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br/linguasagem)
1. Introdução
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O autor é doutorando em Lingüística no PPGL da UFSCar e desenvolve suas pesquisas de doutorado
sob orientação da Profa. Dra. Vanice de Oliveira Sargentini.
Publicado em Revista Linguasagem – 16° Edição (www.letras.ufscar.br/linguasagem)
Além disso, não podemos deixar de destacar a distinção que Saussure (apud
BOUQUET, 2009) aplica, nos textos originais, à própria teoria do valor, a grande
vedete da quarta recepção do “Curso de Linguística Geral” na França e considerada pelo
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Neste momento, convém reiterar que, ao mencionarmos Ferdinand de Saussure como autor do “Curso
de Linguística Geral”, apoiamo-nos, na verdade, na versão de Bouquet (2009) sobre a relação de autoria
entre o mestre genebrino e a obra: a versão do apócrifo, a qual introduzimos, em linhas gerais, na seção
anterior deste trabalho.
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Bally e Sechehaye alteraram uma aula oral do terceiro curso para deixá-lo de
acordo com sua tese. Lá onde o professor declara: (...) “É preciso ter uma
lingüística da língua e uma lingüística da fala”, o curso modaliza esse
enunciado emprego um “a rigor” sem fundamento. (...) Além disso, eles
suprimiram quase sistematicamente, ao longo de toda obra, a palavra discurso,
em sua acepção sinônima de fala, bem como numerosas aulas, que tratavam do
discurso (BOUQUET, ibidem, p. 169).
Nesse particular, acreditamos que nos seja possível conjeturar, inclusive devido
à menção anterior de Bouquet (ibidem) a uma “tese” que os editores do “Curso de
Linguística Geral” pareciam ter o objetivo de validar com a publicação da obra, que o
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fato de terem vivido na passagem do século XIX para o século XX pode tê-los
influenciado pelo modelo de cientificidade estabelecido pelo Positivismo.
Segundo a filósofa e historiadora brasileira Marilena Chauí (2001), a abordagem
filosófica formulada pelo francês Augusto Comte inaugurou uma espécie de novo
primado da razão, na esteira da filosofia idealista de Platão, do racionalismo de René
Descartes entre os séculos XVI e XVII e do pensamento iluminista do século XVIII.
Assim parece-nos razoável supor que a opção de Bally e Sechehaye pela
linguística da língua e, por extensão, a preconização da descrição dos diferentes níveis
de constituição da língua – a saber: fonético-fonológico, morfológico, sintático, lexical e
semântico – tenham sido corolários da obediência à liturgia positivista, a qual pregava,
entre outros dogmas, a dissecação do “como” do objeto de estudo em vez da busca de
respostas a seus “porquês” (ID. ibidem).
De quebra, a estabilidade sugerida pelo objeto das Ciências da Linguagem
adequado aos moldes do Estruturalismo3, reduzido à reiterabilidade de seu paradigma
formal e à regularidade imposta por sua estrutura, contemplava outro importante
princípio da positividade científica: a busca pela verdade absoluta, estável, redutível,
por exemplo, a um axioma ou a uma equação.
E são exatamente a definição de língua como sistema autônomo, ao mesmo
tempo inserida na vida social da comunidade linguística e livre de influência e de
mudanças eventualmente provocadas pelos falantes, e a preferência dos estruturalistas
pela linguística da “langue” em detrimento da da “parole” que suscitaram, para não
dizer que ainda suscitam, as críticas de que o projeto de análise linguística proposto
Saussure no “Curso de Linguística Geral” descartava a exterioridade linguística, no seio
da qual se inscrevem nomeadamente o sujeito e a história.
Ora, com base em fontes manuscritas do linguista suíço, as quais dão corpo aos
“Escritos de linguística geral”, e na leitura realizada por Simon Bouquet sobre a vulgata,
não devemos nos furtar a ponderar que, para o pensamento saussuriano, considerar a
língua, em sua essência de sistema, como independente do indivíduo significa, na
verdade, acreditar que este isoladamente não detém poder suficiente para transformar
todo um vasto conjunto de estruturas. Coletivamente, no entanto, Saussure via na
comunidade de falantes a capacidade de levar a cabo mudanças num sistema
relativamente autônomo.
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Como é sabido, “Estruturalismo” é o nome dado à perspectiva de estudos linguísticos inaugurada pela
publicação do “Curso” e cuja paternidade é igualmente creditada a Ferdinand de Saussure.
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A título de ilustração dessa constatação, podemos citar, entre outros exemplos possíveis:
a) A aceitabilidade de um enunciado como “Os menino joga bola” no português, uma óbvia
variação do registro culto “Os meninos jogam bola”, em comparação ao estranhamento,
ininteligibilidade e refutabilidade de que seria vítima inevitavelmente, por exemplo, “Menino os
bola joga”, já que uma construção dessas obviamente desrespeita a ordem sujeito-predicado-
objeto gravada no DNA da língua;
b) A criação do sintagma “ficha-limpa” que, em virtude da sanção da Lei da Ficha Limpa (lei
complementar n.º 135/2010) neste ano, vem sendo empregado como adjetivo, predicando
políticos livres de pendências judiciais. A emergência, recepção e a circulação do sintagma só
foram possíveis por causa de sua obediência à regra de concordância nominal verificada entre o
substantivo feminino “ficha” e o adjetivo flexionado em gênero idêntico “limpa”, outro pilar dos
alicerces da língua portuguesa.
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(...) a opção pela langue, em detrimento da parole, foi amiúde concebida como
a circunscrição necessária de um objeto para o estabelecimento de uma ciência
autônoma, considerou-se, em contrapartida, que o corte saussuriano excluía as
unidades transfrásticas, as variedades linguísticas, o texto, as condições de
produção, a história, o sujeito e o sentido (HAROCHE; HENRY; PÊCHEUX
apud PIOVEZANI, 2008, p. 9).
Roman Jakobson foi um linguista russo que viveu entre 1896 e 1982.
Dividido entre os círculos linguísticos de Moscou, Praga e Copenhague e a
Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, o tempo durante o qual conduziu sua
carreira de pesquisador o credenciou a vivenciar a segunda recepção do “Curso de
Linguística Geral”, iniciada no intervalo entre as duas Grandes Guerras e junto a alguns
poucos linguistas franceses:
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Em contrapartida, no Leste Europeu, desde os anos 20, fora dos dois grandes
centros de estudos lingüísticos da época, a Alemanha e a França, o CLG, em
conjunto com os Manifestos do Círculo lingüístico de Praga, tornou-se “um
texto estratégico para a ‘periferia’ em sua conquista das instituições centrais”
(PUECH apud PIOVEZANI, 2008, p. 15).
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Muito embora sejam inegáveis a contribuição e a importância da noção de funções de linguagem ao
desenvolvimento dos estudos linguísticos, informamos que não nos dedicaremos aqui à definição e
exemplificação de cada uma das seis funções teorizadas por Jakobson (1995), reservando-nos a
possibilidade de abordar uma ou outra função quando julgarmos o procedimento necessário e conveniente
à concretização dos objetivos deste trabalho.
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Adjetivamos como “pretensa” a neutralidade perseguida pelas atividades jornalística e acadêmico-
científica de forma geral porque acreditamos que não seja possível desconsiderar a definição de discurso
produzida por Pêcheux (apud BRANDÃO, 2002): o discurso como lugar privilegiado da ideologia, como
espaço de consubstanciação da história na língua, como ponto de articulação entre os fenômenos
ideológicos e os processos linguísticos. Dessa forma, toda manifestação discursiva reflete, em alguma
medida, um ponto de vista, um posicionamento ideológico, algum “conjunto de ideias elaboradas por uma
falsa consciência” – o conceito marxista de ideologia –, por mais que os artifícios linguísticos se esforcem
para engendrar efeito do contrário.
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4. Conclusão
Referências bibliográficas