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Em janeiro de 1821, no Rio Grande do Sul, Auguste de Saint-Hilaire anotava em seu diário que o
Reino do Brasil perigava ser “perdido pela casa de Bragança” e que “suas províncias” podiam ex-
plodir em nações independentes, “como as colônias espanholas”, considerando-se a tamanha dife-
rença entre as mesmas. O naturalista francês escrevia coberto de razões: “Sem falar do Pará e de
Pernambuco, a capitania de Minas e do Rio Grande, já menos distanciadas, diferem mais entre si
que a França da Inglaterra”.
Desde sua origem, em inícios dos anos 1500, a América por tuguesa foi constituída por um mosaico
de regiões semi-autônomas, de frente para a Europa e para a África, de costas umas para as ou-
tras. As diversas colônias luso-brasileiras expor tavam sua produção minerária e agro-pastoril e
impor tavam os manufaturados e cativos que consumiam pelos grandes portos da costa –
Salvador, Recife, Rio de Janeiro, etc. Eram muito frágeis os contatos entre as capitanias e, mais
tarde, províncias, inexistindo o que hoje de nimos como “mercado nacional”. A coroa lusitana tudo
fazia para manter os frágeis contatos entre as diversas partes de seu domíno americano.
Em 1808, a família real, o aparato administrativo e importante parte das classes dominantes
lusitanas desembarcaram no Rio de Janeiro, sob a proteção da marinha britânica, fugidos da
invasão napoleônica de Portugal e da revolução liberal. Com o m inevitável do exclusivismo
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comercial lusitano [“abertura dos portos às nações
09/09/2018 amigas”],
Brasil, 1822: UmosPaís
ingleses
Parido impuseram taxas
pela Escravidão - Geledés
alfandegárias privilegiadas que inviabilizaram qualquer produção manufatureira nas províncias do
Brasil. Em verdade, era tudo que os escravistas luso-brasileiros queriam. Ou seja, importar
manufaturados a baixo preço.
No frigir dos ovos, a exação de Lisboa sobre as prvíncias do Brasil foi substituída pelo tacão, não
menos pesado, do Rio de Janeiro. As eventuais maiores exigências da administração real joanina
sobre as províncias do Brasil eram compensadas por um maior aperto no tornique que literalmente
esmagava os trabalhadores escravizados. Com a Corte em Lisboa ou no Rio de Janeiro, tudo
seguia, mais ou menos, como dantes, no velho quartel de Abrantes!
Em 1820, quando da Revolução do Porto, a burguesia comercial lusitana mobilizou-se para por m
ao absolutismo e impor uma ordem liberal e constitucional em Portugal. Exigiram, igualmente, a
recolonização do Reino do Brasil! Nesse então, como na América Espanhola, já plenamente
conscientes do caráter parasitário da ordem absolutista portuguesa, as classes dominantes luso-
brasileiras almejavam independência restrita aos limites das regiões que controlavam. Já em 1817,
os liberais pernambucanos haviam sido massacrados quando rebelaram-se pela independência
daquela província e das que dela dependiam. Não haviam pensado, por um momento sequer,
na “Independência do Brasil”!
O Reino do Brasil seguia sendo entidade sobretudo administrativa, sem vínculos econômicos e so-
ciais objetivos e subjetivos entre as diversas províncias. Os laços entre o Rio Grande do Sul e o
Prata eram certamente mais forte do que os com a Bahia ou Pernambuco. Era grande a comunhão
entre o Rio de Janeiro e Angola, até 1850! A construção do Estado-nação brasileiro, como o
conhecemos hoje, esboçou-se fragilmente na esfera política no II Império; recuou na República
Velha, de viés federalista; foi sobretudo produto do ciclo nacional-industrialista dos anos 1930.
Em inícios dos anos 1820, nas províncias do Reino do Brasil atuavam as mesmas forças centrí-
fugas que explodiram a América espanhola em constelação de repúblicas independentes – México,
Venezuela, Colômbia, Argentina, etc. Pouco serviu àquelas regiões terem suas classes explora-
doras a mesma metrópole, a mesma origem, a mesma lingua e a mesma religião, ao igual do que
ocorria com o Brasil.
No Reino do Brasil, ainda que vicejassem as mesmas tendências dispersivas que nos territórios
castelhanos, as províncias luso-brasileiras emergiram da Independência coeridas por uma monar-
quia fortemente centralizadora e autoritária. Para não poucos historiadores, tal fato apresenta-se
como um verdadeiro mistério histórico ou é explicado por razões super ciais e ingênuas – presença
de dom Pedro no Brasil; clarividência de dom João, etc.
Saudades do Colonialismo
Quando da crise de 1820, as classes dominantes provinciais desejavam pôr m ao governo abso-
lutista lusitano sediado no Rio de Janeiro; nacionalizar o comércio nas mãos dos lusitanos; re-
sistir às crescentes pressões abolicionistas do trá co internacional de trabalhadores escravizados;
tomar as rédeas de suas respectivas províncias. No Norte, Nordeste, Centro-Sul e Sul, eram for tís-
simas as tendências republicanas e independentistas.
Tudo levava a crer que o Reino do Brasil explodiria em uma constelação de repúblicas, como as
possessões espanholas, que sequer mantiveram os laços unitários dos antigos vice-reinados –
Nova Espanha; Nova Granada; Peru; Prata. Em inícos dos anos 1820, a tendência era o
surgimento de uma República Rio-Grandense, Paulista, Fluminense, Mineira, Pernambucana,
Baiana, Amazônica, de dimensões territoriais impostas pela força das armas de cada região.
O comerciante inglês John Armitage, chegou ao Brasil com 21 anos em 1828. Ele escreveu uma
perspicaz História do Brasil, na qual registrou os temores das classes proprietárias luso-brasileiras:
“Quaisquer tentativas prematuras para o estabelecimento da república teriam sido seguidas de
uma guerra sanguinolenta e duradoura, na qual a parte escrava da população teria pegado em
armas, e a desordem e a destruição teriam assolado a mais bela porção da América Meridi-
onal.” Para manter-se a escravidão, manteve-se a unidade do Reino do Brasil, transformado em
Império. Mudava-se algumas coisa, para que tudo seguisse como sempre, sobretudo no relativo ao
braço escravizado.
O Estado monárquico, autoritário e centralizador brasileiro – ou seja, o Brasil unitário – foi par te-
jado e embalado pelos interesses do comércio e da produção escravista colonial. A Independência
unitária deu-se sob a batuta conservadora dos grandes escravistas, com destaque para os do Rio
Grande do Sul, do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Minas Gerais, da Bahia e de Pernambuco. Os
ideários republicanos, separatistas e federalistas provinciais das frageis “classes
médias” pro ssionais, dos pequenos proprietários não escravistas, etc. foram simplesmente repri-
midos.
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09/09/2018
2 comentários
Brasil, 1822: Um País Parido pela Escravidão - Geledés
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Pedro Chequer
Parabens, excelente texto. Amerita alem de lido, ser disseminado!!
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Iki Junior
O escritor desse artigo deve ser muito burro e desonesto de falar que a monarquia brasileira era absolutista. Faz
citações sem falar do verdadeiro contexto da situação da época porque convém a ele mentir pra enganar o gado. A
nossa monarquia era parlamentarista, e o segundo reinado foi o período de de maior estabilidade social e política que já
se viu nesse país. E acima de tudo, a família imperial era ABOLICIONISTA! Pedro l tentou abolir a escravidão junto com
a independência do Brasil, e se ele fosse realmente um autoritário teria passado por cima de todas as leis e acabado
com a escravidão. Isso pq na época era um escândalo pensar em abolir a mesma. Não pense vc que somente brancos
tinham escravos, os NEGROS que detinham terras aqui no nordeste, os ditos oligarcas, tbm tinham escravos. O que vc
tem a dizer quanto a isso? Apaga teu artigo pra n passar vergonha pq nós monarquistas somos implacáveis com a
mentira.
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