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Eduardo Defaveri

CURSO REGULAR – ANALISTA JUDICIÁRIO

DIREITO CIVIL

Sumário
LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO ......................................................................... 5

Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) .......................................................................... 5

Princípios Norteadores do Direito Civil. Parte Geral ................................................................................... 23

Princípios Norteadores do Direito Civil....................................................................................................... 23

Pessoa natural ............................................................................................................................................ 25

Morte da pessoa natural ............................................................................................................................ 34

Parte Geral. Direito da personalidade ........................................................................................................ 40

Direitos da Personalidade........................................................................................................................... 40

Bens. Domicílio. Pessoa Jurídica ................................................................................................................. 53

Bens. ........................................................................................................................................................... 53

Domicílio .................................................................................................................................................... 66

Pessoa Jurídica ........................................................................................................................................... 67

Teoria do Negócio Jurídico ......................................................................................................................... 85

Teoria geral do negócio jurídico ................................................................................................................. 85

Negócio Jurídico. Vícios ou defeitos ......................................................................................................... 100

Vícios os defeitos do Negócio Jurídico...................................................................................................... 100

Negócio Jurídico (cont.): elementos acidentais ........................................................................................ 113

Elementos acidentais do negócio jurídico ................................................................................................ 113

Prescrição. Decadência ............................................................................................................................. 118


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Prescrição e Decadência ........................................................................................................................... 118

Direito das Obrigações ............................................................................................................................. 124

Teoria Geral das Obrigações ..................................................................................................................... 125

Classificações das obrigações ................................................................................................................... 127

Direito das Obrigações ............................................................................................................................. 142

1. Adimplemento das obrigações (Teoria do Pagamento) ........................................................................ 142

2. Transmissão das obrigações ................................................................................................................. 158

Direito das Obrigações ............................................................................................................................. 163

1. Regras especiais de pagamento e formas de pagamento indireto ....................................................... 163

Teoria do Inadimplemento ....................................................................................................................... 176

1. Teoria do Inadimplemento ................................................................................................................... 176

Teoria Geral dos Contratos ....................................................................................................................... 194

1. Teoria Geral dos Contratos ................................................................................................................... 194

Teoria Geral dos Contratos (cont.) ........................................................................................................... 218

1. Teoria Geral dos Contratos (continuação) ............................................................................................ 218

Contratos em espécie ............................................................................................................................... 230

1. Contratos em espécie ........................................................................................................................... 230

Responsabilidade Civil .............................................................................................................................. 312

1. Responsabilidade Civil .......................................................................................................................... 312

Alimentos – Poder familiar ....................................................................................................................... 345

1. Alimentos ............................................................................................................................................. 345

2. Poder Familiar ...................................................................................................................................... 350

Posse ........................................................................................................................................................ 353

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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1. Posse .................................................................................................................................................... 353

3. Propriedade .......................................................................................................................................... 367

4. Direito de vizinhança ............................................................................................................................ 389

5. Condomínio .......................................................................................................................................... 396

6. Direito real de aquisição do promitente comprador ............................................................................ 406

7. Direitos reais de gozo ou fruição .......................................................................................................... 407

8. Direitos reais de garantia ...................................................................................................................... 418

→ DIREITO DE FAMÍLIA............................................................................................................................. 438

1. Aspectos gerais ..................................................................................................................................... 438

2. Casamento ............................................................................................................................................ 441

3. Dissolução da sociedade conjugal e do casamento .............................................................................. 466

4. União estável ........................................................................................................................................ 475

5. Relações de parentesco ........................................................................................................................ 483

6. Alimentos ............................................................................................................................................. 497

7. Tutela e Curatela .................................................................................................................................. 501

→ DIREITO DAS SUCESSÕES ..................................................................................................................... 510

1. Introdução ao Direito das Sucessões .................................................................................................... 510

2. Herança e sua administração ............................................................................................................... 512

3. Sucessão legítima ................................................................................................................................. 521

4. Sucessão testamentária ........................................................................................................................ 527

5. Disposições testamentárias .................................................................................................................. 534

6. Revogação do testamento .................................................................................................................... 540

7. Rompimento do testamento ................................................................................................................ 541

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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8. Testamenteiro ...................................................................................................................................... 541

9. Inventário ............................................................................................................................................. 542

10. Partilha ............................................................................................................................................... 557

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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DIREITO CIVIL
LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO

Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB)

I. Conceito de lei

Lei é um imperativo autorizante. Isso porque emana de uma autoridade competente e


surte efeito para todos (generalidade). Imperativo autorizante, visto que a lei autoriza ou não
determinadas condutas.

A lei é uma fonte do direito (primária). A LINDB traz regras a respeito dessa fonte de lei.

O art. 1º diz que: salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país 45 dias
depois de oficialmente publicada. Se lei for omissa, será de 45 dias o período de vacatio legis
(período entre a publicação e a vigência da lei).

A LC 95/98 ensina como será feita a contagem do prazo: faça a inclusão da data da
publicação e faça a inclusão do último dia do prazo. A vigência inicia no dia subsequente à
consumação integral.

Ex.: CC/02 entrou em vigor no dia 11/01/2003, um ano após a sua publicação.

O art. 1º, §1o, trata sobre quando a norma brasileira passa a vigorar no estado estrangeiro,
dizendo que a obrigatoriedade da lei brasileira, nos Estados, estrangeiros, se iniciará 3 meses
depois de oficialmente publicada.

Em havendo uma norma corretiva, ou seja, se houver uma nova publicação do texto legal,
que corrige alguns erros, neste caso, este prazo de 45 dias ou de 3 meses, começam a correr a
partir da nova publicação, sendo considerado como lei nova.

O CESPE (Delta-GO/2017) já considerou correta a seguinte assertiva: A Lei n.º XX/XXXX,


composta por quinze artigos, elaborada pelo Congresso Nacional, foi sancionada, promulgada e
publicada. De acordo com a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, se algum dos
artigos da lei sofrer alteração antes de ela entrar em vigor, será contado um novo período de
vacância para o dispositivo alterado.
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II. Princípio da continuidade da lei

O art. 2º consagra o princípio da continuidade da lei. Isto é, quando a lei entra em vigor,
continuará ela em vigor, até que outra lei a modifique ou a revogue.

Ou seja, não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a
modifique ou revogue.

Portanto, a lei posterior revoga a anterior.

Mas quando é que esta lei revogará a anterior?

a. Quando expressamente o declare

• Quando é com ela incompatível

• Quando regulamenta inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior

Observe-se que a lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já
existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

Trata-se de aplicação do princípio da especialidade.

III. Revogação

O meio mais comum para se retirar a eficácia de uma norma jurídica é por meio da
revogação.

A revogação poderá ocorrer de duas formas:

• Revogação total (ab-rogação): é a revogação absoluta, havendo a supressão total do texto.

• Revogação parcial (derrogação): há uma supressão parcial do texto. A lei nova torna sem efeito
parte de uma lei anterior.

Quanto ao modo de revogação, há duas modalidades:

• Revogação expressa (por via direta): a lei nova diz que está revogando a lei anterior.

• Revogação tácita (por via indireta/oblíqua): a lei nova é incompatível com a anterior.

IV. Repristinação

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O art. 2, § 3o, afasta a possibilidade da lei revogada anteriormente repristinar com a


revogação da lei que a revogou. Só será possível repristinar se houver disposição em sentido
contrário.

Repristinação ocorre quando existe a Lei A. Esta Lei A é revogada pela Lei B. Aí vem a Lei C
e revoga a Lei B. Repristinação se dará quando a Lei C revoga a Lei B, vindo a Lei A vigorar
novamente.

A regra, no entanto, é de não repristinação. Mas se houver uma disposição expressa em


sentido contrário, será possível repristinar.

No caso de inconstitucionalidade da Lei B, esta seria natimorta, razão pela qual não teria
efeito algum, de modo que a Lei A sofreria o efeito repristinatório, voltando a vigorar, pois não
deveria ter deixado de vigorar.

V. Características da norma jurídica e sua aplicação

A lei tem algumas características básicas:

• Generalidade: lei tem eficácia para todos.

• Imperatividade: impõe deveres para todos.

• Permanência: a lei perdura até que seja revogada por outra.

• Competência: a lei precisa ter emanado da autoridade competente.

• Autorizante: a lei autoriza ou não autoriza determinada conduta.

VI. Princípio da obrigatoriedade da lei

O art. 3o traz o princípio da obrigatoriedade da lei, estabelecendo que ninguém se escusa


de cumprir a lei, alegando que não a conhece.

Mas qual é o fundamento? Existem 3 correntes para esta norma:

• Teoria da ficção legal: a obrigatoriedade foi instituída para segurança jurídica.

• Teoria da presunção absoluta: haveria uma presunção iure et iure de que todos conhecem a lei.

• Teoria da necessidade social: Tartuce e MHD se filia a ela. As normas devem ser conhecidas para

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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que melhor sejam observadas. Há uma necessidade social de que se consideram as normas
conhecidas para que sejam observadas. Trata-se de aplicação do princípio da vigência sincrônica
das leis.

VII. Normas de integração da norma

Como se faz integração das normas jurídicas?

Há um dever do aplicador do direito que é o de corrigir as lacunas existentes na lei. Há uma


vedação ao magistrado sobre o não julgamento (vedação ao “non liquet”). Isto é, o magistrado
não poderá não julgar sob alegação de que não há norma. Neste caso, deverá promover uma
forma de integração das normas.

O ordenamento jurídico é completo, ainda que a norma seja lacunosa.

O art. 140 do CPC/2015 diz que o juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna. O
parágrafo único ainda diz que o juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei. Perceba
que o juiz somente julgará com fundamento em equidade quando houver expressa autorização
legal.

O juiz sempre deve julgar com equidade, mas por equidade não, pois deverá se ater as
normas do ordenamento jurídico.

O art. 4º diz que quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com:

• Analogia

• Costumes

• Princípios gerais de direito

Em regra, deverá seguir esta ordem.

Mas o caso concreto pode exigir que a aplicação se dê fora dessa ordem, aplicando-se
primariamente os princípios gerais.

Isso porque, por conta da constitucionalização do direito civil, temos uma maior força
normativa dos princípios, atraindo eles para uma aplicação direta.

a) Analogia
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Analogia é uma forma de integração, não sendo forma de interpretação.

A analogia é a aplicação de uma norma próxima, ou conjunto de normas próximas, quando


não há uma norma prevista para aquele caso concreto.

Ausente norma para regular o caso, será necessário valer de norma que regula caso
semelhante.

i. Classificação da analogia

Classifica-se a analogia como:

• Analogia legal (legis): é a aplicação de uma norma próxima, mas apenas de uma norma próxima.

• Analogia juris: há um conjunto de normas próximas para extrair dali uma norma que irá regular
este caso concreto.

ii. Interpretação extensiva e interpretação analógica que não se confundem com


analogia

Não confunda analogia com interpretação extensiva ou com interpretação analógica:

• Interpretação extensiva: é método ou modo de interpretar. Há apenas a ampliação do sentido


da norma, havendo uma subsunção. Ou seja, o fato continuará subsumindo àquela norma.

• Interpretação analógica: também é forma de intepretação. Aqui, o legislador traz uma série de
menções, fazendo o encerramento genérico, permitindo ao aplicador da norma que se valha dos
exemplos trazidos e pelo encerramento genérico para subsumir a situação ao dispositivo legal.

iii. Normas de exceção e normas excepcionais

Uma regra que é importante é a que trata das normas de exceção e normas excepcionais.

Isso porque normas de exceção e normas excepcionais não admitem analogia ou


interpretação extensiva. Ex.: normas que restringem a autonomia privada não comportam
analogia ou interpretação extensiva. Para um pai vender o imóvel para um filho, é preciso que
este pai tenha autorização dos demais filhos, sob pena de anulabilidade. Aqui há uma restrição
da autonomia privada.

Mas pergunta-se: caso o pai queira hipotecar um imóvel em favor de um dos filhos. Neste
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caso, será necessária autorização dos demais filhos?

NÃO. Isso porque não é venda, e sim hipoteca. Não se pode fazer uma analogia para
abarcar uma situação que não foi abarcada em norma excepcional (art. 496 do CC).

b) Costumes

Costumes são práticas, usos, reiterados que tenham conteúdo lícito (tanto é que ato que
fere os bons costumes é ato ilícito), e que também tenha relevância jurídica (sendo a ideia de
obrigatoriedade que tem na cabeça dos indivíduos).

Os costumes são classificados como:

• Costumes secundum legem: é o costume segundo a lei. Há uma referência expressa da lei sobre
os costumes, mandando que se observem os costumes. Não há uma integração, havendo, em
verdade, uma subsunção do fato à norma.

• Costumes praeter legem: aqui o costume é efetivamente de integração. Pois o costume praeter
legem é aplicado quando a lei é omissa. Ex.: reconhecimento do cheque pré-datado. A
jurisprudência entende que existe direito de indenização a favor daquele que teve contra si
depositado um cheque antes do prazo ajustado. É o teor da Súmula 370 do STJ.

• Costumes contra legem: neste caso, a aplicação do costume contraria o que dispõe a lei, mas
isto não se pode admitir, visto que costume não revoga a lei.

c) Princípios gerais de direito

Professor Miguel Reale conceitua princípios como sendo verdades fundantes. São as
verdades que fundam o sistema, sendo alicerces do sistema.

Para Nelson Nery Jr. e Rosa Nery, os princípios gerais de direito não se encontram
positivados no nosso sistema normativo, tendo por função auxiliar o juiz no preenchimento das
lacunas.

No direito romano, os princípios gerais de direito já estavam previstos, tais como:

• Viver honestamente

• Não lesar a ninguém

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Dar a cada um o que é seu

Estes princípios serão utilizados quando a norma for omissa.

O CC consagra 3 princípios fundamentais:

• Princípio da eticidade:

Deve haver ética nas relações. Valoriza a boa-fé, na lealdade da conduta entre as partes.
É a boa-fé objetiva, a qual tem função de interpretação dos negócios jurídicos, mas também a
função de controle das condutas humanas, além de possuir a função de integração.
Ex.: se o contrato foi omisso em determinado ponto, e não há norma contratual que regule este
ponto, deverá integrar a lacuna por meio da boa-fé objetiva, por meio do comportamento
esperado de alguém que se encontre naquela situação.
• Princípio da socialidade:

A ideia é deixar de ser um código egoísta e passar a ser um código com preocupação da função
social. Todas as categorias civis têm função social, como propriedade, empresa, posse, família,
responsabilidade civil, contratos, etc.
• Princípio da operabilidade:

Tartuce diz que há dois sentidos: simplicidade (permite operá-lo de forma mais fácil) e a
efetividade (permite que seja aplicado facilmente, tornando-o efetivo).

d) Equidade

Em regra, equidade é uma fonte informal do direito, mas caso esteja na lei será formal.

O conceito de equidade passa pelo conceito de bom-senso. É usar um senso de justiça no


caso particular. Trata-se de uma adaptação razoável da lei ao caso concreto. O juiz não é a boca
da lei, mas ele faz justiça, sendo necessário que ele julgue com equidade.

Classifica-se a equidade em:

• Equidade legal:

A aplicação da equidade está prevista no próprio texto legal.


Ex.: art. 413 que trata da redução equitativa da multa ou cláusula penal. Neste caso, a penalidade
deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em

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parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a


natureza e a finalidade do negócio.
• Equidade judicial:

Estará presente quando a lei determina que o magistrado deverá decidir por equidade o caso
concreto.
O CPC estabelece no art. 140, p.ú., que o juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em
lei. Se a lei não autoriza ele a julgar por equidade, não poderá ele julgar dessa forma.
Diferencia-se julgar por equidade de julgar com equidade:
o Julgar por equidade: é desconsiderar a regra legal, julgando pelo bom senso.

o Julgar com equidade: é decidir valendo-se da regra, mas dando a ela interpretação justa
para o caso concreto. Trata-se de um dever perene do magistrado.

VIII. Aplicação da norma jurídica no tempo

O art. 5º, XXXVI, diz que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e
a coisa julgada.

O art. 6º da LINDB diz que a Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato
jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

Este dispositivo conceitua o que é ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada:

• Direito adquirido

Direito adquirido é o direito que alguém adquiriu, sendo incorporado ao patrimônio desse
alguém.
O §2º do art. 6º diz que se consideram adquiridos assim os direitos que o seu titular possa
exercer, e aqueles cujo começo do exercício tenha termo prefixo, ou condição preestabelecida
inalterável, a arbítrio de outrem.
O fato de existir um termo, ou seja, “daqui a 20 dias irá se incorporar ao seu patrimônio” já
implica direito adquirido, pois é certo que passará 20 dias, ou seja, já poderá incorporar o
respectivo patrimônio.
Ex.: benefício previdenciário que alguém já estava usando não poderá perder, desde que tenha
sido concedido regularmente. No caso da reforma da previdência, só poderá atingir quem não se
aposentou. Mas quem já se aposentou tem o direito adquirido.
• Ato jurídico perfeito
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É uma manifestação de vontade lícita, emanada por uma pessoa livremente disposta, a qual já
se encontra aperfeiçoada.
O ato jurídico perfeito é aquele que está consumado de acordo com a lei vigente ao tempo em
que se efetuou aquele ato. Ex.: contrato celebrado anteriormente.
• Coisa julgada

Coisa julgada é a decisão na qual não cabe mais recurso.

i) Proteção do ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada

Tais institutos não são absolutos.

Exemplo disso é a ação de investigação de paternidade julgado improcedente por falta de


provas no momento em que não existia o exame de DNA. O Enunciado 109 da I Jornada de Direito
Civil diz que a restrição da coisa julgada, oriunda de demandas reputadas improcedente por
insuficiente de provas, não deve prevalecer para obstar a busca da identidade genética pelo
investigando.

Ou seja, a coisa julgada não prevalece quando se está a tratar de direito fundamental ao
conhecimento da origem genética. Haverá aqui uma ponderação de valores.

O art. 2.035 do CC diz que nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de


ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para assegurar a função social da
propriedade e dos contratos.

Ou seja, o contrato celebrado antes é ato jurídico perfeito. Mas não vai prevalecer se
contrariar norma de ordem pública. Aqui há uma relativização da proteção.

Este dispositivo traz o princípio da retroatividade motivada (ou justificada). Ou seja, as


normas de ordem pública relativas à função social da propriedade e à função social dos
contratos podem retroagir.

Ex.: redução equitativa da multa contratual. Foi celebrado um contrato antes do CC/02, o
qual previa uma multa abusiva. Com o novo CC, apesar de ser um ato jurídico perfeito, o juiz
poderá promover a redução equitativa da multa, ainda que o ato tenha sido anterior, pois o
contrato deverá observar a função social.

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IX. Aplicação da norma jurídica no espaço

Aqui há uma maior preocupação com a ideia de direito internacional.

O art. 7º consagra a regra lex domicili, ou a regra do domicílio. Ou seja, devem ser
aplicadas, no que concerne ao começo e fim da personalidade, as normas do país em que
domiciliada a pessoa.

Ou seja, a lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre:

• Começo e o fim da personalidade

• Nome

• Capacidade

• Direitos de família

a) Casamento

Com relação ao casamento, se for celebrado no Brasil, deverão aplicadas as regras dos
impedimentos dirimentes e às formalidades da celebração do ordenamento jurídico brasileiro.

O casamento entre estrangeiros poderá ser celebrado no Brasil perante autoridades


diplomáticas ou consulares do país de ambos os nubentes.

E se os nubentes tiverem domicílios diversos?

Neste caso, tendo domicílio diverso, deverão ser aplicadas as regras de invalidade do
casamento do primeiro domicílio conjugal.

Ex.: João e Maria são brasileiros, os quais vão se casar, devendo ser observadas as regras
de impedimento do CC. Johny e Jenifer são americanos e irão se casar perante a autoridade
diplomática, devendo observar as normas de impedimento dos EUA, pois é o país de domicílio de
ambos os nubentes.

Mas e se os nubentes tiverem domicílios diversos, ou seja, se Jenifer está se casando com
Juan, que é colombiano? Como dito, caso tenham os nubentes domicílios diversos, deverão ser
aplicadas as regras quanto à invalidade do casamento, as regras do primeiro domicílio conjugal,
ou seja, onde Juan e Jenifer irão morar? Esta é a pergunta.
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Em relação ao regime de bens, a LINDB diz que deve ser aplicada a lei do local em que os
cônjuges tenham domicílio. A regra é o regime de comunhão parcial.

Havendo divergência quanto aos domicílios, ou seja, se tiverem dois ou três domicílios,
prevalecerá as regras do primeiro domicílio conjugal.

O §7o do art. 7º diz que salvo o caso de abandono, o domicílio do chefe da família
estende-se ao outro cônjuge e aos filhos não emancipados, e o domicílio do tutor ou curador se
estenderá aos incapazes sob sua guarda.

Constitucionalmente falando, o chefe da sociedade conjugal são o marido e a mulher. A


direção da sociedade conjugal é exercida pelo marido e pela mulher.

O §8o diz que o domicílio da pessoa que não tiver residência fixa (domicílio) é o local que
a mesma for encontrada, onde tiver sua moradia habitual.

b) Bens

No que se refere aos bens, deve ser aplicada a norma do local em que estes bens se
situam.

Caso os bens sejam móveis, aplica-se a lei do domicílio do seu proprietário. O penhor
regula-se pela lei do domicílio que tiver a pessoa, em cuja posse se encontre a coisa apenhada.

c) Obrigações

Ao tratar das obrigações, na LINDB, há consagração da regra locus regit actum. Isso
significa que a regra do local em que foram constituídas as obrigações será a lei que regerá o
contrato.

Para aplicar a lei brasileira a um determinado negócio, precisa que este negócio tenha
sido celebrado no território nacional.

Sendo celebrado no exterior, mas tendo que produzir efeitos no Brasil, poderá produzir.
No entanto, se a lei brasileira exigir uma forma específica (ex.: escritura pública), esta norma
deverá observar esta regra para produzir efeitos no Brasil.

Portanto, celebrado no Brasil, serão observadas as regras brasileiras do negócio. Sendo

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celebrado no estrangeiro, serão as regras do lugar em que foi celebrado o negócio.

d) Sucessão por morte ou por ausência

O art. 10 da LINDB regula a sucessão por morte ou por ausência.

A sucessão por morte ou por ausência obedece à norma do país do último domicílio do
de cujus ou o desaparecido, qualquer que seja a natureza e a situação dos bens.

Com relação às normas quanto à vocação hereditária para suceder bens de estrangeiro
situado no Brasil, vão ser as leis nacionais em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou
de quem os represente.

Mas há uma exceção: sendo mais favoráveis ao cônjuge ou aos filhos do casal, serão
aplicadas a lei pessoal do último domicílio. No entanto, se a lei do último domicílio do de cujus
se mostrar mais favorável ao filho do casal ou a sua viúva ou viúvo.

e) Sociedades e fundações estrangeiras

Com relação às sociedades e fundações estrangeiras, devem ser obedecidas as leis do


lugar da sua constituição.

Existem 3 regras específicas:

• Para atuar no Brasil, sociedades e fundações estrangeiras precisam de autorização do governo


federal. Nesse caso, ficam sujeitas às leis brasileiras.

• Governo estrangeiro ou entidade constituída para atender governo estrangeiro não pode
adquirir no Brasil bens imóveis ou suscetíveis à desapropriação.

• Governo estrangeiro pode adquirir propriedade de prédio necessários à sede dos


representantes diplomáticos ou dos agentes consulares.

f) Competência do juiz brasileiro

Em relação à competência do juiz brasileiro, há necessidade de atuação quando o réu for


domiciliado no Brasil, ou quando aqui tiver de ser cumprida a obrigação, situação na qual deverá
ser observada a competência da autoridade judicial brasileira.

Quanto aos imóveis situados no Brasil, a competência da autoridade judiciaria brasileira


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é exclusiva.

g) Execução da sentença estrangeira

O art. 15 da LINDB estabelece que será executada no Brasil a sentença proferida no


estrangeiro, desde que reúna os seguintes requisitos:

• Proferida por juiz competente

• Partes foram citadas, observada a ampla defesa e contraditório

• Sentença transitada em julgado

• Revestida das formalidades necessárias para execução no país de origem

• Estar traduzida por intérprete autorizado

• Ter sido homologada pelo STJ

Observados os requisitos, poderá executar a lei estrangeira.

O art. 17 estabelece que as leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer
declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando:

• Ofenderem a soberania nacional

• Ofenderem a ordem pública

• Ofenderem os bons costumes

Ex.: o STJ já se manifestou sobre a Convenção de Montreal, a qual estabelece limitações


de indenização em casos de atrasos de voos, perda, extravios de bagagem, etc. No entanto, o CDC
vai consagrar o princípio da reparação integral dos danos.

O STJ reorientou sua jurisprudência em recente julgado quanto à aplicação dos


mencionados tratados internacionais. Assim, tais tratados têm prevalência em detrimento do
CDC. No que se refere aos contratos empresariais, a I Jornada de Direito Comercial fixou o
entendimento de que aos contratos de transporte aéreo internacional celebrados por
empresários aplicam-se as disposições da Convenção de Montreal e a regra da indenização
tarifada nela prevista.

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h) Celebração de atos por autoridades consulares brasileiras

O art. 18 estabelece que, em se tratando de brasileiros, são competentes as autoridades


consulares brasileiras para lhes celebrar o casamento e os mais atos de Registro Civil e de
tabelionato, inclusive o registro de nascimento e de óbito dos filhos de brasileiro ou brasileira
nascido no país da sede do Consulado.

As autoridades consulares brasileiras também poderão celebrar separação consensual e


o divórcio consensual de brasileiros, se não houver filhos menores ou incapazes do casal e
observados os requisitos legais quanto aos prazos, devendo constar da respectiva escritura
pública as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia
e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção
do nome adotado quando se deu o casamento.

É indispensável a assistência de advogado, devidamente constituído, que se dará


mediante a subscrição de petição, com ambas as partes, ou com apenas uma delas, caso a outra
constitua advogado próprio, não se fazendo necessário que a assinatura do advogado conste da
escritura pública.

X. Estudo das antinomias jurídicas

Antinomia: “nomia” é norma + “anti” é contrariedade. É uma norma que conflita com a
outra.

A antinomia é o conflito de normas, sendo a presença de duas ou mais normas conflitantes,


não se podendo dizer qual delas poderá ser aplicada ao caso concreto.

Existem meta-critérios clássicos que foram criados por Norberto Bobbio para solucionar o
choque entre normas jurídicas.

Para solucionar antinomias de 1º grau, existem os seguintes critérios:

• Critério cronológico: uma norma posterior prevalece sobre norma anterior.

• Critério da especialidade: uma norma especial prevalece sobre norma geral.

• Critério hierárquico: uma norma de hierarquia superior prevalece sobre a inferior.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

São resoluções de conflitos de normas por meio de um critério só.

O interessante está nas antinomias de 2º grau, quando o choque envolve dois critérios
trazidos por Norberto Bobbio:

• Norma especial anterior x norma geral posterior:

Prevalece o critério da especialidade.


• Norma superior anterior x norma inferior posterior:

Prevalece o critério hierárquico.


• Norma geral superior x norma especial inferior:

A própria Constituição consagra o princípio da isonomia. A norma especial que parece destoar
da norma geral superior pode ser que simplesmente esteja aplicando o princípio da isonomia.
Ex.: CF consagra o princípio da igualdade, estabelecendo que homens e mulheres são iguais
perante a lei. Mas a Lei Maria da Penha confere um tratamento especial para mulher, sendo uma
lei especial e inferior, enquanto a CF é geral e superior. Neste caso, apesar de parecer
contraditório, o princípio da isonomia respalda. Não existe uma prevalência dos critérios nesse
caso.
Portanto, no caso de conflito entre norma superior e norma especial, há dois caminhos para
solução desse choque. O primeiro é o legislativo criar uma terceira norma e estabelece qual das
duas normas deverá prevalecer. A maioria dos casos é solucionada pelo Poder Judiciário, o qual
deverá analisar o caso concreto e definir.
O art. 8 do NCPC diz que ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais
e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa
humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade
e a eficiência. O juiz deverá fazer um juízo de ponderação para verificar o critério que
aplicará naquele caso, observando os critérios acima mencionados.
Importa registrar que a Lei n. 13.655, de 2018 incluiu os artigos de 20 a 30 na LINDB, tendo
sido o art. 25 vetado. A interpretação dos arts. 20 a 30 deve ser a de que eles se aplicam para
temas de direito público, mais especificamente para matérias de Direito Administrativo,
Financeiro, Orçamentário e Tributário. Tais regras não se aplicam, portanto, para temas de direito
privado.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 20 da LINDB tem por objetivo reforçar a ideia de responsabilidade decisória estatal
diante da incidência de normas jurídicas indeterminadas. O dispositivo proíbe “motivações
decisórias vazias, apenas retóricas ou principiológicas, sem análise prévia de fatos e de impactos.
Obriga o julgador a avaliar, na motivação, a partir de elementos idôneos coligidos no processo
administrativo, judicial ou de controle, as consequências práticas de sua decisão.”
(https://www.conjur.com.br/dl/parecer-juristas-rebatem-criticas.pdf)
Impende ressaltar que o art. 20 não impede de que o julgador decida com base em valores
jurídicos abstratos, mas antes da decisão se torna necessário seja feita uma análise prévia de quais
serão as consequências práticas dessa decisão. Assim, a análise das consequências práticas da
decisão passa a fazer parte das razões de decidir.
Ressalte-se que esse regramento do art. 20 vale para decisões proferidas nas esferas
administrativas (ex: em um PAD), controladora (ex: julgamento das contas de um administrador
público pelo TCE) e judicial (ex: em uma ação civil pública pedindo melhores condições do sistema
carcerário).
A expressão “consequências práticas da decisão” prevista no art. 20 significa “as
consequências econômicas da decisão proferida”. Ou seja, Trata-se da chamada “análise econômica
do direito – AED”. “De acordo com a Análise Econômica do Direito (AED), a economia,
especialmente a microeconomia, deve ser utilizada para resolver problemas legais, e, por outro
lado, o Direito acaba por influenciar a Economia. Por esta razão, as normas jurídicas serão eficientes
na medida em que forem formuladas e aplicadas levando em consideração as respectivas
consequências econômicas.” (OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo.
2ª ed., São Paulo: Método, 2014, p. 31).
Outro aspecto da alteração da LIND é a previsão do parágrafo único do art. 20 que preconiza
“A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de
ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis
alternativas”.
Assim, todas as decisões, sejam elas proferidas pelos órgãos administrativos, controladores
ou judiciais, devem ser motivadas. O administrador, conselheiro ou magistrado, ao tomar uma
decisão, deverá indicar os motivos de fato e de direito que o levaram a agir daquela maneira.
O art. 21 da LINDB tem por objetivo exigir o exercício responsável da função judicante do
agente estatal. O que significa dizer que “invalidar atos, contratos, processos configura atividade
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

altamente relevante, que importa em consequências imediatas a bens e direitos alheios. Decisões
irresponsáveis que desconsiderem situações juridicamente constituídas e possíveis consequências
aos envolvidos são incompatíveis com o Direito”. (https://www.conjur.com.br/dl/parecer-juristas-
rebatem-criticas.pdf)
Por sua vez o art. 22 da mencionada lei preconiza o primado da realidade que significa: “(...)
a norma em questão reconhece que os diversos órgãos de cada ente da Federação possuem
realidades próprias que não podem ser ignoradas. A realidade de gestor da União evidentemente é
distinta da realidade de gestor em um pequeno e remoto município. A gestão pública envolve
especificidades que têm de ser consideradas pelo julgador para a produção de decisões justas,
corretas. As condicionantes envolvem considerar (i) os obstáculos e a realidade fática do gestor, (ii)
as políticas públicas acaso existentes e (iii) o direito dos administrados envolvidos. Seria pouco
razoável admitir que as normas pudessem ser ignoradas ou lidas em descompasso com o contexto
fático em que a gestão pública a ela submetida se insere.” (https://www.conjur.com.br/dl/parecer-
juristas-rebatem-criticas.pdf)
O parágrafo segundo do art. 22 trouxe critérios a serem considerados na aplicação das
sanções, quais sejam:
a) Natureza e gravidade da infração cometida;
b) Danos causados à Administração Pública;
c) Agravantes;
d) Atenuantes;
e) Antecedentes.
O art. 23 trouxe regramento sobre alteração de interpretação e modulação dos efeitos da
decisão. Nesse sentido, caso haja alguma mudança na forma como a Administração Pública, os
Tribunais de Contas ou o Poder Judiciário interpretavam determinada norma, deverá ser previsto
um regime de transição. Isso significa dizer que deve haver uma concessão de um prazo para que
os administradores públicos e demais pessoas afetadas pela nova orientação possam se adaptar à
nova interpretação.
Requisitos para a aplicação do regime de transição:
a) A decisão administrativa, controladora ou judicial deve estabelecer uma interpretação ou
orientação nova;
b) Essa interpretação nova deve recair sobre uma norma de conteúdo indeterminado;
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

c) Por conta dessa interpretação, será imposto novo dever ou novo condicionamento de direito;
d) O regime de transição mostra-se, no caso concreto, indispensável para que o novo dever ou
condicionamento de direito seja cumprido de modo proporcional, equânime e eficiente;
e) A imposição desse regime de transição não pode acarretar prejuízo aos interesses gerais.
Cabe ao órgão julgador a análise dos preenchimentos dos requisitos acima, sendo passível
de recurso caso o interessado entenda que deveria ter direito ao regime de transição.
Art. 24 - REVISÃO DEVERÁ LEVAR EM CONTA A ORIENTAÇÃO VIGENTE NA ÉPOCA DA PRÁTICA
DO ATO. O ato deverá ser analisado conforme as orientações gerais da época e as situações por elas
regidas deverão ser declaradas válidas, mesmo que apresentem vícios.
O art. 26 da LINDB previu a possibilidade de a autoridade administrativa celebrar um acordo
(compromisso) com os particulares com o objetivo de eliminar eventual irregularidade, incerteza
jurídica ou um litígio (situação contenciosa). É requisito para que esse compromisso seja realizado
que o órgão jurídico (AGU, PGE, PGM) seja previamente ouvido, e, ainda, em alguns casos a
realização de audiência pública.
O art. 27 previu a imposição de compensação. De acordo com a Sociedade Brasileira de
Direito Público o “dispositivo em questão visa evitar que partes, públicas ou privadas, em processo
na esfera administrativa, controladora ou judicial aufiram benefícios indevidos ou sofram prejuízos
anormais ou injustos resultantes do próprio processo ou da conduta de qualquer dos envolvidos. O
art. 27 tomou o cuidado de exigir que a decisão que impõe compensação seja motivada e precedida
da oitiva das partes. Há, também nesse caso, a possibilidade de celebração de compromisso
processual entre os envolvidos.”
Segundo ainda a Sociedade Brasileira de Direito Público, “o art. 28 quer dar a segurança
necessária para que o agente público possa desempenhar suas funções. Por isso afirma que ele só
responderá pessoalmente por suas decisões ou opiniões em caso de dolo ou erro grosseiro (o que
inclui situações de negligência grave, imprudência grave ou imperícia grave)”.
O art. 29, por sua vez, previu a consulta pública prévia à edição de atos normativos por
autoridade administrativa. Isso traz transparência e previsibilidade à atividade normativa do
Executivo.
Por fim, o art. 30 da LINDB trouxe instrumentos para aumentar a segurança pública:
Art. 30. As autoridades públicas devem atuar para aumentar a segurança jurídica na aplicação das
normas, inclusive por meio de regulamentos, súmulas administrativas e respostas a consultas.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Parágrafo único. Os instrumentos previstos no caput deste artigo terão caráter vinculante em
relação ao órgão ou entidade a que se destinam, até ulterior revisão.

Princípios Norteadores do Direito Civil. Parte Geral

Princípios Norteadores do Direito Civil

I. Introdução

O CC foi instituído pela Lei 10.406, sendo de 10/01/2002, que teve a previsão de vigência
pelo prazo de 1 ano. Então, 1 ano da publicação, começando a vigorar no dia subsequente,
começando no dia 11/01/2003.

Miguel Reale apontava os regramentos básicos do atual Código Civil:

• Eticidade

• Socialidade

• Operabilidade

a) Princípio da eticidade

Será observado em vários dispositivos do CC/02, havendo exemplificativamente as


seguintes funções da boa-fé objetiva:

• Função interpretativa: sendo exemplo o art. 113, o qual estabelece que os negócios jurídicos
devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração. Há aqui o
princípio da boa-fé objetiva como forma de interpretação.

• Função limitadora: o art. 187 traz uma sanção para aquele que contraria a boa-fé no exercício
de um direito. E portanto o exercício irregular de um direito é abuso de direito, sendo ato ilícito.
Há um controle feito pela boa-fé objetiva, a qual limita a atuação do sujeito. O direito termina
quando inicia o direito do outro.

• Função de integração: o art. 422 do CC/02 consagra a boa-fé como forma de integração do
contrato, a qual deverá ser observada na conclusão ou na execução do contrato. Ex.: o contrato
foi omisso, mas qual seria o comportamento esperado?

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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b) Princípio da socialidade

O princípio da socialidade visa modificar o caráter individualista que vigorava na


codificação anterior.

É a observância da função social.

O art. 421 do CC estabelece que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos
limites da função social do contrato. O contrato tem uma função social que deverá ser observada.

Exemplo disso é a usucapião, em que se o indivíduo trabalhar e morar na terra, o prazo


será por metade, ou ainda menor.

Conferiu-se a função social uma enorme relevância.

c) Princípio da operabilidade

O princípio da operabilidade tem dois significados:

• Simplicidade: o instituto deverá ser aplicado facilmente.

• Efetividade: o código deve ser efetivo.

Percebe-se a aplicação do operabilidade por meio das cláusulas gerais.

Mas o que são cláusulas gerais?

Segundo Judith Martins Costa, na atual codificação material, é possível que se perceba um
sistema aberto, ou um sistema de janelas abertas, que permitem uma constante incorporação e
solução para novos problemas.

Como as cláusulas são gerais, é possível manter o ordenamento a despeito da


transformação das realidades sociais, pois as normas conseguem se adaptar às novas
modificações. Tratam-se, portanto, de janelas abertas deixadas pelo legislador para serem
preenchidas pelo aplicador do direito caso a caso.

Exemplo é a função social da propriedade, boa-fé, bons costumes, atividade de risco, etc.

As cláusulas gerais têm um sentido dinâmico, diferenciando-se dos conceitos legais


indeterminados:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Conceito legal indeterminado:

É estático. Consta da lei, mas não há definição. Quando o aplicador do direito dele se utiliza, e
passa a dar sentido ao conceito legal indeterminado, passará a ser uma cláusula geral, pois
somente então terá uma função dinâmica. Antes não era regulado.
• Cláusulas gerais:

Miguel Reale criou uma particular teoria do conhecimento, baseando-se em duas subteorias:
culturalismo jurídico e a teoria tridimensional do direito. A diferença entre um e outro é do
ponto de vista.
O culturalismo jurídico é do ponto de vista subjetivo, pois o enfoque jurídico está no aspecto do
sujeito. Orientarão a aplicação e as decisões que serão tomadas as seguintes expressões: cultura,
experiência e a história. A partir da análise da cultura local, da experiência local e da história
local é possível extrair uma norma, estando os olhos voltados para o sujeito.
Na teoria tridimensional, vamos para o plano objetivo. Isso porque o direito é fato, valor e
norma. Ou seja, se há um fato, há uma repercussão valorada na sociedade e a partir dessa
valoração, cria-se uma norma. O adultério era crime, mas com o tempo, houve uma valoração
do fato pela sociedade, deixando de ser crime. Ou seja, mudou-se a norma.
Na relação entre culturalismo jurídico e a teoria tridimensional do direito, fica fácil, visto que
cultura é o valor que se dá aquela situação. Experiência é a norma. Enquanto a história é o fato.
O magistrado e jurista devem fazer um mergulho no fato e, então de acordo com seus valores e
experiências, aplica a norma, de acordo com os limites, os quais devem ser observados.

Pessoa natural

O CC/02 cuida da pessoa natural do art. 1º ao art. 39.

I. Capacidade

O art. 1º diz que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil. Essa capacidade
é uma capacidade de direito ou de gozo. Toda pessoa tem esta capacidade.

Existe ainda outra capacidade, sendo denominada capacidade de fato ou de exercício. Esta
capacidade algumas pessoas não têm.

Conclui-se que para ter capacidade civil plena, é preciso ter a capacidade de direito (gozo)
e a capacidade de fato (exercício).

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Existem certos conceitos que são similares à capacidade, mas são diferentes:

• Legitimação: é a capacidade especial para um determinado ato ou negócio jurídico. Ex.:


necessidade de outorga conjugal para vender o imóvel, sob pena de anulabilidade do contrato.
Esta legitimação é conferida ao cônjuge.

• Legitimidade: é a capacidade processual, estando relacionada às condições da ação.

• Personalidade: é a soma de caracteres de uma pessoa. É aquilo que a pessoa é para ela e aquilo
que ela é para a sociedade. Diz-se que a capacidade é a medida da personalidade. E portanto a
personalidade é a essência, ou substância, e a capacidade é o quantum.

II. Início da personalidade jurídica e a situação jurídica do nascituro

O art. 2º do CC diz que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida.
Mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Afinal, qual a teoria foi adotada?

Existem 3 correntes que justificam a situação do nascituro:

• Teoria natalista:

A personalidade começa com o nascimento com vida. O nascituro não é pessoa. Isso porque o
CC exige para a personalidade o nascimento com vida. Por meio dessa teoria, o nascituro não
tem direitos, mas apenas expectativas de direitos.
A crítica principal que se faz é no sentido de que, se o nascituro não é pessoa, o que ele seria,
uma coisa? A resposta seria afirmativa. No entanto, não se pode tratar o nascituro como coisa,
visto que o próprio código assegura desde a concepção direito ao nascituro.
• Teoria da personalidade condicional:

A personalidade civil começa com o nascimento com vida, mas os direitos do nascituro estão
sujeitos a uma condição suspensiva. Por isso o nome da teoria da personalidade condicional.
Condição suspensiva é um elemento acidental do negócio jurídico, podendo estar presente ou
não. Trata-se de um elemento acidental que subordina a eficácia do negócio a um evento futuro
e incerto, no caso, o evento é o nascimento. E portanto, a condição é o nascimento.
Qual é a crítica? O nascituro não teria direito, mas apenas expectativas de direitos. Essa teoria é
extremamente apegada a questões patrimoniais. Ela não responde a apelo de direitos pessoais
ou de direitos da personalidade do nascituro. Isso porque direitos da personalidade são
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

incondicionais, não podendo estar sujeito a uma condição, termo ou encargo. Essa é a grande
crítica da teoria da personalidade.
• Teoria concepcionista:

Segundo a maioria da doutrina e a jurisprudência do STJ, esta é a teoria que foi adotada pelo
Código Civil.
Essa teoria concepcionista sustenta que o nascituro é pessoa humana, tendo os direitos
resguardados pela lei. A conclusão dessa corrente consta do Enunciado 1 da Jornada de Direito
Civil, que diz que a proteção que o código defere ao nascituro alcança o natimorto, e portanto
aquele que nasceu sem vida, no que concerne aos seguintes direitos: nome, imagem e
sepultura. A teoria concepcionista é a que prevalece entre doutrinadores.
Maria Helena Diniz adere a esta teoria, apesar de fazer uma distinção simples entre
personalidade jurídica:
a) Personalidade jurídica formal: é a relacionada com direitos da personalidade. O nascituro já
têm.
b) Personalidade jurídica material: é a personalidade jurídica relacionada a direitos patrimoniais.
O nascituro só adquire com nascimento com vida.
A teoria concepcionista tem prevalecido no STJ. Há um julgamento importante em que se
reconheceu o dano moral ao nascituro pela morte de seu pai que ocorreu antes do seu
nascimento.

O debate das teorias relativas ao nascitura ganha reforço com a Lei 11.804/08, que trata
dos alimentos gravídicos, apesar da crítica à nomenclatura.

Os alimentos gravídicos compreendem os valores suficientes para cobrir despesas


adicionais do período da gravidez. O que se busca tutelar é o nascituro, tendo como destinatário
o próprio nascituro, apesar de uma corrente alegar que é destinado à gestante.

Nesse sentido, caminha o ordenamento jurídico para adoção da teoria concepcionista.

a) Situação jurídica do embrião

Vislumbrada a teoria concepcionista, é necessário trazer alguns comentários em relação


ao embrião.

A Lei 11.105, conhecida como Lei de Biossegurança, vai tutelar a situação do embrião,
reforçando a teoria concepcionista.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 5º da Lei diz que é permitida a utilização de células-tronco embrionárias para fins
de pesquisa e terapia, obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não
utilizados no respectivo procedimento, desde que:

• sejam embriões inviáveis; ou

• sejam embriões congelados há 3 anos ou mais, na data da publicação da Lei, ou que, já


congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a
partir da data de congelamento.

Ainda, para fins de utilização de embrião para fins de pesquisa e uso terapêutico, a lei
autoriza tal utilização, desde que, em qualquer caso, seja indispensável o consentimento dos
genitores.

A utilização de células-tronco embrionárias é excepcional, pois a regra é a não utilização.

O STF considerou constitucional essa lei.

Veja, o descarte dos embriões não utilizados se dá pelo encaminhamento às pesquisas


de células-tronco. Ou seja, não terá o embrião direitos da personalidade. A existência dos direitos
da personalidade é condicionado à concepção intrauterina.

III. Os incapazes no Código Civil de 2002

Muita coisa mudou com a Lei 13.146/15 (Estatuto da Pessoa com Deficiência).

O Estatuto apenas consolidou aquilo que constava da Convenção de Nova Iorque, a qual
tem força de emenda constitucional.

Segundo o art. 3º, são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida
civil apenas os menores de 16 anos.

O art. 4º estabelece que são incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os


exercer:

• Maiores de 16 e menores de 18 anos

• Ébrios habituais e os viciados em tóxico

• Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Pródigos

Não trata dos doentes mentais ou de deficiência. A ideia é a inclusão total dos deficientes.

a) Estatuto da Pessoa com Deficiência

Não há mais possibilidade de pessoas maiores de 18 anos serem absolutamente


incapazes. Se elas não puderem exprimir sua vontade, serão relativamente incapazes. O objetivo,
portanto, foi a plena inclusão da pessoa com algum tipo de deficiência.

A Lei nº 13.146/2005 tem aplicação imediata, atingindo todas as pessoas que, no início da
vigência da referida norma, não podiam exprimir a vontade, por causa transitória ou permanente,
as quais passaram a ser consideradas relativamente incapazes.

É forçoso afirmar que o art. 6º da Lei 13.146/15 estabelece que a deficiência não afeta a
plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

• Casar-se e constituir união estável;

• Exercer direitos sexuais e reprodutivos;

• Exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas
sobre reprodução e planejamento familiar;

• Conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

• Exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

• Exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em


igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

Veja, a ideia é a inclusão da pessoa com deficiência. No plano familiar, com relação aos
atos existenciais há uma inclusão plena da pessoa com deficiência.

O art. 84 do Estatuto estabelece que a pessoa com deficiência tem assegurado o direito
ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas.

E se for necessário auxílio?

Quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela, conforme a lei.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

É facultado à pessoa com deficiência a adoção de processo de tomada de decisão apoiada.

A definição de curatela de pessoa com deficiência constitui medida protetiva


extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor
tempo possível.

A ideia é incluir a pessoa com deficiência. E ainda, a curatela afetará tão somente os atos
relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial.

Em outras palavras, podem existir a limitação de atos patrimoniais, mas não em relação
a atos existenciais.

Portanto, para que a curatela esteja presente, é necessário que haja ação judicial
específica, enquadrando-se em uma das hipóteses do art. 4º, pois se for menor de idade, o pai
será o responsável.

b) Representação e assistência

Com relação aos absolutamente incapazes, estes deverão ser representados. Então, o
menor de 16 anos deverá ser representado, sob pena de nulidade absoluta do ato por ele
praticado.

Em relação aos relativamente incapazes, estes deverão ser assistidos, sob pena de
anulabilidade do negócio.

Questão que era sempre debatida seria o negócio celebrado pelo incapaz antes da
declaração da incapacidade. Mas aí vinha a declaração da incapacidade do sujeito pela sentença,
ou seja, a sentença era posterior ao negócio que havia sido fechado.

Este ato anterior à sentença poderá ser nulo ou será válido?

Pablo Stolze diz que os atos anteriores à interdição poderão ser tidos como inválidos, se
a causa de interdição já existia, e, se à época em que os fatos foram praticados, a incapacidade
podia ser percebida pelo negociante capaz. Se ele não podia perceber, não seria possível anular.

Segundo o STJ, serão considerados nulos os atos e negócios jurídicos praticados pelo
incapaz anteriores à sentença de interdição, em se comprovando que o estado da incapacidade

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

é contemporâneo ao ato ou negócio a que se pretende anular.

Na opinião de Flávio Tartuce, a boa-fé blindaria o negócio tratado entre o sujeito capaz e
o sujeito absolutamente incapaz.

Hoje em dia, como não existem mais absolutamente incapazes maiores de 18 anos.

c) Absolutamente incapazes

Os únicos absolutamente incapazes são os menores impúberes, ou seja, os menores de


16 anos. Há uma presunção absoluta de incapacidade.

Eventualmente, um ato de um menor de 16 anos (absolutamente incapaz) poderá gerar


efeitos, conforme o Enunciado 138 do CJF, que diz que a vontade dos absolutamente incapazes é
juridicamente relevante para concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde
que se demonstre que havia discernimento bastante para a prática do ato.

Ex.: menino de 15 anos foi à padaria comprar pão. Este negócio não será nulo.

d) Relativamente incapazes

São relativamente incapazes a certos atos ou à maneira de os exercer:

• Maiores de 16 e menores de 18 anos:

Existem atos em que esses menores de 18 e maiores de 16 anos podem praticar sem a
assistência, como é o casamento, desde que exista autorização dos pais. Também poderão
elaborar testamentos e ser testemunhas em negócios e atos jurídicos. Além disso, poderão
requerer registro do seu nascimento. Poderão ainda ser empresários, desde que exista
autorização legal para tanto. Podem ser eleitor, podendo votar. Podem também ser
mandatários para negócios extrajudiciais.
• Ébrios habituais e os viciados em tóxico:

O NCPC estrutura a ação de interdição que é o art. 747 ao art. 758.


É plenamente possível a ação de interdição, tanto é que o art. 753, §2º, do NCPC estabelece que
o laudo pericial indicará especificadamente, se for o caso, os atos para os quais haverá
necessidade de curatela. E portanto promove a ação de interdição, o sujeito será interditado,
mas o laudo dirá os atos trará as hipóteses em que será necessária a curatela. Fora desses atos,

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poderá o sujeito praticar o ato que quiser, pois a ideia é manter plenamente integrado ao
contexto social. Veja, a regra é a capacidade.
• Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade

Antes da alteração do Estatuto, esta causa era geradora de incapacidade absoluta.


Ex.: surdo, mudo que não consiga se expressar, idoso que tenha Alzheimer, pessoa em coma, etc.
• Pródigos

Pródigos são aquelas pessoas que dissipam o patrimônio de forma desordenada e desregrada.
Basta pensar nas pessoas viciadas em jogos.
Os pródigos têm que ter nomeação de um curador. Mas como a questão é patrimonial, ficarão
privados apenas dos atos que possam comprometer o seu patrimônio. Caso contrário não.
Poderão desde já continuar praticando os seus atos.

Em relação à capacidade, é importante mencionar a capacidade dos índios ou silvícolas.

A situação dos índios ou silvícolas, conforme o parágrafo único do art. 4º, é regida por lei
especial. Essa lei especial é a Lei 6.001/73, que é o Estatuto do Índio, o qual coloca que o silvícola,
enquanto não for integrado à comunidade nacional, sob o regime de tutela, devendo ter uma
assistência exercida pela FUNAI.

A lei considera que são nulos os atos praticados por índio não integrado e qualquer outra
pessoa estranha à comunidade, caso não tenha havido tutela da FUNAI.

Não se aplica essa regra de nulidade, se o índio revelar consciência e conhecimento do ato
praticado, e desde que o ato praticado não lhe seja prejudicial.

Qualquer índio pode requerer ao juízo competente que seja liberado do regime tutelar,
desde que preencha os requisitos legais, sendo a ideia de estar plenamente integrado à comunhão
nacional.

e) Emancipação

A emancipação é um ato jurídico que antecipa os efeitos da maioridade, e da consequente


capacidade civil plena.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Com a emancipação, o menor deixa de ser incapaz, passando a ser capaz, mas não deixa
de ser menor. O Enunciado do CJF diz que a emancipação, por si só, não ilide a aplicação do ECA.
Ou seja, o menor emancipado não pode tirar carteira de motorista. Não poderá também
ingressar em local em que seja proibida a entrada de menores, pois o indivíduo continua sendo
menor. Não poderá ingerir bebidas alcoólicas.

A emancipação é a regra geral, caso preenchido os requisitos legais. No entanto, tendo


ocorrido a emancipação, em regra, o que se terá é uma emancipação definitiva, irretratável e
irrevogável.

Mas, a emancipação por concessão dos pais ou por sentença do juiz está sujeito à
desconstituição por um vício de vontade. Isso porque o caso seria de anulação da emancipação.

A emancipação é ato formal e solene, visto que, via de regra, deve ser feita por
instrumento público.

Poderá ocorrer a emancipação nas seguintes situações:

• Emancipação voluntária parental:

É aquela emancipação concedida por ambos os pais. Não é necessária a homologação do juiz, se
ambos os pais concordam. É concedida a emancipação por instrumento público, devendo ser
registrada no cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais. O menor deverá ter no mínimo 16
anos completos para esta emancipação legal.
• Emancipação judicial:

A emancipação se dará por meio de sentença do juiz, quando, por exemplo, o sujeito ingressar
com processo para poder emancipar o filho.
A decisão judicial afasta a necessidade de escritura pública, mas não afasta a necessidade de
registro. Tanto a emancipação voluntária como a judicial, deverão ser registradas no cartório
de Registro Civil das Pessoas Naturais.
Segundo o ECA, a emancipação

pode ser concedida pelo Juiz da Infância e Juventude quando faltarem os pais e, preenchidos os
requisitos da lei civil, se os direitos do requerente, previstos no ECA, forem ameaçados ou violados
por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, bem como por omissão ou abuso dos pais ou
responsável ou em razão de sua conduta (art. 148 c/c art. 98 do ECA).
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Emancipação legal:

É a emancipação que se dará independentemente do registro. Veja, o registro é dispensado.


o Emancipação legal matrimonial (casamento): o casamento implica emancipação do
menor. O menor poderá casar a partir dos 16 anos, desde que haja autorização. É
possível ainda o casamento de menor de 16 anos, desde que haja situações previstas no
código (ex.: gravidez). Caso se divorciem ou se ficar viúva, ou ainda se o casamento for
anulado, tais situações não implicam incapacidade.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona dizem que se for caso de nulidade ou de anulabilidade,
a emancipação irá persistir se o casamento foi contraído de boa-fé pelo menor
(casamento putativo). Em relação ao divórcio e a viuvez, não há retorno ao estado de
incapacidade.
o Emancipação pelo exercício de emprego público efetivo:

Perceba que é emprego público efetivo, estando afastados cargos comissionados e


cargos temporários.
o Emancipação por colação de grau em curso de ensino superior:

É muito difícil de se verificar.


o Emancipação por estabelecimento civil ou comercial, ou pela relação de emprego,
desde que, em função deles, o menor com 16 anos completos tenha economia própria:

Neste caso, é preciso que o menor tenha ao menos 16 anos.


o Emancipação legal do militar:

É possível que o menor militar, que tenha ao menos 17 anos, e esteja prestando o serviço
militar, seja emancipado.

Morte da pessoa natural

I. Morte real

O fim da personalidade da pessoa natural se dá através da morte, conforme art. 6º do


Código Civil.

No entanto, alguns direitos do de cujus permanecem, diante da possibilidade dos lesados


indiretos pleitearem eventuais indenizações por lesão à honra e imagem do morto.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Tartuce conclui que o morto tem resquícios de personalidade civil.

A lei considera que a morte real se dá com a morte cerebral (encefálica). Para afirmar a
morte real, é necessário um laudo médico, visando a elaboração do atestado de óbito, o qual será
registrado no cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais.

O art. 77 da Lei 6.015/73 estabelece que nenhum sepultamento será feito sem a certidão
de óbito.

II. Morte presumida sem declaração de ausência e justificação

O art. 7º do Código Civil diz que há dois casos de morte presumida sem declaração de
ausência:

• Desaparecimento do corpo de uma pessoa numa situação em que for extremamente provável
a morte de quem estava em perigo de vida. Ex.: naufrágio.

• Desaparecimento do corpo de uma pessoa envolvido em campanha militar ou feito prisioneiro,


e não for encontrado até 2 anos após o término da guerra.

Nestes casos, haverá uma morte presumida, sendo desnecessário a decretação de


ausência.

O parágrafo único do art. 7º estabelece que a declaração da morte presumida somente


poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações.

Com isso, na sentença, que reconhece a morte presumida, é necessária que conste a
provável data do falecimento da pessoa natural.

O art. 7º equivale ao art. 88 da Lei 6.015/73. Este dispositivo já tratava da denominada


morte por justificação, que é a morte presumida sem decretação de ausência.

Segundo o art. 88, poderão os Juízes togados admitir justificação para o assento de óbito
de pessoas desaparecidas em naufrágio, inundação, incêndio, terremoto ou qualquer outra
catástrofe, quando estiver provada a sua presença no local do desastre e não for possível
encontrar-se o cadáver para exame.

No parágrafo único está escrito que será também admitida a justificação no caso de

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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desaparecimento em campanha, provados a impossibilidade de ter sido feito o registro nos


termos do artigo 85 e os fatos que convençam da ocorrência do óbito.

III. Morte presumida com declaração de ausência

Ausência é uma outra hipótese de morte presumida, dando-se em razão do


desaparecimento da pessoa natural.

Na ausência há 3 fases relativas à declaração de ausência, dando-se por meio de ação


judicial:

• Curadoria dos bens do ausente:

A pessoa desapareceu, não deixou representante ou procurador, será nomeado um curador para
administrar os bens. Este curador terá como função guardar os bens da pessoa desaparecida e,
em ação específica, proposta pelo MP ou por qualquer interessado, normalmente um herdeiro.
Caso o desaparecido tenha deixado representante ou procurador, não será ausência.
Todavia, poderá haver a nomeação de curador, caso o desaparecido tenha deixado procurador
ou representante, mas este não tenha aceitado o encargo de representar e administrar os seus
bens. Neste caso, o juiz poderá nomear um curador.
O art. 25 diz que cabe ao cônjuge a condição de curador legítimo, desde que não esteja
separado judicialmente, ou não esteja separado de fato por mais de 2 anos antes da declaração
da ausência. Cabe ressaltar que o NCPC ainda trata da separação judicial.
Estando o cônjuge ausente, o próprio §1º estabelece uma ordem de preferência para exercer a
curadoria, dizendo que a curadoria dos bens incumbe aos pais do ausente. Não tendo pais, serão
chamados os descendentes do ausente, e neste caso o grau mais próximo exclui o grau mais
remoto. Não havendo pais, nem descendentes, compete ao juiz a escolha do curador dativo.
O companheiro e convivente merece a mesma proteção e regramento do que é conferido ao
cônjuge.
O art. 745 do NCPC estabelece que feita a arrecadação dos bens, o juiz mandará publicar editais
na rede mundial de computadores, no sítio do tribunal a que estiver vinculado e na plataforma
de editais do CNJ, onde permanecerá por 1 (um) ano, ou, não havendo sítio, no órgão oficial e
na imprensa da comarca, durante 1 ano, reproduzida de 2 em 2 meses, anunciando a
arrecadação e chamando o ausente a entrar na posse de seus bens.
Findo o prazo de 1 ano, previsto no edital, poderão os interessados requerer a abertura da
sucessão provisória, observando-se o disposto em lei.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Sucessão provisória:

Decorrido 1 ano da arrecadação dos bens do ausente, poderá ser aberta a sucessão provisória,
desde que haja pedido formulado pelos interessados.
Caso o ausente tenha deixado representantes ou procurador, será aberta a sucessão provisória
após o prazo de 3 anos.
Os interessados para requerer a sucessão provisória são:
i) o cônjuge não separado judicialmente (inclui-se o companheiro);
ii) os herdeiros presumidos, legítimos ou testamentários;
iii) os que tiverem sobre os bens do ausente direito dependente de sua morte (ex.: legatários);
iv) os credores de obrigações vencidas e não pagas.
Segundo o art. 745, §2º, do NCPC diz que o interessado, ao requerer a abertura da sucessão
provisória, pedirá a citação pessoal dos herdeiros presentes, a citação pessoal do curador e a
citação por edital dos herdeiros ausentes, a fim de que venham a requerer habilitação.
A sentença da abertura da sucessão provisória só produzirá efeito 180 dias depois de publicada
pela imprensa. Após, transita em julgado.
Logo que transite em julgado, será possível a abertura de eventual testamento, e ao inventário
e partilha dos bens, como se o ausente fosse falecido.
Se for o caso, antes mesmo da partilha, o magistrado poderá determinar que certos bens sejam
vendidos. Isto é, o art. 29 do CC diz que, antes da partilha, o juiz, quando julgar conveniente,
ordenará a conversão dos bens móveis, sujeitos a deterioração ou a extravio, em imóveis ou em
títulos garantidos pela União.
O Código Civil exige que os herdeiros, que vão entrar na posse dos bens, prestem garantia para
que sejam imitidos na posse desses bens, seja por meio de penhor ou hipoteca, devendo ser
tais valores no montante dos quinhões a que deverão receber.
O art. 31 do CC diz que, em relação aos bens imóveis do ausente, serão, como regra, inalienáveis,
até que haja a divisão e partilha desses bens. Aquele que tiver direito à posse provisória, mas
não puder prestar a garantia, será excluído, ou seja, não será imitido na posse, mantendo-se
sob a administração do curador, ou sob a administração de outro herdeiro designado pelo juiz,
e que preste essa garantia.
Quem está dispensado de prestar garantia? Cônjuge, ascendente e descendente.
Empossados nos bens, os sucessores provisórios ficarão representando ativa e passivamente o
ausente, de modo que contra eles correrão as ações pendentes e as que de futuro àquele forem
movidas.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Se o herdeiro for descendente, ascendente ou cônjuge do ausente terão direitos a todos os


frutos.
Os demais sucessores terão direito apenas a metade desses frutos.
Caso o ausente retorne, e é provada que sua ausência foi voluntária, perderá o direito quanto
aos frutos para o sucessor correspondente.
O art. 34 do CC diz que aquele que foi excluído da posse dos bens, por não ter bens suficientes
para oferecer em garantia, poderá exigir que seja entregue a ele metade dos frutos civis, caso
ele tivesse direito aos bens que teria direito anteriormente. Ou seja, se ele tinha direito à metade,
ele receberá um quarto, caso ele tenha direito à integralidade dos frutos, receberá metade, já
que não ficou com a posse dos bens pois não tinha como prestar garantias.
Apareceu o ausente no momento da posse provisória, os herdeiros, neste momento, perdem o
direito quanto aos bens, mas não perdem direito quanto aos frutos já colhidos.
Se, durante a posse provisória, ficar provada a exata época do falecimento do ausente,
considera-se que foi nesta data aberta a sucessão. Diante disso, será analisada quem eram os
herdeiros naquela data.
O art. 36 fala que se o ausente aparecer, ou se lhe provar a existência, depois de estabelecida
a posse provisória, irão cessar desde logo as vantagens dos sucessores nela imitidos, ficando
obrigados a tomar as medidas assecuratórias precisas, até a entrega dos bens a seu dono.
• Sucessão definitiva:

O prazo para conversão da sucessão provisória em sucessão definitiva é de 10 anos, contados do


trânsito em julgado da ação que julgou a ação de sucessão provisória.
O art. 38 do Código Civil diz que cabe requerimento de sucessão definitiva, se o ausente tiver 80
anos de idade, e que de 5 datam as últimas notícias dele.
O art. 39, caput, do Código Civil diz que, regressando o ausente nos 10 anos seguintes à abertura
da sucessão definitiva, ou algum de seus descendentes ou ascendentes, aquele ou estes
haverão só os bens existentes no estado em que se acharem, ou então terão os bens sub-
rogados em seu lugar, ou o preço que os herdeiros e demais interessados houverem recebido
pelos bens alienados depois daquele tempo.
O parágrafo único do art. 39 estabelece que, após este prazo de 10 anos, caso o ausente não
tenha regressado, os bens arrecadados serão definitivamente dos herdeiros.
Caso não retorne o ausente, e não tendo eles herdeiros, os bens serão declarados vagos e
passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados nas respectivas
circunscrições, ou ao domínio da União, quando situados em território federal.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Cabe ressaltar que o art. 1.571, §1º, trata da morte por ausência e fala que ela põe fim ao
casamento. O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio,
aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente.

IV. Comoriência

Comoriência tem relação com o momento da morte.

Segundo o art. 8 do CC, se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se
podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão
simultaneamente mortos.

Perceba que duas pessoas tenham morrido na mesma ocasião, não se exigindo que
tenham morrido no mesmo lugar. Nesse caso, considera-se que morreram ao mesmo tempo.

A importância disso é para fins sucessórios, bastando pensar que se João for casado com
Maria, e não tendo eles filhos, há um irmão de João e uma irmã de Maria. Caso ambos João e
Maria venham a falecer, metade dos bens vai para o irmão de João e a outra metade para irmã de
Maria.

Se não houvesse comoriência, supondo que João morresse depois de Maria, ela teria
morrido e João herdaria os bens de Maria. Após, João morreria meia hora depois, herdando a
totalidade da herança o irmão de João.

Esta presunção de morte simultânea é relativa, podendo ser afastada por um laudo
médico.

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Eduardo Defaveri

Parte Geral. Direito da personalidade

Direitos da Personalidade

A IV Jornada de Direito Civil trouxe o Enunciado 274, o qual estabelece que os direitos da
personalidade, regulados de maneira não exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula
geral da tutela da pessoa humana, constante do art. 1º, III, da Constituição.

Em caso de colisão entre direitos da personalidade, como nenhum poderá sobrelevar os


demais, deverá ser aplicada a técnica da ponderação.

I. Conceito de direitos da personalidade

O que são direitos da personalidade?

Maria Helena Diniz estabelece que direitos da personalidade são direitos subjetivos da
pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja:

1. Sua integridade física (vida, alimentos, próprio corpo, seja vivo seja morto, o corpo alheio,
as partes separadas do corpo vivo ou morto)

• Sua integridade intelectual (liberdade de pensamento, autoria científica, artística literária, etc.)

• Sua integridade moral (honra, segredo pessoal, segredo profissional, imagem, identidade
pessoal, familiar, social, etc.)

Pessoa jurídica tem direito da personalidade?

É controvertido, mas prevalece o entendimento de que a pessoa jurídica tem direito da


personalidade por equiparação, conforme art. 52 do Código Civil. Isto é pacificado na
jurisprudência, razão pela qual a pessoa jurídica poderá sofrer dano moral, mas em relação
apenas a honra objetiva, pois é destituída de honra subjetiva.

Todavia, o Código Civil não reconhece a possibilidade de que as pessoas jurídicas sejam
titulares de direitos da personalidade, tendo em vista que foi deferido a elas apenas a proteção
dos direitos da personalidade, no que couber (MPDFT).

Com base nisso, a Súmula 227 do STJ determinou que a pessoa jurídica pode sofrer dano
moral. O STJ já entendeu ser possível dano moral à PJ por protesto indevido de duplicata.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Por outro lado, pessoas jurídicas de direito público não poderão sofrer danos morais,
apesar de também serem passíveis de proteção dos direitos da personalidade.

O rol de direitos da personalidade é exemplificativo pela redação do Enunciado do CJF,


mas existem alguns exemplos em que há direitos da personalidade não previstos na CF e nem no
Código Civil:

• Direito à opção sexual

• Direito ao esquecimento:

Foi reconhecido no Enunciado 531 do CJF, estabelecendo que a tutela da dignidade da pessoa
humana, na sociedade da informação, inclui o direito ao esquecimento. Na jurisprudência do STJ,
ganha destaque a decisão dada no REsp 1334097-RJ, o qual reconheceu o direito ao
esquecimento de um homem que havia sido inocentado da acusação de ter se envolvido na
chacina da candelária. Ele foi retratado pelo programa “Linha Direta”, quando já estaria
absolvido.
• Direito de não saber:

Este direito é uma novidade. O direito de não saber é um direito distinto do direito à privacidade.
Na verdade, o direito de não saber só terá efeito se houver uma manifestação expressa da
preferência de não saber. E mesmo havendo a manifestação expressa, encontrará limites para o
exercício do direito de não saber, isto é, é a probabilidade de, em não sabendo isso, violar o
direito de outras pessoas.
Ex.: o STJ entendeu que o portador do vírus HIV não tem direito a não saber que é portador do
vírus. Neste caso, a questão do direito de não saber encontra obstáculo que ele não consegue
transpor, que é a probabilidade de prejudicar o direito de outras pessoas, como a integridade
física.

II. Colisão entre direitos da personalidade

O grande desafio diz respeito à amplitude da incidência do direito ao esquecimento, pois


do outro lado também existe o direito à informação e liberdade de imprensa. Na colisão desses
direitos, é necessário se socorrer da técnica da ponderação. Os direitos serão sopesados no caso
concreto, e partir de um juízo de razoabilidade, o juiz emitirá uma solução.

Cabe ressaltar que a técnica da ponderação já está prevista expressamente no NCPC. O

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§2º do art. 489 do NCPC diz que no caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e
os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência
na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão.

A sistematização dessa ideia de ponderação foi trazida por Robert Alexy.

Na sua obra, Alexy, visando a ponderação, parte de algumas premissas para que o
sopesamento seja possível:

• Os direitos fundamentais têm em sua maioria a estrutura de um mandado de otimização. Ou


seja, deve ser cumprido o máximo possível dos direitos fundamentais. Ou seja, é possível que
haja a satisfação de direitos fundamentais em graus variados.

• Na colisão entre princípios, há restrições recíprocas. Alexy faz uma diferenciação de colisão
entre regras e colisão entre princípios. Se a colisão for entre regras, uma delas deverá ser
retirada. Sendo uma colisão entre princípios, haverá uma ponderação, ou seja, um deles cederá
de alguma forma para que o outro também seja exercido.

Fredie Didier Jr. discorda dessa opinião, pois se encontra respaldado pelo professor Humberto
Ávila.
• Neste caso, o aplicador do direito aplica a técnica da ponderação, fazendo o sopesamento. Isso
porque os direitos fundamentais trazem mandados de otimização, e como o conflito é entre
princípios, é necessário fazer o sopesamento. É, em verdade, a aplicação da máxima da
proporcionalidade.

• A pesagem feita pelo aplicador do direito deve ser fundamentada em uma argumentação que
convença. O juiz, ao aplicar a técnica da ponderação, deverá resultar numa fundamentação
idônea, ou seja, de possível conclusão e de forma que seja justa.

Didier discorda da necessidade dessa colisão ser apenas entre princípios, pois, para ele, no
caso de colisão entre regras poderia também solucionar pela técnica da ponderação, como forma
de alcançar uma decisão mais justa.

III. Características dos direitos da personalidade

Os direitos da personalidade são:

• Intransmissíveis

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Irrenunciáveis

• Extrapatrimoniais

• Vitalícios

• Inatos

• Absolutos

• Indisponíveis

• Imprescritíveis

• Impenhoráveis

IV. Limitação dos direitos da personalidade

O art. 11 do CC já traz a hipótese de que, com exceção dos casos previstos em lei, os direitos
da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer
limitação voluntária.

E portanto pela redação do CC, o exercício do direito fundamental não pode sofrer
limitação voluntária. Mas há a relativização desse caráter ilimitado e absoluto do direito da
personalidade.

O Enunciado 4 do CJF diz que o exercício dos direitos da personalidade podem sofrer
limitação voluntária, mas desde que esta limitação não seja permanente e nem geral. Isto
justifica o Big Brother.

O Enunciado 139 do CJF diz que os direitos da personalidade podem sofrer limitações,
ainda que não expressamente previstas em lei, não podendo ser exercido com abuso de direito,
pois violaria a boa-fé e os bons costumes.

V. Casuística dos direitos da personalidade

Exemplo de direito da personalidade é o direito patrimonial decorrente da imagem. Com


relação à imagem, lembremos os caso do “contrato vitalício” entre o jogador de futebol e a Nike.
Na verdade, não poderá este contrato ser vitalício, eis que não se permite que este contrato seja
permanente. Por conta disso, este contrato vitalício não é formulado no Brasil, pois aqui não é
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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permanente.

O direito da personalidade não é disponível no sentido estrito, mas são transmissíveis as


cessões de uso do direito da personalidade. Isto é, aspectos patrimoniais do direito da
personalidade podem ser destacados e transmitidos, desde que de forma limitada e não
permanente.

O que é disponível no direito da personalidade?

É aquela parcela dos direitos subjetivos patrimonial, isto é, a repercussão patrimonial do


direito.

VI. Tutela geral dos direitos da personalidade

O art. 12, caput, do CC, traz a tutela geral da personalidade, estabelecendo que é possível
exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos,
sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

E portanto o que há aqui são dois princípios: princípio da prevenção (visa evitar que o
dano ocorra) e o princípio da reparação integral dos danos (visa reparar o dano ocorrido).

Em relação a esta reparação, são cumuláveis dano moral, material e estético.

Nesta mesma linha, a súmula 403 do STJ estabelece que independe de prova de prejuízo
a publicação não autorizada, para fins de indenização, da imagem da pessoa com fins
econômicos ou comerciais. Mesmo que não tenha prejuízo, havendo a disposição da imagem para
fins comerciais, terá direito à indenização.

VII. Dano em ricochete

O parágrafo único do art. 12 reconhece direito da personalidade ao morto, conferindo


proteção àqueles que são lesados indiretamente. São os denominados danos em ricochete.

A reparação de eventual dano moral poderá ser perseguida pelo cônjuge, ou qualquer
parente em linha reta, ou colateral até o 4º grau. Em tais casos, o que há é um dano indireto, ou
seja, atinge o morto, mas repercute em seus familiares. Portanto, os familiares, quando buscam a
reparação, agem em direito próprio.

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Eduardo Defaveri

O art. 20, parágrafo único, trata de um caso específico, que é o caso de lesão à imagem do
morto, estabelecendo também a possibilidade de legitimação dos lesados indiretos pelo dano
em ricochete.

Todavia, há uma diferença. Quando se trata de lesão à imagem do morto ou ausente, serão
partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes.

Perceba, o dispositivo relacionado à imagem não fala dos colaterais até o 4º grau.
Todavia, caso estes sujeitos sofram dano moral em ricochete, nada impede que ingressem com a
ação.

Nestes casos, as pessoas ingressam com o feito em nome próprio, independentemente de


vocação hereditária, ou seja, sem que precisem respeitar a ordem estabelecida.

VIII. Direito de disposição de partes separadas do próprio corpo (art. 13)

O art. 13 trata do direito de disposição de partes separadas do próprio corpo para fins de
transplante.

Segundo o art. 13, salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio
corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons
costumes.

O parágrafo único diz que o ato previsto neste artigo será admitido para fins de
transplante, na forma estabelecida em lei especial.

Veja, o Código estabelece que essa disposição do corpo de forma permanente é vedada,
salvo se existir uma exigência médica nesse sentido. Caso não exista exigência médica, não há de
que se falar em disposição de parte do corpo vivo de forma permanente, salvo para fins de
transplante.

Existem ações que pleiteiam a alteração do nome do transexual, mas sem a necessidade
de cirurgia de adequação do sexo. Neste caso, o Poder Judiciário, em consonância com a I Jornada
de Direito da Saúde, promovida pelo CNJ, estabelece que quando comprovado o desejo de viver
e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto, resultando na incongruência entre a identidade
determinada pela anatomia e a identidade sentida, a cirurgia de transgenitalização passa a ser

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dispensável para retificação do nome no registro civil.

A IV Jornada de Direito Civil trouxe o Enunciado 376 que diz: O art. 13 do CC, ao permitir a
disposição do próprio corpo por exigência médica autoriza a cirurgia de transgenitalização, e como
consequência autoriza a alteração do prenome e do sexo no registro civil.

IX. Doação de órgãos (art. 14)

Segundo o art. 14, é válida, com objetivo científico, ou altruístico, a disposição gratuita do
próprio corpo, no todo ou em parte, para depois da morte.

A disposição de órgão para depois da morte é plenamente possível, porém esta disposição
do próprio corpo pode ser revogada a qualquer momento.

O art. 4º da Lei 9.434/97 estabelece que a retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo
de pessoas falecidas para transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização
do cônjuge ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o
segundo grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à
verificação da morte.

Ou seja, a retirada de órgãos pós mortem deverá ser precedida de diagnóstico de morte
encefálica, e depende de autorização de parente maior, na linha reta ou colateral até o 2º grau,
ou do cônjuge sobrevivente.

Perceba que há uma aparente incongruência, visto que o código diz que a pessoa pode
dispor de parte do seu corpo, podendo inclusive revogar esta autorização. No entanto, a Lei
9.434/97 diz que se for morte encefálica, os parentes são quem vão dizer se irão dispor dos órgãos
do parente morto.

Afinal, quem é que toma essa decisão?

Havendo manifestação expressa do doador de órgãos em vida, esta manifestação


prevalece sobre a manifestação dos familiares.

Neste caso, é necessário fazer uma interpretação, a fim de dialogar as fontes,


estabelecendo que se ele não tiver se manifestado, a família decide. Porém, caso ele tenha feito
manifestação expressa, ainda que a família discorde, será feita a doação, em consonância com
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o princípio da autonomia da vontade.

X. Direitos do paciente (art. 15)

Segundo o art. 15, ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a
tratamento médico ou a intervenção cirúrgica.

Flávio Tartuce exemplifica o caso em que um paciente está à beira da morte. Neste caso, é
necessária cirurgia, mas esta intervenção é de alto risco. A intervenção, neste caso, deverá
ocorrer, sob pena de responsabilização do médico. Isso porque, o fato do art. 15 trazer tal regra,
não pode permitir uma conclusão que sacrifique a própria vida.

Um hard case trazido por Tartuce é aquele em que um sujeito, à beira da morte, com
cirurgia de alto risco, mas por convicções religiosas se nega a intervenção cirúrgica. Aqui há
alguma divergência doutrinária no sentido de ser possível ou não a intervenção médica.

Tartuce entende que em casos de urgência, deverá haver intervenção cirúrgica, visto que
o direito à vida demandaria maior proteção do que o direito à liberdade religiosa. Mas isto não é
pacífico. A despeito disso, a jurisprudência dominante entende no mesmo sentido do que Tartuce.
Ou seja, havendo risco do sujeito, deverá prevalecer o direito à vida.

Contrariamente, o Enunciado 403 do CJF estabelece que o direito à inviolabilidade de


consciência e de crença aplica-se também à pessoa que se nega a tratamento médico, inclusive
transfusão de sangue com risco de morte.

O enunciado vai além, dizendo que esta liberdade de crença vai prevalecer, desde que
observados os seguintes critérios:

• Capacidade civil plena do sujeito que se nega

• Manifestação de vontade deve ser livre, consciente e informada

• A oposição deve ser exclusivamente da pessoa do declarante

A VI Jornada de Direito Civil aprovou o Enunciado 533, dizendo que o paciente plenamente
capaz pode deliberar sobre todos os aspectos concernentes ao tratamento médico que possa lhe
causar algum risco de vida, seja imediato ou mediato, salvo as situações de emergências no curso
de procedimentos médico e cirúrgicos que não possam ser interrompidos.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Veja, no meio da cirurgia não é possível exigir que, caso tenha havido uma complicação,
sendo necessária, por exemplo, uma transfusão de sangue, seja exigida a autorização do paciente.

XI. Tutela do direito ao nome, sinal ou pseudônimo

Todos os elementos que fazem parte do nome estão protegidos:

• Prenome: primeiro nome da pessoa (ex.: João).

• Sobrenome: apelido, patronímico, nome de família (ex.: Silva).

• Partícula: ex.: João da Silva.

• Agnome: visa perpetuar o nome anterior (ex.: João da Silva Filho).

A proteção de todos esses elementos constam do art. 17, o qual diz que o nome da pessoa
não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao
desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória.

Havendo a exposição do nome da pessoa ao desprezo público, ainda que não haja a
intenção difamatória, haverá ato ilícito.

O nome também não poderá ser utilizado, sem autorização, em propaganda comercial
(art. 18).

Veja, se o nome foi utilizado não para expor a desprezo público, e sim como enaltecimento
da pessoa, mas na hipótese tenha havido intenção comercial ou para fins de propaganda, também
deverá indenizar, pois seria imprescindível autorização.

O art. 19 consagra a proteção ao pseudônimo, que é aquele em que o artista se escode


atrás de uma obra, seja artística ou literária. Fernando Pessoa fazia isso. Para o dispositivo civil, o
pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome.

Apesar da falta de proteção legal, deve-se concluir que esta proteção também deve ser
estendida ao apelido, o qual na verdade é denominado de cognome, nome artístico de alguém
ou alcunha.

A Lei de Registros Públicos, que é a Lei 6.015/73, no art. 58 diz que o prenome será
definitivo, mas a própria lei traz exceções, admitindo-se a sua substituição por apelidos públicos
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

notórios.

Ex.: no interior é muito comum o pai registrar a filha como Maria, mas a mãe queria chamar
ela de Joana e nunca chama ela de Maria. Ela cresce sendo chamada de Joana pela cidade inteira.
Nesse caso, cabe a substituição do prenome, pois é público e notório, através do qual ela é
conhecida.

A alteração dos componentes do nome é possível através de sentença específica. Esta


sentença deverá ser registrada em cartório de registro de pessoas naturais.

Os casos de alteração do nome estão na Lei 6.015/73, mas é um rol meramente


exemplificativo:

• Nome expõe ao ridículo.

• Erro de grafia crasso. Ex.: “Frávia”.

• Adequação de sexo

• Introdução de alcunha.

• Introdução do nome do cônjuge ou convivente

• Introdução do nome do pai ou da mãe no caso de adoção do filho

• Tradução de nome estrangeiro. Ex.: John para João.

• Se houver coação ou ameaça decorrente de colaboração de crime

• Para incluir nome de padrasto ou da madrasta ao enteado.

• No caso de abandono afetivo do genitor, é possível a exclusão do sobrenome do genitor (STJ,


Info 555). A pessoa tem direito a excluir um nome que lhe remeta às angústias de um abandono
afetivo.

O art. 56 fixa um prazo decadencial para que o nome do interessa possa ser alterado. E
isso desde que não prejudique apelidos de família.

Este prazo decadencial, o qual estabelece que, no primeiro ano após ter atingido a
maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador, alterar o nome, desde que não
prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O STJ entende que este prazo decadencial não é absoluto, podendo ser alterado mesmo
após o esgotamento do prazo de 1 ano após a maioridade, desde que haja motivação idônea.

XII. Direito à imagem e os direitos a ela conexos

Segundo o art. 20, salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à


manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a
publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu
requerimento e sem prejuízo da indenização que lhe couber, se estes atos praticados atingirem a
honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.

Perceba que o art. 20 diz que a exploração de uma imagem de uma pessoa poderá ser
barrada por ela, inclusive poderá implicar indenização por danos morais.

Para utilização da imagem de outra pessoa, o dispositivo traz uma necessidade de


autorização. Não havendo autorização, é possível aplicar o princípio da prevenção, impedindo
que novas publicações sejam feitas, bem como o princípio da reparação integral do dano, de
forma que, caso haja violação, deverá reparar o dano.

Esta autorização será dispensável quando a divulgação da informação é necessária para:

• Interesse da ordem pública

• Interesse da administração da justiça

Ordem pública e administração da justiça são cláusulas gerais, ou seja, será o juiz quem vai
dizer no caso concreto se estas permitem a divulgação dessa imagem ou da pessoa sem a sua
autorização. Basta pensar nos crimes de envolvimento de políticos.

O direito de imagem se subdivide em:

• imagem-retrato: é a sua fisionomia e aparência.

• imagem-atributo: é a sua qualificação, sendo a imagem pela qual as pessoas lhe julgam.

A proteção à imagem não pode ser, e não é, uma proteção absoluta, devendo ser
ponderada com o direito à informação e com a liberdade de imprensa.

Se houver uma colisão entre direito da imagem e direito à liberdade de imprensa, tem-se
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

que levar em conta a notoriedade do retratado, notoriedade dos fatos, a veracidade dos fatos, e
ainda as características de sua utilização.

Perceba que entre o direito à informação e o direito à imagem, é necessário ponderar qual
prevalecerá, considerando qual é o fato, a pessoa e se o fato é verídico.

O direito brasileiro não admite o hate speech, que são as manifestações de ódio, despreza,
intolerância, sendo possíveis nos EUA. Dessa forma, o STF adotou essa corrente de proibição do
hate speech, sustentando que deve haver limitações ao direito de liberdade de expressão.

O STJ diz que, se houver dano, para verificar a gravidade do dano, sofrido pela imagem
da pessoa que não autorizou, deverão ser analisadas alguns pontos:

• qual é o grau de consciência do retratado em relação a possibilidade de captação de sua


imagem. Ex.: artista no meio da rua está traindo a esposa. Sendo ele pessoa pública, e se
sujeitando a trair na própria rua, esta imagem poderá ser reproduzida.

• qual é o grau de importância do retratado em relação à amplitude da captação. Não haverá


direito à reparação se o indivíduo for retratado no meio do estádio lotado, visto que ninguém o
viu lá.

• qual é a natureza e o grau da repercussão do meio pelo qual se dá a divulgação. Uma coisa é o
amigo publicar na página do facebook, outra coisa é sair na Folha de São Paulo.

• deve entender qual é o direito de informar como uma garantia que deve ser exercida. Nesse
sentido, há alguns critérios que devem ser levados em consideração: i) qual é o grau de utilidade
para o público do fato informado; ii) qual é o grau de atualidade da imagem (verificar sobre o
direito ao esquecimento); iii) qual é o grau de necessidade de veiculação daquela imagem para
veicular o fato; iv) qual é o grau de preservação do contexto em que a imagem foi colhida (ex.:
imagem contextualizada de maneira imprópria).

Com relação às obras biográficas, esta questão chegou ao STF.

Precisa de autorização do biografado?

O STF, por unanimidade, julgou procedente uma ADI, para dar interpretação conforme à
Constituição aos arts. 19 e 20 do Código Civil, sem redução de texto.

O STF declarou inexigível o consentimento da pessoa biografada. Ou seja, ela não tem
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

que autorizar para ser biografada. É igualmente desnecessária a autorização das pessoas que
sejam coadjuvantes na biografia, bem como aquelas que tenham morrido, mas que foram
mencionadas.

Além disso, o Supremo reafirmou que o direito à inviolabilidade, da privacidade,


intimidade, da honra e da imagem da pessoa, caso haja lesão aos seus direitos, deve-se haver a
reparação dos danos.

É simples: pode publicar a biografia sem autorização, mas caso seja aplicado ato ilícito,
deverá reparar o dano por meio de indenização.

XIII. Direito à intimidade

O Código Civil tutela o direito à intimidade, prescrevendo no art. 21 que a vida privada da
pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências
necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.

Esse direito não é absoluto.

Anderson Schreiber diz que é necessária a ponderação. Há um exemplo claro de


ponderação de vida privada e a segurança, por exemplo. No caso do aeroporto, quando se coloca
a bagagem no Raio-X, o agente da Infraero visualiza tudo. Mas neste caso o direito à segurança se
sobrepõe ao direito à privacidade.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Bens. Domicílio. Pessoa Jurídica

Bens.

I. Diferença entre bens e coisas. A teoria do patrimônio mínimo

a) Conceito

Coisa é gênero. Bem é espécie.

Portanto, bem é uma coisa que proporciona ao homem uma utilidade, sendo suscetível de
apropriação. O ar não é bem, pois apesar da utilidade, não é suscetível de apropriação.

b) Patrimônio mínimo

A tese do patrimônio mínimo foi desenvolvida pelo ministro Luiz Edson Fachin, em uma
obra em que ele aponta uma tendência, que é a repersonalização do direito civil, situação na qual
o direito civil retira os olhos do patrimônio, colocando-os sobre a pessoa.

A tese pode ser resumida da seguinte forma: deve-se assegurar a uma pessoa o mínimo
de direitos patrimoniais, a fim de que esta pessoa viva com dignidade.

Toda pessoa tem que ter o mínimo de direitos patrimoniais.

A aplicação dessa teoria é verificada no art. 548 do Código Civil, o qual estabelece que é
nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência
do doador. Portanto, este artigo consagra a nulidade da doação universal, visto que é preciso de
um mínimo de patrimônio para garantir a vida digna da pessoa.

O art. 928, parágrafo único, estabelece, ao tratar da indenização contra o incapaz, que o
valor indenizatório que o incapaz será responsabilizado será fixado pelo juiz com equidade, para
não privar o incapaz e seus dependentes do mínimo para viver com dignidade.

As principais alterações da teoria do patrimônio mínimo terão o seu alcance no que se


refere à proteção ao bem de família.

A proteção do bem de família é a proteção do direito à moradia, que é consagrado


constitucionalmente, bem como corolário da dignidade da pessoa humana.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Nesse caminho, o STJ consolidou o entendimento de que o imóvel de que pessoa solteira
reside, seja viúva, divorciada ou separada, constitui bem de família, sendo portanto
impenhorável, conforme Súmula 364 do STJ.

O STJ já estendeu a impenhorabilidade ao imóvel situado a pessoa jurídica, quando a


família também tenha ali a sua residência. Segundo o STJ, a impenhorabilidade da lei 8.009, ainda
que tenha como destinatário pessoas físicas, merecem a ser aplicadas a certas pessoas jurídicas,
às firmas individuais, às pequenas empresas com conotação familiar, por haver identidade de
patrimônios.

Ou seja, se a família mora nos fundos e na frente funciona uma padaria, onde o pai
trabalha lá, a mãe fica no caixa e o filho na confeitaria, aquele bem será impenhorável, pois eles
mesmos moram lá, pouco importando que o registro consta no nome da sociedade.

c) Principais classificações dos bens

i. Quanto à tangibilidade

b. bens corpóreos: tem existência corpórea e são materiais. Ex.: casa e carro.

• bens incorpóreos: tem existência abstrata. Ex.: direito de autor, propriedade industrial,
fundo empresarial.

ii. Quanto à mobilidade

• bens imóveis: não podem ser removidos sem a sua deterioração ou destruição. Podem
ser subdivididos em:

o por natureza: são formados pelo solo e tudo aquilo que se incorporar a ele de

forma natural. Abrange o solo, subsolo, superfície, espaço aéreo e tudo que lhe
for incorporado. Ex.: árvore que é incorporada naturalmente.

o por acessão física, industrial ou artificial: tudo que o homem incorporar

permanentemente ao solo, não podendo remover do solo sem a destruição,


será bem imóvel. Ex.: plantações, construções, etc. Segundo o art. 81, não
perdem o caráter de imóveis as edificações que, separadas do solo, mas
conservando a sua unidade, forem removidas para outro local, bem como os
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se


reempregarem.

o por acessão física intelectual: tudo que for empregado intencionalmente para

exploração industrial, aformoseamento ou comodidade, estes bens móveis


seriam considerados imóveis por acessão física intelectual. Exemplo clássico
são as pertenças. Mas parcela da doutrina sustenta que não há mais pertenças
no código civil. Tartuce discorda.

o por disposição legal: são bens considerados imóveis pela lei, a fim de dar maior

proteção jurídica, tais como: o direito à sucessão aberta, direitos reais sobre
imóveis (hipoteca) e penhor agrícola, excepcionalmente.

• bens móveis: são aqueles que podem ser transportados sem deterioração ou
destruição, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social daquele
bem, podendo ser transportados por força própria ou de terceiros. Os bens móveis
poderão ser subclassificados por:

o por natureza: são aqueles que podem ser transportados sem qualquer dano,

seja por força própria (semoventes) ou por força alheia.

o por antecipação: são os bens que eram imóveis, mas que foram mobilizados

por uma atividade humana. Ex.: colheita de uma plantação. Todo ano o
fazendeiro semeia para colher. Trata-se de um bem móvel por antecipação.

o por determinação legal: a lei estabelece que o bem é móvel, conforme art.

83 do CC, são móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção


por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-
social.

Ações e direitos que recaem sobre bens móveis são bens móveis. Ex.: penhor, assim como
a energia, direitos pessoais de caráter patrimonial é bem móvel, etc.

Navio e aeronave, são bem móveis ou imóveis?

Flávio Tartuce considera que são bens imóveis especiais ou bens móveis sui generis. Isso

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

porque apesar de serem móveis, são tratados como imóveis pela lei, visto que exige um registro
especial deles e admite a instituição de hipoteca.

Logo, pelo princípio de que o acessório segue o principal, a hipoteca, que é direito real de
garantia, é bem móvel ou imóvel?

Recaindo sobre um bem imóvel, será a hipoteca bem imóvel, pois o acessório segue o
principal. Caso o direito real de garantia recai sobre bem móvel, será também considerado bem
móvel. Ou seja, a hipoteca poderá ser um bem móvel ou imóvel, a depender de qual bem ela
garante.

iii. Classificação quanto a fungibilidade

• bens infungíveis: não podem ser substituído por outro da mesma espécie, qualidade ou
quantidade. O automóvel é um bem móvel, mas também é infungível. Isso porque o
carro tem chassi.

• bens fungíveis: podem ser substituídos. São aqueles que podem ser substituído por
outro da mesma espécie, qualidade ou quantidade.

iv. Classificação quanto a consuntibilidade

• bens consumível: são bens móveis cujo uso importa a sua destruição imediata e os bens
destinados à alienação. Ex.: sanduíche gera consuntibilidade física. Carro possui uma
consuntibilidade jurídica.

• bens inconsumível: são aqueles bens que permitem a sua reiterada utilização sem que
haja a sua destruição (inconsuntibilidade física), bem como aqueles que são inalienáveis
(inconsuntibilidade jurídica).

É possível trabalhar dentro da inconsuntibilidade com classificações. Ou seja, um bem


pode ser inconsumível juridicamente e consumível fisicamente. O carro possui uma
inconsuntibilidade física, mas tem consuntibilidade jurídica, pois pode ser alienado.

v. Classificação quanto à divisibilidade

• bens divisíveis: são aqueles que podem partir em porções reais e distintas, formando

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

cada uma um todo perfeito. O art. 87 explica que os bens divisíveis são os que se podem
fracionar sem alteração na sua substância (aspecto físico), sem diminuição considerável
de valor (aspecto econômico), ou sem prejuízo do uso a que se destinam (aspecto
funcional). Ex.: sacas de cereais são bens divisíveis.

• bens indivisíveis: são aqueles bens que não podem ser partilhados, pois, do contrário,
deixa de ser um todo perfeito, gerando a desvalorização do bem ou mesmo a perda das
qualidades essenciais desse todo. Ex.: diamante de 5 quilates vale muito mais do que
dividir o bem em 5 partes de 1 quilate cada. Portanto, é indivisível, pois há uma perda
substancial do seu valor. A indivisibilidade pode decorrer da natureza do bem, de
imposição legal ou mesmo da vontade do seu proprietário. Há uma indivisibilidade
natural em relação à casa, assim como o relógio de pulso. A herança, segundo a lei, é
bem indivisível até que ocorra a partilha. A indivisibilidade convencional pode ocorrer
quando dois proprietários de um boi convencionarem que aquele animal não vai ser
morto para vender a carne, mas tão somente para reprodução.

vi. Classificação quanto à individualidade

• bens singulares (individuais): são bens individuais, considerados de per si. Ex.: livro, boi,
etc.

• bens universais: são bens que se encontram agregados a um todo, constituído por várias
coisas singulares, mas considerados em seu conjunto, formando um todo
individualizado. Essa união poderá ser fática ou mesmo jurídica.

o universalidade de fato: ocorre quando essa ligação é feita pela vontade humana.
Esses bens que formam esta universalidade podem formar relações jurídicas
próprias. Ex.: biblioteca pode ser vendida inteira, tendo um valor próprio, como a
obra completa de Machado de Assis.

o universalidade de direito: essa unidade individualizada é dada pela lei, sendo uma
ficção legal. O art. 91 diz que há universalidade de direito quando se tem um
complexo de relações jurídicas de uma pessoa dotada de valor econômico. Ex.:
patrimônio, massa falida.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Patrimônio é conceituado por Cristiano Chaves como sendo complexo de relações jurídicas
apreciáveis economicamente (credor x devedor x credor).

vii. Classificação quanto à dependência em relação a outro bem (bens reciprocamente


considerados)

• bem principal: são aqueles que existem de forma autônoma e independente, não
dependendo de qualquer outro objeto.

• bem acessório: são aqueles bens que a existência e finalidade dependem de outro bem,
que é denominado principal. O acessório segue o principal, conforme o princípio da
gravitação jurídica.

São bens acessórios:

• Frutos: Os frutos têm origem no bem principal, mas mantêm a integridade deste último,
sem diminuir a substância ou quantidade. Classificam-se como:

o frutos naturais: ex.: frutos de uma árvore, mas mantém a inteireza da coisa principal,
no caso a árvore;

o frutos industriais: decorrendo de uma atividade humana. Ex.: saco de balinhas feita
por uma fábrica;

o frutos civis: decorrendo de uma relação jurídica econômica, denominados de


rendimentos. Ex.: aluguel é fruto para o dono do imóvel, assim como os juros e
dividendos.

Quanto ao estado que normalmente se encontram os frutos, podem ser classificados em:
o frutos pendentes: são os frutos que ainda não foram colhidos. Ex.: fruta que está na
árvore.

o frutos percebidos: são os frutos que já foram colhidos.

o frutos estantes: são os frutos que já foram colhidos e já estão armazenados. Ex.:
maçãs colhidas e que estão armazenadas.

o frutos percipiendos: são os frutos que deveriam ter sido colhidos, mas não foram.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

o frutos consumidos: são os frutos que foram colhidos e não existem mais, pois foram
consumidos.

• Produtos: Produtos são bens acessórios que saem da coisa principal, diminuindo a sua
quantidade e substância. Neste ponto difere do fruto, pois este sai da coisa principal,
mas não diminui a sua substância ou quantidade. Ex.: pepita de ouro retirado de uma
mina. Explora-se a mina até que acabará o ouro.

• Pertenças: Pertenças são bens destinados a servir um outro bem, denominado de


principal. O art. 93 do CC trata das pertenças, apesar de uma doutrina dizer que não se
consideram bens imóveis por acessão intelectual.

Este dispositivo afirma que são pertenças os bens que, não constituindo partes
integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro.
Há um bem que vai servir outro bem, de forma permanente, mas não sendo parte
integrante deste bem. A pertença não perde a sua individualidade, pois é um bem que serve outro
bem. A doutrina traz um exemplo que esclarecedor. Ex.: em uma fazenda, o sujeito compra uma
caminhonete para utilizar dentro da fazenda. Este bem é uma pertença, pois é destinado a servir
um bem principal, que é um imóvel, não perdendo a sua individualidade e não é parte integrante
deste bem.
Pertença são todos os bens móveis que o proprietário intencionalmente emprega na
exploração industrial de um imóvel ou na sua comodidade. Por isso, as pertenças se classificam
como essenciais, fundamentais ou não essenciais.
O art. 94 diz que os negócios jurídicos que dizem respeito ao bem principal não
abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das
circunstâncias do caso. Veja que, apesar de ser acessória, a pertença não segue o principal, via de
regra.
Tartuce sustenta que os bens imóveis por acessão intelectual não desapareceram com o
CC/02, pois eles seriam as pertenças.
• Partes integrantes: Partes integrantes são bens acessórios que estão unidos ao bem
principal, formando um todo independente. Ex.: lâmpada que se coloca no lustre, assim
como a lente que se coloca na câmera, formando um todo independente.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A diferença substancial para as pertenças é a de que as pertenças continuam guardando


a sua individualidade, enquanto as partes integrantes não, pois passam a integrar o bem principal,
formando um todo único.
• Benfeitorias: Benfeitorias são bens acessórios introduzidos em um bem móvel ou bem
imóvel, visando a sua conservação, ou melhor de sua utilidade.

Podem ser classificadas em:


o benfeitorias necessárias: têm por finalidade conservar ou evitar que o bem se
deteriore. Ex.: reforma no telhado da casa para evitar que o telhado desabasse.

o benfeitorias úteis: aumentam ou facilitam o uso ou a utilidade da coisa. Ex.: instalar


grades na janela da casa.

o benfeitorias voluptuárias: são benfeitorias para mero deleite. Ex.: piscina numa casa.

Não se pode confundir benfeitorias com acessões, eis que as primeiras são melhorias
e as últimas são incorporações.

viii. Classificação quanto ao titular do domínio

• bens particulares: são bens que pertencem ao particular (física ou jurídica).

• bens públicos: pertencem a pessoa jurídica de direito público interno. Os bens públicos
podem ser classificados em diferentes tipos:

o bens de uso geral (ou de uso comum do povo): são aqueles necessários ao uso geral
do povo, sem a necessidade de uma permissão especial. Ex.: praças e ruas, ainda que
cobre pedágio.

o bens de uso especial: são bens ou terrenos que são utilizados pelo próprio estado
para execução de um serviço público especial. Isto é, há uma destinação especial
àquele bem, denominado de afetação. Ex.: repartições públicas, sede da prefeitura,
etc.

o bens públicos dominicais: são bens que fazem parte de um patrimônio disponível da
pessoa jurídica de direito público. Ex.: terras devolutas, pois não têm uma destinação
específica. Os bens dominicais podem ser convertidos em bem de uso comum ou
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

bem de uso especial.

Os bens de uso comum e de uso especial são inalienáveis, enquanto os bens dominicais
são alienáveis. Mas esta inalienabilidade não é absoluta, podendo perdê-la, desde que haja
desafetação, ou seja, que mude a destinação do bem.

Na afetação, o bem dominial passa a ser afetado a uma função. Ex.: terreno vazio passou
a ser a sede da prefeitura. Na desafetação, há a mudança da destinação do bem para a categoria
de bens dominicais. Ou seja, passam a fazer parte do patrimônio disponível da pessoa jurídica de
direito público, podendo ser alienado. Os bens públicos podem ou não ser alienáveis, a depender
da destinação ou não do bem, se há afetação ou não.

Seja qual for a espécie de bem público, nenhum deles está sujeito a usucapião.

Para muitos doutrinadores está superada a dicotomia: bem público e bem privado. Para
eles, haveria agora uma tricotomia, trazendo o denominado bem difuso. Ex.: bem ambiental seria
bem difuso. Esta superação, e a visualização do bem difuso, é a melhor concepção civil
constitucional, como é o caso do meio ambiente, em que se considera que tal bem é da
coletividade.

O que é res nullius?

Res nullius são as coisas que não têm dono, ou seja, coisas de ninguém. Por uma questão
lógica, estas coisas só podem ser bens móveis, pois se o bem imóvel não pertence a qualquer
pessoa, ele pertence ao Estado. Exemplo disso são as terras devolutas.

Portanto as res nullius se restringem aos bens móveis.

II. Bem de família voluntário ou convencional

O bem de família é o imóvel utilizado como residência da entidade familiar.

No direito de família existem duas formas de prever o bem de família:

• bem de família voluntário ou convencional

• bem de família legal

O bem de família é voluntário ou convencional quando pode ser instituído por alguém:
61
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• pelos cônjuges

• pela entidade familiar

• por um terceiro

Esta instituição do bem de família convencional se dará por escritura pública ou


testamento. Mas não pode ultrapassar 1/3 do patrimônio líquido da pessoa que faz a instituição.

O bem de família convencional não revoga o bem de família legal, podendo inclusive
conviverem.

No caso do bem de família convencional, os cônjuges devem aceitar expressamente este


benefício.

Para que seja bem de família convencional, é necessário que o bem seja:

• imóvel

• residencial rural ou urbano

• incluindo todos os bens acessórios que compõem este bem

Atente-se que a proteção do bem de família convencional pode abranger valores


mobiliários, desde que se refiram a bens cuja renda seja aplicada na conservação do imóvel e
ao sustento da família.

A instituição do bem de família convencional deve ser feita por escrito, registrada no
cartório de registro de imóveis, no local em que o imóvel está situado. Esta instituição se dará por
escritura pública ou testamento.

São consequências da instituição do bem de família convencional:

• inalienabilidade do imóvel

• impenhorabilidade do imóvel

• isenção de execução por dívidas posteriores à instituição

Há situações em que a despeito de o bem ser de família convencional, e ter tais


características, não prevalecerá estas condições:
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• dívidas anteriores à constituição do bem de família

• no caso de dívidas posteriores relacionadas a tributos relacionados ao prédio

• no caso de dívidas de condomínio

O art. 1.715, p.ú., diz que no caso de execução dessas dívidas, o saldo existente será
aplicado em outro prédio, como bem de família, ou em títulos da dívida pública, para sustento
familiar, salvo se motivos relevantes aconselharem outra solução, a critério do juiz.

A inalienabilidade é a regra geral do bem de família convencional, mas é possível a


alienação do referido bem se houver o consentimento dos interessados, ouvido o Ministério
Público, desde que houvesse autorização judicial.

Eventualmente, comprovada a impossibilidade de manutenção do bem de família


convencional, poderá o juiz extinguir o bem de família ou autorizar a sub-rogação real,
colocando um bem no lugar do outro para fins de bem de família convencional.

O art. 1.722 diz que se extingue, igualmente, o bem de família com a morte de ambos os
cônjuges e a maioridade dos filhos, desde que não sujeitos a curatela.

Esta extinção não impede a aplicação da proteção do bem de família legal, constante da
Lei 8.009/90.

III. Bem de família legal

O art. 1º da Lei 8.009/90 diz que o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade
familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal,
previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam
seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

A Súmula 364 do STJ já estabeleceu que o conceito de impenhorabilidade de bem de


família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.

A Súmula 205 do STJ diz que a Lei 8.009/90 tem eficácia retroativa, atingindo esta
impenhorabilidade de dívidas anteriores ao advento da lei. Trata-se de uma retroatividade
motivada ou justificada, em prol de normas de ordem pública.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O bem de família é irrenunciável, e o seu oferecimento à penhora não o torna bem sujeito
à constrição.

O STJ entende que, no caso de locação do bem, se esta renda é utilizada para manutenção
daquela família, ou para locação de outro imóvel em que esta família viva, a proteção do bem de
família permanece. Trata-se do bem de família indireto. Este inclusive é o teor da Súmula 486 do
STJ: É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde
que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.

Segundo o informativo 579 do STJ, a impenhorabilidade do bem de família no qual reside


o sócio devedor não é afastada pelo fato de o imóvel pertencer à sociedade empresária.

Recentemente, o STJ estendeu a impenhorabilidade também para o imóvel comercial,


desde que seja revertida a renda para custear a moradia num imóvel alugado. Nas palavras da
Corte, é impenhorável o único imóvel comercial do devedor que esteja alugado quando o valor
do aluguel é destinado unicamente ao pagamento de locação residencial por sua entidade
familiar (Info 591).

Do mesmo modo, o STJ entendeu que, se o executado possui um único imóvel residencial,
mas quem mora nele é um parente (ex: filho), mesmo assim esse imóvel será considerado como
bem de família, sendo impenhorável. Em outras palavras, constitui bem de família, insuscetível
de penhora, o único imóvel residencial do devedor em que resida seu familiar, ainda que o
proprietário nele não habite (Inf. 543).

No caso da família não ter imóvel próprio, a impenhorabilidade recai sobre os bens
móveis quitados, que guarnecem a residência e sejam de propriedade do locatário.

Veículos de transporte, obras de arte, adornos suntuosos estão excluídos dessa


impenhorabilidade.

Os demais bens dentro da residência serão considerados impenhoráveis.

O STJ já decidiu que a penhorabilidade se estenderá às garagens que tenham matrícula


própria. Está sumulado.

O art. 3º estabelece que impenhorabilidade não é oponível aos seguintes casos:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição


do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo
contrato;

• Credor da pensão alimentícia, resguardados os direitos, sobre o bem, do seu


coproprietário que, com o devedor, integre união estável ou conjugal, observadas as
hipóteses em que ambos responderão pela dívida;

• Cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função


do imóvel familiar;

• Execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela
entidade familiar. Esta exceção só se aplica se a hipoteca foi constituída por ambos os
cônjuges ou de toda a entidade familiar. O fato de a hipoteca não ter sido registrada não
pode ser utilizado como argumento pelo devedor para evitar a penhora do bem de
família, pois o registro não é necessário (Inf. 585, STJ).

• Imóvel ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal
condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.

• Por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Da mesma forma, na execução civil movida pela vítima, não é oponível a


impenhorabilidade do bem de família adquirido com o produto do crime, ainda que a
punibilidade do acusado tenha sido extinta em razão do cumprimento das condições estipuladas
para a suspensão condicional do processo (Inf. 575).

O STJ, em sede de recursos repetitivos, disse que é legítima a penhora do bem de família
pertencente a fiador em contrato de locação. Em outubro de 2015, o STJ sedimentou este
entendimento, inclusive trazendo a Súmula 549, a qual afirma que é válida a penhora de bem de
família pertencente a fiador de contrato de locação.

Além disso, o STJ entendeu que o rol das exceções do bem de família é meramente
exemplificativo. O STJ diz que a proteção da impenhorabilidade não pode prevalecer nos casos
em que o devedor age de má-fé.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Domicílio

As regras quanto ao domicílio da pessoa natural estão entre os arts. 70 e 78 do CC.

Domicílio é o local em que a pessoa pode ser sujeito de direitos e deveres na ordem
privada. É o local onde poderá ser cobrada ou cobrar direitos e deveres na ordem jurídica.

Domicílio é o local da sua residência. Há quem diga que domicílio é residência com ânimo
definitivo. O domicílio eleitoral é mais amplo do que o domicílio civil.

O art. 71 vai dizer que é possível a pluralidade de domicílios, ou seja, a pessoa poderá ter
duas ou mais residências, o qual ela viva alternadamente, considerando-se domicílio seu
qualquer delas.

O art. 72 do CC diz que o local em que a pessoa exercitar profissão também é domicílio
da pessoa natural, também sendo permitido a pluralidade domiciliar. Neste caso, se a pessoa
exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá domicílio para as relações que
lhe corresponderem.

O art. 74 estabelece que se muda o domicílio, transferindo a residência, com a intenção


manifesta de mudar o domicílio. Para se provar a intenção manifesta de mudar, basta que a prova
da intenção resulte da declaração da pessoa às municipalidades dos lugares, que deixa, e para
onde vai, ou, se tais declarações não fizer, da própria mudança, com as circunstâncias que a
acompanharem.

Essa intenção é vislumbrada por meio das declarações da pessoa à municipalidade, tanto
de onde ela está saindo como onde ela está indo morar. Ex.: alteração do domicílio eleitoral é
exemplo de intenção manifesta de se mudar.

O art. 73 do CC fala que a pessoa natural, se não tiver residência habitual, será o domicílio
em que ela for encontrada. Ex.: ciganos, peregrinos, circenses, etc.

I. Classificação do domicílio

O domicílio poderá ser classificado:

• domicílio voluntário: é aquele fixado pela vontade da pessoa.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• domicílio necessário (ou legal): é o domicílio imposto pela lei. Não exclui o domicílio
voluntário.

o domicílio do incapaz: é o do seu representante ou assistente

o domicílio do servidor público: lugar em que exercer permanentemente suas


funções

o domicílio do militar: onde servir

o domicílio da Marinha ou da Aeronáutica: sede do comando a que se encontrar


imediatamente subordinado;

o domicílio do marítimo: onde o navio estiver matriculado

o domicílio do preso: o lugar em que cumprir a sentença.

• domicílio contratual (convencional): o art. 78 diz que, nos contratos escritos, poderão
os contratantes especificar domicílio onde se exercitem e cumpram os direitos e
obrigações deles resultantes. Nos contratos é possível eleger um domicílio. O foro
competente para divergir sobre eventual divergência será aquele eleito. Denomina-se
cláusula de eleição de foro.

Pessoa Jurídica

I. Introdução e conceito

A pessoa jurídica pode ser conceituada como um conjunto de pessoas, se for uma
corporação, ou conjunto de bens, que adquirem uma personalidade jurídica, a partir de uma
ficção legal.

A pessoa jurídica não se confunde com as pessoas de seus membros.

Muitas teorias procuram explicar a existência da pessoa jurídica.

O Código Civil adotou a teoria da realidade técnica, eis que se trata da somatória de outras
duas outras teorias: teoria da ficção (Savigny) e da teoria da realidade orgânica (Otto Gierke).

• Teoria da ficção (Savigny):

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Sustentava que a pessoa jurídica seria um sujeito com existência ideal, ou seja, fruto da
técnica jurídica. As pessoas jurídicas seriam pessoas por ficção legal, uma vez que somente os
sujeitos dotados de vontade poderiam por si mesmos titularizar direitos subjetivos. A pessoa jurídica
não teria uma função social, teria uma existência abstrata, ideal.
A crítica recai no fato de negar a atuação social da pessoa jurídica, ela participa de
relações sociais, esta teoria é extremamente abstrata, demais. A pessoa jurídica integra as relações
sociais. Como reconhecer à ficção, mero artifício, a natureza de um ente que tem indiscutível
existência real? Se a PJ é uma criação de lei, mera abstração, quem haveria criado o Estado, PJ de
direito público por excelência?
• Teoria da realidade objetiva ou organicista (Clóvis Beviláqua):

É o contraponto da teoria da ficção. Para ela, a pessoa jurídica não seria fruto da técnica
jurídica, mas sim um organismo social vivo. Para este pensamento a pessoa jurídica teria uma
atuação social, sendo um organismo social vivo.
A crítica recai no fato de o erro não reconhecer a atuação social. O erro é dizer que a PJ é
criada pela sociologia e não pelo direito.
• Teoria da realidade técnica (Ferrara):

Aproveitando elementos das duas correntes anteriores, é mais equilibrada. Afirma que
a pessoa jurídica teria existência real, não obstante a sua personalidade ser conferida pelo direito.
Posto a pessoa jurídica seja personificada pelo direito, tem a atuação social na condição de sujeito
de direito. Sem olvidar que a personalidade jurídica é concedida pelo direito, ela tem função social.

II. Classificação da pessoa jurídica

A pessoa jurídica poderá ser classificada quanto à nacionalidade:

• Pessoa jurídica nacional: é organizada em conformidade com a lei brasileira, tendo no


Brasil a sua sede principal.

• Pessoa jurídica estrangeira: é formada em outro país e para funcionar no Brasil precisará
de autorização do Poder Executivo.

Quanto à estrutura interna, poderá a pessoa jurídica ser:

• Corporação: ocorre quando há um conjunto de pessoas que atuam para determinados


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

fins. Ex.: corporações de pessoas, de sociedades, associações, partidos políticos,


entidades religiosas.

• Fundação: é um conjunto de bens, os quais são arrecadados para uma finalidade de


interesse social.

Quanto às funções e à capacidade:

• Pessoas jurídicas de direito público

o interno: visam atender interesse público interno. Ex.: União, Estados, DF e


Municípios, autarquias, associações públicas etc.

o externo: visam atender interesse público externo. Ex.: Estados estrangeiros e


todas as pessoas regidas por direito internacional público.

• Pessoas jurídicas de direito privado: são instituídas pela vontade dos particulares,
podendo ser divididas em:

o Fundações;

o Associações;

o Sociedades simples ou empresárias;

o Partidos políticos;

o Entidades religiosas;

o EIRELI;

III. Pessoa jurídica de direito privado

O art. 44, §1º, do Código Civil traz um rol das pessoas jurídicas de direito privado:

• Associações;

• Sociedades;

• Fundações;

• Organizações religiosas;
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Partidos políticos;

• EIRELI;

Há que se destacar um Enunciado, o qual diz que a relação entre as pessoas jurídicas
constantes do art. 44 não é exaustivo.

Tartuce diz que este enunciado abre a possibilidade para afirmar que o condomínio edilício
tem personalidade jurídica. Frise-se que existe esta discussão doutrinária. A maioria entende que
o condomínio edilício não tem personalidade jurídica,

O art. 45 do CC estabelece que a existência da pessoa jurídica começa com a inscrição do


ato constitutivo no respectivo registro.

O parágrafo único estipula o prazo decadencial de 3 anos para anular a constituição das
pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação
de sua inscrição no registro.

O registro deve contar com os requisitos constantes do art. 46 do CC:

• a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver;

• o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos diretores;

• o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial e


extrajudicialmente;

• se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que modo;

• se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais;

• as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso.

As pessoas jurídicas devem ser representadas por uma pessoa natural, a qual
representará ativa ou passivamente. Em regra, essa pessoa virá mencionada no respectivo
estatuto.

Sendo o Estatuto omisso, a pessoa jurídica será representada pelos seus próprios
diretores. Veja, os atos praticados por tais pessoas vinculam a pessoa jurídica.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Aqui, é bom que se ressalte o Enunciado 145 que diz que o art. 47, que diz que os atos
vinculam a pessoa jurídica, não afasta a aplicação da teoria da aparência, no caso de
responsabilização do sócio, praticados em nome da pessoa jurídica.

O fato do ato praticado ser do sócio, diretor ou administrador vincular a pessoa jurídica,
não afasta a aplicação da teoria da aparência. Isso significa dizer que é possível aplicar a teoria da
desconsideração da personalidade jurídica, caso o sócio tenha abusado, a fim de que ele
responda pelos seus atos.

Em havendo uma administração coletiva da pessoa jurídica, as decisões se tomarão pela


maioria de votos dos presentes, salvo se o ato constitutivo dispuser de modo diverso.

Tomada a decisão, o prazo para anular essa deliberação será de 3 anos, quando violarem
a lei ou estatuto, ou forem eivadas de erro, dolo, simulação ou fraude.

Atente-se que pessoas jurídicas não se confundem com entes despersonalizados.

Entes despersonalizados não têm personalidade jurídica. São conjuntos de bens ou de


pessoas que não tem personalidade própria, tais como a família, condomínio, massa falida,
espólio, herança jacente, sociedade de fato, etc.

Para Tartuce, a sociedade irregular se diferencia da sociedade de fato. Aquela tem contrato
social, mas não foi registrado. Enquanto a sociedade de fato é aquela que não tem contrato social.

Ambas são entes despersonalizados.

O condomínio é um conjunto de bens em copropriedade. Para muitos doutrinadores, tal


como Tartuce, há pessoa jurídica quando se trata de condomínio edilício, eis que tem inscrição no
CNPJ.

IV. Modalidades de pessoas jurídica de direito privado

a) Associações

O art. 53 diz que se constituem as associações pela união de pessoas que se organizem
para fins não econômicos. Deve ser lido como não lucrativos.

O que há aqui é um conjunto de pessoas que se destinem a fins não lucrativos. Isto não

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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significa que não possa ter lucro. Não poderá ser esta a finalidade da associação.

As associações podem desenvolver atividade econômica, desde que não exista finalidade
lucrativa. Ex.: clubes, etc.

Segundo o CC, não existe entre os associados direitos e obrigações recíprocos. Isso
porque não há intuito de lucro.

A diferença entre a associação e a sociedade é a de que aquela não tem fins lucrativos e a
sociedade sempre tem fins lucrativos.

A diferença entre associação e a fundação é a de que aquela é um conjunto de pessoas e


a esta é um conjunto de bens.

O art. 54 traz os requisitos para uma associação, estabelecendo que, sob pena de
nulidade, o estatuto das associações conterá:

• a denominação, os fins e a sede da associação;

• os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;

• os direitos e deveres dos associados;

• as fontes de recursos para sua manutenção;

• o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos deliberativos;

• as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução.

• a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas.

O art. 55 diz que deverão os associados ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir
categorias com vantagens especiais.

O art. 56 diz que a qualidade de associado é intransmissível, visto que se trata de um ato
personalíssimo, mas é possível que o estatuto disponha em sentido contrário.

Se o associado for titular de quota ou fração ideal do patrimônio da associação, a


transferência de quota ou fração ideal não importará na atribuição da qualidade de associado
ao adquirente ou ao herdeiro, visto que se trata de ato personalíssimo. É claro que o estatuto
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

poderá dispor de maneira diversa.

A exclusão do associado só é possível se houver justa causa. Mesmo assim, é preciso que
a exclusão seja decorrente de um procedimento que assegure ampla defesa e recurso, nos
termos previstos no estatuto.

Há aqui uma aplicação da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

O STJ, em recurso repetitivo, entendeu que as taxas de manutenção criadas por


associações de moradores não obrigam o não associado, ou seja, não obrigam aqueles que não
anuíram a associação. Ex.: associação dos moradores da Rua João da Silva. Um dos moradores não
quer fazer parte. O direito é de não se associar.

Só existem duas formas de obrigação do sujeito: uma por meio de lei outra por meio de
contrato. Caso o sujeito não tenha aderido, não poderá ser compelido a pagar a associação.

O art. 58 consagra que nenhum associado poderá ser impedido de exercer direito ou
função que lhe tenha sido legitimamente conferido pela associação, a não ser nos casos previstos
na lei ou no estatuto.

O art. 59 diz que compete privativamente à assembleia geral:

• destituir os administradores

• alterar o estatuto

Ocorre que o artigo não diz qual é o quórum para instalação e nem o quórum para
deliberação para destituir administradores e alterar estatuto.

Essas regras, em prestígio à autonomia privada, ficarão a cargo do estatuto.

O art. 60 fala do quantum, mas é para outro caso. Este dispositivo estabelece que a
convocação dos órgãos deliberativos será na forma do estatuto, garantido a 1/5 dos associados
o direito de promover esta convocação.

Este art. 60 estipula 1/5 dos associados tem o direito de convocar órgão deliberativo.

Percebe-se que há direito de convocar qualquer órgão deliberativo, e não somente a


assembleia, podendo o estatuto prever outros órgãos menores que a assembleia para deliberar
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

uma série de questões.

Se for dissolvida a associação, o patrimônio líquido remanescente será destinado à


entidade de fins não econômicos designada no estatuto. Caso o estatuto seja omisso, os
associados deliberarão a respeito. O remanescente poderá ser destinado à instituição municipal,
estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes.

Existe precedente do TJRS em que se considera nula a previsão no Estatuto que determina
que nos casos de dissolução da associação, o patrimônio vai ser rateado entre os associados, eis
que haveria um esbarrar na vedação de lucro. Bastaria pensar numa associação que cresceu
muito e que tenha um patrimônio de 100 milhões de reais com 100 associados.

Existe a possibilidade de eventualmente o associado recuperar aquilo que ele investiu


na cota. Trata-se do ressarcimento, não havendo falar em enriquecimento.

Vale atentar que, não existindo no Município, no Estado, no Distrito Federal ou no


Território, em que a associação tiver sede, instituição nas condições indicadas, o que remanescer
do seu patrimônio se devolverá à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União.

b) Fundações

As fundações são um conjunto de bens, os quais são arrecadados e personificados para


uma determinada finalidade.

O art. 62 do CC diz que as fundações são criadas por escritura pública ou por testamento.

A sua criação pressupõe a existência dos seguintes elementos:

• afetação de bens livres

• especifique a finalidade da fundação

• estatuto deve prever como será administrada a fundação

• elaboração de estatuto

A elaboração do estatuto é submetido à apreciação do Ministério Público, eis que ele


fiscaliza a fundação.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Quando insuficientes os bens para constituir a fundação, serão destinados a outra


fundação que se proponha a fim igual ou semelhante, salvo se de outro modo não dispuser o
instituidor.

As fundações surgem com registro do seu estatuto no Registro Civil de Pessoas Jurídicas.

O parágrafo único do art. 62 diz que a fundação somente poderá constituir-se para fins
de:

• assistência social

• cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico

• educação

• saúde

• segurança alimentar e nutricional

• defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento


sustentável

• pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de


sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e
científicos

• promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos

• atividades religiosas

É muito difícil de não enquadrar alguma fundação nestas hipóteses.

O art. 64 do CC diz que constituída a fundação, num negócio jurídico entre vivos, o
instituidor é obrigado a transferir a fundação a propriedade, ou outro direito real, sobre os bens
dotados. Caso não o faça, os bens serão registrados em nome da fundação por mandado judicial.

Em razão da finalidade social da fundação, os administradores deverão prestar contas ao


Ministério Público. As fundações sempre serão supervisionadas pelo MP.

A atuação, via de regra, cabe ao Ministério Público estadual. A exceção é de que se a


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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fundação funcionar em várias unidades da federação, caberá a atuação conjunta dos Ministérios
Públicos de todos os estados envolvidos. Se funcionarem no Distrito Federal ou em Território,
caberá o encargo ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios.

A alteração das normas estatutárias de uma fundação somente é possível pela


deliberação de 2/3 dos competentes para gerir e representar a fundação. Além disso, esta
alteração não pode contrariar ou desvirtuar o fim desta.

O prazo decadencial para o Ministério Público aprovar essas alterações estatutárias é de


45 dias. caso o MP seja omisso ou denegue a alteração, poderá o juiz suprir essa autorização, a
requerimento do interessado.

Ademais, quando a alteração não se der por votação unânime, os administradores, ao


submeterem o estatuto à análise do Ministério Público, irão requerer que seja cientificada a
minoria vencida para impugnar a votação se quiser, em 10 dias.

Caso a atividade desempenhada pela fundação se tornar ilícita, impossível ou imoral, ou


ainda se não atender as finalidades a que se destina, poderá haver a dissolução dessa fundação.

Atente-se que esta dissolução poderá ocorrer na seara administrativa, isto é, feita pelo
Ministério Público. Nestes casos, os bens que pertencem à fundação serão destinados a uma
outra fundação que desempenhe atividade semelhante, salvo se o estatuto tiver uma previsão
em sentido contrário.

c) Sociedades

Já foi dito que finalidade lucrativa distingue sociedade de associação, apesar de ambas
serem espécies de corporação.

As sociedades se dividem em:

• sociedade empresária: finalidade lucrativa, mas através de atividade empresária.

• sociedade simples: finalidade lucrativa, mas mediante atividade não empresária.

O Enunciado 69 diz que sociedades cooperativas são sociedades simples, mas sujeitas à
inscrição na Junta Comercial.

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As sociedades, sejam simples ou empresárias, podem assumir a forma de:

• sociedade em nome coletivo

• sociedade em comandita simples

• sociedade em comandita por ações

• sociedade limitada

• sociedade em conta de participação

Ressalva-se que a sociedade anônima somente pode ser sociedade empresária, jamais
sociedade simples.

d) Corporações especiais: partidos políticos e organizações religiosas

O Código Civil reserva às leis especiais o tratamento dos partidos políticos e das
organizações religiosas.

O art. 44 diz que são livres a criação, a organização, a estruturação interna e o


funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar
reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento.

O poder público não pode negar reconhecimento dos atos constitutivos, desde que se trate
efetivamente de uma organização religiosa e preencha os requisitos.

Com relação aos partidos políticos, eles são organizados e funcionarão conforme disposto
em lei específica. Serão estudados em direito eleitoral.

V. Domicílio da pessoa jurídica de direito privado

A União deverá promover ação na capital em que tiver domicílio a outra parte. Ex.: João
mora em Curitiba, devendo a União promover ação em Curitiba.

A União poderá ser demandada nos seguintes domicílios:

• Distrito Federal

• Capital do estado em que o ato que deu origem foi praticado

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Capital do estado em que se encontra o bem que está envolvido na lide

Os Estados e Territórios têm como domicílio as suas capitais.

O Município tem como domicílio o lugar em que funciona a sua administração, ou onde
funciona a sua prefeitura.

A pessoa jurídica de direito privado também tem domicílio, sendo esta a sua sede jurídica,
onde funcionam as suas diretorias e administrações. Ou seja, terá a pessoa jurídica domicílio no
lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio
especial no seu estatuto ou atos constitutivos.

É possível que uma pessoa jurídica tenha diferentes domicílios. Trata-se de uma
pluralidade domiciliar.

Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da


pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do
estabelecimento, situado no Brasil, a que ela corresponder. Está dizendo que se se tratar de uma
pessoa jurídica estrangeira, será considerado o domicílio onde a obrigação tiver nascido.

Portanto, é possível pluralidade domiciliar inclusive quanto à pessoa jurídica.

VI. Extinção da pessoa jurídica de direito privado

Em relação ao término da pessoa jurídica, interessa dividir o estudo em corporações e


fundações.

a) Extinção das corporações (sociedades e associações)

A existência das corporações vai terminar com algumas hipóteses possíveis:

• dissolução deliberada por unanimidade de seus membros

• determinado por lei

• decorrência de ato governamental

• decurso do prazo da pessoa jurídica

• dissolução parcial, e no prazo de 180 dias, não há pluralidade de sócios


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• dissolução judicial

No caso da dissolução de uma associação, os seus bens arrecadados deverão ser


destinados a entidades de fins não lucrativos.

Não estando previsto no estatuto a destinação para qual entidade serão encaminhados
os bens, serão eles destinados a estabelecimento municipal, estadual ou federal, com finalidade
semelhante ao da associação que está sendo dissolvida naquele momento.

Por cláusula do estatuto, ou sendo ele silente, é possível que por deliberação dos sócios,
caso o estatuto seja omisso, ou se assim prever o estatuto, que antes da destinação do
remanescente, receba cada associado o respectivo valor da sua contribuição do patrimônio da
associação. Neste caso, não se está a promover o enriquecimento do associado.

b) Fundações

Em relação à extinção das fundações, existe uma norma específica, que é o art. 69.

Este dispositivo vai dizer que se tornar ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa
a fundação, ou vencido o prazo de sua existência, o Ministério Público, ou qualquer interessado,
vai promover a extinção, incorporando-se o seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato
constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada pelo juiz, que se proponha a fim igual
ou semelhante

VII. Desconsideração da personalidade jurídica

Cai muito em prova.

a) Introdução

A regra é que a pessoa jurídica tenha uma existência distinta da existência dos seus sócios.
Portanto, a regra é que a responsabilidade dos sócios, em relação às dívidas sociais, é uma
responsabilidade subsidiária, desde que o tipo societário permita isto.

Basta pensar que na sociedade limitada, se estiver com o capital social integralizado, não
haverá sequer responsabilidade subsidiária. Da mesma forma é com as quotas já integralizadas
pelos sócios da sociedade anônima.

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Eduardo Defaveri

Em razão da possibilidade de excluir a responsabilidade dos sócios ou do administrador da


pessoa jurídica, por vezes há desvio da administração da pessoa jurídica, que passa a ser um
instrumento para o cometimento de fraudes.

Visando coibir a fraude e o abuso, surgiu a teoria da desconsideração da personalidade


jurídica, sendo também denominada de teoria da penetração ou disregard doctrine.

b) Conceito

O instituto da desconsideração da personalidade jurídica permite que o juiz,


episodicamente, não considere os efeitos da personificação da sociedade, atingindo e vinculando
a responsabilidade dos sócios, em relação àquelas obrigações.

Os bens da empresa também podem responder pelas dívidas do sócios, sendo


denominado de desconsideração da personalidade jurídica inversa. O NCPC trata expressamente
desse instituto.

O art. 50 estabelece que, em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo


desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte,
ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e
determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos
administradores ou sócios da pessoa jurídica.

Perceba que o juiz não pode de ofício decretar a desconsideração da personalidade


jurídica.

Não é preciso insolvência exatamente, mas é preciso demonstrar o risco de prejuízo


somado à existência de fraude, pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial.

O CDC, no art. 28, também trata da desconsideração da personalidade jurídica. Segundo o


dispositivo, o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em
detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato
ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada
quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica
provocados por má administração.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Todavia, o §5º estabelece que também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica
sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos
causados aos consumidores. No mesmo sentido é o teor do art. 4 da Lei 9.605/98, o qual
estabelece que poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for
obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.

Percebe-se que o Código Civil exija que exista desvio de finalidade ou confusão
patrimonial, além do próprio prejuízo ao credor. Este é a adoção da teoria maior, pois a
desconsideração exige o abuso da personalidade jurídica e o prejuízo ao credor. A teoria maior
exige que se demonstre a confusão patrimonial ou o desvio de finalidade.

Por essa razão, o STJ já decidiu também que o mero encerramento irregular da atividade
da empresa não tem o condão de, por si só, gerar a incidência da desconsideração da
personalidade jurídica, especialmente aquela prevista no Código Civil, que exige a fraude.

Para o CDC e a Lei de Crimes Ambientais, exige apenas o prejuízo ao credor, motivo pelo
qual adotou a teoria menor. Aqui, a desconsideração da personalidade jurídica exige apenas a
existência de prejuízo ao credor.

A desconsideração da personalidade jurídica não retira a personalidade jurídica da


sociedade, mas apenas se desconsiderou em determinada situação.

Não se deve confundir desconsideração com despersonalização.

c) Desconsideração da personalidade jurídica inversa

A desconsideração da personalidade jurídica inversa ocorre quando desconsidera o sócio,


fazendo com que a sociedade responda por dívidas do sócio inadimplente.

Caso muito comum são aqueles relacionados a dívidas de alimentos ou de divórcio. Nestas
situações, os sócios adquirem bens para si, mas com o patrimônio da sociedade e em nome dela,
a fim de que não tenha nada em seu nome. Eis a confusão patrimonial.

Perceba que a desconsideração da personalidade jurídica passa a ser aplicada também na


seara do direito de família.

O Enunciado 283 diz que é cabível desconsideração da personalidade jurídica inversa para
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

alcançar bens do sócio que se valeu da pessoa jurídica para ocultar ou desviar bens pessoas com
prejuízos a terceiros.

O NCPC incluiu a desconsideração da personalidade jurídica inversa.

d) Desconsideração da personalidade jurídica e sucessão de empresas

Com a evolução da desconsideração da personalidade jurídica, tem-se adotado a teoria da


sucessão de empresas. Esta teoria estabelece que nos casos de abuso da personalidade, em que
há claramente uma fraude, o magistrado poderá estender a responsabilidade de uma empresa
para outra.

A primeira é chamada de empresa sucedida e a outra é denominada empresa sucessora.

Ex.: ABC Móveis encerrou suas atividades. Passados dois meses, é inaugurada a loja DEF
Móveis, com os mesmos móveis, mas não com o nome do sócio devedor, mas com o nome da
filha. Na verdade, há uma empresa sucessora, situação na qual o credor poderá cobrar a DEF
Móveis.

Neste caso, o juiz poderá determinar a desconsideração da personalidade jurídica da DEF


Móveis para atingir as dívidas decorrentes da ABC Móveis.

A desconsideração da personalidade jurídica sempre foi viável, e isso antes mesmo dessa
previsão do NCPC.

e) Desconsideração da personalidade jurídica e Lei Anticorrupção

Em matéria de inovação, há um item que trouxe a desconsideração da personalidade


jurídica.

Trata-se da desconsideração da personalidade jurídica administrativa. Neste caso, será


possível a desconsideração da personalidade jurídica no âmbito administrativo. Não é necessário
buscar o poder judiciário.

Segundo o art. 14, a personalidade da pessoa jurídica poderá ser desconsiderada sempre
que for utilizada com abuso de direito para facilitar, para encobrir ou para dissimular a prática de
atos ilícitos previstos na Lei Anticorrupção, ou para provocar uma confusão patrimonial.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Neste caso, serão estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas àquela pessoa jurídica
aos seus administradores e sócios com poderes de administração.

O dispositivo está inserido no capítulo relativo ao processo administrativo. Trata-se de


medida que independe de decisão judicial. Portanto, a lei anticorrupção traz a desconsideração
da personalidade jurídica passível de ser feita no âmbito administrativo, desde que respeitado
o contraditório e ampla defesa, e sem impedir que se questione no âmbito judicial a validade das
medidas tomadas.

f) Desconsideração da personalidade jurídica no âmbito fiscal

No âmbito fiscal, o STJ entende que se presume dissolvida irregularmente a empresa que
deixar de funcionar no seu domicílio fiscal sem ter comunicada essa alteração de domicílio aos
órgãos competentes, legitimando-se, portanto, o redirecionamento da execução fiscal aos sócios-
gerentes ou que administrem. É o teor da súmula 435 do STJ. Há aqui uma presunção de fraude.

Vale lembrar que isso é em sede de execução fiscal.

g) Desconsideração da personalidade jurídica nas entidades sem fins lucrativos

O Enunciado 284 do CJF diz que as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos
ou de fins não econômico estão abrangidas pela aplicação da desconsideração da personalidade
jurídica.

Portanto, é plenamente possível que haja nas fundações e nas associações, ainda que não
tenham finalidade lucrativa.

h) Desconsideração da personalidade jurídica invocada pela própria pessoa jurídica

O Enunciado 285 do CJF diz que a teoria da desconsideração da personalidade jurídica do Código
Civil pode ser invocada pela pessoa jurídica em seu favor.

Ou seja, nada impede que a pessoa jurídica se utilize da desconsideração em seu favor,
quer para não atingir o sócio-administrador, quer para atingir o sócio.

i) Desconsideração da personalidade jurídica no Novo CPC

Está previsto nos art. 133 a 137, dentro do capítulo das intervenções de terceiro.

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Segundo o art. 133, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica será


instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

O juiz não poderá decretar a desconsideração de ofício. Tartuce afirma que é possível nos
casos de aplicação da teoria menor (CDC e ambiental).

O §1º diz que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os


pressupostos previstos em lei. Ou seja, para desconsiderar é preciso observar o direito material,
sendo relação material, busca-se o art. 50; sendo de consumo, aplica-se o art. 28 do CDC.

Como dito anteriormente, aplica-se as regras da desconsideração à hipótese de


desconsideração inversa da personalidade jurídica.

Já o art. 134 estabelece que o incidente de desconsideração é cabível em todas as fases


do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título
executivo extrajudicial.

Não há mais dúvidas de que a desconsideração poderá ocorrer em qualquer fase.

Feita a instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as


anotações devidas.

É dispensada a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica


se esta já for requerida na petição inicial, visto que, neste caso, o sócio ou a pessoa jurídica já
serão citados, passando a figurar no polo passivo. Esta é a crítica sobre a intervenção de terceiros.

Caso haja o incidente, a sua instauração suspenderá o processo, salvo na hipótese em que
há o pedido na petição inicial.

O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos


para desconsideração da personalidade jurídica, conforme o art. 50 do CC ou o art. 28 do CDC,
etc.

Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e


requerer as provas cabíveis no prazo de 15 dias. Concluída a instrução, se necessária, o incidente
será resolvido por decisão interlocutória.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Caso a decisão seja proferida pelo Relator, cabe agravo interno.

O art. 137 diz que, acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de


bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente.

Perceba que a opção do legislador é fazer com que aquilo que é desconsiderado é aquilo
que envolve o plano de eficácia e não de validade. Ou seja, o ato é válido, mas perante o credor
este ato é ineficaz.

Ex.: pessoa jurídica passou um bem para o nome do sócio. O credor pediu a
desconsideração. O bem valia 10 milhões de reais. A pessoa jurídica devia 1 milhão ao credor. O
sócio teve de pagar este 1 milhão, já que houve a desconsideração.

O restante continua sendo válida, mas sendo ela ineficaz em relação ao credor, que teve
vitorioso o plano de desconsideração.

O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao procedimento dos


Juizados Especiais.

Teoria do Negócio Jurídico

Teoria geral do negócio jurídico

I. Conceitos básicos. Fato, ato e negócio jurídico

Fato jurídico é o fato que interessa ao direito, sendo uma ocorrência que tenha relevância
jurídica.

Ato jurídico é um fato que tem relevância jurídica, mas com elemento volitivo e conteúdo
lícito. É a atuação da vontade de alguém.

Negócio jurídico é um ato jurídico, com elemento volitivo e de conteúdo lícito, mas que há
composição de interesse das partes, com finalidade específica e desejada pelas partes.

O negócio jurídico é o ponto principal da parte geral do Código Civil, sendo o ponto
principal para entender o contrato, casamento, testamento, etc.

a) Negócio jurídico processual

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O NCPC trouxe uma novidade, denominado de negócio jurídico processual.

O art. 190 do NCPC diz que, versando o processo sobre direitos que admitam
autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento
para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes,
faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.

Logicamente, o juiz controlará a validade dessas convenções processuais celebradas entre


as partes. Percebam uma inovação importante do NCPC.

O art. 191 ainda diz que, de comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para
a prática dos atos processuais, quando for o caso. Tal calendário processual vincula as partes e o
juiz, e os prazos nele previstos somente serão modificados em casos excepcionais, devidamente
justificados.

Por conta do calendário processual, fica dispensada a intimação das partes para a prática
de ato processual ou a realização de audiência cujas datas tiverem sido designadas no calendário.

b) Ato jurídico stricto sensu

O ato jurídico stricto sensu há o elemento volitivo, mas os efeitos da manifestação de


vontade já estão pré-determinados pela lei.

Ex.: ocupação de um imóvel. Os efeitos de ser proprietário de um imóvel traz


consequências jurídicas, como pagamento de tributos, condomínio, etc. Da mesma forma o
reconhecimento de filho também é o ato jurídico stricto sensu, visto que o indivíduo passa a ter
deveres sobre o filho.

c) Ato-fato jurídico (ou ato real)

Além desses conceitos, parte considerada da doutrina traz o denominado ato-fato jurídico.

Paulo Lôbo estabelece que os atos-fatos jurídicos são atos, ou comportamentos


humanos, em que não houve vontade, ou tendo havido vontade, o direito não a considerou.

Nos atos-fatos jurídicos, a vontade não integra o suporte fático, visto que é a lei que faz o
ato-fato jurídico, atribuindo consequências ou efeitos independentemente da parte ou do sujeito

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

ter desejado ou não estes efeitos.

Exemplo: descoberta de um tesouro sem querer.

II. Classificação do negócio jurídico

As classificações do negócio jurídico servem tanto para o negócio jurídico quanto para o
ato jurídico stricto sensu.

a) Quanto às manifestações de vontade dos envolvidos

Negócios jurídicos unilaterais: a declaração de vontade emana de apenas uma pessoa. Ex.:
testamento, renúncia. É possível também falar em:

o Negócios unilaterais receptícios: em que a declaração deve ser levada ao conhecimento do


destinatário, momento em que passará a produzir efeitos (ex.: promessa de recompensa).

o Negócios unilaterais não receptícios: em que o conhecimento do destinatário é irrelevante


(ex.: testamento).

• Negócios jurídicos bilaterais: há manifestação de vontade de duas partes, coincidentes.

• Negócios jurídicos plurilaterais: há manifestação de vontade de mais de duas partes, com


interesses coincidentes. Ex.: contrato social em que há 4 ou mais sócios para formarem uma
sociedade. O contrato de consórcio a mesma coisa.

b) Quanto às vantagens patrimoniais dos envolvidos

• Negócios jurídicos gratuitos: há um ato de liberalidade. Ex.: doação.

• Negócios jurídicos onerosos: em ambos os lados há sacríficos de vontades. Ex.: compra e venda.

• Negócios jurídicos neutros: são aqueles em que não há uma atribuição patrimonial determinada.
Ex.: instituição de um bem de família voluntário.

• Negócios jurídicos bifrontes: são aqueles em que poderão ser gratuitos ou poderão ser
onerosos, a depender do contrato. Ex.: mandato, depósito, etc. Se o sujeito está recebendo pelo
mandato, será oneroso, senão será gratuito.

c) Quanto aos efeitos no aspecto temporal

• Negócios jurídicos inter vivos: destinam-se a produzir efeitos durante a vida dos negociantes.
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• Negócios jurídicos mortis causa: destinam-se a produzir efeitos após a morte de determinada
pessoa. Ex.: testamento e o legado.

d) Quanto à necessidade ou não de solenidades e formalidades

• Negócios jurídicos formais ou solenes: são aqueles que obedecem a uma forma ou solenidade
para ser concluído.

• Negócios jurídicos informais: não é necessário forma ou solenidade para o ato. Ex.: locação e
prestação de serviços.

e) Quanto à independência ou autonomia

• Negócios jurídicos principais e independentes: são aqueles que não dependem de qualquer
outro negócio jurídico para existência. Ex.: contrato de locação.

• Negócios jurídicos acessórios e dependentes: são aqueles que a existência está subordinada ao
negócio jurídico principal. Ex.: contrato de fiança em relação ao contrato de locação.

f) Quanto às condições especiais dos negociantes

• Negócios jurídicos impessoais: o negócio jurídico não depende de qualquer condição dos
envolvidos. A prestação pode ser cumprida tanto pelo contratante ou por terceiros. Ex.: caso não
queira comprar o carro numa loja, compra o mesmo carro noutra.

• Negócios jurídicos pessoais (intuito personae): o negócio jurídico depende de uma condição
especial de um dos negociantes. Trata-se de uma obrigação infungível. Ex.: contratação de um
pintor para fazer um quadro na casa do sujeito.

g) Quanto ao momento de aperfeiçoamento

• Negócios jurídicos consensuais: o negócio jurídico já gera efeitos a partir do momento em que
ocorre o acordo de vontades. Ex.: compra e venda.

• Negócios jurídicos reais: o negócio jurídico gera efeito a partir da entrega do objeto (tradição).
Ex.: comodato e mútuo.

III. Elementos estruturais do negócio jurídico. Escada Ponteana.

O negócio jurídico tem 3 planos:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• plano da existência

• plano da validade

• plano da eficácia

Atente-se que esta escada permite que um negócio seja existente, mas seja inválido, ainda
que seja eficaz. Ex.: negócio jurídico anulável. Caso não seja anulado, será ele convalidado.

É possível também que o negócio seja existente, válido, mas não seja eficaz. Ex.: contrato
celebrado sob condição suspensiva.

a) Plano da existência

No plano da existência, apesar de o Código Civil não tratar, a doutrina trata.

Neste plano, há os pressupostos para um negócio jurídico, sendo seus elementos mínimos
e sua essência. Sem que haja isto, o negócio não existe.

Para existir negócio jurídico é necessário que tenha:

• Partes

• Vontade

• Objeto

• Forma

Não havendo algum desses elementos, o negócio não existe.

O Código Civil trata diretamente do plano de validade.

b) Plano da validade

Para que um negócio jurídico seja válido, é necessário que tenha:

• Partes capazes

• Vontade livre

• Objeto lícito, possível, determinado ou determinável

• Forma prescrita ou não defesa em lei


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Esses são os requisitos de validade do negócio jurídico. Não tendo o negócio jurídico tais
requisitos, será ele nulo de pleno direito. Ou seja, nulidade absoluta.

O negócio também poderá ser anulável, existindo casos de nulidade relativa.

A nulidade poderá ser total ou parcial:

• nulidade total: ocorre quando todo o negócio jurídico é anulado.

• nulidade parcial: ocorre quando apenas parte do negócio jurídico é anulado.

O art. 184 diz que, respeitada a intenção das partes, a invalidade parcial de um negócio
jurídico não o prejudicará na parte válida, se esta for separável. Na primeira parte, este
dispositivo consagra o princípio da conservação dos negócios jurídicos, tendo em vista a função
social do contrato.

i. Partes capazes (capacidade do agente)

Quer dizer que é necessário tratar com o agente capaz.

Capacidade geral

É possível que o negócio seja firmado por absolutamente incapaz ou por relativamente
incapaz? SIM, desde que esteja representado, em caso de absolutamente incapaz, ou assistido,
caso relativamente incapaz.

• Não estando representado o absolutamente incapaz, o negócio será nulo.

• Não estando assistido o relativamente incapaz, o negócio será anulável.

No tocante à incapacidade relativa de uma das partes, o CC diz que esta incapacidade não
pode ser arguida pela outra parte, ou seja, invocada pelo capaz em benefício próprio. E também
não pode aproveitar cointeressados capazes, salvo se o objeto for indivisível.

A alegação de incapacidade é uma exceção pessoal. Isto é, se foi celebrado um contrato


com um menor, de 17 anos, relativamente incapaz, não poderá o capaz alegar a menoridade da
outra parte para fins de anulação do contrato. Somente o relativamente incapaz poderá alegar,
visto que a norma é protetiva.

Da mesma forma, se João celebra um contrato com o adolescente de 17 anos, Antônio, e


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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com Carlos, de 20 anos. Carlos, que é cointeressado, também não poderá arguir a incapacidade
de Antônio para fins de anulação do contrato, salvo se o objeto for indivisível.

Capacidade especial (Legitimação)

Existem determinados atos em que é necessário um plus na capacidade, ou seja, é


necessária autorização específica para realizar certos atos, sendo isto denominado de legitimação,

No caso de venda de bens imóveis entre cônjuges, é necessária a autorização do outro


cônjuge, denominando-se de outorga conjugal. Neste caso, haverá uma capacidade especial.

ii. Vontade ou consentimento deve ser livre

O consentimento para um negócio pode ser expresso ou tácito.

O art. 111 do CC contraria um ditado popular, pois estabelece que o silêncio importa
anuência, quando as circunstâncias ou os usos o autorizarem, e não for necessária a declaração
de vontade expressa.

Portanto, via de regra, quem cala não consente. Isso porque João calou-se, motivo pelo
qual não consentiu, salvo se os usos, costumes ou circunstância o autorizem, e não seja declaração
expressa de vontade necessária.

Segundo art. 112, nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas
consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. Adota-se aqui a teoria subjetiva dos
contratos e negócios jurídicos. Isto quer diz que não importa somente aquilo que está
literalmente escrito, devendo ser necessário saber a intenção das partes.

O STJ já decidiu que a doação feita a um Santo, deverá ser considerada como doada a uma
igreja católica, representante daquele Santo. Veja, ainda que esteja escrito que foi doado a um
Santo, é preciso considerar efetivamente o que pleiteava a pessoa doadora.

No art. 113, os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé objetiva e
os usos do lugar de sua celebração. Trata-se de aplicação da teoria objetiva dos negócios
jurídicos. Isso porque, na interpretação dos contratos, é necessário se valer da boa-fé objetiva, ou
seja, a partir dos comportamentos que são esperados com aquele tipo de contrato.

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Eduardo Defaveri

O art. 114 estabelece que os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se


estritamente. Em contratos gratuitos, como doação e comodato, não podem dar um efeito
ampliativo ao contrato, devendo ser dado um efeito restritivo.

Ex.: se João doou um carro, e não fez referência à aparelhagem de som, não se pode
entender que João doou toda a aparelhagem, visto que o contrato gratuito deve ser interpretado
restritivamente.

iii. Objeto lícito, possível, determinado ou determinável

• Objeto lícito:

É aquele que não é contrário aos bons costumes, à ordem pública, à boa-fé, à função social, etc.
Se o objeto for ilícito, o negócio jurídico é nulo.
• Objeto possível:

Isto é, no plano fático. É preciso que exista uma possibilidade física e uma possibilidade jurídica.
Se as prestações do negócio são impossíveis, o negócio deve ser declarado nulo. Haverá uma
impossibilidade jurídica quando a lei veda o seu conteúdo. Ex.: não se pode negociar herança de
pessoa viva.
O art. 106 do CC traz uma ressalva importante, estabelecendo que a impossibilidade inicial do
objeto não invalida o negócio jurídico se for relativa, ou então se ela cessar antes de realizada
a condição a que ele estiver subordinado. Este artigo estabelece que somente a nulidade
absoluta tem o condão de nulificar o negócio.
Ex.: João disse que conseguiria um diamante de 18 quilates para a namorada. Para João, isto é
impossível, mas não é absolutamente impossível. Só que essa impossibilidade é relativa. Se a
impossibilidade é relativa, o negócio é válido. No entanto, se com o passar do tempo João compra
o diamante, o negócio será plenamente válido, ainda que estivesse sob condição suspensiva.
Por outro lado, se a impossibilidade é absoluta, não haver negócio, sendo ele nulo.
• Objeto determinado ou determinável:

O negócio jurídico deve ao menos ser determinável. Ex.: obrigação incerta. O objeto ainda está
pendente de determinação (concentração). Por exemplo, Samer disse que entregaria 2 bois a
Eduardo. No dia em que Eduardo vai pegar os bois, Samer diz quais serão os dois bois que ele irá
pegar. Samer escolhe os bois A e B, ou seja, fez a concentração, visto que eram determináveis,

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passando a ser determinados. Isso porque o negócio é lícito, possível, determinado ou


determinável.

iv. Forma prescrita ou não defesa em lei

A forma deve ser prescrita, ou seja, a lei traz a forma, ou a forma pode ser não defesa em
lei, de forma que não contrarie a lei.

Como regra, a declaração de vontade não necessita de uma forma especial, salvo quando
a lei o exigir. Vige o princípio da liberdade das formas.

Em casos especiais, a lei prevê a necessidade de uma formalidade.

É necessário diferenciar formalidade de solenidade:

• solenidade: necessidade de escritura pública.

• formalidade: exigência de uma formalidade qualquer. Ex.: forma escrita.

Formalidade é gênero e solenidade é espécie.

Se houver desrespeito à forma ou for preterida de alguma solenidade essencial para o


negócio, este negócio será nulo, conforme art. 166, incisos IV e V, do CC

O art. 109 do CC diz que, no negócio jurídico celebrado com a cláusula de não valer sem
instrumento público, este é da substância do ato.

Ou seja, caso alguém celebre um negócio e estabeleça uma cláusula de não valer sem
instrumento público, passará este a ser da substância do ato. Portanto, a imposição de um
negócio solene pode decorrer das intenção das partes, razão pela qual sua inobservância poderá
implicar nulidade do negócio.

O art. 108 vai estabelecer que a escritura pública somente será exigida nos negócios
jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre
imóveis de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Aqui há uma função social, pois quem compra um imóvel com valor até 30 salários
mínimos tem em seu favor a presunção de que não tenha condições de arcar com a escritura
pública.

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c) Plano da eficácia

No último degrau estão os efeitos, mas com relação às partes ou com relação a terceiros.

São elementos da eficácia de um negócio:

• Condição (evento futuro e incerto)

• Termo (evento futuro e certo)

• Encargo ou modo (ônus introduzido numa liberalidade)

• Regras relativas ao inadimplemento do negócio jurídico que vão levar à resolução (juros,
cláusula penal, perdas e danos, regime de bens, etc.

i. Eficácia e direito intertemporal

O art. 2.035 do CC diz que a validade dos negócios e demais atos jurídicos, constituídos
antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002, obedece ao disposto nas leis anteriores,
referidas no art. 2.045, mas os seus efeitos (sua eficácia), salvo se houver sido prevista pelas
partes, determinada forma de execução, se subordinam aos preceitos produzidos após a vigência
deste Código.

Em outras palavras, no plano da validade vale a regra que vigia no momento de celebração
do contrato. Com o CC/02, as regras continuam válidas, mesmo que tenha havido mudanças.

No entanto, os efeitos que se produzirem após a entrada em vigor do CC/02, se sujeitam a


ele.

Perceba que o art. 2.035 não fala de existência, estando subentendida na validade. Outra
situação é o fato de que devem ser aplicadas as normas incidentes no momento da produção
dos efeitos, e não da celebração do contrato.

Ex.: supondo que tenha sido celebrado um contrato na vigência do Código Civil de 1916, e
trazia uma multa exagerada no contrato, causando uma onerosidade excessiva. Com o CC/02, o
contrato será considerado válido, celebrado conforme as regras do CC/16, mas ele foi
descumprido na vigência do CC/02. Como cláusula penal e multa estão ligadas à eficácia, é possível
que o juiz aplique o art. 403 do CC/02, o qual consagra a possibilidade de o magistrado reduzir

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equitativamente a cláusula penal que for exagerada.

ii. Estudo dos elementos acidentais do negócio jurídico. Condição, termo e encargo.

Os elementos acidentais do negócio jurídico são aqueles em que as partes podem ou não
adicionar em seus negócios.

→ Condição

A condição é elemento acidental, podendo ou não estar presente no contrato. É um


elemento que deriva exclusivamente da vontade das partes, fazendo com que o contrato ou o
direito dependa de um evento futuro e incerto.

São elementos da condição:

• vontade exclusiva das partes

• assunção de uma condição

• condição de evento futuro e incerto, que pode ou não acontecer

Classificam-se a condição quanto à licitude:

• condições lícitas: estão de acordo com o ordenamento.

• condições ilícitas: contrariam o ordenamento, a ordem pública ou os bons costumes. Nulificam


o negócio que está relacionado com aquela condição. Ex.: não se pode vender um carro, sob a
condição de que João mate José. Este negócio é nulo, pois não se poderá executar a obrigação.

Quanto às possibilidades:

• condições possíveis: são aquelas que podem ser cumpridas físicas ou juridicamente.

• condições impossíveis: são aquelas que não podem ser cumpridas, podendo derivar de uma
razão natural ou de uma razão jurídica. Neste caso, haverá nulidade absoluta. Ex.: João diz que
venderá o seu carro sob a condição de Pedro viajar a Júpiter dentro de 2 anos. Essa condição,
apesar de não ser ilícita, é impossível.

Quanto à origem:

• condição causal: são aquelas que têm origem em evento natural. Ex.: João vende um bem a

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Eduardo Defaveri

Pedro se chover amanhã.

• condição potestativa: a eficácia do negócio dependerá de um elemento volitivo, da vontade


humana. As condições potestativas podem ser subclassificadas em:

o meramente potestativas: dependem das vontades intercaladas de duas pessoas. São lícitas.
Ex.: liberalidade instituída em favor de uma pessoa, dependente do seu desempenho
artístico. Se a pessoa cantar no espetáculo da escola, a mãe vai dar uma viagem para a
Disney. Neste caso, será meramente potestativa, pois dependem de vontade intercalada de
duas pessoas.

o puramente potestativas: quando dependem da vontade unilateral, ao puro arbítrio de uma


das partes. Neste caso, são ilícitas. Ex.: João dará a viagem para a Disney se ele mesmo quiser.
Isto não se trata de uma condição, em verdade.

• condição mista: é aquela que depende de um ato volitivo e de um evento natural. Ex.: João dará
a viagem para a Disney a Pedro, se ele cantar na apresentação da escola e estiver chovendo na
hora.

Quanto aos efeitos:

• condições suspensivas: são aquelas que, enquanto não se verificarem as condições, o negócio
jurídico não gera efeitos. Ex.: venda a contento. O aperfeiçoamento do negócio só ocorrerá com
a aprovação ad gustum do comprador. A venda está a contento do comprador. Ou seja, somente
passará a produzir efeitos quando o comprador aprovar.

• condições resolutivas: são aquelas que, enquanto não se verificar a condição, ela não traz
nenhuma consequência para o negócio jurídico, cabendo inclusive o exercício do direito sob
condição. Ex.: retrovenda. É o fato do vendedor exigir o direito de recompra daquele bem. Se
não for exercida a retrovenda, o negócio (compra e venda) produzirá plenamente os seus efeitos.

O art. 128 do CC diz que, se a condição resolutiva for aposta a um negócio de execução
continuada ou periódica, a realização da condição resolutiva, não tem eficácia quanto aos atos
já praticados, salvo disposição em contrário, desde que compatíveis com a natureza da condição
pendente e conforme aos ditames de boa-fé. Portanto, o que foi feito antes da condição
resolutiva permanece íntegro.

Com relação às modalidades de condição (suspensiva ou resolutiva), devem ser destacados

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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os arts. 129 e 130 do CC.

Isso porque o art. 129 estabelece que se reputa verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a
condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, e
considera-se ao contrário, não verificada a condição maliciosamente levada a efeito por aquele a
quem aproveita o seu implemento.

No art. 129, a lei veda a má-fé, pois, de forma maliciosa, não se está permitindo que a
condição ocorra. Neste caso, será tido como se a condição tivesse ocorrido.

E o art. 130 diz que, ao titular do direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou
resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a conservá-lo. Este dispositivo diz que a
existência da condição impede que o sujeito exerça o seu direito, visto que há mera expectativa
de direito. No entanto, isto não impede que o sujeito pratique atos destinados a conservar este
direito eventual.

→ Termo

Termo também é um elemento acidental do negócio.

O termo faz com que a eficácia do negócio fique subordinada à ocorrência de um evento
futuro e certo. Se for futuro incerto, é condição.

Classificam-se o termo em:

• Termo inicial (dia a quo):

A partir deste termo o negócio passa a produzir efeitos.


Enquanto o termo inicial não ocorre, não inicia o exercício do direito decorrente do contrato.
Mas não suspende a aquisição do direito, visto que o evento é futuro e certo, já estando este
evento incorporado ao patrimônio do contratante. É apenas o exercício que demanda a
ocorrência de um termo.
Quem celebra o contrato sob condição suspensiva não tem o direito, mas apenas expectativa do
direito. É bem diferente do termo, pois neste o sujeito tem o direito.
• Termo final (dias ad quem):

Tem eficácia resolutiva, pondo fim às consequências derivadas daquele negócio.

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Prazo é o lapso entre o termo inicial e o termo final.

O art. 132 traz regras específicas para contagem dos prazos:

• Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do


começo, e incluído o do vencimento.

• Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia
útil.

• Meado considera-se, em qualquer mês, o seu 15º quinto dia, ainda que se trate do mês de
fevereiro.

• Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se


faltar exata correspondência. Ex.: celebrado o contrato no dia 30 mês de agosto. E daqui a seis
meses o contrato vence, sendo no dia 30 de fevereiro. Como não exista 30 de fevereiro, será no
dia 1º de março.

• Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.

O art. 135 estabelece que, ao termo inicial e final aplicam-se, no que couber, as disposições
relativas à condição suspensiva e resolutiva.

Classificação dos termos:

• Quanto à origem:

o termo legal: fixado pela própria norma jurídica. Diferencia-se da condição, que é fixada
exclusivamente pela vontade das partes.

o termo convencional: fixado pelas partes.

• Quanto à certeza:

o termo certo (determinado): é o tempo determinado, pois se sabe quando o evento vai
ocorrer. Ex.: dia 20 de abril o devedor pagará o credor.

o termo incerto (indeterminado): sabe-se que o evento ocorrerá, mas não se sabe quando.
Ex.: quando João morrer, Pedro vai receber herança, mesmo que não se saiba quando.

→ Encargo

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O encargo é um elemento acidental do negócio jurídico, mas se caracteriza por trazer um


ônus ligado a uma liberalidade. Normalmente há um encargo na doação, no testamento, no
legado, etc. Ex.: João dá o terreno a Pedro para o fim de...

Em relação à doação modal, ou doação com encargo, existem regras específicas. Isto é, só
haverá liberalidade efetivamente na parte que exceder o encargo imposto.

Se o sujeito não der execução ao encargo, haverá a revogação da doação.

O art. 136 estabelece que o encargo não suspende a aquisição nem o exercício do direito,
salvo quando expressamente imposto no negócio jurídico, pelo disponente, como condição
suspensiva.

Perceba que a condição suspende a aquisição do direito, enquanto o termo não suspende
a aquisição, mas apenas o exercício do direito. Já o encargo não suspende a aquisição e nem o
exercício do direito.

O art. 137 estabelece que se considera não escrito o encargo ilícito ou impossível, salvo
se constituir o motivo determinante da liberalidade, caso em que se invalida o negócio jurídico.

Via de regra, considera-se que o encargo é não escrito, mas se for para considerá-lo como
não escrito, será conservado o negócio sem o respectivo encargo. Todavia, sendo o encargo o
motivo determinante para a liberalidade, aí o negócio será invalidado.

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Negócio Jurídico. Vícios ou defeitos

Vícios os defeitos do Negócio Jurídico

São vícios do negócio jurídico:

a) Vícios sociais: fraude contra credores e simulação. São condenados pela repercussão social,
atentando contra a boa-fé.

• Vícios da vontade ou do consentimento: erro, dolo, coação, estado de perigo e lesão.

a) Erro e ignorância

Erro é a falsa noção da realidade.

Segundo o art. 138, os negócios jurídicos celebrados por erro são anuláveis, desde que as
declarações de vontade emanem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de
diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.

Portanto, se o erro for substancial gera a anulação do negócio. Não precisa ser o erro
escusável, justificável ou não. Basta que seja substancial.

A ignorância gera as mesmas consequências do erro. O erro é falsa percepção, enquanto


a ignorância é o desconhecimento total quanto ao objeto do negócio. Nos dois, a pessoa se
engana sozinha. O negócio é anulável, desde que o erro ou a ignorância seja essencial ou
substancial.

Quando é que o erro será substancial ou essencial?

O erro é substancial quando:

• O erro interessa à natureza do negócio, ou o erro incide sobre o objeto principal da declaração,
ou ainda se há erro quanto às qualidades essenciais.

Ex.: O sujeito compra uma bijuteria, acreditando se tratar de ouro. O sujeito paga 2 mil reais e
descobre que era bijuteria. Neste caso, o sujeito não teria comprado se soubesse que era
bijuteria. Aqui o erro é quanto às qualidades essenciais, de modo que este erro é substancial,
implicando a anulação do negócio.
• Se o erro for a respeito à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a

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declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante.

Trata-se do error in persona, bastando alguém que se casa e desconhece o comportamento


pessoal do cônjuge, podendo justificar a anulação do casamento.
• Erro de direito, e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do
negócio jurídico.

Em tese, ninguém pode se escusar de cumprir a lei, alegando que não a conhece. No entanto, o
erro de direito pode justificar a anulação do negócio quando ele for o motivo para a prática
daquele negócio.
Ex.: Locatário de um imóvel comercial pode propor a ação renovatória no último ano do contrato
até 6 meses antes do contrato vencer. Supondo que o indivíduo pensou errado, pensando que
deveria ter proposto um ano antes ou que perdeu prazo para a ação renovatória, situação na
qual ele celebra um novo contrato de locação mais oneroso do que seria se tivesse renovado o
contrato.
Neste caso, poderá ele ingressar com a ação alegando erro de direito essencial ou substancial,
eis que não teria celebrado o contrato se soubesse que tinha direito à ação renovatória, motivo
pelo qual pede a anulação do contrato.
Veja, houve erro de direito, não houve sequer a recusa à aplicação da lei, sendo possível a
anulação.

O motivo do negócio jurídico é a razão pela qual uma pessoa celebra o negócio. A doutrina
diferencia motivo de causa do negócio, pois a causa está no plano objetivo.

No caso de contrato de compra e venda, a causa é a transmissão da propriedade, enquanto


o motivo não se sabe, podendo ser os mais variados.

Assim sendo, o falso motivo, por regra, não gera anulabilidade do negócio jurídico, já que
não interessa ao direito. Todavia, caso este falso motivo esteja expresso como razão
determinante, aí poderá ser anulado, conforme art. 140 do CC.

O art. 141 diz que a transmissão errônea da vontade por meios interpostos é anulável
nos mesmos casos em que o é a declaração direta.

Meios interpostos são meios de comunicação, principalmente pela internet. Isto quer dizer
que, se houver um erro de transmissão por meios interpostos, é anulável o negócio nos mesmos

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casos como se fossem a declaração direta. Aplicam-se as mesmas regras.

O art. 143 estabelece que o erro de cálculo não gera anulação, mas apenas autoriza a
correção da declaração de vontade. Ou seja, o negócio é mantido. Trata-se de aplicação do
princípio da preservação do negócio jurídico.

Ademais, o erro não prejudica a validade do negócio jurídico quando a pessoa, a quem a
manifestação de vontade se dirige, se oferecer para executá-la na conformidade da vontade real
do manifestante. É aplicação do princípio da preservação do negócio jurídico.

Ou seja, se houver um erro na manifestação da vontade, poderá o outro contratante se


oferecer para cumprir o contrato nos moldes da vontade que a pessoa desejava anteriormente.

Cabe mencionar ainda o erro quanto à pessoa ou à coisa, segundo o qual o erro de
indicação, a que se referir a declaração de vontade, não viciará o negócio quando se puder
identificar a coisa ou pessoa cogitada por seu contexto e pelas circunstâncias.

O que é erro obstativo?

O erro obstativo, também denominado de erro impróprio, é um erro não adotado no


Código Civil. Trata-se de um erro de forma exacerbada, impedindo que o negócio venha a se
formar. Seria uma hipótese em que o erro inviabilizaria a existência do negócio.

O prazo decadencial para anular um negócio jurídico eivado de erro é de 4 anos, contados
da celebração do negócio jurídico.

b) Dolo

Dolo é um artifício ardiloso, sendo empregado para enganar alguém para ter um benefício
próprio.

O art. 145 diz que o negócio praticado com dolo é anulável, quando este for a sua causa
Trata-se do dolo substancial (essencial).

Se for o dolo acidental, haverá perdas e danos, mas o negócio é mantido. Será acidental
se o negócio fosse realizado, embora por outro modo.

No caso de uma das partes se valer de um artifício malicioso para levar a outra a praticar

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um ato que não praticaria normalmente, visando obter uma vantagem, haverá dolo. E este dolo
poderá gerar anulação do negócio jurídico.

Frise-se: dolo essencial gera anulação do negócio; dolo acidental gera perdas e danos,
mas não anulação do negócio jurídico. Isso porque o negócio seria praticado mesmo assim, de
outro modo, mas seria.

Ressalte-se que não só o próprio negociante pode agir com dolo, gerando a anulabilidade
do negócio. É possível que haja dolo de terceiro, o qual pode acontecer se a parte, a quem
aproveite o dolo, tivesse conhecimento dessa atuação do terceiro, ou ao menos devesse ter
conhecimento da atuação do terceiro.

Caso a parte não tivesse conhecimento sobre o terceiro, e tampouco pudesse ter, será
válido o negócio, e pelas perdas e danos daquele que sofreu o dano será de responsabilidade do
terceiro.

Dolo do representante legal? O dolo do representante legal de uma das partes só obriga
o representado a responder civilmente até a importância do proveito que experimentou.

E se o representante for convencional? Neste caso, o representado irá responder, visto


que errou na eleição do representante. E mais, será o representado responsabilizado
solidariamente com o representante por perdas e danos.

Classificam-se o dolo:

• Quanto ao conteúdo:

o Dolus bonus: é o dolo tolerável, afirmando, por exemplo, que o produto é o melhor do Brasil.
Não tem a finalidade de prejudicar o comprador.

o Dolus malus: não é admitido. São ações maliciosas com objetivo de enganar pessoas e causar
prejuízos. Neste caso, poderá haver a anulação do negócio jurídico.

• Quanto às condutas das partes:

o Dolo positivo (comissivo): praticado por uma ação.

o Dolo negativo (omissivo): praticado por uma omissão. Cabe ressaltar que o art. 147
estabelece que, nos negócios jurídicos bilaterais, o silêncio intencional de uma das partes a
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respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, é preciso que o prejudicado
prove que não celebraria o negócio se a omissão não ocorresse. É preciso que fique claro
que o prejudicado demonstre que o dolo é substancial, de modo que não celebraria o
negócio se tivesse a informação que ele não tinha. Caso contrário, o negócio é mantido,
podendo até mesmo caber perdas e danos.

o Dolo recíproco (dolo bilateral, dolo compensado e dolo enantiomórfico): é o caso em que
ambas as partes atuam tentando prejudicar o outro. São dois malandros. O código civil
estabelece que se ambas as partes procederem com dolo, nenhuma pode alegá-lo para
anular o negócio, ou reclamar indenização. Caso um deles tenha prejuízos maiores do que
o outro, haverá uma compensação parcial e o prejudicado em quantia maior poderá pleitear
perdas e danos contra a outra parte. Trata-se do dolo enantiomórfico.

c) Coação

A coação é uma pressão física ou moral, que é exercida sobre a vontade de um negociante.
Visa obriga a assumir uma obrigação que ele mesmo não queria.

O art. 151 diz que a coação, para viciar a declaração da vontade, deve ser relevante. E
ainda, deverá ser fundada em temor de dano iminente e considerável à sua pessoa envolvida,
ou à sua família, ou aos seus bens.

Se o temor de dano disser respeito a pessoa não pertencente à família do paciente, o juiz,
com base nas circunstâncias, decidirá se houve coação.

A coação pode ser classificada em:

• Coação física: há o constrangimento corporal. Há aqui nulidade absoluta. Há quem defenda que
seja caso de inexistência, visto que não há sequer vontade da pessoa.

• Coação moral (vis compulsiva): é o fundado em temor de dano iminente. Há aqui a anulabilidade
do ato.

O art. 152 estabelece que, no apreciar a coação, o juiz deve levar em conta o sexo, a idade,
a condição, a saúde, o temperamento do paciente e todas as demais circunstâncias que possam
influir na gravidade dela. Veja, é necessário analisar o caso concreto.

O prazo para ação anulatória no caso de coação é de 4 anos, contados da cessação da

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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coação.

A coação exercida por terceiro gera anulabilidade o negócio jurídico, desde que o
negociante beneficiado tivesse ou devesse ter conhecimento dessa coação ou se, pelo menos,
devesse ter conhecimento. Neste caso, ambos, tanto o coator como o beneficiário da coação, vão
responder solidariamente por perdas e danos.

O negócio jurídico permanece válido se o negociante beneficiário da coação não tinha o


conhecimento, e nem mesmo devesse ter o conhecimento, acerca da coação investida. Neste
caso, o coator responderá por perdas e danos causados ao coacto.

O art. 153 diz que não se considera coação:

• Ameaça do exercício normal de um direito. Ex.: ameaçar protestar o título em cartório.

• Simples temor reverencial. Ex.: receio de desagradar o padre da cidade.

d) Estado de perigo

Há estado de perigo toda vez que o negociante, ou parte de sua família, estiver em perigo,
e a outra parte conhecer este perigo, sendo este perigo a única causa para celebrar o contrato,
haverá vício do contrato.

Em se tratando de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo


as circunstâncias.

Veja, aqui há uma situação de perigo que alguém vive, ou alguém da família do contratante
vive, e este é o elemento subjetivo. Esta situação de perigo deve ser conhecida pela outra parte.

Portanto, são requisitos do estado de perigo:

• situação de perigo conhecida pela outra parte (elemento subjetivo)

• onerosidade excessiva (elemento objetivo)

Nas palavras do Código Civil, há estado de perigo quando alguém, premido da necessidade
de se salvar, ou de salvar algum familiar seu, de grave dano conhecido pela outra parte, assume
obrigação excessivamente onerosa.

A anulação terá o prazo decadencial de 4 anos, contados da celebração do ato.


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Para afastar a anulação, o juiz poderá se utilizar da revisão negocial, com base no princípio
da preservação dos contratos.

e) Lesão

Segundo o art. 157, ocorre a lesão quando uma pessoa está sob premente necessidade,
ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da
prestação oposta.

Veja, aqui a pessoa necessitada ou inexperiente firma contrato por valor muito maior do
que vale a prestação que vai receber. Mas é manifestamente maior.

O CC recomenda que a análise da desproporção das prestações deve ser segundo os


valores vigentes à época em que foi celebrado o negócio jurídico.

A lesão é um vício na formação do contrato. Ou seja, quando o contrato foi formado, as


prestações já eram manifestamente desproporcionais. Havia um desequilíbrio negocial.

Se o caso fosse de vício posterior à celebração, seria o caso de revisão contratual, pela via
da imprevisibilidade, etc.

A anulabilidade do negócio poderá ser afastada, se for oferecido suplemento suficiente,


ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.

Veja, há aqui a aplicação do princípio da conservação dos contratos.

Vale lembrar que na lesão a regra é a revisão do contrato e não a sua anulação.

Doutrinariamente, o lesionado pode optar por nem pleitear a anulação do negócio jurídico
e promover diretamente a revisão do contrato.

Aqui também há elementos subjetivos e objetivos:

• desproporção entre as prestações (elemento objetivo)

• premente necessidade ou inexperiência da parte (elemento subjetivo)

Lesão não se confunde com dolo, visto que este exige um aproveitamento intencional da
parte beneficiada, agindo com meio articuloso para obter vantagem. Na lesão não é assim.

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Eduardo Defaveri

A lesão não se confunde com o estado de perigo, visto que, na lesão, o elemento subjetivo
é a premente necessidade ou inexperiência da parte, enquanto no estado de perigo, o perigo que
acomete o contratante ou alguém próximo a ele é conhecido pelo outro negociante. Na lesão não
é necessário que a outra parte conheça da situação do contratante.

f) Simulação

Simulação é um vício social.

Na simulação há um desacordo entre a vontade declarada (manifestação) e a vontade


interna (essência, ou desejo interior).

A simulação gera a nulidade do negócio, podendo ser alegada por terceiros, mas também
por uma parte contra a outra, visto que gera a nulidade do negócio jurídico, sendo uma questão
de ordem pública.

Na simulação, as duas partes contratantes estão combinadas, e a ideia normalmente é


iludir terceiros, mas isto não impede que uma alegue o vício contra a outra, visto que a nulidade
é absoluta.

O art. 167 reconhece a nulidade absoluta do negócio jurídico simulado, mas prevê que irá
subsistir o negócios que se dissimulou, isto é, o negócio que se buscou esconder, desde que este
negócio seja válido for na substância e na forma.

Tal dispositivo trata da simulação relativa. Isso porque na simulação relativa há dois
negócios: o negócio aparente e o negócio escondido (dissimulado).

Veja, se for possível manter o negócio dissimulado, ele irá persistir, desde que válido na
substância e na forma.

Como se está a falar de uma nulidade absoluta, em todos os casos de simulação, não há
necessidade de uma ação específica para declarar nulo o ato simulado. O seu reconhecimento
pode ser incidental ou até mesmo de ofício pelo juiz, eis que se trata de norma de ordem pública.

O art. 167, §1º, consagra os casos em que ocorre a simulação:

• Negócios jurídicos que conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas das quais realmente
se conferem, ou se transmite esses direitos.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Trata-se de uma simulação subjetiva. Pedro finge que vende um imóvel a João, quando na
verdade vende a José. É a ideia do “laranja”.
• Negócios jurídicos que contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira.

Indivíduo confessa uma dívida que não existe. Trata-se de modalidade de simulação objetiva.
• Negócios jurídicos que os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados.

Há uma simulação objetiva, pois a alteração das datas terá repercussão jurídica.

O rol do art. 167, §1º, é um rol exemplificativo.

O §2º do art. 167 diz que ficam ressalvados os direitos de terceiros de boa-fé em face dos
contraentes do negócio jurídico simulado.

Este comando traz a inoponibilidade do negócio simulado a terceiros de boa-fé. Isso


porque a boa-fé contém um valor de ordem pública, motivo pelo qual protege a boa-fé.

Quanto ao conteúdo, a simulação pode ser classificada em:

• Simulação absoluta: tem aparência de negócio, mas na verdade não há negócio algum. Ex.: pai
que, supostamente, doa um imóvel ao filho, mas continua usufruindo do imóvel, a fim de não
responder por uma dívida que tenha contraiu.

• Simulação relativa: há um negócio aparente, que não existe, mas há outro negócio dissimulado,
escondido. Neste caso, poderá a simulação relativa ser classificada em:

o Simulação relativa subjetiva: a parte celebra um negócio na aparência, mas celebra outro
na essência. Ex.: laranja. Vende-se um imóvel a João, constando na escritura o nome de João,
mas na verdade vende-se a José.

o Simulação relativa objetiva: a parte celebra um negócio, mas na realidade há outra figura
obrigacional. Por exemplo, para burlar o fisco celebra contrato de mútuo, quando, na
verdade, seria de locação.

Frise-se que em todos os casos o negócio celebrado é nulo, pois simulação é causa de
nulidade absoluta.

A reserva mental, também denominada de reticência essencial, está prevista no art. 110
do CC, estabelecendo que a manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a

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reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento.

No momento de assinar o contrato, o sujeito colocou uma coisa, quando na verdade tinha
outro objetivo. Caso a outra parte não saiba, o contrato continua valendo.

No entanto, se a outra parte conhecia o vício, aí o negócio se tornará simulação. Isso


porque os dois estariam combinados em declarar algo que efetivamente não seria verdade.

Em resumo, haverá reserva mental:

• se a outra parte não tem conhecimento da reserva mental, o negócio é válido.

• se a outra parte tem conhecimento da reserva mental, o negócio é nulo, visto que similar à
simulação.

Sílvio de Salvo Venosa faz uma diferenciação entre simulação e reserva mental. Para ele,
quando a reserva mental é de conhecimento da outra parte, o negócio se aproxima muito da
simulação, tanto é que para parte da doutrina seriam idênticos.

Para Venosa, o que diferencia entre os vícios é que o declarante, no caso de reserva
mental, acredita que o declaratário não saiba que ele está mentindo. Na simulação, por sua vez,
o declarante sabe que o declaratário tem o conhecimento, visto que estariam inclusive em
conluio.

g) Fraude contra credores

A fraude contra credores é uma atuação maliciosa do devedor. Ante a sua iminente
insolvência, o devedor começa a dissipar o seu patrimônio de forma gratuita ou onerosa, de
maneira a afastar a possibilidade de seus bens responderem pelas obrigações assumidas antes
das transmissões desses bens.

João tem 2 imóveis, valendo 500 mil reais. João deve 500 mil reais. Se for executado, vai à
insolvência. Neste caso, João vende um imóvel e doa outro imóvel para quando o credor executar
os 500 mil reais, não encontrar bens para solver a dívida

O art. 158 estabelece que estão incluídas as hipóteses de remissão e de perdão da dívida
na fraude contra credores. Se João, devedor, perdoa dívida de José no valor de 500 mil reais,
também poderá caracterizar fraude contra credores, podendo tal negócio ser anulado pelos
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credores quirografários, como lesivos dos seus direitos.

Os credores quirografários promoverão ação anulatória no prazo decadencial de 4 anos,


contados da celebração do negócio. Esta ação é denominada de ação pauliana ou revocatória.

O credor com garantia real também poderá propor ação pauliana ou revocatória, se a
garantia se tornar insuficiente. Cabe ressaltar que apenas os credores que já o eram ao tempo
dos atos de disposição poderão pleitear a anulação deles.

A ação pauliana poderá ser intentada contra o devedor insolvente, a pessoa que com ele
celebrou a estipulação considerada fraudulenta, ou terceiros adquirentes que hajam procedido
de má-fé. A boa-fé não!

Parte da doutrina, acompanhada de parte da jurisprudência, considera que o ato em


fraude contra credores seria um ato ineficaz.

O art. 790, VI, do NCPC, estabelece que estão sujeitos à execução, os cuja alienação ou
gravação com ônus real tenha sido anulada em razão do reconhecimento, em ação autônoma, de
fraude contra credores. Percebe-se que o Código Civil adotou a teoria da anulação e o NCPC
confirma esta adoção.

Para fins de prova, deve-se dizer que cabe a ação anulatória e o que há é a anulação do
ato.

Por conta disso, o ato praticado com fraude contra credores poderá ser anulado, dando-se
em ação pauliana. Sendo anulado o negócio, o credor quirografário, que recebeu do devedor
insolvente o pagamento da dívida ainda não vencida, ficará obrigado a repor, em proveito do
acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores, aquilo que recebeu.

Na fraude contra credores há dois elementos:

• elemento objetivo (eventus damni): é a atuação prejudicial do devedor e do terceiro.

• elemento subjetivo (consilium fraudis): é a intenção de prejudicar o credor.

Esta é a regra geral.

Se a disposição dos bens pelo devedor se deu de forma gratuita ou se perdoou dívidas, o

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

art. 158 vai dispensar o consilium fraudis, ou seja, dispensará a prova de que o sujeito atuou com
fraude contra credores.

Isto é, se abre mão do seu patrimônio de forma gratuita, basta que o credor demonstre
que experimentou prejuízo com aquele comportamento, razão pela qual não necessita
demonstrar o consilium fraudis.

A ação anulatória caberá ainda que o devedor não soubesse que com o seu ato de remissão
estivesse sendo levado à insolvência.

Segundo o art. 159, serão igualmente anuláveis os contratos onerosos do devedor


insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida do outro
contratante.

Veja, a lei traz uma presunção relativa de consilium fraudis.

Uma hipótese em que há motivos para ser conhecida do outro contratante é a venda de
bens entre irmãos.

Consoante o art. 160, se o adquirente dos bens do devedor insolvente ainda não tiver pago
o preço e este for, aproximadamente, o corrente, desobrigar-se-á depositando-o em juízo, com a
citação de todos os interessados. Caso o valor do bem seja inferior, o adquirente, para conservar
os bens, poderá depositar o preço que lhes corresponda ao valor real.

Trata-se da aplicação do princípio da preservação contratual.

Atente-se que em face de terceiros, a ação pauliana só surtirá efeitos se comprovar a má-
fé.

Ex.: Pedro vendeu para João em fraude contra credores. João vendeu para José, mas este
não sabia do ônus. No entanto, em face de José não poderá sofrer a ação de fraude contra
credores, visto que seria necessário provar a má-fé.

A súmula 195 do STJ estabelece que, em embargos de terceiro, não se anula ato jurídico
por fraude contra credores. A súmula diz que se quiser anular um ato ou contrato por fraude
contra credores, será necessário propor ação pauliana.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Cabe ressaltar que em embargos de terceiro não é possível alegar fraude contra credores,
pois o instrumento correto é ação pauliana.

De acordo com o art. 164, há uma presunção relativa de boa-fé, pois, presumem-se de
boa-fé os negócios ordinários indispensáveis à manutenção de estabelecimento mercantil, rural,
ou industrial, ou à subsistência do devedor e de sua família. Veja, será presumido de boa-fé as
alienações feitas para que o negócio continuasse em funcionamento, ou aquilo feito pelo sustento
ou subsistência, ainda que tivesse em estado de insolvência.

Anulados os negócios fraudulentos, a vantagem resultante reverterá em proveito do


acervo sobre que se tenha de efetuar o concurso de credores.

Se esses negócios tinham por único objeto atribuir direitos preferenciais, mediante
hipoteca, penhor ou anticrese, sua invalidade importará somente na anulação da preferência
ajustada.

A fraude contra credores só vai ser presumida no caso de transferência gratuita de bens
ou de remissão de dívidas, pagamento de dívida antecipada, constituição de uma garantia que
não existia, etc.

Presumem-se fraudatórias dos direitos dos outros credores as garantias de dívidas que o
devedor insolvente tiver dado a algum credor.

Não confundir fraude contra credores com fraude à execução:

• na primeira há um instituto de direito civil, enquanto na segunda há um instituto de direito


processual civil.

• na fraude à execução, é desnecessária ação pauliana, visto que o ato não é anulável, mas ineficaz,
podendo ser reconhecido no próprio processo de execução, por simples petição. Na fraude
contra credores o ato é anulado.

• na fraude contra credores a sentença da ação pauliana é constitutiva negativa, ou


desconstitutiva, pois anula um ato. Na fraude à execução, esta decisão tem natureza
declaratória, reconhecendo a ineficácia do ato praticado.

A súmula 375 do STJ diz que o reconhecimento da fraude à execução depende do registro

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

da penhora do bem alienado, ou da prova da má-fé do terceiro adquirente.

O informativo 552, o STJ disse que, no que diz respeito à fraude à execução:

• é indispensável a citação válida para a configuração de fraude à execução. Somente a partir daí
é que o indivíduo sabe que contra si corre um processo que poderá reduzi-lo à insolvência.

• é necessário o registro da penhora do bem alienado, ou da prova da má-fé do terceiro


adquirente

• a boa-fé se presume, inexistindo registro na matrícula do imóvel, quem deve provar que o
terceiro adquirente tinha o reconhecimento da demanda é o credor. Por outro lado, presume
a fraude à execução quando há alienação de bens realizada após a averbação do registro de
bem do processo.

Negócio Jurídico (cont.): elementos acidentais

Elementos acidentais do negócio jurídico

1) Elementos acidentais do negócio jurídico. Condição, termo e encargo.

Os elementos acidentais do negócio jurídico são aqueles em que as partes podem ou não
adicionar em seus negócios.

→ Condição

A condição é elemento acidental, podendo ou não estar presente no contrato. É um


elemento que deriva exclusivamente da vontade das partes, fazendo com que o contrato ou o
direito dependa de um evento futuro e incerto.

São elementos da condição:

1. Vontade exclusiva das partes

• Assunção de uma condição

• Condição de evento futuro e incerto, que pode ou não acontecer

Classificam-se a condição quanto à licitude:

• Condições lícitas: estão de acordo com o ordenamento.

• Condições ilícitas: contrariam o ordenamento, a ordem pública ou os bons costumes. Nulificam


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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o negócio que está relacionado com aquela condição. Ex.: não se pode vender um carro, sob a
condição de que João mate José. Este negócio é nulo, pois não se poderá executar a obrigação.

Quanto às possibilidades:

• Condições possíveis: são aquelas que podem ser cumpridas físicas ou juridicamente.

• Condições impossíveis: são aquelas que não podem ser cumpridas, podendo derivar de uma
razão natural ou de uma razão jurídica. Neste caso, haverá nulidade absoluta. Ex.: João diz que
venderá o seu carro sob a condição de Pedro viajar a Júpiter dentro de 2 anos. Essa condição,
apesar de não ser ilícita, é impossível.

Quanto à origem:

• Condição causal: são aquelas que têm origem em evento natural. Ex.: João vende um bem a
Pedro se chover amanhã.

• Condição potestativa: a eficácia do negócio dependerá de um elemento volitivo, da vontade


humana. As condições potestativas podem ser subclassificadas em:

o Meramente potestativas: dependem das vontades intercaladas de duas pessoas. São lícitas.
Ex.: liberalidade instituída em favor de uma pessoa, dependente do seu desempenho
artístico. Se a pessoa cantar no espetáculo da escola, a mãe vai dar uma viagem para à
Disney. Neste caso, será meramente potestativa, pois dependem de vontade intercalada de
duas pessoas.

o Puramente potestativas: quando dependem da vontade unilateral, ao puro arbítrio de uma


das partes. Neste caso, são ilícitas. Ex.: João dará a viagem para à Disney se ele mesmo quiser.
Isto não se trata de uma condição, em verdade.

• Condição mista: é aquela que depende de um ato volitivo e de um evento natural. Ex.: João dará
a viagem para à Disney a Pedro, se ele cantar na apresentação da escola e estiver chovendo na
hora.

Quanto aos efeitos:

• Condições suspensivas: são aquelas que, enquanto não se verificarem as condições, o negócio
jurídico não gera efeitos. Ex.: venda a contento. O aperfeiçoamento do negócio só ocorrerá com
a aprovação ad gustum do comprador. A venda está a contento do comprador. Ou seja, somente

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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passará a produzir efeitos quando o comprador aprovar.

• Condições resolutivas: são aquelas que, enquanto não se verificar a condição, ela não traz
nenhuma consequência para o negócio jurídico, cabendo inclusive o exercício do direito sob
condição. Ex.: retrovenda. É o fato do vendedor exigir o direito de recompra daquele bem. Se
não for exercida a retrovenda, o negócio (compra e venda) produzirá plenamente os seus efeitos.

O art. 128 do CC diz que, se a condição resolutiva for aposta a um negócio de execução
continuada ou periódica, a realização da condição resolutiva, não tem eficácia quanto aos atos
já praticados, salvo disposição em contrário, desde que compatíveis com a natureza da condição
pendente e conforme aos ditames de boa-fé. Portanto, o que foi feito antes da condição
resolutiva permanece íntegro.

Com relação às modalidades de condição (suspensiva ou resolutiva), devem ser destacados


os arts. 129 e 130 do CC.

Isso porque o art. 129 estabelece que se reputa verificada, quanto aos efeitos jurídicos, a
condição cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte a quem desfavorecer, e
considera-se ao contrário, não verificada a condição maliciosamente levada a efeito por aquele a
quem aproveita o seu implemento.

No art. 129, a lei veda a má-fé, pois, de forma maliciosa, não se está permitindo que a
condição ocorra.

E o art. 130 diz que, ao titular do direito eventual, nos casos de condição suspensiva ou
resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a conservá-lo. Este dispositivo diz que a
existência da condição impede que o sujeito exerça o seu direito, visto que há mera expectativa
de direito. No entanto, isto não impede que o sujeito pratique atos destinados a conservar este
direito eventual (esse artigo aplica tanto para condição quanto para termo).

→ Termo

Termo também é um elemento acidental do negócio.

O termo faz com que a eficácia do negócio fique subordinada à ocorrência de um evento
futuro e certo. Se for futuro incerto, é condição.

Classificam-se o termo em:


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Termo inicial (dia a quo):

A partir deste termo o negócio passa a produzir efeitos.


Enquanto o termo inicial não ocorre, não inicia o exercício do direito decorrente do contrato.
Mas não suspende a aquisição do direito, visto que o evento é futuro e certo, já estando este
evento incorporado ao patrimônio do contratante. É apenas o exercício que demanda a
ocorrência de um termo.
Quem celebra o contrato sob condição suspensiva não tem o direito, mas apenas expectativa do
direito. É bem diferente do termo, pois neste o sujeito tem o direito.
• Termo final (dias ad quem):

Tem eficácia resolutiva, pondo fim às consequências derivadas daquele negócio.

Prazo é o lapso entre o termo inicial e o termo final.

O art. 132 traz regras específicas para contagem dos prazos:

• Salvo disposição legal ou convencional em contrário, computam-se os prazos, excluído o dia do


começo, e incluído o do vencimento.

• Se o dia do vencimento cair em feriado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte dia
útil.

• Meado considera-se, em qualquer mês, o seu 15º quinto dia, ainda que se trate do mês de
fevereiro.

• Os prazos de meses e anos expiram no dia de igual número do de início, ou no imediato, se


faltar exata correspondência. Ex.: celebrado o contrato no dia 30 do mês de agosto. E daqui a
seis meses o contrato vence, sendo no dia 30 de fevereiro. Como não existe 30 de fevereiro, será
no dia 1º de março.

• Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto.

O art. 135 estabelece que, ao termo inicial e final aplicam-se, no que couber, as disposições
relativas à condição suspensiva e resolutiva.

Classificação dos termos:

• Quanto à origem:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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o Termo legal: fixado pela própria norma jurídica. Diferencia-se da condição, que é fixada
exclusivamente pela vontade das partes.

o Termo convencional: fixado pelas partes.

• Quanto à certeza:

o Termo certo (determinado): é o tempo determinado, pois se sabe quando o evento vai
ocorrer. Ex.: dia 20 de abril o devedor pagará o credor.

o Termo incerto (indeterminado): sabe-se que o evento ocorrerá, mas não se sabe quando.
Ex.: quando João morrer, Pedro vai receber herança, mesmo que não se saiba quando.

→ Encargo

O encargo é um elemento acidental do negócio jurídico, mas se caracteriza por trazer um


ônus ligado a uma liberalidade. Normalmente há um encargo na doação, no testamento, no
legado, etc. Ex.: João dá o terreno a Pedro para o fim de...

Em relação à doação modal, ou doação com encargo, existem regras específicas. Isto é, só
haverá liberalidade efetivamente na parte que exceder o encargo imposto.

Se o sujeito não executar o encargo, haverá a revogação da doação.

O art. 136 estabelece que o encargo não suspende a aquisição nem o exercício do direito,
salvo quando expressamente imposto no negócio jurídico, pelo disponente, como condição
suspensiva.

Perceba que a condição suspende a aquisição do direito, enquanto o termo não


suspende a aquisição, mas apenas o exercício do direito. Já o encargo não suspende a aquisição
e nem o exercício do direito.

O art. 137 estabelece que se considera não escrito o encargo ilícito ou impossível, salvo
se constituir o motivo determinante da liberalidade, caso em que se invalida o negócio jurídico.

Via de regra, considera-se que o encargo ilícito é não escrito, mas se for para considerá-
lo como escrito, será conservado o negócio sem o respectivo encargo. Todavia, sendo o encargo
o motivo determinante para a liberalidade, aí o negócio será invalidado (art. 137, CC).

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Prescrição. Decadência

Prescrição e Decadência

Os prazos de prescrição estão concentrados em dois artigos do Código Civil: arts. 205 e
206.

Os demais prazos do CC, via de regra, são decadenciais. Os prazos prescricionais são
sempre em anos.

Prazos em dias, meses, em anos e dias, são sempre decadenciais.

Prescrição está associada às ações condenatórias, relativas a direitos subjetivos. Há


violação, nasce uma pretensão, devendo o sujeito ser condenado a indenizar.

Por outro lado, decadência está relacionada a direitos potestativos, às ações constitutivas
(positivas ou negativas), em que a outra parte tem uma relação de sujeição. Ex.: numa ação
desconstitutiva, como anulação de casamento, há prazo para tanto, podendo ou não exercer, não
podendo a outra parte se opor quanto a isso.

Agnelo Amorim diferencia prescrição e decadência. O professor ainda menciona que as


denominadas ações imprescritíveis deveriam ser denominadas de ações perpétuas. Ou seja, são
perpétuas (imprescritíveis) todas aquelas ações que não estão sujeitas nem prescrição nem a
decadência, tais como:

• Todas as ações meramente declaratórias;

• Algumas ações constitutivas, tais como aquelas que não têm prazo especial de exercício fixado
em lei.

Quanto às ações condenatórias, seguindo o entendimento de Agnelo Amorim, não há,


entre elas, ações perpétuas (imprescritíveis), pois todas são atingidas, ou por um dos prazos
especiais do art. 206 ou pelo prazo geral do art. 205. Ademais, não há ações condenatórias
perpétuas (imprescritíveis), nem sujeitas a decadência, bem como não há ações constitutivas
sujeitas a prescrição. Além disso, não há ações declaratórias sujeitas a prescrição ou a decadência.

a) Regras quanto a prescrição

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O Código Civil adotou a tese da prescrição da pretensão.

i. Noções gerais da prescrição

O art. 189 diz que, violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual poderá ser
extinta pela prescrição.

Perceba que a prescrição é a causa extintiva da pretensão.

O direito em si permanece incólume. E portanto, o art. 882 do CC é perfeito quando diz


que não se pode repetir o que se pagou para solver dívida prescrita, ou obrigação judicialmente
inexigível.

Isso porque a dívida prescrita continua sendo dívida, não podendo apenas exigir o
pagamento.

Para as ações condenatórias, quando não houver prazo específico, o prazo prescricional
geral será de 10 anos.

O início do prazo prescricional inicia com o surgimento da pretensão, ou seja, decorre da


exigibilidade do direito. A pretensão nasce após a violação do direito.

A partir do momento em que o direito é violado, há nascimento de uma pretensão. Ex.:


sujeito ofendeu a moral do outro, tendo direito à reparação dos danos, contado o prazo a partir
do momento em que foi praticada a ofensa.

ii. Teoria da actio nata com o viés subjetivo

Parte da doutrina pondera de que não se pode admitir apenas com o surgimento do dano
a contagem do prazo prescricional. Para início do prazo prescricional seria necessário o
conhecimento do dano pelo sujeito que o experimentou.

Portanto, só teria início a contagem do prazo a partir do momento em que a parte teve o
conhecimento do ato ou do fato do qual nasce o seu direito de exigir. O que há aqui é a adoção
da teoria da actio nata com o viés subjetivo.

Ex.1: No caso de responsabilidade civil do estado por erro médico, a data para o início do
lapso prescricional não é a data do acidente, e sim a data em que a vítima tem ciência inequívoca

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

de sua invalidez ou da extensão da incapacidade. A partir desse conhecimento é que inicia o prazo
prescricional. Este é o teor de súmula 278 do STJ.

Ex.2: O médico esqueceu uma agulha dentro do corpo de uma mulher. Não tinha a mulher
o conhecimento de que havia uma agulha dentro de si, até o dia em que, por meio do raio-X,
percebeu-se o instrumento dentro do corpo. Neste caso caberá ação de indenização, a contar do
momento em que teve o conhecimento do fato.

É a adoção da teoria da actio nata com viés subjetivo, adotada pela jurisprudência.

Em sede legislativa, esta teoria foi adotada pelo art. 27 do CDC, estabelecendo que
prescreve em 5 anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do
serviço, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.

Sobre o art. 27 do CDC, importa registrar que de acordo com entendimento do STJ a
pretensão do segurado de cobrar do segurador a indenização contratada prescreve em um ano
(prescrição ânua). Não se o prazo prescricional do art. 27 do CDC, pois não se trata de fato do
serviço (acidente de consumo), mas de inadimplemento contratual.

Se o indivíduo experimentou o dano, mas não sabe que o experimentou, não começa a
contar o prazo.

iii. Exceção, renúncia e alteração da prescrição

De acordo com o art. 190, a exceção prescreve no mesmo prazo em que a pretensão.

Os prazos aplicáveis às pretensões devem regular as exceções correspondentes.

É possível a renúncia da prescrição expressa ou tacitamente, e só valerá, sendo feita, sem


prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar. Tácita é a renúncia quando se presume
de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição.

Não é possível renúncia prévia da prescrição!

Os prazos de prescrição não podem ser alterados por acordo das partes, pois têm origem
estritamente legal (art. 192). Já a decadência poderá ser legal ou convencional.

iv. Momento de alegação da prescrição e prescrição intercorrente

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Eduardo Defaveri

A prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita
(art. 193). Agora, não está limitada à primeira manifestação da parte, podendo a prescrição ser
alegada em sede de recurso.

O código civil não traz nenhuma novidade, e portanto a súmula 150 do STF continua em
vigor, dizendo que a execução prescreve no mesmo prazo da prescrição da ação.

O NCPC incluiu uma outra forma de prescrição nas ações de execução, denominada
prescrição intercorrente. O art. 921 do NCPC estabelece entre as hipóteses de suspensão da
execução, o fato de o executado não ter bens penhoráveis.

Nesta situação, o juiz suspende o processo pelo prazo de 1 ano, situação na qual também
ficará suspensa a prescrição. Após ultrapassado o prazo de 1 ano, começa a correr o prazo da
prescrição intercorrente. Então, o NCPC traz a hipótese e possibilidade de prescrição intercorrente
nas ações de execução. O juiz, depois de ouvir as partes, no prazo de 15 dias, poderá de ofício
reconhecer a prescrição intercorrente e extinguir o processo.

Segundo o art. 195, os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os
seus assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição, ou não a alegarem
oportunamente.

Veja que os relativamente incapazes ou as pessoas jurídicas poderão cobrar indenização


daqueles que deixou a prescrição acontecer.

O art. 196 diz que a prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr contra o seu
sucessor.

v. Causas que impedem ou suspendem a prescrição

A prescrição poderá ser impedida ou suspensa, bem como ser interrompida.

No caso de impedimento, o prazo prescricional não começa a correr, mas na suspensão o


prazo, já iniciado, para de correr, voltando a correr de onde parou.

Na interrupção, o prazo para e volta a correr do início.

São hipóteses de impedimento e suspensão da prescrição:

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• Não corre a prescrição entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;

O enunciado 296 do CJF, por uma questão de valorização constitucional, estabelece que não
corre também a prescrição entre os companheiros durante a união estável.
• Não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;

• Não corre a prescrição entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a
tutela ou curatela;

• Não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes (menores de 16 anos);

• Não corre a prescrição contra os ausentes do País em serviço público;

• Não corre a prescrição contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de
guerra;

• Não corre a prescrição pendendo condição suspensiva;

Vale também para termo inicial, o qual recebe o mesmo tratamento da condição suspensiva.
Este dispositivo seria desnecessário, pois enquanto não tiver ocorrido a condição suspensiva, não
adquiriu sequer o direito, não tendo como exigir.
• Não corre a prescrição não estando vencido o prazo;

• Não corre a prescrição pendendo ação de evicção.

A evicção é a perda de uma coisa em decorrência a uma decisão judicial ou decisão administrativa
que atribui determinada coisa a terceiro. Enquanto estiver cobrando algo em juízo não correrá a
prescrição contra o sujeito que vendeu a coisa.
• Não corre a prescrição antes da respectiva sentença definitiva, quando a ação se originar de
fato que deva ser apurado no juízo criminal;

Houve um ilícito civil e penal. O sujeito está respondendo o processo na esfera penal, razão pela
qual deverá aguardar o término do processo penal para aferir a responsabilidade civil do
indivíduo. Enquanto não houver a respectiva sentença definitiva, não começará a correr o prazo
prescricional.

O art. 201 diz que, suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, esta
suspensão só aproveita aos demais se a obrigação for indivisível.

Com relação à interrupção da prescrição, percebe-se que há condutas do credor ou


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conduta do devedor, fazendo com que o prazo se interrompa e retorne ao seu início.

A interrupção da prescrição somente ocorrerá uma única vez, sendo as hipóteses:

• interrompe a prescrição o despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o


interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;

O NCPC, de acordo com o art. 240, §1º, estabelece que a interrupção da prescrição, operada pelo
despacho que ordena a citação, ainda que proferido por juízo incompetente, retroagirá à data
de propositura da ação.
Portanto, o prazo em que foi ajuizada a ação será considerada como marco interruptivo da
prescrição, visto que o despacho terá força retroativa.
O art. 19, §2º, da Lei 9.307, estabelece que a instituição da arbitragem interrompe a prescrição
retroagindo à data de requerimento de instauração àquela arbitragem.
Portanto, a instituição de arbitragem também interrompe a prescrição.
• interrompe a prescrição o protesto judicial ou o protesto cambial;

• interrompe a prescrição a apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em


concurso de credores;

• interrompe a prescrição qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

• interrompe a prescrição qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe
reconhecimento do direito pelo devedor.

Veja, aqui há uma conduta do devedor. Ex.: pagamento de juros pelo devedor. Outro exemplo o
STJ entendeu que constitui causa interruptiva da prescrição a propositura de demanda judicial
pelo devedor, seja anulatória, seja de sustação de protesto, que importe em impugnação de
débito contratual ou cártula representativa de direito de credor.

A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do


último ato do processo para a interromper.

A prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado.

O art. 204 diz que a interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros
credores. Da mesma forma, a interrupção operada contra um codevedor, ou seu herdeiro, não
prejudica aos demais coobrigados.

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A interrupção por um dos credores solidários aproveita aos outros, mas a interrupção
efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros.

Havendo a interrupção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário, mas se o


indivíduo é herdeiro de um devedor solidário, a interrupção em relação ao herdeiro não prejudica
os demais herdeiros, salvo se a obrigação for indivisível.

No § 3º, o CC estabelece que, no caso de interrupção produzida contra o principal, esta


interrupção também atingirá o fiador. Trata-se de aplicação da gravitação jurídica.

b) Regras quanto à decadência

A decadência é a perda do direito em razão do seu não exercício.

A decadência pode ter origem na lei ou por convenção das partes.

O art. 207 diz que, salvo disposição legal em contrário, não se aplicam à decadência as
normas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição.

Portanto, via de regra, decadência não se interrompe e não se suspende.

O art. 208 estabelece que a decadência não corre contra os absolutamente incapazes.
Atente-se que os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas também têm ação contra os seus
assistentes ou representantes legais, que derem causa à decadência, ou não a alegarem
oportunamente.

Como dito anteriormente, é nula a renúncia à decadência legal. Por outro lado, é possível
renunciar a decadência convencional, após a sua consumação.

Deve o juiz, de ofício, conhecer da decadência legal, enquanto a decadência convencional


não pode ser reconhecida de ofício.

O NCPC traz a possibilidade de reconhecer a decadência sem dizer sua natureza.

Todavia, se a decadência for convencional, a parte a quem aproveita poderá alegá-la em


qualquer grau de jurisdição.

Direito das Obrigações

124
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Teoria Geral das Obrigações

I. Conceito de obrigação

Obrigação é uma relação jurídica transitória, que existe entre um sujeito ativo (credor) e
um sujeito passivo (devedor), tendo como objeto uma prestação, que pode ser positiva ou
negativa. Havendo o descumprimento dessa prestação (inadimplemento), o credor poderá se
satisfazer no patrimônio do devedor.

Os elementos subjetivos são:

2. credor

• devedor

Os elementos objetivo:

• imediato: é a prestação

• mediato: é o objeto da prestação.

O elemento imaterial é o vínculo que liga o credor ao devedor.

II. Elementos subjetivos da obrigação

Os elementos subjetivos são os sujeitos, ou seja, as pessoas envolvidas na relação jurídica


obrigacional.

São sujeitos:

• sujeito ativo: credor

• sujeito passivo: devedor

Existem casos em que os sujeitos são credores e devedores, uns dos outros. Isso porque
existe proporcionalidade das prestações firmadas. Isto é, um deve entregar uma coisa e o outro
deve pagar pela coisa. Estas prestações entre credores e devedores é denominada de sinalagma.

III. Elementos objetivo (material) da obrigação

Elemento objetivo da obrigação é o conteúdo da obrigação.

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O objeto imediato da obrigação é uma prestação, a qual pode ser positiva ou negativa. A
prestação positiva poderá ser uma obrigação de dar ou obrigação de fazer. A prestação negativa
poderá ser uma obrigação de não fazer. É a única prestação negativa que se admite no
ordenamento jurídico brasileiro, não se admitindo a obrigação de não dar.

O objeto mediato da obrigação é a coisa ou a tarefa que vai ser desempenhada pelo
devedor. É o objeto imediato da prestação, seja positiva ou negativa. Portanto, é correta a
afirmação: o objeto mediato da obrigação é o objeto imediato da prestação.

Por exemplo, se há a obrigação de dar coisa, o objeto imediato é a obrigação de dar, mas
o objeto mediato é a própria coisa que será entregue, que será o objeto imediato da prestação de
dar.

IV. Elementos imaterial da obrigação (elemento virtual ou espiritual)

O elemento imaterial é o vínculo jurídico que existe entre as partes, sendo o elo que sujeita
o devedor em favor do credor.

A melhor expressão para este vínculo consegue-se extrair a partir do art. 391 do CC, que
diz que todos os bens do devedor respondem pelo inadimplemento das obrigações. É o princípio
da responsabilidade patrimonial do devedor.

sobre o vínculo da obrigação, prevalece na doutrina contemporânea a chamada teoria


dualista (binária), a qual estabelece que a obrigação é concebida a partir de uma relação de débito
e crédito.

A teoria binária pode ser percebida a partir do estudo de dois elementos básicos da
obrigação:

• débito (schuld): é o dever legal de cumprir aquela obrigação.

• responsabilidade (haftung): é a necessidade de ser observar aquela prestação.

O haftung surge quando o schuld não é observado. Se o sujeito não cumpre a obrigação
que deveria cumprir, nasce a responsabilidade, devendo o devedor responder com o seu
patrimônio pela obrigação.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Portanto, a obrigação tem dois elementos: schuld e haftung.

Veremos que há situações em que há o schuld, mas não há o haftung, bem como situações
em que há o haftung, sem schuld.

Exemplo de schuld sem haftung é o caso da obrigação natural, obrigação não exigível,
dívida prescrita. Por isso, se o sujeito pagar a dívida prescrita, não terá direito à repetição, visto
que há schuld, apesar de não existir mais o haftung.

Exemplo de haftung sem schuld ocorre na fiança. Isso porque o fiador paga dívida que não
é dele, pois não tem o débito, apesar de ter a responsabilidade.

V. Fontes obrigacionais

São consideradas fontes obrigacionais:

• Lei: isso porque da lei pode surgir a obrigação.

• Contrato: é a fonte principal do direito obrigacional. A concepção de contrato não se


confunde com a obrigação, pois se trata de um negócio jurídico, seja bilateral ou
plurilateral, que visa a criação, modificação, extinção, de direitos e deveres com
conteúdo patrimonial. O contrato não se confunde com a obrigação pelo fato de que o
contrato cria a obrigação. A obrigação é fruto do contrato, e portanto não é contrato.

• Atos ilícitos e abuso de direito: o abuso do direito não deixa de ser um ato ilícito.

• Atos unilaterais: são as denominadas declarações unilaterais de vontade, como é o caso


da promessa de recompensa.

• Títulos de crédito: o sujeito pode ser responsabilizado a partir de um título de crédito.

Classificações das obrigações

I. Quanto ao seu conteúdo

A obrigação pode ser:

• obrigação positiva: há a obrigação de dar e a obrigação de fazer.

• obrigação negativa: há a obrigação de não fazer.


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a) Obrigação de dar (positiva)

Na obrigação de dar, o sujeito passivo se compromete a entregar alguma coisa, a qual pode
ser certa ou incerta. Ex.: obrigação decorrente de um contrato de compra e venda.

A obrigação de dar é sub-classificada em duas modalidades:

• obrigação de dar coisa certa (específica)

• obrigação de dar coisa incerta (genérica) o objeto é determinável, mas não está
determinado ainda.

i. Obrigação de dar coisa certa (específica)

Na obrigação de dar coisa certa, a coisa é individualizada. O art. 313 do CC diz que o credor
não é obrigado a receber outra coisa, ainda que esta outra coisa seja mais valiosa, já que seu
crédito se relaciona a uma coisa específica.

O art. 233 estabelece que a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios (princípio
da gravitação jurídica), salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.

Segundo Flávio Tartuce, as consequências em caso de inadimplemento da obrigação de


dar coisa certa são:

• 1) perdeu-se a coisa sem culpa do devedor, antes da tradição (entrega ao credor): a


obrigação é resolvida, sem pagamento de perdas e danos, visto que não há
responsabilidade do devedor, visto que foi sem culpa a perda.

2) perdeu-se a coisa com culpa do devedor, antes da tradição (entrega ao credor): o credor
poderá exigir o equivalente da coisa, mais perdas e danos, visto que há responsabilidade
subjetiva do devedor, neste caso.

3) deteriorou-se a coisa sem culpa do devedor, antes da tradição (entrega ao credor): o


credor terá duas opções: i) resolve a obrigação, não havendo direito a perdas e danos,
visto que não há culpa do devedor; ii) fica com a coisa, abatendo do preço a
desvalorização da coisa. Também não terá perdas e danos.

4) deteriorou-se a coisa com culpa do devedor, antes da tradição (entrega ao credor): o

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credor poderá exigir o equivalente da coisa, ou mesmo ficar com a coisa deteriorada,
tendo em qualquer um desses casos direito a perdas e danos, pois há responsabilidade
do devedor.

5) perdeu-se a coisa sem culpa do devedor na obrigação de restituir coisa certa que é do
credor, antes da tradição: neste caso, aplica-se a máxima res perit domni (a coisa perece
para o dono), devendo o credor deverá suportar o prejuízo, já que não houve culpa do
devedor. Ex.: o contrato é de locação. João deverá devolver o imóvel dentro de 2 dias.
Um dia antes há uma tempestade e destrói o apartamento. Como João não tem culpa, a
coisa pereceu para o dono.

6) perdeu-se a coisa com culpa do devedor na obrigação de restituir coisa certa que é do
credor, antes da tradição: neste caso, quem responderá pela perda da coisa será o
devedor, pelo equivalente, mais perdas e danos. Isso porque, em verdade, a sua
responsabilidade é subjetiva.

7) deteriorou-se a coisa sem culpa do devedor, antes da tradição (entrega ao credor), no


caso da obrigação de restituir coisa certa que é do credor: o credor só poderá exigir a
coisa no estado em que se encontra, sem qualquer indenização, ainda que parcialmente,
visto que a coisa perece para o dono.

8) deteriorou-se a coisa com culpa do devedor, antes da tradição (entrega ao credor), no


caso da obrigação de restituir coisa certa que é do credor: o credor tem direito de exigir
o equivalente da coisa ou mesmo a coisa, mais perdas e danos.

Além dessas 8 regras, é necessário destacar o art. 237, o qual diz que até a tradição,
pertence ao devedor a coisa, com seus melhoramentos e acrescidos. Em razão desses
melhoramentos e acrescidos, o devedor pode exigir o aumento do preço, já que houve.

Se o credor não anuir com este aumento, neste caso o devedor pode resolver a obrigação,
visto que a lei veda o enriquecimento sem causa do credor. E neste caso a coisa era do devedor, e
ela sofreu acréscimo e melhoramento.

ii. Obrigação de dar coisa incerta (genérica)

A obrigação pode ser de dar coisa certa, mas também pode ser de dar coisa incerta
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(obrigação genérica).

A obrigação tem por objeto uma coisa indeterminada, só indicada pelo gênero e
quantidade. Haverá uma indicação posterior quanto à qualidade da coisa.

E esta indicação quanto à qualidade é denominada concentração, a qual normalmente faz


é o devedor. Isto é, quem normalmente faz a concentração, tornando o objeto indeterminado em
determinado é o devedor.

A concentração pode caber ao devedor, situação na qual não poderá dar a pior coisa e nem
é obrigado a prestar a melhor.

Caso o contrato estabeleça que a concentração caiba ao credor (art. 244), não poderá fazer
a opção pela coisa mais valiosa, nem ser compelido a aceitar a coisa menos valiosa. O que temos
aqui é a consagração do princípio da equivalência das prestações, preocupando-se com o
sinalagma, que é a equivalência das prestações.

Após a escolha feita pelo devedor, o credor é cientificado dessa escolha, situação na qual
a obrigação genérica passará a ser uma obrigação específica, aplicando-se as regras de dar coisa
certa.

Antes da concentração, via de regra, não se pode falar em inadimplemento da obrigação


genérica, visto que o gênero não perece. O art. 246 do CC continua consagrando que o gênero
nunca perece. Segundo este dispositivo, antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou
deterioração da coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito.

b) Obrigação de fazer (positiva)

Na obrigação de fazer, há uma obrigação cuja prestação consiste no cumprimento de uma


tarefa a ser cumprida pelo devedor.

Ex.: prestação de serviço, contrato de empreitada de uma obra, etc.

A obrigação de fazer pode ser classificada da seguinte forma:

• Obrigação de fazer fungível

• Obrigação de fazer infungível

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i. Obrigação de fazer fungível

A obrigação de fazer fungível pode ser cumprida por qualquer pessoa, sem que seja o
devedor originário.

Neste caso, se houver inadimplemento com culpa do devedor, poderá o credor exigir que:

• o devedor cumpra forçadamente a obrigação (fixação de astreintes ou multa).

• a obrigação seja cumprida por terceiro à custa do devedor originário.

• a conversão da obrigação em perdas e danos, não querendo cumprimento forçado ou


por terceiro.

O art. 249, parágrafo único, estabelece que, em caso de urgência, pode o credor,
independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois
ressarcido pelo devedor originário. Este dispositivo consagra uma espécie de autotutela civil.

Ex.: A encomendou 100 salgadinhos para o aniversário, mas eles ainda não chegaram, pois
são 19:30 e o aniversário é as 20:00. Neste caso, A compra em outro lugar os 100 salgados e leva
para casa. Após, será ressarcido pelo devedor originário. Trata-se de tutela de urgência, autotutela
civil.

ii. Obrigação de fazer infungível

A obrigação de fazer também poderá ser infungível, ou seja, personalíssima (intuito


personae).

Neste caso, se houver o inadimplemento, com culpa do devedor, o credor tem duas
opções:

• exigir o cumprimento forçado da obrigação, seja por astreintes ou multa, fazendo com
que o devedor execute a obrigação.

• exigir perdas e danos.

Atente-se que no caso de obrigação de fazer infungível, não é possível pedir para que outro
cumpra a obrigação.

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c) Obrigação de não fazer (negativa)

É a única obrigação negativa admitida no direito brasileiro. No Brasil, ninguém é obrigado


a não dar alguma coisa, mas poderá admitir a obrigação de não fazer.

Segundo o art. 390 do CC, nas obrigações negativas o devedor é inadimplente desde o dia
em que executou o ato de que se não devia ter executado.

A obrigação de não fazer é quase sempre infungível, como é o contrato de


confidencialidade, eis que o segredo é da empresa.

Se houver o inadimplemento de uma obrigação de não fazer, com culpa do devedor, o


credor tem algumas opções:

• cumprimento forçado da obrigação, ou seja, uma abstenção do ato, por meio de uma
tutela específica. Ex.: juiz fixa multa para que ele desfaça o que ele fez, se for possível.

• exigir perdas e danos. Ex.: a obrigação era de não revelar segredo, mas ele revelou. Não
há como voltar atrás a palavras, então caberá perdas e danos.

O art. 251 do CC autoriza que, em casos de urgência, o credor desfaça ou mande desfazer
aquilo que foi feito pelo devedor, que tinha obrigação de não fazer, independentemente de
autorização judicial, sem prejuízo do ressarcimento devido.

Sujeito não poderia construir, mas construiu, mas em caso de urgência o credor demoliu a
construção. Isto é caso de autotutela civil, sem prejuízo de ressarcimento por parte do credor,
que agora teve que arcar com o desfazimento da obra que nem deveria ter sido feita.

II. Quanto a complexidade do seu objeto

A obrigação quanto a complexidade do seu objeto pode ser:

• obrigação simples

• obrigação composta

a) Obrigação simples

Na obrigação simples há uma só prestação.

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Ex.: na compra e venda de bem determinado, basta dar este bem e esta é a única
prestação.

b) Obrigação composta

Na obrigação composta há uma pluralidade de objetos e de prestações, podendo ser


subdividida em:

• Obrigação composta objetiva cumulativa (conjuntiva)

O sujeito passivo tem prestações cumulativas a cumprir, ou seja, deve cumprir todas as
prestações previstas.
Ex.: contrato de locação. O locador é obrigado a entregar o imóvel, garantir seu uso
pacífico e responder pelos vícios das coisas que foi locada. Há outros ainda, mas estas
são obrigações cumulativas do locador. Já o locatário é obrigado a pagar o aluguel,
assumir os encargos como condomínio, tributos, etc., usar o imóvel conforme o
convencionado, a não modificar a forma externa do imóvel. São obrigações cumulativas
do locatário.
• Obrigação composta objetiva alternativa

A obrigação se apresenta com mais de uma prestação, bastando que uma delas seja
cumprida para que se cumpra a obrigação.
Se a escolha vai acontecer, via de regra caberá ao devedor (concentração). O devedor
tem prestações alternativas e escolhe uma delas.
O §1º do art. 252 do CC disciplina que o devedor não pode obrigar o credor a receber
parte em uma prestação e parte em outra. Ex.: João disse que no final do mês vai
entregar 50 sacas de soja ou de feijão. No final do mês, não pode João obrigar o credor
a receber 25 sacas de soja e 25 sacas de feijão. As prestações são alternativas, ou uma
ou outra.
Se a obrigação for de prestações periódicas, ou seja, todo final do mês João deva entregar
50 sacas de feijão ou 50 sacas de soja, a cada mês a opção poderá ser exercida (art. 252,
§2º).

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O §3º do art. 252 vai dizer que, se houver pluralidade de optantes, poderá haver a
possibilidade de não concordarem entre si, situação na qual decidirá o juiz, findo o prazo
por este assinado para a deliberação.
Se a concentração couber a um terceiro, mas este não quiser escolher, ou não puder
exercer, caberá ao juiz a escolha se não houver acordo entre as partes (§4º).

O art. 253 estabelece que, se uma das prestações não puder ser objeto de obrigação, ou
se uma das prestações tenha se tornado inexequível, o débito vai subsistir em relação a outra.

Há a conversão de uma obrigação composta objetiva alternativa, se houver o perecimento


de uma das prestações possíveis, será convertida a prestação composta alternativa em obrigação
simples, visto que fica possível apenas uma prestação.

E se as duas prestações se tornarem totalmente impossível ou inexequíveis?

Se houver culpa do devedor, e não couber a escolha ao credor, o devedor deverá arcar com
a última prestação pela qual se obrigou, sem prejuízo da sua responsabilidade por perdas e danos.

Se a escolha couber ao credor, e se tornou impossível uma das prestações por culpa do
devedor?

Neste caso, o credor terá duas opções: ou exige a prestação restante mais perdas e danos,
ou exige o valor da prestação que se perdeu, sem prejuízo de perdas e danos.

E se cabendo a escolha ao credor, e se tornam impossíveis as duas prestações?

Se o cumprimento das duas prestações se tornar impossíveis, o credor poderá exigir o valor
de qualquer uma das duas prestações, além de perdas e danos.

Essas duas formas de obrigações compostas não se confundem com a obrigação


facultativa.

Na obrigação facultativa, há uma única prestação, sendo obrigação simples, apesar de


estar acompanhada de uma faculdade de o devedor cumprir o acordo com uma outra opção. O
credor não pode exigir esta faculdade do devedor. É uma obrigação simples.

A obrigação facultativa não está prevista no Código Civil, mas é tratada pela doutrina e

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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jurisprudência.

III. Quanto ao número de pessoas envolvidas

A obrigação pode ser classificada quanto ao número de pessoas envolvidas.

As obrigações podem ser complexas quando se analisa as partes envolvidas, denominadas


obrigações complexas subjetivas. Neste caso, em que há mais de um credor ou mais de um
devedor, ganha importância o estudo das obrigações solidárias.

O código civil traz preceitos em relação à obrigação solidária ativa e obrigação solidária
passiva.

O art. 264 do CC estabelece que existe solidariedade quando na mesma obrigação


concorrer mais de um credor ou mais de um devedor, e cada um deles com direito ou obrigação
à dívida toda.

Solidariedade não se presume, ou decorre da lei ou da vontade das partes.

Vale destacar que a solidariedade não é a regra no Código Civil, mas é a regra no Código
de Defesa do Consumidor.

a) Solidariedade ativa

Na solidariedade ativa cada um dos credores solidários têm direito a exigir do devedor o
cumprimento da obrigação por inteiro.

Alguns dos credores podem não ter demandado, enquanto alguns credores solidários não
demandarem, o devedor poderá pagar a qualquer deles, desobrigando-se.

Ex.: Se Maria deve 100 mil reais a João e José. Se der 100 mil a João, estará resolvido. Mas
isto apenas se Maria não tiver sido demandada, pois se José demandou Maria, só poderá pagar
aquele que demandou, tendo direito a receber a dívida toda.

O pagamento feito a um dos credores solidários extingue a dívida, até o montante que foi
pago. Se for pago tudo, extingue a dívida por completo.

Se um dos credores solidários falecer, os seus herdeiros são credores solidários?

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NÃO. Se um dos credores solidários falecer e deixar herdeiros, cada um desses herdeiros
têm direito a exigir e a receber apenas a quota do crédito correspondente ao seu quinhão
hereditário, com exceção de que a obrigação seja indivisível (neste caso, o herdeiro recebe o bem
inteiro e ressarce os demais).

Os herdeiros do credor solidário não são credores solidários, só podendo exigir a sua quota
do quinhão hereditário.

E se a obrigação solidária for convertida em perdas e danos, pois não cabe mais cumprir?

Neste caso, subsiste a solidariedade para todos os efeitos. Se deveria entregar dois
cavalos para dois credores, ou seja, cada um deles poderia exigir os dois cavalos, sendo que os
dois cavalos valem 100 mil reais. Se os dois cavalos morrem, porque Maria bêbada enforcou os
dois, Maria deverá dar 100 mil reais para qualquer um dos dois, visto que a solidariedade subsiste,
mesmo que convertida em perdas e danos.

Perceba a diferença entre solidariedade e indivisibilidade. Isso porque se a obrigação


indivisível é convertida em perdas e danos, a obrigação passa a ser divisível. Mas a solidariedade,
se converte em perdas e danos, continua sendo solidária.

Supondo que o credor tenha perdoado a dívida, ou tenha recebido o pagamento daquela
dívida, este credor irá responder perante os outros pela parte que lhes caiba, tanto se tiver
perdoado como se ele tiver recebido a dívida.

A um dos credores solidários, o devedor não pode opor exceções pessoais que eram
oponíveis a outros credores solidários. Ex.: Se Roberta tem exceção pessoal contra José por conta
da coação para celebração do contrato, não poderá opor esta exceção pessoal em relação a João.

Por óbvio, isto não impede que Roberta pague João e exerça direito de regresso contra
José.

Ainda, segundo a lei, o julgamento contrário a um dos credores solidários não atinge os
demais, mas o julgamento favorável a um dos credores solidários aproveita aos demais, sem
prejuízo de exceção pessoal possível de ser invocada em favor de qualquer um dos credores.

Ou seja, se um dos credores teve contra si uma exceção pessoal levantada, isto não

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prejudica o direito dos outros, mas se o credor foi lá e reconheceu o seu direito ao crédito, isto
beneficia todos os outros credores solidários.

Mas o outro credor solidário, quando foi dar cumprimento a sentença, pode ter em relação
a ele levantado uma exceção pessoal, pois este é um direito do devedor em relação
especificamente àquele credor.

b) Obrigação solidária passiva

Na obrigação solidária passiva, o credor tem o direito de exigir e receber de um, de alguns
ou de todos os devedores totalmente ou parcialmente a dívida que é comum.

Se o pagamento tiver sido parcial, todos os devedores continuarão solidariamente


obrigados pelo resto.

Se houver a propositura de uma ação em face de um devedor, não importará renúncia à


solidariedade (art. 275, parágrafo único, CC).

E se houver a morte de um dos devedores solidários?

Se um dos devedores solidários falece, cessará a solidariedade em relação aos sucessores


do de cujus, devendo os herdeiros ser responsáveis até os limites da herança e dos seus quinhões
respectivos. E portanto não há solidariedade.

Se a obrigação for indivisível, a questão é de indivisibilidade.

Agora, se pegarmos todos os herdeiros reunidos, o código vai dizer que neste caso, em
relação aos demais devedores, serão considerados como único devedor. Mas isto apenas em
relação aos demais devedores. Caso contrário, não.

Em regra, morreu, cessou a solidariedade.

Tanto o pagamento parcial realizado por um dos devedores, como o perdão da dívida
obtida por um dos devedores (fração da dívida), não tem o efeito de atingir os demais devedores
na integralidade da dívida. Claro que haverá um desconto do que foi pagou ou perdoado.

Então, se 3 pessoas devem a Roberta 30 mil reais. E se Roberta perdoar João 10 mil reais,
poderá cobrar de José e de Pedro os 20 mil reais, de qualquer um deles.

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O art. 278 do CC estabelece que qualquer cláusula ou qualquer condição, ou obrigação que
tenha sido adicionada ao contrato, por estipulação de um dos devedores solidários e o credor,
esta cláusula ou condição adicional, ou estipulação adicional, não poderá agravar a condição dos
outros devedores, que não tenham consentido com esta modificação ou adição no contrato. Trata-
se do princípio da relatividade do contrato.

Portanto, se for adicionado uma cláusula por acordo entre um devedor e o credor, por
lógico, em relação aos demais devedores solidários, não produzirá efeitos.

O que acontece se por culpa de um dos devedores a obrigação se torna impossível de ser
cumprida?

A solidariedade subsiste, ainda que convertida em perdas e danos. No entanto, pela


indenização, ou pela culpa, ou seja, pelas perdas e danos causados somente o culpado
responderá.

Ex.: João e José são locatários, ou seja, devedores solidários de Antônio. Eles devem
entregar o apartamento daqui a 1 dia, e venceram os 29 dias em que foi gozado o uso da
propriedade. No 30º dia, José põe fogo na casa.

Dos 29 dias de aluguel, Antônio poderá cobrar tanto João quanto José, mas em relação às
perdas e danos causadas por José, Antônio somente poderá cobrar de José, não podendo cobrar
de João.

Se a prestação se tornar impossível por culpa de um dos devedores solidários, pelo


equivalente, qualquer um poderá ser cobrado, mas pelas perdas e danos, somente o devedor
culpado.

Na solidariedade passiva, o devedor, quando demandado, poderá opor contra o credor as


defesas que lhe são pessoais a este devedor e as defesas comuns a todos. Ex.: pagamento parcial
ou pagamento total é defesa comum a todos, assim como a prescrição.

Mas este devedor demandado não poderá promover as defesas pessoais que outro
codevedor tenha em relação a outro credor.

O art. 282 do cc disciplina que o credor pode renunciar a solidariedade em favor de um,

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de alguns ou de todos os devedores, não perdoando a dívida, mas exonera o devedor da


solidariedade.

Se o credor exonera um ou alguns devedores da solidariedade, a solidariedade subsistirá


em relação aos demais.

Ex.: Roberta é credora de 100 mil de 4 pessoas, cada um deve 25 mil. Roberta exonerou
João da solidariedade, razão pela qual João só deverá pagar 25 mil a Roberta, mas em relação aos
75 mil, Roberta poderá cobrar de qualquer dos outros 3 devedores.

O Enunciado 351 do CJF esclarece que a renúncia à solidariedade em favor de um


determinado devedor afasta a sua hipótese de chamamento ao processo.

Portanto, se o devedor foi exonerado da solidariedade, não será mais considerado devedor
solidário. Então não caberia chamamento ao processo.

O devedor que satisfaz a dívida por inteiro poderá exigir de cada um dos codevedores a
sua quota, dividindo-se igualmente por todos os devedores a quota daquele devedor que se
mostrar insolvente.

Presumem-se iguais os débitos as partes de todos os codevedores. Ex.: há 5 pessoas e elas


devem 100 mil a Roberta. Roberta cobra de João, e este paga os 100 mil. João tem direito de
receber 20 mil de cada um dos demais devedores.

Mas supondo que um deles esteja insolvente, os 20 mil de José deverão ser distribuído
pelos 4 devedores solventes.

Se a dívida solidária interessar exclusivamente um dos devedores, este vai responder pela
dívida totalmente por quem pagou a dívida.

Ex.: Roberta celebrou contrato de fiança para o seu irmão, mas houve a dispensa do
benefício de ordem, motivo pelo qual o fiador pagou diretamente. Neste caso, há direito do fiador
de receber do devedor a integralidade da dívida, visto que foi exclusivamente em benefício do
devedor que foi paga a dívida. É a sub-rogação legal, conforme os arts. 283 e 285.

Observa-se que o devedor que foi exonerado da solidariedade também é responsável


em relação à quota do devedor que se tornou insolvente. Então, mesmo naquele caso em que
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o sujeito havia se desonerado da solidariedade, se sobrou 20 mil em aberto do devedor


insolvente, todos eles responderão pela parte faltante do devedor insolvente.

IV. Quanto à divisibilidade do objeto

Só haverá esta classificação se houver pluralidade de credores. Ou seja, importa saber se


ela divisível ou indivisível se houver mais de um credor ou mais de um devedor.

• obrigação divisível

• obrigação indivisível

a) Obrigação divisível

Poderá ser divisível quando puder ser cumprida de forma fracionada.

Segundo o art. 257, havendo mais de um devedor ou mais de um credor em obrigação


divisível, essa se presume dividida em tantas obrigações, iguais e distintas, quantos os credores
ou devedores.

Isto significa que se houver uma obrigação divisível e pagar 100 mil reais e houver 10
credores, presume-se que cada um deles teria direito a 10 mil reais. E se houver 10 devedores,
presume-se que cada um deles deve 10 mil reais.

Esta é a presunção! Se o instrumento contratual trouxer outra previsão, a outra


prevalecerá.

b) Obrigação indivisível

Ocorrerá quando não puder ser fracionada o cumprimento.

Em relação à obrigação indivisível, esta impossibilidade de fracionamento pode decorrer


da própria natureza do objeto da prestação, ou por razões econômicas, ou ainda por algum motivo
determinante do negócio jurídico.

A indivisibilidade poderá ser natural, legal ou por convenção das partes.

Na maioria das vezes, a indivisibilidade é econômica, pois o fracionamento das coisas gera
a sua desvalorização, tendo origem na autonomia privada.

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Flávio Tartuce estabelece que, se houver 2 ou mais devedores, cada um será obrigado a
dívida toda, pois a obrigação é indivisível. Mas o devedor que paga a dívida toda sub-roga-se no
direito do credor em relação ao outro ou aos outros coobrigados. Há aqui um caso de sub-rogação
legal.

Em caso de pluralidade de credores na obrigação indivisível, estes credores poderão exigir


a obrigação por inteiro. Porém o devedor só vai se desonerar se pagar a todos os credores
conjuntamente, ou a um dos credores, quando este der caução de ratificação de concordância dos
outros credores.

Flávio Tartuce estabelece que se um dos credores remitir ou perdoar a dívida, a obrigação
não fica extinta com relação aos demais. Mas estes demais só poderão exigir aquela obrigação,
descontando a parcela do credor que remitiu ou perdoou a dívida. E este mesmo critério vai ser
observado no que toca à transação, novação, compensação ou confusão com relação aos demais
credores.

Supondo que Roberta tenha 3 credores, pois vendeu a eles um boi que custa 30 mil reais.
Um dos credores perdoou a dívida, não querendo mais o boi. No entanto, os outros dois
continuam querendo o boi. Neste caso, os credores têm direito ao boi, mas deverão pagar 10 mil
reais para ter direito ao recebimento deste boi. A obrigação continua indivisível, mas é preciso
descontar do valor a quota parte daquele que perdoou a dívida que existia.

A obrigação indivisível perde o seu caráter se for convertida em perdas e danos. Ex.: o boi
morreu, razão pela qual Roberta deverá entregar 30 mil reais aos credores. A partir de então, a
obrigação passa a se tornar divisível. Veja que, na obrigação solidária, a conversão em perdas e
danos não desnatura a solidariedade.

Havendo perecimento do objeto da prestação indivisível, por culpa de um só dos


devedores, estabelece o Enunciado 540 do CJF que todos os devedores irão responder de maneira
divisível pelo equivalente do bem que pereceu, mas só o culpado responderá por perdas e danos.

Este entendimento não é pacífico. Tartuce defende que com a conversão em perdas e
danos, se houver culpa de apenas um dos devedores, este deverá arcar com o pagamento da coisa
e com a indenização, ficando todos os demais totalmente desobrigados.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Direito das Obrigações

1. Adimplemento das obrigações (Teoria do Pagamento)

Como se sabe, é por meio do pagamento que se tem a liberação do devedor em relação ao vínculo
obrigacional que ele tinha firmado com o credor.

I. Pagamento direto

Quando se fala em pagamento direto interessa os elementos subjetivos da obrigação, ou seja, o solvens e o
accipiens. Elementos subjetivos são os sujeitos daquela relação.

a) Solvens

É aquele que irá solver a obrigação, ou seja, é quem vai pagar. Via de regra, o solvens é o devedor, mas outras
pessoas também podem pagar.

O art. 304 do CC diz que qualquer interessado na extinção da dívida pode pagar, usando, se o credor se
opuser, dos meios conducentes à exoneração do devedor.

Quem é o terceiro interessado na dívida?

É aquela pessoa que tenha interesse patrimonial na extinção daquela dívida, como o fiador, avalista,
herdeiro, etc.

Havendo o pagamento pelo interessado, ele irá se sub-rogar nos direitos do credor. Há uma sub-rogação
legal. O pai que paga a dívida do filho não é terceiro interessado, devendo haver interesse jurídico.

Cabe ressaltar que o solvens poderá ser o terceiro não interessado. Se o terceiro não interessado fizer o
pagamento em seu próprio nome, terá direito ao reembolso, não se sub-rogando nas posições do credor. Na verdade,
terá direito apenas ao reembolso. Se pagar a dívida antes do vencimento, só terá direito ao reembolso quando houver
o vencimento daquela dívida.

E se o terceiro não interessado fizer o pagamento em nome do devedor, e em conta desse devedor?

Não existindo oposição do devedor quanto a este pagamento, que o terceiro não interessado faz em seu
nome, este terceiro não interessado não terá direito a nada. Neste caso, considera-se como se tivesse feito uma
doação, já que fez em nome do devedor e não houve oposição desse devedor.

Diferente é o art. 306, que diz que realizado o pagamento por terceiro não interessado, em seu próprio nome
(terceiro), sem conhecimento ou havendo oposição do devedor, não existirá a obrigação de reembolso em relação a
este terceiro, se o devedor provar que ele tinha meios para ilidir a ação do credor. Ex.: disser que a dívida estava
prescrita, situação na qual não poderá cobrar do devedor.

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Por outro lado, se o devedor não prova que tinha meio para ilidir a ação do credor, aí é claro que deverá
pagar ao terceiro não interessado, a despeito de ter pago com a oposição, visto que o sujeito deveria ter de pagar de
alguma forma ao credor. Mas como o terceiro pagou, terá este direito ao reembolso. Isso porque a lei veda o
enriquecimento sem causa.

O que obsta o direito ao reembolso é considerar que o devedor poderia dizer que não pagaria o credor, pois
ele era devia ao devedor, razão pela qual seria compensada a dívida, ou a dívida estava prescrita, ou ainda havia
confusão. Se o devedor conseguir provar que não iria pagar a dívida, o terceiro não interessado não terá direito a
reembolso.

O art. 307 estabelece que só terá eficácia o pagamento que importar transmissão da propriedade, quando
feito por quem possa alienar o objeto em que ele consistiu. Ou seja, veda-se a venda a non domino, ou seja, alienação
por quem não é dono.

O parágrafo único diz que, se a parte der em pagamento coisa fungível que pertença a um terceiro, não será
mais possível que este terceiro reclame do credor que recebeu de boa-fé a coisa fungível e que a consumiu, ainda
que o solvente não tivesse o direito de aliená-la.

b) Accipiens

É quem vai receber o pagamento, ou seja, a quem se deve pagar.

Quem recebe normalmente é o credor, mas o pagamento pode ser feito a um representante do credor, que
tenha poderes para receber o pagamento. Caso este representante não tenha poderes, este pagamento só irá valer
após uma ratificação do credor, ou ainda se o devedor provar que houve a reversão do pagamento em proveito do
credor.

O art. 309 do CC é válido o pagamento ao credor putativo, ou seja, aquele que parece credor, mas que não
o é, desde que o credor tenha agido com boa-fé. Este dispositivo aplica a teoria da aparência.

Ex.: Eduardo é locatário de um imóvel e vem fazendo pagamentos do aluguel na imobiliária X. Após um ano,
o locador mudou para imobiliária Y, sem informar ao locatário. Neste caso, Eduardo continuou depositando em favor
da imobiliária X. Este é credor putativo, pois o devedor fez pagamentos por meio da teoria da aparência.

Segundo o art. 310, não vale o pagamento cientemente feito ao credor incapaz de dar quitação, salvo se o
devedor provar que houve reversão do valor pago em favor daquele credor incapaz de dar quitação.

É preciso conferir uma interpretação extensiva para esta incapacidade, não abrangendo apenas a
incapacidade stricto sensu (absoluta e relativa), funcionando também como tal o credor que não tinha autorização
para isso. Neste caso, o pagamento deve acontecer novamente.

O art. 311 diz que deve ser autorizado para receber o pagamento quem está munido do documento
representativo da quitação. Presume-se autorizado a receber o pagamento quem detém o recibo nas mãos, salvo se
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as circunstâncias contrariarem a presunção daí resultante.

Já o art. 312 enuncia que, se o devedor pagar ao credor, apesar de já ter sido intimado da penhora feita
sobre o crédito, ou sobre a impugnação feita sobre aquele crédito por uma terceira pessoa, não deve ser tido como
válido o pagamento perante o terceiro. Na verdade, será considerado ineficaz, apesar de a lei falar em invalidade.

Ex.: João é credor da Roberta, tendo um cheque de 30 mil reais. João está devendo José, o qual promove
ação de execução contra João. O cheque é penhorado, e Roberta já tem ciência disso. Roberta faz o pagamento da
dívida em favor de João. Este pagamento é inválido, segundo a lei, em face de José.

c) Do objeto e da prova do pagamento direto

Aqui há duas situações distintas:

2. Objeto do pagamento

• Prova do pagamento

i. Objeto do pagamento

O art. 313 diz que o objeto da prova é a prestação, e o credor poderá se recusar a receber o que não foi
pactuado, ainda que esta coisa seja mais valiosa do que aquilo que foi pactuado.

Além disso, se não tiver sido acordado o pagamento parceladamente, não se pode obrigar o credor a receber
de forma parcelada, e nem o devedor a pagar parceladamente, salvo se o contrato tiver previsão nesse sentido.

Mas há uma exceção legal, conforme o art. 916, o qual diz que, no prazo para embargos, reconhecendo o
crédito do exequente, e comprovando o depósito de 30% do valor da execução, acrescido de custas e honorários de
advogado, o executado pode requerer que lhe seja permitido pagar o restante em até 6 parcelas mensais. Trata-se de
uma imposição legal de recebimento parcelado da dívida.

O art. 314 enuncia que, ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o credor ser
obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se ajustou.

Já o art. 315 afirma que, as dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente e
pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subsequentes. Trata-se de aplicação do princípio do nominalismo, o
qual sofrerá temperamentos porque poderá se estar diante de uma hipótese de correção monetária.

Para se evitar os efeitos da inflação, aplicam-se índices de correção monetária, sendo absolutamente válido,
encontrando previsão no art. 316, o qual afirma que é lícito convencionar o aumento progressivo de prestações
sucessivas, e neste caso tem-se uma cláusula de escala móvel ou escolamento, pois aí consegue vislumbrar a
manutenção do poder aquisitivo ou do valor real da prestação.

O art. 317 estabelece que, quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o

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valor da prestação devida e o valor do momento de sua execução, poderá o juiz corrigir esta desproporção, desde
que haja pedido da parte, de modo a assegurar o valor real da prestação.

Este dispositivo traz a revisão contratual por um fato superveniente diante de uma imprevisibilidade que
resultou em onerosidade excessiva. É a denominada teoria da imprevisão.

O art. 318 diz que são nulas as convenções de pagamento em ouro ou em moeda estrangeira (cláusula
valutar), também são nulas as convenções que prevejam a possibilidade de compensar o valor de uma prestação com
a comparação entre a moeda nacional e uma moeda estrangeira.

Existem exceções, casos em que serão ressalvados pela legislação, como é o caso do art. 2 do DL 857/69, que
diz ser estas proibições inaplicáveis aos:

• contratos e títulos referentes a importação ou exportação de mercadorias;

• contratos de financiamento ou de prestação de garantias relativos às operações de exportação de bens e


serviços vendidos a crédito para o exterior;

• contratos de compra e venda de câmbio em geral;

• empréstimos e quaisquer outras obrigações cujo credor ou devedor seja pessoa residente e domiciliada
no exterior, excetuados os contratos de locação de imóveis situados no território nacional;

• contratos que tenham por objeto a cessão, transferência, delegação, assunção ou modificação das
obrigações referidas no item anterior, ainda que ambas as partes contratantes sejam pessoas residentes
ou domiciliadas no país.

ii. Prova do pagamento direto

O devedor que paga tem direito a quitação pelo credor, e pode reter o pagamento, enquanto não lhe seja
dada.

Essa quitação deverá ter os seguintes requisitos, previstos no art. 320:

• valor expresso da obrigação

• dívida que está sendo quitada (especificidade)

• identificação do devedor, ou de quem está pagando em seu lugar

• tempo e lugar do pagamento

• assinatura do credor, ou de seu representante

O parágrafo único do art. 320 diz que, ainda que a quitação não tenha os requisitos estabelecidos, valerá a
quitação, se de seus termos ou das circunstâncias conseguir se perceber que a dívida foi paga.
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Deve-se obstar o enriquecimento sem causa do credor.

Existem algumas regras que fazem nascer a presunção de pagamento. Esta presunção é relativa, admitindo
prova em contrário:

• nas obrigações de trato sucessivo, a quitação da última estabelece a presunção de que foram solvidas as
prestações anteriores, salvo se houver ressalva expressa da quitação.

• se for dada quitação ao capital, sem a reserva dos juros, presume-se que houve o pagamento dos juros
também. Trata-se de aplicação do princípio da gravitação jurídica.

• a entrega do título ao devedor firma a presunção relativa do pagamento, mas esta presunção de quitação
fica sem efeito se o credor provar em 60 dias que não houve o pagamento.

Flávio Tartuce diz que tal presunção se dará apenas em relação aos títulos de crédito, pois se for outro
instrumento contratual, será presumido o perdão da dívida.
• presumem-se a cargo do devedor as despesas com o pagamento e a quitação. Isto é, se o contrato não
tratar sobre de quem serão as despesas, correrão por conta do devedor. Agora, se houver um aumento
dessas despesas por fato imputado ao credor, em relação a este acréscimo, quem deverá suportar será o
credor.

• Se houver o pagamento por medida ou por peso, e havendo silêncio das partes, presume-se que foi
adotado os critérios do lugar da execução da obrigação.

Ex.: Se Roberta compra 10 alqueires no Estado de SP, e ele mora em Goiás. Mas qual seria a metragem do
alqueire? Não foi falado. Em São Paulo, 1 alqueire é 24.000m, enquanto em Goiás 1 alqueire é 48.000m.
Dessa forma, presume-se que a medida seguirá o critério do lugar da coisa.

d) Do lugar do pagamento direto

Com relação ao lugar do pagamento, a obrigação pode ser classificada em:

• obrigação quesível: é a regra. O devedor fica quieto, não saindo do lugar, pois o pagamento é feito no seu
domicílio. É o credor que vai buscar o pagamento. Há uma presunção relativa de que as obrigações têm
pagamento quesível, salvo se o instrumento negocial, ou a natureza da própria obrigação, ou mesmo a lei,
impuser uma lei em sentido contrário.

• obrigação portável: o local de cumprimento é o domicílio do credor, ou um terceiro lugar.

Designados dois ou mais lugares para o pagamento ser feito, quem escolhe entre eles é o credor.

Se o pagamento consistir na tradição de um imóvel, ou em prestações relativas a imóvel, este pagamento


será feito no lugar em que se encontra o imóvel (o bem).

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O art. 329 estabelece que, se ocorrer um motivo grave para que se não justifique o pagamento no lugar
determinado, poderá o devedor fazer o pagamento em outro lugar, sem que gere prejuízo para o credor. Motivo
grave será dito pelo juiz, como enchente, greve no serviço público, etc.

O art. 330 estabelece que o pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir a renúncia do
credor relativamente ao lugar previsto no contrato. Trata-se da consagração do princípio da boa-fé objetiva, nascendo
a surrectio para o devedor e a supressio para o credor.

• Supressio: é uma supressão, por uma renúncia tácita de um direito pelo seu não exercício pelo passar do
tempo.

• Surrectio: é o nascimento de um direito para a parte em razão do não exercício da outra parte.

e) Do tempo do pagamento

O devedor deverá pagar quando houver o vencimento da obrigação. O vencimento é o momento em que a
obrigação deverá ser satisfeita.

Lembre-se que, salvo disposição legal em contrário, não se ajustando o tempo do pagamento, poderá o
credor exigir imediatamente.

As obrigações condicionais devem ser cumpridas na data em que ocorrerá a condição, cabendo ao credor a
prova de que deste teve ciência o devedor.

A obrigação poderá ser:

• obrigação de execução instantânea: é a obrigação em que é cumprida imediatamente após a sua


constituição. Ex.: compra de pão na padaria.

• obrigação de execução diferida: neste caso, o cumprimento se dá de uma vez só, mas ocorre no futuro,
de forma diferida. Ex.: Roberta compra um bem por 10 mil reais, mas ele quer 30 dias para pagar o valor.

• obrigação de execução continuada (ou de trato sucessivo): o cumprimento da obrigação se dará por
subvenções periódicas. Ex.: comprou um bem por 10 mil reais, mas pagou em 10 meses.

O art. 333 traz um rol de situações em que há o vencimento antecipado da dívida. Se a dívida deve ser paga
no momento do seu vencimento, e se há um rol de vencimento antecipado, há uma antecipação do pagamento desta
dívida.

O vencimento antecipado da dívida poderá ocorrer, situação na qual terá o credor direito de cobrar a dívida
antes de vencido o prazo estipulado no contrato ou marcado:

• quando há falência do devedor, ou de concurso de credores;

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• quando os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em execução por outro credor;

• quando se cessarem, ou se se tornarem insuficientes, as garantias do débito, fidejussórias, ou reais, e o


devedor, tendo sido intimado, se negou a reforçar as garantias.

Nestas situações, haverá o vencimento antecipado da dívida.

Mas e se houver uma solidariedade passiva, o devedor solidário também sofrerá o vencimento antecipado?

NÃO. Não irá se reputar antecipado o vencimento com relação aos demais devedores solventes.

Lembrando que o rol acima é meramente exemplificativo.

II. Das regras especiais de pagamento e das formas de pagamento indireto

a) Do pagamento em consignação

Conceitua-se como um depósito feito pelo devedor da coisa devida, a fim de que o devedor se libere de uma
obrigação, podendo ocorrer na esfera judicial ou na esfera extrajudicial, neste caso o dinheiro é depositado em
estabelecimento bancário oficial.

O pagamento em consignação é um meio indireto de o devedor exonerar-se do liame obrigacional que


vincula o devedor ao credor.

Está sempre relacionada a uma obrigação de dar, não podendo estar relacionada a uma obrigação de fazer
ou não fazer, visto que é necessário depositar a coisa.

O art. 335 estabelece um rol de situações em que a consignação poderá acontecer:

• poderá haver consignação em pagamento se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o
pagamento, ou se recursar a dar quitação;

• poderá haver consignação em pagamento se o credor não for, nem mandar representante para receber
a coisa no lugar, tempo e condição devidos (obrigação quesível);

• poderá haver consignação em pagamento se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado
ausente, ou se o credor residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil;

• poderá haver consignação em pagamento se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o
objeto do pagamento;

• poderá haver consignação em pagamento se pender litígio sobre o objeto do pagamento.

Para que a consignação em pagamento seja válida e eficaz, é necessário que o devedor observe todos os
requisitos do pagamento direto, como pessoas, objeto, modo e tempo do pagamento e todos os requisitos sem os

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quais não é válido o pagamento.

Promovida a ação de consignação em pagamento, será citado o credor para que apresente contestação. Na
contestação, o credor poderá alegar:

• não houve recusa do pagamento

• que houve justa recusa

• que o depósito não foi efetuado no prazo e no lugar do pagamento

• que o depósito não foi integral, situação na qual deverá indicar o valor

O art. 546 do NCPC estabelece que, julgado procedente o pedido, o juiz declarará extinta a obrigação e
condenará o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios. É o princípio da causalidade.

O CC, no art. 339, diz que, julgado procedente o depósito, o devedor já não poderá levantar o objeto da
consignação, eis que o levantamento da quantia consignada só será possível se os outros devedores concordarem e
os fiadores concordarem. Tanto é que o art. 340 do CC diz que o credor que, depois de contestar a lide ou aceitar o
depósito, aquiescer no levantamento, perderá a preferência e a garantia que lhe competiam com respeito à coisa
consignada, ficando para logo desobrigados os codevedores e fiadores que não tenham anuído.

Se o credor anuiu, a despeito da concordância dos fiadores, eles “lavaram as mãos”, não respondendo mais
em relação àquela dívida.

O art. 342 diz que, se houver a obrigação de dar coisa incerta, é preciso que se faça a escolha (concentração).
Se esta escolha couber ao credor, será ele citado para promover a concentração, sob pena de não o fazendo perder o
direito de escolha, e ser depositada a coisa à escolha do devedor.

O devedor de uma obrigação litigiosa se exonerará através de consignação. Supondo que o devedor pague a
um dos pretendidos credores, tendo o conhecimento do litígio. Neste caso, o devedor de obrigação litigiosa assumirá
o risco do pagamento.

Se ele achou que João venceria e João vencer, não há problema. O problema surge se Pedro pagou a João,
mas quem venceu foi José. Então deverá pagar a José, visto que assumiu o risco, a despeito do litígio que pesava sob
o objeto.

Se a dívida vencer, pendendo litígio entre os credores, pode qualquer dos credores requerer a consignação.
Veja, via de regra, a consignação é requerida pelo devedor, mas no caso do art. 345 é o credor que pede a consignação
(art. 345).

Se houver prestações sucessivas e houver consignação de uma delas, o devedor pode continuar depositando
as que forem se vencendo no curso do processo, sem maiores formalidades.

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Deverá fazer este depósito no prazo de 5 dias, contados da data do respectivo vencimento de cada uma das
prestações em que forem se vencendo no curso do processo.

O §1º do art. 539 do NCPC estabelece que em se tratando de obrigação em dinheiro, poderá o valor ser
depositado em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no lugar do pagamento, cientificando-se o
credor por carta com aviso de recebimento, dando o prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa.

Decorrido o prazo de 10 dias, contado do retorno do aviso de recebimento, sem a manifestação de recusa,
será liberado o devedor da obrigação, ficando à disposição do credor a quantia depositada.

Mas se houver recusa, poderá ser proposta, dentro de 1 (um) mês, a ação de consignação, promovida pelo
devedor, instruindo a inicial com o comprovante do depósito e comprovante da recusa pelo credor.

Não propondo a ação, o depósito ficará sem efeito, podendo o devedor levantar este depósito.

b) Da imputação do pagamento

Imputar é apontar para alguém ou para algo.

Uma pessoa que está obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só credor, tem a pessoa
o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos e vencidos.

Ex.: Roberta deve a João 50 mil reais de um cheque, outro de 50 mil reais e mais um de 50 mil reais. Cada
um desses cheques venceu em 3 meses, 2 meses e 1 mês, respectivamente. Roberta deposita 50 mil reais.

A imputação é dizer qual é a dívida que está sendo paga. Esta escolha geralmente cabe ao devedor, sendo
possível ao contrato estabelecer que esta escolha caiba ao credor.

Caso o devedor não fazer qualquer declaração, transfere-se o direito de escolha ao credor.

Caso não haja manifestação do credor, quem fará a imputação é a própria lei.

A ordem de imputação é a seguinte:

• havendo capital e juros, o pagamento será feito primeiro em relação aos juros.

• havendo duas dívidas, será imputado o pagamento à dívida mais antiga.

• havendo as dívidas com mesmo vencimento, será imputada à dívida mais onerosa.

• não havendo dívida mais onerosa, a imputação será feita a todas as dívidas, na mesma proporção, apesar
de ausência de previsão legal.

Perceba que há uma ordem legal quando o devedor e o credor não exerce este direito que a lei lhes concede.

O ato de imputação é um ato unilateral, razão pela qual é consagrado como uma regra especial de

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pagamento.

c) Do pagamento com sub-rogação

Sub-rogar-se é substituir uma coisa por outra. Coloca-se uma coisa no lugar da coisa primitiva. E esta nova
coisa terá os mesmo ônus e mesmos atributos.

Mas se fizer uma substituição não de uma coisa, mas de uma pessoa por outra, tendo esta os mesmos direitos
e as mesmas ações daquela pessoa antiga, haverá uma sub-rogação pessoal.

Na sub-rogação pessoal ativa, troca-se o credor. O que se percebe é que não há extinção da obrigação, só
sendo trocado o credor. Ou seja, uma terceira pessoal passa a ser o credor da relação jurídica obrigacional.

A sub-rogação opera-se, de pleno direito, em favor:

• do credor que paga a dívida do devedor comum;

• do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário, bem como do terceiro que efetiva o
pagamento para não ser privado de direito sobre imóvel;

• do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em parte.

O art. 349 afirma que a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias
que o credor primitivo tinha, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores.

A sub-rogação poderá ser classificada em:

• Sub-rogação legal

• Sub-rogação convencional

i. Sub-rogação legal

São as hipóteses de pagamento feitas por terceiro interessado, o qual irá se sub-rogar na posição do credor.

Ex.: o credor paga a dívida do devedor comum a outro credor. Roberta e João são credores de José de 100
mil reais. Roberta dá 50 mil reais a João, passando a ter o crédito de 100 mil reais de José. Neste caso, há sub-rogação
legal.

Também tem sub-rogação legal o adquirente de um imóvel hipotecado que paga ao credor hipotecário,
situação na qual ficará sub-rogado na posição de credor hipotecário.

Também será possível a sub-rogação do terceiro interessado que paga a dívida pela qual podia ser
responsabilizado.

ii. Sub-rogação convencional

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O pagamento efetivado por terceiro não interessado, via de regra, não gera sub-rogação, mas poderá gerar
se estiver previsto em contrato. Quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere
todos os seus direitos, há aqui uma sub-rogação convencional.

Quando uma terceira pessoa empresta ao devedor uma quantia necessária para que o devedor solva sua
dívida, mas com a condição de que deste que está emprestando (mutuante) ficar sub-rogado nos direitos do credor
satisfeito, também haverá sub-rogação convencional.

Segundo o CC, a sub-rogação é convencional:

• quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus direitos;

• quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia precisa para solver a dívida, sob a condição
expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor satisfeito. Nesta hipótese, aplica-se as
regras da cessão do crédito.

Em relação à sub-rogação legal, o sub-rogado pode exercer todos os direitos do credor até a soma do que
ele tiver desembolsado para desobrigar o devedor. Não há intuito de lucro, havendo caráter gratuito na sub-rogação
legal.

Veja, se o terceiro pagou 100 mil para se sub-rogar no direito de credor, só poderá cobrar do devedor 100
mil, e não 150 mil, que era a dívida originária, por exemplo.

O que se discute é saber se a sub-rogação legal pode justificar que o sub-rogado cobre valor a mais, não
havendo definição aos entendimentos.

Tartuce entende que não pode, pois, do contrário, a sub-rogação passaria a ter a mesma feição da cessão de
créditos, a qual tem natureza onerosa. Ele entende que a sub-rogação só pode ter natureza gratuita.

Existe outra corrente que entenda que possa ter caráter oneroso, com base no princípio da autonomia
privada (Maria Helena Diniz).

Relativamente ao credor originário, que só em parte for reembolsado, somente ele vai ter preferência em
relação ao sub-rogado parcial, na cobrança da dívida restante. Isto se os bens do devedor não forem suficientes para
saldar inteiramente o que dever ao credor originário e agora dever ao sub-rogado parcial.

É o teor do art. 351, o qual dispõe que o credor originário, só em parte reembolsado, terá preferência ao
sub-rogado, na cobrança da dívida restante, se os bens do devedor não chegarem para saldar inteiramente o que a
um e outro dever.

Ex.: João é credor de José de 100 mil reais. Roberta dá 50 mil reais a João, e irá se sub-rogar parcialmente.
Roberta poderá cobrar 50 mil reais de José nas mesmas condições que João, mas ele é credor originário. No entanto,
se José só tiver 50 mil reais para pagar, ele irá pagar João, visto que ele tem preferência em relação ao sub-rogado.

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d) Da dação em pagamento

Dação em pagamento é uma forma de pagamento indireto. Trata-se da hipótese em que o credor consente
em receber prestação diversa da que lhe é devida.

Há um acordo privado entre os sujeitos da relação obrigacional, em que pactuam a substituição do objeto
obrigacional por outro.

Ex.: João deve 100 mil reais a Pedro. Pedro dá um lote para João e resta quitada a dívida.

Houve aqui uma dação em pagamento.

O art. 358 diz que, se for título de crédito a coisa dada em pagamento, a transferência importará em cessão.

Ex.: João deve 100 mil reais a Roberta. Mas ele resolve dar um cheque de 100 mil que era de José. Neste
caso, se a coisa dada é título de crédito, haverá uma cessão.

Não existe identidade entre cessão de crédito e dação em pagamento. Na cessão de crédito, há uma
transmissão de uma posição contratual, ou seja, da obrigação. Na dação, há o pagamento indireto.

Neste caso, é preciso interpretar o art. 358, no sentido de que serão aplicadas as regras da cessão de crédito
por analogia.

Supondo que o terceiro, devedor do título, não tenha sido notificado, é necessário notificar, visto que é
necessário saber quem é o credor do título. Na cessão ele seria notificado, razão pela qual aqui na dação também o
será.

Se o credor for evicto da coisa recebida em pagamento, a obrigação primitiva será restabelecida e ficará
sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros de boa-fé.

Ex.: João deve um cavalo a Pedro, mas este aceitou um lote de Pedro. Feita a dação. No entanto, por conta
de uma ação, houve evicção lote, voltando João a dever um cavalo a Pedro. Ocorre que, no período, o cavalo havia
sido vendido para um terceiro de boa-fé. Neste caso, João deverá para Pedro um valor equivalente ao cavalo.

e) Da novação

A dação em pagamento não se confunde com novação real.

Na dação não há substituição de uma obrigação por outra. O que há é a substituição do objeto da prestação.

Na novação, a dívida anterior se extingue e nasce uma nova.

A novação também é uma forma de pagamento indireto, ocorrendo a substituição de uma obrigação por
outra obrigação nova.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O principal efeito da novação é a extinção de uma dívida primitiva, com todos os acessórios e garantias, com
o surgimento de uma dívida nova.

Pode ser que seja ressalvada, mantendo-se os acessórios e as garantias. Mas neste caso Tartuce afirma que
se houver esta previsão, significa que não houve a novação total, mas parcial, pois parte dela foi mantida.

Art. 364. A novação extingue os acessórios e garantias da dívida, sempre que não houver estipulação em
contrário. Não aproveitará, contudo, ao credor ressalvar o penhor, a hipoteca ou a anticrese, se os bens dados em
garantia pertencerem a terceiro que não foi parte na novação.

São elementos essenciais da novação:

• existência de obrigação anterior

• obrigação nova surgir

• intenção de novar (animus novandi)

Segundo o art. 360, dá-se a novação:

• quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior;

• quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o credor;

• quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao antigo, ficando o devedor quite com
este.

Segundo o art. 361, o ânimo de novar poderá ser expresso ou tácito, mas deverá ser inequívoco.

Não podem ser validadas por novação obrigações nulas ou obrigações extintas, visto que não se pode novar
o que não existe, e a obrigação já extinta inexiste. Também não se pode novar obrigação que não produz efeitos
jurídicos, e portanto obrigação nula.

Por outro lado, a obrigação anulável, que produz efeitos, poderá ser confirmada pela novação, sendo
portanto uma forma de convalidação.

Se a obrigação é nula, a novação é nula.

Supondo que a obrigação anterior era válida, e aí veio a novação, a qual seria nula. Neste caso, se a novação
é nula, vai prevalecer a obrigação antiga, visto que deverá retroagir.

A novação pode ser:

• novação objetiva (real): o devedor vai contrair com o credor uma nova dívida, mas o credor e devedor são
os mesmos.

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• novação subjetiva (pessoal): há alteração dos sujeitos da relação, podendo ser classificada em:

o novação subjetiva ativa: há substituição do credor. Para isso, a lei traz alguns requisitos: i)
consentimento do devedor perante o novo credor; ii) consinta o antigo credor; iii) consinta do novo
credor. Todos precisam consenti r!

o novação subjetiva passiva: há a extinção da dívida anterior por uma nova, mas com a substituição do
devedor. Aqui também há uma subclassificação:

▪ novação subjetiva passiva por expromissão: em que o terceiro assume a dívida do devedor
originário, substituindo o devedor originário, mas sem consentimento do devedor originário.
E por isso expromissão.

▪ novação subjetiva passiva por delegação: nesse caso, é feita com consentimento do devedor
originário, concordando em ser substituído.

o novação subjetiva mista: há alteração do objeto e a alteração dos sujeitos da relação jurídica. Ex.:
Roberta devia um cavalo a José. Agora, quem deve é João, e não mais um cavalo, e sim um boi. Houve
uma novação subjetiva e objetiva.

No caso da novação subjetiva passiva: altera-se o devedor. A obrigação anterior está extinta e se altera a
obrigação com um novo devedor. Caso este novo devedor seja insolvente, o credor não terá direito de regresso contra
o antigo devedor, visto que a dívida anterior está extinta. Isto, salvo se o credor demonstrar que o devedor originário
obteve esta novação passiva por má-fé.

Em outras palavras, se o novo devedor for insolvente, não tem o credor, que o aceitou, ação regressiva contra
o primeiro, salvo se este obteve por má-fé a substituição (art. 363).

Se não houver o consentimento do fiador, e for feita uma novação, estará ele exonerado, visto que da nova
ele não participou.

O art. 365 vai dizer que ocorrendo a novação entre o credor e um dos devedores solidários, somente sobre
os bens do que contrair a nova obrigação vão subsistir as preferências e garantias do crédito novado. Ou seja, os
outros devedores solidários ficam por esse fato exonerados.

Isto é, se os devedores solidários da obrigação primitiva estão exonerados, visto que aquela dívida se
extinguiu.

Cabe ressaltar que o STJ tem analisado o instituto da novação com as lentes do princípio da função social do
contrato. Esta forma de enxergar a novação fica evidenciada pela Súmula 286 do STJ, que diz que a negociação do
contrato bancário, ou a confissão da dívida, não impede a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades
dos contratos anteriores.

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f) Da compensação

Compensação ocorre quando duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, situação
na qual as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.

O art. 369 estabelece que compensação efetua-se quando houver:

• dívidas líquidas

• dívidas vencidas e

• coisas fungíveis

O art. 370 diz que, embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis, elas não poderão ser compensadas,
se for verificado que elas diferem na qualidade, quando a qualidade estiver especificada no contrato.

Por exemplo, se apesar de serem sacas de café, um ser de tipo exportação e o outro não, haverá uma
diferença de qualidade, razão pela qual não se poderá fazer compensação legal.

O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever. Todavia, o fiador pode compensar
sua dívida com a de seu credor ao afiançado. Está dizendo que o fiador pode, quando cobrado pelo credor, dizer que
o credor deve 10 mil reais ao afiançado, devendo haver a compensação primeiramente.

Os prazos de favor (prazos graciosamente concedidos pelo credor), embora consagrados pelo uso geral, não
obstam a compensação. Ou seja, se o devedor souber que o credor está deve 10 mil, mas está devendo a ele 20 mil,
mas o devedor apenas quer cobrar os 10 mil, sem que seja compensado dos 20 mil. Neste caso, o devedor pede prazo
de favor, período no qual cobrará os 10 mil do credor. Quando o credor for dizer que o devedor ainda deve 10 para
ele, não poderá alegar que o prazo de favor prolongou o vencimento, situação na qual ocorreria a prorrogação.

Ou seja, prazos de favor não obstam a compensação.

A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, porém existem algumas exceções a esta regra:

• não haverá compensação se a dívida provier de esbulho, furto ou roubo não será possível a compensação.

• não haverá compensação se a dívida se originar de comodato, depósito ou alimentos;

• não haverá compensação se a dívida for de coisa não suscetível de penhora.

Portanto, a dívida impenhorável também é incompensável.

O art. 375 traz a possibilidade de cláusula excludente de compensação. Ou seja, diante da autonomia privada
e liberdade contratual, permite-se que as partes consagrem a cláusula de exclusão a compensação. Dessa forma, não
haverá compensação quando as partes, por mútuo acordo, a excluírem, ou no caso de renúncia prévia de uma
delas. Veja então que também admite-se a renúncia à compensação.

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O art. 376 diz que, obrigando-se por terceiro uma pessoa, não pode compensar essa dívida com a que o
credor dele lhe dever.

O devedor que, notificado, nada opuser à cessão que o credor faz a terceiros dos seus direitos, este devedor
não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da cessão teria podido opor ao cedente.

A lei diz que, quando é feita a cessão, o cessionário receberá o crédito, passando a ser credor do cedido.
Depois de cedido, e não tendo se oposto, não poderá alegar que teria à época crédito contra o cedente, pois não
havia se manifestado em tempo.

Cabe ressaltar que, se a cessão lhe não tiver sido notificada, poderá opor ao cessionário compensação do
crédito que antes tinha contra o cedente.

O art. 379 diz que, se a mesma pessoa for obrigada por várias dívidas compensáveis, serão observadas, no
compensá-las, as regras estabelecidas quanto à imputação do pagamento. Ou seja, se há várias dívidas
compensáveis, o devedor vai dizer qual é a dívida que está compensando. Caso não o faça, quem irá dizer será o
próprio credor.

Caso ninguém se valha dessa faculdade, quem vai decidir será a lei:

• havendo capital e juros, o pagamento será feito primeiro em relação aos juros.

• havendo duas dívidas, será imputado o pagamento à dívida mais antiga.

• havendo as dívidas com mesmo vencimento, será imputada à dívida mais onerosa.

• não havendo dívida mais onerosa, a imputação será feita a todas as dívidas, na mesma proporção, apesar
de ausência de previsão legal.

Por fim, não se admite a compensação em prejuízo de direito de terceiro. O devedor que se torne credor
do seu credor, depois de penhorado o crédito deste, não pode opor ao exequente a compensação, de que contra o
próprio credor disporia.

g) Da confusão

Confusão está presente quando há na mesma pessoa credor e devedor. Isto pode ocorrer tanto por ato inter
vivos como por ato causa mortis.

A confusão operada na pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação até a concorrência
da respectiva parte no crédito, ou na dívida, subsistindo quanto ao mais a solidariedade.

Confusão ocorre quando o credor e o devedor são a mesma pessoa, situação na qual extinguiu a obrigação.

No caso de causa mortis, a confusão poderá ocorrer quando o filho deve ao pai, mas, tendo aquele morrido,
o filho recebeu a herança, extinguindo a dívida.
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No caso do credor solidário, João deve com outros 3 indivíduos 100 mil reais ao pai. João era o único herdeiro.
Em relação a ele, houve a confusão. Portanto, 25 mil reais houve confusão, faltando 75 mil reais, situação na qual
persistirá a solidariedade, passando João ser o credor do crédito.

Cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios, a obrigação anterior.

h) Da remissão das dívidas

A remissão é o perdão.

A remissão é o direito exclusivo do credor de exonerar o devedor.

O art. 385 estabelece que a remissão da dívida é um negócio jurídico bilateral, ou seja, o perdão deverá ser
aceito pelo devedor, situação na qual, se aceita, extinguirá a obrigação, mas sem prejuízo de terceiro.

A remissão só poderá ocorrer se não houver prejuízo a terceiros.

A remissão concedida a um dos codevedores extingue a dívida na parte a ele correspondente, mas não
atinge a solidariedade em relação aos demais, de modo que não possa cobrar o débito sem dedução da parte
remitida.

Ex.: João é credor de Pedro e mais 4, no valor de 100 mil reais. João perdoa Pedro, mas ainda será credor de
80 mil reais, mantendo a solidariedade em relação aos demais.

A devolução voluntária do título da obrigação, quando por escrito particular, prova desoneração do devedor
e seus coobrigados, se o credor for capaz de alienar, e o devedor capaz de adquirir.

O perdão poderá ser expresso ou tácito.

Atente-se que, se houver a entrega do negócio empenhado, não haverá o perdão da dívida, mas tão somente
a exoneração da garantia que existia em relação àquela dívida. Ou seja, a restituição voluntária do objeto empenhado
prova a renúncia do credor à garantia real, não a extinção da dívida.

Não confundir renúncia com remissão, pois renúncia é gênero e remissão é espécie. Na renúncia, é possível
recair sobre diversos direitos pessoais, inclusive é um ato unilateral. A remissão é perdão, ou seja, é ato bilateral, só
podendo se dar em relação a direitos creditórios.

2. Transmissão das obrigações

I. Introdução

Transmitir é passar para frente.

Quando há uma transmissão há uma cessão. E com isso é possível extrair um conceito importante de que é
o conceito de cessão.

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Cessão é a transferência, a título oneroso ou gratuito, de uma posição na relação jurídica obrigacional.

O direito brasileiro admite três formas de cessão:

• cessão do crédito

• cessão do débito

• cessão do contrato

II. Cessão de crédito

A cessão de crédito pode ser conceituada como um negócio jurídico bilateral, gratuito ou oneroso, através
do qual o credor transfere a outrem, totalmente ou parcialmente, a sua posição na relação obrigacional.

Ou seja, o credor passa para outra pessoa a posição de credor.

Há um credor primitivo que cede este crédito, denominado de cedente, bem como uma pessoa que passa a
ser credora, denominada cessionário. Há ainda o devedor, que é denominado de cedido.

Com a cessão, são transferidos todos os elementos da obrigação, tanto os acessórios como as garantias,
visto que a obrigação é a mesma, pois há mudança dos sujeitos que compõem a obrigação. No entanto, os acessórios
poderão não ser abrangidos, caso haja disposição em contrário.

Cabe ressaltar que o cessionário de crédito hipotecário tem o direito de fazer averbar a cessão no registro
do imóvel.

A verdade é que a cessão de crédito independe da anuência do devedor, mas ele deve ficar sabendo que
houve esta cessão.

O art. 286 vai dizer: o credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a
lei, ou se não houver vedação no contrato (convenção) com o devedor.

Esta cláusula proibitiva da cessão, que poderá estar prevista no contrato, não será oponível ao cessionário
de boa-fé, se ela não estiver escrita no contrato (instrumento da obrigação).

Em regra, a cessão tem eficácia inter partes, e não exige sequer que seja escrita, ou seja, poderá ser verbal.

Mas para ter eficácia perante terceiros, será necessário que seja formulada por um instrumento escrito, já
que a cessão é negócio jurídico bilateral. Ou seja, é ineficaz, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se
não celebrar-se mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do § 1º do art.
654.

Independentemente do conhecimento da cessão pelo devedor, pode o cessionário exercer os atos


conservatórios do direito cedido (art. 293).

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Para a cessão ser válida, é desnecessária a anuência do devedor. Mas o art. 290 dispõe que a cessão não
tem eficácia em relação aodevedor se ele não for notificado. Todavia, considera-se notificado o devedor que, em
escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.

O devedor pode opor ao cessionário (que passou a ter a condição de credor) as exceções que ele tinha em
face do antigo credor ao novo credor, bem como as exceções que, no momento em que veio a ter conhecimento
da cessão, tinha contra o cedente. Isso significa que, quando o cedido for notificado da cessão, poderá alegar uma
cessão em face do cedente.

A cessão de crédito pode ser onerosa (pode envolver lucro), situação na qual o cedente ficará responsável
pela existência do crédito ao tempo que cedeu (pro soluto).

Sendo a título gratuito, o cedente também terá responsabilidade, caso tenha procedido de má-fé.

Ex.: contrato de faturização (factoring) é exemplo de cessão de crédito onerosa. Há um cheque para receber
10 mil reais daqui a 30 dias, mas o sujeito busca a factoring para obter 9 mil reais hoje. Aqui houve uma cessão de
crédito onerosa. O cedente só responderá pela existência do crédito e não pela solvência. O credor originário não
responde pela solvência, mas apenas pela existência.

A cessão de crédito, em regra, é pro soluto, e não pro solvendo. Todavia, é possível existir esta previsão
contratual, no sentido de que a cessão é pro solvendo, ou seja, o cedente terá responsabilidade pelo pagamento do
crédito. Neste caso, a cessão será pro solvendo. Nesta hipótese, o cedente não responderá por mais do que recebeu
com os seus respectivos juros, mas tem de ressarcir as despesas da cessão e as que o cessionário houver feito com
a cobrança.

Supondo que no contrato com a factoring, Roberta tenha recebido 9 mil reais pela cessão do crédito de 10
mil reais. Daqui a 30 dias, se a factoring não receber os 10 mil reais, Roberta deverá pagar os 9 mil, mais os respectivos
juros durante este intervalo de tempo à factoring. Trata-se de cessão pro solvendo.

O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor que tiver conhecimento da
penhora. Todavia, o devedor que o pagar, não tendo notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o
credor os direitos de terceiro.

Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento da cessão, paga ao credor primitivo, ou que, no
caso de mais de uma cessão notificada, paga ao cessionário que lhe apresenta, com o título de cessão, o da obrigação
cedida; quando o crédito constar de escritura pública, prevalecerá a prioridade da notificação.

Segundo o art. 291, ocorrendo várias cessões do mesmo crédito, prevalece a que se completar com a
tradição do título do crédito cedido.

III. Cessão de débito (assunção de dívida)

Na cessão de débito, haverá um novo devedor.


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Trata-se de um negócio jurídico bilateral pelo qual um devedor, com anuência do credor, transfere a um
terceiro a posição de sujeito passivo da relação obrigacional.

O art. 299 estabelece que é facultado a terceiro assumir a obrigação do devedor, desde que haja o
consentimento expresso do credor, ficando exonerado o devedor primitivo, salvo se, ao tempo da assunção, o
devedor derivado fosse insolvente e o credor o ignorava. Veja, se ficar demonstrado que, ao tempo da assunção, o
devedor que ingressava já era insolvente, e o credor desconhecia esta situação.

Qualquer das partes pode assinar prazo ao credor para que se manifeste, consentindo na assunção da dívida,
situação na qual será interpretado o silencia como recusa. Ou seja, quem cala não consente. É preciso que o credor
concorde com a assunção da dívida.

Na assunção de dívida, há o antigo devedor (cedente), o novo devedor (cessionário) e o credor (cedido).

A cessão de débito pode ser classificada de duas formas:

• Assunção por expromissão: uma terceira pessoa assume espontaneamente o débito da outra, e o devedor
principal nem toma parte dessa situação. O devedor originário não anui. Esta assunção de dívida pode ser
sub-classificada em liberatória e cumulativa:

o Assunção por expromissão liberatória: o devedor primitivo se exonera, ingressando um novo


devedor, liberando o devedor antigo.

o Assunção por expromissão cumulativa: o expromitente entra como um novo devedor, mas ao lado
do devedor primitivo. O devedor primitivo não é exonerado nessa circunstância.

• Assunção de delegação: o devedor originário participa dessa relação, transferindo débito para terceiro,
com a anuência do credor. Esta é a mais comum de ocorrer.

O art. 300 consagra como regra geral que devem ser consideradas extintas todas as garantias especiais
dadas ao credor originário, salvo com consentimento expresso do devedor primitivo.

Isso significa que as garantias especiais dada pelo credor primitivo, serão consideradas extintas, pois ele está
exonerado. O novo devedor passará a responder, salvo se houver consentimento expresso do devedor primitivo, no
sentido de que as garantias por ele prestadas continuam valendo.

Sendo anulada a assunção de dívida, restaura-se o débito. E sendo ele restaurado, serão restauradas
também as suas garantias, salvo garantias prestadas a terceiros, com exceção do caso em que terceiros conheciam o
vício da assunção (art. 301).

Ou seja, a assunção de dívida é negócio jurídico, podendo ser anulado. Se for anulado, terá efeitos
retroativos, motivo pelo qual o devedor primitivo, que outrora estava exonerado, não mais está. Há o retorno ao
status anterior, devendo voltar tudo ao normal, inclusive às garantias especiais.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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No que toca ao terceiro, esta garantia que tinha prestado não volta, salvo se o terceiro tivesse conhecimento
desse vício anteriormente, situação na qual também voltará como garantidor.

Na assunção de dívida, não poderá o novo devedor opor ao credor as exceções pessoais que competiam ao
devedor primitivo. Ou seja, o novo devedor não poderá opor exceções pessoais pertencentes ao devedor primitivo.

Ademias, o adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento do crédito garantido. Se
o credor, notificado, não impugnar em 30 dias a transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.

IV. Cessão de contratos

A cessão contratual não está regulamentada em lei, mas ainda assim é válida. Trata-se de um negócio jurídico
atípico.

É a transferência da inteira posição ativa ou passiva na relação contratual. O que há é a cessão da posição
contratual.

Na maioria das vezes, nos contratos, as partes são mutuamente credores e devedores de obrigações. Trata-
se de uma relação complexa, já que se trata de uma cessão de um complexo de direitos e obrigações.

Para que haja a cessão contratual, é indispensável que haja o consentimento do outro contratante.

Isso porque o contrato faz lei entre as partes, obrigando as partes que contrataram. O princípio que orienta
os contratos é o princípio da relatividade.

Ex.: no mandato, o sujeito faz um substabelecimento, situação na qual cede a posição de mandatário. Ou
seja, há uma cessão contratual.

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Eduardo Defaveri

Direito das Obrigações

1. Regras especiais de pagamento e formas de pagamento indireto

a) Do pagamento em consignação

Conceitua-se como um depósito feito pelo devedor da coisa devida, a fim de que o devedor
se libere de uma obrigação, podendo ocorrer na esfera judicial ou na esfera extrajudicial, neste
caso o dinheiro é depositado em estabelecimento bancário oficial.

O pagamento em consignação é um meio indireto de o devedor exonerar-se do liame


obrigacional que vincula o devedor ao credor.

Está sempre relacionada a uma obrigação de dar, não podendo estar relacionada a uma
obrigação de fazer ou não fazer, visto que é necessário depositar a coisa.

O art. 335 estabelece um rol de situações em que a consignação poderá acontecer:

b) poderá haver consignação em pagamento se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar
receber o pagamento, ou se recursar a dar quitação;

• poderá haver consignação em pagamento se o credor não for, nem mandar representante para
receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos (obrigação quesível);

• poderá haver consignação em pagamento se o credor for incapaz de receber, for desconhecido,
declarado ausente, ou se o credor residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil;

• poderá haver consignação em pagamento se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente
receber o objeto do pagamento;

• poderá haver consignação em pagamento se pender litígio sobre o objeto do pagamento.

Para que a consignação em pagamento seja válida e eficaz, é necessário que o devedor
observe todos os requisitos do pagamento direto, como pessoas, objeto, modo e tempo do
pagamento e todos os requisitos sem os quais não é válido o pagamento.

Promovida a ação de consignação em pagamento, será citado o credor para que apresente
contestação. Na contestação, o credor poderá alegar:

• não houve recusa do pagamento

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• que houve justa recusa

• que o depósito não foi efetuado no prazo e no lugar do pagamento

• que o depósito não foi integral, situação na qual deverá indicar o valor

O art. 546 do NCPC estabelece que, julgado procedente o pedido, o juiz declarará extinta
a obrigação e condenará o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios. É o princípio
da causalidade.

O CC, no art. 339, diz que, julgado procedente o depósito, o devedor já não poderá levantar
o objeto da consignação, eis que o levantamento da quantia consignada só será possível se os
outros devedores concordarem e os fiadores concordarem. Tanto é que o art. 340 do CC diz que
o credor que, depois de contestar a lide ou aceitar o depósito, aquiescer no levantamento,
perderá a preferência e a garantia que lhe competiam com respeito à coisa consignada, ficando
para logo desobrigados os codevedores e fiadores que não tenham anuído.

Se o credor anuiu, a despeito da concordância dos fiadores, eles “lavaram as mãos”, não
respondendo mais em relação àquela dívida.

O art. 342 diz que, se houver a obrigação de dar coisa incerta, é preciso que se faça a
escolha (concentração). Se esta escolha couber ao credor, será ele citado para promover a
concentração, sob pena de não o fazendo perder o direito de escolha, e ser depositada a coisa à
escolha do devedor.

O devedor de uma obrigação litigiosa se exonerará através de consignação. Supondo que


o devedor pague a um dos pretendidos credores, tendo o conhecimento do litígio. Neste caso, o
devedor de obrigação litigiosa assumirá o risco do pagamento.

Se ele achou que João venceria e João vencer, não há problema. O problema surge se Pedro
pagou a João, mas quem venceu foi José. Então deverá pagar a José, visto que assumiu o risco, a
despeito do litígio que pesava sob o objeto.

Se a dívida vencer, pendendo litígio entre os credores, pode qualquer dos credores
requerer a consignação. Veja, via de regra, a consignação é requerida pelo devedor, mas no caso
do art. 345 é o credor que pede a consignação (art. 345).

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Se houver prestações sucessivas e houver consignação de uma delas, o devedor pode


continuar depositando as que forem se vencendo no curso do processo, sem maiores
formalidades.

Deverá fazer este depósito no prazo de 5 dias, contados da data do respectivo vencimento
de cada uma das prestações em que forem se vencendo no curso do processo.

O §1º do art. 539 do NCPC estabelece que em se tratando de obrigação em dinheiro,


poderá o valor ser depositado em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no
lugar do pagamento, cientificando-se o credor por carta com aviso de recebimento, dando o
prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa.

Decorrido o prazo de 10 dias, contado do retorno do aviso de recebimento, sem a


manifestação de recusa, será liberado o devedor da obrigação, ficando à disposição do credor a
quantia depositada.

Mas se houver recusa, poderá ser proposta, dentro de 1 (um) mês, a ação de consignação,
promovida pelo devedor, instruindo a inicial com o comprovante do depósito e comprovante da
recusa pelo credor.

Não propondo a ação, o depósito ficará sem efeito, podendo o devedor levantar este
depósito.

b) Da imputação do pagamento

Imputar é apontar para alguém ou para algo.

Uma pessoa que está obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só
credor, tem a pessoa o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem líquidos
e vencidos.

Ex.: Roberta deve a João 50 mil reais de um cheque, outro de 50 mil reais e mais um de 50
mil reais. Cada um desses cheques venceu em 3 meses, 2 meses e 1 mês, respectivamente.
Roberta deposita 50 mil reais.

A imputação é dizer qual é a dívida que está sendo paga. Esta escolha geralmente cabe ao
devedor, sendo possível ao contrato estabelecer que esta escolha caiba ao credor.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Caso o devedor não fazer qualquer declaração, transfere-se o direito de escolha ao credor.

Caso não haja manifestação do credor, quem fará a imputação é a própria lei.

A ordem de imputação é a seguinte:

• havendo capital e juros, o pagamento será feito primeiro em relação aos juros.

• havendo duas dívidas, será imputado o pagamento à dívida mais antiga.

• havendo as dívidas com mesmo vencimento, será imputada à dívida mais onerosa.

• não havendo dívida mais onerosa, a imputação será feita a todas as dívidas, na mesma
proporção, apesar de ausência de previsão legal.

Perceba que há uma ordem legal quando o devedor e o credor não exerce este direito que
a lei lhes concede.

O ato de imputação é um ato unilateral, razão pela qual é consagrado como uma regra
especial de pagamento.

c) Do pagamento com sub-rogação

Sub-rogar-se é substituir uma coisa por outra. Coloca-se uma coisa no lugar da coisa
primitiva. E esta nova coisa terá os mesmo ônus e mesmos atributos.

Mas se fizer uma substituição não de uma coisa, mas de uma pessoa por outra, tendo esta
os mesmos direitos e as mesmas ações daquela pessoa antiga, haverá uma sub-rogação pessoal.

Na sub-rogação pessoal ativa, troca-se o credor. O que se percebe é que não há extinção
da obrigação, só sendo trocado o credor. Ou seja, uma terceira pessoal passa a ser o credor da
relação jurídica obrigacional.

A sub-rogação opera-se, de pleno direito, em favor:

• do credor que paga a dívida do devedor comum;

• do adquirente do imóvel hipotecado, que paga a credor hipotecário, bem como do terceiro que
efetiva o pagamento para não ser privado de direito sobre imóvel;

• do terceiro interessado, que paga a dívida pela qual era ou podia ser obrigado, no todo ou em

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

parte.

O art. 349 afirma que a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações,
privilégios e garantias que o credor primitivo tinha, em relação à dívida, contra o devedor principal
e os fiadores.

A sub-rogação poderá ser classificada em:

• Sub-rogação legal

• Sub-rogação convencional

i. Sub-rogação legal

São as hipóteses de pagamento feitas por terceiro interessado, o qual irá se sub-rogar na
posição do credor.

Ex.: o credor paga a dívida do devedor comum a outro credor. Roberta e João são credores
de José de 100 mil reais. Roberta dá 50 mil reais a João, passando a ter o crédito de 100 mil reais
de José. Neste caso, há sub-rogação legal.

Também tem sub-rogação legal o adquirente de um imóvel hipotecado que paga ao credor
hipotecário, situação na qual ficará sub-rogado na posição de credor hipotecário.

Também será possível a sub-rogação do terceiro interessado que paga a dívida pela qual
podia ser responsabilizado.

ii. Sub-rogação convencional

O pagamento efetivado por terceiro não interessado, via de regra, não gera sub-rogação,
mas poderá gerar se estiver previsto em contrato. Quando o credor recebe o pagamento de
terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus direitos, há aqui uma sub-rogação
convencional.

Quando uma terceira pessoa empresta ao devedor uma quantia necessária para que o
devedor solva sua dívida, mas com a condição de que deste que está emprestando (mutuante)
ficar sub-rogado nos direitos do credor satisfeito, também haverá sub-rogação convencional.

Segundo o CC, a sub-rogação é convencional:


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• quando o credor recebe o pagamento de terceiro e expressamente lhe transfere todos os seus
direitos;

• quando terceira pessoa empresta ao devedor a quantia precisa para solver a dívida, sob a
condição expressa de ficar o mutuante sub-rogado nos direitos do credor satisfeito. Nesta
hipótese, aplica-se as regras da cessão do crédito.

Em relação à sub-rogação legal, o sub-rogado pode exercer todos os direitos do credor até
a soma do que ele tiver desembolsado para desobrigar o devedor. Não há intuito de lucro,
havendo caráter gratuito na sub-rogação legal.

Veja, se o terceiro pagou 100 mil para se sub-rogar no direito de credor, só poderá cobrar
do devedor 100 mil, e não 150 mil, que era a dívida originária, por exemplo.

O que se discute é saber se a sub-rogação legal pode justificar que o sub-rogado cobre
valor a mais, não havendo definição aos entendimentos.

Tartuce entende que não pode, pois, do contrário, a sub-rogação passaria a ter a mesma
feição da cessão de créditos, a qual tem natureza onerosa. Ele entende que a sub-rogação só pode
ter natureza gratuita.

Existe outra corrente que entenda que possa ter caráter oneroso, com base no princípio
da autonomia privada (Maria Helena Diniz).

Relativamente ao credor originário, que só em parte for reembolsado, somente ele vai ter
preferência em relação ao sub-rogado parcial, na cobrança da dívida restante. Isto se os bens do
devedor não forem suficientes para saldar inteiramente o que dever ao credor originário e agora
dever ao sub-rogado parcial.

É o teor do art. 351, o qual dispõe que o credor originário, só em parte reembolsado, terá
preferência ao sub-rogado, na cobrança da dívida restante, se os bens do devedor não chegarem
para saldar inteiramente o que a um e outro dever.

Ex.: João é credor de José de 100 mil reais. Roberta dá 50 mil reais a João, e irá se sub-
rogar parcialmente. Roberta poderá cobrar 50 mil reais de José nas mesmas condições que João,
mas ele é credor originário. No entanto, se José só tiver 50 mil reais para pagar, ele irá pagar João,
visto que ele tem preferência em relação ao sub-rogado.
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d) Da dação em pagamento

Dação em pagamento é uma forma de pagamento indireto. Trata-se da hipótese em que o


credor consente em receber prestação diversa da que lhe é devida.

Há um acordo privado entre os sujeitos da relação obrigacional, em que pactuam a


substituição do objeto obrigacional por outro.

Ex.: João deve 100 mil reais a Pedro. Pedro dá um lote para João e resta quitada a dívida.

Houve aqui uma dação em pagamento.

O art. 358 diz que, se for título de crédito a coisa dada em pagamento, a transferência
importará em cessão.

Ex.: João deve 100 mil reais a Roberta. Mas ele resolve dar um cheque de 100 mil que era
de José. Neste caso, se a coisa dada é título de crédito, haverá uma cessão.

Não existe identidade entre cessão de crédito e dação em pagamento. Na cessão de


crédito, há uma transmissão de uma posição contratual, ou seja, da obrigação. Na dação, há o
pagamento indireto.

Neste caso, é preciso interpretar o art. 358, no sentido de que serão aplicadas as regras da
cessão de crédito por analogia.

Supondo que o terceiro, devedor do título, não tenha sido notificado, é necessário
notificar, visto que é necessário saber quem é o credor do título. Na cessão ele seria notificado,
razão pela qual aqui na dação também o será.

Se o credor for evicto da coisa recebida em pagamento, a obrigação primitiva será


restabelecida e ficará sem efeito a quitação dada, ressalvados os direitos de terceiros de boa-fé.

Ex.: João deve um cavalo a Pedro, mas este aceitou um lote de Pedro. Feita a dação. No
entanto, por conta de uma ação, houve evicção lote, voltando João a dever um cavalo a Pedro.
Ocorre que, no período, o cavalo havia sido vendido para um terceiro de boa-fé. Neste caso, João
deverá para Pedro um valor equivalente ao cavalo.

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e) Da novação

A dação em pagamento não se confunde com novação real.

Na dação não há substituição de uma obrigação por outra. O que há é a substituição do


objeto da prestação.

Na novação, a dívida anterior se extingue e nasce uma nova.

A novação também é uma forma de pagamento indireto, ocorrendo a substituição de uma


obrigação por outra obrigação nova.

O principal efeito da novação é a extinção de uma dívida primitiva, com todos os acessórios
e garantias, com o surgimento de uma dívida nova.

Pode ser que seja ressalvada, mantendo-se os acessórios e as garantias. Mas neste caso
Tartuce afirma que se houver esta previsão, significa que não houve a novação total, mas parcial,
pois parte dela foi mantida.

Art. 364. A novação extingue os acessórios e garantias da dívida, sempre que não houver
estipulação em contrário. Não aproveitará, contudo, ao credor ressalvar o penhor, a hipoteca ou
a anticrese, se os bens dados em garantia pertencerem a terceiro que não foi parte na novação.

São elementos essenciais da novação:

• existência de obrigação anterior

• obrigação nova surgir

• intenção de novar (animus novandi)

Segundo o art. 360, dá-se a novação:

• quando o devedor contrai com o credor nova dívida para extinguir e substituir a anterior;

• quando novo devedor sucede ao antigo, ficando este quite com o credor;

• quando, em virtude de obrigação nova, outro credor é substituído ao antigo, ficando o devedor
quite com este.

Segundo o art. 361, o ânimo de novar poderá ser expresso ou tácito, mas deverá ser

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inequívoco.

Não podem ser validadas por novação obrigações nulas ou obrigações extintas, visto que
não se pode novar o que não existe, e a obrigação já extinta inexiste. Também não se pode novar
obrigação que não produz efeitos jurídicos, e portanto obrigação nula.

Por outro lado, a obrigação anulável, que produz efeitos, poderá ser confirmada pela
novação, sendo portanto uma forma de convalidação.

Se a obrigação é nula, a novação é nula.

Supondo que a obrigação anterior era válida, e aí veio a novação, a qual seria nula. Neste
caso, se a novação é nula, vai prevalecer a obrigação antiga, visto que deverá retroagir.

A novação pode ser:

• novação objetiva (real): o devedor vai contrair com o credor uma nova dívida, mas o credor e
devedor são os mesmos.

• novação subjetiva (pessoal): há alteração dos sujeitos da relação, podendo ser classificada em:

o novação subjetiva ativa: há substituição do credor. Para isso, a lei traz alguns requisitos: i)
consentimento do devedor perante o novo credor; ii) consinta o antigo credor; iii) consinta
do novo credor. Todos precisam consenti r!

o novação subjetiva passiva: há a extinção da dívida anterior por uma nova, mas com a
substituição do devedor. Aqui também há uma subclassificação:

▪ novação subjetiva passiva por expromissão: em que o terceiro assume a dívida do


devedor originário, substituindo o devedor originário, mas sem consentimento do
devedor originário. E por isso expromissão.

▪ novação subjetiva passiva por delegação: nesse caso, é feita com consentimento do
devedor originário, concordando em ser substituído.

o novação subjetiva mista: há alteração do objeto e a alteração dos sujeitos da relação


jurídica. Ex.: Roberta devia um cavalo a José. Agora, quem deve é João, e não mais um cavalo,
e sim um boi. Houve uma novação subjetiva e objetiva.

No caso da novação subjetiva passiva: altera-se o devedor. A obrigação anterior está

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extinta e se altera a obrigação com um novo devedor. Caso este novo devedor seja insolvente, o
credor não terá direito de regresso contra o antigo devedor, visto que a dívida anterior está
extinta. Isto, salvo se o credor demonstrar que o devedor originário obteve esta novação passiva
por má-fé.

Em outras palavras, se o novo devedor for insolvente, não tem o credor, que o aceitou,
ação regressiva contra o primeiro, salvo se este obteve por má-fé a substituição (art. 363).

Se não houver o consentimento do fiador, e for feita uma novação, estará ele exonerado,
visto que da nova ele não participou.

O art. 365 vai dizer que ocorrendo a novação entre o credor e um dos devedores solidários,
somente sobre os bens do que contrair a nova obrigação vão subsistir as preferências e garantias
do crédito novado. Ou seja, os outros devedores solidários ficam por esse fato exonerados.

Isto é, se os devedores solidários da obrigação primitiva estão exonerados, visto que


aquela dívida se extinguiu.

Cabe ressaltar que o STJ tem analisado o instituto da novação com as lentes do princípio
da função social do contrato. Esta forma de enxergar a novação fica evidenciada pela Súmula 286
do STJ, que diz que a negociação do contrato bancário, ou a confissão da dívida, não impede a
possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades dos contratos anteriores.

f) Da compensação

Compensação ocorre quando duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma
da outra, situação na qual as duas obrigações extinguem-se, até onde se compensarem.

O art. 369 estabelece que compensação efetua-se quando houver:

• dívidas líquidas

• dívidas vencidas e

• coisas fungíveis

O art. 370 diz que, embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis, elas não poderão
ser compensadas, se for verificado que elas diferem na qualidade, quando a qualidade estiver

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especificada no contrato.

Por exemplo, se apesar de serem sacas de café, um ser de tipo exportação e o outro não,
haverá uma diferença de qualidade, razão pela qual não se poderá fazer compensação legal.

O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever. Todavia, o fiador
pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado. Está dizendo que o fiador pode,
quando cobrado pelo credor, dizer que o credor deve 10 mil reais ao afiançado, devendo haver a
compensação primeiramente.

Os prazos de favor (prazos graciosamente concedidos pelo credor), embora consagrados


pelo uso geral, não obstam a compensação. Ou seja, se o devedor souber que o credor está deve
10 mil, mas está devendo a ele 20 mil, mas o devedor apenas quer cobrar os 10 mil, sem que seja
compensado dos 20 mil. Neste caso, o devedor pede prazo de favor, período no qual cobrará os
10 mil do credor. Quando o credor for dizer que o devedor ainda deve 10 para ele, não poderá
alegar que o prazo de favor prolongou o vencimento, situação na qual ocorreria a prorrogação.

Ou seja, prazos de favor não obstam a compensação.

A diferença de causa nas dívidas não impede a compensação, porém existem algumas
exceções a esta regra:

• não haverá compensação se a dívida provier de esbulho, furto ou roubo não será possível a
compensação.

• não haverá compensação se a dívida se originar de comodato, depósito ou alimentos;

• não haverá compensação se a dívida for de coisa não suscetível de penhora.

Portanto, a dívida impenhorável também é incompensável.

O art. 375 traz a possibilidade de cláusula excludente de compensação. Ou seja, diante da


autonomia privada e liberdade contratual, permite-se que as partes consagrem a cláusula de
exclusão a compensação. Dessa forma, não haverá compensação quando as partes, por mútuo
acordo, a excluírem, ou no caso de renúncia prévia de uma delas. Veja então que também
admite-se a renúncia à compensação.

O art. 376 diz que, obrigando-se por terceiro uma pessoa, não pode compensar essa
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dívida com a que o credor dele lhe dever.

O devedor que, notificado, nada opuser à cessão que o credor faz a terceiros dos seus
direitos, este devedor não pode opor ao cessionário a compensação, que antes da cessão teria
podido opor ao cedente.

A lei diz que, quando é feita a cessão, o cessionário receberá o crédito, passando a ser
credor do cedido. Depois de cedido, e não tendo se oposto, não poderá alegar que teria à época
crédito contra o cedente, pois não havia se manifestado em tempo.

Cabe ressaltar que, se a cessão lhe não tiver sido notificada, poderá opor ao cessionário
compensação do crédito que antes tinha contra o cedente.

O art. 379 diz que, se a mesma pessoa for obrigada por várias dívidas compensáveis,
serão observadas, no compensá-las, as regras estabelecidas quanto à imputação do pagamento.
Ou seja, se há várias dívidas compensáveis, o devedor vai dizer qual é a dívida que está
compensando. Caso não o faça, quem irá dizer será o próprio credor.

Caso ninguém se valha dessa faculdade, quem vai decidir será a lei:

• havendo capital e juros, o pagamento será feito primeiro em relação aos juros.

• havendo duas dívidas, será imputado o pagamento à dívida mais antiga.

• havendo as dívidas com mesmo vencimento, será imputada à dívida mais onerosa.

• não havendo dívida mais onerosa, a imputação será feita a todas as dívidas, na mesma
proporção, apesar de ausência de previsão legal.

Por fim, não se admite a compensação em prejuízo de direito de terceiro. O devedor que
se torne credor do seu credor, depois de penhorado o crédito deste, não pode opor ao exequente
a compensação, de que contra o próprio credor disporia.

g) Da confusão

Confusão está presente quando há na mesma pessoa credor e devedor. Isto pode ocorrer
tanto por ato inter vivos como por ato causa mortis.

A confusão operada na pessoa do credor ou devedor solidário só extingue a obrigação

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até a concorrência da respectiva parte no crédito, ou na dívida, subsistindo quanto ao mais a


solidariedade.

Confusão ocorre quando o credor e o devedor são a mesma pessoa, situação na qual
extinguiu a obrigação.

No caso de causa mortis, a confusão poderá ocorrer quando o filho deve ao pai, mas, tendo
aquele morrido, o filho recebeu a herança, extinguindo a dívida.

No caso do credor solidário, João deve com outros 3 indivíduos 100 mil reais ao pai. João
era o único herdeiro. Em relação a ele, houve a confusão. Portanto, 25 mil reais houve confusão,
faltando 75 mil reais, situação na qual persistirá a solidariedade, passando João ser o credor do
crédito.

Cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus acessórios, a obrigação
anterior.

h) Da remissão das dívidas

A remissão é o perdão.

A remissão é o direito exclusivo do credor de exonerar o devedor.

O art. 385 estabelece que a remissão da dívida é um negócio jurídico bilateral, ou seja, o
perdão deverá ser aceito pelo devedor, situação na qual, se aceita, extinguirá a obrigação, mas
sem prejuízo de terceiro.

A remissão só poderá ocorrer se não houver prejuízo a terceiros.

A remissão concedida a um dos codevedores extingue a dívida na parte a ele


correspondente, mas não atinge a solidariedade em relação aos demais, de modo que não possa
cobrar o débito sem dedução da parte remitida.

Ex.: João é credor de Pedro e mais 4, no valor de 100 mil reais. João perdoa Pedro, mas
ainda será credor de 80 mil reais, mantendo a solidariedade em relação aos demais.

A devolução voluntária do título da obrigação, quando por escrito particular, prova


desoneração do devedor e seus coobrigados, se o credor for capaz de alienar, e o devedor capaz

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de adquirir.

O perdão poderá ser expresso ou tácito.

Atente-se que, se houver a entrega do negócio empenhado, não haverá o perdão da dívida,
mas tão somente a exoneração da garantia que existia em relação àquela dívida. Ou seja, a
restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real, não a
extinção da dívida.

Não confundir renúncia com remissão, pois renúncia é gênero e remissão é espécie. Na
renúncia, é possível recair sobre diversos direitos pessoais, inclusive é um ato unilateral. A
remissão é perdão, ou seja, é ato bilateral, só podendo se dar em relação a direitos creditórios.

Teoria do Inadimplemento

1. Teoria do Inadimplemento

I. Introdução

Inadimplir é não cumprir a obrigação.

O inadimplemento pode ocorrer em dois casos específicos:

inadimplemento relativo: há uma mora, ou seja, há um descumprimento parcial de obrigação, visto

que é possível que a obrigação seja cumprida.

• inadimplemento absoluta: a obrigação não pode ser mais cumprida.

O critério para distinguir o inadimplemento relativo do absoluto é saber se a obrigação

pode ou não pode ser cumprida. É necessário verificar não apenas a possibilidade fática, mas

também verificar a utilidade da obrigação para o credor, a fim de verificar se a mora é relativa ou

mora absoluta.

Se uma mulher encomenda um vestido de noiva para ser entregue no dia 10, dia em que

ela se casa, mas neste dia não é entregue, situação na qual a noiva resolve alugar um outro vestido,
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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não adianta entregar o vestido no dia 11. Ainda que haja a possibilidade fática, esta obrigação é

inútil para o credor, pois a obrigação não pode mais ser cumprida, razão pela qual configura

inadimplemento absoluto.

Portanto, na visão da doutrina clássica, o inadimplemento poderá ser relativo e absoluto.

No entanto, a doutrina moderna traz a violação positiva do contrato e o cumprimento

inexato ou defeituoso do contrato, como formas de inadimplemento da obrigação. Em relação

ao cumprimento inexato ou defeituoso do contrato, o Código Civil trata deles como mora, ou

seja, como inadimplemento relativo. Isso porque a mora incluir o cumprimento do contrato.

No tocante à violação positiva do contrato, ou seja, a quebra de um dever anexo

contratual, ou seja, quebra da boa-fé objetiva pela não adoção de uma conduta não esperada, a

doutrina tradicional não resolve.

Essa proteção dada à boa-fé objetiva e a ideia de considerar a quebra de um dever anexo

contratual como inadimplemento, serve para que exista uma proteção para afastar certos

comportamentos capazes de gerar dano, e para demonstrar que os deveres das partes não se

esgotam no momento em que se está prestando o contrato.

Os deveres contratuais também devem ser pré-contratuais e pós-contratuais, seja de

assistência, vigilância ou de cooperação. A quebra desses deveres anexos gera a violação positiva

do contrato, bem como a responsabilização civil de quem promoveu esta quebra.

O Enunciado 24 do CJF diz que, em virtude do princípio da boa-fé, a violação dos deveres

anexos constitui uma espécie de inadimplemento e independe de culpa. Veja, trata-se de

responsabilidade civil objetiva.

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Ex.: o credor, ante uma dívida não paga do devedor, negativa o nome do devedor em banco

de dados. Neste caso, o devedor paga a dívida, situação na qual passa o credor a ser o responsável

pela retirada do devedor do cadastro de inadimplentes. Trata-se de um dever anexo.

II. Regras quanto ao inadimplemento relativo

Inadimplemento relativo é mora. Mora é atraso, é retardamento, é a imperfeita satisfação

da obrigação.

O art. 394 diz que se considera em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o

credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.

Veja que é possível a mora accipiens do credor, que não quer receber no tempo, lugar e

forma que a lei ou contrato estabelecer.

A mora, portanto, é o atraso no pagamento e também o pagamento feito em lugar, tempo

ou forma diversa da convencionada. Ou seja, mora está presente quando há um cumprimento

defeituoso do contrato.

Existem duas formas de mora:

• mora solvendis (debitoris)

• mora accipiendi (creditoris)

a) Mora solvendis (debitoris)

Mora solvendis é a mora do devedor.

Se em decorrência da mora do devedor, a prestação se tornar inútil ao credor, não há mais

mora, mas sim inadimplemento absoluto, situação na qual o credor poderá rejeitar o

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cumprimento, sem prejuízo de perdas e danos cabíveis (mora convertida em inadimplemento

absoluto).

Essa inutilidade da obrigação deve ser aferida com base no princípio da boa-fé e com o

princípio da preservação do contrato. Mesmo o devedor estando em mora, pode ser que a

resolução do contrato não seja o melhor caminho, ainda que o credor deseje a resolução.

É a partir da ideia de função social do contrato que se começa a entender a chamada teoria

do adimplemento substancial.

A teoria do adimplemento substancial estabelece que em determinadas situações, ainda

que o devedor incida em mora, o credor não poderá resolver o contrato, como nas hipóteses em

que a obrigação tenha sido quase em sua totalidade cumprida.

Neste caso, não caberá extinção do contrato, mas sim outros efeitos para manutenção do

contrato, como execução dos valores, cobranças, etc.

A jurisprudência tem aplicado esta teoria do adimplemento substancial nos casos de mora

de pouca relevância, quando se considera o contrato como um todo, sendo tipicamente aplicado

nos contratos de financiamento.

Basta pensar no indivíduo que comprou um carro e pagou 60 parcelas das 64 prestações

acordadas, estando em atraso com relação as últimas 4 parcelas. Neste caso há adimplemento

substancial.

A análise do adimplemento substancial não é apenas quantitativa (ponto de vista

econômico), mas também subjetivo (ponto de vista subjetivo), ou seja, busca-se analisar o

comportamento das partes sob o ponto de vista contratual.

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Isso porque, caso o devedor tenha agido de má-fé para não pagar as 4 últimas prestações,

caberá a resolução do contrato, visto que o ordenamento não tolera a má-fé.

Por essa razão, a teoria do adimplemento substancial exige que haja:

• fatores quantitativos (objetivos): é a medida econômica do descumprimento.

• fatores qualitativos (subjetivos): é a análise do comportamento contratual adotado pelas partes.

Essa análise é casuística.

O art. 399 do CC disciplina que o devedor em mora responde pela impossibilidade da

prestação, embora essa impossibilidade resulte de caso fortuito ou de força maior, se estes

ocorrerem durante a mora.

Mas o mesmo dispositivo traz uma ressalva, no sentido de que essa responsabilidade, por

caso fortuito ou força maior que o devedor tem pela perda da coisa quando estava em mora, será

afastada, se o devedor provar uma isenção total, se conseguir provar que o dano sobreviria ainda

que a coisa estivesse com o credor ou a obrigação tivesse sido oportunamente executada.

Ex.: o devedor deveria ter devolvido o cavalo a João até ontem, mas hoje houve uma

enchente na fazenda, situação na qual o cavalo morreu afogado. Neste caso, houve caso fortuito,

devendo o devedor pagar o cavalo a João, salvo se provar que, em razão de João ser vizinho do

devedor, a fazenda também seria atingida pela enchente, o que não evitaria a morte do cavalo.

Em relação à mora do devedor, esta recebe uma sub-classificação:

• mora ex re: é a mora automática, que ocorre quando a obrigação for positiva (fazer ou dar) e ao

mesmo tempo for líquida, ou seja, sabe-se o seu valor. O mais importante para a mora ex re é

que a mora tenha a data fixada para o seu inadimplemento. A consequência é que esta mora é

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

automática, sem necessidade de interpelação do devedor.

Ex.: a data de vencimento é no dia 20.10. Se o devedor não observa esta data, já incidirá em

mora, pois ela é automática.

• mora ex persona: é uma mora caracterizada pela inexistência de um termo final para

caracterização da obrigação, ou seja, para gerar a mora exige-se que haja uma providência do

credor, que notificará, interpelará ou protestará o crédito. Neste caso, precisa-se de uma atuação

do credor.

• mora presumida (irregular): a mora será presumida quando se trata de ato ilícito. Segundo o art.

398, nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o

praticou. Ou seja, começa-se a contar a mora da data da prática do ato ilícito. Tanto é que no

caso de ato ilícito os juros de mora começam a contar da data do evento danoso, visto que a

partir de então o devedor está em mora.

b) Mora accipiendi (creditoris)

Mora accipiendi é a mora do credor, ou seja, mora de quem tem a receber.

Ocorre quando o credor se recusa a aceitar o adimplemento da obrigação no tempo, forma

e lugar pactuado.

No caso da mora accipiens, não se discute a culpa do credor.

Quais são os efeitos da mora do credor?

• Afasta-se do devedor, que esteja isento de dolo, a responsabilidade pela conservação da coisa.

Não vai responder pela conduta culposa que gere, por exemplo, perda da coisa, salvo se

intencionalmente destruir a coisa.

• Obriga o credor a ressarcir o devedor pelas despesas que este deverá efetuar para conservar a

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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coisa.

• Sujeita o credor a receber a coisa pela estimação mais favorável ao devedor. Se o valor da coisa

oscilar entre o tempo do contrato e o tempo em que a obrigação for efetivamente cumprida, em

razão da mora do credor, deverá ser feita uma estimativa mais favorável ao devedor.

É preciso diferenciar purgação da mora de cessação da mora.

i. Purgação da mora (emenda da mora)

Purgação da mora (emenda da mora) é o afastamento do inadimplemento parcial,

afastando os efeitos decorrentes desse inadimplemento. Esta purgação da mora pode se dar de

duas formas:

• Purgação da mora por parte do devedor: o devedor oferece a prestação mais os prejuízos que

já causou.

• Purgação da mora por parte do credor: o credor se oferece para receber o pagamento e se

sujeita aos efeitos da mora até aquela data.

Na emenda da mora, quer que sejam cessados os efeitos futuros da mora, mas os efeitos

que já foram gerados vão se revelar, ou seja, deverá pagar pela conservação da coisa, caso seja

credor e esteja em mora, ou ainda terá de pagar as perdas e danos, se for o devedor que está em

mora (juros, multa, etc.).

Para Maria Helena Diniz, purgação da mora é um ato espontâneo do sujeito, pois ele quer

remediar uma situação que ele mesmo deu causa, evitando os seus efeitos decorrentes, trazendo

aquela situação a uma situação de normalidade.

A purgação da mora, portanto, só produz efeitos ex nunc, não retroagindo para evitar que

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

sejam eles produzidos anteriormente, razão pela qual deverá pagar indenização, perdas e danos,

etc.

ii. Cessação da mora

A cessação da mora, por sua vez, ocorre quando há um fato extintivo da mora que produz

efeitos pretéritos também.

Ex.: novação da dívida. Neste caso, a dívida anterior se extingue, motivo pelo qual se

extinguirá tudo, não existindo mais o efeito produzido pela mora. Houve a cessação da mora, com

efeito retroativo, podendo também se dar com a remissão da dívida ou até com a renúncia do

credor.

III. Regras quanto ao inadimplemento absoluto

O inadimplemento absoluto é quando a prestação não tem mais utilidade para o credor,

não podendo mais ser cumprida.

Não cumprindo o devedor a prestação que lhe cabe cumprir, passa então este devedor a

responder pelo valor do objeto, acrescido de perdas e danos.

As perdas e danos são as indenizações cabíveis, juros compensatórios, cláusula penal,

atualizações monetárias, custas e honorários advocatícios.

Em relação aos honorários advocatícios, há uma discussão se seriam os contratuais ou

sucumbenciais. Isso porque, quando o juiz sentencia, ele fixa os honorários. Todavia, quando o

Código Civil faz menção aos honorários, a leitura de que o STJ faz é no sentido de que seriam os

honorários contratuais, visto que o devedor deverá ressarcir a parte lesada que contratou

advogado para o caso. O STJ exige que seja feito um preço médio.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Nas obrigações negativas, ou seja, nas obrigações de não fazer, o devedor é considerado

inadimplente desde o dia que executa o ato que não deveria ter executado.

Nos contratos benéficos, em que só uma das partes presta a obrigação e só uma delas

recebe, responde por culpa o beneficiário, mas aquele a quem não favoreça o contrato só vai

responder por eventual inadimplemento absoluto caso tenha agido com dolo (art. 392).

Ex.: no contrato de comodato, em que o comodatário é quem recebe o imóvel para morar

gratuitamente, responderá por culpa, caso haja inadimplemento absoluto. Mas o comodante

responderá apenas por dolo se tiver agido dolosamente para gerar aquele inadimplemento

absoluto.

Diferente é o contrato oneroso, a qual a responsabilidade é, via de regra, subjetiva,

devendo demonstrar culpa de qualquer das partes para responsabilização das partes.

Se estiver caracterizada a violação de um dever contratual, o ônus de demonstrar que não

houve culpa é do devedor. Isso porque cria-se uma presunção de que o contrato foi violado

culposamente, incumbindo ao devedor o ônus de demonstrar que o fato não pode ser imputado

a este devedor, visto que não agiu culposamente.

Nos casos de inadimplemento absoluto, a principal consequência é conversão da obrigação

em perdas e danos.

As perdas e danos dirigidas ao credor da obrigação deve cumular, além daquilo que ele

efetivamente perdeu, aquilo que razoavelmente deixou de lucrar.

Aquilo que efetivamente perdeu são os danos emergentes. O que o credor razoavelmente

deixou de lucrar é denominado lucros cessantes.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Portanto, as perdas e danos devem abranger danos emergentes e lucros cessantes.

O art. 404 diz que as perdas e danos vão ser pagas com atualização monetária,

abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

IV. Dos juros no Código Civil de 2002

Juros são frutos civis, ou seja, rendimentos devidos pela utilização de um capital alheio.

Os juros podem ser classificados como:

• Juros moratórios: juros devidos a título de ressarcimento, pelo descumprimento de uma

obrigação.

• Juros remuneratórios: há utilização de um capital alheio, mas esta utilização é consentida, razão

pela qual há uma remuneração dessa utilização.

A respeito dos juros legais moratórios, que servem para fins de ressarcimento do prejuízo

experimentado, o art. 406 diz que são devidos os juros de acordo com a taxa que estiver em vigor

para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.

Portanto, os juros de mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional serão

os mesmos aplicados para o caso de mora numa relação obrigacional.

Mas qual é essa taxa?

Flávio Tartuce, na linha expressiva da doutrina, diz que a taxa é aquela prevista no art. 161

do CTN, que é a taxa de 1% ao mês, ou de 12% ao ano.

Existe divergência no STJ a saber se seria cabível a taxa SELIC, mas ainda não há posição

consolidada.

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Uma matéria que vai suscitar debate é aquela relacionada à taxa de juros que pode ser

cobrada pelas instituições financeiras ou bancárias.

A jurisprudência vem entendendo que os juros cobrados pelas instituições bancárias e

financeiras podem ser fixados de acordo com as regras de mercado.

Para o STJ, as instituições bancárias e financeiras não se restringem aos limites dos juros

remuneratórios previstos na Lei de Usura, que é de 2% ao mês. A estipulação de juros

remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.

E se o contrato é omisso?

No caso de omissão contratual, e em se tratando de instituições bancárias e financeiras, o

STJ entende que incidirão as taxas de mercado. O STJ, na súmula 530, vai dizer que, nos contratos

bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros efetivamente contratada - por

ausência de pactuação ou pela falta de juntada do instrumento aos autos -, aplica-se a taxa média

de mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa

cobrada for mais vantajosa para o devedor.

O art. 405 diz que os juros de mora serão contados desde a citação inicial. Mas não é

sempre! Esta regra só se aplica à responsabilidade contratual.

Todavia, no caso responsabilidade extracontratual, aplica-se a súmula 54 do STJ, a qual

estabelece que os juros moratórios fluem a partir do evento danoso.

Atente-se que nem sempre os juros de mora serão contados desde a citação, ainda que se

trate de responsabilidade contratual. Essa incidência do art. 405 está limitada às hipóteses que

a citação representa a notificação do devedor, pois, em se tratando de mora ex re, deve-se

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considerar que os juros de mora serão considerados desde o inadimplemento, visto que o

devedor já está constituído em mora antes da citação.

A hipótese do art. 405, que diz que os juros de mora serão contados desde a citação

inicial, desde que:

• Situações em que há responsabilidade contratual

• Não há termo final para o vencimento da obrigação (citação funcionará como notificação)

Vale acrescentar que o art. 240 diz que a citação válida, ainda que ordenada pelo juízo

incompetente, constitui em mora o devedor. Portanto, os juros de mora serão contados desde a

citação inicial, ainda que se tratar de juízo incompetente.

IV.A. Comissão de permanência

A comissão de permanência é um valor cobrado pelas instituições financeiras no caso de

inadimplemento contratual enquanto o devedor não quitar sua obrigação. Em outras palavras,

é um encargo cobrado por dia de atraso no pagamento de débitos junto a instituições financeiras.

É cobrado após o vencimento e incide sobre os dias de atraso.

A comissão de permanência foi instituída por meio da Resolução 15/1966, do Conselho

Monetário Nacional. Atualmente, rege o tema a Resolução 1.129/1986 do CMN.

Para o fim de disciplinar a comissão de permanência o STJ editou a Súmula 472. Segundo

a referida súmula, a cobrança de comissão de permanência – cujo valor não pode ultrapassar a

soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato – exclui a exigibilidade

dos juros remuneratórios, moratórios e da multa contratual.

Conclui-se, portanto, que:


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• O valor cobrado de comissão de permanência não pode ultrapassar a soma dos encargos

remuneratórios e moratórios previstos no contrato.

• A comissão de permanência exclui a exigibilidade dos juros remuneratórios, moratórios e da

multa contratual.

Dessa forma, ou se cobra a comissão de permanência, ou se cobra os demais encargos

previstos no contrato.

São inacumuláveis a comissão de permanência com os seguintes encargos:

• Juros remuneratórios;

• Correção monetária;

• Juros moratórios;

• Ou multa moratória.

Em suma, não pode cumular com nada.

Veja as outras súmulas do STJ que tratam sobre o tema:

• Súmula 30: A comissão de permanência e a correção monetária são inacumuláveis.

• Súmula 294: Não é potestativa a cláusula contratual que prevê a comissão de permanência,

calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, limitada à taxa do

contrato.

• Súmula 296: Os juros remuneratórios, não cumuláveis com a comissão de permanência, são

devidos no período de inadimplência, à taxa média de mercado estipulada pelo Banco Central do

Brasil, limitada ao percentual contratado.

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V. Cláusula penal

Cláusula penal é uma penalidade de natureza civil.

É imposta pela inexecução de um dever assumido, de um dever patrimonial. Esta

inexecução pode ser parcial ou pode ser total.

A cláusula penal é fruto de um contrato entre as partes. Por isso, é conhecida como multa

contratual ou pena convencional.

Trata-se, em verdade, de uma obrigação acessória, a qual visa garantir o cumprimento da

obrigação principal, servindo como estímulo da obrigação principal.

A outra finalidade da cláusula penal é fixar antecipadamente o valor das perdas e danos,

no caso de descumprimento da obrigação principal.

Segundo o art. 408, incorre de pleno direito o devedor na cláusula penal, desde que,

culposamente, deixe de cumprir a obrigação ou se constitua em mora.

Ou seja, se o devedor culposamente deixou de cumprir a obrigação (responsabilidade

subjetiva, como regra), caso em que incidirá na cláusula penal quer deixe de cumprir a obrigação

ou quer se constitua em mora.

O STJ entende que cláusula penal contida em contratos bilaterais, onerosos e

comutativos devem ser aplicada para ambos os contratantes, ainda que regida apenas em favor

de uma das partes.

Em um contrato no qual foi estipulada uma cláusula penal, caso haja o inadimplemento do

devedor, é possível que o credor exija o valor desta cláusula penal e mais as perdas e danos?

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Se for cláusula penal moratória, sim. Por outro lado, se for cláusula penal compensatória,

não. Isso porque a multa contratual, no caso de mora, é denominada de multa moratória. Já, no

caso de inexecução total, será uma multa compensatória, já que servirá como fixação da perdas

e danos. Apenas a multa compensatória (inadimplemento absoluto) tem a função de antecipar as

perdas e danos.

O STJ entende que, enquanto a cláusula penal compensatória funciona como uma

prefixação das perdas e danos, a cláusula penal moratória funciona como uma punição para

quem retardou o cumprimento da obrigação. Ou seja, a cláusula moratória não funciona como

prefixação das perdas e danos. E portanto, não há óbice a que se exija a cláusula penal moratória

juntamente como valores referentes a lucros cessantes. Isso porque só a multa compensatória

serve prefixação das perdas e danos.

O art. 412 diz que o limite da cláusula penal compensatória é o limite da obrigação

principal.

Isso só vale para multa compensatória. Para a multa penal moratória, a doutrina estabelece

que o limite da cláusula é de:

• 10%, caso tenha como referência os arts. 8º e 9º da Lei de Usura.

• 2%, caso se trate de contratos de consumo, conforme art. 52, §1º, do CDC.

• 2%, caso se trate de dívidas condominiais, conforme 1.336, §1º, Código Civil.

Portanto, esses são os limites da multa moratória que incide em caso de mora do devedor.

O art. 413 disciplina que a penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a

obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for

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manifestamente excessivo, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio.

Este artigo traz a função social do contrato e a boa-fé objetiva, trazendo proporcionalidade,

razão pela qual o juiz deverá julgar com bom-senso e equidade.

O art. 411 diz que, quando se estipular a cláusula penal para o caso de mora, ou em

segurança especial de outra cláusula determinada no contrato, terá o credor o direito de exigir a

satisfação da pena cominada, com o desempenho da obrigação principal.

Este dispositivo diz que há uma faculdade cumulativa, ou seja, se for multa moratória ou

multa decorrente de uma das cláusulas do contrato, será possível cumular a cobrança dessa multa

com a cobrança do cumprimento da obrigação principal.

Caso a multa seja compensatória, o credor deverá decidir: ou vai ter de cobrar a cláusula

penal, dispensando perdas e danos, ou cobrará perdas e danos, não podendo cobrar a cláusula

penal. Ou seja, o art. 410 diz que, quando se estipular a cláusula penal para o caso de total

inadimplemento da obrigação, esta converter-se-á em alternativa a benefício do credor.

Sendo a obrigação indivisível, e havendo vários devedores, estabelece o art. 414 que, se

um desses devedores incorrer em mora, se um dos devedores for inadimplente, todos os

devedores incorrerão na pena.

Todavia, a cláusula penal somente será cobrada na sua inteireza do culpado, respondendo

os demais pela sua quota.

Ex.: há uma cláusula penal de 100 mil reais. Houve o inadimplemento. Todos terão de

pagar, mas somente poderá cobrar do culpado os 100 mil reais, enquanto dos demais poderá

cobrar o valor da cláusula penal, mas limitada à sua quota, ou seja, 20 mil reais.

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Mesmo assim, os que pagaram o valor da quota, terão direito à ação regressiva contra o

causador do dano, ou seja, aquele que deu causa à aplicação da pena.

O art. 416 estabelece que a parte interessada não precisa provar o prejuízo para ter

direito à multa, pois ela já está prefixada. Como regra, ainda que o prejuízo exceda a cláusula

penal, não poderá o prejudicado exigir indenização suplementar.

Isso porque não se pode cumular multa compensatória com indenização por perdas e

danos, em razão do inadimplemento da obrigação. A faculdade é disjuntiva (alternativa).

Contudo, se no contrato estiver prevista esta possibilidade, com base na autonomia

privada, ou seja, se houver a previsão de cláusula penal cumulada com perdas e danos, esta

cláusula penal funcionará como taxa mínima de indenização, recaindo ao credor a obrigação de

provar o prejuízo excedente.

VI. Das Arras ou Sinal

Sinal é um valor dado em dinheiro ou bem móvel que é entregue a uma parte, quando se

está firmando um contrato preliminar, que traz uma presunção de que haverá a celebração do

contrato definitivo.

É normalmente aplicado nos contratos de promessa de compra e venda de imóvel.

Se por ocasião da conclusão do contrato uma parte der a outra, a título de arras, dinheiro

ou outro bem, em caso de execução, serão restituídos ou serão computados da prestação devida,

desde que do mesmo gênero da obrigação principal.

Se foi dado um cavalo para assegurar a compra de um apartamento, será necessário

restituir o cavalo para que o contratante comece a pagar as prestações.

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No entanto, se o contratante deu 10 mil reais como arras, quando começar a pagar o

apartamento pelo contrato definitivo, estes 10 mil reais deverão ser descontados.

A partir dessa leitura do art. 417, percebe-se a funções da arras:

• funciona como uma antecipação de pagamento.

• torna definitivo o contrato preliminar.

• antecipação de perdas e danos, pois pode ocorrer a não realização do contrato definitivo.

São duas as espécies de arras ou de sinal:

• Arras confirmatórias:

São arras presentes na hipótese em que não consta a possibilidade de arrependimento.

Ex.: João celebra um contrato preliminar, prevendo que celebrará o contrato definitivo, mas não

consta a possibilidade de arrependimento quanto à celebração desse contrato definitivo.

Em regra, as arras são confirmatórias.

O art. 418 diz que, se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra parte tê-

lo por desfeito, retendo as arras antecipada (antecipação das perdas e danos). Se a inexecução

for de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito, e neste caso

exigir devolução das arras que prestou mais o equivalente (já que funcionou como antecipação

das perdas e danos), com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente

estabelecidos, juros e honorários de advogado.

Perceba que na hipótese de arras confirmatórias, a parte inocente pode pedir indenização

suplementar se comprovar que o prejuízo experimentado é maior. As arras confirmatórias

funciona como uma taxa mínima, motivo pelo qual poderá exigir a execução do contrato, como

pode exigir perdas e danos. Neste caso, funcionará como taxa mínima.

• Arras penitenciais:
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No caso das arras penitenciais, há previsão no contrato de arrependimento. Então, funcionarão

as arras como uma pena.

As arras têm a função unicamente indenizatória e não para confirmar o contrato definitivo.

Nas arras penitenciais, não há possibilidade de indenização suplementar.

O art. 420 disciplina que não caberá a indenização suplementar se as arras são penitenciais. Isso

porque já estava previsto este direito de arrependimento, mas nas arras confirmatórias, não,

pois cabem indenização suplementar se comprovar que o prejuízo foi maior.

Teoria Geral dos Contratos

1. Teoria Geral dos Contratos

I. Conceito de contrato

Contrato é um ato jurídico bilateral (sentido amplo) que tem por objetivo a criação,
alteração ou extinção de direitos e deveres. É ato jurídico em sentido amplo pois o contrato
constitui negócio jurídico por excelência.

Para Flávio Tartuce, contrato é negócio jurídico bilateral ou plurilateral que tem por
objetivo a criação, alteração ou extinção de direitos e deveres com conteúdo patrimonial. Esta é
a ideia da visão clássica, que exige um conteúdo patrimonial.

Portanto, casamento não seria contrato, pois o conteúdo não seria patrimonial, e sim
afetivo, a comunhão plena de vida.

Em um conceito contemporâneo de contrato, o contrato constitui a relação jurídica


subjetiva, destinada à produção de efeitos jurídicos existenciais e patrimoniais, e não apenas
entre os titulares dos direitos subjetivos, mas também entre terceiros.

Começa-se a mitigar o princípio da relatividade, passando a atingir efeitos perante


terceiros.

O contrato pode ter então conteúdo existencial, estando relacionado aos direitos da
personalidade. Ex.: contrato que explora direito de imagem de um atleta há exploração de um

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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direito da personalidade.

Este contrato passa a ter um efeito também patrimonial, mas este efeito jurídico também
é existencial, ligado ao direito da personalidade.

II. Principais classificações contratuais

a) Quanto aos direitos e deveres das partes

O contrato é negócio bilateral sempre, ou plurilateral. Não há contrato unilateral, eis que,
para se falar em contrato, é necessário que se tenha ao menos duas pessoas contratando.

O contrato, a despeito de somente poder ser negócio jurídico bilateral ou plurilateral,


poderá ser classificado em:

c. Contrato unilateral: apenas um dos contratantes assume deveres em face do outro. Ex.: contrato
de mútuo é contrato unilateral. Isso porque se aperfeiçoa quando o mutuário (devedor) recebe
o valor. A partir daí só surge a obrigação para uma das partes, que é o devedor. O mesmo se
aplica ao comodato. Doação também é exemplo.

• Contrato bilateral: as partes, simultânea e reciprocamente, têm deveres e direitos uma em face
da outra, sendo elas credoras e devedoras umas das outras. Por isso é chamado de contrato
sinalagmático, que é a proporcionalidade entre as prestações. Ex.: compra e venda.

• Contrato plurilateral: há um contrato com várias pessoas envolvidas. Estas pessoas têm direitos
e deveres também, e geralmente na mesma proporção. Ex.: seguro de vida em grupo e consórcio.

b) Quanto ao sacrifício patrimonial das partes

Quando se fala de sacrifício patrimonial, há contrato oneroso e gratuito:

• Contrato oneroso: há vantagens para ambos os contratantes. Ambos sofrem um sacrifício


patrimonial, mas auferem vantagens.

• Contrato gratuito (benéfico): somente uma das partes é onerada. O art. 114 do CC enuncia que
a interpretação desses negócios benéficos deve ser restritiva. Ex.: doação.

Geralmente, o contrato oneroso é bilateral e o contrato gratuito é unilateral, mas não é a


mesma coisa.

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No caso do mútuo feneratício (que envolve remuneração), apesar de o contrato surgir com
a entrega do dinheiro, o mutuário fica obrigado a pagar os juros incidentes sobre o valor do
empréstimo. Apesar de o contrato ser unilateral, pois só o mutuário terá o dever de pagar
(devolver) o valor ao banco, será o contrato oneroso, tendo em vista que o sujeito recebeu o
valor do mútuo e o mutuante também obteve vantagem pela lucratividade dessa atividade.
Portanto, ambas as partes experimentaram vantagens patrimoniais. Assim, estamos diante de um
contrato unilateral e oneroso.

c) Quanto ao momento do aperfeiçoamento do contrato

• Contrato consensual: há o aperfeiçoamento pela simples manifestação de vontade das partes.


Ex.: compra e venda e locação.

• Contrato real: não se aperfeiçoa com a mera manifestação de vontade, mas sim pela entrega da
coisa. Ex.: comodato, mútuo, depósito, etc. Antes da entrega da coisa, só há uma promessa de
contratar, que não é ainda um contrato perfeito e acabado, o qual só ocorrerá quando receber a
coisa.

d) Quanto aos riscos que envolvem a prestação

• Contrato comutativo: as partes já sabem quais são as suas prestações, pois são preestabelecidas.
A compra e venda é, em regra, contrato comutativo.

• Contrato aleatório: há a álea (sorte), situação na qual a prestação de uma das partes não é
conhecida com exatidão no momento em que o contrato é celebrado, pois dependerá da sorte,
ou seja, de um fato desconhecido. Ex.: contrato de seguro, pois não se sabe quando a pessoa vai
morrer e o sujeito ficará pagando o valor mensalmente.

Existem contratos que se tornam aleatórios em razão de que as partes assim acordaram,
por conta de um elemento acidental. Ex.: compra e venda de uma colheita futura.

Nos contratos aleatórios, existem duas formas básicas:

• Contrato aleatório emptio spei: é a venda da esperança. Ocorre quando um dos contratantes
toma para si o risco da própria existência da coisa. O preço será integralmente pago, mesmo que
a coisa não exista no futuro (ex.: não colha nada futuramente). Se a coisa não existir, o sujeito
pagará da mesma forma. O risco é maior.

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• Contrato aleatório emptio rei speratae: é a venda da esperança com coisa esperada. Aqui, o
risco não versa sobre a existência da coisa, mas em relação à quantidade da coisa comprada. O
risco é menor, pois o mínimo de objeto será entregue. Se a coisa não vier existir, não haverá a
alienação.

e) Quanto à previsão legal

• Contrato típicos: contratos com previsão legal mínima. Ex.: compra e venda, doação, mútuo, etc.

• Contrato atípicos: não tem previsão legal. Ex.: contrato de garagem, contrato de
estacionamento, etc.

f) Quanto à negociação do conteúdo pelas partes

• Contrato de adesão: há um estipulante que impõe o conteúdo negocial e do outro lado um


aderente que vai concordar ou não este conteúdo. Não há elaboração paritária do contrato. O
CDC, no art. 54, diz que contrato de adesão são aqueles que suas cláusulas tenham sido
aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor, sem
que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o seu conteúdo. O contrato de
adesão não se limita aos contratos de consumo.

• Contrato paritário (negociado): o conteúdo do contrato é plenamente discutido pelas partes.

g) Quanto à presença de formalidades

• Contrato formal: exige qualquer formalidade, como forma escrita. Ex.: contrato de fiança deve
ser feito por escrito.

• Contrato informal: não há nenhuma formalidade. Esta é a regra em virtude da liberdade das
formas.

• Contrato solene: é espécie de contrato formal, situação na qual se exige solenidade pública. A
escritura pública é exigida para as negociações que envolvem imóveis de valores superiores a 30
vezes ao maior salário-mínimo vigente.

h) Quanto à independência contratual

• Contrato independente ou principal: existe por si só, não havendo relação de dependência com
outro contrato.

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• Contrato dependente ou acessório: depende para sua validade de um outro negócio, que é o
contrato principal, com base no princípio da gravitação jurídica. A invalidade da obrigação
principal implica a invalidade das obrigações acessórias, mas a invalidade das obrigações
acessórias não induzem a da obrigação principal. Ex: fiança.

A doutrina fala sobre os contratos coligados. Tais contratos coligados são aqueles que,
embora distintos, são ligados por uma cláusula acessória ou por uma cláusula implícita/explícita.
Há uma ligação por um nexo funcional. Os contratos coligados em sentido amplo se dividem em
3 espécies:

• Contratos coligados em sentido estrito

• Contratos coligados por cláusula expressamente prevista

• Contratos conexos: são aqueles contratos ligados por um vínculo econômico-social. São os mais
presentes na prática.

Percebe-se que se trata de contratos com uma certa independência, mas que em uma
parte dependem um do outro (dependência parcial).

Por exemplo, o STJ entendeu que o inadimplemento de um contrato poderá gerar a


extinção de outro, a depender da relação de interdependência existente.

Ex.: contrato de um clube e um atleta profissional é coligado com o contrato de exploração


da imagem desse atleta pelo clube. Apesar de serem independentes, se o contrato de trabalho é
rompido, também deverá ser extinto o contrato de exploração da imagem, visto que somente será
explorado a imagem do atleta enquanto ele joga no clube. Do contrário, não há mais como
explorar a imagem do indivíduo.

Ex.: contrato de automóvel com o arrendamento da garagem. João quer comprar o carro
de Pedro se ele arrendar a sua garagem para colocar o carro. Pedro concorda. João compra o carro
e aluga a garagem de Pedro por 500 reais ao mês. Na última hora João desiste da compra do carro.
Neste caso, o arrendamento da garagem não subsiste, pois apesar de serem independentes, um
dos contratos está ligado ao outro.

i) Quanto ao momento do cumprimento

198
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Contrato instantâneo: é aquele em que o aperfeiçoamento do contrato e o seu cumprimento


ocorrem de imediato. Ex.: compra e venda à vista.

• Contrato de execução diferida: é aquele cujo cumprimento é previsto de uma vez só no futuro.
Ex.: compra e venda de um violão por 500 reais, mas com o pagamento feito apenas em 30 dias.
a prestação é paga de uma vez no futuro.

• Contrato de trato sucessivo: é aquele em que o cumprimento é previsto de forma sucessiva, isto
é, de forma periódica. É típico de financiamento bancário e aluguel.

j) Quanto à pessoalidade

• Contrato intuito personae (personalíssimo): a característica do contratante é elemento


determinante da sua conclusão. Ex.: para cantar no aniversário do Samer deve ser a Ivete
Sangalo. Outro exemplo é o contrato de fiança, visto que deve ser aquele determinado fiador.
Por conta disso, a condição de fiador não se transmite ao herdeiro, mas o herdeiro só responderá
por obrigações já vencidas e não pagas enquanto era vivo o fiador.

• Contrato impessoal: a pessoa do contratante não é juridicamente relevante. Ex.: compra e


venda. Se o objeto que vende é João, José ou Maria, pouco importa.

III. Princípios contratuais no Código Civil

a) Princípio da autonomia privada

Antigamente era denominado autonomia da vontade, mas prevalece a autonomia privada,


pois não é a vontade que manda, em virtude da preocupação social.

É preciso diferenciar liberdade de contratar com liberdade contratual:

• Liberdade de contratar: está relacionado com a escolha da pessoa com quem o contratante vai
celebrar o negócio jurídico.

• Liberdade contratual: está relacionado com o conteúdo do negócio.

Dessas duas liberdades, ou da dupla liberdade, é que decorre essa autonomia privada.

Flávio Tartuce conceitua autonomia privada como sendo um regramento básico, de ordem
particular, que hoje recebe influências de normas de ordem pública. Na formação do contrato, é
preciso que haja liberdade das partes, mas também fatores psicológicos, políticos, econômicos e
199
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

sociais.

Ou seja, há um direito de a parte auto regulamentar o seu direito, mas esse direito
encontra limitações em normas de ordem pública, particularmente nos princípios sociais
contratuais.

b) Princípio da função social dos contratos

O princípio da função social dos contratos é princípio de ordem pública.

O art. 2.035 diz que o contrato deve ser necessariamente interpretado e visualizado de
acordo com o contexto da sociedade. Interpreta-se o contrato considerando a sociedade que está
inserido.

O efeito desse princípio da função social do contrato é a mitigação da força obrigatória


dos contratos (pacta sunt servanda). Isso porque não faz tanta lei assim se violar a função social.
Portanto, mitiga-se a força obrigatória se violar a função social.

O art. 421 do CC preconiza que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos
limites da função social do contrato. A doutrina faz crítica, dizendo que também se fala em
liberdade contratual (conteúdo do contrato).

É importante estudar a questão da dupla eficácia do princípio da função social dos


contratos:

• Eficácia interna: é a eficácia entre as partes, tendo 5 principais aspectos:

o Protege os vulneráveis contratuais: por isso o CDC protege o consumidor; CLT protege o
empregado; CC protege o aderente.

o Implica vedação da onerosidade excessiva (desequilíbrio contratual): eventual onerosidade


ou desequilíbrio poderá implicar anulação do contrato, revisão do contrato ou mesmo a
resolução do contrato.

o Proteção da dignidade humana e dos direitos da personalidade no contrato: não pode


prevalecer conteúdo que traga prejuízo à proteção da pessoa humana. Dentro do conteúdo
deve ser respeitada a dignidade da pessoa humana.

o Nulidade de cláusulas antissociais e abusivas: o abuso do direito de contratar pode gerar

200
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

um desrespeito à função social do contrato. No plano de saúde, a cláusula que limita no


tempo a internação é cláusula abusiva.

o Conservação contratual como ideal a ser perseguido: a extinção do contrato é a última


razão, só é válida quando a preservação contratual não puder ser feita.

• Eficácia externa: há dois aspectos principais:

o Quando se analisa a eficácia para fora das partes do contrato, é preciso visualizar o
contrato para fins de proteção dos direitos difusos e coletivos. É a preservação do contrato
com base na proteção ambiental, por exemplo.

o Traz a tutela externa do crédito: é a possibilidade de o contrato gerar efeitos perante


terceiros, de condutas que terceiros praticam e repercutem no contrato. Ex.: no art. 608 do
CC disciplina que, aquele que aliciar alguém que está obrigado em um contrato escrito, a
prestar serviços a outras pessoas, este alguém pagará a indenização correspondente a 2 anos
de prestação do serviço. O dispositivo traz a responsabilidade do terceiro aliciador, havendo
a tutela do crédito não apenas no contrato, mas também externa ao contrato.

O art. 2.035, parágrafo único, preconiza que nenhuma convenção prevalecerá se


contrariar preceitos de ordem pública, tais como os previstos no CC, para assegurar função social
da propriedade e função social do contrato, cláusulas contratuais não vão prevalecer.

Há novas normas previstas no CC/02 surtindo efeitos sobre contratos firmados sobre a
vigência do código anterior. Então, na eficácia deverão observar aquilo disposto no CC/02. Há uma
retroatividade motivada, por aplicação de normas de ordem pública.

Vale ressaltar que a função social é considerada fundamento para a tutela externa do
crédito, na medida em que terceiros não poderão exercer sua liberdade em rota de colisão com
a função social do contrato alheio. A concorrência leal pode ser realizada. O que não se pode
fazer é utilizar mecanismos desleais de concorrência e levar à quebra de contratos dos outros
concorrentes com seus fornecedores.

Veja o que diz o Enunciado 21 da I Jornada de Direito Civil: “A função social do contrato,
prevista no art. 421 do novo Código Civil, constitui cláusula geral a impor a revisão do princípio da
relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do
crédito.”
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A função social do contrato acolhe também a teoria do terceiro cúmplice, que decorre da
interferência ilícita do terceiro em negócios jurídicos alheios, por meio de atos e comportamentos
que induzem o inadimplemento.

Nos termos do art. 608 CC, “Aquele que aliciar pessoas obrigadas em contrato escrito a
prestar serviço a outrem pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste
desfeito, houvesse de caber durante dois anos”. Exemplo famoso de tal aliciamento foi o caso do
cantor Zeca Pagodinho, aliciado pela Brahma em prejuízo à Schincariol (contratante anterior).

c) Princípio da força obrigatória do contrato (pacta sunt servanda)

Este princípio diz que o contrato faz lei entre as partes. Obviamente, este princípio tem
sido mitigado pelo princípio da função social do contrato e da boa-fé objetiva.

d) Princípio da boa-fé objetiva

Boa-fé objetiva é comportamento leal dos contratantes, agindo dentro do esperado. Por
isso, a boa-fé objetiva está relacionada a deveres anexos e laterais de conduta.

Percebe-se que a boa-fé objetiva consagra deveres anexos contratuais:

• Dever de respeito entre as partes

• Dever de informar o conteúdo do negócio

• Dever de agir conforme a confiança que foi depositada

• Dever de colaboração e cooperação entre as partes

A quebra desses deveres anexos gera a violação positiva do contrato. Neste caso,
prevalece o entendimento de que há responsabilidade civil objetiva.

O CC traz 3 funções importantes para a boa-fé objetiva:

• Função de interpretação: ajudará o juiz na atividade de interpretar. O CC diz que os negócios


jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar da celebração.

• Função de controle: no art. 187 do CC disciplina que também comete ato ilícito o titular de um
direito que ao exercê-lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico-
social pela boa-fé ou pelos bons costumes. Há a boa-fé com a função de controle.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Função de integração: no art. 422, o CC diz que os contratantes são obrigados a guardar, assim
na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Deve observar a boa-fé no momento em que o contrato é executado e após ele. Há


aplicação da boa-fé em todas as fases negociais.

Ex.: boa-fé objetiva aplicada na fase pré-contratual, como foi no caso de tomates. Nesse
caso, a empresa distribuiu sementes para que os agricultores da região plantassem tomates com
a promessa de que faria a compra futura. Fez isso durante uns 5 anos. Após este período, apesar
de ter distribuído as sementes, não comprou os tomates. Neste caso, a empresa foi obrigada a
indenizar em razão da violação da boa-fé pré-contratual, visto que fez com que nascesse a
legítima expectativa de que o tomate seria comprado.

Deve-se reconhecer a reparação dos danos originados na fase pré-contratual, sendo


necessário que haja previamente um início de tratativas entre as partes e a afronta do
comportamento esperado, o qual poderá causar um prejuízo.

Então, é necessário ter um prejuízo e o rompimento de um comportamento esperado. E


entre o rompimento do comportamento deve existir um nexo de causalidade. Ou seja, o prejuízo
esperado deve ter decorri do desse comportamento ilegítimo, motivo pelo qual este dano deverá
ser indenizado.

Na fase contratual, a violação à boa-fé objetiva pode ocorrer no caso da Súmula 308 do
STJ, que diz que a hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, seja anterior ou
posterior à celebração de promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes
do imóvel. Isso porque o sujeito que adquire imóvel está de boa-fé, a qual não pode ser
responsabilizado por conta da construtora não ter repassado o dinheiro que o consumidor pagou.

Quanto à aplicação da boa-fé objetiva na fase pós-contratual, basta pensar no credor que,
depois de ter negativado o devedor pelo inadimplemento, e pago o crédito pelo devedor, deixa
de retirar o nome do devedor do cadastro de inadimplente. Do contrário, haverá responsabilidade
pós-contratual.

A Súmula 548 do STJ diz que incumbe ao credor a exclusão do registro da dívida em nome
do devedor no cadastro de inadimplente, no prazo de 5 dias úteis, a partir do integral

203
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

pagamento do débito pelo devedor.

Ainda em relação à boa-fé objetiva, quanto à função integrativa, será estudado alguns
conceitos.

i. Supressio e surrectio

Supressio, ou verwirkung, é a supressão de um direito ou de uma posição jurídica pelo seu


não exercício pelo decurso do tempo. O art. 330 do CC disciplina que o pagamento reiteradamente
feito em outro local faz presumir renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato.

Houve a supressio em relação ao credor, mas em relação ao devedor houve a surrectio.

Surrectio, ou erwirkung, é o surgimento de um direito diante de práticas e usos reiterados,


como o costume. Ex.: Tribunal de Justiça de MG decidiu que uma situação criada ao arrepio da
cláusula contratual. A locadora receberia o valor, mas ao ignorar da cláusula prevista no contrato
e aceitar valores inferiores àqueles previstos no contrato criou um nome direito subjetivo que
estabilizou uma situação que, de fato, já estava consolidada.

ii. Tu quoque

Tu quoque significa que o contratante violou uma norma jurídica, razão pela qual não
pode o contratante se aproveitar da situação que criou pelo desrespeito da norma. O Tu quoque
é uma proibição de que alguém faça com outrem o que não gostaria que fosse feito contra si.

Ex.: o contratante não pode deixar de cumprir um contrato com base na exceção de
contrato não cumprido se a causa de inadimplemento foi desse contratante que deu causa do
inadimplemento à parte contrária.

iii. Exceptio doli

A exceptio doli é a defesa do réu contra uma ação dolosa, contrária à boa-fé.

A exceção mais conhecida é a exceção de contrato não cumprido, que significa que
ninguém pode exigir que uma parte cumpra a sua obrigação se esta própria pessoa não cumpriu
a sua.

A exceção de contrato não cumprido só pode ser aplicada quando a lei ou o contrato não

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

especificar quem deve ser o primeiro a cumprir a obrigação. Se o contrato ou a lei disser quem
deve cumprir em primeiro lugar a obrigação não poderá aquele que tiver de cumprir primeiro a
obrigação alegar exceptio non adimpleti contractus, pois é ele quem deve cumprir primeiramente
a obrigação.

Observa-se que o adimplemento substancial pode afastar a exceção de contrato não


cumprido. Se uma parte cumpriu 90% da avença, não poderá o outro não cumprir sua obrigação
sob a alegação de que o outro não cumpriu sua obrigação. A exceção de contrato não cumprido
pode ser afastada em caso de adimplemento substancial.

iv. Venire contra factum proprium

A venire contra factum proprium non potest é a proibição de um comportamento


contraditório. A pessoa não pode exercer um direito próprio contrariando um comportamento
que anteriormente havia adotado. Deve ser respeitada a confiança e a lealdade, que são
decorrentes da boa-fé objetiva.

O professor Anderson Schreiber traz 4 pressupostos para aplicação da teoria do


comportamento contraditório:

• Conduta inicial (fato próprio)

• Nasça uma legítima confiança da outra parte, no sentido objetivo da conduta adotada
inicialmente

• Comportamento contraditório do comportamento que se esperava

• Resulte um dano, ou risco de dano, desse comportamento contraditório

Ex.: O TJSP teve um caso em que uma administradora de cartão de crédito tinha a prática
de aceitar os pagamentos de valores atrasados. Ela foi mantendo esta prática. Contudo, a
empresa, apesar de o contrato prever a possibilidade de receber a rescisão contratual em caso de
inadimplemento, não exercia tal direito, permitindo que houvesse o pagamento em atraso e o
contrato continuava em vigor. Em um certo momento a empresa alegou que deveria haver a
rescisão contratual em virtude do pagamento em atraso. O TJSP disse que a força obrigatória dessa
cláusula deve ser mitigado, visto que passou a receber os pagamentos em atraso.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Trata-se de aplicação da máxima do venire contra factum proprium non potest.

v. Duty to mitigate the loss

A máxima do duty to mitigate the loss é o dever que o credor tem de mitigar a perda.

O Enunciado 169 do CJF diz que o princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar
o agravamento do próprio prejuízo.

Ex.: Em um contrato de locação de imóvel urbano, se há um inadimplemento, o credor,


logo que tome ciência do inadimplemento, deve ingressar com a ação de despejo. Não pode o
credor permitir que o locatário fique, por exemplo, 3 anos com o aluguel em atraso.

O credor tem o dever de mitigar as perdas e não permitir que se excedam em quantitativos
enormes.

Existe uma relação direta entre o duty to mitigate the loss e a cláusula de stop loss.

O STJ decidiu que instituição financeira, que descumprindo o que foi oferecido ao cliente,
deixa de acionar o mecanismo stop loss, que foi pactuado em contrato de investimento, incorre
em infração contratual, a qual pode gerar dever de indenizar ao investidor, caso tenha
experimentado prejuízos.

O mecanismo stop loss ocorre quando, por exemplo, o investidor compra a ação a 10 reais.
Se esta ação cair a 8 reais, deverá o operador vender esta ação. É o ponto de encerramento da
operação financeira para que evite danos maiores.

Caso o banco não observe este mecanismo, deverá indenizar o investidor. Isso porque o
credor tinha o dever de minorar o prejuízo.

Esta é a ideia do stop loss, havendo uma relação próxima entre o duty to mitigate the loss
e o stop loss.

vi. Estoppel:

Estoppel está relacionado com o direito internacional público. Trata-se de uma proibição
do comportamento contraditório em relação aos atos de soberania.

Estado não pode invocar uma causa de anulabilidade, de extinção ou de suspensão de um


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

tratado se, após tomar conhecimento dos fatos, tiver aceitado expressamente que o tratado é
válido ou continua em execução, ou, em virtude de sua conduta, deva ser considerado como tendo
concordado que o tratado é valido, ou continua em execução, conforme o caso.

e) Princípio da relatividade dos efeitos contratuais

O princípio da relatividade dos efeitos contratuais significa que o contrato gera efeitos
entre as partes. É o princípio da relatividade.

Este princípio encontra exceções no fato de que o contrato pode gerar efeitos entre
terceiros.

Flávio Tartuce traz 4 exemplos de exceções em que o contrato produzirá efeitos perante
terceiros:

• Estipulação em favor de terceiro: neste caso, o terceiro é beneficiado. Ex.: contrato de seguro
de vida. O terceiro que recebe o benefício não participa do contrato.

• Promessa de fato de terceiro: uma pessoa promete que outra pessoa vai praticar determinada
conduta. Ex.: promotor de eventos promete um espetáculo de um cantor famoso.

• Contrato com a pessoa a declarara (cláusula pro amico in eligendo): no momento da conclusão
do contrato, uma das partes poderá simplesmente se reservar à faculdade de indicar a pessoa
que vai adquirir os direitos e as obrigações posteriormente. Ex.: contrato preliminar.

• Tutela externa do crédito (eficácia externa da função social do contrato): o sujeito não
pode aliciar um terceiro que está prestando serviços a outro. Caso o faça, deverá
indenizar. Isso porque há uma tutela externa.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

IV. Formação do contrato pelo Código Civil

Como se sabe, o contrato nasce da conjunção de vontades, podendo ser de duas ou mais vantagens,
caso seja plurilateral.

É possível identificar 4 fases na formação de um contrato:

• Fase de negociações preliminares


• Fase de proposta
• Fase do contrato preliminar (facultativa)
• Fase da formação do contrato definitivo

a) Fase de negociações preliminares (de puntuação)

A fase de negociações preliminares é a fase em que ocorre os debates prévios, tratativas, não sendo
prevista expressamente no código.

É conhecida também como fase da proposta não formalizada. Ex.: quando há uma carta de
intenções.

Apesar de não haver previsão clássica da fase de negociações preliminares, a doutrina tem
entendido a possibilidade de responsabilização nesta fase, por meio da aplicação do princípio da boa-fé
objetiva.

b) Fase da proposta formalizada (de policitação ou de oblação)

Esta fase também é denominada de fase da oferta formalizada.

Aqui há uma manifestação de vontade de contratar, situação em que uma das partes solicita a
concordância com a outra parte.

O art. 427 vai dizer que a proposta vincula o proponente.

Quando se fala em proposta, há duas partes: proponente (policitante ou solicitante), que é quem
formula a proposta e do outro há o policitado ou oblato, ou o solicitado, que é quem recebe a proposta.

O art. 428 do CC vai consagrar as hipóteses em que essa proposta deixa de ser obrigatória. Em tese
ela obriga o proponente, mas em algumas hipóteses deixa ela de ser obrigatória:

• A proposta feita sem prazo a uma pessoa presente, deixa de ser obrigatória caso não tenha
sido imediatamente aceita (ex.: proposta feita pelo telefone, por WhatsApp, caso a pessoa
esteja online e visualizou a proposta).
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• A proposta feita sem prazo ao ausente, mas que tenha decorrido tempo suficiente para a
resposta chegar ao conhecimento do proponente, deixa de ser obrigatória.
• A proposta feita ao ausente que não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado pelo
proponente, deixa de ser obrigatória.
• Antes da proposta, ou juntamente com a proposta, chegar ao conhecimento do oblato ou do
solicitado a retratação do proponente, deixa de ser obrigatória.

O art. 430 do CC diz que, se a aceitação, por uma circunstância imprevista, chegar tarde ao
conhecimento do proponente, este deverá comunicar o fato imediatamente ao aceitante, sob pena de
perdas e danos. Este dispositivo consagra a boa-fé objetiva.

Caso o solicitado receba a proposta e altere o seu conteúdo, encaminhando a aceitação ao


proponente, haverá aqui uma contraproposta, ou seja, uma nova proposta. Ou seja, a aceitação fora do
prazo, ou com uma restrição, com modificação, é considerada uma nova proposta, vindo com isso uma
inversão dos papéis.

O art. 432 do CC diz que se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação expressa
(ou seja, haja o costume de uma aceitação implícita), ou o proponente a tiver dispensado, será reputar
concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa.

Há aqui um silêncio eloquente. Lembre-se que a regra é de que o silêncio importa recusa.

Se a proposta é feita entre ausentes, o contrato reputa-se concluído a partir do momento em que
a aceitação for expedida (art. 434). Há aqui a aplicação da teoria da expedição. Na verdade há a teoria da
agnição (da informação), mas dentro dela há adoção da teoria da expedição. Esta é a regra, mas há exceções.

O Código Civil, adotando a teoria da agnição, adota em certas hipóteses a teoria da recepção. Neste
caso, em determinados momentos, o contrato será formado quando a proposta que foi aceita for recebida
essa aceitação pelo proponente.

A teoria da recepção será aplicada nos seguintes casos:

• Se, antes da aceitação, ou com ela, chegar ao proponente a retratação do aceitante, considera-
se que não há celebração do contrato. Ou seja, ainda que o aceitante já tenha expedido a
aceitação, antes de o proponente receber esta aceitação, já chegou a retratação. A lei
considerará a teoria da recepção.
• Se o proponente tiver se comprometido de esperar resposta. Nesse caso, o proponente adotou
a teoria da recepção. Isto é, para que o contrato esteja formalizado, deve ser esperada a
resposta.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Se a resposta não chegar no prazo convencionado entre as partes. Aqui há uma convenção entre
as partes e que implicou a adoção da subteoria da recepção.

Portanto, a regra geral é a teoria da expedição. Excepcionalmente, adota-se a teoria da recepção.

É correto afirmar que o Código Civil adotou a teoria da expedição, mas também adotou a teoria da
recepção.

O art. 435 diz “reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”. Se houver
contraproposta, por ser nova proposta, terá como lugar o local em que foi celebrada a contraproposta.

Essa norma do art. 435 vale para os contratos nacionais. Isso porque a LINDB, art. 9º, §2º, trata dos
contratos internacionais. Portanto, a obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em
que resida o proponente, e não o lugar em que foi feita a proposta.

c) Fase do contrato preliminar (facultativa)

Também denominado pré-contrato, ou pactum de contraendo.

A fase de contrato preliminar não é obrigatória.

O contrato preliminar, salvo em relação à forma, deve observar os mesmos requisitos do contrato
definitivo.

Ex.: compra e venda de um imóvel cujo valor de imóvel supere 30 vezes o maior salário mínimo
vigente exige escritura pública, mas o contrato preliminar dispensará essa escritura pública.

São dois os tipos de contrato preliminar previsto no direito brasileiro:

• Compromisso unilateral de contrato (contrato de opção):


Nesta hipótese somente uma das partes se obriga a celebrar o contrato definitivo. Para o outro
contratante há uma opção, podendo ele celebrar ou não o contrato definitivo. O art. 466 diz que,
se a promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a mesma sem efeito, deve
se manifestar no prazo previsto ali.
Se ele não se manifestar, perderá este direito. Se não houver prazo para se manifestar, deverá
ser feito no prazo razoavelmente assinado pelo devedor, que é aquele que se sujeita, que é o
único que se sujeita a cumprir o contrato.

• Compromisso bilateral de contrato:


As duas partes vão assinar o instrumento e ao mesmo tempo vão assumir a obrigação de celebrar
o contrato definitivo.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Contrato preliminar que ganha relevância é o contrato preliminar para compra e venda de bens
imóveis. Isso porque aqui é preciso diferenciar o efeito do compromisso quando o contrato preliminar é
registrado ou não na matrícula do imóvel.

Em verdade, há o compromisso preliminar de compra e venda quando este instrumento não estiver
registrado. Segundo a melhor doutrina, se o registro ocorrer, aí estaremos diante de um direito real de
aquisição do promitente comprador, podendo promover uma ação de adjudicação compulsória.

O art. 463, parágrafo único, diz que o contrato preliminar deve ser levado ao registro competente.
A leitura que é feita neste dispositivo é no sentido de que o registro é necessário para que o contrato
preliminar tenha efeitos perante terceiros. Isto é, mesmo que o contrato preliminar não tenha sido
registrado, terá efeito entre as partes.

Se tiver um contrato preliminar de compra e venda de imóvel e leva-se a registro, passa-se a ter
um não apenas um contrato preliminar, mas também um direito real de aquisição do imóvel. Se houver um
contrato preliminar bilateral de imóvel não registrado, aí o compromissário comprador terá 3 opções, as
quais poderá exercer se o vendedor se negar a celebrar o contrato definitivo, desde que não conste a
denominada cláusula de arrependimento:

• Exigir tutela específica: neste caso, exigirá que o vendedor celebre o contrato definitivo.
• Juiz poderá suprir a vontade do inadimplente: caso o vendedor não celebre, o juiz suprirá a
vontade do inadimplente, caso em que confere caráter definitivo ao contrato preliminar.
• Converter a obrigação em perdas e danos: deve ser feita a leitura com base no princípio da
preservação do contrato.

Se o contrato preliminar estiver registrado, haverá o direito real de aquisição, hipótese em que o
único caminho é a adjudicação compulsória.

d) Fase de contrato definitivo

A fase de contrato definitivo gera todas as suas consequências avençadas.

V. Revisão judicial dos contratos por fato superveniente

Extrai-se a revisão da leitura dos arts. 317 e 478 do CC.

Existem duas correntes sobre qual seria a teoria adotada no CC sobre fato superveniente.

211
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

1ªC: diz que o Código Civil adotou a teoria da imprevisão, pela cláusula rebus sic stantibus. Esta é a
doutrina majoritária. Neste caso, analisa-se o fato imprevisível e a partir daí é possível a revisão. Este fato
é superveniente.

2ªC: para outra corrente, é adotada a denominada teoria da onerosidade excessiva.

O CC/02 vai consagrar a revisão contratual por fato superveniente diante de uma imprevisibilidade
somada a uma onerosidade excessiva.

Os requisitos para se fazer uma revisão judicial do contrato por fato superveniente são:

• Contrato deve ser bilateral e sinalagmático (ou excepcionalmente unilateral)


• Contrato deve ser oneroso
• Contrato deve assumir a forma comutativa: contrato aleatório não é possível, pois álea é da
sorte. Lembrando que o contrato de seguro poderá ser revisado, pois, apesar de ser aleatório,
admite-se que seja revisada as parcelas mensais, as quais são comutativas.
• Contrato deve ser de execução diferida ou de trato sucessivo
• Contrato deve apresentar uma desproporcionalidade da prestação por um acontecimento
imprevisível ou extraordinário: o Enunciado 17 do CJF diz que a interpretação dos motivos
imprevisíveis, constantes do art. 317 do CC, deve abarcar tanto casos de desproporção não
previsíveis, como causas previsíveis, mas de resultados imprevisíveis. No mesmo sentido, o
Enunciado 175 do CJF, que diz que a menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade, prevista
no art. 478, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gera o desequilíbrio, mas
também que o fato seja imprevisível, devendo ser reavaliado em relação às consequências que
esse fato produz. Mesmo que o fato seja previsível, se o resultado for imprevisível, caberá a
revisão.
• A imprevisibilidade ou extraordinariedade deve gerar onerosidade excessiva: deverá estar
presente esta quebra do sinalagma obrigacional.

Atente-se que a mora não é requisito para a revisão contratual, e nem mesmo a ausência de mora.
O fato de oferecer uma ação de revisão contratual não descaracteriza a mora. Caso haja uma cláusula nula,
ou até mesmo um juro abusivo, aí poderá até mesmo discutir a mora.

O mero oferecimento da ação revisional não desconstitui a mora. Mesmo assim poderá propor a
ação.

A jurisprudência tem entendido pela necessidade de depósito da parte incontroversa. Apesar da


onerosidade excessiva, o sujeito afirma que poderá pagar um valor X, o qual deverá passar a depositar, visto
que se trata de valor incontroverso, podendo ser em juízo ou fora dele.
212
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Este entendimento teve a regra repetida e ampliada no Novo CPC, motivo pelo qual passou a ser um
requisito da petição inicial para esses casos, sob pena de inépcia da inicial.

O art. 302, §2º, do NCPC diz que, nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente
de empréstimo, financiamento, alienação de bens, etc., o autor tem que, sob pena de inépcia, discriminar na
petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o
valor incontroverso do débito. O §3º vai dizer que o valor incontroverso deve continuar a ser pago no tempo
e no modo em que contratados.

VI. Revisão contratual por fato superveniente no Código de Defesa do Consumidor

O art. 6º, V, do CDC diz que são direitos básicos do consumidor a modificação das cláusulas
contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes
que as tornem excessivamente onerosas.

O CPC está dizendo que se o fato superveniente tornar excessivamente onerosa poderá ser revisado
o contrato. Não fala nada sobre a excepcionalidade e extraordinariedade do fato superveniente. Basta que
seja superveniente este fato.

Portanto, o CDC não adota a teoria da imprevisão. Basta um fato novo, um fato superveniente que
gera o desequilíbrio, motivo pelo qual o CDC adotou a teoria da base objetiva do negócio jurídico.

VII. Vícios redibitórios

Os vícios redibitórios são conceituados como defeitos que desvalorizam a coisa ou que tornam essa
coisa imprópria para o seu uso.

O conceito adotado pela doutrina majoritária indica que estes vícios devem ser ocultos. No entanto,
o Código Civil trata de casos em que tais vícios sejam aparentes.

Observa-se que Flávio Tartuce diz que não é possível confundir vício redibitório com erro.

• Vício redibitório: o problema atinge a coisa ou o objeto do contrato, ou seja, o vício deprecia o
valor da coisa. No caso de vício redibitório, há o atingimento na eficácia contratual, podendo
gerar a revisão ou resolução do contrato.
• Erro: o erro é do consentimento, se enganando sozinha, tendo uma concepção errada da
realidade. No caso de erro, há a análise no plano da validade, pois o contrato poderá ser anulado
por vício do consentimento.

213
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Existe uma garantia legal contra os vícios redibitórios, no caso dos contratos bilaterais,
sinalagmáticos, oneroso e comutativo. Exemplo é a compra e venda.

No caso de contratos aleatórios é possível falar em vício redibitório?

SIM, desde que seja em relação aos seus elementos comutativos. Quando é firmado um contrato
de venda da esperança de coisa esperada, é possível entregar 10 ou 100, mas caso não entregue nada, estará
resolvido o contrato. Então, caso seja comprado a colheita de soja. No final das contas, poderá entregar 100
sacas de soja ou 1000 sacas de soja. Este é o elemento aleatório, mas deverá ser prestado. Caso a soja esteja
estragada, ou imprópria para o uso a que se destina, haverá o vício redibitório, que é o elemento comutativo
dentro do contrato aleatório.

O adquirente prejudicado pelo vício redibitório poderá fazer o uso de ações edilícias, sendo este o
nome dado às ações decorrente de vício redibitório, prevista no art. 442.

Por meio das ações edilícias, o adquirente poderá:

• Ação quanti minoris (ou ação estimatória): neste caso, o adquirente pedirá o abatimento do
preço.
• Ação redibitória: é uma ação que visa a resolução do contrato, sem prejuízo de perdas e danos,
se o vendedor tiver agido de má-fé. Está prevista no art. 443 do CC.

No entanto, com base no princípio da preservação do contrato, deverá fazer uso da ação quanti
minoris ao invés da resolução do contrato.

Como as ações edilícias são ações desconstitutivas, ou constitutivas negativas, os prazos previstos no
art. 445 são decadenciais, pois se trata de direito potestativo.

Quais são os prazos?

• Vício aparente
O art. 445 diz que o adquirente decai o direito de redibição ou de abatimento do preço no prazo
de 30 dias se a coisa for móvel ou no prazo de 1 ano se a coisa for imóvel, contados da entrega
definitiva da coisa.
Se o adquirente já estava na posse da coisa ou do bem, o prazo será contado da alienação da
coisa. Neste caso, será reduzido pela metade: 15 dias se for bem móvel e prazo de 6 meses se
for bem imóvel.

• Vício oculto

214
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Se o vício só puder ser conhecido mais tarde, o prazo começará a ser contado a partir de o
momento em que o adquirente tiver ciência do vício, tendo o prazo de 180 dias para a ação
estimatória ou redibitória, se for bem móvel, ou o prazo de 1 anos para a ação estimatória ou
redibitória, se o bem for imóvel.

Observa-se que no caso de venda de animais (bens semoventes), o prazo de garantia dos vícios
redibitórios são os prazos previstos numa legislação ordinária especial, podendo ser o próprio CDC, como
é o caso em que se compra um cachorro num Pet Shop.

Se não houver previsão legal, deverá ser aplicado os prazos de costume, segundo os usos e
costumes locais, típicos de região rural.

Na falta de costumes e usos locais, serão aplicados o art. 445 do Código Civil, pois os animais são
bens móveis semoventes. Caso seja vício evidente, haverá o prazo de 30 dias, não sendo evidente o prazo
será de 180 dias.

Com relação ao art. 446, estabelece que não correrão os prazos do art. 445 na constância de cláusula
de garantia. Mas aqui a cláusula de garantia, na verdade, durante ao prazo em que há uma garantia
contratual não corre a garantia legal. No entanto, a lei continua no art. 446, estabelecendo que o adquirente
deve denunciar o defeito ao alienante nos 30 dias seguintes ao descobrimento desse defeito, sob pena de
decadência.

Ou seja, há o prazo de 445, que é o prazo de garantia legal, mas se houver uma garantia contratual,
este prazo de garantia legal somente será contado a partir do encerramento do prazo de garantia
convencional.

Todavia, se durante o prazo de garantia contratual for descoberto um vício, haverá 30 dias para
informar o alienante. Se não o fizer, decairá da garantia convencional, e começa a correr a garantia legal.
A decadência prevista no art. 446 está ligada à perda da garantia contratual e não à possibilidade de se
ingressar com a ação edilícia.

Findo o prazo de garantia convencional, e o adquirente não tendo exercido o seu direito no prazo de
30 dias, começam a contar os prazos legais do art. 445.

VIII. Evicção

Evicção é a perda da coisa, diante de uma decisão judicial ou de um ato administrativo, que atribui
esta coisa a terceiro. A evicção pode ser total ou parcial.

215
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O STJ vai dizer que, para que o evicto possa exercer os direitos resultantes da evicção, na hipótese
em que a coisa é perdida por decisão judicial, não é preciso aguardar o trânsito em julgado da decisão
judicial que reconhece que o direito pertence a terceiro.

Na evicção há a perda do bem por conta de um vício anterior à celebração do negócio. Este vício
anterior é o fato determinante da evicção.

O art. 447 do CC nos faz perceber que há uma garantia legal em relação à perda da coisa que foi
celebrado no negócio jurídico. Portanto, atinge-se contratos bilaterais, onerosos e comutativos, mesmo
que a coisa tenha sido adquirida em hasta pública.

São partes da evicção (elementos subjetivos da evicção):

• Alienante: quem transferiu a coisa viciada.


• Adquirente (evicto): quem comprou a coisa viciada e agora perdeu a coisa.
• Terceiro (evictor): tem a decisão judicial ou ato administrativo em seu favor.

O art. 199, III, do CC, diz que não corre a prescrição enquanto pender a ação de evicção. Somente
após o trânsito em julgado da sentença é que o prazo prescricional, que visa o ressarcimento em razão da
evicção, é que começa a correr.

A responsabilidade pela evicção deriva da lei, não precisando estar prevista no contrato.

Todavia, as partes podem reforçar, atenuar ou mesmo agravar os efeitos da evicção, conforme o art.
448 do CC.

Em relação ao reforço da evicção, tem-se entendido que há um limite, que é o limite do dobro do
valor da coisa. É uma pena, mas tem esse limite, mas que se tem entendido doutrinariamente.

Em relação a exclusão da responsabilidade, também é possível, mas para tanto essa exclusão deve
ser feita de forma expressa, denominada cláusula de non praestanda evictione, ou cláusula de não
responsabilidade pela evicção.

Todavia, ainda que seja excluída a responsabilidade pela evicção, se esta evicção acontecer, o
adquirente tem o direito ao preço da coisa que ele pagou, ou seja, de ser ressarcido pelo alienante, por
conta da vedação do enriquecimento sem causa.

Mas isto desde que o adquirente não soubesse do risco da evicção, ou, que sabendo do risco da
evicção informado pelo alienante, não tenha assumido o risco, tendo direito ao que pagou pela coisa. Se ele
assumiu o risco, não terá direito sequer ao preço da coisa.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 450 do CC diz que o evicto prejudicado pode pleitear do alienante, nos casos de evicção total,
a restituição integral do preço pago. Levará em conta o valor da época em que essa coisa se perdeu.

Outra possibilidade é que o evicto requeira a indenização dos frutos a que tiver sido obrigado a
restituir ao evictor.

Ainda, terá direito à indenização pelas despesas de contratos, pelos prejuízos que resultaram da
evicção, danos emergentes, despesas com escritura, lucros cessantes, danos morais, danos materiais etc.

O evicto tem direito em face do alienante o direito de ressarcimento pelas custas judiciais e pelos
honorários advocatícios que teve que arcar.

O evicto (adquirente) tem direito em face do alienante de obter a indenização pelas benfeitorias
necessárias e úteis que não tenham sido abonadas pelo evictor.

Se essas benfeitorias foram abonadas, e elas tenham sido feitas pelo alienante, ele terá direito que
estes valores sejam debitados, levados em conta no momento da restituição devida.

Se quem fez a benfeitoria útil foi o alienante (ex.: 100 mil reais), e o evictor pagou para o adquirente.
Quando o adquirente for cobrar o valor de 1 milhão do alienante, que seria o valor da propriedade, deverá
abater esses 100 mil que já recebeu pelas benfeitorias feitas pelo alienante.

O art. 451 do CC diz que a responsabilidade do alienante pela evicção total ou parcial permanece,
ainda que a coisa alienada esteja deteriorada, salvo se houver dolo do adquirente.

Mesmo que deteriorada, o alienante é responsável pela evicção.

Se o evicto tiver auferido vantagem da deterioração, ou desde que não tenha sido condenado a pagar
esses valores ao evictor, essas vantagens também devem ser deduzidas em relação às despesas que se
pleiteia em face do alienante. É o art. 452 vedando o enriquecimento sem causa.

Se a evicção for parcial, aí haverá duas regras previstas no art. 455. Se a evicção for parcial, mas for
considerável, o adquirente pode optar pela rescisão do contrato ou a restituição da parte do preço
correspondente ao desfalque que experimentou.

Se a evicção é parcial, mas não foi considerável, a lei vai dizer que o evicto só pode pleitear a
indenização correspondente a esse desfalque que experimentou (perdas e danos), mas o negócio é
mantido. Há aqui que descobrir se o prejuízo foi considerável.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Vale ressaltar que, com relação à evicção, normalmente fala-se em denunciação da lide. Neste caso,
será chamado alguém que tenha responsabilidade para que esta pessoa assuma e viabilize o direito de
regresso.

A denunciação da lide não é mais obrigatória, isto é, não o fazendo, mesmo assim é possível propor
ação autônoma, visando o seu ressarcimento.

Atualmente, com o NCPC, não cabe mais a denominada denunciação da lide per saltum, devendo
denunciar o alienante imediato.

No art. 128, II, o NCPC diz que feita a denunciação pelo réu, se o denunciado for revel, o denunciante
poderá deixar de prosseguir com a defesa, ou abster de recorrer, restringindo à atuação à ação regressiva.

Por fim, o art. 457 do CC diz que não pode o adquirente demandar pela evicção se sabia que a coisa
alheia era litigiosa. Isto é, veda-se que o evicto demande o alienante se ele tinha o conhecimento do vício,
do risco de perder aquela coisa. Neste caso, não há boa-fé.

Teoria Geral dos Contratos (cont.)

1. Teoria Geral dos Contratos (continuação)

IV. Formação do contrato pelo Código Civil

Como se sabe, o contrato nasce da conjunção de vontades, podendo ser de duas ou mais
vantagens, caso seja plurilateral.

É possível identificar 4 fases na formação de um contrato:

• Fase de negociações preliminares

• Fase de proposta

• Fase do contrato preliminar (facultativa)

• Fase da formação do contrato definitivo

a) Fase de negociações preliminares (de puntuação)

A fase de negociações preliminares é a fase em que ocorre os debates prévios, tratativas,


não sendo prevista expressamente no código.
218
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

É conhecida também como fase da proposta não formalizada. Ex.: quando há uma carta
de intenções.

Apesar de não haver previsão clássica da fase de negociações preliminares, a doutrina


tem entendido a possibilidade de responsabilização nesta fase, por meio da aplicação do
princípio da boa-fé objetiva.

b) Fase da proposta formalizada (de policitação ou de oblação)

Esta fase também é denominada de fase da oferta formalizada.

Aqui há uma manifestação de vontade de contratar, situação em que uma das partes
solicita a concordância com a outra parte.

O art. 427 vai dizer que a proposta vincula o proponente.

Quando se fala em proposta, há duas partes: proponente (policitante ou solicitante), que


é quem formula a proposta e do outro há o policitado ou oblato, ou o solicitado, que é quem
recebe a proposta.

O art. 428 do CC vai consagrar as hipóteses em que essa proposta deixa de ser obrigatória.
Em tese ela obriga o proponente, mas em algumas hipóteses deixa ela de ser obrigatória:

• A proposta feita sem prazo a uma pessoa presente, deixa de ser obrigatória caso não tenha
sido imediatamente aceita (ex.: proposta feita pelo telefone, por WhatsApp, caso a pessoa
esteja online e visualizou a proposta).

• A proposta feita sem prazo ao ausente, mas que tenha decorrido tempo suficiente para a
resposta chegar ao conhecimento do proponente, deixa de ser obrigatória.

• A proposta feita ao ausente que não tiver sido expedida a resposta dentro do prazo dado pelo
proponente, deixa de ser obrigatória.

• Antes da proposta, ou juntamente com a proposta, chegar ao conhecimento do oblato ou do


solicitado a retratação do proponente, deixa de ser obrigatória.

O art. 430 do CC diz que, se a aceitação, por uma circunstância imprevista, chegar tarde ao
conhecimento do proponente, este deverá comunicar o fato imediatamente ao aceitante, sob
pena de perdas e danos. Este dispositivo consagra a boa-fé objetiva.
219
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Caso o solicitado receba a proposta e altere o seu conteúdo, encaminhando a aceitação ao


proponente, haverá aqui uma contraproposta, ou seja, uma nova proposta. Ou seja, a aceitação
fora do prazo, ou com uma restrição, com modificação, é considerada uma nova proposta, vindo
com isso uma inversão dos papéis.

O art. 432 do CC diz que se o negócio for daqueles em que não seja costume a aceitação
expressa (ou seja, haja o costume de uma aceitação implícita), ou o proponente a tiver
dispensado, será reputar concluído o contrato, não chegando a tempo a recusa.

Há aqui um silêncio eloquente. Lembre-se que a regra é de que o silêncio importa recusa.

Se a proposta é feita entre ausentes, o contrato reputa-se concluído a partir do momento


em que a aceitação for expedida (art. 434). Há aqui a aplicação da teoria da expedição. Na
verdade há a teoria da agnição (da informação), mas dentro dela há adoção da teoria da
expedição. Esta é a regra, mas há exceções.

O Código Civil, adotando a teoria da agnição, adota em certas hipóteses a teoria da


recepção. Neste caso, em determinados momentos, o contrato será formado quando a proposta
que foi aceita for recebida essa aceitação pelo proponente.

A teoria da recepção será aplicada nos seguintes casos:

• Se, antes da aceitação, ou com ela, chegar ao proponente a retratação do aceitante, considera-
se que não há celebração do contrato. Ou seja, ainda que o aceitante já tenha expedido a
aceitação, antes de o proponente receber esta aceitação, já chegou a retratação. A lei
considerará a teoria da recepção.

• Se o proponente tiver se comprometido de esperar resposta. Nesse caso, o proponente adotou


a teoria da recepção. Isto é, para que o contrato esteja formalizado, deve ser esperada a
resposta.

• Se a resposta não chegar no prazo convencionado entre as partes. Aqui há uma convenção entre
as partes e que implicou a adoção da subteoria da recepção.

Portanto, a regra é a teoria da expedição. Excepcionalmente, adota-se a teoria da


recepção.

É correto afirmar que o Código Civil adotou a teoria da expedição, mas também adotou a
220
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

teoria da recepção.

O art. 435 diz “reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”. Se houver
contraproposta, por ser nova proposta, terá como lugar o local em que foi celebrada a
contraproposta.

Essa norma do art. 435 vale para os contratos nacionais. Isso porque a LINDB, art. 9º, §2º,
trata dos contratos internacionais. Portanto, a obrigação resultante do contrato reputa-se
constituída no lugar em que resida o proponente, e não o lugar em que foi feita a proposta.

c) Fase do contrato preliminar (facultativa)

Também denominado pré-contrato, ou pactum de contraendo.

A fase de contrato preliminar não é obrigatória.

O contrato preliminar, salvo em relação à forma, deve observar os mesmos requisitos do


contrato definitivo.

Ex.: compra e venda de um imóvel cujo valor de imóvel supere 30 vezes o maior salário
mínimo vigente exige escritura pública, mas o contrato preliminar dispensará essa escritura
pública.

São dois os tipos de contrato preliminar previsto no direito brasileiro:

• Compromisso unilateral de contrato (contrato de opção):

Nesta hipótese somente uma das partes se obriga a celebrar o contrato definitivo. Para o outro
contratante há uma opção, podendo ele celebrar ou não o contrato definitivo. O art. 466 diz que, se a
promessa de contrato for unilateral, o credor, sob pena de ficar a mesma sem efeito, deve se manifestar no
prazo previsto ali.
Se ele não se manifestar, perderá este direito. Se não houver prazo para se manifestar, deverá ser
feito no prazo razoavelmente assinado pelo devedor, que é aquele que se sujeita, que é o único que se sujeita
a cumprir o contrato.
• Compromisso bilateral de contrato:

As duas partes vão assinar o instrumento e ao mesmo tempo vão assumir a obrigação de celebrar o
contrato definitivo.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Contrato preliminar que ganha relevância é o contrato preliminar para compra e venda de
bens imóveis. Isso porque aqui é preciso diferenciar o efeito do compromisso quando o contrato
preliminar é registrado ou não na matrícula do imóvel.

Em verdade, há o compromisso preliminar de compra e venda quando este instrumento


não estiver registrado. Segundo a melhor doutrina, se o registro ocorrer, aí estaremos diante de
um direito real de aquisição do promitente comprador, podendo promover uma ação de
adjudicação compulsória.

O art. 463, parágrafo único, diz que o contrato preliminar deve ser levado ao registro
competente. A leitura que é feita neste dispositivo é no sentido de que o registro é necessário
para que o contrato preliminar tenha efeitos perante terceiros. Isto é, mesmo que o contrato
preliminar não tenha sido registrado, terá efeito entre as partes.

Se tiver um contrato preliminar de compra e venda de imóvel e leva-se a registro, passa-


se a ter um não apenas um contrato preliminar, mas também um direito real de aquisição do
imóvel. Se houver um contrato preliminar bilateral de imóvel não registrado, aí o
compromissário comprador terá 3 opções, as quais poderá exercer se o vendedor se negar a
celebrar o contrato definitivo, desde que não conste a denominada cláusula de arrependimento:

• Exigir tutela específica: neste caso, exigirá que o vendedor celebre o contrato definitivo.

• Juiz poderá suprir a vontade do inadimplente: caso o vendedor não celebre, o juiz suprirá a
vontade do inadimplente, caso em que confere caráter definitivo ao contrato preliminar.

• Converter a obrigação em perdas e danos: deve ser feita a leitura com base no princípio da
preservação do contrato.

Se o contrato preliminar estiver registrado, haverá o direito real de aquisição, hipótese em


que o único caminho é a adjudicação compulsória.

d) Fase de contrato definitivo

A fase de contrato definitivo gera todas as suas consequências avençadas.

V. Revisão judicial dos contratos por fato superveniente

Extrai-se a revisão da leitura dos arts. 317 e 478 do CC.


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Existem duas correntes sobre qual seria a teoria adotada no CC sobre fato superveniente.

1ªC: diz que o Código Civil adotou a teoria da imprevisão, pela cláusula rebus sic stantibus.
Esta é a doutrina majoritária. Neste caso, analisa-se o fato imprevisível e a partir daí é possível a
revisão. Este fato é superveniente.

2ªC: para outra corrente, é adotada a denominada teoria da onerosidade excessiva.

O CC/02 vai consagrar a revisão contratual por fato superveniente diante de uma
imprevisibilidade somada a uma onerosidade excessiva.

Os requisitos para se fazer uma revisão judicial do contrato por fato superveniente são:

• Contrato deve ser bilateral e sinalagmático (ou excepcionalmente unilateral)

• Contrato deve ser oneroso

• Contrato deve assumir a forma comutativa: contrato aleatório não é possível, pois álea é da
sorte. Lembrando que o contrato de seguro poderá ser revisado, pois, apesar de ser aleatório,
admite-se que seja revisada as parcelas mensais, as quais são comutativas.

• Contrato deve ser de execução diferida ou de trato sucessivo

• Contrato deve apresentar uma desproporcionalidade da prestação por um acontecimento


imprevisível ou extraordinário: o Enunciado 17 do CJF diz que a interpretação dos motivos
imprevisíveis, constantes do art. 317 do CC, deve abarcar tanto casos de desproporção não
previsíveis, como causas previsíveis, mas de resultados imprevisíveis. No mesmo sentido, o
Enunciado 175 do CJF, que diz que a menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade, prevista
no art. 478, deve ser interpretada não somente em relação ao fato que gera o desequilíbrio, mas
também que o fato seja imprevisível, devendo ser reavaliado em relação às consequências que
esse fato produz. Mesmo que o fato seja previsível, se o resultado for imprevisível, caberá a
revisão.

• A imprevisibilidade ou extraordinariedade deve gerar onerosidade excessiva: deverá estar


presente esta quebra do sinalagma obrigacional.

Atente-se que a mora não é requisito para a revisão contratual, e nem mesmo a ausência
de mora. O fato de oferecer uma ação de revisão contratual não descaracteriza a mora. Caso haja
uma cláusula nula, ou até mesmo um juro abusivo, aí poderá até mesmo discutir a mora.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O mero oferecimento da ação revisional não desconstitui a mora. Mesmo assim poderá
propor a ação.

A jurisprudência tem entendido pela necessidade de depósito da parte incontroversa.


Apesar da onerosidade excessiva, o sujeito afirma que poderá pagar um valor X, o qual deverá
passar a depositar, visto que se trata de valor incontroverso, podendo ser em juízo ou fora dele.

Este entendimento teve a regra repetida e ampliada no Novo CPC, motivo pelo qual passou
a ser um requisito da petição inicial para esses casos, sob pena de inépcia da inicial.

O art. 302, §2º, do NCPC diz que, nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação
decorrente de empréstimo, financiamento, alienação de bens, etc., o autor tem que, sob pena de
inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende
controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito. O §3º vai dizer que o valor
incontroverso deve continuar a ser pago no tempo e no modo em que contratados.

VI. Revisão contratual por fato superveniente no Código de Defesa do Consumidor

O art. 6º, V, do CDC diz que são direitos básicos do consumidor a modificação das cláusulas
contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos
supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.

O CPC está dizendo que se o fato superveniente tornar excessivamente onerosa poderá ser
revisado o contrato. Não fala nada sobre a excepcionalidade e extraordinariedade do fato
superveniente. Basta que seja superveniente este fato.

Portanto, o CDC não adota a teoria da imprevisão. Basta um fato novo, um fato
superveniente que gera o desequilíbrio, motivo pelo qual o CDC adotou a teoria da base objetiva
do negócio jurídico.

VII. Vícios redibitórios

Os vícios redibitórios são conceituados como defeitos que desvalorizam a coisa ou que
tornam essa coisa imprópria para o seu uso.

O conceito adotado pela doutrina majoritária indica que estes vícios devem ser ocultos.
No entanto, o Código Civil trata de casos em que tais vícios sejam aparentes.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Observa-se que Flávio Tartuce diz que não é possível confundir vício redibitório com erro.

• Vício redibitório: o problema atinge a coisa ou o objeto do contrato, ou seja, o vício deprecia o
valor da coisa. No caso de vício redibitório, há o atingimento na eficácia contratual, podendo
gerar a revisão ou resolução do contrato.

• Erro: o erro é do consentimento, se enganando sozinha, tendo uma concepção errada da


realidade. No caso de erro, há a análise no plano da validade, pois o contrato poderá ser anulado
por vício do consentimento.

Existe uma garantia legal contra os vícios redibitórios, no caso dos contratos bilaterais,
sinalagmáticos, oneroso e comutativo. Exemplo é a compra e venda.

No caso de contratos aleatórios é possível falar em vício redibitório?

SIM, desde que seja em relação aos seus elementos comutativos. Quando é firmado um
contrato de venda da esperança de coisa esperada, é possível entregar 10 ou 100, mas caso não
entregue nada, estará resolvido o contrato. Então, caso seja comprado a colheita de soja. No final
das contas, poderá entregar 100 sacas de soja ou 1000 sacas de soja. Este é o elemento aleatório,
mas deverá ser prestado. Caso a soja esteja estragada, ou imprópria para o uso a que se destina,
haverá o vício redibitório, que é o elemento comutativo dentro do contrato aleatório.

O adquirente prejudicado pelo vício redibitório poderá fazer o uso de ações edilícias,
sendo este o nome dado às ações decorrentes de vício redibitório, prevista no art. 442.

Por meio das ações edilícias, o adquirente poderá:

• Ação quanti minoris (ou ação estimatória): neste caso, o adquirente pedirá o abatimento do
preço.

• Ação redibitória: é uma ação que visa a resolução do contrato, sem prejuízo de perdas e danos,
se o vendedor tiver agido de má-fé. Está prevista no art. 443 do CC.

No entanto, com base no princípio da preservação do contrato, deverá fazer uso da ação
quanti minoris ao invés da resolução do contrato.

Como as ações edilícias são ações desconstitutivas, ou constitutivas negativas, os prazos


previstos no art. 445 são decadenciais, pois se trata de direito potestativo.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Quais são os prazos?

• Vício aparente

O art. 445 diz que o adquirente decai o direito de redibição ou de abatimento do preço no prazo de
30 dias se a coisa for móvel ou no prazo de 1 ano se a coisa for imóvel, contados da entrega definitiva da
coisa.
Se o adquirente já estava na posse da coisa ou do bem, o prazo será contado da alienação da coisa.
Neste caso, será reduzido pela metade: 15 dias se for bem móvel e prazo de 6 meses se for bem imóvel.
• Vício oculto

Se o vício só puder ser conhecido mais tarde, o prazo começará a ser contado a partir de o momento
em que o adquirente tiver ciência do vício, tendo o prazo de 180 dias para a ação estimatória ou redibitória,
se for bem móvel, ou o prazo de 1 anos para a ação estimatória ou redibitória, se o bem for imóvel.

Observa-se que no caso de venda de animais (bens semoventes), o prazo de garantia dos
vícios redibitórios são os prazos previstos numa legislação ordinária especial, podendo ser o
próprio CDC, como é o caso em que se compra um cachorro num Pet Shop.

Se não houver previsão legal, deverá ser aplicado os prazos de costume, segundo os usos
e costumes locais, típicos de região rural.

Na falta de costumes e usos locais, serão aplicados o art. 445 do Código Civil, pois os
animais são bens móveis semoventes. Caso seja vício evidente, haverá o prazo de 30 dias, não
sendo evidente o prazo será de 180 dias.

Com relação ao art. 446, estabelece que não correrão os prazos do art. 445 na constância
de cláusula de garantia. Mas aqui a cláusula de garantia, na verdade, durante ao prazo em que
há uma garantia contratual não corre a garantia legal. No entanto, a lei continua no art. 446,
estabelecendo que o adquirente deve denunciar o defeito ao alienante nos 30 dias seguintes ao
descobrimento desse defeito, sob pena de decadência.

Ou seja, há o prazo de 445, que é o prazo de garantia legal, mas se houver uma garantia
contratual, este prazo de garantia legal somente será contado a partir do encerramento do prazo
de garantia convencional.

Todavia, se durante o prazo de garantia contratual for descoberto um vício, haverá 30

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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dias para informar o alienante. Se não o fizer, decairá da garantia convencional, e começa a
correr a garantia legal. A decadência prevista no art. 446 está ligada à perda da garantia contratual
e não à possibilidade de se ingressar com a ação edilícia.

Findo o prazo de garantia convencional, e o adquirente não tendo exercido o seu direito
no prazo de 30 dias, começam a contar os prazos legais do art. 445.

VIII. Evicção

Evicção é a perda da coisa, diante de uma decisão judicial ou de um ato administrativo,


que atribui esta coisa a terceiro. A evicção pode ser total ou parcial.

O STJ vai dizer que, para que o evicto possa exercer os direitos resultantes da evicção, na
hipótese em que a coisa é perdida por decisão judicial, não é preciso aguardar o trânsito em
julgado da decisão judicial que reconhece que o direito pertence a terceiro.

Na evicção há a perda do bem por conta de um vício anterior à celebração do negócio.


Este vício anterior é o fato determinante da evicção.

O art. 447 do CC nos faz perceber que há uma garantia legal em relação à perda da coisa
que foi celebrado no negócio jurídico. Portanto, atinge-se contratos bilaterais, onerosos e
comutativos, mesmo que a coisa tenha sido adquirida em hasta pública.

São partes da evicção (elementos subjetivos da evicção):

• Alienante: quem transferiu a coisa viciada.

• Adquirente (evicto): quem comprou a coisa viciada e agora perdeu a coisa.

• Terceiro (evictor): tem a decisão judicial ou ato administrativo em seu favor.

O art. 199, III, do CC, diz que não corre a prescrição enquanto pender a ação de evicção.
Somente após o trânsito em julgado da sentença é que o prazo prescricional, que visa o
ressarcimento em razão da evicção, é que começa a correr.

A responsabilidade pela evicção deriva da lei, não precisando estar prevista no contrato.

Todavia, as partes podem reforçar, atenuar ou mesmo agravar os efeitos da evicção,


conforme o art. 448 do CC.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Em relação ao reforço da evicção, tem-se entendido que há um limite, que é o limite do


dobro do valor da coisa. É uma pena, mas tem esse limite, mas que se tem entendido
doutrinariamente.

Em relação a exclusão da responsabilidade, também é possível, mas para tanto essa


exclusão deve ser feita de forma expressa, denominada cláusula de non praestanda evictione, ou
cláusula de não responsabilidade pela evicção.

Todavia, ainda que seja excluída a responsabilidade pela evicção, se esta evicção
acontecer, o adquirente tem o direito ao preço da coisa que ele pagou, ou seja, de ser ressarcido
pelo alienante, por conta da vedação do enriquecimento sem causa.

Mas isto desde que o adquirente não soubesse do risco da evicção, ou, que sabendo do
risco da evicção informado pelo alienante, não tenha assumido o risco, tendo direito ao que pagou
pela coisa. Se ele assumiu o risco, não terá direito sequer ao preço da coisa.

O art. 450 do CC diz que o evicto prejudicado pode pleitear do alienante, nos casos de
evicção total, a restituição integral do preço pago. Levará em conta o valor da época em que essa
coisa se perdeu.

Outra possibilidade é que o evicto requeira a indenização dos frutos a que tiver sido
obrigado a restituir ao evictor.

Ainda, terá direito à indenização pelas despesas de contratos, pelos prejuízos que
resultaram da evicção, danos emergentes, despesas com escritura, lucros cessantes, danos
morais, danos materiais etc.

O evicto tem direito em face do alienante o direito de ressarcimento pelas custas judiciais
e pelos honorários advocatícios que teve que arcar.

O evicto (adquirente) tem direito em face do alienante de obter a indenização pelas


benfeitorias necessárias e úteis que não tenham sido abonadas pelo evictor.

Se essas benfeitorias foram abonadas, e elas tenham sido feitas pelo alienante, ele terá
direito que estes valores sejam debitados, levados em conta no momento da restituição devida.

Se quem fez a benfeitoria útil foi o alienante (ex.: 100 mil reais), e o evictor pagou para o
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adquirente. Quando o adquirente for cobrar o valor de 1 milhão do alienante, que seria o valor da
propriedade, deverá abater esses 100 mil que já recebeu pelas benfeitorias feitas pelo alienante.

O art. 451 do CC diz que a responsabilidade do alienante pela evicção total ou parcial
permanece, ainda que a coisa alienada esteja deteriorada, salvo se houver dolo do adquirente.

Mesmo que deteriorada, o alienante é responsável pela evicção.

Se o evicto tiver auferido vantagem da deterioração, ou desde que não tenha sido
condenado a pagar esses valores ao evictor, essas vantagens também devem ser deduzidas em
relação às despesas que se pleiteia em face do alienante. É o art. 452 vedando o enriquecimento
sem causa.

Se a evicção for parcial, aí haverá duas regras previstas no art. 455. Se a evicção for parcial,
mas for considerável, o adquirente pode optar pela rescisão do contrato ou a restituição da
parte do preço correspondente ao desfalque que experimentou.

Se a evicção é parcial, mas não foi considerável, a lei vai dizer que o evicto só pode
pleitear a indenização correspondente a esse desfalque que experimentou (perdas e danos), mas
o negócio é mantido. Há aqui que descobrir se o prejuízo foi considerável.

Vale ressaltar que, com relação à evicção, normalmente fala-se em denunciação da lide.
Neste caso, será chamado alguém que tenha responsabilidade para que esta pessoa assuma e
viabilize o direito de regresso.

A denunciação da lide não é mais obrigatória, isto é, não o fazendo, mesmo assim é
possível propor ação autônoma, visando o seu ressarcimento.

Atualmente, com o NCPC, não cabe mais a denominada denunciação da lide per saltum,
devendo denunciar o alienante imediato.

No art. 128, II, o NCPC diz que feita a denunciação pelo réu, se o denunciado for revel, o
denunciante poderá deixar de prosseguir com a defesa, ou abster de recorrer, restringindo à
atuação à ação regressiva.

Por fim, o art. 457 do CC diz que não pode o adquirente demandar pela evicção se sabia
que a coisa alheia era litigiosa. Isto é, veda-se que o evicto demande o alienante se ele tinha o
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conhecimento do vício, do risco de perder aquela coisa. Neste caso, não há boa-fé.

Contratos em espécie

1. Contratos em espécie

I. Compra e venda

A compra e venda está previsto no art. 481 do CC.

a) Conceito

O art. 481 conceitua compra e venda, pois estabelece que, pelo contrato de compra e
venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-
lhe certo preço em dinheiro.

Trata-se de um contrato translativo, mas o contrato de compra e venda por si só não


transmite a propriedade, pois a propriedade móvel se transfere através da tradição, e a
transferência da propriedade imóvel se dá por meio do registro no cartório de registro
imobiliário.

O contrato de compra e venda só traz o compromisso do vendedor de transmitir essa


propriedade e promover a tradição ou o registro.

b) Natureza jurídica

A respeito da natureza jurídica da compra e venda, esta possui algumas características:

a) Contrato bilateral

• Contrato sinalagmático: as duas partes prestam e sabem, como regra, o que estão prestando.

• Contrato oneroso: há sacrifício patrimonial para ambas as partes

• Contrato comutativo: sabe de antemão quais são as prestações. Poderá assumir a forma de
contrato aleatório, como é o caso de compra da esperança (ex.: compra da colheita futura).

• Contrato consensual: reputa-se celebrado o contrato a partir do momento em que há encontro


das vontades. O art. 482 diz que, a compra e venda, quando pura, considera-se obrigatória e
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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perfeita, desde que as partes acordem quanto ao objeto e quanto ao preço.

c) Elementos constitutivos

São elementos constitutivos da compra e venda:

• Partes: as partes devem ser capazes.

• Coisa: a coisa deve ser lícita, determinada ou determinável. A coisa deve ser de propriedade do
vendedor, pois se estiver vendendo coisa que não é dele, será denominado de venda a non
domino. Neste caso, a lei nos faz concluir que a venda a non domino é caso de ineficácia perante
o seu real proprietário.

• Preço: deve ser certo e determinado, em moeda nacional corrente, e por um valor nominal, com
base no princípio do nominalismo.

i. Categorias especiais de preço

Existem algumas categorias especiais de preço:

• Preço por cotação: admitido no art. 487 do CC. Nos casos de compra e venda em que o preço
está fixado com base num índice, há um preço por cotação. Este índice permite uma objetiva
determinação, pois não há arbitrariedade de uma das partes. Poderá o preço ser fixados com
base na taxa de mercado, na bolsa de valores, etc.

• Preço por avaliação: o art. 485 permite que o preço seja arbitrado pelas partes ou por um
terceiro de sua confiança. Ex.: venda de um imóvel, mas chamarão 3 imobiliárias fazem a
avaliação.

• Preço tabelado ou preço médio: não são a mesma coisa. O art. 488 do CC diz que, convencionada
a venda sem fixação do preço ou sem a fixação de critérios para fixação do preço, se não houver
tabelamento oficial (preço fixado pelo Estado), entende-se que as partes se sujeitaram ao preço
médio ou corrente, nas vendas habituais do vendedor.

O parágrafo único vai dizer que, não havendo acordo sobre o preço, vai prevalecer o preço médio.
Ou seja, na falta de acordo sobre o preço, não se presume que está concluída a compra e venda.
O parágrafo único do art. 488 somente se aplica se houver uma diversidade de preços
habitualmente praticado pelo vendedor. Se o vendedor possui diversos preços praticados, vai
valer o termo médio.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Preço unilateral: o art. 489 consagra a nulidade da compra e venda se a fixação do preço for
deixada ao livre arbítrio de uma das partes. No entanto, o preço unilateral é o preço fixado por
uma das partes unilateralmente, mas sem que haja a arbitrariedade, sem a liberdade de
arbítrio. O que o comando legal veda é o preço manipulado por cartéis.

d) Estrutura sinalagmática e os efeitos da compra e venda

O conceito de sinalagma tem uma relação íntima com o equilíbrio contratual. O direito do
comprador é de receber a coisa, mas o devedor tem o direito de receber o preço.

Dessa estrutura sinalagmática é possível extrair que os riscos relacionados à coisa, ao


preço, ao transporte da coisa, ao registro, vão correr ora por parte do comprador ora por parte do
vendedor.

• Risco em relação a coisa correm por conta do vendedor: é o vendedor que tem a obrigação de
entregar a coisa ao comprador. Enquanto não ocorre essa tradição, a coisa é do vendedor. É a
tradição que transmite a propriedade (res perit domino).

• Risco do preço corre por conta do comprador: isso porque ainda não houve a tradição.

• Despesas com transporte da coisa: via de regra correm por conta do vendedor, salvo se
estipularem de forma diferente.

• Despesas com escritura e despesas com o registro: são pagas pelo comprador.

O art. 491 do CC diz que não sendo a venda à crédito ou à prazo, o vendedor não é
obrigado entregar a coisa antes de receber o preço.

O art. 492 traz a regra que diz que, até o momento da tradição, os riscos correm por conta
do vendedor, e os riscos do preço peço comprador.

Os casos fortuitos que ocorrerem no ato de contar, marcar ou de assinalar as coisas (ex.:
gado marcado e pesado), se elas já estiverem à disposição do comprador, os riscos correrão pelo
comprador. Ex.: o vendedor já levou os gados para a fazenda do comprador, situação em que ele
já está marcando o gado. Se naquele momento ocorrer um caso fortuito e o gado vier a se perder,
os riscos do gado correrão por conta do comprador, visto que a coisa já estava à disposição do
comprador.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Também correrão os riscos por conta do comprador, se este estiver em mora de receber
as coisas, desde que estejam à sua disposição no tempo em que foi ajustado, no modo e da forma
ajustada.

Em relação à tradição da coisa vendida, se não houver estipulação entre as partes, a


tradição irá ocorrer no lugar onde se encontrava a coisa ao tempo em que foi celebrada a venda.
As despesas com a tradição via de regra correm pelo vendedor, mas a coisa deverá ser entregue
no lugar onde estava quando foi pactuado o contrato, salvo se houver disposição diversa.

É possível que as partes negociem a expedição da coisa por parte do vendedor. Isso é
comum nas vendas realizadas fora do estabelecimento comercial.

Nesses casos, se a coisa é expedida para um lugar diverso, por ordem e por conta do
comprador, correrão os riscos por conta dele, salvo se o vendedor não seguir as instruções do
comprador.

O art. 495 do CC diz que, não obstante o prazo ajustado para o pagamento, se antes da
tradição o comprador cair em insolvência civil, poderá o vendedor sobrestar a entrega da coisa
até que o comprador lhe dê garantias, seja real ou fidejussória, de que vai pagar o preço por
aquela coisa. Há aqui exceptio non adimpleti contractus, há um inadimplemento antes da entrega
da coisa.

e) Restrições à autonomia privada na compra e venda

i. Venda de ascendente a descendente

O art. 496 do CC diz que é anulável a venda de ascendente a descendente, salvo se os


outros descendentes e o cônjuge do alienante expressamente houverem consentido.

O parágrafo único desse dispositivo dispensa o consentimento do cônjuge se o regime for


de separação obrigatória de bens.

Este dispositivo é uma norma restritiva de direitos, não admitindo interpretação extensiva
e nem analogia aos casos de união estável.

O prazo para anular essa venda de ascendente para descendente é um prazo decadencial
de 2 anos, contado da celebração do negócio.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O Enunciado 545 do CJF diz que o prazo para anular esse contrato de 2 anos é contado da
ciência do ato, e que esta ciência se presume absolutamente quando houver um registro dessa
transferência.

A jurisprudência do STJ tem entendido que a anulação da venda de ascendente para


descendente só será admissível se houver prova do prejuízo para a parte que levantou essa
anulabilidade.

ii. Venda entre cônjuges

Há outra espécie de restrição à autonomia privada.

Cônjuge pode comprar do outro cônjuge bens, mas não qualquer bem.

O art. 499 possibilita a compra e venda entre cônjuges, desde que o contrato de compra
e venda seja compatível com o regime de bens adotado pelo casal. Isso porque só é possível
compra e venda de bens excluídos da comunhão. Se o bem estiver dentre aqueles constantes da
comunhão, a compra e venda será nula, visto que há a impossibilidade do objeto (art. 166, II).

É possível que haja a compra e venda de bens entre cônjuges mesmo que se trate de
comunhão universal, pois existem bens excluídos do regime da comunhão universal, como são
os bens de uso pessoal e utensílios de trabalho dos cônjuges.

• Regime de comunhão parcial: a compra e venda poderá se dar desde que seja de bens
particulares.

• Regime de comunhão universal: a compra e venda poderá se dar desde que seja de bens
incomunicáveis.

• Regime de participação final nos aquestos: a compra e venda poderá se dar em relação ao bens
que não entram na participação.

• Regime de separação legal ou convencional: a compra e venda poderá se dar, desde que não
haja fraude ou ilicitude. Lembre-se que a má-fé não se presume. Não é porque o indivíduo é
casado sob o regime de separação que não poderá vender bens ao seu cônjuge.

iii. Venda de bens sob administração

O art. 497 diz que não podem ser comprados, ainda que estejam em hasta pública, pelos
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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tutores, curadores, testamenteiros, administradores, os bens confiados à sua guarda ou


administração.

Neste caso, haveria um conflito de interesses. Ademais, é vedada a compra pelos


servidores públicos em geral dos bens e dos direitos da pessoa jurídica a que este servidores
servirem ou dos bens que estiverem sob a sua administração direta ou indireta.

A lei está buscando impedir a ocorrência de situações nas quais a atividade funcional da
pessoa possa influir no negócio que será firmado, e o agente ser beneficiado pela influência que
sustenta.

É ainda vedada a compra pelos juízes e serventuários em geral dos bens a que se litigar no
tribunal em que servirem, tanto o juiz quanto os serventuários da justiça.

Também não poderá comprar os bens o leiloeiro ou seus pressupostos quanto aos bens
cuja venda esteja encarregado.

Perceba que há uma vedação de cunho moral.

Mais uma vez o STJ faz uma interpretação no sentido de que o juiz não pode comprar um
bem que esteja no seu tribunal, mas poderá comprar em outro tribunal, assim como o
servidores. Isso porque se não há risco da influência não há prejuízo e nem ilegalidade.

iv. Venda de bens em condomínio

O art. 504 do CC diz que um condômino não pode, em relação ao condomínio de coisa
indivisível, vender a sua parte a estranhos se outro condômino quiser tanto por tanto, ou seja,
em igualdade de condições.

Há uma espécie de preempção legal. O condômino, se não tiver o conhecimento da venda,


poderá simplesmente depositar o preço, e haver para si a coisa vendida para um terceiro ou
estranho, desde que o faça em 180 dias. Este prazo é decadencial.

Contudo, o STJ julgou recentemente um caso em que, ao conceder o direito de preferência


aos demais condôminos, o que o legislador procurou foi conciliar objetivos particulares do
vendedor com o intuito da comunidade dos coproprietários. É a ideia de que a função social
recomenda que é mais cômodo manter a propriedade entre os seus titulares, evitando que haja
235
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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desentendimentos naquele condomínio pela entrada de um estranho. É uma hipótese de


preferência legal.

O STJ entende que, se o imóvel se encontra em estado de indivisão, apesar de este imóvel
ser divisível, ainda assim há de se reconhecer o direito de preferência do condômino que
pretenda adquirir o quinhão do comunheiro. Há uma restrição da autonomia privada. Ou seja,
se o vendedor condômino quiser vender por 100 mil reais o imóvel a um terceiro, mas o
condômino oferecer 100 mil reais, deverá vender a este.

Parte da doutrina entende que, sendo preterido o condômino, deverá propor a ação
anulatória da compra e venda feita.

Mas encontra-se um entendimento no sentido de que deve ser proposta uma ação de
adjudicação, pois o principal efeito da ação é constituir positivamente a venda para o condômino
que foi preterido.

Portanto, estaríamos diante de uma ação de adjudicação e não anulatória.

O prazo de 180 dias é contado de quando?

A lei não diz. Maria Helena Diniz diz que esse prazo de 180 dias é contado da data da
alienação do bem. Sílvio Venosa diz que o prazo começa a correr da data em que o condômino
tomar ciência do negócio, ou do registro imobiliário, no caso de imóvel.

Sendo muitos os condôminos, como se saber qual tem a preferência?

A lei traz uma ordem que deve ser respeitada:

1. Quem tiver benfeitoria de maior valor

2. Quem tiver o maior quinhão

3. Quem depositar judicialmente o preço

f) Regras especiais da compra e venda

i. Venda por amostra (por protótipo ou por modelo)

É uma compra e venda que funciona como condição suspensiva.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Isso é comum no caso dos mascates que passavam nas casas com amostras de tecidos.
Caso a pessoa se interessasse por aquele pedaço de tecido, faria um pedido de 5, 10, 20, 40
metros, e o vendedor pediria para a fábrica fazer. Havia ali uma promessa de entrega das peças
ou do tecido, conforme o mostruário.

A venda por amostra tem a eficácia suspensiva, de forma que não ocorre o
aperfeiçoamento do negócio até que haja a tradição com a qualidade esperada do bem que foi
adquirido.

Se os bens não foram entregues conforme o que foi contratado, o contratante poderá
simplesmente não aceitar. O contrato de compra e venda será desfeito, por uma condição
resolutiva, visto que o produto não tem a qualidade da amostra do produto apresentado.

O parágrafo único do art. 484 do CC diz que vai prevalecer a amostra, se houver uma
contradição ou ao modo de descrição da coisa no contrato. O dispositivo está dizendo que se o
sujeito apareceu na loja e disse que era egípcio e depois constar no contrato de que o fio era
chinês, a amostra irá prevalecer, por uma questão de boa-fé.

ii. Venda a contento ou sujeita à prova

A venda a contento ou sujeita à prova são tratadas como cláusulas especiais no contrato
de compra e venda.

Muitas vezes serão presumidas em alguns contratos, não precisando de previsão expressa
algumas vezes. Ex.: no caso dos vinhos, o garçom coloca um pouco para que o cliente verifique a
qualidade do vinho. No momento em que concorda, a pessoa concorda com a venda, estando
implementada a condição suspensiva.

A venda não se aperfeiçoa enquanto o comprador não se declara satisfeito com o bem
que está sendo adquirido. Há uma condição suspensiva. Na venda a contento, a tradição não
transfere a propriedade, mas apenas da posse. Há a posse direta, pois, enquanto o comprador
não manifestar a vontade, as obrigações que ele teria é de simples comodatário.

A rejeição funcionará como uma condição resolutiva do contrato.

No caso de venda a contento, o prazo para manifestação do comprador, quando não for de

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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imediato (como no vinho), o vendedor tem o direito de intimar esse comprador, judicial ou
extrajudicialmente, para que se manifeste sobre a venda (art. 582).

Quando é intimado, surge para o comprador o dever de pagar até a restituição da coisa
um aluguel que será arbitrado pelo comodante a título de pena, e será cabível eventual
reintegração de posse.

Foi promovida uma venda a contento, mas o sujeito não se manifestou. O vendedor
interpelou o comprador para que ele se manifestasse em 2 dias, para que este se manifestasse ou
para que este pagasse a coisa. Se ele não paga e nem devolve, passados os 2 dias, considera-se
como se houve uma locação, havendo a necessidade de pagar um aluguel cabível, bem como ação
de reintegração de posse.

Qual a diferença entre venda a contento e a venda sujeita a prova?

Na venda a contento, o comprador não conhece o bem, sendo necessário provar e


manifestar a vontade de celebrar o contrato.

Na venda sujeita à prova, a coisa já é conhecida, mas o comprador somente necessita da


prova de que o bem é o mesmo que ele já conhece, tendo todas as qualidades assegurada ao
vendedor.

iii. Venda por medida

A venda por medida, também denominada de venda ad mensuram. Nesse caso, as partes
podem estipular um preço por medida de extensão. Nessa situação, a medida passa a ser uma
condição essencial do contrato.

Na venda ad mensuram, a área do imóvel não é apenas enunciativa, sendo simplesmente


enunciativa no caso da venda ad corpus, situação em que se vende um corpo certo (ex.: rancho,
chácara, etc.). Na venda ad mensuram, o comprador está comprando com base na metragem,
caso em que a compra e venda terá a área como essencial, como é o caso de compra e venda de
imóvel por metro quadrado.

No caso de venda por extensão, admite-se que haja uma variação de até 5% (ou seja, até
um vigésimo da área). Existe uma presunção relativa de que essa variação de 5% a mais ou a

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menos é tolerável pelo comprador.

Mas se houver uma variação superior ao tolerável, então haverá um vício. Neste caso, o
comprador poderá exigir:

• Complementação da área

• Abatimento do preço (ação quanti minoris)

• Resolução do contrato

Nesse caso, se ficar evidenciada a má-fé do vendedor, vem cumulada com perdas e danos,
com uma indenização em razão do comportamento.

O prazo decadencial é de 1 ano, contado do registro do título, conforme art. 501 do CC.
O prazo não corre enquanto o interessado não for imitido na posse.

Se a venda for realizada ad corpus, ou seja, imóvel vendido como coisa certa, não caberão
os pedidos de complementação, abatimento do preço ou resolução do contrato.

iv. Venda de coisas conjuntas

Não se confunde com a venda casada, que é vedado. A prática do contrato de venda
permite a venda de coisas conjuntas permite. Ex.: compra de um rebanho bovino. Há uma
universalidade de fato.

Nas coisas vendidas conjuntamente, o defeito oculto de uma coisa não autoriza a
rejeição de todas. Se foi comprado um rebanho bovino e uma vaca apresenta vício, não impede a
rejeição de todos os bovinos.

O art. 503, que se refere a vendas conjuntas, não pode ser aplicado a casos em que a venda
seja coletiva, que é diferente daquelas.

No caso de venda coletiva, as coisas vendidas formam um todo só. Por exemplo, se a
compra de um par de sapatos, um deles apresentar problema, poderá devolver os dois para
adquirir novos, pois a venda é coletiva.

g) Cláusulas especiais da compra e venda

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Há aqui previsões que alteram os efeitos da compra e venda, dando a ela uma feição
diferenciada.

O CC consagra:

• Cláusula de retrovenda

• Cláusula de venda a contento ou venda sujeita à prova

• Cláusula de preempção convencional

• Cláusula de venda com reserva de domínio

• Cláusula de venda de documentos

As cláusulas especiais, para que tenham eficácia e validade, devem estar expressamente
previstas no instrumento. Este é um ponto em que se diferenciam das regras especiais.

Nas regras especiais não é necessário que conste expressamente esta previsão.

i. Cláusula de retrovenda

Cláusula de retrovenda é um pacto inserido no contrato pelo qual o vendedor reserva-se


o direito de reaver o imóvel dentro de um certo prazo.

Neste caso, restitui o preço e as despesas feitas pelo comprador, mas reaverá o imóvel.

O prazo máximo que decorre o direito à retrovenda é de 3 anos.

Cláusula de retrovenda só é admitida nos contratos de compra e venda de bens imóveis.


Essa cláusula torna a propriedade resolúvel, e portanto tem-se aqui uma cláusula resolutiva
expressa.

Se o comprador se recusa as quantias a que ele faz jus, o vendedor deverá depositar
judicialmente esse valor, propondo uma ação de resgate (art. 506).

O direito de resgate poderá ser exercido pelo vendedor e também pelos herdeiros e
legatários, isso em relação ao terceiro adquirente, já que consta cláusula expressa registrada.

Perceba-se que há uma transmissão causa mortis da cláusula de retrovenda, discutindo a


doutrina se seria possível a transmissão inter vivos da cláusula de retrovenda, inclusive de forma
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

onerosa.

A lei diz que é transmissível da cláusula de retrovenda do vendedor para os herdeiros e


legatários.

No caso de transmissão onerosa da cláusula de retrovenda, a professora Maria Helena


Diniz diz não ser possível, pois traria um direito personalíssimo do vendedor.

Paulo Lôbo diz ser possível em virtude de que não há qualquer proibição nesse sentido
pelo Código Civil.

O art. 508 do CC trata da retrovenda feita por condôminos, quando duas ou mais pessoas
têm o direito de retrato, mas apenas uma delas o exerce, o comprador poderá intimar a outra ou
as outras para acordarem com essa retrovenda.

Mesmo nesse caso, prevalecerá o pacto em favor de quem tenha depositado o valor pago
pela coisa e pelas despesas do comprador, desde que esse valor seja integral.

ii. Cláusula de preempção

A cláusula de preempção é a cláusula pela qual o comprador de um bem móvel ou imóvel


tem a obrigação de oferecer este bem àquele que o vendeu, podendo essa intimação ser judicial
ou extrajudicial, a fim de que o vendedor use o seu direito de prelação, em igualdade de condições
com o terceiro. Isso se o comprador decidir vender a coisa.

Esta cláusula poderá estar prevista no contrato.

O art. 513, parágrafo único, diz que a preferência abrangerá o prazo de 180 dias se for bem
móvel, ou de até 2 anos se for bem imóvel. Tais prazos devem ser contados da data da realização
da venda.

Após o decurso desses prazos, é finda a preferência. Portanto, é possível a venda do bem
a outrem, sem direito de preferência.

Se, dentro do período de preferência, o comprador decidir vender o bem, o vendedor


deverá ser notificado judicial ou extrajudicialmente.

O direito de preferência caducará se a coisa for móvel, se não exercer esse direito de

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

preferência em 3 dias.

Sendo a coisa imóvel, terá o prazo de 60 dias para exercer o direito de preferência, a
contar da data em que o vendedor foi notificado pelo comprador para exercer o direito de
preferência.

O Código Civil diz que, aquele que exerce a preferência tem a obrigação de pagar o preço
ajustado ou encontrado em igualdade de condições com terceiro, sob pena de perder o direito
de preferência.

O vendedor que tenha sido preterido no seu direito de preferência, caso seja a preempção
convencional, o vendedor não poderá anular a venda. Se fosse uma prelação legal (ex.:
condômino), poderá fazer a adjudicação do bem.

No entanto, no caso de preempção convencional, se o vendedor for preterido, caberá


apenas o direito de ação visando a reparação de danos, mesmo que o adquirente tenha adquirido
o bem por má-fé (art. 518).

O art. 519 diz que, se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade pública, ou
por interesse social, não tiver o destinado para que se desapropriou, ou não for utilizada em obras
ou serviços públicos, caberá ao expropriado o direito de preferência pelo preço atual da coisa.
Este dispositivo consagra o direito de retrocessão.

Esse direito de preferência terá natureza real ou natureza pessoal?

O STJ já entendeu que os efeitos são de natureza meramente pessoais, cabendo portanto
ao expropriado o direito de pleitear perdas e danos no caso de tredestinação.

Por outro lado, também há decisões do STJ reconhecendo eficácia real do direito de
retrocessão. Tartuce concorda que esse direito de retrocessão tem natureza real.

O art. 520 diz que o direito de preferência não se pode ceder, e também não passa aos
herdeiros. Há aqui reconhecido a intransmissibilidade do direito de preferência, seja mortis causa,
seja inter vivos. A preferência convencional não se transmite aos herdeiros.

iii. Cláusula de venda sobre documentos

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Pela cláusula de venda sobre documentos, que tem por objeto bens móveis, a tradição
será substituída pela entrega de um documento correspondente à propriedade (título
representativo do domínio), conforme art. 529 do CC.

Se estiver prevista esta cláusula de venda sobre documentos e esta documentação estiver
em ordem, o comprador não pode recusar pagamento, alegando que há um defeito na qualidade
da cosia ou no estado da coisa, salvo se o defeito estiver efetivamente comprovado.

Veja, o parágrafo único do art. 529 diz que, achando-se a documentação em ordem, não
pode o comprador recusar o pagamento, a pretexto de defeito de qualidade ou do estado da coisa
vendida, salvo se o defeito já houver sido comprovado. Isso porque o comprador ainda nem
sequer tem a coisa consigo.

Com essa transferência do documento que transfere a propriedade, o pagamento deverá


ocorrer na data e no lugar em que ocorrer essa entrega do documento. Quando o documento é
entregue, o preço deverá ser pago.

O art. 532 diz que, estipulado o pagamento por intermédio de estabelecimento bancário,
caberá ao banco efetuar esse pagamento com a entrega dos documentos, não tendo o banco a
obrigação de verificar a coisa vendida, pela qual não responde.

O parágrafo único diz que, nesse caso, somente após a recusa do estabelecimento bancário
a efetuar o pagamento, poderá o vendedor pretendê-lo, diretamente do comprador.

iv. Cláusula de venda com reserva de domínio

Ocorre a cláusula de venda com reserva de domínio quando o vendedor vende a coisa,
mas continua tendo o domínio.

Por meio dessa cláusula, inserida no contrato de coisa móvel infungível, o vendedor
mantém o domínio da coisa, mas até que haja o pagamento integral pelo comprador.

O comprador receberá a posse direta da coisa, mas a propriedade continua sendo do


vendedor, sendo esta resolúvel, visto que, uma vez pagando o comprador, a propriedade passa a
ser dele.

Pelos riscos da coisa, responderá o comprador (res perit emptoris), ou seja, é uma exceção
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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à ires perit domino, sendo uma forma de viabilizar a cláusula com reserva de domínio.

O art. 522 consagra como formalidade para a cláusula de venda com reserva de domínio
que sua estipulação se dê por escrito e haja registro no cartório de títulos e documentos do
domicílio do comprador. Segundo o CC, esta é uma condição de validade perante terceiros de
boa-fé. Em verdade não é uma condição de validade, mas sim de eficácia, pois não levando a
registro não deixará de ser válida, e sim ineficaz perante terceiros.

E se houver mora ou inadimplemento absoluto?

O vendedor poderá promover uma ação de cobrança das parcelas vencidas e que não
foram efetivamente pagas. Essa é uma opção.

A segunda é o vendedor recuperar a posse da coisa, já que ele é o proprietário da coisa.

Mas como é que o vendedor vai recuperar a posse da coisa?

Flávio Tartuce entende que será através da reintegração de posse. Daniel Assunção
entende que será o procedimento comum com tutela de urgência, mas não se sabe como a
jurisprudência vai se posicionar.

O art. 525 diz que o vendedor somente poderá executar a cláusula de reserva de domínio
após constituir o comprador em mora, mediante protesto do título ou interpelação judicial.

Vale ressaltar que a teoria do adimplemento substancial também vai promover mudanças
e mitigações na chamada cláusula de reserva de domínio. Ex.: sujeito pagou 90% das parcelas, não
poderá o contrato simplesmente ser desfeito, devendo preservá-lo e promover a ação de
cobrança, a fim de que cobre as parcelas vencidas e as vincendas.

É preciso diferenciar da cláusula de venda de reserva com domínio de contrato de


alienação fiduciária e do leasing (arrendamento mercantil):

• Cláusula de venda com reserva com domínio: há uma cláusula especial de compra e venda.
Implica que o domínio permaneça nas mãos do devedor.

• Alienação fiduciária: há um direito real de garantia. O devedor é o fiduciante que compra o bem
de um terceiro, mas não podendo pagar, pegará o dinheiro com a instituição financeira, e para
garantir o pagamento a esta instituição financeira, transferirá a propriedade a esse credor
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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fiduciário. Há aqui também uma propriedade resolúvel, mas esta é de terceiro, e não do próprio
vendedor.

• Leasing (arrendamento mercantil): há um contrato. Há um contrato de locação com opção de


compra. A opção de compra se dá com o pagamento do valor residual garantido (VRG).

h) Terrenos da Marinha

Terrenos de marinha são todos aqueles que, banhados pelas águas do mar ou dos rios e
lagoas navegáveis, vão até à distância de 33 metros para a parte da terra contados da linha do
preamar médio, medida em 1831.

Os terrenos de marinha são bens da União. Isso se justifica por se tratar de uma região
estratégica em termos de defesa e de segurança nacional.

Segundo José dos Santos, em algumas regiões, a União permitiu que particulares
utilizassem, de forma privada, imóveis localizados em terrenos de marinha. Como essas áreas
pertencem à União, o uso por particulares é admitido pelo regime da enfiteuse (aforamento). A
enfiteuse funciona da seguinte forma, a União (senhorio direto) transfere ao particular (enfiteuta)
o domínio útil, este particular passa a ter a obrigação de pagar anualmente uma importância a
título de foro ou pensão.

O particular (enfiteuta) pode transferir para outras pessoas o domínio útil que exerce
sobre o bem. Todavia, a pessoa que transferir o domínio útil do imóvel deverá pagar 5% do valor
do domínio útil à União. Esse valor é chamado de laudêmio e seu pagamento está previsto no
art. 3º do Decreto-Lei nº 2.398/87.

O STJ entende que será nulo o contrato o contrato firmado entre particulares de compra
e venda de imóvel de propriedade da União quando ausente o prévio recolhimento do laudêmio
e a certidão da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), ainda que o pacto tenha sido registrado
no Cartório competente.

Vale ressaltar que a prévia autorização da Secretaria do Patrimônio da União (SPU) não é
mera formalidade, pois, segundo entende o STJ, a comunicação do negócio jurídico formalizado
entre o ocupante e terceiro à SPU não se reveste de ato de mera formalidade, mas se constitui em
medida de essencial importância e que produz efeitos jurídicos relevantes, uma vez que a União

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

é a proprietária do terreno de marinha e, nessa qualidade, deverá estar sempre a par e consentir
com a utilização de bem que lhe pertence.

Tais bens públicos são da espécie “bens dominicais”, os quais, apesar de não estarem
sendo utilizados para a realização de uma finalidade pública, o regime jurídico dos bens dominicais
é híbrido, aplicando-se as normas de direito público e de direito privado. O contrato de compra e
venda de um bem dominical deve respeitar formalidades legais mais rígidas do que se fosse um
bem de um particular.

O tabelião de notas poderia ter lavrado a escritura de compra e venda e o oficial do


Registro de Imóveis não pode registrar o título sem a prova do pagamento do laudêmio. É dever
dos tabeliães e registradores, antes de lavrar ou registrar a escritura, exigir a certidão da SPU, na
qual estará declarado que houve o pagamento do laudêmio e cumprimento das demais
formalidades.

II. Troca ou permuta

Troca ou permuta é conceituado como sendo um contrato através do qual as partes se


obrigam a dar uma coisa para receber outra coisa, não podendo esta coisa ser dinheiro, pois do
contrário haveria compra e venda.

Há aqui um contrato bilateral, oneroso (as duas partes realizam sacrifício patrimonial),
comutativo (as duas partes conhecem as prestações a que se submetem), translativo da
propriedade (cada uma das partes assume essa propriedade), contrato consensual (o contrato se
aperfeiçoa com o simples encontro das vontades).

A permuta vai gerar para cada contratante a obrigação de transferir ao outro contratante
o domínio da coisa, que é o objeto da prestação.

Em relação às despesas com a tradição, o art. 533, I, vai consagrar, via de regra, a divisão
em igualdade, mas o contrato poderá dispor de forma diferente.

Aplicam-se, residualmente, à troca as disposições referentes à compra e venda.

Ressalte-se a distinção de que, na compra e venda, o vendedor, após a entrega da coisa


vendida, não poderá pedir a devolução da coisa pelo fato de não ter recebido o preço.

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Na troca, o tradente (permutante) tem o direito de pedir de volta o que deu se a outra
parte não lhe entregar o objeto permutado, ou seja, não cumprir a sua obrigação.

a) Troca entre ascendentes e descendentes

O art. 533, II, diz que é anulável a troca de valores desiguais entre ascendentes e
descendentes, se não houver o consentimento dos demais descendentes e do cônjuge do
alienante.

Veja que o art. 533 fala de trocas desiguais. Ou seja, se estiver diante de troca s coisas
iguais, não é necessário o consentimento dos demais descendentes e do cônjuge do alienante.

O raciocínio é o mesmo para o caso em que o descendente der coisa mais valiosa ao
ascendente e este dá a ele uma coisa menos valiosa, sendo desnecessário o consentimento dos
demais descendentes e do cônjuge.

III. Contrato estimatório (venda em consignação)

O contrato estimatório é também denominado de venda em consignação.

Nesse contrato, o consignante vai transferir ao consignatário bem móveis, a fim de que o
consignatário venda esses bens por um preço estimado.

Ou o consignatário vende esses bens, pagando um preço estimado, ou terminado o


contrato sem venda, devolverá esses bens no prazo ajustado (art. 534).

Há aqui um contrato bilateral, oneroso, real (pois se aperfeiçoa com a entrega da cosia
consignada) e comutativo.

Parcela da doutrina vai dizer que, na verdade, esse contrato não seria bilateral, pois
quando ele nasce apenas uma das partes tem a obrigação. Antes de nascer, o consignante entrega
a coisa, mas quando termina de entregar a coisa é que nasce o contrato estimatório, passando a
apenas o consignatário a ter a obrigação de pagar ou de devolver. Portanto, seria um contrato
unilateral, mas oneroso.

Há um grande debate sobre a natureza jurídica da obrigação assumida pelo consignatário.

1ªC: Alguns autores vão entender que essa obrigação assumida por ele é alternativa. Isso

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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se dá pelo fato de poder escolher se ele devolve a coisa ou se ele paga o preço. Caio Mário, Tartuce,
Lôbo.

2ªC: Outros dizem que a obrigação é facultativa, devendo ele pagar, mas caso não queira
poderá devolver. Maria Helena Diniz, Simão e Venosa entendem dessa forma.

O consignatário poderá devolver a coisa ou pagar. Isso é majoritário.

O consignante mantém a condição de proprietário da coisa. O art. 536 diz que a coisa
consignada não pode ser objeto de penhora ou sequestro pelos credores do consignatário,
enquanto não pagar integralmente o preço. Isso porque a coisa não é dele.

O art. 537 diz que o consignante não pode dispor da coisa antes de lhe ser restituída ou
de lhe ser comunicada a restituição. Isso quer dizer que há exigência de um comportamento de
boa-fé, dentro do esperado pelo consignante.

Findo o prazo do contrato, o consignante tem duas opções: cobrar o preço de estima ou
promover a ação de reintegração da posse, a fim de reaver o bem cedido. Lógico que isto se
considerarmos a obrigação alternativa.

Caso seja considerada obrigação facultativa, o único dever que o consignatário tem é de
pagar a coisa. Findo o prazo, o credor poderia apenas propor a ação de cobrança e não poderia
propor a ação de reintegração de posse.

Daí a importância de se definir se a obrigação é alternativa ou facultativa.

O art. 535 diz que o consignatário não se exonera da obrigação de pagar o preço, se a
restituição da coisa, em sua integridade, se tornar impossível, ainda que por fato a ele não
imputável.

Percebe-se que deverá ter de pagar a coisa, já que não consegue devolver. Isso porque
passa a ser de sua responsabilidade.

IV. Doação

Doação é um contrato benéfico, unilateral e gratuito.

Só será admitido interpretação restritiva, conforme art. 114.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Em relação à doação com encargo (modal), entende-se que continua diante de um


contrato unilateral, mas unilateral imperfeito. Isso porque existe o encargo, mas este não constitui
uma contraprestação. O encargo é um ônus, mas que não tem o peso de uma contraprestação.
Existe entendimento em sentido diverso, mas este é o que prevalece.

A controvérsia existe em relação à aceitação do donatário. A aceitação do donatário é


requisito essencial do contrato de doação?

Maria Helena Diniz diz que a doação não se aperfeiçoa enquanto o donatário não
manifestar a sua aceitação.

Paulo Luiz Netto Lôbo vai dizer que a aceitação é simplesmente um elemento
complementar, ligado à eficácia da doação, não sendo elemento essencial da doação. Flávio
Tartuce concorda com esse entendimento, dizendo que a aceitação se encontra no plano da
eficácia e não da validade.

O art. 539 diz que o doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não
a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não se manifeste dentro dele a declaração,
entende-se que a aceitou, desde que a doação seja pura, ou seja, não seja sujeita a encargo
(modal).

Eventual silencia do doador traz uma presunção relativa de aceitação.

Inclusive, dispensa-se a aceitação expressa quando se tratar de doação pura, feita em


favor de absolutamente incapaz. É o que diz no art. 543.

A aceitação ainda pode ser tácita, na hipótese de doação feita em contemplação a


casamento futuro. Quando os nubentes se casam, há uma aceitação tácita. Pode ser feita de um
nubente para eles, de um terceiro em favor dos nubentes, aos filhos que no futuro casamento
advierem, etc. Havendo casamento, há uma aceitação tácita.

O art. 546 diz que, nessa situação, a celebração do casamento gera uma presunção de
aceitação.

São características do contrato de doação o fato de ser um contrato consensual (aperfeiçoa


com o encontro de vontades), contrato formal (pode ser solene, escrito, e eventualmente até pode

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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ser verbal).

A doação solene ocorrerá nos casos de doação de imóvel com valor superior a 30 salários
mínimos. A doação será formal e não solene, nos casos envolvendo casos de imóvel inferior ou
igual a 30 salários mínimos e nos bens móveis.

O art. 541, parágrafo único, diz que a doação de bens móveis e de pequeno valor poderá
ser verbal seguida da tradição.

a) Modalidades de doação

i. Doação remuneratória

A doação remuneratória é uma doação em forma de remuneração.

Tem como característica a retribuição de um serviço prestado pelo donatário. Mas vale
lembrar que este serviço originariamente não seria cobrado pelo donatário.

Ex.: doação de um automóvel feita ao médico que salvou a vida do doador. Neste caso, o
carro vale 40 mil e a cirurgia feita pelo médico vale 30 mil, ainda que tenha sido gratuita. Mas em
relação aos 10 mil é que haverá a liberalidade. A lei diz que só há liberalidade na parte que excede
o valor do serviço prestado.

A análise da doação remuneratória é interessante por 3 razões principais:

• cabe alegação de vício redibitório em relação ao bem doado, já que a doação é remuneratória.

• mesmo nos casos de ingratidão, as doações remuneratórias não podem ser revogadas.

• as doações remuneratórias de serviços feitos ao ascendente não estão sujeitas à colação, não
devendo ser trazidas ao inventário.

ii. Doação contemplativa

A doação contemplativa (ou meritória) é baseada na condição pessoal do indivíduo,


baseada no merecimento do donatário.

O art. 540 diz que a doação contemplativa é aquela feita em contemplação a um


merecimento do donatário, de modo que esta não perde o caráter de liberalidade.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O doador declara expressamente quais os motivos da sua doação. Normalmente o doador


leva em consideração uma característica pessoal do donatário. Ex.: doam-se os livros ao professor,
pois é um excelente leitor e estudioso.

iii. Doação ao nascituro

O art. 542 diz que a doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante
legal.

Será o representante legal que aceita a doação ao nascituro.

Na doação ao nascituro, o contrato está válido, mas a eficácia da doação depende do


nascimento com vida do donatário, estando em uma condição suspensiva. Portanto, se está diante
de uma doação condicional.

Entende-se possível a doação a uma prole eventual, nem ter sido concebida ainda. Este
entendimento é confirmado pelo art. 1.800, §4º, que diz que se, decorridos 2 anos após a
abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo
disposição em contrário do testador, caberão aos herdeiros legítimos.

O doador morreu, mas antes de morrer doou o bem a uma prole eventual. Se depois da
morte, passados 2 anos, a prole eventual não foi concebida, passa-se os bens aos herdeiros, objeto
da doação.

iv. Doação sob forma de subvenção periódica

Subvenção periódica é dar a alguém algo periodicamente. Há aqui uma doação de trato
sucessivo, situação na qual o doador vai estipular rendas a favor do donatário (art. 545).

Em regra, terá como causa extintiva a doação sob forma de subvenção periódica a morte
do doador ou do donatário. Quem morrer primeiro extinguirá a doação.

Atente-se que a doação sob forma de subvenção periódica poderá ultrapassar a vida do
doador, se houver previsão contratual nesse sentido. Nunca vai ultrapassar a vida do donatário,
tendo como característica intuito personae.

v. Doação em contemplação de casamento futuro

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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A doação em contemplação de casamento futuro é aquela em que o sujeito diz que se João
casar com Maria, eles receberão um imóvel. É a denominada doação propter nuptias.

Essa doação é feita a pessoa certa e determinada, e portanto é uma doação condicional.

Esta doação pode ser feita entre os nubentes, por um terceiro que faça a um deles ou a
ambos, ou a favor dos filhos que nascerem àquele casamento.

v. Doação poderá ser de ascendentes a descendentes e doação entre cônjuges

A doação poderá ser de ascendentes a descendentes e doação entre cônjuges.

O art. 544 diz que as doações de ascendentes a descendentes e doação entre cônjuges
importam em adiantamento do que lhes cabe por herança. Há uma preocupação com a legítima.

Há uma presunção de que aquilo que foi recebido antes será adiantamento da herança.
Então, quando for aberto o inventário deverá ser trazido o bem ao processo.

No caso de doação de ascendentes a descendentes, os bens deverão ser colacionados ao


processo de inventário pelo descendente que recebeu o bem, sob pena de ser considerado
sonegado, perdendo o direito que tem sobre a coisa.

É possível que o doador dispense essa colação, caso em que o donatário não precisará
trazer o bem ao inventário.

A doação entre cônjuges é plenamente válida e possível, desde que o bem doado não seja
integrante de patrimônio comum do casal, como é o bem particular. O que não se admite é a
doação de bem comum do casal.

vi. Doação com cláusula de reversão

A doação com cláusula de reversão é aquela em que o doador estipula que os bens doados
voltem ao patrimônio do doador, caso ele sobreviva ao donatário.

O que há aqui é uma condição resolutiva expressa (art. 547).

Atente-se que não se pode estipular que, se o donatário morrer, os bens serão destinados
a João, pois estaria havendo pacta corvina, discutindo herança de pessoa viva.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Se o doador morrer antes do donatário, esta condição jamais ocorrerá, incorporando-se os


bens definitivamente ao patrimônio do donatário, pois a condição resolutiva não se
implementará.

A cláusula de reversão não torna o bem inalienável, podendo o donatário alienar o bem.
Mas se alienar o bem e vier a falecer antes do doador, essa alienação é sem efeito perante o
doador. Torna-se com a implementação da condição resolutiva, conforme art. 1.359.

vii. Doação conjuntiva

A doação conjuntiva é aquela que conta com a presença de 2 ou mais donatários, havendo
uma obrigação divisível, e que será doado o bem para 2, 3 ou 4 donatários.

Há uma presunção relativa de divisão igualitária da coisa entre os donatários.

Em regra, não existe direito de acrescer entre os donatários. Ou seja, foi doado um bem a
4 pessoas, mas um dos donatários morreu, agora a parte dele vai para os herdeiros, não havendo
direito de acrescer aos demais.

Isso é a regra, tendo em vista que o direito de acrescer poderá estar previsto no contrato,
ou mesmo em lei, conforme o art. 551, parágrafo único.

O art. 551, parágrafo único, traz o direito de acrescer legal quando os donatários forem
marido e mulher, caso em que, caso a mulher morra, passa tudo para o marido.

viii. Doação manual

A doação manual é a doação com a mão, situação em que há uma tradição imediata,
tratando-se da doação que se dá com a tradição.

Lembre-se que é o caso da doação verbal que se consuma com a tradição, sendo certo que
se trata de coisa de pequeno valor (art. 541, parágrafo único).

ix. Doação inoficiosa

A doação inoficiosa é aquela prevista no art. 549, a qual estabelece que é nula a doação
quanto à parte que exceder o limite de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor
em testamento.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

É a doação que prejudica a legítima.

Não é toda doação que é considerada nula, atingindo somente a parte que exceder à
legítima.

Ex.: João tem um patrimônio de 1 milhão de reais, tendo 79 anos e dois filhos. Arrumou
uma namorada de 18 anos, decidindo doar a ela 700 mil reais. João não poderia doar 700 mil, pois
50% do seu patrimônio integra a legítima. Portanto se doou 700 mil, considera-se 200 mil nulos,
angariando 500 mil.

Segundo o STJ, aplicam-se às pretensões declaratória de nulidade de doações inoficiosas


o prazo prescricional de 10 anos para o ajuizamento dessa ação.

A ação só pode ser proposta por quem é interessado na declaração de nulidade, ou seja,
pelos herdeiros do doador.

x. Doação universal

A doação universal é a doação do universo de bens.

O art. 548 diz que é nula a doação de todos os bens sem a reserva do mínimo para a
sobrevivência do doador.

Portanto a doação universal é vedada, caso não haja reserva para sobrevivência do doador.

Há a consagração do estatuto do patrimônio mínimo do Ministro Luiz Edson Fachin.

É preciso fazer uma leitura adequada do art. 548, chegando a conclusão de que poderá a
pessoa doar todo o seu patrimônio, desde que faça reserva de usufruto ou de rendas a seu favor.

Ex.: sujeito doa o seu único apartamento com a cláusula de usufruto de que os valores do
aluguel serão dele.

xi. Doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice

O art. 550 diz que a doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice na traição é anulável,
desde que proposta a ação anulatória pelo outro cônjuge ou pelos herdeiros necessários, até 2
anos após a dissolução da sociedade conjugal. Essa dissolução vem com a separação judicial ou
divórcio.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Esse dispositivo não pode ser aplicado quando o doador vive em união estável com o
donatário. Isto ocorre quando o doador está separado de fato do cônjuge.

xii. Doação a entidade futura

Doação a entidade futura ocorre quando a entidade irá existir.

A doação feita por uma pessoa a uma pessoa jurídica que ainda não existe, condicionando
a eficácia da doação à regular constituição dessa sociedade é a doação a entidade futura.

Caso a entidade não seja constituída no prazo de 2 anos, a contar da doação, caducará a
doação.

b) Promessa de doação

Existe uma discussão se é possível um contrato preliminar de doação, o qual será unilateral
sobre uma liberalidade futura.

Uma das partes compromete-se a celebrar um contrato de doação no futuro.

Tartuce entende que é possível. Admitida a validade e eficácia do negócio, o futuro


beneficiário, que tem um contrato preliminar a seu favor, terá o direito de exigir o cumprimento
dessa promessa.

c) Revogação da doação

A revogação da doação é uma forma de resilição unilateral, por conta da perda da


confiança.

É reconhecido esse instituto como um direito potestativo em favor do doador.

A revogação poderá se dar por 2 motivos:

• Ingratidão do donatário

O art. 556 proíbe que exista a renúncia prévia do doador ao direito de revogar a doação por
ingratidão. Isso não impede que, tendo ocorrido o ato de ingratidão, ainda assim não revogue. O
que não pode é renunciar previamente.
O art. 557 traz um rol exemplificativo de casos que podem motivar a revogação por ingratidão:
o donatário atentou contra a vida do doador: se conseguir consumar a morte do doador,
255
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

quem terá legitimidade será os seus herdeiros.

o donatário atentou fisicamente contra o doador

o donatário injuriou gravemente o doador ou se caluniou

o se, podendo ministrar alimentos ao doador, o donatário tenha se recusado a prestar

o quando o donatário causar uma das hipóteses acima em face do cônjuge, ascendente,
descendente, ainda que adotivo, ou irmão do doador.

O art. 561 diz que, no caso de homicídio doloso do doador, a ação caberá aos seus herdeiros,
exceto se aquele houver perdoado. A única opção de perdoar o donatário no caso de ter sido
morto pelo donatário, é o caso em que tenha sido vítima da tentativa de homicídio e ter sido
internado no hospital, momento em que, em sã consciência, perdoou o donatário, e
posteriormente viesse a morrer. Neste caso, obviamente não caberia a revogação da doação.
A revogação por ingratidão não vai prejudicar direitos adquiridos por terceiros, e nem vai obrigar
o donatário a restituir frutos que percebeu antes da citação válida da ação que intenta a
revogação da doação. Antes da citação ele é possuidor de boa-fé, então o adquirente terceiro de
boa-fé e os frutos percebidos não devem ser restituídos. Se o donatário já alienou o bem terá o
direito do valor da coisa alienada.
Existem casos em que não se admite a revogação por ingratidão, como é o caso de:
o doação puramente remuneratória: somente admite-se a revogação naquilo que exceder a
prestação do serviço, ou seja, na parte da liberalidade;

o doação com encargo quando já cumprido o encargo: também não podem ser revogadas as
doações com encargo quando já cumprido o encargo.

o doação relacionada com o cumprimento de uma obrigação natural: apesar de não existir
responsabilidade, existe débito, não cabendo a revogação.

o doação propter nuptias: não caberá a revogação de doação no caso de doação em


contemplação de casamento futuro.

O prazo para revogação da doação, segundo o art. 559, deverá ser pleiteada no prazo de 1 ano,
a contar de quando chegue o conhecimento do doador o fato que autoriza ao doador o fato que
autoriza a revogação da doação, e chegue ao seu conhecimento de que o autor daquele fato é o
donatário, começando a contar esse prazo de 1 ano. Como a ação de revogação é constitutiva
negativa, esse prazo é decadencial.
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• Inexecução do encargo ou modo para executar

No caso de revogação da doação por inexecução do encargo, apesar de existir uma certa
controvérsia, é majoritário o entendimento de que o prazo para revogação da doação por
descumprimento de encargo é prescricional de 10 anos, pois teria ocorrido a violação ao direito
subjetivo do doador de ver cumprido o encargo.

O art. 560 diz que o direito de revogar a doação não se transmite aos herdeiros do doador
e nem prejudica os herdeiros do donatário.

A verdade é que o direito de revogar a doação se transmite aos herdeiros do doador se a


ação já foi iniciada. O direito de revogar não foi transmitido ao herdeiros do doador, mas sim a
possibilidade de prosseguir a ação que foi iniciada pelo doador visando a revogação da doação.
Portanto, eles poderão continuar contra o donatário, inclusive continuar contra os herdeiros do
donatário, caso ele venha a falecer depois do ajuizamento do pleito revogatório.

A respeito da revogação da doação onerosa, por inexecução do encargo, não se pode


confundir o legitimado da revogação da doação com os legitimados para exigir a execução do
encargo, que pode ser o doador, terceiro ou até o Ministério Público, caso o encargo tenha
interesse geral.

Não havendo prazo para o cumprimento, o doador poderá notificar o donatário


judicialmente para que dentro de um prazo razoável cumpra a obrigação (art. 562). Após o decurso
do prazo, poderá começar o prazo para doação.

V. Locação de coisas no Código Civil

O contrato de locação é um contrato por meio do qual uma das partes se obriga a ceder a
outra parte por um tempo o uso e gozo de uma coisa infungível, por meio de uma certa
remuneração que é denominado aluguel.

A primeira característica é que é um contrato bilateral, contrato oneroso (existe


remuneração, ou seja, o sacrifício por ambas), contrato comutativo (as partes já sabem as suas
prestações), contrato consensual (aperfeiçoa-se com o encontro das vontades), contrato informal
(não depende de forma escrita e nem escritura pública) e é um contrato de execução continuada
ou de trato sucessivo.

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Eduardo Defaveri

O Código Civil trata da locação de bens móveis e bens imóveis.

Em relação aos bens imóveis, o CC tratará das locações que não estejam sujeitas à Lei
8.245/91, a qual trata da locação de imóveis urbanos, levando em consideração a destinação
desse imóvel. Se o imóvel for destinado à residência, indústria, comércio e para prestação de
serviços, será regido pela Lei 8.245/91.

E se for destinado para outros fins, será regido para outros fins, como agricultura, pecuária,
extrativismo, etc., incidindo o Estatuto da Terra ou o Código Civil.

Além disso, o art. 1º da Lei de Locações excluiu alguns imóveis do âmbito de aplicação,
como imóveis públicos (Lei 8.666), vagas autônomas de garagem, espaços publicitários, locação
de espaços de apart-hotel, flats, equiparados (CC e CDC), arrendamento mercantil e leasing
(resoluções do BACEN).

O que se percebe é que o Código Civil tem uma aplicação reduzida em relação aos imóveis.

a) Deveres das partes numa locação

O locador é obrigado a:

• entregar ao locatário a coisa com todas as suas pertenças e condições de ser utilizadas

• manter o bem no estado de utilização pacífica pelo locatário

• se ocorrer a deterioração da coisa no prazo da locação e não sendo essa deterioração culpa do
locatário, poderá ele propor a redução do aluguel, ou até mesmo resolver o contrato, pois a coisa
não lhe serve mais (art. 567).

• resguardar o locatário contra turbações e esbulhos cometidos por terceiros. Tanto o locador
quanto o locatário serão legitimados para ações possessórias.

O locatário é obrigado a (art. 569):

• servir-se da coisa alugada para seus usos convencionados ou presumidos conforme a natureza
da coisa

• pagar pontualmente o aluguel

• levar ao conhecimento do locador as turbações feitas por terceiros

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• restituir a coisa no estado em que há recebeu, salvo as deteriorações naturais da coisa

O art. 571 diz que se a locação for estipulada com prazo fixo, antes do vencimento prazo
não poderá ser reavida pelo locador, salvo se o locador indenizar o locatário pelas perdas e danos
resultantes da quebra contratual. Neste caso, o locatário terá o direito de retenção do bem até
que haja o seu pagamento.

Da mesma forma, o locatário somente pode devolver a coisa antes do pactuado pagando
a multa prevista no contrato, proporcionalmente ao tempo que restar para o término daquele
contrato.

O art. 572 vai dizer que a multa ou a obrigação de pagar o aluguel pelo tempo que restar
do contrato, se ela constituir uma obrigação excessiva, poderá o juiz reduzi-la em bases razoáveis.

Se a locação é por prazo determinado, cessará de pleno direito com o esgotamento do


prazo.

Findo o prazo da locação, se o locatário continuar na posse da coisa alugada e o locador


não se opor. Neste caso, presume-se que a locação tenha sido prorrogada pelo tempo
indeterminado e com o mesmo valor de aluguel (art. 574).

Nessas circunstâncias, a qualquer tempo, poderá o locador notificar o locatário para que
ele restitua ao locador o bem. É a denominada denúncia vazia, resilição unilateral.

Se a coisa, objeto de locação, foi alienada pelo locador, havendo um novo proprietário,
este não é obrigado a respeitar o contrato, pois o contrato só vale entre as partes.

Todavia, se o contrato, estando em sua vigência, por prazo determinado, tenha uma
cláusula de vigência no caso de alienação, e esta cláusula conste no registro de imóveis ou no
cartório de títulos e documentos, situação na qual terá eficácia perante terceiros.

Nos casos envolvendo imóvel, caso o novo locador não esteja obrigado a respeitar o
contrato, não poderá simplesmente despejar o locatário, devendo observar o prazo de 90 dias
para o locatário desocupar o bem, situação na qual começará a contar o prazo de notificação,
visando a desocupação do imóvel.

Em relação às benfeitorias, o locatário tem direito de retenção quanto às benfeitorias


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necessárias, até ser indenizado por ela.

Em relação às benfeitorias úteis, terá direito de retenção se a implementação delas tenha


sido autorizada pelo locador.

O STJ vai trazer a Súmula 335 que vai dizer que nos contratos de locação é válida a cláusula
de renúncia às benfeitorias e ao direito de retenção.

VI. Empréstimo: comodato e mútuo

O contrato de empréstimo é um negócio jurídico pelo qual uma pessoa entrega uma coisa
a outra pessoa e de forma gratuita, situação na qual essa pessoa se obriga a devolver a coisa
emprestada ao final do contrato.

Se esta coisa for consumível, esta coisa deverá ser restituída na mesma espécie e na
mesma quantidade.

Há duas espécies de contrato de empréstimo:

• comodato: empréstimo de bem infungível.

• mútuo: empréstimo de bem fungível.

Os dois contratos de empréstimos, além de serem gratuitos e unilaterais, ou seja,


benéficos, como regra, também são comutativos e informais, e reais, percebendo a características
de unilateralidade.

a) Comodato

O comodato, que é o empréstimo de bem infungível, pode ter por objeto tanto bens
móveis como imóveis.

A parte que empresta é o comodante e a parte que recebe é o comodatário.

O contrato é baseado na confiança. Por isso o contrato é intuito personae.

A doutrina aponta a possibilidade de comodato de bens fungíveis, desde que esses bens
sejam utilizados para enfeites ou para ornamentação. Trata-se do comodato ad pompam vel ad
ostentationem. Quer dizer que, por convenção das partes, um bem que, por sua natureza é

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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fungível, acaba se tornando infungível.

O art. 580 diz que tutores, curadores e administradores de bens alheios em geral não
podem dar em comodato, sem autorização especial, dos bens que estão sob sua guarda.

O contrato de comodato é temporário, pois do contrário seria doação. Esse prazo pode ser
determinado ou indeterminado.

Caso seja indeterminado, presume-se que o prazo é aquele para o uso a que se destinou o
empréstimo. Neste caso, não pode o comodante, salvo necessidade urgente e imprevista, assim
reconhecida pelo juiz, suspender o uso ou gozo da coisa emprestada antes do cumprimento do
fim a que se propôs.

Esta regra também vale para o comodato com prazo determinado, visto que, antes do
prazo, o comodante não pode reaver a coisa, salvo necessidade e urgência imprevistas.

A parte final do art. 582 do CC diz que o comodatário constituído em mora, além de por
ela responder, irá pagar até restituí-la o aluguel da coisa, que será aquele arbitrado pelo
comodante. É um aluguel-pena.

O STJ entende que esse aluguel é uma verdadeira pena privada e não será tido como
indenização pela ocupação. O objetivo aqui coagir o comodatário a fim de que ele restitua o mais
rapidamente possível a coisa emprestada.

Se houver um arbitramento exagerado, poderá ser objeto de controle judicial. Segundo o


STJ, o aluguel-pena não pode ser superior ao dobro do valor do aluguel cobrado em média pelo
mercado.

A primeira parte do art. 582 diz que o comodatário é obrigado a conservar, como se sua
fosse sua, não podendo usar a coisa emprestada em desacordo com o que prevê o contrato de
comodato ou da própria natureza da coisa. Se assim o fizer, responderá poder perdas e danos.

O art. 583 diz que, se caindo em risco a coisa emprestada, o comodatário deixar de salvar
essa coisa para salvar coisa própria, responderá pelo dano ocorrido na coisa objeto do comodato,
ainda que este dano seja fruto de caso fortuito ou força maior.

O comodatário não pode recobrar do comodante despesas que ele teve para usar e gozar
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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da coisa emprestada (art. 584).

Havendo pluralidade de comodatários, haverá responsabilidade solidária entre eles (art.


585). É um caso de solidariedade passiva legal.

b) Mútuo

O mútuo é o empréstimo de coisas fungíveis, havendo de um lado o mutuante (cede a


coisa) e do outro o mutuário (recebe a coisa).

Em regra, é um contrato unilateral, real (aperfeiçoa-se com a entrega da coisa), gratuito


(exceção ao mútuo feneratício), comutativo, temporário e informal.

Exemplo é o empréstimo de dinheiro.

O mútuo somente pode ter por objeto bens móveis, pois só recai sobre bens fungíveis, e
todos os bens imóveis são infungíveis.

Como a coisa é transferida para outrem e este outrem a consome, devolvendo uma nova
coisa com o mesmo gênero, mesma qualidade e com a mesma quantidade, é forçoso convir que
este contrato é translativo da propriedade, pois transfere o domínio da coisa empresada ao
mutuário. Portanto, por conta do mutuário correrão todos os riscos da coisa, desde o momento
da tradição.

O art. 590 diz que o mutuante pode exigir do mutuário uma garantia real ou fidejussória,
se antes do vencimento do contrato o mutuário sofrer uma notória mutação na sua situação
econômica.

Caso o mutuário não atenda essa solicitação do mutante para constituir uma garantia real
ou fidejussória, haverá neste caso o vencimento antecipado da dívida.

Em regra, o mútuo, quando feito a um menor de idade, a lei vai dizer que se for feito a um
menor sem autorização do seu representante, não poderá ser reavido do mutuário, e nem mesmo
dos seus fiadores, pois o mútuo foi feito a um menor sem autorização do representante (art. 588).

Esta regra comporta exceções. O art. 589 diz que não se aplica a regra do art. 588 quando:

• a pessoa, de cuja autorização necessitava o mutuário para contrair o empréstimo, o ratificar

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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posteriormente;

• o menor, estando ausente essa pessoa, se viu obrigado a contrair o empréstimo para os seus
alimentos habituais;

• se o menor tiver bens ganhos com o seu trabalho. Mas, em tal caso, a execução do credor não
lhes poderá ultrapassar as forças;

• se o empréstimo reverteu em benefício do menor;

• se o menor obteve o empréstimo maliciosamente.

i. Mútuo oneroso (mútuo feneratício)

O mútuo poderá ser oneroso, tratado no art. 591.

Segundo esse artigo, destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos


juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406,
permitida a capitalização anual.

Ou seja, o mútuo feneratício está limitado a 1% ao mês.

No entanto, a jurisprudência superior entende pacificamente que entidades bancárias não


estão sujeitas a esse limite, pois não se sujeitam à Lei de Usura.

Há inclusive a edição de 3 súmulas sobre o tema:

• Súmula 382: a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica
abusividade.

• Súmula 379: nos contratos bancários, não regidos por legislação específicas, os juros moratórios
podem ser convencionados até o limite de 1% ao mês, mas são os contratos bancários não
regidos por legislação específica. Essa súmula atinge as empresas de factoring.

• Súmula 530: nos contratos bancários, na impossibilidade de se comprovar a taxa de juros


efetivamente contratada, por não ter sido juntado o instrumento de pactuação aos autos, será
aplicada a média de mercado divulgada pelo BACEN, salvo se a taxa cobrada pelo banco for mais
vantajosa para o consumidor.

O art. 592 do CC traz os prazos do contrato, caso não haja previsão no instrumento do

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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mútuo. No caso de mútuo de produtos agrícolas, tanto para consumo quanto para semeadura,
presume-se o prazo até a próxima colheita.

No caso de empréstimo de dinheiro, o prazo é de 30 dias, contados da sua celebração, caso


não haja previsão.

Nos demais casos, coisa fungível presume-se o prazo que declarar o mutuante de qualquer
forma. Esse prazo será fixado por aquele que emprestou a coisa por meio de interpelação judicial
feita ao mandatário, o que não obsta que o magistrado venha a aumentar esse prazo
efetivamente, a depender das circunstâncias evidenciadas.

V. Prestação de serviço

É um negócio jurídico através do qual alguém (prestador) se compromete a realizar uma


determinada atividade, a qual é exercida no interesse de uma outra pessoa (tomador).

Mas essa pessoa que se compromete por meio de outrem é denominado remuneração.

Há aqui um contrato bilateral, oneroso, consensual, comutativo e informal. Bilateral, pois


há pessoas que vão prestar de ambos os lados. Consensual, pois se aperfeiçoa com acordo de
vontades. Comutativo, pois ambas as partes prestam alguma coisa. Informal, pois pode ser oral,
escrito, ou seja, não depende de forma escrita.

a) Regras da prestação e serviço no CC/02

O art. 594 diz que toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode
ser contratado mediante remuneração.

Percebe-se que a prestação de serviço deve ser de um serviço lícito. A licitude deve ser
analisado em sentido amplo, bastando que haja uma contrariedade à função social do contrato, à
boa-fé, função econômica, etc. Dessa forma, o contrato, pelo menos em alguma parte, será nulo.

Se a remuneração não estiver sido estipulada ou não tiver acordo entre as partes, a fixação
dessa remuneração será feita por arbitramento, levando em conta os costumes do local, tempo
de serviço e qualidade do serviço executado, e impedindo o enriquecimento sem causa das partes.

O art. 597 diz que a retribuição será paga depois de prestado o serviço, se não houver

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

uma convenção ou costume que disponha de forma diversa, ou seja, que o pagamento será
adiantado ou que o pagamento será em prestações.

O art. 598 diz que prestação de serviço não se poderá convencionar por mais de 4 anos.
É um teto, pois não poderá ter caráter perpétuo.

Se houver um contrato em que o prazo da prestação de serviço é fixada em um período


superior a 4 anos, o contrato deverá ser reputado extinto em relação ao excesso. Preserva-se o
contrato, mas naquilo que ultrapassar 4 anos, será considerado extinto.

O CJF trouxe um enunciado estabelecendo que, nos contratos de prestação de serviço, nos
quais haja de um lado e de outro empresários, e sendo a função econômica relacionada à
exploração de uma atividade empresarial, as partes podem convencionar um prazo superior ao
prazo de 4 anos. Este prazo de 4 anos não será aplicado quando houver um contrato firmado
entre duas pessoas jurídicas no exercício de atividade empresarial. Flavio Tartuce discorda.

b) Extinção do contrato de prestação de serviço

O art. 599 diz que, sendo o negócio da prestação de serviço celebrado sem prazo, não
podendo o elemento temporal ser retirado de sua natureza ou do costume do lugar, pode
qualquer uma das partes, mediante aviso prévio, resolver o contrato.

O parágrafo único do art. 599 vai consagrar prazos para essa denúncia do contrato:

• aviso com antecedência de 8 dias, se o salário se houver fixado por tempo de um mês, ou mais;

• aviso com antecipação de 4 dias, se o salário se tiver ajustado por semana, ou quinzena;

• aviso de véspera, quando se tenha contratado por menos de sete dias.

Decorre esses prazos da boa-fé objetiva e do direito de informação.

O prestador de serviço contratado por um tempo certo ou contratado por uma obra
determinada, deverá cumprir esse prazo, não podendo se ausentar ou se despedir sem justa
causa.

Do contrário, apesar de ter direito à retribuição daquilo que prestou, deverá pagar perdas
e danos ao tomador (art. 602).

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Isso vai se valer na hipótese de o prestador ter sido demitido por justa causa, visto que
neste caso está sendo despedido por uma falha dele. Terá direito à retribuição, mas deverá pagar
uma indenização ao tomador.

Por outro lado, se o prestador de serviço for demitido sem justa causa, o tomador deverá
pagar, além da retribuição vencida, a metade dos valores que teria direito até o termo final do
contrato.

O art. 605 do CC vai dizer que o tomador não pode transferir para outra pessoa o direito
aos serviços ajustados. E o prestador não pode, sem a concordância com tomador, se substituir
por outra pessoa. Há aqui a consagração de que a prestação de serviço tem o caráter intuito
personae.

A prestação de serviço é um negócio personalíssimo, motivo pelo qual, se uma das partes
morre, o contrato também será extinto. Também se extingue o contrato de prestação de serviços
pelo escoamento do prazo, se tiver prazo determinado; pela finalização da obra, se for uma obra
certa; pela rescisão do contrato, se tiver aviso prévio; por inadimplemento de uma das partes;
pela impossibilidade de continuidade do contrato por motivo de força maior.

c) Tutela externa do contrato

O art. 608 consagra a denominada tutela externa do crédito, estabelecendo que aquela
pessoa que aliciar outra pessoa que estava obrigada em contrato escrito a prestar serviço a outrem
pagará a este a importância que ao prestador de serviço, pelo ajuste desfeito, houvesse de caber
durante 2 anos.

Quem chega para aliciar a pessoa que está contratada por outrem para prestar o serviço
vai pagar a outra pessoa o valor que esse prestador teria direito durante 2 anos em face dessa
outra pessoa. Há uma fixação de uma indenização contra um terceiro que interfere numa relação
contratual que não celebrou.

Por isso, tutela externa do contrato, pois há responsabilização do terceiro que desrespeitou
o contrato. Há uma exceção muito clara ao princípio da relatividade.

d) Prestação de serviço agrícola

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O art. 609 estabelece que a alienação do prédio agrícola, onde a prestação dos serviços
se opera, não importa a rescisão do contrato, ressalvando-se ao prestador opção entre continuar
esse contrato com o adquirente da propriedade ou com o primitivo contratante.

A pessoa que comprou a propriedade agrícola deverá continuar com o sujeito que está
prestando o serviço até o término do serviço. Há aqui uma obrigação que assume uma eficácia
real perante o adquirente do prédio agrícola, pois terá de perceber esse contrato em relação à
pessoa que nem participou.

Trata-se de uma exceção ao princípio da relatividade.

VI. Contrato de empreitada

Alguns dizem que é uma espécie de prestação de serviço.

A empreitada é o contrato por meio do qual uma das partes (empreiteiro) vai se obrigar a
fazer ou mandar fazer determinada obra mediante remuneração. Esta obra será feita em favor de
outra pessoa, que é denominado de tomador ou dono da obra.

A doutrina diz que são 3 as modalidades de empreitada, conforma art. 610:

• empreitada sob administração: o empreiteiro apenas administra as pessoas que foram


contratadas pelo dono da obra.

• empreitada sob mão de obra: o empreiteiro fornece a mão de obra, sendo o material fornecido
pelo dono da obra. Neste caso, o empreiteiro não apenas gerencia, mas contrata as pessoas.

• empreitada mista ou de lavor e materiais: o empreiteiro fornece a mão de obra e também os


materiais, se comprometendo a executar a obra inteira. Há aqui uma obrigação de resultado. Por
isso, é o empreiteiro que contrata o pessoal e fornece os materiais.

Há aqui um contrato bilateral, oneroso, comutativo, consensual e informal.

a) Regras da empreitada no CC/02

O art. 611 diz que na hipótese de o empreiteiro fornecer os materiais (empreitada mista),
correrão por conta do empreiteiro os riscos até o momento de entrega da obra. Se o dono da obra
estiver em mora para receber a obra, os riscos serão por conta do dono da obra.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 612 diz que se o empreiteiro só forneceu a mão de obra, todos os riscos pelos quais
ele não tenha culpa correrão por conta do dono da obra. Quando a empiteirada é de mão de obra
apenas, a obrigação do empreiteiro passa a ser uma obrigação de meio, e não de resultado, ao
contrário da empreitada de lavor e materiais.

Sendo a empreitada de mão de obra, se a coisa perece antes de ser entregue e não há
mora do dono ou culpa do empreiteiro, ele não responderá, mas também não terá direito à
retribuição, pois não houve culpa do prestador e do tomador.

Mas se o empreiteiro comprovar que a coisa pereceu por conta dos defeitos dos materiais
fornecidos pelo dono da obra, e que ele reclamou tempestivamente contra aquela quantidade de
materiais ou contra aquela qualidade de materiais. Nesse caso, o código diz que há direito sim a
retribuição.

O art. 618 diz que, nos contratos de empreitada de edifício, ou de outras construções
consideráveis, o empreiteiro de materiais e de lavor responderá pelo prazo irredutível de 5 anos
pela solidez e pela segurança do trabalho. Isso em razão dos materiais ou do solo, por exemplo.
Aqui há um prazo de garantia legal.

Haverá decadência do direito do dono da obra se não propuser a ação contra o


empreiteiro, nos 180 seguintes ao aparecimento do vício ou defeito.

Em relação ao prazo para pleitear indenização por descumprimento de contrato, e tendo


isso causado prejuízo (responsabilidade civil contratual), o STJ entende que há um prazo de 10
anos.

Concluída a obra, de acordo com o ajustado, o dono da obra é obrigado a receber essa
obra.

Poderá o dono da obra rejeitar quando o empreiteiro tiver se afastado das suas instruções,
ou de seus planos dados a ele, ou se tiver se afastado das regras técnicas para construção.

Eventualmente, poderá o dono da obra requerer que haja o abatimento proporcional do


preço contratado. Isso se o serviço não tiver sido prestado a contento, evitando um
enriquecimento sem causa de quem prestou o serviço (art. 616).

268
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Em relação ao pagamento da remuneração, o art. 614 vai dizer que se a obra constar de
partes distintas (ex.: 10 salas de um prédio comercial, e ele vai reformar as 10), ou for obra em
que se determina por medidas, o empreiteiro tem direito de receber ou de exigir o pagamento
na proporção em que a obra foi executada.

O preço da empreitada pode ser estipulado pela obra inteira, denominando-se preço
global.

O art. 614, §1º, cria uma presunção relativa, dizendo que tudo o que foi pago presume-se
verificado.

No §2º, o CC estabelece que o que se mediu presume-se verificado se, em 30 dias, a contar
da medição, não forem denunciados os vícios ou defeitos pelo dono da obra ou por quem estiver
incumbido da sua fiscalização. Essa presunção exige dois comportamentos: comissivo (medir a
obra) e omissivo (ausência de denúncia da obra no prazo de 30 dias, situação na qual caso não
seja denunciado haverá presunção de que foi verificado e que está de acordo com o projeto).

O art. 619 trata da denominada empreitada com preço fixo. Essa empreitada pode ser por
preço fixado absoluto ou por preço fixo relativo.

O empreiteiro que se compromete a executar uma obra inteira, conforme o plano que foi
aceito, terá ele direito de receber a prestação que ele convencionou, mas não terá direito de
acréscimo do preço, pois houve uma empreitada com preço fixo absoluto.

Agora, se forem introduzidas modificações no projeto, a não ser que resultem de


instruções escritas pelo dono da obra, haverá a possibilidade de ser acrescido um valor ao preço
fixo originariamente fixado.

Eventualmente, ainda que não exista autorização escrita do dono da obra, será este
obrigado a pagar o empreiteiro todos os aumentos, se o dono da obra estiver sempre presente na
obra, e ele não podia ignorar o que estava sendo feito no local, não tendo jamais protestado com
o que estava ocorrendo.

Neste caso, ainda que não tenha dado instruções escritas, o parágrafo único do art. 619
diz que deverá o dono da obra pagar. Trata-se de aplicação da boa-fé. Haveria uma autorização
tácita.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Se houver uma diminuição do preço do material ou mesmo da mão de obra, que seja
superior a 10% do preço global convencionado, poderá o valor do preço global ser revisto, se
houver pedido do dono da obra nesse sentido.

A execução da obra poderá ser transferida a um terceiro. Quando o código autoriza a


empreitada de mão de obra, que há uma sub-empreitada, há uma exceção. Ao contrário da
prestação de serviços, que tem caráter personalíssimo, a empreitada pode ser cedida a outrem.

Essa sub-empreitada pode ser total ou parcial.

Mesmo depois de iniciada a construção, o dono da obra pode suspender essa construção.
Isso desde que pague ao empreiteiro as despesas que o empreiteiro teve, o lucro que o dono da
obra já experimentou pelo serviço já feito e ainda uma indenização razoável por suspensão da
obra.

O art. 625 autoriza a suspensão da obra, situação na qual será autorizada a suspensão da
obra nas seguintes hipóteses:

• suspensão da obra por culpa do dono

• suspensão da obra por motivo de força maior;

• suspensão da obra quando, no decorrer dos serviços, forem manifestadas dificuldades


imprevisíveis de execução do serviço, resultantes de causas geológicas ou hídricas, ou outras
semelhantes, de modo que torne a empreitada excessivamente onerosa, e o dono da obra se
opuser ao reajuste do preço inerente ao projeto por ele elaborado, observados os preços;

• suspensão da obra se as modificações exigidas pelo dono da obra, por seu vulto e natureza,
forem desproporcionais ao projeto aprovado, ainda que o dono se disponha a arcar com o
acréscimo de preço.

Como dito, o contrato de empreitada não é personalíssimo, tanto que o art. 626 afirma
que o contrato de empreitada não se extingue pela morte de qualquer das partes, salvo se
ajustado em consideração às qualidades pessoais do empreiteiro.

VII. Contrato de depósito

O contrato de depósito traz um depositário, que recebe um objeto móvel e corpóreo para

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

guarda, até que o depositante reclame desse objeto.

O objeto pode ser classificado como:

• depósito voluntário: há o depósito por vontade do depositante.

• depósito necessário: há o depósito por imposição.

o depósito necessário legal: decorre da lei.

o depósito necessário miserável: decorre de uma calamidade pública.

Em relação ao objeto do depósito, poderá ser classificado em:

• depósito regular: o objeto é uma coisa infungível.

• depósito irregular: o objeto é uma coisa fungível.

O contrato de depósito, em regra, é unilateral e gratuito. Mas é possível que seja bilateral
e oneroso.

Percebe-se que há depósito oneroso em guarda de cofre de banco. Nesse caso, este
depósito é remunerado, apesar de que, via de regra, o contrato ser gratuito.

O contrato de depósito é comutativo e é personalíssimo, pois se confia na pessoa que


guarda a coisa.

O contrato de depósito é real, aperfeiçoando-se com a entrega da coisa.

O art. 646 diz que o depósito voluntário se prova por escrito. Não quer dizer que o contrato
seja formal, mas sim formal, pois para sua celebração não necessita da forma escrita. Para o
depósito ser provado, deverá ele estar escrito. O dispositivo trata da prova da existência do
contrato de depósito, e não da sua existência em si. Para sua eficácia perante terceiros, talvez seja
necessário a prova escrita para provar a sua existência.

O contrato de depósito não se confunde com o comodato, apesar de ambos, via de regra,
serem gratuito. A diferença é que o comodatário goza e utiliza da coisa, enquanto o depositário
apenas guarda a coisa.

a) Regras quanto ao depósito voluntário

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O depósito é voluntário porque as partes acordaram nesse sentido. No caso do depósito


voluntário, o depositário é obrigado a ter a guarda do bem. Além disso, é obrigado a ter em relação
à coisa o mesmo cuidado que teria com uma coisa que lhe pertence.

Ainda, o depositário tem o dever de restituir a coisa com todos os frutos e acrescidos que
ela experimentou (art. 629). Isso porque o depositário não goza da coisa, motivo pelo qual deverá
devolver a coisa com os frutos gerados durante o período.

Se a coisa tiver sido depositada em benefício de um terceiro, sendo notificado o


depositário disso, não poderá o depositário se exonerar restituindo a coisa a este, sem
consentimento do terceiro.

Ainda que o contrato fixe um prazo para restituição, o depositário ainda assim deverá
entregar a coisa logo que ela for exigida pelo depositante.

Mas o art. 636 também excepciona a regra, estabelecendo que o depositário não é
obrigado a devolver a coisa quando:

• tiver direito de retenção por conta das despesas para conservação da coisa em razão dos
prejuízos que experimentou em razão do depósito.

• o objeto foi judicialmente embargado;

• sobre objeto pendeu uma execução notificada ao depositário

• houver uma suspeita fundada de que a coisa foi dolosamente obtida, requerendo o depositário
que a coisa seja depositada em depósito público.

O contrato de depósito é personalíssimo, pois se baseia na confiança. Dessa forma, conclui-


se que a morte do depositário ou do depositante implica extinção do contrato.

O CC reconhece a possibilidade de o depósito voluntário ser feito de forma conjunta,


tendo dois ou mais depositantes. Se for divisível a coisa depositada, quando for o momento de
devolução da coisa, o depositário irá entregar a cada um dos depositantes a sua respectiva parte,
salvo se houver entre os depositantes solidariedade. Neste caso, o depositário poderá entregar a
coisa toda a um dos depositantes.

O contrato de depósito não traz a possibilidade de uso da coisa. Se houver o uso da coisa,
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

haverá motivo suficiente para resolução do contrato, já que o depositário serviu-se da coisa ou
alienou a coisa sem expressa autorização do depositante.

A exceção existe quando o depositante autoriza o uso da coisa, ou quando permita que
uma terceira pessoa use a coisa. Nesse caso, o depositário será responsável se houver prejuízo
pela utilização da coisa pelo terceiro que o depositário escolheu, visto que a lei presume que tenha
havido culpa na escolha do terceiro (art. 640, parágrafo único).

O depositário não responde por caso fortuito ou força maior. A sua responsabilidade é
subjetiva, mesmo sendo o contrato gratuito.

O depositário tem a obrigação de restituir a coisa assim que o depositante reivindicar.

Por outro lado, o depositante também tem obrigações no contrato de depósito, mesmo
que gratuito, sendo obrigado a pagar ao depositário as despesas para conservação da coisa e os
prejuízos que o depositário experimentou com o depósito, visto que não se permite
enriquecimento sem causa. Neste caso, poderá haver direito de retenção do depositário caso não
seja ressarcido.

b) Depósito necessário

Maria Helena Diniz diz que são 3 as espécies de depósito necessário:

• depósito legal: decorre da lei.

• depósito miserável: decorre de calamidade.

• depósito do hospedeiro: o hospedeiro é o depositário das bagagens dos hóspedes, de forma que
os hospedeiros respondem como depositários se houver a perda da bagagem dentro do hotel.

Em regra, o depósito necessário não se presume gratuito, diferentemente do voluntário.

Não se admite que haja a prisão civil do depositário infiel, pois o Pacto de San José da Costa
Rica tem eficácia supralegal e não admite essa prisão.

VIII. Mandato

O mandato é o contrato pelo qual o mandante vai transferir poderes a outrem,


denominado mandatário, e esse poder é transferido para que o mandante exerça determinados

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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atos ou que administres interesses do mandante.

O art. 654 diz que todas as pessoas capazes são aptas a dar procuração por instrumento
particular, tendo validade, desde que haja assinatura do mandante.

Mandato é o contrato e procuração é o instrumento através do qual o mandato se


materializa. O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a
qualificação do outorgante e do outorgado, a data da outorga e o objetivo da outorga com a
designação e a extensão dos poderes conferidos ao outorgado.

O mandado é um contrato unilateral, pois é o mandatário que assumirá as obrigações, via


de regra.

A vontade das partes ou a natureza profissional do outorgado, poderá converter o mandato


em contrato bilateral imperfeito, que ocorre quando o mandatário tiver direito a remuneração.

Presume-se que o mandato é gratuito, quando se está diante de um mandato civil, mas
quando se estiver diante de um contrato empresarial, esta representação será oneroso.

Em relação ao mandato oneroso, há a regra de que o mandatário deve retribuir a


remuneração acordada pelas partes ou a remuneração prevista em lei. Se a lei e o contrato forem
omissos, o valor da remuneração do mandatário será determinada pelos usos do lugar. Caso ainda
assim não chegue ao valor, será arbitrada pelo juiz de forma razoável.

O mandato é consensual, aperfeiçoando-se pela vontade das partes. É o mandato um


contrato informal.

Mesmo que o mandato seja outorgado por instrumento público, poderá haver
substabelecimento do mandato por instrumento particular. Mas isto não é sempre! Isso porque o
art. 657 vai dizer que a outorga do mandato está sujeito à forma exigida em lei para o ato a ser
praticado.

O mandato verbal não pode ser admitido em casos em que a celebração do contrato para
qual o mandato foi celebrado exija a forma escrita. Ex.: mandato para alguém celebrar um
contrato de fiança em meu nome. Neste caso, o mandato deverá ter forma escrita. Para comprar
um imóvel, deverá se dar por instrumento público.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Feita a nomeação do mandatário, será necessário que ele aceite este encargo. Essa
aceitação poderá ser tácita ou expressa. A aceitação tácita resultará do início do cumprimento do
contrato celebrado.

O contrato de mandato é personalíssimo, pois se baseia na confiança.

c) Principais classificações do mandato

Em relação à origem, o mandato pode ser:

• mandato legal: o mandato decorre da lei. Ex.: pai administra o bem do filho incapaz.

• mandato judicial: o mandato é conferido por uma ação judicial. Ex.: inventariante representa o
espólio.

• mandato convencional: o mandato decorre de contratos e convenção das partes.

o mandato ad judicia: representação da pessoa no campo judicial.

o mandato ad negotia: para administração em geral do interesse do mandante na esfera


extrajudicial.

Em relação à pessoa do mandatário:

• mandato singular: quando só há um mandatário.

• mandato plural: quando há vários mandatários, podendo assumir as seguintes formas

o mandato plural conjunto ou simultâneo: nenhum dos mandatários podem agir de forma
separados, devendo agir de forma conjunta.

o mandato plural solidário: qualquer dos mandatários ou dos procuradores podem agir de
forma isolada. Em regra, quando há mandato plural, presume-se que o mandato é solidário.

o mandato plural fracionário: a ação que compete a cada mandatário é discriminada no


instrumento.

o mandato plural sucessivo ou substitutivo: o mandatário só pode agir na falta do mandatário


principal, havendo uma ordem prevista no instrumento.

d) Principais regras do mandato no CC/02

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Primeiramente, atos praticados por quem não tem mandato ou por quem tenha e não
tenha poderes suficientes para a prática do ato, estes atos serão ineficazes em relação ao suposto
mandante.

Não vinculam o mandante, salvo se ele ratificar os atos praticados, conforme art. 662 do
CC, caso em que esta ratificação retroagirá à data do ato. Portanto, essa ratificação terá efeitos ex
tunc.

Sempre que o mandatário realizar negócios expressamente em nome do mandante, será


o responsável o mandante, já que o mandatário não pratica o ato em seu nome.

Como o mandatário é um possuidor de boa-fé, poderá reter o objeto da operação que


firmou até o recebimento do pagamento de que lhe é devido por conta do mandato, desde que
seja oneroso.

O mandatário que excede os poderes outorgados pelo mandante ou procede contra os


poderes outorgados pelo mandante, será considerado gestor de negócios. Neste caso, enquanto
o mandante não ratificar ou confirmar o ato, será considerado gestão de negócios. Após a
ratificação será considerado mandato retroativo.

O menor relativamente incapaz poderá ser mandante ou mandatário. Se ele é o mandante,


os poderes que outorga deverão ser feito por instrumento público, caso tenha por objeto a prática
de atos da vida civil.

Se a procuração tiver por objeto a atuação em juízo, neste caso o menor poderá outorgar
por simples instrumento particular, desde que assistido pelo seu representante legal.

Se o relativamente incapaz for mandatário, se for mandato extrajudicial, o mandante não


terá ação contra o menor púbere, já que assumiu o risco.

e) Obrigações do mandatário

São obrigações do mandatário:

• aplicar toda sua diligência na execução do mandato;

• prestar contas da sua gerência;

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• não pode compensar prejuízos a que tenha dado causa com proveitos que tenha gerado ao
mandante;

• pelas somas que o mandatário deveria ter entregado ao mandante, mas inclusive tomou para si
essas somas, deverá pagar ao mandante juros, desde o momento em que houve abuso da sua
representação.

• se o mandatário comprar em nome próprio algo que deveria comprar ao mandante, poderá o
mandante ingressar com a ação reivindicatória para obter a coisa comprada pelo mandante em
seu nome.

• se o mandatário, conhecendo da morte, da interdição ou da mudança de estado do mandante,


estiver diante de um negócio que já tenha se iniciado e deve ser concluído se não houver perigo,
o mandatário deve concluir o negócio.

f) Obrigações do mandante

São obrigações do mandante:

• deve satisfazer as obrigações contraídas pelo mandatário;

• deve adiantar as importâncias necessárias para execução do mandato;

• deve pagar ao mandatário a remuneração ajustada;

• deve ressarcir ao mandatário as perdas sofridas pela execução do mandato, desde que não
resultem de culpa do mandatário.

• ainda que o mandatário contrarie instruções do mandante, se não se exceder aos limites do
mandato, o mandante estará obrigado perante a parte que celebrou negócio com o procurador
do mandante. A única coisa é que o mandante tem é o direito de regresso ao mandatário para
pleitear perdas e danos.

• sendo o mandato outorgado por duas ou mais pessoas, cada uma ficará solidariamente
responsável perante o mandatário.

g) Substabelecimento

Substabelecimento é uma cessão parcial de um contrato. O mandatário transferirá partes


dos poderes a uma pessoa.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Havendo proibição de substabelecer, e o mandatário ainda assim o fizer, responderá o


mandatário pelos prejuízos ocorridos sob a gerência do substituto (substabelecido), ainda que
esses prejuízos se deem por caso fortuito ou força maior, salvo se comprovar que teriam ocorrido
mesmo que estivesse sob sua gerência.

Se houver poderes de substabelecer, o mandatário só serão imputados a ele os danos que


o substabelecido causar se tiver agido com culpa na escolha do substabelecido ou nas instruções
passadas ao substabelecido.

Se a proibição de substabelecer constar expressamente na procuração, o mandante não


se obriga pelas obrigações firmadas pelo substabelecido.

Sendo omissa a procuração quanto ao substabelecimento, o mandatário irá responder se


o substabelecido proceder culposamente. Trata-se de uma responsabilidade objetiva indireta,
visto que, para responsabilizar o mandatário, será necessário demonstrar que houve culpa do
substabelecido.

Em relação à extensão do substabelecimento, poderá ser:

• substabelecimento sem reserva de poderes: o sujeito que substabelece transfere ao


substabelecido de forma definitiva, renunciando o mandato.

• substabelecimento com reserva de poderes: o substabelecente outorgará poderes ao


substabelecido, mas não irá outorgar poderes.

h) Extinção do contrato de mandato

O contrato de mandato se extinguirá quando há revogação pelo mandante ou quando há


revogação pelo mandatário.

A morte ou interdição de qualquer das partes implica fim do mandato.

Além disso, também se encerra o mandato pelo escoamento do prazo ou pela conclusão
do negócio que justificou o mandato.

O CC ainda autoriza a chamada cláusula de irrevogabilidade. Esta cláusula afasta o direito


potestativo do mandante de resilir unilateralmente o contrato.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Ocorrendo a revogação do mandato pelo mandante, e a notificação somente do


mandatário, essa resilição não irá gerar efeitos em relação a terceiros de boa-fé, reputando-se
como celebrado o contrato, tendo o mandante direito de regresso contra o mandatário (art. 686).

A revogação pode ser expressa ou também poderá ser tácita. A revogação tácita do
mandato ocorre quando se comunica ao mandatário a nomeação de outro
procurador/mandatário.

No caso de morte de uma das partes, apesar de haver a extinção do mandato, serão
válidos, em relação aos contratantes de boa-fé, os atos que foram ajustados com esses
contratantes de boa-fé em nome do mandante pelo mandatário, enquanto o mandatário ignorar
que houve a morte do mandante ou a revogação por qualquer outra causa.

IX. Contrato de comissão

O contrato de comissão é um contrato pelo qual o comissário vai realizar a aquisição ou a


venda de um bem em seu próprio nome à conta do comitente.

A diferença da comissão e o contrato é de que na comissão o comissário age em seu


próprio nome, e não em nome do comitente.

O contrato de comissão é bilateral, oneroso, consensual, comutativo e informal.

O contrato de comissão é realizado com base na confiança do comissário, constituindo-se


caráter intuito personae.

O comissário fica obrigado diretamente com a pessoa que ele contratar, não havendo ação
dessa pessoa contra o comitente e nem deste contra aquela.

São espécies de comissão:

• comissão imperativa: não há margem de manobra para o comissário.

• comissão indicativa: há uma margem de atuação do comissário, devendo comunicar ao


comitente para saber se este concorda ou não com essa atuação.

• comissão facultativa: o comitente vai transferir ao comissário as razões do seu interesse nos
negócios, mas não há restrição ou observação especial do comissário.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A obrigação do comissário é uma obrigação de meio. Portanto, a responsabilidade dele é


subjetiva, tanto é que a lei diz que responderá ele por prejuízo, salvo por motivo de força maior.

O comissário não responde pela insolvência das pessoas com quem ele tratar, a não ser
que haja culpa dele.

Todavia, no contrato de comissão, é possível que se estabeleça a chamada cláusula del


credere. Nesse caso, quando há cláusula del credere, o comissário responde solidariamente com
a pessoa com quem ele tiver tratado.

Essa cláusula não é sempre permitida, pois no contrato de representação comercial


autônomo, a lei 4.886/65, em seu art. 43, vai vedar expressamente esta cláusula del credere.

Em regra, presume-se que o comissário poderá conceder a dilação do prazo para


pagamento pelo terceiro, em conformidade com os usos do lugar e não tiver instruções diversas
dadas pelo comitente.

Em havendo morte do comissário ou se por motivo de força maior o comissário não puder
concluir o contrato de comissão, o comitente deverá pagar uma remuneração proporcional ao
comissário. Mas obviamente o contrato irá se encerrar, pois o contrato é personalíssimo.

Mesmo que o comissário tenha motivado o fim do contrato, terá direito de ser remunerado
pelos serviços que já prestou e que se mostrem úteis ao comitente. No caso de dispensa por causa
decorrente de culpa do comissário, o comitente terá o direito de exigir do comissário os prejuízos
experimentado (art. 703).

O art. 709 diz que no contrato de comissão devem ser aplicadas as regras previstas para o
contrato de mandato, pois são contratos muito próximos.

Segundo o STJ, é válida a cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a


obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de
unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o
preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de
corretagem. Todavia, é abusiva a cobrança pelo promitente-vendedor do serviço de assessoria
técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere, vinculado à celebração de promessa de compra
e venda de imóvel.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

No mesmo julgado acima, ficou decidido de que a incorporadora tem legitimidade passiva
"ad causam", na condição de promitente-vendedora, para responder a demanda em que é
pleiteada pelo promitente-comprador a restituição dos valores pagos a título de comissão de
corretagem e de taxa de assessoria técnico-imobiliária, alegando-se prática abusiva na
transferência desses encargos ao consumidor.

Essa ação prescreve em 3 anos para restituição dos valores pagos a título de comissão de
corretagem ou de serviço de assistência técnico-imobiliária (SATI), ou atividade congênere (art.
206, § 3º, IV, CC).

X. Agência e distribuição

No contrato de agência, uma pessoa vai assumir, em caráter perene e não eventual, a
obrigação de promover à conta de outra pessoa, mediante retribuição, a realização de certos
negócios.

Ou seja, dentro de uma zona determinada, alguém vai promover negócios à conta e em
nome de outra pessoa e será remunerado por isso.

Distribuição haverá quando o agente tiver à disposição a coisa que vai ser negociada.

Quando se está diante de contrato de agência, há um contrato bilateral, consensual,


comutativo, personalíssimo e informal.

É ainda uma característica do contrato de agência o fato de ser um contrato de trato


sucessivo, pois as obrigações vão sendo cumpridas periodicamente.

O contrato de distribuição terão as mesmas características do contrato de agência, sendo ,


consensual, comutativo, personalíssimo e informal, além de ser de trato sucessivo.

O contrato de agência e de distribuição são contratos de exclusividade. Tanto é que o art.


711 diz que, salvo ajuste em contrário, o proponente não pode constituir, ao mesmo tempo, mais
de um agente, na mesma zona, com idêntica incumbência. Além disso, não pode o agente assumir
o encargo de nela tratar de negócios do mesmo gênero, à conta de outros proponentes.

O agente deve agir com toda a diligência possível e deve observar as instruções do
representado (proponente), sob pena de haver um descumprimento do contrato.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O agente e o distribuidor tem direito à remuneração pelos negócios concluídos dentro da


sua de exclusividade. Ainda que não tenha interferido naquele negócio, mas que tenha sido
celebrado na sua zona, terá ele direito à participação. A isso se dá o nome de comissão.

A remuneração é devida também ao agente quando o negócio deixa de ser realizada por
conta do representado (proponente). Ou seja, o agente ou distribuidor fez tudo e era para o
negócio ser celebrado, mas não foi, terá o proponente direito de receber a sua comissão.

Se o proponente sem justa causa cessa o atendimento das proposta ou reduz o


atendimento, começando a agir de forma antieconômica a continuação do contrato, o agente ou
distribuidor terá direito à indenização. Isso porque houve a quebra da boa-fé.

No tocante ao descumprimento do contrato, destacam-se duas regras:

• mesmo quando dispensado por justa causa, o agente tem direito de ser remunerado pelos
serviços úteis que prestou.

• se a dispensa se der sem culpa do agente, neste caso terá direito à remuneração devida, mas
terá direito dos negócios pendentes, pois trabalhou até o momento, havendo a sua dispensa sem
ter dado causa.

O art. 720 vai dizer que se o contrato for celebrado por tempo indeterminado, qualquer
das partes poderá resolver o contrato, desde que tenha aviso prévio de 90 dias de antecedência
e que tenha havido prazo compatível com o investimento ou com a natureza do contrato
celebrado, ou com o investimento feito pelo agente.

Por fim, deve ser aplicado ao contrato de agência ou distribuição, naquilo que forem
compatíveis as regras do mandato ou da comissão que estejam no Código Civil ou regras de
representação previstas em lei especial.

XI. Corretagem

Corretagem é o negócio jurídico pelo qual uma pessoa (corretor) se obriga a obter para
uma outra pessoa (comitente) um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas pelo
comitente.

O corretor receberá uma remuneração chamada de comissão.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O contrato, portanto, é um contrato bilateral, oneroso, informal e consensual.

Trata-se de um contrato acessório, pois visa a celebração de um outro contrato,


dependendo dessa celebração para surtir efeitos.

É um contrato aleatório, pois o corretor de imóveis só irá receber a comissão se o negócio


for firmado. Há sujeição do risco.

A comissão pode ser variável, fixa ou mista.

A obrigação de pagar a comissão de corretagem, segundo o STJ, é de quem contrata o


corretor. Se é o vendedor que contrata o corretor para vender o imóvel, quem paga é o vendedor.

O art. 725 diz que a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha o corretor
conseguido o resultado previsto no contrato de corretagem, ainda que esse contrato não se
efetue em razão de arrependimento das partes.

O STJ entende que o corretor tem direito à remuneração mesmo tendo sido realizado um
negócio que ele intermediou posteriormente ao prazo do contrato de corretagem.

Ademais, o STJ entende que a remuneração é devida mesmo havendo inadimplemento por
qualquer das partes posteriormente. O que é fundamental é que o contrato de corretagem tenha
gerado um resultado útil.

O STJ também entende que, ainda que o negócio jurídico de compra e venda não se
concretize por inadimplemento do comprador, é devida a comissão de corretagem no caso em
que o corretor tenha intermediado esse negócio. As partes firmaram um contrato de promessa
de compra e venda, e um dos contratantes lançou um sinal, caso em que o corretor fará jus à
remuneração, pois realizada a intermediação.

O art. 726 diz que sendo iniciado e concluído o negócio diretamente entre as partes, sem
atuação do correto, não terá o corretor direito a nenhuma remuneração, mas se por escrito tiver
sido ajustado um contrato de corretagem de exclusividade, por meio de instrumento chamado de
opção, terá direito o corretor à remuneração, ainda que o negócio tenha sido realizado sem a sua
mediação.

Essa remuneração não será devida quando se estiver diante de uma comprovada inércia,
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

ociosidade ou descumprimento do contrato de corretagem pelo corretor.

Se houver corretagem conjunta, ou seja, por mais de um corretor, a remuneração será paga
a todos em partes iguais, salvo se o ajuste tiver sido feito de forma contrária.

XII. Contrato de transporte

O contrato de transporte é aquele em que alguém (transportador) se obriga a transportar


alguém ou alguma coisa a algum lugar, mediante remuneração.

Essa obrigação é de resultado. Aqui há uma cláusula de incolumidade, entregando a coisa


ou a pessoa incólume ao seu destino.

Trata-se de um contrato bilateral, pois o transportado é devedor da passagem e credor do


transporte, e há o transportador que é o devedor do transporte e credor da passagem. É
comutativo, oneroso e informal, não dependendo de forma escrita ou de escritura pública.

a) Regras gerais previstas no Código Civil

O art. 731 do CC diz que o contrato de transporte exercido em virtude de autorização,


permissão ou concessão será regido pelas normas regulamentares, sem prejuízo do disposto neste
Código.

Percebe-se que se há um contrato de transporte com base numa autorização, permissão


ou concessão haverá normas de direito administrativo, visto que há uma relação contratual
firmada com o Estado, mas sem prejuízo da aplicação das normas de direito civil.

O art. 732 diz que vão ser aplicadas as normas previstas em leis especiais e tratados e
convenções internacionais ao contrato de transporte, desde que essas normas não contrariem
aquilo disposto no Código Civil.

Há discussões sobre qual regra será aplicada quando há tratado regulamentando


transporte específico. Isso é importante em razão da Convenção de Varsóvia e em razão da
Convenção de Montreal. Essas duas convenções vão se relacionar a limitações de indenização em
caso de perda de voo ou de extravio de bagagens em viagens internacionais, relacionadas a
transporte aéreo.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A pergunta que se faz é: num contrato de transporte aéreo internacional haverá essa
limitação ou não para o estabelecimento de uma indenização? A reparação será proporcional ao
dano ou conforme prevê a convenção?

O STJ se inclina no sentido da reparação integral do dano, ou seja, ausência de aplicação


das convenções internacionais, visto que deve ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor.
Mas isso desde que haja relação de consumo.

O art. 733 do CC trata do transporte cumulativo. É o transporte em que há vários


transportadores que se obrigam por determinado percurso. Ex.: uma parte do trecho será
rodoviário e outra parte é aquático. Aqui há transportes cumulativos, já que em cada percurso há
transporte diferente.

O art. 756 diz que no transporte cumulativo, todos os transportadores responderão


solidariamente. Uma empresa, no entanto, terá direito de regresso contra a outra.

Havendo dano resultante do atraso ou da interrupção da viagem vai ser determinado em


razão da totalidade do percurso. Essa ressalva do §1º do art. 733 é interessante, pois se foi
contratado uma companhia para levar alguém de Brasília a São Paulo em 12 horas. Quando chega
em Goiânia o ônibus quebra. A companhia, após 2 horas, decide pagar o transporte aéreo. O
sujeito que chegaria às 6 horas da manhã de ônibus, chegou às 6 horas da manhã de avião. Não
houve atraso.

Nesse caso, será considerado o trajeto como um todo para verificar se houve o
cumprimento tempestivo da obrigação de resultado ou não.

b) Transporte de pessoas

No caso de transporte de pessoas, há de um lado o transportador e de outro o passageiro.


O passageiro é transportado por meio do pagamento de uma passagem.

A obrigação assumida é uma obrigação de resultado, não respondendo o transportador


apenas em casos de força maior (inclusive caso fortuito).

O art. 734 não admite como excludente a cláusula de não indenizar. É inadmissível no
contrato de transporte, ainda que não se trate de contrato de consumo.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O parágrafo único do art. 734 diz que é lícito ao transportador exigir a declaração do valor
que contém a bagagem entregue a ele, a fim de fixar o valor máximo da indenização.

O art. 735 diz que a responsabilidade contratual do transportador por acidente com
passageiro não é elidida por culpa de terceiro, pois em relação ao terceiro terá direito de ação de
regresso.

Perceba que há casos em que o Código Civil se mostra mais favorável ao consumidor do
que o próprio CDC, visto que a responsabilidade no CDC pode ser elidida por culpa de terceiro,
enquanto o art. 735 afirma que, no caso de contrato de transporte, não se admite a culpa do
terceiro para excluir a responsabilidade.

Portanto, há aqui a necessidade do diálogo das fontes, conforme Cláudia Lima Marques.

O transporte ainda pode ser feito de forma gratuita (carona), hipótese em que não se
subordina às normas do contrato de transporte, conforme súmula 145 do STJ. A referida súmula
afirma que, no transporte desinteressado, de simples cortesia, o transportador só será civilmente
responsável por danos causados ao transportado quando incorrer em dolo ou culpa grave.

Não se considera gratuito quando há um interesse indireto, ou seja, mesmo que seja sem
remuneração, se trouxer remuneração indireta, haverá responsabilização do transportador. Ex.:
passageiro paga gasolina ou pedágio, não sendo considerado isso como carona.

O art. 738 diz que a pessoa transportada deve se sujeitar às normas estabelecidas pelo
transportador, fixada em bilhetes ou à vista do transportado, abstendo-se de quaisquer atos que
causem incômodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a
execução normal do serviço.

Se o prejuízo sofrido pela pessoa transportada for atribuível à transgressão de normas e


instruções regulamentares pelo próprio passageiro, o juiz reduzirá equitativamente a indenização,
na medida em que a vítima houver concorrido para a ocorrência do dano. Há a concorrência da
vítima para o dano. E quando isso ocorre, haverá a redução da indenização, visto que era dever
legal da vítima observar as normas de segurança e instituídas pelo transportador.

O transportador não pode recusar passageiros por qualquer motivo, salvo nos casos
previstos em regulamento ou quando as condições de higiene ou de saúde do interessado
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

justificarem essa recusa.

O art. 740 trata da chamada resilição unilateral do contrato de transporte. É a resilição


feita pelo passageiro, sendo essa possível antes da viagem, e desde que seja feita a comunicação
da resilição ao transportador em tempo para que a passagem seja vendida a outra pessoa.

Caso a viagem já tenha sido iniciada e o passageiro desista da viagem no meio do percurso,
poderá receber de volta o valor proporcional ao percurso, desde que fique comprovado que outra
pessoa foi transportada em seu lugar. Do contrário, não terá direito a receber nada de volta.

O art. 742 consagra em favor do transportador o direito de retenção da bagagem, como


garantia do valor da passagem. Para Tartuce e Venosa, não há nesse caso penhor legal da
bagagem, e sim um direito pessoal, colocado à disposição do transportador.

c) Transporte de coisas

No transporte de coisas não há passageiros, mas sim um expedidor, o qual irá entregar um
bem corpóreo ao transportador para que ele leve esse bem a um destinatário, que poderá ser o
próprio expedidor, recebendo uma remuneração denominado frete.

O art. 744 diz que ao receber a coisa, o transportador irá emitir o conhecimento, com a
menção dos dados que identificam aquela coisa recebida. Esse conhecimento é um título de
crédito, sendo este atípico.

O art. 745 diz que, no caso de informação inexata ou falsa descrição no documento que o
transportador emitiu com base nas informações prestadas pelo transportado, o transportador
indenizado pelo prejuízo que sofrer. Esta ação respectiva deve ser ajuizada no prazo de 120 dias,
a contar daquele ato, sob pena de decadência.

A doutrina afirma que neste caso o prazo seria prescricional, já que haveria a violação de
um direito que gera um prejuízo, situação em que o autor irá buscar a pretensão à indenização.

Veja, se o expedidor informar que o transportador está expedindo tijolos, mas na verdade
se trata de maconha, o expedidor deverá arcar com o dano, tendo o transportador ter o prazo de
120 dias para propositura dessa ação, a contar do momento em que a informação falsa foi
prestada.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 750 vai dizer que a responsabilidade do transportador irá se limitar ao valor
constante do conhecimento, já que teria o dever de informar. Essa responsabilidade iniciará do
momento em que recebe a mercadoria e somente vai se encerrar no momento em que entregar
ao destinatário. Caso não encontre o destinatário, será depositada a mercadoria em juízo.

O art. 752 afirma que, desembarcadas as mercadorias, o transportador não é obrigado a


avisar o destinatário que desembarcou as mercadorias, salvo se houver convenção nesse sentido.
Ademais, devem constar do conhecimento de embarque as cláusulas de aviso ou de entrega a
domicílio.

Cabe mencionar que há uma crítica da doutrina com relação à possível violação da boa-fé
objetiva, em virtude de não haver a observância do direito de informação.

Ao final do percurso, as mercadorias serão entregues ao destinatário ou quem apresente


o documento de frete endossado. Essa pessoa deverá conferir as mercadorias, hipótese em que,
se não estiverem elas de acordo, deverá apresentar imediatamente a reclamação, sob pena de
decadência.

Se o vício da coisa não for perceptível icto oculi no momento de recebimento da


mercadoria. Nesse caso, o parágrafo único do art. 754 afirma que, se houver avaria ou perda
parcial não perceptível à primeira vista, o destinatário conserva a sua ação contra o
transportador, desde que denuncie o dano em 10 dias a contar da entrega da mercadoria, sob
pena de decadência.

O art. 753 diz que, se o transporte não puder ser feito ou sofrer longa interrupção, o
transportador solicitará instruções ao remetente, e zelará pela coisa, por cujo perecimento ou
deterioração responderá, salvo força maior. Veja que a coisa estará sob responsabilidade do
transportador.

Se perdurar o impedimento, mas não sendo este imputável ao transportador e se não


houver manifestação do remetente, poderá o transportador fazer o depósito judicial da coisa ou
vender a coisa transportada, desde que sejam observados os preceitos legais e regulamentares,
ou os usos locais, depositando o valor em juízo ou em favor do expedidor.

Por outro lado, caso o impedimento se dê por responsabilidade do transportador, poderá

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

este depositar a coisa judicialmente, mas por sua conta e risco. Só será possível vender a coisa
transportada, quando o impedimento ser de sua responsabilidade, caso a coisa seja perecível.

Seja qual for o caso, o transportador deve informar o remetente da efetivação do depósito
ou da venda.

Se o transportador mantiver a coisa depositada em seus próprios armazéns, continuará a


responder pela sua guarda e conservação, sendo-lhe devida, porém, uma remuneração pela
custódia, a qual poderá ser contratualmente ajustada ou se conformará aos usos adotados em
cada sistema de transporte.

Caso haja dúvida sobre quem seja o destinatário, o transportador deve fazer o depósito
judicial da coisa, caso não seja possível obter instruções do remetente. Se a demora puder
ocasionar a deterioração da coisa, o transportador deverá vender a coisa, depositando o saldo em
juízo.

XIII. Contrato de seguro

O art. 757 traz o conceito do contrato de seguro.

Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a


garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos
predeterminados.

Em outras palavras, no contrato de seguro, uma pessoa física ou jurídica (chamada de


“segurada”) paga uma quantia denominada de “prêmio” para que uma pessoa jurídica
(“seguradora”) assuma determinado risco. Caso o risco se concretize (o que chamamos de
“sinistro”), a seguradora deverá fornecer à segurada uma quantia previamente estipulada
(indenização).

Então, há um segurador que recebe um prêmio, situação na qual garante determinados


bens ou pessoas contra riscos predeterminados.

Há um contrato bilateral, oneroso, consensual, mas é aleatório, pois o risco é um fator


determinante.

Apesar de parte da doutrina afirmar que o contrato de seguro é comutativo, por conta de
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cálculos e estatísticas utilizadas pela seguradora. Mas ainda prevalece que se trata de um contrato
aleatório.

Essa comutação ocorrerá entre o prêmio que o segurado paga é a garantia, que é a
contraprestação que o segurador dá. Portanto, o segurador recebe o prêmio dando ao segurado
uma garantia.

Apesar desse entendimento doutrinário, Tartuce entende que o contrato é aleatório.

a) Regras gerais do seguro no Código Civil

Quem pode ser segurador?

Somente pode ser segurador uma entidade legalmente autorizada para esta finalidade
(art. 757). Ou seja, somente sociedades anônimas, grupos de seguro ou cooperativas. Para ser
seguradora é indispensável que haja autorização do governo federal.

Ressalta-se que as cooperativas para seguro terão por objeto apenas seguros agrícolas.

Segundo a lei, a prova do contrato de seguro se dá por meio da apólice ou bilhete de


seguro. Na falta, poderá ser comprovado por qualquer documento que comprove o pagamento
do prêmio.

Veja que a forma é livre, não sendo um contrato formal, pois a lei diz que irá prová-lo por
meio da apólice ou bilhete de seguro. Ou seja, se irá prová-lo é porque ele existe.

Isso mostra que o contrato de seguro é consensual, pois ele está aperfeiçoado desde o
momento em que o acordo de vontades ocorre.

A apólice é o instrumento do contrato de seguro. Ela irá conter as regras gerais do negócio,
e a sua emissão deverá ser precedida, segundo a lei, por uma proposta escrita com a declaração
dos elementos essenciais dos interesses e dos riscos a ser garantidos.

O bilhete do seguro é o instrumento mais simplificado do negócio, por meio do qual se


pode contratar o seguro.

Tanto a apólice como o bilhete de seguro podem ser nominativo, à ordem ou ao portador,
mencionando em relação a cada um deles os riscos assumidos, início e fim do seguro, limite da

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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garantia e prêmio devido.

• apólice ou bilhete de seguro nominativo: menciona o nome do segurador e do segurado. Neste


caso, é transferido por meio de cessão civil.

• apólice ou bilhete de seguro à ordem: será transmitido em endosso em preto, dizendo quem é
que irá receber.

• apólice ou bilhete de seguro ao portador: quem portar é o segurado. Serão transmissíveis por
simples tradição.

O art. 761 vai tratar do denominado cosseguro. No cosseguro, há os riscos de um seguro


direto que são assumidos por várias segurados, sendo corresponsáveis pelo risco.

Nesse caso, a apólice vai indicar qual é a seguradora líder, dentre as corresponsáveis, que
irá administrar o contrato.

Não se pode confundir cosseguro com resseguro. Nessa hipótese, há uma seguradora que
faz um seguro, mas contrata outra seguradora, temendo os riscos desse contrato anterior.

O art. 762 diz que é nulo o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do
segurado, do beneficiário, ou de representante de um ou de outro.

O art. 763 irá dizer que, não tem direito à indenização o segurado que estiver em mora
no pagamento do prêmio, se ocorrer o sinistro antes de sua purgação. Flávio Tartuce afirma que
este dispositivo deve ser interpretado conforme o adimplemento substancial. Como exemplo, é o
caso em que o indivíduo paga o seguro há 10 anos, mas no mês de atraso não paga e a seguradora
recusa a garantia. Neste caso, deverá a seguradora garantir.

O fato de se não ter verificado o risco em previsão do qual se faz o seguro não exime o
segurado de pagar o prêmio, salvo disposição especial.

O segurado e o segurador são obrigados a guardar na conclusão e na execução do contrato,


a mais estrita boa-fé e veracidade, tanto a respeito do objeto como das circunstâncias e
declarações a ele concernentes.

O art. 766 diz que, se o segurado, por si ou por seu representante, fizer declarações
inexatas ou omitir circunstâncias que possam influir na aceitação da proposta ou na taxa do
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

prêmio, este segurado perderá o direito à garantia, e também ficará obrigado ao prêmio vencido.

Portanto, se quebrou a boa-fé objetiva, perderá a garantir e ficará obrigado ao prêmio que
não pagou.

O parágrafo único diz que, se a inexatidão ou omissão nas declarações do segurado não
resultar de má-fé, o segurador terá direito a resolver o contrato, ou poderá cobrar, mesmo após o
sinistro, a diferença do prêmio.

No chamado seguro à conta de outrem, o segurador poderá opor ao segurado quaisquer


defesas que tenha contra o estipulante, por descumprimento das normas de conclusão do
contrato, ou de pagamento do prêmio. Há no art. 767 uma exceção ao princípio da relatividade.

Ex.: se o pai fez um seguro em favor do filho, poderá o segurador opor ao filho exceções
que teria contra o pai. Ainda que se trate de terceiro, o art. 767 é exceção ao princípio da
relatividade.

O art. 768 diz que o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o
risco objeto do contrato. No entanto, deverá este agravamento se dar de maneira intencional.

Por isso ganha discussão na doutrina e na jurisprudência se a embriaguez do segurado em


acidentes de trânsito afasta ou não o dever da seguradora de pagar a indenização.

No STJ há entendimentos para os dois sentidos. Flávio Tartuce entende que a embriaguez,
por si só, não consiste em agravamento intencional do risco, não afastando o dever de indenizar.

Todavia, o STJ entendeu que não é devida a indenização securitária decorrente de


contrato de seguro de automóvel quando o causador do sinistro (preposto da empresa
segurada) estiver em estado de embriaguez, salvo se o segurado demonstrar que o infortúnio
ocorreria independentemente dessa circunstância (Inf. 594).

Em outras palavras, será devido o pagamento da indenização se a empresa segurada


conseguir provar que o acidente ocorreria mesmo que o condutor não estivesse embriagado.

O art. 769 do CC diz que o segurado é obrigado a comunicar o segurador, logo que saiba,
todo incidente suscetível de agravar consideravelmente o risco coberto, sob pena de, se não
informar o segurador, perder o direito à garantia, se provar que silenciou de má-fé. Há um dever
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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de informar, resultante da boa-fé.

Caso não comunique e fique comprovado que silenciou de má-fé, nesta hipótese perderá
o direito de indenização.

O segurador, desde que o faça nos 15 dias seguintes ao recebimento do aviso da


agravação do risco sem culpa do segurado, poderá cientificar, por escrito, de sua decisão de
resolver o contrato.

Essa resolução, que deve ser comunicada no prazo de 15 dias, só terá eficácia após 30 dias
da notificação do segurado, devendo ser restituída pelo segurador a diferença do prêmio.

O art. 771 determina que o segurado deverá comunicar imediatamente à seguradora


quando ocorrer algum sinistro envolvendo o veículo, já que isso possibilita que esta tome medidas
que possam amenizar os prejuízos da realização do risco, bem como a sua propagação. Se não
houver esta comunicação imediata, o segurado perderá o direito à indenização.

Todavia, o STJ decidiu que, para que a perda do direito à indenização, é necessário que
fique demonstrada a omissão dolosa do segurado, que beire a má-fé, ou culpa grave,
prejudicando, de forma desproporcional, a atuação da seguradora. Ex.: se o segurado demorou 3
dias para comunicar à seguradora sobre o roubo do veículo em razão de ameaças do criminoso,
não perderá a indenização, pois não poderia ser dele exigido comportamento diverso.

Em regra, a diminuição do risco no curso do contrato não acarreta a redução do prêmio


estipulado. Mas, se a redução do risco for considerável, o segurado poderá exigir a revisão do
prêmio, ou a resolução do contrato.

Sob pena de perder o direito à indenização, o segurado deve informar o sinistro ao


segurador, logo que souber. E ainda o segurado deverá tomar as providências imediatas para
minorar a ocorrência do sinistro. Isso é a consagração do dever de mitigar as perdas (duty to
mitigate the loss).

O art. 773 do CC vai dizer que o segurador, que ao tempo do contrato sabia que o risco
estava superado, mas não obstante expediu a apólice irá pagar em dobro o prêmio estipulado.
Isso porque se não há risco, não há porque celebrar contrato de seguro. Por conta disso, a doutrina
afirma que o contrato é aleatório, pois o risco é elemento essencial do contrato de seguro.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

É possível que o contrato de seguro traga a cláusula de recondução tácita do contrato pelo
mesmo prazo. Se ficarem caladas as partes, o contrato será prorrogado no tempo pelo mesmo
prazo.

O prolongamento do contrato nas mesmas condições contratadas pelo mesmo prazo. Tal
cláusula é válida, mas não pode ocorrer por mais de uma vez (art. 774).

Ocorrendo o pagamento pela seguradora, é possível a ação regressiva em face do culpado


pelo evento danoso. A seguradora irá pagar o sujeito que está garantido, mas terá direito de
ressarcimento ou de regresso em face de quem efetivamente causou o dano.

Os agentes autorizados do segurador presumem-se seus representantes para todos os atos


relativos aos contratos que agenciarem.

O segurador é obrigado a pagar em dinheiro o prejuízo resultante do risco assumido, salvo


se convencionada a reposição da coisa.

b) Seguro de dano

No seguro de dano, a garantia não pode ultrapassar o valor da coisa garantida, ou seja,
do valor do interesse segurado. Se o valor segurado for superior ao bem garantido, estará havendo
enriquecimento sem causa.

Portanto, se o valor segurado for superior ao valor coisa, o segurado vai perder a garantia
e pagar o prêmio por quebra da boa-fé e enriquecimento sem causa (art. 778).

Em relação à indenização a ser recebida pelo segurado, o art. 781 diz que não poderá
ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro. Em hipótese alguma o limite
máximo da garantia fixada na apólice. Ex.: foi feito um seguro de um carro de 50 mil reais. Este é
o valor do seguro. Após um ano, o sujeito trocou o carro. Quando for avaliar, o segurador pagou
40 mil reais, com base na tabela FIPE.

É possível a cumulação de seguros, no caso de seguro de dano, inclusive o seguro duplo.


Mas sempre o valor do seguro não poderá ser superior ao interesse segurado.

O art. 783 autoriza o seguro parcial, assegurando o interesse por menos do que ele vale.

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Se ocorrer um sinistro parcial, a indenização também será reduzida proporcionalmente.


Ex.: segura-se 50% do bem, se fica segurado 10 mil receberá 5 mil reais da seguradora. É a
denominada cláusula de rateio.

Em relação à garantia, esta não inclui o sinistro provocado por vício intrínseco à coisa
segurada. Portanto, se o segurado não declarou do vício quando da celebração do contrato, será
um vício não segurado. Dessa forma, o vício não é algo que aconteceu, mas sim por algo intrínseco
à coisa. A responsabilidade neste caso será do fornecedor.

Em regra, o contrato de seguro de dano não é personalíssimo, podendo transferir a


terceiro a condição de segurado do bem. Mas é possível que o contrato preveja a clausula
proibitiva de cessão.

O STF entende que, sendo paga a indenização, o segurador vai se sub-rogar nos limites do
valor respectivo, nos direitos e ações que competem ao segurado, contra o autor do dano. Essa
regra não se aplica ao seguro de pessoas, pois o art. 800 do CC é explícito, estabelecendo que,
nos seguros de pessoa, o segurador não pode se sub-rogar nos direitos e ações do segurado ou
do beneficiado, contra quem causou o sinistro. Há aqui apenas a vedação legal à sub-rogação para
o seguro de pessoa.

O Código Civil prevê que a seguradora que paga a indenização sub-roga-se nos direitos do
segurado. Ou seja, o art. 786 estabelece que, paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos
limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do
dano. Este inclusive já era o teor da Súmula 188 do STF, a qual diz que o segurador tem ação
regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no
contrato de seguro.

Segundo o §2º do art. 786, é ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga,
em prejuízo do segurador, os direitos a que se refere este artigo. Tal dispositivo previu, de forma
expressa e inequívoca, a ineficácia, perante o segurador, de atos de disposição praticados pelo
segurado juntamente ao autor do dano.

Desse modo, eventual termo de renúncia ou quitação outorgado pelo segurado ao


terceiro causador do dano não impede o exercício do direito de regresso pelo segurador. O

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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legislador buscou proteger o direito do segurador de ser ressarcido da quantia que gastou para
indenizar o segurado.

Assim, se o segurado optou por acionar o seguro, cobrando a garantia contratada, não lhe
cabe firmar com o causador do dano qualquer tipo de transação que possa importar na extinção
ou diminuição do direito de regresso do segurador. Se o fizer, o ato será absolutamente ineficaz
em relação ao segurador. Por exemplo, o acordo celebrado entre o causador do dano e o segurado,
em que este “fica com pena” da motorista e pede para que ela pague apenas a franquia do seu
seguro, é válido e eficaz entre eles (contratantes).

No entanto, não se pode admitir que os efeitos dessa avença sejam estendidos ao
segurador que, além de não ter participado do ajuste, possui, por força de lei, o direito de ser
reembolsado de todos os valores gastos com o reparo do bem sinistrado. Portanto, mesmo que o
segurado tenha outorgado termo de quitação ou renúncia ao causador do sinistro, o segurador
terá direito de ser ressarcido, em ação regressiva contra o autor do dano, pelas despesas que
efetuou com o reparo ou substituição do bem sinistrado.

Tudo que foi dito acima é a regra. Haverá exceção no caso de má-fé do segurado e boa-fé
do autor do dano. Ex.: Pedro, negligente, bateu no carro de João, que não revela que tem seguro.
Pedro paga o conserto a João e este assina a quitação integral. No entanto, João, de má-fé, aciona
o seguro pedindo o conserto do carro, o que é feito. Após, a seguradora ajuíza ação regressiva
contra Pedro cobrando a quantia do conserto do carro segurado.

Nessa hipótese específica e excepcional, o STJ entende que o terceiro (Pedro), ao ser
demandado na ação regressiva, poderá se eximir do ressarcimento das despesas com o bem
sinistrado, bastando que, nos termos do art. 373, II, do CPC, prove que já realizou a reparação
completa dos prejuízos causados, apresentando o recibo assinado pelo segurado ou eventuais
documentos que comprovem o custeio das despesas. Neste caso, o juiz deverá julgar
improcedente o pedido regressivo formulado, restando à seguradora a alternativa de demandar
contra o próprio segurado, por locupletamento ilícito, tendo em vista que, em evidente ato de
má-fé contratual, requereu, indevidamente, a cobertura securitária mesmo já tendo sido
indenizado diretamente pelo autor do dano.

Também merece destaque o art. 786, §1º, o qual estabelece que, salvo dolo, a sub-rogação
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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não tem lugar se o dano foi causado pelo cônjuge do segurado, ascendente ou descendente, seja
consanguíneo ou afim. Esse dispositivo fala que o segurador irá se sub-rogar no direito do
segurado e vai propor a ação contra o causador do dano. Mas se o causador do dano for a mulher,
filho ou pai da pessoa, não haverá sub-rogação. A exceção é em relação ao dolo.

O seguro de responsabilidade civil é uma modalidade de seguro de dano. No seguro de


responsabilidade civil, a seguradora se compromete a cobrir danos causados por atos ilícitos
cometidos pelo segurado ao terceiro.

O Código Civil é expresso ao proibir o segurado de reconhecer a sua responsabilidade ou


confessar a ação, ou mesmo transigir com o terceiro indenizado ou mesmo de indenizá-lo, sem
que haja a anuência expressa do segurador nos casos de seguro de responsabilidade civil.

No caso de seguro de responsabilidade civil, se foi intentado uma ação contra o segurado,
o segurado deverá dar ciência ao segurador a respeito da lide. Essa ciência será dada através da
denunciação da lide. Não havendo, poderá posteriormente em acionar o segurador.

O STJ, na súmula 537, estabelece que, em ação de reparação de danos, a seguradora


denunciada, se aceitar a denunciação ou contestar o pedido do autor, pode ser condenada,
direta e solidariamente junto com o segurado, ao pagamento da indenização devida à vítima, nos
limites contratados na apólice.

É bom lembrar que o fato de poder ser condenada diretamente e solidariamente não
autoriza que ela seja acionada unicamente e exclusivamente pelo terceiro. Tanto é que a súmula
529 estabelece que no seguro de responsabilidade civil facultativo, não cabe o ajuizamento de
ação pelo terceiro prejudicado direta e exclusivamente em face da seguradora do apontado
causador do dano.

Existem seguros de responsabilidade civil que são obrigatórios como é o caso do DPVAT.
Nesses seguros, a indenização pelo sinistro será paga pelo segurador diretamente ao terceiro
prejudicado (art. 788).

Vale mencionar a súmula 246 do STJ, a qual diz que o valor do seguro obrigatório deve ser
deduzido da indenização judicialmente fixada.

i. Seguro DPVAT
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O DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestres) é um


seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por
sua carga, a pessoas, transportadas ou não.

Qualquer pessoa que sofrer danos pessoais causados por um veículo automotor, ou por
sua carga, em vias terrestres, tem direito a receber a indenização do DPVAT. Isso abrange os
motoristas, os passageiros, os pedestres ou, em caso de morte, os seus respectivos herdeiros. Para
receber indenização, não importa quem foi o culpado.

O DPVAT não paga indenização por prejuízos decorrentes de danos patrimoniais, somente
danos pessoais.

O STJ já se manifestou no sentido de que o DPVAT não cobre os danos de acidente


ocasionado por trem.

Qual é o valor da indenização de DPVAT prevista na Lei?

• no caso de morte: R$ 13.500,00 (por vítima)

• no caso de invalidez permanente: até R$ 13.500,00 (por vítima)

• no caso de despesas de assistência médica e suplementares: até R$ 2.700,00 como reembolso


a cada vítima.

A incidência de atualização monetária nas indenizações por morte ou invalidez do seguro


DPVAT opera-se desde a data do evento danoso, conforme súmula 580 do STJ.

Quem são os beneficiários do seguro DPVAT? Quem tem direito de receber a indenização?

• No caso de morte: metade será paga ao cônjuge do falecido, desde que eles não fossem
separados judicialmente, e o restante aos herdeiros da vítima, obedecida a ordem da vocação
hereditária. Não havendo cônjuge nem herdeiros, serão beneficiários os que provarem que a
morte da vítima os privou dos meios necessários à subsistência. Segundo o STJ, é válido o
pagamento de indenização aos pais do de cujus no caso em que os genitores, os quais se
apresentaram como únicos herdeiros, diante da apresentação da certidão de óbito que
afirmava que o falecido era solteiro e não tinha filhos. Nada impede, porém, que o filho exerça
seu direito de ingressar com ação cobrando a quantia dos pais do falecido que receberam a
indenização de forma indevida.
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Eduardo Defaveri

• No caso de invalidez permanente: a própria vítima.

• No caso de despesas de assistência médica e suplementares: a própria vítima.

O STJ decidiu que, se uma gestante envolve-se em acidente de carro e, em virtude disso,
sofre um aborto, ela terá direito de receber a indenização por morte do DPVAT, nos termos do
art. 3º, I, da Lei 6.194/74. Segundo o Ministro Relator, o ordenamento jurídico como um todo
alinhou-se mais à teoria concepcionista para a construção da situação jurídica do nascituro,
conclusão enfaticamente sufragada pela majoritária doutrina contemporânea” (Inf. 547).

A ação de cobrança do DPVAT prescreve em 3 anos, iniciando o prazo da data em que teve
ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez ou da morte. O prazo prescricional
começa no dia que foi realizado o pagamento administrativo que o beneficiário considera que
tenha sido menor que o devido.

A súmula 573 do STJ estabelece que, nas ações de indenização decorrente de seguro
DPVAT, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez, para fins de contagem do prazo
prescricional, depende de laudo médico, exceto nos casos de invalidez permanente notória ou
naqueles em que o conhecimento anterior resulte comprovado na fase de instrução.

Para obter a indenização, a pessoa deverá procurar uma das empresas seguradoras que
seja consorciada ao DPVAT e apresentar a documentação necessária. Para requerer o seguro
DPVAT não é necessário advogado, despachante ou qualquer outra ajuda de terceiros. Segundo
o STJ, o Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos
individuais homogêneos dos beneficiários do seguro DPVAT, dado o interesse social qualificado
presente na tutela dos referidos direitos subjetivos.

Na ação de cobrança do seguro DPVAT, constitui faculdade do autor escolher entre:

• foros do domicílio do autor

• foro do local do acidente ou

• foro do domicílio do réu

Caso a pessoa beneficiária do DPVAT não receba a indenização ou não concorde com o
valor pago pela seguradora, ela poderá buscar auxílio do Poder Judiciário, por meio de uma ação

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

de cobrança contra a seguradora objetivando a indenização decorrente de DPVAT.

Consoante o entendimento do STJ, em ação de cobrança de seguro DPVAT, a intimação da


parte para o comparecimento à perícia médica deve ser pessoal, e não por intermédio de
advogado (Info 589).

Segundo o STJ, o espólio, ainda que representado pelo inventariante, não possui
legitimidade ativa para ajuizar ação de cobrança do seguro obrigatório (DPVAT) em caso de
morte da vítima no acidente de trânsito.

Segundo a Lei do DPVAT, o valor indenizatório deve ser pago metade ao cônjuge não
separado judicialmente e o restante aos herdeiros da vítima, segundo a ordem de vocação
hereditária (art. 4º da Lei 6.194/1974). O valor oriundo do DPVAT não integra o patrimônio da
vítima de acidente de trânsito. Em outras palavras, o valor da indenização não é um crédito da
vítima falecida. Não integra o patrimônio deixado pelo morto. O valor da indenização do DPVAT,
em caso de morte, passa diretamente para os beneficiários (cônjuge supérstite e demais
herdeiros).

c) Seguro de pessoa

O contrato de seguro de pessoa visa assegurar a pessoa humana, protegendo ela contra
riscos de morte, comprometimento de saúde, incapacidades em geral, etc.

O art. 789 diz que nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado
pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o
mesmo ou diversos seguradores.

A primeira diferença entre o seguro de dano e o seguro de pessoa é de que este não tem
limites, pois a vida humana não é quantificável.

Se a pessoa quiser fazer 10 seguros de vida, será possível.

No seguro de vida e no seguro sobre a vida de outros, o proponente é obrigado a declarar,


sob pena de falsidade, o interesse de assegurar a vida do outro. Deve declarar qual é o interesse
para assegurar.

Presume-se esse interesse quando o segurado for ascendente, descendente ou cônjuge do


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

proponente, pois do contrário deverá explicar a razão de fazer o seguro.

O contrato de seguro de pessoas pode instituir um terceiro beneficiário, o qual receberá a


indenização em caso da morte do segurado. Na falta de indicação do terceiro, o capital será pago
metade ao cônjuge e a outra metade aos herdeiros do segurado.

Se não for casado e não tiver herdeiros necessários, vão ser beneficiados aqueles que
provaram que com a morte do segurado ficaram privados dos meios necessários à subsistência
(art. 792, parágrafo único).

Também é válida a instituição do seguro como beneficiário o companheiro, desde que, ao


tempo do contrato, o beneficiário era separado judicialmente ou mesmo separado de fato (art.
793).

Nos casos de seguro de vida ou acidentes pessoais geradores de morte, o capital


estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, pois não é herança.

Ainda a respeito do seguro de vida, o STJ tem uma decisão no sentido de que, na hipótese
em que o contrato de seguro de vida é renovado ano a ano, não pode a seguradora modificar
subitamente as condições da avença, e nem deixar de renová-la em razão da idade do segurado.

No seguro de vida por causa de morte, é lícito estipular um prazo de carência. Durante o
período de carência, o segurador não responderá pela ocorrência do sinistro (art. 797). Nessas
hipóteses, ocorrendo o sinistro, o segurador é obrigado a devolver ao beneficiário o montante da
reserva técnica. A reserva técnica é aquilo que já foi pago.

Em relação ao beneficiário do seguro, este não tem direito ao capital estipulado quando o
segurado comete suicídio nos 2 primeiros anos da vigência do contrato ou nos 2 primeiros anos
da recondução de um contrato que estava suspenso. A pessoa receberá a reserva técnica, mas o
capital não irá receber (art. 798).

Não interessa mais se o suicídio foi premeditado ou não.

Ressalvada essa hipótese, é nula cláusula contratual que exclua pagamento de capital por
causa de suicídio do segurado. Passados estes 2 anos, tem total direito de receber.

Esse seguro de pessoas pode ser estipulado por uma pessoa natural ou por pessoa jurídica,
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

em proveito de um grupo que essa pessoa jurídica de qualquer modo se vincule. É o denominado
seguro de vida em grupo. Neste caso, o estipulante é o único responsável para com o segurador.

Se houver modificação do valor da apólice, será necessário a anuência expressa dos


segurados que correspondam a 3/4 dos integrantes do grupo (art. 801).

XIV. Constituição de renda

Por meio da constituição de renda uma pessoa (instituidor) entregará uma determinada
quantia em dinheiro, bem móvel ou imóvel, a outra pessoa (rendeiro).

O rendeiro fica obrigado a pagar ao instituidor temporariamente uma certa renda, a qual
poderá ser estipulada em favor do próprio rendeiro.

Perceba que, em regra, essa transmissão ocorre de forma gratuita, por meio de atividade
benevolente. Não há qualquer contraprestação por parte do rendeiro, pois ele seria o beneficiário.

Em regra, o contrato é unilateral, gratuito, comutativo, real, temporário e solene.

Veja, o contrato de constituição de renda deve se dar por escritura pública.

A constituição de renda pode ser instituída por ato inter vivos ou por ato causa mortis
(testamento). Neste caso, o testamento deve ser público, conforme a doutrina.

A constituição da renda pode se dar por meio de sentença judicial, como quando há o
pagamento de alimentos indenizatórios.

A constituição de renda é feita por prazo certo, mas pode ser feito inclusive por vida, ou
seja, até que se ultime a vida do devedor (rendeiro), situação na qual que, ocorrendo, retornará o
bem ao instituidor.

Não pode a constituição de renda ser pela vida do instituidor, pois se este morrer, a
família daquele que necessitava dos alimentos ou da renda não poderá ficar sem nada.

Se o rendeiro deixar de cumprir uma obrigação estipulada, o credor (instituidor) poderá


acioná-lo. Este credor também poderá ser terceiro, que em benefício do qual a renda foi instituída.
Este credor também poderá acioná-lo para que ele pague o que deve, ou para que apresente
garantias de que vai pagar o que deve, ou que deverá a partir daquele momento, sob pena de

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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rescindir o contrato de constituição de renda (art. 810).

Via de regra, não existe direito de acrescer entre os beneficiários da renda. Se falece o
rendeiro, o outro continuará recebendo a mesma coisa que recebida, sendo extinto o benefício
contra aquele que faleceu.

A exceção está na chamada constituição de renda gratuita em que há o direito de acrescer


entre os cônjuges. É o caso da constituição de renda legal, em que, morrendo um dos cônjuges, o
outro passar a receber a renda do outro.

Além desse direito de acrescer legal, é possível o direito de acrescer convencional, em que
haja previsão nesse sentido.

XV. Jogo e aposta

Apesar de o Código tratar de forma conjunta, não se confundem os contratos.

O contrato de jogo ocorre quando duas ou mais pessoas prometem entre si que vão pagar
uma certa soma àquela pessoa que conseguir um resultado favorável de um acontecimento
incerto.

A aposta está presente quando duas ou mais pessoas têm opiniões discordantes entre
qualquer assunto, e elas prometem entre si que vão pagar uma certa quantia ou entregar
determinado bem à pessoa cuja opinião prevalecer, por conta de um evento incerto.

Em ambos os casos há contratos bilaterais, onerosos, consensual, informal, mas é


essencialmente aleatório, visto que a aposto e o jogo decorrem de um risco.

Em regra, as dívidas de jogo e aposta constituem obrigações naturais, pois há o schuld sem
haftung, ou seja, há débito, mas não há responsabilidade.

Essa regra vai se estender para qualquer contrato que encubra a dívida do jogo ou da
aposta, mesmo que seja um reconhecimento, novação ou fiança de dívida de jogo.

Essa regra tem aplicação ainda que o jogo não seja proibido. Mesmo assim a obrigação
será natural.

A única exceção é se houver um jogo ou aposta legalmente permitidos, tais como as

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

loterias oficiais: Mega-Sena, Lotomania, etc. Nesses casos, a dívida poderá ser cobrada
judicialmente.

Ainda há uma exceção aos denominados prêmios oferecidos para o vencedor de uma
competição de natureza desportiva, artística ou intelectual. Em verdade, o que se tem aqui é uma
promessa de recompensa, sendo um ato unilateral que constitui uma fonte de obrigação.

XVI. Fiança

Fiança é um contrato pelo qual o fiador garante que vai satisfazer ao credor uma
obrigação que é assumida pelo devedor, caso este não cumpra a obrigação.

Perceba que a fiança é um contrato acessório, firmado entre fiador e credor.

Por isso, em regra, há o benefício de ordem do fiador.

O contrato de fiança traz duas relações jurídicas: uma que é interna do próprio contrato,
que é a relação entre o fiador e o credor do devedor, mas também há uma relação externa, que é
a relação entre o fiador e o devedor.

O art. 820 diz que a fiança pode ser estipulada, ainda que sem o consentimento do
devedor, e mesmo contra a sua vontade, visto que é um contrato diferente do contrato firmado
entre credor e devedor.

Na fiança há um contrato unilateral, pois quem tem obrigação é apenas o fiador. Em regra,
é um contrato gratuito, salvo quando as instituições financeiras são as fiadoras, situação em que
serão remuneradas e o contrato passará a ser oneroso. A fiança será formal, pois exige a forma
escrita.

O art. 819 diz que a fiança não admite interpretação extensiva, pois se está diante de um
contrato benéfico.

O STJ, na Súmula 214, diz que o fiador na locação não responde por obrigações
resultantes de aditamento ao qual não anuiu. Há aplicação do princípio da relatividade do
contrato.

Segundo o STJ, a fiança limitada decorre da lei e do contrato, de modo que o fiador não

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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pode ser compelido a pagar valor superior ao que foi avençado, devendo responder tão somente
até o limite da garantia por ele assumida, o que afasta sua responsabilização em relação aos
acessórios da dívida principal e aos honorários advocatícios, que deverão ser cobrados apenas do
devedor afiançado.

Por se tratar de contrato benéfico, as disposições relativas à fiança devem ser interpretadas
de forma restritiva (art. 819 do CC), razão pela qual, nos casos em que ela é limitada (art. 822), a
responsabilidade do fiador não pode superar os limites nela indicados. Ex: indivíduo outorgou
fiança limitada a R$ 30 mil; significa que ele não terá obrigação de pagar o que superar esta
quantia, mesmo que esse valor a maior seja decorrente das custas processuais e honorários
advocatícios (Inf. 595).

Atente-se ao caso da fiança que garante a locação urbana (Lei de Locações). Salvo
disposição em contrário, qualquer das garantias da locação vai se estender até que o imóvel seja
devolvido, ainda que esta prorrogação tenha se dado por prazo indeterminado. Então a fiança será
prorrogada, conforme seja prorrogada automaticamente a fiança.

Por isso a lei diz que, passando a fiança a ter prazo indeterminado, o fiador poderá se
exonerar por uma notificação dirigida ao locador. Neste caso, ficará garantida a dívida ainda por
mais 120 dias após a notificação.

Em julho de 2015 o STJ entendeu que essa tese da prorrogação da fiança se estenderá
também para fianças prestadas em contratos bancários. Neste caso, o fiador poderá se exonerar
para não mais afiançar o débito.

Se o contrato principal for nulo, a fiança será nula, pois se trata de contrato acessório, mas
o contrário não ocorrerá da mesma forma.

a) Efeitos e regras da fiança no Código Civil

A fiança pode ser total ou parcial, podendo afiançar parte da dívida ou a dívida toda. O que
não se pode fazer é afiançar um valor superior ao valor do débito principal.

Em regra, a fiança será total, garantindo a dívida com todos os seus acessórios, juros,
multa, despesas judicial com citação do fiador, etc., tendo ele direito de regresso contra o
afiançado.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Tornando-se insolvente ou incapaz o fiador, o credor pode exigir a sua substituição. Se


esta substituição do fiador não ocorrer, haverá o vencimento antecipado da dívida.

Lembre-se que o fiador não é devedor solidário e sim subsidiário, tendo benefício de
ordem. Regulamentando o benefício de ordem, o art. 827 diz que o fiador demandado pelo
pagamento da dívida tem direito a exigir, até a contestação da lide, que sejam primeiro executados
os bens do devedor.

O fiador que alega o benefício de ordem deve indicar os bens do devedor principal que
bastem para a satisfação da dívida. Mas ele irá nomear bens livre e desembaraçados localizados
no mesmo município em que haja a cobrança da dívida. Tartuce entende que essa redação literal
do dispositivo deve sofrer ponderações.

O art. 828 consagra hipóteses em que o fiador não pode alegar benefício de ordem:

• fiador renunciou expressamente ao benefício de ordem;

• fiador se obrigou como principal pagador ou como devedor solidário;

• devedor estiver insolvente ou devedor falido.

A renúncia ao benefício de ordem será nula quando estiver inserida em contrato de


adesão, conforme o Enunciado 364 do CJF.

O art. 829 diz que a fiança conjuntamente prestada a um só débito por mais de uma pessoa
importa em solidariedade entre os fiadores, se não reservarem o benefício da divisão.

A exceção a esta regra consta do fato em que se houver no contrato de fiança uma
distribuição de quanto cada um deles ficará responsável.

O art. 834 diz que, quando o credor sem justa causa deixar de dar andamento à execução
feita contra o devedor, o fiador poderá fazê-lo, pois caso não pague o devedor, o fiador deverá
pagar.

Tanto é que o art. 835 diz que o fiador poderá se exonerar da fiança que tenha celebrado
sem limitação de tempo sempre que lhe convier. Este dispositivo está dizendo que o fiador, se foi
prestada por prazo indeterminado, poderá se exonerar quando quiser.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Neste caso, ficará o fiador obrigado a todos os efeitos da fiança 60 dias após a notificação
do credor.

Atente-se que o fiador ficará por 120 dias obrigado quando se tratar de locação urbana.
No caso de contratos em geral, ficará o fiador obrigado por mais 60 dias a contar da comunicação.

O art. 836 diz que a obrigação do fiador passa aos herdeiros, mas a responsabilidade da
fiança será limitada ao tempo decorrido até a morte do fiador, e não pode ultrapassar as forças
da herança.

O contrato de fiança depende da confiança, sendo personalíssimo, de forma que a morte


implica fim ao contrato de fiança.

O art. 837 diz que o fiador pode opor ao credor as exceções e defesas pessoais do próprio
fiador, que geram a extinção do contrato, mas também poderá alegar defesas extintivas da
obrigação que competem ao devedor principal. Ex.: fiador não paga sob alegação da prescrição,
pagamento direto ou indireto, etc.

O fiador, mesmo que solidário, fica desobrigado se, sem o seu consentimento, o credor
conceder moratória ao devedor. O STJ entende que moratória ou transação entre devedor e o
credor exoneram o fiador, ainda que ele tivesse assumido a obrigação em caráter solidário, já que
não participou dessa nova celebração.

A fiança será extinta se, por fato do credor, for impossível a sub-rogação nos direitos e
preferências do credor pelo fiador. Ex.: o credor é credor de garantia real (hipoteca) e garantia
fidejussória (existe um fiador), mas o credor renuncia a sua preferência sobre a coisa, executando
o fiador.

Neste caso, a fiança estará extinta por fato atribuível ao credor, visto que estará o fiador
impossibilitado de se sub-rogar aos direitos e preferências que ele tinha.

Ademais, a fiança será extinta se o credor, em pagamento da dívida, aceitar amigavelmente


do devedor, um conteúdo diverso da dívida obrigada. Ou seja, a fiança está extinta se houver
dação em pagamento, mesmo que depois o credor venha a perder esse bem em razão da
evicção.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 839 diz que se for invocado o benefício de ordem e o devedor, retardando-se a
execução, cair em insolvência, também ficará o fiador exonerado. Isso quer dizer que, quando for
executar o fiador, e ele indicar vários bens do devedor, alegando benefício de ordem, mas o credor
nada o fez.

Quanto à sua extensão da fiança, ela poderá ser classificada em:

• Fiança ilimitada: quando a garantia concedida pelo fiador abrange a integralidade da obrigação,
incluindo as parcelas acessórias da dívida principal. Ex.: multa contratual, juros de mora e
atualização monetária;

• Fiança limitada: quando o fiador manifesta, de forma expressa, que só está se responsabilizando
por determinada parcela da obrigação. Na fiança limitada, o fiador poderá dizer que está se
responsabilizando apenas pela obrigação principal e que não pagará despesas acessórias. Ex.:
fiador se compromete a pagar apenas os aluguéis que o inquilino não quitar, mas não arcará com
multa ou quaisquer outras verbas acessórias. Existe também a possibilidade de a fiança limitada
abranger até mesmo apenas uma parte da obrigação principal. Ex.: fiador se comprometo a pagar
até o máximo de 70% da dívida principal, caso o devedor não cumpra sua parte.

A regra é que a fiança seja ilimitada (total, universal). Assim, se o fiador quiser se
responsabilizar apenas por parte da obrigação, isso deverá ser expressamente consignado no
contrato. Em caso de silêncio por parte do fiador (ou seja, se o contrato não falar nada), entende-
se que a fiança foi concedida de forma ilimitada.

Por essa razão, o art. 822 diz que, não sendo limitada, a fiança compreenderá todos os
acessórios da dívida principal, inclusive as despesas judiciais, desde a citação do fiador.

Já o art. 823 afirma que a fiança pode ser de valor inferior ao da obrigação principal e
contraída em condições menos onerosas, e, quando exceder o valor da dívida, ou for mais
onerosa que ela, não valerá senão até ao limite da obrigação afiançada.

XVII. Transação

Transação é uma espécie de concessão recíproca. Transação é um contrato por meio do


qual as partes vão pactuar a extinção de uma obrigação por meio de concessões recíprocas.

A transação pode ser preventiva, sendo antes de ser instaurado qualquer processo judicial.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

É um contrato bilateral, oneroso, consensual, comutativo e deve ter como objeto direitos
obrigacionais de cunho patrimonial e de caráter privado. Se não for dispositivo, não há como
transacionar.

O art. 842 diz que a transação far-se-á por escritura pública, nas obrigações em que a lei o
exige, ou por instrumento particular, nas em que ela o admite; se recair sobre direitos contestados
em juízo, será feita por escritura pública, ou por termo nos autos, assinado pelos transigentes e
homologado pelo juiz

A transação é um contrato formal, mas não é solene, salvo quando o ato exigir escritura
pública. Há pelo menos a exigência de forma escrita.

A transação poder ser:

• Transação judicial (ou extintiva): ocorre quando a transação é feita perante o juiz. Essa transação
deverá ser feita por escritura pública ou por termo nos autos, assinado pelas partes e
homologado pelo juiz, fazendo coisa julgada material.

• Transação extrajudicial (ou preventiva): é feita preventivamente, antes de ser instaurado o


litígio judicial. Exige-se apenas a forma escrita.

A transação deve ser interpretada de forma restritiva, já que há concessões mútuas.

Diante de natureza contratual da transação, via de regra, produz efeitos inter partes (p.
relatividade). No entanto, pode admitir algumas exceções, como o caso da transação entre o
credor e o devedor, sem o conhecimento do fiador, implica desobrigação do fiador. Portanto,
produziu efeitos perante um terceiro que nem participou da transação.

A transação entre um credor solidário e um devedor vai extinguir a obrigação desse


devedor em relação a todos os credores solidários que não participaram da transação.

Se a transação for entre um dos devedores solidários e seu credor, vai se extinguir a dívida
para todos os devedores solidários.

Portanto, há uma exceção ao princípio da relatividade do contrato.

Ocorrendo a evicção da coisa renunciada pelo outro transigente, ou seja, o transigente


forneceu ao outro uma coisa a que depois gerou evicção.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A consequência é o reavivamento da obrigação extinta pela transação? Não.


Diferentemente da dação em pagamento, que é modo de pagamento indireto, aqui há um
contrato. O fato de experimentar a evicção não implica o retorno do status a quo anterior à
celebração da transação. O evicto terá direito a perdas e danos (art. 845).

Em decorrência do princípio da indivisibilidade, que é adotado pelo art. 848 do CC,


chegamos a conclusão de que é nula a transação quando é nula qualquer de suas cláusulas. Por
isso o princípio da indivisibilidade.

Nula a cláusula da transação, nula é a transação. Em se tratando da transação, haverá


mitigação do princípio da preservação do contrato.

Ressalte-se o parágrafo único do art. 848 que diz que, quando a transação versar sobre
diversos direitos contestados, independentes entre si, o fato de não prevalecer em relação a um
não prejudicará os demais, já que os demais são independentes.

Ou seja, se a transação estiver tratando de diferentes objetos e direitos, os quais são


independentes entre si, o fato de ter sido maculado um direito não atinge os demais.

O art. 850 diz que é nula a transação a respeito do litígio de uma sentença transitada em
julgado, se dessa sentença não tinha conhecimento algum dos transatores. Ou ainda é nula uma
transação por título posteriormente descoberto se verificar que nenhum deles tinha direito sobre
o objeto da transação. É nula a transação a non domino.

XVIII. Compromisso

Compromisso é um acordo de vontades por meio do qual as partes decidem que não vão
submeter o litígio a uma decisão judicial, conferindo a solução de uma desavença a um árbitro ou
árbitros. Diante desse conflito de interesses de natureza disponível será feita por um árbitro.

A arbitragem se restringe a direitos patrimoniais disponíveis, decidindo as próprias partes


a tarefa de retirar do judiciário e submete a um árbitro a decisão do fato em apreço.

O compromisso arbitral não se confunde com cláusula compromissória. A cláusula é


prevista em contrato para que a arbitragem seja solucionada. No compromisso arbitral ocorre
após o surgimento do conflito, situação em que as partes acordam em submeter o litígio ao

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árbitro.

O compromisso é bilateral, oneroso, consensual e comutativo.

O art. 851 vai admitir duas formas de compromisso arbitral:

• Compromisso arbitral judicial: é celebrado na pendência da lide (endoprocessual). É feito por


termo nos autos.

• Compromisso arbitral extrajudicial: ocorre antes do ajuizamento da ação. Portanto, pode ser
celebrado por escritura pública ou particular.

O art. 853 traz a cláusula compromissória, que é uma convenção, através da qual as partes
comprometem-se a submeter à arbitragem litígios que possam vir a surgir, relativamente ao
contrato.

Recentemente, o STJ entendeu que o Poder Judiciário não pode decretar a nulidade de
cláusula arbitral (compromissória) sem que essa questão tenha sido apreciada anteriormente pelo
próprio árbitro. Isso porque, segundo o art. 8º, parágrafo único, da Lei de Arbitragem (Lei nº
9.307/96), antes de judicializar a questão, a parte que deseja arguir a nulidade da cláusula
arbitral deve formular esse pedido ao próprio árbitro (Info 591).

Segundo a Ministra Nancy Andrighi, a kompetenz-kompetenz (competência-


competência) é um dos princípios basilares da arbitragem, que confere ao árbitro o poder de
decidir sobre a sua própria competência, sendo condenável qualquer tentativa, das partes ou do
juiz estatal, no sentido de alterar essa realidade. Em outras palavras, no embate com as
autoridades judiciais, deterá o árbitro preferência na análise da questão, sendo dele o benefício
da dúvida

Vale ressaltar que essa questão da nulidade poderá ser apreciada pelo Poder Judiciário em
momento posterior. Isso porque, para fazer cumprir a sentença arbitral, o credor terá que ajuizar
uma execução judicial. Nesse momento, o devedor poderá se defender por meio de embargos à
execução alegando a nulidade da cláusula arbitral e, consequentemente, da sentença arbitral.

Excepcionalmente, é possível que o Poder Judiciário, nos casos em que prima facie é
identificado um compromisso arbitral "patológico", isto é, claramente ilegal, declare a nulidade
dessa cláusula, independentemente do estado em que se encontre o procedimento arbitral.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Outro julgado importante do STJ foi o de que a franquia, ainda que não seja contrato de
consumo, é um contrato de adesão. Segundo o art. 4º, § 2º da Lei nº 9.307/96, nos contratos de
adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente:

• tomar a iniciativa de instituir a arbitragem; ou

• concordar, expressamente, com a sua instituição, por escrito, em documento anexo ou em


negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula.

Todos os contratos de adesão, mesmo aqueles que não consubstanciam relações de


consumo, como os contratos de franquia, devem observar o disposto no art. 4º, § 2º, da Lei nº
9.307/96. Assim, é possível a instituição de cláusula compromissória em contrato de franquia,
desde que observados os requisitos do art. 4º, § 2º, da Lei nº 9.307/96.

Responsabilidade Civil

1. Responsabilidade Civil

I. Introdução

A responsabilidade civil surge em razão do descumprimento de alguma obrigação. Há


desobediência de uma regra legal, seja contratual ou extracontratual, nascendo o direito de
indenizar.

Em relação à origem, a responsabilidade civil vai admitir a seguinte classificação:

1. Responsabilidade civil contratual: a responsabilidade civil contratual é aquela que surge em


razão do inadimplemento de uma obrigação contratual.

• Responsabilidade civil extracontratual (aquiliana): é baseada no ato ilícito e no abuso de direito.

Ato ilícito é um ato praticado em desacordo com a ordem jurídica, que viola direitos e causa
prejuízos a uma outra pessoa, situação na qual nasce o dever de reparar o dano.

O art. 186 do CC diz que, aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou
imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 187 consagra a teoria do abuso de direito (teoria dos atos emulativos).

Abuso do direito é o exercício de forma abusiva ou irregular do direito. O ato é


originariamente lícito, mas foi exercício fora dos limites impostos pelos seus fins econômicos,
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Aqui há a consagração dos princípios da socialidade e
eticidade.

A teoria do abuso de direito está consagrado em 4 conceitos jurídicos indeterminados, ou


seja, em cláusulas gerais que serão preenchidas pelo juiz (fins econômicos, social, pela boa-fé ou
pelos bons costumes).

Para que o abuso do direito esteja configurado, é importante que a pessoa esteja
exercendo o direito de forma abusiva ou irregular. É a atuação do exercício irregular do direito.

Para tanto, não é necessário que se discuta ou que se levante o elemento culpa. Basta que
a conduta exceda manifestamente os parâmetros do art. 187 (fins econômicos, fins social, boa-fé
objetiva ou pelos bons costumes).

Em suma, o abuso de direito é causa de responsabilidade objetiva, não se discutindo a


presença ou não de culpa.

O exercício irregular do direito poderá se dar em diversos ramos da ciência jurídica: direito
do consumidor (ex.: propagandas discriminatórias), direito do trabalho (ex.: direito de demissão
do trabalhador, mas não poderá ser vexatória), direito processual (ex.: punição por litigância de
má-fé para quem deduziu pretensão contra texto expresso em lei).

O que é assédio judicial?

Assédio judicial ocorre quando alguém, líder de um certo grupo, instiga os liderados a
promover uma série de demandas descabidas contra uma determinada pessoa. Ex.: pessoa
ameaça ingressar com mais de 100 processos contra outra por esta não fazer o que ela quer.
Apesar de haver o direito de ação, este está sendo exercido de forma irregular.

Dentro do direito civil, será encontrado no direito das coisas, o exercício abusivo do direito
de propriedade, que atribui ao titular a prerrogativa de usar, gozar, de fruir, de dispor da coisa,
sendo oponível a todos os outros. Este direito de propriedade tem esse caráter erga omnes.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Quando estão preenchidos todos estes atributos, o sujeito passa a ter a propriedade plena do
bem.

O Código Civil consagra limitações ao direito de propriedade, como o direito de


vizinhança, em que as regras relacionadas ao uso nocivo da propriedade, árvores limítrofes,
passagem forçada, limites entre prédios, etc. Tudo isso é limitação ao exercício de propriedade. E
se o sujeito não observa estes limites, estará exercendo irregularmente o seu direito de
propriedade, e portanto haverá abuso do direito.

O §1º do art. 1.228 diz que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância
com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados a flora, a fauna,
as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada
a poluição do ar e das águas.

Com base neste dispositivo é possível verificar que o exercício do direito de propriedade
deverá atender ao fim econômico e social, bem como a preservação do meio ambiente.

Percebe-se que o direito de propriedade é limitado, pois ela deve cumprir a sua função
social.

O ato emulativo, ou seja, o exercício abusivo do direito, está vedado expressamente no


§2º do art. 1.228, o qual estabelece que são defesos os atos que não trazem ao proprietário
qualquer comodidade, ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. O
sujeito não pode utilizar a propriedade para prejudicar outra pessoa.

II. Elementos da responsabilidade civil

São elementos da responsabilidade civil que fazem nascer o direito de indenizar:

• Conduta humana

• Dano (prejuízo)

• Culpa lato sensu (dolo ou culpa)

• Nexo de causalidade

a) Conduta humana

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A conduta humana é causada por uma ação ou omissão, que poderá ser voluntária, por
negligência, imprudência ou imperícia.

A conduta humana pode ser dolosa ou culposa.

A regra é de que a conduta seja positiva, ou seja, uma ação.

Para que haja uma conduta omissiva apta a gerar o dever de indenizar, é preciso que se
esteja diante de um caso em que o sujeito tinha o dever jurídico de agir e não agiu, ou seja, tinha
o dever jurídico de praticar o ato, mas não praticou. Além disso, é imprescindível que tenha
havido prejuízo.

Para responsabilizá-lo, não basta que o indivíduo tivesse o dever de praticar o ato, não
praticou e houve o prejuízo. É necessário ainda demonstrar que, se a conduta tivesse sido
praticada, o dano teria sido evitado, ou poderia ter sido evitado. Não basta o dever de agir e não
agiu, devendo também demonstrar que se o indivíduo tivesse agido, o dano poderia não ter
ocorrido.

O art. 942 do CC estabelece que os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito
de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado. Se a ofensa tiver mais de um autor, todos
responderão solidariamente pela reparação. Há consagração da hipótese de solidariedade legal.

Perceba que, neste caso, o indivíduo está sendo responsabilizado por ato próprio.

Todavia, poderá o indivíduo responder por ato praticado por terceiros, como os pais
respondem pelos filhos menores, dono do animal responde pelo animal, etc.

Como se vê, não é apenas o ato próprio que gera responsabilidade para o indivíduo, mas
também atos de terceiros, a depender do caso.

b) Culpa genérica (culpa lato sensu)

Culpa genérica engloba tanto dolo quanto a culpa em sentido estrito.

Dolo é a violação intencional, ou seja, é a vontade e consciência de praticar uma conduta.


No direito civil, o dolo tem o mesmo tratamento da culpa grave, respondendo o indivíduo pelos
danos que causou em sua totalidade.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A culpa em sentido estrito, apesar de existir o desrespeito a uma norma, não há a violação
intencional desse dever. Portanto, na culpa há uma conduta voluntária, mas se chega a um
resultado involuntário. Todavia, o resultado era previsível, razão pela qual houve uma violação aos
deveres objetivos de cuidado.

As modalidades de culpa são: imprudência, imperícia e negligência.

• Imprudência: é falta de cuidado somado a uma ação. É o agir sem tomar os cuidados necessários.
É o sujeito que emprega velocidade acima do permitido.

• Negligência: é a falta de cuidado pela omissão. É o sujeito que causa dano, porque o carro
derrapa na pista, batendo no carro estacionado, eis que os pneus estavam carecas, ainda que
estivesse em baixa velocidade.

• Imperícia: é falta de qualificação, própria dos profissionais liberais. Ex.: médico que faz cirurgia
sem ter habilitação para fazer cirurgia.

É possível que haja na mesma situação negligência e imprudência, como é o caso em que
o sujeito corre a 200 km/h na avenida, chovendo e com pneus carecas.

A culpa poderá sofre classificações.

i. Quanto à origem

• Culpa contratual: é o desrespeito a uma norma prevista no contrato, ou mesmo um dever anexo,
relacionado com a boa-fé objetiva. Vale lembrar que a culpa contratual é considerada mais grave
do que a extracontratual.

• Culpa extracontratual (aquiliana): é a violação de um dever estampado no ordenamento


jurídico, ou mesmo um abuso de um direito, que se tem consagrado no ordenamento jurídico, o
qual é exercido de forma abusiva.

ii. Quanto à presunção

• Culpa in vigilando: era a culpa decorrente da quebra do dever legal de vigilância. É o pai que não
vigiou o filho, tendo este causado dano. Neste caso, o pai iria ser responsabilizado por este
prejuízo.

• Culpa in elegendo: o patrão, pelo ato do empregado que causou prejuízo, responderia, já que

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

ele elegeu aquele empregado.

• Culpa in custodiendo: é a culpa decorrente da falta de cuidado ao se guardar uma coisa ou um


animal. Se a coisa estava sob a custódia, haveria uma presunção de culpa.

Hoje em dia não cabe mais falar nessas modalidades de culpa presumida. Isso porque o
art. 933 do Código Civil adota a teoria do risco. Portanto, esses casos acima passam a ser casos de
aplicação da responsabilidade objetiva.

Está superado o modelo de culpa presumida, conforme Enunciado 452 do CJF.

iii. Quanto ao grau de culpa

• Culpa grave (lata): há uma imprudência ou negligência crassa. O efeito é o mesmo do efeito do
dolo, devendo o ofensor pagar a indenização integral.

• Culpa média e culpa leve: é a culpa intermediária, passando a ser analisada se há uma
concorrência de culpas com relação ao terceiro. Isso porque haverá repercussão na indenização.
Se houver uma exceção desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, o juiz poderá reduzir
equitativamente a indenização, especialmente quando a vítima tiver contribuído para o evento
danoso.

• Culpa levíssima: o fato só teria sido evitável se tivesse empregado uma cautela extraordinária.
Em regra, responderá a pessoa, ainda que a culpa seja levíssima, conforme se extrai do art. 944
do CC, o qual diz que a indenização mede-se pela extensão do dano. Mas, presente a culpa
levíssima, a indenização deverá ser reduzida, visto que haverá maior desproporção entre a culpa
e o dano experimentado.

Essa possibilidade de redução do montante da indenização em razão do grau de culpa do


agente deve ser interpretada de forma restritiva, visto que se trata de exceção à regra da
reparação integral do dano.

É possível que haja a não reparação integral do dano, nos casos em que há desproporção
entre a gravidade da culpa e o dano experimentado, situação na qual o juiz reduzirá
equitativamente a indenização. Esta desproporção deve ser analisada restritivamente, porque a
regra é a reparação integral.

Veja que este tema é tratado na responsabilidade subjetiva, em que há análise da culpa.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Flávio Tartuce chama a atenção para os casos de responsabilidade objetiva. Para ele, no
caso de responsabilidade objetiva, não se discute culpa, mas a culpa concorrente da vítima é
admitida como atenuante do nexo de causalidade. Dessa forma, se a vítima contribuiu 20% para
a ocorrência do dano e o causador contribuiu com 80% para a causação do dano, significa que
haverá implicância na redução equitativa da indenização. Portanto, se há um dano de 100 mil, mas
20% foi culpa da vítima, deverá reduzir 20% na indenização, por conta da atenuação do nexo de
causalidade.

c) Nexo de causalidade

O nexo de causalidade é um elemento imaterial da responsabilidade civil.

É a relação de causa e efeito, entre a conduta culposa e o dano suportado.

A responsabilidade civil, ainda que objetiva, não existe se não houver relação de
causalidade entre a conduta do agente e o dano experimentado pela vítima.

i. Teorias justificadoras do nexo de causalidade

Existem várias teorias que justificam o nexo de causalidade, sendo 3 delas as mais
importantes:

• Teoria das equivalências das condições: eliminam-se hipoteticamente o antecedente a fim de


verificar se os fatos ocorreriam da mesma forma que ocorreram. Não foi adotada no Código Civil.

• Teoria da causalidade adequada: existe uma parcela da doutrina (Tartuce) que diz que esta foi
adotada pelo Código Civil, sendo esta a ser adotada para fins de prova. Esta teoria diz que o fato
relevante ao evento é o que gera a responsabilidade civil. Ou seja, existe nexo de causalidade
quando há fato relevante para causação do dano. Estaria prevista nos arts. 944 e 945 do CC. O
que se faz é a possibilidade de pensar a causalidade como forma adequada.

• Teoria do dano direto e imediato: prevalece na doutrina esta corrente. Somente devem ser
reparados os danos que decorrem dos efeitos necessários da conduta do agente. Os efeitos
necessários decorrentes daquela conduta são os que podem ser imputados àquele sujeito. É a
ideia do art. 403 do CC. Veja, é na doutrina que prevalece!

ii. Excludentes do nexo de causalidade

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

São excludentes do nexo de causalidade:

• Culpa exclusiva da vítima

• Culpa exclusiva de terceiro

• Caso fortuito ou força maior

Nos casos de culpa exclusiva da vítima ou culpa exclusiva de terceiro, responsabilidade


subjetiva recai inteiramente sobre a vítima ou sobre o terceiro, de forma que causou o dano não
será responsabilizado.

A respeito do caso fortuito ou da força maior, não há unanimidade sobre o conceito de


caso fortuito ou força maior. Flávio Tartuce diferencia, estabelecendo que:

• Caso fortuito: é um evento totalmente imprevisível, decorrente de ato humano ou evento


natural.

• Força maior: é um evento previsível, mas inevitável. Ex.: furacão. Sabe-se que virá, mas é
inevitável.

Essas excludentes do nexo de causalidade devem ser analisadas caso a caso. É preciso
verificar se naquele evento se está diante de um caso fortuito ou força maior, ou se decorre do
risco do empreendimento, o chamado risco proveito, ou seja, se não há relação com a atividade
do suposto causador do dano.

É imperioso saber se o fato causado entra ou não no risco do negócio. Isto é, se será
considerado efeito interno ou se se trata de um evento externo ao negócio, a fim de verificar se
há responsabilidade ou não pelo fato. Isto varia de caso a caso.

Por exemplo, assalto à mão armada pode ser caso fortuito ou não, a depender do negócio.

Para descobrir é preciso verificar onde o assalta ocorreu e qual era o serviço prestado pelo
estabelecimento que ocorreu. Ex.: assalto a ônibus é considerado caso fortuito ou força maior,
excluindo a responsabilidade pela ausência de nexo causal. Todavia, o assalto dentro de uma
agência bancária não exclui o nexo de causalidade, devendo a instituição financeira ser
responsabilizada. Este dever de indenizar continua presente porque o banco deve garantir
segurança de quem está dentro dele.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Todavia, se o assalta ocorre na via pública, fora da instituição financeira, o banco não
responde, pois o evento foge do risco do empreendimento, ou seja, é um fato externo. O assalto
dentro da agência é fato interno.

O STJ entende que assalto praticado no interior de shopping center não exime a empresa
de responder pelo prejuízo experimentado pela vítima, pois se trata de risco do
empreendimento, ainda que seja no estacionamento.

Além disso, o STJ, na Súmula 479, estabelece que instituições financeiras respondem
objetivamente pelos danos gerados por um fortuito interno, relativo a fraudes e delitos
praticados por terceiros, no âmbito das atividades bancárias.

Perceba que há excludentes de nexo de causalidades que devem ser analisados


casuisticamente.

Com relação ao caso fortuito e a força maior, para estarem presentes, no entanto, é
necessário o preenchimento de dois elementos que os caracterizam:

• Necessariedade: deve ser analisado se o fato ocorrido tinha, no caso concreto, a aptidão (força)
de impossibilitar o cumprimento da obrigação. O fato deve ser de tal ponto grave que gere a
impossibilidade absoluta de cumprimento da prestação. Vale ressaltar que impossibilidade não
se confunde com dificuldade ou onerosidade. Não basta que o fato tenha tornado mais difícil ou
oneroso o cumprimento da obrigação. Ele deve ter tornado impossível.

• Inevitabilidade: deve ser analisado se o devedor não tinha, no caso concreto, meios para evitar
ou impedir as consequências do evento. “O fato deve ser irresistível, invencível, atuando com
força indomável e inarredável. O que se considera é se o evento não podia ser impedido nos seus
efeitos. O fato resistível, que pode ser superado, não constitui evento a autorizar a exoneração.
É perfeitamente possível que o fato seja imprevisível, mas suas consequências evitáveis. Se o
devedor não toma medidas para evitá-la, tipifica-se o inadimplemento e não a impossibilidade
com apoio no caso fortuito ou força maior.” (Marco Aurélio Viana).

Por conta disso, o STJ entendeu que a invasão promovida pelo MST em propriedade rural,
por si só, não é fato suficiente para configurar o evento como de força maior, pois deve ser
analisada, concretamente, a presença dos requisitos do caso fortuito e força maior
(necessariedade e inevitabilidade, previstos no art. 393, parágrafo único). A parte que faz esta

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

alegação deve comprovar que a ocupação ilegal da propriedade rural pelo MST criou óbice
intransponível ao cumprimento da obrigação. Deverá também provar que não havia meios de
evitar ou impedir os seus efeitos. Assim, a cédula de crédito rural hipotecária permanecerá
exigível na hipótese de o MST invadir o imóvel do financiado e este deixar de comprovar que a
invasão constitui óbice intransponível ao pagamento do crédito e que não existiam meios de
evitar ou impedir os efeitos dessa ocupação.

d) Dano (prejuízo)

Via de regra, não existe responsabilidade civil sem dano.

O dano assume um papel fundamental em matéria de responsabilidade civil.

Existem as seguintes espécies de danos:

• Dano material

• Dano moral

• Dano estético

• Dano moral coletivo

• Dano social

• Dano pela perda de uma chance

i. Danos patrimoniais ou materiais

Dano patrimonial ou material atinge o patrimônio corpóreo de uma pessoa. Não cabe a
fixação de dano hipotético ou eventual de uma pessoa.

É preciso provar a efetiva lesão, como regra.

E portanto o dano material deve ser provado.

O dano patrimonial pode ser sub-classificado em:

• Danos emergentes (danos positivos): é o que efetivamente se perdeu com o dano. Ex.: houve
um homicídio, situação na qual a família gastou com hospital, funeral, etc. A família tem o direito
de ser reembolsado por estas despesas.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Lucros cessantes (danos negativos): é aquilo que efetivamente se deixou de ganhar. Ex.: no caso
do homicídio, é a prestação de alimentos indenizatórios, ou seja, é o valor que o sujeito estaria
contribuindo para a sua família, mas que agora não pode mais. Existem lucros e rendas cessantes.

O taxista, quando fica na oficina por conta de um dano experimentado, ficará sem
trabalhar. Se o valor da reparação do carro foi 3 mil reais, isto será dano emergente. Mas durante
o período que o sujeito ficou sem trabalhar ele não ganhou, devendo receber os danos negativos,
ou seja, os lucros cessantes por aquilo que não recebeu durante o período.

→ Alimentos indenizatórios

Em relação aos alimentos indenizatórios, por conta de morte ou invalidez, é devida uma
indenização a título de lucros cessantes aos dependentes do falecido.

Mas como se chega a este valor?

Deve-se levar em conta o tempo de vida provável daquela pessoa que faleceu,
considerando a expectativa de vida informada pelo IBGE.

O cálculo dos alimentos indenizatórios é feito da seguinte forma: o STJ considera que 2/3
do salário da vítima, pois 1/3 ela gastaria consigo mesma. Portanto, 2/3 irão para os dependentes
da vítima, mais FGTS, décimo terceiro, férias, horas extras eventuais, até o limite da idade de
expectativa de vida provável da vítima.

Supondo que o acidente tenha atingido uma vítima que já tinha ultrapassado este limite
de idade de vida provável, trazido pelo IBGE. Ex.: atropelaram o senhor de 80 anos na faixa de
pedestre.

Neste caso, faz-se um cálculo de sobrevida, de acordo com as condições gerais daquele
sujeito. E este cálculo poderá variar de 2 a 5 anos, ou até maior.

A jurisprudência entende que o valor que foi pago pelo seguro obrigatório (DPVAT) deve
ser abatido do montante reparatório pago pelo causador do dano. Este é o teor da Súmula 246
que diz que o valor do seguro obrigatório deve ser deduzido da indenização judicialmente
fixada.

Há crítica da doutrina sobre isso, pois para a jurisprudência seria caso de enriquecimento

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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sem causa.

Em alguns casos, o STJ tem quebrado esta regra de que a indenização deverá ser fixada
com base na vida provável da vítima falecida. Exemplo disso ocorre nos casos em que quem
falece é o filho da família. Ex.: filho teria 17 anos quando faleceu. Neste caso, ele contribuiria para
família até uma certa idade. Ou também nos casos em que falece o pai da família, o qual tinha 54
anos e o filho tinha 17 anos. Neste caso, o filho não vai ficar recebendo do pai até o fim da vida
provável, mas apenas até os 24 ou 25 anos, que é o limite da relação de dependência. Esta é a
presunção que o STJ cria.

Mas isto vai variar de caso a caso.

E se quem morre é o filho menor?

Neste caso, a Súmula 491 do STF estabelece que é indenizável o acidente que cause a
morte de filho menor, ainda que não exerça trabalho remunerado.

O cálculo dessa indenização é feito com base num salário mínimo, contabilizando 2/3 no
período em que o menor teria entre 14 a 24 anos, supondo que ajudaria a família.

No entanto, existem julgados que defendem elementos indenizatórios aos pais, inclusive
após este período. Nesta situação, em que o indivíduo atinge 24 ou 25 anos, presume-se que ele
teria casado, hipótese que passará a contribuir com 1/3 de seus rendimentos.

Flávio Tartuce critica essa visão do STJ, alertando que isto não é a realidade brasileira. Para
ele, a pessoa com 25 anos, como regra geral, não contribui com mais nada para sua família.

Segundo o STJ, na responsabilidade civil extracontratual, se houver a fixação de


pensionamento mensal, os juros moratórios deverão ser contabilizados a partir do vencimento
de cada prestação, e não da data do evento danoso ou da citação.

Não se aplica ao caso a Súmula 54 do STJ, que somente tem incidência para condenações
que são fixadas em uma única parcela. Se a condenação for por responsabilidade extracontratual,
mas o juiz fixar pensão mensal, neste caso, sobre as parcelas já vencidas incidirão juros de mora a
contar da data em que venceu cada prestação. Sobre as parcelas vincendas, em princípio não
haverá juros de mora, a não ser que o devedor atrase o pagamento, situação na qual os juros irão

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

incidir sobre a data do respectivo vencimento (Inf. 580, STJ).

III. Dano moral

O dano é uma lesão.

O dano moral está presente quando está lesão se dá em face de direitos da personalidade.

A angústia, o sofrimento ou a dor são efeitos do dano moral. Isso porque o dano moral é
configurado a lesão de direitos da personalidade.

No dano moral não existe uma finalidade de acréscimo patrimonial, tanto é que não
incide imposto de renda sobre esta indenização. Este entendimento inclusive é sumulado pelo
STJ (Súmula 498).

Como dito, para haver dano moral, é necessário que haja lesão aos direitos da
personalidade. Diante disso, é possível que o indivíduo não sinta dor, angústia ou sofrimento, mas
ainda assim esteja presente o dano moral.

Se estiverem presentes os sentimento negativos, poderá ou não gerar dano moral.

Demonstrada a ocorrência da ofensa, não é preciso comprovar que essa ofensa gerou dor,
angústia ou sofrimento para configuração do dano moral.

É por isso que se diz que é um dano moral in re ipsa, isto é, comprovado dano a um direito
da personalidade, não é necessário comprovar que aquela atitude gerou dor, angústia ou
sofrimento. Ex.: inscrição no cadastro dos inadimplentes quando é indevida.

a) Classificação do dano moral

O dano moral pode ser classificado como:

• Dano moral direto: a lesão atinge a própria pessoal, diretamente. O sujeito inscreveu o nome do
lesado nos cadastros de inadimplentes.

• Dano moral indireto: ocorre quando há um dano moral em ricochete. Isto é, o dano moral que
atinge a pessoa de forma reflexa. Por exemplo, por conta da atitude imprudente alguém é morto.
Há um dano moral à família do lesado. Veja, um terceiro experimentou o dano moral por um fato
ocasionado a outra pessoa. Ex.: uso indevido da imagem do morto ou lesão à honra do morto.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Haverá também dano em ricochete quando há lesão em face de uma coisa. O animal é
considerado uma coisa para fins de indenização. Se alguém matar um animal, poderá ser
considerado que houve um dano moral, caso em que seria um dano moral em ricochete, atingindo
a pessoa de forma reflexa.

b) Diferença entre dano moral e mero dissabor da vida em sociedade

O STJ tem o entendimento de que a mera quebra de um contrato, ou mera inadimplência


de um contrato, não é capaz de gerar dano moral.

Esta é a regra. Isso porque a jurisprudência do STJ vai dizer que, se o descumprimento do
contrato se der em relação a valores que são fundamentais, aí haverá dano moral. Ex.: sujeito
precisa ser internado, mas o plano de saúde indevidamente nega esse atendimento. Como o valor
tratado aí é saúde, e é fundamental, haverá dano moral.

Outro direito fundamental reconhecido é o direito à moradia. Neste caso, a questão que
chega ao STJ é o fato de que a construtora não entregou o imóvel na data aprazada. Por conta
disso, o STJ entende que se ultrapassar os limites do razoável, haverá configuração do dano moral.

c) Corpos estranhos encontrados em produtos alimentícios

No caso em que há contato do corpo estranho com a pessoa que consumiu o produto
alimentício, segundo o STJ, haverá a configuração do dano moral. Isto é pacífico.

A discussão que existe é, e se o sujeito comprar a Coca-Cola, notar que há uma barata
nadando dentro do refrigerante? Neste caso, há ou não o dano moral?

Em 2014, o STJ considerou que os danos morais seriam reparáveis, ainda que o produto
não tivesse sido consumido. O fundamento foi de que houve um concreto risco de lesão à saúde
do consumidor, de forma que há uma ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada.
Neste caso, justifica a fixação de danos morais de alimentos não consumido, pois continha um
corpo estranho.

O que se percebe é que há um caminhar para a responsabilidade civil sem dano. Isso
porque o sujeito não experimentou o dano moral.

Todavia, a respeito do fato de o consumidor ter encontrado um produto estranho no


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produto, mas não tê-lo consumido, julgados posteriores do STJ afastaram o cabimento de
indenização por dano moral.

O ministro Luís Felipe Salomão disse que: “a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
se consolidou, no sentido de que a ausência de ingestão do produto impróprio para o consumo
configura hipótese e mero dissabor vivenciado pelo consumidor”. Este julgado é de 2015.

d) Espera na fila do banco e indenização por dano moral

A espera na fila do banco gera indenização por dano moral?

Isto irá depender do caso concreto. O dano moral não surge apenas da simples violação à
legislação que determina o tempo máximo de espera.

O mero descumprimento do prazo, apesar de gerar ume infração administrativa, poderá


não haver dano moral, pois vai depender da verificação dos casos, ou dos fatos que geraram
sofrimento ou o desconforto que ultrapassou o limite do mero dissabor da vida em sociedade,
causando angústia, dor ou outro valor psíquico, capaz de gerar dano moral.

Ex.: idoso esperou durante 2 horas na fila do banco em pé. Houve a responsabilização por
dano moral neste caso.

Estas decisões em que começa a condenar alguém porque fez com que outra pessoa
esperasse por mais de duas horas na fila do banco implica a adoção da possibilidade de se
responsabilizar civilmente alguém pela perda do tempo livre.

A perda do tempo livre justifica a indenização, pois se trata de um valor que deve ser
considerado.

e) Danos morais da pessoa jurídica

Pessoa jurídica pode ou não pode sofrer dano moral?

O tema está pacificado na jurisprudência e no código civil caminha neste sentido ao


estipular, no art. 52, que se aplica à pessoa jurídica, no que couber, os direitos da personalidade.

Portanto, o Código Civil vai reconhecer a existência de direitos da personalidade em favor


da pessoa jurídica.

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Eduardo Defaveri

Se ela tem direitos da personalidade, e se o dano moral é violação aos direitos da


personalidade, quer dizer que, se a pessoa jurídica sofrer violação em um de seus direitos da
personalidade, haverá sofrido dano moral, cabível indenização neste sentido.

Normalmente atinge a honra objetiva da pessoa jurídica. Ex.: inscrição indevida em


cadastro de inadimplentes da pessoa jurídica.

São alguns direitos da personalidade da pessoa jurídica: direito ao nome, direito à honra
objetiva, direito à imagem, etc.

O STJ foi decidir a respeito do cabimento ou não de indenização por danos morais em
benefício de pessoa jurídica de direito público. Ocorre que o STJ entendeu que não são cabíveis.
O fundamento é a origem do instituto do cabimento da indenização por danos morais.

Como se sabe, o dano moral busca proteger os direitos fundamentais. E a origem dos
danos fundamentais está ligada à necessidade de se proteger o cidadão do Estado. Por isso, tanto
a doutrina como a jurisprudência somente irão reconhecer às pessoas jurídicas de direito público
direitos fundamentais de caráter processual ou que assegurem a ela a sua autonomia.

Veja, são direitos fundamentais que asseguram proteção ao Estado contra o próprio
Estado.

Para o STJ, não cabe ao Estado alegar que um indivíduo violou direito da personalidade do
Estado e, portanto, deve indenizá-lo moralmente, pela violação da imagem.

f) Natureza jurídica da indenização por danos morais

Para se chegar a este valor, é necessário analisar 3 correntes:

1ªC: entende que a indenização de danos morais tem a natureza meramente reparatória.
Está superada.

2ªC: a indenização por danos morais tem caráter punitivo ou disciplinador (punitive
damages). A ideia é punir alguém pelo fato de ter violado um direito da personalidade.

3ªC: a indenização por danos morais tem caráter compensatório, caráter reparatório, mas
também tem um caráter pedagógico, disciplinador, visando coibir novas condutas. Não pode ser

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Eduardo Defaveri

ínfima a indenização a fim de fomentar a prática ilícita pelo ofensor. Esta é a tese que vai
prevalecer.

Há uma tendência de se admitir a fixação dos danos morais se valendo de um critério


punitivo, pedagógico e compensatório.

Porém o que prevalece, para fins de prova, é o caráter compensatório e o caráter


pedagógico.

g) Tabelamento ou critérios de quantificação para arbitrar o dano moral

Em outubro de 2016, o STJ fixou critérios para se chegar a esse valor de indenização por
danos morais.

Inicialmente, o juiz, para fixar danos morais, deve agir com equidade, com bom senso,
levando-se em conta a extensão do dano, condições socioeconômicas e culturais das pessoas
envolvidas, questões psicológicas das partes, assim como o grau de culpa do agente ou do terceiro,
ou mesmo da vítima, o quanto ela concorreu para o evento.

Ocorre que o STJ tem um julgado que é da relatoria do ministro San Severino, que foi
relembrado por Luís Felipe Salomão.

O STJ tem o entendimento de que o julgador deve adotar o método bifásico:

• 1ª Fase: Fixação do valor básico de acordo com o interesse jurídico lesado e analisa-se como o
Tribunal normalmente fixa o dano para essa situação. Ex.: houve morte no caso concreto e o
Tribunal normalmente fixa 200 salários mínimos para estes casos.

• 2ª Fase: Fixação definitiva do valor da indenização, de acordo com as circunstâncias


particulares do caso concreto. Aqui, verifica-se a gravidade do fato, a circunstância em que se
deu o fato, se a vítima concorreu com o fato, condições econômicas das partes.

É preciso entender que a indenização tem uma função pedagógica, mas o valor pecuniário
não pode gerar enriquecimento sem causa do autor.

Portanto, o juiz deve ter atenção ao princípio da proporcionalidade, de forma que não seja
ínfima a indenização, a ponto de fomentar a prática ilícita, e nem mesmo alta para gerar
enriquecimento sem causa.
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IV. Danos estéticos

Hoje, doutrina e jurisprudência separam dano estético de dano moral, mas ambos são
danos de caráter extrapatrimonial.

Conceitua-se dano estético como sendo lesão à beleza física, à harmonia da forma externa
de alguém.

Estes danos estão presentes quando a pessoa tem uma ferida, uma cicatriz, um corte na
pele, quando sofre uma lesão ou a perda de um órgão, podendo ser inclusive interno, desde que
seja visível. A imputação também pode ser dano estético.

O dano estético é presumido, pois está exteriorizada a lesão (in re ipsa).

O STJ vem entendendo que dano estético é uma coisa e dano moral é outra. No dano
estético há uma alteração morfológica da formação corporal, que agride a visão, causando
desagrado ou repulsa, ou mesmo chamando atenção pela falta de harmonia gerada pelo evento.

No dano moral, há uma alteração mental.

Por isso a súmula 387 do STJ diz que é lícita a cumulação de dano estético com o dano
moral.

V. Danos morais coletivos

Dano moral coletivo é o dano que atinge ao mesmo tempo vários direitos da
personalidade de pessoas determinadas ou determináveis. Os danos morais coletivos não têm
caráter difuso.

O CDC vai admitir expressamente a reparação de danos morais coletivos (art. 6, VI).

Os danos morais coletivos atingem direitos individuais homogêneos e direitos coletivos em


sentido estrito. Isso porque, no dano moral coletivo, a indenização é destinada às vítimas. Por isso
devem elas ser determinadas ou determináveis.

No STJ, há precedentes nos dois sentidos, ora admitindo danos morais coletivos, ora
inadmitindo essa indenização. No entanto, é uma tendência a sua admissão de reparação de dano
moral coletivo.

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Em 2012, o STJ condenou uma instituição bancária por danos morais coletivos, causados
aos clientes com deficiência física, pois o banco havia colocado os caixas no andar de cima da
agência bancária, dificultando o acesso das pessoas com deficiência.

VI. Danos sociais

O professor da USP, Antônio Junqueira, propõe uma nova modalidade de dano,


denominado dano social.

Danos sociais são lesões à sociedade, que atingem à qualidade de vida da sociedade, tanto
por conta do seu rebaixamento patrimônio moral, principalmente no tocante à segurança, quanto
por diminuição da qualidade de vida. Esse rebaixamento pode ter repercussão material e também
repercussão moral.

O dano social decorre de uma conduta socialmente reprovável. São danos difusos,
envolvendo direitos difusos, sendo as vítimas indeterminadas e indetermináveis. Por conta disso,
a indenização por danos sociais também está previsto no art. 6º, VI, do CDC.

O valor a ser fixado será destinado ao fundo de proteção que tenha relação ao direito
atingido ou a uma instituição de caridade.

O TJSP condenou a Amil ao pagamento de danos sociais, em que pese a polêmica


condenação ter sido originada de um processo individual sem que houvesse pedido de danos
sociais na petição inicial. Foi fixada em 1 milhão de reais, destinado aos Hospital das Clínicas de
São Paulo. Isso porque a Amil, reiteradamente, se negava a cobrir tratamentos médicos quando o
sujeito tinha direito.

Flávio Tartuce rasgou elogios a esta decisão, afirmando que a condenação decorreu de
uma matéria de ordem pública, motivo pelo qual seria desnecessário o pedido na petição inicial.

VII. Danos por perda de uma chance

A perda de uma chance é um tema interessante e importante, visto que se percebeu que
as pessoas sofriam danos por perda de uma chance considerável de se cumprir.

Essa perda de uma chance ocorre quando a pessoa vê frustrada uma expectativa que ela
tinha e que, dentro da lógica do razoável, ela teria, caso as coisas tivessem seguido o seu curso
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normal. É a perda da chance séria e real que justifica a indenização.

Por exemplo, vários julgados condenam advogados que perdem o prazo do recurso, pois
houve a perda de uma chance de vitória judicial. Perceba que se trata de um caso em que o sujeito
de 1ª instância decida de uma forma, e o Tribunal de Justiça entende de outra forma. Neste caso,
não há dúvidas de que deverá pagar indenização.

Essa chance de vitória deve ser séria e real, quando, por exemplo, o Tribunal tenha o
entendimento pacífico contrário ao entendimento do juiz que julgou a sentença. Do contrário, se
a chance era mínima, não haverá perda de uma chance.

O STJ vai dizer que a teoria da perda de uma chance pode ser utilizada para apuração de
responsabilidade civil por erro médico, mas na hipótese em que o erro médico tenha reduzido
de forma concreta as possibilidades de cura do paciente. Ou seja, o paciente teria grandes
chances de cura se tivesse sido tratado adequadamente, mas ele veio falecer em razão daquela
doença porque houve um tratamento médico inadequado, ocasionando a perda de uma chance
de viver.

No caso dessa indenização por erro médico, não se trata de uma coisa simples. No caso, o
que matou o paciente não foi o erro médico ou o médico, e sim a doença. O dano morte foi
experimentado em razão de uma doença.

A perda de uma chance é uma modalidade autônoma de indenização, motivo pelo qual
não há responsabilização pelo resultado morte, pois não foi o médico que causou. O médico irá
responder pela perda de uma chance que ele privou o paciente. Então, a chance em si é
considerada como um bem autônomo, perfeitamente reparável. E portanto, não há uma
mitigação do nexo causal, e sim o nexo causal direto. Ou seja, há a conduta do médico, que pode
ser omissiva ou comissiva e o resultado e o dano, que é a perda da chance, como bem jurídico
autônomo.

Há uma doutrina que pretende dar um caráter mais objetivo para esta teoria da perda de
uma chance, a fim de considerar para que haja uma chance real e séria, deverá ela ser superior a
50% de chances.

No entanto, não há entendimento consolidado nesse sentido.

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A maior parte dos julgados não considera aplicável a teoria da perda de uma chance,
motivo pelo qual dependerá do caso concreto a fixação de indenização.

VIII. Regras importantes quanto à fixação da indenização previstas no Código Civil

a) Pensão por incapacidade do trabalho

De acordo com o art. 950 do CC, se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não
possa exercer sua profissão ou ofício, ou se diminuir a capacidade de trabalho, a indenização
cabível deve cobrir, além das despesas de tratamento e os lucros cessantes, a pensão
correspondente ao trabalho que ele não poderá mais exercer, ou uma pensão que cubra a
depreciação da remuneração que experimenta, em razão de não poder mais exercer na
plenitude o trabalho que exercia.

Essa indenização eventualmente poderá ser pleiteada de uma só vez.

Esse pedido do credor, para receber tudo de uma vez será feito, não necessariamente vai
ocorrer, pois o juiz, para deferir ou não, analisará quais são as condições econômicas do devedor.

b) Responsabilidade dos profissionais liberais

O art. 951 do CC vai regulamentar a responsabilidade dos profissionais liberais. Esta


responsabilidade é subjetiva.

Segundo o entendimento majoritário, se o profissional de saúde assume uma obrigação


de resultado, como o cirurgião plástico, cirurgião dentista para o tratamento ortodôntico, a
responsabilidade será objetiva. Ou seja, ela independe de culpa.

Mas será encontrado no entendimento no próprio STJ, em que entende que poderá ser
discutida a culpa no caso de obrigação de resultado assumida por profissional liberal. Cumpre ao
médico demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores externos e alheios à sua
atuação na cirurgia.

Veja, o STJ diz que se continua discutindo a culpa, porém há a inversão do ônus da prova.
O paciente não precisa provar que o médico errou, e sim o médico provar que não houve culpa
sua, e que o erro experimentado decorreu de fatores externos, alheios à cirurgia.

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c) Valor de afeição em face da perda da coisa

O art. 952 do CC diz que, havendo usurpação ou esbulho de coisa alheia, além dessa coisa
ter de ser restituída, a indenização vai consistir pagar o valor das deteriorações e dos lucros
cessantes. Se a coisa faltar, o esbulhador terá de indenizar o correspondente à coisa perdida,
tendo em vista eventual afeição que a pessoa pode ter.

Percebe-se que o valor de afeição em face de perda da coisa será considerado.

O legislador diz que o vizinho, bêbado do prédio, que entrou no garagem e atropelou o
cachorro da vizinha, não poderá apenas repor um novo cachorro, ainda que seja da mesma raça.
Neste caso, é necessário considerar o valor da afeição, considerando o quanto o animal era
importante para a pessoa.

O valor de afeição deverá ser considerado quando for fixar o valor da indenização.

IX. Classificação da responsabilidade civil quanto à culpa

Existe responsabilidade civil subjetiva e responsabilidade civil objetiva.

• Responsabilidade civil subjetiva: a responsabilidade civil subjetiva é a regra, devendo ser


comprovada a presença de culpa em sentido amplo (dolo ou negligência, imprudência ou
imperícia).

• Responsabilidade civil objetiva: a responsabilidade objetiva, dentre outros vários fundamentos


legais, encontra fundamento importante no Código Civil, que é o art. 927, parágrafo único.

Este dispositivo diz que, aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.

No entanto, o parágrafo único diz que, haverá obrigação de reparar o dano,


independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade
normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos
de outrem.

Perceba aqui que a responsabilidade poderá independer de culpa, e ser objetiva, quando:

• a lei disser que ela é objetiva

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• a atividade for de risco (cláusula geral)

No Brasil, a responsabilidade objetiva é fundada na teoria do risco em uma de suas


modalidades.

A teoria do risco possui as seguintes vertentes:

• Teoria do risco administrativo: adotada nos casos de responsabilidade objetiva do Estado.

• Teoria do risco criado: está presente nos casos em que o agente cria um risco. No art. 938 do CC,
há responsabilidade do ocupante do prédio pelas coisas que dele caírem ou serem lançadas
(defenestrar).

• Teoria do risco profissional: neste caso, a atividade exercida pelo sujeito gera riscos.

• Teoria do risco proveito: o risco decorre de uma atividade lucrativa. O sujeito extrai proveito
desse risco. É o que fundamenta a responsabilidade de um fornecedor por um produto. O sujeito
colocou 1 milhão de Coca-Cola, mas uma delas tinha uma barata. Há a teoria do risco proveito,
apesar do CDC já disser que responde objetivamente.

• Teoria do risco integral: diverge das demais, pois não admite causa excludente de
responsabilidade civil alegada. É típica dos danos ambientais e dos danos nucleares.

Perceba que o parágrafo único do art. 927 fala em atividade de risco. Esta expressão é uma
cláusula geral. Então é o juiz quem vai dizer se aquela atividade é de risco ou não é.

Se for lido o art. 7º, XXVIII, da CF, parece que a responsabilidade do empregador é dolosa
ou culposa, em face de dano experimentado pelo empregado.

Este dispositivo diz que são direitos do trabalhador, sem excluir outros, seguros contra
acidentes do trabalho a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que o empregador está
obrigado, quando incorrer em dolo ou em culpa.

A CF diz que o seguro vai ter de arcar, sem excluir a indenização quando incorrer em dolo
ou culpa. Então, para ter de pagar indenização será necessário incorrer dolo ou culpa.

No entanto, quando o dispositivo inicia, afirma que são direitos do trabalhador, sem excluir
outros. Portanto, o empregador deverá pagar ao empregado uma indenização, quando causa
prejuízo, com dolo ou culpa, mas também quando há prejuízo sem dolo ou sem culpa,
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respondendo objetivamente pelos danos causados ao empregado. Isso porque a atividade que
exerce é uma atividade de risco.

Portanto, atividade de risco é aquilo que a jurisprudência dos Tribunais dizem que é. Trata-
se de uma cláusula geral.

O segundo exemplo é o caso dos ambientes virtuais, em que há mensagens de ofensas


ali prolatadas.

Segundo o STJ, o dano moral decorrente de mensagens de conteúdo ofensivo inseridas


no site pelo usuário, não constituem risco inerente à atividade dos provedores de conteúdo, de
modo que não lhes aplica a responsabilidade objetiva do parágrafo único do art. 927 do CC.

Então, tem-se entendido que é necessário demonstrar a culpa da empresa que mantém o
site. Neste caso, só irá responder se tiver agido culposamente, como por exemplo quando é
comunicada extrajudicialmente sobre as mensagens ofensivas, e ainda assim não toma
providências para afastar o dano.

Em 2014, veio o Marco Civil da Internet 12.965/14, no seu art. 18, a lei diz que o provedor
de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo
gerado por terceiro.

O problema é que o art. 19 traz uma restrição perigosa, pois diz que provedores de internet
somente podem ser responsabilizados por danos decorrentes de um conteúdo gerado por uma
terceira pessoa se, após ordem judicial específica, não tomarem as providências para, dentro do
prazo assinalado, tornar indisponíveis o conteúdo.

Veja, pela lei, a responsabilidade dos provedores é denominada de responsabilidade civil


subjetiva agravada, pois não basta a culpa, mas deverá ser esta culpa agravada por uma ordem
judicial descumprida.

X. Responsabilidade objetiva no Código Civil e principais regras específicas

a) Responsabilidade civil objetiva por atos de terceiros

Lembrando que não se fala mais em culpa in custodiendo, in elegendo e in vigilando, pois
passam a ser casos de responsabilidade objetiva.
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Eduardo Defaveri

O art. 932 vai dizer que:

• Os pais são responsáveis pelos atos praticados pelos filhos que estejam sob a sua autoridade e
sob a sua companhia.

• O tutor e curador são responsáveis por atos de pupilos ou curatelados que estejam sob sua
autoridade e em sua companhia.

• O empregador é responsável pelos atos dos seus empregados.

• Os donos do hotel também serão responsáveis pelos hóspedes que tenham gerado dano.

• Aqueles que contribuírem gratuitamente nos produtos do crime, serão responsáveis até a
concorrência da respectiva quantia, independentemente de culpa. Ou seja, se o indivíduo
contribuiu com o produto do crime, deverá responder até a quantia que a qual concorreu.

Todos esses casos são de responsabilidade civil objetiva, conforme o art. 933, o qual diz
que as pessoas mencionadas no art. 932 respondem independentemente de culpa.

Trata-se de aplicação da teoria do risco criado.

Para que essas pessoas respondam, não é necessário que demonstrem culpa delas, mas é
necessário que demonstrem que houve culpa daqueles pelos quais elas respondem. Então, há
uma responsabilidade objetiva indireta, denominada responsabilidade objetiva impura.

Isso porque não é necessária comprovar culpa do sujeito que está sendo responsabilizado,
porém é preciso provar a culpa do tutelado, curatelado, filho, empregado, etc.

Por conta disso, é que se chama de responsabilidade objetiva indireta ou impura.

Lembrando que quem ressarcir o dano tem o direito de reaver o que tiver pago em
benefício daquele por quem pagou. O direito de regresso está garantido, salvo quando o
causador do dano for descendente, absolutamente ou relativamente incapaz.

O art. 942, parágrafo único, diz que há solidariedade entre todos os sujeitos dos incisos do
art. 932. Trata-se de uma solidariedade em relação à vítima, ou seja, poderá ela acionar tanto o
empregado quanto o empregador.

Ocorre que o caso dos incapazes é uma exceção a essa regra. Se o ato ilícito foi praticado

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Eduardo Defaveri

por um incapaz, o responsável por ele irá responder de forma principal e o incapaz terá apenas
responsabilidade subsidiária e mitigada.

Atente-se que deve ser lido este dispositivo juntamente com o art. 928. Este dispositivo diz
que o incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis:

• Não tiverem obrigação de fazê-lo ou;

• Não dispuserem de meios suficientes.

O parágrafo único do art. 928 diz que a indenização, que deverá ser equitativa, não terá
lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem.

Este dispositivo cria a hipótese de responsabilização civil do incapaz.

Atente-se que todos são solidários, menos o incapaz. Isso porque o incapaz tem uma
responsabilidade subsidiária, pois só irá responder se os responsáveis por ele não tiverem essa
responsabilidade ou não tiverem condições de pagar. A responsabilidade do incapaz deve ser
equitativa, com base naquilo que poderá pagar, e nem terá lugar se essa indenização privá-lo ou
daqueles que dele dependam de sua sobrevivência.

Começa-se a perceber que a responsabilidade do incapaz é subsidiária. Ex.: a indenização


é de 10 mil. Percebe-se que os pais do incapaz conseguem pagar 5 mil e o incapaz 5 mil. Neste
caso, a responsabilidade do incapaz é subsidiária, somente a partir do momento em que não
conseguir pagar.

Lembrando que o STJ decidiu que a responsabilidade dos pais por filho menor, além de
ser objetiva, deve-se comprovar apenas a culpa na prática do ato ilícito daquele pelo qual são
os pais responsáveis legalmente (ou seja, é necessário provar apenas a culpa do filho).

Por isso, pode-se concluir dizendo que os incapazes (ex: filhos menores), quando
praticarem atos que causem prejuízos, terão responsabilidade subsidiária, condicional, mitigada
e equitativa, nos termos do art. 928 do CC. A responsabilidade dos pais dos filhos menores será
substitutiva, exclusiva e não solidária.

Por conta desse entendimento, não há obrigação nenhuma da vítima lesada de propor a
ação em litisconsórcio contra o responsável e o incapaz. Não há litisconsórcio necessário, neste

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caso.

Seria plenamente possível que o autor (vítima) tivesse, por sua opção e liberalidade,
ajuizado a ação contra ambos (pai e filho, este causador do dano). Neste caso, teríamos uma
hipótese de litisconsórcio:

• Facultativo: não há nada (seja a lei ou a relação jurídica) que obrigue sua formação, decorrendo
ela da conveniência da parte.

• Simples: porque a decisão não seria necessariamente idêntica para o incapaz e seu responsável.

A vantagem de o autor propor contra os dois seria para o caso de ele já saber que o
responsável pelo incapaz não possui patrimônio suficiente e que o próprio incapaz detém bens,
em seu nome, que poderiam servir para custear a indenização. Trata-se de hipótese rara na
prática, mas possível. Neste caso, o autor faria dois pedidos:

• O primeiro para que haja a condenação do responsável pelo incapaz a reparar o dano;

• O segundo pedido seria subsidiário, ou seja, na hipótese de o responsável pelo incapaz não ter a
obrigação de indenizar ou não ter meios para isso, pede-se a condenação do próprio incapaz.

Contudo, há uma exceção: os pais só respondem pelo filho incapaz que esteja sob sua
autoridade e em sua companhia. Assim, os pais, ou responsável, que não exercem autoridade
de fato sobre o filho, embora ainda detenham o poder familiar, não respondem por ele.

Desse modo, a mãe que, à época de acidente provocado por seu filho menor de idade,
residia permanentemente em local distinto daquele no qual morava o menor – sobre quem
apenas o pai exercia autoridade de fato – não pode ser responsabilizada pela reparação civil
advinda do ato ilícito, mesmo considerando que ela não deixou de deter o poder familiar sobre o
filho (Inf. 575, STJ).

Lembrando que o art. 932, I, do CC estabelece que são também responsáveis pela
reparação civil os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua
companhia.

A doutrina e a jurisprudência afirmam que o legislador não foi muito feliz quando utilizou
a expressão “em sua companhia”. Assim, deve-se evitar, neste caso, a interpretação literal e os

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pais irão responder mesmo que eles não estejam presentes no momento do ato causador do
dano.

Para Cristiano Farias, não se trata de proximidade física no momento do dano. Mesmo que
o menor, em viagem, cause danos a terceiros, tais danos estão sob o amparo do dispositivo em
questão. Cabe aos pais contribuir para a formação dos hábitos e comportamentos dos filhos, e
isso se reflete, de modo sensível, quando os menores estão fora do lar, e não se encontram sob a
proteção direta deles, e nem haja fiscalização familiar. É irrelevante, portanto, para a incidência
da norma, a proximidade física dos pais, no momento em que os menores causam danos.

Inclusive o STJ já decidiu que o fato de o menor não residir com o genitor não configura,
por si só, causa excludente de responsabilidade civil.

Por todo o exposto, não há como afastar a responsabilização do pai do filho menor
simplesmente pelo fato de que ele não estava fisicamente ao lado de seu filho no momento da
conduta.

Deve-se esclarecer que a responsabilidade dos pais pelos atos dos filhos menores, nos
termos do art. 932, I, é objetiva. A responsabilidade por ato de terceiro (art. 932) é objetiva, sendo
também chamada de responsabilidade indireta ou complexa.

Este é inclusive o teor do Enunciado 451-CJF: A responsabilidade civil por ato de terceiro
funda-se na responsabilidade objetiva ou independente de culpa, estando superado o modelo de
culpa presumida.

Assim, as pessoas arroladas no art. 932 responderão sem que se discuta se tiveram ou não
culpa. A vítima precisará, contudo, provar a culpa do causador direto do dano.

i. Responsabilidade dos hospitais e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça

Especificamente quanto às demandas por danos causados por médicos, se for observado
qual é a responsabilidade dos hospitais nestes casos? O médico é empregado dos hospitais e aí
eles respondem objetivamente, independentemente de culpa?

Depende. O STJ faz essa distinção.

Para o STJ, a responsabilidade dos hospitais, pelos danos causados aos pacientes (que são
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consumidores), poderá ser sintetizada da seguinte forma:

• Obrigações assumidas diretamente pelos hospitais: tais como fornecimento de recursos


materiais, fornecimento de recursos humanos auxiliares, etc., devem ser prestadas de forma
adequada e, nessa hipótese, a responsabilidade do hospital será objetiva.

• Atos técnicos praticados por médicos sem vínculo de emprego e de subordinação: serão
imputados ao profissional médico pessoalmente, ficando o hospital eximido da responsabilidade,
desde que não tenha concorrido para o dano.

• Atos praticados de forma defeituosa por médico vinculado ao hospital: responderão


solidariamente o hospital e o médico, inclusive objetivamente. Ou seja, será pela teoria da
responsabilidade objetiva impura, pois, comprovado que o médico agiu de forma culposa, então
o hospital responde objetivamente indiretamente.

O STJ faz essa distinção importante aqui.

b) Responsabilidade civil objetiva por danos causados por animal

No art. 936 dispõe que o dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado,
se não provar culpa da vítima ou força maior.

Não havendo culpa exclusiva da vítima ou força maior, haverá uma causa excludente do
nexo de causalidade.

Na verdade, a responsabilidade civil do dono ou detentor do animal é objetiva.

Não se fala mais em culpa in custodiendo.

c) Responsabilidade civil objetiva por danos causados por prédios em ruína

O art. 937 diz que o dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem
de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.

Perceba que não é defenestração, não se trata de coisas jogadas da janela. Aqui é o prédio
em ruínas.

O Código exige que essa necessidade de reparos seja manifesta.

Neste caso, o dono da construção responde objetivamente pelo risco criado ou pelo risco

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proveito.

Essas situações, na imensa maioria dos casos, estarão inseridas dentro da responsabilidade
objetiva do CDC. Isso porque o morador do prédio será considerado como consumidor direto
(quem comprou o apartamento) e a vítima do evento serão vítimas do eventos, sendo
considerados consumidores por equiparação (bystander).

d) Responsabilidade civil objetiva por danos causados por coisas lançadas


(defenestramento)

Para não confundir, é necessário destacar a responsabilidade civil objetiva por danos
causados por coisas lançadas (defenestramento).

Defenestrar significa jogar pela janela, com base no art. 938 do CC, o qual diz que, aquele
que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano provenientes das coisas que dele caírem
ou forem lançadas em lugar indevido.

Há aqui uma responsabilidade objetiva do ocupante da casa, em virtude do risco criado.

E o caso de prédios de escritório ou de apartamentos em que se mostra impossível


identificar de onde é que a coisa foi lançada. Neste caso, a responsabilidade será do condomínio,
tendo este direito de regresso se souber quem foi.

e) Responsabilidade civil objetiva no contrato de transporte

Sabe-se que o contrato de transporte é um contrato típico, pois está descrito na lei.

O art. 750 diz que a responsabilidade do transportador, limitada ao valor constante do


conhecimento, começa no momento em que o transportador, ou seus prepostos, recebem a coisa,
e termina quando é entregue ao destinatário, ou depositada em juízo, se o destinatário não for
encontrado.

Começa quando recebe e termina quando entrega. A obrigação é de resultado.

O transportador assume a obrigação de entregar ao seu destino, com segurança e


integridade. O nome dessa cláusula de cláusula de incolumidade.

A responsabilidade do transportador ganha contornos de responsabilidade objetiva,

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conforme art. 734, que diz que o transportador responde pelos danos causados às pessoas
transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula
excludente da responsabilidade.

Portanto, se houver dano à pessoa ou à bagagem, o transportador deverá pagar.

O art. 735 diz que, havendo acidente com o passageiro, não cabe a alegação de culpa
exclusiva de terceiro. Tal proteção é maior do que a prevista no CDC, visto que lá a culpa exclusiva
de terceiro exclui a responsabilidade, aqui não.

O transportador terá direito à ação regressiva, apesar de ter que indenizar o passageiro.

Em relação ao transporte de pessoas, o art. 736 diz que não há responsabilidade


contratual objetiva do transportador no caso de transporte gratuito (carona).

O art. 736, parágrafo único, diz que, caso o transportador receba algum tipo de vantagem
indireta, a sua responsabilidade será objetiva. Ex.: pagar gasolina, pedágio, almoço etc. Então a
responsabilidade será objetiva.

No caso de programa de milhagem, aplica-se o art. 736, parágrafo único, visto que a
companhia aérea recebe um lucro indireto. Portanto, não dá para dizer que o sujeito terá
responsabilidade subjetiva.

XI. Excludentes do dever de indenizar

a) Legítima defesa

O art. 188, I, diz que não constituem atos ilícitos aqueles atos praticados em legítima
defesa.

A excludente do dever de indenizar é a legítima defesa real, visto que a legítima defesa
putativa não exclui o dever de indenizar.

Tartuce faz uma analogia para aplicar ao art. 930 do CC os casos de legítima defesa. Esta
dispositivo é inicialmente aplicável a estado de necessidade e remoção de perigo iminente.

O art. 930 consagra o direito de regresso daquele que causou o dano em relação ao
causador do estado de perigo. Portanto, indeniza-se, mas tem o direito de regresso.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O parágrafo único reconhece o direito de regresso contra aquele que o dano acabou sendo
causado. Ex.: destruiu o muro do vizinho para salvar alguém que seria atropelada. Deverá pagar o
muro ao vizinho, mas terá o direito de regresso à pessoa que foi a pessoa em razão da qual causou
o dano.

Tartuce diz que, sendo exercido a legítima defesa em caráter imoderado, ou seja, havendo
abuso, e no caso de legítima defesa putativa, haverá o dever de indenizar. Mas poderá ter o direito
de regresso em face da pessoa que o sujeito defendeu, ou em face da pessoa que causou ao
sujeito o pensamento de que a situação era de legítima defesa.

Se age em legítima defesa putativa ou se excede na legítima defesa, deverá o sujeito


indenizar o prejudicado. Mas poderá ter direito de regresso, aplicando o art. 930, em face da
pessoa protegida ou em face da pessoa que gerou o estado de ânimo, que no mundo dos fatos
não existiu.

b) Estado de necessidade ou remoção de perigo iminente

O art. 188, II, diz que não constituem atos ilícitos a deterioração ou destruição da coisa
alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.

O parágrafo único diz que o ato será legítimo somente quando as circunstâncias o
tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção
do perigo.

Isso significa que o ato praticado em estado de necessidade não é ilícito, mas só é ilícito,
caso seja imprescindível, pois do contrário o sujeito irá responder, e nos limites do indispensável.

O art. 929 diz que, se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, não forem culpados do perigo,
terão direito à indenização do prejuízo que sofreram.

O art. 930 diz que, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do
dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.

Ex.: Lucas soltou o Rottweiller na rua, vindo em direção à João. Mas João quebrou a porta
do vizinho Pedro para se esconder. João deverá indenizar Pedro por ter quebrado a porta, mas
também terá direito de regresso contra Lucas por ter soltado o cachorro quando não deveria.

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Eduardo Defaveri

c) Exercício regular do direito

O art. 188, I, segunda parte, diz que o ato praticado num exercício regular de um direito
não é ato ilícito.

Exemplo disso é o caso da inclusão do nome do devedor no rol de inadimplentes. Pode


causar um dano à imagem se for indevido, mas é direito se o devedor estiver em mora.

d) Excludentes de nexo de causalidade

Nexo de causalidade é o vínculo entre a conduta e o resultado.

São excludentes do nexo de causalidade:

• culpa exclusiva da vítima

• culpa exclusiva de terceiro

• caso fortuito ou força maior

e) Cláusula de não indenizar

Cláusula é uma previsão contratual.

A cláusula de não indenizar é uma previsão contratual que exclui totalmente a


responsabilidade da parte.

Esta cláusula é conhecida como cláusula de irresponsabilidade. A aplicação dessa cláusula


de não indenizar é uma aplicação muito comedida e restrita.

A cláusula de não indenizar só vale para os casos de responsabilidade contratual, não


havendo falar em casos de responsabilidade extracontratual.

A cláusula de não indenizar não incide nos casos em que houver conduta dolosa, ou
criminosa, da parte. Ex.: diante de um contrato que tem cláusula de não indenizar e a outra parte
atua dolosa, ou criminosamente, para causar o dano. Neste caso, a cláusula de não indenizar não
será válida.

É nula a cláusula de não indenizar quando inserida em contrato de consumo.

É nula a cláusula de não indenizar nos contrato de adesão.


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Eduardo Defaveri

É nula a cláusula de não indenizar nos contratos de transporte.

Também não tem validade e nem eficácia a cláusula de não indenizar nos contratos de
guarda. Ex.: contratos de estacionamento.

É possível que haja causa excludente do nexo de causalidade nos casos de contrato de
guarda. Ex.: roubo dentro do estacionamento. Neste caso, a empresa de estacionamento não
responde por assalto a mão armada ocorrida dentro do estacionamento.

Alimentos – Poder familiar

1. Alimentos

I. Alimentos no Código Civil de 2002

Alimentos são prestações destinadas a satisfação de necessidades pessoais do


alimentando. Essas necessidades que a pessoa tem, mas que não consegue prover por si mesma.

São pressupostos para que exista o direito a alimentos:

• Vínculo entre alimentante e alimentando (casamento, parentesco ou união estável)

• Necessidade do alimentando

• Possibilidade do alimentante

Necessidade e possibilidade forma um binômio alimentar. MHD diz que precisar ter
possibilidade, necessidade e proporcionalidade, ou seja, um trinômio alimentar.

O STJ diz que os alimentos entre os cônjuges têm caráter excepcional, pois se estiver diante
de um cônjuge trabalhador, poderá buscar o seu sustento pelo seu esforço próprio. Nesse caso,
poderá fixar os alimentos como transitórios.

O art. 1.703 diz que, para manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente irão
contribuir na proporção de seus sustentos. Ou seja, os pais serão obrigados a contribuir
proporcionalmente com os alimentos.

II. Características da obrigação de alimentos

São características da obrigação alimentar:


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• A obrigação de alimentos gera direito personalíssimo. Somente o alimentando é o titular do


direito, ou seja, somente ele poderá pleitear, tendo caráter intuito personae.

• Deverá haver reciprocidade. A obrigação de alimentos é recíproca entre cônjuges,


companheiros, pais e filhos, ascendentes e descendentes. A obrigação recairá sobre o mais
próximo. O art. 1.697 diz que, na falta de ascendentes, cabe a obrigação alimentar aos
descendentes (1º lugar). Faltando ascendente e descendentes, os alimentos poderão ser
pleiteados dos irmãos (2º lugar).

• Os alimentos são irrenunciáveis, ou seja, poderá o credor não exercer ao seu direito a alimentos,
mas lhe é vedado renunciar ao direito a alimentos. Esse crédito alimentos é insuscetível de
cessão, compensação e penhora. O STJ já entendeu que o art. 1.707 não impede que seja
reconhecida como válida e eficaz a renúncia manifestada entre cônjuges por ocasião do divórcio
ou da união estável. Essa irrenunciabilidade dos alimentos só será admitida quando subsista um
vínculo de direito de família. O filho não pode renunciar ao direito de alimentos, mas o ex-
cônjuge poderá renunciar.

• O direito a alimentos é uma obrigação divisível. Esta é a regra, sendo excepcionalmente solidária.
O art. 1.698 estabelece que, se o parente que deve alimentos em primeiro lugar não tiver
condições de prestar os alimentos por inteiro, serão chamados a prestar alimentos os parentes
de grau imediato. Sendo várias as pessoas a obrigadas prestar alimentos, todas concorrerão na
proporção dos respectivos recursos. Então, a obrigação é divisível. Intentada a ação contra um
dos obrigados a prestar alimentos, nada impede que o alimentante chame os parentes para
ajudar a prestar os alimentos. Em verdade, não se trata de um chamamento ao processo. Tanto
o autor quanto ao réu poderá chamar os parentes. Essa legitimidade para a ação de prestação
de alimentos também poderá ser encabeçada pelo Ministério Público, podendo também ele
chamar os outros parentes para integrar a lide (Enunciado 523, CJF).

Nos casos em que os alimentos são pleiteados em favor de idoso, a obrigação deixa de ser
subsidiária, passando a ser solidária. É o disposto no art. 12 do Estatuto do Idoso. Neste caso, o
chamamento dos demais parentes será um típico chamamento ao processo, nos termos do
NCPC.
• A obrigação de alimentos é imprescritível. Cuidado que a pretensão de cobrança de alimentos
fixado em sentença ou ato voluntário é prescritível em 2 anos. Caso o alimentando for
absolutamente incapaz, não correrá a prescrição. Ressalve-se que se o devedor de alimentos for
o pai ou a mãe, não correrá enquanto ele for menor de idade, sob o fundamento de que está
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

vigorando o poder familiar. Ou seja, não corre a prescrição quando o filho é relativamente
incapaz e o filho ainda se encontra sob o poder familiar. Mas aqui somente se atinge a pretensão
de cobrança.

• A obrigação de alimentos é incessível e inalienável, tampouco de compensação.

• A obrigação de alimentos é impenhorável, decorrendo do fato de a obrigação ser inalienável.

• A obrigação de alimentos é irrepetível, não sendo possível propor uma ação de repetição de
indébito para obter para si os valores prestados a título de alimentos, ainda que fique
comprovado posteriormente que o suposto pai não era o pai biológico da criança.

• A obrigação alimentar não está sujeita à arbitragem, por expressa disposição do art. 852 do
NCPC.

• A obrigação de alimentos é uma obrigação transmissível. Isso porque a obrigação de prestar


alimentos vai se transmitir aos herdeiros do devedor, tendo eles a obrigação de prestar os
alimentos, mas apenas nos limites da herança.

Segundo o STJ, o falecimento do pai do alimentando não implica a automática


transmissão do dever alimentar aos avós. É orientação do STJ que a responsabilidade dos avós
de prestar alimentos é subsidiária, e não sucessiva. Essa obrigação tem natureza complementar
e somente exsurge se ficar demonstrada a impossibilidade de os genitores proverem os alimentos
de seus filhos.

III. Principais classificações dos alimentos

Quanto às fontes, os alimentos podem ser:

• Alimentos legais: são os alimentos decorrente da lei, decorrem do direito de família (parentesco,
casamento, união estável, etc.). Não se trata apenas de alimentos ao incapaz, mas também sendo
possível os alimentos gravídicos, destinados ao nascituro e à mãe. Neste caso, admite-se a prisão
civil do devedor de alimentos.

• Alimentos convencionais: são os alimentos que decorrem de acordo, contrato, testamento,


legado, etc. Neste caso, os alimentos são prestados por se quer, não cabendo prisão civil.

• Alimentos indenizatórios: são os alimentos que decorrem de um ato ilícito, culminando em uma
indenização. Não caberá prisão civil por descumprimento aos alimentos.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Quanto à extensão, os alimentos podem ser:

• Alimentos civis (côngruos): são os alimentos que tem por objetivo do status a quo, mantendo o
padrão de vida anterior. Esses são a regra.

• Alimentos necessários (naturais ou indispensáveis): tem por objetivo fixar apenas o


indispensável para sobrevivência digna da pessoa. Ex.: cônjuge culpado pela dissolução da
sociedade conjugal, sendo arbitrado em favor dele os alimentos.

Quanto à forma de pagamento, os alimentos podem ser:

• Alimentos próprios (in natura): são os alimentos pagos em espécie, fornecendo os alimentos e
a moradia propriamente dita.

• Alimentos impróprios: são os mais comuns, pagos mediante pensão.

Quanto à finalidade, os alimentos podem ser:

• Alimentos definitivos: são aqueles fixados definitivamente. Há um acordo de vontades ou uma


sentença judicial transitada em julgado. Apesar da nomenclatura, esses alimentos podem ser
alterados o seu valor, caso haja uma alteração substancial no binômio ou trinômio.

• Alimentos provisórios: são os alimentos fixados antes da sentença, seguindo o rito especial da
Lei de Alimentos (Lei 5.478/68). Nesse caso, a lei vai exigir que haja uma prova pré-constituída
desse vínculo entre alimentando e alimentante (ex.: casamento, filiação, etc.). Se houver uma
prova pré-constituída, correrá pelo rito especial e haverá a possibilidade de já fixar os alimentos
provisórios.

• Alimentos provisionais: são alimentos que decorrem de outras ações que não seguem o rito
especial da ação de alimentos, sendo fixados por uma tutela antecipada, ou seja, por meio de
uma liminar concedida, por exemplo, numa medida cautelar de separação de corpos. Não há
prova pré-constituída. Caso ao final não seja reconhecido o pai efetivamente, não caberá
repetição do valor pago a título de alimentos.

• Alimentos transitórios: são os alimentos em que são fixados por um período de tempo em prol
do ex-cônjuge ou ex-companheiro, a fim de que consiga se reajustar e se realocar no mercado
de trabalho. Tem o termo pré-determinado.

Se o executado não paga os alimentos, ou tendo sido instado a se justificar, mas essa

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

justificativa não foi aceita, o juiz poderá, além de determinar o protesto da decisão judicial,
decretar a prisão civil do devedor de alimentos, desde que seja fundado em alimentos legais
(direito de família).

Essa prisão será cumprida em regime fechado, separado dos presos comuns. Segundo o
STJ, o advogado que tenha contra si decretada prisão civil por inadimplemento de obrigação
alimentícia não tem direito a ser recolhido em sala de Estado Maior ou, na sua ausência, em prisão
domiciliar.

Flávio Tartuce diz que pelo NCPC esse prazo da prisão poderá ser de 1 a 3 meses (art. 528,
§3º). Isso será em relação aos alimentos provisórios e definitivos. Para ele, em relação aos
alimentos provisionais, parece-lhe que continuam sendo regulados pelo art. 19 da Lei de
Alimentos, caso em que justifica a prisão civil por prazo não superior a 60 dias.

Isso deverá ser decidido pela jurisprudência.

A Súmula 309 do STJ diz que o débito alimentar que autoriza a prisão do alimentante é
aquele que compreende os 3 meses anteriores ao ajuizamento da execução, bem como aqueles
que se vencerem no curso do processo. No restante, caberá uma ação de cobrança. Segundo o
STJ, o atraso de 1 só prestação alimentícia, compreendida entre as 3 últimas atuais devidas, já é
hábil a autorizar o pedido de prisão do devedor, nos termos do artigo 528, §3o do NCPC.

A literalidade da súmula foi reproduzida no §7º do art. 528 do NCPC.

Segundo o STJ, equipara-se à gestão de negócios a prestação de alimentos feita por outrem
na ausência do alimentante.

IV. Extinção da obrigação de alimentos

A obrigação de prestar alimentos se extingue com:

• Morte do credor, visto que se tratar de uma obrigação personalíssima

• Se houver uma alteração substancial no binômio ou trinômio alimentar

• No caso de menores, a obrigação alimentar é extinta quando completar 18 anos. Essa extinção,
no entanto, não é automática, sendo necessária a propositura de uma ação de exoneração, visto
que o STJ entende que a obrigação do genitor poderá continuar se o filho estiver cursando
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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faculdade até o encerramento da graduação. O STJ não admite que a obrigação de prestar
alimentos ultrapassar a graduação e passe para uma pós-graduação.

• Dissolução do casamento ou da união estável: o art. 1.709 admite que a sentença de divórcio
fixem alimentos pós-divórcio. Se o alimentante se casar de novo não significará que a obrigação
será extinta. Só irá extinguir neste caso se o binômio ou trinômio (necessidade, possibilidade e
proporcionalidade) for alterado. Se o credor (alimentando) se casar novamente, poderá haver a
extinção do dever de prestar alimentos (art. 1.708). A ideia do código é a de que não há mais
necessidade.

• Comportamento indigno do credor em relação ao devedor: é uma cláusula geral, devendo ser
completada pelo juiz. Entende-se que devem ser aplicadas as mesmas causas de revogação da
doação, tal como atentar contra a honra, vida ou a família do devedor de alimentos,
justificando a quebra do dever de prestar alimentos.

2. Poder Familiar

I. Poder familiar

Poder familiar é o poder exercido pelos pais em relação aos filhos, dentro da ideia atual de
família democrática, colaboração familiar e relações baseadas no afeto, segundo o melhor
interesse da criança ou adolescente.

Doutrina afirma que o poder familiar deve ser denominado de autoridade parental.

O poder familiar será exercido pelo pai e pela mãe, em igualdade de condições. Os filhos
estão sujeitos ao poder familiar enquanto forem menores.

O art. 1.632 deixa claro que separação judicial, divórcio ou dissolução de união estável não
alteram relações de pais e filhos, inclusive o direito à convivência, ainda que haja alguma alteração
na situação.

É o art. 1.632 o fundamento básico para a chamada responsabilidade civil por abandono
afetivo, havendo a quebra do dever de companhia. Se há a quebra desse dever, há um direito de
indenização em decorrência dessa quebra, ou seja, responsabilidade civil pro abandono afetivo.

São atribuições do poder familiar:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Dirigir a educação e criação dos filhos

• Exercer a guarda dos filhos, seja unilateral ou compartilhada

• Conceder aos filhos ou negar-lhes consentimento ao casamento e à viagem ao exterior

• Conceder ou negar aos filhos o consentimento para que mudem de residência permanente
quando esta mudança implique em mudança de município

• Nomear tutor por testamento, se o outro pai não lhe sobreviver ou se outro não puder exercer
o poder familiar

• Representar ou assistir aos filhos

• Reclamar os filhos de quem ilegalmente detenha as crianças e adolescentes

• Exigir que os filhos lhe prestem obediência, respeito e os serviços próprios da sua idade e da sua
condição.

Em relação a essa última atribuição do poder familiar, a obediência e respeito não podem
ser exercidas de maneira desarrazoada. Tanto é que visando dar concretude à ideia de
razoabilidade na educação, no dever de obediência do filho, entrou em vigor no Brasil a Lei da
Palmada (Lei Menino Bernardo).

Essa lei alterou dispositivos do ECA e inseriu o art. 18-A, que diz ter a criança ou
adolescente o direito de ser criado sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou
degradante como forma de correção, disciplina ou educação.

A lei é polêmica, mas a ideia da lei não é proibir o castigo, e sim vedar o tratamento
degradante, cruel, etc.

Os pais ainda não podem explorar economicamente o filho, não podendo imputar ao filho
serviços que não compatíveis com a sua idade e a sua condição.

A quebra desse dever do poder familiar, ou seja, o exercício abusivo do poder familiar
poderá implicar a suspensão ou mesmo a extinção do poder familiar.

Em relação aos efeitos do poder familiar, pai e mãe são tratados como usufrutuários dos
bens dos filhos. No entanto, os pais não poderão alienar os bens dos filhos e tampouco gravar

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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com ônus reais, salvo se houver necessidade ou se for melhor para o filho, caso em que será
indispensável a autorização judicial.

Se estes atos de alienação ou disposição serem realizados sem autorização judicial, o ato
de disposição será tido como nulo.

Colidindo os interesses dos pais com os dos filhos, a requerimento do filho ou do MP, o juiz
irá dar ao filho um curador especial.

Cessará o poder familiar:

• Pela morte dos pais

• Pela morte dos filhos

• Pela emancipação

• Pela maioridade

• Pela adoção

• Pela decisão judicial

Os fundamentos para a destituição do poder familiar pelo juiz poderão ser vários, como o
castigo imoderado do filho, abandono do filho, prática de atos contrários à moral e aos bons
costumes, quebra de deveres inerentes ao poder familiar, etc.

O poder familiar é suspenso quando o pai ou a mãe é condenado por sentença transitada
em julgado por prática de crime, tendo sido fixado uma pena superior a 2 anos de prisão (art.
1.637, parágrafo único).

II. Alienação parental (implantação de falsas memórias)

A alienação parental é a alienação do filho feita por um dos pais.

É também conhecida de implantação de falsas memórias.

Maria Berenice Dias diz que em muitas vezes um dos cônjuges não consegue se conformar
com o término da relação, passando a haver uma rejeição que faz surgir naquele cônjuge um
desejo de vingança. Essa vingança gera um processo de destruição do outro cônjuge perante o seu

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filho.

O genitor aliena o filho contra o outro cônjuge.

A Lei 12.318 diz em seu art. 2º que se considera alienação parental a interferência na
formação psicológica na criança ou adolescente que é promovida ou induzida por um dos
genitores, pelos avós ou por quem detenha a criança ou adolescente sob sua autoridade, a fim de
que essa criança ou adolescente repudie o genitor, causando prejuízos à manutenção de vínculos
com ele. Há o processo de destruição da imagem do genitor.

A alienação parental é um ato ilícito, podendo gerar responsabilidade civil do alienador,


pois no seu direito de guarda e poder familiar exerceu de forma abusiva.

Ficando caracterizada a alienação parental, o juiz poderá:

• declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador

• para compensar isso, poderá aumentar o regime de convivência familiar com genitor que sofreu
os efeitos decorrentes da alienação parental

• estipular uma multa ao alienador

• determinar o acompanhamento psicológico ou biopsicossocial da criança, do genitor alienador e


do genitor alienado.

• Alteração da guarda

• Declarar a suspensão da autoridade parental do genitor

Por fim, o fato do pai ou da mãe contrair novas núpcias, ou estabelecer nova união estável,
não faz com que o pai ou mãe perca o poder familiar.

Posse

1. Posse

I. Natureza jurídica da posse

Moreira Alves aponta duas correntes.

1ªC: entende que posse é fato.


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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2ªC: entende que posse é direito. É a prevalente.

Se posse é direito, é preciso saber se se trata de direito real ou de direito pessoal. Aqui há
entendimento para todos os lados.

Orlando Gomes defende que se trata de direito real de direito de posse.

Flávio Tartuce diz que o direito real é de natureza especial. Especial porque a posse é o
domínio fático que a pessoa exerce sobre uma coisa. Se direito é fato, valor e norma, a posse é o
componente jurídico do direito. A posse nasce de um fato que é valorado e encontra respaldo
normativo. Por isso teria a natureza especial, por conta desse nascedouro fático.

Atente-se que há duas correntes que procuram justificar a posse como categoria jurídica.

1ª Teoria Subjetivista (Savigny): dá relevância ao aspecto subjetivo da posse. Aqui a posse


possui dois elementos:

c) Corpus: é o elemento objetivo, material, que é a disponibilidade sobre a coisa.

• Animus domini: é o elemento subjetivo, que é a intenção de ter a coisa para si.

Perceba que se for adotada a teoria subjetiva, não seriam possuidores o locatário,
comodatário, depositário, etc., pois não teriam animus domini.

Por isso, dizem-se que foi adotada a teoria objetivista.

2ª Teoria Objetiva (Ihering): para constituição da posse basta que o sujeito disponha
fisicamente da coisa. Na verdade, para o Ihering, o corpus é formado pela atitude externa do
possuidor em relação à coisa. O possuidor passa a agir, em relação à coisa, com intuito de explorá-
la, inclusive economicamente. Para a teoria objetiva, dentro do corpus há uma intenção de
explorar a coisa para fins econômicos.

Essa teoria foi a adotada no Código Civil, basta ler o art. 1.196, o qual diz que se considera
possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes
à propriedade. Portanto, posse é quem exerce ou tem de fato o exercício de um dos exercícios
inerentes à propriedade.

Corpus é o elemento físico dotado de uma intenção de uma exploração econômica,

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diferente de Savigny, que diz que é necessário o domínio físico (corpus), somado à vontade
subjetiva (animus).

Pelo conceito objetivo, consegue-se perceber que a posse pode ser desdobrada, podendo
haver a posse direta e a posse indireta. O locador é possuidor indireto, pois exerce um dos
poderes inerentes à propriedade, pois o proprietário goza da propriedade. O locatário usa a coisa,
ou seja, exerce um dos atributos da propriedade, sendo possuidor direto.

II. Diferenças entre posse e detenção

• Posse: é exercida em nome próprio.

• Detenção (ou fâmulo da posse): é exercida em nome alheio.

O art. 1.198 diz que se considera detentor aquele que, achando-se em relação de
dependência para com outro, conserva a posse em nome desta outra pessoa e em cumprimento
de ordens ou instruções suas. O parágrafo único afirma que, aquele que começou a comportar-
se do modo como prescreve este artigo, em relação ao bem e à outra pessoa, presume-se
detentor, até que prove o contrário.

Exemplo do fâmulo da posse é o caseiro. Outro também é o manobrista, exercendo sobre


o bem uma posse sobre outra pessoa. Veja, o manobrista exerce detenção em relação à empresa,
a qual é possuidora do carro no momento da condução.

Outro exemplo ainda é o caso da ocupação irregular de área pública. O STJ entende que
a ocupação irregular de área pública não induz posse e sim mera detenção. Por isso, será
considerado mero detentor.

É possível que o mero detentor se torne possuidor? SIM. É possível a conversão da


detenção em posse, quando há a quebra do vínculo de subordinação (Enunciado 301 do CJF). E
isso poderá ocorrer de forma justa ou injusta.

III. Principais classificações da posse

a) Quanto ao desdobramento

Quanto ao desdobramento, a posse se classifica em:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Posse direta: exercida por quem tem o poder físico sobre a coisa (ex.: locatário).

• Posse indireta: exercido por meio de outra pessoa, como um exercício de direito (ex.: locador).

O Enunciado 76 do CJF diz que o possuidor direto tem direito de defender sua posse
contra o possuidor indireto, e o possuidor indireto tem direito de defender sua posse contra o
possuidor direto.

b) Quanto aos vícios objetivos

Quanto à presença de vícios objetivos:

• Posse justa: é a posse não violenta, não clandestina ou não precária.

• Posse injusta: é a posse violenta, clandestina ou precária.

A posse violenta é aquela obtida por meio de esbulho, violência física ou moral, como a
ameaça.

A posse clandestina é a posse obtida às escuras, às escondidas.

A posse precária é a posse obtida com abuso de confiança ou abuso de direito. Ex.: o
sujeito para de pagar o aluguel e não devolve o imóvel.

A posse, mesmo injusta, é posse. Isso significa que é possível defender essa posse injusta
em face de terceiros, inclusive se valer de ações possessórias em caso de esbulho e turbação.
Isso porque a posse é viciada somente sobre uma determinada pessoa, e não em relação a todo
mundo.

O art. 1.208, segunda parte, vai dizer que posses injustas por meio de violência ou
clandestinidade podem ser convalidadas. No entanto, as posses precárias não podem ser
convalidadas. Segundo o dispositivo, não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância
assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de
cessar a violência ou a clandestinidade.

Portanto, uma posse que nasce violenta ou clandestina poderá ser convalidada caso cesse
a violência ou a clandestinidade. Este é o entendimento que prevalece na doutrina.

Após 1 ano e 1 dia do ato de violência ou da clandestinidade, a posse é convalidada,


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deixando de ser injusta e passa a ser justa. A posse precária, no entanto, continuará sendo injusta.

c) Quanto à boa-fé subjetiva

Quanto à boa-fé subjetiva, classifica-se a posse em:

• Posse de boa-fé: é a posse que ignora a existência de um vício que impede a aquisição da coisa.

• Posse de má-fé: é a posse em que há conhecimento do vício que acomete a coisa. Por isso, do
ponto de vista subjetivo, pois está na cabeça do sujeito.

É possível falar em posse de boa-fé injusta?

SIM. Nada impede alguém ter uma posse injusta e de boa-fé. Basta pensar naquele que
adquire a posse de outrem sem saber que aquela posse é injusta. Houve a violência, e na semana
seguinte houve a transferência da posse, pois não houve a ultrapassagem do prazo de 1 ano e 1
dia, a fim de se tornar justa.

É possível haver posse justa e de má-fé?

SIM. Posse justa é uma posse não violenta, não clandestina e não precária. Mas é possível
que essa posse contenha algum vício. Nesse caso, haverá uma posse justa e de má-fé.

d) Quanto à presença de um título

A posse poderá ser:

• Posse com título: há uma causa representativa da transmissão da posse. Há documento escrito.

• Posse sem título: não há essa causa representativa da posse, não há documento escrito.

No caso do achado de tesouro, a doutrina fala em ato-fato jurídico, pois o indivíduo não
teria a vontade juridicamente relevante para que o ato jurídico produza efeitos. Mas concorda-se
que há a posse daquela pessoa, mas uma posse sem título.

Com base nessa ideia, surgem as expressões:

• Ius possidendi: é o direito à posse que decorre da propriedade. Há uma posse com título, pois
decorre da propriedade, do direito explicitado.

• Ius possessionis: é o direito que decorre exclusivamente da posse. Há uma posse sem título, que

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

decorre de um exercício fático. É a posse que decorre da posse.

Alguns autores falam da posse natural, que é a posse sem título (ius possessionis), e posse
civil ou jurídica, que é o ius possidendi (posse com título).

Quando há título presume-se a boa-fé.

e) Quanto ao tempo

A posse pode ser classificada em:

• Posse nova: a posse conta até 1 ano, ou seja, com menos de 1 ano e 1 dia.

• Posse velha: a posse conta com pelo menos 1 ano e 1 dia.

A importância está na seara processual civil, a fim de verificar o cabimento das ações
possessórias.

f) Quanto aos efeitos

A posse se classifica em:

• Posse ad interdicta: a posse pode ser defendida inclusive por meio das ações possessórias
diretas. Essa posse não conduz à usucapião. É a posse fundada em contrato de locação,
comodato, depósito, etc.

• Posse ad usucapionem: há admissão da aquisição da propriedade por meio da usucapião. Deve


ser mansa, pacífica, duradoura, ininterrupta e deve ter a intenção de ser dono. Aqui não há
contrato, mas se houver, será como justo título, ajudando a presumir a boa-fé.

Perceba que quando se fala em posse ad usucapionem adota-se a teoria de Savigny,


levando em conta que a posse seria um exercício fático com animus domini.

Via de regra, há adoção da teoria objetiva de Ihering, mas também se adota, no caso da
posse ad usucapionem, a teoria de Savigny.

IV. Efeitos materiais e processuais da posse

a) Efeitos quanto aos frutos

O art. 1.214 diz que o possuidor de boa-fé tem direito, enquanto a boa-fé durar, aos frutos

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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percebidos.

O parágrafo único vai dizer que os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé
devem ser restituídos, mas apenas depois de serem deduzidas as despesas da produção e
custeio daquele fruto. Devem ser também restituídos os frutos colhidos com antecipação, pois
não eram para estar percebidos.

A lei distingue a boa-fé da má-fé com repercussão naquilo que tem ou não direito.

O art. 1.215 diz ainda que os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos
logo que são separados. No entanto, os frutos civis reputam-se percebidos dia por dia (juros).

Lembre-se que frutos não implicam a diminuição da coisa. O produto gera a diminuição
da coisa.

O art. 1.216 trata do possuidor de má-fé, estabelecendo que o possuidor de má-fé


responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos frutos que, por culpa sua,
deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé. O possuidor de má-fé tem
direito às despesas da produção e custeio.

O possuidor de boa-fé só responde pelos frutos pendentes, pois os que já colheu e já


percebeu são dele.

Em relação ao produto, que implica diminuição da substância da coisa, há um dever de


restituição, ainda que o possuidor seja de boa-fé. Isso porque, quando se retira um produto, se
está desfalcando a coisa, pois ela passa a ser menor do que era anteriormente. E para vedar o
enriquecimento sem causa, deve ser devolvida a coisa completa e não incompleta.

Quando se fala em fruto, devolve-se a coisa completa, mas no produto, para se falar em
devolver a coisa completa, deve ser devolvida a coisa completa naquele período.

b) Efeitos da posse em relação às benfeitorias

Benfeitorias são bens acessórios, que serão introduzidos, a fim de conservar, melhorar a
sua utilidade, classificando-se em necessária (conservar a coisa), útil (melhora a utilidade da
coisa) e voluptuária (de mero deleite).

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O art. 1.219 diz que o possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias
necessárias e úteis. Quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, terá ele o direito de levantá-
las, quando o puder sem detrimento da coisa principal, e terá o possuidor de boa-fé o direito de
retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

Em relação à locação de imóvel urbano, há uma regulamentação específica a respeito do


possuidor de boa-fé e de má-fé quanto às benfeitorias.

Essa lei vai dizer que, salvo disposição contratual em sentido diverso, as benfeitorias
necessárias, introduzidas pelo locatário, mesmo que não tenham sido autorizadas pelo locador,
gerará o direito de indenização ao locatário. As benfeitorias úteis, no entanto, se tiverem sido
autorizadas pelo locador, também deverão ser indenizadas.

Neste caso, permitirão tanto a necessária, ainda que sem autorização, quanto a útil, com
autorização do locador, o direito de retenção. Em relação às voluptuárias, poderão ser
levantadas, desde que não gerem dano à coisa.

Veja, as partes de um contrato paritário de locação poderão dispor de modo diferente,


como é o caso em que não há nenhum direito de indenização por benfeitorias necessárias, úteis
ou voluptuárias, ou ainda que terá direito a qualquer benfeitoria.

Em relação às benfeitorias, o art. 1.220 vai dizer que ao possuidor de má-fé serão
ressarcidas somente as benfeitorias necessárias, não tendo o direito de retenção pela
importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

Já o art. 1.222 diz que o reivindicante da coisa é obrigado a indenizar as benfeitorias ao


possuidor de má-fé, sendo essas benfeitorias necessárias. Nesse caso, sendo possuidor de má-fé,
o reivindicante poderá optar em pagar o valor atual da coisa ou o valor do custo da coisa para o
possuidor de má-fé, segundo mais interessante ao reivindicante.

No entanto, se o reivindicante reivindica a coisa de um possuidor de boa-fé, deverá o


reivindicante pagar pelo valor atual da coisa, e não pelo seu preço de custo.

É uma forma de punir a posse de má-fé.

V. Posse e responsabilidades

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O art. 1.217 diz que o possuidor de boa-fé não responde pela perda ou deterioração da
coisa, a que não der causa. Veja, o dispositivo diz que o possuidor de boa-fé tem
responsabilidade subjetiva.

Já o art. 1.218. O possuidor de má-fé responde pela perda, ou deterioração da coisa,


ainda que acidentais, salvo se provar que de igual modo se teriam dado, estando ela na posse
do reivindicante. Em outras palavras, a responsabilidade do possuidor de má-fé é objetiva. Só
vai se eximir se comprovar que a deterioração da coisa ocorresse de qualquer modo.

O art. 1.221 diz que as benfeitorias compensam-se com os danos, e só obrigam ao


ressarcimento se ao tempo da evicção ainda existirem. Há aqui uma hipótese de compensação
legal.

VI. Posse e processo civil

Três são as situações que possibilitam 3 ações respectivas:

• Ameaça à posse: promove-se uma ação de interdito proibitório.

• Turbação da posse: promove-se uma ação de manutenção de posse.

• Esbulho da posse: promove-se uma ação de reintegração de posse.

O art. 1.210 do CC vai dizer que o possuidor tem direito a ser mantido na posse no caso de
turbação, de ser restituído na posse no caso de esbulho e de ser segurado na posse no caso de
uma violência iminente em que precise dessa segurança.

Há no art. 554 do NCPC a consagração total do princípio da fungibilidade das ações


possessórias. Segundo este dispositivo, a propositura de uma ação possessória em vez de outra
não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela
cujos pressupostos estejam provados.

Se está diante de uma amaça, turbação ou esbulho novo, que são aqueles com menos de
1 ano e 1 dia, caberá uma ação de força nova, que seguirá o rito especial previsto no NCPC,
cabendo a medida liminar inaudita altera pars.

Por outro lado, se houver uma ameaça, turbação ou esbulho velho, com mais de 1 ano e
1 dia, haverá uma ação de força velha, observando-se o procedimento comum.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Em 2016, o STJ entendeu que particulares podem ajuizar ação possessória para
resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso comum do povo)
instituída como servidão de passagem. Ex: a empresa construiu uma indústria e invadiu a via de
acesso (rua) que liga a avenida a uma comunidade de moradores locais. Os moradores tem
legitimidade para ajuizar ação de reintegração de posse contra a empresa alegando que a rua que
está sendo invadida representa uma servidão de passagem.

Atente-se que o ordenamento jurídico não permite a proteção possessória em caso de


particular que ocupe bens públicos dominicais, sendo esta situação caracterizada como mera
detenção. No entanto, é possível que particulares exerçam proteção possessória para garantir seu
direito de utilizar bens de uso comum do povo, como é o caso, por exemplo, da tutela possessória
para assegurar o direito de uso de uma via pública.

a) Principais aspectos processuais

É necessário analisar o art. 555 do NCPC.

Segundo este dispositivo, é lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:

• condenação em perdas e danos;

• indenização dos frutos.

Poderá cumular sem haver a desnaturação do rito possessório.

O parágrafo único diz que pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária
e adequada para:

• evitar nova turbação ou esbulho;

• cumprir-se a tutela provisória ou final.

O que este dispositivo autoriza é a de que, além de condenação em perdas e danos e


indenização dos frutos, é possível fixar uma multa inibitória para que o réu não faça novamente.

Lembre-se que a ação possessória tem caráter dúplice, sendo possível que o réu, na
contestação da ação possessória, poderá alegar que ele é o ofendido, devendo ele ser indenizado
pelo autor. Trata-se do pedido contraposto (art. 556).

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Já o art. 557 afirma que na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor
quanto ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a ação de reconhecimento
de domínio for deduzida em face de terceira pessoa. Aqui há uma mudança, pois não havia esta
previsão.

O parágrafo único diz que não obsta à manutenção ou à reintegração de posse a alegação
de propriedade ou de outro direito sobre a coisa.

Se o réu prova que o autor provisoriamente mantido ou reintegrado na posse carece de


idoneidade financeira para, caso perca, responder por perdas e danos, o juiz fixará o prazo de 5
dias para que fixe caução, podendo ser real ou fidejussória, sob pena de a coisa ser depositada
em juízo.

Essa caução é dispensada quando se está lidando com partes economicamente


hipossuficientes, havendo uma interpretação voltada para a função social e dignidade da pessoa
humana.

O art. 562 diz que, estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem
ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração da posse. Caso
não esteja devidamente instruída, determinará que o autor justifique previamente o alegado,
antes da expedição do mandado de manutenção ou reintegração da posse, citando-se o réu para
comparecer à audiência que for designada.

O parágrafo único vai dizer que, contra as pessoas jurídicas de direito público, não será
deferida a manutenção ou a reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos
representantes judiciais. Este dispositivo traz uma exceção.

O art. 563 vai dizer que, se considerar suficiente a justificação apresentada pelo autor, o
juiz fará logo expedir mandado de manutenção ou de reintegração.

O art. 565 vai dizer que, no litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a
turbação do imóvel tiver ocorrido há mais de 1 ano e 1 dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de
concessão da medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30
dias. Lembrando que na mediação o mediador não propõe a solução às partes, mas fomenta um
contato entre elas.

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Se passou de 1 ano e 1 dia, em regra, a lei não permite a liminar, pois voltaria para o
procedimento comum. Todavia, o próprio NCPC traz uma exceção, por conta da necessidade de
audiência de mediação no prazo de 30 dias.

No caso de litígio coletivo pela posse de imóvel, caso tenha sido concedida a liminar, e se
essa não for executada no prazo de 1 ano, a contar da data de distribuição, caberá ao juiz designar
audiência de mediação.

Lembrando que o Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a


Defensoria Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça.
O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer necessária à
efetivação da tutela jurisdicional.

Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de Estado ou
do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio poderão ser intimados
para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre a existência
de possibilidade de solução para o conflito possessório. Aplica-se o disposto neste artigo ao litígio
sobre propriedade de imóvel.

Segundo o art. 1.211 do CC, quando mais de uma pessoa se disser possuidora, manter-se-
á provisoriamente a que tiver a coisa, se não estiver manifesto que essa pessoa obteve a posse
de modo viciado. Portanto, ficará mantida na posse aquela pessoa que já se encontra na posse.
Esse dispositivo trata do chamado possuidor aparente.

O art. 1.212 diz que o possuidor pode intentar a ação de esbulho, ou a de indenização,
contra o terceiro, que recebeu a coisa esbulhada sabendo que era esbulhada.

Este dispositivo diz que aquele que sofreu esbulho pode propor uma ação de reintegração
de posse em face de um terceiro de má-fé, que adquiriu a posse por quem sabia que adquiriu por
ser esbulhada.

VII. A legítima defesa da posse e o desforço imediato

O art. 1.210, §1º, diz que o possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou
restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo. Portanto, os atos devem ser
imediatos. E além disso, os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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à manutenção, ou restituição da posse.

Há aqui uma previsão de uma autotutela, sendo requisitos:

• defesa seja imediata

• possuidor tome o cuidado para que as medidas não possam ir além do indispensável para a
recuperação da posse, sob pena de abuso do direito.

A legítima defesa é antes do esbulho, ocorrendo na turbação da posse.

O desforço imediato ocorre após o esbulho, pois já foi perdida a posse.

VIII. Forma de aquisição, transmissão e perda da posse

O art. 1.204 afirma que a posse é adquirida desde o momento em que se torna possível
o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade.

Dessa forma, há a aquisição da posse de diferentes maneiras, como:

• Aquisição originária: contato direto entre a pessoa e a coisa.

• Aquisição derivada: há uma intermediação pessoal.

Quando se encontra uma coisa abandonada e é pega para si, há uma forma de aquisição
originária. Mas quando alguém vende um bem é forma de aquisição derivada.

Como forma derivada mais importante há a tradição, que é a entrega de bem móvel.

Professor Washington de Barros Monteiro classifica a tradição da seguinte forma:

• Tradição real: há a entrega efetiva da coisa.

• Tradição simbólica: não há a entrega efetiva da coisa, mas algo que simboliza a entrega. Ex.:
entrega da chave do apartamento. É o que ocorre na traditio longa manu, em que a coisa a ser
entregue é colocada à disposição da outra parte.

• Tradição ficta: é a tradição que se dá por presunção, como ocorre na traditio brevi manu.

O art. 1.206 diz que a posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com
os mesmos caracteres. É o princípio da continuidade do caráter da posse, pois é uma forma
derivada da aquisição da posse, em que as características é passada aos herdeiros e legatários.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 1.207 vai dizer que o sucessor universal continua de direito a posse do seu
antecessor. Já ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos
legais.

Sucessor universal é o caso de herança e legítima. Sucessor singular é o caso de compra e


venda, sucessão e legado.

Então, nos casos de herança há simplesmente uma sucessão. Portanto, nos casos de
herança, em que há a sucessão universal, há continuidade da posse do atual com o antecessor.

No caso de sucessão singular (compra e venda), o possuidor atual poderá unir a sua posse
atual com o seu antecessor.

Isto é importante para fins de usucapião futuramente.

O art. 1.209 diz que a posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a das coisas
móveis que nele estiverem, de forma que havendo a transmissão da posse do imóvel haverá
também transmissão da posse dos bens móveis que guarnecem o bem imóvel, já que esses bens
são acessórios. Há aplicação do princípio da gravitação jurídica.

O art. 1.223 diz que a posse será perdida quando ela cessa, embora contra a vontade do
possuidor. Será considerada cessada a posse quando ele perde o poder sobre o bem, ou seja,
quando cessa os atributos inerentes ao direito de propriedade.

O art. 1.224 diz que só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho,
quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é
violentamente repelido.

Isso significa dizer que, tomada a notícia de que o imóvel foi esbulhado, poderá o possuidor
se dirigir até o local e retirar as pessoas de lá no ato, visto que não se considera que a posse foi
perdida, somente se considerando que no outro dia foi perdida a posse.

IX. Composse

Composse é posse conjunta.

É uma situação na qual duas ou mais pessoas exercerão poderes possessórios sobre a

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

mesma coisa. Há um condomínio de posses.

O art. 1.199 vai dizer que, se duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada
uma exercer sobre ela atos possessórios, contanto que não excluam os dos outros
compossuidores.

Se ele excluir um compossuidor do exercício de posse, haverá possibilidade de ação


possessória do compossuidor excluído. A conclusão que se chega é de que é possível que um
compossuidor ingresse com ação possessória contra outro compossuidor. Há inclusive decisão
do STJ nesse sentido.

A composse pode ser classificada em:

• Composse pro indiviso (indivisível): há compossuidores, com fração ideal das posses, mas não
se consegue determinar, no plano fático, qual é a parte de cada um. Ex.: dois irmão com a posse
de uma fazenda, que plantam soja conjuntamente.

• Composse pro diviso (divisível): cada compossuidor sabe qual é a sua parte, pois é determinável
no plano fático e real. Ex.: os dois irmãos têm um terreno, mas há uma cerca dividindo metade
do local.

Direito das coisas.

3. Propriedade

I. Conceito

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Propriedade é o direito que alguém possui em relação a algum determinado bem ou coisa. É o
domínio que a pessoa tem sobre a coisa.

Direito de propriedade é consagrado como direito fundamental (art. 5º, XXII, CF). A propriedade não
é direito absoluto, motivo pelo qual deve haver o cumprimento da função social.

A propriedade está relacionada a 4 atributos (art. 1.228):

• Faculdade de usar: corresponde à faculdade de se pôr o bem a serviço do proprietário, sem


modificar a sua substancia. O Estatuto da Cidade coloca limitação ao direito de usar a coisa.
• Faculdade de gozar (fruir): é a faculdade de retirar os frutos da coisa.
• Faculdade de dispor: poder de consumir o bem, de aliená-lo ou gravá-lo, ou de submetê-lo ao
serviço de terceira pessoa, ou de desfrutá-lo. Pode se dar por ato inter vivos ou mortis causa
(testamento).
• Faculdade de reaver: é exercido por meio de uma ação petitória, fundada no direito de
propriedade. Isso se dá pela ação reivindicatória.

Se determinada pessoa tiver os 4 atributos da propriedade, haverá a propriedade plena da coisa. Se


não houver um dos atributos a propriedade será limitada.

Quando a propriedade for resolúvel, também há uma propriedade limitada, pois alguns dos
atributos da propriedade passam a ser de outra pessoa. O proprietário, que reúne todos os poderes (ou
atributos) da propriedade (GRUD), é titular da propriedade plena ou alodial.

Quando limitada ou restrita, a propriedade pode dividir-se em:

• Nua propriedade: é a titularidade do domínio, sem os atributos de uso e fruição. A pessoa é o


nu-proprietário, senhorio direto.
• Domínio útil: corresponde aos atributos de usar, gozar, dispor da coisa. A pessoa é o
superficiário, usufrutuário, usuário, habitante, promitente comprador etc. É a utilização efetiva
da coisa, que corresponde aos atributos de usar, gozar e dispor da coisa.

A depender dos atributos que possui, a pessoa que detenha o direito de propriedade recebe uma
denominação diferente, como superficiário, usufrutuário, usuário, habitante, promitente comprador, etc.

Por exemplo, no usufruto percebe-se que o nu proprietário tem o direito de dispor e reaver a coisa,
mas quem tem o domínio útil (usufrutuário) tem os atributos de gozar e usar da coisa.

II. Principais características do direito de propriedade

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São características do direito de propriedade:

• Direito absoluto: tem caráter erga omnes, oponível a todos. Mas hoje há muitas limitações ao
direito de propriedade, como a função social e socioambiental da propriedade.
• Direito exclusivo: via de regra, não pode pertencer a coisa a mais de uma pessoa, salvo no caso
de condomínio.
• Direito perpétuo: o direito não se perde, como regra, pelo seu não exercício.
• Direito elástico: Orlando Gomes diz que a propriedade pode ser distendida ou contraída, de
acordo com o seu exercício. Ora o sujeito tem os 4 atributos, estando estendida, ora ele tem
menos atributos, contraindo o direito de propriedade.

III. Função social e socioambiental da propriedade

O §1º do art. 1.228 vai dizer que o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as
suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o
estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio
histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

Esse dispositivo confere uma finalidade ao exercício do direito de propriedade. É necessário que a
propriedade cumpra essa função.

A função social e socioambiental da propriedade está prevista no CC e no art. 225 da CF, dispositivo
que protege o meio ambiente como um bem difuso e que visa à sadia qualidade de vida das pessoas e futuras
gerações (assegura direitos intergeracionais).

A função social da propriedade tem uma dupla intervenção:

• Faceta limitadora: veda a degradação do meio ambiente.


• Faceta impulsionadora: fomenta a exploração da propriedade.

A CF traz vários preceitos que seguem a linha da faceta impulsionadora da função social da
propriedade. O art. 186 da CF vai dizer que há função social da propriedade quando há o aproveitamento
racional e adequado da propriedade. É preciso aproveitar a propriedade para que se exerça a função social.
É preciso observar, como o art. 186 continua, as relações do trabalho, exigindo relação de emprego.

A norma geral civil vai consagrar uma função socioambiental da propriedade, devendo respeitar a
fauna, flora, patrimônio histórico e artístico, etc. Esse dispositivo traz uma especial preocupação com o
ambiente, seja natural, artificial ou cultural, mas há a preocupação ambiental.

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Exemplo disso se extrai do STJ, quando passou a decidir que o novo proprietário de um imóvel é
obrigado a fazer a reparação ambiental, mesmo que não tenha sido ele o causador do dano ambiental. Ou
seja, a obrigação de reparação ambiental é ambulatória e, portanto, propter rem.

É imperioso anotar que o art. 2º, §2º, do Código Florestal diz que as obrigações previstas no Código
Florestal têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência
de domínio ou posse do imóvel rural. É o direito de sequela objetivo, em que a obrigação persegue a coisa
sobre a qual ela recai.

O art. 1.228, §2º, diz que são proibidos os atos que não trazem ao proprietário qualquer
comodidade ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem. Na verdade, o que há aqui
é a vedação do exercício irregular do direito de propriedade. É a vedação ao ato emulativo.

Portanto, se prendermos à literalidade, bastaria que o sujeito tivesse alguma utilidade ou


comodidade ao direito de propriedade para não se falar em ato emulativo. A verdade é que o ato ilícito pode
ser praticado a partir do exercício irregular do direito de propriedade, ainda que o sujeito tenha alguma
comodidade.

É necessário então fazer uma leitura sistemática do art. 1.228, §2º, do CC, mas terá que lembrar do
art. 187 do CC, que diz que também comete ato ilícito aquele que abusa do direito.

O Enunciado 49 do CJF diz que a regra do art. 1.228, §2º, deve ser interpretada restritivamente,
prevalecendo a regra do art. 187 do CC. Para efeitos de ato emulativo, é preciso considerar que a
responsabilidade tem caráter objetivo, e não subjetivo.

O §3º do art. 1.228 trata da desapropriação por necessidade ou por utilidade pública, e da
desapropriação por interesse social, além de tratar do ato de requisição em caso de perigo público
iminente. Segundo o dispositivo, o proprietário pode ser privado da coisa, nos casos de desapropriação, por
necessidade ou utilidade pública ou interesse social, bem como no de requisição, em caso de perigo público
iminente.

Flávio Tartuce diz que esse dispositivo fala de direito administrativo.

O art. 1.229 diz que a propriedade do solo abrange a do espaço aéreo e subsolo correspondentes,
em altura e profundidade úteis ao seu exercício, não podendo o proprietário opor-se a atividades que sejam
realizadas, por terceiros, a uma altura ou profundidade tais, que não tenha ele interesse legítimo em impedi-
las. Esse dispositivo trata da extensão vertical da propriedade. Esse artigo vai se amparar no critério de
utilidade pelo seu proprietário.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Segundo o art. 1.230, a propriedade do solo não abrange as jazidas, minas e demais recursos
minerais, os potenciais de energia hidráulica, os monumentos arqueológicos e outros bens referidos por
leis especiais. Isso se dá, porque a CF diz que tais bens pertences à União.

O que fica garantido ao concessionário é o produto da lavra, mas o bem pertence à União.

O parágrafo único estabelece que o proprietário do solo tem o direito de explorar os recursos
minerais de emprego imediato na construção civil, desde que esses produtos não sejam submetidos a
transformação industrial.

Exemplo disso é a areia. O sujeito que compra uma propriedade e contém areia, poderá vender a
uma construtora, pois a areia não necessita de transformação industrial.

O art. 1.231 diz que a propriedade presume-se plena e exclusiva, até prova em contrário.

IV. Desapropriação judicial privada por posse-trabalho

Segundo o §4º do art. 1.228, o proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel
reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de 5 anos, de
considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras
e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.

Essa é a denominada desapropriação judicial privada por posse-trabalho.

Esse dispositivo diz que o proprietário poderá perder a área se:

• Se tratar de uma área extensa


• Várias pessoas estiverem morando lá
• Essa pessoas estão de boa-fé
• Estão lá a mais de 5 anos ininterruptamente
• Estão exercendo trabalho e moradia no lugar
• Realizaram serviços e obras considerados relevantes pelo juiz de interesse social e econômico

Neste caso, o juiz irá fixar uma justa indenização ao proprietário, pagando-se o preço a ele, situação
na qual a sentença poderá ser registrada no Registro de Imóveis, em nome daqueles que se encontram na
área.

Atente-se que isto não se trata de usucapião. Isso porque na usucapião há uma forma originária de
aquisição da propriedade, motivo pelo qual não há pagamento por isso. Neste caso da desapropriação judicial

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privada por posse-trabalho há o pagamento, então é uma forma de desapropriação, visto que há
indenização.

Há 4 diferenças básicas entre a desapropriação judicial privada por posse-trabalho e a usucapião


coletiva do Estatuto da Cidade:

• Na usucapião coletiva urbana, os ocupantes devem ser de baixa renda. Na desapropriação


judicial privada por posse-trabalho não há essa exigência.

• Na usucapião coletiva urbana, a área deve ter no mínimo 250m², enquanto na desapropriação
judicial privada por posse-trabalho exige apenas uma extensa área.

• Na usucapião coletiva urbana, só há aplicação para imóveis urbanos, enquanto a desapropriação


judicial privada por posse-trabalho pode ser por imóveis urbanos ou rurais.

• Na usucapião coletiva urbana, não há indenização, enquanto na desapropriação judicial privada


por posse-trabalho há uma indenização justa.

Esse conceito representa a efetivação da função social da propriedade, pois é a posse que está sendo
exercido sobre a área, e o desempenho da atividade positiva sobre o imóvel faz com que a posse faça nascer
o direito à propriedade daquele imóvel, desde que paga uma justa indenização.

A boa-fé da posse e daqueles que ocupam o terreno na desapropriação não é uma boa-fé objetiva.
A boa-fé aqui é subjetiva, estando relacionada à conduta dos envolvidos, verificando-se se empregam uma
forma adequada da exploração da propriedade.

A desapropriação judicial privada por posse-trabalho pode ser alegada inclusive como matéria de
defesa, bem como por ação autônoma.

V. Diferença entre propriedade resolúvel e propriedade fiduciária

a) Propriedade resolúvel

A propriedade resolúvel é uma propriedade que pode ser resolvida. Pode ser extinta pelo advento
de uma condição ou de um termo, ou mesmo por uma causa superveniente, que venha a destituir a relação
jurídica. Exemplo disso é a chamada compra e venda com cláusula de retrovenda. Durante esse período de
até 3 anos a propriedade do comprador é uma propriedade resolúvel, podendo ser extinta a qualquer
momento.

O art. 1.359 vai dizer que, resolvida a propriedade pelo implemento da condição ou pelo advento
do termo (causa anterior), entendem-se também resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência

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(retorna ao status a quo), e o proprietário, em cujo favor se opera a resolução, pode reivindicar a coisa do
poder de quem a possua ou detenha.

Já o art. 1.360 afirma que, se a propriedade se resolver por outra causa superveniente, o possuidor,
que a tiver adquirido por título anterior à sua resolução, será considerado proprietário perfeito, restando à
pessoa, em cujo benefício houve a resolução, que ela proponha uma ação contra aquele cuja propriedade se
resolveu para haver a própria coisa ou o seu valor.

Exemplo de causa superveniente é a ingratidão do donatário, que pode gerar revogação da doação.
Se pode gerar a revogação, há uma causa superveniente, a qual pode destituir a relação jurídica. Se antes
dessa causa superveniente, o donatário aliena o bem que foi a ele doado. Neste caso, em regra, o terceiro
será de boa-fé, ficando perfeita a propriedade. Caberá apenas ao doador ingressar com uma ação contra o
donatário a fim de que este o indenize.

b) Propriedade fiduciária

A propriedade fiduciária é uma propriedade baseada na confiança (fidúcia). Aqui há uma


propriedade resolúvel.

O art. 1.361 vai considerar fiduciária a propriedade resolúvel de coisa móvel infungível que o devedor
tenha, com escopo de garantia, transferido ao credor.

Basicamente, na propriedade fiduciária há este movimento: Pedro devedor compra da


concessionária um carro. Para tanto, Pedro vai ao banco e pede 50 mil reais, comprando o bem da
concessionária. No entanto, a concessionária transfere a Pedro que transfere a propriedade ao banco. O
dono do carro, em verdade, é o banco. Essa transferência de Pedro ao banco é como forma de garantia de
que irá pagar o empréstimo. Quando terminar de pagar as prestações, aquele bem passa a ser de Pedro.
Portanto a propriedade do banco é resolúvel.

A Lei 9.514/97 vai regular a alienação fiduciária em garantia de bens imóveis. O art. 22 da Lei vai dizer
que a alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com
o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa
imóvel.

VI. Formas de aquisição da propriedade imóvel

Existem formas originárias de aquisição de propriedade e formas derivadas.

• Formas originárias: basicamente há acessões e a usucapião. Acessões são ilhas, aluvião, avulsão,
álveo abandonado, plantações, construções. A outra é a usucapião.

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• Formas derivadas: o registro imobiliário é uma forma e a sucessão hereditária (saisine).

a) Formas originárias de aquisição da propriedade imóvel

O que há aqui é uma propriedade que inicia do zero, entre a pessoa e a coisa, nenhum vício anterior
subsiste.

Agora veremos as acessões naturais e das acessões artificiais.

i. Acessões naturais

O art. 1.248 diz que as acessões constituem um modo de aquisição originário da propriedade, através
do qual passa a pertencer ao proprietário tudo aquilo que foi incorporado natural ou artificial na sua
propriedade.

São acessões naturais a formação de ilhas, aluvião, avulsão ou abandono de álveo.

São acessões artificiais as plantações ou construções.

→ Formação de ilhas:

A ilha é uma faixa de terra que é cercada por água em todos os lados. Importante é perceber que há
um acúmulo paulatino de areia, cascalho, materiais que vão sendo levados pela correnteza até que ultrapasse
o limite da água.

Pode acontecer também de haver o rebaixamento da água, descobrindo uma parte de terra.

O que interessa no direito civil apenas as ilhas formadas em rios não navegáveis, ou seja, particulares,
pois, do contrário, será ilhas públicas.

O código vai dizer que no caso das ilhas particulares, elas irão pertencer aos proprietários ribeirinhos
que fazem fronteiras ali (fronteiros).

As regras são simples:

• as ilhas que se formarem no meio do rio: consideram-se acréscimos sobrevindos aos terrenos
ribeirinhos fronteiros de ambas as margens, na proporção de suas testadas, até a linha que dividir
o álveo em duas partes iguais;
• as ilhas que se formarem entre a referida linha e uma das margens: consideram-se acréscimos
aos terrenos ribeirinhos fronteiros desse mesmo lado;

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• as ilhas que se formarem pelo desdobramento de um novo braço do rio continuam a pertencer
aos proprietários dos terrenos à custa dos quais se constituíram: se a ilha é produto de um
braço do rio que abriu sobre o terreno de alguém, a ilha será deste.

→ Aluvião

Aluvião é a forma de aquisição da propriedade imóvel em que os acréscimos formados, sucessiva e


imperceptivelmente, por depósitos e aterros naturais ao longo das margens das correntes, ou pelo desvio
das águas destas, pertencem aos donos dos terrenos marginais, sem indenização.

É um processo lento.

O terreno aluvial, que se formar em frente de prédios de proprietários diferentes, dividir-se-á entre
eles, na proporção da testada de cada um sobre a antiga margem.

Perceba-se que há dois tipos de aluvião:

• Aluvião própria: é o acréscimo natural que vai sendo levado pelas águas do rio, até que surja
uma terra.
• Aluvião imprópria: se dá quando as águas se afastam, formando um terreno descoberto e
acréscimo de terra.

→ Avulsão

Segundo o art. 1.251, a avulsão se dá quando, por força natural violenta, uma porção de terra se
destacar de um prédio e se juntar a outro, o dono deste adquirirá a propriedade do acréscimo, se indenizar
o dono do primeiro ou, sem indenização, se, em 1 ano, ninguém houver reclamado.

O parágrafo único vai dizer que, recusando-se ao pagamento de indenização, o dono do prédio a que
se juntou a porção de terra deverá aquiescer a que se remova a parte acrescida.

→ Álveo abandonado

Álveo é a superfície que as águas cobrem, sem transbordar para o solo natural.

Álveo abandona é a parte que secou do rio. É o rio que seca, que desaparece.

Conforme o art. 1.252, o álveo abandonado de corrente pertence aos proprietários ribeirinhos das
duas margens, sem que tenham indenização os donos dos terrenos por onde as águas abrirem novo curso,
entendendo-se que os prédios marginais se estendem até o meio do álveo.

ii. Acessões artificiais


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O art. 1.253 vai dizer que toda construção ou plantação existente em um terreno presume-se feita
pelo proprietário e à sua custa, até que se prove o contrário.

Existem 6 regras específicas em relação ao tema (arts. 1.254 – 1.259):

• Quem semeia, planta ou edifica em terreno próprio com sementes, plantas ou materiais
alheios, adquire a propriedade destes materiais, sementes ou plantas, porém fica obrigado a
pagar o valor desses materiais, além de responder por perdas e danos, se agiu de má-fé. Ex.: se
o sujeito havia deixado sementes na fazenda do vizinho, mas no outro dia o vizinho havia
plantado todas as sementes na área dele, agiu de má-fé, devendo pagar indenização por perdas
e danos.

• Quem semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as


sementes, plantas e construções. Se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização. Se a
construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-
fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo (exceção ao princípio da gravitação
jurídica), mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo. É o
que a doutrina chama de acessão inversa ou invertida.

• Se de ambas as partes houve má-fé, o proprietário adquirirá as sementes, plantas e


construções, devendo ressarcir o valor das acessões. Aqui, o sujeito sabe que está plantando
em terreno que não é seu e o proprietário sabe que alguém está plantando no seu terreno
irregularmente. Em relação ao proprietário, presume-se a má-fé quando o trabalho de
construção, ou lavoura, se fez em sua presença e sem impugnação sua.

• Se a construção, feita parcialmente em solo próprio, invade solo alheio em proporção não
superior à vigésima parte deste, o construtor adquire de boa-fé a propriedade da parte do solo
invadido, se o valor da construção exceder o dessa parte invadida, e responde por indenização
que cubra o valor da área perdida e a desvalorização da área remanescente. Essa indenização
deve corresponder ao valor de 5% do terreno, mas também ao valor da desvalorização da área
remanescente.

• Pagando em 10 vezes as perdas e danos, o construtor de má-fé adquire a propriedade da parte


do solo que invadiu, se em proporção à vigésima parte deste e o valor da construção exceder
consideravelmente o dessa parte e não se puder demolir a porção invasora sem grave prejuízo
para a construção. Aqui é o invasor de má-fé. Isso se não puder ser demolida a parte invasora
sem grave prejuízo à construção como um todo.

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• Se o construtor estiver de boa-fé, e a invasão do solo alheio for superior a 5% (vigésima parte)
deste, adquire a propriedade da parte do solo invadido, e responde por perdas e danos que
abranjam o valor que a invasão acrescer à construção, mais o da área perdida e o da
desvalorização da área remanescente. Por outro lado, estando de má-fé, será obrigado a
demolir o que nele construiu, pagando as perdas e danos apurados, que serão devidos em
dobro.

O STJ decidiu no sentido de que o construtor, proprietário dos materiais, poderá cobrar do
proprietário do solo a indenização devida pela construção, quando não puder havê-la do contratante. Ex:
a Empresa "A" contratou uma construtora (Empresa “C”) para fazer um centro comercial no terreno
pertencente à empresa "B". A empresa "B", mesmo não tendo participado do contrato, poderá ser
responsabilizada subsidiariamente caso a construção seja realizada e a construtora (Empresa “C”) não seja
paga. Aplica-se, ao caso, o parágrafo único do art. 1.257: "O proprietário das sementes, plantas ou materiais
poderá cobrar do proprietário do solo a indenização devida, quando não puder havê-la do plantador ou
construtor (Inf. 593).

ii. Usucapião de bens imóveis

A usucapião é uma forma de aquisição originária da propriedade, em que há a aquisição de um


domínio, ou de outro direito real (como usufruto), se dá através de uma posse prolongada.

As principais características da posse ad usucapionem, que podem gerar a aquisição da propriedade:

• Posse seja exercida com a intenção de dono (animus domini)


• Posse deve ser mansa e pacífica (não pode ter sido contrariado por quem tinha o legítimo
interesse).
• Posse deve ser contínua e duradoura, e, em regra, há um determinado lapso temporal a ser
cumprida. A exceção é o art. 1.243 que admite a soma de posses sucessivas.
• Posse deve ser justa. Posse justa é a posse não violenta, não clandestina e não precária. Os vícios
da violência e clandestinidade podem cessar.
• Posse dever ser de boa-fé e com justo título, em regra (ordinária). A usucapião extraordinária
não depende de boa-fé e justo título.

O art. 1.243 vai dizer que o possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido, acrescentar à sua
posse a dos seus antecessores, contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, com justo título e de boa-
fé.

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O art. 1.244 estabelece que se estende ao possuidor o disposto quanto ao devedor acerca das
causas que obstam, suspendem ou interrompem a prescrição, as quais também se aplicam à usucapião.
Por isso muitos chamam a usucapião de prescrição aquisitiva.

A prescrição poderá ser impedida ou suspensa, bem como ser interrompida. No caso de
impedimento, o prazo prescricional não começa a correr, mas na suspensão o prazo, já iniciado, para de
correr, voltando a correr de onde parou. Na interrupção, o prazo para e volta a correr do início.

São hipóteses de impedimento e suspensão da prescrição:

• Não corre a prescrição entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;


• Não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;
• Não corre a prescrição entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a
tutela ou curatela;
• Não corre a prescrição contra os absolutamente incapazes (menores de 16 anos);
• Não corre a prescrição contra os ausentes do País em serviço público;
• Não corre a prescrição contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de
guerra;
• Não corre a prescrição pendendo condição suspensiva;
• Não corre a prescrição não estando vencido o prazo;
• Não corre a prescrição pendendo ação de evicção.
• Não corre a prescrição antes da respectiva sentença definitiva, quando a ação se originar de
fato que deva ser apurado no juízo criminal;

O art. 201 diz que, suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, esta suspensão só
aproveita aos demais se a obrigação for indivisível.

Com relação à interrupção da prescrição, percebe-se que há condutas do credor ou conduta do


devedor, fazendo com que o prazo se interrompa e retorne ao seu início. A interrupção da prescrição
(usucapião) somente ocorrerá uma única vez, sendo as hipóteses:

• interrompe a prescrição o despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o


interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
• interrompe a prescrição o protesto judicial ou o protesto cambial;
• interrompe a prescrição a apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em
concurso de credores;
• interrompe a prescrição qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

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• interrompe a prescrição qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe
reconhecimento do direito pelo devedor.

A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do
processo para a interromper.

São modalidades de usucapião de bens imóveis:

• Usucapião ordinária
• Usucapião extraordinária
• Usucapião constitucional (especial rural)
• Usucapião constitucional (especial urbana)
• Usucapião especial urbana por abandono do lar
• Usucapião especial urbana coletiva
• Usucapião especial indígena

→ Usucapião ordinária (art. 1.242)

Segundo o art. 1.242, adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e
incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por 10 anos.

Portanto, são requisitos:

• posse contínua e duradoura, mansa e pacífica


• justo título e boa-fé
• lapso temporal de 10 anos.

O parágrafo único reduz esse prazo para de 5 anos, se o imóvel houver sido adquirido,
onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde
que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social
e econômico.

A doutrina faz uma crítica, pois o código exige um duplo requisito para reduzir: i) pagamento
onerosamente e o registro no cartório; ii) nesse período em que estava registrado fez sua moradia e realizou
investimentos de interesse social e econômico.

→ Usucapião extraordinária (art. 1.238)

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Segundo o art. 1.238, aquele que, por 15 anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu
um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé, podendo requerer ao juiz que
assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

O prazo será reduzido para 10 anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia
habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

O sujeito exerce a posse mansa, pacífica, duradoura e contínua pelo prazo de 15 anos, não
dependendo de justo título ou boa-fé. Para reduzir, baste estabelecer a moradia habitual ou realizar obras
ou serviços de caráter produtivo.

→ Usucapião constitucional ou usucapião especial rural (art. 191 da CF)

Segundo o art. 191, aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como
seu, por 5 anos ininterruptos, sem oposição, área de terra, em zona rural, não superior a 50 hectares,
tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a
propriedade.

O art. 191 é reproduzida literalmente pelo art. 1.239 do CC. Não há exigência de justo título e boa-
fé. Nesse caso, o registro será meramente declaratório da propriedade.

É uma usucapião pro labore, gerada pelo trabalho.

O Enunciado 594 diz que é possível adquirir uma propriedade de menor extensão do que ao do
módulo rural estabelecida para a região, por meio da usucapião especial rural.

→ Usucapião constitucional ou usucapião especial urbana ou usucapião pro misero (art. 183 da CF)

O art. 183 vai dizer que, aquele que possuir como sua área urbana de até 250m², por 5 anos,
ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o
domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

O direito ao usucapião especial urbana não é reconhecido ao mesmo possuidor por mais de uma
vez. Essa vedação não se vislumbra da usucapião especial rural.

Destaque-se que o herdeiro legítimo continua de pleno direito à posse de seu sucessor, desde que já
resida no imóvel por ocasião da abertura da sucessão.

As somas das posses somente pode ser mortis causa, não podendo ser inter vivos.

A usucapião especial urbana não exige justo título ou boa-fé.

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→ Usucapião especial urbana por abandono do lar (art. 183 da CF)

A Lei 12.424 incluiu a usucapião especial urbana por abandono do lar no sistema da usucapião
especial urbana.

O art. 1.240-A diz que, aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição,
posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² cuja propriedade dividia com ex-
cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-
lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

O direito da usucapião especial urbana por abandono do lar não é conhecida por mais de uma vez.

Ressalte o entendimento no Enunciado 595 do CJF, estabelecendo que o requisito do abandono do


lar deve ser interpretado na ótica do instituto da usucapião familiar como um abandono voluntário da
posse do imóvel, somada à ausência da tutela da família. Não importa a culpa do fim do casamento ou da
união estável.

→ Usucapião especial urbana coletiva

O art. 10 do Estatuto da Cidade (Lei 10.257) diz que as áreas urbanas com mais de 250m², ocupadas
por população de baixa renda para sua moradia, por 5 anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não
for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas
coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

A usucapião especial coletiva de imóvel urbano é declarada por sentença, a qual servirá de título para
registro no cartório de registro de imóveis.

Na sentença, o juiz atribuirá igual fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da
dimensão do terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os condôminos,
estabelecendo frações ideais diferenciadas.

O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de
seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.

A usucapião especial urbana coletiva estabelece um condomínio especial entre os usucapientes, o


qual será indivisível, não sendo passível de extinção, salvo deliberação favorável tomada por, no mínimo,
2/3 dos condôminos, no caso de execução de urbanização posterior à constituição do condomínio.

As deliberações relativas à administração do condomínio especial serão tomadas por maioria de


votos dos condôminos presentes, obrigando também os demais, discordantes ou ausentes.

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→ Usucapião especial indígena

Está prevista no Estatuto do Índio.

Segundo o art. 33, o índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por 10 anos consecutivos,
trecho de terra inferior a 50 hectares, adquirir-lhe-á a propriedade plena.

Este artigo não se aplica às terras do domínio da União, ocupadas por grupos tribais, às áreas
reservadas de que trata esta Lei, nem às terras de propriedade coletiva de grupo tribal.

→ Observações

Usucapião administrativa

Além das modalidades judiciais, a Lei Minha Casa Minha Vida (Lei 11.977) instituiu a modalidade de
usucapião administrativa, efetivada pelo cartório de registro de imóveis, a fim de que o poder público
legitime a posse, sejam eles públicos ou particulares, a qual será concedida aos moradores cadastrados pelo
poder público, desde que esses não sejam concessionários, foreiros ou proprietários de um outro imóvel
urbano ou rural, e desde que não sejam beneficiários de uma legitimação de posse concedida anteriormente.

O detentor do título de legitimação de posse, depois de 5 anos com esse título, poderá requerer ao
oficial de registro de imóveis que seja convertida a legitimação de posse em registro de propriedade. Nesse
caso, desde que se trate de imóvel particular, pois bem público não haverá essa conversão.

Usucapião extrajudicial

O art. 1.071 do CPC incluiu a usucapião extrajudicial, em que se permite o reconhecimento da


usucapião na esfera extrajudicial, sendo uma faculdade.

Direito das coisas.

iii. Usucapião imobiliária e a questão intertemporal

O art. 2.029 diz que até dois 2 após a entrada em vigor do Novo Código Civil, os prazos estabelecidos
no parágrafo único do art. 1.238 e no parágrafo único do art. 1.242, que tratam da usucapião ordinária e
extraordinária com prazo reduzido em razão da posse trabalho ou moradia, serão acrescidos de 2 anos,
qualquer que seja o tempo transcorrido na vigência do anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916.

A ideia é não pegar o sujeito de surpresa. Ex.: antes o prazo era de 15 anos e após o NCC é de 10
anos. Se já tinha a posse do imóvel por 10 anos antes do CC, não é possível, com a entrada em vigor do novo

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código, dizer que ele já se tornara proprietário. Para isso, caso tivesse 10 anos, teria ele de completar mais 2
anos a fim de consumar a usucapião.

Para os demais casos de usucapião, valerá a regra do art. 2.028, o qual estabelece que serão os da lei
anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver
transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.

Então se antes o prazo era de 20 anos para usucapião, e com a entrada em vigor do código civil já
tivesse passado mais de 10 anos, continua sendo regulado pela lei anterior, caso o prazo tenha sido reduzido
pelo código civil.

Se o prazo de usucapião era de 20 anos, e ainda não tenha passado da metade do prazo, então, com
a entrada do novo código civil, será considerado o novo prazo.

O entendimento majoritário da doutrina e jurisprudência é de que, no caso de redução dos prazos


de prescrição, transcorrido metade ou menos da metade do prazo anterior, o novo prazo será contado a
partir do novo prazo do código civil. A doutrina diz que será considerado o novo prazo contado a partir da
entrada do Código Civil.

b) Formas de aquisição derivada da propriedade

i. Registro público

O registro do título aquisitivo é a principal maneira derivada de aquisição da propriedade imóvel.


É o registro que implica transferência da propriedade.

O art. 108 diz que os contratos constitutivos ou translativos de direitos reais sobre imóveis devem
ser feitos por escritura pública, se o valor do imóvel for superior a 30 salários mínimos. Do contrário, basta
que seja escrita.

A escritura pública não transfere a propriedade. Esta é uma solenidade, ou seja, uma formalidade,
estando no prazo de validade do contrato. Para que o contrato produza efeitos, é preciso que haja o registro
imobiliário, situando-se no plano da eficácia do contrato. É ele que vai gerar a aquisição da propriedade.

O art. 1.245 do CC vai dizer que a propriedade vai se transferir entre vivos através do registro. Ou
seja, é forma derivada de aquisição.

Segundo o art. 1.246, o registro é eficaz desde o momento em que se apresentar o título ao oficial
do registro, e este o prenotar no protocolo. A partir desse momento, o registro é eficaz, ou seja, consagra-se
o princípio da prioridade, tendo ela quem primeiro solicitou o registro ao registrador.

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Se o teor do registro for falso, o interessado poderá requerer que o teor do registro seja retificado
ou anulado (art. 1.247). Cancelado o registro, poderá o proprietário reivindicar o imóvel, independentemente
da boa-fé ou do título do terceiro adquirente.

ii. Sucessão hereditária de bens imóveis

Na sucessão hereditária de bens imóveis, a propriedade se transfere com a morte. É uma forma de
aquisição derivada da propriedade.

O registro é feito apenas para fins de publicidade, visto que a transferência do imóvel se deu com a
morte.

Segundo o art. 1.784, aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos
e testamentários. Este é o princípio da saisine.

VII. Formas de aquisição da propriedade móvel

a) Ocupação e achado do tesouro e estudo da descoberta

→ Ocupação

O art. 1.263 diz que aquele que se assenhorear de coisa sem dono desde logo lhe adquire a
propriedade, não sendo essa ocupação defesa por lei.

A ocupação é uma forma de aquisição originária da propriedade (res nullius – coisa de ninguém).

Pode ser objeto de ocupação inclusive a coisa abandonada por outrem (res derelicta).

→ Achado do tesouro

O art. 1.264, em sua primeira parte, conceitua o tesouro como sendo o depósito antigo de coisas
preciosas, oculto e de cujo dono não haja memória.

Três são as regras que merecem destaque:

• o tesouro será dividido por igual entre o proprietário do prédio e o que achar o tesouro
casualmente, desde que tenha agido de boa-fé.
• o tesouro pertencerá por inteiro ao proprietário do prédio, se for achado por ele, ou em
pesquisa que o proprietário ordenou, ou se quem encontrou o tesouro foi terceiro não
autorizado (agiu de má-fé).
• sendo o tesouro encontrado em terreno aforado, o tesouro será dividido por igual entre o
descobridor e o enfiteuta, ou será deste por inteiro quando ele mesmo seja o descobridor.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

→ Descoberta

Segundo o art. 1.233, quem quer que ache coisa alheia perdida deve restituir a coisa ao dono ou
legítimo possuidor.

A coisa perdida não é coisa sem dono! O dono apenas não está com a coisa porque a perdeu.

Se o descobridor da coisa não conhecer o dono, deverá tomar todas as medidas necessárias para
encontrá-lo. Caso não encontre a coisa, deverá entregar à autoridade competente (delegado de polícia ou
juiz de direito).

A autoridade competente dará conhecimento da descoberta através da imprensa e outros meios de


informação, somente expedindo editais se o seu valor os comportar.

Após 60 dias da divulgação, e ninguém tenha aparecido, a coisa será vendida em hasta pública, serão
deduzidas as despesas da coisa, a recompensa do descobridor (que não pode ser inferior a 5%) e o restante
pertencerá ao município. Se o valor da coisa for diminuto, o município poderá abandonar em favor de quem
a achou.

A recompensa não pode ser inferior a 5%, sendo ela denominado achádego.

O art. 1.235 diz que o descobridor responde pelos prejuízos causados ao proprietário ou possuidor
legítimo, quando tiver procedido com dolo. Não responderá por prejuízos que tenha causado com culpa.

b) Usucapião de bens móveis

É forma originária de aquisição da propriedade.

Há aqui duas formas:

• Usucapião ordinária
• Usucapião extraordinária

→ Usucapião ordinária

Quem possui a coisa móvel como sua, de forma contínua e pacífica, durante 3 anos, desde que tenha
justo título e boa-fé, vai adquirir a propriedade.

→ Usucapião extraordinária

Aqui, se a posse da coisa se prolongar por 5 anos, haverá usucapião, sendo dispensável a boa-fé e o
justo título.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

c) Especificação

A especificação é uma forma derivada de aquisição da propriedade móvel.

Especificar é concentrar uma coisa. Consiste na transformação de uma coisa numa nova espécie,
através do trabalho de alguém (especificador). Tendo o especificador feito o seu trabalho, não é mais possível
o retorno a sua forma anterior.

Ex.: quando há uma escultura em relação a uma pedra. Se a pedra pertencia a alguém, mas tenha
havido a especificação da pedra, por meio da escultura, feita pelo escultor.

São regras da especificação:

• A espécie nova (escultura) será de propriedade do especificador, se não for possível o retorno
ao status anterior. Se o dono da pedra era outro, deverá o especificador indenizar o dono da
coisa anterior. Mas o produto da especificação passa a ser do especificador.

• Se toda a matéria for alheia, e não se puder retornar à forma anterior, e o especificador tiver
agido de boa-fé, a espécie nova será dele.

• Se for possível a redução ao estado anterior, ou quando for impraticável, mas a espécie nova se
foi obtida de má-fé, pertencerá ao dono da matéria-prima. O art. 1.271 diz que o especificador
de má-fé não tem direito sequer a indenização pelo trabalho.

• Em qualquer caso, inclusive o da pintura em relação à tela, da escultura, escritura e outro


qualquer trabalho gráfico em relação à matéria-prima, a espécie nova será do especificador, se
o seu valor exceder consideravelmente o da matéria-prima.

A regra é a de que a coisa especificada pertence ao especificador. Excepciona no caso de má-fé, em


que a coisa retornará ao dono da matéria-prima, sem direito à indenização ao especificador.

Ainda que o especificador tenha agido de má-fé, se a coisa especificada tiver valor consideravelmente
superior ao valor da matéria-prima, continuará a coisa como dele.

d) Confusão, comistão e adjunção

Essas três categorias são formas derivadas de aquisição da propriedade móvel.

Coisas pertencentes a coisas diversas e a pessoas diferentes se mistura, e de forma que é impossível
o retorno ao status anterior, ou seja, é impossível separá-las.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Confusão há mistura de coisas líquidas ou mesmo entre gases. Ex.: mistura de álcool com vinho;
álcool com gasolina. Neste caso, não dá mais para separar.
• Comistão é a mistura de coisas sólidas e secas, não sendo mais possível separar. Ex.: mistura de
areia com cimento.
• Adjunção é a justaposição, ou seja, é a sobreposição de uma coisa sobre a outra coisa, não tendo
mais como separar. Ex.: tinta na parede não dá mais para separar.

São regras fundamentais:

• Se a coisa pertencer a diversos donos, e sendo elas confundidas, misturadas ou adjuntadas sem
o consentimento deles, continuam pertencendo a esses donos diversos, desde que seja possível
separá-las sem deterioração.

• Não sendo possível a separação das coisas, ou exigindo dispêndio excessivo, vai se manter como
indivisível o todo, cabendo a cada um dos donos quinhão proporcional ao valor da coisa com
que entrou para a mistura ou agregado. Se uma das coisas puder considerar-se principal, será o
dono do principal o dono do todo, indenizando os demais.

• Se a confusão, comistão ou adjunção se operou de má-fé, à outra parte caberá escolher entre
adquirir a propriedade do todo, pagando o que não for seu, abatida a indenização que lhe for
devida, ou renunciar ao que lhe pertencer, caso em que será indenizado. Essa decisão entre
comprar o que falta ou vender o que tem será tomada pelo condômino de boa-fé, e o de má-fé
fica sujeita à decisão do condômino de boa-fé.

• Se da união de matérias de natureza diversa se formar espécie nova, à confusão, comissão ou


adjunção aplicam-se as normas da especificação.

O Código fala em comissão, mas a doutrina aponta que o correto seria comistão.

e) Tradição

A tradição é a entrega da coisa ao adquirente. É uma transferência da propriedade móvel ou ao


menos a posse.

O art. 1.267 diz que a propriedade das coisas não se transfere pelos negócios jurídicos antes da
tradição. Portanto, para transferir a propriedade, é necessário haver a tradição do bem móvel.

A tradição pode ser real, simbólica, ficta, etc.

• Tradição real: é a efetiva entrega da coisa a quem adquiriu a coisa.

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• Tradição ficta: o parágrafo único afirma que há tradição quando o transmitente continua a
possuir pelo constituto possessório. Ex.: Samer era o dono, mas vendeu a coisa para João, e em
seguida pediu para que a coisa fosse alugada para ele. João aceitou alugar a coisa a Samer,
continuando com a coisa consigo, sendo possuidor. Não houve a entrega efetiva, mas houve uma
tradição ficta, pelo constituto possessório. Também haverá tradição ficta quando o adquirente
já está na posse da coisa, por ocasião do negócio jurídico, passando a ser o dono da coisa. A isso
se dá o nome de traditio brevi manu.
• Tradição simbólica: por outro lado, quando o adquirente cede o direito à restituição da coisa,
que se encontra em poder de terceiro, há uma tradição simbólica, sendo denominada de traditio
longa manus.

O art. 1.268 trata da alienação a non domino, ou seja, alienação por quem não era o dono. Nessas
situações, a tradição não implicará transferência da propriedade, exceto se a coisa oferecida ao público, em
leilão ou estabelecimento comercial, for transferida em circunstâncias tais que, ao adquirente de boa-fé,
como a qualquer pessoa, poderia crer que o alienante se afiguraria dono da coisa.

Se o adquirente estiver de boa-fé e o alienante adquirir depois a propriedade, considera-se realizada


a transferência desde o momento em que ocorreu a tradição.

O §2º diz que não transfere a propriedade a tradição, quando tiver por título um negócio jurídico
nulo.

f) Sucessão hereditária de bens móveis

É a aplicação do princípio da saisine, que se dá com a abertura da sucessão.

VIII. Perda da propriedade imóvel e móvel

O art. 1.275 elenca outras hipóteses de perda da propriedade:

• perda da propriedade por alienação;


• perda da propriedade pela renúncia;
• perda da propriedade por abandono;
• perda da propriedade por perecimento da coisa;
• perda da propriedade por desapropriação.

O art. 1.276 diz que o imóvel urbano que o proprietário abandonar, com a intenção de não mais o
conservar em seu patrimônio, e que se não encontrar na posse de outra pessoa, poderá ser arrecadado,

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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como bem vago, e passados, 3 anos depois, à propriedade do Município ou à do Distrito Federal, se se
achar nas respectivas circunscrições.

O imóvel rural, todavia, que tenha sido abandonado nas mesmas circunstâncias, poderá ser
arrecadado, como bem vago, e passar, 3 anos depois, à propriedade da União, onde quer que ele se localize.

O §2º cria uma presunção, muito criticada pela doutrina, afirmando que se presume de modo
absoluto a intenção, quando, cessados os atos de posse, deixar o proprietário de satisfazer os ônus fiscais.
A jurisprudência também tempera e modera essa aplicação do §2º.

4. Direito de vizinhança

I. Conceito

O direito de vizinhança são limitações impostas para que exista uma boa convivência social.

Paulo Lôbo diz que os direitos de vizinhança são um conjunto de normas de convivência entre
titulares de direito de propriedade ou pelo menos de posse de imóveis que estejam próximo uns aos outros.

As normas relativas aos direitos de vizinhança são claras limitações ao exercício da propriedade,
existindo pelo simples fato de uma propriedade ser vizinha de outra propriedade.

Essas obrigações estão na coisa, perseguindo a coisa. Ou seja, são obrigações propter rem,
ambulatoriais.

II. Uso anormal da propriedade

O problema da vizinhança ocorre quando há um uso anormal da propriedade.

O art. 1.277 vai dizer que o proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar
as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam o prédio, provocadas
pela utilização de propriedade vizinha.

Veja, para cessar interferências prejudiciais à SEGURANÇA, ao SOSSEGO e à SAÚDE, o direito tem
esse direito.

Aqui, como visto, veda-se o abuso do direito.

O parágrafo único do art. 1.277 diz que são proibidas as interferências externas, considerando-se a
natureza da utilização, a localização do prédio. Além disso, é necessário que sejam atendidas as normas
que distribuem as edificações em zonas, e os limites ordinários de tolerância dos moradores da vizinhança.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Para verificar se há abuso ao direito de propriedade, é preciso verificar os limites ordinários comuns
de tolerância dos moradores de vizinhança.

O art. 1.278 estabelece que o direito de alegar o uso anormal da propriedade não prevalece quando
as interferências forem justificadas por interesse público. Nesse caso, o proprietário ou o possuidor vizinho,
causador delas, pagará ao vizinho indenização cabal. Atente-se que não haverá ilicitude, e sim o uso normal
da propriedade.

Exemplo disso ocorre com a chamada passagem de rede elétrica pelo seu terreno, visto que o terreno
do vizinho tem direito a ter rede elétrica.

Pode ainda o vizinho exigir a sua redução, ou eliminação, quando esta redução ou eliminação se
tornarem possíveis.

O proprietário ou o possuidor tem direito a exigir do dono do prédio vizinho a demolição, ou a


reparação do prédio, quando o prédio estiver ameaçado de ruína, bem como poderá exigir que seja
prestada caução pelo perigo de dano iminente.

O proprietário ou o possuidor de um prédio, em que alguém tenha direito de fazer obras, pode, no
caso de dano iminente, exigir do autor delas as necessárias garantias contra o prejuízo eventual.

São possíveis várias demandas judiciais fundadas no exercício anormal da propriedade, como ação
de obrigação de fazer, de não fazer, ação de reparar o dano, ação demolitória, ação de nunciação de obra
nova, visando embargar a obra (rito comum) e ainda a ação de dano infecto, exigindo do vizinho que preste
uma caução, já que há riscos de iminente dano.

III. Árvores limítrofes

O art. 1.282 diz que a árvore limítrofe é aquela cujo tronco esteja na linha divisória, caso em que será
presumida de forma relativa de que a árvore pertence em comum aos donos dos prédios confinantes. Há
uma presunção de condomínio.

As raízes e os ramos de árvore, que ultrapassarem a estrema do prédio, poderão ser cortados (raiz
ou galhos), até o plano vertical divisório, pelo proprietário do terreno invadido (Art. 1.283). O direito de
fazer a poda não pode comprometer a vida da árvore, já que a propriedade também deve observar a sua
função socioambiental.

O art. 1.284 diz que os frutos caídos de árvore do terreno vizinho pertencem ao dono do solo onde
caíram, se este for de propriedade particular.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

IV. Passagem forçada e da passagem de cabos e tubulações

a) Passagem forçada

O art. 1.285 afirma que o dono do prédio que não tiver acesso à via pública, nascente ou a porte,
poderá, mediante pagamento de indenização, constranger o vizinho para que ele dê passagem. E esse rumo,
se não for feito amigavelmente, será judicialmente fixado.

O imóvel que não tem acesso é o imóvel encravado. O imóvel que cede o acesso é o imóvel serviente.

Será constrangido o vizinho que tenha o imóvel que mais natural e facilmente se preste a esta
passagem, conforme o §1º do art. 1.285.

Se ocorrer a alienação parcial do imóvel serviente, ou seja, uma delas também perde acesso à via
pública e à nascente, o proprietário da outra parte também deverá tolerar essa passagem. O acesso à via é a
única forma de o imóvel efetivamente cumprir sua função social.

Não confundir passagem forçada com servidão, em especial com a chamada servidão de passagem.

• passagem forçada: é um instituto de direito de vizinhança, sendo obrigatória. Aqui há o


pagamento de uma indenização, já que se está constrangendo o imóvel vizinho.
• servidão de passagem: é um direito real de gozo, de fruição, não sendo obrigatória, mas
facultativa. Essa indenização só será cabível se houver acordo entre os proprietários dos imóveis
envolvidos.

b) Cabos e tubulações

Além da imposição da passagem forçada, o código trata de forma semelhante com a passagem de
cabos e tubulações.

O art. 1.286 diz que, mediante recebimento de indenização que atenda, também, à desvalorização
da área remanescente, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem através de seu imóvel, de cabos,
tubulações e outros condutos subterrâneos de serviços de utilidade pública, em proveito de proprietários
vizinhos, quando de outro modo for impossível ou excessivamente onerosa.

Aqui é a ideia de função social da propriedade somado ao interesse público indireto.

O proprietário prejudicado pode exigir que a instalação seja feita de modo menos gravoso ao prédio
onerado, bem como, depois, seja removida, à sua custa, para outro local do imóvel.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Se as instalações oferecerem grave risco, será facultado ao proprietário do prédio onerado exigir a
realização de obras de segurança.

V. Águas

O art. 1.288 diz que o dono ou possuidor do prédio inferior é obrigado a receber as águas que correm
naturalmente do superior, não podendo realizar obras que embaracem o seu fluxo. A condição natural e
anterior do prédio inferior não pode ser agravada por obras feitas pelo dono ou possuidor do prédio
superior. Até porque a passagem do prédio superior ao inferior deve se dar da forma menos gravosa possível.

Em relação aos escoamentos artificiais da água, de um prédio superior ao inferior, poderá o


proprietário do prédio inferior reclamar que se desvie ou que seja indenizado pelos prejuízos que
experimentar. Dessa indenização será deduzido o benefício que recebeu.

Isto é, se esse desaguar artificial deve exigir que se desvie ou exigir que seja ressarcido pelo prejuízo
sofrido, mas também deve haver a compensação dos benefícios que aufere em razão disso.

O art. 1.290 diz que o proprietário de nascente, ou do solo onde caem águas pluviais, satisfeitas as
necessidades de seu consumo, não pode impedir, e nem desviar o curso natural das águas remanescentes
pelos prédios inferiores.

Ou seja, o proprietário do prédio superior não pode impedir que a água, após a necessidade de seu
consumo, continue o seu trajeto e acabe não abastecendo os prédio inferiores.

O art. 1.291 estabelece que o possuidor do imóvel superior não poderá poluir as águas
indispensáveis às primeiras necessidades da vida dos possuidores dos imóveis inferiores. As demais, que
não se mostrem indispensáveis, se poluir, deverá recuperá-las, ressarcindo os danos que estes sofrerem, se
não for possível a recuperação ou o desvio do curso artificial das águas.

O proprietário tem direito de construir barragens, açudes, ou outras obras para represamento de
água em seu prédio. Se as águas represadas invadirem prédio alheio, será o seu proprietário indenizado
pelo dano sofrido, deduzido o valor do benefício obtido (art. 1.292).

O art. 1.293 prevê algumas regras importantes:

• É permitido a quem quer que seja, mediante prévia indenização aos proprietários prejudicados,
construir canais, através de prédios alheios, para receber as águas a que tenha direito,
indispensáveis às primeiras necessidades da vida, e, desde que não cause prejuízo considerável
à agricultura e à indústria, bem como para o escoamento de águas supérfluas ou acumuladas,
ou a drenagem de terrenos.

392
“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Ao proprietário prejudicado nesse caso, também assiste direito a ressarcimento pelos danos que
experimentou ou de que, no futuro, venha a experimentar, em decorrência da infiltração ou
irrupção das águas.

• Ao proprietário prejudicado terá direito à indenização por conta da deterioração das obras
destinadas a canalizar essas águas.

• O proprietário prejudicado poderá exigir que seja subterrânea essa canalização que atravessa
áreas edificadas, pátios, hortas, jardins ou quintais.

• O aqueduto será construído de maneira que cause o menor prejuízo aos proprietários dos
imóveis vizinhos, e a expensas do seu dono, a quem incumbem também as despesas de
conservação.

Com relação ao aqueduto, não haverá o impedimento de que os proprietários cerquem os imóveis e
construam sobre ele, sem prejuízo para a sua segurança e conservação. Além disso, os proprietários dos
imóveis poderão usar das águas do aqueduto para as primeiras necessidades da vida.

Havendo no aqueduto águas supérfluas, outros poderão canalizá-las, mediante pagamento de


indenização aos proprietários prejudicados e ao dono do aqueduto, de importância equivalente às despesas
que então seriam necessárias para a condução das águas até o ponto de derivação.

Têm preferência os proprietários dos imóveis atravessados pelo aqueduto.

Nesse sentido, o STJ decidiu que o proprietário de imóvel tem direito de construir aqueduto no
terreno do seu vizinho, independentemente do consentimento deste, para receber águas provenientes de
outro imóvel, desde que não existam outros meios de passagem de águas para a sua propriedade e haja o
pagamento de prévia indenização ao vizinho prejudicado (Info 591).

VI. Direito de tapagem e limites entre prédios

O art. 1.297 fala do direito de tapagem, que é o direito de tapar.

É o direito que o proprietário tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu
prédio, urbano ou rural.

A norma consagra o direito de constranger o confinante a proceder com ele a demarcação entre os
dois prédios, a aviventar rumos apagados e a renovar marcos destruídos ou arruinados, repartindo-se
proporcionalmente entre os interessados as despesas para essa tapagem.

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Eduardo Defaveri

O § 1o estabelece a existência de um condomínio necessário, entre os proprietários confinantes,


relativamente ao muro que deverão construir. Ou seja, os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisórios,
tais como sebes vivas, cercas de arame ou de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, até prova em
contrário, pertencer a ambos os proprietários confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade com
os costumes da localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construção e conservação.

Atente-se que as sebes vivas, as árvores, ou plantas quaisquer, que servem de marco divisório, só
podem ser cortadas, ou arrancadas, de comum acordo entre proprietários.

O § 3o admite a construção de tapumes especiais para impedir a passagem de animais de pequeno


porte, ou para outro fim. Nesse caso, a construção pode ser exigida de quem provocou a necessidade, pelo
proprietário, que não está obrigado a concorrer para as despesas.

Por fim, sendo confusos os limites entre as propriedades, se não houver outro meio, serão
determinadas conforme a posse justa. Não se achando posse justa provada, o terreno contestado se dividirá
por partes iguais entre os prédios, ou, não sendo possível a divisão cômoda, se adjudicará a um deles,
mediante indenização ao outro.

VII. Direito de construir

O art. 1.299 diz que o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver,
salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.

O art. 1.300 diz que o proprietário construirá de maneira que o seu prédio não despeje águas,
diretamente, sobre o prédio vizinho, pois, do contrário, haveria o uso abusivo da propriedade.

O que ganha relevância é o direito de privacidade entre os vizinhos.

Por isso, é proibido abrir janelas, fazer eirado, terraço ou varanda, a menos de 1.5 m do terreno
vizinho. Na zona rural, não será permitido levantar edificações a menos de 3 metros do terreno vizinho.

Desrespeitando essas regras, o proprietário prejudicado poderá inclusive propor uma ação
demolitória. O prazo decadencial dessa ação demolitória é de até 1 ano e 1 dia da demolição da obra.

O § 1o diz que em relação aos imóveis urbanos, as janelas cuja visão não incida sobre a linha divisória,
bem como as perpendiculares, não poderão ser abertas a menos de 0.75 centímetros.

Existe uma distinção quanto às aberturas de luz ou aberturas de ventilação.

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As vedações de construção de 1.5 m, 3 m ou 0.75 cm não se aplicam quando as aberturas não sejam
maiores do que 0.10 cm de largura, 0.20 cm de cumprimento e estejam construídas a mais de 2 metros de
altura de cada piso.

O art. 1.304 diz que nas cidades, vilas e povoados cuja edificação estiver adstrita a alinhamento, o
dono de um terreno pode nele edificar, madeirando na parede divisória do prédio contíguo, se ela suportar
a nova construção. Nesse caso, o proprietário terá de embolsar ao vizinho metade do valor da parede e do
chão correspondentes explorados. Há o direto de travejamento ou direito de madeiramento, que é o direito
de colocar uma madeira ou viga no prédio vizinho para utilizar da melhor forma possível o prédio.

O direito de travejamento ou madeiramento está previsto também no art. 1.305, o qual estabelece
que o confinante, que primeiro construir o muro, pode assentar a parede divisória até meia espessura no
terreno contíguo, sem perder por isso o direito a haver meio valor dela se o vizinho a travejar, caso em que
o primeiro fixará a largura e a profundidade do alicerce.

Se a parede divisória pertencer a um dos vizinhos, e não tiver capacidade para ser travejada pelo
outro, não poderá o outro fazer um alicerce ao pé dessa parede sem prestar caução, pelo risco a que expõe
a construção anterior.

O condômino da parede-meia pode utilizá-la até ao meio da espessura, não pondo em risco a
segurança ou a separação dos dois prédios, e avisando previamente o outro condômino das obras que ali
tenciona fazer; não pode sem consentimento do outro, fazer, na parede-meia, armários, ou obras
semelhantes, correspondendo a outras, da mesma natureza, já feitas do lado oposto.

O art. 1.307 introduz o direito de alteamento, que serve para deixar o muro mais alto, tendo o direito
de aumentar o muro. Neste caso, o código estabelece que qualquer dos confinantes pode altear a parede
divisória, se necessário reconstruindo-a, para suportar o alteamento, caso em que o dono da obra arcará
com todas as despesas, inclusive de conservação, ou com metade, se o vizinho adquirir meação também na
parte aumentada.

Não é lícito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos ou quaisquer aparelhos ou
depósitos suscetíveis de produzir infiltrações ou interferências prejudiciais ao vizinho.

Não é permitido fazer escavações ou quaisquer obras que tirem ao poço ou à nascente de outrem a
água indispensável às suas necessidades normais.

O CC/02 veda a realização de obras ou de serviços que sejam suscetíveis de provocar


desmoronamento ou deslocamento de terra, ou que comprometa a segurança do prédio vizinho. Só poderão
ser realizadas esse tipo de obra após houver obras acautelatórias (art. 1.311). O proprietário do prédio

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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vizinho tem direito a ressarcimento pelos prejuízos que sofrer, ainda que tenham sido realizadas as obras
acautelatórias.

O art. 1.313 reconhece que o proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o vizinho
entre no prédio (direito de penetração), mediante prévio aviso, em algumas hipóteses, tais como:

• Quando dele temporariamente usar, quando for indispensável à reparação, construção,


reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório;
• Quando for necessário se apoderar de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem
casualmente.

Estas regras se aplicam aos casos de limpeza ou reparação de esgotos, goteiras, aparelhos higiênicos,
poços e nascentes e ao aparo de cerca viva.

Na hipótese de o vizinho se apoderar de coisas suas, uma vez entregues as coisas buscadas pelo
vizinho, poderá ser impedida a sua entrada no imóvel.

Se por conta do direito de penetração provier dano, terá o prejudicado direito a ressarcimento.

5. Condomínio

I. Conceito

Condomínio ocorre quando há o domínio exercido por mais de uma pessoa.

O condomínio pode ser classificado de algumas formas:

Quanto à origem, o condomínio é classificado como:

• Condomínio voluntário ou convencional: um acordo de vontades criou o condomínio.


• Condomínio incidente ou eventual: motivos estranhos à vontade dos condôminos criaram o
condomínio (ex.: herança).
• Condomínio necessário ou legal: é o condomínio imposto pela lei (ex.: muro que divide duas
propriedades).

Quanto ao objeto do condomínio, poderá ser:

• Condomínio universal: compreenderá a totalidade dos bens. É a regra.


• Condomínio particular: compreenderá determinadas coisas ou determinados efeitos. Isso será
possível quando estiver previsto no ato de instituição do condomínio.

Quanto à forma do condomínio:


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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Condomínio pro diviso: determina no plano fático, concreto e corpóreo, quanto é o direito de
propriedade de cada condômino. Ex.: parte autônoma de um condomínio edilício.
• Condomínio pro indiviso: não é possível determinar de modo corpóreo qual é o direito que cada
um dos condôminos têm. Ex.: parte comum do prédio, piscina, churrasqueira, etc.

II. Condomínio voluntário ou convencional

O tratamento do código civil a respeito do condomínio voluntário exclui o condomínio em edificações


(condomínio edilício), o qual terá o tratamento separado.

O art. 1.314 do CC diz que, cada condômino pode usar da coisa conforme sua destinação, e pode
exercer sobre essa coisa exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão, reivindicá-la de terceiro,
defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal, ou gravá-la.

O que não pode é impedir que o outro condômino também se valha ou se utilize da coisa.

Nenhum dos condôminos pode alterar a destinação da coisa comum, nem poderá dar posse, uso ou
gozo dela a estranhos, sem o consenso dos outros.

O condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação


ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita (art. 1.315). Presumem-se iguais as partes ideais
dos condôminos.

Pode o condômino se eximir do pagamento das despesas e dívidas, desde que renuncie à sua parte
ideal (art. 1.316). Se os demais condôminos assumem as despesas e as dívidas, a renúncia lhes aproveita,
adquirindo a parte ideal de quem renunciou, na proporção dos pagamentos que fizerem. Todavia, se não há
condômino que faça os pagamentos, a coisa comum será dividida.

Quando a dívida houver sido contraída por todos os condôminos, sem se discriminar a parte de cada
um na obrigação, nem se estipular solidariedade, entende-se que cada qual se obrigou proporcionalmente
ao seu quinhão na coisa comum (Art. 1.317).

As dívidas contraídas por um dos condôminos em proveito da comunhão, e durante ela, obrigam o
contratante; mas terá este ação regressiva contra os demais.

O art. 1.319 vai dizer que cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa
e pelo dano que lhe causou a essa coisa, sempre descontada a sua fração.

Diz o art. 1.320 que, a todo tempo será lícito ao condômino exigir a divisão da coisa comum,
respondendo o quinhão de cada um pela sua parte nas despesas da divisão.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Se essa divisão não for amigável, é cabível inclusive uma ação de divisão, a qual é imprescritível, pois
a qualquer momento poderá decidir extinguir o condomínio.

Sendo o bem indiviso, caberá a alienação judicial da coisa, dividindo o valor que receber por essa
alienação.

Os condôminos podem acordar que fique indivisa a coisa comum por prazo não maior de 5 anos,
suscetível de prorrogação ulterior.

Atente-se que não poderá exceder de 5 anos a indivisão estabelecida pelo doador ou pelo testador.
Ou seja, não permite a prorrogação.

Se houver o requerimento de qualquer interessado e se graves razões o aconselharem, pode o juiz


determinar a divisão da coisa comum antes do prazo de indivisão.

Se a coisa for indivisível, e os condôminos não quiserem adjudicar a coisa a um só dos condôminos,
e este que adjudicou indenizar os outros, esta coisa deverá ser vendida. Uma vez vendida, será repartido o
apurado, preferindo-se, na venda, em condições iguais de oferta, o condômino ao estranho, e entre os
condôminos aquele que tiver na coisa benfeitorias mais valiosas, e, não as havendo benfeitorias mais
valiosas, o condômino tiver o quinhão maior.

Se nenhum dos condôminos tem benfeitorias na coisa comum e participam todos do condomínio em
partes iguais, realizar-se-á licitação especial entre estranhos.

Antes de adjudicada a coisa àquele que ofereceu maior lanço, a licitação será procedida entre os
condôminos, a fim de que a coisa seja adjudicada a quem afinal oferecer melhor lanço, preferindo, em
condições iguais, o condômino ao estranho.

a) Administração do condomínio

O art. 1.323 dispõe sobre a administração da coisa comum, de forma que o administrador possa ser
um condômino ou estranho ao condomínio.

Em relação à administração e às decisões do condomínio, será calculado a maioria com base nos
quinhões de cada condômino, as quais têm força vinculativa e são tomadas por maioria absoluta. Não sendo
possível alcançar maioria absoluta, decidirá o juiz, a requerimento de qualquer condômino, ouvidos os
outros.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Deliberando a maioria sobre a administração da coisa comum, escolherá o administrador, que poderá
ser estranho ao condomínio; resolvendo alugá-la, preferir-se-á, em condições iguais, o condômino ao que
não o é.

Os frutos da coisa comum, não havendo em contrário estipulação ou disposição de última vontade,
serão partilhados na proporção dos quinhões.

II. Condomínio necessário

As situações típicas de condomínio necessário são as de direito de vizinhança.

O proprietário tem direito de estremar o imóvel com parede, muro, cerca ou vala, tendo o mesmo
direito de adquirir a meação da parede, muro, cerca ou vala que o vizinho já fez, embolsando-lhe metade do
que atualmente valer a obra e o terreno por ela ocupado.

IV. Condomínio edilício

Segundo o art. 1.331, é possível que haja condomínio em edificações duas modalidades de partes:

• Partes exclusivas: áreas autônomas, como residências, escritórios, salas etc. dentro do prédio.
Essas partes podem ser alienadas, gravadas livremente pelo seu proprietário, não havendo
direito de preferência dessas áreas exclusivas dentro do condomínio edilício.
• Partes comuns: são partes de propriedade comum do condomínio, como o solo, estrutura do
prédio, telhado, rede de distribuição de água, esgoto, acesso até a rua, etc. Isto não pode ser
alienado separadamente, pois cada fração ideal contém uma parte comum.

A jurisprudência é pacífica de que não há relação jurídica consumerista entre condômino e


condomínio.

Para a estruturação do condomínio edilício, são essenciais dois atos:

• Instituição do condomínio edilício


• Constituição do condomínio edilício

O art. 1.332 diz que a instituição do condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento,
registrado no Cartório de Registro de Imóveis.

Da instituição de condomínio devem constar:

• discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das


outras e das partes comuns;

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes


comuns;
• finalidade para que as unidades se destinam.

Em relação à convenção de condomínio, que constitui o estatuto coletivo que regula os interesses
dos condôminos, o art. 1.333 vai dizer que deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, 2/3 das frações
ideais e torna-se, desde logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos
sobre elas tenham posse ou detenção.

Para ela ser obrigatória perante terceiros (erga omnes) deverá ser registrada no cartório de registro
de imóveis.

A convenção é regida pela força obrigatória da convenção (pacta sunt servanda), mas esta convenção
encontra limitações em preceitos sociais e normas de ordem pública.

A convenção de condomínio deve determinar basicamente o que está previsto no art. 1.334:

• determinará a quota proporcional e o modo de pagamento das contribuições dos condôminos


para atender às despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio;
• determinará sua forma de administração;
• determinará a competência das assembleias, forma de sua convocação e quórum exigido para
as deliberações;
• determinará as sanções a que estão sujeitos os condôminos, ou possuidores;
• determinará o regimento interno.

A convenção poderá ser feita por escritura pública ou por instrumento particular.

A natureza jurídica do condomínio é de ente despersonalizado, tendo personalidade judiciária,


podendo ir a juízo.

Flávio Tartuce defende que deve ser pessoa jurídica.

Direito das coisas.

a) Direitos e deveres dos condôminos

Segundo o art. 1.335, são direitos do condômino:

• usar, fruir e livremente dispor das suas unidades;


• usar das partes comuns, conforme a sua destinação, desde que não exclua a utilização dos
demais compossuidores;
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• votar nas deliberações da assembleia e delas participar, desde que esteja quite com as
obrigações do condomínio.

O art. 1.336 diz que são deveres do condômino:

• contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição
em contrário na convenção;
• não realizar obras que comprometam a segurança da edificação;
• não alterar a forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas;
• dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira
prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.

b) Penalidades a que está sujeito o condômino

O §1º do art. 1.336 diz que o condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros
moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de 1% ao mês e multa de até 2% sobre o débito.

Essa norma é de ordem pública.

O §2o diz que 2/3 dos condôminos podem deliberar pela imposição de uma multa no montante de
até 5 vezes o valor do condomínio para o condômino que tenha realizado uma obra que comprometeu a
segurança da edificação ou que tenha alterado a forma ou a cor da fachada, ou que tenha dado uma
destinação diferente à sua fração ideal, ou ainda que tenha utilizado a sua parte de forma indevida.

Esse dispositivo diz que se o condômino não observar os seus deveres, 2/3 dos condôminos poderão
impor uma multa cujo valor pode chegar a 5 vezes o valor da cota condominial, além das perdas e danos que
se apurarem.

É uma forma de punir aquele que não observa seus deveres.

Segundo o art. 1337, o condômino, ou possuidor, que não cumprir reiteradamente com os seus
deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de 3/4 dos condôminos restantes, ser constrangido
a pagar multa de até ao 5 vezes do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais,
independentemente das perdas e danos que se apurem.

O parágrafo único afirma que o condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento
antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser
constrangido a pagar multa correspondente ao 10 vezes do condomínio, até ulterior deliberação da
assembleia.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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A jurisprudência é no sentido de que, a depender da incompatibilidade, poderia ser o indivíduo ser


expulso do condomínio. Tartuce discorda.

Lembrando que toda e qualquer punição deverá ser precedida de ampla defesa e contraditório,
havendo uma incidência da eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Segundo o STJ, o condômino não pode, sem a anuência de todos os condôminos, alterar a cor das
esquadrias externas de seu apartamento para padrão distinto do empregado no restante da fachada do
edifício, ainda que a modificação esteja posicionada em recuo, não acarrete prejuízo direto ao valor dos
demais imóveis e não possa ser vista do térreo, mas apenas de andares correspondentes de prédios vizinhos.

O STJ também já entendeu que, ainda que, na vigência do CC/1916, tenha sido estipulado, na
convenção original de condomínio, ser irrevogável e irretratável cláusula que prevê a divisão das despesas
do condomínio em partes iguais, admite-se ulterior alteração da forma de rateio, mediante aprovação de
2/3 dos votos dos condôminos, para que as expensas sejam suportadas na proporção das frações ideais.

Também decidiu que, em assembleia condominial, o condômino proprietário de diversas unidades


autônomas, ainda que inadimplente em relação a uma ou algumas destas, terá direito de participação e de
voto relativamente às suas unidades que estejam em dia com as taxas do condomínio.

O condômino que tenha sido demandado pelo condomínio em ação de cobrança deve participar do
rateio das despesas do litígio contra si proposto.

c) Direito de preferência. Alienação de partes acessórias e comuns

O art. 1.338 estabelece que, resolvendo o condômino alugar área no abrigo para veículos, vai ter
preferência, em condições iguais, qualquer dos condôminos a estranhos, e entre todos os possuidores.

O que há aqui é a garantia do direito de preferência que há entre os condôminos.

É preciso que haja na convenção do condomínio autorização expressa para que a vaga de garagem
possa ser alegada para um terceiro. Isso porque o art. 1.331 faz essa exigência.

O art. 1.339 diz que os direitos de cada condômino às partes comuns são inseparáveis de sua
propriedade exclusiva. Veja, é vedado alienar o uso da parte da exclusiva sem alienar a parte comum.

São também inseparáveis das frações ideais correspondentes as unidades imobiliárias, com as suas
partes acessórias. Ou seja, é permitido alienar a parte acessória da sua unidade mobiliária. Ex.: vaga de
garagem.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Para alienar a garagem para um terceiro, fora do condomínio, é preciso autorização da convenção e
inexistência de contrariedade pela assembleia geral.

É permitido ao condômino alienar parte acessória de sua unidade imobiliária (ex.: garagem) a outro
condômino, só podendo fazê-lo a terceiro se essa faculdade constar do ato constitutivo do condomínio, e se
a ela não se opuser a respectiva assembleia geral.

d) Despesas condominiais

As despesas condominiais são obrigações propter rem. Isto quer dizer que o adquirente responderá
pelos débitos de quem alienou a unidade, inclusive com multas e com juros, conforme o art. 1.345.

O STJ inclusive entendeu que, havendo um compromisso de compra e venda, ainda que não levado
a registro, há essa responsabilidade com as despesas de condomínio, as quais recairão sobre o promitente
comprador. Todavia, caso o condomínio não tinha notícias da venda, recairão também sobre o promitente
vendedor.

Se ficar provado que o condomínio sabia da venda, aí o promitente vendedor não irá responder,
mesmo que pelas dívidas do promitente vendedor, pois a obrigação é ambulatorial (propter rem).

O art. 1.346 diz que é obrigatório o seguro de toda a edificação contra o risco de incêndio ou
destruição, total ou parcial. Trata-se de uma norma de ordem pública.

e) Administração do condomínio edilício

A administração do condomínio é feita por pessoas e órgão relacionadas ao condomínio:

• Síndico
• Assembleia
• Conselho fiscal

O conselho fiscal é facultativo.

i. Síndico

O síndico é o administrador geral do condomínio, podendo ou não ser um condômino. O prazo para
a administração do síndico não poderá ser superior a 2 anos, mas poderá ser reeleito.

Segundo o art. 1.348, compete ao síndico:

• convocar a assembleia dos condôminos;

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• representar, ativa e passivamente, o condomínio, praticando, em juízo ou fora dele, os atos


necessários à defesa dos interesses comuns;
• dar imediato conhecimento à assembleia da existência de procedimento judicial ou
administrativo, de interesse do condomínio;
• cumprir e fazer cumprir a convenção, o regimento interno e as determinações da assembleia;
• diligenciar a conservação e a guarda das partes comuns e zelar pela prestação dos serviços que
interessem aos possuidores;
• elaborar o orçamento da receita e da despesa relativa a cada ano;
• cobrar dos condôminos as suas contribuições, bem como impor e cobrar as multas devidas;
• prestar contas à assembleia, anualmente e quando exigidas;
• realizar o seguro da edificação.

Eventualmente, a assembleia investir outra pessoa, em lugar do síndico, em poderes de


representação. O síndico pode transferir a outrem, total ou parcialmente, os poderes de representação ou
as funções administrativas, mediante aprovação da assembleia, salvo disposição em contrário da convenção.

Em casos excepcionais, o síndico poderá ser destituído pela assembleia, com voto da maioria
absoluta, desde que tenha praticado irregularidades, não prestado contas, ou não administrado
convenientemente o condomínio.

ii. Assembleia

Existe uma assembleia geral ordinária e assembleia geral extraordinária.

• assembleia geral ordinária: é convocada pelo síndico anualmente, a qual irá aprovar o
orçamento, a prestação de contas e eleger outro síndico ou alteração do regimento interno. Se
o síndico não convocar a assembleia, 1/4 dos condôminos poderá fazer a convocação. Se a
assembleia não se reunir, o juiz decidirá, a requerimento de qualquer condômino.
• assembleia geral extraordinária: pode ser convocada para tratar de temas relevantes ou de
temas urgentes, podendo ser convocada pelo síndico ou por 1/4 dos condôminos.

Segundo o STJ, a alteração de regimento interno de condomínio edilício depende de votação com
observância do quórum estipulado na convenção condominial. Com a Lei 10.931/2004, foi ampliada a
autonomia privada dos condôminos, os quais passaram a ter maior liberdade para definir o número mínimo
de votos necessários para a alteração do regimento interno.

Em relação ao quórum das votações, são regras:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Alteração da convenção: depende da aprovação de 2/3 dos votos dos condôminos a alteração
da convenção;
• Mudança da destinação do edifício ou da unidade imobiliária (deixar de ser residencial para
ser comercial): depende da aprovação pela unanimidade dos condôminos.
• Realização de obras no condomínio:
o Obras voluptuárias: depende de aprovação de 2/3 dos condôminos;
o Obras úteis: voto da maioria dos condôminos.
o Obras necessárias: não precisa de autorização, pois é para manter o funcionamento e
condições do condomínio. Síndico ou qualquer condômino realiza.
o Construção de outro pavimento ou outro edifício com novas unidades: depende da
aprovação da unanimidade dos condôminos.

A respeito das deliberações, salvo quando houver quórum especial, as deliberações da assembleia
serão tomadas, em 1ª convocação, por maioria de votos dos condôminos presentes que representem pelo
menos metade das frações ideais.

Em 2ª convocação, a assembleia poderá deliberar por maioria dos presentes, salvo quando exigido
quórum especial.

iii. Conselho fiscal

O conselho fiscal pode ser criado ou não. É um órgão consultivo financeiro, composto por 3 membros,
dando parecer às contas do síndico. Os membros serão eleitos pelo prazo não superior a dois anos.

f) Extinção do condomínio edilício

A extinção do condomínio pode se dar quando:

• Edificação for total ou consideravelmente destruída;


• Edificação ameaçar ruína, e os condôminos deliberarem pela demolição
• Desapropriação do imóvel, passando a pertencer ao poder público.

Se for deliberada a reconstrução, poderá o condômino eximir-se do pagamento das despesas


respectivas, alienando os seus direitos a outros condôminos, mediante avaliação judicial.

Se for realizada a venda, em que se preferirá, em condições iguais de oferta, o condômino ao


estranho, será repartido o apurado entre os condôminos, proporcionalmente ao valor das suas unidades
imobiliárias.

Havendo desapropriação, a indenização será repartida na proporção das unidades imobiliárias.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

6. Direito real de aquisição do promitente comprador

Para se estar diante de um direito real, é preciso que o compromisso de compra e venda do imóvel
esteja registrado na matrícula do imóvel, pois senão só haverá efeitos inter partes.

Neste caso, a coisa deverá ser entregue pelo promitente vendedor. Caso não entregue, caberá ação
de adjudicação compulsória, seja em face do promitente vendedor ou de terceiros, pois, caso esteja em
nome de terceiro, não poderá alegar boa-fé.

Segundo o STJ, o promitente comprador, amparado em compromisso de compra e venda de imóvel


cujo preço já tenha sido integralmente pago, tem o direito de requerer judicialmente, a qualquer tempo, a
adjudicação compulsória do imóvel.

O art. 1.417 diz que, mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou
arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de
Imóveis, o promitente comprador adquire direito real à aquisição do imóvel.

Se houver inadimplemento do compromissário comprador, o promitente vendedor poderá pleitear


uma ação de rescisão contratual cumulada com reintegração de posse.

Mas antes da propositura, ainda que haja data da vencimento, a lei exige que o credor interpele o
devedor, seja judicial ou extrajudicialmente, a fim de constituir o devedor em mora (mora ex persona).

Atente-se que, ainda que se tenha cláusula constitutiva expressa, exige-se que haja a interpelação
para constituir em mora e em seguida propor a ação de rescisão contratual cumulada com reintegração de
posse.

Vencida e não paga a prestação, o contrato será considerado rescindido se 30 dias após ser
constituído em mora o devedor, ele não ter purgado a mora.

Pode ser que quem desista seja o próprio compromissário comprador, e isto configuraria
inadimplemento, já que não é possível desistir do negócio que não tenha cláusula de arrependimento no
contrato de compra e venda registrado, que gera direito real de aquisição.

Nesse caso, o STJ traz a súmula 543, estabelecendo que, na hipótese de resolução de contrato de
promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a
imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa
exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu
causa ao desfazimento.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O STJ entende que é nula cláusula contratual que prevê a perda de todas as parcelas pagas pelo
promissário comprador.

Tartuce chama atenção à súmula 308 do STJ, a qual diz que a hipoteca firmada entre a construtora e
o agente financeiro, seja anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, essa hipoteca
não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel.

Como decorrência da súmula, a jurisprudência do STJ admite que a ação proposta pelo promissário
comprador seja proposta em face do agente financeiro e do promitente vendedor em litisconsórcio
necessário para a outorga da inscrição definitiva e liberação da hipoteca.

7. Direitos reais de gozo ou fruição

I. Introdução

Os direitos reais de gozo ou fruição são situações reais, em que há uma divisão dos atributos da
propriedade: gozar, reaver, usar e dispor.

Aqui haverá uma transmissão de atribuir a uma outra pessoa o direito de gozar e fruir da coisa.

São direitos reais de gozo ou fruição:

• Superfície
• Servidão
• Usufruto
• Uso
• Habitação
• Concessão de direito real de uso
• Concessão de uso especial para fins de moradia

II. Superfície

A superfície é um direito real autônomo, podendo ser gratuita ou onerosa, temporária ou vitalícia.

Superfície é um instituto real pelo qual o proprietário concede a uma outra pessoa, por um tempo
determinado ou indeterminado, onerosa ou gratuitamente, o direito de construir ou de plantar em seu
terreno. Esse direito recai sempre sobre bens imóveis, através de escritura pública que é registrada.

Na superfície há de um lado o proprietário (fundieiro), que é quem cede o uso do bem, e do outro
há o superficiário, que é quem recebe o imóvel, que irá gozar e usar o imóvel.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 1.369 diz que o direito de superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se for inerente ao
objeto da concessão. Tartuce diz que essa norma é de ordem privada, podendo pactuar de forma distinta.

A propriedade superficiária pode ser autonomamente objeto de direitos reais, seja de gozo ou de
garantia. Mas quem tem a propriedade superficiária pode colocar a propriedade em forma de garantia, desde
que o prazo não exceda a duração do prazo da concessão da superfície.

É possível hipotecar o direito do superficiário, mas somente pelo prazo de concessão da superfície.

É possível adquirir por usucapião o direito de superfície, apesar de extremamente raro.

Admite-se a constituição do direito de superfície por cisão.

Se a superfície for concedida onerosamente, pagando um valor para se tornar superficiário, esta
remuneração, que pode ser parcelada ou de uma só vez, é chamada de solarium ou canon superficiário.

Solarium é a remuneração paga pelo superficiário quando a superfície foi concedida de forma
onerosa.

O superficiário deve responder pelos encargos e tributos que incidem sobre o bem, conforme art.
1.371.

Pode haver ainda haver a transferência da superfície para terceiros, inclusive para os herdeiros, caso
o superficiário venha a morrer. Não poderá ser estipulado pelo concedente, a nenhum título, qualquer
pagamento pela transferência.

Se ocorrer a alienação do imóvel ou do direito de superfície, o superficiário ou o proprietário tem


direito de preferência, em igualdade de condições.

O Enunciado 510 do CJF diz que ao superficiário que não tenha sido previamente notificado pelo
proprietário para exercer o seu direito de preferência, é assegurado para que, no prazo de 6 meses, contados
do registro da alienação, adjudicar para si o bem, mediante o depósito do preço.

Esta mesma ideia vale para o fundieiro se for vendido o direito de superfície, tendo o prazo de 6
meses para adjudicar para si.

Existem correntes em sentido diverso, que discordem desse enunciado. Mas adotá-lo para a prova é
o ideal.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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A superfície poderá se extinguir antes do termo final previsto no contrato. Isso, se o superficiário der
ao terreno uma destinação diversa da pactuada, daquela que motivou a concessão do direito de superfície
(art. 1.374).

Com a extinção da superfície, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o terreno,
construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o
contrário.

Ex.: Sujeito tinha um terreno e cedeu a uma empresa que construiu o shopping. Essa superfície tinha
o prazo de 20 anos. Após esse período, tudo aquilo que estava em cima do terreno passa a ser do proprietário,
inclusive o shopping.

Atente-se a diferença sobre a superfície do Código Civil e a superfície do Estatuto da Cidade.

• Superfície do Código Civil: poderá recair sobre imóvel urbano ou rural. Além disso, poderá ter
exploração para construções ou plantações. Em regra, não existe autorização para utilização do
subsolo ou do espaço aéreo. Aqui, há uma cessão que se dá por prazo determinado, como regra.

• Superfície prevista no Estatuto da Cidade: poderá recair sobre imóvel urbano. Não traz restrição
sobre exploração para construções ou plantações, podendo ser qualquer utilização compatível
com a política urbana. Não proíbe a utilização para o subsolo ou espaço aéreo, sendo possível
que o superficiário se valha do subsolo ou do espaço aéreo. Aqui, a cessão poderá ser por prazo
determinado ou indeterminado, a depender do contrato.

No caso de extinção do direito de superfície em consequência de desapropriação, a indenização cabe


ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um.

III. Servidões

Por meio da servidão, um prédio proporciona a utilidade para outro prédio, sendo este último
gravado. O prédio, que é do domínio de outra pessoa, serve outro prédio.

Segundo o art. 1.378, a servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio
serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante declaração expressa dos proprietários, ou
por testamento, e subsequente registro no Cartório de Registro de Imóveis.

O direito real de gozo ou de fruição se constitui mediante declaração expressa dos proprietários
dos prédios, ou também pode se dar por testamento, devendo este contrato ser levado a registro no CRI.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A servidão não se presume, tendo uma origem clara, sendo este um negócio jurídico inter vivos
(contrato) ou negócio mortis causa (testamento), ou ainda usucapião.

O art. 1.379 diz que o exercício incontestado e contínuo de uma servidão aparente, por 10 anos,
autoriza o interessado a registrá-la em seu nome no Registro de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença
que julgar consumado a usucapião. Aqui haveria usucapião ordinária da servidão, pois o sujeito teria justo
título e boa-fé.

Por outro lado, se o possuidor não tiver título, o prazo da usucapião será de 20 anos. Aqui haveria
uma usucapião extraordinária da servidão.

Há uma crítica da doutrina estabelecendo que, se em 15 anos o sujeito já adquire a propriedade por
meio da usucapião extraordinária da propriedade, não faria sentido adquirir a servidão em 20 anos. Mas é
isto que diz a lei.

A servidão ainda pode ser constituída por uma destinação do proprietário, o qual poderá reservar
determinada serventia de um prédio seu em favor de um outro prédio que também é seu. Se, no futuro, os
dois imóveis passarem a ser de donos distintos, de proprietários diversos, o que era serventia, passa a ser
servidão.

Além disso, servidão poderá ser instituída por meio de sentença judicial, no caso de reconhecimento
de servidão que está sendo discutido.

Em síntese, são formas de constituição da servidão:

• Declaração expressa do proprietário


• Testamento
• Destinação do proprietário
• Sentença judicial

Não se pode esquecer que a servidão não se confunde com passagem forçada.

• Servidão de passagem: é um direito real de gozo, de fruição, não sendo obrigatória, mas
facultativa. Essa indenização só será cabível se houver acordo entre os proprietários dos imóveis
envolvidos.
• Passagem forçada: é um instituto de direito de vizinhança, sendo obrigatória. Aqui há o
pagamento de uma indenização, já que se está constrangendo o imóvel vizinho.

A passagem forçada é também denominada de servidão legal, enquanto a servidão é voluntária.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

a) Classificação das servidões

Quanto à natureza dos prédios envolvidos:

• Servidão rústica: quando os prédios estão em zona rural.


• Servidão urbana: quando os prédios estão em área urbana.

Em relação à conduta das partes:

• Servidão positiva: exercida por meio de um ato positivo, comissivo. Ex.: servidão de passagem é
um fazer.
• Servidão negativa: exercida por meio de um ato negativo, omissivo. Ex.: servidão de não
construir é um não fazer.

Quanto ao modo de exercício:

• Servidão contínua: a servidão independe do ato humano. Ex.: servidão de passagem de água.
• Servidão descontínua: precisa de uma atuação humana, como é a servidão de passagem de
pessoas.

Quanto à forma de exteriorização:

• Servidão aparente: a servidão aparece, sendo evidenciada no plano concreto e fático. Ex.: na
servidão de passagem, é possível ver pessoas caminhando.
• Servidão não aparente: servidão que não é revelada no plano exterior, fático ou concreto. Ex.:
servidão de não construir.

b) Obras na servidão

O art. 1.380 diz que o dono de uma servidão pode fazer todas as obras necessárias à sua
conservação e ao seu uso, e, se a servidão pertencer a mais de um prédio, serão as despesas rateadas entre
os respectivos donos.

Essas obras devem ser feitas pelo dono do prédio dominante, se o contrário não dispuser
expressamente o título.

O art. 1.384 vai dizer que a servidão pode ser removida, de um local para outro, podendo ser feita:

• pelo dono do prédio serviente à sua custa, desde que não diminua as vantagens do prédio
dominante;

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Eduardo Defaveri

• pelo dono do prédio dominante à sua custa, se houver considerável incremento para sua
utilidade e não prejudicar o prédio serviente.

c) Finalidade da servidão

A servidão é regida pelo princípio da menor onerosidade ao imóvel serviente.

O art. 1.385 estabelece que a servidão se restringe às necessidades do prédio dominante, evitando-
se agravar o encargo ao prédio serviente.

Por isso, constituída para um certo fim a servidão, não poderá ela se ampliar para outro fim. Ex.:
servidão para passagem de gado não poderá ser ampliada para cultura agrícola.

Nas servidões de trânsito, a servidão maior inclui a servidão de menor ônus, e a servidão menor exclui
a servidão mais onerosa. Ex.: Se a servidão é de passagem de carro, inclui a passagem de pessoas, pois esta
é menos onerosa do que aquela. Mas se a servidão é para passagem de pessoas, não incluirá a passagem de
carro, que é mais onerosa.

Se as necessidades da cultura, ou da indústria, do prédio dominante impuserem àquela servidão uma


maior largueza, ou seja, se mostrando necessárias, o dono do serviente é obrigado a sofrer essa maior
largueza. Nesse caso, deverá ser indenizado pelo excesso.

d) Indivisibilidade da servidão

O exercício da servidão é regido pelo princípio da indivisibilidade. Conforme o art. 1.386, as


servidões prediais são indivisíveis, e subsistem, no caso de divisão dos imóveis, em benefício de cada uma
das porções do prédio dominante, e continuam a gravar cada uma das do prédio serviente, salvo se, por
natureza, ou destino, só se aplicarem a certa parte de um ou de outro.

e) Extinção das servidões

Salvo nas desapropriações, a servidão vai se extinguir apenas em relação a terceiras pessoas quando
houver o cancelamento do registro no Registro de Imóveis, pois é necessário observar a publicidade.

Se o prédio dominante estiver hipotecado, e a servidão se mencionar no título hipotecário, será


também preciso, para a cancelar, o consentimento do credor.

O dono do prédio serviente tem direito ao cancelamento da servidão quando:

• o dono do prédio serviente houver renunciado a sua servidão. Portanto, a servidão poderá se
extinguir pela renúncia do seu titular

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• tiver cessado a utilidade ou a comodidade da servidão para o prédio dominante


• dono do prédio serviente resgatar a servidão

Resgate da servidão é uma escritura pública, escrita tanto pelo proprietário do prédio dominante
quanto pelo proprietário do prédio serviente, em que se constata o preço da liberação do ônus real que recai
sobre o prédio serviente, em que se declara a sua quitação e que há a previsão de autorização para que se
proceda o cancelamento do assento da servidão.

O art. 1.389 ainda diz que também se extingue a servidão, ficando ao dono do prédio serviente a
faculdade de fazê-la cancelar, mediante a prova da extinção:

• pela reunião dos dois prédios no domínio da mesma pessoa (confusão real);
• pela supressão das respectivas obras por efeito de contrato, ou de outro título expresso;
• pelo não uso, durante 10 anos contínuos.

IV. Usufruto

O usufruto é o direito real de gozo ou fruição por excelência.

De um lado há o usufrutuário, que tem o direito de usar e fruir a coisa, tendo o domínio útil da coisa,
do outro lado, há o nu proprietário, que tem o direito de reaver e dispor da coisa.

O art. 1.390 diz que o usufruto pode recair em um ou mais bens, móveis ou imóveis, ou em um
patrimônio inteiro, ou parte deste, abrangendo-lhe, no todo ou em parte, os frutos e utilidades.

O usufruto de bens imóveis vai ser constituído através de registro no Cartório de Registro de Imóveis,
quando não resultar de usucapião. Veja, é possível o usufruto por meio da usucapião, apesar de raro.

a) Classificação do usufruto

O usufruto vai admitir as seguintes classificações:

• Usufruto legal: quando decorre da lei. Não precisa ser registrado nesse caso. Ex.: usufruto do pai
em relação ao bem do filho menor.
• Usufruto voluntário: é feito pela convenção das partes. Pode ter origem em testamento ou em
contrato. Ex.: doação de um bem pelo pai ao filho, mas reserva o usufruto para si.
• Usufruto misto: é o que decorre da usucapião, pois há o efeito da lei e o efeito da vontade do
usucapiente.

Havendo justo título e boa-fé, o prazo para a usucapião de usufruto é de 10 anos. Se não houver, o
prazo é de 15 anos, sendo uma usucapião extraordinária do usufruto.

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Quanto ao objeto que recai, o usufruto poderá ser:

• Usufruto próprio: recai sobre bens infungíveis e inconsumíveis. Ao final do usufruto, o


usufrutuário vai restituir o bem ao nu proprietário.
• Usufruto impróprio: recai sobre bens fungíveis ou consumíveis. O usufrutuário se torna
proprietário da coisa. Ao final do usufruto, irá restituir o equivalente, já que a coisa era
consumível. Se o equivalente não existir, será restituído em dinheiro.

Em relação à duração:

• Usufruto temporário: há um certo prazo de duração estabelecido. Sendo pessoa jurídica, o prazo
máximo do usufruto é de 30 anos.
• Usufruto vitalício: há usufruto enquanto o usufrutuário viver. Caso seja para uma pessoa natural,
e não existindo prazo para o término, o usufruto é vitalício. A morte do nu proprietário não é
causa de extinção do usufruto, e sim a morte do usufrutuário. Os herdeiros do nu proprietário
continuarão com a propriedade limitada (direito de reaver e de dispor), mas o usufruto
continuará com o usufrutuário.

O art. 1.393 diz que não se pode transferir o usufruto por alienação. O que pode fazer é ceder o
exercício do usufruto, seja a título gratuito ou oneroso.

Não poderá vender o usufruto, mas ceder o bem, objeto de usufruto, em comodato ou locação, ou
seja, gratuito ou onerosamente.

Sendo inalienável o direito real de usufruto, há que se considerar que o usufruto também é
impenhorável, mas não se confundirá a impossibilidade de se penhorar o usufruto, com a possibilidade de
se penhorar os frutos que decorrem o usufruto.

Veja, não pode penhorar o direito de usufruir, mas o produto desse seu direito pode ser penhorado.
Ex.: João deve a Samer 100 mil reais. Não há nenhuma propriedade em seu nome, mas o sujeito é
usufrutuário de uma propriedade que está alugada a um banco, que paga a ele o aluguel de 10 mil reais por
mês. Nesse caso, Samer não poderá penhorar o direito de usufruto, mas poderá penhorar o produto do
usufruto.

b) Direitos do usufrutuário

O usufrutuário tem direito de posse, uso, administração e percepção dos frutos.

Ainda, o usufrutuário tem direito aos frutos naturais pendentes ao iniciar o usufruto, sem encargo
de pagar as despesas de produção.

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Todavia, ao tempo que se cessar o usufruto, os frutos que estiverem pendentes também pertencerão
ao nu proprietário, sem compensação das despesas.

O usufrutuário poderá usufruir do prédio, mas não poderá mudar a sua destinação econômica, sem
que o nu proprietário expressamente o autorize.

Quando o usufruto recai em títulos de crédito, o usufrutuário tem direito a perceber os frutos e a
cobrar as respectivas dívidas. Cobradas as dívidas, o usufrutuário aplicará, de imediato, a importância em
títulos da mesma natureza, ou em títulos da dívida pública federal, com cláusula de atualização monetária
segundo índices oficiais regularmente estabelecidos.

Segundo o art. 1.397, as crias dos animais pertencem ao usufrutuário, deduzidas quantas bastem
para inteirar as cabeças de gado existentes ao começar o usufruto.

Os frutos civis, vencidos na data inicial do usufruto, pertencem ao proprietário, e ao usufrutuário os


vencidos na data em que cessa o usufruto.

c) Deveres do usufrutuário

Antes de receber o usufruto, o usufrutuário deverá inventariar os bens que está recebendo, dizendo
qual o estado que está recebendo os bens, e prestará uma caução, real ou fidejussória, mas só prestará se
for exigida pelo dono da coisa.

Não é obrigado à caução o doador que se reservar o usufruto da coisa doada.

O usufrutuário que não quiser ou não puder prestar a caução, perderá o direito de administrar o
objeto do usufruto, caso em que a administração ficará a cargo do proprietário, sendo que este ficará
obrigado a entregar ao usufrutuário o rendimento do bem, deduzidas as despesas da administração e a sua
remuneração na condição de administrador.

O usufrutuário ainda não é obrigado a pagar deteriorações do uso regular do usufruto.

Terá de indenizar, caso haja culpa de sua parte, havendo responsabilidade subjetiva do usufrutuário.

Incumbe ao usufrutuário as despesas ordinárias para conservação do bem.

Ao nu proprietário vai incumbir a reparação extraordinária da coisa. Além disso, deverão assumir as
reparações ordinárias não módicas, ou seja, quando a despesa for superior a 2/3 do rendimento líquido
daquele ano.

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Se a coisa, objeto de usufruto, for desapropriada, a indenização ficará sub-rogada no ônus do


usufruto, no lugar do prédio. Ex.: João é nu proprietário de uma propriedade. Pedro é usufrutuário. Estado
desapropria e indeniza João no valor de 1 milhão. Pedro continuará usufruindo do produto, ou seja, desse
valor da indenização, ainda que João seja o nu proprietário apenas do valor, e não mais do imóvel.

d) Extinção do usufruto

O usufruto se extinguirá, havendo o cancelamento do registro no Cartório de Registro de Imóveis:

• pela renúncia
• pela morte do usufrutuário;
• pelo termo de sua duração;
• pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou pelo decurso
de 30 anos da data em que se começou a exercer;
• pela cessação do motivo de que se origina (ex.: filhou virou maior de idade, cessando para o pai);
• pela destruição da coisa;
• pela consolidação (usufrutuário passa a ser o proprietário da coisa);
• por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo
com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às
importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art. 1.395;
• pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e 1.399).

O art. 1.411 vai dizer que, constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas (usufruto
simultâneo ou em conjunto), irá se extinguir a parte em relação a cada uma das que falecerem, salvo se
houver uma estipulação expressa sobre o direito de acrescer, estabelecendo que o quinhão desses couber
ao sobrevivente. Em regra, a morte do usufrutuário implica fim de 50% do usufruto.

É necessária disposição expressa do direito de acrescer.

V. Uso

Uso é o direito de usar. O direito real de uso pode ser constituído de forma gratuita ou onerosa,
havendo apenas o atributo de usar a coisa.

De um lado há o usuário e do outro há o proprietário.

Há um direito personalíssimo de uso.

Veja, o usuário só pode usar, não podendo fruir, ou seja, não poderá ceder.

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O art. 1.412 diz que o usuário apenas usará a coisa e perceberá os seus frutos, quanto o exigirem as
necessidades suas e de sua família.

Serão avaliadas as necessidades pessoais do usuário conforme a sua condição social e o lugar onde
viver. Atente-se que as necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos
solteiros e das pessoas de seu serviço doméstico.

O art. 1.413 estabelece que são aplicáveis ao uso, no que não for contrário à sua natureza, as
disposições relativas ao usufruto.

VI. Habitação

Aqui o sujeito só poderá habitar o bem.

O direito real de habitação é o mais restritos dos direitos reais de fruição. Isso porque só será cedida
uma parte de um atributo da propriedade.

De um lado há o proprietário e do outro é o habitante.

Esse direito real pode ser legal ou convencional.

O caráter gratuito da habitação é claro, conforme o art. 1.414, o qual estabelece que, quando o uso
consistir no direito de habitar gratuitamente casa alheia, o titular deste direito não a pode alugar, nem
emprestar, mas simplesmente ocupá-la com sua família.

Há um caráter personalíssimo ao direito real de habitação, não sendo viável que o habitante institua
um benefício semelhante em favor de terceiro.

É proibido o direito real de habitação de 2º grau, sem que conceda em parte o quarto para que outra
pessoa tenha o direito real de habitação, eis que o caráter da habitação é personalíssimo.

Se houver um direito real de habitação simultâneo, qualquer uma das partes pode habitar, podendo
haver uma convivência compulsória.

Se só uma delas habitar a casa sozinha, a outra não tem direito de receber aluguel de sua parte, pois
somente tem direito de habitar, e não de fruir da coisa.

São aplicáveis à habitação, no que não for contrário à sua natureza, as disposições relativas ao
usufruto.

VII. Concessões especiais para uso e moradia

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Esses direitos reais se referem a áreas públicas, normalmente invadidas e tomadas por favelas, a fim
de regularizar juridicamente essa situação.

A concessão real de uso está prevista nos arts. 7º e 8º do DL 271/67, atualizado pela Lei 11.481/07.

Segundo o art. 7o, é instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou particulares remunerada
ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como direito real resolúvel, para fins específicos de
regularização fundiária de interesse social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra,
aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de
subsistência ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas.

Na concessão de uso de terrenos públicos ou particulares, será um direito real para regularização
fundiária, em virtude do interesse social.

A concessão do direito de uso para fins de moradia consta da MP 2.220/01, que continua em vigor.

O art. 1º afirma que, aquele que praticou como seu, por 5 anos ininterruptamente, e sem oposição,
de até 250m² de um imóvel urbano, utilizando o imóvel por sua moradia, vai ter direito a concessão de uso
especial para fins de moradia, desde que não seja proprietário ou concessionário, seja urbano ou rural.

Há a consagração de um direito para fingir moradia.

8. Direitos reais de garantia

I. Introdução

Existem direito reais de garantia sobre coisa própria (alienação fiduciária) e direitos reais de garantia
sobre coisa alheia, que é o tema com que iniciamos.

As características básicas dos direito reais de garantia sobre coisa própria são (P-I-S-E):

• Preferência: o credor hipotecário e o pignoratício têm preferência no pagamento em relação aos


outros credores, já que tem aquele bem reservado como uma garantia para seu pagamento.
• Indivisibilidade: o pagamento de uma prestação não importa exoneração parcial da garantia,
ainda que essa garantia compreenda vários bens. Via de regra, a garantia é indivisível. Ex.: se
João deu em garantia um bem imóvel, e pagou 50% de sua dívida, o bem imóvel continua
garantindo a dívida em sua inteireza.
• Sequela: se um bem é garantido e esse bem é vendido, o direito real de garantia permanece,
acompanhando o bem, esteja ele sob a titularidade de qualquer pessoa.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Excussão: o credor, hipotecário ou pignoratício, tem direito de excutir a coisa hipotecada ou


empenhada. Isso quer dizer que o credor pode ingressar com ação de execução para promover
a alienação judicial da coisa garantida.

O credor anticrético não tem esse direito de excussão, pois tem apenas o direito de reter o bem
enquanto a dívida não for paga, podendo extrair o fruto para pagamento do bem. Na hipoteca e penhor há
essa possibilidade do direito de excussão. O direito de reter a coisa do credor anticrético vai se extinguir após
15 anos a data da constituição da anticrese. É a perempção da anticrese.

Atente-se que é nula cláusula que autoriza credor hipotecário, pignoratício ou anticrético a fica com
o bem, objeto da garantia. É a nulidade do pacto comissório real.

Somente aquele que pode alienar o bem é quem pode empenhá-lo, hipotecá-lo ou dar em anticrese.
Isso porque só pode se dar em garantia aquilo que se tem.

Somente os bens que podem ser alienados é quem podem ser dados em penhor, hipoteca ou
anticrese, havendo dois requisitos para tanto:

• Requisito subjetivo:
O requisito subjetivo é que o sujeito seja proprietário e, sendo casado, necessária a outorga
conjugal).
O §1º do art. 1.420 diz que a propriedade superveniente torna eficaz, desde o registro, as
garantias reais estabelecidas por quem não era dono. Ou seja, o requisito subjetivo é o fato de
ser dono para poder dar o bem para penhor, hipoteca ou anticrese. Se não era dono, mas se
tornou no meio do caminho, será reputada válida a garantia.
O §2º diz que a coisa comum, que é a que tem dois ou mais proprietários, não pode ser dada em
garantia real em sua totalidade sem o consentimento de todos os condôminos. Todavia, um
proprietário, que seja coproprietário, poderá dar individualmente dar em garantia real a parte
que tiver.

• Requisito objetivo:
O bem deve ser alienável, pois, do contrário, não poderá ser dado em penhor, hipoteca ou
anticrese.

São requisitos do contrato que constitui o penhor, anticrese ou hipoteca, sob pena de não terem
eficácia:

• Estar previsto o valor do crédito, sua estimação, ou valor máximo


• Estar previsto o prazo fixado para pagamento

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• Estar previsto a taxa dos juros, se houver


• Estar previsto o bem dado em garantia com as suas especificações

A dívida será considerada vencida quando:

• O bem dado em garantia se deteriorar ou se depreciar, e o devedor, intimado, não a reforçar


ou substituir;
• Quando o devedor cair em insolvência ou falir;
• Quando não pagas pontualmente as prestações, toda vez que deste modo se achar estipulado
o pagamento. Neste caso, o recebimento posterior da prestação atrasada importa renúncia do
credor ao seu direito de execução imediata;
• Quando houver o perecimento do bem dado em garantia, e não for substituído;
• Quando for desapropriado o bem dado em garantia, situação em que será depositado o preço
que for necessária para o pagamento integral do credor.

Nos casos de perecimento do bem dado em garantia, haverá sub-rogação na indenização do seguro,
ou no ressarcimento do dano, em benefício do credor, a quem assistirá sobre ela preferência até seu
completo reembolso.

É possível que terceiro preste garantia real por dívida alheia, mas não ficará obrigado substituí-la, ou
reforçá-la, quando, sem culpa sua, se perca, deteriore, ou desvalorize (art. 1.427).

Quando, excutido o penhor, ou executada a hipoteca, o produto não bastar para pagamento da
dívida e despesas judiciais, continuará o devedor obrigado pessoalmente pelo restante.

II. Penhor

O penhor é um direito real de garantia sobre coisa alheia.

a) Constituição do penhor

O penhora é constituído, em regra, sobre bens móveis, podendo ser constituído sob bens de acessão
intelectual. Ocorre também, em regra, a transferência da posse de bem. A exceção está no penhor rural,
industrial, mercantil e de veículos, a coisa empenhada continuam na posse do devedor.

As partes do penhor são:

• Credor pignoratício: pode ser o devedor da obrigação ou o terceiro.


• Devedor pignoratício: é o devedor da obrigação.

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A instituição do penhor pode ser instituída pelo penhor, seja público ou privado. Esse instrumento
deve ser levado a registro no cartório de títulos e documentos.

O registro é elemento essencial para que o penhor tenha eficácia real e erga omnes. Se não for levado
a registro, o negócio tomará uma feição contratual, gerando apenas efeito inter partes, motivo pelo qual se
mostra essencial o registro para constituir o direito real de garantia sobre coisa alheia.

b) Direitos do credor pignoratício

O credor pignoratício terá, via de regra:

• direito à posse da coisa empenhada;


• direito à retenção da coisa, até que o indenizem das despesas devidamente justificadas, que
tiver feito, não sendo ocasionadas por culpa sua;
• direito ao ressarcimento do prejuízo que houver sofrido por vício da coisa empenhada;
• direito a promover a execução judicial, ou a venda amigável, se lhe permitir expressamente o
contrato, ou lhe autorizar o devedor mediante procuração;
• direito a apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu poder;
• direito a promover a venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, sempre que haja
receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore, devendo o preço ser
depositado. O dono da coisa empenhada pode impedir a venda antecipada, substituindo-a, ou
oferecendo outra garantia real idônea.

O credor não pode ser constrangido a devolver a coisa empenhada, ou uma parte dela, antes de ser
integralmente pago, podendo o juiz, a requerimento do proprietário, determinar que seja vendida apenas
uma das coisas, ou parte da coisa empenhada, suficiente para o pagamento do credor.

c) Deveres do credor pignoratício

Segundo o art. 1.435, o credor pignoratício é obrigado:

• tem o dever de custodiar a coisa, como depositário, e a ressarcir ao dono a perda ou


deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na dívida, até a concorrente quantia,
a importância da responsabilidade;
• tem o dever de defender a posse da coisa empenhada e a dar ciência, ao dono dela, das
circunstâncias que tornarem necessário o exercício de ação possessória;
• tem o dever de imputar o valor dos frutos, de que se apropriar (art. 1.433, inciso V) nas despesas
de guarda e conservação, nos juros e no capital da obrigação garantida, sucessivamente;

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• tem o dever de restituir o bem empenhado, com os respectivos frutos e acessões, uma vez paga
a dívida;
• tem o dever de entregar o que sobeje do preço, quando a dívida for paga.

d) Modalidades de penhor

São várias as modalidades de penhor:

• Penhor legal
• Penhor convencional

i. Penhor legal

Penhora legal é o penhor que decorre da lei, sendo os credores pignoratícios:

• Hospedeiros e fornecedores de alimentos sobre as bagagens, móveis, joias, dinheiro de seus


fregueses, que tiveram consigo, pelas despesas que tiverem ocasionado no hotel ou no
restaurante.
• Dono do prédio locado (locador) é credor pignoratício sobre os bens móveis que o inquilino tiver
guarnecendo no local, pelo valor dos aluguéis, condomínio, etc.
Poderão fazer o penhor antes mesmo de buscar a autoridade judicial, desde que seja
demonstrada a urgência e que a demora se mostra perigosa. Após, irá requerer que o juiz
proceda à homologação judicial do penhor realizado.
• Artista e do técnico de espetáculo: o art. 31 da Lei 6.533 consagra o penhor legal em favor do
artista e do técnico de espetáculo, os quais terão penhor legal sobre o equipamento e todo o
material de propriedade do empregador, utilizado na realização de programa, espetáculo ou
produção, pelo valor das obrigações não cumpridas pelo empregador.

ii. Penhor convencional

O penhor convencional decorre da vontade das partes.

No penhor convencional comum é uma forma ordinária de penhor, cujo objeto é um bem móvel
com a transmissão da posse ao credor. Ex.: joia na Caixa Econômica Federal.

Por outro lado, o penhor convencional pode assumir um caráter especial. Portanto, há penhor
convencional especial:

• Penhor rural (agrícola e pecuário)


• Penhor industrial e mercantil

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• Penhor de títulos de crédito

→ Penhor rural

O penhor rural é especial, pois se constitui sobre imóveis. Há o registro do penhor no Cartório de
Registro de Imóveis da circunscrição em que estiverem situadas as coisas empenhadas, realizado por meio
de instrumento público ou particular.

O devedor emite, em favor do credor, cédula rural pignoratícia. Sendo uma cédula, significa que
haverá garantia.

O penhor é especial também em virtude de que não há entrega do bem ao credor. O bem continua
na posse do devedor.

Existem duas modalidades de penhor rural:

• Penhor agrícola
• Penhor pecuário

O penhor agrícola e o penhor pecuário não podem ser convencionados por prazos superiores aos
das obrigações garantidas. Embora vencidos os prazos, permanece a garantia, enquanto subsistirem os bens
que a constituem.

A prorrogação do penhor deve ser averbada à margem do registro respectivo, mediante


requerimento do credor e do devedor.

Se o prédio estiver hipotecado, o penhor rural poderá constituir-se independentemente da anuência


do credor hipotecário, mas não lhe prejudica o direito de preferência, nem restringe a extensão da hipoteca,
ao ser executada. O art. 1.441 diz que tem o credor direito a verificar o estado das coisas empenhadas,
inspecionando-as onde se acharem, por si ou por pessoa que credenciar.

Penhor agrícola

No penhor agrícola poderá ter como objeto de penhor:

• máquinas e instrumentos de agricultura;


• colheitas pendentes, ou em via de formação;
• frutos acondicionados ou armazenados;
• lenha cortada e carvão vegetal;
• animais do serviço ordinário de estabelecimento agrícola.

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Esse bens são imóveis por acessão física industrial ou por acessão física intelectual, ou seja, uma
decisão do dono.

Consoante o art. 1.443, o penhor agrícola que recai sobre colheita pendente, ou em via de
formação, abrange a imediatamente seguinte, no caso de frustrar-se ou ser insuficiente a que se deu em
garantia.

Se o credor não financiar a nova safra, poderá o devedor constituir com outrem novo penhor, em
quantia máxima equivalente à do primeiro. O segundo penhor terá preferência sobre o primeiro, abrangendo
este apenas o excesso apurado na colheita seguinte.

Penhor pecuário

Segundo o art. 1.444, podem ser objeto de penhor os animais que integram a atividade pastoril,
agrícola ou de lacticínios.

Esses animais serão considerados imóveis por acessão intelectual.

O devedor pignoratício não poderá alienar os animais empenhados sem prévio consentimento, por
escrito, do credor.

Quando o devedor pretender alienar o gado empenhado ou, por negligência, ameace prejudicar o
credor, poderá este requerer se depositem os animais sob a guarda de terceiro, ou exigir que se lhe pague
a dívida de imediato.

Os animais da mesma espécie, comprados para substituir os mortos, ficam sub-rogados no penhor.

Presume-se a substituição, mas não terá eficácia contra terceiros, se não constar de menção adicional
ao respectivo contrato, a qual deverá ser averbada.

→ Penhor industrial e mercantil

Esse penhor terá por objeto:

• máquinas, aparelhos, materiais, instrumentos, instalados e em funcionamento, com os


acessórios ou sem eles;
• animais, utilizados na indústria;
• sal e bens destinados à exploração das salinas;
• produtos de suinocultura, animais destinados à industrialização de carnes e derivados;
• matérias-primas e produtos industrializados.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Os bens aqui serão imóveis por acessão intelectual. São bens que foram incorporados aos imóveis.
Neste caso, os bens permanecerão com o devedor.

O penhor industrial e mercantil é constituído por mediante instrumento público ou particular,


registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição onde estiverem situadas as coisas
empenhadas.

O devedor poderá emitir em favor do credor uma cédula do respectivo crédito, sendo denominada
de cédula de crédito industrial ou cédula de crédito mercantil.

O devedor não pode, sem o consentimento por escrito do credor, alterar as coisas empenhadas ou
mudar-lhes a situação, nem delas dispor. O devedor que, anuindo o credor, alienar as coisas empenhadas,
deverá repor outros bens da mesma natureza, que ficarão sub-rogados no penhor.

Tem o credor direito a verificar o estado das coisas empenhadas, inspecionando-as onde se acharem,
por si ou por pessoa que credenciar.

→ Penhor de títulos de crédito (ou penhor de direito)

O penhor de direito é constituído através de instrumento público ou particular, registrado no


Registro de Títulos e Documentos.

Podem ser objeto de penhor direitos, suscetíveis de cessão, sobre coisas móveis.

O titular de direito empenhado deverá entregar ao credor pignoratício os documentos


comprobatórios desse direito, salvo se tiver interesse legítimo em conservá-los.

O penhor de crédito só tem eficácia quando notificado o devedor do crédito. Por notificado tem-se
o devedor que, em instrumento público ou particular, declarar-se ciente da existência do penhor.

Deve o credor pignoratício cobrar o crédito empenhado, assim que o crédito tiver exigível, ainda que
a dívida ainda não esteja exigível.

Ex.: João deu em garantia a Samer um cheque de 10 mil reais. A dívida de João com Samer vence
daqui a um mês, mas a dívida do devedor do cheque para com João vence em uma semana. Passada essa
semana, Samer já poderá cobrar o cheque, ainda que a dívida com João ainda não esteja vencida.

Se este consistir numa prestação pecuniária, depositará a importância recebida, de acordo com o
devedor pignoratício, ou onde o juiz determinar. Se consistir na entrega da coisa, nesta se sub-rogará o
penhor.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Estando vencido o crédito pignoratício, tem o credor direito a reter, da quantia recebida, o que lhe é
devido, restituindo o restante ao devedor; ou a excutir a coisa a ele entregue

O credor pignoratício deve praticar os atos necessários à conservação e defesa do direito empenhado
e cobrar os juros e mais prestações acessórias compreendidas na garantia.

Se o mesmo crédito for objeto de vários penhores, só ao credor pignoratício, cujo direito prefira aos
demais, o devedor deve pagar; responde por perdas e danos aos demais credores o credor preferente que,
notificado por qualquer um deles, não promover oportunamente a cobrança.

O titular do crédito empenhado só pode receber o pagamento com a anuência, por escrito, do credor
pignoratício, caso em que o penhor se extinguirá.

Segundo o art. 1.458, o penhor, que recai sobre título de crédito, constitui-se mediante instrumento
público ou particular ou endosso pignoratício, com a tradição do título ao credor.

Ao credor, em penhor de título de crédito, compete o direito de:

• conservar a posse do título e recuperá-la de quem quer que o detenha;


• usar dos meios judiciais convenientes para assegurar os seus direitos, e os do credor do título
empenhado;
• fazer intimar ao devedor do título que não pague ao seu credor, enquanto durar o penhor;
• receber a importância consubstanciada no título e os respectivos juros, se exigíveis, restituindo
o título ao devedor, quando este solver a obrigação.

O devedor do título empenhado que receber a intimação, ou se der por ciente do penhor, não poderá
pagar ao seu credor. Se o fizer, responderá solidariamente por este, por perdas e danos, perante o credor
pignoratício.

Se o credor der quitação ao devedor do título empenhado, deverá saldar imediatamente a dívida,
em cuja garantia se constituiu o penhor.

→ Penhor de veículos

O penhor de veículo é mais comum.

É também constituído por instrumento, público ou particular, registrado no Cartório de Títulos e


Documentos do domicílio do devedor e anotado no certificado de propriedade.

O devedor pignoratício não entrega o veículo ao credor, mantendo com o devedor.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O penhor de veículos não é efetivado sem que sejam previamente segurados os veículos contra
furtos, avarias, perecimentos, ou danos causados por terceiros.

Portanto, antes de haver o penhor de veículos, é preciso fazer um seguro do veículo.

Se houver a alienação ou a mudança de titularidade do veículo, sem prévia comunicação ao credor


pignoratício, haverá o vencimento antecipado do crédito.

O prazo máximo do penhor de veículos é de 2 anos, prorrogável por até igual tempo.

e) Extinção do penhor

Extingue-se o penhor:

• pela extinção da obrigação;


• pelo perecimento da coisa;
• pela renúncia do credor;
• pela confusão da mesma pessoa como credor e de dono da coisa;
• pela a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa empenhada, feita pelo credor ou por
ele autorizada.

Há uma presunção de renúncia do credor quando:

• consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço;


• restituir a sua posse ao devedor; ou
• anuir à sua substituição por outra garantia.

Exemplo de confusão é o caso em que o sujeito recebeu o bem empenhado como herança. Neste
caso, o devedor pignoratício é herdeiro do credor pignoratício, havendo confusão. No caso da confusão tão-
somente quanto a parte da dívida pignoratícia, subsistirá inteiro o penhor quanto ao resto.

III. Hipoteca

A hipoteca também é direito real de garantia sobre coisa alheia, caso em que, via de regra, vai recair
em bem bens imóveis. Não há a transferência da posse da coisa imóvel entre as partes. A coisa imóvel
continua na posse do devedor.

A hipoteca deve ser registada e, como é imóvel, é no registro de imóveis.

Os registros e as averbações seguirão a ordem em que forem requeridas, conforme o princípio da


anterioridade registral ou prioridade registral.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Se ela for apresentada ao oficial de registro, mas após for apresentada uma segunda hipoteca, antes
do registro da primeira, o oficial de registro irá sobrestar a inscrição da hipoteca nova e irá prenotá-la. O
prazo de aguardo da inscrição anterior (primeira hipoteca) é de 30 dias. Esgotado o prazo sem que haja
requerimento da inscrição da primeira hipoteca, a segunda hipoteca será registrada e passará a ter a
preferência (art. 1.495).

O registro terá validade e eficácia enquanto a obrigação principal perdurar. Após, não haverá falar
mais em hipoteca.

A especialização da hipoteca deve ser renovada a cada 20 anos.

A hipoteca legal não terá prazo máximo, perdurando enquanto vigorar a situação descrita na lei.

Por outro lado, a hipoteca convencional terá o prazo máximo de 30 anos.

O art. 1.473 diz o que pode ser objeto do direito real de garantia hipotecário:

• os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com eles;


• o domínio direto;
• o domínio útil (direito do usufrutuário);
• as estradas de ferro;
• os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo onde se acham;
• os navios;
• as aeronaves.
• o direito de uso especial para fins de moradia;
• o direito real de uso;
• a propriedade superficiária;
• propriedade fiduciária;
• direitos oriundos da imissão provisória na posse, quando esta é concedida ao poder público.

A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. Subsistem os ônus


reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o mesmo imóvel.

O art. 1.475 diz que é nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel hipotecado.
Portanto, o imóvel pode ser vendido ou doado, mas a hipoteca irá o acompanhar, sendo um direito de
sequela.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

É possível que as partes convencionem que, sendo alienado o bem, haverá o vencimento antecipado
do crédito hipotecário. Em resumo, é proibido proibir a alienação, mas é possível constar que, havendo
alienação, haverá o vencimento antecipado da dívida.

O dono do imóvel hipotecado pode constituir outra hipoteca sobre ele, mediante novo título, em
favor do mesmo ou de outro credor. Ou seja, é possível a chamada sub-hipoteca (art. 1.476), o qual poderá
constituir sobre o imóvel uma outra hipoteca, mas o da primeira terá preferência. O titular da segunda
hipoteca, quando vencida a sua dívida, não poderá executar o imóvel antes de vencida a dívida da primeira
hipoteca.

Nos casos e nas hipóteses de sub-hipoteca, se o devedor da obrigação garantida pela primeira
hipoteca não se oferecer no vencimento para pagar, o credor da segunda hipoteca poderá fazer a extinção
da primeira, consignando o valor em juízo. Nesse caso, o credor da sub-hipoteca vai se sub-rogar nos direitos
da primeira hipoteca.

a) Remição ou resgate da hipoteca

São duas as hipóteses especiais de remição ou resgate da hipoteca merecem destaque:

• Remição da hipoteca pelo adquirente de imóvel:


O sujeito adquire o imóvel hipotecado, decidindo realizar a remição da hipoteca.
Segundo o art. 1.481, dentro do prazo decadencial de 30 dias, contados do registro do título
aquisitivo, o adquirente do imóvel hipotecado tem o direito de remi-lo, citando os credores
hipotecários e propondo importância não inferior ao preço por que o adquiriu o imóvel.
Se o adquirente deixar de remir o imóvel, ficará sujeito à execução da hipoteca, ficando também
obrigado a ressarcir os credores hipotecários por uma desvalorização que tenha permitido que o
imóvel sofresse em razão de sua culpa.
Se o credor hipotecário impugnar o preço da aquisição ou a importância oferecida, realizar-se-á
licitação, efetuando-se a venda judicial a quem oferecer maior preço, assegurada preferência ao
adquirente do imóvel.
Não impugnado pelo credor, o preço da aquisição ou o preço proposto pelo adquirente, haver-
se-á por definitivamente fixado para a remissão do imóvel, que ficará livre de hipoteca, uma vez
pago ou depositado o preço.
Disporá de ação regressiva contra o vendedor o adquirente que ficar privado do imóvel em
consequência de licitação ou penhora, o que pagar a hipoteca, o que, por causa de adjudicação
ou licitação, desembolsar com o pagamento da hipoteca importância excedente à da compra e
o que suportar custas e despesas judiciais.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

• Remição da hipoteca no caso de falência ou insolvência do devedor hipotecário:


Foi tratada pelo NCPC no art. 877, segundo o qual, transcorrido o prazo de 5 (cinco) dias,
contado da última intimação, e decididas eventuais questões, o juiz ordenará a lavratura do
auto de adjudicação do bem penhorado.
Considera-se perfeita e acabada a adjudicação com a lavratura e a assinatura do auto pelo juiz,
pelo adjudicatário, pelo escrivão ou chefe de secretaria, e, se estiver presente, pelo executado,
expedindo-se a carta de adjudicação e o mandado de imissão na posse, quando se tratar de bem
imóvel. Sendo bem móvel, haverá apenas a ordem de entrega ao adjudicatário.
No caso de penhora de bem hipotecado, o executado poderá remir o bem até a assinatura do
auto de adjudicação, oferecendo preço igual ao da avaliação, se não tiver havido licitantes, ou
ao do maior lance oferecido, se houve licitantes.
Na hipótese de falência ou de insolvência do devedor hipotecário, o direito de remição será
deferido à massa ou aos credores em concurso, não podendo o exequente recusar o preço da
avaliação do imóvel.

b) Perempção da hipoteca convencional

O art. 1.485 diz que há a extinção da hipoteca pelo decurso do prazo máximo de 30 anos, a contar
da constituição do negócio.

Hipoteca legal não tem prazo máximo, mas apenas prazo máximo da hipoteca convencional.

Admite-se a instituição convencional da hipoteca para dívida futura ou dívida condicional, que
depende de evento futuro e incerto. Mas isto só será possível se determinado o valor máximo do crédito
no ato de instituição.

A execução da hipoteca nesse caso vai depender de uma prévia concordância do devedor quanto à
verificação da condição do evento futuro e incerto, ou ainda haver uma prévia concordância do dever quanto
ao montante da dívida.

Havendo divergência entre o credor e o devedor quanto à ocorrência do fato ou do montante da


dívida, o credor deverá provar o seu crédito, o qual, provando, terá a garantia do bem.

O art. 1.488 inovou por meio da possibilidade de fracionamento da hipoteca, o que é uma exceção
à regra da indivisibilidade do direito real de garantia.

O fracionamento da hipoteca será possível se o imóvel, dado em garantia hipotecária, vier a ser
loteado, ou se nele se constituir condomínio edilício, poderá o ônus ser dividido, gravando cada lote ou

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

unidade autônoma, se o requererem ao juiz o credor, o devedor ou os donos, obedecida a proporção entre
o valor de cada um deles e o crédito.

O credor só poderá ser contrário ao pedido de desmembramento do ônus se provar que esse
desmembramento ocasionará diminuição de sua garantia.

c) Classificação da hipoteca

i. Quanto à sua origem

• Hipoteca convencional:
Decorre da vontade das partes.

• Hipoteca legal:
Decorre da lei. Essas hipóteses de hipoteca legal estão previstas no art. 1.489 do CC:
o Hipoteca legal é conferida às pessoas de direito público interno sobre os imóveis
pertencentes aos encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos
fundos e rendas;
o Hipoteca legal é conferida aos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras
núpcias, antes de fazer o inventário do casal anterior;
o Hipoteca legal é conferida ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do
delinquente, para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas
judiciais;
o Hipoteca legal é conferida ao coerdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da partilha,
sobre o imóvel adjudicado ao herdeiro reponente;
o Hipoteca legal é conferida ao credor sobre o imóvel arrematado, para garantia do
pagamento do restante do preço da arrematação.
A hipoteca legal pode ser substituída por caução de títulos da dívida pública federal ou
estadual, recebidos pelo valor de sua cotação mínima no ano corrente, ou ainda por outra
garantia, a critério do juiz, a requerimento do devedor.
A hipoteca legal, de qualquer natureza deverá ser registrada e especializada, a fim de que os
terceiros tomem conhecimento (art. 1.497).
O registro e a especialização incumbem a quem está obrigado a prestar essa garantia.
Não existe prazo máximo para a hipoteca legal, mas exige-se que a especialização da hipoteca
seja renovada a cada 20 anos.

• Hipoteca cedular (art. 1.486)

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Segundo o dispositivo, o credor e o devedor podem, no ato constitutivo da hipoteca, autorizar a


emissão de uma cédula hipotecária. Especializando-se os bens dados em garantia, com aquela
cédula, com o registro da cédula no ofício imobiliário. Então, é necessário registrar no cartório
de registro de imóveis.

• Hipoteca judicial
Encontrou regulamentação com NCPC, conforme art. 495, segundo o qual a decisão que
condenar o réu ao pagamento de prestação consistente em dinheiro e a que determinar a
conversão de prestação de fazer, de não fazer ou de dar coisa em prestação pecuniária valerão
como título constitutivo de hipoteca judiciária.
A decisão produz a hipoteca judiciária:
o ainda que a condenação seja genérica ou
o ainda que o credor possa promover o cumprimento provisório da sentença ou esteja
pendente arresto sobre bem do devedor;
o mesmo que impugnada por recurso dotado de efeito suspensivo.
A hipoteca judiciária poderá ser realizada mediante apresentação de cópia da sentença perante
o cartório de registro imobiliário, independentemente de ordem judicial, de declaração expressa
do juiz ou de demonstração de urgência.

d) Extinção da hipoteca

Segundo o art. 1.499, a hipoteca extingue-se:

• pela extinção da obrigação principal;


• pelo perecimento da coisa;
• pela resolução da propriedade;
• pela renúncia do credor;
• pela remição;
• pela arrematação ou adjudicação.

Extingue-se ainda a hipoteca com a averbação do cancelamento do registro no Registro de Imóveis,


à vista da respectiva prova.

Não extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, a arrematação ou adjudicação, sem que tenham
sido notificados judicialmente os respectivos credores hipotecários, que não forem de qualquer modo partes
na execução.

IV. Anticrese

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A anticrese é muito pouco utilizada no Brasil.

Na anticrese há um direito real de garantia, em que o imóvel é dado em garantia, sendo este
transmitido ao credor, seja pelo devedor ou por um terceiro, o qual transmite o imóvel ao credor, retirando
as coisas e frutos para pagamento da dívida.

O imóvel continua a ser do devedor, mas o credor passa a receber os aluguéis do imóvel.

Na anticrese há um bem imóvel, mas cuja posse é transferida ao devedor ou ao credor, aproximando-
se do penhor.

O imóvel dado em anticrese pode ser hipotecado e o hipotecado pode ser dado em anticrese.

É possível ainda a remição ou resgate da anticrese pelo adquirente do imóvel dado em anticrese
(imóvel anticrético).

V. Alienação fiduciária em garantia

A alienação fiduciária em garantia é um direito real de garantia, mas sobre coisa própria.

Vai encontrar respaldo:

• no Código Civil, que dispõe sobre a propriedade fiduciária de bens móveis infungíveis.
• no DL 911/69, que trata dos bens imóveis, dados em alienação fiduciária;
• Lei 9.514, que trata da alienação fiduciária em garantia sobre bens imóveis.

a) Conceito

O art. 22 da Lei 9.514 estabelece que a alienação fiduciária é o negócio jurídico pelo qual o devedor,
ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade
resolúvel de coisa imóvel.

Há a propriedade resolúvel da coisa imóvel que passa a ser do credor fiduciário.

A alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio, mas este é resolúvel, além da posse
indireta da coisa alienada. O alienante passa a ser o depositário do bem.

A posse direta do bem fica com o devedor fiduciante, mas o credor fiduciário tem a posse indireta do
bem.

O devedor fiduciante aliena o bem adquirido a um terceiro, e este credor fiduciário paga um preço
ao alienante originário da coisa, a quem vendeu a coisa ao devedor fiduciante.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Com o pagamento de todos os valores devidos pelo devedor fiduciante, este irá adquirir a
propriedade do bem em garantia.

b) Alienação fiduciária em garantia de bens móveis

Está regulamentada no Código Civil e no DL 911.

O §1º do art. 1.361 diz que a propriedade fiduciária se constitui com o registro do contrato, motivo
pelo qual haverá um direito real de garantia, desde que seja celebrado por instrumento público ou
particular, que lhe serve de título, no Registro de Títulos e Documentos do domicílio do devedor.

Em se tratando de veículos, o registro deverá ser feito na repartição competente para o


licenciamento, fazendo-se a anotação no certificado de registro.

O art. 1.362 diz que o contrato, que serve de título à propriedade fiduciária, deverá observar alguns
requisitos, tais como:

• Contrato preveja qual é o valor total da dívida, ou sua estimativa;


• Contrato preveja o prazo, ou a época do pagamento;
• Contrato preveja a taxa de juros, se houver;
• Contrato preveja a descrição da coisa objeto da transferência, com os elementos indispensáveis
à sua identificação.

Antes de vencida a dívida, o devedor fiduciante vai usar e gozar da coisa, ficando em sua posse, pois
será o depositário da coisa.

O devedor fiduciante é obrigado a ter a diligência exigida pela natureza da coisa, além de ser obrigado
a entregar a coisa ao credor se a dívida não for paga no seu vencimento.

Portanto, havendo inadimplemento por parte do devedor, o credor poderá vender a coisa, podendo
ser judicial ou extrajudicial.

Feita a venda, o preço será aplicado no pagamento do crédito, e se houver saldo, este será entregue
ao devedor, havendo a quitação.

Considera-se existente a mora do devedor fiduciante quando houver o simples vencimento do prazo,
sendo uma mora ex re. Mas ela é comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não
precisando este ser assinado pelo devedor fiduciante.

A mora e o inadimplemento das obrigações contratuais garantidas por alienação fiduciária vão
facultar ao credor considera, desde aquele momento, vencidas todas as obrigações contratuais.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Segundo a jurisprudência superior, o inadimplemento relativo será provado com a carta registrada
com AR, e uma vez provado haverá a liminar, a fim de deferir a busca e a apreensão do bem móvel. Veja, a
mora é ex re, mas para prová-la, é necessário que haja carta registrada com AR, motivo pelo qual será
deferida a busca e apreensão.

A ação de busca e apreensão na alienação fiduciária em garantia de bens móveis, encontra


regulamentação no art. 3º do DL 911/69.

Este dispositivo estabelece que o proprietário fiduciário ou credor pode, desde que comprovada a
mora, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado
fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário.

Após 5 dias a execução da liminar, consolidam-se a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem
no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo
certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da
propriedade fiduciária.

No prazo 5 dias, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os
valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do
ônus.

O devedor fiduciante apresentará resposta no prazo de 15 dias da execução da liminar. Essa resposta
pode ser apresentada mesmo que o devedor tenha se utilizado da faculdade de pagar a dívida para ter o bem
em sua propriedade, eis que poderá considerar que o pagamento foi feito a maior, desejando agora a
restituição que entende cabível.

Da sentença cabe apelação apenas no efeito devolutivo.

Na sentença que decretar a improcedência da ação de busca e apreensão, o juiz condenará o credor
fiduciário ao pagamento de multa, em favor do devedor fiduciante, a qual será equivalente a 50% do valor
originalmente financiado atualizado, se o bem tiver sido alienado.

Essa multa não exclui responsabilidade do credor fiduciário por perdas e danos.

O §12 vai dizer que a parte interessada poderá requerer diretamente ao juízo da comarca onde foi
localizado o veículo com vistas à sua apreensão, sempre que o bem estiver em comarca distinta daquela
da tramitação da ação, bastando que em tal requerimento conste a cópia da petição inicial da ação e, quando
for o caso, a cópia do despacho que concedeu a busca e apreensão do veículo.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A apreensão do veículo será imediatamente comunicada ao juízo, que intimará a instituição


financeira para retirar o veículo do local depositado no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas.

O STJ, em recursos repetitivos, entendeu que a lei não autoriza ao devedor fiduciante que purgue a
mora, ou seja, apenas aquilo que pague em atraso, pois a lei é clara de que o devedor poderá pagar apenas
a integralidade da dívida pendente.

Ainda, o STJ tem aplicado à alienação fiduciária a teoria do adimplemento substancial, casos em que
será afastada a busca e apreensão, em virtude de que a mora do devedor é insignificante. Poderá cobrar o
remanescente de outra forma, mas diversa da busca e apreensão.

Todas essas regras serão aplicadas ao leasing (arrendamento mercantil).

O art. 1.365 diz que é nula a cláusula que autoriza o proprietário fiduciário a ficar com a coisa
alienada em garantia, se a dívida não for paga no vencimento. Ou seja, é vedado o pacto comissório real.

Todavia, pode o devedor, com a anuência do credor, dar seu direito eventual à coisa em pagamento
da dívida, após o vencimento desta. Ou seja, vencida a dívida, poderá dar o bem em dação em pagamento.

A Lei 13.043/14 incluiu o art. 1.368-B no Código Civil.

Este dispositivo diz que a alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito
real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário do fiduciante ou sucessor do fiduciante.

Isso fez com que a alienação fiduciária se tornasse de natureza mista, sendo direito real de garantia
sobre coisa própria, mas também é direito real de aquisição.

O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da garantia,
mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido
transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a propriedade e a
posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos, tributários ou não, incidentes sobre o
bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem.

c) Alienação fiduciária em garantia de bens imóveis

Está prevista na Lei 9.514/97.

A alienação fiduciária pode ser contratada por uma pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das
entidades que operam no sistema financeiro imobiliário.

Poderá ser objeto de alienação fiduciária em garantia:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Bens enfitêuticos, hipótese em que será exigível o pagamento do laudêmio, se houver a


consolidação do domínio útil no fiduciário;
• Direito de uso especial para fins de moradia;
• Direito real de uso, desde que suscetível de alienação;
• Propriedade superficiária;

Esses bens podem ser alienados fiduciariamente em garantia de bem imóvel.

O art. 23 diz que a propriedade fiduciária de coisa imóvel se constitui mediante registro, no
competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.

Com a constituição da propriedade fiduciária, se dará o desdobramento da posse, tornando-se o


fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.

São requisitos do instrumento que será registrado:

• Constar o valor do principal da dívida;


• Constar o prazo e as condições de reposição do empréstimo ou do crédito do fiduciário;
• Constar a taxa de juros e os encargos incidentes;
• Constar a cláusula de constituição da propriedade fiduciária, com a descrição do imóvel objeto
da alienação fiduciária e a indicação do título e modo de aquisição;
• Constar a cláusula assegurando ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre utilização, por sua
conta e risco, do imóvel objeto da alienação fiduciária;
• Constar a indicação, para efeito de venda em público leilão, do valor do imóvel e dos critérios
para a respectiva revisão;
• Constar a cláusula dispondo sobre os procedimentos de que trata o art. 27.

Com o pagamento integral da dívida e seus encargos, resolve-se a propriedade fiduciária do imóvel.

Ocorrendo o pagamento, no prazo de 30 dias, a contar da data de liquidação da dívida, o fiduciário


fornecerá o respectivo termo de quitação ao fiduciante, sob pena de multa em favor deste, equivalente a
meio por cento ao mês, ou fração, sobre o valor do contrato.

À vista do termo de quitação, o oficial do competente Registro de Imóveis efetuará o cancelamento


do registro da propriedade fiduciária.

O art. 26 vai dizer que, vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e for constituído em mora
o fiduciante, a propriedade vai se consolidar a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O devedor fiduciante, ou seu representante legal, será intimado, a requerimento do fiduciário, pelo
oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de 15 dias, a prestação vencida. Se purgar
a mora, voltará a valer a alienação fiduciária, com todos os seus efeitos.

Segundo o STJ, é nula a intimação do devedor para oportunizar a purgação de mora realizada por
meio de carta com aviso de recebimento quando esta for recebida por pessoa desconhecida e alheia à
relação jurídica (Inf. 580).

Portanto, no caso de bens imóveis, é possível a purgação da mora no Registro de Imóveis. O oficial,
nos 3 dias seguintes à purgação da mora, entregará ao fiduciário as importâncias recebidas, deduzidas as
despesas de cobrança e de intimação.

Se passados os 15 dias, e o devedor não fez a purgação da mora, então o oficial de registro de imóveis
irá promover a averbação na matrícula do imóvel da consolidação da propriedade em nome do credor
fiduciário.

Consolidada a propriedade em nome do fiduciário, no prazo de 30 dias, contados da data do registro,


promoverá público leilão para a alienação do imóvel, já que é vedado o pacto comissório real, não podendo
ficar com o imóvel o credor fiduciário.

No primeiro público leilão, o maior lance oferecido deve ser pelo menos superior ao valor do imóvel.
Todavia, sendo inferior ao valor do imóvel, será realizado o segundo leilão, nos 15 dias seguintes.

No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da
dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições
condominiais.

Nos 5 dias seguintes à venda do imóvel, o credor fiduciário vai entregar ao devedor fiduciante aquilo
que sobrar. Esse fato vai importar em recíproca quitação.

Se no segundo leilão não for igual ou superior ao valor da dívida e dos encargos, será considerada a
dívida extinta.

Direito de família.

→ DIREITO DE FAMÍLIA
1. Aspectos gerais

O direito de família tem como conteúdo os seguintes institutos: casamento, união estável, relações
de parentesco, filiação, alimentos, bens de família, tutela, curatela e guarda.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

I. Princípios do direito de família

No momento da prova, estes princípios resolvem regras desconhecidas.

a) Princípio da solidariedade familiar

Solidariedade é um respondendo por todos e todos respondendo por um. A solidariedade familiar
deve ser concebida num sentido amplo, tendo um caráter afetivo, social, moral, patrimonial, espiritual,
inclusive sexualmente.

Basta ver do ponto de vista patrimonial. Isso porque o cônjuge culpado pelo fim do relacionamento
tem direito aos alimentos necessário, imprescindíveis à sobrevivência. Este poderá pleitear do cônjuge
inocente, desde que não tenha mais ninguém para prestar estes alimentos a ele.

Ora, é a solidariedade familiar que justifica a prestação desses alimentos.

b) Princípio da igualdade entre filhos

O art. 227, §6º, da CF diz que os filhos, havidos ou não do casamento, ou por adoção, tem os mesmos
direitos e qualificações, sendo proibidas quaisquer designações discriminatórias, relativas à discriminação.

c) Princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros

Aqui, é a preocupação da igualdade entre cônjuges e companheiros. A lei reconhece a igualdade


entre homens e mulheres no tocante à direção da sociedade conjugal ou convivencial da união estável.

Isto justifica que o marido pleiteie os alimentos da mulher, visto que poderia ter sido ele o dono de
casa durante a sociedade conjugal.

Da mesma forma, em razão do princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros, poderá a


mulher usar o nome do homem ou o homem usar o nome da mulher.

Ainda, há a igualdade na chefia familiar, exercendo ambos o poder familiar.

d) Princípio da não intervenção

O princípio da não intervenção também é conhecido como princípio da liberdade.

O art. 1.513 do CC diz que é proibido a qualquer pessoa de direito público ou privado interferir na
comunhão de vida instituída pela família. Segundo a CF, a família é a base da sociedade, não podendo haver
intervenção da família.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 1.565, §2º, diz que o planejamento familiar é de livre decisão do casal, sendo vedada qualquer
tipo de coerção. Isto não impede que o estado incentive controle de natalidade, planejamento familiar ou
eduque as famílias por meio de políticas públicas. Mas a decisão final é do casal.

e) Princípio do maior interesse da criança e do adolescente

Este princípio será estudado no ECA.

A ideia do princípio do maior interesse da criança e do adolescente vem consagrada no art. 227,
caput, da CF. A Constituição diz que é dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem (entre 15 e 29 anos), com absoluta prioridade, o direito à vida, saúde, alimentos,
educação, lazer, profissionalização, cultura, dignidade, direito ao respeito, liberdade, convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão.

A Constituição consagra claramente o princípio do maior interesse da criança e do adolescente. A


Constituição vai além, pois consagra também o jovem.

É possível ser adolescente e jovem ao mesmo tempo? SIM. Quem tem 16 anos é adolescente e jovem.

Exemplo de aplicação do princípio do maior interesse da criança e do adolescente. Basta pensar na


ideia da guarda compartilhada, a qual prevalece sobre a guarda unilateral, visto que se mostra mais benéfico
à criança ou adolescente. Frise-se que não se trata da guarda mochila, em que a criança dorme dois dias em
cada uma das casas.

A ideia da guarda compartilhada é que o filho more com a mãe, por exemplo, mas que o pai busca o
filho na escola todos os dias, almoçando com ele, bem como passeando com o filho. Ou seja, o filho acaba
tendo essa convivência sempre com os dois pais.

e) Princípio da afetividade

É o princípio do afeto. O afeto hoje pode ser apontado como principal fundamento das relações
familiares. Se não há afeto não há família.

A valorização do afeto remonta a um trabalho de João Batista Vilella, de 1979, quando tratou da
desbiologização da paternidade. Ele diz que as transformações pelas quais passou a família, deixando de ser
uma unidade de caráter econômico, social e religioso, para se afirmar como um grupo de afetividade,
imprimiu um considerável esforço para um esvaziamento biológico da paternidade.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A partir desse trabalho é que se começa a se defender a paternidade socioafetiva. Se considerarmos


que é o afeto que legitima a existência da família, chega-se à conclusão de que pai não é concebe do ponto
de vista biológico, pai é quem cria o filho.

f) Princípio da função social da família

É extraído do art. 226 da CF, o qual diz que a família é a base da sociedade, recebendo uma especial
proteção do Estado.

As relações familiares serão analisadas dentro do contexto social, dentro daquilo que a sociedade
hoje apresenta ao Estado. Se a sociedade muda, é preciso que a concepção de família também é alterada.
Isso porque existe a função social da família.

A função social familiar fundamenta o parentesco decorrente da paternidade socioafetiva, pois hoje
quem cria o filho muitas vezes não é quem biologicamente o gerou.

Outras entidades familiares, como a união homoafetiva, vão ser reconhecidas porque a sociedade
mudou. Hoje há as famílias formadas por pessoas do mesmo sexo, sendo equiparada à família heteroafetiva.

II. Concepção constitucional de família

Interpretando-se o art. 226 da CF, pode-se dizer que a família decorre de alguns institutos, tais como:
casamento civil, união estável entre homem e mulher e a chamada família monoparental (um dos pais e os
filhos).

Esse rol constitucional é um rol exemplificativo, passando admitir outras manifestações familiares,
surgindo a ideia de anaparental, ou seja, é a família sem pais.

Ainda é possível reconhecer a chamada família homoafetiva, resultante da união de casais do mesmo
sexo.

Também se fala da família mosaico, que pode ser chamada de família pluriparental, em que os
membros da família possuem várias origens. Ex.: João foi casado com Maria e teve 2 filhos. João depois se
casou com Carla, que tinha 2 filhos do primeiro casamento. Portanto, João e Carla agora se casam e trazem
para dentro de casa os 4 filhos. A família terá origens diversas, formando uma família mosaico.

Família por design consiste em pessoas que se unem no intuito único de ter uma relação que gere
filhos, seja de forma natural ou reprodução assistida e, posteriormente criarão a criança em conjunto, mas
sem formarem um casal afetivo.

2. Casamento

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I. Conceito e natureza jurídica

O casamento pode ser conceituado pela união de duas pessoas, de forma reconhecida e
regulamentada pelo Estado, em que se objetiva estabelecer uma família, baseada no vínculo de afeto,
estabelecendo comunhão plena de vida entre os cônjuges.

A natureza jurídica casamento é muito discutida pela doutrina.

1ªC: Teoria institucionalista (Maria Helena Diniz): O casamento seria uma instituição.

2ªC: Teoria contratualista (Sílvio Rodrigues): O casamento é um contrato, de natureza especial.

3ªC: Teoria mista ou eclética (Flávio Monteiro de Barros e Flávio Tartuce): O casamento é uma
instituição quanto ao conteúdo, mas quanto à forma é um contrato especial.

II. Princípios específicos do casamento

O casamento é um negócio jurídico especial, tendo regras próprias de constituição, além de


princípios específicos.

a) Princípio da monogamia

Segundo o princípio da monogamia, só é possível se casar com uma pessoa.

Este princípio é extraído do art. 1.521, o qual diz que não podem casar as pessoas casadas.

b) Princípio da liberdade de escolha

Segundo este princípio, é possível casar com quem quiser, desde que essa pessoa também queira.

Como exercício da autonomia privada, há o princípio da liberdade de escolha.

É claro que há os impedimentos matrimoniais, ou seja, o genro, por exemplo, não poderá se casar
com a sogra.

c) Princípio da comunhão plena de vida

O casamento estabelece comunhão plena de vida entre os cônjuges.

III. Capacidade para o casamento, impedimentos matrimoniais e causas suspensivas do casamento

Não confundir incapacidade para o casamento com impedimentos para o casamento.

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A incapacidade para o casamento é geral, impedindo qualquer pessoa de se casar com qualquer outra
pessoa. O impedimento não é geral, atingindo determinadas pessoas em situações específicas.

A incapacidade é geral, como no caso da pessoa com 12 anos, a qual não poderá casar.

Os incapazes para o casamento são apenas os menores de 16 anos. Isso porque somente os
absolutamente incapazes são incapazes para o casamento, visto que a idade núbil começa aos 16 anos.

Não há nenhuma outra previsão no ordenamento jurídico brasileiro que traga outro absolutamente
incapaz que não o menor de 16 anos.

Isso vai ao encontro do Estatuto da Pessoa com Deficiência, pois o art. 6º diz que a deficiência não
afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para casar-se e para constituir união estável.

a) Capacidade para o casamento

O homem e a mulher em idade núbil (16 anos completos) podem ser casar, e se forem menores de
18 anos, será necessário uma autorização de ambos os pais ou representantes legais, enquanto não for
atingida a maioridade civil.

Havendo divergência entre os pais, quem resolverá será o juiz. Portanto, é possível o suprimento
judicial. É o que diz o art. 1.517, parágrafo único.

O art. 1.517, quando fala dessa necessidade de autorização, não se aplica ao emancipado, pois este
já tem plena capacidade, dispensando essa autorização dos pais para fins de casamento.

O art. 1.518 diz que até o momento da celebração do casamento, os pais ou tutores podem revogar
essa autorização. Após a celebração, não mais poderão revogar.

O art. 1.520 vai dizer que excepcionalmente será permitido de quem ainda não completou 16 anos,
ou seja, de quem ainda não tem idade núbil. Isto ocorrerá quando for para impedir a imposição ou
cumprimento de uma pena criminal ou quando for o caso de gravidez.

Essa parte perdeu força por conta do crime de estupro ser crime de ação penal pública
incondicionada quando a vítima ser menor do que 18 anos.

b) Impedimentos matrimoniais

O art. 1.521 traz um rol taxativo de pessoas que não podem casar. Trata-se de matéria de ordem
pública.

Não poderão casar:


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• ascendentes com os descendentes


• colaterais até o 3º grau, inclusive (até o tio não pode casar com sobrinha)
• os afins em linha reta (parentesco por afinidade, em que sogra não pode casar com genro)
• adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem foi cônjuge do adotante
• o adotado com o filho do adotante (são irmãos)
• pessoas casadas (seria uma incapacidade, mas a lei trata como impedimento)
• cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio consumado ou tentado com o seu
consorte (homicídio doloso, pois o culposo pode)

Com relação aos colaterais até o 3º grau, o presidente Getúlio Vargas abriu uma exceção para o seu
amigo, por meio do Decreto-Lei 3.200/41, até hoje em vigor, autoriza-se o casamento entre tios e sobrinhos
se uma junta médica apontar a inexistência de risco biológico. Neste caso, existe o casamento avuncular.

Em se tratando de vínculo por afinidade em linha reta, este vínculo será perpétuo, sendo mantido
mesmo depois da dissolução de casamento ou da união estável. A sogra é para sempre, jamais podendo o
genro se casar com a sogra.

Em relação aos efeitos, o impedimento matrimonial impossibilita que o casamento seja celebrado. A
oposição ao casamento pode ocorrer até o momento da celebração e por qualquer pessoa capaz.

Caso o oficial do registro tiver o conhecimento da existência do impedimento, deve reconhecer o


impedimento de ofício.

A consequência do casamento com impedimento é a nulidade absoluta.

c) Causas suspensivas do casamento

Em algumas situações o casamento será celebrado a despeito de haver causas suspensivas.

Estas causas suspensivas não geram nulidade absoluta e nem a nulidade relativa do casamento.

A consequência de casar-se com causa suspensiva é apenas experimentar uma sanção patrimonial
aos cônjuges. A sanção principal é o regime da separação obrigatória (legal) de bens.

O art. 1.523 faz uma recomendação, no sentido que não devem casar.

Portanto, não devem casar:

• Viúvo ou viúva, que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer o inventário dos bens
do casal, com a respectiva partilha

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Evita-se a confusão patrimonial. Aqui também há uma outra consequência imposta por lei, que
é a hipoteca legal a favor dos filhos sobre os bens imóveis dos pais.

• Viúva ou mulher cujo casamento se desfez por nulidade absoluta ou relativa até 10 meses
depois do começo da viuvez ou da dissolução da sociedade conjugal.
O objetivo é evitar a confusão sobre a paternidade. Perdeu muito a aplicação prática.
• Divorciado enquanto não houver sido homologado ou decidida a partilha do casal
• Tutor e curador e seus descendentes, ascendentes, cunhados, sobrinhos, com a pessoa
tutelada ou curatelada enquanto não cessar a tutela ou curatela, ou enquanto não estiverem
saldar as respectivas contas que foram prestadas.

Em todas essas hipóteses acima, o parágrafo único do art. 1.523 diz que a causa suspensiva
desaparece se for provada a ausência de prejuízo aos envolvidos.

A respeito da arguição da presença de uma causa suspensiva, não é todo mundo que poderá fazer
essa arguição.

Na causa suspensiva, somente poderá ser realizada essa arguição até o momento da celebração do
casamento por parentes em linha reta de um dos cônjuges e pelos colaterais até o 2º grau (irmão ou
ascendente – pais, avós, sogros, irmãos e cunhados).

As causas suspensivas não podem ser conhecidas de ofício pelo juiz ou oficial do registro civil, pois
tem natureza privada.

Levantada a causa suspensiva, o casamento será pelo regime de separação obrigatória de bens. Após
um tempo percebeu-se que não houve confusão patrimonial, etc. Desaparecendo um motivo de imposição
da causa suspensiva, é possível promover a ação visando a alteração do regime de bens, desde que haja
motivo justificado. Essa ação deverá ser proposta por ambos os cônjuges. É o que ensina o art. 1.639, §2º.

IV. Processo de habilitação e da celebração do casamento

O casamento é um negócio jurídico formal e solene.

O art. 1.525 diz que o requerimento de habilitação do casamento é firmado por ambos os cônjuges
de próprio punho ou por procurador.

O requerimento de habilitação deverá ser instruído com:

• Certidão de nascimento ou documento equivalente de ambos os pretensos cônjuges

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• Autorização por escrito, se for o caso em cuja dependência legal estiverem ou ato judicial que
supra essa autorização
• Declaração de duas testemunhas que atestem e conhecem os pretensos cônjuges, e que não
existam impedimentos entre eles
• Declaração de estado civil
• Declaração de domicílio
• Declaração de residência atual dos pais dos contraentes
• Declaração de residência atual dos próprios contraentes
• Se for o caso, juntar certidão de óbito do cônjuge falecido ou da sentença que declarou a nulidade
ou a anulação do casamento anterior, transitada em julgado ou do registro da sentença de
divórcio

O art. 1.526 diz que a habilitação será feita perante o oficial de registro civil, com audiência do MP.

O parágrafo único diz que se houver impugnação do oficial ou do MP, ou de uma terceira pessoa,
essa habilitação será submetida ao juiz. Ou seja, se não houver a oposição ou essa impugnação, não será
submetida a habilitação ao juiz.

A ideia é a desjudicialização da habilitação.

Estando em ordem a documentação, o oficial vai extrair um edital, afixando o edital durante 15 dias,
nas circunscrições do registro civil de ambos os nubentes e vai publicar na imprensa local se houver. São os
denominados proclamos do casamento.

Essa publicação pode ser dispensada pela autoridade, se houver uma urgência, conforme o art. 1.527,
parágrafo único.

O oficial de registro civil tem o dever de esclarecer aos nubentes os fatos que podem ocasionar a
invalidade do casamento e sob os diversos regimes de bens existentes.

Tanto os impedimentos quanto as causas suspensivas serão opostas em uma declaração escrita e
assinada, instruída já com as provas das declarações, ou ao menos indicando o local onde essas provas podem
ser obtidas.

Com isso, o oficial dará aos nubentes a nota da oposição, dando ciência dos fatos aos nubentes, tendo
eles o prazo de 3 dias para indicar as provas que pretendem produzir, remetendo os autos ao juízo.

No juízo, essas provas serão produzidas, e então serão ouvidos os interessados, o MP (prazo de 5
dias) e após vai para o juiz decidir essa oposição no prazo de 5 dias.

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Cumpridas essas formalidades, verificada a inexistência de um fato obstativo, será extraída a


certificação de que eles estão habilitados. Isso se dá através de um certificado de habilitação. Esse certificado
de habilitação terá um prazo de eficácia de 90 dias. Nesse prazo, o casamento deve ser celebrado.

O casamento ocorrerá no dia e lugar previamente designado pela autoridade que presidirá o ato, que
é o Juiz de Paz.

O art. 98, II, da CF diz que a União, Estados, DF e territórios vão criar a justiça de paz, a qual é
remunerada, composta por cidadãos eleitos pelo voto direto, universal e secreto, os quais terão mandato de
4 anos, tendo competência para, dentre outras, celebrar casamentos.

O ato solene relativo ao casamento será realizado na sede do cartório com as portas abertas,
presentes pelo menos 2 testemunhas.

Caso queiram as partes casar em casa, e a autoridade concordar, poderá ser realizado, mas o edifício
ficará com as portas abertas durante o ato.

Neste caso, se for celebrado fora do cartório, o número de testemunhas que deverão estar presentes
será de no mínimo 4 testemunhas.

Também será preciso de 4 testemunhas se algum dos contraentes fora analfabeto, não souber ou
não puder escrever.

O oficial do registro, após ouvir dos nubentes sobre a pretensão do casamento por livre e espontânea
vontade, vai declará-los casados, nos seguintes termos: “De acordo com a vontade que ambos acabais de
afirmar perante mim, de vos receberdes por marido e mulher, eu, em nome da lei, vos declaro casados”.

Flávio Tartuce entende que esse dispositivo deve ser adaptado para as situações de casamento
homoafetivo.

Após celebrado o casamento, é lavrado um assento no livro de registro.

Em relação ao momento em que o ato é aperfeiçoado, este se dá a partir do momento em que o


homem e a mulher manifestam a sua vontade de estabelecer o vínculo conjugal e o juiz os declara casados.

O registro do ato no assentamento está no plano de eficácia do casamento perante terceiros, porém
ele já foi celebrado no momento em que o juiz, a partir da declaração de que ambos se manifestaram pela
vontade de casar.

O art. 1.538 traz uma advertência, afirmando que a celebração do casamento será imediatamente
suspensa se um dos contraentes recusar a solene afirmação de sua vontade, ou se manifestar arrependido.

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O sujeito que der causa à suspensão não poderá se retratar no mesmo dia.

V. Casamento em caso de moléstia grave

Se um dos nubentes estiver acometido por uma moléstia grave, o presidente do ato, oficial de
registro, vai celebrar o casamento onde estiver a pessoa.

Se houver urgência, poderá celebrar o casamento mesmo à noite.

O casamento é celebrado perante 2 testemunhas, e a urgência vai dispensar o processo de


habilitação anterior dos nubentes.

Se houver a falta ou impedimento da autoridade competente do local, essa falta ou impedimento


será suprida por qualquer dos substitutos legais do juiz de paz.

Se a falta for do oficial de registro, ela será suprida por um oficial ad hoc, nomeado pelo juiz de paz
para aquele ato.

VI. Casamento nuncupativo (em viva voz) ou extremis vitae momentis, ou in articulo mortis

Casamento in articulo mortis é à beira da morte.

O art. 1.540 diz que quando algum dos contraentes estiver em iminente risco de vida, não obtendo
a presença da autoridade, a qual incumbiria presidir o ato, este casamento poderá ser celebrado na presença
de 6 testemunhas, que não tenham parentesco em linha reta ou colateral com os nubentes.

Realizado esse casamento, essas 6 testemunhas deverão comparecer perante a autoridade judicial
no prazo de 10 dias, pedindo que essa autoridade judicial tome por termo as declarações das testemunhas,
as quais irão dizer que foram convocadas por parte do enfermo. E que o enfermo estava realmente em
perigo de vida, mas estava em seu juízo, sabendo o que estava fazendo, além de que, em sua presença,
declararam os contraentes, livre e espontaneamente receber-se marido e mulher.

Verificada a idoneidade dos cônjuges, o casamento será tido como válido.

Essas formalidades todas serão dispensadas se o enfermo convalescer e puder ratificar o


casamento na presença do juiz e da autoridade competente (juiz de paz eventualmente, e o oficial de
registro).

VII. Casamento por procuração

O casamento pode ser celebrado por procuração, sendo esta por instrumento público, com poderes
especiais. A eficácia desse mandato não pode ultrapassar 90 dias.
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VIII. Casamento religioso com efeitos civis

O art. 226, §2º, diz que o casamento religioso tem efeitos civis nos termos da lei.

O tema é regulamentado pelo art. 1.515, o qual diz que, para atender às exigências da lei para
validade do casamento civil, equipara o casamento religioso ao casamento civil, desde seja registrado no
registro próprio, produzindo efeitos a partir da sua celebração.

Portanto, esse registro terá efeitos retroativos na data da celebração do casamento religioso.

Duas são as situações possíveis do casamento religioso que tenha efeitos civis:

• Casamento religioso que tenha sido precedido da habilitação, devendo ser registrado no prazo
decadencial de 90 dias. Após o referido prazo, o registro do casamento dependerá de uma nova
habilitação.
• Casamento religioso não ser precedido de um processo de habilitação. Neste caso, terá efeitos
civis se, a requerimento do casal, for registrado esse casamento a qualquer momento, sempre
mediante prévia habilitação perante a autoridade competente.

IX. Invalidade do casamento

a) Casamento inexistente

O casamento inexistente ocorre em 3 hipóteses apresentada pela doutrina clássica:

• Casamento entre pessoas do mesmo sexo: essa hipótese perdeu a razão de ser, visto que o STF
equiparou a união homoafetiva à união estável, podendo ser convertida em casamento. Se é
possível converter em casamento, é possível casar-se. O CNJ, através da Res. 175/13 veda as
autoridades competentes de todo o Brasil de se recusar a habilitação, celebração ou conversão
de união estável em casamento das pessoas do mesmo sexo.
• Casamento com ausência de vontade: exemplo disso é o casamento com coação física.
• Casamento celebrado por autoridade totalmente incompetente (em razão da matéria): o
casamento celebrado por um juiz de direito na hipótese de existir juiz de paz será um casamento
inexistente, assim como o caso de casamento celebrado por promotor de justiça ou delegado.

O casamento inexistente é um nada jurídico, mas em algumas situações será necessário reconhecer
a inexistência do casamento para que ele deixe de produzir efeitos. Neste caso, como é um nada jurídico,
entende-se que é possível a mesma ação que é proposta para declarar a nulidade do casamento.

b) Casamento nulo

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O casamento nulo é aquele celebrado com infringência a impedimento matrimonial.

Isso já foi estudado. Casamento entre genro e sogra é nulo, por infringência a impedimento
matrimonial.

Os impedimentos podem ser decorrentes de parentesco consanguíneo, por afinidade, civil, de


vínculo matrimonial ou de crime. A grande maioria das situações práticas é o caso de duplicidade de
casamentos.

É preciso ainda que seja compreendido os efeitos e procedimentos da ação declaratória de nulidade
do casamento.

Os efeitos e características dessa ação declaratória de nulidade:

• Imprescritível: a nulidade não vai se convalescer com o decurso do tempo.


• Promovida por ação direta: pode ser proposta por qualquer interessado, e como se trata de
ordem pública, pode ser proposta pelo MP.
• Sentença que declara a nulidade tem efeitos retroativos à data de celebração do casamento:
não poderá prejudicar terceiros de boa-fé, tampouco aquisição de direitos onerosos resultantes
de sentença transitada em julgado.

c) Casamento anulável

O casamento anulável é aquele em que poderá ou não ser anulado, sendo as hipóteses previstas no
art. 1.550:

• Casamento de quem não completou a idade mínima para casar


• Casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;
• Casamento por vício da vontade;
• Casamento do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento;
• Casamento realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da
revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;
• Casamento por incompetência da autoridade celebrante.

i. Anulação do casamento de quem não completou a idade mínima para casar

No casamento de quem não completou a idade mínima para casar, o prazo é decadencial de 180
dias. Ou seja, este é o prazo para propor uma ação anulatória.

Essa ação anulatória poderá ser proposta:

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• pelo próprio menor, desde que representado pelos seus representantes legais.
• pelos seus ascendentes.

O início da contagem do prazo depende de quem está propondo a ação.

Se estiver diante de um menor, o prazo de 180 dias será contado a partir do momento em que o
menor completar 16 anos.

Se a ação foi proposta pelo representante legal do menor, este prazo de 180 dias será contado do
momento da celebração do casamento.

Esse casamento celebrado pelo menor poderá ser convalidado em duas hipóteses:

• casamento resultado gravidez


• menor, depois de completar a idade núbil, confirmar o casamento com a autorização dos
representantes ou suprimento judicial

ii. Anulação do casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante
legal

O casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal, também
é um casamento anulável.

O prazo para propositura da ação declaratória de nulidade é de 180 dias.

O prazo para a propositura da ação declaratória de nulidade do casamento seguirá as regras abaixo:

• Proposta pelo menor: prazo de 180 dias, contados a partir do momento em que ele completa 18
anos.
• Proposta pelo representante legal: prazo de 180 dias, contados a partir da celebração do
casamento.
• Proposta por um herdeiro necessário: prazo de 180 dias, contados data de óbito do menor.

Esse casamento também poderá ser convalidado quando os pais tiverem assistido a cerimônia e não
tiverem manifestado oposição ou se tiverem manifestado a aprovação.

iii. Anulação do casamento por vício da vontade em relação à coação moral e error in persona

Casamento por coação moral

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O casamento também poderá ser anulado se for celebrado sob coação moral, situação em que o
prazo para anular o casamento será decadencial de 4 anos, contados da celebração do casamento. A ação,
no caso da coação moral, é personalíssima, somente podendo ser proposta pelo coagido.

O ato de coação poderá ser convalidado também se houver uma posterior coabitação entre os
cônjuges e a ciência do vício por um período que o juiz reputar razoável.

Obs.: Samer, e eu também concordo, que o prazo para anulação deveria ser contado da cessação da
coação e não da celebração do casamento.

Casamento com erro essencial

O casamento com erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge também admite a sua anulação.

O art. 1.557 traz um rol de situações caracterizadoras de erro in persona que autorizariam a anulação
do casamento.

Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:

• O erro que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu
conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
Por exemplo, o cônjuge se casa e depois descobre que seu cônjuge é homossexual. Se tornar
insuportável a vida em comum do casamento, poderá anular.

• A ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida
conjugal;
Ex.: a mulher descobre que o marido era traficante de drogas.

• A ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não caracterize


deficiência ou de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz de pôr em
risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;
Ex.: hermafroditismo, que são as duas manifestações sexuais em uma única pessoa.
Outro exemplo é a deformações sexuais, como a impotência coeundi, que é a impotência para a
prática do sexo. A impotência generandi, que é a impotência de gerar filhos, não gera anulação
do casamento.

O prazo decadencial para anular o casamento por erro in persona é de 3 anos, contados da
celebração do casamento. Essa ação também é personalíssima.

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Eduardo Defaveri

A coabitação posterior, sabendo do vício, convalida o casamento, salvo nas hipóteses de defeito
físico irremediável ou a moléstia grave.

iv. Anulação do casamento do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o


consentimento

O incapaz de consentir ou de manifestar a sua vontade de modo inequívoco pode anular o


casamento. Isto engloba o casamento dos ébrios habituais, alcoólatras, vícios em tóxicos e aquelas que por
causa transitória não puderem exprimir a sua vontade. Nestes casos, o casamento será considerado anulável.

Nesses casos, o prazo decadencial para anulação do casamento também é de 180 dias, contados da
celebração do casamento.

Aqui também vale a mesma ideia, pois se a pessoa está em coma, este prazo de 180 dias deve ser
contado do dia em que sair do coma. Mas a lei fala da celebração do casamento.

v. Anulação do casamento realizado por procuração, se houve a revogação do mandato antes da


celebração do casamento, mas o mandatário e o outro cônjuge não tomaram conhecimento

Ou seja, o casamento poderá ser anulado se houve o casamento após a revogação do mandato sem
que o representante e o outro cônjuge tivessem o conhecimento da extinção do mandato.

O prazo da ação anulatória será decadencial de 180 dias, contados do momento em que o mandante
toma o conhecimento de que o casamento, a despeito da revogação do mandato, foi celebrado.

Nesse caso, essa anulação caberá apenas ao mandante, em caráter personalíssimo, sendo o ato
convalidado pela coabitação.

vi. Anulação do casamento perante autoridade relativamente incompetente

É uma autoridade relativamente incompetente.

Se um juiz de paz de uma determinada cidade realiza casamento em outra cidade, fora da sua
competência, esse casamento é anulável.

O prazo será decadencial de 2 anos, contados da data da celebração do casamento.

O art. 1.554 trata da hipótese de convalidação por conta da incompetência ratione loci do juiz de paz.
Neste caso, subsiste o casamento celebrado por aquele que, sem possuir a competência exigida na lei,
exercer publicamente as funções de juiz de casamentos e, nessa qualidade, tiver registrado o ato no Registro
Civil.

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vii. Efeitos e procedimentos da ação anulatória

A ação anulatória do casamento é constitutiva negativa, ou seja, o indivíduo casado deixa de ser
casado.

O prazo é decadencial, via de regra, de 180 dias, salvo:

• Coação: 4 anos
• Error in persona: 3 anos
• Incompetência relativa da autoridade: 2 anos

O MP não tem legitimidade para propor a ação, pois o casamento poderá ser convalidado pela
vontade dos cônjuges, bem como não poderá ser conhecido de ofício.

Como regra, a anulabilidade terá efeitos ex nunc, não retroagindo.

O professor Flávio Tartuce entende que essa anulação é ex tunc, devendo retroagir, pois a pessoa
que era casada não vira divorciada, e sim solteira. Samer concorda.

d) Casamento putativo

Casamento putativo é o casamento que existiu apenas na cabeça de uma pessoa ou de duas.

É um casamento nulo ou anulável que gerará efeitos ao cônjuge que estava de boa-fé (boa-fé
subjetiva).

O art. 1.561 traz 3 regras fundamentais sobre o casamento putativo, que são relacionadas à boa-fé
subjetiva ao desconhecimento do vício:

• Se houver boa-fé de ambos os cônjuges, o casamento gerará efeitos para ambos e para os
filhos, até o trânsito em julgado da sentença que declara nulidade ou decreta anulação.
Eventuais bens adquiridos no período serão compartilhados conforme o regime de bens, pois o
casamento gerará efeitos para ambos os cônjuges, já que estão de boa-fé. Ex.: direito de usar o
nome do outro cônjuge; emancipação decorrente do casamento, caso fosse menor de idade;
pensão alimentícia, etc.

• Se apenas um dos cônjuges estiver de boa-fé, o casamento irá gerar efeitos somente a ele e
aos filhos do casal. Só esse cônjuge poderá pleitear alimentos, usar o nome, etc.

• Se os dois estiverem de má-fé, o casamento somente gerará efeitos para os filhos. Os bens do
casamento serão divididos, mas não pela comunhão parcial de bens, mas pela vedação do

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enriquecimento sem causa. É a mesma regra da sociedade de fato, já que ambos estavam de má-
fé.

Direito de família.

X. Provas do casamento

Existem 3 tipos de formas comprobatórias de casamento:

• Certidão de registro do casamento

• Prova indireta, fundada na posse do estado de casado.


Para isso, são necessários 3 requisitos para sua comprovação.
o Nomen: um cônjuge tem que utilizar o nome de outro cônjuge.
o Tractatus: é o tratamento dado entre as partes, como se fossem casadas.
o Fama (reputatio): a sociedade reconhece naquelas partes pessoas casadas.

• Prova direta supletória


Supondo que o sujeito tenha se casado e se registrado, sendo extraído uma certidão a qual foi
perdida. Nesse caso, far-se-á prova direta complementar ou supletória. Justificada a perda do
registro civil, é admitida qualquer outra prova, como o passaporte.

XI. Efeitos pessoais do casamento e seus deveres

Pelo casamento, é estabelecido mutuamente a comunhão plena de vida. O casamento gera, nessa
condição de consortes, a comunhão plena de vida.

Como primeiro efeito concreto dessa comunhão plena de vida, qualquer dos cônjuges poderá
acrescer ao seu nome o sobrenome do outro.

O art. 1.566 consagra deveres de ambos os cônjuges:

• Fidelidade recíproca
Veda-se o concubinato, ou seja, não é apenas a vedação à monogamia.

• Vida em comum, no domicílio conjugal


Dentro do dever de coabitação há também o debitum conjugale, que é o dever de manter
relações sexuais. Este dever está mitigado, por conta da coabitação, visto que poderá trabalhar
fora, ou ainda estar casado e morar cada um em seus apartamentos.

• Mútua assistência

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Aqui, a assistência não é apenas a patrimonial, mas também moral, afetiva, patrimonial, sexual,
inclusive espiritual. Quanto à assistência patrimonial, o art. 1.568 diz que cada cônjuge é obrigado
a concorrer na proporção dos seus bens para sustento da família e educação dos filhos.

• Sustento, guarda e educação dos filhos


Esse dever não vai findar com o fim do casamento, persistindo apesar da sociedade conjugal não
persistir.

• Respeito e consideração mútuos


Aqui, encontra-se amparo para o dever de fidelidade, já que a quebra do dever de fidelidade, em
última instância, representa a quebra do dever de respeito e consideração. Haveria uma dupla
quebra dos deveres do casamento.

O art. 1.5670 diz que eventualmente a administração da sociedade conjugal e a direção da família
poderá ser exercida exclusivamente por um dos cônjuges. Em regra, há o compartilhamento da direção da
família.

Assumirá um dos cônjuges a administração da sociedade conjugal quando:

• um dos cônjuges estiver em um lugar remoto ou não sabido.


• um dos cônjuges estiver encarcerado por mais de 180 dias.
• um dos cônjuges tiver sido interditado.

XII. Efeitos patrimoniais do casamento e regime de bens

O regime patrimonial é um conjunto de regra de ordem privada, relacionado com interesses


patrimoniais resultantes daquela entidade familiar.

As regras que irão reger esses efeitos patrimoniais são denominados de regime de bens.

a) Princípios do regime de bens

O regime de bens é regido por alguns princípios:

• Princípio da autonomia privada


As partes poderão escolher um regime diferente do regime legal, inclusive adaptando os regimes,
desde que não viole norma de ordem pública.
O art. 1.639 diz que é lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos
seus bens, o que lhes aprouver. O exercício dessa autonomia privada se dá através de um
contrato ou pacto. Como esse pacto se dá antes da celebração do casamento (antes das núpcias),

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esse pacto é chamado de pacto antenupcial, que é um contrato que definirá o regime de bens
que surge da entidade familiar.
É possível criar um regime misto, combinando regras dos regimes previstos em lei, prevendo
regras diferentes.

• Princípio da indivisibilidade do regime de bens


O regime de bens é indivisível em relação aos cônjuges, não podendo ser um regime de bens
para um dos cônjuges e outro regime para o outro cônjuge.

• Princípio da variedade do regime de bens


Existem 4 possibilidades de regime de bens, prevalecendo a comunhão parcial de bens no caso
de omissão sobre essa disposição.

• Princípio da mutabilidade justificada


O Código Civil possibilita a alteração justificada do regime de bens, desde que haja autorização
judicial nesse sentido. O juiz apreciará as razões de justificação de alteração do regime de bens,
ficando ressalvados os direitos de terceiros, os quais não experimentarão o regime de bens
inicialmente fixado.
O NCPC, no art. 734, tratará da possibilidades e procedimentos especiais quanto à alteração de
regime de bens. Para promover a alteração de regime de bens, é preciso que a petição inicial seja
proposta por ambos os nubentes, sendo uma hipótese de jurisdição voluntária.
Ex.: quando João casa com Maria, a despeito de haver causa suspensiva do casamento, há uma
punição legal que estabelece a separação obrigatória de bens. Quando essa causa suspensiva é
vencida, é possível que João e Maria proponham ação visando a alteração de regime de bens.
O §1º do art. 734 diz que ao receber a petição inicial, o juiz vai determinar a intimação do MP e
a publicação de edital em que se divulgue essa pretendida modificação do regime de bens. Após
30 dias da publicação do edital, o juiz poderá decidir sobre a modificação do regime de bens.
Os efeitos da alteração do regime de bens são efeitos ex nunc, não retroagem, tendo efeito a
partir do trânsito em julgado da decisão que alterou o regime de bens.
O Código anterior não permitia a alteração do regime de bens, mas como o código atual permite
a alteração. No caso de ter ocorrido casamento antes do Código Civil de 2002, poderão alterar o
regime de bens, pois a alteração de regime de bens está situada no plano da eficácia. No que
toca à eficácia, o código civil diz no art. 2.035 fala que, em relação à eficácia, aplica-se as normas
da atualidade.

XIII. Regras gerais quanto ao regime de bens

O regime legal de bens é o da comunhão parcial.


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O art. 1.640, parágrafo único, diz que poderá os nubentes, no processo de habilitação, optar por
qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, será reduzido a termo a opção pela comunhão
parcial, sendo por outro regime de bens, será necessário fazer o pacto antenupcial por escritura pública.

Esse pacto se dá através de escritura pública, ou seja, o contrato de pacto antenupcial é solene.

O art. 1.641 impõe, para determinadas situações, o regime de separação de bens, ou de separação
obrigatória de bens:

• Pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do


casamento;
• Pessoa maior de 70 (setenta) anos;
• Todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

O inciso II, relativo aos maiores de 70 anos, doutrina alega que é de inconstitucionalidade desvairada.
Isso porque discrimina o idoso.

Segundo o STJ, a proteção matrimonial conferida ao noivo, nos termos do art. 258, parágrafo único,
II, do Código Civil de 1916, não se revela necessária quando o enlace for precedido de longo relacionamento
em união estável, que se iniciou quando os cônjuges não tinham restrição legal à escolha do regime de
bens. Em outras palavras, a proteção matrimonial conferida pelo art. 1.641, II, do Código Civil de 2002, não
deve ser aplicada quando o casamento for precedido de união estável que se iniciou quando os cônjuges
eram menores de 70 anos (Inf. 595).

O art. 1.642 e 1.643 consagram atos que podem ser praticados por qualquer dos cônjuges, sem a
necessidade de autorização do outro, independentemente do regime de bens adotado pelos consortes.

Um dos cônjuges poderá fazer sem autorização do outro:

• praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempenho de sua


profissão;
• administrar os bens próprios;
• desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados sem o seu
consentimento ou sem suprimento judicial
Promove-se uma ação anulatória, sendo desnecessária a autorização do outro cônjuge, qualquer
que seja o regime de bens do casamento. Essa ação anulatória deve ser proposta no prazo de 2
anos, contados do término do casamento e da sociedade conjugal.
• demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invalidação do aval, realizados pelo
outro cônjuge;

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Lembrando que para haver fiança é necessário que o outro cônjuge autorize. O caso é de ação
anulatória, com prazo de 2 anos, contados do fim do casamento e da sociedade conjugal.
Com relação ao aval, o CC prevê a possibilidade de invalidação. Parte da doutrina diz que esse
dispositivo é inaplicável, sendo preciso tutelar a boa-fé e a circulação do título de crédito.
• reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo outro cônjuge ao
concubino, desde que provado que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum destes,
se o casal estiver separado de fato por mais de 5 anos;
Até é possível anular a doação feita ao concubino, desde que se demonstre efetivamente que
não foi produto do esforço comum entre os cônjuges, e que não estejam separados de fato há
mais de 5 anos. Este dispositivo acaba não sendo mais aplicado, pois se houver uma separação
de fato, é possível que se esteja diante de uma união estável entre o doador e o donatário. O que
se veda é a doação ao concubino pelo sujeito que está casado e não separado de fato.
• praticar todos os atos que não lhes forem vedados expressamente;
• comprar, ainda a crédito, as coisas necessárias à economia doméstica;
• obter, por empréstimo, as quantias que a aquisição dessas coisas possa exigir.
Ou seja, poderá gastar sem autorização do outro cônjuge ou poderá obter empréstimo se é
utilizado para comprar bens necessários à economia doméstica.
Segundo a lei, há uma solidariedade passiva e legal por ambos os cônjuges.

O art. 1.647 diz que alguns atos e negócios jurídicos vão exigir a outorga conjugal. Se for da esposa,
essa outorga uxória. Sendo do marido, chama-se outorga marital.

Essa outorga não será sempre necessária, podendo ser dispensado quando os cônjuges forem
casados no regime de separação absoluta de bens.

Em relação à separação absoluta de bens, a doutrina diz que é possível a alienação de bens, imóveis
e móveis, sem a necessidade de outorga do outro cônjuge.

Mas em relação à separação obrigatória, existe uma certa polêmica, por conta da Súmula 377 do
STF, a qual estabelece que, no regime de separação legal de bens, comunicam-se os bens adquiridos na
constância do casamento. Se eles se comunicam, há uma aproximação do regime de separação legal de bens
para o regime de comunhão parcial de bens.

No caso do regime da separação obrigatória de bens, que decorre da lei, prevalece que é necessário
a outorga do outro cônjuge para alienar bens. A questão é se a súmula 377 tem ou não mais aplicação.

1ªC: Uma primeira corrente afirma que a súmula está cancelada, motivo pelo qual haveria separação
absoluta, tanto na separação convencional como na legal.

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2ªC: A segunda corrente, prevalente, afirma que a súmula não está cancelada, sendo necessária a
outorga, tendo como fundamento a vedação ao enriquecimento sem causa. Como se comunicam os bens na
constância do casamento, é necessária a outorga conjugal.

Será necessária a outorga conjugal quando:

• alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis


• pleitear, como autor ou réu, os direitos que recaem sobre bens imóveis
• prestar fiança ou aval
• fazer uma doação, desde que não seja remuneratória

São consideradas válidas as doações nupciais feitas aos filhos, quando estes se casarem, ou então
quando os filhos estabelecerem uma economia separada.

Para as demais, será necessária a outorga conjugal ou marital.

A falta de outorga conjugal pode ser suprida pelo juiz, podendo se dar quando:

• o cônjuge não puder conceder essa outorga


• o cônjuge denega essa outorga de forma injusta

A ausência de outorga conjugal, se não houver suprimento pelo juiz, vai gerar anulação do negócio
jurídico, sendo uma nulidade relativa. Para anular o negócio jurídico, será necessário propor ação anulatória,
que terá prazo decadencial de 2 anos, contados da dissolução da sociedade conjugal.

Esta ação poderá ser proposta tanto pelo cônjuge preterido como pelos herdeiros.

Em relação à administração dos bens do casamento, ambos os cônjuges administrarão


conjuntamente. Mas é possível que apenas um deles exerça essa administração, quando um deles não
puder exercê-lo. Neste caso, cabe ao cônjuge que exerce a administração dos bens sozinho gerir os bens
comuns e os bens do consorte.

Caberá a este consorte administrar bens em comuns, mas cabe a ele alienar os bens imóveis comuns,
e os bens móveis ou imóveis do consorte, desde que haja autorização judicial.

Ex.: o sujeito está tendo que administrar os bens do casal e da esposa sozinho, pois ela não pode
administrar naquele momento. A lei autoriza a sua administração sozinho, mas se for vender bens imóveis
comuns ou bens imóveis ou móveis do outro consorte, será necessária autorização do juiz para essa
alienação.

XIV. Regras quanto ao pacto antenupcial

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Pacto antenupcial é um contrato celebrado antes das núpcias, antes do casamento. O pacto
antenupcial é um contrato formal e solene (escritura pública), pelo qual as partes irão regulamentar as
questões patrimoniais relativas ao casamento.

Essas questões patrimoniais serão reguladas por um conjunto de regras denominado regime de bens.

O pacto antenupcial deverá ser feito por escritura pública, devendo ser feito no cartório de notas. É
nulo se não for por escritura pública.

Ainda que após a escrituração do pacto antenupcial os cônjuges deixem de se casar, este contrato
não será nulo, mas apenas ineficaz.

Supondo que o pacto antenupcial seja feito por instrumento particular, mesmo assim as partes se
casaram após alguns dias. Neste caso, o pacto antenupcial será tido como nulo, mas o casamento será válido.

A nulidade do pacto antenupcial não atinge a validade do casamento, mas neste caso o casamentos
será regido pelo regime da comunhão parcial de bens, que é o regime legal.

O art. 1.655 diz que é nula a convenção ou cláusula do pacto antenupcial que conflite com norma
de ordem pública. Ex.: cláusula que exclui o direito à sucessão no regime de comunhão parcial de bens, ou a
cláusula que consagra que a administração dos bens será exercida exclusivamente pelo marido.

Diante de uma nulidade de apenas uma cláusula do pacto antenupcial, não haverá a nulidade do
pacto por inteiro, por conta do princípio da conservação dos negócios jurídicos.

Para que o pacto antenupcial tenha efeitos erga omnes, este pacto deverá ser averbado no livro
especial do Registro de Imóveis do domicílio dos cônjuges.

A doutrina de Flávio Tartuce vai dizer que a eficácia perante terceiros vai decorrer da escritura
pública, pois este registro do pacto no Registro de Imóveis somente irá se justificar se tiverem bens imóveis.
Se o casal não tiver, este registro no cartório será desnecessária.

XV. Regime de bens

Existem 4 regimes de bens regulamentados e previstos pelo código civil:

• regime da comunhão parcial de bens


• regime da comunhão universal de bens
• regime de participação final dos aquestos
• regime da separação de bens

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Esse rol não é taxativo, sendo rol exemplificativo.

a) Regime da comunhão parcial de bens

Este é o regime legal.

A regra básica do regime de comunhão parcial de bens é a de que se comunicam os bens havidos na
constância do casamento. Os bens comunicáveis formam os aquestos. Em relação a estes aquestos, o outro
cônjuge terá direito à metade (meação).

Existem bens que não se comunicam (incomunicáveis), estando excluídos da comunhão, conforme
o art. 1.659:

• Bens que cada cônjuge já possuía ao se casar, e os bens havidos por doação ou sucessão, bem
como os sub-rogados em seu lugar não se comunicam;
• Bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação
dos bens particulares;
Ex.: Samer tinha um imóvel de 100 mil reais e uma doação de 100 mil reais. Durante o casamento,
Samer pega os 100 mil reais e vende o imóvel, comprando uma casa de 200 mil reais. Este bem
será incomunicável.
• Obrigações anteriores ao casamento;
• Obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
• Bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
• Proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
Inclui a aposentadoria do cônjuge. Todavia, os proventos recebidos durante a constância da
união ou da sociedade conjugal se comunicarão.
Samer recebe um salário de 10 mil reais. Esse salário não se comunica com a cônjuge. Mas ele
gasta 5 mil por mês e junta 5 mil por mês. Então, ao final de cada ano, Samer tem 60 mil reais.
Em 10 anos, há 600 mil reais. Quando houve o divórcio, a mulher terá direito à metade dos 600
mil, visto que foi incorporado ao patrimônio.
• Pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
Se envolver a regra acima mencionada, haverá a comunicação.

O art. 1.660 traz um rol de bens comunicáveis:

• Bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um
dos cônjuges;
• Bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
Ex.: valor decorrente de uma loteria se comunicará.
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• Bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;


• Benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
Comunicam-se as benfeitoria úteis, necessárias e voluptuárias em bens particulares de cada
cônjuge, apesar de o bem em si não se comunicar. As benfeitorias valorizam a coisa principal,
entendendo-se que este acréscimo patrimonial deve entrar na comunhão dos aquestos.
• Frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do
casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Ex.: durante a constância do casamento o cônjuge recebia valores do aluguel. No final, este
dinheiro deverá ser partilhado entre os cônjuges.
• Verbas trabalhistas que o cônjuge terá direito, se estas surgiram durante à união do casal.
Ex.: se o sujeito trabalhou durante 10 anos numa empresa, promoveu uma ação e recebeu 500
mil reais. Esta verba trabalhista, já que se originou na constância da sociedade conjugal também
irá se comunicar.

Além dessas previsões, a lei considera incomunicáveis os bens cuja aquisição tenha por título uma
causa anterior ao casamento. Ou seja, não irá se comunicar um bem aquele que tenha por motivo uma
causa anterior ao casamento.

Ex.: o sujeito é solteiro e vende um terreno por 300 mil reais. O comprador do terreno diz que vai
pagar em 10x de 30 mil reais. No segundo mês, o sujeito se casou, tendo mais 8 meses para receber 30 mil
reais. Este valor estará sendo recebido após a celebração do casamento, mas não irá se comunicar, pois se
trata de um bem que tenha por título uma causa anterior à celebração do casamento.

Relativamente aos bens móveis, o Código Civil consagra uma presunção relativa de que estes bens
foram adquiridos na constância da sociedade conjugal, motivo pelo qual deve haver a comunicação desses
bens.

A administração do patrimônio comum do casal compete a qualquer um dos cônjuges (princípio da


igualdade).

As dívidas contraídas no exercício dessa administração vão obrigar os bens comuns do casal, mas
também vão obrigar os bens particulares do cônjuge que está administrando os bens comuns.

A anuência de ambos os cônjuges é necessária para que determinados atos tenham efeitos e sejam
válidos. É necessária essa anuência para que atos impliquem a cessão ou uso de bens comuns tenham a
validade.

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Se for promovida a cessão de uso ou de gozo de um bem comum, para que haja validade dessa
cessão a título gratuito, é preciso a anuência do outro cônjuge. Ex.: usufruto, comodato, etc. Do contrário,
poderá o outro cônjuge propor ação anulatória dessa cessão.

Os bens da comunhão respondem por obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher, desde que
tenham sido contraídas para atender aos encargos da família.

Em relação à administração e à disposição dos bens constitutivos do patrimônio particular de cada


cônjuge, essa administração competirá ao cônjuge proprietário do bem particular. Poderá o pacto
antenupcial estabelecer de forma diversa.

É necessária a outorga conjugal para venda de bem imóvel que seja particular por um dos cônjuges
na comunhão parcial. Ou seja, ainda que se esteja diante de um bem particular, se o casamento foi celebrado
por comunhão parcial de bens, para haver a alienação deste imóvel, será exigido a outorga conjugal.

b) Regime da comunhão universal de bens

Aqui há uma comunhão universal, comunicando-se os bens anteriores, presentes e posteriores à


celebração do casamento. Há uma comunhão plena dos aquestos.

Entra não apenas os bens, mas também as dívidas de ambos os cônjuges, como regra.

A comunhão é plena, mas não é absoluta, havendo bens incomunicáveis.

São excluídos da comunhão universal:

• Bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;


• Bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a
condição suspensiva;
Fideicomisso é uma forma de substituição testamentária, prevendo um primeiro herdeiro,
denominado fiduciário, o qual será substituído por outro herdeiro, que é o fideicomissário.
Quando o bem estiver com o herdeiro fiduciário, haverá uma incomunicabilidade deste bem,
pois a propriedade desse bem fiduciário é uma propriedade resolúvel. O que há aqui é a proteger
o direito do fideicomissário.
• Dívidas anteriores ao casamento, salvo se tiverem como origem com o próprio casamento, ou
reverterem em proveito comum;
• Doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de
incomunicabilidade;

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• Bens de uso pessoal, livros, instrumentos de profissão, proventos de cada dos cônjuges,
pensões, etc.
• Em relação aos frutos, assim como a comunhão parcial, aplica-se a regra da comunhão parcial,
mesmo que retirados de bens incomunicáveis.

c) Regime de participação final dos aquestos

Esse regime tem pouquíssima aplicação.

A regra é de que, durante o casamento, há uma espécie de separação convencional de bens. E


quando o casamento se encerra, há algo próximo à comunhão parcial de bens.

Finda a união, cada cônjuge terá direito a uma participação dos bens pelo qual colaborou para a
aquisição. Deverá provar o esforço patrimonial para ter colaborado para o bem, mas terá direito à
participação dos aquestos.

Durante a sociedade conjugal a regra será como se estivessem casado em separação convencional
de bens.

Se um dos cônjuges solveu uma dívida do outro cônjuge, terá direito na hora do divórcio a imputar
tal valor na meação do cônjuge.

No caso de bens adquiridos pelo trabalho conjunto, cada um dos cônjuges terá uma cota igual neste
condomínio. Mas é possível que seja feita prova em contrário, no sentido de que um colaborou 70% e outro
com 30%. Presume-se que haja um condomínio igualitário.

Os bens imóveis são de propriedade do cônjuge cujo nome constar no registro. Este é o dono! Se
houver uma impugnação dessa titularidade, cabe ao cônjuge proprietário o ônus de provar que a aquisição
do bem foi regular e de forma individual. E essa prova é extremamente difícil. Neste caso, o ônus da prova
não será de quem alega.

O art. 1.682 diz que o direito da meação no regime de participação final dos aquestos é irrenunciável,
incessível e impenhorável.

d) Regime da separação de bens

O regime da separação de bens poderá ser convencional ou obrigatório (legal).

A regra básica é que não haverá comunicação de qualquer bem, seja ele posterior ou anterior à união.

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Eduardo Defaveri

Cabe a administração de cada bem pelo proprietário exclusivo de cada bem. Poderá alienar ou gravar
com ônus real os bens sendo imóveis e sem a outorga do outro. Ou seja, quando tratar de separação
convencional, não é necessária a outorga do outro cônjuge.

Por outro lado, na separação obrigatória, prevalece que é necessária a autorização do outro
cônjuge para alienar ou gravar de ônus real bens imóveis.

Conforme a súmula 377 do STF, no regime de separação legal, comunicam-se os bens adquiridos na
constância do casamento.

3. Dissolução da sociedade conjugal e do casamento

O art. 226 da CF, em seu §6º, diz que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.

Para Flávio Tartuce e para muitos doutrinadores, essa EC 66 teria revogado a separação de direito e
teria revogado dispositivos sobre essa separação.

Ocorre que, na V Jornada de Direito Civil, foram aprovados enunciados que concluíram pela
manutenção da separação jurídica (ou de direito) no sistema jurídico.

O Enunciado 514 diz que a EC 66/10 não extinguiu a separação judicial ou extrajudicial.

O Enunciado 517 diz que a EC 66/10 extinguiu os prazos previstos no código civil, sendo mantido o
divórcio por conversão.

Nessa mesma linha, o NCPC reafirmou a existência do instituto da separação de direito. O NCPC, no
art. 53, I, fixa a competência da ação de separação da seguinte forma:

3. Foro do domicílio do guardião do filho incapaz


4. Não havendo filho incapaz, a ação de separação terá como órgão competente o último domicílio
do casal
5. Caso nenhum dos ex-cônjuges residir no antigo domicílio do casal, será competente o foro do
domicílio do réu

A ação de separação judicial corre em segredo de justiça, tendo acesso apenas partes e advogados,
podendo eventualmente, com autorização judicial, um terceiro ter acesso ao dispositivo da sentença.

Com relação ao divórcio e a separação consensuais, o art. 731 do NCPC estabelece que as suas
homologações poderão ser requeridas em petição assinada por ambos os cônjuges, da qual constarão
disposições relativas à descrição e partilha dos bens comuns do casal, disposições entre a pensão alimentícia

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entre os cônjuges, acordo em relação à guarda dos filhos incapazes, regime de visitas e valor da contribuição
para criar e educar os filhos. Poderá ser feita esta partilha após a homologação do divórcio.

Nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para alcançar uma solução consensual
da controvérsia, dispondo o juiz de profissionais de outras áreas que tenham conhecimento e apliquem na
mediação ou na conciliação.

Com essa finalidade de solução consensual da controvérsia, quando receber o juiz a petição inicial,
se for o caso, analisará possíveis tutelas provisórias. Em seguida, determinará a citação do réu para
comparecer a uma audiência de conciliação e mediação.

Nesta citação, a lei vai dizer que o mandado de citação conterá apenas os dados para comparecer à
audiência de mediação e conciliação. Esse mandado de citação vai desacompanhado da cópia da inicial.

Sendo infrutífera a audiência de conciliação e mediação, passa a incidir a partir de então as normas
de procedimento comum.

O Ministério Público, nas ações de família, só irá intervir quando houver interesse de incapaz. Neste
caso, o MP deverá sempre ser ouvido da homologação do acordo.

Eventualmente, o divórcio, separação ou extinção da união estável poderão ser feitos


consensualmente através de escritura pública, lavrada em cartório, desde que:

• Não se trate de ex-cônjuges com nascituro (mulher grávida)


• Não tenham filhos incapazes

Do contrário, havendo nascituro ou filhos incapazes, serão realizados pelo poder judiciário.

O tabelião só irá lavrar a escritura pública se ambos os cônjuges estiverem assistidos por advogado.
Poderá ser 1 advogado para ambos.

O art. 1.571 diz que a sociedade conjugal termina:

• Pela morte de um dos cônjuges


• Pela nulidade ou anulação do casamento
• Pela separação judicial
• Pelo divórcio

No §2º a lei diz que, dissolvido o casamento pelo divórcio, o cônjuge poderá manter o nome de
casado, salvo se houver uma disposição em sentido contrário na sentença judicial.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Flávio Tartuce entende que em relação à separação judicial deve ser tido como revogado.

E a dissolução do casamento por morte presumida em razão da ausência?

Como se sabe, o art. 1.571, §1º, diz que o casamento do ausente se desfaz no caso de morte
presumida, de forma que seu ex-cônjuge estará livre para casar com terceiro.

A morte presumida se tem quando o sujeito desaparece. Declara-se ausente e é feita a arrecadação
de bens. Aguarda-se 1 ano na arrecadação de bens, e, após, há abertura da sucessão provisória. Após 10
anos, é aberta a sucessão definitiva. No momento em que é aberta a sucessão definitiva, considera-se que
houve a morte presumida do ausente e portanto está extinto a sociedade conjugal.

Mas e se o ausente se fizer presente, reaparecendo após o prazo, e o ex-cônjuge já estiver casado?

Neste caso, há duas posições:

1ªC: o segundo casamento é válido, com base na boa-fé.

2ªC: o segundo casamento é inválido.

Tartuce defende o 1º posicionamento.

I. Questões pontuais relativas ao tema da dissolução da sociedade conjugal e do casamento após


a EC 66/2010

Para Flávio Tartuce não há mais qualquer modalidade de separação, seja judicial ou extrajudicial.
Não haveria mais a separação sanção, separação remédio ou separação falência.

Na mesma linha, não teria mais sentido a possibilidade de reconciliação de casais separados
juridicamente.

Além disso, teria desaparecido a razão para se discutir a possibilidade de reconciliação do casal por
escritura pública.

Vale lembrar que a separação de fato continua plenamente vigente. Logo, continua trazendo
consequências:

• Cônjuge separado de fato poderá constituir união estável com outra pessoa, podendo o bem
se comunicar com a companheira.
• Uma corrente reconhece que uma separação de fato por um longo tempo põe fim a uma
sociedade conjugal.

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Em outras palavras, o STJ entende que uma pessoa que se separou de fato por um longo período pôs
fim à sociedade conjugal.

Direito de família.

II. Manutenção do conceito de sociedade conjugal

O conceito de sociedade conjugal estaria vigente?

Se não há mais separação judicial não haveria mais importância prática no estudo da sociedade
conjugal, pois quando ela é extinta pelo divórcio, estará extinto o casamento. Diante disso, como as hipóteses
seriam da extinção do casamento e, consequentemente, da sociedade e conjugal, não haveria necessidade
de separação desses institutos.

Mas em várias passagens legais há uma referência na sociedade conjugal e até mesmo na própria
separação de fato, que poderá configurar uma causa de extinção da sociedade conjugal, já que é possível
uma união estável pelo separado de fato, sem dissolver o casamento.

A sociedade conjugal é um ente despersonalizado, formado pelo casamento, estando relacionada


com os deveres de coabitação, fidelidade recíproca e regime de bens, formado pelo casamento.

A sociedade conjugal está inserida no conceito de casamento. A separação jurídica (ou de direito),
que continua sendo regulamentada pelo Novo CPC, coloca fim à sociedade conjugal, apesar da emenda e do
entendimento de abolição da separação jurídica. É necessário respeitar os atos anteriores à EC 66, sendo
imperioso que os atos anteriores são perfeitos. Logo, existem pessoas separadas juridicamente e não
divorciadas, podendo essas pessoas se divorciarem desde já.

Por tudo isso, é forçoso convir que sociedade conjugal não se confunde com o casamento.

Outra questão que justifica é a questão da separação de fato, que poderá extinguir a sociedade
conjugal, reconhecendo a união estável das pessoas separadas de fato com outra pessoa.

III. Divórcio

Divórcio coloca fim no casamento. Terminando o casamento, também está encerrado a sociedade
conjugal, a qual está inserida no casamento.

Além do divórcio judicial, passou-se a possibilitar o divórcio extrajudicial, movimento denominado


de desjudicialização.

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A EC 66/10 aboliu o chamado divórcio por conversão ou divórcio indireto, que exigia um prazo
mínimo. Hoje, vigora o divórcio direto.

O art. 733 do NCPC possibilita o divórcio extrajudicial, desde que ele seja consensual. Neste caso, o
divórcio deve se dar por escritura pública, não podendo ter um filho incapaz, quer seja menor ou maior,
mas relativamente incapaz.

Lavrada essa escritura pública, constarão as disposições relativas à partilha dos bens do casal, pensão
alimentícia entre os cônjuges, acordo sobre a guarda dos filhos, desde que se trate de filhos incapazes, regime
de visitações do outro cônjuge, valor de contribuição que o outro cônjuge vai prestar ao outro para criar e
educar os filhos (art. 731).

O art. 1.581 do CC diz que o divórcio pode ser concedido sem que haja prévia partilha de bens. Pode
ser que o ex-casal estejam concordando quanto ao divórcio, mas não quanto á partilha de bens.

A partilha posterior de bens poderá ser feita por 3 caminhos:

• Nos próprios autos da ação de divórcio


• Ação autônoma de partilha de bens
• Havendo consenso, por escritura pública (partilha extrajudicial)

É possível que haja cumulação de uma ação de divórcio com a ação de partilha de bens. Nesse caso,
Flávio Tartuce ressalta que seria o caso de julgamento antecipado parcial do mérito, precisamente no que
toca ao divórcio, continuando o processo em relação à discussão dos outros pedidos, como é a partilha de
bens. É a possibilidade de aplicação de julgamento antecipado parcial do mérito. Uma decisão interlocutória
com a possibilidade de julgar coisa julgada material.

A ação de divórcio é personalíssima, cabendo somente ao cônjuge. Mas se o cônjuge estiver numa
situação de incapacidade, como interdição, poderá o curador, ascendente ou irmão propor essa ação.

IV. Possibilidade de se discutir culpa para o divórcio do casal

Existe essa discussão na doutrina. Isso porque a partir da extinção da separação jurídica, poderia se
discutir culpa no divórcio ou não.

O entendimento prevalente é no sentido de que não se pode discutir culpa no divórcio.

Flávio Tartuce entende que é possível. Em determinadas situações, discutir de quem é a culpa no
divórcio pode ser uma discussão que tenha relevância jurídica, como é o caso de atribuição de
responsabilidade civil ao cônjuge (indenização por danos morais, ex.), fixação de alimentos (alimentos

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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necessários para subsistência). Ele ainda afirma que em algumas situações parece teratológico não se atribuir
culpa ao outro cônjuge, como é o caso de violência doméstica, ou ainda no caso de transmissão de doença
grave ao cônjuge, ou ainda no caso de o cônjuge ter uma família paralela (concubinato). Então, Tartuce diz
que nesses casos poderia se discutir culpa.

Todavia, prevalece que não se discute culpa.

A ação de divórcio pode ser cumulada com a ação de reparação de danos, caso em que, ainda que
seja cumulada, o feito correrá na vara de família.

V. A questão do uso do nome pelo cônjuge

O Código Civil possibilita que um dos cônjuges utilize o nome do outro.

O art. 1.578 diz que o cônjuge declarado culpado na separação perde o direito de usar o sobrenome
do outro cônjuge. O próprio código excepciona essa regra, prevendo que o cônjuge culpado, em
determinadas situações, poderá continuar utilizando o sobrenome do cônjuge inocente:

• Quando a alteração do sobrenome implicar verdadeiro prejuízo para a sua identificação.


• Quando houver uma manifesta distinção entre o nome do cônjuge culpado e os filhos havidos da
união dissolvida.
• Quando houver um dano grave na decisão judicial, causado pela retirada do sobrenome do ex-
cônjuge.

O cônjuge inocente poderá renunciar ou não o direito de usar o sobrenome do outro cônjuge. Na
verdade, via de regra, cabe essa opção, sendo um direito personalíssimo.

Flávio Tartuce e a doutrina prevalente entendem que, com a EC 66, não há mais influência da culpa
na manutenção do sobrenome do outro cônjuge após o divórcio. Isso porque o nome incorporado pelo
cônjuge constitui um direito da personalidade. Sendo assim, o direito ao nome é um direito fundamental,
ligado à dignidade da pessoa humana.

O art. 1.571, §2º, diz que dissolvido o casamento pelo divórcio, o cônjuge pode manter o nome de
casado. É comum que ex-casais tenham nome de casal até os dias de hoje.

VI. O problema da guarda na dissolução do casamento

O art. 1.583 diz que a guarda será unilateral ou compartilhada.

A guarda unilateral ocorre quando um dos pais terá a guarda, sendo regulamentado o direito de
visitação do outro.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Na guarda compartilhada, o infante mora com um dos pais, mas tem contato cotidianamente com o
outro ascendente. Segundo o STJ, fatores geográficos são aptos a impedir a guarda compartilhada.

Tartuce diz que a guarda compartilhada pressupõe pessoas civilizadas de ambos os lados.

O art. 1.583, §2º, diz que, na guarda compartilhada, o tempo de convivência com o filho deve ser
dividido de forma equilibrada com a mãe e o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e o interesse
dos filhos.

O §3º diz que na guarda compartilhada a cidade considerada base da moradia do filho é aquela que
atender à necessidade dos filhos.

Tartuce critica esse dispositivo, sustentando que a guarda compartilhada, segundo esta disposição,
é aquela em que o filho fica alguns dias na cidade onde a mãe mora e outros dias na cidade em que o pai
mora, ou quando há distribuição do tempo. Na verdade, isto não é guarda compartilhada e sim uma guarda
alternada.

O art. 1.583, §5º, diz que a guarda unilateral obriga o pai e a mãe, que não detenha a guarda, a
supervisionar os interesses do filho. A fim de possibilitar essa supervisão, qualquer dos genitores que não
tenha a guarda terá a legitimidade para prestar informações e prestar contas de assunto que interessa ao
filho, direta ou indiretamente.

É a ideia de fiscalização da atuação do ex-cônjuge que tenha a guarda do menor.

Perceba que a fixação da guarda compartilhada não gera a obrigação de prestar alimentos. Visto que
está compartilhando a convivência e não os encargos. A fixação de alimentos deve sempre observar o
binômio: necessidade e possibilidade. Alguns acrescentam ainda a proporcionalidade.

O art. 1.584 diz que a guarda unilateral ou compartilhada pode ser efetivada por dois meios:

• Requerida por consenso pelo pai ou pela mãe, ou qualquer deles numa ação autônoma.
• Decisão judicial, decretada pelo juiz, observando os interesses do menor e levando em conta o
tempo que cada um dos pais possui.

Na audiência de conciliação numa ação em que se pleiteia a guarda, o juiz vai informar o significado
e a importância da guarda compartilhada. É importante que haja guarda compartilhada, significando que
haverá ainda o duplo referencial de pai e mãe.

Se não for observada as cláusulas compartilhadas, poderá o juiz aplicar algumas sanções.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O §2º vai diz que, se não houver acordo entre os pais quanto à guarda do filho, e se ambos estiverem
aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um deles expressamente
declarar que não deseja a guarda do menor.

É com base nisso que a guarda compartilhada passa a ser a modalidade compulsória e regra da
guarda. Portanto, se os dois podem exercer o poder familiar, o juiz fixará a guarda compartilhada, passando
a ser a regra.

De acordo com o STJ, a guarda compartilhada somente deixará de ser aplicada quando houver
inaptidão de um dos ascendentes para o exercício do poder familiar, fato que deverá ser declarado, prévia
ou incidentalmente à ação de guarda, por meio de decisão judicial (Inf. 595).

Assim, para a Ministra, a guarda compartilhada somente não será aplicada em dois casos:

• Se o genitor declarar que não deseja a guarda do menor;


• Se houver uma decisão judicial suspendendo ou determinando a perda do poder familiar do
genitor (inaptidão para o exercício do poder familiar).

O § 2º do art. 1.584 somente admite duas exceções em que não será aplicada a guarda
compartilhada. Todavia, o STJ está dividido sobre a possibilidade de relativização do dispositivo:

1ªC: Pela redação do art. 1.584 do CC, a guarda compartilhada apresenta força vinculante, devendo
ser obrigatoriamente adotada, salvo se um dos genitores não estiver apto a exercer o poder familiar ou se
um deles declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor. Nesse sentido: STJ. 3ª Turma. REsp
1626495/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 15/09/2016.

2ªC: As peculiaridades do caso concreto podem servir como argumento para que não seja
implementada a guarda compartilhada. Ex: se houver dificuldades geográficas (pai mora em uma cidade e
mãe em outra, distante). STJ. 3ª Turma. REsp 1605477/RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em
21/06/2016.

Vale ressaltar, ainda, que, conforme entendimento do STJ, a simples animosidade entre os genitores
e suas diferenças de ponto de vista sobre a criação dos filhos não são impedimento para a fixação da guarda
compartilhada.

O §3º do art. 1.584 vai dizer que, para estabelecer as atribuições do pai e da mãe, e os períodos de
convivência entre os pais e o menor, no caso de guarda compartilhada, poderá o juiz, de ofício ou por
requerimento do MP, se basear em laudo da equipe técnico-profissional, a fim de verificar a realidade dos
pais.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Tartuce diz que para haver guarda compartilhada, os pais devem se respeitar, mas é possível
encontrar decisões do STJ afirmando que, a despeito das dificuldades de relacionamento, mantém uma
guarda compartilhada.

Se houver o descumprimento imotivado da guarda, seja unilateral ou compartilhada, haverá


redução das prerrogativas atribuídas ao seu detentor.

Se o juiz perceber que o filho não deve permanecer na guarda dos pais, poderá deferir essa guarda
a uma terceira pessoa, que demonstre essa compatibilidade com a natureza da guarda. O juiz vai considerar
preferencialmente as relações de parentesco, afinidade e principalmente relações de afeto entre a criança
ou adolescente e a pessoa que irá deter a guarda do menor.

O art. 1.584, §6º, diz que qualquer estabelecimento é obrigado a prestar informações a qualquer dos
genitores sobre seus filhos, sob pena de multa de 200 reais a 500 reais por dia de não atendimento. O CC
está dizendo que, mesmo sem ter a guarda, os pais têm direito a ter notícias do filho.

Hoje, há basicamente 4 modalidades de guarda:

• Guarda unilateral: uma pessoa tem a guarda, enquanto a outra tem regulamentado o direito de
visitação.
• Guarda alternada: o filho permanece um tempo com o pai e outro tempo com a mãe. É uma
guarda ping-pong, ou guarda mochila. É muito criticada.
• Guarda compartilhada: os pais dividem as atribuições relacionadas ao filho, convivendo com
ambos os pais. O filho mora com o pai, mas é a mãe que almoça todos os dias com o filho.
• Guarda da nidação (aninhamento): é a guarda do ninho. Os filhos permanecem no mesmo
domicílio em que o casal dissolvido morava. Por conta disso, o pai vai para o apartamento e a
mãe vai para outro apartamento, mas a casa em que moravam continuam sendo a mesma. A
mãe ficará de segunda a quinta no antigo apartamento e o pai nos demais dias. O problema é
que gera um custo muito alto para os pais, restando inviabilizado.

Ressalta-se que a guarda compartilhada não implica isenção de pagamento de pensão alimentícia.
Isso porque o que é compartilhado é a convivência.

Segundo o STJ, sem a demonstração cabal de que um dos ex-cônjuges não está apto a exercer o
poder familiar, o julgador não pode indeferir pedido de guarda compartilhada.

Se houver motivos graves, o juiz pode, em qualquer caso, regular de forma diferente as regras de
guarda. A lei diz, no art. 1.586, que em homenagem ao melhor interesse do menor, o juiz poderá fixar regras

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diferentes para o menor. Todas essas normas serão aplicadas e o juiz poderá eventualmente adaptar uma
norma à outra, a depender da situação.

Essas regras serão aplicadas ainda que se trate de casamento inválido, inexistente, anulado, etc. Isso
porque, mesmo o casamento nulo, produz efeitos em relação aos filhos, ainda que estivessem de má-fé.

Se o pai ou a mãe contrair novas núpcias, não haverá qualquer problema. Só poderá ser privado do
filho no caso em que se prove que o filho não está sendo mais tratado covenientemente.

O art. 1.589, parágrafo único, irá estender o direito de visita aos avós.

Além da previsão legal, é possível estender o direito de visitação a outras pessoas que guardem
uma afinidade com o menor. Ex.: é o caso do padrasto que sempre cuidou da criança. É possível
regulamentar essa visitação pelo juiz, a despeito de inexistência de previsão legal.

VII. Alimentos na dissolução do casamento

Na separação judicial litigiosa, se um dos cônjuges é o inocente e estiver desprovido de recursos, o


outro cônjuge culpado irá prestar os alimentos fixados pelo juiz. Essa é a redação do art. 1.702.

A lei diz que o cônjuge declarado culpado na separação judicial não poderá pleitear alimentos ao
cônjuge inocente, salvo os alimentos necessários, e se não tiver parentes para prestar alimentos.

Após a EC 66, 3 correntes doutrinárias surgiram:

1ªC: Diante da impossibilidade total da discussão de culpa, esses dispositivos estariam revogados.
Não existiriam mais alimentos necessários para o cônjuge culpado pelo cônjuge inocente. Maria Berenice
Dias.

2ªC: Admite a discussão desses comandos legais, mas apenas numa ação autônoma de alimentos.
José Fernando Simão diz que não houve a revogação dessas normas no código civil e não é possível discutir
essa culpa na ação de divórcio.

3ªC: É possível a discussão de culpa na ação de divórcio. A questão de alimentos poderia ser discutida
nessa demanda ou em ação autônoma. Flávio Tartuce diz que esses dispositivos não estariam revogados.

A 2ª corrente deve ser a prevalente para concursos.

4. União estável

I. Introdução

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A CF reconhece a união estável como uma entidade familiar. Essa união estável é a união entre
homem e mulher. Há o animus famili.

A lei deverá facilitar a conversão da união estável em casamento. No entanto, não há hierarquia entre
entidades familiares.

O art. 1º da Lei 9.278/96 diz que é reconhecida como entidade familiar a união estável entre um
homem e uma mulher, configurada na convivência duradoura, pública e contínua, estabelecida com
objetivo de constituição de família (animus famili).

São requisitos para a caracterização da união estável:

• A união deve ser pública: não pode ser oculta, clandestina;


• A união deve ser duradoura: ou seja, estável, apesar de não se exigir um tempo mínimo;
• A união deve ser contínua: sem que haja interrupções constantes;
• A união deve ser estabelecida: objetivo de constituir uma família;
• As duas pessoas não podem ter impedimentos para casar;
• A união entre essas duas pessoas deve ser exclusiva: é impossível a existência de uniões estáveis
concomitantes e a existência de união estável se um dos componentes é casado e não separado
de fato.

Esse objetivo de constituir família é presente, enquanto no namoro esse objetivo é futuro. É isto
que se diferencia do namoro. Na união estável, há a constituição da família com a mulher no presente.

A lei não fala em prazo mínimo para constituição da união estável, tampouco uma prole comum.
Além disso, a lei não exige que companheiros coabitem sob o mesmo teto.

Ademais, os impedimento matrimoniais vão impedir a caracterização de união estável, havendo,


portanto, concubinato, mas não irão se aplicar quando se está diante de uma pessoa casada e já separada
de fato ou separada judicialmente. Ou seja, os impedimento para o casamento impedem a configuração de
união estável, mas esses impedimentos, quando se está diante de uma pessoa separada de fato ou de direito,
e essa também é impedida de casar, esta não estará impedida de constituir união estável. Ou seja, nem todos
os impedimentos do casamento impedem a configuração da união estável.

As causas suspensivas do casamento não impedem a união estável. Mas o STJ tem entendido pela
aplicação da separação obrigatória de bens. Apesar de se tratar de uma norma restritiva, o STJ aplica por
analogia à união estável. Ou seja, se a pessoa constituiu união estável a despeito de uma causa suspensiva
de casamento, haverá o regime de separação obrigatória de bens.

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Não se pode confundir união estável com concubinato. O art. 1.727 traz um conceito de concubinato,
sustentando que as relações não eventuais constituídas entre homem e mulher impedidos de casar,
constituem concubinato. Veja, aquela “pulada de cerca” não é concubinato, e sim adultério. Concubinato é
um adultério reiterado.

O concubinato não constitui uma entidade familiar, e sim uma sociedade de fato.
Consequentemente, não há direito à meação, alimentos, direitos sucessório, etc. Veja, é possível falar em
direitos patrimoniais no concubinato, desde que se trate de bens adquiridos em sua constância e pelo
esforço comum.

A ação, no que toca ao reconhecimento ou dissolução do concubinato, é uma a de dissolução da


sociedade de fato, não correndo na Vara de Família, e sim na vara cível, eis que não se trata da família.

Pela literalidade da norma, não há que se reconhecer o paralelismo entre casamento e união
estável. Tartuce afirma que, se a união paralela durar muitos anos, e sendo ela de conhecimento do outro
cônjuge, não haveria outro caminho senão presumir que o outro cônjuge aceitou tal situação o
relacionamento paralelo. E sendo esse reconhecimento confirmado, será necessário dar um tratamento
diferente ao caso, inclusive sob o ponto de vista da divisão de bens.

O STF discorda desse entendimento do Tartuce, em que a pensão ficou integralmente com a esposa.

Uma segunda pontuação é o caso em que se admite que o cônjuge casado possa estar separado de
fato, ainda que esteja residindo sob o mesmo teto. Houve na situação a quebra do afeto, podendo ser
comprovado pela a ausência de prática de relação sexual. Na verdade, já estariam separados de fato, apesar
de morar na mesma residência.

Essa conclusão abre a possibilidade de deixar de ser concubinato e se tornar união estável.

Outro problema envolve as uniões estável plúrimas ou união estável paralelas, em que a pessoa
convive em união estável com mais de um companheiro. João trabalha de segunda a quinta no RJ, tendo uma
companheira. Nas sextas-feiras, João vai para Petrópolis e encontra outra companheira. Uma não sabe da
outra. Neste caso haveria duas correntes:

1ªC: Nenhum relacionamento será união estável, visto que a união estável seria exclusiva,
considerando ambos os relacionamentos como concubinato.

2ªC: O primeiro relacionamento é a união estável. Os relacionamentos que se firmarem a partir daí
serão uniões estáveis putativas em analogia ao cônjuge de boa-fé. Ou seja, não haveria o segundo

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relacionamento, mas como estava de boa-fé, haveria a incidência dos efeitos da união estável, mas em
relação ao sujeito de má-fé, por saber das duas relações, incidiria as regras do concubinato para ele.

3ªC: Maria Berenice Dias defende que todas as uniões são estáveis, pois é preciso valorizar o afeto.

O STJ adota a 1ª corrente, repudiando a ideia de uniões estáveis plúrimas ou paralelas.

a) Namoro qualificado

O namoro qualificado possui diversas características em comum com a união estável, podendo ser
com ela facilmente confundido. De fato, ambos os tipos de relacionamento são de cunho romântico-afetivo,
externados publicamente para a sociedade e costumam ser duradouros, denotando estabilidade,
compromisso e um forte vínculo entre os envolvidos.

Entretanto, cada um apresenta efeitos jurídicos absolutamente diversos. Por exemplo, a união
estável possui regime de bens e, quando dissolvida, gera divisão patrimonial e obrigação de prestar
alimentos, enquanto o namoro qualificado não é causa para nenhum desses efeitos.

Com a evolução do direito para se aproximar dos modelos mais atuais de família, muitos requisitos
anteriormente considerados pertinentes para a definição de união estável, passaram a ser considerados
destoantes do contexto social. Assim, não se exige mais que a união se dê com a residência de ambos os
conviventes no mesmo imóvel, como também não se exige qualquer lapso temporal mínimo para que se
considere constituída e tampouco há a necessidade de que o casal tenha filhos para que seja considerada
uma modalidade de família a merecer proteção do Estado.

A união estável pode ser conceituada, modernamente, como o relacionamento afetivo-amoroso


duradouro e público entre pessoas de sexos diferentes ou do mesmo sexo, residentes sob o mesmo teto ou
não, com affectio maritalis, ou seja, ânimo de constituição de família.

Com toda a simplificação dos pressupostos para configuração da união estável, aprofundou-se ainda
mais a aparente semelhança entre essa modalidade de família e o relacionamento classificado como namoro
qualificado. Isso porque nos dias atuais é bastante comum que namorados residam juntos, que tenham
longos namoros, que participem intensamente da vida social e familiar um do outro e que compartilhem,
inclusive, contas bancárias e cartões de crédito.

Com tantos aspectos semelhantes, afinal, como diferenciá-los?

A principal diferença entre a união estável e o chamado namoro qualificado reside no fato de que a
primeira é família constituída no momento atual, enquanto o namoro qualificado é um relacionamento em
que os namorados meramente alimentam uma expectativa de constituição de uma família no futuro.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Assim, no namoro qualificado há planos para constituição de família, há projetos para o futuro,
enquanto na união estável há uma família plena já constituída que transmite a imagem externa de um
casamento, ou, em outras palavras, transmite a “aparência de casamento”.

Numa situação concreta, podemos ter um casal que more num mesmo apartamento já há um ou dois
anos e tenha uma conta poupança conjunta e, prontamente, classificar seu relacionamento como união
estável. Entretanto, este casal pode estar tão somente acumulando recursos para um futuro casamento, ou
para adquirir um imóvel próprio onde construirão sua vida juntos, podendo tal situação ser enquadrada na
modalidade de namoro qualificado, se existir apenas um projeto futuro de família.

Em recente decisão de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, a 3ª Turma do STJ empreendeu
séria análise do instituto do namoro qualificado em face da união estável (STJ – 3ª Turma, REsp. Nº 1.454,643-
RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, DJe. 10.03.2015).

O caso apresentado perante a Corte Superior versava sobre um casal que conviveu durante dois anos
em um apartamento no exterior antes de se casarem. Na época, ele viajou para aceitar uma proposta de
trabalho enquanto ela o seguiu com a intenção de fazer um curso de Inglês e acabou permanecendo mais
tempo devido ao seu ingresso num Mestrado. Noivaram ainda no exterior e o rapaz adquiriu com seus
recursos pessoais um apartamento próprio que seria a residência familiar após o casamento. Casaram-se em
setembro de 2006 adotando como regime a comunhão parcial de bens, regime no qual somente há partilha
dos bens adquiridos onerosamente na constância do casamento. Em 2008, entretanto, adveio o divórcio.
Assim, a ex-mulher ingressou em juízo pleiteando o reconhecimento e a dissolução de união estável que,
segundo ela, existiu durante o período de dois anos anterior ao casamento. Sob esse argumento, o
apartamento adquirido por ele à época deveria ser partilhado entre ambos.

Em primeira e segunda instâncias, a ex-mulher saiu vitoriosa. Entretanto, ao apreciar o recurso


interposto pelo ex-marido, o Ministro Bellizze teve entendimento diverso. Segundo ele, não houve união
estável, “mas sim namoro qualificado, em que, em virtude do estreitamento do relacionamento, projetaram,
para o futuro, e não para o presente, o propósito de constituir entidade familiar”.

O ministro ainda aduziu que nem mesmo o fato de ter existido a coabitação do casal era suficiente
para evidenciar uma união estável, já que a convivência no mesmo imóvel se deu apenas devido à
conveniência de ambos em razão de seus interesses particulares à época.

Assim, a situação examinada seria tão somente um namoro qualificado, pois não estava presente a
affectio maritalis, ou seja, o escopo de constituir família naquele momento.

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Com muita propriedade, o ministro elucidou a questão ao afirmar que, para que estivesse constituída
a união estável, era preciso que a formação do núcleo familiar “com compartilhamento de vidas e com
irrestrito apoio moral e material” estivesse concretizada e não apenas planejada.

Para Rolf Madaleno,"a união estável exige pressupostos mais sólidos de configuração, não bastando
o mero namoro, por mais estável ou qualificado que se apresente, porquanto apenas a convivência como
casal estável, de comunhão plena e vontade de constituir família concretiza a relação estável, da qual o
namoro é apenas um projeto que ainda não se desenvolveu e talvez sequer evolua como entidade familiar".

Desta feita, podemos concluir que, para determinar se um relacionamento se configura como união
estável ou como mero namoro qualificado, é necessário proceder análise minuciosa do caso concreto a fim
de detectar a presença ou não do elemento subjetivo que se traduz no animus de constituir família com o
pleno compartilhamento da vida e o mútuo suporte espiritual e material irrestrito. A esse animus, portanto,
resume-se toda a questão.

II. Efeitos pessoais e patrimoniais da união estável

O efeito pessoal da união estável está no art. 1.724, em que traz os deveres dos companheiros:

• Dever de lealdade: está o dever de fidelidade.


• Dever de respeito
• Dever de mútua assistência
• Dever de guarda, sustento e educação dos filhos.

O art. 1.725 diz que na união estável, salvo se houver um contrato de convivência, aplicar-se-á o
regime de bens da comunhão parcial.

Portanto, presume-se que os bens adquiridos na constância da união estável são bens do casal.

O contrato de convivência pode ser lavrado por escritura pública, em tabelionato, mas também
poderá ser lavrado por um instrumento particular, o qual poderá ou não ser registrado em Cartório de Títulos
e Documentos, a fim de gerar publicidade para terceiros.

O art. 1.725 diz que será aplicado o regime da comunhão parcial de bens no que couber, pois há
dispositivos que não serão aplicados à união estável, pois derivam do casamento.

Ex.: não se exige na união estável a outorga conjugal para a alienação de imóvel. Isso porque, no
casamento, quando se exige a outorga conjugal para alienação de bem imóvel, há a imposição de uma norma
restritiva a quem está casado, pois só se fala em cônjuge. Como a norma é restritiva, a interpretação deverá
ser restritiva.

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No entanto, os companheiros podem celebrar um contrato escrito entre si estipulando regras


patrimoniais específicas que irão vigorar naquela união estável. Ex.: empresários, esportistas ou artistas
milionários costumam assinar contratos com suas companheiras estabelecendo que, naquela união estável,
irá vigorar o regime da separação de bens. Isso é denominado pela doutrina de "contrato de convivência"
ou "contrato particular de convívio conjugal".

No caso do casamento, se os nubentes desejarem fazer um pacto antenupcial, o Código Civil exige
que isso seja formalizado por meio de escritura pública. Contudo, para o contrato de união estável não se
exige esta mesma formalidade.

Diferentemente do casamento, o Código Civil exigiu apenas que isso fosse feito por contrato escrito,
não obrigando a lavratura de escritura pública ou qualquer outra providência notarial ou registral. Este
inclusive é o teor do art. 1.725, o qual estabelece que, na união estável, salvo contrato escrito entre os
companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.

Inclusive o CNJ editou o Provimento 37/2014, a fim de dispor sobre o registro da união estável no
Livro "E", por Oficial do Registro Civil da Pessoas Naturais. Este provimento deixa claro que não é obrigatório
o registro do contrato de convivência nem a sua celebração por escritura pública, sendo apenas de caráter
facultativo.

Por conta disso, o STJ decidiu que é válido, desde que escrito, o pacto de convivência formulado
pelo casal no qual se opta pela adoção da regulação patrimonial da futura relação como símil (igual) ao
regime de comunhão universal, ainda que não tenha sido feito por meio de escritura pública. Em outras
palavras, um casal que vive (ou viverá) em união estável pode celebrar contrato de convivência dizendo que
aquela relação será regida por um regime de bens igual ao regime da comunhão universal. Esse contrato,
para ser válido, precisa ser feito por escrito, mas não é necessário que seja realizado por escritura pública
(Inf. 595).

Com relação ao contrato de convivência, este não se confunde com o chamado "contrato de
namoro". Contrato de namoro é um pacto escrito celebrado entre duas pessoas no qual elas declaram que
mantêm entre si apenas um namoro e não uma união estável. O contrato de namoro não tem relevância
jurídica, considerando que não tem a eficácia jurídica de garantir para as partes envolvidas o objetivo que
elas almejavam ao celebrá-lo, qual seja, o de evitar a caracterização da união estável. Explicando melhor:
mesmo que as partes tenham celebrado este contrato, o Poder Judiciário poderá reconhecer que, na
prática, havia sim união estável (e não simples namoro).

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Se a intenção é evitar a comunhão patrimonial, logo que o namoro se tornar mais estável, o ideal é
a realização de um contrato de convivência na qual seja estipulado que o regime de bens entre o casal é o da
separação total.

O art. 1.726 diz que a união estável poderá se converter em casamento, desde que haja pedido dos
companheiros ao juiz e posterior assento no registro civil.

Aqui há uma contradição à regra de facilitação do casamento, pois para se casar não é necessário ir
até o poder judiciário, mas para converter a união estável em casamento é preciso.

O STJ entende que é possível a alteração de assento registral de nascimento para incluir o
sobrenome do companheiro na constância da união estável, aplicando-se a regra do art. 1.565, §1º, por
analogia, desde que haja prova documental nesse sentido.

O art. 1.694 assegura os alimentos entre os companheiros, sendo aplicáveis à união estável as
mesmas regras do casamento, em relação às verbas alimentares.

Por fim, o NCPC teve uma feliz opção de equalizar expressamente união estável e casamento. O NCPC
em várias vezes fala em “cônjuge ou companheiro”.

Direito de família.

III. União homoafetiva e seu enquadramento como união estável

Em relação à união homoafetiva, sempre existiram 2 correntes. Uma primeira que dizia que união
homoafetiva não era família, e sim sociedade de fato. Esta corrente prevaleceu durante muito tempo.

Hoje, a corrente adotada é a que entende que a união homoafetiva é uma entidade familiar, sendo
equiparada à união estável, tendo os mesmos efeitos. O argumento é de que o rol constitucional que prevê
as famílias é exemplificativo. Isso porque a CF tem um caráter pluralista, consagrando uma cláusula de
inclusão, e não de exclusão. Além disso, o direito à sexualidade é um direito fundamental, não podendo ser
privado do indivíduo.

Essa segunda corrente é a adotada pelo STJ e pelo STF. Não é demais lembrar que o Supremo
entendeu pela aplicação de todas as regras da união heteroafetiva à união homoafetiva.

A equiparação é no sentido de que:

• A união estável homoafetiva será reconhecida quando houver uma união pública, duradoura,
contínua e estabelecida com o objetivo de constituir família. São os mesmos requisitos, não
exigindo apenas a distinção de sexo.
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• Os deveres daqueles que vivem em união homoafetiva são os mesmos que vivem em união
heteroafetiva. Veja, se há o dever de guarda, sustento e educação dos filhos, significa que é
possível a adoção pelo casal homoafetivo.
• É possível ainda que se converta a união homoafetiva em casamento. Se é possível converter em
casamento, também deve ser possível a celebração direta do casamento. A partir dessa
equiparação constitucional, chega-se a conclusão de que é possível o casamento homoafetivo.

5. Relações de parentesco

Relação de parentesco é o vínculo jurídico estabelecido entre pessoas, com origem consanguínea,
por afinidade e civil.

Existem 3 modalidades de parentesco admitidas pelo direito:

• Parentesco consanguíneo (natural): o vínculo existente entre as pessoas é biológico.


• Parentesco por afinidade: é o parentesco do genro com a sogra. É o vínculo entre o cônjuge ou
o companheiro com os parentes do outro cônjuge e companheiro. Lembre-se que marido e
mulher não são parentes entre si. Há um vínculo de conjugalidade. Esse parentesco se limita à
linha ascendente, descendente e colateral até 2º grau. Ainda, na afinidade, o vínculo por
ascendência não se extingue.
• Parentesco civil: é qualquer parentesco que decorra de outra origem. Normalmente, é o vínculo
por adoção. Há outras situações que geram parentesco civil, tais como técnica de reprodução
heteróloga (utilizada com material genético de terceiro) e também o caso da parentalidade
socioafetiva.

I. Graus de parentesco

O art. 1.591 diz que são parentes em linha reta:

• Ascendentes
• Descendentes

O art. 1.594 diz que se contam, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações.

O pai de Samer é o ascendente em 1º grau. O avô é o ascendente em 2º grau. O filho de Samer é o


descendente em 1º grau e o neto é de 2º grau.

O art. 1.592 diz que são parentes em linha colateral, até o 4º grau, as pessoas provenientes de um
só tronco. Ex.: Samer não descende do primo e nem do seu tio, então o parentesco é colateral. Só existe
parentesco colateral até o 4º grau.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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A segunda parte do art. 1.594 diz que se conta o número de graus, de acordo com o número de
gerações, subindo de um dos parentes até o ascendente comum, e depois descendo até encontrar o parente.

Samer e seu primo não descendem do mesmo tronco, por isso são parentes em linha colateral. Neste
caso, deverá contar até o ascendente comum com o primo, que é o avô deles. Do Samer até o pai há um
grau, depois mais um grau do pai para o avô (2 graus). Em seguida, conta-se mais um grau para alcançar o
tio e desce mais um grau para alcançar o primo. Veja, Samer e seu primo são parentes de 4º grau.

Conclui-se que não há parentesco colateral de 1º grau, pois é necessário subir um grau e verificar o
parente que se tem o grau de parentesco.

II. Filiação

Filiação é a situação jurídica entre ascendente e descendente de 1º grau, de pai e filho.

O art. 1.597 traz algumas presunções de filiação:

• Presume-se concebidos na constância do casamento o filho nascido 180 dias depois de


estabelecida a convivência conjugal.
• Os filhos nascidos nos 300 dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, seja por morte,
divórcio, separação judicial, por nulidade ou anulação, presumem-se que decorra do casamento
dissolvido.

O art. 1.598 diz que, salvo prova em contrário, se antes de decorrido o prazo de 10 meses do fim da
sociedade conjugal, a mulher contrair novas núpcias e lhe nascer um filho, a regra mudará:

• Se o filho nascer nos primeiros 300 dias, há uma presunção de que o filho é do primeiro
casamento.
• Haverá uma presunção de que o filho é do segundo marido, se o filho nascer após os 300 dias do
fim do primeiro matrimônio, desde que já exista mais de 180 dias do início do segundo
casamento.

Outra presunção é os filhos decorrentes de fecundação artificial homóloga, isto significa que foi feita
pelo material genético dos próprios cônjuges. Neste caso, presume-se que foi havido do primeiro casamento
os filhos havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que já falecido o marido.

Presume-se havidos na constância do casamento os filhos havidos a qualquer tempo, quando se


tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga. Veja, há um embrião que
foi concebido de forma artificial que é inserida na mulher. A fecundação aqui foi in vitro, na proveta.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Também se presume havidos na constância do casamento os filhos havidos por concepção artificial
heteróloga, desde que tenha havido prévia autorização do marido. Há uma presunção de filiação. Após a
autorização e feita a concepção heteróloga, não há mais como desistir de ser o pai. Essa presunção é absoluta
de filiação.

O STJ entende que essas presunções de concepção sobre quem é o pai também são aplicáveis, por
analogia, à união estável.

É possível ainda a utilização da técnica de reprodução assistida heteróloga em casos de união


homoafetiva.

O STJ já admitiu a adoção unilateral pela união estável homoafetiva, a qual ocorre quando o adotando
não perde o vínculo originário que tem. Isto é, a companheira homoafetiva da mulher que se submeteu à
reprodução assistida heteróloga adota o filho da mulher que vai nascer. Trata-se de adoção unilateral,
gerando filiação.

Nas hipóteses de técnica de reprodução assistida heteróloga, prevalece o entendimento da


impossibilidade de quebra do sigilo do doador. Ou seja, quem doou o material genético não poderá ser
divulgado, ainda que a criança esteja desamparada.

a) Gestação de substituição (barriga de aluguel)

Um tema interessante é a gestação de substituição (barriga de aluguel). No Brasil, não é admitida a


sua modalidade onerosa. Esta gestação de substituição vem regulamentada por uma Resolução 2121/2015
do CFM, devendo ser realizada de forma gratuita.

Esse empréstimo da barriga ou do útero é admitido apenas no âmbito familiar, e no parentesco até
o 4º grau. Isto só será admitido até a prima, até a tia ou até sobrinha neta.

A mãe, neste caso, será quem foi a doadora do material genético (genetrix), ou seja, a mulher que
gera é a gestatrix, que é não será a mãe.

b) Afastamento da presunção de paternidade

O art. 1.599 diz que a prova de impotência do marido para gerar à época de concepção vai afastar
a presunção de paternidade dos casos mencionados acima. Ou seja, se foi constatada a impotência
generandi, está quebrada a presunção.

O art. 1.600 diz que não basta o adultério da mulher para elidir a presunção legal da paternidade.

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Eduardo Defaveri

O art. 1.602 diz que não basta a confissão materna para excluir essa presunção de paternidade. Isto
significa que não basta, após um período, afirmar que o filho não é do suposto pai e sim de um terceiro. A
simples confissão não quebra a presunção de paternidade.

O art. 1.601 diz que cabe ao marido o direito de contestar a paternidade daqueles filhos nascidos de
sua mulher, sendo este questionamento imprescritível. Se essa filiação for contestada, os herdeiros de
quem impugnou a filiação tem direito de continuar com a ação se o suposto pai morrer ao longo do feito.

Vale ressalvar que o enunciado 520 do CJF diz que o conhecimento da ausência de um vínculo
biológico e a posse do estado de filho obsta essa contestação posterior da paternidade presumida. O
sujeito sabe que o filho não é dele, mas registra o filho em seu nome (adoção à brasileira). Ou sabe que o
filho não é seu, mas mesmo assim cria a criança como se fosse seu. Após um longo período, não é mais
possível bater às portas do judiciário e informar que o filho não é seu. Está formada a paternidade
socioafetiva.

c) Multiparentalidade

Multiparentalidade é a possibilidade de um pai ter mais de um pai e mais de uma mãe.

É crescente na jurisprudência a admissão dessa multiparentalidade. Há uma decisão do TJ-SP em que


se reconhece a dupla maternidade. No caso, o sujeito era casado e a mulher morreu no parto, ficando com
a criança. Mais tarde, ele acaba se casando de novo. A madrasta passa a cuidar da criança como se fosse sua
filha. Os avós paternos e maternos continuaram presentes, assim como os pais da madrasta.

O TJ-SP entendeu que estaríamos diante de uma dupla maternidade, pois teria duas mães: a que
morreu e a madrasta.

d) Prova da filiação

Ainda, o art. 1.603 diz como a parentalidade deve ser provada. O dispositivo diz que a filiação deve
ser provada pela certidão do termo de nascimento registrada no registro civil.

O art. 1.604 diz que ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de
nascimento, salvo se provar que o que está no registro é falso ou equivocado o registro.

Essa ação vindicatória é possível desde que se funde na falsidade ou no erro do registro civil.

No caso de socioafetividade há a criação de um parentesco civil, não podendo mais alegar a falsidade
ou erro do registro civil, pois o afeto gerou a filiação.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Na falta da certidão do termo de nascimento, a filiação poderá ser provada por qualquer outra forma
admitida em direito (art. 1.605). São admitida provas supletivas da filiação, podendo ser por escrito, ou
presunções relativas resultantes de fatos certos e conhecidos, como a posse do estado de filho.

e) Ação de prova de filiação

A ação de prova de filiação pode ser proposta pelo filho. É uma ação personalíssima. É possível que
haja a transmissão aos herdeiros, caso o filho morrer menor ou incapaz.

Quem propõe a ação é o filho, pois ela é personalíssima, mas se ele morrer menor ou incapaz, a ação
post mortem pode ser proposta pelos seus herdeiros.

Caso a ação seja iniciada pelo filho, os herdeiros poderão continuar a ação.

O Enunciado 521 do CJF diz que qualquer descendente tem legitimidade, por direito próprio, para
propor o reconhecimento do vínculo de parentesco em face dos avós, ainda que o seu pai não tenha iniciada
a prova de filiação.

O que é tratado aqui é a ação avoenga, a qual é proposta pelo neto em face dos avós para que se
reconheça o vínculo entre o avô e o pai. A jurisprudência é pacífica na sua admissão.

Contudo, o STJ entendeu que o filho, em nome próprio, não tem legitimidade para deduzir em juízo
pretensão declaratória de filiação socioafetiva entre sua mãe – que era maior, capaz e, ao tempo do
ajuizamento da ação, pré-morta (já falecida) – e os supostos pais socioafetivos dela. Neste caso, o filho teria
legitimidade para propor ação pedindo o reconhecimento de sua relação de parentesco socioafetivo com os
pretensos avós. Aí, contudo, seria outra ação, na qual se buscaria um direito próprio (e não de sua mãe).

III. Reconhecimento de filho

O reconhecimento de filho pode se dar de duas formas:

• Voluntária (perfiliação)
• Compulsória (judicial)

a) Reconhecimento voluntário

O art. 1.609 traz hipóteses de reconhecimento voluntário de filhos:

• No registro de nascimento da criança


• Por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório no registro de pessoas
naturais

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Por testamento, legado ou codicilo, ainda que incidentalmente manifestado;


• Por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o
objeto único e principal do ato que o contém.

Esse reconhecimento de filho poderá preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu
falecimento, se ele deixar descendentes (reconhecimento post mortem).

No reconhecimento post mortem, o reconhecimento do filho depois da morte somente será admitido
se esse filho tiver deixado descendentes, a fim de que não haja interesse escuso na herança. Ou seja, o filho
morre e o suposto pai reconhece, após a morte do filho, a sua filiação. Só será possível se já tiver herdeiros.

O art. 1.610 diz que o reconhecimento do filho é irrevogável, ainda que este reconhecimento conste
de testamento. O testamento é revogável, mas mesmo assim se constar o reconhecimento de filho, haverá
um reconhecimento irrevogável.

O reconhecimento de filho é um ato jurídico stricto sensu. Ou seja, reconhece-se o filho, mas os
efeitos desse reconhecimento decorrem da lei.

Atente-se que esse reconhecimento do filho, conforme o art. 1.614, não pode ser feito se o filho for
maior sem o seu consentimento. E mesmo o filho menor poderá impugnar esse reconhecimento nos 4
primeiros anos após a sua maioridade, ou ao menos a sua emancipação.

O fato da aceitação e consentimento do filho maior e da não impugnação do filho menor, assim que
tenha se tornado capaz, não desnaturam a natureza do reconhecimento que é ato jurídico.

O art. 1.614, no que toca à previsão de 4 anos após a maioridade do filho menor para impugnar a sua
paternidade, tem sido afastado, no sentido de que não se pode fixar um período de 4 anos para que venha
a juízo e conteste esse reconhecimento da paternidade.

Na verdade, poderá vir a juízo contestar essa paternidade a qualquer tempo. Isso porque se está
diante de uma impugnação ao estado da pessoa. E por estar relacionado ao estado de pessoas não envolve
qualquer prazo decadencial, sendo imprescritível.

Caso seja maior, o reconhecimento só será possível se houver consentimento do filho.

O ato de reconhecimento de filho é incondicional. Qualquer condição ou termo estabelecido no ato


de reconhecimento é tido como ineficaz.

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O at. 1.611 diz que o filho havido fora do casamento e reconhecido por um dos cônjuges não poderá
residir no lar conjugal sem o consentimento do outro cônjuge. Guilherme Calmon diz que esta norma é
inconstitucional, pois violaria a proteção integral e o melhor interesse da criança.

b) Reconhecimento judicial

O reconhecimento judicial é o reconhecimento forçado, em que se dá por meio de uma ação


investigatória de paternidade ou maternidade, caso não se saiba quem é a mãe.

Essa ação se funda em estado de pessoa, sendo imprescritível.

O art. 27 do ECA diz que o reconhecimento ao estado de filiação é direito personalíssimo,


indisponível e imprescritível.

Esse direito de filiação pode ser exercitado contra os pais ou contra os herdeiros, sem qualquer
restrição, respeitado o segredo de justiça.

O foro competente para o processamento e julgamento da ação de investigação de paternidade é:

• Em regra, é o foro do domicílio do réu.


• Se houver pedido de alimentos, será o do domicílio do alimentando.
• Se houver cumulação com petição de herança, será competente o juízo do inventário, caso seja
antes da partilha.
• Caso a partilha já tenha sido feita, será competente o domicílio de qualquer dos herdeiros.

Se houver pendência do julgamento da ação de investigação de paternidade, a ação de petição de


herança deverá correr na Vara de Família, onde corre a ação de investigação de paternidade.

Em relação à legitimidade ativa, a ação, por ser personalíssima, deve ser proposta pelo filho, ou pelo
Ministério Público, na condição de substituto processual. Segundo a teoria concepcionista, o nascituro
também teria legitimidade para propositura da ação.

O STJ admite a ação de neto contra o avô.

No que toca à legitimidade passiva da ação investigatória, será proposta em face do suposto pai ou
da suposta mãe. Caso tenham falecidos, a ação será proposta contra os herdeiros da pessoa investigada,
pois esta ação tem caráter pessoal e não patrimonial, não podendo ser proposta contra o espólio.

Não havendo herdeiros, a ação investigatória poderá ser proposta contra a União ou contra o
município, que serão quem irão receber os bens.

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Também poderá essa ação ser proposta contra o avô, se estivermos diante de uma ação avoenga.

Proposta a ação, é possível a contestação. O art. 1.615 vai dizer que qualquer pessoa que tenha justo
interesse poderá contestar a ação investigatória. Ou seja, o cônjuge, o companheiro ou os herdeiros, têm
legitimidade para contestar a ação de paternidade.

Em relação aos alimentos, a súmula 277 do STJ diz que julgada procedente a ação de investigação de
paternidade, o pagamento dos alimentos são devidos desde a citação.

A parentalidade socioafetiva na ação de investigação de paternidade acabou se tornando um objeto


comum no feito, fundada na posse de estado de filho, pois é possível que a socioafetividade gere essa
paternidade.

Ainda, uma questão relevante é a ideia de obrigação ou não de realizar o exame de DNA, a fim de
que se ateste a paternidade.

O STF entende que o direito à intimidade biológica do suposto pai prevalece sobre o direito da busca
da verdade biológica ou da identificação genética do suposto filho. O STF diz que não se pode conduzir o pai
à obrigatoriedade da realização do exame. Todavia, essa sua negativa conduz à presunção relativa de
paternidade.

Nesse mesmo sentido, os arts. 231 e 232 do CC dizem que aquele que se nega a se submeter ao
exame médico necessário para atestar qualquer coisa não poderá se aproveitar da sua recursa. O art. 232 diz
que a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia se obter com aquele
exame.

A Súmula 301 do STJ diz que em ação de investigação de paternidade, a recusa do suposto pai a se
submeter ao exame de DNA induz à presunção iuris tantum de paternidade.

Outro ponto importante é a chamada relativização da coisa julgada na ação investigatória.

A jurisprudência dos tribunais superiores têm relativizado a coisa julgada em casos de ações de ações
investigatória em que o pedido tenha sido julgado improcedente por falta de provas em época que não havia
o exame de DNA.

Nesse sentido, o Enunciado 109 do CJF diz que a restrição da coisa julgada oriunda das demandas
reputadas improcedentes por insuficiência de provas não devem prevalecer para inibir a busca da identidade
genética do investigando.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Ainda, a verdade biológica, com relação direta com a dignidade humana do suposto filho, vai
prevalecer sobre a coisa julgada.

IV. Adoção

Não existem mais dispositivos no Código Civil regulamentando efetivamente o tema.

O art. 1.618 diz que a adoção de crianças e adolescentes será feita na forma prevista no ECA.

E mesmo quando trata de maior, o art. 1.619 diz que a adoção de maior dependerá de uma
assistência efetiva do poder público, de sentença constitutiva, mas serão aplicadas, no que couber, as regras
previstas no ECA.

Segundo Maria Berenice Dias, adoção é um ato jurídico em sentido estrito, o qual tem a sua eficácia
condicionada à uma chancela judicial. Portanto, só se admite adoção judicial.

A adoção cria um vínculo fictício de maternidade e paternidade e a filiação, entre pessoas


originariamente estranhas.

A adoção sempre depende de uma sentença judicial, seja de maior ou de menor, sendo inscrita no
registro civil, mediante mandado judicial.

O processo de adoção correrá na Vara de Infância e Juventude, caso seja menor, ou da Vara de
Família, caso se trate de um maior de idade.

A intervenção do MP será sempre obrigatória, pois se está tratando de questão de estado de pessoas,
ou seja, de ordem pública.

A adoção é medida excepcional e irrevogável. Excepcional porque somente se recorre quando há o


esgotamento de todos os recursos para manter aquele menor na sua família natural, ou ainda na sua família
extensa.

• Família natural é a comunidade formada pelos pais, ou qualquer deles, e os seus descendentes.
• Família extensa é a família ampliada, ou seja, aquela que se estende para além da unidade pai e
filhos.

Irrevogável porque esse vínculo estabelecido não pode mais voltar atrás.

Poderá adotar apenas aqueles que tiverem mais de 18 anos.

A adoção pode ser tanto unilateral quanto conjunta. Para a adoção conjunta, é indispensável que o
casal seja casado civilmente ou ao menos mantenham união estável.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

No entanto, o §4º do art. 42 diz que os divorciados, judicialmente separados ou os ex-companheiros


podem adotar conjuntamente, desde que acordem sobre a guarda, regime de bens e o estágio de convivência
com a criança ou adolescente tenha se iniciado anteriormente, na constância do período de convivência do
casal.

Se for possível, poderá a guarda ser compartilhada.

O art. 42, §3º, do ECA diz que o adotante deve ser ao menos 16 anos mais velho que o adotando.
Sendo um casal, deverá o membro mais jovem do casal ser ao menos 16 anos mais velho que o adotando.

A adoção poderá ser efetuado pelo tutor ou curador em face do seu pupilo, tutelado ou curatelado.
Isso só ocorrerá após a prestação de contas de sua administração, ou seja, saldar eventuais débitos,
momento em que a adoção poderá ocorrer (art. 44, ECA). Se adotar, é preciso que antes tenha prestado
contas eventuais débitos existentes.

A consolidação do instituto da adoção, em regra, dependerá do consentimento dos pais ou dos


representantes legais do menor a ser adotado. Se este menor tiver 12 anos, é preciso que ele também
concorde com a adoção.

Sendo ele for menor de 12 anos, a lei não fala desse consentimento do menor.

Vale lembrar que o consentimento dos pais será dispensado se eles serem desconhecidos ou tiverem
sido destituído do poder familiar.

O art. 41 do ECA diz que a adoção atribui a condição de filho ao adotado, tendo ele os mesmos
direitos, deveres e direitos sucessórios, desfazendo qualquer vínculo com os pais e parentes anteriores, salvo
em relação aos impedimentos matrimoniais.

Se um dos cônjuges ou companheiros adota o filho do outro (adoção unilateral), mantém o vínculo
do adotando com o pai biológico.

A decisão que defere a adoção vai conferir ao adotado o sobrenome do adotante. Eventualmente, é
possível que se determine a modificação do prenome do adotando, desde que haja pedido do adotando
ou do adotante.

Caso haja modificação do prenome do adotando, e ela tiver sido requerida pelo adotante, a lei vai
dizer que é obrigatória a oitiva do adotando se ele tiver mais de 12 anos.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Em relação aos efeitos da adoção, eles começam a surtir a partir do trânsito em julgado da decisão
que concede a adoção. Excepcionalmente, se o adotante falecer no curso do procedimento (adoção post
mortem) a sentença terá efeitos a partir da data do óbito.

O art. 42, §6º, diz que a adoção pode ser deferida ao adotante que depois de inequívoca
manifestação de vontade falecer no curso do processo, antes de prolatada a decisão. É a chamada adoção
post mortem.

Se, no curso da ação de adoção conjunta, um dos cônjuges desistir do pedido e outro vier a falecer
sem ter manifestado inequívoca intenção de adotar unilateralmente, não poderá ser deferido ao interessado
falecido o pedido de adoção unilateral post mortem. Tratando-se de adoção em conjunto, um cônjuge não
pode adotar sem o consentimento do outro. Assim, se proposta adoção em conjunto e um dos autores
(candidatos a pai/mãe) desiste da ação, a adoção deve ser indeferida, especialmente se o outro vem a morrer
antes de manifestar-se sobre a desistência.

O art. 39, §2º, veda a adoção por procuração, pois a adoção tem caráter personalíssimo. É vedada
ainda a adoção por ascendente ou por irmão.

Não existe vedação da adoção por tio, por sobrinho, etc.

No entanto, existe a vedação de avô adotar o neto e a vedação de irmão adotar o outro.

Este é o termo da lei. Isso porque a jurisprudência do STJ já entendeu a possibilidade de adoção de
descendente por ascendente em razão das peculiaridades do caso concreto, como no caso em que a filha
ficou grávida com 8 anos de idade, em decorrência de abuso sexual. Nesta situação, o STJ entendeu por bem
admitir a adoção pelos avós do seu neto, em virtude de que os dois haviam sido criados como se irmãos
fossem.

O art. 46 do ECA diz que a adoção será precedida de um estágio de convivência. Então a adoção, via
de regra, é precedida de um estágio de convivência da criança e do adolescente.

Esse estágio de convivência pode ser eventualmente dispensado, se o adotando já estiver em tutela
ou guarda legal do adotante.

A simples guarda de fato não dispensa o estágio de convivência.

Ainda, se estivermos diante de uma adoção internacional, o estágio de convivência terá o prazo
mínimo de 30 dias e sempre ocorrerá.

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O art. 48 do ECA diz que o adotado tem direito de conhecer a sua origem biológica. Veja, não é caso
de doação de sêmen. Neste caso, o adotado terá direito a obter acesso irrestrito ao processo no qual a
medida foi aplicada, inclusive a incidentes processuais, desde que tenha completado 18 anos.

Isso porque o direito à verdade biológica é direito fundamental.

O parágrafo único do art. 48 vai possibilitar esse acesso ao processo de adoção inclusive ao menor
de 18 anos, desde que haja requerimento nesse sentido. Neste caso, ficará assegurado ao menor a
orientação e assistência jurídica e psicológica.

V. Poder familiar e o problema da alienação parental

Poder familiar é o poder exercido pelos pais em relação aos filhos, dentro da ideia atual de família
democrática, colaboração familiar e relações baseadas no afeto, segundo o melhor interesse da criança ou
adolescente.

Doutrina afirma que o poder familiar deve ser denominado de autoridade parental.

O poder familiar será exercido pelo pai e pela mãe, em igualdade de condições. Os filhos estão
sujeitos ao poder familiar enquanto forem menores.

O art. 1.632 deixa claro que separação judicial, divórcio ou dissolução de união estável não alteram
relações de pais e filhos, inclusive o direito à convivência, ainda que haja alguma alteração na situação.

É o art. 1.632 o fundamento básico para a chamada responsabilidade civil por abandono afetivo,
havendo a quebra do dever de companhia. Se há a quebra desse dever, há um direito de indenização em
decorrência dessa quebra, ou seja, responsabilidade civil pro abandono afetivo.

São atribuições do poder familiar:

• Dirigir a educação e criação dos filhos


• Exercer a guarda dos filhos, seja unilateral ou compartilhada
• Conceder aos filhos ou negar-lhes consentimento ao casamento e à viagem ao exterior
• Conceder ou negar aos filhos o consentimento para que mudem de residência permanente
quando esta mudança implique em mudança de município
• Nomear tutor por testamento, se o outro pai não lhe sobreviver ou se outro não puder exercer
o poder familiar
• Representar ou assistir aos filhos
• Reclamar os filhos de quem ilegalmente detenha as crianças e adolescentes

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• Exigir que os filhos lhe prestem obediência, respeito e os serviços próprios da sua idade e da sua
condição.

Em relação a essa última atribuição do poder familiar, a obediência e respeito não podem ser
exercidas de maneira desarrazoada. Tanto é que visando dar concretude à ideia de razoabilidade na
educação, no dever de obediência do filho, entrou em vigor no Brasil a Lei da Palmada (Lei Menino Bernardo).

Essa lei alterou dispositivos do ECA e inseriu o art. 18-A, que diz ter a criança ou adolescente o direito
de ser criado sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante como forma de correção,
disciplina ou educação.

A lei é polêmica, mas a ideia da lei não é proibir o castigo, e sim vedar o tratamento degradante,
cruel, etc.

Os pais ainda não podem explorar economicamente o filho, não podendo imputar ao filho serviços
que não compatíveis com a sua idade e a sua condição.

A quebra desse dever do poder familiar, ou seja, o exercício abusivo do poder familiar poderá implicar
a suspensão ou mesmo a extinção do poder familiar.

Em relação aos efeitos do poder familiar, pai e mãe são tratados como usufrutuários dos bens dos
filhos. No entanto, os pais não poderão alienar os bens dos filhos e tampouco gravar com ônus reais, salvo
se houver necessidade ou se for melhor para o filho, caso em que será indispensável a autorização judicial.

Se estes atos de alienação ou disposição serem realizados sem autorização judicial, o ato de
disposição será tido como nulo.

Colidindo os interesses dos pais com os dos filhos, a requerimento do filho ou do MP, o juiz irá dar
ao filho um curador especial.

Cessará o poder familiar:

• Pela morte dos pais


• Pela morte dos filhos
• Pela emancipação
• Pela maioridade
• Pela adoção
• Pela decisão judicial

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Os fundamentos para a destituição do poder familiar pelo juiz poderão ser vários, como o castigo
imoderado do filho, abandono do filho, prática de atos contrários à moral e aos bons costumes, quebra de
deveres inerentes ao poder familiar, etc.

O poder familiar é suspenso quando o pai ou a mãe é condenado por sentença transitada em julgado
por prática de crime, tendo sido fixado uma pena superior a 2 anos de prisão (art. 1.637, parágrafo único).

a) Alienação parental

A alienação parental é a alienação do filho feita por um dos pais.

É também conhecida de implantação de falsas memórias.

Maria Berenice Dias diz que em muitas vezes um dos cônjuges não consegue se conformar com o
término da relação, passando a haver uma rejeição que faz surgir naquele cônjuge um desejo de vingança.
Essa vingança gera um processo de destruição do outro cônjuge perante o seu filho.

O genitor aliena o filho contra o outro cônjuge.

A Lei 12.318 diz em seu art. 2º que se considera alienação parental a interferência na formação
psicológica na criança ou adolescente que é promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou por
quem detenha a criança ou adolescente sob sua autoridade, a fim de que essa criança ou adolescente repudie
o genitor, causando prejuízos à manutenção de vínculos com ele. Há o processo de destruição da imagem do
genitor.

A alienação parental é um ato ilícito, podendo gerar responsabilidade civil do alienador, pois no seu
direito de guarda e poder familiar exerceu de forma abusiva.

Ficando caracterizada a alienação parental, o juiz poderá:

• declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador


• para compensar isso, poderá aumentar o regime de convivência familiar com genitor que sofreu
os efeitos decorrentes da alienação parental
• estipular uma multa ao alienador
• determinar o acompanhamento psicológico ou biopsicossocial da criança, do genitor alienador e
do genitor alienado.
• Alteração da guarda
• Declarar a suspensão da autoridade parental do genitor

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Por fim, o fato do pai ou da mãe contrair novas núpcias, ou estabelecer nova união estável, não faz
com que o pai ou mãe perca o poder familiar.

Direito de família.

6. Alimentos

I. Alimentos no Código Civil de 2002

Alimentos são prestações destinadas a satisfação de necessidades pessoais do alimentando. Essas


necessidades que a pessoa tem, mas que não consegue prover por si mesma.

São pressupostos para que exista o direito a alimentos:

• Vínculo entre alimentante e alimentando (casamento, parentesco ou união estável)


• Necessidade do alimentando
• Possibilidade do alimentante

Necessidade e possibilidade forma um binômio alimentar. MHD diz que precisar ter possibilidade,
necessidade e proporcionalidade, ou seja, um trinômio alimentar.

O STJ diz que os alimentos entre os cônjuges têm caráter excepcional, pois se estiver diante de um
cônjuge trabalhador, poderá buscar o seu sustento pelo seu esforço próprio. Nesse caso, poderá fixar os
alimentos como transitórios.

O art. 1.703 diz que, para manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente irão contribuir
na proporção de seus sustentos. Ou seja, os pais serão obrigados a contribuir proporcionalmente com os
alimentos.

II. Características da obrigação de alimentos

São características da obrigação alimentar:

• A obrigação de alimentos gera direito personalíssimo. Somente o alimentando é o titular do


direito, ou seja, somente ele poderá pleitear, tendo caráter intuito personae.

• Deverá haver reciprocidade. A obrigação de alimentos é recíproca entre cônjuges,


companheiros, pais e filhos, ascendentes e descendentes. A obrigação recairá sobre o mais
próximo. O art. 1.697 diz que, na falta de ascendentes, cabe a obrigação alimentar aos
descendentes (1º lugar). Faltando ascendente e descendentes, os alimentos poderão ser
pleiteados dos irmãos (2º lugar).

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• Os alimentos são irrenunciáveis, ou seja, poderá o credor não exercer ao seu direito a alimentos,
mas lhe é vedado renunciar ao direito a alimentos. Esse crédito alimentos é insuscetível de
cessão, compensação e penhora. O STJ já entendeu que o art. 1.707 não impede que seja
reconhecida como válida e eficaz a renúncia manifestada entre cônjuges por ocasião do divórcio
ou da união estável. Essa irrenunciabilidade dos alimentos só será admitida quando subsista um
vínculo de direito de família. O filho não pode renunciar ao direito de alimentos, mas o ex-
cônjuge poderá renunciar.

• O direito a alimentos é uma obrigação divisível. Esta é a regra, sendo excepcionalmente solidária.
O art. 1.698 estabelece que, se o parente que deve alimentos em primeiro lugar não tiver
condições de prestar os alimentos por inteiro, serão chamados a prestar alimentos os parentes
de grau imediato. Sendo várias as pessoas a obrigadas prestar alimentos, todas irão concorrer na
proporção dos respectivos recursos. Então, a obrigação é divisível. Intentada a ação contra um
dos obrigados a prestar alimentos, nada impede que o alimentante chame os parentes para
ajudar a prestar os alimentos. Em verdade, não se trata de um chamamento ao processo. Tanto
o autor quanto ao réu poderá chamar os parentes. Essa legitimidade para a ação de prestação
de alimentos também poderá ser encabeçada pelo Ministério Público, podendo também ele
chamar os outros parentes para integrar a lide (Enunciado 523, CJF).
Nos casos em que os alimentos são pleiteados em favor de idoso, a obrigação deixa de ser
subsidiária, passando a ser solidária. É o disposto no art. 12 do Estatuto do Idoso. Neste caso, o
chamamento dos demais parentes será um típico chamamento ao processo, nos termos do
NCPC.

• A obrigação de alimentos é imprescritível. Cuidado que a pretensão de cobrança de alimentos


fixado em sentença ou ato voluntário é prescritível em 2 anos. Caso o alimentando for
absolutamente incapaz, não correrá a prescrição. Ressalve-se que se o devedor de alimentos for
o pai ou a mãe, não correrá enquanto ele for menor de idade, sob o fundamento de que está
vigorando o poder familiar. Ou seja, não corre a prescrição quando o filho é relativamente
incapaz e o filho ainda se encontra sob o poder familiar. Mas aqui somente se atinge a pretensão
de cobrança.

• A obrigação de alimentos é incessível e inalienável, tampouco de compensação.

• A obrigação de alimentos é impenhorável, decorrendo do fato de a obrigação ser inalienável.

• A obrigação de alimentos é irrepetível, não sendo possível propor uma ação de repetição de
indébito para obter para si os valores prestados a título de alimentos, ainda que fique
comprovado posteriormente que o suposto pai não era o pai biológico da criança.
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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• A obrigação alimentar não está sujeita à arbitragem, por expressa disposição do art. 852 do
NCPC.

• A obrigação de alimentos é uma obrigação transmissível. Isso porque a obrigação de prestar


alimentos vai se transmitir aos herdeiros do devedor, tendo eles a obrigação de prestar os
alimentos, mas apenas nos limites da herança.

Segundo o STJ, o falecimento do pai do alimentando não implica a automática transmissão do dever
alimentar aos avós. É orientação do STJ que a responsabilidade dos avós de prestar alimentos é subsidiária,
e não sucessiva. Essa obrigação tem natureza complementar e somente exsurge se ficar demonstrada a
impossibilidade de os genitores proverem os alimentos de seus filhos.

III. Principais classificações dos alimentos

Quanto às fontes, os alimentos podem ser:

• Alimentos legais: são os alimentos decorrente da lei, decorrem do direito de família (parentesco,
casamento, união estável, etc.). Não se trata apenas de alimentos ao incapaz, mas também sendo
possível os alimentos gravídicos, destinados ao nascituro e à mãe. Neste caso, admite-se a prisão
civil do devedor de alimentos.
• Alimentos convencionais: são os alimentos que decorrem de acordo, contrato, testamento,
legado, etc. Neste caso, os alimentos são prestados por se quer, não cabendo prisão civil.
• Alimentos indenizatórios: são os alimentos que decorrem de um ato ilícito, culminando em uma
indenização. Não caberá prisão civil por descumprimento aos alimentos.

Quanto à extensão, os alimentos podem ser:

• Alimentos civis (côngruos): são os alimentos que tem por objetivo do status a quo, mantendo o
padrão de vida anterior. Esses são a regra.
• Alimentos necessários (naturais ou indispensáveis): tem por objetivo fixar apenas o
indispensável para sobrevivência digna da pessoa. Ex.: cônjuge culpado pela dissolução da
sociedade conjugal, sendo arbitrado em favor dele os alimentos.

Quanto à forma de pagamento, os alimentos podem ser:

• Alimentos próprios (in natura): são os alimentos pagos em espécie, fornecendo os alimentos e
a moradia propriamente dita.
• Alimentos impróprios: são os mais comuns, pagos mediante pensão.

Quanto à finalidade, os alimentos podem ser:

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• Alimentos definitivos: são aqueles fixados definitivamente. Há um acordo de vontades ou uma


sentença judicial transitada em julgado. Apesar da nomenclatura, esses alimentos podem ser
alterados o seu valor, caso haja uma alteração substancial no binômio ou trinômio.
• Alimentos provisórios: são os alimentos fixados antes da sentença, seguindo o rito especial da
Lei de Alimentos (Lei 5.478/68). Nesse caso, a lei vai exigir que haja uma prova pré-constituída
desse vínculo entre alimentando e alimentante (ex.: casamento, filiação, etc.). Se houver uma
prova pré-constituída, correrá pelo rito especial e haverá a possibilidade de já fixar os alimentos
provisórios.
• Alimentos provisionais: são alimentos que decorrem de outras ações que não seguem o rito
especial da ação de alimentos, sendo fixados por uma tutela antecipada, ou seja, por meio de
uma liminar concedida, por exemplo, numa medida cautelar de separação de corpos. Não há
prova pré-constituída. Caso ao final não seja reconhecido o pai efetivamente, não caberá
repetição do valor pago a título de alimentos.
• Alimentos transitórios: são os alimentos em que são fixados por um período de tempo em prol
do ex-cônjuge ou ex-companheiro, a fim de que consiga se reajustar e se realocar no mercado
de trabalho. Tem o termo pré-determinado.

Se o executado não paga os alimentos, ou tendo sido instado a se justificar, mas essa justificativa não
foi aceita, o juiz poderá, além de determinar o protesto da decisão judicial, decretar a prisão civil do devedor
de alimentos, desde que seja fundado em alimentos legais (direito de família).

Essa prisão será cumprida em regime fechado (prisão do PA), separado dos presos comuns. Segundo
o STJ, o advogado que tenha contra si decretada prisão civil por inadimplemento de obrigação alimentícia
não tem direito a ser recolhido em sala de Estado Maior ou, na sua ausência, em prisão domiciliar.

Flávio Tartuce diz que pelo NCPC esse prazo da prisão poderá ser de 1 a 3 meses (art. 528, §3º). Isso
será em relação aos alimentos provisórios e definitivos. Para ele, em relação aos alimentos provisionais,
parece-lhe que continuam sendo regulados pelo art. 19 da Lei de Alimentos, caso em que justifica a prisão
civil por prazo não superior a 60 dias.

Isso deverá ser decidido pela jurisprudência.

A Súmula 309 do STJ diz que o débito alimentar que autoriza a prisão do alimentante é aquele que
compreende os 3 meses anteriores ao ajuizamento da execução, bem como aqueles que se vencerem no
curso do processo. No restante, caberá uma ação de cobrança. Segundo o STJ, o atraso de 1 só prestação
alimentícia, compreendida entre as 3 últimas atuais devidas, já é hábil a autorizar o pedido de prisão do
devedor, nos termos do artigo 528, §3 do NCPC.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

A literalidade da súmula foi reproduzida no §7º do art. 528 do NCPC.

Segundo o STJ, equipara-se à gestão de negócios a prestação de alimentos feita por outrem na
ausência do alimentante.

IV. Extinção da obrigação de alimentos

A obrigação de prestar alimentos se extingue com:

• Morte do credor, visto que se tratar de uma obrigação personalíssima


• Se houver uma alteração substancial no binômio ou trinômio alimentar
• No caso de menores, a obrigação alimentar é extinta quando completar 18 anos. Essa extinção,
no entanto, não é automática, sendo necessária a propositura de uma ação de exoneração, visto
que o STJ entende que a obrigação do genitor poderá continuar se o filho estiver cursando
faculdade até o encerramento da graduação. O STJ não admite que a obrigação de prestar
alimentos ultrapassar a graduação e passe para uma pós-graduação.
• Dissolução do casamento ou da união estável: o art. 1.709 admite que a sentença de divórcio
fixem alimentos pós-divórcio. Se o alimentante se casar de novo não significará que a obrigação
será extinta. Só irá extinguir neste caso se o binômio ou trinômio (necessidade, possibilidade e
proporcionalidade) for alterado. Se o credor (alimentando) se casar novamente, poderá haver a
extinção do dever de prestar alimentos (art. 1.708). A ideia do código é a de que não há mais
necessidade.
• Comportamento indigno do credor em relação ao devedor: é uma cláusula geral, devendo ser
completada pelo juiz. Entende-se que devem ser aplicadas as mesmas causas de revogação da
doação, tal como atentar contra a honra, vida ou a família do devedor de alimentos, justificando
a quebra do dever de prestar alimentos.

7. Tutela e Curatela

Tutela resguarda o menor não emancipado. A curatela é uma assistência para defesa do maior
incapaz, que foi interditado.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência promoveu uma série de alterações, passando a pessoa com
deficiência ser plenamente capaz.

Eventualmente, as pessoas com deficiência poderão se valer da tomada de decisão apoiada.

I. Tutela

O art. 1.728 diz que os filhos menores são postos sob tutela quando:

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• Os pais falecem
• Os pais estão ausentes
• Os pais estão destituídos do poder familiar

A tutela pressupõe a perda ou a suspensão do poder familiar, por parte dos pais.

Na tutela há o tutor e o tutelado (pupilo).

A tutela e o poder familiar não podem coexistir, pois a tutela visa substituir o poder familiar.

Em relação à origem, a tutela pode ser dividida em 3 categorias:

• Tutela testamentária: a tutela tem origem no testamento, pois há uma nomeação pelo tutor.
• Tutela legítima: essa tutela decorre da falta da tutela testamentária, não havendo tutor
nomeado pelos pais. O art. 1.731 diz que incumbem aos parentes consanguíneos do menor na
seguinte ordem: ascendente e colateral até o 3º grau, do mais próximo ao mais remoto.
• Tutela dativa: não tendo parentes, e nem colateral até o 3º grau, ou seja, na falta de tutela
testamentária e legítima, o juiz irá nomear tutor idôneo e que resida no domicílio do menor.

Se estivermos diante de irmãos órfãos, o art. 1.733 vai dizer que o tutor será um só, comum a ambos
os menores. Princípio da unicidade da tutela.

O art. 1.735 diz que não podem ser tutores e serão exonerados da tutela, caso a exerçam:

• Quem não tiver a livre administração de seus bens (ex.: pródigo)


• Aqueles que tiverem obrigação para com o menor, ou tiverem crédito contra o menor, ou estiver
em demanda contra o menor, ou ainda que seus parentes estejam com demanda contra o
menor;
• Inimigos do menor, ou de seus pais, ou que tiverem sido por estes expressamente excluídos da
tutela;
• Condenados por crime de furto, roubo, estelionato, falsidade, contra a família ou os costumes;
• Pessoas de mau procedimento, ou falhas em probidade, e as culpadas de abuso em tutorias
anteriores;
• Aqueles que exercerem função pública incompatível com a boa administração da tutela (ex.: juiz,
MP, delegado, etc.).

O art. 1.736 diz que podem se escusar da tutela:

• Mulheres casadas
• Aos maiores de 60 anos

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• Aqueles que tiverem sob sua autoridade mais de 3 filhos


• Impossibilitados por enfermidade
• Aqueles que habitarem longe do lugar onde se haja de exercer a tutela;
• Aqueles que já exercerem tutela ou curatela;
• Militares em serviço

Quem não for parente do menor não poderá ser obrigado a aceitar a tutela, caso tenha um parente
que possa exercer a tutela.

O art. 1.738 diz que o prazo decadencial é de 10 dias para manifestação de escusa por parte do
nomeado tutor.

O NCPC, no art. 760, diz que o tutor ou curador pode eximir-se do encargo, apresentando escusa ao
juiz no prazo de 5 dias. O Código Civil fala em 10 dias, mas o prazo do NCPC deve prevalecer.

O tutor ou curador serão intimados para prestar compromisso, no prazo de 5 dias, contados da
intimação do despacho que determinar o cumprimento do testamento, se foi o caso de tutela testamentário.

O art. 1.740 traz as incumbências do tutor no exercício do seu múnus público:

• Dirigir a educação do menor, defendê-lo e prestar-lhe alimentos, conforme os seus haveres e


condição;
• Reclamar do juiz que providencie, como houver por bem, quando o menor haja mister correção;
• Cumprir com os demais deveres que normalmente cabem aos pais, ouvida a opinião do menor,
se este já contar 12 anos de idade.

O juiz é quem fiscaliza o tutor. Mas é possível que para fiscalização do tutor seja nomeado pelo juiz
um pró-tutor.

Em relação à responsabilidade do juiz quanto à tutela, esta irá depender da situação:

• O juiz terá uma responsabilidade direta e pessoal quando não tiver nomeado tutor ou tiver
nomeado a destempo.
• A responsabilidade do juiz será subsidiária quando não tiver exigido uma garantia legal do tutor,
nem tiver removido o tutor quando ele se tornou suspeito. Ou seja, o juiz só responderá se o
tutor não conseguir arcar com aquele prejuízo que causou.

Mas nos dois casos de responsabilidade em razão da tutela, é necessária haver a culpa do juiz, sem
precisar de dolo.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Os bens do menor serão entregues ao tutor, através de um inventário de bens. Caso esse patrimônio
seja considerável, é possível prestar do tutor uma caução. Claro que a depender do caso, se o tutor for de
conhecida idoneidade, é possível dispensar a caução.

Se o menor possuir bens, será o menor sustentado por esses bens.

O tutor vai representar o menor e após os 16 anos vai assisti-lo.

Algumas incumbências do tutor exigem anuência do juiz, tais como:

• Pagamento de dívida do menor


• Aceitar, pelo menor, herança, legado ou doação, com ou sem encargo
• Transigir ou celebrar contrato visando extinguir dívida
• Vender bens móveis ou imóveis do menor
• Propor ações em juízo e promover todas as diligências a bem deste, assim como defendê-lo nos
pleitos contra ele movidos

Ainda que com autorização do juiz, o tutor não poderá praticar, ou seja, são atos vedados ao tutor:

• Adquirir por si bens móveis ou imóveis pertencentes ao menor


• Dispor dos bens do menor a título gratuito
• Constituir o tutor como cessionário de crédito ou de direito, contra o menor.

Nesses casos, haverá nulidade absoluta do ato.

Antes de assumir a tutela, o tutor vai declarar tudo que o menor lhe deve, sob pena de não poder
lhe cobrar posteriormente, enquanto estiver exercendo a sua tutoria. A única exceção é o fato em que o
tutor não teria conhecimento desse débito à época da tutoria.

O tutor responde pelos prejuízos que, por sua culpa ou dolo de sua parte, causar ao tutelado. Há uma
responsabilidade subjetiva do tutor pelo tutelado.

Pelos atos do tutelado em face de terceiros, o tutor responde objetivamente. É a responsabilidade


objetiva indireta, visto que não se precisa provar a culpa do tutor, mas é preciso demonstrar que houve culpa
do tutelado.

Por outro lado, o tutor tem direito de ser pago pelo que dispender no exercício de sua tutoria. É o
direito de reembolso.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Além desse direito, o art. 1.752 vai consagrar em favor do tutor o montante que vai receber a título
de compensação pela atuação e administração dos bens do tutelado, guardando uma proporcionalidade com
o valor dos bens do tutelado.

O §2º do art. 1.752 diz que são solidariamente responsáveis pelos prejuízos as pessoas as quais
competia fiscalizar a atividade do tutor e também as que concorreram para um dano em face do tutelado.

Quem tinha o dever de fiscalizar o tutor, como é o caso do pró-tutor e do juiz, ou qualquer pessoa
que tenha concorrido culposamente para o prejuízo experimentado pelo tutelado, serão solidariamente
responsáveis pelos prejuízos.

O tutor deverá prestar contas, mas, além disso, a lei exige que o tutor faça um balanço anual, a ser
demonstrado ao juiz, o qual aprovará o balanço.

De 2 em 2 anos, o tutor apresentará uma prestação de contas ao juiz. Também deverá ocorrer a
prestação de contas quando o juiz julgar conveniente que se preste por algum motivo.

A prestação de contas será processada em juízo, nos próprios autos da nomeação da tutoria. Será na
Vara da Infância ou na Vara de Família, caso não exista a primeira. Não existindo a Vara de Família, será na
Vara Cível.

Encerrada a tutela, ainda que dê quitação, essa quitação não produzirá efeitos enquanto não for
aprovada as contas pelo juiz.

O art. 1.763 até o art. 1.766 traz situações de extinção da tutela:

• Maioridade
• Emancipação de menor
• Menor cair sob o poder familiar (ex.: for adotado ou reconhecido como filho)
• Termo final da tutoria
• Por uma escusa legítima do tutor
• Houver a remoção do tutor pelo juiz

A remoção ou destituição do tutor caberá quando ele for negligente, prevaricador ou incursor numa
incapacidade.

O art. 1.761 do CC diz que incumbe ao MP, ou quem tenha o legítimo interesse, requerer a remoção
do tutor ou curador.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O parágrafo único do dispositivo diz que o tutor ou curador será citado para contestar essa alegação
no prazo de 5 dias, e após seguirá o rito comum.

Havendo extrema gravidade, o juiz poderá suspender, antes da decisão, o tutor ou curador e nomear
um tutor em caráter interino.

II. Curatela

A curatela é um instituto que visa defender os maiores incapazes, havendo de um lado um curador e
do outro um curatelado.

Curatela só vai incidir em relação ao maior incapaz.

Com o estatuto da pessoa com deficiência só existem menor absolutamente incapaz, não existindo
maior absolutamente incapaz. Ou seja, o maior só poderá ser relativamente incapaz.

São relativamente incapazes:

• Ébrios habituais
• Viciados em tóxicos
• Pessoas que, por causa transitória ou definitiva, não possam exprimir a sua vontade
• Pródigos

A incapacidade não se presume, sendo necessário prová-la por um processo de interdição, que vai
decorrer a curatela.

A interdição poderá ser promovida:

• Pelo cônjuge ou companheiro


• Pelos parentes ou tutores
• Pelo representante da entidade que se encontra abrigado pelo interditando
• Pelo próprio Ministério Público
• Pela própria pessoa (art. 1.768)

O art. 748 do NCPC diz que o MP só irá promover a interdição em caso de doença mental grave se as
pessoas designadas acima não existirem ou não promoverem a interdição, ou se, estas pessoas existirem,
forem incapazes.

Portanto, o MP terá uma legitimidade subsidiária.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O art. 752 diz que o MP intervirá como fiscal da ordem jurídica nas ações de interdição as quais ele
não propõe.

Se houver urgência, o juiz poderá nomear um curador provisório para o interditando, a fim de praticar
determinados atos.

Nessa linha, o interditando será citado para no dia designado comparecer ao juiz, sendo entrevistado
acerca de sua vida, negócios, parentes, bens, vontades, preferências, etc. A ideia é para que o juiz possa
perceber o nível de incapacidade do interditando.

Caso o interditando não possa se deslocar até o juízo, o juiz irá ouvi-lo no local onde estiver,

No prazo de 15 dias da entrevista, o interditando poderá impugnar essa interdição. Caso não tenha
constituído um advogado, nomeará o juiz um curador especial.

Passados 15 dias, o juiz determinará a produção de prova pericial para avaliar a incapacidade do
interditando. O laudo pericial vai indicar quais são os atos que o interditando necessita de curatela.

A ideia é a de que a curatela seja o mínimo possível, e segundo as potencialidades da pessoa.

Para a escolha do curador, o juiz levará em conta a vontade e as preferências do interditando.

O art. 1.775 diz que o cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, é de direito
o curador do outro. É o curador escolhido pela lei.

Se o curador é o cônjuge, e estão eles casados sob o regime universal de bens, esse cônjuge não é
obrigado a prestar contas, salvo se houver uma determinação judicial fundamentada em sentido contrário.

Caso não seja casado, o curador do interditando será seus ascendentes.

Não havendo ascendentes, o curador será o descendente que se mostrar mais apto.

Não havendo descendentes, o curador será dativo, nomeado pelo juiz.

Essa ordem acima é uma ordem legal que poderá não ser seguida, não sendo obrigatória. O que irá
prevalecer é o melhor interesse do curatelado.

O art. 1.775-A diz que nomeação do curador para pessoa com deficiência, o juiz poderá estabelecer
uma curatela compartilhada entre o pai e a mãe, já que ambos exercerão a curatela do curatelado.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O art. 754 diz que, apresentado o laudo, produzidas as demais provas e ouvidos os interessados, o
juiz proferirá sentença. Na sentença, o juiz deverá nomear o curador. Na mesma sentença, o juiz irá fixar os
limites da curatela.

Conforme o NCPC, art. 757, a autoridade do curador vai se estender a pessoa e aos bens do incapaz
que se encontrava sob guarda e responsabilidade do curatelado, quando houve a interdição. Ex.: o
curatelado tem 40 anos e o filho tem 12 anos. O curador do curatelado vai assumir a tutela do menor, salvo
se o juiz entender outra situação mais conveniente. É o princípio da unicidade de curatela.

O §3º do art. 755 do NCPC diz que a sentença de interdição será inscrita no Registro de Pessoas
Naturais, publicada no site do Tribunal, na plataforma do CNJ e deverá permanecer por 6 meses. Visa
assegurar o princípio da publicidade.

O STJ entende que não é a sentença que decreta a interdição e reconhece a incapacidade que gera a
nulidade do negócio jurídico. O que gera a nulidade do ato jurídico praticado pelo incapaz não depende da
sentença de interdição. Se for reconhecida a incapacidade da pessoa, neste caso, impõe-se a declaração de
nulidade pelos negócios jurídicos por ela firmados, respeitados os adquirentes de boa-fé.

As pessoas que não puderem exprimir a sua vontade serão relativamente incapazes, as quais
receberão todo o apoio para manter a sua convivência familiar.

A convivência comunitária e familiar são prioritárias, mas o recolhimento dessa pessoa em


estabelecimento que afaste a convivência familiar e comunitária é excepcional, ou seja, será a última medida.
Caso não haja essa necessidade, poderá ficar em casa e conviver com a família e a comunidade.

O art. 758 do NCPC diz que o curador deverá buscar o tratamento e o apoio apropriado a conquista
dessa autonomia pelo interdito.

Se houver a recuperação do interdito, haverá o levantamento da curatela.

Além disso, poderá a curatela ser levantada parcialmente, quando a incapacidade daquele interdito,
que era uma incapacidade maior, agora se restringiu. Quando demonstrada a recuperação parcial, haverá o
levantamento parcial da curatela.

O Código Civil determina a aplicação residual da curatela das regras previstas para a tutela. Isso
porque os fundamentos são os mesmos, que é ajudar alguém.

III. Tomada de decisão apoiada

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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O art. 115 do Estatuto da Pessoa com Deficiência determinou que o Título IV do Livro IV da Parte
Especial do Código Civil passasse a vigorar com a seguinte título: “da Tutela, da Curatela e da Tomada de
Decisão Apoiada”.

A tomada de decisão apoiada veio com a inclusão do art. 1.783-A do Código Civil.

Segundo esse dispositivo, a tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual visa auxiliar a pessoa
com deficiência para a prática de atos que se mostrem mais complexos.

A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2
(duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para que estas duas
ou mais pessoas lhe prestem apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os
elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade.

O §1º do art. 1.783-A diz que, para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com
deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e
os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos direitos
e aos interesses da pessoa que devem apoiar.

O pedido de tomada de decisão será requerido pela pessoa que deseja ser apoiada, indicando quais
as pessoas aptas a prestarem esse apoio. Antes de se manifestar esse pedido, o juiz irá ouvir pessoalmente
o requerente e também essas pessoas que desejam lhe prestar apoio.

A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos perante terceiros sem qualquer
restrição, desde que esteja nos limites da decisão que autorizou o apoio.

E se houver divergência entre a pessoa apoiada e um de seus apoiadores? Neste caso, o juiz irá
decidir, suprindo a vontade de uma das partes discordantes.

Se o apoiador for negligente, se exercer uma pressão indevida, ou não adimplir com as obrigações, a
pessoa apoiada ou qualquer pessoa poderá denunciar ao juiz o seu comportamento.

Sendo procedente essa denúncia, o juiz irá destituir esse apoiador, podendo ter um novo apoiador
ou não.

Além disso, a pessoa apoiada poderá a qualquer tempo solicitar o término do acordo de tomada de
decisão apoiada.

O apoiador poderá solicitar ao juiz a exclusão da sua participação do processo de tomada de decisão
apoiada.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Direito das sucessões.

→ DIREITO DAS SUCESSÕES


1. Introdução ao Direito das Sucessões

Em termos gerais, são duas as modalidades básicas de sucessão mortis causa:

• Sucessão legítima: é a que decorre da lei, enunciando a ordem de vocação hereditária.


• Sucessão testamentária: decorre da sucessão por testamento, tendo origem em ato de última
vontade do, agora, de cujos. Há uma voluntariedade expressa em testamento, codicilo ou legado.

A sucessão é aberta quando o sujeito morre, pois o morto não pode ser titular de direitos. Ou seja,
quando há a morte, outra pessoa imediatamente assume a titularidade daquele direito. A herança se
transmite desde logo aos herdeiros, sejam eles legítimos ou testamentário (princípio de saisine).

A incidência do ITCMD leva em conta o momento do falecimento do autor da herança, o qual decorre
da ideia de saisine. Por exemplo, se o sujeito morreu hoje esta será a alíquota, ainda que amanhã seja
alterada.

O direito de saisine faz com que o inventário tenha um intuito ou natureza meramente declaratória,
pois já houve a transmissão com a morte. O inventário simplesmente regulariza a situação.

O art. 1.785 diz que a sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido. Ou seja, este último
domicílio é onde ocorreria o inventário.

O NCPC, no seu art. 48, diz que o foro do domicílio do autor da herança é o competente para
inventário, partilha, arrecadação dos bens e de cumprimento das disposições de última vontade do autor da
herança.

O foro do domicílio de autor da herança é competente para apreciar impugnação, pedido de


anulação de partilha extrajudicial e para toda e qualquer ação para que o espólio seja réu, ainda que o óbito
tenha ocorrido em lugar diferente ou no estrangeiro.

O parágrafo único do art. 48 do NCPC diz que, se o autor da herança não possuía domicílio certo, a
competência será de onde se encontram os bens imóveis. Caso haja diferente bens imóveis em diferentes
foros, qualquer um deles será competente.

Não havendo bens imóveis, o foro competente será o foro de qualquer dos bens do espólio.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Nos casos de sucessão envolvendo estrangeiro ou bens situados no exterior, existem regras
específicas que devem ser observadas. O art. 10 da LINDB diz que a sucessão obedece à lei do país em que
domiciliado o defunto, ainda que este defunto não esteja domiciliado no Brasil. Aplica-se a lei do domicílio
do defunto.

Complementando a disposição legal, a disposição de bens situados no Brasil será regulada pela lei
brasileiro, desde que em benefício do cônjuge ou filhos brasileiros. No entanto, a sucessão se regula pelas
leis do domicílio do de cujos, mas se for uma sucessão de bens referente a bens que se situam no Brasil, será
aplicada uma lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, salvo se a lei do de cujos se
mostrar mais favorável.

O art. 23, II, NCPC diz que compete à autoridade judiciária brasileira, com exclusão de qualquer outra,
proceder a confirmação do testamento particular e inventário e partilha de bens situados no Brasil. O caso é
de competência absoluta.

Isto quer dizer que processar inventário, testamento, confirmação de testamento particular no Brasil
será feita pela autoridade judiciária brasileira. Isso não impede que eventualmente se aplique a legislação
estrangeira pela autoridade judiciária brasileira.

O art. 1.777 vai regular a sucessão e a legitimação para suceder o sujeito. A lei que vai reger a
sucessão é a que estava em vigor no momento da morte.

Existem duas modalidades de herdeiros:

• Herdeiros necessários:
Os herdeiros necessários têm a seu favor a proteção da “legítima”. Legítima é a metade do
patrimônio do autor da herança. Essa metade é indisponível, devendo ser calculada essa metade
com base nos bens da época da abertura da sucessão (morte do de cujos). É a metade do
patrimônio líquido. Dentro desse valor será contabilizado os bens sujeitos à colação, que o
herdeiro eventualmente recebeu, sendo considerado adiantamento de herança.
O art. 1.789 diz que se houver herdeiros necessários, o autor da herança só pode dispor de
metade da herança, ficando a outra indisponível. O art. 549 do CC diz que é nula a doação na
parte que exceder à legítima.
São herdeiros necessários:
d) Ascendentes
e) Descendentes
f) Cônjuge

• Herdeiros facultativos:
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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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Os herdeiros facultativos não têm a proteção da legítima, podendo ser preteridos por força de
testamento. Se o de cujos não falar nada e morrer, esses herdeiros vão receber, mas se disporem
de forma diversa em testamento, não terão direito à legítima.
São herdeiros facultativos:
b) Companheiro
c) Colaterais até o 4º grau

2. Herança e sua administração

I. Introdução

A herança é o conjunto de bens que é formado quando o sujeito morre. O falecimento do autor da
herança faz com que o conjunto de bens constitua a herança.

A herança é o que forma o espólio. O espólio não tem personalidade jurídica, apesar de ser uma
universalidade jurídica, tendo natureza de ente despersonalizado.

O espólio tem personalidade judiciária, ou seja, pode atuar em juízo.

O direito à sucessão aberta e o direito à herança constituem bens imóveis por determinação legal,
mesmo que a herança seja constituída exclusivamente por bens móveis.

Além disso, a herança é um bem indivisível, ou seja, antes da partilha há um condomínio pro
indiviso. Nesse caso, o art. 793 do CC vai consagrar que o direito à sucessão aberta pode ser objeto de
cessão, mas esta cessão deve se dar por escritura pública, pois se trata de bem imóvel.

O §2º do art. 793 vai dizer que é ineficaz a cessão por um coerdeiro de seu direito hereditário sobre
qualquer bem da herança considerado singularmente. Veja, é ineficácia!

Ex.: João faleceu, deixando dois carros e um apartamento. Os dois carros valem 150 mil e o
apartamento vale 150 mil. João deixou 2 filhos e não tinha esposa. Cada filho ficou com 150 mil reais.

O direito à herança é bem indivisível antes da partilha, havendo um condomínio eventual (pro
indiviso). Neste caso, um dos filhos de João poderá ceder a parcela da quota hereditária, desde que o faça
por meio de escritura pública. Por outro lado, o filho de João não poderá ceder 50% do carro X para um
terceiro. Esta cessão de direito individual é ineficaz.

O art. 1.794 diz que o coerdeiro não poderá ceder a sua quota hereditária a pessoa estranha à
sucessão se o outro coerdeiro a quiser tanto por tanto. Isto é, há a criação de um direito de preferência,
exercido por meio de lei (preempção legal).

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Eduardo Defaveri

Se o coerdeiro for preterido, poderá ele depositar o preço que o herdeiro recebeu, havendo a quota
para si, já que ele foi preterido.

A ação de adjudicação da quota para si com o depósito do preço está sujeito ao prazo decadencial, o
qual, segundo a lei, é contado da transmissão do bem.

A jurisprudência pondera no sentido de que este prazo deve ser contado a partir do momento em
que o herdeiro toma conhecimento da venda da cessão da quota hereditária.

Se existirem vários coerdeiros que possam exercer esse direito de preferência legal, exercendo este
direito de preferência, este quinhão será distribuído na proporção das respectivas quotas hereditárias.

O art. 1.792 do CC consagra a máxima sucessória que diz “intra vires hereditaris”, ou seja, o herdeiro
não responde por encargos superiores às forças da herança.

Além disso, os herdeiros somente respondem pelas dívidas do de cujos na proporção de suas quotas.
Ou seja, João morreu, deixando patrimônio de 1 milhão. Havia uma dívida de 600 mil e dois filhos. Foi feita a
partilha e José recebeu 500 mil e Maria 500 mil. O credor dos 600 mil poderá buscar de José 300 mil e cobrar
de Maria 300 mil, não podendo cobrar 500 de José e 100 da Maria. Isto é, cada um responde nos limites da
herança e proporcionalmente à sua quota hereditária.

O código civil consagra o prazo de 30 dias, a contar da abertura da sucessão, para que haja a abertura
do inventário do patrimônio hereditário.

O NCPC, no art. 611, estabelece que o processo de inventário e partilha deve ser instaurado dentro
de 2 meses, o que dá aproximadamente 60 dias, a contar da abertura da sucessão, devendo ser finalizado
nos 12 meses subsequentes, podendo justificadamente prorrogar o prazo de ofício ou a requerimento das
partes.

Como se vê, o NCPC está diferente do que o do Código Civil, no tocante ao prazo da instauração do
processo de inventário. Samer entende que houve a revogação tácita do prazo previsto no CC.

A administração do inventário cabe ao inventariante.

O art. 1.797 diz que, até que haja o compromisso do inventariante, a administração caberá a um
administrador provisório, de acordo com uma ordem sucessiva que é estabelecida pela lei:

• Primeiramente, esta administração provisória caberá ao cônjuge ou companheiro.


• Caso não seja o caso, pelo herdeiro que estiver na posse ou na administração daquele bem.

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• Se houver mais de um herdeiro na posse daquele bem, será o administrador provisório o mais
velho.
• Se não for o caso, será o testamenteiro o administrador provisório.
• Não havendo testamenteiro, será administrador provisório uma pessoa de confiança do juiz.

Este rol é meramente exemplificativo, pois no caso concreto outra pessoa poderá se mostrar mais
adequada para administrar provisoriamente o bem.

II. Herança jacente e herança vacante

Para não esquecer, herança jacente começa com “J”, vindo antes de “V”, que é de herança vacante.
Dessa forma, a herança, antes de ser vacante, será jacente.

a) Herança jacente

O art. 1.844 diz que, não sobrevivendo cônjuge, ou companheiro, nem parente algum sucessível, ou
tendo sobrevivido, mas tendo havido a renúncia à herança, será devolvido ao Município ou ao Distrito
Federal, se localizada nas respectivas circunscrições, ou à União, quando situada em território federal a
propriedade à herança.

Os bens da herança ficarão na guarda de um curador até a sua entrega a um sucessor que venha a se
habilitar. Se não houver ninguém para se habilitar, os bens ficarão com esse curador até que seja declarada
a vacância daqueles bens. Num primeiro momento há uma herança jacente, submetida aos cuidados do
curador, o qual quer ver se aparece o sucessor. Se não aparecer, a herança é declarada jacente.

O art. 738 do NCPC vai dizer que nos casos em que a lei considerar jacente a herança, o juiz, em cuja
comarca tinha domicílio o falecido, procederá imediatamente a arrecadação dos respectivos bens. O juiz
deverá promover a arrecadação destes bens.

O NCPC, no art. 740, vai dizer que o juiz vai determinar ao oficial de justiça, acompanhado de
testemunhas, que arrole os bens do sujeito que morreu, descrevendo-os num auto circunstanciado.

Eventualmente, se o juiz não puder comparecer ao local por meio do oficial de justiça, o juiz irá
requisitar que a autoridade policial proceda a arrecadação e ao arrolamento desses bens com a presença de
duas testemunhas.

Se for por oficial de justiça, basta que esteja acompanhado do curador. Se for por autoridade policial,
será necessária duas testemunhas.

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O §2º do art. 740 do CPC diz que não estando ainda nomeado um curador, o juiz irá designar um
depositário para cuidar dos bens. Durante a arrecadação, o juiz ou a autoridade policial que estiver fazendo
a arrecadação, vai inquirir os vizinhos e moradores da vizinhança para saber quem era o falecido, onde estão
ou se existem sucessores, além de saber se há mais bens em nome do de cujos.

O art. 740, §5º, diz que, se constar ao juiz a existência de juiz em uma outra comarca, deverá o juiz
determinar a expedição de carta precatória para que tais bens sejam arrecadados também.

Feitas essas diligências, serão expedidos editais para encontrar sucessores legítimos.

Aqui, ainda se trata de herança jacente.

O art. 741 do CPC diz que, ultimada a arrecadação, o juiz mandará expedir edital, o qual será
publicado na internet, permanecendo nos sítios de tribunal, CNJ, por 3 meses, a fim de que os sucessores
venham a se habilitar no prazo de 6 meses a contar do início da publicação.

Se for verificada a existência de um sucessor ou de um testamenteiro em lugar certo, será feita sua
citação, sem prejuízo do edital que procurará outros sucessores também.

Quando o falecido for estrangeiro, este fato deverá ser comunicado à autoridade consular. A ideia é
de que haja outros mecanismos para encontrar ou procurar outros herdeiros.

Reconhecida sua qualidade de herdeiro ou de testamenteiro, ou provada a identidade de cônjuge ou


companheiro, a arrecadação se tornará inventário, o qual será ultimado em partilha.

b) Herança vacante

Por outro lado, decorrido 1 ano da publicação dos editais, sem que haja herdeiro que tenha se
habilitado, ou que esteja pendente de habilitação, a herança jacente será declarada vacante.

E isto tem caráter definitivo para destinação do bem. Isso porque, transitada em julgado a sentença
que declarou a vacância, o cônjuge ou companheiro, os herdeiros, ou credores do de cujos, só poderão
reclamar o seu direito numa ação direta, não podendo mais se habilitarem.

Ou seja, os bens jacentes serão transferidos ao ente público no momento da declaração da


vacância. Perceba que não se aplica o princípio da saisine com relação ao ente público.

Se alguém quiser questionar esta transferência, será necessário promover uma ação direta nesse
sentido, seja o credor, herdeiro ou cônjuge.

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Decorridos 5 anos da abertura da sucessão, os bens arrecadados passarão ao domínio definitivo do


município, distrito federal ou da União.

Perceba que o sujeito morre, não deixando herdeiros aparentes, sendo feito o processo de
arrecadação, arrolamento de bens e publicação de editais, a herança será jacente. Após 1 ano da publicação
do primeiro edital, a herança se torna vacante, passando ao domínio do município.

Poderá um herdeiro, credor ou cônjuge ou companheiro questionar, por meio de ação direta, a
transferência desses bens, mas passados 5 anos da abertura da sucessão (dia da morte), estes bens passam
ao domínio definitivo do município, DF ou União.

Enquanto esse período não passa, há uma propriedade resolúvel, só se tornando definitiva 5 anos
após a sucessão. Nesse período o município poderá perder essa propriedade.

Mas quando todos os herdeiros chamados à herança renunciarem, a herança será declarada vacante
imediatamente, pois todos renunciaram.

III. Vocação hereditária e legitimados a suceder

A legitimação é uma capacidade especial para um determinado ato. Neste caso, o ato é a sucessão.

O art. 1.798 diz que são legitimados a suceder:

• Pessoas nascidas
• Pessoas já concebidas no momento da abertura da sucessão, ou seja, da morte (nascituro)

Veja, o nascituro tem direito à herança, mas desde que ele nasça com vida, ou seja, está pendente
uma condição para reconhecimento desse direito sucessório.

Existe uma discussão na doutrina se esta regra se estenderia ou não aos embriões, havidos por meio
de técnica de reprodução assistida.

Não existe entendimento pacífico. Flávio Tartuce entende que devem ser estendidos aos embriões,
reproduzidos por meio de técnica de reprodução assistidas, as mesmas regras deferidas aos nascituros.

O art. 1.799 diz que na sucessão testamentária ainda podem ser chamados a suceder os filhos,
mesmo que não concedidos de pessoas indicadas pelo testador (prole eventual), desde que estas estejam
vivas ao tempo da sucessão.

Este primeiro inciso diz que poderá deixar herança para uma prole eventual de outrem. Ex.: o autor
da herança deixou uma casa de praia para o primeiro filho de João e Maria.

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No entanto, se decorridos 2 anos após a abertura da sucessão, o herdeiro não for concebido, os bens
reservados, salvo se houver uma disposição diversa, estes bens vão caber aos herdeiros legítimos.

As pessoas jurídicas também podem ser herdeiras. Também poderão ser herdeiras as pessoas
jurídicas cuja organização seja determinada pelo testador, sob a forma de fundação. A fundação pode ser
constituída por meio de herança.

O art. 1.801 diz que não podem ser nomeados herdeiros ou legatários, ou seja, não têm legitimação
sucessórias:

• As pessoas que, a rogo, tenham escrito o testamento, nem mesmo o cônjuge ou companheiro,
ascendentes, descendentes ou irmãos dessa pessoa. A questão é estritamente moral.
• As testemunhas do testamento
• O concubino do testador casado (ex.: amante), salvo se estivesse separado de fato, pois, neste
caso, não haveria concubinato, e sim união estável.
• O tabelião civil ou militar, ou comandante ou escrivão, perante o que se fizer ou se aprovar o
testamento.

IV. Aceitação e renúncia da herança

Aceitar é confirmar a transmissão da herança. A herança já se transmite com a morte, mas a aceitação
é um ato que confirma o recebimento da herança.

O art. 1.804 diz que aceita a herança, a transmissão ao herdeiro torna-se definitiva.

Por outro lado, não haverá a transmissão quando há renúncia à herança feita pelo herdeiro.

São formas de aceitação da herança:

• Expressa: o herdeiro ou testamenteiro faz uma declaração de que aceita a herança.


• Tácita: é resultante de um ato próprio da qualidade de herdeiro, atuando efetivamente como
herdeiro.
• Presumida: o art. 1.807 diz que o interessado em que o herdeiro declare se aceita, ou não, a
herança, poderá, 20 dias após a abertura da sucessão, requerer ao juiz que num prazo razoável
não superior a 30 dias venha a se manifestar sobre a aceitação ou não da herança. Neste caso, o
silêncio importa a aceitação.

Em relação à renúncia à herança, esta deverá sempre ser expressa, a constar de escritura pública ou
termo judicial. Isso porque o direito à sucessão aberta é bem imóvel.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Existem duas modalidades de renúncia à herança:

• Renúncia abdicativa: é aquela em que o herdeiro não quer a herança. Há uma cessão a todos os
coerdeiros. Não existe a incidência do ITBI contra o renunciante.
• Renúncia translativa: o herdeiro vai ceder os seus direito a favor de determinada pessoa,
incidindo o ITBI neste caso.

O art. 1.808 diz que não se pode aceitar ou renunciar a herança em partes, de forma fracionada (Ex.:
não há como aceitar apenas o ativo e recusar o passivo), bem como não se pode aceitar ou recusar herança
sob condição ou a termo (Ex.: aceita a herança se tiver um filho nos próximos 2 anos).

Existe exceção à regra sobre impossibilidade de fracionamento na aceitação.

• O §1º do art. 1.808 diz que o herdeiro, a quem se testarem legados, podem aceitar o legado e
renunciar a herança, ou mesmo aceitar a herança e renunciar o legado.
• O §2º diz que o herdeiro, chamado, na mesma sucessão, a mais de um quinhão hereditário, sob
títulos sucessórios diversos, pode livremente deliberar quanto aos quinhões que aceita e aos que
renuncia.

Não poderá o sujeito aceitar e recusar em parte à herança. Ex.: não pode o sujeito renunciar o carro
e ficar com a Fazenda.

Mas há exceções. O sujeito que é legatário e herdeiro ao mesmo tempo poderá renunciar o legado e
aceitar a herança, ou vice-versa. Veja, aqui há títulos distintos.

Outro caso é diferente. Ex.: João tinha 2 filhos, que eram José e Maria. José, já falecido, tinha dois
filhos: Antônio e André. Maria continua viva. Quando abriram o testamento de João, perceberam que, em
relação à herança, 50% seria para Maria e 50% seria para José. Como José estava falecido, há aqui os dois
filhos de José podendo herdar por representação. Além disso, João disse que 10% do patrimônio seria
destinado a Antônio.

João tinha 1 milhão de reais, sendo 50% indisponível. Dos 500 mil disponíveis, 10% é para o Antônio.
Então sobraram 950 mil reais, os quais 50% seria da Maria e 50% do Antônio e de André, por representação.
Além disso, Antônio recebeu mais os 10% dos 500 mil, já que foi herdeiro testamentário.

Neste caso, Antônio poderá recusar uma das duas heranças, sem que haja problema.

Não sendo essas exceções, não é possível recusar em parte ou aceitar em parte a herança.

Aceitação e renúncia são atos irrevogáveis (art. 1.812) do Código Civil.

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Eduardo Defaveri

O principal efeito da renúncia está no art. 1.810, ou seja, na sucessão legítima, a parte do
renunciante vai acrescer aos outros herdeiros da mesma classe. Se ele for o único herdeiro da classe, será
devolvido aos da classe subsequente.

Ex.: Supondo que Maria tenha 3 irmãos, caso Maria renuncie a herança, seria distribuída a herança
para os outros dois irmãos. Caso um deles esteja morto, a parte dela seria dividida em metade para o irmão
e a outra metade seria dividida para os dois filhos do irmão morto por representação.

No entanto, se ela não tiver irmãos, passará a herança para a classe subsequente. Ex.: Maria tinha
dois irmãos pré-mortos, sendo que um deles deixou 2 filhos e o outro irmão deixou 3 filhos. Nesse caso, se
Maria renunciar a herança, a parte dela será dividida por 5, visto que na classe debaixo todos herdarão por
cabeça.

A renúncia gera um tratamento ao renunciante como se ele nunca tivesse existido como pessoa.
Logo, o renunciante atinge o direito de representação de outros herdeiros. Ou seja, se Maria renunciar à
herança, o filho da Maria não receberá nada, não passando para o filho dela. Isso porque para a herança
passar ao seu filho, é necessário que ela tenha existido e morrido.

Se o renunciante for o único legitimado de sua classe, ou se todos de uma mesma classe renunciarem
à herança, vem a sucessão por direito próprio, vindo a sucessão por cabeça. Ex.: se João tem 3 filhos, cada
um desses filhos tem outros 2, ou seja, João tem 6 netos. Caso todos os filhos renunciarem à herança, os
netos receberão por cabeça, em quotas iguais, recebendo cada 1/6 da herança.

Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando à herança, os credores poderão, com
autorização judicial, aceitar a herança em nome daquele que havia renunciado (art. 1.813). Isto veda a
fraude.

Nesse caso, os credores serão habilitados no inventário, o qual se dará no prazo de 30 dias, a contar
do conhecimento da renúncia da herança pelo herdeiro.

Pagas as dívidas dos renunciantes aos seus credores, vai prevalecer a renúncia quanto ao
remanescente. Lembre-se que a renúncia é irrevogável!

V. Excluídos da sucessão: indignidade sucessória e deserdação

A diferença fundamental entre indignidade sucessória e deserdação é a de que, na indignidade


sucessória, o isolamento sucessório se dá por simples incidência de uma norma ou por decisão judicial. Ou
seja, a indignidade sucessória poderá atingir qualquer herdeiro.

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A ação de indignidade sucessória poderá ser proposta por qualquer interessado, mas também poderá
ser proposta pelo MP, quando envolver questão de ordem pública.

O prazo decadencial para a indignidade sucessória é de 4 anos, a contar da abertura da sucessão.

Na deserdação, há um ato de última vontade, ou seja, o sujeito foi deserdado, afastando o herdeiro
necessário. Neste caso, é imprescindível que este ato de deserdação seja confirmado por sentença.

As hipóteses de deserdação e de indignidade sucessória serão unificadas em parte, pois são


considerados herdeiros indignos, nos termos do art. 1.814:

• Herdeiros que tenham sido autores, coautores ou partícipes de um homicídio doloso ou de


tentativa de homicídio de cuja pessoa sucessão se tratar, ou então de seu cônjuge, companheiro,
ascendente ou descendente. Ex.: Suzane von Richthofen.
• Herdeiro que tiver acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou o herdeiro que
incorrer em crime contra a honra do autor da herança, do seu cônjuge ou companheiro.
• Herdeiros que, por violência ou por meio fraudulento, tiver inibido ou obstado o autor da herança
a dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Os arts. 1.962 e 1.963 do CC vão trazer, além dessas causas, as causas que autorizam a deserdação
dos descendentes por seus ascendentes ou ascendentes por seus descendentes:

• Quando houver a prática de ofensa física a essas pessoas;


• Quando houver injúria grave entre essas pessoas
• Quando houver relações ilícitas com madrasta, padrasto, companheiro, esposa, do filho ou do
neto.
• Quando houver o desamparo praticado por essas pessoas, em decorrência de uma alienação
mental ou de grave enfermidade do prejudicado.

Esses casos de indignidade do art. 1.814 se aplicam à deserdação, mas os casos de deserdação dos
arts. 1.962 e 1.963 do CC não se aplicam à indignidade sucessória.

Veja, a indignidade se aplica a todos os herdeiros, enquanto a deserdação somente se aplicará na


relação ascendente x descendente.

Ao herdeiro instituído, ou a quem aproveite essa deserdação, vai incumbir o ônus de provar a
veracidade da causa que foi alegada pelo testador para confirmar a deserdação na ação de confirmação de
deserdação. A deserdação deve necessariamente ser confirmada em juízo.

O prazo decadencial para essa ação de confirmação é de 4 anos, a contar da abertura do testamento.

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Eduardo Defaveri

Em relação à indignidade, o art. 1.816 do CC vai dizer que são pessoais os efeitos da exclusão. Isto
significa que os descendentes dos herdeiros excluídos vão sucedê-lo, como se ele estivesse morto antes da
abertura da sucessão.

Isto também acontecerá se os filhos forem menores, mas neste caso o excluído da herança não terá
direito ao usufruto dos bens recebidos na herança, tampouco direito à sucessão eventual desses bens, caso
um de seus filhos venha a morrer.

Esta regra também será aplicada ao caso de deserdação.

Vale ressaltar que são válidas as alienações onerosas e os atos de administração praticado pelo
herdeiro antes da sentença que o excluiu da qualidade de herdeiro, tutelando boa-fé de terceiros.

Admite-se ainda a reabilitação do indigno por força de testamento ou por outro ato autêntico,
evidenciando-se o perdão pelo autor da herança.

O art. 1.818 prevê a reabilitação tácita, a qual se dá quando o autor da herança contempla o indigno
como testamenteiro, quando ele já conhecia a causa dessa indignidade.

VI. Ação de petição de herança

Ação é uma demanda.

Trata-se de uma demanda que tem por objetivo incluir herdeiro na herança, mesmo depois da sua
divisão. Portanto, o direito à sucessão aberta é um direito real, pois a sucessão aberta é um bem imóvel por
determinação legal.

O herdeiro irá demandar os bens da herança, mesmo que estes bens estejam com terceiros, visto
que a ação tem natureza real.

Se a pessoa que detinha a posse da herança for um herdeiro aparente, os atos que o herdeiro
aparente praticou a título oneroso e de boa-fé são considerados válidos e eficazes.

A ação de petição de herança está sujeita ao prazo prescricional de 10 anos.

Direito das sucessões.

3. Sucessão legítima

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

O STF faz e tende a fazer é equiparar o tratamento do cônjuge com o companheiro, eis que a CF não
criou hierarquia entre casamento e união estável, apesar do anseio constitucional pela valoração da família
e facilitação da conversão da união estável em casamento.

O art. 1.829 do CC diz que a sucessão será deferida na seguinte ordem:

• Aos descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se esse cônjuge


estivesse casado com o falecido em comunhão universal de bens ou no regime de separação
obrigatória de bens, ou no de comunhão parcial de bens e o autor da herança não tiver deixado
bens particulares.
• Aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
• Ao cônjuge sobrevivente;
• Aos colaterais.

I. Sucessão dos descendentes e a concorrência do cônjuge

Veja, o cônjuge irá concorrer com o autor da herança, mas só não vai concorrer quando tiver se
casado no regime de comunhão universal, obrigatória (legal) ou no regime de comunhão parcial, desde que
o falecido cônjuge não tenha deixado bens particulares.

O cônjuge e o herdeiro são descendentes de 1ª classe. Se tiver cônjuge e herdeiro reunidos, não será
necessário se preocupar com ascendentes e colaterais.

Em relação ao regime de comunhão parcial de bens, essa concorrência sucessória que exige a
presença de bens particulares, conforme prevalece, irá recair sobre os bens particulares. Sobre os bens
comuns, o cônjuge casado no regime de comunhão parcial de bens não será herdeiro, e sim meeiro. No
tocante ao bens particulares do cônjuge falecido, ele herda.

O art. 1.832 diz que quando estiver em concorrência com o descendente, cabe ao cônjuge quinhão
igual aos quinhões que couberem a esses descendentes, por cabeça, sendo que a quota do cônjuge não
poderá ser inferior a ¼ da herança, se ele for ascendente dos herdeiros com os quais concorrer. Ex.: João
deixou 3 filhos com Maria. No tocante aos bens particulares de João, Maria concorre em igualdade de
condições com os descendentes, por cabeça. Veja, está assegurado a Maria ¼. Ex.2: Supondo que João tenha
filhos com Maria. João morre. No tocante aos bens particulares de João, Maria concorrerá por cabeça com
os filhos, mas terá direito a 25%, devendo os outros 4 dividirem os 75%, pois terá ela direito ao mínimo de ¼
quando for ascendente de todos os filhos do casal. Ex.3: Se Maria não for ascendente de todos, ela receberá
em igualdade de condições, mas não existirá o resguardo de ¼ da herança, no tocante aos bens particulares.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
Eduardo Defaveri

Existe uma discussão na doutrina sobre a sucessão híbrida, que é aquela em que o cônjuge concorre
com os descendentes comuns, mas também concorre com descendentes exclusivos do autor da herança.
Neste caso, o sujeito tem resguardado ¼ da herança?

1ªC: é majoritário o entendimento de que se houver a sucessão híbrida, não se deverá fazer a
reserva da ¼ da herança. Ex.: se houver 5 filhos, 3 do segundo casamento e 2 do primeiro casamento, mais
o cônjuge, a herança deveria ser dividida por 6.

2ªC: é minoritário o entendimento de que neste caso deveria ser feita a reserva da ¼ ao cônjuge
sobrevivente.

Em relação aos descendentes, o descendente de grau mais próximo excluirá o descendente de grau
mais remoto, salvo o direito de representação. Ex.: João deixou 3 filhos, os quais têm outros dois filhos cada
um (6 netos). João morrendo, os 3 filhos herdam, e os netos não herdam nada. Mas supondo que um dos
filhos de João é pré-morto, os 2 netos filhos do filho de João herdarão por representação (estirpe). Neste
caso, 1/3 da herança vai para cada um dos filhos de João, sendo que a parte do filho pré-morto de João será
dividida pelos dois netos.

Os descendentes de mesma classe vão ter os mesmos direito à sucessão, recebendo cada um deles
50% do valor da herança. A sucessão, neste caso, é por cabeça. Tem-se a chamada sucessão por cabeça,
quando a sucessão se reparte um a um. Mas a sucessão por estirpe (direito de representação) ocorre quando
a herança não é repartida um a um, mas na proporção dos parentes do mesmo grau vivo, ou se eles forem
mortos, tendo deixado essa prole viva, essa prole receberá uma fração.

II. Sucessão dos ascendentes e a concorrência do cônjuge

O art. 1.829, no inciso II, diz que na falta de descendentes são chamados para suceder os
ascendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, sem haver qualquer ressalva com relação ao
regime de bens.

Veja, os ascendentes são herdeiros de 2ª classe, pois só são chamados a suceder quando os de 1ª
classe faltarem.

Com relação à concorrência dos ascendentes com o cônjuge sobrevivente, o regime de bens é
absolutamente indiferente, pois concorrerá da mesma forma.

Igualmente como ocorre com os descendentes, os ascendentes de grau mais próximo exclui o de
grau mais remoto. Não existe direito de representação no tocante aos ascendentes, bastando pensar que
João, casado, morreu sem deixar descendentes. Além disso, ele tinha 2 avós paterno, mas em relação a

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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maternos, só tinha uma bisavó materna. Neste caso, a bisavó não herdará por estirpe para representar a avó
materna de João. O de grau mais próximo, neste caso, é o avô e a avó paterna, motivo pelo qual eles
receberão a herança, pois não há direito de representação em ascendência.

Se houver igualdade em grau e diversidade em linha, os ascendentes da linha paterna irão receber
metade e os da linha materna receberão a outra metade (art. 1.836). Ex.: João morreu, deixando a esposa e
avós maternos e um avô paterno. Nesta hipótese, 50% vai para o avô paterno e 50% vai para os avós
maternos.

O art. 1.837 diz que concorrendo o cônjuge com 2 ascendentes de 1º grau (pai e mãe), terá ele direito
a 1/3 da herança. Concorrendo o cônjuge com somente um ascendente de 1º grau, ou com ascendentes de
grau diversos, terá ele direito a metade da herança. Ex.: João morre e deixa pai, mãe e mulher, cada um
receberá 1/3. Se João morre e deixar mãe e mulher, cada uma receberá metade. Se João morre e deixa avô,
avó, bisavô, bisavó e mulher, ela receberá metade e a outra metade será dividia entre os demais.

III. Sucessão do cônjuge, isoladamente

Faltando descendente e ascendente, é deferida a sucessão por inteiro e isoladamente ao cônjuge


sobrevivente. Perceba que a sucessão integral da herança pelo cônjuge ocorre como 3ª opção. Então, o
cônjuge é herdeiro de 3ª classe.

O art. 1.830 diz que somente é reconhecido o direito sucessório ao cônjuge sobrevivente, se ao
tempo da morte do outro não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de 2 anos,
salvo se provado neste caso que essa convivência se tornou impossível sem culpa do sobrevivente.

O art. 1.830 ressuscita a discussão a respeito de culpa, motivo pelo qual é muito criticado pela
doutrina. Apesar disso, recentemente, o STJ aplicou o art. 1.830.

O art. 1.831 reconhece ao cônjuge sobrevivente, independentemente do regime de bens, o direito


real de habitação, o qual se refere ao imóvel destinado à residência do casal, desde que seja o único imóvel
desta natureza que seja objeto de inventário.

Esse direito real de habitação tem uma ligação forte sobre a doutrina do patrimônio mínimo, do
Ministro Luiz Edson Fachin.

O direito real de habitação é o direito para habitar, não podendo, em tese, alugar o imóvel, ceder em
comodato, etc. Professor Flávio Tartuce faz algumas ponderações, como é o caso em que o imóvel grande
possa ser alugado, revertendo seus valores para alugar um imóvel menor.

O entendimento prevalente é no sentido de estender essa regra aos companheiros.

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“Nós somos aquilo que repetidamente fazemos. Excelência, portanto, não é um ato, mas um hábito” (Aristóteles)
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IV. Sucessão dos colaterais

Os colaterais são herdeiros de 4ª classe. O art. 1.839 diz isso.

Se não houver cônjuge sobrevivente, serão chamados a suceder os colaterais em 4º grau: primos,
sobrinho-neto, tio-avô.

Algumas regras são importantes:

• Na classe dos colaterais, os mais próximos excluem os mais remotos.


Existe direito de representação apenas dos filhos dos irmãos pré-mortos, concedidos aos filhos
de irmãos. Ex.: João morreu, não tinha pais, não era casado, mas deixou 2 irmãos. Um deles é
pré-morto, sobrinho de João, o qual vai ter direito de representação na herança de João, mas só
em relação aos filhos de irmãos, não havendo outro direito de representação em relação aos
colaterais.
• Concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais, cada um dos
irmãos unilaterais vai ter direito à metade do que receber o irmão bilateral.
Ex.: João deixou 100 mil reais para dois irmãos unilaterais e um irmão bilateral. Os unilaterais
receberão 25 mil cada um e o irmão bilateral receberá 50 mil reais, eis que este é irmão duas
vezes.
• Na falta de irmãos vão herdar os filhos dos irmãos. Na falta dos sobrinhos vão herdar os tios.
A regra é a de que os sobrinhos terão prioridade sobre os tios, ainda que sejam de mesmo grau.
Portanto, se houver sobrinhos, tios não irão herdar.

V. Sucessão do companheiro

O art. 1.790 do CC regulamenta a sucessão do companheiro, mas com a ressalva do entendimento


da inconstitucionalidade do dispositivo.

Esse dispositivo diz que a companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto
aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável.

Em relação aos bens particulares, o companheiro não herda, só herdando em relação aos bens
comuns. Com relação aos bens comuns adquiridos na união estável, metade será dele e no tocante a outra
metade é que ele irá herdar alguma coisa.

• Se ele concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for
atribuída ao filho.

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Então concorrerá em igualdade de condições, se os filhos forem em comum dele com o


companheiro que faleceu.
• Se ele concorrer com descendentes só do autor da herança, terá direito à metade do que esses
descendentes tiverem.
Se o João tinha 2 filhos antes e morreu, a companheira dele terá direito à metade do que os filhos
dele anteriores à união estável tem direito. Ex.: João deixou 500 mil de patrimônio, 2 filhos e a
mulher depois, neste caso ela receberá 100 mil e eles receberão 200 mil cada um, segundo o art.
1.790.
• Se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança.
Este inciso é de uma inconstitucionalidade acachapante.
• Não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.
Se não tiver mais ninguém, aí o companheiro herdaria totalmente a herança.

O STF tem se manifestado por meio do RE 878.694, no sentido da inconstitucionalidade do art. 1.790
do CC. Aplica-se ao companheiro, portanto, o mesmo regime sucessório dos cônjuges.

O enunciado 117 do CJF diz que o direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro em
razão da interpretação analógica do art. 1.831 do CC. Foi falado que esse dispositivo deve ser aplicado ao
cônjuge e por analogia se aplica o art. 1.831 ao companheiro. O CJF escreveu interpretação analógica, mas
seria analogia.

VI. Direito de representação

O direito de representação é aquele em que a lei chama os parentes do falecido a todos os direitos
que esse parente sucederia se estivesse vivo, conforme art. 1.851.

Em duas situações a norma jurídica consagra esse direito de representação:

• Linha reta descendente: nunca existe o direito de representação na linha reta ascendente.
• Linha colateral transversal: existe somente em relação aos filhos do irmão falecido, quando
concorrer com outros irmãos do autor da herança.

Então, quem tinha que receber a herança já morreu, e os filhos destes receberão por representação,
visto que existem herdeiros de graus mais próximo, os quais vão herdar por cabeça.

O direito de representação é concedido aos filhos de herdeiro pré-morto.

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Existe uma discussão se o direito de representação poderia ser usado também quando o herdeiro
que falece está em situação de comoriência. Ex.: o pai e o avô em um acidente morrem. O filho tem um tio,
filho do avô, e tem um neto. Poderia este neto herdar por estirpe?

SIM. Como quem tinha que herdar era o pai, ou seja, o pré-morto, quem irá herdar será o neto, em
direito de representação.

A jurisprudência tem se manifestado nesse sentido em conceder aos filhos dos que morreram em
comoriência o direito de sucessão por representação.

O art. 1.856 diz que o renunciante à herança de uma pessoa pode representá-la na sucessão de
outra. Ex.: João é filho de José, mas é pai de Antônio. João morre. Antônio renuncia a herança de seu pai
João. Um ano depois, o avô de Antônio, pai de João, senhor José, tinha dois filhos: João (pré-morto) e Carla,
que ainda está viva. Metade da herança de José teria que ir para João, mas ele é pré-morto. O Código está
dizendo que Antônio, que renunciou à herança de João, poderá representá-lo na herança do José.

4. Sucessão testamentária

I. Conceito de testamento e características

Flávio Tartuce diz que testamento é negócio jurídico unilateral, personalíssimo e revogável pelo
testador, através do qual são feitas disposições de caráter patrimonial ou extrapatrimonial para depois de
sua morte (efeitos mortis-causa).

O testamento poderá ter conteúdo extrapatrimonial, inclusive apenas conteúdo extrapatrimonial.

O art. 1.857 diz que são válidas as disposições testamentárias de caráter não patrimonial, ainda que
o testador somente a elas tenha se limitado.

É possível fazer um testamento moral, de valores para que os filhos podem seguir, não tendo nada
de patrimonial.

Em relação ao conteúdo patrimonial, o art. 1.857, §1º, diz que os bens da legítima não podem ser
objeto de testamento (50% do patrimônio do sujeito, se tiver herdeiros necessários).

São características do testamento:

• Aperfeiçoa-se com uma única manifestação de vontade, e a renúncia ou a aceitação da herança


é irrelevante do ponto de vista jurídico para validade do testamento.

• O testamento é um negócio jurídico gratuito, pois o testador não aufere qualquer vantagem.

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• Negócio mortis causa, pois somente produz efeitos após a morte.

• É revogável, pois o testador poderá modificá-lo ou revogá-lo a qualquer tempo. Por outro lado,
a despeito de ser revogável, o reconhecimento de filho irrevogável, mesmo quando este
reconhecimento de filho estiver em testamento e este for revogado.

• É vedado o testamento conjuntivo, sendo nulo e vedado por lei o testamento por meio de mais
de uma pessoa conjuntamente.

• Toda pessoa capaz poderá dispor por testamento da totalidade de seus bens para depois da
morte. Não poderão testar os incapazes, e o art. 1.860 diz que também não podem testar as
pessoas que no ato de fazer o testamento não estiverem no pleno discernimento (Ex.: bêbado,
drogas, etc.). O maior de 16 anos, no entanto, poderá testar. Se a pessoa tiver uma incapacidade
superveniente, não há invalidação do testamento feito anteriormente. Da mesma forma, se a
pessoa era incapaz quando testou, o fato de ter capacidade superveniente, não validará
supervenientemente o testamento. Há que se analisado se no momento da prática do ato a
pessoa tinha capacidade ou não.

• O art. 1.859 diz que se extingue em 5 anos o direito de impugnar a validade do testamento,
contado o prazo da data do seu registro. Este prazo se aplica aos casos de nulidade relativa e
também aos casos de nulidade absoluta.

II. Modalidades ordinárias do testamento

O art. 1.862 diz que são modalidades ordinárias de testamento:

• Testamento público
• Testamento cerrado
• Testamento particular

a) Testamento público

O testamento público é aquele lavrado pelo tabelião de notas. Ele recebe as declarações do testador,
observa os requisitos essenciais do art. 1.864 para lavrar o testamento.

São requisitos para o testamento público:

• O testamento deve ser escrito pelo tabelião em seu livro de notas, de acordo com as declarações
do testador.

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• O testamento deverá ser lido em voz alta pelo tabelião ao testador e a 2 testemunhas ao mesmo
tempo.
• Poderá ser lido pelo testador na presença das testemunhas e do oficial (tabelião).
• O instrumento deve ser, em seguida a esta leitura, assinado pelo testador, pelo tabelião e pelas
testemunhas.

A jurisprudência superior tem mitigado a observância desses requisitos formais do testamento


público. Se ficar evidente que é o sujeito que testou, e o fato de que havia uma testemunha ao invés de duas,
se não há qualquer empecilho, então há mitigação do formalismo.

Se o testador não souber ou não puder assinar, neste caso o tabelião irá declarar isso no instrumento,
caso em que irá assinar pelo testador, a seu rogo, uma das testemunhas instrumentárias irá assinar
(testemunha a rogo).

Assim, confirma-se a tese pela qual o analfabeto poderá testar, já que quem não souber assinar
poderá pedir que uma pessoa o assine.

O art. 1.866 diz que o indivíduo inteiramente surdo, se souber ler, poderá testar. Nesses casos, o
sujeito irá ler o seu testamento ou, se não souber ler, irá designar alguém que o leia, presente as
testemunhas.

Em relação aos cegos, somente é possível testar por meio do testamento público, caso em que será
lido em voz alta por duas vezes: uma pelo tabelião e outro por uma das testemunhas.

Ocorrendo o falecimento do testador, segundo o CPC 2015, qualquer interessado, exibindo o traslado
e a certidão de testamento público, poderá requerer ao juiz que ordene o cumprimento do testamento.

Sucessões.

b) Testamento cerrado

Testamento cerrado é também chamado de testamento místico, pois não se sabe qual é o seu
conteúdo até que o sujeito morra.

Essa modalidade não tem grande aplicação prática.

O art. 1.868 diz que o testamento cerrado, escrito pelo testador ou por outra pessoa, a seu rogo, e
assinado pelo testador, será válido se aprovado pelo tabelião ou seu substituto legal, observadas as
formalidades da lei.

São formalidades para o testamento cerrado:


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• Testador o entregue ao tabelião em presença de 2 testemunhas;


• Testador declare que aquele é o seu testamento e quer que seja aprovado;
• Tabelião lavre, desde logo, o auto de aprovação, na presença de duas testemunhas, lendo o
testamento, em seguida, ao testador e testemunhas;
• Auto de aprovação seja assinado pelo tabelião, pelas testemunhas e pelo testador.

Após, o tabelião passar a cerrar e a coser (costurar) o documento aprovado, tudo isso com 5 pontos
de retrós, sendo lacrado nos pontos de costura (art. 1.689). A jurisprudência tem mitigado essas exigências.

O testamento cerrado poderá ser escrito em língua nacional ou em língua estrangeira (art. 1.871).
Não pode dispor de seus bens no testamento cerrado quem não sabe ler ou escrever, pois é necessário
escrever o seu próprio testamento.

Podem fazer testamento cerrado o surdo ou o mudo, contanto que saiba escrever.

Após a aprovação e cerrado o testamento, este será entregue ao testador, lançando o tabelião no
seu livro o dia, lugar, hora, ano, etc. em que o testamento foi aprovado e entregue ao testador.

Quando ocorrer a morte do testador, o testamento cerrado será apresentado ao juiz, o qual vai abrir
o testamento, determinando que se registre para que seja cumprido, desde que o juiz não constate a
presença de um vício externo que torne esse testamento nulo ou suspeito de alguma falsidade.

Do termo de abertura do testamento constará o nome de quem apresentou o testamento cerrado,


ainda de forma secreta, e como essa pessoa obteve o testamento.

Após a oitiva do MP, e não havendo dúvidas a ser esclarecidas, o juiz manda registrar, arquivar e
cumprir o testamento. Feito o registro, será intimado o testamenteiro para que ele venha a assinar o termo
da testamentária.

O art. 1.980 diz que o testamenteiro é obrigado a cumprir as disposições testamentárias no prazo
marcado pelo testador. Além disso terá que dar conta do que recebeu e dispendeu, tendo inclusive
responsabilidade por aquilo enquanto durar a execução do testamento.

c) Testamento particular

O testamento particular é também chamado de testamento hológrafo, pois é escrito pelo próprio
testador, sem maiores formalidades.

O art. 1.876 do CC diz que o testamento particular poderá ser escrito de próprio punho ou por
processo mecânico.

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Se escrito de próprio punho, serão requisitos para sua validade que esse testamento seja lido e
assinado, na presença de 3 testemunhas pelo menos, as quais também deverão subscrever esse testamento.

Sendo elaborado por um processo mecânico, não poderá conter rasuras e nem espaços em branco.
Da mesma forma, deverá ser assinado pelo testador, após ter sido lido na presença de ao menos 3
testemunhas, as quais irão assiná-lo.

A jurisprudência mitiga os rigores formais estabelecidos em lei. A ideia é de que se ficar evidente o
desejo do autor da herança, deverá aquele testamento ser cumprido.

Falecido o testador, publica-se em juízo o testamento particular, citam-se os herdeiros legítimos para
que possam comparecer.

O NCPC vai dizer no art. 737 que a publicação do testamento particular poderá ser requerida pelo
herdeiro, legatário, pelo testamenteiro ou por um terceiro que detenha um testamento.

O §1º desse dispositivo diz que serão intimados os herdeiros que não tiverem requerido a publicação
do testamento, a fim de que possam ser inquiridos pelo juiz.

No §2º diz que se o juiz perceber a presença dos requisitos previstos em lei, depois de ouvir o MP,
vai confirmar esse testamento.

O art. 1.878 diz que se as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição ou sobre a sua
leitura perante elas, e se reconhecerem essas testemunhas as suas próprias assinaturas, assim como a
assinatura do testador, o testamento será confirmado.

Agora, se faltar uma testemunha porque morreu ou está ausente, mas pelo menos a que resta
reconhecer a sua assinatura do testamento e a assinatura do testador, esse testamento poderá ser
confirmado a critério do juiz se se perceber suficiente a prova da sua veracidade.

Em circunstância excepcionais, declaradas na cédula testamentária, é possível que o testamento


particular de próprio punho e assinado pelo testador assim seja feito sem testemunhas, situação na qual
poderá ser confirmado desde que situações excepcionais justifiquem a ausência de testemunhas. É o caso
do testamento particular de emergência.

Ex.: alguém está sequestrado e tem um papel e uma caneta. Ele faz o testamento e guarda no bolso.
Após é assinado. Quando encontram o seu corpo, verificam o testamento, devidamente assinado, mas sem
testemunhas. Nesta situação, a lei admite que não se tenha testemunhas.

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O art. 1.880 diz que o testamento particular pode ser escrito em língua estrangeira, desde que as
testemunhas compreendam essa língua.

III. Modalidades especiais do testamento

São modalidades especiais do testamento:

• Testamento marítimo
• Testamento aeronáutico
• Testamento militar

Esse rol é taxativo.

Essas modalidades estão submetidas às mesmas regras de publicação e confirmação do testamento


particular. Em verdade, não há praticamente nenhuma aplicação prática.

a) Testamento marítimo e aeronáutico

O art. 1.888 diz que aquele que estiver em viagem a bordo de um navio nacional pode testar perante
o comandante e na presença de 2 testemunhas. Esse testamento poderá ser público ou cerrado, de próprio
punho, lacrado, etc.

Não precisa ser militar, o fato é que a pessoa civil deve estar a bordo de navio.

O registro desse testamento será feito no diário de bordo.

O art. 1.889 segue a mesma linha, mas se refere ao testamento a bordo de aeronave. Quem estiver
a bordo de aeronave poderá testar na presença de pessoa designada pelo comandante e outras 2
testemunhas, adotando a forma de um testamento público ou testamento cerrado, devendo ser registro no
diário de bordo.

Esse testamento ficará sob a guarda do comandante. Quando o navio atracar ou quando a aeronave
pousar, esse comandante vai entregar o testamento às autoridades do primeiro porto ou aeroporto que
atracar ou pousar.

O testamento marítimo ou aeronáutico vai caducar se o testador não morrer naquela viagem e nos
próximos 90 dias subsequentes ao seu desembarque em terra no lugar em que possa fazer o testamento de
forma ordinária, não fizer outro testamento.

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Então, na verdade, o testamento marítimo ou aeronáutico vão caducar, se o testador não tiver
morrido na viagem, em 90 dias subsequentes ao seu desembarque em terra em lugar que se possa fazer de
forma ordinária outro testamento, e assim não o confirmar.

O art. 1.892 diz que é inválido o testamento marítimo se, ao tempo que se fez, o navio estava em
porto, onde o testador pudesse desembarcar e testar de forma ordinária.

b) Testamento militar

O testamento militar poderá ser feito, não havendo tabelião, perante 2 testemunhas.

Se o testador não souber escrever, por estar ferido ou ser analfabeto, será necessário 3 testemunhas,
visto que uma delas irá assinar a rogo, a pedido do testador.

Esse testamento militar não tem nenhuma aplicação prática.

Se o testador pertencer a corpo ou a cessão de corpo destacado, o testamento será escrito pelo
comandante daquele corpo.

Se o testador estiver em tratamento em hospital, o testamento será escrito pelo oficial de saúde ou
pelo diretor daquele hospital.

Se o testador foi o oficial mais graduado, o testamento será escrito por aquele que substituir, ou seja,
o próximo na linha sucessória.

O testamento militar também caduca em 90 dias, desde que depois esteja nos 90 dias seguidos em
lugar que possa testar de maneira ordinária.

Vale ressaltar que os militares, se estiverem em combate, e forem feridos, poderão testar oralmente,
confiando as suas últimas palavras a 2 testemunhas. É o testamento nuncupativo, sendo este o testamento
militar feito oralmente por quem está em meio de guerra, ferido e confia suas últimas vontade de 2
testemunhas.

Essa modalidade de testamento não terá efeito se o testador não morrer naquela guerra ou
convalescer em relação àquele ferido.

IV. Codicilo

Codicilo é uma disposição testamentária de pequena monta.

Tem um requisito formal muito menor.

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O art. 1.881 diz que toda capaz de testar poderá, através de um escrito particular, poderá fazer
disposições especiais sobre seu enterro, algumas esmolas de pouca monta, legar bens móveis, como roupas,
acessórios pequenos, joias de pequeno valor, etc.

Além disso, no codicilo é possível nomear ou substituir um testamenteiro, sendo possível fazer
sufrágios, ou seja, disposições sobre sufrágios da alma, além de ser possível perdoar herdeiro indigno.

Os atos praticados por meio do codicilo revogam-se por atos iguais e consideram-se revogados, se
havendo testamento posterior, o testamento não confirmar ou não modificar o codicilo (art. 1.884).

A confirmação do codicilo deve ser feita do mesmo modo que é feito o testamento particular, sendo
levado a juízo (art. 737, NCPC).

5. Disposições testamentárias

A nomeação de herdeiro ou legatário poderá ser feita:

• Disposição pura e simples


• Disposição sob condição
• Disposição para certo fim (com encargo)
• Disposição para certo motivo

Perceba que não há como inserir um termo, pois há uma proibição expressa no art. 1.898 de que a
designação do tempo em que deve começar ou cessar o direito do herdeiro, salvo em relação às disposições
fideicomissárias, são tidas como não escritas.

Outra regra é que, quando a cláusula testamentária ser suscetível de interpretações dúbias
diferentes, irá sempre prevalecer a interpretação que se assegure a vontade do testador.

O art. 1.900 diz que é nula a disposição que institua herdeiro ou legatário sob condição captatória.
Ou seja, é nula quando dispor também em testamento em benefício do testador ou em benefício de
terceiros, pois estaria se admitindo um pacto corvina.

Também é nula a disposição testamentária que se refira a uma pessoa absolutamente


indeterminada, indeterminável, incerta, etc.

É nula ainda a disposição ao arbítrio de herdeiro ou de outrem fixar o valor do legado.

Por fim, é nula a disposição testamentária que favoreça a pessoa que, a seu rogo, assinou o
testamento, as outras testemunhas, companheiros, cônjuge, descendentes ou irmão dessas pessoas, ou
ainda o concubino do testador, que é casado, tabelião, etc. Nesses casos, será nulo esse favorecimento.

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É válida a disposição testamentária em favor de pessoa incerta que deva ser determinada por
terceiro, dentre duas ou mais pessoas mencionadas pelo testador, ou que pertençam a uma família ou
coletividade definida. A pessoa é indeterminada, mas é determinável. Não há absoluta indeterminação
subjetiva.

O erro na designação na pessoa do herdeiro, legatário ou da coisa, vai anular essa disposição, salvo
se pelo contexto ser possível identificar quem é essa pessoa ou qual é a coisa a que se referia o testador.

Se o testador nomeia certos herdeiros individualmente e outros herdeiros coletivamente, a herança


será dividida em tantas quotas quanto forem os indivíduos e os grupos. Ex.: Samer deixa 1/3 de seus bens
para João, 1/3 para José e 1/3 para os filhos de Caio. Os filhos de caio são 3.

São anuláveis as disposições testamentárias inquinadas de erro, dolo ou coação, estando sujeitas ao
prazo decadencial.

Esse prazo decadencial é de 4 anos, contados do momento em que tiver conhecimento interessado
do vício que inquina o testamento.

É importante que se estude as cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e de


impenhorabilidade.

Essas cláusulas poderão estar no testamento, podendo ser temporárias ou vitalícias. Sendo vitalícias,
a morte do beneficiado (legatário ou herdeiro) vai extinguir a cláusula.

O art. 1.848 diz que, salvo se houver justa causa declarada no testamento, o testador não pode
estabelecer cláusula de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade sobre os bens da
legítima (50% é indisponível). Diante disso, somente por justa causa, a despeito de julgados e
posicionamentos em sentido diverso, é que se possa haver essas cláusulas sobre a legítima.

O §2º do mesmo dispositivo diz que através de autorização judicial, e se houver justa causa, podem
os bens ser alienados ou gravados, se houver a necessidade. Nesse caso, os produtos dessa alienação ou
conversão serão sub-rogados nos ônus que recaíam sobre os primeiros. Ex.: a casa era inalienável, mas o
sujeito precisava vender a casa, pois mudaria de cidade. O juiz autoriza a venda e a compra da outra casa, a
qual passaria a ser inalienável, recaindo a cláusula de inalienabilidade.

O art. 1.911 diz que a cláusula de inalienabilidade implica impenhorabilidade e incomunicabilidade.

I. Legado

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Legado é uma disposição específica sucessória, sendo realizada a título singular. É a atribuição de um
bem certo para uma pessoa, por meio de um testamento. Ex: para João, Samer deixa o seu carro Fiat Elba
1996.

A lei admite o sub-legado. O art. 1.913 diz que se o testador ordenar que o herdeiro ou que o
legatário entregue coisa de sua propriedade a uma outra pessoa, essa outra pessoa será o sub-legatário. Não
o cumprindo, entender-se-á que renunciou à herança ou ao legado.

Ex.: João, herdeiro de Samer, entregará a Elba a José. Se não entregar este bem a José, presume-se
que ele renunciou à herança. Então, José não é legatário do de cujos, e sim sub-legatário, pois a ordem é de
que o legatário ou herdeiro entregue o bem a outra pessoa que vai ser a sub-legatária.

a) Espécies dos legados

São espécies de legados:

• Legado de coisa genérica: se o legado for uma coisa que se determina pelo gênero, esse legado
é válido e será cumprido mesmo que essa coisa não exista entre os bens deixados pelo testador.
Ou seja, vende-se o bem e compra aquela coisa. Isso porque o gênero nunca perece.
• Legado de crédito: nessa disposição o legado consiste não na entrega de um objeto, mas sim na
entrega de um direito creditício, que o testador possui. O testador é um credor e deixa seu
crédito para o legatário. O legado de crédito, ou de quitação de dívida, terá eficácia somente até
a importância desta, ou daquele, ao tempo da morte do testador. Cumpre-se o legado,
entregando o herdeiro ao legatário o título respectivo. Este legado não compreende as dívidas
posteriores à data do testamento.
• Legado de quitação de dívida: o testador é credor do legatário, utilizando o testamento para
quitar essa obrigação, ou seja, sua nomeação desobriga-o ao pagamento da dívida. Nada recebe,
mas nada deve. Aqui se subtende que o legado suporta as dívidas até a data do testamento.
• Legado de alimentos: o art. 1.920 diz que o legado de alimentos abrange o sustento, a cura, o
vestuário, enquanto o legatário viver, além da educação do legatário enquanto ele for menor.
• Legado alternativo: via de regra, o legatário ou o herdeiro terá a escolha dentre os bens descritos
pelo autor da herança qual será entregue ao legatário. Há uma alternância.

b) Efeitos dos legados

Desde o momento da abertura da sucessão, a coisa passa a pertencer ao legatário, salvo se o legado
estiver sob uma condição suspensiva, eis que é juridicamente possível.

Em relação ao legado, também é possível o legado a termo, já a herança não.

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O direito de pedir o legado pelo legatário não será exercido enquanto houver litígio recaindo sobre
a validade do testamento. Então, enquanto estiver litigando sobre a validade do testamento, o legatário não
terá direito de exigir o bem objeto de legado. Essa premissa do mesmo modo vai valer para os legados
condicionais ou legados a termo. Enquanto não ocorrida a situação, não poderá exigir o bem objeto de
legado.

No legado de coisa genérica, quem irá escolher a coisa é o herdeiro, via de regra, salvo se houver
estipulação em sentido diverso pelo autor da herança.

E o herdeiro deverá escolher essa coisa dentro do meio termo, não precisando dar a melhor e nem
podendo dar a pior. Se o autor da herança der a opção para o legatário escolher a coisa, dentro do gênero
determinado, o legatário, segundo o art. 1.931 poderá escolher a melhor coisa da herança.

Em relação ao legado alternativo, se não houver disposição expressa, quem fará a escolha entre as
coisas será o herdeiro.

Em relação ao cumprimento do testamento, este cumprimento incumbirá aos herdeiros. Se não


houver herdeiros, quem vai cumprir é o legatário, na proporção daquilo que herdarem e receberem.

c) Caducidade dos legados

O art. 1.939 do CC diz que o legado vai caducar se depois do testamento, o testador modificar a
coisa legada ao ponto de não ter a forma e nem caber a denominação que tinha.

Então, o legado caduca se o testador a qualquer título alienar a coisa, no todo ou em parte. Se a
alienação for em parte, caducará o legado até a parte em que pertencer ao testador. Ex.: O testador deixou
10 bolas de futebol, mas vendeu 5, restando 5 bolas como legado àquela pessoa.

Também caduca o legado se a coisa perecer ou for evicta.

Caduca o legado se o legatário for excluído da sucessão por indignidade ou se o legatário falecer
antes do testador.

d) Direito de acrescer entre legatários

Em relação a direito de acrescer, deve-se pensar que se está tratando de colegatários. Nesse caso, o
direito de acrescer vai competir aos nomeados conjuntamente a respeito de uma só coisa, ou então quando
o objeto do legado não puder ser dividido sem risco de desvalorização. É o que diz o art. 1.942 do CC.

Se um dos coerdeiros ou dos colegatários do direito de acrescer entre colegatários morrer antes do
testador, poderá ter esse direito de acrescer exercido.

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Se o colegatário renunciar ao legado, renunciando à herança, for excluído, ou a condição não se


verificar, vai acrescer o quinhão a outra parte dos colegatários conjuntos.

Se houve a entrega de um bem a uma pessoa, ficando o carro para João e Maria, mas Maria morreu
antes de João, ou foi excluída por indignidade. O carro, que era dos dois, mas agora passou a ficar com o
carro também.

A ideia do direito de acrescer remonta à percepção de que uma coisa é entregue para duas ou mais
pessoas em condomínio, havendo o direito de acrescer às outras.

Não sendo o caso do direito de acrescer, este restante que agora apareceu será transmitido aos
herdeiros legítimos se não for o caso do direito de acrescer.

Havendo legado de um só usufruto conjuntamente a duas ou mais pessoas, a parte que faltar vai
acrescer aos colegatários, via de regra. Se apesar de conjuntos, no tocante ao usufruto, for legada a cada
pessoa uma parte certa do usufruto, a propriedade irá se consolidar naquela fração em relação ao nu
proprietário que passará a ter a propriedade plena.

Para tanto, será necessário deixar um imóvel alugado para o banco do Brasil por 100 mil reais por
mês para João, José e Maria. Maria morreu antes dos dois, deixando o usufruto desse imóvel que está
alugado para João e José, os quais passam a receber mais 50 mil reais cada.

Quando há um usufruto certo para cada um é diferente. O proprietário do imóvel é Antônio, sendo
o usufruto foi dado para João, José e Maria. No caso, não se distinguiu quanto cada um receberia. Maria
morreu, passando João e José a receber 50% cada um de Maria.

Deixando o imóvel do Banco do Brasil alugado por 100 mil reais para Antônio, mas no tocante ao
usufruto foi deixando 1/3 para Maria, 1/3 para João e 1/3 para José. Nesse caso, este 1/3 já se consolida na
propriedade plena em relação a Antônio, o qual passará a receber 1/3 do aluguel.

II. Substituições testamentárias

Substituir é ocupar um lugar que era ocupado por outra pessoa.

Quando se fala em substituição testamentária, há uma disposição testamentária, na qual o testador


irá chamar uma pessoa para receber a herança ou o legado, seja no todo ou em parte, ou na falta ou após a
renúncia do herdeiro ou legatário nomeado em primeiro lugar.

Na substituição testamentária o testador deixa um bem para José, mas se José renunciar, ou se José
morrer antes, o bem ficará para João. Neste caso, João será chamado a substituir o lugar de José.

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São modalidades de substituições testamentárias do Código Civil:

• Substituição vulgar ou ordinária: o testador substitui diretamente uma pessoa por outra, se o
herdeiro ou legatário nomeado não quiser ou não puder aceitar a herança ou legado.
• Substituição recíproca: um herdeiro substitui o outro ou vice-versa. Ex.: Samer deixa um bem
para João e para José, mas se João morrer, os bens deverão ir todos para José e vice-versa.
• Substituição fideicomissária: o testador poderá instituir herdeiros ou legatários, estabelecendo
que por ocasião de sua morte a herança ou o legado vai se transmitir ao fiduciário e o direito
dessa pessoa vai se resolver quando essa pessoa morrer ou quando ocorrer uma certa condição
ou certo termo, situação em que esse direito irá se resolver em favor de outra pessoa, que é
chamado de fideicomissário. O fiduciário tem, via de regra, uma propriedade resolúvel.

O art. 1.956 vai restringir a possibilidade da chamada substituição fideicomissária. A substituição


fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador.

O parágrafo único do art. 1.952 diz que, se ao tempo da morte do testador, já tiver nascido o
fideicomissário, ele vai adquirir a propriedade dos bens fideicometidos, situação em que o fiduciário terá
apenas o usufruto dos bens enquanto o fideicomissário for menor. Na verdade, somente poderá se instituir
essa cláusula fideicomissária quando estiver diante de alguém que não foi concebido ainda.

O fideicomisso vai caducar se o fideicomissário morrer antes do fiduciário. É a chamada


premoniência.

Também caducará se antes de se realizar a condição resolutória do direito deste fideicomissário, o


fideicomissário morrer, podendo também o fideicomissário morrer antes da condição suspensiva ser
implementada. Nesses casos, o fideicomissário passará a ter a propriedade plena dos bens do legado ou do
objeto de herança.

Se houver renúncia da herança ou do legado pelo fiduciário, nesse caso o fideicomissário poderá
aceitá-la. Essa autorização de aceitação do fideicomissário em caso de renúncia pelo fiduciário, ela está
amparada no art. 1.954 do CC.

O art. 1.959 diz que são nulos os fideicomissos além do 2º grau. Na verdade, não se pode dizer que
se coloca como fiduciário João, como fideicomissário uma prole eventual de João e como fideicomissário do
fideicomissário os filhos da prole do filho de João. Veja, só se pode fideicomisso até o 1º grau. A nulidade
dessa substituição ilegal (de 2º grau) não prejudica a instituição em 1º grau.

III. Redução das disposições testamentárias

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Pode ser que seja necessária a redução das disposições testamentárias para que não se prejudique a
legítima. Se o testador faz uma disposição que rompe a proteção da legítima, essa disposição somente será
válida até os limites da metade disponível do seu patrimônio.

Então se se verificar que as disposições testamentárias ultrapassam a porção disponível, elas serão
reduzidas, e reduzidas proporcionalmente às quotas do herdeiro ou dos herdeiros que foram instituídos ali.

Se reduzir as quotas dos herdeiros instituídos e não bastou, aí será reduzido as dos legados, na
proporção do que bastar.

Via de regra, primeiro se reduz as dos herdeiros. Se não reduzir, será necessário reduzir as dos
legatários também.

O testador poderá prever que o caso vai ser necessário redução. Se ele pensar assim, poderá dispor
qual é a preferência no tocante a redução, podendo estabelecer que será primeiro reduzido os legatários e
depois os herdeiros. Essa redução será feita nos moldes desejados pelo testador, sem problema algum.

6. Revogação do testamento

O testamento poderá ser revogado. Revogação é um ato unilateral em que há uma extinção de um
determinado negócio jurídico.

O art. 1.969 diz que o testamento poderá ser revogado expressamente pelo mesmo modo e forma,
como ele pode ser instituído. Na verdade, a pessoa que testou por testamento público poderá revogá-lo por
testamento particular. Esse é o entendimento prevalente. O que importa é que se adote uma das formas
para revogação do testamento público.

Em relação ao modo de revogação, a revogação poderá ser expressa, quando existe uma declaração
expressa na vontade de revogar, ou poderá ser tácita, quando houver um novo testamento que está em
conflito com o testamento anterior. Tanto é que a revogação poderá ser total ou parcial.

A revogação vai produzir efeitos ainda que o novo testamento venha a caducar, eis que a caducidade
do testamento novo é a perda de sua eficácia.

Se o testamento foi anulado, aí a revogação não vai valer. Se ele apenas caducou, a revogação
continua válida, apesar do novo testamento ter caducado. É o caso do testamento que depois de 90 dias não
foi confirmado, havendo a caducidade do testamento. Mas mesmo havendo a caducidade, houve a
revogação do anterior.

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Vale lembrar que o testamento cerrado considera-se revogado se o testador abrir, já que a ideia é
que seja secreto. Ou seja, se for aberto, presume-se que foi revogado o testamento.

7. Rompimento do testamento

O testamento não vai ter efeito algum quando o testador não tem descendente, mas lhe sobrevém
um descendente, ou quando o testador tinha descendente, mas não sabia que tinha.

Neste caso, há a chamada rupção do testamento. Há o rompimento do testamento. Trata-se de uma


revogação ficta, estabelecida por lei.

A lei presume que se o testador soubesse que tinha um filho, ou se o testador teve um filho após o
testamento, por óbvio, não iria dispor como havia disposto anteriormente. Essa é a ideia.

O testamento é rompido porque feito na ignorância ou na inexistência de descendentes, ou de outros


herdeiros necessários (ex.: achou que o pai havia morrido).

O art. 1.975 diz que não se rompe o testamento se testador dispuser de sua metade não
contemplando os herdeiros necessários de cuja existência saiba, ou quando os exclua dessa parte. Neste
caso, preserva-se a vontade do testador.

8. Testamenteiro

O art. 1.976 diz que o testador pode nomear um ou mais testamenteiros, conjuntos ou separados,
para que dê cumprimento às disposições de última vontade do testador. Perceba que a testamentaria, ou
seja, o trabalho do testamenteiro é um múnus privado.

Existem 2 modalidades de testamenteiros:

• Testamenteiro universal: é aquele que tem a posse e administração da herança, eis que não há
cônjuge ou herdeiro necessário. E esse testamenteiro vai requerer inventário, e vai cumprir o
testamento.
• Testamenteiro particular: nesse caso, o testamenteiro não universal terá uma atuação restrita à
fiscalização da execução testamentária. O testamenteiro irá se restringir a essa fiscalização.

O art. 1.980 diz que o testamenteiro é obrigado a cumprir as disposições testamentárias, dentro do
prazo estabelecido pelo testador.

Além disso, deverá prestar contas do que recebeu ou de que dispendeu, ficando responsável
enquanto durar a execução do testamento.

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Compete ao testamenteiro defender sempre a validade do testamento, conforme art. 1.981.

Se o testador não conceder um prazo maior ao testamenteiro, esse testamenteiro deverá cumprir o
testamento e prestar contas no prazo de 180 dias, contados do momento da aceitação da testamentaria.

Esse prazo poderá ser prorrogado pelo juiz, desde que justificadamente.

Ainda existe a possibilidade de se nomear um testamenteiro, sendo denominado testamenteiro


dativo, na falta de um testamenteiro nomeado.

Nesse caso, a execução compete a um dos cônjuges, ou na falta deles, um herdeiro nomeado pelo
juiz (art. 1.984).

O exercício da testamentaria é um exercício personalíssimo. Isso significa que se o testamenteiro


morrer, essa obrigação não é passada aos seus herdeiros. Ela nem sequer pode ser delegada. Mas o
testamenteiro poderá agir por meio de mandatário.

É possível ainda que haja a instituição de mais de um testamenteiro em conjunto, sendo denominado
de pluralidade de testamenteiros ou testamentaria plural. Nesse caso, cada testamenteiro poderá executar
o ato isoladamente, na falta do outro, mas todos irão ficar solidariamente responsáveis, e tendo que dar
contas dos bens que lhes foram confiados.

Como retribuição, o testamenteiro que não for herdeiro, ou não for legatário, terá direito a um
prêmio, sendo denominado de vintena, sendo esta de 1% a 5% do valor da herança líquida, a depender do
trabalho que o testamenteiro exercer.

Ainda, segundo o art. 1.989, reverterá à herança o prêmio que o testamenteiro perder, por ser
removido ou por não ter cumprido o testamento. Nesse caso, aquela vintena será revertida à herança.

Em relação às hipóteses de remoção do testamenteiro, a verdade é que será removido em situações


em que o juiz percebe ou conclui que ele não tem cumprido o seu múnus, ficando a critério do magistrado.

O testamenteiro, quando não for herdeiro ou não for legatário, terá direito a um prêmio, mas nada
impede que, sendo herdeiro ou legatário o testamenteiro, ele renuncie à herança ou ao legado para receber
o prêmio, podendo escolher um ou outro. O que não se permite é que o herdeiro que seja testamenteiro ou
legatário que seja testamenteiro receba duplamente à herança ou legado e o prêmio (vintena).

Sucessões.

9. Inventário

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Eduardo Defaveri

I. Inventário

Inventário é o procedimento legal de caráter obrigatório para que haja a atribuição legal de bens
deixados pelo de cujos aos seus sucessores.

O art. 1.991 diz que desde a assinatura do compromisso até a homologação da partilha, a
administração da herança caberá ao inventariante.

Portanto, o inventariante é o administrador do espólio.

Espólio é o conjunto de bens que se forma com a morte de uma pessoa. É a universalidade jurídica
despersonalizada.

O NCPC, no art. 610, diz que havendo o testamento ou havendo interessado incapaz, o inventário
será judicial.

Se não houver testamento, e se todos forem capazes e todos estiverem de acordo, o inventário e a
partilha poderão ser feitos por escritura pública. Trata-se de uma faculdade da parte neste caso. No entanto,
a assistência de advogado é obrigatória.

II. Inventário judicial

Existem 3 espécies de inventários judicial:

• Inventário judicial pelo rito tradicional


• Inventário judicial pelo rito do arrolamento sumário
• Inventário judicial pelo rito do arrolamento comum

a) Inventário judicial pelo rito tradicional

O legitimado para requerer a abertura desse inventário, segundo o art. 615, será aquele que estiver
na posse ou administração do espólio.

No entanto, o art. 616 confere legitimidade concorrente a outras pessoas:

• Cônjuge ou companheiro
• Herdeiro
• Legatário
• Testamenteiro, se houver testamento
• Cessionário de um herdeiro ou de legatário
• Credor de um herdeiro ou de legatário, ou ainda do autor da herança.

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• Ministério Público, se houver incapazes


• Fazenda Pública, se houver interesse
• Administrador judicial da falência do herdeiro, do legatário, do autor da herança ou de seus
respectivos cônjuges ou companheiros também têm legitimidade.

Não existe mais menção à possibilidade de abertura de inventário se dar de ofício pelo juiz. Isto não
foi reproduzido pelo NCPC.

Do momento em que o inventariante presta compromisso até o momento de homologação da


partilha, a administração da herança fica com o inventariante. Mas até ele prestar esse compromisso, o
espólio será administrado pelo administrador provisório, nomeado pelo juiz, o qual terá direito ao
reembolso das despesas necessárias e úteis que fizer. Além disso, terá responsabilidade subjetiva, devendo
demonstrar culpa por danos que eventualmente causar aos herdeiros e legatários.

O NCPC, em seu art. 617, diz que o juiz vai nomear um inventariante e vai arrolar uma ordem para
essa nomeação:

• Cônjuge ou companheiro
• Se não for o caso, o herdeiro que tiver na posse ou na administração do espólio
• Se não for o caso, qualquer dos herdeiros. Sendo menor, exercerá seu múnus por meio de
representante legal.
• Se não for o caso, poderá ser o testamenteiro
• Se não for o caso, poderá ser o cessionário do herdeiro ou do legatário, o inventariante judicial,
no local onde houver inventariante judicial, ou ainda uma pessoa estranha que se mostre idônea
e que seja nomeada pelo juiz.

Esta ordem não é absoluta, sendo preferencial. Mas a depender do caso concreto, o juiz poderá
nomear um e não nomear outro.

O inventariante é intimado, quando da sua nomeação, tendo 5 dias para prestar o compromisso de
exercer esse seu múnus.

Em relação ao inventariante dativo, ele vai assumir os direitos e deveres da inventariança. O


inventariante dativo não será o representante do espólio em juízo.

Nas hipóteses em que há inventariante dativo, todos os herdeiros e sucessores do falecido serão
autores ou réus nas ações em que o espólio for parte.

São incumbência (deveres) do inventariante:

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• Representar o espólio ativa e passivamente, judicialmente ou extrajudicialmente


• Administrar o espólio
• Prestar as primeiras informações (primeiras declarações)
• Prestar as últimas declarações
• Exibir em cartório, em qualquer tempo, para que as partes possam examinar, os documentos
relativos ao espólio
• Trazer à colação no inventário os bens recebidos pelo herdeiro ausente ou pelo herdeiro
renunciante, ou ainda pelo herdeiro excluído
• Prestar contas de sua gestão
• Requerer, se for o caso, a declaração de insolvência do falecido

O art. 619 do NCPC traz outras incumbências ao inventariante, as quais demandarão autorização
judicial para serem exercidas:

• Alienação de bens de qualquer espécie


• Transação, judicial ou extrajudicialmente
• Pagamento de dívidas do espólio
• Pagamento de despesas necessárias para conservação ou melhoramento dos bens do espólio

Não sendo observada a autorização judicial, o ato será nulo.

No prazo de 20 dias, contados do momento em que o inventariante prestou o seu compromisso, o


inventariante fará as primeiras declarações.

Dessas primeiras declarações será lavrado um termo circunstanciado. No termo circunstanciado,


serão exarados alguns dados:

• Nome, estado civil, idade, domicílio do autor da herança


• Dia e local em que faleceu
• Se deixou ou não bens
• Se deixou ou não testamento
• Nome, estado civil, residência dos herdeiros
• Se houver cônjuge ou companheiro, qual seria o regime de bens do casamento ou da união
estável

Em relação aos bens do espólio, devem estar nessas primeiras declarações, os bens sujeitos à colação
e os bens alheios que forem encontrados junto com o de cujos.

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É interessante que se faça uma declaração completa, não apenas dos bens (do ativo), mas também
do passivo (das dívidas), a fim de verificar a situação do de cujos.

O NCPC elenca algumas penas ao inventariante:

• Pena de sonegados:
Somente poderá ser arguida contra o inventariante quando tiver encerrado a descrição dos bens
e tendo feito uma declaração de que não existiam outros bens a inventariar e depois se descobriu
que havia outro bem que havia sido sonegado.
Pena de sonegados é uma penalidade imposta ao herdeiro que deixe de informar no inventário
sobre a existência de um bem colacionado, partilhado. Ex.: o sujeito recebeu em doação do pai
uma casa no valor de 500 mil reais. Essa casa, em tese, deverá ser colacionada. Supondo que o
pai tenha deixado 3,5 milhões de patrimônio para 2 filhos. Mas como ele havia doado a um dos
filhos a casa de 500 mil reais, o certo seria esse filho colacionar a casa, caso em que a herança
ficaria em 4 milhões, ficando cada um dos filhos com 2 milhões.
Se esse herdeiro (que recebeu a doação) é o inventariante, e ainda assim não colaciona esse bem,
aí é aplicável a pena de sonegados. Trata-se da perda do direito em relação àquele bem. O
inventariante herdeiro é citado, tendo a oportunidade de informar e de descrever os bens do
falecido que estão na sua posse, mas se assim não o fizer, estará sujeito à pena de sonegados.
Neste caso, como pena, o bem passará integralmente ao outro(s) herdeiro(s), não havendo a
compensação dos valores. E os outros bens que faltam serão divididos metade-metade. No caso,
o herdeiro que recebeu a pena ficará com 1.750.000 e o irmão receberá 2.250.000 (1.750.000 +
500 mil da casa).

• Remoção do inventariante:
O inventariante poderá ser removido. O art. 722 do NCPC traz hipóteses em que o inventariante
pode ser removido:
d. Se não prestar no prazo de 20 dias, após a nomeação, as primeiras declarações e nem
prestar no prazo final as últimas declarações.
e. Se não der ao inventário o andamento regular. É o caso do sujeito que começa a levantar
dúvidas o tempo todo, pratica atos meramente protelatórios, etc.
f. Se por sua culpa se deteriorarem os bens, forem dilapidados ou sofrerem danos os bens do
espólio.
g. Inventariante que não defendeu o espólio nas ações em que o espólio foi parte.
h. Inventariante deixou de cobrar dívidas do espólio
i. Inventariante não promover medidas para evitar o perecimento de direitos do espólio

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j. Quando o inventariante não prestar contas, ou quando tendo prestado contas elas não
tiverem sido julgadas boas
k. Inventariante sonegar, ocultar ou desviar os bens do espólio

Diante dessas situações, o juiz deverá garantir o contraditório antes da remoção, podendo inclusive
remover de ofício.

Apresentadas as primeiras declarações, o juiz mandará citar o cônjuge, companheiro, herdeiro,


legatário, fazenda pública, MP, se houver incapaz, testamenteiro, etc. Essa citação será por carta, sendo
acompanhada de cópia das primeiras declarações.

Em relação à Fazenda Pública, Ministério Público e testamenteiro, o escrivão vai remeter para essas
pessoas cópia dos autos, e não apenas o mandado de citação com as primeiras declarações.

Concluídas essa citações, as partes terão vista do processo no prazo comum de 15 dias, podendo se
manifestar sobre as primeiras declarações.

Se houver impugnações, alegando que há uma omissão e essas impugnações forem julgadas
procedentes, o juiz mandará retificar as primeiras declarações.

Se o juiz acolher um pedido de reclamação da nomeação do inventariante, aí é mais grave, pois se


acolher o pedido, o juiz deverá nomear outro inventariante, sempre que possível observando a ordem
estabelecida em lei.

Se o juiz perceber que a disputa sobre a qualidade de herdeiro demandar produção de provas que
não a documental, ele remeterá as partes às vias ordinárias, sobrestando até que haja o julgamento naquela
ação a entrega do quinhão que caberia ou caberá ao herdeiro que será ou que seria admitido.

Pode ser que as partes venham a questionar a possibilidade de determinado sujeito ser herdeiro.
Neste caso, o juiz, se houver prova documental de que o sujeito é herdeiro, seguirá o inventário. Não havendo
prova documental de que o sujeito é herdeiro, para comprovação de que é herdeiro, serão necessárias outras
provas que não documentais. Nesta situação, remetem-se as partes para a via ordinária.

O art. 628 do CPC vai dizer que aquele que se julgar preterido pode demandar a sua admissão no
inventário, requerendo essa admissão antes da partilha. Ou seja, o sujeito não está nas primeiras
declarações!

Da mesma forma, nesse caso, se a solução da questão exigir provas que não bastem as documentais,
o juiz remeterá as partes às vias ordinárias, determinando que se reserve ao inventariante o quinhão que
aquele herdeiro excluído teria até que o litígio seja concluído.

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Essa ideia de que o juiz do inventário vai solucionar as demandas que puderem ser comprovadas
documentalmente e apenas remeterá as que exigirem análise mais complexa para outro feito, para outra
ação ou para outro juízo, encontra base na ideia central do art. 612 do NCPC. O juiz irá decidir todas as
questões de direito, desde que todos os fatos relevantes estejam provados por documento. Ele só irá
remeter para as vias ordinárias as questões que dependerem de outras provas.

O art. 629 do NCPC diz que a Fazenda Pública, no prazo de 15 dias, depois de ter dado vista à
manifestação quanto as primeiras declarações, informará ao juízo o valor dos bens descritos nas primeiras
declarações.

Após o prazo de 15 dias das primeira declarações, ou tendo sido julgadas e decididas as reclamações
impostas, ou opostas, o juiz vai nomear um perito para avaliar os bens do espólio, se na comarca não houver
um perito judicial.

O perito é dotado de fé pública, motivo pelo qual, em regra, não será necessária mandar repetir a
avaliação. Mas o art. 873 do NCPC trata dessa possibilidade de determinar que seja refeita ou reiterado a
avaliação feita pelo perito:

• Provar que houve erro ou dolo do avaliador.


• Se verificar que houve uma majoração ou diminuição do valor do bem que foi avaliado, ou uma
fundada dúvida sobre o valor que foi atribuído ao bem pelo perito.

Não vai se expedir carta precatória para avaliação de bens situados fora da comarca onde corre o
inventário, desde que se trate de bens de pequeno valor ou de bens que são conhecidos do perito nomeado.

A ideia da norma é conferir uma maior agilidade ao processo de inventário.

O art. 633 do NCPC diz que se as partes forem capazes, não irá se proceder à avaliação se a Fazenda
Pública concordar expressamente com o valor atribuído nas primeiras declarações aos bens do espólio.

Se os herdeiros concordarem com os valores apresentados e declarados pela Fazenda, não há


necessidade de fazer a avaliação. Mas a Fazenda apresenta valores de bens imóveis. Se a Fazenda já alterou
os valores de bens imóveis, e os herdeiros concordaram, já que houve algum questionamento, será
necessário fazer a avaliação em relação aos bens móveis.

Entregue o laudo de avaliação, o juiz irá mandar que as partes se manifestem nesse laudo no prazo
de 15 dias.

As partes podem aceitar esse laudo e se não aceitarem poderão apresentar impugnações, as quais
serão resolvidas. Após a resolução, será lavrado em seguida o termo das últimas declarações.

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Nessas últimas declarações, feita pelo inventariante, poderá ele emendar, aditar ou completar, se
for o caso, as primeiras declarações que prestou.

As partes serão ouvidas sobre as últimas declarações prestadas pelo inventariante. Serão ouvidas no
prazo de 15 dias.

Após, é calculado o tributo a ser recolhido pelas partes. Sobre esse valor serão ouvidas as partes no
prazo de 5 dias, e depois será ouvida a Fazenda Pública. Depois disso, há o recolhimento dos impostos.

b) Inventário judicial pelo arrolamento sumário

O NCPC diz, em seu art. 659, que a partilha amigável, celebrada entre partes capazes, será
homologada de plano pelo juiz.

O §1º diz que o disposto nesse artigo vai se aplicar ao pedido de adjudicação. Esse pedido de
adjudicação caberá quando o herdeiro for único.

Transitada em julgado a decisão homologatória da partilha ou de adjudicação, será lavrado o formal


de partilha, ou será elaborada a carta de adjudicação.

Lavrado o formal de partilha, intima-se o fisco para que seja feito o lançamento administrativo dos
impostos e de outros tributos eventualmente cabíveis.

Perceba que há o formal de partilha ou da carta de adjudicação antes do recolhimento do tributo


pelo arrolamento sumário. A ideia é celeridade.

O arrolamento sumário é uma forma abreviada de inventário de partilha de bens, sendo necessário
que haja concordância de todos os herdeiros, desde que sejam maiores e capazes. No arrolamento sumário
não importa o valor dos bens que serão partilhados.

No arrolamento comum, o valor dos bens que serão partilhados é uma informação importantes, mas
no arrolamento sumário não.

Os herdeiros apresentam um plano de partilha ao juiz, o qual somente irá homologar. Trata-se de
um procedimento de jurisdição voluntária.

No arrolamento sumário, não se aprecia questões relativas a lançamento, a pagamento, quitação de


taxas judiciais e de tributos, pois incompatíveis com a celeridade.

A taxa judiciária, se for devida, será calculada com base no valor atribuído aos herdeiros.

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Se o fisco entender de forma diferente quanto ao valor, caberá ao fisco, por meio de processo
administrativo, atribuir valor diverso do valor que foi estimado pela parte, e exigir eventual diferença por
meios adequados através do lançamento de créditos tributários.

O ITCMD será objeto de processo administrativo. Ou seja, as autoridades fazendárias não ficam
restritas aos valores dos bens atribuídos pelos herdeiros.

O art. 663 diz que a existência de credores do espólio não prejudicará a homologação da partilha e
nem mesmo a adjudicação, se forem reservados bens suficientes para o pagamento da dívida.

c) Inventário judicial pelo rito do arrolamento comum

Nesse caso, mais uma vez, é preciso deitar olhos no NCPC.

O art. 664 do NCPC diz que quando o valor dos bens do espólio for igual ou inferior a mil salários
mínimos, o inventário será processado na forma de arrolamento.

Neste caso, caberá ao inventariante, que foi nomeado, independentemente da assinatura do termo
de compromisso, apresentar, com suas declarações, a atribuição de valores de bens do espólio e o plano de
partilha.

Perceba que o interesse está no valor dos bens deixados até mil salários mínimos.

Neste caso, o inventariante, independentemente do termo de compromisso já apresenta o valor dos


bens e um plano de partilha nas suas primeiras declarações.

Se qualquer das partes ou o Ministério Público impugnar esse valor apresentado pelo inventariante,
caberá ao juiz nomear um avaliador que oferecerá um laudo em 10 dias.

Perceba que no arrolamento comum é possível a nomeação de avaliador, diferentemente do


arrolamento sumário, visto que há discordância.

Apresentado o laudo pelo avaliador, o juiz, na audiência, vai deliberar sobre a partilha, decidindo na
mesma audiência, de plano, todas reclamações, mandando pagar dívidas não impugnadas.

Provada a quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e suas rendas, o juiz julgará a partilha
após a quitação do tributo. Veja, é mais uma diferença para perceber com relação ao arrolamento sumário.

Essa forma de arrolamento não leva em conta eventual acordo entre partes e interessados. O
arrolamento comum leva em conta o valor dos bens inventariados, enquanto o sumário leva em conta
eventual acordo entre as partes.

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Se qualquer das partes ou o Ministério Público impugnar a estimativa no arrolamento comum, o juiz
nomeará avaliador que vai oferecer laudo em 10 dias.

O NCPC, no art. 665, diz que será possível o caminho do arrolamento comum para o inventário, ainda
que haja incapaz entre os herdeiros, desde que todas as partes estejam de acordo e que o Ministério Público
também concorde.

Portanto, passa-se a permitir que haja o procedimento de arrolamento comum quando os valores
dos bens não superarem mil salários mínimos, e não houver herdeiros incapazes, desde que todos estejam
de acordo e o Ministério Público também concorde.

Sucessões.

III. Inventário extrajudicial

Segundo o art. 610 do NCPC, havendo testamento ou interessado incapaz irá se proceder ao
inventário judicial.

Portanto, é necessário fazer uma leitura inversa, pois para se poder fazer um inventário extrajudicial
é preciso que não haja testamento ou interessado incapaz.

O §1º diz que se todos forem capazes e todos estiverem de acordo, o inventário e a partilha podem
ser feito por escritura pública.

O §2º diz que o tabelião vai lavrar a escritura pública se todas as partes de um advogado ou de um
defensor público.

A Resolução 35 do CNJ de 2007 em seu art. 1º diz que é livre a escolha do tabelião que vai lavrar o
inventário, não havendo em que se falar em competência territorial para isso.

O art. 2º diz que o inventário extrajudicial não é obrigatório, sendo facultativo.

Pode ser solicitado a qualquer tempo neste caso a suspensão pelo prazo de 30 dias, ou mesmo a
desistência da via judicial, para que as partes promovam o inventário pela via extrajudicial.

As escrituras públicas de inventário não dependem de homologação judicial.

Essa escritura pública é título hábil para registro civil, imobiliário, transferência de bens e
levantamento de valores. É ainda essa escritura pública obrigatória a nomeação de um interessado para
representar o espólio, tendo poderes de inventariante, cumprindo as obrigações ativas e passivas que
tiverem pendentes (art. 11 da Resolução).

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Em relação ao recolhimento de tributos, há o ITCMD que vai incidir. Esse recolhimento deverá
anteceder a lavratura da escritura pública de inventário (art. 15 da Res. 15), consagrando uma preferência
da fazenda pública.

Os cônjuges dos herdeiros devem comparecer ao ato de lavratura de escritura pública do inventário
e partilha quando:

• Houver renúncia à herança


• Houver algum tipo de partilha que importe em transmissão

É necessária a presença do cônjuge, eis que o direito à herança (sucessão aberta) é um direito
imobiliário, sendo necessário, em tese, da outorga conjugal.

Não será preciso a outorga conjugal quando os cônjuges estiverem casados em regime de separação
absoluta de bens.

É admissível uma sobrepartilha, ou seja, uma partilha depois da partilha realizada. Essa sobrepartilha
também poderá ser feita por escritura pública, ainda que a partilha tenha sido originariamente judicial, ou
seja, se à época havia um herdeiro incapaz, mas agora não exista mais (art. 25).

Se houver somente um herdeiro, desde que seja maior e capaz, terá ele direito à totalidade da
herança. Nesse caso, não haverá partilha, por óbvio. Será lavrado uma escritura pública de inventário e uma
adjudicação de bens (art. 26).

É possível falar em inventário negativo. É aquele em que o de cujos não deixou qualquer bem. O
inventário negativo é realizado por escritura pública, afirmando a ideia de que o falecido não deixou nada,
motivo pelo qual o cônjuge supérstite não teria qualquer bem a partilhar. Isso permite que o cônjuge
sobrevivente possa se casar novamente pelo regime de comunhão parcial de bens ou ainda em comunhão
total.

Como se sabe, há uma causa suspensiva após a morte do de cujos, até que haja a partilha. Com o
inventário negativo, é lavrada escritura pública afirmando que o morto não deixou bens e pode ser realizado
o novo casamento sem que haja causas suspensivas que poderiam ensejar a separação legal dos bens.

A escritura pública de inventário e partilha pode ser lavrada a qualquer tempo. O prazo de 60 dias
não é próprio, mas o tabelião observará, no tocante aos bens, eventual multa na legislação tributária.

Por fim, o tabelião poderá se negar a lavrar a escritura pública de inventário e partilha, se houver
fundados indícios de fraude ou se há dúvida sobre a condição de herdeiro do interessado.

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IV. Pena de sonegados

Sonegar é omitir, dizer que não aconteceu, fingir que não há.

O art. 1.992 do CC diz que se impõe a pena de sonegados ao herdeiro que sonegar os bens da
herança, não os descrevendo no inventário. Também se impõe a pena de sonegados ao herdeiro que omitir
os bens na colação.

A pena de sonegados gera ao herdeiro sonegador a perda do direito àquele bem. Sonegados são os
bens que deveriam ser inventariados ou trazidos à colação, mas não o foram, pois foram ocultados por aquele
que deveria ter trazido o bem, e não trouxe.

Para aplicação da pena de sonegados, não basta o elemento objetivo da ocultação do bem, exige-
se ainda um elemento subjetivo, que é o dolo de ocultar.

Ou seja, para pena de sonegados exige-se 2 elementos:

• Elemento objetivo: ocultar o bem.


• Elemento subjetivo: dolo de ocultar, ou seja, a intenção de não contar aos demais herdeiros que
não há o bem.

Se o sonegador for o próprio inventariante, além da pena de sonegado, será removido da


inventariança, não participando daquele bem.

A pena de sonegação deverá ser arguida nos próprios autos do inventário. Havendo a apresentação
do bem, essas arguições serão aditadas. Mas se persistir a recusa, será resolvida em via própria, por meio da
ação de sonegados.

A ação de sonegados somente poderá ser promovida pelos herdeiros ou pelos credores da herança,
sendo promovida no mesmo foro do inventário, tendo o juiz uma competência funcional (art. 1.994).

Não sendo possível a restituição do bem pelo sonegador, será necessário restituir os valores
equivalentes ao bem, além das perdas e danos. É o teor do art. 1.995.

V. Pagamento das dívidas

O art. 1.997 diz que a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido, do autor da
herança.

Se a partilha já tiver sido feita, os herdeiros vão responder pelas dívidas, porém na proporção à
parte que lhes coube na herança. Veja, os herdeiros não podem responder além das forças da herança.

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O §1º do art. 1.997 diz que: quando, antes da partilha, for requerido no inventário o pagamento de
dívida constante de documentos, e houver a impugnação deste pagamento, sendo que esta impugnação não
se funda na alegação de que aquela dívida já foi paga, e há uma prova que levanta uma certa dúvida sobre a
procedência ou não do pedido de pagamento por parte do credor do autor da herança, neste caso, o juiz irá
mandar reservar, em poder do inventariante, a quantia necessária, os bens suficientes, para solução
daquele débito, que venham a recair sobre uma futura execução.

O credor, neste caso, será obrigado a iniciar uma ação de cobrança, a qual deverá se dar no prazo
de 30 dias, sob pena de cair a reserva do bem. Proposta a ação de cobrança ficará sem nenhum efeito a
reserva de bens feita pelo juiz (art. 1.997, §2º).

O art. 642 do NCPC diz que antes da partilha, os credores podem requerer ao juízo do inventário o
pagamento das dívidas vencidas e exigíveis. A petição será distribuída por dependência e é autuada em
apenso aos autos de inventário.

Há aqui um pedido de habilitação de crédito. Se as partes concordarem, o juiz vai declarar habilitado
o credor, determinando que ocorra a separação dos valores e bens para pagamento da dívida.

Os donatários não serão sempre chamados a se pronunciar sobre o pedido de habilitação do credor.
Esses donatários serão chamados a se pronunciar sobre eventual habilitação de crédito sempre que houver
a possibilidade desse valor resultar dele a dedução das liberalidades. Se ele realmente for credor, aquele
que receberia 100 mil, poderá receber 50 mil, motivo pelo qual será necessária a sua manifestação.

Se não houver concordância de todas as partes, o pedido de habilitação de crédito será


encaminhado às vias ordinárias. O juiz, neste caso, mandará reservar em poder do inventariante bens
suficientes para pagar o credor quando a dívida constar de um documento e a impugnação não se referir à
quitação daquela dívida.

O legatário poderá ser chamado a se manifestar sobre dívidas do espólio. Ele será chamado pela
mesma lógica do donatário, ou seja, será chamado para se manifestar sobre eventual pedido de habilitação
de crédito quando:

• Toda a herança for dividida em legítima; ou


• Reconhecimento da dívida importar redução do legado

V. Colação ou conferência

Colação ou conferência são expressões sinônimas.

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O art. 2.002 diz que os descendentes que concorrem à sucessão do ascendente comum são
obrigados, para igualar às legítimas, a conferir ou colacionar as doações que, em vida do autor da herança,
receberam, sob pena de sonegação.

O parágrafo único do art. 2002 diz que para o cálculo da legítima, o valor dos bens colacionados ou
conferidos será computado na parte indisponível, sem aumentar a parte disponível.

Ou seja, o herdeiro, quando recebe em vida o bem, deverá devolver este bem para que seja calculada
a parte que ele receberá da herança, valendo-se também o bem como patrimônio do autor da herança.

A colação é justificada na possibilidade de doação do ascendente em relação ao descendente, ou


mesmo na doação entre cônjuges, pois há uma presunção de que essas doações são adiantamento do que
cabe a eles na herança, ou seja, da legítima.

A finalidade da colação é igualar as legítimas entre descendentes e o cônjuge sobrevivente.

Caso o filho que recebeu a doação já tiver morrido, os netos terão o dever de colacionar esses bens.

O ordenamento jurídico adotou a chamada colação em substância. Isso quer dizer que a mesma
coisa doada como adiantamento da legítima deve ser trazida à colação. Se foi dado um quadro, este deverá
ser trazido à colação, e não o valor do quadro. Só será trazido o valor do quadro quando este já não mais
existir. Se os donatários não mais tiverem o bem, trarão à colação o valor daquele bem.

Segundo o código civil, o valor do bem vai levar em conta o valor que a coisa dada possuía ao tempo
da doação (da liberalidade), conforme o art. 2.004. O NCPC, com uma aparente contradição, vai dizer que o
herdeiro obrigado à colação vai reportar os bens que recebeu. Todavia, se não tiver mais aqueles bens, ele
vai trazer valor daqueles bens.

O parágrafo único do art. 627 diz que os bens a serem conferidos na partilha, assim como as acessões
e as benfeitorias que fez o donatário, vão ser calculados pelo valor que tiverem ao tempo da abertura da
sucessão.

O Código Civil fala do bem na época da liberalidade da doação. O CPC se refere ao valor do bem ao
tempo da abertura da sucessão, que é quando o sujeito morreu.

Ainda não há uma questão pacífica. Mas o Enunciado 119 do CJF diz que, para evitar o
enriquecimento sem causa, a colação será efetuada com base no valor que a coisa tinha na época da
doação. Isso na hipótese em que o bem doado não mais pertença ao patrimônio do donatário. Agora, se o
bem ainda pertencer ao patrimônio do donatário, a colação vai ser feita com base no valor do bem na
época da abertura da sucessão.

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Tartuce vai dizer que, como o NCPC é posterior ao CC, deverá prevalecer. Mas será necessário
aguardar a jurisprudência.

O art. 2.005 diz que a dispensa da colação das doações que saíram da parte disponível da herança
é possível, desde que essa doação tenha saída da parte disponível e não da parte indisponível.

A lei vai presumir que houve essa imputação da parte disponível, quando foi feita a liberalidade
em favor de um descendente que à época não era herdeiro necessário, que não seria chamado à sucessão
na qualidade de herdeiro necessário.

Basta pensarmos no neto. Se o avô doar para o neto, este não é herdeiro necessário, bastando que
o avô tenha doado parte disponível da herança, não sendo necessário trazer à colação.

As doações remuneratórias feitas ao descendente, por serviços prestados ao ascendente, também


não estão sujeitas à colação.

O NCPC, no art. 641, diz que se o herdeiro negar o recebimento dos bens ou a obrigação de
colacionar esses bens, o juiz, tendo em vista essas alegações, irá considerar as provas produzidas para
decidir se ele tem o dever de colacionar ou se não tem esse dever.

Se for declarada improcedente a oposição, ou seja, o herdeiro tem o dever de colacionar, ele deverá
conferir esse bem no prazo improrrogável de 15 dias. Caso contrário, o juiz determinará o sequestro do bem.
Esse bem será inventariado e partilhado, imputando o quinhão hereditário no valor desse bem, se já não
mais o possuir. É possível que esse bem fique com aquele herdeiro, desde que seja imputado ao seu
quinhão hereditário o valor daquele bem.

Se a matéria exigir uma dilação probatória, não podendo ser comprovada por meio documental, o
juiz determinará para as vias ordinárias.

VI. Redução das doações inoficiosas

Aqui é reduzir. Na parte que excede não será válida, mas no que não excede será válida.

Se for o caso de uma doação que excede à parte que poderia ser disposta, portanto, que seja
inoficiosa, ficará sujeita à redução.

O art. 549 do CC vai considerar nula a doação inoficiosa na parte que exceder pelo doador aquilo
que, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.

Ex.: João doou 500 mil reais, deixando 500 mil reais para herança. A doação não será inoficiosa, pois
a metade disponível estava assegurada.

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Ex.: João doou 500 mil reais, deixando 250 mil reais para herança. Essa doação poderá ser ou não
inoficiosa, pois será necessário voltar ao momento em que foi feita a doação para saber se essa doação é
inoficiosa. Supondo que João tenha morrido em 10.10.2016. Será necessário voltar à época da doação, que
se deu em 10.10.2014, época em que João tinha um patrimônio de 1 milhão. Na época, ele doou 500 mil,
motivo pelo qual a doação não foi inoficiosa, ainda que quando de sua morte tenha ficado com 250 mil.

Ex.: Por outro lado, se na época João tinha 800 mil, quer dizer que ele somente poderia ter doado
400 mil. Portanto, como ele doou 500 mil, na parte que excede os 400 mil, que resulta em 100 mil, o donatário
deverá devolver, visto que a doação seria nula nessa parte.

O art. 2.007 diz que o excesso será apurado com base no valor que os bens doados tinham no
momento da liberalidade/doação (§1º). O §2º diz que a redução da liberalidade vai ser feita pela restituição
ao conjunto de bens do excesso que será apurado (100 mil reais, no exemplo).

O art. 2.008 diz que, aquele que renunciou a herança ou que foi excluído da herança deve conferir
ou colacionar as doações recebidas, com a finalidade de repor o que exceder à parte disponível. Isso é no
mesmo sentido do art. 640 do NCPC, que diz que o herdeiro que renunciou à herança ou que foi excluído não
se exime de colacionar o bem pelo fato da renúncia ou exclusão, devendo colacionar para efeito de repor a
parte inoficiosa sobre as liberalidades feitas pelo doador.

Ou seja, no exemplo acima, o indivíduo que recebeu 500 mil, quando somente poderia ter recebido
400 mil, deverá repor os 100 mil a mais recebidos pela doação inoficiosa, ainda que renuncie à herança ou
que tenha sido excluído.

10. Partilha

I. Partilha

Partilha é dividir. A partilha fixa o momento em que o acervo deixa de ser uma coisa comum,
transformando-se em coisa particular.

O herdeiro pode sempre requerer à partilha, ainda que o testador venha a proibir o herdeiro de
requerer a partilha.

O direito à partilha é um direito do herdeiro, decorrendo de um direito fundamental que é o direito


à herança.

Há 3 espécies de partilha:

• Partilha amigável

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• Partilha judicial
• Partilha em vida

a) Partilha amigável

A partilha vai ser amigável na hipótese em que todos os herdeiros forem capazes, fazendo-se
portanto:

• Por escritura pública


• Por termo nos autos do inventário
• Por termo particular, desde que, neste último caso, seja homologado pelo juiz

Lembrando que o inventário extrajudicial, feito por escritura pública, não precisa de homologação
judicial.

b) Partilha judicial

É obrigatória a partilha judicial nos casos em que houver divergência entre herdeiros, ou nos casos
em que há herdeiros incapazes.

O art. 647 do NCPC diz que, separados os bens para pagamento dos credores para a respectiva
praça ou leilão, o juiz vai facultar às partes, no prazo comum de 15 dias, que formulem o pedido de
quinhão.

Em seguida, o juiz vai proferir uma decisão de deliberação da partilha, resolvendo os pedidos das
partes, designando os bens que devem constituir cada quinhão hereditário de cada herdeiro ou legatário.

O parágrafo único do art. 647 diz que o juiz pode deferir antecipadamente, a qualquer dos herdeiros,
o exercício do direito de usar e de fruir determinado bem. É o princípio da saisine.

Mas desde o deferimento do exercício do direito de usar e fruir o bem, caberá ao herdeiro
beneficiário todos os ônus e bonus decorrentes do exercício daquele direito.

O art. 648 do NCPC traz regras de intepretação para partilha, funcionando como metanormas, ou
seja, traz a formas como deverão ser interpretadas as normas:

1. Princípio da igualdade da partilha: é a metanorma de se buscar o máximo possível à igualdade


na divisão, seja quanto ao valor, quanto à natureza, quanto à qualidade dos bens. Basicamente,
se o autor da herança deixou 5 herdeiros e 5 lotes, será um lote para cada um. Se ele deixou 2
herdeiros e 2 carro de 80 mil e 2 lotes de 80 mil, esse princípio diz que tanto quanto ao valor
como quanto à qualidade, deverá buscar a igualdade. Dessa forma, ficará 1 lote e 1 carro para

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cada um dos herdeiros. A ideia é não dar 160 mil para um em lotes e 160 mil para o outro em
carros, e sim manter a qualidade e quantidade para garantir a igualdade.

2. Prevenção de litígios futuros (mediação ou conciliação): a qualquer momento é possível que as


partes se valham de mediação ou conciliação para facilitar a partilha. Se estiver ocorrendo uma
dificuldade, será feita agora uma conciliação ou mediação.

3. Máxima comodidade dos coerdeiros do cônjuge ou do companheiro: na verdade, o art. 649 do


NCPC vai dizer que, se o bem ser susceptível de uma divisão cômoda, será feita dessa forma. Ex.:
há um terreno de 1500 metros, podendo ser fracionado em 3 terrenos de 500 metros para cada
herdeiro. Diante disso, será feito dessa forma, pois é mais cômoda a divisão. Se não for suscetível
de uma divisão cômoda, que não couberem na parte do cônjuge ou do companheiro, ou no
quinhão de um só dos herdeiros, esses bens serão licitados entre os interessados, ou ainda serão
vendidos judicialmente. A ideia é de que serão vendidos os bens e os valores serão partilhados,
já que não pode haver uma divisão cômoda dos bens, salvo se houver um acordo sobre o
condomínio do bem, situação em que o bem será adjudicado a todos.

Tutelando os direitos do nascituro, o art. 650 do NCPC estabelece que, se um dos interessados for
nascituro, o quinhão que cabe a ele será reservado em poder do inventariante até o seu nascimento. Caso
não nasça, será redistribuído o bem entre os herdeiros.

O art. 661 do NCPC fala do partidor, que é o agente responsável pela organização da partilha. É
funcionário do poder judiciário, que organizará o esboço da partilha, de acordo com aquilo que foi decidido
pelo juiz. No entanto, o partidor deverá observar uma ordem, isto é, quando ele fizer o esboço da partilha,
a primeira coisa a ser atendida são:

3. As dívidas
4. Meação do cônjuge
5. Meação disponível
6. Quinhões hereditários, começando pelo cordeiro mais velho

Feito o esboço, as partes irão se manifestar no prazo comum de 15 dias. Eventuais reclamações
serão resolvidas, situação em que a partilha será lançada nos autos.

Em seguida é pago o ITCMD, a título da morte, sendo juntada aos autos a certidão negativa de dívida
para com a fazenda pública, julgando o juiz a partilha por sentença homologatória, conforme art. 664, caput.

Transitada em julgado essa sentença, o herdeiro vai receber os bens que lhe tocarem e receberá um
formal de partilha. Esse formal vai conter o termo do inventariante e títulos dos herdeiros, a avaliação dos

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bens que constituíram o quinhão daquele herdeiro, o pagamento do quinhão hereditário daquele herdeiro
e a quitação dos impostos, além da sentença que homologou a partilha. Esse formal de partilha é
fundamental para registrar a aquisição do imóvel no registro imobiliário.

O formal de partilha poderá ser substituído eventualmente por uma certidão de pagamento de
quinhão hereditário, desde que o quinhão hereditário não exceda o valor de 5 vezes o salário mínimo.

c) Partilha em vida

A partilha em vida é uma partilha feita pelo ascendente a descendente por atos inter vivos ou por
ato de última vontade, podendos ser total ou parcial, desde que se respeite os parâmetros legais.

Neste caso, o testador indica os bens e os valores que devem compor os quinhões hereditários.

Professor Zeno Veloso vai dizer que a partilha em vida pode ser realizada de 2 formas:

• Por equivalência à doação: existe essa divisão de bens entre os herdeiros, mas de forma
imediata, antecipando o que iriam receber na herança, ou seja, que receberiam apenas após à
morte do autor da herança.

• Por divisão de bens entre herdeiros para post-mortem: é feita por ato mortis causa, só
produzindo efeitos com a morte do ascendente, funcionando como uma espécie de testamento.
A diferença é que, neste caso, o testamento, ao invés de dizer que deixou 1/5 para cada herdeiro,
ele já vai discriminar, deixando, por exemplo, o Golf para o João, o Astra para o José, o lote da
avenida X para João e o lote da avenida Y para José.

II. Garantia dos quinhões hereditários

Quando é julgada a partilha no processo de inventário, cada um dos herdeiros terá direito aos bens
correspondentes ao seu quinhão (art. 2.023).

Como é feito dessa declaração, ou seja, cada um vai receber um bem, os herdeiros serão
reciprocamente responsáveis (obrigados) a indenizar, se no caso de evicção dos bens aquinhoados. Ex.: 3
eram herdeiros, o pai deixou 150 mil em 3 lotes de 50 mil. Cada um deles recebeu o seu lote. Um deles
descobriu que não era do pai, pois já pertencia uma outra pessoa que tinha comprado do seu pai. Então, o
pai não deixou 150 mil, mas apenas 100 mil, motivo pelo qual cada um deveria ter recebido 33 mil. Diante
disso, os outros que receberam os 2 lotes deverão pagar a esse herdeiro 16.500 mil cada um.

Existem casos em que não há mais essa responsabilidade recíproca pela evicção, situação em que
a responsabilidade cairá. Haverá essa hipótese quando:

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• Houver acordo entre as partes sobre a exclusão da responsabilidade: ex.: cada um dos herdeiros
recebeu o lote de 50 mil, mas um deles recebeu um lote que poderá valorizar, valendo 100 mil
daqui a 1 ano, situação em que acordam que o herdeiro, que poderá ter a valorização do seu lote
dobrada, assuma a responsabilidade por possível evicção, desonerando os demais.
• A perda for por culpa exclusiva de um dos herdeiros
• A perda se der por um fato posterior à partilha: ex.: perda do quadro recebido ou perda pela
usucapião.

III. Anulação, rescisão e nulidade da partilha

O art. 2.027 diz que a partilha é anulável pelos mesmos vícios e defeitos que vão invalidar os
negócios jurídicos em geral. Esse direito de anulação da partilha decai no prazo de 1 ano.

O NCPC, sem eu art. 658, trata da rescisão da partilha julgada por sentença, por um motivo
posterior, que justifica a rescisão dessa partilha:

• Se for o caso de anulação da partilha, será necessário fazer a rescisão dela


• Se a partilha foi realizada sem formalidade legais, também se admitirá a rescisão por motivo
posterior à sentença.
• Se a partilha tiver preterido um herdeiro ou tiver incluído quem não era herdeiro, casos em que
caberá a rescisão da partilha.

Essa rescisão da partilha deverá se dar dentro do prazo de 2 anos, ou por causa de anulação da
partilha, por inobservância das formalidades legais, ou ainda por que incluiu quem não era herdeiro ou que
excluiu herdeiro.

O STJ entende que o prazo para que o herdeiro que não participou da partilha proponha a anulação
da partilha em juízo deverá se dar no prazo de 10 anos.

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