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25 anos de lutas e
realizacoes no exercicio
do controle social do SUS
anos
COORDENAÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE SAÚDE DE PORTO ALEGRE
NÚCLEO DE COORDENAÇÃO:
Coordenadora:
Mirtha da Rosa Zenker
Segmento: Trabalhador em saúde
Associação dos Terapeutas Ocupacionais do Rio Grande do Sul
Vice-coordenadora:
Djanira Corrêa da Conceição
Segmento: Usuário
Conselho Distrital de Saúde Restinga
Coordenadores Adjuntos:
João Alne Schamann Farias
Segmento: Usuário
Conselho Distrital de Saúde Partenon
Erno Harzheim
Segmento: Governo
Secretaria Municipal de Saúde
Organizadores:
Gabriel Calazans Baptista
Heloisa H. R. de Alencar
Loreni Lucas
Marisa Martins Altamirano
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CONSELHEIROS DE SAÚDE DO BRASIL, UNI-VOS!
PELO SUS! PELO DIREITO HUMANO À SAÚDE!
Rumo a 15ª Conferência Nacional da Saúde
Valdevir Both¹
"Somente os que forem capazes de encarnar a utopia serão aptos para o combate
decisivo, o que pretende recuperar o quanto de humanidade já tivermos perdido”
Ernesto Sábato, Antes del fin, 1998.
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Na esteira desses questionamentos, poderia resultar importante perguntar-
se nas nossas rodas de conversa, se essas realidades ainda existem ou não
nos dias de hoje e qual a sua relação com a saúde. Mesmo com dúvidas
sobre o sentido que fazem essas perguntas para muitos/as no atual contexto
do debate da saúde, as ponho, certo de que poderão ser acolhidas.
Na aurora do século XXI fomos acordados pela crise econômica
mundial, uma velha conhecida que apareceu com “estilo novo”. Nos
assustamos, pois seu “modelito” inovador, agora financeirizado, só
aumentou a sua fealdade, que sempre lhe foi e continua sendo
característica. Mas a intensidade do susto foi aumentada pelo alto grau de
imprevisibilidade desta presença! Afinal, as “agências de classificação de
risco” descartavam por completo essa visita horripilante quando a poucos
dias, antes do grande “estouro” em 2008, classificavam os títulos
imobiliários americanos, que iniciaram a crise, de AAA (a maior nota
possível). Estas agências, criadas pelos grandes capitalistas, julgam
empresas e governos e indicam quais deles têm saúde financeira e merecem
crédito. Essas agências, as mesmas que desvalorizaram a maior produtora
de petróleo do mundo, a Petrobrás, afugentando investimentos, foram as
que supervalorizaram os títulos altamente apodrecidos nos Estados Unidos.
Estranho, não?
A crise econômica mundial, “iniciada” em 2008 nos EUA,
aparentemente diferente, mas a rigor muito semelhante às crises
anteriores, está produzindo um efeito catastrófico de drenagem de recursos
públicos para a rapinagem financeira privada. Dados comprobatórios não
faltam. Em 2008, o Senado dos Estados Unidos votou a favor de um pacote
de módicos 700 bilhões de dólares, dinheiro público para salvar o sistema
financeiro de Wall Street. No mesmo ano, alguns países europeus (França,
Áustria, Alemanha, Países Baixos e Itália) repassaram ao sistema financeiro
(diga-se, a alguns bancos) a bagatela de 1,17 trilhão de euros, dinheiro
pertencente ao povo. Mas bah tchê! Algum conselheiro de saúde,
integrante de alguma Comissão de Finanças, Orçamento, etc, poderia me
ajudar a traduzir esses valores em reais e ver o que poderíamos fazer com
essa
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essa grana? Seria possível pagar quantos kg de churrasco no sul? Quantas
moquecas capixabas poderiam ser saboreadas? Quantos pães de queijo em
Minas? tapiocas, tacacás...? E quantas equipes de saúde da família,
unidades básicas, Upas, etc? (por favor, não me deixem só, me ajudem nesse
cálculo, aguardo retorno)!
Causa espanto quando representantes do “andar de cima” fazem
críticas às políticas públicas como o Bolsa Família em função do seu suposto
caráter “assistencialista”. Quem afinal vive mamando na teta do Estado? Soa
estranho também o conselho clássico dos liberais capitalistas, como Milton
Friedman, quando sugerem que políticas públicas universais como saúde e
educação têm um alto custo à sociedade, ao ponto de se tornarem
impagáveis, e desenvolverem a preguiça e a inércia nos “pobres”. Essas
mesmas vozes, que têm seus representantes em toda parte, simplesmente
calam quando quantitativos astronômicos de recursos salvam bancos.
Especialmente a estes reitero: gastar dinheiro com o sistema financeiro
capitalista gera duas consequências nefastas: a) assistencialismo, no sentido
ruim do termo, sempre tão condenado por eles, visto que estão tão
dependentes do Estado, do dinheiro público, que não conseguem viver sem
essa mão amiga; b) preguiça e inércia, pois, como vivem basicamente às
custas dos títulos da dívida pública, que geram alta lucratividade, o
investimento no desenvolvimento produtivo se torna menos atrativo,
produzindo disposição à preguiça nos grandes empresários e, como
imediata consequência, uma inércia econômica. Não por acaso temos visto
baixo crescimento econômico ou recessão em muitos países nos últimos
tempos, mesmo tendo investido fortunas de dinheiro público. Insisto:
continuar com essa política cria nos ricos, hoje proprietários do sistema
financeiro, do qual a maioria dos Estados e “democracias contemporâneas”
se tornaram escravos, “assistencialismo”, preguiça e inércia.
Diretamente proporcional a esse “assalto legal” aos cofres públicos é
a continuidade e alargamento da concentração da renda e riqueza no
mundo. Thomas Piketty, renomado economista francês, mostrou
recentemente (2013) a habilidade do capitalismo em concentrar a riqueza
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nas mãos de poucos, mesmo em tempos de crise. A ONG britânica Oxfam
International, divulgou um relatório em janeiro de 2015 estimando que, a
continuar o atual ritmo da concentração de riqueza no mundo, em 2016 1%
dos mais ricos terão maior riqueza que 99% da população. Outro dia,
enquanto tomava uma taça de vinho durante a noite, jogado no sofá da sala,
cansado depois de um dia longo de trabalho, ouvi um discurso de um
economista formado em Harvard alertando para a necessidade de todos os
setores da sociedade fazerem sacrifícios nesse momento de “crise”. Como
saboreava um vinho, devo ter escutado mal e não devo ter entendido.
Afinal, como um especialista, formado em Harvard, não saberia que os ricos
ficaram muito mais ricos nos últimos anos, exatamente porque a palavra
sacrifício lhes é desconhecida?
Mas se a economia anda “devagar, quase parando”, parada em
muitos países, se os ricos continuam concentrando e enriquecendo como
nunca, e se o dinheiro não cai das árvores, como isso é possível? Algum
conselheiro ou conselheira de saúde pode explicar quem paga essa conta?
Ora, a explicação está numa receita que não é nova, embora seus
ingredientes sim! Essa lógica é sustentada pela exploração do trabalho
humano, ou seja, do trabalho das mulheres e homens que labutam
diariamente em todos os cantos do planeta. Obviamente que a engrenagem
do capitalismo contemporâneo é muito mais complexa que em tempos idos
(obviamente não vivemos mais no séc. XIX), mas para a nossa finalidade
aqui, é suficiente afirmar o que é, e sempre foi, a essência do capitalismo: ele
rouba o trabalho das pessoas. O capitalista financeirizado preguiçoso, que
depende do “assistencialismo estatal” e nos leva reiteradamente a ciclos de
inércia econômica, não deixou de depender da “mais-valia” (Opa! O que
será a mais-valia?). Pelo contrário, como o dinheiro não é produzido pelas
árvores, como eu imaginava quando criança, os capitalistas continuam
dependendo de energia humana viva (braços, corpos, “mentes criativas”,
etc) tanto para produzir como para consumir. Seu desafio é amplificar a
exploração dessa energia, do trabalho!
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Altíssimas taxas de desemprego pelo mundo (poucas vezes vistas em
países ricos) e a destruição das políticas sociais universais são as
consequências mais imediatas e brutais, quando a prioridade é o ajuste
fiscal (traduzindo: concentração de renda e riqueza nas mãos de poucos às
custas da exploração de muitos) ao invés da proteção social dos
trabalhadores. Causa perplexidade que países com sistemas de proteção
social consolidados por décadas, de uma hora para outra, adotem reformas
que destroem conquistas históricas, que são a expressão concreta da luta
dos povos por seus direitos. Ainda que esses sistemas de proteção tenham
sido implementados somente em alguns países durante o século XX, e
tenham convivido perfeitamente com o capitalismo, destruí-los significa
um duro golpe nos direitos sociais, sempre tão estranhos a esse mesmo
sistema capitalista.
Desde quando a crise econômica “iniciou” em 2008, ganharam força
um conjunto de discursos e práticas que requentam um passado anterior à
Declaração Universal dos Direitos Humanos. Se em 1948 (com todos os
limites intrínsecos ao processo de construção da referida Declaração)
pactuamos termos mínimos (não máximos) da nossa convivência social,
curiosamente isso está sendo visto hoje como inviável financeiramente e
injusto socialmente. Em 1948, desgraçados pela guerra, pactuamos que
“todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos.
Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em
espírito de fraternidade” (Art. 1º). E não paramos por aí. Tínhamos o firme
propósito de construir a paz mundial, embalados pela crença de que ela
somente seria possível se houvesse justiça social. Disso resultou, entre
outros tantos direitos proclamados, que “toda a pessoa, como membro da
sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a
satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças
ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a
organização e os recursos de cada país” (Art. 22º). O texto deixou algumas
lacunas, mas novamente fiquemos com o essencial para o nosso
objetivo aqui: que todas e todos (e não somente alguns) têm o direito a ter
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direitos e que, entre eles, figura a segurança social.
O que anda na pauta por aí, nos debates do Fundo Monetário
Internacional (FMI), Banco Mundial (BM), G20, Organização Mundial da
Saúde, etc., já não é mais a busca de estratégias cooperativas internacionais
para que a segurança social seja universalizada no mundo, conforme a
Declaração Universal dos Direitos Humanos. O que se afirma de forma
explícita é que esse caminho seria impossível em função do alto custo
financeiro aos Estados e injusto socialmente, afinal, como o orçamento é
escasso, deve ser focado nos mais pobres. E claro, nesse “pacote
ideológico”, embutem na população outra “verdade” mentirosa, a de que o
Estado é por natureza ineficiente e corrupto. Nascem daí os chamados
“pisos de proteção social”, que englobam ações e serviços básicos ou
mínimos aos mais pobres, desprovidos das condições econômicas para os
custearem. Com os demais, que não se enquadram na categoria “pobre”, o
Estado não deve se preocupar, restando a estes comprarem a sua
“proteção” social no mercado. Fiquei sabendo outro dia que essa proposta
está tendo muita simpatia das grandes instituições financeiras do mundo (os
capitalistas financeiros), pois pode significar a criação de um novo mercado
muito lucrativo, inclusive com linhas de crédito com o objetivo de financiar o
tratamento de câncer, a compra de vacinas, o pagamento por um parto ou o
transplante de um órgão. “Genial”! Já estão estudando formas de subsídio
público para essas propostas. Quando soube do fato, tive um sonho durante
a noite. Nele me apaixonei por uma linda mulher, de fazer inveja à Mona
Lisa. Ao me aproximar, fitei seus lindos olhos e sussurrei: “quero seu coração
pra mim”! Imediatamente me respondeu: “impossível meu anjo, não posso
lhe dar o que não me pertence. Estou viva graças a um transplante
financiado pelo banco. Durante os próximos 15 anos, meu coração estará
penhorado”. Com os olhos lacrimejados, sentenciou: “se o queres para ti,
deves negociá-lo com o banco”. Acordei do pesadelo e estava me dirigindo
a uma agência bancária para liquidar o empréstimo dela através de um
novo financiamento.
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A tradução dos “pisos de proteção social” para a área da saúde é a
adoção e implementação da chamada “cobertura universal de saúde”
(atenção: não é sistema universal de saúde), que propõe serviços mínimos
aos mais pobres. O que se esconde, ou nem tanto, por trás destas propostas,
é a violação do princípio elementar da Declaração Universal dos Direitos
Humanos, adotado em nossa Constituição, que é a nossa condição de
igualdade (realço aqui a igualdade no sentido que lembra Boaventura de
Souza Santos, que é preciso defender a igualdade quando a diferença nos
inferioriza e defender a diferença quando a igualdade nos descaracteriza).
Diferente do que propunha a Declaração, o que está em curso é a
“inferiorização” da maior parte dos homens e mulheres da sua condição de
sujeito de direitos, em específico aqui, do direito à proteção social.
Mas, o que é mais preocupante é que estas propostas estão sendo
levadas a efeito em nome da própria Declaração Universal dos Direitos
Humanos. Senão vejamos o que diz o Relatório “Piso de Proteção Social para
uma Globalização Equitativa e Inclusiva” do Grupo Consultivo constituído
pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) com a colaboração da
Organização Mundial da Saúde (OMS): “a noção de Piso de Proteção Social
está ancorada no princípio fundamental de justiça social e no direito
universal de todos à seguridade social e a um padrão de vida digno. As
disposições estabelecidas no marco conceitual do Piso referem-se a uma
série de direitos constantes na Declaração Universal de Direitos
Humanos”. Genial, não se tratasse novamente de um “golpe semântico”,
pois no texto em questão a noção de direitos humanos é empregada de
forma imprópria para justificar uma proposta que implode com o seu
significado histórico mais caro.
Esse processo anda a passos largos em todo mundo. Com maior ou
menor intensidade, a atual reacomodação capitalista mundial está
provocando a perda de direitos de milhões e milhões de pessoas, exigindo
alta carga de sacrifício humano e significando para muitos a perda do direito
mais elementar que é a vida. Mesmo que a razão para a morte de 700
pessoas, que viajavam num navio pesqueiro em condições sub-humanas da
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Líbia para a Itália em abril de 2015, não seja única, como ignorar o fato de
que esses seres humanos fugiam de uma situação de extrema pobreza
absoluta? A respeito, me lembro da noite em que foi veiculada pela TV a
notícia de que os países ricos estavam reunidos para discutir o problema. O
consenso a que chegaram foi de que era preciso destruir as embarcações
que realizam o tráfico humano, aumentar a fiscalização e qualificar as
operações de salvamento em caso de acidentes. Meu filho de dez anos, na
sua ingenuidade de criança, interrogou-me: “pai, mas e as milhares de
pessoas famintas que estão aguardando na costa da Líbia, como vão
conseguir fugir para a Europa em busca de comida com essas medidas?”
Juro que tive a impressão de que nascemos inteligentes e nos tornamos
imbecis quando atingimos a “maioridade” (Kant que me perdoe)!
Em terras brasileiras, mesmo que com um grau de dificuldade maior,
o capitalismo, e os efeitos da sua crise iniciada em 2008, não deixaram de
mostrar os seus rastros. Os capitalistas financeiros, usando de todos os
mecanismos possíveis, buscaram ao máximo capturar o Estado (o que não
significa advogar a tese de que o Estado é apenas “vítima do sistema”). Por
isso, se por um lado o país adotou várias políticas sociais importantes na
última década (ancoradas e permitidas pela decisão política do governo
federal por um determinado modelo de desenvolvimento), divergindo, em
muitos casos, do receituário neoliberal de plantão, também é verdade que o
país ainda não conseguiu realizar e consolidar algumas mudanças profundas
e que impactam estruturalmente na proteção social do povo brasileiro.
Nossa taxa de juros, altíssima, diga-se de passagem, continua garantindo
altas fatias de lucro aos financistas. Dados apontam que em 2014, os cinco
maiores bancos do país lucraram mais de 60 bilhões de reais. Isso
representou um aumento de mais de 14% se comparado com 2013. Além
disso, seu patrimônio cresceu mais de 18% nos últimos 12 meses (atingindo
370 bilhões). Parafraseando minha vó: meeeeeeu Jesus! (Obs: ela recorria a
essa expressão, e com ênfases diferentes na letra “e”, em casos muito
excepcionais, quando o nível de espanto era elevado). Estranho que esse
crescimento se dê num cenário em que todos deveriam fazer “sacrifícios”. A
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alta taxa de juros, sempre elogiada pelos capitalistas financeiros
preguiçosos, tem sido posta como importante remédio para combatermos a
inflação e atrair dinheiro, especialmente dos “investidores estrangeiros”,
para custear o “projeto brasileiro”. No entanto, quanto maior o juro, maior o
rendimento com os títulos da dívida pública. Na Argentina, os fundos
investidores em papeis da dívida foram chamados recentemente de “fundos
abutres”. Porquê será?
Essa captura do Estado pelo sistema capitalista financeiro tem
comprometido mais de 40% do orçamento da União com os juros,
amortização e renegociação da dívida pública. Ainda que se reconheça
como importantes avanços dos últimos anos o fato da “desdolarização” da
dívida pública (isso significa maior governabilidade do Estado sobre a dívida,
administrando-a a partir da taxa de juros interna-Selic e dependendo menos
da variação externa do câmbio), e a sua diminuição se comparada com o PIB,
esse império financeiro é inaceitável. É público e notório que o montante de
mais de 40% do orçamento da União, destinado a “rapinagem”, impede um
projeto de desenvolvimento que tenha como princípio a justiça social.
Dados do orçamento federal, executado em 2014, dão conta de que
gastamos 45,11% com juros e amortização da dívida pública. Esse
percentual representa 978 bilhões de reais, quase um trilhão. Significa 11
vezes mais do que foi gasto com saúde. Um aumento também em relação a
2013, quando gastamos 40,30% com a dívida pública.
Meeeeeeeeeeeeeeeeeeeu Jesus!
Mas os capitalistas não se contentam somente com os títulos da
dívida por aqui. Interessa a eles, sobremaneira, outras “áreas férteis” na
produção de dólares. O petróleo é o mais cobiçado. Afinal, se em nossa
“terra tem palmeiras, onde canta o sabiá”, tem também o óleo do pré-sal,
que às petrolíferas privadas interessará! Estimativas indicam que as reservas
do pré-sal seriam algo em torno de 70 a 80 bilhões de barris. Isso representa
algo em torno de 9 trilhões de dólares. Traduzindo para a nossa moeda, nada
menos que 22 trilhões de reais. Isso é dinheiro que pertence ao povo. Pediria
novamente a ajuda aos conselheiros bons em cálculo: se fôssemos dividir
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22 trilhões de reais por 200 milhões de brasileiros, quanto daria para cada
um? Prevendo essa quantidade de barris, o governo brasileiro criou um
novo marco regulatório da exploração do petróleo no Brasil. A mudança de
legislação data de 2010, quando era presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e
estabelece o “regime de partilha” para o petróleo do pré-sal. Com ele, a
propriedade é exclusiva do Estado e as empresas, quando exploram,
recebem pelos custos da exploração e mais uma parcela do lucro sobre o
campo (tecnicamente são chamados de “custo em óleo” e “óleo
excedente”). Essa lei abriu caminho para que fosse aprovada em 2013, já no
governo da presidenta Dilma Rousseff, a lei que destina 75% dos royalties do
petróleo e 50% do Fundo Social do Pré-sal para a educação, e 25% para a
saúde. Não é demais lembrar que este modelo é bem diferente daquele
criado em 1995, quando o presidente era Fernando Henrique Cardoso, que
permitiu às concessionárias exploradoras dos campos (grandes empresas
privadas multinacionais) a posse do petróleo extraído por elas no que era
chamado de “regime de concessão”. Ele propiciou às empresas o domínio
sobre o “ouro negro” que, por direito constitucional pertence igualmente a
todos os brasileiros. Durante a vigência do mesmo as empresas pagavam
somente um quantitativo x ao Estado, mas não partilhavam o produto
extraído. Na média, um valor baixíssimo diante da quantidade de barris que
exploram.
Esse novo marco legal foi criticado por uns, elogiado por outros e
atacado odiosamente por terceiros. Os primeiros argumentaram que a nova
lei era um avanço, mas que as empresas privadas ainda teriam muito lucro
com o “regime de partilha”. Os segundos reconheceram que o novo marco
legal significava o acordo “possível” à época para que o monopólio do pré-
sal voltasse ao Estado, mesmo que esse dependesse de empresas para a sua
exploração. Ambos, porém, partem do mesmo princípio, a dizer, de que o
petróleo, que é uma das maiores riquezas brasileiras, pertence ao povo e
não à iniciativa privada (alguns poucos capitalistas). Os que pertencem ao
terceiro grupo, coordenados por fortes grupos econômicos, aliados às
empresas petrolíferas estrangeiras e aos meios de comunicação no Brasil (a
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Rede Globo é a principal), reagiram com extrema violência à lei de 2010.
Para fazê-lo, requentaram velhos argumentos, através dos quais parece
terem convencido parcela grande da população. Venderam a “verdade”
mentirosa de que o estado brasileiro estaria afugentando os investimentos
das empresas petrolíferas do Brasil, e estando ele (o Estado) descapitalizado
para tal empreitada, não sobraria outra consequência à falência do modelo
adotado. Essa posição foi fortemente corroborada em 2014, por outro
princípio liberal capitalista já citado acima, o de que o Estado não funciona e
é corrupto por natureza. A prova estaria na “Operação Lava Jato” da polícia
federal, que revelou sérios problemas de corrupção na Petrobrás. Uma das
principais vozes desse grupo, Reinaldo Azevedo, da Revista Veja, chegou a
sentenciar no final de janeiro de 2015: “Dilma só tem uma saída honrada e
honrosa: anunciar a privatização da Petrobras depois da desratização. Mas
não fará isso, é claro! Enterrará a estatal e o país”.
Reinaldo Azevedo sintetiza qual é o real objetivo de um pequeno
grupo de capitalistas bilionários nacionais e internacionais: privatizar uma
das nossas maiores riquezas. Veja, com essa fala de Reinaldo Azevedo, que
nada mais é que a expressão dos capitalistas reacionários, preguiçosos e
“assistencialistas” em terra brasileiras, não se põe como objetivo acabar
com a corrupção, bandeira histórica dos defensores do SUS no Brasil. Usa
desse argumento, como em outros momentos da história, somente para
buscar privatizar o que é do povo. Isso sim é corrupção! Se quisessem acabar
com a corrupção, os grandes meios de comunicação estariam dando a
mesma ênfase a escândalos de corrupção ainda maiores, descobertos
recentemente. Falamos aqui do caso “HSBC” e “Operação Zelotes”. No caso
do HSBC, estima-se que 8.667 correntistas brasileiros, diga-se de passagem,
muito ricos, tinham escondido (oficialmente fala-se depositado) na filial
suíça do HSBC em 2006 e 2007, mais de 20 bilhões de reais. Tudo isso para
não pagar imposto. Esse grupo de mais de seis mil brasileiros, que reclama
dos altos impostos no país, sonegou um montante quase igual ao orçamento
previsto para o Bolsa Família em 2015, e que atende mais de 14 milhões de
famílias.Com a operação Zelotes, descobriu-se que grandes empresas brasi -
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leiras, incluídas aí empresas de comunicação, as mesmas que ecoam os
males da corrupção do Estado brasileiro, subornaram e compraram
conselheiros do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), ligado
ao Ministério da Fazenda. Estas empresas, para não pagarem as dívidas
aplicadas pela Receita Federal, pagavam propina para que os conselheiros
(muitos indicados pelas próprias empresas) interviessem no sentido de
anular ou diminuir essas multas ao máximo. Minha avó chamava essa
prática de roubo. Nessa “brincadeira”, estima-se que foi sonegado um
montante superior a 19 bilhões de reais. Num comparativo rápido, três
vezes mais do que consumiu supostamente a corrupção na Petrobrás (6
bilhões). O Banco Santander é acusado de anular débitos que superam 3
bilhões de reais (o fato indignou a sogra de um primo meu, fazendo com que
tirasse todo o dinheiro depositado nessa instituição). O Grupo Gerdau,
segundo as investigações, é acusado de anular 1,2 bilhão em dívidas.
Recentemente ouvi um discurso do presidente do Conselho do Grupo
Gerdau que dizia: “existem diversas maneiras de transformar nosso mundo
num lugar melhor para se viver. Não existe nenhuma receita mágica ou
fórmula secreta”. Numa democracia é preciso dar o direito de inocência a
todos os cidadãos até que se prove o contrário. Mas, se as denúncias sobre o
CARF se confirmarem, existem sim fórmulas secretas que tornam o mundo
dos ricos um lugar “melhor” de se viver.
Porque a grande mídia não toca nos casos HSBC e Operação Zelotes,
que implicam valores próximos a 40 bilhões de reais? Atenção: 40 bilhões é
quase a metade do investimento anual em saúde por parte da União! A
hipótese é simples: não querem acabar com a corrupção no Brasil, até
porque, são elas próprias, enquanto grandes empresas capitalistas, as
envolvidas nos maiores escândalos de corrupção no país. O Grupo de
comunicação RBS, afiliado da Rede Globo no Sul do país, é suspeito de pagar
15 milhões de reais em propina para se livrar de um débito fiscal de 150
milhões no CARF. Portanto, repito: quando falam diuturnamente da
corrupção na Petrobrás é para privatizá-la, nada mais! Aliás, estes grandes
grupos de comunicação sabem muito bem que a corrupção está na alma
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do capitalismo, e em sendo elas próprias grandes empresas, ou seu
negócio dependendo do apoio publicitário das empresas capitalistas, a
corrupção não lhe é estranha. Ignácio Rangel já dizia: “A corrupção é o
creme do capitalismo. Não se desesperem, isso é sinal de que o
capitalismo está se expandindo”.
O tema da concentração dos meios de comunicação no Brasil
mereceria uma atenção muito maior do que atualmente a sociedade e
conselheiros de saúde lhe atribuem. Não é aceitável que somente a opinião
de dez famílias brasileiras, que controlam os grandes meios de
comunicação, entrem em praticamente todos os lares brasileiros, todos os
dias. Se o fato por si só já viola a legislação que proíbe a concentração no
país, isso se agrava ainda mais quando levado em conta o tratamento dado
por eles às políticas públicas. Quem milita no campo da saúde pública sabe o
que é conviver diariamente com noticiários tendenciosos que se destinam a
desconstruir uma das maiores conquistas do povo brasileiro que é o SUS. O
que se pretende não são críticas construtivas, sempre muito salutares para
avançarmos no sistema. Em muitos dos casos, a mensagem subliminar que é
passada é: “o SUS não funciona e nunca vai funcionar. Tenha um plano
privado de saúde.” Portanto, a grande imprensa, quando se comporta assim,
faz mal à saúde pública, ao interesse público. Ao se comportar assim, não
informa, mas, interessadamente, desinforma. A grande imprensa brasileira,
pela sua parcialidade, tende a imbecilizar as pessoas e tirar-lhes o senso
crítico. Ela produz o que Vandana Shiva, uma grande filósofa feminista
indiana chamava de “monocultura da mente”. Da mesma forma como a
monocultura agrícola faz mal à saúde, pois expulsa a biodiversidade, a
monocultura da mente acaba com a diversidade dos olhares sobre o mundo.
Da mesma forma como os responsáveis pela monocultura agrícola tendem
ao esconderijo (é assim que interpreto o PL 4148/2008, aprovada pela
Câmara dos Deputados no dia 28 de abril de 2015, que dispensa as
indústrias de informarem no rótulo a origem transgênica) os responsáveis
da monocultura da mente escondem que são ou estão a serviço de grupos
sociais do “andar de cima”. Da mesma forma como as monoculturas agríco-
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las tendem a intoxicar o meio ambiente, pela alta carga de agrotóxicos (e
não defensivos, como querem nos fazer crer), a monocultura da mente
intoxica as nossas relações sociais. Essa poluição tem contribuído para criar
e disseminar o ódio das pessoas à política, às instituições (partidos, por
exemplo), aos políticos, às políticas públicas centradas na efetivação de
direitos. Outro dia, um ex-ministro da saúde, foi hostilizado publicamente
num restaurante em São Paulo, em virtude de ter sido o responsável por
implementar o programa “Mais Médicos”. Meeeu Jesus! Onde está o
“crime” de uma política pública que tende a ampliar o acesso de milhões de
pessoas a um médico e que é aprovada por mais de 80% dos usuários?
Críticas são sempre bem vindas e não podemos nos furtar delas em
qualquer circunstância; no entanto, a forma como foi feita (um momento
privado do ex-ministro) é completamente condenável, da mesma forma
como o seu conteúdo, que amplia a desinformação e prejudica o avanço do
SUS. Atitudes como estas tendem a ser colhidas num “solo odioso”.
A fala do cidadão no restaurante provoca desinformação e
despolitização por diversos temas citados. Interessa-nos tão somente a
parte do discurso em que cita o tema dos impostos. Atenção conselheiros:
este tema deve nos interessar! Tem se tornado normal no Brasil a repetição
de um discurso plantado pelas grandes elites capitalistas, que todos nós
brasileiros e brasileiras pagamos muito imposto. É repetido aos quatro
ventos que esse é um dos maiores males do país, ao ponto do pagamento do
imposto se tornar uma ação otária – são instalados “impostômetros” nas
praças. E a quem é responsável por cobrá-lo, no caso o Estado, imputem-lhe
o sinônimo de ladrão. Esse tema, de tanto circular na grande imprensa, tem
ganhado as nossas mentes (monoculturadas), nossos corações e ido para as
ruas: “sonegar é legítima defesa”, dizia um cartaz em uma das mobilizações a
poucos meses – ainda bem que já estão sendo instalados “sonegômetros”.
Esse discurso é perigoso para os nossos direitos, para a saúde, por dois
motivos: primeiro, não existe política pública universal de qualidade em
nenhum lugar do mundo, e não terá em Marte quando formos prá lá, sem
uma cobrança equivalente de impostos; segundo, não é verdade que todos
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os brasileiros pagam muito imposto. Quem paga muito imposto no Brasil é o
povo assalariado, que ganha menos, que é a maioria da população.
Vamos aos dados que mostram esse “festival de injustiças
tributárias”, geralmente escondido pela grande mídia no Brasil. Os que
recebem até dois salários mínimos contribuem com 54% da sua renda para o
pagamento de tributos. Os que recebem acima de trinta salários mínimos,
com 29%. Além disso, não podemos esquecer que ainda somos um país
machista e racista. Dados recentes mostram que a população mais pobre é
formada por 68,06% de negros e 31,94% de brancos. Destes, 45,66% são
homens e 54,34% de mulheres. Do outro lado da pirâmide, a população mais
rica é formada por 83,72% de brancos e 16,28% de negros. Destes, 62,05%
são homens e 31,05% mulheres. Logo, como concluiu um importante estudo
do INESC, se os mais pobres pagam mais imposto, proporcional à sua renda,
negros e mulheres são os mais penalizados. De novo!
Isso acontece principalmente porque nossa carga tributária é
chamada de “regressiva”, fazendo com que uma quantia grande do imposto
recaia sobre os bens e serviços consumidos pela maioria dos brasileiros.
Estima-se que quase a metade da carga tributária venha do Imposto sobre a
Circulação de Mercadorias e Serviços ICMS) e Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI). Uma injustiça flagrante, que só aumenta quando
consideramos que quem ganha um salário mínimo no Brasil e o Jorge Paulo
Lemann (maior bilionário brasileiro, dono da Ambev e que reiteradamente
reclama que paga muito imposto) pagam o mesmo percentual de imposto
quando abastecem os seus respectivos veículos automotores ou compram
um kg de feijão. Mas isso ainda não é tudo! Me contou um amigo de uma
vizinha, que vige no Brasil uma normativa que isenta de Imposto sobre a
Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) as embarcações de luxo como
lanchas, jatos particulares, jet skis e helicópteros. Eu não acreditei! Afinal,
como acreditar que um jogador de futebol muito rico no Brasil aliás, muitos
jogadores e ex-jogadores muito ricos no Brasil costumam reclamar e ir para a
rua contra os altos impostos) não tenha pago IPVA sobre a sua luxuosa
lancha de mais de 15 milhões de reais que exibiu recentemente, enquanto o
19
irmão da minha vó, que é assalariado, tenha pago o respectivo imposto
sobre o seu carrinho popular? Mesmo não acreditando muito nesse amigo
da minha vizinha, seria interessante que os conselheiros de saúde
checassem se essa informação é verdadeira ou não (esse amigo da minha
vizinha tem umas “sacadas” impressionantes: há alguns meses, da sacada
do seu apartamento, zombava de um artista muito famoso que marchava
contra a corrupção trajando uma camiseta da CBF).
É por essas e outras que ricos do Brasil, que muito reclamam, pagam
muito pouco imposto por aqui. O percentual sobre o patrimônio é pífio, de
modo que a sua contribuição para o bolo final da arrecadação alcança
míseros 3,5%. Nos Estados Unidos é acima dos 12%. Outro dado que ajuda a
perceber a injustiça tributária no Brasil é a taxação do capital. Se na França é
de 38,5%, no Canadá 31%, na Alemanha 26,4%, nos EUA 21,2% e na Turquia
17,5% (pelo que me consta, nenhum destes países é socialista ou
comunista), no Brasil é 0,00%. Meeeeeu Jesus! Como não pautar na
conferência municipal, estadual ou nacional o imposto sobre as grandes
fortunas (IGF), previsto na Constituição? Alguns dados indicam que, taxando
em 1% os endinheirados que têm um quantitativo acima de um milhão,
teríamos em torno de 100 bilhões por ano. Nada seria mais justo, afinal,
como lembra bem Rawls (que é um liberal americano e não um comunista
cubano) a tributação deve ser um mecanismo de realização dos direitos e da
igualdade numa sociedade e não de manutenção de privilégios ou
acirramento da desigualdade social.
É por isso que “me dá nos nervos” (lembrando da minha avó) quando
ouço por aí, nas conferências e conselhos de saúde pelo Brasil, ou nas rodas
de chimarrão no meu querido RS, que o Brasil ou os brasileiros pagam muito
imposto. Esse discurso é uma cilada e um grande gol contra o SUS e os nossos
direitos. Se dermos eco a ele, vamos embarcar na agenda atual dos grandes
capitalistas que querem pagar ainda menos do que já pagam atualmente no
Brasil e fortalecer o discurso da “sonegação legítima”. Nossa tese deve ser
outra: os pobres, negros, mulheres, assalariados, etc, pagam muito imposto
e os ricos pagam pouco. Logo, a agenda será diminuir a carga ao primeiro
20
grupo e aumentar para o segundo. Seria lindo um auditório de conferência
de saúde tomado por faixas e cartazes com os dizeres: “IGF já” ou “os
militantes do SUS advertem: a taxação do capital financeiro faz bem à saúde
pública”.
Mas a fome dos capitalistas não pára por aí. Cada vez mais
esfomeados, andam ampliando seus negócios para áreas como a saúde a um
ritmo cada vez mais acelerado. Se atentarmos para as cifras da indústria
farmacêutica mundial, veremos que, em 2008, faturou mais de 500 bilhões
de dólares. Em 2011 o lucro passou para mais de 700 bilhões de dólares. E as
cifras não param de crescer. O Brasil figura como um dos grandes
consumidores de remédios. No primeiro trimestre de 2015, de acordo com a
própria Interfarma, as vendas de medicamentos no varejo no Brasil
aumentaram 12%, superando os 10 bilhões de reais. Confirmo isso na cidade
onde moro, dado que os vendedores de remédios abrem uma farmácia nova
a cada semana. Como a saúde agradeceria se fossem padarias ou livrarias!
Mas não, nossas ruas estão cada vez mais habitadas por farmácias.
Outro dia uma conselheira muito atenta, participando de um curso
de formação, me indagou: sonhei que ficarei bilionária; se isso se confirmar,
e eu te contratar como assessor de investimentos, qual seria a sua sugestão
para esse dinheiro ser rentável hoje e no futuro? Sem pestanejar, retruquei:
compre um banco ou um laboratório farmacêutico! Se a opção fosse o
laboratório, acrescentei que deveria ter um grande gasto em marketing (em
média os laboratórios gastam o dobro em marketing do que em pesquisa) e
um bom discurso humanitário, até para justificar as isenções tributárias. No
entanto, alertei de que não deveria se voltar para os problemas de saúde dos
mais pobres, especialmente países africanos. Isso rende pouco. O ano era
2014 e a minha resposta foi corroborada pelo alerta dado pela diretora-geral
da Organização Mundial da Saúde (OMS), Margareth Chan, que naquele ano
criticou duramente a indústria farmacêutica em função do terrível surto de
ebola em países paupérrimos da África. Enquanto o número de mortes por
causa do ebola se aproximava dos 5 mil, ela alertava: "historicamente o
ebola foi confinado a países africanos mais pobres. O incentivo de pesquisa e
21
desenvolvimento é praticamente inexistente. Uma indústria com fins
lucrativos não investe em produtos para mercados que não podem pagar”.
Se a indústria biomédica atual retorna altas fatias de lucro e promete
ser ainda mais promissora no futuro próximo, ela tende a deslegitimar o
discurso dos direitos sociais e da construção de Sistemas Universais de
Saúde como o SUS no Brasil. Mesmo que ela se utilize do preceito
constitucional da universalidade da saúde quando lhe convém, como no
caso da judicialização criminosa de tratamentos e medicamentos (e com isso
não afirmo que a judicialização da saúde seja um problema em si, até porque
direitos exigem um sistema judiciário autônomo e atuante. Mas, o que está
em questão aqui é a utilização do sistema judiciário como instrumento de
lucratividade irresponsável, como mostrado há pouco tempo na imprensa
brasileira). Para quem faz da saúde um negócio lucrativo, interessa que o
SUS no Brasil não funcione. Quanto mais gente na fila, melhor; para isso,
quanto maior o sub-financiamento, melhor. Aqui vale o ditado popular
“quanto pior, melhor!”. Em muitos casos, esse sofrimento humano rende
boas manchetes nos veículos de comunicação, não como crítica para
melhorar o sistema, o que seria muito importante, mas para disseminar
junto à população uma cultura liberal individualista de que os sistemas
públicos universais, que partem do pressuposto dos direitos humanos, são
inviáveis. No entanto, o SUS, muito embora tenha problemas que precisam
ser enfrentados com urgência, tem qualidades inestimáveis e a opção
acertada da sociedade brasileira por um sistema universal de saúde na
década de 1980 já faz dele um dos seus maiores patrimônios. Mas essas
qualidades tendem a ser escondidas pela imprensa e muitos prestadores e
profissionais. Acompanho, por exemplo, muitas campanhas de doação de
órgãos, e que são importantes para a ampliação dos transplantes. Mas
poucas divulgam o fato de que a maior parte dos transplantes é feita pelo
SUS. Vejo pouco sobre o eficiente sistema de vacinação brasileiro. Quase
nada sobre o papel da vigilância do SUS. Pouco sobre o Serviço de
Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) como parte integrante do SUS. A
respeito, outro dia um conselheiro de saúde sugeriu, numa conferência
22
municipal de saúde, que o SUS deveria ter um serviço de atendimento móvel
de urgência como o SAMU. Sua proposta era justificada diante do rápido
atendimento prestado pelo SAMU à família, funcionários e os próprios
apresentadores de televisão muito ricos do Brasil, que caíram de avião. Essas
qualidades do SUS são deixadas no anonimato. Esta dupla estratégia, de
ataque ao SUS e esconder as suas ações induzem as pessoas a terem um
plano privado de saúde. Nunca é demais lembrar que o lucro dos planos
de saúde em 2013 foi de 111 bilhões de reais. Meeeeeu Jesus! Se
comparado ao lucro no período de 2003 a 2011, o crescimento foi
próximo a 200%.
A estratégia de deslegitimar e desconstruir o SUS não é de hoje. Ela
vem desde o momento que o aprovamos a “duras penas” na Constituição.
Desde o início, o formato da relação público-privado que adotamos na
Constituição em 1988 tem se mostrado contraditório ao direito à saúde. No
entanto, o que ocorre de novo nesse momento no Brasil é o tamanho da
ofensiva que está sendo levada a cabo por certos setores e forças políticas
para desconstruir o SUS e outras conquistas que têm tudo a ver com a
seguridade social e a saúde. É assustador a quantidade de projetos de lei que
estão entrando na pauta do Congresso Nacional e que violam direitos.
Capitaneado pelo seu presidente Eduardo Cunha, a Câmara Federal não tem
medido esforços nesse sentido. Ainda em abril, cumprindo sua promessa de
campanha para a presidência da Câmara, Eduardo Cunha pôs a votação, e
aprovou, o Projeto de Lei-PL 4330. Esse projeto permite que os
trabalhadores da atividade-fim de uma empresa não sejam mais
contratados diretamente por ela, mas por uma empresa terceirizada que
terá como finalidade o lucro. O tamanho do prejuízo ao trabalhador já pode
ser calculado pelos dados disponíveis: o trabalhador terceirizado ganha
27,1% a menos do que o contratado diretamente. A cada 10 acidentes de
trabalho, 8 acontecem com o terceirizado. De cada 5 mortes no trabalho, 4
ocorrem com os trabalhadores terceirizados. Por isso, diferente do que os
230 deputados defendem, que votaram sim ao projeto, essa proposta não
visa regulamentar os hoje 12 milhões terceirizados da atividade-meio, mas,
23
bilizar os direitos de 33 milhões de contratados diretamente. Pergunto a
você conselheiro: esse projeto tem alguma relação com o tema da saúde?
Seria o caso de termos uma faixa nas Conferências de Saúde com os dizeres:
“a terceirização dos direitos dos trabalhadores faz mal a saúde”!
O segundo projeto que anda a uma velocidade nunca antes vista, é o
que reduz a maioridade penal. Há poucos dias foi aprovada, após uma
manobra autoritária de Eduardo Cunha, em primeiro turno no plenário da
Câmara, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reduz a maioridade
penal de 18 para 16 anos para crimes hediondos, homicídio doloso e lesão
corporal seguida de morte. A aprovação desta matéria preocupa por demais
os conselheiros de saúde, especialmente os jovens, que conhecem o
lastimável sistema carcerário brasileiro e sabem que quem lá está são
majoritariamente negros e pobres. Sabem também, que esse projeto é
péssimo para esses jovens e a sociedade em geral se atentarmos para os
altos índices de transmissão da AIDS dentro dos presídios brasileiros. A taxa
de infecção é 60 vezes superior à taxa na população total do país. Portanto,
as chances de infectação por AIDS da juventude brasileira aumentarão
consideravelmente. No calor dos debates, houve deputado citando a pena
de morte indonesiana como modelo eficiente de redução dos crimes
envolvendo o tráfico de drogas. Insinuava ele o quê: algum projeto logo aí na
frente de pena de morte aqui no Brasil? Reitero: essa aprovação tem alguma
relação com a saúde? Alguma sugestão de faixa aqui?
Mas a “onda reacionária” solta por aí, tem também uma proposta
que pode decretar o fim do SUS como sistema universal de saúde no Brasil. É
meus amigos conselheiros, é nesse estágio que nos encontramos. A PEC n.
451/2014, se aprovada, obrigará as empresas com mais de 30 trabalhadores
a pagarem plano de saúde privados a todos os empregados. Eduardo e sua
turma, comprometidos com os planos privados de saúde, tem como único
objetivo fortalecer a saúde privada e destruir nosso SUS. E tem conselheiro
que está achando que essa proposta será um avanço ao país. Outros
conselheiros não estão preocupados com a proposta. A todos digo: vigiai!
Afinal, a onda contra os direitos se fortaleceu nos últimos tempos e os
24
financiadores das campanhas estão “cobrando a conta”. Já foi demonstrado
que Eduardo Cunha foi um dos maiores recebedores de recursos de
empresas privadas de saúde no último pleito eleitoral. Estas empresas
distribuíram 52 milhões de reais para 131 candidaturas, de 23 partidos
políticos. Cunha recebeu só da Saúde Bradesco 250 mil reais. É por isso que
propôs uma Emenda a Constituição em 2014, que anistiava as multas dos
planos de saúde em 2 bilhões de reais. Ainda bem que ela foi rejeitada pela
Presidenta da República. Na mesma perspectiva, engavetou a CPI contra os
planos de saúde quando assumiu a presidência. Será por isso que em maio
último a Câmara aprovou o financiamento privado de campanha? Está
provado que a conta cobrada pelas empresas, quando financiam
candidaturas, é alta, o que justificaria mais dois cartazes ao fundo dos
auditórios das nossas conferências: “o financiamento privado de
campanhas faz mal a saúde”; “queremos uma reforma política de verdade”!
O que está em jogo, com o projeto de obrigatoriedade das empresas
pagarem planos de saúde, é o direito à saúde dos brasileiros. Isso vai
desobrigar o Estado a fortalecer e qualificar o SUS para todos. Por outro lado,
será a oportunidade de ouro dos planos privados de saúde de expandirem os
seus negócios no Brasil. Será também a oportunidade ímpar, dentre outras
já existentes, para as empresas e o capital estrangeiro atuarem na
assistência à saúde no Brasil, visto que agora, por conta da Lei n.
13.097/2015, esse investimento lhe foi permitido. Essa Lei, que altera a
redação do art. 23 da Lei n. 8080, foi incluída pelo Congresso Nacional,
quando da apreciação da MP n. 656, e sancionada pela Presidenta da
República em janeiro de 2015.
Num contexto biopolítico, em que os corpos e mentes se traduzem
cada vez mais em “mercadoria estratégica” para investimentos do capital, é
de extrema importância reafirmarmos a supremacia do direito à saúde
como mecanismo de enfrentamento da exploração contemporânea. É desta
constatação e princípio que decorre a defesa intransigente do SUS como
sistema universal e gratuito. Defender com “unhas e dentes” a continuidade
do SUS no processo da 15ª Conferência Nacional da Saúde no Brasil não
25
significa ignorar os mais diferentes problemas e limites que carrega consigo.
Significa, acima de tudo, manter aceso um projeto civilizacional e de país que
respeite e promova a dignidade humana. Defender o SUS significa ter como
horizonte uma saúde pública de qualidade para cuidar bem das pessoas, um
direito inalienável do povo brasileiro! Defender o SUS significa contribuir na
luta para que a proteção social se afirme cada vez mais como direito humano
em nosso país. É manter erguida a bandeira de William Beveridge (Obs: ele
não era comunista, bolivariano, etc! Conhecer ou retomar as suas reflexões
seria uma tarefa muito importante para os defensores dos sistemas
universais de saúde e seguridade social), que acreditava ser tarefa de todo
governo a luta contra a escassez, a doença, a ignorância, a miséria e a
ociosidade. Beveridge nunca propôs a ruptura do regime econômico
capitalista, de modo inclusive que a sua proposta tornou-se uma alternativa
para continuá-lo. No entanto, num momento em que o capitalismo ataca os
direitos humanos e a democracia como poucas vezes se viu, defender o
Estado de bem-estar social pode significar uma ação “revolucionária”.
Se essas provocações fazem algum sentido, talvez o desafio maior da
15ª Conferência Nacional da Saúde seja defender a continuidade da
UNIVERSALIDADE E GRATUIDADE do SUS. De novo: isso não significa dizer
que ele não precise de avanços estruturais. No entanto, o que está em
questão com os ataques que vem sofrendo nos dias atuais é o seu “objetivo
fundacional”, sem o qual, perderá sua identidade.
A amplitude desse desafio nos remete ao espírito da 8ª Conferência
Nacional da Saúde (1986). Naquela oportunidade, os delegados estavam
menos preocupados em aprovar mil propostas e talvez mais centrados num
propósito político mais amplo que o país demandava naquele período. Seus
delegados também não tinham tanta preocupação que os termos da sua
proposta, ou que o seu Município ou o seu Estado fossem contemplados e
citados na redação do relatório final. Mais do que apenas participar da Etapa
Nacional tinham um compromisso enorme de multiplicar as discussões em
pequenas reuniões na esfera local, nas quais eram envolvidas uma
multiplicidade sem fim de entidades, grupos, organizações e movimentos.
26
Esse processo foi criando um envolvimento social e um “acúmulo político”
necessário para que fosse possível a aprovação do SUS na 8ª Conferência
Nacional da Saúde e, alguns anos depois, na Constituição de 1988.
O espírito da 8ª Conferência Nacional de Saúde pode exigir de nós
conselheiros, lideranças sociais, movimentos e entidades sociais, a
“reinvenção político-metodológica” das Conferências. Nesta direção, a
realização das conferências livres propostas pelo Conselho Nacional de
Saúde é bem vinda como contributo à mobilização nas diferentes etapas.
Para além delas, outras propostas poderiam ser muito oportunas no
processo da 15ª, a exemplo de uma “marcha em defesa do SUS”, de uma
visita pessoal aos senadores e deputados, de audiências com o poder
judiciário, etc. Talvez devamos “recuperar” com mais força a mobilização e
a pressão social na defesa do SUS e da Seguridade Social, do direito
humano à saúde.
Apontar um desafio central para a 15ª Conferência pode soar
estranho ou até anti-democrático para um período em que já aprendemos
que não existem temas e assuntos permitidos ou proibidos, lutas e
sujeitos mais importantes que outros. Uma democracia viva se faz fazendo
e deve ser capaz de contemplar a diversidade no seu mais amplo sentido.
Mas também é possível que essa rica “teia social” brasileira construa
diálogos e pontes no sentido de reconhecer agendas comuns e urgentes
nesse momento histórico.
Portanto, CONSELHEIROS DE SAÚDE DO BRASIL, UNI-VOS! PELO
SUS! PELO DIREITO HUMANO À SAÚDE!
27
OS ESPAÇOS DE CONTROLE SOCIAL COMO POSSIBILIDADE DE
FORMAÇÃO E O PAPEL ESTRATÉGICO DA EDUCAÇÃO PERMANENTE
³ Médica sanitarista, mestre em Saúde Coletiva pela UFRGS, membro da Comissão de Educação
Permanente e Assessora Técnica do CMS/POA.
28
que dialoga diretamente com o da educação: formação profissional em
saúde alinhada às exigências que a mudança no modelo tecnoassistencial
vigente desde a instituição do SUS impõe. Destaque-se que é um esforço a
ser enfrentado de forma intersetorial, fomentando mudanças curriculares
nos cursos de formação profissional tanto de nível universitário como
técnico, mas também de estruturas abertas e adequadas à formação e
desenvolvimento dos trabalhadores na rede SUS, que passa a ter também a
tarefa de se tornar uma rede-escola. O desafio intersetorial está configurado
no próprio princípio fundamental da Política proposta, onde a Educação
Permanente em Saúde é compreendida como a “aprendizagem no trabalho,
onde o aprender e ensinar se incorporam ao quotidiano das organizações
e ao trabalho” .
Em Porto Alegre a implantação dessa Política de Educação
Permanente vem sendo acompanhada de perto pelo Conselho Municipal de
Saúde e pode-se dizer que o exemplo de Porto Alegre tem sido considerado,
pelos órgãos federais que coordenam essa política, um bom exemplo de
ação integrada entre as Instituições de Ensino, a gestão local do SUS, o
conjunto dos serviços de saúde e o controle social municipal.
A participação do Conselho Municipal de Saúde, especialmente
através de sua rede descentralizada (Conselhos Distritais e Locais de Saúde),
tem conseguido sensibilizar, atuar e influir nas definições dos projetos de
extensão e formação desenvolvidos na rede de saúde, bem como o tema do
controle social passou a ser formalmente inserido nos currículos e debates
acadêmicos dos diversos cursos da área da saúde. Um exemplo concreto foi
a introdução de uma disciplina de 30 horas no plano de ensino da Residência
Integrada Multidisciplinar em Saúde da Criança desenvolvida no Hospital
Materno Infantil Presidente Vargas, em parceria com a UFRGS. Esta
disciplina é composta por aulas expositivas teóricas e incursões dos
residentes nas atividades e reuniões dos conselhos de saúde.
30
a necessidade de se investir nos Conselhos Locais de Saúde (CLS), somando-
se à Resolução do CNS nº 333 de novembro de 2003 (substituída pela Res
453/2012), que regulamenta os CLS e considera que “o processo bem-
sucedido de descentralização da saúde promoveu o surgimento de
Conselhos Regionais, Conselhos Locais, Conselhos Distritais de Saúde”.
Os CLS foram tomados como uma aposta para desburocratizar,
ampliar e renovar as possibilidades de relação com o usuário no campo da
saúde, como parte de um conjunto de iniciativas de democratização do
Estado e aprimoramento da gestão de políticas públicas. A Política Nacional
de Atenção Básica (PNAB), especificamente, incorpora a participação dos
usuários como um dos princípios fundamentais para a sua estruturação.
Acredita-se que a existência de fóruns participativos na atenção básica com
a presença de usuários, possibilita a qualificação dos serviços e a
permeabilidade destes às demandas e necessidades da comunidade.
Na cidade de Porto Alegre, paralelamente ao aumento dos
investimentos em atenção básica, a partir de 2010 nota-se a aposta na
ampliação e fortalecimento dos CLS nas Unidades Básicas de Saúde (UBS).
Os planos municipais de saúde de 2010/2013 e 2014/2017 citam os CLS
como necessários para a ampliação da gestão participativa, estabelecendo
meta e indicador, prevendo “constituir Conselhos Locais de Saúde,
Conselhos Gestores e Câmaras Técnicas em 50% dos serviços de saúde”.
Dessa forma, a Comissão de Educação Permanente do CMS/POA tem
se ocupado de implementar ações de educação permanente e
educação popular, por meio das experiências de participação
desenvolvidas em diversos territórios junto aos Conselhos Locais de
Saúde, que têm se mostrado espaços importantes para a mobilização e
articulação das comunidades.
31
Comissão de Educação Permanente, Espaços de Formação e o Movimento
em Defesa do SUS
32
O ano de 2016 foi especialmente marcado por protestos de direita e
de esquerda que polarizaram a sociedade brasileira em um processo que
culminou com o dramático impeachment da Presidenta Dilma Rousseff.
Além do impeachment, presenciamos com consternação fatos como a
aprovação da “PEC 55”, que compreendíamos como parte de uma
estratégia de governo que traria muitos prejuízos para a saúde, sobretudo
para aqueles que mais precisam do SUS. Na Comissão de Educação
Permanente, ao longo deste processo, intensificamos nossas discussões
sobre a necessidade de mobilização das comunidades e sobre a
importância de articularmos os diferentes movimentos e frentes de luta
da saúde em um movimento unificado que pudesse denunciar e
pressionar contra retrocessos no campo da saúde.
Assim, a partir de um espaço institucional de participação, que é o
CMS, chamamos uma reunião ampliada no dia 30 de maio de 2016, para a
qual convidamos todos os interessados em lutar pela saúde e pela
democracia. O auditório do CMS estava lotado, com representantes de
sindicatos, de movimentos sociais, ativistas, estudantes e trabalhadores da
saúde. A primeira ação que construímos foi um ato em defesa do SUS e
contra a aprovação daquela que concordávamos ser a “PEC da morte”. Com
recursos dos próprios participantes, imprimimos folders e um manifesto,
que foram elaborados coletivamente. O ato se deu no dia 02 de junho, com
oficina de cartazes pela manhã e concentração em frente ao Hospital de
Pronto Socorro no Largo Leopoldo Hertzl, às 15 horas. Durante o ato
distribuímos panfletos nas sinaleiras, conversamos com os transeuntes e, às
17 horas, partimos em marcha até a esquina democrática com faixas e
cartazes, sempre buscando conversar com a população sobre as
consequências da PEC para a saúde. Outros atos semelhantes foram
organizados em seguida, nas imediações do Hospital Conceição, da Santa
Casa e no terminal da Av. Bento Gonçalves.
Buscamos nos organizar para participar das marchas pelo Movimento
Fora Temer reunidos em um “bloco da saúde”, levando nossos “pirulitos” e
cartazes. Também organizamos diversos “abraços” aos serviços de saúde
33
(US Vila Floresta, CAPSi Harmonia, US Belém Velho, US Conceição,
Consultório na Rua GHC, Escola GHC, Geração POA, US Guarujá, US Jd
Leopoldina, PACS, SAMU, Hospital Sanatório Partenon, US Santa Tereza, US
Santo Alfredo, SRT Nova Vida, US Osmar Freitas, US Vila Cruzeiro, US Vila
Gaúcha, Hospital Conceição, SMS), fazendo eco a um movimento nacional
mais amplo – AbraSUS. Em roda, em diversos atos, nosso colega Brígido
Ribas leu o Manifesto: Declaração de Amor ao SUS, e muitos puderam se
manifestar sobre os acontecimentos políticos contra os quais estávamos
lutando, aportando suas experiências pessoais, trocando informações e
ideias para avançarmos.
Nestas ações, mesmo em tempos tão individualistas e reacionários,
é fantástico observarmos como o SUS ainda é capaz de gerar sentimentos de
pertencimento e união, que faz parte da identidade de muitos cidadãos, o
que nos motiva a seguir defendendo uma saúde pública de qualidade. É
emocionante fazer parte de um grupo que grita junto a plenos pulmões: viva
o SUS! A despeito das diferenças na conjuntura política de hoje, vemos que
problemas como os anseios privatistas, o subfinanciamento, o burocratismo
e o engessamento estatal que sempre foram pontos de tensão para o
aprimoramento do SUS, estão mais fortes que nunca e seguem
demandando enfrentamento político.
Em uma das assembleias do movimento estiveram presentes outras
iniciativas de agregação, como o Fórum Sanitarista Gaúcho, e pactuamos um
movimento de articulação chamado #ocupasusrs. Foram feitas camisetas do
#ocupasusrs, novas reuniões, discussões, debates e integrantes deste
coletivo realizaram uma peça de teatro e outras intervenções artísticas para
conscientizar e sensibilizar a população contra as ameaças aos direitos
sociais e os interesses políticos em disputa. O termo “ocupação” se renova
como estratégia de luta em um contexto no qual têm sido ocupadas escolas,
universidades e órgãos governamentais, dentre outros espaços
significativos para o interesse público.
Interessante ressaltarmos que a estratégia não é nova. No volume
anterior desta série, duas ocupações importantes estão citadas na luta pelo
34
SUS em Porto Alegre: a do Postão, em 1988; e a do Hospital Materno Infantil
Presidente Vargas, em 1991. Assim, as Ocupações, como estratégia de luta,
desde 1988, estão presentes na gramática política da luta pela saúde na
cidade. É interessante notarmos como o termo "invasão" já aparecia nas
reportagens da época, como forma de desqualificar estas formas de
protesto da população. O contraste entre ocupar/invadir tensiona os
sentidos acerca do que é público e do que é privado, no cerne da politica,
como forma de repensar a sociedade e como a construímos coletivamente.
"A alegria, garra e muita vibração”, ontem e hoje, são aspectos
existenciais e indentitários da participação e dos processos grupais
envolvidos. As pessoas se divertem, se empolgam e se emocionam, e isto
não é incompatível com a luta política. A luta política também é feita de
afetos, afetada, e é com estas festas que abrimos frestas na dureza do
cotidiano para enfrentar os retrocessos e buscar mudanças sociais e
institucionais. As renovadas formas de ocupação têm mostrado a
complexidade do fazer político, a importância de renovarmos nossas
estratégias de luta e enfrentarmos nossas contradições e as dificuldades
para articularmos nossas demandas e ideologias em movimentos menos
fragmentados, sem que percam o contato com a diversidade das formas de
viver e pensar que se produzem no cotidiano dos diferentes espaços sociais.
Neste sentido, uma ação conjunta importante em que estivemos
envolvidos foi a organização da Festa Junina do SUS, realizada no Largo
Glênio Peres, no dia 24 de junho de 2016, que contou com jogos bem
humorados e com teor político, como a pescaria e o “bocão” com fotos de
políticos envolvidos nos ataques aos direitos sociais. Rimos, dançamos,
brincamos e demos nosso recado no microfone, e aproveitamos para
distribuir materiais e conversar com quem passou por lá. A criatividade
política é o grande desafio! Seguimos, em tempos de vertiginosa
informação, com nossos cartazes, manifestos, passeatas, ocupações, pra
fazer valer leis e regras e para desafiá-las quando forem injustas. Fomos
criando junto, coletivamente e o espaço da Comissão de Educação
Permanente foi fundamental.
35
Descrevemos aqui apenas algumas das ações que foram realizadas
em 2016 e que trouxeram força e empolgação para não nos
desmobilizarmos e seguirmos acreditando em melhorias sociais. É claro que
este caminho esteve atravessado por dificuldades e por muitas derrotas:
teve golpe, teve PEC, Temer não caiu fora, etc. Entretanto, conhecemos o
percurso da luta pela saúde e sabemos das dificuldades para as construções
coletivas de longo prazo. São empreendimentos que requerem muito
trabalho e uma forte capacidade de organização para integrar amplos
setores da sociedade. O desafio é ainda maior no momento atual, marcado
pela crescente especialização e fragmentação dos processos de trabalho,
que afetam nossas identidades, proliferando mais as nossas diferenças do
que nossos espaços de igualdade, nossas comunidades, secundarizando o
que temos em comum.
Os tempos nos deixam perplexos, ainda mais quando nos damos
conta de que nossas mazelas são globais, como aprendemos com os
visitantes internacionais, sobretudo italianos, que vieram participar de
atividades da Comissão de Educação Permanente e dos Conselhos Locais de
Saúde. A globalidade da luta nos remete a nossa condição humana,
condição de sermos humanos em um mundo no qual as coisas parecem
ganhar autonomia. As tecnologias nos empoderam frente a realidade, mas
dificultam nossos projetos coletivos mais amplos.
Na Comissão de Educação Permanente queremos desconstruir o
discurso desencantado de que é um equívoco nos guiarmos por utopias, de
que não podemos sonhar, de que devemos nos conformar com as regras do
jogo e não questioná-las. Em outras palavras, queremos desconstruir a ideia
de que a política pode ser reduzida à gestão, como se o Estado fosse uma
empresa nos moldes capitalistas. Queremos defender a ideia de que alguns
valores, sobretudo a saúde, não são mercadorias.
Isto nos faz lembrar que a participação nos conselhos não é apenas
uma questão de fiscalizar e aprovar processos burocráticos, mas são
também espaços de construção, são lugares para organizar a população e
articular diferenças multiplicando afetos e construir ações coletivas que
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extrapolem estes espaços institucionais. As ações que construímos
pretendem fazer parte da formação cidadã, em escolas de democracia que,
em ato, assim como a Educação Permanente, se faz com os saberes de todas
as pessoas e comunidades envolvidas, sobretudo aquelas que
historicamente têm sua voz abafada e deturpada pelos meios de
comunicação.
Dar voz para as experiências que a mídia esconde e que atualmente
são deturpadas em seus conteúdos e práticas por um senso comum
reacionário que simplifica as demandas sociais e naturaliza as relações de
opressão. Por esta razão, essas vozes são fundamentais para a compreensão
do processo histórico que atravessa nossas instituições e construções
coletivas. Assim, na Comissão de Educação Permanente, estamos
retomando a noção de participação, não como elemento externo que irá
apenas avaliar e legitimar os fluxos burocráticos e as diretrizes
estabelecidas, mas sim, como construção coletiva inseparável das políticas
públicas e do exercício da cidadania.
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I MOSTRA DO CONTROLE SOCIAL DE PORTO ALEGRE -
EXPERIÊNCIAS EXITOSAS CONTADAS EM OFICINAS LITERÁRIAS
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No dia 9 de abril de 2016, por ocasião da comemoração do Dia
Mundial da Saúde, o CMS realizou, em parceria com a Secretaria Municipal de
Saúde, a I Mostra do Controle Social de Porto Alegre, evento que ocorreu no
Largo Glênio Peres durante todo o dia.
Para a Mostra foram inscritas
e apresentadas 10 ex-
periências exitosas que têm o
protagonismo dos espaços
descentralizados de controle
social – Conselhos Locais,
Conselhos Gestores e Conse-
lhos Distritais de Saúde. O
objetivo principal foi dar
visibilidade a esse “movi-
mento” que é coletivo, criativo, afirmativo e construtor de cidadania. Ao mesmo
tempo tinha o objetivo de difundir e divulgar para o público em geral a diretriz da
participação social como fundamento estruturador do Sistema Único de Saúde.
Esse evento foi avaliado como muito positivo pelo conjunto de pessoas
que dele participaram, e motivou, pelo seu conteúdo e significado, a inclusão
dessas experiências no capítulo central desse livro. Para o relato das
experiências foram organizadas oficinas literárias, cuja metodologia implicou a
produção da escrita pelos próprios envolvidos na experiência, a partir de suas
vivências e compreensão singular dos fatos. Contou-se, para o
desenvolvimento dessa metodologia, com grupo de pesquisadores e
apoiadores vinculados à Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
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Sobre a metodologia desenvolvida, dentro dos princípios que
fundamentam a educação popular, objetivou-se, primeiramente,
desconstruir a ideia de escrita como atributo intelectual formal, isto é,
afirmar a potencialidade criativa individual e coletiva, através de dinâmicas
lúdicas que ensejaram o brincar com as palavras e expressões, construindo
coletivamente textos que permitiam traduzir sentimentos, ideias,
conceitos. A partir dos exercícios lúdicos, se trabalhou com temas
norteadores para o relato, que tinham como propósito provocar a reflexão
sobre os objetivos, particularidades e resultados das experiências. Esse
momento foi primeiramente exercitado em grupos, onde se misturaram os
participantes de diferentes experiências, e onde se debateu apenas uma
delas, para a experimentação dos demais, permitindo que, num momento
posterior, cada grupo pudesse se debruçar sobre o seu próprio relato.
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As questões norteadoras trabalhadas nos grupos foram:
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GRUPOS DE PROMOÇÃO DE SAÚDE: UMA ESTRATÉGIA PARA O
FORTALECIMENTO DO CONTROLE SOCIAL
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AÇÃO DO CONSELHO LOCAL CHÁCARA DA FUMAÇA
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Associação de Moradores próxima à Unidade de Saúde. Pensando-se na
necessidade de maior tempo livre para os usuários, foi marcado um sábado
à tarde para a realização da atividade.
Chegado o dia, lá estavam presentes dois trabalhadores da US
Chácara da Fumaça, uma moradora já participante do Conselho Local e
outras cinco pessoas convidadas que se interessaram e vieram contribuir e
conhecer mais sobre o tema proposto. A experiência foi muito positiva.
Seguiram-se posteriormente outros encontros, nos quais os participantes,
em maior e menor número, mobilizaram diversos assuntos de seu interesse
como cidadãos, elucidaram dúvidas a respeito do papel dos conselheiros de
saúde e dos conselhos, trouxeram questionamentos sobre prevenção em
saúde, preocupações como a epidemia de dengue e com os mananciais de
água, até mesmo sobre o que se fazer diante da crescente onda de violência
no bairro. Foi a partir dessas discussões que se estabeleceu um dia de
caminhada na comunidade para que juntos, trabalhadores e usuários,
visitassem as casas e esclarecessem as pessoas da comunidade sobre a
importância dos cuidados de prevenção a criadouros de mosquitos.
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Tais encontros foram fundamentais para aproximarem mais as
pessoas junto ao tema da Saúde, para que pudessem inclusive constatar que
a saúde não é simplesmente a ausência de doenças, que envolve
circunstâncias e momentos pessoais e também das comunidades nas quais
estamos inseridos. Assim, apropriaram-se mais do papel do Controle Social
e tiveram, de saída, maior motivação para se fazerem presentes nas
reuniões do Conselho Local.
Aproveitando esse verdadeiro “despertar”, foi aberto o período
eleitoral de inscrição de chapas para o núcleo coordenador do Conselho
Local da US Chácara da Fumaça. Pela primeira vez em muito tempo, se não
realmente de forma inédita, tivemos a inscrição de duas chapas
concorrentes. O dia do pleito foi de muita festa junto à Unidade, sem haver
animosidade entre os candidatos. Ao final, a chapa vencedora fez de pronto
o convite para que os demais integrantes continuassem a participar das
reuniões e viessem contribuir com sua visão e motivação para mais
melhorias junto aos serviços da Unidade.
Pode-se constatar que a ação desenvolvida foi capaz de incrementar
maior participação num primeiro momento, principalmente por aproximar
trabalhadores e usuários fora da rotina de atendimento e por propor
discussões mais amplas abordando a saúde de forma indireta. A atividade
repercutiu na renovação do núcleo de coordenação do CLS e na troca do dia
e horário dos encontros.
Acreditamos que essa experiência é motivadora de novas ações
para esclarecimentos e mobilização de mais atores para o Controle
Social em Saúde.
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PARTICIPAÇÃO DA COMUNIDADE NA CONSTITUIÇÃO DO CLS NOSSA
SENHORA APARECIDA
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ATIVAÇÃO DO CONSELHO LOCAL DA UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE
MORRO SANTANA
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Desta forma então, foi feita a eleição do Conselho com uma enorme
participação da comunidade, e com isso foi reativado o Conselho Local. Para
reforçar a decisão da não transformação foi feito um abaixo assinado com
mais de mil assinaturas e a ata, que foi entregue ao Secretário na reunião do
Conselho Municipal da Saúde, na Faculdade de Economia da UFRGS. Muitas
polêmicas incentivaram as pessoas a participar.
Essa experiência foi possibilitada pela união e credibilidade de
melhorias na Saúde. A partir disso houve maior integração nas ações, entre
trabalhadores e comunidade. O Conselho Local teve papel fundamental em
ações como: Inauguração da sala do aconchego mãe e bebê, implantação do
acolhimento, informatização (prontuário eletrônico), semana do idoso,
semana da consciência negra, ações contra a dengue nas comunidades,
seminários, fóruns, oficinas, reconhecimento dos territórios, reuniões com
a Gerência Distrital de Saúde, reuniões com Secretário da Saúde
reivindicando as necessidades do Posto. Atualmente nos reunimos toda
última segunda feira do mês no posto (Conselho Local), fazemos também a
confraternização de final de ano.
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VILA GAÚCHA, UM BOM LUGAR
A poesia do cotidiano – o SUS que dá certo!
“Devemos persuadir-nos que hoje não basta o que bastava tempos atrás. Tempos novos,
novas realizações; novas chagas, novos remédios...”.
Scalabrini
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Participação Comunitária e o Controle Social:
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Apresentar esse trabalho é apresentar para nós, moradores e
trabalhadores, o SUS que dá certo, quando se constrói pelo coletivo. Outro
reconhecimento em 2016 foi a premiação com a experiência inovadora “Um
olhar ampliado à comunidade da Vila Gaúcha” na II Mostra da Atenção Básica
de Porto Alegre.
Essas conquistas são frutos de campo fértil que é a Vila Gaúcha,
campo de semeadura de sonhos, de lutas, de construção de um sistema cada
vez mais integral, humanizado e de qualidade na atenção e gestão em saúde,
com a garantia de um serviço capaz de acolher o outro, com a
responsabilidade de todos com as práticas adotadas, efetividade do projeto
técnico assistencial, afirmação da clínica ampliada para levar a vida com saúde.
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A PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA NA US SANTA TEREZA
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Reunião intersetorial no Conselho Local de Saúde
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ESTIGMA, PRECONCEITO E SUAS IMPLICAÇÕES
Conselho Distrital Humaitá/Navegantes/Ilhas
¹ Poema de Loreni Lucas, conselheira do CDS HNI, para mostrar e falar de toda a nossa região na
visão de uma usuária que as vezes precisa gritar e também ouvir...27/05/2016
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O Conselho Local Saúde Diretor Pestana (CLS Diretor Pestana) foi
convidado para um curso sobre HIV/AIDS e Controle Social por usuárias
pertencentes ao Movimento Nacional das Cidadãs Posithivas (MNCP) e à
Associação de Pessoas Vivendo com HIV/AIDS do RS (APVHA/RS), que
também participam deste CLS. O curso foi ministrado pelo Centro de
Educação e Assessoramento Popular (CEAP) em parceria com o MNCP,
APVHA/RS e o Fórum ONG/Aids do Rio Grande do Sul (FOAIDS).
A avaliação do referido curso se deu através da divisão de pequenos
grupos para realizar projeto de multiplicação das temáticas abordadas. A
escolha da oficina partiu do pressuposto que a descentralização do
atendimento das pessoas com HIV/Aids para Atenção Básica não foi
acompanhada de uma qualificação dos profissionais de saúde para um
acolhimento adequado, que levasse em conta a diversidade das pessoas,
gênero, raça/cor, classe econômica, profissão, a(as) vulnerabilidade(s) e a
individualidade do sujeito e, nesse sentido, a temática da oficina tem alta
relevância. E foi assim que Loreni Lucas, Silvia Aloia e Rosinea da Rosa
escolheram a realização de uma oficina denominada “Estigma, Preconceito
e suas Implicações” em uma reunião do Conselho Distrital
Humaitá/Navegantes/Ilhas (CDS HNI), porque neste espaço estratégico se
reúnem representantes de trabalhadores, gestores e usuários de todas as
Unidades de Saúde dessa região.
A metodologia utilizada foi em formato de exposição dialogada, onde
dados epidemiológicos de HIV/AIDS, do Brasil, Rio Grande do Sul e Porto
Alegre foram apresentados, assim como a experiência pessoal de integrantes
do grupo, do viver com HIV/AIDS, do ser mulher, das dificuldades enfrentadas
no acolhimento nos serviços de saúde e do reconhecimento de direitos.
Após a exposição, abriu-se para debate, onde as facilitadoras foram
lançando suposições como: “Você tem preconceito?” A maioria dos
presentes responderam que não. Contudo, no decorrer do debate, ao serem
provocados com questionamentos de opinião pessoal como: “se você
realizasse um teste rápido com seu namorado e o dele desse positivo, o que
faria?”; “Se seu filho se relacionar com uma menina com HIV, como você
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reagiria?”; “E se eles quisessem ter filhos?”, alguns participantes
começaram a apresentar subjetivamente reação como o silêncio,
identificando-se que o preconceito está presente.
Não Adesão
ao
Tratamento
Uso de
Álcool e
outras
drogas
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As oficinas seguem sempre princípios norteadores, que são:
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Nossas oficinas levaram em conta tudo isto pois foi assim que
construímos ou tentamos construir nossas rodas de conversa ou oficinas,
através do diálogo amoroso com a comunidade, onde se conseguiu a
construção compartilhada do conhecimento, o que resulta na emancipação
do entendimento e de soluções coletivas, tais como: rever seus próprios
estigmas e preconceitos, se enxergar na problemática do outro como ser
humano. Compartilhar as experiências das populações excluídas leva a
compreender o processo de aquisição do conhecimento, onde a troca de
saberes populares promove a ruptura radical do modelo tradicional de
escola. A Educação Popular constrói uma reflexão e daí uma nova teoria para
as classes populares.
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A EXPERIÊNCIA DE CONTROLE SOCIAL NO AMBIENTE HOSPITALAR
‘‘Paulo Goulart e o Conselho Gestor aqui
nasceram com um sorriso de menino e se tornaram
um coração gigante em defesa do controle social.’’
69
Reunião do Conselho Gestor
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Outra ação importante ocorreu na visita aos 12 postos de saúde que
são gerenciados pelo GHC, na medida em que os conselheiros do Conselho
Gestor também atuam nos Conselhos Locais dessas Unidades. Nestas visitas
se constatou que haviam diversas pendências e precariedades nas
estruturas físicas e esta pauta foi levada ao Plenário, ocasião em que se
formou um grupo de manutenção exclusivo para estas Unidades de Saúde.
Detalhes sobre problemas na infraestrutura são os mais frequentes nas
queixas dos usuários, com os quais sempre se conversa no momento das
visitas. Nunca a queixa é sobre o atendimento em si, mas sobre a estrutura,
o que se compreende, pois é um Hospital muito grande e que atende um
grande número de pessoas, é difícil administrar e temos o entendimento de
que para a gestão que quer fazer um bom trabalho, o Conselho Gestor é o
olhar atento para os detalhes que muitas vezes são fáceis de solucionar e
fazem toda a diferença.
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FORMAÇÃO DO CONSELHO GESTOR DO PRONTO ATENDIMENTO
LOMBA DO PINHEIRO
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A ideia de constituir o Conselho Gestor veio de fora, do Conselho
Municipal de Saúde, não era uma demanda, um entendimento da própria
comunidade. O Conselho Gestor foi criado em 2012, e , conforme estabelece
o Regimento Interno, os representantes dos usuários devem ser
homologados pelo Conselho Municipal de Saúde, a partir da indicação do
Conselho Distrital de Saúde da Lomba do Pinheiro, na medida em que é o
território preferencial de abrangência do serviço.
O Conselho Gestor se empenhou duramente com o Secretário de
Saúde para conseguir resolver os problemas de atendimento, que
envolviam o convênio com o Hospital da PUC. Para isso foi constituído
um Grupo de Trabalho, que teve o acompanhamento do Ministério
Público Estadual.
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O Conselho Gestor é muito atuante e resolutivo, com reuniões
mensais, na segunda quinta feira de cada mês, às 19 horas. É composto por 6
representantes dos usuários, 3 representantes da Coordenação e 3
representantes dos trabalhadores. Pode se dizer que o Serviço teve avanços
significativos, e as pautas das reuniões versam sobre estes temas: reformas,
melhorias no atendimento, convênio, relações dos trabalhadores com os
usuários, etc. O Conselho Gestor já está na segunda gestão.
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PRÊMIO DESTAQUE EM SAÚDE – O SUS QUE FUNCIONA
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Edição 2013:
Categorias premiadas:
77
Edição 2014:
Categorias premiadas:
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Edição 2015:
Categorias premiadas:
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Edição 2016:
Categorias premiadas:
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HOMENAGENS PÓSTUMAS
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