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TEORIA E PRÁTICA DA
TRADUÇÃO
CONTEXTUALIZANDO
1Do que nos consta, ainda não há tradução desse artigo para o português. Seu título em alemão
é Ein Rahmen für eine allgemeine Translationstheorie. A tradução do título que usamos aqui é de
Alice Leal (2007).
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A teoria desenvolvida por Vermeer é conhecida como Teoria do Escopo.
Segundo essa teoria, a escolha do processo tradutório está diretamente ligada à
função do texto de chegada, ou da tradução propriamente dita. Como bem
observa Leal (2007), o mais importante para Vermeer era “romper com a noção
tradicional da teoria linguística da tradução” (p. 26), que defendia, de um modo
geral, a necessidade absoluta de busca por equivalência ao se traduzir um texto
qualquer, e, a partir disso, o autor queria demonstrar que as questões da tradução
iriam muito além de um simples trabalho processual linguístico. Para o teórico,
existiriam inúmeras outras questões para ser levadas em conta antes mesmo de
o tradutor pensar no processo linguístico, e as respostas para essas questões
dependeriam do escopo (encargo ou projeto) do texto de chegada. Por isso, um
mesmo texto poderia ter resultados diversificados. Nisso residiria, portanto, um
início de quebra de paradigma nos estudos voltados para a tradução, que
coincidiria com o momento das discussões para a criação de uma área de estudos
específicos.
Talvez, no âmbito dessa disciplina, o mais importante para nós seja tomar
conhecimento de que, entre todos os aspectos que envolvem o processo
tradutório – que Vermeer considera até mais importantes que o processo
puramente linguístico –, o mais relevante para o teórico alemão é aquele “que se
refere à condição da tradução como uma ação (Handlung) humana, ou seja, uma
ação intencional e repleta de propósitos (daí a ideia de escopo), que ocorre numa
determinada situação” (Leal, 2007, p. 27). Vermeer ainda “acrescenta que
qualquer ação humana (nesse caso, a tradução, especificamente), ao mesmo
tempo em que é parte de uma situação, pode também modificá-la, estabelecendo
uma espécie de circularidade entre essas ações e o mundo” (Leal, 2007, p. 27).
Se estivermos atentos a nossas discussões anteriores, lembraremos, aqui,
facilmente da questão da Bildung alemã, que discutimos quando tratamos da
história da tradução na Alemanha primeiro romântica; com base nisso,
percebemos que outro aspecto da tradução relevante para Vermeer é também a
questão cultural. Como sugere Leal (2007), com isso, o teórico alemão, através
da sua teoria do escopo, estaria propondo desviarmos a atenção de uma teoria
linguística para a tradução para, no seu lugar, pensarmos em algo mais amplo
como uma “teoria cultural da tradução, que abranja as particularidades dos
sistemas culturais envolvidos no processo tradutório” (p. 27).
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Isso tudo se abre para que possamos, dentro dessa perspectiva teórica,
considerar como base de nossa prática tradutória toda a desconstrução que
fizemos nesta disciplina dos conceitos de texto, de original, de autor, de leitor, de
tradução, de tradutor, de fidelidade e, também, de intraduzibilidade, entre outros.
No âmbito do funcionalismo alemão:
2Atenção para o fato de que estamos trabalhando, aqui, com a tradução para o português de texto
escrito originalmente em 1988.
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um conceito global da tradução, que serve como uma referência
permanente para o tradutor. (Nord, 2016, p. 15-16)
Como resume Leal (2007, p. 34), para Nord a tradução deve ser
considerada “comunicação intercultural, já que tanto o texto de partida quanto o
texto de chegada são culturalmente determinados pela situação comunicativa em
que são recebidos”. Além disso, a autora alemã não defende a análise rigorosa
do texto de partida como determinante para a função do texto de chegada, para
isso é preciso que o tradutor, de modo objetivo, a defina pelo “propósito do texto
de chegada na comunicação intercultural”. Leal ainda finaliza dizendo que
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Antes, porém, ressaltamos a importância de levar sempre em
consideração, durante o processo de análise que o Modelo Nord realiza, o
movimento circular no qual essa análise deve se apoiar (tal qual a circularidade
entre as ações humanas e o mundo relevadas por Vermeer), pelo qual
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Entendemos, com isso, que o modelo de análise proposto por Nord não
trata especificamente de tradução de textos literários, embora a teórica afirme em
seu discurso que o modelo pode ser utilizado também com esse fim – talvez essa
afirmação de Nord seja o único ponto do modelo proposto que careça de
problematização e adaptação na sua utilização prática. Por isso, nessa aula,
vamos nos concentrar no tipo de tradução para a qual esse modelo é efetivamente
fundamental, ou seja, para a tradução de textos técnicos e especializados.
Nesse sentido, os fatores extratextuais que devem ser analisados nesse
modelo são divididos da seguinte maneira (Cf. Nord, 2016, p. 83-143):
Emissor: O emissor do texto deve sempre ser analisado em relação
ao produtor do texto. O emissor é a pessoa que elabora o encargo (ou
projeto) para a realização do texto. Por exemplo: um editor ou uma
empresa. O produtor é aquele que efetivamente realiza o texto sob os
encargos determinados pelo emissor. O produtor, por sua vez, pode
exercer o encargo com maior ou menor criatividade, a depender da
liberdade que lhe é concedida pelo emissor e pela “normas e
convenções textuais da cultura alvo” (p. 86). Na tradução, o tradutor
pode ser relacionado diretamente com o produtor do texto. Lembrando
que em alguns casos emissor e produtor são a mesma pessoa. A
pergunta que se faz, aqui, é: quem/sob o encargo de quem foi
produzido o texto? A resposta pode ser encontrada no paratexto, mas
também no conhecimento do receptor ou do tradutor, que pode ser
ativado apenas pelo nome do autor etc. (Nord, 2016, p. 83-91).
Intenção do emissor: Para uma compreensão desse fator é preciso
considerar que ele se realiza em dois momentos: no momento da
elaboração da proposta e no momento da recepção dessa proposta. A
intenção do emissor propriamente dita (lembrando que ele também
pode ser o próprio produtor do texto) será apresentada através dos
propósitos do encargo textual, porém, como sabemos, esses
propósitos foram recebidos pelo leitor do texto, e não sabemos, por
esse motivo, se o resultado esteve totalmente em conformidade com
eles. Sendo isso inquestionável, a intenção do emissor só estará
“completa” quando analisarmos também a função e o efeito
apresentados pela situação de recepção do texto. O efeito do texto
apenas pode ser analisado após a recepção (o efeito causado no
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leitor), já a função é mais complexa, porque ela englobará todos os
fatores situacionais que apresentaremos aqui. A função do texto
começaria antes da recepção, com os propósitos do emissor, e
finalizaria com as expectativas do receptor. Assim, a pergunta que
caberia realizar para analisar esse fator complexo, que é a intenção do
emissor, seriam: para que o texto foi elaborado? e com que função?
Para respondê-las, com vimos, é preciso primeiramente colocá-las em
diálogo com as respostas encontradas para os outros fatores
extratextuais/situacionais; podemos também encontrar essas
respostas questionando o próprio emissor, encontrá-las no texto (com
base na informação do emissor ou do produtor), e também nas
impressões causadas pela nossa própria leitura do texto etc. (Nord,
2016, p. 91-97).
Público ou receptor: Para quem foi destinado o texto? É a pergunta
que sustenta esse fator. Lembrando que o público para quem se
destina o texto fonte nunca será o mesmo público que receberá o texto
alvo, simplesmente porque já de partida o público da tradução é
composto de “membros de outra comunidade cultural e linguística” (p.
99). Outra questão importante a ser considerada, é que nem sempre o
receptor de determinado texto é aquele para o qual ele foi direcionado,
então, é preciso também prever os receptores eventuais. Ao tradutor
cabe, portanto, uma tarefa mais árdua do que a do produtor do texto
fonte, porque, além de analisar as características dos receptores do
texto fonte e suas relações com o mesmo, ele terá de entender as
características dos receptores da tradução, cuja leitura vai causar
impacto na função e efeito do texto alvo, que por sua vez impactará o
resultado da sua tradução em relação ao texto original. Assim,
entendemos que algumas adaptações deverão ser realizadas pelo
tradutor no momento das suas escolhas tradutórias. (Nord, 2016, p. 97-
106).
Meio: Trata-se mais especificamente do suporte pelo qual o texto foi
transmitido ou comunicado. Em que meio o texto foi apresentado?, é a
pergunta que se sugere, aqui, à análise do tradutor. É preciso saber se
foi uma comunicação oral ou escrita, se ela ocorreu diante do receptor
ou não. Como Nord (2016) nos chama a atenção,
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O meio de transmissão não afeta apenas as condições de recepção, mas
também as condições de produção, porque determina a forma como as
informações devem ser apresentadas no que diz respeito ao nível de
explicitação, arranjo dos argumentos, escolha dos tipos de frase,
características de coesão, uso de elementos não verbais como mímica
e gestos, etc. (p.106)
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dificuldade em se determinar o conteúdo do texto, difícil para quem
ainda não adquiriu tal competência. Nord entende por conteúdo
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texto, como e o que dizem sobre o mesmo para complementar nossa
análise (Nord, 2016, p. 190-196).
Elementos estilísticos: Os três últimos fatores vamos agrupar, aqui,
em elementos estilísticos, porque a intenção dessa análise também fica
bastante clara após a explicação de todos os fatores anteriores. Trata-
se, portanto, do léxico, para o qual nos perguntaríamos: Com que tipo
de palavras o texto foi elaborado?; da sintaxe, em que nos interessaria
saber com que tipo de frases o texto foi elaborado?; e, por último, as
características suprassegmentais, quando a melhor pergunta
possivelmente seria: em que tom? ou com que marcas o texto foi
elaborado? – este fator estaria, segundo Nord, diretamente ligado ao
meio em que o texto foi escrito (Nord, 2016, p. 196-223).
O modelo criado por Nord para ser aplicado à tradução, ao ter como base
a teoria funcionalista alemã, para além de auxiliar imensamente o trabalho inicial
do tradutor, auxiliar os professores de tradução na sua atividade didática, tem
como escopo mais amplo defender a tradução daquilo que temos falado desde a
nossa primeira aula, mostrando na prática que “Traduzir é muito mais do que uma
mera operação de transcodificação linguística” (Nord, 2016, p. 283).
O modelo Nord apresenta aos professores e alunos de tradução a
quantidade de competências que precisam ser desenvolvidas para além da mera
prática de “traduzir” um texto, o que nos mostra que teoria e prática
necessariamente devem caminhar de mãos dadas nos cursos de tradução; e esse
modelo dá um suporte muito amplo tanto para a tradução em si quanto para a
reflexão sobre o trabalho de tradução e sobre o desenvolvimento de cada projeto
(ou encargo) especificamente.
O modelo também oferece aporte para pensarmos e elaborarmos com mais
consistência a crítica de tradução, pois lhe dá caráter mais objetivo e menos
simplista. Para Nord (2016)
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preocupa-se principalmente com os fatores e componentes que
determinam o processo de tradução e com o próprio processo tradutório.
(p. 282-283)
situação do TF situação do TA
PRINCÍPIOS DE
TRANSFERÊNCIAS
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TEMA 5 – TABELA DE APLICAÇÃO
Vamos oferecer, agora, uma releitura do método Nord em uma tabela que
poderá ser usada tanto por professores e alunos/tradutores quanto por críticos de
tradução, com função didática ou não. Fizemos pequenas adaptações para tornar
mais fácil o uso da tabela, por exemplo, separando em dois momentos da análise
extratextual o fator intenção do autor, que será apresentado como propósito e
função3.Também dividimos a tabela em dois momentos, um para análise do texto
fonte e um segundo momento para a elaboração do projeto de tradução, que ficará
em coluna paralela, para que o analista já possa ir registrando suas possíveis
escolhas tradutórias enquanto analisa o texto a ser traduzido. No final, depois da
tradução, essa tabela completa serve ao crítico de tradução.
3 Neste fator aproveitaremos para incluir a análise de dois tipos de textos mais comuns aos
objetivos da tradução: documental, que serve, como o próprio termo diz, para documentar uma
comunicação; e a instrumental, que serve para passar uma mensagem do autor do texto fonte
para o receptor do texto alvo, ela pode ser de três tipos: equifuncional, pode ter a mesma função
tanto no texto fonte como no texto alvo (manuais de instruções, por exemplo); heterofuncional,
uma adaptação de função sem contradizer as intenções do emissor (a tradução da Odisseia para
crianças, por exemplo); e homóloga, quando se reproduz a função do texto fonte para obter na
cultura alvo o mesmo efeito que obteve na cultura fonte.
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TEXTO DE PARTIDA TEXTO DE CHEGADA
FATORES EXTRATEXTUAIS
Emissor QUEM
Sob encargo
Produtor DE QUEM
QUEM
Emissor
Sob encargo
Produtor DE QUEM
Lugar ONDE
Tempo QUANDO
Tradução documenta
documental O QUÊ
Equifuncional
Tradução
Heterofuncional
instrumental
Homóloga
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TEXTO DE PARTIDA TEXTO DE CHEGADA
FATORES INTRATEXTUAIS
Conteúdo O QUÊ
Como PARTE
de uma unidade
Hierarquização da unidade maior (qual?)
textual ou como
unidade
autônoma
Com auxílio de
Elementos não verbais que elementos
NÃO VERBAIS
Com que tipo
Léxico
de PALAVRAS
Com que tipo
Elementos Sintaxe
de FRASES
estilísticos
Em que TOM
Elementos
ou com que
suprassegmentais
MARCAS
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FINALIZANDO
LEITURA COMPLEMENTAR
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Saiba mais – A tradução pedagógica: experimentos e exercícios para uso
em aula
A professora da UERG, Elisa Corrêa, apresenta excelente artigo para quem tem
interesse na aplicação da tradução no ensino de língua estrangeira.
Disponível em: <http://seer.fclar.unesp.br/entrelinguas/article/view/9225/696>.
Acesso em: 23 maio 2018.
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REFERÊNCIAS
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