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Angela Vorcaro
UFMG, ALI
angelavorcaro@uol.com.br
1
Cf. Granon-Lafont, A topologia de Jacques Lacan, Jorge Zahar, Rio de janeiro, 1988.
2
Lavendhomme, R., Le lieu du sujet, Seuil, Paris, 2002.
2
3
Em: A criança no discurso do Analítico, Judith Miller (org), p.13.
4
Afinal, a idéia de estrutura parece aí pautada pela resistência à concepção de
desenvolvimento infantil, oriunda de uma psicologia médica, que explica o sujeito pela evolução
de um sistema de necessidades, num corpo que tenderia à acumulação adaptativa. Como
sabemos, mesmo articulando organismo e meio, a noção de estrutura no desenvolvimento é
proposta na psicologia genética por Piaget e se define pela maturação ou pela complexificação
de um equilíbrio crescente: um estado de maior equilíbrio superaria o estado que o precede e a
este jamais retornaria, até a conformação da estrutura adulta-cientista. Teríamos aí um
exemplo típico de um processo de estruturação, segundo Piaget. Cf. Lacan, J. Seminário VIII,
A transferência, Jorge Zahar; Rio de Janeiro, 1992, p.101.
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causado por esse objeto a do qual nada é pensável, mas que determina o
sujeito do pensamento que se imagina ser ser5.
A asserção de que a estrutura do sujeito é, por princípio e desde o
princípio, sincrônica é interrogada aqui, considerando a experiência clínica, que
deixa formular a hipótese de uma diacronia lógica.
A direção do tratamento nos conduz a considerar, no caso de crianças,
a estrutura de gestão do desejo como não decidida, para usar um termo de
Calligaris6 . É ainda o que permite ser depreendido da afirmação de Sauret de
que
<<Se a criança está inicialmente em posição de objeto do
fantasma materno e sintoma da verdade do par parental, se o infantil
evolui ao redor do despreendimento do fantasma e de um sintoma
próprios, é preciso deduzir disso que precede que a psicanálise com
uma criança é repentinamente uma contra-psicanálise: deixar cair isso
contra o que, sendo o caso, a análise poderá se efetuar – no sentido em
que Lacan lembrava que se pensa sempre contra um significante>>7
5
CF. Seminário XXII, RSI. inédito.
6
Cf. Calligaris, C., Introdução a uma clínica diferencial das psicoses, Artes Médicas: Porto
Alegre, 1989, p. 27.
7
Marie-Jean Sauret, De l’infantil à la structure, Presses Universitaires du Mirail, Toulouse,
p.490;
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E o que eu já tratei detalhadamente num livro e que apresentarei, aqui, brevemente. Cf.
Angela Vorcaro, A criança na Clínica Psicanalítica, Cia de Freud, Rio de Janeiro, 1997.
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9
J.Lacan (1973-4), Seminário XXI , Les nons dupes errent, lição de 11/06/74, inédito.
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Contempla-se, assim, apenas as condições que balizam, sem absolutamente bastar, a
leitura do texto hieroglífico escrito pela criança em suas manifestações transferenciais, para
que seu testemunho seja efetivamente passível de recolhimento e de intervenção, na clínica
5
13
Oriento-me aqui pelo RSI (Seminário XXII, inédito, de J. Lacan - 1974-5) e pelas formulações
que Jean Claude Milner, no artigo “R,S,I”, deixa ler com clareza.( Les noms indistints, Seuil,
Paris, 1983, p. 7 e segs.).
14
J. Lacan, “Conferencia en Ginebra sobre el sintoma” (04/10/75), Intervenciones e textos 2,
Buenos Aires, Manantial, 1988.
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15
J. Lacan (1972-3), Seminário XX, Mais, ainda, Rio de janeiro, Jorge Zahar, 1982, p.174.
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<<Muito da consistência, a história já deu provas, é pura imaginação [...]Se acontece não
existir raiz na função de x, nós a inventamos, inventamos a categoria da raiz imaginária. Este
ponto de flutuação permite ver que o termo imaginário não quer dizer pura imaginação J. Lacan
(1974-5), Seminário XXII, op. cit,, lição de 11/02/75.
17
J.Lacan (1973-4), Seminário XXI, op.cit., lição de 15/01/74.
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Sobre esse ponto, é interessante destacar outra observação de Lacan que permite a
hipótese da trança:<<Ninguém jamais, no mundo, seguiu uma linha reta. Nem o homem, nem a
ameba, nem a mosca, nem o galho, nada! Pelas últimas notícias, sabe-se que o traço da luz
também não a segue, que é inteiramente solidário à curva universal. A reta, nisso tudo,
9
inscreve, de qualquer forma, alguma coisa. Inscreve a distância, mas a distância (comparem
com a via de Newton) não é absolutamente nada sem um fator efetivo de uma dinâmica que
chamaremos de cascata, aquela que faz com que tudo o que cai siga uma parábola. Logo, não
há reta senão escrita, agrimensura somente do céu. Mas existem enquanto tais, uma e outra,
para sustentar a reta, são artefatos que habitam somente a linguagem>> ( Seminário XVIII,
D’un discours que ne serait pas du semblant, inédito, lição de 12/05/71: Lituraterre). A trança,
portanto, pode ser tomada nesse estatuto de artefato da linguagem para a formulação da
constituição subjetiva.
19
J. Lacan (1973-4), Seminário XXI, op. cit., lição de 11/12/73.
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20
Erik Porge, Psicanálise e tempo, Rio de Janeiro, Campo Matêmico, 1994.
21
Idem.
15
22
Para o aprofundamento e diferenciação destas configuraçóes, cf. Da holófrase e seus
destinos, em Vorcaro, A., Crianças na Psicanálise, clínica, instituição, laço social, Cia de
Freud, Rio de Janeiro, 1999.
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17
23
Apertura de las II Jonadas Nacionales: desarollo y estructura em la directión de la cura,
Buenos Aires, Centro Pequeno Hans, 1992, apud Bernardino, L., As psicoses não decididas da
infância, um estudo psicanalítico, Casa do Psicólogo, São Paulo, 2004.
18
Nem por isso, Freud deixa de abordar a latência como fator que nomeia
como constitucional:
Ou ainda:
24
Em conferência realizada em São Paulo, 1999.
20
25
Ao menos duas condições restritivas apontam para a violação do período de latência: desastres na
estrutura que jogam as crianças à deriva pulsional, impossibilitadas que ficam de fazer laços com os
semelhantes que agenciam o grande Outro.
O menino jogado na rua no período de latência, (mas também a criança violentada sexualmente e
a criança trabalhadora), antes que uma exigência pulsional o confronte ao outro sexo, é violentado
sexualmente, é batido no real de seu corpo já que é obrigado a funcionar no registro do adulto. Antes que
possa reorganizar sua construção fantasmática ele faz. Em vez de fantasiar faz o ato.
Ao dizer “é um assalto, me dá o dinheiro senão eu te corto a cara” especularizam o assalto
temporal sofrido e recebem como resposta o mesmo medo, o horror e a submissão já vivido por elas. Sua
fala ganha reconhecimento social, é ordenadora do laço em que ele supõe ter o domínio, fazer a lei
insensata do vale tudo. Nessa posição perversa, sua palavra não é engajada no brincar de bandido, mas faz
ato e tem reconhecimento devido ao perigo de desamparo a que submete o outro.
A violação da latência que o convoca a responder antes que detenha um saber, o institui num
lugar de poder que lhe é conferido, onde, a despeito do real de sua constrição orgânica, seu corpo pode
realizar qualquer ato: ele vai responder não com a palavra, mas com seu corpo.
A criança surda, sem acesso ao diagnóstico e ao tratamento na infância, fica exposta à condição
de débil. Muitas sem escolaridade alguma, outras vezes em escolas não habilitadas, é exposta a uma
restrição da língua a tal ponto que apenas alguns gestos indicativos são sistematizados por seus pares que
lêem estes gestos em posição signica, biunívoca. Depois de passarem toda sua latência na posição de
objeto do gozo do Outro, sem acesso a meios para aparelhar-se com algum saber, são enfim, na
adolescência, expostas á língua de sinais. Descobrem uma possibilidade inédita de circulação na língua,
de encontros, de saber. Enfim, aparelham-se com a língua. Nesse momento, entretanto seu corpo está
organicamente constituído, está acossada pela urgência das pulsões e pela necessidade de realização. Seu
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corpo não lhe impõe qualquer limite, qualquer ato pode ser experimentado sem nenhuma elaboração. É ao
mesmo tempo em que passam a falar, com o corpo pela língua de sinais, podem também fazer qualquer
ato com o corpo. Falar e fazer são facilmente equivalentes, transparentes, sem mudança de registro de um
para o outro, sem leitura de um sobre o outro.
Os surdos, ao se disporem da língua de sinais, dificilmente mantém-se submissos a pais que não
falam a língua deles. Esses adolescentes são jogados, sem intermediação, em outros laços, onde suas
referências parentais nada valem, pois efetivamente falam línguas estrangeiras a ambos. Morte, gravidez,
roubos e delinqüência em todos os seus âmbitos podem ser pressagiados nos dois casos.
Nessas duas situações, enfim – a primeira, dos meninos de rua, em que a adolescência é
antecipada, suprimindo a latência, por violação, e a segunda, dos surdos, em que a latência é postergada à
adolescência, em que a condição real do organismo produz a urgência de realização que impede o tempo
de elaboração da castração – encontramos a condição social incidindo na estruturação do sujeito:
antecipação da adolescência ou adiamento da infância.
Esses modos de supressão da latência mostram o limite do corpo – seja por sua restrição de
tamanho, habilidade e força, ou ainda por sua imaturidade sexual – como constrição necessária à
elaboração da castração, que faz o adiamento do ato uma condição estrutural do cálculo subjetivo. Tais
desastres na latência evidenciam o quanto o Real do desenvolvimento orgânico determina a possibilidade
da elaboração psíquica.
26
CF. Nina Leite, “História e estrutura”, Dizer, no. 7, Revista da Escola Lacaniana de Psicanálise, 1993.
27
Jacques Lacan (1960), Intervenção no Congresso de Bonneval, mimeo.
28
J. Lacan (1966), “Da estrutura como intromistura de uma alteridade, prévia a qualquer que seja o
sujeito”, Congresso de Baltimore, A controvérsia estruturalista, R. Macksey e Donato E. orgs., São
Paulo, Cultrix, 1976.
22
29
J. Lacan (1974-5), Seminário XXII, RSI, lição de 21/01/75.
30
Rassial, J-J, O adolescente e o psicanalista, Cia de Freud, Rio de Janeiro, 1999.
31
Cabe lembrar que, para além da adolescência, a presença do real no corpo também se
manifesta na angústia, na gravidez e na doença orgânica.
25
Significante fálico: não garante uma relação válida com o outro sexo.
Será preciso fundar a intersubjetividade aquém ou além deste
significante.
Nome-do-Pai: não é mais sustentado pela relação familiar, vai ter que
ser validado destacado do pai da realidade e de todo pai imaginário,
podendo então se escrever no plural: a mulher, o sintoma, etc.
Enfim, na adolescência o significante se confessa enganador e o
simbólico frágil.
4 – A construção do Sinthome:
32
Seminário XX, Mais, ainda, op. cit., p.171.
28
33
Ibid., p.75.
29
34
Recorrendo ao triádico, Inibição, Sintoma, Angústia, anunciado por Freud, Lacan o
localiza no nó borromeano. Este triádico havia sido reintroduzido por Lacan no Seminário da
Angústia, segundo ele para mostrar as qualidades do afeto que os afetuosos aficcionados
estavam impedidos de perceber; demonstrar que esses três termos são tão heterogêneos
entre si quanto o Real, o Simbólico e o Imaginário.
30
<<se pensarmos que não há o Outro do Outro, pelo menos não gozo do
Outro do Outro, é bom que façamos a sutura em alguma parte.[...] tudo isso
para fazer sentido>>35.
<<são todos feitos da mesma maneira, de não serem outra coisa senão
Um>>36.
35
Seminário XXIII, Le Sinthome, op. cit.,lição de 13/01/76.
36
Seminário XX, op. cit., p.174.
37
Seminário XXII, RSI, op. cit. , lição de10/12/74.
38
“Conferencia en Ginebra sobre el Sintoma” (04/10/75), Intervenciones e textos 2, Buenos
Aires, Manantial, 1988.
31
este sentido sexual só se define por não poder se inscrever. [...]E a linguagem
é feita assim. É alguma coisa que o mais longe que vocês cultivarem o
ciframento não chegará jamais a abandonar o que é do sentido, porque ele
está lá neste lugar. É o que faz com que a relação sexual não possa se
escrever...>>39 (grifos meus).
39
Seminário XXI , Les nons-dupes errent, op. cit., lição de 20/11/73.
40
Seminário XXII, RSI, lição de 11/03/75.
41
Cabe lembrar que a visão de universo construída pela ciência moderna, com Copérnico,
Kepler, Galileu e Newton, parte do princípio que o universo teve um grande arquiteto e
engenheiro – Deus – que o criou como uma máquina perfeita, dotada de leis precisas que
comandam seus movimentos, que podem ser descoberts utilizando-se procedimentos
32
42
Seminário XX, Mais, ainda, op. cit., p.35.
43
Seminário XXIII, Le Sinthome, op. cit., lição de 16/12/75.
44
<<o sofrimento do sintoma diz respeito ao gozo fálico. A escrita sintomática[...]expõe o
irrepresentável do falo. O sintoma pratica um ato de violência, tenta recuperar um gozo já
perdido um dia, usando os intrumentos de sua perda. Essa tentativa em si é sofrimento, e esse
sofrimento equivale ao gozo que ela busca>> (Gerard Pommier, A ordem sexual, op. cit. ,
p.215.
34
45
Seminário XX, Mais, ainda, op. cit., p.152.
35
fazer que nos escapa. Ou seja, um saber que transborda muito o gozo que
podemos ter>>46.
<<uma por uma, elas ex-sistem. Elas são terrivelmente reais. Elas são
só isso. Elas só consistem enquanto o simbólico ex-siste, ou seja, o
inconsciente. É enquanto elas ex-sistem como sintoma cuja consistência o
inconsciente provoca, isto aparentemente no campo planeado do Real: em
nome do que se imagina do Real, no qual se imagina no Real o efeito do
Simbólico.>>(RSI, 1974-5[11/03/75])
Lacan afirma que a idéia da suplência da mulher irreal que não ex-
siste, é a errância que remete a trilha do Nome-do-Pai, pai como
nomeante.
46
Seminário XXIII, Le Sinthome, op. cit., lição de 13/01/76.
36
47
Seminário XXII, RSI, op. cit., lição de 11/02/75.
37
48
CF. Chatel de Brancion “Haverá um irredutível do Sintoma?”, em: Do sintoma... ao sinthoma,
Rio de Janeiro, Letra freudiana, ano XV, n.17-8, pp.168-175.1996). Cabe ressaltar que a
concepção de sinthome abre uma importante via para o tratamento das psicoses e,
especialmente, para o tratamento das psicoses não decididas da infância.
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39
Bibliografia: