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O slogan foi repetido várias vezes por aliados em conversas com a piauí.
Saiu da cabeça do marqueteiro Renato Pereira, responsável pelas duas
campanhas vitoriosas de Paes, a partir de um plano elaborado pela
consultoria McKinsey. E foi exposto aos secretários junto com a ideia do
prefeito “sempre presente”, que virou o lema da administração. Mais
recentemente, com a aproximação dos jogos, uma nova divisa ancorou uma
campanha publicitária nacional na tevê aberta. “A Cidade Olímpica é a
Cidade Maravilhosa sendo maravilhosa para mais gente”, resumiu Pereira
no final de agosto, num café de Ipanema, na Zona Sul do Rio.
Ex-antropólogo, do tipo que se embrenhava na Amazônia com os índios,
Renato Pereira passou por uma produtora de cinema e publicidade antes de
migrar para as campanhas políticas e se consagrar no PMDB. Diz ter
tomado “muita porrada dos amigos” quando decidiu fazer a campanha de
Paes, “o candidato do sistema”. Hoje, o marqueteiro afirma estar
convencido de que o prefeito não é apenas um dos melhores do Brasil,
como um ótimo candidato à Presidência. “Quando se abrirem as cortinas,
vai ficar claro o que os Jogos Olímpicos significaram para o Rio. Do
Alasca à Patagônia, todo o mundo estará olhando para nós.” Segundo ele, o
maior beneficiário da atenção internacional dedicada à cidade será Eduardo
Paes. “Só vai ser preciso conectar os pontos. E isso a gente faz.”
Recursos para as sinapses nunca faltaram. Entre 2009 e 2015, Paes aplicou
480 milhões de reais em publicidade e propaganda – treze vezes o que
gastou o antecessor, Cesar Maia. Só em 2015, foram 133 milhões de reais,
mais do que São Paulo e provavelmente um recorde entre as grandes
capitais brasileiras. Desse montante, 18,6 milhões foram para a Prole, a
empresa de Pereira, que levou o contrato em uma licitação com outras duas
agências, a Propeg e a Binder.
Era sua primeira eleição, mas ele já estava na segunda legenda, o PFL,
egresso do PV. Dizia ser a favor da legalização do aborto, da união civil
dos homossexuais e da distribuição de seringas descartáveis aos
dependentes de drogas. E tinha grandes ambições: “Sonho ser secretário-
geral da ONU, isso depois de ser prefeito, governador e presidente da
República”, declarou em 1995 ao Jornal do Brasil, sem nenhuma ironia
aparente. Tinha, então, 26 anos.
Elegeu-se deputado federal em 1998, e três anos depois voltou ao Rio para
ser secretário municipal de Meio Ambiente de Cesar Maia, então reeleito.
As relações entre os dois começaram a degringolar em 2002, quando Paes
se desligou da prefeitura para ser candidato a deputado federal, e trocou o
PFL pelo PSDB. A razão do rompimento é até hoje tema de especulações
entre aliados e ex-aliados dos dois, com versões mais favoráveis a um ou a
outro, conforme o interlocutor. Existe, porém, um enredo comum: embora
Paes fosse o mais votado, havia no clã Maia – sobretudo por parte da
primeira-dama, Mariangeles – a vontade de viabilizar a carreira de
Rodrigo, filho do casal. Paes fazia sombra a essa ambição.
“Eu te garanto que enquanto eu estiver aqui não tem risco de o Rio quebrar.
Sabe por quê? No Natal e no Réveillon, enquanto todo mundo está
curtindo, eu estou trabalhando. No sábado e no domingo, quando o pessoal
está descansando, eu trabalho”, afirmou o prefeito enquanto bebia o
terceiro de cinco cafezinhos que ele consumiria em duas horas,
entremeados de cigarrilhas.
Durante aquela campanha, Paes foi aos poucos reduzindo seus ataques a
Cabral e voltando as baterias contra Frossard. No segundo turno, apoiou o
ex-rival. Terminada a eleição, a executiva local do PSDB se reuniu no
escritório político de Gouvêa Vieira. A correligionária o admoestou. “Você
não apoiou a Denise, dizendo que tinha que ganhar do Cabral, e no segundo
turno já estava com ele. Ele não era um quadrilheiro? O que você viu que te
fez mudar de ideia?”
Paes não nega o episódio, e baixa o tom de voz quando responde sobre o
assunto. “Ela é supercalma, né? Mais explosiva que ela é impossível. Não
me lembro de ter chamado de vagabunda. Mas tive uma discussão firme
com ela. Pedi desculpas, mas ela também pediu.” Gouvêa Vieira diz que
não se sentiu pessoalmente atingida. “Sei que não foi pessoal. Vagabundo é
uma palavra corriqueira no vocabulário dele. Faça uma busca no Google,
Eduardo Paes + prefeito + vagabundo. Vai ver que ele chama todo mundo
de vagabundo – empreiteiros, funcionários públicos, inimigos políticos.”
Com uma das mãos Paes segurava a bengala, com a outra puxou Tia Surica
e saiu manquitolando ao lado dela em direção ao próximo barracão a ser
visitado naquela última sexta-feira antes do Carnaval. Os dois se separaram
no barracão da Mocidade Independente de Padre Miguel. Ele entrou. “É
meu filho adotivo”, disse Surica, orgulhosa. “Para nós é uma satisfação ele
ser portelense. O Brizola era mangueirense, o prefeito é portelense”,
comentou, já contando que na semana seguinte faria a feijoada do almoço
de abertura do Carnaval no Palácio da Cidade. Quando o prefeito deixou o
barracão, perguntei se poderia acompanhá-lo na feijoada. “Nessa é que
você não vai, de jeito nenhum!” Breque no samba.
Ampliando uma prática inaugurada em 2006 por Cesar Maia, Paes também
liberou, ano após ano, verbas para a realização dos desfiles – a chamada
subvenção, combatida pelo Ministério Público do estado. “Consideramos
que a Liga Independente das Escolas de Samba tem dinheiro suficiente para
fazer o desfile, já que administra o Sambódromo durante o Carnaval. Mas
eles sempre dizem que a festa dá prejuízo”, diz a promotora Gláucia
Santana. Até 2015, a subvenção orbitava em torno de 1 milhão de reais.
Mas a crise acabou com os patrocínios, e os bicheiros há vários anos já não
têm a mesma potência financeira. Argumentando que a medida era
necessária para preservar o Carnaval, Paes dobrou o valor da subvenção em
2016: 2 milhões de reais por escola – ou 24 milhões de reais.
“Mantenha os amigos por perto, e os inimigos mais perto ainda”, diz uma
velha máxima da política. Assim que ganhou a eleição para a prefeitura,
Eduardo Paes saiu em busca dos inimigos. Primeiro, visitou o rival Jorge
Picciani, cacique do PMDB no estado, e lhe ofereceu espaço no governo.
Convidou alguns apoiadores de Gabeira para compor seu secretariado.
Entre eles Eduarda La Rocque, executiva do mercado financeiro, que fizera
a campanha de Gabeira e havia sido indicada por Joaquim Levy para o time
do prefeito. Outro egresso da candidatura verde foi o ex-presidente do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Sérgio Besserman
Vianna, que, além de comentarista e colunista de rádio e jornal, era
presidente do Instituto Pereira Passos, da prefeitura. Besserman recordou o
diálogo que teve com Paes: “Ele disse que queria que eu ficasse,
trabalhando com mudanças climáticas e sustentabilidade. Eu respondi:
olha, eu tenho uma outra vida, trabalho com opinião, falo no rádio etc. E
ele: ‘Zero restrição. Seja por motivos republicanos, seja porque a sua
opinião não vai mudar nunca o voto de ninguém. Mas o cara que é contra
mim e sabe que você tá comigo, mesmo me criticando no rádio, esse cara já
me respeita um pouco mais. E isso me ajuda bastante.’”
Numa conversa no Centro de Operações da Prefeitura, em fevereiro, Paes
disse que procurar os antigos aliados de Gabeira foi uma forma de
reunificar a cidade, após a conflagrada eleição de 2008. “O Rio estava
rachado e eu era odiado pelos setores médios. Não iria conseguir governar
se não chamasse esse pessoal para conversar”, afirmou, enquanto
reabastecia nossas xícaras com o café de uma garrafa térmica fornecida
pelo ajudante de ordens. Naquela manhã, em duas horas de conversa,
seriam incontáveis reposições, acompanhadas de quatro cigarrilhas.
A oposição acusa Paes de usar sua maioria acachapante para travar debates
importantes. “Não se aprova nem requerimento de informações na Câmara
se o Eduardo não quiser. Não houve nenhuma CPI em oito anos de
mandato”, diz a tucana Teresa Bergher. A única comissão aprovada,
durante as manifestações de junho de 2013, tinha como objetivo investigar
irregularidades nos contratos da prefeitura com as empresas de ônibus.
Mas, dominada por vereadores da base, a CPI não foi instalada e a oposição
se retirou em protesto. “Quem quer CPI é oposição. Eu como parlamentar
já fiz muita CPI. Mas você não pode querer que, como governante, eu
aceite CPI. Como governante, trabalho para que não tenha CPI. Tenho
controladoria, tenho tribunal de contas. Não vou aceitar CPI nunca”,
afirmou.
No início do ano, a polêmica em torno da relação das empresas de ônibus
com a prefeitura voltou à pauta. Paes concedeu aumento de 11,7% no preço
das passagens e liberou as empresas do compromisso, assumido em
contrato, de instalar ar-condicionado em 100% da frota até o final deste
ano. A nova meta passou a ser de 70%. A Justiça suspendeu o decreto no
final de fevereiro, mas a prefeitura vai recorrer para fazer valer sua posição.
“O óleo diesel aumentou, o preço dos ônibus aumentou, a economia está
pior e a capacidade do empresário de investir diminuiu. Atingir a meta
neste momento aumentaria a tarifa em 15 centavos. There’s no free lunch”,
explicou o prefeito.
A Vila Autódromo surgiu nos anos 60. Era então uma vila de pescadores
que se instalou à beira da Lagoa de Jacarepaguá, no local onde, anos mais
tarde, foi construído o Autódromo Internacional Nelson Piquet. Nos anos
90, quando subprefeito da Barra, Eduardo Paes tentou removê-la, sob o
argumento de que era área de proteção ambiental, mas a resistência foi tão
forte e os conflitos com os moradores, tão violentos que a prefeitura
desistiu. Desde que se decidiu construir o Parque Olímpico exatamente ali,
era óbvio que haveria novo confronto. Desta vez, a prefeitura venceu.
Essa polêmica, porém, não deve afetar o cotidiano da região. O que mais
preocupa os urbanistas é a ausência de habitações, que pode transformar a
área revitalizada em bairro fantasma à noite. Dos catorze edifícios já
aprovados, apenas seis começaram a sair do chão – e nenhum é residencial.
A prefeitura já ofereceu alguns incentivos para esse tipo de construção, por
enquanto em vão.