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O Filho Pródigo

Henri J. M. Nouwen

A Volta do Filho Pródigo


Henri J. M. Nouwen

O Retorno do Filho Pródigo, c. 1669

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A história de dois ilhos e seu !ai

Havia um homem que tinha dois filhos. O mais jovem disse ao Pai: “Pai, dá-me a parte da
herança que me cae!. " o Pai dividiu os ens entre eles. Poucos dias depois, ajuntando todos
os seus haveres, o filho mais jovem partiu para uma regi#o long$nqua e ali dissipou sua
herança numa vida devassa.

" gastou tudo. %oreveio &quela regi#o uma grande fome e ele começou a passar privaç'es.
(oi, ent#o, empregar-se com um dos homens daquela regi#o, que o mandou para seus campos
cuidar dos porcos. "le queria matar a fome com as olotas que os porcos comiam, mas
ningu)m lhas dava. " caindo em si, disse: “*uantos empregados de meu pai t+m p#o com
fartura, e eu aqui, morrendo de fome ou-me emora, procurar o meu pai e dier-lhe: Pai,
pequei contra o /)u e contra ti0 já n#o sou mais digno de ser chamado teu filho. 1rata-me
como um dos teus empregados!. Partiu, ent#o, e foi ao encontro de seu pai.

"le estava ainda longe, quando seu pai o viu, encheu-se de compai2#o, correu e lançou-se-lhe
ao pescoço, corindo-se de eijos. O filho, ent#o, disse-lhe: “Pai, pequei contra o /)u e contra
ti0 já n#o sou digno de ser chamado teu filho!. 3as o pai disse aos seus servos: “4de depressa,
traei a melhor t5nica e revesti-o com ela, ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos p)s.
1raei o novilho cevado e matai-o0 comamos e festejemos, pois este meu filho estava morto e
tornou a viver0 estava perdido e foi encontrado!. " começaram a festejar.

%eu filho mais velho estava no campo. *uando voltava, já perto de casa ouviu m5sicas e
danças. /hamando um servo, perguntou-lhe o que estava acontecendo. "ste lhe disse: “6 teu
irm#o que voltou e teu pai matou o novilho cevado, porque o recuperou com sa5de!. "nt#o
ele ficou com muita raiva e n#o queria entrar. %eu pai saiu para suplicar-lhe. "le, por)m,
respondeu a seu pai: “Há tantos anos que eu te sirvo, e jamais transgredi um s7 dos teus
mandamentos, e nunca me deste um carito para festejar com meus amigos. /ontudo, veio
esse teu filho, que devorou teus ens com prostitutas, e para ele matas o novilho cevado!.

3as o pai lhe disse: “(ilho, tu estás sempre comigo, e tudo o que ) meu ) teu. 3as era preciso
que festejássemos e nos alegrássemos, pois esse teu irm#o estava morto e tornou a viver0 ele
estava perdido e foi encontrado!.8

8
A História de dois filhos e seu pai 9c 8;,88-<=>

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Prólogo

$n%ontro %o& u&a !intura

O !'ster

?m encontro, aparentemente sem import@ncia, de um pAster mostrando detalhes de A


Volta do Filho Pródigo, de Bemrandt, foi o que fe surgir uma longa aventura espiritual que
me fe reavaliar minha vocaç#o e me deu novo alento para viv+-la. Co centro desta aventura
está uma pintura do s)culo D44 e seu artista, uma paráola do primeiro s)culo e seu autor,
uma pessoa do s)culo vinte & procura do sentido da vida.

E hist7ria começa no outono de 8FG<, na cidadeinha de 1rsol, na (rança, onde eu


estava passando alguns meses em A Arca, uma comunidade que mant)m um lar para pessoas
com prolemas mentais. (undada em 8FIJ por um canadense, Kean anier, a comunidade de
1rsol ) a primeira de mais de noventa comunidades A Arca espalhadas pelo mundo.

?m dia fui visitar minha amiga %imone andrien no pequeno centro de documentaç#o
comunitário. "nquanto falávamos deparei-me com um pAster preso & sua porta. "sse pAster
retratava um homem envolto num amplo manto vermelho tocando afetuosamente o omro
de um jovem andrajoso, ajoelhado diante dele. "u n#o consegui desviar os olhos do quadro.
%enti-me atra$do pela intimidade entre os dois personagens0 o vermelho cálido do manto, o
amarelo dourado da t5nica do rapa, e a lu misteriosa envolvendo amos. 3as, acima de
tudo, foram as m#os L as m#os do homem idoso -, a maneira como tocavam os omros do
jovem, que me sensiiliaram como jamais acontecera.

Perceendo que n#o estava mais prestando muita atenç#o & conversa, disse a %imone:
“(ale-me desse pAster!. "la respondeu: “O.M., essa ) uma reproduç#o de A Volta do Filho
Pródigo, de Bemrandt. oc+ gostaN!. /ontinuei olhando e, finalmente, gaguejei: “6 onito,
mais do que isso... dá-me vontade de chorar e rir ao mesmo tempo... toca profundamente!.
%imone retrucou: “1alve voc+ devesse ter o seu pr7prio e2emplar. Pode comprá-lo em Paris!.
“%im!, respondi, “preciso ter uma c7pia!.

*uando vi o quadro pela primeira ve eu havia justamente conclu$do uma viagem de seis
semanas, faendo palestras nos "stados unidos e convocando comunidades crist#s a faer
tudo o que estivesse ao seu alcance com o fim de deter a viol+ncia e evitar a guerra na

Em)rica
inquieto e/entral. %entia-me
muito carente. t#o cansado
urante a viagemque
agiramal podia
como andar. %entia-me
um defensor da justiçaangustiado, s7,
e da pa, capa
de enfrentar sem medo o mundo somrio. /onclu$da a jornada, sentia-me como uma criança
enfraquecida que quer se aninhar no colo da m#e e chorar. 1#o logo se dispersavam as
multid'es entusiastas ou suplicantes, eu era acometido de solid#o t#o arrasadora que
facilmente poderia sucumir &s forças sedutoras que prometiam descanso f$sico e emocional.

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(oi nesse estado de esp$rito que me deparei pela primeira ve com A Volta do Filho
Pródigo so a forma de um pAster preso & porta do escrit7rio de %imone. 3eu coraç#o saltou
no peito quando o vi. epois dessa viagem t#o desgastante, tudo o que eu poderia querer
estava contido no carinhoso araço de pai e filho. "u era, na verdade, o filho e2austo depois
de longas viagens0 queria ser araçado, procurava um lar onde me sentisse seguro. O filho que
volta L era como eu me sentia e tudo o que desejava. Por muito tempo eu havia ido de um
lugar para outro L confrontando, pedindo, advertindo, consolando. Egora desejava somente
descansar em algum local onde me sentisse seguro, onde me sentisse em casa.

3uita coisa aconteceu nos meses e anos que se seguiram. 3esmo tendo me livrado
daquele cansaço e2tremo e voltado & vida de ensino e viagens, o araço de Bemrandt ficou
impresso em minha alma muito mais profundamente do que qualquer manifestaç#o
passageira de apoio emocional. Pusera-me em contato com algo dentro de mim que susiste
em distante dos altos e ai2os de uma vida atarefada, algo que representa a constante usca
do esp$rito humano, o anseio por uma volta definitiva, por uma inquerantável sensaç#o de
segurança, por um lar permanente. "mora ocupado com diferentes grupos de pessoas,
envolvido em diversos temas e comparecendo a locais variados, a Volta do Filho Pródigo
permanecia indel)vel na minha mente e passou a ter cada ve mais import@ncia em minha
vida espiritual. E aspiraç#o por um lar definitivo, de que me tornara consciente mediante a
pintura de Bemrandt, tornou-se mais profunda e mais intensa, de certo modo transformando
o artista em guia e fiel companheiro.

oiseanos
Harvard depoispara
regressei de ver a pintura
A Arca de Bemrandt
em 1rosl, renunciei
para passar lá um& ano
cadeira na ?niversidade
inteiro. de
E ra#o dessa
mudança foi verificar se estaria sendo chamado a viver uma vida com pessoas deficientes
mentas em uma das comunidades A Arca. urante esse ano de transiç#o, senti-me muito
perto de Bemrandt e de seu Filho Pródigo. Efinal de contas, eu estava procurando um novo
lar. Parecia que meu compatriota me fora dado como um companheiro especial. Entes que
terminasse o ano, decidira faer de A Arca meu novo lar, ingressando na comunidade O
Amanhecer, em 1oronto.

A Pintura

?m pouco antes de dei2ar 1rosl, fui convidado por meus amigos o 3assie e sua
esposa ana Boert a acompanha-los numa viagem & uni#o %ovi)tica. E minha primeira reaç#o

foi: “Egora
grande ora,poderei
soueraverque
a verdadeira pintura!.
o srcinal fora esde
adquirido em que
8QIIpassara a me interessar
por /atarina, a Rrande,por
paraessa
o
Hermitage, em %#o Petersurgo 9depois da revoluç#o passou a chamar-se eningrado,
recentemente voltando & denominaç#o anterior de %#o Petersurgo> e lá continua. "u nunca
sonhara que t#o logo teria a chance de ver o quadro. Epesar de estar ansioso para conhecer de
perto um pa$s que havia t#o fortemente influenciado meus pensamentos, emoç'es e
sentimentos durante grande pare de minha vida, isso se tornou quase irrelevante se

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comparado & oportunidade de sentar diante do quadro e contemplar a pintura que me


mostrava o mais profundo do meu coraç#o.

esde o momento de minha partida, eu saia que a minha decis#o de me ligar a A Arca de
maneira definitiva e minha visita & uni#o %ovi)tica estavam intimamente ligados. O elo, eu
tinha certea, era O Filho Pródigo de Bemrandt. e certa maneira senti que ver essa pintura
me possiilitaria entrar no mist)rio de volta ao lar de uma forma que ainda n#o tinha
acontecido.

Betornar de uma cansativa viagem de palestras para um lugar seguro havia sido uma volta
ao lar0 dei2ar o mundo de professores e alunos para viver numa comunidade de homens e
mulheres deficientes mentais me fiera sentir como voltar para casa0 encontrar pessoas de um
pa$s que se separara do resto do mundo por muros e fronteiras fortemente guardadas, isso,
tam)m, foi, & sua maneira, um jeito de regressar & casa. 3as, so ou al)m de tudo isso,
“voltar para casa! parecia dier, para mim, caminhar passo a passo em direç#o Squele que me
espera de raços aertos e deseja me envolver num eterno araço. "u saia que Bemrandt
entendera profundamente esse retorno espiritual. %aia que quando Bemrandt pintou seu
Filho Pródigo, ele vivera uma e2ist+ncia que n#o lhe dei2ara d5vida sore sua verdadeira e
5ltima morada. %enti que se eu pudesse encontrar Bemrandt e2atamente onde ele pintara
pai e filho, eus e humanidade, compai2#o e mis)ria, num c$rculo de amor, eu viria a saer
tanto quanto poss$vel sore morte e vida. 1am)m tive esperança de que, mediante a ora-
prima de Bemrandt, chegaria um dia a ser capa de e2pressar o que eu mais gostaria de dier

sore o amor.
"star em %#o Petersurgo ) uma coisa. 1er a oportunidade de refletir sossegadamente
sore o Filho Pródigo no Hermitage ) inteiramente diferente. *uando vi a longa fila de gente
esperando para entrar no museu, fiquei preocupado imaginando como e por quanto tempo
poderia ver o que tanto desejara.

3inha preocupaç#o, entretanto, logo desapareceu. Cossa e2curs#o oficialmente acaou


em %#o Petersurgo e diversas pessoas do grupo voltaram &s suas cidades. E m#e de o,
%uanne 3assie, que estava na uni#o %ovi)tica durante a nossa viagem, convidou-nos a passar
alguns dias com ela. %uanne ) especialista em arte e cultura russas e seu livro The and of the
Fire!ird me ajudar astante a me preparar para a viagem. Perguntei a %uanne: “/omo devo
faer para me apro2imar do Filho PródigoN!. "la respondeu: “C#o se preocupe, Henir. ou
providenciar para que voc+ tenha todo o tempo que queira e necessite junto & sua ora
favorita!.

Co segundo dia de nossa estada em %#o Petersurgo, %uanne me deu um n5mero de


telefone e disse: “"ste ) o n5mero do escrit7rio de Ele2ei riantsev, ele ) um grande amigo
meu. 1elefone para ele e ele lhe ajudará a chegar ao seu Filho Pródigo!. 1elefonei
imediatamente e fiquei surpreso ao ouvir Ele2ei, num ingl+s cordial e com um leve sotaque,
prometer me encontrar na porta lateral, longe da entrada dos turistas.

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%áado, =I de julho de 8FGI, &s 8Jh<T, fui ao Hermitage, caminhei ao longo do Bio Ceva,
passando pela entrada principal, e encontrei a porta que Ele2ei me indicara. "ntrei e algu)m
sentado atrás de uma mesa grande permitiu que usasse o telefone interno para chamar Ele2ei.
epois de alguns minutos ele apareceu e me receeu com muita gentilea. evou-me atrav)s
de corredores espl+ndidos e imponentes escadas a um lugar fora do percurso haitualmente
feito pelos turistas. "ra uma sala comprida, de teto alto e aprecia um ateli+ de um velho
artista. Os quadros estavam empilhados por toda parte. Co centro havia mesas grandes e
cadeiras coertas de pap)is e toda sorte de ojetos. *uando nos sentamos por alguns
minutos, logo se tornou evidente que Ele2ei era o responsável pelo departamento de
restauraç#o do museu. /om muita cordialidade e claro interesse na minha vontade de passar
algum tempo com a pintura de Bemrandt, ele me ofereceu toda a ajuda necessária. evou-
me depois diretamente ao Filho Pródigo, disse ao guarda para n#o me molestar e me dei2ou.

"nt#o lá estava eu0 olhando para o quadro que estivera na minha mente e no meu
coraç#o apro2imadamente tr+s anos. "stava deslumrando diante de sua majestosa elea.
%eu tamanho, maior do que o natural, seus vermelhos intensos, marrons e amarelos, seus
recessos somreados e limiares luidios, mas, acima de tudo, o araço de pai e filho, cheio de
lu, e as quatro misteriosas testemunhas, tudo isso me atingiu com uma intensidade maior do
que poderia pensar. Houve momentos em que me ocorrera que a verdadeira pintura poderia
me desapontar. Econteceu o oposto. %ua grandiosidade e esplendor fieram com que tudo
ficasse para trás e me cativassem por completo. i aqui foi realmente uma volta ao lar.

"nquantorapidamente,
sucedendo-se muitos grupos de turistas
sentei com
numa das seus respectivos
cadeiras guias chegavam
de veludo vermelho defronte edopartiam,
quadro
e fiquei ilhando. Egora eu estava diante da ora srcinal. C#o somente o pai araçado o seu
filho de volta & casa, mas tam)m o filho mais velho e tr+s outros personagens. 6 uma ora
grande em 7leo sore tela, medindo =,; m de altura por 8,G m de largura. evou algum tempo
para que eu simplesmente esti"esse ali, simplesmente me dando conta de que estava diante
do que tanto queria ter visto, meramente goando o fato de estar soinho no Hermitage, em
%#o Petersurgo, admirando o Filho Pródigo por quanto tempo desejasse.

E pintura estava muito em e2posta, numa parede que receia, de uma janela pr72ima,
farta lu natural, num @ngulo de GT o. e onde estava, notei que a lu se intensificava & medida
que a tarde ca$a. Ss quatro horas o sol coria a pintura com novo rilho, e as figuras mais atrás
L que pareciam somente esoçadas nas primeiras horas L pareciam sair dos seus cantos
escuros. /om o entardecer, a lu do sol se tornava anelada e virante. O araço do pai e filho
tornou-se mais vigoroso e envolvente e os espectadores, mais diretamente participantes neste
misterioso encontro de reconciliaç#o, perd#o e cura interior. Rradativamente compreendi que
havia tantas pinturas do Filho Pródigo quantas as alteraç'es na luminosidade e, por algum
tempo, permaneci como que encantado com a graciosa dança da naturea e arte.

%em que me desse conta, mais duas horas haviam se passado quando Ele2ei reapareceu.
/om um sorriso compreensivo e uma atitude de apoio sugeriu que eu estava precisando de
uma pausa e me convidou para um caf). /onduiu-me atrav)s dos espl+ndidos corredores do

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museu L que era, em grande parte, o antigo palácio de inverno dos cares L at) o local de
traalho onde havia estado anteriormente. Ele2ei e seu colega haviam disposto sore a mesa
p#es, queijos e doces e me animaram para que me servisse & vontade. /ertamente, quando eu
faia planos e esperava passar algum tempo tranquilo admirando o quadro, n#o imaginava que
tomaria um caf) & tarde com os restauradores de arte do Hermitage. 1anto Ele2ei com o seu
companheiro dividiram comigo tudo o que saiam sore a ora de Bemrandt e se mostraram
ansiosos por saer por que me marcara tanto. Pareciam surpresos e mesmo um pouco
perple2os diante das minhas refle2'es e aordagem espiritual. Ouviam atentamente e me
pediram que falasse mais.

epois do caf), voltei ao quadro por mais um hora at) que o segurança e a fa2ineira me
disseram claramente que o museu estava fechando e que eu já estivera lá astante tempo.

*uatro dias mais tarde voltei para mais uma visita. Cessa ocasi#o, algo divertido
aconteceu, algo que n#o posso dei2ar de relatar. Por causa do @ngulo com que o sol da manh#
atingia a pintura, o verni empregado refletia um rilho perturador. Peguei ent#o uma das
poltronas de veludo vermelho e mudei-a para um lugar de modo que esse rilho n#o
interferisse e eu pudesse ver nitidamente os personagens no quadro. ogo que o segurança,
um rapa s)rio, de on) e vestimenta militar, viu o que eu estava faendo, ficou muito irritado
com minha ousadia em pegar a cadeira e muda-la de lugar. /aminhando na minha direç#o,
mandou, numa efus#o de palavreado russo e de gestos universalmente aceitos, que eu
colocasse a cadeira no seu lugar. "m resposta, apontei-lhe o sol e a tela, tentando e2plicar por

que mudar no
me sentei a cadeira. 3eus
ch#o. 4sso o esforços foram
perturou emmais.
ainda v#o. /oloquei
epois dea cadeira de voltatentativas
mais algumas ao seu lugar e
para
conquistar a sua simpatia, ele disse que me sentasse no aquecedor deai2o da janela, de onde
eu teria uma oa vis#o. "ntretanto, o primeiro guia a circular por al com um grupo grande
dirigiu-se a mim e falando com severidade mandou-me sair de onde estava e voltar &s cadeiras
de veludo. epois disso, o guarda ficou nervoso com o guia e lhe informou, numa profus#o de
palavras e gestos, que fora ele que me dei2ara sentar sore o aquecedor. O guia n#o se
satisfe, mas decidiu voltar sua atenç#o aos turistas que estavam contemplando Bemrandt e
questionando o tamanho dos personagens. Elguns minutos mais tarde Ele2ei veio ver como eu
estava. 4mediatamente o guarda s apro2imou dele e estava oviamente tentando e2plicar o
que acontecera, mas a discuss#o durou tanto tempo que fiquei preocupado com o rumo que
as coisas tomariam. "nt#o, repentinamente, Ele2ei saiu. Por um momento me senti culpado de
ter causado tanto transtorno e receei ter aorrecido Ele2ei. "ntretanto, de minutos depois ele
voltou carregando uma poltrona grande, estofada, de veludo vermelho e com pernas

douradas. 1udo para mim /om um largo sorriso colocou a cadeira defronte ao quando e pediu
que me sentasse. Ele2ei, o guarda e eu, todos sorrimos. "u tinha minha pr7pria poltrona e
ningu)m mais se opunha. e repente, tudo parecia astante cAmico. 1r+s cadeiras vaias que
n#o podiam ser tocadas e uma poltrona lu2uosa vinda de uma outra sala do palácio de
inverno, & minha disposiç#o, para que eu a colocasse onde me aprouvesse. /ordial urocracia
Pensei se algum dos personagens do quadro que havia presenciado toda a cena estaria
sorrindo tam)m. Cunca ficarei saendo.

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Co conjunto passei mais de quatro horas com o Filho Pródigo, anotando o que eu ouvia
dos guias e turistas, o que eu via & medida que o sol se tornava mais forte e desaparecia e,
tam)m, o que eu sentia no mais profundo do meu ser & medida que me tornava parte da
paráola que fora uma ve narrada por Kesus e que depois Bemrandt havia retratado na sua
ora. (iquei imaginando como esse tempo precioso passado no Hermitage iria qualquer dia
produir frutos.

*uando dei2ei o recinto, me dirigi ao jovem guarda e tentei e2pressar minha gratid#o por
me aguentar tanto tempo. *uando olhei nos seus olhos, so o on) da B5ssia, vi um homem
semelhante a mim: temeroso, mas com um desejo imenso de ser perdoado. e seu rosto
imere veio um sorriso muito gentil. %orri tam)m e amos nos sentimos a salvo.

O a%onte%i&ento

Elgumas semanas depois de visitar o Hermitage, em %#o Petersurgo, cheguei & Erca O
Amanhecer, em 1oronto, para vier e traalhar como guia espiritual da comunidade. Epesar de
que levara um ano todo para decidir minha vocaç#o e discernir a vontade de eus L procurar
entender se estaria sendo chamado para uma vida com deficientes mentais L ainda me sentia
apreensivo e receoso sore a minha capacidade de viv+-la em. Cunca antes prestara muita
atenç#o aos deficientes mentais. 3uito ao contrário, me ocupara mais e mais de estudantes
universitários e de seus prolemas. Eprendi como faer palestras e escrever livros, como e2por
temas sistematicamente, como compor t$tulos e sut$tulos, como argumentar e como analisar.
Portanto, eu n#o saia muito em me comunicar com homens e mulheres que mal falam e, se
o faem, n#o est#o interessados em argumentos l7gicos ou opini'es em elaoradas. %aia
ainda menos como anunciar o "vangelho de /risto a pessoas que ouviam mais com o coraç#o
do que com a mente e que eram mais sens$veis aos meus atos do que &s minhas palavras.

/heguei a O Amanhecer em agosto de 8FGI, com a convicç#o de que fiera a escolha


certa, mas com o coraç#o ainda muito perturado diante do que estava por vir. Epesar disso
estava convencido de que, depois de mais de vinte anos na sala de aula, chegara o tempo de
confiar que eus ama os pores em esp$rito de maneira especial e que, apesar de ter pouco
para lhes oferecer, eles, certamente, teriam muito o que me dar.

?ma das primeiras coisas que fi depois de minha chegada foi procurar um lugar
adequado para pendurar o pAster do Filho Pródigo. O escrit7rio que me deram era e2celente.
*uando me sentava para ler, escrever ou falar com algu)m, podia ver aquele misterioso
araço de pai e filho que se tornaram parte integrante da minha jornada espiritual.

esde a minha visita ao Hermitage, tornara-se mais consciente das quatro pessoas, dois
homens e duas mulheres, que estavam ao redor do espaço iluminado onde o pai acolhe
imaginando o que eles pensam ou sentem sore o que est#o vendo. "ssas testemunhas ou
oservadores d#o margem a toda sorte de interpretaç#o. *uando penso na minha pr7pria
caminhada, cada ve mais me convenço de que, por muito tempo, fi o papel de oservador.

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Por anos eu havia ensinado aos jovens os diferentes aspectos da vida espiritual, tentando
ajudá-los a en2ergar a necessidade de viver de acordo com esses sentimentos. *uanto a mim,
teria eu na verdade tido a coragem de me dirigir ao centro, de ajoelhar e de me dei2ar
envolver por um eus misericordiosoN

O simples fato de ser capa de e2pressar uma opini#o, enunciar um argumento, defender
um ponto de vista, elucidar um parecer, me dera, e ainda me dá, uma sensaç#o de controle. ",
em geral, sinto-me muito mais seguro quando consigo controlar um situaç#o n#o definida do
que quando me sumeto ao desenrolar dos acontecimentos.
/ertamente houve muitas horas de oraç#o, muitos dias e meses de retiro e in5meras
palestras com diretores espirituais, mas eu nunca aandonara o papel de oservador. Epesar
de que a vida toda desejara estar no interior olhando para fora, n#o ostante continuamente
voltava & posiç#o de um estranho olhando para dentro. Elgumas vees este olhar para dentro
era de curiosidade, outras de ci5me ou de ansiedade e, &s vees, at) um olhar afetuoso. 3as
dei2ar a posiç#o um tanto cAmoda de oservador e cr$tico parecia um grande salto num
territ7rio totalmente desconhecido. esejava tanto manter certo controle sore minha
caminhada espiritual, continuar capa de prever pelo menos parte do resultado, que renunciar
& posiç#o tranquila parte do resultado, que renunciar & posiç#o tranquila de oservador pela
incertea do filho que volta parecia quase imposs$vel. (ormar estudantes, transmitir a eles as
muitas e2plicaç'es dadas, ao longo dos s)culos, das palavras e atos de Kesus, e indicar-lhe os
diversos caminhos espirituais que as pessoas percorreram no passado, se parece astante com

tomar a atitude
mulheres de um
de p), atrás dos em
do Pai, quatro personagens
posiç'es que
diferentes, circundam
o homem o araço
sentado divino.
olhando Es duas
no vaio, sem
vislumrar ningu)m, e o jovem alto, em p), ereto, em atitude cr$tica diante do que se passa
num plano & sua frente L s#o todas maneiras de n#o se envolver diretamente. Há indiferença,
curiosidade, devaneio e oservaç#o atenta0 há olhares fi2os, contemplativos, vigilantes e
calmos0 há diferentes posturas L na retaguarda, encostado a um arco, de raços cruados, de
m#os entrelaçadas. /ada uma dessas atitudes, reservadas ou manifesta, me s#o em
familiares. Elgumas s#o mais confortáveis do que outras, mas todas s#o maneiras de n#o se
envolver.

Optar por mudar, n#o mais lecionando a estudantes universitários e passando a viver com
deficientes mentais, era, pelo menos para mim, um passo em direç#o ao plano em que o pai
araça o filho ajoelhado. 6 o local iluminado, o paradeiro da verdade e do amor. 6 o lugar onde
tanto desejo estar, mas do qual tenho tanto receio.

E$ encontrarei tudo o que procuro, tudo o que desejei ter, tudo o que poderei precisar,
mas tam)m ) nesse estágio que devo renunciar a tudo aquilo a que ainda me apego. 6 o lugar
que me fa compreender que verdadeiramente aceitar amor, perd#o e cura ), muitas vees,
mais dif$cil do que conced+-los. 6 o estágio que se situa al)m de conquistas, merecer e oter
recompensa. 6 o lugar de entrega e confiança asolutas.

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odo depois de chegar a O Amanhecer, inda, uma onita jovem portadora de s$ndrome
de oUn, pAs seus raços em volta do meu pescoço e me disse: “em-vindo!. "la age da
mesma maneira com todos os rec)m-chegados e, sempre que fa isso, ) com plena convicç#o
e amor. 3as como receer um tal araçoN inda nunca havia me encontrado. Cada saia dos
meus antecedentes antes de chegar a O Amanhecer. Kamais conhecer meu lado somrio, nem
pudera visualiar aspectos menos favoráveis. "la nunca lera nenhum dos meus livros, nunca
me ouvira pregar, ou sequer havia tido uma conversa comigo.

"nt#o deveria eu simplesmente sorrir, dirigir-me a ela com carinho, e continuar como se
nada tivesse acontecidoN Ou inda estava ali, naquele mesmo plano, diendo com seu gesto:
“enha, n#o seja t#o t$mido, seu Pai tam)m quer araça-lo!. Parece que cada ve, seja com a
saudaç#o de inda, o aperto de m#o de ill, o sorriso de Rregor, o sil+ncio de Edam ou as
palavras de Bamond, tenho que faer uma escolha entre “e2plicar! esses gestos ou
simplesmente aceita-los como convites para suir mais alto, chegar mais perto.

"stes anos em O Amanhecer n#o t+m sido fáceis. 1em havido muita luta $ntima e
sofrimento mental, emocional e espiritual. Cada, asolutamente nada, dava a impress#o de
que tivesse atingido o ojetivo. "ntretanto, a mudança de Harvard para A Arca representava
uma pequena mudança da posiç#o de oservador para a de participante, de áritro para o de
pecador contrito, de pregar o amor a ser querido como o filho em-amado. C#o suspeitava
qu#o dif$cil seria a jornada. C#o saia qu#o profundamente enraiada a resist+ncia que havia
em mim e como seria angustiante encarar a verdade, cair de joelhos e dei2ar que lágrimas

escorressem livremente.
grande acontecimento que"uo quadro
n#o faia
deideia de como
Bemrandt seria dif$cil participar efetivamente do
retrata.

/ada pequeno passo em direç#o ao centro me parecia uma solicitaç#o imposs$vel, um


pedido para que eu dei2asse de lado essa vontade de estar no controle, de que adicasse, mais
uma ve, da inclinaç#o de faer progn7sticos, de mais uma ve sucumir ao medo de ignorar a
que tudo isso levaria, e a me entregar ao amor que n#o conhecia limites. "ntretanto, saia que
nunca seria capa de viver o grande mandamento do amor sem que eu mesmo fosse amado
incondicionalmente. E dist@ncia entre ensinar e aceitar eu mesmo o amor evidenciou-se muito
mais longa do que eu imaginara.

A +is,o

3uito do que aconteceu desde que cheguei a O Amanhecer está escrito em diários e
anotaç'es, mas, do jeito que está, pouco pode ser partilhado com outros. Es palavras s#o
muito cruas, intensas, “carregadas! e sem floreios. Egora chegou o tempo em que ) poss$vel
olhar para trás, para esses anos de turul+ncia e descrever, de maneira ojetiva, o ponto a que
toda essa luta me conduiu. Einda n#o sou astante independente para dei2ar que o araço do
Pai me envolva completamente. e muitas maneiras estou ainda me dirigindo ao centro. "stou
ainda como o Filho Pródigo L viajando, preparando falas, imaginando como será quando

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

chegar & casa do Pai. 3as estou, certamente, no caminho para asa. ei2ei o pa$s long$nquo e
vim para sentir a pro2imidade do amor. "stou, portanto, pronto a partilhar minha hist7ria. Há
uma certa esperança, uma certa lu e algum consolo nessa narrativa. 3uito do que vivi nos
5ltimos anos será parte desta hist7ria, n#o para e2pressar insegurança ou desespero, mas
como passagens de minha caminhada & procura da lu.

O quadro de Bemrandt ficou em perto de mim durante esse tempo. 3udei-o de lugar
algumas vees L do meu escrit7rio para a /apela, da /apela para a sala de estar da casa “ia
de Primavera! 9a casa de oraç#o dVO Amanhecer> e dessa sala de estar de volta para a /apela.
(alei sore esse quadro muitas vees, dentro e fora da comunidade dVO Amanhecer, a pessoas
deficientes e aos que as assistem L a guias espirituais e padres, a homens e mulheres de
diversas camadas sociais.

*uanto mais falei do Filho Pródigo, quanto mais o contemplei, mais a pintura passou a ser
a minha pr7pria criaç#o, a ora que cont)m n#o somente o cerne da hist7ria que eus deseja
me contar, mas tam)m tradu todo o sentido daquilo que eu quero dier a eus e a seu
povo. 1odo o "vangelho está ali. 1oda a minha vida está ali. 1odas as vidas dos meus amigos. E
ora se tornou uma passagem misteriosa por meio da qual posso entrar no Beino de eus. 6
como se fora um port#o largo que me permite passar para o outro lado da vida e de lá
contemplar uma variedade singular de pessoas e fatos que comp'em o meu dia-a-dia.

Por muitos anos procurei vislumrar eus mediante a oservaç#o cuidadosa de diferentes
aspectos do comportamento humano: amor e solitude, alegria e pesar, ressentimento e
gratid#o, disc7rdia e pa. Procurei entender os altos e ai2o da alma humana, ali distinguir
dome e sede que somente um eus cujo nome ) Emor pode saciar. 1entei descorir o
duradouro acima do transit7rio, o eterno contrapondo-se ao temporal, o verdadeiro amor
vencendo toda desolaç#o, toda ang5stia o fato que, ao lado da nossa naturea mortal paira
uma presença maior, profunda, ampla e mais ela do que podemos imaginar, e falar dessa
presença como algo que mesmo agora pode ser visito, ouvido e tocado por aqueles que se
disp'em a crer.

"ntretanto, durante a minha estada aqui nVO Amanhecer, fui conduido a um lugar dentro
de mim onde ainda n#o estivera. 6 um recanto muito $ntimo que eus escolheu para faer sua
morada. 6 a$ que me sinto seguro sendo envolvido pelo araço de um Pai amoroso que me
chama pelo nome e di: “oc+ ) o meu filho querido, que tem todo o meu carinho!. 6 nesse
local seguro que encontro toda a alegria e toda a pa que n#o s#o deste mundo.

faer"sse arigomorada.
ali minha sempre Kesus
e2istiudi:
e eu
“%eoalgu)m
reconhecia comoguardará
me ama, a fonte dminha
graças, mas n#o
palavra conseguia
e o meu Pai o
=
amará e a ele viremos e nele estaeleceremos morada! . "stas palavras sempre me tocaram
profundamente. "u sou o templo de eus

=
Jo #$%&'.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

3as foi sempre dif$cil, para mim, reconhecer a verdade contida nessas palavras. %im, eus
haita no mais $ntimo do meu ser, mas como poderia eu aceitar o chamado de Kesus:
“Permanecei em mim, como eu em v7s!<. O convite ) claro e inconfund$vel. Haitar no mesmo
lugar onde eus fe a sua morada, este ) o grande desafio espiritual. Parecia uma tarefa
imposs$vel.

/omo meus pensamentos, sentimentos, emoç'es e pai2'es, eu estava sempre distante do


local escolhido por eus como o lar. oltar para casa e permanecer ali, onde eus haita,
ouvindo o apelo da verdade e do amor, isso era, de fato, a jornada que eu mais temia pois
saia que eus ) um amante possessivo que me quer por inteiro todo o tempo. *uando eu
estaria pronto para aceitar esse amorN

eus mesmo me mostrou o caminho, Os prolemas f$sicos e emocionais que


interromperam o meu dia-a-dia atarefado nVO Amanhecer me origaram L de forma decisiva L
a voltar para casa e a uscar eus onde eus pode ser encontrado L no meu pr7prio santuário.
C#o posso dier que tenha a$ chegado. Cesta vida n#o conseguirei, porque a usca de eus
transcende os limites da morte. Epesar de ser uma caminhada longa, e astante dif$cil, )
tam)m cheia de surpresas deliciosas, muitas vees nos permitindo sentir o gosto do que está
por vir.

*uando vi pela primeira ve o quadro de Bemrandt, essa noç#o da presença de eus em
mim n#o era t#o n$tida quanto agora. "ntretanto, a reaç#o intensa ao araço do pai e filho
mostrou qu#o ansiosamente eu uscara aquele lugar secreto onde eu tam)m pudesse me
sentir t#o amparado quanto o jovem do quadro. Ca ocasi#o n#o era poss$vel prever o que seria
necessário para chegar um pouco mais perto desse lugar. Egradeço n#o ter saido de antem#o
o que eus havia reservado para mim. Egradeço tam)m, pois, com o sofrimento, algo de
novo se ariu dentro de mim. 1enho uma vocaç#o diferente agora. 6 o desejo de falar e
escrever dessa aertura dentro de situaç'es na minha vida e na de outros, tam)m incerta.
evo me ajoelhar diante do Pai, colocar os ouvidos no seu peito e ouvir, sem interrupç#o, os
atimentos do coraç#o de eus. %omente ent#o posso e2pressar com cautela e suavidade o
que ouço. %ei agora que devo falar da eternidade no cotidiano0 da alegria duradoura na
realidade passageira de nossa reve e2ist+ncia neste mundo0 da casa do amor na casa do
medo0 da presença de eus nas dimens'es humanas. "stou em ciente da grandiosidade desta
vocaç#o. Einda assim, confio que este seja o 5nico caminho. Poder$amos chama-lo de vis#o
“prof)tica! L contemplar o mundo e as pessoas atrav)s dos olhos de eus.

%erá isso poss$vel para um ser humanoN 3ais ainda: “) a opç#o que devo faerN!. C#o se
trata de uma pergunta intelectual. 6 uma quest#o de vocaç#o. %ou chamado a entrar no
santuário em dentro do meu pr7prio ser onde eus escolheu faer sua morada. %omente por
meio da oraç#o cont$nua posso me colocar a$. 3uitas dificuldades e muito sofrimento podem
arir o caminho, mas tenho a certea de que somente pela oraç#o constante poderei chegar.

<
Jo #(%$.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

-ntrodu,o

O ilho &ais /o+e&0


O ilho &ais +elho e o !ai

Co ano que seguiu ao meu primeiro encontro com o Filho Pródigo, minha jornada
espiritual foi marcada por tr+s fases que me ajudaram a traçar as ase da minha hist7ria.

E primeira fase d7i a e2peri+ncia de ser o filho mais moço. Os longos anos de ensino
universitário e o profundo envolvimento com assuntos ligados &s Em)ricas /entral e do %ul
fieram com que me sentisse um tanto perdido. 1enho peramulado por lugares long$nquos e
vastos, encontrado gente com os mais diversos estilos de vida e de diferentes credos, e
participado de muitos movimentos. 3as, no fim de tudo isso, eu me senti sem um lar e
astante cansado. *uando vi a maneira carinhosa como o pai tocava os omros do filho mais
jovem e o amparava contra o seu peito, senti em no fundo do meu coraç#o que eu era o filho
perdido que desejava voltar, como ele o fiera, para ser araçado da mesma maneira. Por
muito tempo me coloquei no lugar do Filho Pródigo, de volta & casa, antegoando o momento
de ser afetuosamente receido por meu Pai.

epois, um tanto inesperadamente alguma coisa mudou. epois de estar na (rança por
um ano, e da minha visita ao Hermitage, em %#o Petersurgo, o desespero que fiera com que
eu me sentisse t#o em sintonia com o filho mais jovem diminuiu um tanto L passou, por assim
dier, a ocupar um lugar de menos destaque em meu consciente. "u tomara a decis#o de ir
para O Amanhecer em 1oronto e, consequentemente, me sentia mais confiante do que at)
ent#o.

?ma segunda fase da minha jornada espiritual teve in$cio numa tarde em que eu
conversava sore a pintura de Bemrandt com art Ravigan, um amigo ingl+s que no 5ltimo
ano passara a me conhecer intimamente. "nquanto e2plicava a art como tinha sido forte a
minha identificaç#o com o filho mais jovem, ele me olhou firme nos olhos e me disse: “%erá
que n#o ) com o filho mais velho que voc+ mais se pareceN!. /om essas palavras ariu-se um
novo espaço dentro de mim.

%inceramente, eu nunca me vira como o filho mais velho, mas depois que art me colocou
diante dessa possiilidade, in5meras ideias me vieram & mente. /omeçando pelo simples fato
que, na minha pr7pria fam$lia eu sou, realmente, o filho mais velho, conclu$ que vivera uma
vida de muita disciplina. Eos seis anos já desejava ser padre e nunca mudara de ideia. Casci, fui
atiado, crismado e ordenado na mesma igreja e fui sempre oediente aos meus pais,

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

professores, ispos e ao meu eus. Cunca sai de casa, nem desperdicei meu tempo e dinheiro
em praeres do se2o0 jamais me perdi em “devassid#o ou emriague!. J 1oda a minha vida fui
muito responsável, fiel & tradiç#o e & fam$lia. 3as, com tudo isso, posso, na verdade, ter
estado t#o perdido quanto o filho mais jovem. e repente me en2erguei de maneira
inteiramente diversa. "n2erguei o meu ci5me, raiva, suscetiilidade, ostinaç#o, mau humor e,
acima de tudo, meu farisa$smo sutil. i quando eu me quei2ava e quanto o meu pensar e agir
estavam imu$dos de ressentimento. Por algum tempo n#o dava para acreditar a que tivesse
me en2ergado como o filho mais jovem. "u era, certamente, o mais velho, mas t#o perdido
quanto seu irm#o mais moço, apesar de que eu permanecera “em casa! toda a minha vida.

"u estivera traalhando duro na faenda de meu pai, mas nunca, na verdade, me
regoijara pelo fato de estar em casa. "m ve de me sentir agradecido pelos privil)gios a mim
concedidos, eu meu tornara uma pessoas ressentida: cimenta de meus irm#os e irm#s mais
jovens que tanto tinham se aventurado e que eram receidos de volta com tanto carinho.
urante o meu primeiro ano e meio nVO Amanhecer, o comentário t#o perspica de art
continuava a reger a minha vida interior.

3ais estava por vir. Cos meses que se seguiram & comemoraç#o do trig)simo aniversário
de minha ordenaç#o sacerdotal, gradualmente fui entrando em depress#o e passei a sentir
muita ang5stia. /heguei ao ponto de n#o mais me sentir seguro na minha pr7pria comunidade
e tive que sair para uscar ajuda e traalhar diretamente na minha cura interior. Os poucos
livros que pude levar comigo eram todos sore Bemrandt e a paráola do Filho Pródigo.

"mora morando numlerlugar


muito reconfortável umatanto
sore vida isolado, distante
atriulada de meus
do grande amigos
pintor e da comunidade,
holand+s e conhecerera
os
caminhos sofridos que, finalmente, o capacitaram a pintar essa ora magn$fica.

Por hora, admirei os lindos desenhos e pinturas que ele havia criado no meio de todos os
reveses, desilus'es e pesar e compreendi como, de seu pincel, emergiu a figura de um homem
quase cego amparando seu filho num gesto de perd#o e compadecimento. "ra preciso que
tivesse passado por muitas mortes e chorado muitas lágrimas para ter produido uma figura
de eus com tanta humildade.;

(oi durante esse per$odo de grande sofrimento $ntimo que uma outra amiga falou o que
eu mais precisava ouvir. " assim deu in$cio & terceira fase de minha jornada espiritual. %ue
3osteller, que estivera com a comunidade dVO Amanhecer desde o in$cio dos anos QT e
desempenhara um papel importante para que eu viesse para cá, me dera apoio indispensável
quando as coisas se tornaram dif$ceis e me encorajara a lutar e sofrer o quanto fosse preciso,
de modo a oter plena liertaç#o interior. *uando %ue me visitou no meu “hermitage!W e
falamos sore o Filho Pródigo, ela disse: “*uer voc+ seja o filho mais moço ou o mais velho,
voc+ precisa compreender que ) chamado a se tornar o Pai!.

J
c &#%'$.
;
)A*+,-*T% Paul.a vie "1 lVoeuvre de Bemrandt. Paris% A/0 dition1Vilo% #23$. PP. &#4%&'3.
W C.1.: O autor usa um jogo de palavras com o nome do museu e o profundo sentido de “hermitage! - cela ou convento de
eremitas L referindo-se & sua pr7pria e2peri+ncia naquele momento.

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O Filho Pródigo
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%uas palavras me atingiam como uma descarga el)trica porque, depois de todos esses
anos de ter vivido com a pintura e visto o pais idoso amparando um filho, nunca me ocorrera
que a figura do Pai era a que melhor e2pressava a minha vocaç#o.

%ue n#o me deu chance para que protestasse: “oc+ esteve a vida toda procurando
amigos, desde que o conheço vive carente de afeiç#o0 esteve interessado em milhares de
coisas, solicitando de um lado e de outro atenç#o, louvou e afirmaç#o, & direta e & esquerda.
/hegou a hora de procurar sua verdadeira vocaç#o L de ser um pai que pode acolher seus
filhos que voltam sem lhes faer perguntas e sem esperar nada em troca. Olhe para o pai no
pAster e voc+ entenderá quem voc+ ) chamado a ser. C7s, nVO Amanhecer, e a maioria das
pessoas que o cerca n#o precisamos de voc+ como um om amigo ou mesmo um irm#o
carinhoso. Precisamos de voc+ como o pai que possa se arrogar o direito da verdadeira
compai2#o!.

Olhando para o homem idoso arudo, com seu amplo manto vermelho, sentir profunda
dificuldade em me ver daquela maneira. "u estava pronto a me identificar com o jovem
perdulário ou com o filho mais velho, ressentido, mas a ideia de ser como o anci#o que nada
tinha a perder porque perdera tudo a ser somente que dar me dei2ava com muito medo.
"ntretanto, Bemrandt morreu quanto tinha I< anos e estou muito mais pr72imo dessa idade
do que da de qualquer um dos dois filhos. Bemrandt se dispAs a se colocar no lugar do pai0
por que n#o euN

O ano e meio decorridos desde esse desafio de %ue 3osteller tem sido um tempo em que
procuro assumir minha paternidade espiritual 1em sido uma luta ena e dif$cil e muitas vees
ainda sinto o desejo de continuar como filho e nunca envelhecer, mas tam)m e2perimentei a
alegria enorme de filhos voltando ao lar e de colocar neles as m#os numa atitude de perd#o e
+nç#o. /heguei a saer um pouco como ) ser um pai que nada pergunta, desejando somente
receer os filhos em casa.

1udo o que eu vivi desde o meu primeiro encontro com o pAster de Bemrandt deu-me
n#o somente a inspiraç#o para escrever este livro, mas tam)m para estruturá-lo. 4rei
primeiramente refletir sore o filho mais jovem, depois sore o mais velho e finalmente sore
o pai. Porque, na verdade, sou o filho mais moço0 sou o filho mais velho0 e estou a caminho de
me tornar o pai. ", para voc+s que v#o faer esta caminhada espiritual comigo, desejo e oro
para que descuram dentro de cada um de voc+s n#o somente o filho perdido de eus, mas
tam)m a m#e e o pai compassivos que eus ).

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parte I

O F-HO MA- MOO

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O filho mais jovem disse ao pai5 6Pai% d71me a parte da heran8a 9ue me ca!e:.  o pai
di"idiu os !ens entre eles. Poucos dias depois% a;untando todos os seus ha"eres% o filho mais
;o"em partiu para uma regi<o long=n9ua e ali dissipou sua heran8a numa "ida de"assa.

 gastou tudo. >o!re"eio ?9uela regi<o uma grande fome e ele come8ou a passar
pri"a8@es. Foi% ent<o% empregar1se com um dos homens da9uela regi<o% 9ue o mandou para
seus campos cuidar dos porcos. le 9ueria matar a fome com as !olotas 9ue os porcos comiam%
mas ningum lhas da"a.  caindo em si% disse5 69uantos empregados de meu pai tBm com
fartura% e eu a9ui% morrendo de fomeC Vou1me em!ora% procurar o meu pai e diDer1lhe5 Pai%
pe9uei contra o /u e contra tiE ;7 n<o sou digno de ser chamado tu filho. Trata1me como um
dos seus empregados:. Partiu% ent<o% e foi ao encontro de seu pai.

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Henri J. M. Nouwen

8
4e&5randt e o ilho &ais &oo

Bemrandt estava perto da morte quando ele pintou o seu Filho Pródigo.
Provavelmente d7i um dos seus 5ltimos traalhos. *uanto mais leio sore a pintura e a
contemplo, mais a en2ergo como cap$tulo final de uma vida tumultuada e sofrida. Kuntamente
com sua ora inacaada >ime<o e o Menino Jesus, o Filho Pródigo retrata a percepç#o de sua
idade avançada L uma percepç#o em que cegueira f$sica e profunda vis#o interior est#o
intimamente ligadas. E maneira pela qual o velho %ime#o segura a criança indefesa e o modo
de o pai araçar seu filho e2austo revelam uma vis#o interior que fa lemrar as palavras de
Kesus aos seus disc$pulos: “Eençoados os olhos que veem o que v7s vedes!. I 1anto %ime#o
como o pai do filho que volta traem dentro de si aquela lu misteriosa pela qual eles veem. 6
uma lu interior, em escondida, mas que irradia uma elea suave e penetrante.

"ssa lu interior, entretanto, ficar escondida por muito tempo. Por muitos anos fora
inating$vel para Bemrandt. Rradativamente, & custa de muita ang5stia, ele a encontrou em si
mesmo e, por meio dele, naqueles que pintou. Entes de ser como o pai, Bemrandt fora por
muito tempo como o jovem orgulhoso que “se apossou de tudo o que tinha e partiu para um
pa$s distante onde esanjou toda a fortuna!.

*uando olho para os autorretratos, profundamente interioriados, que Bemrandt pintou


durante seus 5ltimos anos, e que e2plicam astante a sua inclinaç#o para retratar o pai, o
anci#o iluminado e o velho %ime#o, n#o devo esquecer que, como jovem. Bemrandt tinha
todas as caracter$sticas do Filho Pródigo: impetuoso, convencido, gastador, sensual e muito
arrogante. Eos trinta anos ele se retratou com uma esposa. %asMia, como o filho perdido num
ordel. "sse quadro n#o dei2a ver nada mais profundo. "mriagado, com a oca entreaerta e
os olhos ávidos de se2o, ele olha desdenhosamente para aqueles que contemplam seu retrato
como se dissesse: “4sso n#o ) o má2imoN!. /om sua m#o direita, ele ergue um copo
parcialmente cheio enquanto com a esquerda toca os quadris de sua namorada, cujo olhar )
t#o lascivo quanto o seu. O caelo comprido e encaracolado de Bemrandt, sua oina de
veludo com a pena ranca e a espada com a anha de couro e cao dourado, tocando as
costas dos dois folga'es, tudo isso dei2a pouca d5vida sore suas intenç'es. E cortina pu2ada
no cano superior direito fa a gente pensar nos ord)is do decadente distrito da lu vermelha
de Emsterd#. (itando intencionalmente esse autorretrato sensual do jovem Bemrandt como

I
c #4%&'.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

o Filho Pródigo, mal posso crer que este seja o mesmo homem que, trinta anos mais tarde, se
retratou com olhos que penetram t#o profundamente os escondidos mist)rios da vida.

"ntretanto, os i7grafos de Bemrandt o descrevem como um jovem orgulhoso por


demais convencido de seu pr7prio talento e desejoso de e2plorar tudo o que o mundo tem a
lhe oferecer, um e2trovertido que ama lu25ria e pouco se importa com o que se passa com as
pessoas & sua volta. C#o há d5vida de que o dinheiro era uma das principais preocupaç'es de
Bemrandt. "le ganhou muito, gastou muito e perdeu muito. . Rrande parte de sua energia foi
gasta em longos processos judiciais de fal+ncia. Os autorretratos pintados no final da segunda
d)cada de sua e2ist+ncia e ao começar a terceira mostram Bemrandt como um homem
sedento de fama e ajulaç#o, apreciador de roupas e2travagantes, preferindo correntes
douradas a colarinhos rancos engomados, e chap)us, oinas, capacetes e turantes
esportivos e iarros. 3esmo que muito desse modo de se vestir t#o caprichado possa ser
considerado como um procedimento normal, visando & prática e & demonstraç#o de t)cnicas d
pintura, tam)m retrata uma personalidade arrogante que n#o visa somente agradar aos seus
patrocinadores.

/ontudo, a esse curto per$odo de sucesso, popularidade e riquea, seguem-se muita


tristea, infelicidade e infort5nio. Pode ser acarunhador tentar resumir as muitas desventuras
da vida de Bemrandt. C#o s#o diferentes das do Filho Pródigo. epois de ter perdido seu filho
Bumartus em 8I<;, sua primeira filha /orn)lia em 8I<G e sua segunda filha /orn)lia em
8IJT, sua esposa %asMia, que ele muito amava e admirava, morre em 8IJ=. Bemrandt fica

com
a ser um filho de
marcada pornove meses,prolemas
in5meros 1itus. epois da morte de?m
e sofrimentos. %asMia, a vida de Bemrandt
relacionamento continua
muito infeli com a
enfermeira de 1itus, Reertje irc2, termina por aç#o judicial e internaç#o de Reerttje num
sanat7rio. %egue-se uma uni#o mais estável com HendricMje %toffels. "la lhe dá um filho que
morre em 8I;< e uma filha, /orn)lia, a 5nica que sorevive a ele.

urante esses anos, a popularidade de Bemrandt, como artista, caiu rapidamente,


emora alguns colecionadores e cr$ticos continuassem a reconhec+-lo como um dos grandes
pintores de seu tempo. %eus prolemas financeiros se tornaram de tal ordem que em 8I;I,
Bemrandt ) considerado insolvente e, para evitar fal+ncia, as propriedades e ens que possui
s#o colocados & disposiç#o de seus credores. 1udo o que possui, suas oras de arte e as de
outros pintores, sua vasta coleç#o de ojetos artesanais, sua casa em Emsterd#, sua mo$lia,
tudo ) vendido em tr+s leil'es, durante os anos de 8I;Q e 8I;G.

Epesar de que Bemrandt nunca conseguira ficar completamente livre de dividas e


devedores, aos cinquenta anos alcançou uma certa pa. %eus quadros deste per$odo crescem
em calor e interioridade e mostram que os muitos desapontamentos n#o o tornaram
amargurado. Eo contrário, tiveram sore sua maneira de ver um efeito purificador. Kaco
Bosenerg, escreve: “"le começou a contemplar homem e naturea com olhos mais
penetrantes, n#o mais aturdido por apar+ncias pomposas ou demonstraç'es teatrais!.Q "m

Q
0O>N)0% Jaco!.Bemrandt5 life and worG.'. ed. ondres1N.orG% Phaindon% #2I3. p. &I.

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8II< morre HendricMje e cinco anos depois Bemrandt assiste n#o s7 ao casamento, mas
tam)m & morte de seu amado filho, 1itus. *uando o pr7prio Bemrandt morre em 8IIF, ele
) um homem pore e solitário. %omente sua filha /orn)lia, sua nora 3agdalene an oo e sua
neta 1itia sorevivem a ele.

*uando vejo o Filho Pródigo ajoelhando diante do pai e encostando o rosto contra seu
peito, vejo o artista outrora t#o confiante e respeitado e chego & dolorosa conclus#o de que a
fama que alcançou foi apenas gl7ria passageira. "m ve dos ricos trajes com os quais o jovem
Bemrandt pintou a si mesmo no ordel, ele agora usa somente uma t5nica rasgada corindo
seu corpo emaciado e as sandálias, com as quais caminhou tanto, que se tornaram gastas e
imprestáveis.

Olhando o filho penitente e o pai compassivo, vejo que a lu cintilante refletida por
correntes douradas, armaduras, capacetes, velas e l@mpadas escondidas se apagou e foi
sustitu$da pela lu interior da velhice. 6 o movimento a partir da gl7ria que leva a uma usca
cada ve maior de riquea e popularidade em direç#o & gl7ria que se acha escondida na alma
humana e transcende a morte.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

=
Partida do ilho &ais /o+e&

O filho mais jovem disse ao pai5 6Pai% d71me a parte da heran8a 9ue me ca!e:.  o pai di"idiu
os !ens entre eles. Poucos dias depois% a;untando todos os seus ha"eres% o filho mais ;o"em
partiu para uma regi<o long=n9ua.

&a re/ei,o radi%al

E denominaç#o correta da pintura de Bemrandt ), como já foi dito, A Volta do Filho


Pródigo. "stá impl$cita na “volta! uma partida. oltar ) tornar a casa depois de dei2ar a casa,
um retorno depois de ter ido emora. O pai que acolhe o seu filho em casa está t#o feli
porque este filho “estava morto e tornou a viver0 ele estava perdido e foi encontrado!. G E
alegria imensa em receer de volta o filho perdido esconde a tristea imensa e2perimentada

antes. O achar tem atrás de si o perder, o regessar ariga so seu manto a partida. Olhando
para a volta carinhosa e cheia de alegria, tento pensar no gosto dos acontecimentos tristes que
o precederam. %7 quando me atrevo a me aprofundar no que significa dei2ar a casa posso
entender realmente a volta. O tom suave, amarelo-castanho, da t5nica do filho ) onito
quando visto em harmonia com o vermelho do manto paterno, mas a verdade ) que a roupa
do filho está em frangalhos que denunciam a mis)ria de que ele vem. Co conte2to do araço
compassivo, nossa fragilidade pode parecer ela, mas nossa fragilidade n#o tem oura elea
sen#o aquela que vem da compai2#o que a cerca.

Para em entender o mist)rio da compai2#o, tenho que olhar francamente para a
realidade que a suscita. O fato ) que muito antes de ir e vir, o filho partiu. "le disse a seu pai:
“á-me a parte da herança que me cae!, depois ele reuniu tudo o que receera e partiu. O
evangelista ucas conta tudo isso de maneira t#o simples e direta que ) dif$cil em avaliar que
o que está acontecendo aqui ) um acontecimento inaudito, danoso, ofensivo, e em flagrante
contradiç#o aos háitos mais respeitáveis da )poca. Xenneth aile, na sua e2plicaç#o
arangente da hist7ria de ucas, mostra que a maneira do filho partir ) equivalente a desejar a
morte de seu pai. aile escreve:

Por mais de 9uinDe anos tenho perguntado a pessoas de diferentes camadas sociais
do Marrocos ? ndia e da Tur9uia ao >ud<o so!re as implica8@es de um pedido como esse

G
c #(%'&.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

K do filho eLigir sua heran8a en9uanto seu pai ainda "i"e. A resposta tem sido sempre a
mesma... a con"ersa se passa assim5

1 Algum na sua cidade ;7 feD um pedido assim5

1 NuncaC

1 >eria poss="el algum faDer um pedido semelhante

1 imposs="el.
1 >e algum fiDesse isso% o 9ue aconteceria

1 /ertamente seu pai o espancariaC

1 Por 9uB

1 O pedido significa5 ele 9uer 9ue seu pai morra.2

aile e2plica que o filho pede n#o s7 a divis#o da herança, mas tam)m pede que possa
dispor de sua parte. “epois de passar os seus ens par o seu filho, o pai ainda tem o direito
de viver do usufruto... enquanto ele viver. Equi o filho mais moço recee, e, portanto se
entende que tenha solicitado a concess#o a que, de forma e2pl$cita, n#o tem direito at) a
morte de seu pai. E infer+ncia de: VPai, eu n#o posso esperar que morraV fundamenta as duas
solicitaç'es.! 8T

O filho indo emora ), portanto, um ato muito mais grave do que parece & primeira vista.
6 uma rejeiç#o cruel do lar no qual o filho nasceu e foi criado e uma ruptura com a mais
preciosa tradiç#o apoiada pela comunidade maior da qual ele fa parte. *uando ucas escreve
“partiu para uma regi#o long$nqua!, ele se refere a muito mais do que ao desejo de um jovem
de ver o mundo. "le se refere a uma quera drástica da maneira de viver, pensar e agir que
receeu como um legado sagrado das geraç'es passadas. 3ais do que desrespeito, ) uma
traiç#o aos valores cultuados pela fam$lia e pela comunidade. O pa$s distante ) o mundo no
qual n#o se repeita o que em casa ) considerado sagrado.

E e2plicaç#o, para mim, ) muito importante n#o s7 porque me dá uma compreens#o


e2ata da paráola no seu conte2to hist7rico, mas tam)m L e soretudo L porque me convida
a reconhecer o filho mais jovem em mim mesmo. "m princ$pio parecia dif$cil descorir na
minha pr7pria caminhada tal desafio. C#o me considero como sendo capa de menosprear os
valores que faem parte da minha herança. 3as quando e2amino cuidadosamente as maneiras
sutis pelas quais preferi o pa$s long$nquo & morada t#o perto, o filho mais jovem de repente
aparecer. (alo aqui do “dei2ar a casa! espiritual L em distinto do simples fato que passei a
maior parte de minha vida fora de minha querida Holanda.

F
E4"Y, Xenneth ". Poet and peasant and through peasant ees A literar1cultural approach to the para!les
. Rran Bapids, 3ich,
Zilliam . "erdmans, 8FG<. pp. 8I8-8I=
8T
4dem, iidem, p. 8IJ

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

3ais do que qualquer outra hist7ria no "vangelho, a paráola do Filho pródigo retrata o
infinito amor compassivo de eus. " quando me coloco nessa hist7ria so a lu do amor de
eus, fica claro que dei2ar a casa está muito mais pr72imo de minha viv+ncia espiritual do que
eu poderia pensar.

E pintura de Bemrandt do Pai acolhendo o filho tem pouco movimento. "m comparaç#o
com o seu desenho do Filho Pródigo de 8I<I L cheio de aç#o, o pai correndo de encontro ao
filho e o filho se jogando aos seus p)s L a pintura do Hermitage, feita <T anos mais tarde, ) de
total calmaria. O contato do pai com o filho ) uma enç#o perene0 o filho descansando contra
o peito do pai ) uma pa ine2tingu$vel. /hrstian 1[mpel escreve: “O momento de receer e
perdoar na quietude da composiç#o perdura para sempre. Os gestos do pai e do filho falam de
alguma coisa que n#o se e2tingue, mas permanece, para sempre!.88 KaMo Bosenerg resume a
vis#o de maneira muito ela quando escreve: “O pai e o filho parecem e2teriormente quase
im7veis, mas intimamente est#o muito emocionados... a hist7ria n#o ) do amor humano de
um pai terreno... o que ) retratado aqui ) o amor divino e a miseric7rdia capa de transformar
morte em vida!.8=

-nsens7+el 8 +o do a&or

ei2ar a casa ), portanto, muito mais do que um acontecimento hist7rico limitado a


tempo e lugar. 6 negar a realidade espiritual de que pertenço a eus com todo o meu ser, que
eus me ampara num eterno araço, que sou realmente moldado nas palmas das m#os de
eus e escondido nas suas somras. ei2ar a casa significa ignorar a verdade de que eus me
moldou “em segredo, tecido na terra mais profunda!.8< ei2ar a casa ) viver como se eu ainda
n#o possu$sse um lar e precisasse procurar muito & dist@ncia at) encontrá-lo.

E casa ) o centro do meu seu, onde posso ouvir a vo que di: “oc+ ) o meu (ilho
Emado, sore voc+ ponho todo o meu carinho! L a mesma vo que deu vida ao primeiro Ed#o
e falou a Kesus, o segundo Ed#o0 a mesma vo que fala a todos os filhos de eus e que os
lierta para viver no meio de um mundo somrio emora permanecendo na lu.

"u ouvi essa vo. irigiu-se a mim no passado e continua a falar agora. 6 a vo do amor
que ) eterno, perdura para sempre e se transforma em afeto quando ouvida. *uando a ouço,
seu que estou em casa com eus e nada tenho a temer. /omo o (ilho Emado de meu Pai
celestial, “ainda que eu caminhe por um vale teneroso, nenhum mal temerei!. 8J /omo o
em-amado, posso “curar os enfermos, ressuscitar os mortos, purificar os leprosos, e2pulsar
demAnios.! 1endo receido sem “qualquer Anus!, posso faer “um dom gratuito!.8; /omo
(ilho Emado, posso interpelar, consolar, admoestar e encorajar sem medo de ser rejeitado ou

88
0em!randt. Amsterdam% N.J.. )echt% #23I. p. '(4 /om a cola!ora8<o de Astrid TQmpel.R
8=
Op. cit.% PP. &'#1&'$.
8<
>l #'2%#'1#(
8J
>l &'%$.
8;
Mt #4%3.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

necessidade de afirmaç#o. /omo o Emado, posso sofrer perseguiç#o sem desejo de vingança e
receer cumprimentos sem precisar utiliá-los como prova de minha ondade. /omo o
Emado, posso ser torturado e morto sem duvidar que o amor que me ) transmitido ) mais
forte do que a morte. /omo o Emado, sou livre para viver e dar a vida, livre tam)m para
morrer enquanto a estou dando.

Kesus me mostrou claramente que posso tam)m ouvir a mesma vo por ele ouvida no rio
Kord#o e no monte 1aor. 1am)m me mostrou que, como ele, haito junto do Pai. Orando
pelos disc$pulos, ele di: “"les n#o s#o do mundo comoeu n#o sou do mundo. %antifica-os na
verdade0 a tua palavra ) verdade. /omo tu me enviaste ao mundo, tam)m eu os enviei ao
mundo. ", por eles, a mim mesmo me santifico, para que sejam santificados na verdade!. 8I
"ssas palavras revelam minha verdadeira morada, meu local de perman+ncia, meu verdadeiro
lar. E f) ) a garantia de que ali eu haito e sempre haitarei. Es m#os um tanto r$gidas do Pai
tocam os omros do Filho Pródigo e aençoam com +nç#o divina, imorredoura. “1u )s o meu
Emado, sore ti ponho toda a minha complac+ncia!.

"ntretanto sa$ de casa muitas vees. ei2ei as m#os que aençoam e corri para lugares
distantes em usca de amor. "sta ) a grande trag)dia de minha vida e da de muitos que
encontro no caminho. e um modo tornei-me surdo & vo que me chama. O Emado0 dei2ei o
5nico lugar onde posso ouvir essa vo e fui emora desesperado, esperando poder encontrar
alhures o que n#o mais encontrava em casa.

"m princ$pio isto parece simplesmente inacreditável. Por que dei2aria eu o lugar onde
posso ouvir tudo que precisoN *uanto mais penso nesse ponto, mais compreendo que a
verdadeira vo do amor ) muito suave e gentil, falando comigo nos lugares mais escondidos do
meu ser. C#o ) rude, querendo se impor e pedindo atenç#o. 6 a vo d um pai quase cego que
chorou muito e passou por muitas mortes. 6 a vo que somente pode ser ouvida por aqueles
que se dei2am ser tocados.

%entir o toque das m#os endientes de eus eJ ouvir a vo me chamando Emado s#o a
mesma coisa. 4sso ficou claro para o profeta "lias. "lias estava na montanha esperando
encontrar o %enhor. eio primeiro um furac#o, mas eus n#o estava naquele vento. epois do
vento a terra tremeu, mas o %enhor n#o estava naquele tremor. %eguiu-se um fogo, mas
tam)m o %enhor n#o estava no fogo. (inalmente, veio alguma coisa muito suave, uns diriam
que seria uma risa ligeira, outros, um murm5rio. 1endo "lias ouvido isto, coriu o rosto com o
manto porque saia que eus estava presente. Ca sua doçura, a vo era o toque e o toque era
a vo.8Q

3as há muitas outras voes, algumas em tom em alto, cheias de promessas e atraentes.
iem: “á e mostre que voc+ vale alguma coisa!. ogo depois Kesus ter ouvido a vo
chamando-o de Emado, foi conduido ao deserto para ouvir ouros apelos. isseram-lhe que se
fosse em-sucedido, popular e poderoso, seria tam)m querido. "ssas mesmas voes n#o me

8I
Jo #S%#I1#2.
8Q
/f. #0s #2%##1#'.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

s#o desconhecidas. "st#o sempre presentes e sempre me atingem nos pontos em que
questiono meu pr7prio valor e ponho em d5vida meu merecimento. %ugerem que n#o serei
amado se n#o o conseguir por meio de traalho árduo e muito esforço. "speram que eu prove
a outros e a mim mesmo que mereço ser amado e ficam me empurrando para que faça todo o
poss$vel para oter aprovaç#o. Cegam aertamente que o amor seja um dom inteiramente
gratuito. Eandono o lar toda ve que dei2o de crer na vo que me chama Emado e sigo outras
que oferecem m5ltiplos caminhos para que eu encontre o amor que tanto procuro.

*uase a partir do momento que eu tive ouvidos para ouvir, ouvi esse chamados que
ficaram comigo desde ent#o. (oram transmitidos a mim por meus pais, amigos, professores,
colegas, mas, acima de tudo, o foram e ainda o s#o atrav)s da m$dia que me envolve. " diem:
“3ostre-me que voc+ ) legal. Procure ser melhor do que o seu amigo /omo foram as suas
notasN 1rate de passar na escola Bealmente espero que voc+ consiga por voc+ mesmo *uem
s#o seus amigosN 1em certea de que quer ser amigo dessas pessoasN "sses trof)us mostram
que 3 esportista voc+ foi C#o dei2em que o considerem fraco, v#o se aproveitar de voc+ Ká
tomou as provid+ncias para *uando envelhecerN *uando dei2ar de ser produtivo, as pessoas
se afastar#o. *uando voc+ está morto, está morto!.

esde que eu fique em contato com a vo que me chama de Emado, essas quest'es e
conselhos s#o astante inofensivos. Pais, amigos e professores, mesmo aqueles que se dirigem
a mim atrav)s da m$dia, s#o em geral muito sinceros em suas preocupaç'es. %eus conselhos e
sugest'es s#o em-intencionados. Eliás, podem ser limitadas manifestaç'es humanas de um

amor divino ilimitado.


essas sugest'es 3as quando
pueris podem esqueço
facilmente essa avo
começar do minha
reger primeiro amor incondicional,
e2ist+ncia e me levar aoent#o
“pa$s
distante!. C#o ) muito dif$cil para eu saer quando isso está acontecendo. Baiva,
ressentimento, ci5me, desejo de vingança, lu25ria, gan@ncia, antagonismo e rivalidades s#o
sinais inconfund$veis de que sa$ de casa. " isso acontece muito facilmente. *uando presto
atenç#o ao que se passa na minha mente, momento a momento, chego & descoerta
desagradável de que há poucos momentos durante o meu dia em que estou totalmente livre
destas emoç'es somrias, pai2'es e sentimentos.

/onstantemente caindo numa velha armadilha, antes mesmo que eu me apercea disso,
descuro-me imaginando porque algu)m me magoou, rejeitou-me ou n#o prestou atenç#o em
mim. %em me dar conta, vejo-me remoendo o sucesso de outros, minha pr7pria solid#o e a
maneira pela qual o mundo se aproveita de mim. Epesar de minhas oas intenç'es, muitas
vees me pego sonhando em me tornar rido, poderoso e c)lere. 1odos esses e2erc$cios
mentais me mostram a fragilidade da minha f) e que sou o em-Emado sore quem eus p'e
toda a sua complac+ncia. "u tenho tanto medo de n#o ser amado, de ser culpado, posto de
lado, superado, ignorado, perseguido e morto, que estou constantemente criando estrat)gias
para me defender e consequentemente criando estrat)gias para me defender e
consequentemente garantir o amor que acho que preciso e mereço. Essim faendo, me
distancio da casa de meu pai e escolho haitar um “pa$s distante!.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

Pro%urando onde n,o !ode ser en%ontrado

e sa$da, aqui fica a quest#o: “E quem pertençoN E eus ou ao mundoN!. 3uitas das
preocupaç'es diárias sugerem que pertenço mais ao mundo do que a eus. *ualquer cr$tica
me dei2a angado e a menor rejeiç#o me deprime. O melhor elogio levanta meu esp$rito, um
pequeno sucesso me anima. em pouco ) necessário para me levantar ou me dei2ar por ai2o.
(requentemente sou como uma emarcaç#o num oceano, completamente ao saor de suas
ondas. O tempo e energia que consumo tentando manter o equil$rio e evitando ser aatido e
naufragar mostra que minha vida ) uma luta pela soreviv+ncia. C#o um luta aençoada, mas
um questionamento preocupado que resulta da ideia errada de que ) o mundo que dá os
meus par@metros.

"nquanto eu ficar perguntando: “oc+ me amaN oc+ realmente me amaN!, eu confiro


todo o poder &s voes do mundo e me coloco em situaç#o de depend+ncia porque o mundo
está cheio de “ses!. O mundo di: “%im eu o amo se voc+ onito, inteligente e rico. "u amo
“voc+! se voc+ tem oa educaç#o, om emprego e ons relacionamentos. Emo voc+ se voc+
realia muito, vende mito, compra muito!. Há “ses! sem n5mero escondidos no amor do
mundo. "sses “ses! me escraviam uma ve que ) imposs$vel responder adequadamente a
todos eles. O amor do mundo ) e será sempre condicional. "nquanto eu uscar o meu
verdadeiro eu no mundo condicional, ficarei “preso! ao mundo, tentando, caindo e tentando
novamente. 6 um mundo que leva & decad+ncia, porque o que oferece n#o preenche o anseio
mais $ntimo do meu coraç#o.

“ecad+ncia! pode ser a melhor palavra para e2plicar o vaio que t#o profundamente
permeia a nossa sociedade contempor@nea. Cossos háitos faem que nos apeguemos &quilo
que o mundo chama de realiaç#o pessoal: ac5mulo de fortuna e poder0 otenç#o de status e
admiraç#o0 consumo e2cessivo de comida e eida, e satisfaç#o se2ual, sem faer distinç#o
entre concupisc+ncia e amor. "sses háitos criam e2pectativas que s7 podem dei2a de
satisfaer nossas verdadeiras necessidades. "nquanto cultuamos os valores mundanos, nossos
háitos levam-nos a indagaç'es infrut$feras no “pa$s distante!, faendo com que nos
defrontemos com desilus'es sem fim, ao mesmo tempo que dentro de n7s sore um vaio.
Cesses dias em que aumentam as solicitaç'es, peregrinamos longe da casa do Pai. E vida
desregrada pode muito em ser considerada uma vida vivida num “pa$s distante!. 6 de lá que
se srcina o nosso clamor por liertaç#o.

%ou o Filho Pródigo toda ve que usco amor incondicional onde n#o pode ser
encontrado. Por que continuo a ignorar o lugar do amor verdadeiro e insisto em uscá-lo em
outra parteN Por que volto a sair de casa onde sou chamado de filho de eusN ?m amado de
meu PaiN (ico constantemente surpreso, verificando como disponho dos dons receidos de
eus L minha sa5de, qualidades emocionais e intelectuais -0 utilio-os para impressionar as
pessoas, receer aprovaç#o e louvor, e competir por recompensa, em ve de desenvolv+-los
para a gl7ria de eus.. %im, muitas vees carrego-os para um “pa$s distante! e coloco-os a
serviço de um mundo oportunista que desconhece seu verdadeiro valor. 6 quase como se eu
quisesse provar a mim mesmo e aos que me rodeiam que eu n#o necessito do amor de eus,

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que posso sustituir por conta pr7pria, que posso ser totalmente independente. %o tudo isso,
há a grande revolta, o “n#o! decisivo ao amor do Pai, a imprecaç#o n#o proferida: “"u gostaria
que voc+ estivesse morto!. O “C#o! do Filho Pródigo reflete a revolta srcinal de Ed#o: seu
afastamento do eus em cujo amor somos criados e do qual depende o nosso sustento. 6 a
reeli#o que me coloca fora do jardim, longe do alcance da árvore da vida. E insuordinaç#o
que fa com que me perca num “pa$s distante!.

Olhando novamente a ora de Bemrandt que retrata A Volta do Filho Pródigo, vejo
agora que o que ocorre vai al)m de um gesto de compai2#o por um filho que se perdera. O
grande acontecimento que vejo ) o fim de uma grande reeli#o. E reeli#o de Ed#o e de todos
os seus descendentes ) perdoada e a +nç#o pela qual Ed#o receeu a vida imortal )
restaurada. Parece-me que essas m#os estiveram sempre estendidas L mesmo quando n#o
havia omros sore os quais descansá-las. eus nunca aai2ou os raços, jamais retirou sua
+nç#o, nunca dei2ou de considerar seu filho a permanecer em casa. C#o podia impor o seu
amor ao seu Emado. 1inha que dei2ar que se fosse em lierdade emora saendo a dor que
isso causaria a amos. (oi o pr7prio amor que o impediu de manter o filho em casa a qualquer
preço. (oi ainda o amor que fe que dei2asse o filho procurar o seu caminho, mesmo com o
risco de perd+-lo.

Equi o mist)rio da minha vida ) revelado. %ou amado a tal ponto que tenho lierdade
para aandonar a casa. E +nç#o e2iste desde o princ$pio. ei2ei e dei2o o lar muitas vees,
mas o Pai está sempre me uscando com raços estendidos para me receer de volta e de

novo sussurrar aos meus ouvidos: “1u )s o meu Emado, sore ti ponho todo o meu carinho!.

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<
A +olta do ilho &ais /o+e&

O filho mais ;o"em partiu para uma regi<o long=n9ua e ali dissipou sua heran8a numa "ida
de"assa.  gastou tudo. >o!re"eio ?9uela regi<o uma grande fome e ele come8ou a passar
pri"a8@es. Foi% ent<o% empregar1se com um dos homens da9uela regi<o% 9ue o mandou para
seus campos cuidar dos porcos. le 9ueria matar a fome com as !olotas 9ue os porcos comiam%
mas ningum lhas da"a.  caindo em si% disse5 6-uantos empregados de meu pai tBm p<o com
fartura% e eu a9ui% morrendo de fomeC Vou1me em!ora% procurar o meu pai e diDer1lhe5 Pai%
pe9uei contra o /u e contra tiE ;7 n<o sou mais digno de ser chamado teu filho. Trata1me
como um dos teus empregados:. Partiu% ent<o% e foi ao encontro de seu pai.

$star !erdido

O jovem araçado e aençoado pelo pai ) home pore, muito pore. ei2ou a casa com
orgulho e dinheiro, resolvido a viver sua pr7pria vida longe de seu pai e da comunidade. oltou
sem nada, sem dinheiro, sa5de, honra, amor pr7prio, reputaç#o... tudo havia sido dissipado.

Bemrandt dei2a pouca d5vida sore a sua condiç#o. %ua caeça está raspada. C#o possui
mais o caelo comprido e encaracolado com o qual Bemrandt se retratou como o Filho
Pródigo no ordel, arrogante e soero. E caeça ) a de um prisioneiro cujo nome foi
sustitu$do por um n5mero. *uando a caeça de um homem ) raspada, quer seja na pris#o ou
no e2)rcito, num trote de calouros ou num campo de concentraç#o, ele ) despojado de um
dos seus traços de personalidade. Es roupas com que Bemrandt o veste s#o roupas $ntimas,
que mal corem seu corpo emaciado. O pai e o homem alto que oserva a cena usam amplos
mantos carmim, que lhes conferem status e dignidade. O filho ajoelhado n#o tem agasalho. E
roupa parda e em frangalhos mal core seu corpo cansado do qual toda a força se esvaiu. Es
solas dos p)s narram a hist7ria de uma jornada longa e penosa. O p) esquerdo, por fora da

sandália muito usada, está arranhado. O p) direito somente calçado numa sandália
arreentada, tam)m aponta para sofrimento e mis)ria. "is um homem despojado de tudo... a
n#o ser de sua espada. O 5nico sinal de dignidade que resta ) a pequena espada presa ao seu
quadril L emlema de sua norea. 3esmo em meio & sua degradaç#o, ele se apegou ao fato
de que ainda era o filho de seu pai. e outra forma ele teria vendido sua preciosa espada,
s$molo de sua filiaç#o. E espada está lá para me mostrar que, apesar de ter voltado como

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O Filho Pródigo
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mendigo e pária, ele n#o havia esquecido que ainda era filho de seu pai. (oi esta filiaç#o
valiosa que, lemrada, persuadiu-o a voltar.

ejo diante de mim um homem que se afundou numa terra estranha e perdeu tudo o que
levou consigo. ejo derrota, humilhaç#o, vaio. "le, que era t#o semelhante ao pai, agora está
em pior situaç#o que os empregados de seu pai. 1ornou-se um escravo.

O que aconteceu com o filho no pa$s distanteN El)m de todas as consequ+ncias f$sicas e

materiais,
em quais *uanto
previs$vel. foram asmais
$ntimas consequ+ncias
me distancio do onde
do lugar aandono
eus do larN Etanto
haita, sequ+ncia de fatosme
mais incapa )
sino de ouvir a vo que me chama O Emado0 quanto menos ouço aquela vo, mais enredado
eu fico na manipulaç#o e nas tranas de poder do mundo.

Econtece mais ou menos assim: fico em d5vida quanto & segurança do lar e oservo
outras pessoas que parecem estar melhor do que eu. (ico imaginando como faer para chegar
aonde est#o. "sforço-me por ajudar, ter sucesso, ser reconhecido.

*uando falho, sinto ci5mes ou fico resentido. *uando me saio em, preocupa-se que
outros v#o ter ci5mes ou se sentir#o melindrados. 1orno-me desconfiado ou fico de esp$rito
prevenido e com mesmo crescente de n#o conseguir o que tanto desejo ou perder o que já
consegui. Preso neste emaranhado de necessidades e aspiraç'es, eu n#o sei e2atamente quais
s#o as minhas motivaç'es. %into-me atingido pelos circunstantes e n#o confio nas aç'es e
pronunciamentos ao meu redor. %empre prevenido, quero meu senso de lierdade e passo a
dividir o mundo em dois grupos: os que s#o a meu favor ou contra mim. 4ndago se algu)m
realmente se incomoda. (ico procurando justificar a minha desconfiança. Onde quer que eu
vá, eu os vejo e digo: “C#o se pode confiar em ningu)m!. " depois imagino se algum alguma
ve me amor de verdade. O mundo & minha volta se torna somrio. 3eu coraç#o fica pesado.
3eu corpo está cheio de tristeas. 3inha vida perde sentido. 1ornei-me um ser perdido.

O filho mais jovem ficou em ciente de como estava perdido quando nenhum dos seus
companheiros mostrou o menor interesse por ele. %7 tomaram conhecimento da sua pessoa
enquanto podia lhe ser 5til. 3as n#o tendo mais dinheiro para gastar, ou presentes para dar,
dei2ou de e2istir para eles. Para mim ) dif$cil imaginar o que significa ser totalmente estanho,
algu)m a quem ningu)m dá a menor demonstraç#o de apreço. E verdadeira solid#o ocorre
quando perdemos a sensaç#o de ter algo em comum. *uando ningu)m queria lhe dar o
alimento que ele estava dando aos porcos, o filho mais jovem entendeu que n#o era
considerado nem mesmo como um ser humano. *uando ningu)m queria lhe dar o alimento

que
mesmoele estava
como umdando
ser aos porcos,como
humano, o filho
ummais jovem
igual. entendeu
"ntendo que n#o
um pouco era considerado
quanto eu dependonem
de
alguma aprovaç#o. E mesma formaç#o hist7rica, vis#o, religi#o e educaç#o0 amigos comuns,
estilos de vida e háitos0 a mesma fai2a de idade e profiss#o0 tudo isto pode servir de ase
para aprovaç#o. /ada ve que encontro algu)m, sempre procuro alguma coisa que possamos
ter em comum. Parece uma reaç#o espont@nea, normal. *uando digo “sou da Holanda!, a

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

resposta frequentemente ): “Eh, eu já estive lá! ou “eu tenho um amigo lá!, ou “O.X.,
moinhos, tulipas e tamancos!.

*ualquer que seja a reaç#o, há sempre d amos os lados a procura por um elo comum.
*uanto menos afinidades temos, tanto mais dif$cil estar juntos e mais afastados nos sentimos.
*uando n#o sei a l$ngua e ignoro os costumes, quando n#o compreendo seu modo de vida e
religi#o, seus rituais e sua arte e desconheço a comida e a maneira de se alimentar... ent#o me
sinto mais alienado e perdido.

*uando o filho mais jovem n#o era mais considerado um ser humano pelas pessoas & sua
volta, sentiu a profundea de seu isolamento, a mais completa solid#o que algu)m pode sentir.
"stava realmente perdido e foi essa noç#o de perda total que o chamou & realidade. (icou em
estado de choque se dando conta da asoluta ins@nia do seu comportamento, verificando, de
repente, que estava a caminho da morte. Havia se desligado tanto do que dá a vida L fam$lia,
amigos, comunidade, relacionamentos e mesmo alimentaç#o L que a morte seria
naturalmente o pr72imo passo. iu instantaneamente e com nitide o caminho que escolheu0
compreendeu a sua opç#o pela morte0 perceeu que um passo a mais naquela direç#o o
levaria & autodestruiç#o.

Caquele momento cr$tico, o que foi que fe com que optasse pela vidaN (oi a
redescoerta do seu mais profundo eu.

4ei+indi%ando a ilia,o

O que quer que ele tivesse perdido, fosse dinheiro, amigos, reputaç#o, amor pr7prio,
alegria interior e pa L uma ou todas -, ele ainda continuou a ser o filho de seu pai. "nt#o ele
di para si mesmo: “*uantos empregados de meu pai t+m p#o com fartura e eu aqui,
morrendo de fome. ou-me emora, procurar meu Pai e dier-lhe: “Pai, peque contra o /)u e
contra ti0 já n#o sou mais digno de ser chamado teu filho. 1rata-me como um dos teus
empregados.!. /om essas palavras no coraç#o, ele pode voltar, dei2ar o pa$s estranho e ir para
casa.

O significado do retorno do filho mais jovem ) concisamente e2presso nas palavras: “Pai...
n#o sou mais digno de ser chamado teu filho!. "le compreende que dei2ou de ser digno de sua
filiaç#o, mas ao mesmo tempo compreende que ele ) na verdade o filho detentor desse
privil)gio que pAs a perder.

E volta do filho mais jovem ocorre e2atamente quando ele reivindica sua filiaç#o, apesar
de ter perdido toda a dignidade que esta lhe confere. Ca verdade, ) a perda de todos os seus
ens que o fa chegar ao mais ai2o n$vel de sua identidade. "le atingiu os alicerces de sua
filiaç#o. "m retrospecto, parece que o Filho Pródigo tinha que perder tudo para entrar em
contato com o seu ser. *uando perceeu que queria ser tratado como um dos porcos,
entendeu que n#o era um porco, mas um ser humano, um filho de seu pai. E partir dessa

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

compreens#o ) que optou por viver e n#o morrer. ?ma ve que entrou novamente em contato
com a realidade de sua filiaç#o, ele podia ouvir L emora vagamente L a vo chamando-o de
Emado e sentiu L emora & dist@ncia L o toque da +nç#o. "ssa certea e confiança no amor
de eus, mesmo que n#o muito precisa, deu-lhe força para reclamar os seus direitos de filho,
apesar de desprovido de qualquer m)rito.

Há alguns anos, passei por uma situaç#o concreta de ter que tomar a decis#o: voltar ou
n#o. ?ma amiade que em princ$pio parecia promissora e en)fica aos poucos foi me levando
para mais e mais longe0 aos poucos eu me senti totalmente ocecado por ela. Co sentido
espiritual, encontrei-me esanjando tudo o que eu receera do meu pai para manter esse
envolvimento. C#o mais conseguia rear. Perdera interesse pelo meu traalho e achava cada
ve mais dif$cil dar atenç#o aos prolemas de outros. 3esmo reconhecendo que meus
pensamentos e aç'es eram insustentáveis, era atra$do pelo meu coraç#o sedento de amor a
formas ilus7rias de conquistar um senso de autoestima.

(inalmente, quando essa amiade terminou completamente, precisei optar por me


autodestruir ou confiar que o amor que eu procurava de fato e2istia... lá em casa. ?ma vo,
emora parecendo fraca, sussurrou aos meus ouvidos que nenhum ser humano jamais
conseguiria me dar o amor ao qual eu aspirava, nenhum relacionamento, pessoa alguma
nenhuma comunidade seria capa de satisfaer &s necessidades mais profundas do meu
coraç#o inconstante. "ssa vo meiga e persistente falou comigo sore a minha vocaç#o, meus
primeiros votos, os muitos dons que eu receera na casa do meu pai. "ssa vo me chamava

“filho!.
E agonia do aandono do$a tanto que era dif$cil, quase imposs$vel, acreditar naquela vo.
3eus amigos, vendo o meu desespero, me estimulavam a vencer a ang5stia e a confiar que
e2istia algu)m esperando por mim em casa. (inalmente, optei por me refrear em ve de
continuar esanjando e me dirigi a um lugar onde eu pudesse estar s7. á, na minha solid#o,
comecei a caminhar em direç#o & casa devagar e vacilante, ouvindo ainda mais claramente a
vo que di: “oc+ ) o meu em-amado, sore voc+ recai todo o meu carinho!.

"ssa e2peri+ncia dolorosa, mas cheia de esperança, levou-me ao @mago da luta espiritual
pela escolha certa. O %enhor di: “"u te propus a vida ou a morte, +nç#o ou maldiç#o.
"scolhe, pois, a vida, para que vivas tu e a tua descend+ncia, amando a 4ahUeh teu eus,
oedecendo & sua vo e apegando-te a ele!.8G Bealmente, ) uma quest#o de vida ou morte.
Eceitamos a repulsa do mundo que nos aprisiona ou uscamos a lierdade dos filhos de eusN
Precisamos escolher.

Kudas traiu Kesus. Pedro o negou. Emos foram filhos que se perderam. Kudas, incapa de
se agarrar & verdade de que era filho de eus, se enforcou. "m termos de Filho Pródigo,
vendeu a espada de sua filiaç#o. Pedro, no meio de seu desespero, lemrou-se dos seus direito
e voltou em lágrimas. Kudas escolheu a morte. Pedro, a vida. "ntendo que tal escolha está

8G
+t '4% #21&4.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

sempre diante de mim. /onstantemente sinto-me tentado a chafurdar-me em minha mis)ria e


a me desligar da graça, do meu lado humano receido de eus, da +nç#o fundamental, e,
portanto, ensejar que as forças do mal vençam. 4sso acontece mais e mais quando digo a mim
mesmo: “C#o sou om. e nada sirvo. e nada valho. Cingu)m me ama. C#o sou ningu)m!.
Há sempre in5meros eventos e situaç'es que posso relacionar para convencer a mim mesmo e
a outros que a minha vida n#o vale a pena ser vivida, que sou somente um peso, um prolema,
uma fonte de conflito ou um aproveitador do tempo e energia de terceiros. 3uita gente vive
com esse conceito negativo de si mesmo. /ontrastando com o Filho Pródigo, dei2amos que a
escurid#o nos asorva t#o amplamente que n#o reste nenhuma lu & qual possamos voltar e
nos dirigir. 6 poss$vel que fisicamente n#o se matem, mas espiritualmente dei2aram de viver.
ei2am de crer na sua srcem divina e tam)m de viver. ei2am de crer na sua srcem divina e
tam)m, portanto, no seu Pai que lhes conferiu sua humanidade.

3as quando eus criou homem e mulher & sua pr7pria imagem, “viu que era om! 8F e,
apesar das voes sinistras, nenhum home ou mulher poderá jamais mudar isso.

E opç#o por minha pr7pria filiaç#o, entretanto, n#o ) fácil. Es voes assustadoras do
mundo circundante tentam me convencer de que n#o presto e que s7 posso ser om se
conseguir galgar a escada do sucesso. "ssas voes me levam a rapidamente esquecer a vo que
me chama “meu filho, o Emado!, lemrando-me que sou amado independentemente de
qualquer aplauso ou realiaç#o. "ssas voes sinistras afogam aquela vo gentil, meiga, cheia de
lu que me chama “meu filho!, elas me arrastam para a periferia de minha e2ist+ncia e faem-

me duvidar que há um eus amoroso & minha espera em no centro do meu ser.
3as dei2ar o pa$s estrangeiro ) somente o princ$pio. O caminho para casa ) longo e dif$cil.
O que faer no percurso de volta ao PaiN 6 muito claro o que fa o Filho Pródigo. "le prepara
um cenário. *uando ele se volta, lemrando sua filiaç#o, ele di: “ou-me emora, procurar o
meu pai, e dier-lhe: \Pai, pequei contra o /)u e contra ti0 já n#o sou mais digno de ser
chamado teu filho. 1rata-me como um dos teus empregadosV!. S medida que leio essas
palavras, fico ciente de como a minha vida $ntima está cheia desse tipo de conversa. e fato
poucas vees n#o há em minha caeça algum encontro imaginário no qual me e2plico, me
vanglorio ou me desculpo, proclamo ou defendo, evocando louvor ou piedade. Parece que
estou sempre envolvido em longos diálogos com interlocutores ausentes, antecipando suas
perguntas e preparando minhas respostas. 6 surpreendente o desgaste emocional que envolve
estas ruminaç'es e resmungos. %im, estou dei2ando o pa$s estrangeiro. %im, estou voltando
para casa... mas, por que todo esse preparo de discursos que nunca ser#o proferidosN

E ra#o ) clara. Epesar de reivindicar minha verdadeira identidade como filho de eus,
ainda vivo como se eus a quem retorno peça uma e2plicaç#o. Einda penso no seu amor
condicional e na morada como um lugar do qual n#o estou muito certo. "nquanto volto para
casa, alimento d5vidas sore se serei em receido quando lá chegar. *uando contemplo a
minha jornada espiritual, minha longa e cansativa viagem para casa, vejo como está cheia de

8F
n #%'#.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

culpa quanto ao passado e preocupaç'es quanto ao futuro. erifico meus erros e sei que perdi
a dignidade de minha filiaç#o, mas ainda n#o estou plenamente preparado para crer que,
emora minhas faltas sejam muitas, “a graça ) ainda maior!. =T Einda me apoiando no meu
conceito de pouca valia, escolho para mim um lugar em aai2o ao que pertence ao filho.
Ecreditar no perd#o completo, asoluto, n#o ocorre prontamente. 3inha e2peri+ncia humana
me di que o perd#o se resume na disposiç#o do outro de desistir da vingança e de mostrar
alguma caridade.

O longo %a&inho !ara %asa

A Volta do Filho Pródigo está cheia de amiguidades. "stá viajando na direç#o certa, mas
que confus#o "le admite ser incapa de faer isso por conta pr7pria e confessa que iria
receer melhor tratamento como escravo na casa de seu pai do que como foragido num pa$s
estrangeiro, mas ainda está longe de confiar no amor do pai. %ae que ainda ) o filho, mas
reconhece que perdeu a dignidade de modo que possa ser chamado “filho!0 prepara-se para
aceitar o status de “empregado! de modo que possa soreviver. Há arrependimento, mas n#o
um arrependimento & lu do amor imenso de um %enhor misericordioso. 6 um
arrependimento que satisfa ao pr7prio ego e permite soreviver. /onheço muito em esse
modo de pensar e sentir. "quivale a dier: “em, eu n#o poderia resolver soinho, tenho que
admitir que eus ) a 5nica esperança que me resta. 4rei a "le e pedirei perd#o, esperando que
o castigo seja pequeno e eu possa soreviver so a condiç#o de traalhar duro. eus continua
a ser um eus severo e julgador. 6 este eus que me fa sentir culpado e temeroso, faendo-
me continuar procurando justificativas. E Oedi+ncia a este eus n#o nos dá a verdadeira
lierdade, mas resulta em amargura e ressentimento.

?m dos grandes desafios da vida espiritual ) o de receer o perd#o de eus. Há alguma


coisa em n7s humanos que fa que nos apeguemos aos nossos pecados e impede-nos de
dei2ar eus anir o nosso passado e nos oferecer um recomeçar inteiramente novo. Ss vees
at) parece que quero provar a eus que a minha mis)ria ) grande demais para que eu a
supere. "mora eus deseje me devolver a total dignidade da filiaç#o, fico insistindo que me
contentarei em ser o servo eventual. 3as será que desejo mesmo voltar a ter a
responsailidade de filhoN %erá que almejo ser completamente perdoado de modo que se
torne poss$vel começar uma nova vidaN %erá que confio em mim e numa regeneraç#o totalN
esejo me afastar da reeli#o profunda contra eus e me entregar inteiramente ao seu amor,
de modo que uma nova criatura possa surgirN Beceer o perd#o e2ige uma asoluta aceitaç#o
e reparos. "nquanto eu mesmo quiser faer isso, s7 otenho soluç'es parciais, como a de ser
um empregado. /omo tal, posso manter certa dist@ncia, revoltar-me, repudiar, faer greve, ir
emora ou me quei2ar do salário. /omo o filho amado, devo e2igir todo o respeito e começar
a me preparar para ser o pai.

=T
/f. Tm (%&4.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

6 claro que a dist@ncia entre dar a volta e chegar & casa deve ser percorrida com
saedoria e disciplina. E disciplina ) a de se tornar um filho de eus. Kesus aponta que o
caminho para eus ) o mesmo caminho para uma nova inf@ncia. “"m verdade vos digo que, se
n#o vos converterdes e n#o vos tornardes como crianças, de modo algum entrareis no Beino
dos /)us.!=8 Kesus n#o pede que eu continue criança, mas que me transforme em criança.
1ornar-me criança ) viver & procura de uma segunda inoc+ncia, n#o a inoc+ncia de um rec)m-
nascido, mas a candura que se chega por opç#o consciente.

/omo podem aqueles que chegaram a essa segunda inoc+ncia ser descritosN Kesus mostra
isso claramente nas em-aventuranças. ogo ap7s ter ouvido a vo de %atanás que o intima a
provar ao mundo que ele ) digno de ser amado, ele começa o seu minist)rio p5lico. ?m dos
seus primeiros passos ) o de convocar os disc$pulos para que o sigam e partilhem do seu
minist)rio. epois Kesus so a montanha, re5ne os ap7stolos ao seu redor e di: “em-
aventurados s#o os pores, os mansos, aqueles que choram, os que t+m fome e sede de
justiça, os compassivos, os puros de coraç#o, os que promovem a pa e aqueles que s#o
perseguidos por causa da justiça!.

"ssas palavras s#o a e2press#o do filho de eus. 6 um autorretrato de Kesus, o (ilho


Emado. 6 um retrato de como eu devo ser. 6 um retrato de como eu devo ser. Es em-
aventuranças me indicam o caminho mais simples para a volta a casa, o retorno & casa de meu
Pai. " ao longo dessa jornada descorirei as alegrias da segunda inf@ncia: conforto,
miseric7rdia e at) uma vis#o mais clara de eus. " quando eu chegar a casa e sentir o araço

do
serámeu Pai,herança,
minha compreenderei
um lugarque n#o
onde terei somente
poderei direito ao sem
viver em lierdade, /)u, osess'es
mas que tam)m a terra
nem coraç'es.

1ornar-se criança ) viver as em-aventuranças e encontrar a porta estreita para o Beino.


Bemrandt saeria dissoN C#o sei se a paráola leva-me a ver novos aspectos da pintura ou se
a pintura me mostra novas facetas da paráola. 3as, contemplando a caeça do menino que
volta, posso ver retratada a segunda inf@ncia.

emro-me claramente de ter mostrado a pintura de Bemrandt a amigos e de perguntar-


lhes o que viam. ?ma delas, uma jovem, ficou em p), caminhou at) a reproduç#o do Filho
Pródigo e colocou a sua m#o na caeça do filho mais jovem. isse, ent#o: “"sta ) a caeça de
um e+ que acaa de sair do 5tero materno. eja, está ainda 5mida e o rosto parece o de um
feto!. 1odos n7s que estávamos ali vimos, de repetem a mesma coisa. "staria Bemrandt
retratando n#o somente a volta ao Pai, mas tam)m a volta ao seio de eus, que ) 3#e e Pai
ao mesmo tempoN

Et) ent#o eu pensava na caeça raspada do jovem como na de um prisioneiro, ou na de


algu)m que tivesse vivido num campo de concentraç#o. "u havia visto aquele rosto como o
rosto emaciado de um ref)m maltratado. " talve tenha sido isso somente que Bemrandt
quis e2pressar. 3as depois desse encontro com meus amigos, n#o consigo mais olhar o quadro

=8
Mt #3%'.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

sem que eu veja ali um e+ voltando ao 5tero materno. 4sso me ajuda a compreender melhor
o caminho que devo sentir de volta para casa.

C#o ) a criança pore, meiga e pura de coraç#o: C#o chora a criança por qualquer dor
que sintaN C#o ) a criança o intercessor faminto e sedento de justiça e a v$tima final da
perseguiç#oN " o que dier de Kesus, a Palavra de eus feito carne, que se formou no 5tero de
3aria durante nove meses, veio ao mundo como uma criança venerada por pastores da
redondea e por homens de terra long$nquasN O (ilho eterno tornou-se uma criança de modo
a que eu pudesse voltar a ser criança e retornar com "le ao Beino do Pai. “"m verdade, te
digo!, disse Kesus a Cicodemos, “quem n#o nascer do alto, n#o pode ver o Beino de eus!.==

O +erdadeiro ilho !ródigo

Eordo aqui o mist)rio de que o pr7prio Kesus tornou-se o Filho Pródigo por nossa causa.
ei2ou a casa de seu Pai celeste, veio a um pa$s distante, desfe-se de tudo o que possu$a, e
por meio da cru voltou & casa do Pai. 1udo isso ele fe n#o como filho reelde, mas
oediente, enviado para traer de volta todos os filhos de eus que se encontravam perdidos.
Kesus que contou a hist7ria &queles que o criticavam por se associar com pecadores viveu ele
mesmo a longa e dolorosa jornada que descreve.

*uando comecei a refletir na paráola e na pintura de Bemrandt, nunca havia pensado


no jovem cansado aparentando um rec)m-nascido, como Kesus. 3as agora, depois de muitas
horas de $ntima contemplaç#o, sinto-me aençoado por essa vis#o. C#o está o jovem
alquerado ajoelhado diante do pai, “O /ordeiro de eus, que tira o pecado do mundo!N=<
C#o ) "le a v$tima inocente que se tornou pecado por nossa causaN =J C#o ) "le o que n#o se
apoiou na sua igualdade com eus, mas “tornou-se como um ser humano!N=; C#o ) "le o (ilho
de eus sem pecado, que e2clamou na cru: “eus meu, eus meu, por que me
aandonaste!N=I Kesus ) o Filho Pródigo, do Pr7digo Pai, que despendeu tudo o que o Pai lhe
havia dado de modo que eu pudesse me tornar como "le, e com "le voltar & casa de seu Pai.

er Kesus, ele mesmo, como o Filho Pródigo, vai muito al)m da interpretaç#o usual da
paráola. "ntretanto, essa vis#o encerra um grande segredo. ou aos poucos descorindo que
isso significa que a minha filiaç#o e a de Kesus s#o uma, que a minha volta e a de Kesus s#o
uma, que a minha morada e a de Kesus s#o uma. C#o há caminho para eus fora daquele
seguido por Kesus, aquele que narrou a hist7ria do Filho Pródigo ) a Palavra de eus por meio

==
Jo '%'.
=<
Jo #%&2.
=J
& /or (%&#.
=;
/f. Fl &%I1S.
=I
Mt &S%$I.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

da qual todas as coisas vieram a e2istir. =Q “" o ero se fe carne, e haitou entre n7s! e nos
tornou parte de sua plenitude.

*uando olho para a hist7ria do Filho Pródigo com os olhos da f) a “volta! se torna a volta
do (ilho de eus que chamou a si todos os povos e os leva de volta a seu Pai /elestial. =G /omo
fala Paulo: “Pois nele aprouve a eus faer haitar toda a plenitude e reconciliar por ele e para
ele todos os seres, os da terra e os dos c)us!.=F

(r]revivendo
monges Pierre na
3arie, o fundador
cidade, da (raternidade
reflete sore Kesus como odeFilho
Kerusal)m,
Pródigo uma comunidade
de maneira $licade
e
po)tica. "le escreve:

"le, que ) nascido n#o da esp)cie humana, do desejo ou da vontade da carne, mas do
pr7prio eus, um dia chamou a si tudo o que estava deai2o dos seus p)s e partiu com sua
herança, seu t$tulo de (ilho e o preço do resgate. Partiu para um pa$s distante... a terra
long$nqua... onde se tornou como s#o os seres humanos e esvaiou-se. O seu povo n#o o
aceitou e seu primeiro erço foi um erço de palha /omo uma rai num ch#o árido, cresceu
diante de n7s, foi despreado, o mais $ntimo dos homens, diante de quem escondemos a nossa
face. em cedo, ele conheceu o e2$lio, a hostilidade, a solid#o... epois de ter perdido tudo
numa caminhada de total doaç#o, seu valor, sua pa, sua lu, sua verdade, sua vida... todos os
tesouros de conhecimento e saedoria e o mist)rio escondido mantido secreto por tempos
sem fim0 depois de ter-se perdido entre os filhos transviados de 4srael passando seu tempo
com os doentes “e n#o com os afortunados!, com os pecadores “e n#o com os justos!, e at)
com as prostitutas a quem prometeu entrada no reino de seu Pai0 depois de ter sido tratado
como glut#o e +ado, como amigo dos coradores de impostos e dos pecadores, como um
%amaritano, um possesso, um lasfemo0 depois de ter ofertado tudo, at) o seu corpo e seu
sangue, depois de ter sentido profunda tristea, ang5stia e a alma dilacerada. epois de ter
chegado ao limite do desespero t#o em e2presso na cru, onde o Pai o teria aandonado,
distante da fonte de água viva, e de onde, crucificado, "le e2clama: “1enho sede!. esceu &
mans#o dos mortos e, ent#o ao terceiro dia, levantou-se das profundeas do inferno
carregando os crimes de todos nos, nossos pecados, nossos sofrimentos. e p), e2clamou:
“%im, estou ascendendo ao meu Pai e ao seu Pai, ao meu eus e ao seu eus!. " suiu aos
c)us. "nt#o, no sil+ncio, olhando para seu (ilho, e todas as suas criaturas, uma ve que o (ilho
tinha se tornado tudo em todos, o Pai disse aos seus servos: “epressa 1ragam a melhor veste
e o curam, ponham um anel em seus dedos e sandálias em seus p)s, vamos comer e festejar
Porque os meus (ilhos que, como voc+s saem, estavam mortos voltaram & vida0 estavam
perdidos e foram encontrados 3eu Filho Pródigo os trou2e todos de volta!. "les todos
começaram a festejar vestidos em seus trajes longos, que se tornaram imaculados no sangue
do /ordeio.<T

=Q
/f. Jo #%#1#$.
=G
/f. Jo #&%'&.
=F
/l #%#21&4.
<T
es fils prodigues et le fils prodigue. %ources ivesParisR% n. #'% pp. 3S12'% #23S.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

Olhando novamente para o Filho Pródigo de Bemrandt, vejo-o agora de modo diferente,
vejo Kesus voltando para seu Pai e meu Pai, seu eus e meu eus.

6 pouco provável que Bemrandt tenha pensado dessa maneira sore o Filho Pródigo.
"ssa compreens#o n#o faia parte das pregaç'es e escritos de seu tempo. "ntretanto, ver
nesse jovem cansado e vencido o pr7prio Kesus nos tra muito conforto e consolaç#o. O jovem
que o pai araça n#o ) mais um pecador arrependido, mas toda a humanidade voltando a
eus. O corpo dilacerado do Filho Pródigo se torna o corpo dilacerado de toda a humanidade,
e a face do neonato que volta de torna a face de todos os que sofrem e almejam reentrar no
para$so perdido. Essim o quadro de Bemrandt dei2a de retratar somente uma paráola
comovente0 torna-se o sumário da hist7ria de nossa salvaç#o. E lu que ilumina tanto o Pai
como o (ilho, fala agora da gl7ria que aguarda os filhos de eus. (a lemrar das palavras
mágicas de Ko#o: “... /ar$ssimos, desde já somos filhos de eus, mas o que n7s seremos ainda
n#o se manifestou. %aemos que por ocasi#o desta manifestaç#o seremos semelhantes a ele,
porque o veremos tal como ele )!.<8

3as nem a pintura de Bemrandt nem a paráola que ela representa nos dei2a em
+2tase. *uando vi a cena central do pai araçando seu filho no pAster no escrit7rio de %imone
n#o tinha ainda tomado conhecimento dos quatro espectadores apreciando a cena. 3as agora
conheço aqueles rostos em torno “da volta!. %#o pelo menos enigmáticos, especialmente
aquele homem alto & direta do quadro. %im, há elea, gl7ria, salvaç#o... mas tam)m há os
olhares cr$ticos de oservaç'es n#o comprometidos. "les acrescentam uma nota repressiva &

pintura e impedem
reconciliaç#o qualquer
espiritual. possiilidade
E caminhada de mais
do filho uma jovem
soluç#on#o
rápida
podeeser
rom@ntica para
separa da de oseu
tema da
irm#o
mais velho. "nt#o ) para ele que eu agora, um tanto temeroso, volto minha atenç#o.

<8
# Jo '%&.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

parte II
II

O F-HO MA- V$HO

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

O Filho mais "elho esta"a no campo. -uando "olta"a% ;7 perto de casa ou"iu msicas e
dan8as. /hamando um ser"o% perguntou1lhe o 9ue esta"a acontecendo. ste lhe disse5 6U teu
irm<o 9ue "oltou e teu pai matou o no"ilho ce"ado% por9ue o recuperou com sade:. nt<o ele
ficou com muita rai"a e n<o 9ueria entrar. >eu pai saiu para suplicar1lhe. le% porm%

respondeu% a seu pai5 6H7 tantos anos 9ue eu te sir"o% e ;amais transgredi um só dos teus
mandamentos% e nunca me deste um ca!rito para feste;ar com meus amigos. /ontudo% "eio
esse teu filho% 9ue de"orou teus !ens com prostitutas% e para ele matas o no"ilho ce"adoC:.

Mas o Pai lhe disse5 6Filho% tu est7s sempre comigo% e tudo o 9ue  meu  seu. Mas era
preciso 9ue feste;7ssemos e nos alegr7ssemos% pois esse ter irm<o esta"a morto e tornou a
"i"erE ele esta"a perdido e foi encontradoC:.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

J
4e&5randt e o ilho &ais +elho

urante as minhas horas no Hermitage, olhando em sil+ncio para o Filho Pródigo, nunca
duvidei que o homem em p) do lado direito do plano, onde o pai araça seu filho que volta,
era o filho mais velho. E maneira como ele se posiciona olhando para o gesto magn@nimo da
acolhida n#o dei2a d5vida sore quem Bemrandt quis retratar. (i muitas anotaç'es
descrevendo este oservador distante e severo e en2erguei nele tudo o que Kesus nos di
sore o filho mais velho.

"ntretanto, a paráola dei2a claro que o filho mais velho ainda n#o está em casa quando o
pa araça seu filho perdido e lhe mostra a sua compai2#o. Eo contraio, a hist7ria relata que,
quando o filho mais velho finalmente regressa & casa depois do traalho, a festa de oas-
vindas para seu irm#o está a todo vapor.

(ico surpreso com que facilidade n#o percei a discrep@ncia entre a pintura de
Bemrandt e a paráola, simplesmente assumindo que Bemrandt quis pintar amos os
irm#os numa mesma ora em que retrata o Filho Pródigo.

*uando voltei para casa e comecei a ler todos os estudos hist7ricos sore a pintura,
depressa compreendi que muito cr$ticos estavam menos seguros quanto & identidade do
homem em p) & direita. Elguns o descreviam como um homem velho, e alguns at)
questionavam se teria sido mesmo Bemrandt que o pintara.

3as ent#o um dia, já passado um ano de minha visita ao Hermitage, um amigo, 4van er,
com quem eu falara muitas vees sore o meu interesse na pintura do Filho Pródigo, mandou-
me uma c7pia do estudo feito por arara Koan Haeger “O significado religioso da Volta do
Filho Pródigo de 0em!randt!.<= "ste traalho rilhante, que coloca a pintura no conte2to da
tradiç#o visual e iconográfica do tempo de Bemrandt, trou2e o filho mais velho de volta &
cena.

Haeger mostra que, nos comentários $licos do tempo de Bemrandt, a paráola do


fariseu e do corador de impostos e a paráola do Filho Pródigo estavam intimamente ligadas.
Bemrandt segue a tradiç#o. O homem sentado atendo no peito e olhando para o filho que

<=
1he religious significance of BemrandtVs Betur of the Prodigal %onN an eLamination of the p,cture in the conteLt of the "isual
and iconographic tradition. Ann Ar!or% Mich.% *ni"ersit Microfilm ,nternational% #23'. p. #S'. +issertaEao de doutorado
apresentado ? *ni"ersidade de Michigan.

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volta ) um servo representando os pecadores e coradores de impostos, enquanto o homem


em ) olhando para o pai de maneira enigmática ) o filho mais velho representando os escrias
e fariseus. "ntretanto, colocando o filho mais velho na pintura como a testemunha mais
importante, Bemrandt vai n#o somente al)m do sentido literal da palavra, mas tam)m al)m
da tradiç#o da pintura do seu tempo. Essim, Bemrandt, como dia Haeger, “prende-se n#o &
letra, mas ao esp$rito do te2to $lico!. <<

Os achados de arara Haeger representam muito mais que uma afirmaç#o feli da minha
intuiç#o inicial. Ejudam-me a ver A Volta do Filho Pródigo como um traalho que resume a
grande luta espiritual e as grandes escolhas que essa luta e2ige. Pintando n#o somente o filho
mais jovem que essa luta e2ige. Pintando n#o somente o filho mais jovem nos raços de seu
Pai, mas tam)m o filho mais velho que pode aceitar ou n#o o amor que lhe ) oferecido,
Bemrandt me apresenta o “drama interior da alma! <J L dele e meu tam)m. Essim como a
paráola do Filho Pródigo encerra o cerne da mensagem do "vangelho e chama os que a
ouvem para que façam suas pr7prias escolhas diante dela, da mesma forma a pintura de
Bemrandt encerra sua pr7pria luta espiritual e convida os que a contemplam para que
tomem uma decis#o pessoal sore suas vidas.

Essim, os espectadores no quadro de Bemrandt faem com que a ora envolva os que a
contemplam de maneira muito pessoal. Co outono de 8FG<, quando vi o pAster mostrando a
parte central da pintura, entendi imediatamente que fora chamado a faer algo de pessoal.
Egora que conheço melhor toda a pintura e tam)m o significado da testemunha que as

destaca & direita, estou mais do que nunca convencido do enorme desafio espiritual que este
quadro representa.

Olhando para o filho mais moço e pensando na vida de Bemrandt, tornou-se evidente
para mm que Bemrandt o deve ter entendido de maneira muito pessoal *uando ele pintou A
Volta do Filho Pródigo, tinha vivido uma vida marcada por uma grande autoconfiança, sucesso
e fama, seguida de muitas perdas dolorosas, desapontamentos e fracassos. 3ediante tudo
isso, ele caminhou da lu e2terior para a interior, do retratar de fatos mundanos para o de
significados profundos, de uma vida cheia de ens e pessoas para uma vida marcada por
solid#o e sil+ncio. /om a idade se tornou mais recolhido e tranquilo. (oi uma volta espiritual.

3a o filho mais velho ) tam)m parte da e2peri+ncia da vida de Bemrandt, e muitos


i7grafos modernos na verdade criticam a vis#o rom@ntica de sua vida. "les enfatiam que
Bemrandt estava muito mais sujeito &s e2ig+ncias de seus patrocinadores e & sua necessidade
de dinheiro do que em geral se acredita0 que seus temas s#o muitas vees resultantes da moda
em vigor em seu tempo e n#o de vis#o espiritual, e que seus fracassos se devem tanto ao seu
caráter farisaico e odioso quanto & falta de aceitaç#o por parte daqueles com quem convivia.

iversas iografias recentes veem em Bemrandt muito mais um articulador interesseiro


e calculista do que algu)m & procura da verdade espiritual. "las sustentam que muitas de suas

''
,dem% i!idem.% p. #S3.
<J
,dem% i!idem.% p. #S3.

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Henri J. M. Nouwen

pinturas, apesar de el$ssimas, s#o muito menos espirituais do que parecem. 3inha reaç#o
inicial a esses estudos desmistificadores sore Bemrandt foi de choque. %oretudo a iografia
de Rar %chUart L que dá pouca margem a romantiar Bemrandt L fe-me imaginar se
houve alguma ve “uma convers#o!. 6 n$tido, pelos estudos recentes do relacionamento de
Bemrandt com seus patrocinadores, que encomendavam e compravam seus traalhos, em
como sua fam$lia e amigos, que ele era uma pessoa de dif$cil conviv+ncia. %chUart o descreve
como “uma pessoa amarga e vingativa, que usava todas as armas, permitidas ou n#o, para
atacar os que atravessavam seu caminho!.<;

e fato, Bemrandt era conhecido por muitas vees agir de forma ego$sta, arrogante e at)
vingativa. 4sso se v+ em pela maneira como tratou Reertje irc2, com quem viveu por seis
anos. "le usou o irm#o de Reertje, a quem a pr7pria Reertje dera uma procuraç#o, para
angariar testemunhas de seus viinhos contra ela, de modo que pudesse ser enviada para um
asilo de doentes mentais.<I /onsequentemente, Reertje foi internada. *uando mais tarde
houve a possiilidade de ela sair, “Bemrandt contratou um agente para que conseguisse
provas contra ela, de modo que permanecesse em cativeiro!.<Q

urante o ano de 8IJF, quando estes acontecimentos trágicos tiveram in$cio, Bemrandt
ficou t#o esgotado que nada conseguiu produir. Ceste ponto, um outro Bemrandt surge,
algu)m sumerso em amargura e desejo de vingança, capa de traç#o.

6 dif$cil encarar este Bemrandt. C#o ) t#o dif$cil simpatiar com um tipo sensual que
cede aos praeres hedonistas do mundo, depois se arrepende, volta para casa e se torna
algu)m com muita espiritualidade. 3as apreciar um homem com ressentimentos profundos,
que perde muito do seu precioso tempo em processos corriqueiros e está constantemente se
indispondo com terceiros em face do seu modo arrogante, ) muito mais dif$cil. "ntretanto, ao
que se saia, isso tam)m ) um aspecto de sua vida0 um aspecto que n#o posso ignorar.

Bemrandt ) tanto filho mais velho quando o mais novo da paráola. *uando, durante os
5ltimos anos de sua vida, ele pintou amos os filhos na sua Vida do Filho Pródigo, ele tinha
vivido uma vida em que n#o ignorava nem os desatinos do filho mais moço nem os desacertos
do filho mais novo. Emos precisavam de cura e de perd#o. Emos precisavam voltar para
casa. 3as, tanto da hist7ria, como do quadro de Bemrandt, depreende-se que a convers#o
mais dif$cil de se oter ) a daquele que permanece em casa.

<;
0em!randt5 Dign e"en% Dign >childeri;en. Naarsen% Netherlands% *itge"ereri; ar >chwartD% #23$. p. 'I&
<I
M% /harles . 0em!randts portrait5 a !iograph. New orG% >imon and >chuster% #233. p. &&2
<Q
,dem% i!idem.

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;
O ilho &ais +elho !arte

O Filho mais "elho esta"a no campo. -uando "olta"a% ;7 perto de casa ou"iu msicas e dan8as.
/hamando um ser"o% perguntou1lhe o 9ue esta"a acontecendo. ste lhe disse5 6U teu irm<o 9ue
"oltou e teu pai matou o no"ilho ce"ado% por9ue o recuperou com sade:. nt<o ele ficou com
muita rai"a e n<o 9ueria entrar. >eu pai saiu para suplicar1lhe. le% porm% respondeu% a seu
pai5 6H7 tantos anos 9ue eu te sir"o% e ;amais transgredi um só dos teus mandamentos% e
nunca me deste um ca!rito para feste;ar com meus amigos. /ontudo% "eio esse teu filho% 9ue
de"orou teus !ens com prostitutas% e para ele matas o no"ilho ce"adoC:.

$& !: %o& as &,os entrelaadas

urante as horas em que estive no Hermitage olhando para o quadro de Bemrandt, fui
aos poucos me sentindo fascinado pela figura do filho mais velho. emro-me de olhar para
ele por longo tempo e imaginar o que estaria se passando na caeça e no coraç#o desse
homem. "le ), sem d5vida alguma, o principal oservador da volta do filho mais jovem.
*uando eu conhecia somente o fragmento da pintura na qual o pai araça seu filho que volta
era mito fácil reconhec+-lo como convidativo, comovente e tranquiliador. 3as quando vi todo
o quadro logo percei a comple2idade do encontro. O principal espectador, oservando o pai
araçando o filho que volta, parece muito afastado. "le olha para o pai, mas sem alegria. "le
n#o se apro2ima, n#o sorri nem e2pressa oas-vindas. "le simplesmente fica lá, ao lado do
estrado, aparentemente n#o querendo soressair.

6 verdade que a Volta ) o principal acontecimento da pintura0 entretanto, n#o está


situada no centro de tela. Ocorre do lado esquerdo da pintura, enquanto do lado direito
predomina a figura austera do filho mais velho. Há um espaço grande separando o pai do filho
mais velho, um espaço que cria uma tens#o que precisa ser resolvida.

/om o filho mais velho na pintura, n#o ) mais poss$vel sentimentaliar a “olta!. O
principal oservador mant)m dist@ncia, aparentemente n#o querendo participar das oas-
vindas do pai. O que se passa na caeça desse homemN O que irá ele faerN /hegará mais
perto e araçará seu irm#o como fe seu pai, ou irá emora com raiva e avers#oN

esde que meu amigo art falou que posso ser muito mais como filho mais velho do que
como o filho mais moço, tenho oservado esse “homem & direita! com maior cuidado e tenho

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visto muito mais coisas novas e dif$ceis. E maneira como o filho mais velho foi pintado por
Bemrandt retrata-se um tanto como seu pai. Emos t+m ara e usam largos mantos
vermelhos sore seus omros. "stes sinais e2ternos sugerem que ele e seu pai t+m muito em
comum e essa semelhança ) sulinhada pela lu que incide sore o filho mais velho L o que fa
que haja uma ligaç#o direta da sua face com a face iluminada do pai.

3as que diferença dolorosa entre os dos O pai se inclina sore o filho que volta. O filho
mais velho, ereto, fica ainda mais firme na sua postura porque se apoia numa vara que alcança
o ch#o. E capa do pai ) larga e acolhedora0 a do filho cai rente ao corpo. Es m#os do pai est#o
aertas e tocam o filho que volta numa atitude de +nç#os0 as do filho est#o entrelaçados e se
mant+m junto ao peito.

Há lu em amas as faces, mas a lu do rosto do Pai flui por todo o corpo L especialmente
as m#os L e envolve o filho mais jovem num grande halo de t)pida luminosidade, enquanto a
lu no rosto do filho mais velho ) fria e contrita. %ua figura permanece no escuro e suas m#os
entrelaçadas continuam nas somras.

E paráola que Bemrandt pintou poderia ter se chamado “E Paráola dos (ilhos
Perdidos!. C#o s7 se perdeu o filho mais moço que saiu de casa e foi a um pa$s distante, &
procura de lierdade e praer, mas o que ficou em casa tam)m se tornou um homem
perdido. "2ternamente fe todas as coisas que um om filho deve faer, mas, no $ntimo, se
afastou do seu pai. "le cumpriu o seu dever, traalhou duro todos os dias e deu conta de suas
origaç'es, mas se tornou mais e mais infeli e cativo.

Perdido e& ressenti&ento

Para mim ) dif$cil admitir que este homem ressentido, amargo e raivoso esteja
espiritualmente mais perto de mm do que o sensual filho mais jovem. "ntretanto, quanto mais
penso no filho mais velho, mais me vejo nele. /omo o filho mais velho na minha pr7pria
fam$lia, sei em como ) ter de ser um filho modelo.

3uitas vees imagino se n#o s#o especialmente os filhos mais velhos que querem
corresponder &s e2pectativas de seus pais se ser considerados oedientes e e2emplares.
3uitas vees querem agradar. 3uitas vees receiam desapontar seus pais. 3as muitas vees
e2perimentam, em cedo na vida, uma certa inveja relativamente a seus irm#os e irm#s mais
jovens, que parecem se preocupar menos em agradar e est#o muito mais & vontade para
“viver sua pr7pria vida!. Para mim certamente foi assim. " sempre alimente uma estranha
curiosidade pela vida de reeldia que eu n#o ousara viver, mas que outros, ao meu redor,
viviam. (i tudo de maneira correta, principalmente atendendo aos compromissos agendados
por muitas figuras paternas na minha vida L professores, diretores espirituais, ispos, papas L
mas, ao mesmo tempo, muitas vees me perguntei por que n#o tive coragem de ir emora
como fe o filho mais jovem.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

6 estranho dier isso,mas, no fundo do meu coraç#o, tenho tido um sentimento de inveja
em relaç#o ao filho reelde. 6 a emoç#o que desperta quando vejo meus amigos se divertindo,
faendo toda sorte de coisas que condeno. "u classifique seu comportamento como impr7prio
e mesmo imoral, mas ao mesmo tempo muitas vees me perguntei por que eu n#o tinha
coragem de, pelo menos em parte, faer a mesma coisa.

E vida regrada e correta de que tanto me orgulho ou pela qual sou elogiado se torna,
algumas vees, como um peso que foi colocado nos meus omros e continua a me incomodar,
mesmo quando já a aceitei de tal maneira que n#o dá para mudar. C#o tenho dificuldade em
me identificar com o filho mais velho da paráola, que se quei2ava: “Há tantos anos que eu te
sirvo, e jamais transgredi um s7 de teus mandamentos, e nunca me deste m carito para
festejar com meus amigos!. Cesta quei2a, oedi+ncia e dever se tornaram um peso e o
traalho, uma escravid#o.

1udo isso se tornou muito real para mim quando um amigo, que recentemente se
convertera ao cristianismo, criticou-me por n#o orar astante. %ua cr$tica me dei2ou muito
angado. isse a mim mesmo: “/omo ele se atreve a me dar liç'es sore a oraç#o! Por anos
ele viveu uma vida desregrada, sem disciplina, enquanto eu desde criança tenho estado
estritamente dentro da f). Egora ele se converteu e começa a me dier como me comportar!.
"sse ressentimento $ntimo me mostra como estou “perdido!. (iquei em casa e n#o me afastei,
mas n#o vivi uma vida com lierdade na casa de meu pai. 3inha anga e inveja mostraram-me
minha pr7pria sujeiç#o.

4sso n#o ) e2clusividade minha. Há muitos filhos e filhas mais velhos que est#o perdidos
enquanto ainda em casa. 6 esta derrota L caracteriada por julgamento e condenaç#o, raiva e
ressentimento, amargura e ci5me L que ) t#o perniciosa e prejudicial ao coraç#o humano.
3uitas vees pensamos em derrota em termos de aç'es que s#o facilmente identificáveis, at)
espetaculares. O filho mais jovem pecou de maneira que ) facilmente reconhec$vel. O seu
destino ) 7vio. "le empregou mal os eu dinheiro, tempo, amigos, seu pr7prio corpo. O que
fe foi errado0 n#o s7 sua fam$lia e amigos saiam disso, mas ele mesmo. "le se reelou contra
a moral e dei2ou-se seduir pela sua pr7pria concupisc+ncia e gan@ncia. Há algo claramente
visto que esse procedimento errado n#o levava sen#o & mis)ria, o filho mais jovem recorou o
om senso, deu a volta e pediu perd#o. 1emo aqui uma falha humana clássica, com uma
decis#o acertada. (ácil de entender e fácil de aceitar.

O desacerto do filho mais velho, entretanto, ) mais dif$cil de identificar. Efinal de contas,
ele fe tudo o que devia. (oi oediente, cumpridor de suas origaç'es, respeitador das leis e
traalhador. Es pessoas o respeitavam, admiravam-se, elogiavam-no e consideravam-no,
igualmente, um filho modelo. Eparentemente, o filho mais velho era sem defetos. 3as quando
se defronta com a alegria do pai pelo filho que volta, surge uma onda de revolta que e2plode,
chegando & superf$cie. e repente, aparece ali nitidamente vis$vel uma pessoa ressentida,
orgulhosa, má, ego$sta0 algu)m que permaneceu profundamente escondido apesar de estar
crescendo e se fortalecendo ao longo dos anos.

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Olhando em para mim, e depois & minha volta, para as vidas de outros, pergunto o que
causa mais dano: lu25ria ou ressentimento. Há tanto ressentimento entre os “justos! e os
“corretos!. Há tanto julgamento, condenaç#o e preconceito entre os “santos!. Há tanta raiva
contida entre as pessoas que s#o muito preocupadas em evitar “o pecado!.

6 dif$cil avaliar o desatino do “santo! ressentido, precisamente porque está t#o


intimamente ligado ao desejo de ser om e virtuoso. %e, por e2peri+ncia pr7pria, como me
esforce para ser om, aceito, aprovado e um e2emplo que valesse para os outros. Havia
sempre o esforço consciente de evitar as armadilhas do pecado e o medo constante de ceder &
tentaç#o. 3as com tudo isso, havia uma seriedade, uma intensidade moral e at) um pouco de
fanatismo, que fiera com que fosse mais e mais dif$cil me sentir & vontade na casa de meu pai.
1ornei-me menor livre, menos espont@neo, menos rincalh#o e os outros começaram a cada
ve mais me ver como algu)m um tanto “pesado!.

e& alegria

*uando ouço as palavras com as quais o filho mais velho agride seu pai L justificando-se e
pedindo reconhecimento, palavras ciumentas L ouço uma quei2a mais profunda. 6 a que vem
do coraç#o que acha que nunca receeu o que lhe era devido. 6 a quei2a e2pressa de in5meras
maneiras, sutis ou n#o, formando uma montanha de ressentimento. 6 a quei2a que rada:
“"sforcei-me tanto, traalhei por tanto tempo, fi o poss$vel e mesmo assim n#o recei o que
outros receem t#o facilmente. Por que as pessoas n#o me agradecem, n#o me convidam, n#o
rincam comigo, n#o me consideram, enquanto prestam tanta atenç#o &queles que levam a
vida de maneira trivial e levianaN!.

6 nessa quei2a declarada ou n#o que reconheço o filho mais velho em mim. 3uitas vees
me surpreendi reclamando de pequenas rejeiç'es, pequenas indelicadeas, pequenas
neglig+ncias. olta e meia há dentro de mim murm5rios, lamentos, resmungos, quei2as que
continuam mesmo contra minha vontade. *uanto mais discorro sore o assunto em quest#o,
tanto mais se agrava meu estado. *uanto mais me aprofundo na mat)ria, tanto mais se
complica. "ssa quei2a $ntima ) somria e pesada. /ondenaç#o de outros, condenaç#o pr7pria,
justificativas e arrependimentos v#o se fortalecendo de maneira cada ve mais prejudicial.
/ada ve que me dei2o levar por isso, entro num espiral de auto rejeiç#o. S medida que me
dei2o arrastar ao interior do vasto lairinto das minhas quei2as, fico mais e mais perdido, at)
que, no fim, acao me achando a pessoa mais incompreendida, rejeitada, negligenciada e

despreada deste mundo.


e uma coisa estou certo: quei2ar-se ) contraproducente e nocivo. *uando e2presso
minhas quei2as com o intento de merecer simpatia e receer a satisfaç#o que tanto desejo, o
resultado ) sempre o oposto do que eu queria oter. Elgu)m que reclama ) algu)m dif$cil de
conviver e poucas pessoas saem como responder &s quei2as feitas por algu)m que se rejeita.

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O trágico ) que muitas vees, uma ve e2pressa, a lam5ria leva ao que mais se queria evitar:
um afastamento maior.

esse ponto de vista ) muito compreens$vel a incapacidade do filho mais velho de


partilhar da alegria de seu pai. *uando ele chegou em casa, vindo do traalho, ouviu m5sica e
danças. Perceeu que havia alegria na casa. 4mediatamente, suspeitou do que estava
acontecendo. ?ma ve que assumimos essa atitude de desconfiança, dei2amos de ser
espont@neos ao ponto que nem mesmo a alegria pode despertar alegria.

E hist7ria di: “/hamando um servo, perguntou-lhe o que estava acontecendo!. Há o


medo de que eu tenha sido e2clu$do novamente, que algu)m n#o tenha me contado o que
estava se passando, que eu tenha sido mantido & margem dos acontecimentos. E d5vida
retorna imediatamente: “Por que n#o fui informado sore o que está acontecendoN!. O servo,
sem suspirar, e2citado e ansioso para dar oa nova, e2plica: “6 teu irm#o que voltou e teu pai
matou o novilho cevado, porque o recuperou com sa5de!. 3as essa manifestaç#o de alegria
n#o pode ser receida. "m ve de al$vio e gratid#o, a alegria do servo leva ao aposto: “"nt#o
ele ficou com muita raiva e n#o queria entrar!. E alegria e o ressentimento n#o podem
coe2istir. E m5sica e as danças, em ve de convidar ao festejo, tornaram-se causa para um
afastamento ainda maior.

1enho n$tida lemrança de uma situaç#o semelhante. ?ma ve, quando me sentia muito
s7, convidei um amigo para sair. Epesar de ter respondido que n#o tinha tempo, encontrei-o
pouco mais tarde na casa de um amigo comum onde havia uma festa. Eo me ver ele disse:
“em-vindo, junte-se a n7s, que om ver voc+!. 3as minha raiva foi t#o grande por n#o ter
sido informado da festa que n#o pude ficar. 1odas as minhas quei2as $ntimas sore n#o ser
aceito, apreciado e amado vieram & tona, dei2ei a sala atendo a porta atrás de mim. %entia-
me totalmente atingido L incapa de receer e poder participar da alegria que havia ali. Cum
momento, a alegria naquela sala tornara-se uma fonte de ressentimento.

"ssa e2peri+ncia de n#o poder partilhar da alegria ) a e2peri+ncia de um coraç#o


ressentido. O filho mais velho n#o podia entrar na casa e partilhar da alegria do seu pai. %ua
mágoa $ntima o paralisava e o dei2ava taciturno.

Bemrandt entendeu o sentido profundo de tudo isso quando ele pintou o filho mais
velho ao lado do estrado em que o filho mais jovem ) receido na alegria do pai. "le n#o
descreve a comemoraç#o com m5sica e dançarinos0 eram meros sinais e2teriores do
contentamento do pai. E 5nica indicaç#o de que ) uma festa ) o realce dado a um tocador de

flauta esculpido
lugar de na Bemrandt
uma festa, parede na qual se lu,
pintou apoia uma
a lu das mulheres
radiosa 9a m#e
que envolve dooFilho
tanto PródigoN>.
pai como o filho."m
E
alegria que Bemrandt retrata ) a alegria tranquila que pertence & casa de eus.

Ca paráola ) poss$vel imaginar o filho mais velho do lado de fora, no escuro, n#o
desejando entrar na casa iluminada e cheia de ru$dos de festa. 3as Bemrandt n#o pinta nem
a casa nem os campos. "le retrata tudo com claro e escuro. O araço do pai, cheio de lu, ) a

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

casa de eus. á est#o as m5sicas e as danças. O filho mais velho fica fora do c$rculo desse
amor, recusando-se a entrar. E lu sore seu rosto mostra que ele tam)m ) chamado & lu,
mas n#o pode ser forçado.

Ss vees as pessoas se perguntam: O que aconteceu como o filho mais velhoN "le se
dei2ou persuadir pelo paiN "ntrou, finalmente, e participou dos festejosN Eraçou seu irm#o e
lhe desejou as oas-vindas como seu pai havia feitoN %entou-se & mesa com o pai e o filho e
partilhou com eles da refeiç#o festivaN

Cem a pintura de Bemrandt nem a paráola que ela retrata falam da decis#o final do
filho mais velho de maneira que permita que ele possa ser encontrado. %erá que o filho mais
velho á capa de reconhecer que ele tam)m ) um pecado que precisa ser perdoadoN %erá
que ele está disposto a admitir n#o ser melhor do que seu irm#oN

"stou s7 diante dessas quest'es. o mesmo modo como n#o sei como o filho mais jovem
aceitou a comemoraç#o ou como passou a viver com o pai depois de sua volta, tam)m n#o
sei se o filho mais velho se reconciliou com seu irm#o, com seu pai, ou com ele mesmo. O que
conheço, com certea plena, ) o coraç#o do pai. 6 um coraç#o capa de compai2#o sem
limites.

&a ;uest,o n,o resol+ida

iferentemente de um conto de fadas, a paráola n#o sugere um final feli. Eo contrário,


dei2a-nos face a face com uma das mais dif$ceis escolhas espirituais: confiar ou n#o no amor
todo misericordioso de eus. %ou eu somente que posso faer essa escolha. "m resposta &
quei2a “"ste homem acolhe os pecadores e senta-se & mesa com eles!, Kesus enfrentou os
fariseus e os escrias n#o somente com A Volta do Filho Pródigo, mas tam)m com a volta do
filho mais velho, ressentido. eve ter sido um choque para essas pessoas religiosas oedientes
&s leis. "las tinham que encarar sua pr7pria quei2a e decidir como teriam que reagir ao amor
de eus pelos pecadores. %eriam elas capaes de se juntar a eles & mesa como fe KesusN "ra e
anda ) um verdadeiro desafio: para elas, para mim, para qualquer pessoa possu$da de
ressentimento e tentada a levar a vida de maneira quei2osa.

*uanto mais penso no filho mais velho contido no meu pr7prio eu, mais compreendo
qu#o enraiada está essa fraquea e como será dif$cil voltar para casa depois de uma aventura
se2ual do que depois de um sentimento de raiva que reside no mais profundo do meu ser. C#o
) fácil distinguir o meu ressentimento e administrá-lo de maneira sensata.
6 muito mais nocivo: e2iste alguma coisa junto & minha virtude como a oura face da
moeda. C#o ) om ser oediente, respeitoso, oservador das leis, traalhador e capa de
sacrif$cioN ", no entanto, parece que meus ressentimentos e quei2as est#o misteriosamente
ligados a essas mesmas atitudes merecedoras de elogios. "ssa ligaç#o muitas vees fa que me
desespere. Co mesmo momento que quero falar ou agir com maior generosidade, sinto-me

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envolvido por raiva e ressentimento. " tam)m parece que e2atamente quando quero ser
realmente altru$sta, sinto, de forma osessiva, necessidade de amor. "2atamente quando faço
o poss$vel para desempenhar em uma tarefa, pergunto-me por que outros n#o se doam
como eu. *uando penso ser capa de superar minhas tentaç'es, sinto inveja daqueles que
sucumiram &s suas. Parece que onde quer que se encontre meu lado virtuoso, a$ tam)m
e2istirá sempre um quei2oso ressentido.

Equi eu me defronto com minha verdadeira porea. %into-me totalmente incapa de


e2tirpar meus ressentimentos. "st#o t#o profundamente encravados na te2tura do meu ser
interior que arrancá-los parece algo como uma autodestruiç#o. /omo me livrar deles sem
arrancar as virtudes tam)mN

%erá eu o filho mais velho que e2iste em mim pode voltar para casaN Posso eu ser
encontrado como o filho mais jovem foi encontradoN /omo posso voltar quando estou perdido
em ressentimento, apanhado em cenas de ci5mes, prisioneiro da oedi+ncia e do dever que
escraviaN (ica claro que s7 por mim mesmo n#o posso me encontrar. 6 mais assustador ter de
me curar como o filho mais velho do que como o filho mais moço. "m face de me senti incapa
de autorredenç#o, agora entendo as palavras de Kesus a Cicodemos: “C#o te admires de eu
haver dito: deveis nascer do alto!.<G /ertamente alguma coisa tem de acontecer pela qual eu
n#o seja responsável. C#o posso renascer em condiç#o inferior, isto ), com minha pr7pria
força, minha pr7pria mente, minha vis#o psicol7gica. C#o há d5vida em minha mente sore
isto porque no passado me esforcei para superar as minhas quei2as e falhei... e falei... e falhei,

at)
podeque
vircheguei
a minha& cura,
eira de
de total
ondecolapso
eus seemocional
deruça. eO at)
quemesmo de e2aust#o
n#o ) poss$vel paraf$sica.
mim %7 do alto
) poss$vel
para eus. “/om eus, tudo ) poss$vel!.

<G
Jo '%S.

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I
A +olta do ilho &ais +elho

O Filho mais "elho... ficou com muita raiva e n#o queria entrar. %eu pai saiu para suplicar-lhe...

O Pai disse5 6Filho% tu est7s sempre comigo% e tudo o 9ue  meu  seu. Mas era preciso 9ue
feste;7ssemos e nos alegr7ssemos% pois ter irm<o esta"a morto e tornou a "i"erE ele esta"a
perdido e foi encontrado:.

&a %on+ers,o !oss7+el

O pai n#o deseja somente a volta do filho mais jovem, mas tam)m a do mais velho. O
mais velho tam)m precisa ser encontrado e conduido de volta & casa da alegria. Besponderá
ele ao apelo de seu pai ou ficará emperrado em sua amarguraN Bemrandt tam)m dei2a a

decis#o final do filho mais velho aerta a questionamentos. arara Koan Haeger escreve:
“Bemrandt n#o revela se ele + a lu. /omo ele n#o condena francamente o irm#o mais velho,
Bemrandt sugere a esperança de que ele tam)m se dará conta de que ) pecador... a
interpretaç#o de como o filho mais velho reage ) dei2ada ao oservador!.<F

O t)rmino n#o conclusivo da hist7ria e a pintura de Bemrandt dei2am-se com muito


traalho espiritual a realiar. *uando olho para a fae iluminada do filho mais velho e, em
seguida, para suas m#os escurecidas, sinto n#o somente sua sujeiç#o, mas tam)m a
possiilidade de se liertar. "sta n#o ) uma hist7ria que separa os dois irm#os L o om e o
mau. %omente o pai ) om. "le ama amos os filhos. "le corre ao encontro de amos. "le quer
que os dois se sentem & sua mesa e participem de sua felicidade. O filho mais jovem se dei2a
araçar num araço de perd#o. O mais velho fica para trás, olha para o gesto compassivo do
pai, e n#o pode ainda esquecer a sua raiva e dei2ar que o pai o cure tam)m.

O amor do Pai n#o se imp'e aos seus queridos. "mora ele deseje sanear todos os nossos
cantos escuros, somos ainda livres para faer nossa escolha L se queremos permanecer nas
trevas ou penetrar na lu do amor de eus. eus está lá. O perd#o de eus está lá. O amor de
eus sem limites está lá. O que ) claro ) que eus está sempre pronto a dar e a perdoar, n#o
dependendo asolutamente de nossa resposta. O amor de eus n#o depende de nosso
arrependimento de nossa resposta. *uer eu seja o filho mais jovem ou o mais velho, o 5nico

<F
Haeger% op. cit.% PP. #3(1#3I.

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desejo de eus ) o filho mais jovem ou o mais velho, o 5nico desejo de eus ) o de me faer
voltar para casa. Erthur (reeman escreve:

O pai ama cada filho e dá a cada um a lierdade para ser o que puder, mas n#o
pode lhes dar a lierdade que eles n#o aceitem ou entendam
convenientemente. O pai parece compreender, al)m dos costumes de seu
meio social, a necessidade de seus filhos de serem eles mesmos. 3as ele
tam)m conhece a sua car+ncia por seu amor e por um “lar!. /omo de que a
paráola n#o tem um fecho $ndia certamente que o amor do pai n#o depende
de um final adequado da hist7ria. O amor do pai s7 dele depende e continua
parte do seu caráter. /omo di %haMespeare em um dos seus sonetos: “Emar
n#o ) o amor que se altera quando alteraç#o encontra!.JT

Para mim, pessoalmente, a poss$vel convers#o do filho mais velho ) de import@ncia


crucial. 1enho muitas das caracter$sticas do grupo que Kesus mais critica: os fariseus e os
escrias. "studei os livros, conheci as leis e muitas vees me apresente como uma autoridade
em assuntos religiosos. Es pessoas t+m me demonstrado muito respeito e at) me chamado de
“reverendo!. 1enho receido cumprimentos e louvor, dinheiro e pr+mios e muitos aplausos.
1enho criticado diversas formas de comportamento e muitas vees condenado.

Essim quando Kesus narra a paráola do Filho Pródigo, tenho de escutá-la. Beconheço que
estou mais perto daqueles que provocaram que Kesus contasse a hist7ria, faendo o seguinte
comentário: “"sse homem acolhe os pecadores e senta-se & mesa com eles!. Há alguma
chance de que eu volte ao Pai e me sinta em-vindo em sua casaN Ou estou t#o enrodilhado
nas minhas prerrogativas que estou destinado, contra a minha vontade, a ficar do lado de fora,
atolado em raiva e ressentimentoN

Kesus di: “em-aventurados v7s, os pores... em-aventurados v7s, que agora tendes
fome... em-aventurados v7s, que agora chorais...!, J8 mas eu n#o sou pore, faminto, nem
choro. Kesus di: “"u te louvo, 7 Pai, %enhor do c)u e da terra, porque ocultasse essas coisas
9do reino> aos sáios e entendidos!.J= 6 a estes, aos eruditos e aos perspicaes, que eu
nitidamente pertenço. Kesus mostra franca prefer+ncia por aqueles que s#o marginaliados
pela sociedade L os pores, os doentes e os pecadores L mas eu, certamente, n#o sou
marginaliado. E pergunta dolorosa que, do "vangelho, surge para mim, ): “%erá que já tive a
minha recompensaN!. Kesus reprova muito aqueles que “gostam de faer oraç#o pondo-se em
p) nas sinagogas e nas esquinas, a fim de serem vistos pelos homens!. J< Beferindo-se a eles,
Kesus di: “em verdade vos digo: já receeram a sua recompensa!. JJ /om tudo o que já escrev
e preguei sore a oraç#o e com toda a pulicidade de que goo, n#o posso dei2ar de imaginar
se essas palavras n#o s#o dirigidas a mim.

JT
1he Parale of the Prodigal% manuscrito n<o pu!licado .
J8
c I%&41&#.
J=
c #4%&#.
J<
Mt I%(.
JJ
Mt I%(.

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Henri J. M. Nouwen

/ertamente s#o, mas a hist7ria do filho mais velho coloca essas perguntas angustiantes
deai2o de uma nova lu, dei2ando claro que deus n#o ama o filho mais jovem mais do que o
filho mais velho. Ca hist7ria o pai se dirige ao filho mais velho da mesma maneira que se
dirigiu ao mais moço, convida-o a entrar e di: “3eu filho, tu estás sempre comigo, e tudo o
que ) meu ) teu!.

"ssas s#o as palavras a que devo prestar atenç#o e permitir que penetrem em fundo no
meu ser. eus me chama “meu filho!. O vocáulo grego para filho que ucas emprega aqui )
J;
te;non, “uma maneira afetuosa de falar!, como Koseph E. (itmer d. 1raduindo
literalmente, o que o pai di ) “criança!.

"sta aordagem afetuosa fica ainda mais clara nas palavras que se seguem. E
recriminaç#o áspera e amarga do filho n#o ) receida de modo a julgá-lo. C#o há recriminaç#o
ou den5ncia. O pai n#o se defende ou sequer comenta o comportamento do filho mais velho.
O pai se coloca diretamente acima de todas as consideraç'es para enfatiar sua ligaç#o muito
$ntima com o seu filho quando di: “1u estás sempre comigo!. E declaraç#o do Pai de amor
irrestrito elimina qualquer possiilidade de que o filho mais jovem seja mais amado do que o
mais velho. O mais velho nunca dei2ou a casa. O pai dividiu tudo com ele. (e dele parte da sua
rotina diária, nada dele escondendo. “1udo o que tenho ) teu!, ele di. C#o pode haver
pronunciamento mais claro do amor ilimitado do pai pelo seu filho mais velho. Essim, o amor
sem reservas, ilimitado, ) oferecido inteiramente e igualmente a amos os filhos.

<ei=ando de lado a ri+alidade

E alegria pela volta dramática do filho mais jovem de maneira alguma quer dier que o
mais velho ) menos amado, menos considerado, menos favorecido. O pai n#o compara os dois
filhos. Ema-os com amor total e e2pressa esse amor de acordo com os percursos de cada um.
/onhece-os intimamente. /ompreende suas qualidades $mpares e suas imperfeiç'es. "le v+
com amor a pai2#o do seu filho mais jovem, mesmo que lhe falte a vitalidade da pai2#o. Para o
filho mais jovem n#o há pensamentos de melhor ou pior, mais ou menos, da mesma maneira
que n#o há termos de comparaç#o para o filho mais velho. O pai responde a amos de acordo
com as suas peculiaridades. E volta do filho mais jovem o fa convocar para uma
comemoraç#o cheia de alegria. E volta do filho mais velho o fa estender um convite para total
participaç#o nessa alegria.

“Ca casa de meu Pai há muitas moradas!, JI di Kesus. /ada filho de eus tem lá seu lugar
reservado, todos lugares de eus. 1enho de aandonar toda comparaç#o, rivalidade e
competiç#o e capitular ao amor do Pai. 4sso requer um avanço na f) porque tenho pouca
e2peri+ncia de amor sem paralelos e desconheço o poder curador desse amor. "nquanto eu
ficar de fora, no escuro, posso comente permanecer na quei2a ressentida que resulta de

J;
The gospel according to st. uGe. Theanchor )i!le arden /it% N..R% ". &% p. #43$%#23(
JI
Jo #$%&.

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comparaç'es. (ora da lu, meu irm#o mais jovem parece ser mais amado pelo Pai do que eu0
de fato, fora da lu, n#o posso mesmo v+-lo como meu pr7prio irm#o.

eus está me chamando para voltar para casa, entrar na lu e descorir ent#o que, em
eus, todas as pessoas s#o 5nicas e inteiramente amadas. Ca lu de eus posso finalmente ver
meu viinho como meu irm#o, como aquele que pertence tanto a eus quanto eu. 3as, fora
da morada de eus, irm#os e irm#s, maridos e esposas, amantes e amigos se tornam rivais e
mesmo inimigos, cada um eternamente emprestado por ci5mes, suspeitas e ressentimentos.

C#o ) de admirar que, na sua raiva, o filho mais velho se quei2e ao pai... “e nunca me
deste um carito para festejar com os meus amigos. /ontudo, veio esse teu filho, que devorou
teus ens com as prostitutas, e para ele matas o novilho cevado!. "stas palavras revelam como
este homem deve se sentir profundamente magoado. O seu amor pr7prio está dolorosamente
ferido pela alegria do pai, e a sua pr7pria raiva o impede de aceitar este patife que volta, como
seu irm#o. /om as palavras “esse teu filho! ele se distancia do seu irm#o e tam)m de seu pai.

"le olha para eles como estranhos que perderam todo o senso de realidade e se
envolveram num relacionamento totalmente inadequado, considerando os fatos que na
realidade ocorreram na vida do Filho Pródigo. O filho mais velho n#o tem mais um irm#o. Cem,
tam)m, um pai. Emos passaram a ser estranhos para ele. Para seu irm#o um pecador, ele
olha com despreo0 para seu pai, um senhor de escravos, com receio.

ejo aqui como o filho mais velho está perdido. 1ornou-se um estranho em sua pr7pria
casa. C#o há comunh#o. 1odo relacionamento ) permeado pela escurid#o. "star com medo ou
mostrar despreo, ter de sumeter-se ou ter de controlar, ser um opressor ou uma v$tima:
estas s#o as opç'es para aquele que fica fora da lu. Os pecados n#o pode sem confessados, o
perd#o n#o poder ser otido, n#o pode e2istir a reciprocidade do amor. E verdadeira
comunh#o tornou-se imposs$vel.

/onheço a dor desta categoria. Cela, tudo perde sua espontaneidade. 1udo se torna
suspeito, constrangedor, calculado e cheio de segundas intenç'es. C#o há mais confiança.
/ada pequeno passo requer uma retriuiç#o0 cada pequena oservaç#o pede uma análise0 o
melhor gesto tem de ser medido. "sta ) a patologia da escurid#o.

Há uma maneira de escaparN C#o creio que haja L n#o do meu lado, pelo menos. Parece
que quanto mais tento me desvencilhar da escurid#o, mais escuro fica. Preciso da lu, mas
essa lu tem de sorepor-se & escurid#o e isso ru, por mim, n#o consigo. C#o consigo me
perdoar. C#o consigo me sentir amado. Por mim mesmo n#o posso sair do terreno da minha
raiva. C#o posso caminhar para casa nem por minha conta entrar em comunh#o. Posso rear
por ela. 3as minha pr7pria lierdade n#o posso conseguir por mim mesmo. 4sso precisa me
ser dado. "stou perdido. Preciso ser encontrado e traido para casa pelo guia espiritual que sai
ao meu encontro.

E hist7ria do Filho Pródigo ) a de um eus que me procura e n#o descansa at) que me
encontre. "le insiste e suplica. "le me pede que dei2e de me apegar a estados de esp$rito que

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levam & morte e me dei2e alcançar por raços que me carregar#o para o lugar onde
encontrarei a vida que mais desejo.

Becentemente e2perimentei de maneira concreta em minha pr7pria carne a volta do filho


mais velho. "nquanto faia caminhadas, fui atingido por um carro e logo internado num
hospital & eira da morte. Eli tive a n$tida vis#o que n#o estaria pronto para morrer enquanto
alimentasse a quei2a de n#o ter sido amado o astante por aquele que me deu a vida. %enti
que n#o crescera astante. %enti fortemente o apelo para aandonar minha quei2a de
adolescente e renunciar & mentira de que sou menos amado que meus irm#os mais jovens. (oi
assustador, mas muito gratificante, liertador. *uando meu pai, já em velho, veio da Holanda
de avi#o para me visitar, entendi que esse era o momento para que eu me apropriasse da
minha filiaç#o divina. Pela primeira ve em minha vida disse francamente a meu pai que o
amava e me senti agradecido pelo seu amor por mim. isse-lhe muitas coisas que nunca lhe
dissera antes e fiquei surpreso pelo tempo que levara a di+-las. 3eu pai ficou um tanto
surpreso e at) intrigado por tudo isso, mas receeu minhas palavras com compreens#o e um
sorriso. *uando revejo este acontecimento espiritual encaro-o como uma verdadeira volta: a
volta de uma depend+ncia ilus7ria de um pai humano, que n#o pode me dar tudo o que
preciso, a uma verdadeira depend+ncia do Pai celestial que di: “(ilho, tu estás sempre comigo
e tudo o que ) meu ) teu!0 a volta tam)m do meu eu quei2oso, confrontador, ressentido ao
meu eu verdadeiro, que está livre para dar e receer amor. ", mesmo que tenha havido, e
certamente continuará a haver, muitos retrocessos, trou2e-me o princ$pio da lierdade para
viver a minha pr7pria vida e morrer a minha pr7pria morte. E volta ao “Pai L de quem toma o
nome toda fam$lia!JQ permiti-me dei2ar que meu pai seja nada menos que o ondoso,
amoroso, mas limitado ser humano que ele ), e que dei2e que meu Pai celestial seja o eus
cujo amor ilimitado e incondicional dissolva todos os ressentimentos e raiva, e me torne livre
para amar sem a necessidade de precisar agradar ou merecer aprovaç#o.

Mediante %oniana e gratid,o

"sta minha e2peri+ncia pessoal da volta do filho mais velho pode oferecer alguma
esperança &s pessoas ca$das no ressentimento que ) o fruto amargo de sua necessidade de
agradar. %uponho que n7s todos um dia teremos que nos haver com o filho mais velho dentro
de n7s. E pergunta diante de n7s ) simplesmente: O que faer para tornar poss$vel essa voltaN
"mora eus venha at) n7s para nos encontrar e nos traer de volta, precisamos admitir n#o
somente estar perdidos, mas tam)m dispostos a ser encontrados e traidos de volta. /omoN
Oviamente n#o somente esperando e sendo passivos. Epesar de que somo incapaes de nos
liertar de nossa raiva contida, podemos dei2ar que eus nos encontre e nos cure por seu
amor, por meio da prática concreta e diária de confiança e gratid#o. /onfiança e gratid#o s#o
as mat)rias para a convers#o do filho mais velho. ", mediante minha e2peri+ncia pessoal
passei a conhec+-las.

JQ
f '%#$1#(.

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%em confiança, n#o posso me dei2ar encontrar. /onfiança ) a convicç#o $ntima de que o
Pai me quer de volta & casa. "nquanto eu duvidar que vale a pena que seja encontrado e me
coloque como menos amado do que meus irm#os e irm#s mais jovens, n#o posso ser
encontrado. 1enho de continuar diendo a mim mesmo: “eus o está procurando. "le irá a
qualquer lugar para encontrá-lo. "le o ama, deseja-o de volta, n#o pode descansar a menos
que voc+ esteja com "le!.

Há uma vo forte, carregada, dentro de mim que proclama o oposto: “eus n#o está
realmente interessando em mim, prefere o pecador arrependido que volta para casa depois de
seus impensados deslies. "le n#o presta atenç#o em mim que nunca dei2ei a casa. "le me
aceita como sou. C#o sou seu filho favorito. C#o espero que me d+ o que realmente desejo!.

Ss vees esta vo tenerosa ) t#o forte que preciso de enorme energia espiritual para
confiar que o Pai me deseja de volta tanto quanto ao filho mais jovem. 6 preciso verdadeira
disciplina para superar minha quei2a crAnica e pensar, falar e agir com a convicç#o de que
estou sendo procurado e serei encontrado. %em tal disciplina, fico preso a um desespero que
dura para sempre.

iendo a mim mesmo que n#o sou suficientemente importante para ser encontrado,
reforço a minha quei2a at) que me torne totalmente surdo & vo que me chama. E qualquer
hora preciso negar essa vo que me leva a rejeitar-me e a afirmar a verdade que eus
certamente quer tanto araçar a mim quanto aos meus ostinados irm#os e irm#s. Para ser
efica, esta confiança tem de ser mais profunda do que a sensaç#o de perda. Kesus confirma a
sua veracidade quando di: “1udo quanto suplicares e pedirdes, crede que receestes, e assim
será para v7s!.JG iver com confiança plena facilitará o caminho para que eus realie o meu
desejo mais profundo.

Kuntamente com a confiança deve haver gratid#o L o oposto do ressentimento.


Bessentimento e gratid#o n#o podem coe2istir, uma ve que o ressentimento impede a
percepç#o e o reconhecimento da vida como um dom. 3eus ressentimentos me diem que
n#o receo o que mereço0 sinto sempre inveja.

Rratid#o, entretanto, vai al)m do “meu! e do “teu! e proclama a verdade que a vida )
puro dom. Co passado sempre pensei na gratid#o como uma resposta espont@nea ao tomar
conhecimento dos dons receidos, mas agora compreendi que a gratid#o pode tam)m ser
vivida como uma disciplina. E disciplina da gratid#o ) o esforço e2pl$cito para reconhecer que
tudo o que sou e tenho ) dado a mim como um dom de amor, um dom par ser comemorado

com alegria.
Rratid#o como disciplina envolve uma escolha consciente. Posso ser grato mesmo quando
minhas emoç'es e sentimentos estejam ainda impregnados de mágoa e ressentimento. 6
incr$vel quantas ocasi'es surgem em que posso orar pela gratid#o em ve de lam5rias. Posso
preferir ser agradecido quando sou criticado, mesmo quando meu coraç#o ainda responde

JG
Mc ##%&$.

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com amargura. Posso optar por falar de ondade e elea, mesmo quando interiormente
ainda procuro algu)m para acusar ou algo para achar feio. Posso escolher ouvir as voes que
perdoam e olhar os rostos dos que sorriem, mesmo enquanto ainda ouço voes de vingança e
vejo trejeitos de 7dio.

Há sempre a escolha entre os ressentimentos e a gratid#o porque eus apareceu nas


minhas trevas, insistiu que eu voltasse para casa e declarou numa vo cheia de afeiç#o: “1u
estás sempre comigo e tudo o que eu tenho ) teu!. Bealmente eu posso optar por viver nas
trevas em que me encontro, indicar aqueles que parecem estar melhor do que eu, me quei2ar
dos muitos reveses que sofri no passado e, como consequ+ncia, me corir de ressentimento.
3as n#o tenho que faer isso. Há a possiilidade de olhar os olhos dVEquele que veio para me
procurar e ver ali que tudo o que sou e tudo o que tenho ) pura dádiva e merece gratid#o.

E opç#o pelo agradecimento poucas vees ocorre sem verdadeiro esforço. 3as todas as
vees faço essa opç#o, a pr72ima escolha se torna mais fácil, mais livre, um pouco menos
consciente. Porque cada graça que agradeço se are para outra e mais outra at) que,
finalmente, at) o mais normal, 7vio e aparentemente mundano acontecimento ou encontro
resulta em algo repleto de graça. Há um prov)rio estionano que di: “*uem n#o agradece o
pouco n#o agradecerá o muito!. Etos de reconhecimento faem que a pessoa se torne
agradecida porque, passo a passo, mostram que tudo ) graça.

1anto a confiança como a gratid#o e2ige a coragem de correr risco porque tanto a
desconfiança como o ressentimento, querendo continuar a faer parte do meu modo de ser,
me previnem constantemente contra o perigo de aandonar meus cálculos cuidadosos e
previs'es reservadas. "m muitos pontos tenho que dar um salto na f) de modo a permitir que
a confiança e a gratid#o prevaleçam: para escrever uma carta amiga a algu)m que n#o me
perdoe, dar um telefonema para algu)m que n#o me perdoe, dar um telefonema para algu)m
que me tenha rejeitado, falar uma palavra que aençoe para algu)m que n#o possa faer o
mesmo.

O salto na f) sempre significa amar sem esperar ser amado, dar sem desejar receer,
convidar sem esperar ser convidado, araçar sem esperar ser araçado. ", todas as vees que
dou um salto, sinto um lampejo, daquele que se dirige a mim e me convida para a sua alegria,
a alegria na qual posso n#o somente me encontrar, mas tam)m meus irm#os e irm#s. Essim,
a prática de confiar e agradecer revela o eus que me procura, ardendo no desejo de me livrar
de todos os meus ressentimentos e quei2as e de me faer tomar lugar a seu lado no anquete
celestial.

O +erdadeiro ilho &ais +elho

E volta do filho mais velho está se tornando t#o importante para mim 9uanto L se n#o
mais importante 9ue L a volta do filho mais jovem. /omo será o filho mais velho quando se
liertar de suas quei2as, sua raiva, ressentimentos e ci5mesN Ká que a paráola nada di a

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respeito da resposta do filho mais velho, ficamos com a opç#o de escutar o Pai ou de
permanecer cativos em nossa autorrejeiç#o.

3as mesmo quando reflito sore essa escolha e acredito que a paráola toda foi contada
por Kesus e pintada por Bemrandt para minha convers#o, fica claro para mim que Kesus, que
narrou a hist7ria, ) ele mesmo n#o somente o filho mais jovem, mas tam)m o mais velho. "le
veio para mostrar o amor do Pai e para me liertar dos v$nculos dos meus ressentimentos.
1udo o que Kesus di a respeito de si pr7prio o revela como o (ilho amado, aquele que vive em
plena comunh#o com o Pai. C#o há dist@ncia, medo ou desconfiança entre Kesus e o Pai.
Es palavras do Pai na paráola: “3eu filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que eu
tenho ) teu!, e2pressam o verdadeiro relacionamento de eus Pai com Kesus, seu (ilho. Kesus
constantemente afirma que toda a gl7ria que pertence ao Pai pertence igualmente ao (ilho. JF
1udo o que o Pai realia o (ilho tam)m realia. ;T C#o há separaç#o entre Pai e (ilho: O Pai e
eu somos um0;8 n#o há divis#o de tarefas: “O Pai ama o (ilho e tudo entregou em sua m#o!0 ;=
n#o há competiç#o: “1udo o que ouvi de meu Pai eu vos dei a conhecer!0 ;< n#o há inveja: “O
(ilho, por si mesmo, nada pode faer, mas s7 aquilo que v+ o Pai faer!. ;J Há perfeita uni#o
entre Pai e (ilho. "ssa uni#o se encontra no centro da mensagem de Kesus: “/rede-me: eu
estou no Pai e o Pai em im!. ;; Ecreditar em Kesus significa acreditar que ele ) o enviado do Pai,
aquele no qual e por meio de quem e plenitude do amor de eus ) revelada.;I

4sso ) dramaticamente narrado pelo pr7prio Kesus quando ele conta a paráola dos
lavradores homicidas. O dono da vinha, depois de ter mandado em v#o diversos servos para
receer o seu quinh#o da colheita, decide mandar “seu filho amado!. Os lavradores
reconhecem que ele ) o herdeiro e o matam para ficar com a herança para eles pr7prios. "sse
) o retrato do verdadeiro filho que oedece ao pai, n#o como escravo, mas como o Emado, e
realia o desejo do Pai em perfeita uni#o com ele.

Essim Kesus ) o filho mais velho do Pai. "le ) enviado pelo Pai para revelar o amor
infatigável de eus por todos os seus filhos ressentidos e para se ofertar como o caminho para
casa. Kesus ) o caminho que eus encontra para tornar poss$vel o imposs$vel L permitir que a
lu conquiste as trevas. Bessentimentos e quei2as, por profundas que possam parecer, podem
esvanecer diante da face na qual ) vis$vel a lu plena da (iliaç#o. *uando olho novamente para
o filho mais velho de Bemrandt, compreendo que a fria lu no seu rosto pode se tornar
profunda e cálida L transformando-o completamente L e torna-lo quem na verdade ele ): “O
(ilho Emado sore quem paira a complac+ncia de eus!.

JF
/f. Jo #%#$.
;T
/f. Jo #4%'&.
;8
/f. Jo #S%&&.
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Jo '%'(.
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Jo #(%#(.
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Jo (%#2.
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Jo #$%##.
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/; Jo (%&$E I%$4E #I%&SE #S%3.

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parte IIII
II

O PA-

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le esta"a ainda ao longe% 9uando seu pai "iu1o% encheu1se de compaiL<o% correu e lan8ou1
se1lhe ao pesco8o% co!rindo1o de !ei;os... O pai disse aos seus ser"os5 6,de depressa% traDei a
melhor tnica e re"esti1o com ela% ponde1lhe um anel no dedo e sand7lias nos ps. TraDei o
no"ilho ce"ado e matai1oE comamos e feste;amos% pois este meu filho esta"a morto e tornou a
"i"erE esta"a perdido e foi encontradoC:.  come8aram a feste;ar.

... sei pai saiu para suplicar1lhe... O pai lhe disse5 6Filho% tu est7s sempre comigo% e tudo o
9ue  meu  teu. Mas era preciso 9ue feste;7ssemos e nos alegr7ssemos% pois esse teu irm<o
esta"a morto e tornou a "i"erE ele esta"a perdido e foi encontradoC:.

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Q
4e&5randt e o !ai

Co Hermitage, enquanto fiquei contemplando o quadro, tentando asorver o que via,


muitos turistas passaram por ali. Epesar de que ficavam menos do que um minuto diante da
pintura, quase todos os guias a descreviam como retratando o pai compassivo e muitos
mencionaram que era um dos 5ltimos quadros de Bemrandt0 que ele o pintara depois de uma
vida de sofrimento. Ca verdade, ) disso que se trata. 6 a e2press#o humana da miseric7rdia
divina. "m ve de ser chamado A Volta do Filho Pródigo, poderia facilmente ter sido chamado
“E Ecolhida do Pai /ompadecido!. E +nfase ) menor no filho do que no Pai. E paráola ), na
verdade, a “Paráola do Emor Paterno!. ;Q endo a maneira como Bemrandt retrata o pai,
tive uma nova e plena compreens#o de carinho, miseric7rdia e perd#o. Echo que nunca
algu)m e2primiu t#o em o imenso amor de eus, sua infinita miseric7rdia. 1odos os detalhes
da figura do Pai L a e2press#o do seu rosto, sua postura, a cor de seu traje e, acima de tudo, as
suas m#os, o seu gesto L falam do amor de eus pela humildade, amor que e2istiu desde
sempre e continua.

1udo aqui se une L a hist7ria de Bemrandt, a hist7ria da humanidade, a hist7ria de eus.


1empo e eternidade se entrelaçam, a morte pr72ima e a vida eterna se tocam. Pecado e
perd#o se fundem0 o humano e o divino s#o um s7.

O que dá & figura paterna pintada por Bemrandt uma força ine2plicável ) que o
essencialmente divino ) contido no essencialmente humano. ejo um velho quase cego, com
igode e ar, vestido num traje ordado a outro, de um vermelho intenso, colocando suas
m#os grandes e espalmadas sore os omros do filho que volta. 4sto ) espec$fico, concreto e
fácil de descrever.

ejo tam)m, entretanto, compai2#o infinita, amor incondicional e perd#o asoluto L


realidades divinas L oriundas de um Pai que ) criador do universo. Equi, tanto o humano como
o divino, o frágil e o poderoso, o velho e o eternamente jovem s#o em retratados. Cisto
consiste o g+nio de Bemrandt. E verdade espiritual toma forma, ganha corpo. i um cr$tico,
Paul audiquet: “O espiritual em Bemrandt... e2trai da carne suas mais fortes e
esplendorosas caracter$sticas!.;G

;Q
FitDmer% op. /it.% p. #43$.
;G
,dem% i!idem.

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6 significativo que Bemrandt tenha escolhido um homem quase cego para comunicar o
amor de eus. /ertamente a paráola contada por Kesus e a maneira como foi interpretada no
decorrer dos s)culos constituem a ase para refletir, reproduir com fidelidade, amor
misericordioso de eus. C#o devo, por)m, esquecer que foi a pr7pria hist7ria de Bemrandt
que lhe permitiu e2pressar esse amor de maneira $mpar.

O mesmo cr$tico di: “esde juventude, Bemrandt s7 teve uma vocaç#o: envelhecer!.;F
6 verdade que Bemrandt sempre mostrou grande interesse por pessoas de idade. "le as
desenhou, esoçou-as, pintou-as desde que era jovem e ficou mais e mais fascinado por sua
elea interior. Elguns de seus melhores retratos por sua elea interior. Elguns de seus
melhores retratos s#o de pessoas velhas e os autorretratos com maior força foram feitos nos
seus 5ltimos anos de vida.

epois de muitas tentativas, em casa e no traalho, ele mostra um fasc$nio especial por
pessoas cegas. S medida que a lu em seu traalho reflete o interior, ele começa a pintar
cegos como os que realmente veem. "le ) atra$do por 1oit e por %ime#o, que ) quase cego, e
os pinta diversas vees.

S medida que a pr7pria vida de Bemrandt caminha em direç#o &s somras da velhice, &
medida que seu sucesso declina, e o esplendor de sua vida e2terior diminui, ele vai
descorindo a elea imensa da vida interior. Eli ele descore a lu de uma chama interior que
n#o morre nunca: a chama do amor. E sua arte n#o tenta mais “agarrar, conquistar e conduir
o invis$vel!, mas “transformar o vis$vel na chama do amor que se srcina no coraç#o $mpar do
artista!.IT

O coraç#o $mpar de Bemrandt se torna o coraç#o $mpar do pai. E centelha interior de


amor que ilumina, que cresceu e se fortaleceu ao longo dos muitos anos de sofrimento vividos
pelo artista, encandece no coraç#o do Pai que acolhe seu filho que volta.

"ntendo agora por que Bemrandt n#o seguiu literalmente o te2to da paráola. Cela,
ucas escreve: “"stava ainda longe quando o pai o viu e, movido de compai2#o, corre-lhe ao
encontro, lançou-se-lhe ao pescoço e o eijou!. *uando jovem, Bemrandt havia esoçado,
desenhado essa passagem com todo o seu conte5do dramático, mas, pr72imo da morte,
Bemrandt quis retratar um pai muito sereno que reconhece o filho, n#o com os olhos do
corpo, mas com os do esp$rito, do coraç#o.

Parece que as m#os que pousaram sore as costas do filho que volta s#o instrumentos da
vis#o espiritual do pai. O pai, quase cego, en2erga longe e tem uma vis#o total. %ua vis#o )
eterna, atinge toda a humanidade. 6 uma percepç#o que compreende perdas de homens e
mulheres de todos os tempos, que conhece com imensa compai2#o o sofrimento daqueles que
escolheram aandonar a casa, que choraram rios de lágrimas quando se viram angustiados e

;F
Op. /it.% p. 2.
IT
0en Hughe% citado por )audi9uet% op. /it.

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em agonia. O coraç#o do pai arde com um desejo enorme de traer os filhos de volta para
casa.

Oh, quanto ele gostaria de falar com eles, de preveni-los contra os in5meros perigos com
que estriam se defrontando, e de convenc+-los de que em casa poderiam encontrar tudo o
que procuram fora. /omo gostaria de tra+-lo de volta com sua autoridade paterna e de
mant+-lo perto, de modo que n#o viessem a sofrer.

3as seuagarrar,
constranger, amor ) empurrar.
muito grande para livres
ei2a-os faer para
qualquer coisa
rejeitar desse
esse amortipo. C#o retriu$-lo.
ou para deve forçar,6
precisamente a imensid#o do amor divino que ) a fonte do seu grande sofrimento. eus,
criador do c)u e da terra, escolheu ser, em primeira inst@ncia e acima de tudo, um Pai.

/omo Pai ele quer que seus filhos sejam livres, livres para amar. "ssa mesma lierdade
lhes dá a possiilidade de dei2ar a casa, “ir a uma regi#o long$nqua!, e perder tudo. O coraç#o
do Pai sae a dor que advirá dessa opç#o, mas seu amor o torna incapa de evita-la. /omo Pai,
ele deseja que aqueles que permanecem em casa goem de sua presença e sintam sua afeiç#o.
3as aqui, novamente, ele deseja que o amor oferecido seja receido livremente. %eu
sofrimento n#o pode ser medido quando seus filhos o amam somente com palavras, enquanto
seus coraç'es permanecem distantes.I8 "le conhece “suas l$nguas enganosas! e “coraç'es
desleais!, I= mas ele n#o pode faer que o amem sem perder sua verdadeira paternidade.

/omo Pai, a 5nica autoridade que ele quer e2ercer ) a da miseric7rdia. "ssa autoridade
adv)m de dei2ar os pecados dos filhos ferirem seu coraç#o. C#o há sentimentos de lu25ria,
coiça, raiva, ressentimento, ci5me, vingança que seus filhos tenham vivenciado que n#o
tenham causado enorme pesar ao seu coraç#o. E dor ) t#o profunda quanto o coraç#o ) puro.
O amor do Pai arange todo o sofrimento humano, encerra toda a humanidade. O toque de
suas m#os, irradiando uma lu divina, deseja somente curar, restaurar a vida.

"ste ) o eus no qual eu quero crer, um Pai que, desde o in$cio da criaç#o, tem estendido
seus raços numa +nç#o compassiva, nunca se impondo a quem quer que seja, sempre
esperando, nunca dei2ando cair seus raços em desespero, sempre aguardando que seus
filhos voltam, de modo que possa lhes dirigir palavras carinhosas e dei2em seus raços
cansados repousar sore os seus omros. %eu 5nico desejo ) aençoar.

"m latim, aençoar ) !enedicere, que significa literalmente dier coisas oas. O Pai deseja
transmitir, mais com seu afago do que com sua vo, coisas oas a seus filhos. "le n#o os quer
punir0 já foram soejamente castigados por todos os seus caprichos. O Pai deseja somente que
saiam que o amor que uscaram das maneiras mais diversas estava, está e estará sempre &
sua espera. O Pai deseja dier, mais com as m#os do que em palavras: “oc+ ) o meu Emado,

I8
/f. Mt #(%3E ,s &2%#'.
I=
/f. >l S3%'I1'S.

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sore voc+ coloco minha +nç#o!. "le ) o pastor, “apascenta ele o seu reanho, com o seu
raço re5ne os cordeiros, carrega-se no seu regaço!.I<

O verdadeiro alvo da pintura de Bemrandt s#o as m#os do Pai. Celas se concentra toda a
humanidade, a elas se dirigem os olhares dos que est#o pr72imos0 nelas a miseric7rdia se
personifica0 nelas há perd#o, reconciliaç#o e cura e, por meio delas, n#o somente o filho
cansado, mas tam)m o pai aatido, encontra repouso. esde o momento em que vi o pAster
no escrit7rio de minha amiga %imone, me senti atra$do por aquelas m#os. C#o entendi em o
porqu+. Eos poucos, com o decorrer dos anos, passei a conhecer aquelas m#os. "las me
sustentaram desde o momento da minha concepç#o, me acolheram no instante do parto, me
puseram junto ao seio de minha m#e, me alimentaram, me agasalharam. Protegeram-me nos
momentos de perigo e me consolaram nas horas de dor. 3uitas vees acenaram com o adeus,
e sempre me receeram de volta. "ssas s#o as m#os de eus. %#o tam)m as m#os de meus
pais, professores, amigos, terapeutas e de todos aqueles que eus colocou no meu caminho
para que eu sentisse aparado.

Pouco depois de Bemrandt ter pintado o Pai e suas m#os endientes, morreu.

Es m#os do artista haviam pintado in5meros rostos e in5meras m#os. Cesta sua ora,
uma das 5ltimas, Bemrandt pintou o semlante e as m#os de eus. *uem teria posado para
este retrato em tamanho naturalN O pr7prio BemrandtN

O pai do Filho Pródigo ) um autorretrato, mas n#o como o entendemos. O rosto de


Bemrandt se mostra em diversos de seus quadros. Eparece como o Filho Pródigo no
prost$ulo, no lago como o disc$pulo amedrontado, como um dos homens que ajuda a retirar
da cru o corpo do %enhor.

"ntretanto, aqui n#o ) o rosto de Bemrandt que vemos, mas sua alma, a alma de um pai
que sofreu muitas mortes. urante os seus I< anos, Bemrandt viu morrer n#o s7 sua querida
esposa %asMia, mas tr+s filhos, duas filhas e duas outras mulheres com quem viveu. E tristea
pelo seu querido filho 1ito, que morreu aos =I anos, logo depois de ter se casado, nunca foi
avaliada, mas na figura do pai do Filho Pródigo podemos ver quantas lágrimas terá derramado.
/riado & imagem de eus, Bemrandt descoriu, no decorrer de sua longa e penosa
caminhada, a verdadeira naturea dessa semelhança. 6 a figura do anci#o quase cego,
chorando ai2inho, aençoando o filho muito sofrido. Bemrandt era o filho, tornou-se o pai
e, assim, se preparou para chegar & vida eterna.

I<
,s $4%##.

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G
O !ai a%olhe o ilho de +olta a %asa

le esta"a ainda longe% 9uando seu pai o "iu seu filho mais ;o"emR% encheu1se de compaiL<o%
correu e lan8ou1se1lhe ao pesco8o% co!rindo1o de !ei;os.
... seu pai saiu para suplicar1lhe ao filho mais "elhoR 9ue entrasse.

Pai e &,e

3uitas vees tenho pedido a amigos que me deem a primeira impress#o do Filho Pródigo
de Bemrandt. 4nevitavelmente, eles se referem ao home velho e sáio que perdoa o seu filho:
o patriarca enevolente.

*uanto mais olho para o “patriarca!, mais claro se torna que Bemrandt fiera alguma
coisa em diferente do que dei2ar eus posar como o velho e sáio chefe de fam$lia. 1udo
começou com as m#os. Es duas m#os s#o em diferentes. E m#o esquerda do pai tocando o
omro do filho ) forte e musculosa. Os dedos est#o em aertos e se estendem sore oa
parte do omro e costas do Filho Pródigo. Posso senti uma certa press#o, especialmente no
polegar. E m#o n#o parece somente tocar, mas, com sua força, tam)m sustentar. 3uito
emora haja delicadea na maneira com que o pai com sua m#o esquerda toca o filho, n#o )
sem um firme envolvimento.

/omo ) diferente a m#o direita do pai "sta m#o n#o segura ou agarra. "la ) delicada,
macia e muito meiga. Os dedos est#o juntos e t+m uma certa eleg@ncia. 1oca gentilmente os
omros do filho. "la quer acariciar, afagar e oferecer consolo e conforto. 6 a m#o de uma m#e.

Elguns comentaristas tem sugerido que a m#o esquerda, masculina, ) a pr7pria m#o de
Bemrandt, enquanto a m#o direita, feminina, ) semelhante & m#o de The Jewish )rideI$
pintada no mesmo per$odo. *uero acreditar que isso seja verdade.
1#o logo reconheci a diferença entre as duas m#os do pai, um novo mundo de
compreens#o se ariu para mim. O Pai n#o ) somente um grande patriarca. "le ) igualmente
pai e m#e. "le toca o filho com uma m#o igualmente pai e m#e. "le toca o filho cm uma m#o

IJ
1he KeUish ride% tam!m chamado 4ssac e Beecca% pintado por "olta de #I33% 0i;Gsmuseum% Amsterdam.

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masculina e uma feminina. "le segura, ela acaricia. "le confirma, ela consola. "le ),
certamente, eus em quem o masculino e o feminino, a paternidade e a maternidade, est#o
totalmente presentes. Equela m#o direita carinhosa fa ecoarem em mim as palavras do
profeta 4sa$as: “Por acaso uma mulher se esquecerá da sua criancinha de peitoN C#o se
compadecerá ela do filho do seu ventreN Einda que as mulheres se esquecessem, eu n#o me
esquecera de t. "is que te gravei nas palmas das minhas m#os!.I;

3eu amigo Bichard Zhite me mostrou que a m#o do pai acariciante e feminina está em
paralelo com o p) ferido e descalço do filho, enquanto a m#o forte masculina corresponde ao
p) calçado na sandália. %eria demais pensar que uma das m#os protege o filho no seu aspecto
vulnerável, enquanto a outra reforça o seu vigor e aspiraç#o de ir adiante na vidaN

Há depois o amplo manto vermelho. /om sua cor quente e sua forma arcada, oferece um
lugar de arigo onde ) om estar. "m princ$pio, o manto corindo o corpo curvado do pai
pareceuTme uma arraca convidando o viajante cansado a encontrar algum repouso. 3as
continuando a fitar o manto vermelho, outra imagem, mais forte do que a da tenda, veio &
minha mente: as asas protetoras do pássaro f+mea. emraram-me das palavras de Kesus
sore o maternal amor de eus: “Kerusal)m, Kerusal)m... quantas vees quis eu ajuntar os teus
filhos, como a galinha recolhe os seus pintinhos deai2o das suas asas, e n#o o quiseste!.II

ia e noite eus me mant)m protegido como uma galinha protege seus pintinhos deai2o
de suas asas. 3ais do que a imagem de uma tenda, a figura das asas de uma m#e vigilante
representa a segurança que eus oferece aos seus filhos. "2primem cuidado, proteç#o, um
lugar para repousar e se sentir a salvo.

/ada ve que olho para o manto da pintura de Bemrandt visualio esses aspectos de
tenda ou de asas protetoras0 perceo a caracter$stica do amor maternal de eus e meu
coraç#o começa a cantar com palavras inspiradoras pelo salmista:

-uem ha!ita na prote8<o do Alt=ssimo


pernoita ? som!ra do Onipotente%
diDendo ao >enhor5 Meu a!rigo%minha fortaleDa%
meu +eus% em 9uem confioC
... ele te esconde com suas penas%
so! suas asas encontras um a!rigo.IQ

" assim, so a imagem de um velho patriarca judeu, surge tam)m um eus maternal

acolhendo
Bemrandt,seu filho de sore
deruçado volta aseu
casa. *uando
filho olhoe tocando
que volta agora novamente paracom
seus omros o velho pintado
suas m#os, por
passo
a ver n#o s7 um pai que aperta seu filho nos raços, mas tam)m uma m#e que acaricia seu
filho, envolve-o com o calor do seu corpo, e segura-o contra o ventre do qual ele proveio.

I;
,s $2%#(1#I.
II
Mt &'%'S1'3.
IQ
>l 2#%#1$.

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Essim, a “volta do filho pr7digo! se torna a volta ao seio de eus, o retorno &s srcens do ser e
novamente fa ecoar a e2ortaç#o de Kesus a Cicodemos para renascer do alto.

Egora entendo melhor a grande pa deste retrato de eus. C#o há sentimentalismo aqui,
nem romantismo, nem um simples conto com um final feli. O que vejo aqui ) eus como
m#e, acolhendo de volta no seu ventre aquele que foi criado & sua semelhança. Os olhos quase
cegos, as m#os, o manto, o corpo curvado, todos evocam o amor maternal de eus, marcado
por pesar, desejo, esperança e interminável e2pectativa.

o mist)rio na verdade ) que eus, na sua infinita compai2#o, uniu-se por toda a
eternidade com a vida de seus filhos. “"la! escolheu livremente se tornar dependente de suas
criaturas, a quem outorgou lierdade. "ssa escolha lhe causa pena quando eles partem0 essa
escolha lhe tra alegria quando eles retornam. 3as a sua alegria n#o será completa at) que
todos aqueles que “dela! tenham nascido tenham regressado a casa e se reunido ao redor da
mesa preparada para eles.

" isso inclui o filho mais velho. Bemrandt o coloca & dist@ncia, fora da proteç#o do manto
esvoaçante, & margem do c$rculo de lu. O dilema do filho mais velho ) aceitar ou rejeitar que
o amor de seu pai está acima de comparaç'es0 ousar ser amado como seu pai almeja amá-lo
ou insistir em ser amado como ele acha que deveria ser amado. O pai sae que a escolha deve
ser do filho, mesmo enquanto ele espera com as m#os estendidas. %erá que o filho mais velho
estará disposto a se ajoelhar e ser tocado pelas m#os que tocam seu irm#o mais jovemN %erá
ele capa de ser perdoado e de sentir a presença curadora do pai que o ama sem termo de
comparaç#oN E hist7ria de ucas dei2a claro que o pai vai em direç#o a amos os filhos. C#o s7
ele ocorre para dar as oas-vindas ao filho mais jovem, reelde,mas tam)m vem ao encontro
do mais velho, eloso, quando ele volta dos campos se perguntando qual o motivo da m5sica e
dança e lhe pede que entre.

Ne& &as ne& &enos

"ntender o sentido pleno do que está acontecendo aqui ) muito importante para mm.
"mora o pai esteja realmente cheio de alegria pela volta do filho mais jovem, ele n#o se
esqueceu do mais velho. "le desconhece areaç#o do filho mais velho. E sua alegria era t#o
intensa que ele n#o poderia esperar para dar in$cio & comemoraç#o, mas t#o logo ficou ciente
da chegada do seu filho mais velho, saiu da festa, foi ao seu encontro e suplicou-lhe que se
unisse a eles.

Co seu ci5me e amargura, o filho mais velho pode somente ver que o seu irm#o
responsável está receendo mais atenç#o do que ele e conclui que ele ) o menos amado dos
dois. O coraç#o do pai, entretanto, n#o está dividido em mais ou menos. E resposta
espont@nea e livre & volta do seu filho mais jovem n#o encerra nenhuma comparaç#o com o
filho mais velho. Eo contrário, ele deseja ardentemente que seu filho mais velho participe de
sua alegria.

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Para mm n#o ) fácil ter essa compreens#o. Cum mundo que constantemente compara as
pessoas, classificando-as em mais ou menos inteligentes, mais ou menos atraentes, mais ou
menos em-sucedidas, n#o ) fácil acreditar num amor que n#o fa o mesmo. *uando vejo
algu)m ser elogiado ) dif$cil n#o me achar menos merecedor de elogios0 quando leio a
respeito da generosidade e da ondade de outras pessoas, ) dif$cil n#o inquirir se eu mesmo
sou t#o generoso e enevolente quanto eles0 e quando vejo trof)us, recompensas e pr+mios
sendo entregues a pessoas notáveis, n#o posso dei2ar de me perguntar por que isso n#o
aconteceu comigo.

O mundo em que cresci ) um mundo t#o cheio de graduaç'es, marcas e estat$sticas que,
consciente ou inconscientemente, procuro sempre encontrar a minha medida em relaç#o a
outros. 3uita tristea e alegria na minha vida adv)m do meu comparar, e muito, se n#o tudo,
deste comparar ) in5til, representando enorme perda de tempo r energia.

Cosso eus, que ) tanto Pai como 3#e para n7s, n#o compara nunca. Epesar de que na
minha caeça seque isto ) verdade, ) anda muito dif$cil que eu aceite por completo, e com
todo o meu ser, esse racioc$nio. *uando ouço algu)m ser chamado de filho ou filha preferida,
minha resposta imediata ) que as outras crianças devem ser menos queridas, ou menos
amadas. C#o posso imaginar como todos os filhos de eus possam ser favoritos. ", entretanto,
o s#o. *uando, do meu lugar no mundo, olho para o reino de eus, depressa começo a pensar
em eus como o responsável por um grande placar celestial e fico sempre com medo de n#o
conseguir classificaç#o. 3as quando, da casa acolhedora de eus, olho para o mundo,

descuro quecaráter
mulheres seu eus ama
$mparcom
sem amor
jamaisdivino, um amor que confere a todos os homens e
comparar.

O irm#o mais velho se compara com o irm#o mais jovem e fica com ci5mes. 3as o pai
ama tanto a amos que jamais lhe ocorreu atrasar a festa para impedir que o filho mais velho
se sentisse rejeitado. "stou convencido de que muitos dos meus prolemas emocionais se
derreteram como neve ao sol se eu pudesse dei2ar que a verdade do amor maternal de eus,
que n#o fa comparaç'es, penetrasse em meu coraç#o.

(ica claro como isso ) dif$cil quando reflito sore a paráola dos traalhadores da vinha.IG
/ada ve que eu leio essa paráola na qual o dono da vinha recompensa da mesma na era os
que traalharam uma hora somente e os que fieram “um traalho pesado ao calor do sol!,
um sentimento de irritaç#o ainda rota dentro de mim.

Por que o dono da vinha n#o pagou em primeiro lugar aqueles que traalharam muitas

horas e depoisos
paga primeiro surpreendeu os retardatários
traalhadores da und)cima com
hora,sua generosidadeN
criando Por que, ao
falsas e2pectativas contrário,
para elee
os outros
despertando amargura e ci5mes desnecessáriosN "stas perguntas, agora compreendo, veem
de uma e2pectativa que quer que a administraç#o do que ) temporal prevaleça sore a ordem
incomparável do que ) divino.

IG
Mt &4%#1#I.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

C#o havia antes me ocorrido que o dono da vinha poderia desejar que os traalhadores
das primeiras horas pudessem se regoijar com a generosidade dispensada aos que vieram
mais tarde. Cunca me passou pela caeça que ele possa ter agido supondo que aqueles que
haviam traalhado todo o dia na vinha ficaram muito agradecidos por terem tido a
oportunidade de traalhar para o seu patr#o e anda mais por reconhecerem como ele ) uma
pessoa generosa. 6 preciso que haja uma $ntima reviravolta para aceitar esse modo de pensar
sento de comparaç'es. 3as essa ) a maneira de pensar de eus. eus olha para o seu povo
como uma fam$lia cujos memros se satisfaem verificando que aqueles que fieram em
pouco s#o t#o amados quanto os que muito realiaram.

eus ) t#o ing+nuo a ponto de pensar que haveria grande regoijo quando todos os que
passaram um tempo em sua vinha, fosse por um per$odo curto ou longo, receessem a mesma
atenç#o. Ca verdade, ele foi t#o ing+nuo que presume que estariam t#o felies em sua
presença que nem sequer lhes ocorrera estarem se comparando. 6 por isso que fala com a
perple2idade e um amante incompreendido: “Por que teriam voc+s inveja diante de minha
generosidadeN!. "le poderia ter dito: “oc+s estiveram comigo todo o dia, e eu lhes de tudo o
que pediram Por que est#o t#o amargos!. 6 o mesmo espanto que vem do coraç#o do pai
quando ele di ao seu filho ciumento: “3eu filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que ) meu
) teu!.

Equi se situa escondido o grande apelo para a convers#o: contemplar n#o com os olhos
da minha pr7pria autoestima, diminu$da, mas com os olhos do amor de eus. "nquanto eu

ficar olhando
ao menor paran#o
custo, eus comosen#o
posso o senhor da vinha,
me tornar como o pai
ciumento, que quer
amargo e2igir de em
e ressentido mimrelaç#o
o má2imo
aos
meus irm#os e irm#s. 3as se for capa de olhar o mundo com os olhos do amor de eus e
descorir que a vis#o de eus n#o ) a de um estereotipo proprietário de terras ou de um
patriarca, mas sim a de um pai todo dádiva e todo miseric7rdia, que como se comportam, vejo
ent#o em depressa que a minha 5nica e verdadeira resposta s7 pode ser de profunda
gratid#o.IF

O %ora,o de <eus

Ca pintura de Bemrandt, o filho mais velho simplesmente oserva. 6 dif$cil imaginar o


que vai no seu coraç#o. o mesmo modo que na paráola, tam)m na pintura fico com a
interrogaç#o. /omo responderá ele ao convite para participar da comemoraç#oN

C#o há d5vida na paráola ou na pintura, sore o coraç#o do pai. %eu coraç#o se volta
para seus dois filhos, ele ama a amos0 ele espera v+-los como irm#os ao redor da mesa0 ele

IF
Muito desta minha compreens<o da par7!ola dos tra!alhadores da "inha de"o ao estudo muito como"edor de Heinrich
>paemann% ,n des iefern des ie!e% ine Menschheitspara!el uGas #(% ##1#'R. ,n5 +as PrinDip ie!e. Frei!urg im )reisgar. Herder%
#23I. PP. 2(1#&4.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

quer que compreendam que, emora t#o diferentes, pertencem & mesma fam$lia e s#o filhos
do mesmo pai.

*uando me conscientio de tudo isso, vejo como a hist7ria do pai e seus filhos perdidos
ratifica enfaticamente que n#o fui eu que escolhi eus, mas eus que primeiro me escolheu.
"sse ) o grande mist)rio da nossa f). C#o escolhemos eus, mas eus nos escolhe. esde toda
a eternidade estamos escondidos “nas somras das m#os de eus! e “gravados nas palmas de
suas m#os!.QT Entes que qualquer ser humano nos toque, eus “nos fa em segredo! e “nos
Q8
tece! nas profundeas da terra,Q=e antes que qualquer ser humano Q<decida a nosso respeito,
eus “nos tece no seio materno!. eus nos ama com um “primeiro! amor, amor ilimitado e
incondicional0 quer que sejamos seus filhos amados e nos pede que nos tornemos t#o capaes
de amar quanto ele pr7prio.

urante a maior parte da minha vida lutei para encontrar eus, para conhecer eus e
amar eus. utei para seguir as diretries da vida espiritual L rear sempre, servir aos outros,
ler as escrituras L e para evitar as muitas tentaç'es que me levariam & intemperança. (alhei
muitas vees, mas sempre recomecei, mesmo quando estava perto do desespero.

Egora imagino se avaliei em que durante todo esse tempo eus tem estado & minha
procura, para me conhecer e me amar. E pergunta n#o ) “/omo posso encontrar eusN, mas
“/omo me dei2ar conhecer por eusN!. ", finalmente, a indagaç#o n#o ) “/omo devo amar a
eusN!, mas “/omo devo me dei2ar amar por eusN!. eus está olhando & dist@ncia,
procurando por mim, tentando me encontrar e desejando me traer para casa. "m todas as
tr+s paráolas que Kesus narra em resposta & quest#o por que ele come com os pecadores, ele
p'e +nfase na iniciativa divina. eus ) o pastor que vai & procura das ovelhas perdidas. eus )
a mulher que acende uma l@mpada, varre a casa e procura em todo lugar pela moeda perdida
at) que a encontre. eus ) o pai que vigia os filhos e espera por eles, corre ao seu encontro,
araça-os, insiste com eles, pede e suplica que venham para casa.

Pode parecer estranho, mas eus deseja tanto me encontrar, ou mais, do que eu a "le.
%im, eus precisa de mm tanto quanto eu preciso dele. eus n#o ) o patriarca que fica em
casa, n#o se altera, e espera que seus filhos venham a ele, desculpem-se por seu
comportamento anormal, peçam para ser perdoados e prometam se emendar. Eo contrário,
ele dei2a a casa e, n#o levando em consideraç#o a sua dignidade, corre ao encontro deles,
ignorando desculpas ou promessas de mudança e os tra & mesa astante provida que os
espera.

n#o /omeço agoraem


mais pensar a entender
eus secomo o rumo da
escondendo e minha jornada
dificultando o espiritual irá mudar
tanto quanto quando
poss$vel queeu
o
encontre, mas, pelo contrário, como aquele que me procura enquanto eu me refugio. *uando

QT
,s $2%&1#I.
Q8
>l #'2%#(.
Q=
>l #'2%#'.
Q<
/f. #Jo $%#21&4.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

eu vir o meu eu perdido atrav)s dos olhos de eus e descorir a alegria do %enhor com a
minha volta para casa, a$ ent#o minha vida pode se tornar menos angustiada e mais confiante.

C#o seria om acrescer a alegria de eus, dei2ando que "le me encontre, carregue-se
para casa e celere com os anjos a minha voltaN C#o seria maravilhoso faer eus sorrir por
lhe dar a chance de me encontrar e me amar perdidamenteN Perguntas como estas levantam
uma quest#o: a do conceito que faço de mim mesmo. Posso aceitar que valha a pena que eu
seja procuradoN Ecredito que haja, da parte de eus, um desejo verdadeiro de simplesmente
estar comigoN
Equi está a ess+ncia da minha luta espiritual: a luta contra a autorrejeiç#o, despreo e
avers#o. 6 um comate ferrenho porque o mundo e seus demAnios conspiram para que eu me
considere sem valor, incapa e insignificante. 3uitas das economias consumistas sorevivem
manipulando a ai2a autoestima de seus usuários e criando, por meio de recursos mat)rias,
e2pectativas do esp$rito. esde que eu permaneça !por ai2o!, posso facilmente ser tentado a
comparar coisas, conhecer pessoas ou r a lugares que prometam uma mudança radical no meu
pr7prio conceito, mesmo que na realidade n#o levem a tal resultado. 3as todas as vees que
concordar em ser assim manipulado ou seduido terei ainda mais motivos para me reai2ar e
para me sentir como a criança rejeitada.

& !ri&eiro e eterno a&or

Por muito tempo achei que era uma esp)cie de virtude ter ai2a autoestima. (ui tantas
vees prevenido contra o orgulho e presunç#o que acae achando que era om me depreciar.
3as agora compreendo que o verdadeiro pecado ) negar o amor primeiro de eus por mim e
ignorar a ondade srcinal. Porque, sem reivindicar esse primeiro amor e essa ondade
srcinal, perco contato com o meu verdadeiro eu e enveredo, entre pessoas e lugares errados,
numa usca destrutiva pelo que s7 pode ser achado na casa de meu Pai.

C#o penso estar soinho nesta luta querendo faer jus ao primeiro amor de eus e &
virtude fundamental. eai2o de muita afirmaç#o, competitividade e rivalidade humanas0
deai2o de muita confiança e at) arrog@ncia, há muitas vees um coraç#o muito inseguro,
muito menos confiante em s mesmo do que o comportamento e2terior fará acreditar. 3uitas
vees fiquei chocado descorindo que homens e mulheres com talentos indiscut$veis e com
pr+mios por suas realiaç'es t+m tantas d5vidas sore sua pr7pria virtude. "m ve de
reconhecer no sucesso alcançado um sinal de sua elea interior, usam-no para acoertar um
senso pessoal de falta de m)rito. C#o poucos me disseram: “%e as pessoas souessem o que
vai no meu $ntimo, poriam fim aos seus aplausos e louvor!.

emro-me claramente de ter conversado com um jovem amado e admirado por todos os
que o conheciam. /ontou-me como uma pequena cr$tica de que modo um dos seus amigos o
atirara num aismo de depress#o. *uando falava, lágrimas rolavam dos seus olhos e seu corpo
se contorcia em ang5stia. "le sentia que seu amigo atravessara o muro de suas defesas e o

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en2ergava como ele realmente era: um hip7crita vil, um homem despre$vel deai2o de uma
armadura cintilante. *uando ouvi a sua hist7ria compreendi como ele levava uma vida infeli,
muito emora as pessoas & sua volta o invejassem pelos seus dons. por anos ele havia
caminhado por a$ com as perguntas secretas: “%erá que algu)m realmente me amaN %erá que
algu)m realmente se importa comigoN!. " cada ve que suia um pouco mais alto na escada
do sucesso, pensava: “"ste n#o ) realmente quem sou0 um da tudo vira água aai2o e as
pessoas ver#o que n#o presto!.

"sse encontro ilustra como muitas pessoas vivem a sua vida L nunca confiando
plenamente que sejam amados como s#o. 3uitos t+m hist7rias terr$veis que fornecem ra'es
plaus$veis para sua ai2a autoestima0 hist7rias de pais que n#o lhes davam o que precisavam0
de professores que os maltratavam0 de amigos que os tra$am e de uma 4greja que os dei2ou do
lado de fora, no frio, num momento cr$tico de sua vida.

E paráola do Filho Pródigo ) uma hist7ria que fala de um amor que e2istiu antes que
qualquer rejeiç#o fosse poss$vel e permanecerá depois que todas as rejeiç'es tenham e2istido.
6 o primeiro e o eterno amor de um eus que ) Pai e 3#e. 6 a fonte de todo o amor humano
verdadeiro, mesmo o mais limitado.

E vida toda de Kesus e sua pregaç#o tiveram somente um ojetivo: revelar esse amor de
eus, ine2tingu$vel, ilimitado, maternal e paternal, e mostrar o caminho para que este amor
guie todas as fraç'es de nossas vidas diárias. "m sua pintura, retratando o Pai, Bemrandt
oferece-me um lampejo desse amor. 6 o amor que sempre acolhe de volta e deseja
comemorar.

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Henri J. M. Nouwen

F
O !ai ;uer %o&e&orar

O pai disse aos ser"os5 6,de depressa% traDei a melhor tnica e re"esti1o com ela% ponde1lhe um
anel no dedo e sand7lias nos ps. TraDe o no"ilho ce"ado e matai1oE comamos e feste;emos%
pois este meu filho esta"a morto e tornou a "i"erE esta"a perdido e foi encontradoC:. 
come8aram a feste;ar.

<ando o &elhor

6 evidente que o filho mais jovem n#o está voltando a uma simples fam$lia de faendeiros.
ucas descreve o pai como um homem muito rico com vastas propriedades e muitos
empregados. Para corresponder a essa descriç#o, Bemrandt veste-o ricamente, e aos dois
homens que o oservam. Es duas mulheres mais ao fundo se apoiam num arco que mais
parece faer parte de um palácio do que de uma faenda. E vestimenta lu2uosa do pai e a
apar+ncia pr7spera dos que o circundam postam-se em flagrante contraste ao longo
sofrimento t#o vis$vel nos olhos quase cegos, sua face entristecida e sua figura curvada.

O mesmo eus que sofre por causa do imenso amor pelos seus filhos ) o eus que ) rico
em ondade e miseric7rdiaQJ e que quer revelar a seus filhos a riquea de sua gl7ria. Q; O pai
nem dá a seus filhos a oportunidade de se desculparem. "le se antecipa &s s5plicas de seus
filhos, pondo-as de lado e, espontaneamente, concedendo-lhes perd#o0 essas s5plicas para ele
s#o irrelevantes em face do regoijo pela sua volta. C#o somente o pai perdoa sem faer
perguntas e alegremente acolhe seu filho perdido de volta & casa, mas n#o pode esperar para
lhe dar vida nova, vida em aund@ncia. QI 1#o fortemente eus deseja dar vida a seu filho que
volta que parece quase impaciente. Cada ) suficientemente om. O melhor precisa ser-lhe
dado. "mora o filho esteja preparado para ser tratado como um serviçal contratado, o pai
pede o manto reservado a um h7spede ilustre e, emora o filho n#o mais se ache digno de
assim ser chamado, o pai lhe dá o anel para o dedo e as sandálias para os p)s para honrá-lo
como seu filho amado e novamente devolver-lhe a posiç#o de herdeiro.
emro-me nitidamente das roupas que use durante o ver#o depois de terminar a escola
secundária. 3inhas calças rancas, cinto largo, camisa colorida e sapatos luidos: tudo

QJ
/f. 0m &%$ e f &%$.
Q;
0m 2%&'.
QI
Jo #4%#4.

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O Filho Pródigo
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demonstrava como eu me sentia em comigo mesmo. 3eus pais estavam contentes por poder
comprar essas roupas novas para mim e se mostravam muito orgulhosos do seu filho. "u me
sentia grato sendo seu filho. emro-me soretudo de me sentir muito em usando sapatos
novos. esde ent#o tenho viajado muito e verificado como as pessoas passam a vida
descalças. Egora entendo ainda melhor o significado sim7lico de possuir calçados. P)s
descalços falam de porea e muitas vees de escravid#o. /alçados s#o para os ricos e
poderosos, oferecem proteç#o contra coras, d#o força e segurança. 1ransformam os
perseguidos em perseguidores. Para muitos pores, ter calçados ) um sinAnimo de status. ?m
antigo “spiritual! afro-americano e2prime isso muito em: “1odos os filhos de eus t+m,
sapatos. *uando eu for para o c)u vou calçar meus sapatos0 vou andar por todo o /)u de
eus!.QQ

O Pai veste seu filho com todos os sinais de lierdade, a lierdade dos filhos de eus. "le
n#o quer que sejam servos ou escravos. "le deseja que usem o manto da honra, o anel do
herdeiro e o calçado que o prestigia. 6 como uma vestimenta pela qual o ano da graça de eus
) inaugurado. O verdadeiro sentido dessas vestimentas e dessa inauguraç#o ) compreendido
na quarta vis#o do profeta ^acarias:

"le me fe ver Kosu), sumo sacerdote, que estava de p) diante do Enjo de
4ahUeh... Kosu) estava vestido com roupas sujas, enquanto estava de p) diante
do anjo. " ele falou aos que estavam de p) diante dele: “1irai-lhe as vestes
sujas e vesti-o com vestes lu2uosas0 colocai em sua caeça um turante

limpo!.
limpas. /olocaram
O Enjo de um turante
4ahUeh limpo
estava ememp),sua caeça
e lhe e o“+
disse: vestiram
1ireicom
de troupas
a tua
iniquidade!. " o Enjo de 4ahUeh declarou solenemente a Kosu): “Essim disse
4ahUeh dos "2)rcitos: \%e andares pelos meus caminhos e guardares os meus
preceitos, ent#o tu governarás e guardares os meus preceitos, ent#o tu
governarás a minha gente e administrarás a minha morada e eu te darei acesso
entre os que est#o aqui em p)... Ouve, pois, Kosu), sumo sacerdote... "u
afastarei a iniquidade desta terra em um 5nico dia.l Caquele dia... convidar-
vos-eis uns aos outros deai2o da vinha e deai2o da figueiraV!.QG

*uando leio a hist7ria do filho pr7digo tendo em mente essa vis#o do profeta ^acarias, a
palavras “depressa! com a qual o pai e2orta seus criados a traer o manto, anel, sandálias para
seu filho denota muito mais do que impaci+ncia humana. Bevela a ansiedade de eus para
inaugurar o novo reino que foi preparado desde o in$cio dos tempos.

C#o há d5vida de que o pai deseja uma festa suntuosa. 3atar o novilho que havia sido
cevado para uma ocasi#o especial mostra quanto o pai desejava retirar todos os impedimentos
e oferecer ao filho uma celeraç#o como nunca antes tinha havido. 6 7via sua esfuiante
alegria. epois de ter dado instruç'es para que tudo ficasse pronto, ele e2clama: “amos

QQ
All ods /hillum ot ings. ,n5 The ,nterpreterWs )i!le. N. orG Nash"ille% A!ingdon Press% #2(&. ". 3% p. &&S
QG
Xc '%#1#4.

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celerar faendo uma festa, porque este meu filho estava morto e voltou & vida0 estava
perdido e foi encontrado!, e imediatamente começam a comemorar. Há aund@ncia de
comida, m5sica e danças, e os ru$dos alegres de um festejo podem ser ouvidos em longe de
casa.

& %on+ite 8 alegria

Edmito que n#o estou haituado & imagem de eus dando uma enorme festa. Parece em
desacordo com a imagem s)ria e solene que sempre tive de eus. 3as quando penso nas
diversas maneiras usadas por Kesus para descrever o Beino de eus, encontro sempre, no
centro, um anquete festivo. Kesus di: “3as eu vos digo que vir#o muitos do oriente e do
ocidente e se assentar#o & mesa no Beino dos /)usQF, com Era#o, 4saac e Kaco!. " ele
comprara o Beino dos /)us com uma festa de casamento oferecida pelo rei ao seu filho. Os
servos do rei saem para convidar as pessoas diendo: “"is que preparei meu anquete, meus
touros e cevados já foram degolados e tudo está pronto. inde &s n5pcias!. GT 3as muitos n#o
estavam interessados. "stavam muito ocupados com seus pr7prios afaeres.

/omo na paráola do (ilho Pr7digo, Kesus e2prime aqui o desejo de seu Pai de oferecer a
seus filhos um anquete e a sua preocupaç#o em realia-lo mesmo quando aqueles que est#o
convidados se recusarem a comparecer. "sse convite para uma refeiç#o ) um convite para
uma intimidade com eus. 4sso fica em claro na _ltima /eia, um pouco antes da morte de
Kesus. E$ ele di aos seus disc$pulos: “esde agora n#o eerei deste G8 fruto da videira at)
aquele dia em que convosco eerei o vinho novo no Beino do meu Pai!. " no final do Covo
1estamento a vit7ria definitiva de eus ) descrita como uma linda festa de casamento.
“Porque o %enhor, o eus todo-poderoso passou a reinar Elegremo-nos e e2ultemos, demos
gl7ria a eus, porque est#o para realiar-se as n5pcias do /ordeiro... felies aqueles que foram
convidados para anquete das n5pcias do /ordeiro!.G=

E comemoraç#o fa parte do Beino de eus. eus n#o s7 oferece perd#o, reconciliaç#o e
cura, como deseja que aqueles a quem esses dons s#o conferidos os receam como uma fonte
de alegria. "m todas as tr+s paráolas narradas por Kesus para e2plicar porque ele come com
os pecadores, eus se rejuila e convida outros para que com ele se rejuilem. “Elegrai-vos
comigo!, di o Pastor, “achei a ovelha que estava perdida!. “Elegrai-vos comigo!, di a mulher,
“achei a dracma que estava perdida!. “Elegrai-vos comigo!, di o pai, “este meu feilho estava
perdido e foi encontrado!.

QF
Mt 3%##.
GT
Mt &&%$.
G8
Mt &I%&2.
G=
Ap #2%I12.

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1odas essas voes s#o as voes de eus. eus n#o deseja guardar para si mesmo sua
alegria. eseja que todos dela participem. E alegria de eus ) a dos anjos e dos santos0 ) a
alegria de todos os que pertencem ao Beino.

Bemrandt retrata o momento da volta do filho mais jovem. O filho mais velho e os
outros tr+s memros da fam$lia paterna se mant+m & dist@ncia. %erá que compreender#o a
alegria do paiN ei2ar#o que ele o araceN " euN %er#o eles capaes de dei2ar de lado suas
recriminaç'es e participar da comemoraç#oN " euN

Posso s7 por um momento visualiar, e resta-me imaginar o que acontecerá depois.


Bepito: /onseguir#oN " euN %ei que o pai deseja que todas as pessoas & sua volta admirem as
roupas novas do filho que retorna, que o acompanhem em torno da mesa, que comam e
dancem juntos. C#o ) um assunto particular. 4sso ) algo para que todos na fam$lia festejem
com gratid#o.

Bepito novamente: (ar#o issoN " euN 6 uma pergunta importante porque se refere, por
estranho que pareça, & minha reaç#o contrária a viver uma vida com alegria.

eus se rejuila. C#o porque os prolemas do mundo tenham sido resolvidos, n#o porque
toda a dor e sofrimento humanos tenham chegado ao fim, nem porque milhares de pessoas
tenham se convertido e estejam no momento louvando-o por sua ondade. C#o, eus se
rejuila porque um dos seus filhos que estava perdido foi encontrado. 6 dessa alegria que sou
chamado a compartilhar. 6 a alegria de eus, n#o a alegria que o mundo oferece. 6 a alegria
que decorre de ver uma criança voltar a casa no meio de toda a destruiç#o, devastaç#o e
sofrimento do mundo. 6 uma alegria secreta, t#o inconsp$cua como o tocador de flauta
pintado por Bemrandt na parede acima da caeça daquele que, sentado, oserva.

C#o estou acostumado a e2ultar por coisas pequenas, secretas e que as pessoas & minha
volta pouco distinguem. "stou em geral pronto e preparado para receer más not$cias, para ler
sore guerra, viol+ncia e crimes, e para presenciar conflitos e desordens. "spero sempre que
meus visitantes falem de seus prolemas e mágoas, seus reveses e desapontamentos, suas
depress'es e ang5stias. e certo modo me acostumei a viver com a tristea e assim perdi a
capacidade de reconhecer a alegria e ouvidos para ouvir o contentamento que pertence a
eus e que ) encontrado nos cantos secretos do mundo.

1enho um amigo que ) t#o profundamente ligado a eus que ele pode ver alegria onde
perceo somente tristea. "le viaja muito e encontra um sem-n5mero de pessoas. *uando
retorna, espero sempre que me fale da situaç#o econAmica dif$cil dos pa$ses que visitou, das
grandes injustiças de que tomou conhecimento e do sofrimento que testemunhou. 3as
mesmo estando consciente da grande agitaç#o em que o mundo se encontra, raramente
menciona o fato. *uando partilha as suas e2peri+ncias, fala das alegrias ocultas que descoriu.
(ala de um homem, uma mulher ou uma criança que lhe trou2eram esperança e pa. (ala de
pequenos grupos de pessoas que s#o leais umas &s outras no meio de toda perturaç#o. (ala
das pequenas maravilhas de eus. Ss vees me dou conta de que estou desapontado porque

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Henri J. M. Nouwen

quero ouvir “not$cias de jornais!, hist7rias e2citantes e divertidas que podem ser comentadas
entre amigos. 3as ele nunca responde & minha necessidade de sensacionalismo. /ontinua
diendo: “i algo muito pequeno e muito elo, algo que me deu muita alegria!.

O pai do filho pr7digo se entrega totalmente & satisfaç#o que lhe tra o filho que retorna.
1enho de assimilar esse ensinamento. 1enho de aprender a me “apoderar! de toda verdadeira
alegria que há para asorv+-la e apresenta-la para que outros a vejam. %im, eu sei que nem
todo mundo se converteu, que ainda n#o há pa em todo lugar, que nem toda dor foi
suprimida, mas, ainda assim, vejo pessoas voltando e retornando a casa0 ouço voes que oram0
reparo em momentos de perd#o e presencio muitos sinais de esperança. C#o tenho que
esperar at) que tudo esteja em, mas posso festejar cada pequena refer+ncia ao Beino que
está pr72imo.

"sta ) uma verdadeira disciplina. "2ige escolhe a lu mesmo quando há muita escurid#o
para me assustar, optar pela vida mesmo, quando as forças da morte s#o t#o vis$veis e eleger a
verdade mesmo quando estou rodeado por mentiras. %ou tentado a ficar t#o impressionado
pela tristea 7via da condiç#o humana que n#o reconheço mais a alegria que se manifesta de
diversas maneiras, singelas, mas verdadeiras. E recompensa por escolher a alegria ) a alegria
mesmo. iver entre pessoas com defici+ncia mental me convenceu disso. Há tanta rejeiç#o,
dor e mágoa entre n7s, mas, uma ve que voc+ procura encontrar a alegria escondida no meio
de todo sofrimento, a vida se transforma em celeraç#o. E alegria nunca anula a tristea, no
entanto transforma-a num solo f)rtil para mais alegria.

/ertamente serei chamado de ing+nuo, n#o realista e sentimental e serei acusado de


ignorar os “verdadeiros! prolemas, os males estruturais que fundamentam grande pare da
mis)ria humana. 3as eus se rejuila quando um pecador arrependido volta. "statisticamente
isso n#o ) muito interessante. 3as, para eus, n5meros parecem nunca importar.

*uem sae se o mundo está sendo salvo da destruiç#o porque uma, duas ou tr+s pessoas
permaneceram em oraç#o enquanto o resto da humanidade perdeu a esperança e se
desintegrouN

o ponto de vista de eus, um silencioso ato de arrependimento, um pequeno gesto de


amor desinteressado, um momento de verdadeiro perd#o ) tudo o que ) preciso para que
eus, de seu trono, corra ao encontro de seu filho que volta e encha os c)us com viraç'es de
divina alegria.

N,o se& tristea

%e esse ) o caminho de eus, ent#o sinto o desafio de aandonar todas as voes de ru$na
e condenaç#o que me levam & depress#o e permitir &s pequenas alegrias revelar a verdade
sore o mundo em que vivo. *uando Kesus fala do mundo, ele ) em realista. "le fala sore
guerras e revoluç'es, terremotos, pestes e escasse, perseguiç#o e encarceramento, traiç'es,

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

7dio e assassinatos. C#o há asolutamente ind$cio de que todos estes sinais da negrura do
mundo estejam jamais ausentes. 3as, ainda assim, no meio de tudo isso a alegria de eus
pode ser nossa. 6 o contentamento de pertencer & casa de eus cujo amor ) mais forte do que
a morte e que nos capacita a viver no mundo emora já pertencendo ao reinado da alegria.

"ste ) o segredo da alegria dos santos. e santo Ent#o do deserto a s#o (rancisco de
Essis, ao irm#o Boger %chult de 1ai), E 3adre 1eresa de /alcutá, a alegria tem sido a marca
do povo de eus. E alegria pode ser vista os rostos das mais simples pessoas, pores e muitas
vees sofredoras, que vivem hoje dentro de grande convulsa social e econAmica, mas que já
podem ouvir a m5sica e dançar na cada do Pai. "u, de minha parte, vejo esta felicidade no
rosto das pessoas deficientes mentais de minha oportunidade. 1odos estes homens e
mulheres santos, n#o importa se viveram há muito tempo ou pertencem & nossa )poca,
podem reconhecer as muitas pequenas voltas que ocorrem diariamente e se alegrar com o Pai.
e certo modo eles penetram o verdadeiro sentido da verdadeira alegria.

Para mim ) interessante verificar todos os dias a diferença radical entre ceticismo e
alegria. Os c)ticos procuram as trevas aonde quer que se dirijam. %empre apontam para
perigos iminentes, motivos oscenos e esquemas secretos. /onsideram a confiança ing+nua, o
elo rom@ntico e o perd#o sentimental. ^omam do entusiasmo, ridiculariam o fervor
espiritual e despream o comportamento carismático. /onsideram-se realistas que veem a
realidade como realmente ela ) e creem que n#o s#o enganados por “emoç'es escapistas!.
3as quando suestimam a alegria de eus, sua cegueira s7 leva & maior escurid#o.

Es pessoas que vieram a conhecer a alegria de eus n#o negam o infort5nio, mas
escolhem n#o viver nele. %ustentam que a lu que rilha na escurid#o ) mais confiável que a
escurid#o em si e que um pouco de lu pode dispersar as trevas. Beferem-se a vislumres de
lu aqui e ali e se recordam, entre elas, que s#o sinais da presença de eus, invis$vel, mas
verdadeiro. escorem que há pessoas que curam os sofrimentos dos outros, perdoam
ofensas, dividem seus pertences, encorajam o esp$rito comunitário, comemoram os dons
receidos e vivem em constante antecipaç#o da total manifestaç#o da gl7ria de eus.

E cada momento, todos os dias, tenho a chance de escolher entre o ceticismo e a alegria.
/ada pensamento que tenho pode ser de descrença ou de aç#o de graça. /ada palavra que
profiro pode ser incr)dula ou de gratid#o. /ada aç#o pode ser c)tica ou de j5ilo.
Rradativamente perceo todas essas poss$veis escolhas e gradativamente descuro que cada
opç#o pela alegria acarreta por si mais alegria e fa que a vida se torne uma verdadeira
comemoraç#o na casa do Pai.

Kesus viveu intensamente essa alegria da casa do Pai. Cele podemos visualiar a alegria de
seu Pai. “1udo o que o Pai tem ) meu!,G< di ele, inclusive a alegria de eus sem limites. "ssa
alegria divina n#o elimina o divino pesar. "m limites. "ssa alegria divina n#o elimina o divino
pesar. "m nosso mundo, alegria e tristea se e2cluem. Equi emai2o, a alegria compreende a

G<
Jo #I%#(.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

aus+ncia de sofrimento e o sofrimento, a aus+ncia de alegria. 3as essas distinç'es em eus


n#o e2istem. Kesus, o filho de eus, ) o homem das dores, mas tam)m o homem de total
alegria. 4sto podemos vislumrar quando compreendemos que, no meio de seu maior
sofrimento, Kesus nunca ) separado de eu Pai. sua uni#o com o Pai nunca se desfa mesmo
quando ele “se sente! aandonado por eus. E alegria de eus pertence & sua descend+ncia e
esta alegria de Kesus e do Pai ) a mim oferecida. Kesus deseja que eu goe da mesma alegria de
que ele desfruta: “assim como o Pai me amou tam)m eu vos amei. Permaneci em meu amor.
%e oservais meus mandamentos, permanecereis no meu amor... "u vos digo isso para que
minha alegria esteja em v7s e vossa alegria seja plena!.GJ

/omo o filho de eus que volta, haitando na casa do Pai, tenho direito & alegria de eus.
Há poucos minutos em minha vida em que eu n#o seja tentado pela tristea, melancolia,
descrença, mau humor, pensamentos somrios, especulaç'es m7ridas e ondas de depress#o.
" com muita frequ+ncia dei2o que esses estados de esp$rito aafem a alegria da casa de meu
Pai. 3as quando em verdade acredito que de fato regressei e que meu Pai já me vestiu com
um manto, anel e sandálias, posso retirar máscara de tristea do meu coraç#o e afugentar a
mentira que acoerta o meu verdadeiro eu. Essim posso aspirar & verdade com a lierdade
pr7pria do filho de eus.

3as há mais. ?ma criança n#o continua criança. ?ma criança se torna um adulto. ?m
adulto vem a ser pai e m#e. *uando o Filho Pródigo volta a casa, ele retorna n#opara continuar
criança, mas para tomar posse dos seus direitos de filho e ele mesmo vir a ser pai. /omo o filho

de
sim,eus que volta,) sendo
o chamado, convidado
para que a reassumir
eu mesmo me tornemeu lugar
o Pai. na casa
"stou de meu
pasmo com Pai,
esseochamado.
desafio agora
Por
muito tempo vivi com a convicç#o que voltar & casa do meu Pai seria o chamado final. (oi
necessário que tanto o filho mais velho quanto o mais novo, em mim e2istentes, se
empenhassem em muito traalho espiritual para retornar e receer o amor acolhedor
voltando. 3as quanto mais perto chego da casa, fica mais evidente a compreens#o de que,
al)m do chamado para a volta, há um outro chamado. 6 o apelo para que me torne o pai que
acolhe e deseja festejar. 1endo recuperado minha filiaç#o, tenho agora de reivindicar a
paternidade. *uando vi pela primeira ve o Filho Pródigo de Bemrandt, nunca poderia
imaginar que me tornar o filho que se arrepende era somente um passo a caminho da
transformaç#o no pai acolhedor. ejo agora que as m#os que perdoam, consolam, curam e
oferecem uma refeiç#o festiva devem vir a ser as minhas. 1ornar-se o pai, portanto, a
conclus#o surpreendente destas refle2'es sore A Volta do Filho Pródigo, de Bemrandt.

GJ
Jo #(%21##.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

/onclus#o
>ornar?se o !ai

6>ede misericordioso como o "osso Pai  misericordioso:.

& !asso solit@rio

*uando vi pela primeira ve os detalhes da pintura do Filho Pródigo de Bemrandt,


iniciou-se uma jornada espiritual que me levou a escrever este livro. *uando agora o concluo,
descuro a longa jornada que percorri.

esde o in$cio estava preparado para aceitar que n#o somente o filho mais jovem, mas
tam)m o mais velho me revelariam um aspecto importante da minha jornada espiritual. Por
muito tempo o pai continuou a ser “o outro!, aquele que me receeria, me perdoaria,
oferecer-me-ia um lar e me daria pa e alegria. O pai era o lugar ao qual eu deveria voltar, o
ojetivo da minha jornada, o lugar onde encontrara o eterno descanso. (oi s7 aos poucos e
muitas vees com astante sofrimento que cheguei a compreender que minha jornada
espiritual nunca se completaria enquanto o pai fosse um estranho.

Ocorreu-me que, mesmo com a melhor formaç#o espiritual e teol7gica, n#o conseguiria
me liertar de um eus Pai um tanto ameaçador e um tanto tem$vel. 1udo o que eu aprendera
a respeito do amor do Pai n#o me permitira me liertar de uma autoridade que tinha poder
sore mim e que o usara conforme a sua vontade. e tal modo o amor de eus por mim era
limitado pelo meu medo de seu poder que me parecia prudente manter uma dist@ncia
raoável mesmo que o desejo por pro2imidade fosse imenso. %ei que in5meras pessoas
compartilham esse meu modo de pensar. 1enho visto como o medo de estar sujeito & vingança
e ao castigo de eus tem paralisado a intelig+ncia e as emoç'es de muita gente,
independentemente de idade, religi#o ou estilo de vida. "ste medo de eus, paralisante, )
uma das grandes trag)dias humanas.

E pintura de Bemrandt e sua pr7pria vida trágica ofereceram-me um conte2to no qual


descuro que o estágio final de vida espiritual p'e de lado todo o medo do Pai a ponto de ser
poss$vel tornar-se como ele. "nquanto o Pai suscitar medo, continua como estranho e n#o
pode haitar em mim. 3as Bemrandt, que me mostrou o Pai e2tremamente vulnerável, fe-
me compreender que a minha vocaç#o final ) realmente me tornar como o Pai e e2ercer no
meu dia-a-dia sua divina compai2#o. Epesar de que sou tanto o filho mais jovem como o mais

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

velho, n#o devo permanecer como eles, mas me tornar o Pai. Cenhum pai ou m#e se tornaram
pai e m#e sem antes ter sido filho ou filha, mas cada filho ou filha tem que, conscientemente,
decidir pAr de lado sua inf@ncia e se tornar pai e m#e para outro. 6 um passo dif$cil e solitário a
ser dado L especialmente num per$odo da hist7ria em que a paternidade ) dif$cil de ser em
e2ercida -, mas ) um passo essencial & realiaç#o da jornada espiritual.

"mora Bemrandt n#o coloque o pai fisicamente no centro da pintura, ) claro que o pai
) o centro do acontecimento que a ora retrata. ele vem toda a lu, para ele vai toda a
atenç#o. Bemrandt, fiel & paráola, quis que nossa primeira atenç#o se dirija ao pai antes de
qualquer outra pessoa.

(ico surpreso como demorou para que eu colocasse o pai no centro de minha atenç#o.
era t#o fácil me identificar com os dos filhos. %ua inconst@ncia, aparente ou $ntima, e t#o
compreens$vel e t#o profundamente humana que a identificaç#o se fa quase
espontaneamente logo que se fala do parentesco. Por muito tempo me identifiquei t#o
completamente com o filho mais jovem que nem me ocorreu que eu pudesse ser mais como o
mais velho. 3as logo que um amigo disse: “C#o ) voc+ o filho mais velho na hist7riaN!, ficou
dif$cil ver qualquer outra coisa. Eparentemente n7s todos participamos, em grau maior ou
menor, de todas as formas da imperfeiç#o humana. Cem gan@ncia, nem raiva, nem lu25ria,
nem ressentimento, nem frivolidade, nem cumes est#o totalmente ausentes em casa um de
n7s. Cossa imperfeiç#o humana pode ser vivida de muitas maneiras, mas n#o há ofensa, ci5me
ou guerra que n#o tenha suas ra$es em nossos pr7prios coraç'es.3as o que acontece com o

paiN Por que prestar


que queremos tanta atenç#o
nos identificarN nos falar
Por que filhostanto
quando
em)ser
o pai queosestá
como no quando
filhos centro ea)verdadeira
com o pai
quest#o ): “oc+ quer ser como paiN!. 6 agradável poder dier: “"stes filhos s#o como eu!. á
uma impress#o de ser entendido. 3as como seria poder dier: “O Pai ) como eu!N esejo ser
como o PaiN %erá que desejo ser n#o somente aquele que está sendo perdoado, mas tam)m
aquele que perdoa0 n#o somente aquele que ) em-vindo, mas aquele que acolhe0 n#o
unicamente aquele que ) tratado com compai2#o, mas aquele que tem compai2#oN

C#o há por parte da 4greja e da sociedade uma press#o sutil para que nos mantenham
como filhos dependentesN E 4greja, no passado, n#o pressionou & oedi+ncia de modo que
ficasse dif$cil reivindicar paternidade espiritual e a nossa sociedade de consumo n#o nos tem
encorajado a condescender com pueril autorrealiaç#oN *uem realmente tem nos interpelado
para nos liertemos da depend+ncia imatura e aceitemos o fardo de adultos responsáveisN"
n#o estamos n7s mesmos constantemente tentando escapar & tarefa assustadora da
paternidadeN Bemrandt certamente fe isso. %7 depois de muita dor e sofrimento, quando se
apro2imava da morte, foi capa de entender e pintar a verdadeira paternidade espiritual.

1alve o pronunciamento mais radical feito por Kesus seja: “%ede misericordiosos como o
vosso Pai ) misericordioso!.G; E miseric7rdia de eus ) descrita por Kesus n#o simplesmente
para me mostrar como eus está disposto a sentir por mim ou a perdoar meus pecados e me

G;
c I,<I

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

oferecer ma vida nova e felicidade, mas tam)m a me convidar a me assemelhar a eus e a


mostrar a outros a mesma compai2#o que ele tem por mim. %e o 5nico significado da hist7ria
fosse que as pessoas pecam, mas eus perdoa, eu poderia facilmente começar a pensar sore
meus pecados como uma oa ocasi#o para que eus me conceda seu perd#o.0 C#o haveria um
verdadeiro desafio nessa interpretaç#o. "u me conformaria com as minhas fraqueas e
esperaria que eventualmente eus fecharia os olhos para elas e me permitiria voltar para casa,
n#o importa o que eu tivesse feito. E mensagem dos "vangelhos n#o tem este romantismo
sentimental.

O que devo concretiar ) que seja eu o filho mais jovem ou o mais velho, sou o filho de
meu Pai compassivo. %ou um herdeiro. Cingu)m coloca isso mais claramente do que Paulo
quando escreve: “O pr7prio "sp$rito se une ao nosso esp$rito para testemunhar que somos
filhos de eus... e coerdeiros de /risto, pois sofremos com ele para tam)m com ele sermos
glorificados!.GI Bealmente, como filho e herdeiro devo me tornar sucessor. evo tomar o lugar
do meu Pai e oferecer a outros a mesma compai2#o que ele deve por mim. E volta do Pai )
afinal de contas o desafio para me tornar o Pai.

"sse chamado para me tornar o Pai e2clui qualquer interpretaç#o “indulgente! da


hist7ria. %ei o quanto eu quero volta e me sentir seguro, mas realmente desejo ser filho e
herdeiro com tudo o que isso acarretaN "star na casa do Pai e2ige que eu faça da vida do Pai a
minha pr7pria e me transforme em sua imagem.

Becentemente, olhando num espelho, fiquei impressionado vendo como eu me pareço


com meu pai. Olhando para as minhas feiç'es, vi de repente o homem que eu tinha visto
quando tinha vinte e sete anos de idade: o homem que eu admirara e criticara tam)m, que
eu tinha amado e temido. 3uito da minha energia tinha sido gasta em encontrar eu mesmo no
rosto dessa pessoa, e muitas das minhas perguntas sore quem eu era e quem eu deveria vir a
ser haviam sido formuladas por ser o filho desse homem. e repente, quando vi esse homem
aparecendo no espelho, fiquei surpreendido com a noç#o de que todas as diferenças que eu
notara durante toda a vida pareciam pequenas se comparadas com as semelhanças. /omo
num choque, entendi que eu era realmente herdeiro, sucesso, aquele que ) admirado, temido,
louvado e mal compreendido pelos outros, como meu pai foi para mim.

A !aternidade da &iseri%órdia

E pintura do Filho Pródigo de Bemrandt me fa compreender que n#o preciso mais usar
minha filiaç#o para me manter afastado. 1endo vivido meu papel de filho plenamente, chegou
a hora de ultrapassar todas as arreiras e confessar a verdade que tudo o que desejo ) me
transformar no velho & minha frente. C#o posso permanecer criança para sempre, n#o posso
continuar usando meu pai como desculpa para a minha vida. 1enho que pousar estender
minhas pr7prias m#os numa +nç#o e receer meus filhos com toda a compai2#o, n#o importa

GI
0m 3%#I1#S.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

o que eles sintam ou pensem a meu respeito0 uma ve que tornar-me o Pai misericordioso ) o
ojetivo final da vida espiritual, como ) demonstrado na paráola e tam)m na pintura de
Bemrandt, preciso agora analisar o seu completo significado.

Primeiramente tenho que ter em mente o conte2to no qual Kesus narra a hist7ria de “um
homem que tinha dois filhos!. ucas escreve: “1odos os pulicanos e os pecadores estavam se
apro2imando para ouvi-lo. Os fariseus e os escrias, por)m, murmuravam: \"sse homem
recee os pecadores e come com elesV!. GQ /omo um professor, eles questionam sua
veracidade criticando sua pro2imidade com os pecaminosos. "m resposta, Kesus narra aos
cr$ticos as paráolas da ovelha perdida, da dracma perdida e do Filho Pródigo.

Kesus quer dei2ar claro que o eus de quem fala ) um eus de miseric7rdia que
alegremente acolhe em sua casa pecadores arrependidos. Essociar-se e sentar-se & mesa com
pessoas de má reputaç#o, portanto, n#o contradi seu ensinamento sore eus, mas, de fato,
transp'e esta norma para o dia-a-dia. %e eus perdoa os pecadores, ent#o certamente aqueles
que t+m f) devem faer o mesmo. %e eus recee em casa os pecadores, ent#o certamente
aqueles que confiam em eus devem faer o mesmo. %e eus ) misericordioso, ent#o com
certea os que amam eus devem em nome de quem age, ) o eus da compai2#o, o eus que
oferece a si mesmo como e2emplo e modelo para todo o comportamento humano.

3as há mais. 1ornar-se como o Pai celestial n#o ) s7 um aspecto importante da pregaç#o
de Kesus, ) a ess+ncia de sua mensagem. E qualidade por e2cel+ncia das suas palavras, e o fato
de seus apelos serem aparentemente ine2equ$veis, s#o um tanto 7vios quando ouvidos como
parte de um chamado geral para nos tornarmos verdadeiros filhos e filhas de eus.

"nquanto pertencermos a este mundo ficaremos sujeitos a seus traços competitivos e


esperaremos ser recompensados por todo o em que fiermos. 3as quando pertencemos a
eus, que nos ama incondicionalmente, podemos viver como ele. E grande convers#o que
eus pede ) dei2ar de pertencer ao mundo para pertencer a eus.

*uando, pouco antes da sua morte, Kesus rea ao Pai pelos seus disc$pulos, ele di: “"les
n#o s#o do mundo como eu n#o sou do mundo... que todos sejam um. /omo tu, Pai, estás em
mim e eu em ti, que eles estejam em n7s, para que o mundo creia que tu me enviaste!.GG

?ma ve que estamos na casa de eus como filhos e filhas de sua fam$lia, podemos ser
como ele. Kesus n#o de2a d5vidas a respeito disso quando e2plica: “%e amais os que vos amam,
que graça alcançaisN Pois at) mesmo os pecadores amam aqueles que os amam. " se faeis o
em aos que vo-lo faem, que graça alcançaisN Et) mesmo os pecadores agem assim " se
emprestais &queles de quem esperais receerem, que graça alcançaisN Et) mesmo os
pecadores emprestam aos pecadores para receerem o equivalente. 3uito pelo contrário,
amai vossos inimigos, faei o em e empresta sem esperar coisa alguma em troca. %erá grande

GQ
c #(%#1&.
GG
Jo #S%#I1&#.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

a vossa recompensa, e seres filhos do Elt$ssimo, pois ele ) om para com os ingratos e com os
maus. %ede misericordiosos como o vosso Pai ) misericordioso!.GF

"sta ) a ess+ncia da mensagem do "vangelho. E maneira como os seres humanos s#o


chamados a amar uns aos ouros com o mesmo amor desprendido que vimos na pintura do pai
de Bemrandt. E miseric7rdia com a qual somos chamados a amar n#o pode se asear num
estilo de vida competitivo. 1em de ser esta compai2#o asoluta na qual nenhum traço de
competiç#o pode ser achado. 1em de ser esse amor radical do inimigo. %e devemos n#o
somente ser receidos por eus, mas tam)m receer como eus, devemos nos tornar como
nosso Pai celestial e ver o mundo atrav)s dos seus olhos.

3as, mais importante que o conte2to da paráola e o ensinamento e2pl$cito de Kesus ) a


pr7pria pessoa de Kesus. Kesus ) o verdadeiro (ilho do Pai. "le ) modelo para que nos
tornemos o Pai. Cele reside a plenitude de eus. 1oda a saedoria de eus reside nele0 toda a
gl7ria de eus permanece nele0 todo o poder de eus pertence a ele. %ua uni#o com o Pai )
t#o $ntima e t#o completa que ver Kesus ) ver o Pai. “3ostra-nos o Pai!, di-lhe (elipe. Kesus
responde: “*uem me v+, v+ o Pai!.FT

Kesus nos mostra o que ) a verdadeira filiaç#o. "le ) o filho mais jovem sem ser reelde.
"le ) o filho mais velho sem ser ressentido. "m tudo ) oediente ao Pai, mas nunca seu
escravo. "le ouve tudo o que o Pai lhe di, mas isso n#o o torna seu servo. "le fa tudo o que o
Pai lhe manda faer, mas permanece completamente livre. "le dá tudo e recee tudo. "le fala
aertamente: “"m verdade, vos figo: o (ilho, por si mesmo, nada pode faer, mas s7 aquilo
que v+ o Pai faer0 tudo o que este fa o (ilho o fa igualmente. Porque o Pai ama o (ilho e lhe
mostra tudo o que fa0 e lhe mostrará oras maiores do que essas para que v7s admireis.
/omo o Pai ressuscita os mortos e ao fa viver, tam)m o (ilho dá a vida a quem quer. Porque
o Pai a ningu)m julga, mas confiou ao (ilho todo julgamento, a fim de que todos honrem o
(ilho, como honram o Pai!.F8

"sta ) a filiaç#o divina. " ) a esta filiaç#o que sou chamado. O mist)rio de redenç#o ) que
o (ilho de eus se tornou carne de modo que todos os filhos perdidos de eus pudessem se
tornar filhos e filhas como Kesus ) filho. Cesta perspectiva, a hist7ria do Filho Pródigo assume
uma nova dimens#o. Kesus, o em-amado do Pai, dei2a a casa do Pai para carregar os pecados
dos filhos errantes de eus e tra+-los de volta. 3as, ao sair, permanece junto ao Pai e
mediante completa oedi+ncia oferece cura a seus irm#os e irm#s necessitados. Essim, por
minha causa, Kesus se torna o filho mais jovem e tam)m o filho mais velho, de modo a me
mostrar como me tornar o Pai. Por seu interm)dio posso me tornar novamente um aut+ntico
filho e, como filho aut+ntico, finalmente posso crescer para me tornar misericordioso como o
meu Pai celestial ).

GF
c I%'&1'I.
FT
Jo #$%2.
F8
Jo (%#21&'.

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O Filho Pródigo
Henri J. M. Nouwen

S medida que passam os meus anos de vida, descuro como ) dif$cil e complicado, mas
tam)m compensador, descer nessa paternidade espiritual. E pintura de Bemrandt elimina
qualquer pensamento que tenha algo que ver com poder, influ+ncia ou controle. Posso alguma
ve ter tido a ilus#o de que um dia os diferentes chefes desapareceriam e poderia finalmente
ser eu mesmo o chefe. 3as esse ) o jeito do mundo no qual o poder ) o principal ojetivo. "
n#o ) dif$cil ver que aqueles que tentaram a maior parte de suas vidas se livrar de seus patr'es
n#o ser#o muito diferentes de seus antecessores quando finalmente ocuparem seus lugares.
Paternidade espiritual n#o tem nada a ver com poder ou controle. 6 uma paternidade de
miseric7rdia. ", para ter uma ideia disso, tenho de continuar olhando para o pai araçando o
filho pródigo.

Epesar de minhas melhores intenç'es, continuamente me descuro emprenhado em


adquirir poder. *uando dou conselho, quero saer se está sendo seguido0 quando ofereço
ajuda, quero que me agradeçam. *uando dou dinheiro, espero que seja gasto ao meu modo0
quando faço algo de om, desejo ser lemrado. Posso n#o ganhar uma estátua, ou mesmo
uma placa comemorativa, mas estou constantemente preocupado em n#o ser esquecido0 e, de
alguma maneira, continuar presente nos pensamentos e nas aç'es de outros.

3as o pai do Filho Pródigo n#o se preocupa com ele mesmo. %ua longa vida de muitos
sofrimentos fe desaparecer suas aspiraç'es de manter controle da situaç#o. %eus filhos s#o a
5nica preocupaç#o0 a eles quer se dedicar e se doar completamente.

Posso eu dar sem esperar algo de volta, amar sem estaelecer condiç'esN /onsiderando
minha imensa necessidade de reconhecimento e afeto, eu me dou conta de que será uma luta
por toda a minha vida. 3as tam)m estou convencido que de cada ve que me soreponho a
esta solicitaç#o e atuo livremente, n#o esperando retorno, posso confiar que minha vida
poderá realmente produir os frutos do "sp$rito de eus.

Há um caminho para essa paternidade espiritualN Ou estou condenado a permanecer t#o


sujeito & minha necessidade de encontrar um lugar no meu mundo que acao sempre por usar
a autoridade do poder em ve da autoridade da miseric7rdiaN %erá que a competiç#o invadiu
de tal maneira todo o meu ser que continuarei a en2ergar meus filhos como rivaisN %e Kesus
realmente me chama para ser misericordioso como o meu Pai celestial ) compassivo e se Kesus
se oferece como o caminho para essa vida de miseric7rdia, ent#o n#o posso continuar palavra.
evo confiar que sou capa de me tornar o Pai que sou chamado a ser.

Pesar0 !erd,o e generosidade

Olhando para a pintura do pai, de Bemrandt, posso ver tr+s caminhos para uma
paternidade verdadeiramente compassiva: pesar, perd#o e generosidade.

Poderia parecer estranho incluir pesar como um caminho para a compai2#o. 3as ). Pesar
requer permitir que os pecados do mundo L os meus inclusive L firam o meu coraç#o e me
falam derramar lágrimas, muitas lágrimas por eles. C#o há compai2#o sem muitas lágrimas. %e

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n#o podem ser lágrimas que jorrem dos meus olhos, t+m de ser ao menos lágrimas que
rotem do meu coraç#o.

*uando penso na imensa ostinaç#o dos filhos de eus, nossa lu25ria, nossa gan@ncia,
nossa viol+ncia, nossa raiva, nosso ressentimento, e quando olho para tudo isso com os olhos
do coraç#o de eus, n#o posso sen#o prantear e radar pesarosamente:

Olha, minha alma, como um ser humano tenta causar tanto sofrimento quanto

poss$vel a outro0
companheiros0 olhaolha
parapara aquelas
aqueles pais pessoas tramando
hostiliando os seusfaer mal
filhos0 a para
olha seus
aquele proprietário de terras e2plorando os seus operários0 olha para as
mulheres violentadas, os homens seviciados, as crianças aandonadas. Olha,
minha alma, v+ os campos de concentraç#o, as pris'es, os asilos, os hospitais,
e ouve os lamentos dos pores.

"sse lamento ) oraç#o. %oram t#o poucos que lamentam neste mundo. 3as o lamento )
e2erc$cio do coraç#o que v+ os pecados do mundo e sae por si mesmo ser o triste preço da
lierdade sem a qual o amor n#o pode florescer. "stou comelando a perceer que muito da
oraç#o ) contristar-se. O pesar ) t#o profundo n#o somente porque o pecado humano ) t#o
grande, mas tam)m L e mais ainda L porque o amor de eus ) t#o ilimitado. Para me tornar
como o Pai de quem a 5nica autoridade ) a miseric7rdia, tenho de verter in5meras lágrimas e
assim preparar meu coraç#o para receer qualquer pessoa, n#o importa qual tenha sido a sua
jornada, e perdoá-la com esse coraç#o.

O segundo caminho que leva & paternidade espiritual ) o perd#o. 6 mediante o perd#o
constante que nos tornamos como o Pai. Perdoar de coraç#o ) muito, muito dif$cil. 6 quase
imposs$vel. Kesus disse aos seus disc$pulos: “*uando o teu irm#o pecar contra ti sete vees por
dia e sete vees retornar, diendo \"stou arrependidoV, tu o perdoarás!.F=

3uitas vees eu disse: “"u o perdoo!, mas mesmo quando diia essas palavras, meu
coraç#o permanecia angado ou ressentido. "u ainda queria ouvi que eu, afinal de contas,
estava certo0 ainda queria ouvir justificativas e desculpas, ainda queria ter a satisfaç#o de
receer de volta elogios L pelo menos o reconhecimento de ser t#o capa de perdoar

3as o perd#o de eus ) incondicional0 vem de um coraç#o que n#o pede nada para ele
mesmo0 um coraç#o totalmente vaio de pretens'es pr7prias. 6 esse perd#o divino que devo
praticar na minha vida diária. Pede que eu dei2e de repisar meus argumentos que diem que a
clem+ncia n#o ) sáia, ) pouco saudável e pouco prática. /onclama-se a dei2ar de lado toda a
minha necessidade de gratid#o e de cumprimentos. (inalmente, pede-me que eu passe por
cima daquela parte do meu coraç#o que está magoada e ofendida e que deseja manter
controle, colocando umas tantas condiç'es entre mim e aquele a quem devo perdoar.

F=
c #S%$.

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"sse “passar por cima! ) o verdadeiro e2erc$cio do perd#o. 1alve seja mais “transpor! do
que “passar por cima!. 3uitas vees tenho que transpor a arreira dos argumentos e
sentimentos de irritaç#o que erigi entre mim e todos aqueles que eu amo e que com
frequ+ncia n#o correspondem a esse amor. 6 uma arreira de medo de ser usado ou magoado
novamente. 6 um muro de orgulho, e de desejo de manter o controle. 3as todas as vees que
posso passar por cima ou transpor esse muro, entro na casa onde haita o Pai, e lá chego
perto do meu viinho com amor sincero e misericordioso.

O sentimento de pesar me permite ver algu)m do meu muro e me dar conta do


sofrimento enorme que resulta da perdiç#o humana. Ere meu coraç#o para uma
solidariedade sincera com meus concidad#os. Perdoar ) a maneira de transpor a arreira e
acolher os outros em meu coraç#o sem esperar nada em troca. %omente quando me lemro
que sou o filho em-amado posso acolher aqueles que querem voltar com a mesma
compai2#o com a qual o Pai me recee.

O terceiro caminho para se tornar como o Pai ) o da generosidade. Ca paráola, o Pai n#o
somente dá a seu filho tudo o que pede, mas tam)m o cumula de presentes na sua volta. "
para seu filho mais velho di: “1udo o que ) meu ) teu!. F< C#o há nada que o Pai reserve para
si mesmo. "le se doa em profus#o a seus filhos.

"le n#o somente oferece mais do que seria raoável esperar de algu)m que foi ofendido0
n#o, ele se dá todo, sem reserva. Emos os filhos s#o “tudo! para ele. "le deseja despejar
sore eles sua pr7pria vida. O modo como o filho mais jovem ganha manto, anel e sandálias e
) receido em casa com uma festa pomposa, como tam)m a maneira pela qual o filho mais
velho ) convidado a aceitar seu lugar $mpar no coraç#o de seu pai e a sentar-se & mesa com
seu irm#o mais jovem, tornam claro que todas as arreiras de um comportamento patriarcal
foram derruadas. "sta n#o ) a figura de um pai especial. "sta ) a descriç#o de eus cuja
ondade , amor, clem+ncia, elo, alegria e generosidade de eus usando todas as imagens da
cultura daquela )poca, emora muitas vees transformando-as.

Para me tornar como o Pai, preciso ser t#o generoso como o pai ) generoso. a mesma
maneira que o Pai se doa a seus filhos, tam)m devo me doar aos meus irm#os e irm#s. Kesus
mostra muito claramente que ) precisamente essa doaç#o de si mesmo que ) a marca do
verdadeiro disc$pulo. “Cingu)m tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus
amigos!.FJ

"ssa doaç#o de si mesmo ) um e2erc$cio porque ) algo que n#o ocorre espontaneamente.

/omo
poder,filhos
nossosdas trevasest$mulos
grandes que se manifestam por meioedo
s#o a soreviv+ncia medo, interesse pr7prio,
a autopreservaç#o. 3as comogan@ncia e
filhos da
lu que saem que o verdadeiro amor e2pulsa todo o medo, torna-se poss$vel nos
despojarmos de tudo pelos outros.

F<
c #(%'#.
FJ
Jo #(%#'.

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/omo filhos da lu, preparamo-nos para nos tornar verdadeiros mártires: gente que dá
testemunho com suas vidas do ilimitado amor de eus. ar tudo resulta em ganhar tudo. Kesus
e2pressa isto claramente quando di: “O que perder a sua vida por causa de mim e do
"vangelho, irá salvá-la!.F;

1odas as vees que dou um passo em direç#o & generosidade, sei que estou me movendo
do medo para o amor. 3as esses passos, pelo menos no princ$pio, s#o dif$ceis de dar porque
há muitas emoç'es e sentimentos que me impedem de dar livremente. Por que daria eu
energia, tempo, dinheiro e, sim at) atenç#o a algu)m que me ofendeuN Por que dividiria eu
minha vida com algu)m que por ela n#o mostrou nenhum respeitoN "u poderia ser capa de
perdoar, mas, al)m disso, dar

"ntretanto... a verdade ) que, no sentido espiritual, a pessoa que me ofendeu pertence &
minha esp)cie!, minha “gen!. E palavra, do latim genus e do grego genos, refere-se a sermos
da mesma esp)cie. Renerosidade ) um doar que vem do conhecimento desse laço $ntimo. E
verdadeira generosidade ) agir com ase na verdade L e n#o no sentimento L que aqueles que
devo perdoar s#o da mesma “parentela!, pertencem & minha fam$lia. " quando procedo dessa
maneira, essa verdade se torna evidente para mim. E generosidade cria essa fam$lia e nela
cr+.

O pesar, o perd#o e a generosidade s#o, portanto, os tr+s caminhos pelos quais a imagem
de eus pode crescer em mim. %#o tr+s aspectos do chamado do Pai para estar em casa. /omo
o Pai, n#o sou mais chamado a voltar para casa como o filho mais jovem ou o mais velho, mas
para estar lá como aquele a quem os filhos ostinados de eus podem voltar e ser acolhidos
com alegria. 6 muito dif$cil somente estar em casa e esperar. 6 uma espera sofrida por aqueles
que se foram e uma espera com confiança querendo oferecer perd#o e vida nova &queles que
ir#o voltar.

/omo o Pai, tenho de crer que tudo o que o coraç#o humano deseja pode ser encontrado
em casa. /omo o Pai, devo estar livre da necessidade de vagar por a$ curiosamente e procurar
o que eu poderia achar que teriam sido oportunidades perdidas na inf@ncia. /omo o Pai, tenho
de saer que, na verdade, minha juventude passou e que rincar de jogos da juventude n#o )
nada mais do que uma tentativa rid$cula para encorir a verdade que estou velho e pr72imo da
morte. /omo o Pai, devo ousar assumir a responsailidade de uma pessoa espiritualmente
adulta e confiar que a verdadeira alegria e total realiaç#o podem somente advir de acolher
em casa aqueles que foram feridos e magoados na sua caminhada, e amá-los com amor que
n#o pede nem espera nada de volta.

Há um tremendo vaio nesta paternidade espiritual. C#o há poder, n#o há sucesso, n#o
há popularidade nem fácil satisfaç#o. 3as esse enorme vaio ) tam)m o lugar de verdadeira

F;
Mc 3%'(.

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lierdade. 6 o lugar onde n#o há “nada mais a perder!,FI onde o amor n#o tem amarras, e
onde se encontra verdadeira força espiritual.

/ada ve que me ponho em contato com esse vaio, terr$vel mas proveitoso, se que ali
posso acolher qualquer pessoa sem condenar e oferecer esperança. Eli me sinto livre para
receer os pecados de outros sem precisar avaliar, classificar ou analisar. Eli, num estado de
esp$rito totalmente isento de julgamento, posso engendrar como transmitir confiança.

?ma ve,
aençoado. Ca enquanto
presença visitava
de meu um amigo
amigo, n#oagoniante, vivi esta
senti vontade e2peri+ncia
alguma de um
de perguntar vaioo
sore
passado ou investigar o futuro. "stávamos somente juntos, sem medo, sem culpa ou pudor,
sem preocupaç'es. Caquele vaio, o amor incondicional de eus podia ser sentido e pod$amos
dier o que o velho %ime#o disse quando pegou o menino Kesus nos seus raços: “Egora,
%enhor, conforme a tua promessa, podes dei2ar o teu servo partir em pa!. FQ Eli, nomeio de
um vaio terr$vel, havia total confiança, pa e alegria asolutas. E morte n#o era mais o
inimigo. O amor era vitorioso.

/ada ve que encontramos essa vacuidade sagrada do amor que nada e2ige, os c)us e a
erra tremem e “há alegria ante dos anjos de eus!. FG 6 a alegria pelos filhos e filhas que
voltam. 6 a alegria da paternidade espiritual.

Para viver esta paternidade espiritual ) necessário ter verdadeira disciplina de estar em
casa. /omo uma pessoa que sempre se rejeita & procura de afirmaç#o e afeto, acho imposs$vel
amar consistentemente sem pedir algo de volta. 3as o ojetivo ) precisamente desistir que eu
mesmo consiga isso como uma proea heroica. Para faer jus & paternidade espiritual e &
consequente autoridade compassiva, tenho de dei2ar que o reelde filho mais jovem e o
ressentido filho mais velho, suam & plataforma para receer o amor incondicional,
misericordioso que o Pai me oferece, e descorir ali o chamado para estar em casa como meu
Pai está em casa.

Essim amos os filhos em mim podem gradativamente ser transformados no Pai


misericordioso. E transformaç#o leva & realiaç#o do mais profundo desejo do meu coraç#o
inquieto. Pois que alegria maior posso ter do que estender meus raços cansado e dei2ar
minhas m#os descansarem sore os omros dos meus filhos que volta, aençoando-osN

FI
Ve;a a can8<o 6Me and )o!! Mcee:% de Janis Joplin% com a frase 6i!erdade  só outra pala"ra para nada mais a perder:.
FQ
c &%&2.
FG
c #(%#4.

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"p$logo
Vi+endo a !intura

*uando vi o pAster de Bemrandt pela primeira ve no outono de 8FG<, toda a minha
atenç#o se voltou para as m#os do velho pai apertando contra o peito o filho que volta. i
perd#o, reconciliaç#o, cura0 vi tam)m segurança, descanso, estar em casa. (ui t#o
profundamente tocado por essa imagem do araço de dar a vida entre pai e filho porque tudo
em mim ansiava ser receido do mesmo modo que o Filho Pródigo foi receido. "sse encontro
passou a ser o coraç#o da minha volta.

E comunidade A Arca, aos poucos, se tornou a minha casa. Cunca em minha vida eu
sonhara que homens e mulheres com defici+ncia mental seriam aqueles que poriam suas m#os
em mim num gesto de +nç#o e me ofereceriam um lar. Por muito tempo eu procurar
proteç#o e segurança entre os eruditos e talentosos, mal compreendendo que as coisas do
Beino eram revelados aos “pequeninos!.FF “o que ) loucura no mundo, eus o escolheu para
confundir os sáios!.8TT

3as quando e2perimentei a acolhida calorosa e modesta daqueles que n#o tem do que se
gaar, e recei um araço carinhoso de pessoas que n#o faiam quaisquer perguntas, comecei
a descorir que uma verdadeira volta espiritual quer dier uma volta aos pores em esp$rito a
quem o Beino do /)u pertence. O araço do Pai tornou-se muito real para mim nos araços
dos mentalmente pores.

1er primeiramente visto a pintura quando em visita a uma comunidade de deficientes


mentas permitiu-se estaelecer uma ligaç#o que está profundamente enraiada no mist)rio de
nossa salvaç#o. 6 a associaç#o entre a +nç#o dada por eus e a +nç#o dada pelos pores.
CVA Arca passei a ver que essas +nç#os s#o na verdade uma s7. O mestre holand+s n#o s7 me
pAs em contato com os mais profundos anseios do meu coraç#o, mas tam)m levou-me a

descorir que tais anseios poderiam ser satisfeitos na comunidade onde primeiro o encontre.
(a agora mais de seis anos desde que vi o pAster de Bemrandt em 1rosl e cinco anos
desde que resolvi faer a A Arca o meu lar. *uando reflito sore esse tempo entendo que as
pessoas com defici+ncia mental e aqueles que as assistem fieram com que eu “vivesse! a

FF
Mt ##%&(.
8TT
#/or #%&S.

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pintura de Bemrandt mais completamente do que eu poderia imaginar. Es recepç'es


afetuosas que tenho receido em muitas das comunidades dA Arca e as muitas
comemoraç'es das quais tenho participado fieram com que eu vivesse profundamente a
volta do filho mais jovem. oas-vindas e festividades s#o, certamente, duas das principais
caracter$sticas da vida nVA Arca. Há tantas demonstraç'es de acolhida, araços e eijos,
canç'es, rincadeiras e refeiç'es festivas que, para um estranho, A Arca pode parecer uma
comemoraç#o interminável de oas-vindas.

"u tam)m vivi a hist7ria do filho mais velho. "u n#o tinha realmente visto como o filho
ais velho pertence ao Filho Pródigo de Bemrandt at) ir a %#o Petersurgo e ver todo o
quadro. E$ eu descori a tens#o que Bemrandt invoca. C#o há somente a reconciliaç#o cheia
de lu entre o pai e o filho mais jovem, mas tam)m a dist@ncia somra e ressentida do filho
mais velho. Há arrependimento, mas tam)m raiva. Há comunh#o, mas tam)m
distanciamento. Há o rilho cálido da cura, mas tam)m a friea do olho cr$tico0 há a oferenda
da miseric7rdia, mas tam)m enorme resist+ncia para rece+-la. C#o demorou para que eu
descorisse o filho mais velho em mim.

E vida na comunidade n#o afasta o lado somrio. Eo contrário. Parece que a lu me atra$a
para A Arca tam)m me tornou consciente das trevas em mim mesmo. /i5mes, raiva, o
sentimento de se rejeitado ou negligenciado L tudo isso veio & tona no conte2to de uma
comunidade lutando por uma vida de perd#o, reconciliaç#o e cura. E vida comunitária levou-
me a uma verdadeira contenda espiritual: o esforço para continuar caminhando em direç#o &

lu precisamente quando a escurid#o ) t#o real.


"nquanto eu vivia por minha conta, parecia muito fácil manter o filho mais velho fora de
foco. 3as dividir a vida com pessoas que n#o escondem seus sentimentos logo me pAs em
confronto com o filho mais velho. Há pouco romantismo numa vida comunitária. Há a
necessidade constante de avançar das trevas arangentes para a plataforma do araço do pai.

eficientes mentais t+m pouco a perder. %em engano eles me mostram quem s#o.
Eertamente e2pressam seu amor e igualmente seu medo, sua delicadea e igualmente sua
ang5stia, sua generosidade e igualmente seu ego$smo. %endo simplesmente quem s#o,
rompem minhas defesas elaoradas e e2igem que seja t#o franco com eles como s#o comigo.
%ua incapacidade descortina a minha pr7pria. %ua ang5stia espelha espalha a minha. %uas
fraqueas mostram-se as minhas. (orçando-me a enfrentar em mim o filho mais velho, A Arca
ariu o caminho para tra+-lo para casa. Es mesmas pessoas deficientes que me acolheram e
me convidaram a festejar tam)m me mostraram o meu eu ainda n#o convertido e fieram-
me entender que a jornada estava longe de ser completada.
Epesar de que estes achados tiveram profundo impacto em minha vida, a maior dádiva
dVA Arca foi desafio de me tornar o pai. %endo mais velho do que a maioria dos memros da
comunidade e sendo tam)m seu pastor, parece natural pensar em ser o pai. Porque fui
ordenado, já tenho o t$tulo. Egora tenho de corresponder.

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1ornar-me o Pai numa comunidade de deficientes mentais e daqueles que os assistem


e2ige muito mais do que emaranhar-se nas lutas do filho mais jovem e do filho mais velho. O
Pai de Bemrandt ) um pai esvaiado pelo sofrimento. Etrav)s das muitas mortes que sofreu,
tornou-se inteiramente livre para receer e dar. %uas m#os estendidas n#o est#o pedindo,
agarrando, e2igindo, prevenindo, julgando ou condenando. %#o m#os que somente aençoam,
tudo dando e nada pedindo em troca.

ejo-me agora diante da dif$cil e aparentemente imposs$vel tarefa de me lierar da


criança que está em mim. Paulo di claramente: “*uando eu era criança, falava como criança,
pensava como criança, raciocinava como criança. epois que me tornei homem, fi
desaparecer o que era pr7pria da criança!. 8T8 6 confortável ser o instável filho mais jovem ou o
filho mais velho indignado.

Cossa comunidade está cheia de filhos instáveis e indignados, e estando cercados pelos
seus iguais e2iste uma sensaç#o de solidariedade. "ntretanto, quanto mais faço parte dessa
comunidade, tanto mais a solidariedade desponte como uma parada na estrada para um
destino muito mais solitário: a solid#o do Pai, a solid#o de eus, a solid#o definitiva da
compai2#o. E comunidade n#o precisa de mais um filho, mais jovem ou mais velho, convertido
ou n#o, mas de um pai que viva com m#os estendidas, sempre querendo dei2a-las descansar
nos omros de seus filhos que volta. "ntretanto, tudo em mim resiste a esta vocaç#o. (ico me
agarrando & criança em mim e2istente. C#o quero ser parcialmente cego0 quero ver
claramente o que acontece & minha volta. C#o quero esperar at) que meus filhos voltam ao

lar0
C#oquero
queroestar comsil+ncio
guardar eles quer estejam
sore o quenum pa$s distante
aconteceu0 estouou no campo
curioso para com
ouviros traalhadores.
toda a hist7ria e
ter in5meras perguntas para faer. C#o desejo continuar estendendo minhas m#os quando há
t#o poucos querendo ser araçados, especialmente quando pais e figuras paternas s#o por
muitos considerados como a fonte de seus prolemas.

", entretanto, depois de uma longa vida como filho, sei sem d5vida que o verdadeiro
chamado ) para tornar-se o pai que somente aençoa com infinita compai2#o, sem faer
perguntas, sempre dando e perdoando, nunca esperando qualquer coisa de volta. Cuma
comunidade tudo isso ) muitas vees sensivelmente perturador. *uero saer o que está
acontecendo. *uero me envolver nos altos e ai2os das vidas das pessoas. *uero ser
lemrado, convidado, informado. 3as o fato ) que poucos se d#o conta do que desejo e
aqueles que o faem n#o saem como corresponder. Es pessoas & minha volta, quer
deficientes ou n#o, n#o est#o procurando outro pai, outro companheiro nem mesmo um
irm#o. Procuram um pai que possa aençoar e perdoar sem precisar deles da maneira que eles
necessitam dele. ejo claramente a realidade da minha vocaç#o para ser um pai0 ao mesmo
tempo, parece-me quase imposs$vel segui-la. C#o quero ficar em casa quando todos saem,
quer levados por seus in5meros anseios ou por in5meras irritaç'es. %into estes mesmos
impulsos e desejo circular como os outros faem 3as quem vai estar em casa quando eles
voltarem L cansados, e2austos, nervosos, desapontados, culpados ou envergonhadosN *uem

8T8
#/or #'%##.

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vai convenc+-los que depois de tudo dito e feito há um lugar seguro ao qual ) poss$vel volta e
receer um araçoN %e n#o for eu, quem seráN E alegria da paternidade ) totalmente
diferente do praer dos filhos instáveis. 6 uma alegria que supera a repulsa e a solid#o0 sim,
ultrapassa a afirmaç#o e a comunidade. 6 a alegria de uma paternidade que se srcina do Pai
celestial8T= e a compartilha de sua divina solid#o.

C#o me surpreende que em poucas pessoas queiram e2ercer essa paternidade. Os
sofrimentos s#o muitos, as alegrias em pouco vis$veis. ", no entanto, n#o a desejando, eu me
furto & minha responsailidade de adulto espiritualmente maduro. %im, eu at) atraiçoo a
minha vocaç#o. Cada menos do que isso 3as como posso escolher algo que me parece t#o
contrário &s minhas necessidadesN ?ma vo me di: “C#o tenhais medo. E /riança o tomará
pela m#o e o conduirá & paternidade!. %ei que esta vo ) confiável. /omo sempre, os pores,
os fracos, os marginais, os rejeitados, os esquecidos, os menos... eles n#o somente precisam
de mim para ser seu pai, mas tam)m me mostram como ser um pai para eles. erdadeira
paternidade ) compartilhar da porea do amor n#o e2igente de eus. 1enho medo de
participar dessa porea, mas aqueles que já faem parte dela, por meio de suas defici+ncias
f$sicas ou mentais, ser#o meus mestres.

Olhando para as pessoas com quem vivo, os homens e mulheres deficientes, em como
para os que cuidam deles, vejo o enorme anseio por um pai no qual paternidade e
maternidade sejam uma s7. 1odos sofreram por terem sido rejeitados ou aandonados0 todos
foram magoados conforme cresciam0 todos se perguntam se merecem o amor incondicional

de
poreus
m#oseque
todos percorrem o lugar para onde possam volta com segurança e serem tocados
os aençoem.

Bemrandt retrata o pai como o homem que ultrapassou o caminho dos filhos. %ua
pr7pria solid#o e raiva podem ter estado presentes, mas foram transformadas pelo sofrimento
e pelas lágrimas. %eu isolamento se transformou em interminável solid#o, sua raiva em
ilimitada gratid#o. "sse ) quem eu devo vir a ser. "ntendo isso claramente quando me
defronto com a elea incomparável do vaio do pai e sua compai2#o. Posso dei2ar o filho
mais jovem e o mais velho amadurecer em mim chegando ao pai misericordiosoN

*uando, há quatro anos, fui ao %#o Petersurgo para ver A Volta do Filho Pródigo, de
Bemrandt, n#o faia ideia de quanto teria de viver o que ent#o estava vendo. /oloco-me com
estupefaç#o diante do lugar ao qual Bemrandt me trou2e. Ruiou-me do jovem ajoelhado,
desgrenhado, ao pai em p), curvado e velho0 do local de ser aençoado & posiç#o de aençoar.
*uando olho para minhas m#os envelhecidas, sei que me foram dadas para serem estendidas
em direç#o de todos aqueles que sofrem, para pousarem sore os omros de todos os que
vierem e para oferecerem a +nç#o que emerge da imensid#o do amor de eus.

8T=
/f. f '%#$.

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