Budesonida inalatória em crianças – Milani GKM et alii Os Consensos para o Manejo da Asma recomendam ouso de corticóide por via oral em episódios agudos modera-dos, que apresentaram resposta incompleta ou recaída dossintomas após a utilização de ß2-agonista inalatório. Nasexacerbações graves, o uso de corticóide é obrigatório1,5. Em situações de emergência, os pacientes com asmadevem usar corticóide sistêmico precocemente, pois têmrecuperação mais rápida e menor risco de hospitalização ede asma fatal5. Na crise aguda de asma, geralmente os corticóides sãoadministrados por via sistêmica. O corticóide inalatório éefetivo no tratamento da asma crônica, porém, o seu papelna crise aguda ainda não está definido6. Poucos estudos analisam a ação do corticóide inalatóriona doença respiratória aguda. A comparação do uso decorticóide por via oral com o inalatório tem demonstradoeficácia semelhante para os dois tratamentos, porém, commenor número de reagudizações no segundo caso7,8. O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia de budeso- nida na forma de suspensão, em dose única (2 mg) parainalação, como tratamento adjunto ao ß2 inalatório, compa-rada com dose única de prednisona por via oral em pacien-tes com crise aguda de asma. Métodos Participaram do estudo 49 crianças com crise moderadade asma aguda, que procuraram o Serviço de Pronto- Atendimento Pediátrico do Hospital de Clínicas da UFPR. Crise aguda de asma moderada foi definida pelapresença de sibilos audíveis, uso de musculatura acessó-ria, aumento da freqüência respiratória e incapacidade deandar ou emitir mais de três ou cinco palavras entre cadarespiração5. Os critérios de inclusão foram: crise aguda de asmacom tempo de evolução maior que 6 horas; história detrês crises anteriores; idade entre 2 a 7 anos, de ambosos sexos; escore clínico para avaliação da gravidade dacrise de asma superior ou igual a 8. Os critérios de exclusão foram: doença cardiopulmo-nar crônica ou aguda concomitante; uso de corticóidesistêmico nos 14 dias que antecederam a crise ou corti-cóide inalatório nas 72 horas prévias; crise grave ou quenecessitasse internação imediata (incluindo pacientescom intenso esforço respiratório, alteração do nível deconsciência, bradicardia, saturação de oxigênio inferior a88% em ar ambiente, risco de fadiga respiratória);história de doença renal, hepática, cardiopatia congênitaou anemia falciforme; estridor concomitante; vômitosrecorrentes; piora clínica durante o período de avaliação. Os pacientes foram divididos de forma randômica em três grupos (Tabela 1): –Grupo I (n = 15): placebo por via inalatória e por via oral. –Grupo II (n = 17): placebo por via inalatória e corticóide por via oral. –Grupo III (n = 17): budesonida por via inalatória e placebo por via oral. O delineamento do estudo é prospectivo, paralelo,duplo-cego e duplo- placebo. Ao chegarem no setor dePronto-Atendimento Pediátrico, todos os pacientes foramsubmetidos à avaliação clínica, aferição de escore clínicoe medida transcutânea da saturação de hemoglobina, poroxímetro da marca NONIN (Onyx 9500, NONIN MEDICALINC; MN - USA). Todos os pacientes foram tratados com broncodilata-dor (salbutamol - 0,15 mg/kg diluído em 3 ml de soluçãosalina isotônica) por via inalatória. Foi utilizado nebuliza-dor com peça bucal PARI LC plus, com sistema valvulado Tabela 1 - Características dos pacientes na admissão Os valores estão expressos em média±DP. Placebo (GI) Prednisona (GII) Budesonida (GIII) n = 15 n = 17 n = 17 Idade (meses) 49,6±15,6 51,1±18,7 47,3±16,3 Sexo (M : F) 9:6 8:9 8:9 No de internações prévias 1 (7%) 3 (19%) 3 (19%) Duração da sibilância (h) 26,1±21,1 16,8±9,9 29,7±28,4 Escore clínico 10,0±1,7 9,7±1,3 9,9±1,4 Saturação de O2(%) 91,0±2,1 91,6±1,5 91,8±2,0 Freq. cardíaca (BCM) 141,9±13,3 136,2±16,4 133,9±19,4 Freq. respiratória (IRM) 44,2±10,6 42,3±8,7 45,6±9,2
108Jornal de Pediatria - Vol. 80, Nº2, 2004
Budesonida inalatória em crianças – Milani GKM et alii (PARIJET, Germany), adaptado ao ponto de saída deoxigênio hospitalar, com fluxo de 6 l/min. O pacientepermaneceu na posição sentada, com duração aproxima-da da inalação de 15 minutos. As avaliações do escore clínico (Tabela 2) e medida dasaturação de hemoglobina foram repetidas 15 minutosapós a inalação e consideradas como valores basais. Neste momento, conforme seleção, para cada pacientefoi administrado placebo ou prednisona por via oral, na dosede 1 mg/kg, por uma enfermeira não envolvida no estudo.A randomização foi realizada em blocos de seis, no momen-to da inclusão do paciente no estudo. A medicação foiarmazenada em cápsulas idênticas de 1 mg, 5 mg e 20 mg.Caso o paciente não ingerisse a cápsula, era realizada a suadiluição em 3 ml de água, chá ou groselha. Se ocorressemvômitos, aguardava-se 15 minutos para repetir a adminis-tração da medicação. Imediatamente após a ingestão, foi iniciado a inalaçãocom budesonida, suspensão para inalação 0,5 mg/ml, numvolume de 4 ml (dose total de 2 mg), ou com um volumeigual de placebo, com fluxo de O2 de 6 l/min. Os pacientes foram mantidos em observação por 4horas. Avaliações de escore clínico e saturação de hemo- globina foram realizadas em 30 minutos, 60 minutos, 2horas e 4 horas. Caso os pacientes mantivessem o mesmo escoreclínico ou houvesse piora da saturação de hemoglobinadurante as avaliações acima citadas, eram repetidas asinalações com broncodilatador. Após 4 horas de observação, foi indicada alta hospita-lar para os pacientes que apresentavam melhora clínica,prescrito broncodilatador por via inalatória, e orientado oretorno do paciente em 24 e 72 horas. Todos os pacientes foram avaliados pelo mesmo exami-nador. Os que não apresentaram resposta ao tratamentoforam encaminhados ao médico plantonista do Pronto- Atendimento, e seguia-se a conduta de rotina do serviço. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesqui-sa do Hospital de Clínicas. Todos os pais e pacientes foraminformados da natureza do estudo e consentiram na suaparticipação. O escore clínico empregado neste estudo foi baseado emescores clínicos previamente utilizados em estudos sobreasma aguda, na população pediátrica9,10. O escore era composto pelos seguintes parâmetros:freqüência respiratória, sibilos, tiragem, dispnéia e satura-ção de hemoglobina. A pontuação de cada parâmetro variouentre zero e três, com pontuação máxima do escore equi-valente a 15. Para o cálculo amostral o desfecho levado em conta foia diferença no escore clínico . O tamanho da amostra foiestimado de acordo com o desvio padrão estimado doescore clínico para detectar uma variação em relação aogrupo placebo de 10%. Para um erro alfa de 0,05, e beta de0,03, o tamanho da amostra necessário foi de 30 crianças. Foram utilizados a análise de variância (ANOVA) e ostestes não- paramétricos Wilcoxon para amostras relaciona-das, Mann-Whitney para amostras independentes (pelo 0 1 2 3 Freqüência respiratória (IRM)* <30 31-45 46 a 60 >61 Sibilos Ausentes Final da Toda Inspiratórios e expiração expiração expiratórios ou MV abolido Tiragem Ausente Retração Retração Batimento intercostal intercostal ou de aleta supraesternal nasal Dispnéia Ausente Atividade e Diminuição Concentra-se fala normal de atividade. na respiração. 5 a 8 palavras < 5 palavras por sentença por sentença Saturação O2 99-100% 96-98% 93-95% < 9 3 % Tabela 2 - Escore clínico *Para pacientes com idade superior a 6 anos: FR < 20 IRM, escore 0; 21-35, escore 1; 36-50 IRM, escore 2; > 50 IRM, escore 3.