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CAPÍTULO 415e
Obesidade é um estado de excesso de massa adiposa. É comum associá-la cupante, atingindo 15,9% em 2009/2010, mas pode estar estabilizando.
a excesso de peso, mas isso nem sempre é correto: indivíduos magros,
porém muito musculosos, podem apresentar excesso de peso segundo REGULAÇÃO FISIOLÓGICA DO EQUILÍBRIO ENERGÉTICO
padrões numéricos, mas não têm aumento da massa adiposa. A distribui- Há evidências substanciais de que o peso corporal é regulado por fatores
ção do peso corporal na população é contínua, o que torna a escolha de endócrinos e neurais que terminam por influenciar os braços efetores da
uma distinção clinicamente significativa entre magro e obeso um tanto absorção e do dispêndio de energia. Esse sistema regulador complexo é
arbitrária. A obesidade é, portanto, definida pela avaliação
de sua ligação com a morbidade e a mortalidade.
Biologia da obesidade
Peso Altura
Embora não seja uma medida direta da adiposidade, kg lb cm pol.
o método mais usado para avaliar a obesidade é o índice de
2 2 340
massa corporal (IMC), igual a peso/estatura (em kg/m ) 150
320 125
(Fig. 415e.1). Outras abordagens para a quantificação da 140
300 Índice de massa corporal (IMC) 50
obesidade são a antropometria (espessura da prega cutâ- 130 [kg/m2]
280 130
nea), a densitometria (pesagem sob a água), a tomografia 70
120
computadorizada (TC) ou a ressonância magnética (RM) 260
e a impedância elétrica. Segundo os dados das tabelas da 110 240 MULHERES 60 HOMENS 135
para descrever indivíduos com IMC entre 25 e 30. Um IMC 50 110 170
entre 25 e 30 deve ser visto como clinicamente significativo
100 175
e merecedor de uma intervenção terapêutica na presença 45
95 70
de fatores de risco que são influenciados por adiposidade, 90
180
40
como hipertensão e intolerância à glicose. 85
185
A distribuição do tecido adiposo em diferentes espaços 80
35 10
anatômicos tem implicações importantes para a morbidade. 75 190 75
Especificamente, a gordura intra-abdominal e a subcutânea 70 195
abdominal são mais importantes que a gordura subcutânea 30 65
200
presente nas nádegas e nos membros inferiores. O modo
60 80
mais fácil de fazer essa distinção clinicamente é determinan- 205
do a razão cintura/quadril. Um número > 0,9 em mulheres 25 55
210
ou > 1 em homens é considerado anormal. Muitas das com- 50
85
plicações importantes da obesidade, como resistência à insu-
lina, diabetes, hipertensão, hiperlipidemia e, em mulheres, FIGURA 415e.1 Nomograma para determinar o índice de massa corporal. Para
hiperandrogenismo, estão mais fortemente associadas à gor- usar esse nomograma, coloca-se uma régua ou outro objeto reto entre o peso cor-
poral (sem as roupas) em quilogramas, localizado na linha à esquerda, e a estatura
dura intra-abdominal e/ou da parte superior do corpo que à
(sem os sapatos) em centímetros, localizada na linha à direita. O índice de massa
adiposidade total (Cap. 422). O mecanismo subjacente dessa
corporal é lido a partir do meio da escala e está em unidades do sistema métrico.
associação é desconhecido, mas pode estar ligado ao fato de
(Copyright 1979, George A. Bray, M.D., com autorização.)
os últimos estão a grelina, que é elaborada no estômago e que estimula a aumentou o interesse pelas implicações do tecido para patogênese e terapia
alimentação, o peptídeo YY (PYY) e a colecistoquinina, que são elabora- de obesidade. Células adiposas bege, recentemente descritas, lembram as
dos no intestino delgado e que sinalizam ao cérebro por ação direta nos células TAM na expressão de UCP-1. Elas são dispersas através do tecido
centros de controle hipotalâmicos e/ou por intermédio do nervo vago. adiposo branco e seu potencial termogênico é incerto.
Os metabólitos, como a glicose, podem influenciar o apetite, visto que
a hipoglicemia induz a fome; entretanto, a glicose normalmente não é O ADIPÓCITO E O TECIDO ADIPOSO
um regulador importante do apetite. Esses diversos sinais hormonais, O tecido adiposo é formado pelas células adiposas, que armazenam lipí-
Endocrinologia e metabolismo
metabólicos e neurais atuam influenciando a expressão e a liberação de deos, e por um compartimento estromático e vascular, onde ficam células
vários peptídeos hipotalâmicos (p. ex., neuropeptídeo Y [NPY], peptídeo como os pré-adipócitos e os macrófagos. A massa adiposa aumenta com
relacionado com a proteína Agouti [AgRP, de Agouti-related protein], o crescimento das células adiposas à medida que mais lipídeos se deposi-
hormônio estimulador dos melanócitos α [α-MSH, de α-melanocyte- tam, bem como pelo aumento do número de adipócitos. O tecido adiposo
stimulating hormone] e hormônio concentrador da melanina [MCH, de obeso também se caracteriza por maior número de macrófagos infiltrados.
melanin-concentrating hormone]), substâncias integradas às vias sinaliza- O processo que origina as células adiposas a partir do pré-adipócito me-
doras serotoninérgicas, catecolaminérgicas, endocanabinoides e opioides senquimatoso envolve uma série coordenada de etapas de diferenciação,
(ver adiante). Fatores psicológicos e culturais também parecem ter um mediadas por uma cascata de fatores de transcrição específicos. Um dos
papel na expressão final do apetite. Com exceção de síndromes genéticas fatores fundamentais é o receptor ativado do proliferador dos peroxissomos
tipo γ (PPARγ, de peroxisome proliferator-activated receptor γ), um receptor
raras que envolvem a leptina, seu receptor e o sistema da melanocortina,
nuclear que se liga aos fármacos sensibilizantes à insulina da classe das
os defeitos específicos nessa rede complexa de controle do apetite que in-
tiazolidinedionas, usadas no tratamento do diabetes tipo 2 (Cap. 418).
fluenciam os casos comuns da obesidade não foram bem definidos.
Embora o adipócito em geral tenha sido considerado como um depó-
O dispêndio de energia envolve os seguintes componentes: (1) taxa me-
sito para armazenamento de gordura, ele também é uma célula endócrina
tabólica basal ou em repouso; (2) custo energético da metabolização e do ar-
que libera inúmeras moléculas de maneira regulada (Fig. 415e.3). Essas
incluem o hormônio de regulação do equilíbrio de energia leptina, cito-
Controladores cinas, como fator de necrose tumoral α (TNF-α, de tumor necrosis factor
Fatores centrais do apetite α) e interleucina (IL) 6, fatores do complemento, como o fator D (também
Fatores
psicológicos Aumento Redução conhecido como adipsina), agentes protrombóticos, como inibidor do ati-
culturais
Apetite vador de plasminogênio I e um componente do sistema de regulação da
NPY α-MSH pressão arterial, angiotensinogênio. A adiponectina, uma proteína abun-
MCH CART dante derivada do tecido adiposo cujos níveis ficam reduzidos na obesida-
AgRP GLP-1
Orexina Serotonina de, aumenta a sensibilidade à insulina e a oxidação lipídica, além de exer-
Endocanabinoide Hormônios cer efeitos protetores da vasculatura, enquanto a resistina e a RBP4, cujos
Leptina
Insulina
níveis se mostram aumentados na obesidade, podem induzir resistência
Aferentes neurais Cortisol à insulina. Esses fatores, e outros ainda não identificados, participam da
(vagais) fisiologia da homeostase dos lipídeos, da sensibilidade à insulina, do con-
Peptídeos intestinais Metabólitos
CCK Glicose
trole da pressão arterial, da coagulação e da saúde vascular, bem como pro-
Grelina Cetonas vavelmente contribuem para as patologias relacionadas com a obesidade.
PYY
ETIOLOGIA DA OBESIDADE
FIGURA 415e.2 Fatores que regulam o apetite por intermédio de
efeitos sobre os circuitos neurais centrais. Estão relacionados al-
Embora as vias moleculares que regulam o equilíbrio de energia estejam
guns fatores que aumentam ou diminuem o apetite. AgRP, peptídeo começando a ser conhecidas, as causas da obesidade continuam indefi-
relacionado com Agouti; CART, transcrito relacionado com a cocaína nidas. Em parte, isso reflete o fato de que a obesidade é um grupo hete-
e a anfetamina, de cocaine- and amphetamine-related transcript; CCK, rogêneo de distúrbios. De um lado, a fisiopatologia da obesidade parece
colecistoquinina, de cholecystokinin; GLP-1, peptídeo 1 relacionado simples: um excesso crônico de aporte de nutrientes com relação ao nível
com o glucagon, de glucagon-related peptide-1; MCH, hormônio con- de dispêndio energético. No entanto, devido à complexidade dos sistemas
centrador da melanina; α-MSH, hormônio estimulador dos melanó- neuroendócrinos e metabólicos que regulam a ingestão, o armazenamen-
citos α; NPY, neuropeptídeo Y; PYY, peptídeo YY. to e o dispêndio de energia, é difícil quantificar todos os parâmetros rele-
Fome/saciedade
Outros
PAI-1 Citocinas
TNF-α Termogênese/sistema autônomo
Angiotensinogênio
RBP4 IL-6 Função neuroendócrina
Enzimas Substratos
Aromatase Ácidos graxos livres
11β-HSD-1 Glicerol Barreira hematencefálica
FIGURA 415e.3 Fatores liberados pelo adipócito que podem afetar Células β
os tecidos periféricos. IL-6, interleucina 6; PAI-1, inibidor do ativador Alvos periféricos Células imunes
do plasminogênio 1, de plasminogen activator inhibitor; RBP4, proteína
Outros
4 de ligação retinal, de retinal binding protein 4; TNF-α, fator de necrose
tumoral α; 11β-HSD-1, 11β-hidroxiesteroide desidrogenase1.
Estado alimentado/
vantes (p. ex., consumo de alimentos e dispêndio de energia) ao longo do obesidade
Leptina
tempo em pacientes humanos.
Adipócito
Papel dos genes versus ambiente A obesidade costuma ocorrer em fa-
mílias, e a hereditariedade do peso corporal é semelhante à da estatura. Estado de jejum
Leptina
No entanto, a herança não costuma ser mendeliana, sendo difícil distin-
CAPÍTULO 415e
guir o papel dos genes e dos fatores ambientais. Pessoas adotadas asseme-
lham-se mais a seus pais biológicos que aos adotivos quanto à obesidade, FIGURA 415e.4 Sistema fisiológico regulado pela leptina. Os níveis
o que é um forte indicador da influência genética. De modo semelhante, da leptina em elevação ou queda atuam por meio do hipotálamo, in-
gêmeos idênticos têm IMCs bastante semelhantes, independentemente fluenciando o apetite, o gasto de energia e a função endócrina, bem
de serem criados juntos ou separados, e seus IMCs correlacionam-se como por intermédio de locais periféricos, como o sistema imune.
muito mais estreitamente que os de gêmeos dizigotos. Esses efeitos ge-
néticos parecem estar associados à ingestão e ao dispêndio de energia. O nível de sua produção serve como índice das reservas adiposas de energia
Atualmente, as variantes genéticas identificadas, tanto as comuns como (Fig. 415e.4). Níveis altos de leptina diminuem o consumo de alimento e au-
as raras, são responsáveis por menos de 5% da variância do peso corporal. mentam o gasto de energia. Outro camundongo mutante, o db/db, resistente
Biologia da obesidade
No entanto, seja qual for o papel dos genes, é evidente que o ambien- à leptina, apresenta mutação no receptor desse hormônio e uma síndrome
te tem importância fundamental na obesidade. Uma evidência é o fato semelhante. O gene ob está presente em seres humanos, onde também é ex-
de que a fome previne a obesidade mesmo no indivíduo mais propenso a presso na gordura. Já foram descritas várias famílias com obesidade mór-
essa doença. Além disso, o recente aumento na prevalência da obesidade bida de início precoce causada por mutações que inativam a leptina ou seu
nos EUA é rápido demais para ser explicado por alterações no conjunto receptor, o que demonstra a importância biológica da via da leptina em seres
dos genes. Contudo, os genes sem dúvida influenciam a tendência à obe- humanos. A obesidade nesses indivíduos começa logo após o nascimento, é
sidade em resposta a dietas específicas e à disponibilidade de alimentos. grave e é acompanhada de anormalidades neuroendócrinas. A mais proe-
Fatores culturais também são importantes, estando ligados tanto à dispo- minente delas é o hipogonadismo hipogonadotrófico, que é revertido pela
nibilidade e à composição da dieta quanto a alterações do nível de ativi- suplementação da leptina no subgrupo deficiente em leptina. No modelo do
dade física. Em sociedades industrializadas, a obesidade é mais comum camundongo, observam-se hipotireoidismo central e atraso do crescimento,
em mulheres pobres, enquanto nos países subdesenvolvidos as mulheres alterações não tão visíveis em seres humanos com deficiência de leptina. As
mais ricas são mais obesas. Em crianças, a obesidade tem alguma corre- mutações dos genes da leptina ou de seu receptor não desempenham um
lação com o tempo que passam em frente à televisão. Embora o papel da papel importante nas formas comuns de obesidade.
composição da dieta na obesidade continue gerando controvérsia, parece Mutações de vários outros genes podem causar obesidade grave em
que as dietas ricas em gorduras podem promover a obesidade quando seres humanos (Quadro 415e.1); porém, tais síndromes são raras. As mu-
combinadas com dietas ricas em carboidratos simples, rapidamente ab- tações do gene que codificam a pró-opiomelanocortina (POMC) causam
sorvidos. Genes específicos são propensos a influenciar a resposta a die- obesidade grave porque não ocorre a síntese de α-MSH, um neuropeptídeo
tas específicas, mas esses genes são amplamente não identificados. fundamental que inibe o apetite no hipotálamo. A ausência de POMC tam-
Outros fatores ambientais podem contribuir para o aumento da bém causa insuficiência suprarrenal secundária devido à falta do hormônio
prevalência da obesidade. Tanto correlações epidemiológicas como da- adrenocorticotrófico (ACTH, de adrenocorticotropic hormone), bem como
dos experimentais sugerem que a privação de sono acarreta o aumento palidez cutânea e cabelos avermelhados pela falta de α-MSH. Acredita-se
da obesidade. As alterações no microbioma intestinal com capacidade de que as mutações da proenzima convertase 1 (PC-1) causem obesidade ao
modificar o equilíbrio energético estão recebendo suporte experimental impedirem a síntese de α-MSH a partir de seu peptídeo precursor, a POMC.
de estudos em animais, e um possível papel para as infecções virais obe- O α-MSH liga-se ao receptor da melanocortina tipo 4 (MC4R), um receptor
sogênicas continua a receber atenção esporádica. hipotalâmico importante que inibe a alimentação. As mutações heterozi-
gotas de perda da função nesse receptor respondem por até 5% dos casos
Síndromes genéticas específicas Sabe-se há muitos anos que, em roedores, graves de obesidade. A perda de função de MRAP2, uma proteína neces-
a obesidade é causada por uma série de mutações distintas distribuídas por sária para a sinalização normal de MC4R, foi encontrada em casos raros de
todo o genoma. A maioria de tais defeitos gênicos isolados causa hiperfagia obesidade grave. Esses cinco defeitos genéticos definem uma via pela qual
e diminuição do dispêndio de energia, o que sugere uma ligação fisiológica a leptina (ao estimular a POMC e aumentar o α-MSH) restringe o consumo
entre esses dois parâmetros na homeostase energética. A identificação da de alimentos e limita o peso (Fig. 415e.5). Os resultados de estudos de as-
mutação no gene ob em camundongos geneticamente obesos (ob/ob) foi um sociação em todo o genoma para identificar loci genéticos responsáveis pela
grande avanço no referido campo. O camundongo ob/ob desenvolve obe- obesidade na população geral até o momento são decepcionantes. Mais de
sidade grave, resistência à insulina e hiperfagia, além de um metabolismo 40 loci replicados ligados à obesidade foram identificados, mas juntos são
deficiente (ele engorda mesmo quando recebe a mesma quantidade de calo- responsáveis por menos de 3% da variação interindividual no IMC. O mais
rias que os camundongos magros na mesma gaiola). O produto do gene ob é replicado deles é um gene chamado FTO, que tem função desconhecida, mas
o peptídeo leptina, nome que deriva do grego leptos, o qual significa magro. assim como muitos dos outros candidatos recentemente descritos, é expres-
A leptina é secretada pelas células adiposas e atua sobretudo no hipotálamo. so no cérebro. Como se estima que a herdabilidade da obesidade seja de 40 a
sam obesidade de início tardio. O gene fat codifica a carboxipeptidase E, ples. Contudo, diferentemente da síndrome de Cushing, os níveis basais
uma enzima processadora de peptídeos; acredita-se que mutações nesse de cortisol no sangue e na urina, bem como após a injeção do hormônio
gene também causem obesidade ao perturbarem a produção de um ou mais liberador de corticotrofina (CRH, de corticotropin-releasing hormone)
neuropeptídeos. A AgRP é coexpressa com o NPY em neurônios do núcleo ou ACTH, são normais; o teste de supressão em 24 horas com 1 mg de
arqueado. A AgRP antagoniza o α-MSH nos receptores de MC4, e sua ex- dexametasona é normal em 90% dos casos. Os restantes dão resultados
pressão excessiva induz a obesidade. Já os camundongos com deficiência do normais em um teste-padrão de dexametasona em baixas doses por dois
peptídeo MCH, cuja administração induz a alimentação, são magros. dias. A obesidade pode estar associada à reativação local excessiva do
Várias síndromes humanas, complexas e de herança definida, es- cortisol na gordura pela 11β-hidroxiesteroide-desidrogenase 1, enzima
tão associadas à obesidade (Quadro 415e.2). Embora genes específicos que converte a cortisona inativa em cortisol.
tenham definição limitada atualmente, sua identificação provavelmente
HIPOTIREOIDISMO A possibilidade de hipotireoidismo deve ser considera-
melhorará nossa compreensão das formas mais comuns de obesidade hu-
da, mas ela é uma causa incomum de obesidade; a medição do hormônio
mana. Na síndrome de Prader-Willi, um distúrbio multigênico do neu-
estimulante da tireoide (TSH, de thyroid-stimulating hormone) possibilita
rodesenvolvimento, a obesidade coexiste com baixa estatura, deficiência
descartar hipertireoidismo facilmente. Grande parte do ganho de peso que
intelectual, hipogonadismo hipogonadotrófico, hipotonia, mãos e pés
ocorre nessa deficiência hormonal se deve ao mixedema (Cap. 405).
pequenos, boca em forma de peixe e hiperfagia. A maioria dos pacientes
apresenta expressão reduzida de genes imprinted paternalmente herdados INSULINOMA Os pacientes com insulinoma costumam ganhar peso
porque comem excessivamente para evitar os sintomas da hipoglicemia
(Cap. 420). O substrato aumentado mais níveis altos de insulina promo-
Enzima processadora PC-1
vem armazenamento de energia na gordura. Isso pode ser acentuado em
Receptor do
alguns indivíduos, mas é modesto na maioria.
Expressão da
Receptor pró-opio- sinal de
Leptina do sinal melanocortina α-MSH melanocortina 4 CRANIOFARINGIOMA E OUTROS DISTÚRBIOS QUE ENVOLVEM O HIPOTÁLAMO Seja
de leptina (POMC) em decorrência de tumores, traumatismo ou inflamação, a disfunção hi-
potalâmica dos sistemas que controlam a saciedade, a fome e o dispêndio
de energia pode resultar em graus variados de obesidade (Cap. 402). É
Apetite incomum encontrar uma base anatômica distinta para essas alterações.
AgRP reduzido
Mutações Provavelmente, disfunções sutis do hipotálamo são as causas mais comuns
conhecidas no de obesidade que se pode demonstrar com as técnicas neurorradiológicas
ser humano
disponíveis hoje. O hormônio do crescimento (GH, de growth hormone),
FIGURA 415e.5 Uma via central por meio da qual a leptina age para que tem atividade lipolítica, mostra-se diminuído na obesidade e aumen-
regular o apetite e o peso corporal. A leptina sinaliza para os neu- tado com a perda de peso. Apesar dos níveis baixos de GH, a produção do
rônios por meio da pró-opiomelanocortina (POMC) no hipotálamo fator do crescimento semelhante à insulina tipo I (IGF-I, de insulin-like
induzindo aumento da produção do hormônio estimulador dos growth factor I, ou somatomedina) é normal, sugerindo que a supressão do
melanócitos α (α-MSH), requerendo a enzima processadora proen- GH seja resposta que compense o aumento da oferta nutricional.
zima convertase 1 (PC-1). O α-MSH age como um agonista sobre os
receptores de melanocortina 4 para inibir o apetite, e o neuropeptí- Patogênese da obesidade comum A obesidade pode ser causada por au-
deo peptídeo relacionado com a proteína Agouti (AgRP) age como mento da ingestão de energia, diminuição do dispêndio ou uma combina-
antagonista desse receptor. As mutações que causam obesidade em ção de ambos. Assim, identificar a etiologia da obesidade exige medições
seres humanos estão indicadas por setas preenchidas verdes. dos dois parâmetros. Contudo, é difícil fazer medidas precisas e diretas da
CAPÍTULO 415e
mulheres dotrófico
Outras características Hipoplasia do esmalte dos Orelhas displásicas
dentes
Hiperfagia Puberdade atrasada
Birras
Fala anasalada
Deficiência intelectual Leve a moderada Inteligência normal Leve Ligeira
Biologia da obesidade
ingestão de energia em indivíduos em vida livre, e os obesos em particular por algum tempo, (alguns) indivíduos obesos gastam menos energia que
costumam subestimar sua ingestão. As medições do dispêndio crônico de (alguns) indivíduos magros. Também há uma tendência, entre os que se
energia são possíveis pelo uso de água duplamente marcada ou câmaras e tornaram obesos na infância, de ter taxas menores de dispêndio de ener-
salas metabólicas. Em pacientes com peso e composição corporal estáveis, gia do que os que permanecem magros. A origem fisiológica das taxas
a ingestão de energia é igual ao dispêndio. Assim, essas técnicas possibili- variáveis de dispêndio de energia (mantidos constantes o peso corporal e
tam avaliar a ingestão de energia em indivíduos em vida livre. Os níveis de a ingestão de energia) é praticamente desconhecida.
dispêndio de energia são diferentes em obesos em períodos de ganho ou Outro componente da termogênese recém descrito, denominado
de perda de peso, e nos estados pré ou pós-obesidade. Os estudos que não termogênese da atividade fora do exercício (NEAT, de nonexercise activity
levam em conta esses fenômenos são difíceis de interpretar. thermogenesis), foi relacionado com a obesidade. Trata-se da termogêne-
O conceito de “ponto de equilíbrio” do peso corporal tem suscitado se que acompanha outras atividades físicas que não o exercício voluntá-
contínuo interesse. Em favor dessa ideia, existem mecanismos fisiológicos rio, como tarefas cotidianas, movimentos aleatórios, contração muscular
em torno de um sistema sensor no tecido adiposo que reflete as reservas espontânea e manutenção da postura. A NEAT responde por cerca de
de gordura, e um receptor, ou adipostato, presente nos centros hipotalâmi- dois terços do aumento do dispêndio diário de energia induzido pelo ex-
cos. Quando as reservas de gordura diminuem, o sinal do adipostato cai, e cesso de alimentação. A ampla variação no armazenamento de gordura,
o hipotálamo responde estimulando a fome e diminuindo o dispêndio de observada em indivíduos alimentados sem excesso, pode ser prevista pela
energia. No entanto, quando as reservas de gordura são abundantes, o sinal intensidade com que a NEAT é induzida. A origem molecular e a regula-
aumenta, e o hipotálamo responde diminuindo a fome e aumentando o dis- ção desse fenômeno são desconhecidas.
pêndio de energia. A recente descoberta do gene ob e seu produto, a leptina,
Leptina na obesidade comum A grande maioria dos obesos tem níveis
bem como do gene db, cujo produto é o receptor da lectina, fornece uma elevados de leptina, mas não apresenta mutações nem na leptina nem em
base molecular a esse conceito fisiológico (ver anteriormente). seu receptor. Por isso parecem ter uma forma funcional de “resistência à
Qual a situação da ingestão de alimentos nos obesos? (Os obesos comem leptina”. Dados sugerem que alguns desses indivíduos produzem menos
mais que os magros?) Tal questão suscitou intenso debate, o que se leptina por unidade de massa adiposa que outros, ou têm uma forma re-
deve em parte às dificuldades metodológicas inerentes à determinação lativa de deficiência de leptina que predispõe à obesidade, mas isso ainda
da ingestão alimentar. Muitos indivíduos obesos acreditam que ingerem é contraditório e incompleto. O mecanismo de resistência à leptina, e a
pouca quantidade de alimento, achado muitas vezes confirmado pelos re- possibilidade de revertê-la com a elevação dos níveis desse hormônio ou
sultados de questionários sobre a ingestão de alimentos. No entanto, hoje com a combinação de leptina e outros tratamentos em um subgrupo de
se sabe que a ingestão média de energia aumenta com a obesidade. De indivíduos obesos, ainda não foi elucidado. Alguns dados sugerem que
acordo com as leis da termodinâmica, os obesos devem comer mais que a leptina pode ser incapaz de atravessar a barreira hematencefálica à
os magros em média para manter seu peso mais alto. No entanto, é possí- medida que os níveis sobem. Também há evidências, a partir de estudos
vel que alguns dos indivíduos predispostos à obesidade sejam capazes de com animais, de que inibidores da sinalização da leptina, como SOCS3 e
ficar obesos sem um aumento absoluto no consumo calórico. PTP1b, estejam implicados no mecanismo de resistência.
representa uma das causas mais comuns de doença hepática nos países
o exercício, ainda que modestos, aumentam a sensibilidade à insulina e industrializados. A infiltração gordurosa do fígado na DHGNA pode
muitas vezes melhoram o controle da glicose no diabetes. evoluir em um subgrupo para esteato-hepatite não alcoólica (EHNA)
Distúrbios reprodutivos As doenças do eixo reprodutor estão associa- inflamatória e, mais raramente, para cirrose e carcinoma hepatocelular.
das à obesidade em ambos os sexos. O hipogonadismo masculino está A esteatose em geral melhora após perda de peso, secundária a dieta ou
associado a um aumento do tecido adiposo, que muitas vezes se distribui cirurgia bariátrica. O mecanismo para a associação continua obscuro. A
em uma conformação mais típica de mulheres. Homens cujo peso é mais obesidade pode aumentar a secreção biliar de colesterol e a supersatura-
de 160% do peso corporal ideal (PCI) muitas vezes têm redução da testos- ção da bile e elevar a incidência de cálculos, sobretudo de colesterol (Cap.
terona plasmática e da globulina de ligação ao hormônio sexual (SHBG, 369). Uma pessoa 50% acima do PCI tem uma incidência seis vezes maior
de sex hormone-binding globulin) e níveis de estrogênio (derivados da de cálculos biliares sintomáticos. Paradoxalmente, o jejum aumenta a su-
conversão de androgênios suprarrenais no tecido adiposo) aumentados persaturação da bile ao reduzir o componente fosfolipídico. A colecistite
(Cap. 411). Pode-se observar ginecomastia. No entanto, na maioria des- induzida pelo jejum é uma complicação das dietas extremas.
ses indivíduos, a masculinização, a libido, a potência e a espermatogênese Câncer A obesidade está associada a um aumento do risco de vários tipos
são normais. A testosterona livre pode diminuir em homens com obesi- de câncer e, além disso, pode levar a desfechos de tratamento mais pre-
dade mórbida cujo peso excede 200% do PCI. cários e aumento da mortalidade por câncer. A obesidade masculina está
Em mulheres, a obesidade está muito associada a anormalidades associada a maior mortalidade por câncer de esôfago, cólon, reto, pâncreas,
menstruais, principalmente em mulheres com obesidade na parte supe- fígado e próstata; a obesidade feminina está associada a maior mortalidade
rior do corpo (Cap. 412). Achados comuns são aumento na produção de por câncer da vesícula biliar, dos ductos biliares, das mamas, do endomé-
androgênios, diminuição da SHBG e aumento da conversão periférica de trio, do colo uterino e dos ovários. O aumento da taxa de conversão da
androgênios em estrogênios. A maioria das mulheres obesas com oligo- androstenediona em estrona, que ocorre no tecido adiposo de obesos, pode
menorreia tem síndrome do ovário policístico (SOP), com sua anovulação causar alguns desses tumores. Outras possíveis ligações mecanicistas po-
associada e hiperandrogenismo ovariano; 40% das mulheres com SOP são dem envolver hormônios, fatores de crescimento e citocinas cujos níveis
obesas. A maioria das mulheres não obesas com SOP também é resisten- estão ligados ao estado nutricional, como insulina, leptina, adiponectina e
te à insulina, sugerindo que a resistência à insulina, a hiperinsulinemia IGF-I, bem como ativação das vias de sinalização ligadas tanto à obesidade
ou a combinação das duas é causadora ou contribui para a fisiopatolo- quanto ao câncer. Estimou-se recentemente que, nos EUA, a obesidade seja
gia ovariana na SOP tanto em indivíduos obesos como magros. Cada vez responsável por 14% dos cânceres em homens e 20% em mulheres.
mais evidências fornecem suporte ao papel das adipocinas na mediação
de uma ligação entre a obesidade e a disfunção reprodutiva da SOP. Em Doenças dos ossos, das articulações e da pele A obesidade pode aumen-
mulheres obesas com SOP, a perda de peso ou o tratamento com fárma- tar o risco de osteoartrite. Não há duvida de que isso se deve em parte
cos sensibilizantes à insulina muitas vezes normalizam a menstruação. O ao traumatismo devido ao peso extra, mas também está potencialmente
aumento da conversão da androstenediona em estrogênio, mais comum ligado à ativação de vias inflamatórias que poderiam promover patologia
em mulheres com obesidade na parte inferior do corpo, pode aumentar sinovial. A prevalência de gota também pode ser maior (Cap. 395). Uma
a incidência de câncer do útero em mulheres obesas na pós-menopausa. das afecções de pele associadas à obesidade é a acantose nigricans, que
se manifesta por escurecimento e espessamento das dobras da pele no
Doença cardiovascular O estudo Framingham revelou que a obesidade foi pescoço, nos cotovelos e nos espaços interfalangianos dorsais. A acantose
um fator de risco independente para a incidência durante 26 anos de doenças reflete a gravidade da resistência à insulina subjacente e diminui com a
vasculares em homens e mulheres (como doença arterial coronariana, aci- perda de peso. A friabilidade da pele também pode aumentar, sobretudo
dente vascular encefálico e insuficiência cardíaca congestiva). A razão cin- nas dobras, o que aumenta o risco de infecções por leveduras e fungos.
tura/quadril pode ser o melhor fator preditivo desses riscos. O impacto da Finalmente, a estase venosa é mais comum no obeso.