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Henri J. M. Nouwen
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
Havia um homem que tinha dois filhos. O mais jovem disse ao Pai: “Pai, dá-me a parte da
herança que me cae!. " o Pai dividiu os ens entre eles. Poucos dias depois, ajuntando todos
os seus haveres, o filho mais jovem partiu para uma regi#o long$nqua e ali dissipou sua
herança numa vida devassa.
" gastou tudo. %oreveio &quela regi#o uma grande fome e ele começou a passar privaç'es.
(oi, ent#o, empregar-se com um dos homens daquela regi#o, que o mandou para seus campos
cuidar dos porcos. "le queria matar a fome com as olotas que os porcos comiam, mas
ningu)m lhas dava. " caindo em si, disse: “*uantos empregados de meu pai t+m p#o com
fartura, e eu aqui, morrendo de fome ou-me emora, procurar o meu pai e dier-lhe: Pai,
pequei contra o /)u e contra ti0 já n#o sou mais digno de ser chamado teu filho. 1rata-me
como um dos teus empregados!. Partiu, ent#o, e foi ao encontro de seu pai.
"le estava ainda longe, quando seu pai o viu, encheu-se de compai2#o, correu e lançou-se-lhe
ao pescoço, corindo-se de eijos. O filho, ent#o, disse-lhe: “Pai, pequei contra o /)u e contra
ti0 já n#o sou digno de ser chamado teu filho!. 3as o pai disse aos seus servos: “4de depressa,
traei a melhor t5nica e revesti-o com ela, ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos p)s.
1raei o novilho cevado e matai-o0 comamos e festejemos, pois este meu filho estava morto e
tornou a viver0 estava perdido e foi encontrado!. " começaram a festejar.
%eu filho mais velho estava no campo. *uando voltava, já perto de casa ouviu m5sicas e
danças. /hamando um servo, perguntou-lhe o que estava acontecendo. "ste lhe disse: “6 teu
irm#o que voltou e teu pai matou o novilho cevado, porque o recuperou com sa5de!. "nt#o
ele ficou com muita raiva e n#o queria entrar. %eu pai saiu para suplicar-lhe. "le, por)m,
respondeu a seu pai: “Há tantos anos que eu te sirvo, e jamais transgredi um s7 dos teus
mandamentos, e nunca me deste um carito para festejar com meus amigos. /ontudo, veio
esse teu filho, que devorou teus ens com prostitutas, e para ele matas o novilho cevado!.
3as o pai lhe disse: “(ilho, tu estás sempre comigo, e tudo o que ) meu ) teu. 3as era preciso
que festejássemos e nos alegrássemos, pois esse teu irm#o estava morto e tornou a viver0 ele
estava perdido e foi encontrado!.8
8
A História de dois filhos e seu pai 9c 8;,88-<=>
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O Filho Pródigo
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Prólogo
O !'ster
?m dia fui visitar minha amiga %imone andrien no pequeno centro de documentaç#o
comunitário. "nquanto falávamos deparei-me com um pAster preso & sua porta. "sse pAster
retratava um homem envolto num amplo manto vermelho tocando afetuosamente o omro
de um jovem andrajoso, ajoelhado diante dele. "u n#o consegui desviar os olhos do quadro.
%enti-me atra$do pela intimidade entre os dois personagens0 o vermelho cálido do manto, o
amarelo dourado da t5nica do rapa, e a lu misteriosa envolvendo amos. 3as, acima de
tudo, foram as m#os L as m#os do homem idoso -, a maneira como tocavam os omros do
jovem, que me sensiiliaram como jamais acontecera.
Perceendo que n#o estava mais prestando muita atenç#o & conversa, disse a %imone:
“(ale-me desse pAster!. "la respondeu: “O.M., essa ) uma reproduç#o de A Volta do Filho
Pródigo, de Bemrandt. oc+ gostaN!. /ontinuei olhando e, finalmente, gaguejei: “6 onito,
mais do que isso... dá-me vontade de chorar e rir ao mesmo tempo... toca profundamente!.
%imone retrucou: “1alve voc+ devesse ter o seu pr7prio e2emplar. Pode comprá-lo em Paris!.
“%im!, respondi, “preciso ter uma c7pia!.
*uando vi o quadro pela primeira ve eu havia justamente conclu$do uma viagem de seis
semanas, faendo palestras nos "stados unidos e convocando comunidades crist#s a faer
tudo o que estivesse ao seu alcance com o fim de deter a viol+ncia e evitar a guerra na
Em)rica
inquieto e/entral. %entia-me
muito carente. t#o cansado
urante a viagemque
agiramal podia
como andar. %entia-me
um defensor da justiçaangustiado, s7,
e da pa, capa
de enfrentar sem medo o mundo somrio. /onclu$da a jornada, sentia-me como uma criança
enfraquecida que quer se aninhar no colo da m#e e chorar. 1#o logo se dispersavam as
multid'es entusiastas ou suplicantes, eu era acometido de solid#o t#o arrasadora que
facilmente poderia sucumir &s forças sedutoras que prometiam descanso f$sico e emocional.
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(oi nesse estado de esp$rito que me deparei pela primeira ve com A Volta do Filho
Pródigo so a forma de um pAster preso & porta do escrit7rio de %imone. 3eu coraç#o saltou
no peito quando o vi. epois dessa viagem t#o desgastante, tudo o que eu poderia querer
estava contido no carinhoso araço de pai e filho. "u era, na verdade, o filho e2austo depois
de longas viagens0 queria ser araçado, procurava um lar onde me sentisse seguro. O filho que
volta L era como eu me sentia e tudo o que desejava. Por muito tempo eu havia ido de um
lugar para outro L confrontando, pedindo, advertindo, consolando. Egora desejava somente
descansar em algum local onde me sentisse seguro, onde me sentisse em casa.
3uita coisa aconteceu nos meses e anos que se seguiram. 3esmo tendo me livrado
daquele cansaço e2tremo e voltado & vida de ensino e viagens, o araço de Bemrandt ficou
impresso em minha alma muito mais profundamente do que qualquer manifestaç#o
passageira de apoio emocional. Pusera-me em contato com algo dentro de mim que susiste
em distante dos altos e ai2os de uma vida atarefada, algo que representa a constante usca
do esp$rito humano, o anseio por uma volta definitiva, por uma inquerantável sensaç#o de
segurança, por um lar permanente. "mora ocupado com diferentes grupos de pessoas,
envolvido em diversos temas e comparecendo a locais variados, a Volta do Filho Pródigo
permanecia indel)vel na minha mente e passou a ter cada ve mais import@ncia em minha
vida espiritual. E aspiraç#o por um lar definitivo, de que me tornara consciente mediante a
pintura de Bemrandt, tornou-se mais profunda e mais intensa, de certo modo transformando
o artista em guia e fiel companheiro.
oiseanos
Harvard depoispara
regressei de ver a pintura
A Arca de Bemrandt
em 1rosl, renunciei
para passar lá um& ano
cadeira na ?niversidade
inteiro. de
E ra#o dessa
mudança foi verificar se estaria sendo chamado a viver uma vida com pessoas deficientes
mentas em uma das comunidades A Arca. urante esse ano de transiç#o, senti-me muito
perto de Bemrandt e de seu Filho Pródigo. Efinal de contas, eu estava procurando um novo
lar. Parecia que meu compatriota me fora dado como um companheiro especial. Entes que
terminasse o ano, decidira faer de A Arca meu novo lar, ingressando na comunidade O
Amanhecer, em 1oronto.
A Pintura
?m pouco antes de dei2ar 1rosl, fui convidado por meus amigos o 3assie e sua
esposa ana Boert a acompanha-los numa viagem & uni#o %ovi)tica. E minha primeira reaç#o
foi: “Egora
grande ora,poderei
soueraverque
a verdadeira pintura!.
o srcinal fora esde
adquirido em que
8QIIpassara a me interessar
por /atarina, a Rrande,por
paraessa
o
Hermitage, em %#o Petersurgo 9depois da revoluç#o passou a chamar-se eningrado,
recentemente voltando & denominaç#o anterior de %#o Petersurgo> e lá continua. "u nunca
sonhara que t#o logo teria a chance de ver o quadro. Epesar de estar ansioso para conhecer de
perto um pa$s que havia t#o fortemente influenciado meus pensamentos, emoç'es e
sentimentos durante grande pare de minha vida, isso se tornou quase irrelevante se
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esde o momento de minha partida, eu saia que a minha decis#o de me ligar a A Arca de
maneira definitiva e minha visita & uni#o %ovi)tica estavam intimamente ligados. O elo, eu
tinha certea, era O Filho Pródigo de Bemrandt. e certa maneira senti que ver essa pintura
me possiilitaria entrar no mist)rio de volta ao lar de uma forma que ainda n#o tinha
acontecido.
Betornar de uma cansativa viagem de palestras para um lugar seguro havia sido uma volta
ao lar0 dei2ar o mundo de professores e alunos para viver numa comunidade de homens e
mulheres deficientes mentais me fiera sentir como voltar para casa0 encontrar pessoas de um
pa$s que se separara do resto do mundo por muros e fronteiras fortemente guardadas, isso,
tam)m, foi, & sua maneira, um jeito de regressar & casa. 3as, so ou al)m de tudo isso,
“voltar para casa! parecia dier, para mim, caminhar passo a passo em direç#o Squele que me
espera de raços aertos e deseja me envolver num eterno araço. "u saia que Bemrandt
entendera profundamente esse retorno espiritual. %aia que quando Bemrandt pintou seu
Filho Pródigo, ele vivera uma e2ist+ncia que n#o lhe dei2ara d5vida sore sua verdadeira e
5ltima morada. %enti que se eu pudesse encontrar Bemrandt e2atamente onde ele pintara
pai e filho, eus e humanidade, compai2#o e mis)ria, num c$rculo de amor, eu viria a saer
tanto quanto poss$vel sore morte e vida. 1am)m tive esperança de que, mediante a ora-
prima de Bemrandt, chegaria um dia a ser capa de e2pressar o que eu mais gostaria de dier
sore o amor.
"star em %#o Petersurgo ) uma coisa. 1er a oportunidade de refletir sossegadamente
sore o Filho Pródigo no Hermitage ) inteiramente diferente. *uando vi a longa fila de gente
esperando para entrar no museu, fiquei preocupado imaginando como e por quanto tempo
poderia ver o que tanto desejara.
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%áado, =I de julho de 8FGI, &s 8Jh<T, fui ao Hermitage, caminhei ao longo do Bio Ceva,
passando pela entrada principal, e encontrei a porta que Ele2ei me indicara. "ntrei e algu)m
sentado atrás de uma mesa grande permitiu que usasse o telefone interno para chamar Ele2ei.
epois de alguns minutos ele apareceu e me receeu com muita gentilea. evou-me atrav)s
de corredores espl+ndidos e imponentes escadas a um lugar fora do percurso haitualmente
feito pelos turistas. "ra uma sala comprida, de teto alto e aprecia um ateli+ de um velho
artista. Os quadros estavam empilhados por toda parte. Co centro havia mesas grandes e
cadeiras coertas de pap)is e toda sorte de ojetos. *uando nos sentamos por alguns
minutos, logo se tornou evidente que Ele2ei era o responsável pelo departamento de
restauraç#o do museu. /om muita cordialidade e claro interesse na minha vontade de passar
algum tempo com a pintura de Bemrandt, ele me ofereceu toda a ajuda necessária. evou-
me depois diretamente ao Filho Pródigo, disse ao guarda para n#o me molestar e me dei2ou.
"nt#o lá estava eu0 olhando para o quadro que estivera na minha mente e no meu
coraç#o apro2imadamente tr+s anos. "stava deslumrando diante de sua majestosa elea.
%eu tamanho, maior do que o natural, seus vermelhos intensos, marrons e amarelos, seus
recessos somreados e limiares luidios, mas, acima de tudo, o araço de pai e filho, cheio de
lu, e as quatro misteriosas testemunhas, tudo isso me atingiu com uma intensidade maior do
que poderia pensar. Houve momentos em que me ocorrera que a verdadeira pintura poderia
me desapontar. Econteceu o oposto. %ua grandiosidade e esplendor fieram com que tudo
ficasse para trás e me cativassem por completo. i aqui foi realmente uma volta ao lar.
"nquantorapidamente,
sucedendo-se muitos grupos de turistas
sentei com
numa das seus respectivos
cadeiras guias chegavam
de veludo vermelho defronte edopartiam,
quadro
e fiquei ilhando. Egora eu estava diante da ora srcinal. C#o somente o pai araçado o seu
filho de volta & casa, mas tam)m o filho mais velho e tr+s outros personagens. 6 uma ora
grande em 7leo sore tela, medindo =,; m de altura por 8,G m de largura. evou algum tempo
para que eu simplesmente esti"esse ali, simplesmente me dando conta de que estava diante
do que tanto queria ter visto, meramente goando o fato de estar soinho no Hermitage, em
%#o Petersurgo, admirando o Filho Pródigo por quanto tempo desejasse.
E pintura estava muito em e2posta, numa parede que receia, de uma janela pr72ima,
farta lu natural, num @ngulo de GT o. e onde estava, notei que a lu se intensificava & medida
que a tarde ca$a. Ss quatro horas o sol coria a pintura com novo rilho, e as figuras mais atrás
L que pareciam somente esoçadas nas primeiras horas L pareciam sair dos seus cantos
escuros. /om o entardecer, a lu do sol se tornava anelada e virante. O araço do pai e filho
tornou-se mais vigoroso e envolvente e os espectadores, mais diretamente participantes neste
misterioso encontro de reconciliaç#o, perd#o e cura interior. Rradativamente compreendi que
havia tantas pinturas do Filho Pródigo quantas as alteraç'es na luminosidade e, por algum
tempo, permaneci como que encantado com a graciosa dança da naturea e arte.
%em que me desse conta, mais duas horas haviam se passado quando Ele2ei reapareceu.
/om um sorriso compreensivo e uma atitude de apoio sugeriu que eu estava precisando de
uma pausa e me convidou para um caf). /onduiu-me atrav)s dos espl+ndidos corredores do
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museu L que era, em grande parte, o antigo palácio de inverno dos cares L at) o local de
traalho onde havia estado anteriormente. Ele2ei e seu colega haviam disposto sore a mesa
p#es, queijos e doces e me animaram para que me servisse & vontade. /ertamente, quando eu
faia planos e esperava passar algum tempo tranquilo admirando o quadro, n#o imaginava que
tomaria um caf) & tarde com os restauradores de arte do Hermitage. 1anto Ele2ei com o seu
companheiro dividiram comigo tudo o que saiam sore a ora de Bemrandt e se mostraram
ansiosos por saer por que me marcara tanto. Pareciam surpresos e mesmo um pouco
perple2os diante das minhas refle2'es e aordagem espiritual. Ouviam atentamente e me
pediram que falasse mais.
epois do caf), voltei ao quadro por mais um hora at) que o segurança e a fa2ineira me
disseram claramente que o museu estava fechando e que eu já estivera lá astante tempo.
*uatro dias mais tarde voltei para mais uma visita. Cessa ocasi#o, algo divertido
aconteceu, algo que n#o posso dei2ar de relatar. Por causa do @ngulo com que o sol da manh#
atingia a pintura, o verni empregado refletia um rilho perturador. Peguei ent#o uma das
poltronas de veludo vermelho e mudei-a para um lugar de modo que esse rilho n#o
interferisse e eu pudesse ver nitidamente os personagens no quadro. ogo que o segurança,
um rapa s)rio, de on) e vestimenta militar, viu o que eu estava faendo, ficou muito irritado
com minha ousadia em pegar a cadeira e muda-la de lugar. /aminhando na minha direç#o,
mandou, numa efus#o de palavreado russo e de gestos universalmente aceitos, que eu
colocasse a cadeira no seu lugar. "m resposta, apontei-lhe o sol e a tela, tentando e2plicar por
que mudar no
me sentei a cadeira. 3eus
ch#o. 4sso o esforços foram
perturou emmais.
ainda v#o. /oloquei
epois dea cadeira de voltatentativas
mais algumas ao seu lugar e
para
conquistar a sua simpatia, ele disse que me sentasse no aquecedor deai2o da janela, de onde
eu teria uma oa vis#o. "ntretanto, o primeiro guia a circular por al com um grupo grande
dirigiu-se a mim e falando com severidade mandou-me sair de onde estava e voltar &s cadeiras
de veludo. epois disso, o guarda ficou nervoso com o guia e lhe informou, numa profus#o de
palavras e gestos, que fora ele que me dei2ara sentar sore o aquecedor. O guia n#o se
satisfe, mas decidiu voltar sua atenç#o aos turistas que estavam contemplando Bemrandt e
questionando o tamanho dos personagens. Elguns minutos mais tarde Ele2ei veio ver como eu
estava. 4mediatamente o guarda s apro2imou dele e estava oviamente tentando e2plicar o
que acontecera, mas a discuss#o durou tanto tempo que fiquei preocupado com o rumo que
as coisas tomariam. "nt#o, repentinamente, Ele2ei saiu. Por um momento me senti culpado de
ter causado tanto transtorno e receei ter aorrecido Ele2ei. "ntretanto, de minutos depois ele
voltou carregando uma poltrona grande, estofada, de veludo vermelho e com pernas
douradas. 1udo para mim /om um largo sorriso colocou a cadeira defronte ao quando e pediu
que me sentasse. Ele2ei, o guarda e eu, todos sorrimos. "u tinha minha pr7pria poltrona e
ningu)m mais se opunha. e repente, tudo parecia astante cAmico. 1r+s cadeiras vaias que
n#o podiam ser tocadas e uma poltrona lu2uosa vinda de uma outra sala do palácio de
inverno, & minha disposiç#o, para que eu a colocasse onde me aprouvesse. /ordial urocracia
Pensei se algum dos personagens do quadro que havia presenciado toda a cena estaria
sorrindo tam)m. Cunca ficarei saendo.
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O Filho Pródigo
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Co conjunto passei mais de quatro horas com o Filho Pródigo, anotando o que eu ouvia
dos guias e turistas, o que eu via & medida que o sol se tornava mais forte e desaparecia e,
tam)m, o que eu sentia no mais profundo do meu ser & medida que me tornava parte da
paráola que fora uma ve narrada por Kesus e que depois Bemrandt havia retratado na sua
ora. (iquei imaginando como esse tempo precioso passado no Hermitage iria qualquer dia
produir frutos.
*uando dei2ei o recinto, me dirigi ao jovem guarda e tentei e2pressar minha gratid#o por
me aguentar tanto tempo. *uando olhei nos seus olhos, so o on) da B5ssia, vi um homem
semelhante a mim: temeroso, mas com um desejo imenso de ser perdoado. e seu rosto
imere veio um sorriso muito gentil. %orri tam)m e amos nos sentimos a salvo.
O a%onte%i&ento
Elgumas semanas depois de visitar o Hermitage, em %#o Petersurgo, cheguei & Erca O
Amanhecer, em 1oronto, para vier e traalhar como guia espiritual da comunidade. Epesar de
que levara um ano todo para decidir minha vocaç#o e discernir a vontade de eus L procurar
entender se estaria sendo chamado para uma vida com deficientes mentais L ainda me sentia
apreensivo e receoso sore a minha capacidade de viv+-la em. Cunca antes prestara muita
atenç#o aos deficientes mentais. 3uito ao contrário, me ocupara mais e mais de estudantes
universitários e de seus prolemas. Eprendi como faer palestras e escrever livros, como e2por
temas sistematicamente, como compor t$tulos e sut$tulos, como argumentar e como analisar.
Portanto, eu n#o saia muito em me comunicar com homens e mulheres que mal falam e, se
o faem, n#o est#o interessados em argumentos l7gicos ou opini'es em elaoradas. %aia
ainda menos como anunciar o "vangelho de /risto a pessoas que ouviam mais com o coraç#o
do que com a mente e que eram mais sens$veis aos meus atos do que &s minhas palavras.
?ma das primeiras coisas que fi depois de minha chegada foi procurar um lugar
adequado para pendurar o pAster do Filho Pródigo. O escrit7rio que me deram era e2celente.
*uando me sentava para ler, escrever ou falar com algu)m, podia ver aquele misterioso
araço de pai e filho que se tornaram parte integrante da minha jornada espiritual.
esde a minha visita ao Hermitage, tornara-se mais consciente das quatro pessoas, dois
homens e duas mulheres, que estavam ao redor do espaço iluminado onde o pai acolhe
imaginando o que eles pensam ou sentem sore o que est#o vendo. "ssas testemunhas ou
oservadores d#o margem a toda sorte de interpretaç#o. *uando penso na minha pr7pria
caminhada, cada ve mais me convenço de que, por muito tempo, fi o papel de oservador.
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Por anos eu havia ensinado aos jovens os diferentes aspectos da vida espiritual, tentando
ajudá-los a en2ergar a necessidade de viver de acordo com esses sentimentos. *uanto a mim,
teria eu na verdade tido a coragem de me dirigir ao centro, de ajoelhar e de me dei2ar
envolver por um eus misericordiosoN
O simples fato de ser capa de e2pressar uma opini#o, enunciar um argumento, defender
um ponto de vista, elucidar um parecer, me dera, e ainda me dá, uma sensaç#o de controle. ",
em geral, sinto-me muito mais seguro quando consigo controlar um situaç#o n#o definida do
que quando me sumeto ao desenrolar dos acontecimentos.
/ertamente houve muitas horas de oraç#o, muitos dias e meses de retiro e in5meras
palestras com diretores espirituais, mas eu nunca aandonara o papel de oservador. Epesar
de que a vida toda desejara estar no interior olhando para fora, n#o ostante continuamente
voltava & posiç#o de um estranho olhando para dentro. Elgumas vees este olhar para dentro
era de curiosidade, outras de ci5me ou de ansiedade e, &s vees, at) um olhar afetuoso. 3as
dei2ar a posiç#o um tanto cAmoda de oservador e cr$tico parecia um grande salto num
territ7rio totalmente desconhecido. esejava tanto manter certo controle sore minha
caminhada espiritual, continuar capa de prever pelo menos parte do resultado, que renunciar
& posiç#o tranquila parte do resultado, que renunciar & posiç#o tranquila de oservador pela
incertea do filho que volta parecia quase imposs$vel. (ormar estudantes, transmitir a eles as
muitas e2plicaç'es dadas, ao longo dos s)culos, das palavras e atos de Kesus, e indicar-lhe os
diversos caminhos espirituais que as pessoas percorreram no passado, se parece astante com
tomar a atitude
mulheres de um
de p), atrás dos em
do Pai, quatro personagens
posiç'es que
diferentes, circundam
o homem o araço
sentado divino.
olhando Es duas
no vaio, sem
vislumrar ningu)m, e o jovem alto, em p), ereto, em atitude cr$tica diante do que se passa
num plano & sua frente L s#o todas maneiras de n#o se envolver diretamente. Há indiferença,
curiosidade, devaneio e oservaç#o atenta0 há olhares fi2os, contemplativos, vigilantes e
calmos0 há diferentes posturas L na retaguarda, encostado a um arco, de raços cruados, de
m#os entrelaçadas. /ada uma dessas atitudes, reservadas ou manifesta, me s#o em
familiares. Elgumas s#o mais confortáveis do que outras, mas todas s#o maneiras de n#o se
envolver.
Optar por mudar, n#o mais lecionando a estudantes universitários e passando a viver com
deficientes mentais, era, pelo menos para mim, um passo em direç#o ao plano em que o pai
araça o filho ajoelhado. 6 o local iluminado, o paradeiro da verdade e do amor. 6 o lugar onde
tanto desejo estar, mas do qual tenho tanto receio.
E$ encontrarei tudo o que procuro, tudo o que desejei ter, tudo o que poderei precisar,
mas tam)m ) nesse estágio que devo renunciar a tudo aquilo a que ainda me apego. 6 o lugar
que me fa compreender que verdadeiramente aceitar amor, perd#o e cura ), muitas vees,
mais dif$cil do que conced+-los. 6 o estágio que se situa al)m de conquistas, merecer e oter
recompensa. 6 o lugar de entrega e confiança asolutas.
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O Filho Pródigo
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odo depois de chegar a O Amanhecer, inda, uma onita jovem portadora de s$ndrome
de oUn, pAs seus raços em volta do meu pescoço e me disse: “em-vindo!. "la age da
mesma maneira com todos os rec)m-chegados e, sempre que fa isso, ) com plena convicç#o
e amor. 3as como receer um tal araçoN inda nunca havia me encontrado. Cada saia dos
meus antecedentes antes de chegar a O Amanhecer. Kamais conhecer meu lado somrio, nem
pudera visualiar aspectos menos favoráveis. "la nunca lera nenhum dos meus livros, nunca
me ouvira pregar, ou sequer havia tido uma conversa comigo.
"nt#o deveria eu simplesmente sorrir, dirigir-me a ela com carinho, e continuar como se
nada tivesse acontecidoN Ou inda estava ali, naquele mesmo plano, diendo com seu gesto:
“enha, n#o seja t#o t$mido, seu Pai tam)m quer araça-lo!. Parece que cada ve, seja com a
saudaç#o de inda, o aperto de m#o de ill, o sorriso de Rregor, o sil+ncio de Edam ou as
palavras de Bamond, tenho que faer uma escolha entre “e2plicar! esses gestos ou
simplesmente aceita-los como convites para suir mais alto, chegar mais perto.
"stes anos em O Amanhecer n#o t+m sido fáceis. 1em havido muita luta $ntima e
sofrimento mental, emocional e espiritual. Cada, asolutamente nada, dava a impress#o de
que tivesse atingido o ojetivo. "ntretanto, a mudança de Harvard para A Arca representava
uma pequena mudança da posiç#o de oservador para a de participante, de áritro para o de
pecador contrito, de pregar o amor a ser querido como o filho em-amado. C#o suspeitava
qu#o dif$cil seria a jornada. C#o saia qu#o profundamente enraiada a resist+ncia que havia
em mim e como seria angustiante encarar a verdade, cair de joelhos e dei2ar que lágrimas
escorressem livremente.
grande acontecimento que"uo quadro
n#o faia
deideia de como
Bemrandt seria dif$cil participar efetivamente do
retrata.
A +is,o
3uito do que aconteceu desde que cheguei a O Amanhecer está escrito em diários e
anotaç'es, mas, do jeito que está, pouco pode ser partilhado com outros. Es palavras s#o
muito cruas, intensas, “carregadas! e sem floreios. Egora chegou o tempo em que ) poss$vel
olhar para trás, para esses anos de turul+ncia e descrever, de maneira ojetiva, o ponto a que
toda essa luta me conduiu. Einda n#o sou astante independente para dei2ar que o araço do
Pai me envolva completamente. e muitas maneiras estou ainda me dirigindo ao centro. "stou
ainda como o Filho Pródigo L viajando, preparando falas, imaginando como será quando
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chegar & casa do Pai. 3as estou, certamente, no caminho para asa. ei2ei o pa$s long$nquo e
vim para sentir a pro2imidade do amor. "stou, portanto, pronto a partilhar minha hist7ria. Há
uma certa esperança, uma certa lu e algum consolo nessa narrativa. 3uito do que vivi nos
5ltimos anos será parte desta hist7ria, n#o para e2pressar insegurança ou desespero, mas
como passagens de minha caminhada & procura da lu.
O quadro de Bemrandt ficou em perto de mim durante esse tempo. 3udei-o de lugar
algumas vees L do meu escrit7rio para a /apela, da /apela para a sala de estar da casa “ia
de Primavera! 9a casa de oraç#o dVO Amanhecer> e dessa sala de estar de volta para a /apela.
(alei sore esse quadro muitas vees, dentro e fora da comunidade dVO Amanhecer, a pessoas
deficientes e aos que as assistem L a guias espirituais e padres, a homens e mulheres de
diversas camadas sociais.
*uanto mais falei do Filho Pródigo, quanto mais o contemplei, mais a pintura passou a ser
a minha pr7pria criaç#o, a ora que cont)m n#o somente o cerne da hist7ria que eus deseja
me contar, mas tam)m tradu todo o sentido daquilo que eu quero dier a eus e a seu
povo. 1odo o "vangelho está ali. 1oda a minha vida está ali. 1odas as vidas dos meus amigos. E
ora se tornou uma passagem misteriosa por meio da qual posso entrar no Beino de eus. 6
como se fora um port#o largo que me permite passar para o outro lado da vida e de lá
contemplar uma variedade singular de pessoas e fatos que comp'em o meu dia-a-dia.
Por muitos anos procurei vislumrar eus mediante a oservaç#o cuidadosa de diferentes
aspectos do comportamento humano: amor e solitude, alegria e pesar, ressentimento e
gratid#o, disc7rdia e pa. Procurei entender os altos e ai2o da alma humana, ali distinguir
dome e sede que somente um eus cujo nome ) Emor pode saciar. 1entei descorir o
duradouro acima do transit7rio, o eterno contrapondo-se ao temporal, o verdadeiro amor
vencendo toda desolaç#o, toda ang5stia o fato que, ao lado da nossa naturea mortal paira
uma presença maior, profunda, ampla e mais ela do que podemos imaginar, e falar dessa
presença como algo que mesmo agora pode ser visito, ouvido e tocado por aqueles que se
disp'em a crer.
"ntretanto, durante a minha estada aqui nVO Amanhecer, fui conduido a um lugar dentro
de mim onde ainda n#o estivera. 6 um recanto muito $ntimo que eus escolheu para faer sua
morada. 6 a$ que me sinto seguro sendo envolvido pelo araço de um Pai amoroso que me
chama pelo nome e di: “oc+ ) o meu filho querido, que tem todo o meu carinho!. 6 nesse
local seguro que encontro toda a alegria e toda a pa que n#o s#o deste mundo.
faer"sse arigomorada.
ali minha sempre Kesus
e2istiudi:
e eu
“%eoalgu)m
reconhecia comoguardará
me ama, a fonte dminha
graças, mas n#o
palavra conseguia
e o meu Pai o
=
amará e a ele viremos e nele estaeleceremos morada! . "stas palavras sempre me tocaram
profundamente. "u sou o templo de eus
=
Jo #$%&'.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
3as foi sempre dif$cil, para mim, reconhecer a verdade contida nessas palavras. %im, eus
haita no mais $ntimo do meu ser, mas como poderia eu aceitar o chamado de Kesus:
“Permanecei em mim, como eu em v7s!<. O convite ) claro e inconfund$vel. Haitar no mesmo
lugar onde eus fe a sua morada, este ) o grande desafio espiritual. Parecia uma tarefa
imposs$vel.
*uando vi pela primeira ve o quadro de Bemrandt, essa noç#o da presença de eus em
mim n#o era t#o n$tida quanto agora. "ntretanto, a reaç#o intensa ao araço do pai e filho
mostrou qu#o ansiosamente eu uscara aquele lugar secreto onde eu tam)m pudesse me
sentir t#o amparado quanto o jovem do quadro. Ca ocasi#o n#o era poss$vel prever o que seria
necessário para chegar um pouco mais perto desse lugar. Egradeço n#o ter saido de antem#o
o que eus havia reservado para mim. Egradeço tam)m, pois, com o sofrimento, algo de
novo se ariu dentro de mim. 1enho uma vocaç#o diferente agora. 6 o desejo de falar e
escrever dessa aertura dentro de situaç'es na minha vida e na de outros, tam)m incerta.
evo me ajoelhar diante do Pai, colocar os ouvidos no seu peito e ouvir, sem interrupç#o, os
atimentos do coraç#o de eus. %omente ent#o posso e2pressar com cautela e suavidade o
que ouço. %ei agora que devo falar da eternidade no cotidiano0 da alegria duradoura na
realidade passageira de nossa reve e2ist+ncia neste mundo0 da casa do amor na casa do
medo0 da presença de eus nas dimens'es humanas. "stou em ciente da grandiosidade desta
vocaç#o. Einda assim, confio que este seja o 5nico caminho. Poder$amos chama-lo de vis#o
“prof)tica! L contemplar o mundo e as pessoas atrav)s dos olhos de eus.
%erá isso poss$vel para um ser humanoN 3ais ainda: “) a opç#o que devo faerN!. C#o se
trata de uma pergunta intelectual. 6 uma quest#o de vocaç#o. %ou chamado a entrar no
santuário em dentro do meu pr7prio ser onde eus escolheu faer sua morada. %omente por
meio da oraç#o cont$nua posso me colocar a$. 3uitas dificuldades e muito sofrimento podem
arir o caminho, mas tenho a certea de que somente pela oraç#o constante poderei chegar.
<
Jo #(%$.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
-ntrodu,o
Co ano que seguiu ao meu primeiro encontro com o Filho Pródigo, minha jornada
espiritual foi marcada por tr+s fases que me ajudaram a traçar as ase da minha hist7ria.
E primeira fase d7i a e2peri+ncia de ser o filho mais moço. Os longos anos de ensino
universitário e o profundo envolvimento com assuntos ligados &s Em)ricas /entral e do %ul
fieram com que me sentisse um tanto perdido. 1enho peramulado por lugares long$nquos e
vastos, encontrado gente com os mais diversos estilos de vida e de diferentes credos, e
participado de muitos movimentos. 3as, no fim de tudo isso, eu me senti sem um lar e
astante cansado. *uando vi a maneira carinhosa como o pai tocava os omros do filho mais
jovem e o amparava contra o seu peito, senti em no fundo do meu coraç#o que eu era o filho
perdido que desejava voltar, como ele o fiera, para ser araçado da mesma maneira. Por
muito tempo me coloquei no lugar do Filho Pródigo, de volta & casa, antegoando o momento
de ser afetuosamente receido por meu Pai.
epois, um tanto inesperadamente alguma coisa mudou. epois de estar na (rança por
um ano, e da minha visita ao Hermitage, em %#o Petersurgo, o desespero que fiera com que
eu me sentisse t#o em sintonia com o filho mais jovem diminuiu um tanto L passou, por assim
dier, a ocupar um lugar de menos destaque em meu consciente. "u tomara a decis#o de ir
para O Amanhecer em 1oronto e, consequentemente, me sentia mais confiante do que at)
ent#o.
?ma segunda fase da minha jornada espiritual teve in$cio numa tarde em que eu
conversava sore a pintura de Bemrandt com art Ravigan, um amigo ingl+s que no 5ltimo
ano passara a me conhecer intimamente. "nquanto e2plicava a art como tinha sido forte a
minha identificaç#o com o filho mais jovem, ele me olhou firme nos olhos e me disse: “%erá
que n#o ) com o filho mais velho que voc+ mais se pareceN!. /om essas palavras ariu-se um
novo espaço dentro de mim.
%inceramente, eu nunca me vira como o filho mais velho, mas depois que art me colocou
diante dessa possiilidade, in5meras ideias me vieram & mente. /omeçando pelo simples fato
que, na minha pr7pria fam$lia eu sou, realmente, o filho mais velho, conclu$ que vivera uma
vida de muita disciplina. Eos seis anos já desejava ser padre e nunca mudara de ideia. Casci, fui
atiado, crismado e ordenado na mesma igreja e fui sempre oediente aos meus pais,
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
professores, ispos e ao meu eus. Cunca sai de casa, nem desperdicei meu tempo e dinheiro
em praeres do se2o0 jamais me perdi em “devassid#o ou emriague!. J 1oda a minha vida fui
muito responsável, fiel & tradiç#o e & fam$lia. 3as, com tudo isso, posso, na verdade, ter
estado t#o perdido quanto o filho mais jovem. e repente me en2erguei de maneira
inteiramente diversa. "n2erguei o meu ci5me, raiva, suscetiilidade, ostinaç#o, mau humor e,
acima de tudo, meu farisa$smo sutil. i quando eu me quei2ava e quanto o meu pensar e agir
estavam imu$dos de ressentimento. Por algum tempo n#o dava para acreditar a que tivesse
me en2ergado como o filho mais jovem. "u era, certamente, o mais velho, mas t#o perdido
quanto seu irm#o mais moço, apesar de que eu permanecera “em casa! toda a minha vida.
"u estivera traalhando duro na faenda de meu pai, mas nunca, na verdade, me
regoijara pelo fato de estar em casa. "m ve de me sentir agradecido pelos privil)gios a mim
concedidos, eu meu tornara uma pessoas ressentida: cimenta de meus irm#os e irm#s mais
jovens que tanto tinham se aventurado e que eram receidos de volta com tanto carinho.
urante o meu primeiro ano e meio nVO Amanhecer, o comentário t#o perspica de art
continuava a reger a minha vida interior.
3ais estava por vir. Cos meses que se seguiram & comemoraç#o do trig)simo aniversário
de minha ordenaç#o sacerdotal, gradualmente fui entrando em depress#o e passei a sentir
muita ang5stia. /heguei ao ponto de n#o mais me sentir seguro na minha pr7pria comunidade
e tive que sair para uscar ajuda e traalhar diretamente na minha cura interior. Os poucos
livros que pude levar comigo eram todos sore Bemrandt e a paráola do Filho Pródigo.
Por hora, admirei os lindos desenhos e pinturas que ele havia criado no meio de todos os
reveses, desilus'es e pesar e compreendi como, de seu pincel, emergiu a figura de um homem
quase cego amparando seu filho num gesto de perd#o e compadecimento. "ra preciso que
tivesse passado por muitas mortes e chorado muitas lágrimas para ter produido uma figura
de eus com tanta humildade.;
(oi durante esse per$odo de grande sofrimento $ntimo que uma outra amiga falou o que
eu mais precisava ouvir. " assim deu in$cio & terceira fase de minha jornada espiritual. %ue
3osteller, que estivera com a comunidade dVO Amanhecer desde o in$cio dos anos QT e
desempenhara um papel importante para que eu viesse para cá, me dera apoio indispensável
quando as coisas se tornaram dif$ceis e me encorajara a lutar e sofrer o quanto fosse preciso,
de modo a oter plena liertaç#o interior. *uando %ue me visitou no meu “hermitage!W e
falamos sore o Filho Pródigo, ela disse: “*uer voc+ seja o filho mais moço ou o mais velho,
voc+ precisa compreender que ) chamado a se tornar o Pai!.
J
c &#%'$.
;
)A*+,-*T% Paul.a vie "1 lVoeuvre de Bemrandt. Paris% A/0 dition1Vilo% #23$. PP. %&'3.
W C.1.: O autor usa um jogo de palavras com o nome do museu e o profundo sentido de “hermitage! - cela ou convento de
eremitas L referindo-se & sua pr7pria e2peri+ncia naquele momento.
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%uas palavras me atingiam como uma descarga el)trica porque, depois de todos esses
anos de ter vivido com a pintura e visto o pais idoso amparando um filho, nunca me ocorrera
que a figura do Pai era a que melhor e2pressava a minha vocaç#o.
%ue n#o me deu chance para que protestasse: “oc+ esteve a vida toda procurando
amigos, desde que o conheço vive carente de afeiç#o0 esteve interessado em milhares de
coisas, solicitando de um lado e de outro atenç#o, louvou e afirmaç#o, & direta e & esquerda.
/hegou a hora de procurar sua verdadeira vocaç#o L de ser um pai que pode acolher seus
filhos que voltam sem lhes faer perguntas e sem esperar nada em troca. Olhe para o pai no
pAster e voc+ entenderá quem voc+ ) chamado a ser. C7s, nVO Amanhecer, e a maioria das
pessoas que o cerca n#o precisamos de voc+ como um om amigo ou mesmo um irm#o
carinhoso. Precisamos de voc+ como o pai que possa se arrogar o direito da verdadeira
compai2#o!.
Olhando para o homem idoso arudo, com seu amplo manto vermelho, sentir profunda
dificuldade em me ver daquela maneira. "u estava pronto a me identificar com o jovem
perdulário ou com o filho mais velho, ressentido, mas a ideia de ser como o anci#o que nada
tinha a perder porque perdera tudo a ser somente que dar me dei2ava com muito medo.
"ntretanto, Bemrandt morreu quanto tinha I< anos e estou muito mais pr72imo dessa idade
do que da de qualquer um dos dois filhos. Bemrandt se dispAs a se colocar no lugar do pai0
por que n#o euN
O ano e meio decorridos desde esse desafio de %ue 3osteller tem sido um tempo em que
procuro assumir minha paternidade espiritual 1em sido uma luta ena e dif$cil e muitas vees
ainda sinto o desejo de continuar como filho e nunca envelhecer, mas tam)m e2perimentei a
alegria enorme de filhos voltando ao lar e de colocar neles as m#os numa atitude de perd#o e
+nç#o. /heguei a saer um pouco como ) ser um pai que nada pergunta, desejando somente
receer os filhos em casa.
1udo o que eu vivi desde o meu primeiro encontro com o pAster de Bemrandt deu-me
n#o somente a inspiraç#o para escrever este livro, mas tam)m para estruturá-lo. 4rei
primeiramente refletir sore o filho mais jovem, depois sore o mais velho e finalmente sore
o pai. Porque, na verdade, sou o filho mais moço0 sou o filho mais velho0 e estou a caminho de
me tornar o pai. ", para voc+s que v#o faer esta caminhada espiritual comigo, desejo e oro
para que descuram dentro de cada um de voc+s n#o somente o filho perdido de eus, mas
tam)m a m#e e o pai compassivos que eus ).
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parte I
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O filho mais jovem disse ao pai5 6Pai% d71me a parte da heran8a 9ue me ca!e:. o pai
di"idiu os !ens entre eles. Poucos dias depois% a;untando todos os seus ha"eres% o filho mais
;o"em partiu para uma regi<o long=n9ua e ali dissipou sua heran8a numa "ida de"assa.
gastou tudo. >o!re"eio ?9uela regi<o uma grande fome e ele come8ou a passar
pri"a8@es. Foi% ent<o% empregar1se com um dos homens da9uela regi<o% 9ue o mandou para
seus campos cuidar dos porcos. le 9ueria matar a fome com as !olotas 9ue os porcos comiam%
mas ningum lhas da"a. caindo em si% disse5 69uantos empregados de meu pai tBm com
fartura% e eu a9ui% morrendo de fomeC Vou1me em!ora% procurar o meu pai e diDer1lhe5 Pai%
pe9uei contra o /u e contra tiE ;7 n<o sou digno de ser chamado tu filho. Trata1me como um
dos seus empregados:. Partiu% ent<o% e foi ao encontro de seu pai.
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O Filho Pródigo
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8
4e&5randt e o ilho &ais &oo
Bemrandt estava perto da morte quando ele pintou o seu Filho Pródigo.
Provavelmente d7i um dos seus 5ltimos traalhos. *uanto mais leio sore a pintura e a
contemplo, mais a en2ergo como cap$tulo final de uma vida tumultuada e sofrida. Kuntamente
com sua ora inacaada >ime<o e o Menino Jesus, o Filho Pródigo retrata a percepç#o de sua
idade avançada L uma percepç#o em que cegueira f$sica e profunda vis#o interior est#o
intimamente ligadas. E maneira pela qual o velho %ime#o segura a criança indefesa e o modo
de o pai araçar seu filho e2austo revelam uma vis#o interior que fa lemrar as palavras de
Kesus aos seus disc$pulos: “Eençoados os olhos que veem o que v7s vedes!. I 1anto %ime#o
como o pai do filho que volta traem dentro de si aquela lu misteriosa pela qual eles veem. 6
uma lu interior, em escondida, mas que irradia uma elea suave e penetrante.
"ssa lu interior, entretanto, ficar escondida por muito tempo. Por muitos anos fora
inating$vel para Bemrandt. Rradativamente, & custa de muita ang5stia, ele a encontrou em si
mesmo e, por meio dele, naqueles que pintou. Entes de ser como o pai, Bemrandt fora por
muito tempo como o jovem orgulhoso que “se apossou de tudo o que tinha e partiu para um
pa$s distante onde esanjou toda a fortuna!.
I
c #4%&'.
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o Filho Pródigo, mal posso crer que este seja o mesmo homem que, trinta anos mais tarde, se
retratou com olhos que penetram t#o profundamente os escondidos mist)rios da vida.
com
a ser um filho de
marcada pornove meses,prolemas
in5meros 1itus. epois da morte de?m
e sofrimentos. %asMia, a vida de Bemrandt
relacionamento continua
muito infeli com a
enfermeira de 1itus, Reertje irc2, termina por aç#o judicial e internaç#o de Reerttje num
sanat7rio. %egue-se uma uni#o mais estável com HendricMje %toffels. "la lhe dá um filho que
morre em 8I;< e uma filha, /orn)lia, a 5nica que sorevive a ele.
Q
0O>N)0% Jaco!.Bemrandt5 life and worG.'. ed. ondres1N.orG% Phaindon% #2I3. p. &I.
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8II< morre HendricMje e cinco anos depois Bemrandt assiste n#o s7 ao casamento, mas
tam)m & morte de seu amado filho, 1itus. *uando o pr7prio Bemrandt morre em 8IIF, ele
) um homem pore e solitário. %omente sua filha /orn)lia, sua nora 3agdalene an oo e sua
neta 1itia sorevivem a ele.
*uando vejo o Filho Pródigo ajoelhando diante do pai e encostando o rosto contra seu
peito, vejo o artista outrora t#o confiante e respeitado e chego & dolorosa conclus#o de que a
fama que alcançou foi apenas gl7ria passageira. "m ve dos ricos trajes com os quais o jovem
Bemrandt pintou a si mesmo no ordel, ele agora usa somente uma t5nica rasgada corindo
seu corpo emaciado e as sandálias, com as quais caminhou tanto, que se tornaram gastas e
imprestáveis.
Olhando o filho penitente e o pai compassivo, vejo que a lu cintilante refletida por
correntes douradas, armaduras, capacetes, velas e l@mpadas escondidas se apagou e foi
sustitu$da pela lu interior da velhice. 6 o movimento a partir da gl7ria que leva a uma usca
cada ve maior de riquea e popularidade em direç#o & gl7ria que se acha escondida na alma
humana e transcende a morte.
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=
Partida do ilho &ais /o+e&
O filho mais jovem disse ao pai5 6Pai% d71me a parte da heran8a 9ue me ca!e:. o pai di"idiu
os !ens entre eles. Poucos dias depois% a;untando todos os seus ha"eres% o filho mais ;o"em
partiu para uma regi<o long=n9ua.
antes. O achar tem atrás de si o perder, o regessar ariga so seu manto a partida. Olhando
para a volta carinhosa e cheia de alegria, tento pensar no gosto dos acontecimentos tristes que
o precederam. %7 quando me atrevo a me aprofundar no que significa dei2ar a casa posso
entender realmente a volta. O tom suave, amarelo-castanho, da t5nica do filho ) onito
quando visto em harmonia com o vermelho do manto paterno, mas a verdade ) que a roupa
do filho está em frangalhos que denunciam a mis)ria de que ele vem. Co conte2to do araço
compassivo, nossa fragilidade pode parecer ela, mas nossa fragilidade n#o tem oura elea
sen#o aquela que vem da compai2#o que a cerca.
Para em entender o mist)rio da compai2#o, tenho que olhar francamente para a
realidade que a suscita. O fato ) que muito antes de ir e vir, o filho partiu. "le disse a seu pai:
“á-me a parte da herança que me cae!, depois ele reuniu tudo o que receera e partiu. O
evangelista ucas conta tudo isso de maneira t#o simples e direta que ) dif$cil em avaliar que
o que está acontecendo aqui ) um acontecimento inaudito, danoso, ofensivo, e em flagrante
contradiç#o aos háitos mais respeitáveis da )poca. Xenneth aile, na sua e2plicaç#o
arangente da hist7ria de ucas, mostra que a maneira do filho partir ) equivalente a desejar a
morte de seu pai. aile escreve:
Por mais de 9uinDe anos tenho perguntado a pessoas de diferentes camadas sociais
do Marrocos ? ndia e da Tur9uia ao >ud<o so!re as implica8@es de um pedido como esse
G
c #(%'&.
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K do filho eLigir sua heran8a en9uanto seu pai ainda "i"e. A resposta tem sido sempre a
mesma... a con"ersa se passa assim5
1 NuncaC
1 imposs="el.
1 >e algum fiDesse isso% o 9ue aconteceria
1 Por 9uB
aile e2plica que o filho pede n#o s7 a divis#o da herança, mas tam)m pede que possa
dispor de sua parte. “epois de passar os seus ens par o seu filho, o pai ainda tem o direito
de viver do usufruto... enquanto ele viver. Equi o filho mais moço recee, e, portanto se
entende que tenha solicitado a concess#o a que, de forma e2pl$cita, n#o tem direito at) a
morte de seu pai. E infer+ncia de: VPai, eu n#o posso esperar que morraV fundamenta as duas
solicitaç'es.! 8T
O filho indo emora ), portanto, um ato muito mais grave do que parece & primeira vista.
6 uma rejeiç#o cruel do lar no qual o filho nasceu e foi criado e uma ruptura com a mais
preciosa tradiç#o apoiada pela comunidade maior da qual ele fa parte. *uando ucas escreve
“partiu para uma regi#o long$nqua!, ele se refere a muito mais do que ao desejo de um jovem
de ver o mundo. "le se refere a uma quera drástica da maneira de viver, pensar e agir que
receeu como um legado sagrado das geraç'es passadas. 3ais do que desrespeito, ) uma
traiç#o aos valores cultuados pela fam$lia e pela comunidade. O pa$s distante ) o mundo no
qual n#o se repeita o que em casa ) considerado sagrado.
F
E4"Y, Xenneth ". Poet and peasant and through peasant ees A literar1cultural approach to the para!les
. Rran Bapids, 3ich,
Zilliam . "erdmans, 8FG<. pp. 8I8-8I=
8T
4dem, iidem, p. 8IJ
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3ais do que qualquer outra hist7ria no "vangelho, a paráola do Filho pródigo retrata o
infinito amor compassivo de eus. " quando me coloco nessa hist7ria so a lu do amor de
eus, fica claro que dei2ar a casa está muito mais pr72imo de minha viv+ncia espiritual do que
eu poderia pensar.
E pintura de Bemrandt do Pai acolhendo o filho tem pouco movimento. "m comparaç#o
com o seu desenho do Filho Pródigo de 8I<I L cheio de aç#o, o pai correndo de encontro ao
filho e o filho se jogando aos seus p)s L a pintura do Hermitage, feita <T anos mais tarde, ) de
total calmaria. O contato do pai com o filho ) uma enç#o perene0 o filho descansando contra
o peito do pai ) uma pa ine2tingu$vel. /hrstian 1[mpel escreve: “O momento de receer e
perdoar na quietude da composiç#o perdura para sempre. Os gestos do pai e do filho falam de
alguma coisa que n#o se e2tingue, mas permanece, para sempre!.88 KaMo Bosenerg resume a
vis#o de maneira muito ela quando escreve: “O pai e o filho parecem e2teriormente quase
im7veis, mas intimamente est#o muito emocionados... a hist7ria n#o ) do amor humano de
um pai terreno... o que ) retratado aqui ) o amor divino e a miseric7rdia capa de transformar
morte em vida!.8=
E casa ) o centro do meu seu, onde posso ouvir a vo que di: “oc+ ) o meu (ilho
Emado, sore voc+ ponho todo o meu carinho! L a mesma vo que deu vida ao primeiro Ed#o
e falou a Kesus, o segundo Ed#o0 a mesma vo que fala a todos os filhos de eus e que os
lierta para viver no meio de um mundo somrio emora permanecendo na lu.
"u ouvi essa vo. irigiu-se a mim no passado e continua a falar agora. 6 a vo do amor
que ) eterno, perdura para sempre e se transforma em afeto quando ouvida. *uando a ouço,
seu que estou em casa com eus e nada tenho a temer. /omo o (ilho Emado de meu Pai
celestial, “ainda que eu caminhe por um vale teneroso, nenhum mal temerei!. 8J /omo o
em-amado, posso “curar os enfermos, ressuscitar os mortos, purificar os leprosos, e2pulsar
demAnios.! 1endo receido sem “qualquer Anus!, posso faer “um dom gratuito!.8; /omo
(ilho Emado, posso interpelar, consolar, admoestar e encorajar sem medo de ser rejeitado ou
88
0em!randt. Amsterdam% N.J.. )echt% #23I. p. '(4 /om a cola!ora8<o de Astrid TQmpel.R
8=
Op. cit.% PP. &'#1&'$.
8<
>l #'2%#'1#(
8J
>l &'%$.
8;
Mt #4%3.
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necessidade de afirmaç#o. /omo o Emado, posso sofrer perseguiç#o sem desejo de vingança e
receer cumprimentos sem precisar utiliá-los como prova de minha ondade. /omo o
Emado, posso ser torturado e morto sem duvidar que o amor que me ) transmitido ) mais
forte do que a morte. /omo o Emado, sou livre para viver e dar a vida, livre tam)m para
morrer enquanto a estou dando.
Kesus me mostrou claramente que posso tam)m ouvir a mesma vo por ele ouvida no rio
Kord#o e no monte 1aor. 1am)m me mostrou que, como ele, haito junto do Pai. Orando
pelos disc$pulos, ele di: “"les n#o s#o do mundo comoeu n#o sou do mundo. %antifica-os na
verdade0 a tua palavra ) verdade. /omo tu me enviaste ao mundo, tam)m eu os enviei ao
mundo. ", por eles, a mim mesmo me santifico, para que sejam santificados na verdade!. 8I
"ssas palavras revelam minha verdadeira morada, meu local de perman+ncia, meu verdadeiro
lar. E f) ) a garantia de que ali eu haito e sempre haitarei. Es m#os um tanto r$gidas do Pai
tocam os omros do Filho Pródigo e aençoam com +nç#o divina, imorredoura. “1u )s o meu
Emado, sore ti ponho toda a minha complac+ncia!.
"ntretanto sa$ de casa muitas vees. ei2ei as m#os que aençoam e corri para lugares
distantes em usca de amor. "sta ) a grande trag)dia de minha vida e da de muitos que
encontro no caminho. e um modo tornei-me surdo & vo que me chama. O Emado0 dei2ei o
5nico lugar onde posso ouvir essa vo e fui emora desesperado, esperando poder encontrar
alhures o que n#o mais encontrava em casa.
"m princ$pio isto parece simplesmente inacreditável. Por que dei2aria eu o lugar onde
posso ouvir tudo que precisoN *uanto mais penso nesse ponto, mais compreendo que a
verdadeira vo do amor ) muito suave e gentil, falando comigo nos lugares mais escondidos do
meu ser. C#o ) rude, querendo se impor e pedindo atenç#o. 6 a vo d um pai quase cego que
chorou muito e passou por muitas mortes. 6 a vo que somente pode ser ouvida por aqueles
que se dei2am ser tocados.
%entir o toque das m#os endientes de eus eJ ouvir a vo me chamando Emado s#o a
mesma coisa. 4sso ficou claro para o profeta "lias. "lias estava na montanha esperando
encontrar o %enhor. eio primeiro um furac#o, mas eus n#o estava naquele vento. epois do
vento a terra tremeu, mas o %enhor n#o estava naquele tremor. %eguiu-se um fogo, mas
tam)m o %enhor n#o estava no fogo. (inalmente, veio alguma coisa muito suave, uns diriam
que seria uma risa ligeira, outros, um murm5rio. 1endo "lias ouvido isto, coriu o rosto com o
manto porque saia que eus estava presente. Ca sua doçura, a vo era o toque e o toque era
a vo.8Q
3as há muitas outras voes, algumas em tom em alto, cheias de promessas e atraentes.
iem: “á e mostre que voc+ vale alguma coisa!. ogo depois Kesus ter ouvido a vo
chamando-o de Emado, foi conduido ao deserto para ouvir ouros apelos. isseram-lhe que se
fosse em-sucedido, popular e poderoso, seria tam)m querido. "ssas mesmas voes n#o me
8I
Jo #S%#I1#2.
8Q
/f. #0s #2%##1#'.
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s#o desconhecidas. "st#o sempre presentes e sempre me atingem nos pontos em que
questiono meu pr7prio valor e ponho em d5vida meu merecimento. %ugerem que n#o serei
amado se n#o o conseguir por meio de traalho árduo e muito esforço. "speram que eu prove
a outros e a mim mesmo que mereço ser amado e ficam me empurrando para que faça todo o
poss$vel para oter aprovaç#o. Cegam aertamente que o amor seja um dom inteiramente
gratuito. Eandono o lar toda ve que dei2o de crer na vo que me chama Emado e sigo outras
que oferecem m5ltiplos caminhos para que eu encontre o amor que tanto procuro.
*uase a partir do momento que eu tive ouvidos para ouvir, ouvi esse chamados que
ficaram comigo desde ent#o. (oram transmitidos a mim por meus pais, amigos, professores,
colegas, mas, acima de tudo, o foram e ainda o s#o atrav)s da m$dia que me envolve. " diem:
“3ostre-me que voc+ ) legal. Procure ser melhor do que o seu amigo /omo foram as suas
notasN 1rate de passar na escola Bealmente espero que voc+ consiga por voc+ mesmo *uem
s#o seus amigosN 1em certea de que quer ser amigo dessas pessoasN "sses trof)us mostram
que 3 esportista voc+ foi C#o dei2em que o considerem fraco, v#o se aproveitar de voc+ Ká
tomou as provid+ncias para *uando envelhecerN *uando dei2ar de ser produtivo, as pessoas
se afastar#o. *uando voc+ está morto, está morto!.
esde que eu fique em contato com a vo que me chama de Emado, essas quest'es e
conselhos s#o astante inofensivos. Pais, amigos e professores, mesmo aqueles que se dirigem
a mim atrav)s da m$dia, s#o em geral muito sinceros em suas preocupaç'es. %eus conselhos e
sugest'es s#o em-intencionados. Eliás, podem ser limitadas manifestaç'es humanas de um
/onstantemente caindo numa velha armadilha, antes mesmo que eu me apercea disso,
descuro-me imaginando porque algu)m me magoou, rejeitou-me ou n#o prestou atenç#o em
mim. %em me dar conta, vejo-me remoendo o sucesso de outros, minha pr7pria solid#o e a
maneira pela qual o mundo se aproveita de mim. Epesar de minhas oas intenç'es, muitas
vees me pego sonhando em me tornar rido, poderoso e c)lere. 1odos esses e2erc$cios
mentais me mostram a fragilidade da minha f) e que sou o em-Emado sore quem eus p'e
toda a sua complac+ncia. "u tenho tanto medo de n#o ser amado, de ser culpado, posto de
lado, superado, ignorado, perseguido e morto, que estou constantemente criando estrat)gias
para me defender e consequentemente criando estrat)gias para me defender e
consequentemente garantir o amor que acho que preciso e mereço. Essim faendo, me
distancio da casa de meu pai e escolho haitar um “pa$s distante!.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
e sa$da, aqui fica a quest#o: “E quem pertençoN E eus ou ao mundoN!. 3uitas das
preocupaç'es diárias sugerem que pertenço mais ao mundo do que a eus. *ualquer cr$tica
me dei2a angado e a menor rejeiç#o me deprime. O melhor elogio levanta meu esp$rito, um
pequeno sucesso me anima. em pouco ) necessário para me levantar ou me dei2ar por ai2o.
(requentemente sou como uma emarcaç#o num oceano, completamente ao saor de suas
ondas. O tempo e energia que consumo tentando manter o equil$rio e evitando ser aatido e
naufragar mostra que minha vida ) uma luta pela soreviv+ncia. C#o um luta aençoada, mas
um questionamento preocupado que resulta da ideia errada de que ) o mundo que dá os
meus par@metros.
“ecad+ncia! pode ser a melhor palavra para e2plicar o vaio que t#o profundamente
permeia a nossa sociedade contempor@nea. Cossos háitos faem que nos apeguemos &quilo
que o mundo chama de realiaç#o pessoal: ac5mulo de fortuna e poder0 otenç#o de status e
admiraç#o0 consumo e2cessivo de comida e eida, e satisfaç#o se2ual, sem faer distinç#o
entre concupisc+ncia e amor. "sses háitos criam e2pectativas que s7 podem dei2a de
satisfaer nossas verdadeiras necessidades. "nquanto cultuamos os valores mundanos, nossos
háitos levam-nos a indagaç'es infrut$feras no “pa$s distante!, faendo com que nos
defrontemos com desilus'es sem fim, ao mesmo tempo que dentro de n7s sore um vaio.
Cesses dias em que aumentam as solicitaç'es, peregrinamos longe da casa do Pai. E vida
desregrada pode muito em ser considerada uma vida vivida num “pa$s distante!. 6 de lá que
se srcina o nosso clamor por liertaç#o.
%ou o Filho Pródigo toda ve que usco amor incondicional onde n#o pode ser
encontrado. Por que continuo a ignorar o lugar do amor verdadeiro e insisto em uscá-lo em
outra parteN Por que volto a sair de casa onde sou chamado de filho de eusN ?m amado de
meu PaiN (ico constantemente surpreso, verificando como disponho dos dons receidos de
eus L minha sa5de, qualidades emocionais e intelectuais -0 utilio-os para impressionar as
pessoas, receer aprovaç#o e louvor, e competir por recompensa, em ve de desenvolv+-los
para a gl7ria de eus.. %im, muitas vees carrego-os para um “pa$s distante! e coloco-os a
serviço de um mundo oportunista que desconhece seu verdadeiro valor. 6 quase como se eu
quisesse provar a mim mesmo e aos que me rodeiam que eu n#o necessito do amor de eus,
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
que posso sustituir por conta pr7pria, que posso ser totalmente independente. %o tudo isso,
há a grande revolta, o “n#o! decisivo ao amor do Pai, a imprecaç#o n#o proferida: “"u gostaria
que voc+ estivesse morto!. O “C#o! do Filho Pródigo reflete a revolta srcinal de Ed#o: seu
afastamento do eus em cujo amor somos criados e do qual depende o nosso sustento. 6 a
reeli#o que me coloca fora do jardim, longe do alcance da árvore da vida. E insuordinaç#o
que fa com que me perca num “pa$s distante!.
Olhando novamente a ora de Bemrandt que retrata A Volta do Filho Pródigo, vejo
agora que o que ocorre vai al)m de um gesto de compai2#o por um filho que se perdera. O
grande acontecimento que vejo ) o fim de uma grande reeli#o. E reeli#o de Ed#o e de todos
os seus descendentes ) perdoada e a +nç#o pela qual Ed#o receeu a vida imortal )
restaurada. Parece-me que essas m#os estiveram sempre estendidas L mesmo quando n#o
havia omros sore os quais descansá-las. eus nunca aai2ou os raços, jamais retirou sua
+nç#o, nunca dei2ou de considerar seu filho a permanecer em casa. C#o podia impor o seu
amor ao seu Emado. 1inha que dei2ar que se fosse em lierdade emora saendo a dor que
isso causaria a amos. (oi o pr7prio amor que o impediu de manter o filho em casa a qualquer
preço. (oi ainda o amor que fe que dei2asse o filho procurar o seu caminho, mesmo com o
risco de perd+-lo.
Equi o mist)rio da minha vida ) revelado. %ou amado a tal ponto que tenho lierdade
para aandonar a casa. E +nç#o e2iste desde o princ$pio. ei2ei e dei2o o lar muitas vees,
mas o Pai está sempre me uscando com raços estendidos para me receer de volta e de
novo sussurrar aos meus ouvidos: “1u )s o meu Emado, sore ti ponho todo o meu carinho!.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
<
A +olta do ilho &ais /o+e&
O filho mais ;o"em partiu para uma regi<o long=n9ua e ali dissipou sua heran8a numa "ida
de"assa. gastou tudo. >o!re"eio ?9uela regi<o uma grande fome e ele come8ou a passar
pri"a8@es. Foi% ent<o% empregar1se com um dos homens da9uela regi<o% 9ue o mandou para
seus campos cuidar dos porcos. le 9ueria matar a fome com as !olotas 9ue os porcos comiam%
mas ningum lhas da"a. caindo em si% disse5 6-uantos empregados de meu pai tBm p<o com
fartura% e eu a9ui% morrendo de fomeC Vou1me em!ora% procurar o meu pai e diDer1lhe5 Pai%
pe9uei contra o /u e contra tiE ;7 n<o sou mais digno de ser chamado teu filho. Trata1me
como um dos teus empregados:. Partiu% ent<o% e foi ao encontro de seu pai.
$star !erdido
O jovem araçado e aençoado pelo pai ) home pore, muito pore. ei2ou a casa com
orgulho e dinheiro, resolvido a viver sua pr7pria vida longe de seu pai e da comunidade. oltou
sem nada, sem dinheiro, sa5de, honra, amor pr7prio, reputaç#o... tudo havia sido dissipado.
Bemrandt dei2a pouca d5vida sore a sua condiç#o. %ua caeça está raspada. C#o possui
mais o caelo comprido e encaracolado com o qual Bemrandt se retratou como o Filho
Pródigo no ordel, arrogante e soero. E caeça ) a de um prisioneiro cujo nome foi
sustitu$do por um n5mero. *uando a caeça de um homem ) raspada, quer seja na pris#o ou
no e2)rcito, num trote de calouros ou num campo de concentraç#o, ele ) despojado de um
dos seus traços de personalidade. Es roupas com que Bemrandt o veste s#o roupas $ntimas,
que mal corem seu corpo emaciado. O pai e o homem alto que oserva a cena usam amplos
mantos carmim, que lhes conferem status e dignidade. O filho ajoelhado n#o tem agasalho. E
roupa parda e em frangalhos mal core seu corpo cansado do qual toda a força se esvaiu. Es
solas dos p)s narram a hist7ria de uma jornada longa e penosa. O p) esquerdo, por fora da
sandália muito usada, está arranhado. O p) direito somente calçado numa sandália
arreentada, tam)m aponta para sofrimento e mis)ria. "is um homem despojado de tudo... a
n#o ser de sua espada. O 5nico sinal de dignidade que resta ) a pequena espada presa ao seu
quadril L emlema de sua norea. 3esmo em meio & sua degradaç#o, ele se apegou ao fato
de que ainda era o filho de seu pai. e outra forma ele teria vendido sua preciosa espada,
s$molo de sua filiaç#o. E espada está lá para me mostrar que, apesar de ter voltado como
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
mendigo e pária, ele n#o havia esquecido que ainda era filho de seu pai. (oi esta filiaç#o
valiosa que, lemrada, persuadiu-o a voltar.
ejo diante de mim um homem que se afundou numa terra estranha e perdeu tudo o que
levou consigo. ejo derrota, humilhaç#o, vaio. "le, que era t#o semelhante ao pai, agora está
em pior situaç#o que os empregados de seu pai. 1ornou-se um escravo.
O que aconteceu com o filho no pa$s distanteN El)m de todas as consequ+ncias f$sicas e
materiais,
em quais *uanto
previs$vel. foram asmais
$ntimas consequ+ncias
me distancio do onde
do lugar aandono
eus do larN Etanto
haita, sequ+ncia de fatosme
mais incapa )
sino de ouvir a vo que me chama O Emado0 quanto menos ouço aquela vo, mais enredado
eu fico na manipulaç#o e nas tranas de poder do mundo.
Econtece mais ou menos assim: fico em d5vida quanto & segurança do lar e oservo
outras pessoas que parecem estar melhor do que eu. (ico imaginando como faer para chegar
aonde est#o. "sforço-me por ajudar, ter sucesso, ser reconhecido.
*uando falho, sinto ci5mes ou fico resentido. *uando me saio em, preocupa-se que
outros v#o ter ci5mes ou se sentir#o melindrados. 1orno-me desconfiado ou fico de esp$rito
prevenido e com mesmo crescente de n#o conseguir o que tanto desejo ou perder o que já
consegui. Preso neste emaranhado de necessidades e aspiraç'es, eu n#o sei e2atamente quais
s#o as minhas motivaç'es. %into-me atingido pelos circunstantes e n#o confio nas aç'es e
pronunciamentos ao meu redor. %empre prevenido, quero meu senso de lierdade e passo a
dividir o mundo em dois grupos: os que s#o a meu favor ou contra mim. 4ndago se algu)m
realmente se incomoda. (ico procurando justificar a minha desconfiança. Onde quer que eu
vá, eu os vejo e digo: “C#o se pode confiar em ningu)m!. " depois imagino se algum alguma
ve me amor de verdade. O mundo & minha volta se torna somrio. 3eu coraç#o fica pesado.
3eu corpo está cheio de tristeas. 3inha vida perde sentido. 1ornei-me um ser perdido.
O filho mais jovem ficou em ciente de como estava perdido quando nenhum dos seus
companheiros mostrou o menor interesse por ele. %7 tomaram conhecimento da sua pessoa
enquanto podia lhe ser 5til. 3as n#o tendo mais dinheiro para gastar, ou presentes para dar,
dei2ou de e2istir para eles. Para mim ) dif$cil imaginar o que significa ser totalmente estanho,
algu)m a quem ningu)m dá a menor demonstraç#o de apreço. E verdadeira solid#o ocorre
quando perdemos a sensaç#o de ter algo em comum. *uando ningu)m queria lhe dar o
alimento que ele estava dando aos porcos, o filho mais jovem entendeu que n#o era
considerado nem mesmo como um ser humano. *uando ningu)m queria lhe dar o alimento
que
mesmoele estava
como umdando
ser aos porcos,como
humano, o filho
ummais jovem
igual. entendeu
"ntendo que n#o
um pouco era considerado
quanto eu dependonem
de
alguma aprovaç#o. E mesma formaç#o hist7rica, vis#o, religi#o e educaç#o0 amigos comuns,
estilos de vida e háitos0 a mesma fai2a de idade e profiss#o0 tudo isto pode servir de ase
para aprovaç#o. /ada ve que encontro algu)m, sempre procuro alguma coisa que possamos
ter em comum. Parece uma reaç#o espont@nea, normal. *uando digo “sou da Holanda!, a
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
resposta frequentemente ): “Eh, eu já estive lá! ou “eu tenho um amigo lá!, ou “O.X.,
moinhos, tulipas e tamancos!.
*ualquer que seja a reaç#o, há sempre d amos os lados a procura por um elo comum.
*uanto menos afinidades temos, tanto mais dif$cil estar juntos e mais afastados nos sentimos.
*uando n#o sei a l$ngua e ignoro os costumes, quando n#o compreendo seu modo de vida e
religi#o, seus rituais e sua arte e desconheço a comida e a maneira de se alimentar... ent#o me
sinto mais alienado e perdido.
*uando o filho mais jovem n#o era mais considerado um ser humano pelas pessoas & sua
volta, sentiu a profundea de seu isolamento, a mais completa solid#o que algu)m pode sentir.
"stava realmente perdido e foi essa noç#o de perda total que o chamou & realidade. (icou em
estado de choque se dando conta da asoluta ins@nia do seu comportamento, verificando, de
repente, que estava a caminho da morte. Havia se desligado tanto do que dá a vida L fam$lia,
amigos, comunidade, relacionamentos e mesmo alimentaç#o L que a morte seria
naturalmente o pr72imo passo. iu instantaneamente e com nitide o caminho que escolheu0
compreendeu a sua opç#o pela morte0 perceeu que um passo a mais naquela direç#o o
levaria & autodestruiç#o.
Caquele momento cr$tico, o que foi que fe com que optasse pela vidaN (oi a
redescoerta do seu mais profundo eu.
4ei+indi%ando a ilia,o
O que quer que ele tivesse perdido, fosse dinheiro, amigos, reputaç#o, amor pr7prio,
alegria interior e pa L uma ou todas -, ele ainda continuou a ser o filho de seu pai. "nt#o ele
di para si mesmo: “*uantos empregados de meu pai t+m p#o com fartura e eu aqui,
morrendo de fome. ou-me emora, procurar meu Pai e dier-lhe: “Pai, peque contra o /)u e
contra ti0 já n#o sou mais digno de ser chamado teu filho. 1rata-me como um dos teus
empregados.!. /om essas palavras no coraç#o, ele pode voltar, dei2ar o pa$s estranho e ir para
casa.
O significado do retorno do filho mais jovem ) concisamente e2presso nas palavras: “Pai...
n#o sou mais digno de ser chamado teu filho!. "le compreende que dei2ou de ser digno de sua
filiaç#o, mas ao mesmo tempo compreende que ele ) na verdade o filho detentor desse
privil)gio que pAs a perder.
E volta do filho mais jovem ocorre e2atamente quando ele reivindica sua filiaç#o, apesar
de ter perdido toda a dignidade que esta lhe confere. Ca verdade, ) a perda de todos os seus
ens que o fa chegar ao mais ai2o n$vel de sua identidade. "le atingiu os alicerces de sua
filiaç#o. "m retrospecto, parece que o Filho Pródigo tinha que perder tudo para entrar em
contato com o seu ser. *uando perceeu que queria ser tratado como um dos porcos,
entendeu que n#o era um porco, mas um ser humano, um filho de seu pai. E partir dessa
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
compreens#o ) que optou por viver e n#o morrer. ?ma ve que entrou novamente em contato
com a realidade de sua filiaç#o, ele podia ouvir L emora vagamente L a vo chamando-o de
Emado e sentiu L emora & dist@ncia L o toque da +nç#o. "ssa certea e confiança no amor
de eus, mesmo que n#o muito precisa, deu-lhe força para reclamar os seus direitos de filho,
apesar de desprovido de qualquer m)rito.
Há alguns anos, passei por uma situaç#o concreta de ter que tomar a decis#o: voltar ou
n#o. ?ma amiade que em princ$pio parecia promissora e en)fica aos poucos foi me levando
para mais e mais longe0 aos poucos eu me senti totalmente ocecado por ela. Co sentido
espiritual, encontrei-me esanjando tudo o que eu receera do meu pai para manter esse
envolvimento. C#o mais conseguia rear. Perdera interesse pelo meu traalho e achava cada
ve mais dif$cil dar atenç#o aos prolemas de outros. 3esmo reconhecendo que meus
pensamentos e aç'es eram insustentáveis, era atra$do pelo meu coraç#o sedento de amor a
formas ilus7rias de conquistar um senso de autoestima.
“filho!.
E agonia do aandono do$a tanto que era dif$cil, quase imposs$vel, acreditar naquela vo.
3eus amigos, vendo o meu desespero, me estimulavam a vencer a ang5stia e a confiar que
e2istia algu)m esperando por mim em casa. (inalmente, optei por me refrear em ve de
continuar esanjando e me dirigi a um lugar onde eu pudesse estar s7. á, na minha solid#o,
comecei a caminhar em direç#o & casa devagar e vacilante, ouvindo ainda mais claramente a
vo que di: “oc+ ) o meu em-amado, sore voc+ recai todo o meu carinho!.
"ssa e2peri+ncia dolorosa, mas cheia de esperança, levou-me ao @mago da luta espiritual
pela escolha certa. O %enhor di: “"u te propus a vida ou a morte, +nç#o ou maldiç#o.
"scolhe, pois, a vida, para que vivas tu e a tua descend+ncia, amando a 4ahUeh teu eus,
oedecendo & sua vo e apegando-te a ele!.8G Bealmente, ) uma quest#o de vida ou morte.
Eceitamos a repulsa do mundo que nos aprisiona ou uscamos a lierdade dos filhos de eusN
Precisamos escolher.
Kudas traiu Kesus. Pedro o negou. Emos foram filhos que se perderam. Kudas, incapa de
se agarrar & verdade de que era filho de eus, se enforcou. "m termos de Filho Pródigo,
vendeu a espada de sua filiaç#o. Pedro, no meio de seu desespero, lemrou-se dos seus direito
e voltou em lágrimas. Kudas escolheu a morte. Pedro, a vida. "ntendo que tal escolha está
8G
+t '4% #21&4.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
3as quando eus criou homem e mulher & sua pr7pria imagem, “viu que era om! 8F e,
apesar das voes sinistras, nenhum home ou mulher poderá jamais mudar isso.
E opç#o por minha pr7pria filiaç#o, entretanto, n#o ) fácil. Es voes assustadoras do
mundo circundante tentam me convencer de que n#o presto e que s7 posso ser om se
conseguir galgar a escada do sucesso. "ssas voes me levam a rapidamente esquecer a vo que
me chama “meu filho, o Emado!, lemrando-me que sou amado independentemente de
qualquer aplauso ou realiaç#o. "ssas voes sinistras afogam aquela vo gentil, meiga, cheia de
lu que me chama “meu filho!, elas me arrastam para a periferia de minha e2ist+ncia e faem-
me duvidar que há um eus amoroso & minha espera em no centro do meu ser.
3as dei2ar o pa$s estrangeiro ) somente o princ$pio. O caminho para casa ) longo e dif$cil.
O que faer no percurso de volta ao PaiN 6 muito claro o que fa o Filho Pródigo. "le prepara
um cenário. *uando ele se volta, lemrando sua filiaç#o, ele di: “ou-me emora, procurar o
meu pai, e dier-lhe: \Pai, pequei contra o /)u e contra ti0 já n#o sou mais digno de ser
chamado teu filho. 1rata-me como um dos teus empregadosV!. S medida que leio essas
palavras, fico ciente de como a minha vida $ntima está cheia desse tipo de conversa. e fato
poucas vees n#o há em minha caeça algum encontro imaginário no qual me e2plico, me
vanglorio ou me desculpo, proclamo ou defendo, evocando louvor ou piedade. Parece que
estou sempre envolvido em longos diálogos com interlocutores ausentes, antecipando suas
perguntas e preparando minhas respostas. 6 surpreendente o desgaste emocional que envolve
estas ruminaç'es e resmungos. %im, estou dei2ando o pa$s estrangeiro. %im, estou voltando
para casa... mas, por que todo esse preparo de discursos que nunca ser#o proferidosN
E ra#o ) clara. Epesar de reivindicar minha verdadeira identidade como filho de eus,
ainda vivo como se eus a quem retorno peça uma e2plicaç#o. Einda penso no seu amor
condicional e na morada como um lugar do qual n#o estou muito certo. "nquanto volto para
casa, alimento d5vidas sore se serei em receido quando lá chegar. *uando contemplo a
minha jornada espiritual, minha longa e cansativa viagem para casa, vejo como está cheia de
8F
n #%'#.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
culpa quanto ao passado e preocupaç'es quanto ao futuro. erifico meus erros e sei que perdi
a dignidade de minha filiaç#o, mas ainda n#o estou plenamente preparado para crer que,
emora minhas faltas sejam muitas, “a graça ) ainda maior!. =T Einda me apoiando no meu
conceito de pouca valia, escolho para mim um lugar em aai2o ao que pertence ao filho.
Ecreditar no perd#o completo, asoluto, n#o ocorre prontamente. 3inha e2peri+ncia humana
me di que o perd#o se resume na disposiç#o do outro de desistir da vingança e de mostrar
alguma caridade.
A Volta do Filho Pródigo está cheia de amiguidades. "stá viajando na direç#o certa, mas
que confus#o "le admite ser incapa de faer isso por conta pr7pria e confessa que iria
receer melhor tratamento como escravo na casa de seu pai do que como foragido num pa$s
estrangeiro, mas ainda está longe de confiar no amor do pai. %ae que ainda ) o filho, mas
reconhece que perdeu a dignidade de modo que possa ser chamado “filho!0 prepara-se para
aceitar o status de “empregado! de modo que possa soreviver. Há arrependimento, mas n#o
um arrependimento & lu do amor imenso de um %enhor misericordioso. 6 um
arrependimento que satisfa ao pr7prio ego e permite soreviver. /onheço muito em esse
modo de pensar e sentir. "quivale a dier: “em, eu n#o poderia resolver soinho, tenho que
admitir que eus ) a 5nica esperança que me resta. 4rei a "le e pedirei perd#o, esperando que
o castigo seja pequeno e eu possa soreviver so a condiç#o de traalhar duro. eus continua
a ser um eus severo e julgador. 6 este eus que me fa sentir culpado e temeroso, faendo-
me continuar procurando justificativas. E Oedi+ncia a este eus n#o nos dá a verdadeira
lierdade, mas resulta em amargura e ressentimento.
=T
/f. Tm (%&4.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
6 claro que a dist@ncia entre dar a volta e chegar & casa deve ser percorrida com
saedoria e disciplina. E disciplina ) a de se tornar um filho de eus. Kesus aponta que o
caminho para eus ) o mesmo caminho para uma nova inf@ncia. “"m verdade vos digo que, se
n#o vos converterdes e n#o vos tornardes como crianças, de modo algum entrareis no Beino
dos /)us.!=8 Kesus n#o pede que eu continue criança, mas que me transforme em criança.
1ornar-me criança ) viver & procura de uma segunda inoc+ncia, n#o a inoc+ncia de um rec)m-
nascido, mas a candura que se chega por opç#o consciente.
/omo podem aqueles que chegaram a essa segunda inoc+ncia ser descritosN Kesus mostra
isso claramente nas em-aventuranças. ogo ap7s ter ouvido a vo de %atanás que o intima a
provar ao mundo que ele ) digno de ser amado, ele começa o seu minist)rio p5lico. ?m dos
seus primeiros passos ) o de convocar os disc$pulos para que o sigam e partilhem do seu
minist)rio. epois Kesus so a montanha, re5ne os ap7stolos ao seu redor e di: “em-
aventurados s#o os pores, os mansos, aqueles que choram, os que t+m fome e sede de
justiça, os compassivos, os puros de coraç#o, os que promovem a pa e aqueles que s#o
perseguidos por causa da justiça!.
do
serámeu Pai,herança,
minha compreenderei
um lugarque n#o
onde terei somente
poderei direito ao sem
viver em lierdade, /)u, osess'es
mas que tam)m a terra
nem coraç'es.
=8
Mt #3%'.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
sem que eu veja ali um e+ voltando ao 5tero materno. 4sso me ajuda a compreender melhor
o caminho que devo sentir de volta para casa.
C#o ) a criança pore, meiga e pura de coraç#o: C#o chora a criança por qualquer dor
que sintaN C#o ) a criança o intercessor faminto e sedento de justiça e a v$tima final da
perseguiç#oN " o que dier de Kesus, a Palavra de eus feito carne, que se formou no 5tero de
3aria durante nove meses, veio ao mundo como uma criança venerada por pastores da
redondea e por homens de terra long$nquasN O (ilho eterno tornou-se uma criança de modo
a que eu pudesse voltar a ser criança e retornar com "le ao Beino do Pai. “"m verdade, te
digo!, disse Kesus a Cicodemos, “quem n#o nascer do alto, n#o pode ver o Beino de eus!.==
Eordo aqui o mist)rio de que o pr7prio Kesus tornou-se o Filho Pródigo por nossa causa.
ei2ou a casa de seu Pai celeste, veio a um pa$s distante, desfe-se de tudo o que possu$a, e
por meio da cru voltou & casa do Pai. 1udo isso ele fe n#o como filho reelde, mas
oediente, enviado para traer de volta todos os filhos de eus que se encontravam perdidos.
Kesus que contou a hist7ria &queles que o criticavam por se associar com pecadores viveu ele
mesmo a longa e dolorosa jornada que descreve.
er Kesus, ele mesmo, como o Filho Pródigo, vai muito al)m da interpretaç#o usual da
paráola. "ntretanto, essa vis#o encerra um grande segredo. ou aos poucos descorindo que
isso significa que a minha filiaç#o e a de Kesus s#o uma, que a minha volta e a de Kesus s#o
uma, que a minha morada e a de Kesus s#o uma. C#o há caminho para eus fora daquele
seguido por Kesus, aquele que narrou a hist7ria do Filho Pródigo ) a Palavra de eus por meio
==
Jo '%'.
=<
Jo #%&2.
=J
& /or (%&#.
=;
/f. Fl &%I1S.
=I
Mt &S%$I.
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O Filho Pródigo
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da qual todas as coisas vieram a e2istir. =Q “" o ero se fe carne, e haitou entre n7s! e nos
tornou parte de sua plenitude.
*uando olho para a hist7ria do Filho Pródigo com os olhos da f) a “volta! se torna a volta
do (ilho de eus que chamou a si todos os povos e os leva de volta a seu Pai /elestial. =G /omo
fala Paulo: “Pois nele aprouve a eus faer haitar toda a plenitude e reconciliar por ele e para
ele todos os seres, os da terra e os dos c)us!.=F
(r]revivendo
monges Pierre na
3arie, o fundador
cidade, da (raternidade
reflete sore Kesus como odeFilho
Kerusal)m,
Pródigo uma comunidade
de maneira $licade
e
po)tica. "le escreve:
"le, que ) nascido n#o da esp)cie humana, do desejo ou da vontade da carne, mas do
pr7prio eus, um dia chamou a si tudo o que estava deai2o dos seus p)s e partiu com sua
herança, seu t$tulo de (ilho e o preço do resgate. Partiu para um pa$s distante... a terra
long$nqua... onde se tornou como s#o os seres humanos e esvaiou-se. O seu povo n#o o
aceitou e seu primeiro erço foi um erço de palha /omo uma rai num ch#o árido, cresceu
diante de n7s, foi despreado, o mais $ntimo dos homens, diante de quem escondemos a nossa
face. em cedo, ele conheceu o e2$lio, a hostilidade, a solid#o... epois de ter perdido tudo
numa caminhada de total doaç#o, seu valor, sua pa, sua lu, sua verdade, sua vida... todos os
tesouros de conhecimento e saedoria e o mist)rio escondido mantido secreto por tempos
sem fim0 depois de ter-se perdido entre os filhos transviados de 4srael passando seu tempo
com os doentes “e n#o com os afortunados!, com os pecadores “e n#o com os justos!, e at)
com as prostitutas a quem prometeu entrada no reino de seu Pai0 depois de ter sido tratado
como glut#o e +ado, como amigo dos coradores de impostos e dos pecadores, como um
%amaritano, um possesso, um lasfemo0 depois de ter ofertado tudo, at) o seu corpo e seu
sangue, depois de ter sentido profunda tristea, ang5stia e a alma dilacerada. epois de ter
chegado ao limite do desespero t#o em e2presso na cru, onde o Pai o teria aandonado,
distante da fonte de água viva, e de onde, crucificado, "le e2clama: “1enho sede!. esceu &
mans#o dos mortos e, ent#o ao terceiro dia, levantou-se das profundeas do inferno
carregando os crimes de todos nos, nossos pecados, nossos sofrimentos. e p), e2clamou:
“%im, estou ascendendo ao meu Pai e ao seu Pai, ao meu eus e ao seu eus!. " suiu aos
c)us. "nt#o, no sil+ncio, olhando para seu (ilho, e todas as suas criaturas, uma ve que o (ilho
tinha se tornado tudo em todos, o Pai disse aos seus servos: “epressa 1ragam a melhor veste
e o curam, ponham um anel em seus dedos e sandálias em seus p)s, vamos comer e festejar
Porque os meus (ilhos que, como voc+s saem, estavam mortos voltaram & vida0 estavam
perdidos e foram encontrados 3eu Filho Pródigo os trou2e todos de volta!. "les todos
começaram a festejar vestidos em seus trajes longos, que se tornaram imaculados no sangue
do /ordeio.<T
=Q
/f. Jo #%#1#$.
=G
/f. Jo #&%'&.
=F
/l #%#21&4.
<T
es fils prodigues et le fils prodigue. %ources ivesParisR% n. #'% pp. 3S12'% #23S.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
Olhando novamente para o Filho Pródigo de Bemrandt, vejo-o agora de modo diferente,
vejo Kesus voltando para seu Pai e meu Pai, seu eus e meu eus.
6 pouco provável que Bemrandt tenha pensado dessa maneira sore o Filho Pródigo.
"ssa compreens#o n#o faia parte das pregaç'es e escritos de seu tempo. "ntretanto, ver
nesse jovem cansado e vencido o pr7prio Kesus nos tra muito conforto e consolaç#o. O jovem
que o pai araça n#o ) mais um pecador arrependido, mas toda a humanidade voltando a
eus. O corpo dilacerado do Filho Pródigo se torna o corpo dilacerado de toda a humanidade,
e a face do neonato que volta de torna a face de todos os que sofrem e almejam reentrar no
para$so perdido. Essim o quadro de Bemrandt dei2a de retratar somente uma paráola
comovente0 torna-se o sumário da hist7ria de nossa salvaç#o. E lu que ilumina tanto o Pai
como o (ilho, fala agora da gl7ria que aguarda os filhos de eus. (a lemrar das palavras
mágicas de Ko#o: “... /ar$ssimos, desde já somos filhos de eus, mas o que n7s seremos ainda
n#o se manifestou. %aemos que por ocasi#o desta manifestaç#o seremos semelhantes a ele,
porque o veremos tal como ele )!.<8
3as nem a pintura de Bemrandt nem a paráola que ela representa nos dei2a em
+2tase. *uando vi a cena central do pai araçando seu filho no pAster no escrit7rio de %imone
n#o tinha ainda tomado conhecimento dos quatro espectadores apreciando a cena. 3as agora
conheço aqueles rostos em torno “da volta!. %#o pelo menos enigmáticos, especialmente
aquele homem alto & direta do quadro. %im, há elea, gl7ria, salvaç#o... mas tam)m há os
olhares cr$ticos de oservaç'es n#o comprometidos. "les acrescentam uma nota repressiva &
pintura e impedem
reconciliaç#o qualquer
espiritual. possiilidade
E caminhada de mais
do filho uma jovem
soluç#on#o
rápida
podeeser
rom@ntica para
separa da de oseu
tema da
irm#o
mais velho. "nt#o ) para ele que eu agora, um tanto temeroso, volto minha atenç#o.
<8
# Jo '%&.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
parte II
II
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
O Filho mais "elho esta"a no campo. -uando "olta"a% ;7 perto de casa ou"iu msicas e
dan8as. /hamando um ser"o% perguntou1lhe o 9ue esta"a acontecendo. ste lhe disse5 6U teu
irm<o 9ue "oltou e teu pai matou o no"ilho ce"ado% por9ue o recuperou com sade:. nt<o ele
ficou com muita rai"a e n<o 9ueria entrar. >eu pai saiu para suplicar1lhe. le% porm%
respondeu% a seu pai5 6H7 tantos anos 9ue eu te sir"o% e ;amais transgredi um só dos teus
mandamentos% e nunca me deste um ca!rito para feste;ar com meus amigos. /ontudo% "eio
esse teu filho% 9ue de"orou teus !ens com prostitutas% e para ele matas o no"ilho ce"adoC:.
Mas o Pai lhe disse5 6Filho% tu est7s sempre comigo% e tudo o 9ue meu seu. Mas era
preciso 9ue feste;7ssemos e nos alegr7ssemos% pois esse ter irm<o esta"a morto e tornou a
"i"erE ele esta"a perdido e foi encontradoC:.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
J
4e&5randt e o ilho &ais +elho
urante as minhas horas no Hermitage, olhando em sil+ncio para o Filho Pródigo, nunca
duvidei que o homem em p) do lado direito do plano, onde o pai araça seu filho que volta,
era o filho mais velho. E maneira como ele se posiciona olhando para o gesto magn@nimo da
acolhida n#o dei2a d5vida sore quem Bemrandt quis retratar. (i muitas anotaç'es
descrevendo este oservador distante e severo e en2erguei nele tudo o que Kesus nos di
sore o filho mais velho.
"ntretanto, a paráola dei2a claro que o filho mais velho ainda n#o está em casa quando o
pa araça seu filho perdido e lhe mostra a sua compai2#o. Eo contraio, a hist7ria relata que,
quando o filho mais velho finalmente regressa & casa depois do traalho, a festa de oas-
vindas para seu irm#o está a todo vapor.
(ico surpreso com que facilidade n#o percei a discrep@ncia entre a pintura de
Bemrandt e a paráola, simplesmente assumindo que Bemrandt quis pintar amos os
irm#os numa mesma ora em que retrata o Filho Pródigo.
*uando voltei para casa e comecei a ler todos os estudos hist7ricos sore a pintura,
depressa compreendi que muito cr$ticos estavam menos seguros quanto & identidade do
homem em p) & direita. Elguns o descreviam como um homem velho, e alguns at)
questionavam se teria sido mesmo Bemrandt que o pintara.
3as ent#o um dia, já passado um ano de minha visita ao Hermitage, um amigo, 4van er,
com quem eu falara muitas vees sore o meu interesse na pintura do Filho Pródigo, mandou-
me uma c7pia do estudo feito por arara Koan Haeger “O significado religioso da Volta do
Filho Pródigo de 0em!randt!.<= "ste traalho rilhante, que coloca a pintura no conte2to da
tradiç#o visual e iconográfica do tempo de Bemrandt, trou2e o filho mais velho de volta &
cena.
<=
1he religious significance of BemrandtVs Betur of the Prodigal %onN an eLamination of the p,cture in the conteLt of the "isual
and iconographic tradition. Ann Ar!or% Mich.% *ni"ersit Microfilm ,nternational% #23'. p. #S'. +issertaEao de doutorado
apresentado ? *ni"ersidade de Michigan.
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O Filho Pródigo
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Os achados de arara Haeger representam muito mais que uma afirmaç#o feli da minha
intuiç#o inicial. Ejudam-me a ver A Volta do Filho Pródigo como um traalho que resume a
grande luta espiritual e as grandes escolhas que essa luta e2ige. Pintando n#o somente o filho
mais jovem que essa luta e2ige. Pintando n#o somente o filho mais jovem nos raços de seu
Pai, mas tam)m o filho mais velho que pode aceitar ou n#o o amor que lhe ) oferecido,
Bemrandt me apresenta o “drama interior da alma! <J L dele e meu tam)m. Essim como a
paráola do Filho Pródigo encerra o cerne da mensagem do "vangelho e chama os que a
ouvem para que façam suas pr7prias escolhas diante dela, da mesma forma a pintura de
Bemrandt encerra sua pr7pria luta espiritual e convida os que a contemplam para que
tomem uma decis#o pessoal sore suas vidas.
Essim, os espectadores no quadro de Bemrandt faem com que a ora envolva os que a
contemplam de maneira muito pessoal. Co outono de 8FG<, quando vi o pAster mostrando a
parte central da pintura, entendi imediatamente que fora chamado a faer algo de pessoal.
Egora que conheço melhor toda a pintura e tam)m o significado da testemunha que as
destaca & direita, estou mais do que nunca convencido do enorme desafio espiritual que este
quadro representa.
Olhando para o filho mais moço e pensando na vida de Bemrandt, tornou-se evidente
para mm que Bemrandt o deve ter entendido de maneira muito pessoal *uando ele pintou A
Volta do Filho Pródigo, tinha vivido uma vida marcada por uma grande autoconfiança, sucesso
e fama, seguida de muitas perdas dolorosas, desapontamentos e fracassos. 3ediante tudo
isso, ele caminhou da lu e2terior para a interior, do retratar de fatos mundanos para o de
significados profundos, de uma vida cheia de ens e pessoas para uma vida marcada por
solid#o e sil+ncio. /om a idade se tornou mais recolhido e tranquilo. (oi uma volta espiritual.
''
,dem% i!idem.% p. #S3.
<J
,dem% i!idem.% p. #S3.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
pinturas, apesar de el$ssimas, s#o muito menos espirituais do que parecem. 3inha reaç#o
inicial a esses estudos desmistificadores sore Bemrandt foi de choque. %oretudo a iografia
de Rar %chUart L que dá pouca margem a romantiar Bemrandt L fe-me imaginar se
houve alguma ve “uma convers#o!. 6 n$tido, pelos estudos recentes do relacionamento de
Bemrandt com seus patrocinadores, que encomendavam e compravam seus traalhos, em
como sua fam$lia e amigos, que ele era uma pessoa de dif$cil conviv+ncia. %chUart o descreve
como “uma pessoa amarga e vingativa, que usava todas as armas, permitidas ou n#o, para
atacar os que atravessavam seu caminho!.<;
e fato, Bemrandt era conhecido por muitas vees agir de forma ego$sta, arrogante e at)
vingativa. 4sso se v+ em pela maneira como tratou Reertje irc2, com quem viveu por seis
anos. "le usou o irm#o de Reertje, a quem a pr7pria Reertje dera uma procuraç#o, para
angariar testemunhas de seus viinhos contra ela, de modo que pudesse ser enviada para um
asilo de doentes mentais.<I /onsequentemente, Reertje foi internada. *uando mais tarde
houve a possiilidade de ela sair, “Bemrandt contratou um agente para que conseguisse
provas contra ela, de modo que permanecesse em cativeiro!.<Q
urante o ano de 8IJF, quando estes acontecimentos trágicos tiveram in$cio, Bemrandt
ficou t#o esgotado que nada conseguiu produir. Ceste ponto, um outro Bemrandt surge,
algu)m sumerso em amargura e desejo de vingança, capa de traç#o.
6 dif$cil encarar este Bemrandt. C#o ) t#o dif$cil simpatiar com um tipo sensual que
cede aos praeres hedonistas do mundo, depois se arrepende, volta para casa e se torna
algu)m com muita espiritualidade. 3as apreciar um homem com ressentimentos profundos,
que perde muito do seu precioso tempo em processos corriqueiros e está constantemente se
indispondo com terceiros em face do seu modo arrogante, ) muito mais dif$cil. "ntretanto, ao
que se saia, isso tam)m ) um aspecto de sua vida0 um aspecto que n#o posso ignorar.
Bemrandt ) tanto filho mais velho quando o mais novo da paráola. *uando, durante os
5ltimos anos de sua vida, ele pintou amos os filhos na sua Vida do Filho Pródigo, ele tinha
vivido uma vida em que n#o ignorava nem os desatinos do filho mais moço nem os desacertos
do filho mais novo. Emos precisavam de cura e de perd#o. Emos precisavam voltar para
casa. 3as, tanto da hist7ria, como do quadro de Bemrandt, depreende-se que a convers#o
mais dif$cil de se oter ) a daquele que permanece em casa.
<;
0em!randt5 Dign e"en% Dign >childeri;en. Naarsen% Netherlands% *itge"ereri; ar >chwartD% #23$. p. 'I&
<I
M% /harles . 0em!randts portrait5 a !iograph. New orG% >imon and >chuster% #233. p. &&2
<Q
,dem% i!idem.
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;
O ilho &ais +elho !arte
O Filho mais "elho esta"a no campo. -uando "olta"a% ;7 perto de casa ou"iu msicas e dan8as.
/hamando um ser"o% perguntou1lhe o 9ue esta"a acontecendo. ste lhe disse5 6U teu irm<o 9ue
"oltou e teu pai matou o no"ilho ce"ado% por9ue o recuperou com sade:. nt<o ele ficou com
muita rai"a e n<o 9ueria entrar. >eu pai saiu para suplicar1lhe. le% porm% respondeu% a seu
pai5 6H7 tantos anos 9ue eu te sir"o% e ;amais transgredi um só dos teus mandamentos% e
nunca me deste um ca!rito para feste;ar com meus amigos. /ontudo% "eio esse teu filho% 9ue
de"orou teus !ens com prostitutas% e para ele matas o no"ilho ce"adoC:.
urante as horas em que estive no Hermitage olhando para o quadro de Bemrandt, fui
aos poucos me sentindo fascinado pela figura do filho mais velho. emro-me de olhar para
ele por longo tempo e imaginar o que estaria se passando na caeça e no coraç#o desse
homem. "le ), sem d5vida alguma, o principal oservador da volta do filho mais jovem.
*uando eu conhecia somente o fragmento da pintura na qual o pai araça seu filho que volta
era mito fácil reconhec+-lo como convidativo, comovente e tranquiliador. 3as quando vi todo
o quadro logo percei a comple2idade do encontro. O principal espectador, oservando o pai
araçando o filho que volta, parece muito afastado. "le olha para o pai, mas sem alegria. "le
n#o se apro2ima, n#o sorri nem e2pressa oas-vindas. "le simplesmente fica lá, ao lado do
estrado, aparentemente n#o querendo soressair.
/om o filho mais velho na pintura, n#o ) mais poss$vel sentimentaliar a “olta!. O
principal oservador mant)m dist@ncia, aparentemente n#o querendo participar das oas-
vindas do pai. O que se passa na caeça desse homemN O que irá ele faerN /hegará mais
perto e araçará seu irm#o como fe seu pai, ou irá emora com raiva e avers#oN
esde que meu amigo art falou que posso ser muito mais como filho mais velho do que
como o filho mais moço, tenho oservado esse “homem & direita! com maior cuidado e tenho
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
visto muito mais coisas novas e dif$ceis. E maneira como o filho mais velho foi pintado por
Bemrandt retrata-se um tanto como seu pai. Emos t+m ara e usam largos mantos
vermelhos sore seus omros. "stes sinais e2ternos sugerem que ele e seu pai t+m muito em
comum e essa semelhança ) sulinhada pela lu que incide sore o filho mais velho L o que fa
que haja uma ligaç#o direta da sua face com a face iluminada do pai.
3as que diferença dolorosa entre os dos O pai se inclina sore o filho que volta. O filho
mais velho, ereto, fica ainda mais firme na sua postura porque se apoia numa vara que alcança
o ch#o. E capa do pai ) larga e acolhedora0 a do filho cai rente ao corpo. Es m#os do pai est#o
aertas e tocam o filho que volta numa atitude de +nç#os0 as do filho est#o entrelaçados e se
mant+m junto ao peito.
Há lu em amas as faces, mas a lu do rosto do Pai flui por todo o corpo L especialmente
as m#os L e envolve o filho mais jovem num grande halo de t)pida luminosidade, enquanto a
lu no rosto do filho mais velho ) fria e contrita. %ua figura permanece no escuro e suas m#os
entrelaçadas continuam nas somras.
E paráola que Bemrandt pintou poderia ter se chamado “E Paráola dos (ilhos
Perdidos!. C#o s7 se perdeu o filho mais moço que saiu de casa e foi a um pa$s distante, &
procura de lierdade e praer, mas o que ficou em casa tam)m se tornou um homem
perdido. "2ternamente fe todas as coisas que um om filho deve faer, mas, no $ntimo, se
afastou do seu pai. "le cumpriu o seu dever, traalhou duro todos os dias e deu conta de suas
origaç'es, mas se tornou mais e mais infeli e cativo.
Para mim ) dif$cil admitir que este homem ressentido, amargo e raivoso esteja
espiritualmente mais perto de mm do que o sensual filho mais jovem. "ntretanto, quanto mais
penso no filho mais velho, mais me vejo nele. /omo o filho mais velho na minha pr7pria
fam$lia, sei em como ) ter de ser um filho modelo.
3uitas vees imagino se n#o s#o especialmente os filhos mais velhos que querem
corresponder &s e2pectativas de seus pais se ser considerados oedientes e e2emplares.
3uitas vees querem agradar. 3uitas vees receiam desapontar seus pais. 3as muitas vees
e2perimentam, em cedo na vida, uma certa inveja relativamente a seus irm#os e irm#s mais
jovens, que parecem se preocupar menos em agradar e est#o muito mais & vontade para
“viver sua pr7pria vida!. Para mim certamente foi assim. " sempre alimente uma estranha
curiosidade pela vida de reeldia que eu n#o ousara viver, mas que outros, ao meu redor,
viviam. (i tudo de maneira correta, principalmente atendendo aos compromissos agendados
por muitas figuras paternas na minha vida L professores, diretores espirituais, ispos, papas L
mas, ao mesmo tempo, muitas vees me perguntei por que n#o tive coragem de ir emora
como fe o filho mais jovem.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
6 estranho dier isso,mas, no fundo do meu coraç#o, tenho tido um sentimento de inveja
em relaç#o ao filho reelde. 6 a emoç#o que desperta quando vejo meus amigos se divertindo,
faendo toda sorte de coisas que condeno. "u classifique seu comportamento como impr7prio
e mesmo imoral, mas ao mesmo tempo muitas vees me perguntei por que eu n#o tinha
coragem de, pelo menos em parte, faer a mesma coisa.
E vida regrada e correta de que tanto me orgulho ou pela qual sou elogiado se torna,
algumas vees, como um peso que foi colocado nos meus omros e continua a me incomodar,
mesmo quando já a aceitei de tal maneira que n#o dá para mudar. C#o tenho dificuldade em
me identificar com o filho mais velho da paráola, que se quei2ava: “Há tantos anos que eu te
sirvo, e jamais transgredi um s7 de teus mandamentos, e nunca me deste m carito para
festejar com meus amigos!. Cesta quei2a, oedi+ncia e dever se tornaram um peso e o
traalho, uma escravid#o.
1udo isso se tornou muito real para mim quando um amigo, que recentemente se
convertera ao cristianismo, criticou-me por n#o orar astante. %ua cr$tica me dei2ou muito
angado. isse a mim mesmo: “/omo ele se atreve a me dar liç'es sore a oraç#o! Por anos
ele viveu uma vida desregrada, sem disciplina, enquanto eu desde criança tenho estado
estritamente dentro da f). Egora ele se converteu e começa a me dier como me comportar!.
"sse ressentimento $ntimo me mostra como estou “perdido!. (iquei em casa e n#o me afastei,
mas n#o vivi uma vida com lierdade na casa de meu pai. 3inha anga e inveja mostraram-me
minha pr7pria sujeiç#o.
4sso n#o ) e2clusividade minha. Há muitos filhos e filhas mais velhos que est#o perdidos
enquanto ainda em casa. 6 esta derrota L caracteriada por julgamento e condenaç#o, raiva e
ressentimento, amargura e ci5me L que ) t#o perniciosa e prejudicial ao coraç#o humano.
3uitas vees pensamos em derrota em termos de aç'es que s#o facilmente identificáveis, at)
espetaculares. O filho mais jovem pecou de maneira que ) facilmente reconhec$vel. O seu
destino ) 7vio. "le empregou mal os eu dinheiro, tempo, amigos, seu pr7prio corpo. O que
fe foi errado0 n#o s7 sua fam$lia e amigos saiam disso, mas ele mesmo. "le se reelou contra
a moral e dei2ou-se seduir pela sua pr7pria concupisc+ncia e gan@ncia. Há algo claramente
visto que esse procedimento errado n#o levava sen#o & mis)ria, o filho mais jovem recorou o
om senso, deu a volta e pediu perd#o. 1emo aqui uma falha humana clássica, com uma
decis#o acertada. (ácil de entender e fácil de aceitar.
O desacerto do filho mais velho, entretanto, ) mais dif$cil de identificar. Efinal de contas,
ele fe tudo o que devia. (oi oediente, cumpridor de suas origaç'es, respeitador das leis e
traalhador. Es pessoas o respeitavam, admiravam-se, elogiavam-no e consideravam-no,
igualmente, um filho modelo. Eparentemente, o filho mais velho era sem defetos. 3as quando
se defronta com a alegria do pai pelo filho que volta, surge uma onda de revolta que e2plode,
chegando & superf$cie. e repente, aparece ali nitidamente vis$vel uma pessoa ressentida,
orgulhosa, má, ego$sta0 algu)m que permaneceu profundamente escondido apesar de estar
crescendo e se fortalecendo ao longo dos anos.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
Olhando em para mim, e depois & minha volta, para as vidas de outros, pergunto o que
causa mais dano: lu25ria ou ressentimento. Há tanto ressentimento entre os “justos! e os
“corretos!. Há tanto julgamento, condenaç#o e preconceito entre os “santos!. Há tanta raiva
contida entre as pessoas que s#o muito preocupadas em evitar “o pecado!.
e& alegria
*uando ouço as palavras com as quais o filho mais velho agride seu pai L justificando-se e
pedindo reconhecimento, palavras ciumentas L ouço uma quei2a mais profunda. 6 a que vem
do coraç#o que acha que nunca receeu o que lhe era devido. 6 a quei2a e2pressa de in5meras
maneiras, sutis ou n#o, formando uma montanha de ressentimento. 6 a quei2a que rada:
“"sforcei-me tanto, traalhei por tanto tempo, fi o poss$vel e mesmo assim n#o recei o que
outros receem t#o facilmente. Por que as pessoas n#o me agradecem, n#o me convidam, n#o
rincam comigo, n#o me consideram, enquanto prestam tanta atenç#o &queles que levam a
vida de maneira trivial e levianaN!.
6 nessa quei2a declarada ou n#o que reconheço o filho mais velho em mim. 3uitas vees
me surpreendi reclamando de pequenas rejeiç'es, pequenas indelicadeas, pequenas
neglig+ncias. olta e meia há dentro de mim murm5rios, lamentos, resmungos, quei2as que
continuam mesmo contra minha vontade. *uanto mais discorro sore o assunto em quest#o,
tanto mais se agrava meu estado. *uanto mais me aprofundo na mat)ria, tanto mais se
complica. "ssa quei2a $ntima ) somria e pesada. /ondenaç#o de outros, condenaç#o pr7pria,
justificativas e arrependimentos v#o se fortalecendo de maneira cada ve mais prejudicial.
/ada ve que me dei2o levar por isso, entro num espiral de auto rejeiç#o. S medida que me
dei2o arrastar ao interior do vasto lairinto das minhas quei2as, fico mais e mais perdido, at)
que, no fim, acao me achando a pessoa mais incompreendida, rejeitada, negligenciada e
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
O trágico ) que muitas vees, uma ve e2pressa, a lam5ria leva ao que mais se queria evitar:
um afastamento maior.
1enho n$tida lemrança de uma situaç#o semelhante. ?ma ve, quando me sentia muito
s7, convidei um amigo para sair. Epesar de ter respondido que n#o tinha tempo, encontrei-o
pouco mais tarde na casa de um amigo comum onde havia uma festa. Eo me ver ele disse:
“em-vindo, junte-se a n7s, que om ver voc+!. 3as minha raiva foi t#o grande por n#o ter
sido informado da festa que n#o pude ficar. 1odas as minhas quei2as $ntimas sore n#o ser
aceito, apreciado e amado vieram & tona, dei2ei a sala atendo a porta atrás de mim. %entia-
me totalmente atingido L incapa de receer e poder participar da alegria que havia ali. Cum
momento, a alegria naquela sala tornara-se uma fonte de ressentimento.
Bemrandt entendeu o sentido profundo de tudo isso quando ele pintou o filho mais
velho ao lado do estrado em que o filho mais jovem ) receido na alegria do pai. "le n#o
descreve a comemoraç#o com m5sica e dançarinos0 eram meros sinais e2teriores do
contentamento do pai. E 5nica indicaç#o de que ) uma festa ) o realce dado a um tocador de
flauta esculpido
lugar de na Bemrandt
uma festa, parede na qual se lu,
pintou apoia uma
a lu das mulheres
radiosa 9a m#e
que envolve dooFilho
tanto PródigoN>.
pai como o filho."m
E
alegria que Bemrandt retrata ) a alegria tranquila que pertence & casa de eus.
Ca paráola ) poss$vel imaginar o filho mais velho do lado de fora, no escuro, n#o
desejando entrar na casa iluminada e cheia de ru$dos de festa. 3as Bemrandt n#o pinta nem
a casa nem os campos. "le retrata tudo com claro e escuro. O araço do pai, cheio de lu, ) a
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O Filho Pródigo
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casa de eus. á est#o as m5sicas e as danças. O filho mais velho fica fora do c$rculo desse
amor, recusando-se a entrar. E lu sore seu rosto mostra que ele tam)m ) chamado & lu,
mas n#o pode ser forçado.
Ss vees as pessoas se perguntam: O que aconteceu como o filho mais velhoN "le se
dei2ou persuadir pelo paiN "ntrou, finalmente, e participou dos festejosN Eraçou seu irm#o e
lhe desejou as oas-vindas como seu pai havia feitoN %entou-se & mesa com o pai e o filho e
partilhou com eles da refeiç#o festivaN
Cem a pintura de Bemrandt nem a paráola que ela retrata falam da decis#o final do
filho mais velho de maneira que permita que ele possa ser encontrado. %erá que o filho mais
velho á capa de reconhecer que ele tam)m ) um pecado que precisa ser perdoadoN %erá
que ele está disposto a admitir n#o ser melhor do que seu irm#oN
"stou s7 diante dessas quest'es. o mesmo modo como n#o sei como o filho mais jovem
aceitou a comemoraç#o ou como passou a viver com o pai depois de sua volta, tam)m n#o
sei se o filho mais velho se reconciliou com seu irm#o, com seu pai, ou com ele mesmo. O que
conheço, com certea plena, ) o coraç#o do pai. 6 um coraç#o capa de compai2#o sem
limites.
*uanto mais penso no filho mais velho contido no meu pr7prio eu, mais compreendo
qu#o enraiada está essa fraquea e como será dif$cil voltar para casa depois de uma aventura
se2ual do que depois de um sentimento de raiva que reside no mais profundo do meu ser. C#o
) fácil distinguir o meu ressentimento e administrá-lo de maneira sensata.
6 muito mais nocivo: e2iste alguma coisa junto & minha virtude como a oura face da
moeda. C#o ) om ser oediente, respeitoso, oservador das leis, traalhador e capa de
sacrif$cioN ", no entanto, parece que meus ressentimentos e quei2as est#o misteriosamente
ligados a essas mesmas atitudes merecedoras de elogios. "ssa ligaç#o muitas vees fa que me
desespere. Co mesmo momento que quero falar ou agir com maior generosidade, sinto-me
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
envolvido por raiva e ressentimento. " tam)m parece que e2atamente quando quero ser
realmente altru$sta, sinto, de forma osessiva, necessidade de amor. "2atamente quando faço
o poss$vel para desempenhar em uma tarefa, pergunto-me por que outros n#o se doam
como eu. *uando penso ser capa de superar minhas tentaç'es, sinto inveja daqueles que
sucumiram &s suas. Parece que onde quer que se encontre meu lado virtuoso, a$ tam)m
e2istirá sempre um quei2oso ressentido.
%erá eu o filho mais velho que e2iste em mim pode voltar para casaN Posso eu ser
encontrado como o filho mais jovem foi encontradoN /omo posso voltar quando estou perdido
em ressentimento, apanhado em cenas de ci5mes, prisioneiro da oedi+ncia e do dever que
escraviaN (ica claro que s7 por mim mesmo n#o posso me encontrar. 6 mais assustador ter de
me curar como o filho mais velho do que como o filho mais moço. "m face de me senti incapa
de autorredenç#o, agora entendo as palavras de Kesus a Cicodemos: “C#o te admires de eu
haver dito: deveis nascer do alto!.<G /ertamente alguma coisa tem de acontecer pela qual eu
n#o seja responsável. C#o posso renascer em condiç#o inferior, isto ), com minha pr7pria
força, minha pr7pria mente, minha vis#o psicol7gica. C#o há d5vida em minha mente sore
isto porque no passado me esforcei para superar as minhas quei2as e falhei... e falei... e falhei,
at)
podeque
vircheguei
a minha& cura,
eira de
de total
ondecolapso
eus seemocional
deruça. eO at)
quemesmo de e2aust#o
n#o ) poss$vel paraf$sica.
mim %7 do alto
) poss$vel
para eus. “/om eus, tudo ) poss$vel!.
<G
Jo '%S.
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O Filho Pródigo
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I
A +olta do ilho &ais +elho
O Filho mais "elho... ficou com muita raiva e n#o queria entrar. %eu pai saiu para suplicar-lhe...
O Pai disse5 6Filho% tu est7s sempre comigo% e tudo o 9ue meu seu. Mas era preciso 9ue
feste;7ssemos e nos alegr7ssemos% pois ter irm<o esta"a morto e tornou a "i"erE ele esta"a
perdido e foi encontrado:.
O pai n#o deseja somente a volta do filho mais jovem, mas tam)m a do mais velho. O
mais velho tam)m precisa ser encontrado e conduido de volta & casa da alegria. Besponderá
ele ao apelo de seu pai ou ficará emperrado em sua amarguraN Bemrandt tam)m dei2a a
decis#o final do filho mais velho aerta a questionamentos. arara Koan Haeger escreve:
“Bemrandt n#o revela se ele + a lu. /omo ele n#o condena francamente o irm#o mais velho,
Bemrandt sugere a esperança de que ele tam)m se dará conta de que ) pecador... a
interpretaç#o de como o filho mais velho reage ) dei2ada ao oservador!.<F
O amor do Pai n#o se imp'e aos seus queridos. "mora ele deseje sanear todos os nossos
cantos escuros, somos ainda livres para faer nossa escolha L se queremos permanecer nas
trevas ou penetrar na lu do amor de eus. eus está lá. O perd#o de eus está lá. O amor de
eus sem limites está lá. O que ) claro ) que eus está sempre pronto a dar e a perdoar, n#o
dependendo asolutamente de nossa resposta. O amor de eus n#o depende de nosso
arrependimento de nossa resposta. *uer eu seja o filho mais jovem ou o mais velho, o 5nico
<F
Haeger% op. cit.% PP. #3(1#3I.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
desejo de eus ) o filho mais jovem ou o mais velho, o 5nico desejo de eus ) o de me faer
voltar para casa. Erthur (reeman escreve:
O pai ama cada filho e dá a cada um a lierdade para ser o que puder, mas n#o
pode lhes dar a lierdade que eles n#o aceitem ou entendam
convenientemente. O pai parece compreender, al)m dos costumes de seu
meio social, a necessidade de seus filhos de serem eles mesmos. 3as ele
tam)m conhece a sua car+ncia por seu amor e por um “lar!. /omo de que a
paráola n#o tem um fecho $ndia certamente que o amor do pai n#o depende
de um final adequado da hist7ria. O amor do pai s7 dele depende e continua
parte do seu caráter. /omo di %haMespeare em um dos seus sonetos: “Emar
n#o ) o amor que se altera quando alteraç#o encontra!.JT
Essim quando Kesus narra a paráola do Filho Pródigo, tenho de escutá-la. Beconheço que
estou mais perto daqueles que provocaram que Kesus contasse a hist7ria, faendo o seguinte
comentário: “"sse homem acolhe os pecadores e senta-se & mesa com eles!. Há alguma
chance de que eu volte ao Pai e me sinta em-vindo em sua casaN Ou estou t#o enrodilhado
nas minhas prerrogativas que estou destinado, contra a minha vontade, a ficar do lado de fora,
atolado em raiva e ressentimentoN
Kesus di: “em-aventurados v7s, os pores... em-aventurados v7s, que agora tendes
fome... em-aventurados v7s, que agora chorais...!, J8 mas eu n#o sou pore, faminto, nem
choro. Kesus di: “"u te louvo, 7 Pai, %enhor do c)u e da terra, porque ocultasse essas coisas
9do reino> aos sáios e entendidos!.J= 6 a estes, aos eruditos e aos perspicaes, que eu
nitidamente pertenço. Kesus mostra franca prefer+ncia por aqueles que s#o marginaliados
pela sociedade L os pores, os doentes e os pecadores L mas eu, certamente, n#o sou
marginaliado. E pergunta dolorosa que, do "vangelho, surge para mim, ): “%erá que já tive a
minha recompensaN!. Kesus reprova muito aqueles que “gostam de faer oraç#o pondo-se em
p) nas sinagogas e nas esquinas, a fim de serem vistos pelos homens!. J< Beferindo-se a eles,
Kesus di: “em verdade vos digo: já receeram a sua recompensa!. JJ /om tudo o que já escrev
e preguei sore a oraç#o e com toda a pulicidade de que goo, n#o posso dei2ar de imaginar
se essas palavras n#o s#o dirigidas a mim.
JT
1he Parale of the Prodigal% manuscrito n<o pu!licado .
J8
c I%&41&#.
J=
c #4%&#.
J<
Mt I%(.
JJ
Mt I%(.
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O Filho Pródigo
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/ertamente s#o, mas a hist7ria do filho mais velho coloca essas perguntas angustiantes
deai2o de uma nova lu, dei2ando claro que deus n#o ama o filho mais jovem mais do que o
filho mais velho. Ca hist7ria o pai se dirige ao filho mais velho da mesma maneira que se
dirigiu ao mais moço, convida-o a entrar e di: “3eu filho, tu estás sempre comigo, e tudo o
que ) meu ) teu!.
"ssas s#o as palavras a que devo prestar atenç#o e permitir que penetrem em fundo no
meu ser. eus me chama “meu filho!. O vocáulo grego para filho que ucas emprega aqui )
J;
te;non, “uma maneira afetuosa de falar!, como Koseph E. (itmer d. 1raduindo
literalmente, o que o pai di ) “criança!.
"sta aordagem afetuosa fica ainda mais clara nas palavras que se seguem. E
recriminaç#o áspera e amarga do filho n#o ) receida de modo a julgá-lo. C#o há recriminaç#o
ou den5ncia. O pai n#o se defende ou sequer comenta o comportamento do filho mais velho.
O pai se coloca diretamente acima de todas as consideraç'es para enfatiar sua ligaç#o muito
$ntima com o seu filho quando di: “1u estás sempre comigo!. E declaraç#o do Pai de amor
irrestrito elimina qualquer possiilidade de que o filho mais jovem seja mais amado do que o
mais velho. O mais velho nunca dei2ou a casa. O pai dividiu tudo com ele. (e dele parte da sua
rotina diária, nada dele escondendo. “1udo o que tenho ) teu!, ele di. C#o pode haver
pronunciamento mais claro do amor ilimitado do pai pelo seu filho mais velho. Essim, o amor
sem reservas, ilimitado, ) oferecido inteiramente e igualmente a amos os filhos.
E alegria pela volta dramática do filho mais jovem de maneira alguma quer dier que o
mais velho ) menos amado, menos considerado, menos favorecido. O pai n#o compara os dois
filhos. Ema-os com amor total e e2pressa esse amor de acordo com os percursos de cada um.
/onhece-os intimamente. /ompreende suas qualidades $mpares e suas imperfeiç'es. "le v+
com amor a pai2#o do seu filho mais jovem, mesmo que lhe falte a vitalidade da pai2#o. Para o
filho mais jovem n#o há pensamentos de melhor ou pior, mais ou menos, da mesma maneira
que n#o há termos de comparaç#o para o filho mais velho. O pai responde a amos de acordo
com as suas peculiaridades. E volta do filho mais jovem o fa convocar para uma
comemoraç#o cheia de alegria. E volta do filho mais velho o fa estender um convite para total
participaç#o nessa alegria.
“Ca casa de meu Pai há muitas moradas!, JI di Kesus. /ada filho de eus tem lá seu lugar
reservado, todos lugares de eus. 1enho de aandonar toda comparaç#o, rivalidade e
competiç#o e capitular ao amor do Pai. 4sso requer um avanço na f) porque tenho pouca
e2peri+ncia de amor sem paralelos e desconheço o poder curador desse amor. "nquanto eu
ficar de fora, no escuro, posso comente permanecer na quei2a ressentida que resulta de
J;
The gospel according to st. uGe. Theanchor )i!le arden /it% N..R% ". &% p. #43$%#23(
JI
Jo #$%&.
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O Filho Pródigo
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comparaç'es. (ora da lu, meu irm#o mais jovem parece ser mais amado pelo Pai do que eu0
de fato, fora da lu, n#o posso mesmo v+-lo como meu pr7prio irm#o.
eus está me chamando para voltar para casa, entrar na lu e descorir ent#o que, em
eus, todas as pessoas s#o 5nicas e inteiramente amadas. Ca lu de eus posso finalmente ver
meu viinho como meu irm#o, como aquele que pertence tanto a eus quanto eu. 3as, fora
da morada de eus, irm#os e irm#s, maridos e esposas, amantes e amigos se tornam rivais e
mesmo inimigos, cada um eternamente emprestado por ci5mes, suspeitas e ressentimentos.
C#o ) de admirar que, na sua raiva, o filho mais velho se quei2e ao pai... “e nunca me
deste um carito para festejar com os meus amigos. /ontudo, veio esse teu filho, que devorou
teus ens com as prostitutas, e para ele matas o novilho cevado!. "stas palavras revelam como
este homem deve se sentir profundamente magoado. O seu amor pr7prio está dolorosamente
ferido pela alegria do pai, e a sua pr7pria raiva o impede de aceitar este patife que volta, como
seu irm#o. /om as palavras “esse teu filho! ele se distancia do seu irm#o e tam)m de seu pai.
"le olha para eles como estranhos que perderam todo o senso de realidade e se
envolveram num relacionamento totalmente inadequado, considerando os fatos que na
realidade ocorreram na vida do Filho Pródigo. O filho mais velho n#o tem mais um irm#o. Cem,
tam)m, um pai. Emos passaram a ser estranhos para ele. Para seu irm#o um pecador, ele
olha com despreo0 para seu pai, um senhor de escravos, com receio.
ejo aqui como o filho mais velho está perdido. 1ornou-se um estranho em sua pr7pria
casa. C#o há comunh#o. 1odo relacionamento ) permeado pela escurid#o. "star com medo ou
mostrar despreo, ter de sumeter-se ou ter de controlar, ser um opressor ou uma v$tima:
estas s#o as opç'es para aquele que fica fora da lu. Os pecados n#o pode sem confessados, o
perd#o n#o poder ser otido, n#o pode e2istir a reciprocidade do amor. E verdadeira
comunh#o tornou-se imposs$vel.
/onheço a dor desta categoria. Cela, tudo perde sua espontaneidade. 1udo se torna
suspeito, constrangedor, calculado e cheio de segundas intenç'es. C#o há mais confiança.
/ada pequeno passo requer uma retriuiç#o0 cada pequena oservaç#o pede uma análise0 o
melhor gesto tem de ser medido. "sta ) a patologia da escurid#o.
Há uma maneira de escaparN C#o creio que haja L n#o do meu lado, pelo menos. Parece
que quanto mais tento me desvencilhar da escurid#o, mais escuro fica. Preciso da lu, mas
essa lu tem de sorepor-se & escurid#o e isso ru, por mim, n#o consigo. C#o consigo me
perdoar. C#o consigo me sentir amado. Por mim mesmo n#o posso sair do terreno da minha
raiva. C#o posso caminhar para casa nem por minha conta entrar em comunh#o. Posso rear
por ela. 3as minha pr7pria lierdade n#o posso conseguir por mim mesmo. 4sso precisa me
ser dado. "stou perdido. Preciso ser encontrado e traido para casa pelo guia espiritual que sai
ao meu encontro.
E hist7ria do Filho Pródigo ) a de um eus que me procura e n#o descansa at) que me
encontre. "le insiste e suplica. "le me pede que dei2e de me apegar a estados de esp$rito que
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levam & morte e me dei2e alcançar por raços que me carregar#o para o lugar onde
encontrarei a vida que mais desejo.
"sta minha e2peri+ncia pessoal da volta do filho mais velho pode oferecer alguma
esperança &s pessoas ca$das no ressentimento que ) o fruto amargo de sua necessidade de
agradar. %uponho que n7s todos um dia teremos que nos haver com o filho mais velho dentro
de n7s. E pergunta diante de n7s ) simplesmente: O que faer para tornar poss$vel essa voltaN
"mora eus venha at) n7s para nos encontrar e nos traer de volta, precisamos admitir n#o
somente estar perdidos, mas tam)m dispostos a ser encontrados e traidos de volta. /omoN
Oviamente n#o somente esperando e sendo passivos. Epesar de que somo incapaes de nos
liertar de nossa raiva contida, podemos dei2ar que eus nos encontre e nos cure por seu
amor, por meio da prática concreta e diária de confiança e gratid#o. /onfiança e gratid#o s#o
as mat)rias para a convers#o do filho mais velho. ", mediante minha e2peri+ncia pessoal
passei a conhec+-las.
JQ
f '%#$1#(.
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%em confiança, n#o posso me dei2ar encontrar. /onfiança ) a convicç#o $ntima de que o
Pai me quer de volta & casa. "nquanto eu duvidar que vale a pena que seja encontrado e me
coloque como menos amado do que meus irm#os e irm#s mais jovens, n#o posso ser
encontrado. 1enho de continuar diendo a mim mesmo: “eus o está procurando. "le irá a
qualquer lugar para encontrá-lo. "le o ama, deseja-o de volta, n#o pode descansar a menos
que voc+ esteja com "le!.
Há uma vo forte, carregada, dentro de mim que proclama o oposto: “eus n#o está
realmente interessando em mim, prefere o pecador arrependido que volta para casa depois de
seus impensados deslies. "le n#o presta atenç#o em mim que nunca dei2ei a casa. "le me
aceita como sou. C#o sou seu filho favorito. C#o espero que me d+ o que realmente desejo!.
Ss vees esta vo tenerosa ) t#o forte que preciso de enorme energia espiritual para
confiar que o Pai me deseja de volta tanto quanto ao filho mais jovem. 6 preciso verdadeira
disciplina para superar minha quei2a crAnica e pensar, falar e agir com a convicç#o de que
estou sendo procurado e serei encontrado. %em tal disciplina, fico preso a um desespero que
dura para sempre.
iendo a mim mesmo que n#o sou suficientemente importante para ser encontrado,
reforço a minha quei2a at) que me torne totalmente surdo & vo que me chama. E qualquer
hora preciso negar essa vo que me leva a rejeitar-me e a afirmar a verdade que eus
certamente quer tanto araçar a mim quanto aos meus ostinados irm#os e irm#s. Para ser
efica, esta confiança tem de ser mais profunda do que a sensaç#o de perda. Kesus confirma a
sua veracidade quando di: “1udo quanto suplicares e pedirdes, crede que receestes, e assim
será para v7s!.JG iver com confiança plena facilitará o caminho para que eus realie o meu
desejo mais profundo.
Rratid#o, entretanto, vai al)m do “meu! e do “teu! e proclama a verdade que a vida )
puro dom. Co passado sempre pensei na gratid#o como uma resposta espont@nea ao tomar
conhecimento dos dons receidos, mas agora compreendi que a gratid#o pode tam)m ser
vivida como uma disciplina. E disciplina da gratid#o ) o esforço e2pl$cito para reconhecer que
tudo o que sou e tenho ) dado a mim como um dom de amor, um dom par ser comemorado
com alegria.
Rratid#o como disciplina envolve uma escolha consciente. Posso ser grato mesmo quando
minhas emoç'es e sentimentos estejam ainda impregnados de mágoa e ressentimento. 6
incr$vel quantas ocasi'es surgem em que posso orar pela gratid#o em ve de lam5rias. Posso
preferir ser agradecido quando sou criticado, mesmo quando meu coraç#o ainda responde
JG
Mc ##%&$.
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O Filho Pródigo
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com amargura. Posso optar por falar de ondade e elea, mesmo quando interiormente
ainda procuro algu)m para acusar ou algo para achar feio. Posso escolher ouvir as voes que
perdoam e olhar os rostos dos que sorriem, mesmo enquanto ainda ouço voes de vingança e
vejo trejeitos de 7dio.
E opç#o pelo agradecimento poucas vees ocorre sem verdadeiro esforço. 3as todas as
vees faço essa opç#o, a pr72ima escolha se torna mais fácil, mais livre, um pouco menos
consciente. Porque cada graça que agradeço se are para outra e mais outra at) que,
finalmente, at) o mais normal, 7vio e aparentemente mundano acontecimento ou encontro
resulta em algo repleto de graça. Há um prov)rio estionano que di: “*uem n#o agradece o
pouco n#o agradecerá o muito!. Etos de reconhecimento faem que a pessoa se torne
agradecida porque, passo a passo, mostram que tudo ) graça.
1anto a confiança como a gratid#o e2ige a coragem de correr risco porque tanto a
desconfiança como o ressentimento, querendo continuar a faer parte do meu modo de ser,
me previnem constantemente contra o perigo de aandonar meus cálculos cuidadosos e
previs'es reservadas. "m muitos pontos tenho que dar um salto na f) de modo a permitir que
a confiança e a gratid#o prevaleçam: para escrever uma carta amiga a algu)m que n#o me
perdoe, dar um telefonema para algu)m que n#o me perdoe, dar um telefonema para algu)m
que me tenha rejeitado, falar uma palavra que aençoe para algu)m que n#o possa faer o
mesmo.
O salto na f) sempre significa amar sem esperar ser amado, dar sem desejar receer,
convidar sem esperar ser convidado, araçar sem esperar ser araçado. ", todas as vees que
dou um salto, sinto um lampejo, daquele que se dirige a mim e me convida para a sua alegria,
a alegria na qual posso n#o somente me encontrar, mas tam)m meus irm#os e irm#s. Essim,
a prática de confiar e agradecer revela o eus que me procura, ardendo no desejo de me livrar
de todos os meus ressentimentos e quei2as e de me faer tomar lugar a seu lado no anquete
celestial.
E volta do filho mais velho está se tornando t#o importante para mim 9uanto L se n#o
mais importante 9ue L a volta do filho mais jovem. /omo será o filho mais velho quando se
liertar de suas quei2as, sua raiva, ressentimentos e ci5mesN Ká que a paráola nada di a
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respeito da resposta do filho mais velho, ficamos com a opç#o de escutar o Pai ou de
permanecer cativos em nossa autorrejeiç#o.
3as mesmo quando reflito sore essa escolha e acredito que a paráola toda foi contada
por Kesus e pintada por Bemrandt para minha convers#o, fica claro para mim que Kesus, que
narrou a hist7ria, ) ele mesmo n#o somente o filho mais jovem, mas tam)m o mais velho. "le
veio para mostrar o amor do Pai e para me liertar dos v$nculos dos meus ressentimentos.
1udo o que Kesus di a respeito de si pr7prio o revela como o (ilho amado, aquele que vive em
plena comunh#o com o Pai. C#o há dist@ncia, medo ou desconfiança entre Kesus e o Pai.
Es palavras do Pai na paráola: “3eu filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que eu
tenho ) teu!, e2pressam o verdadeiro relacionamento de eus Pai com Kesus, seu (ilho. Kesus
constantemente afirma que toda a gl7ria que pertence ao Pai pertence igualmente ao (ilho. JF
1udo o que o Pai realia o (ilho tam)m realia. ;T C#o há separaç#o entre Pai e (ilho: O Pai e
eu somos um0;8 n#o há divis#o de tarefas: “O Pai ama o (ilho e tudo entregou em sua m#o!0 ;=
n#o há competiç#o: “1udo o que ouvi de meu Pai eu vos dei a conhecer!0 ;< n#o há inveja: “O
(ilho, por si mesmo, nada pode faer, mas s7 aquilo que v+ o Pai faer!. ;J Há perfeita uni#o
entre Pai e (ilho. "ssa uni#o se encontra no centro da mensagem de Kesus: “/rede-me: eu
estou no Pai e o Pai em im!. ;; Ecreditar em Kesus significa acreditar que ele ) o enviado do Pai,
aquele no qual e por meio de quem e plenitude do amor de eus ) revelada.;I
4sso ) dramaticamente narrado pelo pr7prio Kesus quando ele conta a paráola dos
lavradores homicidas. O dono da vinha, depois de ter mandado em v#o diversos servos para
receer o seu quinh#o da colheita, decide mandar “seu filho amado!. Os lavradores
reconhecem que ele ) o herdeiro e o matam para ficar com a herança para eles pr7prios. "sse
) o retrato do verdadeiro filho que oedece ao pai, n#o como escravo, mas como o Emado, e
realia o desejo do Pai em perfeita uni#o com ele.
Essim Kesus ) o filho mais velho do Pai. "le ) enviado pelo Pai para revelar o amor
infatigável de eus por todos os seus filhos ressentidos e para se ofertar como o caminho para
casa. Kesus ) o caminho que eus encontra para tornar poss$vel o imposs$vel L permitir que a
lu conquiste as trevas. Bessentimentos e quei2as, por profundas que possam parecer, podem
esvanecer diante da face na qual ) vis$vel a lu plena da (iliaç#o. *uando olho novamente para
o filho mais velho de Bemrandt, compreendo que a fria lu no seu rosto pode se tornar
profunda e cálida L transformando-o completamente L e torna-lo quem na verdade ele ): “O
(ilho Emado sore quem paira a complac+ncia de eus!.
JF
/f. Jo #%#$.
;T
/f. Jo #4%'&.
;8
/f. Jo #S%&&.
;=
Jo '%'(.
;<
Jo #(%#(.
;J
Jo (%#2.
;;
Jo #$%##.
;I
/; Jo (%&$E I%$4E #I%&SE #S%3.
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Henri J. M. Nouwen
parte IIII
II
O PA-
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le esta"a ainda ao longe% 9uando seu pai "iu1o% encheu1se de compaiL<o% correu e lan8ou1
se1lhe ao pesco8o% co!rindo1o de !ei;os... O pai disse aos seus ser"os5 6,de depressa% traDei a
melhor tnica e re"esti1o com ela% ponde1lhe um anel no dedo e sand7lias nos ps. TraDei o
no"ilho ce"ado e matai1oE comamos e feste;amos% pois este meu filho esta"a morto e tornou a
"i"erE esta"a perdido e foi encontradoC:. come8aram a feste;ar.
... sei pai saiu para suplicar1lhe... O pai lhe disse5 6Filho% tu est7s sempre comigo% e tudo o
9ue meu teu. Mas era preciso 9ue feste;7ssemos e nos alegr7ssemos% pois esse teu irm<o
esta"a morto e tornou a "i"erE ele esta"a perdido e foi encontradoC:.
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Q
4e&5randt e o !ai
O que dá & figura paterna pintada por Bemrandt uma força ine2plicável ) que o
essencialmente divino ) contido no essencialmente humano. ejo um velho quase cego, com
igode e ar, vestido num traje ordado a outro, de um vermelho intenso, colocando suas
m#os grandes e espalmadas sore os omros do filho que volta. 4sto ) espec$fico, concreto e
fácil de descrever.
;Q
FitDmer% op. /it.% p. #43$.
;G
,dem% i!idem.
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6 significativo que Bemrandt tenha escolhido um homem quase cego para comunicar o
amor de eus. /ertamente a paráola contada por Kesus e a maneira como foi interpretada no
decorrer dos s)culos constituem a ase para refletir, reproduir com fidelidade, amor
misericordioso de eus. C#o devo, por)m, esquecer que foi a pr7pria hist7ria de Bemrandt
que lhe permitiu e2pressar esse amor de maneira $mpar.
O mesmo cr$tico di: “esde juventude, Bemrandt s7 teve uma vocaç#o: envelhecer!.;F
6 verdade que Bemrandt sempre mostrou grande interesse por pessoas de idade. "le as
desenhou, esoçou-as, pintou-as desde que era jovem e ficou mais e mais fascinado por sua
elea interior. Elguns de seus melhores retratos por sua elea interior. Elguns de seus
melhores retratos s#o de pessoas velhas e os autorretratos com maior força foram feitos nos
seus 5ltimos anos de vida.
epois de muitas tentativas, em casa e no traalho, ele mostra um fasc$nio especial por
pessoas cegas. S medida que a lu em seu traalho reflete o interior, ele começa a pintar
cegos como os que realmente veem. "le ) atra$do por 1oit e por %ime#o, que ) quase cego, e
os pinta diversas vees.
S medida que a pr7pria vida de Bemrandt caminha em direç#o &s somras da velhice, &
medida que seu sucesso declina, e o esplendor de sua vida e2terior diminui, ele vai
descorindo a elea imensa da vida interior. Eli ele descore a lu de uma chama interior que
n#o morre nunca: a chama do amor. E sua arte n#o tenta mais “agarrar, conquistar e conduir
o invis$vel!, mas “transformar o vis$vel na chama do amor que se srcina no coraç#o $mpar do
artista!.IT
"ntendo agora por que Bemrandt n#o seguiu literalmente o te2to da paráola. Cela,
ucas escreve: “"stava ainda longe quando o pai o viu e, movido de compai2#o, corre-lhe ao
encontro, lançou-se-lhe ao pescoço e o eijou!. *uando jovem, Bemrandt havia esoçado,
desenhado essa passagem com todo o seu conte5do dramático, mas, pr72imo da morte,
Bemrandt quis retratar um pai muito sereno que reconhece o filho, n#o com os olhos do
corpo, mas com os do esp$rito, do coraç#o.
Parece que as m#os que pousaram sore as costas do filho que volta s#o instrumentos da
vis#o espiritual do pai. O pai, quase cego, en2erga longe e tem uma vis#o total. %ua vis#o )
eterna, atinge toda a humanidade. 6 uma percepç#o que compreende perdas de homens e
mulheres de todos os tempos, que conhece com imensa compai2#o o sofrimento daqueles que
escolheram aandonar a casa, que choraram rios de lágrimas quando se viram angustiados e
;F
Op. /it.% p. 2.
IT
0en Hughe% citado por )audi9uet% op. /it.
Página 6" de 96
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Henri J. M. Nouwen
em agonia. O coraç#o do pai arde com um desejo enorme de traer os filhos de volta para
casa.
Oh, quanto ele gostaria de falar com eles, de preveni-los contra os in5meros perigos com
que estriam se defrontando, e de convenc+-los de que em casa poderiam encontrar tudo o
que procuram fora. /omo gostaria de tra+-lo de volta com sua autoridade paterna e de
mant+-lo perto, de modo que n#o viessem a sofrer.
3as seuagarrar,
constranger, amor ) empurrar.
muito grande para livres
ei2a-os faer para
qualquer coisa
rejeitar desse
esse amortipo. C#o retriu$-lo.
ou para deve forçar,6
precisamente a imensid#o do amor divino que ) a fonte do seu grande sofrimento. eus,
criador do c)u e da terra, escolheu ser, em primeira inst@ncia e acima de tudo, um Pai.
/omo Pai ele quer que seus filhos sejam livres, livres para amar. "ssa mesma lierdade
lhes dá a possiilidade de dei2ar a casa, “ir a uma regi#o long$nqua!, e perder tudo. O coraç#o
do Pai sae a dor que advirá dessa opç#o, mas seu amor o torna incapa de evita-la. /omo Pai,
ele deseja que aqueles que permanecem em casa goem de sua presença e sintam sua afeiç#o.
3as aqui, novamente, ele deseja que o amor oferecido seja receido livremente. %eu
sofrimento n#o pode ser medido quando seus filhos o amam somente com palavras, enquanto
seus coraç'es permanecem distantes.I8 "le conhece “suas l$nguas enganosas! e “coraç'es
desleais!, I= mas ele n#o pode faer que o amem sem perder sua verdadeira paternidade.
/omo Pai, a 5nica autoridade que ele quer e2ercer ) a da miseric7rdia. "ssa autoridade
adv)m de dei2ar os pecados dos filhos ferirem seu coraç#o. C#o há sentimentos de lu25ria,
coiça, raiva, ressentimento, ci5me, vingança que seus filhos tenham vivenciado que n#o
tenham causado enorme pesar ao seu coraç#o. E dor ) t#o profunda quanto o coraç#o ) puro.
O amor do Pai arange todo o sofrimento humano, encerra toda a humanidade. O toque de
suas m#os, irradiando uma lu divina, deseja somente curar, restaurar a vida.
"ste ) o eus no qual eu quero crer, um Pai que, desde o in$cio da criaç#o, tem estendido
seus raços numa +nç#o compassiva, nunca se impondo a quem quer que seja, sempre
esperando, nunca dei2ando cair seus raços em desespero, sempre aguardando que seus
filhos voltam, de modo que possa lhes dirigir palavras carinhosas e dei2em seus raços
cansados repousar sore os seus omros. %eu 5nico desejo ) aençoar.
"m latim, aençoar ) !enedicere, que significa literalmente dier coisas oas. O Pai deseja
transmitir, mais com seu afago do que com sua vo, coisas oas a seus filhos. "le n#o os quer
punir0 já foram soejamente castigados por todos os seus caprichos. O Pai deseja somente que
saiam que o amor que uscaram das maneiras mais diversas estava, está e estará sempre &
sua espera. O Pai deseja dier, mais com as m#os do que em palavras: “oc+ ) o meu Emado,
I8
/f. Mt #(%3E ,s &2%#'.
I=
/f. >l S3%'I1'S.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
sore voc+ coloco minha +nç#o!. "le ) o pastor, “apascenta ele o seu reanho, com o seu
raço re5ne os cordeiros, carrega-se no seu regaço!.I<
O verdadeiro alvo da pintura de Bemrandt s#o as m#os do Pai. Celas se concentra toda a
humanidade, a elas se dirigem os olhares dos que est#o pr72imos0 nelas a miseric7rdia se
personifica0 nelas há perd#o, reconciliaç#o e cura e, por meio delas, n#o somente o filho
cansado, mas tam)m o pai aatido, encontra repouso. esde o momento em que vi o pAster
no escrit7rio de minha amiga %imone, me senti atra$do por aquelas m#os. C#o entendi em o
porqu+. Eos poucos, com o decorrer dos anos, passei a conhecer aquelas m#os. "las me
sustentaram desde o momento da minha concepç#o, me acolheram no instante do parto, me
puseram junto ao seio de minha m#e, me alimentaram, me agasalharam. Protegeram-me nos
momentos de perigo e me consolaram nas horas de dor. 3uitas vees acenaram com o adeus,
e sempre me receeram de volta. "ssas s#o as m#os de eus. %#o tam)m as m#os de meus
pais, professores, amigos, terapeutas e de todos aqueles que eus colocou no meu caminho
para que eu sentisse aparado.
Pouco depois de Bemrandt ter pintado o Pai e suas m#os endientes, morreu.
Es m#os do artista haviam pintado in5meros rostos e in5meras m#os. Cesta sua ora,
uma das 5ltimas, Bemrandt pintou o semlante e as m#os de eus. *uem teria posado para
este retrato em tamanho naturalN O pr7prio BemrandtN
"ntretanto, aqui n#o ) o rosto de Bemrandt que vemos, mas sua alma, a alma de um pai
que sofreu muitas mortes. urante os seus I< anos, Bemrandt viu morrer n#o s7 sua querida
esposa %asMia, mas tr+s filhos, duas filhas e duas outras mulheres com quem viveu. E tristea
pelo seu querido filho 1ito, que morreu aos =I anos, logo depois de ter se casado, nunca foi
avaliada, mas na figura do pai do Filho Pródigo podemos ver quantas lágrimas terá derramado.
/riado & imagem de eus, Bemrandt descoriu, no decorrer de sua longa e penosa
caminhada, a verdadeira naturea dessa semelhança. 6 a figura do anci#o quase cego,
chorando ai2inho, aençoando o filho muito sofrido. Bemrandt era o filho, tornou-se o pai
e, assim, se preparou para chegar & vida eterna.
I<
,s $4%##.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
G
O !ai a%olhe o ilho de +olta a %asa
le esta"a ainda longe% 9uando seu pai o "iu seu filho mais ;o"emR% encheu1se de compaiL<o%
correu e lan8ou1se1lhe ao pesco8o% co!rindo1o de !ei;os.
... seu pai saiu para suplicar1lhe ao filho mais "elhoR 9ue entrasse.
Pai e &,e
3uitas vees tenho pedido a amigos que me deem a primeira impress#o do Filho Pródigo
de Bemrandt. 4nevitavelmente, eles se referem ao home velho e sáio que perdoa o seu filho:
o patriarca enevolente.
*uanto mais olho para o “patriarca!, mais claro se torna que Bemrandt fiera alguma
coisa em diferente do que dei2ar eus posar como o velho e sáio chefe de fam$lia. 1udo
começou com as m#os. Es duas m#os s#o em diferentes. E m#o esquerda do pai tocando o
omro do filho ) forte e musculosa. Os dedos est#o em aertos e se estendem sore oa
parte do omro e costas do Filho Pródigo. Posso senti uma certa press#o, especialmente no
polegar. E m#o n#o parece somente tocar, mas, com sua força, tam)m sustentar. 3uito
emora haja delicadea na maneira com que o pai com sua m#o esquerda toca o filho, n#o )
sem um firme envolvimento.
/omo ) diferente a m#o direita do pai "sta m#o n#o segura ou agarra. "la ) delicada,
macia e muito meiga. Os dedos est#o juntos e t+m uma certa eleg@ncia. 1oca gentilmente os
omros do filho. "la quer acariciar, afagar e oferecer consolo e conforto. 6 a m#o de uma m#e.
Elguns comentaristas tem sugerido que a m#o esquerda, masculina, ) a pr7pria m#o de
Bemrandt, enquanto a m#o direita, feminina, ) semelhante & m#o de The Jewish )rideI$
pintada no mesmo per$odo. *uero acreditar que isso seja verdade.
1#o logo reconheci a diferença entre as duas m#os do pai, um novo mundo de
compreens#o se ariu para mim. O Pai n#o ) somente um grande patriarca. "le ) igualmente
pai e m#e. "le toca o filho com uma m#o igualmente pai e m#e. "le toca o filho cm uma m#o
IJ
1he KeUish ride% tam!m chamado 4ssac e Beecca% pintado por "olta de #I33% 0i;Gsmuseum% Amsterdam.
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O Filho Pródigo
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masculina e uma feminina. "le segura, ela acaricia. "le confirma, ela consola. "le ),
certamente, eus em quem o masculino e o feminino, a paternidade e a maternidade, est#o
totalmente presentes. Equela m#o direita carinhosa fa ecoarem em mim as palavras do
profeta 4sa$as: “Por acaso uma mulher se esquecerá da sua criancinha de peitoN C#o se
compadecerá ela do filho do seu ventreN Einda que as mulheres se esquecessem, eu n#o me
esquecera de t. "is que te gravei nas palmas das minhas m#os!.I;
3eu amigo Bichard Zhite me mostrou que a m#o do pai acariciante e feminina está em
paralelo com o p) ferido e descalço do filho, enquanto a m#o forte masculina corresponde ao
p) calçado na sandália. %eria demais pensar que uma das m#os protege o filho no seu aspecto
vulnerável, enquanto a outra reforça o seu vigor e aspiraç#o de ir adiante na vidaN
Há depois o amplo manto vermelho. /om sua cor quente e sua forma arcada, oferece um
lugar de arigo onde ) om estar. "m princ$pio, o manto corindo o corpo curvado do pai
pareceuTme uma arraca convidando o viajante cansado a encontrar algum repouso. 3as
continuando a fitar o manto vermelho, outra imagem, mais forte do que a da tenda, veio &
minha mente: as asas protetoras do pássaro f+mea. emraram-me das palavras de Kesus
sore o maternal amor de eus: “Kerusal)m, Kerusal)m... quantas vees quis eu ajuntar os teus
filhos, como a galinha recolhe os seus pintinhos deai2o das suas asas, e n#o o quiseste!.II
ia e noite eus me mant)m protegido como uma galinha protege seus pintinhos deai2o
de suas asas. 3ais do que a imagem de uma tenda, a figura das asas de uma m#e vigilante
representa a segurança que eus oferece aos seus filhos. "2primem cuidado, proteç#o, um
lugar para repousar e se sentir a salvo.
/ada ve que olho para o manto da pintura de Bemrandt visualio esses aspectos de
tenda ou de asas protetoras0 perceo a caracter$stica do amor maternal de eus e meu
coraç#o começa a cantar com palavras inspiradoras pelo salmista:
" assim, so a imagem de um velho patriarca judeu, surge tam)m um eus maternal
acolhendo
Bemrandt,seu filho de sore
deruçado volta aseu
casa. *uando
filho olhoe tocando
que volta agora novamente paracom
seus omros o velho pintado
suas m#os, por
passo
a ver n#o s7 um pai que aperta seu filho nos raços, mas tam)m uma m#e que acaricia seu
filho, envolve-o com o calor do seu corpo, e segura-o contra o ventre do qual ele proveio.
I;
,s $2%#(1#I.
II
Mt &'%'S1'3.
IQ
>l 2#%#1$.
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O Filho Pródigo
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Essim, a “volta do filho pr7digo! se torna a volta ao seio de eus, o retorno &s srcens do ser e
novamente fa ecoar a e2ortaç#o de Kesus a Cicodemos para renascer do alto.
Egora entendo melhor a grande pa deste retrato de eus. C#o há sentimentalismo aqui,
nem romantismo, nem um simples conto com um final feli. O que vejo aqui ) eus como
m#e, acolhendo de volta no seu ventre aquele que foi criado & sua semelhança. Os olhos quase
cegos, as m#os, o manto, o corpo curvado, todos evocam o amor maternal de eus, marcado
por pesar, desejo, esperança e interminável e2pectativa.
o mist)rio na verdade ) que eus, na sua infinita compai2#o, uniu-se por toda a
eternidade com a vida de seus filhos. “"la! escolheu livremente se tornar dependente de suas
criaturas, a quem outorgou lierdade. "ssa escolha lhe causa pena quando eles partem0 essa
escolha lhe tra alegria quando eles retornam. 3as a sua alegria n#o será completa at) que
todos aqueles que “dela! tenham nascido tenham regressado a casa e se reunido ao redor da
mesa preparada para eles.
" isso inclui o filho mais velho. Bemrandt o coloca & dist@ncia, fora da proteç#o do manto
esvoaçante, & margem do c$rculo de lu. O dilema do filho mais velho ) aceitar ou rejeitar que
o amor de seu pai está acima de comparaç'es0 ousar ser amado como seu pai almeja amá-lo
ou insistir em ser amado como ele acha que deveria ser amado. O pai sae que a escolha deve
ser do filho, mesmo enquanto ele espera com as m#os estendidas. %erá que o filho mais velho
estará disposto a se ajoelhar e ser tocado pelas m#os que tocam seu irm#o mais jovemN %erá
ele capa de ser perdoado e de sentir a presença curadora do pai que o ama sem termo de
comparaç#oN E hist7ria de ucas dei2a claro que o pai vai em direç#o a amos os filhos. C#o s7
ele ocorre para dar as oas-vindas ao filho mais jovem, reelde,mas tam)m vem ao encontro
do mais velho, eloso, quando ele volta dos campos se perguntando qual o motivo da m5sica e
dança e lhe pede que entre.
"ntender o sentido pleno do que está acontecendo aqui ) muito importante para mm.
"mora o pai esteja realmente cheio de alegria pela volta do filho mais jovem, ele n#o se
esqueceu do mais velho. "le desconhece areaç#o do filho mais velho. E sua alegria era t#o
intensa que ele n#o poderia esperar para dar in$cio & comemoraç#o, mas t#o logo ficou ciente
da chegada do seu filho mais velho, saiu da festa, foi ao seu encontro e suplicou-lhe que se
unisse a eles.
Co seu ci5me e amargura, o filho mais velho pode somente ver que o seu irm#o
responsável está receendo mais atenç#o do que ele e conclui que ele ) o menos amado dos
dois. O coraç#o do pai, entretanto, n#o está dividido em mais ou menos. E resposta
espont@nea e livre & volta do seu filho mais jovem n#o encerra nenhuma comparaç#o com o
filho mais velho. Eo contrário, ele deseja ardentemente que seu filho mais velho participe de
sua alegria.
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O Filho Pródigo
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Para mm n#o ) fácil ter essa compreens#o. Cum mundo que constantemente compara as
pessoas, classificando-as em mais ou menos inteligentes, mais ou menos atraentes, mais ou
menos em-sucedidas, n#o ) fácil acreditar num amor que n#o fa o mesmo. *uando vejo
algu)m ser elogiado ) dif$cil n#o me achar menos merecedor de elogios0 quando leio a
respeito da generosidade e da ondade de outras pessoas, ) dif$cil n#o inquirir se eu mesmo
sou t#o generoso e enevolente quanto eles0 e quando vejo trof)us, recompensas e pr+mios
sendo entregues a pessoas notáveis, n#o posso dei2ar de me perguntar por que isso n#o
aconteceu comigo.
O mundo em que cresci ) um mundo t#o cheio de graduaç'es, marcas e estat$sticas que,
consciente ou inconscientemente, procuro sempre encontrar a minha medida em relaç#o a
outros. 3uita tristea e alegria na minha vida adv)m do meu comparar, e muito, se n#o tudo,
deste comparar ) in5til, representando enorme perda de tempo r energia.
Cosso eus, que ) tanto Pai como 3#e para n7s, n#o compara nunca. Epesar de que na
minha caeça seque isto ) verdade, ) anda muito dif$cil que eu aceite por completo, e com
todo o meu ser, esse racioc$nio. *uando ouço algu)m ser chamado de filho ou filha preferida,
minha resposta imediata ) que as outras crianças devem ser menos queridas, ou menos
amadas. C#o posso imaginar como todos os filhos de eus possam ser favoritos. ", entretanto,
o s#o. *uando, do meu lugar no mundo, olho para o reino de eus, depressa começo a pensar
em eus como o responsável por um grande placar celestial e fico sempre com medo de n#o
conseguir classificaç#o. 3as quando, da casa acolhedora de eus, olho para o mundo,
descuro quecaráter
mulheres seu eus ama
$mparcom
sem amor
jamaisdivino, um amor que confere a todos os homens e
comparar.
O irm#o mais velho se compara com o irm#o mais jovem e fica com ci5mes. 3as o pai
ama tanto a amos que jamais lhe ocorreu atrasar a festa para impedir que o filho mais velho
se sentisse rejeitado. "stou convencido de que muitos dos meus prolemas emocionais se
derreteram como neve ao sol se eu pudesse dei2ar que a verdade do amor maternal de eus,
que n#o fa comparaç'es, penetrasse em meu coraç#o.
(ica claro como isso ) dif$cil quando reflito sore a paráola dos traalhadores da vinha.IG
/ada ve que eu leio essa paráola na qual o dono da vinha recompensa da mesma na era os
que traalharam uma hora somente e os que fieram “um traalho pesado ao calor do sol!,
um sentimento de irritaç#o ainda rota dentro de mim.
Por que o dono da vinha n#o pagou em primeiro lugar aqueles que traalharam muitas
horas e depoisos
paga primeiro surpreendeu os retardatários
traalhadores da und)cima com
hora,sua generosidadeN
criando Por que, ao
falsas e2pectativas contrário,
para elee
os outros
despertando amargura e ci5mes desnecessáriosN "stas perguntas, agora compreendo, veem
de uma e2pectativa que quer que a administraç#o do que ) temporal prevaleça sore a ordem
incomparável do que ) divino.
IG
Mt &4%#1#I.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
C#o havia antes me ocorrido que o dono da vinha poderia desejar que os traalhadores
das primeiras horas pudessem se regoijar com a generosidade dispensada aos que vieram
mais tarde. Cunca me passou pela caeça que ele possa ter agido supondo que aqueles que
haviam traalhado todo o dia na vinha ficaram muito agradecidos por terem tido a
oportunidade de traalhar para o seu patr#o e anda mais por reconhecerem como ele ) uma
pessoa generosa. 6 preciso que haja uma $ntima reviravolta para aceitar esse modo de pensar
sento de comparaç'es. 3as essa ) a maneira de pensar de eus. eus olha para o seu povo
como uma fam$lia cujos memros se satisfaem verificando que aqueles que fieram em
pouco s#o t#o amados quanto os que muito realiaram.
eus ) t#o ing+nuo a ponto de pensar que haveria grande regoijo quando todos os que
passaram um tempo em sua vinha, fosse por um per$odo curto ou longo, receessem a mesma
atenç#o. Ca verdade, ele foi t#o ing+nuo que presume que estariam t#o felies em sua
presença que nem sequer lhes ocorrera estarem se comparando. 6 por isso que fala com a
perple2idade e um amante incompreendido: “Por que teriam voc+s inveja diante de minha
generosidadeN!. "le poderia ter dito: “oc+s estiveram comigo todo o dia, e eu lhes de tudo o
que pediram Por que est#o t#o amargos!. 6 o mesmo espanto que vem do coraç#o do pai
quando ele di ao seu filho ciumento: “3eu filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que ) meu
) teu!.
Equi se situa escondido o grande apelo para a convers#o: contemplar n#o com os olhos
da minha pr7pria autoestima, diminu$da, mas com os olhos do amor de eus. "nquanto eu
ficar olhando
ao menor paran#o
custo, eus comosen#o
posso o senhor da vinha,
me tornar como o pai
ciumento, que quer
amargo e2igir de em
e ressentido mimrelaç#o
o má2imo
aos
meus irm#os e irm#s. 3as se for capa de olhar o mundo com os olhos do amor de eus e
descorir que a vis#o de eus n#o ) a de um estereotipo proprietário de terras ou de um
patriarca, mas sim a de um pai todo dádiva e todo miseric7rdia, que como se comportam, vejo
ent#o em depressa que a minha 5nica e verdadeira resposta s7 pode ser de profunda
gratid#o.IF
O %ora,o de <eus
C#o há d5vida na paráola ou na pintura, sore o coraç#o do pai. %eu coraç#o se volta
para seus dois filhos, ele ama a amos0 ele espera v+-los como irm#os ao redor da mesa0 ele
IF
Muito desta minha compreens<o da par7!ola dos tra!alhadores da "inha de"o ao estudo muito como"edor de Heinrich
>paemann% ,n des iefern des ie!e% ine Menschheitspara!el uGas #(% ##1#'R. ,n5 +as PrinDip ie!e. Frei!urg im )reisgar. Herder%
#23I. PP. 2(1#&4.
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quer que compreendam que, emora t#o diferentes, pertencem & mesma fam$lia e s#o filhos
do mesmo pai.
*uando me conscientio de tudo isso, vejo como a hist7ria do pai e seus filhos perdidos
ratifica enfaticamente que n#o fui eu que escolhi eus, mas eus que primeiro me escolheu.
"sse ) o grande mist)rio da nossa f). C#o escolhemos eus, mas eus nos escolhe. esde toda
a eternidade estamos escondidos “nas somras das m#os de eus! e “gravados nas palmas de
suas m#os!.QT Entes que qualquer ser humano nos toque, eus “nos fa em segredo! e “nos
Q8
tece! nas profundeas da terra,Q=e antes que qualquer ser humano Q<decida a nosso respeito,
eus “nos tece no seio materno!. eus nos ama com um “primeiro! amor, amor ilimitado e
incondicional0 quer que sejamos seus filhos amados e nos pede que nos tornemos t#o capaes
de amar quanto ele pr7prio.
urante a maior parte da minha vida lutei para encontrar eus, para conhecer eus e
amar eus. utei para seguir as diretries da vida espiritual L rear sempre, servir aos outros,
ler as escrituras L e para evitar as muitas tentaç'es que me levariam & intemperança. (alhei
muitas vees, mas sempre recomecei, mesmo quando estava perto do desespero.
Egora imagino se avaliei em que durante todo esse tempo eus tem estado & minha
procura, para me conhecer e me amar. E pergunta n#o ) “/omo posso encontrar eusN, mas
“/omo me dei2ar conhecer por eusN!. ", finalmente, a indagaç#o n#o ) “/omo devo amar a
eusN!, mas “/omo devo me dei2ar amar por eusN!. eus está olhando & dist@ncia,
procurando por mim, tentando me encontrar e desejando me traer para casa. "m todas as
tr+s paráolas que Kesus narra em resposta & quest#o por que ele come com os pecadores, ele
p'e +nfase na iniciativa divina. eus ) o pastor que vai & procura das ovelhas perdidas. eus )
a mulher que acende uma l@mpada, varre a casa e procura em todo lugar pela moeda perdida
at) que a encontre. eus ) o pai que vigia os filhos e espera por eles, corre ao seu encontro,
araça-os, insiste com eles, pede e suplica que venham para casa.
Pode parecer estranho, mas eus deseja tanto me encontrar, ou mais, do que eu a "le.
%im, eus precisa de mm tanto quanto eu preciso dele. eus n#o ) o patriarca que fica em
casa, n#o se altera, e espera que seus filhos venham a ele, desculpem-se por seu
comportamento anormal, peçam para ser perdoados e prometam se emendar. Eo contrário,
ele dei2a a casa e, n#o levando em consideraç#o a sua dignidade, corre ao encontro deles,
ignorando desculpas ou promessas de mudança e os tra & mesa astante provida que os
espera.
QT
,s $2%&1#I.
Q8
>l #'2%#(.
Q=
>l #'2%#'.
Q<
/f. #Jo $%#21&4.
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eu vir o meu eu perdido atrav)s dos olhos de eus e descorir a alegria do %enhor com a
minha volta para casa, a$ ent#o minha vida pode se tornar menos angustiada e mais confiante.
C#o seria om acrescer a alegria de eus, dei2ando que "le me encontre, carregue-se
para casa e celere com os anjos a minha voltaN C#o seria maravilhoso faer eus sorrir por
lhe dar a chance de me encontrar e me amar perdidamenteN Perguntas como estas levantam
uma quest#o: a do conceito que faço de mim mesmo. Posso aceitar que valha a pena que eu
seja procuradoN Ecredito que haja, da parte de eus, um desejo verdadeiro de simplesmente
estar comigoN
Equi está a ess+ncia da minha luta espiritual: a luta contra a autorrejeiç#o, despreo e
avers#o. 6 um comate ferrenho porque o mundo e seus demAnios conspiram para que eu me
considere sem valor, incapa e insignificante. 3uitas das economias consumistas sorevivem
manipulando a ai2a autoestima de seus usuários e criando, por meio de recursos mat)rias,
e2pectativas do esp$rito. esde que eu permaneça !por ai2o!, posso facilmente ser tentado a
comparar coisas, conhecer pessoas ou r a lugares que prometam uma mudança radical no meu
pr7prio conceito, mesmo que na realidade n#o levem a tal resultado. 3as todas as vees que
concordar em ser assim manipulado ou seduido terei ainda mais motivos para me reai2ar e
para me sentir como a criança rejeitada.
Por muito tempo achei que era uma esp)cie de virtude ter ai2a autoestima. (ui tantas
vees prevenido contra o orgulho e presunç#o que acae achando que era om me depreciar.
3as agora compreendo que o verdadeiro pecado ) negar o amor primeiro de eus por mim e
ignorar a ondade srcinal. Porque, sem reivindicar esse primeiro amor e essa ondade
srcinal, perco contato com o meu verdadeiro eu e enveredo, entre pessoas e lugares errados,
numa usca destrutiva pelo que s7 pode ser achado na casa de meu Pai.
C#o penso estar soinho nesta luta querendo faer jus ao primeiro amor de eus e &
virtude fundamental. eai2o de muita afirmaç#o, competitividade e rivalidade humanas0
deai2o de muita confiança e at) arrog@ncia, há muitas vees um coraç#o muito inseguro,
muito menos confiante em s mesmo do que o comportamento e2terior fará acreditar. 3uitas
vees fiquei chocado descorindo que homens e mulheres com talentos indiscut$veis e com
pr+mios por suas realiaç'es t+m tantas d5vidas sore sua pr7pria virtude. "m ve de
reconhecer no sucesso alcançado um sinal de sua elea interior, usam-no para acoertar um
senso pessoal de falta de m)rito. C#o poucos me disseram: “%e as pessoas souessem o que
vai no meu $ntimo, poriam fim aos seus aplausos e louvor!.
emro-me claramente de ter conversado com um jovem amado e admirado por todos os
que o conheciam. /ontou-me como uma pequena cr$tica de que modo um dos seus amigos o
atirara num aismo de depress#o. *uando falava, lágrimas rolavam dos seus olhos e seu corpo
se contorcia em ang5stia. "le sentia que seu amigo atravessara o muro de suas defesas e o
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O Filho Pródigo
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en2ergava como ele realmente era: um hip7crita vil, um homem despre$vel deai2o de uma
armadura cintilante. *uando ouvi a sua hist7ria compreendi como ele levava uma vida infeli,
muito emora as pessoas & sua volta o invejassem pelos seus dons. por anos ele havia
caminhado por a$ com as perguntas secretas: “%erá que algu)m realmente me amaN %erá que
algu)m realmente se importa comigoN!. " cada ve que suia um pouco mais alto na escada
do sucesso, pensava: “"ste n#o ) realmente quem sou0 um da tudo vira água aai2o e as
pessoas ver#o que n#o presto!.
"sse encontro ilustra como muitas pessoas vivem a sua vida L nunca confiando
plenamente que sejam amados como s#o. 3uitos t+m hist7rias terr$veis que fornecem ra'es
plaus$veis para sua ai2a autoestima0 hist7rias de pais que n#o lhes davam o que precisavam0
de professores que os maltratavam0 de amigos que os tra$am e de uma 4greja que os dei2ou do
lado de fora, no frio, num momento cr$tico de sua vida.
E paráola do Filho Pródigo ) uma hist7ria que fala de um amor que e2istiu antes que
qualquer rejeiç#o fosse poss$vel e permanecerá depois que todas as rejeiç'es tenham e2istido.
6 o primeiro e o eterno amor de um eus que ) Pai e 3#e. 6 a fonte de todo o amor humano
verdadeiro, mesmo o mais limitado.
E vida toda de Kesus e sua pregaç#o tiveram somente um ojetivo: revelar esse amor de
eus, ine2tingu$vel, ilimitado, maternal e paternal, e mostrar o caminho para que este amor
guie todas as fraç'es de nossas vidas diárias. "m sua pintura, retratando o Pai, Bemrandt
oferece-me um lampejo desse amor. 6 o amor que sempre acolhe de volta e deseja
comemorar.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
F
O !ai ;uer %o&e&orar
O pai disse aos ser"os5 6,de depressa% traDei a melhor tnica e re"esti1o com ela% ponde1lhe um
anel no dedo e sand7lias nos ps. TraDe o no"ilho ce"ado e matai1oE comamos e feste;emos%
pois este meu filho esta"a morto e tornou a "i"erE esta"a perdido e foi encontradoC:.
come8aram a feste;ar.
<ando o &elhor
6 evidente que o filho mais jovem n#o está voltando a uma simples fam$lia de faendeiros.
ucas descreve o pai como um homem muito rico com vastas propriedades e muitos
empregados. Para corresponder a essa descriç#o, Bemrandt veste-o ricamente, e aos dois
homens que o oservam. Es duas mulheres mais ao fundo se apoiam num arco que mais
parece faer parte de um palácio do que de uma faenda. E vestimenta lu2uosa do pai e a
apar+ncia pr7spera dos que o circundam postam-se em flagrante contraste ao longo
sofrimento t#o vis$vel nos olhos quase cegos, sua face entristecida e sua figura curvada.
O mesmo eus que sofre por causa do imenso amor pelos seus filhos ) o eus que ) rico
em ondade e miseric7rdiaQJ e que quer revelar a seus filhos a riquea de sua gl7ria. Q; O pai
nem dá a seus filhos a oportunidade de se desculparem. "le se antecipa &s s5plicas de seus
filhos, pondo-as de lado e, espontaneamente, concedendo-lhes perd#o0 essas s5plicas para ele
s#o irrelevantes em face do regoijo pela sua volta. C#o somente o pai perdoa sem faer
perguntas e alegremente acolhe seu filho perdido de volta & casa, mas n#o pode esperar para
lhe dar vida nova, vida em aund@ncia. QI 1#o fortemente eus deseja dar vida a seu filho que
volta que parece quase impaciente. Cada ) suficientemente om. O melhor precisa ser-lhe
dado. "mora o filho esteja preparado para ser tratado como um serviçal contratado, o pai
pede o manto reservado a um h7spede ilustre e, emora o filho n#o mais se ache digno de
assim ser chamado, o pai lhe dá o anel para o dedo e as sandálias para os p)s para honrá-lo
como seu filho amado e novamente devolver-lhe a posiç#o de herdeiro.
emro-me nitidamente das roupas que use durante o ver#o depois de terminar a escola
secundária. 3inhas calças rancas, cinto largo, camisa colorida e sapatos luidos: tudo
QJ
/f. 0m &%$ e f &%$.
Q;
0m 2%&'.
QI
Jo #4%#4.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
demonstrava como eu me sentia em comigo mesmo. 3eus pais estavam contentes por poder
comprar essas roupas novas para mim e se mostravam muito orgulhosos do seu filho. "u me
sentia grato sendo seu filho. emro-me soretudo de me sentir muito em usando sapatos
novos. esde ent#o tenho viajado muito e verificado como as pessoas passam a vida
descalças. Egora entendo ainda melhor o significado sim7lico de possuir calçados. P)s
descalços falam de porea e muitas vees de escravid#o. /alçados s#o para os ricos e
poderosos, oferecem proteç#o contra coras, d#o força e segurança. 1ransformam os
perseguidos em perseguidores. Para muitos pores, ter calçados ) um sinAnimo de status. ?m
antigo “spiritual! afro-americano e2prime isso muito em: “1odos os filhos de eus t+m,
sapatos. *uando eu for para o c)u vou calçar meus sapatos0 vou andar por todo o /)u de
eus!.QQ
O Pai veste seu filho com todos os sinais de lierdade, a lierdade dos filhos de eus. "le
n#o quer que sejam servos ou escravos. "le deseja que usem o manto da honra, o anel do
herdeiro e o calçado que o prestigia. 6 como uma vestimenta pela qual o ano da graça de eus
) inaugurado. O verdadeiro sentido dessas vestimentas e dessa inauguraç#o ) compreendido
na quarta vis#o do profeta ^acarias:
"le me fe ver Kosu), sumo sacerdote, que estava de p) diante do Enjo de
4ahUeh... Kosu) estava vestido com roupas sujas, enquanto estava de p) diante
do anjo. " ele falou aos que estavam de p) diante dele: “1irai-lhe as vestes
sujas e vesti-o com vestes lu2uosas0 colocai em sua caeça um turante
limpo!.
limpas. /olocaram
O Enjo de um turante
4ahUeh limpo
estava ememp),sua caeça
e lhe e o“+
disse: vestiram
1ireicom
de troupas
a tua
iniquidade!. " o Enjo de 4ahUeh declarou solenemente a Kosu): “Essim disse
4ahUeh dos "2)rcitos: \%e andares pelos meus caminhos e guardares os meus
preceitos, ent#o tu governarás e guardares os meus preceitos, ent#o tu
governarás a minha gente e administrarás a minha morada e eu te darei acesso
entre os que est#o aqui em p)... Ouve, pois, Kosu), sumo sacerdote... "u
afastarei a iniquidade desta terra em um 5nico dia.l Caquele dia... convidar-
vos-eis uns aos outros deai2o da vinha e deai2o da figueiraV!.QG
*uando leio a hist7ria do filho pr7digo tendo em mente essa vis#o do profeta ^acarias, a
palavras “depressa! com a qual o pai e2orta seus criados a traer o manto, anel, sandálias para
seu filho denota muito mais do que impaci+ncia humana. Bevela a ansiedade de eus para
inaugurar o novo reino que foi preparado desde o in$cio dos tempos.
C#o há d5vida de que o pai deseja uma festa suntuosa. 3atar o novilho que havia sido
cevado para uma ocasi#o especial mostra quanto o pai desejava retirar todos os impedimentos
e oferecer ao filho uma celeraç#o como nunca antes tinha havido. 6 7via sua esfuiante
alegria. epois de ter dado instruç'es para que tudo ficasse pronto, ele e2clama: “amos
QQ
All ods /hillum ot ings. ,n5 The ,nterpreterWs )i!le. N. orG Nash"ille% A!ingdon Press% #2(&. ". 3% p. &&S
QG
Xc '%#1#4.
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celerar faendo uma festa, porque este meu filho estava morto e voltou & vida0 estava
perdido e foi encontrado!, e imediatamente começam a comemorar. Há aund@ncia de
comida, m5sica e danças, e os ru$dos alegres de um festejo podem ser ouvidos em longe de
casa.
Edmito que n#o estou haituado & imagem de eus dando uma enorme festa. Parece em
desacordo com a imagem s)ria e solene que sempre tive de eus. 3as quando penso nas
diversas maneiras usadas por Kesus para descrever o Beino de eus, encontro sempre, no
centro, um anquete festivo. Kesus di: “3as eu vos digo que vir#o muitos do oriente e do
ocidente e se assentar#o & mesa no Beino dos /)usQF, com Era#o, 4saac e Kaco!. " ele
comprara o Beino dos /)us com uma festa de casamento oferecida pelo rei ao seu filho. Os
servos do rei saem para convidar as pessoas diendo: “"is que preparei meu anquete, meus
touros e cevados já foram degolados e tudo está pronto. inde &s n5pcias!. GT 3as muitos n#o
estavam interessados. "stavam muito ocupados com seus pr7prios afaeres.
/omo na paráola do (ilho Pr7digo, Kesus e2prime aqui o desejo de seu Pai de oferecer a
seus filhos um anquete e a sua preocupaç#o em realia-lo mesmo quando aqueles que est#o
convidados se recusarem a comparecer. "sse convite para uma refeiç#o ) um convite para
uma intimidade com eus. 4sso fica em claro na _ltima /eia, um pouco antes da morte de
Kesus. E$ ele di aos seus disc$pulos: “esde agora n#o eerei deste G8 fruto da videira at)
aquele dia em que convosco eerei o vinho novo no Beino do meu Pai!. " no final do Covo
1estamento a vit7ria definitiva de eus ) descrita como uma linda festa de casamento.
“Porque o %enhor, o eus todo-poderoso passou a reinar Elegremo-nos e e2ultemos, demos
gl7ria a eus, porque est#o para realiar-se as n5pcias do /ordeiro... felies aqueles que foram
convidados para anquete das n5pcias do /ordeiro!.G=
E comemoraç#o fa parte do Beino de eus. eus n#o s7 oferece perd#o, reconciliaç#o e
cura, como deseja que aqueles a quem esses dons s#o conferidos os receam como uma fonte
de alegria. "m todas as tr+s paráolas narradas por Kesus para e2plicar porque ele come com
os pecadores, eus se rejuila e convida outros para que com ele se rejuilem. “Elegrai-vos
comigo!, di o Pastor, “achei a ovelha que estava perdida!. “Elegrai-vos comigo!, di a mulher,
“achei a dracma que estava perdida!. “Elegrai-vos comigo!, di o pai, “este meu feilho estava
perdido e foi encontrado!.
QF
Mt 3%##.
GT
Mt &&%$.
G8
Mt &I%&2.
G=
Ap #2%I12.
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O Filho Pródigo
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1odas essas voes s#o as voes de eus. eus n#o deseja guardar para si mesmo sua
alegria. eseja que todos dela participem. E alegria de eus ) a dos anjos e dos santos0 ) a
alegria de todos os que pertencem ao Beino.
Bemrandt retrata o momento da volta do filho mais jovem. O filho mais velho e os
outros tr+s memros da fam$lia paterna se mant+m & dist@ncia. %erá que compreender#o a
alegria do paiN ei2ar#o que ele o araceN " euN %er#o eles capaes de dei2ar de lado suas
recriminaç'es e participar da comemoraç#oN " euN
Bepito novamente: (ar#o issoN " euN 6 uma pergunta importante porque se refere, por
estranho que pareça, & minha reaç#o contrária a viver uma vida com alegria.
eus se rejuila. C#o porque os prolemas do mundo tenham sido resolvidos, n#o porque
toda a dor e sofrimento humanos tenham chegado ao fim, nem porque milhares de pessoas
tenham se convertido e estejam no momento louvando-o por sua ondade. C#o, eus se
rejuila porque um dos seus filhos que estava perdido foi encontrado. 6 dessa alegria que sou
chamado a compartilhar. 6 a alegria de eus, n#o a alegria que o mundo oferece. 6 a alegria
que decorre de ver uma criança voltar a casa no meio de toda a destruiç#o, devastaç#o e
sofrimento do mundo. 6 uma alegria secreta, t#o inconsp$cua como o tocador de flauta
pintado por Bemrandt na parede acima da caeça daquele que, sentado, oserva.
C#o estou acostumado a e2ultar por coisas pequenas, secretas e que as pessoas & minha
volta pouco distinguem. "stou em geral pronto e preparado para receer más not$cias, para ler
sore guerra, viol+ncia e crimes, e para presenciar conflitos e desordens. "spero sempre que
meus visitantes falem de seus prolemas e mágoas, seus reveses e desapontamentos, suas
depress'es e ang5stias. e certo modo me acostumei a viver com a tristea e assim perdi a
capacidade de reconhecer a alegria e ouvidos para ouvir o contentamento que pertence a
eus e que ) encontrado nos cantos secretos do mundo.
1enho um amigo que ) t#o profundamente ligado a eus que ele pode ver alegria onde
perceo somente tristea. "le viaja muito e encontra um sem-n5mero de pessoas. *uando
retorna, espero sempre que me fale da situaç#o econAmica dif$cil dos pa$ses que visitou, das
grandes injustiças de que tomou conhecimento e do sofrimento que testemunhou. 3as
mesmo estando consciente da grande agitaç#o em que o mundo se encontra, raramente
menciona o fato. *uando partilha as suas e2peri+ncias, fala das alegrias ocultas que descoriu.
(ala de um homem, uma mulher ou uma criança que lhe trou2eram esperança e pa. (ala de
pequenos grupos de pessoas que s#o leais umas &s outras no meio de toda perturaç#o. (ala
das pequenas maravilhas de eus. Ss vees me dou conta de que estou desapontado porque
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O Filho Pródigo
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quero ouvir “not$cias de jornais!, hist7rias e2citantes e divertidas que podem ser comentadas
entre amigos. 3as ele nunca responde & minha necessidade de sensacionalismo. /ontinua
diendo: “i algo muito pequeno e muito elo, algo que me deu muita alegria!.
O pai do filho pr7digo se entrega totalmente & satisfaç#o que lhe tra o filho que retorna.
1enho de assimilar esse ensinamento. 1enho de aprender a me “apoderar! de toda verdadeira
alegria que há para asorv+-la e apresenta-la para que outros a vejam. %im, eu sei que nem
todo mundo se converteu, que ainda n#o há pa em todo lugar, que nem toda dor foi
suprimida, mas, ainda assim, vejo pessoas voltando e retornando a casa0 ouço voes que oram0
reparo em momentos de perd#o e presencio muitos sinais de esperança. C#o tenho que
esperar at) que tudo esteja em, mas posso festejar cada pequena refer+ncia ao Beino que
está pr72imo.
"sta ) uma verdadeira disciplina. "2ige escolhe a lu mesmo quando há muita escurid#o
para me assustar, optar pela vida mesmo, quando as forças da morte s#o t#o vis$veis e eleger a
verdade mesmo quando estou rodeado por mentiras. %ou tentado a ficar t#o impressionado
pela tristea 7via da condiç#o humana que n#o reconheço mais a alegria que se manifesta de
diversas maneiras, singelas, mas verdadeiras. E recompensa por escolher a alegria ) a alegria
mesmo. iver entre pessoas com defici+ncia mental me convenceu disso. Há tanta rejeiç#o,
dor e mágoa entre n7s, mas, uma ve que voc+ procura encontrar a alegria escondida no meio
de todo sofrimento, a vida se transforma em celeraç#o. E alegria nunca anula a tristea, no
entanto transforma-a num solo f)rtil para mais alegria.
*uem sae se o mundo está sendo salvo da destruiç#o porque uma, duas ou tr+s pessoas
permaneceram em oraç#o enquanto o resto da humanidade perdeu a esperança e se
desintegrouN
%e esse ) o caminho de eus, ent#o sinto o desafio de aandonar todas as voes de ru$na
e condenaç#o que me levam & depress#o e permitir &s pequenas alegrias revelar a verdade
sore o mundo em que vivo. *uando Kesus fala do mundo, ele ) em realista. "le fala sore
guerras e revoluç'es, terremotos, pestes e escasse, perseguiç#o e encarceramento, traiç'es,
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7dio e assassinatos. C#o há asolutamente ind$cio de que todos estes sinais da negrura do
mundo estejam jamais ausentes. 3as, ainda assim, no meio de tudo isso a alegria de eus
pode ser nossa. 6 o contentamento de pertencer & casa de eus cujo amor ) mais forte do que
a morte e que nos capacita a viver no mundo emora já pertencendo ao reinado da alegria.
"ste ) o segredo da alegria dos santos. e santo Ent#o do deserto a s#o (rancisco de
Essis, ao irm#o Boger %chult de 1ai), E 3adre 1eresa de /alcutá, a alegria tem sido a marca
do povo de eus. E alegria pode ser vista os rostos das mais simples pessoas, pores e muitas
vees sofredoras, que vivem hoje dentro de grande convulsa social e econAmica, mas que já
podem ouvir a m5sica e dançar na cada do Pai. "u, de minha parte, vejo esta felicidade no
rosto das pessoas deficientes mentais de minha oportunidade. 1odos estes homens e
mulheres santos, n#o importa se viveram há muito tempo ou pertencem & nossa )poca,
podem reconhecer as muitas pequenas voltas que ocorrem diariamente e se alegrar com o Pai.
e certo modo eles penetram o verdadeiro sentido da verdadeira alegria.
Para mim ) interessante verificar todos os dias a diferença radical entre ceticismo e
alegria. Os c)ticos procuram as trevas aonde quer que se dirijam. %empre apontam para
perigos iminentes, motivos oscenos e esquemas secretos. /onsideram a confiança ing+nua, o
elo rom@ntico e o perd#o sentimental. ^omam do entusiasmo, ridiculariam o fervor
espiritual e despream o comportamento carismático. /onsideram-se realistas que veem a
realidade como realmente ela ) e creem que n#o s#o enganados por “emoç'es escapistas!.
3as quando suestimam a alegria de eus, sua cegueira s7 leva & maior escurid#o.
Es pessoas que vieram a conhecer a alegria de eus n#o negam o infort5nio, mas
escolhem n#o viver nele. %ustentam que a lu que rilha na escurid#o ) mais confiável que a
escurid#o em si e que um pouco de lu pode dispersar as trevas. Beferem-se a vislumres de
lu aqui e ali e se recordam, entre elas, que s#o sinais da presença de eus, invis$vel, mas
verdadeiro. escorem que há pessoas que curam os sofrimentos dos outros, perdoam
ofensas, dividem seus pertences, encorajam o esp$rito comunitário, comemoram os dons
receidos e vivem em constante antecipaç#o da total manifestaç#o da gl7ria de eus.
E cada momento, todos os dias, tenho a chance de escolher entre o ceticismo e a alegria.
/ada pensamento que tenho pode ser de descrença ou de aç#o de graça. /ada palavra que
profiro pode ser incr)dula ou de gratid#o. /ada aç#o pode ser c)tica ou de j5ilo.
Rradativamente perceo todas essas poss$veis escolhas e gradativamente descuro que cada
opç#o pela alegria acarreta por si mais alegria e fa que a vida se torne uma verdadeira
comemoraç#o na casa do Pai.
Kesus viveu intensamente essa alegria da casa do Pai. Cele podemos visualiar a alegria de
seu Pai. “1udo o que o Pai tem ) meu!,G< di ele, inclusive a alegria de eus sem limites. "ssa
alegria divina n#o elimina o divino pesar. "m limites. "ssa alegria divina n#o elimina o divino
pesar. "m nosso mundo, alegria e tristea se e2cluem. Equi emai2o, a alegria compreende a
G<
Jo #I%#(.
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Henri J. M. Nouwen
/omo o filho de eus que volta, haitando na casa do Pai, tenho direito & alegria de eus.
Há poucos minutos em minha vida em que eu n#o seja tentado pela tristea, melancolia,
descrença, mau humor, pensamentos somrios, especulaç'es m7ridas e ondas de depress#o.
" com muita frequ+ncia dei2o que esses estados de esp$rito aafem a alegria da casa de meu
Pai. 3as quando em verdade acredito que de fato regressei e que meu Pai já me vestiu com
um manto, anel e sandálias, posso retirar máscara de tristea do meu coraç#o e afugentar a
mentira que acoerta o meu verdadeiro eu. Essim posso aspirar & verdade com a lierdade
pr7pria do filho de eus.
3as há mais. ?ma criança n#o continua criança. ?ma criança se torna um adulto. ?m
adulto vem a ser pai e m#e. *uando o Filho Pródigo volta a casa, ele retorna n#opara continuar
criança, mas para tomar posse dos seus direitos de filho e ele mesmo vir a ser pai. /omo o filho
de
sim,eus que volta,) sendo
o chamado, convidado
para que a reassumir
eu mesmo me tornemeu lugar
o Pai. na casa
"stou de meu
pasmo com Pai,
esseochamado.
desafio agora
Por
muito tempo vivi com a convicç#o que voltar & casa do meu Pai seria o chamado final. (oi
necessário que tanto o filho mais velho quanto o mais novo, em mim e2istentes, se
empenhassem em muito traalho espiritual para retornar e receer o amor acolhedor
voltando. 3as quanto mais perto chego da casa, fica mais evidente a compreens#o de que,
al)m do chamado para a volta, há um outro chamado. 6 o apelo para que me torne o pai que
acolhe e deseja festejar. 1endo recuperado minha filiaç#o, tenho agora de reivindicar a
paternidade. *uando vi pela primeira ve o Filho Pródigo de Bemrandt, nunca poderia
imaginar que me tornar o filho que se arrepende era somente um passo a caminho da
transformaç#o no pai acolhedor. ejo agora que as m#os que perdoam, consolam, curam e
oferecem uma refeiç#o festiva devem vir a ser as minhas. 1ornar-se o pai, portanto, a
conclus#o surpreendente destas refle2'es sore A Volta do Filho Pródigo, de Bemrandt.
GJ
Jo #(%21##.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
/onclus#o
>ornar?se o !ai
esde o in$cio estava preparado para aceitar que n#o somente o filho mais jovem, mas
tam)m o mais velho me revelariam um aspecto importante da minha jornada espiritual. Por
muito tempo o pai continuou a ser “o outro!, aquele que me receeria, me perdoaria,
oferecer-me-ia um lar e me daria pa e alegria. O pai era o lugar ao qual eu deveria voltar, o
ojetivo da minha jornada, o lugar onde encontrara o eterno descanso. (oi s7 aos poucos e
muitas vees com astante sofrimento que cheguei a compreender que minha jornada
espiritual nunca se completaria enquanto o pai fosse um estranho.
Ocorreu-me que, mesmo com a melhor formaç#o espiritual e teol7gica, n#o conseguiria
me liertar de um eus Pai um tanto ameaçador e um tanto tem$vel. 1udo o que eu aprendera
a respeito do amor do Pai n#o me permitira me liertar de uma autoridade que tinha poder
sore mim e que o usara conforme a sua vontade. e tal modo o amor de eus por mim era
limitado pelo meu medo de seu poder que me parecia prudente manter uma dist@ncia
raoável mesmo que o desejo por pro2imidade fosse imenso. %ei que in5meras pessoas
compartilham esse meu modo de pensar. 1enho visto como o medo de estar sujeito & vingança
e ao castigo de eus tem paralisado a intelig+ncia e as emoç'es de muita gente,
independentemente de idade, religi#o ou estilo de vida. "ste medo de eus, paralisante, )
uma das grandes trag)dias humanas.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
velho, n#o devo permanecer como eles, mas me tornar o Pai. Cenhum pai ou m#e se tornaram
pai e m#e sem antes ter sido filho ou filha, mas cada filho ou filha tem que, conscientemente,
decidir pAr de lado sua inf@ncia e se tornar pai e m#e para outro. 6 um passo dif$cil e solitário a
ser dado L especialmente num per$odo da hist7ria em que a paternidade ) dif$cil de ser em
e2ercida -, mas ) um passo essencial & realiaç#o da jornada espiritual.
"mora Bemrandt n#o coloque o pai fisicamente no centro da pintura, ) claro que o pai
) o centro do acontecimento que a ora retrata. ele vem toda a lu, para ele vai toda a
atenç#o. Bemrandt, fiel & paráola, quis que nossa primeira atenç#o se dirija ao pai antes de
qualquer outra pessoa.
(ico surpreso como demorou para que eu colocasse o pai no centro de minha atenç#o.
era t#o fácil me identificar com os dos filhos. %ua inconst@ncia, aparente ou $ntima, e t#o
compreens$vel e t#o profundamente humana que a identificaç#o se fa quase
espontaneamente logo que se fala do parentesco. Por muito tempo me identifiquei t#o
completamente com o filho mais jovem que nem me ocorreu que eu pudesse ser mais como o
mais velho. 3as logo que um amigo disse: “C#o ) voc+ o filho mais velho na hist7riaN!, ficou
dif$cil ver qualquer outra coisa. Eparentemente n7s todos participamos, em grau maior ou
menor, de todas as formas da imperfeiç#o humana. Cem gan@ncia, nem raiva, nem lu25ria,
nem ressentimento, nem frivolidade, nem cumes est#o totalmente ausentes em casa um de
n7s. Cossa imperfeiç#o humana pode ser vivida de muitas maneiras, mas n#o há ofensa, ci5me
ou guerra que n#o tenha suas ra$es em nossos pr7prios coraç'es.3as o que acontece com o
C#o há por parte da 4greja e da sociedade uma press#o sutil para que nos mantenham
como filhos dependentesN E 4greja, no passado, n#o pressionou & oedi+ncia de modo que
ficasse dif$cil reivindicar paternidade espiritual e a nossa sociedade de consumo n#o nos tem
encorajado a condescender com pueril autorrealiaç#oN *uem realmente tem nos interpelado
para nos liertemos da depend+ncia imatura e aceitemos o fardo de adultos responsáveisN"
n#o estamos n7s mesmos constantemente tentando escapar & tarefa assustadora da
paternidadeN Bemrandt certamente fe isso. %7 depois de muita dor e sofrimento, quando se
apro2imava da morte, foi capa de entender e pintar a verdadeira paternidade espiritual.
1alve o pronunciamento mais radical feito por Kesus seja: “%ede misericordiosos como o
vosso Pai ) misericordioso!.G; E miseric7rdia de eus ) descrita por Kesus n#o simplesmente
para me mostrar como eus está disposto a sentir por mim ou a perdoar meus pecados e me
G;
c I,<I
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
O que devo concretiar ) que seja eu o filho mais jovem ou o mais velho, sou o filho de
meu Pai compassivo. %ou um herdeiro. Cingu)m coloca isso mais claramente do que Paulo
quando escreve: “O pr7prio "sp$rito se une ao nosso esp$rito para testemunhar que somos
filhos de eus... e coerdeiros de /risto, pois sofremos com ele para tam)m com ele sermos
glorificados!.GI Bealmente, como filho e herdeiro devo me tornar sucessor. evo tomar o lugar
do meu Pai e oferecer a outros a mesma compai2#o que ele deve por mim. E volta do Pai )
afinal de contas o desafio para me tornar o Pai.
A !aternidade da &iseri%órdia
E pintura do Filho Pródigo de Bemrandt me fa compreender que n#o preciso mais usar
minha filiaç#o para me manter afastado. 1endo vivido meu papel de filho plenamente, chegou
a hora de ultrapassar todas as arreiras e confessar a verdade que tudo o que desejo ) me
transformar no velho & minha frente. C#o posso permanecer criança para sempre, n#o posso
continuar usando meu pai como desculpa para a minha vida. 1enho que pousar estender
minhas pr7prias m#os numa +nç#o e receer meus filhos com toda a compai2#o, n#o importa
GI
0m 3%#I1#S.
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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen
o que eles sintam ou pensem a meu respeito0 uma ve que tornar-me o Pai misericordioso ) o
ojetivo final da vida espiritual, como ) demonstrado na paráola e tam)m na pintura de
Bemrandt, preciso agora analisar o seu completo significado.
Primeiramente tenho que ter em mente o conte2to no qual Kesus narra a hist7ria de “um
homem que tinha dois filhos!. ucas escreve: “1odos os pulicanos e os pecadores estavam se
apro2imando para ouvi-lo. Os fariseus e os escrias, por)m, murmuravam: \"sse homem
recee os pecadores e come com elesV!. GQ /omo um professor, eles questionam sua
veracidade criticando sua pro2imidade com os pecaminosos. "m resposta, Kesus narra aos
cr$ticos as paráolas da ovelha perdida, da dracma perdida e do Filho Pródigo.
Kesus quer dei2ar claro que o eus de quem fala ) um eus de miseric7rdia que
alegremente acolhe em sua casa pecadores arrependidos. Essociar-se e sentar-se & mesa com
pessoas de má reputaç#o, portanto, n#o contradi seu ensinamento sore eus, mas, de fato,
transp'e esta norma para o dia-a-dia. %e eus perdoa os pecadores, ent#o certamente aqueles
que t+m f) devem faer o mesmo. %e eus recee em casa os pecadores, ent#o certamente
aqueles que confiam em eus devem faer o mesmo. %e eus ) misericordioso, ent#o com
certea os que amam eus devem em nome de quem age, ) o eus da compai2#o, o eus que
oferece a si mesmo como e2emplo e modelo para todo o comportamento humano.
3as há mais. 1ornar-se como o Pai celestial n#o ) s7 um aspecto importante da pregaç#o
de Kesus, ) a ess+ncia de sua mensagem. E qualidade por e2cel+ncia das suas palavras, e o fato
de seus apelos serem aparentemente ine2equ$veis, s#o um tanto 7vios quando ouvidos como
parte de um chamado geral para nos tornarmos verdadeiros filhos e filhas de eus.
*uando, pouco antes da sua morte, Kesus rea ao Pai pelos seus disc$pulos, ele di: “"les
n#o s#o do mundo como eu n#o sou do mundo... que todos sejam um. /omo tu, Pai, estás em
mim e eu em ti, que eles estejam em n7s, para que o mundo creia que tu me enviaste!.GG
?ma ve que estamos na casa de eus como filhos e filhas de sua fam$lia, podemos ser
como ele. Kesus n#o de2a d5vidas a respeito disso quando e2plica: “%e amais os que vos amam,
que graça alcançaisN Pois at) mesmo os pecadores amam aqueles que os amam. " se faeis o
em aos que vo-lo faem, que graça alcançaisN Et) mesmo os pecadores agem assim " se
emprestais &queles de quem esperais receerem, que graça alcançaisN Et) mesmo os
pecadores emprestam aos pecadores para receerem o equivalente. 3uito pelo contrário,
amai vossos inimigos, faei o em e empresta sem esperar coisa alguma em troca. %erá grande
GQ
c #(%#1&.
GG
Jo #S%#I1&#.
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a vossa recompensa, e seres filhos do Elt$ssimo, pois ele ) om para com os ingratos e com os
maus. %ede misericordiosos como o vosso Pai ) misericordioso!.GF
Kesus nos mostra o que ) a verdadeira filiaç#o. "le ) o filho mais jovem sem ser reelde.
"le ) o filho mais velho sem ser ressentido. "m tudo ) oediente ao Pai, mas nunca seu
escravo. "le ouve tudo o que o Pai lhe di, mas isso n#o o torna seu servo. "le fa tudo o que o
Pai lhe manda faer, mas permanece completamente livre. "le dá tudo e recee tudo. "le fala
aertamente: “"m verdade, vos figo: o (ilho, por si mesmo, nada pode faer, mas s7 aquilo
que v+ o Pai faer0 tudo o que este fa o (ilho o fa igualmente. Porque o Pai ama o (ilho e lhe
mostra tudo o que fa0 e lhe mostrará oras maiores do que essas para que v7s admireis.
/omo o Pai ressuscita os mortos e ao fa viver, tam)m o (ilho dá a vida a quem quer. Porque
o Pai a ningu)m julga, mas confiou ao (ilho todo julgamento, a fim de que todos honrem o
(ilho, como honram o Pai!.F8
"sta ) a filiaç#o divina. " ) a esta filiaç#o que sou chamado. O mist)rio de redenç#o ) que
o (ilho de eus se tornou carne de modo que todos os filhos perdidos de eus pudessem se
tornar filhos e filhas como Kesus ) filho. Cesta perspectiva, a hist7ria do Filho Pródigo assume
uma nova dimens#o. Kesus, o em-amado do Pai, dei2a a casa do Pai para carregar os pecados
dos filhos errantes de eus e tra+-los de volta. 3as, ao sair, permanece junto ao Pai e
mediante completa oedi+ncia oferece cura a seus irm#os e irm#s necessitados. Essim, por
minha causa, Kesus se torna o filho mais jovem e tam)m o filho mais velho, de modo a me
mostrar como me tornar o Pai. Por seu interm)dio posso me tornar novamente um aut+ntico
filho e, como filho aut+ntico, finalmente posso crescer para me tornar misericordioso como o
meu Pai celestial ).
GF
c I%'&1'I.
FT
Jo #$%2.
F8
Jo (%#21&'.
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S medida que passam os meus anos de vida, descuro como ) dif$cil e complicado, mas
tam)m compensador, descer nessa paternidade espiritual. E pintura de Bemrandt elimina
qualquer pensamento que tenha algo que ver com poder, influ+ncia ou controle. Posso alguma
ve ter tido a ilus#o de que um dia os diferentes chefes desapareceriam e poderia finalmente
ser eu mesmo o chefe. 3as esse ) o jeito do mundo no qual o poder ) o principal ojetivo. "
n#o ) dif$cil ver que aqueles que tentaram a maior parte de suas vidas se livrar de seus patr'es
n#o ser#o muito diferentes de seus antecessores quando finalmente ocuparem seus lugares.
Paternidade espiritual n#o tem nada a ver com poder ou controle. 6 uma paternidade de
miseric7rdia. ", para ter uma ideia disso, tenho de continuar olhando para o pai araçando o
filho pródigo.
3as o pai do Filho Pródigo n#o se preocupa com ele mesmo. %ua longa vida de muitos
sofrimentos fe desaparecer suas aspiraç'es de manter controle da situaç#o. %eus filhos s#o a
5nica preocupaç#o0 a eles quer se dedicar e se doar completamente.
Posso eu dar sem esperar algo de volta, amar sem estaelecer condiç'esN /onsiderando
minha imensa necessidade de reconhecimento e afeto, eu me dou conta de que será uma luta
por toda a minha vida. 3as tam)m estou convencido que de cada ve que me soreponho a
esta solicitaç#o e atuo livremente, n#o esperando retorno, posso confiar que minha vida
poderá realmente produir os frutos do "sp$rito de eus.
Olhando para a pintura do pai, de Bemrandt, posso ver tr+s caminhos para uma
paternidade verdadeiramente compassiva: pesar, perd#o e generosidade.
Poderia parecer estranho incluir pesar como um caminho para a compai2#o. 3as ). Pesar
requer permitir que os pecados do mundo L os meus inclusive L firam o meu coraç#o e me
falam derramar lágrimas, muitas lágrimas por eles. C#o há compai2#o sem muitas lágrimas. %e
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n#o podem ser lágrimas que jorrem dos meus olhos, t+m de ser ao menos lágrimas que
rotem do meu coraç#o.
*uando penso na imensa ostinaç#o dos filhos de eus, nossa lu25ria, nossa gan@ncia,
nossa viol+ncia, nossa raiva, nosso ressentimento, e quando olho para tudo isso com os olhos
do coraç#o de eus, n#o posso sen#o prantear e radar pesarosamente:
Olha, minha alma, como um ser humano tenta causar tanto sofrimento quanto
poss$vel a outro0
companheiros0 olhaolha
parapara aquelas
aqueles pais pessoas tramando
hostiliando os seusfaer mal
filhos0 a para
olha seus
aquele proprietário de terras e2plorando os seus operários0 olha para as
mulheres violentadas, os homens seviciados, as crianças aandonadas. Olha,
minha alma, v+ os campos de concentraç#o, as pris'es, os asilos, os hospitais,
e ouve os lamentos dos pores.
"sse lamento ) oraç#o. %oram t#o poucos que lamentam neste mundo. 3as o lamento )
e2erc$cio do coraç#o que v+ os pecados do mundo e sae por si mesmo ser o triste preço da
lierdade sem a qual o amor n#o pode florescer. "stou comelando a perceer que muito da
oraç#o ) contristar-se. O pesar ) t#o profundo n#o somente porque o pecado humano ) t#o
grande, mas tam)m L e mais ainda L porque o amor de eus ) t#o ilimitado. Para me tornar
como o Pai de quem a 5nica autoridade ) a miseric7rdia, tenho de verter in5meras lágrimas e
assim preparar meu coraç#o para receer qualquer pessoa, n#o importa qual tenha sido a sua
jornada, e perdoá-la com esse coraç#o.
O segundo caminho que leva & paternidade espiritual ) o perd#o. 6 mediante o perd#o
constante que nos tornamos como o Pai. Perdoar de coraç#o ) muito, muito dif$cil. 6 quase
imposs$vel. Kesus disse aos seus disc$pulos: “*uando o teu irm#o pecar contra ti sete vees por
dia e sete vees retornar, diendo \"stou arrependidoV, tu o perdoarás!.F=
3uitas vees eu disse: “"u o perdoo!, mas mesmo quando diia essas palavras, meu
coraç#o permanecia angado ou ressentido. "u ainda queria ouvi que eu, afinal de contas,
estava certo0 ainda queria ouvir justificativas e desculpas, ainda queria ter a satisfaç#o de
receer de volta elogios L pelo menos o reconhecimento de ser t#o capa de perdoar
3as o perd#o de eus ) incondicional0 vem de um coraç#o que n#o pede nada para ele
mesmo0 um coraç#o totalmente vaio de pretens'es pr7prias. 6 esse perd#o divino que devo
praticar na minha vida diária. Pede que eu dei2e de repisar meus argumentos que diem que a
clem+ncia n#o ) sáia, ) pouco saudável e pouco prática. /onclama-se a dei2ar de lado toda a
minha necessidade de gratid#o e de cumprimentos. (inalmente, pede-me que eu passe por
cima daquela parte do meu coraç#o que está magoada e ofendida e que deseja manter
controle, colocando umas tantas condiç'es entre mim e aquele a quem devo perdoar.
F=
c #S%$.
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"sse “passar por cima! ) o verdadeiro e2erc$cio do perd#o. 1alve seja mais “transpor! do
que “passar por cima!. 3uitas vees tenho que transpor a arreira dos argumentos e
sentimentos de irritaç#o que erigi entre mim e todos aqueles que eu amo e que com
frequ+ncia n#o correspondem a esse amor. 6 uma arreira de medo de ser usado ou magoado
novamente. 6 um muro de orgulho, e de desejo de manter o controle. 3as todas as vees que
posso passar por cima ou transpor esse muro, entro na casa onde haita o Pai, e lá chego
perto do meu viinho com amor sincero e misericordioso.
O terceiro caminho para se tornar como o Pai ) o da generosidade. Ca paráola, o Pai n#o
somente dá a seu filho tudo o que pede, mas tam)m o cumula de presentes na sua volta. "
para seu filho mais velho di: “1udo o que ) meu ) teu!. F< C#o há nada que o Pai reserve para
si mesmo. "le se doa em profus#o a seus filhos.
"le n#o somente oferece mais do que seria raoável esperar de algu)m que foi ofendido0
n#o, ele se dá todo, sem reserva. Emos os filhos s#o “tudo! para ele. "le deseja despejar
sore eles sua pr7pria vida. O modo como o filho mais jovem ganha manto, anel e sandálias e
) receido em casa com uma festa pomposa, como tam)m a maneira pela qual o filho mais
velho ) convidado a aceitar seu lugar $mpar no coraç#o de seu pai e a sentar-se & mesa com
seu irm#o mais jovem, tornam claro que todas as arreiras de um comportamento patriarcal
foram derruadas. "sta n#o ) a figura de um pai especial. "sta ) a descriç#o de eus cuja
ondade , amor, clem+ncia, elo, alegria e generosidade de eus usando todas as imagens da
cultura daquela )poca, emora muitas vees transformando-as.
Para me tornar como o Pai, preciso ser t#o generoso como o pai ) generoso. a mesma
maneira que o Pai se doa a seus filhos, tam)m devo me doar aos meus irm#os e irm#s. Kesus
mostra muito claramente que ) precisamente essa doaç#o de si mesmo que ) a marca do
verdadeiro disc$pulo. “Cingu)m tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus
amigos!.FJ
"ssa doaç#o de si mesmo ) um e2erc$cio porque ) algo que n#o ocorre espontaneamente.
/omo
poder,filhos
nossosdas trevasest$mulos
grandes que se manifestam por meioedo
s#o a soreviv+ncia medo, interesse pr7prio,
a autopreservaç#o. 3as comogan@ncia e
filhos da
lu que saem que o verdadeiro amor e2pulsa todo o medo, torna-se poss$vel nos
despojarmos de tudo pelos outros.
F<
c #(%'#.
FJ
Jo #(%#'.
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/omo filhos da lu, preparamo-nos para nos tornar verdadeiros mártires: gente que dá
testemunho com suas vidas do ilimitado amor de eus. ar tudo resulta em ganhar tudo. Kesus
e2pressa isto claramente quando di: “O que perder a sua vida por causa de mim e do
"vangelho, irá salvá-la!.F;
1odas as vees que dou um passo em direç#o & generosidade, sei que estou me movendo
do medo para o amor. 3as esses passos, pelo menos no princ$pio, s#o dif$ceis de dar porque
há muitas emoç'es e sentimentos que me impedem de dar livremente. Por que daria eu
energia, tempo, dinheiro e, sim at) atenç#o a algu)m que me ofendeuN Por que dividiria eu
minha vida com algu)m que por ela n#o mostrou nenhum respeitoN "u poderia ser capa de
perdoar, mas, al)m disso, dar
"ntretanto... a verdade ) que, no sentido espiritual, a pessoa que me ofendeu pertence &
minha esp)cie!, minha “gen!. E palavra, do latim genus e do grego genos, refere-se a sermos
da mesma esp)cie. Renerosidade ) um doar que vem do conhecimento desse laço $ntimo. E
verdadeira generosidade ) agir com ase na verdade L e n#o no sentimento L que aqueles que
devo perdoar s#o da mesma “parentela!, pertencem & minha fam$lia. " quando procedo dessa
maneira, essa verdade se torna evidente para mim. E generosidade cria essa fam$lia e nela
cr+.
O pesar, o perd#o e a generosidade s#o, portanto, os tr+s caminhos pelos quais a imagem
de eus pode crescer em mim. %#o tr+s aspectos do chamado do Pai para estar em casa. /omo
o Pai, n#o sou mais chamado a voltar para casa como o filho mais jovem ou o mais velho, mas
para estar lá como aquele a quem os filhos ostinados de eus podem voltar e ser acolhidos
com alegria. 6 muito dif$cil somente estar em casa e esperar. 6 uma espera sofrida por aqueles
que se foram e uma espera com confiança querendo oferecer perd#o e vida nova &queles que
ir#o voltar.
/omo o Pai, tenho de crer que tudo o que o coraç#o humano deseja pode ser encontrado
em casa. /omo o Pai, devo estar livre da necessidade de vagar por a$ curiosamente e procurar
o que eu poderia achar que teriam sido oportunidades perdidas na inf@ncia. /omo o Pai, tenho
de saer que, na verdade, minha juventude passou e que rincar de jogos da juventude n#o )
nada mais do que uma tentativa rid$cula para encorir a verdade que estou velho e pr72imo da
morte. /omo o Pai, devo ousar assumir a responsailidade de uma pessoa espiritualmente
adulta e confiar que a verdadeira alegria e total realiaç#o podem somente advir de acolher
em casa aqueles que foram feridos e magoados na sua caminhada, e amá-los com amor que
n#o pede nem espera nada de volta.
Há um tremendo vaio nesta paternidade espiritual. C#o há poder, n#o há sucesso, n#o
há popularidade nem fácil satisfaç#o. 3as esse enorme vaio ) tam)m o lugar de verdadeira
F;
Mc 3%'(.
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lierdade. 6 o lugar onde n#o há “nada mais a perder!,FI onde o amor n#o tem amarras, e
onde se encontra verdadeira força espiritual.
/ada ve que me ponho em contato com esse vaio, terr$vel mas proveitoso, se que ali
posso acolher qualquer pessoa sem condenar e oferecer esperança. Eli me sinto livre para
receer os pecados de outros sem precisar avaliar, classificar ou analisar. Eli, num estado de
esp$rito totalmente isento de julgamento, posso engendrar como transmitir confiança.
?ma ve,
aençoado. Ca enquanto
presença visitava
de meu um amigo
amigo, n#oagoniante, vivi esta
senti vontade e2peri+ncia
alguma de um
de perguntar vaioo
sore
passado ou investigar o futuro. "stávamos somente juntos, sem medo, sem culpa ou pudor,
sem preocupaç'es. Caquele vaio, o amor incondicional de eus podia ser sentido e pod$amos
dier o que o velho %ime#o disse quando pegou o menino Kesus nos seus raços: “Egora,
%enhor, conforme a tua promessa, podes dei2ar o teu servo partir em pa!. FQ Eli, nomeio de
um vaio terr$vel, havia total confiança, pa e alegria asolutas. E morte n#o era mais o
inimigo. O amor era vitorioso.
/ada ve que encontramos essa vacuidade sagrada do amor que nada e2ige, os c)us e a
erra tremem e “há alegria ante dos anjos de eus!. FG 6 a alegria pelos filhos e filhas que
voltam. 6 a alegria da paternidade espiritual.
Para viver esta paternidade espiritual ) necessário ter verdadeira disciplina de estar em
casa. /omo uma pessoa que sempre se rejeita & procura de afirmaç#o e afeto, acho imposs$vel
amar consistentemente sem pedir algo de volta. 3as o ojetivo ) precisamente desistir que eu
mesmo consiga isso como uma proea heroica. Para faer jus & paternidade espiritual e &
consequente autoridade compassiva, tenho de dei2ar que o reelde filho mais jovem e o
ressentido filho mais velho, suam & plataforma para receer o amor incondicional,
misericordioso que o Pai me oferece, e descorir ali o chamado para estar em casa como meu
Pai está em casa.
FI
Ve;a a can8<o 6Me and )o!! Mcee:% de Janis Joplin% com a frase 6i!erdade só outra pala"ra para nada mais a perder:.
FQ
c &%&2.
FG
c #(%#4.
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"p$logo
Vi+endo a !intura
*uando vi o pAster de Bemrandt pela primeira ve no outono de 8FG<, toda a minha
atenç#o se voltou para as m#os do velho pai apertando contra o peito o filho que volta. i
perd#o, reconciliaç#o, cura0 vi tam)m segurança, descanso, estar em casa. (ui t#o
profundamente tocado por essa imagem do araço de dar a vida entre pai e filho porque tudo
em mim ansiava ser receido do mesmo modo que o Filho Pródigo foi receido. "sse encontro
passou a ser o coraç#o da minha volta.
E comunidade A Arca, aos poucos, se tornou a minha casa. Cunca em minha vida eu
sonhara que homens e mulheres com defici+ncia mental seriam aqueles que poriam suas m#os
em mim num gesto de +nç#o e me ofereceriam um lar. Por muito tempo eu procurar
proteç#o e segurança entre os eruditos e talentosos, mal compreendendo que as coisas do
Beino eram revelados aos “pequeninos!.FF “o que ) loucura no mundo, eus o escolheu para
confundir os sáios!.8TT
3as quando e2perimentei a acolhida calorosa e modesta daqueles que n#o tem do que se
gaar, e recei um araço carinhoso de pessoas que n#o faiam quaisquer perguntas, comecei
a descorir que uma verdadeira volta espiritual quer dier uma volta aos pores em esp$rito a
quem o Beino do /)u pertence. O araço do Pai tornou-se muito real para mim nos araços
dos mentalmente pores.
descorir que tais anseios poderiam ser satisfeitos na comunidade onde primeiro o encontre.
(a agora mais de seis anos desde que vi o pAster de Bemrandt em 1rosl e cinco anos
desde que resolvi faer a A Arca o meu lar. *uando reflito sore esse tempo entendo que as
pessoas com defici+ncia mental e aqueles que as assistem fieram com que eu “vivesse! a
FF
Mt ##%&(.
8TT
#/or #%&S.
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"u tam)m vivi a hist7ria do filho mais velho. "u n#o tinha realmente visto como o filho
ais velho pertence ao Filho Pródigo de Bemrandt at) ir a %#o Petersurgo e ver todo o
quadro. E$ eu descori a tens#o que Bemrandt invoca. C#o há somente a reconciliaç#o cheia
de lu entre o pai e o filho mais jovem, mas tam)m a dist@ncia somra e ressentida do filho
mais velho. Há arrependimento, mas tam)m raiva. Há comunh#o, mas tam)m
distanciamento. Há o rilho cálido da cura, mas tam)m a friea do olho cr$tico0 há a oferenda
da miseric7rdia, mas tam)m enorme resist+ncia para rece+-la. C#o demorou para que eu
descorisse o filho mais velho em mim.
E vida na comunidade n#o afasta o lado somrio. Eo contrário. Parece que a lu me atra$a
para A Arca tam)m me tornou consciente das trevas em mim mesmo. /i5mes, raiva, o
sentimento de se rejeitado ou negligenciado L tudo isso veio & tona no conte2to de uma
comunidade lutando por uma vida de perd#o, reconciliaç#o e cura. E vida comunitária levou-
me a uma verdadeira contenda espiritual: o esforço para continuar caminhando em direç#o &
eficientes mentais t+m pouco a perder. %em engano eles me mostram quem s#o.
Eertamente e2pressam seu amor e igualmente seu medo, sua delicadea e igualmente sua
ang5stia, sua generosidade e igualmente seu ego$smo. %endo simplesmente quem s#o,
rompem minhas defesas elaoradas e e2igem que seja t#o franco com eles como s#o comigo.
%ua incapacidade descortina a minha pr7pria. %ua ang5stia espelha espalha a minha. %uas
fraqueas mostram-se as minhas. (orçando-me a enfrentar em mim o filho mais velho, A Arca
ariu o caminho para tra+-lo para casa. Es mesmas pessoas deficientes que me acolheram e
me convidaram a festejar tam)m me mostraram o meu eu ainda n#o convertido e fieram-
me entender que a jornada estava longe de ser completada.
Epesar de que estes achados tiveram profundo impacto em minha vida, a maior dádiva
dVA Arca foi desafio de me tornar o pai. %endo mais velho do que a maioria dos memros da
comunidade e sendo tam)m seu pastor, parece natural pensar em ser o pai. Porque fui
ordenado, já tenho o t$tulo. Egora tenho de corresponder.
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Cossa comunidade está cheia de filhos instáveis e indignados, e estando cercados pelos
seus iguais e2iste uma sensaç#o de solidariedade. "ntretanto, quanto mais faço parte dessa
comunidade, tanto mais a solidariedade desponte como uma parada na estrada para um
destino muito mais solitário: a solid#o do Pai, a solid#o de eus, a solid#o definitiva da
compai2#o. E comunidade n#o precisa de mais um filho, mais jovem ou mais velho, convertido
ou n#o, mas de um pai que viva com m#os estendidas, sempre querendo dei2a-las descansar
nos omros de seus filhos que volta. "ntretanto, tudo em mim resiste a esta vocaç#o. (ico me
agarrando & criança em mim e2istente. C#o quero ser parcialmente cego0 quero ver
claramente o que acontece & minha volta. C#o quero esperar at) que meus filhos voltam ao
lar0
C#oquero
queroestar comsil+ncio
guardar eles quer estejam
sore o quenum pa$s distante
aconteceu0 estouou no campo
curioso para com
ouviros traalhadores.
toda a hist7ria e
ter in5meras perguntas para faer. C#o desejo continuar estendendo minhas m#os quando há
t#o poucos querendo ser araçados, especialmente quando pais e figuras paternas s#o por
muitos considerados como a fonte de seus prolemas.
", entretanto, depois de uma longa vida como filho, sei sem d5vida que o verdadeiro
chamado ) para tornar-se o pai que somente aençoa com infinita compai2#o, sem faer
perguntas, sempre dando e perdoando, nunca esperando qualquer coisa de volta. Cuma
comunidade tudo isso ) muitas vees sensivelmente perturador. *uero saer o que está
acontecendo. *uero me envolver nos altos e ai2os das vidas das pessoas. *uero ser
lemrado, convidado, informado. 3as o fato ) que poucos se d#o conta do que desejo e
aqueles que o faem n#o saem como corresponder. Es pessoas & minha volta, quer
deficientes ou n#o, n#o est#o procurando outro pai, outro companheiro nem mesmo um
irm#o. Procuram um pai que possa aençoar e perdoar sem precisar deles da maneira que eles
necessitam dele. ejo claramente a realidade da minha vocaç#o para ser um pai0 ao mesmo
tempo, parece-me quase imposs$vel segui-la. C#o quero ficar em casa quando todos saem,
quer levados por seus in5meros anseios ou por in5meras irritaç'es. %into estes mesmos
impulsos e desejo circular como os outros faem 3as quem vai estar em casa quando eles
voltarem L cansados, e2austos, nervosos, desapontados, culpados ou envergonhadosN *uem
8T8
#/or #'%##.
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vai convenc+-los que depois de tudo dito e feito há um lugar seguro ao qual ) poss$vel volta e
receer um araçoN %e n#o for eu, quem seráN E alegria da paternidade ) totalmente
diferente do praer dos filhos instáveis. 6 uma alegria que supera a repulsa e a solid#o0 sim,
ultrapassa a afirmaç#o e a comunidade. 6 a alegria de uma paternidade que se srcina do Pai
celestial8T= e a compartilha de sua divina solid#o.
C#o me surpreende que em poucas pessoas queiram e2ercer essa paternidade. Os
sofrimentos s#o muitos, as alegrias em pouco vis$veis. ", no entanto, n#o a desejando, eu me
furto & minha responsailidade de adulto espiritualmente maduro. %im, eu at) atraiçoo a
minha vocaç#o. Cada menos do que isso 3as como posso escolher algo que me parece t#o
contrário &s minhas necessidadesN ?ma vo me di: “C#o tenhais medo. E /riança o tomará
pela m#o e o conduirá & paternidade!. %ei que esta vo ) confiável. /omo sempre, os pores,
os fracos, os marginais, os rejeitados, os esquecidos, os menos... eles n#o somente precisam
de mim para ser seu pai, mas tam)m me mostram como ser um pai para eles. erdadeira
paternidade ) compartilhar da porea do amor n#o e2igente de eus. 1enho medo de
participar dessa porea, mas aqueles que já faem parte dela, por meio de suas defici+ncias
f$sicas ou mentais, ser#o meus mestres.
Olhando para as pessoas com quem vivo, os homens e mulheres deficientes, em como
para os que cuidam deles, vejo o enorme anseio por um pai no qual paternidade e
maternidade sejam uma s7. 1odos sofreram por terem sido rejeitados ou aandonados0 todos
foram magoados conforme cresciam0 todos se perguntam se merecem o amor incondicional
de
poreus
m#oseque
todos percorrem o lugar para onde possam volta com segurança e serem tocados
os aençoem.
Bemrandt retrata o pai como o homem que ultrapassou o caminho dos filhos. %ua
pr7pria solid#o e raiva podem ter estado presentes, mas foram transformadas pelo sofrimento
e pelas lágrimas. %eu isolamento se transformou em interminável solid#o, sua raiva em
ilimitada gratid#o. "sse ) quem eu devo vir a ser. "ntendo isso claramente quando me
defronto com a elea incomparável do vaio do pai e sua compai2#o. Posso dei2ar o filho
mais jovem e o mais velho amadurecer em mim chegando ao pai misericordiosoN
*uando, há quatro anos, fui ao %#o Petersurgo para ver A Volta do Filho Pródigo, de
Bemrandt, n#o faia ideia de quanto teria de viver o que ent#o estava vendo. /oloco-me com
estupefaç#o diante do lugar ao qual Bemrandt me trou2e. Ruiou-me do jovem ajoelhado,
desgrenhado, ao pai em p), curvado e velho0 do local de ser aençoado & posiç#o de aençoar.
*uando olho para minhas m#os envelhecidas, sei que me foram dadas para serem estendidas
em direç#o de todos aqueles que sofrem, para pousarem sore os omros de todos os que
vierem e para oferecerem a +nç#o que emerge da imensid#o do amor de eus.
8T=
/f. f '%#$.
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