Sei sulla pagina 1di 17

Aceleracionismo: como uma filosofia

marginal previu o futuro em


que vivemos?
O mundo está mudando a uma velocidade atordoante — mas para alguns
pensadores, isso ainda não é rápido o bastante. Seria o aceleracionismo uma
ideia perigosa ou falaria ao coração de nossa época problemática?

Ababelado Mundo
May 28, 2017
Andy Backet para o The Guardian — traduzido por
Materialismos

M eio século atrás, no grande

ano hippie de 1967, o jovem e


cultuado escritor de ficção
científica Roger Zelazny publicou
sua terceira novela. Sob muitos
aspectos, Lord of the light (O
Senhor da Luz) era um produto de
seu tempo, repleto de mitologia hindu e diálogos cósmicos. No entanto,
havia vestígios de algo mais avançado e político. Uma das tramas envolvia
um grupo de revolucionários que queria elevar a humanidade “a outro
patamar” transformando abruptamente sua relação com a tecnologia.
Zelazny os chamou de Aceleracionistas.
Ele e o livro andam bastante esquecidos hoje em dia. Mas como disse um
mais longevo autor de sci-fi, JG Ballard, em 1971, “o que os modernos
escritores de ficção científica inventam hoje, você e eu estaremos fazendo
amanhã”. Ao longo das últimas cinco décadas, e especialmente nos últimos
anos, a maior parte do mundo tem andado mais rápido. Padrões de trabalho,
ciclos políticos, tecnologias cotidianas, hábitos e aparelhos de comunicação,
a renovação das cidades, a aquisição e o descarte de mercadorias — tudo tem
acelerado. Enquanto isso, ao longo do mesmo meio século, praticamente
imperceptível para mídia e para o mainstream acadêmico, os
aceleracionistas deixaram pouco a pouco de ser apenas um dispositivo
ficcional para se consolidarem num movimento intelectual: uma nova
maneira de pensar sobre o mundo contemporâneo e seu potencial.
Os aceleracionistas argumentam que a tecnologia, particularmente a
tecnologia computacional, e o capitalismo, especialmente em sua versão
globalizada e mais agressiva, deveriam ser massivamente acelerados — seja
porque essa seria a melhor maneira de empurrar a humanidade para frente,
seja porque não há alternativa. Os aceleracionistas apoiam a automação.
Apoiam uma futura fusão entre digital e o humano. Não raro, apoiam a
desregulamentação dos mercados e a redução drástica do governo.
Frequentemente acreditam que a revolta social e política têm valor em si
mesmas.
Os aceleracionistas, portanto, vão de encontro ao conservadorismo, ao
socialismo tradicional, à social democracia, ao ambientalismo, ao
protecionismo, ao populismo, ao localismo e todas as demais ideologias que
têm se preocupado em moderar ou reverter o já altamente disruptivo mundo
moderno, cujo ritmo, ao que tudo indica, é hoje difícil de acompanhar. “O
aceleracionismo é uma heresia política”, escrevem Robin Mackey e Armen
Avanessian na introdução de seu #Accelerate: the accelerationist
reader(Acelere: o leitor aceleracionista), um livro ora desconcertante, ora
empolgante, publicado em 2014, que persiste como o único guia
propriamente dito para o movimento.
Como outras heresias, o aceleracionismo tem gerações de adeptos,
declarados ou não: transmitindo suas ideias de um para o outro, refinando
algumas e recusando outras, comunicando-se entre si numa linguagem
privada, convergindo em torno de figuras dominantes, competindo para ver
quem fará a próxima grande descoberta do credo, dividindo-se em facções,
se queimando. Há, ou houve, aceleracionistas vindos de Estados Unidos,
Canadá, Inglaterra, Alemanha, Itália e França. O movimento produziu livros,
ensaios, revistas, manifestos, blogs e batalhas nas mídias sociais — e
crípticos, quase inclassificáveis, comunicações que combinavam ficção
distópica com um leque alucinante de teorias políticas, culturais e
econômicas.
Eventualmente, os aceleracionistas ocuparam postos docentes em
universidades. Organizaram encontros públicos esporádicos, para pensar em
voz alta, discutir e conquistar adeptos. Uns poucos registraram fragmentos
disso tudo, que podem ser encontrados no Youtube: são cenas obscuras de
jovens intensos falando hipnoticamente sobre o futuro, frequentemente ao
som de música eletrônica e com imagens abstratas se movendo ao fundo,
para uma plateia por vezes atordoada reunida em salas mal iluminadas.
Em um dado momento, devem ter existido provavelmente apenas uma dúzia
de aceleracionistas no mundo. O rótulo só passou a ser usado regularmente
em 2010, quando foi tomado de empréstimo do romance de Zelazny
por Benjamin Noys, um poderoso crítico do movimento. Ainda assim, por
décadas, mais tempo do que muitos pensadores contemporâneos mais
ortodoxos, os aceleracionistas têm dedicado atenção a muitas das questões
centrais do final do Século XX e começo do Século XXI: a ascensão da China,
e da inteligência artificial; o que significa ser humano numa era de
dispositivos eletrônicos cada vez mais viciantes e intrusivos; o fluxo
aparentemente incontrolável dos mercados globais; o poder do capitalismo
como teia de desejos; o cada vez mais confuso limite entre o imaginário e o
factual; a reprogramação de nossas mentes por filmes e músicas cada vez
mais rápidos, e a cumplicidade, a repulsa e o tesão que muitos sentimos em
relação à velocidade da vida moderna.
“Vivemos todos num sistema operacional programado pela tríade guerra,
capitalismo e IA [Inteligência Artificial]”, diz Steve Goodman, um
aceleracionista britânico que sempre contrabandeia suas ideias dramáticas e
auto-conscientes para dentro da dance music, por meio de um aclamado selo
musical, o Hyperdub. “Gostemos ou não”, argumenta Steven Shaviro, um
observador americano do aceleracionismo, em seu livro de 2015 sobre o
movimento, No speed limit (Sem limite de velocidade), “somos todos
aceleracionistas agora."

C elebrar a velocidade e a

tecnologia tem seus riscos. Um século


atrás, os escritores e artistas
do movimento Futurista italiano se
apaixonaram pelas máquinas da era
industrial e sua aparente capacidade
de revigorar a sociedade. Muitos
futuristas foram conduzidos por essa fascinação ao belicismo e ao fascismo.
Embora alguns trabalhos futuristas ainda sejam até hoje admirados, a
reputação do movimento nunca se recuperou.
Uma das figuras centrais do aceleracionismo é o filósofo britânico Nick
Land, que deu aulas na Universidade de Warwick nos anos 1990 e então,
subitamente, abandonou a academia. “Filósofos são vivissecadores”, ele
escreveu em 1992. “Têm a inteligência precisa e reptiliana compartilhada por
todos que experimentam com coisas vivas”. Iain Hamilton Grant, que foi um
dos alunos de Land, recorda: “Sempre houve em todos nós uma tendência a
provocar os liberais e Nick era quem melhor fazia isso”.
Desde Warwick, Land tem publicado de maneira profícua na internet, nem
sempre sob o próprio nome, sobre a suposta obsolescência da democracia
contemporânea; também tem escrito favoravelmente sobre “biodiversidade
humana” e “seleção natural capitalista” [human capital sorting] — a ideia
pseudocientífica, hoje popular entre a extrema direita, de que diferentes
raças diferem “naturalmente” no mundo moderno; e sobre a supostamente
inevitável “desintegração da espécie humana” quando a inteligência artificial
evoluir o suficiente.
Outros aceleracionistas tomam hoje distância de Land. Grant, que ensina
filosofia na University of the West England, diz dele o seguinte: “Eu tento
não ler suas coisas. A galera [no movimento aceleracionista] está
embaraçada. Acham que ele soa como um delinquente. Qualquer um que
seja aceleracionista, que seja reflexivo, pensa: ‘Quão longe é longe demais?’.
Por outro lado, de novo, até mesmo levantar essa questão já é se opor ao
aceleracionismo”. O aceleracionismo não é sobre impor limites.
Até mesmo seu crítico, Benjamin Noys, reconhece que o movimento tem um
apelo. “Acelerar é uma palavra sexy”, ele diz — uma coisa não muito comum
em filosofia. Os artistas determinadamente transgressivos Jake e Dinos
Chapman são ligados ao movimento e colaboradores de longa data de Land.
Uma de suas mais alucinantes e grotescas pinturas está na capa de seus
textos reunidos, Fanged Noumena, publicado em 2011, que contém algumas
das passagens mais sombrias e fascinantes do aceleracionismo. No começo
desse ano, cópias de segunda mão da edição, que
agora está sendo reimpressa, eram vendidas na
Amazon por 180 libras.

Em nossos tempos politicamente febris, as ideias


impacientes, intempestivas, possivelmente
revolucionárias, do aceleracionismo parecem
relevantes, ou, no mínimo, intrigantes como nunca.
É Noys quem diz: “O aceleracionismo sempre
pareceu ter uma resposta. Se o capitalismo estava
indo rápido, eles diziam que precisava ir ainda mais
rápido. Se o capitalismo derrapa na pista e perde
velocidade” — como vem perdendo desde a crise
financeira de 2008 — “eles dizem que ele precisa ser
impulsionado”. A campanha disruptiva que marcou
a eleição americana e a presidência maníaca de Donald Trump, com suas
políticas ultra-capitalistas e anti-governo, tem sido vista por muitos
observadores — alguns alarmados, outros deliciados — como a primeira
expressão em grande escala de uma política aceleracionista. Nos últimos
anos, Noys tem visto as ideias aceleracionistas “ressonando” e “circulando”
por todo lugar, das parcelas pró-tecnologia da esquerda inglesa aos círculos
dos ricos e libertários da extrema-direita americana. Nos blogs da alt-right,
Land especialmente tem se tornado um nome a ser conjurado.
Comentadores têm reparado com entusiasmo nas conexões entre algumas de
suas ideias e o pensamento tanto do libertário bilionário do vale do
Silício, Peter Thiel, quando do iconoclasta estrategista de Trump, Steve
Bannon.
“No Vale do Silício”, diz Fred Turner, um dos principais historiadores da
indústria digital americana, “o aceleracionismo é parte de todo um
movimento que está dizendo, nós não precisamos mais de
política[tradicional], podemos nos livrar de ‘esquerda’ e ‘direita’, basta que
entendamos a tecnologia direito. O aceleracionismo também se adequa à
maneira como os dispositivos eletrônicos são comercializados — com a
promessa de, finalmente, nos libertar do mundo material e deixar toda essa
bagunça do mundo físico para trás”.
Para Turner, o apelo do aceleracionismo é muito mais antigo do que
moderno: “Eles falam num idioma milenarista”, prometendo uma
vaga mudança universal que estaria ao alcance de nossas mãos.
Noys adverte que os aceleracionistas estão tentando “reivindicar o futuro”.

De certa forma,

Karl Marx foi o


primeiro
aceleracionista. Seu
Manifesto de 1848
demonstrava tanto
fascínio quanto
horror pelo
capitalismo, com sua
“revolução constante da produção” e sua “perturbação
ininterrupta de todas as condições sociais”. Ele via um
capitalismo ainda mais frenético como um prenúncio essencial de
um movimento no qual o cidadão comum seria “por fim
compelido a encarar… as reais condições de sua vida” e começar
uma revolução.
Mas foi na França, no final dos anos 1960, que as ideias aceleracionistas se
desenvolveram primeiro de maneira sustentável. Sacudida pelo fracasso da
revolta da esquerda em 1968 e pelo aparentemente interminável boom da
economia ocidental do pós-guerra, alguns marxistas franceses decidiram que
uma nova resposta ao capitalismo era necessária. Em 1972, o filósofo
Gilles Deleuze e o psicanalista Felix Guattari publicaram o Anti-
Edipo. Era um livro inquietante, dispersivo e sedutoramente
ambíguo, que sugeria que, em vez de simplesmente se opor ao
capitalismo, a esquerda deveria reconhecer sua habilidade tanto
para liberar quanto para oprimir pessoas, e deveria procurar
fortalecer essas tendências anárquicas, “para ir ainda mais
longe… no movimento do mercado… para ‘acelerar o processo’”.
Dois anos mais tarde, outro marxista francês desiludido, Jean-François
Lyotard, estendeu o argumento de maneira ainda mais provocativa. Seu
livro Economia Libidinal declarava que mesmo os aspectos
opressivos do capitalismos eram “apreciados” [enjoyed] por
aqueles cujas vidas o sistema reordenava e acelerava. Além disso,
não havia alternativa. “O sistema do capital é, quando tudo está
dito e feito, natural”.
Na França, os dois livros são controversos. A certa altura, Lyotard
renegou Economia Libidinal considerando-o um “livro do mal”, e se dedicou
a outros temas. Deleuze e Guattari advertiram em seu livro seguinte, Mil
Platôs, que foi publicado em 1980 — quando um relativamente benigno
capitalismo pós-guerra estava sendo substituído pela versão mais selvagem e
severa da era Thatcher-Reagan — que o excesso de capitalismo poderia
levar a sociedade aos “buracos negros” do fascismo e do niilismo.
Mas na Inglaterra, Anti-Édipo e Economia Libidinal conquistaram outro
status. Como boa parte da filosofia francesa pós-guerra, foram ignorados por
décadas, como alienígenas demais, em todos os sentidos, e não foram
traduzidas para o inglês até 1983 e 1993, respectivamente. Mas, para um
pequeno número de filósofos britânicos, os dois livros foram uma revelação.
Iain Hamilton Grant foi primeiro atrás de Economia Libidinal como
estudante de mestrado em Warwick no começo dos anos 90. “Eu não
podia acreditar! Que o livro de um marxista dissesse ‘Não há
como escapar disso”, se referindo ao capitalismo, e que não
passávamos de pequenas peças na engrenagem do desejo, que
configurava um gigantesco sistema — era a primeira vez, que eu
saiba”. Grant “foi fisgado”. Em vez de escrever sua dissertação, ele investiu
obsessivos seis meses na produção da primeira tradução para o inglês.
Tais projetos filosóficos exploratórios eram tolerados em Warwick de um
jeito que não acontecia em outras universidades britânicas. Warwick foi
fundada em 1960 como uma universidade que pretendia experimentar e se
engajar no mundo contemporâneo. Nos anos 1990, seu campus ligeiramente
afastado do centro [out-of-the-town] e seus blocos de prédios arejados que
mais pareciam Zigurates desgastados do que construções futuristas, mas
seu ethos original sobreviveu em alguns departamentos, como no de
filosofia, onde estudar a vanguarda francesa era a norma. No centro dessa
atividade estava o jovem professor do departamento, Nick Land.
Land era franzino, um homem de aparência frágil com e um olhar
implacável [iron gaze], uma voz suave mas envolvente, e um ar
impressionante de confiança intelectual. “Muitas pessoas eram espertas, diz
Grant, “mas eu nunca vi ninguém tão capaz de destruir tão completamente
[forensically] uma tese”. Robin Mackay, que também se tornou um dos
alunos de Land, recorda: “Nick estava sempre pronto a dizer, ‘Não perca
tempo lendo isso’. Mas ele já tinha lido tudo!”
No começo dos anos noventa, Land tinha destilado suas leituras, que
incluíam Deleuze e Guattari e Lyotard, num conjunto de ideias e num estilo
de escrita que eram, para seus estudantes, pelo menos, visionárias e
sedutoramente perigosas. Land escreveu em 1992 que o capitalismo nunca
tinha sido propriamente liberado, mas que em vez disso tinha sido contido
pela política, “a última grande indulgência sentimental da humanidade”. Ele
descartou a Europa como como um lugar esclerosado, e cada vez mais
marginal, “a lata de lixo racial da Ásia”. E ele via a civilização acelerar por
todo lado em direção ao apocalipse: “A desordem deve aumentar… Toda
organização [humana] é… um mero… desvio no fluxo inexorável da morte”.
Land deu aulas estranhas e teatrais: subindo nas cadeiras enquanto falava,
ou nelas se debruçando e balançando para frente e para trás. Ele também
apimentava seus pronunciamentos com pitadas de humor negro. Dizia à
audiência, “eu trabalho no campo de Estudos do Colapso da Civilização
Ocidental”. Um quarto de século depois, alguns estudantes egressos da
filosofia de Warwick ainda falam dele com deslumbramento. Robin Mackay
diz, “Eu acho que ele é um dos mais importantes filósofos dos últimos 50
anos”.
Mas para um pretenso guia para o futuro, Land era em muitos sentidos um
antiquado. Até o final dos anos 1990, ele usava um computador Amstrad de
tela verde, e seus primeiros textos em Warwick continham mais referências a
filósofos dos séculos XVIII e XIX — Friedrich Nietzsche era uma fixação —
 que aos pensadores e à cultura contemporâneos. A versão Warwick do
aceleracionismo não se cristalizou completamente até outros radicais
chegarem ao departamento de filosofia no meio dos anos 90.
Sadie Plant foi um delas: uma ex-professora de estudos culturais da
Universidade de Birminghan, que estudava cultura popular moderna. Mark
Fisher, um ex-aluno dela em Birmingham, foi outro que chegou nessa época.
Era nervoso e intenso, enquanto ela era calorosa e amigável. Por um tempo,
ela e Land foram parceiros.
Assim como Land, Plant e Fisher tinham ambos lido os "aceleracionistas"
franceses e eram cada vez mais hostis ao que sentiam como uma hegemonia
[the hold] da esquerda tradicional e das ideias liberais nos departamentos de
humanas na Inglaterra e ao redor do mundo. Ao contrário de Land, Plant e
Fisher eram tecnófilos: ela tinha uma versão recente de um Apple, ele foi um
foi um early adopter do celular. “Computadores… perseguem a aceleração,
caminhos exponenciais, proliferação, miniaturizando-se, conectando-se uns
nos outros”, escreveu Plant em Zeroes and Ones (Zeros e Uns), um livro
"cafeinado" de 1997 sobre o desenvolvimento da computação. Plant e Fisher
eram também fãs declarados da incrivelmente cinética musica dance e dos
filmes de ação dos anos 90, que viam como formas populares de arte que
incorporavam as possibilidades da nova era digital.
Com a internet tornando-se parte do dia-a-dia pela primeira vez, e o
capitalismo aparentemente triunfante depois do colapso do comunismo, em
1989, a crença de que o futuro seria completamente moldado pelos
computadores e pela globalização — o acelerado “movimento do mercado”
que Deleuze e Guattari invocado duas décadas antes — se espalhou pela
academia e pela política inglesa e americana durante os anos 1990. Os
aceleracionistas de Warwick estavam na vanguarda.
Mas haviam duas diferentes visões do futuro. Nos Estados Unidos,
confiantes revistas arco-íris [rainbow-colored] como a Wired promoveram o
que ficou conhecido como “a ideologia californiana”: o argumento otimista
de que o potencial humano seria destravado em todos os cantos pela
tecnologia digital. Na Inglaterra, esse otimismo influenciou o New
Labour [Novo Trabalhismo]. Em Warwick, no entanto, as profecias eram
mais sombrias. “Uma de nossas motivações, diz Plant, “era
precisamente minar esse utopismo alegre dos anos 1990, a maior
parte do qual era muito conservador” — um desejo masculino e
ultrapassado de salvação pelos gadgets, na visão deles. “Nós
queríamos um mundo mais aberto, complicado e complexo, não
uma brilhante nova ordem”.
Os aceleracionistas de Warwick eram influenciados também pelo seu
ambiente. “A Inglaterra dos anos 90 parecia opressiva, cinzenta, arruinada”,
diz Mackay. “Nós víamos o capitalismo e a tecnologia como se fossem essas
forças intensas que estavam tentando tomar posse de um corpo decrépito”.
Para observar esse processo, e ajudar apressá-lo, em 1995, Plant, Fisher,
Land, Mackay e duas dúzias de estudantes e acadêmicos de Warwick criaram
uma instituição radical: a Unidade de Pesquisa sobre Cultura Cibernética
(Cybernetic Culture Research Unit) — CCRU. Ela se tornaria um dos grupos
mais mitológicos da recente história intelectual inglesa.

O CCRU existiu como

entidade, em pleno
funcionamento, por menos de
cinco anos. Parte desse tempo,
teve como base num um único
escritório nos corredores
apertados do departamento de
filosofia de Warwick, do qual era uma parte extra-oficial. Mais tarde, o
quartel general da unidade foi transferido para uma sala alugada no centro
de Georgian, próximo ao Leamington Spa, sobre uma franquia da Body
Shop.
Por décadas, referências atordoantes ao CCRU têm pipocado em diferentes
websites, músicas e jornais políticos e culturais, e nas seções mais cerebrais
da imprensa do gênero. “Tinham grupos de estudantes na faixa dos 20 anos
que reencenavam nossas práticas”, diz Robin Mackay. Desde 2007, ele tem
tocado uma respeitada editora de livros de filosofia, a Urbanomic, com
edições limitadas das velhas publicações do CCRU e de novas coletâneas de
textos proeminentes entre seus produtos.
O CCRU sempre teve consciência da importância da própria imagem. Seu
nome era deliberadamente duro, com uma pitada de militarismo ou
robótica, especialmente quando seus membros começaram a escrever se
referindo a si mesmos como um coletivo, sem um artigo definido, como
“Ccru”. Em 1999, eles resumiram sua história para um jornalista de música
simpatizante, Simon Reynolds no estilo conciso e descarnado que era sua
marca registrada: “Ccru… teve início em outubro de 1995, quando usava
Sadie Plant como tela e a Universidade de Warwick como habitat… o Ccru se
alimenta de estudantes de graduação + acadêmicos com problemas de
funcionamento + Nick Land + pesquisadores independentes…”
Ex-membros do CCRU ainda usam essa linguagem, e se mantém ferozmente
apegados à ideia de que ele se tornou uma espécie de mente coletiva. Land
me disse num email: “Ccru era uma entidade… irredutível a agendas ou
biografias de suas sub-agencias componentes… Total submissão À Entidade
era o segredo.”
Hoje em dia, Iain Hamilton Grant é um afável professor de meia idade que
usa colete com uma caneta no bolso de cima. Mas quando eu pedi a ele para
descrever o CCRU, ele disse com repentina intensidade: “Nós éramos uma
flecha! Praticamente não tinha desarmonia. Não tinha ociosidade.
Tentávamos não ficar distantes uns dos outros. Ninguém se atrevia a deixar
um parceiro na mão. Quando todo mundo acompanhava o ritmo de todo
mundo, o elemento coletivo aumentava sua velocidade.”
A gangue do CCRU criava grupos de leitura e organizava conferências e
publicações. Eles se espremiam na salinha apertada do CCRU no
departamento de filosofia e davam seminários improvisados uns pros
outros. Mackay lembra de Steve Goodman, um membro do CCRU que era
particularmente interessado em tecnologia militar e em como isso estava
transformando a vida civil, “desenhando o yin/yang no quadro negro e
falando de helicópteros. Não era a pontuação acadêmica que contava — era
disso que todos estavam cansados antes do CCRU. O que importava era a
construção de referências comuns.”
Grant explicou: “Alguma coisa seria introduzida ao grupo. Neuromancer [a
novel de William Gibson de 1984 sobre internet e inteligência artificial]
chegou ao departamento de filosofia e se espalhou como um vírus. Você
encontraria exemplares espalhados por toda sala.”
Os escritórios de Land e Plant no
departamento também se tornaram núcleos
do CCRU. “Eles eram generosos com seu
tempo”, disse Grant. “E ele tinha boas
drogas — skunk. Embora tenha ficado meio
sinistro aparecer por lá quando que ele
começou a viver no escritório. Tinha uma
torre de potes de Cup Noodles e cuecas, que
ele lavava no banheiro dos funcionários,
secando no aquecedor.”
O campus de Warwick ficava aberto até tarde.
Quando o departamento de filosofia fechava, à
noite, o CCRU partia para o bar da
organização estudandil do outro lado da rua,
onde Land pagava drinks pra todo mundo, e
dali para as casas uns dos outros, onde a mente coletiva continuava a
trabalhar. “Era como a Fábrica de Andy Warhol”, disse Grant. “trabalho e
produção o tempo todo.”
Em 1996, o CCRU listava seus interesses como “cinema, complexidade,
moeda, música, dinheiro digital, encriptação, feminismo, ficção, imagens,
vida inorgânica, jungle music, mercados, matrizes, microbióticos,
multimídia, redes, números, percepção, replicação, sexo, simulação, som,
telecomunicações, têxteis, textos, comércio, vídeo, virtualidade, guerra”.
Hoje, muitos desses tópicos são populares na mídia e se tornaram fixações
políticas. Duas décadas atrás, diz Grant, “Nós sentíamos que éramos as
únicas pessoas no planeta que estavam levando essas coisas a sério”. A meta
do CCRU era fundir suas preocupações numa matéria intelectual inovadora
e infinitamente flexível — como o ciborgue que podia assumir qualquer forma
no filme O Exterminador do Futuro 2, de 1991, a referência favorita — que
pudesse de alguma forma unir o passado e o futuro.
O principal resultado da frenética e promíscua pesquisa do CCRU era uma
linha de produção de artigos crípticos, atulhados de termos inventados,
especulativos a ponto de se tornarem ficção. Uma peça típica de 1996,
“Swarmachines”, incluía uma sessão sobre música jungle, a música dance
eletrônica mais intensa da época: “O jungle funciona como um acelerador de
partículas, baixo de frequências císmicas que engendra um drone celular
com imensos corpos… retrocede e recarrega o tempo convencional em
velozes bips de silício… não é apenas música. O jungle é o diagrama do devir
inumano planetário”. [Nota do tradutor: sou incapaz de traduzir a frase
decentemente, pra quem quiser conferir o original: “Jungle functions as a
particle accelerator, seismic bass frequencies engineering a cellular drone
which immerses the body … rewinds and reloads conventional time into
silicon blips of speed … It’s not just music. Jungle is the abstract diagram of
planetary inhuman becoming.”].
Os aceleracionistas de Warwick viam a si mesmos como participantes, não
como tradicionais observadores acadêmicos. Eles compravam discos
de jungle, frequentavam, clubes e arrumavam DJs para tocar em
conferências públicas, que promoviam na universidade para popularizar as
ideias aceleracionistas e atrair mentes afins. Grant lembra que esses
encontros, que ocorreram em 1994, 1995 e 1996 sob o nome de Futuros
Virtuais [Virtual Futures] atraiam “todo tipo de nerd sob o sol: fãs de ficção
científica, gente de ciências naturais, cientistas políticos, filósofos de outras
universidades”, mas também caçadores de tendências culturais. “Alguém da
[revista de moda] Face compareceu à primeira.”
Mesmo dentro do permissivo departamento de Filosofia de Warwick, o
desdém cada vez mais gritante demonstrado pelo CCRU em relação aos
padrões da prática acadêmica se tornaram um problema. Ray Brassier viu
isso acontecer. Hoje um internacionalmente conhecido filósofo da
Universidade Americana em Beirut, entre 1995 e 2001 era um estudante
maduro de meio período em Warwick.
“Eu estava interessado no CCRU, mas cético”, Brassier diz. “Era um pouco
mais velho que a maioria deles. O CCRU achava que estava mergulhando em
algo maior do que a academia, e eles, de fato, colocaram o dedo em muita
coisa que estava apenas começando a acontecer no mundo. Mas o trabalho
deles era frustrante também. Eles reconheceriam tranquilamente as
debilidades de suas pesquisas. ‘Não é sobre conhecimento’. Mas se pensar
fosse apenas conectar coisas, é claro que é empolgante, como tomar
anfetaminas. Mas pensar também é desconectar coisas”.
Brassier diz que o CCRU se tornou uma presença “muito divisora” no
departamento de filosofia. “A maioria do departamento realmente odiava e
desprezava Nick — e esse ódio se estendia aos seus estudantes.” Havia
discussões e disputas burocráticas cada vez mais agressivas em torno da
pesquisa do CCRU, e sobre como — e se — ela deveria ser regulada e avaliada.
Em 1997, Plant pediu demissão da universidade. “A cobrança pessoal,
política e filosófica da dinâmica do CCRU era irresistível para muitos, mas
eu me sentia sufocada e tive que sair”, ela me disse. Ela se tornou escritora
em tempo integral, e, por alguns anos, foi a principal acadêmica da mídia
digital na imprensa britânica, uma “Garota de TI para o Século XXI”, como
o Independent decretou empolgado em outubro de 1997.
Em 1998, Land pediu demissão de Warwick também. Ele e meia dúzia de
membros do CCRU se refugiaram na sala que ficava em cima do Leamington
Spa Body Shop. Lá, eles
derivaram do aceleracionismo
para um vórtice de ideias mais
esotéricas e antiquadas, tiradas
do ocultismo, da numerologia,
de romances obscuros do
escritor de horror americano,
PH Lovecraft, e, da vida do
escritor inglês Aleister Crowley,
que tinha nascido em
Leamington, uma casa
cavernosa para a qual muitos
membros do CRRU se mudaram.
“O CCRU se tornou um quase-culto, uma quase-religião”, diz Mackay. “Eu
saí antes dele terminar em loucura completa.” Dois textos chave para a
Unidade sempre foram o romance Coração das Trevas, de Joseph Conrad, e
sua adaptação para o cinema, Apocalypse Now, que tornava a conquista de
seguidores para se retirar do mundo e da sanidade convencional parecer
mortalmente glamorosa. Em sua sala no último andar, Land e seus
estudantes desenhavam diagramas ocultos nas paredes. Grant diz que um
“regime punitivo” de muito pensamento e bebida levou muitos membros a
crises mentais e físicas. Land mesmo, depois do que, mais tarde, ele
descreveria como “talvez um ano de abuso fanático” da “sagrada substância
da anfetamina”, e “insônia artificial prolongada”… dedicada a práticas fúteis
de ‘escrita’”, sofreu um colapso no final de 2000, e sumiu da vista do
público.
“O CCRU simplesmente evaporou”, diz Brassier. “E muitas pessoas — não me
inclua nessa — pensaram, ‘melhor assim’”.

S eis anos depois, na universidade de Western Ontario, no Canada, um

discreto mestrando em ciências políticas, Nick Srnicek, começou a ler um


blog britânico sobre cultura pop e política chamado k-punk. K-punk estava
nas redes desde de 2013, e tinha conquistado, entre acadêmicos e críticos de
música, uma legião de seguidores que o cultuavam por sua exploração
errante entre discos, programas de TV, a história britânica recente e a
filosofia francesa.
K-punk era escrito por Mark Fisher, ex-integrante do CCRU. O blog reteve
alguns dos traços de Warwick, como as citações reverenciais de Deleuze e
Guattari, mas aos poucos se livrou da retórica agressiva e da política pró-
capitalista em nome de um olhar mais condescendente e uma abordagem
mais da modernidade mais inclinada à esquerda. Fisher sentia cada vez mais
que o capitalismo era uma decepção para os aceleracionistas, com suas
cautelosas e entrincheiradas corporações e seus ciclos intermináveis de
produtos que eram essencialmente os mesmos. Mas ele também estava com
preguiça da esquerda, que, ele pensava, estava ignorando em vez de explorar
a tecnologia. Srnicek concordou. Ele e Fisher se tornaram amigos.
Na crise financeira de 2008, com a resposta ineficaz, pra não dizer
ultrapassada, da esquerda — como os protestos de vida curta do movimento
Occupy — convenceram Srnicek de que uma atualização da política era
necessária. Em 2013, ele e o jovem teórico político britânico, Alex Williams,
assinaram juntos o Manifesto por uma política aceleracionista. “O
capitalismo começou a limitar as forças produtivas da tecnologia”,
escreveram. “[Nossa versão] do aceleracionismo é basicamente a certeza de
que essas capacidades produtivas podem e devem ser liberadas…
direcionadas para para fins comuns… em direção a uma modernidade
alternativa”.
O que viria ser essa “modernidade alternativa” foi parca mas sedutoramente
esboçado, com referências vagas à redução das horas de trabalho, ao uso da
tecnologia para reduzir conflitos sociais em vez de acirrá-los, e a uma
humanidade caminhando para “além dos limites da terra e de nossas
próprias formas corporais atuais”. Em blogs políticos e de filosofia da
Inglaterra, dos Estados Unidos e da Itália se espalhou a ideia de que Srnicek
e Williams tinham fundando uma nova filosofia política: “o aceleracionismo
de esquerda”.
Dois anos mais tarde, em 2015, eles expandiram seu manifesto em um livro
ligeiramente mais concreto: Inventing the Future [Inventando o Futuro].
Ele argumentava em nome de uma economia baseada tanto quanto possível
na automação, com empregos, horas de trabalho e salários largamente
substituídos por renda básica universal. O livro atraiu mais atenção do que
qualquer livro especulativo de esquerda tinha conseguido em anos, com
interesse despertado e elogios recebidos de esquerdistas intelectualmente
curiosos como o trabalhista Jon Cruddas e os escritores Paul Mason e Mike
Davis.
Mas a palavra aceleracionismo não aparece no livro. “Nós desistimos do
termo”, Srnicek me disse. “Ele ficou popular demais. E nós não queríamos
simplesmente que as coisas andassem mais rápido, no fim das contas. O
argumento em favor da redução da jornada de trabalho era um argumento
pra desacelerar a vida das pessoas”.
O manifesto de 2013 tinha mencionado, de passagem, a primeira versão do
aceleracionismo de Land, descrevendo-a como “aguda” e “hipnotizante”,
mas também “míope”e “confusa”. Quando Srnicek e eu nos encontramos —
 de maneira pertinente, ele escolheu um espaço público futurista: um café na
nova extensão angular da Tate Modern — eu perguntei como ele avaliava o
trabalho de Land e do CCRU hoje. “O material do Land é uma leitura válida
de Deleuze e Guattari”, ele começou, educadamente. “Mas a desumanidade
de tudo aquilo… e não estou bem certo que que voltar aos textos do CCRU
seja interessante — todo aqueles jogos de palavras… Usando a palavra ‘cyber’,
soa tão anos 1990.”
Eu perguntei a Land o que ele achava do aceleracionismo de esquerda. “A
ideia de que uma tecnologia auto-propulsora é separável do
capitalismo”, ele disse, “é um erro teórico profundo”.

D epois de seu colapso, Land deixou

a Inglaterra. Ele se mudou para Taiwan


“no começo do novo milênio”, ele me
disse, e depois para Shangai “poucos
anos depois”. Ele ainda vive lá hoje. “A
vida de estrangeiro é um alívio”. A China
também era empolgante. Num artigo
para a Shangai Star, um jornal de língua inglesa, ele descreveu a moderna
fusão de marxismo e capitalismo como o “maior motor do desenvolvimento
político e econômico que o mundo jamais conheceu”. Em Warwick, ele e o
CCRU tinham escrito muitas vezes entusiasmados, mas com poucos
detalhes, sobre o que chamavam “neo-China”. Vivendo lá, Land me disse, ele
seu deu conta que “num nível massivo” a China já era uma sociedade
aceleracionista: fixada no futuro e mudando rapidamente. Apresentado aos
projetos radicais do estado Chinês, seus antigos receios libertários em
relação aos capacidades dos governos caiu por terra.
Na menos revolucionária Inglaterra, o jornalismo chinês de Land, um
estranho amálgama de propaganda pró-governo, hipérboles de relações
públicas, e imaginário CCRU selvagem — “Na World Expo 2010 Shangai…
trilhos paralelos se fundem no maior evento discreto da história mundial” —
 passou despercebido ou foi completamente ignorado entre 2000 e 2010.
Entre o número cada vez maior de pessoas com interesse no
aceleracionismo, há um sentimento de que Land levou a filosofia em
direções indevidas.
Outros membros da diáspora de Warwick se ambientaram de maneira
menos controversas ao mundo moderno. Suzanne Livingston, uma ex-
integrante do CCRU, juntou-se a uma agência internacionalmente
conhecida, a Wolff Olins, e usou o trabalho de PhD em robótica e
inteligência artificial que tinha feito em Warwick para ajudar empresas de
tecnologia como Sony e Ericsson. Steve Goodman fundou um selo de música
eletrônica, o Hyperdub, em 2004, e começou a lançar discos
de dubstep esqueléticos e ameaçadores de Burial, o louvado artista do sul de
Londres, entre outros, às vezes com mensagens aceleracionistas imiscuídas.
“É como uma cebola”, ele diz. “Nossa audiência é convidada a explorar
quantas camadas quiser — alguns podem lacrimejar, por isso não obrigamos
ninguém a comer”.
Entre 2002 e 2014, Goodman também deu aulas de cultura musical
na University of East London (UEL), que, junto com o Goldsmith College,
no sul de Londres, é uma empregadora frequente dos egressos do CCRU. “O
bando de Warwick é até hoje um grupo de amigos , devotados e leais uns aos
outros”, diz um ex-colega de Goodman na UEL. “Esse é um jeito positivo de
colocar. O outro é dizendo que essa coisa de seita no CCRU nunca deixou de
existir.”
Seja ou não o aceleracionismo uma seita, Robin Mackay é seu centro. Além
de publicar os textos principais do grupo no Urbanomics, tem mantido
contato com a maioria de seus antigos camaradas de Warwick, até mesmo
Land, que conhece, e tem defendido, há 25 anos. Mas Mackay é hoje uma
presença menos perturbadora. Com 43 anos agora, vive numa vila há 10
anos na ilha de Cornwall. Ele me encontrou perto da estação, vestindo uma
camisa preta severa e tocando um tecno complicado no estéreo do carro,
com um de seus filhos no banco de trás.
Na sala de estar de seu semi-reformado chalé, com as cortinas fechadas para
se proteger do adorável dia de primavera, Mackay falou sobre
aceleracionismo e sua história serpenteante por horas, fumando o tempo
todo — um velho hábito do CCRU — e piscando vagarosamente entre as
longas sentenças, deliberamente, para que você pudesse vê-lo pensando.
Perto do fim, ele disse: “O aceleracionismo é uma máquina contra o
pessimismo. Ao considerar as possibilidades inexploradas, você pode se
sentir menos desconsolado em relação ao presente.” Mackay diz que tem
experimentado períodos de depressão. Seu amigo próximo, Mark Fisher, que
também sofria de depressão, tirou a própria vida em janeiro deste ano.
Perto do fim de sua vida, Fisher estava cada vez mais preocupado com a
ideia de que a Inglaterra não estava avançando rumo a um grande salto à
frente, mas se encaminhava para um estado de estase. Apesar de todo o
frenesi da vida moderna, em alguns sentidos até mesmo os países mais
desenvolvidos ainda viviam do lado oposto do aceleracionismo: os mesmos
partidos políticos pareciam se perpetuar no poder; o mesmo capitalismo
preguiçoso, ainda lutando para encontrar seu momento depois da crise
financeira; a mesma saudade dos velhos tempos, expressa tanto
pelo voto dos idosos no Brexit e quanto pela nostalgia da
esquerda.
Mesmo o pensamento do arqui-aceleracionista Nick Land, que tem 55 anos
hoje, pode estar perdendo velocidade. Desde 2013, ele tem se tornado o guru
do movimento neoreacionário de extrema-direita, baseado nos Estados
unidos, ou dos NRx, como eles se identificam. Os neoreacionários acreditam
na substituição do moderno estado-nação, da democracia e da burocracia
governamental por cidades estado autoritárias, que nos blogs reacionários
soam tanto como reinos medievais idealizados quanto com modernos
enclaves como Singapura.
Em 2013, Lane escreveu um ensaio sobre o movimento, intitulado no estilo
tipicamente teatral de “O Ilumunismo Sombrio”[The Dark Enlightment],
que se tornou amplamente conhecido como um dos textos fundadores do
neoreacionarismo. Land argumenta hoje que a neoreação, como Trump e o
Brexit, é algo que os aceleracionistas deveriam apoiar, a fim de apressar o
fim do status quo. No entanto, o analista do aceleracionismo, Ray Brassier,
não está convencido. “Nick Land foi do argumento ‘A política está morta’, de
20 anos atrás, para essa coisa completamente antiquada e convencional de
reacionarismo.” A neoreação acredita na tecnologia e tem seguidores no Vale
do Silício, mas em outros sentidos parece ter um uma causa
demasiadamente voltada para o passado para conseguir conquistar a adesão
dos aceleracionistas.
Sem um capitalismo dinâmico do qual se alimentar, como tinham escrito
Deleuze e Guattari no começo dos anos 70, e os filósofos de Warwick em
1990, poderia acontecer do aceleracionismo simplesmente enveredar por
becos escuros. Em seu livro de 2014, Malign Velocities [Velocidades
Malignas]. Benjamin Noys acusa-o de oferecer “falsas” soluções para os
atuais dilemas tecnológicos e econômicos. Com o aceleracionismo, ele
escreve, um salto para o futuro melhor é “sempre prometido e
está sempre fora do alcance”.
1970, o escritor americano Alvin Toffler, um expoente do primo mais alegre
do aceleracionismo, o futurismo, publicou Future Shock [Choque de
Futuro], um livro sobre as possibilidades e os perigos das novas tecnologias.
Toffler previu a iminente chegada das tecnologias artificiais de inteligência,
da criogenia, da clonagem e de robôs que substituiriam atendentes atrás dos
balcões de check-in das companhias aéreas. “O ritmo da mudança está se
acelerando”, concluiu numa versão do livro convertida num documentário
com locução levemente canastrona, ao estilo Orson Welles. “Nos estamos
vivenciando uma das maiores revoluções da história — o nascimento de uma
nova civilização.”
Pouco depois, em 1973, a crise do petróleo chegou. O capitalismo
mundial não acelerou de novo por décadas. Estamos esperando
até hoje pela maior parte da “nova civilização” que Toffler
prometeu. De todo jeito, Choque de Futuro vendeu inúmeras
cópias. Um dia um aceleracionista poderá fazer o mesmo.
Com exceção das capas de livros reproduzidas, todas as outras imagens
são dos originais de Jack Kirby para a adaptação de Lord of the Light, o
livro de Zelazny citado no primeiro parágrafo. Os desenhos de Kirby foram
coloridos e publicados mais ou menos recentemente pela revista Heavy
Metal. Dá pra ler sobre isso nesta matéria breve da io9.

Potrebbero piacerti anche