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Guia

Prático sobre
Como Escrever Um
Livro

Clube de Autores







Guia Prático sobre Como Escrever Um Livro 1






Índice
Tem uma história para contar? Parabéns: o primeiro passo está dado. .................. 3
Regra # 1: Domine o seu idioma ............................................................................. 4
Regra # 2: Não ignore o mar de referências à sua volta .......................................... 5
Regra # 3: Entenda (e abrace) o zeitgeist ................................................................ 6
Regra # 4: Faça uma linha do tempo ....................................................................... 8
Regra # 5: Crie personalidades, não personagens ................................................... 9
Regra # 6: Pesquise e crie mundos tangíveis, não cenários artificialescos ............. 11
Regra # 7: Deixe as mãos guiarem o enredo ......................................................... 12
Cuidados importantes .......................................................................................... 14
Não seja um mero relator de fatos ........................................................................................................... 14
Observe com cautela a Lei de Tchehov .................................................................................................. 15
Dicas de George Orwell sobre como escrever bem ............................................... 18
Livro escrito é livro pronto? ................................................................................. 19



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Tem uma história para contar? Parabéns: o primeiro passo
está dado.

Livros são, antes de mais nada, registros de histórias relevantes.

Podem ser ficção, não ficção, manuais técnicos ou qualquer gênero existente: seja
como for, livros são compilados estruturados de conhecimento.

Mas há algo nessa frase acima que deve ser relido: a palavra "estruturados".

Todos, afinal temos alguma história para contar sobre alguma coisa qualquer que
vivemos ou imaginamos - mas isso não significa que todos consigamos
efetivamente escrever um livro de sucesso (qualquer que seja a medida de
sucesso considerada) com base nessa história.

É preciso, antes de mais nada, estruturar a história, dar a ela a cadência
necessária para que capte não só o entendimento do leitor, mas também - e
talvez principalmente - o seu desejo em continuar lendo-a.

Assim, se você tiver uma história para contar, ótimo: já é o primeiro passo para
escrever um livro. Só não se esqueça que a estrada será longa e que ainda haverá
muitos passos a serem dados - muitos dos quais serão explorados aqui, neste
guia, com o único objetivo de auxiliá-lo por esta inenarrável aventura que é criar
mundos.


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Regra # 1: Domine o seu idioma

Há uma diferença muito pouco sutil entre a história falada e a história escrita: a
fala carrega tons e entonações que dificilmente podem ser replicadas pela
escrita. Por este mesmo motivo, histórias faladas permitem mais liberdades com
o nosso idioma, são mais soltas, mais "musicais".

Na história escrita, tudo muda: nela, a entonação é dada pelo leitor, não pelo
narrador.

A posição de uma vírgula pode quebrar todo o ritmo da frase ou mesmo alterar o
seu sentido; a falta de vírgulas pode deixar o leitor com absoluta falta de ar,
asfixiando a história inteira; tempos verbais errados (como usar o ‘quer que eu
faço isso?’ ao invés de ‘quer que eu faça isso?’) podem assassinar a imagem do
autor perante o leitor – imagem que sempre deve ser mantida no mais alto
patamar pelo bem do enredo.

A história escrita depende, por óbvio, da escrita, e quanto mais mambembe,
quanto mais desconectada do nosso idioma, ela for, mais difícil será cativar uma
base interessante de leitores. Vemos isso no cotidiano do Clube de Autores: se há
um ponto comum na imensa maioria dos livros mais vendidos aqui é que eles
passaram por uma revisão profissional antes de chegarem às prateleiras.

Temos um idioma que, embora belíssimo, é carregado de sutilezas e de
minuciosas regrinhas para tudo. É difícil, muito difícil, dominar todos os detalhes
do português – mas usar isso como desculpa para não se aprofundar no básico
não ajuda o autor em nada. Quer viver da escrita? Estude seu idioma.

Histórias bem escritas, afinal, são também histórias mais lidas, como se pode
concluir por obviedade.

E bons livros têm os seus enredos bem escritos, não cuspidos de qualquer
maneira em folhas em branco.

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Regra # 2: Não ignore o mar de referências à sua volta

É impossível escrever bem se você não lê bem. Aliás, isso não deveria sequer ser
uma questão: é um privilégio inenarrável termos, hoje, a possibilidade de ler
tanto por tão pouco. Temos, ao alcance de todos, gênios como Guimarães Rosa,
Mia Couto, Tolstoi. Mestres que praticamente refundaram idiomas inteiros e
criaram modelos de expressão literária absolutamente revolucionários.

Como sequer querer multiplicar leitores sem antes entender como esses grandes
mestres dos nossos e de outros tempos o fizeram? Ou, refazendo a pergunta:
para quê desperdiçar essa base tão gigantesca de conhecimento que está ali, ao
nosso alcance?

E isso porque estamos falando aqui apenas dos mestres já consagrados.

Há outros: há os escritores independentes que apenas agora começam a criar os
seus públicos. E por que eles são fundamentais? Porque a literatura do futuro
está sendo desenhada justamente por eles.

Há como ser um escritor incrível sem ser um leitor ávido? É possível, claro, mas
não provável. E decididamente não é um caminho que pareça muito inteligente.

Quer um lugar ao sol junto aos mestres da literatura? Comece pelo caminho mais
fácil e óbvio: aprenda com eles.

Faça uma lista de histórias e livros que te interessem e mergulhe neles. Leia não
com um olhar leigo, mas sim como um explorador desbravando um novo
universo: atente-se à cadência das frases, às palavras, às referências utilizadas, à
maneira com que o autor brinca com o tempo e apresenta protagonistas e
antagonistas, a toda a construção da trama.

Aliás, ao invés de apenas ler, estude as obras que considerar referências
importantes para você.

Não que você precise seguir uma espécie de receita de bolo - escrever sempre
dependerá de um estilo essencialmente individual. Mas o simples fato de você
estudar os seus próprios mestres o fará ampliar, decisivamente, os limites da sua
própria capacidade criativa.


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Regra # 3: Entenda (e abrace) o zeitgeist

Zeitgeist é uma palavra alemã que significa “espírito do tempo”. Sua aplicação
prática: entender qual o conjunto de valores que está efetivamente movendo
uma sociedade em um dado momento para que se consiga tomar proveito disso.

O “tomar proveito”, nesse caso, significa surfar a onda de uma comoção popular
já formada e, portanto, deixando algo que se queira vender (seja um produto ou
uma história) com uma vantagem fundamental. E, apesar do conceito parecer
recém saído das páginas de um livro de marketing, ele já era essencial há séculos.

Tome Shakespeare, por exemplo.

Todas, absolutamente todas as suas grandes peças tiveram os seus enredos
baseados em fatos que estavam mexendo com o imaginário popular. Othello foi
escrito quando Elisabeth I expulsava os mouros de Londres; o Rei Lear se baseou
em um caso jurídico real que se transformara na grande fofoca do reino;
MacBeth foi feita para celebrar, por meio de metáforas, a linhagem do monarca
James I, para quem a peça foi escrita.

A receita de Shakespeare sempre foi simples (o que, ressalvo, não subtrai em
nada a sua genialidade): entender o que estava movendo o povo e criar uma peça
que metaforizasse o momento para angariar um tipo mais entusiasmado de
atenção.

O bardo, no entanto, viveu em um tempo de poucas imensas mudanças sociais –
o oposto do nosso.

Nossos tempos são mais agitados: há pequenas revoluções, por assim dizer,
acontecendo a cada par de dias. Olhe para a política brasileira: não há uma só
semana em que tudo não esteja na iminência de uma ruptura completa.

Olhe a política americana: não dá para dizer que a gestão Trump, com todas as
suas promessas xenófobas e radicais, tenha pacificado o planeta.

Olhe para os refugiados do Oriente Médio, para a falta de preparo da Europa em
recebê-los e para o absoluto caos gerado por causa disso. Olhe para o Brexit.

Olhe ao seu redor.

O mundo tende a ser um lugar muito, mas muito mais tenso do que o que já foi
em qualquer ponto do passado pós revolução industrial.

E por que isso tem alguma relevância em um guia para escritores?

Porque, se nos permite a frieza, nunca um mundo entregou tantos zeitgeists e
tanta inspiração para histórias.

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Esse lugar quente, feito de cataclismas semanais e de radicalismos diários, é uma
espécie de paraíso para mover mentes e corações e gerar clássicos talvez muito
mais intensos que os da Inglaterra Shakespeariana.

Para quem está do lado de cá das prateleiras, apenas acompanhando a literatura
moderna enquanto ela se forma, é um tempo que se pode traduzir no mais puro
entusiasmo.

Para quem está do lado daí, escrevendo, torna-se cada vez mais imperativo saber
como aproveitar bem esse nosso mundo tão inclinado a se revolucionar.

O resumo dessa regra? Busque banhar o seu enredo, de todas as formas
possíveis, nos grandes temas que estiverem movendo a opinião social do seu
público leitor. Acredite: só isso já servirá como um poderoso convite para que
eles se entreguem de corpo e alma às suas páginas.



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Regra # 4: Faça uma linha do tempo

Marguerite Duras costumava dizer que, para um escritor, escrever é um ato tão
involuntário quanto respirar.

E, de fato, às vezes a maior dificuldade que encontramos é justamente evitar que
ideias se transformem em frases, que frases se transformem em parágrafos e que
parágrafos se transformem em capítulos com uma força tão tsunâmica que, em
pouco tempo, a narrativa inteira acabe se perdendo no caos.

Não que esse caos seja de todo danoso: a livre escrita é uma ferramenta
poderosa para ajudar o autor até a descobrir mais sobre a sua própria obra.

Há, no entanto, que se inserir um pouco de estrutura para evitarque a obra se
perca - a começar por uma linha de tempo.

Um livro não precisa, necessariamente, seguir uma narrativa linear, partindo
sempre no sentido passado-futuro. Na sua obra prima "Ghana Must Go", a autora
Taiye Selasi passeia pelas vidas de gerações de seus personagens sem nenhum
tipo de receio, forçando o próprio leitor a encaixá-los cronologicamente na
história.

Para a autora, no entanto, essa cronologia já estava mais que definida. Caso
contrário ela facilmente se perderia e um livro fabuloso se transformaria em uma
confusão incompreensível.

A lição que isso dá para escritores? Se você já tiver a sua história mais ou menos
concebida, pegue um pedaço de papel e desenhe a sua cronologia.

Partindo do passado para o presente ou o futuro, anote os fatos, registre causas e
consequências, insira personagens e genealogias onde achar necessário.

Este será o esqueleto da sua obra, uma espécie de linha mestra à qual você
sempre poderá recorrer em caso de necessidade.

A partir daí você até poderá, para o bem do seu estilo narrativo, começar pelo
final, voltar ao passado, saltar até o presente e brincar pela cronologia o quanto
quiser. Mas, quando tiver dúvida sobre algum fato qualquer, sobre que
antagonista impactou que protagonista por que motivo e em que momento,
bastará recorrer à sua linha do tempo.

Esta será a sua estrutura perene, sagrada.

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Regra # 5: Crie personalidades, não personagens

A imagem abaixo é a árvore genealógica da família Buendía, base da obra prima
Cem Anos de Solidão, do vencedor do Nobel de Literatura Gabriel García
Marquez.




Perceba que muitos dos personagens têm nomes iguais ou semelhantes, o que
fatalmente confunde o leitor enquanto este viaja pelas gerações de habitantes da
cidade de Macondo, na Colômbia.

Mas... se há tanta confusão, como foi, exatamente, que esse livro se transformou
em um dos maiores clássicos da história da literatura mundial?

Simples: cada um dos personagens tem uma história própria, uma personalidade
marcante e absolutamente singular.

Mais do que nomes riscados em uma folha, os personagens de García Marquez
têm os seus próprios medos, traumas, angústias, esperanças, ímpetos. Todos são
fruto de suas sociedades, de seus tempos e de suas ambições, o que dá ao
romance uma credibilidade formidável.

Mais do que isso: as personalidades são tão vivas que o leitor costuma não
apenas se identificar, mas se apaixonar pela saga dos Buendías, criando um tipo
de laço que costuma existir apenas aqui fora, na vida real.

O que se aprende com isso?

Que personagens precisam ser mais que nomes jogados no meio de uma história.

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Quando for criar os seus, assegure-se de dar a eles uma história que inclua tudo,
de medos a motivações.

Mesmo que parte dos traços de personalidade não encontrem espaço na
narrativa em si, mantenha-os anotados para evitar que um determinado
personagem aja de maneira incoerente com quem ele realmente for.


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Regra # 6: Pesquise e crie mundos tangíveis, não cenários
artificialescos

Seu livro, naturalmente, se passa em algum lugar - seja ele real ou imaginário. E
mesmo que ele seja imaginário, sua imaginação certamente se baseou em algum
(ou alguns) lugares reais, com auras e climas próprios.

Da mesma forma, seu livro também se passou em algum tempo. Seja na
antiguidade clássica ou em um futuro distópico, o fato é que o tempo da sua
narrativa certamente foi moldado e abalado por acontecimentos que fizeram
todos, de personagens a cenários, chegarem onde chegaram.

Se estiver trabalhando em um romance sobre a ditadura militar brasileira, terá
um enredo provavelmente abalado por um zeitgeist de medo, censura, guerra
fria.

Se estiver concebendo uma história de amor nascida nos confins dos sertões
nordestinos, terá um ambiente forjado pela lei do mais forte e pela escassez
absoluta.

Se estiver historiando a vida do Rio de Janeiro no período imperial, perambulará
sobre uma sociedade perdida entre os impulsos da modernização e o
conservadorismo distópico característico de um reino europeu nos trópicos
latinos.

Seja qual for o tempo e o espaço do seu romance, pesquise tudo o que conseguir.

Quais foram os personagens reais que marcaram época? Quais os fatos que
movimentaram a opinião social? Quais os costumes? Quais as situações políticas?
Quais os níveis de caos abalando os mundos em que suas histórias se passarão?

Da mesma forma que você deve criar personalidades ao invés de personagens,
aqui é importante criar mundos próximos do que a imaginação do leitor possa
entender como reais, críveis.





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Regra # 7: Deixe as mãos guiarem o enredo

Se você tem uma linha de tempo, cenários críveis, personagens densos e um
zeitgeist amarrando a tudo e a todos em uma mesma teia aderente, então resta a
parte efetivamente divertida: escrever.

E aqui a regra é a mais simples de todas: dê espaço para que suas mãos,
provavelmente já agoniadas, se derramem pelo teclado.

Nem sempre saberemos ao certo por onde começar, claro - mas, dado todo o
material já colecionado sobre a história, aqui é o momento de deixar as mãos
decidirem.

Busque apenas ficar a sós com o teclado e com suas anotações em algum
ambiente propício à concentração e pronto. Comece.

Deixe vir uma palavra aqui, outra ali… Deixe surgir o eventual arrependimento,
apagando frases inteiras e produzindo novas.

Na dúvida, recorra à suas anotações sobre a história. Se necessário, ajuste-as um
pouco. Ou muito.

Mas siga.

Olhe em frente, testemunhando em primeira mão pessoas se metamorfoseando
em personagens. Na imaginação, nomes passarão a se colar a faces, passados a
rugas, futuros a olhares.

Encontros e desencontros inventados, e não por isso menos reais, povoarão o
imaginário do escritor que ficará dali, de uma mesa discreta, arquitetando os
destinos do mundo.

E que mundo, acrescente-se. Bem melhor que o de carne-e-osso, feito apenas do
que vemos e não do que pensamos. O mundo de quem observa escrevendo inclui
tantos pensamentos e inconscientes alheios que faz da realidade algo tão tedioso
quanto uma samambaia dormindo no canto de uma sala escura.

Enquanto isso, o teclado metralha. Frases desconexas vão ganhando sentido,
parágrafos vão se erguendo como que por mágica, capítulos vão se formando
como cidades inteiras. Mundos inteiros vão nascendo, feitos para o deleite do seu
Criador que constrói, destrói, cria e mata.

É, afinal, hora de escrever.

É hora de olhar ao redor e de voltar a imaginar as imaginações dos que passam
crus, inocentes, aguardando sem saber os seus destinos serem esculpidos.

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É hora de ignorar uma realidade para criar outra.

É hora de ser escritor.

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Cuidados importantes
Não seja um mero relator de fatos

Qual livro é mais fidedigno: Os Sertões, de Euclides da Cunha, ou Guerra do Fim
do Mundo, de Vargas Llosa?

Já começamos aqui pedindo desculpas se ofendemos qualquer um com o nosso
próprio gosto literário. Não negamos, nem poderíamos negar, a poderosíssima
importância histórica dos Sertões: sem ele, todo um tempo-espaço do nosso país
seria desconhecido.

Mas, entre as páginas e mais páginas de dados históricos, há uma narrativa chata,
insuportável, daquelas que faz o leitor questionar seriamente a sua própria
sanidade caso pense em prosseguir até a última página. Os Sertões é tão
linearmente verdadeiro que ele ultrapassa as fronteiras da chatice aceitável.

Mude, agora, de livro: vá para A Guerra do Fim do Mundo.

A história é a mesma: a Canudos de Antônio Conselheiro; a narrativa, por outro
lado, é extremamente diferente.

Sim, há dados históricos e personagens inquestionavelmente verdadeiros. Mas
há também pequenas corruptelas – como o fictício Barão de Canabrava,
representando o Brasil velho e que, na vida real, provavelmente era o Barão de
Jeremoabo.

Há cenas que poderiam facilmente ter existido – como diálogos entre soldados e
jagunços – mas que dificilmente teriam sido exatamente aquelas, proferidos
exatamente por aquelas pessoas. São alguns dos melhores diálogos de uma obra
prima digna do Prêmio Nobel, acrescento.

Há realidade, sem dúvidas, algo comprovado por séries de referências históricas
encontradas nos próprios Sertões de Euclides da Cunha. Mas, para aqueles
momentos em que a realidade fica chata ou obscura demais, há a ficção com sua
pulsação mais forte, mais densa, mais intensa.

O que, no fim, importa mais?

Uma realidade tão enfadonha quanto todas as realidades que existem, ainda que
de uma densidade aterrorizante como a de Canudos do fim do século XIX, ou uma
visão romanceada e, portanto, mais emocionante, dela?

A pergunta foi retórica: a verdade mais verdadeira, aquela que pode ser esticada
em uma simples linha de tempo, é apenas um livro mal escrito.

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A verdade que fica para a posteridade, afinal, é sempre a versão mais bem
contada da história.

Veja: não estamos pregando aqui a ficcionalização de realidades. Estamos apenas
reforçando que, com o objetivo de gerar mais aderência à sua obra, não se negue
a lançar mão de uma imaginação... digamos... ponderada.

Observe com cautela a Lei de Tchehov



Tchekhov dizia que, se um revólver aparecesse em uma cena qualquer de uma
história, é porque ele eventualmente seria disparado.

Histórias, ao menos sob a ótica do mestre russo, não tinham espaço para
elementos supérfluos, para desnecessidades. Nas histórias, tudo devia ser
calculado, medido, intercalado em uma relação simbiótica de causas e
consequências.

Tudo devia ser construído para conduzir a concentração do leitor pela
imaginação do autor: qualquer possível desvio, qualquer brecha deixada por
descuido poderia soprar a imaginação do leitor para longe, fazendo-o criar
versões paralelas repletas de “se’s” e costurar hipóteses que seriam, em essência,
estradas abertas para a total perda de interesse no enredo real.

Tchekhov morreu em 1904.

Anos depois, um outro mestre da literatura, o japonês Haruki Murakami,
publicou a sua obra prima 1Q84 – uma espécie de thriller psicometafísico tão
impressionante que as suas 1.500 páginas terminam quase que em um susto só,
deixando um surpreendente gosto de “quero mais”.

Em um ponto específico da história, um personagem entrega um revólver para
uma amiga mencionando a “Lei de Tchekhov” e, portanto, profetizando que ela
eventualmente atiraria em alguém. Ela teria que atirar, afinal.

E, no livro, há oportunidades para isso. Inúmeras.

A personagem, Aomami, chega a um ponto em que a arma vira quase uma
extensão de seu próprio corpo. Mas… o livro chega ao fim e o revólver nunca
cumpre o papel para o qual foi criado.

Alguns podem argumentar que, talvez, o papel do revólver tenha sido justamente
esse: o de representar algo, de agregar alguma sensação de segurança para guiar
a personagem pelo sempre tenso enredo. Talvez a sua própria existência tenha
sido uma espécie de fim em si mesmo.

O fato, todavia, é que tanto na arte quanto na vida, histórias são invariavelmente
resultados dos seus tempos.

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Na Rússia do final do século XIX – a mesma de Tolstoi e Gorki, diga-se de
passagem – a vida real era tão rústica e prática que uma arma não disparada
simplesmente não faria sentido em nenhuma história: geraria estranheza,
angústia, incômodo. No passado, tudo tinha um motivo de ser, um destino a ser
cumprido – e a arte, enquanto mímica da vida, não poderia ser diferente.

Hoje, nossos tempos são outros.

Hoje, lemos livros enquanto prestamos atenção na estação de metrô que
devemos saltar, assistimos à televisão enquanto navegamos no Facebook e
escrevemos as nossas histórias enquanto absorvemos as críticas feitas em tempo
real sobre seus trechos inacabados.

O autor de hoje é tão multitarefa quanto seu leitor: vive escolhendo, a cada piscar
de olhos, a que deve prestar atenção e o que deve ignorar. Hoje, portanto, todos
estamos acostumados não a uma, mas a toda uma coleção de “desnecessidades”
supérfluas nos cenários das nossas vidas reais. Nossas vidas reais, arriscaríamos
dizer, são muito mais recheadas de coisas supérfluas do que de elementos que
realmente fazem parte dos nossos destinos.

O próprio conceito de destino mudou: de algo pre-determinado e imutável ele se
metamorfoseou em algo essencialmente volúvel, dependente das pequenas
escolhas nossas de cada dia.

No mundo de Tchekhov, um revólver não faria sentido se não fosse disparado.
Era a finalidade que definia o ser, o objeto.

No mundo de Murakami, no nosso mundo atual, basta que um revólver exista
para que sua função seja cumprida. O objeto em si é também a sua própria
finalidade.

E isso muda toda a forma com que interpretamos as grandes obras dos nossos
tempos de uma maneira revolucionária, somando sutilezas nos enredos que
tendem a acrescentar muito mais sentido a cada capítulo, a emprestar muito
mais realidade à ficção.

Para quem costuma achar que a “boa literatura” já estava morta (algo
infelizmente corroborado por fatos como Bob Dylan receber o Nobel ou José
Sarney ser membro da Academia Brasileira de Letras), é bom despir-se de
preconceitos e ler novos livros com novos olhos.

As obras primas de hoje são muito mais complexas, sutis e densas que as do
passado: os novos autores estão revolucionando a literatura como em nenhum
outro tempo da nossa história.

O que isso tudo importa para você, escritor?

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Simples: seja simples, mas não simplório, na construção de seus cenários e de
suas tramas. Se quiser, acrescente objetos que sirvam apenas para agregar valor
ao contexto - mas cuidado para não deixar o seu leitor perdido, com uma
interrogação presa na mente.

Você não precisa seguir à risca a Lei de Tchekhov - mas isso não significa que
precise também desprezá-la completamente.

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Dicas de George Orwell sobre como escrever bem

Já que tanto falamos sobre mestres e referências, por que não abrir uma seção de
dicas partidas exatamente de um deles?

George Orwell é, provavelmente, um dos escritores mais lidos do mundo. Autor
de A Revolução dos Bichos e 1984, ambos com uma concepção distópica de
sociedades “pseudo-comunistas”, ele cativou leitores por todo o planeta.

Boas ideias para livros, no entanto, são apenas parte da fórmula de sucesso de
qualquer escritor. Além disso – e de outros ingredientes como, por exemplo,
pitadas de sorte e competência em autopromoção – há que se escrever bem.
Claro.

E não é que Orwell criou uma espécie de manual para se escrever bem? Veja as
suas seis regras abaixo:

1. Nunca use uma palavra longa quando uma curta resolver
2. Se for possível cortar uma palavra de um texto, corte
3. Nunca use a voz passiva quando puder usar a voz ativa
4. Nunca use metáforas ou comparações que já forem “lugar-comum” (e que,
portanto, você já tiver visto inúmeras vezes)
5. Nunca use um termo em inglês ou em jargão científico quando conseguir
substituir por algo mais corriqueiro, simples de ser entendido
6. Se necessário, quebre qualquer uma dessas regras para evitar dizer algo
que soe tosco

Tudo bem que não há um livro de receitas para se escrever livros – mas não
custa nada beber um pouco da sabedoria dos que já trilharam, com sucesso, o
caminho que estamos buscando. Não é verdade?



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Livro escrito é livro pronto?

Não: um original escrito deve ser considerado como um rascunho do que o seu
livro realmente será.

Há ainda outros pontos que precisam ser endereçados antes dele ser
efetivamente lançado, incluindo leitura crítica, revisão ortográfica e gramatical,
capa e diagramação, ISBN etc.

Mas esse é um segundo passo, dado apenas depois que seu livro estiver
devidamente escrito e que você se sentir razoavelmente confortável com o
resultado.

Quer mais informações sobre como lançar um livro? Fizemos um post no blog do
Clube de Autores que certamente poderá ajudá-lo. Para acessar, vá a este link:
http://blog.clubedeautores.com.br/2018/10/como-lancar-um-livro-sem-
burocracia.html











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