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Faculdades de Ciências e da Saúde

FACIS

Amanda Marchesini dos Reis


Simone Aparecida Baldavia Girotto

A INTERNALIZAÇÃO AFETIVA REPRESENTADA NA BUSCA E


REJEIÇÃO DA COMIDA
Tendo como inspiração o filme Gordos de Daniel Sánchez Arévalo

ESPECIALIZAÇÃO EM DEPENDÊNCIAS, ABUSOS E COMPULSÕES

São Paulo
2012
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Amanda Marchesini dos Reis
Simone Aparecida Baldavia Girotto

A INTERNALIZAÇÃO AFETIVA REPRESENTADA NA BUSCA E


REJEIÇÃO DA COMIDA
Tendo como inspiração o filme Gordos de Daniel Sánchez Arévalo

Monografia apresentada à
FACIS. Como requisito parcial
para obtenção do título de
especialista em Dependências,
Abusos e Compulsões.

São Paulo
2012
2
AGRADECIMENTOS

Às integrantes da dupla, que através da harmonia e identificação foi possível


à conclusão da obra de forma prazerosa e simples, e com a cumplicidade
acadêmica, as competências textuais foram cada vez mais sendo expostas e
perpetuadas.

Aos professores da FACIS que nos orientou e nos apresentou um mundo de


ideias completamente novas e diferentes das padronizadas mundo afora. Ideias que
serão usadas em nossas vidas para sempre.

Ao GOAS (Grupo de Orientação e Assistência à Saúde) por tornar possível a


realização do curso.

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DEDICATÓRIA

Aos amados Rosely e João Carlos pela sua direção e forma de me


demonstrar o mundo.
À Adriana e Alessandra pela cumplicidade e partilha dos momentos mais
importantes da vida.

Aos preciosos Maria Antonia e Nelson por todo apoio e exemplo de vida que
sempre foram transmitidos.
Para Fernando que com seu senso crítico direcionando a novas descobertas.

Aos nossos queridos pacientes que nos ensinam a amadurecer


profissionalmente através de suas experiências e sentimentos vivenciados com suas
vidas e que são partilhadas nos consultórios psicológicos. Permitindo a aplicação
das técnicas desenvolvidas no curso dessa especialização e desenvolvendo nosso
sentimento de empatia com seus relatos.

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“O autoconhecimento é a beleza que se ouve no silêncio”
Rosana Gabriel

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RESUMO

Este trabalho visa discutir por meio da pesquisa dos principais conteúdos da
Psicologia Analítica a forma como todos os indivíduos associam a comida com a
introjeção de afeto, com isso, algumas vezes a querem em excesso e às vezes a
repelem totalmente, sendo esse objeto a essência de Transtornos Alimentares e
Distúrbios Afetivos. Essa obra teve como inspiração o filme Gordos do diretor Daniel
Sánchez Arévalo.
A partir da Obra de Jung, podemos afirmar que o padrão de beleza é
internalizado no indivíduo no início da puberdade, e antes mesmo dessa fase ser
ultrapassada, a comida pode ser vista como amiga ou inimiga.
Atualmente, os padrões de beleza são impostos a todos os indivíduos e a
aceitação social não necessariamente está ligada ao afeto, mas a introjeção afetiva
pode ser confundida então com o padrão e consequentemente o objeto que localiza
entre a beleza e o afeto, a comida, caminha em um paradigma o qual será abordado
no decorrer do presente trabalho.
É com isso que a Resiliência e a Individuação se tornam a base para o
reconhecimento do Self e a introjeção de afeto sem ser associado aos padrões de
beleza.

Palavras Chaves: Afeto, Compulsão Alimentar e Padrões de Beleza.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................ 08

O FILME “GORDOS”
Apresentação das Personagens ............................................................ 10
Resumo do Filme ................................................................................... 10

VISÃO DE IMAGEM CORPORAL, TRANSTORNOS COMPULSIVOS


ALIMENTARES E AFETO
Imagem Corporal e Beleza Contemporânea .......................................... 13
Afetividade .............................................................................................. 16
Compulsão Alimentar ............................................................................. 18

CONCEITOS DA PSICOLOGIA ANALÍTICA


Inconsciente Coletivo ............................................................................. 22
Inconsciente Pessoal ............................................................................. 23
Arquétipo ................................................................................................ 24
Complexo ............................................................................................... 25
Complexo Materno ................................................................................. 26
Persona .................................................................................................. 27
Sombra ................................................................................................... 28
Símbolo .................................................................................................. 29
Processo de Individuação ...................................................................... 30

RELAÇÃO SOBRE AS DIFICULDADES AFETIVAS EM SER ACEITO


COMO EXPRESSÃO O SINTOMA DO TRANSTORNO ALIMENTAR E A
ANÁLISE DAS PERSONAGENS DO FILME GORDOS ................................ 32

CONCLUSÃO ................................................................................................. 35

REFERÊNCIAS ............................................................................................... 37

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INTRODUÇÃO

O afeto é uma condição necessária a todo e qualquer indivíduo que vive em


sociedade e é o fato essencial que constrói a identidade e assume sua importância
durante toda a vida humana. Um dos fatores que influenciam a aceitação em
sociedade é justamente a existência do afeto e, na atualidade, a busca por essa
aceitação e reconhecimento afetivo tem se tornado projeto de gerações.
Como o afeto pode ser alcançado? E como estar inserido ou não em uma
sociedade, que padroniza e aliena indivíduos com características semelhantes e
diferentes, faz com que se alcance ou se perca afeto? Como os indivíduos reagem
as essas questões psíquicas?
Esse trabalho visa elucidar essas questões através de exposições de
conceitos da Psicologia Analítica e seus autores, assim como exemplos das
personagens do filme Gordos de Daniel Sánchez Arévalo.
Em um breve resumo, é possível ter uma visão geral do filme, que demonstra
através de seu enredo a busca pelo afeto utilizando a comida como caminho para
obtenção afetiva. Sendo também um objeto prazeroso ligado ao Complexo Materno
proposto por Jung, assunto discorrido no corpo do trabalho.
Assim como a comida, aqui nessa obra, é tida como um objeto de obtenção
de afeto, outros objetos podem ser tidos como formas de obtenção de aceitação e
rejeição do mesmo, o que é também a explicação discorrida para a existência das
dependências, abusos e compulsões, ilustrando a linha que norteia essa tese de
especialização do curso de Dependências, Abusos e Compulsões (DAC).
A proposta desse trabalho é discorrida ao longo de três capítulos que
possuem em comum a característica de englobar os temas relacionados à
Psicologia Analítica e textos reunidos para embasamento teórico sobre afeto,
dependências, abusos e compulsões, assim como comida e exemplos obtidos com o
enredo do filme.
No primeiro capítulo denominado “Visão de Imagem Corporal, Transtornos
Compulsivos Alimentares e Afeto” é realizada uma breve explicação através de
levantamento teórico à luz da Psicologia Analítica e com a leitura de teóricos da
mesma, sobre a Imagem Corporal e a Beleza Contemporânea, Afetividade e
Compulsão Alimentar.

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No segundo capítulo, os conceitos relacionados ao primeiro capítulo são
discorridos na forma de subtítulos visando elucidar os pontos cardiais dessa obra,
afeto, comida e beleza. Sendo os temas: Complexo Materno, Processo de
Individuação, Sombra, Símbolo, Persona, Arquétipo, Inconsciente Pessoal e
Inconsciente Coletivo, os temas abordados com a intenção de explicar através da
Teoria Analítica a formação dos processos de Dependências, Abusos e
Compulsões, assim como a relação entre comida, beleza e afetividade nos
indivíduos da sociedade ocidental contemporânea.
O capítulo final que encerra o presente trabalho faz a correlação entre os
conceitos apresentados nos capítulos anteriores unindo afeto, os sintomas de
transtornos alimentares e faz uma breve exemplificação dos temas utilizando as
personagens do filme inspiração para demonstrar como indivíduos pertencentes à
Sociedade Ocidental Contemporânea se comportam em relação a si mesmo e aos
outros. Demonstrando a relação sobre as dificuldades afetivas em ser aceito como
expressão do sintoma do transtorno alimentar e a análise das personagens do filme
”Gordos”, encerra o presente trabalho.
Com todas essas elucidações e os conceitos da Psicologia Analítica
apresentada, é possível se concluir uma possível forma de lidar com a imagem
individual de si mesmo, através da aceitação da imagem corporal e do padrão de
beleza atual, que aliena e classifica os indivíduos como bons ou maus.
Sendo assim, através da aceitação dessas questões, é possível a
identificação dos padrões e a criação de identidade própria independentemente dos
padrões de beleza, não relacionando esse tópico com a aceitação e rejeição de
afeto.
A afetividade é uma questão ligada aos padrões apresentados nesse
trabalho, e é possível ser um dos caminhos para solução dos Transtornos
Alimentares que acometem indivíduos que projetam na comida, a relação inicial de
buscar a aceitação e, por conseguinte o afeto e o desenvolvimento psíquico e de si
mesmo, de uma forma saudável, sem recorrer as DACs como objeto de
compensação.

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O FILME “GORDOS”

Apresentação das Personagens

Antonio de La Torre (Enrique), Roberto Enríquez (Abel), Verónica Sánchez (Paula),


Raúl Arévalo (Álex), Leticia Herrero (Sofía), Fernando Albizu (Andrés), Pilar Castro
(Pilar), María Morales (Leonor), Adam Jezierski (Luis), Marta Martín (Nuria), Teté
Delgado (Beatriz), Roberto Álamo (Párroco), Seidina Mboup (Cheick (as Seydina
Mboup), Miguel Ortiz (Jesús) e José David Pérez (Samuel).

Resumo do Filme

O enredo de Gordos une todas as personagens através de uma terapia em


grupo ministrada pelo terapeuta Abel, que propõe essa terapia justamente para que
todos os envolvidos possam atingir a meta comum que é aceitar que estão fora de
um padrão de beleza e não estão saudáveis nem fisicamente nem mentalmente, e
por isso, a cura seria perder esse peso extra e se enquadrar neste padrão.
O terapeuta é casado com Paula, uma professora de Educação Física que
está grávida, e no início do filme pode ser visto um relacionamento muito bom entre
marido e mulher, com muita libido existente entre os dois e uma situação familiar
considerada equilibrada.
A outra família apresentada pelo filme é de Párroco, um integrante do grupo
terapêutico que está obeso assim como sua esposa Seidina e sua filha Beatriz, irmã
gêmea de Samuel, apresentado como único integrante da família que não é obeso.
Essa família apresenta um relacionamento forte entre as figuras parentais, com um
relacionamento alienante dos filhos e com a presença de muita libido. Entre eles,
não importa o sobrepeso e ambos aparentam estarem felizes com suas figuras
físicas. O que leva Párroco a procurar o grupo é o comprometimento da saúde,
alegando que todos os homens de sua família morreram aos 50 anos, fato que o
assuta, já que possui 49 anos.
A primeira integrante do sexo feminino a aceitar a proposta do terapeuta é
Núria, uma analista de Tecnologia da Informação cujo namorado foi trabalhar em

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outro país, com a sua ausência, Núria engordou 20 kgs, alegando não saber viver
sozinha e com medo da reação do namorado por sua atual forma física.
Outro casal apresentado é Andrés e Pílar, noivos demonstrados como
cristãos religiosos, inicialmente não aceitam a proposta da terapia, mas Pílar sim,
alegando que não se sente amada e por isso, recorre ao alimento como fonte de
afetivo.
E, por último, Enrique é um obeso, mas já foi o inventor de um método
revolucionário para emagrecer, as pílulas Kiloaway, homossexual assumido, perde
os direitos e a sua fortuna quando volta a ganhar peso, demonstrando de imediato à
falha em seu produto, uma vez que para se perder peso, é necessário também um
acompanhamento psicológico e físico.
Com o desenrolar do filme, o método terapêutico funciona e todos perdem
peso, mas com isso os verdadeiros motivos que levaram todos os integrantes a
ganharem peso são revelados, e todos são basicamente ter o alimento como uma
fonte de afeto, tanto em uma tentativa desesperada de internalizá-lo quanto de
repelí-lo.
Assim, fica claro que casal religioso se utiliza do alimento para fazer com que
a noiva engorde e assim fique menos atraente sexualmente para seu noivo e ambos
possam manter a castidade pré-matrimonial. Quando ela perde peso, a castidade
não é mantida e por ser algo socialmente não aceito, volta a ganhar peso para
esconder a gravidez.
A obesidade era o fato que ligava a família de Párroco, e a filha que antes era
tida como não integrante na família e motivo de abuso verbal por parte do irmão, se
torna um fator determinante na identidade grupal da família, retirando o filho magro
da mesma, quando comprovado através de um teste de DNA que não é realmente
filho biológico do pai.
Foi também através do alimento que Núria começou a sabotar seu
relacionamento amoroso, assim, engordando, encontrou uma forma para que seu
namorado a rejeitasse, por causa de sua figura física. Com o retorno do namorado e
a aceitação dele pela sua figura física, torna-se claro que a tentativa de sabotar seu
relacionamento falha, e Núria é a única a realmente perder peso.
O antigo garoto propaganda das pílulas milagrosas para perder peso, volta a
ganhar peso e assume a esposa do antigo sócio e se torna o assassino do mesmo,

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unindo com a psicopatologia da mulher, que aceita a morte do marido na tentativa
desesperada de ter alguém como companheiro, e o antigo homossexual assume sua
heterossexualidade.
Por último, o terapeuta percebe as falhas em sua terapia quando começa a
repelir sua esposa quando ela perde a forma física dada como ideal, já que por
conta da gravidez engorda alguns kilos e por isso, seu desejo pela mesma se perde,
deixando claro que a terapia era uma grande projeção do terapeuta em seus
pacientes por conta de sua não aceitação da figura física obesa, transmitindo essa
frustração aos seus pacientes.

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VISÃO DE IMAGEM CORPORAL, TRANSTORNOS COMPULSIVOS
ALIMENTARES E AFETO

Imagem Corporal e Beleza Contemporânea

Um dos temas mais discutidos na contemporaneidade são os temas


relacionados à Imagem Corporal, e são frequentemente associados ao bem-estar,
moda, saúde e também é tido como elemento a ser atingido, ou seja, é internalizado
e com isso, coloca todos os indivíduos em um mesmo nível e que deverá ser
atingido, são os modelos e os padrões atuais de beleza.
Como afirma Ruffino (1993), as sociedades modernas vão, cada vez mais,
homogeneizando comportamentos, e cada grupo social vai perdendo seus traços
culturais característicos. E com isso, o padrão que é aceito hoje em dia é ser magro
e com traços atléticos. A imagem corporal então é diretamente ligada à beleza, e
sendo um nivelamento social, acaba criando um comportamento para se atingir essa
beleza.
Sendo a beleza ligada com a imagem corporal, as duas unidas vão se
desenvolvendo com a puberdade e o início da adolescência, como um produto da
relação do indivíduo consigo mesmo e com os outros. Nas palavras de Lourenção
Van Kolck (1984), a imagem corporal é uma unidade adquirida, é dinâmica, portanto
alterações corporais provocam mudanças na imagem corporal, e esse fenômeno é
particularmente intenso na adolescência.
É inclusive nesse momento de vida, que com o aumento da necessidade de
criar relações sociais e intensificar a noção de eu relacional, o adolescente começa
a criar certos comportamentos que ajudam na identificação grupal, assumindo cada
vez mais a sua identidade individual e relacional.
Mas nos dias atuais, além da falta do apoio social para lidar com suas
transformações, as jovens deparam-se com os modelos de beleza e com a extrema
valorização da aparência veiculada pelos meios de comunicação. É preocupante o
fato de que esses modelos sejam internalizados, sem ser questionados, como algo
natural do sujeito.
Como afirma Kehl (2001), a intensidade com que os meios de comunicação
atingem as culturas é mais intensa que a capacidade de assimilação das pessoas,
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fazendo com que o que se vê seja incorporado sem ser simbolizado. Em nossa
sociedade, há uma desconsideração da subjetividade e uma supervalorização da
imagem, um culto narcísico ao corpo, que é vendido como objeto de consumo, onde,
mais importante do que sentir, pensar, criar, é ter medidas perfeitas, considerando-
se o padrão de magreza como ideal. Assim, a adolescente, que já tem que lidar com
suas transformações físicas, é colocada frente a esses modelos e à impossibilidade
de corresponder a eles.
O excesso de preocupação com a aparência e o aumento da insatisfação com
o corpo, principalmente com o peso, na contemporaneidade, tem sido objeto de
muitos estudos científicos. Esse interesse é motivado pelo reconhecimento do
crescimento dos distúrbios alimentares em garotas adolescentes e mulheres jovens,
principalmente. (Striegel-Moore, 2001)
De acordo com Louro (2004), entre tantas marcas, ao longo do século, a
maioria das sociedades vem estabelecendo a divisão masculino/feminino como uma
divisão primordial.
Uma divisão usualmente compreendida como primeira, originária ou essencial
e, quase sempre relacionada com o corpo. É um engano, contudo, supor que o
modo como pensamos o corpo e a forma como, a partir de sua materialidade
“deduzimos” identidades de gênero e sexuais seja generalizável para qualquer
cultura, para qualquer tempo e lugar (Louro, 2004).
Com isso, a imagem corporal pode ser definida como constructo com
múltiplas facetas, integrado de uma variedade de dimensões mensuráveis
(Thompson, 2004), que se desenvolve por meio de pensamentos, sentimentos e
percepções acerca da própria aparência geral, das partes do corpo e das estruturas
e funções fisiológicas (Hart, 2003).
Já dentro da Teoria Analítica, Jung dita que a relação sincronística entre o
corpo e o universo aparece nas teorias orientais, como um mapa do universo. O ser
humano é um espelho do campo à sua volta, e a estrutura desse campo é dada pela
constelação de planetas ou arquétipos do tempo. O conceito do corpo como uma
manifestação do universo é também mostrado na Astrologia, onde partes do corpo
são governadas pelos planetas. Como disse Jung (1961, p. 101):

Nossa psique é estruturada à imagem da estrutura do mundo, e o que


ocorre num plano maior se produz também no quadro mais íntimo e subjetivo
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da alma”. O homem satisfaz, segundo ele, a necessidade da expressão
mítica, quando possui uma representação que explique suficientemente o
sentido da existência humana no cosmos, representação que provém da
totalidade da alma, isto é, da cooperação do consciente e do inconsciente. “A
carência de sentido impede a plenitude da vida e significa, portanto, doença.

Em “O Segredo da Flor de Ouro”, Jung mostra que só é possível


compreender aspectos metafísicos quando podemos torná-los objeto da psicologia,
e que sua admiração pelos grandes filósofos do oriente baseia-se na sua crença de
que eles fazem psicologia simbólica e que seria um erro, portanto, tomá-los
literalmente. A ideia do corpo diamantino, do corpo alento incorruptível que nasce na
flor de ouro, ou no espaço da polegada quadrada, é uma dessas afirmações
metafísicas. Esse corpo é como os demais, um símbolo de um fato psicológico
muito importante, o qual, por ser objetivo, aparece primeiramente projetado em
formas dadas através de experiências da vida biológica: fruto, embrião, criança,
corpo vivente, etc. Tal fato pode expressar-se melhor pelas palavras: não sou eu
que vivo, mas sou vivido.
Cada situação de vida é simbólica e cada símbolo representa uma situação
da vida. Assim como o desenvolvimento corporal, o psíquico também é dirigido pelo
dom da infância transpessoal, fenômeno que chamam os de “arquétipo”.
A primeira vivência é a da Grande Mãe, e ninguém discorda da importância
desse relacionamento mãe/criança, na longa caminhada da vida. A psicologia
mostra-nos que a experiência e conhecimento que a criança começa a ter no mundo
e com o mundo inicia-se com o simbolismo do corpo. A vivência tônica do recém-
nascido com a mãe ou substituta é de crucial importância no desenvolvimento da
personalidade.
É a fase matriarcal, cuja linguagem simbólica nos diz que a realização do
desejo predomina, é a natureza espiritual da mulher, é o tempo lunar, a fertilidade, o
tronco, o ventre, a matriz, o centro onde irradia a sociedade corporal. É o lugar do
coração, do inconsciente, da intuição, dos instintos da vida e do relacionamento. O
lugar de toda fecundidade: a mulher – a Grande Deusa – matéria-prima.
Pode-se concluir então que o conceito de auto-imagem internalizado e
concluído através da busca arquetípica da Grande-Mãe também produz o padrão de
beleza, produzindo uma homogeinização de comportamentos em busca desse
arquétipo. Esses comportamentos ditam o padrão de beleza contemporâneo.

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Afetividade

No presente trabalho, associamos a figura do corpo ao afeto, uma vez que é o


padrão social de beleza atual que dita quais são os indivíduos que são aceitos e
quais são os excluídos.
Para Nise da Silveira, em seu artigo “O mundo das Imagens” no qual aborda a
temática de esquizofrenia, comenta sobre o afeto. Aqui cabe uma rápida
comparação entre esquizofrênicos e feios/gordos, por serem em ambos os casos,
alienados socialmente. Diz:
“Nessa apologia do afeto, não sejamos demasiado ingênuos, pensando que
será fácil satisfazer as grandes necessidades afetivas de seres que foram tão
machucados, e socialmente tão rejeitados”. Um deles escreveu:

"De que serve colher rosas


Se não tenho a quem ofertá-las?"

A afetividade, no âmbito da constituição psíquica, é descrita como estrutura


elementar presente desde o nascimento do indivíduo, que preside o pensamento e a
ação, o intelecto e a vontade. Desenvolver a afetividade (...) pode possibilitar uma
ampliação do olhar frente ao mundo e também uma escuta diferenciada, permitindo
que novos significados possam ser atribuídos a velhas situações, proporcionando a
compreensão da noção do todo e sua complexidade em detrimento à tendência de
isolar os fatos; restringindo, assim, as experiências vividas. (ARCURI, 2012)
Na busca pelo afeto não é incomum a projeção em objetos externos que
permitem temporariamente sanar a angústia criada pela falta de afetividade,
angústia imposta a todos os indivíduos que naturalmente buscam o gozo e a
satisfação egoica que o afeto proporciona.
De acordo com Jung, a projeção é um processo inconsciente automático,
através do qual um conteúdo inconsciente para o sujeito é transferido para um
objeto, fazendo com que este conteúdo pareça pertencer ao objeto. A projeção
cessa no momento em que se torna consciente, isto é, ao ser constatado que o
conteúdo pertence ao sujeito.” (JUNG, 1961)

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Tornando a falta, a angústia e a vontade em formas conscientes e possíveis
de se obter, a comida pode ser considerada um forte objeto, tanto pela facilidade em
encontrá-la quanto pelo prazer real que uma alimentação proporciona ao indivíduo
em âmbito físico, biológico e psíquico que permite ao indivíduo ter noção de si
mesmo, uma vez que sentidos físicos são mais intensos, facilmente percebidos e
aceitos.
A projeção tem, também, efeitos positivos. No dia-a-dia, ela facilita as
relações interpessoais. Além disso, quando supomos que alguma característica ou
qualidade está presente em uma pessoa, e constatamos, então, pela experiência,
que a suposição não tem fundamento, podemos aprender algo sobre nós mesmos.
(SHARP, 1993, p.127-8)
A compreensão de Jung acerca da projeção é, até certo ponto, próxima da
psicanálise, especialmente em seu aspecto estrutural, segundo Jung, “A projeção,
onde quer que os conteúdos subjetivos sejam transportados para o objeto, surgindo
como se a ele pertencesse, nunca é um ato voluntário” (JUNG, 2000, p. 146).
Embora a teoria das relações objetais não possuam um equivalente explicito
do SELF, sugeriu-se que este conceito é implícito ou que uma tal idéia é compatível
com relações objetais (SUTHERLAND, 1980).
As projeções uma vez transformadas em temas conscientes e perceptíveis ao
indivíduo podem provocar culpa e falta de equilíbrio, esbarrando no quesito
socialmente aceitável ou não. Como é o caso da manutenção da figura física
considerada bela (magreza). Fazendo a projeção, o cálculo inconsciente poderia ser
resumido em: se eu comer eu me sinto bem, mas tenho culpa por não ser magro,
prefiro ser infeliz, mas aceito pela sociedade, isso gera afeto.
A necessidade de retirar as projeções é, geralmente, indicada por
expectativas frustradas nos relacionamentos, acompanhadas de um forte afeto. Jung
era da opinião, contudo, que enquanto houver uma discordância óbvia entre aquilo
que imaginamos ser verdade e a realidade que se nos apresenta, não há
necessidade de se falar em projeções e menos ainda de retirá-las. (SHARP, 1993).
Com isso, é possível observar que o afeto e a comida possuem entre si uma
relação objetal inconsciente que adentra o campo consciente a partir do momento
que atinge o corpo na forma de sintoma, tanto em formas moderadas como a fome e

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em formas mais graves, como compulsões alimentares tema que será discutida a
seguir.

Compulsão Alimentar

Conceituaremos duas visões sobre o transtorno de compulsão alimentar, o


conceito e a visão da psicologia analítica.
A compulsão alimentar é um transtorno caracterizado por comportamentos
recorrentes e está associado à perda do controle no consumo da comida. Quando
pensamos em compulsão alimentar ou comer compulsivo, estamos nos referindo à
pessoa que come grande quantidade de alimentos rapidamente, perde o controle e
não consegue interromper a refeição mesmo quando se sente estufada ou
plenamente saciada. Para caracterizar esse comer como doença é preciso que
ocorra pelo menos duas vezes por semana. A compulsão alimentar pode ocorrer em
pessoas de qualquer sexo, raça, idade ou posição socioeconômica.
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-
IV) Os Transtornos Alimentares são nomeados em três categorias:
Anorexia Nervosa: recusa do alimento devido à imagem distorcida corpórea, a
pessoa tem a percepção de estar além de seu peso, tem medo intenso de engordar
e entra em dietas drásticas, chegando a desnutrição de seu corpo.
Bulimia Nervosa: episódios de compulsão alimentar, seguidos de métodos
compensatórios para a prevenção do aumento de peso. Estes métodos são a
indução do vomito, ingestão de laxantes, diuréticos, exercícios em excesso.
Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica: episódios de compulsão
alimentar, associados a sintomas específicos relativos à perda de controle alimentar
seguidos de angústias relativo ao comportamento alimentar. Na compulsão
alimentar periódica não há eliminação do conteúdo.
O pensamento analítico tem como base o indivíduo como o todo, sua
abordagem trata o desenvolvimento das funções psíquicas do indivíduo e tudo o que
a ela esta relacionando, seja biologicamente, culturalmente, socialmente,
psicologicamente, etc.. O desenvolvimento do indivíduo está diretamente ligado em
suas relações sociais e experiências vividas, experiências estas que podem ser
positiva ou negativa, ativando todos os mecanismos envolvidos na psique e no Self,

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afetando tanto o mental como o corpo físico, criando defesas para combater os
sintomas apresentados, geralmente, inconscientemente. Uma dessas defesas é a
projeção e a compensação para melhor lidar com estes conflitos internos. Uma das
formas de compensação é eleger um “objeto de prazer” projetando suas dificuldades
em lidar com si mesmo. Cada indivíduo adquirirá um objeto, podendo eles ser a
comida, sexo, compras, álcool, etc., podendo desenvolver as dependências, abusos
e compulsões.
E é com o enfoque mente e corpo que desenvolveremos a visão que a
psicologia analítica nos trás sobre os transtornos alimentares.
Ao nascermos criamos a necessidade de desenvolver uma consciência
corporal, que inicialmente está intimamente relacionada aos cuidados básicos da
mãe (cuidadora) e se isso não ocorrer o indivíduo não desenvolverá a
conscientização corpórea (sua imagem como um todo), ativando complexos e
levando-o ao distanciamento de seu self, sua alma, sua essência. Desta forma,
criando um vazio interior que necessita ser preenchido com algo ou alguma coisa,
“objeto”, podendo desenvolver diversos tipos de compulsões e dependências para
suprir esta carência de si próprias.
Temos uma imagem arquetípica da grande mãe cuidadora, que será
desenvolvida ao longo de nossas vidas, mas os primeiros cuidados básicos serão
marcantes para a vida do bebê/criança. No caso da compulsão alimentar, se a mãe
não for capaz de reconhecer o seu corpo e feminilidade, consequentemente não
conseguirá se amar como seres femininos completos e não transmitiram o amor
necessário aos seus filhos, gerando um grande medo e irão profundas inconscientes
nestes primeiros momentos da vida da criança.
Desta forma, este afeto e carinho não transmitido pela mãe pode se
transforma na figura simbólica da comida, levando a anorexa rejeitar a comida e a
bulímica a socar a comida “goela abaixo” em atitudes desesperadoras na busca de
aceitação ou rejeição desta mãe.
Com a ingestão ou a falta do alimento/comida, o corpo projeta na estrutura
física as consequências pelo ato compulsivo, mostrando, claramente, sinais de
advertência que algo não está correto, já que a pessoa não consegue perceber as
alterações psíquicas que vem ocorrendo em seu processo de desenvolvimento.

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Assim, o corpo envia sinais de advertências que devem ser ouvidos e
obedecidos e não de ser ignorados. O corpo nos protege e nos guia aos mostrar
estes sinais e sintomas nos levando a uma tentativa de religação com nós mesmos,
com a alma/essência perdida, esse é o padrão de beleza.
A criança, em seu desenvolvimento inicial expressa toda a sua naturalidade
criativa de expressão, é sua alma expressando a sua vida plena e total. Com o
decorrer do desenvolvimento está naturalidade acaba sendo silenciada pelas
imposições inconscientes dos pais, da sociedade que já estão “adoecidos”, pois não
se consegue perceber esta expressão. Assim a criança se torna um adulto faminto e
vazio, buscando algo para preencher este buraco através de objetos simbólicos,
como a comida, compras, sexo, álcool, etc. Criando uma rejeição profunda de si e
do corpo.
Também a grandes exposições da criança a valores sociais como ter bom
emprego, ter estabilidade, ser bom esposa/esposa, ser bons pais, etc., desta forma
fazendo que o ser humano corra e corra indiscriminadamente atrás destes objetivos,
e isto, pode se tornar algo compulsivo transmitido a criança, se vendo responsável
em realizar os mesmos padrões de comportamento, buscando aprovações
exteriores.
Ao chegarmos a idade adulta desenvolvemos está mesma correria frenética
aos valores transmitidos que acaba nos servindo para afastar do trágico medo de
não sermos amados, causando grande terror interior que nos leva a
comportamentos autodestrutivos. Desta maneira, o adulto cresce acreditando que o
exterior, esquecendo de amar-se, não desenvolvendo seu potencial arquetípico.
Passando a buscar o amor externamente esquecendo-se de amar a si mesmo,
desenvolvendo a sensação de ser necessário agradar ao outro e esquecendo de si.
Woodmaan (2003, p. 67) afirma isto quando diz que:
O processo de crescer se torna um exercício de adivinhação de como
agradar os outros, em vez de uma expansão por meio de experiências. Não
há crescimento sem sentimentos autênticos. As crianças que não são
amadas em seu próprio ser não sabem como se amar. Quando se tornam
adultos, têm de aprender a alimentar sua criança perdida, a ser a sua própria
mãe.

E como alimentar esta criança perdida? Uma das formas é desenvolvendo a


compulsão alimentar, comendo e comendo suprindo a nutrição da alma,
fantasiosamente, gerando sintomas que causam o distanciamento do corpo e de si
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mesmo, instigando uma ira íntima que se não compreendida e transformada
acumula de geração a geração.
Sendo assim, é necessário que este adulto com a compulsão resgate em seu
interior, a criança que foi calada, recuperando a sua alma e se responsabilizando
pela sua própria vida de modo criativo e espontâneo, fugindo assim do vazio e
criando real sentimento de pertencimento. Mas este não é um processo fácil de ser
reconhecido e transformado, é necessário que haja o reconhecimento do que o faz
se ligar a este objeto de compensação (a comida), trabalhar sentimentos de
frustações, autocrítica e auto avalição como forma de prevenir o comportamento
compulsivo e consiga realizar o seu processo de individuação.

21
CONCEITOS DA PSICOLOGIA ANALÍTICA

Neste capítulo abordaremos brevemente alguns dos conceitos da Psicologia


Analítica.

Inconsciente Coletivo

Em seus escritos, Jung postula que existem fatores que nos são natos e até
instintivos, com os quais dependemos para nossa sobrevivência, como por exemplo,
o ato de sentirmos fome ou até mesmo a necessidade de socialização desde as
primeiras concepções de ego.
Estas reações e impulsos parecem ser, aparentemente, de natureza pessoal
muito íntima, e nós os consideramos apenas uma forma de comportamento
idiossincrásico. Na verdade, fundamenta-se num sistema instintivo pré-formado e
sempre ativo, característico do homem. Formas de pensamento, gestos de
compreensão universal e inúmeras atitudes seguem um esquema estabelecido
muito antes de o homem ter desenvolvido uma consciência reflexiva.
As maiorias dessas funções vitais que nos são herdadas fornecem um
equilíbrio inicialmente físico nos classificando em uma única origem, a de ser um
autentico ser humano. Ninguém nos ensina a ter fome ou mesmo a querer um
alimento quente e fresco, ou ainda não temos que passar por alguma situação
desagradável para sabermos que precisamos disso.
O próprio Jung explica essa questão com outra levantada: A maioria deles
nem conhece os pais e não tem ninguém para ensinar-lhes nada. Então por que
supor que seria o homem o único ser vivo privado de instintos específicos, ou que a
sua psique desconheça qualquer vestígio da sua evolução?
Uma vez esclarecido a necessidade de existir esses impulsos primários na
sobrevivência do ser humano, os pensamentos inatos a todos os indivíduos de uma
determinada sociedade, também se fazem necessários para uma sobrevivência
geral dos indivíduos que por semântica são únicos.
Pela questão do ser humano ser sociável de natureza, são postulados alguns
padrões e objetivos e essas “normas” que devem ser seguidas, de certa forma

22
nivelam todos os indivíduos daquela sociedade, mas de certa forma, mesmo
nivelados continuam únicos com tantas propriedades possíveis.
Contudo, esses indivíduos teoricamente únicos, devem seguir as normas que
são comuns a todos, nesse processo, abandonam algumas de suas características e
adotam as do grupo. Esse processo, em suas palavras: “Como os instintos, os
esquemas de pensamentos coletivos da mente humana também são inatos e
herdados. E agem quando necessário, mais ou menos da mesma forma em todos
nós” (JUNG, 1919, p. 219–237).
Essa dualidade entre o que é herdado e comum a todos e o que é individual
faz a sociedade ser saudável, uma vez que, esse dualismo permite que haja essa
troca de informações sem que as características do self se dissolvam: E mesmo
então precisamos ter em conta o equilíbrio mental (ou "sanidade") da pessoa em
causa. Pois o resultado não poderá ser um nivelamento coletivo do indivíduo para
ajustá-lo às "normas" da sua sociedade, já que tal procedimento levá-lo-ia a uma
condição totalmente artificial. Uma sociedade saudável e normal é aquela em que as
pessoas habitualmente entram em divergência, desde que um acordo geral é coisa
rara de existir fora da esfera das qualidades humanas instintivas.
Também em sua teoria de Psicologia Analítica, muito do que é explicado
como Inconsciente coletivo provém da Filosofia grega, com o qual Jung explica
através dos Arquétipos as ideias centrais que lideram o ser humano. É através dos
arquétipos que os indivíduos possuem características que os nivelam e mantem
suas características individuais.
Como citado em O Homem e seus Símbolos, Jung chamou "o inconsciente
coletivo" isto é, a parte da psique que retém e transmite a herança psicológica
comum da humanidade. Estes símbolos são tão antigos e tão pouco familiares ao
homem moderno que este não é capaz de compreendê-los ou assimilá-los
diretamente.

Inconsciente Pessoal

Diferente do inconsciente coletivo o inconsciente pessoal provém de


conteúdos das experiências vividas pelo indivíduo e não pertencem a sua
consciência.

23
O inconsciente pessoal refere-se às camadas mais superficiais do
inconsciente. Seu conteúdo são experiências que não foram aceitas pelo ego e
foram reprimidas ou desconsideradas por diversos motivos. São conteúdos
dolorosos, esquecidos propositalmente e é constituído por diversos complexos.

Arquétipo

Jung em seus estudos observou que seus pacientes traziam conteúdos que
eram, por diversas vezes, imagens espontaneamente e temas semelhantes aos da
mitologia grega, mitologia egípcia, entre outras culturas. Diante destes fatos Jung
percebeu que todos os indivíduos possuem um “modelo original” ou “imagens
primordiais” que denominou como Arquétipos.
Arquétipo é uma fonte primária de energia organizadora da psique.
Funcionam como centros autônomos que tendem a produzir, em cada geração, a
repetição e a elaboração dessas mesmas experiências. Eles se encontram isolados
uns dos outros, embora possam se interpenetrar e se misturar. São predisposições
natural que surgem na consciência como imagens, padrões ou motivos recorrentes e
universais que representam e simbolizam a experiência típica humana universal de
diferentes maneiras.
Todos os indivíduos herdam as mesmas imagens arquetípicas básicas,
universais, e no decorrer de suas vidas estes arquétipos, que são inconscientes,
passam a consciência se transformando em imagens arquetípicas, imagens estas
que se formam conforme as experiências de cada indivíduo, aparecendo assim às
diferenças individuais e essenciais criadas a partir destas experiências individuais.
Os arquétipos formam os complexos, pois constituem o núcleo de um
complexo atraindo para si experiências significativas para vida dos indivíduos.
Alguns dos arquétipos são da mãe, do pai, da criança, do herói, dos deuses,
do velho sábio, entre outros. São muitos os arquétipos gravados em nossa psique
em formas sem conteúdos que representam a possibilidade de um certo tipo de
percepção e ação (HALL E NOIRDBY 2005).
Hillman (1983) cita que o conceito de arquétipo como sendo fundamental na
obra de Jung, refere-se aos arquétipos como importante processo no funcionamento
psíquico e descreve o modo pelo qual percebemos e nos relacionamos com o

24
mundo.

Complexo

No inconsciente pessoal estão os complexos, aglomerados de sentimentos,


pensamentos e lembranças carregados de forte potencial afetivo, incompatíveis com
a atitude consciente. São agrupamentos em torno de um núcleo central que é uma
imagem arquetípica que atrai em torno de si várias experiências. Um complexo é a
imagem de qualquer experiência que provocará uma reação fortíssima, com força
própria, que pode atuar de modo arrebatador e intenso no controle de nossos
pensamentos e comportamentos.
Os complexos em si não são negativos, são blocos estruturais de nossa
psique e a fontes de todas as nossas emoções, sendo assim, podem também atuar
positivamente em nossa psique. Reconhecemos quando um complexo é ativado
quando emoções interferem no equilíbrio psíquico e perturba a função costumeira do
ego. São como pequenas personalidades independentes, autônomas e separadas
da personalidade total e características necessárias da vida psíquica. Quando, os
complexos, entram em ação, se constelam, contribuem para o comportamento e são
marcados pelo afeto, quer uma pessoa esteja ou não consciente deles.
Os complexos são formados por fatores culturais, sociais e familiares,
posteriormente estes complexos são “pegos” por cada indivíduo e a maioria acabam
sendo gerados com base nas experiências e história especifica vivida por uma
pessoa e são exclusivamente desta pessoa. Isto porque o inconsciente é estruturado
por padrões e atitudes culturais mais amplos, os quais acabam por influenciar as
atitudes conscientes do indivíduo e os complexos mais significativos dentro de um
contexto de pressupostos culturais inconscientes.
Quando uma pessoa é dominada por um complexo, ela se sente totalmente
impotente e incapaz de controlar suas emoções. Os estímulos que provocam o
complexo podem ser insignificante ou grandioso, de longa ou curta duração, mas os
seus efeitos sobre a psique podem continuar por extensos períodos de tempo e
chegar á consciência em ondas de emoção e ansiedade.

25
Existem diversos tipos de complexos atuando em nossa psique, mas Jung
aborda o complexo materno como um dos mais importantes na vida do indivíduo,
por isto descreveremos este complexo com mais atenção no próximo subtítulo.

Complexo Materno

“Mãe é amor materno, é a minha vivência e o meu segredo. O que mais


podemos dizer daquele ser humano a que se deu o nome de mãe, sem cair no
exagero, na insuficiência ou na inadequação e mentira – poderíamos dizer –
portadora casual da vivência que encerra ela mesma e a mim, toda humanidade e
até mesmo toda criatura viva, que é e desaparece, da vivência da vida de que
somos os filhos?” (JUNG, 2007, 33).
O Complexo Materno poderia ser explicado com o momento exato que os
pontos sensíveis da Psique fazem referencia à mãe, ou todos os momentos que
foram marcados na psique infantil que será carregada pelo ego em desenvolvimento
por toda a vida.
Todos os indivíduos nascem com a característica de serem completamente
dependentes da mãe, é ela quem o alimenta e quem o acalma, dando todo o suporte
físico e afetivo tão importante em todas as fases da vida. Sendo a mãe uma função,
não necessariamente será a mãe biológica a pessoa responsável por esse
compromisso, podendo também ser a tia, uma babá, a irmã, e como citado, a mãe
ideal é aquilo que a pessoa considera ser maternal (CORNEAU, 1999).
Essas demonstrações afetivas desde os primórdios marcam os seres
humanos, é com essas marcas, que no futuro serão determinantes nas relações
sociais além das concebidas com a figura materna. É através desse laço afetivo que
o individuo estará apto a socializar com outras pessoas.
O complexo materno vai então se construir ao longo da vida, e pessoas que
na infância sempre foram amadas pela mãe, que sempre tiveram sua atenção e
dedicação será marcada por um complexo materno originalmente positivo (KAST,
1997).
Ao longo da vida, esse vínculo com a mãe deve ser resolvido a ponto de cada
vez mais o individuo ficar liberto dessa relação e criar vínculos com outras pessoas,
inclusive com a ajuda do pai e de outras redes sociais, como a escola e como as

26
relações com irmãos. Mas ela nunca é esquecida, sendo sempre relembrada com as
figuras primárias contidas no mundo e comum a todos os seres humanos. São os
arquétipos, dentre eles, aquele que revive a dependência da mãe: o arquétipo da
grande mãe.
Portanto, a idéia de Complexo Materno é quando esse vínculo é trazido à
mente por alguma situação que força uma lembrança inconsciente dessa marca
negativa essencial do individuo. Seja nas relações sociais e afetivas posteriores ao
primeiro vínculo, ou simplesmente quando o arquétipo que simboliza a mãe é
colocado em pauta na vida do indivíduo.
O complexo materno apresenta certas características, como: ansiedade,
necessidade de quebra de contrato, agressividade, persecutoriedade e desrespeito
às regras sociais, portanto, pode-se afirmar que dentro deste complexo estão todas
as dependências e drogadições (SANTOS E MURO, 2004).
Existe um padrão que é arquetípico no complexo de inferioridade, no qual a
pessoa se acostuma com a forma destorcida de ganhar amor, que leva a uma
fixação nesse processo propiciando o auto-boicote. Este complexo está estritamente
associado à criação, rejeição dos pais e falta de afetividade, portanto, para que o
indivíduo possa suportar viver no complexo de inferioridade ele infla seu ego, ou
seja, aparenta uma superioridade que não possui.

Persona

Persona eram máscaras usadas no teatro grego que definia os papéis


característicos dos personagens, formando assim uma personagem e uma
personalidade. Sentido este que utilizamos em nossas vidas como máscaras
psíquicas coletivas, que aparenta uma individualidade na adaptação social
(situações sociais), em outras palavras significa a pessoa tal como é apresentada e
não a pessoa como real. Podemos dizer que persona são máscaras ou face que
uma pessoa põe para confrontar o mundo.
A persona é à base da vida social, pois é através dela que nos apresentamos
ao mundo em suas diversas facetas exigidas de nós em determinados ambientes:
familiares, profissionais, escolares, etc., momento em que a pessoa assume atitudes
especifica, podendo ser representadas conscientemente ou não.

27
Uma atitude pode ser manifesta ou latente, mas esta atuando constantemente
a fim de orientar uma pessoa para uma situação ou um ambiente. Além disto, uma
atitude e uma combinação de fatores ou conteúdos psíquicos que terminarão a ação
nesta ou naquela direção definida. Quanto mais tempo uma atitude persiste e quanto
mais frequentemente ela for chamada a satisfazer as exigências do meio, mais
habitual ela se torna. (STEIN 2006).
Desta forma podemos dizer que a persona pode ter um caráter positivo
quanto negativo. Se positivo proporcionará a pessoa se adequar as diversas
situações sociais, mas se negativas a pessoa se deixa tomar por este personagem
que acaba assumindo sua essência e passa a desempenhá-la em excesso e seu
ego passa a identificá-la como papel único, tornando-se alheio à sua natureza e vive
em estado de tensão em razão do conflito entre a persona superdesenvolvida e as
partes subdesenvolvidas de sua personalidade.
A persona serve também como proteção contra nossas características
internas as quais achamos que nos desabonam e, portanto, queremos esconder.
Resumindo a persona é um arquétipo de adaptação social que a princípio tem
o caráter do inconsciente coletivo e posteriormente vai se adequando ao
inconsciente pessoal, conforme as atitudes necessárias a serem tomadas no
cotidiano do indivíduo.

Sombra

A Sombra é a parte obscura da personalidade, é o outro lado da psique. É uma


unidade complexa com vida autônoma, contém o lado negativo de cada indivíduo,
expressando o lado não aceito da personalidade, são as características, atitudes,
memórias e desejos inaceitáveis, experiências rejeitadas da pessoa, portanto, a
sombra se torna incompatível com os padrões e ideias sociais, representando o que
consideramos inferior em nossa personalidade e também o que negligenciamos em
nós mesmos.
A sombra, apesar de seu aspecto sombrio, também possui o seus aspectos
positivos, quando em harmonia com o ego, deixa a vida com mais vigor e riqueza,
incentivando a criatividade, insights, espontaneidade, busca para soluções, busca

28
recursos internos para lidar com dificuldades emocionais, características estas
importante para o desenvolvimento do indivíduo.
Ao tornar-se consciente a sombra é integrada ao eu, o que faz com
que se opere uma aproximação à totalidade. A totalidade não é a perfeição,
mas sim ser completo. Pela assimilação da sombra, o homem como que
assume seu corpo, o que traz para o foco da consciência toda a sua esfera
animal dos instintos, bem como a psique primitiva ou arcaica, que assim não
se deixam mais reprimir por meio de ficções e ilusões. (JUNG, 1999, p 6-28).

Desta forma, devemos considerar a sombra como uma personalidade viva,


carregada de intenções, sentimentos e ideias, que se constitui de elementos com
fortes bases morais, guardando em si os traços obscuros da personalidade do
indivíduo e grande carga emocional.

Símbolo

A palavra “símbolo” origina-se do grego symbolon, que significa um sinal de


reconhecimento (KAST 1997). Como sinal de reconhecimento o símbolo só é
símbolo quando combinado com algo ou alguma coisa, sendo desta forma algo
composto.
O símbolo possui dois lados o externo e o interno, ele poderá surgir na psique
de externamente ou internamente representando uma conexão interna para o
indivíduo.
O símbolo é a representação da linguagem da psique inconsciente,
geralmente manifestados através de imagens oníricas, fantasias, metáforas, contos
de fadas, mitos, etc, de maneira bastante espontânea.
A interpretação de um símbolo deverá buscar não somente uma única
definição, mas ampliar ao máximo seus significados e simbolizações para que se
possa descobrir o sentido oculto que o símbolo trará em determinada situação. É
necessário vivenciar os símbolos e não apenas vê-los como sinais, é necessário
sentir e tocar o símbolo emocionalmente com toda a sua magnitude para que
realmente entremos em contato com o que ele busca nos dizer para que haja a
transformação do que o símbolo quer realmente representar.
Ao estabelecermos uma relação verdadeira com o símbolo, possibilitamos
que tudo que está ligado a este símbolo possa torna-se repentinamente vivo,
permitindo que vivencie uma série de experiências psíquicas tornando-os
29
significativos.
Os símbolos podem ser representados como dito anteriormente por imagens
arquetípicas, mas também podem ser manifestadas pela exposição de lembranças
negativas, angústias, situações corriqueiras do dia-a-dia.
Os símbolos que recebem uma amplificação de seu significado podem ser
reconhecidos como aspectos das imagens que controlam, ordenam e dá sentido a
vida do indivíduo.
Dentro da psicologia analítica o símbolo possui grande importância, devido a
sua capacidade para transformar a energia natural em formas culturais e espirituais.

Processo de Individuação

É um dos conceitos centrais da Psicologia Analítica de Jung. É o processo de


desenvolvimento da personalidade pela diferenciação psicológica do eu. É um
processo no qual o Ego visa tornar-se diferenciado da coletividade, embora nela
vivendo, ampliando suas relações.
Para se alcançar a individuação é necessário se evitar as tendências coletivas
inconscientes. A individuação respeita as normas coletivas e o individualismo as
combate. O contrário à individuação é ceder às tendências egocêntricas e
narcisistas ou à identificação com papéis coletivos. A individuação leva à realização
do Self, e não simplesmente à satisfação do ego. É um processo dinâmico que
passa pela compreensão da finitude da existência material, objetiva, face à
inevitabilidade da morte física.
Um dos maiores trabalhos no processo de individuação, que consiste no
desenvolvimento da personalidade total, é sem dúvida a integração da sombra na
consciência. Uma vez reconhecida, a sombra, como parte de si mesmo, o ser
humano irá fazê-lo constantemente, pois os conteúdos sombrios não se esgotam,
porque sempre que houver processo de escolha, consciente, haverá também, o lado
que ficou negligenciado ou não escolhido, aquele que poderia ter sido vivido e não
foi. Neste sentido, a sombra estará sempre ao lado do indivíduo e focaliza o
resultado de suas escolhas.
Normalmente, reconhecer a sombra implica em “arrumar encrenca” e colocar
em questionamento toda a consciência de si: os hábitos, crenças, valores,

30
afetividade, etc. É um mergulho no desconhecido, é ficar sem chão, é perder o
apoio.

31
RELAÇÃO SOBRE AS DIFICULDADES AFETIVAS EM SER ACEITO
COMO EXPRESSÃO O SINTOMA DO TRANSTORNO ALIMENTAR E
A ANÁLISE DAS PERSONAGENS DO FILME GORDOS.

Ao longo do presente trabalho foi discutida a existência de um padrão de


beleza feminino e masculino atual que engloba todos os indivíduos da sociedade
Ocidental contemporânea. A partir dessa ideia, é possível dizer que as pessoas que
possuem o tão almejado corpo atlético e magro, considerado saudável e belo, fazem
parte de uma sociedade e por isso, são aceitos pela mesma.
Sendo um padrão, cria em todos os indivíduos características comuns que
podem modelar o comportamento em busca dele, tais como rotinas de dietas,
presença em academias, alimentações sem alguns componentes, como açucares e
gorduras e lojas de roupas com numerações pequenas para incentivar a compra dos
números pequenos.
Para Novaes E Vilhena (2003) em seu artigo: De Cinderela a moura torta:
sobre a relação mulher, beleza e feiúra, analisa brevemente a origem de tal padrão
de beleza que dita o “corpo humano moderno” e tenta explicar a origem desse
padrão social na sociedade atual.
Para Le Breton (1985), o corpo moderno é fruto do individualismo e do
descolamento do indivíduo do todo comunitário, causando-lhe um sentimento de “si
mesmo” antes de sentir-se membro de uma comunidade.
Segundo o autor, o advento do individualismo trouxe também o aparecimento
de um pensamento racional e laico sobre a natureza, bem como o afastamento das
tradições populares. Com a ruptura da antiga solidariedade que integrava o indivíduo
a uma coletividade e ao cosmos/natureza por meio de uma rede de
correspondência, em que tudo se correlaciona, importantes modificações ocorreram
nas formas de vínculo social.
Em nossa cultura o corpo torna-se a fronteira precisa que marca a diferença
de um homem a outro, sendo a marca do indivíduo e o lugar que, por excelência,
delimita sua soberania. Essa forma específica de individuação tem como
característica fundamental fazer com que a pessoa se diferencie de seus
semelhantes. Entretanto, o corpo não marca somente a distinção de cada um em
relação aos demais membros da comunidade à qual pertence; esse modelo permite
32
ao ator social conceber seu próprio corpo como uma propriedade, e não mais como
a sua essência, sinalizando, dessa forma, um modelo de possessão.
É a partir dessa premissa aqui proposta que os indivíduos são aceitos ou não
na sociedade moderna. Cabe aqui a análise daqueles que não se encaixam nesse
padrão, os excluídos socialmente e que carregam em si a angústia de não
reconhecer afeto em si mesmo, por si mesmo e consequentemente pelos outros.
O discurso do corpo fala das relações internas à sociedade – é também nele
que veremos expressar-se a busca da felicidade plena. Palco privilegiado dos
paradoxos e dos conflitos, o corpo que almeja sua singularidade é o mesmo que
tenta negar a diferença e a alteridade. A eterna busca da imortalidade transforma-o
em um corpo de encenação da obra de arte. Os discursos da saúde, da medicina,
do erotismo, tamponam o real que apavora: o mal-estar e a finitude. (NOVAES e
VILHENA, 2003).
A partir da premissa de que estar engajado em um padrão social de beleza o
faz possuir o afeto de si mesmo e estar apto a receber o afeto alheio, todos aqueles
que não se enquadram nessa teoria, carregam a angústia do desprezo. Essa linha
pode ser a explicação da existência das compulsões alimentares no que tange a
noção física de si mesmo e a noção psíquica de aceitação de si mesmo, caminho
imprescindível à Individuação, podendo projetar então no objeto: comida essa
frustração ou objeto de afeto.
O filme Gordos de Daniel Sánchez Arevalo, nos mostra exatamente esse
quadro. Mas precisamente as personagens: Núria, Terapeuta, Parroco, Abel e Pílar,
remontam essa aceitação de si e a visão de padrão de beleza e sociedade.
O casal de noivos, no qual todos os problemas de aceitação da figura física
estão projetados em Pílar que é um exemplo de repulsa ao objeto comida, uma vez
que Pilar quer se tornar sexualmente atrativa (dentro dos padrões sociais) e é
impedida pelo noivo, a mantendo acima do peso (fora dos padrões sociais) com o
objetivo de manter a castidade antes do casamento.
O casado Párroco, não liga para a figura física de sua esposa (acima do
peso) ou tampouco à sua. A questão é o medo da morte uma vez que todos de sua
família morreram em decorrência do sobrepeso. Mas apesar de o casal aparentar
estar feliz, a filha que está cada vez mais alienada tanto de si mesma, quanto da

33
unidade familiar, tem pela comida o afeto reconhecido e que guarda com muito zelo,
já que não o sente em nenhum outro objeto e pessoa.
A personagem de Núria sabota seu relacionamento através do objeto comida.
Engordando vinte quilogramas, sabe que não será aceita por seu namorado que
prefere as mulheres magras (dentro dos padrões de beleza). A sabotagem se deve
ao contato de si mesma (Self) e ao conhecimento do que quer e não quer (Processo
de Individuação) que estava sendo abafado pela figura do namorado que a mantinha
aos seus padrões.
Todas as personagens remotam ao terapeuta, que diz saber que todos
precisam de ajuda psicológica, por estarem fora dos padrões sociais de beleza.
Todos são obesos e gordos, o que os fazem ser alienados da sociedade e, portanto,
feios e mal amados.
Essa situação terapêutica se faz presente em sua própria família, onde sua
esposa, grávida, perde as figuras físicas de uma mulher engajada no padrão de
beleza social contemporâneo. Mesmo sendo algo reversível, sabe que não tem o
mesmo afeto de seu marido. Sendo então, o terapeuta a representação do padrão
social de beleza e que o projeta em sua própria esposa.
Portanto o padrão está intrínseco em todas as camadas da sociedade e em
todas as pessoas, não há um individuo que escape a essa realidade, e com isso,
pode-se afirmar que a fuga de tal padrão não é viável e sim, a aceitação como
primeiro passo à possível cura desse mal-estar e quiçá as Dependências, Abusos e
Compulsões.

34
CONCLUSÃO

Marion Woodman (2003) em sua obra “A Feminilidade Consciente” cita um


brilhante exemplo de como a estrutura da Psique é construída. É através do
encontro de uma pedrinha que a criança com sua naturalidade e ingenuidade tenta
expressar o encanto e a beleza da pedra. Com isso, tenta mostra-la a sua mãe para
que ela entenda esse mundo mágico que está sendo formado. Essa mãe quando se
depara com essa pedrinha a repreende com veemência e com isso, a alma da jovem
criança é introduzida a um processo de recalque, sendo aos poucos, cada vez mais
calada.
Esse processo de calar e repreender os sentimentos de descoberta do mundo
externo e interno pode ser interpretado como ausência de afeto e rejeição afetiva, de
repente, o mundo interno que seria exposto ao mundo externo não é suficientemente
bom e rejeitado (pela mãe) e pelo mundo externo. Essa frustação inicial se
transforma em uma busca inconsciente que mais tarde será projetada e depositada
em objetos alheios ao indivíduo tais como: comida, drogas, sexo, etc.
De acordo com Jung nossa psique é estruturada à imagem da estrutura do
mundo, e o que ocorre num plano maior se produz também no quadro mais íntimo e
subjetivo da alma (JUNG, 1961) esse caminho é a construção da identidade do
indivíduo, que será um processo contínuo durante toda a vida.
A ingenuidade, a beleza natural e o essencial encontrado pela criança do
nosso exemplo são abafados assim, no lugar desses elementos, é criado um vácuo
a ser compensado ao longo de sua vida, buscando esses elementos primários em
objetos posteriores, em uma tentativa de preencher esse vazio.
Na sociedade Ocidental Contemporânea, os elementos estruturadores de
uma pessoa aceita pela mesma são: possuir uma figura física bela, dentro dos
padrões considerados saudáveis, ser magro e possuir bens materiais, tudo isso
associado ao sucesso.
Diante do exposto, os indivíduos que fazem parte dessa sociedade
padronizada e, portanto, alienante, formam dois grupos: os integrantes e os
excluídos. Os integrantes vivem em uma constante busca e manutenção desse
padrão social, já os excluídos, tentam se enquadrar nesse padrão e existe a

35
possibilidade de projetar em objetos externos essa busca (dos elementos essenciais
primários). Nesse trabalho abordamos o objeto: comida.
A angústia de ser rejeitado por uma sociedade que impõe características que
padroniza indivíduos ou também os unifica associados aquele vazio inicial
provocado pela poda da alma (exemplo da menina) faz com que se desenvolvam as
Dependências, Abusos e Compulsões, sendo também uma forma de tentar
compensar e preencher esse vazio. Pode-se dizer que é uma forma de alimentar
esse vazio através da comida.
Exemplificando o uso do objeto comida com o filme Gordos de Daniel Sánchez
Arévalo a personagem Núria está em um processo de descobrimento de seu Self,
caminhando através da individuação e da descoberta de novas situações nunca
antes experimentadas, que só foi possível com a ausência do namorado.
Com isso, tenta deixar de agradá-lo com a sua forma física, comendo e
engordando, que antes era aceitável pelo namorado e pela sociedade e uma vez
interrompido esse ciclo de agradar ao próximo, encontra a sua própria identidade,
iniciando um processo de encontro de si mesma. (Resiliência).
Outro exemplo do uso é a esposa do terapeuta que enquanto possuía as
formas físicas atléticas socialmente aceitáveis recebia o afeto do marido, e mantinha
uma postura de não comer comidas não consideradas saudáveis. Quando perde
essas características, é desprezada pelo marido perdendo a aceitação e o afeto do
mesmo, começando a comer comidas gordurosas e não saudáveis.
Podemos perceber no casal, essa relação corpórea e afetiva, não foi
influenciada pelo padrão de beleza físico social atual. Mesmo havendo
consequências do reflexo dessa unidade nos filhos, não houve mudanças no peso
do marido, já que estava pleno com sua forma física e era aceito pela esposa e
reciprocamente.
Desta forma, podemos demonstrar que a relação que existe entre afeto e
transtornos alimentares, é um reencontro de si mesmo com as sensações de
descoberta primárias experimentadas na infância, e que retorna ao longo da vida na
forma de Dependências, Abusos e Compulsões, mais especificamente com o objeto
comida, abordados nesse presente trabalho.

36
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