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© Revista Jurídica® ISSN 0103-3379

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judiciária. Ano 62, nº 442, Agosto de 2014.

Diretor: Elton José Donato

Bimestral: 1953-1962; trimestral: 1963-1965; irregular: 1966-1967; anual: 1968;


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ANO 62 – AGOSTO DE 2014 – Nº 442

Repositório Autorizado de Jurisprudência


Supremo Tribunal Federal: 03/85
Superior Tribunal de Justiça: 09/90
Tribunais Regionais Federais 1ª, 2ª e 4ª Regiões

Fundador
Professor Angelito Asmus Aiquel

Diretor Executivo
Elton José Donato

Gerente Editorial e de Consultoria


Eliane Beltramini

Coordenador Editorial
Cristiano Basaglia

Conselho Editorial
Ada Pellegrini Grinover – Alexandre Pasqualini – Alexandre Wunderlich
Anderson Vichinkeski Teixeira – Antonio Janyr Dall’Agnol Jr.
Araken de Assis – Arruda Alvim – Carlos Alberto Molinaro
Cezar Roberto Bitencourt – Daniel Francisco Mitidiero – Daniel Ustárroz
Darci Guimarães Ribeiro – Eduardo Arruda Alvim – Eduardo de Oliveira Leite
Eduardo Talamini – Ênio Santarelli Zuliani – Fátima Nancy Andrighi
Fredie Didier Júnior – Guilherme Rizzo Amaral – Humberto Theodoro Júnior
Ingo Wolfgang Sarlet – Jefferson Carús Guedes
João José Leal – José Carlos Barbosa Moreira – José Maria Rosa Tesheiner
José Roberto Ferreira Gouvêa – José Rogério Cruz e Tucci – Juarez Freitas
Lúcio Delfino – Luis Guilherme Aidar Bondioli
Luís Gustavo Andrade Madeira – Luiz Edson Fachin – Luiz Guilherme Marinoni
Luiz Manoel Gomes Júnior – Luiz Rodrigues Wambier – Márcio Louzada Carpena
Mariângela Guerreiro Milhoranza – Paulo Luiz Netto Lôbo
Rolf Madaleno – Salo de Carvalho – Sergio Cruz Arenhart
Sérgio Gilberto Porto – Teresa Arruda Alvim Wambier – William Santos Ferreira

Colaboradores desta Edição


Alice da Rocha Silveiro, Fernando Rubin,
Liane Tabarelli Zavascki, Lindomar Luiz Della Libera,
Mariana Menna Barreto Azambuja
Sumário
Doutrinas
Civil, Processual Civil e Comercial
1. O Princípio Dispositivo no Procedimento de Cognição e de
Execução
Fernando Rubin.............................................................................9

2. Responsabilidade Civil por Violação dos Direitos da


Persona­lidade
Mariana Menna Barreto Azambuja...............................................23

3. Análise Interdisciplinar da Síndrome da Alienação Parental:


Aspectos Jurídicos e Psicológicos
Alice da Rocha Silveiro................................................................. 51

4. Cláusulas Gerais, Segurança Jurídica e Interpretação Civil-


-Constitucional
Liane Tabarelli Zavascki................................................................ 81

Penal e Processual Penal


1. A Magnitude da Lesão Como Circunstância Autorizadora
da Prisão Preventiva nos Crimes Contra o Sistema Finan- Sumário
ceiro Nacional
Lindomar Luiz Della Libera........................................................103

Jurisprudência
Civil, Processual Civil e Comercial
Acórdãos na Íntegra
1. Supremo Tribunal Federal........................................................... 125
2. Superior Tribunal de Justiça........................................................ 133
3. Tribunal Regional Federal da 1ª Região...................................... 149
4. Tribunal Regional Federal da 4ª Região...................................... 157
Ementário de Jurisprudência
1. Ementário de Jurisprudência Civil, Processual Civil e Comercial.....167

Penal e Processual Penal


Acórdãos na Íntegra
1. Superior Tribunal de Justiça........................................................ 199
2. Superior Tribunal de Justiça........................................................ 205
3. Tribunal Regional Federal da 2ª Região...................................... 215

Ementário de Jurisprudência
1. Ementário de Jurisprudência Penal e Processual Penal......................221

Índice Alfabético e Remissivo.................................................241


EDITORIAL

A Revista Jurídica trata de temas atuais e de suma relevância aos profissionais


do direito. Os trabalhos doutrinários, de autoria de relevantes juristas, são divididos
nas áreas cível e penal.

Doutrina Cível
O Mestre Fernando Rubin sentiu a necessidade de discorrer a respeito
de um fundamental princípio do sistema adjetivo, do qual muito tratamos
e que constantemente é utilizado ao se ponderar a respeito do iter procedi-
mental de cognição e também de execução. Entender a aplicação do princípio
dispositivo é fundamental para se compreender a lógica do processo contem-
porâneo, que não pode deixar de ser coisa das partes para se transformar em
exclusivo objeto de interesse e atuação do Estado-juiz.
A Mestranda Mariana Menna Barreto Azambuja assevera que, dentre
todos os direitos fundamentais elencados na Constituição Federal, certamen-
te o direito da personalidade, mesmo com sua recente existência no ordena-
mento jurídico brasileiro e suas constantes divergências conceituais, merece
o devido destaque. Isso porque é este direito que fará com que tenhamos pro-
tegido o nosso núcleo pessoal, dentre eles: nossa honra, nosso nome, nossa
imagem e, por fim, nossa privacidade. Da mesma forma, a análise das formas
de violação e reparação destes direitos, através dos danos materiais e morais,
se faz imperiosa dentre os operadores do direito, tendo por base o crescimen-
to das possibilidades de invasão no âmbito privado dos cidadãos, seja atra-
vés dos meios de comunicação ou até mesmo do uso pessoal da tecnologia.
A Advogada Alice da Rocha Silveiro faz um breve exame das transfor-
mações ocorridas na sociedade, a partir da Constituição Federal de 1988, que
trouxe mudanças no campo das relações familiares, estabelecendo a igualda-
de entre homens e mulheres, e a consagração dos princípios da dignidade da
pessoa humana, afetividade, solidariedade e, especialmente, o princípio do
melhor interesse da criança. A partir daí a criança passou a ser reconhecida
como sujeito de Direito que merece especial proteção do Estado. Tendo em
vista essa realidade, foi efetivada, em 2010, a Lei nº 12.318, que cuida da pro-
teção das crianças em face de maus-tratos, pressões psicológicas, entre outros
aspectos que as prejudiquem. Ainda, simultaneamente a esta realidade atual,
a preferência legal passou a recair pelo compartilhamento da guarda dos fi-
lhos. Assim, o escopo deste trabalho abrange aspectos jurídicos e psicológi-
cos da Síndrome da Alienação Parental (SAP), com foco nas consequências
geradas nas crianças e nas medidas a serem tomadas quando identificada a
prática da SAP por um dos genitores, analisando qual o melhor tipo de guar-
da diante desta situação.
A Professora Liane Tabarelli Zavascki elabora um estudo sobre o Có-
digo Civil de 2002, e afirma que na sua estrutura por princípios, cláusulas
gerais e conceitos indeterminados, revela a intenção legislativa de se preten-
der um sistema aberto. Tem como objetivo refletir sobre as contribuições da
interpretação civil-constitucional para que essa tessitura aberta do sistema
não comprometa a segurança jurídica do ordenamento.

Doutrina Penal

O Advogado Lindomar Luiz Della Libera analisa o conteúdo e a apli-


cação da magnitude da lesão prevista no art. 30, da Lei nº 7.492/1986, como
circunstância autorizadora da prisão preventiva. Discute-se questões relacio-
nadas ao significado da expressão “magnitude da lesão”, a natureza jurídica
da prisão preventiva, as principais posições doutrinárias, bem como realiza-
-se uma retrospectiva da aplicação do instituto pelos Tribunais Regionais Fe-
derais e Superiores. O estudo é relevante na medida em que analisa a legiti-
midade e o cabimento da prisão, seja isoladamente, seja com a associação da
magnitude da lesão à garantia da ordem pública ou da ordem econômica e
demais circunstâncias do art. 312, do Código de Processo Penal.

Os Editores
Doutrina
Cível

O Princípio Dispositivo no Procedimento


de Cognição e de Execução
F ernando R ubin
Mestre em Processo Civil pela UFRGS, Professor da Graduação e Pós-
-Graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis – UNIRITTER,
Laureate International Universities, Professor Colaborador da Escola
Superior de Advocacia – ESA/RS, Professor Pesquisador do Centro de
Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul – CETRA-Imed, Professor
Convidado de Cursos de Pós-Graduação lato sensu, Advogado.

ve
a C íí v l
el
PALAVRAS-CHAVE: Processo civil; princípio dispositivo;
fase de conhecimento; fase de execução.

SUMÁRIO: Introdução; I – Do dispositivo como princípio ge-


ral do processo; II – Princípio dispositivo no procedimento de
conhecimento; III – Princípio dispositivo no procedimento de
na

execução; Conclusão.
r ii n

INTRODUÇÃO
tr

Em momento de apresentarmos à comunidade jurídica nacional


ut

a nossa obra de processo em atualizada edição1, sentimos a necessida-


ou

de de discorrermos a respeito de um fundamental princípio do sistema


Do

1 RUBIN, Fernando. A preclusão na dinâmica do processo civil. 2. ed. São Paulo: Atlas,
mar. 2014. 363 p.
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adjetivo, do qual muito tratamos e que constantemente é utilizado ao se dis-


correr a respeito do iter procedimental de cognição e também de execução.
Entender a aplicação do princípio dispositivo é fundamental para se
compreender a lógica do processo contemporâneo, que não pode deixar de
ser coisa das partes para se transformar em exclusivo objeto de interesse e
atuação do Estado-juiz.
Enfrentaremos, por isso, cenários em que a sua aplicação inconteste
deixou de ser visualizada, como também explicitaremos o núcleo duro de
inserção do princípio dispositivo e a sua relação com o princípio específico
da execução denominado de disponibilidade e resultado.

I – DO DISPOSITIVO COMO PRINCÍPIO GERAL DO PROCESSO

O princípio dispositivo determina que cabe à parte requerer, dentro de


sua disponibilidade, determinada prestação de tutela jurisdicional; o Estado-
-juiz resta assim inerte, aguardando a provocação da parte interessada para
que possa a partir daí tomar as medidas legais cabíveis, concedendo a parte
o seu direito dentro dos limites requeridos.
Trata-se de princípio geral, já que possui ampla aplicação, não só nos
processos de cognição, ou conhecimento, mas também nos processos de exe-
cução e mesmo nos processos cautelares (cada vez mais em desuso).
Inegavelmente vincula-se ao conceito histórico de ação, já que por meio
desta a parte, e somente ela, encaminha pedido de prestação de tutela jurisdi-
cional – de cognição, execução ou cautelar2.
Indiscutivelmente, é um dos princípios fundamentais do nosso pro-
cesso civil, sendo comumente lembrado como um dos elos ou ponto de in-
tersecção do direito processual com o direito material, ao passo que instituto
intimamente relacionado com a natureza do direito material3.
A partir do impulso inicial realizado pela parte, deixa o Magistrado de
permanecer inerte, devendo agir para a rápida solução da problemática. Eis
aqui o espaço do impulso oficial, a exigir energia do agente político do Estado

2 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Direito material, processo e tutela jurisdicional.


In: Polêmica sobre a ação – A tutela jurisdicional na perspectiva das relações entre direito e
processo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 285/319.
3 DUARTE, Bento Herculano; OLIVEIRA JR., Zulmar Duarte. Princípios do processo civil –
Noções fundamentais. São Paulo: Método, 2012. p. 83.
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para dar a cada um o que é seu de direito, depois de ser devidamente provo-
cado pela adequada via processual.
O sistema processual assim montado presta-se para que o Magistra-
do haja dentro da lei, não ultrapassando dos seus propósitos, vulnerando a
imparcialidade que dele a sociedade espera; impedindo que inicie processo e,
principalmente, altere a causa de pedido e/ou pedido do feito que ele mesmo
terá que julgar futuramente.
Representa, pelo que foi até aqui exposto, o princípio dispositivo, um
dos alicerces do sistema processual, determinando uma adequada limitação
ao poder de atuação do Magistrado. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, na
sua tese de doutorado, bem atentou para esse detalhe, referindo que tanto no
direito brasileiro como na maioria dos ordenamentos processuais, o maior
limite formal para a atividade do órgão judicial é o constituído pelo princípio
dispositivo, sendo esse papel desempenhado pela preclusão no concernente
aos atos da parte4.
Em linhas propedêuticas, cabe ainda registrar que o princípio disposi-
tivo se aproxima de alguns outros importantes e históricos institutos proces­
suais, embora com eles não se confunda propriamente. Embora haja um as-
pecto subjetivo que integra também o princípio do juiz natural, este relaciona-se
especificamente à garantia de preexistência do órgão jurisdicional ao fato (le-
vado ao conhecimento do juízo pela parte interessada) e o respeito absoluto
às regras objetivas de determinação de competência5. Por sua vez, o princípio
da identidade física do juízo aponta que o Magistrado que desenvolveu a instru-
ção deve proferir julgamento final, em razão da sua vinculação mais próxima
às questões fáticas controvertidas discutidas ao longo do procedimento. Ain-
da, o princípio da indeclinabilidade, ou da inafastabilidade da jurisdição, tem a
peculiaridade de se referir à circunstância de o órgão jurisdicional, uma vez
provocado, não poder recusar-se de julgar ou delegar a função de dirimir o
litígio nos termos postos pela parte.
Por fim, temos o princípio da demanda, constantemente confundido com
o princípio dispositivo – o que, de certa forma, se justifica, já que não há como
compreender a dimensão de um sem conhecer o outro. O princípio da de-

4 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo:
Saraiva, 2003. p. 207 e 222.
5 DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2012.
p. 13.
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manda, também conhecido como princípio da inércia, e diretamente vincula-


do ao conceito de ação antes informado, seria prévio ao princípio dispositivo,
significando apenas que o Estado não pode mover-se sozinho em busca da
satisfação das pretensões dos jurisdicionados: caberia ao próprio interessado
a iniciativa de provocar o exercício da função jurisdicional, de ativar os ór-
gãos jurisdicionais (que são, portanto, inertes) e buscar a satisfação de uma
pretensão6.
O princípio dispositivo viria, então, como lógica complementar robus-
ta ao princípio da demanda, informando que a parte, ao propor determinado
pleito judicial, é responsável pelo devido encaminhamento dos fatos e dos
pedidos, como também pela indicação das provas lícitas referentes a tais cir-
cunstâncias, devendo o Estado-juiz respeitar esses limites – o que implicaria
realmente na limitação à atuação do Magistrado antes referida, ao passo que
não estaria na sua alçada auxiliar ou substituir à atividade da parte, adotan-
do ativamente uma medida procedimental que compete exclusivamente ao
litigante.

II – P
 RINCÍPIO DISPOSITIVO NO PROCEDIMENTO DE
CONHECIMENTO

O ambiente em que seguramente mais visualizamos a presença do


princípio dispositivo é na fase de conhecimento7. Aqui, a parte autora, mas
também a parte ré, podem mais livremente dispor do seu direito, dentro do
campo da autocomposição, como também podem estabelecer ainda na parte
inaugural do litígio – fase postulatória – os devidos contornos da lide, fora
dos quais o juízo está impedido de decidir.
Nesse sentir, dispõe o art. 128 do CPC que o juiz decidirá a lide nos
limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões não
suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte; como também o
art. 460 do mesmo diploma processual: é defeso ao juiz proferir sentença, a
favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em
quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

6 AMENDEIRA JR., Sidnei. Manual de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1,
2012. p. 87.
7 CORDEIRO, Thaís Matallo. Os princípios processuais no código de processo civil projetado:
alteração principiológica significativa? Disponível em: <http://www.migalhas.com.br/
dePeso/16,MI187837,6104Os+principios+processuais+no+Codigo+de+Processo+Civil+
projetado>. Acesso em: 5 abr. 2014.
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Julgamentos dessa ordem, fora do objeto litigioso do processo8, por cer-


to devem ser redefinidos, a partir da interposição do competente recurso, o
que não necessariamente determina a sua ampla nulidade. Sobre a presença
de julgamento destoante do pedido encaminhado pela parte autora, temos
a posição de que somente o julgamento ultra petita (coisa além do pedido),
autoriza o segundo grau a não invalidar o ato, vindo a tão só reduzir (ade-
quar) o comando sentencial ao âmbito do que permitido ser concedido judi-
cialmente, em face do pleito dirigido pela parte demandante; nesse diapasão,
coerente a posição de Marinoni e Arenhart no sentido de que, em regra, só a
sentença que julga além do pedido pode ser corrigida para menos pelo Tribunal
ad quem, ou seja, para os limites do pedido, pois seria um atentado à celerida-
de e à economia processual exigir uma (nova) sentença de primeiro grau de
jurisdição para definir o que já foi julgado procedente9. Por outro lado, pro-
ferida sentença extra petita (julgado coisa diversa da pedida), normalmente o
acórdão deve se postar para a decretação da nulidade, com o retorno dos au-
tos para novo julgamento pelo primeiro grau, atentando-se para o fenômeno
de supressão de instância10.
A seu turno, o art. 282, III e IV, do CPC, aponta que a petição inicial in-
dicará o fato e os fundamentos jurídicos do pedido, como também o pedido,
com as suas especificações; já o art. 315 elucida que o réu, por sua vez, pode
reconvir ao autor no mesmo processo, toda vez que a reconvenção seja cone-
xa com a ação principal ou com o fundamento da defesa.
Estabelecidos os argumentos e as teses de ataque, contra-ataque e de-
fesa, ficam as partes e o Estado-juiz impedidos de alterar os limites do li-
tígio, após o saneamento do feito – nos termos expressos do art. 294 c/c o
art. 264 do CPC. A estabilização do processo, mediante a inalteração da cau-
sa de pedir e pedido, possui duplo fundamento: um particular, com efeitos
privados, consiste na realização prática da lealdade processual, a qual não
consiste apenas na fidelidade à verdade, mas compreende a colocação clara e
precisa dos fatos e dos fundamentos jurídicos por ambas as partes, de modo
a não se surpreender, nem um nem outro, com alegações novas de fatos ou
indicação de provas imprevistas. O outro fundamento da estabilização do

8 SANCHES, Sydney. Objeto do processo e objeto litigioso. Ajuris, n. 16 (1979): 146/156.


9 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil. 11. ed.
São Paulo: RT, v. 2, 2013. p. 411.
10 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4. ed. São Paulo: RT,
1998. p. 240.
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processo é o do interesse público na boa administração da justiça, que deve


responder de maneira certa e definitiva à provocação consistente no pedido
do autor, ou mesmo na reconvenção do réu11.
Antes de ser proferida decisão final de mérito a transitar em julgado
(art. 269, I, CPC), pode se suceder o pagamento espontâneo ou mais comu-
mente a realização de acordo, mediante transação ou conciliação (art. 269, III,
CPC). Essa última hipótese mostra-se realmente interessante para o nosso
estudo, ao passo que as partes podem compor o litígio envolvendo matéria
não incluída no feito – como expressamente consta, aliás, no art. 475-N, III,
do CPC, não estando o juízo impossibilitado de homologar o acordo fora
dos limites propostos na demanda. Ocorre que aqui o julgador não está di-
retamente decidindo o mérito da contenda, não havendo razão para se falar
em quebra da sua imparcialidade, se as próprias partes estão de acordo em
composição mais ampla envolvendo direitos disponíveis. A limitação impos-
ta pelo princípio dispositivo, deixe-se bem claro, portanto, relaciona-se ao
julgamento de mérito pelo juiz (art. 269, I) e não à homologação de acordo
entabulado pela partes, mesmo envolvendo matéria não debatida nas fases
anteriores do procedimento (art. 269, III) – a qual, de acordo com o nosso
sistema processual, é tão título executivo judicial como a sentença de mérito
propriamente dita12.
Outra grande questão que se estabelece ao se discutir a aplicação do
princípio dispositivo na fase de conhecimento cinge-se à sua importante rela-
tivização recente, no âmbito instrutório.
O Código de Processo Brasileiro, especialmente no art. 130, articulado
com os incisos I e II do art. 125, reconhece a possibilidade de o juiz, não só a
requerimento das partes, mas também de ofício, determinar a realização de
provas necessárias à melhor instrução do processo.
Está, assim, o Código respeitando uma tendência mundial, relativizan-
do o princípio dispositivo em sentido impróprio ou processual e o próprio
brocardo latino mihi factum, dabo tibi ius, ao passo que admite a necessidade
de, no processo moderno, o Magistrado ter maior liberdade no impulsiona-

11 CARVALHO, Milton Paulo de. Do pedido no processo civil. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris, 1992. p. 121/129.
12 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado. 3. ed.
São Paulo: RT, 2011. p. 490.
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mento do feito (inquisitorial system), não o deixando à livre intervenção das


partes interessadas (adversarial system)13.
A referida necessidade de intervenção judicial, diga-se de passagem,
surge precipuamente da tomada de consciência da insuficiência das partes
e seus procuradores, por si só, serem agentes hábeis a conduzir, a contento,
o processo em busca da verdade processual e da justiça; cabendo, pois, ao
órgão judicial auxiliar nesta senda, tratando de equilibrar o jogo, em face de
desigualdades sociais/econômicas/técnicas comumente presentes entre os
contendores – conjectura que passou a exigir, em suma, algo mais do que a
igualdade formal proporcionada pelo modelo processual liberal14. O Estado-
-juiz, nesse contexto atual, passaria, na verdade, a deixar de ser imparcial,
se assistisse inerte, como um expectador de um duelo, ao massacre de uma
das partes, ou seja, se deixasse de interferir para tornar iguais partes que são
desiguais15.
Tal exigência moderna de suplementação de um modelo de atuação
passiva do Estado-juiz na instrução processual orienta, então, o julgador a
buscar a verdade independente da preclusão para as partes em matéria de
prova – valendo-se de todos os meios probatórios lícitos e legítimos, típicos
ou atípicos16.
De fato, embora a regra tradicional seja a de que o juiz deva decidir
segundo o alegado e provado pelas partes – iudex secundum allegata et probata
partium indicare debet, o princípio dispositivo, ao longo da evolução do direito
processual brasileiro (seguindo o fluxo mundial, repete-se17), sofreu sensíveis
restrições, consolidando-se que o juiz pode determinar as diligências neces-
sárias à instrução do processo; sendo, então, absoluto somente no tocante à

13 DAMASKA, Mirjan R. The faces of justice and state authority – A comparative approach to
the legal process. New Haven and London: Yale University Press, 1986. p. 3/6.
14 CAPPELLETTI, Mauro. Problemas de reforma do processo civil nas sociedades
contemporâneas. In: MARINONI, Luiz Guilherme (coord.). O processo civil contemporâneo.
Curitiba: Juruá, 1994. p. 14; BARBOSA MOREIRA, J. C. La igualdad de las partes en
el proceso civil. In: Temas de direito processual. Quarta Série. São Paulo: Saraiva, 1989.
p. 67/81.
15 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. O novo regime do agravo. 2. ed. São Paulo: RT, 1996.
p. 313/314.
16 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 3. ed. São Paulo: RT, 2001.
p. 157.
17 HABSCHEID, Walther J. As bases do direito processual civil. Trad. Arruda Alvin. Revista
de Processo, n. 11-12 (1978): 117/145. Especialmente p. 144; SATTA, Salvatore. Diritto
processuale civile. 2. ed. Padova: CEDAM, 1950. p. 119.
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afirmação dos fatos em que se funda o pedido, no que o juiz depende inteira-
mente das partes – iudex secundum allegata partium indicare debet18.
Sucedeu-se, prossigamos, uma superação da concepção tradicional da
posição do juiz no processo civil, que até então se limitava à investigação
do direito; época em que competia às partes determinar o objeto do proces-
so (Dispositionsmaxime), ministrar os fundamentos de fato da sentença, por
meio de afirmações e provas (Verhandlungsmaxime), e até mesmo responder
pelo chamado impulso processual19. O princípio dispositivo passou, então, a ser
compreendido sobre dois diversos enfoques: de um lado, o direito exclusivo
da parte de propor o processo e requerer a tutela jurisdicional em busca dos
próprios interesses; e, de outro, a regra da iniciativa das partes na instrução
da causa – esta última acepção, sim, passando a sofrer alterações substanciais
de concepção, à medida que o formato publicístico do processo fez emergir
as influências oficiosas decorrentes da aplicação do princípio inquisitório20.
Pode-se, então, dizer que estamos tratando de hipótese em que o Es-
tado-juiz, segundo o contemporâneo enfoque dado ao princípio dispositivo
em sentido impróprio ou processual, passa a ter a oportunidade de produzir,
mesmo ex officio, meios de prova (atuações judiciais com as quais as fontes se in-
corporam definitivamente ao processo); a partir da colaboração das partes, as
quais, segundo o princípio dispositivo em sentido próprio ou material, têm a
exclusiva autonomia para aportar ao feito os fatos e as fontes de prova (elemen-
tos com os quais se conta antes do processo)21. Parece, pois, lógico se afirmar
– dada a sutil, mas existente diferença entre meios e fontes de prova – que para
a realização de determinada diligência instrutória de ofício, o julgador deve
levar em conta tão somente dados obtidos no processo22, âmbito próprio no
qual os meios de prova estão inseridos23.

18 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 11. ed. São Paulo: RT,
v. 2, 1987. p. 78/79.
19 BAUR, Fritz. Transformações do processo civil em nosso tempo. Trad. J. C. Barbosa
Moreira. Revista Brasileira de Direito Processual, n. 7 (1976): 57/68.
20 LIEBMAN, Enrico Tullio. Fondamento del principio dispositivo. Rivista di Diritto
Processuale, n. 15 (1960): 551/565.
21 MELENDO, Santiago Sentís. La prueba es libertad. Revista dos Tribunais, n. 462 (1974):
11/21; FORNACIARI, Mario Alberto. Actividad esclarecedora del juez en el código
procesal civil y comercial de la nación (deber o facultad). Revista de Processo, n. 46 (1987):
90/102.
22 RIBEIRO, Darci Guimarães. Tendências modernas da prova. Ajuris, n. 65 (1995): 324/349.
Especialmente p. 330.
23 MARELLI, Fabio. La trattazione della causa nel regime delle preclusioni. Padova: CEDAM,
1996. p. 62/63.
16
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Doutrina Civil
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Essa atual concepção de cooperação do Estado-juiz com a atividade


probatória originariamente exclusiva das partes, vinculada à exigência con-
temporânea de o julgador obter suficientes meios hábeis de atingir a verdade
processual, impõe, por outro lado, que mantenha o Magistrado a necessária
imparcialidade que dele se espera (vedado o abuso de autoridade, tão ile-
gítimo quanto o abuso de liberdade das partes) para que, enfim, possa, em
sentença, julgar com responsabilidade e se aproximar, tanto quanto possível,
da solução justa no caso concreto24.
Tecnicamente mais preciso, segundo Fritz Baur, seria dizer que na ins-
trução a tarefa do juiz, do ponto de vista da pesquisa da verdade processual,
é corretiva (se as partes expõem fatos inverídicos) e especialmente supletiva
(se lacunosa a exposição e a produção de provas pelas partes, e, por isso, se
faz necessário colher os meios de prova de ofício)25. Daí porque, agora, na es-
teira dos ensinamentos de Liebman, não se pode dizer que haja na instrução
espaço próprio para aplicação absoluta do princípio inquisitório, ao passo
que se admite, nessa seara, uma participação cooperativa do julgador (com
as partes litigantes), nunca de forma a ser aceito modelo que relativize com-
pletamente o princípio dispositivo (em sentido processual ou impróprio)26.
Portanto, das lições retiradas da melhor doutrina, extrai-se que viven-
ciamos fase do processo subordinado ao “princípio dispositivo atenuado”27,
em que ao menos a atividade probatória deve sim ser exercida pelo juiz – no
entanto, não em substituição das partes, mas juntamente com elas28.

III – PRINCÍPIO DISPOSITIVO NO PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO

O princípio dispositivo também se faz presente na fase executória.


Como não poderia deixar de ser, o exequente, a partir da configuração de um
título executivo, terá a faculdade – e não a obrigatoriedade – de requerer o
cumprimento de uma obrigação de pagar, fazer, não fazer ou entregar coisa.

24 ALVES, Jones Figueiredo. Do poder ex officio no processo civil. Recife: TJPE, 1989. p. 12/17.
25 BAUR, Fritz. Transformações do processo civil em nosso tempo. Trad. J. C. Barbosa
Moreira. Revista Brasileira de Direito Processual, n. 7 (1976): 57/68.
26 LIEBMAN, Enrico Tulio. Fondamento del principio dispositivo. Rivista di Diritto
Processuale, n. 15 (1960): 551/565.
27 ARAGÃO, E. D. Moniz. Preclusão (processo civil). In: OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro
de (coord.). Estudos em homenagem ao Professor Galeno Lacerda. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris, 1989. p. 151/152.
28 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 4. ed. São Paulo: RT, 1994.
p. 54, 129, 155, 164, 175, 233, 234, 249, 250, 287 e 288.
17
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Não cabe, pois, ao juízo, determinar o início dos trabalhos executivos,


se realmente não houver manifestação expressa do exequente nesse sentido;
como também não cabe ao Magistrado executar coisa acima ou diversa da
constante no título executivo e requerida oportunamente pela parte interes-
sada.
A lógica de aplicação do princípio dispositivo, relacionado ainda espe-
cialmente com o princípio da demanda, na forma como exposta para a fase de
conhecimento, vale aqui para a fase de execução, respeitado evidentemente o
estágio diferenciado da demanda nesses dois momentos29.
Eis a razão pela qual a doutrina menciona a existência, na fase execu-
tiva, do específico princípio da disponibilidade e resultado: a tutela jurisdicional
executiva não pode ser prestada de ofício; o Estado-juiz tem de ser devida-
mente provocado para que preste a tutela jurisdicional, qualquer que seja ela,
com o rompimento do seu estado de inércia; o princípio da disponibilidade
da execução, contudo, não significa que, uma vez devidamente provocada a
jurisdição, o Estado-juiz não tenha o dever de atuar, até mesmo de ofício, com
vistas à prestação da tutela jurisdicional executiva e, consequentemente, à
satisfação do exequente pela prática dos atos que se justificarem em cada caso
concreto, sendo esse o devido espaço do princípio do resultado ou princípio
da máxima utilidade da execução30.
O art. 475-J, caput, introduzido pela Lei nº 11.232/2005, é a central nor-
ma infraconstitucional que atesta a necessidade de o exequente provocar a
máquina judiciária também na fase executiva, sob pena de arquivamento dos
autos e eventual ocorrência de espécie de prescrição superveniente à decisão
transitada em julgado – o que determinaria extinção da execução (hipótese de
remissão total da dívida), mediante sentença, nos termos do art. 794, II, c/c o
art. 795, ambos do CPC.
A espelho da fase de conhecimento, tem-se que cabe ao procurador
do exequente determinar o impulso da demanda em determinado lapso de
tempo, sob pena de reconhecimento do instituto da prescrição – aqui deno-
minada de “prescrição intercorrente”, em sentido lato, por se dar em meio à
tramitação processual31 (e em razão de inércia do próprio titular da preten-

29 ASSIS, Araken de. Manual de execução. 13. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 112/117.
30 SCARPINELLA BUENO, Cassio. Curso sistematizado de direito processual civil. 2. ed.
São Paulo: Saraiva, v. 3, 2009. p. 20/21.
31 DONIZETTI, Elpídio. Processo de execução. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 261/262.
18
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

são). Mesmo que haja para o título executivo judicial a lógica do sincretismo
processual, já que não mais existentes processos autônomos de conhecimen-
to e de execução (após as reformas processuais executivas, principalmente a
partir da já mencionada Lei nº 11.232/200532), entendemos que permanece
sólido o Verbete nº 150 do Supremo Tribunal Federal, a explicitar que “pres-
creve a execução no mesmo prazo da prescrição da ação”.
Assim, transitada em julgado a demanda judicial e não cumprido o
comando pelo réu no prazo de quinze dias da sua intimação na origem, con-
forme prescreve o art. 475-J, caput, do CPC, inicia o prazo para o exequente
dar impulso à fase de satisfação do crédito, sob pena de reconhecimento da
prescrição intercorrente. Tanto é verdadeira a assertiva que o art. 475-L, VI,
prevê que a impugnação ao cumprimento de sentença, oposta pelo executa-
do, trate de tema prescricional, desde que esta causa extintiva da obrigação
seja superveniente à sentença (transitada em julgado)33. Ora, se o executado
pode se defender alegando a prescrição, por certo não é aquela relativa à
pretensão cognitiva, coberta pelo manto da coisa julgada material; só pode se
tratar da “prescrição intercorrente” decorrente da inércia do credor na pro-
moção do cumprimento da sentença.
Dúvida relevante a respeito da prescrição intercorrente cinge-se ao
marco inicial para a sua contagem. Entendemos que o prazo para eventual
decretação da prescrição em fase executiva inicia-se justamente após o não
cumprimento do julgado pelo réu; e não do arquivamento do processo, que
se dá seis meses após o não cumprimento de julgado pelo demandado, con-
forme previsão do art. 475-J, § 5º, do CPC. Aliás, o art. 617 aponta que é a
propositura da execução o ato responsável pela interrupção da prescrição,
sendo que tal ato, s.m.j., pode ser realizado justamente no primeiro dia útil
que se seguir ao fim do prazo de quinze dias, dado ao sucumbente, para cum-
primento voluntário da condenação constante do título executivo34.
Guilherme Rizzo Amaral traz exemplo ilustrativo que bem contempla
o imbróglio:

32 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Teoria e prática da tutela jurisdicional. Rio de


Janeiro: Forense, 2008. p. 176/177; RUBIN, Fernando. Atuação da preclusão e da coisa
julgada material: um paralelo entre o procedimento de execução e o procedimento de
cognição. Revista Dialética de Direito Processual, n. 102 (2011): 54/61.
33 ASSIS, Araken de. Op. cit., p. 517.
34 SCARPINELLA BUENO, Cássio. Op. cit., p. 196/199.
19
Revista Jurídica 442
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Agosto/2014

O devedor condenado a reparar danos sofridos pelo credor poderá argüir


a prescrição intercorrente três anos após ter encerrado o seu prazo para
cumprir voluntariamente a sentença, caso não tenha o credor requerido a
execução nesse interregno; no curso desses três anos (mais precisamente
após seis meses) deverá o processo vir a ser arquivado. O ato de arquiva-
mento sob hipótese alguma interrompe o prazo prescricional a que se faz
referência, muito menos determina o (re)início de sua contagem.35

Vê-se, pois, que o prazo para o reconhecimento da prescrição intercor-


rente da pretensão executiva deve ser o mesmo que o direito material estipu-
la para a decretação da prejudicial vinculada à pretensão cognitiva; e inicia
imediatamente a partir do momento em que não cumprido voluntariamente
o julgado pelo réu. Foi de três anos no exemplo anterior em razão do direito
material (diploma civilista) estabelecer tal lapso temporal para a demanda
condenatória de reparação de danos; e seria, portanto, de um ano o prazo
prescricional intercorrente, v.g., se tivéssemos tratando de crédito decorren-
te de demanda securitária transitada em julgado envolvendo acidentes pes­
soais.
Por fim, registre-se que o exequente pode pretender desistir de sua
prestação, total ou parcialmente, de acordo com o art. 569 do CPC; como
também pode chegar a um acordo judicial com a parte executada, valendo
aqui as linhas já proferidas quanto à homologação da transação judicial e a
formalização de conciliação – a ser perfectibilizada, aqui, em audiência den-
tro da fase de execução.

CONCLUSÃO

O princípio dispositivo, como se pode perceber, é essencial para a di-


nâmica do procedimento, seja na fase de conhecimento, seja na fase de exe-
cução. Como grande limitador do agir do Estado-juiz, impõe que seja a parte
autora a única responsável por impulsionar o processo nos termos desejados,
iniciando a demanda com a petição inicial e também expressamente peticio-
nando ao Magistrado para que se inicie os trabalhos executivos propriamente
ditos – exigindo satisfação do seu crédito, pela via da penhora, expropriação
e pagamento, em virtude de não ter sido presenciado cumprimento voluntá-
rio da obrigação pelo devedor.

35 AMARAL, Guilherme Rizzo. Cumprimento e execução de sentença sob a ótica do formalismo-


-valorativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 192.
20
Revista Jurídica 442
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A bem da verdade, corresponde ao princípio da demanda ou da inércia


o ato de a parte interessada pleitear perante o Poder Judiciário determinada
prestação de tutela jurisdicional – de cognição, executiva ou mesmo cautelar
–, sendo que os limites do pleito, devidamente explicitados na peça da parte
proponente, envolve o âmbito específico de aplicação do dispositivo como
fundamental princípio geral do processo.
De qualquer forma, se compete à parte requerente a propositura de
determinada medida em busca dos seus direitos (impulso inicial), compete
ao juízo conceder ulterior impulso oficial a fim de que se examine o pedido e
se dê cumprimento, nos termos requeridos e de acordo ainda com as dispo-
sições legais de estilo – não sendo concedida coisa além (ultra petita) ou coisa
diversa da pedida (extra petita).
Aliás, necessário recordar, neste momento conclusivo, que o princípio
dispositivo, ao longo da fase de cognição, veio sendo atenuado em período
mais recente, com relação às atividades instrutórias, restringindo-se o seu
núcleo duro – princípio dispositivo em sentido material ou próprio – à im-
possibilidade de o juiz alterar e conceder bem outro que não conste na causa
de pedir e pedido. No direito probatório, dado o seu caráter constitucional
e prioritário, vige a regra da não preclusividade das questões, assentada na
relativização do princípio dispositivo em sentido processual ou impróprio,
o qual, por sua vez, desenvolveu-se a partir de exigência moderna de su-
plementação de um modelo de atuação passiva do Estado-juiz na instrução
processual.
Já a respeito do acordo judicial, mediante transação ou conciliação, o
mesmo pode ocorrer a qualquer tempo, sendo que, realizado já na fase de
conhecimento, pode envolver matéria não posta em juízo, inexistindo, aqui,
razões para se cobrar aplicação do princípio dispositivo (em sentido material
ou próprio) – a fim de o julgador eventualmente homologar composição nos
estritos termos do objeto litigioso de até então –, se as próprias partes mani-
festam interesse na autocomposição, sendo disponíveis os direitos discutidos
perante o agente político do Estado.

21
Responsabilidade Civil por Violação
dos Direitos da Personalidade
M ariana M enna B arreto A zambuja
Mestranda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul (PUCRS), Especialista em Direito Civil pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (UFRGS), Graduada pela Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Professora no Curso de
Especialização em Direito Civil da Universidade Ritter dos Reis (Uniritter).

RESUMO: Entre todos os direitos fundamentais elencados na Cons-


tituição Federal, certamente o direito da personalidade, mesmo com
sua recente existência no ordenamento jurídico brasileiro e suas
constantes divergências conceituais, merece o devido destaque. Isso
porque é este direito que fará com que tenhamos protegido o nosso
núcleo pessoal, entre eles nossa honra, nosso nome, nossa imagem e,
por fim, nossa privacidade. Da mesma forma, a análise das formas
de violação e reparação destes direitos, por meio dos danos mate-
riais e morais, se faz imperiosa entre os operadores do Direito, ten-
do por base o crescimento das possibilidades de invasão no âmbito
privado dos cidadãos, seja por meio dos meios de comunicação, seja
por meio até mesmo do uso pessoal da tecnologia.
PALAVRAS-CHAVE: Direitos da personalidade; violação; danos à
personalidade.
ABSTRACT: Among all the fundamental rights listed in the Cons-
titution, definitely the personality rights, even with the recent exis-
tence in the Brazilian legal system and his constant conceptual diffe-
rences, deserves relevence. That’s because this is the right that will
give us protection for our personal rights, among them: our honor,
our name, our image and finally our privacy. In the same way, the
analysis of the forms of violation and repair of these rights, through
the material and moral damages, becomes imperative among jurists,
based on the increase possibilities of intrusion in the citizens pri-
vacy, either through media communication or even the personal use
of the technology.
KEYWORDS: Personality rights; violation; personality damages.
SUMÁRIO: Introdução; I – Os direitos da personalidade; I.1 Ori-
gem dos direitos da personalidade; I.2 Os direitos da personalida-
23
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

de no direito brasileiro; I.2.1 Constituição Federal; I.2.2 Código Ci-


vil; I.2.2.1 Honra; I.2.2.2 Imagem; I.2.2.3 Privacidade; I.2.2.4 Nome;
I.3 A legislação portuguesa e a cláusula geral; II – A responsabili-
dade civil; II.1 Danos à personalidade; II.2 A dignidade da pessoa
humana como fundamento nas decisões de violação dos direitos
da personalidade; II.3 Análise de casos concretos; Conclusão; Refe­
rências.

INTRODUÇÃO

A matéria de direitos de personalidade foi inserida no ordenamento


jurídico brasileiro, de forma expressa, muito recentemente, porém não deixa
de possuir evidente relevância dentro no mundo em que vivemos. Diante
do estudo do tema, também se faz necessária a pesquisa sobre as formas de
violação de tais direitos e de que forma eventuais danos seriam juridicamente
reparados.
O instituto da responsabilidade civil, por sua vez, possui longa história
no sistema jurídico, tendo em vista que, desde o Código de 1916, este vem
sendo usado como forma de obrigar aquele que cometeu ato ilícito e gerou
dano, a repará-lo.
Mesmo considerando a complexidade de ambas as matérias, este estu-
do tem como objetivo analisar as formas de reparação de danos a direitos de
personalidade, por meio do dano material e, principalmente, do instituto do
dano moral, sendo este o mais utilizado para fins de reparação e compensa-
ção pelo responsável.

I – OS DIREITOS DA PERSONALIDADE

I.1 Origem dos direitos da personalidade

O caso emblemático quando se fala em uma violação de direitos da


personalidade foi o chamado Caso Birsmarck. Otto Von Bismarck era um
estadista alemão conhecido como “Napoleão da Alemanha” por sua incrível
popularidade.
Bismarck veio a falecer no ano de 1898, e, no decorrer de seu velório,
jornalistas conseguiram adentrar no local e tirar fotos do corpo do chanceler.
As imagens rapidamente se espalharam, o que obrigou a família do estadista
a ajuizar uma ação contra aqueles que veicularam, indevidamente, a imagem.
24
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

O caso é até hoje considerado como marco sobre a violação do direito de


imagem1.
Em termos de direito comparado, foi a codificação italiana de 1942 e a
codificação portuguesa de 1966 que merecem destaque quando o assunto é a
iniciação dos direitos da personalidade em termos legislativos. Em relação à
origem doutrinária, por sua vez, não se pode deixar de citar a doutrina ger-
mânica e a francesa no século XIX2.

I.2 Os direitos da personalidade no direito brasileiro


Sobre o progresso dos direitos da personalidade no Direito brasileiro,
Roxana Borges3:
À medida que a sociedade se torna mais complexa e as violações às pessoas
proliferam, até mesmo como decorrência de certos usos dos conhecimentos
tecnológicos, novas situações demandam proteção jurídica. É o que ocorre
no campo dos direitos de personalidade: são direitos em expansão. Com a
evolução legislativa e com o desenvolvimento do conhecimento específico
acerca do direito, vão-se revelando novas situações que exigem proteção
jurídica e, consequentemente, novos direitos vão sendo reconhecidos.

Têmis Limberger também fala sobre o tema4:


A possibilidade de abertura do sistema leva a uma integração da responsa-
bilidade civil por danos à pessoa no tocante aos direitos da personalidade,
inclusive quando houver relação de consumo (interpretação integrada da
Constituição, do CDC e do novo CCB). São aplicáveis, então, os seguintes
dispositivos: art. 5º, X, da CF e arts. 21, 927 e parágrafo único do novo
CCB, que vem ao encontro dos arts. 4º, caput (dignidade), e 6º, VI, do CDC.
Desse modo, o novo CCB vem a reforçar posições anteriormente já exis-
tes no Código Consumerista, especificamente as relacionadas ao tema do

1 ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Considerações sobre a tutela dos direitos de


personalidade no Código Civil de 2002. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). O novo Código
Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 109.
2 ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Considerações sobre a tutela dos direitos de
personalidade no Código Civil de 2002. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). O novo Código
Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 103.
3 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de personalidade e autonomia privada. 2. ed.
rev. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 25.
4 LIMBERGER, Têmis. O direito à intimidade na era da informática: a necessidade de proteção
dos dados pessoais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 193.
25
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

presente trabalho: como os direitos de personalidade e a indenização por


dano moral.

O Código Civil brasileiro atribui personalidade jurídica a todos os se-


res humanos, inclusive resguardando os direitos do nascituro e de algumas
pessoas jurídicas.
Quanto à titularidade dos direitos da personalidade, importa men-
cionar a divergência que ainda existe na doutrina e jurisprudência acerca
das pessoas jurídicas. Embora existam o art. 52 do Código Civil5 e a Súmula
nº 227 do Superior Tribunal de Justiça, que atribuem à pessoa jurídica pro-
teção de direitos da personalidade e a possibilidade de ser vítima de dano
moral, o reconhecimento de tais circunstâncias ainda é difícil de encontrar no
ordenamento jurídico.
Também sobre a titularidade, não se pode deixar de lado a tutela post
mortem dos direitos da personalidade. Esse tópico foi legislado por meio dos
arts. 12 e 20 do Código Civil brasileiro, ambos em seu parágrafo único6.
Em relação a esse tópico, Ney Rodrigo Lima Ribeiro7 bem analisa a
possibilidade de indenização em face de ofensa a pessoa falecida:
Não somente a indenização é possível. Admite-se a pretensão cominatória,
a que alude o art. 287 do CPC, inclusive com antecipação de tutela. Na hi-
pótese, harmoniosamente com Código Civil, a lei processual expressamen-
te prevê a viabilidade de cumulação de indenização por perdas e danos

5 “Art. 52. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da
personalidade”. “STJ. Súmula nº 227 – 08.09.1999 – DJ 20.10.1999. Pessoa jurídica – Dano
moral. A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”.
6 Sobre o tema discorre Fábio de Andrade: “Observe-se, porém, que o Código Civil, ao
disciplinar o tema, no parágrafo único do art. 12, não somente reconhece aos sucessores
elencados neste dispositivo o direito à indenização, como também concede a eles o direito
de exigir que cesse a ameaça ou lesão. Além disso, prevê, no parágrafo único do art. 20,
em relação à divulgação de escritos, transmissão da palavra ou a publicação, exposição
ou a utilização de imagens de uma pessoa falecida que serão partes legítimas para obter
esta proteção ao cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. Sobressai, portanto, que,
em relação a estes casos, a redação não é idêntica ao parágrafo único do art. 12, estando
excluída do elenco de pessoas legitimadas a pleitear a tutela do falecido os colaterais até
o quarto grau” (ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Considerações sobre a tutela dos
direitos de personalidade no Código Civil de 2002. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). O
novo Código Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 109-110).
7 RIBEIRO, Ney Rodrigo Lima. Direito à proteção de pessoas falecidas. Enfoque luso-
-brasileiro. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo
Bonato (Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 448 p.
26
Revista Jurídica 442
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com a multa pelo descumprimento da determinação judicial de cessação


da ameaça ou lesão, nos termos do art. 461, § 2º.

O princípio fundamental que caminha juntamente aos direitos da per-


sonalidade é o da dignidade da pessoa humana, servindo, inclusive, como
fundamento jurídico para as decisões sobre o tema. As expressões personali-
dade e dignidade se conectam cada vez mais.
Segunda Roxana Borges, em termos normativos, nem a Constituição
nem o Código Civil trazem listas exaustivas ou taxativas de direitos da per-
sonalidade. Os direitos da personalidade elencados são meramente exempli-
ficativos, não excluindo novas normas que possam ser adotadas posterior-
mente8.

I.2.1 Constituição Federal


No Brasil, foi a Constituição Federal de 1988 que trouxe para o orde-
namento jurídico a primeira norma jurídica expressa fazendo referência aos
direitos da personalidade, embora seja importante referir que Teixeira de
Freitas e Clóvis Bevilaqua já haviam demonstrado a necessidade de legislar
sobre o tema mesmo antes da concretização do Código Civil de 19169.
No inciso X do art. 5º da Carta Maior, onde estão estampados os direi-
tos e garantias fundamentais dos indivíduos10, encontra-se disposto que “são
invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,
ficando assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral de-
corrente de sua violação”. Aqui se verifica a importância reconhecida pelo

8 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de personalidade e autonomia privada. 2. ed.


rev. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 25.
9 BELTRÃO, Silvio Romero. Direitos de personalidade: de acordo com o Novo Código Civil.
São Paulo: Atlas, 2005. p. 43.
10 Ingo Sarlet afirma que “os direitos fundamentais, como resultado da personalização e
positivação constitucional de determinados valores básicos (daí seu conceito axiológico),
integram, ao lado dos princípios estruturais e organizacionais (a assim denominada parte
orgânica ou organizatória da Constituição), a substância propriamente dita, o núcleo
substancial, formado pelas decisões fundamentais, da ordem normativa, revelando que
mesmo num Estado constitucional democrático se tornam necessárias (necessidade que se
fez sentir da forma mais contundente no período que sucedeu à Segunda Grande Guerra)
certas vinculações de cunho material para fazer frente aos espectros da ditadura e do
totalitarismo” (SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria
geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 11. ed. rev. e atual. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2012. p. 61).
27
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

legislador em voltar a valorar a pessoa em detrimento do patrimônio11, tam-


bém chamado de despatrimonialização ou, ainda, repersonalização.
Ficou claro, na leitura do dispositivo, que a iniciativa da Constituição
estava longe de esgotar a matéria; entretanto, serviu para dar o primeiro pas-
so dentro do ordenamento jurídico sobre o tema.
Para isso, emergiu a necessidade do Poder Legislativo em aprofundar a
matéria, dando mais elementos para os julgadores. Nada mais oportuno que
no Código Civil de 2002.

I.2.2 Código Civil


O Código Civil de 2002 legislou a matéria dos direitos da personalida-
de em sua parte geral, nos arts. 11 a 21.
Mesmo que de forma objetiva, foi onde a matéria encontrou maior em-
basamento na análise dos casos concretos. De forma geral, o Código determi-
nou que tais direitos serão intransmissíveis e irrenunciáveis, embora admita
exceções12 para ambos os casos.

11 Dennis Lacerda discorre sobre o fenômeno da despatrimonialização: “Os fenômenos da


constitucionalização do direito privado, bem como o seu processo de repersonalização e
despatrimonialização, orientam, inexoravelmente, o estudo dos direitos da personalidade,
que nada mais são do que direitos fundamentais, consagrados pelas Constituições.
Inclusive, pode-se dizer que os direitos da personalidade representam a expressão máxima
da repersonalização do direito, uma vez que trata da tutela dos próprios atributos inerentes
à condição humana” (LACERDA, Dennis Otte. Direitos de personalidade na contemporaneidade:
a repactuação semântica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2010. p. 49).
12 Sobre as exceções, Fernanda Borghetti Cantali assim entende: “A imagem é direito de
personalidade, que inequivocamente é objeto de negócio jurídico. Portanto, o desfrute
desse direito pode gerar resultado econômico. O importante é admitir a possibilidade
de transmissão dos efeitos patrimoniais sem que isso leve à conclusão precipitada de
descaracterização como direitos intransmissíveis e inalienáveis. O que não é possível é
transmitir ou alienar o direito em si, mesmo que gratuitamente, já que os direitos que
decorrem da personalidade são inerentes a esta e, portanto, inseparáveis, da pessoa
humana. [...] Em outra perspectiva, afirmar-se que o titular pode, em determinadas
circunstâncias e com certa limitação, ‘renunciar ao exercício de um direito de personalidade,
mas não pode renunciar ao direito em si’. Neste caso, emerge questão a partir do exemplo
supracitado: a cirurgia de transgenitalização importa, sim, na renúncia ao direito sobre as
partes do corpo, não sendo possível visualizar esta renúncia apenas quanto ao exercício do
direito. É inequivocamente, mais abrangente” (CANTALI, Fernanda Borghetti. Direitos
da personalidade: disponibilidade relativa, autonomia privada e dignidade humana.
Porto Alegre: 2008. p. 271. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pró-Reitoria de Pesquisa
e Pós-Graduação – PRPPG. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2008.
p. 134 e 137).
28
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

Antes do Código, Pontes de Miranda13 já abordava tais características:


Os direitos de personalidade são intransmissíveis. Nasçam com a pessoa,
ou se adquiram depois, os direitos de personalidade são intransmissíveis.
[...] A intransmissibilidade deles é resultante da infungibilidade mesma da
pessoa e da irradiação de efeitos próprios (os direitos de personalidade).
[...] Os direitos de personalidade são irrenunciáveis. Há outros direitos a
que se pode renunciar, como aqueles direitos a cujo titular incubem deve-
res, de igual ou de maior monta (e.g., direitos de família). A razão para a
irrenunciabilidade é a mesma da intransmissibilidade: ter ligação íntima
com a personalidade e ser eficácia irradiada por essa. Se o direito é direi-
to de personalidade, irrenunciável é. Não importa, em consequência, qual
seja.

Outra importante característica é a subjetividade dos direitos da perso-


nalidade, isto é, cada um tem um entendimento do que pode ser compartilha-
do ou não com outrem e se isso violará ou não seus direitos íntimos.
Além dos direitos fundamentais à vida e à integridade física, por exem-
plo, o Código Civil brasileiro faz, de forma específica, menção ao direito à
honra, à imagem, à privacidade e ao nome. Para maior entendimento, mister
a análise específica de cada um deles.

I.2.2.1 Honra
A honra vem disposta no art. 20 do Código Civil, juntamente com o di-
reito de imagem. Porém, diante das particularidades, entende-se necessária a
separação dos temas para um maior entendimento.
Inclusive, dentro do próprio conceito de honra, existe uma divisão
doutrinária e jurisprudencial, podendo ser ela subjetiva ou objetiva. Nesse
sentido o ensinamento de Rodrigo Bornholdt14:
A honra subjetiva será o sentimento, ou juízo, que o indivíduo faz de si
mesmo, o qual será, contudo, avaliado pelo juiz, conforme se apresente o
contexto. [...] Já a honra objetiva será representada pela reputação, fama,
respeito, consideração, que todos devem ao indivíduo.

13 MIRANDA, Francisco Pontes de. Tratado de direito privado. Campinas: Bookseller, t. 7,


2000. p. 31-32.
14 BORNHOLDT, Rodrigo Meyer. Liberdade de expressão e direito à honra: uma nova abordagem
no direito brasileiro. Santa Catarina: Bildung, 2010. p. 300.
29
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

Outra diferenciação entre honra social e objetiva é conceituada por


Marcelo Malizia Cabral15:
A primeira traduz-se na consideração que cada pessoa tem por si própria,
enquanto a segunda refere-se ao respeito e à consideração que cada pessoa
goza perante o grupo social.
Desse modo, os valores éticos da própria pessoa e da comunidade em que
vive podem ser diversos, o que possibilitará a divergência do gravame à
honra nos níveis pessoal e social.

A violação da honra gera não só responsabilidade civil, mas também


criminal. São crimes contra a honra a calúnia, a difamação e a injúria, todos
tipificados no Código Penal por meio dos arts. 138 a 14016.

I.2.2.2 Imagem
Conforme Andréa Barroso Silva, a origem do direito à imagem deu-
-se antes mesmo do advento da fotografia em 1839, já que foi por meio do
reconhecimento de um individualismo, após a Revolução Francesa, que os
ordenamentos jurídicos passaram a reconhecer o direito à imagem17.

15 CABRAL, Marcelo Malizia. A colisão entre os direitos de personalidade e o direito de


informação. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo
Bonato (Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 119.
16 Calúnia: “Art. 138. Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como
crime: Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa. § 1º Na mesma pena incorre
quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga. § 2º É punível a calúnia contra
os mortos”. Exceção da verdade: “§ 3º Admite-se a prova da verdade, salvo: I – se,
constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado
por sentença irrecorrível; II – se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas
no nº I do art. 141; III – se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi
absolvido por sentença irrecorrível”. Difamação: “Art. 139. Difamar alguém, imputando-
lhe fato ofensivo à sua reputação: Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa”.
Exceção da verdade: “Parágrafo único. A exceção da verdade somente se admite se o
ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções”. Injúria:
“Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena – detenção, de
um a seis meses, ou multa. § 1º O juiz pode deixar de aplicar a pena: I – quando o ofendido,
de forma reprovável, provocou diretamente a injúria; II – no caso de retorsão imediata,
que consista em outra injúria. § 2º Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que,
por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes: Pena – detenção, de
três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência. § 3º Se a injúria
consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a
condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência: (Redação dada pela Lei nº 10.741,
de 2003) Pena – reclusão de um a três anos e multa. (Incluído pela Lei nº 9.459, de 1997)”.
17 SILVA, Andréa Barroso. Direito à imagem: o delírio da redoma protetora. In: MIRANDA,
Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato (Org.). Direitos da
personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 285.
30
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

No Brasil, o direito a imagem veio regulado pelo art. 20 do Código


Civil e tem como escopo a proteção da imagem do indivíduo, dando a ele o
poder de escolha de sua eventual reprodução.
Neste sentido, Roxana Borges18:
O direito à imagem, numa concepção negativa dos direitos de personali-
dade, visa a impedir que terceiros, sem a autorização da pessoa, registrem
sua imagem ou a reproduzam, qualquer que seja o meio: fotos, filmes etc.
A proibição da reprodução não autorizada da imagem alcança a proibição
de sua publicação ou exposição pública.

Esse direito alcança flexibilidade quando falamos em pessoas públicas


ou que ocupem cargo político. Outra divulgação justificável ocorre se a ima-
gem for capturada em local público e não houver destaque nas pessoas que
não corroboraram com a sua publicação.
Salienta-se ainda o disposto na Súmula nº 403 do STJ, que refere que
“independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autori-
zada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais”.
Em relação ao caráter autônomo do direito de imagem, Andréa
Barroso Silva19 ainda refere que:
Entende-se que o direito à imagem é autônomo em relação aos demais di-
reitos da personalidade, especialmente o direito à honra e à reserva sobre a
intimidade da vida privada, não obstante possa o direito à imagem instru-
mentalmente proteger tais bens [...].
No Código Civil brasileiro, o direito à imagem se encontra no mesmo
artigo (art. 20), em que também se fala no direito à honra. Por fim, importante
a supramencionada ressalva, já que se trata de direitos autônomos.

I.2.2.3 Privacidade
A matéria da privacidade vem disposta no art. 21 do Código Civil, ar-
tigo esse muito criticado pela doutrina civilista. Nesse artigo está descrito
que a vida privada da pessoa natural é inviolável e que o Magistrado deve
adotar as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário
ao preceito.

18 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de personalidade e autonomia privada. 2. ed.


rev. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 157.
19 SILVA, Andréa Barroso. Direito à imagem: o delírio da redoma protetora. In: MIRANDA,
Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato (Org.). Direitos da
personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 290.
31
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

Também como na questão da imagem, a privacidade das pessoas pú-


blicas é relativizada pela jurisprudência20, que considera que determinadas
matérias jornalísticas têm cunho meramente informativo, não violando nem
ofendendo a intimidade.
Conforme o entendimento de Fábio de Andrade21:
Acrescente-se que a regra estabelecida pelo Código no art. 21 não está se-
quer em harmonia com a jurisprudência, pois esta tem – nos moldes do
Direito português –, “conforme a natureza do caso”, excepcionando a tu-
tela da privacidade, em face de interesses julgados prevalentes. Um grupo
de casos, em que se tem configurado esta orientação, concerne a quebra de
sigilo bancário, desde que o credor atenda a diversos requisitos e, em espe-
cial, demonstre a indispensabilidade desta providência.
Vê-se, portanto, que o tema da privacidade mereceria por parte do codifi-
cador brasileiro um tratamento bem mais profundo do que o existente no
Código de 2002. O tema permanece sendo tratado pela jurisprudência sem
que exista uma norma geral que o sistematize.

O direito à intimidade, por sua vez, é considerado núcleo do direito à


privacidade. Dentro desse núcleo estão ainda presentes todos aqueles dados
sensíveis, com máxima proteção diante de sua relevância pessoal.

I.2.2.4 Nome
Consoante analisa Arthur Maximus Monteiro, antes de definir a fun-
ção do nome (identificar e distinguir pessoas), deve-se referir seu conceito,
isto é, um sinal gráfico ou fonético atribuído a um determinado sujeito22.

20 “Agravo regimental em agravo de instrumento. Responsabilidade civil. Veiculação de


matéria jornalística. Pessoa pública. Inexistência de dano. Reexame de provas. Súmula
nº 7/STJ. 1. Decidindo o tribunal estadual, soberano na análise das provas, que a matéria
jornalística reveste-se de cunho meramente informativo, envolvendo, ainda, interesse
público, sem nenhum sensacionalismo, ofensa ou intromissão na privacidade dos autores,
a pretensão dos agravantes, em sentido contrário, está inviabilizada nesta instância
especial, nos termos da Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça. 2. Agravo regimental
não provido.” (AgRg-AI 928658/DF, 2007/0156113-3, 3ª T., Rel. Min. Ricardo Villas Bôas
Cueva (1147), DJ 16.08.2011)
21 ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Considerações sobre a tutela dos direitos de
personalidade no Código Civil de 2002. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). O novo Código
Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 117.
22 MONTEIRO, Arthur Maximus. Direito ao nome da pessoa natural no ordenamento
jurídico brasileiro. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET,
Gustavo Bonato (Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 366.
32
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

O mesmo autor23 faz uma análise sobre a relação do direito ao nome,


com o direito de propriedade, demonstrando a sua discordância com tal
comparação:
Entre as correntes que defendem a existência do direito ao nome, a primei-
ra a ser destacada é a que entende o direito ao nome como um direito de
propriedade. Segundo os defensores dessa corrente, a possibilidade de o
nome ser oponível erga omnes traria consigo a caracterização como direito
de propriedade. Ninguém, nem mesmo o Estado, poderia privá-lo desse
direito. E o seu titular poderia se opor a qualquer um que dele se utilizasse
indevidamente.

Essa teoria, contudo, é inaceitável.

O autor24 justifica a impossibilidade de considerar o nome uma pro-


priedade, justificando que o direito de propriedade tem caráter exclusivo,
enquanto o nome pode, perfeitamente, ser o mesmo para duas pessoas dife-
rentes. Contudo, ainda existe a necessidade de proteção a este instituto.

No que tange ao nome25, o Código Civil trouxe quatro artigos especí-


ficos, definindo que todo cidadão tem direito a prenome e sobrenome; que o
emprego do nome não pode ser de cunho difamatório; da necessidade de au-
torização para veiculação de nome em propaganda comercial e, por fim, que
o pseudônimo goza dos mesmos benefícios conferidos ao nome pelo Código.

Em relação à violação do nome, Roxana Borges26 assim refere:

23 MONTEIRO, Arthur Maximus. Direito ao nome da pessoa natural no ordenamento


jurídico brasileiro. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET,
Gustavo Bonato (Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 375-376.
24 MONTEIRO, Arthur Maximus. Direito ao nome da pessoa natural no ordenamento
jurídico brasileiro. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET,
Gustavo Bonato (Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 376.
25 “Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome.
Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou
representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção
difamatória. Art. 18. Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda
comercial. Art. 19. O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se
dá ao nome.”
26 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de personalidade e autonomia privada. 2. ed.
rev. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 222.
33
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

O art. 16 do Código Civil de 2002 atribui a todas as pessoas o direito ao


nome. Constituirá violação a esse direito de personalidade se o nome de
alguém for utilizado para expor a pessoa a desprezo ou a constrangimento,
mesmo estando ela ausente. O art. 17 do Código Civil de 2002 prevê que o
nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou
representações que a exponham ao desprezo público, ainda que não haja
intenção difamatória. Nessas hipóteses, a pessoa atingida em seu direito
de personalidade pode ingressar em juízo visando a proibir o emprego
indevido de seu nome, podendo haver, inclusive, indenização por danos
morais e materiais decorrentes desse emprego indevido.

Quanto aos casos concretos, pode-se referir aqueles em que se busca


a alteração do nome por motivo de violação à dignidade da pessoa, ou ain-
da casos em que o nome é utilizado de forma indevida e sem a autorização
do titular. Contudo, veremos os casos concretos de maneira específica mais
adiante.
Por fim, cabe citar as características do nome, arroladas por Arthur
Maximus Monteiro, sendo elas oponibilidade, inestimabilidade, vinculação
a uma relação familiar, obrigatoriedade, imutabilidade, imprescritibilidade
e indisponibilidade27.

27 O autor assim dispõe: “Como direito de personalidade, suas características são:


1. Oponibilidade: o direito ao nome é oponível erga omnes, na medida em que seu titular
possui o direito de impedir sua usurpação ou utilização indevida por quem quer que
seja. Exclui-se, no entanto, o direito de exclusividade, já que duas pessoas podem
regularmente possuir o mesmo nome, sem que isso implique violação recíproca desse
direito. 2. Inestimabilidade: não possui conteúdo econômico imediato nem apreciável.
3. Vinculação a uma relação familiar: no que toca ao sobrenome e ao nome familiar, haja vista
que ambos derivam de sua ascendência direta. 4. Obrigatoriedade: o indivíduo é obrigado a
ter um nome, a usá-lo como identificação e a abster-se de modificá-lo, salvo nas hipóteses
legais. 5. Imutabilidade: decorrente da característica acima, segundo o qual o nome é, em
princípio imutável. O sujeito, ao ser registrado, manterá essa identificação por toda a
vida, salvo se comprovar a ocorrência de alguma das hipóteses de mudança admitidas,
mediante devido processo legal. 6. Imprescritibilidade: o direito ao nome é imprescritível,
na medida em que nem seu desuso implicará sua perda, nem tampouco o uso prolongado
permitirá sua aquisição. 7. Indisponibilidade: o direito ao nome não pode ser cedido,
transferido, alienado, seja a título gratuito ou oneroso. Trata-se de decorrência lógica das
suas características de obrigatoriedade e de imutabilidade acima expostos” (MONTEIRO,
Arthur Maximus. Direito ao nome da pessoa natural no ordenamento jurídico brasileiro.
In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato
(Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 378-379).
34
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

I.3 A legislação portuguesa e a cláusula geral


Um dos dilemas normativos em relação aos direitos da personalidade
reside na questão da ausência de uma cláusula geral entre os artigos que re-
gem a matéria.
Para Jorge Miranda, Otavio Luiz Rodrigues Junior e Gustavo Bonato
Fruet28 revelam o motivo para existências de um direito geral da persona­
lidade:
A existência de um direito geral de personalidade é defendida sob o funda-
mento de que, dada a variedade de tipos de lesões aos direitos da perso-
nalidade, é necessária a proteção ampla dos indivíduos, por meio de uma
espécie de direito-quadro [...], de caráter aberto, que permita açambarcar
hipóteses não previamente reguladas em tipos legais específicos, algo que
torna ainda mais evidente quando se observam problemas ligados à priva-
cidade e às liberdades comunicativas.

No Código Civil português, por exemplo, existe o art. 70, que faz men-
ção à cláusula geral de personalidade, merecendo aqui sua transcrição:
Art. 70. Tutela geral da personalidade
A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de
ofensa à sua personalidade física ou moral.

No Código brasileiro, as características dos direitos da personalidade,


consoante já referido, são a irrenunciabilidade e a intransmissibilidade. O Có-
digo português, por sua vez, possui como característica o dever determinado
de que qualquer ameaça ao direito de personalidade deve ser concretizado
para ser protegido.
Tal característica facilita consideravelmente a solução de casos em
Portugal, eis que a previsão geral de tutela protege, com mais força, os direi-
tos de personalidade em espécie.
Paulo da Mota Pinto29, reconhecido jurista português, discorre sobre os
direitos de personalidade:

28 MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo Bonato.


Principais problemas dos direitos da personalidade e estado-da-arte da matéria no direito
comparado. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo
Bonato (Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 17.
29 PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria geral do direito civil. 3. ed. atual. Coimbra: Coimbra
Editora, 1999. p. 84.
35
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

O reconhecimento pelo direito civil – ou por qualquer outro – da ideia de


pessoa ou personalidade começa por ser, para além de um princípio nor-
mativo, a aceitação de uma estrutura lógica sem a qual a própria ideia de
Direito não é possível.

Existe divergência na doutrina brasileira se seria necessária a existência


de cláusula geral no nosso sistema jurídico, tendo em vista que aqui vigora o
princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, que, de certa forma,
serviria para a mesma finalidade.
Todavia, Fábio de Andrade30 explica que, se houvesse uma cláusula ge-
ral expressa, a dignidade da pessoa humana poderia ficar resguardada para
casos especiais, onde então seria necessária a aplicação de um princípio tão
relevante dentro do ordenamento jurídico brasileiro.
O art. 12 do Código Civil brasileiro parece compreender uma proteção
geral aos direitos da personalidade, porém, diante de sua falta de expressi-
vidade, existe uma divergência de entendimentos entre os doutrinadores e
operadores do Direito em geral.
Fernanda Borghetti Cantali31 faz menção à importância da cláusula
geral:
O direito geral de personalidade é o único capaz de tutelar adequadamente
a personalidade humana, pois é a única forma de se conferir tutela pers-
pectiva globalizante, abrangendo todos os bens da personalidade, mesmo
os não previstos em lei.

A mesma autora entende, por sua vez, que o art. 12 do Código Civil foi
concebido para ser a cláusula geral de tutela aos direitos da personalidade,
servindo para proteger, de forma mais ampla, os referidos direitos em qual-
quer situação jurídica32.

30 ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Considerações sobre a tutela dos direitos de


personalidade no Código Civil de 2002. In: SARLET, Ingo Wolfgang (Org.). O novo Código
Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 106.
31 CANTALI, Fernanda Borghetti. Direitos da personalidade: disponibilidade relativa,
autonomia privada e dignidade humana. Porto Alegre: 2008. p. 271. Dissertação (Mestrado
em Direito) – Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação – PRPPG. Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, 2008. p. 71.
32 CANTALI, Fernanda Borghetti. Direitos da personalidade: disponibilidade relativa,
autonomia privada e dignidade humana. Porto Alegre: 2008. p. 271. Dissertação (Mestrado
em Direito) – Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação – PRPPG. Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, 2008. p. 86.
36
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

II – A RESPONSABILIDADE CIVIL

Quando se fala em responsabilidade, o que vem à mente são seus ele-


mentos principais: o ato ilícito, o dano e o nexo causal. O art. 927 do Código
Civil33 estabelece que aquele por ato ilícito causar dano a outrem tem o dever
de repará-lo.
Sergio Cavalieri Filho34 assim define a responsabilidade civil:
Sempre se disse que o ato ilícito é uma das fontes da obrigação, mas nunca
a lei indicou qual seria a obrigação. Agora o Código diz – aquele que co-
mete ato ilícito fica obrigado a indenizar. A responsabilidade civil opera a
partir do ato ilícito, com o nascimento da obrigação de indenizar, que tem
por finalidade tornar indemne o lesado, colocar a vítima na situação em que
estaria sem a ocorrência do fato danoso.
[...] À luz do exposto, creio ser possível assentarmos duas premissas que
nos servirão de suporte doutrinário. Primeira: não há responsabilidade, em
qualquer modalidade, sem violação de dever jurídico preexistente, uma
vez que responsabilidade pressupõe o descumprimento de uma obrigação.
Segunda: para se identificar o responsável, é necessário precisar o dever
jurídico violado e quem o descumpriu.

A reparação é a função primordial da responsabilidade civil, que, em


segundo plano, ainda falará em caráter punitivo e dissuasório.
O primeiro, que antigamente era deixado somente a cargo do direito
penal, hoje encontra respaldo na doutrina e jurisprudência, diante de sua
função compensatória, por meio dos danos extrapatrimoniais.
Neste sentido, ensina Eugênio Facchini Neto35:
A função punitiva, presente na antiguidade jurídica, havia sido quase es-
quecida nos termos modernos, após a definitiva demarcação dos espaços
destinados à responsabilidade civil e à responsabilidade penal. A esta

33 “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado
a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de
culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
34 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. 3. reimpr. São Paulo:
Atlas, 2009. p. 3-4.
35 FACCHINI NETO, Eugênio. Da responsabilidade no novo Código. In: SARLET, Ingo
Wolfgang (Org.). O novo Código Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2006. p. 183.
37
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

última estaria confinada a função punitiva. Todavia, quando se passou a


aceitar a compensabilidade dos danos extrapatrimoniais, percebeu-se estar
presente ali também a ideia de uma função punitiva da responsabilidade
civil.

O segundo, por sua vez, tem uma pretensão futura. Busca a não repe-
tição do ato ilícito pelo causador, que, diante da indenização com fins dis­
suasórios, deverá evitar a conduta reprovada.
Na mesma senda, o mesmo autor refere:
Distingue-se esta da anterior por não ter em vista uma conduta passada,
mas por buscar, ao contrário, dissuadir condutas futuras. Ou seja, pelo me-
canismo da responsabilização civil, busca-se sinalizar a todos os cidadãos
sobre quais condutas a evitar, por serem reprováveis do ponto de vista
ético-jurídico. É óbvio que também as funções reparatória e punitiva adim-
plem uma função dissuasória, individual e geral.36

A reparação, por sua vez, tem suas razões explicadas por Maria Alice
Hofmeister37:
Por que se deve reparar um dano causado a outrem? A razão é bem sim-
ples e encontra sua explicação na própria natureza humana. O homem vive
em sociedade e exercita a sua liberdade. Todavia, há que coadunar seus
atos e seus comportamentos com as práticas por outrem. Esta questão da
coexistência humana, põe-se desde o início dos séculos ao direito, não só
em sua forma atual, como nas expressões jurídicas primitivas que o ho-
mem conheceu e vivenciou.

Consoante ensina Clóvis Bevilaqua38, no caso da responsabilidade ci-


vil, deve-se analisar a vítima por trás do ato ilícito e do agente, para que

36 FACCHINI NETO, Eugênio. Da responsabilidade no novo Código. In: SARLET, Ingo


Wolfgang (Org.). O novo Código Civil e a Constituição. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2006. p. 184.
37 HOFMEISTER, Maria Alice Costa. O dano moral na sociedade de risco. Rio de Janeiro:
Renovar, 2002. p. 115.
38 “O direito penal vê, por traz do crime, o criminoso, e o considera um antissocial, que
é preciso adaptar ás condições da vida collectica ou o pol-o em condições de não mais
desenvolver a sua energia perversa em detrimentos dos fins humanos, que a sociedade se
propõe realizar; o direito civil vê, por trás do acto ilícito, não simplesmente o agente, mas,
principalmente, a victima, e vem em soccorro della, afim de, tanto quanto lhe fôr permittido,
restaurar o seu direito violado, conseguindo, assim, o que poderíamos chamar a eurythimia
social reflectida no equilíbrio dos patrimônios e das relações pessoaes, que se formam no
38
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

assim seja possível a compreensão do dano com a consequente restauração


do direito violado.
Por fim, em relação ao quantum indenizatório, Eugênio Facchini Neto
(informação verbal39) diz que o norte se dará pela fixação da jurisprudência,
após a padronização de casos concretos. Alguns critérios são sempre conside-
rados, como, por exemplo, se a revista onde a imagem indevida foi veiculada
é de caráter local, nacional ou internacional.

II.1 Danos à personalidade


Quando se fala em violação de direitos da personalidade, não se pode
falar tão somente na figura do dano moral, eis que, consoante o art. 5º, X, da
CF, está presente também o dano material, dependendo do caso concreto.
Os autores Pablo Gagliano e Rodolfo Pamploma Filho40 fazem uma ex-
celente distinção sobre a identificação dos danos:
[...] podemos concluir que um critério prático de diferenciação entre o dano
patrimonial e o dano moral, além daquele referente à esfera jurídica atingi-
da e às consequências geradas de forma direta pelo evento danoso, reside,
certamente, na forma de reparação.
Tal conclusão se dá pelo fato de que, no dano patrimonial (onde restou
atingido um bem físico, de valor comensurável monetariamente), a reposi-
ção pode ser feita por meio de reposição natural. Essa possibilidade já não
ocorre no dano moral, eis que a honra violada jamais pode ser restituída
à sua situação anterior, porquanto, como já disse certo sábio, as palavras
proferidas são como as flechas lançadas, que não voltam atrás...
A reparação, em tais casos, reside no pagamento de uma soma pecuniária
arbitrada judicialmente, com o objetivo de possibilitar ao lesado uma sa-
tisfação compensatória pelo dano sofrido, atenuando, em parte, as conse­
quências da lesão.

Diante da complexidade do tópico do dano moral, optou-se por focar


na análise deste instituto, levando em conta que o dano material, quando

circulo do direito privado.” (BEVILAQUA, Clovis. Theoria geral no direito civil. Atual. por
Achilles Bevilaqua. 4. ed. Rio de Janeiro: Editora Paulo de Azevedo Ltda., 1949. p. 350)
39 Em entrevista concedida ao programa Justiça Gaúcha em 29.09.2009.
40 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil.
Responsabilidade civil. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, v. III, 2010. p. 92.
39
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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devidamente comprovado nos autos, é forma mais simples de reparação, di-


ferente do dano moral que exige maior análise pelo julgador.
Sobre dano moral, Yussef Said Cahali41 assim refere:
Na realidade, multifacetário o ser anímico, tudo aquilo que molesta gra-
vemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais
inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está
integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há
como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia,
no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no
desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na hu-
milhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da
normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no
desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral.

O dano moral vem consubstanciado pelo art. 5º, V e X, da Constituição


Federal e serve como forma de compensar um tipo de dano que não possui-
ria, em sua natureza, nenhuma forma possível de reparação.
Ultrapassadas questões como a da possibilidade ou não da cumulação
do dano moral com o da material (Súmula nº 37 do STJ), persiste a dificulda-
de em conceituar e quantificar o dano moral.
Sérgio Cavalieri42 explica sobre os danos morais:
Como se vê, hoje o dano moral não mais se restringe à dor, tristeza e so-
frimento, estendendo a sua tutela a todos os bens personalíssimos – os
complexos de ordem ética –, razão pela qual revela-se mais apropriado
chamá-lo de dano imaterial ou não patrimonial, como ocorre no Direito por-
tuguês. Em razão dessa natureza imaterial, o dano moral é insusceptível
de avaliação pecuniária, podendo apenas ser compensado com a obrigação
pecuniária imposta ao causador do dano, sendo esta mais uma satisfação
do que uma indenização.

Fica claro que é da natureza do dano moral ser imaterial, ou seja, é im-
possível sua materialização ou substituição. Toma-se como exemplo o tema

41 CAYALI, Yussef Said. Dano moral. 3. ed. rev. ampl. e atual. conforme o Código Civil de
2002. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 22-23.
42 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8. ed. 3. reimpr. São Paulo:
Atlas, 2009. p. 81.
40
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

deste trabalho. É evidente que não existe como tornar material um dano à
honra ou ao nome.
Retornar ao status quo é um dos objetivos da responsabilidade civil.
Entretanto, quando se trata de dano à personalidade, como, por exemplo,
uma fotografia divulgada indevidamente, não existe meio possível de fazer
com que essa imagem se apague para sempre da mente de todos que a viram.
O instituto do dano moral não serve para retornar ao status quo, mas
sim para dar à vítima do dano uma satisfação, com a qual se procura com-
pensar – ou consolar – pelo sofrimento causado.
O art. 186 do Código Civil brasileiro, dispositivo referente aos atos ilí-
citos, faz menção expressa ao dano moral: “Aquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a ou-
trem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Deste modo, a agressão moral é expressamente reconhecida pelo Direi-
to brasileiro, inclusive de modo in re ipsa, isto é, que desnecessita de compro-
vação efetiva do dano para ser considerado indenizável, bastando a demons-
tração da ocorrência do fato.
No caso supracitado, cita-se um exemplo comum na rotina do Poder
Judiciário: o cadastro indevido nos órgãos de restrição de crédito. Com o ca-
dastro indevido, a violação ao direito nome fica evidente e o dano moral é
pacificamente43 considerado in re ipsa.

II.2 A dignidade da pessoa humana como fundamento nas


decisões de violação dos direitos da personalidade
O princípio da dignidade da pessoa humana vem disposto no primeiro
artigo da Constituição Federal de 1988, em seu inciso III.

43 “Apelação cível. Responsabilidade civil. Ação declaratória de inexistência de débito c/c


indenização por danos morais. Inscrição indevida. Dano moral in re ipsa. Fraude. Ausência
de zelo e prudência quando da contratação. Dever de indenizar da ré. Se a ré se beneficia
com sua atividade, sem ter os cuidados necessários, deve ela responder pelos riscos daí
advindos, configurando-se responsabilidade pelo fato do serviço, prevista no art. 14 do
Código de Defesa do Consumidor, aplicável ao caso por se tratar de relação de consumo.
Valor indenizatório fixado abaixo dos parâmetros estabelecidos por esta Câmara em
casos análogos, devendo ser mantido por ausência de recurso da parte autora. Apelo
desprovido, de plano.” (TJRS, AC 70054440565, 9ª C.Cív., Rel. Eugênio Facchini Neto,
J. 04.06.2013)
41
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Doutrina Civil
Agosto/2014

Por mais complicada que seja a conceituação de dignidade humana


– consoante doutrina majoritária –, optamos por transcrever a explicação tra-
zida por Ingo Sarlet44:
Assim sendo, temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrín-
seca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor
do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade,
implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamen-
tais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho
degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existen-
ciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua
participação ativa e corresponsável nos destinos da própria existência e da
vida em comunhão com os demais seres humanos.

Com a evolução história, o princípio da dignidade da pessoa humana


passa a expandir cada vez mais sua área de atuação. Justifica-se, tendo em
vista que tal princípio vai muito além de sua normatividade, alcançando o
patamar de cláusula inviolável dentro da Constituição Federal, merecendo
cada vez mais proteção jurídica.
Roxana Borges45 discorre sobre o tema:
Uma vez que a dignidade humana é inserida no ordenamento por meio
do art. 1º, III, da Constituição, o valor da dignidade da pessoa humana
torna-se, explicitamente, um princípio, uma norma de dever-ser, com ca-
ráter jurídico e vinculante, não podendo mais ser considerado apenas um
valor cujo caráter seria somente axiológico. Embora os valores emanem a
todo momento do ordenamento jurídico, quando um desses valores é juri-
dicizado e transformado em princípio, sua força vinculante é maior e sua
carga axiológica passa a ter caráter obrigatório, constitui-se norma, tendo,
portanto, caráter deontológico, e, por estar no ordenamento jurídico como
princípio fundamental, vincula todas as esferas jurídicas.

No caso dos direitos da personalidade, a dignidade da pessoa humana


tem sido utilizada como forma de preencher as lacunas existentes na legis-
lação. Sem uma cláusula geral46 expressa no Brasil, alguns julgadores encon-

44 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição


de 1988. 6. ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 63.
45 BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de personalidade e autonomia privada. 2. ed.
rev. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 15.
46 “As noções sobre um ‘direito geral de personalidade’, ou de uma tutela geral, como
pretendem outros, bem assim sua vinculação estrita à dignidade humana, devem
42
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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tram dificuldades em encontrar solução para determinados casos em que os


direitos da personalidade são violados.
Desta forma, não há alternativa senão a da aplicação do princípio da
dignidade humana, que possui, em sua essência, a busca pela proteção do
ser humano que se encontre em situação de violação de seus direitos funda-
mentais.
Conforme acima referido, ainda existe grande preocupação da doutri-
na e da jurisprudência no que diz respeito ao desenvolvimento de um concei-
to da dignidade da pessoa humana. Porém, diante de sua evidente subjetivi-
dade, ainda fica na mãos dos julgadores a aplicação de tal princípio frente às
circunstâncias dos casos concretos.
Dennis Lacerda47 também relata a condição especial que o princípio da
dignidade possui frente aos direitos da personalidade:
Essa perspectiva principiológica da dignidade humana serve de substrato
normativo e axiológico de todos os demais direitos não patrimoniais, como
os direitos de personalidade. [...]
É nessa linha que a vida deixa de ser apenas o primeiro e mais fundamental
direito tutelado pelo ordenamento jurídico para se tornar condição especial
de outros direitos. Desenvolve-se aí a concepção da supremacia da vida
humana e que, para ser entendida como vida, necessariamente deve ser
digna.

Embora tal princípio deva, em um primeiro momento, ser utilizado


tão somente para dirimir questões de alta complexidade, diante da ausência
expressa na legislação de cláusula geral para tutelar os direitos da persona-
lidade, os julgadores têm aplicado a dignidade da pessoa humana como se
cláusula geral fosse.

ser examinadas sem grandes apelos retóricos, o que, infelizmente, tem sido comum.
Tomando-se como base a jurisprudência e a dogmática da Alemanha, fonte de inspiração
do desenvolvimento da doutrina dos direitos da personalidade, é correto dizer que a
dignidade humana é inviolável e que a todos os poderes estatais impõe sua proteção (1,
I e 1, I 2, GG).” (MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET, Gustavo
Bonato. Principais problemas dos direitos da personalidade e estado-da-arte da matéria
no direito comparado. In: MIRANDA, Jorge; RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz; FRUET,
Gustavo Bonato (Org.). Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2012. p. 20)
47 LACERDA, Dennis Otte. Direitos de personalidade na contemporaneidade: a repactuação
semântica. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2010. p. 91.
43
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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Neste sentido, Fernanda Borghetti Cantali48 afirma:


Com efeito, não há como refutar o reconhecimento e a consagração de uma
tutela geral de personalidade por meio do princípio da dignidade da pes-
soa humana, o qual consiste em uma cláusula geral de concreção da prote-
ção e do livre desenvolvimento da personalidade.

A Constituição de 1988 decretou a dignidade da pessoa humana como


um dos fundamentos máximos da República, demonstrando a intenção em
valorar a pessoa acima de todo e qualquer princípio. É fato que, quando se
fala em direito da personalidade, tal princípio serve, inegavelmente, como
base para as decisões sobre o tema.

II.3 Análise de casos concretos


Após a compreensão de conceitos iniciais sobre a matéria, cabível a
análise de casos concretos para a visualização de como os tribunais vêm apli-
cando o Direito no que tange à violação de direitos da personalidade.
Conforme reflete Maria Alice Hofmeister49:
É possível estimar o inestimável? Como calcular o incalculável, eis o de-
safio que se põe insistentemente aos nossos tribunais. A questão se coloca
aos magistrados da seara da responsabilidade civil, aos quais cabe reduzir
a um denominador comum monetário os diversos prejuízos sofridos pelo
homem.
A justiça fixa preço a tudo: à honra ultrajada, ao sofrimento físico ou moral,
às lesões diversas devidas a ferimentos ou moléstias.

Diante disto, decidiu-se por analisar um caso referente a cada direito


da personalidade em espécie, dando início pelo direito à honra:
Direito civil e processual civil. Danos morais. Lei de Imprensa. Publicação
de escrito contendo a expressão “corrupto desvairado”, ofensiva à honra sub-
jetiva. Recurso especial improvido. 1. Não há negativa de jurisdição ante a
fundamentação suficiente do acórdão recorrido, pois a jurisprudência desta

48 CANTALI, Fernanda Borghetti. Direitos da personalidade: disponibilidade relativa,


autonomia privada e dignidade humana. Porto Alegre: 2008. p. 271. Dissertação (Mestrado
em Direito) – Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação – PRPPG. Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, 2008. p. 79.
49 HOFMEISTER, Maria Alice Costa. O dano moral na sociedade de risco. Rio de Janeiro:
Renovar, 2002. p. 194.
44
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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Casa é pacífica ao proclamar que, se os fundamentos adotados bastam para


justificar o concluído na decisão, o julgador não está obrigado a rebater, um
a um, os argumentos utilizados pela parte. 2. Não se acolhe alegação re-
cursal de violação dos dispositivos da Lei de Imprensa, porque o Supremo
Tribunal Federal, ao julgar a ADPF 130 (Rel. Min. Ayres Bitto), já firmou
que todo o conjunto dessa lei não foi recepcionado pela Constituição Fede-
ral de 1988, de maneira que esse fundamento do recurso deixou de existir
no ordenamento jurídico, não havendo em aludido julgamento, ademais,
modulação temporal de efeitos. 3. Tendo o recurso sido interposto antes
do julgamento do col. Supremo Tribunal Federal, é recomendável o apro-
veitamento de argumentos (REsp 945.461/MT, Relª Min. Nancy Andrighi)
expostos, admitido o pré-questionamento implícito, enfocando-se, pois,
fundamentos deduzidos no debate do caso desde a inicial. 4. A expressão
“corrupto desvairado”, lançada em artigo jornalístico, configura ofensa à honra,
por constituir, tecnicamente, injúria – figura jurídica diante da qual inadmis-
sível exceção de verdade, causando, portanto, dano moral e indenização.
5. No caso, em que matéria jornalística imputa a ex-Presidente da República a
qualificação de “político desvairado” não se revela excessiva, a condenação
ao valor de R$ 60.000,00, de modo que não pode ser acolhido o recurso que
visa à redução do valor (tendo, ao contrário, sido o valor considerado insu-
ficiente no julgamento, em conjunto do Recurso Especial nº 1.120.971/RJ).
6. Recurso especial improvido. (REsp 1068824/RJ, 2008/0136124-7, 3ª T.,
Rel. Min. Sidnei Beneti (1137), DJ 28.02.2012 – grifos nossos)

No caso em apreço, o autor da ação – o ex-Presidente Fernando Collor


– foi chamado de “corrupto desvairado” no corpo de matéria jornalística de
periódico.
O objetivo do periódico era realizar uma comparação entre os gover-
nos de Lula e Collor, e, no decorrer dessa comparação, acabaram por injuriar
o ex-presidente, chamando-o de corrupto desvairado. O STJ considerou ofen-
sa à honra subjetiva do hoje senador da República, condenando a empresa a
danos morais.
Na indenização, os ministros entenderam que o caráter não era somen-
te reparatório ao dano íntimo, mas também dissuasório, devido ao grau de
ofensa proferido por revista de grande circulação nacional e internacional a
pessoa pública que integra o corpo político do País.
A próxima decisão objeto de análise é sobre o direito de imagem:
Civil e processual civil. Recurso especial. Ação de reparação por dano mate-
rial e compensação por dano moral. Prequestionamento. Ausência. Súmula
45
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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nº 282/STF. Reexame de fatos e provas. Inadmissibilidade. Uso indevido de


imagem. Fins comerciais. Atriz de teatro e televisão. Veiculação em âmbito
nacional. Prejuízo. Desnecessidade de demonstração. Dano moral in re ipsa.
1. O Tribunal de origem não discutiu a questão relativa ao montante fixado
para reparação dos danos materiais, o que impede o exame da matéria por
esta Corte. 2. A análise dos pressupostos necessários ao reconhecimento da
litigância de má-fé, bem como acerca da comprovação do prejuízo material
experimentado pela autora, demandam o reexame de fatos e provas, o que
é inadmissível em recurso especial (incidência da Súmula nº 7/STJ). Pre-
cedentes. 3. O acórdão recorrido, com base no substrato fático-probatório
dos autos, concluiu que houve exposição da imagem da recorrente em âmbito na-
cional, sem prévia autorização desta, com fins exclusivamente econômicos e
publicitários, em razão de campanha promovida pelo recorrido e veicula-
da em revista de grande tiragem e circulação e em outdoors espalhados
pelo país. 4. Na hipótese, não é necessária a comprovação de prejuízo para
configuração do dano moral, pois este decorre da própria violação do direito de
imagem titulado pela recorrente – dano in re ipsa. Entendimento consagrado
na Súmula nº 403/STJ. 5. Restabelecimento do valor da condenação fixado
pelo juiz de primeiro grau. Para o arbitramento do montante devido, o jul-
gador deve fazer uso de sua experiência e do bom senso, atento à realidade
da vida e às peculiaridades da hipótese em discussão, bem como ao porte
econômico do causador e ao nível socioeconômico da vítima. 6. Recurso
especial do réu não provido. Recurso especial da autora parcialmente pro-
vido. (REsp 1102756/SP, 2008/0272939-4, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi
(1118), DJ 20.112012 – grifos nossos)

No caso acima, a autora da ação – atriz global – ingressou com ação de


reparação de danos materiais e morais em desfavor de revista que veiculou
sua imagem para fins econômicos e publicitários sem sua autorização.
O STJ entendeu que se tratava de dano in re ipsa em que a comprovação
do prejuízo é desnecessária diante do tipo de dano que fora violado, isto é,
dano a direito da personalidade.
Por outro lado, segue arresto de decisão na qual o STJ entendeu não
existir violação ao direito à privacidade e ao direito de imagem:
Direito civil. Direito de imagem. Topless praticado em cenário público. Não
se pode cometer o delírio de, em nome do direito de privacidade, estabele-
cer-se uma redoma protetora em torno de uma pessoa para torná-la imune
de qualquer veiculação atinente a sua imagem. Se a demandante expõe sua
imagem em cenário público, não é ilícita ou indevida sua reprodução pela impren-
sa, uma vez que a proteção à privacidade encontra limite na própria exposição rea-
46
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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lizada. Recurso especial não conhecido. (REsp 595600/SC, 2003/0177033-2,


4ª T., Rel. Min. Cesar Asfor Rocha (1098), DJ 18.03.2004 – grifos nossos)

Fica claro, pela decisão do STJ, que, quando se trata de exposição vo-
luntária, não há de se falar em dano à imagem ou à privacidade, vez que tal
privacidade encontra seus limites na forma com que o titular do direito a
utiliza.
Por fim, no que diz respeito ao direito ao nome, segue decisão do STJ:
Civil. Dano moral. Utilização indevida do nome da recorrente em um sis-
tema de fraudes da qual não participou. Indenização devida. Recurso pro-
vido. 1. A jurisprudência desta Corte é farta de precedentes que negam
indenização por dano moral nas hipóteses em que o fato alegado pela parte
representa, segundo as regras de experiência, um mero dissabor inerente à
vida em sociedade. 2. Os limites entre o mero dissabor e o dano moral in-
denizável deve ser apurado mediante regras de experiência, pelo julgador.
3. A vinculação do nome da recorrente em um sistema de fraudes praticado na
Prefeitura Municipal de Ribeirão das Neves, sem a sua ciência, não pode
ser considerado um dissabor cotidiano. Trata-se de uma situação inusitada
e claramente passível de causar abalo psíquico. 4. É natural que uma pessoa
inocente que tenha seu nome vinculado a investigações administrativas, sendo
inclusive convocada a prestar esclarecimentos, sofra com a insegurança a
respeito do resultado da investigação. Até a confirmação de sua inocência,
um cidadão comum teria sido colhido por significativa aflição e angústia,
causadas pelo medo de ser responsabilizado por algo que não fez. Dian-
te de tal quadro, a existência de dano moral subjetivo é inegável. 5. Há
precedentes no âmbito desta Corte que reconhecem a existência de dano
moral in re ipsa para hipóteses de inscrição do nome de um consumidor em
cadastros de inadimplentes, ou em hipóteses de protesto indevido, ou seja,
em hipóteses de violação de direitos da personalidade. Tendo em vista, é razoá­
vel estender a mesma interpretação a todas as violações dessa natureza,
considerando que a ofensa a qualquer direito de personalidade provoque
um dano moral in re ipsa. 6. Recurso especial provido para restabelecimen-
to da sentença. (REsp 955031/MG, 2007/0119157-0, 3ª T., Relª Min. Nancy
Andrighi (1118), DJ 20.03.2012 – grifos nossos)

Quando se fala em utilização indevida do nome, ainda mais como no


caso supracitado, em que a veiculação foi realizada a um sistema de fraude
da qual ela não havia participado, há violação de direito da personalidade.
No evento em tela, o banco – réu da ação – acabou criando contas ban-
cárias sem autorização dos titulares, funcionários da mesma instituição. O
47
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais modificou a decisão procedente de pri-


meiro grau, entendendo que, diante da não ocorrência de lesão concreta, o
dano inexiste.
O STJ, por sua vez, entendeu que, mesmo não tendo ocorrido prejuí­
zo patrimonial às vítimas, elas acabaram sendo vinculadas a processos de
investigação administrativa e judicial, gerando-lhes incômodo que foge do
habitual. O Tribunal Superior entendeu ainda que, se no caso de cadastro
indevido do nome em órgãos de restrição de crédito incide o dano moral, da
mesma forma neste episódio o nome dos autores foi vinculado de maneira
ilícita, gerando indenização.

CONCLUSÃO

Os direitos da personalidade são ainda uma novidade dentro do orde-


namento jurídico brasileiro, por isso ainda existem inúmeras complementa-
ções a serem feitas na legislação existente. A importância da matéria é ineren-
te ao próprio tema central, ou seja, a personalidade.
Afora a questão do dano material, que prescinde de comprovação nos
autos, a forma mais comum de reparar os danos causados a direitos da per-
sonalidade é, sem dúvidas, o instituto do dano moral, tendo em vista que ele
busca, mesmo que parcialmente, possibilitar ao lesado uma satisfação, ou,
ainda, uma compensação pelo dano sofrido.
Embora nos dias de hoje exista inegável banalização do referido insti-
tuto, ainda é a forma mais procurada como forma de valorar um dano. Pa-
rece-nos delicado mensurar determinados danos, e é exatamente por essa
dificuldade que o dano moral passou a integrar o ordenamento jurídico.

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Doutrina Civil
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2013.
VAZ, Caroline. Funções da responsabilidade civil: da reparação à punição e dissuasão:
os punitive damages no direito comparado e brasileiro. Porto Alegre: Livraria do
Advogado.
Análise Interdisciplinar da Síndrome
da Alienação Parental: Aspectos
Jurídicos e Psicológicos
A lice da R ocha S ilveiro
Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica
do Rio Grande do Sul – PUCRS, Advogada e Associada ao
Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFam).

RESUMO: O presente trabalho faz um breve exame das transfor-


mações ocorridas na sociedade, a partir da Constituição Federal de
1988, que trouxe mudanças no campo das relações familiares, esta-
belecendo a igualdade entre homens e mulheres, e a consagração
dos princípios da dignidade da pessoa humana, afetividade, solida-
riedade e, especialmente, o princípio do melhor interesse da crian-
ça. A partir daí a criança passou a ser reconhecida como sujeito de
Direito que merece especial proteção do Estado. Tendo em vista essa

Parecer Jurídico
realidade, foi efetivada, em 2010, a Lei nº 12.318, que cuida da prote-
ção das crianças em face de maus-tratos, pressões psicológicas, entre
outros aspectos que as prejudiquem. Ainda, simultaneamente a esta
realidade atual, a preferência legal passou a recair pelo compartilha-
mento da guarda dos filhos. Assim, o escopo deste trabalho abrange
aspectos jurídicos e psicológicos da síndrome da alienação parental
(SAP), com foco nas consequências geradas nas crianças e nas medi-
das a serem tomadas quando identificada a prática da SAP por um
dos genitores, analisando qual o melhor tipo de guarda diante desta
situação.
PALAVRAS-CHAVE: Superior interesse da criança; síndrome da
alienação parental; divórcios judiciais; guarda compartilhada; con-
sequências psicológicas.
ABSTRACT: This paper gives a brief examination of the changes that
are occurring in society, from the Federal Constitution of 1988 which
brought changes in the field of family relationships, establishing
equality between men and women, and the consecration of the
principles of human dignity, affection, solidarity and, especially, the
principle of the best interests of the child. Thenceforward, children
are recognized as a subject of civil rights that deserves special
protection of the State. Given this reality, it was enacted in 2010 the
Law nº 12.318 which handled the protection of children in face of

51
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

bad-treatments, psychological pressures, among other aspects that


might harm them. Moreover, simultaneously to this current reality,
the legal preference began to go toward joint custody. Thus, the
scope of this work covers legal and psychological aspects of Parental
Alienation Syndrome (PAS), focusing on the consequences generated
in children and the measures to be taken when the practice of PAS
is identified by a parent, analyzing which is the best type of custody
in that situation.
KEYWORDS: Best interests of the child; parental alienation syndro-
me; contentious divorce cases; joint custody; psychological conse-
quences.
SUMÁRIO: Introdução; 1 Panorama histórico das alterações da fa-
mília e os princípios na família; 2 A síndrome da alienação parental:
conceito e legislação; 3 A guarda compartilhada como forma de re-
dução da incidência de síndrome de alienação parental; 4 Aspectos
psicológicos: reações e comportamentos do alienado e do alienador;
Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

O presente estudo trata dos aspectos jurídicos e psicológicos da síndro-


me da alienação parental (SAP), que, apesar de não ser um fenômeno novo,
tanto no campo médico como no campo jurídico, veio a ser regulamentada
somente em 27.08.2010 por meio da Lei nº 12.318.
No sistema jurídico brasileiro, a difusão de discursos sobre a síndrome
da alienação parental se deu, sobretudo, por meio de associações e movimen-
tos sociais de pais separados, sendo depois incorporada às reivindicações de
pais militantes e aos discursos de profissionais que atuam no Judiciário. As-
sim, a SAP vem se tornando o núcleo dos debates quando o assunto é litígio
conjugal e guarda dos filhos.
A alienação parental ou síndrome da alienação parental ocorre, fun-
damentalmente, quando a criança ou o adolescente é utilizado por um dos
genitores como instrumento de agressividade, sendo induzido, por meio de
diversas maneiras, a odiar o outro genitor ou parente próximo. Uma dificul-
dade no caso é o reconhecimento de sua efetiva ocorrência face à possibili-
dade de consistir apenas em embuste ou exagero do outro cônjuge. Como
segundo passo, surge o questionamento quanto à melhor guarda a ser atri-
buída em benefício ao menor, visando sempre o seu melhor interesse. Daí a
importância de serem estudadas as reações e os comportamentos dos perso-
nagens envolvidos na SAP.
52
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Salienta-se que a criança, mesmo após o término da relação amoro-


sa dos pais, necessita continuar tendo convívio com ambos, pois o exercício
do poder familiar em nada se altera com a separação/divórcio1. Com a Lei
nº 11.698/2008, promoveu-se alteração no Código Civil e a preferência da
guarda mudou da unilateral para a compartilhada.
No presente pesquisa, será traçado um panorama histórico das alte-
rações da família e procurará definir os contornos da síndrome da aliena-
ção parental, analisando a Lei nº 12.318/2010, que veio para regulamentá-la.
Busca-se também o enfoque na guarda, sobretudo na espécie de guarda com-
partilhada, como forma da redução da incidência da SAP. Por fim, a pesquisa
pretende examinar as potenciais consequências da SAP, explorando as rea-
ções comportamentais das vítimas da alienação e do genitor alienado.
A pesquisa visa a contribuir para uma maior compreensão do assunto,
de forma com que todos possam ter ciência do potencial mal que a alienação
parental ou síndrome da alienação traz especialmente às crianças.

1 PANORAMA HISTÓRICO DAS ALTERAÇÕES DA FAMÍLIA E OS


PRINCÍPIOS NA FAMÍLIA

A família tem o seu elemento constitutivo na religião, com deuses ocul-


tos e domésticos2. É fato certo e comprovado, pelos registros históricos, pela
literatura, pela Bíblia e pelos fragmentos jurídicos, que a família ocidental vi-
veu um largo período sobre a forma patriarcal, que veio de crenças passadas
relativa aos mortos e dos cultos que lhes eram devidos3.
Nesta antiga Lei da Família, tanto na Grécia como em Roma, o genitor
poderia dispor como quisesse do seu filho, podendo inclusive matá-lo ou
vendê-lo. Enquanto o pai vivesse, o filho era considerado sempre menor, es-
tando submetido a sua autoridade4.
A partir do século IV, com o Imperador Constantino, instalou-se no
Direito romano a concepção cristã da família na qual as preocupações de or-

1 FREITAS, Douglas Phillips; PELLIZZARO, Graciela. Alienação parental: comentários à Lei


nº 12.318/2010. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 86.
2 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito de família. Rio de Janeiro:
Forense, v. 5, 2004. p. 25.
3 COULANGES, Fustel de. Cidade antiga. Coleção Obra-Prima de Cada Autor – Serie Ouro.
São Paulo: Martin Claret, 2001. p. 52.
4 Id., p. 95.
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dem moral predominavam, sob a inspiração do espírito de caridade, tendo


como influência o Direito germânico5. Nesta época, os pais exerciam o poder
familiar mais como dever do que como direito6.
Em meados do século XVIII, com o início da Revolução Industrial, hou-
ve um súbito enxugamento da família, que migrou do campo para os grandes
centros industriais. Com essa migração, apesar das mulheres começarem a
ser chamadas para o mercado de trabalho, o cuidado dos filhos ainda cabia
a elas, de modo que restava aos pais a figura de provedor. Neste contexto, as
mães que passaram a achar que eram donas dos filhos7.
Neste contexto, tendo sido fortemente influenciada pelo Direito roma-
no, a legislação brasileira outorgou ao marido a incumbência de chefiar a fa-
mília, imprimindo-lhe a feição patriarcal. À mulher cabia a importante tarefa
de procriar e cuidar dos filhos8.
Com o Código Civil de 1916, como o casamento não se dissolvia, ocor-
rendo o desquite, os filhos menores geralmente ficavam com o cônjuge ino-
cente. Se ambos os pais eram culpados pela separação, os filhos menores
podiam ficar com a mãe (se o juiz verificasse que não acarretaria prejuízo
de ordem moral a eles)9. Essas regras evidentemente deixavam de priorizar
os interesses da criança. Entretanto, com as mudanças sociais, econômicas e
políticas, a Lei Civil de 1916 foi sofrendo alterações, sendo, então, criado o
Código Civil de 2002, até então em vigor10.
Essa família foi aos poucos, em passos lentos, sendo modificada, dei-
xando para trás aquele modelo antigo patriarcal baseado originalmente na
religião e na culpa, e dando espaço aos direitos das mulheres, e a igualdade
dos seus membros. A expressão “poder familiar” veio como substituição da

5 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito de família. Rio de Janeiro:
Forense, v. 5, 2004. p. 29.
6 Id., p. 30.
7 BRUNO, Denise Duarte. A importância da equipe multidisciplinar na investigação da
alienação parental. I Congresso de Alienação Parental, Porto Alegre, 27 abr. 2012. 14pm.
8 RODRIGUES, Lia Palazzo. Algumas considerações sobre o direito de família no novo
Código Civil e seus reflexos no regime supletivo de bens. In: WELTER, Belmiro Pedro;
MADALENO, Rolf Hanssen (Coord.). Direitos fundamentais do direito de família. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 190.
9 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011. p. 439.
10 CORRÊA, Marise Soares. A história e o discurso da lei: o discurso antecede a história.
Revista de Estudos Criminais, Porto Alegre: Fonte do Direito, v. 18, p. 237-243, 2005.
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arcaica denominação “pátrio poder”, e as mulheres passaram a ter atividade


profissional intensa, enquanto os homens passaram a participar mais do co-
tidiano doméstico.
Assim, com as transformações ocorridas na sociedade, a Constituição
Federal de 1988 adotou uma nova ordem no campo das relações familiares,
estabelecendo a igualdade entre homens e mulheres11, e consagrando os prin-
cípios da dignidade da pessoa humana12, afetividade, solidariedade e, sobre-
tudo, o princípio do melhor interesse da criança.
Com a Norma Constitucional e, posteriormente, em 1990, com Lei
nº 8.069 (ECA), a criança passa a ser reconhecida como um sujeito de direito
que merece especial proteção do Estado, passando-se a existir a doutrina da
proteção integral. A infância é reconhecida como fase especial do processo de
desenvolvimento, e a prioridade absoluta a esta parcela da população passa
a ser princípio constitucional com o art. 22713 da citada Carta14.
Outrossim, dita o art. 229 da Carta Magna que têm os pais o dever de
assistir, criar e educar os filhos menores, em uma visível percepção de consti-
tucionalização do Direito de Família e de atenção aos princípios de proteção
integral e do melhor interesse da criança.
Passando-se para o cenário internacional, com a Declaração de
Genebra, em 1924, afirmou-se a necessidade de proclamar a criança uma pro-

11 Entretanto, por mais que se fale numa igualdade absoluta entre os membros de uma
família, a plena igualdade entre seus membros não se faz presente, conservando-se rasgos
do antigo modelo patriarcal (ESTROUGO, Mônica Guazzelli. O princípio da igualdade
aplicado à família. In: WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen (Coord.).
Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 329).
12 Com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e assegurando prioridade
absoluta à infância e adolescência, não há mais como separar o Direito de Família do
Direito da Criança e do Adolescente (AZAMBUJA, Maria Regina Fay de. A criança
no novo direito de família. In: WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen
(Coord.). Direitos fundamentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2004. p. 288).
13 “Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e
ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
14 AZAMBUJA, Maria Regina Fay de. A criança, o adolescente: aspectos históricos, p. 3/5.
Disponível em: <http:www.mp.rs.gov.br/infancia/doutrina/id615.htm>. Acesso em:
16 abr. 2012.
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teção especial15. Em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos do Ho-


mem aprovada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, foi proclamado o
direito a cuidados e à assistência especial à infância16. Em 1959, tem-se a De-
claração dos Direitos das Crianças, dando-se ao infante especial proteção17.
Em 1989, sobreveio a Convenção sobre os Direitos da Criança, apro-
vada na Resolução nº 44/25 da Assembleia-Geral das Nações Unidas18, que
visa à proteção de crianças e adolescentes. Segundo o seu art. 3º, I19, todas as
decisões relativas a crianças, adotadas por instituições públicas ou privadas
de proteção social, por Tribunais, autoridades administrativas ou órgãos le-
gislativos, terão que levar em conta, imperiosamente, o interesse superior
da criança. A mencionada Convenção foi ratificada pelo Brasil em 1990, por
meio do Decreto nº 99.710/199020.
A infância inquestionavelmente deve ser efetivamente considerada de
alta prioridade, sendo universalmente salvaguardados os seus direitos fun-
damentais.

2 A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL: CONCEITO E


LEGISLAÇÃO

É indiscutível ser fundamental para o desenvolvimento de uma crian-


ça ter um bom convívio com ambos os genitores, assim como com outros
parentes próximos ou pessoas com que tenha grande relação afetiva21. Logo,
é fundamental que ambos os genitores contribuam juntos para a criação dos

15 CONVENÇÃO sobre os Direitos da Criança. Direitos da criança. Disponível em: <http://


www.apfn.com.pt/declaracao_universal_dos_direitos_da_crianca.htm>. Acesso em: 24
mar. 2012.
16 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 9. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. p. 46.
17 MADALENO, Rolf. Curso de direito de família. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 52.
18 CONVENÇÃO sobre os Direitos da Criança. Disponível em: <http://www.unicef.org/
brazil/pt/resources_10120.htm>. Acesso em: 5 abr. 2012.
19 Art. 3.1: “Todas as decisões relativas a crianças, adotadas por instituições públicas ou
privadas de proteção social, por tribunais, autoridades administrativas ou órgãos
legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança”.
20 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. Direito de família. Rio de Janeiro:
Forense, v. 5, 2004. p. 45.
21 MADALENO, Rolf Hanssen. A guarda compartilhada pela ótica dos direitos fundamen­
tais. In: WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen (Coord.). Direitos funda-
mentais do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 347.
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seus filhos. Primeiro, em razão dos dispositivos de lei (art. 1.63222 e art. 1.57923
do CCB), e, segundo, em termos afetivos, pois a presença de ambos os pais na
formação dos filhos é indispensável24.
A síndrome da alienação parental (SAP)25 também é chamada de im-
plantação de falsas memórias, e surge maiormente quando, na ruptura da
vida conjugal, nasce um desejo de vingança por parte de um dos genitores
para com o outro26, que desencadeia em um processo de destruição, desmora-
lização e descrédito do ex-parceiro, sendo, para isso, utilizada a criança como
mera ferramenta27-28. Isso se dá de diversas formas, que podem ser conscien-
tes ou inconscientes29.
Segundo o Advogado cearense Marcos Duarte, cardeal característica
desse comportamento é a lavagem cerebral no menor para que atinja uma
hostilidade em relação ao pai ou a mãe. O menor se transforma no defensor
abnegado de um dos genitores, repetindo as mesmas palavras aprendidas do
próprio discurso do alienador contra o “inimigo”. O filho passa a acreditar
que foi abandonado e passa a compartilhar ódios e ressentimentos com o
alienador30.

22 Art. 1.632 do CCB: “A separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não
alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de
terem em sua companhia os segundos”.
Art. 1.579 do CCB: “O divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação
aos filhos”.
23 “Art. 1.579. O divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos.”
24 SOUZA, Raquel Pacheco Ribeiro de. A tirania do guardião. In: Síndrome da alienação
parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela
Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 9.
25 Tribunal de Justiça de São Paulo, AI 0060567-22.2008.8.26.0000, 8ª CDP., Rel. Des. Caetano
Lagrasta, J. 17.06.2009, DJe 25.06.2009. Outro número: 6018404000.
26 Esse genitor pode ser tanto o guardião, como o não guardião. Pode ser ainda a família
ampliada (BRUNO, Denise Duarte. A importância da equipe multidisciplinar na
investigação da alienação parental. I Congresso de Alienação Parental, Porto Alegre, 27 abr.
2012. 14pm.
27 FREITAS, Douglas Phillips; PELLIZZARO, Graciela. Alienação parental: comentários à Lei
nº 12.318/2010. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 17.
28 Também nesta linha: BRUNO, Denise Duarte. A importância da equipe multidisciplinar
na investigação da alienação parental. I Congresso de Alienação Parental, Porto Alegre, 27
abr. 2012. 14pm.
29 SIMÃO, Rosana Barbosa Ciprino. Soluções judiciais contra a perniciosa prática da
alienação parental. In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos
psicológicos, sociais e jurídicos. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 14.
30 DUARTE, Marcos. Alienação parental: restituição internacional de crianças e abuso do
direito de guarda. 1. ed. Fortaleza: Leis & Letras, 2010. p. 114.
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A alienação ocorre muitas vezes porque um dos pais cria empecilhos


ao convívio dos filhos com o outro genitor, favorecendo um distanciamento
que, com o passar do tempo, gera um fosso intransponível entre eles. Outras
vezes porque os próprios pais parecem se demitir da função parental, agindo
como se fossem desprezíveis e inúteis, aceitando como verdadeiro o mito de
que as mulheres sempre são privilegiadas quando o assunto é a guarda dos
filhos31. Termina que o genitor alienador lança nos filhos as suas próprias
frustrações no que se refere ao insucesso conjugal32. Destaca-se que, no meio
disso tudo, até a assertiva de abuso sexual33 pode poder utilizada34.
Apesar da regulamentação recente para este tema no Brasil, a SAP não
é um fenômeno novo, tendo sido reconhecida por diversos países35, sendo
primeiramente nos Estados Unidos, em 1985, por professor especialista do
Departamento de Psiquiatria Infantil da Universidade de Columbia, chama-
do Richard A. Gardner36.
Em 27 de agosto 2010, enfim, surgiu no sistema jurídico brasileiro uma
lei para regulamentar a alienação parental (Lei nº 12.318), a qual se encar-
regou de cuidar da proteção das crianças em face de maus-tratos, pressões
psicológicas, entre outros aspectos que as prejudiquem, tanto quanto a saúde
mental e psicológica.
O art. 2º da Lei sobre Alienação Parental conceitua:
Art. 2º Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação
psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um
dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob

31 SOUZA, Raquel Pacheco Ribeiro de. A tirania do guardião. In: Síndrome da alienação
parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela
Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 8.
32 SIMÃO, Rosana Barbosa Ciprino. Soluções judiciais contra a perniciosa prática da alienação
parental. In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos,
sociais e jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre:
Equilíbrio, 2008. p. 14.
33 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011. p. 463.
34 TJRS, AI 70043405950, 7ª Câmara Cível, Rel. Des. André Luiz Planella Villarinho,
J. 14.12.2011; TJRS, AI 70042944835, 8ª Câmara Cível, Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos,
J. 14.07.2011.
35 FREITAS, Douglas Phillips. Alienação parental: comentários à Lei nº 12.318/2010. Rio de
Janeiro: Forense, 2010. p. 19.
36 FREITAS, Douglas Phillips; PELLIZZARO, Graciela. Alienação parental: comentários à Lei
nº 12.318/2010. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 17.
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a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que


cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

O parágrafo único do mesmo artigo expressa, de maneira exemplifica-


tiva, as formas de alienação parental, como realizar campanhas de desqua-
lificação, dificultar o exercício da autoridade parental, dificultar contato da
criança com o genitor, omitir informações sobre a criança, apresentar falsa
denúncia contra o genitor ou outros familiares, e mudar de domicílio para
local distante.
Em seu art. 3º, a Lei nº 12.318/2010 estabelece que a prática de ato de
alienação parental fere direito fundamental de convivência familiar saudá-
vel, prejudica a realização de afeto nas relações com o genitor e com o grupo
familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descum-
primento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tu-
tela ou guarda.
Havendo indícios de sua prática, prevê o art. 4º da Lei nº 12.318 a ins-
tauração de procedimento autônomo ou incidental, com tramitação prioritá-
ria, adotando o juiz as medidas necessárias à preservação da integridade psi-
cológica do filho. Como uma dificuldade no caso é de se reconhecer quando
está realmente ocorrendo a SAP, mostra-se muito importante a realização de
perícia multidisciplinar para avaliar o caso (art. 5º, §§ 1º e 2º), estipulando o
art. 5º, § 3º, da Lei que o laudo deve ser apresentado em até 90 dias.
Frisa-se que o avaliador, ao entrevistar a criança e a defrontar com per-
guntas diretivas, corre o risco de sugestioná-la e talvez prejudicá-la perma-
nentemente. É importante que acesse a sua memória, e não aquilo que foi
instruído ou ouvido repetidamente, no que chamamos de “depoimento sem
dano”: construir um ambiente de conforto e naturalidade para que a criança,
quando quiser, espontaneamente se manifeste. Da mesma forma, a doutrina
especializada indica que, quando se trata de avaliar uma criança, não se deve
levá-la tão a sério, não se podendo tomar como realidade, em um primeiro
momento, as suas declarações literais. Deve-se, ao invés, decodificar o desejo
da criança por trás de seus ditos. Além da criança, devem ser entrevistadas
todas as pessoas envolvidas na situação.
Em que pese a fundamental importância da participação de psicólo-
gos, psiquiatras, assistentes sociais e assistentes técnicos37, faz-se necessário

37 TRINDADE, Jorge. Os sujeitos da alienação parental. I Congresso de Alienação Parental,


Porto Alegre, 27 abr. 2012. 11:20 p.m. Reafirmado por Sandra Maria Baccara Araújo.
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não só a sua participação, mas também que o juiz se capacite para poder
distinguir o sentimento de ódio exacerbado que leva ao desejo de vingança
a ponto de programar o filho para reproduzir falsas denúncias com o intuito
de afastá-lo do genitor38. Outrossim, quanto mais demorada a identificação
do que realmente aconteceu, menos chances há de ser detectada a falsidade
das denúncias39.
Caracterizada a prática de alienação parental ou conduta que dificulte
a convivência paterno-filial, sem prejuízo da responsabilidade civil40 ou cri-
minal do alienador, pode o juiz:
I – declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador;
II – ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado;
III – estipular multa ao alienador;
IV – determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial;
V – determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua
inversão;
VI – determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente;
VII – declarar a suspensão da autoridade parental. (Art. 6º da Lei nº 12.318)

Igualmente, apontada mudança abusiva de endereço, inviabilização


ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obri-
gação de levar para ou retirar a criança ou o adolescente da residência do
genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar
(§ 1º do art. 6º).
Por fim, segundo o art. 8º da Lei, a alteração de domicílio do menor é
irrelevante para a determinação da competência relacionada às ações funda-
das em direito de convivência familiar, salvo se decorrente de consenso entre
os genitores ou de decisão judicial.

38 DIAS, Maria Berenice. Síndrome da alienação parental: O que é isso?. In: Síndrome da
alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado
pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 13.
39 DUARTE, Marcos. Alienação parental: restituição internacional de crianças e abuso do
direito de guarda. 1. ed. Fortaleza: Leis & Letras, 2010. p. 115.
40 Em relação à responsabilidade, o CCB/2002, a partir do art. 926 prescreve o dever de
reparar o prejuízo quem por ato ilícito causar dano a outrem; o art. 186 reporta-se à ilicitude
decorrente da ação ou omissão voluntária de quem, por negligência ou imprudência,
causar dano material ou moral a outrem.
60
Revista Jurídica 442
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Realça-se que é o Conselho Tutelar o elo entre a sociedade e o sistema


de justiça quando se trata de justiça de uma criança ou um adolescente. Al-
gumas situações, entretanto, por exigirem a intervenção do Poder Judiciário,
deverão ser dirigidas ao Ministério Público.
Concernente à mediação, ela é um procedimento que vem sendo utili-
zado com sucesso em vários países a partir de sua proposta de realizar uma
resolução pacífica das disputas, pela qual ampliam-se as possibilidades de
acordo entre os ex-cônjuges e pais e filhos. Entretanto, foi vetado o artigo na
Lei nº 12.318 (art. 9º) que possibilitava a sua realização, antes ou no curso do
processo judicial.
Finalmente, em relação à nomenclatura utilizada, a definição de sín-
drome de alienação parental, feita por Richard Gardner, se tornou clássica, e,
assim, sendo, serve como ponto de partida para qualquer abordagem sobre
o tema41.
Alguns, que preferem usar o termo alienação parental (AP), dizem que
a SAP não é realmente uma síndrome, pois ela não consta formalmente no
DSM-IV42. Ocorre que uma síndrome, pela definição médica, é um conjunto
de sintomas que ocorrem juntos, caracterizando uma doença específica. É o
que ocorre com a SAP, que é caracterizada por um conjunto de sintomas que
aparecem na criança geralmente juntos. Além disso, ressalta-se que hoje há
autoridades renomadas na psicologia e psiquiatria que defendem sua inclu-
são no DSM-V e no CID-1143.
Deste modo, não obstante a inicial controvérsia quando do DSM-IV
que motivou a não inclusão da SAP naquela edição e o fato de que o primeiro

41 VALENTE, Maria Luiza Campos da Silva. Síndrome da alienação parental: a perspectiva


do serviço social. In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos
psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados.
Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 72.
42 FEITOR, Sandra Inês Ferreira. A síndrome de alienação parental e o seu tratamento à luz
do direito de menores. Dissertação de Mestrado. Disponível em: <http://pt.scribd.com/
doc/55032789/a-sindrome-de-alienacao-parental-e-o-seu-tratamento-a-luz-do-direito-
de-menores>. Acesso em: 24 abr. 2012.
43 “Dizer que a SAP não existe porque não é listada no DSM-IV é como dizer em 1980 que
a AIDS (síndrome de imuno-deficiência adquirida) não existia porque não foi listada
até então em livros de texto médicos de diagnósticos-padrão.” (GARDNER, Richard. O
DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de síndrome de alienação parental (SAP)?
Disponível em: <http://sites.google.com/site/alienacaoparental/textos-sobre-sap-1/o-
dsm-iv-tem-equivalente. Acesso em: 22 out. 2011).
61
Revista Jurídica 442
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esboço do DSM-V ainda não a tenha contemplado, hoje existe vasto material
científico objeto de inúmeras publicações sobre o tema44. O fato é que, cha-
mando-a de síndrome ou não, a alienação parental é um fenômeno grave que
precisa ser enfrentado com extrema cautela pelos profissionais envolvidos
nos casos em que ela está presente.

3 A GUARDA COMPARTILHADA COMO FORMA DE REDUÇÃO DA


INCIDÊNCIA DE SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL

A separação dos cônjuges não pode significar a separação dos pais de


seus filhos, tendo ambos os pais o direito de conviver com sua prole de ma-
neira contínua (vide art. 1.589 do CC). A proteção dos filhos é a questão mais
importante em jogo, e a guarda determinada deve ser aquela que cumpra
essa tarefa45.
Primeiramente, com a Lei do Divórcio (Lei nº 6.515/1977) e, em se-
guida, com a Constituição Federal de 1988 e com o Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA), passou a ser fixada a guarda àquele com melhores
condições de manter a criança. Para isso são analisados o interesse e o bem-
-estar da criança e as condições dos pais de atender individualmente a esses
interesses46. Antes disso, os fatores que eram levados em conta eram a idade,
o sexo da criança e a existência ou não de um cônjuge culpado pela dissolu-
ção familiar.
Tendo em vista esta realidade atual, com a Lei nº 11.698/2008 (Lei da
Guarda Compartilhada), houve uma alteração no Código Civil, e a prefe-
rência da guarda passou a ser da unilateral para a compartilhada, em que os
filhos permanecem sob a autoridade de ambos os genitores, que vêm a tomar

44 Realizou-se nos dias 2 e 3 de outubro de 2010, nos EUA, o Canadian Symposium for
Parental Alienation Syndrome, que consiste numa conferência anual acerca da Parental
Alienation Disorder and it’s hopeful inclusionin the DSM-5. Este evento projeta-se como
um grande marco na história da saúde mental, pois a associação americana de psiquiatria
considerou incluir a alienação parental na DSM, não como síndrome, mas como parental
alienação disorder (PAD), ou seja, como um distúrbio do foro psiquiátrico (CAMADIAN
Symposium for Parental Alienation Syndrome. American Psychiatric Association
Considers Parental Alienation for the DSM-5. Disponível em: <http://cspas.ca/press_
release_aug_2010.shtml>. Acesso em: 24 abr. 2012).
45 LÔBO, Paulo. Famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 169.
46 FREITAS, Douglas Phillips; PELLIZZARO, Graciela. Alienação parental: comentários à Lei
nº 12.318/2010. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 84.
62
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em conjunto as decisões importantes quanto ao seu bem-estar, à sua educa-


ção e à sua criação (vide art. 1.583 e parágrafos do CC).
Importante destacar que a guarda compartilhada (ou conjunta)47 é di-
ferente da guarda alternada48-49. Na última, mais do interesse dos pais do que
dos filhos, procede-se praticamente a divisão da criança (divisão da custódia
física)50; enquanto que, na primeira, os filhos permanecem sob a autoridade
equivalente de ambos os genitores, que conjuntamente tomam as decisões
importantes quanto ao seu bem-estar, à sua educação e à sua criação51.
Para se estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de con-
vivência sobre guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do
MP, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe inter-
disciplinar52. Dessa forma, ainda que a guarda e a visitação esteja a cargo dos
pais, o que for acordado depende da chancela judicial, o que só ocorre após a
ouvida do Ministério Púbico53.
O art. 1.584, modificado pela Lei nº 11.698/2008, aduz que a guarda,
unilateral ou compartilhada, poderá ser requerida, por consenso dos genito-
res, em ação autônoma de separação, divórcio, dissolução de união estável,
ou em medida cautelar; ou, ainda, pode ser decretada pelo juiz, em atenção
a necessidades específicas do filho ou em razão da distribuição de tempo ne-
cessário ao convívio de ambos54.
Segundo os dados do IBGE, vem havendo um aumento no percentual
de divórcios em que ambos os cônjuges são responsáveis pela guarda do filho

47 Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul, Apelação Cível nº 70005760673, 7ª Câmara Cível,
Rel. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, J. 12.03.2003.
48 Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Apelação Cível nº 1.0000.00.328063-3/000, Rel. Des.
Lamberto Sant’Anna, Data do acórdão: 11.09.2003, Data da publicação: 24.10.2003.
49 GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade
parental. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 125.
50 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011. p. 446.
51 FREITAS, Douglas Phillips; PELLIZZARO, Graciela. Alienação parental: comentários à Lei
nº 12.318/2010. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 86.
52 Art. 1.584, § 3º, do CC: “Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos
de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do
Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe
interdisciplinar”.
53 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011. p. 442.
54 Art. 1.584 do CCB/2002.
63
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de 2,7% (2004) para 5,5% (2010), mas permanece a hegemonia das mulheres
na guarda dos filhos menores em 87,3% (2010). Em relação à guarda paterna,
houve um índice de 5,6% em 201055 (frisando-se que na maior parte dos casos
em que a guarda é deferida aos pais é em razão de algo grave pesar sobre a
mãe, ou nos casos em que a criança já estava morando com o pai56)57.
Sublinha-se que, nos casos de alienação parental, como o juiz tem a
obrigação de assegurar proteção integral, de modo frequente reverte a guar-
da58 ou suspende as visitas59 e determina a realização de estudos sociais e psi-
cológicos60. Entretanto, destaca-se que só se deve alterar a guarda da criança
ou suspender as visitas quando provado que o menor está sendo criado em
um ambiente não favorável à sua formação moral, à sua de saúde, à sua se-
gurança, ao seu bem-estar ou à sua educação, ou quando representar perigo
para a sua integridade física e psicológica61-62.
Com efeito, garante o art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 12.318/2010
que será assegurado à criança ou ao adolescente e ao genitor garantia mí-
nima de visitação assistida, ressalvados os casos em que há iminente risco
de prejuí­zo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente,
atestado por profissional eventualmente designado pelo juiz para acompa-
nhamento das visitas63.

55 IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Dados estatísticos. Disponível em:


<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noti­
cia=1753>. Acesso em: 31 mar. 2012.
56 MADALENO, Rolf. A guarda compartilhada pela ótica dos direitos fundamentais. In:
WELTER, Belmiro Pedro, MADALENO, Rolf Hanssen (Coord.). Direitos fundamentais do
direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 345.
57 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, AI 70041249442. 8ª Câmara Cível, Rel. Des. Rui
Portanova, J. 28.04.2011.
58 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Apelação Cível nº 70040516387, 8ª Câmara
Cível, Rel. Rui Portanova, J. 26.05.2011.
59 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento nº 70042885384,
8ª Câmara Cível, Rel. Ricardo Moreira Lins Pastl, J. 01.09.2011.
60 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011. p. 463.
61 WALD, Arnold. O novo direito de família. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 207-210.
62 Da mesma forma entende o psicólogo, mediador, perito e assistente técnico Evandro Luiz
Silva (SILVA, Evandro Luis; RESENTE, Mário. A exclusão de um terceiro. In: Síndrome da
alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado
pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 34).
63 No mesmo sentido: DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Danos psíquicos da alienação
parental no litígio familiar. In: MADALENO, Rolf; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro
(Coord.). Atualidades do direito de família e sucessões. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2008. p. 225.
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Da mesma forma, segundo o art. 7º da mesma Lei, a atribuição ou al-


teração da guarda dar-se-á preferencialmente àquele que viabiliza a efetiva
convivência da criança ou do adolescente com o outro genitor e demais fami-
liares nas hipóteses em que seja inviável a guarda compartilhada64.

Enfatiza-se que ouvir a opinião das crianças pode ser importante65-66.


Todavia, atribuir a decisão de guarda ao “desejo” da criança é atribuir a ela
uma responsabilidade que não lhe cabe, e que, sem dúvida, vai onerá-la para
sempre67-68.

Fazendo-se um exame no Direito alienígena, a guarda compartilhada


também se apresenta contemplada pela legislação de vários países como pre-
ferencial, séria opção ou modelo básico. Assim é na Alemanha, na Inglaterra,
na Espanha, na Itália, na Argentina, na Suécia, nos Estados Unidos, na Dina-
marca e na França69.

No Brasil, apesar de expresso no art. 1.584 do CC70 que, quando não


houver acordo entre os pais quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre

64 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento nº 70043806686,


7ª Câmara Cível, Rel. Roberto Carvalho Fraga, J. 24.08.2011.
65 Frisa-se que a entrevista com a criança deve ser feita eu local neutro, não sendo
recomendável a entrevista em casa (BRUNO, Denise Duarte. A importância da equipe
multidisciplinar na investigação da alienação parental. I Congresso de Alienação Parental,
Porto Alegre, 27 abr. 2012. 14pm).
66 Vide o art. 12 da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e do Adolescente
(Brasil. Decreto nº 99.710, de 21 de novembro de 1990. Disponível em: <http://www.dji.
com.br/decretos/1990-099710/1990-099710-.htm>).
67 CARNEIRO, Terezinha Féres. Alienação parental: uma leitura psicológica. In: Síndrome
da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos.
Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008.
p. 66.
68 Art. 28, § 1º, do ECA: “Sempre que possível, a criança ou o adolescente será previamente
ouvido por equipe interprofissional, respeitado seu estágio de desenvolvimento e
grau de compreensão sobre as implicações da medida, e terá sua opinião devidamente
considerada”.
Art. 161, § 3º, do ECA: “Na apreciação do pedido levar-se-á em conta o grau de parentesco
e a relação de afinidade ou de afetividade, a fim de evitar ou minorar as conseqüências
decorrentes da medida”.
Art. 28, § 2º, do ECA: “Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de idade, será necessário
seu consentimento, colhido em audiência”.
69 Grisard Filho, op. cit., p. 217.
70 Da mesma forma dispõe o art. 42, § 5º, do ECA.
65
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que possível, a guarda compartilhada71, e os Tribunais ainda a concedem ape-


nas quando os cônjuges terminam de forma consensual. Também, quando
ambos os pais se manifestam expressamente pela guarda unilateral, o juiz
não pode impor o compartilhamento72.
O entendimento majoritário é, portanto, de que a guarda compartilha-
da só pode ser deferida quando houver consenso entre os genitores, havendo
uma tendência dos magistrados de não acreditarem que o compartilhamen-
to da guarda gere efeitos positivos se decorrer de determinação judicial73-74.
Neste sentido há muitos julgados75.
De outro lado, há doutrinadores que são contrários à guarda unilateral,
compreendendo que a guarda compartilhada deve ser sempre a primeira op-
ção, para o melhor da criança ou do adolescente76.

71 Por isso faz-se importante que, na audiência de conciliação, o juiz informe aos pais o
significado deste tipo de guarda, a sua importância, a similitude de deveres e diretos
atribuídos aos genitores e as sansões pelo descumprimento de suas cláusulas, conforme o
art. 1.584, § 1º, do CC.
72 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2011. p. 444.
73 Idem, p. 443.
74 No mesmo sentido entendem: PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil.
Direito de família. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 2004. p. 301; GRISARD FILHO, Waldyr.
Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 5. ed. rev. e atual.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 225.
75 TJDF, AI 20080020196247, Acórdão nº 364827, 2ª T.C., Rel. Des. Carlos Pires Soares Neto,
J. 10.06.2009, Diário de Justiça 22.07.2009; TJSP, AC 0337261-14.2009.8.26.0000, 5ª CDP.,
Rel. Des. Erickson Gavazza Marques, J. 11.11.2009, Diário de Justiça eletrônico 24.11.2009;
TJMG, AC 1.0024.08.197958-5/001, 8ª C.Cív., Rel. Des. Vieira de Brito, J. 14.04.2011, Diário
de Justiça eletrônico 22.06.2011; TJRS, AI 70014577217, 7ª C.Cív., Rel. Des. Luiz Felipe
Brasil Santos, J. 10.05.2006; TJRS, AI 70007822257, 7ª C.Cív., Relª Desª Maria Berenice Dias,
J. 31.03.2004; TJRS, AC 70007133382, 7ª C.Cív., Relª Desª Maria Berenice Dias, J. 29.10.2003;
TJRS, AC 70047024161, 8ª C.Cív., Rel. Des. Luiz Felipe Brasil Santos, J. 22.03.2012.
76 Neste sentido há vários doutrinadores: LÔBO, Paulo. Famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2009. p. 177; ALVES, Leonardo Barreto Moreira Alves. A guarda compartilhada e a Lei
nº 11.698/2008. De Jure: Revista Jurídica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Belo
Horizonte, n. 13, p. 236, jul./dez. 2009. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/
bitstream/handle/2011/28056/guarda_compartilhada_lei_alves.pdf?squence=1>.
Acesso em: 5 abr. 2012; FREITAS, Douglas Phillips; PELLIZZARO, Graciela. Alienação
parental: comentários à Lei nº 12.318/2010. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 92-93 e p. 86;
DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Danos psíquicos da alienação parental no litígio familiar.
In: MADALENO, Rolf; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro (Coord.). Atualidades do
direito de família e sucessões. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2008. p. 227.
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Sobre o tema, o STJ se manifestou em 2011, afirmando a Ministra Nancy


Andrighi77 que não é necessário haver consenso dos pais para a aplicação da
guarda compartilhada, pois o foco é o melhor interesse do menor, e o enten-
dimento de que é inviável este tipo de guarda quando não há tal consenso
fere este princípio78.
Os casos em que realmente não é recomendada a guarda compartilha-
da são quando há a forte suspeita de violência praticada contra o filho por
parte de um dos genitores (física, psíquica e/ou sexual), nos casos de negli-
gência praticada por um dos genitores, quando há a falta de aptidão do geni-
tor para o exercício do encargo (p. ex., doença mental, retardo mental grave),
e nos casos de pais que são usuários de bebidas e/ou drogas (art. 19 do ECA).
Concluindo-se, ambos os tipos de guardas têm pontos positivos e nega-
tivos, e sempre vão existir pessoas que pensam diferente sobre qual a moda-
lidade mais benéfica para as crianças79. Dessa forma, o importante é sempre
analisar no caso concreto o que é melhor para a criança, afinal, o que funciona
bem para uma família pode não funcionar tão bem para a outra.

4 ASPECTOS PSICOLÓGICOS: REAÇÕES E COMPORTAMENTOS DO


ALIENADO E DO ALIENADOR

Tratando-se das consequências que a síndrome da alienação parental


pode gerar, frisa-se que o maior sofrimento da criança não advém da sepa-
ração dos pais em si, mas do conflito e do fato de se ver privada do convívio
contínuo com um dos seus genitores. Além disso, crianças muito pequenas
dependem dos adultos para discriminar sentimentos, para construir a per-
cepção da realidade, e até para terem uma noção adequada de si mesmas.
Deste modo, pode-se dizer que são os filhos quem mais sofrem no processo
de divórcio/separação ou dissolução de união estável dos pais, tendo em
vista que perdem a estrutura familiar que lhes assegura melhor desenvolvi-
mento psíquico, físico e emocional.

77 STJ, REsp 1251000/MG, 3ª Turma, Relª Min. Nancy Andrighi, J. 23.08.2011, DJe 31.08.2011.
78 Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/portal_stj/
publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=103980>. Acesso em: 23 dez. 2011.
79 PODEVYN, François. Síndrome da alienação parental. <http://www.apase.org.br/94001-
sindrome.htm>. Acesso em: 19 mar. 2012.
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A criança envolvida na SAP sente, primeiramente, uma forte sensação


de angústia80, e variados sintomas, como medo, inibições, agressividade, so-
matizações, bloqueios na aprendizagem e tiques nervosos. Ela, além de ficar
com uma visão maniqueísta da vida, fica privada de um dos pais como mo-
delo identificatório. Igualmente, a criança pode acabar sofrendo várias con-
sequências mais sérias, como depressão crônica, incapacidade de adaptação,
transtornos de identidade e de imagem, desespero, sentimento incontrolável
de culpa, sentimento de isolamento, comportamento hostil, falta de organi-
zação, dupla personalidade e, em grau muito elevado, pode levar às vezes ao
envolvimento com drogas e violência e até mesmo a um futuro suicídio81-82.
Em geral, o desejo dos filhos é juntar os pais separados, e seus senti-
mentos acabam ficando confusos e inconstantes. Assim, quando o genitor
alienador passa a destruir a imagem do outro perante os filhos, estes, ao se
sentirem inseguros, acabam, muitas vezes, precisando se calar, sufocando
suas emoções com relação àquele genitor amado, para não desagradar ou fe-
rir o genitor alienador, ou, então, passam a odiar e rejeitar o genitor alienado,
apresentando as mesas falas e sentimentos do guardião alienador83.
Como explicita o Psicanalista Eduardo Sá84, todo este processo provoca
uma perturbação do equilíbrio emocional da criança e afeta o seu desenvol-
vimento psicossomático. Assente em motivos falsos, a criança vê nascer em
si, contra a sua vontade, um sentimento de revolta, um ódio perante o pro-
genitor, com todas as consequências comportamentais e perturbação interior
que tal estado implica.
Este maltrato psíquico é fonte de preocupação do Estatuto da Criança
e do Adolescente, quando externa em seu art. 18 “ser dever de todos velar

80 DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Danos psíquicos da alienação parental no litígio familiar.
In: MADALENO, Rolf; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro (Coord.). Atualidades do
direito de família e sucessões. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2008. p. 222.
81 PODEVYN, François. Síndrome da alienação parental. Disponível em: <http://www.
apase.org.br/94001-sindrome.htm>. Acesso em: 5 out. 2011.
82 No mesmo sentido: TRINDADE, Jorge. Síndrome de alienação parental (SAP). In: DIAS,
Maria Berenice. Incesto e alienação parental: realidades que a Justiça insiste em não ver. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 104; SILVA, Evandro Luiz; RESENDE, Mário. A
exclusão de um terceiro. In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos
psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados.
Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 31.
83 Id., p. 228.
84 SÁ, Eduardo. Alienação parental. Coimbra: Almedina, 2011. p. 16.

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pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer


tratamento desumano, violento, vexatório ou constrangedor”85.
O Psiquiatra estadunidense Richard Gardner86 procedeu à distinção
entre três estágios de gravidade da alienação parental, posição partilhada por
José Manuel Aguillar87, que se subdivide em leve, moderada e severa. Quan-
do mais severa a alienação, piores são os sintomas desenvolvidos na criança.
Segundo François Podevyn, é primordial estabelecer um diagnóstico
correto antes de escolher o tratamento a ser seguido. Um erro de diagnóstico
pode ocasionar traumas psicológicos significativos em todas as partes envol-
vidas. Os estágios da doença não dependem dos esforços feitos pelo genitor
alienador, e sim do grau de êxito com o filho88.
A respeito dos comportamentos das crianças vítimas de alienação pa-
rental, Ludwig F. Lowenstein89 refere que elas frequentemente expressam
a mesma hostilidade que o progenitor guardião alienador, identificando-se
com ele e o imitando, não desejando visitar ou passar tempo com o geni-
tor alienado. Compartilham com o alienador o seu sentimento de rejeição,
e padecem das mesmas desilusões e crenças irracionais que o guardião de
coração partido. Além disso, não raramente, elas ainda sentem-se com poder
na sua aliança com o progenitor alienador, não têm medo dos Tribunais, não
apresentam razões válidas para rejeitar o pai alienado e têm dificuldades em
distinguir aquilo que lhes foi dito das suas próprias memórias (implantação
de falsas memórias)90.

85 MADALENO, Rolf Hanssen. A guarda compartilhada pela ótica dos direitos fundamentais.
In: WELTER, Belmiro Pedro; MADALENO, Rolf Hanssen (Coord.). Direitos fundamentais
do direito de família. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 350.
86 Gardner (1998) apud SOUZA, Raquel Pacheco Ribeiro de. Psicologia forense e psicologia
jurídica: síndrome de alienação parental e narcisismo. Disponível em: <http://www.
psicologiananet.com.br/psicologia-forense-e-psicologia-juridica-pesquisa-cientifica-com-
o-tema-sindrome-de-alienacao-parental-e-narcisismo/1953/>. Acesso em: 16 mar. 2012.
87 VERSIANI, Tátilla Gomes. A síndrome de alienação parental na reforma do Judiciário.
p. 6. Trabalho de Conclusão de Curso. Disponível em: <http://www.alienacaoparental.
com.br/>. Acesso em: 12 fev. 2012.
88 Podevery também elaborou um quadro de “Como identificar o estágio da enfermidade
em função dos critérios” (Id).
89 LOWENSTEIN, L. F. Parental Alienation Due to a Shared Psychotic Disorder. 2006.
Disponível em: <http://www.parental-alienation.info/publications/41-paralidueto­
ashapsydisfoladeu.htm>. Acesso em: 5 fev. 2012.
90 No mesmo sentido: GUAZZELLI, Mônica. A falsa denúncia de abuso sexual. In: DIAS,
Maria Berenice. Incesto e alienação parental: realidades que a Justiça insiste em não ver.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 122.
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Frisa-se que estes efeitos decorrentes da SAP sobre as crianças podem


ser irreparáveis. Conforme Jose Manuel Aguilar Cuenca91, a infidelidade
emocional da criança para com o pai alienante pode, sim, resultar em puni-
ções cuja severidade alcança um amplo espectro. Chantagem, ausência de
afeto ou punição física são normalmente constantes.
Ademais, a criança, que não sabe que pode haver outros adultos que
dela cuidem, pode ficar aterrorizada de deixar o único mundo seguro que em
sua experiência existe, aquele em que ela e o alienador formam uma unidade
simbiótica, indissolúvel, onde as individualidades e identidades se dissolvem
em uma unidade indiferenciada, caótica e perturbadora da saúde mental92.
Nos casos em que um dos pais se vitimiza para chamar a atenção do
filho, mostrando-se abalado, os filhos deste dramático alienador podem ser
“convencidos” a alinhar-se ao seu lado por identificá-lo como o mais frágil, o
que teria sido mais prejudicado ou enfrentado maior sofrimento no processo
de separação93.
Já nos casos das crianças mais velhas, elas geralmente mostram raiva
pelo genitor alvo da alienação e participam ativamente do processo da SAP,
mas por razões diferentes daquelas que o alienador utiliza para justificar a
alienação. Embora possam expressar verbalmente os mesmos motivos apre-
sentados pelo alienador, suas ações e emoções sugerem motivações diferen-
tes para o seu afastamento em relação ao genitor alvo, como o sentimento de
abandono, o desejo de que os pais voltem a viver juntos, ciúmes pelo novo
casamento, ciúmes pelo irmão novo fruto desse novo casamento, etc.94.
Cabe sublinhar que a noção de tempo de uma criança é diferente da
noção de tempo de um adulto. Assim, interpreta o afastamento como traição
e abandono, passando a rejeitar a presença do genitor alienado, recusando
todas as possíveis formas de contato95.

91 CUENCA, Jose Manuel Aguilar. O uso de crianças no processo de separação. Síndrome de


alienação parental. Disponível em: <http://www.apase.org.br/94012-josemanuel.htm>.
Acesso em: 24 abr. 2012.
92 MOTTA, Maria Antonieta Pisano. A síndrome da alienação parental. In: Síndrome da
alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado
pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 47.
93 Id., p. 52.
94 Id., p. 51.
95 DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Danos psíquicos da alienação parental no litígio familiar.
In: MADALENO, Rolf; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro (Coord.). Atualidades do
direito de família e sucessões. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2008. p. 22.
70
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Sublinha-se ainda que, às vezes, o principal impacto não acontece nem


na infância ou adolescência, e sim na hora de escolher um parceiro para a
vida e construir uma nova família. Os “filhos do divórcio” acabam se espe-
lhando no relacionamento de seus pais96-97.
Sendo assim, as crianças que sofrem da síndrome de alienação parental
possivelmente estabelecerão relações marcadas por essa vivência na infância,
aprendendo a manipular situações, desenvolvendo um egocentrismo, uma
dificuldade de relacionamento e uma grande incapacidade de adaptação. Ti-
veram destruída a ligação emocional com o progenitor ausente, atualizando
estas dificuldades nas relações futuras98.
Em relação às reações e aos comportamentos do genitor alienador, os
motivos para que um genitor inicie a implantar a SAP em seus filhos são
variados: podem estar cegos por raiva ou pelo ciúme ao constatar que seu ex-
-cônjuge encontra-se em nova relação amorosa. Se ele não tiver um par tam-
bém pode sentir que os filhos são a única coisa que lhe restam. A sua cólera
pode também ser em virtude do ressentimento por ter perdido as benesses de
que usufruía na vigência do casamento99.
Em geral, as estratégias usadas pelo progenitor alienador consistem em
um discurso manipulativo e persuasivo, utilizando-se da culpa, das intimi-
dações, do medo, da vitimização, das ameaças ou até do excesso de simpatia.
O alienador faz de tudo para impedir o contato da criança com o genitor
alienado, o desvalorizando e o insultando na frente dos filhos, recusando
informações sobre as atividades em que os filhos estão envolvidos, tomando
decisões importantes a respeito dos filhos sem o consultar, fazendo, assim,
com que a criança pense que foi abandonada e que não é amada pelo genitor
alienado, induzindo culpa no filho por ter bom relacionamento com o genitor

96 Id., p. 230.
97 VALENTE, Maria Luiza Campos da Silva. Síndrome da alienação parental: a perspectiva
do serviço social. In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos
psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados.
Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 76.
98 SILVA, Evandro Luiz; RESENDE, Mário. A exclusão de um terceiro. In: Síndrome da alienação
parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela
Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 28.
99 MOTTA, Maria Antonieta Pisano. A síndrome da alienação parental. In: Síndrome da
alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado
pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 38.
71
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Agosto/2014

alienado. Neste processo, envolvem até mesmo pessoas próximas, como a


avó das crianças, os tios, os irmãos, etc.100.
Ressalta-se que muitas vezes os pais alienadores não agem consciente-
mente, não percebendo o mal todo que estão causando. De outro lado, tem-se
ciência que nem todo alienador age inconscientemente, tendo aqueles que
deliberadamente induzem a alienação sobre seus filhos101. Destaca-se que, na
vasta maioria dos casos, a campanha começa antes mesmo da separação102.
Segundo o ilustre Jorge Trindade, o genitor alienador finge hipotetica-
mente querer ajudar os filhos e o outro genitor, dando conotações de preocu-
pação e de colaboração, quando, na realidade, age como “um leão dominador
vestido de cordeiro”, tendo em vista que, como todo abusador, utiliza da
inocência da criança para atacar o genitor alienado103.
François Podevyn104 elenca uma lista de comportamentos clássicos de
um alienador que visa a sabotar a relação entre os filhos e o outro genitor105:
a) Recusar de passar as chamadas telefônicas aos filhos;
b) Organizar várias atividades com os filhos durante o período que o outro
genitor deve normalmente exercer o direito de visitas;
c) Apresentar o novo cônjuge aos filhos como sua nova mãe ou seu novo
pai;
d) Interceptar as cartas e os pacotes mandados aos filhos;

100 KENNETH, H.; WALDRON, Ph.D.; DAVID, E.; JOANIS, J. D. Understanding and
Collaboratively Treating Parental Alienation Syndrome. American Journal of Family Law,
v. 10, p. 121-133, 1996. Disponível em: <http://www.fact.on.ca/Info/pas/waldron.htm>.
Acesso em: 23 jan. 2012.
101 Estes genitores sentem inclusive uma sensação de triunfo, misturada com alegria, pela
vitória sobre o derrotado genitor “alvo”, não parecendo se sentirem culpada em estarem
usando os filhos (MOTTA, Maria Antonieta Pisano. A síndrome da alienação parental.
In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e
jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio,
2008. p. 42).
102 Id., p. 47.
103 TRINDADE, Jorge. Manual de psicologia jurídica: para operadores do direito. 4. ed. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 156.
104 PODEVYN, François. Síndrome de alienação parental. Disponível em: <http://www.
apase.org.br/94001-sindrome.htm>. Acesso em: 5 abr. 2012.
105 Da mesma forma o site “amorteinventada” trás uma lista de atitudes e comportamentos
do genitor alienador para facilitar a identificação da SAP (http://www.amorteinventada.
com.br).
72
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Doutrina Civil
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e) Desvalorizar e insultar o outro genitor na presença dos filhos;


f) Recusar informações ao outro genitor sobre as atividades em que os fi-
lhos estão envolvidos (esportes, atividades escolares, grupos teatrais, es-
cotismo, etc.);
g) Falar de maneira descortês do novo conjugue do outro genitor;
h) Impedir o outro genitor de exercer seu direito de visita;
i) “Esquecer” de avisar o outro genitor de compromissos importantes (den-
tistas, médicos, psicólogos);
j) Envolver pessoas próximas (sua mãe, seu novo conjugue, etc.) na lava-
gem cerebral de seus filhos;
k) Tomar decisões importantes a respeito dos filhos sem consultar o outro
genitor (escolha da religião, escolha da escola, etc.);
l) Trocar (ou tentar trocar) seus nome e sobrenomes;
m) Impedir o outro genitor de ter acesso às informações escolares e/ou
médicas dos filhos;
n) Sair de férias sem os filhos e deixá-los com outras pessoas que não o
outro genitor, ainda que este esteja disponível e queira ocupar-se dos
filhos;
o) Falar aos filhos que a roupa que o outro genitor comprou é feia, e proibi-
-los de usá-las;
p) Ameaçar punir os filhos se eles telefonarem, escreverem, ou a se comu-
nicarem com o outro genitor de qualquer maneira;
q) Culpar o outro genitor pelo mau comportamento dos filhos.

Segundo Podevyn, a razão mais utilizada pelo alienador para impedir


seus filhos de verem o genitor alienado é de que o último não seria capaz de
ocupar-se dos filhos, e que estes não se sentem bem quando voltam das visi-
tas. Outro argumento usado é de que o encontro com o outro genitor não é
conveniente para os filhos e que estes necessitam de um tempo para adaptar-
-se106. A mais extrema razão utilizada é a acusação de abuso sexual.

106 Neste sentido, a Dra. portuguesa Sandra Inês Ferreira Feitor afirma que se objetivarmos
atingir um sujeito, ou provocar uma reação emocional a um determinado objeto,
necessitaremos de um trabalho sistemático, contínuo e prolongado, no qual, isolamento,
medo, a remoção emocional de toda afeição positiva em relação a ele e distância física,
permitem a aquisição do modelo exclusivo que desejamos implantar (FEITOR, Sandra Inês
Ferreira. A síndrome de alienação parental e o seu tratamento à luz do direito de menores.
Dissertação de Mestrado. Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/55032789/a-
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Revista Jurídica 442
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Agosto/2014

Frisa-se que, apesar de muitos não saberem, o ato de fazer do filho um


confidente, compartilhando com ele suas decepções e suas mágoas, como se
ele fora um par, um igual, negando a sua relação de dependência do adulto,
predispõe à alienação parental107. Chantagens sentimentais, com expressões
do tipo “você não quer deixar a mãe triste, né?” são igualmente muito co-
muns na SAP108.
Outra característica muito habitual em genitores alienadores é a super-
proteção109: genitores que se mostram temerosos de tudo e de todos quando
se trata de seus filhos são igualmente propícios a serem alienadores110.
Igualmente, a tentativa de ser o único adulto confiável, a única pessoa
a quem a criança possa recorrer, revelando um desejo de exclusividade na
relação, e um temor a que a criança possa se apegar ou confiar em qualquer
outro adulto que não o próprio genitor alienador, em uma tentativa de se
ligar simbioticamente à prole, caracteriza estar presente a síndrome de alie-
nação parental111-112.
Paradoxalmente, ao impedir o convívio do genitor não guardião com
os filhos, o guardião alienador pode acusá-lo de negligência, fazendo como

sindrome-de-alienacao-parental-e-o-seu-tratamento-a-luz-do-direito-de-menores>.
Acesso em: 18 abr. 2012).
107 CARNEIRO, Terezinha Féres. Alienação parental: uma leitura psicológica. In: Síndrome
da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos.
Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008.
p. 65.
108 FREITAS, Douglas Phillips. Alienação parental: comentários à Lei nº 12.318/2010. Rio de
Janeiro: Forense, 2010. p. 21.
109 Constata-se que as mães que “programam” a SAP em seu filho são superprotetoras, e a
exclusão que fazem do pai podem anteceder a própria separação e podem não só retroagir
ao início da vida das crianças, mas por vezes alcança a própria gravidez (MOTTA, Maria
Antonieta Pisano. A síndrome da alienação parental. In: Síndrome da alienação parental e a
tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela Associação
de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 40).
110 Id., p. 41.
111 MOTTA, Maria Antonieta Pisano. In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião:
aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e Mães
Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 40.
112 Neste sentido: SILVA, Evandro Luiz; RESENDE, Mário. A exclusão de um terceiro.
In: Síndrome da alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e
jurídicos. Organizado pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio,
2008. p. 27; DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Danos psíquicos da alienação parental no
litígio familiar. In: MADALENO, Rolf; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro (Coord.).
Atualidades do direito de família e sucessões. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2008. p. 228-229.
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se o genitor alienado pareça o vilão da história, aquele que não se importa


com os filhos em comum. Pode-se indagar se o alienador, ao atacar o cônjuge
com verbalizações negativas e destrutivas, não estaria projetando no outro o
seu próprio egoísmo e megalomania113.
Infelizmente, o que o genitor alienador não percebe é que, mais tarde,
os filhos podem se conscientizar do ocorrido, e vir a se distanciarem deles e
odiá-los por terem sido tão cerceados e impedidos de contatos felizes com
seu outro genitor e até com o mundo de maneira geral114.

CONCLUSÃO

Apesar do grande avanço que tivemos em 2010, ao se ter uma lei esti-
pulando a alienação parental, apenas a lei, por si só, não é suficiente, precisan-
do-se o envolvimento de todos para que essa realidade possa ser finalmente
alterada. Medidas que deem publicidade ao tema, e medidas que preparem
as crianças, como idas a psicólogos e campanhas nas escolas, também podem
ser consideras boas alternativas.
Finalizando-se de uma forma positiva, sublinha-se que a síndrome
da alienação parental pode, sim, ser revertida. Porém, tendo em vista que o
discurso do alienador tem muito poder sobre a criança, é fundamental uma
intervenção judicial que garanta que o tratamento psicológico estipulado ju-
dicialmente seja de fato cumprido, o que normalmente não acontece. Sendo
assim, o Judiciário precisa passar a adotar uma postura mais firme para que,
no mínimo, exija-se o cumprimento da decisão proferida, a fim de garantir a
continuidade do tratamento e da perícia determinados.
De outro lado, o poder familiar no Brasil que é compartilhado precisa
ser melhor compreendido, deixando de ocupar o lugar frio que lhe reserva
um artigo de lei para passar a ser uma questão de atitude daqueles que re-
almente se esmeram pela felicidade dos filhos. Não há dúvidas que ambos
os genitores são fundamentais para o desenvolvimento psíquico dos filhos,
sendo por essa razão que se faz tão positiva para as crianças a guarda com-

113 DUARTE, Lenita Pacheco Lemos. Danos psíquicos da alienação parental no litígio
familiar. In: MADALENO; Rolf; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro. Atualidades do
direito de família e sucessões. Sapucaia do Sul: Nota Dez, 2008. p. 229.
114 MOTTA, Maria Antonieta Pisano. A síndrome da alienação parental. In: Síndrome da
alienação parental e a tirania do guardião: aspectos psicológicos, sociais e jurídicos. Organizado
pela Associação de Pais e Mães Separados. Porto Alegre: Equilíbrio, 2008. p. 47.
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partilhada, em detrimento da guarda unilateral com visitas quinzenais ou


semanais.
Atualmente, não há mais espaço para omissões. Nem dos pais, nem
dos juízes, promotores, advogados, psicólogos, médicos ou assistentes so-
ciais. Todos são responsáveis por atentar ao melhor interesse da criança, que
tem o direito constitucionalmente assegurado à convivência familiar com
ambos os pais, estejam juntos ou divorciados, na mesma casa ou em espaços
diferentes.
Cuidar da criança é absoluta prioridade, pois a criança é o futuro do
nosso país. Afinal, abandono gera abandono, violência gera violência e cui-
dado gera cuidado!

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80
Cláusulas Gerais, Segurança Jurídica e
Interpretação Civil-Constitucional
L iane T abarelli Z avascki
Professora de Direito Civil na Faculdade de Direito da PUCRS,
Doutora em Direito pela mesma Instituição, Advogada.

RESUMO: O Código Civil de 2002, enriquecido na sua estrutura por


princípios, cláusulas gerais e conceitos indeterminados, revela a in-
tenção legislativa de se pretender um sistema aberto. Diante disso,
o presente artigo tem como objetivo refletir sobre as contribuições
da interpretação civil-constitucional para que essa tessitura aberta
do sistema não comprometa a segurança jurídica do ordenamento.

PALAVRAS-CHAVES: Cláusulas gerais; segurança jurídica; inter-


pretação civil-constitucional.

ABSTRACT: The Civil Code of 2002, enriched by principles in its


structure, general and indeterminate concepts, reveals the legislative
intent of if you want an open system. Thus, the present article aims to
reflect on the contributions of civil and constitutional interpretation
for this fabric open system does not compromise the security of legal
order.

KEYWORDS: General provisions; legal security; civil and constitu-


tional interpretation.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Cláusulas gerais, conceitos jurídicos inde-


terminados e conceitos puramente normativos; 2 A hermenêutica
constitucional; 3 Cláusulas gerais, segurança jurídica e interpretação
civil-constitucional; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

Na contemporaneidade, todos os ramos do Direito exigem uma leitura


constitucionalizada. Os princípios-vetores constitucionais e, em especial, os
que se referem aos direitos fundamentais demandam que todos os Poderes da
República reúnam esforços conjuntos para suas concretizações. Desse modo,
81
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

a tarefa da interpretação civil-constitucional adquire significativa importân-


cia para fins de cumprir esse compromisso nas relações intersubjetivas.
O presente trabalho visa a refletir sobre a presença de normas jurídicas
abertas e/ou indeterminadas, como as cláusulas gerais e os conceitos jurídi-
cos indeterminados no Código Civil de 2002 como uma técnica legislativa
que permite a atualização do sistema à dinâmica social, o constante diálogo
desse sistema com o sistema constitucional e outros infraconstitucionais e
confere maior autonomia ao intérprete.
Nessa linha, fundamental observar que o sistema de codificação civil
atual viabiliza interpretações discricionárias e conotações de ordem valora-
tivas diversas. Assim, urge apontar as significativas contribuições da inter-
pretação civil-constitucional tendo presente que esta mesma interpretação
não pode comprometer a necessária e indispensável segurança jurídica das
relações.

1 CLÁUSULAS GERAIS, CONCEITOS JURÍDICOS


INDETERMINADOS E CONCEITOS PURAMENTE NORMATIVOS

O Código Civil de 2002, enriquecido na sua estrutura por princípios,


cláusulas gerais e conceitos indeterminados, revela a intenção legislativa de
se pretender um sistema aberto. Reconhece-se, assim, a falácia do dogma da
completude1, o qual era preconizado nas codificações oitocentistas. O legis-
lador não é onisciente tampouco onipotente. O Estado, desse modo, constata
que a dinâmica social exige a participação ativa e efetiva do intérprete para
atualizar e adequar o texto ao contexto.
Registre-se, por oportuno, que a vagueza da linguagem dos princípios,
das cláusulas gerais e dos conceitos indeterminados não é defeito, e, sim, uma
técnica legislativa. Isso demanda ampla compreensão hermenêutica e, conse-
quentemente, implica o reconhecimento de maior poder ao juiz. As cláusulas
gerais são, nesse sentido, normativas abertas, preceitos jurídicos vazios ou
incompletos que possibilitam maior autonomia ao intérprete. Caracterizadas

1 Princípio jurídico o qual preconiza que o ordenamento jurídico é completo como maneira
de assegurar o monopólio estatal de produção jurídica. Nega, pois, a existência de lacunas,
pois, se elas fossem admitidas, admitir-se-ia, também, introduzir um direito concorrente
ao estatal. Assim, o direito estatal é onipotente, regulando todos os casos do mundo da
vida que demandam pronunciamento da lei. Princípio considerado notável no positivismo
jurídico.
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Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
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pela generalidade e abstração, permitem que o mesmo preceito normativo


compreenda um grande número de casos2.
Para Martins-Costa, as cláusulas gerais são proteiformes na medida em
que assumem diversa significação, seja qual for o ângulo de análise do estu-
dioso. Também porque o exame de suas significações afasta o reducionismo
ou simplificação na sua análise3.
Entende, ademais, que as cláusulas gerais
constituem o meio legislativamente hábil para permitir o ingresso, no orde-
namento jurídico, de princípios valorativos expressos ou ainda inexpressos
legislativamente, de standards, máximas de conduta, arquétipos exempla-
res de comportamento, das normativas constitucionais e de diretivas eco-
nômicas, sociais e políticas viabilizando a sua sistematização no ordena-
mento positivo.4

Implicam, portanto, o reconhecimento de uma cultura diversa no Di-


reito5, a cultura de um sistema jurídico aberto, superando o formalismo do
sistema de 1916 e promovendo significativa mudança no modelo de interpre-
tação jurídica. Dessa forma, propõe-se uma ordem axiológica de estruturas
normativas generalizantes, permitindo ao intérprete criar, com mais liberda-
de, as normas jurídicas adequadas aos casos concretos que enfrentem6.
Nesse sentido, Martins-Costa adverte que o Código Civil de 2002 re-
velou
um processo pelo qual a cultura jurídica abandona determinado paradig-
ma de relacionamento com as demais instâncias do todo social – o para-
digma de um sistema fechado, um sistema que se autorreferencia de modo
absoluto – e começa a se movimentar em torno de outro paradigma, o de
sistema aberto, ou sistema de autorreferência relativa.7

2 Ver MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo


obrigacional. 1. ed. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
3 MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo
obrigacional. 1. ed. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 273-274.
4 Ibid., p. 274.
5 Ibid., p. 274.
6 Ver MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo
obrigacional. 1. ed. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
7 Ibid., p. 275.
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Assim, o legislador atual procura associar a seus enunciados genéri-


cos prescrições de conteúdo completamente diverso em relação aos modelos
tradicionalmente reservados às normas jurídicas. Cuida-se das normas que
não prescrevem uma certa conduta, mas que, simplesmente, definem valores
e parâmetros hermenêuticos. Servem assim como ponto de referência inter-
pretativo e oferecem ao intérprete os critérios axiológicos e os limites para a
aplicação das demais disposições normativas8.
Nesse contexto, pode-se afirmar que “torna-se imprescindível que o in-
térprete promova a conexão axiológica entre o corpo codificado e a Constitui-
ção da República, que define os valores e os princípios fundantes da ordem
pública [...]”9. Logo, “cabe ao intérprete, não mais ao legislador, a obra da in-
tegração do sistema jurídico; e esta tarefa há de ser realizada em consonância
com a legalidade constitucional”10.
No que se refere à estrutura das cláusulas gerais, Martins-Costa aduz
que,
multifacetárias e multifuncionais, as cláusulas gerais podem ser basica-
mente de três tipos, a saber: a) disposições de tipo restritivo, configurando
cláusulas gerais que delimitam ou restringem, em certas situações, o âm-
bito de um conjunto de permissões singulares advindas de regra ou prin-
cípio jurídico. É o caso, paradigmático, da restrição operada pela cláusula
geral da função social do contrato às regras, contratuais ou legais, que têm
sua fonte no princípio da liberdade contratual; b) de tipo regulativo, con-
figurando cláusulas que servem para regular, com base em um princípio,
hipóteses de fato não casuisticamente previstas na lei, como ocorre com a
regulação da responsabilidade civil por culpa; e, por fim, de tipo extensi-
vo, caso em que servem para ampliar uma determinada regulação jurídica
mediante a expressa possibilidade de serem introduzidos, na regulação em
causa, princípios e regras próprios de outros textos normativos. É exemplo
o art. 7º do Código do Consumidor e o § 2º do art. 5º da Constituição Fede-

8 TEPEDINO, Gustavo. Crise de fontes normativas e técnica legislativa na parte geral do


Código Civil de 2002. In: TEPEDINO, Gustavo (Coord.). A parte geral do novo Código Civil:
estudos na perspectiva civil-constitucional. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar,
2003. p. XV-XXXIII, p. XIX.
9 Ibid., p. XX. Nesse sentido, o autor complementa: “[...] as cláusulas gerais do novo Código
Civil poderão representar uma alteração relevante ao panorama do direito privado
brasileiro desde que lidas e aplicadas segundo a lógica da solidariedade constitucional e
da técnica interpretativa contemporânea. [...]” (p. XX).
10 Ibid., p. XXI.
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ral, que reenviam o aplicador da lei a outros conjuntos normativos, como


acordos e tratados internacionais e diversa legislação ordinária.11

Ademais, acerca das funções das cláusulas gerais, veja-se que


a função que é, em primeiro lugar, atribuída às cláusulas gerais é a de per-
mitir, num sistema jurídico de direito escrito e fundado na separação das
funções estatais, a criação de normas jurídicas com alcance geral pelo juiz.
[...]
Conquanto tenham estas cláusulas função primeiramente individualizado-
ra – conduzindo ao direito do caso –, têm, secundariamente, função genera-
lizadora, permitindo a formação de instituições “para responder aos novos
fatos, exercendo um controle corretivo do Direito estrito”.12
[...]
Atuam, ainda – e esta é relevantíssima função, nem sempre bem percebida
– como elemento de conexão ou “lei de referência” para oportunizar, ao
juiz, a fundamentação da sua decisão de forma relacionada com os casos
precedentes.
[...]
Têm, ainda, as cláusulas gerais a função de permitir à doutrina operar a
integração intrassistemática entre as disposições contidas nas várias partes
do Código Civil [...].
[...]
Por fim, viabilizam a integração intersistemática, facilitando a migração de
conceitos e valores entre o Código, a Constituição e as leis especiais.13

11 MARTINS-COSTA, Judith Hofmeister. O direito privado como um “sistema em


construção”: as cláusulas gerais no Projeto de Código Civil brasileiro. Disponível em:
<http://www6.ufrgs.br/ppgd/doutrina/martins1.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010. Refere
análise sistematizada das características das cláusulas gerais de CORDEIRO, António
Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 1989, em especial o tomo II,
p. 1184.
12 Judith Hofmeister Martins-Costa sinaliza que a expressão em itálico e entre aspas
empregada é de SILVA, Clóvis do Couto e. O princípio da boa-fé no direito civil brasileiro e
português. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1986. p. 53.
13 MARTINS-COSTA, Judith Hofmeister. O direito privado como um “sistema em
construção”: as cláusulas gerais no Projeto de Código Civil brasileiro. Disponível em:
<http://www6.ufrgs.br/ppgd/doutrina/martins1.htm>. Acesso em: 13 jul. 2010.
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Tarefa árdua, diante desse cenário de abertura do sistema, é distinguir


cláusulas gerais, conceitos jurídicos indeterminados e conceitos puramente
normativos.
Para Branco,
a diferença entre cláusulas gerais, conceitos jurídicos indeterminados e
conceitos puramente normativos não é tarefa fácil, pois há limites tênues
entre uns e outros. [...] As cláusulas gerais descrevem fatos de maneira ge-
nérica que não permitem a construção de um silogismo perfeito com sub-
sunção automática dos fatos do mundo com os fatos descritos em abstrato
na norma. Para sua aplicação, é preciso que o juiz construa a regra do caso
concreto levando em consideração as peculiaridades do caso e o princípio
que se quer realizar através da cláusula geral, dentro dos limites ditados
pelo legislador. Exemplo clássico de cláusula geral está no art. 159 do Có-
digo Civil de 1916: “Aquele que por ação ou omissão provocar dano a ou-
trem...”. O que significa provocar dano a outrem? Trata-se se cláusula geral
cujo significado precisa ser preenchido no caso concreto. [...] Os conceitos
jurídicos indeterminados são expressões cujo significado também depende
de preenchimento segundo as circunstâncias fáticas e jurídicas do caso con-
creto, mas, diferentemente das cláusulas gerais, não se trata de conjunto
de fatos, mas de expressões que podem estar presentes em qualquer parte
da norma, seja na descrição de parte dos fatos em abstrato, seja nas con-
sequências jurídicas. Exemplo de conceito jurídico indeterminado é o de
“interessado” de que trata o art. 304 do Código Civil. [...] Os conceitos pu-
ramente normativos são aqueles que não têm referência direta e concreta
a situações fáticas, mas a situações e a conceitos eminentemente jurídicos.
Exemplo: referência a “contrato comutativo” do art. 441 do CC.14

Interessante registrar, no que se refere aos conceitos jurídicos indeter-


minados, que é inevitável uma aproximação desses com os conceitos discri-
cionários. Dessa forma, essa abertura semântica normativa permitiria diver-
sas interpretações por meio de conceitos discricionários, o que poderia con-
duzir à insegurança do sistema. Isso porque se daria margem para escolhas
do intérprete com base em critérios próprios.
Oportuno, nessa linha, invocar os ensinamentos de Gadamer, para
quem a verdade de um texto não está na submissão incondicionada à opinião
do autor nem só nos preconceitos do intérprete, senão na fusão dos horizon-

14 BRANCO, Gerson Luiz Carlos. Função social dos contratos: interpretação à luz do Código
Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 139-140, nota 112.
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tes de ambos, partindo do ponto atual da história do intérprete que se dirige


ao passado em que o autor expressou-se15.
Assim, a real finalidade da hermenêutica jurídica é “encontrar o Di-
reito” (seu sentido) na aplicação “produtiva” da norma, pois a compreensão
não é um simples ato reprodutivo do sentido original do texto, senão, tam-
bém, produtivo16.
Desse modo, o intérprete “contamina” os fatos e os direitos que lhe em-
basam o desenvolvimento do labor, sepultando o ideal kelseniano de pureza
da ciência17.
Freitas, nesse passo, adverte que,
mais do que nunca, força reconhecer que [...] proveito nenhum resulta da-
quela concepção anacrônica de Carta Maior como um conjunto normativo
em relação ao qual o exegeta inferiria soluções de modo exclusivamente
dedutivo. No plano fático, não faz qualquer sentido imaginar que o intér-
prete constitucional – e, numa certa medida, todo juiz o é – obtenha êxito
operando apenas com modelos de subsunção lógico-formal. O melhor ca-
minho, em termos contemporâneos, está em escolher, acertadamente, as
premissas adequadas e necessárias ao longo da jornada de compreensão-
-decisão, processo que, em essência, gadamerianamente, jamais deve expe-
rimentar um corte rígido, sob pena de ser uma abordagem infiel ao mundo
real.18

Renove-se, aqui, por oportuna, a concepção interpretativa de Gadamer


no sentido de que
a tarefa da interpretação consiste em concretizar a lei em cada caso, isto
é, em sua aplicação. A complementação produtiva do Direito, que ocorre
com isso, está obviamente reservada ao juiz, mas este encontra-se por sua
vez sujeito à lei, exatamente como qualquer outro membro da comunidade
jurídica. Na ideia de uma ordem judicial supõe-se o fato de que a sentença

15 Para maiores esclarecimentos, ver GADAMER, Hans-George. Verdad y método. Trad.


Ana Agud Aparicio y Rafael de Agapito. Salamanca: Sígueme, 1977.
16 Ibid., p. 366.
17 Ver KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. João Baptista Machado. 5. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1996.
18 FREITAS, Juarez. O intérprete e o poder de dar vida à Constituição: preceitos de
exegese constitucional. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – R. TCMG,
Belo Horizonte, v. 35, n. 2, p. 15-46, abr./jun. 2000. p. 19.
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do juiz não surja de arbitrariedades imprevisíveis, mas de uma ponderação


justa de conjunto.19

Registre-se, outrossim, que maior será discricionariedade do juiz quan-


to mais aberto for o sistema jurídico em sua principiologia. Ademais, a com-
plexificação das relações sociais na contemporaneidade tem fragilizado o sis-
tema jurídico, eis que demanda previsões legislativas que antecipem situa­
ções sui generis e, não raras vezes, ainda controversas no meio social, o que
suscitam os “casos difíceis” em pauta de julgamento pelo Judiciário. Esses
“casos difíceis” são, também, situações onde frequentemente a discriciona-
riedade do juiz é reafirmada e revisitada.
Veja-se, por exemplo, sobre “O Judiciário em crise – O caso brasileiro”,
que:
Esta dimensão da crise judiciária foi bem revelada em duas pesquisas con-
duzidas pelo Instituto de Estudos Econômicos, Sociais e Políticos de São
Paulo (IDESP), a primeira em 1993 e a outra em 2000.
Na primeira ocasião, foi solicitado aos juízes que manifestassem as suas
opiniões sobre uma sequência de afirmações, entre as quais merecem des-
taque:
a) o juiz não pode ser um mero aplicador das leis, tem de ser sensível aos problemas
sociais;
b) o compromisso com a justiça social deve preponderar sobre a estrita aplicação
da lei.
Enquanto 73,7% declararam concordar “inteiramente” ou “muito” com a
assertiva a, somente 37,7% manifestaram o mesmo grau de concordância
com a proposição b.20
Já na pesquisa mais recente, contradição similar pode ser detectada. Ques-
tionados acerca da frequência com que decisões judiciais são mais baseadas
em “suas visões políticas do que na leitura rigorosa da lei”, os magistrados
ouvidos responderam:

19 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método. Trad. Flávio Paulo Meurer. 3. ed. Petrópolis:
Vozes, 1997. p. 489.
20 SADEK, Maria Teresa (Org.). Uma introdução ao estudo da justiça. São Paulo: Sumaré,
1996. p. 22 citada por CASTRO E COSTA, Flávio Dino de. A função realizadora do Poder
Judiciário e as políticas públicas no Brasil. In: Interesse Público – IP, Porto Alegre, a. 6, n. 28,
p. 64-90, nov./dez. 2004. p. 81.
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Quadro – Visão dos juízes sobre a politização da justiça


Muito frequentemente 4,2%
Frequentemente 21,3%
Ocasionalmente 52,9%
Nunca 21,5%
Fonte: Idesp

Contudo, submetidos a uma pergunta21 atinente à possível tensão entre


respeito aos contratos e observância da justiça social, o seguinte resultado
foi alcançado22:
Posição A – Os contratos devem ser sempre respeitados, independentemente de
suas repercussões sociais: 19,7%;
Posição B – O juiz tem um papel social a cumprir. E a busca da justiça social jus-
tifica decisões que violem os contratos: 73,1%.
Isto é, ao mesmo tempo em que rejeitam a ideia de que os juízes decidam
“politicamente” e sublinham a fidelidade a uma “leitura rigorosa (??) da
lei”, os pesquisadores colocam a “justiça social” como fator legitimador da
inobservância dos contratos, parecendo ignorar a inevitável carga político-
-ideológica daquele conceito.23

Dessa forma, impõe-se refletir sobre a atividade interpretativa judicial


e sobre o intérprete em si, pois, se, de um lado, insta analisar a ponderação
no sentido de que interpretação e aplicação são tarefas judiciais distintas, de
outro, cabe refletir também sobre a necessidade de se ter intérpretes com uma
postura ativa, que assumam a carga axiológica de seus julgados com respon-
sabilidade e compromisso social.
Assim, conforme Junqueira, valendo-se das lições da obra de Thomas
Kuhn intitulada “A estrutura da Revolução Científica: noção de paradigma”,

21 A questão tinha o seguinte teor: “Na aplicação da lei, existe frequentemente uma tensão
entre contratos, que precisam ser observados, e os interesses de seguimentos sociais menos
privilegiados, que precisam ser atendidos. Considerando o conflito que surge nesses casos
entre esses dois objetivos, duas posições opostas têm sido defendidas [...] Com qual das
duas posições o(a) senhor(a) concorda mais?”.
22 PINHEIRO, Armando Castelar. O Judiciário e a economia na visão dos magistrados. São Paulo:
Idesp, 2001. p. 10 – referido por CASTRO E COSTA, Flávio Dino de. A função realizadora
do Poder Judiciário e as políticas públicas no Brasil. In: Interesse Público – IP, Porto Alegre,
a. 6, n. 28, p. 64-90, nov./dez. 2004. p. 81. Itálico no original.
23 Ibid., p. 82.
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adverte que, após o paradigma da lei que vigia sob a égide do Código Civil
de 1916, hoje se está diante do paradigma do juiz24.
Diante disso, no item a seguir, considerações serão tecidas acerca das
importantes contribuições da hermenêutica constitucional.

2 A HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL
A palavra, o uso do vernáculo é e sempre foi instrumento de trabalho
do jurista. Seja ela escrita ou falada, aquele que opera o Direito sempre se de-
dicou a compreender, delimitar, apreender, enfim, interpretar o sentido que
as palavras podem adquirir em um texto. Interpretar é estabelecer o alcance
de uma proposição, revelar o seu sentido.
Não obstante as contribuições de Kelsen25 para a ciência do Direito, nos
dias atuais, o Direito é “contaminado” por inúmeros axiomas, proposições va-
lorativas, éticas, morais, entre outras, que, muitas vezes, representam o mo-
mento histórico e as prioridades de determinada sociedade. Ainda, partindo-se
do contributo de Kelsen que estabelece o sistema jurídico com uma estrutura
piramidal, onde a Lei das leis, isto é, a Constituição Federal, situa-se no topo
desse sistema, a interpretação constitucional adquire significativa importância.
Nesse sentido, interpretar a Constituição significa, em última instân-
cia, dar concretude aos direitos fundamentais ali insculpidos. O Texto Maior
prescreve os objetivos e fundamentos da República e todo o ordenamento
jurídico infraconstitucional deve ser interpretado de modo a prestigiar os co-
mandos constitucionais. Os direitos fundamentais ali prescritos devem ser
prioridade absoluta de realização por parte dos agentes de um Estado que se
intitula Democrático de Direito.
Interessante pontuar, nessa linha, a lição de Freitas, ao advertir que
“jurista é aquele que, acima de tudo, sabe eleger diretrizes supremas, notadamente
as que compõem a tábua de critérios interpretativos aptos a presidir todo e
qualquer trabalho de aplicação do Direito”26.

24 Ver AZEVEDO, Antonio Junqueira de. O Direito pós-moderno e a codificação. In:


AZEVEDO, Antonio Junqueira de. Estudos e Pareceres de Direito Privado, São Paulo: Saraiva,
2004. p. 55-63.
25 Para maiores esclarecimentos, ver KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Trad. João Baptista
Machado. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996.
26 FREITAS, Juarez. O intérprete e o poder de dar vida à Constituição: preceitos de exegese
constitucional. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – R. TCMG, Belo
Horizonte, v. 35, n. 2, p. 15-46, abr./jun. 2000. p. 18. Itálico no original.
90
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Por outro lado, impera salientar, nesse estudo, que, ao se almejar uma
interpretação concretizante dos preceitos e da axiologia constitucional pre-
sente, em particular, nos seus fundamentos, urge conhecer os vetores princi-
piológicos contidos nela. O Direito atual, acompanhando os ensinamentos de
Alexy27, cuida de uma rede de princípios e regras. Essa teia de mandamentos,
de densidades e hierarquias distintas, demanda intérpretes preparados para
otimizar-lhes os comandos e produzir a máxima eficácia possível.
Veja-se, por oportuno, as contribuições de Freitas acerca de preceitos
propostos em estudo de interpretação constitucional:
a) todo juiz, no sistema brasileiro, é, de certo modo, juiz constitucional e se afigura
irrenunciável preservar, ao máximo, a coexistência pacífica e harmoniosa entre
os controles difuso e concentrado de constitucionalidade;
b) a interpretação constitucional é processo tópico-sistemático, de maneira que
resulta impositivo, no exame dos casos, alcançar solução de equilíbrio
entre o formalismo e o pragmatismo, evitando-se soluções unilaterais e
rígidas;
c) ao hierarquizarmos prudencialmente os princípios, as normas e os valores cons-
titucionais, devemos fazer com que os princípios ocupem o lugar de destaque, ao
mesmo tempo situando-os na base e no ápice do sistema, vale dizer, fundamento
e cúpula do mesmo;
d) o intérprete constitucional deve ser o guardião, por excelência, de uma
visão proporcional dos elementos constitutivos da Carta Maior, não en-
tendida a proporcionalidade apenas como adequação meio-fim. Propor-
cionalidade significa, sobremodo, que estamos obrigados a sacrificar o
mínimo para preservar o máximo de direitos;
e) o intérprete constitucional precisa considerar, ampliativamente, o inafastável
poder-dever de prestar a tutela, de sorte a facilitar, ao máximo, o acesso legítimo
do jurisdicionado. Em outras palavras, trata-se de extrair os efeitos mais
fundos da adoção, entre nós, do intangível sistema de jurisdição única;
f) o intérprete constitucional deve guardar vínculo com a excelência ou otimização
máxima da efetividade do discurso normativo da Carta, no que esta possui de
eticamente superior, conferindo-lhe, assim, a devida coerência interna e a não
menos devida eficácia social;

27 Ver ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva.
São Paulo: Malheiros, 2008.
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g) o intérprete constitucional deve buscar uma fundamentação racional


e objetiva para as suas decisões sincrônicas com o sistema, sem adotar
soluções contra legem, em que pese exercer atividade consciente e assu-
midamente positivadora e reconhecendo que a técnica do pensamento
tópico não difere essencialmente da técnica de formação sistemática,
ambas facetas do mesmo poder de hierarquizar e dar vida ao sistema,
entre as várias possibilidades de sentido;
h) o intérprete constitucional deve honrar a preservação simultânea das caracterís-
ticas vitais de qualquer sistema democrático digno do nome, vale dizer, a aber-
tura e a unidade, que implica dever de zelar pela permanência na e da mudança;
i) o intérprete constitucional deve acatar a soberania da vitalidade do sistema cons-
titucional no presente, adotando, quando necessário e com extrema parcimônia,
a técnica da exegese corretiva;
j) o intérprete constitucional precisa ter clareza de que os direitos fundamen-
tais não devem ser apreendidos separada ou localizadamente, como se estives-
sem, todos, encartados no art. 5º da Constituição;
k) o intérprete constitucional, sabedor de que os princípios constitucionais
jamais devem ser eliminados mutuamente, ainda quando em colisão ou contra-
dição, cuida de conciliá-los, com maior ênfase do que aquela dedicada às regras,
que são declaradas inconstitucionais, em regra, com a pronúncia de nulidade;
l) o intérprete constitucional somente pode declarar a inconstitucionalida-
de (material ou formal) quando frisante e manifestamente configurada
juridicamente. Dito de outro modo, deve concretizar o Direito, preser-
vando a unidade substancial e formal do sistema em sua juridicidade.28

Note-se, pois, que a atividade interpretativa envolve, ineroxavelmente,


uma ação hierarquizante diante de inúmeros princípios e regras que são po-
tencialmente aplicáveis no caso concreto, mas que, se assim o fossem, respos-
tas absolutamente contraditórias e paradoxais daí resultariam.
Freitas, ademais, endossa a noção de hierarquização da atividade inter-
pretativa ao afirmar que:
Com efeito, uma vez que inexiste hipótese de dispensa da hierarquização
(interpretar é, sempre e sempre, hierarquizar), o relevante consiste em per-
ceber que a inafastabilidade da hierarquização converte o critério hierár-

28 FREITAS, Juarez. O intérprete e o poder de dar vida à Constituição: preceitos de exegese


constitucional. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – R. TCMG, Belo
Horizonte, v. 35, n. 2, p. 15-46, abr./jun. 2000. p. 43-46. Itálico no original.
92
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

quico axiológico numa diretriz operacional superior em confronto com os


demais critérios (cronológico e da especialidade), sendo necessário, tam-
bém, assumir os consectários desta onipresença hierarquizante, especial-
mente ao lidarmos com o fenômeno da colisão de princípios e, de resto,
com as denominadas antinomias de segundo grau.
[...]
Hierarquizar é, pois, a nota suprema da interpretação jurídica como um
todo. Hierarquizando os princípios e as regras constitucionais, mais evi-
dente transparece o papel concretizador do intérprete (juiz ou o cidadão
em geral) de ser o positivador, aquele que dá vida ao ordenamento, sem
convertê-lo propriamente em legislador. Ultrapassa-se, desse modo, a po-
lêmica, sem sentido dialético, entre objetivismo e subjetivismo. Mais inten-
sa se mostra a valia da preocupação tedesca com a “adequação funcional”.
Preferível, por isso mesmo, afirmar que o intérprete constitucional em ge-
ral (e, de modo maiúsculo, o magistrado), de certo jeito, positiva o Direito
por derradeiro. Fora de dúvida, o intérprete (não o legislador) é quem cul-
mina o processo de positivação jurídica.29

Destarte, registre-se que, diante da atividade precípua e hierarquizante


da interpretação constitucional, a fim de prestigiar a concretude dos direitos
fundamentais, inúmeros princípios devem ser observados e aplicados para
se obter uma solução que mais se aproxime da realidade e da axiologia cons-
titucional. Isso porque é flagrante que, nos dias atuais, a crescente aplicação
dos princípios tem relegado às regras atuação secundária, e os operadores
do Direito devem adquirir destreza e habilidade para atuar com esse novo
Direito: O Direito “por princípios”.
Germana de Oliveira Moraes, nesse passo, alerta para o fato de que
a eficiência do Direito “por princípios” depende fundamentalmente da
atuação do juiz constitucional durante o processo de concretização do Di-
reito para o qual é imprescindível sua capacidade de percepção dos valores
sociais. A sociedade, por sua vez, já condicionada pelo modelo legalista
que prometia sempre uma solução previsível para com os conflitos, vê-se,
hoje, perplexa diante da possibilidade de concorrência de soluções diferen-
tes, ao abrigo do Direito, sem ter ainda a compreensão de que esta multi-
plicidade advém de seu caráter encantadoramente livre, plural e mutante.

29 FREITAS, Juarez. O intérprete e o poder de dar vida à Constituição: preceitos de exegese


constitucional. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – R. TCMG, Belo
Horizonte, v. 35, n. 2, p. 15-46, abr./jun. 2000. p. 21.
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Agosto/2014

A melhor via que poderá eleger o juiz, nestes tempos de transição, para
atender este desafio de reconstruir e “constituir” o Direito no caso concre-
to, ou seja, de dizer se determinada conduta é ou não compatível com os
princípios constitucionais (= valores), é a interação com a sociedade civil.
Afinal, rigorosamente, numa democracia quem dita o Direito é a socieda-
de, reservando-se, agora, sob a égide do Direito “por princípios”, também
ao juiz, em especial, ao juiz constitucional, o papel de decodificador dos
valores (= princípios) que ela aceita em determinado momento e em deter-
minado local.30

Ainda, acerca da temática, Freitas complementa que


[...] as normas estritas ou regras vêm perdendo, cada vez mais, espaço e re-
levo para os princípios, despontando estes, por definição, como superiores
àquelas, conquanto não se deva postular um sistema constituído apenas de
princípios, erro idêntico ao de pretender um ordenamento operando como
mera e desconectada aglutinação de regras.
[...]
A cimentação da sistematicidade ocorre por força da amálgama unicamen-
te trazida pela natureza e pela atuação dos princípios fundantes e funda-
dos do ordenamento jurídico.31

Constata-se, pois, a importância da tarefa interpretativa e sua comple-


xidade na contemporaneidade. Inúmeros interesses a serem atendidos, com-
preensões divergentes, prioridades distintas dos mais diversos intérpretes.
De qualquer modo, frise-se que o vetor maior para a interpretação constitu-
cional que envolva direitos fundamentais deve ser, de modo imperativo, o
resultado que produza as menores limitações ou restrições de forma a presti-
giar, o quanto possível, sua maior eficácia possível.
Assinale-se que,
assim, devem ser interpretadas restritivamente as limitações, havendo, a rigor,
regime unitário dos direitos fundamentais das várias gerações, donde segue que,
no âmago, todos os direitos têm eficácia direta e imediata, reclamando crescen-
te acatamento encontrando-se peremptoriamente vedados os retrocessos.

30 MORAES, Germana de Oliveira. Controle jurisdicional da Administração Pública. 2. ed. São


Paulo: Dialética, 2004. p. 187.
31 FREITAS, Juarez. O intérprete e o poder de dar vida à Constituição: preceitos de exegese
constitucional. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – R. TCMG, Belo
Horizonte, v. 35, n. 2, p. 15-46, abr./jun. 2000. p. 17.
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Revista Jurídica 442
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Agosto/2014

Com efeito, uma vez reconhecido qualquer direito fundamental, a sua


ablação e a sua inviabilização de exercício mostram-se inconstitucionais.
Nessa ordem de considerações, todo aplicador precisa assumir, especial-
mente ao lidar com os direitos fundamentais, que a exegese deve servir
como energético anteparo contra o descumprimento de preceito funda-
mental, razão pela qual deve ser evitado qualquer resultado interpretativo
que reduza ou debilite, sem justo motivo, a máxima eficácia possível dos
direitos fundamentais. Em outras palavras, a interpretação deve ser de molde
a levar às últimas consequências a “fundamentalidade” dos direitos, afirmando a
unidade do regime dos direitos das várias gerações, bem como a presença de direitos
fundamentais em qualquer relação jurídica.32

Há de se salientar, também, que, não obstante vários sejam – ou pos-


sam ser – os intérpretes constitucionais, ainda mais em se tratando de um
Estado como o brasileiro, o qual admite o sistema difuso e concentrado de
controle de constitucionalidade, o Judiciário tem a atribuição, por excelência,
de realizar essa insigne tarefa.
Marcelo Figueiredo ressalta o papel do Judiciário, por longa data, como
garantidor dos direitos civis e da liberdade individual, no Estado de modela-
gem liberal e o Estado Democrático e de Direito ao qual o Brasil se propõe a
ser exige do Judiciário a tutela dos direitos sociais, sem que isso seja invasão
da seara de competência dos demais poderes33.
Entenda-se, ademais, que o Poder Judiciário, além de ser o Poder cons-
titucionalmente consagrado para a interpretação constitucional, é aquele que
deve possuir imparcialidade ao realizar a prestação jurisdicional. Embora
não esteja ele comprometido com interesses como porventura pode ocorrer
com o Executivo e Legislativo, deve, sim, haver uma atuação afirmativa das
Cortes de Justiça no sentido da promoção dos direitos fundamentais quando
de sua atuação. Nesse sentido, pois, não há de se falar em imparcialidade dos
juízes, que, antes e acima de tudo, devem ter compromisso constitucional.
Freitas já se manifestava nesse sentido em duas oportunidades distin-
tas quando assevera que:

32 FREITAS, Juarez. O princípio da democracia e o controle do orçamento público brasileiro.


Revista Interesse Público, Porto Alegre, v. 4, n. esp., p. 11-23, 2002. p. 19. Itálico no original.
33 FIGUEIREDO, Marcelo. O controle das políticas públicas pelo Poder Judiciário no Brasil
– Uma visão geral. In: Interesse Público – IP, Belo Horizonte, v. 9, n. 44, p. 27-66, jul./ago.
2007. p. 40.
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Ora, em face de ser o juiz o detentor único da jurisdição, surge o amplo


e irrenunciável direito de amplo acesso à tutela jurisdicional como uma contra-
partida lógica a ser profundamente respeitada, devendo ser proclamado este
outro vetor decisivo no processo de interpretação constitucional: na dúvida,
prefira-se a exegese que amplie o acesso ao Judiciário, por mais congestionado que
este se encontre, sem embargo de providências inteligentes para desafogá-lo,
sobretudo coibindo manobras recursais protelatórias e estabelecendo que o Su-
premo Tribunal Federal deva desempenhar exclusivamente as atribuições
relacionadas à condição de Tribunal Constitucional, sem distraí-lo com ta-
refas diversas destas, já suficientemente nevrálgicas para justificar a exis-
tência daquela Corte.34
[...]
Almejo, finalmente, deixar consignado que se mostra indispensável apos-
tar no Poder Judiciário brasileiro, em sua capacidade de dar vida aos pre-
ceitos ilustrativamente formulados e crer na sua fundamentada sensibili-
dade para o justo, razão pela qual insisto em proclamar que todos os juízes,
sem exceção, precisam, acima de tudo, ser respeitados, fazendo-se respei-
tar, como juízes constitucionais.35

Logo, diante das considerações aqui tecidas, vislumbra-se a importân-


cia da interpretação constitucional como instrumento de realização dos direi-
tos fundamentais36.

34 FREITAS, Juarez. O intérprete e o poder de dar vida à Constituição: preceitos de exegese


constitucional. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – R. TCMG, Belo
Horizonte, v. 35, n. 2, p. 15-46, abr./jun. 2000. p. 29-30. Itálico no original.
35 Idem. O princípio da democracia e o controle do orçamento público brasileiro. Revista
Interesse Público, Porto Alegre, v. 4, n. esp., p. 11-23, 2002. p. 4. Itálico no original.
36 Nesse sentido são as contribuições de Fachin, para quem “[...] três perspectivas se
presentificam em direção ao porvir: de uma parte, considerando-se que um Código
que não está na ordem do dado, uma dimensão criativa é a que fará, sob as luzes da
jurisprudência, doutrina e legislação superveniente, a concretude real e efetiva da Lei
nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002; de outra parte, uma teoria crítica, inclusive por coerência,
deve estar no campo do inacabado, do refazimento permanente, o que se alça como
alavanca metodológica de análise e não apenas como dissecção estável de seu objeto; e por
derradeiro, a dimensão constitucional do direito civil brasileiro contemporâneo abarca,
ao lado dos horizontes formais e substanciais dessa base, a perspectiva de reconstrução
incessante do próprio direito civil para que, no limite, acerte o passo com as demandas de
seu tempo, e na possibilidade, contribua na edificação da justiça” (FACHIN, Luiz Edson.
Teoria crítica do direito civil: à luz do novo Código Civil brasileiro. 3. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2012. p. 363).
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3 CLÁUSULAS GERAIS, SEGURANÇA JURÍDICA E INTERPRETAÇÃO


CIVIL-CONSTITUCIONAL

Inicialmente, registre-se que a interpretação judicial não é arbitrária,


mas vinculada. As cláusulas gerais, cuja liberdade de significados de confor-
mação encontra limite nos princípios constitucionais, promovem a interpre-
tação e aplicação do Direito por meio da ponderação de valores presentes no
caso concreto por parte do intérprete/juiz.
Dotadas que são de grande abertura semântica, não pretendem as cláu-
sulas gerais dar resposta, previamente, a todos os problemas da realidade,
uma vez que estas respostas são progressivamente construídas pela jurisprudência37.
Assim, a revalorização da confiança como valor preferencialmente tu-
telável no trânsito jurídico correspondente a uma alavanca para repensar o
direito civil brasileiro contemporâneo e suas categorias fundamentais38.
Nesse ponto, registre-se que a fundamentação constitucional do princí-
pio da boa-fé assenta na cláusula geral de tutela da pessoa humana39.
Isso porque as “cláusulas gerais contidas na codificação civil, como a
boa-fé objetiva e a função social do contrato, serão preenchidas, no caso con-
creto, conforme valores, regras e princípios constitucionais”40.
Veja-se que
[...] o Direito é um fenômeno profundamente social, o que revela a impos-
sibilidade de se estudar o direito civil sem que se conheça a sociedade na
qual ele se integra, bem como a imbricação entre suas categorias e essa
sociedade.
Nomeadamente o direito positivado é profundamente histórico e contex-
tualizado. Assim procedendo, ele opera a definição de uma moldura que
se assenta em um juízo de inclusão e de exclusão, segundo esses valores
dominantes, por meio de categorias jurídicas.

37 MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo


obrigacional. 1. ed. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 299. Itálico no original.
38 FACHIN, Luiz Edson (Coord.). Repensando fundamentos do direito civil brasileiro
contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p. 115.
39 NEGREIROS, Teresa. Teoria do contrato: novos paradigmas. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2006. p. 117.
40 HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes; TARTUCE, Flávio. O princípio da
autonomia privada e o direito contratual brasileiro. In: Direito contratual: temas atuais.
São Paulo: Método, 2007. p. 41-80, p. 51-52.
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Tratar da configuração clássica do sujeito e das transformações conceituais


pelas quais o sujeito passou constitui uma tentativa de localizar, nestes dois
últimos séculos, o indivíduo abstratamente considerado, elevado ao pata-
mar da juridicidade no que se designou como sujeito. Ao final do século
XX, portanto, séculos depois da vigência do estatuto moderno fundamen-
tal da apropriação dos bens, da titularidade e do sujeito – o Código Civil
napoleônico – esboça-se uma tentativa de superação do sujeito abstrato,
com a construção do sujeito concreto, agregando-se àquela noção de cida-
dania. Eis aí o porvir do direito civil.
Sujeito concreto e cidadania não se assentam na razão de uma compreen­
são exclusivamente abstrata do sujeito: passa a ter sentido o plano do seu
conteúdo, bem como suas projeções concretas. Com isso, é possível afir-
mar que, quando a Constituição Brasileira de 1988 tutela o direito à vida
– e coloca em um primeiro grau o direito de personalidade –, situando
em um primeiro patamar o sujeito, não está fazendo homenagem àquele
sujeito abstrato do sistema clássico. Refere-se a um novo sujeito, alguém
que tenha uma existência concreta, com certos direitos constitucionalmen-
te garantidos: vida, patrimônio mínimo (que compreende habitação) e so-
brevivência.41

Assim, no que se refere a critérios para se obter segurança jurídica


diante de um sistema normativo aberto, consoante Martins-Costa, deve ser
“vista a lei não como limite, mas como ponto de partida para a criação e o de-
senvolvimento do direito, manifesta-se a utilidade das cláusulas gerais”42.
Ademais, adverte que
[...] toda e qualquer reconstrução dogmática está, em primeiro lugar, atada
aos valores e diretivas do ordenamento, que exige do juiz não apenas ato
de vontade, mas, fundamentalmente, ato de conhecimento e de responsabi-

41 FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do direito civil: à luz do novo Código Civil brasileiro.
3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2012. p. 206-207. Acrescenta o autor: “Infere-se que a regra
do Direito, em si mesma, se confronta com uma crise de racionalidade, uma incapacidade
crescente de dar conta da realidade. O Direito não é mais um redutor do real, e ele não
mais o contém. Justifica-se a insistência em centrar e colocar no palco da relação entre
Direito e a sociedade o problema de assimetria, a relação de interdependência, exatamente
para que fique claro o fato de que é o Direito que está na sociedade e não vice-versa.
Já não é o Direito que dá conta das relações sociais. Embora isso pareça uma flagrante
obviedade, em um sistema dominado por uma orientação monolítica e concentrada, o
reconhecimento dessa realidade se mostra relevante” (p. 247-248).
42 MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo
obrigacional. 1. ed. 2. tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p. 292. Itálico no original.
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lidade, razão pela qual a exigência constitucional da motivação da sentença


deve ser acrescida pela mais completa explicitação dos elementos de fato e
de direito que ensejaram, na hipótese examinanda, a invocação da boa-fé.43

Logo, não se pode afirmar que a presença das cláusulas gerais sacrifi-
cam a segurança jurídica do ordenamento, eis que, embora reclamem uma
maior atuação do juiz-intérprete, os princípios constitucionais atuam no sen-
tido de limitar a interpretação e restringir a discricionariedade judicial.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, conclui-se que a segurança jurídica do ordenamen-


to, diante de normas de tessitura aberta como as cláusulas gerais no Código
Civil de 2002, é preservada por meio de uma interpretação civil-constitucio-
nal que prestigie os princípios-vetores da Carta Maior.
O caráter discricionário de decisões judiciais que envolvem textos de
textura aberta com conceitos indeterminados demanda uma interpretação
construtiva para o deslinde dos hard cases44. Ressalte-se que esse poder discri-
cionário dos juízes não se presta para legitimar arbitrariedades. Muito antes
pelo contrário, trata-se de uma parcela de liberdade nas escolhas interpreta-
tivas que o Magistrado possui, porém uma liberdade que encontra controle e
limite no Texto Magno.
Diga-se isso em razão de que essas escolhas não devem se dar de modo
irrestrito e desarrazoado. Defende-se aqui que o limite da discricionariedade
judicial deve ter como fundamento último a supereficácia social dos direitos
fundamentais nas relações intersubjetivas. Ou seja, a justificação dessa atua­
ção com discrição do juiz encontra ressonância no fundamento do próprio
sistema jurídico, isto é, o princípio da dignidade da pessoa humana.

43 MARTINS-COSTA, Judith (Org.). A reconstrução do direito privado: reflexos dos princípios,


diretrizes e direitos fundamentais constitucionais no direito privado. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002. p. 657-658. Nesse passo, interessante registrar também que “[...] no
Direito os valores são capturados e desvendados pelas quatro fontes de produção de
normatividade jurídica, quais sejam, a legislativa, a jurisprudencial, a costumeira e a
negocial, sendo operacionalizados pelos modelos jurídicos [...]. Um modelo dogmático
sintetizará, contudo, a totalidade dos valores: será o que tem a pessoa humana como
‘valor fonte’ do ordenamento [...]” (MARTINS-COSTA, Judith; BRANCO, Gerson Luiz
Carlos. Diretrizes teóricas do novo Código Civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 176).
44 Expressão usada por DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. Nelson Boeira.
São Paulo: Martins Fontes, 2002.
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100
Revista Jurídica 442
Doutrina Civil
Agosto/2014

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______. O direito privado como um “sistema em construção”: as cláusulas gerais no
Projeto de Código Civil brasileiro. Disponível em: <http://www6.ufrgs.br/ppgd/
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TEPEDINO, Gustavo. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República.
2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, v. I, 2007.
______. Crise de fontes normativas e técnica legislativa na parte geral do Código
Civil de 2002. In: TEPEDINO, Gustavo (Coord.). A parte geral do novo Código Civil:
estudos na perspectiva civil-constitucional. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:
Renovar, 2003.

101
Doutrina
Penal

A Magnitude da Lesão Como


Circunstância Autorizadora da
Prisão Preventiva nos Crimes Contra
o Sistema Financeiro Nacional
L indomar L uiz D ella L ibera
Advogado em Curitiba, devidamente inscrito na Seccional
Paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil sob o nº 58.968,
Pós-Graduando em Direito Penal e Direito Processual Penal e em

Doutrina Penal
Direito Público pelo Complexo Jurídico Damásio de Jesus.

RESUMO: O objeto deste estudo é a análise do conteúdo e


aplicação da magnitude da lesão prevista no art. 30 da Lei
nº 7.492/1986 como circunstância autorizadora da prisão pre-
ventiva. Discutem-se questões relacionadas ao significado da
expressão “magnitude da lesão”, a natureza jurídica da prisão
preventiva, as principais posições doutrinárias, bem como re-
aliza-se uma retrospectiva da aplicação do instituto pelos Tri-
bunais Regionais Federais e Superiores. Como fontes, utiliza a
pesquisa bibliográfica e jurisprudencial. O estudo é relevante
na medida em que analisa a legitimidade e o cabimento da pri-
são, seja isoladamente, seja com a associação da magnitude da
lesão à garantia da ordem pública ou da ordem econômica e
demais circunstâncias do art. 312 do Código de Processo Penal.

PALAVRAS-CHAVE: Processo penal; prisão preventiva; mag-


nitude da lesão.
Revista Jurídica 442
Doutrina Penal
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SUMÁRIO: 1 Considerações iniciais; 2 A magnitude da lesão pre-


vista no artigo 30 da Lei nº 7.492/1986; 3 A magnitude da lesão e
a ordem econômica; 4 A magnitude da lesão e a ordem pública;
5 A decretação da prisão preventiva pautada na magnitude da lesão;
6 Considerações finais; Referências.

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A prisão preventiva representa uma medida extrema e sempre foi alvo


de larga discussão, tanto na doutrina quanto na jurisprudência. Desde a pre-
visão inicial no art. 312 do Código de Processo Penal, houve enorme avanço
na interpretação tanto do instituto quanto das suas circunstâncias autoriza-
doras primitivas, quais sejam: garantia da ordem pública, aplicação da lei
penal e conveniência para a instrução criminal.
Contudo, o tema ainda ganhou novo contorno em 1986, com o advento
da Lei nº 7.492/1986, a Lei dos Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacio-
nal. O referido diploma introduziu no ordenamento, por meio do seu art. 30,
mais uma circunstância supostamente autorizadora da prisão preventiva, a
chamada “magnitude da lesão causada”.
Nessa linha, toda a discussão que já reinava acerca das circunstâncias
Doutrina Penal

primitivas da prisão preventiva previstas no art. 312 foi então estendida à


magnitude da lesão causada. Ainda, a polêmica foi renovada com a introdu-
ção no art. 312 do Código de Processo Penal, da “garantia da ordem econô-
mica” pela Lei nº 8.884/1994, a chamada Lei Antitruste.
Assim, passados mais de 27 anos do nascimento da Lei nº 7.492/1986,
hodiernamente, a magnitude da lesão causada e as demais circunstâncias do
art. 312 do Código de Processo Penal continuam em evidência, dada a hipó-
tese excepcional de segregação que representam.
Ademais, mesmo com a vigência da Lei nº 12.403, de 4 de maio do ano
de 2011, conhecida como a Nova Lei da Prisão Cautelar, o tema permanece
atual, visto que o mencionado diploma não tocou na magnitude da lesão,
tampouco em seus contornos. Portanto, mesmo com as inovações operadas
pela lei acima mencionada, o tema continua desafiando os aplicadores do
Direito.
Destarte, ante a necessidade de enfrentamento e compreensão deste
mal necessário, que é a prisão preventiva, o presente almejou analisar sob
104
Revista Jurídica 442
Doutrina Penal
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diversos aspectos a aplicação da magnitude da lesão causada no Direito bra-


sileiro.
Nesse sentido, embora não haja a pretensão de esgotar o tema e muito
menos de lançar um entendimento inquestionável sobre o assunto, existe,
sim, a tentativa de colaborar na interpretação e na aplicação da magnitude
da lesão como circunstância autorizadora da prisão preventiva nos crimes
contra o Sistema Financeiro Nacional.
Outrossim, advirta-se desde já o caro leitor que este não é o espaço
para conceituação e análise mais aprofundada do Sistema Financeiro pro-
priamente dito, dos tipos penais previstos na Lei nº 7.492/1986, da integração
com outros diplomas legais, em especial com a Lei nº 8.137/1990. Apesar da
relevância dos referidos assuntos, o objeto será restrito ao aspecto processual
da prisão preventiva pautada na magnitude da lesão.
Deste modo, nesta humilde tentativa, ora se lançou mão do entendi-
mento jurisprudencial, da hermenêutica, da análise dos fins da lei dos crimes
contra o Sistema Financeiro Nacional, da natureza jurídica das prisões caute-
lares e, principalmente, da opinião doutrinária. Vale ressaltar que o presente
estudo é, acima de tudo, um convite para uma reflexão do leitor sobre o tema.

2 A MAGNITUDE DA LESÃO PREVISTA NO ARTIGO 30 DA LEI


Nº 7.492/1986

Inicialmente, cumpre ressaltar que a redação da Lei nº 7.492/1986, de


maneira geral, bem como especialmente a do seu art. 30, padeceu de melhor
técnica jurídica e, em que pesem os mais de vinte anos de vigência do diplo-
ma legal, hodiernamente, doutrina e jurisprudência não economizam críticas.
Assim, ainda que com redação obscura, a magnitude da lesão está pre-
vista no art. 30 da Lei nº 7.492/1986, o qual estatui:
Art. 30. Sem prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Pe-
nal, aprovado pelo Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941, a prisão
preventiva do acusado da prática de crime previsto nesta lei poderá ser
decretada em razão da magnitude da lesão causada (VETADO).

Contudo, o que nem todos observam é que a redação aprovada e cons-


tante no art. 30 da Lei nº 7.492/1986 é diferente da proposta original encami-
nhada ao Poder Executivo para sanção, pois inicialmente havia, no final do
dispositivo, a expressão “ou do clamor público provocado”.
105
Revista Jurídica 442
Doutrina Penal
Agosto/2014

Deste modo, constata-se que o texto original congregava duas hipóteses


autônomas para a prisão preventiva nos crimes contra o sistema financeiro,
quais sejam: a magnitude da lesão causada ou o clamor público provocado.
Ocorre que o então Presidente da República da época, José Sarney, na
mensagem de veto nº 252, de 16 de junho de 1986, vetou a expressão “ou do
clamor público provocado” sob o seguinte argumento:
No art. 30, a expressão “ou do clamor público provocado”, porque a decre-
tação de prisão preventiva é medida cautelar penal, com o objetivo de evi-
tar que, da liberdade do acusado, possam resultar outros crimes ou, ainda,
sua fuga ou interferência na colheita de provas, e não é jurídico que decisão
de tamanha gravidade restritiva da liberdade individual, seja tomada em
razão de circunstâncias emocionais. (1986, p. 01)

O veto presidencial, ao suprimir a expressão “ou do clamor público


provocado”, parece ter previsto uma série de polêmicas que seriam ocasio-
nadas pela redação do dispositivo, bem como contribuiu para a facilitação da
compreensão do já confuso art. 30 da Lei nº 7.492/1986.
Em suas razões, nada foi mais correto e constitucional do que o afas-
tamento de circunstâncias emocionais do rol de hipóteses autorizadoras de
uma prisão cautelar, ficando ainda claro que não seria jurídico a adoção de
uma medida de extrema gravidade com base em circunstâncias emocionais e
subjetivas representadas pelo “clamor público provocado”.
Desta forma, em que pese vetado “o clamor público provocado”, a
magnitude da lesão permaneceu, e, ao que tudo indica, tal fato se deve ao
preliminar reconhecimento pelo Poder Executivo da sua plausibilidade e re-
levância jurídica, do contrário seguiria a mesma sorte da primeira.
Contudo, a palavra “magnitude” aparenta ser imprecisa, bem como
não apresenta substancial significado jurídico, fato agravado em vista da in-
feliz redação do art. 30 da Lei nº 7.492/1986. Assim, a compreensão da apli-
cação e dos fundamentos da prisão preventiva nos crimes contra o Sistema
Financeiro Nacional passa, necessariamente, pela análise inicial e elementar
do significado e origens do verbete “magnitude”.
Segundo o Dicionário Aurélio de Língua Portuguesa, “magnitude”
vem do latim “magnitudine” e significa “importância”, “grandeza” (1999,
p. 1255).
106
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Doutrina Penal
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Em razão disso, outra conclusão não há senão a de que a inclusão da


magnitude pelo legislador foi realizada com a intenção de ressaltar a dimen-
são, extensão, abrangência do prejuízo ocasionado em vista da prática crimi-
nosa.
Por outro lado, inobstante a preocupação do legislador com o abalo e
dimensão dos prejuízos causados, é certo que magnitude possui uma enorme
carga valorativa, fato que implica conclusões muito subjetivas do julgador,
pois o que é magno para alguns nem sempre será para outros. Logo, na com-
preensão da intenção do legislador, reside mais um entrave para a decretação
da prisão preventiva pautada na magnitude da lesão, a qual sempre estará
vulnerável, em cada caso concreto, a um juízo particular do julgador.

3 A MAGNITUDE DA LESÃO E A ORDEM ECONÔMICA

Vistos a redação do art. 30 da Lei nº 7.492/1986 e o aparente significado


do verbete “magnitude”, cumpre enfrentar a possibilidade e a necessidade
da associação da garantia da ordem econômica com a magnitude da lesão
na decretação da prisão preventiva. Em especial porque é uma prática fre-
quentemente visualizada, e, ao que tudo indica, sua ocorrência se deve pela
especial ligação daquela com o bem jurídico tutelado nos delitos financeiros.
Em relação à ordem econômica, é certo que até hoje não foi possível
justificar processualmente o sentido específico de sua inclusão no art. 312
do Código de Processo Penal pela Lei nº 8.884/1994, em especial frente à
sua questionável natureza jurídica cautelar e destoante lógica processual in-
compatível com as circunstâncias de conveniência para a instrução criminal
e necessidade de assegurar a aplicação da lei penal, também previstas no
art. 312 do Código de Processo Penal.
Porém, partindo-se da conclusão de que a ordem econômica é espécie
do gênero ordem pública, não é de se estranhar que a magnitude da lesão,
circunstância bem mais específica e diretamente vinculada aos delitos da Lei
nº 7.492/1986, não pudesse passar em branco sem a sua direta vinculação
com a ordem econômica.
Isso significa dizer que é difícil ou mesmo pouco provável – e a ju-
risprudência tem mostrado isso – que na decretação da prisão pautada na
magnitude da lesão não se reconheça a necessidade de tutelar a garantia da
ordem econômica. Isso porque, queira ou não, há uma correlação direta dos
fins, e a ordem econômica tem uma dimensão mais ampla que a magnitude
107
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Doutrina Penal
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da lesão, o que facilita com que se amolde a praticamente qualquer situação


ligada aos delitos contra o sistema financeiro.
Nessa linha, é rica a jurisprudência que associa a magnitude da lesão
à ordem econômica e, algumas vezes, também com a ordem pública. Tal ex-
pediente pode ser encontrado no HC 40.818/RJ e no HC 100.315/SP, este
último a seguir citado, ambos oriundos do Superior Tribunal de Justiça:
HABEAS CORPUS – PROCESSUAL PENAL – OPERAÇÃO “GRANDES
LAGOS” – CRIMES DE SONEGAÇÃO FISCAL, FALSIDADE IDEOLÓ-
GICA, FORMAÇÃO DE QUADRILHA, OCULTAÇÃO DE CAPITAIS E
CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA – PRISÃO PREVENTIVA DO PACIEN-
TE SATISFATORIAMENTE FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA
ORDEM PÚBLICA E DA ORDEM ECONÔMICA – COMPLEXIDADE
DO FEITO – DIVERSIDADE DE RÉUS – EXCESSO DE PRAZO – INO-
CORRÊNCIA – PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE – PRECEDENTES –
1. [...] 2. O Juízo do feito, ao decretar a prisão preventiva do ora paciente,
apresentou fundamentação idônea, com dados concretos do processo, para
demonstrar a necessidade da segregação do acusado para se preservar a
ordem pública e evitar, assim, a reiteração e a continuidade da atividade
ilícita que, conforme se destacou, encontra-se estruturada para a prática de
crimes. 3. Ressaltou, ainda, a magnitude da quantia sonegada e desviada pela qua-
drilha, estimada em aproximadamente 1 (um) bilhão de reais, o que revela a peri-
culosidade da organização criminosa, impondo ao Poder Judiciário pronta atuação,
para a cessação do prejuízo público e garantia da ordem econômica. 4. [...]. (Su-
perior Tribunal de Justiça, Habeas Corpus nº 100.315/SP, Relª Min. Laurita
Vaz, Julgado em 08.05.2008 – grifei)

Diante do exposto, é apropriado concluir que a magnitude da lesão


guarda estreito vínculo com a garantia da ordem econômica, sendo indiscutí-
vel a possibilidade da associação de ambas nos decretos prisionais.

4 A MAGNITUDE DA LESÃO E A ORDEM PÚBLICA

A magnitude da lesão, conforme visto, guarda estreita relação com a


garantia da ordem econômica. Em relação à garantida da ordem pública, não
poderia ser diferente, eis que a mesma sorte é traçada devido, ao que tudo
indica, às amplas possibilidades de interpretação e aplicação desta última
circunstância.
Em vista disso, ressalte-se a ausência de definição precisa da expressão
ordem pública, sendo comum a sua valoração e imposição fundamentada em
108
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Doutrina Penal
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cada caso concreto, havendo, porém, o entendimento da sua assimilação ao


justo receio de que o delito volte a se repetir no seio social.
Nesse passo, é sabido que a magnitude da lesão, por sua própria na-
tureza, está quase sempre associada a casos de considerável repercussão na
mídia, os quais envolvem cifras pecuniárias altíssimas e, por isso, de certa
forma, exigem reprimenda exemplar para o resguardo da ordem pública e,
algumas vezes, até da ordem econômica. Tal expediente é possível princi-
palmente na visão – questionável – daqueles que associam a ordem pública
ao resgate da credibilidade da justiça e do sistema financeiro frente ao seio
social, bem como dos que receiam que a prática criminosa se reitere.
Desta forma, há algum tempo, a jurisprudência tem demonstrado a
associação da garantia da ordem pública e a magnitude da lesão, merecendo
especial destaque o HC 14.270/SP, ainda do ano 2001 do Superior Tribunal
de Justiça. Confira-se:
HABEAS CORPUS – SUSTENTAÇÃO ORAL – FALTA – CONSEQUÊN-
CIA – SÚMULA Nº 394/STF – REVOGAÇÃO – PRISÃO PREVENTIVA –
ORDEM PÚBLICA – MAGNITUDE DA LESÃO – FUGA – 1. [...] 3. O desvio
de vultosas quantias dos cofres públicos causa repercussão negativa na opinião
pública, até mesmo em função da publicidade opressiva envolvente do caso e invoca
a garantia da ordem pública, aliada à magnitude da lesão, a justificar o decreto
de prisão preventiva, com fundamento no art. 30 da Lei nº 7.492, de 1986, c/c o
art. 312 do CPP. 4. Não merece censura o julgado local ao amparar-se, tam-
bém, no fato objetivo da fuga, malgrado em recurso exclusivo da defesa,
cabendo ponderar, diante da notoriedade dos acontecimentos, que o Judi-
ciário não pode e nem deve ficar alheio a eles, levando-os, pelo contrário,
na devida linha de conta em suas decisões, deixando de ser, na linguagem
do Ministro Francisco Campos, “um espectador inerte”. [...]. 5. Ordem ne-
gada. (Superior Tribunal de Justiça, Habeas Corpus nº 14.270/SP, Rel. Min.
Fernando Gonçalves, Julgado em 19 de março de 2001 – grifei)

Vale ainda lembrar que, ao longo dos anos, a garantia da ordem públi-
ca foi associada com a magnitude da lesão em decisões de vários Tribunais
Regionais Federais, mas sempre merecendo destaque especial a manutenção
destas decisões pelo Superior Tribunal de Justiça, a exemplo dos Recursos
Especiais nºs 754.255/PR e 662.356/RS.
Desta feita, pode-se advogar a estreita relação da ordem pública com
a magnitude da lesão, especialmente em vista do reconhecimento constante
109
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destas circunstâncias representativas do periculum libertatis nas decisões ju-


diciais.
Outrossim, uma vez mais importa pontuar a fácil associação da ordem
pública com a magnitude da lesão dada a valoração, na maioria das vezes,
profundamente subjetiva da primeira. Ademais, não é forçoso reconhecer
que um dano de magnitude, altíssimo ao Sistema Financeiro Nacional, causa
abalo à ordem pública, a qual, na maioria das vezes, deve ser resguardada.

5 A DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA PAUTADA NA


MAGNITUDE DA LESÃO

Vistos o significado do termo “magnitude” e a sua associação com a ga-


rantia da ordem pública e da ordem econômica, surge imperiosa necessidade
da sua análise singular dissociada de qualquer outra circunstância autônoma
do periculum libertatis prevista no art. 312 do Código de Processo Penal.
Nessa trilha, é mister a interpretação do trecho inicial do art. 30 da Lei
nº 7.492/1986, o qual estatui: “Sem prejuízo do disposto no art. 312 do Códi-
go de Processo Penal [...]”.
Em análise do referido enunciado, a primeira conclusão unânime ex-
traída, tanto na doutrina quanto na jurisprudência, é que, para a decretação
da prisão, devem existir indícios suficientes de autoria e prova da existência
do crime, os quais são pressupostos essenciais de qualquer preventiva cons-
tituindo o fumus commissi delicti do instituto.
Contudo, a grande questão surge na reflexão acerca da imprescindi-
bilidade ou não da associação da magnitude da lesão com mais alguma cir-
cunstância autônoma da prisão preventiva. Senão, mencione-se que o art. 30
da Lei nº 7.492/1986, seja por sua redação deficiente, seja pela abstração da
expressão magnitude, não foi preciso acerca da obrigatoriedade ou não da
junção da magnitude com a garantia da ordem pública, da ordem econômica,
da conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei
penal.
Em torno deste dilema, surgiram duas interpretações para o art. 30.
A primeira defende a imprescindibilidade da associação da magnitude da
lesão com, no mínimo, uma das circunstâncias específicas e alternativas do
periculum libertatis previstas no art. 312 do Código de Processo Penal. A se-
gunda reconheceu a autonomia da magnitude, bem como a desnecessidade
de sua associação com qualquer daquelas circunstâncias.
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Doutrina Penal
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Destarte, em torno destes entendimentos, tanto a doutrina quanto a ju-


risprudência inicialmente muito debateram. A princípio, existiram decisões
pautadas na segunda orientação, ou seja, considerando unicamente a magni-
tude da lesão causada como suficiente para a decretação da prisão preventi-
va, a exemplo do Habeas Corpus nº 94.01.14136-3, do Tribunal Regional Fede-
ral da 1ª Região, julgado no ano de 1994, e do Habeas Corpus nº 96.02.13407-0,
do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, julgado no ano de 1996.
Contudo, hodiernamente, a primeira orientação tem se logrado domi-
nante em todo o País. O Supremo Tribunal Federal, inclusive, após o julga-
mento do HC 80.717, em 2001, definitivamente considerou que a magnitude
da lesão deveria estar associada com pelo menos uma das circunstâncias do
periculum libertatis do art. 312 do CPP. Confira-se:
HABEAS CORPUS – JULGAMENTO – PEDIDO DE ADIAMENTO –
SUSTENTAÇÃO ORAL – AUSÊNCIA DO ADVOGADO NA SESSÃO –
PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA – PREVENÇÃO – PRINCÍPIO DO JUIZ
NATURAL – SÚMULA/STF 394 – CANCELAMENTO – CONEXÃO EN-
TRE TRÊS AÇÕES PENAIS – ALEGAÇÃO DE OBRIGATORIEDADE DE
REUNIÃO DE PROCESSOS AFASTADA – CPP, ART. 80 – PRISÃO PRE-
VENTIVA – REVOGAÇÃO – REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP PREEN­
CHIDOS – APLICAÇÃO DO ART. 30 DA LEI Nº 7.492/1986 – 1. [...];
4. Verificados os pressupostos estabelecidos pela norma processual (CPP, art. 312),
coadjuvando-os ao disposto no art. 30 da Lei nº 7.492/1986, que reforça os motivos
de decretação da prisão preventiva em razão da magnitude da lesão causada, não
há falar em revogação da medida acautelatória. A necessidade de se resguardar a
ordem pública revela-se em consequência dos graves prejuízos causados à credi-
bilidade das instituições públicas. 5. Habeas corpus indeferido. (Supremo Tri-
bunal Federal, Habeas Corpus nº 80717, Relª Min. Ellen Gracie, Julgado em
13.06.2001 – grifei)

O entendimento expressado no HC 80.717/2001, anteriormente men-


cionado, pode ser minuciosamente visualizado e compreendido na trans-
crição do seguinte trecho do voto da Excelentíssima Senhora Ministra
Ellen Gracie, no qual ressaltada a forma de interpretação do art. 30 da Lei
nº 7.492/1986:
Que a lesão aos cofres públicos ocorreu, nem o paciente contesta. Que
seu vulto seja elevado, tampouco. Estão presentes fortes indícios que o
apontam como um dos possíveis responsáveis pelo desvio. Aí estão, sem
sofisma, os requisitos postos pelo art. 312 do Código de Processo Penal
que o Magistrado associa, coadjuvando-os ao disposto pelo art. 30 da Lei
111
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Doutrina Penal
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nº 7.492/1986. Foi apropriada a aplicação desse dispositivo, que em meus


julgados perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região sempre apliquei
conjugadamente, tal como o fez o Juízo Monocrático, com o disposto no
art. 312 do CPP. Esta me parece ser a leitura adequada da cláusula “sem
prejuízo do disposto no art. 312 do CPP”, inserida naquele dispositivo. Isso
significa que a magnitude da lesão não é razão autônoma para decreta-
ção da preventiva, mas que essa dimensão deve ser considerada, quando
presentes os pressupostos que a autorizam. (Supremo Tribunal Federal,
Habeas Corpus nº 80.717, Relª Min. Ellen Gracie, Julgado em 13.06.2001)

A partir de então, o Supremo Tribunal Federal definitivamente firmou


orientação acerca da imprescindibilidade da associação da magnitude com
alguma das circunstâncias representativas do periculum libertatis contidas no
art. 312 do Código de Processo Penal, fato que desconsiderou a capacidade
singular da magnitude da lesão para embasar uma prisão preventiva. Ainda,
em julgamentos posteriores, pontuou que a magnitude é elemento do tipo
penal e, portanto, neutra para o fim da prisão por si só. Vejamos:
PRISÃO PREVENTIVA – EXCEPCIONALIDADE – Ante o princípio cons-
titucional da não culpabilidade, a custódia acauteladora há de ser tomada
como exceção, cumprindo interpretar os preceitos que a regem de forma
estrita, reservando-a a situações em que a liberdade do acusado coloque em
risco os cidadãos, especialmente aqueles prontos a colaborarem com o Es-
tado na elucidação de crime. PRISÃO PREVENTIVA – LEI Nº 9.034/1995 –
MAGNITUDE DA LESÃO – MEIO SOCIAL – CREDIBILIDADE DO JUDI-
CIÁRIO – A magnitude da lesão é elemento do tipo penal, sendo neutra para efeito
de segregação preventiva. O clamor social, na maioria das vezes a envolver
visão apaixonada, não serve ao respaldo da custódia precária e efêmera, o
mesmo devendo ser dito quanto ao prestígio do Judiciário, a quem incum-
be, independentemente de fatores atécnicos, da capa do processo, da reper-
cussão do crime, guardar a mais absoluta equidistância, decidindo à luz da
ordem jurídica. (Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus nº 82909/PR,
Rel. Min. Marco Aurélio, Julgado em 05.08.2003 – grifei)

A mesma orientação foi adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, o


qual, reiteradamente, tem reconhecido a necessidade de alguma das circuns-
tâncias do periculum libertatis do art. 312 do Código de Processo Penal, acom-
panhar a magnitude da lesão, a exemplo do Recurso Especial nº 772.504/PR
e do Habeas Corpus nº 47.712/RJ.
No âmbito dos Tribunais Regionais Federais, o tema assumiu idênti-
co contorno, havendo reiteradas decisões em todas as regiões sustentando a
112
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Doutrina Penal
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primeira orientação, qual seja: a imprescindibilidade de associação da mag-


nitude da lesão com alguma circunstância específica do art. 312 do Código de
Processo Penal. A exemplo, são esclarecedores o Recurso em Sentido Estrito
nº 2007.38.00.037373-4/MG, do Tribunal Federal da Primeira Região, o Re-
curso em Sentido Estrito nº 2008.61.81.000280-2/SP, do Tribunal da Terceira
Região, e o Habeas Corpus nº 2006.04.00.009070-2, do Tribunal da Quarta Re-
gião, este último citado a seguir:
PROCESSO PENAL – HABEAS CORPUS – CRIMES FINANCEIROS –
EVASÃO DE DIVISAS – LAVAGEM DE DINHEIRO – INCOMPETÊNCIA
DO JUÍZO – NÃO CONFIGURAÇÃO – EXCESSO DE PRAZO – CONS-
TRANGIMENTO ILEGAL – INOCORRÊNCIA – IMPROVÁVEL MANU-
TENÇÃO DA CONDUTA DELITIVA – RISCO À ORDEM PÚBLICA – IN-
SUBSISTÊNCIA – 1. [...]; 4. Comprovado o bloqueio das contas utilizadas para a
prática do ilícito, e não havendo notícia de outras contas investigadas ou empresas
constituídas através das quais o paciente tivesse a oportunidade de reiterar a con-
duta, não mais subsiste o requisito alternativo da garantia da ordem pública, sendo
que a magnitude da lesão, por si só, não justifica a medida extrema. (Tribunal
Regional Federal da 4ª Região, Habeas Corpus nº 2006.04.00.009070-2, Rel.
Des. Néfi Cordeiro, Julgado em 25.04.2006 – grifei)

Noutro giro, existe orientação do Tribunal Regional da 4ª Região, o


qual, em um passado não muito distante, adotava posicionamento mais fle-
xível acerca da presença das demais circunstâncias do art. 312 do Código de
Processo Penal. Segundo essa linha, a magnitude não autorizaria, por si só, a
prisão, mas os demais requisitos do art. 312, os quais deveriam acompanhá-
-la, prescindiam de uma higidez irrefutável. Logo, presente a magnitude da
lesão e havendo meros indícios de afronta a qualquer uma das circunstâncias
do art. 312, havia possibilidade de interpretação mais elástica da primeira,
autorizando-se a preventiva. Confira-se:
HABEAS CORPUS – CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO – CUS-
TÓDIA PROVISÓRIA – APELAÇÃO – ART. 30 DA LEI Nº 7.492/1986 E
ART. 312 DO CPP – MAGNITUDE DA LESÃO E POSSIBILIDADE DE
FUGA – ORDEM DENEGADA – 1. A interpretação que se deve dar ao art. 30
da Lei nº 7.492/1986 é a de que, nos crimes contra o sistema financeiro, havendo
magnitude da lesão, a presença dos pressupostos previstos no art. 312 do CPP
constitui uma exigência mais elástica. Assim, se for reconhecida a possibilidade
mínima de perigo à ordem pública ou econômica, fuga do agente ou influência
na prova, sendo grave a lesão ao sistema financeiro, estará justificada a custódia
provisória. 2. A acusação à paciente de fraude aos consumidores na ativida-
de de administração de consórcio importa o reconhecimento de um vulto
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Doutrina Penal
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significativo de prejuízo. Exatamente por isso o clamor público na Cidade


de Caxias do Sul, quando descobertos os fatos imputados na ação penal.
3. Nos crimes de colarinho branco, é comum que o produto integral do
delito não seja encontrado, porque em geral abrigado em paraísos fiscais.
A fuga, portanto, passa a constituir uma possibilidade. E a mínima existên-
cia de um dos requisitos da prisão preventiva (art. 312 do CPP), quando aliada
à magnitude da lesão, como no caso, possibilita a decretação da prisão provisó-
ria. 4. Ordem denegada. (Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Habeas
Corpus nº 2001.04.01.075310-6, Rel. Des. Fábio Bittencourt da Rosa, Julgado
em 13.11.2001 – grifei)

Em doutrina, tanto a redação do art. 30 da Lei nº 7.492/1986 quanto a


expressão “magnitude da lesão” são alvo de críticas, motivo pelo qual a pri-
meira orientação é defendida e seguida pela maior parte dos autores, entre
eles Fausto Martin de Sanctis, para o qual:
A magnitude da lesão, por si só, não pode servir de lastro a uma prisão pre-
ventiva, tendo em vista os seus limites restritos e excepcionais, pois implica
ceifar a liberdade antes mesmo de uma sentença condenatória transitada
em julgado. (Sanctis, 2003)

Semelhante orientação é pregada por José Carlos Tórtima, para o qual


não só o emprego da expressão “magnitude da lesão” foi infeliz, mas tam-
bém a redação do art. 30. Assim, segundo o referido autor, não há utilidade
para a magnitude, visto que deve estar associada a alguma das circunstâncias
previstas no art. 312 do Código de Processo Penal. Vejamos:
[...] eleger-se a magnitude da lesão causada como motivo ensejador da prisão
cautelar parece-nos solução das mais infelizes. Como se não bastasse, a
disposição é inócua, pois a exegese do ora comentado art. 30 não permite
supor que a magnitude da lesão causada, por si só, justifique a prisão pre-
ventiva. Ao contrário, a disposição em causa afirma que ela é aplicável sem
prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, vale dizer, a decre-
tação da custódia preventiva continuaria na dependência dos pressupostos
(materialidade e indícios de autoria) e de uma das quatro circunstâncias ali
elencadas (garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência
da instrução criminal ou segurança da aplicação da lei penal).
Ora, se assim é, bastariam os referidos pressupostos e ainda uma das referi-
das circunstâncias para se adotar a medida excepcional, pouco importando
o exótico requisito da magnitude da lesão. (2000, p. 161, 162 – destaques no
original)
114
Revista Jurídica 442
Doutrina Penal
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No mesmo sentido, Paulo José da Costa Júnior, Maria Elizabeth Queijo


e Charles Marcildes Machado não pouparam críticas ao art. 30 da lei em vista
da interpretação subjetiva da magnitude da lesão e a ausência de sua relevân-
cia, pois só uma lesão patrimonial não pode permitir a imposição da prisão
preventiva. Confira-se:
O art. 30 da Lei nº 7.492/1986 estabelece que poderá ser decretada a pri-
são preventiva do acusado em razão da magnitude da lesão causada, sem
prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, isto é, con-
siderando-se os requisitos impostos pelo referido dispositivo legal já men-
cionados.

A lesão causada referida pelo legislador é de ordem patrimonial. Contudo,


a aferição da magnitude dessa lesão será sempre de cunho subjetivo, tra-
zendo insegurança jurídica à interpretação do dispositivo. Por outro lado,
não parece suficiente a lesão patrimonial, ainda que de grande monta, para
fundamentar decreto de prisão preventiva. Somente se justificaria a medi-
da extrema se a liberdade do acusado pusesse em risco a segurança ou a
credibilidade do Sistema Financeiro Nacional, ou seja, quando efetivamen-
te houvesse necessidade de garantia da ordem pública. (2002, p. 174, 175)

Por consequência, os referidos autores defendem a abrangência da


magnitude da lesão pela circunstância da ordem pública – fato que uma vez
mais denota a inutilidade do art. 30 da Lei nº 7.492/1986 –, bem como o dever
de observância do art. 312 do Código de Processo Penal, também nos delitos
daquele diploma.
Rodolfo Tigre Maia, ainda nos idos do ano de 1996, ao tecer suas consi-
derações sobre o art. 30, chamou a atenção para a interpretação do dispositi-
vo e pontuou a impossibilidade de a magnitude da lesão, por si só, autorizar
a prisão preventiva. Vejamos:
Tendo em vista a excepcionalidade que deve revestir a prisão cautelar, es-
tamos que a exegese deste artigo deverá ser restritiva, sendo o prejuízo
causado, por maior que seja, insuficiente por si mesmo de ensejar a decre-
tação da prisão preventiva, o que parece ter sido a mens legis ao não alterar
a redação do citado art. 312 e, sim, determinar que este fosse considerado
quando do sopesamento da magnitude da lesão. (1996, p. 168)

Porém, em sentido contrário, existem autorizadas vozes que advogam


a possibilidade de a prisão preventiva observar unicamente a magnitude da
lesão causada, desde que haja prova da existência do crime e indícios sufi-
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Doutrina Penal
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cientes de autoria. Sobre tal orientação, é esclarecedor o magistério de Luiz


Carlos dos Santos Gonçalves, ao interpretar o art. 30 da Lei nº 7.492/1986,
em cotejo com o HC 80.717 – já colacionado anteriormente – do Supremo
Tribunal Federal:
Não é este, porém, o teor do citado art. 30 da Lei nº 7.492/1986. Ele fala
em “sem prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal”,
sugerindo-se tratar-se de nova e autônoma situação autorizadora da custó-
dia cautelar. E a lei pode fazê-lo, consoante o permissivo do art. 5º, inciso
LXVI: “Ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir
a liberdade provisória, com ou sem fiança”. Vale dizer: há um espaço le-
gislativo para a previsão da prisão processual, embora a excepcionalidade
desta seja alcançada por meio da presunção de inocência, constante tam-
bém do art. 5º, inciso LVII.
Se o objeto jurídico da Lei nº 7.492/1986 é, como sustentamos, a confiança
das pessoas na higidez do sistema financeiro, a prisão preventiva, presen-
tes a prova da materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria, apre-
senta-se como medida de defesa social necessária para o prosseguimento
regular deste. Não é uma restrição baseada na culpabilidade do réu, mas
também não as mencionadas figuras do art. 312 do Código de Processo
Penal. (2006, p. 14)

O referido autor ainda prossegue defendendo a possibilidade da de-


cretação preventiva não só quando haja necessidade de acautelar o processo,
bem como ressalta a autonomia da magnitude da lesão em vista dos próprios
fins da Lei dos Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional, senão:
Não comungamos com o ponto de vista de que a prisão cautelar só pode
existir quando houver necessidade de acautelar o processo. A possibili-
dade de decretação da prisão preventiva para garantia da ordem pública
bem demonstra, pois ela tem como objeto o processo, mas diretamente, a
sociedade.
A magnitude da lesão causada ao Sistema Financeiro Nacional, em espe-
cial a sua credibilidade, pode justificar autonomamente, portanto, a prisão
preventiva, sem necessidade de incluir esta proteção na rubrica da “ordem
pública” ou exigir risco de descrédito a outras instituições, que não as pró-
prias do sistema financeiro nacional. (2006, p. 14)

Guilherme de Souza Nucci, por sua vez, parece ter seguido o mesmo
caminho acerca da utilidade da magnitude da lesão e, ao que tudo indica,
116
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ressalta a autonomia do requisito em vista da necessidade de manutenção da


credibilidade da justiça. Confira-se:
Não é possível permitir a liberdade de quem retirou e desviou enorme
quantia dos cofres públicos, para a satisfação de suas necessidades pes-
soais, em detrimento de muitos, pois o abalo à credibilidade da justiça é
evidente. Se a sociedade teme o assaltante ou o estuprador, igualmente
tem apresentado termos em relação ao criminoso do colarinho branco.
Note-se o disposto no art. 30 da Lei nº 7.492/1986: “Sem prejuízo do dis-
posto no art. 312 do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei
nº 3.689, de 3 de outubro de 1941, a prisão preventiva do acusado da prática
de crime previsto nesta lei poderá ser decretada em razão da magnitude
da lesão causada [...]” (grifamos), o que demonstra que, em delitos contra
a ordem econômico-financeira, torna-se relevante o dano provocado pelo
criminoso, que, efetivamente, causa repugnância ao resto da população.
(2008, p. 607)

Vistos o entendimento jurisprudencial e a discussão doutrinária acerca


do tema, é certo concluir que a análise da magnitude da lesão como circuns-
tância autônoma ou não da prisão preventiva é muito profunda. Isso por-
que, necessariamente, uma série de fatores devem ser valorados, entre eles:
a finalidade da Lei nº 7.492/1986; a interpretação do art. 30; a presunção de
inocência e natureza jurídica da prisão cautelar; a real necessidade da medida
e a equidade na interpretação com as demais hipóteses do art. 312 do Código
de Processo Penal.
Nesse sentido, a priori, extrair uma interpretação literal inquestionável
do art. 30 é pouco provável em vista da sua redação deficiente – tantas vezes
já criticada –, visto que simplesmente dispôs: “Sem prejuízo do disposto no
art. 312 do Código de Processo Penal [...]”, ficando claro que o texto não deli-
mitou a amplitude do que deveria ser observado no referido artigo.
Logo, o primeiro dilema originado consiste em descobrir se a inter-
pretação do dispositivo exigiria, além do fumus commissi delicti ordinário das
cautelares, o periculum libertatis constante nas circunstâncias específicas do
art. 312 do Código de Processo Penal.
Em todo caso, é certo que a discussão não assumiria tamanho relevo
se o legislador tivesse optado por uma redação clara no início do dispositivo.
Contudo, o legislador, lamentavelmente, assim não procedeu.
Assim, ainda que com a redação deficiente, o art. 30, ao que tudo in-
dica, só requer a observância da prova da existência do crime e de indícios
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Doutrina Penal
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suficientes de autoria, previstos no art. 312, os quais – repita-se – constituem


o fummus commissi delicti de qualquer prisão preventiva.
Tal conclusão decorre de uma interpretação sistemática da Lei
nº 7.492/1986 – já que a literal é praticamente inútil –, eis que por meio da-
quela é possível sustentar a prescindibilidade de a magnitude da lesão es-
tar acompanhada de qualquer das circunstâncias específicas do periculum
libertatis previstas no Código de Processo Penal por uma razão simples. Ine-
xistiria sentido de o legislador implementar a magnitude da lesão e condicio-
nar a possibilidade da prisão preventiva, caso existente aquela, à presença de
alguma circunstância do periculum libertatis já prevista na época no Código
de Processo Penal.
Desta forma, é possível considerar, a partir da análise da Lei
nº 7.492/1986 em conjunto com o art. 312 do Código de Processo Penal, que o
art. 30 daquele diploma, ao utilizar a expressão “sem prejuízo”, manifestou a
possibilidade e a viabilidade de associação da magnitude da lesão com algu-
ma das outras circunstâncias autônomas presentes no art. 312, mas isso não
significou obrigatoriedade.
Ademais, tal argumento ganha força na medida em que as circunstân-
cias representativas do periculum libertatis existentes da época (garantia da
ordem pública, garantia de aplicação da lei penal e conveniência da instru-
ção criminal) podem coexistir simultaneamente na hipótese fática, bem como
interagir com a magnitude da lesão. Ainda, a garantia da ordem pública e
da ordem econômica – esta última após sua criação pela Lei nº 8.884/1994 –,
dado o caráter genérico e subjetivo de que estão investidas, guardam íntima
relação com os bens jurídicos tutelados pela Lei nº 7.492/1986, o que facilita
uma vez mais a aplicação das referidas circunstâncias.
Destarte, aparentemente, há que se reconhecer que o art. 30 da Lei
nº 7.492/1986 – ainda que com redação infeliz – tentou eleger a magnitude da
lesão como nova circunstância autônoma e específica do periculum libertatis
para a decretação da prisão preventiva.
Outrossim, se visualizadas a própria amplitude do Sistema Financeiro
e a dependência coletiva em relação ao mesmo, este parece ter sido um dos
pontos determinantes para a criação da magnitude da lesão como circuns-
tância da preventiva. Significa dizer que a própria tutela da credibilidade no
Sistema Financeiro, a confiança das pessoas, a venda da higidez do sistema
são buscados como respaldo para a prisão do acusado pautada na referida
circunstância.
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Doutrina Penal
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Por outro lado, se empregado um olhar mais garantista, é certo reco-


nhecer que a magnitude da lesão nem de longe é genuinamente uma medida
cautelar e sequer seu emprego serve para a tutela do processo, visto que re-
presenta uma sórdida medida de antecipação da pena. Tal conclusão é extra-
ída da sua própria substância, a qual em hipótese alguma se assemelha com a
conveniência da instrução criminal e a necessidade de assegurar a aplicação
da lei penal, previstas no art. 312 do Código de Processo Penal. Acerca da
natureza das cautelares, é pertinente conferir a lição de Aury Lopes Jr.:
[...] as medidas cautelares não se destinam a “fazer justiça”, mas sim ga-
rantir o normal funcionamento da justiça através do respectivo processo
(penal) de conhecimento. Logo, são instrumentos a serviço do instrumento
processo; por isso, sua característica básica é a instrumentalidade qualifi-
cada ou ao quadrado.
É importante fixar esse conceito de instrumentalidade qualificada, pois só
é cautelar aquela medida que se destinar a esse fim (servir ao processo de
conhecimento). E somente o que for verdadeiramente cautelar é constitu-
cional. (2009, p. 115)

Diante deste quadro, em vista das características que devem revestir


uma prisão cautelar, se comparada a magnitude da lesão com as duas cir-
cunstâncias do periculum libertatis genuinamente processuais previstas no
art. 312 do Código de Processo Penal, quais sejam, conveniência para a ins-
trução criminal e necessidade de assegurar a aplicação da lei penal, é gritante
a incompatibilidade dos fins buscados.
A conveniência para a instrução criminal e a necessidade de assegu-
rar a aplicação da lei penal, cada uma a seu turno, procuram assegurar um
resultado útil ao processo penal, bem como tutelar a sua devida aplicação.
Tais circunstâncias, indene de dúvidas, se legitimam não como prisões por
antecipação da pena, mas sim como medidas indispensáveis e legítimas, seja
a primeira por risco de interferência do acusado nas provas, seja a segunda
por risco de fuga.
Já a magnitude da lesão, por sua vez, nesse viés garantista anterior-
mente mencionado, nada mais é do que a antecipação da pena, pois a pri-
são do acusado não se legitima ante a ineficácia da medida para o processo
penal, fator este que implica a sua crise de legitimidade. Em vista disso, tal
bandeira, da ausência de cautelaridade, tem sido amplamente levantada por
aqueles que defendem a impossibilidade da aplicação singular da magnitude
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da lesão. E claro, não há que se negar que tal orientação tem propriedade e
forte respaldo jurídico.
Destarte, se é certo que a magnitude da lesão de cautelar nada tem,
relembre-se que, ao que tudo indica, a sua inclusão na Lei dos Crimes Contra
o Sistema Financeiro Nacional correspondeu mais ao aspecto do resgate da
credibilidade social, conforme anteriormente já exposto.
Em todo caso, há necessidade de abertura de um parêntese para ressal-
tar que a garantia da ordem pública e, principalmente, a garantia da ordem
econômica também não são argumentos dos mais legítimos para a tutela do
processo nem mesmo genuinamente cautelares. Porém, mesmo assim em-
basam prisões, algumas até por situações menos relevantes que a tutela do
sistema financeiro.
Nesse passo, retomando a interpretação do art. 30 da Lei nº 7.492/1986,
anteriormente iniciada, se é certo que a redação do dispositivo é obscura e,
ainda que por meio de uma interpretação sistemática, é possível sustentar a
autonomia da magnitude da lesão como circunstância da preventiva, tam-
bém é certo que uma lei na seara criminal deve ser clara por si mesma, dada
a liberdade como bem jurídico.
Logo, se a lei claramente não prevê, não cabe ao intérprete, perigo-
samente, presumir que estatuiu. Isto significa dizer que uma circunstância
autônoma para a prisão preventiva sem nenhuma cautelaridade e de consti-
tucionalidade duvidosa tentou nascer, mas já nos primeiros respiros a infeliz
e deficiente redação do art. 30 da Lei nº 7.492/1986 começou a asfixiá-la.
Destarte, ao intérprete restaram dois caminhos: o primeiro, ignorar por
completo a autonomia da magnitude da lesão pautado principalmente na re-
dação do art. 30 da Lei nº 7.492/1986 e na ausência de cautelaridade; o segun-
do, conferir autonomia para a magnitude respaldado na busca dos fins da Lei
nº 7.492/1986, na necessidade de tutela coletiva, tudo aliado ao argumento
da existência da garantia da ordem econômica e da ordem pública.
Desta forma, em que pese a maioria dos Tribunais Regionais Federais,
o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal sustentarem a
imprescindibilidade de a magnitude da lesão estar acompanhada de alguma
das circunstâncias do periculum libertatis previstas no art. 312 do Código de
Processo Penal, o tema ainda proporciona críticas.
Conforme visto, é certo que a redação do art. 30 é deficiente, que a
aparente vontade do legislador foi o resgate ou a manutenção da credibilida-
120
Revista Jurídica 442
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de do sistema financeiro, que a magnitude da lesão não é motivo para uma


prisão genuinamente cautelar, entre outros. Porém, com todas as vênias pos-
síveis, o posicionamento jurisprudencial adotado foi tímido. Isto porque, ao
negar a autonomia da magnitude da lesão, é possível sustentar, por justiça,
a negativa de autonomia para a garantia da ordem pública e da ordem eco-
nômica. Ademais, seja por impropriedade de delimitação ou por ausência de
cautelaridade, as três circunstâncias são idênticas.
Nessa linha, é pouco significativa a exigência da presença de, pelo me-
nos, uma das circunstâncias do art. 312 do Código de Processo Penal, caso a
magnitude venha associada com a garantia da ordem pública ou da ordem
econômica. Tudo porque tal prática propicia o mesmo fim: a segregação do
acusado por uma circunstância de duvidosa cautelaridade.
Destarte, é possível concluir que a garantia da ordem pública e da
ordem econômica – inobstante estarem presentes no art. 312 do Código de
Processo Penal – também só poderiam sustentar a prisão preventiva caso es-
tivessem acompanhadas da necessidade de garantir a aplicação da lei penal
ou por conveniência para a instrução criminal.
Portanto, data venia, o Supremo Tribunal Federal, ao considerar a mag-
nitude da lesão como elementar do tipo e neutra do conteúdo, exigindo a sua
associação com alguma outra circunstância do periculum libertatis presente
no art. 312 do Código de Processo Penal, não conferiu uma resposta imune
a críticas.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A magnitude da lesão representa – conforme exaustivamente ressal-


tado linhas atrás – um ponto polêmico no já tormentoso instituto da prisão
preventiva, mesmo após a edição da Lei nº 12.403, de 4 de maio do ano de
2011, conhecida como a Nova Lei da Prisão Cautelar.
Ademais, em que pesem os mais de 20 anos de vigência da Lei
nº 7.492/1986 e o amadurecimento doutrinário e jurisprudencial sobre o as-
sunto, a magnitude da lesão continua a desafiar uma releitura do processo
penal frente a cada caso concreto. Isso porque, inobstante a possibilidade de
sua decretação associada ou não às demais circunstâncias do art. 312 do Có-
digo de Processo Penal, em vista de sua natural subjetividade, sempre guar-
dará relação com a garantia da ordem pública e da ordem econômica.
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Doutrina Penal
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Na mesma linha, ressalte-se que fora questionado a ausência de natu-


reza jurídica genuinamente cautelar da magnitude da lesão, bem como da
garantia da ordem pública e da ordem econômica, estas últimas previstas
no art. 312 do Código de Processo Penal. Tal significa dizer que, inobstan-
te a aparente inutilidade conferida à magnitude da lesão pelo entendimen-
to jurisprudencial, o qual sedimentou a necessidade de sua associação com
pelo menos uma das circunstâncias representativas do periculum libertatis do
art. 312 do Código de Processo Penal, o fantasma das prisões não genuina-
mente cautelares sempre persistirá. Tudo porque é evidente e irrefutável a
relação de idêntica subjetividade e indefinição que guardam a magnitude da
lesão, a garantia da ordem pública e a ordem econômica.
Nesse contexto, os Tribunais, ao fecharem a “porta da frente”, chama-
da magnitude da lesão, dada a sua previsão legal deficiente e ausência da
cautelaridade, não extirparam do ordenamento a “porta dos fundos”, consti-
tuída na garantida da ordem pública e da ordem econômica. Ademais, nem
mesmo é função, bem como seria exigir um esforço heroico que os Tribunais
corrigissem o ordenamento jurídico, já tantas vezes “contaminado” pela má
técnica legislativa.
Destarte, é certo que a prisão do acusado em delitos previstos na Lei
nº 7.492/1986 não será obstada pelo reconhecimento da legitimidade ou não
da magnitude, pois restaram no ordenamento a garantia da ordem pública e
da ordem econômica, tão subjetivas, vagas e imprecisas que as tornam facil-
mente amoldáveis a qualquer bem jurídico tutelado pelo sistema financeiro.
Diante deste contexto, é quase que risível dizer que ao se negar – acer-
tadamente – autonomia para a magnitude da lesão restaria respeitada a ex-
cepcionalidade da prisão preventiva e extirpada circunstância tão odiosa e
visivelmente não cautelar.

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124
Jurisprudência
Cível
stf
S upremo T ribunal F ederal

24.06.2014 Primeira Turma


AgRg no Agravo de Instrumento nº 811.723 São Paulo
Relator: Min. Roberto Barroso
Agte.(s): Banco do Brasil S/A
Adv.(a/s): Valnei Dal Bem
Agdo.(a/s): Flávio Leite de Moraes e outro(a/s)
Adv.(a/s): Nilberto Rene Amaral de Sá e outro(a/s)
Intdo.(a/s): Companhia Comove de Óleos Vegetais
Adv.(a/s): Sérgio de Godoy Bueno

EMENTA

AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO


– BEM DE FAMÍLIA – IMPENHORABILIDADE –
NECESSIDADE DE ANÁLISE DE LEGISLAÇÃO
INFRACONSTITUCIONAL E NOVA APRECIAÇÃO DO
ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO – SÚMULA Nº 279/STF
Hipótese em que para dissentir do entendimento do Tribunal
de origem seria necessária nova apreciação do material probatório
constantes dos autos (Súmula nº 279/STF), bem como a análise da
legislação infraconstitucional pertinente. Precedentes.
Agravo regimental a que se nega provimento.
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Jurisprudência Civil
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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Pri-


meira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Ministro
Dias Toffoli, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas,
por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental, nos
termos do voto do relator. Não participou do julgamento, justificadamente, o
Ministro Marco Aurélio.
Brasília, 24 de junho de 2014.

Ministro Luís Roberto Barroso


Relator

RELATÓRIO

O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Relator):


1. Trata-se de agravo regimental cujo objeto é decisão monocrática do
Ministro Joaquim Barbosa, relator originário do feito, que negou seguimento
ao agravo de instrumento, pelos seguintes fundamentos (fls. 990/991):
“Trata-se de agravo de instrumento interposto de decisão que não admitiu
recurso extraordinário (102, III, a, da Constituição) contra acórdão do Tri-
bunal de Justiça do Estado de São Paulo, cuja ementa tem o seguinte teor:
‘PENHORA – Bem de família. É impenhorável, em seu todo o imó-
vel que serve de residência do ente familiar, não fazendo a Lei
nº 8.009/1990 nenhuma distinção entre o imóvel edificado em um ou
mais lotes de terreno, com uma ou mais matrículas no Registro de Imó-
veis, para eficácia da proteção legal. Acórdão mantido. Embargos in-
fringentes rejeitados.’ (fl. 822)
Nas razões de recurso extraordinário, o ora agravante alega que o acórdão
recorrido violou o disposto no art. 6º da Constituição, ‘por entender que o
conceito de moradia, considerada um direito social por esse dispositivo,
abrange as suntuosas construções do terreno de quase 7.000m2 (sete mil
metros quadrados), no qual residem os Recorridos’ (fl. 917).
O Tribunal a quo decidiu a causa com base na interpretação da legislação
infraconstitucional que disciplina a matéria (art. 1º, parágrafo único, da Lei
nº 8.009/1990), sendo que eventual ofensa à Constituição, se existente, seria
indireta ou reflexa, hipótese em que não se admite o recurso extraordinário.
Do exposto, nego seguimento ao agravo.”
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Jurisprudência Civil
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2. A parte agravante sustenta que, “embora o acórdão recorrido men-


cione a norma infraconstitucional sobre a impenhorabilidade do bem de fa-
mília, o recurso vai além dessa impenhorabilidade, até porque não se dis-
corda da impenhorabilidade do bem de família. A questão é estabelecer a
aplicação do real objetivo e alcance da norma, é estabelecer qual é a proteção
jurídica constitucional e o exato bem jurídico protegido, vez que certamente
o objetivo constitucional não foi afastar o patrimônio dos devedores da repa-
ração devida aos credores, mas apenas preservar um local para residência”
(fl. 1002).
3. É o relatório.

VOTO

O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Relator):


1. O agravo regimental não pode ser provido. Tal como constatou a
decisão agravada, o Tribunal de origem decidiu a causa com base na in-
terpretação da legislação infraconstitucional que disciplina a matéria (Lei
nº 8.009/1990).
2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de
ser incabível recurso extraordinário quando, para chegar à conclusão diversa
do Tribunal de origem, for necessário reexaminar legislação infraconstitu-
cional.
3. Ademais, a pretensão do agravante – fracionar a residência do casal
que está edificada em amplo terreno – exigiria a análise do acervo probatório
acostado aos autos, como os laudos periciais. Logo, incide, na espécie, a Sú-
mula nº 279/STF. Nesse sentido, confiram-se as seguintes ementas:
“RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Imóvel rural. Penhora. Dimen-
sões da propriedade. Modulo rural. Acórdão impugnado que decidiu a causa com
base na legislação infraconstitucional e no conjunto fático-probatório. Ofensa cons-
titucional indireta. Ausência de razões novas. Decisão mantida. Agravo regimental
improvido. Nega-se provimento a agravo regimental tendente a impugnar,
sem razões novas, decisão fundada em jurisprudência assente na Corte.”
(AI 564.360-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso)
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – PROCESSUAL CIVIL
– PENHORA – BEM DE FAMÍLIA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 279
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – OFENSA CONSTITUCIONAL
INDIRETA – AGRAVO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.
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Relatório
1. Agravo nos autos principais contra decisão que não admitiu recurso ex-
traordinário, interposto com base na alínea a do inc. III do art. 102 da Cons-
tituição da República.
2. O Tribunal Regional Federal da 4º Região decidiu:
‘AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – BEM DE FAMÍLIA –
IMPENHORABILIDADE – DOIS LOTES DE TERRENOS, EM CADA
QUAL EDIFICADA UMA CASA – EXECUTADO QUE RESIDE EM
UMA DELAS – AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE AMBAS AS CASAS
SÃO INTERLIGADAS – 1. A Lei nº 8.009/1990, em seu art. 1º, põe a sal-
vo de penhora o imóvel residencial da família ou entidade considerada
como tal, para fins de satisfação de qualquer tipo de dívida, desde que
seja o único imóvel de propriedade do executado. 2. Não havendo pro-
va da alegação de que ambas as casas se interligam e formam um único
imóvel, deve ser mantida a decisão que determinou a penhora sobre
aquela na qual não reside o executado, mesmo diante da alegação de
que esta serve de residência a outras pessoas da sua família.’
3. A decisão agravada teve como fundamento para a inadmissibilidade do
recurso extraordinário a circunstância de que a contrariedade à Constitui-
ção, se tivesse ocorrido, seria indireta.
4. O Agravante argumenta que ‘há, sim, afronta direta aos dispositivos
constitucionais invocados, diversamente do que assevera a decisão que ne-
gou seguimento ao recurso extraordinário’.
No recurso extraordinário, alega que o Tribunal a quo teria contrariado os
arts. 1º, inc. III, e 6º da Constituição da República.
Apreciada a matéria trazida na espécie, decido.
5. O art. 544 do Código de Processo Civil, com as alterações da Lei
nº 12.322/2010, estabelece que o agravo contra decisão que não admite re-
curso extraordinário processa-se nos autos deste recurso, ou seja, sem a
necessidade da formação de instrumento.
Sendo este o caso, analisam-se, inicialmente, os argumentos expostos no
agravo, de cuja decisão se terá, então, se for o caso, exame do recurso ex-
traordinário.
6. Razão jurídica não assiste ao Agravante.
A Desembargadora Relatora do caso no Tribunal Regional Federal da
4ª Região observou:
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Jurisprudência Civil
Agosto/2014

‘A decisão agravada foi por mim assim exarada:


“A certidão da oficiala de justiça, juntada à fl. 179 dos autos, dá conta de que
‘a matrícula de nº 54.342 abrange dois lotes de terrenos: lotes 15 e 16. Trata-se
de dois lotes individualizados e cada qual com uma casa construída [...]. No
entanto, efetuei a penhora apenas sobre o lote de nº 16 constante da referida ma-
trícula, uma vez que constatei ‘in loco’ que no lote de n. 15 situa-se a residência
do executado (casa 184) [...]”.
Efetivamente, a cópia da matrícula acostada à fl. 198-verso atesta que há duas
casas construídas sobre os terrenos de propriedade do executado.
Se assim for, laborou com acerto o juízo de primeiro grau ao assentar
que “impenhorabilidade da Lei nº 8.009/1990 abrange o bem que sirva
de moradia do executado ou da sua entidade familiar, isto é, do núcleo
que resida com o executado, proteção essa, portanto, que se cinge a um
único imóvel”.
Ocorre que a alegação de que “são uma mesma casa e que se interligam e for-
mam um único imóvel onde reside a família do agravante”, embora possível,
não encontra lastro no substrato probatório carreado ao feito.
De fato, a parte recorrente não logrou comprovar que tal alegação corresponde
à realidade.
Assim, como a análise da questão ventilada este agravo de instrumento depende
de que reste evidenciado, por meio de sobejo conjunto probatório acostado aos
autos, a induvidosa impenhorabilidade do imóvel, não há como acolher-se
o pleito recursal, cumprindo à parte recorrente, diante da atual etapa
da execução fiscal, suscitar a questão em ação própria ou em sede de
embargos, nos quais disporá de meios para comprovar a procedência
da sua tese.
Por fim, no que concerne à alegação de que a execução fiscal deveria ser
redirecionada à empresa que continua exercendo a mesma atividade,
melhor sorte não assiste à agravante. Com efeito, mesmo que venha a
ser reconhecida a sucessão tributária, não se afasta a responsabilidade
do sócio, pois há solidariedade, nos termos o art. 124, inc. II, do CTN,
c/c o art. 135, inc. III, do CTN.
[...].’
As razões de agravo não trouxeram nenhum argumento jurídico ou fato
novo, de modo que, para evitar tautologia, adoto a decisão acima transcrita
como razão de decidir.” (grifos nossos)
129
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Concluir de forma diversa do que decidido pelas instâncias originárias de-


mandaria o reexame de prova constante dos autos, inviável em recurso
extraordinário, nos termos do que dispõe a Súmula nº 279 deste Supremo
Tribunal.
O novo exame do julgado impugnado exigiria, ainda, a análise prévia da
legislação infraconstitucional aplicada à espécie (Código Tributário Nacio-
nal). Assim, a alegada contrariedade à Constituição da República, se tives-
se ocorrido, seria indireta, o que não viabiliza o processamento do recurso
extraordinário.
Nesse sentido:
“Embargos de declaração em recurso extraordinário. 2. Decisão monocrá-
tica. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. 3. Alega-
ção de ausência de prestação jurisdicional. Decisão fundamentada, apesar
de contrária aos interesses da parte. AI-QO-RG 791.292 de minha relatoria,
DJe 13.08.2010. 4. Bem de família. Caracterização. Ofensa reflexa. Incidên-
cia das Súmulas nºs 279 e 636. 5. Agravo regimental a que se nega provi-
mento” (RE 545.419-AgR, 2ª T., Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 27.03.2012).
A decisão agravada, embasada nos dados constantes do acórdão recorrido,
harmoniza-se com a jurisprudência deste Supremo Tribunal, razão pela
qual nada há a prover quanto às alegações do Agravante.
8. Pelo exposto, nego seguimento a este agravo (art. 544, § 4º, inc. II, alínea
a, do Código de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno no
Supremo Tribunal Federal).” (ARE 720.124-AgR, Relª Min. Cármen Lúcia)

4. Outros precedentes: AI 737.621, Relª Min. Cármen Lúcia; ARE


712.129, Relª Min. Cármen Lúcia; ARE 700.230 ED, Rel. Min. Teori Zavascki;
ARE 785.917-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli.
5. Diante do exposto, nego provimento ao agravo regimental.

PRIMEIRA TURMA
EXTRATO DE ATA

AgRg no Agravo de Instrumento nº 811.723


Proced.: São Paulo
Relator: Min. Roberto Barroso
Agte.(s): Banco do Brasil S/A
130
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Adv.(a/s): Valnei Dal Bem


Agdo.(a/s): Flávio Leite de Moraes e outro(a/s)
Adv.(a/s): Nilberto Rene Amaral de Sá e outro(a/s)
Intdo.(a/s): Companhia Comove de Óleos Vegetais
Adv.(a/s): Sérgio de Godoy Bueno

Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental, nos termos


do voto do relator. Unânime. Não participou, justificadamente, deste julga-
mento, o Senhor Ministro Marco Aurélio. Presidiu, este julgamento, o Senhor
Ministro Dias Toffoli. Primeira Turma, 24.06.2014.
Presidência do Senhor Ministro Marco Aurélio. Presentes à Sessão os
Senhores Ministros Dias Toffoli, Luiz Fux, Rosa Weber e Roberto Barroso.
Compareceu o Senhor Ministro Celso de Mello para julgar processo a ele
vinculado.
Subprocurador-Geral da República, Dr. Paulo G. Gonet Branco.

Carmen Lilian Oliveira de Souza


Secretária da Primeira Turma

131
STJ
S uperior T ribunal de J ustiça

Recurso Especial nº 1.422.929 – SC (2013/0278696-8)


Relatora: Ministra Nancy Andrighi
R. p/ Acórdão: Ministro João Otávio de Noronha
Recorrente: K. B. da S.
Advogado: Tarcísio Geroleti da Silva
Recorrido: Ministério Público do Estado de Santa Catarina

EMENTA

CIVIL – PROCESSUAL CIVIL – FAMÍLIA – DESTITUIÇÃO


DO PÁTRIO PODER – MENOR – FAMÍLIA SUBSTITUTA
– CASO PECULIAR – MIGRAÇÃO DA MÃE PARA O SUL
DO BRASIL EM BUSCA DE MELHORES CONDIÇÕES –
MAUS-TRATOS E SITUAÇÃO DE RISCO – CONFIRMAÇÃO
– PRETENSÃO DE ATRIBUIÇÃO DA GUARDA À AVÓ
MATERNA – INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO COM A
FAMÍLIA ESTENDIDA (AVÓS, TIOS E PRIMOS) – ADOÇÃO
CONCLUÍDA – PREVALÊNCIA DO INTERESSE DO
MENOR – ESTABILIDADE NA CRIAÇÃO E FORMAÇÃO –
NECESSIDADE – RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO
I – Na hipótese em que a genitora deixa a casa dos pais e migra
para o sul do país em busca de melhores condições, optando por levar
consigo filha menor, cumpre-lhe proteger a criança e dela cuidar,
garantindo-lhe sustento, guarda, companhia e educação em ambiente
livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes
(Constituição Federal e Estatuto da Criança e Adolescente).
II – Se não há controvérsia sobre o fato de a menor ter sido vítima
de negligência e de maus-tratos e encontrar-se em situação de risco,
destitui-se o pátrio poder.
III – Estando a criança em situação de risco e não subsistindo
nenhum vínculo afetivo entre ela e a família de origem, prevalece
133
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

o interesse da menor, que deve ser inserida em família substituta,


sobretudo quando há notícia de que o processo de adoção já foi
concluído.
IV – Recurso especial desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima


indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o
voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi, dando provimento ao recurso especial
e o voto divergente do Sr. Ministro João Otávio de Noronha, por maioria, ne-
gar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro João
Otávio de Noronha. Votou vencida a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Votaram
com o Sr. Ministro João Otávio de Noronha os Srs. Ministros Sidnei Beneti,
Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente). Lavra-
rá o acórdão o Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha.
Brasília (DF), 24 de abril de 2014 (data do Julgamento).

Ministro João Otávio de Noronha


Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2013/0278696-8


Processo Eletrônico REsp 1.422.929/SC
Números Origem: 031110021330 20120316034 20120316034000100
20120316034000200 20120316034000201 31110021330
Pauta: 22.04.2014 Julgado: 22.04.2014
Segredo de Justiça
Relatora: Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi
Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva
Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Humberto Jacques de
Medeiros
134
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AUTUAÇÃO

Recorrente: K. B. da S.
Advogado: Tarcísio Geroleti da Silva
Recorrido: Ministério Público do Estado de Santa Catarina
Assunto: Direito civil – Família – Relações de parentesco

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epí-


grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma adiou o julgamento deste processo por indicação do(a) Sr(a).
Ministro(a) Relator(a).

RELATÓRIO

Cuida-se de recurso especial interposto por K. B. da S., com fundamen-


to no art. 105, III, a, da CF, contra acórdão proferido pelo TJ/SC.
Ação: de perda do poder familiar ajuizada pelo Ministério Público do
Estado de Santa Catarina – recorrido – em desfavor da recorrente, ante a ma-
nifesta incúria no trato com a menor A. G. B. da S.
O poder familiar foi suspenso, por medida liminar em 09.09.2010, deci-
são que também determinou o acolhimento da criança em família substituta
provisória. (fls. 142, e-STJ)
Sentença: julgou procedente o pedido de destituição do poder familiar
e declarou a criança A. G. B. da S., disponível para a adoção.
Extrai-se, do julgado, excerto representativo da motivação do i. Juiz de
1º Grau quanto à capacidade materna:
É possível observar nas declarações dos técnicos que acompanham a evo-
lução de A. G. e da dinâmica da entidade familiar que existe um consenso
quanto à falta de condições da mãe biológica para cuidar adequadamente da
criança. São contundentes as declaração da Psicóloga da equipe de proteção
de alta complexidade, profissional qualificada para a análise [...] (fls. 142,
e-STJ).
135
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

No que toca às condições de alocação da infante no lar de sua avó ma-


terna, consigna que:
Não há dúvida de que a avó materna estaria disposta a receber de volta A.
G., como ficou reiteradamente consignado em diversas manifestações dos
autos. No entanto, este Juízo está convicto de que esta não é a solução mais
apropriada.
A triste história da pequena A. G., nordestina retirante, cuja mãe migrou
para o sul em busca de melhores condições de subsistência não é ameniza-
da com a expectativa gerada de retorno à convivência da avó materna com
quem se alega existir vínculo afetivo robusto.
Evidente o paradoxo: a mãe saiu do lar materno porque as condições de
vida no Ceará não eram boas; desvendada a sua incapacidade de proteger
a filha passou a considerar ótimas as condições de vida no Ceará.
O Estudo Social da entidade familiar oriundo da cidade de Jucás, Estado
do Ceará (fl. 41 dos autos) consigna que: a avó da criança A. G. B. da S. con-
vive com o esposo e sete filhos, dentre estes, seis são menores de idade. Reside em
casa própria de taipa, com cinco cômodos, piso de cimento, e sobrevivem de rendas
advindas do programa Bolsa Família no valor de R$ 134,00 (cento e trinta e quatro
reais) e aposentadoria no valor de R$ 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco reais)
da avó de G., o Senhor Cícero Ernesto da Silva, que recentemente foi beneficiado
com aposentadoria por idade.
Não obstante a falta de recursos materiais não seja motivo suficiente para
a destituição do poder familiar e que a realidade descrita no estudo social
seja encarada como natural no Estado do Nordeste, a criança está, neste
momento, sob os cuidados do Juízo da Infância e Juventude da Comarca
de Indaial, Santa Catarina, Estado da Federação cuja realidade social é dis-
tinta, em que não se pode considerar apropriado para uma criança que tem
histórico de subnutrição dividir um lar com outras sete crianças, em família
cuja renda per capita é inferior a R$ 80,00 (oitenta reais).
Com todo respeito à recomendação dos técnicos, o retorno de A. ao lar da
avó materna no Nordeste não resolveria o problema da criança e nada jus-
tificaria à consciência deste Juízo devolvê-la ao mesmo local em que se ini-
ciou o seu problema nutricional, quiçá para regredir todo o progresso que
já se conseguiu durante o período de acolhimento, quiçá para submetê-la a
um ambiente em que a miséria, a forme e a violência doméstica façam parte
da rotina como uma fatalidade instransponível, ou para que seu destino
possa vir a ser aquele que alimenta as estatísticas dos índices alarmantes
de mortalidade infantil consignados pelo Promotor de Justiça na petição
inicial (fl. 07). (145/146, e-STJ – sem grifos no original)

Acórdão: o TJ/SC negou provimento ao recurso interposto pela recor-


rente, em acórdão assim ementado:
136
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE FAMÍLIA – AÇÃO DE PERDA DO


PODER FAMILIAR – PROCEDÊNCIA NA ORIGEM – RECURSO DA
MÃE – FILHA MENOR, VÍTIMA DE AGRESSÕES PERPETRADAS PELO
PADRASTO – GENITORA QUE SE MOSTROU OMISSA E NEGLIGENTE
– SITUAÇÃO DE RISCO EVIDENCIADA – DIREITOS FUNDAMENTAIS
VIOLADOS – MEDIDA QUE VISA RESGUARDAR E MELHOR ATEN-
DER AOS INTERESSES DA CRIANÇA – PEDIDO DE CONCESSÃO DA
GUARDA À AVÓ MATERNA – AUSÊNCIA DE VÍNCULO AFETIVO –
SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Embargos de Declaração: interpostos pela recorrente, foram rejeitados.
Recurso especial: alega violação dos arts. 19, § 3º, 23 e 39, § 1º do ECA.

Sustenta que a guarda da menor deveria ter sido concedia à avó, pois
esta manifestou sua vontade de cuidar da neta, porquanto existe norma co-
gente quanto à absorção de menor pela família ampliada e que, apenas quan-
do ocorrer a ausência de um grupo familiar, houver manifesto desinteresse
deste, ou outra razão ponderável que fundamente a preterição, a absorção da
menor cujos pais foram destituídos do pátrio poder, deve ocorrer no seio da
família estendida.
Contrarrazões: O Ministério Público estadual, em contrarrazões, aponta
a inexistência de prequestionamento dos dispositivos tidos como violados,
incidência das Súmulas nºs 7/STJ, 126/STJ e 283/STF.
Às fls. 297/300, parecer do Ministério Público Federal, de lavra do Sub-
procurador-Geral da República, Washington Bolívar Júnior, pelo não provimen-
to do recurso especial, ante a existência dos óbices das Súmulas nºs 7 e 126/STJ.
É o relatório.

VOTO
Cinge-se a controvérsia em dizer se é possível, em hipótese de desti-
tuição do poder familiar, determinar a adoção de criança, mesmo existindo
membros da família expandida – in casu, avó – que manifestaram o desejo de
ter a guarda da infante.

1 Dos contornos da lide


Para a perfeita sintonia desse julgamento com a ordem cronológica dos
eventos que antecedem a apreciação deste recurso especial, releva declinar
que:
137
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

– Em 09.09.2010, foi suspenso, liminarmente, o poder familiar da recorren-


te-mãe sobre sua filha A. G. B. da S., sendo determinado, no mesmo ato,
que a criança fosse acolhida em família substituta provisória;
– Em 23.03.2012, foi lavrada sentença que decretou, em definitivo, a perda
do poder familiar da mãe biológica e declarou a menor disponível para
a adoção;
– Em 05.10.2012, a criança foi entregue para adoção, iniciando-se, nessa
data, o estágio de convivência, tendo ocorrido o trânsito em julgado da
adoção em 19.09.2013 (informação prestada pela autoridade judicial de
1º Grau – fl. 311, e-STJ);
– A menor tem, atualmente, 06 anos e 09 meses.

2 Do prequestionamento e da incidência dos óbices das


Súmulas nºs 7 e 126/STJ
1. De se falar, inicialmente, que o prequestionamento dos dispositivos
legais é evidente, pois tratam expressamente dos temas revolvidos pelo Tri-
bunal de origem, que dizem respeito à possibilidade de entrega da criança
para a adoção, quando existe parente interessado em cuidar do menor. De
outra banda, vê-se também que o recurso especial interposto não esbarra nos
óbices sumulares apontados, a uma, por não discutir a existência de aspectos
subjetivos determinante para a alocação da criança em determinado lugar,
fatos sob o crivo do grau ordinário, mas analisar a possível desatenção a cri-
tério objetivo, propugnado em lei, o que configura matéria de direito.
2. A duas, porque o dispositivo constitucional que o recorrente entende
deveria ter sido objeto de questionamento por meio de recurso extraordi-
nário – art. 227 da CF –, apenas foi brandido como linha programática a ser
perseguida, sem, contudo, caracterizar-se como espeque da fundamentação,
de índole constitucional, fato que afasta a incidência da Súmula nº 126/STJ.

3 Da possibilidade de adoção, em caso da destituição


do poder familiar, quando há membro da família
estendida disposto a acolher a criança
3. O marco definidor da solução da controvérsia posta em desate está
em se aferir se existem possibilidades de preterimento da família estendida,
quando ocorrer a destituição do poder familiar.
4. Nesse debate restrito, parte-se da irremediável destituição do poder
familiar, medida, obviamente extrema, e que foi tomada no intuito de prote-
138
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

ger a menor de uma criação drasticamente deficiente em afeto, necessidades


materiais, educação formal e para a vida em sociedade, que também era tis-
nada por atos de agressão perpetrados pelo padrasto da criança.
5. O resumido e sofrido quadro da situação da menor, diz de uma pri-
meira infância transcorrida, quase que totalmente, à míngua de elementos es-
senciais na boa formação de uma pessoa, física e psicologicamente saudável,
fatores decisivos para a definição quanto à inviabilidade de sua continuidade
no núcleo familiar originário.
6. Nesse contexto, a avó materna da menor se apresentou desejosa de
exercer o múnus da guarda de sua neta, não obstante sua precária condição
econômica, tão bem relatada na sentença, na parte em que transcrita.
7. Junto a esse aspecto – condição financeira –, a sentença, corroborada
in totum pelo acórdão, agregou a distância geográfica que separava avó de
neta – a primeira morando em cidade do interior do Estado do Ceará, e a
segunda, em cidade do interior do Estado de Santa Catarina – e, questões de
índole cultural, para rechaçar o pleito da avó, motivações que repriso para
melhor compreensão da matéria:
Não há dúvida de que a avó materna estaria disposta a receber de volta A.
G., como ficou reiteradamente consignado em diversas manifestações dos
autos. No entanto, este Juízo está convicto de que esta não é a solução mais
apropriada.
A triste história da pequena A. G., nordestina retirante, cuja mãe migrou
para o sul em busca de melhores condições de subsistência não é ameniza-
da com a expectativa gerada de retorno à convivência da avó materna com
quem se alega existir vínculo robusto. (fls. 145/146)

8. Prossegue, em outro excerto, a sentença:


Não se pode permitir que a menina A. entre no círculo vicioso a que, infe-
lizmente, pertence a sua mãe, achando natural ser vítima de violência do-
méstica, incapaz de reagir às agressões físicas e psicológicas do companhei-
ro, e que nada faz para modificar tal realidade miserável, não procura um
emprego, estudo ou mesmo acolhimento, orientação e apoio das estruturas
disponibilizadas pelo Poder Público.
A reinserção de a. na família materna apenas a faria reproduzir o compor-
tamento de submissão e conformismo que conheceu como referência.
139
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
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Diante do triste contesto estampado nos autos, é possível evitar que a pe-
quena A. sofras as mesmas conseqüências da convivência nociva de sua
família original. (fls. 147/148)

9. Faz-se aqui, então, antes da apreciação da correção do ato judicial de


piso, um corte na linha expositiva para se perquirir o porquê da opção pre-
ferencial, tanto da legislação, quanto da doutrina, pela prioritária alocação
dos infantes atingidos pela destituição, ou extinção do poder familiar de seus
genitores, na família estendida.
10. Orienta os concêntricos patamares estabelecidos em lei para a alo-
cação do menor em situações de vulnerabilidade no lar em que reside, a ideia
de que a convivência familiar – estricto sensu – é, primariamente, um direito
da própria criança, pois da teia familiar originária aufere o conforto psico-
lógico da sensação de pertencimento e retira os primeiros elementos para a
construção do sentimento de sua própria identidade.
11. Assim, construiu-se ordem hierárquica de presunção de maior bem
estar para o a criança e o adolescente, em relação ao ambiente em que devem
conviver, dado pela sequência: família natural; família estendida e família
substituta.
12. Embora a fragilização, ou fim do vínculo natural entre pais e filhos,
definido como família natural, não seja empeço insuperável para a constru-
ção de uma personalização sadia da criança, é intuitivo se compreender que
o distanciamento do modelo social natural torna essa empreitada mais com-
plexa, tanto para ela – criança – quanto para aqueles que vão cuidar desse
menor.
13. Seguindo essa toada, o ECA, explicitamente consolidou o direito
da criança e do adolescente ao convívio familiar, dando à família substituta,
nesse cenário, caráter de excepcionalidade (art. 19 da Lei nº 8.069/1990).
14. Válter Kenji Ishida, a propósito do tema, afirma, quanto ao direito
à convivência familiar que:
Pode ser conceituado atualmente como o direito fundamental da criança e
adolescente a viver junto à sua família natural ou subsidiariamente à sua
família extensa. Trata-se de uma ampliação do previsto no art. 9º da Con-
venção sobre os Direitos da Criança (1989) que prevê o direito da criança
em não ser separada dos pais contra a vontade dela. O Título I do ECA
abarca os chamados direitos fundamentais da criança e do adolescente.
140
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

O Capítulo III por sua vez, prevê o direito à convivência familiar e comu-
nitária. A garantia da convivência familiar se perfaz através de dois princí-
pios basilares: O da proteção integral e o da prioridade absoluta. A entidade
familiar dispõe de proteção constitucional, já que o art. 226 da Carta Magna
especifica proteção especial pelo Estado da família. Esta possui um concei-
to dilatado, abrangendo a união estável (art. 226, § 3º) e a comunidade for-
mada por qualquer dos pais e seus descendentes (art. 226, § 4º). A própria
Declaração Universal dos Direitos do Homem já dispunha em seu art. XVI,
3, que a família é o núcleo natural e fundamental da sociedade. Finalmente,
a Lei nº 12.010/2009 elegeu a família natural como prioridade (art. 1º, § 2º),
entidade a qual a criança e o adolescente devem permanecer, ressalvada a
absoluta impossibilidade, devendo existir decisão judicial fundamentada.
Assim, nos procedimentos da infância e juventude, a preferência é sempre
de mantença do menor junto aos genitores biológicos. Na impossibilidade,
existe a colocação em acolhimento familiar ou institucional (§ 1º).
(ISHIDA, Válter Kenji in Estatuto da Criança e do Adolescente – Doutrina e
Jurisprudência. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2013. p. 40/41)

15. A fórmula é sempre monótona, e segue linha de que as crianças e


adolescentes devem permanecer, sempre que possível com seus pais e, na
ausência ou destituição do poder familiar desses, a sua alocação deve se dar
na família estendida, pois ainda nessa, permanecerão vívidos os laços de con-
sanguinidade tão caros à nossa sociedade.
16. Somente, na consecutiva impossibilidade de manutenção da crian-
ça nesses núcleos de família natural, poderão os menores ser colocados em
família substituta.
17. Na hipótese, sob exame, não se discute a existência dos elementos
necessários à caracterização de condições indutoras da perda do poder fami-
liar, o debate que aqui se trava, é a validade da decisão que ignora o núcleo
familiar estendido e entrega a criança para a adoção.
18. Há por certo, de se apreciar com cautelosa consideração, a posição
do juízo de origem quanto às condições financeiras da família estendida – re-
presentada pela avó materna que externou o desejo de cuidar da neta –, que à
época do julgamento apresentava renda per capita de R$ 80,00 (oitenta reais).
19. No entanto, esse elemento, isoladamente tomado, nunca poderia ter
sido utilizado como fator primário para a definição sobre a entrega da criança
à sua família estendida ou para a adoção.
141
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

20. Como dito antes, a Lei define o fator primário, que são os círculos
concêntricos construídos a partir da parentalidade do menor – chamada de
família natural – e que, apenas na ausência, impossibilidade ou falta de inte-
resse do antecedente, abre espaço para o posterior, numa linha que gradati-
vamente se afasta do seu centro, até desbordar desse núcleo familiar expan-
dido, para só então permitir o albergamento do menor em família substituta.
21. Nesse sentido, cita-se o posicionamento de Rolf Madaleno:
Para a apreciação do pedido de colocação em família substituta deverá ser
levado em linha de consideração o grau de parentesco e a relação de afini-
dade ou de afetividade do infante com os integrantes do núcleo familiar de
destino, a fim de evitar ou minorar as consequências provenientes da me-
dida. O parágrafo único do art. 25 do Estatuto da Criança e do Adolescente
já expressava igual preocupação com relação aos vínculos de afinidade e
de efetividade que podem ser considerados como sendo os elementos fun-
damentais e indispensáveis ao maior êxito de uma saudável vinculação
de filiação. Consequentemente, será preferível colocar a pessoa em desen-
volvimento sob os cuidados de um tio, quando igualmente presentes os
vínculos de afinidade e afetividade, ao invés de um estranho.
(MADALENO, Rolf in Curso de direito de família. Rio de Janeiro: Forense,
2011. p. 614)

22. Não se vislumbra, no entanto, além do debate econômico travado


na espécie, e de uma tênue abordagem do distanciamento geográfico que se-
para avó de neta, nenhuma manifestação de desabono quanto à existência de
ambiente familiar inadequado para a menor no lar de sua avó.
23. Apenas fatores objetivamente comprovados, como pareceres técni-
cos que informem a existência de sólidos elementos desabonadores do aco-
lhimento da criança na família ampliada, podem superar a força impositiva
da legislação de regência.
24. E, nesse ponto, de se destacar que ocorre, o reverso, pois a recomen-
dação técnica acolhe a ideia de que a menor deveria ser colocada no lar da
avó materna.
25. Leio nesse sentido, trecho da própria sentença:
Apesar do quadro desenhado, a equipe técnica opina pela colocação de
A. G. na família extensa, devolvendo-a ao lar da avó materna, no Ceará,
sustentando tal entendimento na orientação jurídica de preservação dos
vínculos familiares e promoção da reintegração familiar, considerando
existir forte vínculo afetivo a recomendar trabalho neste sentido, além de
142
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

refutar-se a vulnerabilidade social e a precariedade da condição socioeco-


nômica da entidade familiar como fator capaz de dar ensejo a privação da
convivência com a família de origem. (fl. 145, e-STJ)

26. O distanciamento geográfico, tanto quanto a questão econômica,


não podem servir de obstáculo à concretização do direito da infante à convi-
vência com sua família natural estendida.
27. As diversidades socioculturais porventura existentes, mesmo que
fossem de significativa monta, não teriam o condão de alterar a cogente nor-
ma, quanto o mais se dizem respeito a meras nuances culturais, como as que
ocorrem entre os habitantes do nosso país, moradores de regiões geográficas
mais distantes, como o Sul e o Nordeste.
28. Causa espécie, por fim, a continuidade do curso da ação de ado-
ção de A. G., quando pendente o julgamento deste recurso especial, fato que
poderia ser compreendido como a tentativa de se consolidar uma situação
fática, independentemente do resultado final do julgamento.
29. Sobre esses elementos, impende se restabelecer a ordem de priori-
dade fixada pelo ECA, para o acolhimento da menor A. G., dando ensejo ao
seu acolhimento junto à família natural estendida.
30. Forte em tais razões dou provimento ao recurso especial, para refor-
mar o acórdão e determinar a imediata colocação da menor sob os cuidados de
sua avó materna, anulando-se, por conseguinte, o processo de adoção conso-
lidado sob o alvedrio do Juízo de origem.

EMENTA

CIVIL – PROCESSUAL CIVIL – FAMÍLIA – DESTITUIÇÃO


DO PÁTRIO PODER – MENOR – FAMÍLIA SUBSTITUTA
– CASO PECULIAR – MIGRAÇÃO DA MÃE PARA O SUL
DO BRASIL EM BUSCA DE MELHORES CONDIÇÕES –
MAUS-TRATOS E SITUAÇÃO DE RISCO – CONFIRMAÇÃO
– PRETENSÃO DE ATRIBUIÇÃO DA GUARDA À AVÓ
MATERNA – INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO COM A
FAMÍLIA ESTENDIDA (AVÓS, TIOS E PRIMOS) – ADOÇÃO
CONCLUÍDA – PREVALÊNCIA DO INTERESSE DO
MENOR – ESTABILIDADE NA CRIAÇÃO E FORMAÇÃO –
NECESSIDADE – RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO
1. Na hipótese em que a genitora deixa a casa dos pais e migra
para o sul do país em busca de melhores condições, optando por levar
143
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

consigo filha menor, cumpre-lhe proteger a criança e dela cuidar,


garantindo-lhe sustento, guarda, companhia e educação em ambiente
livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes
(Constituição Federal e Estatuto da Criança e Adolescente).
2. Se não há controvérsia sobre o fato de a menor ter sido vítima
de negligência e de maus-tratos e encontrar-se em situação de risco,
destitui-se o pátrio poder.
3. Estando a criança em situação de risco e não subsistindo nenhum
vínculo afetivo entre ela e a família de origem, prevalece o interesse da
menor, que deve ser inserida em família substituta, sobretudo quando
há notícia de que o processo de adoção já foi concluído.
4. Recurso especial desprovido.

VOTO VENCEDOR

O Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha:


Sr. Presidente, tratam os autos de questão delicada que, nem sempre,
acaba sendo decidida da maneira mais adequada nas instâncias ordinárias.
Peço permissão para recapitular a controvérsia. Trata-se de caso de
destituição definitiva do poder familiar por sentença que, com base nas parti-
cularidades da causa e nos laudos técnicos apresentados, julgou procedente o
pedido formulado pelo Ministério Público, considerando superior o interesse
da menor A. G. B. da S. – vítima de negligência e maus-tratos, situação incon-
troversa nos autos – e declarando-a disponível para adoção.
O Tribunal de origem negou provimento à apelação, decisão mantida
em sede de embargos de declaração.
No STJ, a relatora dá provimento ao recurso para reformar o aresto
recorrido, determinando a imediata entrega da menor à avó materna e anu-
lando, por conseguinte, o processo de adoção, já concluído.
Não obstante o percuciente voto da Ministra Nancy Andrighi, conhe-
cedora como ninguém de Direito de Família, peço vênia para discordar.
Para justificar meu entendimento, recorro a trechos da bem fundamen-
tada sentença de primeiro grau:
“A triste história da pequena A. G., nordestina, retirante, cuja mãe migrou
para o sul em busca de melhores condições de subsistência não é ameniza-
144
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

da com a expectativa gerada de retorno à convivência da avó materna com


quem se alega existir vínculo afetivo robusto.
Evidente o paradoxo: a mãe saiu do lar materno porque as condições de
vida no Ceará não eram boas; desvendada a sua incapacidade de proteger
a filha, passou a considerar ótimas as condições de vida no Ceará.
O Estudo Social da entidade familiar oriundo da cidade de Jucás, Estado
do Ceará (fl. 41 dos autos) consigna que: ‘[...] a avó da criança A. G. B. da S.
convive com o esposo e sete filhos, dentre eles, seis são menores de idade. Reside em
casa própria de taipa, com cinco cômodos, piso de cimento, sobrevivem de rendas
advindas do programa Bolsa Família no valor de R$ 134,00 (cento e trinta e quatro
reais) e aposentadoria no valor de R$ 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco reais)
do avô de G., o Senhor Cícero Ernesto da Silva, que recentemente foi beneficiado
com aposentadoria por idade [...]’
Não obstante a falta de recursos materiais não seja motivo suficiente para
a destituição do poder familiar e que a realidade descrita no estudo social
seja encarada como natural no Estado do Nordeste, a criança está, neste
momento, sob os cuidados do Juízo da Infância e Juventude da comarca de
Indaial, Santa Catarina, Estado da Federação cuja realidade social é distin-
ta, em que não se pode considerar apropriado para uma criança que tem
histórico de subnutrição dividir um lar com outras sete crianças, em família
cuja renda per capita é inferior a R$ 80,00 (oitenta reais).
[...]
Diante do triste contexto estampado nos autos, é possível evitar que a pe-
quena A. sofra as mesmas consequências da convivência nociva de sua fa-
mília original.
[...]
Não é possível permitir que a criança continue sujeita à fome, ante o risco
da mãe e do padrasto consumirem o leite que recebe da assistência social
privando-a de nutrição adequada, à falta de higiene porque a mãe não obe-
dece às orientações do CREAS, à falta de educação e formação pois a mãe
não se preocupa sequer com a sua e, sobretudo, à falta de esperança de um
dia viver num mundo diferente do caos que é a notória realidade do seu
lugar de origem.”

Diante desse quadro, concluiu a juíza que, embora a avó materna esti-
vesse disposta a receber de volta a neta, essa não seria a solução mais apro-
priada.
145
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Comungo com o entendimento adotado nas instâncias precedentes


pelas razões seguintes: primeiro, porque estando hoje com quase 7 anos a
menina, ou ela é adotada agora ou, mais tarde, dificilmente conseguirá sê-
-lo; segundo, porque, nas condições em que vivem os familiares maternos no
Nordeste, é possível que essa criança precise, mais à frente, também deixar a
casa da avó, como fez a genitora, em busca de lugar melhor; terceiro, porque,
de acordo com depoimento resultante do acompanhamento psicológico da
criança, não existe mais vínculo afetivo com a família de origem, contrarian-
do as alegações da ora recorrente, devendo-se, portanto, considerar a pos-
sibilidade de a menor ser submetida a uma desgastante ida e volta; quarto,
porque, em observância ao art. 19 da Lei nº 8.069/1990, segundo o qual “toda
criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua fa-
mília e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência
familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependen-
tes de substâncias entorpecentes”, não se pode negar a A. G. B. da S. a opor-
tunidade de viver em um lar em que receba amor, cuidado, em que não passe
por privações econômicas e possa estudar.
Por essas razões, nego provimento ao recurso especial.
É como voto.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino (Relator):


Sr. Presidente, este é um caso que pode ser qualificado como um hard
case, pois envolve a colisão entre dois princípios fundamentais: a preservação
dos interesses da criança, princípio aplicado pelo Ministro João Otávio de
Noronha, ou a manutenção da criança no vínculo familiar, que é o princípio
preconizado no voto da Ministra Nancy Andrighi, reconduzindo a criança
para a família estendida, que seria a avó materna.
A questão é extremamente complexa e os dois votos estão muito bem
fundamentados, seja a análise feita pela Ministra Nancy Andrighi, seja a do
Ministro João Otávio de Noronha, com base na sentença.
No caso, há uma peculiaridade que me preocupa, que é o fato de a
criança já ter sido adotada, sendo que os adotantes não são parte no processo.
Eventualmente, a nossa decisão vai interferir diretamente no interesse
jurídico dos adotantes, que já têm uma convivência com a criança há mais de
um ano e meio.
146
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Com toda a vênia da Ministra Nancy Andrighi, acompanho a diver-


gência inaugurada pelo Ministro João Otávio de Noronha, inclusive pelos
argumentos articulados pelo Ministro Sidnei Beneti relativos à valorização
das instâncias de origem.
Note-se que a sentença da Juíza de Direito da Comarca de Indaial está
muito bem fundamentada, referindo os vários aspectos pelos quais ela não
valorizou o laudo feito no Estado do Ceará, sendo que essa sentença foi con-
firmada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
Por isso, com todas as vênias a eminente relatora, acompanho a diver-
gência, negando provimento ao recurso especial.
É o voto.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva: Srs. Ministros, do


mesmo modo, peço todas as vênias à Ministra Nancy Andrighi e, de todos os
fundamentos já aduzidos, acompanho a divergência inaugurada pelo Minis-
tro João Otávio de Noronha.
Nego provimento ao recurso especial.

147
trf 1ª r.
T ribunal R egional F ederal da 1ª R egião

Numeração Única: 0000380-69.2007.4.01.3700


Apelação Cível nº 2007.37.00.000391-3/MA
Relator: Desembargador Federal Kassio Nunes Marques
Apelante: Caixa Econômica Federal – CEF
Advogado: Lidinei Rodrigues de Melo e outros(as)
Apelado: Livraria Estudantil Ltda.
Advogado: Mario Silvio Costa Carvalho

EMENTA

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CIVIL –


CONSUMIDOR – INCLUSÃO IRREGULAR DE NOME DE
EMPRESA NA SERASA – ART. 14 DO CDC – VÍCIOS NA
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO BANCÁRIO – INDENIZAÇÃO POR
DANO MORAL – CABIMENTO – SENTENÇA MANTIDA
1. Segundo a Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça, a
relação jurídica estabelecida entre instituição bancária e seus clientes
possui natureza consumerista. Todavia, a facilitação da defesa dos
direitos do contratante, tais como a responsabilidade objetiva do
fornecedor do serviço e a inversão do ônus da prova – entre outras
positivadas no CDC –, depende da constatação da verossimilhança das
alegações. Precedentes.
2. A orientação jurisprudencial deste Tribunal, em sintonia com
a assentada no STJ, é no sentido de que a inclusão indevida de nome de
consumidor nos cadastros restritivos de crédito enseja dano moral in
re ipsa, isto é, o dano sobrevém do próprio fato, sendo dispensável sua
comprovação, por ser considerado presumido.
3. Nos termos do art. 14 da Lei nº 8.078/1990, o fornecedor
de serviços responde, independentemente da existência de culpa,
pela reparação dos danos morais causados aos consumidores por
149
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações


insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Contudo,
o § 3º, incisos I e II, do mesmo artigo, exime o fornecedor dessa
responsabilidade, quando é constatada a inexistência do alegado defeito
(I) ou verificada a ocorrência de culpa exclusiva do consumidor ou de
terceiros (II). Precedente: AC 0041934-43.2005.4.01.3800/MG, 5ª T., Relª
Desª Fed. Selene Maria de Almeida, DJ de 03.12.2013.
4. A imposição da obrigação de indenizar danos morais objetiva o
suprimento de dupla função: compensar o sofrimento injustificadamente
causado à parte que sofreu o prejuízo e sancionar o causador do dano,
configurando, assim, meio de desestímulo à prática de novas condutas
similares. Apesar disso, não deve ser excessivo, para não resultar no
enriquecimento ilícito do lesado. Precedentes.
5. Na hipótese, em ação revisional de cláusulas contratuais
consideradas abusivas, movida contra a Caixa Econômica Federal – CEF,
a empresa autora obteve liminar, em 24 de julho de 2006, a garantia da
exclusão de seu nome dos cadastros dos órgãos de restrição ao crédito.
Porém, a ordem judicial foi ignorada pela instituição financeira, que a
incluiu no rol da Serasa. Nesse sentido, adequada a solução aplicada
pelo magistrado de base, que fixou o valor indenizatório por danos
morais em R$ 10.000,00 (dez mil reais).
6. Apelação a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Decide a Turma, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos


termos do voto do Relator.
6ª T. do TRF da 1ª Região.
Brasília, 28 de julho de 2014.

Desembargador Federal Kassio Marques


Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação contra sentença que, em ação ordinária, julgou


parcialmente procedente o pedido formulado pela parte autora para conde-
nar à Caixa Econômica Federal – CEF ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil
150
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

reais) a título de indenização por danos morais e, em virtude da sucumbência


recíproca determinou que cada parte arcasse com os custos de seu patrocínio.
A autora, pessoa jurídica, alega, na inicial, que ajuizou, na 5ª Vara, ação
revisional em virtude de cláusula contratual abusiva relativa a empréstimo
contraído entre a empresa e a CEF; que o juiz da causa revisional determi-
nou, em liminar, que a instituição bancária se abstivesse de incluir ou manter
o nome da empresa nos cadastros dos órgãos de restrição ao crédito; que a
Caixa Econômica Federal incluiu irregularmente seu nome no cadastro da
Serasa; que a conduta da CEF causou prejuízos materiais e morais, sobre-
tudo, diante dos fornecedores dos quais depende para a realização de suas
atividades comerciais.
A CEF apresentou apelação pretendendo a reforma da sentença e, em
ordem de sucessão, a diminuição do valor arbitrado pelo juiz para a conde-
nação da indenização por danos morais.
A autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.

VOTO

A meu ver, não merece reforma a sentença tendo em vista que reputo
corretos os fundamentos adotados pelo magistrado de base, porquanto di-
rimiram de forma pertinente a lide, conforme se depreende dos seguintes
trechos (fls. 127/129):
No caso em questão, o dano decorrente da inscrição indevida em cadastro
de inadimplente, é uma situação de dano moral in re ipsa, pois este pre-
sumidamente afeta a dignidade da pessoa humana, tanto em sua honra
subjetiva, como perante a sociedade.
Além disso, consiste o dano moral na violação a direitos personalíssimos,
inclusive os dos entes personificados, protegidos por nosso ordenamento
jurídico, no Código Civil, em seu art. 52, no mesmo caminho do Enunciado
nº 227 do STJ, qual seja: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”. Portanto,
apesar de não serem passíveis de dor, sofrimento, tristeza ou angústia, não
menos verdade que se atribuem a eles uma honra de natureza objetiva, ou
seja, sua reputação frente à sociedade.
No caso dos presentes autos, cotejando os documentos a ele anexados, ve-
rifica-se ocorrência de conduta ilícita que acarretou a indevida inclusão da
empresa autora no rol dos maus pagadores junto à Serasa. A inclusão é in-
151
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

devida, pois já havia anteriormente uma determinação para que a Requeri-


da se abstivesse de lançar o nome da Requerente no cadastro de devedores.
[...]
Com efeito, os documentos carreados aos autos não são suficientes para
atestar a existência de qualquer outro dano que não seja moral, vez que
a Requerente apenas expôs que a inclusão de seu nome a prejudicaria em
compras, participações em licitações. O que não houve, entretanto, foi a
comprovação de que o lançamento do seu nome no Serasa de fato a impe-
diu de realizar os atos necessários e inerentes à sua atividade empresarial.

Assim, considerando os fatos acarreados aos autos, o teor do Código


de Defesa do Consumidor e os consolidados entendimentos da jurisprudên-
cia deste Tribunal a respeito do assunto, colaciono as seguintes ementas:
CIVIL – RESPONSABILIDADE CIVIL – DANOS MORAIS – ATRASO
NA ENTREGA DE CORRESPONDÊNCIA ENVIADA VIA SEDEX PARA
PARTICIPAÇÃO EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO – INABILITA-
ÇÃO DA EMPRESA – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – DEVER
DE INDENIZAR – VALOR DA INDENIZAÇÃO – RAZOABILIDADE
1. “As empresas públicas prestadoras de serviços públicos submetem-se ao
regime de responsabilidade civil objetiva, previsto no art. 14 do CDC, de
modo que a responsabilidade civil objetiva pelo risco administrativo, pre-
vista no art. 37, § 6º, da CF/1988, é confirmada e reforçada com a celebração
de contrato de consumo, do qual emergem deveres próprios do microssis-
tema erigido pela Lei nº 8.078/1990.” (REsp 1210732/SC, 4ª T., Rel. Min.
Luis Felipe Salomão, J. 02.10.2012, DJe 15.03.2013)
2. Na hipótese, resta cristalino o defeito do serviço prestado, porquanto,
valendo-se a empresa apelada de serviço destinado à entrega de documen-
tos urgentes, criou a expectativa de participação no certame, que restou
frustrada, tendo em vista a demora de 07 (sete) dias para a chegada no
destino, quando a de uma postagem normal é de “D+1”.
3. Na fixação do valor da indenização por danos morais inexiste parâmetro
legal definido para o seu arbitramento, devendo ser quantificado segundo
os critérios de proporcionalidade, moderação e razoabilidade, submetidos
ao prudente arbítrio judicial, com observância das peculiaridades ineren-
tes aos fatos e circunstâncias que envolvem o caso concreto. Ademais, o
quantum fixado para indenização pelo dano moral, não pode configurar
valor exorbitante que caracterize o enriquecimento sem causa da vítima,
como também, não pode consistir em valor irrisório a descaracterizar a in-
denização almejada.
152
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

4. Aplica-se à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, quanto à cor-


reção monetária e juros de mora, o regramento legal próprio da Fazen-
da Pública (Lei nº 9.494/1997, art. 1º-F, com a redação dada pela Lei
nº 11.960/2009).
5. Apelação da ECT improvida.
(AC 0041934-43.2005.4.01.3800/MG, 5ª T., Relª Desª Fed. Selene Maria de
Almeida, DJ 03.12.2013)

EMBARGOS INFRINGENTES – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL –


QUANTUM DEBEATUR – JUROS MORATÓRIOS
1. Em se tratando de fixação do valor de indenização por danos morais
decorrentes de indevida inclusão do nome de pessoa física ou jurídica em
cadastros de inadimplentes, tem se orientado a jurisprudência desta Corte
no patamar médio de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com variação para mais
ou para menos segundo as circunstâncias do caso concreto.
2. Hipótese em que a manutenção indevida do nome da ora embargada
por um período superior a dez meses autoriza o arbitramento do valor em
R$ 10.000,00 (dez mil reais).
3. Impugnando a Caixa Econômica Federal, no recurso de apelação por
ela interposto, a Taxa Selic, que fora mandada aplicar, somente a partir da
prolação da sentença, a título de atualização monetária e de juros morató-
rios, caracteriza reformatio in pejus a determinação de incidência do encargo
de mora, separadamente da correção monetária, desde a data do evento
danoso.
4. Embargos infringentes acolhidos em parte.
(EIAC 0001530-34.2006.4.01.3502/GO, 3ª S., Rel. Des. Fed. Carlos Moreira
Alves, DJ 29.11.2013)

Em face do exposto, nego provimento a apelação.


É como voto.

Desembargador Federal Kassio Marques


Relator

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO


SECRETARIA JUDICIÁRIA

24ª Sessão Ordinária do(a) Sexta Turma


153
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Pauta de: 28.07.2014 Julgado em: 28.07.2014


Ap 0000380-69.2007.4.01.3700/MA
Relator: Exmo. Sr. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques
Revisor: Exmo(a). Sr(a).
Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargador Federal Kassio
Nunes Marques
Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Luiz Augusto Santos Lima
Secretário(a): Eugênia Maria Pires Brandão
Apte.: Caixa Econômica Federal – CEF
Adv.: Lidinei Rodrigues de Melo e outros(as)
Apdo.: Livraria Estudantil Ltda.
Adv.: Mario Silvio Costa Carvalho
Nº de Origem: 3806920074013700 Vara: 5ª
Justiça de Origem: Justiça Federal Estado/Com.: MA

SUSTENTAÇÃO ORAL
CERTIDÃO
Certifico que a(o) egrégia(o) Sexta Turma, ao apreciar o processo em
epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, à unanimidade, negou provimento à Apelação, nos termos do
voto do Relator.

Participaram do Julgamento o Exmo. Sr. Desembargador Federal


Daniel Paes Ribeiro e a Exma. Sra. Juíza Federal Hind Ghassan Kayath,
convocada para substituir o Exmo. Sr. Desembargador Federal Jirair Aram
Meguerian, ausente por motivo de férias.
Brasília, 28 de julho de 2014.

Eugênia Maria Pires Brandão


Secretário(a)
154
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO


SECRETARIA JUDICIÁRIA
24ª Sessão Ordinária do(a) Sexta Turma
Pauta de: 28.07.2014 Julgado em: 28.07.2014
Ap 0000380-69.2007.4.01.3700/MA
Relator: Exmo. Sr. Desembargador Federal Kassio Nunes Marques
Revisor: Exmo(a). Sr(a).
Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargador Federal Kassio
Nunes Marques
Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Luiz Augusto Santos Lima
Secretário(a): Eugênia Maria Pires Brandão
Apte.: Caixa Econômica Federal – CEF
Adv.: Lidinei Rodrigues de Melo e outros(as)
Apdo.: Livraria Estudantil Ltda.
Adv.: Mario Silvio Costa Carvalho
Nº de Origem: 3806920074013700 Vara: 5ª
Justiça de Origem: Justiça Federal Estado/Com.: MA

SUSTENTAÇÃO ORAL
CERTIDÃO

Certifico que a(o) egrégia(o) Sexta Turma, ao apreciar o processo em


epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, à unanimidade, negou provimento à Apelação, nos termos do
voto do Relator.

Participaram do Julgamento o Exmo. Sr. Desembargador Federal


Daniel Paes Ribeiro e a Exma. Sra. Juíza Federal Hind Ghassan Kayath,
convocada para substituir o Exmo. Sr. Desembargador Federal Jirair Aram
Meguerian, ausente por motivo de férias.
Brasília, 28 de julho de 2014.

Eugênia Maria Pires Brandão


Secretário(a)
155
trf 4ª r.
T ribunal R egional F ederal da 4ª R egião

Apelação Cível nº 5004944-06.2013.404.7000/PR


Relator: Marga Inge Barth Tessler
Apelante: Bosco de Azevedo & Cia. Ltda. – ME
Advogado: Nathalia Mello Americo Wolff
Apelante: União – Advocacia-Geral da União
Apelado: os mesmos

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL – DESCONSIDERAÇÃO


DA PERSONALIDADE JURÍDICA INVERSA –
DISREGARD DOCTRINE – FINALIDADE – ART. 50 DO
CÓDIGO CIVIL – FRAUDE OU ABUSO DE DIREITO
– ESVAZIAMENTO DO PATRIMÔNIO PESSOAL –
INTEGRALIZAÇÃO NA PESSOA JURÍDICA
I – A desconsideração inversa da Personalidade Jurídica
caracteriza-se pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade
para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade
jurídica propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio
social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do
sócio.
II – Tendo em vista que a finalidade do Disregard Doctrine é
combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios, o que
pode ocorrer também nos casos em que o sócio esvazia o seu patrimônio
pessoal e o integraliza na pessoa jurídica, conclui-se, de uma interpretação
teleológica do art. 50 do CC, ser possível a desconsideração inversa da
personalidade jurídica, de forma a atingir bens da sociedade em razão
de dívidas contraídas pelo sócio controlador, conquanto previstos os
requisitos da norma.
III – Configura-se a desconsideração da personalidade como
medida excepcional, sendo sua adoção recomendada quando atendidos
157
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

os pressupostos específicos relacionados com a fraude ou abuso de


direito estabelecidos no art. 50 do CC. Se verificados esses requisitos,
pode o juiz, no processo de execução, levantar o véu da personalidade
jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens da empresa.
IV – À luz das provas produzidas, a decisão proferida no primeiro
grau de jurisdição, entendeu, mediante minuciosa fundamentação,
pela ocorrência de confusão patrimonial e abuso de direito por parte
da recorrente, ao se utilizar indevidamente da empresa familiar para
adquirir seus bens particulares.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,


decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por
unanimidade, negar provimento ao recurso de Bosco de Azevedo & Cia.
Ltda. – ME e por dar provimento ao da União, nos termos do relatório, votos
e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de agosto de 2014.

Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler


Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de embargos opostos em face das execuções movidas pela


União, de nºs 5004940-66.2013.404.7000, 5004942-36.2013.404.7000, 5004943-
21.2013.404.7000 e 5004944-06.2013.404.7000.
Sobreveio sentença julgando conjuntamente os embargos, com o se-
guinte dispositivo:
Ante o exposto, julgo improcedentes os embargos, nos termos do art. 269, in-
ciso I, do CPC.

Sem custas.

Condeno a embargante ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo


em R$ 3.000,00 (três mil reais), tendo em vista o tempo de tramitação do
processo e a complexidade da matéria discutida nos autos, nos termos do
art. 20, §§ 3º e 4º do CPC.
158
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Em suas razões a União sustenta que a decisão merece reforma par-


cial no tocante à verba honorária fixada; que somados os valores atribuí­
dos às quatro causas, julgadas conjuntamente, chega-se ao montante de
R$ 542.606,78 (quinhentos e quarenta e dois mil, seiscentos e seis reais e se-
tenta e oito centavos); que as empresas possuem capacidade financeira para
arcar com verba honorária superior à fixada na sentença recorrida; que im-
põe-se a reforma parcial da sentença, a fim de ser majorada a verba honorária
arbitrada em favor da União, fixando-a em 10% sobre o valor da causa.
No seu apelo a executada sustenta que a apelante não se trata de em-
presa criada para fins ilícitos ou para remanejamento de patrimônio da execu-
tada; que inexiste respaldo para a tese de confusão patrimonial, muito menos
qualquer simulação ou fraude na abertura de empresa; que até para fins de
não vender os bens por valores abaixo do mercado, considerando a urgência
da sua situação, os filhos da executada Mariza se propuseram a adquirir os
imóveis que seriam postos à venda (matrículas nºs 32.088 e 47.538), compro-
metendo-se a continuar suportando as despesas pessoais da Executada; que
considerando serem os netos menores, o que geraria impedimentos legais
para vendas próximas, optou-se por transferir os bens para as empresas das
quais eram eles sócios; que a transferência dos imóveis nada teve de relação
com a superveniência da condenação da Executada junto ao TCU; que o Juí­
zo a quo não conseguiu entender o alegado em embargos; que a transferên-
cia dos imóveis não teve como intuito lesar os cofres da União (ainda que
tal consequência possa até ter ocorrido); que a transferência de tais imóveis
pela Executada à Apelante ocorreu devido à uma séria de circunstâncias que
ocorreram muito antes de qualquer questionamento a respeito da executada
Mariza na direção da Associação Saza Lattes; que apresenta estado de saúde
desfavorável, tendo estado internada em hospitais; que suas despesas são
suportadas pelos filhos, que assumiram as empresas; que sua aposentadoria
é reduzida; que tendo em vistas as despesas suas e de sua irmã, suportadas
por seus filhos, o valor de mercado dos bens já restou pago mais de uma vez;
que no ano de 2010, de modo a evitar futuros transtornos após possível óbi-
to, a família resolveu formalizar aquilo que já havia sido acordado seis anos
antes, efetuando a transferência dos bens; que se pretendesse dissipar seu
patrimônio teria transferido seus imóveis a terceiros sem qualquer relação
de parentesco; que uma mera transferência pontual de um imóvel não pode
se prestar, sozinha, para justificar medida tão extrema como a aplicação da
Teoria da Desconsideração Inversa, incluindo na posição de devedora uma
159
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

pessoa jurídica independente; que somente em situações excepcionais em


que o sócio se vale da pessoa jurídica para ocultar bens pessoais em prejuízo
de terceiros é que se deve admitir a desconsideração inversa; que o imóvel
residencial da Executada, doado para as empresas dos netos, com usufruto
para a própria, possui valor de mercado mais do que suficiente para liquidar
os débitos; que bastava à União requerer a nulidade de tal doação; que o ne-
gócio se configurou informalmente antes da constituição do título executivo.
Postula o provimento do recurso para que haja a liberação de todos os bens
que restaram constritos ou, alternativamente, para que seja limitada a res-
ponsabilidade à apelante aos imóveis transferidos.
Com contrarrazões, vieram os autos.
É o sucinto relatório.
Em Pauta.

VOTO

A controvérsia a ser dirimida nos autos gravita em torno da desconsi-


deração inversa da personalidade jurídica, admitida no processo de execução
que originou estes embargos.
Como bem constatou a magistrada de primeiro grau, chama a atenção
três transferências imobiliárias realizadas pela ré no mês de junho de 2010
(evento 105 – MATIMOVEL9) por valores substancialmente inferiores ao de
mercado. Afirmou a julgadora: “ainda que não exista nos autos uma avalia-
ção formal dos imóveis transferidos, ao menos à primeira vista, não quer me
parecer que um apartamento com mais de 200 m² de área em pleno centro
desta Capital valha pouco mais de 50 mil reais”.
De fato, a executada alienou seu apartamento por 52 mil e quinhen-
tos reais (matrícula R.-7.3080 – 3º Ofício de Registro de Imóveis), uma loja
em um shopping center por 23 mil (R-432.088 – 6º Ofício) e um terreno por
15 mil na Alameda das Acácias no Parque Barigui (R-747.358 – 8º Ofício).
As empresas adquirentes (evento 105 – MATRIMOVEL9 dos autos 5020635-
65.2010.404.7000) Bosco de Azevedo & Cia. Ltda., CNPJ XXXX e M. G.
Azevedo e Cia. Ltda., CNPJ XXXX são empresas ligadas à família. A ré é sócia
da primeira e as suas netas Gabriela Bosco Azevedo e Manuela Bosco Azeve-
do sócias da segunda (CONTRSOCIAL8 dos autos 5020635-65.2010.404.7000)
160
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Tais transações ocorreram em datas muito próximas à publicação do


Acórdão nº 629/2010 do TCU, de 23.02.2010, oriundo do processo adminis-
trativo deflagrado em 2007, que a condenou a pagamento (evento 1 – PRO-
CADM2 – autos 5020635-65.2010.404.7000).
Isso e o que mais dos autos consta evidencia que a executada vem pro-
movendo a dissipação de seus bens, buscando se furtar ao pagamento do
débito, que em muito ultrapassa o valor total obtido com a venda dos 3 (três)
imóveis, indicando que a executada pretende lograr seus credores, merecen-
do acolhida a pretensão da União.
Outrossim, amplamente aceita é a despersonalização inversa da pessoa
jurídica em hipóteses tal como a dos autos, nas quais o réu furta-se ao paga-
mento do débito, mediante a alienação de bens a pessoas físicas ou jurídicas
com as quais mantém vínculos familiares ou comerciais.
Com efeito, dispõe o art. 20 do Código Civil: “as pessoas jurídicas têm
existência distinta de seus membros”. Portanto, as pessoas jurídicas têm in-
dividualidade própria, não se confundindo, com as pessoas naturais, físicas,
que a compõem. Por isso, a desconsideração da pessoa jurídica é medida ex-
trema que somente pode ser deferida se a pessoa jurídica de direito privado
não possuir patrimônio próprio, tiver sido dissolvida irregularmente ou em
caso de comprovada gestão fraudulenta dos sócios ou de atos manifestamen-
te praticados com o intuito de burlar a execução. Assim, o contrário também
é admitido, ou seja, a desconsideração inversa, em que os bens da sociedade
podem ser onerados em caso de gestão fraudulenta de um sócio devedor tal
como está a ocorrer no caso sub judice.
Nesse raciocínio, decidiu o e. STJ, em acórdão que ora transcrevo:
PROCESSUAL CIVIL E CIVIL – RECURSO ESPECIAL – EXECUÇÃO DE
TÍTULO JUDICIAL – ART. 50 DO CC/2002 – DESCONSIDERAÇÃO DA
PERSONALIDADE JURÍDICA INVERSA – POSSIBILIDADE – [...]
III – A desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se
pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contraria-
mente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente
dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabi-
lizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio controlador.
IV – Considerando-se que a finalidade da disregard doctrine é combater a
utilização indevida do ente societário por seus sócios, o que pode ocorrer
também nos casos em que o sócio controlador esvazia o seu patrimônio
pessoal e o integraliza na pessoa jurídica, conclui-se, de uma interpretação
161
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

teleológica do art. 50 do CC/2002, ser possível a desconsideração inversa


da personalidade jurídica, de modo a atingir bens da sociedade em razão
de dívidas contraídas pelo sócio controlador, conquanto preenchidos os
requisitos previstos na norma.
V – A desconsideração da personalidade jurídica configura-se como medi-
da excepcional. Sua adoção somente é recomendada quando forem aten-
didos os pressupostos específicos relacionados com a fraude ou abuso de
direito estabelecidos no art. 50 do CC/2002. Somente se forem verificados
os requisitos de sua incidência, poderá o juiz, no próprio processo de exe-
cução, “levantar o véu” da personalidade jurídica para que o ato de expro-
priação atinja os bens da empresa.
VI – À luz das provas produzidas, a decisão proferida no primeiro grau de
jurisdição, entendeu, mediante minuciosa fundamentação, pela ocorrência
de confusão patrimonial e abuso de direito por parte do recorrente, ao se
utilizar indevidamente de sua empresa para adquirir bens de uso parti­
cular.
VII – Em conclusão, a r. decisão atacada, ao manter a decisão proferida no
primeiro grau de jurisdição, afigurou-se escorreita, merecendo assim ser
mantida por seus próprios fundamentos. Recurso especial não provido.
(REsp 948.117/MS, 3ª T., Min. Nancy Andrighi, DJ 03.08.2010)

In casu, estão preenchidos os requisitos para acolher a desconsideração


da personalidade jurídica inversa das empresas ligadas à autora e para as
quais foram transferidos os imóveis em questão: empresa Bosco de Azevedo
& Cia. Ltda., CNPJ XXXX e M. G. Azevedo e Cia. Ltda., CNPJ XXXX.
Aliás, nenhum argumento da parte embargante tem o condão de des-
qualificar a adequação da medida adotada.
Com efeito, numa análise rápida e estanque das transferências imobi-
liárias, até se poderia cogitar – como defende a embargante – ser indevida a
desconsideração inversa da personalidade jurídica das empresas adquirentes
dos bens. Isto porque a Sra. Mariza Soares de Azevedo, que figurava inicial-
mente como única executada, não compõe o quadro societário da empresa
M. G. Azevedo & Cia. Ltda. – EPP e titulariza apenas 1% das cotas da Bosco
de Azevedo & Cia. Ltda. – ME. Assim, como a aplicação da medida visa a
impedir o cometimento de fraude pelo sócio controlador da pessoa jurídica,
e como a Sra. Mariza não era a sócia controladora das empresas adquirentes
dos seus imóveis, seria descabido atingir o patrimônio das pessoas jurídicas.
162
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

É preciso, no entanto, ponderar que no caso em análise tem-se a cons-


tituição de empresas pelo mesmo grupo familiar, ficando bastante caracteri-
zado que a alienação dos imóveis se deu em prejuízo à cobrança promovida
pela União. Veja-se que o título do TCU se formou em fevereiro/2010, sendo
que as transações imobiliárias foram posteriores (junho/2010).
Para abranger situações tais quais a presente, em que o devedor se des-
pe de seu patrimônio, ainda que transferindo-o para pessoa jurídica em que
não figure como sócio, a doutrina e jurisprudência vêm evoluindo. Assim é
que, modernamente, já se fala em desconsideração expansiva da pessoa jurídi-
ca, superando-se a limitação do conceito anteriormente adotado.
Nesse sentido, a lição do Ministro Celso de Mello, do e. STF, que, ao
decidir pedido de liminar no MS 32.494/DF, assim de manifestou:
“EMENTA: PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO E DESCONSIDERA-
ÇÃO EXPANSIVA DA PERSONALIDADE JURÍDICA – DISREGARD
DOCTRINE E RESERVA DE JURISDIÇÃO – EXAME DA POSSIBILIDADE
DE A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, MEDIANTE ATO PRÓPRIO, AGIN-
DO PRO DOMO SUA, DESCONSIDERAR A PERSONALIDADE CIVIL
DA EMPRESA, EM ORDEM A COIBIR SITUAÇÕES CONFIGURADO-
RAS DE ABUSO DE DIREITO OU DE FRAUDE – A COMPETÊNCIA INS-
TITUCIONAL DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO E A DOUTRINA
DOS PODERES IMPLÍCITOS – INDISPENSABILIDADE, OU NÃO, DE
LEI QUE VIABILIZE A INCIDÊNCIA DA TÉCNICA DA DESCONSIDE-
RAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA EM SEDE ADMINISTRATI-
VA – A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
– SUPERAÇÃO DE PARADIGMA TEÓRICO FUNDADO NA DOUTRI-
NA TRADICIONAL? O PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRA-
TIVA – VALOR CONSTITUCIONAL REVESTIDO DE CARÁTER ÉTICO-
-JURÍDICO, CONDICIONANTE DA LEGITIMIDADE E DA VALIDADE
DOS ATOS ESTATAIS – O ADVENTO DA LEI Nº 12.846/2013 (ART. 5º,
IV, E, E ART. 14), AINDA EM PERÍODO DE VACATIO LEGIS – DESCON-
SIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E O POSTULADO DA
INTRANSCENDÊNCIA DAS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS E DAS
MEDIDAS RESTRITIVAS DE DIREITOS – MAGISTÉRIO DA DOUTRINA
– JURISPRUDÊNCIA – PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DA PRETENSÃO
CAUTELAR E CONFIGURAÇÃO DO PERICULUM IN MORA – MEDIDA
LIMINAR DEFERIDA
[...]
163
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

76. A doutrina e a jurisprudência dos tribunais já consideram que um des-


dobramento dessa teoria é a possibilidade de estender os seus efeitos a
outras empresas, diante das circunstâncias e provas do caso concreto espe-
cífico. Trata-se da teoria da desconsideração expansiva da personalidade
jurídica da sociedade, terminologia utilizada pelo Prof. Rafael Mônaco [...].
77. Com a teoria da desconsideração expansiva da personalidade jurídica,
é possível estender os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica
aos ‘sócios ocultos’ para responsabilizar aquele indivíduo que coloca sua
empresa em nome de um terceiro ou para alcançar empresas de um mesmo
grupo econômico.”
(STF, MS 32494-MC/DF, DJe Data 13.11.2013)

De fato, nem sempre a utilização da pessoa jurídica para evitar os efeitos


do processo executivo se dá de maneira “clássica” (transferência da empresa
para seu proprietário ou do proprietário para sua empresa). O elemento de
relevo, que une todas as derivações do instituto da desconsideração da per-
sonalidade jurídica, é a burla à satisfação do crédito. Assim, se resta eviden-
ciado ter havido o emprego de estratagemas para a proteção de patrimônio,
cabível é a desconsideração da personalidade jurídica, pois a independência
patrimonial das pessoas jurídicas não pode servir como escudo protetor do
patrimônio de quem quer que seja, independentemente da existência formal de
relação do indivíduo com a sociedade empresária.
Com bem constatou a julgadora, quanto à audiência realizada, se por
um lado os depoimentos colhidos procuraram justificar a transferência dos
bens – uma forma de contraprestação pelo sustento da Sra. Mariza –, por outra
não desqualificam a conclusão de que ocorreram em evidente prejuízo ao cré-
dito da ré. Ocorreram após a formação do título executivo extrajudicial (acór-
dão do TCU), pois, ainda que se sustente que a anotação da transferência no
registro imobiliário ocorreu apenas para formalizar o ato de disposição que
já havia ocorrido, fato é que a transferência imobiliária somente gera efeitos
perante terceiros com seu registro, conforme Código Civil:
“Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do
título translativo no Registro de Imóveis.
§ 1º Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser
havido como dono do imóvel.
§ 2º Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de
invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua
a ser havido como dono do imóvel.”
164
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Diante desse panorama, não vejo como acolher o pleito da embargante.


Quanto aos honorários advocatícios, assiste razão à União, eis que de-
vem ser majorados, para se adequar ao entendimento desta Turma, no senti-
do de fixá-los em 10% sobre o valor atribuído à causa.
Quanto ao prequestionamento, entendo que não há necessidade de
o julgador mencionar todos os dispositivos legais citados pelas partes, pois
o enfrentamento da matéria através do julgamento feito pelo Tribunal jus-
tifica o conhecimento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ,
EREsp 155.621/SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira,
DJ de 13.09.1999; AgRg-REsp 1305728/RS, 2ª T., Rel. Min. Mauro Campbell
Marques, J. 21.05.2013, DJe 28.05.2013).
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso de Bosco de
Azevedo & Cia. Ltda. – ME e por dar provimento ao da União.
É o voto.

Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler


Relatora

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06.08.2014

Apelação Cível nº 5004944-06.2013.404.7000/PR


Origem: PR 50049440620134047000
Relator: Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler
Presidente: Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores
Lenz
Procurador: Dr(a). Claudio Dutra Fontella
Pedido de preferência: Proc. José Tadeu Xavier pela União Federal
Apelante: Bosco de Azevedo & Cia. Ltda. – ME
Advogado: Nathalia Mello Americo Wolff
Apelante: União – Advocacia-Geral da União
Apelado: os mesmos

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06.08.2014, na


sequência 169, disponibilizada no DE de 23.07.2014, da qual foi intimado(a)
165
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

União – Advocacia-Geral da União, o Ministério Público Federal e as demais


Procuradorias Federais.
Certifico que o(a) 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epí-
grafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso de Bosco
de Azevedo & Cia. Ltda. – ME e por dar provimento ao da União Federal.

Relator Acórdão: Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler


Votante(s): D
 esª Fed. Marga Inge Barth Tessler
Des. Fed. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz
Des. Fed. Fernando Quadros da Silva

Letícia Pereira Carello


Diretora de Secretaria

166
E mentário C ível

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER – FORNECIMENTO DE
MEDICAMENTO – SOLIDARIEDADE
ENTRE ENTRES DA FEDERAÇÃO –
MEDIDA DE URGÊNCIA – ART. 273
DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

33497 – “Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer. Fornecimento de me-


dicamento. Solidariedade entre os entes da federação. Preliminares rejeitadas. Presen-
tes os requisitos autorizadores da medida de urgência. Art. 273 do CPC. 1. Os entes
estatais são solidariamente responsáveis pelo atendimento do direito fundamental à
saúde. Logo o Estado, o Município e a União são legitimados passivos solidários, con-
forme determina o texto constitucional. Constitui dever do Poder Público a garantia à
saúde pública, possuindo o cidadão a faculdade de postular seu direito fundamental
contra qualquer dos entes públicos. 2. A norma contida no art. 2º-B da Lei Federal
nº 9.494/1997 não se aplica ao caso dos autos, eis que não se trata de sentença, mas
sim de decisão em que o Juiz a quo em sede de tutela antecipada determinou ao réu
que concedesse o medicamento pretendido. 3. A saúde se constitui em um bem jurí-
dico constitucionalmente tutelado, cujo poder público deve velar, em sua integralida-
de, incumbindo-lhe formular e implementar políticas sociais e econômicas idôneas,
que visem a garantir o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e não
transferir o ônus para o hipossuficiente. 4. Presentes os requisitos autorizadores da
concessão da tutela antecipada a teor do art. 273 do CPC, mostra-se escorreita a deci-
são de primeiro grau que a deferiu. Recurso conhecido e desprovido.” (TJPA – Proc.
201330034682 – 136395 – Órgão Julgador 2ª C.Cív.Isol. – Relª Celia Regina de Lima
Pinheiro – J. 28.07.2014 – Publ. 04.08.2014)

AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE
POSSE – COMODATO VERBAL –
NOTIFICAÇÃO PARA DESOCUPAÇÃO
167
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

– PERMANÊNCIA INJUSTA –
ESBULHO POSSESSÓRIO

33498 – “Ação de reintegração de posse. Imóvel de propriedade da autora cedido ao


réu (irmão da autora) a título de comodato verbal. Notificação para desocupação do
bem. Permanência injusta do réu na posse do imóvel após expirar-se o prazo para
desocupação, a caracterizar o esbulho possessório. Requisitos do art. 927 do CPC
e art. 1.210 do CC preenchidos autorizando a reintegração da autora na posse do
imóvel. Sentença mantida. Recurso negado.” (TJSP – Agravo Apelação nº 0007224-
69.2012.8.26.0001 – São Paulo – Rel. Des. Francisco Giaquinto – Publ. 11.08.2014)

ADOÇÃO – INEXISTÊNCIA DE
VÍNCULOS COM A FAMÍLIA
ESTENDIDA – PREVALÊNCIA
DO INTERESSE DO MENOR
– ESTABILIDADE NA SUA
CRIAÇÃO E FORMAÇÃO

33499 – “Civil. Processual civil. Família. Destituição do pátrio poder. Menor. Família
substituta. Caso peculiar. Migração da mãe para o sul do Brasil em busca de melhores
condições. Maus-tratos e situação de risco. Confirmação. Pretensão de atribuição da
guarda à avó materna. Inexistência de vínculo com a família estendida (avós, tios e
primos). Adoção concluída. Prevalência do interesse do menor. Estabilidade na cria-
ção e formação. Necessidade. Recurso especial desprovido. Na hipótese em que a
genitora deixa a casa dos pais e migra para o sul do país em busca de melhores con-
dições, optando por levar consigo filha menor, cumpre-lhe proteger a criança e dela
cuidar, garantindo-lhe sustento, guarda, companhia e educação em ambiente livre da
presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes (Constituição Federal
e Estatuto da Criança e Adolescente). Se não há controvérsia sobre o fato de a menor
ter sido vítima de negligência e de maus-tratos e encontrar-se em situação de risco,
destitui-se o pátrio poder. Estando a criança em situação de risco e não subsistindo
nenhum vínculo afetivo entre ela e a família de origem, prevalece o interesse da me-
nor, que deve ser inserida em família substituta, sobretudo quando há notícia de que
o processo de adoção já foi concluído. Recurso especial desprovido.” (STJ – REsp
1422929/SC – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – Rel. p/o Ac. Min. João Otávio de
Noronha – J. 24.04.2014 – DJe 12.08.2014)
168
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

AGRAVO REGIMENTO NO
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA –
INTERPOSIÇÃO EXCLUSIVAMENTE
POR VIA ELETRÔNICA – APLICAÇÃO
DO ART. 10, XVIII, C/C O ART. 23
DA RESOLUÇÃO Nº 14/2013 DO STJ

33500 – “Agravo regimental nos embargos de divergência em recurso especial. In-


terposição do recurso via fax. Falta de juntada do original. Recusa de petição física.
Resolução nº 14/2013 do STJ. 1. A prática de atos processuais por intermédio de sis-
tema de transmissão de dados (fac-símile ou outro similar), possibilitada pela Lei
nº 9.800/1999, tem validade condicionada à juntada das peças originais em até 5 (cinco)
dias do término do prazo recursal, ônus do qual não se desincumbiram os agravantes.
2. As petições de agravo regimental referentes a diversas classes processuais, serão
recebidas exclusivamente de forma eletrônica, podendo ser recusados os documen-
tos apresentados na forma física (art. 10, XVIII, c/c o art. 23 da Resolução nº 14/2013
do STJ). 3. Agravo regimental não conhecido”. (STJ – AgRg-EREsp1211842/RJ – Corte
Especial – Rel. Min. Gilson Dipp – J. 01.08.2014 – DJe 13.08.2014)
Nota:
A paulatina informatização do processo judicial vem impactando a vida dos ope-
radores. De um lado, oferece facilidades, como a consulta aos autos a partir de
qualquer computador conectado a Internet, bem como a prática de atos proces­
suais por via remota, dispensando o tradicional protocolo físico. Contudo, algu-
mas questões ainda geram surpresas para os profissionais, com a eliminação dos
autos físicos.
É o caso do tema enfrentado neste agravo regimental pelo Superior Tribunal de
Justiça. O advogado interpôs o recurso por meio de fax, remetendo via correio os
originais. A questão enfrentada pela Corte foi a regularidade deste procedimento,
uma vez que as Resoluções do STJ exigem a interposição eletrônica do agravo
regimental.
O Presidente do Superior Tribunal de Justiça havia proferido decisão monocráti-
ca com o seguinte teor: “A petição dos embargos de divergência foi recebida na
Secretaria deste Tribunal, em 28 de março de 2014, desacompanhada do compro-
vante de pagamento de custas, nos termos da certidão de fl. 644. À vista disso,
julgo deserto o recurso, com fulcro no art. 511, caput, do Código de Processo Civil,
combinado com o art. 21, inciso XIII, alínea e, do Regimento Interno do Superior
Tribunal de Justiça”.
A parte, insatisfeita, protocolou agravo regimental encaminhado via fac-símile,
como destacado pelo Ministro Gilson Dipp: “À fl. 650 foi certificado que a petição
original do agravo regimental encaminhado por fac-símile em 23.05.2014 e proto-
colado sob o nº 173394/2014, apresentada de forma física em 27.05.2014, foi recu-
sada pela Secretaria Judiciária deste Tribunal com amparo no art. 23 da Resolução
169
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

nº 14/2013 do STJ. À fl. 657 foi certificado, também, que a petição original corres-
pondente ao fac-símile protocolizado em 23.05.2014 não foi recebida nesta Corte”.
Nesse cenário, destacou o Relator que “a prática de atos processuais por intermé-
dio de sistema de transmissão de dados (fac-símile ou outro similar), possibilitada
pela Lei nº 9.800/1999, tem validade condicionada à juntada das peças originais em
até 5 (cinco) dias do término do prazo recursal. Outrossim, a Resolução nº 14/STJ,
publicada em 03.07.2013, que regulamenta o processo judicial eletrônico no Su-
perior Tribunal de Justiça, estabelece que as petições incidentais – como o agravo
regimental – referentes a diversas classes processuais, serão recebidas exclusiva-
mente de forma eletrônica, podendo a Secretaria Judiciária, unidade responsável
pelo recebimento de petições, recusar os documentos apresentados na forma física
(art. 10 c/c o art. 23 da Res. 14/2013 do STJ)”.
No caso concreto, “a decisão que obstou o processamento dos embargos de diver-
gência, de acordo com a certidão de fl. 647, foi considerada publicada em 15.05.2014
e o agravo regimental contra ela manejado foi protocolizado de forma incomple-
ta, via fac-símile, em 23.05.2014 (fl. 652). Conforme certificado à fl. 650, a petição
de agravo regimental, apresentada de forma física, foi recusada em 27.05.2014
pela Secretaria Judiciária deste Tribunal com amparo no art. 23 da Resolução
nº 14/2013 do STJ. Desse modo, se a Resolução nº 14/2013 disciplina a forma de
peticionar a esta Corte, é certo que a petição original do agravo regimental deveria
ter sido encaminhada à Secretaria do Tribunal na forma da supracitada Resolu-
ção”.
Ou seja, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que o agravo regimental,
cabível contra as decisões monocráticas dos Ministros, deve necessariamente ser
apresentado pela via eletrônica, conforme determina a Resolução nº 14/2013. Por
não seguir o procedimento preconizado nesta norma, o recurso não foi conhecido.

AGRAVO RETIDO – APRECIAÇÃO


COMO PRELIMINAR DE
APELAÇÃO – LEGALIDADE

33501 – “Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Apre-


ciação de todas as questões relevantes da lide pelo Tribunal de origem. Ausência
de afronta ao art. 535 do CPC. Agravo retido. Apreciação como preliminar. Art. 523
do CPC. Decisão mantida. 1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quando o acórdão
recorrido analisou todas as questões pertinentes para a solução da lide. 2. ‘A questão
ventilada no agravo retido deve ser analisada como preliminar no julgamento da ape-
lação, nos termos do art. 523 do CPC. Todavia, cessa aí a exigência da lei, inexistindo
imposição quanto à necessidade do agravo retido ser apreciado previamente às de-
mais preliminares’ (REsp 696557/RS, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, J. 16.11.2006,
DJ 04.12.2006, p. 299). 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-
-AREsp 149.639/PR – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. 24.06.2014 –
DJe 01.08.2014)
170
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA
GRATUITA – DEFERIMENTO
– EFEITOS EX NUNC
– JURISPRUDÊNCIA
CONSOLIDADA DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

33502 – “Embargos de declaração recebidos como agravo regimental no recurso es-


pecial. Omissão, contradição, erro material ou obscuridade. Inexistência. Processual
civil. Gratuidade de justiça. Efeitos da concessão. Ex nunc. 1. Consoante a remansosa
jurisprudência do STJ, a eventual concessão do benefício da gratuidade de Justiça
tem efeitos ex nunc, não podendo, pois, retroagir à data de interposição do recurso
de apelação, sem o devido preparo e sem que tivesse sido expressamente deferido o
benefício, que, no caso, não foi requerido simultaneamente à interposição do recurso.
2. A ‘gratuidade não opera efeitos ex tunc, de sorte que somente passa a valer para os
atos ulteriores à data do pedido, não afastando a sucumbência sofrida pela parte em
condenação de 1º grau, que somente pode ser revista se, porventura, acatado o mé-
rito da sua apelação, quando do julgamento desta’ (REsp 556.081/SP, 4ª T., Rel. Min.
Aldir Passarinho Junior, J. 14.12.2004, DJ 28.03.2005, p. 264). 3. Embargos de declara-
ção recebidos como agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – EDcl-REsp
1211041/SC – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)

BEM DE FAMÍLIA – IMÓVEL


VOLUNTARIAMENTE OFERECIDO
EM HIPOTECA – LEGALIDADE
DA PENHORA – INCIDÊNCIA DO
ART. 3º, V, DA LEI Nº 8.009/1990

33503 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Bem de família. Im-


penhorabilidade. Exceção. Art. 3º, V, da Lei nº 8.009/1990. Matéria constitucional.
Impossibilidade. Agravo regimental a que se nega provimento. 1. Imóvel dado em
garantia hipotecária ao crédito que visa executar. Incidência do art. 3º, V, da Lei
nº 8.009/1990. Impenhorabilidade afastada. 2. É defeso a esta Corte apreciar alegação
de violação a dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência
do Supremo Tribunal Federal. 3. Ao repisar os fundamentos do recurso especial, a
parte agravante não trouxe, nas razões do agravo regimental, argumentos aptos a
modificar a decisão agravada, que deve ser mantida por seus próprios e jurídicos
fundamentos. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp
507.224/SP – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)
171
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

CONSUMIDOR – ATRASO DE VOO


– PERMANÊNCIA DO PASSAGEIRO
POR DUAS HORAS NO INTERIOR
DA AERONAVE – NÃO INCIDÊNCIA
DA CONVENÇÃO DE MONTREAL –
DANO MORAL CARACTERIZADO

33504 – “Apelação cível. Transporte. Transporte de pessoas. Ação de indenização


por dano moral. Pouso de emergência. Atraso de voo. Convenção de Montreal. Força
maior. Dano moral. 1. A falha mecânica na aeronave, a ensejar a necessidade de pou-
so de emergência (a partir do qual se deram os sucessivos atrasos e contratempos a
que submetida a autora), qualifica-se como fortuito interno, daí porque não se presta,
diferentemente do fortuito externo, a exonerar o transportador do dever de promover
a justa indenização dos danos causados. 2. Constitui causa de configuração de dano
moral a submissão do passageiro a espera de 2h (duas) horas, no interior da aeronave,
com as portas trancadas e sem qualquer comunicação com os tripulantes, sucedida de
período de espera de outras 2h (duas horas), no aeródromo do aeroporto local, após
a qual a companhia aérea não diligenciou no sentido de proceder à hospedagem dos
passageiros – tendo-o o feito, porém, com relação aos seus funcionários. 3. Conforme
a mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, tratados internacionais
tais como a Convenção de Montreal guardam relação de mera paridade com a lei
ordinária, uma vez concluído o seu rito de incorporação ao plano do Direito positivo
interno. Normas de limitação de responsabilidade previstas na Convenção de Mon-
treal que, ante a referida estatura hierárquica do tratado, no ordenamento brasileiro,
não se sobrepõem ao princípio da integral reparação do dano, de base constitucional
(art. 5º, X). 4. Na fixação do montante indenizatório por gravames morais, deve-se
buscar atender à duplicidade de fins a que a indenização se presta, amoldando-se a
condenação de modo que as finalidades de reparar a vítima e punir o infrator (caráter
pedagógico) sejam atingidas. Quantum mantido em R$ 10.000,00 (dez mil reais), ante
a ausência de recurso da parte autora com vistas a sua majoração. Apelo desprovi-
do.” (TJRS – Apelação Cível nº 70060232774 – 12ª C.Cív. – Rel. Umberto Guaspari
Sudbrack – J. 07.08.2014)

CONSUMIDOR – COBRANÇA
INDEVIDA – NÃO CONFIGURAÇÃO
DE DANOS MORAIS – EPISÓDIO
PRÓPRIO DA VIDA COTIDIANA

33505 – “Apelação cível. Ação de indenização por danos morais. Responsabilida-


de civil. Não configuração de abalo a honra ou a moral. Problema resolvido após o
172
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

fechamento do caixa do estabelecimento. Constatação do equívoco ao cobrar valor


duas vezes. Caracterização de mero aborrecimento. Episódio próprio da vida cotidia-
na. Decisão reformada. Recurso conhecido e provido, à unanimidade.” (TJPA – Proc.
201330220942 – 136533 – Órgão Julgador 4ª C.Cív.Isol. – Rel. Ricardo Ferreira Nunes
– J. 04.08.2014 – Publ. 06.08.2014)

CONSUMIDOR – CONTRATO DE
TRANSPORTE AÉREO – ATRASO
SUPERIOR A 37 HORAS – DANO
MORAL CARACTERIZADO –
INDENIZAÇÃO FIXADA EM
R$ 10.000,00 PARA CADA AUTOR

33506 – “Apelação cível e recurso adesivo. Contrato de transporte aéreo. Compa-


nhias parceiras. Ilegitimidade passiva. Relação de consumo. Atraso de 37 horas até
atingirem os autores o destino final. Pretensão indenizatória moral dos autores, pelo
atraso de mais de 37 horas na viagem contratada com a Empresa Pluna, e poste-
riormente repassada à corré TAM, que, por sua vez, deixou de verificar a veraci-
dade dos bilhetes, alegando tratar-se de bilhetes falsos e compelindo os autores a
custearem, por si, novas passagens até Buenos Aires, destino programado, arcando,
também, com o transporte de retorno, cujos valores pugnam pelo ressarcimento, a
título de danos materiais. Ação de indenização por danos materiais e morais. Ilegi-
timidade passiva. A preliminar de ilegitimidade passiva deve ser afastada. Restou
evidente que os autores foram remanejados à empresa TAM, após a indisponibili-
dade da Pluna, originalmente contratada a transportá-los, com emissão de novas
passagens. Cediço é que, na forma da legislação consumerista, as empresas presta-
doras de serviços respondem solidariamente, quando figurantes na relação jurídica
que vincula as partes, a fim de chancelar maior proteção ao consumidor, parte vul-
nerável. Responsabilidade objetiva. Danos morais e materiais. Valor da indenização
pelos danos morais. Quanto ao valor da indenização, arbitrada pelo Juízo a quo em
R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada autor, igualmente, não merece redução, con-
siderando o contexto fático desenhado nos autos. Recurso adesivo. Pedido de majo-
ração dos honorários advocatícios à procuradora dos autores. Não há motivo para
majorar-se a verba honorária fixada na sentença, haja vista a mínima complexida-
de do feito e o seu julgamento antecipado. Apelo e recurso adesivo desprovidos.”
(TJRS – AC 70055474951 – 12ª C.Cív. – Relª Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout –
J. 07.08.2014)
173
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

CONTRATO DE INVESTIMENTO
– DIREITO DE AJUIZAMENTO DA
AÇÃO CONTRA INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA PARA POSTULAÇÃO
DE DIFERENÇAS NAS APLICAÇÕES

33507 – “Processual civil. Agravo regimental. Recurso especial fundamentado, ape-


nas, na alínea c do permissivo constitucional. Ação ordinária proposta por corretora
de valores mobiliários. Importâncias pertencentes a clientes. Direito de ajuizar ação
contra a instituição financeira para postular diferenças nas aplicações. Contrato de in-
vestimento celebrado entre a corretora e o banco réu. Dissídio comprovado. Indicação
de dispositivo legal. Não incidência dos Enunciados nº 284 da Súmula do STF e nº 7
da Súmula do STJ. Art. 557, § 1º-A, do CPC corretamente aplicado. 1. Discute-se nes-
te recurso especial a possibilidade da agravada, corretora de títulos e valores mobi-
liários, ajuizar ação com o propósito de receber supostas diferenças de importâncias
aplicadas em CDBs (Plano Verão), valores esses pertencentes a seus clientes. O recurso
não envolve debate específico sobre remuneração de cadernetas de poupança nem a
respeito dos índices corretos a serem aplicados, descabendo suspender o julgamento
deste feito com base nas decisões proferidas pelo em. Ministro Dias Toffoli, do col. STF,
nos autos dos REsps 591.797/SP e 626.307/SP. Precedentes. 2. Enquanto o Tribunal de
origem decidiu pela improcedência da ação por entender que a autora, corretora de
valores mobiliários, não teria legitimidade para postular direito, em princípio, de ter-
ceiro, pertinente a diferenças de aplicações financeiras dos clientes daquela, o primeiro
paradigma indicado (REsp 245.007/MG, 4ª T., Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de
20.06.2005), v.g., discutindo a mesma questão, decidiu em sentido oposto, admitindo
a referida postulação judicial por parte da corretora. A diversa nomenclatura adotada
nos acórdãos confrontados – improcedência e ilegitimidade ativa – é irrelevante para
o caso concreto, sendo certo que as teses adotadas são, evidentemente, conflitantes.
3. Não incide a vedação contida no Enunciado nº 284 da Súmula do STF porquanto
o recurso especial reproduziu trecho do paradigma (REsp 245.007/MG) no qual foi
discutida a melhor interpretação a ser conferida ao art. 6º do CPC, específico para so-
lucionar a questão ora debatida. 4. Enunciado nº 7 da Súmula do STJ inaplicável para
impedir o provimento do recurso especial, tendo em vista que a decisão agravada con-
siderou irrelevante o fato de as importâncias aplicadas pela corretora pertencerem a
terceiros, seus clientes, não se discutindo questão probatória sobre tal circunstância.
5. Prequestionamento caracterizado, invocando-se no recurso especial tese enfrentada
no acórdão recorrido, sobre o direito de a corretora manejar a presente ação ordinária.
6. Cuidando-se de matéria solucionada na jurisprudência deste Tribunal Superior, tem-
-se como correta a aplicação da norma do art. 557, § 1º-A, do CPC para efeito de prover
o recurso especial. 7. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1110558/RJ
– 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. 24.06.2014 – DJe 04.08.2014)
174
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

CONTRATO DE MÚTUO – AÇÃO


REVISIONAL – TUTELA ANTECIPADA
PARCIALMENTE DEFERIDA
PARA AUTORIZAR DEPÓSITO
JUDICIAL DO INCONTROVERSO
– MORA CARACTERIZADA

33508 – “Agravo regimental em agravo (art. 544 do CPC). Ação revisional de contrato
de mútuo. Pedido de tutela antecipada deferido em parte, apenas no tocante ao depó-
sito de valores que entende devidos, com a declaração de que inviável o afastamento
da mora, pois as teses levantadas não se fundam na aparência do bom direito, visto
que têm sido invariavelmente rechaçadas pelas Cortes Superiores. Impossibilidade
de exame dos requisitos autorizadores, mormente porque o simples ajuizamento de
ação revisional não constitui, por si só, fundamento suficiente para descaracterizar
a mora. Aplicação da Súmula nº 7/STJ. Decisão monocrática que negou provimento
ao agravo em recurso especial. Irresignação da mutuária. 1. Nos termos da jurispru-
dência do Superior Tribunal de Justiça, o simples ajuizamento de ação para discutir
a legalidade de cláusulas contratuais não constitui, por si só, fundamento suficiente
para descaracterizar a mora, mormente quando o valor ofertado mostrar-se inveros-
símil frente ao valor devido objeto do contrato e as teses arguidas não se fundam na
aparência do bom direito. 2. Considerando que os requisitos autorizadores da conces-
são de tutela antecipada, previstos no art. 273 do CPC, bem como de medida liminar,
traduzem-se matéria fática, devidamente aferida pelo juiz natural, é defeso a esta
Corte Superior o reexame dos aludidos pressupostos, em face do óbice contido na Sú-
mula nº 7 do STJ. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-AREsp 464.485/MS
– 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)

CONTRATO DE MÚTUO –
JUROS MORATÓRIOS – TAXA
MÉDIA DE MERCADO

33509 – “Agravo regimental no recurso especial. Bancário. Ação revisional. Juros re-
muneratórios. Ausência de indicação da taxa. Média do mercado. Agravo regimental
desprovido. 1. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que na impossibilida-
de de se aferir a taxa de juros acordada, seja pela própria falta de pactuação ou pela
ausência de juntada do contrato aos autos, os juros remuneratórios são devidos à taxa
média de mercado para operações da mesma espécie, divulgada pelo Banco Central
do Brasil (AgRg-Ag 1.085.542/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino,
DJe 21.09.2011; AgRg-Ag 1.020.140/RS, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
DJe 09.11.2009) 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp
1279826/SP – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – J. 24.06.2014 – DJe 01.08. 2014)
175
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

CONTRATO DE TRANSPORTE
AÉREO – EXTRAVIO DE BAGAGEM –
DANO IN RE IPSA – INDENIZAÇÃO
FIXADA EM R$ 5.000,00

33510 – “Apelação cível. Contrato de transporte aéreo internacional. Extravio tem-


porário de bagagem. Danos materiais. Danos morais. Dano in re ipsa. Valor da in-
denização. A questão do extravio (embora temporário) da bagagem do autor não é
controvertida, cumprindo serem examinados os desdobramentos do fato na esfera
do direito à reparação. Esta Câmara tem entendimento consolidado no sentido de
que os extravios de bagagem, mesmo aqueles temporários, dão causa ao dano moral
puro e, destarte, merecem ser indenizados. No caso concreto, tratou-se de viagem de
férias para Europa, tendo o apelado restado desprovido de seus pertences durante
todo o período da viagem, pois a mala foi devolvida um mês após o extravio. Danos
materiais. Não se pode indenizar as despesas decorrentes da compra de bens neces-
sários para o tempo da privação daqueles transportados, na medida em que o novo
acervo passou (mesmo que a contragosto) a compor a esfera patrimonial do apelado,
o qual detém, na atualidade, os bens que já transportava (dada a recuperação daque-
les temporariamente perdidos) e os que comprou no solo estrangeiro. Ausência de
desfalque patrimonial que justifique a condenação da ré a título de danos materiais.
Danos morais. Relativamente aos danos morais, fato inconteste é que o autor, em solo
estrangeiro e com os planos usuais que são feitos para situações como esta em liça
(férias na Europa), viu-se privado de sua mala por toda a extensão da viagem, uma
vez que a bagagem foi devolvida ao autor apenas um mês após o incidente. Quantum
indenizatório. A indenização fixada a título de danos morais, no valor de R$ 5.000,00
(cinco mil reais) não merece ser reduzida, considerando indisponibilidade completa
dos bens selecionados para todo o período de lazer. Quantia que, ademais, foi fixada
abaixo da média praticada por esta Câmara em situações parelhas. Ônus sucumben-
ciais redistribuídos, haja vista o decaimento recíproco das partes. Apelo provido em
parte.” (TJRS – Apelação Cível nº 70053743159 – 12ª C.Cív. – Relª Ana Lúcia Carvalho
Pinto Vieira Rebout – J. 07.08.2014)

DANOS CAUSADOS EM ACIDENTE


DE VEÍCULO – NEGATIVA DE
PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO
POR AGRAVAMENTO DO RISCO
PELO SEGURADO – INEXISTÊNCIA
176
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

DE NEXO ENTRE INABILITAÇÃO E


ACIDENTE – INDENIZAÇÃO DEVIDA

33511 – “Civil e consumidor. Ação de cobrança de seguro por danos causados em


acidente de veículo. Veículo segurado envolvido em acidente automobilístico. Perda
total do automóvel. Negativa de pagamento da indenização securitária em virtude
do agravamento do risco por parte do segurado. Veículo conduzido sem carteira de
habilitação específica. Condutor habilitado para as categorias A/B. Veículo condu-
zido que exigia habilitação na categoria D. Irrelevância. Irregularidade que, isolada-
mente, representa apenas infração administrativa. Circunstância não determinante
para a ocorrência do acidente. Condições adversas da pista e meteorológicas que fo-
ram determinantes para o sinistro. Inexistência de nexo causal entre a inabilitação
e o acidente. Ausência de agravamento do risco pelo condutor. Sentença mantida.
Recurso desprovido.” (TJSC – Apelação Cível nº 2014.041684-2 – Fraiburgo – Rel. Des.
Marcus Tulio Sartorato – J. 05.08.2014)

DANOS MORAIS – SAQUES


INDEVIDOS DE CONTA BANCÁRIA
– RESPONSABILIDADE CIVIL
CARACTERIZADA – INDENIZAÇÃO
FIXADA EM R$ 20.000,00

33512 – “Apelação cível. Ação de indenização por danos morais. Prática de ato ilíci-
to. Realização de saques indevidos da conta bancária do apelado por ação ou omis-
são do banco apelante. Banco recorrente não realizou qualquer procedimento interno
para apurar o ato ilícito. Apelado colacionou aos autos o inquérito policial onde a
autoridade responsável indiciou o funcionário do Banco Ubiraci da Costa, afirmando
que não restou dúvidas a partir das imagens que os saques foram efetivados pelo
indiciado. Se espera das instituições financeiras é o cuidado necessário para verifi-
cação da autenticidade dos documentos que lhe são apresentados, em face do risco
que é inerente à sua atividade. Alegação do recorrente. Quantum indenizatório fixado
pelo Magistrado singular no valor de R$ 30.000,00 revela-se excessivo e despropor-
cional. Impõe a minoração de tal montante. Reduzo a quantia do dano moral para
R$ 20.000,00 em relação ao termo inicial da incidência dos juros de mora, pugna ape-
lante para que seja considerada a data da decisão judicial que arbitrou o quantum
indenizatório. Possibilidade. Não há como se considerar em mora o devedor, se ele
não tinha como satisfazer obrigação pecuniária não fixada por sentença, arbitramento
ou acordo entre as partes. Recurso conhecido e parcialmente provido, à unanimida-
de.” (TJPA – Proc. 201330320289 – 136398 – Órgão Julgador 4ª C.Cív.Isol. – Relª Elena
Farag – J. 14.07.2014 – Publicado em 04.08.2014)
177
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

DIREITO DE VISITA – EXAME


TOXICOLÓGICO – HABEAS
CORPUS – ORDEM DENEGADA

33513 – “Habeas corpus. Direito de família. Prova pericial. Exame toxicológico. Direito
de visita. Inadequação da via eleita. Ordem denegada. 1. A determinação de que o
paciente se submeta a exame toxicológico para que seja viável a decisão acerca da
visitação das filhas menores não caracteriza constrangimento da sua liberdade de ir
e vir, tão pouco, ilegalidade ou abuso de poder passível de exame em habeas corpus.
2. Ordem denegada.” (STJ – HC 269.499/PR – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti –
J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)
Nota:
Neste interessante precedente do Superior Tribunal de Justiça, houve a impetração
de habeas corpus, com o objetivo de sustar a determinação judicial, proferida pelo
juízo de família, para a realização de exame pericial toxicológico, o qual pela ins-
tância ordinária foi tido como relevante para a definição do direito de visita.
Como destacado pela doutrina, a visitação almeja fortalecer os vínculos afetivos,
mediante a convivência dos parentes: “A visitação não é somente um direito as-
segurado ao pai ou à mãe, é direito do próprio filho de com eles conviver, o que
reforça os vínculos paterno e materno-filial. Talvez o melhor seria o uso da expres-
são direito de convivência, pois é isso que deve ser preservado mesmo quando pai
e filho não vivem sob o mesmo teto” (DIAS, Maria Berenice. Direito das famílias.
8. ed. São Paulo: RT, 2011. p. 450). Entretanto, quando o interesse das pessoas é
colocado em xeque, surge a necessidade de se recorrer às visitas supervisionadas
ou a ambientes terapêuticos. Daí a relevância da prova produzida nos processos
em que se discute o tema.
Na origem, fora proposta ação de reconhecimento e dissolução de união estável
cumulada com pedido de regulamentação de visitas. Apreciando agravo de ins-
trumento, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná havia considerado presentes
indícios de que o genitor era usuário de drogas, de sorte que, antes de reconhecer
o direito e os limites da visitação, a Corte concluiu pela necessidade de submeter
o pai ao exame toxicológico.
O acórdão foi assim ementado: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE RE-
CONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PEDIDO DE
ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – PRECLUSÃO – INOCORRÊNCIA – DIREITO IN-
DIVIDUAL INDISPONÍVEL – INDÍCIOS DE QUE O GENITOR SEJA USUÁRIO
DE DROGAS, QUE IMPÕEM A NECESSIDADE DE PROVA PERICIAL, AINDA
QUE ANTERIORMENTE INDEFERIDA – INÍCIO DE PROVA – PRESERVAÇÃO
DO MELHOR INTERESSE DAS MENORES, BEM COMO DE SUAS INTEGRI-
DADES FÍSICA E MENTAL – VISITAÇÃO NA CASA PATERNA, FINAIS DE
SEMANA ALTERNADOS, SEM PERNOITE – CUSTAS DA PERÍCIA A SEREM
ARCADAS PELO AGRAVANTE, COM POSSIBILIDADE DE RESSARCIMENTO
QUANDO DA SENTENÇA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO”.
178
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Perante o Superior Tribunal de Justiça, o paciente alegou que estaria sofrendo


constrangimento ilegal “ao ter que se submeter a exame toxicológico que, inclusi-
ve, fora indeferido em um primeiro momento, tendo em vista parecer do Ministé-
rio Público, bem como relatório elaborado por assistente social”.
Inicialmente, a Relatora contestou o cabimento do habeas corpus, à luz do art. 5º,
LXVII, da Constituição Federal, o qual preconiza a concessão de habeas corpus
“sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação
em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”. No caso dos
autos, na visão da 4ª Turma, a situação era distinta, afinal o paciente apenas dese-
java de furtar ao exame toxicológico determinado para proteger as crianças.
Considerou a Ministra Maria Isabel Gallotti que “a determinação de que o paciente
se submeta a exame toxicológico para que seja viável a decisão acerca da visita-
ção das filhas menores não caracteriza constrangimento da sua liberdade de ir e
vir, tão-pouco, ilegalidade ou abuso de poder. Cabe ao juiz da causa, diante dos
elementos constante dos autos, determinar a realização das provas que entender
necessárias ao julgamento da demanda, tratando-se, pois, de diligência adstrita ao
âmbito de discricionariedade do magistrado, visando melhor decidir”.
Apenas se caracterizada uma flagrante ilegalidade poderia o Superior Tribunal de
Justiça atuar, nessa hipótese. Ademais, o habeas corpus é ação de cognição sumária,
cujo rito pressupõe celeridade, de sorte que não comportaria “o exame de questões
que demandem o exame aprofundado de provas, o que é adstrito ao processo de
conhecimento, no qual foi proferido o acórdão impetrado”. Na linha do parecer do
Ministério Público Federal assentou que “o remédio constitucional ora utilizado
deve ser concedido apenas quando alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer
violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de
poder”, sendo certo que “a realização de exame pericial, nos autos de ação de re-
conhecimento e dissolução de união estável c/c pedido de antecipação de tutela,
em nada põe em risco a liberdade de locomoção do paciente, uma vez que apenas
se discute, no ponto, a possibilidade ou não do mesmo vir a exercer o direito de
visita a suas filhas menores”.
Por tais fundamentos, a ordem foi denegada.

DIREITO SOCIETÁRIO – PEDIDO


DE EXCLUSÃO DO QUADRO
SOCIETÁRIO – ANTECIPAÇÃO DE
TUTELA – EXEGESE DO ART. 273,
CPC – NÃO CARACTERIZAÇÃO DA
URGÊNCIA – TUTELA INDEFERIDA

33514 – “Processual civil. Agravo de instrumento. Indeferimento de tutela anteci-


pada para que a agravada fosse excluída do quadro societário de empresa. É cediço
que a concessão da antecipação dos efeitos da tutela, como medida excepcional que é,
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

depende da verificação pelo magistrado dos requisitos elencados no art. 273 do CPC.
Essas exigências deverão comparecer nos autos de modo a comportar uma certeza, ou
até provável certeza, de que há o direito que se propõe buscar, ou que há necessidade
de garantir os efeitos práticos da tutela principal, isto é, existindo prova inequívoca,
se convença da verossimilhança das alegações e haja fundado receio de dano irrepa-
rável ou de difícil reparação. Falta a agravante o requisito da prova inequívoca do
alegado, haja vista que suas alegações ao pleitear sua exclusão da sociedade empre-
sária são no sentido de que haveria má gestão das demais administradoras e a quebra
do affectio sociatatis, além da consequente difícil situação financeira da empresa, que
teria gerado considerável perda da competitividade mercadológica, entretanto, não
houve juntada de prova inequívoca. Em sentido contrário, as agravadas aduziram
que a empresa possui mais de quarenta e cinco anos de existência no mercado, com
reconhecimento perante a sociedade paraense, sendo que parou de atender a clientela
em 2013 e encontra-se hoje apenas quitando com as obrigações trabalhistas, a fim de
encerrar as atividades da empresa de forma digna. a real situação dos fatos deverá ser
melhor analisada pelo Juízo a quo, durante a instrução processual, com a devida di-
lação probatória. não há também perigo resultante da demora, isto porque a própria
empresa encerrou suas atividades, como informado e está simplesmente quitando
todas as obrigações. Ora, ainda que se considerasse que a agravada estaria fora a par-
tir de agora da sociedade, esta ainda permaneceria por dois anos responsável pelas
dívidas e obrigações da sociedade, conforme reza o art. 1.003 do Código Civil, o que
deixa de caracterizar a urgência. Recurso conhecido e improvido. Decisão unânime.”
(TJPA – Proc. 201330176848 – 136625 – Órgão Julgador 1ª C.Cív.Isol. – Rel. Gleide
Pereira de Moura – J. 07.08.2014 – Publ. 11.08.2014)

EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE
– EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO –
CABIMENTO DE APELAÇÃO –
INTERPOSIÇÃO ERRÔNEA DE
AGRAVO – AUSÊNCIA DE DÚVIDA
OBJETIVA – NÃO APLICAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE

33515 – “Processual civil. Embargos de divergência. Exceção de pré-executividade.


Extinção da execução. Interposição de agravo de instrumento. Princípio da fungibi-
lidade recursal. Ausência de dúvida objetiva. Inaplicabilidade. Aplicação da Súmula
nº 168/STJ. Agravo regimental desprovido. I – Consoante entendimento desta Corte
a decisão que acolhe exceção de pré-executividade – pondo fim à execução – tem
natureza de sentença, sendo, portanto, cabível recurso de apelação, e não agravo de
instrumento. Ainda, considera esta Corte inaplicável o princípio da fungibilidade re-
cursal. Precedentes. II – Nos termos da Súmula nº 168/STJ, ‘não cabem embargos de
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

divergência, quando a jurisprudência do tribunal se firmou no mesmo sentido do


acórdão embargado’. III – Os embargos de divergência não são cabíveis para simples
rejulgamento da questão, tendo como finalidade a uniformização da jurisprudência
do Tribunal. Não se prestam apenas como mais um recurso para correção de eventual
equívoco ou violação que possa ter ocorrido em sede de julgamento do recurso espe-
cial. IV – Agravo interno desprovido.” (STJ – AgRg-EDcl-EAg 1056662/AM – Corte
Especial – Rel. Min. Gilson Dipp – J. 01.07.2014 – DJe 05.08.2014)

EXONERAÇÃO DE PENSÃO
ALIMENTÍCIA – INTERPRETAÇÃO
DO ART. 1.635 DO CÓDIGO CIVIL
– MAIORIDADE DOS FILHOS E
ATIVIDADE LABORATIVA

33516 – “Exoneração de pensão alimentícia. Tutela antecipada visando à exoneração


da obrigação alimentar devida aos filhos maiores. Admissibilidade. Embora a aqui-
sição da maioridade civil, por si só, não constitua causa para a exoneração liminar
do encargo, convenha-se, os réus, aos 25 e 23 anos de idade, já não mais necessi-
tam do encargo (já que comprovadamente exercem atividade laborativa, o primei-
ro, funcionário do IBGE e o segundo, sócio de empresa). Presentes os requisitos do
art. 273 do CPC. Decisão reformada. Recurso provido.” (TJSP – Agravo de Instrumento
nº 2081335-22.2014 – Cerquilho – Rel. Des. Salles Rossi – Publ. 08.08.2012)

HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO
– EXTINÇÃO DO PROCESSO
COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO
– CABIMENTO DE APELAÇÃO
– INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO
– ERRO GROSSEIRO

33517 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Agravo de instrumen-


to. Recurso incabível. Decisão de extinção do processo com julgamento de mérito.
Recurso manifestamente incabível. Aplicação de multa pelo Relator. Possibilidade.
Recurso não provido. 1. Não se viabiliza o recurso especial pela indicada violação do
art. 535 do Código de Processo Civil. Isso porque, embora rejeitados os embargos de
declaração, a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo Tribunal de origem,
que emitiu pronunciamento de forma fundamentada, ainda que em sentido contrário
à pretensão da recorrente. 2. Ao contrário do alegado pela recorrente, a hipótese não
é de decisão que indeferiu o efeito suspensivo do recurso de apelação, mas de decisão
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

que homologou acordo e extinguiu o processo com base no art. 269, III, do Código de
Processo Civil, contra a qual seria cabível o recurso de apelação. A decisão proferida
na origem foi proferida justamente em cumprimento aos comandos expendidos na
legislação apontada na medida em que não conheceu do agravo de instrumento por
se tratar de hipótese em que cabível, apenas, o recurso de apelação. 3. A 4ª Turma do
STJ assentou o entendimento no sentido de que o § 2º do art. 557 do CPC há de ser
interpretado em consonância com o seu caput, que expressamente autoriza o Relator
a negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudi-
cado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo
Tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior. 4. Agravo regimen-
tal a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp 336.349/SP – 4ª T. – Rel. Min. Luis
Felipe Salomão – J. 05.08.2014 – DJe 12.08.2014)

LIMINAR EM MANDADO DE
SEGURANÇA – CONCURSO
PÚBLICO – RESTRIÇÃO EDITALÍCIA
– TATUAGEM – ILEGALIDADE

33518 – “Agravo de instrumento. Liminar em mandado de segurança. Concurso pú-


blico. Polícia Militar. Avaliação antropométrica. Restrição editalícia. Tatuagem. Au-
sência de previsão legal. 1. As provas colacionadas aos autos mostram-se capazes de
receber uma efetiva cognição exauriente no tocante à segurança pretendida na exor-
dial. 2. As restrições impostas ao candidato portador de tatuagem, previstas no edital
em questão, não estão previstas em lei. Logo, não pode o edital prever restrições a
direito ao ingresso no cargo público sem previsão legal. 3. O perigo na demora milita
a favor do agravado, uma vez que o termo final da demanda, pode ocorrer quando o
certame já tenha sido finalizado, restando caracterizado o dano irreparável ou de di-
fícil reparação. Recurso conhecido, porém, desprovido.” (TJPA – Proc. 201330295599
– 136387 – Órgão Julgador 2ª C.Cív.Isol. – Relª Celia Regina de Lima Pinheiro –
J. 28.07.2014 – Publ. 04.08.2014)

LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA
– IMPOSSIBILIDADE DE
REDISCUSSÃO DA CONDENAÇÃO
– INTERPRETAÇÃO DO
ART. 475-G, CPC

33519 – “Agravo regimental no recurso especial. Liquidação de sentença. Senten-


ça liquidanda que determinou o pagamento de indenização pela ‘perda de renda e
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

eventuais despesas’ decorrentes de rescisão imotivada de contrato. Laudo pericial


que interpretou corretamente a sentença. Decisão que negou seguimento a recurso
especial. Insurgência da executada. 1. Não cabe rediscutir a sentença do processo cog-
nitivo na sua fase de liquidação, conforme previsão expressa do art. 475-G do CPC.
Precedentes. 2. As instâncias ordinárias, com base em laudo pericial, interpretaram
corretamente a sentença liquidanda, calculando a indenização com base na ‘perda
de renda’ decorrente do contrato rescindido, o que corresponde ao valor bruto que
a empresa contratada receberia da contratante caso o contrato tivesse sido cumprido
normalmente. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1125932/RJ –
4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)

PETIÇÃO INICIAL – AUSÊNCIA


DE JUNTADA DE DOCUMENTOS
ESSENCIAIS À PROPOSITURA
DA AÇÃO – INDEFERIMENTO
DA INICIAL – EXTINÇÃO SEM
RESOLUÇÃO DE MÉRITO

33520 – “Direito processual civil. Documentos essenciais à propositura da ação.


Juntada posterior. Impossibilidade. Extinção do processo sem resolução de mérito.
1. É admitida a juntada de documentos novos após a petição inicial e a contesta-
ção desde que: (i) não se trate de documento indispensável à propositura da ação;
(ii) não haja má-fé na ocultação do documento; (iii) seja ouvida a parte contrária
(art. 398 do CPC). Precedentes. 2. Nesse ponto, mostrava-se mesmo de rigor a descon-
sideração de documento juntado posteriormente à instrução do processo, porquanto
considerado indispensável à propositura da ação pelo acórdão recorrido, nos termos
do que dispõe o art. 283 do CPC, não se aplicando, nesse caso, o disposto no art. 397
do CPC. 3. Porém, a ausência de juntada de documentação tida como indispensável
à propositura da ação, nos termos do que preceituam os arts. 283 e 284, caput e pará-
grafo único, do CPC, gera o indeferimento da inicial, julgamento esse que, conforme
dispõe o art. 267, inciso I, não resulta em extinção do processo com exame de mérito,
o que possibilita a propositura de nova ação com a juntada dos documentos faltantes
(art. 268 do CPC). 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AREsp 435.093/SP
– 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)

PLANO DE SAÚDE – ESTATUTO


DO IDOSO – REAJUSTES EM
FUNÇÃO DA MUDANÇA DE
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Jurisprudência Civil
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FAIXA ETÁRIA – ABUSIVIDADE


– REPETIÇÃO DO INDÉBITO

33521 – “Ação de revisão contratual com repetição de indébito. Plano de saúde.


Cláusulas prevendo reajustes em função da mudança de faixa etária. Abusividade
nos percentuais. Ausência de equidade contratual. Não comprovação de uso cor-
respondente à contraprestação exigida. Vedação de discriminação do idoso pela
cobrança de valores diferenciados em razão da idade. Disposições nulas de pleno
direito (art. 51, IV, do CDC, e art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso). Devolução dos va-
lores pagos indevidamente (art. 42, parágrafo único, do CDC). Repetição em dobro,
contudo, inviável. Ausência de má-fé. Reconhecimento, de ofício, da prescrição das
parcelas pagas no lapso anterior a 3 (três) anos do ajuizamento da ação (art. 206,
§ 3º, IV, do Código Civil). Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJSC –
AC 2012.086503-2 – Joinville – Rel. Des. Ronei Danielli – J. 05.08.2014)

PLANO DE SAÚDE – RECUSA


INDEVIDA DE FORNECIMENTO DE
PRÓTESE NECESSÁRIA AO SUCESSO
DO TRATAMENTO MÉDICO –
DANO MORAL CARACTERIZADO

33522 – “Recurso especial. Plano de saúde. Negativa de cobertura integral. Próte-


se necessária ao sucesso do tratamento médico. Danos morais. Cabimento. Matéria
pacificada. 1. A jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido de que, ainda que
admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitati-
vas dos direitos do consumidor, revela-se abusiva a que exclui o custeio dos meios e
materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento da doença coberta pelo
plano. Precedentes. 2. ‘Nos termos da jurisprudência reiterada do STJ, ‘a recusa inde-
vida à cobertura pleiteada pelo segurado é causa de danos morais, pois agrava a sua
situação de aflição psicológica e de angústia no espírito’ (REsp 657717/RJ, Relª Min.
Nancy Andrighi, DJ 12.12.2005) (AgRg-Ag 1318727/RS, de minha relatoria, 4ª T.,
J. 17.05.2012, DJe 22.05.2012)’. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AREsp
512.109/RJ – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)

PROCESSO CIVIL – CITAÇÃO DE


PESSOA JURÍDICA TEORIA DA
APARÊNCIA – VALIDADE DO ATO

33523 – “Embargos de declaração recebidos como agravo regimental. Agravo em


recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Validade da citação. En-
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
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dereço. Súmula nº 7/STJ. 1. O Tribunal de origem, com fundamento no conjunto


fático-probatório dos autos, concluiu que a citação foi efetivada na sede da empresa,
em endereço que corresponde ao mencionado no contrato social. O acolhimento das
razões de recurso, na forma pretendida, demandaria o reexame de matéria fática, ve-
dado pela Súmula nº 7 do STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ
– EDcl-AREsp 397.851/DF – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – J. 24.06.2014 –
DJe 01.08.2014)

PROCESSO CIVIL – EXCEÇÃO


DE SUSPEIÇÃO DE PERITO –
ASSISTÊNCIA SIMPLES ADMITIDA
– INTERPRETAÇÃO DO ART. 139, CPC

33524 – “Recurso especial. Processual civil. Exceção de suspeição de perito. Assis-


tência simples admitida na exceção. Prazo em dobro do art. 191 do CPC. Inaplica-
bilidade. Violação ao art. 538 do CPC. Inocorrência. Contrariedade ao art. 463 do
CPC. Deficiência na fundamentação (Súmula nº 284/STF). Dissídio jurisprudencial
não demonstrado. Recurso desprovido. 1. De acordo com os arts. 135, 138, III, e § 1º,
297, 304, 305 e 306 do CPC, a exceção de suspeição do juiz ou do perito é um incidente
processual que objetiva sanar possível vício existente no processo, não em relação às
partes litigantes, mas sim ao próprio órgão encarregado de exercer a jurisdição judi-
cial ou a auxiliar deste, como é o caso do perito (CPC, art. 139). É incidente processual
de ordem pública, suscitado por uma das partes do processo, com o objetivo de cor-
rigir algum vício que lhe possa trazer prejuízo no resultado final da lide. 2. A exceção
de suspeição do perito, auxiliar da Justiça nos termos do art. 139 do CPC, é inciden-
te processual em que o expert figura como ‘réu’, promovido, o que, evidentemente,
não enseja a participação da parte contrária à excipiente. Tratando-se de arguição
de suspeição, por sua própria natureza, somente o próprio excepto poderá refutar
a acusação que lhe é atribuída, seu papel, no incidente, será justamente afastar essa
incômoda imputação de estar atrelado a uma das partes. 3. Disso resulta que a parte
que integra um dos pólos da lide em que suscitada a exceção de suspeição do perito
não pode pretender valer-se das regras dos arts. 46, 50 e 54 do CPC, para atuar, no in-
cidente, como litisconsorte, assistente litisconsorcial ou assistente simples do excepto.
Por consectário lógico, somente aquele de quem se poderia exigir isenção e imparcia-
lidade pode ser apontado como suspeito e, assim, ter legitimidade para reconhecer
ou refutar as alegações, considerando-se as hipóteses de suspeição previstas 135 do
CPC. 4. Não se ignora que o processo em exame possui julgamento, já em sede de
apelação, com decisão favorável à recorrente, mas, tal interesse no resultado final da
exceção, por ter repercussão na manutenção da decisão proferida no processo princi-
pal, é inerente à dialética processual, sendo insuficiente para legitimar ou possibilitar
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

a intervenção da parte, contra toda a lógica aplicável ao incidente, dada a natureza


mesma da exceção de suspeição. 5. No caso em liça, o entendimento acima não pode
ser aplicado, em sua plenitude, porque a recorrente foi admitida como assistente sim-
ples na exceção, e, nessa condição, interpôs o presente recurso especial. Assim sendo,
entender que não poderia sequer ser assistente simples implicaria em reformatio in
pejus. 6. Quanto ao art. 191 do CPC, a regra é clara no sentido de que o prazo em
dobro é concedido aos litisconsortes com diferentes procuradores, o que não ocorre
no caso em liça. A ora recorrente é, como já dito, por razões formais, mantida como
mera assistente simples do ora excepto, não podendo ser considerada parte na exce-
ção de suspeição, assim como o excepto não pode ser considerado parte no processo
principal, com diferente procurador, sendo, ainda, de discutível aplicação ao assis-
tente simples a dobra de prazo do art. 191 do CPC. Inaplicável, pois, a regra invo-
cada. 7. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – REsp 909.940/ES – 4ª T.
– Rel. Min. Raul Araújo – J. 17.09.2013 – DJe 04.08.2014)

PROVA PERICIAL – INDEFERIMENTO


– REVISÃO EM SEDE DE RECURSO
ESPECIAL – INVIABILIDADE
– SÚMULA Nº 7/STJ

33525 – “Agravo regimental em agravo em recurso especial. Ação de cobrança. Con-


trovérsia quanto à comprovação de entrega de mercadorias. Perícia. Indeferimento
de produção de prova. Cerceamento de defesa. Não ocorrência. Revisão dos fatos
e provas dos autos. Súmula nº 7/STJ. Violação ao art. 535 do CPC. Não ocorrência.
1. Não há falar em violação do art. 535 do Código de Processo Civil pois o Tribunal
de origem dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que
venha examinar uma a uma as alegações e fundamentos expendidos pelas partes.
2. No presente caso a Corte de origem, apoiada no contexto fático-probatório dos
autos, concluiu pela inexistência de cerceamento de defesa, ante o indeferimento da
produção de provas e julgamento antecipado da lide, ao fundamento de que tais pro-
vas seriam inúteis e protelatórias. Dissentir desse entendimento demandaria, neces-
sariamente, a incursão na seara das provas carreadas ao autos, providência inviável
em sede de recurso especial ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimental
não provido.” (STJ – AgRg-AREsp 489.477/PR – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão
– J. 05.08.2014 – DJe 12.08.2014)

RECUPERAÇÃO JUDICIAL –
PLANO – HOMOLOGAÇÃO –
IMPOSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
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DE VALORES AOS CREDORES –


NECESSIDADE DE HABILITAÇÃO

33526 – “Agravo de instrumento. Tutela antecipada. Homologado plano de re-


cuperação judicial. Impossibilidade de devolução de valores. Arts. 7º e 9º da Lei
nº 11.101/2005. 1. Tendo sido homologado por sentença o plano de recuperação é im-
possível a concessão da antecipação de tutela para devolução de valores, pois devem
os credores se habilitarem na recuperação judicial, na forma dos arts. 7º e 9º da Lei
nº 11.101/2005. 2. Agravo conhecido e provido para cassar a decisão recorrida.”
(TJPA – Proc. 201230036481 – 136379 – Órgão Julgador 1ª C.Cív.Isol. – Rel. Leonardo
de Noronha Tavares – J. 30.06.2014 – Publ. 04.08.2014)

RECURSO ESPECIAL – ANÁLISE


DE MÉRITO EM SEDE DE JUÍZO
DE ADMISSIBILIDADE – SÚMULA
Nº 123/STJ – LEGALIDADE

33527 – “Processual civil. Decisão agravada não atacada. Súmula nº 182/STJ. Análise
de mérito em sede de juízo de admissibilidade. Possibilidade. Súmula nº 123/STJ.
Agravo não conhecido. 1. Verificado que a agravante limita-se a reiterar o argumen-
tos do recurso especial e, portanto, deixa de infirmar os fundamentos da decisão
agravada, não se conhece do agravo regimental, devido ao óbice imposto pela Súmu-
la nº 182/STJ, aplicado, mutatis mutandis, ao caso sob exame, conforme entendimento
desta Corte. 2. Não ocorre invasão de competência do STJ no caso em que o Tribunal
a quo faz análise prévia da existência de violação da legislação federal no momento
do exame de admissibilidade do recurso especial, pois tal procedimento está ampa-
rado pela Súmula nº 123 do STJ, sendo a afronta a lei federal requisito constitucional
para a interposição do mencionado recurso. Agravo regimental não conhecido.” (STJ
– AgRg-AREsp 520.754/PE – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – J. 05.08.2014 –
DJe 13.08.2014)

RECURSO ESPECIAL – AUSÊNCIA DE


COMPROVAÇÃO DA ASSISTÊNCIA
JUDICIÁRIA GRATUITA – DESERÇÃO

33528 – “Processual civil. Embargos de declaração no agravo de instrumento. Rece-


bimento como agravo regimental. Deserção. Assistência judiciária gratuita. Ausência
de comprovação. Decisão mantida. 1. A ausência de comprovação do recolhimento
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

das custas ou do deferimento do benefício da justiça gratuita no ato da interposição do


recurso especial implica sua deserção. Aplicável, por analogia, a Súmula nº 187/STJ.
2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega pro-
vimento.” (STJ – EDcl-Ag1416827/RS – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira –
J. 05.08.2014 – DJe 13.08.2014)
Nota:
O caso concreto envolve uma conhecida questão pelos profissionais do direito: a
necessidade de comprovação do preparo no ato de interposição dos recursos ou
a demonstração de que a parte está isenta deste recolhimento. Em outros termos,
confronta-se a redação do art. 511, CPC, que ordena a comprovação do preparo
no ato de interposição, com a Lei nº 1.060/1950, que versa sobre a assistência judi­
ciária gratuita.
Inicialmente, o Magistrado considerou que o objetivo do recurso era a reforma da
decisão monocrática, razão pela qual recebeu os embargos de declaração como
agravo regimental, tendo em vista os princípios da economia processual e da cele-
ridade, aplicando no ponto precedentes desta Corte (EDcl-Ag 1.304.199/RS, 4ª T.,
Rel. Min. Luis Felipe Salomão, J. 12.06.2012, DJe 21.06.2012).
Quanto ao mérito, enfatizou o Ministro que se tratava de agravo de instrumento,
amparo na antiga redação do art. 544/CPC, interposto contra decisão que negou
seguimento a recurso especial. Quando de sua interposição, perante o Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul, não houve a comprovação do preparo, bem como
de pedido de assistência judiciária gratuita pela parte ora agravante ou seu defe-
rimento na origem.
Desta forma, estaria configurada a deserção do recurso, pois a parte recorrente não
comprovou o pagamento do porte de remessa e de retorno ou, ainda, a condição
de beneficiária da assistência judiciária gratuita.
O Relator destacou o entendimento pacífico da Corte, no sentido de que se pode
pleitear a assistência gratuita “a qualquer tempo, nos termos dos arts. 2º, parágrafo
único, e 4º, § 1º, da Lei nº 1.060/1950. Todavia, até que seja provido o referido pe-
dido, a parte não estará isenta do recolhimento das custas processuais, não sendo
suficiente a mera declaração da parte recorrente, no ato de interposição do agravo,
de não possuir meios de arcar com as custas processuais”.
Sobre o tema, incide a Súmula nº 187/STJ: “É deserto o recurso interposto para o
Superior Tribunal de Justiça, quando o recorrente não recolhe, na origem, a impor-
tância das despesas de remessa e retorno dos autos”.
O seu voto é amparado por precedentes do STJ: “AGRAVO REGIMENTAL
– AGRAVO DE INSTRUMENTO – AUSÊNCIA DE PEÇAS OBRIGATÓRIAS
– NÃO OBSERVÂNCIA DO ART. 544, § 1º, DO CPC – ÔNUS DA PARTE RE-
CORRENTE – SÚMULA Nº 288 DO STF – PREPARO – AUSÊNCIA DE COM-
PROVAÇÃO – DESERÇÃO – PROTOCOLO DO RECURSO ESPECIAL ILEGÍVEL
– IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DA TEMPESTIVIDADE DO RECURSO –
AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO – 1. A ausência de quaisquer das peças
que compõem o agravo, na forma enumerada pelo art. 544, § 1º, do CPC, dá ensejo
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

ao não-conhecimento do recurso. Incidência da Súmula nº 288/STF. 2. Do mesmo


modo, a cópia do comprovante de recolhimento do preparo do recurso especial
constitui peça essencial à formação do agravo de instrumento, impondo-se, assim,
sua apresentação no momento da interposição deste, sob pena de deserção (Súmu-
la nº 187/STJ). [...] 4. A regular formação do agravo de instrumento constitui ônus
da parte recorrente, cujo desatendimento prejudica sua cognição por este Superior
Tribunal. Precedentes do STJ. 5. Agravo regimental ao qual se nega provimen-
to.” (AgRg-Ag 1390604/SC, 4. T., Relª Min. Maria Isabel Gallotti, J. 06.09.2011, DJe
13.09.2011); “PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ESPECIAL – RECOLHIMENTO DAS DESPESAS DE REMESSA E RETORNO –
INEXISTENTE – SÚMULA Nº 187/STJ – RECURSO DESERTO – AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO, SEQUER PEDIDO, DE JUSTIÇA GRATUITA POR DECLA-
RAÇÃO DE POBREZA – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO – DECISÃO
MANTIDA – 1. É da letra do Enunciado nº 187 da Súmula do STJ: ‘É deserto o
recurso interposto para o Superior Tribunal de Justiça, quando o recorrente não
recolhe, na origem, a importância das despesas de remessa e retorno dos autos’.
2. Em que pese a jurisprudência do STJ aceitar que ‘o pedido de assistência judiciária
gratuita pode estar embasada em declaração de pobreza firmada por advogado da
parte com poderes para o foro em geral, sendo desnecessário poderes específicos’
(EDcl-AgRg-AgRg-Ag 715.273/MG, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 23.10.2006), no caso,
não consta nos autos pedido de justiça gratuita, sequer documentação hábil a con-
firmar tal alegação. 3. Agravo regimental não provido.” (AgRg-REsp 1173871/RS,
1ª T., Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, J. 14.09.2010, DJe 29.09.2010).
A principal alegação do embargante, no caso analisado, é que a justiça gratuita ha-
via sido deferida em primeiro grau e que “a prova da concessão do benefício cons-
ta dos autos, tendo em vista que juntou o inteiro teor dos processos da origem”.
Contudo, o Ministro considerou que “a comprovação do recolhimento das custas
ou da condição de beneficiário da justiça gratuita deve ser realizada no momento
da interposição do recurso especial, ônus do qual não se desincumbiu o recorrente,
que nada mencionou a respeito da justiça gratuita nas razões do recurso especial”.
Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPE-
CIAL – PROCESSUAL CIVIL – PREPARO – AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO
– DESERÇÃO – SÚMULA Nº 187/STJ – 1. A parte recorrente deve comprovar, no
momento da interposição do recurso especial, o pagamento das custas judiciais e
do porte de remessa e retorno dos autos, sob pena de deserção. 2. É ônus do recor-
rente a comprovação do alegado deferimento da gratuidade de justiça na origem.
Precedentes. 3. Agravo regimental não provido.” (AgRg-AREsp 228.789/ES, 3ª T.,
Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, J. 07.03.2013, DJe 13.03.2013); “EMBARGOS
DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CI-
VIL – ART. 511 DO CPC – DEVIDA COMPROVAÇÃO DO PREPARO DO ESPE-
CIAL – INOCORRÊNCIA – ALEGADA CONCESSÃO DE JUSTIÇA GRATUITA
NA ORIGEM – COMPROVAÇÃO – INTERPOSIÇÃO DO RECURSO ESPECIAL –
EMBARGOS DECLARATÓRIOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL,
AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO – 1. Em homenagem ao princípio da econo-
mia processual e com autorização do princípio da fungibilidade, devem ser recebi-
189
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

dos como agravo regimental os embargos de declaração que contenham exclusivo


intuito infringente. 2. Necessidade da adequada comprovação do recolhimento
das despesas do recurso especial,inexistente na hipótese dos autos, sob pena de
deserção. 3. A comprovação do alegado deferimento dos benefícios da gratuidade
de justiça na origem deve ocorrer no momento da interposição do recurso especial.
4. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega pro-
vimento.” (EDcl-AREsp 119.096/SP, 3ª T., Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino,
J. 06.01.2012, DJe 12.11.2012).
Ante tais fundamentos, os embargos de declaração foram recebidos como agravo
regimental, ao qual foi negado provimento.

RECURSO ESPECIAL –
INTERPOSIÇÃO POR ADVOGADO
SEM PROCURAÇÃO NOS AUTOS –
INCIDÊNCIA DA SÚMULA
Nº 115/STJ – NÃO CONHECIMENTO

33529 – “Processual civil. Agravo regimental em recurso especial de apelação em em-


bargos do devedor em execução fiscal. Ausência de procuração do advogado subscritor
do recurso. Não conhecimento. Súmula nº 115/STJ. 1. ‘Na instância especial é inexis-
tente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos’ (Súmula nº 115/STJ).
2. Para a aplicação da jurisprudência, é irrelevante a partir de que momento a pro-
curação está faltante, o que importa é que a regularidade da representação proces­
sual deve ser comprovada no ato da interposição do recurso (AgRg-EAg 1383384/SP,
Corte Especial, Rel. Min. Sidnei Beneti, J. 05.02.2014). Se faltou durante todo o curso
do processo na origem, cabe à recorrente juntá-la aos autos a fim de regularizar sua
situação, ainda que sem intimação para tal. A ausência de intimação constitui viola-
ção ao art. 13 do CPC, que somente poderá ser conhecida pelo STJ acaso prequestio-
nada e objeto do recurso especial. 3. No caso concreto, é de se observar que o recurso
especial não foi interposto por violação ao art. 13 do CPC. Aliás, sobre este artigo de
lei sequer houve debate nas instâncias ordinárias. Desse modo, impossível acolher o
agravo regimental para reconhecer a violação ao referido dispositivo legal e determi-
nar à Corte de Origem que marque prazo para ser sanado o feito. Como mencionado,
faltante a procuração nos autos caberia à parte, zelosa, providenciá-la no momento
oportuno, o que não seria rechaçado pela origem (se rechaçado, haveria violação ao
art. 13 do CPC). O que não pode é pretender corrigir o feito em sede especial depois
da interposição do recurso. A falha eventualmente patrocinada pela Corte de Origem
por si só não abre a instância especial. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ –
AgRg-REsp 1451238/SP – 2ª T. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – J. 18.06.2014
– DJe 06.08.2014)
190
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

RECURSO ESPECIAL – REVISÃO


DO DANO MORAL FIXADO –
EXCEPCIONALIDADE – INCIDÊNCIA
DA SÚMULA Nº 7/STJ

33530 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Responsabilidade civil.


Cartão de crédito. Inscrição indevida em cadastro de inadimplentes. Dano moral.
Reexame do suporte fático-probatório dos autos. Súmula nº 7/STJ. 1. Nos termos
da jurisprudência consolidada nesta Corte, a revisão de indenização por danos mo-
rais só é possível em recurso especial quando o valor fixado nas instâncias locais
for exorbitante ou ínfimo, de modo a afrontar os princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade. Ausentes tais hipóteses, incide a Súmula nº 7/STJ, a impedir o co-
nhecimento do recurso. 2. Agravo regimental não provido, com aplicação de multa.”
(STJ – AgRg-AREsp 520.257/DF – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 24.06.2014
– DJe 01.08.2014)

REGULAÇÃO DE VISITAS
DOS AVÓS – RELEVÂNCIA
DO ESTUDO PSICOSSOCIAL
– PROTEÇÃO DO MENOR

33531 – “Recurso especial. Família. Menor. Regulamentação de visitas. Acompa-


nhamento por psicóloga particular. Matéria preclusa. Súmula nº 283/STJ. Realiza-
ção de estudo psicossocial. Proteção da menor. Direito à convivência familiar. Re-
curso desprovido. 1. A Corte local entendeu estar a questão do acompanhamento
das visitas por psicóloga particular preclusa, sendo o recurso intempestivo no ponto.
Contra esse fundamento não se insurgiu a recorrente, o que atrai a incidência da
Súmula nº 283/STJ. 2. A realização de estudo psicossocial busca, em ultima ratio, a
proteção da menor, verificando-se se é o caso de liberar as visitas aos avós pater-
nos sem o acompanhamento de profissional especializada. 3. A criança tem direito
a ser criada e educada no seio de sua família, usufruindo da convivência familiar
e comunitária (ECA, art. 19). 4. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte,
desprovido.” (STJ – REsp 1402818/MS – Rel. Min. Raul Araújo – 4ª T. – J. 24.06.2014 –
DJe 01.08.2014)

REPETIÇÃO DE INDÉBITO –
DEVOLUÇÃO DE TAXA DE SOBRE-
ESTADIA DE CONTÊINERES
191
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

(DEMURRAGE) – PRAZO
PRESCRICIONAL QUINQUENAL

33532 – “Direito comercial. Recurso especial. Prescrição. Sobre-estadia de contêine-


res (demurrage). Revogação do art. 449 do Código Comercial. Taxa prevista no con-
trato. Obrigação líquida. Prazo prescricional quinquenal. Art. 206, § 5º, I, do Código
Civil. 1. ‘A taxa de sobre-estadia, quando oriunda de disposição contratual – que
estabelece os dados e critérios necessários ao cálculo dos valores devidos, os quais
deverão ser aferidos após a devolução do contêiner, pela multiplicação dos dias de
atraso em relação aos valores das diárias –, gera dívida líquida e certa, fazendo incidir
o prazo prescricional quinquenal previsto no art. 206, § 5º, I, do Código Civil’ (REsp
1.335.173/SP, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 17.02.2014). 2. Recurso especial
provido.” (STJ – REsp 1192847/SP – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva –
J. 22.05.2014 – DJe 01.08.2014)

RESCISÃO CONTRATUAL –
PROMESSA DE COMPRA E
VENDA DE BEM IMÓVEL –
INADIMPLEMENTO CONTRATUAL –
DANO MORAL EXCEPCIONALMENTE
CARACTERIZADO

33533 – “Direito civil e processual civil. Rescisão contratual. Promessa de compra e


venda de imóvel. Art. 40, § 2º, da Lei nº 4.591/1964. Não incidência. Particularidade
do caso concreto. Inadimplemento contratual. Parcelas pagas. Devolução integral.
Dano moral. Cabimento. Excepcionalidade. 1. Não há ofensa ao art. 535 do Código de
Processo Civil quando o Tribunal a quo resolve todas as questões pertinentes ao lití-
gio, afigurando-se dispensável que o órgão julgador examine uma a uma as alegações
e os fundamentos expendidos pelas partes. 2. Tendo havido um novo negócio jurí-
dico entre as partes (adquirentes de imóvel da falida Encol e a recorrente) – relação
jurídica que, efetivamente, deu ensejo à presente demanda –, a Carvalho Hosken S/A
não assume no litígio posição de simples incorporadora ou proprietária do terreno
no qual o empreendimento imobiliário seria erguido. Assim, mostra-se inaplicável
o art. 40, § 2º, da Lei nº 4.591/1964, que restringe o valor a ser restituído aos pro-
mitentes compradores pela incorporadora. Bem por essa razão que o mencionado
dispositivo legal não foi prequestionado, motivo por que incide a Súmula nº 211/STJ.
3. Se a rescisão do contrato de compra e venda decorreu do inadimplemento na en-
trega do imóvel, descabe retenção de percentual pago pelo comprador, devendo a
restituição das parcelas ser integral. 4. Muito embora seja sólida a jurisprudência se-
gundo a qual o mero inadimplemento contratual não gera dano moral indenizável,
192
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

reconhece-se excepcionalmente a possibilidade da condenação, notadamente quando


estão em discussão bens jurídicos de especial grandeza, como é o direito a moradia.
Precedentes. 5. No caso em exame, o contrato foi firmado no ano de 1994, com ajuste
de novo termo de compromisso em 1999, mas até a data do ajuizamento da ação –
2005, o inadimplemento persistia e o imóvel não havia sido entregue, circunstância
que revela bem mais que mero dissabor e autoriza, de fato, a condenação por dano
moral. 6. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AREsp 168.231/RJ – 4ª T. –
Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 05.08.2014 – DJe 12.08.2014)

RESPONSABILIDADE CIVIL –
CONTRATAÇÃO MALICIOSA
DE EMPRÉSTIMO – DOLO
DO EMPREGADOR – DANO
MORAL CARACTERIZADO

33534 – “Apelações de ambos os réus e do autor. Assinatura de contrato. Emprega-


do convencido pelo empregador, acreditando tratar-se de abertura de conta salário.
Contrato que, na verdade, era contratação de empréstimo a ser utilizado pelo em-
pregador. Declaração de inexistência de relação jurídica e inexigibilidade do débi-
to. Danos morais. Ocorrência. Comprovação per se. Negativação. Correlação entra
a conduta dos réus e o dano causado ao autor. Valor. Fixação dentro do Princípio
da Razoabilidade. Apelação do autor. Honorários advocatícios fixados somente para
a demanda principal. Pedidos condenatório e declaratório. Desnecessidade de fixa-
ção distinta. Embargos do devedor acolhidos. Demanda distinta. Honorários fixados
para esta demanda. Apelações dos réus não providas. apelação do autor parcialmen-
te provida.” (TJSP – Ap 0298640-45.209.8.26.0000 – Mococa – 1ª Vara Cível – Rel. Des.
Silvio Sterman – Publ. 13.08.2014)

RESPONSABILIDADE CIVIL
DOS SERVIDORES – REMOÇÃO
DE PERFIS FALSOS EM SITES
DE RELACIONAMENTO –
DEVER DE FORNECIMENTO
DO ENDEREÇO DE IP

33535 – “Agravo de instrumento. Obrigação de remover perfis falsos de sites de re-


lacionamentos. Agravada que não informou as URLs das páginas, mas apenas os
nomes que lhes foram atribuídos. Impossibilidade de cumprimento da obrigação.
193
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

Necessidade de saber o endereço virtual específico para sua perfeita identificação.


Obrigação de fornecer os endereços IP dos criadores dos perfis mantida. Dever de
armazenamento de tais dados já reconhecido pelo eg. STJ. Multa cominatória ade-
quada para a hipótese, que não comporta redução. Recurso parcialmente provido.”
(TJSP – AI 209925-47.2014.8.26.00 – Votorantim – Rel. Des. Milton Carvalho – Publ.
11.08.2014)

RESPONSABILIDADE CIVIL
– ESTATUTO DO IDOSO –
NEGATIVA DE ATENDIMENTO POR
CAIXA PREFERENCIAL – DANO
MORAL CARACTERIZADO

33536 – “Apelação cível. Ação de indenização por dano moral. Negado atendimento
a parte autora para o caixa preferencial. Comprovação que o apelado possui mais de
60 anos. Permaneceu na fila por mais de 06 (seis) horas. Lei Estadual nº 7.255. Con-
denação a importância de R$ 30.000,00 a título de danos morais. Valor atribuído na
sentença superior ao pedido na inicial impossibilidade. Julgador não pode ultrapas-
sar o valor indicado pelo autor em evidente julgamento extra petita. Dano moral deve
ser minorado para valor sugerido na inicial, qual seja R$ 8.175,00. Recurso conhe-
cido e parcialmente provido tão somente para minorar o quantum indenizatório de
R$ 30.000,00 para R$ 8.175,00, à unanimidade.” (TJPA – Proc. 201330307857 – 136357
– Órgão Julgador 4ª C.Cív.Isol. – Relª Elena Farag – J. 28.07.2014 – Publ. 01.08.2014)

RESPONSABILIDADE CIVIL –
MORTE DO FILHO – PRESUNÇÃO
DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DO
PAI – PENSIONAMENTO DEVIDO

33537 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Ação de indenização.


Queda de composição ferroviária. Vítima fatal. Alegação de culpa exclusiva da víti-
ma. Reexame de prova. Súmula nº 7/STJ. Dano material. Presunção de dependência
econômica dos filhos menores. Desnecessidade de prova do exercício de atividade
laborativa. Família de baixa renda. Súmula nº 83/STJ. Danos morais. Valor razoável.
1. Inviável o recurso especial cuja análise das razões impõe reexame do contexto fáti-
co-probatório da lide, nos termos da vedação imposta pelo Enunciado nº 7 da Súmula
do STJ. 2. É presumida a dependência econômica dos filhos menores e dependentes
da vítima ao tempo do acidente. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
194
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

possui entendimento no sentido de, em se tratando de família de baixa renda, há


presunção de dependência econômica entre seus membros, de modo que o direito ao
pensionamento não pode ficar restrito à comprovação objetiva do salário que recebia
a vítima à data do óbito, motivo pelo qual se presume que não seria menos do que um
salário mínimo. Incidência da Súmula nº 83 do STJ. 4. A jurisprudência desta Corte
Superior admite, excepcionalmente, em recurso especial, o reexame do valor fixado
a título de danos morais, quando ínfimo ou exagerado. Hipótese, todavia, em que a
verba indenizatória, consideradas as circunstâncias de fato da causa, foi estabelecida
pela instância ordinária em conformidade com os princípios da proporcionalidade e
razoabilidade. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp
495.439/RJ – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)

RESPONSABILIDADE CIVIL –
TRANSEUNTE ATINGIDO POR
PROJÉTIL DISPARADO COM ARMA
DE FOGO DURANTE TENTATIVA DE
ROUBO DE MALOTES DE DINHEIRO
– DEVER DE INDENIZAR DA CASA
BANCÁRIA CARACTERIZADO
PELO RISCO DE SUA ATIVIDADE

33538 – “Recurso especial. Ação de indenização por danos materiais, morais e es-
téticos promovida por transeunte em face de instituição financeira e de empresa de
segurança, atingido por projétil disparado com arma de fogo, no momento em que
ocorreu tentativa de roubo de malotes de dinheiro retirados em frente à agência ban-
cária, na consecução de operação típica. instâncias ordinárias, que, ao final, reconhe-
ceram a responsabilidade solidária dos demandados. Insurgências, em separado, da
instituição financeira e da empresa de segurança. Hipótese em que se pretende a
condenação solidária de instituição financeira e de empresa de segurança pelos danos
morais, estéticos e materiais impostos ao demandante que foi atingido por projétil de
arma de fogo (resultando, ao final, na amputação de sua perna na parte inferior ao
joelho), por ocasião da tentativa de roubo justamente no momento em que a casa ban-
cária, no desempenho de suas operações cotidianas, retirou ostensivamente malotes
de dinheiro, pela porta da frente da agência bancária, em horário e local de grande
circulação de pessoas. Em primeira instância, a ação restou julgada procedente em
face de instituição financeira, e, extinta, sem julgamento de mérito, em relação à em-
presa de segurança. Em sede de recurso de apelação, reforma parcial da sentença,
para reintegrar à lide a empresa de segurança, condenando-a em solidariedade com a
casa bancária pelos danos suportados pelo demandante. 1. A partir do suporte fático
delineado pelas instâncias ordinárias, sobressai evidenciado que a instituição finan-
195
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

ceira, na consecução de operação própria de sua atividade – levada a efeito, por sua
conta e risco, na via pública –, foi alvo de empreitada criminosa, com repercussão na
esfera de direito de terceiros. Constata-se, portanto, que houve a retirada ostensiva
de malotes de dinheiro (mediante a atuação de empresa de segurança contratada
ante iniciativa da instituição financeira), cuja operação foi realizada através da porta
da frente da agência bancária, em horário e local de grande circulação de pessoas,
procedimento adotado pela Caixa Econômica Federal para viabilizar ação intrínseca
ao seu empreendimento, inegavelmente. 1.1 A conduta ilícita perpetrada em face da
instituição financeira (ainda que ocorrida na via pública), deu-se justamente por oca-
sião e em razão da realização de atividade bancária típica por ela desempenhada, in-
serindo-se, nessa extensão, nos riscos esperados do empreendimento desenvolvido,
mantida incólume a relação de causalidade. 1.2 O simples fato de a tentativa de roubo
ter ocorrido na via pública não tem o condão, por si só, de afastar a responsabilida-
de da instituição financeira ante danos infligidos a terceiro transeunte (consumidor
por equiparação), justamente em razão da operação de carga e descarga de dinheiro
em malotes ter sido desenvolvida naquele local. Ao assim proceder, os métodos e
mecanismos de segurança empregados pela casa bancária deveriam ser mais eficien-
tes, rigorosos e producentes, porquanto expõem, em circunstâncias tais, um número
substancialmente maior e impreciso de pessoas aos riscos próprios da atividade que
desenvolve, o que robustece sua responsabilidade pelos danos narrados na exordial.
2. A ratio decidendi dos precedentes desta Corte de Justiça está justamente no fato de
que, no interior das agências, em que há o desenvolvimento, em grande parte, das
atividades bancárias, as quais naturalmente envolvem a concentração de elevadas
somas em dinheiro, o roubo ali praticado insere-se, indene de dúvidas, no risco do
empreendimento desenvolvido pela instituição financeira. Destaca-se: não é exclu-
sivamente o local, mas também a atividade desempenhada que caracterizam os po-
tenciais riscos. 2.1 Não obstante, caso a atividade bancária venha a ser desenvolvida
fora dos limites físicos da agência, também com a movimentação de expressivos va-
lores monetários, a conduta ilícita, ainda que ocorrida na via pública, compreende-se
igualmente no risco do empreendimento, devendo a instituição financeira, por isso,
responsabilizar-se objetivamente ante danos daí advindos, suportados por clientes
ou terceiros. 3. Na hipótese em foco, inexiste dúvida de que o banco demandado, ao
operacionalizar sua atividade bancária (retirada e transporte de expressiva quantia
em dinheiro em plena via pública, pela porta da frente da agência em local e horário
de grande circulação de pessoas), criou riscos a terceiros, devendo, portanto, reparar,
de modo pleno, os danos daí advindos. 4. Em relação à empresa de segurança, com
mais razão, estas condutas criminosas afiguram-se com alto grau de previsibilidade,
sendo inerente à atividade empresarial desempenhada pela recorrente que tem por
objeto propiciar, nos termos contratados, proteção e segurança à atividade bancá-
ria, e, por consequência, aos clientes e a terceiros. 5. Sobre a condenação por danos
morais, não se vislumbra excesso no montante delineado pela Corte local, apto a
autorizar a excepcional intervenção deste Superior Tribunal de Justiça, afigurando-
196
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Civil
Agosto/2014

-se inviável superar o óbice elencado na Súmula nº 7/STJ. 6. Recursos Especiais im-
providos.” (STJ – REsp 1098236/RJ – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – J. 24.06.2014 –
DJe 05.08.2014)

SENTENÇA ESTRANGEIRA –
CONDENAÇÃO PELO JUÍZO
ARBITRAL – RESOLUÇÃO Nº 9/STJ
– HOMOLOGAÇÃO DEFERIDA

33539 – “Sentença estrangeira contestada. Descumprimento de contrato. Condena-


ção pelo juízo arbitral. Nulidade do contrato. Inexistência. Discussão sobre o mérito
do decisum. Impossibilidade. Falta de notificação no procedimento arbitral. Não com-
provação. Requisitos preenchidos. Pedido deferido. 1. Os vícios no contrato aponta-
dos pela parte requerida não foram demonstrados, ao contrário, ficou evidente que
ela teve plena ciência da realização do negócio. Ademais, decidir sobre a nulidade
do contrato neste juízo de delibação corresponderia a invadir o mérito da decisão
homologanda, situação defesa pelo procedimento homologatório. 2. De igual modo,
não comprovou a parte requerida a falta da devida notificação do procedimento ar-
bitral, tal como exigido pelo art. 38, inciso III, da Lei nº 9.307/1996. 3. Preenchidos os
requisitos exigidos pela Resolução nº 9/STJ, assim como os previstos nos arts. 38 e
39 da Lei nº 9.307/1996, impõe-se a homologação da sentença estrangeira. 4. Pedido
deferido.” (STJ – SEC 9.502/EX – Corte Especial – Relª Min. Maria Thereza de Assis
Moura – J. 01.07.2014 – DJe 05.08.2014)

USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA
– ART. 1.238, CC – REQUISITOS

33540 – “Reconhecimento de usucapião extraordinária. Requisitos. Art. 1.238 do


CCB. Reforma. Reexame de provas. Análise obstada pela Súmula nº 7/STJ. Agravo
não provido. 1. Em se tratando de aquisição originária por usucapião extraordinária,
que, para sua configuração, exige um tempo mais prolongado da posse (no CC, de
1916, 20 anos; no CC, de 2002, 15 anos), em comparação com as demais modalidades
de usucapião, a ela dispensam-se as exigências de justo título e de posse de boa-fé.
2. A reforma do aresto quanto à comprovação dos requisitos para o reconhecimento
da usucapião extraordinária, demandaria, necessariamente, o revolvimento do com-
plexo fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 3. Agra-
vo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AREsp 499.882/RS – 4ª T. – Rel. Min. Luis
Felipe Salomão – J. 24.06.2014 – DJe 01.08.2014)
197
Jurisprudência
Penal
stj
S uperior T ribunal de J ustiça

PExt no Habeas Corpus nº 285.537 – PA (2013/0419265-0)


Relator: Ministro Jorge Mussi
Requerente: Luciana Rodrigues Sá e outro(s)
Interes.: Paulo Henrique Pereira de Oliveira

EMENTA

PEDIDO DE EXTENSÃO EM HABEAS CORPUS –


PECULATO (ART. 312 DO CÓDIGO PENAL) – RENÚNCIA
DOS ADVOGADOS RESPONSÁVEIS PELA DEFESA DO
PACIENTE – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE
O ACUSADO FOI DEVIDAMENTE CIENTIFICADO DO
FATO – FALTA DE INTIMAÇÃO PARA CONSTITUIR
NOVO DEFENSOR – TRÂNSITO EM JULGADO
DA CONDENAÇÃO – PREJUÍZO COMPROVADO –
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EXISTENTE – IDENTIDADE
DE SITUAÇÕES PROCESSUAIS – EXTENSÃO DEFERIDA
1. A ordem postulada nesta impetração foi concedida pela
unanimidade de votos dos integrantes da Quinta Turma deste
Sodalício, na sessão ordinária do dia 06.05.2014, para anular a
certidão de trânsito em julgado da condenação, determinando-se
a intimação do paciente para constituir novo advogado, se desejar,
bem como a expedição de contramandado de prisão ou alvará de
soltura em seu favor, salvo se por outro motivo estiver preso.
2. Verificada a identidade fático-processual entre a situação
do paciente e a do ora requerente, que eram patrocinados pelo
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

mesmo causídico, e que a decisão que concedeu a ordem de habeas


corpus não se encontra fundada em motivos de caráter pessoal, aplica-se
o disposto no art. 580 do Código de Processo Penal.
3. Pedido de extensão deferido, concedendo-se a ordem de habeas
corpus em favor do requerente para anular a certidão de trânsito em
julgado da condenação, determinando-se a sua intimação para constituir
novo advogado, se desejar, bem como a expedição de contramandado
de prisão ou alvará de soltura em seu favor, caso a ordem de segregação
já tenha sido cumprida e se por outro motivo não estiver preso.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da


Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e
das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, deferir o pedido de exten-
são, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Regina
Helena Costa e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 05 de agosto de 2014 (data do Julgamento).

Ministro Jorge Mussi


Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Trata-se de pedido de


extensão da ordem concedida nestes autos em favor de Carlos Pereira de
Oliveira, para anular a certidão de trânsito em julgado da condenação, de-
terminando-se a sua intimação para constituir novo advogado, se desejar,
bem como a expedição de contramandado de prisão ou alvará de soltura em
seu favor, caso a ordem de segregação já tenha sido cumprida e se por outro
motivo não estiver preso.
Sustenta a patrona do requerente que este seria alvo de constrangi-
mento ilegal, pois os causídicos que o patrocinavam teriam renunciado ao
mandato outorgado sem cientificá-lo, motivo pelo qual não teria havido a
interposição de recursos de natureza extraordinária contra o acórdão que jul-
gou a apelação, sobrevindo o trânsito em julgado da condenação sem que
pudesse exercer plenamente a sua defesa.
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Alega que os patronos do acusado deveriam permanecer responsáveis


pela sua defesa nos 10 (dez) dias posteriores à renúncia.
Argumenta que embora os recursos sejam regidos pelo princípio da
voluntariedade, consoante o disposto no art. 574 do Código de Processo Pe-
nal, o requerente teria demonstrado o interesse em impugnar o aresto pro-
ferido no julgamento do apelo da defesa, motivo pelo qual a desídia de seus
advogados não poderia ser interpretada em seu desfavor.
Requer a concessão da ordem para que seja expedido contramandado
de prisão em favor do requerente.
O Ministério Público Federal, em parecer de fls. 180/183, manifestou-
-se pelo deferimento do pedido de extensão da ordem concedida no presente
mandamus.
É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Inicialmente, cumpre res-


saltar que o ora requerente era patrocinado pelo mesmo causídico que repre-
sentava o paciente do presente mandamus, consoante o pedido de renúncia
acostado às fls. 26/27, bem como as certidões narrativas de fls. 24 e 156.
A ordem postulada nesta impetração foi concedida pela unanimida-
de de votos dos integrantes da Quinta Turma deste Sodalício, na sessão or-
dinária do dia 06.05.2014, para anular a certidão de trânsito em julgado da
condenação, determinando-se a intimação do paciente para constituir novo
advogado, se desejar, bem como a expedição de contramandado de prisão ou
alvará de soltura em seu favor, tendo o acórdão recebido a seguinte ementa:
“HABEAS CORPUS – PECULATO (ART. 312 DO CÓDIGO PENAL) – RE-
NÚNCIA DOS ADVOGADOS RESPONSÁVEIS PELA DEFESA DO PA-
CIENTE – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE O ACUSADO FOI
DEVIDAMENTE CIENTIFICADO DO FATO – FALTA DE INTIMAÇÃO
PARA CONSTITUIR NOVO DEFENSOR – TRÂNSITO EM JULGADO DA
CONDENAÇÃO – PREJUÍZO COMPROVADO – CONSTRANGIMENTO
ILEGAL EVIDENCIADO – CONCESSÃO DA ORDEM
1. De acordo com o art. 45 do Código de Processo Civil, aplicado ao proces-
so penal por força do art. 3º da Lei Penal Adjetiva, ‘o advogado poderá, a
qualquer tempo, renunciar ao mandato, provando que cientificou o man-
201
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Jurisprudência Penal
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dante a fim de que este nomeie substituto’ sendo que ‘durante os 10 (dez)
dias seguintes, o advogado continuará a representar o mandante, desde
que necessário para lhe evitar prejuízo’.
2. No caso dos autos, nas petições de renúncia dos patronos contratados
pelo paciente, embora haja a informação de que os outorgantes do man-
dato teriam sido cientificados do fato, não consta as suas assinaturas, ou
qualquer outro dado que comprove que realmente foram informados de
que seus patronos não iriam prosseguir no exercício da defesa técnica.
3. Ademais, mesmo diante da ausência de nomeação de outro profissio-
nal da advocacia pelo paciente, constata-se que os causídicos renunciantes
não continuaram a representá-lo pelos 10 (dez) dias seguintes à renúncia,
o que certamente lhe acarretou prejuízos, já que não teve a oportunidade
de recorrer do acórdão proferido no julgamento da apelação, sobrevindo o
trânsito em julgado da condenação sem que pudesse exercer a sua defesa
com a amplitude que lhe é garantida pela Constituição Federal.
4. Ordem concedida para anular a certidão de trânsito em julgado da con-
denação, determinando-se a intimação do paciente para constituir novo
advogado, se desejar, bem como a expedição de contramandado de prisão
ou alvará de soltura em seu favor, caso a ordem de segregação já tenha sido
cumprida e se por outro motivo não estiver preso.” (e-STJ fl. 126).

Como visto, a situação processual do ora requerente se amolda ao qua-


dro encontrado com relação ao paciente deste mandamus, razão pela qual não
se verifica nenhum óbice ao deferimento da extensão pretendida.
Ante o exposto, defere-se o pedido de extensão, concedendo-se a ordem
em favor do requerente para anular a certidão de trânsito em julgado da con-
denação, determinando-se a sua intimação para constituir novo advogado,
se desejar, bem como a expedição de contramandado de prisão ou alvará de
soltura em seu favor, caso a ordem de segregação já tenha sido cumprida e se
por outro motivo não estiver preso.
É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA

Número Registro: 2013/0419265-0


Processo Eletrônico PExt no HC 285.537/PA
Matéria criminal
202
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Números Origem: 0 0059984520054013900 200539005998


59984520054013900
Em Mesa Julgado: 05.08.2014
Relator: Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi
Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro
Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Lindôra Maria
Araújo
Secretário: Bel. Marcelo Pereira Cruvinel

AUTUAÇÃO

Impetrante: Mirllen Thalyta Lima Souza Rocha


Advogado: Mirllen Thalyta Lima Souza Rocha e outro(s)
Impetrado: Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Paciente: Carlos Pereira de Oliveira
Corréu: Everaldo Pamplona Barroso
Corréu: Paulo Henrique Pereira de Oliveira
Corréu: Nazaré Belém da Cruz Benjamin
Assunto: Direito penal – Crimes contra o patrimônio – Estelionato

PEDIDO DE EXTENSÃO

Requerente: Luciana Rodrigues Sá e outro(s)


Interes.: Paulo Henrique Pereira de Oliveira

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Quinta Turma, ao apreciar o processo em epí-


grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
“A Turma, por unanimidade, deferiu o pedido de extensão, nos termos do
voto do Sr. Ministro Relator.”

Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Regina


Helena Costa e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

203
stJ
S uperior T ribunal de J ustiça

Recurso em Habeas Corpus nº 44.840 – GO (2014/0017245-6)


Relator: Ministro Jorge Mussi
Recorrente: Vilma Cristina de Oliveira
Advogados: N
 élio Roberto Seidl Machado
Mauro Coelho TSE
Maria Gabriela Viana Peixoto
Recorrido: Ministério Público Federal

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – QUADRILHA


E TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOA PARA FIM DE
EXPLORAÇÃO SEXUAL (ARTS. 288 E 231, § 3º, DO CÓDIGO
PENAL) – SENTENÇA CONDENATÓRIA – INTIMAÇÃO
– NÃO LOCALIZAÇÃO NO ENDEREÇO FORNECIDO
NOS AUTOS – EDITAL – NOTÍCIA DE MUDANÇA
PARA O EXTERIOR SEM A PRÉVIA COMUNICAÇÃO
DO JUÍZO – ÉDITO REPRESSIVO PUBLICADO NA
IMPRENSA OFICIAL – SUFICIÊNCIA – INTELIGÊNCIA
DOS ARTS. 392, INCISO II, E 370, § 1º, DO CÓDIGO DE
PROCESSO PENAL – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO
CARACTERIZADO – DESPROVIMENTO DO RECLAMO
1. Ambas as Turmas que compõem a 3ª Seção deste Sodalício
firmaram a compreensão de que, em se tratando de réu solto, é suficiente
a intimação de seu advogado acerca do édito repressivo, procedimento
que garante a observância dos princípios da ampla defesa e do
contraditório. Precedentes.
2. Na hipótese dos autos, a recorrente, devidamente citada,
compareceu ao interrogatório judicial e respondeu ao processo solta,
tendo sido expedido mandado de intimação da sentença condenatória
para o endereço por ela declinado nos autos, no qual não foi encontrada,
205
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Jurisprudência Penal
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uma vez que teria se mudado para fora do país há cerca de 3 (três) anos,
sem a prévia comunicação ao Juízo.
3. O advogado contratado pela acusada para patrociná-la foi
devidamente cientificado da prolação do édito repressivo por meio de
publicação no Diário de Justiça, nos termos do art. 370, § 1º, do Código
de Processo Penal, revelando-se descabida a pretensão de realização de
diligências para que fosse pessoalmente intimado, pois a notificação dos
profissionais da advocacia é feita por meio da imprensa oficial, e não
por mandado.
4. O só fato de o patrono contratado pela acusada não haver
apelado do édito repressivo não caracteriza cerceamento de defesa pois,
como é cediço, os recursos caracterizam-se pela voluntariedade, não
havendo como se impor a sua interposição pela parte.
5. Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da


Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos
e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao
recurso. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Regina
Helena Costa e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 05 de agosto de 2014 (data do Julgamento).

Ministro Jorge Mussi


Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Trata-se de recurso ordiná-


rio em habeas corpus interposto por Vilma Cristina de Oliveira contra acórdão
proferido pela 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que de-
negou a ordem no HC 0026919-41.2012.4.01.0000/GO.
Noticiam os autos que a recorrente foi condenada à pena de 8 (oito)
anos e 11 (onze) meses de reclusão, além do pagamento de 165 (cento e ses-
senta e cinco) dias-multa, como incursa nos arts. 288 e 231, § 3º, ambos do
Código Penal.
206
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Diante da não localização da ré no endereço por ela fornecido, pro-


cedeu-se à sua intimação acerca do édito repressivo por edital, tendo o seu
advogado sido notificado por meio de publicação na imprensa oficial.
Sobreveio o trânsito em julgado da condenação, diante da ausência de
interposição de recurso pela defesa.
Sustentam os patronos da recorrente que a sentença teria sido publica-
da por meio de edital sem o esgotamento dos meios legais para a intimação
do defensor constituído.
Entendem que, nos termos do art. 392, inciso III, do Código de Processo
Penal, a intimação da sentença condenatória também deve ser dirigida ao
patrono do acusado.
Aduzem que se estaria diante de nulidade absoluta, sendo patente o
prejuízo suportado pela defesa, que não teria tido a oportunidade de apelar
da condenação.
Requerem o provimento do reclamo para que os defensores constituí-
dos pela recorrente sejam intimados da sentença condenatória, reabrindo-se
o prazo para recursos, assegurando-lhe o direito de recorrer em liberdade até
o trânsito em julgado.
Contrarrazoada a irresignação (e-STJ fl. 232), o Ministério Público Fe-
deral, em parecer de fl. 243, manifestou-se pelo desprovimento do inconfor-
mismo.
É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi (Relator): Por meio deste recurso or-
dinário constitucional pretende-se, em síntese, a intimação dos defensores da
recorrente acerca da sentença condenatória.
O Código de Processo Penal trata da intimação da sentença no art. 392:
Art. 392. A intimação da sentença será feita:
I – ao réu, pessoalmente, se estiver preso;
II – ao réu, pessoalmente, ou ao defensor por ele constituído, quando se
livrar solto, ou, sendo afiançável a infração, tiver prestado fiança;
207
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

III – ao defensor constituído pelo réu, se este, afiançável, ou não, a infração,


expedido o mandado de prisão, não tiver sido encontrado, e assim o certi-
ficar o oficial de justiça;
IV – mediante edital, nos casos do nº II, se o réu e o defensor que houver
constituído não forem encontrados, e assim o certificar o oficial de justiça;
V – mediante edital, nos casos do nº III, se o defensor que o réu houver
constituído também não for encontrado, e assim o certificar o oficial de
justiça;
VI – mediante edital, se o réu, não tendo constituído defensor, não for en-
contrado, e assim o certificar o oficial de justiça.
§ 1º O prazo do edital será de 90 dias, se tiver sido imposta pena privativa
de liberdade por tempo igual ou superior a um ano, e de 60 dias, nos outros
casos.
§ 2º O prazo para apelação correrá após o término do fixado no edital, sal-
vo se, no curso deste, for feita a intimação por qualquer das outras formas
estabelecidas neste artigo.

Ao interpretar o inciso II do referido dispositivo legal, este Relator vi-


nha entendendo que, em observância à garantia da ampla defesa, tanto o acu-
sado que responde ao processo em liberdade quanto o seu defensor deveriam
ser intimados da sentença condenatória.
Ocorre que ambas as Turmas que compõem a 3ª Seção deste Sodalício
firmaram a compreensão de que, em se tratando de réu solto, é suficiente a
intimação de seu advogado acerca do édito repressivo, procedimento que
garante a observância dos princípios da ampla defesa e do contraditório.
Nesse sentido são os seguintes julgados da colenda Quinta Turma:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – 1 INTIMAÇÃO DA
SENTENÇA CONDENATÓRIA – RÉU SOLTO – ART. 392, II, DO CPP
– POSSIBILIDADE DE INTIMAÇÃO APENAS DO CAUSÍDICO – PRECE-
DENTES – [...] 4 RECURSO IMPROVIDO
1. Prevalece no Superior Tribunal de Justiça ser suficiente a intimação da
sentença condenatória ao advogado constituído, no caso de réu solto, nos
termos do art. 392, inciso II, do Código de Processo Penal. [...]
4. Recurso ordinário em habeas corpus a que se nega provimento.
(RHC 29.198/SP, 5ª T., Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, J. 02.04.2013,
DJe 09.04.2013)
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RECURSO EM HABEAS CORPUS – PENAL E PROCESSUAL PENAL –


CRIME DE FURTO QUALIFICADO – [...] ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA
DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA SENTENÇA CONDENATÓRIA – RÉU
SOLTO DURANTE TODA A INSTRUÇÃO CRIMINAL – DEFENSOR
CONSTITUÍDO REGULARMENTE INTIMADO – [...] VÍCIO NÃO CA-
RACTERIZADO – RECURSO DESPROVIDO – [...]
3. A obrigatoriedade de intimação pessoal do acusado para tomar ciên-
cia da sentença somente ocorre se este estiver preso, podendo ser dirigida
unicamente ao patrocinador da defesa, na hipótese de réu solto, segundo
prevê o art. 392, incisos I e II, do Diploma Processual Penal, pois satisfaz a
garantia do contraditório e da ampla defesa. Precedentes.
[...]
5. Recurso desprovido.
(RHC 28.813/SP, 5ª T., Relª Min. Laurita Vaz, J. 21.03.2013, DJe 02.04.2013)

No mesmo norte é o seguinte precedente da Sexta Turma:


CRIMINAL – HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓ-
PRIO – DESCABIMENTO – FALSIDADE IDEOLÓGICA – USO DE DOCU-
MENTO FALSO – CONTRABANDO OU DESCAMINHO – AUSÊNCIA
DE INTIMAÇÃO PESSOAL DE SENTENÇA CONDENATÓRIA – RÉUS
SOLTOS – INTIMAÇÃO DO DEFENSOR – NULIDADE NÃO CONFIGU-
RADA – [...] HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO
[...]
Nos termos do o art. 392, inciso II, do Código de Processo Penal, tratando-
-se de réu solto, é suficiente a intimação do defensor constituído a respeito
da sentença condenatória.
[...]
Habeas corpus não conhecido.
(HC 280.443/ES, 6ª T., Relª Min. Marilza Maynard (Desembargadora Con-
vocada do TJ/SE), J. 04.02.2014, DJe 24.02.2014)

Na hipótese dos autos, a recorrente, devidamente citada, compareceu


ao interrogatório judicial e respondeu ao processo solta, tendo sido expedido
mandado de intimação da sentença condenatória para o endereço por ela de-
clinado nos autos da ação penal em tela, no qual não foi encontrada, uma vez
que teria se mudado para fora do país há cerca de 3 (três) anos (e-STJ fl. 114).
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
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Ora, tendo a acusada ciência da existência do processo criminal em


apreço, e não tendo sido localizada no endereço por ela própria fornecido,
mudando-se do Brasil sem comunicar o Juízo de origem, não se vislumbra
qualquer ilegalidade na sua notificação por edital.
Por outro lado, ao contrário do que sustentado pelos patronos subscri-
tores do reclamo, houve, sim, a intimação dos defensores constituídos pela ré
acerca da prolação do édito repressivo.
Com efeito, verifica-se que a sentença foi publicada no Diário de Justiça
do Estado de Goiás no dia 15.04.2008 (e-STJ fl. 108), ou seja, foi devidamente
disponibilizada na imprensa oficial, que constitui o meio pelo qual os advo-
gados contratados pelas partes são cientificados dos atos processuais.
Nesse sentido, o art. 370, § 1º, do Código de Processo Penal preceitua
que “a intimação do defensor constituído, do advogado do querelante e do
assistente far-se-á por publicação no órgão incumbido da publicidade dos
atos judiciais da comarca, incluindo, sob pena de nulidade, o nome do acu-
sado”.
Por conseguinte, não se mostrava necessária, como vislumbrado na ir-
resignação, a realização de quaisquer diligências no sentido de intimar pes-
soalmente os profissionais responsáveis pela defesa da ré, já que, como visto,
são notificados por meio de publicação na imprensa oficial, e não por man-
dado.
A propósito, assim já decidiu este Sodalício:
PROCESSO PENAL – HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS E
CORRUPÇÃO ATIVA – [...] (3) SENTENÇA CONDENATÓRIA – PA-
CIENTE EM GOZO DE LIBERDADE PROVISÓRIA – INTIMAÇÃO DO
ADVOGADO CONSTITUÍDO PELA IMPRENSA – COMUNICAÇÃO DO
PACIENTE POR MEIO DE OFICIAL DE JUSTIÇA – DUAS TENTATIVAS
FRUSTRADAS – INTIMAÇÃO POR EDITAL – ILEGALIDADE – NÃO
OCORRÊNCIA. [...] (6) ORDEM NÃO CONHECIDA
[...]
3. Não se mostra írrita a intimação, acerca da sentença condenatória, do
advogado, pela imprensa oficial, e do réu solto, por meio de edital, sendo
que o oficial de justiça, por duas vezes, não localizou o acusado, o qual,
em gozo de liberdade provisória, dever-se-ia encontrar sempre ao pronto
alcance das comunicações do Poder Judiciário. No contexto, seguiu-se re-
gular intimação do réu por edital.
[...]
210
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

6. Ordem não conhecida.


(HC 196.421/SP, 6ª T., Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura,
J. 06.02.2014, DJe 26.02.2014)

Ademais, cumpre destacar que, ao contrário do que sustentado no pre-


sente inconformismo, a hipótese dos autos não se enquadra na regra de inti-
mação prevista no inciso III do art. 392 da Lei Penal Adjetiva, que se destina
ao acusado que tem contra si mandado de prisão expedido e não é encontra-
do para o devido cumprimento.
Isso porque, como visto, a recorrente respondeu solta ao processo, cuja
prisão preventiva foi decretada apenas após não ter sido encontrada para ser
intimada da condenação, diante da notícia de que teria se mudado para o
exterior sem a prévia comunicação ao Juízo (e-STJ fls. 119/120).
Por outro lado, a simples ausência de interposição de apelação contra
a sentença condenatória não caracteriza cerceamento de defesa, pois, como é
cediço, os recursos caracterizam-se pela voluntariedade, não havendo como
se impor a sua apresentação pela parte.
Sobre o tema, é uníssono o entendimento neste egrégio Superior Tri-
bunal de Justiça:
HABEAS CORPUS – PROCESSUAL PENAL – CERCEAMENTO DE DEFE-
SA – ALEGAÇÃO DE NULIDADE POR DEFICIÊNCIA TÉCNICA PELA
NÃO OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E AUSÊNCIA DE
NOTAS TAQUIGRÁFICAS NA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO – CONS-
TRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO – ORDEM DENEGADA
1. O fato de o advogado não ter oposto embargos de declaração não implica
ausência de defesa, pois, se a própria interposição do recurso voluntário
representa faculdade relacionada a um juízo discricionário seu, não há por
que lhe condicionar o conteúdo, máxime tratando-se de instrumento im-
próprio para a inovação de teses ainda não enfrentadas pelo juízo.
2. Não se verifica deficiência na defesa técnica quando há defensor consti-
tuído, que corretamente representa o réu durante toda a fase de instrução
(Súmula nº 523 do STF).
[...]
4. Ordem denegada.
(HC 102.307/SP, 5ª T., Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, J. 23.09.2008,
DJe 03.11.2008)
211
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Jurisprudência Penal
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RHC – ROUBO E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO – RÉUS INTI-


MADOS DA SENTENÇA, ASSIM COMO SEU DEFENSOR – PEDIDO DE
RESTITUIÇÃO DO PRAZO RECURSAL – IMPOSSIBILIDADE – DEFE-
SA TÉCNICA-SATISFATÓRIA – AUSÊNCIA DE RECURSO QUE NÃO
EQUIVALE A AUSÊNCIA DE DEFESA – VOLUNTARIEDADE DO RE-
CURSO – RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO
[...]

A ausência de recurso não constitui falta de defesa, posto que o recurso é


voluntário, podendo ou não os réus ou o seu defensor interpô-lo.

[...]

Negado provimento ao recurso.

(RHC 21.148/SC, 5ª T., Relª Min. Jane Silva (Desembargadora Convocada


do TJ/MG), J. 18.10.2007, DJ 05.11.2007, p. 287)

Na mesma esteira são os precedentes do Supremo Tribunal Federal:


EMENTA: HABEAS CORPUS – PROCESSUAL PENAL – AUSÊNCIA DE
INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO – CERCEAMENTO DE DEFESA – INO-
CORRÊNCIA – RÉUS E DEFENSOR CONSTITUÍDO REGULARMENTE
INTIMADOS DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA – NECESSIDA-
DE DO MANDADO DE INTIMAÇÃO DE SENTENÇA SER ACOMPA-
NHADO DE TERMO DE APELAÇÃO – INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO
LEGAL – ORDEM DENEGADA – 1. Os réus e o defensor constituído foram
regularmente intimados da sentença penal condenatória. 2. A não interpo-
sição de apelação não equivale à ausência de defesa, porquanto o defensor
constituído ofereceu embargos de declaração à sentença penal condenató-
ria em tempo hábil. Ausência de recurso que se situa no âmbito da estraté-
gia de defesa delineada pelo defensor constituído, dada a voluntariedade
recursal. 3. Não há qualquer dispositivo legal que determine a necessidade
de o mandado de intimação de sentença condenatória ser acompanhado
de um termo de apelação. Ausência de constrangimento ilegal. 4. Negado
provimento ao writ.

(HC 93120, 2ª T., Rel. Min. Joaquim Barbosa, J. 08.04.2008, DJe-117 Divulg.
26.06.2008, Public. 27.06.2008, Ement. v. 02325-03, p. 00604)

EMENTA: Habeas corpus. Não ocorrência de ausência ou de deficiência de


defesa. Inexistência, no caso, de ausência de defesa, uma vez que ela foi
produzida, não se tendo provado que, por deficiência dela em face das
212
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

circunstâncias, tenha sido o ora paciente prejudicado (Súmula nº 523). A


jurisprudência desta Corte, de há muito e reiteradamente, tem entendido
(a título de exemplo, no RE criminal nº 89.965, RHCs 59.765, 59.888, 61.716,
66.032, HCs 58.696 e 70.725) que a Defensoria Pública, devidamente inti-
mada, não tem o dever de recorrer, dada a regra da voluntariedade do
recurso. Habeas corpus indeferido.

(HC 82053, 1ª T., Rel. Min. Moreira Alves, J. 20.08.2002, DJ 13.09.2002,


p. Ement. v. 02082-02, p. 00296)

Por conseguinte, tendo a recorrente respondido solta ao processo, e


tendo havido a regular intimação do advogado responsável pela sua defe-
sa, o qual não recorreu da sentença condenatória, não se constata qualquer
mácula a ser reparada por este Sodalício, não merecendo reparos o aresto
objurgado, que restou assim ementado:
PENAL – PROCESSUAL PENAL – HABEAS CORPUS – SENTENÇA
CONDENATÓRIA – RÉ NÃO ENCONTRADA – INTIMAÇÃO DA RÉ
POR EDITAL – INTIMAÇÃO DO DEFENSOR CONSTITUÍDO POR PU-
BLICAÇÃO – OBSERVÂNCIA DOS ARTS. 370, § 1º E 392 – III – AMBOS
DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE
– CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO – DENEGAÇÃO
DA ORDEM

1. Em sede de habeas corpus, somente se apresenta como juridicamente pos-


sível a anulação de ato processual em caso de manifesta ilegalidade, verifi-
cável de plano, de forma clara e incontroversa.

2. In casu, não se verifica a apontada ilegalidade do ato de intimação da


sentença condenatória. Haja vista que tanto o defensor constituído da ré
(por publicação), como a ré (por edital), que se encontrava em local incerto
e não sabido, foram intimados da referida sentença, nos termos da lei, com
observância do preceituado no art. 370, § 1º e art. 392, inc. III, ambos do Có-
digo de Processo Penal, como se pode ver das informações prestadas pela
autoridade apontada como coatora.

3. Não se verifica, na hipótese, a presença de constrangimento ilegal passí-


vel de correção pela via processual do habeas corpus.

4. Ordem de habeas corpus denegada.” (e-STJ fl. 159)

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.


É o voto.
213
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA

Número Registro: 2014/0017245-6


Processo Eletrônico RHC 44.840/GO
Matéria criminal
Números Origem: 00269194120124010000 110648120014013500
200135000110813
Em Mesa Julgado: 05.08.2014
Relator: Exmo. Sr. Ministro Jorge Mussi
Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Moura Ribeiro
Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Lindôra Maria
Araújo
Secretário: Bel. Marcelo Pereira Cruvinel

AUTUAÇÃO

Recorrente: Vilma Cristina de Oliveira


Advogados: N
 élio Roberto Seidl Machado
Mauro Coelho TSE
Maria Gabriela Viana Peixoto
Recorrido: Ministério Público Federal
Assunto: Direito penal – Crimes contra a dignidade sexual – Favorecimen-
to da prostituição ou outra forma de exploração sexual

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Quinta Turma, ao apreciar o processo em epí-


grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
“A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso.”

Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Regina


Helena Costa e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

214
TRF 2ª R.
T ribunal R egional F ederal da 2ª R egião

V – Apelação Criminal nº 2007.51.12.000214-4


Nº CNJ: 0000214-42.2007.4.02.5112
Relator: Desembargador Federal Paulo Espirito Santo
Apelante: Jose Rodrigues Fernandes Filho
Advogado: Iure Simiquel Brito e outros
Apelado: Ministério Público Federal
Origem: 1ª Vara Federal de Itaperuna/RJ (200751120002144)

EMENTA

PENAL – APELAÇÃO – EXTRAÇÃO ILEGAL DE


RECURSOS MINERAIS – AUTORIA E MATERIALIDADE
COMPROVADAS – CRIME FORMAL – DOSIMETRIA
CORRETA – LEI Nº 9.605/1998 – LEI Nº 8.176/1991
A autoria e materialidade em desfavor do acusado restaram
sobejamente demonstradas nos autos.
Não há que se falar em revogação tácita do art. 2º da Lei
nº 8.176/1991 pelo art. 55 da Lei nº 9.605/1998, eis que o primeiro trata
dos crimes contra a ordem econômica e a Lei nº 9.605/1998 cuida das
condutas lesivas ao meio ambiente, tutelando, portanto, bens jurídicos
distintos.
Não merece prosperar a tese de atipicidade da conduta prevista
no art. 55 da Lei nº 9.605/1998, eis que o delito em voga se trata de
crime formal, que prescinde de comprovação do dano e devidamente
amoldado aos termos da Lei de Crimes Ambientais.
Refuta-se o reconhecimento de arrependimento posterior
postulado pelo Apelante, tendo em vista que não houve qualquer
comprovação de que houve a reparação do dano ambiental causado.
Afastada a prescrição da pretensão punitiva, tendo em vista que
não decorreu o prazo prescricional de 04 (quatro) anos, previsto no
art. 109, V, do Código Penal, entre os marcos de contagem de tal instituto.
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Manutenção da dosimetria da pena fixada na sentença que


considerou a primariedade do réu e seus bons antecedentes, nos termos
do art. 59 do Código Penal.
Apelação conhecida e desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,


decide a Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da
2ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da defesa, nos ter-
mos do Voto do Relator.
Rio de Janeiro, 23 de julho de 2014.

Desembargador Federal Paulo Espirito Santo


Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação interposta pela defesa de José Rodrigues


Fernandes Filho contra a sentença de fls. 336/341, da lavra do MM. Juiz
Maurício Magalhães Lamha, da 1ª Vara Federal de Itaperuna/RJ, que con-
denou o acusado à pena de 01 (um) ano e 09 (nove) meses de detenção, pela
prática dos crimes dispostos no art. 55 da Lei nº 9.605/1998 e no art. 2º da Lei
nº 8.176/1991.
Narra a denúncia que o réu extraiu minerais de maneira ilegal e clan-
destina, no dia 30 de abril de 2009.
Às fls.343/347, o Apelante apresentou suas razões recursais, alegando,
em síntese, o conflito aparente entre as normas dispostas no art. 55 da Lei
nº 9.605/1998 e art. 2º da Lei nº 8.176/1991 e a atipicidade de conduta em
relação ao art. 55 da Lei nº 9.605/1998.
Sustenta, também, fazer jus à causa de diminuição do arrependimento
posterior e que houve a prescrição em relação aos crimes em voga.
Contrarrazões apresentadas às fls. 354/363.
Às fls. 370/376/325, parecer do Ministério Público Federal, opinando
pelo desprovimento do recurso.
É o relatório. Ao revisor.
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Rio de Janeiro, 23 de julho de 2014.

Desembargador Federal Paulo Espirito Santo

VOTO

O Desembargador Federal Paulo Espirito Santo:


As razões de apelação tecidas pela defesa não merecem prosperar.
Narra a denúncia que o réu extraiu minerais de maneira ilegal e clan-
destina, no dia 30 de abril de 2009, sem a devida autorização dos órgãos com-
petentes.
A autoria e materialidade em desfavor dos acusado restaram sobeja-
mente demonstradas nos autos, mormente pelo relatório de fiscalização de
fls. 93/96, pela confissão do réu de fls. 322/323.
Outrossim, entendo que, neste caso, não há que se falar em conflito de
normas, tampouco em suposta revogação entre os tipos dos arts. 2ª da Lei
nº 8.176/1991 e 55 da Lei nº 9.605/1998, devendo prevalecer as regras da le-
gislação ambiental, por ser norma posterior mais benéfica.
É que, enquanto a Lei nº 8.176/1991 trata dos crimes contra a ordem
econômica, a Lei nº 9.605/1998 cuida das condutas lesivas ao meio ambien-
te, não havendo, assim, qualquer confronto entre elas, eis que tutelam bens
jurídicos distintos.
Portanto, temos que o presente caso trata-se, em verdade, de verdadei-
ro concurso formal, em razão de o acusado, com uma só ação, ter praticado
dois delitos.
Sobre a matéria em destaque, colaciono a jurisprudência a seguir do
Colendo Superior Tribunal de Justiça e do TRF da 4ª Região:
PENAL – PROCESSUAL PENAL – RECURSO ESPECIAL – CRIME
AMBIENTAL – EXTRAÇÃO DE AREIA SEM AUTORIZAÇÃO – LEIS
NºS 8.176/1991 E 9.605/1998 – PROTEÇÃO DE BENS JURÍDICOS DIS-
TINTOS – CONFLITO APARENTE DE NORMAS – INEXISTÊNCIA – RE-
CURSO CONHECIDO E PROVIDO
1. Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, os arts. 55 da
Lei nº 9.605/1998 e 2º, caput, da Lei nº 8.176/1991 protegem bens jurídicos
distintos, quais sejam, o meio ambiente e a ordem econômica, não havendo
falar em derrogação da segunda pela primeira, restando ausente o conflito
217
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

aparente de normas. 2. Recurso especial conhecido e provido para determi-


nar o prosseguimento da ação penal nos termos da denúncia.
(STJ, REsp 200700789635, 5ª T., Arnaldo Esteves Lima, DJe Data: 13.10.2009,
RT v. 00892, p. 00596)

PENAL – CRIME AMBIENTAL – EXTRAÇÃO E EXPLORAÇÃO DE


RECURSOS MINERAIS – SAIBRO – ART. 2º DA LEI Nº 8.176/1991 –
ART. 55, CAPUT, DA LEI Nº 9.605/1998 – CONCURSO FORMAL – PE-
NAS – REDUÇÃO – PRESCRIÇÃO
1. O agente que, visando à exploração de matéria-prima, extraí recursos
minerais (saibro) pertencentes à União, sem autorização das autorida-
des competentes, pratica os delitos do art. 2º da Lei nº 8.176/1991 e do
art. 55, caput, da Lei nº 9.605/1998. 2. A potencial consciência da ilicitude
do fato é elemento da culpabilidade, que não necessita ser efetiva, bastando
que, com algum esforço ou cuidado, o agente possa posicionar-se sobre a
ilicitude do fato. 3. A recuperação da vegetação, ainda que completa, não
isenta o réu de pena, mormente quando há informação do Ibama de que a
extração do saibro afetou o equilíbrio do ecossistema da região. 4. Os tipos
penais definidos no art. 2º da Lei nº 8.176/1991 e no art. 55, caput, da Lei
nº 9.605/1998 consumam-se com a simples extração do recurso mineral sem
a devida autorização do órgão competente. 5. Os bens jurídicos tutelados
pelas Leis nºs 8.176/1991 e 9.605/1998 são distintos, razão pela qual não há
falar em bis in idem ou em revogação de uma pelo advento da outra, sendo
possível a ocorrência de concurso formal entre os delitos nelas capitulados,
nos termos do art. 70 do CP. 6. Sendo as circunstâncias judiciais favorá-
veis ao réu, deve a pena-base ser fixada em seu mínimo legal. Redução das
penas privativas de liberdade e multa. Em caso de descumprimento da
pena substitutiva, deverá o juiz da execução convertê-la em privativa de
liberdade, forte no § 4º do art. 44 do CP, sendo descabida a regressão para
o regime mais grave. 7. Se transcorridos mais de dois anos entre a data do
fato e a data do recebimento das denúncias, quanto às sanções impostas ao
delito do art. 55, caput, da Lei nº 9.605/1998, está configurada a prescrição
retroativa, que autoriza a declaração da extinção da punibilidade.
(TRF 4ª R., ACr 200404010442813, 8ª T., Paulo Afonso Brum Vaz,
DJ 15.06.2005, p. 1045)

Outrossim, não merece prosperar a tese de atipicidade da conduta pre-


vista no art. 55 da Lei nº 9.605/1998, eis que o delito em voga se trata de crime
formal, que prescinde de comprovação do dano e devidamente amoldado
aos termos da Lei de Crimes Ambientais.
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Ademais, refuto o reconhecimento de arrependimento posterior postu-


lado pelo Apelante, tendo em vista que não houve qualquer comprovação de
que houve a reparação do dano ambiental causado.
Afasto, também, a prescrição da pretensão punitiva, tendo em vis-
ta que não decorreu o prazo prescricional de 04 (quatro) anos, previsto no
art. 109, V, do Código Penal, entre os marcos de contagem de tal instituto.
Por derradeiro, não merece qualquer reforma a dosimetria da pena
fixada na sentença, eis que considerou a primariedade do réu e seus bons
antecedentes, conforme se vê à fl. 339, nos termos do art. 59 do Código Penal.
Ante o exposto, nego provimento à Apelação da defesa e mantenho a
sentença por seus próprios fundamentos.
É como voto.
Rio de Janeiro, 23 de julho de 2014.

Desembargador Federal Paulo Espirito Santo

219
E mentário P enal

Crime ambiental

30964 – “Agravo regimental em recurso especial. Penal. Crime ambiental. Princípios


do desenvolvimento sustentável e da prevenção. Poluição mediante lançamento de
dejetos provenientes de suinocultura diretamente no solo em desconformidade com
leis ambientais. Art. 54, § 2º, V, da Lei nº 9.605/1998. Crime formal. Potencialidade
lesiva de causar danos à saúde humana evidenciada. Crime configurado. Agravo re-
gimental provido. Recurso especial improvido. I – Os princípios do desenvolvimen-
to sustentável e da prevenção, previstos no art. 225 da Constituição da República,
devem orientar a interpretação das leis, tanto no direito ambiental, no que tange à
matéria administrativa, quanto no direito penal, porquanto o meio ambiente é um
patrimônio para essa geração e para as futuras, bem como direito fundamental, en-
sejando a adoção de condutas cautelosas, que evitem ao máximo possível o risco de
dano, ainda que potencial, ao meio ambiente. II – A Lei nº 9.605/1998, ao dispor sobre
as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao
meio ambiente e dar outras providências, constitui um divisor de águas em matéria
de repressão a ilícitos ambientais. Isto porque ela trouxe um outro viés, um outro
padrão de punibilidade em matéria de crimes ambientais, trazendo a figura do crime
de perigo. III – O delito previsto na primeira parte do art. 54 da Lei nº 9.605/1998 pos-
sui natureza formal, porquanto o risco, a potencialidade de dano à saúde humana, é
suficiente para configurar a conduta delitiva, não se exigindo, portanto, resultado na-
turalístico. Precedente. IV – A Lei de Crimes Ambientais deve ser interpretada à luz
dos princípios do desenvolvimento sustentável e da prevenção, indicando o acerto da
análise que a doutrina e a jurisprudência tem conferido à parte inicial do art. 54 da Lei
nº 9.605/1998, de que a mera possibilidade de causar dano à saúde humana é idônea
a configurar o crime de poluição, evidenciada sua natureza formal ou, ainda, de peri-
go abstrato. V – Configurado o crime de poluição, consistente no lançamento de deje-
tos provenientes da criação de cerca de dois mil suínos em sistema de confinamento
em 3 (três) pocilgas verticais, despejados a céu aberto, correndo por uma vala que os
levava até às margens do Rio do Peixe, situado em área de preservação permanente,
sendo a atividade notoriamente de alto potencial poluidor, desenvolvida sem o devi-
do licenciamento ambiental, evidenciando a potencialidade do risco à saúde humana.
VI – Agravo regimental provido e recurso especial improvido, restabelecendo-se o
acórdão recorrido.” (STJ – AgRg-REsp 1.418.795 – (2013/0383156-9) – 5ª T. – Rel. Min.
Marco Aurélio Bellizze – DJe 07.08.2014)
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

30965 – “Apelação. Crime ambiental. Art. 34, inciso II, da Lei nº 9.605/1998. Pes-
ca com petrechos não permitidos. Norma penal em branco. Ausência de especifi-
cação quanto aos petrechos, na denúncia. O tipo penal do art. 34, inciso II, da Lei
nº 9.605/1998, é norma penal em branco, necessitando de diploma legal esclarecendo
quais são os petrechos não permitidos. Ausência de especificação acerca dos petre-
chos usados, na denúncia, que impossibilita a análise sobre a rede apreendida com os
acusados. Denúncia inepta. Apelação da defesa provida, para absolver os réus.” (TJRS
– ACr 70059017764 – 4ª C.Crim. – Rel. Des. Gaspar Marques Batista – J. 24.07.2014)

Crime contra a
dignidade sexual

30966 – “Agravo regimental no recurso especial. Crime contra a dignidade sexual.


Estupro após a edição da Lei nº 12.015/2009. Tipo misto alternativo. Conduta prati-
cada contra a mesma vítima e no mesmo contexto fático. Reconhecimento de crime
único. Possibilidade. I – A Lei nº 12.015/2009 promoveu a fusão, em um único delito,
dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor, outrora tipificados nos arts. 213 e
214 do Código Penal, respectivamente. II – Pela nova disciplina normativa, os crimes
de estupro e atentado violento ao pudor são, agora, do mesmo gênero e da mesma
espécie, razão pela qual, quando praticados no mesmo contexto e contra a mesma
vítima, devem ser reconhecidos como crime único. III – A referida alteração aplica-se,
inclusive, a fatos praticados anteriormente à sua vigência, em atenção ao princípio da
retroatividade da lei mais benéfica ao réu. IV – Agravo regimental improvido.” (STJ
– AgRg-REsp 1.262.650 – (2011/0151551-0) – 5ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa –
DJe 14.08.2014)

Crime contra a ordem


tributária

30967 – “Apelação criminal. Crime contra a ordem tributária. Art. 1º, Lei
nº 8.137/1990. Supressão de tributos mediante omissão de informações à autori-
dade fazendária. Inépcia da denúncia não configurada. Presentes os requisitos do
art. 41 do Código Penal. Nulidade da citação. Inocorrência. Cerceamento de defesa
não verificado. Materialidade e autoria demonstradas. Dolo genérico presente. Do-
simetria. Reforma de ofício. Pena de multa. Critério trifásico. Recursos desprovidos.
1. A acusação imputa aos réus a conduta de suprimir ou reduzir tributo, ou contri-
buição social e qualquer acessório, mediante a omissão de informação às autoridades
fazendárias, nos termos do art. 1º, I, da Lei nº 8.137/1990. 2. Segundo a acusação, nos
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

meses de fevereiro a outubro de 1999, os acusados teriam deixado de informar nas


Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTFs), os valores de Con-
tribuição para o Programa de Integração Social – PIS, bem como de promover o de-
vido recolhimento. Após o regular procedimento de apuração fiscal, foi constituído o
crédito tributário de R$ 514.313,05. 3. Não é o caso de declarar a inépcia da denúncia
na hipótese, em que a exordial acusatória narra detalhadamente o fato criminoso e as
suas circunstâncias, identificando o acusado e o tipo penal a ele imputado, além de
arrolar as testemunhas a serem inquiridas. Na hipótese, a peça acusatória descreveu
os fatos delituosos imputados à acusada com observância do art. 41 do Código de
Processo Penal. 4. Ademais, o col. Superior Tribunal de Justiça ‘tem posicionamento
jurisprudencial no sentido de que com a superveniência de sentença condenatória
fica preclusa a alegação de inépcia da denúncia’ (5ª Turma, AgRg-REsp 1325081/SC,
Rel. Min. Moura Ribeiro, DJe 21.02.2014). 5. Não há nulidade na citação do co-réu,
realizada pessoalmente. 6. Inexiste cerceamento de defesa, pois o procedimento fis-
cal que redundou no lançamento do crédito tributário foi integralmente juntado aos
autos da ação penal, permitindo não só o conhecimento dos fatos imputados pela
acusação, como também os documentos que embasaram a apuração do crédito fiscal.
Além disso, não se afigura razoável a produção da prova pericial contábil pretendida,
eis que a alegação formulada pela defesa no sentido da inexigibilidade do tributo não
é matéria fática, mas de direito, a cujo respeito sequer cabe manifestação do perito
judicial. 7. Descabe a suspensão da ação penal na hipótese em que o alegado parce-
lamento fiscal, negado pela Procuradoria da Fazenda Nacional, não foi demonstrado
pelo réu, ônus que lhe competia, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal.
8. Materialidade delitiva demonstrada pela prova documental produzida: autos de
infração, termo de verificação fiscal e termo de encerramento de ação fiscal, além da
constituição definitiva do crédito. 9. Rejeitada a alegação da defesa no sentido de
que as operações com derivados de petróleo, combustíveis e minerais no país seriam
imunes à Contribuição para o PIS e Cofins, com fulcro na Súmula nº 659 do STF.
10. Autoria comprovada pela prova documental e pelo interrogatório judicial dos
réus. 11. A incidência de tributos é inerente ao exercício da atividade mercantil. Afas-
tada, portanto, qualquer excludente na concepção/classificação do delito praticado
a beneficiar, dessa forma, os recorrentes: ‘O desconhecimento da lei é inescusável’
(art. 21, 1ª parte, do Código Penal). 12. O dolo do tipo penal do art. 1º da Lei
nº 8.137/1990 é genérico, bastando, para a tipicidade da conduta, que o sujeito queira
não pagar, ou reduzir tributos, consubstanciado o elemento subjetivo em uma ação
ou omissão voltada a este propósito. 13. As consequências do crime (art. 59 do Có-
digo Penal) devem ser valoradas negativamente, pois, conquanto o dano causado
aos cofres públicos – aí se incluindo toda a coletividade – seja ínsito à própria ob-
jetividade jurídica da figura típica inserta no tipo penal, o valor global dos tribu-
tos e contribuições omitidos e não repassados é considerável, na ordem de mais de
R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), o que gera grave dano à coletividade, bem como
coloca a sociedade empresária administrada pelo acusado em situação de indevi-
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

da vantagem perante os demais agentes (pessoas jurídicas de direito privado) que


atuam no mesmo ramo de atividade econômica. 14. Presente a continuidade delitiva,
apurada nos meses de fevereiro a outubro de 1999, impõe-se a aplicação da causa
de aumento de pena prevista no art. 71 do Código Penal, em sua mínima fração.
15. Pena definitivamente fixada em 2 (dois) anos, 8 (oito) meses e 20 dias de reclusão,
a ser cumprida em regime inicial aberto, nos termos do art. 33, § 2º, c, do Código Pe-
nal. 16. Redução, de ofício, da quantidade de dias-multa, para 12 (doze), a fim de que
as penas de multa e privativa de liberdade aplicadas guardem entre si a proporção
e a coerência. 17. Mantido o valor unitário do dia-multa arbitrado em primeiro grau.
18. Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, mantida a substituição da pena
privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, quais sejam, prestação de ser-
viços à comunidade ou entidade pública a ser indicada pelo Juízo da Execução, e uma
prestação pecuniária, em montante equivalente a 32 (trinta e dois) salários-mínimos.
19. Recursos desprovidos.” (TRF 3ª R. – ACr 0011212-12.2003.4.03.6105/SP – 11ª T. –
Rel. Des. Fed. José Lunardelli – DJe 05.08.2014)

Crime contra o patrimônio

30968 – “Recurso em habeas corpus. Crime contra o patrimônio. Furto qualificado.


Alegação de constrangimento ilegal. Pleito pela revogação da prisão preventiva.
Impossibilidade. Circunstâncias autorizadoras presentes. Reiteração delitiva. Pedi-
do para substituir a prisão cautelar por medida diversa. Inadequação/insuficiência.
Precedentes. 1. A necessidade da segregação cautelar se encontra fundamentada na
garantia da ordem pública em face da periculosidade do recorrente, caracterizada
pela reiteração da prática delituosa, mormente por responder outras ações penais
naquela comarca. 2. Recurso em habeas corpus a que se nega provimento.” (STJ –
Rec-HC 47.172 – (2014/0092884-1) – 5ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 15.08.2014)

Crime de descaminho

30969 – “Agravo regimental no recurso especial. Penal e processo penal. Ofensa ao


art. 334 do CP. Ocorrência. Descaminho. Insignificância. Parâmetro. Mínimo legal
para a execução fiscal. Art. 20 da Lei nº 10.522/2002. Reiteração delitiva. Soma dos
débitos consolidados nos últimos cinco anos. § 4º da norma. Agravo interno a que
se nega provimento. 1. Em sede de crime de descaminho, em que o bem jurídico
tutelado é a ordem tributária, a irrisória lesão ao Fisco conduz à própria atipicidade
material da conduta. 2. Definindo o parâmetro de quantia irrisória para fins de apli-
cação do princípio da insignificância em sede de descaminho, a Terceira Seção deste
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
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Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Representativo de


Controvérsia nº 1.112.748/TO, pacificou o entendimento no sentido de que o valor do
tributo elidido a ser considerado é aquele de R$ 10.000,00 (dez mil reais) previsto no
art. 20 da Lei nº 10.522/2002. 3. Nos casos de ‘reiteração delitiva’, não há como excluir
a tipicidade material à vista do valor da evasão fiscal de cada apreensão, representa-
ção fiscal ou auto de infração, considerados isoladamente, devendo ser considerada,
para os fins do parâmetro legal, a soma dos débitos consolidados nos últimos cinco
anos, nos termos do § 4º da norma. 4. Em restando devidamente comprovada a exis-
tência de outros processos administrativo-fiscais contra o mesmo devedor, não há de
se afirmar, ab initio, a atipicidade material da conduta com base no princípio da insig-
nificância se, em virtude da reiteração, houver efetiva lesão ao bem jurídico tutelado,
a ordem tributária, considerada a soma dos débitos consolidados nos últimos cinco
anos, superior a dez mil reais. 5. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp
1.339.726 – (2012/0175771-4) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura –
DJe 04.08.2014)

Crime de desrespeito
a superior

30970 – “Apelação. Crime de desrespeito a superior. Art. 160 do Código Penal Mili-
tar. Provimento ao recurso do Ministério Público Militar, com a reforma da senten-
ça absolutória. De ofício, declaração da extinção da punibilidade pela prescrição da
pretensão punitiva. Hipótese em que a prova é firme e suficientemente harmônica no
sentido de que o acusado desrespeitou o seu superior hierárquico, valendo-se, para
tanto, não só de palavras ofensivas, como também de gestos desafiadores. O objeto da
tutela penal do delito previsto no art. 160 do Código Penal Militar é a disciplina e a au-
toridade militar, que sempre restam afetadas negativamente em casos como o ora sub
examine. Reforma da sentença que se faz impositiva, com a consequente condenação
do Acusado pela prática do crime de desrespeito a superior. Mandatória é a declara-
ção, de ofício, da extinção da punibilidade do acusado pela ocorrência da prescrição
da pretensão punitiva, considerada a pena concretamente arbitrada. Unânime. Cor-
reição parcial nº 41-17.2014.7.12.0012/AM.” (STM – Ap 126-42.2010.7.12.0012/AM
– Rel. Min. Luis Carlos Gomes Mattos – DJe 14.08.2014)

Crime de extorsão

30971 – “Recurso ordinário em habeas corpus. Arts. 158, § 3º, 129, § 1º, inciso II, e
288, todos do Código Penal. Alegação de ausência dos requisitos da prisão preven-
225
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

tiva. Segregação cautelar sobejamente fundamentada na necessidade de garantia da


ordem pública e na periculosidade concreta dos recorrentes. Recurso desprovido.
1. Hipótese na qual os Recorrentes foram presos em flagrante, no dia 13 de janeiro
de 2014, e preventivamente, no dia 16 de janeiro de 2014, todos em razão da suposta
prática dos crimes tipificados no art. 158, § 3º, art. 129, § 1º, inciso II, e art. 288, do
Código Penal. Narra o auto de prisão em flagrante que a vítima foi encontrada em
um matagal sofrendo extorsão por parte de cinco pessoas. Os crimes foram cometi-
dos com violência física, humilhação e tortura psicológica do ofendido, causando-
-lhe exacerbado sofrimento. Houve, ainda, disparos de arma de fogo contra a polícia,
para assegurar a fuga. 2. A manutenção da custódia preventiva dos recorrentes, nesse
contexto, encontra-se sobejamente fundamentada em face das circunstâncias concre-
tas do caso. O modus operandi do delito demonstra, por si só, a periculosidade dos
acusados, bem como a necessidade da segregação cautelar para a garantia da ordem
pública. Precedentes. 3. As condições pessoais favoráveis, tais como primariedade,
bons antecedentes, ocupação lícita e residência fixa, não têm o condão de, por si sós,
desconstituir a custódia antecipada, caso estejam presentes outros requisitos de or-
dem objetiva e subjetiva que autorizem a decretação da medida extrema. 4. Recurso
desprovido.” (STJ – Rec-HC 46.359 – (2014/0062524-2) – 5ª T. – Relª Min. Laurita Vaz
– DJe 06.08.2014)

Crime de falsificação de
documento público

30972 – “Pagamento de salário extrafolha. Fraude trabalhista. Crime de falsificação


de documento público. Presume-se a veracidade da alegação do demandante no
que se refere ao pagamento de salário não condizente com o valor registrado em
CTPS (pagamento de salário extrafolha), quando o empregador demandado, embora
afirme ter pago salário conforme este documento, não comprova as suas alegações
(art. 818 da CLT c/c art. 333, II, do CPC), deixando, injustificadamente, de juntar aos
autos os recibos de pagamento de salário do período contratual (art. 464 da CLT). De
modo que o valor consignado na CTPS do obreiro, ao que se evidenciou pela omissão
da ré ao não juntar os recibos de pagamento, constituía apenas salário pro forma, com
o escopo de desvirtuar e fraudar a aplicação da legislação (art. 9º da CLT), conduta
que, em tese, encontra-se capitulada no art. 297, §§ 3º e 4º, do Código Penal. Deter-
minada a retificação da CTPS do autor e o pagamento das diferenças remuneratórias
decorrentes, bem como a comunicação ao Ministério Público (art. 5º, II, c/c art. 40
do CPP, e art. 7º da Lei nº 7.347/1985).” (TRT 4ª R. – RO 0001461-18.2012.5.04.0012 –
2ª T. – Rel. Des. Marcelo José Ferlin D’Ambroso – DJe 13.06.2014)
226
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Nota:
O crime está previsto no art. 297 do CP, cuja redação é a seguinte:
“Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documen-
to público verdadeiro:
Pena – reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo,
aumenta-se a pena de sexta parte.
§ 2º Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de en-
tidade paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de
sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular.
§ 3º Nas mesmas penas incorre quem insere ou faz inserir:
I – na folha de pagamento ou em documento de informações que seja destinado
a fazer prova perante a previdência social, pessoa que não possua a qualidade de
segurado obrigatório;
II – na Carteira de Trabalho e Previdência Social do empregado ou em documento
que deva produzir efeito perante a previdência social, declaração falsa ou diversa
da que deveria ter sido escrita;
III – em documento contábil ou em qualquer outro documento relacionado com as
obrigações da empresa perante a previdência social, declaração falsa ou diversa da
que deveria ter constado.
§ 4º Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no § 3º,
nome do segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato
de trabalho ou de prestação de serviços.”
O Mestre Damásio Evangelista de Jesus comenta:
“Nas mesmas penas incorre quem omite, nos documentos mencionados no § 3º,
nome do segurado e seus dados pessoais, a remuneração, a vigência do contrato
de trabalho ou de prestação de serviços.”
Os documentos a que se refere o mencionado § 3º são os seguintes: a) folha de
pagamento ou documento de informações destinado a fazer prova perante a Pre-
vidência Social (I); b) a CTPS do empregado ou documento concebido com o pro-
pósito de produzir efeito perante a Previdência Social (II); c) documento contábil
ou qualquer outro relacionado com obrigações da empresa junto à Previdência
Social (III).
Não obstante a inserção das novas figuras penais, algumas estranhamente conten-
do documento particular como objeto material, o crime previsto no § 4º não deixa
de ser modalidade de “falsificação de documento público” (nomen juris do delito
do art. 297), 2 descrito como infração contra a fé pública (Título X do CP), inserida
entre os crimes de “falsidade documental” (Capítulo III).
A alteração sofrida com a inclusão dada pela Lei nº 9.983/2000 não tem o con-
dão de inserir no rol de comportamentos típicos a omissão de anotação de novo
contrato de trabalho. Pune a conduta do empregador que, mantendo contrato de
trabalho e o registro na CTPS, altera-o falsamente (§ 3º e incisos), ou que, no ato
227
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

do registro, modifica dados com o intuito de burlar a Previdência Social (§ 4º). A


incriminação, porém, não passa disso, não prevendo como fato típico a simples
omissão de registro.” (CTPS: Deixar de registrar empregado não é crime. Disponí-
vel em: online.sintese.com. Acesso em: 16 jul. 2014)

Crime de quadrilha e tráfico

30973 – “Recurso ordinário em habeas corpus. Quadrilha e tráfico internacional de


pessoa para fim de exploração sexual (arts. 288 e 231, § 3º, do Código Penal). Sentença
condenatória. Intimação. Não localização no endereço fornecido nos autos. Edital.
Notícia de mudança para o exterior sem a prévia comunicação do juízo. Édito repres-
sivo publicado na imprensa oficial. Suficiência. Inteligência dos arts. 392, inciso II, e
370, § 1º, do Código de Processo Penal. Constrangimento ilegal não caracterizado.
Desprovimento do reclamo. 1. Ambas as Turmas que compõem a 3ª Seção deste So-
dalício firmaram a compreensão de que, em se tratando de réu solto, é suficiente a
intimação de seu advogado acerca do édito repressivo, procedimento que garante a
observância dos princípios da ampla defesa e do contraditório. Precedentes. 2. Na hi-
pótese dos autos, a recorrente, devidamente citada, compareceu ao interrogatório ju-
dicial e respondeu ao processo solta, tendo sido expedido mandado de intimação da
sentença condenatória para o endereço por ela declinado nos autos, no qual não foi
encontrada, uma vez que teria se mudado para fora do país há cerca de 3 (três) anos,
sem a prévia comunicação ao Juízo. 3. O advogado contratado pela acusada para
patrociná-la foi devidamente cientificado da prolação do édito repressivo por meio
de publicação no Diário de Justiça, nos termos do art. 370, § 1º, do Código de Proces-
so Penal, revelando-se descabida a pretensão de realização de diligências para que
fosse pessoalmente intimado, pois a notificação dos profissionais da advocacia é feita
por meio da imprensa oficial, e não por mandado. 4. O só fato de o patrono contrata-
do pela acusada não haver apelado do édito repressivo não caracteriza cerceamento
de defesa, pois, como é cediço, os recursos caracterizam-se pela voluntariedade, não
havendo como se impor a sua interposição pela parte. 5. Recurso improvido.” (STJ –
Rec-HC 44.840 – (2014/0017245-6) – 5ª T. – Rel. Min. Jorge Mussi – DJe 14.08.2014)

Crime de responsabilidade
de prefeito municipal

30974 – “Habeas corpus. Crime de responsabilidade de prefeito municipal, dispensa


indevida e fraude à licitação. Prisão preventiva. Garantia da instrução criminal. Amea-
ças a testemunhas. Elemento que não persiste. Declaração de testemunha dando
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

conta da ausência de ameaças. Ausência de notícia sobre intimidação. Garantia da


ordem pública. Rejeição de denúncia que imputou ao paciente o crime de favore-
cimento à prostituição. Medida cautelar de proibição de contato do paciente com
integrantes da anterior e atual administração do Município que se mostra suficiente.
Insubsistência dos motivos que ensejaram a decretação da custódia evidenciada. Li-
minar deferida em 23.11.2012. Ausência de superveniência de elementos concretos
que justificassem o restabelecimento da segregação cautelar. Necessidade de confir-
mação da medida de urgência. Corréu em favor de quem se estenderam os efeitos da
medida liminar. Necessidade de confirmação, também, da extensão dos efeitos da
decisão concessiva. 1. Evidenciada a insubsistência dos motivos que ensejaram a de-
cretação da prisão preventiva, esta deve ser revogada, porquanto é patente a coação
ilegal à liberdade de locomoção. Precedente. 2. No caso, além de existir declaração
de testemunha dando conta da inexistência de ameaças por parte do paciente e dos
demais acusados, não há notícias de intimidação de testemunhas no transcurso da
ação penal, situação que evidencia a ausência de elemento que justifique a neces-
sidade da prisão para garantia da instrução criminal. 3. Além de a denúncia pelo
crime de favorecimento à prostituição proposta contra o paciente ter sido rejeitada,
observa-se que a proibição de contato do acusado com os anteriores e atuais compo-
nentes da Administração do município se mostra suficiente para obstar a reiteração
delitiva, até porque atualmente ele não ocupa mais o cargo de Prefeito Municipal.
4. A prisão preventiva é a ultima ratio, que só pode ser aplicada se não houver medida
cautelar alternativa que possibilite o alcance do mesmo objetivo visado com a prisão.
Precedente. 5. Verificado das informações prestadas pelo Juízo de primeiro grau que
o paciente e os corréus se encontram em liberdade desde 10.12.2012, em razão de
liminar deferida neste writ, inexistindo notícia de fundamento novo que justifique o
restabelecimento da segregação cautelar, deve ser confirmada a liminar anteriormen-
te deferida. 6. Observada a existência de corréus em situação idêntica, em favor de
quem se estenderam os efeitos da medida de urgência, devem em favor deles tam-
bém ser estendidos os efeitos da presente decisão, nos termos do art. 580 do Código
de Processo Penal. 7. Ordem concedida para revogar a prisão preventiva imposta ao
paciente, mediante a aplicação de medida cautelar diversa da prisão, consistente na
proibição de manter contato com integrantes da anterior e da atual Administração do
Município de Vitória do Xingu/PA, sem prejuízo da decretação de outras medidas
cautelares pelo Magistrado singular, fundamentadamente, com extensão dos efeitos
aos corréus, que deverão permanecer afastados dos cargos públicos anteriormente
ocupados e proibidos de manter contato com integrantes da anterior e da atual Admi-
nistração do referido Município.” (STJ – HC 260.170 – (2012/0249209-7) – 6ª T. – Rel.
Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 04.08.2014)

30975 – “Recurso ordinário em habeas corpus. Crimes de responsabilidade de prefeito


(art. 1º, incisos V e VII, do Decreto-Lei nº 201/1967). Bis in idem. Condenação anterior.
Inexistência de identidade entre os feitos. Crimes que ocorreram em épocas diversas
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

e envolveram corréus distintos. Impossibilidade de verificação da ocorrência da con-


tinuidade delitiva. Matéria a ser apreciada pelo magistrado de origem ou pelo Juízo
da Execução. Constrangimento ilegal não evidenciado. 1. Na hipótese dos autos, não
restou evidenciada a ocorrência do alegado bis in idem, tendo em vista que as ações
penais deflagradas em desfavor do recorrente cuidam de fatos delituosos distintos,
praticados, inclusive, com o auxílio de diferentes corréus. 2. A análise da alegada con-
tinuidade delitiva demandaria revolvimento aprofundado dos fatos e provas cons-
tantes das ações penais deflagradas, providência que não é admitida na via estreita
do habeas corpus, consoante vem reiteradamente decidindo esta Corte Superior de
Justiça, sem prejuízo de que a matéria seja levada ao conhecimento do Magistrado
singular ou daquele competente para a execução penal. Precedentes do STJ e do STF.
Inobservância do rito previsto no art. 2º do Decreto-Lei nº 201/1967. Acusado que
não ostentava a qualidade de prefeito municipal quando do oferecimento da denún-
cia. Inaplicabilidade do procedimento especial. Mácula não caracterizada. Desprovi-
mento do reclamo. 1. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça e do Supremo
Tribunal Federal orienta-se no sentido de que o rito previsto no art. 2º do Decreto-Lei
nº 201/1967 somente se aplica aos detentores de mandato eletivo, não se estendendo
àqueles que não mais ostentam a qualidade de prefeito quando do oferecimento da
denúncia. 2. Recurso improvido.” (STJ – Rec-HC 46.726 – (2014/0070612-8) – 5ª T. –
Rel. Min. Jorge Mussi – DJe 14.08.2014)

Estatuto da Criança
e do Adolescente

30976 – “ECA. Ato infracional. Posse de substância entorpecente. Tipicidade e in-


constitucionalidade dos crimes de perigo. Inocorrência. Cabimento da representa-
ção. 1. Deve ser recebida a representação quando o fato descrito constituir crime ou
representação. 2. A posse de droga para consumo pessoal prevista no art. 28 da Lei
nº 11.343/2006 tem a natureza jurídica de crime e sua prática constitui ato infracio-
nal que interessa ao ECA. 3. O critério utilizado pelo art. 1º da LICP, que estabelece
distinção entre crime e contravenção a partir da penalidade prevista, não impede
que lei superveniente estabeleça para determinado tipo penal definido como crime,
penalidade diversa da privação ou restrição da liberdade. 4. Estando descrito na lei
de tóxicos que constitui crime o uso de drogas, embora considerado de menor po-
tencial ofensivo e com previsão de medidas educativas específicas, o simples fato de
ser afastada a aplicação de pena privativa ou restritiva de liberdade, evidentemente
não constitui abolitio criminis. 5. Ao contrário do que possa parecer, a uma primeira
vista, o art. 28 da Lei nº 11.343/2006 não contempla apenas a proteção da saúde do
usuário de drogas, mas a norma penal tem em mira, sobretudo, proteger a própria
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

sociedade, pois o uso de drogas afeta a saúde pública e traz como corolário o estímulo
ao tráfico e a circulação de substâncias entorpecentes, reclamando a prevenção geral.
Recurso provido.” (TJRS – AC 70060522828 – 7ª C.Cív. – Rel. Des. Sérgio Fernando de
Vasconcellos Chaves – J. 30.07.2014)

Estelionato

30977 – “Habeas corpus. Art. 313-A c/c os arts. 29 e 30 e art. 171, § 3º, na forma do
art. 69, todos do Código Penal. Inserção de dados falsos em sistemas informatizados
ou bancos de dados da Administração Pública. Denúncia contra ré que não detém
cargo público. Impossibilidade. Habeas corpus concedido. 1. Restringindo-se a condu-
ta imputada à paciente no fato de que ela, mediante o fornecimento de seus dados
pessoais a servidora do INSS, passou a obter, fraudulentamente, benefício previden-
ciário indevido, resta clara a prática do delito de estelionato (art. 171, § 3º, do Códi-
go Penal). Ainda que a coautora, servidora do INSS, tenha procedido à inserção de
dados falsos em sistema de informações (art. 313-A do Código Penal), a conduta da
paciente, beneficiária do referido benefício, se restringe à obtenção indevida de van-
tagem ilícita mediante fraude. Nessa hipótese, ainda que se admita sua participação
para a consumação do crime contra a Administração Pública, ele não passa de crime-
-meio para a execução do estelionato, não sendo, por isso, punível. 2. Considerando
que o pedido de extinção da punibilidade – fundamentado na aplicação analógica
da Lei nº 11.941/2009, que ‘altera a legislação tributária federal relativa ao parcela-
mento ordinário de débitos tributários’, aos casos de débito previdenciário – não foi
submetido à análise da Corte de origem, evidencia-se a impossibilidade de conhecer
o pleito, sob pena de vedada supressão de instância. 3. Habeas corpus parcialmente
conhecido e, no mais, parcialmente concedido a fim de, reconhecendo a atipicidade
da conduta imputada à paciente, trancar a ação penal pela suposta prática do crime
tipificado no art. 313-A do Código Penal.” (STJ – HC 147.248 – (2009/0178774-4) –
5ª T. – Relª Min. Laurita Vaz – DJe 07.08.2014)

Execução penal

30978 – “Agravo regimental no habeas corpus. Execução penal. Livramento condicio-


nal deferido. Cassação pelo Tribunal Estadual. Determinação de exame criminoló-
gico. Fundamentação adequada. Recurso improvido. 1. O Superior Tribunal de Jus-
tiça possui entendimento pacífico no sentido de que o art. 112 da Lei de Execução
Penal, após a alteração trazida pela Lei nº 10.792/2003, não mais exige a submissão
do apenado ao exame criminológico para a concessão de benefícios. 2. Todavia, o
231
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Juiz da Execução, ou mesmo o Tribunal de Justiça, de forma fundamentada, pode


determinar, diante das peculiaridades do caso, a realização do aludido exame para
a formação do seu convencimento, nos termos da Súmula nº 439/STJ. 3. Na hipótese
em comento, o Tribunal de origem, de forma fundamentada, justificou a necessidade
da realização de exame criminológico, notadamente em função das faltas disciplina-
res de natureza grave cometidas pelo agravante no curso da execução, inexistindo o
aventado constrangimento ilegal. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(STJ – AgRg-HC 292.513 – (2014/0084144-9) – 5ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze
– DJe 15.08.2014)

30979 – “Agravo regimental em habeas corpus. Execução penal. Falta grave. Indefe-
rimento de pedido liminar. Não cabimento do recurso. Decisão agravada mantida
por seus próprios fundamentos. 1. Este Superior Tribunal possui entendimento con-
solidado no sentido de que não é cabível a interposição de agravo regimental contra
decisão de Relator que, fundamentadamente, defere ou indefere pedido de liminar
em habeas corpus. 2. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-HC 276.677 –
(2013/0294929-5) – 6ª T. – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – DJe 04.08.2014)

Inquirição de testemunhas

30980 – “Recurso especial. Processo penal. Inquirição de testemunhas. Inversão. Nu-


lidade relativa. Superveniência da Lei nº 11.719/2008. Nova citação. Descabimento.
Interrogatório por carta precatória. Indeferimento. Concentração dos atos proces­
suais. Arrependimento posterior. Reparação integral do dano. 1. A nova redação
do art. 212 do Código de Processo Penal dada pela Lei nº 11.690/2008 eliminou o
sistema presidencialista permitindo a inquirição das testemunhas diretamente pelas
partes, mas não extinguiu a possibilidade de que o juiz também formule perguntas,
não havendo nulidade qualquer se é oportunizado à defesa perguntar diretamente
às testemunhas, mormente porque eventual inobservância à ordem de inquirição ca-
racteriza vício relativo, devendo ser arguido no momento processual oportuno, com
a demonstração da ocorrência do dano sofrido pela parte, pena de preclusão. 2. Inca-
bível a renovação do ato processual se o réu foi regular e previamente citado para a
audiência marcada antes da entrada em vigor da Lei nº 11.719/2008 que, por se tratar
de norma de natureza procedimental, submete-se ao princípio tempus regit actum,
devendo a lei ser aplicada a partir da sua entrada em vigor, com aproveitamento
dos atos pretéritos. 3. É inviável o recurso especial na parte em que não impugna os
fundamentos do acórdão recorrido. Incidência do Enunciado nº 283/STF. 4. Não há
nulidade decorrente do indeferimento, na audiência de instrução e julgamento, do
pedido de realização do interrogatório por carta precatória se a defesa não justificou
a ausência do réu, que haveria, de qualquer modo, de comparecer à audiência que
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

era destinada não somente ao interrogatório dos réus mas também à oitiva das teste-
munhas, não havendo razão legal para cindir o ato procedimental uno, em obséquio
à regra da concentração dos atos processuais trazida pela Lei nº 11.719/2008. 5. A
causa de diminuição de pena relativa ao art. 16 do Código Penal (arrependimento
posterior) somente tem aplicação se houver a integral reparação do dano ou a resti-
tuição da coisa antes do recebimento da denúncia, variando o índice de redução da
pena em função da maior ou menor celeridade no ressarcimento do prejuízo à vítima.
6. Recurso especial improvido.” (STJ – REsp 1.302.566 – (2012/0019480-4) – 6ª T. – Relª
Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 04.08.2014)

Pena

30981 – “Agravo regimental. Recurso especial. Direito penal. Art. 65, III, d, do CP.
Confissão qualificada. Reconhecimento da atenuante quando de qualquer modo ser-
viu de base para a condenação. Reforma do acórdão a quo. Matéria constitucional.
STF. 1. Este Superior Tribunal considera que a confissão qualificada, isto é, aquela
na qual o agente acrescenta teses defensivas discriminantes ou exculpantes, propicia
– quando de qualquer modo serviu de base à condenação – a aplicação da atenuan-
te prevista na alínea d do inciso III do art. 65 do Código Penal. 2. A superveniente
confirmação de decisum singular de relator pelo órgão colegiado supera eventual vio-
lação do art. 557 do Código de Processo Civil (arts. 3º do CPP e 34, XVIII, do RISTJ).
3. A violação de princípios, dispositivos ou preceitos constitucionais revela-se quaes-
tio afeta à competência do Supremo Tribunal Federal, provocado pela via do extraor-
dinário; motivo pelo qual não se pode conhecer do recurso especial nesse aspecto, em
função do disposto no art. 105, III, da Constituição Federal. 4. O agravo regimental
não merece prosperar, porquanto as razões reunidas na insurgência são incapazes de
infirmar o entendimento assentado na decisão agravada. 5. Agravo regimental im-
provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.446.058 – (2014/0077364-2) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião
Reis Júnior – DJe 04.08.2014)

30982 – “Recurso especial. Penal. Dissenso pretoriano. Similitude fática. Ausência.


Divergência não configurada. Dosimetria. Atenuante. Menoridade. Concurso. Duas
agravantes. Diminuição da pena. Segunda fase. Obrigatoriedade. Inexistência. Veri-
ficação. Caso concreto. Necessidade. 1. Ausente a similitude fática entre as hipóteses
que dão suporte aos acórdãos recorrido e paradigma, não se caracteriza a divergência
jurisprudencial. 2. É cediço que a atenuante da menoridade é preponderante. Entre-
tanto, isso não significa que, em todas as situações em que estiver presente, obrigato-
riamente, deverá haver a atenuação da pena na segunda fase da dosimetria da pena.
3. Na hipótese em que a atenuante da menoridade concorrer com apenas uma agra-
vante, necessariamente deverá haver a diminuição da reprimenda na segunda fase
233
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

da dosimetria ou ao menos a compensação, como no caso da reincidência. Contudo,


quando, além da menoridade, houver duas ou mais agravantes, deverá o julgador
avaliar, a partir das circunstâncias concretas do caso sob análise, se a aludida ate­
nuante tem ou não a força de sobrepujar as agravantes que estão em maior núme-
ro, em atendimento à regra do art. 67 do Código Penal. 4. Na situação concreta, as
instâncias ordinárias, a partir da análise dos elementos dos autos, entenderam que,
no concurso entre a atenuante da menoridade e as agravantes de o crime ter sido
praticado mediante dissimulação e contra crianças, preponderavam as duas últimas,
devendo haver o aumento da reprimenda. Para rever a conclusão, seria necessário
o reexame do acervo fático dos autos, providência inviável em recurso especial, por
força da Súmula nº 7/STJ. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte,
improvido.” (STJ – REsp 1.285.055 – (2011/0240156-9) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião
Reis Júnior – DJe 04.08.2014)

Porte ilegal de arma de fogo

30983 – “Recurso especial. Direito penal e processual penal. Homicídio qualificado.


Porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei nº 10.826/2003). Condenação pelo Tribunal
do Júri, reconhecido o concurso material. Princípio da consunção aplicado pelo Tri-
bunal de origem. Impossibilidade. Ofensa ao princípio da soberania dos veredictos.
Recurso provido. 1. O art. 78, I, do Código de Processo Penal submete à competência
do Júri o julgamento dos crimes conexos, fixando a prevalência do Tribunal Popular
sobre outro órgão da jurisdição comum. 2. O art. 593, III, d, e seu § 3º, do Código de
Ritos, permite a anulação do julgamento pelo Conselho de Sentença se o Tribunal
verificar que a decisão é manifestamente contrária à prova dos autos, submetendo
o réu a novo Júri. A norma não permite a substituição da decisão dos jurados pela
do órgão julgador, para não ferir e morte o princípio da soberania dos veredictos.
3. Impossibilidade de anular a decisão dos jurados que optaram por uma corrente de
interpretação da prova a eles apresentada. 4. O crime de porte ilegal de arma de fogo
(art. 14, caput, da Lei nº 10.826/2003) é um tipo penal alternativo que se classifica
como de mera conduta e de perigo abstrato, o que autoriza o reconhecimento da
autonomia do delito em relação ao homicídio. 5. Recurso especial provido para resta-
belecer o veredicto do Tribunal do Júri.” (STJ – REsp 1.360.248 – (2012/0274015-7) –
5ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 12.08.2014)

Receptação

30984 – “Recurso ordinário em habeas corpus. Processual penal. Receptação, uso de


documento falso e adulteração de sinal identificador de veículo. Prisão preventiva.
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Art. 312 do Código de Processo Penal. Garantia da ordem pública. Reiteração de-
litiva. Motivação idônea. Necessidade de manutenção da prisão preventiva. I – A
prisão cautelar, a teor do art. 5º, inciso LVII, da Constituição da República, é medi-
da excepcional de privação de liberdade, cuja adoção somente é possível quando as
circunstâncias do caso concreto, devidamente fundamentadas no art. 312 do Código
de Processo Penal, demonstrarem sua imprescindibilidade. II – Demonstrados os re-
quisitos necessários para a decretação da prisão processual, de rigor sua manuten-
ção, porquanto a necessidade de garantia da ordem pública encontra-se devidamen-
te fundamentada na periculosidade do recorrente para o meio social, evidenciada
pela reiteração delitiva, haja vista o seu envolvimento em outros crimes patrimoniais
(e-STJ, fl. 28), tendo praticado o delito quando em gozo do benefício da liberdade
provisória, demonstrando fazer da prática de delitos contra o patrimônio o seu meio
de vida. Precedentes. III – Recurso em habeas corpus improvido.” (STJ – Rec-HC 48.339
– (2014/0129482-7) – 5ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 15.08.2014)

Tráfico de drogas

30985 – “Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Descabimento. Tráfico de


drogas. Prisão preventiva. Quantidade e diversidade de entorpecentes apreendidos.
Doze porções de maconha, dezoito de cocaína e seis de crack, totalizando mais de
cinco quilos de entorpecentes. Fundamentação idônea. Excesso de prazo. Tema não
enfrentado pelo Tribunal a quo. Supressão de instância. Habeas corpus não conhecido.
Este Superior Tribunal de Justiça, na esteira do entendimento firmado pelo Supremo
Tribunal Federal, tem amoldado o cabimento do remédio heroico, adotando orienta-
ção no sentido de não mais admitir habeas corpus substitutivo de recurso ordinário/
especial. Contudo, a luz dos princípios constitucionais, sobretudo o do devido pro-
cesso legal e da ampla defesa, tem-se analisado as questões suscitadas na exordial a
fim de se verificar a existência de constrangimento ilegal para, se for o caso, deferir-se
a ordem de ofício. A jurisprudência desta Corte tem proclamado que a prisão cautelar
é medida de caráter excepcional, devendo ser imposta, ou mantida, apenas quando
atendidas, mediante decisão judicial fundamentada (art. 93, IX, da Constituição Fede-
ral), as exigências do art. 312 do Código de Processo Penal. As instâncias ordinárias,
soberanas na análise dos fatos, entenderam que restou demonstrada a periculosida-
de concreta da paciente, tendo o juiz de primeiro grau destacado a variedade e a
grande quantidade de droga apreendida – mais de 4 quilos de maconha e mais de
1 quilo de cocaína e crack –, o que evidencia o elevado risco social da concessão do
direito de responder ao processo em liberdade, recomendando a custódia cautelar
para garantia da ordem pública. A alegação de excesso de prazo não foi debatida ou
sequer levantada perante o Tribunal de origem, o que inviabiliza o conhecimento da
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Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

matéria nesta Corte, vedada a supressão de instância. Ordem não conhecida.” (STJ –
HC 287.945 – (2014/0023490-5) – 6ª T. – Relª Min. Marilza Maynard – DJe 07.08.2014)

Tráfico e associação

30986 – “REC. Recurso especial. Penal e processual penal. Tráfico e associação.


Condenação. Fundamento em provas policiais e judiciais. Nulidade. Inexistência.
Negativa de autoria. Aferição. Inviabilidade. Reexame de matéria fático-probatória.
Súmula nº 7/STJ. Pena-base. Exasperação. Fundamentação parcialmente inidônea.
Causa de aumento. Interestadualidade. Fixação no mínimo. Descabimento. Reinci-
dência. Aumento. Desproporcionalidade. Ilegalidade flagrante. 1. A condenação não
está lastreada apenas nas interceptações telefônicas colhidas na fase investigatória,
mas também em outros elementos de prova, como objetos e drogas apreendidos,
depoimento de um dos policiais em juízo, bem como confissão judicial de alguns
dos corréus. 2. O fato de ter o policial testemunhado judicialmente acerca das in-
vestigações ocorridas na fase inquisitorial, não afasta a aptidão de seu depoimento
para corroborar o conjunto probatório colhido nessa fase, autorizando a condenação.
Além disso a confissão judicial de alguns corréus também subsidiou a formulação
do decreto condenatório. 3. Inexistência de ofensa ao art. 155 do Código de Processo
Penal. 4. O pedido do reconhecimento de que o recorrente não faria parte da organi-
zação criminosa, razão pela qual deveria ser afastada a condenação pela prática do
crime do art. 35 da Lei nº 11.343/2006, bem como afirmado o direito à incidência da
causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da mesma lei, demandaria incursão no
campo fático-probatório, providência vedada em recurso especial, por força da Sú-
mula nº 7/STJ. 5. Especificamente quanto ao crime de tráfico de drogas, em relação
à culpabilidade, houve a demonstração de um maior grau de reprovabilidade social
da conduta, evidenciado pela quantidade de droga apreendida (282,61kg de maco-
nha). 6. Não se trata de punir o acusado por ter um maior grau de instrução formal.
Porém, sem dúvida, no caso de delitos como o tráfico e a associação para o tráfico, é
mais reprovável socialmente a conduta daquele que, mesmo tendo obtido formação
intelectual, que lhe abre maiores oportunidades profissionais, opta por enveredar
pela prática desses delitos. Além disso, em razão do seu maior esclarecimento, tem
ele condições de discernir, de forma mais clara, os malefícios de diversas espécies
causados pelos entorpecentes por ele comercializados. 7. O fato de o recorrente ter-se
utilizado de aparelho celular para a prática criminosa não demonstra maior gravi-
dade na conduta e não autoriza a negativação das circunstâncias do crime. Não se
trata de tecnologia sofisticada, tampouco excepcional, uma vez que é comum a sua
utilização no cometimento desses delitos. 8. As assertivas de que a personalidade do
recorrente é destemida e perigosa, por ter-se envolvido no submundo do crime, bem
como de que, em razão de sua atividade criminosa habitual, seria mau exemplo para
236
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

a sociedade possuem natureza genérica. O fato de não ter comprovado o exercício


da atividade lícita por ele afirmada (motorista) também não autoriza a negativação
dessa circunstância judicial, uma vez que não estaria obrigado a fazê-lo. 9. Na certi-
dão mencionada na sentença para justificar os maus antecedentes, não há nenhuma
menção à existência de condenação, dela constando apenas uma ação penal em curso.
Sendo assim, tem aplicação a Súmula nº 444/STJ. 10. A busca do lucro fácil constitui
elementar do crime de tráfico de drogas, não justificando a exasperação da pena-base.
11. A ofensa à saúde pública, pelos malefícios causados pela droga, também já está
inserida no tipo penal do crime de tráfico, não justificando o aumento da pena-base
pela desvaloração das consequências do crime. 12. Na dosimetria da pena do crime
de tráfico de drogas, o sentenciante desvalorou a conduta social, remetendo-se aos
fundamentos que teriam sido analisados na fixação da pena-base do crime de tráfico
de drogas. Entretanto, essa circunstância judicial não foi considerada como negativa
na análise da referida pena-base. Sendo assim, impõe-se que seja afastado o desvalor
a ela atribuído, por ausência de fundamentação. 13. O fato de o recorrente ter aderido
a uma sociedade criminosa para traficar em larga escala constitui elementar do tipo
penal de associação para o tráfico. 14. A circunstância de que a associação visava ao
tráfico interestadual constitui causa de aumento específica, que foi considerada na
terceira fase da dosimetria. Sendo assim, a sua indevida utilização, também quando
da fixação da pena-base, constitui ilegal bis in idem. 15. A negativação dos motivos do
crime deve ser afastada, pois é evidente que o fato de o recorrente ter-se aliado a um
grupo criminoso para a prática reiterada do comércio clandestino de substância tóxi-
ca constitui elementar do crime de associação para o tráfico. 16. O recorrente atuava
na terceira posição da hierarquia da organização criminosa, sendo o responsável pela
arrecadação de dividendos para o grupo criminoso, o que demonstra uma maior re-
provabilidade social de sua conduta, justificando o desvalor atribuído à culpabilida-
de no crime de associação para o tráfico. 17. O tráfico e a associação não envolveram
apenas duas unidades da Federação, mas três (Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito
Federal), tendo a droga percorrido grande distância e sendo destinada à distribuição
em larga escala. Está justificada a fixação da fração de aumento acima do mínimo
legal de 1/6. 18. A quantidade de droga apreendida não pode ser utilizada na es-
tipulação da fração de aumento decorrente da interestadualidade do crime, pois já
valorada quando da fixação da pena-base, razão pela qual sua utilização também na
terceira fase da dosimetria constituiria indevido bis in idem. 19. Diminuição da fração
de aumento, pelo caráter interestadual dos delitos, que se mostra necessária, mas que
não chega a colocá-la no patamar mínimo legal, aplicando-se o patamar intermedi-
ário de 1/5. 20. Embora não haja frações pré-estabelecidas de aumento em razão da
reincidência, deve este guardar coerência com as circunstâncias do caso concreto, o
que não ocorreu no caso concreto, impondo a redução da exasperação efetivada, em
razão dessa agravante, para a correção da ilegalidade flagrante. 21. Recurso especial
parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido em parte. Habeas corpus concedido
de ofício, para reduzir o aumento decorrente da reincidência. Penas redimensiona-
237
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

das nos termos do voto.” (STJ – REsp 1.370.108 – (2011/0134701-1) – 6ª T. – Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior – DJe 05.08.2014)

Tráfico internacional

30987 – “Agravo regimental no recurso especial. Penal. Tráfico internacional. Quan-


tidade e natureza da droga. Preponderância. Vetores utilizados para a fixação da
pena-base e escolha do redutor do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. Possibilidade.
Bis in idem. Inocorrência. 1. É pacífico no âmbito deste Sodalício o entendimento de
que, no momento da escolha da pena-base, o julgador deve valorar, com preponde-
rância sobre as demais circunstâncias judiciais, a natureza e a quantidade da droga,
nos termos do previsto no art. 42 da Lei nº 11.343/2006. 2. Ademais, o arbitramento
do quantum condenatório levou em consideração também a forma de ocultação do
entorpecente e o fato do recorrente atuar como verdadeiro ‘aliciador de mulas’. 3. A
jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que não há bis in idem na considera-
ção da quantidade e natureza da droga apreendida tanto para agravar a pena-base
quanto para negar redução a maior por aplicação da minorante do art. 33, § 4º, da Lei
de Drogas. Crime impossível. Suposto flagrante preparado. Não indicação do artigo
de lei federal violado. Recurso especial não conhecido no particular. Fundamento
não impugnado. Súmula nº 182 do STJ. Regimental não conhecido no ponto. 1. A
falta de impugnação aos fundamentos da decisão singular agravada atrai a incidência
do Enunciado nº 182 da súmula do STJ. 2. Agravo regimental conhecido em parte e
desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.257.309 – (2011/0116855-3) – 5ª T. – Rel. Min. Jorge
Mussi – DJe 14.08.2014)

Violência contra
militar de serviço

30988 – “Habeas corpus. Violência contra militar de serviço (CPM, art. 158). Tranca-
mento de ação penal. Ausência de justa causa. Improcedência. Salvo conduto. Ine-
xistência de ordem de prisão. Só se tranca a ação penal quando, da narrativa do fato,
se percebe que ele é penalmente atípico ou não existe qualquer elemento indiciário
demonstrativo de autoria, de modo a ser dispensada a instrução criminal. O habeas
corpus não comporta exame aprofundado de prova, sob pena de julgamento antecipa-
do da lide, subtraindo do primeiro grau de jurisdição o conhecimento da demanda,
regularmente instaurada. Informações prestadas pela autoridade judiciária esclare-
cendo que nenhuma ordem de prisão foi expedida contra o paciente. Ordem denega-
da. Decisão por maioria.” (STM – HC 75-61.2014.7.00.0000 – Rel. Min. Lúcio Mário de
Barros Góes – DJe 07.08.2014)
238
Revista Jurídica 442
Jurisprudência Penal
Agosto/2014

Violação de direito autoral

30989 – “Habeas corpus. Processual penal. Agravo regimental. Violação de direito


autoral. Venda de CDs e DVDs ‘piratas’. Pleito de absolvição por ausência de ma-
terialidade. Via eleita inadequada. Reexame de provas. 1. O habeas corpus não é o
meio adequado para postular a absolvição, porque esta não prescinde do reexame
de matéria de prova, o que é vedado nesta via. 2. Agravo regimental improvido.”
(STJ – AgRg-HC 295.493 – (2014/0124798-7) – 5ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro –
DJe 12.08.2014)

239
Í ndice A lfabético e R emissivo C ível e P enal

Doutrina Autor

Lindomar Luiz Della Libera


Civil e Processual Civil
• A Magnitude da Lesão Como Circunstância Autorizadora da
Prisão Preventiva nos Crimes Contra o Sistema Financeiro
Assunto Nacional ......................................................................................... 103
Alienação parental
• Análise Interdisciplinar da Síndrome da Alienação Parental: Acórdão na íntegra
Aspectos Jurídicos e Psicológicos (Alice da Rocha Silveiro)........... 51
Civil, Processual Civil e Comercial
Princípio
• O Princípio Dispositivo no Procedimento de Cognição e de Assunto
Execução (Fernando Rubin)............................................................... 9
Bem de família
Responsabilidade civil
• Agravo regimental em agravo de instrumento – Bem de família
• Responsabilidade Civil por Violação dos Direitos da Perso- – Impenhorabilidade – Necessidade de análise de legislação in-
na­lidade (Mariana Menna Barreto Azambuja).................................. 23 fraconstitucional e nova apreciação do acervo fático-probatório
– Súmula nº 279/STF (STF)........................................................... 125
Segurança Jurídica
• Cláusulas Gerais, Segurança Jurídica e Interpretação Civil- CDC
-Constitucional (Liane Tabarelli Zavascki)........................................ 81 • Civil e processual civil – Apelação civil – Consumidor – Inclusão
irregular de nome de empresa na Serasa – Art. 14 do CDC –
Autor Vícios na prestação de serviço bancário – Indenização por dano
moral – Cabimento – Sentença mantida (TRF 1ª R.)..................... 149
Alice da Rocha Silveiro
Desconsideração da personalidade jurídica
• Análise Interdisciplinar da Síndrome da Alienação Parental:
Aspectos Jurídicos e Psicológicos.................................................... 51 • Processual civil e civil – Desconsideração da personalidade ju-
rídica inversa – Disregard doctrine – Finalidade – Art. 50 do Có-
Fernando Rubin digo Civil – Fraude ou abuso de direito – Esvaziamento do patri-
mônio pessoal – Integralização na pessoa jurídica (TRF 4ª R.)..... 157
• O Princípio Dispositivo no Procedimento de Cognição e de Exe-
cução ................................................................................................. 9 Menor
Liane Tabarelli Zavascki • Civil – Processual civil – Família – Destituição do pátrio poder –
Menor – Família substituta – Caso peculiar – Migração da mãe
• Cláusulas Gerais, Segurança Jurídica e Interpretação Civil-
para o sul do Brasil em busca de melhores condições – Maus-tra-
-Constitucional ................................................................................. 81
tos e situação de risco – Confirmação – Pretensão de atribuição
Mariana Menna Barreto Azambuja da guarda à avó materna – Inexistência de vínculo com a família
estendida (avós, tios e primos) – Adoção concluída – Prevalên-
• Responsabilidade Civil por Violação dos Direitos da Perso- cia do interesse do menor – Estabilidade na criação e formação
na­lidade............................................................................................ 23 – Necessidade – Recurso especial desprovido (STJ).................... 133

Penal e Processual Penal


Penal, Processual Penal
Assunto
Assunto
Crime contra o sistema financeiro nacional
• A Magnitude da Lesão Como Circunstância Autorizadora da Extração ilegal de recursos minerais
Prisão Preventiva nos Crimes Contra o Sistema Financeiro • Penal – Apelação – Extração ilegal de recursos minerais – Au-
Nacional (Lindomar Luiz Della Libera)............................................ 103 toria e materialidade comprovadas – Crime formal – Dosimetria

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Revista Jurídica 442
Índice Cível e Penal
Agosto/2014

correta – Lei nº 9.605/1998 – Lei nº 8.176/1991 (TRF 2ª R.) Agravo regimento no Superior Tribunal de Justiça – Inter-
........................................................................................................ 215 posição exclusivamente por via eletrônica – aplicação do
art. 10, XVIII, c/c o art. 23 da Resolução nº 14/2013 do STJ
Peculato
• Agravo regimental nos embargos de divergência em recur-
• Pedido de extensão em Habeas corpus – Peculato (art. 312 do so especial. Interposição do recurso via fax. Falta de juntada
Código Penal) – Renúncia dos advogados responsáveis pela do original. Recusa de petição física. Resolução nº 14/2013
defesa do paciente – Ausência de comprovação de que o acu- do STJ................................................................................ 33500, 169
sado foi devidamente cientificado do fato – Falta de intimação
para constituir novo defensor – Trânsito em julgado da condena- Agravo retido – Apreciação como preliminar de apelação –
ção – Prejuízo comprovado – Constrangimento ilegal existente – Legalidade
Identidade de situações processuais – Extensão deferida (STJ)
........................................................................................................ 199 • Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso es-
pecial. Apreciação de todas as questões relevantes da lide pelo
Tráfico internacional de pessoa Tribunal de origem. Ausência de afronta ao art. 535 do CPC.
Agravo retido. Apreciação como preliminar. Art. 523 do CPC.
• Recurso ordinário em habeas corpus – Quadrilha e tráfico in-
Decisão mantida................................................................. 33501, 170
ternacional de pessoa para fim de exploração sexual (arts. 288
e 231, § 3º, do Código Penal) – Sentença condenatória – In- Assistência judiciária gratuita – Deferimento – Efeitos ex
timação – Não localização no endereço fornecido nos autos nunc – Jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de
– Edital – Notícia de mudança para o exterior sem a prévia co-
Justiça
municação do juízo – Édito repressivo publicado na imprensa
oficial – suficiência – Inteligência dos arts. 392, inciso II, e 370, • Embargos de declaração recebidos como agravo regimental
§ 1º, do Código de Processo Penal – Constrangimento ilegal no recurso especial. Omissão, contradição, erro material ou
não caracterizado – Desprovimento do reclamo (STJ).................. 205 obscuridade. Inexistência. Processual civil. Gratuidade de jus-
tiça. Efeitos da concessão. Ex nunc................................... 33502, 171

Bem – Imóvel voluntariamente oferecido em hipo-


de família
Ementário teca – Legalidade da penhora – Incidência do art. 3º, v, da
Lei nº 8.009/1990
Civil, Processual Civil e Comercial • Agravo regimental no agravo em recurso especial. Bem de famí-
lia. Impenhorabilidade. Exceção. Art. 3º, V, da Lei nº 8.009/1990.
Assunto Matéria constitucional. Impossibilidade. Agravo regimental a
que se nega provimento..................................................... 33503, 171
Ação de obrigação de fazer – Fornecimento de medicamen-
to – Solidariedade entre entres da federação – Medida de Consumidor – Atraso de voo – permanência do passageiro
urgência – Art. 273 do Código de Processo Civil – Não incidência da
por duas horas no interior da aeronave

• Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer. Fornecimen- Convenção de Montreal – Dano moral caracterizado
to de medicamento. Solidariedade entre os entes da federação. • Apelação cível. Transporte. Transporte de pessoas. Ação de
Preliminares rejeitadas. Presentes os requisitos autorizadores indenização por dano moral. Pouso de emergência. Atraso de
da medida de urgência. Art. 273 do CPC........................... 33497, 167 voo. Convenção de Montreal. Força maior. Dano moral.... 33504, 172

Ação de reintegração de posse – Comodato verbal – noti- Consumidor – Cobrança indevida – Não configuração de da-
ficação para desocupação – Permanência injusta – Esbulho nos morais – Episódio próprio da vida cotidiana
possessório • Apelação cível. Ação de indenização por danos morais. Res-
• Ação de reintegração de posse. Imóvel de propriedade da auto- ponsabilidade civil. Não configuração de abalo a honra ou a
ra cedido ao réu (irmão da autora) a título de comodato verbal. moral. Problema resolvido após o fechamento do caixa do
Notificação para desocupação do bem. Permanência injusta estabelecimento. Constatação do equívoco ao cobrar valor
do réu na posse do imóvel após expirar-se o prazo para deso- duas vezes. Caracterização de mero aborrecimento. Episódio
cupação, a caracterizar o esbulho possessório. Requisitos do próprio da vida cotidiana. Decisão reformada. Recurso conheci-
art. 927 do CPC e art. 1.210 do CC preenchidos autorizando a do e provido, à unanimidade.............................................. 33505, 172
reintegração da autora na posse do imóvel. Sentença mantida.
Recurso negado................................................................. 33498, 168 Consumidor – Contrato de transporte aéreo – Atraso su-
perior a 37 horas – Dano moral caracterizado – Indenização
Adoção – Inexistência de vínculos com a família estendida fixada em R$ 10.000,00 para cada autor
– Prevalência do interesse do menor – Estabilidade na sua • Apelação cível e recurso adesivo. Contrato de transporte aé-
criação e formação reo. Companhias parceiras. Ilegitimidade passiva. Relação
• Civil. Processual civil. Família. Destituição do pátrio poder. Me- de consumo. Atraso de 37 horas até atingirem os autores
nor. Família substituta. Caso peculiar. Migração da mãe para o destino final...................................................................... 33506, 173
o sul do Brasil em busca de melhores condições. Maus-tratos
Contrato de investimento – Direito de ajuizamento da ação
e situação de risco. Confirmação. Pretensão de atribuição da
contra instituição financeira para postulação de diferenças
guarda à avó materna. Inexistência de vínculo com a família es-
nas aplicações
tendida (avós, tios e primos). Adoção concluída. Prevalência do
interesse do menor. Estabilidade na criação e formação. Neces- • Processual civil. Agravo regimental. Recurso especial funda-
sidade................................................................................. 33499, 168 mentado, apenas, na alínea c do permissivo constitucional.

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Revista Jurídica 442
Índice Cível e Penal
Agosto/2014

Ação ordinária proposta por corretora de valores mobiliá- categorias A/B. Veículo conduzido que exigia habilitação na
rios. Importâncias pertencentes a clientes. Direito de ajuizar categoria D. Irrelevância. Irregularidade que, isoladamente,
ação contra a instituição financeira para postular diferenças representa apenas infração administrativa. Circunstância não
nas aplicações. Contrato de investimento celebrado entre a determinante para a ocorrência do acidente. Condições adver-
corretora e o banco réu. Dissídio comprovado. Indicação de sas da pista e meteorológicas que foram determinantes para
dispositivo legal. Não incidência dos Enunciados nº 284 da o sinistro. Inexistência de nexo causal entre a inabilitação e
Súmula do STF e nº 7 da Súmula do STJ. Art. 557, § 1º-A, do o acidente. Ausência de agravamento do risco pelo condutor.
CPC corretamente aplicado................................................ 33507, 174 Sentença mantida. Recurso desprovido..............................33511, 177

Contrato de mútuo – Ação revisional – Tutela antecipada Danos morais – Saques indevidos de conta bancária – Res-
parcialmente deferida para autorizar depósito judicial do ponsabilidade civil caracterizada – Indenização fixada em
incontroverso – Mora caracterizada R$ 20.000,00
• Agravo regimental em agravo (art. 544 do CPC). Ação revisional • Apelação cível. Ação de indenização por danos morais. Prática
de contrato de mútuo. Pedido de tutela antecipada deferido em de ato ilícito. Realização de saques indevidos da conta bancá-
parte, apenas no tocante ao depósito de valores que entende ria do apelado por ação ou omissão do banco apelante. Banco
devidos, com a declaração de que inviável o afastamento da recorrente não realizou qualquer procedimento interno para
mora, pois as teses levantadas não se fundam na aparência apurar o ato ilícito. Apelado colacionou aos autos o inquérito
do bom direito, visto que têm sido invariavelmente rechaçadas policial onde a autoridade responsável indiciou o funcionário do
pelas Cortes Superiores. Impossibilidade de exame dos requisi- Banco Ubiraci da Costa, afirmando que não restou dúvidas a
tos autorizadores, mormente porque o simples ajuizamento de partir das imagens que os saques foram efetivados pelo indi-
ação revisional não constitui, por si só, fundamento suficiente ciado. Se espera das instituições financeiras é o cuidado ne-
para descaracterizar a mora............................................... 33508, 175 cessário para verificação da autenticidade dos documentos que
lhe são apresentados, em face do risco que é inerente à sua
Contrato de mútuo – Juros moratórios – Taxa média de mer-
atividade. Alegação do recorrente...................................... 33512, 177
cado

• Agravo regimental no recurso especial. Bancário. Ação revisio- Direito de visita – Exame toxicológico – Habeas corpus –
nal. Juros remuneratórios. Ausência de indicação da taxa. Mé- Ordem denegada
dia do mercado. Agravo regimental desprovido. 1. A jurisprudên-
• Habeas corpus. Direito de família. Prova pericial. Exame toxi-
cia do STJ firmou-se no sentido de que na impossibilidade de se
aferir a taxa de juros acordada, seja pela própria falta de pactua- cológico. Direito de visita. Inadequação da via eleita. Ordem
ção ou pela ausência de juntada do contrato aos autos, os juros denegada. 1. A determinação de que o paciente se submeta a
remuneratórios são devidos à taxa média de mercado para ope- exame toxicológico para que seja viável a decisão acerca da
rações da mesma espécie, divulgada pelo Banco Central do Bra- visitação das filhas menores não caracteriza constrangimento
sil (AgRg-Ag 1.085.542/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso da sua liberdade de ir e vir, tão pouco, ilegalidade ou abuso
Sanseverino, DJe 21.09.2011; AgRg-Ag 1.020.140/RS, 4ª Tur- de poder passível de exame em habeas corpus. 2. Ordem de-
ma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 09.11.2009) 2. Agravo negada................................................................................ 33513, 178
regimental a que se nega provimento................................ 33509, 175
Direito societário – Pedido de exclusão do quadro societário
Contrato de transporte aéreo – Extravio de bagagem – Dano – Antecipação de tutela – Exegese do art. 273, CPC – Não
in re ipsa – Indenização fixada em R$ 5.000,00 caracterização da urgência – Tutela indeferida

• Apelação cível. Contrato de transporte aéreo internacional. Ex- • Processual civil. Agravo de instrumento. Indeferimento de
travio temporário de bagagem. Danos materiais. Danos morais. tutela antecipada para que a agravada fosse excluída do
Dano in re ipsa. Valor da indenização. A questão do extravio quadro societário de empresa. É cediço que a concessão da
(embora temporário) da bagagem do autor não é controvertida, antecipação dos efeitos da tutela, como medida excepcional
cumprindo serem examinados os desdobramentos do fato na que é, depende da verificação pelo magistrado dos requisitos
esfera do direito à reparação. Esta Câmara tem entendimen- elencados no art. 273 do CPC............................................ 33514, 179
to consolidado no sentido de que os extravios de bagagem,
mesmo aqueles temporários, dão causa ao dano moral puro Exceção de pré-executividade – Extinção da execução –
e, destarte, merecem ser indenizados. No caso concreto, Cabimento de apelação – interposição errônea de agravo –
tratou-se de viagem de férias para Europa, tendo o apelado Ausência de dúvida objetiva – Não aplicação do princípio da
restado desprovido de seus pertences durante todo o período fungibilidade
da viagem, pois a mala foi devolvida um mês após o extravio.
Danos materiais.................................................................. 33510, 176 • Processual civil. Embargos de divergência. Exceção de pré-exe-
cutividade. Extinção da execução. Interposição de agravo de
Danos causados em acidente de veículo – Negativa de pa- instrumento. Princípio da fungibilidade recursal. Ausência de dú-
gamento da indenização por agravamento do risco pelo se- vida objetiva. Inaplicabilidade. Aplicação da Súmula nº 168/STJ.
gurado – Inexistência de nexo entre inabilitação e acidente Agravo regimental desprovido............................................ 33515, 180
– Indenização devida
Exoneração de pensão alimentícia – Interpretação do
• Civil e consumidor. Ação de cobrança de seguro por danos cau-
art. 1.635 do Código Civil – Maioridade dos filhos e atividade
sados em acidente de veículo. Veículo segurado envolvido em
laborativa
acidente automobilístico. Perda total do automóvel. Negativa de
pagamento da indenização securitária em virtude do agrava- • Exoneração de pensão alimentícia. Tutela antecipada visando
mento do risco por parte do segurado. Veículo conduzido sem à exoneração da obrigação alimentar devida aos filhos maiores.
carteira de habilitação específica. Condutor habilitado para as Admissibilidade. Embora a aquisição da maioridade civil, por si

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Revista Jurídica 442
Índice Cível e Penal
Agosto/2014

só, não constitua causa para a exoneração liminar do encargo, Processo civil – Citação de pessoa jurídica teoria da aparên-
convenha-se, os réus, aos 25 e 23 anos de idade, já não mais cia – Validade do ato
necessitam do encargo (já que comprovadamente exercem ati-
• Embargos de declaração recebidos como agravo regimental.
vidade laborativa, o primeiro, funcionário do IBGE e o segundo,
Agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos
sócio de empresa). Presentes os requisitos do art. 273 do CPC.
morais. Validade da citação. Endereço. Súmula nº 7/STJ. 1. O
Decisão reformada. Recurso provido................................. 33516, 181
Tribunal de origem, com fundamento no conjunto fático-proba-
tório dos autos, concluiu que a citação foi efetivada na sede
Homologação de acordo – Extinção do processo com reso- da empresa, em endereço que corresponde ao mencionado
lução de mérito – cabimento de apelação – Interposição de no contrato social. O acolhimento das razões de recurso, na
agravo – Erro grosseiro forma pretendida, demandaria o reexame de matéria fática, ve-
• Agravo regimental no agravo em recurso especial. Agravo dado pela Súmula nº 7 do STJ. 2. Agravo regimental a que se
de instrumento. Recurso incabível. Decisão de extinção do nega provimento................................................................. 33523, 184
processo com julgamento de mérito. Recurso manifestamen-
te incabível. Aplicação de multa pelo Relator. Possibilidade. Processo civil – Exceção de suspeição de perito – Assistên-
Recurso não provido........................................................... 33517, 181 cia simples admitida – Interpretação do art. 139, CPC

• Recurso especial. Processual civil. Exceção de suspeição de


Liminar em mandado de segurança – Concurso público – Res- perito. Assistência simples admitida na exceção. Prazo em do-
trição editalícia – Tatuagem – Ilegalidade bro do art. 191 do CPC. Inaplicabilidade. Violação ao art. 538 do
• Agravo de instrumento. Liminar em mandado de segurança. CPC. Inocorrência. Contrariedade ao art. 463 do CPC. Deficiên-
Concurso público. Polícia Militar. Avaliação antropométrica. Res- cia na fundamentação (Súmula nº 284/STF). Dissídio jurispru-
trição editalícia. Tatuagem. Ausência de previsão legal..... 33518, 182 dencial não demonstrado. Recurso desprovido................. 33524, 185

Liquidação de sentença – Impossibilidade de rediscussão da Prova pericial – Indeferimento – Revisão em sede de recurso
condenação – Interpretação do art. 475-G, CPC especial – Inviabilidade – Súmula nº 7/STJ

• Agravo regimental no recurso especial. Liquidação de sentença. • Agravo regimental em agravo em recurso especial. Ação de
Sentença liquidanda que determinou o pagamento de indeniza- cobrança. Controvérsia quanto à comprovação de entrega de
ção pela “perda de renda e eventuais despesas” decorrentes de mercadorias. Perícia. Indeferimento de produção de prova. Cer-
rescisão imotivada de contrato. Laudo pericial que interpretou ceamento de defesa. Não ocorrência. Revisão dos fatos e pro-
corretamente a sentença. Decisão que negou seguimento a re- vas dos autos. Súmula nº 7/STJ. Violação ao art. 535 do CPC.
curso especial. Insurgência da executada.......................... 33519, 182 Não ocorrência................................................................... 33525, 186

Petição inicial – Ausência de juntada de documentos essen-


Recuperação judicial – Plano – Homologação – Impossibili-
dade de devolução de valores aos credores – Necessidade
ciais à propositura da ação – Indeferimento da inicial – Extin-
de habilitação
ção sem resolução de mérito

• Direito processual civil. Documentos essenciais à propositura da • Agravo de instrumento. Tutela antecipada. Homologado plano de
ação. Juntada posterior. Impossibilidade. Extinção do processo recuperação judicial. Impossibilidade de devolução de valores.
sem resolução de mérito. 1. É admitida a juntada de documentos Arts. 7º e 9º da Lei nº 11.101/2005. 1. Tendo sido homologado
novos após a petição inicial e a contestação desde que: (i) não se por sentença o plano de recuperação é impossível a concessão
trate de documento indispensável à propositura da ação; (ii) não da antecipação de tutela para devolução de valores, pois devem
haja má-fé na ocultação do documento; (iii) seja ouvida a parte os credores se habilitarem na recuperação judicial, na forma
contrária (art. 398 do CPC). Precedentes.......................... 33520, 183 dos arts. 7º e 9º da Lei nº 11.101/2005. 2. Agravo conhecido e
provido para cassar a decisão recorrida............................. 33526, 187
Plano de saúde – Estatuto do idoso – Reajustes em função
Recurso especial – Análise de mérito em sede de juízo de ad-
da mudança de faixa etária – Abusividade – Repetição do in-
missibilidade – Súmula nº 123/STJ – Legalidade
débito
• Processual civil. Decisão agravada não atacada. Súmula
• Ação de revisão contratual com repetição de indébito. Plano de
nº 182/STJ. Análise de mérito em sede de juízo de admissibi-
saúde. Cláusulas prevendo reajustes em função da mudança
lidade. Possibilidade. Súmula nº 123/STJ. Agravo não conhe-
de faixa etária. Abusividade nos percentuais. Ausência de equi-
cido..................................................................................... 33527, 187
dade contratual. Não comprovação de uso correspondente à
contraprestação exigida. Vedação de discriminação do idoso Recurso especial – Ausência de comprovação da assistência
pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade. judiciária gratuita – Deserção
Disposições nulas de pleno direito (art. 51, IV, do CDC, e art. 15,
§ 3º, do Estatuto do Idoso)................................................. 33521, 184 • Processual civil. Embargos de declaração no agravo de ins-
trumento. Recebimento como agravo regimental. Deserção.
Assistência judiciária gratuita. Ausência de comprovação. De-
Plano de saúde – Recusa indevida de fornecimento de prótese
cisão mantida. 1. A ausência de comprovação do recolhimento
necessária ao sucesso do tratamento médico – Dano moral
das custas ou do deferimento do benefício da justiça gratuita
caracterizado
no ato da interposição do recurso especial implica sua deser-
• Recurso especial. Plano de saúde. Negativa de cobertura integral. ção. Aplicável, por analogia, a Súmula nº 187/STJ. 2. Embar-
Prótese necessária ao sucesso do tratamento médico. Danos gos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual
morais. Cabimento. Matéria pacificada.............................. 33522, 184 se nega provimento............................................................ 33528, 187

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Revista Jurídica 442
Índice Cível e Penal
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Recurso especial – Interposição por advogado sem procu- causado ao autor. Valor. Fixação dentro do Princípio da Razoa-
ração nos autos – Incidência da Súmula nº 115/STJ – Não bilidade. Apelação do autor................................................ 33534, 193
conhecimento
Responsabilidade civil dos servidores – Remoção de perfis
• Processual civil. Agravo regimental em recurso especial de falsos em sites de relacionamento – Dever de fornecimento
apelação em embargos do devedor em execução fiscal. Au-
do endereço de IP
sência de procuração do advogado subscritor do recurso. Não
conhecimento. Súmula nº 115/STJ. 1. “Na instância especial é • Agravo de instrumento. Obrigação de remover perfis falsos
inexistente recurso interposto por advogado sem procuração de sites de relacionamentos. Agravada que não informou as
nos autos” (Súmula nº 115/STJ.......................................... 33529, 190 URLs das páginas, mas apenas os nomes que lhes foram
atribuídos. Impossibilidade de cumprimento da obrigação.
Recurso especial – Revisão do dano moral fixado – Excepcio- Necessidade de saber o endereço virtual específico para sua
nalidade – Incidência da Súmula nº 7/STJ
perfeita identificação. Obrigação de fornecer os endereços IP
dos criadores dos perfis mantida. Dever de armazenamento
• Agravo regimental no agravo em recurso especial. Responsa- de tais dados já reconhecido pelo eg. STJ. Multa cominató-
bilidade civil. Cartão de crédito. Inscrição indevida em cadastro ria adequada para a hipótese, que não comporta redução.
de inadimplentes. Dano moral. Reexame do suporte fático- Recurso parcialmente provido............................................ 33535, 193
-probatório dos autos. Súmula nº 7/STJ. 1. Nos termos da ju-
risprudência consolidada nesta Corte, a revisão de indenização Responsabilidade civil – Estatuto do idoso – Negativa de
por danos morais só é possível em recurso especial quando o atendimento por caixa preferencial – Dano moral caracte-
valor fixado nas instâncias locais for exorbitante ou ínfimo, de rizado
modo a afrontar os princípios da razoabilidade e da proporcio-
nalidade. Ausentes tais hipóteses, incide a Súmula nº 7/STJ, a • Apelação cível. Ação de indenização por dano moral. Negado
impedir o conhecimento do recurso. 2. Agravo regimental não atendimento a parte autora para o caixa preferencial. Compro-
provido, com aplicação de multa........................................ 33530, 191 vação que o apelado possui mais de 60 anos. Permaneceu na
fila por mais de 06 (seis) horas. Lei Estadual nº 7.255. Con-
denação a importância de R$ 30.000,00 a título de danos mo-
Regulação de visitas dos avós – Relevância do estudo psicos-
rais. Valor atribuído na sentença superior ao pedido na inicial
social – Proteção do menor
impossibilidade. Julgador não pode ultrapassar o valor indicado
• Recurso especial. Família. Menor. Regulamentação de visitas. pelo autor em evidente julgamento extra petita. Dano moral
Acompanhamento por psicóloga particular. Matéria preclusa. Sú- deve ser minorado para valor sugerido na inicial, qual seja
mula nº 283/STJ. Realização de estudo psicossocial. Proteção R$ 8.175,00. Recurso conhecido e parcialmente provido tão so-
da menor. Direito à convivência familiar. Recurso desprovido. mente para minorar o quantum indenizatório de R$ 30.000,00
1. A Corte local entendeu estar a questão do acompanhamento para R$ 8.175,00, à unanimidade...................................... 33536, 194
das visitas por psicóloga particular preclusa, sendo o recurso
intempestivo no ponto. Contra esse fundamento não se insurgiu Responsabilidade civil – Morte do filho – Presunção de de-
a recorrente, o que atrai a incidência da Súmula nº 283/STJ pendência econômica do pai – Pensionamento devido
............................................................................................ 33531, 191
• Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Ação de inde-
nização. Queda de composição ferroviária. Vítima fatal. Alega-
Repetição – Devolução de taxa de sobre-estadia
de indébito
ção de culpa exclusiva da vítima. Reexame de prova. Súmula
de contêineres (demurrage) – Prazo prescricional quinquenal nº 7/STJ. Dano material. Presunção de dependência econômica
• Direito comercial. Recurso especial. Prescrição. Sobre-estadia dos filhos menores. Desnecessidade de prova do exercício de
de contêineres (demurrage). Revogação do art. 449 do Código atividade laborativa. Família de baixa renda. Súmula nº 83/STJ.
Comercial. Taxa prevista no contrato. Obrigação líquida. Pra- Danos morais. Valor razoável............................................. 33537, 194
zo prescricional quinquenal. Art. 206, § 5º, I, do Código Civil
............................................................................................ 33532, 192 Responsabilidade civil – Transeunte atingido por projétil
disparado com arma de fogo durante tentativa de roubo de

Rescisão contratual – Promessa de compra e venda de bem malotes de dinheiro – Dever de indenizar da casa bancária

imóvel – Inadimplemento contratual – Dano moral excepcio- caracterizado pelo risco de sua atividade

nalmente caracterizado • Recurso especial. Ação de indenização por danos materiais,


• Direito civil e processual civil. Rescisão contratual. Promessa de morais e estéticos promovida por transeunte em face de insti-
compra e venda de imóvel. Art. 40, § 2º, da Lei nº 4.591/1964. tuição financeira e de empresa de segurança, atingido por pro-
Não incidência. Particularidade do caso concreto. Inadimple- jétil disparado com arma de fogo, no momento em que ocorreu
mento contratual. Parcelas pagas. Devolução integral. Dano tentativa de roubo de malotes de dinheiro retirados em frente
moral. Cabimento. Excepcionalidade................................. 33533, 192 à agência bancária, na consecução de operação típica. instân-
cias ordinárias, que, ao final, reconheceram a responsabilidade
Responsabilidade civil – Contratação maliciosa de empréstimo solidária dos demandados. Insurgências, em separado, da insti-
– Dolo do empregador – Dano moral caracterizado tuição financeira e da empresa de segurança. Hipótese em que
• Apelações de ambos os réus e do autor. Assinatura de contrato. se pretende a condenação solidária de instituição financeira e
Empregado convencido pelo empregador, acreditando tratar-se de empresa de segurança pelos danos morais, estéticos e ma-
de abertura de conta salário. Contrato que, na verdade, era teriais impostos ao demandante que foi atingido por projétil de
contratação de empréstimo a ser utilizado pelo empregador. arma de fogo (resultando, ao final, na amputação de sua perna
Declaração de inexistência de relação jurídica e inexigibilidade na parte inferior ao joelho), por ocasião da tentativa de roubo jus-
do débito. Danos morais. Ocorrência. Comprovação per se. tamente no momento em que a casa bancária, no desempenho
Negativação. Correlação entra a conduta dos réus e o dano de suas operações cotidianas, retirou ostensivamente malotes

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Índice Cível e Penal
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de dinheiro, pela porta da frente da agência bancária, em horá- Crime contra a ordem tributária
rio e local de grande circulação de pessoas. Em primeira ins- • Apelação criminal. Crime contra a ordem tributária. Art. 1º, Lei
tância, a ação restou julgada procedente em face de instituição nº 8.137/1990. Supressão de tributos mediante omissão de
financeira, e, extinta, sem julgamento de mérito, em relação à informações à autoridade fazendária. Inépcia da denúncia não
empresa de segurança. Em sede de recurso de apelação, refor- configurada. Presentes os requisitos do art. 41 do Código Penal.
ma parcial da sentença, para reintegrar à lide a empresa de se- Nulidade da citação. Inocorrência. Cerceamento de defesa não
gurança, condenando-a em solidariedade com a casa bancária verificado. Materialidade e autoria demonstradas. Dolo genérico
pelos danos suportados pelo demandante......................... 33538, 195 presente. Dosimetria. Reforma de ofício. Pena de multa. Critério
trifásico. Recursos desprovidos.......................................... 30967, 222
Sentença estrangeira – Condenação pelo juízo arbitral –
Resolução nº 9/STJ – Homologação deferida Crime contra o patrimônio
• Sentença estrangeira contestada. Descumprimento de contrato. • Recurso em habeas corpus. Crime contra o patrimônio. Furto
Condenação pelo juízo arbitral. Nulidade do contrato. Inexistên- qualificado. Alegação de constrangimento ilegal. Pleito pela re-
cia. Discussão sobre o mérito do decisum. Impossibilidade. Fal- vogação da prisão preventiva. Impossibilidade. Circunstâncias
ta de notificação no procedimento arbitral. Não comprovação. autorizadoras presentes. Reiteração delitiva. Pedido para subs-
Requisitos preenchidos. Pedido deferido........................... 33539, 197 tituir a prisão cautelar por medida diversa. Inadequação/insu-
ficiência. Precedentes......................................................... 30968, 224
Usucapião extraordinária – Art. 1.238, CC – Requisitos
• Reconhecimento de usucapião extraordinária. Requisitos. Crime de descaminho
Art. 1.238 do CCB. Reforma. Reexame de provas. Análise • Agravo regimental no recurso especial. Penal e processo penal.
obstada pela Súmula nº 7/STJ. Agravo não provido. 1. Em se Ofensa ao art. 334 do CP. Ocorrência. Descaminho. Insignifi-
tratando de aquisição originária por usucapião extraordinária, cância. Parâmetro. Mínimo legal para a execução fiscal. Art. 20
que, para sua configuração, exige um tempo mais prolongado da Lei nº 10.522/2002. Reiteração delitiva. Soma dos débitos
da posse (no CC, de 1916, 20 anos; no CC, de 2002, 15 anos), consolidados nos últimos cinco anos. § 4º da norma. Agravo
em comparação com as demais modalidades de usucapião, a interno a que se nega provimento...................................... 30969, 224
ela dispensam-se as exigências de justo título e de posse de
boa-fé. 2. A reforma do aresto quanto à comprovação dos re- Crime de desrespeito a superior
quisitos para o reconhecimento da usucapião extraordinária, • Apelação. Crime de desrespeito a superior. Art. 160 do Código
demandaria, necessariamente, o revolvimento do complexo Penal Militar. Provimento ao recurso do Ministério Público Militar,
fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula com a reforma da sentença absolutória. De ofício, declaração da
nº 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido....................... 33540, 197 extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva.
Hipótese em que a prova é firme e suficientemente harmônica
no sentido de que o acusado desrespeitou o seu superior hie-
Penal e Processual Penal
rárquico, valendo-se, para tanto, não só de palavras ofensivas,
como também de gestos desafiadores............................... 30970, 225
Assunto
Crime de extorsão
Crime ambiental
• Recurso ordinário em habeas corpus. Arts. 158, § 3º, 129,
• Agravo regimental em recurso especial. Penal. Crime ambien- § 1º, inciso II, e 288, todos do Código Penal. Alegação de
tal. Princípios do desenvolvimento sustentável e da prevenção. ausência dos requisitos da prisão preventiva. Segregação
Poluição mediante lançamento de dejetos provenientes de cautelar sobejamente fundamentada na necessidade de ga-
suinocultura diretamente no solo em desconformidade com rantia da ordem pública e na periculosidade concreta dos recor-
leis ambientais. Art. 54, § 2º, V, da Lei nº 9.605/1998. Crime rentes. Recurso desprovido................................................ 30971, 225
formal. Potencialidade lesiva de causar danos à saúde humana
evidenciada. Crime configurado. Agravo regimental provido. Crime de falsificação de documento público
Recurso especial improvido............................................... 30964, 221 • Pagamento de salário extrafolha. Fraude trabalhista. Crime de
• Apelação. Crime ambiental. Art. 34, inciso II, da Lei falsificação de documento público. Presume-se a veracidade
nº 9.605/1998. Pesca com petrechos não permitidos. Norma da alegação do demandante no que se refere ao pagamento
penal em branco. Ausência de especificação quanto aos pe- de salário não condizente com o valor registrado em CTPS
trechos, na denúncia. O tipo penal do art. 34, inciso II, da Lei (pagamento de salário extrafolha), quando o empregador
nº 9.605/1998, é norma penal em branco, necessitando de demandado, embora afirme ter pago salário conforme este
diploma legal esclarecendo quais são os petrechos não permi- documento, não comprova as suas alegações (art. 818 da
tidos. Ausência de especificação acerca dos petrechos usados, CLT c/c art. 333, II, do CPC), deixando, injustificadamente, de
na denúncia, que impossibilita a análise sobre a rede apreen- juntar aos autos os recibos de pagamento de salário do perío-
dida com os acusados. Denúncia inepta. Apelação da defesa do contratual (art. 464 da CLT............................................ 30972, 226
provida, para absolver os réus........................................... 30965, 222
Crime de quadrilha e tráfico
Crime contra a dignidade sexual • Recurso ordinário em habeas corpus. Quadrilha e tráfico inter-
• Agravo regimental no recurso especial. Crime contra a dignida- nacional de pessoa para fim de exploração sexual (arts. 288
de sexual. Estupro após a edição da Lei nº 12.015/2009. Tipo e 231, § 3º, do Código Penal). Sentença condenatória. Inti-
misto alternativo. Conduta praticada contra a mesma vítima e mação. Não localização no endereço fornecido nos autos.
no mesmo contexto fático. Reconhecimento de crime único. Edital. Notícia de mudança para o exterior sem a prévia co-
Possibilidade....................................................................... 30966, 222 municação do juízo. Édito repressivo publicado na imprensa

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Índice Cível e Penal
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oficial. Suficiência. Inteligência dos arts. 392, inciso II, e 370, Porte ilegal de arma de fogo
§ 1º, do Código de Processo Penal. Constrangimento ilegal não
• Recurso especial. Direito penal e processual penal. Homi-
caracterizado. Desprovimento do reclamo......................... 30973, 228
cídio qualificado. Porte ilegal de arma de fogo (art. 14 da Lei
Crime de responsabilidade de prefeito municipal nº 10.826/2003). Condenação pelo Tribunal do Júri, reconheci-
do o concurso material. Princípio da consunção aplicado pelo
• Habeas corpus. Crime de responsabilidade de prefeito muni-
Tribunal de origem. Impossibilidade. Ofensa ao princípio da so-
cipal, dispensa indevida e fraude à licitação. Prisão preventi-
berania dos veredictos. Recurso provido........................... 30983, 234
va. Garantia da instrução criminal. Ameaças a testemunhas.
Elemento que não persiste. Declaração de testemunha dando Receptação
conta da ausência de ameaças. Ausência de notícia sobre inti-
midação. Garantia da ordem pública.................................. 30974, 228 • Recurso ordinário em habeas corpus. Processual penal. Re-
• Recurso ordinário em habeas corpus. Crimes de responsa- ceptação, uso de documento falso e adulteração de sinal iden-
bilidade de prefeito (art. 1º, incisos V e VII, do Decreto-Lei nº tificador de veículo. Prisão preventiva. Art. 312 do Código de
201/1967). Bis in idem. Condenação anterior. Inexistência de Processo Penal. Garantia da ordem pública. Reiteração deliti-
identidade entre os feitos. Crimes que ocorreram em épocas di- va. Motivação idônea. Necessidade de manutenção da prisão
versas e envolveram corréus distintos. Impossibilidade de verifi- preventiva........................................................................... 30984, 234
cação da ocorrência da continuidade delitiva. Matéria a ser apre-
ciada pelo magistrado de origem ou pelo Juízo da Execução. Tráfico de drogas
Constrangimento ilegal não evidenciado............................ 30975, 229 • Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Descabimento.
Estatuto da Criança e do Adolescente Tráfico de drogas. Prisão preventiva. Quantidade e diversida-
de de entorpecentes apreendidos. Doze porções de maconha,
• ECA. Ato infracional. Posse de substância entorpecente. Tipi- dezoito de cocaína e seis de crack, totalizando mais de cinco
cidade e inconstitucionalidade dos crimes de perigo. Inocor- quilos de entorpecentes. Fundamentação idônea. Excesso de
rência. Cabimento da representação.................................. 30976, 230 prazo. Tema não enfrentado pelo Tribunal a quo. Supressão de
Estelionato instância. Habeas corpus não conhecido........................... 30985, 235

• Habeas corpus. Art. 313-A c/c os arts. 29 e 30 e art. 171, § 3º, Tráfico e associação
na forma do art. 69, todos do Código Penal. Inserção de dados
falsos em sistemas informatizados ou bancos de dados da Ad- • REC. Recurso especial. Penal e processual penal. Tráfico e asso-
ministração Pública. Denúncia contra ré que não detém cargo ciação. Condenação. Fundamento em provas policiais e judiciais.
público. Impossibilidade. Habeas corpus concedido.......... 30977, 231 Nulidade. Inexistência. Negativa de autoria. Aferição. Inviabili-
dade. Reexame de matéria fático-probatória..................... 30986, 236
Execução penal
Tráfico internacional
• Agravo regimental no habeas corpus. Execução penal. Livra-
mento condicional deferido. Cassação pelo Tribunal Estadual. • Agravo regimental no recurso especial. Penal. Tráfico inter-
Determinação de exame criminológico. Fundamentação ade- nacional. Quantidade e natureza da droga. Preponderância.
quada. Recurso improvido.................................................. 30978, 231 Vetores utilizados para a fixação da pena-base e escolha do
• Agravo regimental em habeas corpus. Execução penal. Falta redutor do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. Possibilidade.
grave. Indeferimento de pedido liminar. Não cabimento do recur- Bis in idem. Inocorrência.................................................... 30987, 238
so. Decisão agravada mantida por seus próprios fundamentos.
1. Este Superior Tribunal possui entendimento consolidado no Violência contra militar de serviço
sentido de que não é cabível a interposição de agravo regi-
mental contra decisão de Relator que, fundamentadamente, • Habeas corpus. Violência contra militar de serviço (CPM,
defere ou indefere pedido de liminar em habeas corpus. 2. Agra- art. 158). Trancamento de ação penal. Ausência de justa causa.
vo regimental não conhecido.............................................. 30979, 232 Improcedência. Salvo conduto. Inexistência de ordem de prisão.
Só se tranca a ação penal quando, da narrativa do fato, se perce-
Inquirição de testemunhas be que ele é penalmente atípico ou não existe qualquer elemen-
• Recurso especial. Processo penal. Inquirição de testemu- to indiciário demonstrativo de autoria, de modo a ser dispensa-
nhas. Inversão. Nulidade relativa. Superveniência da Lei da a instrução criminal. O habeas corpus não comporta exame
nº 11.719/2008. Nova citação. Descabimento. Interrogatório por car- aprofundado de prova, sob pena de julgamento antecipado da
ta precatória. Indeferimento. Concentração dos atos proces­suais. lide, subtraindo do primeiro grau de jurisdição o conhecimento
Arrependimento posterior. Reparação integral do dano...... 30980, 232 da demanda, regularmente instaurada. Informações prestadas
pela autoridade judiciária esclarecendo que nenhuma ordem
Pena de prisão foi expedida contra o paciente. Ordem denegada.
• Agravo regimental. Recurso especial. Direito penal. Art. 65, Decisão por maioria............................................................ 30988, 238
III, d, do CP. Confissão qualificada. Reconhecimento da ate-
nuante quando de qualquer modo serviu de base para a con- Violação de direito autoral
denação. Reforma do acórdão a quo. Matéria constitucional • Habeas corpus. Processual penal. Agravo regimental. Violação
............................................................................................ 30981, 233 de direito autoral. Venda de CDs e DVDs “piratas”. Pleito de ab-
• Recurso especial. Penal. Dissenso pretoriano. Similitude fática. solvição por ausência de materialidade. Via eleita inadequada.
Ausência. Divergência não configurada. Dosimetria. Atenuan- Reexame de provas. 1. O habeas corpus não é o meio adequa-
te. Menoridade. Concurso. Duas agravantes. Diminuição da do para postular a absolvição, porque esta não prescinde do re-
pena. Segunda fase. Obrigatoriedade. Inexistência. Verificação. exame de matéria de prova, o que é vedado nesta via. 2. Agravo
Caso concreto. Necessidade.............................................. 30982, 233 regimental improvido.......................................................... 30989, 239

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