Sei sulla pagina 1di 10
A literatura apocaliptica e a ideia de ordem e de fim O tratamento da ideia de orden e de fim no ambito da literatura apocaliptica tem de definir-se relativamente a virios aspectos que integram 0 contetido essencial desta mentalidade. José Augusto M. Ramos Instituto Oriental dda Faculdade de Letras da Universidade de Lisbon O tratamento da ideia de ordem e de fim no ambito da literatura apocaliptica tem de definir-se relativamente a varios aspectos que integram o contetido essencial desta mentalidade. Sao nomeadamente as suas dimensées como fendmeno histérico, como conjunto de ideias, de estraté gias e de atitudes, como discurso assumido e como ima- gética cultivada, O que vamos procurar fazer, para tracar aqui uma breve sintese, é ensaiar alguma transparenciacio daquilo que sao os objectos e os objectivos da apocaliptica, de modo a tornar 0 mais evidentes possivel a realidade ea imagética que constituem a base ea pertinéncia do seu dis- curso. E notério que a apocaliptica se caracteriza essen- cialmente pela especificidade do seu discurso, que é bem reconhecivel e eficaz. E todo o discurso implica forgosa- mente um contetido. Tradicionalmente era menos notéria ou bastante menos stblinhada a existéncia de um discurso especifica~ mente apocaliptico. O livro do Novo Testamento, que se autodesignava precisamente Apocalipse de Jesus Cristo e que ficou para a hist6ria simplesmente conhecido como 0 Apocalipse de Joao, representava demasiado isoladamente este género literdrio e este ambiente cultural e ideoldgico. Foi deste, na verdade, que acabou por se forjar o rétulo que haveria de designar esta categoria literaria que cada vez mais se mostra presente e se revela profundamente actuante, nas mais variadas situagGes da hist6ria. Mas este iltimo livro da Biblia ndo é mais do que um destacado ponto de confluéncia de uma prolifica linha de criativi- dade literdria e de intervencdo politica e cultural, que tinha para sua origem uma longa histéria anterior e antiquissi- mas rafzes. A classificagao de apocalipse ocorre agora fre- Rewsta Potucuesa oe CENCIA DAS REUGOKE~ Ano, 2002 / "1-40-59 B Jost Aucusto M. Raasos quentemente para identificar secqdes importantes de alguns livros famosos da Biblia‘, E, fora da Biblia, a hist6ria da literatura antiga de contexto judaico e afins é rica em produ. tos deste mesmo género, fendmeno e 0 discurso Aapocaliptica representa um género literdrio e um conjunto ideolégico vigentes du- rante quase meio milénio, antes e depois da era crista. O meio histérico, social e cultural no qual se desenvolveu este tipo de discurso é caracteristicamente judaico-cristao, A época Aurea em que floresceu a producio deste género literdrio situa-se mais intensamente entre 0 inicio do séc. II a.C. e a primeira metade do séc. II d.C. As coordenadas, os temas e as referéncias culturais que este género literdrio trans- porta consigo sao os especificos e os mais necessarios e urgentes no ambito deste contex- to histérico. Como género literdtio especifico, ele apresenta um conjunto de modelos re- produzidos, que constituem os recursos e estratagemas que definem literariamente este fenémeno literério. Como conjunto ideoldgico, exibe um conjunto de atitudes que definem uma muito caracteristica e insinuante idiossincrasia. Dois milénios que leva de enraizamento até hoje sao disso 0 melhor comprovativo. Meio herdeira dos profetas, meio assente no fundo mitico perene de que se nutre 0 espirito das culturas pré-classicas, este discurso e esia mentalidade apocalipticos podem considerar-se o verdadeiro ex-libris cultural da época de onde sao contemporaneamente originarios tanto o cristianismo como 0 judaismo. Os acontecimentos politicos e as trans formacées culturais e institucionais, ocorridas na Palestina e no mundo em que ela se inse- ria, foram decisivos para a definigao de uma era nova para o patriménio da religiao hebraica biblica e para a sociedade que se assumia como sujeito dessa religiao e da sua cul- tura. Dessas transfor magoes nasce tanto a nova fase da religifio hebraica, agora designada como judaismo, como a nova versio ou a nova via judaico-crista da religiao biblica, que Passou a ser designada como cristianismo, porque representava o dinamismo das utopias messianicas pré-classicas. Qualquer destas duas religises deve muito ao contexto e ao impulso que a atitude apocaliptica transportava em si. Apresenta-se-nos a apocaliptica como um espaco de convergéncia entre as evidéncias especificas de dois tipos de discurso religioso. O primeiro é de caracteristicas intersubjec- tivas; este € 0 tradicional discurso religioso hebraico que, mais do que na artodoxia dos textos legais, se exprime sobretudo na literatura profética. O segundo é constitufdo pelas transparéncias proprias de uma concepgao religiosa assente sobre o discurso mitico tradi- clonal de estrutura mais objectivante’. © primeiro caracteriza-se pela consciéncia e pela £0 que acontece, de maneira perfeitamente consensual para a compreensio do cap. 7 do livro de Daniel, visto no seu conjunto como uma obra literariamente compésits, sem as caracteristicas estritas de um livro profético. Daniel é uma obra pseudepigrafica, que um militante anénimo da luta contra a politica de heleniza- {0 radial conduzida pelos seleucidas esobretudo pelo ei Antico IV atnbuiusimbolicamente aus eibio a antiguidade, de modo a dar 4 sua mensagem maior autoridade. Nos livros encabecados por nomes de profe- tas, nomeadamente de Isafas (cap. 24a 27) e Zacarias (9 a 14) foram igualmente introduzidos, numa procura de valorizacao dos contetidos pela via da pseudepigratia, textos de cariz apocaliptico. O discurso apocaliptico numa das stas formulacdes biblicas talvez mais autenticas e mais populares apresenta-se no cerne dos evan. gelhos sindpticos, em Mc 13 e seus textos paralelos nos evangelhos de Mateus e em Lucas. *Os contetidos e as formas do discurso profético bem como os conteticos e as formas do discurso mitoldgi- co sao, de facto, reconhecidos como os antecedentes da apocaliptica, como os tratados sobre a mesma costus mam referit. Na literatura mitolégica, as categorias a que correspondem os deuses so categorias estruturantes da realidade e 0 discurso religioso mitico apresenta-se, desta maneira e mesmo na sua representacao do divino, ‘como uma contemplagiio des dimens(es da realidade. F claro que um dliscurso religioso em que Deus se define através de um esquema de relacbes intersubjectivas pode ter_tuma leitura igualmente objectivante. Mas o ime- diatismo do discurso implica gradacdes de consciéncia de teor diferenciado. 44 Revita Perrusutsa oe Ginicis Das Racibes A Ibe1A De OxbeM & De Fa NA LrrenaTura APOCALIPnICA atitude militante, face as vicissitudes da historia e aos problemas da condicao social. E a consciéncia subjectiva da histéria. O segundo vé a longa aventura da sociedade, da hist6- ia e do mundo como uma acgao que decorre de modo objectivo, face a qual a personagem que se encontra na posi¢ao de contemplador e testemunha formula anseios e manifesta inletesses, sentindo que ele préprio esté engolido naquele movimento, mas cujo ritmo e destino o ultrapassa e transcende. Esta é uma consciéncia de historia objectiva. E ambas estas atitudes de consciéncia se afirmam, de forma intensa, irresoliivel e quase desgarra- da na mentalidade apocaliptica e nos seus produtos. ¢ Dijectos e objectivos da apocaliptica Nesta atitude apocaliptica podemos encontrar uma literatura e uma ideologia sobre o futuro que se julga absolutamente necessério para um presente que se sente absoluta- mente inaceitavel, elaborada com os dados que o passado mostrava como mais eficazes e garantidos. O futuro necessario é a expectativa ansiosa que mais marca o olhar e 0 discurso do homem apocaliptico. Poderiamos dizer que este é 0 tema irrenunciavel, pelo qual empe- nha 0s seus esforgos de militante e ao servico do qual coloca o seu engenho de criador para o qual dirige a sua argiicia de estratega. O presente inaceitavel constitui a narrativa de realidade que a apocaliptica produz. E © panorama imediato que vé e que vive. E sobre o presente que ele mais escreve. $6 que tem de fazer essa narracao do estado das coisas sob forma simbélica, por ser directamente conhecida dos seus leitores e para tornar-se mais eficazmente simbilica nas suas conota- Ges. Entende-se facilmente a linguagem simbélica da apocaliptica como sendo um exer- cicio de camuflagem, para auto-proteccao. Mas pode bem ser também um exercicio de insuflagem de simbolicidade, para garantir um acréscimo de contetido a uma realidade inquietantemente vazia. Os dados do passado representa os recursos literrios do homem apocaliptico, para definir as suas leituras do futuro, garantir os seus objectivos de intervencdo e persuadir os leitores aos quais se dirige, dando-Ihes a evidéncia de que os males presentes ficam muito relativizados ¢ os sonhos para o futuro ficam inteiramente garantidos com a evidenciagio da sua inteira previsibilidade. Esta previsibilidade do futuro é o antidoto contra a anguis- tia e a inseguranca. Prevendo-se e fixando-se os contornos dos acontecimentos daquele futuro que interessa imediatamente ao leitor destinatério da mensagem apocaliptica, torna-se-transparente e apetecivel a opacidade do futuro que, em si mesma, seria percebi- da como agressiva. tempo essencial para a apocaliptica poderia entao definir-se, pelas perspectivas do primeiro contacto, como sendo sem dtivida o futuro. Apesar dos mal-entendidos profun- dos e frequentes que o termo tem gerado e que precisa de continuos correctivos, a apoca- liptica buscaria de forma ousada esbogar uma auténtica histéria do futuro’, Como caracteristica fundamental pode tomar-se a propria definicio de apocaliptica (desvelamento, iluminacao, revelacéio) como uma express4o de lucidez ou mesmo hiper- lucidez. Ao assumir como nome deste género literério a palavra “apocalipse”, estava ‘0 livro famoso do P. Anténio Vieira e as leituras que eram mais naturalmente realizadas no seu tempo valorizam esta perspectiva da apocaliptica como “profecia” / previsao clos acontecimentos futuros. Aparente- mente menos ligada a acontecimenitos estritamente de interesse nacional parece ser a perspectiva de leitura da Obra de grande félego que sobre o assunto Anténuio Vieira foi produzindo ao loh«ngo de muitos anos e que recentemente foi traduzida para portugués e editada pela Biblioteca Nacional por uma equipa dirigida por Amaldo Espitito Santo, Lisboa, 2000. Revista Poerucuesa De Citwars Das Reviices 5

Potrebbero piacerti anche