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A cultura e a formação do ser humano:

sobre o acesso à cultura


Por Marcia Tiburi
O conceito de cultura está intimamente ligado ao conceito de
formação. Precisamos prestar atenção nesta relação para
entendermos o estado da questão nos dias de hoje quando certa crise
da cultura relaciona-se à educação no contexto da crise geral da
sociedade. O que a sociedade tem a ver com a cultura? O que a
cultura pode fazer pela formação dos indivíduos para além da
educação? Entre a inclusão e a exclusão de indivíduos e grupos ao
poder, pois é de poder que se trata quando se fala de cultura, a
sociedade de um modo geral enfrenta-se com o desejo da democracia
que nada mais é do que a partilha das ideias e das práticas no
contexto de sua diversidade. Vivemos a experiência de uma
sociedade afundada em diversas perspectivas, desejos,
posicionamentos e, sobretudo, jogos de força. Em meio a isso tudo, a
democracia é um desejo e um ideal pelo qual devemos lutar, pois não
está pronta como demonstra a inacessibilidade da cultura.
O que é cultura
Em primeiro lugar, devemos ter em mente que “cultura” é um
conceito usado genericamente para falar da totalidade dos valores e
das práticas humanas. Neste sentido, cultura é tudo o que é
produzido pelo ser humano enquanto não é próprio da natureza. Em
um segundo sentido, costumamos chamar de cultura um tipo de
recorte para definir práticas relacionadas às artes e às chamadas
ciências humanas voltadas à pesquisa de cunho antropológico e
social. Distinguem-se das ciências duras voltadas para a pesquisa
sobre a natureza.
Esta oposição é decisiva na compreensão da cultura na atualidade. As
ciências exatas ou naturais, ciências vistas como “duras” em função
de seu respaldo no método empírico, são também aquelas que se
relacionam historicamente com a noção de progresso. Progresso, por
sua vez, é algo que faz parte da ideologia do mercado. O produto do
progresso nunca foi a arte, mas a tecnologia que não se faz ver em
espetáculos teatrais ou livros de arte, mas em medicamentos,
eletrodomésticos, carros. Tais produtos são hipervalorizados e
lucrativos. Por oposição a eles é que passamos a chamar de produtos
culturais determinados artefatos que acabam por carregar a marca de
algo inútil porque contrário ao progresso, ao mercado e ao lucro.
Os produtos da cultura em seu sentido estrito são desvalorizados pelo
mercado. Mas que sejam desvalorizados pela sociedade como um
todo é um problema sério. Muitos artistas e produtores culturais
tentam mudar isso e muitos conseguem transformando arte em
objeto industrializado para atingir o maior número possível de
pessoas, ou produzindo objetos – músicas, espetáculos, filmes – para
o puro entretenimento. Aí é que aparece a indústria da cultura que
não tem necessariamente a ver com obras de arte. Ou seja, pode-se
produzir um disco inteiro apenas para fazer sucesso no mercado,
desconsiderando qualquer daqueles valores como sensibilidade e
rigor estético que fazem parte da história da arte. Isso pode
escandalizar alguns, mas para aqueles que pensam em termos de
mercado não há nada demais.
De que acesso estamos falando?
A questão do acesso precisa ser pensada a partir daí. Todos nós
temos acesso aos produtos industrializados da cultura e que são
escoados pelo mercado, seja pela televisão aberta ou pelos shows em
estádios lotados com músicos competentes em entreter massas
inconscientes. No entanto, a maior parte da população nem fica
sabendo o que existe em termos de produtos – ou obras de arte –
para além daquilo que é oferecido no contexto do mercado. Não é
errado pensar que o avanço da indústria impede o avanço da arte,
pois a indústria aliada ao mercado, aliada à propaganda, sempre
coopta adeptos, avança nos espaços, não deixando lugar para outras
expressões. A indústria também comanda os interesses, produzindo-
os pela propaganda.
Raramente se vê nos meios de comunicação a propaganda
espontânea de uma exposição de arte, de cinema, de um espetáculo
de dança que escape do que pode render lucro. Há, é claro, exceções
que confirmam a regra. Mesmo o patrocínio por meio de leis de
incentivo é orientado a produtos da indústria da cultura muito mais
do que a produtos propriamente artísticos. A cultura está reduzida ao
que o mercado determina quando escoa produtos industrializados.
Fazer cultura seria, neste caso, resistir diante do mercado, e poder
intervir no desejo das massas. Mas há desejo fora do mercado nos
dias de hoje?
Podemos responsabilizar a educação e até mesmo a família como
tantos fazem. Podemos dizer que o desinteresse das massas é
promovido pelos meios de comunicação. Estamos diante do velho
dilema de quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha. O problema da
educação, da família, dos meios de comunicação, é o problema geral
da sociedade – sociedade civil, governo, esfera privada e pública –
que não se importa com a formação de seus cidadãos porque ela não
dá lucro. Curiosamente, a educação que dá lucro, aquela das escolas
privadas, vai muito bem no Brasil. O acesso aos bens em geral,
inclusive os culturais, dos que tem poder econômico não é um
problema real.
O problema da cultura é também “cultural”
O problema do acesso à cultura é ele mesmo um problema cultural. E
não deixa de ser até mesmo um problema estético, ou seja, de gosto,
de relação sensível com as obras de arte e os produtos culturais. Mas
aqui ele se mostra também em seu caráter de problema ético. No
Brasil poderia haver certa inconsciência sobre o que estamos fazendo
de nós mesmos se não estivéssemos mergulhados em um profundo
jogo de poder em que está sempre vencendo o mercado. O problema
do mercado não é outro do que a unificação dos seres humanos,
impedidos de outras experiências estéticas capazes de promover a
formação para além da estupidificação, da imbecilização que o modo
de ver o mundo de um só ponto de vista produz.
As palavras que usei são fortes e até mesmo feias, mas devem ser
usadas como um balde de água fria que, incomodando, nos acorda.
Contra o descaso da política institucional e da sociedade como um
todo, cabe a labuta diária de artistas e produtores, professores,
jornalistas e cidadãos que não pensam que a hegemonia do
pensamento, da ação e da experiência estética seja um bom futuro
para uma sociedade que deseja ser verdadeiramente democrática.
Marcia Tiburi é graduada em filosofia e artes e mestre e doutora em
filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Publicou as
antologias As Mulheres e a Filosofia (Editora Unisinos, 2002), O
Corpo Torturado (Ed. Escritos, 2004), e Mulheres, Filosofia ou Coisas
do Gênero (Edunisc). Em 2008 publicou Filosofia em Comum – para
ler junto (Record).É professora do programa de pós-graduação em
Arte, Educação e História da Cultura da Universidade Mackenzie,
colunista da Revista Cult e participante do programa Saia Justa, do
canal GNT.

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