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Alexandre Pinto
1ª Atualização da Unidade V – Temas mais debatidos pela mídia
Introdução
Olá caro leitor, você que busca se preparar para Concursos Públicos, ou simplesmente busca Entender o
Mundo Contemporâneo, esse material traz alguns dos temas mais debatidos pela imprensa brasileira. Ele
completa seu livro, mas não é uma atualização do mesmo, pois como propusemos no livro, produziremos
sempre os temas mais debatidos pela mídia.
Cito como destaques do nosso Mundo Globalizado, o viés mais econômico do nosso trabalho, a situação de
crise que ainda aflige os EUA e, sobretudo, a Europa. E do outro lado, a Força dos Emergentes que
comentávamos no livro e tem se confirmado.
Com relação à Sustentabilidade o destaque foi o vazamento de petróleo no Golfo do México em campo
operado pela British Petroleum, mas também a emissão de metano pelo gado brasileiro, devido o sucesso do
agronegócio.
Nas Relações Internacionais, as armas nucleares voltaram ao centro do debate, seja pelo acordo EUA‐Rússia ou
pela pressão contra o Irã.
No Brasil Contemporâneo, três destaques: a eterna briga entre as alas conservadora e desenvolvimentista do
governo sobre crescimento, juros e inflação; a discussão sobre a necessidade ou não da construção da Usina de
Belo Monte e as perspectivas do agronegócio brasileiro.
Nessa edição, você pode sentir falta de algum tema debatido pela, como a discussão do processo eleitoral, por
exemplo, já que esse foi disparado o tema mais debatido pela mídia nos últimos seis meses. Isso basicamente
se deve a dois motivos: primeiro, política partidária não cai em prova e, infelizmente, nessas eleições a mídia
tomou partido de forma intensa e vou precisar de mais um tempo para diluir o que é tema importante e o que
é propaganda política; em segundo lugar, comecei a escrever esses temas antes do fim do segundo turno. Esse
esclarecimento se faz necessário nessa primeira edição online. Evitaremos discutir temas que tem pouca
probabilidade de cair em prova e depois de fachada planilha com os principais temas, somente introduziremos
temas que forem imprescindíveis, nesse último caso, os temas não discutidos ficarão para próxima edição.
Uma dica ao ‘concurseiro’ é a opinião sobre o assunto é o que menos importa. O importante é você entender
cada assunto na complexidade dele. Não quero dizer com isso que você não possa ter opinião, você pode e
deve. Algumas vezes me esforço para não deixar a entender minha opinião, outras, sou claramente a favor de
certos posicionamentos, mas o que realmente importa é você. Não que concorde comigo, mas que se intere do
que está sendo debatido, que tenha condições de discutir sobre todos os assuntos, para que você possa fazer
qualquer prova e dissertar sobre qualquer tema numa redação.
Gostaria de terminar lembrando que Conhecimentos Gerais/Atualidades está em quase todo concurso. Mesmo
quando não há uma prova específica, há uma redação sobre temas atuais
Um abraço e boa leitura.
Alexandre Pinto
1
Atualidades
Alexandre Pinto
Capítulo 1 – Mundo Globalizado
1 – Crise global1
a) Recuperação
Com exceção da Europa, o mundo segue se recuperando, ainda que de forma lenta, do tsunami econômico de
setembro de 2008. A ONU tem apontado para a melhora nos investimentos este ano. Na Conferência das
Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), China e Irlanda foram apresentadas como as
primeiras nações a registrar, fluxo de investimento estrangeiro direto nos níveis anteriores aos da recessão
global. Outro dado que representa a recuperação é o avanço mundial no turismo de 7%.
Na América Latina, relatório feito pela CEPAL aponta que aplicações de capital estrangeiro que caíram em 2009
devido à crise estão sendo recuperado e deve crescer até 50% em 2010. O relatório da CEPAL afirma que o
aporte estrangeiro direto na região da América Latina e Caribe deve superar US$ 100 bilhões, após queda de
42% no ano passado. A rápida recuperação latino‐americana, no entanto, tem sido desigual.
Nem por isso os sintomas da grave crise deixarão de ser sentido. Segundo a mesma ONU, a crise impediu que
53 mi deixassem pobreza extrema, desacelerando o alcance dos Objetivos do Milênio no mundo. Apesar disso,
o número total de pobres em 2015 deverá ser 1 bilhão a menos do que em 1990.
b) Fraudes
A recuperação da economia tem sido lenta pela falta de confiança dos investidores. Também pudera, até o
Goldman Sachs, o mais lucrativo banco de investimento da história e único dos “quatro grandes” de Wall Street
a não precisar de verbas do Estado durante a crise econômica foi acusado de fraudar, ao menos, um bilhão de
dólares, e segundo o ProPublica, isso é apenas a ponta do iceberg, para a agência, as atitudes do Goldman são
de causar inveja em Bernard Madoff2.
Muitos bancos venderam títulos lastreados em hipotecas de alto risco, ao mesmo tempo criaram derivativos
apostando na queda desses títulos, o que é, no mínimo, estranho, mas não é ilegal. O Goldman foi além,
segundo a SEC (o similar da Comissão de Valores Monetários – CVM ‐ no Brasil) vendeu títulos propositalmente
concebidos para beneficiar um cliente à custa de outros.
No início de 2007, o fundo de Hedge Paulson & Co. foi ao Goldman disposto a apostar pesado no estouro da
bolha imobiliária. Para isso, precisava de um número suficiente de pessoas apostando no contrário, ou seja, no
crescimento indefinido do mercado imobiliário. O banco atendeu lançando dois bilhões de dólares em títulos
chamados Abacus e mentindo aos compradores dizendo que outro agente financeiro o ACA Management
referendava os papéis. Na verdade, o Paulson escolhia os piores papéis e o ACA os referendava. O ACA também
foi iludido pelo Goldman que apresentava o Paulson como um comprador.
Um dos maiores perdedores da fraude foi o ABN Amro, que teve de ser estatizado e vendido ao Santander.
Quando agora vemos no Brasil o Banco Real sumindo para dar lugar ao Santander, é difícil imaginar que uma
fraude nos EUA levaria ao fim uma das marcas mais antigas e populares de bancos no Brasil, isto é globalização.
Igualmente perigosas para as finanças globais foram as operações do Goldman com o governo da Grécia para
iludir as autoridades da UE quanto ao seu endividamento. As receitas futuras de aeroportos, pedágios e loterias
do Estado foram “trocadas” por dinheiro vivo, o que equivale na prática a contrair empréstimos garantidos por
essas receitas, mas não se revelava como dívida nos demonstrativos oficiais. O JP Morgan realizou operações
semelhantes com a Itália.
c) Regulação
Por tudo isso, a maioria dos analistas não comprometidos com instituições financeiras, defende uma maior
regulação da economia. O governo Obama decidiu reformar o sistema financeiro. Wall Street, no entanto,
partiu para o ataque acusando o presidente de “anticapitalista”, “caluniador”, “cara da máfia de Chicago”. Mas
para o Nobel de economia Paul Krugman, o governo fez uma reforma moderada, quando a maioria dos
cidadãos, indignados com os bônus bilionários distribuídos aos banqueiros (algumas vezes com dinheiro
público!) queria esganá‐los.
1
A discussão da crise global e suas consequências mais perenes para economia global estão no Capítulo 1 da
Unidade 5 pags 163-179.
2
Para uma discussão sobre as falcatruas que levaram a prisão de Madoff pela maior fraude de Wall Street, veja,
“Alavancagem excessiva”. Unidade V, capítulo 1, pag 168.
2
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Para os críticos do neoliberalismo, os banqueiros têm de pagar pela irresponsabilidade que deixou 15 milhões
de pessoas sem emprego, Nouriel Roubini, que primeiro previu o desastre dos subprimes, alega ser um
absurdo deixar os banqueiros a vontade e não aproveitar a oportunidade para criar regras que os impeçam de
repetir os mesmos absurdos.
A alegação dos banqueiros, é que não houve nada de errado com uso de verbas públicas, já que cumpriu seu
objetivo. O importante era salvar a economia, e se os banqueiros lucravam com isso, qual o problema?
Os banqueiros não se interessam pelo passado ou pelo futuro, somente pela próxima operação, não enxergam
nada além de seus próprios lucros, comportando‐se como crianças mimadas, que são. Desde os tempos de
Jimmy Carter, quando as regulações criadas por Roosevelt começaram a ser destruídas, os governos não
somente permitem que façam o que quiserem, mas os apóiam. Qualquer tentativa, como a do governo Obama
ou do G203 de evitar a perda dos contribuintes leva a choradeira da turma da bufunfa.
d) Crise na Europa
Em 1º de maio, um grupo de ativistas gregos, sobretudo estudantes, saiu às ruas para protestar e invadiu lojas,
destruiu vidraças de bancos e travou batalhas com a polícia pelas ruas de Atenas. Dois dias depois professores
invadiram a TV estatal e leram um manifesto contra o FMI e o congelamento das contratações. No quarto dia
uma greve geral de 48 horas, com direito a milhares de pessoas junto ao parlamento grego protestando contra
o pacote de medidas anunciada pelo governo. Ao final, três pessoas morreram.
O motivo do protesto? Os gregos que já estavam sufocados por uma taxa de desemprego de 10,3%, terão que
arcar com as conseqüências do pacote anunciado pelo governo para aliviar a crise econômica que se abate
sobre o país4. Os impostos sobre o valor agregado subirão de 21% para 23%, as aposentadorias serão adiadas
por pelo menos mais três anos e terão redução brusca em seu valor, haverá “liberalização” dos transportes, da
energia e das profissões regulamentadas, que segundo críticos, levará a tarifas mais altas e salários mais baixos.
Além disso, os funcionários públicos terão seus salários congelados até, pelo menos 2014, limitação ou
eliminação nos 13º e 14º salários e fim de mais de 8% das licenças previstas.
Ironicamente, as sonegações de impostos pelos mais ricos parece algo comum. Segundo o próprio governo, a
estimativa é de 23 bilhões de euros, algo em torno de 10% do PIB. Pessoas que declaram receber menos de 12
mil euros por ano, portanto isentas, mas têm carros, casa própria, casa de campo, etc. Apenas 324 moradores
declararam ao fisco terem piscinas em casa, mas o Google Earth mostra 16.974 residências nessa situação.
Pior foi a reação dos países da UE em relação à situação grega. A maioria de seus políticos e também suas
populações foi contra o socorro dado à Grécia, porém, 3/4 da dívida grega, pública e privada, está nas mãos de
bancos e seguradoras do continente e as importações gregas são feitas majoritariamente (62%) do continente,
ou seja, se a Grécia quebrar, os demais países da Europa serão os mais prejudicados.
A situação é mais grave ainda quando se leva em conta que a crise na Grécia é apenas a ponta do iceberg,
todos os Piigs estão contaminados, com dívida que somadas chegam a 1,54 trilhão de euros com outros países
europeus. Em 27 de abril, Portugal teve sua classificação de risco rebaixada, no dia seguinte foi a vez da
Espanha. Se esses países passarem pelo mesmo problema da Grécia poderia ser o fim do próprio Euro.
e) A UE a beira do caos5
A Bélgica corre risco de sumir do mapa. A crise econômica exacerbou as dificuldades da convivência das duas
etnias belgas, os flamengos e os valões. Em 13 de junho, o partido mais votado foi a Nova Aliança Flamenga,
direitista, separatista e populista, cujo líder se recusa a assumir o governo de um país que não acreditam, e o
líder do segundo partido mais votado, o Socialista, teme ser usado pelos separatistas. As tensões também têm
seu viés econômico. Os conservadores de Flandres defendem a redução dos gastos públicos enquanto os
socialistas da Valônia querem mais bem‐estar social e controle dos preços.
3
Para conhecimento das propostas do G20 para regulação financeira internacional, veja “O G20 e o Consenso de
Londres”. Unidade 1, Capítulo 5, pag 27.
4
Para um melhor entendimento das causas da crise grega, que afeta toda Europa, veja “A bolha Européia”.
Unidade 5, capítulo 1, pag 175
5
Inspirado no artigo de COSTA, Antonio Luiz M.C. Um Continente em Xeque, in Carta Capital, ano XV, nº
601, de 23 de junho de 2010.
3
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Cisões semelhantes ocorrem na Europa como um todo, observou The Economist. O sul, liderado por Paris,
acredita em estímulos fiscais para sair da crise, e o norte, liderado por Berlim, mostra‐se obcecado por
disciplina fiscal e competitividade.
O superávit alemão em conta corrente é de 5,5% do PIB, quase tão alto quanto o chinês (6,2%) enquanto a
zona do Euro como um todo tem as contas equilibradas, em torno de 0,2% do PIB. Isso mostra que o superávit
alemão foi conseguido dentro da Europa, em outras palavras, para que a Alemanha tivesse esse superávit
elevado outros países como Grécia, Portugal, Espanha, Irlanda e Itália tiveram que ter suas contas deficitárias.
O corte de gastos que esses países estão sendo obrigados a fazer, levará a redução do superávit alemão, divido
a diminuição das exportações, o que na prática pode significar menos empregos na Alemanha.
Para que a Europa como um todo seja significativamente superavitária, há uma grande dependência dos EUA,
que exerceram o papel de importador de última instância durante muito tempo, financiando esse déficit com
emissões monetárias e graças ao poder sem par do dólar como moeda de conta internacional. O
endividamento excessivo dos EUA gerou o estouro da bolha das hipotecas de alto risco 2008/2009 e os EUA
não tem demonstrado mais disposição para manter a depreciação de sua capacidade econômica6, através de
endividamento em excesso.
A solução encontrada pelos europeus para enfrentar a crise é um autoflagelo. O corte de gastos anunciados
pelos governos dos PIIGS afetados e o corte de gastos anunciados em países centrais como Alemanha e Reino
Unido poderá vir a ser catastrófica.
O caso da Alemanha é especialmente perverso, porque o reequilíbrio da economia européia deveria passar
pelo crescimento da demanda interna dos países superavitários e compensar a redução das importações por
países em dificuldades. Cortes de gastos públicos fariam sentido se houvesse superaquecimento da economia,
espirais inflacionárias ou formação de bolhas, nada disso está nem próximo de acontecer. Aparentemente os
governos correm para satisfazer as exigências do mercado. Ironicamente, a maior parcela de endividamento
dos governos dos países centrais se deve ao socorro que fora feito ao sistema financeiro.
A comemoração dos defensores do neoliberalismo foi estampada nos jornais. Em 13 de maio o jornal O Globo
estampou, de forma exultante, em sua manchete principal “Espanha: socialista corta pensão e salários” e no
dia seguinte: “O estado de bem‐estar social na encruzilhada. Portugal e Reino Unido também cortam gastos”.
Na prática, as receitas do mercado só fizeram agravar a situação no bloco.
A Alemanha ao tentar “salvar” o euro com uma política de austeridade fiscal, mesmo que ninguém desconfie
dos títulos alemães, disparou o gatilho de um ciclo nada virtuoso de redução dos gastos e retração do sistema
de bem‐estar social, que embora tenha alegrado os neoliberais, que viviam, como vimos às turras com as ondas
de regulação, não acalmou os mercados como previam e os títulos dos PIIGS, continuam mal avaliados.
Ao reduzir o bem‐estar dos países, a U.E. pode disparar uma onda de enfrentamento popular aos ditames das
autoridades supranacionais. No qual os protestos gregos, seriam somente o início de uma grande onda. Os
povos chamados a pagar a conta não se sentem devidamente representado em Bruxelas, capital da Bélgica e
também da União Européia. As grandes decisões do bloco são tomadas sem consentimento da maioria dos
cidadãos, os governos não desejam ceder mais poder para a UE e os países centrais sabem que uma ampliação
legitimamente democrática, da representação proporcional dos países do leste europeu, diluiria ainda mais
seus poderes.
2 – Os BRIC7: Potências Emergentes
Em abril, uma reforma no Banco Mundial (Bird) ampliou poder de voto dos emergentes, que passaram a somar
pouco mais de 47% do total. Brasil e México foram os principais beneficiados pela mudança, o que na prática
significa dizer que a América Latina terá mais poder na instituição. Na esteira desse acontecimento, o
presidente do Bird Robert Zoellick disse que o “conceito de 3º Mundo é antigo e ultrapassado”', e que essa
idéia já não se aplica mais à economia global multipolar.
As frases do presidente do Bird fazem mais sentido quando levamos em conta quatro países emergentes,
Brasil, Rússia, Índia e China, os chamados BRIC. Desde a invenção de Jim O’Neil até hoje, a idéia dos BRIC era
muito mais um indicativo de investimento do que um grupo organizado. Em 15 de abril, entretanto, eles se
6
Para entendimento, veja “Conseqüências da Crise – Fim do sistema de financiamento das exportações”.
Unidade 5, capítulo 1, pag 170.
7
Para entendimento da criação do acrônimo BRIC e o crescimento de sua relevância internacional, veja “A
balança virou: a força dos emergentes”. Unidade 5, Capítulo, pag 177.
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reuniram mais uma vez em Brasília para traçar estratégias globais em conjunto, no ano passado já haviam se
reunido na Rússia, e a idéia começa a tomar forma.
Os BRIC são importantes pelo seu peso econômico. Eles são as quatro maiores economias fora da OCDE, uma
espécie de clube dos ricos. São também as únicas economias em desenvolvimento com PIBs anuais superiores
a um trilhão de dólares e atravessaram, com exceção da Rússia, o tsunami provocado pelas hipotecas de alto
risco8 bem melhor do que os tidos países ricos.
A China, como sabemos, é o maior destaque e já é o maior exportador mundial9.
Talvez o dado mais relevante dos BRIC é que eles acumulam 40% das reservas cambiais do mundo. Novamente
o destaque é a China, que 2,4 trilhões de dólares, o suficiente para comprar dois terços das empresas cotadas
na Nasdaq, a bolsa eletrônica de Nova York. Para se ter uma noção da grandeza dessas reservas, se os BRIC
decidissem usar apenas um sexto delas poderiam criar um fundo equivalente ao FMI.
Enquanto a maioria dos países ocidentais se esforça para conter os déficits orçamentários e as dívidas
crescentes, a dívida pública dos BRIC em geral é modesta e estável, a exceção é a Índia. Todos têm grandes
mercados internos, com grandes índices de pobreza, e por isso política de crescimento econômico e
antipobreza são prioridades nas suas agendas.
No entanto, não devemos nos iludir com a capacidade dos BRIC de comandar ou mesmo coordenar uma
agenda global. Os países competem tanto entre si como com os EUA ou a UE. Três são potências nucleares, o
Brasil abriu mão do programa de armas nucleares no início dos anos 1990. Somente dois (Rússia e China) têm
assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. A Rússia tem 15 mil dólares de renda per capta, o
Brasil 8,5 mil, a China 6,6 mil e a Índia apenas 3 mil dólares o que mostra a disparidade de suas economias.
Muito embora todos tenham grandes territórios e populações, a comparação das populações de China (1,34
bilhão) e Índia (1,1 bilhão) com as populações de Brasil (190 milhões) e Rússia (140 milhões) é por demais
desigual.
Há ainda mais uma coisa que os BRIC têm em comum, mas que não é motivo para comemorar: a China é o
maior emissor de carbono do mundo10, a Rússia é o terceiro e a Índia é o quarto, figurando os BRIC na lista da
vergonha, daqueles que mais contribuem para o aquecimento global. O Brasil é o único que se destaca, sendo a
décima11 economia do mundo, é apenas o 18º maior emissor.
3 – Ciência & Tecnologia
a) Lançamento do Ipad
A Apple anunciou o lançamento do novo Ipad, um computador portátil com altíssima interatividade. Em
princípio, mas umas das muitas inovações, entretanto, os norte‐americanos enfrentam fila para ter Ipad e as
vendas surpreenderam e chegaram a 700 mil em poucos dias.
A que se deve o sucesso do Ipad? Talvez esteja mais ligado ao histórico de sucesso da Apple, do que na virtude
ou pretensão da nova tecnologia. Dito de outra forma, se uma empresa desconhecida tivesse afirmando todas
as inovações do Ipad, elas seriam recebidas com entusiasmo, mas também com desconfiança.
Em 1977 Steve Jobs e Steve Wozniak da Apple lançaram o “Apple II”, o primeiro “computador caseiro”, a idéia
foi tão inovadora que, alguns anos depois (1981), a IBM lançou o Computador Pessoal (Personal Computer –
PC, em inglês), nome pelo qual ficariam conhecidos todos os computadores doméstico: os “PCs”. Já em 1985, a
primeira versão do sistema operacional Windows fora lançado, e a versão aprimorada, o Windows 3.0, lançado
em 1990, tornou a utilização dos PCs muito mais fácil. O surgimento desses computadores com o Windows
tornou, realmente, o uso dos computadores pessoal. Agora as pessoas poderiam utilizar os computadores sem
necessariamente serem programadores e nas suas próprias casas. Esse feito ampliou o limite da quantidade de
informação que um único indivíduo poderia acumular, criar, manipular e difundir.
Na prática, o PC com Windows permitiu que milhões de indivíduos se tornassem, pela primeira vez, autores do
seu próprio conteúdo em forma digital. Esse exército passou a acessar e criar conteúdos sem precisar ser um
8
Para entendimento da crise econômica provocada pelas hipotecas de alto risco nos EUA, “A crise econômica
mundial”. Unidade 5, capítulo 1, pag 165.
9
Para entendimento do papel da China na economia globalizada, veja “China a Potência mais dinâmica do
mundo”. Unidade 1, capítulo 6, pag 29.
10
Lista dos maiores emissores de carbono do mundo (tradução livre de: List of countries by carbon dioxide
emissions) in: [http://mdgs.un.org/unsd/mdg/SeriesDetail.aspx?srid=749&crid=]
11
Embora o Brasil venha a se consolidar este como 8º maior economia do mundo, o dado da ONU referente as
emissões é de 2007, quando o Brasil era a 10ª maior economia.
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privilegiado, entendido de computação ou trabalhador de uma empresa na qual poderia ter acesso a esse
mundo digital. Pense no que uma pessoa pode fazer com uma máquina de escrever, agora pense no que uma
pessoa pode fazer com um PC! Um dos lemas de Bill Gates12 para Microsoft era que o objetivo da empresa era
dar a cada indivíduo “IAYF” – Informação na ponta dos dedos (information at your fingertips, em inglês).
O passo seguinte foi a descoberta de que a união dos PCs com Windows a rede telefônica, através um modem
dial‐up, permitiria que computares do mundo inteiro se conectarem. Inicialmente essa tarefa não era fácil,
pois, os parâmetros eram diferentes, quando a Word Wide Web, padronizou o sistema com seu protocolo
www, a informação se difundiu como nunca antes fora possível. A Imprensa, o Rádio e a Televisão foram
revolucionários na difusão da informação, mas a interatividade da internet era inimaginável. Agora se faz
representação de tudo em formato digital, a difusão de redes sociais é somente a sequência quase lógica dessa
evolução.
Se nos séculos XV e XVI a expansão marítima globalizou os Estados, nos séculos XVIII e XIX as Revoluções
Industrias globalizaram as empresas, no final do século XX e início do XXI a Web está globalizando as pessoas e
o primeiro passo relevante para isso foi dado pela Apple, que agora promete inovar ainda mais a navegação na
Web, com o novo Ipad.
b) Empregos.Com
Para o bem ou para o mal a tecnologia é um caminho sem volta. Afeta a tudo e todos, a forma como nos
relacionamos e os tipos de empregos que teremos. Alguns estudos tem se pautado na perspectiva das
mudanças que a tecnologia tem proporcionado no mercado de trabalho. Além da terceirização e da
terciarização13, os empregos têm se tornado “ponto com”. Na verdade, a difusão cada vez maior da rede e de
seus benefícios multifacetados, tem levado milhões de pessoas a tornarem profissionais independentes,
freelancers em inglês. Muitos desses trabalhadores têm procurado esse tipo de trabalho em virtude da crise
global que fez sumir milhões de vagas formais no mundo, mas também há aqueles que têm optado por essa
alternativa por preferirem ficar em casa, por comodidade ou para ficar próximo e poder cuidar dos seus filhos
ou pais.
Logicamente, foi o desenvolvimento tecnológico que permitiu esse avanço. A combinação de conexões rápidas
a internet em qualquer lugar e o acesso ao computador, cada vez mais barato, e softwares que permitem
monitorar e administrar funcionários remotos permitiu o avanço desses últimos anos. Segundo a empresa de
pesquisa de mercado IDC, havia 12 milhões de freelancers nos EUA em 2009.
É preciso entretanto não superestimar esse efeito para todo o mundo, Computador pessoal e acesso a rede de
banda larga, embora esteja em grande processo de desenvolvimento, são ainda bastante restritos em boa
parte do mundo. O Brasil nesse campo é emblemático, embora seja um dos campeões da rede em quase tudo,
mais da metade de seus lares não tem acesso a internet.
Em 2020, talvez apenas 1% a 2% da mão de obra será de profissionais independentes, mas quando a maioria da
população já tiver acesso ao computador e a rede, e uma nova geração, já nascida num mundo tomado pela
tecnologia estiver no poder, os empregos remotos darão um salto espetacular, afirmam os especialistas.
c) Genética
A genética é, de longe, a ciência que deixa o senso comum mais perplexo. As muitas boas notícias14 são sempre
ofuscadas pelas polêmicas criadas com setores mais conservadores. Em 19 de maio, tivemos uma dessas
inovações polêmicas, o cientista Craig Venter anuncio, através da revista científica Science, que sua equipe
científica havia criado pela primeira vez uma vida em laboratório. O experimento seria uma bactéria viva criada
a partir de material sintético, inserindo um genoma produzido em computador em uma célula. O projeto seria
criar a possibilidade dotar bactéria com funções pré‐estabelecidas, como produzir combustível fóssil ou
medicamento.
12
Bill Gates é co-fundador da Microsofit e considerado o homem mais rico do mundo.
13
Não confundir terceirização, quando certos serviços são entregues a execução de terceiros; e terciarização,
quando a mão de obra migra para o setor terciário da economia, o de comércio e serviços.
14
Somente em uma semana em junho foram diversas descobertas positivas como em 09 de junho, cientistas
anunciaram que o Genoma do autismo poderia levar a tratamentos; ou em 24 de junho, que as células tronco são
capazes curar certos tipos de cegueira; Em 24 de junho, a mais impressionante, cientistas em experiências com
ratos, criaram um Pulmão em laboratório.
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O feito, em si memorável, no entanto, gerou um conjunto de críticas. O pesquisador é acusado por parte da
comunidade científica de ser “viciado em aplausos”, ou seja, estar muito mais preocupado em fama e dinheiro
do que no avanço da ciência. Assim, enquanto alguns o aplaudiam outros ficavam apáticos ou céticos.
Venter desperta esses sentimentos antagônicos na comunidade científica desde o programa para decodificar
os genes humanos, o Projeto Genoma. O Projeto demorou 15 anos e consumiu cerca de 5 bilhões de dólares,
mas Venter , que havia se associado a equipe de pesquisadores, anunciou que poderia fazer o mapeamento
bem mais rapidamente e com menos custo com capital privado. A tensão ficaria ainda maior quando Venter
anunciou que patentearia as suas descobertas. Alguns alegam que Venter chegou primeiro ao final do
mapeamento genético, porém o anúncio fora feito conjuntamente pelas equipes sob pressão do presidente
dos EUA, Bill Clinton.
Para além das disputas acadêmicas, a descoberta de Venter, se confirmada pela comunidade cientifica, abrirá
outra frente de batalha com os setores religiosos. Para esses setores mais conservadores, a genética não era
capaz de produzir vida, apenas manipulava a vida originalmente criada por Deus, o feito de Venter desmente
essa assertiva.
4 – Diretos Humanos
a) Fome
Todos os anos, 18 milhões de seres humanos morrem de problemas relacionados à pobreza. Desse total, 10
milhões são crianças. Em 2008, o mundo comemorou a segunda maior colheita da história, mesmo assim, 5
milhões de crianças morreram de fome devido a falta de acesso à comida. Estes e outros dados, estão no
estudo do economista argentino Bernardo Kliksberg, que trabalha no Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (Pnud) e em outros organismos multilaterais como Unesco e Unicef.
Convivemos no mundo com 3 bilhões de pobres, dos quais 1,2 bilhão são extremamente pobres e 2,6 bilhões
sequer tem um banheiro. Uma em cada seis pessoas passa fome, num mundo onde se produz alimentos para
uma população maior do que a atual.
Esses fatos se constituem em “Armadilhas da pobreza”, ou seja, crianças que, por nascer na pobreza,
enfrentam trabalho precoce, não conseguem concluir o secundário e, portanto, estão destinadas a ficar fora da
economia formal. Uma gestão social eficiente deve atuar sobre o conjunto de causas, somando‐se políticas
públicas ativas à responsabilidade social das empresas privadas e à mobilização da sociedade civil. A mídia
pode dar grande contribuição, tornado visível o invisível (os pobres), mostrando as boas práticas sociais,
divulgando as experiências comparativas e elevando o nível de qualidade do debate social. Quanto mais
próximos estiverem dos problemas reais da população, como a pobreza, mais êxitos os meios de comunicação
terão.
No estudo a América Latina tem enfoque destacado. O fato de a América Latina ser a região mais desigual do
mundo é a chave para se entender a intensidade da pobreza da região e, sem dúvidas, as políticas ortodoxas
são responsáveis por aumentar ainda mais a distância entre ricos e pobres.
Entretanto, o autor revela que, novos ventos sopram na América Latina, onde os cidadãos buscam por
diferentes caminhos, uma economia com rosto humano. O reflexo disso é uma nova geração de políticas
sociais com maior destinação de recursos, mais ativa, com melhor gestão, e buscando a participação das
comunidades atendidas.
Há progresso em toda América Latina mas há que se redobrar os esforços. Ainda há 190 milhões de pobres na
região tão rica potencialmente. Mais de um em cada três latino‐americanos carecem do essencial. O motor é
impulsionar a participação cidadã. Quanto maior ela for, melhor qualidade terão as políticas públicas.
Bons exemplos, segundo o autor, são os Programas como o Fome Zero e o Bolsa Família, implementados no
Brasil pelo presidente Lula, ganharam respeito e se transformaram em referência internacional por vários
motivos; têm a maior escala, jamais conhecida em matéria de política social no continente; conseguem maior
distribuição progressiva de renda para os mais pobres; melhoram sua situação e envolvem os pais na
responsabilidades relacionadas a educação e saúde para com seus filhos; e também conseguem conectar os
pobres aos serviços do Estado.
b) Saúde
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Comitê da ONU avaliou que a reação dos países e da OMS ao H1N1 foi positiva, mas a gripe aviária ainda é uma
ameaça à saúde humana. A doença foi eliminada em mais de 60 países, todavia ainda persiste no Egito, China,
Indonésia, Bangladesh e Vietnã. FAO15 diz que até extinção do vírus haverá riscos.
Fundo de População das Nações Unidas lamenta número anual de óbitos na 1ª semana de vida e cobra acesso
à saúde materna e a trabalhos de obstetrícia. Segundo a ONU, Serviços inadequados ainda matam 3 milhões de
recém‐nascidos e a diarréia mata mais de 4.000 crianças por dia. Número abrange somente as menores de 5
anos. Documento afirma ainda que mais da metade das escolas primárias em 60 países não possuem
saneamento adequado.
Outro problema internacional é a pecuária. Segundo a FAO alerta para novos surtos de febre aftosa. Agência da
ONU pede aumento da vigilância global sobre a doença, que é altamente contagiosa entre bovinos, ovinos,
caprinos e suínos, após três visitas recentes ao Japão e à Coreia do Sul. Campanha de vacinação começa sábado
no Brasil.
c) Justiça
A boa notícia do período foi a condenação, ainda que tardia, pelo tribunal federal argentino de Benito Bignone,
último ditador do país a 25 anos de prisão. Os últimos meses do ditador foram dedicados a destruir arquivos
relacionados a prisão, tortura e assassinatos de opositores e a promulgar uma anistia geral aos militares, que
diferente do Brasil não foi considerada ampla e irrestrita pelo sistema democrático.
Em 1976, Bignone comandou a ocupação militar do Hospital Posadas, transformado em centro de detenção e
tortura. Com acusação de dar assistência a guerrilheiros, foram presos e torturados no mínimo 38 médicos,
quatro dos quais continuam desaparecidos. Bignone também dirigiu o Campo de Mayo, uma das principais
bases e o principal centro de tortura e execução de presos políticos.
Bignone foi condenado por sequestros, assassinatos e desaparecimentos.
No mais, são dias difíceis para os direitos humanos. A carreira do juiz espanhol Baltazar Garzón, que em 1988
fez prender o ex‐ditador chileno Augusto Pinochet e desde então ganhou o respeito dos defensores dos
direitos humanos investigando crimes das ditaduras sul‐americanas, o terrorismo dos separatistas bascos e os
abusos dos EUA em Guantánamo, corre o risco de ser encerrada.
O Supremo Tribunal o indiciou por violar a anistia de 1977 com investigação, iniciada em outubro de 2008,
sobre 114 mil desaparecidos da ditadura franquista. O relator do processo foi Adolfo Prego, um público
defensor da ditadura, que aceitou a denúncia movida por três organizações surgidas da cisão da Falange, o
partido fascista espanhol.
O juiz argumenta que seqüestro é crime continuado e a anistia não se aplica a crimes contra a humanidade e
teve a seu lado, além do apoio popular, testemunho de promotores e juízes do Tribunal Penal Internacional e
da Suprema Corte argentina. Nada adiantou, o arguto defensor dos direitos humanos foi suspenso.
A condenação de um juiz por investigar crimes contra a humanidade não tem precedentes no mundo. Somente
confirma que a transição espanhola para a democracia, assim como a brasileira, não se completou.
Ao choro de Garzon, após ser suspenso pelo judiciário espanhol, soma‐se o daqueles que defendem o
humanismo e os parentes das vítimas das ditaduras na Espanha e no mundo.
5 ‐ Mídia
No dia 03 de junho, Dia da Liberdade de Imprensa, a Unesco pediu silêncio por 77 jornalistas mortos. A agência
da ONU lembrou jornalistas que morreram no ano passado no exercício da profissão. A situação é mais trágica
no México16, de longe, o país com o maior número de homicídios de jornalistas. Mas em países como
Honduras, a situação também é grave, somente em março cinco jornalistas morrem foram assassinados. E essa
não é a pior notícia em relação a liberdade de informação
Para democracia, a pior notícia é que a decadência mundial dos meios de comunicação tem acelerado a
concentração da propriedade nas mãos de poucos magnatas.
15
A FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) é uma agência da ONU e tem por
objetivo elevar os níveis de nutrição e de desenvolvimento rural.
16
Para entendimento da situação da crise política no México hoje veja “México: Livre Comércio, Drogas e
Guerra ”, para o entendimento geral da crise que envolve a mídia veja no, “Tensões Midiáticas”. Unidade 5,
capítulo 3, pag 216 e da Unidade 5, capítulo 1,pag.180, respectivamente.
8
Atualidades
Alexandre Pinto
Não obstante o momento ruim, o célebre Carl Bernstein, jornalista do Washington Post que, em parceria com o
colega Bob Woodward, desvendou os mistérios do caso Watergate e provocou a renúncia do presidente dos
EUA Richard Nixon, fez meia culpa, alegando que a mídia dilapida seu único patrimônio: a veracidade das
informações. “Devemos encorajar uma nova cultura de responsabilidade, do contrário não seremos levados a
sério quando trouxermos questões relativas à liberdade de expressão”. “Se usarmos mal essa liberdade,
serviremos ao interesse da ignorância e da tirania”, disparou em seminário no Brasil no início de maio.
6 – Pedofilia na Igreja Católica17
A Igreja Católica decidiu, enfim, reagir e sair do córner que se encontrava em virtude das acusações
sistemáticas de pedofilia contra a eclésia. O Papa recebeu vitimas de abusos e chorou com elas.
Aparentemente, poderia ser visto como jogo de cena, mas ao discursar que “perdão não substitui a justiça”,
demonstrou um avanço, em relação a posição anterior, que de forma deliberada tentava encobrir os casos de
pedofilia, como discurso do bispo do Rio Grande do Sul, que jogou a culpa na sociedade, alegando que a
sociedade é que seria pedófila18.
No entanto, o esforço deu em nada. O caso do referendo Lawrence Murphy, denunciado pelo New York Times,
caiu como uma bomba sob a cúpula católica. Murphy, diretor de uma instituição para meninos surdos em
Wisconsin, entre 1950 e 1964 violentou 200 crianças. A aterradora história chegou ao Vaticano somente em
1996, quando o Cardeal Ratzinger, hoje Papa Bento XVI, era prefeito da Congregação Doutrina da Fé, herdeira
da inquisição, seu braço direito era Tarciso Bertone, atual secretário de Estado, e Murphy ainda estava vivo.
A análise do caso se arrastou por dias anos e o reverendo pedófilo morreu. A Igreja então, como de praxe,
silenciou e o caso somente veio a tono em abril com a referida reportagem do jornal de nova‐iorquino.
Agora, os norte‐americanos querem levar Papa a tribunal. Se a idéia for a frente, o estrago será irreparável.
Mesmo que não seja possível punir o papa, chefe de Estado do Vaticano, o comparecimento de sua santidade a
um tribunal, algo improvável, ou a sua condenação a revelia, seria uma mancha na imagem da Igreja.
7 ‐ Notas:
Acidente Aéreo. Para quem acredita em milagres, o dia 12 de maio foi um marco. Um menino holandês de 8
anos foi o único sobrevivente na queda de um Airbus A330‐200 na Líbia, minutos antes da aterrissagem no
aeroporto de Trípoli. O menino teve várias fraturas nas pernas, mas foi operado, e se recupera bem. A
aeronave saíra de Johannesburgo, na África do Sul, e a maior parte dos passageiros faria conexão para a
Europa. Todas as outras 103 pessoas a bordo morreram. Em 2009, uma criança também foi a única
sobrevivente na queda de outro Airbus na África.
Indígenas. Bird chama atenção para sofrimento indígena. Relatório do Banco Mundial lançado em fórum na
sede da ONU, em Nova York, afirma que, embora representem somente 4,4% da população global, índios estão
entre os 10% mais pobres.
Sistema Prisional. “A América Latina não dá dignidade aos presos”, palavras do ministro Cezar Peluso,
presidente do Supremo Tribunal Federal, em congresso da ONU em Salvador, no dia 23 de abril, explicita o
desleixo do sistema prisional no continente. Estranhamente, os setores mais conservadores da sociedade ainda
acham que há “muitas regalias” aos presos. Ao contrário dos argumentos desses setores, o desleixo nos
presídios permitiu, por exemplo, a criação das principais organizações criminosas do país, como o Comando
Vermelho no Rio de Janeiro e o Primeiro Comando da Capital em São Paulo.
17
Para ampliar a discussão sobre o problema da pedofilia na Igreja, veja: “Pedofilia na Igreja Romana”. Unidade
5, capítulo 1, pag 182.
18
O Globo, 05 de maio de 2010.
9
Atualidades
Alexandre Pinto
Capítulo 2 – Meio Ambiente e Sustentabilidade
1. Desastres
a) Golfo do México
Em 20 de abril, uma explosão no campo Deepwater, operado pela British Petroleum no Golfo do México se
transformou no maior desastre ambiental dos EUA, quiçá do mundo. A oposição republicana decidiu que o
gigantesco vazamento de petróleo na costa da Lousiana seria o equivalente para o governo Obama do que foi o
furacão Katrina para o governo Bush, sobretudo devido a resposta lenta dada pelo governo.
Todavia, as diferenças são enormes. O governo Bush sabia da chegada do Katrina, teve tempo para se preparar,
mas o presidente Bush apareceu comemorando o aniversário do senador John MacCain, e o vice‐presidente
Dick Cheney tirou férias. Mesmo a clara demora do governo Obama, deve‐se mais a falta de instrumentos,
devido a desregulamentação defendida pelos republicanos, do que a inoperância.
Outras acusações, como a de que Obama foi condescendente com a indústria petrolífera por ter recebido cerca
de 900 mil dólares em doação para campanha não se sustentam, já que seu adversário republicano John
MacCain recebera 2,4 milhões.
Subtraindo‐se a disputa partidária, a atuação dos governos dos EUA no episódio é lamentável. Um relatório do
Departamento do Interior mostrou que é rotina para os inspetores do MMS (Serviço de Administração de
Minerais) aceitar presentes de empresas que deveriam fiscalizar. Muitos dão questionários de inspeção para
que as empresas para preencham. Tudo isso desde muito antes de Obama, é verdade, mas o que ele fez para
acabar com as práticas corruptas?
Na avaliação técnica do desastre, a situação também é grave. No Brasil, por exemplo, a segurança de petróleo
em alto‐mar é maior, especialmente por conta de um dispositivo acionado por controle remoto que
interrompe a extração em casos de acidentes. Sem tal dispositivo, a British gastou 13,6 bilhões de dólares na
operação, levou três meses e vinte dias para o fechamento do poço, corroeu ainda mais a imagem do
presidente Obama e causou danos incalculáveis ao meio ambiente.
Obama compreendeu bem o problema. Segundo ele, o “vazamento de óleo e o 11 de Setembro ambiental”.
Esse, entre outros problemas, como o desgaste para reforma da saúde, explicam a desmobilização de setores
progressistas e a mobilização dos setores conservadores da sociedade norte‐americana, o que viria a se
confirmar no desastre eleitoral no dia 02 de novembro.
b) Haiti19
Depois de todo alvoroço midiático em torno da tragédia humanitária causada pelos terremotos no Haiti, a
imprensa internacional, mais uma vez, esqueceu‐se do país. A situação no Haiti ainda é terrível. Segundo a
subsecretária Asha‐Rose Migiro da ONU, apesar do registro de alguns avanços em educação e infraestrutura
desde o terremoto de janeiro, caos ainda assola o país caribenho. Somente no início de junho foi completada a
primeira fase de realojamentos. Na qual pouco mais de 7 mil pessoas deixaram áreas de risco na capital, Porto
Príncipe, com ajuda da agência da ONU para migrações, num total de 3 milhões desabrigados. O próprio
presidente da ONU alertou para momento de 'alto risco' no Haiti. Em carta ao Conselho de Segurança, Ban Ki‐
moon reforçou a necessidade de implementação de metas em política, segurança, proteção e reconstrução do
país.
Não obstante, houve avanços. O Banco Mundial anunciou o fim da dívida do Haiti e prometeu disponibilizar
US$ 479 mi, até junho de 2011, para recuperação e desenvolvimento do país. Segundo o UNICEF, a resposta
rápida evitou uma crise maior no Haiti, desde terremoto, número de mortes por doenças ou desnutrição não
teve aumento significativo, até pelo menos o surto recente de cólera.
O Brasil foi um dos países que mais contribuíram, somente para agricultura foram R$ 3,5 milhões. O valor foi
repassado à FAO e será usado na compra e distribuição de sementes, fertilizantes, ferramentas e outros
insumos agrícolas para famílias haitianas, que se recuperam do terremoto.
2. Aquecimento Global20: o Brasil no cento do debate
19
Para uma discussão sobre a tragédia no Haiti veja “Fúria da Natureza, Tragédia e Humanismo: as lições dos
terremotos que abalaram o Haiti e o Chile”. Unidade 5, capítulo 2, pag. 195.
10
Atualidades
Alexandre Pinto
Em 22 de abril, foi comemorado o Dia Internacional da Terra. O secretário‐geral da ONU afirmou que as
“mudanças climáticas e alterações no ozônio são os principais exemplos da falta de proteção”. No caso
específicos das mudanças climáticas, o Brasil, embora ainda seja um país cujo crescimento se dá com baixa
emissão de carbono, está no centro do debate.
O caminho da sustentabilidade global não pode avançar sem o engajamento do Brasil. Sobretudo por causa da
Amazônia, mas também pelo fato do Brasil ter o maior rebanho bovino do mundo, o que não necessariamente
é motivo para comemoração. Com 205 bilhões de cabeças de gado, faturamento de 250 bilhões de reais e
perspectiva de crescimento bastante alta – só no primeiro semestre deste ano as exportações cresceram 40% ‐
o que preocupa os ambientalistas é a emissão de gases poluidores pelo rebanho.
As críticas aos pecuaristas vêm de todos os lados: ambientalistas, autoridades de saúde, grupos vegetarianos e
até de outros produtores rurais. Os pecuaristas brasileiros são acusados de desmatar a Amazônia e o Cerrado,
consumir água em excesso, poluir rios, contaminar áreas de pastagens, fazer lavagem de dinheiro, de fazerem
mal a saúde humana e ampliar o efeito estufa pela ampliação da emissão de metano.
Os pecuaristas, por sua vez, defendem‐se dizendo que produzem 10% da riqueza nacional, dólares para a
balança comercial e empregos no interior, diminuindo a pressão dos centros urbanos.
Segundo a FAO, a pecuária mundial é a principal responsável pelas mudanças climáticas. As fazendas de gado
respondem por 18% das emissões de gases do efeito estufa, especialmente pela emissão de metano no
processo digestivo dos animais, mas também pela derrubada de florestas. O índice supera o dos transportes,
responsável por 11% das emissões, até então a maior vilão. A FAO chega a propor uma taxa sobre a carne, de
forma que desestimule o consumo.
Voltando para o caso brasileiro, a pecuária é o maior responsável pela destruição de biomas importantes como
a Mata Atlântica e o Cerrado. Hoje na Amazônia a situação é dramática. Parte da soja produzida é para
alimentar o gado, a maior parte dos dejetos dos animais vão parar nos rios, contaminado as águas. A socióloga
Marly Wenckler faz uma ligação interessante: “estamos exportando água de qualidade, um bem cada vez mais
escassos, em forma de carne”.
Soma‐se a tudo isso, o peso da pecuária na emissão de gases de efeito estufa no país está em torno de 50% e
do total do desmatamento amazônico a pecuária é responsável por 75%.
Entretanto, segundo Ivens Domingos, analista da respeitada WWF, diz que “é preciso reconhecer o problema.
Mas também é preciso mostrar que há tecnologias e meios para buscar soluções”. O melhoramento genético e
a gestão eficiente da propriedade, que permite o rebanho ganhar peso e aumentar a produtividade, (mais
animais por hectare) por meio de confinamento ou semiconfinamento, são exemplos de meios de mitigar os
impactos ambientais.
Como precisamos acabar com a fome no mundo e preservar o meio ambiente, a solução passa por pesquisas e
investimentos tecnológicos para que possamos produzir mais, agredindo menos.
2 –
3 ‐ Notas
a) Vulcões ‐ O Vulcão Eyjafjallajokull entrou em erupção na Islândia e interrompeu o tráfego aéreo na
Europa, prejudicando 10 milhões de passageiros. No total, mais de 100 mil vôos foram cancelados na Europa,
mas até nas regiões onde não houve cancelamentos foi prejudicada pela interrupção do tráfego na maior parte
da Europa. Diante do imenso prejuízo, algo em torno de 1,7 bilhão de dólares, as companhias pressionaram
para reabrir espaço aéreo, mesmo com as nuvem ainda densas.
b) Biodiversidade ‐ No Dia Mundial das Aves Migratórias, ONU lançou advertência para prevenir
desaparecimento desses pássaros e pede ajuda para preservar espécies em risco. Segundo a organização, risco
de extinção atinge 11% de aves migratórias.
20
Para uma melhor compreensão do fenômeno do Aquecimento Global, suas causas e consequências, veja
“Aquecimento Global”. Unidade 2, capítulo 3, pag 53.
11
Atualidades
Alexandre Pinto
c) Lixo ‐ O estado do Rio de Janeiro joga um terço do lixo em rios e aterros irregulares. Diariamente, 879
toneladas sequer são recolhidas de ruas e favelas do estado, segundo reportagem do jornal o globo de 23 de
maio de 2010.
12
Atualidades
Alexandre Pinto
Capítulo 3 – Relações Internacionais
1 – Armas Nucleares
Depois do fim da Guerra Fria, as armas atômicas voltaram ao topo da agenda internacional com o governo
Barack Obama. Clinton havia ignorado, como se fora coisa de segunda importância e Bush júnior, congelou as
negociações iniciadas pelo seu pai, pela clara opção de favorecer o complexo industrial militar. Obama se
mostrou disposto a trazer a temática de volta seja nos acordos com a Rússia, e que lhe renderia um criticado
Nobel da Paz, ou na tentativa mais agressiva de impedir o Irã de ter acesso a tecnologia nuclear.
a) Acordo EUA ‐ Rússia
Os EUA propuseram, nos 12 e 13 de março, em Washington, na conferência para revisão do Tratado de Não‐
Proliferação Nuclear (TPN), que é realizada a cada cinco anos, “um mundo livre de armas nucleares”. O
secretário‐geral da ONU, Ban Ki‐moon, elogiou bastante a proposta norte‐americana, já que para ele “o
desarmamento é chave para o futuro”.
No entanto, o acordo deve ser entendido, antes de tudo, como uma maneira dos EUA de manter o status co
geopolítico com um menor custo militar e econômico. Com isso não quero negar a importância do feito,
certamente a atitude é mais positiva do que o unilateralismo de Bush júnior21, mas não pode ser vista como
uma aceitação dos norte‐americanos de que o mundo é multipolar, antes é um esforço para salvar a
hegemonia em risco.
A principal parte do acordo se dá entre Washington e Moscou e prevê a redução dos arsenais nucleares e uma
revisão da estratégia nuclear dos EUA, segundo a qual, mesmo se o país for atacado com “armas de destruição
em massa”, promete não usar tais armas contra países que não possuam, desde que estes cumpram o TPN.
O novo acordo sequer exige que as ogivas nucleares postas fora de serviço sejam inutilizadas, podem ficar de
reserva e reativadas em questão de dias se a conjuntura mudar. Críticos alegam que o acordo é um retrocesso
em relação a postura dos Estados Unidos antes da paranóia bushiana, que apostava em ataques nucleares de
“pequeno impacto” contra o eixo do mal. Antes os EUA se comprometiam a utilizar armas nucleares somente
contra potências de peso, como Rússia e China, agora Obama vincula a não utilização de tais armas a aceitação
do TPN. Ou seja, os Estados Unidos ampliaram a pressão para que os países venham a aderir o Tratado.
Não sejamos inocentes a ponto de achar que tais declarações têm algum valor além da retórica. Os Estados são
poderes em busca de expansão22. Afinal, promessa por promessa, o Irã garante que jamais irá produzir, estocar
ou usar armas nucleares, nesse caso com um adendo, é proibido por uma fatwa do líder supremo Ali
Khamenei, fundamentado sobre a lei islâmica, o que a torna quase impossível de revogar, mas os países do
Conselho de Segurança, como veremos abaixo, têm motivos para duvidar.
Em resumo, os EUA desejam que em troca de promessas que podem ser mudadas em horas, países
abandonem anos ou décadas de investimentos e pesquisas. Isso, obviamente, consolidaria a superioridades das
potências que hoje fazem parte do clube nuclear.
Para Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores do Brasil, o tratado nuclear é injusto, pois o pacto em
vigor é fruto de uma época ultrapassada e congela as negociações com as nações em patamares diferentes,
algumas são potências e outras devem permanecer subordinadas. Em favor da posição norte‐americana, está o
fato de que um ataque nuclear mudaria o mundo para sempre, e o risco de terrorismo nuclear cresce quanto
maior for o número de países que dominem a tecnologia.
Outro problema do acordo é a postura de Israel, que se recusou a participar da Cúpula, mesmo sendo uma
potência nuclear. Certamente sofreria pressão dos países árabes para que aderisse o TNP. Dessa forma, Israel
continua a ignorar o mundo, com anuência da mídia e consentimento dos EUA. Obama nada fez para que essa
postura mudasse.
Ainda que a retórica de Obama ‐ “um mundo livre de armas atômicas” – pudesse ser levado a sério, o
programa de Conventional Prompt Gobal Strike23 (CPGS) anunciado em abril, mostra claramente que os EUA
nada mais fazem do que tentar manter sua hegemonia de ataque em todo globo, pois prevê desenvolvimento
de armas convencionais de longo alcance, que teriam o mesmo poder de dissuasão, porém de forma mais
precisa. Nesse caso, Moscou certamente, e talvez até Pequim, não conseguiriam acompanhá‐los.
21
Para a discussão sobre a política unilateral dos EUA, veja “Governo Bush: unilateral, belicista e isolacionista”.
Unidade 3, capítulo 2, pag. 87.
22
Para essa discussão veja “Bases para discussão”. Unidade 3, Capítulo 1, pag. 81.
23
Ataque Global Imediato Convencional – tradução livre.
13
Atualidades
Alexandre Pinto
Como dissemos já dissemos24: Os EUA “continuarão a ser um império e agirão como tal. Não há nada que faça
crer que os EUA abrirão mão da posição que conquistaram ao longo do século passado. Mas Obama pretende
reestruturar prestígio dos EUA. Para isso, ele deve por o combate ao terrorismo em segundo plano e levar a
sério o compromisso de exercer uma liderança multilateral, inclusive aceitando negociar com inimigos. Lógico,
em primeiro lugar para defender o interesse dos EUA”.
b) Tensão EUA ‐ Irã
Tendo a estratégia acima descrita como prioridade geopolítica, a secretária de defesa dos EUA, Hillary Clinton,
conseguiu levar o Conselho de Segurança (CS) da ONU a aprovar uma nova rodada de sanções ao Irã, embora
sem unanimidade. Dos 15 votos, dois foram contrários (Brasil e Turquia) e um se absteve (Líbano). Em
consequência o Irã declarou nulo o acordo de troca de combustível nuclear negociado por Brasil e Turquia.
Para ter o voto da Rússia e da China, Hillary abriu mão de embargos a bancos e empresas iranianas, salvo as
controladas pela guarda revolucionária.
Apesar da vitória formal dos EUA, o saldo das semanas de negociações em torno do Oriente Médio é bem mais
ambíguo. Ao contrário do que foi publicado na grande mídia nacional25, com suas iniciativas, Brasil e Turquia
ganharam projeção à custa dos países ricos. Vários atores tentaram forçar o Irã a negociar, incluídos aí a
própria ONU, os EUA, a Rússia e a China, mas somente Brasil e Turquia conseguiram. Com isso, mostraram que
o centro de gravitação geopolítica mundial está em movimento26 e que o Irã não está tão ilhado quanto os EUA
gostariam.
Entretanto, tanto Brasília quanto Ancara querem mais do que marcar posição27. Opuseram‐se as sanções, por
interesses comerciais importantes com o Irã, mas também estratégicos. A Turquia, vizinha do Irã, deseja um
Oriente Médio em paz, qualquer desestabilização, além das já corriqueiras na região, é desfavorável. Ao Brasil,
mesmo sem vínculos diretos com o Irã ou o Oriente Médio, além do comercial, não convém abrir precedentes
para que as potências apliquem sanções contra nações emergentes que usem energia nuclear, para fins
pacíficos, que é o caso brasileiro.
Já em 2004, o Brasil, para proteger de espionagem industrial sua tecnologia, vetou a inspeção das centrífugas
de urânio em Resende (RJ), permitindo à Agência Internacional de energia Atômica (AIEA) apenas monitorar
válvulas e tubos para medir a produção, o que foi aceito. Imagina se não fosse aceito e o CS tentasse impor ao
Brasil sanções?
A tese do Irã de “energia nuclear para todos, armas nucleares para ninguém”, é defensável sob o prisma
idealista, e inocente do ponto de vista do realismo28. Além da retórica, há algo que todos concordam com o
discurso de Obama, é muito sério e grave, o risco de que haja desvio de equipamentos nucleares e esses
passem a mão de grupos terroristas, que já demonstraram que não teriam o menor melindre em utilizá‐los
contra alvos civis. Segundo a CIA, a Al Qaeda tenta adquirir equipamentos nucleares a 15 anos e sabe‐se de 18
casos de roubo ou desaparecimento desses materiais no mundo. Embora seja consenso que esses grupos ainda
não tenham tecnologias para operar, desenvolver ou produzir bombas, isso se tornaria muito mais fácil com a
difusão do conhecimento tecnológico.
Ainda assim, o maior risco de desvio de armas nucleares não vem do Irã, cujo regime, embora autocrático, é
estável, mas do Paquistão, que tem um sistema em convulsão e forças armadas cheias de fundamentalistas, a
ponto de favorecerem ao Al Qaeda e o Talibã na fronteira norte do país. Mas, os EUA deixam o Paquistão de
lado, simplesmente pelo fato de precisarem do país na luta no Afeganistão. Ou seja, os EUA tão quanto Brasil e
Turquia, estão mais marcando posição do que buscando uma solução prática para o problema do desvio de
armas atômicas.
24
Veja página 94.
25
“Brasil vota a favor do Irã e se isola dentro da ONU”, foi a principal manchete do Jornal O Globo de 10 de
junho de 2010.
26
Sobre as mudanças na geopolítica, veja “A força dos Emergentes”, Unidade 5, capítulo 1, pag. 177 e “China: a
potência mais dinâmica do mundo, Unidade 1, capítulo 6, pag. 29.
27
Para uma discussão sobre entendimento da posição brasileira e a polêmica dos EUA, veja “Política Externa”.
Unidade 5, capítulo 4, pag. 244.
28
Para entendimento de idealismo e realismo nas Relações Internacionais veja “Bases para discussão”. Unidade
3, capítulo 1, pag. 81.
14
Atualidades
Alexandre Pinto
3 – Por dentro do Irã29
Já que o Irã virou destaque internacional devido as sanções impostas pelo CS, faz‐se necessário um melhor
entendimento do país. O Irã dos aiatolás e de Ahmadinejad vive como nenhum outro país do mundo um
dualismo entre a vida privada e a vida pública. No ocidente estamos acostumados a ver políticos e
personalidades terem posturas diferentes no cotidiano e diante das câmaras, mas isso é pouco para entender o
que acontece no Irã. Há uma pessoa que se apresenta diante de todos que é totalmente falsa, enquanto dentro
de quatro paredes, junto de amigos, essa pessoa se revela, passa a ser o que ela de fato é, ou desejaria ser.
Segundo o professor de História iraniana Touraj Daryaee, “os iranianos tem convivido com essa dicotomia há
mil anos e aprenderam a viver assim. Sempre que o governo é mais restritivo, a diferença entre o jeito que as
pessoas agem nos ambientes público e privado se expande”. O contraste tem ficado mais evidente nas duas
últimas gerações, ou seja, após a Revolução Islâmica de 197930, e se agravado ainda nos últimos cinco anos
comandado pelo linha‐dura Mahmoud Ahmadinejad, período que o país regrediu, ao menos em público.
Nas ruas, entre as mulheres, os gestos são contidos, suas roupas, longas e negras. A punição para mulher
flagrada sem véu é de 40 chibatadas! As conversas, se tocam em religião e política, baixa‐se o tom, viram
suspiros. Homens e mulheres desconhecidos raramente conversam. Casais mal se tocam. Tudo fica ainda mais
formal com um mulá passeando, olhar em riste, Corão na mão.
No espaço privado, nas casas, outro Irã aparece. Mulheres sem véu flertam abertamente. Homens criticam o
regime a primeira oportunidade, enquanto abrem uma garrafa de vodka, obviamente contrabandeada, e
oferecem aos visitantes.
Segundo Farzim, engenheiro químico, filho de família milionária, embora a polícia esteja em cada canto
fiscalizando os gestos e atitudes dos cidadãos, quem tem dinheiro não fica preso no Irã: “você paga uns 200,
300 dólares em propina e ninguém te prende. Sai uns 10 dólares a chibatada. O Irã é corrupto, meu amigo: se
você tem dinheiro, pode tudo, até comprar as chibatadas. Se você não tem, então é melhor rezar segundo a
cartilha”. Para quem pode pagar a realidade dói menos, para o grosso da classe média, que não pode conseguir
um passaporte sem prestar quase dois anos de serviço militar e acaba presa por fotos nos protestos pós‐
eleições, o Irã é um fardo. A dor é ampliada quando se entende que, em linhas gerais, o povo é nacionalista e
apaixonado pelo passado de glória dos persas.
Nas ruas, onde sobram placas com números da inteligência do governo para incentivar as denúncias de
“comportamento estranho”, é comum para o estrangeiro perguntar as horas e ser convidado para um
casamento. Mas nenhum iraniano vai a uma festa sem que um amigo ateste que é segura. Candidatos a povo
mais hospitaleiro do mundo, eles se derretem em polidez diante do estrangeiro. Querem mostrar que a
imagem de um presidente a vociferar contra a América e perseguir armas atômicas destoa daquela do cidadão
comum. Nas palavras de Farzad, engenheiro industrial de 30 anos: “nossa cultura é persa, é mais européia do
árabe. Nossa classe média ignora qualquer ódio contra Israel ou os EUA. Eles seriam bem‐vindos para nos
ajudar a derrubar esse regime autoritário”.
Nas últimas décadas, ao menos na classe média, os iranianos tentam viver de forma mais liberal e
ocidentalizada. No passado recente era raro um casal namorar antes do casamento, hoje quase todos os jovens
de cidades grandes namoram. Mas nos últimos cinco anos o cerco tem se fechado. É comum ver policiais
flagrando flertes na rua, dando multas, prendendo gente. Os ônibus continuam separando homens e mulheres
– a traseira do veículo é exclusiva para as mulheres, que segue vazia, e a parte da frente é masculina e segue
entupida.
Outros problemas, além da falta de liberdade, afligem o Irã. Dentre eles o mais importantes são desemprego e
inflação, ambos de dois dígitos, cujos números são maquiados pelo governo, mas são sentidos no dia‐a‐dia pelo
cidadão comum. Azad, engenheiro químico, formado na Alemanha e fluente em quatro línguas, 15 anos de
experiência, busca ocupação há um ano. Recebeu uma proposta do governo, mas declinou. “Se o sujeito não
for religioso e não defender explicitamente o regime, não consegue se manter em emprego público. Eu não
posso apoiar um regime que prende meus amigos. O Irã hoje é um país de mentira. Todo iraniano se
especializou em representar um papel para a sociedade. Todos têm duas caras: uma pública e outra
29
Inspirado na reportagem de: VIEIRA, Willian. Sob o véu da censura: a crescente repressão leva os iranianos a
uma vida dupla. In Carta Capital nº 593, 28 de abril de 2010.
30
Movimento revolucionário, na época da Guerra Fria que transformou o Irã de uma monarquia autocrática
numa república islâmica. Assim, o Irã foi o primeiro país desde a Revolução Francesas (1789), quando os
Estados laicos foram se estabelecendo, a fazer um movimento contrário, ou seja, fez novamente a fusão do
estado com a religião.
15
Atualidades
Alexandre Pinto
verdadeira. Numa sociedade que é baseada na farsa, não se pode confiar em ninguém. Hoje você é meu amigo,
amanhã, meu delator”.
O Irã também é um país religioso. O maior país xiita do mundo: 89% de seus cerca de 67 milhões de habitantes
são xiitas. Acreditam na existência de 12 imãs que se seguiram ao profeta, conferindo devoção especial ao
primeiro, Ali. Assim, tudo é sagrado: tumbas, locais de nascimento, retratos vivem dependurados nas paredes,
no espelho dos taxis, no pescoço dos cidadãos. Isso é considerado uma aberração para os sunitas, grupo
majoritário no mundo islâmico.
Porém, muitas pessoas acham que a polícia religiosa que está prendendo os manifestantes é o Islã e por isso
têm se afastado da mesquita e se fechado em si mesma. Os iranianos, assim como os sauditas, tendem a
frequentar menos as mesquitas durante as orações diárias do que países de população islâmica com regime
laico. Quando um governo religioso autoritário impõe um discurso monolítico à sociedade, de cima para baixo,
leva a um declínio da religiosidade geral pública.
Para boa parte da classe média iraniana, especialmente da capital, o dia após os resultados das eleições, 12 de
junho de 2009, foi o estopim que levou à explosão uma geração de frustrados, um povo que viu seu país ser
lançado a segunda classe internacional, regredir nas liberdades civis e se tornar mais dependente da economia
do petróleo, processo coroado por um governo que, acreditam, corrompeu as eleições para se manter no
poder. Queriam a mudança, mas a repressão que se seguiu afundou o país ainda mais na injustiça, violência e
morte.
Nos protestos de 2009, um rastro de sangue ficou exposto. Segundo a Anistia Internacional, só entre a eleição
e a posse de Ahmadinejad, em 5 de agosto, foram 112 execuções, embora o governo só confirme nove,
algumas em público. A partir daí até dezembro o Irã deteve mais de cinco mil pessoas. Lembrando que os
protestos eram, inicialmente, pacíficos, levando milhares de pessoas às ruas e praças do país, vestidas de
verde, pedindo liberdade, e acabou por se transformar na maior crise política desde a Revolução islâmica, no
final dos anos 1970.
O melhor exemplo das atrocidades perpetradas pelo regime foi o caso da estudante de filosofia Neda Soltan,
assassinada com um tiro na cabeça por um integrante da milícia Basij, durante um protesto pacífico em Teerã.
Outro manifestante filmou a execução de Neda com um celular. O vídeo rodou o mundo, arrancando gritos de
protestos contra o regime, seguido de outras prisões midiáticas como a do cineasta Jafar Panahi, autor de O
Círculo, crítico filme sobre o papel da mulher no Irã.
No entanto, também não é correto dizer que o governo de Ahmadinejad representa uma volta aos princípios
fundamentalistas que vinham se arrefecendo no Irã desde a Revolução. Em certo sentido ele representa uma
mudança, a transferência de poder dos religiosos representantes da Revolução para a linha dura nascida
durante a guerra contra o Iraque, mas que também é contrária as reformas liberalizantes. O governo usa e
abusa da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC), espécie de polícia criada para proteger a Revolução, mas que
investiga a população, está infiltrada nas universidades e controla qualquer tensão social com violência.
Sem o apoio maciço dos clérigos de 30 anos atrás, o governo sabe que só pode se manter no poder
intimidando e punindo. A resposta aos protestos tem sido didáticas: jornais da oposição fechados, sites da
internet controlados, polícia moral com efetivo aumentado e conversas telefônicas gravadas.
Foi assim que o aparato repressivo conseguiu esmorecer os ânimos. Moussavi, candidato derrotado nas
eleições disse que “não vale a pena derramamento de sangue”. Mensagens chegaram aos celulares dos
manifestantes com ameaças e protestos foram cancelados depois que o governo anunciou que iria responder
“com dureza”. As pessoas querem mudanças, mas não estão dispostas a bancar uma guerra civil e o
consequente derramamento de sangue.
Muitos que participaram do protesto, obviamente, não gostaram da intromissão brasileira na discussão sobre
acordos nucleares. “É uma vergonha países como o Brasil apoiar um governo que mata manifestantes no meio
da rua”, diz Hashar, engenheiro eletrônico. “Será que seu presidente sabe que está lidando com um regime que
tem sistematicamente abusado dos direitos humanos, com casos documentados de tortura generalizada,
estupros e assassinatos? Fico chocado que um governo democrático como o seu e uma pessoa confiável como
o Lula tenham ignorado tais atrocidades e apoiado Ahmadinejad. Como ficam os direitos de milhares de mães
que viram suas crianças espancadas até a morte e nem sequer tiveram os corpos entregues de volta?” Lula e
Amorim deveriam responder tais questionamentos.
Mas, o reconhecimento do problema é o princípio que move as mudança. Homens e mulheres mais jovens
cada vez mais educados e alinhados a outro mundo, as restrições soam mais irracionais. Eles comem pela
beirada: véu menor, roupas coloridas, botas e cabelos diferentes para os rapazes são os símbolos dessa
resistência. Assim desafiam o status co e iniciam a mudança.
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Atualidades
Alexandre Pinto
3 – Os EUA e a Guerra ao Terror
Se no Irã, as demandas internas por liberdade levam ao governo a ampliar o autoritarismo de um lado e o
radicalismo na política externa de outro, nos EUA, para que uma guerra seja bem sucedida é preciso
engajamento da opinião pública31. Assim, em 13 de junho, o New York Times anunciou a descoberta de 1
trilhão de dólares em riquezas minerais no Afeganistão, incluindo ferro, cobre, cobalto, ouro e lítio.
Ironicamente, os levantamentos preliminares foram feitos ainda pelos soviéticos, e era um dos motivos da
invasão daquele país no final dos anos 1970.
O que estaria por traz dessa “velha descoberta”? A tentativa de reanimar a disposição do público e dos aliados
a continuar a guerra mais longa da história dos EUA. Politicamente, a situação é complicada para o governo
Obama, O discurso anti‐guerra mobilizou os setores conservadores pelo medo de novos ataques, e o efeito
prático da ampliação das tropas no Afeganistão, ajudou a decepcionar o público mais progressista, que exigem
o cumprimento das promessas de campanha, o quanto antes.
Na prática as perspectivas não melhoraram substancialmente no Afeganistão desde a posse de Obama, mesmo
com o aumento do contingente de 30 mil para 100 mil soldados. Várias ofensivas estão estacionadas ante da
resistência. Mesmo onde as tropas avançam, não é possível estabilizar a situação ou eliminar a presença do
Taleban.
O presidente afegão Hamid Karzai, reeleito contra a vontade de Washington, parece não mais acreditar na
vitória militar. Convocou uma assembléia de chefe tribais, principalmente pashtus do sul, o que indica a
tentativa de tentar acordo com o Taleban.
Enquanto isso, dentro dos EUA, grupos terroristas voltaram a atacar alvos norte‐americanos, na verdade uma
tentativa frustrada de explodir um carro‐bomba em Nova York. Os EUA alegam que o principal suspeito de ter
preparado o ataque treinou no Paquistão. O suposto terrorista paquistanês é naturalizado norte‐americano e
foi preso ao tentar fugir para Dubal.
A CIA alega que o Talibã financiou ataque a Nova York e prometeu maior segurança em voos nos EUA.
4 – Venezuela: chavismo em crise
A tese, um tanto de futebolística, de que a melhor defesa é o ataque se encaixa perfeitamente nas ações de
Hugo Chávez na Venezuela. O presidente bolivariano32 responde a crise econômica, marcada pela escassez de
alimentos, inflação e desvalorização da moeda com ataques ao empresariado. O Estado tem desapropriado
distribuidoras de alimentos e prendido corretores de câmbio.
Seguiu‐se a intervenção do Banco Federal, de propriedade de um dos sócios da Globovision, Nelson
Mezerhane, e a ordem de prisão contra ele e Guillermo Zulouca, principal acionista da emissora, um dos
principais instrumentos da oposição, sob acusação de usura e conspiração. Ambos estão fora do país, sob
ameaça de terem suas propriedades confiscadas, caso não se apresentem a Justiça.
O relator da ONU sobre liberdade de expressão e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos pediram a
retirada das ordens de prisão, que consideram motivas pelas críticas ao governo, principalmente a denúncia de
que a PDVSA armazenava três mil toneladas de alimentos em decomposição, destinados a mercados populares
do Estado, por má gestão na distribuição.
5 – África do Sul: Copa do Mundo e Aarthaid33
Não é fácil um país deixar para trás um passado de discriminação e violência racial de forma tão intensa como
foi na nação mais desenvolvida do continente, a África do Sul. Pouco antes da Copa do Mundo, o líder racista
Eugene Terre’Blanche foi assassinado, o suficiente para reabrir as feridas. Pouco importa nesse caso, se o
assassinato em si não tenha sido uma vingança, oficialmente, ao menos, foi um “acerto de contas” por dívidas
trabalhistas. Terre’Blanche foi morto na cama com uma barra de ferro e um facão por dois empregados de sua
fazenda, um de 15 e outro de 28 anos, a quem não pagava o salário prometido (de 40 dólares por mês) desde
31
Para entendimento do peso da opinião pública nas Relações Internacionais veja: “Bases para discussão”.
Unidade 3, Capítulo 1, pag. 81.
32
Para uma discussão sobre a Revolução Bolivariana e a política chavista, veja: “Revolução Bolivariana”.
Unidade 3, capítulo 2, pág. 96.
33
Inspirado na reportagem de: COSTA, Antonio Luiz M. C. O tempo reabre as feridas: As tensões herdadas do
aparthaid se acirram. In Carta Capital nº 591, 14 de abril de 2010.
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Atualidades
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de dezembro, quando os contratara. A reação prometida pelos grupos racistas pode desencadear uma onda de
violência racial.
A história do grupo neonazista de Terre’Blanche ajuda a entender a situação. Depois de ter servido na ex‐
colônia do sudoeste, hoje Namíbia, e na guarda presidencial, rebelou‐se contra o pragmatismo do primeiro‐
ministro John Vorster (1966‐78) um ex‐nazista que permitiu que diplomatas negros morassem em “bairros
brancos” e não quis reconhecer o governo “branco” da Rodézia (atual Zimbábue).
Terre’Blanche fundou o Movimento de Resistência Africâner, cujo primeiro ato relevante foi, junto com 40
brutamontes, cobrir de piche e pena um professor de história branco que questionou o feriado religioso do
“Dia da Promessa”, feriado sul‐africano que comemorava a vitória do boêres sobre os zulus. No governo
reformista de Pieter Brotha, que deu direito a voto a mestiços e indianos, Terre’Blanche foi preso por posse
ilegal de armas e explosivas.
Quanto mais o apartheid degringolava, mais o seu grupo ameaçava com guerra racial e desafiava a ordem com
desfiles, uniformes e bandeiras neonazistas. Em 1993, ele e seu grupo invadiram o prédio que abrigava as
negociações sobre o fim do apartheid com um carro blindado, arrebentando as vidraças e espancando os
policiais. Mas, em outra invasão que matou dezenas de civis, três de seus “oficiais” foram capturados e
executados. O grupo humilhado, perdeu força e se exilou.
As negociações de Nelson Mandela e os líderes brancos levaram ao fim do apartheid e uma anistia de todos os
crimes políticos. Criou‐se uma comissão da verdade, similar a do PNDH3 no Brasil, para manter viva a memória.
No entanto, Terre’Blanche foi novamente preso por espancar dois empregados negros (um dos quais ficou
inválido) por denunciarem a polícia um jovem branco que arrombara a farmácia de seu posto de gasolina.
Libertado por bom comportamento após quatro dos sete anos a que fora condenado, disse “não ser mais
racista, mais xenófobo, que prefere gente do seu próprio tipo”. Em março de 2008, relançou seu movimento,
agora para criar uma república branca separada, pregando separar do Estado corroído pela morte, pelo crime e
pelo assassinato. Ironicamente, desde o fim do apartheid, a criminalidade na África do sul tem diminuído. O
número de homicídios para cada 100 mil habitantes que era de 66,9 em 1994, passou para 40,3 em 2004 e 38,6
em 2007.
De outro lado, a política conciliatória de Mandela que ajudou a construir uma elite negra, facilitou a ascensão
social e permitiu a formação de um empresariado negro, não fez a reforma agrária, e as mudanças depois de
1994, ficaram bem aquém das prometidas pelo Congresso Nacional Africano (CNA) de Mandela, originalmente
marxista. A concentração de renda aumentou, o Índice de Gini34 subiu de 0,59 em 1994 para 0,67 em 2008. Dos
4% mais ricos na África do Sul apenas um quarto é negro, sendo que esses correspondem a 80% da população.
A situação piorou em 2009 com a crise econômica internacional. O PIB despencou 2,2% e os empregos
temporário promovidos pela Copa do Mundo já não existem para atenuar o problema do desemprego que
atinge 28,6% dos negros e 4,9% dos brancos.
A frustração revela‐se na rivalidade entre etnias e no rancor racial. Julius Malena, líder da juventude do CNA
choca os brancos ao propor uma divisão das fazendas da elite branca e ao entoar o hino símbolo da luta contra
o apartheid que prega “mate o bôer”.
6 ‐ Coréias a beira da guerra
Em 26 de março, a corveta sul‐coreana Cheonan afundou após uma explosão inexplicada perto da fronteira
entre as duas Coréias, provocando a morte de 46 dos 104 tripulantes. A suspeita de que o navio fora afundado
por um submarino norte‐coreano surgiu desde o início, mas havia também a possibilidade de uma explosão
interna, ou choque com uma mina flutuante.
Mas, em 20 de maio, Seul anunciou que uma comissão internacional concluíra que o navio fora mesmo
afundado por um torpedo. Partes dele teriam sido recuperadas, com inscrições semelhantes às de outras
torpedos norte‐coreanos e compatíveis à descrição técnica da arma em brochuras para exportação.
De imediato, o governo da Coréia do Sul proibiu os navios da Coréia do Norte de entrar em suas águas,
embargou quase todo o comércio e iniciou uma propaganda pelo rádio direcionada a seus habitantes. O Norte
34
O Coeficiente de Gini é uma medida de desigualdade desenvolvida pelo estatístico italiano Corrado Gini, e
publicada no documento "Variabilità e mutabilità" ("Variabilidade e mutabilidade"), em 1912. É comumente
utilizada para calcular a desigualdade de distribuição de renda mas pode ser usada para qualquer distribuição. Ele
consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade de renda (onde todos têm a mesma
renda) e 1 corresponde à completa desigualdade (onde uma pessoa tem toda a renda, e as demais nada têm).
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Atualidades
Alexandre Pinto
reagiu colocando suas tropas em alerta, cortou as comunicações e acordos com o Sul, que visavam prevenir
confrontos.
Não está claro qual o interesse do Norte em causar o incidente, quando sua precária economia estava se
beneficiado do comércio com o Sul. Nem porque Seul chamou apenas peritos de países aliados (EUA, Austrália,
Reino Unido e Suécia) quando a credibilidade da acusação exigiria o endosso de países menos engajados.
Rússia e China se dizem céticas com o resultado do relatório, querem provas indiscutíveis. Isso impôs limites a
posição de Washington e Seul de impor sanções a Pyongyang no CS.
7 ‐ Notas:
a) História ‐ A ONU comemorou os 65 anos do término da 2ª Guerra em 06 de junho. O secretário‐geral
lembrou que 40 milhões de civis e 20 milhões de soldados foram mortos no conflito, classificando‐o como uma
das mais épicas lutas pela liberdade.
b) Acidente mata presidente da Polônia ‐ No dia 10 de abril, após acidente aéreo, morreu o presidente
da Polônia, Lench Kaczynski, sua esposa e mais 94 integrantes da elite política e militar do país. Em Cracóvia,
centenas de pessoas manifestaram, umas a favor, outras contra o enterro do presidente na cripta da catedral
do castelo de Wawel. Wawel é o panteão de reis e heróis.
c) Imigração ‐ O relator especial da ONU disse que direitos básicos dos migrantes no Japão, muitas vezes,
são ignorados no país asiático, onde residem aproximadamente 280 mil brasileiros.
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Atualidades
Alexandre Pinto
Capítulo 4 – Brasil Contemporâneo
1 – Crescimento, inflação e juros.
Durou pouco o afinamento entre a Fazenda, ala desenvolvimentista do governo Lula, e o Banco Central, ala
conservadora do mesmo governo. Ainda em abril, quando o FMI, ala conservadora da econômica
internacional, elevou a previsão de crescimento da economia brasileira e alertou para o risco de
superaquecimento – que se refletiria em inflação se medidas de contensão não fossem tomadas –, um novo
ciclo de aperto foi iniciado (em 28 de abril) pelo Copom35. Ironicamente, dias depois chegava o relatório sobre
a inflação no mês de março, demonstrando queda nos preços médios.
Novamente o BC justifica sua atitude devido o risco de descontrole da inflação em meio ao crescimento
acelerado da economia. Ou seja, ao primeiro sinal de que o país deixou para trás a crise financeira
internacional, o BC joga uma ducha de água fria na economia real. Para o ministro da Fazendo Guido Mantega,
a alta dos preços esteve influenciada pelo excesso de chuvas no início do ano, e tenderia a se dissipar durante o
ano. Entretanto, mais uma vez prevaleceu a visão afinada com o mercado financeiro, que logicamente, ganha
mais dinheiro com juros altos.
O roteiro é previsível. Poucos dias antes do Copom se reunir, o noticiário sobre inflação esquenta. Os discursos
de alta de preços na economia ganham destaque. Não importa se a inflação esta sob controle, a classe rentista
defende o aumento da Selic por outros motivos, mas esses operadores de mercado são os únicos ouvidos pela
mídia quando ao assunto é inflação e juros. A manchete do jornal O Globo de 09 de junho expõe a contradição:
“PIB recorde mostra risco de superaquecimento. Expansão foi de 9% no trimestre. Consumo das famílias cede
apos 6 anos”.
Ora! Se o PIB cresceu e o consumo das famílias diminuiu, somente há duas leituras possíveis: o investimento
cresceu acima do consumo, o que afasta o risco de inflação, ou a base de comparação é fraca, o que nega o
superaquecimento.
Na verdade as duas coisas aconteceram. O crescimento de 9% PIB no primeiro trimestre somente se deu pois a
base de comparação (1º trimestre de 2008) era muito fraca devido o pior momento da crise internacional no
Brasil. A formação bruta de capital fixo foi de 7,4%, crescendo bem acima da demanda. Em outras palavras, a
capacidade de produzir da economia cresceu acima do consumo, afastando as pressões inflacionárias. Ainda há
outros argumentos: a inflação começou a desacelerar em maio, depois do momento ruim para agricultura com
as chuvas do início do ano; a crise na Europa e nos EUA tende a diminuir as exportações, ampliando a oferta de
produtos internamente; produtos a preço baixo no mercado externo forçam a inflação para baixo.
De nada adianta tais argumentos. Nas planilhas do BC contém uma “lógica” que explica a capacidade de
crescimento brasileiro em torno de 5%, qualquer coisa acima disso, pressionaria a inflação. Essa “lógica”
baseia‐se na tese de que a oferta não acompanha o ritmo da demanda e que a capacidade instalada da
indústria brasileira estaria próximo do seu limite.
Contra essa tese, o Nível da Capacidade Instalada (Nuci) medido pela FGV, atingiu 84,3% em março, abaixo dos
85,1% de antes da crise. Segundo a Fiesp, no entanto, o mais correto seria a utilização de um outro medidor, o
Nível de Utilização da Produção Plena (Nupp). A diferença fundamental entre os dois dados, é que o Nupp leva
em conta a possibilidade de contratar mais funcionários, reativar máquinas e adotar turnos extras para
aumenta o ritmo de trabalho. Considerando apenas as empresas paulistas, o Nuci fecharia abril em 79,23% e o
Nupp em apenas 69,20%. Traduzindo a linguagem econômica: não há nenhum indício de que esteja faltando
produtos no mercado, ou que isso venha a ocorrer em período próximo, logo não há limites numéricos para o
crescimento.
Há ainda quem questione a capacidade da Selic em conter a inflação, que estaria sendo motivada pela elevação
da capacidade de gasto e endividamento da “classe C”. Num país com os maiores spreads bancários do mundo,
se o mercado entender que há espaço para o crescimento do crédito de forma segura, os juros para os
contribuintes podem diminuir ainda que a Selic aumente.
O pior é que o efeito do aumento da selic sobre a dívida pública é sempre catastrófico. Segundo o consultor
Amir Khair, mestre em finanças públicas pela FGV e ex‐secretário de finanças da prefeitura de São Paulo, 37,7%
dos títulos emitidos pelo governo estão atrelados diretamente a Selic. O especialista calcula uma despesa
adicional de 13 bilhões de reais aos cofres públicos, com a Selic a 11,25%. Como os títulos lastrados pela Selic
35
Para uma discussão sobre a função do Comitê de Política Monetária (Copom) dentro do Sistema DE metas de
Inflação atual, veja “Política Monetária”. Unidade 4, Capítulo1, pag. 145.
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Atualidades
Alexandre Pinto
afetam os demais papeis, a transferência do governo para a classe rentista poderá chegar a 35 bilhões de reais
até o final do ano.
Outro problema do juro alto é que ele torna o Brasil mais atrativo para o capital especulativo, o que tende a
atrair mais dólares, valorizando o real e prejudicando ainda mais as exportação nacionais, que passam por um
momento difícil devido ao estrangulamento da demanda internacional pela crise.
Depois do banho de água fria da alta dos juros, restou a ala desenvolvimentista do governo dar novo alento ao
setor produtivo. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou no dia 5 de maio um conjunto de medidas
para estimular as exportações e se contrapor à valorização do real, potencializada pelo novo ciclo de aumento
da Selic.
Especialistas em política industrial e empresários ligados ao comércio exterior foram unânimes em aplaudir a
criação da Agência de Crédito a Exportação – Exim Brasil ‐, sucessora da Finame, com maior agilidade e um
leque de atuação mais amplo. Segundo o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, “a análise de financiamento
que demorava três ou quatro meses sairá em 30 dias, sem aumento de custos”.
Além da criação da agência, o governo anunciou um corte de gasto de 10 bilhões de reais. A tentativa da
Fazenda é retirar do BC os argumentos da necessidade de controlar os preços com aumento dos juros. Ainda
serão anunciados até o final do ano medidas para tentar frear o valor do dólar, mas todo esse esforço dará em
nada se a Selica continuar sua trajetória de alta.
2 – Belo Monte: Solução ou Problema?36
Projetada ainda no período autoritário e engavetada diversas vezes, a usina hidrelétrica de Belo Monte, a ser
construída no meio da Amazônia, parece que enfim sairá do papel. Será? A licitação da obra foi vencida por um
consórcio pouco coeso e no intervalo entre duas ações que proibiam a licitação pública da obra, o que
demonstra a dificuldade enfrentada até agora e a que virá.
Para os defensores da construção da usina, incluindo aí o governo brasileiro, Belo Monte (que será a terceira
maior usina do mundo, atrás apenas da chinesa Três Gargantas e Itaipu) seria a solução para o país continuar
crescendo, gerando emprego e reduzindo a miséria, com energia razoavelmente limpa, sobretudo porque o
período de maior vazão de Belo Monte coincide com o período dos reservatórios mais vazios no sul e no
sudeste.
Do lado dos setores contrários, ONGs e ativistas de diversos países, o protesto do Greenpeace, despejando três
toneladas de esterco em frente a sede da Agência Nacional de Energia Elétrica em Brasília com uma faixa sobre
os dejetos que dizia: "um belo monte de... problemas”, explicita a questão.
Uma grande batalha Judicial foi montada contra a realização da obra. Somente o juiz federal de Altamira
acolheu três denúncias contra o leilão. Todos encaminhados pelo Ministério Público, que trazia erros e
inconsistências no projeto e no edital de licitação, mas o TRF‐DF aceitou os argumentos da Advocacia Geral da
União, que antes de se preocupar em rebater cada falha apontada, alegou que a não realização do leilão
representaria prejuízo ao País.
O Plano Nacional de Energia 2030, aponta para necessidade de ampliação de oferta de energia. Em um cenário
de crescimento médio de 4,1%, que hoje já pode ser considerado conservador, ante uma taxa mundial de 3%,
nossas necessidades de energia vão aumentar em 4,3% ao ano, e em 2030, será preciso contar praticamente
com o dobro da capacidade de geração atual. Em outras palavras, é preciso adicionar cinco mil megawatts por
ano a oferta de energia, e ainda assim, o consumo per capta previsto seria de 2,3 kWh, sete vezes menor do
que o dos norte‐americanos, como a renda tem melhorado é possível prever também um aumento do
consumo per capta, o que demandaria mais energia.
Não há possibilidade de suprir essa nova demanda por outras fontes renováveis não poluidoras. Tanto as
fontes eólicas quanto a biomassa são importantes para complementar o sistema, mas não como energia de
base37, alega o Ministério de Minas e Energia.
Essa avaliação diverge dos argumentos apresentados pelo Greenpeace que, em princípio, é contrário quaisquer
projetos hidrelétricos no bioma amazônico. “Há pesquisas avançadas na Europa e nos EUA que mostram a
viabilidade de manejar super‐redes de usinas eólicas e obter energia firme nessa modalidade”, afirma o
coordenador da campanha de energia da ONG, Ricardo Baitelo.
36
Inspirado na reportagem de: SIQUEIRA, André. Um mal necessário. O impasse socioambiental permanece,
mas o Brasil precisa da força das turbinas de Belo Monte. In Carta Capital nº 593, 28 de abril de 2010.
37
Para uma discussão das vantagens e desvantagens das fontes alternativas veja “O desafio energético”. Unidade
2, Capítulo 3, pag. 63.
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Atualidades
Alexandre Pinto
Para a WWF a preocupação é a população diretamente afetada. Os 16 mil cidadãos projetados podem estar
subestimados, pois o assoreamento do reservatório poderá elevar as águas mais três metros acima do previsto
inicialmente.
Dal Marcondes, da Envoverde, alega que o mesmo dinheiro investido na construção da usina poderia ser
utilizado na redução de perdas de energia linhas de transmissão, como o mesmo resultado. As perdas na
Europa são de 5%, no Japão 1% e no Brasil chegam a 15%.
Todas as ONGs citam ainda as falhas do passado como argumento contrário a construção. Por exemplo, a usina
hidrelétrica de Samuel, em Rondônia, construída na década de 1980, inundou uma área de 540 km2 no leito do
rio Jamari, portanto maior que a de Belo Monte, e produz apenas 240 MW de energia. Segundo dados do Inpe,
em 1990, a usina emitiu 11,6 mais gazes causadores do efeito estufa do que uma térmica a petróleo38, e dez
anos depois ainda emitia 2,6 vezes mais. Outras acusações de pragas e insetos que passaram a ocupar os
vilarejos próximos às usinas, ou de casas ao lado das usinas e que não tinham acesso a energia elétrica, são
provas de que o projeto macro desprezava as necessidades e especificidades de cada região.
Hoje no Brasil, as usinas para serem construídas levam em conta vários aspectos que englobam a proteção
ambiental a segurança e o destino das populações no entorno. O projeto atual, inúmeras vezes alterado desde
sua concepção, reduziu a área alagada para 516 km2, cerca de um terço do previsto inicialmente. A indústria
vai operar no modelo de fio d’água, ou seja, vai contar apenas com a vazão do rio para gerar energia,
praticamente sem armazenar água. Se isso reduz os danos ambientais, também diminui a capacidade de
geração de energia. Ironicamente Para o coordenador da WWF, Pedro Bara Neto, na tentativa de reduzir
impactos ambientais a usina se tornou inviável, referindo‐se ao fato de que será gerado em média na usina 4,5
mil MW, menos da metade de capacidade nominal 11,2 mil MW.
O que os ambientalistas não estão levando em conta é o histórico brasileiro. Somos donos da matriz energética
mais limpa e invejada do planeta, desenvolvida a pouco menos de meio século para garantir o
desenvolvimento econômico, principalmente para suprir o parque industrial a preços competitivos em nível
internacional.
É quase uma tragédia o que ocorreu no setor elétrico brasileiro, desde quando os governos abandonaram os
grandes projetos estrategicamente planejados e permitiram que as coisas fossem se deteriorando até chegar
ao apagão elétrico de 2001. A matriz original foi sendo lentamente destruída. Deixados de lado os grandes
projetos hidrelétricos, que garantiam a oferta de energia pouco poluidora e barata, o país precisou recorrer em
pleno apagão e nos anos seguintes à geração de energia térmica, de origem basicamente nos derivados de
petróleo. Elevando os custos de produção e sujando ainda mais o meio ambiente. Em outras palavras, a partir
daí sujamos a matriz e aumentamos os custos de forma desproporcional, com imposto de toda sorte e
contribuições que passaram a incidir sobre as tarifas de fornecimento de energia, tornando a energia
consumida no Brasil uma das mais caras do mundo.
Felizmente estamos recuperando os projetos que irão expandir a oferta da energia hídrica. Até 2005, quando
novamente foram retomados os grandes projetos hidráulicos, as hidrelétricas recuaram 7% no total da matriz
elétrica brasileira. Se levarmos em conta todos os projetos existentes hoje para hidrelétrica na Amazônia, vão
inundar 0,03% do espaço da floresta, ou seja, menos que o desmatado num único ano como o de 1991, ano
que menos se queimou floresta em toda série histórica acompanhada pelo Inpe.
Não é somente em termos ambientais que as hidrelétricas são vantajosas. Como vimos, as térmicas além de
mais poluidoras são mais caras. O atraso na construção de hidrelétricas previstas até 2017, o custo do uso das
térmicas será de 2 bilhões de reais, aumentando a conta de luz paga pelo consumidor.
Fora da discussão ambiental também há problemas em Belo Monte. Pouco depois de anunciada a vitória do
consórcio vencedor, a estatal Chesf, líder do grupo vencedor, com 49,98% de participação, anunciou que um
dos maiores parceiros, a empreiteira Queiroz Galvão, dona de uma cota de 10,2%, ameaçara abandonar o
projeto. O temor é que a remuneração não seria suficiente para cobrir os custos da usina.
Ganhou o leilão quem se comprometeu a vender por um preço baixo a energia a ser gerada. O lance vencedor
foi 6% inferior ao estabelecido pelo governo de 83 reais por MWh. Além da Chesf e da Queiroz Galvão,
integram o consórcio a Gaia Energia (10,02%) ligada ao grupo Betin e as construtoras J. Malucelli (9,98%),
Galvão Engenharia (3,75%), Mendes Júnior (3,75%), Contern (3,75%) e Cetenco (5%). Mas tudo indica que essa
estrutura, montada para vencer o leilão, será outra na assinatura do contrato.
38
Para entendimento da emissão de gases de efeito estufa por uma hidrelétrica veja “Fontes Alternativas”.
Unidade 2, Capítulo 3, pag 65.
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Somente a Queiroz Galvão considerou o lance de 78 reais agressivo demais. Não deve ser problema para a
Chesf encontrar outra empresa para substituí‐la. Com a economia em crescimento, empresas grande
consumidoras têm interesse em garantir participação nas hidrelétricas. Para se ter uma idéia, a energia
utilizada pela Vale em um ano equivale a toda demanda residencial de estados como o Rio Grande do Sul e
Paraná juntos!
Resumindo a questão: mesmo com todos os problemas, Belo Monte é a nossa melhor opção.
Matriz de Energia
Percentual
Elétrica
Hidráulica 68,10
Gás Natural 10,47
Biomassa 5,52
Petróleo 5,17
Nuclear 1,73
Carvão 1,32
Eólica 0,74
Importada 7,04
Fonte Aneel. Abril de 2010
3 – Suape e a Indústria Naval39
O bom momento na economia experimentado pelo Brasil fica bem demonstrado pelo ressurgimento da
Indústria Naval. Desde os anos 1990 quando os negócios minguaram, esse é o melhor momento, seja no Rio de
Janeiro, onde sempre a indústria naval foi mais forte, ou em novos pontos, como em Pernambuco, no Porto de
Suape.
Além do momento da economia, a industria naval ressurgiu por causa de dois eventos. O primeiro foi a criação
do Programa de Modernização e Expansão da Frota (Promef) da Transpetro, nas duas primeiras fases do
Promef foram contratados 49 navios, 22 deles construídos no Estaleiro Atlântico Sul (EAS). O segundo se deu
pelo conjunto de oportunidades criadas pela descoberta de grande quantidade de petróleo na camada pré‐sal.
Os estaleiros estão mais modernos, possuem parcerias tecnológicas com grande mercado global, se deslocam
em direção ao Nordeste, nesse caso, encontrando “boa receptividade” no porto de Suape, na região
metropolitana de Recife. Somente em Suape, a nova indústria planeja investimento superiores a 2,2 bilhões de
reais e pretende criar 11 mil empregos diretos.
Além dos estaleiros que chegam e os que ameaçam vir, Suape virou canteiro de obras da futura Refinaria Abreu
e Lima, sociedade entre a Petrobras e a venezuelana PDVSA. Estaleiros, refinaria, pólo petroquímico outras
empresas representam investimentos privados superiores a 25 bilhões de reais.
Mesmo assim a infraestrutura não é o maior diferencial de Suape, sua posição geográfica é o grande trunfo. O
porto está entre os mais próximos da África, onde a exploração de petróleo na costa ocidental está crescendo,
fica perto da Venezuela, do Golfo do México e integra importantes rotas do Atlântico Sul.
A posição geográfica é boa também do ponto de vista do mapa do Brasil. Antes de conquistar sua condição
como pólo industrial, o argumento para atração de investimento no porto enaltecia sua localização estratégica
no Nordeste. O Recife está a aproximadamente 800 km de Salvador, Fortaleza e Petrolina. A localização atraiu
diferentes indústrias alimentícias, de bebidas, de materiais de construção civil e distribuidoras de automóveis.
Transformações como essa explicam muito melhor a melhora de situação do nordeste do que o Bolsa Família,
apesar de todo preconceito contra os nordestinos depois das eleições de outubro.
4 – Agronegócio: perspectivas e desafios
Nos próximos anos, o país caminhará para se consolidar não só como grande produtor de grãos, mas também
de carne açúcar, mineiro de ferro, petróleo e uma série de outros bens de grande consumo cujos preços são
cotado internacionalmente, as chamadas commodities. E o melhor é que, diferentemente do que pregavam as
39
Inspirado na reportagem de: CALHEIROS, Celso. A Boa Maré em Suape. O porto pernambucano consolida-
se e atrai novas empresas. In Carta Capital nº 591, 14 de abril de 2010.
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teses cepalinas40 nos anos 1960, uma grande participação no setor primário da economia não representa mais,
necessariamente, uma ameaça a industrialização e à diversificação das atividades.
A exploração dos recursos naturais não garante o desenvolvimento por si só, mas sem os recursos o
desenvolvimento é mais difícil. Nos últimos cinco anos a participação das commodities nas exportações
brasileiras se ampliou a um ritmo médio superior a 6% ao ano, de acordo com os dados da Secretaria de
Comércio Exterior (Secex). Em 2009, quando a crise internacional fez encolher as exportações brasileiras em
30%, a parcela dos produtos primários passou de 44,8% para 50,2%, e contribuiu para evitar déficit na balança
comercial.
O mais importante, entretanto, é que as atividades que antes eram básicas, hoje são sofisticadas. A superação
das dificuldades para a introdução das culturas de soja e algodão no Centro‐Oeste e a complexidade da
exploração do petróleo na camada pré‐sal são exemplos que essas atividades incorporaram uso intensivo de
tecnologia. Mesmo a descoberta de novas jazidas de minerais são cada vez mais raras, e dependem da
utilização de tecnologias utilizadas nas pesquisas espaciais.
O próprio debate do início do século XX sobre a “vocação agrícola brasileira”, retorna sob novas bases. O
presidente da Vale, Roger Agnelli, diz que “a vocação do Brasil é ser o maior país agrícola, o maior minerador e
o maior produtor de petróleo”, mas isso nada tem a ver com o mote do passado – em se plantando tudo dá –
seremos os maiores porque “somos bons, nada veio de graça”, completa o executivo.
O Brasil tem se beneficiado da boa fase dos bens primários no comércio internacional. Desde o início da
década, cresce a participação dos alimentos, minérios e petróleo no comércio internacional, e os preços
acompanharam a trajetória de alta. A boa notícia é que os países asiáticos, apontados como principais
causadores desse movimento, não dão sinais de exaustão. Entre 1998 e 2008, a Ásia aumentou de 23% para
30% sua participação nas compras mundiais de produtos básicos e manteve estável sua fatia desde então. Por
isso, banqueiros chineses têm demonstrado imenso interesse em fornecer financiamento, infraestrutura e
máquinas para o Brasil.
Outra vantagem em relação ao passado é que os produtos primários tem se valorizado mais do que os
manufaturados devido a concorrência desses últimos. “Antes era necessário vender 15 toneladas de minério de
ferro para comprar um computador, hoje são necessárias três”, diz Agnelli. Segundo informe da Intel, a
produção mundial de microprocessadores vai duplicar nos próximos cinco anos e os preços cairão pela metade.
Isso não quer dizer que vender produtos primários seja hoje o melhor negócio do mundo. Simplesmente que é
uma oportunidade para os países alavancarem o crescimento. Os países do Oriente Médio têm cobrado altos
impostos para extração de petróleo como forma de consolidar ganhos internos. Outra forma de agir, é o que se
tem feito no Brasil, na tentativa de alargar as cadeias produtivas estimulando parcerias com fornecedores
locais e a criação de infraestrutura de energia, tecnologia, transporte e serviço.
A grande questão então é como expandir a produção e, ao mesmo tempo, constituir laços para contribuir com
a economia local. Daí a posição acertada do governo Lula, embora criticada pela mídia neoliberal, de demandar
navios e plataforma da Petrobras preferencialmente de estaleiros radicados no Brasil. Assim, a Petrobras, com
alto índice de nacionalização de fornecedores e investimentos, tornou‐se um exemplo internacionalmente
reconhecido.
Com as reservas do pré‐sal situando‐se entre 14 bilhões e 30 bilhões de barris, a estatal brasileira poderá se
tornar a maior empresa do mundo nos próximos anos. Diante disso, e com a preferência da Petrobras em
comprar produtos produzidos no país, o setor naval brasileiro saiu da estagnação, como vimos acima. A Vale
por sua vez, teve papel crucial na reativação da indústria ferroviária, com a compra de 259 locomotivas e 12,5
mil vagões desde 2003.
Na agricultura, as vantagens também são evidentes. De acordo com as estatísticas de comércio internacional
da ONU, o Brasil é o maior produtor mundial de carne (bovina, suína e frango), açúcar, café e tabaco. Esse
sucesso se deve a vantagens naturais, como água abundante, sol o ano inteiro e terras férteis e baratas, mas
também a um pacote tecnológico, com destaque para atuação da Embrapa e de outras instituições estatais.
Como exemplo podemos citar a técnica de plantio direto, que permite o uso quase contínuo do solo e a
obtenção de três safras durante o ano, ao cobrir a plantação com a palha da colheita anterior.
40
O termo se refere às teses da Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) criada em 1948
pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas com o objetivo de incentivar a cooperação econômica
entre os seus membros. Uma das teses mais defendidas pela Cepal era da Divisão Internacional do Trabalho.
Essa divisão provocava desigualdades, pois os países em desenvolvimento, adquiriam tecnologias a preços altos,
enquanto que os produtos exportados por eles não atingiam preços satisfatórios, favorecendo os países ricos.
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Não são poucas as áreas de pesquisa promissoras no Brasil. O Brasil que já é líder na produção de
biocombustíveis41 vive a expectativa, segundo Raul Calfat, diretor‐geral da Votorantim, de que uma nova
geração de biocombustíveis seja produzida a partir de cavacos de madeira. Se o prognóstico se confirmar será
uma oportunidade única de agregar valor ao resíduo da produção de celulose, além de reduzir impacto
ambiental.
A biotecnologia está na fronteira da tecnologia mundial, e não é diferente no Brasil: “há variedades de cana‐de‐
açúcar que ainda nem estão no campo, mas serão capazes de ampliar a produtividade em 40%”, discursa
Mendonça de Barros, sócio‐diretor do MB associados. A necessidade de aumento da produtividade se impõe
na produção de alimentos, onde mesmo com o aumento da demanda mundial, os preços caíram 5% nos
últimos 30 anos. Somente a tecnologia e a pesquisa permitem que o setor se manter lucrativo.
A aproximação entre produção industrial e a de commodities suprimiu a fronteira entre as duas atividades,
assim como a produção asiática extingui a divisão internacional do trabalho. A periferia agora produz
tecnologia e o setor primário ficou secundário. Assim, “o Brasil não pode prescindir da indústria que já criou e
nem abandonar uma vantagem natural que já se tornou dinâmica”, afirma Luiz Gonzaga Belluzo, professor de
economia da Unicamp.
A maior evidência de que os produtos primários não são entraves, mas sim alavancas para o desenvolvimento é
o desempenho de países como EUA, Canadá, Austrália e Noruega. Tratam‐se de casos de sucesso de quem
soube estruturar o setor industrial em torno de uma base de recursos naturais.
Diante do sucesso do agronegócio no Brasil, cada vez mais investidores de outros países desembarcam no
Brasil com o objetivo de investir nesse ramo de atividade. Aparentemente, mais uma prova do bom momento
do agronegócio, mas o movimento tem sido tão forte que levou o Congresso Nacional a discutir uma forma de
limitar a compra de terras por estrangeiros.
Em nenhuma outra cadeia esse movimento é tão claro como no setor de cana‐de‐açúcar. Nos últimos meses, o
mercado testemunhou uma verdadeira avalanche de fusões e aquisições bancada pelo capital estrangeiro. No
fim do ano passado, a multinacional americana Bunge arrematou cinco usinas do Grupo Moema por 1,5 bilhão
de dólares, triplicando sua capacidade de moagem e assumindo o posto de terceiro maior produtor de açúcar e
álcool do país. Em setembro, a francesa Louis Dreyfus Commodities comprou o controle da Santelisa Vale,
criando a segunda maior companhia do setor em todo mundo. Este ano a holandesa Shell uniu‐se a Cosan,
maior empresa de álcool e açúcar do mundo, e formou uma gigante com faturamento de 40 bilhões de reais.
Segundo dados da Datagro, a participação de estrangeiros na moagem de cana no Brasil era de apenas 4% em
2003, passou para 12,4% em 2008, 23,2% em 2009 e já está em 25,6%. Até 2020, metade da produção deve
estar na mão de capitais estrangeiros. O que também levaria a concentração do capital. Hoje há 179 grupos
controlando 457 usinas, a estimativa é de que em 15 anos sejam apenas 50 ou 60 grupos, estima Plínio Nastari,
presidente da Datagro.
O interesse estrangeiro pelos biocombustíveis está associado a necessidade de substituição da matriz fóssil42,
seja pela escassez, seja pelos problemas ambientais. Na fase atual, em torno de 60% da produção de cana‐de‐
açúcar será destinada a produção de combustível e não de açúcar. Ou seja, essa atividade cada vez mais é uma
indústria de energia e não de alimentos.
No entanto, o mesmo movimento de avanço do capital estrangeiro acontece no Centro‐Oeste e Nordeste do
país, regiões que predomina a cultura de soja. Nos últimos cinco anos várias empresas estrangeiras, financiadas
por fundos de investimentos, começaram a produzir em áreas isoladas como o Mapito (enclave entre
Maranhão, Piauí e Tocantins) e o oeste baiano. Ao menos 20 grupos estrangeiros exploram essas fronteiras
agrícolas.
Algumas dessas empresas especializaram‐se em comprar terras de baixo custo, como áreas de pastagens
degradadas ou que foram desmatadas por produtores que não tiveram capital suficiente para produzir nelas,
com o objetivo de valorizá‐las e vendê‐las por preços muito mais altos. A Tiba Agro é uma dessas empresas. Até
bem pouco desconhecida no Brasil, capturou mais de 300 milhões de dólares em fundos europeus e norte‐
americanos e afirma possuir estoque de aproximadamente 320 mil hectares, duas vezes a área do município de
São Paulo, nos estados de Mato Grosso, Bahia e Piauí.
41
Para entendimento da Saga dos biocombustíveis no Brasil veja: “História: 30 anos do Próalcool”. Unidade 5,
capítulo 4, pag 259.
42
Para entendimento da necessidade de substituição das fontes fósseis e suas dificuldades veja “O dilema do
petróleo”. Unidade 2, capítulo 3, pag. 65.
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A discussão de que os biocombustíveis podem restringir as áreas de alimentos, ampliou o problema da
escassez de terras no mundo inteiro. Nesse contexto, o Brasil é o único país do mundo politicamente estável e
com economia pujante que tem condições de oferecer terra para a produção tanto de alimento como de
combustíveis.
5 ‐ Tecnologia da Informação
Sob protestos do setor privado e da mídia neoliberal, o governo decidiu reativar a Eletrobrás para execução do
Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). Entre os países tecnologicamente mais avançados, o Brasil tem um dos
piores serviços de internet e dez vezes mais cara do que a média, segundo reportagem do jornal O Globo de 27
de abril de 2010.
Estudo do Ipea define o problema do serviço de banda larga no Brasil como alarmante. Permanecendo dessa
forma o Brasil irá se distanciar cada vez mais do restante do mundo na oferta desse serviço. No ranking da
União Internacional das Telecomunicações, órgão da ONU, o Brasil ficou em 60º lugar, atrás de países como
Argentina (49º), a Rússia (48º) e a Grécia (30º).
O modelo brasileiro permite rentabilidade às operadoras sem a internet, então elas se agarram às regras para
frear o avanço da internet, cujo uso permite, por exemplo, baixar os custos das ligações de longa distância. É
como se tivéssemos trocado o monopólio estatal, por vários monopólios privados.
O PNBL prevê capitalização da estatal em 3,22 bilhões de reais, além de um conjunto de investimentos e
desonerações fiscais que podem levar o custo total a 13 bilhões de reais. O objetivo é levar acesso à internet
em alta velocidade a 40 milhões de lares nos próximos cinco anos. Hoje, a cobertura da banda larga no Brasil
chega a 12 milhões de lares, dos 57 milhões existentes no país. Ou seja, planeja‐se a universalização do serviço.
O plano parte da constatação de que o serviço oferecido no Brasil, além de caro e de má qualidade, é limitado
à parcela da população que capaz de garantir maior rentabilidade às operadoras. Na prática, trata‐se de um
esforço para ampliar a cobertura geográfica do serviço e estimular a competição privada na oferta do acesso.
À Telebrás caberá, prioritariamente, dar uso comercial a rede de mil quilômetros de fibras ópticas pertencentes
a empresas públicas do setor elétrico. As companhias precisam dos cabos para controlar seus equipamentos,
mas usam uma ínfima parte da capacidade de dados. Uma tentativa de vender a banda excedente foi feita, na
década passada, pela Eletronet. Mas a empresa quebrou e o governo recuperou, na justiça, o direito de utilizar
a infraestrutura pública.
A estatal terá de aumentar as ramificações de rede, para levá‐la a locais onde a estrutura utilizada pelas
grandes operadoras não chega. Mas a conexão dos postes até as casas e empresas seria feita por empresas
privadas sem distinção entre grandes e pequenas operadoras. É possível atualmente alugar redes das
concessionárias telefônicas, mas, em geral, os preços oferecidos aos concorrentes são calculados de modo a
inibir a competição ou restringi‐los a pequenos nichos de mercado.
O acesso à internet só seria oferecido diretamente pela estatal nas localidades onde ninguém mais se
interessar em vender o serviço. A Telebrás também se incumbirá de conectar os órgãos da administração
pública e espaços como universidades, hospitais e escola. É nesse ponto que surgem as maiores divergências,
nem sempre explicitas, com as grandes operadoras, que perderão uma preciosa fonte de recursos do setor
público, que gasta mais de 200 milhões de reais com serviço de telecomunicações. Essa receita, combinada
com a venda da capacidade às operadoras, daria a Telebrás condições de operar no azul.
Durante o anúncio do PNBL, o governo garantiu que o seu objetivo não é “limitar ou substituir” a iniciativa
privada, mas independente da posição das operadoras, o governo irá universalizar o serviço: “se a iniciativa
quiser fazer a última milha, ótimo. Se não quiser, nós faremos”, disparou o ministro do Planejamento Paulo
Bernardo.
Até o fim de 2010, apenas cem cidades estarão cobertas pela rede, mas é nelas que serão feitos os estudos que
definirão o modelo de expansão do programa. A capacidade de transmissão de dados, inicialmente na casa de
512 Kbps, a um custo máximo mensal de 30 reais, ainda é muito baixa e cara na comparação com a maioria dos
países desenvolvidos, onde a velocidade é cerca de 200 vezes maiores e a preços em geral mais baixos dos que
oferecidos no Brasil. Mas é o começo de um processo que não pode mais ser adiado.
6 – Copa de 2014: atraso e ganância
Segundo a Fifa o alerta de perigo para a Copa no Brasil foi acionado. O Secretário‐Geral da entidade, Jerome
Valcke, no início de maio criticou duramente o atraso das obras nos estádios das sedes no país: “Há diversos
estádios com luz vermelha acesa. É incrível como o Brasil já está atrasado”. O prazo para início das obras
espirou em 3 de maio e nenhum estádio está com obras avançadas até agora. O deputado federal pelo PSDB
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Silvio Torres, da subcomissão da Câmara para fiscalizar a Copa ironizou: “O presidente da República e o
presidente do Comitê organizador Local, Ricardo Teixeira, disseram que iríamos fazer a melhor Copa de todas,
no entanto estamos recebendo um puxão de orelha internacional. A África do Sul esteve sob intervenção da
Fifa, nós estamos correndo o risco de sofrer o mesmo, o que seria um vexame internacional”.
Diante da crise, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), chegou a admitir a possibilidade de mudar as
cidades sedes. Depois de tanto atraso e da tensão acima exposta, o governo baixou Medida Provisória
autorizando a Infraero a gastar quase R$ 5 bi com reforma de terminais para Copa, ou seja, os Aeroportos terão
obras sem licitação!
O pior ainda estava por vir. Em nota oficial publicada no site de Confederação Brasileira de Futebol (CBF), no
dia 16 de junho, o Comitê Organizador Local (COL) comunicou que o projeto de reforma do Morumbi estava
descartado. A justificativa do presidente das duas entidades, Ricardo Teixeira, é que o São Paulo Futebol Clube,
proprietário do estádio, não apresentou as garantias necessárias para a capacidade de investimento de 650
milhões de reais, segundo o projeto de reforma. O time paulista chegou a apresentar um projeto substituto de
R$ 250 milhões, que não chegou a ser analisado.
O projeto de um novo estádio seria mais interessante. O que demonstra a falta de boa vontade com o projeto
do Morumbi. A Folha de São Paulo divulgou nota sobre a visita do prefeito da cidade, Gilberto Kassab (DEM) a
fazenda de Ricardo Teixeira onde os dois teriam discutido o projeto, antes ainda do descarte do Morumbi.
Teixeira negou qualquer encontro com o prefeito, mas Kassab, que confirmou o encontro, alegou que
defendeu a escolha do estádio do São Paulo para abertura da Copa.
A novela em torno da candidatura do Morumbi começou no início de 2009, quando o primeiro projeto de
reforma, orçado em 135 milhões, foi descartado. O clube voltou a apresentar três outras opções mais caras e
contratou a empresa alemã GMP, responsável pela reforma de três estádios na Copa de 2006 na Alemanha e
de três na Copa de 2010 na África do Sul.
As acusações de que a ganância excluiu o Morumbi são graves. Com a exclusão do estádio, não haveria outra
arena em São Paulo capaz de abrigar jogos de abertura da Copa. O Pacaembu, tombado pelo Patrimônio
Histórico, não pode ter reformas bruscas em sua infraerstrutura e a Arena Palestra, do Palmeiras, em reforma,
terá apenas 45 mil lugares, poderia ser sede da Copa, porém não palco da abertura, já que a Fifa exige ao
menos 65 mil lugares. Pouco para maior cidade do país.
Nesse caso, restariam apenas duas opções: a transferência da abertura também para o Maracanã, pois
somente Rio e São Paulo tem infraestrutura e rede hoteleira capaz de absorver os eventos de abertura e
encerramento do mundial, ou a construção de um novo estádio.
É aí que entra o projeto de estádio do Corinthians que ainda não tem previsão de dinheiro para construir seus
65 mil lugares, nem a chancela da Fifa. Mas a arena em Itaquera conseguiu a indicação do COL (Comitê
Organizador Local) para ser a abertura da Copa‐2014 em 08 de novembro de 2010.
Além do COL, o estádio tem o aval do governo e da Prefeitura de São Paulo, que oficializaram o local para o
Mundial: "É a maior festa da humanidade, que é a abertura da Copa", declarou o prefeito paulistano, Gilberto
Kassab. Mas, como vimos, o comitê não indicou o Morumbi à abertura quando este passava por escrutínio da
Fifa e tentava levantar dinheiro para reformas.
O orçamento da arena corintiana girava em torno de R$ 400 milhões para 48 mil lugares. Com a ampliação para
65 mil, necessária para a realização da abertura, não há valor fechado, mas estimativa de R$ 600 milhões. No
plano inicial, a construtora Odebrecht bancaria a obra, mas o Corinthians teria de pagá‐la depois com direitos
ou dinheiro. O montante seria levantado com o BNDES. Mas não se sabe de onde sairão outros R$ 200 milhões.
"Dois terços dos recursos foram viabilizados", disse o governador Alberto Goldman.
A comprovação de fonte de verba só será exigida após aprovação do projeto pela Fifa, como em outras sedes.
Só que as outras cidades tiveram de entregar as garantias até o meio do ano e terão de acabar as obras no final
de 2012. O estádio corintiano tem conclusão prevista para o final de 2013.
A prova cabal de que havia, desde o início, má vontade com o Morumbi ou que o estádio fora descartado por
interesse difusos vieram nas palavras do arquiteto Antonio Paulo Cordeiro, do escritório que trabalha no plano
corintiano: "Nós e o COL sempre estivemos lado a lado na elaboração do projeto, alinhando o nosso projeto ao
que eles pediam. Agora, eles vão fazer um pente fino. Acredito que as mudanças sugeridas não serão grandes".
Se o projeto tem sido feito juntamente com o comitê, isso significa, no mínimo, concorrência desleal, já que a
função do COL é ver os planos, fazer vistorias e exigir modificações.
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