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Coordenação e edição:
Ana Gabriela Simões Borges, Andressa Grilo Assagra e Clarice López de Alda
Revisão de Textos:
Adamastor Marques
Apoio técnico:
Everton Renaud e Gustavo Viana
L533
Leitura: o mundo além das palavras / Instituto RPC. Organizado por Ana
Gabriela Simões Borges, Andressa Grilo Assagra e Clarice López de Alda.
Curitiba: Instituto RPC, 2010.
184 p.
ISBN: 978-85-64009-00-4
CDD 370.7
Sumário
Leitura e Cidadania 06
Um país que não lê 08
Introdução 10
Capítulo 1 - Alfabetização e Letramento 12
Formação do leitor aprendiz 14
Boneco do Conhecimento 24
Capítulo 2 - Apropriação da Leitura Crítica 32
A crítica dos sentidos 34
Ponte entre a escola e o mundo 48
Capítulo 3 - Práticas de Leitura no Ensino Fundamental 56
Por que e para que ensinar a leitura? 58
Atualidade no currículo 68
Capítulo 4 - Literatura Infantil e Contação de Histórias na Escola 76
Leitura literária na escola 78
Quando o faz de conta inspira o mundo real 88
Capítulo 5 - Leitura Significativa e Contextualizada 96
Produtores de significado 98
Adolescentes Editores de Jornal 110
Capítulo 6 - Práticas de Leitura na Comunicação e na Educação 118
Novas referências para o saber 120
Por um mundo menos desigual 130
Capítulo 7 - Leituras, Literaturas e Escola 138
Ler é atribuir sentidos 140
Cada aula, uma novidade 152
Capítulo 8 - Ciberleitura 160
Ciberleitura no contexto educacional 162
Ligados nesta arte 176
Leitura e Cidadania
6
Afirmações que não são nossas, e sim dos professores que vêm de-
senvolvendo o Ler e Pensar ao longo dos anos. De acordo com seus
relatos, o uso do jornal no ambiente escolar tem sido determinan-
te para a formação de alunos leitores habituais, bem informados e
críticos. Crianças e jovens que, com toda a certeza, estão e estarão
prontos para conduzir seu destino e o futuro das suas comunidades
e até da Nação.
7
Um país que não lê
8
resse” enquanto outros 42% admitem “ter dificuldade” de ler. Ou seja,
somos uma Nação de não leitores.
Mariano Lemanski
Presidente do IRPC
9
Introdução
10
As oito abordagens são complementares e ao mesmo tempo inde-
pendentes. Revelam possibilidades que podem ser adotadas de forma
integrada ou isolada por professores de todos os níveis, sempre com
resultados eficientes e eficazes.
Por tudo isso, acreditamos que esta publicação seja inspiradora, e con-
vidamos você a copiar, sem medo de plágio, cada ideia criativa aqui
registrada.
Boa leitura!
11
Capítulo 1
Alfabetização e
Letramento
O capítulo inicial deste livro é tido por muitos professores como um
desafio sem igual: o incentivo à leitura durante o período de alfabeti-
zação. Quem encara o desafio de teorizar sobre o assunto é a professo-
ra Angela Mari Gusso, doutora em Estudos Linguísticos, ex-professora
da Rede Municipal de Ensino de Curitiba e docente em cursos de gra-
duação e pós-graduação. Pesquisadora de Aquisição da Escrita, Angela
Gusso tem diversas publicações sobre o tema em anais de eventos do
ramo da Linguística e em periódicos da área de ensino.
13
Formação do leitor
aprendiz
Angela Mari Gusso
15
ensino sistematizado nos bancos escolares e se prolonga vida afora.
Levando-se em conta que a constituição de leitores é um proces-
so cujo início acontece antes do ensino formal da língua escrita, a
criança que vive situações sociais nas quais a prática de leitura se
faz presente está então, por meio dessa experiência, desenvolvendo
o aprendizado das competências necessárias para a prática leitora.
Dados empíricos revelam que no mundo contemporâneo a leitura é
uma aprendizagem social, antes de ser escolar, pois seu valor social
de comunicação é apreendido no convívio com os materiais escritos
circulantes na vida cotidiana das famílias. Rótulos, etiquetas, letrei-
ros de lojas, catálogos, Bíblia, receita médica ou culinária, livros, re-
vistas, jornais são alguns exemplos de materiais comumente encon-
trados em nossa sociedade e que propiciam a inserção dos sujeitos
no mundo da escrita.
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sistematizado, com base em um planejamento que contemple princí-
pios linguísticos, psicológicos e pedagógicos, sob pena de não lograr
o êxito almejado. O grande desafio da educação linguística (área de
conhecimento que engloba oralidade, leitura e escrita) é permitir a
desmistificação do letramento. O mundo letrado deve ser algo real
para que a criança possa ir, gradativamente, ampliando sua condição
de acesso e usufruto dos bens culturais atrelados à escrita.
Para tanto, não basta que as pessoas, sejam crianças ou adultos, te-
nham acesso à tecnologia da escrita, isso é, à apropriação do conjunto
de técnicas dessa modalidade linguística: conhecer o alfabeto e de-
senvolver habilidades para codificar fonemas em grafemas, decodifi-
car grafemas em fonemas, bem como manipular os materiais usados
(lápis, caderno, borracha, livros didáticos, computador). Apesar de esse
domínio ser requisito indispensável, ele não é suficiente, uma vez que
permite ao sujeito tornar-se alfabetizado, mas não lhe confere a con-
dição de quem sabe ler e escrever e pratica de modo competente a
leitura e escrita na vida cidadã.
Uma vez que as demandas dos indivíduos e dos grupos sociais dos
quais eles fazem parte são variadas e que as condições históricas e de
estágio de desenvolvimento dos grupos também são diferenciadas, há
de se falar em letramentos, no plural, pois as formas de leitura, escrita
e uso da linguagem em geral são heterogêneas, variam no tempo e no
espaço. Quando se fala em letramentos, portanto, leva-se em conta a
linguagem verbal em sua totalidade – ouvir, falar, ler e escrever –, e
as demais linguagens. Além disso, diz respeito, ainda, ao domínio dos
mais diversos instrumentos tecnológicos, ou seja, estende o uso do
lápis e papel, em decorrência do surgimento e ampliação das tecno-
logias digitais que exerceram impacto sobre as condições de produzir
e circular textos na sociedade, bem como no modo de ler os novos
gêneros textuais delas decorrentes.
19
Como as formas e os recursos de escrita vêm se modificando e deter-
minando inusitadas condições ao ato de ler e escrever, as pesquisas re-
lativas a essa área também têm se multiplicado. A produção científica
sobre os temas da alfabetização, letramento e ensino de língua ma-
terna tem trazido, nas últimas três décadas, um conjunto de saberes
solidamente estabelecido a respeito da natureza, função e usos tanto
da linguagem oral, como da escrita. Esses conhecimentos teóricos per-
mitem ao professor criar estratégias de ação mais adequadas, mais
produtivas para alavancar a competência socioverbal dos alunos, em
todos os níveis de escolaridade.
21
Na exploração desses materiais, paralelamente, o professor promove-
rá atividades para a criança ir se apropriando do sistema convencio-
nal de escrita e desenvolvendo habilidades de uso desse sistema em
atividades de leitura e escrita, nas práticas sociais. O trabalho com o
sistema de escrita carece de abordagem sistemática, explícita e direta,
pois é um conhecimento que, para ser construído pelo aprendiz de
escrita, depende da mediação do professor. Sem essa condição, o per-
curso será muito mais lento e difícil, o que para alguns alunos torna-
se desanimador a ponto de julgarem-se incapazes de se apropriarem
desse bem cultural.
23
Boneco do
Conhecimento
Professora: Elenice da Cruz Gonçalves
Instituição: Escola Rural Municipal
Santa Bárbara de Cima
Cidade: Palmeira
“Bem aventurado é aquele que transfere o que sabe
e aprende o que ensina”.
Cora Coralina
“Usei o Boneco para fazer uma analogia entre o crescimento das plan-
tas e o do conhecimento das pessoas”. Disse aos alunos que, assim
como as plantas precisam de água para brotar e crescer, o conheci-
mento precisa da leitura e da informação para se desenvolver. “Cada
leitura que fazemos é como se estivéssemos regando o nosso conheci-
mento. Ele vai crescendo, fazendo com que fiquemos diferentes, mais
espertos, mais informados e mais bonitos”, assegura Elenice.
25
Mesmo que o aspecto lúdico do Boneco seja o que mais chama a aten-
ção dos alunos, Elenice considera a leitura diária do jornal como de
extrema importância para o processo de aprendizagem. “Apesar de eles
serem tão jovens, o contato com os mais variados tipos de texto está
despertando a curiosidade. Além disso, ao aprender a ler e a escrever
com o jornal, a criança também começa a entender qual a função social
da escrita e o quanto ela é importante para a sua vida em sociedade”.
A prática
27
Leitores mirins
29
Exemplo prático
31
Capítulo 2
Apropriação da
Leitura Crítica
Lidar com o leitor, organismo vivo em constante mutação, e ao mesmo
tempo orientá-lo de modo a garantir a apropriação do conhecimento
é uma tarefa das mais complexas. Aprender a ler criticamente exige,
no mínimo, informações comparativas, fontes históricas, referências e
análise de cenário.
33
A crítica dos sentidos
José Carlos Fernandes
Rubem, claro, mandou pelos ares todo seu arsenal teórico sobre o
desejo e o prazer – duas categorias filosóficas marginais e obviamen-
te assustadoras. Rejeitou, qual um membro da Resistência Francesa
35
tico, criou-se o teorema imperfeito de que quem lê sabe das coisas.
Apesar da preguiça que nos provoca a imagem do “sábio amargo e
ressentido”, a associação entre leitura e conhecimento não deixa de
ter um fundo de verdade. O risco reside, contudo, em equiparar a
leitura aos efeitos de um alvejante ou às utilidades de uma tábua de
passar roupa, como já se disse. Mas de resto, as tentativas – seja as
de Rubem Alves, seja a de todos nós – parecem em vão para derrubar
esse sofisma.
Com base nesse raciocínio torto, ler tem de servir para alguma coisa,
o que exclui da conversa umas tantas obras da literatura universal,
cujo maior mérito é justamente não servir para nada, e ainda um
rodo de compêndios de filosofia, igualmente inúteis, assim como a
cultura oral, já que lhe sobra emoção, senso comum e lhe falta fina-
lidade prática. Pode-se viver muito bem e alcançar o progresso das
nações sem que seja preciso decifrar a obra de Espinoza, passar pelos
labirintos de Nietzsche ou enfrentar as contradições de Montaigne.
Passa-se muito bem sem ouvir contos de assombração ou sem culti-
var memórias familiares.
Mas McLuhan parecia sentir muito prazer no que dizia, o que o re-
duziu a poeira. Sua defesa apaixonada de pouco adiantou: a tele-
visão, veículo que admirava, não escapou da fúria dos críticos, que
Tenho cá para mim que essa suposta ligação umbilical entre leitura
e serventia foi propagada tantas e repetidas vezes que se converteu
em uma verdade incontestável, cuspida da boca para fora, principal-
mente na falta de algo mais interessante a dizer. Parodiando Alves,
eu lembraria aqui que em nome das verdades muitas fogueiras fo-
ram acesas. O discurso papagaiado pelo professor da filha de Alves
é o caso. Funciona muito mais como estratégia de poder e de intimi-
dação do que de educação, ainda que ele acredite, sem dúvida, estar
usando as próprias entranhas para defender o conhecimento, com o
qual tem obrigações juramentadas.
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lido. Um livro sem conteúdo equivale à sedução de alguém não
confiável. É lixo. “Perigo, perigo...”, como diria o prudente B-9, o
robô da infância.
O que se quer dizer com isso é que, por uma espécie de conspiração
do destino, a exclusão literária está implícita na ideia de “leitura crí-
tica”. O que não se presta deve ser evitado. Trata-se de uma expres-
são carregada de preconceito, contaminada pela censura e tomada
de uma chatice sem igual, para a qual gente como Alves reserva o
bocejo eterno. Se não houver precauções sobre esse autoritatismo, o
leitor crítico há de se tornar aquele que filtra sua biblioteca com a
fúria de um inquisidor. Há de banir qualquer obra que não contribua
para melhorar de forma instantânea, por isso pobre, a relação entre
ele – o sujeito – e o objeto – o mundo.
Dito isso, volta-se ao começo. Zero a zero. Nem Rubem nem o pro-
fessor de sua filha vencem nesse ringue. Deve-se buscar outra chave
para abrir esta porta. E ela existe – é cultural. Em vez de tentar piso-
tear as evidentes virtudes críticas da leitura, instaurando a ditadura
do prazer, deve-se considerar que desde as décadas de 50 e 60, com
a alvorada da filosofia de Barthes e com os estudos de estética da
recepção – nascida na Universidade de Constança, na Alemanha – os
esforços da literatura se voltaram para o leitor. Mudou tudo. Este é
o ponto de onde se deve partir. Desconsiderar o leitor é retrocesso, é
sonegação de massa crítica. Sem dizer que o leitor funciona como o
fiel da balança. Tendo ele como medida de todas as coisas se resolve
o impasse entre a turma do prazer e a criticidade.
Chega a ser irônico: foi apenas no pós-Guerra que aqueles que garan-
tem a existência do texto, os leitores, foram, digamos, descobertos.
Os escritos de Hans Robert Jauss, Wolfgang Iser e, na mesma esteira,
Umberto Eco, sobre o assunto, inspiraram legiões de estudiosos. Em
sua obviedade aparente, soaram como algo realmente novo. O leitor
carrega um museu imaginário – para cunhar aqui a expressão de An-
dré Malraux – e esse museu é acionado a cada página. Cada leitura é
única e irrepetível. Lê-se com as entranhas da experiência e do saber
acumulado. Lê-se fazendo sinapses. É único. Prazeroso. Lê-se para
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preencher os espaços vazios – expressão algo poética para as gran-
des dúvidas que nos acompanham. Era disso que o pai Alves queria
falar com o professor crítico, sem sucesso.
Eis a questão. A escola, pelo que tudo indica, tem dificuldade de en-
tender o abalo dos sentidos – entre outras premissas da experiência
estética contemporânea – como uma forma de criticidade. Ao bater
na tecla da leitura crítica, subentende-se que, para chegar a esse es-
tágio, o aluno leitor deve seguir etapas, digerir autores, acompanhar
escolas, responder provas. Ou seja, tem de matar o prazer da leitura
para conquistar o conhecimento.
No que tange à leitura sem prazer estético, contudo, diria que atende
pelo nome de “leitura espartana”. De penitência. De necropsia. E o
pior – de maniqueísmo. É como se, historicamente, nos fosse impos-
to um falso problema: o de que há duas leituras, incompatíveis entre
si, e que apenas uma delas merecesse a confiança. É preciso se deter
um pouco sobre essa afirmação.
41
autoritarismo uma deficiência pessoal como leitores. Cabe um pa-
rêntese – a incompreensão dos meandros da experiência estética que
ronda a escola não é de todo culpa dela. Como desenvolve o teórico
britânico Terry Eagleton no livro A ideologia da estética (Ed. Zahar,
1993), a arte pela arte, a arte sem conexão política e ética – consa-
grando a criação como desbunde – se apartou dos grandes debates,
o que inclui o escolar.
Não causa espanto que a escola a tenha recebido com quatro pedras
na mão. Basta acompanhar, ainda hoje, os livros de História ou os
currículos de Artes para ver até onde conseguem chegar: depois de
passar pela “Monalisa”, de Da Vinci, as cartilhas passeiam por Picas-
so e Dalí, dificilmente avançando mais do que isso. No campo da
literatura não é diferente. Em 2009, acompanhou-se toda a polêmica
dos livros proibidos em muitas escolas, reacendendo a discussão so-
bre até onde vai a capacidade das instituições de ensino de dar conta
da literatura contemporânea, uma literatura que, via de regra, tenta
dar conta do leitor múltiplo e não com o leitor do século XIX, cuja
existência a escola insiste em sustentar.
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Muitas instituições, por exemplo, criaram salas com almofadas, de
uso livre e esparramado. Outras tantas criaram a hora da leitura e,
para felicidade geral, muitas entenderam que só haveria melhora
nos índices de leitura se colaboradores das escolas e professores
também fossem vistos com o livro nas mãos.
Aprendeu-se muito nesses anos, embora ainda seja cedo para dizer
que tenha morrido, em alguma reunião de conselho de classe, aque-
la velha opinião de que ler é se instrumentalizar para entender a
realidade, reduzindo, em muito o campo da leitura. A escola ainda
tem medo do discurso do desejo – o defendido por Alves diante do
professor autoritário – por relacioná-lo a uma prática destituída de
racionalidade e de mérito.
45
Um dos pecados mais graves, nesse caso, é o preconceito. Um e ou-
tro meio construíram o seu leitor ideal. Ele é comportado, aplicado,
severo – um homem de Esparta, como já se disse. Segue rotinas, mo-
delos e responde sempre que convocado. Já o leitor real precisa dar
respostas bem menos sacerdotais à vida. Necessita de serviços, de
interpretações, do riso largo. A percepção crítica do mundo passa por
todos esses sentidos. Não deve haver preconceito.
LAJOLO, Marisa. Literatura: leitores & leitura. São Paulo: Ed. Moder-
na, 2001.
PIGLIA, Ricardo. O último leitor. Trad. Heloisa Jahn. São Paulo: Com-
panhia das Letras, 2006.
47
Ponte entre a
escola e o mundo
Professora: Janisse Cordova
Dornelas da Costa
Instituição: Escola Municipal
Germano Paciornick
Cidade: Curitiba
“Ser professor é semear em terreno sempre fértil
e se encantar com a colheita”.
Gabriel Chalita
“A escola não pode mais fechar os olhos para questões sociais que
fazem parte da vida dos alunos e sim trabalhá-las de forma coerente,
respeitosa e comprometida. E as mídias ajudam muito neste proces-
so porque funcionam como pontes que abrem a sala de aula para o
mundo. Educar com o jornal possibilita uma melhor compreensão da
49
realidade, ao mesmo tempo que também desenvolve as potencialida-
des do aluno”, salienta Janisse.
A prática
51
Xô monotonia
Desde o dia em que levou o jornal para a sala de aula pela primeira
vez, Janisse garante que suas aulas passaram a ser muito mais criati-
vas e divertidas. “Nunca mais dei aquelas aulas monótonas nas quais
só eu falava e 35 alunos ficavam estáticos, só ouvindo. Não gosto
nem de lembrar quando tinha aula dessa maneira, e não desejo isso
para meus alunos. Quem é professor sabe, é só lançar algo diferente
que o entusiasmo toma conta da sala”.
53
Abordagem lúdica
Aulas divertidas e criativas com o jornal permitem aos alunos desenvolverem as suas
potencialidades.
55
Capítulo 3
Práticas de Leitura no
Ensino Fundamental
À medida que o processo de alfabetização avança, aproximar o es-
tudante dos livros e despertar seu interesse pela leitura podem fazer
toda a diferença sobre seu futuro.
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Por que e para que
ensinar a leitura?
Ana Gabriela Simões Borges e
Andressa Grilo Assagra
Quando começar a ler? O que ler? Como ler? Por que e para que ensinar
a leitura? Por que a leitura é uma das últimas opções de lazer para as
crianças? O que fazer para formar leitores? Por que as pessoas leem
cada vez menos?
Essas são apenas algumas das dúvidas que passam pela cabeça das
pessoas preocupadas com a educação. Afinal, todos sabem que uma
educação de qualidade depende da leitura e que ela é a base para o
aprendizado das crianças e jovens em nosso País.
Não é por acaso que a leitura é um dos temas mais debatidos no meio
educacional. Além de ser um dos alvos das avaliações nacionais, é um
dos principais pontos de partida para a inserção do aluno na vida es-
colar, principalmente nas séries iniciais do Ensino Fundamental, pois é
na escola que o aluno aprende a ler para aprender todo o resto.
Sabe-se que estimular a leitura não é uma tarefa tão simples e que
também não compete unicamente à escola. Entretanto, em um país
como o Brasil, onde muitas crianças ainda têm dificuldade de acesso
a livros, jornais, revistas e outros materiais de leitura, a escola acaba
sendo um dos únicos espaços em que esse acesso pode ser facilitado.
Recentemente acompanhamos pelos noticiários as comemorações
dos avanços nas avaliações nacionais pelos quatro cantos do País. Que
ótimo que melhoramos, mas, ainda assim, insistimos em perguntar:
será que temos mesmo tanto a comemorar?
É preciso deixar claro que, quando nos referimos à leitura, nos refe-
rimos ao seu sentido mais amplo. Entendemos a leitura como uma
prática social necessária, uma atividade rica, transformadora, praze-
rosa, interativa; que constrói sentidos, que estabelece uma relação di-
nâmica e que dialoga com o leitor e o texto; e que é capaz de divertir,
entreter, ensinar, informar e, até, de fazer o leitor viajar.
59
a leitura, seja como hábito, seja como gosto, precisa fazer parte do
cotidiano dos nossos alunos.
Esse exemplo nos mostra que ler se aprende lendo, assim como escrever
se aprende escrevendo. É preciso que se ensine a ler oferecendo práticas
de leitura que privilegiem a reflexão e que façam os alunos irem além
da simples decodificação das palavras. A Lei 9.394/96, de Diretrizes e
Bases da Educação, afirma que o objetivo do Ensino Fudamental é a for-
mação básica do cidadão e tal objetivo será alcançado mediante o “de-
senvolvimento da capacidade de aprender, tendo como meios básicos o
pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo” (BRASIL, 1996, artigo
32). Com isso, podemos concluir que estimular a leitura não é apenas
apresentar aos alunos a sua técnica; e que para formar bons leitores, a
escola ainda tem um grande trabalho a ser cumprido.
Pode até parecer fácil, mas não é tanto assim, pois as atividades de
leitura na escola precisam ser muito bem planejadas. Não vale “contar
uma história” só porque choveu na hora do intervalo, ou levar um jor-
nal para a sala de aula para sair da rotina, sem ter qualquer objetivo
e planejamento. Essas atitudes podem ter um efeito catastrófico, e em
vez de arrebanhar leitores, pode distanciá-los ainda mais.
Ainda que o novo aluno exija um novo professor e uma nova maneira
de construir o conhecimento, é necessário um processo de transição,
no qual o professor é o condutor. Ao professor cabe o papel de re-
lacionar as categorias textuais para leitura com o desenvolvimento
intelectual dos estudantes, estabelecendo também uma relação com
o aprendizado cotidiano que os estudantes apresentam, vinculando
séries, currículos, desenvolvimento cognitivo e afetivo.
Mas, então, o que fazer para incentivar a leitura? Ideias e exemplos não
faltam e para conhecê-los basta fazer a leitura deste livro, consultar
as revistas educacionais mais lidas, os livros que tratem do tema ou,
ainda, olhar o que o colega da sala ao lado anda fazendo. O importan-
te é que cumpramos nosso papel de apresentar diversas possibilidades
de leitura: dos livros aos jornais, das rodas de leitura à contação de
histórias, do diálogo sobre obras literárias às comunidades de leitores,
das imagens aos poemas, dos gráficos à arte.
Existem várias opções, mas são a sua escolha e a forma como a levará
para a sala de aula que poderão ser transformadoras, ou diminuírem
ainda mais o interesse dos alunos pela leitura.
Por esse e outros motivos, a seleção das leituras é uma das partes mais
delicadas, pois é preciso conhecer bem a turma para definir os tipos
de leitura a serem apresentados, levando em conta o novo conceito
de aluno. Também não se pode ignorar o fato de os estudantes, hoje,
61
estarem inseridos em um ambiente imagético, com textos cada vez
mais curtos e com referências de leitura cada vez mais dispersas e
que isso deve ser mudado aos poucos. Assim, radicalizar e levar Dom
Casmurro para a sala de aula sem nenhum preparo pode não ser a
melhor estratégia.
Nós, leitores mais experientes, sabemos que só lemos o que é in- teres-
sante, importante ou necessário e sabemos que essa escolha pode variar
de acordo com os diferentes contextos e momentos de vida. Da mesma
forma devemos proceder com nossos alunos. Muitas vezes, a nossa aten-
ção centra-se apenas na seleção do texto e nos esquecemos do contexto
e do sujeito, ou seja, do momento de vida e do aluno que irá ler.
Concordamos com Silva (2002) quando ele diz que todos nós educa-
dores temos como objetivo formar alunos e leitores questionadores,
capazes de se situar no contexto social, compreendê-lo e transformá-
63
cilmente, segundo o autor, poderemos indicar boas leituras que não
tratem de assuntos como esses.
Analisando tudo o que foi dito por nós e pelos autores até agora, não
podemos deixar de falar de um suporte bastante rico de leitura: o jor-
nal. Foram inúmeros os motivos que nos fizeram escolher o jornal para
comentar um pouco mais: é atual, apresenta uma grande diversidade
de gêneros textuais, pode ser lido por pessoas de todas as idades; in-
forma, coloca o aluno em contato com a realidade e com o mundo;
entre tantos outros motivos que, se fossem citados aqui, poderiam se
estender até o final deste livro.
Essa prática, sem dúvidas, será mais rica do que o simples responder
de um questionário ou um fichamento, que priorizam a reprodução de
ideias. O aluno precisa ser ativo diante do texto, compreender e refletir
sobre o que quis dizer e, a partir disso, chegar às suas próprias conclu-
sões, ou seja, dar um novo significado ao texto a partir de seu referen-
cial e histórico de vida.
65
leia para eles. Mantê-los em contato com esses suportes de leitura que
circulam na sociedade pode trazer ganhos surpreendentes.
Muitos foram os autores que inspiraram este ensaio e que deram suas
contribuições para a educação e especialmente para a leitura, mas a
maior inspiração veio mesmo da vontade de dar a nossa parcela de
contribuição para os professores, escolas, Secretarias de Educação e
parceiros, que ao longo de 11 anos vêm nos acompanhando nessa ca-
minhada em prol da leitura, por meio do projeto Ler e Pensar. Com a
certeza de que juntos já fizemos muito pela leitura, encerramos nossa
conversa, esperando que, também juntos, façamos ainda mais.
67
Atualidade no
currículo
Professora: Márcia Kaminski Bíscaro
Instituição: Escola Municipal
José Eurípedes Gonçalves
Cidade: Campina Grande do Sul
“A educação sozinha não transforma a sociedade,
sem ela tampouco a sociedade muda”.
Paulo Freire
“Meus primeiros trabalhos com o jornal foram feitos para ‘não desa-
pontar a supervisora’, já que ela defendia a proposta e estimulava os
professores da escola a adotá-la. Mas como não era uma iniciativa na
qual eu efetivamente acreditava, acabava nem sabendo o quê e como
trabalhar”.
Márcia revela também que antes de o jornal entrar nas suas práticas
era uma professora fechada, não tinha muitas ideias e de certo modo
era limitada. “Com o jornal amadureci bastante, ampliei minha visão
do processo educativo e passei a buscar constante aprimoramento.
Não tenho mais vergonha de falar ‘não sei’ porque agora o fato de
não saber sobre alguma coisa me desafia a pesquisar sobre o assunto.
Depois que ganhei o prêmio do Ler e Pensar, minha autoestima au-
mentou, passei a perceber o valor do meu trabalho e, principalmente,
sinto que ele pode ser constantemente melhorado.”
69
de aprendizado e interesse dos alunos pela leitura. “As crianças ado-
ram ler o jornal, e também passaram a pedir mais livros na escola e
hoje eles querem ler nos horários de folga e ainda pedem para levar
para casa. Dá gosto de vê-los devolvendo os livros e comentando sobre
tudo o que leram”.
A prática
O processo tem sido tão bem absorvido pelos alunos que é bastante
comum ouvir perguntas como “Profe: será que isso não tem no jornal?”
em toda a vez que Márcia começa desenvolver um conteúdo novo.
71
Olhar comparativo
Nesses dias, reclamações como “jornal suja a mão” uma ferramenta valio-
sora e são rebatidas na hora. “Suja a mão sim, mas dias em nossas mãos
olha o que você pode ver aqui dentro de interessante, e que se soubermos
veja como é valioso e quantas notícias atuais ele nos aproveitar o jornal va-
traz todos os dias”. A insistência transformou a tur- mos nos tornar verda-
jornal eles ficaram mais soltos. Perderam a timidez”. mais gosto do jornal
são as Cruzadinhas
tanto esforço.
73
Jornal do Estudante
“Ao realizar essa atividade, percebo que consigo ampliar o meu pa-
pel como docente. Além de transmitir informações, cumpro a tare-
fa fundamental de promover a conscientização para o exercício da
cidadania, abro caminhos para os educandos pensarem sozinhos e
os impulsiono ao desejo de reconstruir seus próprios conceitos, fa-
zendo da escola um lugar de entendimento, análise e produção de
informação.”
Alunos mostram publicação produzida com assuntos da atualidade escolhidos por eles e
distribuída em toda a escola.
75
Capítulo 4
Literatura Infantil e
Contação de Histórias na Escola
Tendo objetivos diferentes, a leitura deve ser trabalhada de acordo
com o gênero textual, e são diversas as maneiras de ler, assim como
diversos são os textos e os objetivos de leitura. No que diz respeito
ao gênero literário, a escola assume o importante papel não só de
apresentar aos alunos um mundo lúdico, prazeroso, divertido e emo-
cionante, como principalmente o de promover ações pedagógicas
estruturadas e planejadas, que os levem a compreender e apreciar o
universo da leitura e da literatura.
77
Leitura literária
na escola
Elisa Maria Dalla-Bona
79
res que a configuram;
• de desenvolver a capacidade interpretativa;
• de desfrutar da experiência estética e singular da linguagem literária;
• enfim, de tornar o mundo mais compreensível, sensível e humanizado.
Tanto o texto quanto o leitor são ativos (ISER, 1996). O texto literário
se apresenta de forma inacabada e descontínua ao leitor, que por sua
vez, com o uso de sua imaginação e experiências, completa as lacunas
do texto. Assim, as atividades de interpretação de texto devem ser as
de construção de sentido, que por sua vez é um efeito experimentado
pelo leitor e não preexistente à leitura.
81
O método recepcional, ao colocar o leitor em contato com obras lite-
rárias desafiadoras, provoca um esforço salutar para responder aos
desafios ante o novo, de adotar uma postura de disponibilidade. As
ações pedagógicas propostas têm características provocativas, pro-
blematizadoras e reflexivas, gerando impactos no leitor (aluno) e em
seu meio social (escolar e familiar), na medida em que, por meio da
leitura literária, provoca a revisão de suas crenças, atitudes e valores.
É bom lembrar que o prazer de ouvir uma história bem contada não
se esgota na infância. Tomo como referência a minha própria experi-
ência recente, provocada pelo encantamento de ouvir histórias nar-
radas por Celso Sisto. Ele é um contador de histórias que não utiliza
de outros recursos senão a expressão corporal e a entonação de voz.
Ele consegue tocar profundamente seus espectadores sem utilizar
de materiais de apoio, o que faz com que a atenção se volte para
83
a narração, para o texto e não para os recursos que eventualmente
possam ser utilizados.
Celso Sisto nos dá pistas importantes sobre o tema, em seu livro Textos
e pretextos sobre a arte de contar histórias. Ele insiste na necessidade
de o professor se preparar para a contação, o que pressupõe diversas
leituras antecipadas da obra, até que se sinta tomado pelo desejo de
contá-la. Assim, as palavras vão brotando “dos lábios com veemência,
convicção, detalhe e emoção” (SISTO, 2005).
85
se sentem mais aptos para o desenho. O caderno é um excelente espa-
ço para a divulgação de obras do acervo da escola, para a divulgação
de novas aquisições, para a publicação das entrevistas que realizaram
com autores e ilustradores, para a divulgação de poemas criados pelos
alunos, ou selecionados por eles. Os quadrinhos também podem fazer
parte do caderno, tanto os criados pelos alunos quanto os compilados
por eles.
87
Quando o faz de conta
inspira o mundo real
Professora: Suely Goretty Rubbo Coelli
Instituição: Escola Municipal Frei
Tiago Luchese
Cidade: Bituruna
“A leitura do mundo precede a leitura da palavra”.
Paulo Freire
Então, nada mais natural para ela que se inspirar no mundo do “faz
de conta” para promover uma das atividades lúdicas mais envolventes
usando o jornal: a contação de histórias.
89
tam hipóteses, questionam, criticam. Muito diferente e mais fluido
que antes do projeto, quando tudo era muito difícil de acontecer”.
Suely afirma que até mesmo quando a discussão envolve temas po-
lêmicos, os alunos se posicionam criticamente, inclusive citando refe-
rências e as fontes que consultaram para fundamentar suas opiniões.
A prática
91
Heróis anônimos
Ela diz que a maior parte das crianças, ainda que esteja longe desses
modelos, se identifica e valoriza referenciais equivocados. Sonham
em ser a garota escultural da tevê, o jogador famoso de futebol que
ganha rios de dinheiro, a atriz famosa que vive um romance de conto
de fadas... Ou seja, suas referências são casos raros e modelos prati-
camente inacessíveis para as pessoas comuns.
Ouvir relatos de pessoas reais e que vivem num mundo muito pareci-
do com o dos alunos pode mostrar a eles que devem viver e lutar pela
sua própria vida e não tentar viver a vida dos outros. “Espero que eles
compreendam que ter sucesso é vencer nossos próprios desafios, de-
senvolver nossos talentos e aproveitar as oportunidades que surgem
de forma honesta, fazendo o bem para si mesmo e para os outros”.
93
didáticas. Ficam enfurnados entre as quatro paredes da sala de aula e
levam os alunos a fazer o mesmo, quando até mesmo a pouca idade
os impede de aceitar esse modelo. “Por isso eles se rebelam, se re-
voltam, demonstram indisciplina. Lá fora, o mundo é mais atrativo,
dinâmico e interessante”.
Cidadania
95
Capítulo 5
Leitura Significativa
e Contextualizada
Ler não é somente identificar símbolos, juntar letrinhas, relacionar as
letras aos seus respectivos sons e repetir frases lidas em cartazes ou
anúncios.
97
Produtores de
significado
Benedito da Costa Neto
1
A obra de Manguel em que ele afirma isso e pesquisa outras formas de ler é Uma
história da leitura.
2
A obra em questão é A leitura.
3
Para Damásio, em O mistério da consciência, há diferença entre a noção de “eu” e
a noção do existir.
99
do meio acadêmico: ora temos um leitor que buscará o tema, o sen-
tido, o significado, o conteúdo, o dado que o antecede, sendo muitas
vezes um dado que ele não conhece e que, por não conhecê-lo, não
pode duvidar dele, ora teremos um leitor mais passivo, que passa os
olhos pelo jornal à procura de algo interessante, por lazer, passatem-
po ou por mera formalidade dos eventos diários. Se um jornal traz um
dado irregular (como dizer que Abu Dabi fica no Marrocos), o leitor
necessitaria ser aquele leitor não ideal imaginado por Umberto Eco
no século passado4, que buscaria cada dado para verificar se é ou
não verdadeiro. Mas não são todos os dados, por assim dizer, pois os
números e informações sobre uma investigação policial não podem
ser checados, o que nos faz imaginar que o leitor deve ter com o jor-
nal um pacto de aceitação do dado, ou um pacto que o faz aceitar
determinados dados, se pensarmos ainda no mesmo Eco que trata do
“pacto de leitura”.
4
Umberto Eco tratou disso em vários escritos, mas penso agora em Lector in fabula.
5
Quanto a esta nomenclatura, penso nos estudos de Nicolas Bourriaud e Anne Cauquelin.
6
Barthes ocupou-se disse grande parte de sua produção, mas penso em O prazer do texto.
7
Aqui há uma leitura bastante livre de O discurso – estrutura e acontecimento, de
Michel Pêcheux.
8
Em muitas redações de jornais escritos e falados, a máquina de escrever foi usada
até meados dos anos 1990, por uma questão de custos. Era realmente caro investir
em equipamentos eletrônicos para todas as equipes. Valeria lembrar, igualmente,
que o uso de computadores em larga escala, no meio empresarial, é fato relativa-
mente recente na História.
101
que a voz não é apenas gramatical ou espetacularmente estrutural,
com erros e acertos. A voz que fala num jornal é uma voz social, reple-
ta de intenções as mais diversas, de interesses, de interpretações do
mundo, de visões específicas. É lugar-comum dizer que o jornalismo
deve ser a voz da liberdade, mas tal liberdade pode não ter as asas
tão dilatadas como sonha a versão típica das edições, que cantam a
liberdade de expressão e o teor da verdade de cada matéria. E, nesse
momento, entra em questão o que há de mais complexo na leitura,
que é a questão do discurso.
9
Tal pensamento está em O que é o virtual?
103
nal se diferencia do outro e que em cada jornal há universos textuais
e discursivos diferentes. Ao pé da letra, cada jornal é um veículo de
informação, mas as informações podem ser sobre política, economia
e gastronomia — num jornal de grande circulação, privado – e podem
ser informações sobre aumento salarial, demissões, direitos do traba-
lhador – num jornal sindical. A questão do “texto em si” (tanto as aná-
lises gramaticais quanto textuais) pode ser um grande aliada em sala
de aula, mas desde que outras análises não fiquem de fora. Fariam
parte deste grupo algumas análises ditas estruturalistas, ao modo de
Propp, e ainda análises da Linguística textual ao modo difundido no
Brasil pela professor Ingedore Koch. Até mesmo algumas ferramentas
da Sociolinguística são usadas nesse tipo de análise. Quando não são
mera formalidade classificatória, podem ser úteis. Por exemplo, se di-
zemos que um texto foi escrito por homem ou mulher, se o texto foi
escrito por jovem ou idoso, se o texto foi escrito por pessoa de tal ou tal
formação, devemos ter em mente que por detrás dessas afirmações há
discursos muito poderosos, incluindo aí alguns preconceituosos.
Evidentemente, cada uma dessas análises não pode ser separada sim-
plesmente e isolada. Ao lermos um texto e ao avaliarmos um texto, na
verdade mesclamos vários tipos de análise. Desde que haja a pergunta
“quem o escreveu?”, estamos procurando um sujeito anterior à leitura,
que pode dizer muito a respeito do texto. Isso é mais simples do que
imaginamos. A leitura não deixa de lado seu autor, e inclusive utiliza-
mos adjetivos específicos para nos referirmos a um tipo ou a uma mo-
dalidade textual: borgiano, rosiano, foucaultiano. Do mesmo modo,
enxergamos no jornal uma modalidade, como já citado no começo
deste texto, e continuamos com a utilização de expressões adjetivas:
jornalístico, televisivo, de revista, da web, editorial (como adjetivo e
como substantivo), de lazer, econômico etc. No caso particular de um
jornal, valeria lembrar que talvez não conheçamos todos os jornalis-
105
tas, mas não é tão complexo observar que há articulistas, editorialis-
tas especiais, colunistas razoavelmente fixos, cujos textos ganham em
sentido quando colocados lado a lado, principalmente se conhecemos
o trabalho anterior de quem escreve. Do mesmo modo, se há a pergun-
ta “quando isso foi escrito?”, de algum modo estamos entre o primeiro
e o terceiro tipo de análise, tentando uma fixação não arbitrária para
o texto, de modo a tentar entender o que é/foi escrito numa determi-
nada época, sabendo de antemão que as épocas diferem entre si e que
algo dito numa época não poderia ser dito em outra, do mesmo modo
que, se algo é dito exatamente como o foi em outra época, o resultado
desse discurso é só aparentemente igual. Então, podemos dizer que a
interpretação de um texto tem, sim, a ver com quem o escreveu (seria
melhor sabermos quem o escreveu, mas a fonte em que está já aju-
da), da mesma forma que o lugar/tempo de onde o texto “fala” nos é
importante, desde que não fiquemos analisando a vida particular de
autores e jornalistas.
Penso que a leitura em sala de aula possa ser uma aventura acadêmi-
ca e uma aventura que leve os alunos a lugares não antes visitados,
mas desde que a leitura entre como processo que impeça a difusão do
preconceito, abra portas para novos mundos, exercite a capacidade de
entendimento das coisas do mundo, aumente a capacidade de inves-
tigação e faça crescer o interesse por leituras mais profundas e menos
comerciais e vazias.
107
Para saber mais
BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo: Martins Fontes,
2008.
109
Adolescentes Editores
de Jornal
Professora: Adriana Margarete
Rolim da Silva Gonçalves
Instituição: Unidade de Educação
Integral Abranches
Cidade: Curitiba
“O trabalho escolar é um equilíbrio entre o esforço
e o prazer, instrução e diversão, educação e vida”.
Paulo Almeida
111
A proposta exige uma maior aproximação com o grupo e, enquanto isso
ocorre, Adriana ouve relatos, dúvidas, críticas e o que os estudantes pen-
sam sobre cada assunto. “Isso me permite dialogar com o aluno, conhe-
cê-lo melhor. Aos poucos vou descobrindo que um adolescente, que se
sente incompreendido e à margem da sociedade, pode se tornar um su-
jeito que reconhece suas capacidades intelectuais, afetivas e cognitivas,
consciente de sua responsabilidade para consigo e com seus pares”.
Mas, segundo ela, para conseguir tais resultados o professor precisa es-
tar disposto a ser um aprendiz em tempo integral. “Não dá para repetir
velhas fórmulas. É preciso conhecer a linguagem e as expectativas dos
jovens para poder conquistá-los e deles conseguir o melhor”.
A receita tem dado certo. Orgulhosa, Adriana todos os anos vê seus alunos
sendo premiados em feiras de redação, concursos de frases e de poesias.
A prática
O fanzine “Quem Somos”, nome escolhido pelos alunos, mostra o
mundo da adolescência de forma divertida e em linguagem ade-
quada à percepção do grupo.
113
Quebra de paradigmas
115
Ética e cidadania
A discussão dos temas não está explícita no desenho nem faz parte
dos resultados tangíveis do projeto, mas vai aparecendo aos poucos,
ao longo do processo, porque os alunos passam a exigir mais de si
mesmos antes de emitir opiniões, debater e defender ideias sobre as-
suntos que pretendem publicar.
Produção dos fanzines melhorou a qualidade textual dos alunos e do diálogo em sala
de aula.
117
Capítulo 6
Práticas de Leitura na
Comunicação e na Educação
Não há como interpretar uma informação ignorando a forma como a
mesma é percebida pelo indivíduo receptor, suas referências e relações
sociais. Toda comunicação – especialmente aquela intermediada por
um veículo, seja jornal, rádio, televisão ou internet – pressupõe um
receptor capaz de desvendar mensagens, promover elaborações cultu-
rais e chegar à construção de relações entre a informação à que tem
acesso e o seu próprio universo social.
Produzir um jornal gigante foi uma das propostas de Mary para levar
os alunos do contraturno a analisarem e refletirem sobre as informa-
ções publicadas no jornal. Segundo a professora, ao deixar os alunos
livres para folhear, ler, manusear e discutir entre eles o que será pu-
blicado no Jornal Gigante, cria-se um espaço efetivo para trabalhar as
referências e relações sociais, individuais e coletivas, porque todos são
estimulados a expor o que entendem e o que esperam de cada um dos
assuntos em pauta.
119
Novas referências
para o saber
Marlei Gomes da Silva Malinoski
121
O caráter comunicativo da mensagem sugere, assim, um repensar so-
bre a leitura. Enfatizando um olhar sobre a cultura presente no ato de
ler, será que o dito fracasso escolar nas práticas de leitura e escrita não
estaria justamente nas formas de representação do sentido da leitura
dado pelas práticas educacionais e a didatização do lido?
Para Bourdieu, a leitura pode ser substituída por uma série de palavras
que designa uma espécie de consumo cultural ou pré-saberes. São es-
ses pré-saberes que auxiliam o processo de letramento do indivíduo.
123
Ou seja, quanto mais suas agências de letramento se entrecruzem em
um momento de significação e intervenção.
125
se distancia de práticas orais à medida que se estrutura como uma for-
ma simbólica e complexa. Adaptar textos é restringir a potencialidade
leitora do indivíduo.
127
Para saber mais
BAGNO, Marcos. Língua Materna: Letramento, variação e ensino/
Marcos Bagno, Gilles Gagné, Michael Stubbs. São Paulo: Parábola Edi-
torial, 2002.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. 2.ª ed. São Paulo: Mar-
tins Fontes, 2001.
129
Por um mundo
menos desigual
Professora: Mary Lucia Medeiros
Baldança
Instituição: Unidade de Educação
Integral Dr. Osvaldo Cruz
Cidade: Curitiba
“Num tempo em que a esperança parece cada
vez mais escassa, é fundamental reavivar nossa
confiança em dias melhores”.
Gabriel Chalita
Uma das iniciativas que mais deram resultado na classe foi a produ-
ção de um jornal gigante, que levou os alunos a apresentarem uma
grande evolução quanto ao apreço pela leitura, ampliação do vocabu-
lário, melhora na produção escrita, interpretação de textos e, é claro,
comportamento cidadão. “Eles aprendem a posicionar-se, exercitam
a reflexão, problematizam as questões da sociedade e demonstram
muito interesse em melhorar de vida. E sabem que para isso terão de
continuar estudando”, diz a orgulhosa professora.
131
com os professores o planejamento das aulas trabalhando com o jor-
nal. “As mídias podem e devem ser aproveitadas no processo educati-
vo, desde que na sua finalidade esteja o compromisso com a forma-
ção crítica do sujeito com um mundo menos desigual.Necessitamos
quebrar paradigmas e valores cristalizados que enrijecem a prática
educativa. É preciso abrir a sala de aula para o mundo, onde o alu-
no enriqueça sua experiência de vida, aprenda a ser responsável por
suas palavras, em relação a si e ao meio em que está circunscrito e ao
mundo”.
A prática
133
Abrir a sala para o mundo
135
Via de mão dupla
Por tudo isso, Mary Lucia não acreditar em fórmulas prontas. “Deve-
mos sempre diversificar, surpreender e arriscar. Nem sempre dá certo,
mas é somente com os erros e acertos que o professor vai aprimorando
e alimentando seu trabalho”.
137
Capítulo 7
Leituras, Literaturas e Escola
Este capítulo, que é dedicado à análise comparativa entre o texto ver-
bal e o texto literário, parte do pressuposto de que todo o texto é uma
ocorrência linguística, escrita ou falada, de qualquer extensão, dotada
de unidade sociocomunicativa, semântica e formal. Ou seja, há uma
unidade de linguagem em uso e essa unidade precisa ser compreendi-
da e trabalhada no ambiente escolar.
139
Ler é atribuir
sentidos
Catia Toledo Mendonça
Naquela época, a criança era vista como um ser sem autonomia algu-
ma, como uma página em branco, que deveria ser controlada e pre-
141
ele Dona Benta ou Tia Nastácia – os seus próprios saberes. Ou seja: a
criança não é mais um ser em branco, que a escola e a literatura, como
agentes ideológicos, devem preencher.
O professor das séries iniciais deveria ser capaz de ensinar aos alunos
os caminhos para preencher essas lacunas, ensinar a estabelecer as
relações necessárias para a compreensão da leitura que está fazendo.
Nesse sentido, Vera Aguiar e Glória Bordini, na obra A formação do
leitor: alternativas metodológicas, enfatizam a importância de, no En-
sino Fundamental, criar-se um repertório de textos literários para os
alunos, que lhes permita selecionar, “catar” o significado de um novo
texto que se constrói no diálogo com o outro.
143
Na perspectiva do letramento literário, o papel do professor é o de
mediador de leitura. Ele deverá ser aquele que tomará a mão do leitor
e o guiará pelos bosques da ficção, como o leitor-modelo preconizado
por Umberto Eco. É necessário que o professor letre seus alunos em
relação ao texto literário, que elabore um programa em que o processo
de formação do leitor seja a preocupação, e não apenas a leitura feita
no contexto geral do conteúdo da escola.
Além disso, se o letramento literário não garante que o leitor seja ca-
paz de ler qualquer outro tipo de texto, ele permite que o leitor desen-
volva a capacidade de estabelecer relações, de perceber o que está “por
baixo” da escrita. O texto literário permite que se estimule o leitor para
a percepção da metáfora do iceberg, ou seja, a maior parte do sentido
do texto está subentendido, não está na superfície e somente um leitor
que tenha aprendido a perceber esse fenômeno será capaz de preen-
cher as lacunas deixadas pelo autor, estabelecer relações e realizar o
texto em sua plenitude.
145
que sua leitura traz. Ao se ler um texto informativo, ou um paradi-
dático, as informações absorvidas serão consideradas no momento,
e não se transformarão, necessariamente, em conhecimento. Walter
Benjamim, em seu famoso texto, do início do século XX, O Narrador, já
apontava as diferenças entre conhecimento e informação, destacan-
do a permanência do primeiro em detrimento da transitoriedade do
segundo. A informação é importante no momento em que ela é no-
tícia, enquanto o conhecimento se perpetua, se agrega ao espírito do
indivíduo. A literatura oferece suportes e modelos para compreender e
representar a vida interior, os afetos, as ideias, os ideais, as projeções
fantásticas e também modelos para representarmos nosso passado, o
de nossa gente, o dos povos, da história, ou seja, a literatura favorece
o conhecimento.
Se bem que pese o fato de o texto apresentado aqui ser uma monta-
gem de trechos diversos do texto original, percebe-se claramente a co-
loquialidade excessiva utilizada pela autora. Certamente por desejar
atingir o leitor infantil e, entende-se, por pressupor que este não seria
capaz de entender uma linguagem mais elaborada, o que a coloca no
início da escada de nosso leitor, e somente aí. Assim mesmo, deve-se
considerar a natureza desse texto, visivelmente escrito para ajudar a
criança que está passando pela situação vivida pelo personagem do
conto. Ora, se esta leitura for sugerida como leitura literária, não só
ela estará ocupando um lugar que não lhe pertence, já que o texto está
bastante longe do conceito atual de literatura infantil, como também
estará fugindo de sua proposta inicial, que é ajudar as crianças a acei-
tarem o irmãozinho, uma vez que muitos alunos não estarão vivendo
tal situação. Então, esta seria uma leitura adequada para ser indica-
da pela orientadora educacional, por exemplo, para uma criança que
estivesse precisando de ajuda para lidar com a situação presente. A
indicação ou a leitura para a turma inteira revela-se, pois, inadequa-
da. Quero também chamar atenção para o trecho “minha mãe fica
me chateando”. Além da coloquialidade já citada, fica clara a visão da
mãe como alguém chato, e isso porque está ensinado à criança a se
comportar, ou seja, reforça-se o enfraquecimento da mãe como figura
positiva de formação do indivíduo e se fortalece o enfrentamento da
criança com os pais, tendência comum na década de setenta, quando
a mesma autora escreveu Marcelo, marmelo, martelo, em que a falta
de diálogo entre pais e filhos quase ocasiona um desastre em casa.
Note-se que não se pretende aqui atacar a obra de Ruth Rocha, que
tem textos de boa qualidade, mas apenas destacar o fato de que ter
1
ROCHA, Ruth. Disponível em http://www2.uol.com.br/ruthrocha/historias_02.htm.
Acesso em 25/06/20210.
147
um livro assinado por um autor de literatura infantil não é garantia
da qualidade literária do texto, como se pode comprovar com o tre-
cho acima. É responsabilidade do professor escolher as obras que seus
alunos lerão, levando em consideração todos os itens já citados neste
ensaio, mas, principalmente, deverá analisar a qualidade da obra a
ser lida. Nós, que gostamos de ler, lamentamos a falta de tempo de
ler os livros que gostaríamos de ler; já que não se pode ler tudo, que
se selecione o lido pela qualidade, para que não se desperdice tempo e
esforço, lendo o que não vale a pena.
149
Neste ensaio, procurou-se não apresentar receitas, mas questionar
as práticas de leitura nas escolas brasileiras e apresentar alterna-
tivas, uma vez que a realidade atual não se mostra eficiente, como
atestam os resultados obtidos pelos alunos brasileiros em testes in-
ternacionais e como é facilmente comprovável, em visita a nossas
escolas. Nesse sentido, é que as sugestões apresentadas para a ênfa-
se na leitura literária se justificam, já que se vê tal prática como um
caminho possível para complementar o letramento de nossos alu-
nos, assim como uma forma de permitir que eles, enquanto leitores
literários, tenham contato com textos que lhes permitam escolher e
construir sua própria realidade, sem que esta seja imposta por textos
pedagógicos e utilitários.
151
Cada aula,
uma novidade
Professora: Expedita Estevão da Silva
Instituição: Escola Municipal
Augusto Staben
Cidade: Campina Grande do Sul
“Sempre faço o que não consigo fazer
para aprender o que não sei”.
Pablo Picasso
153
lo, também a emprestar mais livros da biblioteca, porque o gosto pela
leitura cresce exponencialmente.”
A prática
O tema bulliyng, tratado na reportagem que a Gazeta do Povo publi-
cou no dia 16 de junho de 2010, possibilitou que a professora Ex-
pedita discutisse o assunto, também presente na escola, com todos
os alunos. E o debate começou já com a análise do título “Bullying
atinge 35% dos alunos do DF”.
“Vocês sabem o que quer dizer bullying? Vocês acham que isso só
acontece no Distrito Federal? Vocês acham que na nossa escola
existe esse problema?” Com perguntas dessa natureza, Expedita
provocou a discussão do assunto, trazendo-o para a realidade da
comunidade. Na sequência, pediu para fazerem um resumo, seguin-
do as seis perguntas básicas usadas no jornalismo: O que? Quem?
Onde? Como? Quando? Por que? A atividade continuou como tarefa
de casa e os alunos aprofundaram o assunto fazendo pesquisas e
em conversa com os pais.
155
cer as dificuldades iniciais e abriu caminho para novas e gratificantes
experiências que passou a desenvolver com o jornal em sala de aula.
Flexibilidade e admiração
O projeto Gazetinha Augusto Staben (GAS), por exemplo, não fazia parte
das aulas planejadas por Expedita para 2010, mas acabou sendo de-
senvolvido e teve um dos melhores resultados já registrados. A ideia
nasceu em 2009, entre os alunos da turma de 3.ª série, que gostaram
tanto de produzir um jornal que pediram a sua continuidade quando
passaram para a série seguinte.
157
Hoje é comum encontrar a professora e os alunos com um jornal na
mão, desenvolvendo inúmeras atividades, sem medo de lidar com as-
suntos de qualquer natureza.
Consciência social
159
Capítulo 8
Ciberleitura
O que é ciberleitura? Como incentivar a leitura em ambientes virtuais?
Como contribuir para a formação de cidadãos críticos e participativos,
lançando mão dos recursos disponíveis no ciberespaço?
161
Ciberleitura no
contexto educacional
Márcia Silva Di Palma
163
ultrapassando limites de tempo e espaço e preservando a essência das
diferentes culturas.
Até a Idade Antiga, a leitura era realizada em voz alta, nos templos
e edifícios governamentais, pelos membros das elites e sacerdotes. A
temática girava em torno de conhecimentos “sagrados” que apenas
uma pequena parcela da sociedade tinha acesso. Essa prática objeti-
vava garantir que a mensagem fosse traduzida/verbalizada correta e
adequadamente sem que houvesse a interferência da interpretação do
leitor quanto ao que havia sido lido. A prática da leitura em voz alta
e o questionamento pontual sobre elementos concretamente identifi-
cáveis no texto, se mantive da Antiguidade até por volta do século V
depois de Cristo.
165
a interpretação de outros símbolos e linguagens. Assim, o conceito
de leitura, a partir da segunda metade do século passado, passou a
referir-se ao “processo de (de)codificação e interpretação de símbolos
gráficos, imagens, sons, situações isoladas ou combinadas, dando-
lhes um significado pessoal” (SANTOS, 2006).
167
Bem, além dos aspectos formais trazidos pela tecnologia, não pode-
mos deixar de considerar os efeitos que a utilização sistemática dos
recursos tecnológicos nas atividades cotidianas traz ao desenvolvi-
mento de aspectos biológicos, como percepção, sentidos, memória, ra-
ciocínio e imaginação; competências essas, que foram maturadas no
ser humano durante milênios como fator fundamental para garantir a
sobrevivência e/ou melhorar a qualidade de vida dos seres humanos.
Assim, é preciso ter claro, que o meio digital não apenas dá suporte
às questões do dia a dia, mas interfere, modifica e amplia numerosas
funções cognitivas humanas como os sentidos da visão, audição, tato.
Na área da saúde, por exemplo, a manipulação genética com o uso de
microscópios eletrônicos e instrumentos comandados por joysticks que
permite diagnosticar problemas genéticos em gametas antes mesmo
da fecundação; as nanocirurgias, que corrigem defeitos congênitos de
bebês ainda por nascer; a manipulação das células-tronco, que per-
mite a recuperação de órgãos e sistemas seriamente comprometidos
sem a necessidade de intervenções cirúrgicas de grande porte. Essas
competências sensório-motoras foram estimuladas exaustivamente
durante a infância e adolescência dos profissionais que as realizam
atualmente.
169
ção e construção de significados a partir do acesso de textos eletrôni-
cos/hipertextos que são divulgados na nuvem virtual – Internet.
O fato de o texto ser apresentado na tela não muda nada, pois ainda se
trata de leitura, muito embora seja preciso ter claro que com os hiper-
documentos e a interconexão geral as modalidades de leitura tendem
a transformar-se. Isso porque nos materiais impressos tradicionais a
sistemática que ainda predomina é a da leitura realizada, no caso dos
países ocidentais, de cima para baixo, da esquerda para a direita, pará-
grafo por parágrafo, linha a linha, da primeira à última página.
Essa reordenação na forma de ler traz à luz outro aspecto a ser des-
tacado e que diz respeito à quebra da condição passiva do leitor e o
transforma em coautor e interlocutor. Isso porque os hipertextos tra-
zem a possibilidade de discutir, contribuir e inclusive atualizar os con-
teúdos disponibilizados por outrem, e isso faz, com que a relação entre
leitura e escrita se torne mais integrada e ativa que nunca.
171
suas casas ou lan houses. Todavia, não se pode imaginar que o sim-
ples acesso ao sítio de interesse trará grandes impactos ao processo
de aprendizagem dos alunos, porque é importante que os professores
conheçam e estabeleçam uma estratégia para o uso pedagógico dos
recursos tecnológicos para que os mesmos não se esvaziem de seus
potenciais educativos.
173
Para saber mais
ALVES, Rubem. Entre a ciência e a sapiência. SP: Loyola, 1999.
_____. Cibercultura. 2.ª ed. São Paulo: Editora 34, 2000, 4.ª reimpres-
são, 2003.
175
Ligados nesta arte
Professora: Sonia Maria Alves
Domingues
Instituição: Escola Municipal
Paulo Freire
Cidade: Curitiba
“Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos
nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos
alguma coisa. Por isso aprendemos sempre”.
Paulo Freire
“Charge, cartum e tirinha: tô ligado nessa arte!” foi uma das ativida-
des desenvolvida pela professora para 2010. A escolha do trabalho
com esses gêneros textuais foi motivada pelo fato de a turma interes-
sar-se pela linguagem artística.
177
“Esses gêneros oferecem um conteúdo rico e crítico, que têm inúmeras
abordagens sobre a política nacional, estabelecendo relações de inter-
textualidade, exigindo conhecimentos específicos da linguagem e do
período histórico a ser analisado”, diz ela.
A prática
179
de leitor e pesquisador, o professor consegue incentivar os alunos às
mesmas práticas, levando-os a participar ativamente do processo de
aprendizagem”, afirma a professora Sonia.
Leitores preparados
“As atividades que realizo com o jornal, tenho absoluta certeza, tor-
nam meus alunos mais preparados para a leitura e a efetiva com-
preensão daquilo que leem. À medida que a pessoa lê e consegue
identificar as ideias principais do texto, passa a levar em conta os
fatores que influenciam a situação examinada, e isso dá sentido à
leitura. É um círculo virtuoso realimentado por novos textos e novas
descobertas”, diz Sonia.
181
Caminho sem volta
“O professor que não se atualizar terá cada vez mais alunos desmo-
tivados e com baixos rendimentos escolares. Essa nova maneira de
educar, usando as mídias, é desafiadora e muito diferente da manei-
ra tradicional com a qual eu e a maior parte dos professores fomos
qualificados durante o curso de Magistério, mas é um caminho sem
volta.”
Sala de informática é território comum nas aulas da professora Sonia, que por meio de
jornais eletrônicos estimula a leitura.
183