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A PROVA ILÍCITA NA JUSTIÇA DO TRABALHO

João Humberto Cesário(*)

1 NOTAS INTRODUTÓRIAS

A prova, como sabemos, é um termo plurissemântico que pode ser


dialeticamente compreendido, a um só tempo, como meio, atividade e resultado
obtido mediante o discurso realizado em contraditório no curso do processo.
Dito de outro modo, a prova é o ‘resultado’ processual da formação do
convencimento judicial, atingido por via da ‘atividade’ probatória desenvolvida
pelas partes, que por via do ‘discurso’ jurídico, respeitado o ‘contraditório’, se
valem dos ‘meios’ legais e moralmente legítimos ofertados pelo direito, para
contribuírem na tarefa que o Estado-juiz possui de resolver o conflito colocado à
sua apreciação de modo justo. Quanto à sua natureza jurídica, o direito à dilação
probatória possui conotação constitucional de índole fundamental, embora que
não explícita.
É fato que o direito às provas não se encontra formal e categoricamente
albergado no catálogo de direitos fundamentais do artigo 5º da Constituição da
República. Acerca do tema, não se pode perder de vista, no entanto, que ex vi
do § 2º do antedito artigo 5º, os direitos e garantias expressos na Constituição
não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados.
Assim é que o direito fundamental às provas deve ser extraído,
primeiramente, da cláusula do devido processo legal (artigo 5º, LIV, da CRFB)
e, num segundo momento, da garantia do contraditório e da ampla defesa com
os meios e recursos a ela inerentes (artigo 5º, LV, da CRFB), dentre eles o direito

(*)
Doutorando em Função Social do Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo.
Mestre em Direito Agroambiental pela Universidade Federal de Mato Grosso. Juiz do Trabalho
no TRT da 23ª Região. Autor de livros jurídicos. Coordenador Acadêmico da Pós-graduação em
Direito e Processo do Trabalho da Escola Superior da Magistratura Trabalhista de Mato Grosso
nos biênios 2011 a 2013 e 2013 a 2015. Membro do Comitê Executivo do Fórum de Assuntos
Fundiários do Conselho Nacional de Justiça de 2013 a 2014. Professor das disciplinas Teoria
Geral do Processo, Direito Processual Civil, Direito Processual do Trabalho e Direito Ambiental
do Trabalho. Tem atuado ultimamente em aulas e palestras na Escola Nacional de Formação e
Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (ENAMAT) e nas Escolas Judiciais dos TRTs da
3ª, 5ª, 6ª, 7ª, 9ª, 14ª, 15ª, 18ª e 23ª Regiões. Endereços eletrônicos:
www.facebook.com/prof.joaohumbertocesario, www.facebook.com/prof.joaohumbertocesarioII e
@joaohumbertocesario (instagram).

1
à ampla produção probatória, imprescindível à materialização de um verdadeiro
Estado Democrático de Direito, que tenha como fundamento primordial a
dignificação da pessoa humana (artigo 1º, III, da CRFB).
De tal arte, todas as vezes que em juízo houver um fato controvertido e
relevante para o deslinde de uma celeuma, o magistrado deverá garantir ao
interessado a mais ampla produção probatória, sob pena de, em não o fazendo,
malferir autoritariamente um direito fundamental reconhecido pela Constituição
ao cidadão, gerando, com seu comportamento censurável, uma indisfarçável
nulidade processual.
Na esteira desta assertiva é essencial alertar que o direito à produção de
provas, embora fundamental, não chega a ser irrestrito. Aliás, é a própria
Constituição que adverte, no seu artigo 5º LVI, serem inadmissíveis no processo
as provas obtidas por meios ilícitos.
A princípio, com efeito, não possuem valor probante em juízo as
informações obtidas em afronta a garantias fundamentais dos cidadãos, como
aquelas que preservam a intimidade e a vida privada das pessoas (artigo 5º, X,
da CRFB), a inviolabilidade do domicílio (artigo 5º, XI, da CRFB), o sigilo da
correspondência, das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações
telefônicas (artigo 5º, XII, da CRFB), etc.
O tema da ilicitude das provas, porém, não é tão singelo quanto possa
parecer à primeira vista, detendo no seu interior uma série de questões de
intrincadas, cujos meandros essenciais serão enfrentados no desenvolvimento
do presente estudo.

2 O PRINCÍPIO DA LICITUDE DAS PROVAS E O PROCESSO DO


TRABALHO

As provas, processualmente falando, são regidas por uma série de


princípios, entre os quais se destacam a imediação, a paridade de armas
probatórias, a atipicidade dos meios probatórios, a comunhão da prova, a
unidade da prova e a licitude probatória. É justamente este último princípio que
nos interessa mais diretamente no presente estudo. Doravante, com efeito, a
nossa tarefa primordial será a de compreender o que vem a ser a prova ilícita,
pousando os nossos olhos no Processo do Trabalho.

2
Prova originalmente ilícita é aquela diretamente produzida com
transgressão às liberdades individuais constitucionalmente consagradas. Uma
prova pode ainda ser considerada ilícita por derivação, quando for angariada a
partir de outra ilicitamente produzida. Esta última hipótese é o que a doutrina
alienígena denomina como the fruits of the poisonous tree ou, em português, os
frutos da árvore envenenada, situação que é prevista no direito brasileiro no § 1º
do artigo 157 do Código de Processo Penal quando diz que são inadmissíveis
as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de
causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas
por uma fonte independente das primeiras1.
A princípio, pois, não possuem valor probante as informações granjeadas
em afronta a garantias fundamentais dos cidadãos, como aquelas que
preservam a intimidade e a vida privada das pessoas (artigo 5º, X, da CRFB), a
inviolabilidade do domicílio (artigo 5º, XI, da CRFB), o sigilo da correspondência,
das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas (artigo
5º, XII, da CRFB), etc.
Vale ressaltar quanto ao tema, que a concepção de invalidade das provas
ilícitas foi construída, a bem da verdade, muito mais em atenção ao Processo
Penal do que em homenagem ao Processo Civil ou ao Processo do Trabalho.
São dignas de transcrição, a propósito, as palavras de Luiz Guilherme Marinoni
e Sérgio Cruz Arenhart:

“A influência do processo penal sobre a idéia de


proibição de prova ilícita é muito grande. Como nesse setor
a obtenção da prova é deferida à polícia, em uma fase
anterior ao processo, é visível a necessidade de se colocar
freios na atividade policial, com o objetivo de impedir a
obtenção de provas mediante a violação de direitos
fundamentais materiais. Para dissuadir o agente público de

1Comentando a possibilidade de limitação da doutrina dos frutos da árvore envenenada, CAMBI,


Eduardo. Curso de direito probatório. Curitiba: Juruá, 2014, p. 130 diz que, eventualmente, as
provas ilicitamente obtidas podem ser ‘descontaminadas’, quando “ainda que a prova tenha sido
obtida por meio ilícito, o vício pode ser convalidado, mediante acontecimento posterior que
elimine qualquer efeito da prova ilícita sobre a formação da convicção judicial (v.g., quando
ocorre a confissão espontânea da parte, cujo comportamento está sendo investigado)”.

3
obter a prova em desrespeito aos direitos, nada mais eficaz
do que proibir a sua utilização no processo.
Nessa situação há um processo em que se
enfrentam o Estado – titular da pretensão punitiva – e o
particular – titular do direito de liberdade. Nesse caso,
porém, há nítida preferência pelo direito de liberdade, que
se coloca em posição de supremacia em relação à
pretensão punitiva estatal.
A diferença entre os processos penal e civil se torna
nítida quando se constata, por exemplo, que as partes têm
o dever de dizer a verdade no processo civil, enquanto que
o réu, no processo penal, deve ser informado do seu direito
de permanecer calado. Como se vê, a busca da verdade é
tratada de modo totalmente diverso em tais processos. (...)
De modo que as diferentes realidades, situadas em
cada um desses processos, não podem deixar de ser
levadas em consideração, quando se pesa na prova obtida
de modo ilícito. Ao se tentar uniformizar a maneira de
compreender o processo penal e o processo civil, é
possível cair no engano de pensar a prova ilícita como algo
que não tem qualquer relação com as diversas situações
postas nesses diferentes processos.”2

Parece-nos inequívoco, tendo em conta a lição anteriormente


reproduzida, que tanto no âmbito do Processo Civil quanto do Processo do
Trabalho a questão da ilicitude das provas deva ser vista com olhar menos
rigoroso do que no Processo Penal, procedendo-se, caso a caso, a um
abalançamento entre os direitos à proteção da intimidade e à investigação da
realidade no processo.
Temos como de bom alvitre, no pertinente, trazer à tona, uma vez mais, a
preleção de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, que embora erigida
em homenagem ao Processo Civil, calha justa para o Processo do Trabalho:

2MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 6 ed. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 388 e 389.

4
“As provas ilícitas não têm eficácia no processo
(artigo 5º, LVI, CRFB). Afirmando-o, nossa Constituição
realizou uma inequívoca ponderação entre a efetividade da
proteção do direito material e o direito à descoberta da
verdade no processo. (...)
No âmbito do processo civil, a ponderação realizada
pela Constituição não exclui a necessidade de uma
segunda ponderação entre o direito afirmado em juízo pelo
autor e o direito violado pela prova ilícita, haja vista os
diversos valores passíveis de proteção e discussão no
direito processual civil brasileiro. Negar a necessidade
dessa segunda ponderação importa em negar a priori tutela
jurisdicional a uma das partes. Essa ponderação deve ser
realizada em concreto pelo juiz a fim de cotejar a relevância
dos valores em jogo. Dois critérios podem auxiliar o órgão
jurisdicional nessa tarefa: em primeiro lugar, é fundamental
que os valores postos à ponderação sejam devidamente
identificados e explicitados pelo órgão jurisdicional; em
segundo, saber se tinha a parte que postula a admissão da
prova ilícita no processo outro meio de prova à sua
disposição ou não para a prova de suas alegações. Nesse
sentido, é imprescindível a análise da necessidade da
prova ilícita para a formação do convencimento
jurisdicional para saber se ela pode ou não ser aproveitada
em juízo.”3

Vale repisar: “a ponderação realizada pela Constituição não exclui a


necessidade de uma segunda ponderação entre o direito afirmado em juízo pelo
autor e o direito violado pela prova ilícita”. Note-se, a propósito, que na
deflagração legislativa do CPC/2015 a mencionada diretiva chegou a ser
expressamente albergada, já que o anteprojeto dizia no seu artigo 257 que a

3MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil comentado artigo
por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 335.

5
inadmissibilidade das provas obtidas por meio ilícito seria apreciada pelo juiz à
luz da ponderação e dos princípios e dos direitos fundamentais envolvidos. Em
que pese tal encaminhamento ter sido suprimido durante o trâmite do código no
Poder Legislativo, não constando, assim, do texto final aprovado, ela
naturalmente continua intacta, já que absolutamente condizente com a
mensagem constitucional vigente. A partir dessa premissa, portanto,
transportamos a discussão para a praxe processual trabalhista.
Imagine-se a seguinte situação, que, aliás, já enfrentamos concretamente
na nossa experiência de magistrado. Nela, determinado empregado recebe
salário marginal, não computado para fins de pagamento das suas horas extras,
férias, 13º salário e depósitos fundiários. No caso o empregador colhe recibo do
pagamento em papel timbrado da empresa, não entregando uma via ao
empregado. Tais recibos são arquivados em um cômodo fechado da sede da
empresa.
Que dizer se o empregado, aproveitando uma distração do empregador,
adentrar no local do arquivo cujo acesso lhe era vedado, extrair os originais do
acervo documental, fotocopiá-los e a autenticá-los? Abstraindo-se da
possibilidade técnica de eventual impugnação calcada em produção documental
unilateral pela defesa (que no caso concreto que enfrentamos não ocorreu), a
prova assim apresentada em juízo poderia ser considerada ilícita por violação do
sigilo empresarial?
O nó da questão, ao nosso sentir, deve ser desatado por via da
ponderação dos interesses digladiantes. De um lado, o interesse do empregado
em demonstrar processualmente a sua razão. De outro, o interesse do
empregador em preservar a incolumidade do seu acervo documental, que não
poderia ser quebrada pela iniciativa particular.
Cremos que nada obsta que o trabalhador, em uma hipótese como essa,
copie os documentos em questão, visando o resguardo de seu direito. Como é
por demais sabido daqueles que possuem alguma intimidade com a prática
forense trabalhista, uma das provas mais difíceis, talvez a mais complexa de se
produzir na Justiça do Trabalho, é aquela relativa ao salário vulgarmente ‘pago
por fora’.
Ocorre que os empregadores que se utilizam desse ardil realizam o
pagamento em locais fechados e sem a presença de possíveis testemunhas,

6
fazendo-o diretamente em dinheiro e não por cheque nominal ou depósito em
conta, tudo premeditadamente pensado para não deixar rastros da ilegalidade
que praticam contra o empregado e o fisco.
Impedir o trabalhador de ter acesso aos arquivos empresariais, ainda que
sem permissão patronal, para deles extrair a prova que lhe interessa, seria, na
prática, o mesmo que lhe negar o direito fundamental à inafastabilidade da
jurisdição (artigo 5º, XXXV, da CRFB), compreendida na sua acepção mais
nobre de garantir ao cidadão uma prestação jurisdicional útil e eficaz. É de se
realçar que em um juízo de valor mais aprofundado a mencionada prática sequer
pode ser considerada ilegal ou mesmo ilícita, já que o empregado que assim
procede não está a furtar ou a se apropriar indevidamente de tais documentos,
circunscrevendo-se a fotocopiá-los para a defesa do seu direito4.
É de se ressaltar, a propósito, que o artigo 369 do CPC de 2015 esclarece
que os meios moralmente legítimos são hábeis a provar a verdade dos fatos.
Logo, não existindo qualquer imoralidade em copiar um documento de interesse
mútuo das partes, de onde não se extrai qualquer informação legalmente
sigilosa, será vedado ao magistrado desprezar a prova desse modo produzida.
Homenagear a imoralidade, em verdade, seria permitir que o empregador, por
via de um comportamento escuso, deixasse de trazer para os autos uma
informação tão relevante ao deslinde desse tipo de imbróglio, furtando-se, em
decorrência, ao cumprimento da função social a que a propriedade privada está
constitucionalmente jungida (artigo 5º, XXIII, da CRFB).

2.1 (I)LICITUDE DOS MEIOS PROBATÓRIOS: ALGUMAS QUESTÕES


COMUNS NA ESFERA TRABALHISTA

Existem algumas questões que no campo das (i)licitudes probatórias são


muito comuns na esfera trabalhista, entre as quais podemos elencar as
seguintes: a) a gravação de conversa ambiental ou telefônica por um dos
interlocutores; b) o monitoramento audiovisual do ambiente de trabalho e do

4Vale reprodução, aqui, a lição de CAMBI, Eduardo. Op. cit., p. 99: “Saber se uma prova é lícita
ou ilícita é uma questão de interpretação sistemática do ordenamento jurídico. Logo, o problema
não é definir se as provas ilícitas são, ou não, aceitáveis, mas definir o que lícito e o que é ilícito,
no sistema jurídico.”

7
ambiente externo; c) o monitoramento de e-mail corporativo ou pessoal dos
empregados; d) a realização de revistas íntimas ou nos pertences de
empregados; e) a quebra do sigilo bancário pelo empregador sem autorização
judicial. Delas trataremos em tópicos apartados.

2.2 GRAVAÇÃO DE CONVERSA TELEFÔNICA OU AMBIENTAL POR


UM DOS INTERLOCUTORES

Como é por demais sabido, o artigo 5º, XII, da CRFB, diz ser inviolável o
sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das
comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas
hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou
instrução processual penal.
Consoante se pode ver, tanto ao Estado quanto aos particulares é vedada
a interceptação das conversas telefônicas, sob pena da configuração de maltrato
à garantia constitucional do sigilo das comunicações. O que no máximo se pode
admitir é a expedição de ordem de interceptação pelo Estado-juiz, somente para
fins de investigação criminal ou instrução penal5.
A grande indagação que se coloca, nesse contexto, é a de ser permitido,
ou não, ao particular gravar as suas próprias conversas telefônicas, usando-as,
posteriormente, como prova em juízo. Do mesmo modo, pergunta-se ainda se
seria possível a gravação ambiental com escopo probatório, dos diálogos
mantidos pelo interessado e terceiros.
É de se perquirir, v.g., se um empregado que vem sendo assediado moral
ou sexualmente, poderia, a título de prova, gravar a conversa de que tenha
participado, seja ela telefônica ou ambiental, para com substrato no produto da
gravação postular em juízo a indenização a que faça direito.

5 Destacamos, a título de curiosidade acadêmica e prática, que existe julgado do superior


Tribunal de Justiça que tolerou excepcionalmente a interceptação telefônica ordenada por juízo
que no caso concreto atuava fora da jurisdição penal. Tal julgado (STJ – HC 203.405, Rel. Mn.
Sidnei Beneti – Publicação: 01.07.20121), está em parte ementado da seguinte maneira: “A
possibilidade de quebra do sigilo das comunicações telefônicas fica, em tese, restrita às
hipóteses de investigação criminal ou instrução processual penal. No entanto, o ato impugnado,
embora praticado em processo cível, retrata hipótese excepcional, em que se apuram evidências
de subtração de menor, crime tipificado no art. 237 do Estatuto da Criança e do Adolescente.”

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A jurisprudência dos tribunais trabalhistas vem se pronunciando
positivamente sobre o tema, pois embora despreze a interceptação de conversas
telefônicas alheias, outorga guarida às gravações realizadas pelo litigante que
participou da conversação, ainda que sem conhecimento do outro. Trazemos, a
respeito, três arestos, o primeiro oriundo do TST e os demais dos TRTs da 3ª e
2ª Regiões, respectivamente:

GRAVAÇÃO TELEFÔNICA - INTERCEPÇÃO DA


CONVERSA POR TERCEIRO - PROVA ILÍCITA - ARTIGO
5º, XIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. É prova
ilícita, nos termos do artigo 5º, XIII, da Constituição Federal
de 1988, a gravação de conversa telefônica entre o
reclamado e terceiro, interceptada pelo reclamante sem o
conhecimento de ambos os interlocutores, para fim de
comprovação de suposto dano moral. A jurisprudência,
tanto do excelso STF, quanto a do colendo STJ, pacificou-
se no sentido de que é lícita a gravação de conversa
telefônica somente quando feita por um dos interlocutores,
mesmo que sem o conhecimento do outro, mas não se
pode admitir que uma exceção ao princípio da
inviolabilidade das comunicações telefônicas venha a ser
interpretada extensivamente, sob pena de afronta à
hermenêutica jurídica e à mens legis da Constituição
Federal de 1988. Recurso de revista não conhecido.6

DANO MORAL. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO


DE TRABALHO. GRAVAÇÃO DE OFENSAS AO
EMPREGADO NO LOCAL DE TRABALHO. ACEITAÇÃO
DA PROVA NO PROCESSO TRABALHISTA.
Robustamente demonstradas pela prova as ofensas
gravíssimas dirigidas pela representante da empresa à
empregada, a hipótese autoriza não só a rescisão indireta

6 TST – RR - 761175/2001.6 – Ac. 4ª T – Rel. Min. Milton de Moura França – DJ 26/03/2004.

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do contrato de trabalho como também condenação da
empresa em dano moral. A gravação clandestina dos
diálogos mantidos entre a empregada e os seus superiores
no local de trabalho, nos quais essas ofensas eram
sistematicamente praticadas, é perfeitamente legal e
legítima, pois, apesar do desconhecimento dos ofensores,
não se trata de interceptação de Conversa alheia, pois foi
feita por um dos interlocutores, em local de acesso ao
público, sobre fato (o trabalho) da vida social dos
envolvidos. A hipótese, portanto, não caracteriza afronta à
inviolabilidade da vida privada ou da intimidade de quem
quer que seja,resguardada pelo artigo 5, X, da Constituição
Federal (Precedentes do TST, no TST-SDI-I ROMS n
11134/90, publicado no DJ de 27.09.1991, PG 13394, e do
STF nos HC 75338, publicado no DJ de 25-09-98, pp
00011, e RE 212081, publicado no DJ de 27-03-98, pp
00023). Além de não se caracterizar prova ilícita, trata-se,
no caso, do exercício do direito de defesa por parte da
empregada, com o meio legítimo de que ela dispunha.7

EMPREGADOR PODER DE COMANDO. CONVERSA


TELEFÔNICA GRAVADA POR UM DOS
INTERLOCUTORES - VALIDADE - MEIO RAZOÁVEL
COMO ÚNICA FORMA DE OBTENÇÃO DA PROVA –
INTIMIDAÇÃO PESSOAL PARA ASSUNÇÃO DE
AUTORIA DE CRIME - ACUSAÇÃO SEM INVESTIGAÇÃO
- DANO MORAL - INEXISTÊNCIA DE MERO TEMOR
REVERENCIAL. O artigo 5º, inciso XII, da Constituição
Federal, resguarda o sigilo das ligações telefônicas contra
eventuais interceptações clandestinas, nas quais, de forma
sub-reptícia, a comunicação é devassada sem o

7TRT/MG - 01262-2002-111-03-00-7 RO - Ac. 2ª T - Rel. Desembargadora Alice Monteiro de


Barros – Rev. Juiz Convocado Ricardo Marcelo Silva DJMG 20/02/2004.

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conhecimento de nenhum dos interlocutores. Não se
vislumbra ilicitude a ponto de inutilizar a prova se foi um
dos interlocutores que procedeu à gravação da conversa
sem o conhecimento do outro, se constatado que esse foi
o único meio razoável para a obtenção da prova necessária
à comprovação de suas alegações. O poder diretivo do
empregador não pode ser utilizado como forma de
intimidação pessoal, conduta que extravasa os limites
legais. Se a ameaça de dispensa tem como fulcro a
possibilidade de ser constatada a autoria de furto,
decorrendo dessa efetiva constatação, há mero temor
reverencial, ou seja, a prática de um direito do empregador,
que deve proceder às investigações na forma prevista em
lei. No entanto, intimidar o empregado para que assuma a
autoria de um crime, sob pena de sofrer dispensa,
consubstancia intimidação não autorizada. Acusado o
empregado de furto sem as devidas investigações e não
comprovado o fato, há dano moral, que deve ser
devidamente indenizado.8

Por igual, também as decisões do Supremo Tribunal Federal vêm se


consolidando nesse sentido. Colhemos, a propósito, três julgados que embora
não tratem especificamente de matéria trabalhista, calham justos à discussão:

Captação, por meio de fita magnética, de conversa entre


presentes, ou seja, a chamada gravação ambiental,
autorizada por um dos interlocutores, vítima de concussão,
sem o conhecimento dos demais. Ilicitude da prova
excluída por caracterizar-se o exercício de legítima defesa
de quem a produziu. Precedentes do Supremo Tribunal HC

8TRT/SP - 01101200403302000 - RO - Ac. 4ª T 20080337761 - Rel. PAULO AUGUSTO


CAMARA - DOE 02/05/2008.

11
74.678, DJ de 15-8- 97 e HC 75.261, sessão de 24-6-97,
ambos da Primeira Turma.9

ELEITORAL. PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL


EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPRA DE VOTOS.
GRAVAÇÃO DE CONVERSA FEITA POR UM DOS
INTERLOCUTORES: LICITUDE. SÚMULA 279 DO STF.
I. - A gravação de conversa entre dois interlocutores, feita
por um deles, sem conhecimento do outro, com a finalidade
de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada
tem de ilícita, principalmente quando constitui exercício de
defesa. Precedentes.
II - Para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo
acórdão recorrido, necessário seria o reexame do conjunto
fático-probatório constante dos autos, o que atrai a
incidência da Súmula 279 do STF.
III - Ausência de novos argumentos.
IV - Agravo regimental improvido.10

CONSTITUCIONAL. PENAL. GRAVAÇÃO DE


CONVERSA FEITA POR UM DOS INTERLOCUTORES:
LICITUDE. PREQUESTIONAMENTO. Súmula 282-STF.
PROVA: REEXAME EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO:
IMPOSSIBILIDADE. Súmula 279-STF.
I - A gravação de conversa entre dois interlocutores, feita
por um deles, sem conhecimento do outro, com a finalidade
de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada
tem de ilícita, principalmente quando constitui exercício de
defesa.

9 RE 212081 – 1ª T. – Rel. Min. Octavio Gallotti – Julgado em 04/12/97 – DJ 27/03/98.

10 AI-AgR 666459 - 1ª T. - Rel. Min. Ricardo Lewandowski – Julgado em 06.11.07 - DJE 30.11.07.

12
II - Existência, nos autos, de provas outras não obtidas
mediante gravação de conversa ou quebra de sigilo
bancário.
III - A questão relativa às provas ilícitas por derivação "the
fruits of the poisonous tree" não foi objeto de debate e
decisão, assim não prequestionada. Incidência da Súmula
282-STF.
IV - A apreciação do RE, no caso, não prescindiria do
reexame do conjunto fático-probatório, o que não é
possível em recurso extraordinário. Súmula 279-STF. V. -
Agravo não provido.11

É fato que durante a vigência da Lei 9.034-95, pelo menos para fins de
investigação criminal, a captação e a interceptação ambiental de sinais
eletromagnéticos, óticos ou acústicos, e o seu registro e análise pela polícia, só
era admitida mediante circunstanciada autorização judicial. O fato, porém, é que
o mencionado diploma legislativo foi revogado pela Lei 12.850-13, que não mais
faz menção expressa às eventuais formalidades que deverão ser respeitadas na
captação ambiental policial. No Processo do Trabalho, de qualquer modo, não
custa lembrar que estamos cogitando da gravação, ainda que clandestina, de
conversa ambiental realizada pelo próprio interlocutor, não havendo razão,
assim, para a cogitação da sua mácula. Embora que sem tratar diretamente da
processualística laboral, não custa transcrever a lição do professor Eduardo
Cambi, com remissão, inclusive, ao ponto de vista do Supremo Tribunal Federal:

O Supremo Tribunal Federal já asseverou que a


gravação ambiental, meramente clandestina, realizada por
um dos interlocutores sem o conhecimento do outro, não
se confunde com a interceptação telefônica, que exige a
prévia autorização judicial. Logo, a gravação ambiental
clandestina é prova lícita, desde que não exista causa legal
específica de sigilo nem reserva de conversação. (...) A

11 AI-AgR 503617 - 2ª T. - Rel. Min. Carlos Velloso - Julgado em 1º.02.05 - DJ 04.03.05.

13
discussão quanto as violações aos direitos fundamentais
das pessoas investigadas deve ser resolvida por meio do
reconhecimento de juízos de ponderação, tendo-se que a
partir da premissa de que os direitos fundamentais não
possuem caráter absoluto. Por essa razão, em
determinadas situações, poderão sofrer limitações,
independentemente da forma e da força constitucionais
que lhe são atribuídas, havendo hipóteses em que os
direitos fundamentais à intimidade e à vida privada terão
que ceder em face da maior força ou peso dos direitos em
sentido contrário.12

Por óbvio, aquilo que o espírito da Constituição obstaculiza é a


interceptação de diálogos alheios e não o registro das conversas mantidas pelo
próprio interessado, mesmo que o seu interlocutor não esteja ciente do fato.
Ainda mais elementar é o fato de que pelas regras da experiência,
subministradas pelo que ordinariamente acontece, nenhum empregador
assediaria, por exemplo, o seu empregado sexualmente na presença de
testemunhas, fato que tornaria impossível ou extremamente difícil a prova do
assédio em juízo.
Assim, ad argumentandum, mesmo que a gravação fosse ilícita, a
ponderação dos interesses conflitantes recomendaria a aceitação da prova no
âmbito processual trabalhista, para que na prática não fosse sacrificado, em
nome da espúria preservação da intimidade do empregador, o direito
fundamental do empregado à tutela jurisdicional útil e eficaz.
Situação um tanto diferente, é aquela em que um terceiro protagoniza um
diálogo, grava-o, e disponibiliza a gravação à pessoa ofendida que não participou
da conversa. A questão, aqui, é bastante polêmica. Nessa hipótese, concluindo
pela ilicitude da prova, temos os seguintes julgados:

GRAVAÇÃO TELEFÔNICA. PROVA ILÍCITA.


INADMISSIBILIDADE. No caso em exame, o autor

12 CAMBI, Eduardo. Op. cit., p. 119.

14
encartou aos autos um CD-ROM que contém conversa
gravada entre o preposto da ré e o proprietário de empresa
no ramo de transporte que, a seu pedido, simulando estar
interessado em sua contratação, indagou acerca das suas
referências. Contudo, referida gravação telefônica,
consistente na captação de conversa com terceiros, da
qual não participou, não pode ser usada contra a ré, porque
envolve a quebra da privacidade, direito
constitucionalmente, tido como inviolável (art. 5º, X CF).
Entendimento contrário importaria em violação ao artigo 5º,
LVI da Constituição Federal e artigo 332 do CPC, que
impõem limitação à produção da prova. Ademais, o próprio
autor admite que o conteúdo da referida gravação foi
corroborada pela sua testemunha, indicativo de que
detinha condições de obter prova por outros meios
legítimos. Assim, a gravação telefônica, obtida de modo
ilícito, não pode ser admitida como meio de prova. Apelo
do autor ao qual se nega provimento.13

PROVA ILICITA – GRAVAÇÃO CLANDESTINA –


VIOLAÇÃO AO ARTIGO 5º, INCISOS XII E LVI - Tendo
sido apresentada como prova única das assertivas
exordiais, que pretendiam indenização por danos morais e
materiais, gravação efetuada de modo clandestino, sem
participação direta do reclamante, como um dos
interlocutores, ou conhecimento dos envolvidos, não se
pode considerá-la, ainda que em respeito a ditames legais
trabalhistas, sob pena de afronta a princípios
constitucionais. A ilicitude, na hipótese, não se
despontecializa (sic), nem se flexibiliza, diante do

13TRT/MT – RO 0130100-04.2009.5.23.0021, Ac. 2ª T - Rel. Des. Beatriz Theodoro – Publicação:


01.10.2010.

15
conhecimento de que a gravação foi efetuada sem
autorização judicial ou dos seus interlocutores.14

Acreditamos que tal ponto de vista não se sustenta, pois, a rigor, o que o
espírito da Constituição veda é a intercepção telefônica (vide, embora tratando
das cartas analógicas no plano infraconstitucional, o artigo 233 do Código de
Processo Penal, que confirma com a sua mensagem legislativa a afirmação
retro), o que decididamente não se configurou nos exemplos anteriores, já que
o terceiro apenas disponibilizou ao interessado uma gravação que ele próprio
participou. Ora, se o terceiro poderia depor em juízo para atestar o conteúdo do
diálogo, certamente também poderia contribuir para a elucidação do episódio
disponibilizando a quem de direito o diálogo gravado que protagonizou. Em tal
sentido, segue aresto do TRT da 4ª Região:

PROVA ILÍCITA. GRAVAÇÃO CLANDESTINA. Quando a


gravação de conversa é feita por um dos interlocutores,
não está caracterizada interceptação telefônica, razão pela
qual não se pode considerá-la meio ilícito de obtenção de
prova. Considera-se lícita a gravação clandestina, mesmo
que o ofendido seja um terceiro, que não participou do
diálogo, mas foi citado na conversa e obteve a prova por
intermédio do interlocutor.15

Confirmando a diretriz anterior, embora em situação não exatamente


idêntica, temos a jurisprudência turmária do Supremo Tribunal Federal. Note-se
que na hipótese analisada pela Corte Suprema, apesar de a gravação dizer
respeito a conversa mantida pelo próprio interessado junto a um interlocutor, ela
foi realizada com auxílio de um terceiro, no caso um repórter, muito mais se
aproximando da interceptação que nos episódios passados. Ainda assim, o STF,

14 TRT/MG – RO 01573-2007-111-03-00-0, Ac. 4ª T - Rel. Des. Antônio Álvares da Silva –


Publicação: 01/02/2010.
15 TRT/RS – RO 0001138-61.2011.5.04.0751, Ac. 5ª T - Rel. Des. Clóvis Fernando Schuch

Santos – Publicação: 19.10.2012.

16
em voto da relatoria do Ministro Joaquim Barbosa, não teve dúvidas em
chancelar a licitude da prova, como abaixo se pode ver:

AGRAVO REGIMENTAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA


AO ARTIGO 5°, XII, LIV e LVI, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE AFIRMA
A EXISTÊNCIA DE INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
ILÍCITA PORQUE EFETIVADA POR TERCEIROS.
CONVERSA GRAVADA POR UM DOS
INTERLOCUTORES. PRECEDENTES DO STF. AGRAVO
REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. Alegação de existência de
prova ilícita, porquanto a interceptação telefônica teria sido
realizada sem autorização judicial. Não há interceptação
telefônica quando a conversa é gravada por um dos
interlocutores, ainda que com a ajuda de um repórter.
Precedentes do Supremo Tribunal Federal.16

Concluímos, assim, que se não há propriamente interceptação telefônica,


mas apenas gravação feita por um terceiro da sua própria conversa, que é por
ele posteriormente disponibilizada a alguém que tenha sido ofendido durante o
diálogo, a prova poderá ser perfeitamente veiculada em juízo, sem que sobre ela
pese a mácula da ilicitude.

2.3 MONITORAMENTO AUDIOVISUAL DO AMBIENTE DE TRABALHO


E DO AMBIENTE EXTERNO

Situação que merece análise em tópico apartado é aquela oriunda do


monitoramento audiovisual do próprio ambiente de trabalho realizado pelo
empregador. Há quem defenda o ponto de vista de que a prática não seria lícita,
já que traria um desconforto permanente ao empregado, até mesmo conspirando
contra a sua intimidade. Outros esgrimam tese diversa, sustentando que no caso
o bem primordial a ser tutelado seria a segurança patronal. De nossa parte
acreditamos que a análise da matéria demande temperamentos.

16 STF – RE 453562 AgR / SP, Ac. 2ª T - Rel. Min. Joaquim Barbosa – Publicação: 28-11-2008.

17
Pensamos, a princípio, ser lícito que o empregador monitore
audiovisualmente o ambiente de trabalho, sem que evidentemente se valha
dessa possibilidade para pura e simplesmente constranger ou até mesmo
assediar os seus empregados. Há certas hipóteses, aliás, em que o
monitoramento é do interesse do próprio trabalhador, como no caso dos caixas
bancários, que não raro são vítimas de furtos no caixa realizados pelos próprios
companheiros de trabalho, vendo-se compelidos à prestação de contas daquilo
que não subtraíram.
Pense-se, à guisa de exemplificação, no caso de pais que tenham que
deixar seus filhos aos cuidados de babás, ou de familiares que se vejam
obrigados a deixar idosos sob a guarda de cuidadores. Em situações como
essas, a realidade lamentavelmente demonstra que não raramente as crianças
e os idosos são vítimas de maus tratos. Não há como se objetar, portanto, que
nessas hipóteses é bastante conveniente que em nome da segurança dos
vulneráveis a intimidade dos empregados seja em alguma medida sacrificada.
Reproduzimos, acerca do tema, a lição do professor Eduardo Cambi:

“Tais direitos não são absolutos [referindo-se à


intimidade e à segurança], não podendo, por exemplo, o
direito à intimidade ser considerado mais importante que o
direito fundamental à segurança (CF, art. 6º). Por
consequência, a intimidade e a privacidade de um pediatra
pedófilo ou de uma babá violenta não estão acima do
direito à saúde e à integridade física de uma criança. (...)
No Processo Civil, o uso da prova prima facie ilícita pode
ser admitida, segundo a lógica da proporcionalidade em
sentido estrito, conforme as circunstâncias do caso
concreto. A ponderação deverá ocorrer entre o direito
fundamental objeto de tutela (v.g., a integridade física do
bebê) e o direito fundamental violado com a obtenção da
prova (v.g., a intimidade da babá agressora).”17

17 CAMBI, Eduardo. Op. cit., p. 100.

18
Em casos dessa natureza, ademais, será conveniente que o empregador
deixe claro ao doméstico, no ato da admissão, preferencialmente por documento
escrito e assinado, que fará o monitoramento ambiental. Referida cautela, além
de prestigiar a boa-fé objetiva, inviabilizando a possibilidade futura de que a
prova seja tomada por ilícita, terá também o condão de inibir a conduta
eventualmente agressiva do empregado.
Como já advertimos, todavia, a matéria clama por temperamentos. Assim
é que não se pode concluir de modo diverso, a não ser para se compreender
que o ambiente de trabalho não pode ser tão ilimitadamente devassado, a ponto
de o monitoramento atingir, por exemplo, os banheiros em que os empregados
fazem as suas necessidades fisiológicas, tomam banho e trocam roupas. Em
uma situação que tal, a segurança não pode ser prestigiada a ponto de
comprometer a intimidade dos empregados.
Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, que
embora não estivesse tratando da ilicitude probatória propriamente dita, mas de
responsabilidade civil, dá bem a ideia da relevância jurídica do bem violado pelo
monitoramento de banheiros e vestiários:

RECURSO DE REVISTA. CÂMERA DE VÍDEO


INSTALADA NO BANHEIRO MASCULINO DOS
EMPREGADOS. DANOS MORAIS. VALOR DA
INDENIZAÇÃO. Inexistem critérios objetivos para aferição
do dano moral, devendo ser analisadas as particularidades
do caso concreto a fim de se exercer um juízo de eqüidade,
pelo qual o órgão julgador deve exercitar as qualidades
inerentes à sua função: sensatez, equanimidade,
ponderação, imparcialidade. Tal juízo de eqüidade é o
único que se harmoniza com a amplitude dos comandos
constitucionais incidentes à situação de aferição do dano
moral, estético ou à imagem, bem como do valor da
indenização cabível no caso concreto (art. 5º, V e X, art. 7º,
XXVIII, da CF). Na situação em análise, em face da
gravidade da conduta (instalação de câmeras de vídeo em
banheiros), do tipo do bem jurídico tutelado (honra,

19
intimidade, vida privada) e da repercussão do ato no
mundo exterior (segundo o Tribunal Regional, houve
comentários dentro da corporação e o vazamento da
notícia foi inevitável); considera-se razoável o valor de
R$20.000,00 fixado a título de danos morais pelo Juízo de
1º. Grau.18

RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL


DO EMPREGADOR. DANOS MORAIS CAUSADOS AO
EMPREGADO. CARACTERIZAÇÃO. (...) No caso, o
quadro fático registrado pelo Tribunal Regional revela que
“a ré invadiu a intimidade de seus funcionários, quando
instalou câmeras filmadoras no interior do vestiário, local
destinado à mudança de roupa, ainda que seja por acordo
celebrado entre o sindicato da categoria do obreiro e a ré”.
Não há dúvida do acerto da decisão da Corte Regional. A
dignidade do ser humano é composta de atributos da
personalidade e da individualidade, entre as quais se inclui
o direito de não ver o seu corpo exposto ou tocado senão
quando ele próprio o autorize, ou seja, o direito à
intimidade. Trata-se da proteção aos atributos valorativos
da personalidade humana, incorporados ao art. 5º, X, da
Carta Constitucional, que caracteriza o direito subjetivo
constitucional à dignidade, cujo rompimento é objeto de
reparação, inclusive a partir da noção de que, no sistema
jurídico brasileiro, prevalece, como princípio, o dever de
restituição integral do patrimônio, material ou não, lesado.
Quanto ao argumento de que o procedimento foi instituído
a pedido dos empregados, chancelado em norma interna e
até mesmo pela entidade sindical, esclareço que não é
válida tal pactuação, na medida em que viola direitos
fundamentais. Um dos critérios imprescindíveis à

18
TST – AI-RR 70140-55.2007.5.15.0007, Ac. 6ª T - Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado –
Publicação: 28.05.2010.

20
prevalência do poder diretivo do empregador é o fato de
não transacionar de forma a violar direitos indisponíveis,
entre os quais a honra e a intimidade do trabalhador.
Demonstrado o dano decorrente da conduta do
empregador, deve ser mantido o acórdão regional que
condenou a reclamada a indenizá-lo. Recurso de revista de
que não se conhece.19

Situação correlata à que vem sendo debatida no presente tópico, mas que
possui matizes diferenciados do que já vimos até aqui, é aquela relativa à
filmagem externa do trabalhador, realizada, portanto, fora do ambiente de
trabalho. Aqui também o tema clama por moderação. É claro que o empregador
não pode chegar ao ponto de investigar a vida privada do seu empregado,
monitorando, por exemplo, o interior da sua residência, já que a casa é asilo
inviolável do indivíduo (artigo 5º, XI, da CRFB). Há circunstâncias, porém, em
que a filmagem audiovisual realizada fora do ambiente de trabalho poderá ser
usada como prova judicial, notadamente quando realizada em lugares públicos,
como, v.g., logradouros, campos de futebol, casas de espetáculos e outros.
O que falar, por exemplo, de uma situação que já enfrentamos na prática
da magistratura, na qual um trabalhador, dizendo-se incapacitado para o
trabalho por problemas no joelho, foi filmado inúmeras vezes jogando futebol em
um estádio público no período da suposta convalescência, com fôlego e
disposição de um verdadeiro atleta profissional? Em circunstância semelhante,
segue, abaixo, decisão do TRT da 11ª Região, confirmada pela 5ª Turma do TST
em voto da relatoria do Ministro João Batista Brito Pereira:

(...) Tendo certeza de que o Reclamante não


apresentava o quadro de incapacidade por ele aventado,
não restava outra alternativa, senão promover a filmagem
a fim de fazer a prova em contrário dos fatos alegados.
Realmente, afora a perícia médica, nem sempre infalível,
não havia mesmo outro caminho para demonstrar a

19 TST – RR 384-49.2012.5.12.0012, Ac. 7ª T - Rel. Min. Claudio Brandão – Publicação:


12.12.2014.

21
verdade perante o Poder Judiciário, até para impedir que
este incorresse em erro, por falta de uma prova
inconcussa. (...) O Reclamante foi filmado na via pública,
portanto, em locais de acesso a toda a população. Não se
trata, portanto, de ambiente privado, de acesso restrito ou
exclusivo. (...) As filmagens do Reclamante não tiveram por
objetivo ridicularizá-lo, ou dar publicidade perante
terceiros, mas, tão-somente, promover a defesa em um
processo judicial, de aplicação restrita aos interesses das
próprias partes envolvidas.20

Conclui-se, pelo exposto, que a princípio as filmagens externas são


ilícitas, mormente quanto ultrapassam os limites da preservação domiciliar
daquele que foi filmado. Existem hipóteses, entretanto, em que a filmagem
externa pode ser aceita como meio probatório, notadamente quando realizada
em locais públicos, sem o intuito de ridicularizar ou difamar a pessoa filmada,
especialmente em contextos nos quais a prova do interessado seja de difícil
produção.

2.4 MONITORAMENTO DO E-MAIL CORPORATIVO E DE E-MAIL


PARTICULAR

Outra questão candente no universo jurídico trabalhista diz respeito à


possibilidade de o empregador monitorar o e-mail coorporativo dos seus
empregados, para, em última razão, até mesmo inviabilizar no ambiente de
trabalho práticas como a pornografia e a pedofilia, punindo o empregado infrator,
se for o caso, com a dispensa por justa causa.
O Tribunal Superior do Trabalho já teve oportunidade de se manifestar
sobre o tema, para dizer que o e-mail funcional é uma ferramenta de trabalho,
cuja inspeção alusiva à diligente utilização insere-se na órbita do poder diretivo

20Note-se que os excertos decisórios transcritos são de acórdão originário do TRT da 11ª Região,
mas foram extraídos da decisão confirmatória do TST. Vide, a propósito, TST – RR 67400-
31.2009.5.11.0019, Ac. 5ª T - Rel. Min. João Batista Brito Pereira – Publicação: 19.12.2011.

22
e fiscalizatório que o Direito do Trabalho reconhece ao empregador. Trazemos,
nesse sentido, três arestos do TST:

PROVA ILÍCITA. E-MAIL CORPORATIVO. JUSTA


CAUSA. DIVULGAÇÃO DE MATERIAL
PORNOGRÁFICO. 1. Os sacrossantos direitos do cidadão
à privacidade e ao sigilo de correspondência,
constitucionalmente assegurados, concernem à
comunicação estritamente pessoal, ainda que virtual (e-
mail- particular). Assim, apenas o e-mail pessoal ou
particular do empregado, socorrendo-se de provedor
próprio, desfruta da proteção constitucional e legal de
inviolabilidade. 2. Solução diversa impõe-se em se tratando
do chamado e-mail corporativo, instrumento de
comunicação virtual mediante o qual o empregado louva-
se de terminal de computador e de provedor da empresa,
bem assim do próprio endereço eletrônico que lhe é
disponibilizado igualmente pela empresa. Destina-se este
a que nele trafeguem mensagens de cunho estritamente
profissional. Em princípio, é de uso corporativo, salvo
consentimento do empregador. Ostenta, pois, natureza
jurídica equivalente à de uma ferramenta de trabalho
proporcionada pelo empregador ao empregado para a
consecução do serviço. 3. A estreita e cada vez mais
intensa vinculação que passou a existir, de uns tempos a
esta parte, entre Internet e/ou correspondência eletrônica
e justa causa e/ou crime exige muita parcimônia dos
órgãos jurisdicionais na qualificação da ilicitude da prova
referente ao desvio de finalidade na utilização dessa
tecnologia, tomando-se em conta, inclusive, o princípio da
proporcionalidade e, pois, os diversos valores jurídicos
tutelados pela lei e pela Constituição Federal. A
experiência subministrada ao magistrado pela observação
do que ordinariamente acontece revela que, notadamente

23
o e-mail- corporativo, não raro sofre acentuado desvio de
finalidade, mediante a utilização abusiva ou ilegal, de que
é exemplo o envio de fotos pornográficas. Constitui, assim,
em última análise, expediente pelo qual o empregado pode
provocar expressivo prejuízo ao empregador. 4. Se se
cuida de e-mail- corporativo, declaradamente destinado
somente para assuntos e matérias afetas ao serviço, o que
está em jogo, antes de tudo, é o exercício do direito de
propriedade do empregador sobre o computador capaz de
acessar à internet e sobre o próprio provedor. Insta ter
presente também a responsabilidade do empregador,
perante terceiros, pelos atos de seus empregados em
serviço (Código Civil, art. 932, inc. III), bem como que está
em xeque o direito à imagem do empregador, igualmente
merecedor de tutela constitucional. Sobretudo, imperativo
considerar que o empregado, ao receber uma caixa de e-
mail de seu empregador para uso corporativo, mediante
ciência prévia de que nele somente podem transitar
mensagens profissionais, não tem razoável expectativa de
privacidade quanto a esta, como se vem entendendo no
Direito Comparado (EUA e Reino Unido). 5. Pode o
empregador monitorar e rastrear a atividade do empregado
no ambiente de trabalho, em e-mail- corporativo, isto é,
checar suas mensagens, tanto do ponto de vista formal
quanto sob o ângulo material ou de conteúdo. Não é ilícita
a prova assim obtida, visando a demonstrar justa causa
para a despedida decorrente do envio de material
pornográfico a colega de trabalho. Inexistência de afronta
ao art. 5º, incisos X, XII e LVI, da Constituição Federal. 6.
Agravo de Instrumento do Reclamante a que se nega
provimento.21

21 TST - RR - 613/2000-013-10-00.7 – Ac. 1ª T – Rel. Min. João Oreste Dalazen, DJ 10/06/2005.

24
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE
REVISTA - E-MAIL CORPORATIVO - ACESSO PELO
EMPREGADOR SEM A ANUÊNCIA DO EMPREGADO -
PROVA ILÍCITA NÃO CARACTERIZADA. Consoante
entendimento consolidado neste Tribunal, o e-mail
corporativo ostenta a natureza jurídica de ferramenta de
trabalho, fornecida pelo empregador ao seu empregado,
motivo pelo qual deve o obreiro utilizá-lo de maneira
adequada, visando à obtenção da maior eficiência nos
serviços que desempenha. Dessa forma, não viola os arts.
5º, X e XII, da Carta Magna a utilização, pelo empregador,
do conteúdo do mencionado instrumento de trabalho, uma
vez que cabe àquele que suporta os riscos da atividade
produtiva zelar pelo correto uso dos meios que proporciona
aos seus subordinados para o desempenho de suas
funções. Não se há de cogitar, pois, em ofensa ao direito
de intimidade do reclamante. Agravo de instrumento
desprovido.22

PRELIMINAR DE NULIDADE DO JULGADO POR


CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA ILÍCITA. ACESSO
PELO EMPREGADOR À CAIXA DE E-MAIL
CORPORATIVO FORNECIDA AO EMPREGADO. ÓBICE
DA SÚMULA 126 DO TST. (...) 2. In casu, pretende o
Reclamante modificar a decisão vergastada, ao argumento
de que a prova acostada aos autos é ilícita, porquanto
consubstanciada no acesso à sua conta de e-mail pessoal,
quando o Regional, ao enfrentar a questão, entendeu que
a prova era lícita, porque se tratava de acesso, pela
Reclamada, ao conteúdo do e-mail corporativo fornecido
ao Reclamante para o exercício de suas atividades

22 TST - AIRR - 1640/2003-051-01-40.0 – Ac. 1ª T – Rel. Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello
Filho, DJ 24/10/2008.

25
funcionais, do qual se utilizava de forma imprópria,
recebendo fotos com conteúdo que estimulava e reforçava
comportamentos preconceituosos. Além disso, os e-mails
continham conversas fúteis que se traduziam em
desperdício de tempo. (...) 4. Por outro lado, ainda que o
presente recurso não ultrapasse a barreira do
conhecimento, a controvérsia em torno da licitude ou não
da prova acostada pela Reclamada, consubstanciada no
acesso à caixa de e-mail corporativo utilizado pelo
Reclamante, é matéria que merece algumas
considerações. 5. O art. 5º, X e XII, da CF garante ao
cidadão a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da
honra, da imagem das pessoas, bem como o sigilo de suas
correspondências, dados e comunicações telegráficas e
telefônicas. 6. A concessão, por parte do empregador, de
caixa de e-mail a seus empregados em suas dependências
tem por finalidade potencializar a agilização e eficiência de
suas funções para o alcance do objeto social da empresa,
o qual justifica a sua própria existência e deve estar no
centro do interesse de todos aqueles que dela fazem parte,
inclusive por meio do contrato de trabalho. 7. Dessa forma,
como instrumento de alcance desses objetivos, a caixa do
e-mail corporativo não se equipara às hipóteses previstas
nos incisos X e XII do art. 5º da CF, tratando-se, pois, de
ferramenta de trabalho que deve ser utilizada com a
mesma diligência emprestada a qualquer outra de natureza
diversa. Deve o empregado zelar pela sua manutenção,
utilizando-a de forma segura e adequada e respeitando os
fins para que se destinam. Mesmo porque, como assinante
do provedor de acesso à Internet, a empresa é responsável
pela sua utilização com observância da lei. 8. Assim, se o
empregado eventualmente se utiliza da caixa de e-mail
corporativo para assuntos particulares, deve fazê-lo
consciente de que o seu acesso pelo empregador não

26
representa violação de suas correspondências pessoais,
tampouco violação de sua privacidade ou intimidade,
porque se trata de equipamento e tecnologia fornecidos
pelo empregador para utilização no trabalho e para alcance
das finalidades da empresa. 9. Nessa esteira, entendo que
não se configura o cerceamento de defesa a utilização de
prova consubstanciada no acesso à caixa de e-mail
fornecido pelo empregador aos seus empregados. Agravo
de instrumento desprovido.23

A diretiva transcrita parece-nos correta, não somente pelos motivos já


suficientemente expendidos, mas também pelo fato de que como muito bem
retratado pela primeira das ementas, o empregador, ex vi do artigo 932, III, do
Código Civil, é solidariamente responsável pela reparação civil dos danos
causados por seus empregados a terceiros no exercício do trabalho ou em razão
dele.
Ora, se o e-mail é corporativo, possuindo verdadeira característica de
ferramenta de trabalho, e se o empregador pode até mesmo se ver compelido a
indenizar terceiros que, por exemplo, tenham recebido material virótico oriundo
de conta mantida pela empresa junto a provedor, não nos parece que se possa
concluir de modo diferenciado, a não ser para se compreender que a ele será
reconhecido o direito de fiscalizar a utilização desse mecanismo de trabalho, sem
com essa prática violentar a intimidade do obreiro24.
Situação muito diferente, evidentemente, seria se o empregador se
dispusesse a fiscalizar a utilização do e-mail pessoal do seu empregado. Nesse
caso, por certo, a intimidade do trabalhador seria letalmente ferida. Colhemos,

23TST - AIRR - 1542/2005-055-02-40 – Ac. 7ª T – Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho – DJ
06/06/2008.

24 Vide, em sentido contrário, SCHIAVI, Mauro. Provas no processo do trabalho. 4 ed. rev. e
ampl. São Paulo: LTr, 2014, p. 131: “O Direito não acompanha o avanço da tecnologia. Por isso,
não há legislação regulamentando a utilização do e-mail corporativo no local de trabalho. Não
obstante, se o empregador fornece senha individualizada para o empregado utilizar o e-mail da
empresa, a nosso ver também esse e-mail está tutelado pelo sigilo das correspondências e
telecomunicações, vale dizer, tem proteção constitucional quanto à privacidade (art. 5º,V, X e
XII, CF).”

27
em alinhamento com o nosso ponto de vista, decisão do Tribunal Superior do
Trabalho, que embora não trate de propriamente de e-mail, mas de conversa
mantida pelo antigo programa de mensagem instantânea conhecido por ‘msn”,
calha justa para a ilustração da matéria:

DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. COMUNICAÇÃO


ELETRÔNICA. PROGRAMA DE MENSAGEM
INSTANTÂNEA (MSN). ACESSO AO CONTEÚDO DAS
MENSAGENS ENVIADAS E RECEBIDAS PELOS
EMPREGADOS. OFENSA AO DIREITO À INTIMIDADE.
VIOLAÇÃO DO SIGILO DA CORRESPONDÊNCIA.
ABUSO DO PODER DIRETIVO. 1. O empregador, no
âmbito do seu poder diretivo (art. 2º da CLT), pode adotar
medidas a fim de assegurar o cumprimento pelos
empregados do seu compromisso de trabalho e de
proteger a sua propriedade. Deve fazê-lo, contudo, sempre
respeitando os direitos fundamentais do trabalhador,
dentre os quais está incluído o direito à intimidade. 2. No
caso dos autos, é incontroverso que o empregador, na
tentativa de recuperar determinado documento, acessou
um dos computadores utilizados no ambiente de trabalho
e, na oportunidade, fez a leitura das mensagens trocadas
entre os reclamantes via MSN, sem a autorização dos
mesmos. 3. Tais fatos evidenciam que o poder diretivo foi
exercido de forma abusiva, mediante a utilização de
práticas que importaram em ofensa ao direito à intimidade
e ao sigilo da correspondência, assegurados nos arts. 5º,
X e XII, da Carta Magna. 4. Com efeito, a comunicação via
MSN - ainda que estabelecida durante o horário de
trabalho, por meio de computador fornecido pela empresa
-, por ostentar natureza estritamente pessoal, é inviolável,
não sendo possível o exercício, pelo empregador, de
qualquer tipo de controle material, ou seja, relativo ao seu
conteúdo. 5. Nesse contexto, em que os atos praticados

28
pelo empregador não se encontravam dentro de seu poder
diretivo, traduzindo-se em violação dos direitos de
personalidade dos reclamantes, resta configurado o dano
moral passível de indenização. Recurso de revista
conhecido e provido.25

Para que o empregador resguarde seus interesses em situações que tais,


basta vedar, por via de regulamento de empresa ou documento equivalente, a
utilização dos computadores e provedor da empresa para envio da
correspondência eletrônica pessoal dos seus empregados. Uma vez rastreado o
uso do computador e constatada a violação da norma interna, o empresário
poderá dispensar o trabalhador até mesmo por justa causa em caso da
insistência obreira na prática, fazendo-o com arrimo no artigo 482, “h”, da CLT
(ato de indisciplina ou insubordinação), sem necessitar propriamente monitorar
o conteúdo da correspondência pessoal do empregado.

2.5 REALIZAÇÃO DE REVISTAS ÍNTIMAS OU NOS PERTENCES DOS


EMPREGADOS

Outra matéria atual nos tribunais trabalhistas é aquela concernente à


prova angariada mediante revistas realizadas na pessoa e nos pertences do
trabalhador. Por ocasião da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na
Justiça do Trabalho, realizada no ano de 2007, o tema foi discutido, tendo sido
aprovado, a propósito, o seguinte verbete sumular:

S. 15 - REVISTA DE EMPREGADO.
I – REVISTA – ILICITUDE. Toda e qualquer revista, íntima
ou não, promovida pelo empregador ou seus prepostos em
seus empregados e/ou em seus pertences, é ilegal, por
ofensa aos direitos fundamentais da dignidade e intimidade
do trabalhador.

25TST – RR 4497-69.2010.5.15.0000, Ac. 1ª T - Rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann -


Publicação: 07.03.2014.

29
II – REVISTA ÍNTIMA – VEDAÇÃO A AMBOS OS SEXOS.
A norma do art. 373-A, inc. VI, da CLT, que veda revistas
íntimas nas empregadas, também se aplica aos homens
em face da igualdade entre os sexos inscrita no art. 5º, inc.
I, da Constituição da República.

Embora tenhamos participado ativamente daquele memorável evento, no


qual inclusive foi aprovada súmula de nossa autoria (vide, a propósito, a S. 12,
que trata do direcionamento de montantes condenatórios obtidos em ações civis
públicas que versem sobre trabalho escravo), não nos parece que a síntese
conclusiva antes transcrita esteja correta. Uma proposição intermediária seria
mais adequada para o tratamento do assunto. O fundamental é a separação da
revista íntima e vexatória, realizada de modo direcionado e no próprio corpo do
empregado, daquela operada aleatoriamente, na estrita medida do necessário,
em alguns dos pertences do trabalhador.
Ocorre que se por um lado é verdade que a intimidade dos empregados
deva ser preservada, por outro não se pode fechar os olhos para o fato de que
algumas empresas produtoras em larga escala de equipamentos pequenos,
muitas vezes caros e sofisticados, podem, facilmente, ser vítimas de pequenos
e constantes furtos protagonizados pelos seus funcionários.
Nada obsta que a empresa, em situações que tais, colimando reduzir seus
potenciais prejuízos, realize, de tempos em tempos, inspeções por amostragem
nos pertences dos obreiros, tomando o cuidado de amplamente noticiar essa
possibilidade no ato da admissão do trabalhador, respaldando, demais disso, a
diretiva em convenções e acordos coletivos de trabalho e realizando as revistas
na presença de representantes da categoria obreira (artigos 8º, III e 11 da
CRFB). Colacionamos, próximo a tal diretriz, a doutrina de Alice Monteiro de
Barros, bem como a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho:

A nosso ver, a revista se justifica, não quando traduza um


comodismo do empregador para defender o seu
patrimônio, mas quando constitua o último recurso para
satisfazer o interesse empresarial, à falta de outras
medidas preventivas. Essa fiscalização visa à proteção do

30
patrimônio do empregador e à salvaguarda da segurança
das pessoas, mormente na época em que vivemos, com o
fenômeno terrorista atemorizando o mundo. Não basta a
tutela genérica da propriedade, deverão existir
circunstâncias concretas que justifiquem a revista. Mister
que haja, na empresa, no estabelecimento ou no setor
bens suscetíveis de subtração e ocultação, com valor
material, ou que tenham relevância para o funcionamento
da atividade empresarial e para a segurança das pessoas.
Ademais, a tecnologia também poderá ser utilizada para
evitar ou reduzir os efeitos da revista na intimidade dos
empregados. A título de exemplo, a colocação de etiquetas
magnéticas em livros e roupas torna desnecessária a
inspeção em bolsas e sacolas, nos estabelecimentos
comerciais. Quando utilizada, a revista deve ser em caráter
geral, impessoal, para evitar suspeitas, por meio de critério
objetivo (sorteio, numeração, todos os integrantes de um
turno ou setor), mediante ajusto prévio com a entidade
sindical ou com o próprio empregado, na falta daquela,
respeitando-se, ao máximo, os direitos de personalidade
(intimidade, honra, entre outros).26

DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. REVISTA EM BOLSAS E


SACOLAS AO TÉRMINO DO EXPEDIENTE. A revista de
bolsas e sacolas dos empregados como procedimento
interno e geral da empresa, em que o próprio empregado
abre sua bolsa, não configura prática excessiva de
fiscalização, capaz de atinar contra a dignidade e o bem-
estar de seus empregados. Essa prática não atenta contra
o princípio da presunção de boa-fé ínsito das relações
interpessoais, visto que a potencialidade de ofensa das

26 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 4 ed. São Paulo: Ltr, 2008, p. 583.

31
revistas é mínima e passível de ser suportada pelo senso
comum. Recurso de Revista de que se conhece e a que se
dá provimento.27

RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. INEXISTÊNCIA.


REVISTA ÍNTIMA ALEATÓRIA. Restou delimitado no v.
acórdão regional que a revista íntima aos empregados se
dava de forma aleatória, sem contato físico e sem
exposição dos empregados. Assim, a revista não constitui
por si só, motivo a provar o constrangimento, nem violação
da intimidade da pessoa, tampouco discriminação, visto
que a revista era realizada de forma impessoal, razão por
que indevida a indenização por dano moral. Recurso de
Revista conhecido e provido.28

Acreditamos que a revista realizada de tal maneira não poderá ser


considerada pessoal, razão pela qual não estará a maltratar a regra insculpida
no inciso VI do artigo 373-A da CLT, que veda ao empregador ou ao seu preposto
a realização de revistas íntimas. Mais que isso, eventual prova de furto colhida
em estrita consonância com esses cuidados será tida por lícita, sendo hábil a
estribar a dispensa por justa causa do empregado infrator. Colhemos, em sentido
próximo do afirmado, a jurisprudência do TST, embora não concordemos
plenamente com todos os seus fundamentos:

JUSTA CAUSA - CARACTERIZAÇÃO -


DESAPARECIMENTO DE VALE-TRANSPORTE -
REVISTA DE BOLSAS DAS EMPREGADAS NA
PRESENÇA DELAS - PROVA ILÍCITA - VIOLAÇÃO DO
ARTIGO 5º, LVI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
- INEXISTÊNCIA. O cerne da controvérsia diz respeito à

27 TST RR 301/2003-009-04-00 – Ac. 5ª T. Rel. Min. João Batista Pereira – DJ 19/08/2005.

28 TST RR - 375/2007-062-03-40.9 – Ac. 6ª T. – Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga, DJ


05/12/2008.

32
licitude ou não da revista de bolsas procedida pela sócia da
reclamada com a finalidade de encontrar o sitpass (espécie
de vale-transporte) desaparecido nas dependências da
reclamada, durante horário do expediente. Saliente-se,
primeiramente, que a premissa fática sobre a qual se
assenta a alegada violação do artigo 5º, LVI, da
Constituição Federal de 1988 - a saber, que a revista das
bolsas teria acontecido sem a presença da reclamante - é
contrária à adotada pelo v. acórdão do Regional, como
demonstrado, e, portanto, não autoriza a admissão do
recurso de revista, por óbice da Súmula nº 126 do TST.
Quanto à licitude da busca pelo sitpass nas bolsas das
empregadas, tampouco há violação do artigo 5º, LVI, da
Constituição Federal de 1988 que autorize a admissão do
recurso de revista da reclamante. Com efeito,
considerando-se que o desaparecimento do sitpass de
uma das empregadas poderia, se causado por algumas
das outras, caracterizar o ato de improbidade de que trata
o artigo 482, -a-, da CLT, era lícito à reclamada proceder à
busca nas bolsas das empregadas presentes, com
fundamento nos poderes diretivo e disciplinar do
empregador. Por outro lado, era ônus da reclamante
comprovar eventual prática ilícita de prova plantada, ônus
daquele que, conforme o v. acórdão do Regional, não se
desincumbiu. Agravo de instrumento não provido.29

O fundamental quanto ao tema, dessarte, será a busca de uma síntese


capaz de harmonizar o direito à preservação da intimidade do empregado, com
o legítimo interesse da propriedade privada cumpridora da sua função social em
salvaguardar o seu patrimônio. Há de se deixar claro, sempre, que a
possibilidade de revista deverá ser amplamente noticiada nos expedientes
internos da empresa, ser feita de modo impessoal, urbano, cortês e sem

29 TST - AIRR - 497/2004-006-18-40.2 – Ac. 4ª T – Rel. Min. José Antônio Pancotti, DJ


20/05/2005.

33
constrangimentos intoleráveis, pois, caso contrário, o empregador poderá até
mesmo se ver compelido a pagar uma indenização ao empregado, já que nos
termos do artigo 187 do Código Civil, comete ato ilícito o titular de um direito que,
ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim
econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Por outro lado,
revistas realizadas no corpo do trabalhador, mormente nas suas partes íntimas
e sob nudez, serão sempre irremediavelmente tidas como ilícitas.

2.6 QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO PELO EMPREGADOR SEM


AUTORIZAÇÃO JUDICIAL

Salvo algumas exceções direcionadas ao Poder Público e não aos


particulares, a regra geral é a de que a quebra do sigilo bancário e fiscal não
pode prescindir de autorização do Poder Judiciário (artigo 3º da Lei
Complementar 105-01). Sem pretensão exaustiva, podem ser elencadas como
exceções dirigidas à administração pública as seguintes situações:

1. Possibilidade de as autoridades e os agentes fiscais tributários da


União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios examinar
documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive
os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras,
quando houver processo administrativo instaurado ou
procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados
indispensáveis pela autoridade administrativa competente. Nesse
caso, o resultado dos exames, as informações e os documentos
serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária
(artigo 6º da LC 105-01);
2. Possibilidade de a Secretaria da Receita Federal, no exercício das
atribuições previstas no artigo 11 da Lei 9.311-96, requisitar ou
proceder ao exame de documentos, livros e registros, bem como
estabelecer obrigações acessórias. Nesse caso, as instituições
responsáveis pela retenção e pelo recolhimento da contribuição
prestarão à Secretaria da Receita Federal as informações
necessárias à identificação dos contribuintes e os valores globais

34
das respectivas operações, nos termos, nas condições e nos
prazos que vierem a ser estabelecidos pelo Ministro de Estado da
Fazenda, mas a Secretaria da Receita Federal resguardará, na
forma da legislação aplicável à matéria, o sigilo das informações
prestadas, facultada sua utilização para instaurar procedimento
administrativo tendente a verificar a existência de crédito tributário
relativo a impostos e contribuições e para lançamento, no âmbito
do procedimento fiscal, do crédito tributário porventura existente.
3. Possibilidade de as Comissões Parlamentares de Inquérito, com
apoio no permissivo dos plenários da Câmara, do Senado ou das
próprias CPIs, determinar a quebra de sigilo de dados dominados
pelo Banco Central do Brasil.
4. Possibilidade de os sujeitos elencados nos artigos 9º e 10 da Lei
9.613-98, entre eles, por exemplo, seguradoras, corretoras,
administradoras de cartões de crédito e bolsas de valores,
prestarem informações ao Conselho de Controle de Atividades
Financeiras (COAF), visando a prevenção da utilização do sistema
financeiro para os ilícitos de branqueamento de capitais ou
ocultação de bens, direitos e valores (Lei 9.613-98).

Vale enfatizar a propósito do tema, de acordo com o que leciona Eduardo


Cambi30, que a constitucionalidade do artigo 6º da LC 105-01 não é matéria
pacífica no STF, sobre ela existindo o Recurso Extraordinário nº 601.314 com
repercussão geral já reconhecida, bem como que a Corte Suprema tem
compreendido que a LC 105-01 não conferiu poderes ao Tribunal de Contas da
União para determinar a queda do sigilo de dados sob a guarda do Banco
Central. Sobreleva registrar finalmente, ainda segundo o magistério do
mencionado autor, que embora merecedora de críticas, a posição consolidada
na jurisprudência é a de que o Ministério Público não pode requisitar diretamente
a quebra de sigilo, necessitando, para acesso aos dados neles contidos, de
autorização judicial prévia.

30 CAMBI, Eduardo. Op. cit., p. 104 e 105.

35
Como se viu, portanto, a regra geral é de que a quebra de sigilo bancário
e fiscal só pode ser feita com permissão do Poder Judiciário. As poucas
exceções existentes quanto ao tema, são todas dirigidas à administração
pública, jamais aos particulares. Fica fácil responder, com base nessa premissa,
se um empregador, no caso uma instituição bancária, pode se valer de
informações contidas no sigilo bancário do seu empregado, para se defender em
juízo. A resposta, naturalmente, é negativa. Segue-se, acerca do tema, a
jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho:

EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. DANOS MORAIS.


QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. EMPREGADO DE
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. JUNTADA DOS EXTRATOS
DE CONTA CORRENTE DO RECLAMANTE.
UTILIZAÇÃO COMO MEIO DE PROVA. 1. Na esteira da
jurisprudência desta Corte, há de se concluir pela ilicitude
da quebra do sigilo bancário de empregado de intuição
financeira, com a finalidade de utilização dos dados da
movimentação de sua conta corrente como meio de prova
em reclamatória trabalhista. 2. Conquanto o acesso aos
dados bancários do reclamante tivesse o objetivo de
comprovar a quitação de suas verbas rescisórias pela
própria instituição financeira empregadora, a utilização de
tais informações não prescinde de autorização judicial, a
fim de se resguardar o direito à privacidade e à intimidade
do empregado, a par de constituir dever da instituição
financeira o sigilo da movimentação de seus correntistas,
ressalvado o acesso indiscriminado de suas contas, para
cumprimento de dever legalmente imposto (Lei 9.613/98),
o que não é a hipótese dos autos. Recurso de embargos
conhecido e não provido.31

31TST – E-ED-RR 52100-55.2009.5.09.0093, Ac. SDI-1 - Rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann -
Publicação: 27.02.2015.

36
Como se vê, a prova obtida pelas instituições bancárias mediante o
vergastamento das contas bancárias dos seus empregados deve ser tomada
como ilícita. No máximo seria possível, à hipótese, cogitar-se de a instituição
requerer ao Juiz do Trabalho a quebra do sigilo bancário do empregado, quando,
então, a prova realizada mediante tal formalidade seria considerada lícita.

3 SÍNTESES CONCLUSIVAS

Elencamos, ao final do presente trabalho, na forma de pequenas


anotações, as principais conclusões de tudo o quanto abordamos ao longo do
texto:

 O direito às provas não se encontra formal e categoricamente


albergado no catálogo de direitos fundamentais do artigo 5º da
Constituição da República.
 Ainda assim, a fundamentalidade probatória deve ser extraída da
cláusula do devido processo legal (artigo 5º, LIV, da CRFB) e da
garantia do contraditório e da ampla defesa com os meios e
recursos a ela inerentes (artigo 5º, LV, da CRFB).
 Embora fundamental, todavia, o direito à produção de provas não
é irrestrito, vez que a própria Constituição adverte, no seu artigo 5º
LVI, serem inadmissíveis no processo as provas obtidas por meios
ilícitos.
 É de se realçar, entrementes, que a concepção de invalidade das
provas ilícitas foi construída mais em atenção ao Processo Penal
do que em homenagem ao Processo Civil ou ao Processo do
Trabalho. Com efeito, tanto no âmbito do Processo Civil quanto do
Processo do Trabalho a questão da ilicitude das provas deva ser
vista com olhar menos rigoroso do que no Processo Penal,
procedendo-se, caso a caso, a um abalançamento entre os direitos
à proteção da intimidade e à investigação da realidade no
processo.
 Nesta perspectiva, por exemplo, impedir o trabalhador de ter
acesso aos arquivos empresariais, ainda que sem permissão

37
patronal, para deles extrair a prova que lhe interessa, seria, na
prática, o mesmo que lhe negar o direito fundamental à
inafastabilidade da jurisdição, encarada pela sua angularidade
substancial e não apenas formal.
 Outrossim, há de se ficar claro em termos de gravações de
diálogos, sejam eles telefônicos ou ambientais, que aquilo que o
espírito da Constituição obstaculiza é a interceptação de diálogos
alheios e não o registro das conversas mantidas pelo próprio
interessado, mesmo que o seu interlocutor não esteja ciente do
fato.
 Por outra vertente, será lícito que o empregador em algumas
situações monitore audiovisualmente o ambiente de trabalho,
como, entre outras hipóteses, no caso de pais que tenham que
deixar seus filhos aos cuidados de babás ou de familiares que se
vejam obrigados a deixar idosos sob a guarda de cuidadores, sem
que evidentemente se valham dessa possibilidade para pura e
simplesmente constranger ou até mesmo assediar os seus
empregados, adotando, imprescindivelmente, algumas cautelas,
como as de deixar claro, no ato da admissão, que fará o
monitoramento ambiental, sem estender a prática para banheiros
ou vestiários de uso dos trabalhadores.
 Apesar de a princípio as filmagens externas serem ilícitas,
mormente quanto ultrapassem os limites da preservação domiciliar
daquele que foi filmado, existirão hipóteses em que a filmagem
externa poderá ser aceita como meio probatório, notadamente
quando realizada em locais públicos, sem o intuito de ridicularizar
ou difamar a pessoa filmada, especialmente em contextos nos
quais a prova do interessado seja de difícil produção.
 No caso da correspondência eletrônica, deve-se ter em mente que
o e-mail funcional é uma ferramenta de trabalho, cuja inspeção
alusiva à diligente utilização insere-se na órbita do poder diretivo e
fiscalizatório que o Direito do Trabalho reconhece ao empregador.
Isso não quer dizer, porém, que o empregador possa fiscalizar a
utilização do e-mail pessoal do seu empregado, prática que por

38
certo malfere letalmente a intimidade deste último. Para que o
empregador resguarde seus interesses em tal hipótese, poderá
vedar, por via de regulamento de empresa ou documento
equivalente, a utilização dos computadores e provedor da empresa
para envio da correspondência eletrônica pessoal dos seus
empregados.
 No caso de revistas, o fundamental será a separação da revista
íntima e vexatória, realizada de modo direcionado e no próprio
corpo do empregado (a qual é terminantemente vedada), daquela
operada aleatoriamente, na estrita medida do necessário, em
alguns pertences do trabalhador. Desde que respeitada a
parcimônia, nada obstará que a empresa, colimando reduzir
prejuízos patrimoniais potenciais, realize, de tempos em tempos,
inspeções por amostragem nos pertences dos obreiros, tomando o
cuidado de amplamente noticiar essa possibilidade no ato da
admissão do trabalhador, respaldando, demais disso, a diretiva em
convenções e acordos coletivos de trabalho e realizando as
revistas na presença de representantes da categoria obreira.
 Há de se ver, finalmente, que a quebra de sigilo bancário e fiscal
só pode ser feita com permissão do Poder Judiciário. As poucas
exceções existentes quanto ao tema, são todas dirigidas à
administração pública, jamais aos particulares. Logo, a prova
obtida pelas instituições bancárias mediante o vergastamento das
contas bancárias dos seus empregados deve ser tomada como
ilícita, sendo no máximo possível se cogitar de a instituição
requerer ao Juiz do Trabalho a quebra do sigilo bancário do
empregado, quando, então, a prova realizada mediante tal
formalidade seria considerada lícita.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 4 ed. São Paulo: Ltr,
2008.

39
CAMBI, Eduardo. Curso de direito probatório. Curitiba: Juruá, 2014.

CESÁRIO, João Humberto. Provas no processo do trabalho: de acordo com o


novo código de processo civil. Cuiabá: JHC, 2015.

MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de processo civil


comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

________; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 6 ed. São


Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

SCHIAVI, Mauro. Provas no processo do trabalho. 4 ed. rev. e ampl. São Paulo:
LTr, 2014.

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