa construção se manifestasse, foi o que tornou o
jeanswear unissex - todos poderiam usar o mesmo modelo e sentir-se cada vez
mais integrados ao quase global grupo de jovens descontentes,
independentemente do gênero. A liberação sexual através das pílulas
anticoncepcionais, os movimentos feministas e as reivindicações por iguais
oportunidades no mercado de trabalho, deram às mulheres a plena aceitação
por esse tipo de produto. Foi essa demanda que fez com que as primeiras
boutiques especializadas em jeans começassem a ser abertas, oferecendo,
porém, nada muito longe dos estilos básicos e funcionais.
A mudança nas relações entre homens e mulheres, teve seu reflexo no
vestuário, que passou a ter como forte referência, o mercado de roupas
industrializadas. Anne Hollander nos diz:

Como os sexos já eram oficialmente iguais, o novo


método para fugir do mito romântico era fazer com
que parecessem idênticos tomando por base o
modelo superior masculino, é claro [...] O material
expressivo usado para combater a situação veio
desta vez das roupas de trabalho masculinas
produzidas em série, mais notavelmente do
célebre blue jeans.(HOLLANDER, 1994: 207).
31

Como todo movimento gera um outro contrário, o jeans


teve um novo e relevante componente neste período: o
reforço da imagem sexy. Mulheres em cidades
americanas tinham aprendido sobre o conforto e a
praticidade das calças compridas no lugar das saias e
vestidos, pois as usaram para trabalhar nas fábricas
em tempo de guerra. Na década de 1950, atrizes como
Marilyn Monroe e Jayne Mansfield, com suas imagens
provocantes, só tiveram de vestir jeans apertado para
mostrar de que forma a tradicional vestimenta de
trabalho poderia ser sexy.
Antes disso, sob muita resistência, foi postada na
Vogue Americana, uma publicidade do jeans feminino Fig.11 - Marlin Monroe na
década 1960. Fonte:
da Levi’s (1935). Pela primeira vez agregando-se sportswear, edição 48
valores de charme e modernidade à praticidade já
consolidada, na tentativa de considerar o jeans como peça
fashion, podendo fazer parte do guarda-roupa diário das
americanas. Sem muito sucesso na época.
Somente quando as moças que trabalhavam em escritórios,
escolas e lojas, obtendo sua própria renda e sem muito
comprometimento com o tipo de gasto masculino, em
bebidas e cigarro, que o mercado começou a olhar para
elas com interesse particular. Tinham, segundo Hobsbawn
(2000), um maior poder aquisitivo, podendo decidir onde
gastá-lo, e essa renda foi direcionada a princípio, ao
vestuário, aos cosméticos e a discos populares.
Aos poucos, o jeans feminino foi ganhando espaço, através

Fig.12 - Jeans de modelagens adequadas ao seu corpo (o período unissex


Stretch, 1980. obrigava a que inúmeras “penses” fossem feitas no cós das
Fonte: Sportswear
ed 48 calças para que não escorregassem das finas cinturas).
Mais tarde, por volta do final da década de 1970 e início de 1980, o mercado
denim foi se direcionando predominantemente às mulheres.
32

Durante esse período, a expressão "Celebrity jeans" teria sido um bom nome,
pois as pessoas “socialites” americanas como Gloria Vanderbilt, atrizes como
Joan Collins (pré-Dinastia) e cabeleireiro Vidal Sassoon emprestaram os seus
nomes para linhas de jeans.
Aqui no Brasil, a marca Dijon associou seu produto a modelos como Luisa
Brunet e Monique Evans, conseguindo assim fortalecer a imagem da
sensualidade da mulher brasileira, pois uma parte importante do design do
jeans, nesse período, foi o predomínio da
“sexy stretch jeans pants” (o elastano que
tinha sido introduzido em meados dos anos
1960, explode na sua mistura com o denim). A
partir daí ele se tornou um item fortíssimo
como diferencial, tornando-o não só mais sexy,
porém muito mais confortável, pois essa feliz
fusão de fibras proporcionou maior mobilidade,
acompanhando de perto o movimento do
corpo que as veste.
A associação jeans – sensualidade vai
ganhando espaço até se tornar um dos
Fig.13 - Humberto Saad e Luiza
recursos de maior resultado na promoção Brunet – publicidade Dijon. Fonte:
tribojeans.blogspot.com
dessa peça, como veremos adiante.

I.3 - DIFUSÃO DO JEANS


David Harvey explica o espaço/tempo na vida social esclarecendo os vínculos
materiais entre processos políticos econômicos e processos culturais. O
fundamental é a idéia de que o tempo e o espaço não podem ser
compreendidos independentemente da ação social. O autor considera em
particular como o próprio significado e a própria percepção de tempo e do
espaço variam, mostrando que essa variação afeta valores individuais e
processos sociais de maneira fundamental. A marca da vida pós-moderna está
caracterizada por uma sociedade global sem fronteiras (ampliação do espaço),
onde o lazer é incorporado ao nosso cotidiano (redimensionamento do tempo).
33

I.3.A - Atravessando o Atlântico


Fabricantes de vestuário na Europa tinham começado as suas próprias marcas
de jeans em final da década de 1950, mas as marcas americanas ainda eram
as mais valorizadas. O jeans recria então do outro lado do Atlântico, a mítica
sobre o estilo de vida americano, recebendo plena aceitação. O pensamento
jovem, sem idéias pré-concebidas, imbuído da novidade, da liberdade e da
experimentação, inicia, através do seu vestuário, um novo paradigma visual.
Lipovetsky nos ilustra bem quando fala desse período:

No momento em que se eclipsa o imperativo do


vestuário dispendioso, todas as formas, todos os
estilos, todos os materiais, ganham uma
legitimidade de moda: o descuidado, o tosco, o
rasgado, o descosturado, o desmazelado, o
gasto, o desfiado, o esgarçado, até então
rigorosamente excluídos, vêem-se incorporados
no mundo da moda. Reciclando os signos
“inferiores”, a moda prossegue sua dinâmica
democrática, como o fizeram, depois da metade
do século XIX, a arte moderna e as vanguardas
(LIPOVETSKY, 1989:121).

O mesmo Lipovetsky, em seu livro “Os tempos Hipermodernos” coloca nesse


período (a partir da década de 1950) as relações comerciais como
correspondente à segunda fase do consumo, pois ele deixa de ser privilégio
das classes mais abastadas e passa para o consumo de massa ao passarmos
do modelo aristocrático ao da ideologia individualista, hedonista, à alienação ou
ao domínio das necessidades pela sedução. Ele explica:

Entramos na era do Hiper, caracterizada pelo


hiper-consumo, pela hiper-modernidade e pelo
hiper-narcisismo. Encontramos assim a passagem
do capitalismo de produção para uma economia
de consumo e de comunicação de massa
(LIPOVETSKY, 2004:67).

E a disseminação do jeans se acentuou paralelamente à explosão do


movimento musical Rock’n’roll na metade dos anos 50, atingindo não só o
34

público americano (incluindo aqui os habitantes da América do Sul), mas


também o europeu. Quando Elvis Presley cantou e dançou em “Jailhouse rock”
(1957), seu uniforme em denim transmitia com ele uma imagem potente e viril.
“A imagem dos cantores de rock, assim como os versos de suas canções,
representam em si uma mensagem de ruptura” diz Calanca (2008:191).
Ruptura essa que fez com que de lá para os dias de hoje, o jeans e o rock se
tornassem inseparáveis, consolidando-se como a expressão cultural da
juventude, nas palavras de Hobsbawm (2000).
Nos anos que se seguiram, o fenômeno Rock’n Roll envolveu grupos jovens
em jeans e nomes como Beatles, Janis Joplin, Brian Jones, Jimi Hendrix e
tantos outros colocaram a Inglaterra em destaque na moda, bem como na
música, embora os Estados Unidos ainda tivessem um forte papel influenciador
através do seu ideal de felicidade: “The American Dream”. A Califórnia se
tornou um líder inspirador com a filosofia Beach Boys: do sol, surf e diversão. O
Estado dourado parecia-se como o paraíso.

.
Fig.14 - Década 1970 Fig.15 - Década 1970 Fig.16 - Calça em
Calça pintada. Fonte: Look em jeans. patchwork. Fonte:
populuxebooks.com Fonte: Pucci jeans Kioto Moda, 2007

Em meados de 1960, o aumento do movimento hippie (com suas idéias


pacifistas e comunitárias) em San Francisco manteve a atenção sobre a Costa
35

Oeste e previsivelmente o denim foi encontrado para ser o tecido ideal: barato
e funcional, no qual as pessoas pudessem expressar sua própria identidade.
Os hippies inscreviam nas calças jeans suas mensagens, seus bordados, suas
flores, seus tecidos coloridos em forma de aplicações. A liberdade que alguns
hippies e místicos pregavam ao lado da paz e do amor livre, trazia junto o
desprezo à roupa limpa e arrumada, uma vez que, para eles, era um sinal de
comprometimento com o sistema. Vemos agregada aí uma outra marca às que
o jeans já havia incorporado. E esse despojamento dos hippies serviu de
inspiração para os grandes fabricantes, que perceberam a oportunidade de
inovar nos acabamentos e produzir seus jeans já com esses aspectos.
O jeans assume então um outro valor, diferente daquele original: o da
legitimação cultural que, segundo Calanca, é a base para que o jeans
alcançasse o status atual. Ela segue dizendo:

O blue jeans consegue superar quase todas as


divisões de classe, sexo, idade e ultrapassar os
limites regionais, nacionais e ideológicos para se
tornar a peça de vestuário universalmente mais
aceita. Segundo os historiadores do costume, o jeans
sofreu um processo de legitimação cultural que o levou
a adquirir significados diferentes daqueles iniciais, de
outra forma não se explicaria como essa peça de
roupa monocromática e nada refinada conseguiu
exercer tal fascínio. Considerando sua origem, a longa
identificação com a imagem do trabalhador, do duro
trabalho físico, do oeste americano, os sociólogos
afirmam que grande parte da mística do blue jeans
parece derivar de sentimentos populares de
democracia, igualdade, independência, liberdade e
fraternidade. (CALANCA, 2008:194).

Na década de 1970 essa legitimação cultural se solidifica através de um outro


movimento urbano: os Punks, que mesmo sem intenção, tornaram-se grandes
influenciadores do mercado de jeans, até o contemporâneo.
Embora tendo como origem os grupos chamados de “Garage Band” em New-
York, os Punks eram o perfeito espelho da sociedade inglesa em 1977. Nessa
época a Inglaterra passava por uma grande crise econômica e o índice de
desemprego era alarmante. Esses jovens tinham nenhuma ou muito poucas
36

oportunidades profissionais. Contestavam o sistema através da sua música,


das atitudes irônicas e niilistas e do seu visual agressivo.
Grupos de rock influenciaram toda uma geração, pelas atitudes
(anticonformistas, rebeldes e contestatórias), pelas letras das músicas (ou
ausência delas), pelos sons desconexos e ensurdecedores. Tornaram-se,
como se denominava na época, a “tribo urbana” mais contestadora, inclusive
na indumentária: o jeans detonado, sujo e rasgado, preso muitas vezes por
alfinetes, adornado com metais dos mais diversos, juntamente com couro
preto, tatuagens, piercings e cortes de cabelo inusitados tornaram-se a
identificação exterior da sua revolta (BOLLON, 1993). Sua imagem sobrevive
até nossos dias, embora esvaziado das significações originais. Seus
estereótipos, hoje estão por toda parte: jeans rasgados e com aspecto de sujo,
demandam mudanças na indústria para obtê-los antes da sua comercialização,
para todas as classes sociais; “piercings” e tatuagens são utilizados
indiscriminadamente por vários grupos urbanos; taxas, rebites e ilhoses são
adotados até mesmo pela alta-costura. A mistura de materiais aparentemente
díspares na elaboração de uma peça torna-se comum. Na década de 1980,
estilistas como Vivienne Westwood e o belga Walter van Beirendonck (hoje
diretor criativo do departamento de moda da Antwerp Fine Arts Royal
Academy) ajudaram a disseminar esses signos.

. Fig.18 - Beirendonck, 1997.


Fig.17 - Punks em Paris,1979.
Fonte: Profiles.friendster.com Fonte DERYCKE
37

A inglesa Vivienne Westwood, casada com um


dos precursores do movimento Punk, adotou
seu estilo, incorporando a nova estética – dos
rasgos, dos desfiados, dos furos nos tecidos –
para a passarela de moda em 1980.
Nos anos 80, o marketing e a publicidade de
moda caminharam para uma nova abordagem,
relacionando as imagens dos produtos das
marcas ao comportamento do público-alvo. As
campanhas passaram a dar ênfase ao apelo
emocional, atribuindo mais importância à
associação da emoção e à identificação com a
marca do que às qualidades e características
Fig.19 - Vivienne Westwood,
desfile 1980. dos produtos. As primeiras marcas brasileiras a
Fonte: DERYCKE, 1999.
aderirem ao novo formato de promover conceitos
ao invés de vender apenas produtos foram, em sua maioria, as que tinham um
público consumidor jovem, como a Triton e a Zoomp. Na época, elas
conquistaram o consumidor com campanhas que demonstravam atitude e um
estilo de vida moderno (ZIBETTI, 2007).

I.3.B - Sedimentação Brasil


No Brasil o jeans é incorporado a nossa cultura como produto da sedimentação
de um processo diferente daquele que o legitimou na cultura americana.
Seguindo o pensamento de Harvey, ele alinha-se a uma racionalidade
econômica capitalista tradicional que se revelou tipicamente concentracionista,
sustentando-se numa economia em busca do acúmulo de riquezas. Ele aponta
a crise do início dos anos setenta como um período de transição de um padrão
de acumulação capitalista rígido (que ele denominou “fordismo”) e suas forças
produtivas. Essas novas experiências nos domínios de organização industrial
surgem simultaneamente aos primeiros indícios de um regime de acumulação
inteiramente novo, associado com um sistema de regulamentação política e
social bem distinta: a Acumulação Flexível.
38

Esse termo criado por Harvey, define as inovações no processo de produção,


novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados,
novas técnicas, ou seja, uma corrida em busca do moderno, do atraente. Na
verdade seria uma revolução em todos os setores, surgindo um novo ciclo de
compreensão do espaço-tempo. Explora a ligação com as novas práticas e
formas culturais, considerando: a contribuição das novas tecnologias, o
surgimento de uma prática de obsolescência das coisas, o papel do consumo,
da moda e a manipulação de opinião e gosto, a partir da construção de novos
sistemas de signos e imagens.
Os jovens brasileiros absorveram, como os europeus, o ideal de vida
disseminado através de filmes, cuja indústria ia a todo vapor: o “America way of
life”, e com ele, usos e alguns costumes.
Aqui no Brasil a empresa “Roupas AB” de S. Paulo havia lançado em 1948 a
primeira calça de brim azul: a “Rancheiro”. Por ser um material muito rígido,
não obteve muito sucesso, mas o jeans, durante muito tempo, foi conhecido
por esse nome. Um pouco mais tarde a Alpargatas lança as calças “Rodeio”
confeccionadas com o brim Coringa, porém apenas em 1956, quando lança as
calças “Far-West” é que o mercado começa a olhar para o produto nacional
como as “calças que resistem a tudo”. Anos mais tarde, quando começava o
processo de desgaste e amaciamentos mecânicos-químicos, era comum
encontrarem-se pedras pome (usadas no processo stone washed) nos seus
bolsos.

as
Fig.20- Propagandas das 1 calças jeans fabricadas no Brasil. Fonte: site bricabrac.com.br
39

Em 1947, no entanto, a importação se fazia através do catálogo de vendas da


americana Sears, Roebuck and Co, que já oferecia Blue Jeans com
modelagem especial para mulheres e calças em índigo blue, em estilo cowboy,
para adolescentes e rapazes.
A importação de jeans americano, no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro e
São Paulo, durante a década de 1960 era grande. Os jeans eram chamados de
“calça Lee” pelos jovens burgueses, devido à distribuição, quase que exclusiva,
desses jeans americanos no comércio das lojas, chamadas importadoras.
Essas calças eram as mais cobiçadas pela juventude pelos signos que
estavam instalados em sua configuração: liberdade, autenticidade,
contestação, rebeldia etc.
Impossível deixar de citar Renato Teixeira, ao criar o “jingle” com o qual a
marca US Top veiculava, em rede nacional de televisão, a publicidade de seu
produto. Todo o Brasil reconhecia e sabia cantar: “Liberdade é uma calça
velha, azul e desbotada, que você pode usar do jeito que quiser (não usa quem
não quer). US Top desbota e perde o vinco (denim índigo blue)”. A idéia
associa claramente o uso da calça à liberdade, mas principalmente,
estabelece, mais uma vez, uma direta crítica ao “satus cuo”, ao vestuário
tradicional, ao citar o inverso do que era esperado na época em que foi lançado
o Tergal e o Nycron –em calças que não amassavam e nem perdiam o vinco-.
As calças Lee, aos poucos, começaram a dividir espaço com as produções
nacionais.
Esse processo de valorização do produto nacional veio também pela
conscientização dos fabricantes da necessidade de melhoria na qualidade das
peças, para que pudessem concorrer com os importados. Assim, em meados
da década de 1990, a top model brasileira Gisele Bündchen se consagra no
cenário da moda global, ajudando a divulgar ao mundo a beleza da mulher
brasileira e despertando, também, o olhar do mundo para a cultura nacional e
para os produtos “made in Brazil”. E as marcas de jeanswear brasileiras como
Fórum, Zoomp e Ellus, já solidificadas aqui, começam a exportar seu produto.
40

Empresas como a Santista e a Vicunha


passaram a fabricar o tecido denim,
tornando-se hoje, umas das maiores
exportadoras desse produto.
Segundo dados do IEMI (Inst. de
Estudos e Marketing Industrial), o país
produz (com dados de 2008) em torno
de 25,7 milhões de metros de tecidos
denim por mês. A empresa Vicunha é
responsável por cerca de 12 milhões de
metros a cada mês e a Santista, produz
8,5 milhões. Cedro Cachoeira, Canatiba
Fig.21- Gisele Bündchen em shorts jeans.
e Santana Têxtil – também ocupam Fonte: 4.bp.blogspot.com

posições relevantes no mercado nacional.


A produção de calças jeans no Brasil seguiu um ritmo crescente até 2007,
tendo tido uma ligeira queda em 2008, face à crise econômica mundial. A
tabela abaixo nos traz os dados da produção nacional dos últimos anos,
segundo o IMI:
2000 - 155.174.000 peças
2001 - 193.530.000 peças
2002 - 196.464.000 peças
2003 - 198.467.000 peças
2004 - 204.207.000 peças
2005 - 216.521.000 peças
2006 - 217.180.000 peças
2007 - 225.476.628 peças
2008 - 223.627.719 peças

Atualmente esse mercado movimenta R$ 8,2 bilhões por ano, segundo dados
da ABIT (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e da Confecção).
41

I.3.C - Ampliação do conceito Jeans


O início da grande revolução industrial do “prêt-à-porter”, (ou “read to wear”)
onde a produção em série perde o estigma de roupa para as classes menos
favorecidas, pois eram mal cortadas e de acabamento duvidoso e passa a ser
o grande caminho da moda. A que atende a várias estratificações sócio-
econômicas, de maneira rápida, na verdade imediata, sem as esperas comuns
de alinhavos e “provas” até que a roupa estivesse pronta.
Estabelece-se também aí, o início das mudanças experimentais na moda, cujo
resultado “inferior” começa a ser aceito.
Daniela Calanca, nos ilustra dizendo que “Desde seu surgimento, o prêt-à-porter
representa uma inovação, pois a lógica implícita nele é a de eliminar da imagem
pública, a conotação negativa das confecções em série tradicionais. A intenção é dar
um novo valor estilístico ao produto industrial associado - de início - às fibras
sintéticas” (CALANCA, 2008:206).
O fruto do uso “hard” das profissões que o utilizavam a princípio (mineradores,
camponeses, vaqueiros etc): desbotados, puídos, furos, esgarçados passam a
ser sistematicamente fabricados através de interferência mecânica de
abrasivos como rebolo, esmeril, lixas, pedras etc e o amassado, resultante do
uso comum de qualquer peça de vestuário, passa a ser reproduzido
industrialmente por procedimento químico-físico (ver o capítulo sobre jeans
design e tecnologia). Assim, sucessivamente, manchados, desfiados,
repuxados saem do universo jeans para se transmutarem em malhas
desbotadas, bainhas sem acabamento, cortes irregulares, furos e rasgos
propositais nas mais diversas peças e com os mais diversos materiais.
Na Europa, por volta de 1968, Saint Tropez, que era o principal centro de
influência da moda, começou a ver o denim retrabalhado em bonés, bolsas,
sapatos. Os fabricantes, aproveitando a receptividade, aumentaram os seus
experimentos com qualidades, lavagens, cores e padrões diferenciados.
Mas à medida que se inicia a década de 1970 e durante alguns anos,
aconteceu uma coisa incomum no mercado de moda: o jeans se torna o grande
influenciador do mercado europeu. Fabricantes como Peter Golding (Reino
Unido), Fiorucci (Itália) e Marithé et François Girbaud (França) tomam o denim
como matéria prima e diversificam o estilo do que começaram a produzir.
42

Foram além do americano original. Cinturas abaixo da linha tradicional das


calças, tachas e rebites com brilhos e bocas de sino ganham grande
popularidade entre os consumidores incessantemente ávidos por variedade.
Vestia-se total denim: jaquetas, calças, bermudas, shorts, apareceram vestidos
e até mesmo a alta-costura francesa começou a experimentação com denim - o
tecido do trabalhador tinha sido aceito por todos os níveis da sociedade. O
denim acabou criando uma nova moda, um novo estilo na Europa e que foi
prontamente aceito na maioria dos países do mundo ocidental.
A pronta aceitação neste momento se deu pelo fato de que os respeitáveis
adultos passaram de imagem modelo a imitadores dos seus filhos através do
uso de denim.
Nesse cenário, a cultura jeans, indelevelmente associada à juventude que
todos queriam (e ainda querem) passa a simbolizar a condição de ser
eternamente jovem.
O jeans propiciou também a fantasia de estilos. Liderados a partir do “power-
flower” do movimento hippie - foram embelezados como nunca antes, muitas
vezes, a níveis duvidosos (tal excesso de ornamentos) com bordados,
aplicações de patches (ver glossário, pág.124), miçangas e paetês, tachas,
ilhoses (ver glossário, pág.123), etc. enfim, com mil detalhes nas suas já
enormes “bocas de sino”. Sua superfície também servia como uma espécie de
tela para símbolos, desenhos e mensagens que expressavam sua filosofia.
A década de 1970 traz tambem, como vimos, um dos movimentos mais
significativos em termos de radicalização do vestuário: o Punk. Eles se
apropriaram do jeans rasgado como uma segunda pele, fazendo dele um dos
seus estereótipos mais consumidos na época e cujo visual tem sido re-visitado
até hoje, como inspiração para novas coleções.
Essa estética anticonvencional, que nasce a partir do jeans, no nosso
entendimento, estabeleceu a possibilidade da sua apropriação por outros
segmentos do vestuário. Ganharam mercado os tecidos manchados, crepes
amassados, malhas esburacadas, trabalhos em patchwork etc.
Vemos tambem nessa mesma década, o surgimento do movimento da escola
Belga, tendo como principais representantes: Anne Demeleumeester e Martin
Margiela, que com seu desconstrutivismo (ver glossário, pág.120), reforçam a
43

idéia do não convencional. Trabalhos voltados para um resultado de


desestruturação, tanto da imagem do corpo real, como dos acabamentos
formais ou da modelagem.

Fig.22- Martin Margiela e o desconstrutivismo no vestuário.


Fonte:www.maisonmargiela

A esse movimento, somaram-se outros: o Grunge (ver glossário pág.122)


inspirado no movimento musical homônimo nos Estados Unidos e o Pauperism
(ver glossário pág.124), como era chamado na França, tendo como principais
defensores os estilistas japoneses. Ambos apoiavam-se no despojado,
sugerindo conforto acima de tudo, com
roupas amplas, desestruturadas e um clima
naturalista, quase artesanal. Os dois
movimentos contribuiram para que a imagem
de moda se orientasse em uma nova
direção: cortes assimétricos, volumes
inusitados, peças sem acabamentos,
sobreposições díspares, o avesso utilizado
como direito, subvertendo toda a percepção
tradicional do que se considerava, na época,
uma roupa bem feita.
Rei Kawakubo, quase ao mesmo tempo,
Fig.23- Rei Kawakubo em 1981).
adota uma atitude semelhante e polêmica. Fonte: DERICKE, 1999

Desde seu primeiro desfile em Paris (no ano de 1981) para sua marca “Comme
des Garçons”, foi considerada um marco de renovação da moda. Mesmo
44

conhecendo bem as tradições da alta-costura francesa, com seu rigor no corte


e precisão na costura, vai buscar no streetstyle londrino, inspiração para o seu
trabalho criando uma linguagem única, apresentando roupas de malha com
furos como se houvessem desfiado ou rasgado, paletós abotoados nas costas
ou coleções inteiras sem acabamentos nas bainhas.

I.3.D - Jeans sedução


O culto ao corpo, que a partir do início dos anos 1970 retoma a tendência
iniciada, no início do século XX, atinge o seu auge na década de 1980,
responsável também pela hedonista e saudável mania do “jogging”, ginástica
aeróbica e suas atividades derivadas.
Nessa época surge um ícone que personifica
esses ideais de corpo e mente direcionados
para a juventude: a pop-star Madonna.
Brincando com todos os tabus e clichês mais
comuns, Madonna apresenta seu corpo como
algo extremamente ”sexualizado” e ao mesmo
tempo, construído: é um corpo elaborado,
resultado da ginástica aeróbica, musculação e
dietas. Madonna, como percebemos, carrega
até hoje a premissa dos anos 1980, segundo a
qual é possível modelar-se e tornar-se o que se
desejar (CALANCA, 2008).
Fig.24- Madonna década de 1980. Essa modelagem do corpo, que nas décadas
Fonte: http://4.bp.blogspot.com
subsequentes atinge níveis surpreendentes
pela facilitação em “suaves prestações” de intervenções cirúrgicas, lipo-
esculturas, silicones, botox etc, promove um aumento gradativo da exposição
dos corpos, agora impostos e igualitados pela mídia (VILLAÇA, 2007).
Baudrillard estabelece o diálogo com o marketing, colocando que “Seduzir é
morrer como realidade e se produzir como artifício” (BAUDRILLARD apud
CATOIRA, 2006: 35). Essa premissa encontra consonância até a
contemporaneidade.
45

Na sua dissertação de Mestrado: “Moda e Comportamento nas Sociedades


Cariocas”, Anna Clara reflete que:
O universo da moda nos oferece infinitas possibilidades
de comunicação com as pessoas dentro de uma
sociedade, que interagem com as ambições de cada
indivíduo, de acordo com seu poder em discernir os
códigos apresentados por um verdadeiro"cardápio" de
construções da imagem. [...] Estamos o tempo todo,
conectados com um mundo imagético que nos impregna
incessantemente de novos conceitos, novas
possibilidades formadoras do vestir e, principalmente,
do pensar (sujeitos manipulados), e já que copiar é
natural do ser humano, estamos sempre nos
apropriando de histórias distas da nossa realidade,
dando-lhes apenas um olhar particular ao que já está
criado (e na maioria das vezes sancionadas pelo
nosso grupo social), sempre buscando comunicar uma
identidade, onde manipular a partir daí, seu próprio
personagem ("parecer ser") está na regência autônoma
de conjunção das peças de nossas roupas, que irão
participar à sociedade a construção de nossa imagem,
seja ela autoral (dotada de estilo próprio) ou movida pela
rigidez da "ditadura" da moda (quando delega o que
devemos usar e o que devemos descartar) (TAVARES,
2007:18).

Somando o desejo real ou imposto pela mídia


ao excesso de produção da década de 1980,
grandes mudanças urgiam. A fabricação
acabou se tornando um problema em relação à
demanda, pois ela não acompanhou o mesmo
ritmo de crescimento - estimava-se que,
mesmo na Inglaterra, relativamente um
mercado pequeno, havia mais de 100 marcas
de jeans em 1982.
Houve, por conseqüência, uma reviravolta na
relação produção X consumo e uma queda nas
vendas, tendo em vista um mercado que agora
Fig.25- Brooke Shields, 1981.
Fonte:Site da marca. se tornara muito competitivo. Na busca pela
manutenção e até mesmo aumento do volume de peças comercializado,
fabricantes de jeans usaram como estratégia a diferenciação pela
46

autenticidade, outros pelo luxo, pela sedução, pela modelagem, pelo design
etc.
Todas as estratégias se mostraram eficazes, mas desde que Calvin Klein
colocou Brooke Shields, então a ninfeta do momento, num imenso outdoor na
Times Square em New York com a afirmação: ”entre eu e o meu jeans não
existe mais nada”, a sensualidade se instala definitivamente ao lado do jeans.
Ela está presente na concepção, na matéria prima, na modelagem, na atitude
do uso e na publicidade das marcas de jeans, até hoje, como veremos adiante.
A preocupação estética da modelagem dos corpos vem de encontro à
exposição desse corpo através dos tecidos “stretch”. O jeans ganha, então um
fôlego a mais, pois, pela sua estrutura mais forte do que os tecidos de “Lycra”
(marca da malha construída com fio de elastano, pioneira nesse segmento),
além de “colar” ao corpo como uma segunda pele, ele o sustenta, promovendo
e facilitando sua re-modelagem.
A primeira empresa a fabricar o jeans com essa mistura foi a Leger Milk, da
Itália, no final da década de 70, que passou a produzir o denim com certa
porcentagem de fibra elástica, com a proposta de fazer com que a roupa
tomasse formas mais próximas ao corpo. A princípio, a idéia
teve poucos adeptos, mas algum tempo depois, quando a
Levi's lançou a linha feminina no Reino Unido, as inglesas,
literalmente, aderiram à tendência. Na década de 1980,
então, encontrando consonância com o cenário do qual
falamos anteriormente, essa junção se solidifica se espalha
pelo mundo ocidental.
Vemos também que a relação do sujeito contemporâneo
com seu corpo se revela em constante mutação, derrubando
as barreiras que impeçam a sua plena realização. As
últimas décadas viram a eliminação das fronteiras, entre o
Fig.26- Exibição do
corpo sadio e o doente (avanços das ciências médicas), o corpo através do
jeans.
masculino e o feminino (gays liberando componentes sannasjeans.com

femininos na masculinidade e lésbicas, o inverso), corpo normal e anormal


(próteses), sexualidade e bissexualidade à flor da pele ou o sexo distante do
toque pelas simulações eletrônicas etc. (COURTINE, 2008). Abre-se então
47

espaço para a revelação desse corpo em público, de várias maneiras. Uma


delas...O Jeans.
Aqui no Brasil, especialmente no Rio de Janeiro, o movimento musical Funk
que deu origem aos bailes de mesmo nome, expõem os corpos e as atitudes
sexuais de maneira aberta, utilizando o jeans como veículo dessa exposição.
A partir do final da década de 1980 constatou-se então a supervalorização do
jeans em designers como Marithé e François Girbaud, Katharine Hamnett,
Calvin Klein, Paul Smith, e em marcas como Diesel, Miss Sixty, Replay, Forum
e Zoomp entre outras. Essas “griffes” fabricavam regularmente denim nas suas
coleções, muitas vezes, executando uma completa linha de produtos, usando a
sensualidade e até mesmo a sexualidade, colocando-as num papel mais
evidente, como estratégia de marketing.
As publicidades passam a utilizar imagens mais agressivas e a sensualidade
que até então era sutil, se torna cada vez mais evidenciada, além da
exploração das formas e dos corpos ou da insinuação do ato sexual. Estratégia
essa que surtiu grande efeito para os amantes de jeans e da Calvin Klein,
Fiorucci, Diesel e outras.
Algumas reproduções das publicidades de marcas de jeans a seguir, nos dão a
dimensão dessas apropriações sensuais e do quão explícitas elas se tornaram
ao longo das últimas décadas.

Fig.28- Calvin Klein, final de


Fig.27- Jeans Fiorucci, final de 1980. Inicio da 1980 Fonte: Sportswear ed.
sensualidade. Fonte: Sportswear ed. 48. 48
48

Fig.29- Fórum, 1988 Fonte: Fig30- Calvin Klein Jeans Fig.31 - Publicid.Jeans,1990:
o
Vogue Brasil, n 246 Fonte:Huiguang, 2007 Fonte:Sportswear ed.48

A partir daí muitas marcas de jeans vem se utilizando dessa estratégia como
forte elemento de marketing, pois a sedução passou a ser um dos motivadores
de maior demanda no consumo. A imagem sexy está estreitamente ligada ao
jeans. Algumas marcas, inclusive, tiveram suas campanhas recentes proibidas,
tal exagero de exploração de imagens sexuais como, por exemplo, a da Dolce
& Gabbana de 2008, que sugere uma curra.

Fig.32- Armani, 2007.Fonte Fig.33- Diesel, 2007. Fonte Rolling


o o
Rolling Stone n 13/ 2007 Stone n 13/ 2007
49

Fig.34- Dolce Gabana, 2009 Fig.35- Fonte: site da marca: Calvin


Fonte: site da marca Klein, 2009

I.3.E - Autenticidade e novos mercados


As principais empresas pioneiras em jeans, ao contrário, no lugar da conotação
sexual, usaram estratégias de autenticidade para resolver o problema da
escassez de demanda. A Levi's, por
exemplo, sugeriu voltar às bases e,
ao relançar o modelo 501 com
diversas lavagens, resgatou o que
tinha sido sempre: um item cult,
mas transformado em uma
tendência de massa.
Ainda ao longo da década de 1980,
esses valores receberam plena
aceitação dos recém formados, dos
jovens promissores, dos já
estabelecidos gerentes de vários
setores. Eles se somaram às
Fig.36 -Relançamento Jeans Levi’s 501.
Fonte: revistacatarina.com dinâmicas mulheres que agora
50

começaram a se impor no mercado de trabalho, formando um novo grupo


urbano: o dos “yuppies”.
Esses bem sucedidos profissionais reforçaram a idéia da tradição também, pois
queriam ser vistos na forma correta e autêntica do vestuário. Nesse aspecto,
empresas como Hugo Boss, Levi’s e outras tantas, atenderam perfeitamente à
demanda através de peças com um design clássico, com pouco ou nenhum
efeito de lavagem, apenas amaciado. Esses consumidores jamais imaginaram
que haveria nas suas regras de conduta no trabalho, um dia específico para o
jeans: “the fridaywear” (costume criado nos Estados Unidos e logo adotado
pelo mundo, através das empresas multinacionais). A sexta feira onde o rigor
do paletó e gravata ou do “tailleur” estaria liberado, pressupondo que após o
expediente, o “happy hour” daria início ao fim de semana. Essas pessoas
jamais imaginariam também que estariam resgatando, através de seu traje de
lazer, a idéia do uniforme de trabalho original.
Os anos de 1990 seguiram o caminho natural do mercado após um grande
volume de vendas: o do habitual declínio relativo. Apesar dos rumores
ocasionais nessa época, o denim nunca iria morrer, mas a indústria teve e
continua tendo de recorrer a novos truques para seduzir o consumidor. Novos
pesos, novos ligamentos, novas cores são desenvolvidos; lavagens inovadoras
tornam-se um trunfo precioso. Os designers vivem à procura de algo fresco
para, a cada estação, começar de novo.
Nessa década, a indústria do jeans já está
consciente de que um número crescente de
consumidores está preocupado com questões
ambientais, com o consumo desenfreado, com
as posturas politicamente corretas. É também a
década em que se inicia em grande escala, todo
o processo da reciclagem, em que se valoriza o
conceito da sustentabilidade e da informação
que coloca a água como um bem finito.
Por outro lado, se torna consciente também de

Fig.37- Hugo Boss, 1990. que é ela mesma uma indústria altamente
Fonte Sportswear ed. 48 poluidora, portanto recursos precisam e
51

começam a ser investidos para que a sua indústria, principalmente os dois


extremos da cadeia produtiva (o tingimento do fio e as lavagens no
acabamento) contribuam para a diminuição dos danos ambientais.

Fig.38- Estação de tratamento de água. Fonte:Catálogo Comask.

Temos assim a evolução do mercado orgânico e sustentável que vem


ganhando força em indústrias desse segmento. Tanto que cerca de 50% das
800 marcas que expuseram na Bread and Butter Barcelona - Janeiro/2009,
continham produtos com essas exigências em suas coleções. Os estandes,
montados com materiais reaproveitados, ganharam espaço significativo para a
exposição de peças que se apresentavam com uma comunicação única
através de tags, selos e etiquetas.
Confirmaram dessa forma, que atitudes ecologicamente corretas se tornarão

Fig.39- Loja da Éden, pioneira em jeans 100% orgânico no Brasil.


Fonte: guiajeanswear.com.br/2009
52

obrigatórias dentro do desenvolvimento das coleções jeanswear para


sobrevivência das marcas no mercado nos próximos anos. Aqui no Brasil,
depois de quatro anos de pesquisas, chegou ao mercado, em 2008, a primeira
marca nacional com uma coleção desenvolvida com produto 100% orgânico
(Éden). A marca controla seus artigos, desde o plantio (o de algodão orgânico,
livre de agrotóxicos) até o produto final. Todas as etapas são acompanhadas
por profissionais qualificados para garantir os padrões determinados pela Now -
Natural Organic Association e IBD - Instituto Bio Dinâmico, instituições
reconhecidas nacional e internacionalmente nesse segmento.
Do produtor do algodão, passando pelos processos de fiação, tinturaria,
tecelagem, confecção, lavanderia e logística de distribuição, somamos os
fabricantes de aviamentos e insumos têxteis, motoristas etc, no Brasil, cresce a
fatia do mercado trabalhando direta ou indiretamente em torno dele.
Utilizando uma mistura de inovação, investimentos em produção, estilistas
talentosos e maciça propaganda, o Brasil se tornou uma potência entre os
maiores fabricantes de denim do mundo, cujo setor movimenta, como já
apontamos, mais de R$ 8,2 bilhões anualmente. Não à toa, grandes empresas
nacionais como Vicunha, Santista e Cedro Cachoeira vêm investindo pesado
em inovação, produção e exportação. As duas maiores produtoras de jeans do
Brasil, Vicunha e Santista, investem boa parte de seus faturamentos nesses
laboratórios.
A Vicunha (criadora do jeans com fios de ouro para o mercado Premium), e a
maior produtora de denim no Brasil, injetou, nos últimos três anos, R$ 150
milhões em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos. A Santista ocupa
o terceiro lugar no ranking mundial de produtores de denim e destina 0,5% de
sua receita de R$ 1,1 bilhão ao desenvolvimento de novas idéias.
No país, mais especificamente em São Paulo, estão representadas as
principais lojas de jeans do mundo. Ao passear pela Oscar Freire, por exemplo,
símbolo do status e da elite, é possível visitar uma loja das grifes italianas
Diesel ou Replay e da californiana Miss Sixty, algumas das mais badaladas do
universo de jeanswear. A segunda loja da Diesel, no shopping Iguatemi, é a
unidade da marca que mais vende por metro quadrado no mundo. E o caminho
inverso é feito pelos talentosos estilistas brasileiros, que criam jeans cujos
53

cortes valorizam o corpo da mulher. Tanto que Zoomp, Colcci, Fórum e outras
exportam seus jeans regularmente e Carlos Miéle, da M.Officer, acaba de
inaugurar uma loja em Paris. (vitrineoeste.com.br).

Como curiosidade, a Forbes organizou uma lista interessante: a dos jeans mais
caros da história. Entre os vários modelos de designer e peças customizadas
com cristais e jóias, o número um ficou com uma peça muito antiga. O jeans
Levi´s com 115 anos de idade foi leiloado recentemente no e-Bay americano
por incríveis 60 mil dólares (hypedesire.blogtv.uol.com.br), provando que, em
se tratando de jeans, a autenticidade leva vantagem sobre o luxo.

Fig.40 - Jeans Levi’s com 115 anos. O mais caro


do mundo. Fonte: /hypedesire.blogtv.uol.com.br

E o jeans vai além. Invade outros mercados saindo do vestuário para a loja de
decoração, para a de acessórios, brinquedos, para a galeria de arte tanto como
matéria prima quanto como objeto de contemplação etc. Ainda permite aos
que, não satisfeitos com o que lhes foi oferecido, reforcem a idéia de
originalidade, imprimindo modificações constantes, pessoais e únicas ao longo
da sua existência. A seguir alguns exemplos desses novos mercados invadidos
pelo jeans, quer utilizado como matéria prima, quer como objeto de
contemplação.
54

Fig.41 - Fraldas jeans


Fig.42 - Figurino para balê.
para bebê. o
Fonte: Revista Veja, n 22 de 2008
Site da marca

Fig.43 - Griffes famosas como Dolce & Gabana e Louis Vuitton investem em acessórios jeans.

Fig.44 – Capacete jeans. Fig.45 - Tênis Levi’s. Fig.46 - All Star.


Fonte:Bemlegaus.com lojavirus.com.br. Radarurbano.com.br
55

Fig.47 - Poltrona. Fig.48 - Sofá em jeans. Fonte: Sulit.com.ph.


Designboom.com

Fig.49- Ronaldo Fraga


desenvolve caderno em Jeans

Fig.50- Painel com calças jeans resinadas.


Fonte: Delirius Denim.

Fig.51- Caroline Calvin com 32 calças Fig.52- Quadro de Pasquale


jeans.Fonte: revistacatarina.com.br Lecreux. Fonte: br.artmajeur.com
56

II. PROCESSO CRIATIVO CONTEMPORÂNEO

David Harvey, no seu livro A Condição pós-moderna nos traz uma reflexão
significativa para a compreensão das mudanças político-econômico-sociais do
século XX, facilitando o entendimento da dinâmica da vida contemporânea cujo
início, a maioria dos autores situa na segunda metade do século XX. Traz
inovações marcadas por novas condições de trabalho para suprir a demanda
vigente; traz o afloramento da indústria cultural e de entretenimento e com ela,
a indústria da produção de imagem que reorganiza nosso corpo, nossas
maneiras, o tipo de indumentária e tudo o que é fundamental para a
experiência contemporânea (HARVEY, 2003).
Por outro aspecto, os argumentos de Harvey alinham-se ao pensamento de
Jameson ao pontuar que a pós modernidade caracteriza-se como o período
do “fim dos grandes relatos” fim das disciplinas absolutas, do conhecimento
fechado, das grandes verdades, dos estilos puros... tendo como consequência
a valorização dos conhecimentos difusos, dos pequenos relatos, da inter ou
transdisciplinaridade, promovendo um saber ambíguo, muitas vezes
contraditório.
Essa visão é compartilhada por vários autores, como por exemplo, Daniela
Calanca, (2008) quando afirma: “O pós-moderno... também pós-industrial,
enfatiza a parte ambígua e contraditória da racionalidade, tem uma visão crítica
da ciência e da tecnologia, e propõe uma concepção do saber sem os
fundamentos que estão na base do projeto moderno”. Reafirma então a idéia
da pós modernidade utilizar sistemas de concepção de produtos ou idéias que
não são ortodoxas, mas fruto de experimentações e misturas muitas vezes
incoerentes.
Outros autores ainda colocam, como Lyotard, (1979) “A fragmentação da
moda – como grande relato - reflete a fragmentação cultural do pós-moderno”,
e Jameson (2000) diz que “É uma característica do pós-modernismo se
apropriar da condição da incerteza e da assimetria”.
Abordando o processo criativo, no contexto desta pesquisa, vemos que a pós-
modernidade, ao se apropriar de uma diversidade de idéias, coloca o “uso” do
jeans (trazendo consigo as marcas do trabalho) como uma paródia, ou
57

pastiche. Essas referências que se mesclam na concepção do novo resultam


em peças híbridas, na maioria das vezes ambíguas, mas que estimulam a
produção de um jeans enquanto objeto de moda.

Fig.53 - A experimentação enquanto produto de moda. Marcas, manchas, rasgos, remendos,


assimetrias, lixados etc. Fonte: http://guiajeanswear

É marca do designer de moda contemporâneo, como John Galliano, Vivienne


Westwood, Jean Paul Gautier, Marc Jacobs, Anna Sui, Versacce, Issey Miyake
e tantos outros, valerem-se de inúmeras fontes de inspiração, duplicando
estilos de diversos períodos, frequentemente justapondo-os na mesma
coleção, ou misturando elementos de estilos diferentes no mesmo traje
resultando em peças absolutamente criativas e inusitadas. E nesse caso,
vemos a história do jeans recontada por procedimentos criativos.
Rick Poynor complementa, trazendo uma reflexão do ponto de vista do sujeito,
que agora perde a sua estabilidade, dizendo que o principal alicerce da pós-
modernidade, se baseia no fato da
Sociedade contemporânea estar composta por
vários grupos diferenciados, com estilos de vida e
gostos distintos, nos quais não se justifica a
manutenção dos extremismos das vanguardas
modernas (POYNOR, 2002:98).

O jeans é a peça, dentre todas do nosso vestuário, que ilustra de maneira


contundente esses novos procedimentos, ao corporificar em suas formas e
processos de produção do design de moda pós-moderno. Ele personifica os
“pequenos relatos” definidos pelo uso, como estratégia produtivo-criativa.
Seus usuários se apropriam desses relatos – que constituem a história do
jeans - e que, via de regra, não são os seus próprios e incorpora tais signos à
sua história pessoal... Muitas vezes, uma história escancaradamente mais
58

antiga que sua própria existência. Peças


que, como as da imagem, demandariam
aproximadamente trinta anos de uso para se
conseguir tal aspecto.
A indústria, já a partir da década de 1980,
passou a atender a demanda desse novo
mercado, ávido por novidades, adequando
seu maquinário para provocar os aspectos
gastos, desfiados, rompidos, que como
vimos, ora se impunham como moda.
Foi a partir desse período que se ampliou o
desenvolvimento do "design de jeans” -
Fig.54 - Bread&Butter Barcelona 2009. projetos de criação visando atender um
Salsa Jeans. Foto da autora.
determinado público, acompanhando de
perto os avanços tecnológicos, as mudanças estéticas e as informações
veiculadas através da cadeia têxtil.
Na contemporaneidade, em plena era globalizada, em que qualquer peça
básica – como é o jeans - pode ser produzida em praticamente qualquer parte
do mundo, a colocação no mercado e a preocupação com a apresentação do
produto continuarão a fazer a grande diferença.
Hoje, temos uma facilidade maior de escolhas individuais, possibilitando e até
mesmo valorizando aqueles que fazem dessas opções, sua marca pessoal.
Essa atitude se diferencia, e muito, da postura adotada até a metade do século
XX (quando os criadores de então determinavam o que seria usado), trazendo
à tona uma preocupação maior dos fabricantes na concepção dos modelos
principalmente no que se refere à sua originalidade, bem como na tecnologia
de fabricação e logística de distribuição.
Nossa indústria tem se mostrado altamente criativa em várias áreas e
especialmente nas artes visuais, na música e no design em geral, bem como
no de moda. É sobre esse último que as transformações mais significativas
acontecem aqui, pois passamos de uma super valorização do importado para a
busca e exploração do nosso potencial criativo. Canevacci diz sobre a nossa
pátria: “Oferece um cenário produtivo, em que tudo pode ser contaminado,
59

deglutido, entrelaçado. Essa rica desordem pode romper o domínio cultural


daquela mesma modernidade, ir além a sua ordem monológica”.
(CANEVACCI,1996: p.8). Trazemos, novamente, a discussão sobre a criação
na pós-modernidade, onde contamos ainda com as palavras do arquiteto
Robert Venturi, que no seu “suave manifesto” estabelece alguns elementos
que genuinamente contribuem para a compreensão da idéia geral:

"Gosto dos elementos híbridos mais do que dos


'puros', dos comprometidos mais do que dos
'limpos', dos retorcidos mais do que dos 'retos', dos
ambíguos mais do que dos 'articulados', corrom-
pidos quanto anónimos, [...] conciliantes antes que
claros e diretos. Sou mais pela desordem cheia de
vitalidade do que pela unidade óbvia" (VENTURI,
1995: 1).

Notamos então que, com grande facilidade, as alterações que ocorrem nos
Estados Unidos, na Europa e no Oriente, são incorporadas à nossa cultura. O
purismo, a norma, a ordem, a direção, a clareza e a articulação propostas pela
modernidade, perdem espaço para o hibridismo, a ambiguidade, a distorção, os
equívocos e incoerências permitidas na pós-modernidade, e que “É através
dessa antítese da harmonia e da estética desenvolvida ao longo de séculos,
que o defeito vira efeito e passa a ditar as regras do novo fazer”. (POYNOR,
2002).

Fig.55 - Exemplos de várias performances do jeans contemporâneo. Fonte:


www.guiajeanswear.com.br
60

Essas mudanças não se restringem, como vimos, a um campo específico, mas


a todas as manifestações da cultura humana. Muitas normas convencionais
foram descartadas, pois não se ajustam mais a esse novo pensar; outras,
porém, convivem com as novas tecnologias e as novas propostas, criando um
universo rico em experimentações e soluções criativas.
Em moda, tais produtos constituem fruto de um grande paradoxo tendo, por um
lado, a tecnologia, cada vez mais aperfeiçoada sendo capaz de inventar novas
fibras; produzir fios “inteligentes”; tramar construções têxteis de incrível
complexidade; elaborar modelagens com requintes de ergonomia e costuras
impecáveis, utilizadas no sentido oposto, associando-se ao acaso, ao singular,
ao imperfeito.
Nesse percurso, o jeans, encabeça a lista de exemplos, pois poderia ser
comercializada a partir do momento em que sai da oficina de costura, mas
antes, ganha várias lavagens, cada vez mais agressivas que literalmente
destroem o tecido ou ainda se vale de sobre-tinturas com o propósito de causar
aspectos usados e até mesmo sujos, para aí sim estarem prontos para se
exibirem nas vitrinas de moda. Outro paradoxo se delineia aqui, pois a média
de preço do custo de uma calça jeans é (hoje, em 2009) de U$ 6,50. À medida
que recebe lavagens e efeitos especiais que literalmente a destroem, mais
caras vão se tornando, chegando mesmo a cifras
com de 800% de aumento.
Na última década, o
jeans sai das ruas e vai
para as passarelas de
moda, não mais como
nos anos 1980, através
da “Rainha dos Punks”
Vivienne Westwood,
como símbolo de
agressividade e
rompimento ao

Fig.56 - J. F.Ferré, 2007.


“stablishment”, mas Fig.57 - J.Galliano, 2008.
Fonte: www.guiajeanswear com a chancela de Fonte: www.guiajeanswear
61

marcas consagradas da alta costura e do “prêt-a-porter”, como Dior, Chanel,


Fendi, Prada, Gucci etc.

Fig.58- Maison Martin Fig.59- Chanel, Primavera


Margiela, 2008. Fonte: Verão 2008. Fonte:
www.guiajeanswear.com www.guiajeanswear.com

A sua forma segue uma dinâmica entre o conforto e a sedução ora


escondendo, ora revelando o corpo que a contém em modelagens reta, beggy,
over-size, bocas de sino, trompete, “skinny”, com cinturas que vão de pouco
abaixo do busto a pouco acima dos pelos pubianos.
Essas variações tem ganho, na contemporaneidade, um diferencial que
contradiz a ”Destruição Criativa” de Harvey, pois no lugar de aniquilar uma
forma para surgir outra, a simultaneidade é o que caracteriza o mercado atual.
A partir desse pressuposto, colocamos a história visual dessas transformações
no Design das calças (Desenhos da autora, 2009) ao longo desses últimos
anos. É importante enfatizar a idéia de que muitas dessas modelagens estão,
hoje, lado a lado nas ruas e nas vitrinas de moda, reforçando a idéia de que a
moda se preocupa em agradar às várias segmentações do mercado e ao
lifestyle de cada consumidor.
62

Tradicional (antifit) Cowboy Sain-Tropez Boca de Sino

Pata de Elefante Pantalona Jogging Beggy

Semi-Beggy Clochard Oversised Five Pocket (501)


63

Hip-hop Reta Cargo Alfaiataria

Skinny Cropped Cintura baixa Cintura alta

Cenoura Cut boot Cavalo baixo Sarouel


Fig.60 – Vários modelos de jeans nos últimos anos.
Desenhos de Eliana Acar, 2009
64

Hoje, receptivamente, o denim mistura outras fibras na sua estrutura mais


íntima (algodão/elastano; algodão/cupro (ver glossário, pág.120);
algodão/tencel (ver glossário, pág.125); algodão/poliéster etc), adquirindo
outras configurações no seu aspecto exterior ou no toque, quer reforçando a
maciez buscada ao longo de anos, quer valorizando seu visual através de
reflexos metalizados, dourados ou prateados ou ainda deixando-a mais
aderente e sensual.
Acompanhando as tendências do mercado, que coloca o luxo como um dos
novos promissores segmentos, o jeans garante seu espaço com a linha
“Premium”, adotada pelas principais marcas. Seu diferencial fica por conta do
esmero na modelagem, nos metais e pedrarias que o acompanham, e na
própria estrutura do tecido, que recebe até mesmo fios de ouro enobrecendo o
algodão (desenvolvimento Vicunha).
A linha “Vintage” garante a permanência da historia do uso contado através,
agora, não só das marcas no tecido, mas vemos inclusive empresas
fornecedoras de aviamentos desenvolverem botões com banhos que imitam o
metal enferrujado.
Além dessa, outras referências históricas nos são reforçadas diariamente,
como pudemos observar na última edição da Bread & Butter (Feira
internacional de jeanswear) em Barcelona.
Dentre as inúmeras reportagens sobre os lançamentos do evento, somados à
observação pessoal, podemos extrair informações que ilustram bem esses
processos criativos contemporâneos:
Diversas marcas como Salsa Jeans, Blue Bood, Tommy Hilfiger e Levi´s,
trabalharam em cima da idéia de um pintor descuidado, pois estavam
presentes pingos e borrões, de várias cores, nos seus lançamentos.
Iolanda Wutzl, para o site guiajeanswear, nos diz: “O velho dirty aparece nas
lavagens mais claras oferecendo um aspecto de encardido gerado com o
tempo de uso e lavagem, e nos tons de índigo médio pra escuro,
caracterizando um vintage extraído da calça do minerador”. Essa descrição e
as propostas que vem a seguir nos oferecem a possibilidade de perceber, mais
uma vez, o quão importante é a história do uso dessa peça na composição do
seu aspecto contemporâneo.
65

Outras marcas apostaram em grandes furos arredondados com tampões ou


patches contrastantes, ora por cima, ora na parte interna, inspirados na velha
Levi´s usada pelo minerador dos anos 1920 e também na calça do cowboy de
1935, Essas coleções irreverentes estavam presentes em marcas como G-Star
Raw, 0/Zero Construction, Henleys, Bray Steve Alan, Salsa Jeans, Catbalou,
Killah, Christian Audigier, Cross, Datch, e muitas outras.
O efeito que fez sucesso entre os hippies dos anos 70, agora trabalhado de
forma mais cool, vem sendo explorado por marcas como Pepe Jeans, Salsa
Jeans, Umm, etc. A ITV, Industria Tessile del Vomano, presente no setor The
Source na feira, apresentou belíssimas peças em “tie dye”.
O antigo marmorizado hoje tratado como Acid wash, aparece com aparência
menos agressiva conquistada através da evolução dos produtos químicos. A
Salsa jeans investiu nessa lavagem em formas com cós alto e cavalos (parte
da modelagem responsável pela abertura das pernas) ultrabaixos.
Outra linha se dispôs a investir em blacks descarregados, amaciados,
amassados e bigodes, mergulhados na resina para sua fixação. Eles não eram
maioria, porem ganharam destaques através das costuras coloridas. Firetrap,
G-Star Raw, 0/Zero Construction, Kaporal, Gio-Goi, Koyo Jeans, Bray, Teddy
Smith, apostaram nos blacks e nos tingimentos escuros.
O próximo capítulo vai tentar esclarecer a parte técnica desse produto e
mostrar a construção e o desenvolvimento do artefato jeans.
66

III. JEANS: DESIGN E TECNOLOGIA

Design é uma atividade que configura objetos de


uso e sistemas de informação incorporando
valores e manifestações culturais como anúncio de
novos caminhos e possibilidades. O Design
participa da criação cultural questionando ou
reforçando valores culturais de uma sociedade. O
Design apresenta as possíveis interpretações das
diversas possibilidades oferecidas pelas variáveis
da natureza política, econômica, social,
tecnológica (Bomfim: 1999:152).

Essa definição de Amarante Bonfim, amplia o sentido inicial das definições de


design (ver glossário pág.121) ligado apenas à forma dos objetos. Ferlauto nos
diz que com essas mudanças recentes (as da pós modernidade) “O que mais
importa é que aprendemos a pensar de outras maneiras traduzindo e
interpretando a visão desse novo universo de pluralidade e diversidade”
(FERLAUTO, 2009).
Assim como a leitura de informações técnicas nos permite avançar mais
rapidamente na ampliação do conhecimento, as experimentações práticas nos
fornecem possibilidades de inovações mais originais e imediatas.
Segundo Sexe (2007), durante toda a era industrial e até aproximadamente a
década de 1970, a idéia dominante do mercado latino-americano foi calcada
produção. A qualidade do produto era vendida à parte, pois o fazer era o
principal paradigma da indústria. Na década de 1980, a produtividade passa a
ser mais importante: fazer como para conseguir uma produção maior em
menos tempo. Mas partir do início dos anos de 1990, a qualidade passa a
compor o diferencial das peças, pois ela representa maior lucratividade, maior
visibilidade e a possibilidade de distinção entre seus concorrentes. É nesse
momento que o design ganha importância e o paradigma da indústria é
alterado mais uma vez: pensar o fazer. Fazer o que? A que custo? Em quanto
tempo e com qual parâmetro de qualidade?
O Designer de moda deverá dar as respostas. Apesar de, na sua trajetória,
esse profissional receber outras nomenclaturas: artista, artesão, costureiro,
criador, estilista etc., a figura do estilista é a que mais se aproxima do designer,
pois requer as mesmas competências e habilidades e exerce as mesmas
67

funções deste. O Designer de Moda, hoje além de dominar o conhecimento da


sua área específica, tangencia, na sua atuação diária, vários outros campos do
Design. Pesquisa seu público alvo, quer seja para uma peça de alta-costura ou,
e principalmente, quando se presume uma produção em escala (read to wear/
prêt-à-porter); pesquisa as tendências mundiais de moda; os avanços
tecnológicos aplicados à matéria prima (Design de Produto); os sistemas de
fabricação e as macro-tendências de comportamento (Design Social). Planeja;
seleciona tecidos e aviamentos; dimensiona quantitativa e qualitativamente a
coleção; cria e acompanha o desenvolvimento do produto, suas etiquetas, tags
e embalagens (Design Gráfico). Além disso, muitas vezes, orienta a divulgação
desse produto quer seja através de “briefing” na elaboração de catálogo,
produção de desfile, “merchandising” ou da simples exposição do produto na
vitrina (Design de Comunicação Visual).
Daniela Calanca, corrobora a idéia geral dessa ampliação do conceito de
Designer de Moda, dizendo que:

Entre 1950 e 1960 surgem os primeiros ateliês


estilísticos que fornecem consultorias qualificadas
para as indústrias que querem se manter
atualizadas. Quando o ateliê do estilista se associa
aos critérios da produção industrial, o universo das
propostas industriais adquire um novo valor. Do
binômio indústria-projeto estilístico se espera um
produto atual e de preço acessível. Nesse cenário se
modifica também o significado da palavra estilista, que
até os anos 1950 tinha uma conotação depreciativa.
Nos projetos industriais o estilista era quem agia sobre
a exterioridade dos objetos sem modificar seu
significado intrínseco e funcional; no entanto, quando
ele começa a atuar na indústria da moda, torna-se
um mito. Entre 1960 e 1970 o balanço das indústrias
de vestuário cresce continuamente, tanto nos Estados
Unidos como na Europa (CALANCA, 2008:206).

Esse profissional estabelece na contemporaneidade um parâmetro de trabalho


onde a interdisciplinaridade (ver glossário, pág.123) se torna a principal
ferramenta para o bom desempenho da sua função. O acompanhamento das
mudanças políticas, econômicas, sociais, tecnológicas e principalmente
culturais, faz do designer de moda uma antena do mundo contemporâneo.
68

No caso específico do Designer de Jeans, suas atribuições vão além do


esperado para o Designer de Moda usual, pois, ainda deve estar atualizado em
relação aos novos processos de tinturaria e lavanderia. Ainda há um cuidado
extra, antes do processo se iniciar que consiste no cálculo do encolhimento
natural do tecido (quando comercializado bruto) para que essa percentagem
seja adicionada às medidas padrão.
As alterações na indústria, em função da produção de novos artigos e
acabamentos (que no caso do jeans não são poucos) vem a partir das
mudanças experimentais propostas pelos designers, na maioria das vezes
inspirados por grupos urbanos,
Vamos então conhecer um pouco desse universo tecnológico, que propicia na
prática, a fabricação desse ícone da pós-modernidade: a calça jeans.

III.1 - A FIBRA

Fig.61 - Algodoeiro. Fonte:


Catálogo Santista Têxtil

Responsável pelo início de toda a cadeia têxtil, a “fibra têxtil”, numa definição
mais simplista é todo material passível de ser fiado e tecido. Para se obter uma
definição mais precisa, é necessário definir-se a constituição química, que é
baseada em polímeros. Polímeros são substâncias formadas por
macromoléculas, que ligadas entre si, formam um todo coeso e com
propriedades bem definidas.
Elas podem ser divididas em dois tipos básicos:
69

1. Fibras descontínuas que são elementos lineares que possuem um


comprimento determinado, como por exemplo, as fibras de algodão.
2. Filamentos contínuos, que são elementos lineares de comprimento
indeterminado, como o fio da seda.

Sua classificação divide as fibras em Naturais e Químicas.


As Fibras Naturais são provenientes da natureza, ou seja, de polímeros
naturais. Seu melhor exemplo é o algodão, fibra base para a construção do
denim. O algodão é constituído pela Celulose que é o polímero de todos os
vegetais. Dentro das fibras naturais, podemos estabelecer uma subdivisão que
as classifica em vegetais, animais ou minerais.
As fibras vegetais, por sua vez, são subdivididas de acordo com a sua origem:
sementes, caules, folhas, frutos ou raiz.
Fibras Químicas são aquelas que exigem, na sua produção, processos de
transformação química e/ou física. Essas fibras podem ser subdivididas, por
sua vez, em artificiais e sintéticas.
As fibras Artificiais são provenientes de polímero natural, como a celulose
extraída de algumas árvores e que sofrem um processo químico. Bons
exemplos são a Viscose e o Acetato.
As fibras Sintéticas, por sua vez, são fibras cujo polímero foi sintetizado a partir
de substâncias extraídas do petróleo. Temos como exemplos mais conhecidos
o poliéster e a poliamida.
De acordo com a ABNT essa classificação foi regulamentado em 1992, cujo
quadro abaixo nos dá um panorama das principais fibras têxteis, sua origem e
a sigla de cada uma.
70

Fig.62 - Tabela de siglas das fibras Têxteis


Fonte: CD Universidade Santista

III.2 - FIAÇÃO
A fibra utilizada para a fabricação do jeans é basicamente a fibra natural
vegetal: o algodão (ver glossário pág.119). Ressalva feita aos tecidos em que
se misturam outras fibras para a fabricação de produtos com diversas
qualidades, como por exemplo, o elastano que aumenta a flexibilidade ou fios
de ouro que enobrecem e valorizam o visual, ou o desenvolvimento do tecido
Cerâmico, que é um tecido térmico, feito a partir de inserção de barro
mofado na sarja (o tecido mais receptivo), seguido de uma aplicação de
impermeabilizante. Essa mistura tem como resultado um tecido que
provoca intensa sensação de frescor. Esta técnica é usada com sucesso pela
dupla do jeans fashion Marithé e François Girbaud (CHATAIGNIER, 2006).
Para o processo de fabricação do tecido Denim os fios de urdume (ver
glossário pág.125) (no sentido do comprimento do tecido) são tingidos antes
de entrarem no tear, e os de trama (ver glossário pág.125) (no sentido
horizontal) são brancos. Esse tingimento, a princípio feito com o pigmento
extraído da planta índigo, é um produto que oferece baixa solidez, ou seja,
71

perde a cor conforme o uso e as sucessivas lavagens. É graças a essa


característica que o jeans consegue ser tão versátil. Hoje trabalhamos com o
similar sintético que conserva as mesmas características do original. Há
basicamente dois sistemas: um deles é o do tingimento em corda, ou seja, os
fios são agrupados em feixes que mergulham na barca de tingimento e
posteriormente abrem em leque para secagem. O outro processo se dá com o
urdume pronto, onde os fios mergulham paralelos no pigmento. Há uma
curiosidade interessante nesse processo, pois o pigmento, na verdade, tem
uma coloração esverdeada que só se torna azul por oxidação, em contato com
o oxigênio do ar. Vamos entender esses dois métodos com mais detalhes:

III.2.A - Tingimento com índigo


Há mais de 5000 anos atrás, na Índia, alguns métodos de tingimento já eram
usados para a aplicação do pigmento índigo, sobre fibras naturais. O índigo
natural foi obtido pela primeira vez a partir das plantas Indigofera e Isatis
tinctoria, sendo o produto azul, insolúvel em água, posteriormente dissolvido
em cubas de madeira, através de um processo de fermentação natural
conhecido como “vattíng”. Esta foi a origem do nome corantes à cuba (do
inglês, vat dyes). Quimicamente falando, "vatting" significa redução, sendo,
portanto, os corantes à cuba também conhecidos pelo nome de corantes de
redução.

Fig.63 - Tingimento dos fios com índigo. Fonte: Catálogo


Santista Têxtil
72

Desde o grande crescimento dos tecidos conhecidos como denim, que


começou na década de 70, o índigo tem sido um dos mais importantes
corantes usados até os dias de hoje. Entretanto, muito pouco índigo natural é
produzido atualmente, uma vez que, por síntese química, se obtém um produto
muito mais consistente e econômico. A explicação da estrutura química do
índigo foi apresentada por Adolf von Bayer em 1883 e o produto sintético
colocado no mercado pela primeira vez em 1897, pela BASF.

O fato de se produzir um corante de baixa solidez, o que segundo os técnicos


não seria um bom corante, nos dá uma lição com relação ao mercado:
satisfazer às necessidades do consumidor é geralmente mais importante do
que alcançar os mais altos níveis de performance técnica.

1 - TINGIMENTO DE FIOS DE URDUME EM CORDA

Os equipamentos para este tipo de tingimento se destacam, de modo especial,


por suas dimensões, visto que podem alcançar um comprimento de 60 metros.
As cordas, normalmente em número de 12, 24 ou 36, são preparadas com 300
a 400 fios cada uma, podendo alcançar um comprimento de 25.000 metros. O
tingimento pode ser realizado continuamente, sem parar a máquina durante a
troca de partidas, uma vez que, ao final de cada corda, outra corda pode ser
emendada. Geralmente estas instalações são compostas por 4 a 5 cubas de
umectação, seguidas por 6 a 8 cubas de tingimento, com sistemas de
impregnação que proporcionam tempos de imersão de 20 a 25 segundos, onde
é alimentado o índigo já reduzido e solubilizado. Entre cada cuba de
tingimento, como também depois da última, há uma passagem aérea que tem
como finalidade oxidar o corante antes de entrar na cuba seguinte. Isto permite
que uma camada de corante seja absorvida em cada passagem pelas cubas
de tingimento, produzindo, ao final, um tingimento intenso, apesar da baixa
afinidade do índigo. Para se obter uma perfeita oxidação do corante, inclusive
no interior da corda, é necessário uma passagem aérea bastante longa, de até
dois andares, com duração de 1 a 2 minutos. Depois do tingimento e da
oxidação são realizados enxagues em 2 ou 3 barcas normalmente à
temperatura ambiente, seguidos por um tratamento num banho com amaciante
73

catiônico (ver glossário pág.119). que permite melhorar a abertura da corda


para situar os fios em posição paralela antes de transferi-los para o rolo de
engomagem (ver glossário pág.122). Este processo pode tingir
aproximadamente de 10 a 18 kg de fios por minuto.

2 - TINGIMENTO DE FIOS DE URDUME EM CAMADAS

No início da década de 70 foi criada uma segunda geração de equipamentos


de tingir apropriados para conduzir paralelamente os fios de urdume, em lugar
das cordas e realizar a engomagem imediatamente após o tingimento. Tais
instalações tem de 1 a 3 cubas de umectacão, 4 a 8 cubas de tingimento e 3
compartimentos de enxague.

As principais vantagens deste equipamento, em relação à instalação para


tingimento em cordas, são: o menor comprimento, portanto um preço inferior,
um tempo de umectação mais curto, de modo que uma cuba de umectacão
pode ser suficiente, tempos de imerssão e de oxidação consideravelmente
inferiores e maior rapidez no ajuste e estabilização dos banhos de tingimento,
visto que as capacidades das cubas são bem inferiores, se comparados com
os 2000 litros da outra instalação. Entretanto, suas principais desvantagens
são o maior consumo de hidrossulfito e propriedades de solidez inferiores.
Solidez essa, que para o mercado do jeans se torna uma vantagem, porem
deve ser controlada para que nos banhos posteriores, evite-se a migração do
pigmento para os fios de trama. Para isso o uso de anti-migrante é necessário.

Em quaquer do dois processos podemos acrescentar um produto “anti-


migrante” a fim de não permitir que a tinta do urdume penetre nos fios de trama
na hora da lavagem
74

Fig.64 - Tingimento sem anti- Fig.65 - Tingimento com anti-


migrante. migrante

III.3 – TECELAGEM

Tecer significa transformar fios em tecido. No caso do jeans, tecido plano,


produzido em tear de trama e urdume. Esse processo se divide em três
movimentos básicos: Abertura da cala, inserção da trama e batida do pente.

Abertura da cala é uma abertura em formato triangular, originada pelo


movimento de subida e decida de duas camadas de fios provenientes de um
rolo de urdume, acoplados ao tear, por onde deverá passar o fio de trama. O
movimento de subida e decida dos fios é possível através de um dispositivo
chamado “quadro de liços”. O número de quadros de liços de um tear
determina o tipo de ligamento do tecido a ser produzido e vice-versa.

Inserção da trama consiste no movimento de introdução do fio de trama pela


abertura da cala. Devido à alternação dos movimentos dos fios de urdume,
possibilita o ato de tramagem. Para conduzir a trama existem processos
diferenciados, dependendo do tipo de tear: lançadeira, projétil, jato de ar, jato
de água entre outros.

Batida do pente é o processo pelo qual um quadro de lâminas paralelas,


chamado pente conduz o fio de trama até encostá-lo ao anterior. Quando o
75

pente se desloca à frente, encosta o último fio de trama inserido nos demais e,
quando retorna, propicia a inserção de um novo fio. O pente determina não só
a quantidade de fios por centímetro, mas também a largura do tecido cru.

Fig.66 - Esquema de tear. Fonte: CD Universidade Santista Têxtil

Armação ou ligamento é o nome dado à maneira que os fios de trama e


urdume se entrelaçam no tear. As ligações fundamentais, das quais todas as
outras são derivadas são:

Tela ou tafetá – o fio de trama passa sucessivamente por cima de um fio de


urdume e por baixo do fio consecutivo. Na batida seguinte invertem-se as
posições. Tem como característica o alto número de entrelaçamentos,
conferindo consequentemente, muita resistência ao tecido.

Cetim – É caracterizado pelo cruzamento irregular e mais disperso. Por esse


motivo tem muita flexibilidade, menor resistência e muito brilho.

Sarja - Caracteriza-se pelo aspecto diagonal. O fio de trama passa por cima de
dois ou três fios do urdume e por baixo de, pelo menos, um. A trama seguinte e
as subsequentes têm o mesmo comportamento, porem defasado em um fio.
Por ter menos entrelaçamentos que a tela, resulta em um tecido mais flexível
76

além de amassar menos. As sarjas mais comuns são 2/1 ou 3/1, conforme o
esquema a seguir:

Fig.67 - Principais ligamentos Fonte:


CD Universidade Santista Têxtil

Costumamos considerar propriedades como densidade e peso para classificar


os tecidos. A densidade é a quantidade de fios por centímetro. Mede-se tanto a
quantidade de fios do urdume quanto da trama, que nesse último caso é
chamado de batidas/cm (produzidas pelo pente).
O peso Pode ser expresso em gramas por metro quadrado (g/m2) para os
tecidos que serão tingidos posteriormente (color) ou em onças por jarda
quadrada (Oz/yd2) para os denins. A relação entre g/m2 e oz/yd2 é de 33,9. Por
exemplo, quando estamos dizendo que um denim tem 14Oz, estamos nos
referindo a um tecido cujo peso é de 14 Oz/yd2, ou 475 g/m2. Os mais pesados,
por exemplo, os de 12Oz ou 14Oz, suportam as lavagens mais agressivas e
são utilizados na maioria das calças e saias. Os de 10Oz ou 11Oz, são
utilizados nas peças de verão e os de 5Oz ou 7 Oz, em geral utilizados para
camisaria ou peças mais leves.
77

O tecido, quando sai do tear, mesmo que o urdume esteja tinto, como é o caso
do denim, recebe o nome de tecido cru.
O beneficiamento do tecido cru está dividido em três etapas: a Preparação, o
Beneficiamento propriamente dito e os Acabamentos especiais. No caso do
denim, seu beneficiamento se processa em uma máquina chamada “linha
integrada”, onde se realizam quatro processos consecutivos: chamuscagem,
amaciamento, desvio de trama e pré-encolhimento.

Fig.68 - Linha integrada. Fonte Catálogo Universidade Santista

A chamuscagem é o processo pelo qual as fibras curtas e soltas são


eliminadas através do fogo. O amaciamento se dá pela aplicação de produtos
químicos que agem sobre os fios e o desvio de trama é eliminado por tração
mecânica. Na etapa do pré-encolhimento, o tecido é umedecido e seco com
uma diferença de velocidade de entrada e saída da máquina, antecipando o
encolhimento natural do tecido.
A partir daí entra o controle de qualidade e o tecido está pronto para atender a
indústria de confecção. Ainda assim, alguns desses tecidos podem passar pelo
processo chamado délavé, adquirindo o seu primeiro aspecto desbotado, antes
da comercialização.
78

Outros efeitos podem ser conseguidos na própria tecelagem, como, por


exemplo, o efeito Flamé (ver glossário pág.122) que utiliza fios com essa
característica de irregularidade ora na trama, ora no urdume e algumas vezes
(cross ring) nos dois sentidos.

Fig.69 - Efeito “Flamé” de trama Fig.70 - Efeito “Flamé” de urdume

O tecido pronto, então passa pela inspeção de qualidade, existindo para cada
empresa, um parâmetro diferenciado, de acordo com a classificação do produto
(primeira ou segunda linhas).

Fig.71 - Controle de qualidade. Fonte: Catálogo Santista Têxtil.


79

III.4 - CONFECÇÃO

Como uma herança da modernidade, o processo de fabricação das peças


segue a lógica sequencial similar a qualquer outra peça do vestuário:
primeiramente, como vimos no início desse capítulo, é elaborado o projeto de
design de acordo com o “briefing” da empresa com relação ao público alvo. As
pesquisas de tendências são realizadas por vários meios, tais como: os
“bureaux” de moda; os desfiles das várias “fashion weeks” pelo mundo; as
macro tendências de comportamento, os salões e feiras da cadeia têxtil. No
caso específico do jeanswear, a sua maior mostra é o salão internacional
Bread & Butter, com cerca de 800 expositores de diversos países. Outras
fontes tem hoje grande força como influências criativas: a rua e seus grupos, os
movimentos musicais, as diversas correntes artísticas entre outros. O designer
deve estar atento ainda às novas tecnologias, quer seja no desenvolvimento de
matéria prima têxtil, de aviamentos, acabamentos de lavanderia e tingimentos.
A proposta de criação das coleções vem a partir de toda essa conjunção de
informações, somadas à criatividade do Designer.
Inicia-se, então, a construção da modelagem. Modelagem é o desenho
planificado, geralmente em papel craft, das partes da peça que depois de
costuradas resultem no produto vestível em uma das numerações de
fabricação.
A seguir procede-se a montagem na peça piloto (como é chamado o protótipo
em moda), Essa pilotagem tem como objetivo verificar possíveis defeitos, tanto
de modelagem quanto de costura e condições de produtividade. Se houver
alguma falha grave, essa pilotagem é refeita até que a peça esteja de acordo
com o esperado.
Quando aprovada, passa-se à elaboração da ampliação do molde em todos os
tamanhos que essa peça será produzida (P, M, ou G ou ainda... 38, 40, 42,
44... dependendo do sistema adotado pela empresa).
80

Fig.72 - Modelagem da calça jeans – modelo “five pockets”. Fonte: Santista Têxtil

As peças em amarelo correspondem ao tecido denim e as duas outras devem


ser cortadas no tecido de forro.
O processo de encaixe (ver glossário pág.121), que vem a seguir, é uma
espécie de quebra cabeças onde todas as peças que compõem os moldes de
todos os tamanhos, devem ser colocadas sobre a folha de tecido de maneira a
economizá-lo ao máximo (esse encaixe pode ser feito manual ou digitalmente).
Para o encaixe digital, é necessária a transposição das partes do molde para o
computador. Isso se faz através de uma mesa digitalizadora que, com um
“mouse” especial, passa os pontos-chave do molde para a tela, conforme
imagem abaixo:

Fig.74 - Imagem com encaixe eletrônico de uma produção


de jeans. As cores determinam as peças correspondentes
Fig.73 - Digitalização do molde.
Fonte: Catálogo Comask. a cada numeração. Fonte: Audaces.com.
81

Obtem-se então o risco com uma medida de gasto que será usada como
referência para a colocação das várias folhas de tecido e que irão resultar na
produção total das peças. A esse processo damos o nome de enfesto (ver
glossário pág.122). Essa etapa, na maioria das indústrias é feita manualmente,
embora existam maquinas cujo processo é automatizado, pois são acopladas a
uma estação digital.
O enfesto pode ser realizado de forma ímpar (quando as folhas de tecido são
colocadas sempre com a superfície do mesmo lado) ou par (quando a
disposição é casada avesso com o direito), mas nesse caso, podemos utilizá-lo
somente se a peça for simétrica.

Fig.75 - Enfêsto eletrônico. Fonte Catálogo Comask

Enfesto par (face to face)


Enfesto ímpar (face up)
Fig.76 - Ilustração dos dois tipos de enfêsto.
Fonte: CD Universidade Santista.
82

Pronto o enfesto, é colocada a folha com o risco feito a partir do encaixe sobre
a ultima folha de tecido. Esse risco deverá estar totalmente identificado, tendo
cada uma das partes: o número do modelo, a parte da peça que corresponde
aquele formato (cóz, bolso esquerdo, frente esquerda etc), e a numeração a
qual pertence, bem como a linha correspondente ao fio do tecido (o de urdume)
para que o produto final não seja comprometido na sua qualidade. A seguir
vem o corte que por sua vez, também pode ser manual (a maioria) ou
eletrônico:

.
Fig.77 - Máquina de corte manual e profissional operando.
Fonte: Catálogo Santista Têxtil

O corte é posteriormente separado


por tamanho, devidamente
etiquetado em todas as suas partes
com as informações contidas no
risco e enviado para a sala de
costura. A montagem (costura) das
peças é feita geralmente pelo
sistema de linha de produção (ver
glossário pág.124) ou sistema misto
– linha e célula (ver glossário Fig.78 - Plotter de corte eletrônico.
Fonte: Santista Têxtil
pág.120) – quando existe a
necessidade de uma preparação prévia de alguma parte ( bolsos por exemplo)
antes da montagem geral.
83

A seguir uma das possibilidades de disposição funcional das máquinas para a


montagem de calças jeans.

Fig.79 - Layout de uma oficina de costura mista. Fonte CD Universidade Santista

Legenda

A. Máquina reta 01 agulha


B. Máquina reta 02 agulhas
C. Máquina de cós
D. Overlock
E. Máquina Fechadeira
F. Ferro Elétrico
G. Mesa auxiliar
H. Interlock
I. Máquina de caseado
J. Máquina de Travete
K. Máquina de Botão
L. Máquina de fazer Passante
M. Virador
N. Máquina de Ponto Corrente 01 agulha
O. Máquina de Ponto Corrente 02 agulhas

Passam (as de melhor qualidade) por dezesseis máquinas ou dispositivos


diferentes. No total são 40 operações que levam em média pouco menos de 20
84

minutos para sua conclusão (ver tabela abaixo), segundo informações da


Comask.

Fig.80 - Oficina de Costura do jeans. Fonte Catálogo Comask

LISTA DE OPERAÇÕES E ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS - DESCRIÇÃO DO PRODUTO

OPERAÇÕES
DESCRIÇÃO DAS
ORDEM MÁQUINA PONTO ACESSÓRIO
FASES
DESCRIÇÃO

Embainhar bolso relógio


PREPARAÇÃO 1 P. F. 2 Ag. 2x301 Embainhador
(1x)

BOLSO Pregar bolso relógio na


DIANTEIRO
2 P. F. 2 Ag. 2x301 -
vista (1x)

Chulear vista e C. vista


3 Ov. 3 504 -
(2x)

Pregar vista e C. vista


4 P. F. 1 Ag. 301 -
nos forros (2x)

Pregar forro da C. vista


5 P. F. 1 Ag. 301 -
no dianteiro (2x)

Dar piques e virar


6 - - Tesoura
(2x)

Pespontar Guia p/
7 P. F. 2 Ag. 2x301
(2x) pesponto
85

Prender forro da vista


8 P. F. 1Ag. 301 -
no dianteiro (2x)

Fechar fundo do forro


9 Ov. 5 516 -
(2x)

Chulear dianteiro direito


10 Ov. 3 504 -
(1x)

PREPARAÇÃO Orlar vista da braguilha Aparelho p/


BRAGUILHA
11 P. F. 2 Ag. 2x301
(1x) dobra

Pregar zíper na vista


12 P. F. 2 Ag. 2x301 Sapata. zíper
braguilha (1x)

Pregar vista no dianteiro


13 P. F. 1 Ag. 301 -
(1x)

Virar e pespontar borda


14 da vista da braguilha P. F. 1 Ag. 301 -
(1x)
Pesponto curvo
15 braguilha P. F. 2 Ag. 2x301 -
(1x)
Dobrar e chulear
16 Pertingal Ov. 3 504 -
(1x)
Pregar pertingal e zíper
17 no dianteiro direito e P. F. 2 Ag. 2x301 Sapata zíper
bainha do gancho (1x)

Unir gancho dianteiro


18 P. F. 2 Ag. 2x301 -
(1x)

Unir pala ao traseiro Aparelho de


PREPARAÇÃO 19 P.C. 2 Ag. 2x401
(2x) encaixe

Unir gancho traseiro Aparelho de


PALA 20 P.C. 2 Ag. 2x401
(1x) encaixe

Embainhar bolso
PREPARAÇÃO
BOLSO TRASEIRO
21 traseiro P. F. 2 Ag. 2x301 Embainhador
(2x)
Marcar pesponto no
22 bolso - - Gabarito
(2x)

Pespontar bolso
23 P. F. 2 Ag. 2x301 -
(2x)

Passar bolso Ferro/


24 - -
(2x) Gabarito
86

Pregar bolso traseiro Sapata


25 P. F. 2 Ag. 2x301
inserindo etiqueta (2x) Compensadora

Revisar dianteiro
26 - - -
(1x)

Revisar traseiro
27 - - -
(1x)

Unir laterais Aparelho de


MONTAGEM 28 Máq. braço 2x401
(2x) encaixe

Unir entrepernas
29 Ov. 5 516 -
(2x)

Emendar e enrolar cós


30 Ov. 3 504 -
(1x)

Pregar cós inserindo Aparelho de


31 P.C. 2 Ag. 2x401
etiqueta cós

Aparar e descoser
32 - - Tesoura
ponta do cós (2x)

33 Rebater ponta do cós P. F. 1 Ag. 301 -

Embainhar boca da Aparelho


ACABAMENTO 34 P. F. 1 Ag. 301
calça bainha

Fazer passantes e
Colarete 2 Aparelho
35 cortá-los 406
Ag. passante
(5x)

Pregar passantes e
36 Mosqueadeira - -
mosquear (21x)

Casear
37 Caseadeira - -
(1x)

Marcar botão
38 - - -
(1x)

Pregar botão
39 Botoneira - -
(1x)

Limpar e revisar
40 - - -
(1x)
TEMPO TOTAL de PRODUÇÃO = 19’20 min

Fig.81 – Sequência de montagem da calça Jeans. Fonte: Catálogo Senai Cetiqt, 1996.
87

A “Universidade Santista” nos fornece outra tabela, com pequenas variações,


cujo tempo de produção é um pouco maior como podemos verificar abaixo:

Calça five pockets :


o Tempo total = 24,13 minutos
o Quantidade de componentes = 17 (partes)
o Quantidade de operações = 49
o Tipos de máquinas = 11 tipos diferentes + dispositivos
o Consumo de linha = 372 metros
o Consumo de tecido = 1,15 metros lineares
o Peso aproximado = 800 gramas (em denim 14oz)

No. Descrição TOTAIS


1 Bainha bolso relógio 0,15
2 Pregar bolso do relógio 0,55
3 Overlocar espelho 0,18
4 Pregar espelho no forro 0,43
5 Overlocar vista esquerda 0,25
6 Overlocar vista dir.e pr.ziper 0,46
7 Cortar etiq. tam/comp. 0,12
8 Unir etiq. tam/comp. 0,20
9 Bainha do bolso traseiro 0,38
10 Dobrar bolso traseiro 0,85
11 Unir pontas de cós 0,10
12 Formar rolo de cós 0,35
13 Fazer passantes 0,25
14 Cortar passantes na medida 0,18
15 Casar bolsos c/frentes 0,10
16 Pregar bolsos dianteiros 0,82
17 Alinhavar bolsos dianteiros 0,42
18 Pregar etiq. tam/comp. 0,18
19 Fechar bolsos dianteiros 0,80
20 Casar vistas c/ dianteiros 0,10
21 Pregar conjunto de vistas 0,78
22 Pespontar vista esquerda 0,85
23 Unir dianteiros 0,50
24 Revisar dianteiros 0,39
25 Casar bolsos c/traseiros 0,10
26 Pregar bolsos traseiros 1,29
88

No. Descrição TOTAIS


27 Pregar palas 0,48
28 Unir gancho traseiro 0,32
29 Pespontar gancho traseiro 0,28
30 Destacar pala e gancho 0,90
31 Revisar traseiros 0,39
32 Casar traseiros/dianteiros 0,53
33 Fechar entrepernas 0,86
34 Fechar laterais 0,81
35 Destacar laterais 0,33
36 Virar calça 0,19
37 Pespontar laterais 0,36
38 Pregar cós 0,93
39 Destacar e abrir pontas de cós 0,68
40 Acabar pontas de cós 0,97
41 Pregar 07 passantes 0,72
42 Fazer bainha jeans 0,72
43 Fazer 11 travetes 1,10
44 Fazer 01 caseado de olho 0,28
45 Marcar posição do botão 0,08
46 Pregar 01 botão de haste 0,11
47 Limpeza de fios 1,98
48 Revisar e dobrar calça 0,73
49 Embalar calça 0,20
Fig.61 -
Tempo TOTAL 24,73
Fig.82 – Sequência de montagem do jeans.
Fonte CD Universidade Santista

Existe uma defasagem entre os tempos se computarmos seus valores


sequencialmente e o compararmos ao total fornecido no final da tabela. Essa
diferença se dá pelo fato de algumas preparações (como bolso traseiro e
dianteiro, vista e cós) serem feitas simultaneamente.

As etiquetas, no mercado jeanswear constituem um capítulo à parte desde que


em 1886, Levi desenvolveu uma etiqueta de couro no seu jeans. O rótulo
mostrou um desenho de um par de jeans que estavam sendo puxados entre
dois cavalos. Esta foi a forma de anunciar quão forte seus jeans eram.
89

. Fig.83 - Imagem da 1ª etiqueta de couro.


Fonte Huiguang, 2007.

Daí aos nossos dias, as fábricas lançaram mão da estratégia das etiquetas
para promover um reconhecimento instantâneo da marca, e de todo
simbolismo que ela carrega. O profissional encarregado de desenvolver esse
produto é um Designer Gráfico, que nem sempre está representado por outra
pessoa. Na minha vida profissional, por várias vezes, assumi a
responsabilidade de desenvolver não só etiquetas, mas de alterar a própria
identidade visual da marca, a fachada da loja ou a decoração da vitrina,
comprovando a tese de que o designer de moda, na verdade, abrange a
atuação em outros domínios, que não só o seu específico.
Há vários tipos de etiquetas que acompanham uma peça em Denim: as
internas, obrigatórias por lei, com informações de composição dos tecidos;
cuidados especiais na lavagem, secagem e conservação; número do CGC,
acompanhado do país em que foi fabricado o produto; a etiqueta da marca,
conjunta ou separada à de numeração e as externas: linguetas de bolso ou
lateral das peças, as de cós traseiro. O seu desmembramento se deu logo no
início do processo industrial, através das “Tags”. Etiquetas, geralmente em
papel, com imagens e informações sobre as características e conservação do
produto e que agregavam valor ao impacto visual na hora da venda.
A seguir, imagens de Tags de algumas das primeiras marcas de jeans:
90

Fig.84 – Exemplos de vários tags. Fonte: Revista Sportswear edição 48

Aos olhos dos consumidores, um jeans sem etiqueta se


torna uma simples e anônima calça de algodão.
Quando a primeira marca estabeleceu um elo entre a
construção do produto e a imagem do cowboy, estava
criada a etiqueta que atestaria, mesmo muitos anos
depois, o seu status original.
Primeiramente de couro gravado, ganha espaço
também para informar ao consumidor, detalhes sobre a
peça, como lote de fabricação, tamanho etc.

Fig.85 - Primeiras Esse emblema, colocado na parte traseira das calças


etiquetas traseiras.
Fonte Huiguang.
vai se sofisticando em pesados metais, ricos dourados
ou modernos emborrachados, adquirindo relevos, cores
e brilhos que ao longo dos anos vão identificando as empresas e seus
consumidores.
Já atendeu a trabalhadores, aventureiros, cowboys, amantes da natureza e
enamorados, acompanhando cuidadosamente seus logos com frases que o
definam. Essa mensagem era e é clara e precisa: identificação.
91

Algumas etiquetas tem vida curta, às vezes, o tempo de uma estação, mas são
criadas com o propósito de alguma mudança no estilo de vida, ainda que
temporária. Mesmo assim sustentam o compromisso de perpetuar a marca cujo
nome se mantem, transformando-se camaleonicamente, estação após estação.

Um outro diferencial que tem quase o mesmo


comportamento das etiquetas, são as filigranas de
bolso traseiro. Seu desenho, para algumas empresas
é como uma “marca registrada” que proporciona uma
identificação imediata. A princípio apenas
pespontadas, geralmente com duas agulhas,
atualmente encontramos uma variedade muito
grande de bordados e cores, como podemos
observar nos exemplos a seguir: Fig.86- Filigrana original Levi’s.
Fotografado pela autora

Fig.87 - Exemplos de filigranas contemporâneas. Fonte: www.gardus.com.br

Fig.88 - Filigrana Calvin Klein Fig.89 - Bordado-Be- Fig.90 - Bordado com


Jeans Fonte: extreme. Fonte: site da brilho. Fonte: Foto da
Glamour.com.br marca. autora
92

Fig.91 - Be-extreme. Fonte: site Fig.92 - Bolsos trazeiros. Fonte: Huiguang


da marca

A moda dessa sarja, que também deu origem a um novo segmento do


vestuário: o jeanswear expandiu-se, como percebemos, muito além de um
modelo básico.
Com conotações diferenciadas, ampliou o circuito da moda e promoveu, não só
variantes dos moldes originais, como também modelagens para mulheres e
crianças. Mas, como vimos, a partir da década de 1960, o jeans mereceu mais
espaço na mídia da moda, principalmente por causa de suas múltiplas
lavagens.
Dos rios que bordejavam Woodstock às
cachoeiras de Mauá — locais onde hippies
inventavam modismos e tingiam panos com cores
psicodélicas — os truques e ritos de lavagens
ganharam fama. A indústria têxtil, sempre atenta
às demandas vindas de ambos os lados da
pirâmide social, tirou partido da criatividade
artesanal e mergulhou fundo nos beneficiamentos
dos coloridos e das nuances do tecido.
Lavanderias, tanto as de porte como as menores,
adaptaram-se à nova era e investiram no
maquinário para fazer milagres no tecido antigo,
usado por garimpeiros e marinheiros. Uma das
vantagens para que esse trabalho se tornasse
melhor, residia na sua estrutura resistente,
sarjada, na qual a tessitura em diagonal garantia
sucesso e promessa de maior durabilidade.
(CHATAIGNIER, 2006:112).
93

III.5 - BENEFICIAMENTOS

Com informações técnicas extraídas da edição do SENAI. CETIQT. “Denim:


História, Moda e Tecnologia” (1994), resgatamos as informações de que os
processos de beneficiamento (ver glossário, pág.119) de peças do vestuário
confeccionadas podem ser classificados em dois grupos:

1 — Efeitos de desbotamento ou de envelhecimento de peças confeccionadas;


2 — Tingimento de peças confeccionadas.

No caso especifico do Jeans, nos interessa acima de tudo e por razões óbvias,
o primeiro tipo de beneficiamento. Os efeitos de desbotamento sobre peças já
prontas, partindo do material tinto, começaram a ter aceitação na década de
60, quando os "hippies" obtinham, na maioria das vezes de forma involuntária,
efeitos que eram produzidos pelo desgaste do tecido com o uso ou através de
lavagens caseiras, empregando soluções de hipoclorito de sódio (água
sanitária). Em seguida, esses efeitos passaram a ser obtidos em escala
industrial, através do emprego de produtos químicos para provocar o
desbotamento. Para se obter o efeito de envelhecimento passou-se a utilizar a
pedra-pomes e, mais tarde, a argila nodulizada durante o procedimento de
lavagem, para promover o desgaste do tecido. O maquinário para a obtenção
destes efeitos especiais é constituído basicamente de máquina de lavar,
extrator centrífugo e secadeira de tambor rotativo ("Tumbler").

Fig.93 - Lavanderia industrial. Fonte Catálogo da Comask


94

Estes efeitos poderão, ainda, apresentar-se de forma regular, comumente


conhecidos como "delavé", ou de forma irregular, onde são produzidos padrões
ou desenhos distribuídos aleatoriamente sobre o tecido. Nestes casos, os
processos ou efeitos recebem denominações especiais como "acid wash",
"snow wash", "stone wash", etc.. .

III.5.A – Os Desgastes
Responsáveis pelos “pequenos relatos” nas peças jeans, o aspecto usado e
desgastado é obtido, na maioria das vezes através de interferência manual e
antecede o processo de lavanderia propriamente dito. Esse trabalho artesanal
contribui para dar ao usuário a sensação de estar vestindo uma peça exclusiva,
garantindo a satisfação de se destacar dentro do seu grupo.
Os desgastes, na sua maioria são obtidos com o auxílio de equipamentos que
origináriamente foram concebidos para outras funções, resgatando dessa
maneira o já conhecido sistema da bricolagem (ver glossário, pág.119).
Podemos citar como exemplos: o rebôlo para desgastes da beirada dos bolsos;
esmeril para desgastes localizados mais agressivos ou a lixa utilizada para dar
o aspecto “used” na peça. As lixas são um material recorrente na construção
dos desgastes e tanto pode funcionar sozinha como associada a outros
materiais, de universos distintos como raladores, pedaços de madeira com
pregos ou com outros materiais que provoquem algum tipo de “desenho” na
superficie têxtil.
Quando usada sobre um pedaço de madeira, previamente preparado com alto-
relêvo simulando as dobras de uso, produz o que chamamos de “bigodes”, que
são as marcas obtidas ao sentar com a peça e se localizam na região da
virilha. As pernas das calças, muitas vezes são introduzidas numa espécie de
forma pneumática para que os efeitos possam ser mais facilmente
conseguidos.
No processo de obtenção desse efeito o procedimento mais comum é o lixado
manual, porem empresas já possuem procedimentos mecânicos (semi-
automáticos ou automáticos) para esse fim.
95

Fig.94 - Perna pneumática Fig.95 - Processo manual de lixamento.


Fonte: CD Santista Têxtil Fonte: CD Santista Têxtil

Fig.96 - Bricolagem e seu efeito. Fonte: CD Universidade Santista

. Fig.98 - Resultado
Fig.97 - Aplicação de jatos de permaganato.
Fonte Catálogo Comask aplicação de permaganato
96

Fig.99 - Lixados simples: processo. Fonte Fig.100 - Resultado lixado.


Catálogo Comask Fonte: foto da autora

Fig.101 - Pistola de etiquetagem usada para os efeitos de plissado (Fast-Pin) antes da


lavagem. Fonte CD Universidade Santista.

.
Fig.102 - Resultado: efeito Plissado.
Fonte: Foto da autora
97

Fig.103 - Desgastes por instrumentos de retífica: Rebôlo e Esmeril.


Fonte: CD Universidade Santista

Fig.104 – Ralados Fig.105 – Escovado


Fonte: Foto da autora Fonte: Catálogo Santista

Fig.106 – Pincelado Fig.107 - Patches colados


Fonte: Foto da autora Fonte: CD Universidade Santista
98

Fig.108 - Resinado amassado Fig.109 - Resinado com pigmento


Fonte: CD Universidade Santista Fonte: CD Universidade Santista

Outros efeitos são consegudos após a lavagem, quer seja por interferência
manual, como os “Rabiscos” ou por processos mecânico-químico, como o
amassado permanente ou aplicação de efeitos estampados pelo processo a
laser. Este último garante uma perfeição de desenhos mesmo sobre as
costuras. A gravação se dá pelo sistema de sublimação do corante através da
temperatura de aplicação do laser.

Fig.110- Efeito Rabisco Fig.111- Amassado permanente.


Fonte: Guiajeanswear.com Fonte: Foto da autora
99

Fig.112 - Impressão a Laser. Fonte: CD Universidade Santista

Mesmo depois de pronta a peça, os procedimentos não se esgotam aqui.


Temos como exemplo, entre outros, o grupo Cheap Monday que customizam
(pintam, colocam “patches”, bordam etc) 100 peças a cada edição e as
comercializam em lojas intinerantes.

Fig.113 - Processo de customização. Cheap Monday.


Fonte:.guiajeanswear - maio 2009

A industria da lavanderia se utiliza também, paradoxalmente, de processos


mecânicos e até mesmo da robótica, para a produção de defeitos: tinta ou
areia são jateados em partes das peças, através de verdadeiras estações em
que braços mecânicos conduzem os borrifadores previamente programados.
100

Fig.114 - Estação robótica. Fonte: Catálogo Comask

Fig.115 - Processos mecânicos de obtenção de efeitos:


Pintura Robótica. Fonte Catálogo Comask
101

Fig.116 - Lixador mecânico. Fonte: CD Santista Têxtil

Fig.117 - Base para efeitos de “bigode” no processo de jato abrasivo. Material


abrasivo. Fonte:CD Santista Têxtil

Fig.118 - Procedimento de jato abrasivo. Fonte:CD Santista


Têxtil
102

Fig.119 - Prensa para resinados. CD Santista Têxtil.

III.5.B – Lavanderia
Começaremos abordando as lavagens processadas no tecido em peça, ou
seja, antes da sua confecção. A primeira interferência que procurou dar ao
tecido um aspecto de envelhecimento precoce e que deu origem aos demais foi
o denominado "lixado" que consiste em passar o tecido, em aberto e de forma
contínua, em equipamentos normalmente improvisados, providos de cilindros
revestidos com material abrasivo (lixa fixada com cola em rolos de madeira).
O processo que se seguiu foi o denominado ”Bleached” ou "Délavé", que,
inicialmente utilizado em veludos (corduroy), possuía a denominação especial
de "Délavé Cord", sendo posteriormente aplicado em denim e brins em geral.
No processo "Délavé", o cliente pode adquirir o tecido em peça, já envelhecido
(lavado), ou adquiri-lo perfeitamente tinto, junto com uma amostra do mesmo
tecido já lavado e com o aspecto envelhecido.
Atualmente, as empresas fabricantes de denim, fornecem seus produtos com
uma gama muito grande de variações de fios, tramagem, tingimentos e
processos de lavagem.
103

Tomemos como exemplo quatro tecidos denim de diferentes pesos e


tingimentos ( Vicunha – Basf) para observarmos seu comportamento em dois
processos de lavagem:
A primeira receita, cujas amostras estão do lado esquerdo, se processa da
seguinte maneira:

1. Clareamento: tempo de 30’. Produtos: Albigen A 1,5% / Soda Cáustica


50 Be 3,0% / Setamol Ws 1,0% / Rongalit C 3,0%. Temperatura de 90o.
Resfriar. Enxaguar.
2. Neutralização: Acido Acético 1% a 2% (10 minutos). Temperatura: frio.
Enxaguar.
3. Ensaboamento: Decol SN: 1% (10 minutos). Temperatura 80o.
Enxaguar.

Na segunda receita, (amostras da direita) temos algumas modificações nas


percentagens dos produtos químicos, que tornam o jeans mais delavado,
portanto com aspecto de um tempo de uso maior. Observem que o grau de
desbotamento não é o mesmo em função do tipo de tingimento e as
diversas composições:

1. Clareamento: tempo de 30’. Produtos: Albigen A 2,5% / Soda Cáustica


50 Be 5,0% / Setamol Ws 1,0% / Rongalit C 5,0%. Temperatura de 90o.
Resfriar. Enxaguar.
2. Neutralização: Acido Acético 1% a 2% (10 minutos). Temperatura: frio.
Enxaguar.
3. Ensaboamento: Decol SN: 1% (10 minutos). Temperatura 80o.
Enxaguar.
104

Fig.120 - Denim 10,5 Oz.83% algodão / 14% poliéster / 3% elastano.


Tingimento: Special Dye. Fonte: catálogo Basf/Vintage

Fig.121 - Denim 12 Oz.100% algodão. Tingimento: Coating. Fonte: catálogo


Basf/Vintage

Fig.122 - Denim 12 Oz. 84% algodão / 16% poliéster. Special Dye.


Fonte: catálogo Basf/Vintage

Fig.123 - Denim 10,5 Oz. 100% algodão. Coating. Fonte: catálogo Basf/Vintage
105

É evidente que o corante empregado e o método de tintura são os


responsáveis pelo desgaste e aparência após a lavagem. Neste caso
específico, os tecidos são tingidos por processos contínuos de impregnação,
empregando-se pigmentos e com baixo teor de ligantes para facilitar o
desbotamento. Abaixo, alguns dos principais processos aplicados ao jeans
confeccionados (Chataignier, 2006:59):

Jeans Bruto: Amostra do jeans bruto, ou seja, como é comercializado sem


nenhum acabamento ou apenas amaciado, para facilitar a comparação com os
lavados.

Fig.124 – Jeans Bruto Fonte: Foto da autora.

Destroyed: lavagem realizada com química corrosiva, deixando rasgões em


partes das peças que foram previamente lixadas e coloridos aleatórios,
conseguidos com superposição de tintas antes da lavagem.
106

Fig.125- Bread&Butter. Fonte: Fotos da autora, 2009.

Dirty wash: lavagem realizada em jeans que tenha uma base estonada média
com sobretinta em tom caqui, dando efeito de envelhecimento. Também mais
indicado para a peça pronta.

Fig.126 - Levi’s Dirty. Fonte


Huiguang, 2007

Estonado ou stone-wash: Lavagem realizada com algum tipo de abrasivo


associado ou não à solução química. Os abrasivos podem ser:
• Pedra Pomes: de origem vulcânica, pouco usada no Brasil em função da
disponibilidade e é indicada para tecidos médios e pesados.
• Pedra Cinasita: Argila expandida em fornos; é bastante usada no Brasil
em função do custo e disponibilidade; recomendada para tecidos médios
e pesados.
• Perlita e Pó Abrasivo:
- Alternativa para envelhecer tecidos mais leves e delicados.

Pedra Pomme Cinasita Perlita


.
Fig.127 – Pedras abrasivas. Fonte: CD Universidade Santista
107

No exemplo, lavagem realizada com pedras vulcânicas, causando no tecido ra-


nhuras desiguais quando batidas na máquina de lavagem industrial. A imagem
traz também bigodes permanentes deslocados.

Fig.128 – Stone wash - Bread&Butter.


Fonte: Foto da autora, 2009.

Fire wash: lavagem realizada em jeans escuro (índigo ou black) com corantes
vermelhos que produzem tons próximos aos do fogo ou aos de terras
barrentas. O efeito obtém melhores resultados com peças já confeccionadas.

Fig.129 - Bread&Butter
2009. Fonte: Foto da
autora
108

Marmorizados ou Acid Wash: lavagem realizada em alvejantes químicos de


alta densidade, borrifados irregularmente, provocando efeitos de desgaste e
envelhecimento irregulares. Pode ser tambem conseguido por sistema de
amarramento como no Tie-Dye (ver glossário pag.125). A peça a seguir ainda
sofre um processo de amassado permanente.

Fig.130 - Bread&Butter. Fonte: Foto da autora, 2009.

Médium distressed: lavagem realizada em jeans escuro com amaciamento


prévio, sendo que o tecido é lixado depois manualmente, o que torna o produto
final mais caro.

Fig.131 - Jeans Diesel.


Fonte: Huiguang, 2007
109

Second hand: lavagem realizada com pedras que proporcionam aspecto de


roupa usada na peça, como se fosse de brechó; seu nome significa
exatamente o seu aspecto, o de segunda mão.

Fig.132 - Bread&Butter.
Fonte: Foto da autora,
2009

Silver Black - Sprays criam efeito manchado na barra ou nas pernas das
calças, enquanto a aplicação de resina confere a toda peça um acabamento
brilhante.
.

Fig.133 - Bread & Butter


2009. Fonte: Foto da autora
110

Snow wash: lavagem realizada com respingos aleatórios de material químico


corrosivo, que embranquece a peça pronta em determinados lugares como se
fossem flocos de neve. Uma variação dela foi destaque na Bread & Butter
2009, concentrando os respingos na barra, sugerindo as calças de um pintor
descuidado.

Fig.134 - Bread&Butter
Barcelona.
Fonte: Foto da autora, 2009.

Energized – Uma das lavagens mais agressivas onde lixados, bigodes,


ralados, respingos, resina, amassado, tratamento com enzimas e tingimento
estão reunidos em um único acabamento.

Fig.135 - Bread&Butter Barcelona.


Fonte: Foto da autora, 2009.
111

3D resinado
Acabamento resinado que proporciona a sensação de relevos, ao mesmo
tempo em que impermeabiliza a peça.

Fig.136 - Bread&Butter. Fonte: Foto da autora, 2009.

Jeans color: Muitas são as opções de tingimentos coloridos para o denim,


como a proposta para o verão 2010 da Colcci, apresentada na última edição da
São Paulo Fashion Week, em junho de 2009.

Fig.137 - Jeans cor de rosa da Colcci


para o verão 2010. Site SPFW, 2009.
112

E mais:
Overdie: lavagem realizada por múltiplos recursos e tonalidades diferentes de
corantes, criando efeitos de sujeiras.

Mud wash: lavagem realizada em jeans escuro (azul ou black jeans) com
sobretinta verde, algumas vezes produzindo efeito de camuflado.

Pré-washed: lavagem realizada com a finalidade de amaciar o tecido, por meio


de enzimas amaciantes ou silicone. Sem acabar com a solidez do índigo, esta
lavagem torna o produto agradável no toque e uso. Não muda o tom do tecido.

Soft rigid: lavagem realizada em tecido virgem, visando um leve amaciamento.

Algumas lavagens, como pudemos observar, envolvem uma série de


procedimentos químico-físicos para se obter resultados estéticos mais
agressivos, recebendo dois ou mais efeitos sobrepostos, conseguindo-se uma
diferenciação e um aspecto de envelhecimento cada vez maior.
Na contemporaneidade, como apontado no início desse trabalho, esse “sujeito”
pós-moderno, não se contenta em ser homogêneo e coerente. Ele se
transmuta concomitantemente, em jeans bruto, apenas amaciado; em um jeans
vintage mais limpo, beneficiado com processo de ozônio; em jeans manchados
propositalmente com aplicação de corantes fazendo uma releitura do tie-dye;
em jeans detonados, com buracos ou remendados, com efeitos de manchas e
sujeiras relembrando as peças usadas pelos trabalhadores que deram origem a
criação do jeans; stone washed, com ou sem enzimas; destroyed; used;
bigode; fast pin; plissado; bigode permanente; lixado; puído; esmerilhado;
amaciado; marmorizado, marcado a laser, raclado etc etc etc.
É importante lembrar que as nomenclaturas dos efeitos e lavagens podem
mudar, dependendo não só das lavanderias industriais, como também das
tendências da moda (que indicam a todo o momento novidades também neste
setor ) e das grifes às quais pertencem.
113

Após sua neutralização e secagem que pode ser feita em tambores ou fornos,
as peças entram para o acabamento na oficina, onde recebem os metais
(botões, rebites, ilhoses), aplicações, bordados especiais etc.

Fig.138 - Exemplos de metais. Máquina semi-automática. Fonte: Revista Eberle Fashion.

É realizada, então, a limpeza da peça e a etiquetagem externa com a


colocação dos Tags. O jeans segue seu processo de produção através do
controle de qualidade, cujo parâmetro é variável, dependendo da marca e do
mercado a ser atingido, finalizando o ciclo com a embalagem e expedição.
114

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como consequência do fazer e do pensar moda através desse estudo,


selecionamos a partir do jeans, três aspectos de reflexão importantes: o
primeiro é a possibilidade de identificar o jeans como “sujeito” pós-moderno; o
segundo é a constatação das mudanças nos processos de produção que
transformaram a indústria, principalmente de beneficiamento; a terceira
constatação se refere às mudanças nos conceitos estéticos da moda, que a
partir do jeans se expandiram para outros setores. Reconhecemos ainda o seu
uso como uma das mais democráticas peças do vestuário.
O jeans é a peça que ao mesmo tempo moderna e pós-moderna. Ele nasceu
sob a essência da modernidade enquanto sistema de industrialização. E ele é
concomitantemente pós-moderno, pois agrega os três princípios que, segundo
Lipovetsky, definem a pós-modernidade: a sedução, a renovação permanente e
a diferenciação marginal. Ora, o jeans sedutoramente se expõe através de
modelagens femininas, aderentes ao corpo, com o auxílio do fio de elastano,
enquanto permite aos homens serem sensuais tanto pelas formas ajustadas,
quantos pela colocação de uma cintura abaixo das suas peças íntimas ou pela
apropriação do imaginário sensual e sexual de ambos, utilizados como
estratégia de marketing pela maioria dos seus fabricantes.
A renovação em moda é sua própria mola propulsora, na medida em que ela é
sustentada, hoje, pela busca incessante da novidade. As grandes coleções que
duravam seis meses pelo menos, passaram a ser apenas o marco de mudança
das estações, pois inúmeras empresas trabalham com coleções trimestrais,
mensais ou até mesmo apresentando novidades semanalmente.
No jeans, além de acompanhar essa engrenagem, a renovação extrapola o
tempo, pois se faz dia a dia, tanto pelo desbote da sua cor quanto pelas
pressões irregulares e abrasivas em sua superfície, conferindo-lhe um aspecto
único.
Por fim, é o próprio símbolo da diferenciação marginal, por toda a quebra de
paradigmas estéticos da moda, da qual é precursor e que veio rompendo ao
longo dos anos. Seu resultado acontece simultaneamente ao da arte e da
própria organização social das metrópoles.
115

Em concordância com o que diz Daniela Calanca (2008) e Rosane Preciosa


(2005), vivemos numa época em que culturalmente tudo é legítimo e as
experimentações multidisciplinares tanto no campo da arte como da moda
legitimam as criações sem regras estéticas definidas. Nenhuma das duas (arte
e moda) teme romper esses limites, tomando a desmedida, o excesso, os
aspectos empobrecidos, sujos e disformes como valores autênticos nas suas
manifestações.
O jeans sempre acolheu símbolos marginais de fragmentação, quer seja pelo
uso “hard” do trabalho que realizava, quer pelo viés da experimentação pela
bricolagem. Esse procedimento teve como consequência duas direções: a
primeira foi a que ocasionou uma verdadeira revolução em parte da indústria
têxtil que precisou se adaptar a eles. A mudança vem a partir de modificações
estruturais no seu maquinário para intencionalmente produzir os defeitos
(entenda-se efeitos) desejados, ou ainda os conseguindo através de
interferências manuais no processo de produção em série, com o auxílio de
materiais que absolutamente não fazem parte do universo têxtil (bricolagem).
A segunda foi a possibilidade que abriu para que outros segmentos da cadeia
têxtil se apropriassem dessa performance marginal e a aplicassem em outros
materiais (malhas com furos, tingimentos manchados, tecidos desbotáveis,
amassados, desfiados etc). Essa abertura de caminhos alternativos que só
passou a ser utilizada no final da década de 1970, início dos anos 1980, por
Vivienne Westwood, Rei Kawakubo, Zandra Rhodes entre outros, encontraram
no jeans, já sedimentada, uma vivência de mais de dez anos.
Vimos também que a aceitação desse tipo de vestimenta veio primeiramente
através de jovens que de alguma forma buscavam o vestuário de oposição aos
estilos clássicos, adotados pela alta costura ou o prêt-à-porter e que atendiam
à elite social e econômica. A diversidade das culturas urbanas de rua, a
ideologia da vestimenta como afirmação pessoal de subversão em oposição à
conformidade acompanhou vários movimentos a partir da década de 1950. Os
códigos foram se multiplicando através do anticonformismo dos jovens:
Existencialistas, Zazous, Beatniks, Hippies, Punks, Rasta, Skinheads, New
Wave, Happers, etc
116

Através dessas culturas jovens, o jeans foi escolhido por mais de um grupo
como a peça de identificação: ora da sua rebeldia, ora da sua mensagem de
paz e amor, ou da sua ironia ou da sua indiferença ao que a moda estabelecia,
fragmentando assim os padrões de estilo e possibilitando as mudanças
estéticas das quais falamos.

Fig.139 - O Jeans atende aos vários grupos urbanos. Montagem da autora.


Fontes: Sabino (2007), Streetwear (2007) e catálogos das marcas: Desigual,
Mod, Silvian Heach, Timezone, 2009
117

O jeans, independente dos segmentos que atende, vem satisfazendo dois


importantes aspectos quando da escolha do vestuário: o pertencimento ao
grupo e dentro desse grupo, a individualização, o estilo, o diferencial que nos
torna únicos.
No contexto contemporâneo da produção da moda, o jeans, carregando os
seus signos adquiridos ao longo de décadas, ou simplesmente incorporando
seu resultado fisicamente, vem atendendo a praticamente todos os segmentos
econômicos, desconhecendo as diferenças culturais ou de classes sociais;
resolvendo como nenhum outro a igualdade ou hegemonia entre o masculino e
o feminino, se adaptando a qualquer ocasião de uso e se renovando
constantemente a cada lavagem. Essas possibilidades todas vão lhe
conferindo status, sensualidade, reflexões simbólicas e valores
contemporâneos.
Até mesmo países universalmente conhecidos como antiamericanos (e o jeans
carrega os Estados Unidos no seu DNA), estão derrubando paulatinamente as
últimas barreiras para a sua universal aceitação, como vemos nessa foto de
trabalhadores do Irã.

Fig.140 - Trabalhadores no metrô de Teerã em fevereiro de 2009.


Raulnachina.folha.blog.uol.com.br.
118

Como pudemos observar ao longo dessa dissertação, o jeans enquanto peça


do vestuário, percorreu um caminho diverso daquele traçado pela moda em
geral. A alta-costura, durante o final do século XIX e metade do século XX,
funcionou como uma espécie de “ditadora” das tendências de moda. Ao longo
de várias décadas, os modelos dos criadores e posteriormente das grandes
marcas, que vestiam as classes altas, artistas e celebridades, ditaram a moda.
Esses modelos eram repensados (ou copiados) pelo “prêt-à-porter”,
influenciando e disseminando seus modelos às outras classes sociais até
chegar às industrias que atendem o segmento mais popular, entrando na
massificação e, consequentemente, deixando de ser moda.
Já o jeans percorre o trajeto inverso, pois foi criado para vestir o trabalhador;
adotado pelos cowboys; foi escolhido pelos jovens como signo de protesto; foi
usado pelas mulheres como estandarte da sua nova posição; ganhou
popularidade ao redor do mundo; brilhou passarelas de moda; atingiu a
maturidade, renovando-se através do conceito “premium” jeans, que ao lado
dos atuais produtos de luxo no universo da moda (bolsas, óculos e relógios),
torna-se mais um ícone de status social.
Considerando que o Design está, sobretudo, ligado ao uso eficiente da forma,
quer seja dos produtos, serviços ou processos, o jeans é, dentre todas as
peças do vestuário, a que se mostra das mais eficientes sob o ponto de vista
da funcionalidade, ergonomia, desempenho, durabilidade, estilo, diferenciação,
atratividade, inovação etc.
Para o profissional da área, como podemos perceber pela complexidade do
processo de produção, o designer deve ter um repertório bastante amplo para
que no projeto inicial já se encontre determinada uma peça com todas as
características de reprodutibilidade e ainda deixar margem para que os
acabamentos na lavanderia, que muitas vezes são manuais, transmitam a
sensação de peça única ao seu usuário.
Se a interdisciplinaridade é pertinente ao trabalho de qualquer bom designer de
moda, no profissional do segmento jeanswear, como vimos, essa diversificação
dos saberes encontra terreno fértil. Mais do que isso: se torna fonte necessária
de criação, pois reconhece no jeans o mais puro representante do design de
moda pós-moderno.
119

V. GLOSSÁRIO

Algodão
Um dos tecidos leves mais valorizados na moda por sua maciez e conforto, o
algodão é fabricado a partir das fibras do algodoeiro. Embora o algodão puro
seja o mais apreciado por consumidores mais exigentes, muitas indústrias
têxteis costumam mesclá-lo com diversas fibras sintéticas para a redução do
custo do preço final. O tecido de algodão puro, considerado nobre, hoje em dia,
foi durante muito tempo utilizado somente na confecção das roupas dos
escravos brasileiros. Sua valorização na fabrica do vestuário começou a partir
do século XX. No século XI, o chamado algodão colorido passou a ter seu
cultivo estimulado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a
Embrapa. Em 2004, já era disponível nas cores creme, verde e marrom e,
segundo os técnicos, achados arqueológicos mostraram algodões coloridos já
existiam há centenas de anos. Atualmente seu cultivo é muito explorado na
Paraíba (SABINO, 2007).

Amaciante Catiônico
Derivado de ácidos graxos, líquido levemente amarelado, solúvel em água e
que promove o amaciamento das fibras.

Beneficiamento (têxtil)
Considera-se beneficiamento todos os processos que modificam a estrutura ou
a superfície dos tecidos crus. Amaciamento, lixamento, aplicação de resinas,
estamparia, tingimento são alguns deles.

Bricolagem
A bricolagem é o termo utilizado para definir o trabalho executado com as
próprias mãos, utilizando meios diferentes daqueles usados por um
profissional.
O bricoleur é capaz de executar um grande número de tarefas diferenciadas,
mas, diferentemente do profissional, ele não as subordina à posse de matérias-
120

primas e de ferramentas concebidas e arranjadas especificamente para a


realização de seu projeto: o seu universo instrumental é aberto e, para ele, a
regra do jogo consiste em sempre se adaptar ao equipamento de que dispõe.

Célula de Produção
Formação geralmente circular das máquinas de costura, permitindo uma maior
integração entre as operações de montagem (costura) de uma peça do
vestuário.

Cupro
Fibra artificial tendo como base a celulose. Sua dissolução se dá através do
cobre e amoníaco, tendo como resultado uma fibra extremamente macia.

Denim
O denim é uma sarja de algodão fabricada com fios tingidos com índigo (no
urdume) e com fios na cor natural (na trama). O nome surgiu a partir da
abreviação do francês “sergé de Nímes”, que significa sarja de Nímes. Assim,
“de Nímes” passou a ser denim. Nímes é uma cidade portuária na França e o
tecido era muito utilizado na fabricação de roupas para marinheiros. O denim e
a sarja de Nímes são, entretanto, tecidos diferentes, sendo a sarja francesa
uma mistura de lã e seda e o denim americano obtido a partir do puro algodão.
(SABINO, 2007).

Desconstruído (desconstrutivismo)
A desconstrução é a capacidade de se questionar sobre o existente, não se
esgotar com o oferecido, quando o pensar e o repensar o problema conduzirem
a experimentações em direção de uma permanente desmistificação do objeto e
suas representações, considerando o material, a forma, a estrutura, nunca
partindo de soluções auto-evidentes, aprioristicamente “verdadeiras”, “eternas”
ou “universais” onde o fundamental não mais estaria na produção de objetos
com significados estáveis, mas no processo de significações.
Palavra usada na moda para fazer referência a modelos confeccionados com
corte, estrutura e construção diferentes das formas convencionais. As peças
121

desconstruídas têm geralmente um apelo considerado moderno ou


vanguardista e podem ter cortes assimétricos, franzidos inesperados e tipos de
costura que costumam fugir dos padrões previsíveis. (SABINO, 2007)

Desengomagem
Desengomagem é o processo de remoção das gomas (a maioria delas são
base de amido) que são usadas para evitar a quebra das fibras durante a
tecelagem.

Design
Bomfim (2002) nos diz que o termo vem do latim “designare” – de + signum
(marca, sinal) – significa desenvolver, conceber. A expressão “Design” surgiu
no século XVII, na Inglaterra, como tradução do termo italiano “Disegno”, mas
somente com o progresso da produção industrial e com a criação das “Schools
of Designs” a expressão passou a caracterizar uma atividade específica.

Destroyed
Palavra que significa destruído em inglês e é utilizada para referir-se a roupas
com aspecto envelhecido e gasto, podendo possuir rasgos e desfiados
propositais. O efeito é conseguido por meio de técnicas especiais e é muito
usado em calças jeans (SABINO, 2007).

Elastano
Fibra elástica formada por no mínimo 85% de poliuretano segmentado e que
sob a influência de uma força de tração, tem a capacidade de alongar o triplo
do comprimento original. Recupera o comprimento original quando cessa a
força de tração. Conhecida também por Expandex.

Encaixe
É a disposição justaposta de todas as partes que compõem a modelagem da
peça a ser cortada, em todos os tamanhos, com o objetivo de economizar ao
máximo a matéria prima. O bom encaixe deve respeitar o “fio do tecido” que é
122

marcado em cada parte da modelagem. Essa marcação deve coincidir


paralelamente aos fios de urdume.

Enfesto
Colocação em camadas das várias folhas de tecido, nas diferentes cores, para
que sejam cortadas simultaneamente todas as peças que serão produzidas.
Sobre o enfesto é colocado o risco resultante do melhor encaixe.

Engomagem
Processo pelo qual passam os fios de urdume antes de entrarem no tear,
conferindo-lhes mais resistência ao atrito e à tensão.

Flamé
Nome dado aos fios que possuem irregularidade de espessura. No caso dos
jeans, os tecidos feitos com esses fios recebem a denominação “Ring” e
podem ser horizontais, verticais (se usados na trama ou no urdume) ou “Cross
Ring” se utilizados nos dois sentidos.

Grunge
Estilo de algumas bandas de rock pesado como Nirvana e Pearl Jam, que
surgiram em Seatle, nos EEUU na década de 1990. Camisões super largos em
flanela xadrez, camisetas enormes, meias caindo sobre botas, gorros etc
compunham seu visual que foi adotado como inspiração pelos criadores de
moda na época.

Jeans
A palavra jeans é uma corruptela do francês “serje de Geneve”, referindo-se à
italiana Gênova, cidade portuária onde os marinheiros usavam calças
confeccionadas com uma sarja resistente procedente da cidade francesa de
Nimes. A palavra jeans referindo-se às calças de brim índigo blue, só começou
a ser utilizada a partir dos anos 40 pelos jovens americanos. Antes, tal tipo de
123

calças era chamado waist overalls nos Estados Unidos. No Brasil, eram
chamadas calças rancheiras ou calças americanas far-west ou faroeste.
Nos dicionários americanos pesquisados, publicados antes dos anos 60, a
palavra “Jean” aparece como "algodão resistente usado na confecção de
macacões" e, nas edições dos anos 60, a palavra já aparece com "s", jeans,
referindo-se a "calças confeccionadas com sarja de algodão resistente". Em
1947, no entanto, o catálogo de vendas da americana Sears, Roebuck and Co
já oferecia Blue Jeans com modelagem especial para mulheres e calças em
índigo blue, em estilo caubói, para adolescentes e rapazes (SABINO, 2007).

Ilhós(es)
Aviamento de metal, geralmente redondo e vasado ao meio, utilizado
principalmente como passante de cordões para ajustes e fechamentos.

Índigo
O pigmento para o tingimento do brim, utilizado nos jeans, vem da planta
Indigofera tinctoria, e foi usado a princípio. Sua versão sintética só foi
desenvolvida em 1897, quando Adolfo Bayer identificou a estrutura molecular
da planta. Os jeans fabricados antes de 1920 eram, em sua grande parte,
tingidos com o índigo natural, que dava uma tonalidade azul mais clara e um
pouco esverdeada (SABINO, 2007).

Interdisciplinaridade
A interdisciplinaridade diz respeito àquilo que é comum entre duas ou mais
disciplinas ou ramos de conhecimento a partir do estabelecimento de inter-
relações. Não se trata somente de associar ou somar conhecimentos advindos
de disciplinas distintas. Significa, antes de tudo, a impossibilidade de um único
conteúdo ou campo de conhecimento esgotar um assunto, de modo a resultar
em uma análise e visão mais ampla e complexa sobre este. Inter-relacionar
aponta, além disto, para as tríades pesquisa, criação, produção e reflexão,
análise, ação.
Segundo Roland Barthes "para se fazer interdisciplinaridade, não basta tomar
um assunto (um tema) e convocar duas ou três ciências. A interdisciplinaridade
124

consiste em criar um objeto novo que não pertença a ninguém" (BARTHES,


1988, p. 99).

Linha de produção
Formação linear das máquinas de costura de maneira que cada costureira fica
responsável por apenas uma operação, dentro da sequência de montagem da
peça, passando para a seguinte que está situada à sua frente. Esta profissional
fará a próxima costura e passará para frente e assim sucessivamente até que a
peça esteja toda montada. Opõem-se à célula de produção, onde a disposição
circular permite que o processo seja acompanhado por todas as costureiras.

Lixívia
Refere-se à partículas minerais contidas na água do mar, constituindo uma
solução alcalina eficaz, utilizada para remoção de impurezas.

Patch (es)
Do inglês: remendo; mancha; em moda refere-se ao pedaço de tecido utilizado
para remendar. Os trabalhos artesanais, feitos com patches, têm grande
aceitação desde os anos 1960, quando foram confeccionadas pelos hippies,
transformando a antiga “colcha de retalhos” em “patchworks”.

Pauperisme
Movimento de moda iniciado na França, que tinha como inspiração os
“clochards” (mendigos). Sua característica era a sobreposição de peças com
comprimentos irregulares, a desconstrução da modelagem e o despojamento.
Os estilistas japoneses na década de 1980 foram seus principais divulgadores.

Rebite
Aviamento de metal geralmente colocado nas extremidades dos bolsos para
dar maior resistência ao uso. Também utilizado em acessórios como bolsas,
cintos e sapatos.
125

Stablishment
Do inglês: estabilizado, consolidado, sólido. Diz-se do regime social e político
em vigência.

Tencel
Marca registrada de uma fibra artificial chamada Liocel.

Tie-dye
Processo de tingimento artesanal no qual os tecidos são mergulhados
alternadamente em tintas de cores diferentes. Esses tecidos podem ser
enrolados ou amarrados, criando desenhos imprevisíveis.

Trama
Fios que entram no tear transversalmente através de várias formas,
dependendo do tear: pinça, jato de ar, jato de água etc. Seu objetivo é unir os
fios de urdume, gerando os tecidos. Os principais ligamentos são: tela, sarja e
cetim.

Urdume ou Urdidura
Disposição paralela dos fios colocados no sentido longitudinal, enrolados em
uma espécie de tambor e que vão originar o comprimento do tecido e pelos
quais vão passar os fios de trama.
126

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