Sei sulla pagina 1di 9

Émile Durkheim

Lições de Sociologia

lntrodução à edição brasileira


OLIVEIROS S. FERREIRA
introdução
GEORGES DAVY

Tradução
MONICA STAHEL

Mortins Fontes
Sao Poulo 2002
152 LIÇÕES DE socrcLocrA

lavras, o primeiro dever é preparut o que nos dispensará DECIMA LIÇÃO


cadavez mais de um papel para o qual o indivíduo não é
DEVERES GERAIS
feito. Para isso, nossa ação política consistirá em criar os
órgãos secundários que, à medida que se formam, liber-
independentes de qualquer grupamento social
tam ao mesmo tempo o indivíduo do Estado e o Estado
do indivíduo, e dispensam cada vez mais este último de
uma tarefa para a qual ele não é feito.

O HOMICIDIO

Estamos entrando agora numa esfera nova da mora-


lidade. Examinamos nas seções anteriores os deveres que
os homens têm uns para com os outros porque pertencem
a um grupo social determinado, porque fazempxte de uma
rnesma familia, de uma mesma corporação, de um mesmo
Dstado. Mas há outros que são independentes de qualquer
grupamento particular. Devo respeitar a vida, a proprie-
dade, a honra de meus semelhantes mesmo que não sejam
meus parentes nem meus compatriotas. E a esfera mais ge-
ral de toda aéÍica,umayez que é independente de qual-
quer condição local ou étnica. É também a mais elevada.
Os deveres que vamos passar em revista são considerados,
cm todos os povos civilizados, os primeiros e mais premen-
los de todos os deveres. O ato imoral por excelência é o as-
sassínio e o roubo, e a imoralidade desses atos não diminui
crn nada quando são cometidos contra estrangeiros. A mo-
ral doméstica, a moraT profissional , a moral cívica certa-
154 LIÇÕES DE SOCNLOGIA DET/ERES GEMIS 155

mente têm uma gravidade menor. Aquele que falta a um dos buscar areparaçáo, e eles poderão, se quiserem, per-
desses deveres nos aparece, em geral, como menos culpado mitir ao culpado que se redima mediante uma quantia em
do que aquele que comete um desses atentados de que aca- dinheiro. Esses atos, em sulna, só têm sanções parcialmen-
bamos de falar. Essa idéia é tão geral e tão fortemente im- te civis; com muita freqüência limitam-se a uma espécie
pressa nos espíritos que, paru a consciência comum, o de sanção por perdas e danos; em todo caso, mesmo que
crime consiste essencialmente ou quase unicamente em sofíam uma espécie de pena. ou seja, mesmo que o culpado
matar, em ferir, em roubar. Quando nos representamos o seja atingido severamente, esses atos não parecem tão gra-
criminoso, é sempre sob o aspecto de um homem que atenta ves para que o próprio Estado se ocupe de sua repressão.
contra a propriedade ou a pessoa de outro. Todos os traba- São os particulares que devem tomar essa iniciativa. A so-
lho s da e scola criminoló gi c a italiana repousam j ustamen- ciedade não se sente diretamente envolvida e arteaçada por
te no postulado, admitido como axioma, de que o crime está esses atentados que nos revoltam. Às vezes, até, esse mí-
todo aí. Constituir o tipo do delinqüente consiste, por exem- nimo de proteção só é concedido pela sociedade a seus
plo, em constituir o tipo do homicida ou do ladrão, com suas membros, mas é recusado quando a vítima é um estrangei-
diferentes modalidades. ro. Os verdadeiros crimes são então aqueles dirigidos con-
Quanto a esse aspecto, entre a moral moderna e a mo- tra a ordem familiar, religiosa, política. T[rdo o que ameaça
ral antiga apresenta-se o mais absoluto contraste. Sobretu- a organizaçáo política da sociedade, toda falta para com
do após o cristianismo, produziu-se uma verdadeira inter- as divindades públicas, que não são mais que expressões
versão, uma inversão da hierarquia dos deveres. Nas socie- simbólicas do Estado, toda violação dos deveres domésti-
dades absolutamente inferiores, e mesmo sob o regime da cos são punidos por penas que podem ser terríveis.
cité, os deveres de que falaremos, emYez de estarem no Essa evolução que resultou em elevar ao ponto mais
ponto culminante da moral, estavam apenas no limiar da
alto da moral o que antes era sua parte mais inferior é con-
ética. Em vez de serem colocados acima de todos os ou-
seqüência da evolução correspondente que se produziu na
tros, eles, ou pelo menos alguns deles, tinham uma espécie
sensibilidade coletiva e que muitas vezes tivemos oportu-
de caráter facultativo. O que prova a menor dignidade mo-
nidade de apontar. Primitivamente, os sentimentos coleti-
ral que thes era então atribuída é a menor gravidade das
vos mais fortes, os que menos toleram a contradição, são
penas que os sancionavam. Muito freqüentemente, até,não
os que têm por objeto o próprio grupo, seja o grupo polí-
estavam ligados a nenhuma pena. Na Grécia, o próprio
tico em sua integridade, seja o grupo familiar. Daí vêm a
assassínio só era punido mediante solicitação da família, e
autoridade excepcional dos sentimentos religiosos e a se-
esta podia se contentar com uma indenização pecuniária'
Em Roma, na Judéia, o acordo é proibido para o homicí- veridade das penas que garantem o respeito a eles: é que
dio, considerado como crime público, mas o mesmo não as coisas sagradas são emblemas do ser coletivo. Este se
ocorre para ferimentos e roubo. Cabe aos indivíduos lesa- personifica sob a forma de Deus, de seres religiosos de
DEVERES GEMIS 157
156 LIÇÕES DE SOCNLOGIA

todos os tipos, e é ele que é objeto do respeito, da adora- O primeiro e mais imperativo é o que proibe o aten-
ção que se dirige, aparentemente, aos seres fictícios do tado à vida do homem e proíbe o homicídio, salvo nos ca-
mundo religioso. Ao contrário, tudo o que concerne ao in- sos determinados permitidos pela lei (caso de guerra,
dividuo afeta com pouca intensidade a sensibilidade soci-al. condenação legalmente pronunciada, legítima defesa).
A dor do indivíduo Çomove pouco, pois seu bem-estar in- Por que o homicídio foi proibido e essa proibição tornou-
teressa pouco. Atualmente, ao contrário, a coisa detestá- se cada vez mais severa é uma questão da qual não é ne-
vel é o sofrimento individual. A idéia de que um homem cessário tratar depois do que acabamos de dizer. Na me-
sofra sem merecer nos é insupottável, mas, como veremos, dida em que o objetivo do indivíduo é o bem moral e fa-
mesmo o sofrimento merecido nos pesa, nos angustia, e zer o bem é fazer bem aos outros, está claro que o ato que
nos esforçamos para atenuá-lo. É que os sentimentos que tem como efeito privar outro ser humano da existência,
têm por objeto o homem, a pessoa humana, tomam-se mui- ou seja, da condição de todos os outros bens, deve neces-
to fortes, ao passo que os que nos ligam diretamente ao gru- sariamente ser visto como o mais detestável de todos os
po passam para segundo plano. O grupoj? não nos parece crimes. Não nos deteremos entáo a explicar a gênese da re-
ter valor por si mesmo e para si mesmo. E apenas o meio gra que proíbe o assassínio. O mais útil e sugestivo é des-
de rcalizar e de desenvolver a naturezanamedida em que cobrir como a regra funciona em nossas sociedades con-
o ideal dos tempos o reclama. É o objetivo por excelência temporâneas, de que causas depende o domínio maior ou
com relação ao qual todos os outros são secundários' Por menor que ela exerce sobre as consciências, o respeito
isso a moral humana elevou-se acima de todas as outras maior ou menor que the é dado. Para responder a essa ques-
morais. Quanto às razões que determifiatamtanto esse re- tão, devemos dirigir-nos à estatística. É eh, de fato, que nos
cuo de alguns sentimentos coletivos como essa evolução informa sobre as condições em função das quais vatia a
de outros, nós as indicamos com demasiada freqüência pa- taxa social de homicídios, e é essa taxa que mede o grau de
ra que caiba voltar a elas. Estão ligadas ao conjunto de cau- autoridade de que é investida aregra de proibição do as-
sas que, diferenciando cada vez mais os membros das so- sassínio. Essa pesquisa nos fará compreender melhor a na-
ciedades, não thes deixaram outras características comuns ixezadesse crime e, por conseguinte, lançatá alguma luz
essenciais além das que thes provêm de sua qualidade de sobre as características distintivas de nossa moralidade.
homens. Esta tornou-se então, naturalmente, o objeto por Pzr:a dizer a verdade, poderia pârecer, depois de tudo
excelência da sensibilidade coletiva. o que precede, que as causas de que depende a tendência
Depois de indicar, assim, o caráter geral da patte da ao homicídio são evidentes e não têm necessidade de ser
ética que estamos abordando agora, entremos nos detalhes, mais determinadas. O que faz com que o homicídio, hoje,
para examinar as principais regras que ela implica, ou seja, seja proibido sob a ameaça das penas mais fortes de que
os principais deveres que ela impõe. nossos códigos dispõem é o fato de a pessoa humana ser
158 LIÇÕES DE SOCrcLOGIA DEVERES GERAIS 159

objeto de um respeito que, antigamente, se atribuía a coi- passo que a Hungria e a Itália têrn mais de 100, ou seja, 10
sas bem diferentes. Disso dever-se-ia concluir que o que ou 5 vezes mais. Enfim, no interior de cada país encontra-
faz comque um povo tenha maior ou menor inclinação ao mos a mesma distribuição. O homicídio é essencialmente ru-
assassínio ó esse respeito ser mais difundido ou menos, é ral; de todas as profissões, são os lavradores que fornecem
um valor maior ou menor ser atribuído a tudo o que se re- o maior contingente. Ora, não há dúvida de que o respeito
fere ao indivíduo. E um fato confirma essa interpretação: de que a pessoa é cercada, o valor que lhe é atribuído pela
a partir do momento em que é possível acompaúar a opinião crescem com a civilização. Não poderíamos dizer,
marcha dos homicídios através da estatística, observa-se por conseguinte, que o homicídio varia conforme o lugar
que eles diminuem progressivamente. Na França, conta- mais ou menos elevado que o indivíduo ocupa na hierar-
vam-se, durante o período de 1826-1830,279 homicidios; quia dos fins morais?
o número decresce progressivamente, da seguinte manei- É certo que essa explicação não deixa de ter algum
ra 282 (1831-3s); 189 (1836-40); 196 (t841-a5); 240 fundamento. Apenas ela é excessivamente geral. Sem dú-
(18a6-s0);171 (18s1-55); 119 (18s6-60); 121 (1861-65); vida, o desenvolvimento do individualismo não deixa de
136 (1866-70); 190 (1871-7 5); 160 (1876-80); ou seja, uma ter relação com a redução do homicídio; mas não a produz
redução de 62% em 55 anos, redução tanto mais notável diretamente. Se ele tivesse essa eficácia, também a mani-
que durante o mesmo período a população aumentou em festaria nos outros atentados que o indivíduo sofre. Os
mais de um quinto. Encontramos entre todos os povos ci- roubos, os calotes, os abusos de confiança infligem às suas
vilizados a mesma regressão, embora mais ou menos acen- vítimas dores às vezes tão intensas quanto as lesões ma-
tuada conforme os países. Parece, portanto, que o homi- teriais propriamente fisicas. Uma fraude comercial, um ca-
cídio diminui com a civilização. E o que parece confirmar lote grave, pelos males que causam, com freqüência pro-
também um outro fato, o de que ele é tanto mais desen- vocam de uma só vez mais desgraças do que um assassínio
volvido quanto menos civilizados são os países e vice-ver- isolado. Ora, todos esses males, em vez de diminuir, mul-
sa. A ltália, a Hungria, a Espanha estão à frente. Depois vem tiplicam-se com a civllizaçáo. Os roubos, que eram em nú-
a Áustria. Ora, os três primeiros países estão certamente mero de 10.000 em1829, jáestavam em21.000 em1844,
entre os menos avançados; são os últimos da Europa' Eles em 30.000 em 1853, em41.522 em 1876-1880, ou seja,
çontrastam com as nações de alta cultura, a Alemanha, a um aumento de 400%. As bancarrotas subiram de 729 pa-
Inglaterra, a França e a Bélgica, cuja criminalidade homi- ra97l. Tambóm há atentados materiais que apresentam a
cida está entre 10 e 20 por um milhar de habitantes*, ao mesma ascensão: são em primeiro lugar os atentados ao
pudor contra as crianças, e também os espancamentos e
* Trata-se de um erro do original. O coreto seria "por um milhão de ferimentos que passaram de 7 para 8.000 durante o perío-
habitantes" (cf. O suicídio,E. Durkheim). §. da T.) do de 1829-1833 para l5-17.000 em 1863-1869. No en-
1 61
DEIERES GERAIS
LIÇOES DE SOCIOLOGIA
160
Facilmente ela tem
te a ofensa a destruir seu adversário'
protegê-la tanto contra que esses tipos de sentimentos,
tanto, o respeito à pessoa deveria que' esse resultado, tanto mais
os atentados mortais' Para particularmente ca-
os ferimentos como contra foi sua próprtaÍLatÜreza' são
tenha se produzido' "^rureodefazer çàlartodos os sentimentos de piedade' de
ao contrário, um tal crescimento força ;;;;;;"
por si só' tivesse uma seriam suficien-
;;".JõtLsse sentimento' não é ele propriamente dito
simpatia que, em outras circunstâncias'
Pois' quando os pri-
inibidora muito Íiaca' Portanto tes para deter o braço do assassino'
inibidor os segundos são
que pode explicar o espirito 9* "."1t:it:,1:.::
Mas' entre as crcuns-
;it;. desses sentimentos são fortes' do Estado
cida encontra num certo momento'
;t;;;;.
^a|JáÀ quutdo a glória do Estado' a grandeza
progresso do individualismo quando a sociedade
tâncias que acompanham o como o Ú"t pot excelência'
contrárias ao as- à qual tudo. está subordinado'
;;;;i;d"r" haver algumas especialmenteaos ouffos atenta- é a coisa sagrada dú"u,
"do indivíduo que a simpatia' a compat-
oposição
sassínio sem mostraÍ u rrtttrnã ;; ".; tão ãcima
essas circunu?'"*:].,*^- não poderiam contrabalançar
áã, ."""" a pessoa' Quais são à"" .u" possa inspirar
avanços dos sentrmen- "* dos sentimentos
Vimos que, paralelamente aos ;;;;.t as e*igências mais imperiosas um
o homem em geral' o ideal pai' de vingar
tos coletivos que têm for objeto ofendidos. Quando se trata de
defender
como moral do indivíduo' ter a vida um homem?
humano, o bem tanto mateiial
de
dos sen- um Deus, que importância pode
produziam-se uma regressão,
um quando no outro prato
3{raOuec-rmentofamília ou Ela pesa muito pouco na balança
objeto.o grupo'
timentos coletivos qít tC*po' estão objetos de um valor, de
um peso tão incomparáveis'
que dele possam
;u;", independentementá prweito do
í^S* ô" a fé política, o sentimento são d-e honra domésti-
dois movimentos não são com muita fre-
extrair os particulares' Esses Se os sen- ;r;;r."ri*ento àe casta" afé religiosa
;;; puà.lo', são estreitamente solidários'
em geral aumentam' áíc""* por si sós gt'uOo"'
de hómicídios' A multiplici-
prática ainda
;il;;": que nos ligam ao indivíduoenfraquecem; é porque dade de u.su..í'io"tu Córsega está ligada à

é exatament. po'qú os outros


se a própriavendetta se deve
que não os sobrevivente davendetta:mÃ
ter outros objetivos estarmuito vivo'
os grupos já não podem diminui' ;; f"" de o ponto de honra familiar ainda
interesses Ou ptt'o'-t'o*u"
a' Ora'se o homicídio o corso a seu clã ainda
ou seja, os sentimentos que ligam
místico do Estado perde ter- ainda está acima de tudo'
é muito mais porque o culto efei- têm muito vigor' A gtOt''u ào nome
do homem o garihal Com ái'""os sentimentos podem levar ao
reno do que porque o culto por Não só
to, os sentimentos que estão
na base do primeiro são' ""t'
assassíniocomo,ondesãofortes,elesproduzemumaeS-
Alem do mais' eles
si mesmos, incitan;; ao assassínio' que' por si mesma e de
pécie de disposição moral crônica
são muito intensos, como
todosos::ltiment?s ""1"'11"-:: "*ur"i* geràI, inclina ao homicídio' Quando' sob influên-
q'uando s1o ofeldidos' tendem a Íeagrr as pessoas são levadas
po, .orrr.grinte, cia de todos esses estados morais'
à sua intensidade' Se a individual' elas se acos-
com uma .""tg'u'f'oporciona[ u ãa, tao pouco valor à existência
podem levar o homem que sen-
ofensa é grave, portanto'
162 LIÇÕES DE SOCNLOGIA DEYERES GERATS
163

tumam, conseqüentemente, à idéia de que ela deve e pode xão leva à violência. Ela tende a romper tudo o que a atra_
ser sacrificada a todos os tipos de coisas. Todas essas ten- palha e detém.
dências têm por si mesmas algo de violento, de destrutivo, Assim, a redução dos homicídios atuais não se deve
tornando o sujeito de maneira geral inclinado a destruir, a que o respeito à pessoa humana conteúa como um freio
predispondo-o às manifestações violentas, aos atos san_ os móbeis homicidas, os incitantes ao assassínio, mas ao
guinários. Daí provêm os temperamentos rudes e ásperos fato de esses móbeis e esses incitantes serem menos nu_
que caracterizam as sociedades inferiores. Acreditou_se merosos e menos intensos. E esses incitantes são os sen_
com freqüência que essa rudeza fosse um resto de bestia_ timentos coletivos que nos ligam a objetos estranhos à
lidade, uma sobrevivência dos instintos sanguinários da humanidade e ao indivíduo, ou seja, que nos ligam a gru-
animalidade. Na realidade, ela é produto de uma cultura mo_ pos ou a coisas que simbolizam esses grupos. Não quero
ral determinada. O próprio animal, de maneira geral, não dizer, pot outro lado, que esses sentimentos que antiga_
é violento por nattreza; só o é quando as circunstâncias mente constituíam a base da consciência moral estejam
em que vive tornam a violência necessária. por que seria destinados a desaparecer; eles sobreviverão e devem so_
diferente quanto ao homem? Se por tanto tempo ele per_ breviver, mas em menor quantidade e com intensidade bem
maneceu rude para com seus semelhantes, não é absolu_ inferior à que tiúam antes. Eis o que faz com que, nos
tamente porque estivesse mais próximo da animalidade; países civilizados, as taxas da mortalidade homicida ten_
foi anatureza da vida social que ele levava que o moldou dam a baixar.
assim. O hábito de perseguir fins morais estranhos aos in_ Aliás, é fácil verificar essa interpretação. Se ela for
teresses humanos tornou-o relativamente insensível às do_ correta, todas as causas que reforçam esses tipos de sen_
res humanas. Todos esses sentimentos dos quais acabamos timentos deverão elevar as taxas de mortalidade. Ora, a
de falar só podem ser satisfeitos impondo sofrimento ao guerra é evidentemente uma dessas causas. Ela leva as so-
indivíduo. Os Deuses que adoramos só vivem das priva- ciedades, até mesmo as mais cultas, a um estado moral que
ções, dos sacrificios aos quais se submetem os mortais; lembra o das sociedades inferiores. O indivíduo desapaie_
às vezes são até vítimas humanas exigidas, exigências que ce, deixa de ter importància; é a massa que se torna o fator
só fazem traduzir sob forma mística as exigências da so- social por excelência; uma disciplina rígida e autoritária
ciedade para com seus membros. Compreende-se que uma impõe-se a todas as vontades. O amor àpátria,o apego ao
tal educação deixe nas consciências uma aptidão paru Çau- grupo relega ao segundo plano todos os sentimentos de
sar dor. Além do mais, todos esses sentimentos são paixões simpatia pelo indivíduo. Ora, o que acontece? Enquanto,
muito vivas, umavezque não toleram a conkadição, consi_ sob a influência de causas diversas, os roubos, os calotes,
deram-se intangíveis. Caracteres formados assim são, por- os abusos de confiança tornam-se sensivelmente menos
tanto, essencialmente passionais; são impulsivos. Ora, a pai_ numerosos, o homicídio ou aumenta ou, pelo menos, per_
164 LrÇoES DE SOCIOLOG\Á
DEVERES GEMIS
165
manece estacionário. Na França, em 1870, os roubos
dimi_
nuem em 3302, passam de 31.000 para 20.000, os roubos em lB77 a agitaçã,o política torna_se
mais intensa, é a épo_
qualificados de 1.059 paruBTL Os assassínios diminuem ca do Dezesseis de Maio, e um
aumento enorme se pro_
pouco, de 339 passam para307. E, ainda, essa redução duz. O número se eleva subitamente
é pu.u lO:, taxa que não
apenas aparente e dissimula um aumento provavelmente tiúa sido alcançadadesde r839. ilr;;;;
os anos de efer-
importante. Com efeito, essa diminuição da criminalidade vescência que vão de l g49 até
o momento em que o Se_
geral em tempo de guerra está ligada, em parte que gundo Império se consolidou
não se completamente, produz_se
deve exagerar mas que não se pode negar, sobretudo quan_ o mesmo fenômeno. Em lg4g,
contam_se a32 hámicídioq
do há invasão, a uma causa que deve necessariamente 496 em 1849, 4g5 em 1850,
496 em t SSi ; aepols, em 1 g52
ter começa abaixa, embora os números
efeito sobre o homicídio, ou seja, a desordem da adminis_ ainda continuem mui_
fiaçãojudiciária. A perseguição aos crimes se faz menos to altos até 1g54. Durante os primeiros
anos do reinado de
bem quando o território é invadido e tudo se conturba. Luís Filipe, as competições àos partraãs
Não pofíticos foram
violentas. por isso a ascensão
é só isso. A idade em que se cometem mais homicídios da ôurva é càntínua, de 462
é em 183l a 486 em 1932. O máximo
de 20 a 30 anos. Um milhão de homens nesse período do século foi átingido
da em 1839 (s69).
vida cometem 40 homicídios por ano. Ora, toda a juven_
tude dessa idade se encontra então mobilizada; osórimes . lub.:-:: que o protestantismo é uma religião muito
mais individualista do que o catolicismo.
que ela cometeu ou que teria cometido em tempo Cada fiel reali_
de paz za sua fe mais liwemente, dependendo
não entraram nos cálculos da estatística. Se, apesar des_ mais de si mesmo
ou de sua reflexão pessoal. Oiesultado
sas duas causas, o número de homicídios baixou e qu. o, sentimen_
um pou_ tos coletivos comuns a todos os
co, pode-se tet cetteza de que, na realidade, ele haviá membros da Igreja pro_
au_ testante são menos mrmerosos
mentado seriamente. A prova é que em 1g71, quando e menos fortes ou, pelo
os me_
nos, tomam necessariamente
exércitos são dispensados, quando os tribunais podem o indivíduo por objàto. Ora,
se a aptidão para o homicídio é
dedicar a suas funções com maior regularidade, ,ru. incomparaverinente mais for_
."- te nos países católicos do que
ro.puí.", protestantes. Em
que o estado moral do país ainda se tenha modificado
mui_ mldia, os paises católicosta Eurápa
to, constata-se uma elevação considerável. De 339 em fo.ir.""rrl 32 homi_
cídios por um milhar*, os paises p.",".i"rà.
1869, de 307 em 1870, os homicídios passam para 447 nem 4. os
, ou três países que, desse ponto
de visà, estão à fiente de toda
seja, um aumento de 45yo. Desde 1g51, ano excepcional,
Eurgga são não apenas católicos,
como veremos, eles nunca tinham sido tão elevados. l
te católicos: altália, a Espanha
mas fundamentalmen_
As crises políticas têm a mesma influência. Em 1g76, e a Hungria.
ocoÍreram naFrança as eleições do senado e da Câmara
dos
Deputados; os homicídios passam de 409 para 422; x Também
aqui se trata de u1n- erro do original.
mas seria .,por
um milhão" (cf. O suicídio, E. "O cometo
'
Durkheim). N.;; ij
166 LrÇoES DE socDLoGrA DE'/ERES GERAIS 167

O terreno favorável ao desenvolvimento do homicí_


em dias comuns, 7 eraminceftos. O número de casos é mui-
dio é portanto, definitivamente, um estado passional
da to restrito. Mas a preponderância dos dias feriados é tão
consciência pública que tem repercussão natural
nas cons_ acentuada que não poderia ser acidental. No ano, com
ciências particulares. É um crime constituído
de irreflexão, efeito, não há mais do que uns sessenta dias feriados. Eles
de medo espontâneo, de impulso. Todas as paixões,
num deveriam, portanto, fornecer 6 vezes menos casos do que
certo sentido, levam às violências e todas as violências
às os outros dias da semana. Para que, desses homicídios to-
forças homicidas, embora sobretudo aquelas teúam
o efei_ mados ao acaso, o contingente dos dias feriados seja sen-
t9 que tem fins supra-individuais. por conseguinte
, ataxa sivelmente superior aos outros, é preciso que, de maneira
do homicídio testemunha antes de tudo que nossa geral, ele seja muito considerável. A própria distribuição
imora_
lidade está se tornando algo menos pu.riuo, mais dos homicídios dá ensejo a uma observação aniioga. Há
refleti_
do, mais calculado. Essas são, de fato, as características quem se admire em ver o homicídio ligado a um certo es-
de
nossa imoralidade, que se faz notar antes pela tado de atividade, ao passo que um nível tão elevado da
astucia do
que pela violência. Essas características de atividade pode ser considerado antes como normal. Mas
nossa imora_
lidade, aliás, são também as da nossa moral. Também é o que resulta justamente do fato de o crime não estar fo-
ela
está se tornando cadavez mais fria, refletida, ra das condições normais da vida. Pelo próprio fato de um
racional, a
sensibilidade desempenha nela um papel cada vez certo grau de atividade passional sempre ser necessário,
mais
restrito, e é isso que Kant expressava situando paixão sempre há crimes. O essencial é que sua taxa seja ade-
a
fora da moral. O ato moral nos aparece hoje como quada ao estado em que se encontra a sociedade. Uma so-
um ato
de razão. Não há nada surpreendente, aliás, ciedade sem homicídios não é mais pura do que uma socie-
nessa simetria
que observamos entre as características da dade sem paixões1.
moral e da imo_
ralidade. Sabemos, com efeito, que são fatos de
mesma
natuteza e que se esclarecem mutuamente. A imoralidade
não é o contrário da moralidade, assim como a
doença não
é o contrário da saúde, uma e outra são apenas
formas di_
ferentes de um mesmo estado, as duas formas
da vida mo_
ral, as duas formas da vida física.
Assim, tudo o que eleva o nível passional da vida pú_
blica eleva ataxa de homicídio. Os ieriados têm natural_
mente o efeito de intensific ar a vida coletiva, de sobreex_
citar os sentimentos. Ora, de 40 homicídios obserados l. Este capítulo, cujo sentido aliás é completo sem elas, termina com
por quatro linhas cujas palavras estão escritas em abreviatura e são, na maio-
Marro, 19 tinham sido executados em dias feriados, 14 ria, ilegiveis. (N. ed. fr.)

Potrebbero piacerti anche