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A interface entre o público e o privado: 

Mutação Matriz, instrumento de investigação, São Paulo – 2007 
The interface between the public and the private: 
Mutation Matrix, investigative tool, São Paulo – 2007 

La interfaz entre lo público y lo privado: 
Mutación Matrix, herramienta de investigación São Paulo ‐ 2007 
Autor 1: ALBAMONTE, Luciano 
Arquiteto  e  Urbanista,  Mestrando  do  Programa  de  Pós‐Graduação  em  Arquitetura  e  Urbanismo  da 
Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), e bolsista CAPES. E‐mail: lucianoalbamonte@gmail.com 
 
Autora 2: ALVIM, Angélica Benatti 
Arquiteta e Urbanista, Mestre e Doutora em Arquitetura e Urbanismo, Coordenadora Geral de Pós‐Graduação 
da  Universidade  Presbiteriana  Mackenzie (UPM). Bolsista  Produtividade CNPq. Docente  do  Programa  de  Pós‐
Graduação em Arquitetura e Urbanismo. E‐mail: angelica.benatti.alvim@gmail.com 
 
RESUMO 
Este artigo discute o processo de produção projetual a partir de uma série documental e de registros. Parte‐se 
da  premissa  de  que  tal  série  torna‐se  determinante,  entendida como uma  narrativa dos  motivos  do  projeto, 
tão  quão  mais  nitidamente  tais  motivos  possam  demonstrar  sua  identidade,  seja  enquanto  intervenção  do 
futuro  sobre  o  presente,  seja  enquanto  atualização  do  presente  frente  às  pré‐existências  da  sedimentação 
histórica. 
PALAVRAS CHAVE: interface, público, privado, projeto e mutação. 
 
ABSTRACT 
This  article  discusses  the  architectural  design  production  process  from  a  documentary  series  and  records.  It 
starts  with  the  premise  that  this  series  becomes  crucial,  understood  as  a  narrative  of  the  project  reasons,  so 
how  can  more  clearly  this  reasons  demonstrate  their  identity,  either  as  an  intervention  of  the  future  on  the 
present, or as update this forward to pre‐stocks of historical sedimentation. 
KEYWORDS: interface, public, private, project and mutation. 
 
RESUMEN 
Este  artículo  aborda  el  proceso  de  producción  de  diseño  arquitectónico  de  una  serie  de  documentales  y 
registros. Comienza con la premisa de que esta serie se convierte en crucial, entendida como una narración de 
las  razones  del  proyecto,  así  cómo  se  puede  demostrar  más  claramente  en  las  razones  su  identidad,  ya  sea 
como  una  intervención  del  futuro  en  el  presente,  o  como  actualización  de  este  interés  pre‐  existencias  de 
sedimentación histórica. 
PALABRAS CLAVE: interfaz, públicos, privados, proyecto y mutación. 
   
1. INTRODUÇÃO 

O artigo pretende analisar o processo de trabalho que resultou no projeto chamado Mutação 
Matriz  –  Nova  Experimentação  no  Espaço  Urbano,  apresentado  na  sétima  Bienal  Internacional  de 
Arquitetura de São Paulo, em 20071, realizada no pavilhão de exposições do parque do Ibirapuera. 
Nesse evento foi organizado um concurso estudantil entre escolas de Arquitetura e Urbanismo, com 
o tema “Arquitetura: o público e o privado”. Inscreveram‐se no concurso 68 instituições, e 32 foram 
escolhidas  para  exposição  do  trabalho  durante  a  bienal.  Nesse  contexto,  o  projeto  em  questão  foi 
agraciado com o 2º prêmio, apresentando, segundo o júri, uma forma inovadora de reflexão a partir 
do  conceito  de  interface  entre  público‐privado,  e  de  que  modo  o  projeto  arquitetônico  pode  ser  a 
síntese dessa expressão. 

2. JUSTIFICATIVA E LOCALIZAÇÃO 

A  dialética  entre  o  público  e  o  privado  na  produção  do  espaço  contemporâneo  é  oportuna 
para  fomentar  uma  discussão  sobre  essa  atividade  a  partir  de  suas  múltiplas  relações.  Somente  a 
partir do entendimento de diferentes sobreposições de utilização e apropriação desse espaço é que 
se pode perceber as infinitas matizes que o conceito público‐privado irá derivar: “uma área aberta, 
um quarto ou espaço podem ser percebidos como lugar mais ou menos privado ou como uma área 
pública,  dependendo  do  grau  de  acesso,  de  quem  o  utiliza  de  quem  toma  conta  dele  e  de  suas 
respectivas  responsabilidades”  (HERTZBERGUER,  1999).  Ou  seja,  o  território  é  o  espaço  usado, 
efetivamente,  como  união  indissolúvel  de  sistemas  de  objetos  e  sistemas  de  ações  e  suas  formas 
híbridas, as técnicas (SANTOS, 2001). 

Figura 1: Fotomontagem da área de estudo e intenção poética de intervenção 

                                                            
1
 Produzido pela equipe: Arthur Francisco Rausch, Bruno Canavale Atra, Danilo Tanaka Magrini, Mariana de Carvalho Da 
Puglisi, Marina Panzoldo Canhadas, Leonardo da Cunha Catella, Luciano Albamonte da Silva, Thiago Vidal Pelakauskas, Tony 
Guedes Costa. Professoras Orientadoras: Lizete Maria Rubano, Silvana Maria Zioni e Célia Regina Moretti Meirelles. 
O território de análise, diagnóstico e intervenção do projeto é a área central da cidade de São 
Paulo  (Figura  1),  marcadamente  as  conexões  entre  o  centro  histórico  e  o  centro  novo:  Largo  São 
Bento,  o  vale  do  Anhangabaú,  os  viadutos  do  Chá  e  Santa  Efigênia,  rua  Barão  de  Itapetininga,  rua 
Vitória, rua dos Andradas e avenida Ipiranga. Essa área foi escolhida como objeto de estudo dada a 
riqueza  e  as  disparidades  de  seus  espaços,  configurações  recíprocas,  significações  e  densidades 
históricas. Sobretudo, a riqueza e pujança da vida pública de suas ruas. 

Figura 2: Largo São Francisco antes e depois do projeto urbano (2013) 

 
Fonte: Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, 2015. 
 

Atualmente,  em  2014,  constata‐se,  no  centro  histórico  de  São  Paulo,  a  necessidade  de 
equipamentos  que  condicionem  a  pontuação  do  espaço,  a  fim  de  trazer  uma  nova  dinâmica  na 
apropriação do território, criando novas relações entre usuários e local. Exemplos disso são o projeto 
urbano do Largo São Francisco pela prefeitura em 2013 (Figura 2), bem como o estímulo à criação de 
parklets (Figura 3). Em consonância com essas iniciativas, considera‐se que o projeto Mutação Matriz 
permanece  atual  no  seu  enfoque  e  design,  como  uma  proposta  relevante  e  inovadora  para  novas 
possibilidades de ocupação do espaço público. 

Figura 3: Proposta de utilização de vagas de estacionamento com parklets 

Fonte: Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, 2015. 
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E CONCEITUAL 

Em  São  Paulo,  metrópole  subdesenvolvida  industrializada  (SANTOS  e  SILVEIRA,  2001),  atuam 
as  contradições  típicas  do  sistema  capitalista,  onde  chocam‐se  os  interesses  do  corporativismo 
financeiro  à  crescente  informalização  das  condições  públicas.  Definem‐se  assim  três  globalizações, 
que concorrem na produção da cidade contemporânea: a globalização como nos é mostrada a partir 
dos  meios  de  comunicação  em  massa,  propriamente  uma  fábula,  hibridamente  virtual  e  real;  a 
globalização  que  todos  percebemos,  no  nosso  cotidiano,  da  lógica  residual  e  de  segregação  do 
capital,  que  condiciona  e  acentua  as  condições  de  pobreza,  ocasionadas  por  um  aparelho  técnico‐
burocrático  global;  e  uma  globalização  possível,  que  transcenda  o  processo  democrático  de 
apropriação  exploratória,  tanto  da  terra  como  dos  bens  de  consumo,  que  se  faça  valer  enquanto 
processo colaborativo e que implique e reforce uma base de associação cooperativista (FREIRE, 1936, 
SANTOS, 2001). 

Na cidade contemporânea, fluxos de transporte de  massas de pessoas (BAUDRILLARD, 1985) 
configuram  o  programa  do  movimento,  onde  relações  de  densidade  e  movimento  de  massa  criam 
polos centralizantes e zonas de fluidez (DELEUZE e GUATTARI, 1985, SANTOS, 2001). Nesse sentido, 

Se  a  rua  como  uma  coleção  de  blocos  de  edifícios  é  basicamente  a  expressão  da  pluralidade  de 
componentes  individuais,  na  maior  parte  privados,  a  sequência  de  ruas  e  praças  como  um  todo 
constituí  potencialmente  o  espaço  em  que  deve  tornar‐se  possível  um  diálogo  entre  os  usuários 
(HERTZBERGUER, 1991, p.64) 
Hoje,  comumente,  a  rua  conecta  espaços  privados,  demonstrando  a  qualidade  e  o  uso  do 
espaço público como o pouco que sobrou. Seu uso é otimizado por moradores de rua, comerciantes 
informais  (camelôs),  lumens‐operários,  catadores  de  lixo  reciclável,  também  conhecidos  como 
homens nômades, ou homens‐lentos, e que se estabelecem em locais com alto fluxo de pessoas. São 
as  formas  extremas  de  modernização  que  convivem  com  novas  condições  urbanas  –  informais, 
transitórias, clandestinas – geradas pela integração global. Guerra pela ocupação urbana: 

A  cidade  converteu‐se  num  arquipélago  de  enclaves  modernizados,  com  suas  torres  corporativas, 
shopping  centers  e  condomínios  fechados  –  cercadas  por  vastas  áreas  abandonadas,  terrenos  vagos 
ocupados  por  populações  itinerantes.  Camelôs  tomam  as  ruas,  favelas  vão  preenchendo  os  espaços 
entre  as  autopistas,  grupos  de  sem  teto  instalam‐se  sob  os  viadutos.  Instala‐se  assim  a  máquina  de 
guerra, que é uma certa maneira de ocupar o espaço. É uma invenção das populações itinerantes, que 
ocupam  o  território  por  deslocamento,  por  trajetos  que  distribuem  indivíduos  e  coisas  num  espaço 
aberto e indefinido (PEIXOTO, 2002, p.11) 
Desse modo, essa área se caracteriza tanto por ser um lugar estabelecido, como também palco 
de  convívio,  conflitos,  disputas  e  contradições.  Deve‐se,  portanto,  entender  como  os  diversos 
contextos  agem,  considerando  a  cidade  como  amálgama  –  mistura  ou  ajuntamento  de  pessoas  ou 
coisas  diferentes:  “assim  é  possível  enxergar  a  dinâmica  das  variáveis  escolhidas  dentro  de  uma 
situação, reconhecer as heranças e, ao mesmo tempo, as intencionalidades e a busca de sentido pela 
sociedade” (SANTOS e SILVEIRA, 2001). 

O espaço da rua foi, originalmente, o espaço para “ações, revoluções, celebrações, e ao longo 
da  história  podemos  ver  como,  de  um  período  para  o  outro,  os  arquitetos  projetaram  o  espaço 
público  no  interesse  da  comunidade  a  que  de  fato  serviam”  (HERTZBERGUER,  1991).  O  evento 
paulistano  Virada  Cultural,  que  integra  shows  e  eventos  na  cidade  de  São  Paulo,  demonstra  o 
interesse  da  população  por  essa  atividade  de  ocupação  rica  e  prolífera,  sendo  exemplo 
paradigmático de uma apropriação diferenciada do centro histórico da cidade. 

Considera‐se  que  o  ponto  de  mutação  para  a  transformação  do  domínio  público  e  seus 
espaços de ação reside no potencial inusitado e transgressor de uma consciência individual e coletiva 
– dos usuários e produtores da cidade como  corpo diverso e integrado, “para que possa  funcionar 
não só para estimular a interação social como também para refleti‐la” (HERTZBERGUER, 1991). Ora, 
a  concepção  projetual  deve  ser  pensada  como  estratégia  contínua  na  viabilização  de  ações,  que 
tenham  como  consequência  uma  estrutura  formal  de  síntese  entre  linguagem  crítica  e  escalas 
diversas da apropriação da cidade. 

4. METODOLOGIA 

A  metodologia  apresentada  a  seguir  pretende  demonstrar  um  modo  específico  de  produção 
projetual  a  partir  do  espaço  urbano,  conjugando  dois  fatores  –  entre  o  que  é  manifesto  e  o  que  é 
potencial.  Primeiro,  a  partir  de  um  reconhecimento  da  morfologia  urbana  atual  –  fruto  de  uma 
experiência histórica e moldada por diferentes forças, tanto intrínsecas como extrínsecas, em meio a 
um  emaranhado  de  óticas  sociais,  econômicas,  políticas  e  ambientais.  Segundo,  da  análise, 
diagnóstico e proposição de novos processos espaciais que tenham como base a pesquisa de campo, 
o  registro  dessa  vivência  por  meio  da  fotografia,  e  o  desenho  enquanto  investigação  de  projeto.  o 
exercício de uma futurologia, ou, antes, a materialização de um sonho. 

REFERÊNCIAS PROJETUAIS 

Baseado  no  potencial  de  flexibilidade  e  dinâmica  dos  espaços  públicos,  o  projeto  tem  como 
partido  contemplar  espacialmente  diferentes  usos  em  diferentes  escalas.  É  um  suporte  para  um 
programa  versátil  e  flexível,  qualidades  exemplificadas,  respectivamente,  nas  folies  do  parque  La 
Villette (Figura 4) e no Basket Bar do campus da universidade de Utrecht (Figura 5). 
Figura 4: Parque La Vilette, Paris, França. 

 
Fonte: Tschumi, 1982. 
 

Assim,  o  conceito  chave  seria  o  de  uma  estrutura  formal  que  criaria  permutações 
programáticas.  Podem  acontecer  conjuntamente  quadras  esportivas,  vestiários,  bancas  de  jornal, 
bicicletários,  projeções  midiáticas,  palcos,  cafés,  bancos,  atividades  comerciais,  estimulando  assim 
usos sincrônicos e espaços rizomáticos. “Um rizoma não começa nem conclui, ele se encontra sempre 
no meio, entre as coisas, inter‐ser, intermezzo... mas o rizoma tem como tecido a conjunção "e... e... 
e..."  (DELEUZE & GUATTARI, 1980). 

Figura 5: Basket Bar, Utretch, Holanda. 

 
Fonte: NL Architects, 2000. 
 

 
ANÁLISE CARTOGRÁFICA 

Figura 6: o Projeto da Cidade Porosa. 

 
Porosidade (1) + Conectividade (2) + Permeabilidade (3)2 

Foram  elaboradas  algumas  camadas  de  análise  cartográfica  da  área  de  estudo,  seguindo  o 
conceito de cidade porosa (VIGANÓ, 2009). Assim para ler a porosidade, faz‐se necessário definir e 
identificar  os  elementos  que  configuram  as  relações  entre  as  pessoas  e  as  coisas  –  os  percursos, 
fluxos, eventos, bem como uma análise das dimensões físicas do lugar (Figura 6). 

Figura 7: Camadas de análise. 

As  camadas  escolhidas  foram:  traçado  viário;  edifícios  elencados  de  interesse  histórico  e  cultural; 
bens  tombados  pelo  Conselho  Municipal  de  Preservação  do  Patrimônio  Histórico,  Cultural  e 

                                                            
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 Imagem por Heraldo Ferreira Borges, 2014. 
Ambiental  da  Cidade  de  São  Paulo  –  COMPRESP  e  o  Conselho  de  Defesa  do  Patrimônio  Histórico, 
Arqueológico, Artístico e Turístico – CONDEPHAAT; Praças, largos e áreas verdes; ruas com comércio 
regular de vendedores ambulantes, vulgo camelôs; linha férrea e metro (Figura 7). 

VISITAS DE CAMPO E PERCURSOS FOTOGRÁFICOS 

Figuras 8 e 9: Virada Esportiva e Skate. 

As  visitas  de  campo  e  registros  fotográficos  permitiram  identificar  uma  multiplicidade  de 
situações  de  utilização  dos  espaços  públicos  do  centro  da  cidade.  Foi  possível  observar  que,  se  a 
consolidação  do  centro  histórico  enquanto  forma  e  tecido  urbano  foi  produzida  por  um  poder 
econômico dito hegemônico, a acessibilidade resultante de uma consolidação das infraestruturas de 
transporte que tem o centro como polo ocasionou uma série de táticas de apropriação, ao mesmo 
tempo cotidianas e singulares, por uma população diversificada (CERTEAU, 1974; HARVEY, 2012). 

Figuras 10 e 11: graffitti e plataformas diagonais de descanso. 

            

Nesse  sentido,  as  fotografias  que  documentam  a  percepção  dessas  táticas  revelam  quatro 
características  intrínsecas  de  articulação  entre  a  forma  urbana  e  os  modos  de  apropriação 
especificamente. Primeira, a superfície horizontal como suporte de jogo e obstáculo, como se pode 
observar  no  evento  Virada  Esportiva,  realizado  pela  prefeitura  com  o  estímulo  à  ocupação  de 
espaços públicos para a prática recreativa e esportiva (Figura 8), e também de veículos leves, como 
bicicletas, patins e skates (Figura 9). Segunda, superfície vertical como suporte artístico para pixação 
e  graffitti  (Figura  10).  Terceira,  plataformas  contíguas  em  diagonal  como  mirantes  e  lugares  de 
descanso (Figura 11). Quarta, carroças ambulantes de comércio de produtos, alimentos (Figuras 12 e 
13), também catadores de lixo, como homens lentos e máquinas de guerra (DELEUZE e  GUATTARI, 
1985; SANTOS, 2001; PEIXOTO, 2002). 

Figuras 12 e 13: vendedores com carroças ambulantes, vulgo camelô. 

         

LARGO SÃO BENTO 

Ponto  de  cruzamento  e  nó  conector  entre  a  Praça  da  Sé,  a  Rua  Santa  Ifigênia  e  a  Rua  25  de 
Março,  o  largo  São  Bento  caracteriza‐se  pelo  alto  fluxo  de  pessoas  que  transitam  sem 
necessariamente usufruir do espaço para permanência ou contemplação (Figura 14). Um espaço de 
passagem potencial para abrigar um elemento urbano que agrega diversos usos e que estimularia a 
prática  de  troca,  convivência  e  cooperativismo.  Como  realizar  uma  ressignificação  nesse  núcleo 
histórico? 

Figuras 14 e 15: Largo São Bento e Sala São Paulo. 

         

A SALA SÃO PAULO 

Uma tentativa de ressignificação da memória da história de São Paulo está no projeto da Sala 
São Paulo (Figura 15), localizada na estação Júlio Prestes de trem. Projetada em 1925 por Ramos de 
Azevedo, a estação marcou o período em que a cidade cresceu em ritmo acelerado   por  conta  do 
ciclo  do  café  e  da  implantação  da  ferrovia  estadual.  A  conclusão  do  edifício  só  se  deu  em  1938, 
quando o modo de transporte hegemônico da cidade já se caracterizava pelos automóveis. Hoje, a 
Sala  São  Paulo  é  sede  da  Orquestra  Sinfônica  do  Estado  –  OSESP,  e  abriga  diversos  concertos.  A 
realização  do  projeto  trouxe  uma  nova  vitalidade  para  o  antigo  edifício,  mas  que  não  implicou  em 
reais mudanças no espaço público à sua volta, popularmente conhecido como cracolândia. 

VALE DO ANHANGABAÚ  

Pela sua dimensão e horizontalidade, o Vale do Anhangabaú emerge como um grande espaço 
público  que  possibilita  diversas  formas  de  apropriação  (Figura  16),  bem  como  um  potencial  de 
transição  entre  diferentes  cotas.  Como  otimizar  uma  articulação  entre  esses  diferentes  níveis  e  as 
atividades do cotidiano, conformando uma nova intensidade no lugar? 

Figuras 16 e 17: Vale do Anhangabaú e Praça da República. 

          

PRAÇA DA REPÚBLICA 

Uma  praça  de  fluxo  intenso  de  pessoas,  conecta‐se  com  a  cidade  por  meio  da  estação 
República de metrô (Figura 17). Conforma um espaço coletivo que ganha ainda mais dinâmica pelas 
imprevistas  apropriações  de  comerciantes  informais,  moradores  de  rua,  apresentações  artísticas  e 
transeuntes. 

5. O PROJETO 

O  artefato  projetado  –  fruto  de  uma  observação  cuidadosa  e  de  uma  reflexão  aprofundada, 
surgiu num instante. O rápido poder de decisão do croqui gerou, com poucos traços e algumas cores, 
uma  decodificação  do  espaço,  e  um  desdobramento  do  programa:  a  diagonal  como  elemento 
mínimo  de  costura  e  transposição  de  planos,  e  a  plataforma  elevada  efetivando  a  duplicação  do 
espaço público (figura 18). Desse modo, possibilita‐se, em um único movimento, o advento de uma 
arquibancada,  a  multiplicidade  de  usos  para  a  plataforma  elevada  –  palco,  quadra,  picadeiro,  e  a 
cobertura do nível inferior, tornando‐o minimamente abrigado contra as intempéries (Figura 19). 
Figuras 18 e 19: um projeto, duas escalas3. 

    

O  projeto  foi  concebido  enquanto  protótipo  modular,  ou  seja,  um  estudo  preliminar  de  um 
mecanismo  de  factível  à  replicação.  Proposto  para  acontecer  com  4  pontos  de  apoio  apenas  –  um 
duplo  braço  metálico  em  cada  extremidade,  com  rótulas  conectando‐os  à  duas  vigas  vagão,  e  um 
sistema  suplementar  duplo  de  tirantes  metálicos  estaiados.  As  arquibancadas  possuem  uma 
modulação de altura de 4 metros, podendo atingir 8 e até 12 metros através de platôs intermediários 
(Figura 20). 

Figura 20: plantas e corte. 

As figuras 20 a 25, a seguir,  consistem nas inserções realizadas enquanto produto projetual. 
                                                            
3
 Desenhos por Thiago Vidal Pelaskauskas, 2007. 
 
Figuras 20 e 21: Mapa Síntese e inserção no Vale do Anhangabaú. 
 

 
 
 

 
Figuras 22, 23 e 24: inserção no Vale do Anhangabaú. 
 

 
Figura 25: maquete e materialidade, cidade de madeira e intervenção de acrílico. 

 
 

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

Verifica‐se  que  a  multiplicidade  da  proposta,  frente  à  reflexão  sobre  como  o  projeto  se 
manifesta enquanto fenômeno de inovação, apresenta um duplo caráter, ao mesmo tempo inusitado 
e original. Inusitado no sentido de serendipidade – encontrar resposta para um problema impensado 
ou,  antes,  propor  uma  solução  a  mais,  incrementar  espaços  que  já  são  ricos  mas,  sendo  espaços 
públicos e históricos, são também problemáticos e contraditórios, local do debate e da inquietação, 
onde  para  tanto  nenhuma  abundância  deveria  ser  suficiente,  como  bem  se  demonstra  na 
intervenção realizada no largo São Francisco e propostas para parklets, citadas no item 2 (justificativa 
e  localização).  O  projeto  demonstrou  uma  inovação  original  no  sentido  de  voltar  à  origem, 
reconhecer as preexistências, buscando alinhar a produção do novo tanto com o consolidado tecido 
urbano  e  emérito  patrimônio  histórico  quanto  com  a  atualidade  maleável  e  impermanente  das 
ocupações  esporádicas  e  efêmeras,  questões  apresentadas,  respectivamente,  nos  itens  3  e  4 
(metodologia e fundamentação teórica). 

Finalmente, o movimento projetual,  apresentado no ítem 5, busca a resposta à questão: como 
o projeto pode ser – se torna, devir, a interface entre o público e o privado? A análise do processo 
criativo  constitui,  uma  vez  organizada  e  enunciada,  a  própria  cartografia  do  projeto,  enquanto 
cristalização de uma vontade, por meio do desenho,e registro de uma vivência, por toda produção 
documental desse mesmo processo. Um projeto que se pretende arma de transformação do espaço 
(ARGAN, 1965), ao mesmo tempo em que anuncia a impossibilidade de qualquer outra intervenção, 
dada  a  sedimentação  histórica  do  tecido  urbano  estudado,  que  não  seja  mínima.  Comparando  por 
antítese, um exemplo de intervenção máxima, atual e possível, foi corporificado na Praça das Artes, 
projeto também implantado junto ao Vale do Anhangabaú, fazendo uso dos meandros do quarteirão 
para conexão com a Rua São João e a Rua Conselheiro Crispiniano. E é justamente esse manancial de 
possibilidades  que  o  centro  histórico  de  São  Paulo  oferece,  enquanto  densidade  diferencial  de 
escalas: uma belíssima peça multifacetada, que, no (re)fazer projetual, torna‐se um procedimento de 
cura, como a expressão japonesa, kintsugi ‐ 金 継 ぎ, conexão de ouro, ou a beleza da experiência e 
da "insustentável leveza do ser", como no livro de Milan Kundera. 

7. REFERÊNCIAS 

ARGAN, Giulio Carlo. Projeto e destino. São Paulo: Ática, 2000 (1965). 

BAUDRILLARD, À sombra das maiorias silenciosas O fim do social e o surgimento das massas. São Paulo: 
Editora Brasiliense 1985. 

CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano. São Paulo: Vozes, 1974. 

DELEUZE, Guilles e GUATTARI, Felix. Capitalismo e Esquizofrenia 2 – Mil Platôs. São Paulo: Editora 34, 2012 
(1980). 

FREIRE, Gilberto. Sobrados e Mucambos. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1936. 

HARVEY, David. Cidades Rebeldes – do direito à cidade à revolução urbana. São Paulo: Martins Fontes, 2014 
(2012). 

HERTZBERGUER, Herman. Lições de Arquitetura. São Paulo: Martins Fontes, 1999 (1991). 

MORIN, Edgar. O Método 1: a natureza da natureza. Porto Alegre: Sulina, 2005 (1971). 

PEIXOTO, Nelson Brissac. As máquinas de guerra contra os aparelhos de captura. Disponível em: 
<www.artecidade.org.br>, acesso em 04/03/2015. 

SANTOS, Milton. Por uma outra globalização ‐ do pensamento único à consciência universal. São Paulo: 
Editora Record, 2000. 

SANTOS, Milton e SILVEIRA, Maria Laura. O Brasil – Território e sociedade no início do século XXI. Rio de 
Janeiro: Record, 2001. 

VIGANÓ, Paola.  The Metropolis of the Twenty First Century The Project of a Porous City. 2009. Disponível em 
<http://www.oasejournal.nl/en/Issues/80/TheMetropolisOfTheTwenty‐FirstCentury#091>, acesso em 
30/05/2015. 

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