Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
www.icls.com.br
Quando você fala de uma unidade no plano metafísico, a que isso pode estar se
referindo? Como estabelecer, primeiro, se existe alguma unidade metafísica entre
uma religião e outra? A questão é que o estudo de religião comparada não é como o
estudo geografia comparada. Se você quer estudar um terreno, a geografia de um
1
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
lugar, e depois a de outro lugar, você pode se deslocar do primeiro lugar para o
segundo, e viver no segundo como viveu no primeiro, e experimentar ou vivenciar o
segundo lugar como vivenciou o primeiro. Isso já não acontece com as religiões. Por
quê? Isso se dá pelo fato de que a sua existência humana não está absolutamente
determinada pelo lugar. Você muda de lugar e continua sendo exatamente a mesma
pessoa. A mesma pessoa que estava num lugar e estudou a condição geográfica
daquele lugar agora vai para outro lugar e estuda a condição geográfica do outro. E
você é a mesma pessoa, você é um terceiro elemento que está fora e quase que
completamente separado dos dois lugares estudados.
Estudar religião comparada é como estudar filosofia comparada, pois você não
existe como um terceiro independente dos dois fenômenos. Você não pode falar
“Em princípio, eu como homem não dependo da religião, a religião não é parte
constitutiva da minha existência humana”. Um sujeito dizer que pode viver sem
religião e olhá-las desde fora já é se colocar numa situação meio infra-humana; na
verdade, já é atribuir-se uma prerrogativa sobre-humana. Isso significa que não há
como estudar duas religiões de fora das duas. Por outro lado, estudar duas religiões
de dentro de uma é necessariamente ver a outra sob o filtro da primeira, então,
significa que não há como estudá-las como se você fosse um juiz, ou seja, como se
houvesse duas partes e você fosse um juiz fora da situação, e aí uma parte lhe
apresenta a situação do ponto de vista dela, a outra parte lhe apresenta o segundo
ponto de vista, e você, que está fora da situação, vai julgar qual parece mais
razoável. Você nunca está realmente fora da situação, porque todas as grandes
religiões tratam de coisas que são fundamentais para o homem: todas elas afirmam
que você tem certas responsabilidades como homem, que se você não corresponder a
elas, é a sua desgraça que você cria. Logo, seria como se as duas partes tivessem o
poder de ameaçar o juiz – e aí ele realmente já não pode julgar de fora, ele foi
colocado dentro da situação.
É evidente que esse tipo de estudo nunca vai poder resolver certos problemas
abstratos: se o Budismo falou isto, o Cristianismo falou aquilo, que é completamente
diferente, o estudo do Cristianismo e do Budismo não vai resolver a questão. Aí
entra essa noção de “economia espiritual” dentro de uma doutrina. Veja bem, uma
2
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
religião é algo integral. Se você pega uma parte para resolver um problema, saiba
que como a religião lida com o homem, que é um ente limitado, essa solução é
sempre parcial e tem que ser compensada por outra solução para outro problema.
Logo, uma parte da religião é completada pela outra parte da mesma religião; e se
num aspecto a religião dá apenas o mínimo indispensável, no outro aspecto ela
compensa justamente esse mínimo que foi dado.
Por exemplo, se você estudar a teologia católica, você vai perceber que existem
dois tipos de coisas que são necessárias para a salvação do homem. Certas coisas são
necessárias como meios intrínsecos, ou elementos indispensáveis, para que o homem
tenha uma relação saudável com Deus; e existem outras exigências que são parte da
revelação cristã, são instrumentos de salvação que Deus deu para os cristãos. Na
teologia se afirma que nenhum homem pode escapar desse primeiro conjunto de
exigências. Por exemplo, a existência de um único princípio absoluto que premia os
bons e castiga os maus – se você não acredita nisso, não há como você formar uma
relação saudável com Deus pela qual Ele possa lhe salvar (se você nem acredita que
Ele existe, você não pode ser salvo). Agora, você precisa crer que Deus é uno e trino
para que Ele lhe salve? Sim e não. Se você entendeu o sentido dessa mensagem no
contexto cristão e captou a evidência da salvação que o Cristo oferece, então, sim;
não é possível um cristão ser salvo sem acreditar que Deus é uno e trino. Mas é
perfeitamente possível para um não-cristão ser salvo estando completamente
desinformado a respeito. Então, é possível que a questão de contradição aqui seja
somente que um sabe uma coisa e o outro não sabe.
Se você perguntar a um muçulmano sobre Deus, ele vai falar “Deus é aquele
que não tem princípio”. Se você fala que o Verbo procede do Pai, imediatamente o
muçulmano entende “O que procede de algo não é Deus – pois Deus é o princípio
3
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
sem princípio”. Não adianta você falar que essa é uma posição interna, porque aí ele
vai argumentar: o seu pensamento é uma processão interna, ele procede da sua alma,
mas o seu pensamento não é a sua alma, e muito menos o seu pensamento é você.
Note que a ênfase teológica no Islam está em que Deus não tem princípio. Cavando
um pouco na teologia islâmica, na mais estritamente tradicional do ponto de vista
islâmico – e é preciso lembrar que hoje em dia existem muitas seitas no ambiente
muçulmano, ou seja, se você entrar em qualquer mesquita você não necessariamente
vai ouvir o que vamos explicar agora; e se for numa mesquita no Brasil, não é isso
também que as pessoas vão falar, porque por aqui elas pertencem a duas escolas de
Islamismo que são muito recentes e meio heréticas. (Nós falamos “o Cristianismo”,
mas se andarmos de igreja em igreja, no ocidente, veremos que esse “Cristianismo”
é “N” coisas diferentes; o Edir Macedo não concorda com Bento XVI, este não
concorda com o Papa Chenuda, e este não concorda com o patriarca de Moscou. Um
sujeito de fora, digamos, um egípcio, pode achar que tudo isso é Cristianismo e
parece uma coisa só. Do mesmo jeito, para nós, tudo o que é Islamismo parece uma
só coisa, mas não é assim: existem muitas divisões internas, pois já é algo milenar,
que abarca povos inteiros.)
Por outro lado, o muçulmano, na sua teologia estrita, aceita que o Verbo é algo
divino – e é por isso mesmo que ele nega que o Cristo foi crucificado e morto,
porque o que é divino não morre. De certo modo, isso também é uma consequência
da mesma distinção original do muçulmano. Quem está certo aqui? O Cristo foi
crucificado ou não? É evidente que foi. Mas pensarmos o Cristo como um
muçulmano pensa, é evidente que ele não pode ter sido crucificado. Não existe uma
teologia da Encarnação no Islamismo. Toda a explicação da crucificação do Cristo
está na teologia da Encarnação: da união de duas naturezas. A crucificação acontece
porque o Cristo era realmente Deus e homem; se Ele não se encarnasse, Ele não
4
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
Isso significa que o estudo de religião comparada não tem como resolver isso,
porque o estudo de religião comparada não pode borrar ou até apagar as diferenças
entre as religiões – “Não, é tudo uma religião só”. O estudo de religião comparada
pode lhe levar a compreender, por exemplo, o seguinte: se você aceita a encarnação
do Verbo, você tem que aceitar a trindade também – uma coisa exige a outra. Se
você aceita apenas que Deus é “aquilo que de modo algum tem algum princípio”,
você tem que negar a encarnação. E esta é exatamente a fronteira entre o
Cristianismo e o Islamismo.
Agora: “De que forma pode-se aceitar essas contradições e aceitar ambas as
doutrinas como igualmente verdadeiras?”. Não, você não tem como aceitar ambas
5
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
Se você tentar comparar o Islam e o Cristianismo para ver qual é melhor, esta
comparação, primeiro, subentende que você não tem nenhuma das duas religiões,
que você não é praticante de nenhuma e não aceitou nenhuma. Então, já comece a
rezar fervorosamente para que Deus lhe dê alguma religião, porque se você
continuar assim, sem nenhuma, você vai para o Inferno. Agora, quem vai poder lhe
responder qual é a melhor? O que cada ser humano pode fazer quando tem uma
religião é o seguinte: “Você venha aqui e eu tento lhe ensinar a minha, tento lhe
mostrar todas as qualidades da minha”. Porque a resposta concreta para esta
pergunta “Qual é a melhor?” é a resposta que você realmente achar. Não há outra
resposta melhor; se existisse uma resposta melhor, que pudesse ser obtida de outro
6
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
modo, existiria imposição quanto à fé: ou você entra nessa, ou morre! Essa atitude
seria perfeitamente legítima.
Aluno: A religião também não é algo como uma estante, em que você escolhe...
Prof: Exatamente. Para começar, a religião não se oferece para você de todo
este modo, de um modo geral só nos é oferecida uma religião – quando é oferecida
uma. Às vezes acontece como o Sócrates: para aquele povo inteiro, naquela
circunstância histórica, não foi oferecida uma religião acessível e praticável para
todos, só aquilo que o Sócrates estava fazendo era certo, e não havia como a maioria
fazê-lo. Portanto, às vezes Deus não oferece.
E eu não conheço nenhum caso em que Deus ofereça igualmente: “Aqui: vire
muçulmano, vire cristão. Eu estou lhe dando as duas”. Ainda que isso acontecesse e
você recebesse uma oferta igual, você deveria escolher aquela na qual foi criado.
Primeiro, porque você já a recebeu parcialmente antes, e, portanto, já há algo em
você que é incompatível com a oferta nova, e que você vai ter que superar caso você
se converta. Segundo, justamente porque você foi criado com ela você já possui
algum critério para avaliar, dentro dela, quem está falando o que é da religião e
quem está falando loucura da cabeça dele. Porque não é assim: o sujeito se
converteu para o Islam e então todo muçulmano para quem ele pergunta alguma
coisa sobre Islam vai ensinar alguma coisa [verdadeira] de Islam. Se ele é cristão, se
perguntar aos cristãos o que é Cristianismo, a maior parte não vai dar a informação
correta! Então, em relação ao Hinduísmo, Budismo, ou Islamismo, você não tem a
menor idéia de qual é a relação entre as idéias, facções, ou crenças que apresentam
uma certa continuidade histórica e intelectual com a origem da religião e aquelas que
são só invenções posteriores. Você não sabe, não tem meio de saber, porque você
não tem nenhuma experiência daquela religião. Não é por nada, é que é assim: se
você nasce numa religião, seus pais, seus avós foram daquela religião, todas essas
pessoas amaram você – antes de você existir –, porque você é parte delas, e elas
rezaram e pediram a Deus daquele jeito para que lhe desse algum discernimento, e
esse discernimento está no fundo do seu ser. Isso é uma questão muito complicada
mesmo.
É claro que existe o caso em que o que o sujeito tem da religião, de fato, é só
uma aparência. Vou citar o caso clássico de São Pedro e São Paulo: São Pedro
praticava o Judaísmo direitinho, o Judaísmo era uma religião viva para ele, e quando
ele conhece Jesus cristo, ele percebe “Isto é a coroa da religião, é a consumação das
minhas esperanças”. Então, ele não se converte do Judaísmo para o Cristianismo, ele
completa um processo, ele não vê nenhuma contradição entre uma coisa e outra –
porque não há mesmo!
São Paulo é o caso contrário: o que ele chamava de Judaísmo era um negócio
que sei lá quem havia inventado e que consistia principalmente em matar cristãos...
Então é assim: “Você tem que abandonar isso e adotar a religião de Deus”. Ele tem
7
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
mais ou menos a impressão de que aquilo que era válido para o que ele praticava era
válido para todo o Judaísmo; ele tem uma impressão e uma atitude em relação ao
Judaísmo que é completamente diferente da impressão que os outros apóstolos
tinham. Os outros apóstolos, diante [da questão do] do Judaísmo e Cristianismo, não
ficaram na escolha entre o “erro” e o “acerto”; para eles, de um certo modo, o
Cristianismo era a consequência natural daquilo que eles estavam fazendo. Depois
da descida do Espírito Santo, São Pedro começa o discurso falando “Lembram
aquela promessa que Deus enviaria um profeta semelhante a Moisés? Pois bem, é
esta a promessa que foi cumprida aqui”. Ou seja, esta religião não é uma nova
religião, é aquela! Para ele aparece claramente assim. Para São Paulo, não: “Deus
inventou a Lei para que o homem a transgredisse” – uma atitude que, é claro,
podemos interpretar em sentido místico, espiritual ou metafísico, mas que
literalmente é muito estranha.
O que queremos dizer é que raramente Deus propõe para o sujeito assim:
“Aqui há duas coisas igualmente verdadeiras e você tem que escolher uma delas”.
Quando Deus apresenta duas coisas como verdadeiras, Ele apresenta uma como a
coroa da outra, efetivamente. Agora, isso depende não somente da objetiva origem
daquela religião. É evidente que o Judaísmo tem origem em Deus, foi revelado por
Deus, mas aquilo que São Paulo praticava não era o Judaísmo. Em nenhum caso
Deus apresentou duas coisas no mesmo plano – nem para São Pedro, nem para São
Paulo. Também, para nós, embora hoje nós tenhamos acesso a toda a bibliografia
sobre todas as grandes religiões do mundo, Deus não apresenta essas coisas todas no
mesmo plano. Exceto do ponto de vista abstrato: este ponto de vista abstrato é
justamente o ponto que o estudo de religião comparada resolve; mas do ponto de
vista real Ele não nos oferece essas coisas no mesmo plano, nunca.
A maior parte dos ocidentais – mas, veja bem, Deus sabe mais sobre cada caso
individual – que diz “Acho que vou me tornar budista; acho que vou me tornar
muçulmano; acho que vou me tornar hindu” deveria começar por pegar o que há de
mais certo no Cristianismo e praticá-lo por dois ou três anos fervorosamente, para
8
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
ver se Deus fechou realmente esta herança para você, se Deus lhe excluiu realmente
desta herança, ou se é você quem está desperdiçando ela prodigamente, e ela aparece
para você como pobreza. Tente tomar posse dela primeiro.
E lembremos sempre que o estudo de religião comprada não pode ser feito
como um estudo sendo alguém de fora da situação. As decisões são tomadas aqui do
mesmo jeito que as decisões entre tratamentos médicos para uma mesma doença são
tomadas: um médico fala que o tratamento da sua doença é este, outro médico fala
que é aquele, e outro médico fala que é outro ainda. Meu filho, não existem razões
teoréticas que vão demonstrar para você a razão da escolha correta. Assim é na vida
prática e assim é também na vida religiosa. A mesma coisa. O que você pode
entender é a razoabilidade dos tratamentos ou não, ou seja, ao analisar o tratamento
você pode encontrar naquela proposta uma contradição tal que você fala “Não é
possível que isto resolva este problema, não é admissível, não tem como funcionar”.
O estudo da religião comparada, na verdade, é o estudo justamente disto: encontrar
quais são as razões fundamentais que uma herança espiritual não pode contradizer,
as verdades fundamentais que ela não pode contradizer de modo algum. Se você vai
conseguir tomar posse dessas verdades nessa ou naquela religião, só Deus sabe... Eu
não sei!
9
Perguntas e Respostas – A Unidade Transcendente das Religiões e o Caminho Para o Homem
ambas são possíveis, nenhuma delas é absurda, nenhuma delas fala que o absoluto é
relativo e que o relativo é absoluto”. Isso é o máximo que podemos fazer
comparando essas duas teologias. Se você analisar bem, você verá que ambas
implicam e contêm elementos que podem ser deduzidos pela razão humana a partir
de premissas evidentes, e outros elementos que não podem ser deduzidos a partir de
premissas evidentes – “Isto aqui só pela inteligência não dá para saber”. Isso
significa que a verdade total dessa doutrina não pode ser avaliada de maneira
puramente abstrata. Não tem como.
10