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HISTÓRIAS VERDADEIRAS DO

BRASIL

Luiz Guilherme Marques

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“Brasileiros, é necessário pesquisarmos, em profundidade, a
nossa verdadeira História, para identificarmos os nossos
benfeitores e por que chegamos a ser um país onde a corrupção
infecta nosso sangue e a falta de nacionalismo nos caracteriza,
a ponto de De Gaulle dizer que não somos um país sério. Essa
triste realidade, retratada no momento político atual de
confronto entre o juiz federal Sérgio Moro, pelo lado do Bem, e
Lula e Dilma, representando o Mal, se deve, em última análise,
à cultura do escravagismo, implantada pelos colonizadores
portugueses a partir do século XVI, o que gerou a aversão ao
trabalho e a procura do ganha pão por meios tortuosos, só não
sendo o Brasil um país pior, porque, para contrabalançar a
mentalidade tacanha dos colonizadores lusos, apareceram
elementos franceses, no século XVI, holandeses, no século
XVII, e, nos séculos XIX e XX, respectivamente, alemães e
japoneses. O Brasil de hoje não se qualifica como uma nação,
mas sim como um aglomerado disforme de nacionalidades
diversas, que não chegam a formar uma civilização unida. E os
mesmos escravagistas do século XVI, representados atualmente
por determinados políticos e partidos, conduzem o povo
amarrado ao tronco dos escravos, de tal forma que teremos de
consumir ainda muitos séculos para formarmos uma
nacionalidade sadia, mescla das quatro raças: branca,
vermelha, negra e amarela. O Brasil, desde o começo, foi uma
terra onde prevaleceu a escravização humana, primeiro a
indígena, depois a negra, e, agora, a dos pobres, submetidos à
força, pelos estrangeiros, inicialmente portugueses, até a
proclamação da Independência em 1822, e, atualmente, por
grandes empresas multinacionais, em todos os setores da
economia brasileira. Devemos assumir o compromisso de
desvendar a nossa verdadeira História e conscientizar o nosso
povo a proclamar a nossa independência, que começa pelo amor
ao trabalho e à honestidade.”
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PARTE I
TEXTOS

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1 - MARIA MOAÇARA: UMA DAS ÚLTIMAS
ICAMIABAS (vide o item intitulado “A
Existência das Icamiabas”)
Pesquisar demais provoca situações polêmicas e, talvez, até
nem compense, sendo preferível manter o nosso povo na santa
ignorância, a qual merece, por não querer conhecer nem a
História do país onde nasceu e vive e pensa apenas em futebol,
carnaval e uma cervejinha ou cachaça nos finais de semana.
De pesquisador amador da História brasileira, estou quase
entregando os pontos e pendurando a chuteira, para nunca
mais informar sobre nada que vou descobrindo, sobretudo,
acerca do início da civilização branca no Brasil.
Mas vou lhes contar esta última, que descobri meio que ao
acaso, ao folhear o livro intitulado "História da Companhia
de Jesus no Brasil", de Serafim Leite.
Lá pelas tantas, quando afirma a presença de padres jesuítas
na região amazônica, no século XVII, o historiador acima
referido fala em Maria Moaçara como talvez uma
continuadora da civilização das famosas icamiabas, que
habitaram aquela região.
Daí parti para a pesquisa sobre essas índias famosas e me
deparei com o nome de um autor do século XVI, o padre
Gaspar de Carvajal, que escreveu o livro "Relación del nuevo
descubrimiento del famoso río Grande que descubrió por muy
gran ventura el capitán Francisco de Orellana".
Pois bem, esse padre, que não era nenhum retardado mental e
nem doido, afirmou a existência das icamiabas.
Mas os portugueses, querendo apagar os rastros da
colonização espanhola na região amazônica, safadamente,

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lançaram esses fatos à conta de uma simples e fantasiosa
lenda.
É muita cara de pau tentar tampar o sol com a peneira.
História é História e pronto.
Não se deve subestimar a inteligência de outros interessados
na verdade e tentar impingir uma mentira em lugar da
verdade.
E a verdade é que as icamiabas existiram nas proximidades
do rio que era conhecido como Rio Grande.
O que fez essas icamiabas desaparecerem foi o verdadeiro
genocídio promovido por espanhóis e portugueses na região.
Elas eram guerreiras mesmo e matavam como qualquer
guerreiro macho.
Acho que é muito cinismo ou burrice dizer que se trata
apenas de uma lenda.
O livro de Carvajal está aí para garantir que elas existiram e
eram bravas mesmo.
Pretendo estudar sobre o assunto com mais profundidade e
irei informando.
Maria Moaçara foi uma das últimas icamiabas, apenas que se
vestia à portuguesa.

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2 - PADRE GASPAR MISCH: UM HERÓI
PRATICAMENTE ESQUECIDO DA
AMAZÔNIA DO SÉCULO XVII
No seu livro "Crônica da Missão dos Padres da Companhia
de Jesus no Estado do Maranhão", editado em 2010, pelo
Senado Federal, o padre João Filipe Bettendorff fala muito no
seu grande amigo Gaspar Misch, que desempenhou naquele
momento histórico do século XVII, o importante papel de
conciliador dos colonizadores brancos e dos índios, que, se
não fosse sua atuação, juntamente com a do próprio autor do
livro e mais a da cacica tapajó Maria Moaçara, além do padre
Pedro Luís Consalvi e alguns outros, teria havido uma
verdadeira guerra de vastas proporções entre brancos e
índios, com a derrota certeira dos índios, num verdadeiro
genocídio indígena na Amazônia.
Misch era um homem de um senso de humor extraordinário
e, com suas pilhérias e bondade, sabia dissolver os arroubos
dos violentos e dos precipitados.
Este pequeno texto é uma tentativa de chamar a atenção dos
historiadores para sua importante contribuição.

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3 - MENSAGEM AO POVO E ÀS
AUTORIDADES DE SANTARÉM-PA
Não se trata de querer fazer qualquer imposição ao povo de
Santarém, no Pará, mas apenas uma sugestão.
Depois de muito pesquisar sobre a História daquela região, no
século XVII, cheguei à seguinte conclusão: Maria Moaçara
(que foi uma importante cacica tapajó que ali viveu naquele
período), e Johann Philippe Bettendorff (padre jesuíta que lhe
foi contemporâneo) foram as pessoas que desempenharam os
papéis mais importantes para o surgimento e consolidação da
comunidade que é o atual município de Santarém.
Gostaria de sugerir que as autoridades e a população locais
verificassem a veracidade do que estou dizendo a fim de
valorizar esses dois personagens e dar-lhes o reconhecimento
devido, de maneira a preservar sua memória, que me parece
estar um tanto esquecida e, talvez, totalmente ignorada
principalmente pelas novas gerações.
Algum dia gostaria de comparecer a Santarém, por exemplo,
para a inauguração de algum museu com os nomes deles,
escola, biblioteca, praça, monumento ou coisa parecida.
Acho que o que se fez para manter viva a lembrança dos dois
nomes é pouco em relação ao muito que realizaram.
Solicito que alguém leve esta mensagem ao conhecimento do
prefeito, vereadores, professores e demais autoridades de
Santarém.

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4 - PARINTINS: SEU FUNDADOR E DATA DA
FUNDAÇÃO
O fundador de Parintins foi o padre luxemburguês Johann
Philippe Bettendorff, em 29 de setembro de 1669, o qual lhe
deu o nome de São Miguel dos Tupinambarana, pois que
pretendia homenagear o arcanjo Miguel.
Acontece que o redator da rubrica Parintins, da Wikipédia,
sequer menciona o nome de Bettendorff.
É muito séria essa questão de escrever dicionários,
enciclopédias e outras obras desse tipo.

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5 - HOMENAGEM A MARIA MOAÇARA
COMO COFUNDADORA DE SANTARÉM-PA
Enviei, por e-mail, à Prefeitura e à Câmara de Vereadores, a
sugestão de que a cacica tapajó Maria Moaçara, que viveu na
segunda metade do século XVII, pelo menos parte da sua vida
no local onde hoje se localiza o bairro Aldeia, em Santarém-
PA, seja considerada como fundadora daquela cidade, sendo
que a data comemorativa da cidade é 22 de junho, porque o
padre João Felipe Bettendorff teria chegado à aldeia de Maria
Moaçara nesse dia do ano de 1661.
Acontece, meus amigos, que aprofundei a pesquisa sobre
aquela época e verifiquei que Maria Moaçara teve tamanha
importância na sua nação tapajó, que se estendia por muitos
quilômetros, no espaço entre os rios Madeira e Tapajós,
chegando até o litoral, sendo que utilizou sua diplomacia para
fazer com que seu povo simplesmente não matasse os padres
jesuítas, o que já tinha acontecido antes, além de que, para
melhor contribuir para a paz social, acabou aceitando casar
com um militar português de nome Rafael Gonçalves.
Em boa amizade com Bettendorff e os demais padres da
Companhia de Jesus, contribuiu decisivamente para que fosse
construída a base do que seria futuramente a cidade de
Santarém.
Entendo que sua ação foi primordial, pois, se não fosse a
atuação dela, teria ocorrido o massacre aos jesuítas e
posteriormente o revide português e uma verdadeira guerra
teria ceifado milhares de vidas em pouquíssimo tempo.
Mas há um detalhe que quero esclarecer para os prezados
amigos que me concederem sua atenção.
Li atentamente o livro de Bettendorff intitulado Crônica... e
escrevi um texto, que faço questão de transcrever abaixo,
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devido à sua importância para que se esclareça que Maria
Moaçara foi uma mulher digna e não uma sirigaita, como se
fez apresentá-la na falsificação da obra de Bettendorff,
exatamente na interpolação que está nas páginas 577/578 da
edição do Senado Federal:
"PADRES JESUÍTAS NO MARANHÃO E NO PARÁ DO
SÉCULO XVII E MARIA MOAÇARA
A Ordem da Companhia de Jesus foi fundada por Inácio de
Loiola no século XVI não para edificar as criaturas na
Doutrina do Cristo, mas sim para assumir o poder onde quer
que fosse possível.
A dominação que procuraram seus representantes no
Maranhão e no Pará do século XVII só é visível para quem
aprofunda as pesquisas, como é o meu caso, que somente
tenho compromisso com a verdade histórica.
Não pretendo negar o idealismo de três padres jesuítas que ali
aportaram: Bettendorff, Consalvi e Misch, mas posso dizer,
com toda certeza, que os demais trabalharam pela
escravização dos índios e, até, pelo genocídio dos tapajós, que
foram a nação mais adiantada da região, quando sob o
comando da grande cacica Maria Moaçara.
No meu entender, se não fosse a diplomacia dessa grande
líder, não haveria a possibilidade da fundação da atual cidade
de Santarém.
Por isso, sugiro às autoridades desse município que estendam
a autoria da fundação da cidade a ela, ficando ela e
Bettendorff como fundadores.
Como ninguém se preocupou em fazer-lhe o retrato idealizei
este, que apresento nesta postagem.

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Quero esclarecer outro detalhe, que foi a fraude cometida por
algum perverso, que inseriu no livro de Bettendorff uma
passagem em que aquela mulher digna e honrada, com a
inserção maldosa e covarde, teria aparecido praticamente nua
a Bettendorff e agido como verdadeira prostituta.
Isso está nas páginas 577/578 do livro de Bettendorff na
edição do Senado Federal.
Trata-se de uma fraude, que explico em outro artigo que
escrevi sobre o assunto.
Peço às autoridades de Santarém e aos pesquisadores que
analisem esta sugestão.
Maria Moaçara foi um verdadeiro ícone, que merece ser
destacada na História do Pará e, principalmente, de
Santarém.
Espero que lhe façam justiça.

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6 - RESPONSÁVEIS PELA FUNDAÇÃO DE
SANTARÉM: BETTENDORFF E MARIA
MOAÇARA
Atualmente, a data de 22 de junho de 1661 é considerada a da
fundação de Santarém, porque nesse dia o padre Johann
Philippe Bettendorff chegou à localidade onde habitavam os
índios tapajós liderados pela cacica Maria Moaçara.
Escolheu-se esse acontecimento, ou seja, a chegada do referido
sacerdote jesuíta como a da fundação de Santarém.
O que vou dizer não vai fazer com que as autoridades
municipais dessa cidade mudem de entendimento, mas quero
lhes dizer, como pesquisador, que a importância de
Bettendorff foi muito importante para que o genocídio dos
tapajós não ocorresse naquele momento, retardando esse fato
lamentável, mas isso somente se fez possível graças à
mentalidade pacificadora de Maria Moaçara.
Então, meus amigos de Santarém, sugiro a vocês que façam
constar que sejam tidos como fundadores de Santarém
Bettendorff e Moaçara, cada um atuando de forma que se fez
possível o assentamento da missão portuguesa em Santarém.
Outros padres jesuítas tinham sido trucidados pelos tapajós,
anteriormente, e somente graças à diplomacia de ambos pôde
a missão ali instalar-se como aconteceu.

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7 - FALSIFICAÇÕES DA HISTÓRIA EM
RELAÇÃO À CACICA TAPAJÓ MARIA
MOAÇARA (MOACARA)
Tenho sempre falado que minha afeição pela História do
Brasil e pela História Universal vem desde meus 12 anos de
idade, quando comecei a ler incansavelmente,
ininterruptamente, como se o mundo fosse acabar amanhã.
Isso foi me dando base para escrever e hoje tenho 167 livros
escritos, dos quais muitos são de História, inclusive do Brasil.
Quero aqui fazer um comentário sobre um dos livros que
terminei de ler recentemente, cujo nome é "Crônica da
Missão dos Padres da Companhia de Jesus no Estado do
Maranhão", publicado pelo Senado Federal, 2010, escrito pelo
padre jesuíta João Felipe Bettendorff, que viveu de 1625 a
1698, tendo nascido em Lintgen, Luxemburgo, e morrido no
Colégio do Pará, no Brasil.
Quem pesquisa com profundidade, argúcia e vontade firme de
descobrir a verdade, acaba vendo que metade das chamadas
"verdades históricas" é mentira.
É o que acontece comigo, pois investigo fatos históricos "com
um olho no gato e outro no peixe", ou seja, acredito, em tese,
nos historiadores, mas, ao mesmo tempo, confiro para ver se
estão sendo verdadeiros ou tendenciosos ou até se não houve
interpolações, como as há na própria Bíblia.
Pois bem, a única personagem feminina destacada pelo autor
no seu livro é a cacica Maria Moaçara (ou Moacara), que, no
índice onomástico, aparece nas seguintes páginas: 195, 294,
385, 400, 577 e 630.
Aparece no livro como uma grande cacica, mulher honrada,
que, ao contrário das outras índias, que não usavam roupas,
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vestia-se à moda portuguesa e foi casada, primeiro, com o
cacique Roque, tendo ficado viúva pouco depois de um ano, e,
depois de nove anos de viuvez, casou-se com um militar
graduado português de nome Rafael Gonçalves, o que
provocou muito desagrado entre muitos índios, quase gerando
uma guerra interna, que foi contornada, e morreu assassinada
barbaramente pelo sargento-mor Domingos de Matos.
Um detalhe que me chamou a atenção, por ser muito
importante para eu conferir se esse livro foi fraudado, é que o
original sumiu, ou melhor, "sumiram-no", sendo que o nosso
famoso poeta brasileiro Gonçalves Dias encontrou apenas
uma "cópia" manuscrita, cópia esta que foi publicada no
Brasil, pela editora do Senado Federal.
Vamos pensar juntos: o manuscrito original sumiu e a edição
se baseou em uma cópia.
Até aí, aparentemente, nada de suspeito.
Mas acontece que, em todas as referências à cacica ela
aparece como uma mulher digna, respeitada, líder
incontestável dos tapajós, que ocupavam uma extensa área
localizada entre os rios Madeira e Tapajós, tendo ela habitado
principalmente onde hoje se localiza o bairro Aldeia, em
Santarém.
O suspeito é que na referência a ela das páginas 577/578, não
é mais uma mulher respeitável, que andava vestida à moda
portuguesa, mas sim uma mulher de uma vulgaridade de
prostituta, que se teria apresentado nua ao padre Bettendorff
e os acompanhantes dele, quando este foi formalmente visitá-
la e aos seus índios para convidá-los para morarem perto da
cidade, tendo sido dito que nessa ocasião, além da nudez
estranha, ela passou a mão no rosto dele, tentando seduzi-lo,
chamando-o de bonito e convidou a ele e seus companheiros

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brancos para comerem um tipo de doce na sua cabana,
inclusive querendo que o padre historiador se sentasse perto
dela na esteira.
Meus amigos, muita gente pode acreditar nessa interpolação,
tendo-a como uma afirmação feita pelo padre autor do
referido livro, mas essa não colou.
Quem inventou essa mentira não foi inteligente o suficiente,
porque, ao tentar desmoralizar a grande cacica e,
indiretamente, toda a civilização tapajó, esqueceu-se de
fraudar o restante do livro, onde o padre Bettendorff tece
elogios às virtudes da cacica, isso sem contar também que a
linguagem do incidente inventado pelo fraudador é totalmente
diferente do restante da obra.
Seria cansativa para os prezados leitores a comparação literal
dos dois estilos, mas a verdade é que a redação superior de
Bettendorff não aparece na narrativa interpolada do
escrevinhador barato e cafajeste que inseriu a mentira no
livro do grande historiador luxemburguês.
Quem lê o livro todo fica embasbacado com a elegância do
estilo de Bettendorff, mas assusta-se com a redação pobre,
sem qualificação literária e sem ética do interpolador do
incidente das páginas 577/578.
É como se alguém resolvesse retocar um espaço do quadro da
Monalisa, de Leonardo da Vinci: imaginem a portaria que
viraria o quadro...
Pois bem, o que isso tem de importante? Simplesmente o
seguinte: quem fez a interpolação mentirosa pretendeu
desmoralizar a civilização indígena avacalhando a pessoa da
sua cacica mais importante de todos os tempos, que foi Maria
Moaçara (Moacara).
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Os tapajós foram a civilização indígena mais avançada que
existiu no Brasil e literalmente desapareceu depois da morte
da grande líder Maria Moaçara (Moacara)
Alguns pesquisadores e paleontólogos estão tentando
descobrir pistas que levem ao conhecimento da grandiosidade
cultural desse povo, que alcançou seu ponto máximo de
evolução justamente na época em que essa cacica era viva, ou
seja, no final do século XVII.
Leiam o livro a que me refiro, pesquisem as outras fontes,
olhem tudo com olhos de lince e terão alguma ideia da
grandiosidade do povo tapajó, que se equipara, em muitos
aspectos, aos incas, astecas e maias.
A cerâmica tapajó, por exemplo, é de uma beleza e
complexidade que você, prezado leitor, vai ter o sonho de
consumo de adquirir pelo menos uma peça, mesmo sabendo
que se trate de mera imitação!

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8 - A QUESTÃO DOS ÍNDIOS BRASILEIROS
Eu e minha esposa Vera Lúcia Ribeiro Rodrigues temos uma
preocupação especial com os índios brasileiros a ponto de
termos escrito um livro chamado "Os Índios do Brasil",
editado pela AMCGuedes, o qual foi distribuído
gratuitamente principalmente aqui em Juiz de Fora, uma vez
que poucas pessoas têm interesse pelo tema e seria até perda
de tempo e de dinheiro investir em uma divulgação mais
ampla do livro.
Segue link para leitura ou download do livro:
http://www.amagis.com.br/plus/modulos/noticias/ler.php…
Não sabemos se obtivemos algum resultado prático em favor
dessa causa.
Só sabemos dizer que eu tenho um amigo pataxó, o qual vende
suas obras de artesanato no Parque Halfeld, aqui em Juiz de
Fora, e procuro comprar dele o que posso, não só para
adquirir aquilo que valorizamos por nós mesmos, como
também para que o artista tenha como sobreviver numa
realidade onde normalmente se preferem obras
industrializadas de arte muitas vezes sem nenhuma beleza,
segundo meu ponto de vista, pois prefiro o artesanato
normalmente em vez de produtos fabricados em série.
Mas, retornando ao tema desta postagem, que é a questão
indígena, tenho a dizer que estive na Reserva Indígena da
Jaqueira, localizada em Porto Seguro, Bahia, há uns anos
atrás, e, infelizmente, na época, eu ainda não conhecia tanto
quanto conheço hoje sobre a maravilhosa Cultura Indígena
brasileira.
Recentemente, vim a saber da grande civilização que existiu
nas redondezas da atual cidade de Santarém, no Norte
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brasileiro, e que desapareceu misteriosamente no final do
século XVII.
Para infelicidade da Cultura do nosso país, o Governo Federal
nunca investiu seriamente na pesquisa dessa civilização tão
avançada, que foi tratada por alto, mas já é alguma coisa, pelo
padre jesuíta João Felipe Bettendorff, nas suas famosas
Crônicas, e que teve, naquela época, como figura destacada a
cacica que ficou conhecida com o nome de Maria Moaçara.
Pois bem, estudos recentes afirmam que se tratou de uma
grande civilização.
Mas as outras etnias indígenas também merecem estudos
especiais e precisariam da presença de arqueólogos, sociólogos
e historiadores para sua valorização verdadeira perante o
povo brasileiro, que, segundo detectamos, quase nada sabe
sobre esses brasileiros que, segundo achamos, devem ser
tratados com muito respeito, principalmente porque lhes
roubamos o território e lhes dizimamos milhões de irmãos no
passado e agora deixamos para eles apenas alguns pedacículos
de terra, onde eles vivem, ou melhor, sobrevivem do
artesanato, que lhes dá o mínimo para morrerem de fome e de
doenças que os brancos lhes transmitem, sem contar a
corrupção moral que lhes ensinaram, prostituindo-lhes as
filhas e ensinando-lhes aos filhos as tortuosidades morais dos
brancos.
Não estou exagerando, mas sim dizendo a verdade.
Todavia, anexo a esta postagem um link para um
documentário que selecionei meio que aleatoriamente sobre o
mundo dos índios do Brasil:
https://www.youtube.com/watch?v=7lizWxoi2F4

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9 - A CIVILIZAÇÃO TAPAJÓ
Quem valoriza somente o que é estrangeiro deixa de conhecer
muitas coisas importantes que existem ou existiram no nosso
querido Brasil.
Essas pessoas deveriam se informar, por exemplo, sobre a
civilização tapajó, que existiu na região da atual cidade de
Santarém, no Pará, e se estendeu pelas adjacências dos rios
Tapajós e Madeira, mas que se extinguiu misteriosamente no
fim do século XVII e teve como figura mais destacada a cacica
que ficou conhecida pelo nome de Maria Moaçara, a qual foi
mencionada principalmente pelo padre João Felipe
Bettendorff como sendo uma grande líder daquela nação.
A Arte Ceramista, por exemplo, dos tapajós, supera, de
muito, a Marajoara em qualidade estética.
Foi uma civilização avançada.

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10 - PADRE JOHANN PHILIPP
BETTENDORFF: AMIGO DOS ÍNDIOS
BRASILEIROS
Os jesuítas, no seu geral, foram os maiores responsáveis pelo
genocídio material e cultural indígena no Brasil, não só por
iniciativa pessoal, escravizando índios, como também
descaracterizando sua cultura e bem assim apoiando o
Governo português na chamada "guerra justa", que se
iniciou sob o patrocínio do padre Manuel da Nóbrega e que
visava matar todos os índios que não se submetessem aos
colonizadores e aos padres jesuítas.
Essa é a verdade histórica.
Um padre que defendeu os direitos dos índios, inclusive diante
da Corte portuguesa, chamava-se Johann Philipp Bettendorff
e viveu no século XVII no Brasil.
Morreu em Belém do Pará, depois de ter vivido numa tribo
indígena durante um longo tempo.
Esse benfeitor dos índios evitou que ocorresse na Amazônia o
genocídio que aconteceu principalmente nas regiões leste e sul
do Brasil.
Deveria ser homenageado, mas ficou praticamente esquecido
enquanto que os dizimadores de índios, que foram Nóbrega e
Anchieta, entraram para a História do Brasil como grandes
vultos, que, na verdade, não foram mais do que carrascos
vestidos de preto.
Viva Bettendorff, esse grande humanista, cujo retrato sequer
subsiste para ser lembrado pelas gerações que o sucederam!
É o Brasil da mentira e dos falsos heróis.

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11 - A VERDADE SOBRE JOÃO DE
AZPILCUETA NAVARRO
A maioria dos brasileiros nunca ouviu falar nesse
personagem, que nasceu em 1521, na Espanha, sendo parente
de Inácio de Loyola, Francisco Xavier e Martim de Azpilcueta
Navarro, sendo que o primeiro foi o célebre e questionável
fundador da Companhia de Jesus, o segundo uma figura
proeminente dentro dessa Ordem Católica e o terceiro um
jurista e economista importante na Espanha do século XVI.
Até aqui nada de mais, todavia, vou acrescentar que ele foi
professor de Direito Canônico, por um ano, na Universidade
de Coimbra, talvez mais por influência do seu parentesco,
principalmente do último parente, mas não quis continuar na
vida sedentária da Europa e ingressou na Companhia de
Jesus, vindo parar no Brasil, aqui chegando em 1549, ou seja,
na primeira leva de jesuítas, comandada pelo imponente
Manoel da Nóbrega, o qual, diga-se de passagem, não tinha
nenhuma vocação para a religiosidade e tentou ingressar na
Universidade de Coimbra como professor, mas foi recusado
por conta da sua gaguez, apesar das insistências do seu mestre
professor Martim, acima referido.
O jovem jesuíta aportou na Bahia com cerca de 28 anos de
idade, portanto, maduro para ter ciência de que encontraria
aqui uma realidade muito diferente da europeia.
O que o teria movido a escolher, em primeiro lugar, a vida
eclesiástica e, dentro dela, o Brasil ainda selvagem?
Ninguém faz esse tipo de escolha por acaso, mas sim porque,
ates de nascer na existência da época, programou um trabalho
específico nessa área.

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Era a primeira vez que aquele espírito viveria no Brasil, mas
já tinha muita experiência, de outras vidas, nas durezas da
vida militar e aguentaria bem as condições adversas do Novo
Mundo.
Estava, portanto, preparado para a missão que trouxera:
infiltrado na Companhia de Jesus, fundada em 1540, poderia
auxiliar os índios brasileiros e contribuir para neutralizar o
escravagismo dos portugueses colonizadores desta terra.
Assim é que, no começo, não se apercebeu da sua missão e
achou os habitantes do Brasil, tanto indígenas como brancos,
muito estranhos, ou seja, exatamente o contrário do que tinha
aprendido na Europa sobre as questões éticas.
Duas coisas lhe chocaram a sensibilidade e a formação
cultural: a antropofagia e a liberdade sexual.
Quanto à primeira, lutou de todas as maneiras para incutir na
mente dos índios que esse costume era nefasto e que deveria
ser abolido.
A respeito da segunda, com o tempo acabou achando que os
índios eram puros e que sua liberdade sexual representava
um estilo que os brancos não saberiam nunca compreender e,
se adotassem essa forma de proceder, transformariam a
espontaneidade em promiscuidade.
A verdade é que a antropofagia foi perdendo espaço, não por
conta da mudança de mentalidade dos índios, mas sim porque
ocorreu um verdadeiro genocídio e os poucos índios que
sobraram eram insuficientes para se comerem uns aos outros.
Devo dizer, para quem não sabe, que os índios comiam apenas
seus inimigos, como ato de vingança e consideravam que

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apenas matá-los não seria suficiente para lavar sua honra e
dos seus parentes e antepassados.
Os brancos transformaram a liberdade sexual em
libertinagem mais descarada, que, a muito custo, a Igreja
Católica conteve dentro da maior hipocrisia, o que redundou,
depois da invenção da pílula anticoncepcional, na atual
promiscuidade tão desabrida quanto era no século XVI, a que
me refiro.
Todavia, retomando o fio da meada, tenho a dizer que o padre
Navarro, que era conhecido como “Ivituruna” pelos índios,
pois era muito alto e usava a batina negra dos jesuítas, foi o
primeiro a se interessar em aprender a língua dos índios para
melhor interagir com eles.
Aprendeu sobre suas leis não escritas, seus costumes e sua
realidade.
Realmente, daquela geração e das posteriores, foi o que mais
se integrou na realidade dos índios do Brasil.
Inclusive tornou-se amigo e discípulo do famoso chefe
Cunhambebe, que, apesar de habitar na costa do atual Rio de
Janeiro, andava por larga extensão do litoral, inclusive nas
cercanias da Bahia.
Dedicando-se à chamada “catequese”, na verdade, o padre
Navarro gostava mesmo é de estar com os índios, uma vez que
lhe aborrecia a hipocrisia dos seus colegas de batina, que
fingiam castidade, mas tinham suas escravas índias para
resolverem a questão prementemente humana da sexualidade.
Não se fez de rogado quando surgiu a oportunidade de viajar
em companhia do grande sertanista Francisco Bruza

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Espinoza, também espanhol, que conhecia grande parte do
interior do Brasil.
O resultado foi que, em 1553, partiu de Porto Seguro a
referida expedição, da qual faziam parte esses dois amigos
espanhóis, além de doze portugueses, cujo nome a História,
infelizmente, não registrou e mais algumas centenas de índios,
muitos dos quais amigos do líder Espinoza e do “Ivituruna”.
Não é dispensável dizer que os brancos, quando se integravam
nos costumes indígenas, tinham de andar nus e ficar livres das
sobrancelhas, cílios e barba.
Deverá ter sido nessas condições que se embrenharam pela
selva e, depois de mais ou menos um mês, chegaram ao Rio
Jequitinhonha.
Andaram pela região por mais de um ano e fundaram alguns
núcleos humanos, aproveitando a parceria com os índios.
Descobriram ouro e pedras preciosas, naturalmente que com
a ajuda dos índios, que conheciam suas próprias regiões.
O “Ivituruna” tinha muita curiosidade em aprofundar suas
pesquisas sobre os índios, pois, no fundo, era muito mais um
antropólogo do que um religioso.
Passados quase um ano e meio da partida de Porto Seguro,
Espinoza anunciou que não retornaria àquela cidade,
preferindo ficar no convívio com os índios, mas Navarro
retornou, acompanhado dos referidos doze portugueses e um
quantidade de índios.
De qualquer maneira, a miscigenação já tinha começado na
região do atual Vale do Jequitinhonha, pois todos deixaram
filhos havidos com as índias.

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Alguém perguntará a vantagem disso, mas a miscigenação
significou o início da verdadeira raça brasileira naquele ponto
geográfico, a qual se compõe da mistura de brancos,
vermelhos e negros, estes últimos que somente viriam depois,
a partir de 1566, quando determinou o governador-geral
Mem de Sá, sua trazida à força da África, governador esse de
triste memória para a História do Brasil, devido aos seus
feitos de escravocrata de índios e de negros africanos.
Mas, chegando novamente a Porto Seguro, Navarro estava
combalido, apesar da pouca idade, e, em 1557, ou seja, com 36
anos de idade, faleceu, sendo sua morte muito sentida pelos
índios e pouco pelos jesuítas, que o consideravam uma
verdadeira “ovelha negra”, devido à sua declarada simpatia
pelos índios e aversão à ideologia escravocrata dos jesuítas e
dos portugueses.
Somente não se lançou uma pá de cal em cima do seu nome e
dos feitos do corajoso sertanista porque era de família
destacada e isso lhe valeu ter duas de suas cartas conservadas
e que fazem parte da memória jesuítica e histórica do Brasil
do século XVI.
Atualmente é lembrado como nome de uma praça em
Salvador (Praça Azpicueta Navarro), onde morou durante
três anos dos oito que viveu no Brasil.
Sua maior contribuição foi o respeito que impôs aos seus
colegas de batina, inclusive Nóbrega, os quais, se não fosse sua
amizade aos nativos, teriam mais rápido os transformado em
escravos ou os teriam dizimado totalmente.
O Brasil não é afeito a valorizar seus verdadeiros benfeitores,
mas este padre é um desses, que trago dos arquivos do tempo
para vocês, prezados leitores, conhecerem.

25
Se Anchieta, Nóbrega e outros serviram à escravização e
mortandade dos índios, este foi defensor dessa raça, que, na
certa, deixará de existir daqui a uns poucos séculos, se não
houver quem os defenda.

26
12 - A VERDADEIRA HISTÓRIA DO BRASIL
Os compêndios da História do Brasil registram que Portugal
descobriu estas terras em 22 de abril de 1500 e fomos sua
colônia, de direito ou de fato, até 7 de setembro de 1822,
quando D. Pedro I proclamou a nossa independência.
Mas a verdade é que nenhum país da Europa respeitou,
realmente, o Tratado de Tordesilhas, celebrado entre
Portugal e Espanha, tanto que a França tentou se apossar do
território brasileiro, logo no começo da presença branca neste
país, aqui fundando o que chamou de França Antártica e
somente não tomou todo o território naquele mesmo século
porque estava empenhada em uma guerra civil, que lhe minou
as forças e, depois, passou a investir na conquista de outros
territórios, localizados, por exemplo, na África e na Ásia, que
não vem ao caso aprofundar aqui.
A Inglaterra também não se interessou em conquistar para si
o Brasil, pois tinha investimentos altos na colonização de
outras terras, por exemplo, na América do Norte, Ásia e
África.
A Holanda investiu pouco na tentativa de conquista do Brasil,
limitando-se ao espaço onde hoje se localiza o estado de
Pernambuco, por intermédio da Companhia das Índias
Ocidentais, no século XVII.
Em suma, quando se diz que o Brasil sempre foi colônia de
Portugal no período que vai do descobrimento até 1822 não se
está afirmando integralmente uma verdade, mas
simplesmente dando valor a um povo, que, por razões várias,
mas principalmente por falta de opção dos habitantes do país
mais pobre da Europa, emigrou em massa para este novo

27
mundo, acreditando que aqui pelo menos não morreria de
fome.
Milhares de portugueses sem chance de sucesso no minguado
Portugal vieram para o Brasil, em levas sucessivas ou
individualmente, e aqui disputaram com unhas e dentes sua
própria sobrevivência com franceses, holandeses e índios,
estes últimos sendo seus principais alvos, a ponto de serem
praticamente extintos até chegarmos hoje a pouco mais de
300.000 indivíduos, sendo que, na época do descobrimento,
eram mais de 5.000.000.
A História é contada pelos portugueses e pelos brasileiros da
forma como se ensina nas escolas desses dois países, mas
quem aprofundar a pesquisa verá que aconteceu do jeito
como está dito acima.
A independência “pro forma” do Brasil aconteceu realmente
em 1822, com o consenso dos países que disputavam o Brasil,
a qual somente se fez possível com a compra da neutralidade
inglesa, sobretudo, a peso de muito ouro, direta ou
indiretamente.
Temos de conhecer a realidade: apenas mudamos de donos,
como povo, e agora somos colônia dos Estados Unidos,
conforme disse Theodore Roosevelt: “A América para os
americanos.”, ou seja, o continente americano deve ser
dominado pelos estadunidenses, herdeiros espirituais dos
ingleses, os quais trazem na sua ideologia a essência da
cultura hegemônica romana.
Quem não entendeu vai ficar iludido sempre com os
programas de governo de esquerda ou de direita.
Roma continuará dominando uma parte do mundo ainda por
muitos anos.
28
O Brasil permanecerá como sua possessão até que ela entre
em colapso e surjam novos valores éticos na Política e na
Economia internacionais.
Essa é uma verdade que nós, brasileiros, devemos conhecer
para trabalharmos pela nossa verdadeira independência, que
ocorrerá quando tivermos conquistado as grandes virtudes
do trabalho, da organização, da disciplina, do planejamento e
da honestidade.

29
13 - ESPINOSA, NAVARRO, CUNHAMBEBE,
SEPÉ TIARAJU, TIRADENTES E SÉRGIO
MORO – ALGUNS DOS BENFEITORES DO
BRASIL
A História, realmente, é feita de encomenda por quem paga
mais, porque o mercenarismo ainda domina, apesar das
poucas e louváveis exceções.
Dizer isso pode parecer ofensivo àqueles que, profissional ou
amadoristicamente, relatam fatos para conhecimento da
posteridade.
A História do Brasil, por exemplo, é um amontoado de
mentiras, em que se endeusaram figuras questionáveis como
Manuel da Nóbrega, José de Anchieta, Mem de Sá, D. Pedro I
e outros tantos, enquanto que os verdadeiros heróis da
civilização que ficou neste imenso território originalmente dos
índios e agora dos brancos predominantemente são gente
como os espanhóis Juan de Azpilcueta Navarro e Francisco
Bruza Espinosa, que, ao invés de escravizarem e matarem os
índios que encontravam, aprendiam e ensinavam, numa troca
salutar, que deveria ser o parâmetro a ser seguido por
Portugal; os grandes líderes indígenas Cunhambebe e Sepé
Tiaraju, os quais, cada um na sua época, impediram o
genocídio indígena respectivamente no litoral do atual Rio de
Janeiro e do atual Rio Grande do Sul; Tiradentes, que
ensinou, com o próprio destemor, os brasileiros a não
aceitarem a exploração estrangeira, o que até hoje não
aprendemos e, perdoem-me se discordarem, Sérgio Fernando
Moro, que está querendo transmitir aos brasileiros de hoje a
velha lição de Capistrano de Abreu de que todo cidadão
brasileiro deve ter vergonha na cara.

30
A História, meus amigos, tem de ser reescrita, para que se
tome conhecimento das perversidades praticadas, sobretudo
pelos colonizadores portugueses, conluiados com a quase
totalidade dos padres jesuítas que aqui vieram para extorquir
ouro, pedras preciosas e tudo que significasse riqueza dos
índios e prostituírem as índias em nome do Cristo eles
conhecem apenas de raspão.
Verdadeiros conchavos uniam (e unem ainda) religiosos e
governantes para, se possível, extinguir a raça vermelha no
Brasil e substituí-la pela mão de obra dos negros africanos,
que também eram objeto do mesmo tipo de exploração: os
homens fortes eram levados a trabalho escravo até que a
morte de fome e de excesso de esforço os livrasse da sua vida
sofrida.
Quem não tinha pelo menos um escravo era cidadão que
sequer podia dizer-se tal, pois um escravo ou uma escrava
custavam menos que qualquer burro ou porco.
Assim se desenvolveu a chamada “civilização” brasileira, em
que o trabalho passava longe das cogitações dos brancos, que
se permitiam a ociosidade e todos os tipos de vícios, absolvidos
pelos párocos corruptos, que vendiam indulgências enquanto
eles próprios tinham seus escravos e escravas de cama e mesa.
Com a libertação dos escravos por ordem da digna princesa
Isabel, passaram os homens negros à posição de assaltantes e
as mulheres de prostitutas.
Depois de um ano, proclamou-se a República, vindo a ocupar
os cargos presidenciais vários ditadores, dentre os quais
Deodoro da Fonseca, Floriano Peixoto, Getúlio Vargas,
Humberto de Alencar Castello Branco, Artur da Costa e
Silva, Ernesto Geisel, João Batista de Oliveira Figueiredo,

31
Luís Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, num período
republicano de 129 somando quase que a metade de ditadura.
Agora, perguntamos: - Somos um país democrático? Os
governos militares são piores do que os civis? Nosso povo tem
realmente empenho em escolher bem seus governantes ou
gosta de vender seu voto? Os poderes republicanos são
compostos por cidadãos que amam seu país? A dominação
estrangeira deixou de existir? As pessoas se interessam pelos
rumos da nação? A corrupção está no sangue dos brasileiros
ou só dos governantes? Depois da deposição de um governo
corrupto seus sucessores têm sido honestos? Vale a pena lutar
pela honestidade ou compensa ser mais um corrupto entre
tantos?
Cada um terá sua resposta pessoal, como cidadão que tem
vergonha na cara, como dizia Capistrano de Abreu.
Sigamos, brasileiros e brasileiras, os exemplos daqueles que
são heróis de verdade e não os que riem da desgraça do povo,
da fome, da falta de instrução, das injustiças, porque, na
verdade, muitos desses falsos idealistas vivem no luxo, coisa
que não aconteceu e acontece com nenhum daqueles heróis de
verdade que apontei acima.

32
14 - A HISTÓRIA DE NAVARRO E DE
ESPINOSA
Navarro, apesar de parente próximo do referido Loyola, não
se adequava aos parâmetros delineados pelo fundador da
Companhia de Jesus e demais superiores hierárquicos, tendo,
inclusive, deixado a cadeira de professor da Universidade de
Coimbra, onde lecionou por apenas um ano Direito Canônico
e escreveu um livro, preferindo vir para o Brasil, uma vez que
não tinha vocação para o Magistério e, ao contrário, era
dotado de visível espírito aventureiro, atraindo-o a ideia de
ficar livre das peias da hipocrisia e viver livremente, em
contato com a Natureza e pessoas menos duras de coração.
Opostamente a Manoel da Nóbrega - que veio para o Brasil
decepcionado e desgostoso, porque não logrou ingressar no
Magistério na referida Universidade, apesar da intercessão do
seu ex-professor Martim de Azpilcueta Navarro, tio do nosso
Navarro, devendo-se essa não contratação pelo fato de ser
gago - o nosso Navarro pediu autorização para vir para esta
terra: não se adaptava, como disse, ao padrão rigorista e
formalista da Companhia de Jesus nem ao da Universidade.
Queria conhecer o Brasil, do qual já ouvira falar: era
espanhol de família ilustre e parente próximo de três figuras
destacadas na Espanha do século XVI: seu tio Martim,
conceituado jurista, professor e economista, que se
encarregou da sua formação na infância e juventude, Inácio
de Loyola e Francisco Xavier, o jesuíta que foi cognominado o
“apóstolo da Índia”.
Nos primeiros tempos no Brasil ainda se mantinha um tanto
ingênuo sobre a hipocrisia da chamada “catequização” dos
índios, conforme se verifica pelo teor da sua carta escrita em

33
1551. Em 1554 teve oportunidade de sair daquele meio
hipócrita e adentrar pelo sertão, na famosa expedição,
preferível a ficar querendo transformar os índios, que tinham
seu estilo de vida e suas crenças próprias, em europeus
adestrados à força.
Quanto a Espinosa, os historiadores apenas informam que era
castelhano e que, antes de chegar ao Brasil, tinha feito uma
passagem pelo Peru e que veio para o Brasil, indo morar em
Porto seguro, onde constituiu família. Mas levei a pesquisa
mais adiante e pude concluir que, sendo de família judia (o
sobrenome Espinosa é judeu), teve de abandonar sua terra
natal, em Castela, por causa da perseguição católica aos
marranos (judeus convertidos ao Catolicismo) e foi morar no
Peru (que era uma das colônias espanholas (não conseguindo
permanecer lá pelo mesmo motivo, e, dali, veio para o Brasil,
chegando a Porto Seguro.
Concluí que a missão de chefiar a expedição rumo ao atual
Norte de Minas somente lhe foi confiada porque não havia
nenhum outro que ousasse tal empreitada e também porque
era tido como muito honesto e os índios eram seus amigos.
Portanto, ninguém melhor do que ele para procurar ouro e
pedras preciosas para entregá-los de mão beijada aos jesuítas
e ao Governo português.
Mas a experiência vivida, de perseguição na sua terra natal e
no Peru, deve ter servido, pelo que calculo, para sensibilizar o
grande sertanista, que foi Espinosa, para a valorização do
povo e da Cultura Indígenas,
Em Porto Seguro, onde residiu durante cerca de dez anos,
ficou conhecendo Navarro.

34
Bem mais velho que o jovem padre, que aqui chegou em 1549,
portanto, com 27 ou 28 anos, isso não impediu que se
tornassem amigos muito chegados e, inclusive, os muitos
escritos que Navarro traduziu para o tupi contaram com as
ajudas do irmão jesuíta Vicente Rodrigues e do amigo
sefardita Francisco Bruza de Espinosa, que, portanto, era um
homem culto.
Surgiu a oportunidade da expedição, encomendada pelo
Governador-geral de então, da colônia brasileira, rumo às
cabeceiras dos rios Jequitinhonha e São Francisco, onde,
segundo informações dos índios, havia muito ouro e pedras
preciosas. Então, o jovem jesuíta não hesitou em acompanhar
o sertanista e, com a autorização do seu superior, que era
Nóbrega.
Reuniram-se a eles doze portugueses e algumas centenas de
índios e foram de Porto Seguro até a região acima apontada,
ora por via fluvial, ora à pé, conforme Navarro narrou em sua
carta de 20 de junho de 1555.
A ajuda dos índios foi imprescindível, não só para não
errarem o caminho, como também como garantia contra os
ataques de outros indígenas.
Navarro conta sobre essa viagem, de forma resumida, a qual,
de ida, durou cerca de um mês.
Na verdade, o objetivo real da expedição não era catequisar
os índios, mas sim descobrir ouro e pedras preciosas, por
indicação deles, que enriqueceriam a Companhia de Jesus, o
Governo português e os próprios habitantes da colônia que
fossem ladinos o suficiente para tirarem proveito da situação.
Navarro permaneceu mais de um ano na região aonde
chegaram, ali aprendendo muito da Cultura Indígena e
35
colaborando com Espinosa na formação de núcleos humanos,
que se desenvolveram entre os índios que eram conhecidos
pelos portugueses como botocudos, uma vez que usavam
botoques no lábio inferior e nas orelhas.
Esses índios eram muito arredios em relação aos portugueses,
que consideravam inimigos, mas aceitaram de boamente a
convivência e as orientações, sobretudo, de Espinosa e
Navarro.
Ao final de um ano e meio Navarro estava de volta a Porto
Seguro, levando consigo nenhum ouro e pedras preciosas,
para estranheza de todos, mas, em contrapartida, centenas de
índios e todos os doze portugueses sãos e salvos. Todavia,
apesar de ainda relativamente jovem, apresentava vários
achaques orgânicos, devido às condições precárias durante
aquela aventura em regiões totalmente desprovidas de
recursos materiais.
Daí a um ano faleceu, conforme conta um seu colega de batina
em carta um tanto hipócrita, porque, na verdade, Navarro
não era bem visto pelos jesuítas e pelos portugueses, devido à
sua grande simpatia pelos índios.
Espinosa não voltou para o mundo “civilizado”, preferindo
continuar sua vida, até o final, junto aos seus queridos
botocudos.
A história de Navarro é relativamente conhecida, apenas no
que se achou conveniente registrar em proveito da doutrina e
da atuação jesuíticas, mas foi literalmente apagada no que diz
respeito à sua amizade aos índios e sua atuação em defesa
deles e da sua Cultura.
Quanto a Espinosa pouco se registrou, mas tenho a opinião de
que se tornou um verdadeiro líder branco junto aos
36
botocudos, que ocupavam todo o vale do Jequitinhonha, com
isso preservando por muitos anos aquela região das
arremetidas escravagistas dos colonos portugueses.
Infelizmente, a atuação de Navarro em Porto Seguro e
Salvador, que foram as duas cidades baianas onde atuou
como professor e estudioso da língua tupi, essa atuação foi
abafada, sobretudo, pelos seus contemporâneos, liderados por
Nóbrega, muito cioso do seu comando, e, quanto ao que
realizou diretamente junto aos índios, ele próprio teve o
cuidado de manter em segredo, para não piorar ainda mais
seu descrédito junto aos jesuítas e aos colonizadores
portugueses.
Tenho para mim que ficou conhecendo o famoso cacique
Cunhambebe, o qual transitava frequentemente pela costa
brasileira a partir do Rio de Janeiro e o jesuíta “sui generis”
tornou-se seu discípulo quanto à Cultura Indígena, bem como
adepto na luta pela preservação da raça vermelha.
Posso dizer que, em resumo, esses dois espanhóis
contribuíram, e muito, para que o genocídio indígena fosse
freado naquele longínquo século XVI.
Eram cerca de 5.000.000 de índios quando Pedro Álvares
Cabral aqui chegou em 1500 e agora são menos de 300.000:
um verdadeiro genocídio.
Os historiadores da região do Jequitinhonha valorizam, e
muito, os nossos dois personagens, mas quem escreve sobre as
entradas, que antecederam as bandeiras, no geral, passa meio
que por alto a contribuição dos referidos espanhóis, talvez até
por espírito xenofóbico.
Estou apresentando a vocês, prezados leitores, Navarro e
Espinosa, dois beneméritos do Brasil indígena, que ousara
37
desafiar os interesses da Companhia de Jesus e do Governo de
Portugal, o qual, principalmente quando Mem de Sá e seu
sobrinho Salvador Correia de Sá foram nossos Governadores-
gerais, promoveram a morte em massa de indígenas
brasileiros e incrementaram a escravidão negra como nunca
aconteceu em qualquer outra época da História do Brasil.
Restringi-me aqui à História brasileira do século XVI para
lhes apresentar Navarro e Espinosa.

38
15 - O MAUCARATISMO DOS PADRES JESUÍTAS
MANUEL DA NÓBREGA, JOSÉ DE ANCHIETA E
ANTONIO VIEIRA E DO GOVERNADOR-GERAL MEM
DE SÁ
Quem estuda a História do Brasil até o século XVII apenas
por alto talvez tenha guardado uma boa impressão desses três
padres jesuítas e desse governador-geral, mas quem
aprofunda a pesquisa, na certa que ficará conhecendo a
mentalidade perversa que os caracterizou, pois, na verdade,
1) Manoel da Nóbrega não tinha nenhuma vocação para lidar
com os índios, uma vez que, sendo gago, em vão tentou
conseguir uma vaga de professor na Universidade de
Coimbra, somente admitindo a ideia de embarcar para o
Brasil porque, na posição de chefe da pequena delegação de
jesuítas que chegou em 1549, era um verdadeiro ditador dos
próprios colegas de batina e dos colonos, sem contar que
virou, a partir de certo ponto, carrasco dos índios, declarando
a chamada "guerra justa", que significou o seguinte: os índios
que não se submetessem à autoridade dos jesuítas e do
governador-geral poderiam ser escravizados ou mortos por
qualquer pessoa e sem nenhuma justificativa que não essa; 2)
Anchieta, que era um homem adoentado por uma fraqueza
generalizada, aportou no Brasil para tentar melhorar a
própria saúde, também sem nenhuma vocação para a
filantropia e enganou sempre os índios com falsas promessas,
sendo o tempo todo o braço direito de Nóbrega e apoiando a
perversidade dos brancos contra os índios, em constantes
atuações hipócritas, que bem caracterizam a ideologia
jesuítica, a qual consiste em exercer o poder como um
verdadeiro exército sem fuzis, mas devendo tudo fazer para
dominar quem quer que ouse contrariar os postulados da
famigerada Companhia de Jesus; 3) Vieira foi o protótipo do

39
jesuíta ambicioso e vaidoso, que se imiscuiu em todos os
setores e lugares onde conseguiu, chegando ao ponto de ser
preso e apupado pelo povo brasileiro de então, composto pelos
colonos brancos e pelos índios, e não encontrou um defensor
sequer por causa das suas inconveniências e ânsia de
evidência, provenientes do seu complexo de inferioridade por
ser mulato; 4) Mem de Sá foi o mais perverso de todos os
governadores-gerais do Brasil e determinador da morte de
milhares de índios, aqueles que não aceitavam suas
arbitrariedades, sem contar a mão forte que deu aos
traficantes de escravos negros africanos. Foi aliado dos
jesuítas nas perversidades, principalmente de Nóbrega e
Anchieta.
Meus amigos, quem pesquisa com sincero e persistente desejo
de conhecer a verdade acaba descobrindo que muitos dos
heróis que hoje se homenageiam, na verdade, são vilões,
pessoas de mau caráter, enquanto que outros homens e
mulheres, que ficaram ignorados ou subvalorizados pela
História oficial são os verdadeiros heróis.
Entendo como herói quem realiza o Bem com o coração cheio
de bondade e com respeito humano.
A Companhia de Jesus (Ordem fundada por Inácio de
Loyola) tinha e tem finalidades perversas e da ideologia do
Cristo somente tem o rótulo.
Estudem a fundo e verão isso, mas estudem mesmo, desde sua
fundação em 1540, e detectarão pouquíssimos homens de
batina jesuíta realmente humanitários e bons.
E na política governamental portuguesa, na época do Brasil
colônia, verão em Mem de Sá o mais perverso verdugo do
Brasil.
Tenho para mim que o pesquisador sério deve, sempre, não só

40
apontar os verdadeiros heróis, como desmascarar os falsos
benfeitores e heróis de araque.
O povo brasileiro tem o direito de saber se está valorizando
quem merece, pois os nossos ídolos, em um país que não lê,
são impostos pelas elites de sempre e pelos historiadores
mentirosos, comprometidos à peso de dinheiro ou favores dos
poderosos do momento.

41
16 - A EXISTÊNCIA DAS ICAMIABAS
Se a gente utilizar o nome “icamiaba” quase ninguém saberá
a quem estaremos nos referindo, mas elas nada têm a ver com
outra expressão, que é “amazona”, que muita gente associa a
elas, aliás, sem nenhuma razão.
As “amazonas” eram as famosas guerreiras da Mitologia
grega, enquanto que as “icamiabas” tiveram sua existência
confirmada pela primeira vez em 12 de fevereiro de 1542 pelo
frei Carvajal, o qual era o responsável pelo registro da
expedição espanhola chefiada por Orellana, que adentrou
pela Amazônia naquela época.
Esse documento foi levado ao conhecimento do rei espanhol
Carlos V, o qual, por simples associação de ideias, chamou as
guerreiras de “amazonas”.
A informação de Carvajal consta de um livro de sua autoria e
traz detalhes importantes, inclusive o de que uma flechada
atingiu-o no rosto, cegando-o de um olho.
Muito se escreveu, fora do Brasil, sobre as “icamiabas”,
inclusive que se encontravam anualmente com guerreiros de
uma tribo vizinho, formada só de homens, a fim de
acasalamento, visando a perpetuação da linha matrilinear das
“icamiabas”, de tal forma que, se nasciam meninas, eram
conservadas em poder das mães “icamiabas” e, se nasciam
meninos, eram entregues aos pais, ou seja, aqueles da tribo
vizinha.
Em suma, interessava às “icamiabas” apenas as meninas, que
eram treinadas para a guerra, aprendendo, sobretudo, a
utilizar o arco e flecha.

42
No Brasil pouca gente acredita que elas tenham sequer
existido, tratando-as como uma lenda de fundo erótico, mas
há pesquisadores sérios, que se informaram a respeito e
garantem sua existência, pelo menos até há alguns anos atrás,
como é o caso de um historiador que realizou um trabalho
nesse sentido em 1967.
Vale a pena lembrar que a FUNAI registra atualmente a
existência, na região amazônica, de cerca de cem tribos que
não têm nenhum contato com o mundo civilizado.
Mas acreditamos poder considerar que o número real é muito
maior do que esse, porque duvidamos de que os burocratas da
FUNAI se embrenhem pelas matas e que conheçam todos os
seus recantos para verificarem quantas são realmente as
tribos a que se referem.
Milita em favor da existência passada, ou até atual, das
“icamiabas” uma festividade indígena tipicamente feminista,
realizada por várias tribos, na qual, anualmente, as índias
assumem o comando e impõem aos seus maridos os deveres
tipicamente femininos naquele dia, como uma forma de
ameaça de abandonarem a tribo e formarem nações
“icamiabas”, o que, diga-se de passagem, consegue intimidar
os referidos machões.
Quase ninguém sabe dessa realidade e não tem ideia do por
que os índios respeitam tanto suas mulheres!
Por ora é o que informo sobre o assunto, ou seja, as
“icamiabas”, sobre as quais estou pesquisando.

43
17 - A INTEGRAÇÃO DAS RAÇAS BRANCA E
VERMELHA NO BRASIL DO SÉCULO XVI - Espinosa,
Navarro, Cunhambebe e Moreia

INTRODUÇÃO
A segunda metade do século XVI da História do Brasil nunca
foi contada da forma como os prezados leitores verão neste
livro.
A maioria das pessoas que recebem informações sobre aquele
período vê, normalmente, as figuras do governador-geral
Mem de Sá, dos padres jesuítas Manuel da Nóbrega e José de
Anchieta e do colonizador francês Nicolau de Villegagnon e
pensa que tudo girou em torno deles.
Vamos focalizar outros personagens, totalmente diferentes,
cuja atuação, segundo pudemos detectar nas nossas pesquisas
e conclusões, visou, não a escravização dos índios para
trabalharem para os brancos, nem sua dizimação, por que se
recusavam a desempenhar esse papel, mas sim a gradativa e
espontânea integração entre brancos e índios, sem violências e
sem prejuízos para nenhuma das partes, podendo todos
habitar o imenso território brasileiro, com a condição de cada
povo respeitar a cultura do outro e, assim, haver uma
convivência fraternal, onde os brancos ensinariam os índios a
não mais praticarem a antropofagia e a poligamia, enquanto
que os brancos aprenderiam com os índios a grande Ciência
da Natureza e a democracia.
Esse ideal dos nossos quatro personagens foi colocado em
prática, enfrentando o poderio do Governo português e da
Companhia de Jesus.
Aparentemente esses dois últimos segmentos saíram
vitoriosos, mas o que ficou de sementes boas para brotarem
44
no futuro é o que valeu para formar mentalidades mais
arejadas e democráticas do que a dos quatro personagens
ditatoriais que mencionamos acima: Mem de Sá, Nóbrega,
Anchieta e Villegagnon.
As civilizações, os povos recebem, normalmente, as influências
boas e más de personalidades que exercem a liderança, como
o trigo e o joio da parábola evangélica, sendo essa ainda a
realidade humana.
Os personagens que retratamos neste livro são o trigo e os
outros quatro o joio.
Os prezados leitores têm o direito de entender o contrário, se
o quiserem, mas, se o Brasil é hoje uma nação confusa,
desorganizada, vítima de ditadores etc., devemos isso aos
quatro escravagistas e outros que os sucederam.
Podem notar que o que os índios tinham para aprender,
aprenderam de verdade, que foram a abolição da
antropofagia e da poligamia, mas o que os brancos
precisavam assimilar não o fizeram e, assim, até hoje não têm
a mínima consideração pela Natureza e desconhecem a
democracia, apesar da quantidade de leis que tratam dos dois
assuntos.
Vamos adotar neste livro uma inversão que será útil para os
prezados leitores: pedimos que leiam primeiro os dados
biográficos de cada um dos nossos personagens, a fim de
terem uma noção melhor de suas ideias e propósitos, de que
trataremos na Segunda Parte.

PRIMEIRA PARTE – BIOGRAFIAS RESUMIDAS


DOS PERSONAGENS
1 – FRANCISCO BRUZA ESPINOSA
45
Consigna a Wikipédia:
“Francisco Bruza Espinosa, castelhano, foi dos primeiros
desbravadores do sertão da Bahia ainda no século XVI.
Seu nome se grafa também Francisco Bruzo Espinosa,
sendo ainda encontrado como Francisco Bruza, Bruzza,
Brueza de Espinosa, Espinhosa, Espiñosa ou Spinosa.
Em 1553, D. João III ordenou ao governador-geral Tomé
de Sousa explorar as nascentes do rio São Francisco, pois
fora informado que os espanhóis haviam encontrado
ouro e esmeraldas do outro lado da linha deTordesilhas.
A expedição foi encomendada ao castelhano.
Toda região onde está o município de Salinas,
originariamente de 3.689 km2 e abarcando dezesseis
distritos e povoados, teve sua colonização iniciada nesta
metade do século XVI, quando o desbravador Francisco
Bruza Espinosa, seguindo determinação da Coroa,
enveredou pelo vale do Rio Pardo com numerosa
expedição. Palmilhou os tabuleiros de pastagens naturais
– tinha até jazidas de sal, indispensável para o gado – e
foi sair do território mineiro para a Bahia onde hoje está
a cidade de Espinosa, que ganhou o topônimo em sua
homenagem.
Seguido as noticias dadas pela expedição de Espinosa,
acorreram à região os chamados vaqueiros baianos
tangendo seus rebanhos, deflagrando assim o Ciclo do
Couro da Colonização das Gerais. É notório que os
povoados surgidos no curso das atividades agropecuárias,
curso das atividades agropecuária, notadamente as
pastoris, são de crescimento lento.
Os sertões eram habitados pelos índios tapuias por
ocasião do descobrimento. Cinquenta anos depois no
Governo-Geral de Tomé de Sousa, foi organizada uma
expedição à região sob comando do espanhol Francisco
Bruza Espinosa. A expedição, da qual fez parte o padre
jesuíta João de Azpilcueta Navarro, seguiu pelo sul do

46
litoral baiano, atravessou o vale do rio Jequitinhonha e
atingiu o rio São Francisco. Deixaram Porto Seguro em
outubro ou novembro de 1553 e precisaram de ano e meio
para percorrer 355 léguas (2.310 quilômetros), pelo rio
Jequitinhonha, até a Serra do Mar, alcançando o rio São
Francisco, passando ao rio Verde, finalmente descendo o
rio Pardo até o mar.
A crônica da expedição está em carta do jesuíta escrita
em Porto Seguro, para os seus superiores em Coimbra,
a 24 de junho de 1555.
A ação de colonização aconteceu muitos anos depois,
quando, em 1690, o regente do São Francisco, Antônio
Guedes de Brito, se estabeleceu com duzentos homens
armados na serra Geral, hoje município do Jacaraci, na
Bahia. Ali bem perto formou-se o povoado de Lençóis do
Rio Verde – denominação que se explica pelos lençóis
postos a secar no rio pelas lavadeiras da região. Esse
povoado ficava nos arredores de uma antiga capela, mais
tarde e a matriz de São Sebastião. Em 1859, criou-se o
distrito de Lençóis, ligado ao município de Rio Pardo.
Posteriormente, em 1923, sob a denominação de São
Sebastião dos Lençóis, é elevado a município,
desmembrado de Monte Azul. O nome Espinosa foi
instituído depois, em homenagem ao desbravador do
local.”
(https://pt.wikipedia.org/wiki/Francisco_Bruza_Espinosa)

2 – JOÃO DE AZPILCUETA NAVARRO


Diz a Wikipédia:
“João de Azpilcueta Navarro, padre da Companhia de
Jesus, dos primeiros a serem catequistas no Brasil, no
século XVI.

47
Teria sido o primeiro que aprendeu a língua indígena e
dela se utilizou desde 1550 na pregação aos selvagens.
Foi certamente o primeiro basco a pisar terras do Brasil.
Seu nome era Juan de Azpilikueta y Sebastian, da nobre
família dos Azpilikueta do reino da Navarra e os
portugueses, com dificuldade para pronunciar o nome,
passaram a 48chamá-lo Navarro, isto é, nascido na
Navarra, em homenagem a sua procedência. Pertencia à
família de São Francisco Xavier cuja mãe se chamava
Maria Azpilikueta Aznares; um dos irmãos do santo,
Juan de Azpilicueta (1497-1556), foi senhor de Sotés e se
conhecia como Capitão Azpilicueta.
O padre João nasceu no País Basco, na Espanha, em
Iriberri ou Burlada, de onde eram naturais seus pais,
Juan de Azpilcueta e Maria Sebastiana de Iriberri ou de
Javier, entre 1522 e 1523; morreu na Bahia em 1557,
ainda jovem. Era sobrinho do humanista Martín de
Azpilcueta, o famoso Doutor Navarro, que lecionou
naUniversidade de Coimbra. Por isso o padre João
frequentou a Universidade entre 1540 e 1549, data de sua
partida para o Brasil, vivendo em casa do tio, que o
queria como filho. Ingressou na Companhia de Jesus em
Coimbra em 22 de dezembro de 1542, mais ou menos aos
vinte anos. Foi sempre, com atestam suas cartas, um
católico fervoroso. Além do mais, grande estudioso, de
estrita moralidade cristã, europeu da Idade Média, seu
mundo seria transtornado ao desembarcar no Brasil. Foi
ele mesmo quem pediu para embarcar, em 1549.
Em 1544 foi professor de Cânones na Universidade de
Coimbra, quando escreveu o livro, que é publicado até
hoje, intitulado “Diálogos de las Imágenes de los Dioses
Antíguos”.
Seu nome é lembrado na cidade de Diadema – SP através
de um dos logradouros públicos: Rua Azpicueta Navarro,
no bairro Vila Nogueira, e também na cidade de
Salvador: Praça Azpicueta Navarro.

48
No Brasil, após a morte do Donatário da
Bahia, Francisco Pereira Coutinho, resolveu instalar um
Governo-Geral para todo o país, afastando a cobiça
estrangeira. O rei, que foi descrito por Santo Inácio de
Loiola como pai e protetor da Companhia de Jesus,
enviou com o primeiro governador seis jesuítas
comandados pelo padreManuel da Nóbrega. A viagem
durou 56 dias e em 29 de março de 1549 desembarcaram
na Bahia, com calorosa recepção pelos colonos.
O Padre João ficou três anos em Salvador, ocupado com
a construção do colégio e da cidade e, principalmente,
trabalhou nas aldeias indígenas dos arredores. Era
necessário aprender o idioma do gentio para poder
catequizá-los. E nisso o padre João era excelente! Meses
depois, escrevendo à Europa, Nóbrega conta que ele
tinha mais facilidade do que os outros para se comunicar
com os índios, e pensava que devia ser por um parecido
qualquer entre o euskara que falava desde a infância e o
idioma tupi ou abanheenga.
Seus sete anos de estadia no Brasil podem ser divididos
em três anos vividos em Salvador, sendo um dos
fundadores dessa cidade, três vivendo em Porto Seguro e
um ano e meio na viagem ao sertão mineiro.
Viagem ao sertão
Desde 1500, os habitantes de Porto Seguro falavam de
uma cordilheira brilhante e preciosa no interior, a serra
Verde, serra Negra ou serra das Esmeraldas. Os índios
asseguravam que, nas margens da lagoa Vupabaçu
(“Lagoa grande”), se encontravam pedras verdes – e os
portugueses sonhavam com esmeraldas ou safiras. Em
1553, D. João III ordenou ao governador explorar as
fontes do rio São Francisco. Informado de que os
espanhóis haviam achado ouro e esmeralda do outro lado
da linha imaginária de Tordesilhas, encarregou da
expedição o castelhano Francisco Bruza Espinosa.
Nóbrega indicou como padre João de Azpilcueta.
49
Partiram em outubro ou novembro de 1553. Demorariam
um ano e meio, como se conta em Entradas e Bandeiras,
para percorrer penosamente 350 léguas, ou seja, 2310
quilômetros.
Para Afrânio Peixoto, em A cultura brasileira, pg. 289,
Azpilcueta foi o primeiro mestre e missionário do gentio,
o primeiro nas entradas evangelizadoras aos sertões, que
varou em 1553 em Porto Seguro – 350 léguas de périplo,
às cabeceiras do rio Jequitinhonha, São Francisco,
tornando ali ao litoral pelo rio Pardo.» Antes de partir,
em carta aos irmãos deixados em Coimbra, escrita de
Porto Seguro em 19 de setembro de 1553, conta ele:
« Fiquei aqui somente por falta de padres e pela
necessidade que havia na terra de despertar a gente que
estavam e estão no sono do pecado, somente com nome de
cristãos, embebidos em malquerenças, metidos em
demandas, envoltos em torpezas e sujidades
publicamente, o que tudo me causava uma tibieza e pouca
fé e esperança de poder-se fazer fruto, contudo meti-me a
apalpar, quis Nosso Senhor que alguns se apartassem dos
pecados, uns tirando de si, outros casando-se, muitos
cediam das demandas e libelos condescendendo a meus
rogos, e outros, que me ajudavam, e desta maneira se
reconciliavam muitos.» E, adiante, conta de seu pouco
entusiasmo em partir terra adentro: «Interim,
encomendai-me muito ao Senhor, caríssimos, e porque
nunca me achei em tanta necessidade como agora, por ir
só entre leigos de diversas mais por terras cobertas e
gentes bárbaras que se comem, que com lágrimas vos
quisera escrever não a ida, senão meu pouco entusiasmo
para tão grande empresa.»
Azpilcueta afirma, em correspondência citada pelo
padre Serafim Leite em Novas cartas jesuítas, página
155: «Nesta capitania, achei um homem de boas partes,
antigo na terra, e tinha o dom de escrever a língua dos
índios, o que foi para mim grande consolação, e assim o
mais do tempo gastava em lhe dar sermões do
50
Testemunho Velho e Novo e Mandamentos, Pecados
mortais e Artigos de fé, e Obras de Misericórdia, para
tornar em a língua da terra.» Os jesuítas dos estados do
Brasil e do Maranhão escreveram numerosos relatórios,
cartas e informes com pormenores sobre sua vida diária e
seu trabalho missioneiro. Suas cartas, que acabaram nos
arquivos de Roma, Lisboa, Évora, Madrid e no Rio de
Janeiro, foram consultadas pelo padre Serafim Leite no
século dezenove e hoje são material de grande valor para
os historiadores. Era acompanhado em suas missões ao
interior pelo padre Vicente Pires, de São João da Talha,
em Portugal, entrado na companhia aos dezessete anos.
Entravam pelo sertão em terrenos inóspitos, visitando
aldeias distantes e, diz Navarro, «passamos assaz
trabalho e perigos, por nos ser necessário andar de noite
algumas vezes e por matos, porque cá não há os
caminhos de Portugal, e há neles muitas onças e outras
feras.»
Na expedição de 1553, enfrentaram os índios do
Jequitinhonha (puris ou aimorés) e as dificuldades
naturais do caminho ou da ausência dele, nas terras que
os próprios indígenas apelidavam Ivituruna ou
«montanha negra», devido à sua estatura elevada e
vestir-se com a batina negra da Companhia de Jesus.
Enfrentaram tempestades e perda de animais, sempre
com muito cansaço. Dos encontros com os índios
passavam a construir botes para descer caudalosos rios e,
mesmo assim, Azpilcueta pôde se referir à beleza da terra,
à sua fertilidade, aos costumes dos índios, à abundância
de aves e animais selvagens, sem esquecer jamais de sua
missão: encher aquela terra de gente cristã, nativa ou
estrangeira.
Ele próprio solicitou de Nóbrega autorização para
adentrar o sertão, sendo que viajava sempre descalço por
gosto pessoal.
Houve um debate sobre se a expedição conseguiu
localizar ouro e pedras preciosas, mas ele nada afirma
51
sobre o assunto em sua carta de 1555, apesar de que
Ambrósio Pires, em carta dirigida diretamente a Inácio
de Loiola, lança uma acusação grave contra Navarro
dizendo estranhar a expedição, depois de um ano e meio
de viagem, não ter obtido sucesso na localização dessas
preciosidades.
Navarro trouxe consigo para Porto Seguro muitos
indígenas botocudos, com os quais conviveu na sua
estadia nas regiões onde esteve, como companheiro de
viagem de espino, mas este não retornou a Porto Seguro.
O estado de saúde de Navarro tornou-se crítico após a
referida viagem e veio a falecer em 1957.
A carta em que descreveu a viagem foi escrita em Porto
Seguro em vinte e quatro de junho de 1555. No início de
1556, estava de novo em Salvador. Morreu ali entre
quinze e trinta de abril de 1557, tendo dedicado os
melhores anos de sua vida à evangelização. Suas cartas
se podem ler em «Cartas jesuíticas»: Cartas do Brasil,
Cartas avulsas, periodicamente reeditadas.
Trecho de uma carta de Salvador, agosto de 1551:
“Assim, chegamos a uma aldeia onde achamos os gentios
todos embriagados, porque aqui têm uma maneira de
vinho de raízes que embriaga muito, e quando eles estão
assim bêbados ficam tão brutos e ferozes que não
perdoam a nenhuma pessoa, e, quando não podem mais,
põem fogo na casa onde estão os estrangeiros. Com tudo
isto, porque chovia muito e íamos mui molhados, nos
recolhemos em outra casa para nos enxugar, e daí a
pouco vieram com grande fúria, com espadas e outras
armas contra nós...”
Foi considerado pelo historiador Carlos Affonso dos
Santos, no seu livro Navarro, o Primeiro Apóstolo do
Brasil, como um respeitável geógrafo, historiador e
missioneiro.

52
No Brasil, onde viveu de 1549 a 1557, escreveu um livro,
que não foi publicado, intitulado Oraciones y Catequesis
en la Lengua General del Brasil.”
(https://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_de_Azpilcueta_N
avarro)

3 – CUNHAMBEBE
A Wikipédia informa:
“Cunhambebe (? – c. 1555) foi um famoso
chefe indígena tupinambá brasileiro. Foi a autoridade
máxima entre todos os líderes tamoios da região
compreendida entre o Cabo Frio (Rio de Janeiro)
e Bertioga (São Paulo). Foi aliado dos franceses que se
estabeleceram na Baía de Guanabara em 1555, no
projeto da França Antártica. É citado na obra do
religioso francês André Thévet Les singularités de la
France Antarctique e na obra do aventureiro
alemão Hans Staden “História Verdadeira...”. Noticia-se
que o chefe tamoio, em rituais canibais de sua tribo,
tenha devorado mais de sessenta portugueses.
Etimologia
Segundo o tupinólogo Eduardo de Almeida Navarro, o
nome “Cunhambebe” é derivado do
termo tupi kunhãmbeba, que significa “mulher achatada,
sem seios, de seios muito pequenos”, pela junção
de kunhã (mulher) e mbeba (achatado). Seria uma alusão
ao peito musculoso e desenvolvido de Cunhambebe. O
escritor Eduardo Bueno, baseado em Teodoro Sampaio,
diz que “Cunhambebe” significa “o gago” em tupi, mas
tal etimologia é considerada fantasiosa por Eduardo de
Almeida Navarro.
Biografia

53
1642
Segundo Capistrano de Abreu, houve não apenas um,
mas dois Cunhambebes: pai e filho. O pai teria sido o
famoso guerreiro que Hans Staden encontrou na Serra
de Ocaraçu (atual conjunto de morros do Cairuçu, ao Sul
de Paraty, na região de Trindade). André Thevet também
teria conhecido este Cunhambebe. Faleceu de “peste”
(provavelmente varíola) após a chegada dos colonos
franceses deNicolas Durand de Villegagnon à Baía de
Guanabara.
Alguns anos após a morte deste Cunhambebe, o
padre José de Anchieta teria encontrado o Cunhambebe
filho em Yperoig (atual cidade de Ubatuba) para as
negociações que deram origem ao Armistício de
Yperoig – o primeiro tratado de paz conhecido no
continente americano, colocando fim à
chamada Confederação dos Tamoios, que ameaçava São
Vicente e a supremacia portuguesa no sul do Brasil.
Pacificados os indígenas das proximidades de São
Vicente, os portugueses atacaram os franceses que
estavam instalados na Baía de Guanabara, dizimando as
tribos tupinambás que ali residiam. O fato se repetiu no
Cabo Frio, tendo sobrevivido os Tupinambás de Ubatuba,
que, fugindo para o sertão ou misturando-se aos colonos
em Ubatuba, deram origem aos atuais caiçaras, na região
do Litoral Norte de São Paulo.
No início do século XVII, já não havia mais nenhum
tupinambá na região do Rio de Janeiro, a não ser os
convertidos ao catolicismo e os utilizados como serviçais
pelos portugueses.”
(https://pt.wikipedia.org/wiki/Cunhambebe)
4 – BELCHIOR DIAS MOREIA
Vemos na Wikipédia:

54
“Belchior Dias Moreia (Brasil, 1540 – 1619),
bandeirante brasileiro, tem seu nome ligado à serra
de Itabaiana, nos arredores de Aracaju, e ao mito
do Eldorado no Brasil. Era ainda conhecido como
Belchior Dias Moreira ou Belchior Dias Caramuru, por
ser parente de Diogo Álvares o Caramuru. Seria nascido
no Brasil por volta de1540, tinha fazendas ou currais
junto a serra do Canini, nos sertões do rio Real (hoje
município de Tobias Barreto), entre o rio Real e o rio
Jabiberi. Considerado notável colonizador do sertão do
rio Real, onde teria chegado desde 1599, após haver
tomado parte na conquista de Sergipe, como um dos
capitães de Cristóvão de Barros, segundo informa a
«Enciclopédia dos Municípios Brasileiros».
Ficou famoso por suas buscas do Eldorado, que
localizava na serra de Itabaiana. Até hoje há quem creia
que haveria ali riquezas em metais e que a área ocultaria
um “carneiro de ouro”. O mito surge a partir das
expedições deste aventureiro Belchior Dias Moreia, que
alardeou a descoberta de uma grande quantidade de
prata na região, no século XVI.
Embora nada tenha sido efetivamente localizado, a
notícia ajudou a impulsionar outras expedições
particulares e governistas, que tomaram os caminhos da
Serra nos séculos seguintes. Itabaiana, com sua velha
serra, atraiu aventureiros em busca da prata que teria
sido achada por Belchior Dias Moreia e durante dois
séculos alimentou entre os brasileiros o sonho de riqueza.
As primeiras minas de prata haviam sido descobertas no
Brasil por Gabriel Soares de Sousa, que morreu em1592,
cronista e explorador. Era primo de Belchior Dias
Moreia, que com ele aprendeu a varar os sertões da
Bahia e de Sergipe, em busca de ouro e prata, mas estava
a serviço dos reis da Espanha. Atraiu com isso o interesse
de Belchior, que veio se estabelecer na terra. Após dez
anos de pesquisa, anunciou a descoberta das minas de
prata. As supostas minas de Itabaiana jamais foram
55
encontradas. Se foram descobertas, como afirmava ele, o
segredo ficou guardado. Pedindo mercês em troca da
informação sobre o local das minas, Belchior foi a
Portugal e de lá à Espanha, em 1600, para conseguir
um título de nobreza. Demorou-se quatro anos, sem
sucesso. Voltaria duas vezes à Europa com novos
insucessos. Os governadores Luís de Sousa, de
Pernambuco, e D. Francisco de Sousa, da Bahia,
marcaram encontro com Belchior Dias Moreia e
viajaram juntos para Itabaiana, para marcar a
localização das minas. Negando-se a mostrar o local
enquanto não fosse recompensado com as mercês,
Belchior Dias Moreia foi preso e passou dois anos na
cadeia.
Antigamente, o rio Orinoco era o ponto preciso e real
onde estaria o Eldorado, na cabeça das gentes. A partir
de Gabriel Soares de Sousa a perspectiva se transferirá
para as cabeceiras do rio São Francisco. Mesmo
Domingos Fernandes Calabar (1600-1635), que os
portugueses tiveram como traidor, foi guia de uma
expedição holandesa a Itabaiana em procura do ouro e
da prata.
Belchior Dias Moreya morreu em 1619, deixando um
filho – Rubério Dias – tido de uma índia cariri da aldeia
de Geru. Seu neto Melchior Dias Moreia pretendeu
posteriormente ter descoberto minas de prata na
montanha de Itabaiana. Sem revelar, no roteiro
imperfeito que deixou, sua localização.
Por isso mesmo em 1673 a Coroa (era regente o Príncipe
D. Pedro, futuro rei D. Pedro II de Portugal) nomeou
D. Rodrigo Castelo Branco como administrador-geral das
Minas de Itabaiana e editou o Regimento Geral das
Minas do Brasil. Era consequência das incessantes
buscas de ouro e prata em várias partes do território.
Coube ao neto de Rubério Dias, bisneto de Belchior, buscar os
velhos roteiros, a partir das terras do morgado do velho

56
descobridor e sertanista. Tratava-se do coronel Belchior da
Fonseca Saraiva Dias Moreya, apelidado o Moribeca. Num
engodo, apresentara ao governador Afonso Furtado pedras de
marcassita misturadas com amostras de prata que herdara do
avô.”
(https://pt.wikipedia.org/wiki/Belchior_Dias_Moreia)

SEGUNDA PARTE – INTERAÇÃO PRODUTIVA


1 – ANTROPOFAGIA
A maioria das pessoas não tem ideia do em que
consistia a antropofagia praticada por várias nações
indígenas brasileiras: eram, ao mesmo tempo, uma
forma de vingança contra os inimigos e, talvez
principalmente, devido à crença de que assim fazendo
estavam assimilando as energias de coragem desses
inimigos.
Esse hábito era tão enraizado que foi difícil os índios
renunciarem a comer os cadáveres dos inimigos.
“O uso do cachimbo realmente faz a boca torta”: a
poligamia não foi tão difícil de ficar no passado quanto
o foi a antropofagia.
Nos rituais antropofágicos incluía-se até o direito da
vítima de engravidar uma índia da tribo e a criança
fruto dessa relação era devorada posteriormente.
As próprias vítimas encaravam a morte com desdém e
preferiam ser devoradas a morrer de velhice.

57
Conta Hans Staden no seu livro em que narra suas
aventuras no Brasil que Cunhambebe adorava comer
portugueses, mas acredito que isso tenha sido mais
uma estratégia do grande cacique para intimidar o
matreiro amigo dos portugueses, ou seja, Hans Staden,
que, por sinal, nem sacrificado foi.
2 – POLIGAMIA
Fica para muitas pessoas desinformadas a ideia de que
todos os índios eram polígamos, o que não é verdade.
Os casamentos sempre foram levados a sério, como
instituição cheia de regulamentos, impedimentos etc.
Apenas os caciques podiam ter muitas esposas, mas tal
se justifica, segundo a ideologia indígena, porque dali
deveria nascer pelo menos um grande líder.
Não se trata de consagração da promiscuidade, mas
sim de expectativa quanto ao surgimento de um líder.
Filho de cacique nem sempre é cacique, pois o que vale
mesmo é a capacidade de liderar.
Todavia, liderar não significa “fazer e acontecer” com
arbitrariedades e desrespeitos aos membros da tribo:
quem assim procede perde o cargo.
As escolhas se baseiam na real competência dos
dirigentes, ao contrário das eleições dos brancos, que
são reguladas por uma quantidade enorme de leis e
regulamentos, mas acabam vencendo os que compram
votos.
58
3 – CIÊNCIA DA NATUREZA
A Ciência da Natureza pode ser chamada de
Xamanismo.
Vamos reproduzir o que a Wikipédia fala sobre o
Xamanismo, mas o fazemos apenas por uma questão
de facilitação, mas nem tudo que está ali consignado
corresponde à verdade.
Vamos dizer agora o seguinte: o lema principal do
Xamanismo é o “somos todos um”, ou seja, todas as
criaturas (humanas, animais, vegetais e minerais) têm
igual importância do Universo, apenas se
diferenciando pela especialização. Todavia, todo ser
humano deve respeitar as demais criaturas e aprender
a interagir com elas, inclusive para manutenção da
saúde física e espiritual.
A maioria dos brancos tem verdadeiro horror ao
Xamanismo, mas trata-se de puro preconceito,
justamente porque os xamanistas valorizam todas as
criaturas indistintamente, enquanto que muitas
pessoas se julgam donas da Natureza e com direito de
destruir sob o pretexto de levar o progresso a todos os
recantos do mundo.
O resultado dessa devastação está perceptível pelo
desaparecimento de muitas espécies animais e vegetais,
falta de água em muitos lugares antes abundantes
nesse aspecto, surgimento de doenças que tinham
deixado de existir etc. etc.
59
O desequilíbrio ecológico aumenta quando umas
criaturas desaparecem, fazendo surgir, assim, uma
necessidade insatisfeita e uma coisa vai puxando outra.
Observem como a qualidade de vida natural está
piorando de uns anos para cá.
“O xamanismo é um termo genericamente usado em
referência a práticas
etnomédicas, mágicas, religiosas (animista, primitiva), e
filosóficas (metafísica), envolvendo cura, transe,
transmutação e contato entre corpos e espíritos de outros
xamãs, de seres míticos, de animais, dos mortos.
Essencialmente técnicas de contato com
o sagrado ou êxtase e, como analisa Jerome
Rothenberg (1951-2010), utilizando uma linguagem, de
certo modo precursora, do que conhecemos como poesia,
uma criação de circunstancias linguísticas especiais
como a canção e a invocação.
A palavra xamã vem do russo – tungue saman – e
corresponde à práticas dos povos não budistas das
regiões asiáticas e árticas especialmente a Sibéria (região
centro norte da Ásia). Apesar, como assinala Mircea
Eliade da especificidade dessas práticas na região (em
especial as técnicas do êxtase dos tungues, iacutes,
mongóis, turco-tártaros etc.), não existe contudo, origem
histórica ou geográfica para o xamanismo como
conhecido hoje, tampouco algum princípio unificador.
Outros nomes para sua tradução seriam feiticeiros,
médico-feiticeiros, magos, curandeiros e pajés.
Antropólogos discutem ainda na definição xamanismo a
experiência biopsicossocial do transe e êxtase religioso,
bem como as implicações sociais da definição do
xamanismo como fato social. É considerado uma tradição
equivalente à magia enquanto prática individualizada
relacionada aos problemas e técnicas e ciência da

60
sobrevivência cotidiana (agricultura, caça, medicina, etc.)
ou ao fenômeno religioso, abstrato, coletivo,
normatizador.
Xamã
O sacerdote do xamanismo é o xamã, que geralmente
entra em transe durante rituais xamânicos, manifestando
poderes incomuns, invocando espíritos, plantas etc.,
através de objetos rituais, do próprio corpo ou do corpo
de assistentes e pacientes. A comunicação com estes
aspectos sutis da vida pode se processar através de estados
alterados de consciência. Estados esses alcançados
através de batidas de tambor, danças, sonhos e até
ervas enteógenas.
As variações “culturais” são muitas mas, em geral, o
xamã pode ser homem ou mulher, a depender da cultura,
e muitas vezes há na história pessoal desse indivíduo um
desafio, como uma doença física ou mental, que se
configura como um chamado, uma vocação. Depois disto
há uma longa preparação, um aprendizado sobre plantas
medicinais e outros métodos de cura, e sobre técnicas
para atingir o estado alterado de consciência e formas de
se proteger contra o descontrole. Naturalmente o
processo de aprendizagem e as “técnicas” empregadas
variam de cultura para cultura.
O xamã é tido como um profundo conhecedor da
natureza humana, tanto na parte física quanto psíquica.
De acordo com Eliade (o.c.), entre os manchus e os
tungues da Manchúria a tradição dos dons xamânicos
costuma ser feita de avô para neto, pois o filho ocupa-se
em prover as necessidades do pai, isso no caso dos amba
saman (xamãs do clã). Os xamãs independentes seguem a
sua própria vocação. O reconhecimento como xamã só
pode ser feito pela comunidade inteira depois de uma
prova iniciática. Ainda segundo esse autor das
referências a distúrbios psicológicos (especialmente no
processo de formação) o ideal iacuto de um xamã é: um
61
homem sério, que sabe convencer os que estão à sua
volta, não presunçoso nem colérico. Entre os kazak-
quirguizes o baqça, guardião das tradições religiosas é
também cantor, poeta, músico, adivinho, sacerdote e
médico.
Talvez pela experiência do sofrimento antes da iniciação
ou experiência de possessão o xamã é confundido com
indivíduos portadores de distúrbio mental tipo epilepsia,
histeria e psicose, Lévi-Strauss citando os estudos de
Nadel e de Mauss na introdução à obra de Marcel
Mauss afirma que …existe uma relação entre os
distúrbios patológicos e as condutas xamanísticas, mas
que consiste menos numa assimilação das segundas aos
primeiros do que na necessidade de definir os distúrbios
patológicos em função das condutas xamanísticas…
afirma ainda, baseado em estudos comparativos, que a
frequência das neuroses e psicoses parecem aumentar
nas regiões sem xamanismo e que xamanismo pode
desempenhar um duplo papel frente as disposições
psicopáticas: explorando-as por um lado, mas, por outro
canalizando-as e estabilizando-as.
Xamanismo entre os Vikings (Seiðr)
O seiðr, em muitos casos, foi descrito como uma feitiçaria
realizada para “ferver” certos objetos imputados de
poderes mágicos, sendo basicamente utilizado como um
rito adivinhatório ou para assassinato, ou ainda como
prescreve Boyer, relacionado a três ações básicas: prever
o futuro, aprisionar, causar doenças/desgraças ou matar.
A tradução do termo varia segundo os pesquisadores, mas
geralmente é interpretada como sendo canto. Tratava-se
de um ritual mágico de tipo divinatório e profético, com
conotações xamanistas e uma arte mágica criada pela
deusa Freyja. Era um tipo de magia extática com transe,
êxtase do celebrante e cantos da 62uropeia62e,
geralmente realizada durante a noite e praticada sobre
uma plataforma chamada de assento para encantamento

62
(seiðhjallr). A sua realização era conectada com sons
mágicos ou encantamentos, e a melodia era considerada
bonita para os ouvidos. Também compreendia fórmulas
mágicas para chamar tempestades e todos os tipos de
injúrias, metamorfoses e predições de eventos futuros.
Criada pela deusa Freyja, era praticada especialmente
por mulheres chamadas seiðkonur (sing. Seiðkona). Para
Neil Price seria antes de tudo uma forma de extensão do
espírito e de suas faculdades, enquanto que para Zoe
Borovsky a performance do seiðr simbolizaria o modelo
vertical de universo (cosmológico) da árvore Yggdrasill.
Como para o xamã, a praticante de seiðr devia descer ao
mundo dos mortos para relatar os ensinamentos que
buscam os vivos e para efetuar certos malefícios. A
magia nórdica era tanto praticada por homens quanto
por mulheres, com uma nítida especialização feminina.
As Sagas estão repletas de práticas mágicas, mas maiores
detalhes sobre o ritual do seiðr são desconhecidos.
Xamanismo no Brasil
O xamanismo é constante em diversas manifestações
indígenas brasileiras. A palavra “pajé”, de origem Tupi,
se popularizou na literatura de língua portuguesa em
referência ao xamã. Seu estudo, descrições de caso e
comparação, tem sido recomendado para facilitar a
implementação de práticas de assistência à saúde
culturalmente adequadas no Brasil a cerca de 4.000
índios pertencentes a 210 povos sob a responsabilidade
da FUNASA – Fundação Nacional de Saúde desde
agosto de 1999
Xamanismo ou Pajelança – Comunicação com os
encantados e entidades ancestrais através de cânticos,
danças assim como nos índios Guarani Kaiová e
utilização de instrumentos musicais (maracá, zunidores)
para captura e afastamento de espíritos malignos tipo
mamaés, anhangás. Há também a utilização do jejum,
restrições dietéticas, reclusão do doente, além de uma

63
série de práticas terapêuticas que incluem: o uso do
tabaco (o pajé fuma grandes cachimbos) e outras plantas
psicoativas, aplicação de calor e defumação, massagens,
fricções, extração da doença por sucção/ vômito,
escarificação no tórax e locais inflamados com bico,
dentes de animais ou fragmentos de cristais
No Brasil rural e urbano, apesar da tradição multi-étnica
dos ameríndios, observa-se a presença dessas práticas
médicas-religiosas em comunhão com rituais católicos e
espiritualistas de origem africana. Esse xamanismo é
conhecido em algumas regiões como pajelança cabocla,
culto aos encantados, toré, catimbó, candomblé de
caboclo, em rituais de umbanda, culto a Jurema sagrada.
Atualmente no Brasil existem várias vertentes de neo-
xamanismo ou xamanismo urbano, entre estas linhas
diversos grupos se reúnem para estudar e trocar
conhecimentos sobre o tema.
O Xamanismo, ou como conhecemos (índios)
costumavam se obliterar em cavernas, matas virgens,
além de florestas, os rituais com seiva de animais mortos
era um costume tanto quanto normal, o Xamanismo vem
desde a existência brasileira, e com isso, tem suas
apresentações, coloniais realizadas apenas entre eles, e a
diferenciação, de raças.
Uso de plantas psicoativas
Como foi dito algumas práticas xamânicas são marcadas
pelo uso de elementos extraídos de fontes naturais que
levam o indivíduo a entrar em estados modificados de
consciência denominados transe ou êxtase. Esses
produtos, tem característica da presença de
substancias psicoativas ou enteógenos. Para entender o
efeito de tais substâncias não basta analisar a composição
molecular e efeito bioquímico, é necessário situar-se no
contexto (set) de utilização as expectativas e formas de
uso da substância incluindo os mitos ou crenças a seu
respeito.
64
4 – DEMOCRACIA
Na Grécia antiga se falou muito em democracia, bem
como na Roma antiga, mas, se os brancos observassem
os costumes indígenas com a intenção de aprender com
eles, teriam implantado a verdadeira democracia no
mundo dito “civilizado”, que é onde não há democracia
quase que nenhuma.

“A democracia dos povos indígenas

Justiça e igualdade como desafios do cotidiano

Marcy PICANÇO e Paulo MALDOS

Numa manhã, em uma aldeia Guarani, os homens


se reúnem para discutir e decidir como irão lidar com
um conflito sobre a invasão do seu território por parte
de fazendeiros. Os homens se revezam em longas falas,
cada um explicitando um ponto de vista, nem todos
com a mesma posição diante do conflito. Não longe
dali, lavando a roupa no córrego, perto o suficiente da
Casa dos Homens para poder ouvir os debates, as
mulheres comentam entre si, cada uma logo antes de
seu marido falar: “agora ele vai falar tal coisa“, e o
marido falava exatamente o que a sua mulher havia
antecipado para as amigas. Cada casal havia tido a
noite anterior toda para pensar sobre o assunto e
definir uma posição.

É assim que a maioria dos povos indígenas vive a


sua participação política. Eles não delegam a um
indivíduo ou grupo o poder de decidir pela
comunidade. Isto é feito por todos, no dia-a-dia da
aldeia.

65
Não podemos afirmar que todos os povos
indígenas se estruturam da mesma maneira. Ao
contrário, há uma grande diversidade de sistemas
sociais, políticos, religiosos, econômicos, como
também culturais e 66uropeia66cia, entre os povos
indígenas no Brasil e na América Latina. Cada um tão
distinto de outro quanto um egípcio de um russo.

Entretanto, quando estes sistemas políticos são


comparados aos dos países em que os povos indígenas
se encontram, é possível identificar características
comuns entre eles, bem distintas das sociedades que os
envolvem. Nenhum dos povos indígenas no Brasil
criou um Estado; não usam a força coercitiva para
manter a “ordem interna” da comunidade, nem têm o
exercício do poder como privilégio de um grupo.

Em geral, os homens e os mais velhos têm mais o


poder da palavra do que as mulheres e os mais novos.
Além disso, algumas pessoas da comunidade se
distinguem por suas habilidades, como um xamã, um
guerreiro, um caçador, o que não significa uma
posição privilegiada. Ao contrário, eles também atuam
em função do interesse coletivo e são controlados pela
comunidade.

Nas comunidades indígenas, os sistemas


econômico, social, político e religioso são
intrinsecamente relacionados e perpassam todos os
espaços e situações da vida cotidiana. A participação
política e o controle sobre o bem-estar da aldeia estão
presentes no dia-a-dia de todos. Não é atribuição de
alguns poucos especialmente designados para isso e
nem necessita de espaços específicos.

Uma pessoa ter liderança em algum aspecto da


vida da comunidade não significa que ela detenha
algum privilégio ou poder especial em relação aos
outros. Um cacique, por exemplo, pode ser um grande
66
conselheiro ou responsável por diversas atividades; ele
pode ter a tarefa de manter o equilíbrio interno, o bem-
estar na aldeia, de articular o consenso geral. Para
isso, precisa de atributos que o legitimem ante a
comunidade, pois ele pode perder sua função caso
desrespeite ou desagrade a esta.

Uma das tarefas intrínsecas ao ser cacique pode


ser, ao mesmo tempo, uma das formas que a
comunidade tem de 67uropeia-lo: o cacique precisa
retribuir o que recebe. Existem aldeias em que o
cacique é aquele que menos acumulou bens, pois,
ainda que receba muitos presentes, deve dar muitos
presentes em retribuição.

Na verdade, a economia de redistribuição


permanente no interior das comunidades foi a forma
encontrada pelos povos indígenas no Brasil de
interditar o acúmulo de propriedades e bens e, em
67uropeia67cia, de poder, por parte de indivíduos ou
grupos.

De acordo com a tradição indígena, o objetivo da


produção não é acumular excedentes, mas sim,
compartilhar. Todo o excedente da caça, da pesca e da
agricultura é repartido dentro da aldeia ou usado para
presentear comunidades vizinhas, geralmente em
grandes celebrações. Durante a colonização da
América, alguns povos foram impedidos de fazer as
festas da partilha da produção, pois isto era visto como
desperdício. Esta atitude teve um efeito contrário ao
esperado, gerando, muitas vezes, a escassez de
alimentos, uma vez que muitos indígenas não viam
sentido em trabalhar para fazer estoques, sem as
celebrações, que tinham um caráter religioso.

Ao impedir culturalmente esse acúmulo e essa


diferenciação interna, os povos indígenas evitaram o
surgimento da propriedade privada, a constituição de
67
classes sociais e a produção do instrumento por
excelência de dominação de uma classe por outra: o
Estado.

Uma democracia exercida por todos, não só por


representantes.

Esta radical igualdade, ancorada na economia,


organizada pela cultura e concretizada nas práticas
cotidianas, confere um alto grau de autonomia às
comunidades indígenas, o que tem como característica
a não-adoção de práticas como a de delegação de
representação a indivíduos como “representantes” da
comunidade. Entre os povos indígenas, simplesmente
não existe a prática da representação; o que pode
existir são pessoas que vão encaminhar demandas e
propostas da comunidade a serviço e sob o controle
desta – e sempre de forma pontual e específica, não
como uma “representação geral”, de “amplo espectro”
e sem limites no tempo.

Muitas vezes, vemos “representantes indígenas”


perenes na mídia ou nos espaços do Estado, falando
ou negociando em nome “dos povos indígenas” em
geral. Esses “representantes” surgem muito mais pela
necessidade que o Estado e a sociedade têm de
encontrar interlocutores entre os povos indígenas, do
que devido a uma legitimidade construída por aqueles
junto às comunidades. “Representantes genéricos” dos
povos indígenas surgem, portanto, devido a processos
“exógenos” às comunidades e não “endógenos”.

Depois da Constituição de 1988, no Brasil,


centenas de organizações indígenas vêm surgindo,
buscando cumprir um papel de articulação,
organização e mobilização dos povos indígenas em
torno dos seus direitos históricos. Muitas surgem e, da
mesma maneira, morrem, permanecendo aquelas que
melhor conseguem refletir os anseios das comunidades
68
e se transformar em função de uma busca constante de
sintonia com as bases.

Essa ausência de delegação da representação faz


com que toda a comunidade tenha como
responsabilidade cuidar de seu presente e de seu
futuro. Isto mobiliza todos os seus membros a
exercerem sua palavra e seus gestos na construção
autônoma e, ao mesmo tempo, coletiva de sua história,
em todos os espaços existentes no cotidiano.

A sociedade brasileira, surgida com a invasão


69uropeia, há 506 anos, assim como as demais
sociedades latino-americanas, na sua fase
republicana, buscaram na Grécia Antiga as origens de
sua ideia de Democracia. Estas ideias originais foram
adaptadas para a construção de uma República
democrática em nossos países, num contexto de
sociedades baseadas na noção da propriedade privada
como sagrada e dilaceradas pelos conflitos entre as
classes. O resultado desta adequação foi a criação de
Estados como instrumento das classes hegemônicas e
de nações com fortes desigualdades econômicas e
sociais. Tudo isso fez com que nossas “democracias”,
controladas pelo poder de classe e nossas
“representações políticas” apropriadas por este,
ficassem muito longe da promessa de igualdade e
justiça.

No contexto de nossas sociedades, absurdamente


desiguais e injustas, a democracia se tornou um ritual
vazio e a representação política, quase uma farsa. Ao
longo da nossa história, os setores populares têm-se
esforçado em dar substância às nossas recentes
democracias, por meio de mobilizações e de
encaminhamento institucional das demandas e
propostas dos trabalhadores e dos setores populares,
bem como, pelo controle social sobre o Estado e suas

69
instituições. Esta luta, entretanto, tem um triste
histórico de reações das oligarquias e classes
dominantes, revelado nos inúmeros golpes de Estado e
ditaduras militares que tanto feriram os povos latino-
americanos durante todo o século XX.

Hoje, mais uma vez, os povos latino-americanos


buscam eleger representantes que realizem, de fato, as
suas aspirações de democracia e justiça social.
Novamente, os setores dominantes buscam interditar
essa experiência, cooptando os representantes eleitos,
transformando-os em traidores daqueles que os
elegeram; ou ameaçando-os com o desgaste na mídia,
com ações num Poder Judiciário classista, com o
descrédito na sociedade e, no limite, com novos golpes
militares.

Neste difícil momento histórico em que vivemos,


nossas democracias têm muito que aprender com os
povos indígenas e com suas práticas de vida em
comunidade. Seria fundamental que nos dedicássemos
a conhecer as diversas formas que nossos povos
milenares construíram para viver em comunidades
livres da exploração, da dominação, da miséria e da
barbárie social.

Certamente, os povos indígenas têm muito a nos


ensinar a respeito de como construir democracias
verdadeiras, onde a Justiça e a Igualdade estejam
inscritas no cotidiano de nossas sociedades, não
apenas no preâmbulo de nossas Constituições.

Marcy PICANÇO e Paulo MALDOS

Revista «Porantem», do CIMI”

CONCLUSÕES
70
1 – É reconhecido por todos os historiadores que
Espinosa e Navarro eram amigos, que se conheceram
em Porto Seguro a partir de 1549, quando Navarro
chegou ao Brasil, sendo também certo que traduziram
juntos muitos textos para o tupi, apesar de não constar
o nome de Espinosa, pois era judeu sefardita, o que
desagradaria os católicos. Também é admitido por
todos os historiadores que ambos viajaram na famosa
expedição de 1553/1555, que saiu daquela cidade em
direção às cabeceiras dos rios São Francisco e outros;
2 – Nenhum historiador afirma que ambos conheceram
Cunhambebe, mas tenho para mim que esse encontro
aconteceu até mais de uma vez, porque Espinosa
conhecia o Brasil como a palma da mão, inclusive
porque chegou a Porto Seguro, por volta de 1539,
vindo do Peru, ou seja, para ali chegar atravessou o
nosso país na direção oeste-leste andando a pé ou indo
pelos rios e seguramente não tinha nenhuma vocação
para ficar muito tempo em um lugar só, mas devia
viajar muito e, em uma vez pelo menos, deve ter
encontrado Cunhambebe, o qual também devia andar
bastante pelas costas brasileiras. Quanto a Navarro
ficou mais do que reconhecido como um viajante
inveterado. Não tinha parada em lugar algum e tenho
como certo que conheceu Cunhambebe. Acompanhem
meu raciocínio: tanto Espinosa quanto Navarro tinham
muito prestígio junto aos índios; as notícias corriam e a
população era incomparavelmente menor do que hoje
e uns iam falando das novidades para os outros,
71
inclusive da chegada a Porto Seguro, em 1549, do
“Ivituruna”, que era como os índios chamavam
Navarro, por ser um homem alto e que usava a batina
negra dos jesuítas em ocasiões cerimoniosas; fofocas
não faltavam. Desses encontros entre os três devem ter
surgido muitas combinações e trocas de ideias.
Vejamos também o seguinte: Navarro viveu até 1557,
Cunhambebe até 1555 e, quanto a Espinosa, não se
sabe quando faleceu, mas, seguramente, depois de
1555. O respeito mútuo devia estar presente sempre
nesses contatos entre os dois brancos e o índio.
Infelizmente, Navarro não poderia fazer nenhum
registro do assunto ou, então, o que relatou foi
destruído, pois aos jesuítas não interessava a amizade
com os índios, mas apenas sua subordinação e
escravização;
3 – Segundo informação da Wikipédia, Moreia nasceu por
volta de 1540, ou seja, teria de 13 a 15 anos quando da famosa
expedição de 1553. Alguém pode achar absurdo supor que o
adolescente tivesse participado dela. Mas tenho sérias razões
para acreditar na resposta positiva, pois o jovem era neto de
Caramuru e primo de quatro sertanistas famosos, portanto,
na família era quase que obrigatório as novas gerações
seguirem a tradição do avô. Isso sem contar que, quando
adulto, Moreia destacou-se como sertanista, como vocês viram
na sua biografia, acima. Caramuru morava na Bahia e pode-
se deduzir que o jovem neto igualmente. Então estava
próximo de Espinosa e Navarro. Na época não havia
preocupação em estudar quase nada, mas sim ganhar a vida o
mais precocemente possível. O rapaz, com toda essa

72
hereditariedade e influência familiar favorável, na certa, não
pensou duas vezes e embrenhou-se pelo mato junto com
Espinosa e Navarro e os demais aventureiros. Apenas a título
de satisfazer eventual curiosidade, vamos dizer que
Caramuru, seu avô, atuava como uma espécie de
aproximador entre brancos e índios.
“Diogo Álvares Correia (Viana do Castelo, Portugal —
Tatuapara, Salvador, 5 de outubro de 1557) foi um
náufrago português que passou a vida entre
os indígenas da costa do Brasil e que facilitou o contato
dos primeiros viajantes europeus com os povos nativos do
Brasil. Recebeu a alcunha
de Caramuru (palavra tupi que significa
lampreia) pelos Tupinambás. É considerado o fundador
do município baiano de Cachoeira.
Alcançou a costa na altura do Arraial do Rio
Vermelho como náufrago de uma embarcação francesa,
entre 1509 e 1510. Acerca do episódio, afirma-se]

“ Viajando para São Vicente por volta


de 1510, o Fidalgo da Casa Real
Diogo Álvares naufragou nas
proximidades do Rio Vermelho, em
Salvador, na Bahia. Seus
companheiros foram mortos pelos
índios Tupinambás, mas ele
conseguiu sobreviver e passou a viver
entre os índios, de quem recebeu a
alcunha de Caramuru, que
significa moreia. ”

Esse apelido faz referência ao fato de Diogo ter sido,


supostamente, encontrado pelos indígenas em meio às
pedras da praia e às algas, como se fosse uma lampreia.
Posteriormente terá recebido a alcunha de filho do
trovão ou, segundo outras fontes, homem trovão da morte
73
barulhenta, o que estará na origem da lenda que afirma
que Diogo Álvares Correia, teria recebido o apelido ao
afugentar indígenas que o queriam devorar, matando
uma ave com um tiro de arma de fogo.
O náufrago português foi bem acolhido pelos
Tupinambás, a ponto de, o chefe deles, Taparica, lhe ter
dado uma de suas filhas, Paraguaçu, como esposa. De
acordo com os roteiros do filme e da minissérie de
televisão Caramuru - A Invenção do Brasil, Paraguaçu
tinha como irmã a lendária Moema, originariamente
citada (sem essa relação de parentesco) no poema
"Caramuru" de Frei Santa Rita Durão (1781).
Ao longo de quatro décadas, Correia manteve contatos
com os navios europeus que aportavam ao litoral da
Bahia em busca de madeira da "Caesalpinia echinata"
(pau-brasil) e outros géneros tropicais. As relações
comerciais com os franceses da Normandia levaram-no,
entre 1526 e 1528, a visitar aquele país, onde a
companheira foi batizada em Saint-Malo, passando a
chamar-se Catarina Álvares Paraguaçu, em homenagem
a Catherine des Granches, esposa de Jacques Cartier, que
foi a sua madrinha. Na mesma ocasião, foi batizada outra
índia Tupinambá, Perrine, o que fundamenta outra lenda
segundo a qual várias índias, por ciúmes, teriam se
jogado ao mar para acompanhar Caramuru quando este
partia para a França com Paraguaçu.
Sob o governo do donatário da capitania da
Bahia, Francisco Pereira Coutinho, recebeu
importante sesmaria, tendo procurado exercer uma
função mediadora entre os colonos e os indígenas, não
conseguindo, todavia, evitar o recontro de Itaparica, onde
Pereira Coutinho perdeu a vida.
Conhecedor dos costumes nativos, Correia contribuiu
para facilitar o contato entre estes e os primeiros
missionários e administradores europeus. Em 1548,
tendo João III de Portugal formulado o projeto de

74
instituição do governo-geral no Brasil, recomendou ao
Caramuru que criasse condições para que a expedição
de Tomé de Sousa fosse bem recebida, fato que revela a
importância que o antigo náufrago alcançara também na
Corte portuguesa.
Três dos seus filhos (Gaspar, Gabriel e Jorge) e um dos
seus genros (João de Figueiredo) foram armados
cavaleiros por Tomé de Sousa pelos serviços prestados à
Coroa Portuguesa.
O seu naufrágio e vida junto aos indígenas foram
envoltos em contornos de lenda na obra do padre jesuíta
Simão de Vasconcelos, em 1680, na qual se inspirou, um
século mais tarde, frei José de Santa Rita Durão para
compor o poema épico em dez cantos Caramuru (1781).
Em 2001, a sua história foi transformada em um filme
brasileiro Caramuru - A invenção do Brasil.”
(https://pt.wikipedia.org/wiki/Caramuru)
4 – Mas se alguém duvidar que Espinosa e Navarro
conheceram Cunhambebe e Moreia isso não faz diferença.
Pelas nossas pesquisas foi possível verificar que os dois
primeiros batalharam muito pelo respeito devido aos índios.
Quanto a Cunhambebe concluí que somente declarou guerra
aos portugueses depois que estes passaram a desrespeitar os
índios. É sabido que, no início, os portugueses tratavam bem
os índios, inclusive pagando salário pelo seu trabalho, mas, a
partir de 1530, passaram a escravizá-los e, depois, matá-los
quando não aceitavam a escravidão. Moreia foi grande amigo
dos índios e é certo que contribuiu para que eles fossem
respeitados;
5 – Assim, três brancos e um índio tornaram-se amigos de
verdade e fizeram de tudo que puderam para que a paz
vigorasse. Naquela época a miscigenação das duas raças
ocorreu em grande escala, pois não havia praticamente

75
mulheres brancas no Brasil. Espinosa, Navarro, Cunhambebe
e Moreia foram exemplos nobres para brancos e índios
seguirem. Infelizmente, hoje seus nomes estão praticamente
esquecidos e é essa uma das razões que nos levou a escrever
este livro: lembrem-se desse heróis da valentia e da amizade
naquele tempo em que a vida valia muito pouco neste imenso
Brasil!
6 – O nosso país poderia ter seguido outro rumo totalmente
diferente, de interação pacífica entre as duas raças, mas os
colonizadores brancos queriam, no geral, exterminar os índios
para se apropriarem das suas terras e riquezas,
principalmente minerais. A antropofagia e a poligamia foram
meros pretextos utilizados principalmente pelos jesuítas para
decretar a famigerada “guerra justa”, através do que
qualquer pessoa podia impunemente matar os índios que não
se submetessem às imposições dos brancos.
7 – Os colonizadores, no final de tudo, não aprenderam
praticamente nada do que os nossos índios tinham para lhes
ensinar (a Ciência da Natureza e a democracia) e, hoje mais
do que nunca, depredam a Natureza e brigam pelo poder,
como está acontecendo, com processos de uns políticos contra
os outros e, no final das contas, são uns sujos querendo punir
outros mal lavados.

18 - A CIVILIZAÇÃO DOS TAPUIAS


Dedicatória:
- aos 250 membros da tribo Krenak, remanescentes dos
tapuias
- a Marét-Khamaknian e sua mulher Marét-Jikki
76
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é mostrar uma coisa que a
maioria das pessoas não reconhece como verdade, ou seja, que
1 - o fato de um povo não morar em habitações construídas e
sim no chão e nos galhos das árvores; 2 - não utilizar
vestuários de espécie alguma, a não ser algumas tribos, que
cobrem a genitália; 3 - alimentar-se de produtos provenientes
da caça, da pesca e da coleta de frutas e outros elementos
naturais, sem elaborá-los; 4 - não conhecer a escrita e
transmitir seus conhecimentos apenas por via oral; 5 - não
ter nenhum contato com o chamado “mundo civilizado”; mas,
por outro lado, 1 - ter respeito à Natureza e integração com
ela; 2 - adotar um estilo democrático de convivência entre
seus membros e 3 - seguir uma religiosidade onde o contato
com os “mortos” seja verdadeiro orientador de condutas
éticas firmes – tudo isso faz com que esse povo deva ser
considerado dotado de uma Cultura avançada.
Esse é o caso típico dos chamados tapuias, considerados
desde o começo como os piores elementos indígenas pelos
colonizadores portugueses e pelos padres.
A primeira referência feita a eles em documento somente
aconteceu em 1555, da lavra do padre jesuíta João de
Azpilcueta Navarro, enviado para os jesuítas de Coimbra,
como competia ao padre fazer, pois que deveria prestar
contas do que tinha sido feito pela expedição contratada por
Duarte da Costa, tendo como chefe o famoso sertanista e
entendido em minerais Francisco Bruza de Espinosa,
enquanto que o padre era o capelão daquela expedição.
Fazendo um parêntese quanto a tribos arredias que
habitam o território brasileiro atualmente, a FUNAI calcula
em uma centena se número.
77
Podemos fazer as seguintes indagações, que valem
quanto aos antigos tapuias e os atuais povos arredios: 1 -
Como é seu estilo de vida? 2 - São primários, inferiores etc. ou
sua Cultura pode ser até mais avançada do que a dos
brancos? Porque, sejamos sinceros, Cultura não se resume a
Tecnologia e na nossa predominam, apesar de todo o conforto
e tintura de religiosidade, civilidade etc.: 1 - a corrupção ao
lado da hipocrisia, 2 – a aparência enganosa de documentos
escritos, 3 – leis elaboradas para facilitar os crimes e ilícitos
dos próprios legisladores e seus comparsas, 4 – aparência de
democracia, mas existência de uma ditadura ora de direita
ora de esquerda e 5 – obediência ao comando da
criminalidade internacional, do crime organizado e de muitas
correntes religiosas chefiadas por mafiosos?
Voltando, porém, no tempo, ao século XVI do calendário
europeu, vamos verificar que os brancos conseguiram
dominar rapidamente os indígenas do litoral brasileiro, para
tanto utilizando a doutrinação arguta, capciosa e irresistível
principalmente dos jesuítas, que se aliava à força militar dos
portugueses, sobretudo, mas também não podemos deixar de
levar em conta a contribuição paralela e competitiva
principalmente de franceses e holandeses, que disputaram
com Portugal a dominação sobre os índios até o século XVII.
Todavia, quando olhamos as tribos do interior do imenso
território brasileiro, verificamos que elas ficaram mais tempo
imunes à presença e dominação brancas: esses índios foram
chamados de tapuias, o que significa bárbaros, primitivos,
desprezíveis, mas esse qualificativo lhes dado por quem não
conseguiu nem catequizá-los nem escraviza-los ou mata-los
facilmente.
Mas era um povo evoluído, como veremos neste estudo.

78
Podemos dizer que, em princípio, até 1600, o Brasil tinha
brancos apenas na região litorânea, mas isso o dizemos em
princípio, porque o caso dos tapuias foi uma exceção, uma vez
que, mesmo habitando o interior do Brasil, tinham aceito a
convivência de um branco, que foi Francisco Bruza de
Espinosa.
Esse homem foi diferente dos outros e veremos por que.
Foi um caso à parte em termos de integração e respeito
entre índios e brancos.
Se hoje Espinosa ainda é lembrado em muitas cidades do
norte de Minas Gerais (sendo considerado fundador de
Salinas e Espinosa) e há em Belo Horizonte um monumento
na Praça da Estação em que é homenageado, é puro
reconhecimento pelo muito que fez pelos índios tapuias,
chefiados, então, por Marét-Khamaknian e sua mulher
Marét-Jikki.
De início desconstituo a informação de que eram
personagens mitológicos.
Acredito que viveram na época em que a expedição os
encontrou comando vasto trecho de território do norte de
Minas Gerais e a grandeza de espírito de Espinosa de um lado
e igual mentalidade do casal de caciques tapuias fez com que
dali surgisse uma grande história de preservação da Cultura
tapuia e retardamento do genocídio dos tapuias por alguns
séculos.
Talvez muitos vão duvidar desta versão, mas vou insistir
nela, porque História não vive só de documentos e vestígios
materiais, mas o historiador deve, sobretudo, racionar para
concluir sobre as verdades que estão no passado.

79
É preciso ter faro de historiador para preencher lacunas
onde a maioria para e formula a interrogação: - O que houve?
Não há dados sobre este assunto etc.

(detalhe do Monumento à Civilização Mineira, de


autoria do escultor italiano Giulio Starace)
O caso dos tapuias é emblemático, pois aceitaram, por
muito tempo, somente a presença e convivência de Francisco
Bruza de Espinosa e daqueles que Espinosa apresentava como
seus protegidos.
Esta tese é minha e não encontrei quem a endossasse,
mas tenho minhas razões para acreditar que assim aconteceu,
baseando-me em dados concretos a partir dos quais deduzi o
que vou expor adiante.

80
A carta escrita pelo padre Navarro me fornece a base
mais sólida para concluir o que lhes afirmo, mas a carta não
deve ser lida com pressa de terminar a leitura: deve ser
deglutida, mastigada, interpretada.
Repito: em vasta região do norte de Minas Gerais e
adjacências, a figura de Francisco Bruza de Espinosa é
valorizada e considerada ainda hoje, passados cinco séculos
da sua morte, tanto que há um município que lhe recebeu o
nome e outros muitos o consideram o primeiro branco ao
passar por ali.
Isso é muito importante e vocês, prezados leitores, verão
por que.
Sua figura sempre é associada sempre à do padre João
de Azpilcueta Navarro, que o acompanhou na expedição que
chegou até Diamantina, em Minas Gerais, proveniente de
Porto Seguro, num período de viagem e paradas, que perfaze
um ano e meio: é um tempo bastante longo para poder ter
acontecido muitas coisas que o padre não relatou.
A contribuição principal do padre foi registrar a grande
expedição e alguns detalhes (digo, alguns poucos detalhes, pois
não lhe interessava falar mais do que falou), sendo que os
poucos dados que mencionou deram base para muitas
elucubrações e empreendimentos posteriores.
Sem essa carta tudo ficaria esquecido.
Trata-se de um documento sobre o qual me debrucei
para interpretar muito mais suas entrelinhas do que as
palavras que foram empregadas.
A carta é datada de 1555, como já dito, e, atendia apenas
ao dever do jesuíta de relatar o que ocorreu na expedição.

81
O padre, muito prudente, procura, pelo que me pareceu,
mais esconder do que revelar fatos ocorridos, pois, tendo
Espinosa não retornado a Porto Seguro, ainda mais sem haver
nenhuma notícia de ouro e outras riquezas, não quis o padre
contar aos seus companheiros de Portugal quase nada sobre o
que tinha acontecido naquela expedição, porque isso iria
provocar maiores perseguições aos índios e atiçar a cobiça dos
portugueses para as riquezas do interior do Brasil, então em
mãos quase que exclusivamente dos tapuias, que, pelo fato de
serem numerosos e muito guerreiros, tinham condições de
continuar sem a importunação dos brancos, os quais visavam
escravizá-los e até matá-los, caso não aceitassem renunciar à
própria cultura ancestral e a ceder suas terras aos brancos.
Aliás, esse valoroso padre sempre foi considerado um
verdadeiro tropeço para os interesses dos colonizadores e da
Companhia de Jesus, pois, tornando-se amigo dos índios
tapuias, como já o era dos tupis, protegia-os contra a sanha
dos jesuítas e dos portugueses.
Há livros escritos sobre os jesuítas daquele tempo que
praticamente nada dizem sobre o valioso trabalho de
Navarro, mas isso o engrandece, pois mostra que ele foi bom
para os índios, enquanto que, por exemplo, Nóbrega e
Anchieta trabalharam em função do desmonte da Cultura
multimilenária dos indígenas brasileiros.
Navarro era basco, portanto, dotado de coragem e
independência mental, característica, até hoje, dos bascos.
Afeiçoado a Espinosa, a quem ficou conhecendo em
Porto Seguro, não simpatizava nem um pouco com a corrente
jesuítica, que, principalmente sob o comando ferrenho de
Nóbrega e Anchieta, dava mão forte aos governadores-gerais,
sendo o mais perverso e corrupto deles Mem de Sá, de quem
82
aqueles dois padres foram aliados de forma vergonhosa, daí
surgindo a decretação da “guerra justa”, segundo a qual foi
instituída a liberdade de matança de todos os índios que não
se sujeitassem aos portugueses e aos jesuítas.
Navarro nunca aceitaria esse absurdo, que foi decretado
pouco tempo depois de sua morte, quando já governava o
Brasil o tirânico e corrupto Mem de Sá, em nome de Portugal.
Sinceramente, acho que Navarro melhor teria feito se
não retornasse a Porto Seguro, mas a verdade é que retornou
com todos os que sobreviveram da expedição (menos
Espinosa). Alguns historiadores dizem que Espinosa retornou,
mas, pela redação da carta, percebi que o capitão,
denominação com a qual o missivista se refere a Espinosa, não
é relacionado na carta como um daqueles que voltou ao
vilarejo de onde provieram,
Seria muito melhor para ele se tivesse feito como
Espinosa: deixado de mão seu compromisso de retornar ao
mundo civilizado e, ao invés disso, integrar-se aos tapuias,
porque ali seria seu verdadeiro lar e não no meio de tanta
hipocrisia e perversidade que predominavam nas regiões já
dominadas pelos colonizadores portugueses e pelos jesuítas,
que só queriam dos índios sua mão de obra e suas terras.
Em Porto Seguro foi questionado do por que não ter
trazido sequer notícias de ouro e pedras preciosas e acabou
falecendo cerca de dois anos depois.
Aliás, antes mesmo de ter escrito sua famosa carta de
1555, um colega de batina já o tinha denunciado numa carta
enviada diretamente a Inácio de Loyola, afirmando estranhar
que, depois de gasto mais de um ano e meio pela expedição, o
padre nada ter trazido de notícias sobre a procura do ouro e

83
as pedras preciosas que tinham motivado tamanho
investimento.
A maioria dos colegas de Navarro eram sacerdotes
medrosos, que não tiveram a coragem do basco em adentrar o
sertão, e ficavam restritos às redondezas, realizando lavagem
cerebral nos índios e intimidando-os com suas manobras
maliciosas e com o poderio militar português.
Tenho para mim que Navarro deve ter sido envenenado
pelos próprios jesuítas.
Sua morte é relatada em uma carta muito hipócrita, em
que se enumeram suas virtudes e o sentimento de perda dos
que lhe prantearam fingidamente sua morte.
A verdade é que Navarro nunca se adequou ao padrão
jesuíta e, pelas suas notáveis realizações, foi tido por muitos
historiadores sinceros como o único jesuíta amigo dos índios
naquele longínquo século XVI.
Viveu, ao todo, de 1521 a 1557, tendo falecido poucos
meses antes da chegada de Mem de Sá ao Brasil.
Pode ter até acontecido de o próprio Mem de Sá, de
longe, ter determinado que dessem um fim àquele rebelde,
que lhe criaria problemas por ficar defendendo os índios ao
invés de prestigiar os interesses imperialistas de Portugal e da
Companhia de Jesus.
Teve como um dos mais ferrenhos adversários o padre
Francisco Pires, um falsário, que inventou a estória de que a
água da fonte do Arraial da Ajuda, onde construiu uma
ermida, era milagrosa e a terra ali era santa, naturalmente
que vendendo porções da água para o povo crédulo e
intimidado.

84
Navarro teve de conviver com esse estelionatário de
batina antes de viajar na expedição, dando para perceber que
preferiu embrenhar-se pelo sertão a continuar a viver sob o
mesmo teto que o colega sem ética, o qual, diga-se de
passagem, entrou para a Companhia de Jesus burlando
disposição expressa do regimento da Congregação e foi
assumindo, rapidamente, todos os postos de comando em
pouco tempo, sempre apoiado por Manuel da Nóbrega.
Mas, voltando aos tapuias, sua fama de guerreiros
temíveis fez com que os brancos não ousassem tentar subjugá-
los, mas essa situação se deveu, conforme concluo, em grande
parte, à permanência de Espinosa entre eles, porque,
sozinhos, teriam caído nas garras dos colonizadores em
pouquíssimo tempo.
Por isso, a gratidão dos atuais habitantes do norte
mineiro a esse grande defensor dos tapuias.
Acredito que a tradição oral dos índios, de geração em
geração, manteve-se referindo-se elogiosamente ao grande
sertanista judeu-castelhano, que os apadrinhou e orientou
para se defenderem dos brancos colonizadores, o que fez com
que sua memória fosse mantida e a gratidão cercasse seu
nome nas muitas cidades mineiras atuais.
É uma história muito bonita esta que estou contando e
que mostra o quanto o norte de Minas deve a Espinosa e, em
grau menor, a Navarro e, para surpresa até minha, durante
esta aprofundada pesquisa, verifiquei o quanto os tapuias
daquele tempo eram evoluídos e merecem ser valorizados
atualmente nas pessoas dos seus remanescentes, que são os
krenaks.

85
Quanto aos “espíritos” Marét-Khamaknian e sua mulher
Marét-Jikki, tenho para mim que, na verdade, foram chefes
da vasta etnia tapuia na época em que Espinosa ali chegou, ou
seja, de 1554 em diante.
Antes da existência profícua desses dois chefes, os
tapuias não seriam tão adiantados, mas o casal deu um
grande impulso naquele povo e, por isso, passou a ser
lembrado como grandes espíritos, mentores dos tapuias,
milagrosas entidades que viviam no mundo dos “mortos”.
Mas os brancos ajudaram a piorar esse quadro,
espalhando a mentira de que o casal nunca existiu e de que se
tratava apenas de um mito, sendo essa uma tática quase
infalível dos perversos e mentirosos de apagar a História.
É uma forma desonesta de desmerecer o valor de
criaturas respeitáveis, como se fez, por exemplo, quanto às
icamiabas, as índias guerreiras da Amazônia e outras tantas
realidades históricas transformadas em fantasias para a gente
crédula...
Assim, concluo que, se não fosse o feliz encontro entre o
casal líder dos tapuias com Espinosa e o relatório de Navarro,
tudo o que daí surgiu de bom teria ficado sepultado no
esquecimento.
Este texto visa contar essa história verdadeira do Brasil
do século XVI.

A MINHA TESE
1 - A CARTA DE JOÃO DE AZPILCUETA NAVARRO

86
Poucos pesquisadores escreveram sobre os tapuias,
também conhecidos como aimorés, botocudos etc.
O assunto me interessou justamente porque vi
informações a respeito da carta já referida, datada de
24/06/1555.
Vou basear este artigo principalmente nela.
Vamos à carta, da qual extraí os trechos mais ligados ao
tema deste artigo, atualizando e adaptando a redação original
para facilitar a compreensão pelos prezados leitores.
A carta, diga-se de passagem, ao mesmo tempo que nos
ajuda a conhecer alguns pontos que nos interessam, por outro
lado, não responde a todas as perguntas, porque ele não
poderia imaginar que quase quinhentos anos depois alguém
iria toma-la como ponto de partida para uma tese arrojada
sobre os tapuias.
Se a gente ler a carta sem muita atenção para as
entrelinhas, ficará com a mesma opinião dos demais jesuítas
sobre os tapuias, ou seja, de que realmente mereciam esse
qualificativo, porque eram selvagens e nada tinham de bom.
Todavia, lendo-a e relendo-a várias vezes, consegui
perceber que, depois de uns primeiros encontros assustadores,
passou a haver uma verdadeira amizade entre os homens de
Espinosa e os de Khamaknian.
Vou tentar explicar por que cheguei a essa conclusão: a
expedição durou mais de um ano e meio e não é possível que
tenha se resumido ao contato com tribos mais pacíficas, aliás,
poucas, a quem o padre se referiu, enquanto que os tapuias
ficariam, durante esse tempo todo espreitando aqueles doze
brancos, sem conseguir matar um só que fosse.

87
Os tapuias comiam carne humana, não porque queriam
vingar-se dos inimigos que matavam, mas sim porque
gostavam desse tipo de carne, que consideravam um saboroso
petisco.
Se nenhum dos brancos foi morto nesse período de um
ano e meio foi porque acabaram as agressões a partir de certo
momento.
O padre relata um ataque dos tapuias, do qual vários
membros das expedições ficaram feridos, mas a todos eles
curou com própolis.
Mas vamos por partes.
1.1 – OS EXPEDICIONÁRIOS E OS ÍNDIOS QUE OS
ACOMPANHARAM
Eram apenas meia dúzia de brancos, sendo chefe o
experiente sertanista e especialista em minerais o judeu-
castelhano Francisco Bruza de Espinosa, que tinha morado
durante dez anos em Porto Seguro.
Proveniente do Peru, conhecia bastante o interior do
Brasil, pois fez o difícil trajeto de lá até Porto Seguro: andar
no interior das matas e passar por índios ferozes não era
nenhuma novidade para esse castelhano.
Podemos ter certeza de que era um corre-mundo, pois,
sendo castelhano, em alguma época, atravessou o Atlântico e o
Pacífico para chegar ao Peru.
Consegui saber que, aos 26 anos de idade, em 1543,
morava em Porto Seguro e foi um dos que denunciou Pero do
Campo Tourinho, um poderoso milionário, à Inquisição,
demonstrando, com isso, muita coragem, pois se tratava esse

88
cidadão nada mais nada menos do que do fundador de Porto
Seguro e mais uma meia dúzia de vilas.
Portanto, nasceu em 1527.
Consegui me informar de que teve uma filha.
Foi contratado pelo governador-geral Duarte da Costa
para chefiar a referida expedição com a finalidade de
encontrar e entregar-lhe o máximo de ouro, pedras preciosas,
esmeraldas.
Pelo que consegui saber sobre ele, era um homem culto,
tendo trabalhado com o padre Navarro na tradução de textos
católicos para o idioma tupi, era rico por causa da sua
profissão ligada aos minerais de valor.
Quanto ao padre, era membro de importante família
basca, de que faziam parte nada mais nada menos que três
homens de prestígio: 1 - Inácio de Loyola, fundador da
Companhia de Jesus, 2 - Francisco Xavier, que se tornou o
missionário jesuíta mais famoso de todos os tempos, e 3 - o
professor, economista, jurista e escritor Martim de Azpilcueta
Navarro, tio do referido padre.
Se não fosse esse destaque familiar é mais do que certo
que os próprios jesuítas do Brasil teriam dado um fim no
nosso personagem, que era tido como um verdadeiro
adversário infiltrado na Companhia de Jesus, pois, além de
não apoiar as maldades praticadas contra os índios, defendia-
os e era mais amigo deles do que dos jesuítas e dos colonos.
Nosso padre tinha sido, antes de vir para o Brasil, vinda
essa que ocorreu em 1549, professor de Cânones na
Universidade de Coimbra, por apenas um ano, porque seu
gênio inquieto não combinava com a rotina modorrenta do

89
magistério numa cidade universitária. Apesar dessa
inadaptação, escreveu um livro intitulado “Diálogo de las
imágenes de los dioses antíguos”.
Gostava mesmo era da vida nas matas, nas aventuras
por terras desconhecidas e se sentia afim dos índios, de que se
falava muito na Europa desde 1492, quando Cristóvão
Colombo chegou à América.
Aqui no Brasil não deixou de dedicar-se ao trabalho
intelectual e foi o primeiro a aprender a língua tupi,
facilitando seu entrosamento com os índios do litoral e
escreveu um livro na língua tupi, auxiliado pelo referido
amigo Bruza de Espinosa, além de ter traduzido, também com
o auxílio de Espinosa, muitos textos religiosos para aquele
idioma.
Não consta que tenha aprendido o idioma dos tapuias,
mas acredito que sim, pois conviveu com eles durante mais de
um ano e não iria deixar passar essa oportunidade de
aprender mais uma língua, pois a verdade é que tinha muita
facilidade para aprender línguas, sabendo o idioma basco (sua
língua-mãe), o castelhano, o português, o tupi e o latim.
Outro membro branco que participou da expedição e
que vale a pena destacar era um jovem, neto do famoso
sertanista Caramuru, sendo também primo de outros quatro
sertanistas renomados. Tratava-se de um personagem que
ainda viveria até 1619, chamado Belchior Dias Moreia.
Os outros eram apenas ambiciosos sem nenhuma afeição
aos índios, que visavam as riquezas naturais das terras
ocupadas pelos índios, acabando por se transformar, em
várias ocasiões, em problemas sérios para os três primeiros
resolverem.

90
Naturalmente que, durante o período tão longo de
duração do contato com os índios, estes perceberam quais
brancos eram verdadeiros amigos e quais eram simples
mercenários e inimigos disfarçados de amigos, que, cedo ou
tarde, quereriam escravizá-los, tomar-lhes as terras e matá-
los pura e simplesmente.
Os nomes desses elementos não foram relacionados na
carta, na certa porque o padre não viu importância neles e
nem era comum escreverem-se muitos nomes nas missivas,
inclusive porque o papel era escasso.
Somente Espinosa não retornou a Porto Seguro,
preferindo ficar até o fim da vida na convivência com os seus
queridos tapuias.
Cheguei a esta última conclusão sem nenhuma
dificuldade, como verão adiante.
Bem, já falei bastante nos expedicionários.
Agora vamos tratar dos tapuias.
1.2 – DURANTE GRANDE PARTE DO PERCURSO DE
IDA ATÉ DIAMANTINA, PONTO MAIS DISTANTE DA
VIAGEM, A EXPEDIÇÃO FOI LITERALMENTE
CERCADA E AMEAÇADA SERIAMENTE PELOS
TAPUIAS
Apesar de Espinosa conhecer bem seu ofício de
sertanista e contar com armas de fogo, que assustavam os
índios, a animosidade inicial dos temíveis tapuias foi
aterrorizante e, se não fosse, sobretudo, sua coragem e sangue
frio, os brancos teriam sido mortos e devorados já no
primeiro confronto.

91
A verdade é que os tapuias nunca tinham visto gente
daquela cor e que lhes parecia relativamente frágil em
comparação com eles, devido à própria hereditariedade
tapuia, sem contar que seu estilo de vida selvagem, no interior
das matas, fazia deles imbatíveis guerreiros.
Não desafiavam os adversários de frente, mas utilizavam
armadilhas, rastejavam no chão, faziam trincheiras e
surpreendiam seus inimigos com flechadas com setas
envenenadas, além de terem uma constituição física muito
forte.
Mas os brancos tinham como defesa uma coisa que os
tapuias não conheciam e que os aterrorizou: armas de fogo.
Como dito, se não fossem as armas de fogo, os brancos
não teriam sobrevivido ao primeiro confronto!
Mas também os brancos não eram medrosos, pois, em
caso contrário, não teriam se aventurado numa expedição
altamente arriscada e qualquer um deles tinha, na certa, fibra
suficiente para encarar de frente, mesmo que com sérias
chances de derrota, qualquer índio em luta corporal
utilizando apenas os punhos e os pés.
Mesmo o padre era corajoso como qualquer sertanista
da época.
1.3 – OS TAPUIAS ERAM MUITO FEROZES
Essa fama se confirmou “ao vivo e a cores” para os
expedicionários.
Como se pode perceber pela missiva, o aperto que
passaram foi, no início, muito grande e nenhuma outra etnia
tinha tanta gana em matar e devorar aqueles brancos, que

92
deviam lhes parecer um tipo diferente e saboroso de carne
humana.
O cerco aos expedicionários permaneceu durante uma
grande parte da trajetória na ida, durante meses seguidos.
Eis abaixo um desenho representando um guerreiro
tapuia.
Todavia, vou adiantar um detalhe significativo sobre
esses homens aparentemente insensíveis: seu grande cacique,
depois venerado como espírito benfazejo, Khamaknian,
obrigava-os a trazer consigo, aonde fossem, uma pequena
flauta nasal, para, sempre que possível, tocarem suas cantigas,
a fim de suavizarem a própria agressividade.
Por essas e outras, fatos que a maioria dos leitores não
conhece, posso dizer, sem medo de errar, que os temíveis
tapuias eram mais civilizados que muitos brancos
colonizadores, que como único instrumento que admiravam
só tinham o arcabuz, o facão, as bordunas e outros utensílios
de agredir e matar, sem contar que os tapuias seguiam, na sua
sociedade, um código de Ética outorgado pelo referido grande
cacique Khamaknian, que ficou conhecido por eles como seu
grande civilizador.
Vejam, prezados leitores, como as informações
distorcidas pelos jesuítas em geral e pelos colonizadores
mostrou uma nação indígena como desprezível, mas não havia
como os tapuias serem bonzinhos com os brancos, porque, por
exemplo, sabemos que, de 1500 a 1530, tratavam bem os
índios e, inclusive, pagavam-lhes salários pelos serviços
prestados, mas, a partir dessa época, passaram a entender que
os índios deveriam se transformar em seus escravos.

93
Ora, as notícias correm e, sendo mais corajosos e fortes
que a maioria dos outros indígenas brasileiros, os tapuias
opuseram forte resistência à aproximação dos padres, que,
com sua fala mansa, mas hipócrita, e dos colonos, com suas
armas e ameaças, queriam fazer de valentes guerreiros
tapuias meros servidores em troca de coisa nenhuma.
Então, aí, meus amigos, a causa da má fama atribuída
por Ancieta, Mem de Sá, etc. aos grandes tapuias.

1.4 – OS TAPUIAS NÃO UTILIZAVAM NENHUM TIPO


DE VESTUÁRIO [1]
O clima, como diz o padre mais adiante, era temperado,
o que podemos interpretar como quente. Inclusive diz que,
durante aquela trajetória que percorreram, fazia muito
tempo que não chovia: por isso, os tapuias andavam nus.
Alguns falam que os homens usavam apenas uma
proteção para a genitália, enquanto que as mulheres apenas
pintavam o corpo, mas, em outras palavras, naquele clima
quente, o natural era não pensarem em nenhum vestuário.
Guerreiros não deviam nunca ter outra coisa que não
fossem as suas armas, para maior agilidade e nada que lhes
dificultasse lutar contra o que quer que representasse perigo.

94
A nudez dos indígenas não incomodava aqueles
expedicionários, que, na certa, viajaram nus, e, inclusive o
padre estranhou nos índios brasileiros, desde o começo, a
antropofagia e o alcoolismo, esta menos que a primeira.
Fez de tudo para convencer os índios a renunciarem ao
costume de matar e devorar gente e, de todos os padres, foi o
que mais conseguir mudá-los, justamente porque simpatizava
com essas criaturas humanas, as quais eram desprezadas
pelos brancos.
Ficou famoso o estilo da oratória de Navarro, que
imitava os gestos dos pajés nas suas falas aos índios e isso os
conquistava mais facilmente para abandonarem o costume
antropofágico.
O padre, aliás, não era nada formal e deve ter deixado
uma série de descendentes nas aldeias por onde passou, bem
como os outros membros da expedição: assim a mestiçagem
passou a ser uma realidade na região que agora é o norte de
Minas Gerais e suas adjacências.
Muitos puritanos podem considerar inconveniente esta
abordagem, mas temos de considerar que o Brasil atual é uma
mistura das quatro raças: vermelha, branca, negra e amarela.
E há um autor que diz que as índias se relacionavam por
obrigação com seus maridos índios, por dinheiro com os
brancos e por prazer com os negros.
Deu para entender como ocorreu a mestiçagem no
Brasil?
Os negros passaram a ser trazidos como escravos para o
nosso país desde antes da chegada dos jesuítas e seu número
foi aumentado a ponto de ultrapassarem o número de

95
brancos, enquanto que o número de índios, de cerca de cinco
milhões em 1500, agora não passa de trezentos mil.
Os krenaks, remanescentes dos tapuias, são apenas 250.
Havia um plano dos jesuítas e dos colonos de extinguir a
raça vermelha no Brasil, porque eles se recusavam a entregar-
lhes as terras, que eram suas. Quanto aos negros eram
necessários para deixar os brancos viverem ociosamente. Deu
para entender?
Para entender porque os expedicionários viajaram nus:
suor, chuva, barro, andar em alagados, não ser usual o banho
na época, a não ser pelos índios: tudo isso era motivo e
justificativa para os expedicionários andarem do jeito como
nasceram.
Nenhum autor trata desse assunto por simples questão
de falso moralismo.
Ainda devemos considerar o seguinte: muitas nações
indígenas só aceitavam como amigos os brancos que se
depilassem dos pés à cabeça para ficarem parecidos com eles,
que arrancavam, desde cedo, todos os pelos do corpo, menos
os cabelos da cabeça.
Não há notícia, na carta, da presença de mulheres na
expedição, mas tenho como certo de que algumas faziam parte
da comitiva: podem ter certeza disso.
O falso moralismo é uma das maneiras mais prejudiciais
para a História: fato é fato e pronto.
O historiador tem de cumprir seu dever de relatar e
pronto.
1.5 – OS TAPUIAS HABITAVAM AS MATAS

96
Na carta, Navarro diz que houve um percurso muito
longo dentro de matas fechadas, onde era até impossível
enxergar-se o céu.
Não seria ali que encontraram os tapuias, os quais
viviam nas matas?
Imagine-se o que é a vida no meio das matas fechadas da
época! Tudo, para os tapuias, girava em torno daquele meio
ambiente, tanto para caçar, dormir, reproduzir, defender-se
etc.
Não dá para imaginar exatamente todos os detalhes
daquele estilo de vida, nós que nunca vivemos no interior das
matas.
Os expedicionários não tinham nenhum preparo nem
experiência para enfrentar aqueles guerreiros nascidos e
criados dentro das matas. O sufoco deve ter sido muito
grande.
1.6 – OS TAPUIAS ERAM BONS CORREDORES
Imagine-se o que é correr dentro das matas! A
velocidade deles seria sempre um dado preocupante para os
expedicionários!
Espinosa e seus homens devem ter feito das tripas
coração para sobreviverem em um ambiente adverso como o
eram as matas fechadas e, por isso, entendeu melhor tentar ir
adiante por via fluvial, construindo canoas adaptadas, mas,
mesmo assim, viam nas margens os tapuias, que, na certa, não
tinham canoas, porque viviam nas matas e nada sabiam de
como guerrear nos leitos dos rios.
Espinosa e seus expedicionários devem ter logo
procurado sair do interior das matas e acredito que a maior
97
parte do percurso tenha sido feita por água: era a única opção
para escapar dos tapuias!
1.7 - USAVAM CABELOS COMPRIDOS
Esse dado pareceu marcante para o padre missivista,
pois nunca tinha visto índios com cabelos tão compridos, que
ele comparou ao das mulheres, para bem caracterizar esse
detalhe, a fim de ser bem compreendido pelos seus colegas de
Portugal, a quem endereçou a carta.
É interessante esse detalhe dos cabelos compridos,
podendo-se acreditar que nenhum índio aparava os cabelos e
chegavam até a cintura nos adultos.
Aliás, há uma crença de que a cabeleira comprida
protege o ser humano contra um série de males e lhe dá força,
como se vê na história do juiz hebreu Sansão.
Essa crença existiu e existe ainda entre vários povos.
Acredito que a razão de cada índio manter sua cabeleira
intacta seja mais por esse motivo místico do que por qualquer
outra razão, pois eram muito místicos e não tomavam
qualquer iniciativa importante sem ouvirem os pajés, que
consideravam orientados pelos espíritos dos antepassados.
Imagine-se um guerreiro forte, rastejando no chão,
rápido como um veado (como diz o padre), com uma cabeleira
pegando pela cintura e atirando flechas certeiras e
envenenadas: era um verdadeiro terror, que somente os
arcabuzes poderiam manter à distância!
1.8 - SEU DIALETO ERA DIFERENTE DO TUPI
Navarro tentou conversar com eles na língua tupi, que
conhecia razoavelmente, mas não foi compreendido, tanto é

98
verdade que relata uma situação em que tentou fazer-se
compreendido por uma menina tapuia, que ia ser martirizada
e devorada, mas ele não entendeu uma palavra, porque o
padre só falava, até então, o tupi e a menina só compreendia e
se expressava na língua tapuia. Espinosa também conhecia
bem o tupi, mas não se sabe se, de início, entendia alguma
coisa do tapuia.
Acredito que, dentre os índios que faziam parte da
expedição, havia pelo menos alguns que se expressavam bem
na língua tapuia.
Espinosa sabia que, no percurso se defrontaria com os
tapuias e, certamente, sabia que teria de dialogar com eles por
intermédio de intérpretes: como sertanista experiente, esse
detalhe nunca seria menosprezado.
Acho que, com paciência e tempo, os tapuias foram
cedendo e verificando que poderiam confiar, sobretudo,
naquele branco mais imponente, que era Espinosa, o qual,
apesar de contar apenas 36 anos, já parecia um velho, por
causa da dura vida que levou desde a velha Castela, na
Espanha.
Versado em várias línguas, Navarro e Espinosa, na certa,
aprenderam bastante coisas da língua tapuia, inclusive com
seus intérpretes. Em pouco mais de um ano dá para aprender
um tanto de qualquer língua, quando se empenha nessa tarefa
e aqueles dois eram verdadeiras sarnas no que tinham como
objetivo.
1.9 - ERAM MUITO CARNÍVOROS
Inclusive, como já dito, gostavam de carne humana como
alimento, tanto quanto da carne de qualquer outro animal.

99
Imagine-se um povo vivendo nas matas, se iria utilizar
como alimentos somente frutos! Era o que aparecesse pela
frente!
Gente branca era apenas mais uma novidade, pois carne
de índio era rotina no cardápio dos tapuias!
1.10 – SUAS ARMAS ERAM FLECHAS ENVENENADAS
Não consta que usassem tacapes, bordunas etc.
Deviam ser bons artífices, porque, das armas indígenas,
as que exigem mais habilidade para sua confecção são o arco e
flecha, que têm de obedecer a uma técnica avançada.
O tipo de madeira do arco, seu comprimento, o tipo de
corda, a elaboração das flechas: tudo isso mostra uma técnica
apurada, porque significa vitória ou morte nos combates.
Imagine-se um grupo de guerreiros escondidos atrás de
árvores ou entrincheirados no solo com uma flecha apontada:
os inimigos morriam flechados sem nem chegarem a dar
conta do tinha acontecido!
1.11 - DESPEDAÇAVAM UMA CRIATURA HUMANA EM
POUCOS MINUTOS
A rapidez em matar e destrinchar os adversários era
impressionante.
Realmente, somente com armas de fogo os brancos
conseguiram intimidar um pouco aqueles ferozes tapuias.
1.12 - PARA A EXPEDIÇÃO PASSAR POR ELES, OS
BRANCOS COLOCARAM À SUA VOLTA OS ÍNDIOS
PARTICIPANTES DA EXPEDIÇÃO, E, MESMO ASSIM,
CORRERAM MUITO PERIGO

100
Os tapuias queriam mesmo é experimentar a carne dos
brancos.
E os brancos devem ter disparado muitos tiros!

1.13 - NO CAMINHO PASSARAM POR UMA SERRA


MUITO GRANDE, QUE FICA NO SENTIDO NORTE-SUL,
NA QUAL AVISTARAM PEDRAS QUE PARECERAM
SER MÁRMORE. NESSA SERRA NASCEM MUITOS
RIOS CAUDALOSOS, SENDO QUE DOIS DELES, PELOS
QUAIS PASSARAM, VÃO DAR NO OCEANO, ENTRE
PORTO SEGURO E ILHÉUS, UM DOS QUAIS É
CHAMADO RIO GRANDE E O OUTRO RIO DAS
OURINAS. INDO ADIANTE, CHEGARAM A UMA TRIBO
CATIGUZU. DE LÁ FORAM A UM RIO MUITO
CAUDALOSO, CHAMADO PARÁ, O QUAL, SEGUNDO
OS ÍNDIOS, É O RIO SÃO FRANCISCO, O QUAL É
MUITO LARGO. NESSA MARGEM HAVIA UMA TRIBO
MAIS FAVORÁVEL AO CONTATO COM OS BRANCOS,
NA OUTRA OS TAMOIOS. MAS, POR TODA A PARTE,
ESTAVAM OS TAPUIAS.

101
Depois que saíram do alcance dos tapuias, navegando
por rios caudalosos, acabaram atravessando montanhas,
localizadas entre rios.
Pode ser até que mais o receio aos tapuias é que
recomendasse esse trajeto. Com isso descobriram um tipo de
pedra que lhes pareceu ser mármore, mas que de mármore só
tinha a aparência.
A expedição encontrou, no percurso de ida, algumas
tribos amigáveis, que seriam, talvez, velhas conhecidas dos
índios participantes da expedição ou até do próprio Espinosa,
que tinha vindo do Peru e possivelmente passado por ali dez
anos atrás para chegar a Porto Seguro.
Todavia, um dado que me importa sobremaneira
destacar é que, até então, os tapuias eram inimigos de
Espinosa e seus companheiros de expedição, tencionando
matá-los e devorá-los.
Não consegui saber a partir de qual momento da viagem
se tornaram amigos, mas é certo que isso aconteceu.
1.14 - NO TERCEIRO DIA, NUMA ALDEIA DE ÍNDIOS
AMIGOS, ACONTECEU UMA FESTA, SENDO QUE
TINHAM AMARRADA UMA MENINA TAPUIA PARA
SER MORTA E DEVORADA, VINDO MUITOS ÍNDIOS
DAS OUTRAS ALDEIAS PARA A FESTIVIDADE
ANTROPOFÁGICA. ALI ACONTECERAM CERIMÔNIAS
CHOCANTES. DALI PARTIU A EXPEDIÇÃO PARA
OUTRAS ALDEIAS, ONDE O PADRE PREGOU, MAS
INUTILMENTE, PORQUE NÃO ABANDONAVAM O
ALCOOLISMO E A BELICOSIDADE. CORRERAM
SEMPRE MUITO PERIGO DA PARTE DOS TAPUIAS.

102
Havia muitos povos que se tornaram amigos da
expedição de Espinosa, tendo sido uma boa oportunidade sua
presença à referida festa.
Ficou muito claro que a narrativa se refere ao percurso
de ida e que os tapuias ainda estavam no encalço dos
expedicionários, sendo seus inimigos até então.
1.15 - HAVIA NA REGIÃO OUTRAS TRIBOS FEROZES.
Não eram apenas os tapuias os guerreiros temíveis.
Quanto aos nomes dessas tribos é quase impossível decliná-
los, porque não restam nem vestígios de sua existência.
1.16 - AQUELES POVOS NÃO TÊM CHEFES, NO ESTILO
EUROPEU DA PALAVRA, ENTENDENDO O PADRE QUE
EM TODAS AS SOCIEDADES DEVE HAVER UMA
HIERARQUIA.
Uma das coisas que mais chamou a atenção nas
sociedades indígenas foi o fato de não haver entre os membros
das comunidades hierarquia no sentido europeu da palavra.
Nosso padre tinha sido educado e vivido dentro de um
estilo altamente antidemocrático, que era a Companhia de
Jesus, antes sendo educado pelo tio, que queria fazer dele um
professor em Coimbra, seguidor de Inácio de Loyola.
Imagine-se como foi difícil entrar na cabeça de Navarro
a noção de que coletividades possam viver bem e
harmoniosamente sem juízes, autoridades, confessores e
fiscais!
1.17 - QUANDO ALGUM ÍNDIO SE SENTIA OFENDIDO
POR ALGUM CRISTÃO, MESMO QUE MINIMAMENTE,
OS ÍNDIOS JUNTAVAM-SE EM BANDOS PARA
VINGAREM O OFENDIDO. SOMENTE TRATAVAM BEM
103
OS CRISTÃOS QUANDO TINHAM A INTENÇÃO DE
TOMAREM-LHES TUDO, ATÉ AS ROUPAS E, DEPOIS
QUE LHE TOMAVAM TUDO, DAVAM-LHES COMIDA,
ASSIM MESMO COM A CONDIÇÃO DE ARRANCAREM
TODOS OS PELOS DO CORPO E CAÇAREM E
PESCAREM COM ELES.
Entendi que esta afirmação se refere aos brancos que, no
fundo, menosprezavam os índios, não sendo os casos de
Espinosa, Navarro e o jovem Belchior.
1.18 - SEUS PERTENCES PESSOAIS ERAM MUITO
POUCOS E ALIMENTAVAM-SE GRUPALMENTE DO
QUE PESCAVAM E CAÇAVAM.
Uma verdadeira democracia!

2 – KHAMAKNIAN E JIKKY
Sempre tive muito cuidado em analisar as lendas e
procurar entender o que está por trás delas.
Concluí que, normalmente, os personagens lendários
realmente existiram e, depois de sua morte, foram mitificados,
de boa-fé por parte de uns e de má-fé por parte dos
detratores.
Acredito que esses dois caciques, sendo um homem e
uma mulher, se tornaram amigos de Espinosa, Navarro e
Belchior, mas Navarro não quis fazer nenhuma referência a
eles para não piorar mais ainda sua situação e a dos
companheiros de jornada.

104
Afinal, o Governo português e os jesuítas queriam
apenas ouro e pedras preciosas e nenhuma conversa fiada
sobre índios.
Deu para entender?
Assim termino esta breve história sobre os tapuias, que
não eram a escória do Brasil, mas sim um povo evoluído, que,
por orientação dos referidos líderes indígenas, praticavam a
democracia, a religiosidade realmente ética e o amor e
integração à Natureza!
Prezados leitores, procurem conhecer mais a História do
Brasil!

FIM

105
2 – O ENTROSAMENTO ENTRE ESPINOSA E MARÉT-
KHAMAKNIAN E SUA MULHER MARÉT-JIKKI
Percebi, nas minhas pesquisas e reflexões, que esse
entrosamento altamente benévolo para todos baseou-se na
confluência de formas de pensar e de viver sobre os seguintes
tópicos:
1 – integração total com a Natureza
2 – democracia
3 – espiritualidade

NOTAS
[1]
Encontrei uma referência aos tapuias em um texto
divulgado na Internet, de autoria de Lara Paiva, intitulado
“Diferenças entre os Potiguaras e os Tapuias”, no endereço:
www.brechando.com/2016/02/diferencas-entre-os-potiguaras-
e-tapuias/, que transcrevo a seguir:

“Eles apresentavam-se corpulentos, possuidores de


grande força física. A pele queimada, em tons de marrom.
Usavam cabelo longo ao sabor do vento. Não
costumavam usar roupa, mas cobriam as partes íntimas
com peças feitas de materiais rudimentares, extraídos da
natureza.
Em contrapartida, as mulheres apresentavam estrutura
física pequena, mas a cor era a mesma dos homens.
Costumavam manter os cabelos curtos ou longos, de
corpos rechonchudos. Também escondiam suas partes
íntimas. Adornavam seu corpo com o que encontravam
106
na natureza. Utilizavam-se de tais enfeites tanto para a
prática das danças, como na preparação para a guerra.”

PARTE II
DESENHOS

107
Cacica tapajó Maria Moaçara

108
Padre Gaspar Misch

109
Padre João Azpilcueta Navarro e Sertanista Francisco Bruza
Espinosa

Sertanista Belchior Dias Moreira

110
Cunhambebe

111
Homenagem aos tapuias

112

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