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Revisão

Metabolismo do ferro e eritropoiese

Janaina Lauxen Negri


O ferro é um elemento essencial para a vida celular. Ao mesmo
tempo apresenta importante toxicidade. Dessa maneira é
importante que os níveis desse metal sejam cuidadosamente
regulados no organismo humano. Alterações no metabolismo do
ferro podem levar tanto à deficiência como ao seu acúmulo. Essa
revisão aborda as particularidades no mecanismo de controle que
mantém o equilíbrio entre a absorção, distribuição, utilização e
estoque. Como a eritropoiese é o principal consumidor do ferro no
organismo, aspectos relacionados à sua relação com o
metabolismo deste elemento são apontados, demonstrando que
estes processos estão intimamente ligados. Dentro do processo de
homeostase é abordada a importância do papel da hepcidina na
regulação da homeostase do ferro e suas relações com a
eritropoiese.

Palavras-chave: Metabolismo do ferro; eritropoiese; eritropoiese


ineficaz; hepcidina

Introdução

O ferro é um mineral vital para quase Na vida primitiva, com as condições


todos os organismos. É um metal de de anaerobiose existentes, predominava a
2+
transição do bloco d, e, como muitos forma reduzida, ferrosa (Fe ), a qual era
destes metais, pode assumir vários estados mais facilmente absorvida por ser mais
de oxidação. Possui facilidade na doação e solúvel e com excelente biodisponibilidade.
recepção de elétrons, o que garante a sua Mais tarde, com a evolução para um meio
participação em inúmeros mecanismos ambiente aeróbico, o acúmulo de oxigênio
3+
celulares. Serve como cofator para muitas oxidou o íon ferroso a íon férrico (Fe ), que
proteínas e enzimas, participando desta é praticamente insolúvel no pH fisiológico.
maneira de processos essenciais à Além disso, a ciclagem de ferro ferroso a
homeostase celular, tais como o transporte férrico na presença de radicais hidroxil e
de oxigênio, o metabolismo energético e a ânions superóxidos, leva à formação de
1,2
síntese de DNA. Nos mamíferos é radicais hidroxila (Reação de Fenton).
utilizado principalmente na síntese da Estes, por sua vez, atacam facilmente
hemoglobina nos eritroblastos, da membranas e macromoléculas celulares.
mioglobina nos músculos e dos citocromos Sendo assim, apesar da abundância do
1
no fígado. O conteúdo de ferro de um Ferro na crosta terrestre, a sua aquisição e
indivíduo adulto é de 3 a 5 gramas, sendo transporte consistem em um desafio para
que de 60 a 70% está incorporado na células e organismos, devido à sua baixa
2–4
hemoglobina. solubilidade e toxicidade elevada.

Farmacêutica Bioquímica no Laboratório Municipal de Joinville/SC


Aluna do curso de Pós Graduação em Hematologia Clínica e Laboratorial da Academia de Ciência e Tecnologia São
José do Rio Preto/SP

Correspondência: Janaina Lauxen Negri


Rua João Adolfo Muller 238 Apartamento 202 Costa e Silva Joinville/SC
Email: janainalauxen@gmail.com
Fone: 47 99229635
borda em escova, a principal proteína é a
O ferro é essencial à eritropoiese transportadora de metal divalente 1 (DMT-
especialmente para a síntese de 1). Esta proteína, composta por 12
hemoglobina pelos eritrócitos. Tanto a segmentos transmembrana, transporta,
2+ 2+ 2+ 2+
deficiência como o excesso de ferro causa além do ferro, Mn , Co , Cu e Zn .
disfunção celular e do organismo como um Camundongos sem a expressão desta
todo. A anemia é a manifestação mais proteína morrem rapidamente após uma
relevante da deficiência, enquanto que o severa anemia, comprovando a importância
6
excesso de ferro também causa danos ao da DMT-1 para a absorção do ferro. A
organismo devido à sua toxicidade. maior parte do ferro não heme proveniente
Portanto, a manutenção do equilíbrio no da dieta encontra-se na forma férrica, e
metabolismo do ferro garante que sejam precisa, portanto ser reduzido a ferro
mantidas funções celulares essenciais, ao ferroso, o qual é o substrato para a DMT-1.
mesmo tempo em que se evita prováveis Este processo é mediado pela redutase
3,7
danos teciduais decorrentes da toxicidade citocromo b duodenal ou Dcytb. A
1,5
deste elemento. absorção do ferro heme e da ferritina são
menos compreendidas. Existem evidências
Aquisição de ferro de que o heme e a ferritina sejam captados
A obtenção de ferro pelo organismo por endocitose mediada por receptor,
se dá de duas maneiras principais: através porém foi identificado um receptor de alta
da dieta e da reciclagem de hemácias afinidade para o heme nos enterócitos.
1
senescentes. A proteína transportadora do heme-
O ferro da dieta apresenta-se de 1 (HCP-1) foi descrita recentemente e
diversas maneiras, sendo tipicamente localiza-se na membrana apical das células
classificado como ferro heme ou não do duodeno. Demonstrou-se que a HCP-1
6
heme. O ferro heme encontra-se em transporta também o folato, inclusive com
grande abundância nas carnes, como parte maior afinidade do que o heme, por isso
da hemoglobina e da mioglobina. Já o ferro questiona-se ainda o seu papel como um
3,6,7
não heme apresenta-se sobre várias transportador bifuncional.
formas tanto nos alimentos de origem
animal como vegetal. A maior parte
encontra-se na forma férrica, que
apresenta baixa solubilidade e
biodisponibilidade. Contudo, durante o
processo de digestão, a forma não heme
encontra-se complexada com vários
produtos da digestão que podem facilitar ou
dificultar a sua absorção. Por exemplo,
fitatos e taninos, derivados de plantas,
podem sequestrar algumas formas e
diminuir consideravelmente sua absorção,
enquanto que o ácido ascórbico e
compostos derivados das carnes podem
6
aumentar sua absorção.
Apesar de uma dieta normal conter
de 13 a 18 mg de ferro, somente de 1 a 2
mg serão absorvidos na forma inorgânica
1
(não heme) ou na forma heme.
A absorção do ferro ocorre no
epitélio duodenal superior, o qual apresenta Figura 1. O enterócito e as proteínas
estruturas vilosas que aumentam a envolvidas na absorção do ferro. Dcytb:
3
superfície de absorção. As propriedades ferroredutase; DMT-1: transportador de
metal divalente-1; HCP-1: proteína
físicas do trato gastrointestinal tais como a
transportadora do heme-1; NU: núcleo;
área de superfície do intestino, que HFE: proteína da hemocromatose;
aumenta em durante situações de TfR:receptor. receptor . Adaptado de Grotto,
deficiência de ferro, e o ph estomacal, 2008.
6
influenciam na absorção de ferro.
A figura 1 ilustra a localização das Após a ligação com a HCP-1, o
proteínas envolvidas no processo de heme atravessa a membrana plasmática,
absorção do ferro pelos enterócitos. Na sendo apresentado, já no citoplasma da

2
célula, à membrana de vesículas. A aumentada na deficiência e reduzida no
regulação da quantidade de HCP-1 excesso de ferro.
presente na borda em escova do enterócito A segunda maneira pela qual o
é feita de acordo com o conteúdo de ferro organismo adquire ferro é a partir da
intracelular: no caso deficiência de ferro, degradação das hemácias senescentes.
ocorre uma redistribuição desta proteína Durante a seu tempo de vida, que é de
para a membrana plasmática, enquanto aproximadamente 120 dias, as hemácias
que no caso de excesso de ferro ocorre o sofrem danos oxidativos, alterações de
inverso, com redistribuição da membrana proteínas e lipídeos de membrana, perda
apical do enterócito para o seu citoplasma. de ácido siálico e cargas elétricas, queda
Além desse mecanismo de regulação pós- no gradiente iônico e perda de importantes
tradução da proteína, a hipóxia também enzimas tais como algumas quinases. Além
1
induz a síntese da HCP-1. disso, ocorre a formação de neoantígenos.
No interior da célula, o heme Todas essas alterações sinalizam ao
absorvido é quebrado pela heme oxigenase macrófago para eliminar essas células. As
liberando o ferro férrico o qual passará a hemácias são então internalizadas e seus
fazer parte do pool não heme, sendo componentes degradados no interior do
9
armazenado na forma de ferritina ou macrófago. A digestão proteolítica da
1,6
liberado do enterócito para o sangue. Os hemoglobina libera o heme, o qual
enterócitos realizam sua função por dois possivelmente atravessa a membrana do
dias e, então, são eliminados no lúmen fagolisossoma por difusão ou então por um
10
intestinal. O ferro não exportado dos transportador específico. O catabolismo
enterócitos para o plasma, é perdido pela do heme ocorre na membrana do retículo
8
descamação do epitélio intestinal. endoplasmático e é realizado por um
A ferroportina, também conhecida complexo enzimático composto por uma
como IREG1, é o principal exportador de NADPH-citocromo redutase, a heme
ferro. Ela está presente em vários tecidos oxigenase (HO1) e a biliverdina redutase,
que exportam o ferro para o plasma: na tendo como produtos o CO, ferro e
membrana basolateral dos enterócitos bilirrubina. O ferro liberado pode ser
duodenais, na membrana dos macrófagos, estocado no próprio macrófago dentro das
hepatócitos e células placentárias. Para moléculas de ferritina, ou ser exportado
3
que o ferro seja exportado do interior dos pela ferroportina. Para ser transportado
enterócitos, é necessário ainda que este pela transferrina, o ferro precisa ser
3+
seja oxidado a Fe uma vez que a oxidado e esse processo é realizado pela
transferrina sérica tem grande afinidade ceruloplasmina.
pela forma férrica. Essa conversão é A maior parte do ferro que entra na
realizada pela hefaestina no duodeno, e, circulação diariamente provém da
pela ceruloplasmina nos demais tecidos do reciclagem pelos macrófagos. Em
1,8
organismo. A ferroportina é também o circunstâncias normais, a absorção
receptor da hepcidina, importante regulador intestinal de ferro é responsável apenas por
da homeostase do ferro. uma pequena fração do ferro total no
11
Como é possível observar na figura plasma.
1, a proteína da hemocromatose (HFE)
interage com o receptor da transferrina Transporte e captação de
(TfR). A partir desta interação, detecta o ferro pelas células
seu grau de saturação e informa ao A transferrina é a principal proteína
enterócito da maior ou menor necessidade de transporte do ferro. É uma glicoproteína
de absorção do ferro na luz intestinal. A de 75-80 kDa sintetizada e secretada pelo
mutação no gene da HFE leva a fígado. A ligação do ferro à transferrina
descontrole da absorção, provocando a possibilita o aumento da sua solubilidade e
hemocromatose, caracterizada pelo atenua sua reatividade garantindo o
1
acúmulo de ferro no organismo. transporte seguro e liberação para as
1,8
Não há uma via regulada de células. A afinidade da molécula de
excreção do ferro do organismo, portanto é transferrina pelo ferro é extremamente alta
essencial que a absorção do ferro seja no ph fisiológico, de maneira que quase
precisamente controlada. Desta maneira, a todo o ferro não heme na circulação está
mucosa intestinal responde a vários ligado à transferrina. Entretanto, em
fatores, entre eles: mudanças no conteúdo situações de excesso de ferro, quando a
de ferro do organismo, hipóxia tecidual e capacidade de ligação da transferrina está
necessidade de ferro. A absorção é saturada, o ferro não ligado à transferrina

3
(NTBI) aparece no plasma. O NTBI consequentemente, os níveis de sTfR
corresponde às outras formas de ferro no circulantes, os quais estão aumentados nos
1
plasma que se ligam a outros ligantes que paciente com anemia ferropriva. Como a
não a transferrina. Esta forma é bastante concentração de sTfR não é influenciada
reativa e pode participar de reações de por doenças infecciosas ou inflamatórias,
Fanton, sendo considerado um marcador esse é considerado o melhor indicador de
8
de toxicidade do ferro. uma deficiência de ferro quando coexistem
12
A captação do complexo ferro- processos inflamatórios.
transferrina pelas células acontece por
meio de um receptor específico, o receptor Distribuição e estoque de
de transferrina. Após a interação ferro
transferrina-receptor de transferrina tem A maior parte do ferro do organismo
início a captação de ferro pelas células. A encontra-se incorporado à hemoglobina
bomba de prótons da membrana do dos eritrócitos circulantes (60 a 70%).
endossoma acidifica o conteúdo levando a Aproximadamente 20-30% está na forma
uma alteração conformacional da de ferritina e hemosiderina nos hepatócitos
transferrina e do seu receptor o que e nos macrófagos do sistema
3+
culmina com a liberação do ferro. O ferro reticuloendotelial. A quantidade de ferro
é reduzido pela ferroredutase STEAP3 e ligado à transferrina é de aproximadamente
transportado através da membrana do 3 mg, porém este compartimento é
endossoma ao citoplasma pela DMT1. O bastante dinâmico e altera até 10 vezes
8
complexo apotransferrina e TfR1 retorna à durante o dia.
membrana plasmática, sendo que o ph O ferro é estocado nas células
neutro facilita a dissociação da Tf do TfR1. reticuloendoteliais do fígado, baço e
A apotransferrina é liberada para ser medula óssea na forma de ferritina e
recarregada com ferro, completando o ciclo hemosiderina. A apoferritina, a proteína
da tranferrina. Durante seu tempo de vida, livre de ferro, possui um núcleo em sua
a transferrina realiza em torno de 100-200 estrutura que pode abrigar até 4500
8
ciclos de transporte do ferro. átomos de ferro. A apoferritina contendo o
1
Um produto da clivagem do TfR núcleo férrico constitui a ferritina. A maior
tecidual circula no plasma na forma solúvel, parte da ferritina está localizada no interior
o sTfR. Está bem estabelecida a correlação das células, entretanto uma pequena
direta entre a quantidade de sTfR circulante quantidade entra na circulação. A
e a TfR celular. A forma solúvel do receptor concentração sérica de ferritina é utilizada
que circula no plasma reflete a massa de como um indicador bastante útil dos
TfR celular, 80% dela nas células da estoques de ferro. Estima-se que 1 µg/L de
linhagem eritrocítica da medula óssea. ferritina sérica corresponda a 8-10 mg de
1,8
Desta maneira, a atividade medular estoque tecidual de ferro.
eritróide é refletida pela concentração de Outra forma de estoque de ferro é a
sTfR circulante. Em situações de hipoplasia hemosiderina, produto insolúvel da
da série vermelha, como anemia aplástica degradação incompleta da ferritina. Em
ou insuficiência renal crônica, os níveis de situações de excesso de ferro, a
sTfR estão reduzidos, enquanto que em hemosiderina passa a ser a principal
8
condições de hiperplasia eritroides, como proteína de estoque.
anemia falciforme ou outras anemias
hemolíticas crônicas, os níveis deste O ferro na Eritropoiese
1
indicador estão elevados. A eritropoiese no indíviduo adulto
O estado do ferro intracelular é outro acontece, principalmente, na medula
fator que regula a expressão do TfR, óssea. Ocorre um processo de
alterando a concentração de sTfR diferenciação de tipos celulares, iniciando
circulante. Na deficiência de ferro, em com a célula tronco hematopoiética
virtude da maior demanda por este multipotente que sofre maturação em
elemento, ocorre uma regulação sobre a progenitores mieloides, proeritroblastos,
13
superfície celular, levando a um aumento eritroblastos e, finalmente, eritrócitos. O
do TfR. Esse processo é regulado pelos ferro é essencial para a eritropoiese,
elementos responsivos ao ferro (IRE) e principalmente para a síntese de
pelas proteínas reguladoras do ferro. A hemoglobina pelos eritroblastos em
14
deprivação de ferro favorece a formação do maturação.
complexo IRE-IRP no mRNA do TfR,
aumentado sua síntese, e Aquisição de ferro pelos eritroblastos

4
Figura 2. Transporte ferro nos precursores eritroides sintetizando hemoglobina. O ferro é
captado da transferrina diferrica pelo receptor de transferrina (TfR1). A queda do pH das vesículas
endocíticas libera o íon férrico da transferrina, e a ferriredutase Steap 3 o reduz a íon ferroso, o qual é
exportado ao citoplasma através da DMT1. O complexo de apotransferrina (Tf) e TfR1 retorna à
membrana plasmática onde o pH neutro leva a Tf a se dissociar do seu receptor. O ciclo da transferrina
é completado quando ela é reabastecida com íon férrico pelos enterócitos ou pela reciclagem de ferro
pelos macrófagos. O íon ferroso exportado pela DMT1 pode ser transportado para a mitocôndria através
da Mitoferrina 1 (Mfrn1) por contato direto (mecanismo Kiss and run, K&R)ou através de transporte
2+
intermediário através de chaperonas citoplasmáticas (Fe Ch). No interior da mitocôndria o ferro é
incorporado ao heme recém sintetizado. O heme é exportado para o citoplasma por uma transportador
desconhecido e incorporado às cadeias de globina, produzindo a hemoglobina. Em algumas situações o
ferro é exportado como íon ferroso via ferroportina (Fpn) ou como heme por um receptor de vírus de
leucemia felina (FLVCR1). Adaptado de Ganz; Nemeteh., 2012.

O ferro é transportado na circulação transportador de ferro da membrana


pela transferrina e é entregue aos mitocondrial dos eritroblastos. Já a
eritroblastos através da interação da mitoferrina 2 está presente na mitocôndria
transferrina diférrica com o receptor de dos proeritroblastos e outros tipos celulares
14 16
transferrina TfR1. não eritroides. A mitoferrina 1 é expressa
Nos eritroblastos, o ferro é em grande quantidade nos tecidos
principalmente utilizado pela mitocôndria hematopoiéticos, e a sua deficiência
para a síntese do heme, entretanto, assim dificulta a incorporação do ferro ao heme.
como em outros tipos celulares, uma Em animais, mutações na mitoferrina,
pequena quantidade é utilizada para a resultam em anemia hipocrômica e atraso
3,13
síntese de clusters Fe-S. Estes na diferenciação dos eritroblastos.
correspondem a grupos prostéticos Uma vez dentro da mitocôndria, a
essenciais para o funcionamento de várias frataxina – proteína localizada na
proteínas mitocondriais e citosólicas, membrana interna e na matriz mitocondrial
incluindo a proteína reguladora de ferro 1 – regula a utilização do ferro, destinando ou
14
(IRP1). à síntese do heme ou à gênese dos
3
clusters Fe-S.
Mitocôndria e ferro O heme é sintetizado por uma via
Ainda não está bem estabelecido o catalizada por oito enzimas e o passo final
mecanismo pelo qual o ferro é transportado consiste na inserção do ferro na
para a mitocôndria. Nas células eritroides, protoporfirina IX através da ação da
3,13,15
existe evidência da ocorrência de um ferroquelatase. A síntese do heme
mecanismo conhecido como “kiss and run” nas células eritroides está comprometida
3
(Figura 2) através do qual o ferro poderia com a síntese de hemoglobina. O heme é
ser transferido das vesículas endossomais exportado da mitocôndria através de um
15
diretamente para a mitocôndria. transportador ainda não definido e então
A mitoferrina 1 é o principal incorporado às cadeias de globina para

5
15
formar a hemoglobina. hepatócitos que estocam o ferro. A
hepcidina, um hormônio peptídico, é o
Homeostase do ferro principal regulador de todos estes
Regulação intracelular processos. Os hepatócitos são os
Devido à elevada taxa de síntese de principais produtores deste hormônio,
hemoglobina nas células eritroides e à porém outras células expressam, em
toxicidade do heme livre, os progenitores menor quantidade, o mRNA da hepcidina,
5
eritroides precisam manter um rigoroso como os macrófagos e adipócitos. Este
controle da entrada de ferro na célula e hormônio é um regulador negativo da
coordenar a produção de todos os entrada de ferro no plasma. Atua ligando-
17
componentes da hemoglobina. se à ferroportina, levando à sua
A análise de células não eritroides internalização e degradação mediada pela
19
sugere que a regulação intracelular seja ubiquitina. A hepcidina inibe a liberação
feita através do sistema IRP/IRE, ou seja, de ferro para o plasma e fluido extracelular
através das proteínas reguladoras do (figura 3) controlando desta maneira a
ferro/elementos responsivos ao ferro. concentração de ferro plasmático. Inibe a
Quando há baixos níveis de ferro transferência de ferro da dieta dos
intracelular, essas proteínas se ligam aos enterócitos para o plasma, a liberação de
IREs, que correspondem a sequências de ferro dos macrófagos e também do ferro
15,20–22
mRNA constituídas de 30 nucleotídeos estocado nos hepatócitos. Como a
altamente conservados que podem estar ferroportina é a principal maneira pela qual
tanto na extremidade 3´ como na 5´. o ferro entra na circulação, a diminuição
Dependendo da localização dos IREs, a nos seus níveis leva a uma redução do
20
sua associação com a IRP promove duas ferro disponível para a eritropoiese.
funções. A ligação dos IREs na A produção da hepcidina é regulada
extremidade 5´ do mRNA bloqueia a pelo estado do ferro e pela atividade
23
iniciação da tradução ao interferir com a eritropoiética. A regulação pelo ferro é
ligação ao ribossomo, enquanto que a predominantemente transcricional e parece
associação dos IREs na extremidade 3´ estar centrada nos BMPs (bone
estabiliza o mRNA protegendo-o da morphogenetic protein). Os receptores de
degração e prosseguindo-se a síntese transferrina TfR1 e TfR2 são capazes de
1,17
proteica. IREs na extremidade 5´ são detectar os níveis de ferro plasmático e
visto nos mRNAs da FPN1, ferritina, e delta transmitir a informação aos complexo BMP
aminolevulínico sintetase 2 (uma enzima receptor através de proteínas acessórias,
que cataliza a primeira etapa de síntese do HFE e hemojuvelina. Ocorrendo aumento
heme), todas envolvidas na redução dos no níveis de ferro, esse conjunto leva a
níveis de ferro intracelular. Por outro lado, estímulo na síntese de hepcidina pelo
IREs na extremidade 3´ estão presentes fígado. Por outro lado, a anemia e a hipóxia
3
nos mRNAs da TfR1 e da DMT1, reduzem a expressão deste hormônio.
envolvidas no aumento do ferro intracelular. Além da regulação pelo ferro, a produção
Em condições de excesso de ferro de hepcidina é também regulada pela
intracelular, a IRP 1 é convertida a uma necessidade de ferro à eritropoiese.
aconitase citoplasmática catalizando a Durante a eritropoiese ativa, a produção de
isomerização do citrato a isocitrato, hepcidina é suprimida, de maneira que haja
enquanto que a IRP 2 é degradada por um mais ferro disponível para a síntese de
proteossoma. Dessa maneira, nenhuma hemoglobina. A natureza do sinal de
dessas proteínas se liga aos IREs, supressão ainda é desconhecida, mas
resultando em forte redução da existem evidências da existência de um
estabilidade do mRNA da TfR1, o que leva fator circulante produzido pelos precursores
20
a menor expressão dessa proteína na eritróides na medula óssea.
superfície celular com consequente
3,17,18
diminuição na captação de ferro. Desordens na homeostase do
ferro
Regulação sistêmica
A homeostase sistêmica do ferro Eritropoiese deficiente de ferro
envolve a regulação da absorção do ferro A eritropoiese deficiente de ferro
da dieta, da concentração de ferro no fluido ocorre na presença de uma ou mais
extracelular e no plasma sanguíneo, da síndromes de deficiência de ferro:
liberação de ferro dos macrófagos deficiência absoluta de ferro, deficiência
envolvidos na reciclagem do ferro e dos funcional de ferro, e/ou sequestro de ferro.

6
Figura 3. A ação da hepcidina na manutenção da homeostase do ferro. A síntese da hepcidina é
regulada ao nível transcricional por múltiplos estímulos. As concentrações de ferro intra e
extracelulares aumentam a transcrição da hepcidina, assim como a inflamação, enquanto que a
atividade eritropoética aumentada suprime a sua produção. Além disso, a hepcidina regula as
concentrações plasmáticas de ferro ao controlar as concentrações de ferroportina nas células que
exportam o ferro incluindo os enterócitos, os macrófagos do baço e do fígado que reciclam o ferro, e os
hepatócitos. Adaptado de Ganz; Nemeteh., 2012

A deficiência de ferro é a desordem absorção do ferro da dieta. Sendo assim, a


mais comum do metabolismo do ferro no restrição de ferro à eritropoese, apesar da
mundo todo. É também a deficiência presença de estoques adequados,
nutricional mais comum tanto em países interfere com a síntese de hemoglobina e
subdesenvolvidos como em países contribui para a anemia. Desta maneira a
desenvolvidos, sendo considerado um ADC resulta da ativação dos sistemas
15
problema de saúde pública. Ocorre imune e inflamatório. As principais citocinas
quando a quantidade de ferro absorvida envolvidas na fisiopatogênese são:
não é suficiente para suprir as interferon gama, fator de necrose tumoral
necessidades do organismo e/ou repor a alfa, IL-1, IL-6 e IL-10. Dentre elas, a IL-6
24
perda sanguínea adicional. Apesar de tem papel fundamental, pois é o principal
ser um problema predominantemente estimulador da hepcidina nos hepatócitos.
1,15,25
adquirido por perda sanguínea ou ingesta
inadequada, a predisposição genética pode
modular a susceptibilidade a esta condição. Sobrecarga de ferro por transfusões
Têm sido reportadas associações entre Como o organismo humano não
concentração de ferro plasmático e dispõe de um mecanismo específico para
polimorfimos e mutações nos genes de excretar o excesso de ferro, transfusões
15
proteínas como a transferrina e a HFE. realizadas por um longe período
Na deficiência funcional de ferro inexoravelmente levam ao desenvolvimento
ocorre um desbalanço entre a quantidade de sobrecarga de ferro. Com as
necessária de ferro para a síntese de transfusões contínuas, os macrófagos e
hemoglobina e o seu suprimento, o qual hepatócitos não são mais capazes de reter
não é mantido em taxa suficiente para a e estocar o ferro excedente. O ferro entra
19
síntese de hemoglobina. então na circulação em quantidades que
excedem a capacidade de transporte da
Anemia de Doença Crônica transferrina, e com isso aparece na
Inflamação e infecções levam a um circulação o NTBI, citado anteriormente, o
aumento das concentrações plasmáticas qual parece ser o principal mediador do
de hepcidina a qual impede a liberação do dano tecidual na sobrecarga de ferro
26
ferro reciclado pelos macrófagos e também transfusional.
a liberação de ferro dos estoques nos
hepatócitos, além de interferir com a Hemocromatose hereditária e desordens

7
relacionadas correspondem à principal causa de
A hemocromatose (do grego haima eritropoiese ineficaz. Nas talassemias,
=sangue e chromatos =cor) recebeu essa desequilíbrios na produção de cadeias
denominação em 1889 por Von globínicas alfa e beta levam a um aumento
Recklinghausen. No entanto, no início do na ocorrência de apoptose durante a
século XIX, Trousseau e Troisier já haviam maturação eritroide. O excesso de ferro,
descrito a síndrome clínica caracterizada mesmo na ausência de transfusão
por cirrose hepática,diabetes melito e sanguínea, é uma complicação conhecida
17,29
hiperpigmentação da pele, constatando que dessas doenças. Estudos
era causada por acúmulo de ferro em demonstraram que a taxa de absorção
27
diferentes órgãos. intestinal de ferro nos pacientes com β-
Nos pacientes com hemocromatose talassemia é aproximadamente 3 a 4 vezes
30
hereditária ocorre redução na síntese de maior do que em indivíduos saudáveis.
hepcidina, o que leva ao aumento da Numerosos estudos têm demonstrado que
absorção intestinal de ferro e liberação do a expressão alterada da hepcidina é
ferro dos macrófagos, ocasionando seu responsável pelo aumento na absorção do
30
acúmulo progressivo e prejudicial ao ferro observado na β-talassemia.
27
organismo. A magnitude do déficit de Acredita-se que a supressão da hepcidina
hepcidina depende da mutação específica. nesses pacientes ocorra através de um
Mutações em quato diferentes genes foram mecanismo mediado por um fator de
29,30
identificadas como causadoras da crescimento conhecido como GDF15.
hemocromatose hereditária. Elas incluem o Assim como nas talassemias, a anemia
gene da hepcidina HAMP e genes de diseritropoietica congênita tipo I também
proteínas que são necessários para a demonstrou associação com níveis
expressão da hepcidina, como a elevados de GDF15 e, consequentemente,
hemojuvelina, o receptor 2 da transferrina e supressão inapropriada da hepcidina
28 29
HFE. associada com sobrecarga de ferro.

Sobrecarga de ferro associada com a Conclusão


eritropoiese ineficaz A manutenção da homeostase do
O termo eritropoiese ineficaz ferro é extremamente importante para que
descreve um grupo de desordens não ocorra falta ou excesso deste metal,
eritropoieticas em que é produzido um uma vez que ambas as situações são
número menor de eritrócitos do que o prejudiciais ao funcionamento do
esperado a partir do eritroblasto mais organismo. A eritropoiese está intimamente
imaturo na medula óssea. Com isso ocorre ligada à homeostase do ferro, uma vez que
um desequilíbrio entre quantidade de ferro constitui o principal destino do ferro no
que é absorvida pelos eritroblastos da homem e em vários vertebrados. A
medula óssea e a quantidade ferro liberada efetividade deste processo depende
29
na circulação nos eritrócitos. diretamente da manutenção do
Vários tipos de deficiência nos fornecimento adequado de ferro,
eritrócitos causam excesso de ferro mecanismo este regulado principalmente
tecidual em associação com eritropoiese pela hepcidina. Sendo assim os avanços
ineficaz. As principais situações são na compreensão do metabolismo do ferro e
exemplificadas na tabela 1. das suas interações com a eritropoiese
podem resultar em avanços no tratamento
Tabela 1. Eritropoiese ineficaz associada com das doenças que envolvem estes
sobrecarga de ferro na ausência de transfusões* processos, desde a anemia ferropênica até
as hemoglobinopatias.
Deficiência no eritrócito Defeito
Desequilíbrio nas
Síndromes Talassêmicas
cadeias globínicas
Anemia Referências Bibliográficas
Acúmulo de ferro
sideroblástica(adquirida ou
nas mitocôndrias
hereditária)
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