Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
29: 59-62
Resumo
Os autores apresentam o caso clínico de uma criança com episódios de hemólise intravascular grave, tendo-lhe sido diagnosticada
Hemoglobinúria Paroxística a Frio baseado no Teste de Donath-Landsteiner positivo e na critroffigocitose observada no esfregaço do
sangue periférico.
Trata-se de uma situação rara, caracterizada por episódios de hemólise, muitas vezes autolimitados e desencadeados por infecções
virais que antecedem ou acompanham a crise hemolítica.
Discutem-se as características clínicas, diagnosticas e terapêuticas. salientando-se a boa evolução deste caso particular.
Summary
The authors present a case of a child with episodes of severe intravascular hemolisis. The diagnosis was acure Paroxysmal Cold
Hemoglobinúria, based on positive Donath-Landsteiner Test and the eritrofagocitosis observed on peripheral blood smear.
It is a rare disease caracterized by episodes of hemolises, often self-limited and preeipitated by virai infections, that preceed ar
acompained the crisis.
The authors also analyse some aspects of diagnosis and treatment, emphasized the good clinicai evolution of this particular case.
# Formas mistas ou combinadas, nas quais há a Exames à entrada — Hb-6,3 g/d1, Ht-22,1%, VGM-80,
associação na mesma crise hemolítica de aglutininas a HGM-27pg, GB-24500/mm' (92% N-7% L), plaq.-
quente e a frio. -321000/mm3, Retic.-3,4%, ureia-75 mg/dl, creatinina-0,7
# Existe ainda uma forma clínica caracterizada mg/dl, glicose-105 mg/d1, TGO-29 UI/ml, TGP-108 U1/
pela agregação aos GV de urna hemolisina, conjuntamen- /ml, bil.directa-1,4 mg/dl, bil.total-5,1 mg/dl, Urina 11-d-
te com o complemento, a frio, sendo este activado quando 1015, hb ++++, prot. ++++, raros eritrócitos, restante
a temperatura se eleva condicionando hemólise. É um sedimento normal.
anticorpo bifásico responsável pela hemoglobinúria paro- Perante o quadro clínico e laboratorial referido colo-
xistíca a frio. caram-se as seguintes hipóteses diagnósticas:
Apresentamos um caso clínico de Hemoglobinúria —Anemia hemolítica por défice de enzimas eritroci-
Paroxistíca a Frio (H.P.F.), situação rara, que requer testes tárias
específicos sob pena de passar sem diagnóstico. —Anemia hemolítica autoimune
— Hemoglobinopatia
Realizaram-se os seguintes exames para esclarecimento
Caso Clínico do diagnóstico:
# Electroforese das hemoglobinas — Hb A2-1,6%, Hb
Fátima, criança de 9 anos, raça branca, natural de S-2%
Setúbal e residente em Palmela. Internada a 18 de Nov. # Doseamento de G6PDH-195mU/10" erit.
de 1993 no Hospital São Bernardo (HSB) por Dor abdo- # Teste de antiglobulina directo — Poliespecífico (+);
minal, Palidez e Icterícia. Anti C3d (+); Anti 12-G (-)
Antecedentes Pessoais — Gesta 6 para 6, gravidez não # Reticulócitos -10%
vigiada, parto eutócico de termo no HSB. Apgar 10/10. # Provas de compatibilidade e pesquisa de anticorpos
Tinha 3.200 gr ao nascer. Grupo Sanguíneo — A Rh+. irregulares — Negativa
PNV não actualizado. Desenvolvimento Psicomotor ade- # Esfregaço do sangue periférico — Eritrofagocitose
quado à idade. por granulócitos
Situação social desfavorecida correspondendo a um # Teste de Donath-Landsteiner-Positivo
Graffard classe V. # Estudo imunológico: ANA, Anti-DNA, Anti-Sm-
Internamento em Abril de 90 por anemia hemolítica Negativos. C3-111 mg/d1, C4-40 mg/d1, CH50-110
aguda, na altura interpretada como défice enzimático mg/dl.
eritrocitário, não se tendo posteriormente confirmado # Serologias para vírus: EBV-IgG(+), IgM(-), CMV-
laboratorialmente por não comparência às consultas. Fez IgG(+), IgM(-), Mycopl. Pneum. <10
então três transfusões de concentrado eritrocitário (CE), # VDRL-Negativo.
tendo tido alta bem. Sem história anterior de anemia. Perante o quadro clínico e laboratorial chegou-se ao
Internamento em Fevereiro de 91 por maus tratos e diagnóstico definitivo de Hemoglobinúria Paroxística a
suspeita de negligência, tendo sido referenciada ao Tribu- Frio.
nal de Menores. Iniciou terapêutica de suporte com transfusões de CE
Antecedentes Familiares — Pais não consanguíneos, desleucocitado, que repete em dias consecutivos até um
sem história de doenças no foro hematológico. Irmãos total de seis, por manter quadro recorrente de hemólise,
saudáveis. caracterizado por dor abdominal, mialgias e hemoglo-
Criança aparentemente bem até dois dias antes do in- binúria. Não havendo melhoria clínica e laboratorial sig-
ternamento altura em que inicia quadro caracterizado por- nificativa inicia terapêutica com prednisolona «per os»
dor abdominal difusa, intensa, contínua, sem irradiação, na dose de 2mg/kg/d, ao 5° dia de internamento. Verifi-
acompanhada por cefaleias, tonturas e mau estado geral cou-se resposta ao 40 dia de terapêutica, traduzida por
progressivo. Não apresentava febre, diarreia ou queixas aumento da hemoglobina. No 11° dia de internamento
urinárias. Não havia história de ingestão de medicamen- após interrupção acidental da corticoterapia durante 5 dias,
surge nova crise hemolítica, que se não volta a repetir
tos ou alimentos oxidantes, bem como sintomas infec-
após reinicio da prednisolona a qual manteve durante 5
ciosos que antecedecem o quadro clínico.
semanas (desmame incluído).
No dia do internamento após lipotimia e vómitos
Durante o internamento é-lhe diagnosticado Herpes
biliares, recorre ao SU do HSB. genital, tendo feito terapêutica oral com Aciclovir duran-
Do exame objectivo salientava-se: Prostação, palidez te 5 dias.
de pele e mucosas, icterícia da pele e escleróticas. T.ax.- Teve alta clinicamente bem. Tem sido seguida na
-37,5° C, FC-120 ppm, TA-90/50 mmHg. Urina cor vinho consulta de Pediatria Geral do Hospital nos últimos dois
do porto. A palpação abdominal era difusamente doloro- anos estando bem, sem queixas e com análises normais.
sa, sem defesa. Figado palpável 3 cm abaixo rebordo costal Continua a ser apoiada pela comissão de menores aten-
na linha médioclavicular. dendo aos antecedentes já referidos.
Hemoglobinúria Paroxística a Frio. A propósito de Uni Caso Clínico 61
Discussão
Primeiro é importante a estabilização do doente do crises de hemólise recorrente. Entre esses episódios as
ponto de vista hemodinâmico, utilizando-se para isso crianças estão assintomáticas e com teste de antiglohulina
muitas vezes suporte transfusional com CE desleucocitado directo negativo.
aquecido, (5) mas sómente as quantidades e as vezes estri-
tamente necessárias para retirar o doente do estado críti-
BIBLIOGRAFIA
co, dado que as transfusões nas anemias autoimunes po-
dem perpectuar a hemólise. Evitar a exposição ao frio. I. Alan D. Schreibcr et France, \I. Grill-Autoimune Hemolytic Anemia
Em segundo lugar é importante um tratamento de In: Nathan Olki, ed. Hematology of Infancy and Childhood. USA:
manutenção cujo objectivo é parar a hemólise. Aqui o uso WB Saunders company. 1987: 413-42.
2. Packman C.. Leddy J.. Cryopathic Hemolytic Syndromes In: William
de corticóides suscita controvérsia, dado não haver con- Williams and Marshall Lichtman ed. Hematology. USA: MC Graw
senso a, 5' 9' i") relativamente aos benefícios desta terapêu- Hill Publishing company. 1991: 675-80.
tica. No nosso caso utilizámos prednisolona na dose de 2 3. Kannagi R.. Zenith K.. Cztrbohydrate auto-antigens in Autoimune
Hemolytic Anemia. 1991: 3216): 599-605.
mg/kg/d a partir do 5° dia de internamento, com aparente
4. Gottsche 13., Saltm' A.. Mueller C.. Donath Autoimune Hemolytic
sucesso, já que o aporte transfusional foi ineficaz no Anemia in Children. A study of 22 cases. Vos. Sang. 1990: 5814):
controlo terapêutico da hemólise até então e dado que 281-6.
5. Cucci M., Courbon Collet 0. et :d. Donath landsteiner Hemolytic
após a interrupção involuntária dos corticóides houve
Anemia. Physiopathological. cliagnostic. and therapcutic aspects. Ana.
agravamento clínico com nova descida da hemoglobina e Pediatr. Paris. 1992: 39(9): 572-7.
após o seu reinicio nova melhoria com normalização da 6. Heddle NM. Acute Paroxysmal colei Hemoglobinúria. Transfus. Med.
Hb e da contagem de reticulócitos que são critérios de Rev.. 1989: 3(3): 219-29.
7. Cooper R. A.. Bunn E. Hemolytic Anemias. In: Principies of Internai
eficácia terapêutica. Medicine. New York: MC Graw-Hill company. 1987: 1506-10.
A esplenectomia e o tratamento imunossupressor (ci- 8. Wolach B., Heddle N.. Barr U. et al.. TrasielIt Donath-Landsteiner
clofosfamida ou clorambucil) "), são utilizados raramente Hemolytic Anemia. Br. J. Haematol. 1981: 48: 425.
9. Leverger G.. Bancillon A.. Schaison G.. Trcatment aí Autoimune belo-
e somente nas formas crónicas graves, quando não há
lytic Anemias in Children. Ann Pediatr. Paris, 1989: 36)81: 519-23.
resposta á corticoterapia. O seu sucesso nestes casos é no 10. Esaguy A. e Pereira F.. Anemias Hemolíticas Autoimuncs. Rev. Port.
entanto de cerca de 50% segundo alguns autores. "" Pediat., 1992: 23: 205-7.
A criança dois anos após o episódio descrito tem 11. Serrano J.. Autoimune Hemolytic Anemia Revim of 200 cases studied
in a period of 20 years (1970-1989). Sangue Barc., 1992: 37(4): 265-74.
estado clinicamente bem, não tendo novas crises hemolí-
ticas, mantendo teste de antiglobulina directo negativo e
valores de hemoglobina normais para a idade. Este facto
Correspondência: Victor Hugo da Silva Neves
está descrito na literatura, que refere que os episódios
Rua Oliveira Martins. n." 8 - 3." Esq.
hemolíticos agudos são habitualmente severos podendo 2810 Feijó
ser muitas vezes formas autolimitadas, '9' relacionadas com Telefone: 259 33 17
infecções virais, tendo boa evolução clínica e óptimo prog-
nóstico, mantendo-se títulos de anticorpos de Donath
Agradecimento: Às Dr.' T. Chambert e M." J. Rodrigues do Centro Regi-
Landsteiner baixos durante meses sem no entanto haver onal de Sangue de Lisboa pela ajuda prestada no diagnóstico deste caso
recaídas. Estão descritas formas crónicas paroxísticas, com clínico.