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Por Diego Schutt
Para que o leitor se interesse em mergulhar no universo de
ficção do seu texto na companhia do seu protagonista, sua
narrativa precisa ir além da apresentação de suas
características, nos permitindo conhecer sua personalidade e,
principalmente, sua identidade.
Qual a diferença entre características, personalidade e
identidade?
Características
Características são atributos físicos externos, observáveis,
superficiais. Alto, baixo, gordo, magro, loiro, moreno, sério,
sorridente, bonito, feio, formal, informal, criança, adulto, bem
vestido, mal vestido etc. Ao compartilhar as características
físicas de um personagem em uma história, ajudamos os
leitores a criar uma primeira impressão sobre ele.
Personalidade
Personalidade é nosso corpo social, são as qualidades e
defeitos que outras pessoas associam a nós, baseadas na
forma como elas interpretam nossas características físicas,
falas e comportamentos. Próativo, metido, flexível,
manipulador, simpático, interesseiro, humilde, esnobe,
confiante, inseguro etc. Ao darmos pistas sobre a
personalidade de um personagem em uma história,
influenciamos os leitores a criar certas expectativas em relação
ao tipo de pessoa que ele é.
Identidade
Identidade é a imagem que temos de nós mesmos, são as
qualidades e defeitos que associamos a nossa personalidade,
os rótulos que usamos para descrever quem somos (e quem
não somos). Introvertido, extrovertido, inteligente, burro,
paciente, irritadiço, criativo, exibido, médica, professora,
publicitário, faxineiro, astronauta, escritora etc.
Como tudo isso se aplica à histórias de ficção?
Vamos usar como exemplo o início do livro “Extraordinário”.
Veja como a escritora R.J. Palacio escolheu nos apresentar o
personagem August nas primeiras linhas do texto.
“Sei que não sou um garoto de dez anos comum. Quer dizer, é
claro que faço coisas comuns. Tomo sorvete. Ando de
bicicleta. Jogo bola. Tenho um Xbox. Essas coisas me fazem
ser comum. Por dentro. Mas sei que crianças comuns não
fazem outras crianças comuns saírem correndo e gritando no
parquinho. Sei que os outros não ficam encarando as crianças
comuns aonde quer que elas vão.
Se eu encontrasse uma lâmpada mágica e pudesse fazer um
desejo, pediria para ter um rosto comum, em que ninguém
prestasse atenção. Pediria para poder andar na rua sem que
as pessoas me vissem e depois fingissem olhar para o outro
lado. Sabe o que eu acho? A única razão de eu não ser
comum é que ninguém além de mim me enxerga dessa forma.
Mas agora meio que já me acostumei com minha aparência.
Sei fingir que não vejo as caretas que as pessoas fazem.”
Nessas poucas linhas, a escritora nos dá pistas sobre as
características físicas do personagem (um menino de 10 anos
com um rosto incomum), sua personalidade (ele aparenta ser
um garoto calmo, que decidiu se acostumar aos olhares
assustados de outras pessoas ao invés de reagir
agressivamente) e sua identidade (ele se acha um garoto
comum e gostaria que seu rosto fosse diferente do que é).
Dar uma ideia sobre as características físicas e a
personalidade do personagem é importante para criar um
senso de veracidade na história, mas é através das pistas que
a escritora nos dá sobre a identidade de August que o texto
cria um senso de proximidade com o personagem, já que
essas informações nos dão acesso ao que ele tem de mais
íntimo e particular: o DNA do seu ego.
Nossa identidade é nosso corpo emocional.
Assim como nosso instinto de sobrevivência nos compele a
proteger nosso corpo de ameaças externas que coloquem
nossa vida em risco, nosso instinto emocional nos compele a
proteger nossa identidade de ameaças externas que coloquem
nosso ego em risco.
Pense em sua identidade (e na do seu personagem) como os
rótulos que você deseja que outras pessoas associem a sua
personalidade. August, por exemplo, quer que outras pessoas
o vejam como um garoto comum. Portanto, as decisões e
ações do personagem durante a história terão como objetivo
projetar a imagem de um garoto comum.
Se nossa identidade é o que fundamentalmente nos distingue
de outras pessoas, de que forma podemos investigar a
identidade dos personagens das nossas histórias de ficção
para tornálos mais originais e envolventes? Um bom ponto de
partida é investigar os desejos e motivações do personagem.
O que são desejos? São os vazios que sentimos e queremos
preencher. Só desejamos aquilo que não temos. Essa
sensação de falta é o motor que movimenta nossas vidas e
que motiva o protagonista a agir em uma história de ficção.
August deixa seu desejo bastante claro: “Se eu encontrasse
uma lâmpada mágica e pudesse fazer um desejo, pediria para
ter um rosto comum, em que ninguém prestasse atenção.
Pediria para poder andar na rua sem que as pessoas me
vissem e depois fingissem olhar para o outro lado.”
Por trás de todo desejo, sempre existe uma motivação. O que
são motivações? São as explicações que inventamos para
justificar nossos desejos, decisões e ações. Não existe desejo,
decisão ou ação sem motivação.
No início do livro “Extraordinário”, sabemos que o desejo de
August de ter um rosto diferente é motivado por sua aparência
incomum. Mas essa é apenas a ponta do iceberg, a explicação
racional do personagem. Não sabemos porque
verdadeiramente ele deseja isso. Para desenvolver essa
história, a escritora R. J. Palacio precisou, em algum momento
do processo de criação, considerar as motivações emocionais
que despertaram em August esse desejo e,
consequentemente, fizeram o personagem se tornar a pessoa
que se tornou.
Como descobrir as motivações emocionais de um
personagem? Considerando suas experiências passadas e a
forma como elas moldaram suas crenças, seus valores, a
forma como ele interpreta o mundo ao seu redor.
O quão incomum é o rosto de August? O que aconteceu para
que o rosto dele ficasse assim? Por que ele parece ser tão
paciente e compreensivo com a reação insensível das outras
pessoas? Como ele lida com tamanho preconceito no seu dia a
dia? Como sua família e amigos lidam com tudo isso? As
respostas para essas perguntas são apresentadas ao longo da
história. Elas aprofundam, pouco a pouco, nosso envolvimento
com o personagem e nosso interesse em continuar lendo o
texto.
Considere o primeiro contato que o leitor vai ter com o
protagonista da sua história e se pergunte: qual é a primeira
impressão que esse personagem devem causar? A de uma
mulher corajosa? De um homem agressivo? De um
adolescente deprimido? De uma criança impaciente? Na
sequência, se pergunte: que falas e comportamentos
causariam essa primeira impressão? A resposta para essa
pergunta é um bom guia para você caracterizar seu
protagonista.
Caracterizar personagens é basicamente guiar a percepção do
leitor para desenvolver uma determinada impressão e opinião
sobre eles.
Nossa opinião sobre qualquer pessoa é baseada na
quantidade e na qualidade das informações que conhecemos
sobre ela. Em uma história de ficção, nossa opinião sobre os
personagens são baseadas na quantidade e na qualidade das
informações que o escritor nos apresenta sobre eles.
A escritora R. J. Palacio caracteriza August como um menino
comum nas primeiras linhas da história. A narrativa do
personagem demonstra a inocência de um garoto de 10 anos e
sua maturidade para lidar com as reações de outras pessoas
ao seu rosto incomum. O que nos deixa curiosos para saber
mais sobre ele? O que nos impele a seguir lendo o texto?
Nossa vontade de saber se ele vai alcançar seu desejo de ser
visto como um garoto comum e como exatamente ele vai fazer
isso.
Considerando tudo isso, quais informações são as mais
importantes?
Como decidir que características sobre o personagem você
deve incluir em cada parte do texto e quais deve deixar de
fora? Inclua apenas as características necessárias para fazer o
leitor pensar o que você quer que ele pense sobre o
personagem em cada cena da história.
Em certos momentos da narrativa, conhecer a maior frustração
que o personagem teve na vida é importante para o leitor
entender porque ele tomou uma atitude extrema em uma cena
anterior. Em outros momentos, conhecer o histórico do
relacionamento do personagem com a mãe talvez seja
imprescindível para que o leitor consiga dar sentido à um
diálogo entre os dois.
Tudo isso está mais relacionado aos comportamentos e às
características psicológicas do personagem. E sua aparência
física? Sua postura? A cor de camisa que ele usa? O jeito
como ele arruma o cabelo?
Pense em todas as informações associadas à imagem do
personagem como a manifestação externa de suas
características psicológicas. Como a expressão facial, a
postura, a cor da camisa, o jeito como arruma o cabelo podem
revelar o que o personagem está pensando e sentindo? Como
isso revela a imagem que ele quer que os outros tenham dele,
a imagem que ele tem de si e quem ele é de verdade?
Priorize sempre compartilhar o que seu personagem tem de
mais fascinante, surpreendente, único, excitante, estranho e
peculiar. Essas são as qualidades das pessoas de verdade
que as tornam inesquecíveis e fazem a gente sentir
curiosidade para saber mais sobre elas. E não é exatamente
isso o que você quer que seus leitores sintam sobre os seus
personagens?
Fonte:
http://ficcao.emtopicos.com/