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IVAN CARLOS RUFINO BATISTA

A BUSCA PÓS-MODERNA PELA ESPIRITUALIDADE:


UM TEXTO INTRODUTÓRIO

MANAUS, AMAZONAS,NOVEMBRO DE 2008


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IVAN CARLOS RUFINO BATISTA

A BUSCA PÓS-MODERNA PELA ESPIRITUALIDADE:


UM TEXTO INTRODUTÓRIO

Texto elaborado para servir de base analítica a uma discussão do


florescimento do interesse da pós-modernidade pela espiritualidade
como aspecto essencial e fundamental ao pleno desenvolvimento
do ser humano e os setores da sociedade que ela tem influenciado.

MANAUS, AMAZONAS, NOVEMBRO DE 2008


3

O HOMEM PÓS-MODERNO: UM MÍSTICO, NÃO UM ANIMAL OU UMA MÁQUINA.

Após longos séculos de racionalismo, com a negação da realidade sobrenatural e a


crença no Universo como um sistema fechado, o homem se viu preso a uma solidão cósmica
aterrorizadora e letal, pois ficou sem absolutos por quais determinar o certo e o errado. Diante
disso o homem pós-moderno busca fugir desta solidão procurando resgatar sua espiritualidade
perdida e sufocada, sobretudo pelo materialismo dialético de Karl Marx (1818-1883). De sorte
que o homem pós-moderno não pode mais ser conceituado como animal (caso do darwinismo),
nem como máquina (caso do capitalismo). Hoje as evidências da busca humana pela espiritualidade
apontam para o homem como místico (SCHAEFFER; 1988; p. 26-28). Isto é, como quem não
vive sem o sagrado, mas que dele precisa para se mover.

Essa busca revela duas faces preponderantes à religião. Por um lado, ela milita a favor
da religião em geral, ao trazê-la de volta ao cenário da discussão do desenvolvimento humano.
Mas por outro traz desafios e problemas a setores da mesma. É o caso da religião cristã, pois a
natureza deste misticismo que caracteriza a pós-modernidade é esotérica, e não teológica. E a
espiritualidade na ótica cristã é teológica, mais especificamente trinitária, fundamentando-se e
desdobrando-se a partir do ser de seu Deus-Trindade. Assim sendo, como frisa Horton – um
cristão-evangélico – a busca pós-moderna pela espiritualidade por não ser teológico-trinitária,
mas esotérica, caracteriza-se no desejo humano de “encontrar um deus que não nos surpreenda,
especialmente uma divindade que venha a nós, não como no paraíso para nos julgar pela nossa
rebelião, mas um Deus que seja bastante flexível, afável e amigável – um colega” (1999; p. XVI).

Se por um lado as características do deus buscado pela pós-modernidade (descritas por


Horton) reforçam o caráter amoroso, gracioso e bondoso do Deus cristão, por outro O assaltam
de Sua prerrogativa de juiz soberano e retribuidor da injustiça, maldade e rebelião humana. Ou
seja, a espiritualidade buscada é caracterizada mais pelo desejo de ser servido por um deus
manipulável do que pelo anelo de servir o Deus Vivo com amor; por um anelo de contar com um
mágico de poderes sobrenaturais, como aquele gênio da lâmpada; por um colega que não nos deixe
entrar em enrascadas, ou que nos livre delas sem a necessidade de nos perguntar os porquês de
nelas nos haver metido; muito mais do que pela paixão de relacionamento em comunhão com o
Autor da vida para, por essa comunhão, encontrar o sentido do ser pessoa.

E hoje, a busca pós-moderna pelo sagrado se vê em lugares antes inimagináveis, como


em Universidades públicas, que em função de sua orientação materialista marxista não viam o
sobrenatural como realidade inegável da experiência humana. Agora, porém, não só discutem
a espiritualidade, como a reconhecem ser essencial ao sadio desenvolvimento do homem integral.
4

A realização de eventos místico-esotéricos, por parte de algumas academias, corrobora


inequivocamente o sucumbir de centros intelectuais tupiniquins ante o fascínio religioso que
varre a humanidade pós-moderna. Nítido exemplo vem da Universidade Federal do Amazonas
(UFAM), onde fui acadêmico de Pedagogia entre os anos de 1996-1999 e a vi promover neste
período certa “Feira Esotérica”, onde praticantes de yoga, tarólogos, numerólogos, astrólogos,
cartomantes, espiritualistas, e representantes de outras expressões da religiosidade afro-brasileira e
oriental divulgavam abertamente crenças que ofenderiam professores crentes no absolutismo da
realidade material dialética nos idos anos 1960-1980.1

Hoje, porém, há cátedras do intelectualismo universitário considerando o fenômeno religioso


peculiar aos séculos XX e XXI. Cito dois casos: (1) o do sociólogo Ricardo Mariano, pesquisador
que tomou o neopentecostalismo2 brasileiro para ser tema de sua tese de doutorado (a qual virou
livro3); e (2) o do antropólogo Carlos Tadeu Siepierski, cuja tese de doutorado (que lhe garantiu
o título de Doutor em Antropologia Social pela USP – Universidade de São Paulo) aborda como
objeto de estudo a Igreja Renascer em Cristo (do casal Estevam e Sônia Hernandes) e a presença
evangélica na sociedade brasileira.4

O florescimento contemporâneo mundial da força religiosa, portanto, atesta a peculiaridade


mística que caracteriza não só o homem pós-moderno, mas a própria natureza humana, como friso
mais adiante, e o fracasso do materialismo dialético em querer banir a religião da esfera humana
por considerá-la um atraso à ciência. Portanto, a religião não pode ser ignorada por preconceito
filosófico, como o que lhe é imposto arbitrariamente pelo naturalismo científico. O que cabe é a
análise de seus pressupostos e da de sua viabilidade para construir e sustentar uma civilização. É
o caso do Cristianismo, que não se julga uma religião dentre tantas outras de caráter subjetivo,
mas uma cosmovisão coerente na apresentação e sustentação de seus pressupostos, observável
e comprovável em sua história, e unificada em seu sistema de pensamento.5

1
Na verdade, alguns professores notadamente marxistas faziam resistência à realização desta “Feira Esotérica”,
exatamente por compreender o espaço universitário como inadequado à realização de eventos desta natureza, por
tratar-se de evento de caráter religioso, e não científico.
2
Segmento evangélico classificado por Mariano como pertencente a terceira onda no corte histórico de instauração e
consolidação do pentecostalismo em terras tupiniquins. Segmento nascido na década de 1970 com a Igreja Universal
do Reino de Deus, a IURD, de Macedo; Igreja Internacional da Graça de Deus, de R. R. Soares; Igreja Evangélica
Cristo Vive, de Miguel Ângelo; todas de contexto carioca; e consolidado com a chegada da Renascer em Cristo, do
casal Estevam e Sônia Hernandes; Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo, de Valnice Milhomens; de contexto
paulistano, e com a Igreja Sara Nossa Terra, de Robson Rodovalho, de contexto planaltino, além de uma centena de
outras menores, independentes e sem muita expressão nacional.
3
A saber, a obra “Neopentecostais: Sociologia do Novo Pentecostalismo No Brasil”, das Edições Loyola.
4
A tese de Siepierski, de título “De Bem Com a Vida: o Sagrado Num Mundo em Transformação: Um Estudo Sobre
a Igreja Renascer em Cristo e a Presença Evangélica na Sociedade Brasileira Contemporânea; está disponível
no banco eletrônico de teses da USP: <http://www.teses.usp.br/teses>
5
Mais detalhes disso em “Verdade Absoluta – Libertando o Cristianismo de Seu Cativeiro Cultural” (CPAD; 2006).
5

EVIDÊNCIAS DA BUSCA HUMANA PÓS-MODERNA PELA ESPIRITUALIDADE

A busca pós-moderna pela espiritualidade começou na filosofia e impregnou as artes


plásticas, com os impressionistas. Hoje, é a temática mais abordada nas artes cênicas, quer na
televisão, no teatro, e/ou no cinema; alcançando o mundo das letras, com a literatura; a música e,
evidentemente, a teologia. A seguir, uma breve amostra da busca pós-moderna pela espiritualidade
nestes importantes setores que influenciam a sociedade.

Na televisão, tal busca se vindica na produção de telenovelas e mini-séries. Dentre as


telenovelas estão: “A Viagem”, “Um Anjo Caiu do Céu”, “A Padroeira”, “Mandala”, “Olho
no Olho”, “Estrela Guia”, e “Porto dos Milagres”, veiculadas pela Rede Globo. Já entre as
mini-séries podemos citar: “Incidente em Antares”, “Decadência” (polêmica aos evangélicos)
e a não menos provocativa “Presença de Anita”, todas explorando ora a religiosidade oriental
(reencarnação, karma e ego divino), ora a espírita e afro-brasileira (consulta de mortos, viagens
para fora do corpo, feitiçarias, e experiências físico-erótico-espiritualistas, como no capítulo final
de “Presença de Anita”, levada ao ar pela TV Globo, onde o protagonista e a protagonista da
história mantêm fogosa relação sexual, sendo que a insaciável Anita já havia sido morta pelo
próprio amante antes da sessão de sexo quase explícito que marcou a vingança da ninfeta), e a
corrupção, charlatanismo e escândalos em segmentos neopentecostais (tema de “Decadência”,
estrelada por Edson Celulari, a qual tinha alvo certo: a IURD de Edir Macedo).

No palco de teatros, peças tais como “God’s Favorite” (O Favorito de Deus) de Neil
Simon e “The Only Problem” (O Único Problema) de Muriel Spark, centrando no drama de Jó
seu enredo principal, são produções que apontam, ainda que com tom sarcástico, à questão de
como um Deus amoroso e gracioso pode permitir algo vil como o sofrimento humano, dando
a entender a concepção de uma espiritualidade que não seja espinhosa ao homem como a mais
condigna à natureza de um Deus que é proclamado como amor, misericórdia e graça; além do
musical “Godspell”, de Stephen Schwartz, adaptado no Brasil por Miguel Falabella, que retrata,
segundo termos do próprio Falabella, as palavras de Jesus com humor e talento. 6

Nas telas do cinema, a produção de longas como: “O Exorcista”, “O Sexto Sentido”,


“O Advogado do Diabo”, “Ghost – do Outro Lado da Vida”, “Gasparzinho”, “Polterghist”,
“Harry Potter”, “O Senhor dos Anéis” (produções americanas); “No Alto da Compadecida”,
“Xuxa e os Duendes”, e “Simão: O Fantasma Trapalhão” (produções brasileiras), abordam a
paranormalidade, a possessão demoníaca, a ida e vinda de pessoas ao além, contato imediato

6
Falabella declarou isso em entrevista a Jô Soares no seu talk-show “Programa do Jô”, veiculado pela Rede
Globo. Infelizmente não anotei a data da veiculação da entrevista, mas Falabella realmente disso isso da peça.
6

com os mortos, a existência e influência de gnomos na vida humana, como algo não apenas
sobrenatural, mas, sobretudo, real. Assim, cineastas, dramaturgos, autores, atores, diretores e
produtores não mais se inibem em colocar na tela e no palco a sua fé. É a expressão do anseio
de espiritualidade humana nas artes cênicas. Mel Gibson, estrela de “Máquina Mortífera”, foi
às Escrituras do Novo Testamento, nos Evangelhos, para produzir sua maior obra: “A Paixão
de Cristo”. Gibson, diante das críticas suscitadas por seu filme, não hesitou em afirmar que o
mesmo tinha meta evangelística.

A literatura também tem usado a temática da espiritualidade para garantir lucros. Que
nos digam Mônica Bongfliole, com o seu esoterismo sobre anjos; Lair Ribeiro, com seus livros
de neurolingüística e auto-ajuda; Paulo Coelho, com a sua teoria da unissexualidade de Deus;
Zibia Gasparetto, com o seu espiritualismo mediúnico, entre os tupiniquins não-evangélicos; e o
evangélico norte americano Tim La Haye, com sua badalada série “Left Behind”, publicado no
Brasil pela United Press sob o título “Deixados Para Trás”, que também chegou aos cinemas.

A música é outro segmento artístico que também vem lucrando com a busca humana
pelo sagrado, tanto que o mercado fonográfico gospel é um dos que mais cresce no setor, de
forma que a conversão de certos “pop stars” da música brasileira ao segmento evangélico tem
sido alvo da desconfiança de muitos. Conversões tidas mais como oportunismo ganancioso do
que desejo sincero de amar a Deus, pois se verifica certos “artistas” levando carona na onda de
alta vendagem da fonografia gospel para aumentar a sua conta bancária e alavancar a sua
combalida carreira no mercado secular, mais do que preocupados em viver o Evangelho real.

A teologia, como não poderia deixar de ser, também se vê fortemente influenciada pelo
anseio humano contemporâneo pelo sobrenatural, notadamente o espetacular. Nítida evidência
disso é a proliferação de igrejas pentecostais e neopentecostais pelo Brasil e pelo mundo afora.
Estas, caracterizadas mais por uma espiritualidade esotérica que aquelas, a ponto de Ricardo
Gondim Rodrigues, da Assembléia de Deus Betesda, escrever: “Urge mostrar que é possível
ser pentecostal sem ser esotérico” (2001; p. 02). Este clamor de Gondim (como o autor é mais
conhecido entre os evangélicos) vindica o grande analfabetismo teológico que paira sobre as
igrejas cristãs nestes tempos, o que é facilmente percebido no fato da energização por cristais;
o uso de sal grosso e de folha de arruda para se espantar “mau olhado”; banhos de descarrego,
como terapia cultual; uso de técnicas orientais xamanistas de mentalização e visualização como
sinônimo de fé conquistadora; e de outras práticas esotéricas decididamente não mais serem
exclusividade da quimbanda afro-brasileira, espiritualistas e de adeptos da Nova Era, mas por
se revelarem distintivos evangélicos que autenticam a fé que realiza em muitas igrejas. Aliás,
7

a forte ênfase dada pelo Movimento Pentecostal a experiências místicas, como legitimação de
espiritualidade viva, mereceu dura e severa crítica de conservadores e tradicionais da época, que
acusavam os pentecostais de sofrerem da síndrome de corintianismo: a busca do carismático
fenomenal destituído de caráter.7 Hoje, porém, como pode se ver em Gondim, e se constatar em
Bill Burkett (1999), pentecostais clássicos, (notadamente da Assembléia de Deus) reprovam a
espiritualidade neopentecostal, que se mostrando avessa à exegese bíblica e à Teologia Sistemática,
permite a ignorância doutrinária entre os seus fiéis, abrindo espaço para toda sorte de heresias
e blasfêmias travestidas de pseuda evangelicalidade, as quais sutilmente sufocam a integridade da
Igreja cristã, desfigurando-lhe a identidade neotestamentária.

A efervescência do Movimento de Batalha Espiritual entre evangélicos, por exemplo,


com crença em espíritos territoriais, demonização de estruturas (culturais, sociais, econômicas
e políticas), orações de guerra, maldições hereditárias, aconselhamento ekbalístico e mapeamento
espiritual como doutrinas bíblicas, evidencia inequivocamente o sucumbir da teologia de algumas
igrejas ao neognosticismo pagão que vem, vai e insiste voltar à agenda cristã, influenciando a
prática da espiritualidade das igrejas, desfigurando-as. Na verdade, parece que o monstro do gnosticismo
e a besta do legalismo farisaico são inimigos que as igrejas nunca derrotaram totalmente.8

Igualmente, a força da Confissão Positiva, com suas técnicas xamanistas de visualização,


confundidas com fé cristã realizadora, perverte o conceito bíblico de fé, de oração e de jejum, que
deixam de ser confiança no caráter de Deus e submissão à Sua vontade, encontro de amizade
e comunhão com o Soberano, e instrumento de mortificação dos desejos da carne respectivamente,
para serem meios de coerção do Divino a fim de satisfazerem-se as demandas do ego. Desta
forma a fé é tida por moeda de troca (barganha) com Deus; a oração, palavras confessadas com
gritos e/ou sussurros emocionados que coagem ou comovem Deus à ação; e o jejum, sacrifício
abstêmio que possibilita causas impossíveis serem atendidas. Diz a letra de certo hino tradicional
cantado nas igrejas evangélicas que “Deus é fiel a mim”. Mas, seguindo a teologia bíblica, Ele
o é por fidelidade ao Seu próprio caráter e amor de Seu nome, antes de tudo, e não porque seja
Seu plano deixar o homem em sombra e água fresca o tempo todo. Esta situação, segundo a
teologia bíblica, é sempre subproduto daquela, não o contrário. Enfim, a teologia de certas igrejas
revela que o Deus Soberano, que faz “todas as coisas conforme o conselho de Sua vontade”
(Efésios 1:11) não tem lugar em sua agenda e praxis, pois preferem um deus servo, vulnerável
aos seus desejos e caprichos; um deus que se curve aos anseios de um ego humano divinizado.

7
Cf. GARDINER (1991), BRUNNER (1983) e ROMEIRO (1996) sobre maiores detalhes destas críticas.
8
Maiores detalhes deste assunto nas obras de HORTON (1999), HUNT & McMAHON (1999), LOPES (2001),
RODRIGUES (1997, 1999 e 2001) e VIEIRA (1999).
8

OUTRAS BASES QUE JUSTIFICAM A BUSCA PÓS-MODERNA PELO SAGRADO

A busca contemporânea pelo sagrado, contudo, não se justifica só nesta base histórica,
em que o homem dando sinais de cansaço do secularismo materialista do Iluminismo, volta-se
ao místico. Há também uma justificativa profética, o que releva, e em muito, a importância da
presente tendência de busca religiosa do homem, pois segundo a escatologia bíblica, quando
do surgimento e reinado do Anticristo, prodígios e sinais espetaculares serão feitos pelo Falso
Profeta, os quais seduzirão a humanidade com grande poder místico e servirá de credencial para
a legitimação da adoração que se demandará ao Anticristo.

Então vi outra besta que saía da terra, com dois chifres como cordeiro, mas que falava como
dragão. Exercia toda a autoridade da primeira besta, cujo ferimento mortal havia sido curado.
E realizava grandes sinais, chegando a fazer descer fogo do céu a terra, à vista dos homens.
Por causa dos sinais que lhe foi permitido realizar em nome da primeira besta, ela enganou
os habitantes da terra. Ordenou-lhes que fizessem uma imagem em honra à besta que fora
ferida pela espada e, contudo, viverá (Apocalipse 13:11-14 – NVI).

Assim, para que tais eventos apocalípticos se cumpram, faz-se necessário um ambiente
de intensa religiosidade na humanidade novamente. Isto é, impera-se ambiente de anseio pelo
sobrenatural e místico. Ambiente esse que perdeu força e espaço com o materialismo secular
do Iluminismo racionalista que influenciou as gerações do século XIX e a da primeira metade
do século XX. E a busca pelo sobrenatural como vemos hoje ocorrer no mundo, incluindo-se
a adoção de filosofias e práticas religiosas orientais em igrejas outrora fiéis e ortodoxas, sobretudo a
velha mentira satânica de que os homens são deuses, vindica que o ambiente místico-profético
anunciado pelo apóstolo vem sendo preparado, aguardando a ocasião de sua plena revelação.

Além das justificativas históricas e proféticas, há ainda uma justificativa teológica para
a nova busca do homem pelo sobrenatural, a qual se fundamenta no fato da espiritualidade ser
intrínseca ao homem, porque criado a imagem e a semelhança de Deus, sendo inerente ao ser
humano, portanto, o anseio de comunhão com o transcendental. E sendo o ser humano um ente cuja
afirmação se configura na comunhão pessoal com Deus, a espiritualidade humana, na perspectiva
cristã, tem fundamentação e desdobramentos no Deus-Trindade que se revelou ao homem na
criação, salvação e santificação (SCHWARZ; 1999). Assim, na tese cristã, espiritualidade não
desenvolvida pela relação pessoal com o Deus Trino equivale a beber água que não mata a sede,
como disse Jesus à mulher junto ao poço de Jacó (João 4:1-14). Só em Deus Pai, pelo Filho, e
no Espírito Santo a sede espiritual humana é totalmente satisfeita (João 7:37-39). Assim, como diz
Caio Fábio D’Araújo Filho, o debate da espiritualidade humana, “não se baseia na demonstração
ou não de sua existência, mas, sim, em como ela pode manifestar-se em plenitude, de forma
totalizante, ou seja, como poderá ela ser uma espiritualidade integral” (1994; p. 11-12).
9

É possível uma espiritualidade objetiva? Ou a subjetividade é a sua característica mor?


Existe alguma espiritualidade que preencha o homem em o seu ser integral? A espiritualidade
cristã é objetiva? Sei que uma espiritualidade objetiva soa presunçoso aos ouvidos conectados
ao relativismo de nossa sociedade, pois a tese de que não há verdade religiosa objetiva é forte
legado do Racionalismo. Mas para a fé cristã absolutos existem. Apontam para a natureza da pessoa
de Jesus para reclamar objetividade histórica que vindique a singularidade de sua fé, exatamente
pela pessoa que Jesus reivindicava ser: Deus encarnado, a personificação da verdade, vindicada
em Sua personalidade e obras que atestam a Sua deidade.9 Assim, a espiritualidade que Jesus
oferece não só é singular e exclusiva, mas, sobretudo, real. É esta espiritualidade que, vivida
em plenitude, expressa a majestade de Deus ao mundo tenebroso e da qual as igrejas cristãs se
ressentem hoje. Espiritualidade relacional, fundamentada na pericórese10 trinitária, resgatada
na cruz de Cristo, viabilizada no poder do Espírito Santo e plenificada no amor do Pai.

Em sua pesquisa sobre o Desenvolvimento Natural da Igreja, Christian Schwarz atestou


que a marca “espiritualidade contagiante” é básica, necessária e determinante no crescimento
saudável da igreja (1997). De fato, indo-se ao NT se percebe que uma das causas do fracasso
ministerial da igreja de Corinto residia na falta de espiritualidade autêntica, como nos revelam
as palavras do apóstolo Paulo em 1 Coríntios 3:1:

Irmãos, não lhes pude falar como a espirituais, mas como a carnais, como a crianças em
Cristo. Dei-lhes leite, e não alimento sólido, pois vocês não estavam em condições
de recebê-lo. De fato, vocês ainda não estão em condições, porque ainda são carnais.
Porque, visto que há inveja e divisão entre vocês, não estão sendo carnais e agindo
como mundanos? (NVI).
Em virtude da ausência de uma espiritualidade autêntica na vida daquela igreja, ainda
que desfrutasse dos mais carismáticos dotes serviçais (1 Coríntios 1:7), é que o apóstolo lhes
mostrou o caminho sobremodo excelente: o caminho do amor, cuja prática conduz ao centro
da vontade de Deus (Mateus 22:37-40). E quando reportamos a nossa atenção para a igreja de
Jerusalém, notamos como a presença de uma espiritualidade contagiante, pautada no exercício
do amor-ágape que faltava em Corinto, foi decisiva para o impacto que aquela igreja causara.

9
A maior reivindicação de objetividade da fé cristã está na ressurreição de Jesus Cristo como evento espaço-temporal
verídico e verificável historicamente. Tese levantada pelo apóstolo Paulo no primeiro século A.D. na sua carta de
1 Coríntios, capítulo 15, quanto hoje pelo apologista americano Josh McDowell em seus livros “As Evidências da
Ressurreição de Cristo” e “Evidência Que Exige Um Veredicto”, Volume I, ambos publicados em português pela
Editora Candeia, de São Paulo; obras que dão evidências fundamentadas à singularidade histórica de Jesus.
10
Expressão grega que aponta para a interpenetração de amor e amizade entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. A
saber, a comunhão intratrinitária desfrutada pelas pessoas da Santíssima Trindade desde a eternidade dentro daquilo
que a Teologia Sistemática denomina de Trindade Ontológica ou Trindade Imanente, que diz respeito às relações de
Pai, Filho e Espírito Santo dentro do ser trinitário, onde um está no outro (João 14:9-11) e só se configura como Pessoa
na relação fraterna interdependente e de glória mútua um com o outro (João 5:17-26; 16:12-14). Mais detalhes sobre
este conceito, ver “A Trindade e a Sociedade”, de Leonardo Boff (5.ed.; Petrópolis; Editora Vozes; 1999; 296p.).
10

Eles se dedicavam ao ensino dos apóstolos e à comunhão, ao partir do pão e às orações.


Todos estavam cheios de temor, e muitas maravilhas e sinais eram feitos pelos apóstolos.
Os que criam mantinham-se unidos e tinham tudo em comum. Vendendo suas propriedades
e bens, distribuíam a cada um conforme a sua necessidade. Todos os dias continuavam a
reunir-se no pátio do templo. Partiam o pão em suas casas, e juntos participavam das
refeições, com alegria e sinceridade de coração, louvando a Deus e tendo a simpatia
de todo o povo. E o Senhor lhes acrescentava diariamente os que iam sendo salvos
(Atos 2:42-47 – NVI).
Eis uma igreja cuja espiritualidade expressava-se não na religiosidade farisaica, porém
na vivacidade de sua fé em Deus e na forma convicta como respondia a esse Deus, a si mesmo
e ao mundo, mediante tudo o que conhecia a respeito da relação entre o homem e o Eterno. Se
uma igreja local deseja crescer como igreja que experimenta o crescimento que vem de Deus,
desenvolver uma espiritualidade contagiante, segundo o Deus-Trindade, é imperioso. Caminho que
as igrejas cristãs, sobretudo, não podem evitar, demandando-se o alinhamento da vida de cada
membro dessas igrejas aos ditames de vida do Deus Trino, o que exige compreensão bíblica da
espiritualidade para vivê-la em intensidade, pois a gênese, os fundamentos e desdobramentos
da espiritualidade humana estão no Deus-Trindade revelado nas Escrituras Sagradas.

Até mesmo o crescimento das seitas heréticas se baseia no vigor com que vivem a sua fé,
supondo que seja a única fé verdadeira, ainda que lhes faltem elementos objetivos e históricos que
garantam veracidade à demanda de singularidade e exclusividade. E quando uma igreja perde a
paixão que tem por Deus, pode ver Deus perder o prazer no que ela faz, tem ou é como igreja.

“Para que me oferecem tantos sacrifícios?”, pergunta o SENHOR. Para mim, chega
de holocaustos de carneiros e da gordura de novilhos gordos. Não tenho nenhum
prazer no sangue de novilhos, de cordeiros e de bodes! Quando vocês vêm à minha
presença, quem lhes pediu que pusessem os pés em meus átrios? Parem de trazer
ofertas inúteis! O incenso de vocês é repugnante para mim...” (Isaías 1:11-13).

Eis o desnudamento dos sentimentos de Deus para com o tipo de espiritualidade vivida
por Israel. Que nos sirvam de lição Israel e as igrejas da Ásia (Eféso, Pérgamo, Sardes, Tiatira
e Laodicéia) mencionadas no livro do Apocalipse, que receberam repreensões de Deus quanto
à prática de uma espiritualidade não condigna ao Deus que celebravam.
Espiritualidade condigna a Deus é a espiritualidade do coração, e não a de rituais feitos
em alguma catedral. É a espiritualidade fundamentada na pericórese dos divinos Três: Pai, Filho
e Espírito Santo. Espiritualidade onde o amor é a medida de padrão; onde o serviço altruísta ao
outro é caminho sine qua non para a realização do ser pessoa. Espiritualidade ética, que sabe
os seus limites e respeita os limites do outro; que não se vale de manipulações para se vindicar;
e que cresce na prática da verdade porque esta garante a liberdade de ser, como disse Jesus:
“Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João 8:32).

SOLI DEO GLORIA!


11

BIBLIOGRAFIA

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VIEIRA, Samuel: O Império Gnóstico Contra-Ataca: A Emergência do Neognosticismo no


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FIM

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