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uma perspectiva sociocêntrica no qual o grupo experiências dos outros podem levar os seus
se constitui como o lugar desafiador ideal para autores a questionarem-se a eles próprios e a
o desenvolvimento social, intelectual e moral sentirem a necessidade de serem mais explíci-
das crianças. A vida do grupo organiza-se tos. O importante papel da linguagem, no de-
numa experiência de democracia directa, não senvolvimento cognitivo foi sublinhado por
representativa, onde se privilegia a comunica- Vigotsky que considerava que o significado so-
ção, a negociação e a cooperação. De acordo cial dava sentido a esta prática (Niza, 1995 a).
com Niza, a cooperação é o estado mais avan-
çado de desenvolvimento moral. Os conteúdos curriculares
«Esta perspectiva de fazer do grupo-turma radicam na «vida»
em cooperação, o centro de toda a actividade
e de toda a dinâmica social, retira a este mo- O modelo do MEM propõe um currículo ba-
delo de trabalho o enfoque pedocêntrico em seado nos problemas e motivações da vida real
que as actividades e organização do trabalho e uma escola profundamente integrada na cul-
se centram na criança em abstracto.» tura da sociedade que serve. Uma escola ligada
A organização do trabalho partilhada com à vida e não um nicho cultural (António Sérgio).
as crianças permite que estas participem de- O papel da escola deverá ser o de propor-
mocraticamente e assim desenvolvam a coo- cionar uma aprendizagem que tenha um signi-
peração, através de uma organização coopera- ficado social, através de uma troca de conheci-
tiva do trabalho. mentos numa interacção constante com a
A aprendizagem é impulsionada mais pelo comunidade. As actividades do jardim de in-
grupo do que pelo professor ou por cada fância têm um significado funcional ao consti-
criança individualmente. Comunicação e tro- tuírem-se como algo que interessa e é útil para
cas entre o professor e as crianças e entre as o grupo no seu contexto sociocultural. Numa
crianças, são uma maneira de construir a forte ligação com a comunidade, as crianças
aprendizagem através de processos cooperati- multiplicam as suas fontes de informação, e
vos, «todos ensinam e todos aprendem» (Niza, têm oportunidades de nela intervir, na procura
1996). O conhecimento nas salas de aula do e resolução de problemas. Num centro Infantil
MEM não é visto como propriedade privada. dentro da cidade onde o parque das crianças
Em vez disso, a aprendizagem individual é sis- estava localizado num local público, um grupo
tematicamente estendida a todo o grupo onde de crianças esteve envolvido num projecto
as crianças são encorajadas a comunicar. cujo objectivo era melhorar esta área. Entre-
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Assim, a comunicação tem uma dupla fun- vistaram outras crianças, pais e habitantes lo-
ção. Primeiro, a comunicação pode ser vista cais sobre as condições do parque, escreveram
como activadora de uma função cognitiva que para instituições pedindo materiais e final-
ocorre quando se pede às crianças para fala- mente apresentaram toda a informação, ideias
rem sobre as suas acções ou experiências. e planos e conseguiram de facto persuadir as
Neste caso, tem início um processo metacog- autoridades cívicas locais e reabilitarem o par-
nitivo que lhes permite perceberem melhor o que de recreio em benefício das crianças assim
que têm a comunicar (Vigotsky, 1987). Em se- como dos habitantes.
gundo lugar, a comunicação também tem uma
função social quando a informação é parti- Analogia epistemológica entre ensino-
lhada e disseminada de modo a que possa ser -aprendizagem e desenvolvimento
utilizada pela «comunidade» e pelo escrutínio do conhecimento
público do conhecimento.
As perguntas que as crianças fazem sobre as No MEM, procura-se uma analogia episte-
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mento, a interrogação possa surgir. Assim as de algumas das aprendizagens feitas. A impor-
crianças serão capazes de activamente se en- tância da aprendizagem individual estende-se
volverem e tentarem compreender o mundo ao grupo quando é pedido às crianças que fa-
que as rodeia. lem dos processos vividos. Da intervenção in-
dividual ou em pequeno grupo para a comuni-
Os princípios na prática cação com o grupo alargado.
Da parte da tarde têm lugar actividades cul-
Centramo-nos agora na organização da sala turais. Crianças e educadores organizam dife-
de aula e na aérea da literacia, como exemplo rentes actividades como contar histórias, cozi-
do modo como as práticas do MEM reflectem nhar, conferências, e correspondência com
as bases filosóficas e teóricas do Modelo outras escolas, assim como a vinda de pais e
dando uma maior visibilidade à influência de outros convidados da comunidade.
Vigotsky. A reunião do conselho da tarde é uma revi-
são partilhada do dia onde as experiências são
A organização da sala de aula trazidas para o grupo e tem lugar a avalia-
ção/regulação. Normalmente, registam-se ideias
No modelo do MEM a organização da sala
de alargar o projecto e as crianças falam das
de aula é vista como a estrutura básica que
suas próprias acções. O conselho de sexta-
fornece as oportunidades para os alunos
-feira à tarde é o grande momento de regula-
aprenderem. Tradicionalmente, o professor é
ção da semana a partir da leitura dos instru-
o responsável por esta organização o que in-
mentos (tabelas, o diário), e onde têm lugar os
clui planear o ambiente e as actividades, mo-
primeiros planos para a semana seguinte. O
nitorizar o trabalho das crianças e avaliar. No
conselho é um espaço reinstituinte.
MEM, o poder da tomada de decisões e sua re-
gulação é partilhado pelo grupo. «A prática
Os instrumentos de regulação
democrática de organização partilhada é esta-
belecida em conselho cooperativo. Engloba to- O grupo tem ao seu dispor um conjunto de
dos os aspectos da vida escolar desde o pla- instrumentos que ajudam a regular o que
neamento de actividades e projectos, até a sua acontece na sala de aula e que contam a histó-
realização e avaliação cooperativa» (Niza, ria da vida do grupo.
1990). As crianças são desde logo iniciadas na O mapa de presenças é um quadro com duas
utilização dos instrumentos e em práticas de entradas com os dia da semana/mês na fila do
planificação e avaliação que permitem que topo e os nomes das crianças na coluna do
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tividades ou áreas de trabalho na horizontal. tos sociais do grupo. Este elenco (Combinámos)
Cada criança faz um círculo nas actividades é aberto às necessidades reais de cada grupo.
planeadas ou em curso e depois de terem ter- Outro instrumento usado nas salas de aula
minado regressam para o preencher. Este do MEM é o Mapa das Tarefas. As salas são lu-
plano de actividades é usado como um pro- gares onde há muito trabalho a fazer. Tal como
cesso de auto-reflexão sobre a acção na me- é o grupo que planeia e avalia o seu trabalho,
dida em que, progressivamente, as crianças também este é responsável pela manutenção
aprendem a antecipar as suas actividades fa- do espaço e dos materiais: arrumar as ferra-
zendo os seus planos. O plano de actividades mentas, preparar as refeições, limpar as mesas,
é completado por uma lista dos projectos em regar as plantas ou dar de comer aos animais.
curso onde se regista o nome do projecto, a Estas tarefas são distribuídas semanalmente
data do seu início e provável conclusão e os pelas crianças, rotativamente, na reunião do
nomes das crianças envolvidas. Estes instru- conselho na segunda feira de manhã.
mentos são usados em reuniões do conselho Todos estes instrumentos são facilitadores
para regular o trabalho individual e do grupo. da organização democrática e ajudam as crian-
«Porque é que ninguém tem trabalhado na ças a integrar as suas próprias experiências no
área da carpintaria ultimamente?» «Quem está grupo. Pode parecer muito complicado manter
a trabalhar nos projectos?». Estas questões são todos estes registos e conseguir que crianças
de apenas três anos os usem sistematica-
discutidas em conjunto e as crianças tomam
mente. Os grupos do MEM são constituídos
consciência do seu próprio trabalho assim
por grupos com crianças de várias idades e
como do trabalho do grupo, participando e
que, todos os anos, integram crianças novas
monitorizando o seu processo de desenvolvi-
assim como crianças que já foram socializadas
mento estabelecendo contratos de trabalho.
nesta organização. Os mais velhos explicam
O Diário de Turma é composto por quatro
os procedimentos aos mais novos, e estes,
colunas: «Não gostámos», «Gostámos», «Fize-
começando por imitá-los, acabam por inte-
mos» e «Queremos». As primeiras três colunas
grá-los nas suas práticas à medida que come-
permitem ao grupo fazer uma avaliação socio-
çam a entender as funções e os processos sociais.
moral da semana e a quarta uma participação A utilização por todo o grupo destes instru-
no planeamento organizacional e pedagógico . mentos é uma forma de partilhar com as crian-
As diversas colunas do diário vão sendo ças o poder de decisão e a avaliação. Por ve-
preenchidas ao longo da semana de acordo zes, as crianças com idades de 3-6 anos, fazem
com os pedidos das crianças. Estes registos po-
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«qualquer função no desenvolvimento cul- mentos e ideias das crianças. Uma área de es-
tural da criança aparece primeiro no nível so- crita com uma imprensa (ou o computador),
cial – processo interpessoal e mais tarde ao ní- uma fotocopiadora, e outros materiais como
vel individual – processo intrapessoal» dicionários, papel e canetas, convidam tam-
(Vigotsky, 1987). bém a criança a escrever e a formular hipóte-
Para que este desenvolvimento se processe, ses acerca da linguagem escrita. O texto «li-
o adulto simultaneamente desafia e apoia. O vre», que a criança dita à educadora pode ser o
professor aceita a criança individual, ouve-a e ponto de partida para muitas outras activida-
valoriza-a, ajudando-a a situar-se no grupo, a des como por exemplo o drama, a música, de-
comunicar, a ouvir os outros e a colocar as senho, pintura, etc. Estas linguagens são esti-
suas experiências individuais no contexto co- muladas nas salas do MEM pois funcionam
lectivo. O professor tem o importante papel como representações do mundo e ampliam as
de proporcionar um ambiente seguro onde a formas de comunicação.
comunicação possa circular eficazmente.
Da produção à compreensão
A literacia como um instrumento cultural – processo metacognitivo
A aquisição da literacia é um longo pro-
cesso que se inicia muito cedo e se desenvolve A escrita é utilizada como uma estratégia
pelo acto social da escrita (Niza, 1995). Esta vi- para facilitar um processo metacognitivo da
são baseia-se na concepção de Vigotsky acerca produção para a compreensão. A partir do
da leitura e da escrita como instrumento cul- texto individual, as crianças envolvem-se na
tural. A concepção do MEM em relação à lite- descoberta do código escrito, reproduzindo-o
racia baseia-se em algumas condições: 1) o en- e imprimindo-o na imprensa ou no computa-
sino é organizado de forma a que as crianças dor. Começam a produzir textos sem ainda sa-
compreendam a funcionalidade do acto de ler ber escrever.
e escrever. 2) A linguagem escrita é portadora O simples nome que se escreve para identi-
de significado para a criança qualificando o ficar as produções das crianças, convida tam-
seu quotidiano. 3) A aquisição do código es- bém a criança a envolver-se na sua produção e
crito é encarada como um momento natural posteriormente na compreensão. Primeiro co-
do desenvolvimento social e cognitivo da meçam por usar os seus próprios rabiscos
criança, e não como um treino (motor) que é idiossincráticos até que descobrem que os
imposto do exterior (Vigotsky em Niza, 1995). seus nomes têm uma certa forma que deve ser
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ver deve ser relevante para a vida». Esta carac- este grupo, a linguagem escrita era uma maté-
terística, já referida, é central na pedagogia do ria escolar, e a escola um mundo à parte, gera-
MEM também no que diz respeito à aquisição dor de insucesso, separado do seu quotidiano.
da literacia. Escreve-se o que as crianças di- A professora decidiu então pedir-lhes que
zem, o que fazem, aquilo com que concordam trouxessem embalagens vazias de alimentos
enquanto grupo e o que está planeado. O pa- ou de quaisquer outros produtos domésticos.
pel do educador é proporcionar um ambiente Quando na turma descobriram que conse-
onde a escrita tenha uma um papel relevante, guiam ler os rótulos e que essas palavras escri-
de modo a despertar a curiosidade e a pro- tas faziam parte do seu dia-a-dia, mudaram
gressiva descoberta dos seus códigos. Para completamente a sua atitude face às mensa-
além dos instrumentos usados na sala de aula gens escritas. A linguagem escrita tornou-se
para registar a vida do grupo e documentar as afinal algo que já fazia parte dos seu mundo
actividades e processos, a escrita tem também (embora de forma limitada) e um código sobre
uma função de comunicação à distância. Por o qual elas já sabiam alguma coisa. A partir
vezes as crianças querem contar a outras pes- deste momento a ponte estava feita e as crian-
soas o que fizeram e descobriram e pedir in- ças aumentaram o desejo de compreender este
formação que não está disponível na escola. código que lhes parecia tão distante.
Usando o «Jornal da Turma», e a correspon-
dência escrita alargam a comunicação ao exte- O papel dos professores
rior. O Jornal de Turma é impresso periodica-
mente e é composto por uma colecção de Os professores das turmas MEM têm um
textos de crianças, acontecimentos, e projec- papel activo. São agentes cívicos e morais num
tos. São enviados para outras turmas, para os contexto de vida democrática. O papel do pro-
correspondentes e para os pais. A correspon- fessor é promover uma organização participa-
dência com outras escolas é uma forma de as tiva, a cooperação e a cidadania democrática,
turmas MEM tomarem contacto com as van- ouvindo e encorajando a liberdade de expres-
tagens da língua escrita, o seu poder comuni- são, as atitudes críticas, a autonomia e a res-
cativo e cultural. Quando chega um pacote ponsabilidade.
dos correspondentes, uma nova fonte de inte-
resses, informação e entusiasmo traz vida à Conclusões
turma e provoca uma quantidade de novas
ideias e trabalhos. O modelo pedagógico do MEM afirma que
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Trabalho feito no âmbito de um Mestrado em De-
senvolvimento Infantil e Educação de Infância, sob a se-
guinte proposta: «Influência de psicólogos no currículo
em educação de infância. Posteriormente, foi apresentado
na Second Warwick International Early years Conference
«Building Bridges – Learning for Life» em Março de 1996,
e na 6ª Conferência Europeia sobre Qualidade na Educa-
ção de Infância «Desenvolvendo Adultos, Desenvolvendo
Crianças»- organizada pela European Early Childhood
Education Research Association EECERA e pelo Grupo
de Estudos para o Desenvolvimento e Educação de Infân-
cia GEDEI, em Setembro de 1996 em Lisboa. Publicado
(versão inglesa) no Journal of Early Childhood Teacher
Education Volume 19, Nº 2 (1998-99), 131-140.
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