Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Escolhida
scolhida
(Os Cavaleiros do Tempo 01
01)
Jimena Cook
Sinopse
Ao conde de Essex:
Agradeço que tenha levado em conta a minha opinião, no
que diz respeito ao casamento de sua filha. O enlace com o
conde Oton, herdeiro do condado de Wessex…
Querida filha:
Quando ler esta carta, já não estarei junto a você, para
protegê-la e explicar muitas coisas sobre seu presente e seu
futuro. Sua mãe, Ceridwen, era a filha secreta de uma
camponesa e do conde Agnew. Essas mulheres estão
proibidas de se apaixonar e se casar com homens, como seu
avô. A família de sua mãe manteve este segredo oculto até que
ele foi descoberto. Seus avós a consideraram uma filha do mal.
Imagine o que isso significa.
Sua mãe se viu forçada a fugir de seu lar. Aí foi quando
eu a conheci e soube do perigo que sua vida corria.
Apaixonamo-nos e, fruto desse amor, nasceu você. Ela foi
assassinada.
Ceridwen temia por sua vida. Fez-me prometer que, se
algum dia lhe acontecesse algo, ocultaria você do mundo, já
que você, minha princesa, também correria perigo; por esse
motivo a levei a casa de sua tia, para a proteger.
Sua mãe, um dia antes de morrer, disse-me estas
palavras para que eu lhe escrevesse isso: “minha filha, haverá
um momento no qual sua vida se verá ameaçada. Chegado
este dia, deve fugir às Terras Altas, à ilha Maree, e procurar o
castelo do conde Agnew. Diga meu nome e que é minha filha.
Ele é seu avô. Protegerá você. Não confie em ninguém. Deverá
decifrar a mensagem do tempo em que viverá. Faça justiça. Lá
você saberá ao que me refiro”.
Quero-te muito, minha filha. Nunca esqueça. Espero que
algum dia possa nos perdoar.
O que acontecia com ela? Ele sabia que havia algo que a
preocupava. Aquele grito havia sido aterrorizante. Ela estava
tremendo quando a envolvi com meus braços. Seus olhos
carregavam uma expressão de pânico. Desci à cozinha para
pegar um copo de água. Voltei a subir as escadas de caracol
com grandes passadas. Ela continuava ali, pálida. Ofereci-lhe
o copo de água e me sentei junto a ela, na cama.
― Obrigada.
― O que acontece com você, Beth?
― Tive um pesadelo.
― Já passou.
Acomodei-me na cama junto a ela, abracei-a, mas ela
continuava tremendo.
― Comigo não precisa temer nada. Estou aqui para
proteger a ambos.
Ela me olhou com suas pupilas negras. Nelas não vi a
rebeldia e segurança que havia observado em outras
ocasiões, havia medo.
― Não conseguirá. Há algo que escapa de suas mãos,
algo que é impossível de controlar.
― A que se refere?
― Nem eu entendo, será difícil para que você possa
compreender. Estou afetada ainda.
― Entre meus braços ninguém se atreveria a machucá-
la, acredite em mim. ― Eu sorri, queria tranquilizá-la.
― Não se vá, Kimball.
― Não o farei. Prometo-lhe isso.
Eamon nos olhava, assustado.
― Menino, durma. Tudo já passou.
A jovem se aconchegou sobre meu peito. Suas mãos
seguravam as minhas. Eu gostava daquela sensação. Mas, de
fato, era algo novo para mim. Apesar de meu empenho em
negar e evitar que surgisse qualquer sentimento por ela, era
inevitável me apaixonar pela jovem. O coração mandava e
pulsava a grande velocidade quando eu estava a seu lado. Já
não era um dever protegê-la; havia passado a ser uma
prioridade.
Sabia que precisávamos partir o quanto antes; precisava
levar Beth às terras de seu avô e colocá-la a salvo de
Alexander. Além disso, eu havia dado minha palavra ao
conde, que partiria com suas tropas para resgatar o rei.
Ainda me lembrava das palavras de meu anfitrião: “Um
trovador francês chamado Blondel o encontrou. Ele percorreu
todos os cárceres e fortalezas cantando a canção que o
próprio rei Ricardo compôs, e foi em Durnstein, que o rei
respondeu, cantando uma das estrofes. Precisamos partir. O
duque Leopoldo V, que o mantém preso, o matará se não
formos logo para libertá-lo”.
Quando eu retornasse procuraria Elizabeth e o menino,
e os levaria para Essex. Eu não a deixaria escapar. Sabia que
estava começando a sentir algo forte por aquela mulher, um
sentimento, até esse momento, desconhecido para mim.
Despertei. Escutei ruídos no pátio. Levantei
Levantei-me muito
devagar para não despertar o menino, nem a jovem. Fui
observar pelo balcão.
Robert falava com um de seus homens. Decidi me
assear e descer para ver o que acontecia. Observei o menino e
Beth. Peguei minhas botas e saí do quarto.
― Kimball!
― Robert!
rt! Aconteceu algo?
― Apareceu um cervo morto em minhas terras.
― Ladrões?
― Não.
ão. O que me preocupa é a forma como o mataram.
Não é normal. Devo ir vê
vê-lo.
― Acompanho voc
você. ― Ele assentiu.
Montamos nossos cavalos. Atravessamos o bosque até
chegar a um lugar próximo ao rio Witham. Nesse lugar havia
muitos carvalhos. Paramos perto de uma dessas árvores.
Descemos dos cavalos, e ali estava o cervo. Uma adaga
atravessara
vessara seu coração. Havia sangu
sanguee a seu redor. Seus
órgãos não estavam no interior do animal, ffora
ora aberto em
linha reta e era como se tivessem comido as vísceras, pois
havia restos ao redor. Tudo apontava a um ritual onde o visco
era o protagonista: estava espalhado por toda parte. No
tronco do carvalho estava desenhado um símbolo: um ovo de
serpente.
― Meu Deus! O que é isto? ― Eu disse.
O camponês que havia alertado Robert me olhou.
― Foram eles, senhor.
― Quem? ― Eu perguntei.
― Judeus ― disse o camponês, com medo. ― Quando se
mata um animal lhe cravando uma adaga no peito é sinal de
que se deseja a morte de alguém.
― Em Nottingham apareceu um menino morto.
Acusaram os judeus do assassinato. Mas não acredito que
essa pobre gente seja a causadora destas crueldades ― eu
disse.
― Existe muito ódio em cima destas pessoas. O rei João
deve favores para eles, frente ao povo inglês. Eles lhe dão
grandes tributos e ele, em troca, lhes dá muitos privilégios.
Ricardo não os queria em nossas terras ― disse o camponês.
― Esses homens e mulheres tentam sobreviver. O rei
Ricardo os oprime. Muitos inocentes morreram. Não se pode
atribuir as desgraças de um país, a pessoas que somente
tentam viver em paz, segundo seus costumes ― eu respondi.
― Agora, você defende mais os judeus do que a seu rei?
― Disse-me Robert enquanto me olhava com atenção.
― Já sabe que sou fiel somente a meus princípios.
Nunca defenderei uma perseguição injustificada, nem mortes,
nem acusações, a pessoas inocentes.
Ricardo é meu rei, mas meus valores e princípios estão
acima dele. Nunca estive de acordo em sua fixação contra o
povo judeu.
― Ha, ha, ha! Por isso eu o admiro e confio em você,
Kimball. É um homem de honra, de valores. ― Virou-se para
dar ordens ao camponês. ― Enterrem o animal e façam
desaparecer os restos de sangue. Não quero que se corra a
voz entre os camponeses. Senão, o pânico e as superstições
se apoderarão de minha gente e isso somente traz
consequências negativas. Quando parte, amigo?
― Hoje mesmo. Ainda resta muito percurso.
― Acompanharei vocês até York. Preciso ver Humphrey
Stafford. Necessito de seu apoio para resgatar Ricardo e
destronar João.
― Virá bem sua companhia, se por acaso se
apresentarem bárbaros e ladrões pelo caminho.
― Ha, ha, ha! Assim teremos mais tempo para que me
conte o motivo de suas bodas. Não me engana, conheço você
e sei que esconde alguma coisa. ― Ele me olhava com
intensidade. ― Embora tenha que reconhecer que a jovem é
muito bonita, até eu teria me casado com ela.
Ambos rimos. Não queria continuar com aquela
conversação.
Eleanor saiu a nosso encontro.
― Onde estavam?
― Montando a cavalo. Kimball parte hoje.
― Hoje? Não! Não pode ir.
Sorri. Agradava-me o interesse da jovem.
― Sinto muito, Eleanor, mas não tenho mais remédio.
― É pela mulher e pelo menino, verdade?
― Sim…
― Kimball precisa levá-los ao castelo do avô da jovem.
Alguns de meus homens e eu mesmo, os acompanharemos
até York.
― Eu também irei ― disse a jovem.
― Não! ― respondeu seu irmão. ― Não pode vir conosco.
― Sim, eu irei. Faz tempo que a tia Alice quer que eu
passe uma temporada com ela. Eu não aguentaria outra vez
sozinha entre estes muros. Será bom trocar de ares.
― Eleanor!
― Não há mais nada a falar.
― É uma viagem dura.
― Recorde-se, irmão, que estou acostumada. Além disso,
não é a primeira vez que viajo até York. Aguentarei alguns
dias dormindo no interior de uma tenda. Sandra, minha
donzela, virá comigo.
Olhei a meu redor. Eamon e Beth não estavam por ali.
Fui para dentro e subi as escadas rapidamente. Abri o
quarto. Elizabeth estava ensinando o menino a comunicar-se
através das mãos. Aquela mulher me surpreendia a cada dia.
Onde teria aprendido aquilo? O menino, ao ver-me,
levantou-se de um salto e veio correndo para mim. Abracei-o
e o peguei em braços.
― Eu também quero aprender essa linguagem ― eu
disse. Eamon se abraçou a meu pescoço.
Elizabeth se levantou, entusiasmada.
― Olá, Kimball ― Ela fez gestos com as mãos enquanto
falava e aproximou-se de onde estávamos.
― Estão preparados? Partiremos já. ― Desci o menino,
que foi correndo ao quarto contíguo para recolher suas
coisas.
Olhei-a sem piscar. Ela baixou o olhar.
― Obrigada por ontem à noite ― ela disse tímida.
Aproximei-me mais a ela.
― Não precisa me agradecer nada. Mas acredito que há
algo que deve me contar.
Suas pupilas estavam fixas nas minhas.
― Não insista…
Não a deixei continuar.
― Sabe que sim. Beth, estou acostumado a lutar com
prisioneiros e batalhas onde tem que averiguar as estratégias
do inimigo. Desenvolvi um sexto sentido que me permite
perceber quando alguém oculta alguma coisa, e sei que você
esconde algo.
Deixou-se cair. Sentou-se sobre a cama, abatida. Seus
olhos estavam brilhantes, a ponto de chorar. Sentei a seu
lado e envolvi suas delicadas mãos, com as minhas.
Olhou-me.
― Pode confiar em mim ― eu lhe disse.
― Preciso descobrir o que aconteceu com minha mãe.
― E?
― E nada mais.
― Mente, Beth.
Ela se levantou-se de um salto.
― Não minto, Kimball. O que quero é chegar o quanto
antes a meu lar.
Desejava beijá-la. Ela analisava cada um de meus
movimentos enquanto continuava falando de uma maneira
entrecortada.
― Precisamos… nos colocar… em marcha, já…
Não consegui evitar, ela era minha, pertencia a mim, era
minha esposa. Envolvi sua cintura com uma de minhas mãos
e a atraí para mim. Com a outra mão acariciei sua bochecha,
meus olhos pousaram em seus lábios. Precisava senti-los sob
os meus.
Meus lábios roçaram os seus, suaves, carnudos; retive-
os entre os meus. Aproximei-a mais de mim, precisava sentir
seu corpo. Notava sua respiração acelerada, igual à minha.
Uma onda de prazer percorreu todo meu corpo. Queria fazê-la
minha, nesse momento. Ela afastou seu rosto e nos
olhávamos em silêncio, acariciei sua bochecha. Nesse
momento o menino entrou e Beth se afastou de mim, com
brutalidade.
Seu rosto estava aceso. Eu estava consciente de que o
que eu sentira ao beijá-la jamais experimentara com
nenhuma outra mulher. Não podia afastar meu olhar dela.
Eamon nos observava, sem compreender o que acontecia.
XVII
Estava adormecida, o
observei-a.
a. Era uma mulher valente,
segura de si mesma, porém aconchegada entre os lençóis da
cama a via muito frágil. Aproximei
Aproximei-me
me e a beijei na bochecha.
Deitei a seu lado, ela se voltou, colocou sua cabeça sobre
meu peito e me envolveu com seus braços. Eu não estava
acostumado a tantas amostras de carinho, e me surpreendi.
Logo conciliei o sono. Estava intranquilo, com a certeza
de que a qualquer momento, o Santo Ofício entraria.
Minha tia retornara logo após nossa chegada, com sua
donzela. Sabia que ela se zangaria, mas não podia lhe contar
meus planos de fuga e tampouco, avisá-la.
Era melhor desaparecer, se por acaso depois lhe
perguntassem. Retirei devagar a cabeça de Elizabeth e me
levantei.
― Beth, precisamos partir ― eu sussurrei.
Ela se moveu e se virou para o outro lado.
― Ainda não é dia, Ricardo ― ela disse.
― Ricardo? Quem é Ricardo? ― Elevei o tom. Por que ela
o mencionara?
Estava claro que estava sonhando com ele. Seria um
amor do passado? Estava ciumento e mal-humorado pela
menção daquele nome. Ela abriu os olhos, endireitou-se.
― Está na hora?
― Quem é Ricardo? ― Eu exigi uma resposta.
Ela, ainda estava com sono.
― O quê?
― Acaba de mencionar um tal Ricardo. Posso saber
quem é?
― Um amigo. Mas porque tanta exigência?
― Para saber se preciso brigar com alguém mais.
― Como com alguém mais? O que você insinua?
― Quem é, Beth? ― Coloquei-me de pé, em frente a ela,
reclamando uma explicação.
― É um amigo e não penso em dar mais explicações.
Você não pode me exigir nada.
― Claro que sim, sou seu marido.
― Por pouco tempo, ou… já não se lembra?
― Por pouco, ou muito, agora mesmo estamos casados e
tenho plenos direitos sobre você.
Ela se levantou, zangada, e ficou em frente a mim, me
desafiando.
― Ninguém, nem sequer você, tem direitos sobre mim.
Sou uma mulher livre.
Estava contendo minha fúria e ciúmes.
― Depois falaremos disto ― disse zangado. ― Agora
vista-se! Precisamos ir. Vou buscar Eamon, esperamos você
nas baias. Não se demore!
Eu sai do quarto.
Um amigo! E ficava tão tranquila ao me dizer aquilo.
Depois eu falaria com ela, ela me devia uma explicação.
Eamon estava adormecido. Beijei-o na testa.
― Precisamos ir ― eu sussurrei.
O menino abriu os olhos. Deitou-se vestido. Assentiu e
sem preguiça ficou em pé. Agarrou sua bolsinha e seus
pertences. Segurei-o pela mãozinha e fomos às quadras.
Puxou minha mão e com gestos perguntou pela Beth.
― Agora venha. ― Meu tom foi seco e o menino captou
meu estado de ânimo.
― Está zangado com ela? ― Ele perguntou.
― Sim, ela me desconcerta, menino.
― É boa, somente não sabe porque está aqui.
― O que quer dizer? ― Eu perguntei. Possivelmente se
referia ao golpe que afetara sua cabeça.
― Tem um passado que precisa descobrir. E melhor,
quando o fizer vai conseguir responder a todas as perguntas
que a inquietam.
― Um passado? Eamon, não entendo nada. Se houver
algo que eu deva saber precisa me dizer.
O menino baixou o rosto e já não quis continuar com a
conversação. A manhã seria complicada. Incógnitas. Estava
claro que aqueles dois escondiam algo, e ele sabia mais dela
do que eu, igualmente ela, sobre aquele menino. Havia muita
cumplicidade entre eles. Eu havia observando-os. Aquele
menino ganhou meu carinho, e a mulher me roubara o
coração.
Subi Eamon ao lombo do animal. David já estava nos
esperando, e Beth desceu logo. Não me olhou e subiu em seu
cavalo. Começamos a marcha, sigilosos.
Todos sabíamos que a jornada seria dura, precisávamos
avançar, fugir dali. Estava desejando chegar às Terras Altas,
já que sabia que naquele lugar, ela estaria a salvo.
Atravessamos bosques com rios. A umidade nos invadia
por toda parte. A névoa era espessa. Havia mais chuva e mais
névoa do que em minha terra. Eamon estava apoiado em meu
regaço, estava adormecido. Elizabeth ia atrás de nós. David
se aproximou de mim.
― Kimball! Levamos muito tempo de viagem, olhe para
ela, está esgotada.
Precisamos parar.
― É forte, vai resistir. Além disso, já fizemos uma breve
parada para repor forças. ― Eu ainda estava chateado com
Beth.
― O que está pensando? Ela não é um guerreiro. ―
Olhei-o.
― Acredite em mim, pois às vezes eu duvido.
― O que houve, amigo? Você não é assim.
― Não podemos parar, precisamos avançar. ― Observei-
o. ― Acaso você também está cansado?
― Sabe que não.
Afastou-se de mim e foi se colocar ao lado de Beth.
Escutei-os falar.
― Está cansada?
― Não, sou uma guerreira como vocês. Posso aguentar.
Ela nos escutara. Um meio sorriso se desenhou em meu
rosto.
― Sabe que não, Elizabeth.
― Diga ao bruto de seu amigo que aguentarei, até que
ele esteja esgotado.
Continuava me desafiando, não sabia de onde saíra esta
jovem, mas eu adorava sua forma de ser.
― Uff! ― suspirou David ― São igualmente teimosos e
cabeçudos. Já não volto a abrir a boca. O que acontece com
vocês? Não os entendo!
David se posicionou atrás de Beth.
Eu estava disposto a não parar. Se ela dizia que podia
aguentar, é porque conseguia; além disso, era a única forma
de avançar e poder me assegurar de que ela estava a salvo
daquele bispo.
Encontramo-nos com o curso de um rio, era largo, a
água corria com muita força, devíamos atravessá-lo. Desci do
animal. Meti-me no rio. Era profundo. Chegava-me pelo
joelho, mas eu era bastante alto. Primeiro David passaria com
seu cavalo, depois eu com Eamon preso em meus braços,
depois passaria meu cavalo e o de Elizabeth e por último, ela.
Sentia-a nervosa. Olhei-a dissimuladamente: estava com
olheiras. Sabia que me excedera, mas estava com ciúmes,
magoado, raivoso e preocupado. Era orgulhoso: jamais
permitira que uma mulher risse de mim, enganasse-me ou
me tomasse por um imbecil. E ela me desafiava e em público,
sempre colocava em evidência a autoridade que como marido,
eu possuía sobre ela. Eu gostava dessa forma de ser mas, ao
mesmo tempo, ela me enfurecia. Sim, ela merecia um castigo;
se ela havia dito que podia é que podia, e se quisesse
descansar só precisava dizer, então faríamos o descanso, mas
até que ela não fizesse, continuaríamos nosso caminho.
― David! Atravesse você primeiro com seu cavalo, depois
eu atravessarei com Eamon. ― Virei-me para me dirigir a
Elizabeth. ― Você será a última. Ajudarei você. Há
profundidade e a água flui com muita força. ― Desta vez ela
não replicou.
David o atravessou com dificuldade, sobretudo porque o
cavalo perdia a estabilidade. Depois era a vez de Eamon.
― Nossa vez, pequenino, agarre-se forte a meu pescoço.
― E ela? ― Ele disse com gestos.
― Não se preocupe, eu vou depois ― disse Beth antes de
que eu respondesse.
Agarrei-o em meus braços e atravessamos o rio. Depois
foi a vez de meu cavalo e depois dele, eu retornaria para levar
o de Elizabeth. Notava-a nervosa.
― O que houve? Sinto que você está inquieta?
― Escutei ruídos, estou ouvindo desde que saímos.
― Será algum animal, tranquila, por aqui não há
ninguém. ― Olhei a nosso redor; estávamos rodeados de
carvalhos, arbustos e coníferas. ― Em seguida estarei com
você. ― Sorri para tranquilizá-la.
Cruzei devagar, o animal estava inquieto, e a água muito
fria. Quando saímos escutei o grito de Elizabeth.
― Meu Deus! ― exclamou David.
Olhei, assustado, temendo o que poderia encontrar. De
repente eu o vi. Meu coração explodiria. Era Alexander e seus
homens. Mas… Como nos encontraram? Eu não conseguia
entender. Beth dissera que escutara ruídos desde que saímos
do castelo de minha tia. Ele segurava Beth com força e estava
tapando sua boca, com um trapo, para evitar que ela
gritasse.
― Kimball! ― Escutei-a gritar meu nome.
― Alexander! ― Eu gritei. ― Solte-a, ela me pertence: é
minha esposa!
― Sinto muito, conde de Essex! Esse matrimônio não
tem nenhum valor para mim. Ha, ha, ha! Se a quiser vai lutar
pela vida, ou morte, com Durham.
Vi como ele se afastava pelo bosque levando-a com ele
sem que eu pudesse fazer nada. Acreditei morrer. Eu havia
falhado: prometido que a protegeria. Se lhe acontecesse algo,
jamais me perdoaria.
XXIII
― Kimball! ― Eu gritei.
Endireitei-me da cama, suando. As lágrimas percorriam
pelo meu rosto. Fazia dois anos que eu havia voltado para
minha realidade. A primeira coisa que eu vi naquele momento
foi Ann, minha amiga ― Agora, eu despertava em minha casa,
com minha filha.
― Mami!
Levantei-me. Ela voltara a despertar. Fui ao quarto de
Emma. Ela estava de pé, em seu berço. Faltavam dois dias
para que completasse dois aninhos. Eu sorri.
― Olá, minha menina. Despertou outra vez?
Emma me olhava com seus grandes olhos verdes.
Herdara os mesmos olhos de seu pai. “Kimball!”, suspirei.
Recordava-me muito a ele. Foi o presente que tive depois de
me afastar dele e retornar a meu mundo. A prova de que tudo
foi real.
Não dava nenhum tipo de explicação a ninguém. Sabia
que se tivesse dado, teriam pensado que eu estava louca.
Minha mãe levou as mãos à cabeça quando os médicos a
informaram que eu havia saído do coma e que o feto não
sofrera nenhum dano. Ainda me lembro da conversa que tive
com ela, no hospital. Insistia em saber quem era o pai.
Precisei mentir e lhe dizer que era um inglês que partiu do
país e do qual eu nunca mais saberia nada. De certa maneira
era verdade. Ann respeitou meu silêncio.
Meu pai moveu seus contatos para que encontrassem
um trabalho de enfermeira em Londres para mim, e assim foi
que comecei a trabalhar no Royal London Hospital. Graças a
isso, pude arcar com os gastos de cuidar de uma menina.
Meus pais partiram, e eu fiquei ali, grávida, com as
lembranças e alguns papéis de minha suposta mãe, que
trouxera comigo daquela época.
Não entendia nada. Suspirei. Peguei Emma em braços, e
ela me olhou, elevou sua mãozinha gordinha e agarrou meu
cabelo com seus dedinhos, enquanto sorria.
― Sabe, Emma? Seu papai estaria muito orgulhoso de
você e se sentiria muito feliz de tê-la entre seus braços.
― Papai ― ela disse.
― Sim, seu papai. Era muito bonito, como você, minha
princesa.
Balancei-a. Seus olhinhos foram se fechando até ficar
adormecida. Voltei a deixá-la no berço e a cobri.
Fui ao quarto e abri a gaveta de minha mesinha, ali
estavam enrolados os papéis de Ceridwen. Abri e voltei a relê-
los.
FIM
Nota da autora
Uma crença mitológica grega, transmitida através dos
séculos, falava sobre a existência de uma porta imaginária
chamada a Porta dos Homens, um acesso que era a entrada a
outra dimensão, a outros mundos e a outras épocas.
Este passo se abria, sobre tudo, no solstício do verão,
mas em qualquer momento um homem ou uma mulher podia
transpassá-lo sem deixar rastro.
A Escolhida é o primeiro livro da série Os cavalheiros do
Tempo. Cada novela é independente da seguinte, podem-se
ler cada uma delas sem necessidade de ter lido a anterior.
Alguns personagens aparecerão nos dois livros posteriores à
Escolhida e ajudarão aos protagonistas em suas aventuras.