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O Alienista, pois, é uma reação que se constitui como tema tipicamente machadiano: a
sociedade entende que a atividade intelectual, em primeiro lugar, é uma postura solitária,
resumida em si mesma; tal postura gerava um efeito “encantador”, o que, para Machado, é
resultado de uma admiração bajuladora (pensemos em Crispim Soares, o boticário de Itaguaí),
totalmente desvirtuada dos reais e honestos objetivos da Ciência: contribuir para auxiliar
naquilo que urgentemente a sociedade precisa.
Alguns críticos consideram O Alienista uma prosa com humor transcendental. Isso significa que
o humor gerado na leitura desta ficção machadiana é menos barulhento e mais sutil, mais suave,
porque debocha da nossa busca por explicar fenômenos e situações ao pé da letra. Aliás,
fazendo uma revisão da obra machadiana, verificaremos que todos os seus protagonistas levam
às últimas consequências suas certezas. Basta nos recordarmos de, por exemplo, Bentinho, em
Dom Casmurro, ou até mesmo o Brás Cubas, firmes em todos os seus posicionamentos, este
último personagem até mesmo após a morte. Machado de Assis, com O Alienista, contribui para
a galeria das personagens – ou tipos humanos – que, cegos pelas próprias considerações, não
se permitem sensibilizar com os equívocos humanos. Se existe um fundo moralizante nas obras
machadianas, pressuporíamos que até a impassibilidade e a não aceitação dos erros humanos
são também atitudes errôneas.
Simão Bacamarte, por exemplo, não admite que questionem os critérios por meio dos quais
seleciona quem deverá ser internado na Casa Verde. A maestria de Machado de Assis está, em
contraposição, mostrar, a partir do narrador, quais são as justificativas para que certas
personagens sejam internadas, permitindo que nós, leitores, julguemos se são relevantes ou
não. Da mesma maneira que ocorre com a exposição da vida de Brás Cubas, em Memórias
Póstumas de Brás Cubas, e em Dom Casmurro, com o olhar de Bentinho sobre situações que,
para ele, são o atestado de culpa de Capitu, em O Alienista, todas as informações são
apresentadas de maneira caricata para que o leitor – do século XIX, mas também o leitor atual
– possa, ao mesmo tempo, rir e entender o quanto são absurdas certas reações.
Outro personagem emblemático desta prosa machadiana, Porfírio, o barbeiro que lidera a
revolta contra a Casa Verde, descobre algo que o próprio Simão Bacamarte ignora: a diferença
entre loucos e sãos nunca esteve fundamentada na Ciência, mas em questões sociais. A Ciência,
pois, é legitimada pela utilidade que dá ao poder político, o que significa que todo o ideal que
se criou acerca da ingenuidade e da boa vontade dos investimentos científicos não tem razão
de existência a não ser para manutenção dos poderes já estabelecidos.
O narrador de O Alienista está em terceira pessoa e o seu foco narrativo está de acordo com o
que era defendido no Realismo. Afinal, o narrador, construído em terceira pessoa, é uma
entidade onisciente e responsável pela objetividade do relato, sem, aparentemente, incluir seus
juízos de valor e opiniões sobre as personagens e as situações relatadas. Claro que, se pararmos
para pensar, essa objetividade é tão marcada, que sabemos, inclusive, dos detalhes íntimos das
personagens, seus pensamentos e conjecturas. De modo geral, a narrativa balança em focalizar
as ações e os pensamentos de Simão Bacamarte e quando se faz a mudança de foco para outras
personagens, o protagonista está sempre à cena, como se fosse uma espécie de personagem de
transição.