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Ronald Dworkin
Seis ideais de Dworkin sobre a Teoria da Igualdade
1. Desde Kant, toda teoria social normativa depende de uma variante do princípio de
igual consideração e respeito.
2. A igualdade de bem-estar é uma conceção errada deste princípio.
3. A igualdade de recursos é a conceção correta.
4. A igualdade de recursos implica duas exigências:
(1) a distribuição deve ser sensível à escolha (2) deve ser insensível à sorte bruta.
5. Contra Isaiah Berlin, é possível conciliar a liberdade e a igualdade.
6. Os governos devem respeitar o princípio de igual consideração e respeito.
3. Sobre as vantagens naturais: São injustas, mas para Rawls, o princípio de diferença corrige
essas injustiças. Para Dworkin, o mercado de seguros é uma correção mais justa, pois é
mais sensível à responsabilidade individual.
Diferenças com Robert Nozick
Dworkin rejeita a teoria da titularidade de Nozick por duas razões:
Os primeiros a chegar não devem ficar com tudo o que quiserem;
As desigualdades devidas aos talentos naturais não devem ser legítimas.
Dworkin pretende conciliar a direita com a esquerda graças à importância da
responsabilidade individual na sua teoria.
“Nenhum governo é legítimo que não demonstre igualdade de consideração pelo destino de
todos os cidadãos sobre os quais tem domínio e, dos quais demanda fidelidade. A igualdade
de consideração é a virtude soberana das comunidades políticas - sem ela o governo não
passa de tirania […].”
Dworkin, Virtude Soberana, 2005, p. IX.
Amartya Sem
Em “equality of what?” (1980), Amartya Sen critica a igualdade de bem-estar (maximização das
preferências subjetivas de todos), distinguindo-a da igualdade de bens primários de Rawls.
Mas segundo Sen, a igualdade de bens primários não tem em conta as necessidades especiais
das pessoas com handicaps genéticos.
A igualdade de bem-estar sim, mas permite dar mais recursos às pessoas com gostos caros.
Contra ambas as teorias, Amartya Sen defendeu a “igualdade das capacidades” e não a
igualdade de recursos, nem a igualdade de bem-estar.
Pode existir uma igualdade de bens sociais primários ou de recursos materiais sem que exista
igual capacidade para os colocar ao serviço das liberdades, devido às diferenças no contexto
cultural e ambiental dos indivíduos, a diferença de género, exposição a doenças, etc. Assim a
questão fundamental é a da capacidade de transformar os bens sociais primários ou os
recursos em efetiva liberdade de escolha. A noção de capabilidades indica precisamente essa
transformação.
O mais importante é igualizar o conjunto de capabilidades básicas dos indivíduos e não
simplesmente os instrumentos que podem estar ao serviço dessas capabilidades, como os
recursos ou os bens sociais primários.
Ronald Dworkin
Dworkin, desenvolve a crítica da igualdade de bem-estar e afina a igualdade de recursos (ou de
bens primários de Rawls), tendo em conta as críticas de Amartya Sen.
Para Dworkin devemos dar mais recursos às pessoas com necessidades genéticas mas não
queremos dar mais recursos às pessoas com gostos caros.
1. Se lhe forem negados mais recursos, retirados dos que têm gostos menos caros, isto
contradiz a igualdade de bem-estar, já que será impossível atingi-la.
2. Se lhe forem dados mais recursos isto mostra que a igualdade de bem-estar é injusta, já que
é chocante atribuir mais recursos a alguém só porque tem gostos caros.
As nossas circunstâncias são outra história: não faz sentido assumir responsabilidade por elas
a não ser que sejam o resultado de nossas escolhas. Ao contrário, se estamos insatisfeitos com
os nossos recursos impessoais e não nos culpamos por nenhuma escolha que afetou a nossa
parcela nesses recursos, é natural que reclamemos que outros— geralmente os oficiais de
nossa comunidade — foram injustos connosco.
A distinção entre escolha e circunstância é não só familiar, mas fundamental em ética de
primeira pessoa. [… ] Não podemos planejar ou julgar as nossas vidas senão pela distinção
entre aquilo sobre o que devemos assumir responsabilidade, porque o escolhemos, e aquilo
sobre o que não devemos porque estava além de nosso controle. (Dworkin, Virtude
soberana, 2005, p. 455.)
Sobre o valor da responsabilidade individual
1. Se ninguém se sente responsável por pagar os custos das suas ambições, então todos vão
viver frustrados já que os recursos são limitados.
2. Eu poder pagar o custo das minhas ambições é uma fonte de expressão pessoal importante:
se tudo fosse dado a minha vida teria menos sentido.
3. O Estado não trata todos com igual consideração e respeito se considerar as preferências de
uns mais importantes. Viola a neutralidade sobre o bem.
4. Aceitar as consequências dos nossos gostos é central para o exercício da responsabilidade.
Implicações práticas
No seu livro A virtude soberana, Dworkin defende as implicações práticas da igualdade de
recursos em diversos campos, como por exemplo:
- a ação afirmativa nas universidades americanas
- os direitos dos homossexuais
- a questão da eutanásia
- a igualdade política e a liberdade
- a justiça na saúde
“Dworkin na realidade prestou um serviço considerável ao igualitarismo ao incorporar a
ideia mais poderosa do arsenal da direita anti-igualitária: a ideia da escolha e da
responsabilidade”.
Alternativa de Dworkin
A igualdade de recursos requer:
- Uma distribuição que permite desigualdades derivadas das escolhas responsáveis que as
pessoas realizam,
- Uma distribuição que não permite desigualdades que derivam das circunstâncias pelas quais
as pessoas não são responsáveis (a lotaria social e genética)
3. DWORKIN A FAVOR DA IGUALDADE DE RECURSOS
Dworkin e Nozick
De acordo com Nozick, Dworkin mantém que:
1. As pessoas são responsáveis e devem ser responsabilizadas pelos resultados das suas
escolhas.
Contra Nozick, Dworkin mantém que:
2. As pessoas não são responsáveis e não devem ser responsabilizadas pelas circunstâncias
(não escolhidas) em que fazem escolhas.
Conciliar responsabilidade e circunstâncias
Dworkin pensa que se criarmos um quadro justo para uma economia de mercado, então, graças
a uma distribuição inicial justa dos recursos que corrige as desigualdades de circunstâncias
(naturais e sociais): as pessoas poderão livremente fazer as suas escolhas responsáveis sem
necessidade de redistribuições posteriores durante as suas vidas.
Uma restrição à igualdade
Uma distribuição de recursos é justa apenas se for sensível à ambição (ambition-sensitive) e
insensível às dotações naturais e sociais (endowment-insensitive).
Sensível à ambição: devemos ser recompensados em função dos nossos esforços e objetivos.
Insensível às dotações: refere-se aos nossos talentos inatos e naturais, e à nossa posição social
na sociedade - coisas que não escolhemos e que não controlamos. As desigualdades que
decorrem destas diferenças nas dotações devem ser corrigidas.
Leilão numa ilha deserta (hipotético) e teste da inveja para uma distribuição
justa
Uns sobreviventes dum barco naufragado chegam a uma ilha deserta e partilham os recursos
de maneira igual:
Suponhamos que todos temos os mesmos talentos naturais e que todos os recursos da
sociedade estão à venda num leilão gigante.
Suponhamos que todos temos a mesma quantidade de dinheiro para gastar, 100.
No leilão, cada bem será entregue ao indivíduo que der maior lance. Ao final do leilão, que
ocorrerá quantas vezes forem necessárias até que todos restem satisfeitos, cada indivíduo terá
sua cesta diferenciada de produtos, adequada ao plano de vida e interesses de cada um.
O teste da inveja para uma distribuição justa diz o seguinte: a distribuição dos pacotes de
bens no fim do leilão é justa apenas se ninguém sentir inveja pelo pacote de outra pessoa.
A ideia central é que a exigência de justiça fica satisfeita quando ninguém se pode queixar
sobre as posses que tem, já que todos tinham a opção de leiloar todos os recursos.
Este leilão do Dworkin é uma variante da posição original do Rawls (mas sem o véu de
ignorância)
Um exemplo de teste de inveja
Suponhamos que a Joana quer ser surfista e a Andreia quer ser banqueira.
A Joana gasta todo o seu dinheiro numa formação para ser surfista e viver perto da praia. A
Andreia gasta todo o seu dinheiro para obter um MBA e ser uma grande banqueira.
No final do leilão, se nem a Joana nem a Andreia sentem inveja pelo pacote da outra, a
distribuição é justa.
A razão pela qual a distribuição é justa é porque ambas têm uma oportunidade igual de
licitação no pacote da outra, graças à distribuição igual de recursos.
Se a Joana realmente quisesse ser banqueira, poderia ter leiloado o pacote da Andreia.
Se a Andreia realmente quisesse ser uma surfista, poderia ter leiloado o pacote da Joana.
Quanto às conceções sobre a vida boa a ser vivida, esta cabe a cada individuo, devendo o
governo isentar-se de qualquer conceção particular a esse respeito, aqui tem lugar a liberdade
Já vimos como argumentar contra a igualdade de bem-estar, mas é uma alternativa a ter em
conta.
O problema dos gostos caros mais uma vez
O problema dos gostos caros mostra que a igualdade de recursos é uma visão melhor do que a
igualdade de bem-estar.
A Marta gosta de vinho caro, e é apenas feliz com vinho caro. O Pedro gosta de cerveja barata
e é tão feliz com cerveja barata como a Marta o é com vinho caro.
Se a igualdade de bem-estar é o que importa, então a sociedade é obrigada a dar uma maior
proporção de recursos à Marta, uma vez que custa mais para fazê-la feliz do que custa fazer o
Pedro igualmente feliz.
Ora parece injusto dar uma quantidade grande e desigual de recursos à Marta apenas para que
ela seja igualmente feliz ao Pedro.
O IGUALITARISMO DA RESPONSABILIDADE
O igualitarismo sensível à responsabilidade
Na literatura anglófona esta corrente igualitária é conhecida por luck egalitarianism.
Esta corrente tem por base os trabalhos de John Rawls (1971), a crítica ao
igualitarismo de Rawls pelo libertarismo de direita de Robert Nozick (1974) e a
tentativa por Ronald Dworkin (2000) de superar o igualitarismo rawlsiano assim como
o conservadorismo de direita. Esta corrente igualitária tem uma posição dominante
nos debates sobre as teorias da justiça distributiva.
Esta teoria é uma consequência da teoria da igualdade de recursos de Dworkin e da
sua distinção entre escolhas e circunstâncias.
De acordo com qualquer tipo de igualitarismo sensível à responsabilidade individual, as
desigualdades de riqueza entre indivíduos são justificadas quando resultantes de escolhas
pelas quais os indivíduos podem ser considerados responsáveis.
Inversamente, as desigualdades causadas apenas pelo acaso ou pela má sorte bruta não são
justificadas.
Indivíduos responsáveis /miséria
Se os indivíduos podem e devem ser considerados responsáveis pelos resultados das suas
escolhas então qualquer igualitarismo sensível à responsabilidade deve permitir que os
indivíduos suportem os custos (ou gozem dos ganhos) das suas escolhas.
Porém, por vezes os resultados de certas escolhas podem deixar uma pessoa numa situação
económica e psicológica de sofrimento extremo.
Neste caso, porque responsável pela sua escolha, o indivíduo não poderá contar com o apoio do
Estado, através das suas políticas sociais.
(2) introduzir “um nível mínimo de bens” ao qual os indivíduos vítimas dos maus resultados
das suas escolhas tenham sempre acesso (independentemente das considerações ligadas à
responsabilidade) ;
(3) introduzir um esquema de seguro obrigatório de modo a que todos os cidadãos sejam
cobertos contra riscos que afetam a sua capacidade de satisfazer as suas necessidades
(correndo o risco de se transformar numa teoria paternalista).
CRÍTICA DE DWORKIN (IGUALDADE DE RECURSOS) A RAWLS (IGUALDADE
DEMOCRÁTICA)
Por um lado, peca por defeito igualitário ao não ser sensível às desvantagens especiais
de alguns.
Por outro lado, peca por excesso igualitário ao não ser sensível às ambições e esforços
dos indivíduos.
A teoria Rwalsiana não parece contemplar as desvantagens especiais de alguns quanto aos
seus dotes naturais, nomeadamente a deficiente físicos ou mentais. Uma vez que se centra na
distribuição de bens sociais primários, a teoria visa, de acordo com o princípio da diferença, a
maximização das expectativas daqueles que estão pior ao nível da riqueza. No entanto, os que
estão pior ao nível da riqueza não são necessariamente aqueles que estão pior num sentido
geral.
Se alguém tem uma deficiência grave, com a qual gasta grande parte dos recursos de que pode
dispor, estará certamente pior do que alguém que tem os mesmo recursos mas não os
necessita de gastar para acorrer à sua deficiência em particular. Ora, parece intuitivamente
convincente que a justiça deve também eliminar as desvantagens especiais produzidas pela
pura má sorte- o que não está previsto na formulação de Rawls.
A teoria Rawlsiana é também noutro sentido, indevidamente igualitária, uma vez que não é
suficientemente sensível aos gostos e ambições de cada um. Se alguém decidir dedicar o seu
tempo a atividades de lazer, enquanto outros optam por trabalhos exigentes e extenuantes, o
principio da diferença acabaria por premiar os primeiros. Com efeito, apesar das atividades de
lazer a que se dedicam poderem não ser remuneradas e coloca-los numa posição
especialmente desfavorecida à partida, essa mesma posição deveria ser maximizada à custa
dos que escolheram trabalhos mais difíceis e mais remunerados. De novo, parece
intuitivamente difícil de contestar a ideia de que a justiça deveria ser mais sensível aos
esforços individuais e que, portanto, os que optam pelo lazer em detrimento do trabalho já
estão a ser beneficiados de certa forma e não deveriam sê-lo ainda mais através da função de
transferência do Estado.
Os indivíduos não devem ser responsabilizados pelos fatores em relação aos quais não têm
responsabilidade moral, mas devem ser penalizados no que diz respeito às escolhas pelas
quais são responsáveis.
Dworkin sugere que as pessoas devem ter à partida recursos materiais iguais. Assim, as
pessoas devem ter uma igual possibilidade de se segurar em relação ao risco da má sorte,
como, por exemplo, no caso de nascerem ou se tornarem deficientes. Se este seguro social
permite compensar os indivíduos em relação aos imponderáveis da vida- pelos quais não são
moralmente responsáveis- uma igualdade inicial de recursos materiais também deixa margem
para a influencia de diferentes ambições e gostos individuais. O sistema de transferência do
estado não deve compensar as pessoas com gostos caros ou sem ambição, apenas porque
estão pior do que os outros. Mas deve compensar especialmente aqueles que foram afetados
por elementos de pura má sorte, como a deficiência.