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A TOMADA DO ESTADO PELO INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS

SOCIAIS (IPES): O CASO DAS EMPRESAS ESTATAIS FEDERAIS


DO SETOR AGRÍCOLA (1964-1967)

Elaine de Almeida Bortone1

Introdução

A presente comunicação tem como objetivo apresentar os primeiros resultados da


minha pesquisa de doutorado. Trata-se do levantamento das empresas estatais federais e dos
seus dirigentes, especificamente provenientes do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais
(IPES), no período de 1964-1967, com a finalidade de mostrar a hegemonia de uma fração da
burguesia no seio do Estado, determinando seu rumo e representando não só seus interesses
econômicos e políticos, como de toda a burguesia.
Os conflitos determinantes para a fundação do IPES foram a renúncia do presidente
Jânio Quadros e a subida ao poder do vice-presidente João Goulart, em 1961. Goulart não era
bem visto por uma parte dos militares das Forças Armadas e pelos empresários desde 1953,
quando foi ministro do Trabalho no segundo governo de Getúlio Dornelles Vargas (1951-
1954) e defendeu o aumento de 100% para os trabalhadores que recebiam o salário mínimo
(STARLING, 1986). Era acusado de agitador e comprometido com interesses populares e
comunistas. No entanto, a causa do golpe foi político, que refletia o medo dos setores mais
conservadores com o crescente movimento popular pelas reformas de base, pela
implementação de uma “república sindicalista” ou de um regime comunista no país, que
punha em risco os seus interesses econômicos.
Neste contexto, unificaram-se o capital nacional e os setores do capital internacional
que entraram no Brasil, a partir dos anos 1950, como resultado das alterações no sistema
capitalista mundial, e, posteriormente, favorecidos com a política desenvolvimentista do
governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Neste aspecto, o estudo segue a visão do
cientista político René Dreifuss (2006) que aponta a existência de forças sociais, nacionais e
internacionais, o grupo multinacional e associado, que fundou o IPES, um centro estratégico

1
Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em História Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(PPGHIS/UFRJ), bolsista CAPES.
2

de ação política que tinha como finalidade desempenhar uma forte intervenção no Estado para
obter o poder e consolidar uma nova ordem capitalista.
O Estado pré-1964 tornou-se um campo de disputa em cujo interior os detentores do
capital lutaram pelo seu poder e sua reprodução. Foi o momento em que as ideologias geradas
por frações da classe empresarial se fizeram prevalecer, se impuseram e se irradiaram por toda
a sociedade. Após 1964 ipesianos ocuparam a administração e as empresas estatais, e as
reformaram em direção ao fortalecimento do capitalismo e à consolidação de sua classe. O
Estado assumiu a tarefa de atuar para atender às necessidades do capital multinacional e
associado através de políticas fiscais e creditícias e garantir a subordinação da classe
trabalhadora por meio da repressão política, econômica e social.
Neste sentido, a teoria de Antonio Gramsci sobre o Estado atende ao escopo da
pesquisa:

O Estado é certamente concebido como organismo próprio de um grupo, destinado


a criar as condições favoráveis à expansão máxima desse grupo, mas este
desenvolvimento e esta expansão são concebidos e apresentados como a força
motriz de uma expansão universal, de um desenvolvimento de todas as energias
‘nacionais’, isto é o grupo dominante é coordenado concretamente com os
interesses gerais dos grupos subordinados e a vida estatal é concebida como uma
contínua formação e superação de equilíbrios instáveis entre os interesses do grupo
fundamental e os interesses dos grupos subordinados, equilíbrios em que os
interesses do grupo dominante prevalecem, mas até um determinado ponto, ou seja,
não até o estreito interesse econômico-corporativo (GRAMSCI, 2000: 41-42).

A discussão da pesquisa encontra-se na esfera do Estado capitalista. A concepção de


Estado capitalista, para o grego Nico Poulantzas, surge a partir das transformações das
relações de produção e da divisão social do trabalho, que implicaram em modificações no
campo da dominação política. É produto da luta de classes, “uma relação, mais exatamente,
uma condensação material da relação de conflitos entre classes e frações de classes”
(POULANTZAS, 1978: 147).
O Estado representa e organiza o interesse político do bloco no poder, que segundo
Poulantzas (1978) é formado por várias frações de classe burguesas, provenientes de
diferentes modos de produção, presentes na formação social capitalista. A organização se faz
sob a hegemonia e direção, nesse bloco, de uma de suas classes ou frações, que está
interessada em promover as condições favoráveis à acumulação privada da qual ela depende.
3

Do ponto de vista da teoria poulantiziana, o Estado não é um dispositivo unitário e


homogêneo. Existem contradições entre as frações do bloco no poder, apesar da dominação
política. Portanto, o Estado é “um campo e um processo estratégico onde se entrecruzam
núcleos e redes de poder que ao mesmo tempo se articulam e apresentam contradições e
decalagens um em relação aos outros” (POULANTZAS, 1978: 157).
Para atender ao objetivo da pesquisa, fiz um levantamento das empresas estatais
federais existentes no período de 1964-1967, bem como dos nomes dos seus presidentes, vice-
presidentes, diretores e conselheiros que passaram pela órbita do IPES. Busquei informações
no Arquivo Nacional, na Biblioteca Nacional, na biblioteca da Eletrobrás, nos ministérios, nas
empresas ainda existentes, no Diário Oficial da União, nos livros, nos jornais da época e na
Internet. Com a finalidade de certificar se os dirigentes pertenciam ao IPES, recorri aos
documentos do Instituto e à obra de Dreifuss, 1964-A conquista do Estado, que catalogou os
associados, parceiros e apoiadores do Instituto. Os documentos do IPES utilizados estão
custodiados no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, no fundo correspondente.
Para a presente comunicação me limitarei ao setor da agricultura. O governo Castello
Branco (1964-1967) tinha como objetivo combater a inflação, reordenar a economia, reformar
e modernizar o sistema capitalista e criar condições adequadas à expansão do capital. Para tal,
as empresas estatais, do referido setor, passaram a desempenhar a função de condutor da
modernização da agricultura, responsabilizando-se pela infraestrutura e pelo financiamento
para ampliar as perspectivas para o capital privado e atender às demandas das camadas alta e
média da sociedade.

O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES)

O IPES (1961-1972) foi uma entidade formada por empresários nacionais e


internacionais, tecnoempresários e militares de alta patente, em especial vinculados à Escola
Superior de Guerra (ESG), que, com o apoio financeiro do governo norte-americano, buscou
constituir uma coesão interna e fortalecer o poder de um grupo hegemônico, o multinacional e
associado, para conspirar e obter o controle da sociedade e assegurar a conquista do Estado.
4

O termo tecnoempresário foi cunhado por Dreifuss (2006) para designar o conjunto de
escritórios especializados em serviços técnicos de engenharia, consultoria tecnojurídica e
técnico-administrativa, constituindo-se como agências privadas de consultoria
tecnoempresarial prestadora de serviços tanto para empresas particulares quanto para órgãos
estatais.
O IPES se declarou uma “entidade apolítica”2 e se auto definiu como “Estado-
Maior”3. No seu Estatuto4, o Instituto se apresenta como uma “sociedade civil sem fins
lucrativos, de caráter filantrópico e com intuitos educacionais, sociológicos e cívicos”.
Pretendia o “fortalecimento do regime democrático do Brasil” por meio de uma ação que
consistia em estudar os problemas brasileiros e apresentar soluções.
Mas ocultou seus verdadeiros propósitos: manipular a opinião pública para expandir
sua capacidade de influência sobre a sociedade com o objetivo de desestabilizar e depor o
presidente João Goulart (1961-1964) para, assim, obter o controle do Estado. Era, enfim, um
órgão privado de hegemonia.
Para tal fim, o IPES, organizou uma ação política, por meio de uma rica e sofisticada
campanha ideológica, para mobilizar a opinião pública com a finalidade de desestabilizar e
derrubar o governo e modificar o regime político. Simultaneamente, como tática defensiva e
ofensiva, e já pensando em um novo Estado, formulou e difundiu projetos de governo e
anteprojetos de reformas de base para salvaguardar e consolidar suas posições na direção
política e ideológica da sociedade.
Para serem mais abrangentes no seu propósito de desestabilizar o governo Goulart, os
ipesianos se articularam com políticos para bloquearem medidas e terem seus anteprojetos
aprovados. Da mesma forma, buscando uma atuação mais direta na disseminação de seu
ideário, o IPES se infiltrou no meio acadêmico e artístico, nos sindicatos, nas organizações
estudantis e femininas, na igreja, nas Forças Armadas, e em vários outros movimentos e
organizações com objetivo de agregá-los ao seu projeto.
Com o golpe de Estado, em 1º de abril de 1964, foi implantada uma ditadura que
estava a serviço do grande capital. A composição militar-empresarial controlou em definitivo

2
Documento do IPES: O que é o IPES, p. 2, s/d.
3
Ata do IPES da Reunião Conjunta Rio/SP de 03.04.64.
4
Estatutos do IPES, 1963.
5

as rédeas da máquina gerencial-estatal “erigindo um formidável aparato de Estado para


sustentar seu monopólio do poder” (ALVES, 2005: 31). Grande quantidade de associados e
parceiros do IPES ocupou cargos determinantes nos ministérios5, na estrutura administrativa,
nas autarquias, nas empresas estatais, nas empresas de economia mista e nas fundações.
O domínio, o poder e a liberdade de ação dos ipesianos na estrutura do Estado foram
de tamanha grandeza que perpassaram por distintos setores e cargos, e, em alguns casos,
acumularam diferentes funções; além de nomearem e indicarem pessoas provenientes de sua
rede de conhecimento, que estavam imbuídos do mesmo objetivo, para diversas direções
administrativas. O Estado, portanto, expressou a supremacia e a unidade do IPES e passou a
ter uma autonomia “relativa”, que conforme Poulantzas (1978), “reorganiza a hegemonia e o
bloco de poder”.

Os empresários na direção das empresas estatais federais

Os objetivos imediatos do primeiro governo ditatorial consistiam em reprimir e


expurgar as pessoas politicamente ligadas ao governo de Goulart e em se legitimar através de
inúmeros Decretos-Lei e Atos Institucionais, que formaram a estrutura do Estado.
Com os expurgos através dos Inquéritos Policial-Militares (IPMs), militares e civis,
que haviam contribuído para os trabalhos do IPES no sentido de derrubar Goulart, ocuparam
os cargos mais importantes e determinantes nas empresas estatais. As empresas tornaram-se,
portanto, uma arena privilegiada dos interesses das frações integrantes do bloco no poder.
As empresas estatais expandiram sua atuação para manter a política de crescimento
econômico e atender, fundamentalmente, às corporações multinacionais. Estavam
concentradas na produção de bens intermediários, infraestrutura e serviços, indo da produção

5
Uma lista completa de ipesianos que exerceram postos de comando no governo Castello Branco encontra-se em
René Dreifuss, 1964 - A conquista do Estado. A título de exemplificação, pode-se citar alguns ministérios
ocupados por sócios e parceiros do IPES: Ministério da Saúde – Raimundo de Moura Brito; Ministério da
Educação Flávio Suplicy de Lacerda, Pedro Aleixo, Raymundo Augusto de Castro Moniz de Aragão; Ministério
da Justiça e Negócios Interiores – Milton Campos, Juracy Montenegro Magalhães e Men de Sá; Ministério das
Minas e Energia – Mauro Thibau; Ministério da Ind. e Comércio – Daniel Agostinho Faraco e Paulo Egídio
Martins; Ministério da Agricultura – Oscar Thompson Filho e Severo Fagundes Gomes; Ministério da Fazenda –
Octávio Gouvêa Bulhões; Ministério do Planejamento – Roberto de Oliveira Campos; Ministério do Trabalho e
Previdência Social – Arnaldo Sussekind e Luiz Gonzaga do Nascimento e Silva etc.
6

de aço à agricultura, energia elétrica, extração, refinação e distribuição de petróleo, produtos


petroquímicos.
Para melhor entender o quadro 1 das empresas e de seus dirigentes, é preciso elucidar
alguns pontos. Só foram disponibilizados os administradores ligados ao IPES. Com relação ao
tipo de empresa e ao ministério a que era vinculada, foram usados a classificação e o vínculo
ministerial empregado naquela época, já que, posteriormente, alguns foram alterados. Da
mesma forma, as datas de existência foram registradas enquanto eram empresas estatais, visto
que, antes algumas eram privadas, ou retornaram, depois, a esta condição. Com relação ao
tempo de atuação de cada dirigente, é pertinente destacar que, em função da dificuldade em
conseguir as datas precisas de posse e saída, fundamentalmente das empresas que não existem
mais, indiquei a data do período estudado, 1964-1967. Pode acontecer de algum administrador
ter entrado anteriormente ou ter saído depois.

Setor da agricultura

A questão da reforma agrária esteve no centro do embate político no período que


antecedeu o golpe de 1964, e foi um fator determinante para a deposição de Goulart. A
proposta de Goulart orientava-se pelo princípio de que “o uso da propriedade é condicionado
ao bem estar social” e não sendo a ninguém “lícito manter a terra improdutiva por força do
direito de propriedade.” Assim, mediante pagamento em títulos públicos de valor reajustável,
o governo poderia desapropriar todas as terras não exploradas (BANDEIRA, 2010: 314-315).
Os proprietários de terra, que não concordavam com a proposta de Goulart e com o
crescimento do movimento social rural organizado, colocaram a questão da reforma agrária
em destaque nas discussões dentro da Sociedade Rural Brasileira (SRB), da Sociedade
Nacional de Agricultura (SNA), do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e do
IPES.
Conforme pesquisa realizada por Mendonça (2009), a SRB com um posicionamento
bastante radical, contrário a qualquer tipo de reforma fundiária, organizou eventos de
mobilização, como o Congresso Brasileiro para Definição das Reformas de Base, em março
de 1963, ministrou palestras na ESG e disseminou em sua revista, A Rural, artigos com temas
7

sobre a “ameaça” representada pela reforma e apresentou o grande proprietário de terras como
“desprotegido” e “abandonado” pelo Estado. A SNA, com tom mais moderado, admitia a
necessidade de “alguma reforma”.
Em 1961, o IBAD organizou um simpósio sobre a reforma, que resultou no volume
intitulado “Recomendações”, com argumentos contrários ao projeto de Goulart e foi fonte
inspiradora do Estatuto da Terra aprovado por Castello Branco, em 1964. Para o IBAD, a
reforma implicava em propiciar a “formação de empresários em condições de dirigir a
propriedade, assim como a colocação da respectiva produção” e a terra jamais poderia ser
doada, mas, sim vendida com base no valor tributado, com pagamento prévio em dinheiro
(NATIVIDADE, 2013).
O IPES, por sua vez, criou um grupo exclusivamente para estudar a reforma agrária,
embora houvesse uma divergência interna entre o IPES-RJ e o IPES-SP sobre o instrumento
prioritário da reforma agrária: tributação ou desapropriação. Paulo de Assis Ribeiro do IPES-
RJ, que se dedicou a extenso estudo sobre o tema, defendeu a tributação como meio eficaz
para fazer valer o uso produtivo da terra. O IPES-SP, que tinha vários representantes do
empresariado proprietários de terras, se posicionou contra as “veleidades reformistas” do
grupo do RJ porque representava uma grave ameaça ao direito de propriedade. Mas acabou
aceitando a proposta “porque ela teria como objetivo desacreditar o projeto do governo
Goulart e a proposta do movimento camponês”6.
O grupo era formado por Dênio Chagas Nogueira; C. J. de Assis Ribeiro; Paulo de
Assis Ribeiro; José Arthur Rios; e José Garrido Torres, e teve a colaboração de Edgar
Teixeira Leite, Julian Chacel, Luiz Carlos Mancini; José Irineu Cabral; Wanderbilt Duarte de
Barros e Nilo Bernardes. 7 Em outros documentos do IPES constam os nomes de Harold Cecil
Polland; Cândido Guinle de Paula Machado; o escritor e funcionário da Light, José Rubem
Fonseca; Antônio Carlos do Amaral Osório, presidente da Associação Comercial do Rio de
Janeiro; Ivan Hasslocher, proprietário do jornal Ação Democrática editado pelo IBAD, que

6
Parecer do documento do Grupo de Doutrina do IPES-SP sobre o anteprojeto de reforma agrária do IPES-RJ,
s/d
7
A Reforma Agrária. Problemas-bases-soluções, de 1964.
8

utilizava a propagação do comunismo como propaganda; Fernando Mbielli de Carvalho; e


José Irineu Cabral.8
Os estudos do grupo resultaram no anteprojeto de reforma agrária, cujos objetivos
principais eram “contribuir para harmonizar o desenvolvimento rural com o processo de
industrialização” através do “consenso da iniciativa particular e estimulará a formação dos
sistemas cooperativos de produção, mecanização, industrialização e comercialização nas áreas
por ela beneficiadas”; “beneficiar a produção agrícola e agroindustrial”; e obter a “progressiva
extinção do latifúndio e do minifúndio”.9
O anteprojeto forneceu as diretrizes da reforma no primeiro governo pós-1964, como
também alguns autores ocuparam cargos no ministério e na direção das empresas estatais
responsáveis pela reforma, como em outras empresas de outros setores. A hegemonia do IPES
é evidente neste setor.
No governo de Castello Branco a organização do setor da agricultura começou com a
formação do ministério correspondente, cujos quatro nomeados, três passaram pela órbita do
IPES. O primeiro ministro foi Oscar Thompson Filho (1964), anteriormente, em 1963, foi
secretário da Agricultura do estado de São Paulo, no governo de Adhemar de Barros. Oscar,
agrônomo e maior produtor agrícola do país, no IPES participou da mobilização política das
mulheres da classe média para confrontarem Goulart. Permaneceu no cargo apenas dois meses
e foi exonerado pelo presidente “por sua maneira de agir muito pessoal, se isola no ministério
e não me permite entrosar uma ação interpenetrada, coesa e de rendimento em relação à sua
pasta” (VIANA FILHO, 1975: 261). Foi substituído pelo agrônomo Hugo de Almeida Leme
(1964-1965), diretor da Escola Superior de Agricultura Luís de Queirós, de Piracicaba (SP),
em 1960, e sócio comercial do líder do IPES-SP Nivaldo Coimbra de Ulhoa Cintra.
Ney Aminthas de Barros Braga assumiu a pasta no período de 1965-1966 e, por fim,
Severo Fagundes Gomes (1966-1967), empresário (Tecelagem Paraíba S/A); diretor do Banco
Mercantil de SP, afiliado do IPES; proprietário de terras; e maior produtor de leite do estado
de São Paulo, deixou a direção da Carteira Agrícola do Banco do Brasil (1964-1966) para
tornar-se ministro. Severo foi assessorado por Walter Pires de Carvalho e Albuquerque,
descendente de importante família baiana, na ESG fez parte de um grupo que estava dentro do

8
Atas do IPES de 08.06.1962, 27.08.11962, 09.11.1962.
9
A Reforma Agrária. Problemas-bases-soluções, de 1964.
9

IPES. Oficial da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), que apoiou os


ativistas contra Goulart.
O presidente Castello Branco, que entendia a questão agrária como obstáculo ao
desenvolvimento e à industrialização, defendeu a realização de uma reforma que tinha por
finalidade a modernização da agricultura através do aumento da produção e da produtividade
e a organização dos conflitos sociais no campo, que era questão de segurança nacional
(BRUNO, 1997).
Logo no início, o governo militar constituiu o Grupo de Trabalho sobre o Estatuto da
Terra (GRET) com a tarefa de elaborar um documento que servisse de base para a formulação
do Anteprojeto do Estatuto da Terra e das Emendas Constitucionais. Faziam parte do GRET:
Roberto Campos (ministro do Planejamento); Hugo de Almeida Leme (ministro da
Agricultura); representantes do Ministério do Planejamento: Paulo de Assis Ribeiro
(coordenador do GRET), José A. Trigo Drumont Gonçalves, C. J. Assis Ribeiro, Luiz
Gonzaga Nascimento e Silva, Júlio Cesar B. Viana, Frederico Maragliano e Eudes de Souza
Leão Pinto; representantes da SUPRA: José Gomes da Silva (interventor da SUPRA),
Fernando Sodero, Messias Junqueira e Carlos Lorena; e ainda José Garrido Torres (BNDE),
Copérnico de Arruda Cordeiro (do ministério da Agricultura), e o general Golbery do Couto e
Silva, chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI). Apenas Sodero, Junqueira, Lorena e
Cordeiro não passaram pela órbita do IPES. Com esta composição, o governo abriu espaço
para o pensamento reformista do IPES.
Em 1964 foi promulgado o Estatuto da Terra, um instrumento de intervenção do
Estado dividido em dois níveis: a reforma agrária e o desenvolvimento agrícola. O Estatuto da
Terra foi preparado por Roberto Campos que aproveitou boa parte dos estudos do IPES,
revisto pelos seus assessores ipesianos: Mário Henrique Simonsen, Nascimento Silva,
Bulhões Pedreira e José Carlos de Assis Ribeiro (VIANA FILHO, 1975: 278).
A reforma agrária consistia no “conjunto de medidas que visem a promover melhor
distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender
aos princípios de justiça social e ao aumento de produtividade”. Foram criados o Instituto
Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA) e o Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário
10

(INDA), em substituição à SUPRA, órgãos diretamente responsáveis pela implementação das


políticas agrárias e agrícolas.10
A reforma agrária acabou desvinculando-se de suas origens, não expressava um
projeto de transformação histórica em sentido plano e não significou a possibilidade de
transformação do padrão de propriedade da terra. Segundo Bruno (1997), a reforma foi
prioritariamente uma questão política e contribuiu para escamotear os interesses de classe a
abrir espaço para a defesa de posições que, no fundo, negavam a proposta reformista.
Com relação ao desenvolvimento agrícola, as diretrizes da política foram fixadas no
Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG), sob a direção do ministro do
Planejamento e Coordenação Econômica, o ipesiano Roberto de Oliveira Campos.
O investimento na agricultura era considerado importante para a geração de divisas,
advindo da exportação de produtos agrícolas, para o pagamento de parte da dívida externa, e
para o financiamento do desenvolvimento urbano-industrial. Portanto, o setor rural tornou-se
um espaço privilegiado para a expansão industrial através de indústrias voltadas para a
agricultura e indústrias transformadoras de produtos agrícolas (RAMOS, 2007: 6).
O plano diretor do ministério da agricultura tinha dentro das suas prioridades
promover estímulos oficiais às entidades privadas, de capital estrangeiro e nacional. O Estado
realizou uma política de subordinação da agricultura à indústria com a finalidade de propiciar
o desenvolvimento do capitalismo no campo “sob forte mediação financeira do setor público”
(DELGADO, 2005: 58) e ampliar o mercado interno e configurar uma classe média rural
consumidora de produtos industriais (MENDONÇA, 2009).
O Estado criou estímulos e favores fiscais e creditícios para favorecer a expansão, o
crescimento, o aperfeiçoamento e a modernização dos negócios das empresas agrícola,
pecuária, extrativista ou agro industrial no norte do país (IANNI, 1979), além de ter feito
gastos públicos em infraestrutura (estradas, eletrificação e comunicações) para melhor atender
o capital privado. As facilidades oferecidas atraíram capitalistas de origem diversas.
Mendonça (apud SIMON, 1994: 39) aponta que 70% das grandes propriedades situadas no
norte do país pertenciam às empresas do sudeste. A Manasa detinha área equivalente a 90%
do tamanho do estado do Rio de Janeiro.

10
Lei nº 4.504 de 30.11.1964 que dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências.
11

Outras empresas como a Volkswagen e o Banco Bamerindus aproveitando as


facilidades investiram na compra de terras e as transformaram em pasto para a criação de
gado, desprezando a enorme disponibilidade de pastos e campos naturais. Consequentemente,
acarretaram grandes prejuízos ecológicos, criaram poucos empregos e não trouxeram o
prometido desenvolvimento para a região (LOUREIRO e PINTO, 2005). O ipesiano Oscar
Thompson Filho, primeiro ministro da Agricultura, foi assessor técnico da Volkswagen do
Brasil S.A. (1975) no projeto Rio Cristalino11 de exploração agrícola, no sul do Pará.
A expansão do crédito rural foi balanceada pelo Sistema Nacional de Crédito Rural
(SNRC), criado em 196512, que englobava o Banco do Brasil, o Banco Central, o Banco
Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC), o Banco de Crédito da Amazônia (BASA) e o
Banco do Nordeste do Brasil. Eram vinculados ao SNRC, o Instituto Brasileiro de Reforma
Agrária (IBRA), Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário (INDA) e o Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico (BNDE), e tinha como órgãos auxiliares bancos privados,
Caixas Econômicas, sociedades de créditos, financiamento e investimentos e cooperativas
autorizadas a operarem crédito rural (BRASIL, 1965). O SNRC tinha como objetivo
dinamizar o crédito rural através de empréstimos voltados para a produção de equipamentos
agrícolas, sobretudo tratores e insumos agrícolas, como adubos e fertilizantes, e o
aperfeiçoamento do sistema de irrigação das lavouras visando aumentar a produção e
produtividades do setor, para aumentar o excedente agrícola a ser comercializado para o
mercado externo (RAMOS, 2007).
Para a intensificação do uso de adubos, Hugo Leme, em 1964, adotou várias medidas,
que foi objeto de convênio com a United States Agency for International Development
(USAID), destinando 37 milhões de dólares à compra de fertilizantes. Foi também fortalecido,
com a cooperação da Aliança para o Progresso, o crédito rural. Por seu turno, a Carteira
Agrícola do Banco do Brasil, dirigida pelo ipesiano Severo Gomes, passou a financiar

11
Aprovado o dia 20 de dezembro de 1974, o projeto da Companhia Vale do Rio Cristalino começou a
implementar as atividades agropecuárias previstas, com a ajuda financeira da SUDAM. O plano de
desenvolvimento previu a construção de um frigorífico, denominado Atlas, para processar a carne extraída da
fazenda, onde trabalhadores viviam e desenvolviam seu ofício em condições subumanas.
12
Lei nº 4.829 de 05.11.65 assinada pelos ipesianos Octávio Bulhões, ministro da Fazenda, e pelo ministro da
Agricultura, Hugo de Almeida Leme.
12

produtos básicos, como milho, feijão e arroz. Entre 1964 e 1966, os custeios e financiamentos
agrícolas apresentaram um crescimento de 75% (ABREU, 2010).
Para a Amazônia, que até então era uma região de extrativismo voltado para a
subsistência das comunidades indígenas e famílias locais, também se deu um processo de
expansão das relações capitalistas. Para promover e orientar o desenvolvimento na região foi
criada, em 1966, a Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM)13, em
substituição da Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia
(SPVEA), que passou a ser o principal órgão para coordenar e supervisionar programas de
dinamização da economia amazonense, através de incentivos fiscais e financeiros para atrair
investidores nacionais e estrangeiros.
Na esfera financeira, no mesmo ano, o governo reformulou o Banco de Crédito da
Amazônia, passando a denominar-se Banco da Amazônia S/A (BASA), e aumentou o número
de agências do Banco do Brasil na região. A SUDAM, o BASA e o BB financiaram a
produção agrícola, pecuária, pesca, formação de seringais e construção de silos, depósitos e
câmaras de expurgos, para criar condições favoráveis aos empreendimentos capitalistas
(IANNI, 1979).
Em 1967, no fim do governo Castello Branco, foi reformulada e modelada a Zona
Franca de Manaus (ZFM)14, estabelecendo incentivos fiscais para implantação de um pólo
industrial, comercial e agropecuário na Amazônia. As medidas provocaram mudanças e
principalmente a expansão das relações capitalistas na região. A Amazônia, como pontua
Ianni (1979) tornou-se ao mesmo tempo contribuinte para a acumulação de capital no centro-
sul e no exterior e atrativo para os produtos industriais provenientes das mesmas regiões.
A região norte foi transformada numa fronteira econômica com expansão e penetração
de empresas privadas internacionais. Um caso emblemático é o da empresa Jari Florestal e

13
Lei nº 5.173.
14
A Zona Franca de Manaus (ZFM) foi idealizada pelo Deputado Federal Francisco Pereira da Silva e criada
pela Lei nº 3.173 de 06 de junho de 1957, como Porto Livre. Dez anos depois, o governo federal, por meio
do Decreto-Lei nº 288, de 28 de fevereiro de 1967, ampliou essa legislação e reformulou o modelo,
estabelecendo incentivos fiscais por 30 anos para implantação de um pólo industrial, comercial e agropecuário
na Amazônia. Seu primeiro superintendente foi o coronel da reserva do Exército, Francisco Pacheco (1967-
1972), e na sua gestão, em 1968, foi aprovado o primeiro projeto industrial na Zona Franca, o da Beta S/A,
fabricante de jóias e relógios, que funcionou até meados de década de 1990.
http://www.suframa.gov.br/zfm_historia.cfm. visitado em 03.04.16
13

Agropecuária Ltda, de propriedade do norte-americano Daniel Keith Ludwing, que adquiriu


extensas terras, em 1967, consideradas, na época, a maior fazenda do mundo, comparada ao
tamanho do estado de Alagoas. A Jari tinha dois proprietários: 95% de suas ações competiam
a Universe Tankships, com sede nas Bermudas, e as outras 5% a Entrerios Comércio e
Administração, com sede no Rio de Janeiro, cujas ações cabiam a Universe Tankships, que
por sua vez pertencia a Oceanic Tankships, com sede no Panamá, que era de propriedade da
National Bulk Carriers, com sede em Monróvia, na Libéria, que Ludwig tinha 99% das ações
(ARRUDA, 1978).
Ludwig conhecia o ipesiano Augusto Trajano Azevedo Antunes, empresário brasileiro
da mineração, e Roberto Campos, que o convidou para investir no Brasil. Em 1966 se
encontrou com o presidente Castello Branco que o disse, “Venha para o nosso país, Mr.
Ludwig. Nesses dias o Brasil é um país seguro”. O projeto de Ludwig recebeu forte apoio dos
ex-ministros do Interior, Cel. Affonso Albuquerque Lima (1967-1969) e José Costa
Cavalcanti (1969-1974). Através de suas relações obteve um aumento na taxa de incentivos
fiscais, concedidos pela SUDAM, e pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal
(ARRUDA, 1978).
Fizeram parte da equipe de Ludwig no Brasil: Major Heitor Aquino Ferreira, chefe do
escritório da Jari, em Belém; gen. João Batista Tubino, presidente da Jari; cel. Jorge Aragão,
ex-prefeito de Boa Vista (Roraima); almirante José Luiz da Silva, comandante de navegação
de Ludwig (ARRUDA, 1978). José Costa Cavalcanti, em 1986, assumiu a presidência da Jari.
Augusto Trajano Azevedo Antunes, Roberto Campos, Heitor Aquino Ferreira e João
Batista Tubino foram associados e líderes do IPES; José Costa Cavalcanti passou pela órbita
do IBAD e Affonso de Albuquerque Lima pela do IPES.
O empresário Augusto Trajano Azevedo Antunes era proprietário da Indústria e
Comércio de Minério Icomi, empresa que financiou o IPES desde a sua fundação, 15 e do
Banco de Investimentos do Brasil S/A, que também mantinha financeiramente o Instituto.
Antunes foi bastante atuante no IPES para recrutar empresários e militares para o Instituto.
O tecnoempresário Roberto Campos fez parte de um grupo de economistas que dava
importância a evolução da racionalidade empresarial e do papel central das empresas privadas

15
Documento do IPES Breve Histórico, s/d, p. 10
14

no processo de crescimento. Cooperava e colaborava com suas ideias, participou de alguns


debates e ministrou aulas em alguns cursos, todos organizados pelo Instituto. Deu aula na
ESG, foi membro da Análise e Perspectiva Econômica (APEC)16 e da CONSULTEC,
escritório de consultoria tecnoempresarial que desenvolveu diversos estudos para o IPES.
No setor da agricultura, como já discutido, Campos participou da elaboração do
Estatuto da Terra, que propunha uma reestruturação agrária baseada na tributação progressiva
de acordo com o tamanho da propriedade. Visando a estimular a grande empresa rural e a
desincentivar o latifúndio improdutivo, essa tributação se atenuava de acordo com o grau de
utilização da terra. Em 1968, tornou-se presidente do InvestBanco, e, em 1972, já no governo
Médici, participou da comissão diretora da III Conferência Nacional das Classes Produtoras,
no Rio de Janeiro. Nesse mesmo ano, tornou-se presidente da Olivetti do Brasil e membro do
conselho de administração da Mercedes-Benz. (KELLER e LEMOS, 2010). O InvestBanco
financiou o IPES.
Heitor Aquino Ferreira participou do Grupo de Levantamento da Conjuntura do IPES,
liderado pelo gen. Golbery Couto e Silva, responsável pela perícia em informações e contra
informações do Instituto. Golbery quando foi para Brasília, em 1964, para assumir o Serviço
Nacional de Informações (SNI), o levou para secretariá-lo. Na rede IPES/IBAD/ADEP,
Heitor participou de atividades secretas para influenciar os militares a agirem contra o
governo Goulart. No governo Emílio Garrastazu Médici (1969-1974) foi trabalhar na
PETROBRÁS junto com presidente da empresa, gen. Ernesto Geisel (DREIFUSS, 2009).
João Batista Tubino foi líder do IPES-RJ e participou também do Grupo de
Levantamento da Conjuntura do Instituto. Ministrou aulas em cursos promovidos pelo
Instituto para informar os empresários, profissionais, civis e militares, e os responsáveis pela
formação de opinião pública sobre os problemas brasileiros dentro das perspectivas
ideológicas do IPES (DREIFUSS, 2006). Em 1966 foi nomeado interventor federal de
Alagoas, pelo presidente Castello Branco, em virtude da crise ocorrida no estado após o pleito
de outubro de 1965, quando os candidatos ao governo (Rui Palmeira, Sebastião Marinho

16
Organização tecnoempresarial e político-burocrática constituída de economistas, administradores do governo e
empresários defensores do capitalismo dentro do aparelho do Estado. Constitui-se sob a direção e participação de
vários ipesianos: Roberto Campos, Mário H. Simonsen, J. Garrido Torres, Octávio G. de Bulhões, Glycon de
Paiva, Jorge Oscar de Mello Flores, etc. (DREIFUSS, 2006).
15

Muniz Falcão e Arnon de Melo) não alcançaram a maioria absoluta, como determinava a
Emenda Constitucional nº 13, de 1966 (ABREU, 2010).
José Costa Cavalcanti, em 1962, foi assistido pelo IBAD na sua candidatura a
deputado federal pelo estado de Pernambuco na legenda da União Democrática Nacional -
UDN (DREIFUSS, 2006). Assumiu o mandato em 1963 e participou ativamente das
conspirações contra Goulart. Foi membro da Ação Democrática Parlamentar (ADP) e da
APEC; ministro da Minas e Energia (1967-1969), no governo Costa e Silva; ministro do
Interior (1969-1974), no governo Garrastazu Médici, quando foi acusado de genocídios dos
índios brasileiros; presidente da Itaipu Binacional (1974-1985) e da ELETROBRÁS (1980-
1985), passando a responder de forma cumulativa pelas presidências das duas grandes
empresas estatais. Na iniciativa privada foi diretor-presidente e conselheiro da Jari e membro
do conselho de administração da Caemi Mineração e Metalurgia S.A. (ABREU, 2010).
Affonso de Albuquerque Lima, cunhado do ipesiano José Luiz Moreira de Souza, fez
parte do núcleo de oficiais de médio escalão no IPES, coordenado por Golbery, que tinha
como finalidade pressionar oficiais para agirem contra Goulart (DREIFUSS, 2009). Como
chefe da Divisão de Assuntos Econômicos da ESG, foi um dos responsáveis pela adesão
dessa unidade ao movimento político-militar de 31 de março de 1964, que depôs o presidente
João Goulart. Após-1964 foi nomeado interventor na Rede Ferroviária Federal (RFFSA). Em
março de 1966 foi promovido a general-de-divisão e, meses depois, nomeado diretor-geral
das Vias e Transportes do Exército, ocupando, em seguida, o cargo de diretor-geral de
Engenharia e Comunicações, na qual permaneceu até 1967. Como ministro do Interior
sua meta principal foi o incentivo ao desenvolvimento regional, sobretudo do Nordeste e da
Amazônia, visando atenuar o crescente desequilíbrio entre essas regiões e os estados
industrializados do Sudeste. Em relação ao Nordeste, o principal instrumento dessa política
foi a concessão de incentivos fiscais e a canalização de recursos financeiros para a região, por
intermédio da SUDENE. No período de 1970 a 1971 ocupou a direção geral de material
bélico do Exército. A partir de então foi trabalhar na iniciativa privada: diretor-presidente da
Confecções Sparta e Sparta Nordeste e vice-presidente da União de Empresas Brasileiras, que
em maio de 1977 sofreu intervenções do Banco Central e foi decretada sua liquidação
(ABREU, 2010). A Confecção Sparta foi contribuinte do IPES.
16

Em 1972 estourou um escândalo na Jari, quando trabalhadores da empresa


denunciaram as precárias condições de trabalho e de salário. Sete anos depois, em 1979, foi
acusada de destruição permanente de vastas áreas da floresta natural, com eliminação de
espécies e ecossistemas únicos, além de uma possível poluição d'água causada pelas usinas de
polpa.
Outra empresa estrangeira que se estabeleceu na região norte, no período pesquisado
(1964-1967), foi a holandesa Bruynzeel Madeiras S/A, controlada pela Bruynzeel NV.
Entrou, em 1966, com recursos próprios de 2,9 milhões de cruzeiros e 8,8 milhões de
cruzeiros com incentivos da SUDAM para a compra de terras (IANNI, 2009: 126). Em
janeiro de 1966, o Banco Central autorizou o financiamento para a empresa no valor da
moeda de registro em FLS 5.400.000,0017, com equivalência de US$ 1.421.052,53.18
Augusto Trajano Azevedo Antunes começou a explorar madeiras disponíveis na
floresta amazônica que cercava suas jazidas. Para o investimento recorreu a uma sociedade
com a Bruynzeel e, assim, nasceu a Brumasa, Bruynzeel Madeiras S/A (MARCOVITCH,
2009). A Bruynzeel financiou o IPES e tinha na sua composição societária Bethlehem Steel
Corp., Bruynzeel NV, ICOMI, Netherlands Invest Bank for Developing Countries
(DREIFUSS, 2009).
Embora os investimentos tenham resultado no aumento da produtividade agrícola e
transformou a região em um vasto enclave de exportação e importação, agravou a exclusão
social no campo de índios, posseiros e colonos, e nas cidades em decorrência do extenso
êxodo de trabalhadores rurais desapropriados em direção às regiões metropolitanas. Além
disto, expurgou, prendeu e perseguiu lideranças identificadas com as Ligas Camponesas19 e
depurou os sindicatos rurais minando as possíveis bases políticas e sociais de oposição.

Quadro 1 – Empresas estatais federais do setor da agricultura

17
FLS é abreviatura de florins, antiga moeda da Holanda. Em 2002, a Holanda passou a ter o euro como moeda
nacional.
18
Diário Oficial da União de 12.05.66, seção 1, p. 19.
19
As Ligas Camponesas foram associações de trabalhadores rurais criadas, inicialmente, no estado de
Pernambuco, e, posteriormente, na Paraíba, no Rio de Janeiro, em Goiás e em outras regiões do Brasil no
período que se estendeu de 1955 até a queda de João Goulart, em 1964. Tinham como objetivos exerceram
intensa atividade de luta em prol da reforma agrária e da melhoria das condições de vida no campo. Os líderes
mais conhecidos foram Gregório Lourenço Bezerra e Francisco Julião Arruda de Paula.
http://www.ligascamponesas.org.br/?page_id=99 visitado em 02.06.16.
17

NOME VÍNCULO PRESIDENTE DIRETOR CONSELHEIRO


ÓRGÃO
Superintendência Min. da Agricultura Paulo de Castro Eduardo da Silveira
do Desenv. da Oscar Thompson Moreira da Silva Gomes (1965),
Pesca (SUDEPE) Filho (1964), Nei A. (1962-64) José Pires de
(1952-1989) de Barros Braga Almeida (1965)
Autarquia (1965-66), Severo F.
Gomes (1966-67)
Superintendência Presidência da Guilherme Júlio Fernando Egídio Marcos Vinicius
Nacional de República Borghoff de Souza Murgel Pratini de Moraes
Abastecimento (1964-67) (1964-66) (1964)
(SUNAB) (1962
-1989) Autarquia
Comissão de Jurisdição da Guilherme Julio José Agostinho
Financiamento SUNAB Borghoff Trigo Drumond
da Produção (1964-66) Gonçalves
(CFP) (1943– (1964-66)
1990) Autarquia
Instituto Min. da Ind. e do Leônidas Lopes Napoleão Karlos Heinz
Brasileiro do Comércio Borio (1964-67) Fontenelle da Rischbieter (1965-67)
Café (IBC) Daniel Agostinho Silveira (1965) Cyro Toledo Piza
(1952-1990) Faraco (1964-66), (1966)
Autarquia Paulo Egídio Martins
(1966-67)
Instituto Presidência da Paulo Assis Wanderbilt D. de Edvaldo de Oliveira
Brasileiro de República Ribeiro Barros (1965), Flores (1965-67),
Reforma Agrária (1965-69) César Reis de José Agostinho Trigo
(IBRA) Cantanhede Drumond Gonçalves
(1964-1970) (1965), Hélio de (1965-67), Flávio da
Autarquia Almeida Brum Costa Brito (1965-
(1965), Jaul Pires 69), Claudio Cecil
de Castro (1965), Polland (1965-67),
Waldiki Cardoso Julian Magalhães
de Moura (1966) Chacel (1965-68),
João Quintiliano de
A. Marques (1965-
68), Edgard Teixeira
Leite (1965-67)
Instituto Min. da Agricultura Eudes de Souza
Nacional de Oscar Thompson Leão Pinto
Desenvolvimento Filho (1964), Nei A. (1965)
Agrário (INDA) de Barros Braga Assessor:
(1964-1970) (1965-66), Severo F. Edvaldo de O.
Autarquia Gomes (1966-67) Flores (1965)
Superintendência Min. da Agricultura José Gomes da
de Política Oscar Thompson Silva (1964-65)
Agrária Filho (1964), Nei A.
(SUPRA) de Barros Braga
(1962-1964) (1965-66), Severo F.
Autarquia Gomes (1966-67)
Instituto Nac. de Min. da Ind. e do Paulo Accioly de
Pesos e Medidas Comércio Sá (1962-68)
(INPM) Daniel Agostinho
(1961–1973) Faraco (1964-66),
18

Autarquia Paulo Egídio Martins


(1966-67)
Instituto do Min. da Agricultura Benedito Fonseca
Açúcar e do Oscar Thompson Moreira (1964-66)
Álcool Filho (1964), Nei A.
(IAA) de Barros Braga
(1933-1990) (1965-66), Severo F.
Gomes (1966-67)
Comissão Nac. Subsidiária da Guilherme Júlio
de Estímulo à SUNAB Borghoff (1964-
Estabilização de 67), Eraldo
Preços (CONEP) Cravo Peixoto
(1965-1968) (1966), José
Autarquia Lobo Fernandes
Braga (1967)
Cia Brasileira de Subsidiária da Carlos de Castro
Alimentos SUNAB Torres (1964-67)
(COBAL)
(1962-1990)
Economia Mista
Cia Brasileira de Subsidiária da Adauto Guilherme Júlio
Armazenagem SUNAB Esmeraldo Borghoff, Adyr
(CIBRAZEM) (1964-65) Maia (1964), Jim
(1962–1990) Barbosa (1965)
Empresa Pública
Superintendência Nelson de Figueiredo
da Amazônia Ribeiro (1964-66)
(SUDAM)
(1966)
Fonte: tabela feita pela autora

O almirante Paulo de Castro Moreira da Silva pertenceu ao quadro da APEC, e foi


superintendente da SUDEPE, de 1963 a julho de 1964. Em 1966, tornou-se interinamente
diretor do Instituto de Pesquisa da Marinha. Eduardo da Silveira Gomes era membro da
CONSULTEC, escritório de consultoria que desenvolveu estudos para o IPES, escreveu para
a revista Conjuntura Econômica da FGV. Juntamente com a função desempenhada na
SUDEPE, trabalhou no Banco Central, de 1964-1967.
José Pires de Almeida foi do conselho da SUDEPE e do Conselho Nacional de Crédito
Rural, representando o Banco Nacional de Crédito Cooperativo (BNCC), onde foi diretor,
entre 1964-1966. Pertenceu, entre 1964-1980, à SRB, uma agremiação de base estreitamente
regional congregando distintos segmentos do patronato rural. Criado em 1919, a SRB tem
como bandeira a defesa da “modernização” da agricultura brasileira e sua plena
industrialização.
19

O empresário Guilherme Júlio Borghoff (Borghoff S.A Com. e Téc. de Máquinas,


Motores e Equipamentos) pertenceu ao IPES-RJ, tendo funções no Conselho Orientador e
Comitê Diretor. Foi presidente da SUNAB, da CFP e da CONEP; diretor da CIBRAZEM;
membro da Associação Comercial do Rio de Janeiro, da Confederação Nacional do Comércio
(1956), da Associação dos Diplomados da ESG (ADESG), da Associação Nacional de
Máquinas, Veículos e Peças, as Associações tinham vínculos com o IPES.
Em 1965, Borghoff e outros dirigentes da SUNAB se reuniram, no dia 10 de março,
com a comissão de senhoras da Campanha da Mulher pela Democracia (CAMDE) para a
realização da “Marcha com Deus pela Estabilização de Preços”, com objetivo de comemorar
o primeiro ano da “Revolução” e de abrirem uma nova frente de luta contra a alta dos preços,
principalmente dos gêneros alimentícios. Eudóxia Ribeiro Dantas, fundadora da CAMDE,
Maria Cecília Souza Ramos, Iáiá Silveira e Cordélia Sá Lessa solicitaram aos dirigentes de
instalarem uma pequena agência da CAMDE, a Associação das Donas de Casa, na delegacia
regional do órgão com a finalidade de divulgar listas de estabelecimento que aumentaram os
preços, como as casas que mantiveram. O pedido não só foi atendido, como a SUNAB
forneceu o local para o seu QG e funcionárias para auxiliaram na fiscalização. Jim Barbosa
deu assistência jurídica20. A CAMDE, e outras associações femininas, foram financiadas e
orientadas politicamente pelo IPES para exercerem pressão na sociedade contra o governo
Goulart. Foi a principal organizadora da “Marcha da Vitória” realizada no Rio de Janeiro logo
após o golpe, em 2 de abril de 1964. Durante a manifestação, a organização distribuiu um
manifesto parabenizando o Exército pela deposição de Goulart.
Fernando Egídio de Souza Murgel foi da empresa Ceibrasil Cia Eng. e Indústria,
colaboradora do IPES. O economista gaúcho Marcus Vinicius Pratini de Moraes foi da
APEC, e ministro da Indústria, do Comércio e do Turismo (1970-1974).
José Agostinho Trigo Drumond Gonçalves pertenceu a APEC e participou do grupo
do ministro do Planejamento, Roberto Campos, para elaboração do Estatuto da Terra.
O empresário Leônidas Lopes Bório (Sociedade Meridional de Materiais e
Equipamentos Ltda e depois Pesa Paraná Equipamentos S.A) foi nomeado, em 1962, assessor
especial do governador ipesiano Ney Braga para assuntos do Programa Aliança para o

20
Correio da Manhã, 11.03.65, 1º Caderno, p. 8.
20

Progresso, até 1963. No mesmo ano, assumiu a presidência da Companhia de


Desenvolvimento Econômico, posteriormente Banco de Desenvolvimento do Paraná
(BADEP), até o início de 1964. Em abril de 1964 tornou-se presidente do Instituto Brasileiro
do Café (IBC), indicado por Ney Braga. No fim do seu mandato, passou a se dedicar à
atividade privada, tornando-se diretor-presidente da Somapi — Comércio, Indústria e
Companhias Associadas; membro dos conselhos de administração do Banco Finasa (SP); da
Indústria Química e Farmacêutica Schering Plough (RJ); da Associação Nacional de
Programação Econômica e Social (ANPES-SP); do Movimento Universitário de
Desenvolvimento Econômico e Social (MUDES-RJ); da Milder Kaiser Engenharia (RJ) e da
Tektronix Indústria e Comércio Ltda. (SP). O Banco Finasa contribuiu financeiramente com o
IPES. No setor cultural fez parte da Fundação Orquestra Sinfônica Brasileira (RJ); diretor
financeiro do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM) e cônsul honorário, no Rio
de Janeiro, da República da Costa do Marfim (ABREU, 2010). Quando presidente do IBC,
Bório foi acusado pelo deputado João Ribeiro Jr. de irregularidades na venda de café à
Argélia.21
Em 1966, Cyro Toledo Piza foi indicado a candidato para suplente da Junta
Administrativa do IBC pelo estado do Paraná.22 Cyro faz parte da família quatrocentona
paulistana dos ipesianos Luiz Toledo Piza Sobrinho, Silvio Toledo Piza e Lélio Toledo Piza
Almeida Filho. O engenheiro agrônomo e deputado, Napoleão Fontenelle da Silveira nas
eleições de 1962 recebeu apoio da elite orgânica por intermédio da rede
IPES/IBAD/ADEP/ADP/Promotion S.A. (DREIFUSS, 2006).
Karlos Heinz Rischbieter foi da Companhia de Desenvolvimento do Paraná
(CODEPAR), ocupando funções de diretor e presidente, entre 1961-1965. A CODEPAR foi
criada pelo governador Ney Braga com objetivo de promover o desenvolvimento econômico e
industrial do Paraná. A partir de seu trabalho na CODEPAR, Rischbieter estreitou seus laços
políticos com Ney Braga, já então uma das principais lideranças políticas paranaenses. Em
1965 foi nomeado representante do estado do Paraná no Conselho Consultivo de
Planejamento (CONSPLAN), órgão de consulta do governo, a convite do ministro do
Planejamento, Roberto Campos, tornando-se, ainda, assessor econômico do estado do Paraná

21
Jornal Correio da Manhã, 02.10.64, Capa
22
Diário Oficial da União de 21.03.1966, p. 15, seção 2.
21

e do Instituto Brasileiro do Café (IBC). Em seguida, trabalhou no IBC no Rio de Janeiro, e,


em julho de 1966, foi para Hamburgo (Alemanha), onde chefiou o escritório do IBC neste
país. Após o término do governo Castello Branco, em março de 1967, retornou à iniciativa
privada, tornando-se diretor da Pafisa Crédito Financiamento e Investimento, e diretor-gerente
da Paraná Comércio Administração S.A., holding de propriedade de Leônidas Bório, ex-
presidente do IBC, até 1972. Assumiu a presidência do Banco de Desenvolvimento do Paraná
(BADEP), em 1972, e foi um constante articulador empresarial na Europa e no Japão, e um
dos principais responsáveis pela atração de investimentos externos para o estado, dentre eles
as empresas Boschi, Volvo, Philip Morris e Siemens (BRAGA, 2010).
O engenheiro, economista, professor e tecnoempresário Paulo Assis Ribeiro
(Escritório Técnico Paulo de Assis Ribeiro - ETPAR) foi um dos intelectuais orgânicos mais
atuantes no IPES, com enorme produção de artigos e estudos sobre reforma agrária, que
serviram de base para a elaboração do Estatuto da Terra. Líder do IPES-RJ fez parte do Grupo
de Estudos. Além da ETPAR e do IPES, trabalhou também na CONSULTEC, e todos os
escritórios atuavam de maneira orgânica e articulada junto a executivos estaduais e federais, e
a maioria dos seus projetos se tornou políticas públicas. Foi um dos principais membros do
GRET, que elaborou a legislação agrária do Estatuto da Terra, além de exercer, em 1965, a
presidência do IBRA.23
O agrônomo amazonense Wanderbilt Duarte de Barros trabalhou no governo Goulart
no Conselho Nacional de Reforma Agrária (CNRA), e foi membro do Consórcio Brasileiro de
Produtividade (CBP)24. Após 1964, foi diretor do Departamento de Remoção Agrária do
IBRA, conselheiro do Conselho Florestal Nacional (1965) e assessor para problemas
agrônomos de Roberto Campos no ministério do Planejamento. O engenheiro César Reis
Cantanhede e Almeida, irmão do ipesiano Plínio dos Reis Cantanhede e Almeida, foi membro
da FGV e do Consórcio Brasileiro de Produtividade (CBP), do grupo de Paulo Assis Ribeiro.
O coronel, advogado e professor de história Hélio de Almeida Brum foi membro da ADESG,
da Confederação Nacional do Comércio (1956), da Confederação Rural Brasileira (1956), da

23
Em 1964 o senador Josafá Marinho (BA) apontou como ilegal a nomeação de Paulo Assis Ribeiro. Segundo
Josafá, a presidência do IBRA, conforme lei que criou o Instituto, só poderia ser atribuída a um dos 5 membros
da diretoria do mesmo (Correio da Manhã de 21.05.65, 1º Caderno, p.8), da qual ele não fazia parte.
24
Escritório de consultoria tecnoempresarial que cuidava dos interesses do bloco multinacional e associado
constituído de indivíduos ligados ao IPES, tais como Paulo de Assis Ribeiro (DREIFUSS, 2006).
22

SUNAB (1963), do IBC (1968), e deu aula no Centro Nacional de Realismo Social “Pro
Deo”.25 No IBRA, foi também diretor do Departamento de Organização de Núcleos. O
general Jaul Pires de Castro dirigiu o Curso de Atualidades Brasileiras (CAB) do IPES. 26 No
IBRA assumiu o Departamento de Recursos Fundiários. Valdiki Cardoso de Moura assumiu a
diretoria da IBRA, em 1966. Foi membro da APEC e conselheiro, no período de 1961-1964,
do Clube de Engenharia, onde o IPES promoveu diversas atividades.
O conselho do IBRA, em 1964, foi formado por empresários agrícolas, presidentes e
diretores de associações de classe rural e associações de veículos para trabalho no campo e
por economistas, que já vinham trabalhando na questão da reforma agrária e no Estatuto da
Terra, e foram contribuintes do IPES. Os conselheiros passaram a exercer pressão junto ao
governo para obter aumento de preço de seus produtos e impedir o aumento de artigos de seu
consumo, como o arame farpado. O vice-presidente da CRB, Edgard Teixeira Leite ressaltou
o papel desempenhado pela entidade. Recordou a “luta contra a reforma agrária demagógica e
espoliativa pretendida pelo governo deposto” e a “campanha de esclarecimento do Estatuto da
Terra, do atual governo, ao qual foram apresentadas pelo CRB, 44 emendas visando adequá-
lo à realidade agropecuária, emendas aprovadas em sua maioria”.27
A presença do setor rural no governo era grande. Poucos dias depois do golpe,
dirigentes da CRB compareceram ao gabinete do ministro do Planejamento para entregar a

25
O Centro Nacional de Realismo Social Pro Deo foi criado no Brasil, em 1958, a partir de um acordo com a
Universidade Internacional de Estudos Sociais Pro Deo de Roma. O Brasil concedeu um crédito de CR$ 14
milhões de cruzeiros para criar o Instituto Brasileiro de Estudos Latino-Americanos em Roma e o Centro
Nacional de Realismo Social no Brasil. Os Centros tinham como objetivos “divulgar no Brasil os princípios do
realismo social “Pro Deo”, isto é, a aplicação à democracia moderna do realismo crítico capaz de superar as
utopias materialistas com o esclarecimento na sociedade da realidade suprema: Deus, fonte dos direitos e dos
deveres do Homem” (DOU, 28.09.57, seção 1, p. 19). O Centro Nacional de Realismo Social “Pro Deo”
promoveu cursos de Formação Doutrinal, com especializações em Doutrina Social Cristã, Filosofia Política,
Política Internacional e Economia e Sindicalismo (Correio da Manhã 27.02.64, 2º Caderno, p. 2); Metodologia e
Técnica de Opinião Pública; e cursos de línguas. Todos os cursos eram dados por professores nacionais e
internacionais. Em 1972, o ministério do Trabalho e Previdência Social fez convênio com o Centro para realizar
curso de Administração Sindical (DOU, 28.04.72, seção 1, p. 23). Além de promover cursos, ofereceu bolsas de
estudo para universidades estrangeiras, publicou livros, através de sua editora, e organizou concursos para a
melhor reportagem publicada em jornais e revistas sobre o título da encíclica “Populorum Progressio” de Paulo
VI (Correio da Manhã, 29.10.67, 2º Caderno, p. 9), como o IPES que adotou os postulados consubstanciados da
Encíclica “Master et Magistra” para legitimar suas pretensões junto à sociedade e para facilitar sua doutrinação.
Nério Batendieri, diretor do Pro Deo, ministrou uma palestra, A questão salarial, no seminário Causas da
Inquietação Social no Brasil, organizado pelo IPES no Clube de Engenharia de SP. Isaac Kissen, Vicente
Sobrinho Porto e os ipesianos Paulo Ayres Fº, Carlos Mancini e Carlos da Silva participaram, em 22-23 de junho
de 1967, de evento no “Pro-Deo”, no Vaticano, o que sugere afinidade entre as duas organizações.
26
Jornal Correio da Manhã, 21.08.64, 1º Caderno, p. 13.
27
Jornal Correio da Manhã, 25.12.1964, 1º Caderno, p. 11.
23

Roberto Campos nomes de diretores e técnicos da CRB para integrar os grupos de trabalho
organizados para estudos e análise do Planejamento.28
O empresário agrícola Flávio da Costa Brito, em 1961, foi representante das
Cooperativas de Produtos e de Consumo na Comissão Federal de Abastecimento e Preços
(COFAP); tornou-se, em 1962, 2º tesoureiro da CRB, e nos biênios 1963-1965 e 1965-1967
assumiu a presidência. Em 1963 foi diretor-técnico da SNA, onde ficou até 1967. Em 1964
representou a SNA junto ao Conselho Nacional Consultivo da Agricultura. A SNA foi uma
associação de classe que congregava grandes proprietários oriundos dos complexos agrários
menos dinâmico derivados do eixo norte, nordeste e sul do país. Brito foi membro do
conselho consultivo da Aliança Brasileira de Cooperativas, a partir de 1965, nomeado pelo
presidente Castello Branco. Ainda em 1965, integrou o conselho técnico do Instituto
Brasileiro de Reforma Agrária (IBRA), no qual permaneceu até 1969 (ABREU, 2010). Foi
diretor da Rio Cooperativa Agrícola de Cotia-SP (1964-1965), entidade que abastecia o
mercado da Guanabara de ovos; da Confederação e Federação de Cooperativas Agrícolas
(1966); e da CRB. No período de 1967 a 1987 foi presidente da Confederação Nacional de
Agricultura (CNA). Na iniciativa privada foi proprietário da Sociedade Importadora e
Exportadora Prôa Ltda (1950); na segunda metade da década de 1950 foi conselheiro fiscal da
Cia Estanífera do Brasil S/A e do Banco do Intercâmbio Nacional S/A, ambas as empresas
contribuíram financeiramente com o IPES.
O cafeicultor do Vale do Paraíba, Edgard Teixeira Leite foi membro do conselho
técnico e vice-presidente do IBRA, onde permaneceu de abril de 1965 a junho de 1968.
Dirigiu o Cotonifício Ribeirão S.A., a Cromita S.A., o Banco Metropolitano de Crédito
Mercantil e a Companhia Econômica Industrial e Comercial de Alimentos Frigorificados
(CEICAF) (ABREU, 2010). Foi membro da ESG (1965-1967) e da SNA, presidente do CRB
(1965) e do Conselho Nacional de Economia (CNE). Participou do simpósio Recomendações
sobre a Reforma Agrária, organizado pelo IPES.
Edvaldo de Oliveira Flores foi, simultaneamente, conselheiro do IBRA e assessor no
INDA. Claudio Cecil Polland, parente do líder do IPES Harold Cecil Polland, foi da
CONSULTEC. O economista Julian Magalhães Chacel foi do IPES-RJ, diretor do Instituto

28
Jornal Correio da Manhã, 15.05.64, 1º Caderno, p. 12.
24

Brasileiro de Economia da FGV e da ESG. João Quintiliano de Avelar pertenceu ao quadro de


dirigentes da Associação Nacionais de Fabricantes de Veículos e Automóveis (ANFEVEA),
em 1966; do Sindicato Nacional de Indústria de Tratores, Caminhões, Automóveis e Veículos
Similares. E, por fim, Glauco Oliger foi da Associação Brasileira de Crédito e Assistência
Rural (ABCAR), de Santa Catarina.
O engenheiro agrônomo Eudes de Souza Leão Pinto foi um dos líderes do IPES-RJ.
Diplomado pela ESG, em 1962, pertenceu à diretoria da ADESG (1963-1964) e do Rotary
Club. Membro da CRB e do grupo do ministro Roberto Campos para estudar o Estatuto da
Terra. Trabalhou na Nordestina S/A Crédito, Financiamento e Investimento – SANBRA.
O engenheiro agrônomo e tecnocrata José Gomes da Silva (Centro Empresarial do
Carmo, Fazenda Santana do Baguaçu) foi um especialista em reforma agrária. No governo
Jânio Quadros criou o Serviço de Expansão da Soja, que acabou lhe dando o apelido de “Zé
Sojinha”. Após o golpe, foi apresentado pelo ipesiano José Drummond Gonçalves à Roberto
Campos e ao pessoal da CONSULTEC, “o grupo do Rio”, que era formado por Garrido
Torres, Paulo Assis Ribeiro e Júlio Vianna, sobrinho do presidente Castello Branco.
Posteriormente, foi indicado, pelo seu professor Hugo Almeida Leme, para a presidência da
SUPRA, onde criou o Estatuto da Terra.29
O engenheiro Paulo Accioly de Sá foi diretor do setor de Pesquisa Tecnológica do
CNPq (1956-1961), um dos fundadores da Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT) e presidente do Consórcio Brasileiro de Produtividade (CBP), escritório de
consultoria que expressava os interesses comuns do bloco multinacional e associado
Benedito Fonseca Moreira foi membro da APEC, secretário geral da Comissão de
Comércio Exterior (1964-1966), membro Comissão de Financiamento de Produção (CFP), do
conselho fiscal da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e da Fábrica Nacional de Motores
(FNM), em 1967.
O engenheiro Eraldo Cravo Peixoto foi membro da APEC. José Lobo Fernandes
Braga foi da ESG, diretor da Gávea S.A Máquina e Veículos, empresa contribuinte do IPES
(DREIFUSS, 2006) e da Federação do Comércio Varejista do Estado da Guanabara (1966).

29
Memória: Entrevista - José Gomes de Silva. Fundação Perseu Abramo. Publicado em 15.04.06.
25

O general e empresário Carlos de Castro Torres (Armazém Torres) apoiou o IPES e


conferiu palestra intitulada Plano Nacional de Abastecimento, organizada pelo Instituto em
fevereiro de 1965.30
O general Adauto Esmeraldo, contribuinte do IPES, foi chefe do Estado Maior do
Exército e do Departamento de Ordem Política e Social - DOPS (1958), órgão responsável
por controlar e reprimir movimentos políticos e sociais contrários ao governo. Esmeraldo em
seus pareceres alertava que parcela da população era “inculta”, e que o operariado com seu
precário “desenvolvimento intelectual, moral e cívico” seria facilmente influenciado por
ideologias nefastas (REZNIK, 2004: 129). O general Adyr Maia, ativista do IPES
(DREIFUSS, 2006), foi do Conselho Fiscal da CRB, em 1965, e no período de 1967 a 1970
foi membro da Federação da Agricultura do Espírito Santo (FAES). O ativista do IPES, Jim
Barbosa foi procurador da COBAL, em 1965, cargo que ocupou anteriormente na SUNAB.
Na época que estava na SUNAB, em 1964, participou ativamente nas operações de
desapropriação de gado nas regiões pecuárias de São Paulo. Solicitou ao general Golbery do
Couto e Silva a colaboração da 4ª zona aérea do II Exército e da delegacia estadual do DFSP,
o envio de cobertura militar para a missão de expropriação dos rebanhos, em face dos
proprietários locais terem demonstrado forte desagrado pela decisão do governo de não dar o
aumento do preço do boi e de intervir no mercado produtor através da posse de 5 mil cabeças
de gado para normalizar o comércio de carne31. Foi instalada uma Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI), em Araçatuba (SP), para apurar o mercado de carne, e o general Porfírio
Fraga acusou Jim Barbosa de usar violência e forçar pecuaristas a vender seus rebanhos fora
das condições de abate32.

O empresário Nelson de Figueiredo Ribeiro foi diretor do Banco da Amazônia S/A,


em 1964, indicado para o posto por Jarbas Passarinho. Em 1967 foi presidente interinamente,
durante três meses. De 1964 a 1966, Ribeiro integrou o Conselho Técnico da SUDAM.
Participou de reuniões com Jarbas Passarinho na 8ª Região Militar para conspirar contra
Goulart.

30
Jornal Correio da Manhã, 08.01.65 e Carta do ADIPES nº 65/109 de 15.02.65, assinada por Leopoldo
Figueiredo Junior – Presidente.
31
Correio da Manhã de 17.09.65, 1º Caderno.
32
Folha de S. Paulo, de 18.10.65, capa, matéria intitulada CPI da carne começa a apurar responsabilidades.
26

Conclusão

Conforme discutido, os ipesianos ocuparam o ministério e as empresas estatais


federais do setor da agricultura, onde asseguraram a homogeneidade na elaboração de
diretrizes políticas. Algumas políticas já haviam sido desenvolvidas pelo IPES, no período de
1961-1964, como o anteprojeto de reforma agrária, o que sugere uma linha de continuidade na
relação de empresários pré-golpe com o desdobramento da estrutura administrativa do Estado
pós-64, quando a elite econômica organizou a administração do Estado em função de um
projeto político próprio.

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