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TESE DE DOUTORADO
Área de concentração:
Direito, Estado e Cidadania.
Rio de Janeiro
2007
HENRIQUE RIBEIRO CARDOSO
Orientador:
Prof. Dr. José Ribas Vieira
Rio de Janeiro
2007
Aos meus amados filhos Clarinha e Dudu,
razão dos esforços de uma vida, recompensa
de carinho, amor, alegria e felicidade.
Agradecimentos
With the adoption of the transference policy of execution of public and private services,
through concession contracts, Regulatory Agencies have been created aiming at
regulating the execution of such services, and also of certain relevant sectors to society.
The inspiration for that is clearly American, stage of the first Regulator Agency, in 1887
– the Interstate Commerce Commission. In Brazil, from 1996 on, in the Federal sphere,
ten Agencies have been created as autarchies of special regime, granted with certain
autonomy and quasi-executive, quasi-legislative and quasi-judicial competences.
Regarding the functions exerted, the one which causes great perplexity, in seeking for
nature, principles and extension, is the normative competence, which leads to the need
of compatibilizing such exercise with analytic delineation of competences presented by
the Federal Constitution. What matters now is how to conciliate legality, efficiency and
legitimity in the production of regulatory law. The studies of comparative law,
considering historical aspects, have been of great importance in the equalization of such
topic, under the method of deductive ratiocination and analytic process. It is expected to
the contemporary configuration of the society of global risks, which is permanently in
need of decisions, the recognition of wide capacity of issuing rules (by-laws) through
Public Administration. As a proposal of reinforcing democracy, by rescuing the positive
freedom of active citizens, the republican political concept has been posed as a
legitimity load, added to the negative freedom of the liberal politics, delimited by basic
rights, in the conception of a procedural model of law and democracy. The Theory of
the Communicative Action, proposed by Jürgen Habermas, poses that, in regulative
speech acts, practical matters can be solved and criticized based on discursive
rationality. The Ethics of Speech provides elements that enable argumentation based on
criteria of truth, sincerity and normative correction. Leaned on the Ethics of Speech, on
the proposal of procedural means which enable the reach of proper solutions, Robert
Alexy and Jürgen Habermas propose the Discursive Theory of Law, under a post-
positivist concept. The first one dedicates to the proposal of a model of application
speech in judicial processes. On the other hand, the second author focuses on the
democratic genesis of law, under a model of Deliberative Democracy. The thesis
presented proposes, based on the theory of the above-mentioned authors, a model of
speech for the production of by-laws of the regulator agencies, called Deliberative
Regulatory Law, that comprises the fields of fundamentation speeches – eminently
democratic ones, and of application speeches, proposing, at last, a model of process
which reflects the means of ideal argumentation, compatibilizing legality, efficiency
and legitimity, promoting, therefore, a juridical control of legitimity.
Key words: regulation; normative power; control; deliberative democracy.
RÉSUMÉ
Introdução ...................................................................................................................... i
Conclusão ....................................................................................................................262
81-127.
13
Outras terminologias também são adotadas, como Direito Administrativo Ordenador, Direito
Administrativo Econômico, ou Administração Regulatória. Adota-se, nesta tese, a terminologia Direito
Regulatório, designação escolhida no “I Ciclo de Estudos sobre Direito da Regulação”. Tal terminologia é
adotada, dentre tantos, por Marcos Juruena Villela Souto (Marcos Juruena Villela. Direito administrativo
regulatório. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2002) e Diogo de Figueiredo Moreira Neto (MOREIRA
NETO, Diogo de Figueiredo. Direito regulatório: a alternativa participativa e flexível para a
Administração Pública de relações setoriais complexas no estado democrático. Rio de Janeiro, Renovar,
2003). Luiz Roberto Barroso, em introdução a esta obra, manifesta-se – p. 11 – pela adoção da
terminologia aqui indicada.
14
O processo de reforma do Estado que ensejou a criação das Agências Reguladoras no Brasil foi
descrito, detalhadamente, em: CARDOSO, Henrique Ribeiro. O poder normativo das agências
reguladoras. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.
15
Norma jurídica é conceituada como regra, modelo, paradigma, forma ou tudo que se estabeleça em lei
ou regulamento para servir de pauta ou padrão na maneira de agir (SILVA, De Plácido e. Vocabulário
jurídico, volume III. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 250).
O tema da discricionariedade administrativa16 se encontra umbilicalmente
ligado à questão da produção de normas por agências reguladoras, repercutindo na
compreensão do princípio da legalidade. Tal ligação se espelha na medida em que a
relação entre a norma jurídica e a atividade administrativa seja mais ou menos estreita.
Oscila entre uma noção mínima – relação de compatibilidade-, e uma noção máxima –
relação de conformidade. Na primeira hipótese, há lugar para o poder discricionário;17
na segunda, fala-se em competência vinculada.18 A discricionariedade, portanto,
configura um resíduo de liberdade decisória resultante da forma que determinado tema
foi disciplinado por lei.19 É técnica utilizada pelo legislador em razão da impossibilidade
de tudo se prever na letra da lei,20 mas será apenas dentro das fronteiras da lei que
poderá vicejar a liberdade administrativa.21
Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintes normas: a) a incompetência fica
caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou; b) o vício de
forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à
existência ou seriedade do ato; c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em
violação de lei, regulamento ou outro ato normativo; d) a inexistência dos motivos se verifica quando a
matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente
inadequada ao resultado obtido; e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato
visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.” Como se
percebe da transcrição do dispositivo, questões de mérito podem ser apreciadas pelo Poder Judiciário nas
hipóteses veiculadas na alíneas “c”, “d” e “e”. Embora a lei trate da ação popular, sua disciplina aplica-se
a todas as ações e ritos em que tais requisitos sejam questionados, incluindo-se neste rol a ação civil
pública.
30
CARVALHO FILHO, José dos Santos. A discricionariedade: análise de seu
delineamento jurídica. In: GARCIA, Emerson (Coord.). Discricionariedade
administrativa. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 23. Em decisão recente do
Supremo Tribunal Federal, a Primeira turma reafirmou seu entendimento: “A Turma
manteve decisão monocrática do Min. Carlos Velloso que negara provimento a recurso
extraordinário, do qual relator, por vislumbrar ofensa aos princípios da moralidade
administrativa e da necessidade de concurso público (CF, art. 37, II). Tratava-se, na
espécie, de recurso em que o Município de Blumenau e sua Câmara Municipal
alegavam a inexistência de violação aos princípios da proporcionalidade e da
moralidade no ato administrativo que instituíra cargos de assessoramento parlamentar.
Ademais, sustentavam que o Poder Judiciário não poderia examinar o mérito desse ato
que criara cargos em comissão, sob pena de afronta ao princípio da separação dos
poderes. Entendeu-se que a decisão agravada não merecia reforma. Asseverou-se que,
embora não caiba ao Poder Judiciário apreciar o mérito dos atos administrativos, a
análise de sua discricionariedade seria possível para a verificação de sua regularidade
em relação às causas, aos motivos e à finalidade que ensejam. Salientando a
jurisprudência da Corte no sentido da exigibilidade de realização de concurso público,
constituindo-se exceção a criação de cargos em comissão e confiança, reputou-se
desatendido o princípio da proporcionalidade, haja vista que, dos 67 funcionários da
Câmara dos Vereadores, 42 exerceriam cargos de livre nomeação e apenas 25, cargos de
provimento efetivo. Ressaltou-se, ainda, que a proporcionalidade e a razoabilidade
podem ser identificadas como critérios que, essencialmente, devem ser considerados
pela Administração Pública no exercício de suas funções típicas. Por fim, aduziu-se que,
concebida a proporcionalidade como correlação entre meios e fins, dever-se-ia observar
relação de compatibilidade entre os cargos criados para atender às demandas do citado
Município e os cargos efetivos já existentes, o que não ocorrera no caso.” Supremo
Tribunal Federal, Recurso Especial n.º 365368, rel. Min. Ricardo Lewandowski.
Informativo n.º 468 (21 a 25 de maio de 2007). Disponível em www.stf.gov.br, com
acesso em 31 de maio de 2007. O exame da proporcionalidade e da razoabilidade será
Finalmente, esclareça-se, o interesse público, que é o
caracterizador da finalidade, tanto poderá ser definido em sede
administrativa de modo concreto como, se necessário, de modo
abstrato, conformando, neste caso, mais uma etapa intermediária
para sua concreção casuística final, como um ato administrativo
normativo.32
aprofundado no capítulo III desta tese. Note-se, desde já, que o Supremo Tribunal
Federal, no exercício do controle da constitucionalidade e da legalidade dos atos
administrativos, embora adote a postura de insindicabilidade do mérito, em que o juiz
não deve se substituir ao administrador em suas escolhas, serve-se das limitações legais
à liberdade do administrador bem como dos “critérios” de razoabilidade e de
proporcionalidade para tornar nulos atos que exorbitem a discricionariedade.
31
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 94.
32
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Legitimidade e discricionariedade – novas reflexões sobre os
limites e controle da discricionariedade. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 34.
33
FERRAZ, Sérgio. Instrumentos de defesa dos administrados. In: Curso de Direito administrativo. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 1986, p. 167 apud MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Legitimidade e
discricionariedade – novas reflexões sobre os limites e controle da discricionariedade. 4. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2002, p. 41. A questão da melhor decisão – ou da única decisão correta – coincide com
as posturas de Dworkin e de Habermas que serão apresentadas no Capítulo IV desta tese.
34
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito administrativo, 17 ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004, p. 400. A noção de providência ótima do autor se aproxima da noção de
proporcionalidade na aplicação de princípios e diretrizes proposta por Alexy. O tema será estudado no
Capítulo III desta tese.
quando a lei carecer de precisão nas seguintes hipóteses: a) não descrever
antecipadamente a situação em vista da qual ocorrerá o comportamento da
Administração; b) eventual situação for descrita por conceitos jurídico vagos e
imprecisos;35 c) quando a lei conferir no próprio mandamento, de forma explícita,
liberdade decisória à Administração; e d) quando descrever objetivo legal de forma
genérica.36 Para se reconhecer a existência da discricionariedade, é necessário, ainda, o
exame do caso concreto. Ainda que a lei use conceitos vagos, dos quais resultaria certa
liberdade, “tal liberdade só ocorre em casos duvidosos, isto é, quando realmente é
possível mais de uma opinião razoável sobre o cabimento ou descabimento de tais
qualificativos para a espécie.”37
35
Como adiante se demonstrará, o autor confunde discricionariedade com conceitos jurídicos
indeterminados. É conhecida a polêmica entre Celso Antônio Bandeira de Melo e Eros Roberto Grau
acerca da discricionariedade dos conceitos fluidos ou imprecisos. Para Eros Roberto Grau não existem
conceitos jurídicos indeterminados, e, referindo-se expressamente a Celso Antônio Bandeira de Mello,
diz que incide em erro quem admite a existência da indeterminação dos conceitos. Para Grau, a
indeterminação é das expressões, defendendo a utilização da terminologia “termos indeterminados de
conceitos”. “Assim, a reiteradamente referida indeterminação dos conceitos não é deles, mas sim dos
termos que os expressam.” GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 5. ed. São
Paulo: Malheiros Editores, 2003, p. 196 e 197. Em resposta à crítica de Eros Roberto Grau, Celso
Antônio Bandeira de Melo, sem referir-se ao autor, aduz não existir palavra “que possa conferir precisão
às mesmas noções que estão abrigadas sob as vozes ‘urgente’, ‘interesse público’, ‘pobreza’, ‘velhice’,
‘relevante’, ‘gravidade’, ‘calvície’ e quaisquer outras do gênero. A precisão acaso aportável implicaria
alteração do próprio conceito originalmente veiculado.” BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio.
Discricionariedade e controle jurisdicional. 2. ed. 5. tir. São Paulo: Malheiros Editores, 2001, p. 20 e 21,
apud GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores,
2003, p. 197. Em outra obra, Celso Antônio Bandeira de Mello se refere à posição de Eros Roberto Grau,
mais uma vez, sem citá-lo: “Aliás, ao respeito deste tópico dos conceitos fluidos, diga-se, de passagem,
que, surpreendentemente, houve quem, neste século, pretendesse que a fluidez é das palavras e não dos
conceitos. Sendo universalmente sabido que as palavras são simples rótulo sobrepostos a objetos de
pensamento, é de meridiana obviedade que elas não possuem, em si mesmas, outra densidade que não
(por via indireta) a do objeto a que se reportam; logo, só podem ser vagas ou imprecisas se vago ou
impreciso for o conceito que recobrem, assim como só podem ser precisas se preciso for o conceito
recoberto, visto que elas próprias, as palavras, nada aportam ao objeto rotulado. Por isto, o tema em
foco é tratado pela doutrina de todos os países do mundo como referente a conceitos ‘vagos’,
‘imprecisos’, ‘elásticos’, ‘fluidos’, ‘indeterminados’, ‘práticos’, em oposição aos conceitos ‘teoréticos’,
‘precisos’, determinados’ – e não como referente a palavras ‘vagas, ‘fluidas’ etc., em oposição a palavras
precisas.” E mais adiante: “Hoje, só mesmo por um erro lógico primário ou pelo intenso desejo de ser
original ou ‘criativo’ é que se pode explicar esta disparatada tese de que fluidas são as palavras, e não os
conceitos.” BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito administrativo. 17. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004, pp. 849-850. Refere-se a tal discussão: BRUNA, Sérgio Varella. Agências
reguladoras – poder normativo, consulta pública e revisão judicial. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2003, pp. 127-129.
36
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito administrativo. 17. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004, pp. 398-399.
37
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito administrativo. 17. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004, p. 399.
Germana de Oliveira Moraes38 traz um analítico conceito de
discricionariedade, cabendo, pela sua clareza e precisão, a seguinte transcrição:
40
ENTERRÍA, Eduardo García de; FERNÁNDEZ, Tomás-Ramón. Curso de derecho administrativo I.
Madri: Civitas, 2000, p. 457 apud TOURINHO, Rita. A principiologia jurídica e o controle jurisdicional
da discricionariedade administrativa. In: GARCIA, Emerson (Coord.). Discricionariedade
administrativa. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 102.
41
TOURINHO, Rita. A principiologia jurídica e o controle jurisdicional da discricionariedade
administrativa. In: GARCIA, Emerson (Coord.). Discricionariedade administrativa. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2005, p. 102.
42
Observa Sérgio Bruna Varella, “nas sábias palavras de Eros Roberto grau, a discricionariedade e a
imunidade ao controle judicial que lhe é peculiar (ao menos no que diz respeito ao chamado ‘mérito’
administrativo) constituíam um verdadeiro cavalo de Tróia introduzido nas muralhas de pedra da
legalidade.” BRUNA, Sérgio Varella. Agências reguladoras – poder normativo, consulta pública e
revisão judicial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 71.
43
Denominação adotada por Habermas, como se verá no Capítulo IV desta tese.
44
Neste sentido, Alexy. A teoria do autor será exposta no Capítulo III desta tese.
pública (policies),45 postas muitas vezes como princípios da Administração, e
equiparadas a estes em sua forma de aplicação.46
45
Ronald Dworkin adota esta classificação. O tema será retomado nos Capítulos III, IV e V.
46
A equiparação de normas finalísticas que estabelecem políticas públicas a princípios é proposta por
Alexy, e adotada nesta tese.
47
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro de
Estudios Constitucionales, 2004, p. 185.
48
O tema será aprofundado no Capítulo III.
produto do direito formal liberal positivo, especialmente o francês, relacionado em sua
origem à noção de ausência de controle das escolhas administrativas pelo Judiciário,
representando, na atualidade, uma relativização da legalidade administrativa.49 A
discricionariedade configura, como já mencionado anteriormente, um resíduo de
liberdade decisória atribuído ao administrador.
56
Neste sentido o Recurso Especial n.º 365368, noticiado pelo Informativo n.º 468 (21 a 25 de maio de
2007). Disponível em www.stf.gov.br, com acesso em 31 de maio de 2007.
57
No mesmo sentido, o Parecer Normativo da Advocacia-Geral da União, n.º AGU/MS
- 04/06: "66.Dentro da ótica do controle administrativo, compete ao Ministro de Estado
exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração
federal na área de sua competência, expedindo as competentes instruções para a
execução das leis, decretos e regulamentos (incisos I e II do parágrafo único do art. 87
da C.F.)."
58
Espécies de normas decorrentes do poder normativo, vinculando os particulares, são as resoluções,
expedidas por diversas autoridades administrativas, nos respectivos campos de atuação. Tais normas
devem estar em consonância com as diretrizes veiculadas em lei, não podendo contrastá-las.
da República a direção superior da Administração Pública federal.59 Leciona Maria
Sylvia Zanella Di Pietro:
59
No mesmo sentido, o Parecer Normativo da Advocacia-Geral da União, n.º AGU/MS - 04/06: "18.Não
se esqueça ainda que, segundo o modelo constitucional brasileiro, o Presidente da República exerce a
direção superior de toda a Administração Federal, incluindo a indireta, auxiliado pelos Ministros de
Estado, a quem cabe a orientação, coordenação, e supervisão dos órgãos e entidades em sua área de
competência, e que a ação da Administração deve-se pautar sempre pelos princípios gerais da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência." Destaque-se, desde já, que não há preponderância
do regulamento em relação às normas emitidas por agências reguladoras no exercício de sua atividade
fim. O tema será retomado.
60
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 11. ed. São Paulo: Editora Atlas, 1999, p.
89.
61
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo moderno. 7. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2003, p. 128.
62
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito administrativo. 17. ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004, pp. 337-338.
O poder normativo das agências reguladoras, para ser compreendido, deve
ser tomado em consideração com as peculiaridades da Constituição Federal de 1988.
Elaborada num momento de abertura democrática, em seguida a duas constituições
outorgadas – 1967 e EC. n.º 01/1969,63 incorporou em seu texto, de forma “amplíssima,
detalhista e minuciosa”64 todas as preocupações da sociedade que vivenciou o período
de ditadura militar iniciado com a Revolução de 1964. A marca característica da
Constituição de 1988 é ser analítica. Observa Uadi Lammêgo Bulos:
67
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 503.
68
Com dezoito anos de existência, a Constituição de 1988 já conta com cinqüenta e três Emendas
Constitucionais, mais seis Emendas Constitucionais de Revisão, promulgadas na forma do art. 3.º do
ADCT.
69
A única voz contra tal assertiva é a de: BACHOF, Otto. Normas constitucionais inconstitucionais?
Tradução: José Manuel M. Cardoso da Costa. Coimbra: Almedina, 1994.
70
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 483.
premissa de que todas as normas constitucionais desempenham uma função útil no
ordenamento, sendo vedada a interpretação que lhe suprima ou diminua a finalidade.71
71
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 43. Não se refere o
autor à obra consultada de Jorge Miranda. A questão da proporcionalidade na aplicação de normas será
aprofundada no Capítulo III desta tese.
72
BULOS, Uadi Lammêgo. Manual de interpretação constitucional. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 05.
73
FERREIRA FILHO. Manoel Gonçalves. Estudos, documentos, debates: reforma do Estado, papel das
Agências reguladoras e fiscalizadoras, n.º 18, São Paulo: FIESP/CIESP e Instituto Roberto Simonsen,
2000, p. 30.
Como dificuldades a serem superadas na compreensão dos poderes
normativos das agências reguladoras, podem ser apontadas a interpretação
constitucional das regras de competência das agências, combinadas com a doutrina da
separação dos poderes e os princípios da legalidade e da eficiência, bem ainda a
disciplina constitucional e legal das competências regulatórias das agências,
estabelecidas num modelo de leis que veiculam diretrizes/objetivos/princípios.
82
É vedada a delegação com uma ressalva: a prorrogação de delegações já existentes, com as que
beneficiam o Conselho Monetário Nacional e do Banco Central. O fundamento da competência normativa
destas entidades pode ser encontrado em: CARDOSO, Henrique Ribeiro. O poder normativo das
agências reguladoras. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, pp. 189-197.
83
É regra de hermenêutica constitucional, na pena de em Henry Campbell Black, explicitada por Uadi
Lammêgo Bulos, que “uma Constituição deve ser interpretada de acordo com a legislação previamente
existente no Estado, a qual deverá compatibilizar-se com as normas constitucionais.” Da primeira parte da
regra, tem-se a influência que exerce o ordenamento constitucional anterior na atual Carta Constitucional.
Este é o enunciado da regra n.º 04, proposta por Henry Campbell Black, traduzida e transcrita por Uadi
Lammêgo Bulos. BLACK, Henry Campbell. Handbook of construction and interpretation of law. Saint
Paul, Minnesota.: West Publishing Co., 1896 apud BULOS, Uadi Lammêgo. Manual de interpretação
constitucional. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 64.
1.4.4 Legislação finalística e Estado Regulador
Uma realidade não pode ser postergada por quem se propõe a compreender
os amplos poderes normativos das agências reguladoras – a permanente necessidade de
decidir, contingência característica da sociedade de risco da Segunda Modernidade, que
resultou na configuração do Estado Regulador, também denominado de Subsidiário,
Prevencionista ou Securitário.84 O Poder Executivo, ao propor as leis que disciplinam
sua atuação,85 e contando com o beneplácito do Poder Legislativo, produz profundas
modificações no direito. Desde o advento do Estado do Bem-Estar social, as normas
passam a conter as políticas públicas a serem executadas pela Administração através da
84
O tema será explorado no próximo capítulo.
85
O processo de elaboração de leis é deflagrado pela iniciativa legislativa. Tal ato,
leciona Clèmerson Merlin Clève, “constitui manifestação de um poder, aliás, de um
poder que não deve ser definido como menor, porque o detentor do poder de iniciativa
pode liderar, se tiver força para tanto, a agenda parlamentar.” CLÈVE, Clèmerson
Merlin. Atividade legislativa do Poder Executivo. 2. ed. Revista dos Tribunais: São
Paulo, 2000, p. 100. Nos termos do que dispõe a Constituição Federal, a competência
para dispor das competências da União, estabelecidas no art. 20, é concorrente,
competindo a “qualquer membro ou comissão da Câmara dos Deputados, do Senado
Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal
Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos.”
Diferentemente, são de iniciativa privativa do Presidente da República: as leis que: “I -
fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas; II - disponham sobre: a) criação
de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou
aumento de sua remuneração; b) organização administrativa e judiciária, matéria
tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;
c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de
cargos, estabilidade e aposentadoria; d) organização do Ministério Público e da
Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do
Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos
Territórios; e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública,
observado o disposto no art. 84, VI; f) militares das Forças Armadas, seu regime
jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e
transferência para a reserva.” Bastante esclarecedora outra lição de Clèmerson Merlin
Clève, acerca do papel do Executivo na produção de leis: “Releve-se, todavia, que o
Presidente da República detém uma gama importante de matérias residentes no seu
território reservado de iniciativa. Ademais, nos casos em que a iniciativa é concorrente,
dela participando as demais pessoas e órgãos elencados no art. 61 da Lei Fundamental,
o projeto de lei governamental possui um peso maior do que qualquer iniciativa isolada
de parlamentar ou mesmo de comissão desta ou daquela casa, ou do próprio Congresso.
Embora a Constituição de 1988 objetivasse devolver o país ao espaço civilizado das
democracias constitucionais, não se poderia impedir que o Executivo de exercer a
liderança do processo de elaboração das leis. Afinal, esse parece ser seu papel no
presente contexto histórico.” CLÈVE, Clèmerson Merlin. Atividade legislativa do
Poder Executivo. 2. ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2000, p. 110.
aplicação, especialmente no âmbito constitucional, administrativo, econômico e
previdenciário, de uma legislação finalística que se expressa prioritariamente através de
diretrizes/objetivos/princípios.
86
Para Gustavo Binenbojm, “Tal situação - de déficit de legitimidade - se agrava agudamente quando
considerada a proliferação de autoridades administrativas independentes. É que os fundamentos de sua
atividade costumam ser leis dotadas de elevado grau de vagueza, generalidade e abstração, que transferem
aos administradores inúmeras decisões de cunho político. Ademais, a não inclusão das agências na linha
hierárquica direta do Chefe do Poder Executivo esvazia por completo o segundo argumento, já que a
legitimidade decorrente da investidura popular deste não se transfere a reguladores autônomos.”
BINENBOJM, Gustavo. Agências reguladoras independentes e democracia no Brasil. In: BINENBOJM,
Gustavo (Coord.) et alli. Agências reguladoras e democracia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 105.
Luís Roberto Barroso aponta este déficit de legitimidade, identificando que a solução passa pela harmonia
- não independência - dos poderes: “O surgimento de centros de poder como os das agências reguladoras
- cujas características são a não eletividade de seus dirigentes, a natureza técnica das funções
desempenhadas e sua autonomia em relação aos Poderes tradicionais - desperta, naturalmente, a discussão
acerca da legitimidade política no desempenho de tais competências. Este déficit democrático tem sido
objeto de ampla reflexão pela doutrina, que aponta alguns aspectos que, idealmente, seriam capazes de
neutralizar suas conseqüências. Dentre eles, invocam-se os seguintes: o Legislativo conserva o poder de
criar e extinguir agências, bem como de instituir as competências que desempenharão; o Executivo, por
sua vez, exerce o poder de nomeação dos dirigentes, bem como o de traçar as políticas públicas para o
setor específico; o Judiciário exerce o controle sobre a razoabilidade e sobre a observância do devido
processo legal, relativamente às decisões das agências. Ressalte-se que em tempo de liberdade de
imprensa, de organização da sociedade e de existência de uma opinião pública esclarecida e atuante,
sobreleva a importância do dever de motivação adequada, do dever de argumentativa e racionalmente
demonstrar-se o acerto das ponderações de interesse e das escolhas realizadas.” BARROSO, Luís
Roberto. Agências reguladoras. Constituição, transformações do Estado e legitimidade democrática. In:
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo (Coord.) et alli. Uma avaliação das tendências contemporâneas
do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 191. O tema será retomado,
especialmente no Capítulo IV, quando se tratará, com lastro na doutrina de Habermas, da crise do Estado
de direito caracterizada pela crescente atribuição de poderes normativos ao Executivo.
1.4.5 Natureza das normas das agências
87
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estudos, documentos, debates: reforma do Estado, papel das
Agências reguladoras e fiscalizadoras, n.º 18, São Paulo: FIESP/CIESP e Instituto Roberto Simonsen,
2000, p. 30
administrativos (decretos, no caso dos Chefes do Executivo;
resoluções, instruções, portarias etc., no caso de outras
autoridades) que significam exercício do poder normativo,
mediante declaração de vontade sobre algo, de sua competência,
e de como a autoridade deseja sua operacionalização, também
não inovando na ordem jurídica, nem criando direitos ou
impondo penalidades. Assim, o poder normativo das agências
reguladoras (não regulamentadoras) vincula-se às normas
legais pertinentes, sem inovar na ordem jurídica. E não é o de
regulamentar leis e muito menos situações jurídicas autônomas
(leis em sentido material) que criem direitos, deveres e
penalidades. Não é por outra razão que a Constituição Federal,
em seu art. 5.º, II, garante que ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer algo senão em virtude de lei.88
88
ARAÚJO, Edmir Netto de. A aparente autonomia das agências reguladoras. In: MORAES, Alexandre
de, (Coord) et alli. Agências reguladoras. São Paulo: Atlas, 2002, p. 41.
89
No mesmo sentido, em passagem já citada, Maria Sylvia Zanella Di Pietro observa que “o poder
normativo da administração ainda se expressa por meio de resoluções, portarias, deliberações, instruções,
editadas por autoridades que não o Chefe do Executivo. Note-se que o art. 87, parágrafo único, inciso II,
outorga aos Ministros de Estado competência para ‘expedir instruções para a execução de leis, decretos e
regulamentos’.” DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 11. ed. São Paulo: Editora
Atlas, 1999, p. 89.
90
A disciplina das agências reguladoras não é uniforme, mas todas elas possuem o denominado poder
normativo, sendo este atribuído ao colegiado composto por seus diretores.
91
Regra e diretrizes/objetivos/princípios são espécies do gênero norma jurídica. O tema será explorado
com maior profundidade nos Capítulos III e IV desta tese.
legislação é menor, a atribuição de poderes normativos é mais ampla, conferindo-se
maior liberdade de escolhas de meios, igualmente pautados pela regra (ou princípio) da
proporcionalidade. A legalidade porosa se contenta em estabelecer os fins, liberando em
larga medida a Administração em sua execução.
Não se pode perder de vista que os atos normativos - gerais e abstratos - são
espécies de atos administrativos, adstritos à satisfação de seus requisitos.92 Dentre as
espécies de atos normativos da Administração, a que mais sintonia guarda com a missão
das agências, produzindo efeitos externos a seu corpo administrativo, é a resolução.
Para Hely Lopes Meirelles:
94
O ponto será retomado especificamente no Capítulo III desta tese.
95
O tema será explorado no Capítulo IV desta tese.
96
Neste sentido, Sérgio Varella Bruna, para quem, modernamente, “reconhece-se que a expertise das
agências não é capaz de eliminar o caráter político de muitas das decisões cometidas a órgãos
administrativos.” BRUNA, Sérgio Varella. Agências reguladoras – poder normativo, consulta pública e
revisão judicial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 205. Em sentido contrário, assevera
Diogo de Figueiredo Moreira Neto que a competência normativa atribuída às agências reguladoras é a
“chave de uma desejada atuação célere e flexível para a solução, em abstrato e em concreto, de questões
em que predomine a escolha técnica”. Afasta-se, a uma só vez, das escolhas abstratas político-
administrativas do Congresso e das escolhas administrativas discricionárias da burocracia da
administração direta. MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do direito administrativo. 2. ed.
Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 162. Tal posicionamento do autor coaduna-se com sua interpretação
acerca da desnecessidade de se promover a legitimidade de suas decisões: “As agências reguladoras
independentes são entes dotados de funções administrativas e não de funções políticas, o que as
caracterizam como órgãos administrativos e não como órgãos políticos, de modo que as atribuições
normativas que lhes são cometidas, contidas na função reguladora, embora sejam materialmente
normativas, são, como já se expôs, de espécie distinta da função legislativa, esta sim, uma função
política, ainda porque a função reguladora não se destina a produzir normas legais, mas meras normas
reguladoras, com distinta natureza que já foi objeto de exame.” MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo.
Direito regulatório: a alternativa participativa e flexível para a Administração Pública de relações
setoriais complexas no estado democrático. Rio de Janeiro, Renovar, 2003, pp. 153-154.
Discricionariedade é liberdade dentro da lei, nos limites da
norma legal, e pode ser definida como: “A margem de liberdade
conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o
dever de integrar com sua vontade ou juízo a norma jurídica,
diante do caso concreto, segundo critérios subjetivos próprios, a
fim de dar satisfação aos objetivos consagrados no sistema
legal.”97
Do que foi expresso neste tópico, as normas gerais e abstratas das agências
reguladoras podem ser definidas da seguinte forma: atos regulatórios normativos gerais
e abstratos emitidos com fundamento no poder normativo previsto nas leis de instituição
das agências reguladoras para o exercício da discricionariedade administrativa na
aplicação de regras, bem como para a escolha dos meios eficientes para a
implementação de diretrizes/objetivos/princípios expressos em legislação finalística,
que, pautados pela regra da proporcionalidade, especificam direitos e obrigações a todos
os atingidos do setor regulado.
Discricionariedade administrativa na
aplicação de regras somada à Não – aplicação proporcional
Atos regulatórios
aplicação proporcional de diretrizes,
para o atendimento da
normativos
objetivos e legislação finalística
princípios
aplicável a todo e qualquer ato administrativo da administração pública também o será relativamente aos
atos das agências reguladoras, emitam estas atos concretos e individuais, ou atos gerais e abstratos.
106
GUERRA, Sérgio. O controle judicial dos atos regulatórios. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p.
365.
107
O Projeto de Lei n.º 3.337/2004 buscou dar ao tema um tratamento mais uniforme.
108
Relativamente ao direito americano, pode-se afirmar que a existência de uma “submissão das normas
emitidas pelas agências norte-americanas à lei de sua criação – enabling act -, ao American Procedure
Act, bem como à Constituição dos Estados Unidos. As rules, em tradução livre, são denominadas de
resoluções, sendo os acts ou statutes, leis formais. Aquelas retiram seu fundamento de validade destes,
filling in the blanks (preenchendo os espaços) deixados pelo legislador, dentro dos standards trazidos pela
lei. Prevalece, nos Estados Unidos da América, orientação “no sentido de que a lei deve conter os
standards mínimos – intelligible principle doctrine – pelos quais deve a administração se pautar.”
CARDOSO, Henrique Ribeiro. O poder normativo das agências reguladoras. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2006, pp. 114-115.
109
WEIL, Prosper. O direito administrativo. Coimbra: Livraria Almedina, 1977, p. 121.
110
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito administrativo, 17 ed. São Paulo:
Malheiros Editores, 2004, p. 400.
escolhas dos meios para o atingimento das finalidades estabelecidas em lei,
ponderando-se meios e finalidades na hipótese de colisão.111
A Constituição Federal, em seu artigo 84, inciso II, estipula como sendo de
competência privativa do Presidente da República, sem qualquer possibilidade de
111
O tema será retomado no Capítulo III.
112
Neste sentido, SUNDFELD, Carlos Ari. Serviços públicos e regulação estatal. In: SUNDFELD, Carlos
Ari (Coord) et alli. Direito administrativo econômico. 1. ed., 2. tir. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 27.
113
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo
econômico. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 229.
114
Neste sentido, JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São
Paulo: Dialética, 2002, p. 525.
115
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estudos, documentos, debates: reforma do Estado, papel das
Agências reguladoras e fiscalizadoras, n.º 18, São Paulo: FIESP/CIESP e Instituto Roberto Simonsen,
2000, p. 35.
delegação, por não se enquadrar no parágrafo único do mesmo artigo, “exercer, com o
auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da Administração federal;”. No
transporte das agências reguladoras para o ordenamento pátrio, estas devem se adaptar
ao seu novo habitat, sujeitando-se, portanto, à direção superior do Presidente da
República, bem como a supervisão dos Ministros de Estado, em seu auxílio. A
vinculação das agências reguladoras - e demais entidades da Administração Indireta -
aos Ministérios opera-se pela supervisão ministerial, que objetiva o controle dos
resultados, a harmonização de suas atividades com a política e a programação do
Governo, a eficiência de sua gestão e a manutenção de sua autonomia administrativa,
operacional e financeira, exercendo os meios de controle enumerados em lei (art. 26,
parágrafo único, do Decreto-Lei n.º 200/1967 e o art. 29 da Lei n.º 8.490/1992).
116
Neste sentido: CARDOSO, Henrique Ribeiro. O poder normativo das agências reguladoras. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2006, pp. 100-122.
117
ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências reguladoras e a evolução do direito administrativo
econômico. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 348. O autor, entretanto, defende posição contrária à
adotada no presente estudo. Para o ele, não há qualquer possibilidade de supervisão ministerial, ou
mesmo de revisão pelo Presidente da República, por existir a previsão legal de recursos internos à própria
agência.
A tutela administrativa sempre existirá, sempre há possibilidade
de recorrer a um órgão que supervisiona, como por exemplo,
nos casos de evidente mal feito por essas comissões, em que o
Poder Executivo há de intervir ou impedir que se consumem ou
concessões, ou permissões, ou autorizações, ou proibições que
atentam contra o Direito e às vezes até contra a moralidade
pública. Então, a inexistência de um controle, a autonomia
absoluta, como se pretende, me parece excessivo.118
118
BORJA, Célio de Vieira. Debates. In: FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estudos, documentos,
debates: reforma do Estado, papel das Agências reguladoras e fiscalizadoras, n.º 18, São Paulo: FIESP/
CIESP e Instituto Roberto Simonsen, 2000, p. 22.
119
Parecer n.º AGU/MS - 04/06, de 23 de maio de 2006, publicado no Diário Oficial da União de 19 de
julho de 2006.
120
Parecer n.º AGU/MS - 04/06, de 23 de maio de 2006, publicado no Diário Oficial da União de 19 de
julho de 2006.
121
A questão pode ser tornada clara com o auxílio de um exemplo bastante simples: embora se atribua ao
Presidente da República a direção superior da Administração Federal, este não poderá - legalmente -
determinar a atuação de um Delegado da Polícia Federal, ou rever um relatório de um inquérito presidido
pelo Delegado, dando um enquadramento diferenciado a determinada conduta delituosa.
políticas públicas definidas para o setor; d) ou que exorbitem o poder de regular por
violação à lei ou ao regulamento editado pelo chefe do Executivo.
A Administração pública se perfaz tanto por atos individuais quanto por atos
normativos gerais e abstratos. Ao se atribuir ao Presidente da República, em sede
constitucional, a direção superior da Administração, questiona-se a possibilidade de
rever - ao lado de atos administrativos concretos e individuais - atos administrativos
gerais e abstratos. Nesta última classe, encontram-se os atos normativos das agências,
decorrentes do poder normativo reconhecido à Administração, seja em razão da
hierarquia, quando destinado à produção de efeitos unicamente internos, seja em razão
da discricionariedade ou aplicação de diretrizes/objetivos/princípios, somada à
igualdade de tratamento dos administrados, quando direcionada à produção de efeitos
externos.
122
Acerca da autonomia universitária, dispõe o art. 207 da Constituição Federal: “As universidades
gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão
ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.” Leciona Anita Lapa Borges
Sampaio: “As limitações à autonomia universitária obedeceriam ao requisito formal de serem editadas
somente por lei e observarem as competências previstas na Constituição.” SAMPAIO, Anita Lapa
Borges. Autonomia universitária: um modelo de interpretação e aplicação do art. 207 da Constituição
Federal. Brasília: UNB, 1998, p. 274 apud BARBOSA, Samuel Rodrigues. Autonomia universitária:
investigações dogmáticas sobre a constitucionalização de um princípio. In: GRAU, Eros Roberto;
GUERRA FILHO, Willis Santiago. Direito Constitucional: estudos em homenagem a Paulo Bonavides.
1.º ed. 2. tir. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 67. Entretanto, para Manoel Gonçalves Ferreira Filho: “O
que eu observaria sobre a autonomia universitária me leva primeiro a fazer uma observação que é em off.
Pela minha experiência de dirigente universitário a autonomia consiste no direito que tem o reitor de
cumprir as portarias do ministro...” FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Estudos, documentos,
debates: reforma do Estado, papel das Agências reguladoras e fiscalizadoras, n.º 18, São Paulo: FIESP/
CIESP e Instituto Roberto Simonsen, 2000, p. 24.
seria usurpar a função especializada que esta possui, e substituí-la por uma vontade
puramente política. Inconcebível o recurso administrativo e a supervisão ministerial
acerca dos atos regulatórios normativos.
123
Neste sentido, Capítulo II de: CARDOSO, Henrique Ribeiro. O poder normativo das agências
reguladoras. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.
124
É interessante notar que a utilização das expressões “súdito” e “administrado” é freqüente em manuais
de direito administrativo. Diferentemente, o conceito de cidadão é muito pouco explorado no direito
administrativo, havendo alguma repercussão no campo do direito constitucional e eleitoral, onde
usualmente se considera que cidadão é o indivíduo que possui capacidade eleitoral ativa - que possui um
título de eleitor. A cidadania, como adiante se verá, é maior que os direitos políticos, envolvendo um
conjunto de direitos civis, políticos e sociais.
125
Neste sentido, JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das agências reguladoras independentes. São
Paulo: Dialética, 2002, p. 540.
126
GRAU, Nuria Cunnil. Repensando o público através da sociedade. Rio de Janeiro: Revan; Brasília:
ENAP, 1998, p. 211.
procedimentais garantidoras de sua atuação.127 São vistos como órgãos colaboradores
dos partidos e da burocracia estatal. Observa Sérgio Varella Bruna:
131
O tema será explorado no Capitulo II.
participar do processo de elaboração de normas, incluído dentre os colaboradores do
procedimento de argumentação.132
132
Para sanar as omissões constantes nas leis das agências e uniformizar o tratamento da matéria,
apresentou o Presidente da República o Projeto de Lei n.º 3.337/2004, aplicável a todas as agências
reguladoras (Lei Geral das Agências Reguladoras), que institui a obrigatoriedade da consulta pública, e
faculta, por deliberação da Diretoria, a realização de audiência pública. Estabelece o referido projeto que
a participação na consulta pública confere o direito de obter da Agência Reguladora resposta
fundamentada sobre a contribuição apresentada à argumentação. Avança, ademais, por prever a
possibilidade das agências estabelecerem, através de normas de organização, formas de participação
exercidas individualmente por cidadãos: "Art. 4.º Serão objeto de consulta pública, previamente à tomada
de decisão, as minutas e propostas de alterações de normas legais, atos normativos e decisões da Diretoria
Colegiada e Conselhos Diretores de interesse geral dos agentes econômicos, de consumidores ou usuários
dos serviços prestados. § 1.º O período de consulta pública iniciar-se-á sete dias após a publicação de
despacho motivado no Diário Oficial da União e terá a duração mínima de trinta dias. § 2. As Agências
Reguladoras deverão disponibilizar, em local especificado e em seu sítio na Rede Mundial de
Computadores - Internet, em até sete dias antes de seu início, os estudos, dados e material técnico que
foram utilizados como embasamento para as propostas colocadas em consulta pública. § 3.º As Agências
Reguladoras deverão estabelecer nos regimentos próprios os critérios a serem observados nas consultas
públicas. § 4.º É assegurado às associações constituídas há pelo menos três anos, nos termos da lei civil, e
que incluam, entre suas finalidades, a proteção ao consumidor, à ordem econômica ou à livre
concorrência, o direito de indicar à Agência Reguladora até três representantes com notória
especialização na matéria objeto da consulta pública, para acompanhar o processo e dar assessoramento
qualificado às entidades e seus associados, cabendo à Agência Reguladora arcar com as despesas
decorrentes, observadas as disponibilidades orçamentárias, os critérios, limites e requisitos fixados em
regulamento e o disposto nos art. 25, inciso II, e 26 da Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993. § 5.º O
acompanhamento previsto no § 4.º será proporcionado ao representante nas fases do processo entre a
publicação de sua abertura até elaboração de relatório final a ser submetido à decisão da Diretoria
Colegiada ou Conselho Diretor, ressalvado o acesso a dados e informações que sejam classificados como
sigilosos na forma do art. 23 da Lei no 8.159, de 8 de janeiro de 1991. Art. 5.º As Agências Reguladoras,
por decisão colegiada, poderão realizar audiência pública para formação de juízo e tomada de decisão
sobre matéria considerada relevante. § 1.º A abertura do período de audiências públicas será precedida de
despacho motivado publicado no Diário Oficial da União e outros meios de comunicação, até quinze dias
antes de sua realização. § 2.º As Agências Reguladoras deverão disponibilizar, em local especificado e
em seu sítio na Internet, em até quinze dias antes de seu início, os estudos, dados e material técnico que
foram utilizados como embasamento para as propostas colocadas em audiência pública. § 3.º As Agências
Reguladoras deverão estabelecer nos regimentos próprios os critérios a serem observados nas audiências
públicas. Art. 6.º As Agências Reguladoras poderão estabelecer outros meios de participação de
interessados em suas decisões, diretamente ou por meio de organizações e associações legalmente
reconhecidas. Art. 7.º Os resultados da consulta e audiência pública e de outros meios de participação dos
interessados nas decisões a que se referem os art. 4.º e 5.º deverão ser disponibilizados em local
especificado e no sítio da Agência Reguladora na Internet, com a indicação do procedimento adotado,
sendo que a participação na consulta pública confere o direito de obter da Agência Reguladora resposta
fundamentada, que poderá ser comum a todas as alegações substancialmente iguais." Disponível em
http://www2.camara.gov.br/proposicoes, pesquisado em 17/05/2007.
serão por isso mais aceitáveis e facilmente cumpridas pelas
pessoas.133
154
A teoria dos sistemas sociais – ou sociologia sistêmica - no modelo proposto por Luhmann será
apresentada no capítulo IV desta tese. Por ora, segue-se a seguinte lição de Habermas, ao tratar do
desencantamento do direito por obra da sociologia: “O sistema jurídico torna-se autônomo na medida em
que seus componentes estão de tal maneira entrelaçados entre si ‘que normas e ações jurídicas se
produzem umas às outras e que os procedimentos e a dogmática relacionam por seu turno essas relações.’
Como primeira conseqüência desse conceito, o sistema jurídico [...] é desengatado de todos os demais
sistemas de ação.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2.
ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 73. Noticia Ignacio
Izuzquiza, em introdução a obra de Niklas Luhmann, que este passou a ser conhecido, em razão de
polêmica mantida em 1972, como um opositor da teoria da ação comunicativa de Habermas.
LUHMANN, Niklas. Sociedad y sistema: la ambición de la teoría. Tradução: Santiago López Petit et alli.
Barcelona: Ediciones Paidós, 1990, p. 10. Como se demonstrará, Habermas dedica-se a afastar as idéias
de Luhmann – especificamente sua teoria dos sistemas - por entender serem estas conservadoras e
antidemocráticas. Observa Marcelo Neves que “o modelo luhmanniano do Direito moderno (positivo)
como sistema autopoiético é, numa perspectiva empírica, suscetível de restrições. A determinação
alopoiética do Direito prevalece na maior parte da sociedade moderna (mundial).” NEVES, Marcelo. A
constitucionalização simbólica. São Paulo: Editora Acadêmica, 1994, p. 124. Por autopoiese entende-se a
capacidade de autoprodução ou autocriação do direito a partir de si mesmo; por alopoiese, a criação do
direito a partir de outra fonte que não o próprio direito.
155
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I e II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003.
156
VIEIRA, José Ribas. Teoria do Estado: a regulação jurídica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1995, p.
13.
157
VIEIRA, José Ribas. Teoria do Estado: a regulação jurídica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1995, p.
32. Regulação, da forma utilizada pelo autor, no sentido amplo, significa normatização, regulamentação,
emissão de normas jurídicas, que tanto podem ser realizadas pelo Estado, como por entidades “fora do
âmbito estatal”, especialmente em “sociedades de capitalismo avançado.” (Ibid., p. 151) Na tese que ora
se apresenta, regulação é modalidade de intervenção estatal econômica, no campo do direito regulatório –
agências reguladoras de serviço público – ou econômico – entes de regulação das atividades econômicas
em geral, como o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE). A regulação econômica pode
ser efetivada através de leis (ou quaisquer atos normativos primários), de atos administrativos normativos,
de atos administrativos de execução ou de atos administrativos judicantes, bem como por meio de
contratos administrativos. Há, na conceituação adotada, uma restrição em seu campo de atuação, porém
se confere uma variedade maior de conteúdos aos atos regulatórios.
Assume-se a postura, a ser justificada no decorrer da presente tese, que o
positivismo jurídico,158 seja nos moldes propostos por Jeremy Bentham159 ou John
Austin,160 fundadores do positivismo moderno numa concepção utilitarista, 161 seja em
modelos mais recentes de positivismo, como o normativista162 de Herbert Hart163 e Hans
Kelsen,164 ou o sistêmico de Niklas Luhmann,165 não atingiram a plenitude de seus
objetivos: racionalizar e ordenar o mundo. No âmbito da tese que se apresenta, as
teorias positivistas não fundamentam - legalmente e democraticamente - os amplos
158
Tomando de lição a doutrina de Carlos Santiago Nino, é muito difícil caracterizar a concepção
positivista do direito em razão da ambigüidade da expressão “positivismo”: “Ella hace referencia a
posiciones diferentes que a veces nada tienen que ver entre si.” NINO, Carlos Santiago. Introdución al
análisis del derecho. 2. ed. Buenos Aires: Astrea, 1995, p. 30.
159
Para José Juan Moreso, a obra de Jeremy Bentham constitui o ponto de partida da denominada
jurisprudência analítica: “Una teoría positivista del Derecho y una teoría utilitarista de la legislación. Es
decir, una teoría de aquello que el Derecho es, fundada en el rechazo del iusnaturalismo y una teoría de
aquello que el Derecho debe ser, que se funda en el utilitarismo moral.” A primeira obra do autor, A
fragment on governmemt é uma crítica “demoledora” das idéias jusnaturalistas. Observa Moreso que, em
razão da profunda desconfiança que Bentham nutria em relação à Commom Law, “estabeleció un vasto
proyecto de codificacíon de las leyes [...], elaborando así el ideal ilustrado de leyes claras, precisas,
públicas para todos los ciudadanos.” MORESO, José Juan. “Jeremy Bentham”. In: DOMINGO, Rafael.
(org) Juristas universales, vol. 2 – juristas modernos. Barcelona: Marcial Pons, 2004, pp. 751-753.
160
Leciona Gregório Robles que muito das idéias e do método John Austin tem precedentes em Jeremy
Bentham e em Thomas Hobbes. Acerca de sua doutrina jurídica: “Austin sostiene uma concepción
estatalista y positivista del Derecho. Partidário de la codificación, no lllega, sin embargo, a despreciar
el Derecho judicial, como sucede en la obra de su antecesor, Jeremy Bentham.” Na filosofia, Austin
destaca a de Kant como das mais importantes. ROBLES, Gregório. “John Austin”. In: DOMINGO,
Rafael. (org) Juristas universales, vol. 3 – juristas del s. XIX. Barcelona: Marcial Pons, 2004, pp.
111-113. John Austin, jurista inglês nascido em 1790 e falecido em 1859 não deve ser confundido com
John Langshaw Austin, filósofo inglês nascido em 1911 e falecido em 1960.
161
NINO, Carlos Santiago. Introdución al análisis del derecho. 2. ed. Buenos Aires: Astrea, 1995, p. 31.
162
Conforme Cláudio Pereira de Souza Neto, o avanço desta corrente positivista, que trata o direito de
forma dinâmica – no seio de processos judiciais -, consiste no fato de reconhecer que a decisão judicial é,
simultaneamente, um ato de razão e de vontade. SOUZA NETO, Cláudio Pereira. Jurisdição
constitucional, democracia e racionalidade prática. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 107. A doutrina
positivista anterior, calcada na Escola da Exegese, entendia que a decisão judicial era mero ato de
cognição, e que a vontade estaria presente unicamente na legislação.
163
Herbert L. A. Hart expõe sua teoria em The concept of law, publicado originalmente em 1961, obra
apontada como a contribuição mais original da teoria jurídica anglosaxã desde A fragment on
government, de Jeremy Bentham, publicada em 1776. MORESO, José Juan. “Jeremy Bentham”. In:
DOMINGO, Rafael. (org) Juristas universales, vol. 2 – juristas modernos. Barcelona: Marcial Pons,
2004, pp. 751-752. A obra de referência de Hart - The concept of law - foi traduzida para o português
como: O conceito de direito. HART, Herbert. L. A. O conceito de direito. 3. ed. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 2001.
164
O ordenamento jurídico é concebido por Kelsen como um conjunto de normas escalonadas
hierarquicamente de modo que o fundamento de validade de uma norma é sempre a conformidade com
uma norma que lhe é superior. São obras de referência de Kelsen: KELSEN, Hans. Teoria pura do
direito. Tradução: João Batista Machado. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998; KELSEN, Hans. Teoria
geral do direito e do Estado. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
165
A relação entre norma e decisão – e, portanto, entre a legislação e a jurisdição – é desta forma
explicitada por Luhmann: “O cumprimento da norma é uma decisão, porque [este comportamento (de
observar a norma)] é escolhido contra [a possibilidade de] um desvio em relação à própria norma, e isto
só pode ser assim, pelo fato de existir uma norma geral (überhaupt). Inversamente, a norma não seria
norma, caso a decisão não fosse produzida. [...] As normas tornam as decisões possíveis porque as
decisões tornam as normas possíveis.” Prossegue o autor: “O direito é válido, quando ele é válido, até ter
poderes de emissão de normas166 conferidos ao Poder Executivo na atualidade.
Tampouco oferecem respostas à corrente busca pela eficiência administrativa.167
sido modificado.” O autor aponta a tendência dos juristas em optar pela violação do direito “como
[sendo] constitutiva do direito.” LUHMANN, Niklas. “A restituição do décimo segundo camelo: do
sentido de uma análise sociológica do direito.” Tradução: Dalmir Lopes Júnior. In: ARNAUD, André-
Jean; LOPES JR., Dalmir (Orgs). Niklas Luhmann: do sistema social à sociologia jurídica. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2004, pp. 36-38. Para Habermas, na teoria positivista de Luhmann: “O direito tem
que deduzir sua validade de modo positivista, a partir do direito vigente; ele lança fora todas as pretensões
de legitimidade que ultrapassam este nível, como se pode ver, segundo Luhmann, no processo judicial.”
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 76. No mesmo sentido, a lição de
Marcelo Neves: “A positivação do Direito na sociedade moderna implica o controle do código-diferença
‘lícito/ilícito’ exclusivamente pelo sistema jurídico, que adquire dessa maneira seu fechamento operativo.
Nesse sentido, a positividade é conceituada como autodeterminação operacional do Direito.” O direito, na
concepção de Luhmann, é um sistema normativamente fechado - só o direito que estabelece o que é lícito
ou ilícito -, mas cognitivamente aberto – em seu processo de autopoiese (autocriação) deve se harmonizar
como meio ambiente circundante, composto por outros subsistemas. NEVES, Marcelo. A
constitucionalização simbólica. São Paulo: Editora Acadêmica, 1994, pp. 119-120.
166
Leciona Klaus Günther que as normas pretendem ter validade para mais de uma situação específica em
razão de sua propriedade de regra. GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral:
justificação e aplicação. Tradução: Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 77.
167
A legalidade positivista é usualmente contraposta à eficiência.
168
ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 8. ed. Tradução: J. Baptista Machado. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 15. Prossegue o autor, em sua introdução: “Parece-me que com
a metodologia tradicional, tal como se constituiu com SAVIGNY e depois dele, forma ainda uma
plataforma suficientemente firme em que o jurista dos nossos dias pode confiar como base do seu labor
intelectual.” Ibid., p. 18.
169
A publicação original da obra é de 1956, e sua atualização, com reformulação especialmente do
capítulo VI – Direito dos juristas, conceitos jurídicos indeterminados, conceitos normativos, poder
discricionário – data de 1977. ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 8. ed. Tradução: J.
Baptista Machado. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, pp. 7-9, prefácio.
170
ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 8. ed. Tradução: J. Baptista Machado. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 205. É célebre a “metáfora do olhar” de Engisch, referida por
Günther, a respeito da aplicação do direito: um “olhar que corre para lá e para cá” - fato e norma.
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Tradução:
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 397.
A segurança e a justiça prometidas e propaladas não foram alcançadas a
contento. O modelo puro de regras nunca conseguiu superar o problema das lacunas do
direito.171
171
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Jorge M. Seña. 2. ed. Barcelona:
Gedisa, 2004, p. 166. Em outra obra: “As normas jurídicas surgidas do processo da legislação não
solucionam todos os problemas. Tem-se evidenciado numerosas vezes que de maneira nenhuma
determinam de forma completa a decisão jurídica.” ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a
teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild
Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 275. À falta de uma alternativa aceitável, propõe Alexy seu
modelo de regras e princípios, com seus procedimentos de aplicação.
172
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 16.
173
NINO, Carlos Santiago. Introdución al análisis del derecho. 2. ed. Buenos Aires: Astrea, 1995, p. 43.
Esta definição que destaca o núcleo da cátedra positivista. Para Herbert Hart, numa definição um pouco
mais ampla, mas igualmente correta, o positivismo, em sua dimensão jurídica, baseia-se em duas
premissas: “a) a opinião de que não há necessária conexão entre direito e moral ou entre direito tal que ele
é e tal qual ele deveria ser; b) a opinião de que um sistema legal é ‘um sistema lógico fechado’, no qual as
decisões corretas legais podem ser deduzidas por meio de procedimentos lógicos a partir de regras
jurídicas predeterminadas sem referência a fins sociais, políticas e standards morais.” HART, Herbert.
“Positivism and the separation of law and morals.” In: Dworkin, Ronald. (org.) The philosophy of law.
Oxford: Oxford University Press, 1986, p. 18 apud MAIA, Antônio Cavalcanti. “Direitos humanos e a
teoria do discurso do direito e da democracia.” In: Albuquerque Mello, Celso; Torres, Ricardo Lobo
(Orgs.). Arquivos de direitos humanos. Vol. II. Rio de Janeiro: Renovar. 2000, p. 10.
174
Zygmunt Bauman refere-se basicamente à obra Crítica da razão pura, de Immanuel Kant. Depreende
Zygmunt Bauman das lições de Immanuel Kant: “O tipo de conhecimento que pode de fato transcender o
senso comum, constituído em meras opiniões e crenças (opinião: juízo insuficiente tanto subjetiva quanto
objetivamente; crença: o tipo mais pérfido de juízo, ‘reconhecido como objetivamente insuficiente’ mas
subjetivamente aceito como convincente), só pode e deve ‘ser revelado pelos filósofos’. BAUMAN,
Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,
1999, p. 30. Esta postura de Immanuel Kant não se choca com a postura cognitivista da ética, calcada no
princípio da universalização, sustentada em sua metafísica dos costumes (KANT, Immanuel. Doutrina do
direito. 2. ed. Tradução: Edson Bini. São Paulo: Ícone, 1993, p. 39) em que é lastreada a teoria discursiva
do direito. Acerca da relação entre racionalidade e direito, importa a seguinte transcrição: “O estado de
paz é o único em que o Meu e o Teu estão garantidos por leis em meio a homens que mantêm relação
constante entre si, e por conseguinte vivem reunidos sob uma constituição.” A regra desta constituição
deve “ser deduzida a priori pela razão do ideal de uma associação dos homens sob leis públicas em
geral.” KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. Tradução: Edson Bini. São Paulo: Ícone, 1993, p.
206. Immanuel Kant será referido unicamente por seu sobrenome - Kant.
175
René Descartes é “considerado pai da filosofia moderna.” KAMBOUCHNER, Denis. Verbete
“Descartes”. In: CANTO-SPERBER, Monique, (Org). Dicionário de ética e filosofia moral. V. I. São
Leopoldo - RS: Editora UNISINOS, 2003, p. 418. As obras de referência do autor são: Discurso sobre o
método e Meditações metafísicas. Disponível em www.mundodosfilosofos.com.br/descartes.htrm, com
acesso em 29/08/2006.
176
LOCKE, John. Dois tratados sobre o governo. Org. Peter Lasllet. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
filosóficos177 - o sonho da razão legislativa.178 Para esta forma de raciocínio, esclarece
Zygmunt Bauman, conhecer a verdade, com uma certeza que possa suportar
contracorrentes vulgares, é a qualidade que separa seus poucos conhecedores, os
filósofos, dos muitos, da multidão, a quem se impõe a verdade. Assim, “a filosofia não
pode senão ser um poder legislativo; é a tarefa da boa filosofia, da correta metafísica,
servir aos homens que pedem ‘que o conhecimento que diz respeito a todos os homens
transcenda o senso comum’.”179 Na Modernidade, “a ordem fadada a instalar-se e
tornar-se universal era uma ordem racional; a verdade fadada a triunfar era a verdade
universal”.180
177
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, pp. 34-35.
178
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 29.
179
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 30. Ensina o autor que em Kant, na Crítica da razão pura, o filósofo é tratado
como um doador de lei que legisla para a razão humana.
180
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 246.
181
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 29.
182
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 29.
183
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 235. Constata o autor: “O desejo do leigo de ser racional lubrifica o volante da
especialização.” Ibid. p. 236.
184
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 235.
185
SOUZA NETO, Cláudio Pereira. Jurisdição constitucional, democracia e racionalidade prática. Rio
de Janeiro: Renovar, 2002, p. 73. É de se ressaltar, que a escola histórica, influenciada pelo romantismo
alemão e capitaneada por Savigny, embora positivista, não guarda “qualquer compromisso com o
“o direito passou a afirmar-se, segundo a interpretação positivista, como a forma que
reveste determinadas decisões e competências com a força da obrigatoriedade fática.”186
Na Modernidade, a ordem passa a ser vista não como algo natural, mas
como algo artificial, criado pelo homem e manifestamente político e social: a
comunidade e a ordem são criações humanas. A existência é moderna na medida em
que se bifurca em ordem e caos, numa luta da “determinação contra a ambigüidade, da
precisão semântica contra a ambivalência, da transparência contra a obscuridade, da
clareza contra a confusão.”189 Mais ainda: “O outro da ordem não é outra ordem: sua
única alternativa é o caos.”190 Desta forma, na Modernidade, o “outro da ordem” é pura
negatividade, e é a existência do caos, uma existência não ordenada, a “natureza”,
racionalismo e o universalismo”. (Ibid. p. 88) Em Savigny lê-se: “Toda a legislação é, mais ou menos, o
resultado da sua história anterior. Justiniano nunca teve a intenção de elaborar um código próprio, mas de
formar uma simples compilação do rico material existente. O todo histórico converteu-se, assim,
novamente, em lei.” SAVIGNY, Friedrich Karl von. Metodologia jurídica. Tradução: Hebe A. M. Caletti
Marenco. Campinas: Edicamp, 2001, pp. 28-29. Há, como já advertido, diversas matizes de positivismo.
Como adiante se verá, Thomas Hobbes é tido por pré-liberal por SKINNER, Quentin. Liberdade antes do
liberalismo. Tradução: Raul Fiker. São Paulo: Editora UNESP, 1998.
186
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 117. A facticidade, entretanto, não
trouxe a reboque a legitimidade. O tema - a tensão entre facticidade e validade - será retomado no
capítulo IV desta tese.
187
SOUZA NETO, Cláudio Pereira. Jurisdição constitucional, democracia e racionalidade prática. Rio
de Janeiro: Renovar, 2002, p. 87.
188
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 12.
189
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 14.
190
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 14. “Sem a negatividade do caos, não há positividade da ordem; sem o caos, não há
ordem.” Ibid. p. 15.
inadequada para a vida humana, algo que deve ser “dominado, subordinado,
remodelado de forma a se reajustar às necessidades humanas.”191
191
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, pp. 14-15.
192
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 13.
193
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 124. Como adiante se demonstrará
no Estado Procedimental de Habermas – teoria do agir comunicativo aplicada à filosofia política -, a
comunidade jurídica se constitui com base num entendimento obtido através do discurso, e não através de
um contrato social.
194
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, pp. 299-300. Modernidade não se confunde com modernismo, “tendência intelectual
(filosófica, literária, artística) que – com origem remontável a muitos eventos intelectuais específicos da
era precedente – alcançou sua força integral no início deste século e que em retrospecto pode ser vista
(por analogia com o Iluminismo) como um ‘projeto’ de Pós-Modernidade ou um estágio preliminar da
condição pós-moderna. Com o modernismo a Modernidade voltou o olhar sobre si mesma e tentou atingir
a visão clara e a autopercepção que por fim revelariam sua impossibilidade, assim pavimentando o
caminho para a reavaliação pós-moderna.” (Ibid. p. 300) A aparente confusão ao se contrapor
Modernidade e modernismo é solucionada com a identificação do modernismo como uma reflexão acerca
da Modernidade, ou seja, com a Pós-Modernidade, como quer Bauman - Modernidade Reflexiva, ou
ainda, Segunda Modernidade, como propõe Ulrich Beck.
195
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 12.
Impõe-se, a Modernidade, uma tarefa inconclusiva do alcance de focos
imaginários da verdade absoluta, da arte pura, da humanidade como tal, da ordem da
certeza e da harmonia:
196
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, pp. 17-18.
197
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 15.
198
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 16. Intolerância, tolerância e fraternidade serão tratadas a seguir, ainda neste
capítulo.
199
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 22. E também: “Caracterizada como foi desde o início por uma intolerância radical
de quaisquer formas de vida diferentes de si mesma, a sociedade moderna só pode conceber essas
diferenças como ignorância, superstição ou atraso.” Ibid. p. 235.
200
FARIA, José Eduardo. O direito na economia globalizada. 1.ed. 4ª tir. São Paulo: Malheiros Editores,
2004, p. 48-49. Prossegue o autor: “No momento em que os paradigmas são aceitos unanimemente pelos
cientistas, a ciência ingressa num período de normalidade e o trabalho intelectual se torna, então, limitado
à resolução dos problemas e à eliminação das incongruências em conformidade com os esquemas
conceituais, teóricos e metodológicos universalmente aceitos.”
ramos do conhecimento humano é a correta leitura da sociedade, especialmente em
momentos de profunda transformação.
Com Ulrich Beck, pode-se identificar uma categoria zumbi quando a antiga
conceituação está presa a três princípios questionáveis: a) vínculo territorial da
sociologia, com conceitos radicados no “contêiner” do Estado nacional; b) suposição de
uma coletividade prefixada, sem a consideração de novas formas de individualização –
classe, família, nação; c) princípio da evolução, que enxerga a sociedade ocidental como
resultante de um progresso funcional.203
201
No mínimo interessante é a resposta de Jean-Claude Kaufmann, trazida por Ulrich Beck, à pergunta “o
que é um casal?”: “Casal é quando duas pessoas compram uma lavadora ao invés de duas.” BECK,
Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp,
2003, p. 16.
202
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 14-15.
203
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 17-18.
204
BITTAR, Eduardo C. B. O direito na pós-modernidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005,
p. 53.
Modernidade, e a incorporação de uma outra forma social, da (Segunda)
Modernidade.205
Adverte José Ribas Vieira, que “foi a crise do Estado da Providência nos
países capitalistas avançados [que] ensejou uma retomada no campo da Ciência Política
da importância do Estado”, centrado “no debate da crise da Modernidade e seus
derivativos das rupturas consagradas da denominada racionalização política (cidadania,
partidos políticos, etc.).”212
216
Jürgen Habermas, Ulrich Beck, Anthony Giddens e Scott Lash são alguns dos sociólogos da atualidade
a quem se atribui a construção de uma democracia cosmopolita, que rompe com o universalismo do
Iluminismo – verdades universais e antropocêntricas - e constrói uma nova etapa da sociedade, um
“segundo iluminismo”, como bem identificam Johannes Willms e Ulrich Beck, para quem “o segundo
[Iluminismo] precisa ser de tal modo que as pessoas tenham clareza sobre as diversas grandes narrations
das diversas tradições culturais, relacionado-as entre si em sua diferença e aprendendo a viver na
diversidade e também permitindo que algo surja disso. Nesse sentido, acredito que um segundo
Iluminismo é deveras possível e necessário.” BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck
conversa com Johannes Willms. Tradução: Luiz Antônio de Oliveira Araújo. São Paulo: Ed. Unesp, 2003,
p. 204. Aponta Ignácio Izuzquiza, em introdução a obra de Niklas Luhmann que, por um caminho
diverso, o da teoria dos sistemas, ele deseja romper “los postulados del ‘viejo pensamiento europeo’” e
estabelecer uma “ilustración de la Ilustración”. LUHMANN, Niklas. Sociedad y sistema: la ambición de
la teoría. Tradução: Santiago López Petit et alli. Barcelona: Ediciones Paidós, 1990, p. 31.
217
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 09. As linhas mestras do presente capítulo são pautadas em Ulrich Beck,
especificamente em duas obras: Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms e
“A reinvenção da política”, inserida na obra coletiva de Anthony Giddens, e Scott Lash: Modernização
reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna., e BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e
ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999; e, Em busca da
política, Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000. De relevância, também as
obras de autores que seguem a mesma linha de pesquisa dos autores referido, Anthony Giddens, e Scott
Lash. No Brasil, a obra de Ricardo Lobo Torres, no que se refere à tributação na sociedade de risco –
TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e princípios
constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005 - e Eduardo Bittar - BITTAR, Eduardo C. B. O
direito na pós-modernidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005. Ao se tratar da globalização do
direito, paradigmáticas foram as seguintes obras: KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. Tradução:
Edson Bini. São Paulo: Ícone, 1993; RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges.
São Paulo: Martins Fontes, 2004, e DELMAS-MARTY, Mireille. Três desafios para um Direito
Mundial. Tradução: Fauzi Hassan Choukr. Rio de Janeiro: Lumen júris, 2003. De grande valia, a obra de
FARIA, José Eduardo. O direito na economia globalizada. 1. ed., 4.tir. São Paulo: Malheiros Editores,
2004.
218
No dizer de Ulrich Beck, a sociedade “é um grande animal gelatinoso, nebuloso, presente em toda
parte e responsável por muita coisa.” BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa
com Johannes Willms. Tradução: Luiz Antônio de Oliveira Araújo. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p. 08
– e jurídicas, acrescente-se. A sociologia tradicionalmente se serviu do nacionalismo
metodológico em que “as sociedades se organizam em termos de Estados nacionais”.219
219
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 09.
220
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com
Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, pp. 09-10.
221
Ulrich Beck denomina tal conduta de universalismo, sendo conceituada como a transposição de
determinada sociedade para toda a sociedade, ou, todas as sociedades nacionais. BECK, Ulrich.
Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p.
11.
222
Niklas Luhmann, em sua sociologia sistêmica, adere a esta postura de relacionar tecnologia com
evolução social.
223
KANT DE LIMA, Roberto. “Por uma antropologia do direito no Brasil”.
In: FALCÃO, Joaquim de Arruda. Pesquisa científica e direito. Recife:
Massangana, 1983, pp. 92-93. No estudo etnográfico do Direito propõe o
antropólogo a reflexão acerca de três eixos: a questão do saber
jurídico, como se constitui e se reproduz; a questão da aplicação
desse saber através das instituições e práticas especializadas; a
questão entre este saber jurídico e sua aplicação e os outros saberes
jurídicos eventualmente existentes na sociedade e por ele dominados.
(Ibid. p. 99)
as sociedades, ou da ‘Humanidade’, como foi possível estabelecer no campo da
biologia.”224
224
KANT DE LIMA, Roberto. “Por uma antropologia do direito no Brasil”. In: FALCÃO, Joaquim de
Arruda. Pesquisa científica e direito. Recife: Massangana, 1983, pp. 93-94. A psicologia, como adiante se
verá, traz interessante contribuição com teoria da evolução psicológica do ser humano, tanto por obra de
Piaget, com sua psicologia genética – epistemologia genética - quanto por Lawrence Kohlberg, com sua
teoria dos estágios morais - teoria do desenvolvimento moral.
225
Universalismo é conceituado por Nicola Abbagnano do seguinte modo: “Qualquer doutrina contrária
ao individualismo que afirme a subordinação do indivíduo a uma comunidade qualquer (Estado, povo,
nação, humanidade, etc.).” Verbete “Universalismo”, In: ABBAGNANO, Nicola. Tradução: Alfredo
Bossi. Dicionário de filosofia. 4. ed. Martins Fontes: São Paulo, 2003, p. 984.
226
Para Ulrich Beck, “essa mudança de visão cosmopolita tem conseqüências tão revolucionárias nas
ciências sociais quanto a Teoria da Relatividade de Einstein teve na física newtoniana.” BECK, Ulrich.
Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p.
12.
227
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 13.
228
GIDDENS, Anthony. “A vida em uma sociedade pós-tradicional.” In: GIDDENS, Anthony; BECK,
Ulrich; LASH Scott. Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São
Paulo: Ed. Unesp, 1995, p. 74.
oposição entre a velha e a nova Modernidade é um choque que abarca e eletrifica todos
os campos de ação na sociedade moderna.”229
229
BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich; LASH Scott.
Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Ed. Unesp,
1995, p. 59.
230
Esclarece Johannes Willms que antes da adoção de tal modelo capitalista, da Modernidade (ou
Primeira Modernidade) “não havia liberdade de ofício, e sim organizações econômicas em corporações; o
contêiner era a cidade. Cada cidade isolada com sua ordem profissional corporativa particular etc.; não
havia direito estatal, territorial, de cidadania, mas apenas direitos no âmbito da cidade. Só se tornava
cidadão quem pertencesse a uma corporação. Esse era o requisito mínimo.” BECK, Ulrich. Liberdade ou
Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p. 37.
231
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 14.
232
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 29.
233
O princípio da legalidade “é um dos pilares do Estado de Direito em quaisquer de
suas modalidades. O primado da lei, observa René David, ‘obteve sucesso decisivo no
século XIX, quando a quase-totalidade dos Estados membros da família romano-
germânica publicou os seus códigos e se muniu de constituições escritas.’ ”
CARDOSO, Henrique Ribeiro. O poder normativo das agências reguladoras. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 26.
eficientes.234 A prática da Administração Pública, por exemplo, atingiu tamanho grau de
complexidade e de incerteza, que não pode mais ser captada plenamente pelo
pensamento e organização do clássico programa condicional do direito positivo, que
estipula fatos jurídicos e determina as conseqüências que deles advirão.235
234
VIEIRA, José Ribas. Teoria do Estado: a regulação jurídica. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1995, p.
32.
235
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 174.
236
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 22; BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich;
LASH Scott. Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo:
Ed. Unesp, 1995, p. 13.
237
BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich; LASH Scott.
Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Ed. Unesp,
1995, p. 13.
238
BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich; LASH Scott.
Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Ed. Unesp,
1995, p. 14.
religioso de várias facções e credos, a crises econômicas, crises
ecológicas, possivelmente guerras e revoluções, sem esquecer os
estados de emergência produzidos por grandes catástrofes – ou
seja, no sentido mais estrito, o dinamismo da sociedade de
risco.239
260
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 288.
261
O surgimento da Segunda Modernidade, com sua ambivalência e o reconhecimento
dos riscos, coincide com a queda do Estado do Bem-Estar social e a adoção da política
econômica neoliberal, com a conformação do denominado Estado Regulador ou
Subsidiário, ou Prevencionista. Importantes alterações ocorreram quanto ao papel do
Estado.
262
No mesmo sentido: BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK,
Ulrich; LASH Scott. Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São
Paulo: Ed. Unesp, 1995, p. 49.
263
LOBO TORRES, Ricardo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e
princípios constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 246.
264
LOBO TORRES, Ricardo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e
princípios constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 246. A democracia deliberativa
estará a serviço da transparência ao se assegurar o direito de participação mais amplo possível em
escolhas do Estado, permitindo ao cidadão manifestar-se em institucionalidades públicas com
procedimentos destinadas especificamente para tanto.
265
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 178-179.
social de parcela majoritária da “população vêm acompanhadas da segmentação de uma
subclasse impotente e devastada, prejudicada em quase todos os aspectos, [que]
constitui muitos indícios que há desenvolvimentos regressivos.”266 Com Amartya Sen
tem-se – em sua teoria do desenvolvimento como expansão de liberdades substantivas -
que o desenvolvimento não pode ser concretizado acaso não restem completamente
removidas as barreiras que mais contribuem para a sua não materialização, como a
pobreza e a destituição social sistemática.267
águas se perderam e a indústria pesqueira que empregava 60 mil pessoas acabou. A maioria das espécies
de peixes desapareceu e a fauna que vivia em suas margens foi reduzida significativamente.” Disponível
em: http://www.planetaorganico.com.br/aguamal.htm, com acesso em 30/08/2006. A crítica à tecnologia
caracteriza a Escola de Frankfurt – de que Habermas é egresso: “Afinal, não se pode falar hoje a respeito
da Escola de Frankfurt sem falar em Habermas.” WIGGERSHAUS, Rolf. A escola de Frankfurt:
história, desenvolvimento teórico, significação política. Tradução: Lilyane Deroche-Gurcel. Rio de
Janeiro: Difel, 2000, p. 28. A instrumentalidade da tecnologia, ao controlar os objetos, viola a integridade
destes, destruindo-os. A tecnologia, que não é neutra, seria então, por si só, uma tomada de posição.
Leciona Rolf Wiggershaus que “a expressão ‘Escola de Frankfurt’ é uma etiqueta adotada externamente
nos anos 60” que se referia ao Instituto de Pesquisas Sociais que funcionou na Alemanha e em exílio nos
Estados Unidos, durante o período da Segunda Guerra Mundial. Ibid., pp. 33-40.
270
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 176. No mesmo sentido, Niklas
Luhmann, em Sociologia del rischio: “Se si trata invece de rischio, la situazione è differente in modo
significativo, poiché in questo caso la prevenzione influenza la disponibilità al rischio e con essa una
delle condizioni di subentro del danno: si è più decisi a iniziare un processo dall’esito incerto se si ha
un’assicurazione per la ptotezione legale; se ci sono dei motodi di costruzione abbastanze sicuri dal
punto di vista sismico, ci si deciderá a costruire sun un suolo a rischio di terremoti; una banca concede
più credito quando si possono offrire delle garanzie; per la locazione di un reatore nucleare, le
possiobilità di evacuare rapidamente la popolazione costituiscono un ponto di vista non trascurabile (su
questo punto fallì un progetto a Long Island). Ma il circolo della diminuzione e dell’aumenro del rischio,
condizionato dal fattore del’essere preparati, va molto oltre. Come si sa dagli studi sul comportamento
rischioso dei manager, essi tendono non di rado a sopravvalutare il proprio controllo sul decorso di
sviluppi che potrebbero causare dei danni, o addirittura a farsi coraggio rifiutando dei dati disponibili e
procurandosi altre valutazioni più favorevoli. In altre parole, si cercano attivamente delle conferme per
la supposizione che il decorso resterà sotto controllo.” LUHMANN, Niklas. Sociologia del rischio.
Milão: Bruno Mondadori, 1996, p. 40. Observa Ignácio Izuzquiza, em introdução a outra obra do autor,
que o conceito de risco é um elemento central na concepção de Luhmann, e em sua análise dos sistemas
sociais. LUHMANN, Niklas. Sociedad y sistema: la ambición de la teoría. Tradução: Santiago López
Petit et alli. Barcelona: Ediciones Paidós, 1990, p. 30. A obra de referência de Luhmann, em que expõe
sua teoria dos sistemas, é Soziale systeme. Grunriss einer allgemeinen theorie (Sistemas sociais.
Compêndio de uma teoria geral), publicada originalmente em 1984. Para Luhmann, o risco, derivado da
complexidade da sociedade contemporânea, deverá ser cuidado por uma teoria tão complexa quanto a
sociedade que o originou – a teoria dos sistemas sociais.
uma estima social cada vez maior.”271 Para Ulrich Beck, "a ciência e a tecnologia são a
causa dos principais problemas da sociedade industrial."272
271
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 228. Cass R. Sunstein refere-se a cenários catastróficos desta sociedade do risco:
“When catastrophic outcomes are possible, it makes sense to take precautions against the worst-case
scenarios — the Catastrophic Harm Precautionary Principle. This principle is based on three
foundations: an emphasis on people's occasional failure to appreciate the expected value of truly
catastrophic losses; a recognition that political actors may engage in unjustifiable delay when the costs
of precautions would be incurred immediately and when the benefits would not be enjoyed until the
distant future; and an understanding of the distinction between risk and uncertainty.” O autor ilustra sua
exposição referindo- se à mudança climática, gripe aviária, modificação genética de gêneros alimentícios,
espécies animais ameaçadas de extinção e terrorismo. Cass R. Sunstein. "The Catastrophic Harm
Precautionary Principle" In: Catastrophic Risks: Prevention, Compensation, and Recovery, 2007.
Disponível em: http://www.bepress.com/ils/iss10/art3, com acesso em 23/03/2007.
272
Ulrich Beck, entrevistado por Antoine Reverchon. Folha de São Paulo, 20/11/2001. Disponível em
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2011200101.htm, com acesso em 04/09/2006. No Brasil, uma
questão ecológica que envolve grandes proporções – de protestos e incertezas - é a transposição do Rio
São Francisco, que conta com a oposição dos estados doadores – Sergipe, Bahia, Pernambuco e Minas
Gerais – e a aprovação dos receptores de água – Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte: “Cerca de 400
representantes de movimentos sociais estão acampados em Brasília desde a madrugada de ontem
[12/03/2007]. Eles reivindicam a retomada do diálogo com o governo, a revitalização do rio São
Francisco e o arquivamento do projeto de transposição.” Movimentos protestam contra transposição do
rio São Francisco. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u90232.shtml, com
acesso em 13/03/2007. A questão será decidida em última instância pelo Supremo Tribunal Federal: “O
presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de Sergipe, Henri Clay Andrade, vai entrar nesta
sexta-feira com uma ação popular no STF (Supremo Tribunal Federal) contra a decisão do governo Luiz
Inácio Lula da Silva de iniciar as obras de transposição do rio São Francisco. ‘Vamos demonstrar na ação
que há escassez de água na bacia doadora para utilização nesse projeto, inclusive já há estudos do Banco
Mundial, além do parecer do Comitê de Bacia, de que o governo pode fazer pequenas obras no Nordeste
setentrional, sete vezes mais baratas que a obra de transposição e com resultados mais eficientes para
resolver a escassez de água naquela região’, afirmou Andrade.” OAB-SE vai ao STF contra transposição
do São Francisco. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u90800.shtml, com
acesso em 30/03/2007. A questão não é de fácil solução jurídica em razão da regras veiculada na
Constituição Federal, art. 225, § 1.º: “ Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder
Público: IV – Exigir, na forma da lei, para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de
significativa degradação do meio ambiente, Estudo Prévio de Impacto Ambiental, a que se dará
publicidade.” Comentando o texto de lei referido, observa Paulo Affonso Leme Machado que “a palavra
‘potencialmente’ abrange não só o dano de que não se duvida, como o dano incerto e o dano provável.” O
Estudo de Impacto Ambiental deverá “determinar o grau de perigo, ou seja, apontar a extensão ou a
magnitude do impacto.” MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental brasileiro. 12. ed. São
Paulo: Malheiros, 2004, pp. 71-72. A questão - e seus riscos - da transposição do Rio São Francisco ainda
está em aberto.
273
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 25. Em entrevista, questionado acerca de uma regulamentação dos riscos, respondeu: “As
questões seguintes são cruciais para regular os conflitos ligados à gestão dos riscos: quem deve provar o
quê? A quem cabe o ônus da prova? O que pode ser considerado prova em condições de incerteza? Quais
são as normas de responsabilidade em vigor? Quem é moralmente responsável? E, finalmente, quem paga
a conta? Se uma política de gestão de riscos responder a essas interrogações, ela dará um caráter concreto
Modernidade é efeito colateral da Primeira, que erode e consome seus fundamentos. É,
entretanto, um modelo de autotransformação, de metamorfose da Modernidade, e não
de sua destruição, e a sociologia tem o dever de analisar processos sociais que formam
estilos padronizados que simbolizam o possível desenvolvimento futuro.274
Para Habermas, na mesma linha, o direito deve oferecer proteção aos novos
bens coletivos da sociedade de “alto” risco, protegendo contra a destruição do meio
ambiente, a contaminação atômica ou a modificação letal da herança genética, bem
ainda “os efeitos não controlados que podem ser causados por grandes instalações
técnicas, produtos farmacêuticos, experimentos científicos, etc.”275
à idéia de evolução social. Porque mudar as políticas de risco implica mudar as relações de poder que
atravessam hoje em dia a regulamentação dos riscos. Precisamos de uma cultura da incerteza que seja
claramente distinta das culturas do risco marginal, de um lado, e da segurança absoluta, do outro. Ela
difere profundamente da ‘cultura do não-risco’, que consiste em barrar a inovação com dispositivos de
segurança desde a origem.” Ulrich Beck, entrevistado por Antoine Reverchon. Folha de São Paulo,
20/11/2001. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe2011200101.htm, com acesso em
04/09/2006.
274
Esclarece Ulrich Beck que não é o papel dos sociólogos propor dogmas da formação social, mas
identificar “empiricamente e com uma sensibilidade metodológica superior, a fim de determinar aquilo
que já está em formação.” BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com
Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p. 28.
275
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 76. A questão que subjaz é de
quem deverá ser a palavra final sobre determinada conduta: se das ciências empíricas, com seu know how
técnico, ou das ciências sociais, com seu know how ético. A disputa entre ciências empíricas (ou da
natureza) e ciências sociais (ou do espírito) foi central à hermenêutica filosófica de Hans-Georg Gadamer.
Observa o autor que a ciência dá a impressão de um conhecimento total, por trás do qual se escondem
preconceitos ou interesses sociais. A economia, a política, o direito e a guerra se definem pelos
especialistas, e não “pelas associações políticas, essas que representam a vontade da sociedade.” Aponta o
autor que: “A pretensão de uma ausência total de preconceitos é uma ingenuidade, seja na forma delirante
de um iluminismo absoluto, seja como delírio de um empirismo livre de todos os preconceitos da tradição
metafísica, ou ainda como o delírio de uma superação da ciência pela crítica ideológica.” Alerta que a
ciência é comumente caracterizada por possibilitar uma formação de juízo livre acerca de seus objetos de
pesquisa, sendo independente da política e da opinião pública, e que, por gozar de enorme estima pública,
é constantemente invocada por sua autoridade para manipular “lutas políticas.” A ciência (da natureza),
buscando superar sua lendária incompreensibilidade pelo leigo, “desenvolve um recurso de linguagem
próprio para a fixação e o entendimento comunicativo no próprio processo de investigação” atingindo a
consciência pública. Tratando do contexto da ciência moderna, e de sua motivação, em severa crítica, diz:
“O que constitui a essência da metodologia científica é que seus enunciados sejam uma espécie de
tesouraria de verdades garantidas pelo método. Como toda tesouraria, também a ciência tem uma
provisão para uso discricionário. Na verdade, a essência da ciência moderna é enriquecer constantemente
a provisão de conhecimento para o uso discricionário. O decisivo em todos os problemas de
responsabilidade social e humana da ciência, que desde Hiroshima tanto pesam sobre nossa consciência,
consiste em que uma das conseqüências da coerência metodológica da ciência moderna é justamente não
ter condições de dominar os fins a que se aplicam seus conhecimentos, como domina suas próprias
relações objetivas. Possibilitando a aplicação prática que chamamos de técnica, a abstração metodológica
da ciência moderna teve êxito.” A aplicação da ciência e sua técnica não são controladas pela ciência.
Tampouco há qualquer vinculação do saber às forças vinculantes da razão social. Conclui que a separação
extrema da ciência e de sua técnica de todo e qualquer contexto motivacional é algo problemático. Neste
contexto: “A reflexão hermenêutica exerce assim uma autocrítica da consciência pensante que retraduz
todas as suas abstrações, inclusive os conhecimentos das ciências, para o conjunto da experiência de
mundo.” GADAMER, Hans-Georg. Tradução: Enio Paulo Giachini. Verdade e método II. 2. ed. Vozes:
Petrópolis, 2004, pp. 213-229.
2.4 Globalização e sociedade de risco
276
Globalização é mais uma névoa que uma palavra. Identifica Ulrich Beck globalização com localização,
passando a denominar de glocalização a dialética da globalização. A globalização, em seu ritmo
acelerado – 24 horas por dia nas metrópoles - impõe uma nova sociologia do local. O local é redescoberto
como ponto nodal da rede global, não sendo mais encapsulado e afastado do mundo. BECK, Ulrich.
Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p.
183.
277
Observa Boaventura de Sousa Santos: “Fröebel, Heinrichs e Kreye (1980) foram provavelmente os
primeiros a falar, no início da década de oitenta, da emergência de uma nova divisão internacional do
trabalho, baseada na globalização da produção levada a cabo pela empresas multinacionais, gradualmente
convertidas em actores centrais da nova economia mundial.” FRÖEBEL, Folker et al. The new
international division of labor. Cambridge: Cambridge University Press, 1980, apud SANTOS,
Boaventura de Sousa. “Os processos da globalização”. In: SANTOS, Boaventura de Sousa et alli. (Org.).
A globalização e as ciências sociais. 2. ed. São Paulo: Cortez Editora, 2002, p. 29.
278
BECK, Ulrich. O que é globalização? Equívocos do globalismo: respostas à globalização. São Paulo:
Paz e Terra, 1999, pp. 46-47.
279
Em Jürgen Habermas: “Utilizo o conceito ‘globalização’ para a descrição de um processo, não de um
estado final. Ele caracteriza a quantidade cada vez maior e a intensificação das relações de troca, de
comunicação e de trânsito para além das fronteiras nacionais.” HABERMAS, Jürgen. A constelação pós-
nacional: ensaios políticos. Tradução: Márcio Seligman-Silva. São Paulo: Littera-Mundi, 2001, p. 321.
“a emergência de novas estruturas decisórias operando em tempo real e com alcance
planetário”.280
287
Para Ulrich Beck, o modelo neoliberal visa à desmontagem das estruturas
democráticas, das culturas democráticas e das autoridades estatais e procuram substituir
a política pelo mercado, e o cidadão politizado pelo consumidor. BECK, Ulrich.
Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 197-198.
288
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 44. Surge a necessidade de harmonizar o direito interno para viabilizar o ingresso de
capital estrangeiro em países emergentes. O tema será retomado.
289
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 44.
290
O autor traz a questão dos opositores à globalização que intentam enxotar a nova realidade
transnacional. O combate ao neoliberalismo, tocado por esquerda, direita e social-democratas, em
consenso, no intuito de restaurar o Estado nacional, com sua democracia e ideal de segurança, é também
um risco. A negação ao globalismo só pode levar ao isolamento étnico, com exclusão e risco de surtos de
violência e guerra civil. A instauração de regimes de autoritarismo democrático (autoritarismo étnico-
democrático) é também posta como um risco. Caracteriza-se como um regime de política “adaptativa por
fora, em face dos mercados mundiais, e autoritária por dentro.” Aos vencedores no processo de
globalização, o neoliberalismo; aos perdedores, a “reetnização”. Um surto fascista futuro não pode ser
rechaçado. BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São
Paulo: Ed. Unesp, 2003, pp. 50-52. Os recentes fatos políticos na América Latina, com o fortalecimento
do discurso populista de retórica esquerdista e antidemocrática - Hugo Chávez (Venezuela), Evo Morales
(Bolívia) e Rafael Correa (Equador) - parecem confirmar as previsões sombrias de Beck. Estes líderes
apontam a globalização e o neoliberalismo como culpados por todos os males enfrentados pela população
de seus países.
o mundo volta a se unir, exigindo-se uma resposta global a tais riscos. Tal união,
involuntária, deve se tornar voluntária, tendo por liame os direitos do homem.291
301
KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. Tradução: Edson Bini. São Paulo: Ícone, 1993, p. 207.
302
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
Título original: The law of peoples. Massachusetts: Harvard University Press, 1999. A edição de O
Direito dos povos apresenta duas obras condensadas: a primeira parte, “O direito dos povos”, e a segunda,
"A idéia de razão pública revista".
303
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
p. 12. A teoria de John Rawls, neste ponto, é uma adaptação de seu Liberalismo político, ambientado no
receptáculo do estado nacional, a uma sociedade cosmopolita. Assim, “cada um desses acordos é
compreendido como hipotético e não histórico, e neles entram povos iguais simetricamente situados, na
posição original, por trás de um adequado véu de ignorância.” (Ibid., p. 12) Posição original, em glossário
elaborado por Catherine Audard, constante da edição brasileira de Justiça e democracia, “é um
procedimento figurativo que permite representar os interesses de cada um de maneira tão eqüitativa que
as decisões daí resultantes serão elas próprias eqüitativas.” RAWLS, John. Justiça e democracia.
Tradução: Irene A. Paternot. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 380. Rawls esclarece que a posição
original é uma situação puramente hipotética, em que “ninguém conhece seu lugar na sociedade, a
posição de sua classe ou o status social e ninguém conhece sua sorte na distribuição de dotes e
habilidades naturais, sua inteligência, força, e coisas semelhantes.” RAWLS, John. Uma teoria da justiça.
2. ed. Tradução: Almiro Pisetta; Lenita Maria Rímoli Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 13. O
véu da ignorância, ensina Catherine Audard, visa preservar a eqüidade na escolha dos princípios, fazendo
com que não intervenham as contingências naturais e sociais. RAWLS, John. Justiça e democracia.
Tradução: Irene A. Paternot. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 383. Na lição de Rawls: “Os princípios
da justiça são escolhidos sob um véu de ignorância. Isso garante que ninguém é favorecido ou
desfavorecido na escolha dos princípios pelo resultado do acaso natural ou pela contingência de
circunstâncias sociais.” RAWLS, John. Uma teoria da justiça. 2. ed. Tradução: Almiro Pisetta; Lenita
Maria Rímoli Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 13.
304
RAWLS, John. Uma teoria da justiça. 2. ed. Tradução: Almiro Pisetta; Lenita Maria Rímoli Esteves.
São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 13.
observa Ricardo Lobo Torres, “projeta o princípio da razoabilidade305 para o campo
internacional, que passa a ser o das relações entre os povos e não entre os estados.”306
305
Com Ricardo Lobo Torres: “O teste da razoabilidade procura a adequação entre meios e fins,
sopesando as situações diante de princípios constitucionais.” TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito
constitucional financeiro e tributário: valores e princípios constitucionais tributários, vol. II. Rio de
Janeiro: Renovar, 2005, p. 229. Razoabilidade, em Rawls, não deve ser confundida com o teste da
razoabilidade (ou da irrazoabilidade) a que estão subordinados os atos estatais. A questão das regras,
postulados ou princípios que tratam da aplicação de outros princípios (direitos fundamentais ou políticas
públicas) será retomada no decorrer da tese que se apresenta – especificamente no capítulo III. A
razoabilidade será tratada juntamente com a regra da proporcionalidade.
306
TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e
princípios constitucionais tributários, vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 232.
307
Leciona Cícero Araújo que o pluralismo “é um ideal de tolerância para com diferentes filosofias e
estilos de vida dos cidadãos.” Como adiante se demonstrará, a democracia deliberativa – a introdução da
ética do discurso no processo democrático – procura reconciliar pluralismo, civismo (ideal de excelência
no exercício da cidadania) e plebeísmo (ideal de universalização dos direitos políticos) ao propor um
modelo em que as decisões democráticas se sustentam por razões que todos poderiam aceitar como
participantes de uma discurso racional. Disponível em:
http://www.flatusvocis.com/eventos/cif/paperAraujo.htm, com acesso em 22/11/2004.
308
Ensina Ricardo Lobo Torres que foi com a obra de John Rawls que ocorreu “o grande salto no sentido
da generalização do princípio da razoabilidade e da sua transfiguração em fonte de legitimação do próprio
Direito Constitucional.” Sintetiza o referido autor o que são pessoas, instituições e doutrinas razoáveis:
“a) o overlapping consensus é razoável porque as pessoas defendem doutrinas compreensíveis e
razoáveis, embora possa haver desacordo razoável; b) a justiça como imparcialidade (justice as fairness)
é razoável; c) a sociedade bem ordenada (well-ordered society), que não é uma sociedade de santos, é
razoável.d) a razoabilidade impregna também as idéias de reciprocidade, publicidade, tolerância, razão
pública, pluralismo e cidadania.” TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e
tributário: valores e princípios constitucionais tributários, vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, pp.
230-231.
309
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
pp. 15-16.
310
Por utopia realista explicita Rawls, entenda-se que a “esperança para o futuro da sociedade baseia-se
na crença de que o mundo social permite a uma democracia constitucional razoavelmente justa existir
como membro de uma Sociedade dos Povos razoavelmente justa.” RAWLS, John. O direito dos povos.
Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 15.
imparcialidade que assegurem oportunidade justa e meios adequados para todos os
propósitos e muito mais.”311 iii) uma concepção de justiça lastreada no político, 312 em
concepções “disponíveis na cultura política pública de um regime constitucional
liberal”313; iv) existência de instituições políticas e sociais que levem os cidadãos a
adquirirem o sentido adequado de justiça, à medida que participam da sociedade, num
processo de aprendizado, com estabilidade e justiça das instituições sob as quais os
cidadãos se conduzem; v) alcance da estabilidade social enraizada numa concepção de
política razoável de direito e de justiça, num “consenso sobreposto de doutrinas
abrangentes”314; e vi) uma concepção política com uma idéia razoável de tolerância,
derivada de idéias extraídas do político.315
311
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
p. 20.
312
Esclarece Catherine Audard que o termo “político” – political – é introduzido por Rawls apenas em
1985, como forma de resposta a seus críticos, indicando que a teoria da justiça como eqüidade tem um
alcance mais reduzido do que parecia em 1971 – ano da publicação de A theory of justice. Em Rawls, “o
político designa agrupamentos a que não se pertence por livre opção e nos quais o exercício do poder
coercitivo do Estado representa sempre uma ameaça para os direitos e liberdades, mesmo num regime
constitucional. Por isso, o político designa igualmente o domínio limitado ao qual se aplica uma teoria da
justiça: o consenso a respeito das instituições e sua proteção.” RAWLS, John. Justiça e democracia.
Tradução: Irene A. Paternot. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 380. “O político tem para Rawls um
sentido sociológico, quase weberiano.” (Ibid. p. 374)
313
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
p. 20.
314
Segundo Ricardo Lobo Torres, consenso sobreposto é “um consenso social que seria feito entre
gerações e que manteria das instituições sociais pretéritas as doutrinas abrangentes e as concepções
filosóficas básicas (religião, moral e política) TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional
financeiro e tributário: valores e princípios constitucionais tributários, vol. II. Rio de Janeiro: Renovar,
2005, p. 230-231. Consenso sobreposto ou por justaposição – overlapping consensus -, leciona Catherine
Audard em transcrição a John Rawls: “Um consenso por justaposição existe numa sociedade quando a
concepção política da justiça que governa as suas instituições básicas é aceita por cada uma das doutrinas
abrangentes, sejam elas morais, filosóficas ou religiosas, que perduram nessa sociedade ao longo de
gerações.” RAWLS, John. Justiça e democracia. Tradução: Irene A. Paternot. São Paulo: Martins Fontes,
2002, pp. 374-375. São doutrinas abrangentes as que englobam diversos aspectos da existência humana,
que ultrapassam questões meramente políticas. Observa Catherine Audard, em glossário da obra de John
Rawls, que “o próprio Rawls, com a idéia de uma concepção filosófica do ‘justo como eqüidade’,
planejava ampliar sua teoria da justiça nesse sentido. Posteriormente, não só renunciou a esse projeto,
mas condenou-o como incompatível com o respeito ao ‘fato do pluralismo’ e à diversidade das crenças
numa sociedade democrática.” RAWLS, John. Justiça e democracia. Tradução: Irene A. Paternot. São
Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 376. Leciona Ricardo Lobo Torres que a tradução da palavra fairness –
de justice as fairness na teoria de John Rawls – é bastante complicada. Para o autor, a tradução correta
seria “justiça como imparcialidade”, o que faria mais sentido para os povos latinos. TORRES, Ricardo
Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e princípios constitucionais
tributários, vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 231.
315
John Rawls sinteticamente expõe o que entende por tolerância razoável: “(1) Pessoas razoáveis não
afirmam todas a mesma doutrina abrangente. Diz-se que isto é uma conseqüência dos ‘ônus de
julgamento”. (2) São afirmadas muitas doutrinas razoáveis, das quais nem todas podem ser verdadeiras ou
corretas, julgadas a partir de qualquer doutrina abrangente. (3) Não é irrazoável afirmar nenhuma das
doutrinas abrangentes razoáveis. (4) Outros que afirmam doutrinas razoáveis diferentes das nossas
também são razoáveis (5) Ao afirmar a nossa crença em uma doutrina que reconhecemos como razoável,
não estamos sendo irrazoáveis. (6) As pessoas razoáveis pensam que seria irrazoável usar o poder
político, se o tivessem, para reprimir outras doutrinas que sejam razoáveis mas diferentes da sua.”
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p.
John Rawls, propondo a aplicação de sua teoria nacional ao direito dos
povos, apresenta os seguintes correlatos: i’) a sociedade razoavelmente justa dos povos
bem ordenados é também realista, sendo os cidadãos substituídos por “representantes
dos povos”,316 atribuindo a estes povos motivos morais - razões certas - impossíveis de
serem atribuídos a Estados - como a guerra em defesa própria;317 bem ainda, o direitos
dos povos é funcional, podendo ser aplicado a relações entre povos e a arranjos
políticos; ii’) o direito dos povos razoavelmente justo usa idéias, princípios e conceitos
políticos para especificar “arranjos políticos e sociais razoavelmente certos e justos para
a sociedade dos povos”, e desta forma, “as relações entre os povos podem permanecer
justas e estáveis (pelas razões certas) ao longo do tempo.” 318 iii’) concepção política de
justiça contida na categoria do político, na medida em que se estende, para o direito dos
povos, “a concepção política liberal para uma democracia constitucional” em nível
global; iv’) no direito dos povos, a lealdade ao direito não precisa ser igualmente forte
em todos os povos, mas deve ser suficiente, sugerindo Rawls que o processo
institucional pode ser mais fraco quando a lealdade ao direito dos povos também for
mais fraca; v’) não se exige qualquer comunhão religiosa, haja vista que o direito dos
povos “provê para a Sociedade dos Povos um conteúdo de razão pública paralelo aos
princípios da justiça em uma sociedade organizada”; vi’) o argumento em favor da
tolerância no pluralismo razoável do estado nacional, aplica-se com maior razão à
sociedade dos povos, que contém mais doutrinas abrangentes que qualquer povo
individualmente considerado: “Torna-se inevitável que daí advenha a tolerância, se os
povos-membros empregam a razão pública319 nos tratos mútuos.”320
22.
316
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
p. 23.
317
O atentado às torres gêmeas do World Trade Center mudaram profundamente este conceito: “Até
2001, os americanos seguiam o preceito de só entrar em conflitos armados quando atacados. Desde então,
vale a doutrina da ‘guerra preventiva’: os Estados Unidos têm o direito de atacar países que representem
uma ameaça estratégica. Os defensores da tese, como o vice Dick Cheney, passaram a ser os homens mais
consultados por George W. Bush.” SCHELP, Diogo; BOSCOV, Isabela. 50 coisas que o terror mudou no
mundo. Revista Veja, 06/09/2006, p. 92.
318
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
pp. 23-24.
319
Razão pública é aquela de livre utilização. Esclarece Catherine Audard: “Ela representa as regras
utilizáveis para as pesquisas de opinião pública, as negociações e os contratos, os debates públicos,
morais, políticos, etc., e os seus procedimentos são tanto os do senso comum quanto os da ciência quando
esta ultrapassa o estágio da controvérsia.” RAWLS, John. Justiça e democracia. Tradução: Irene A.
Paternot. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 381.
320
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
p. 25.
De especial relevo para a presente tese é a concepção que John Rawls tem
de tolerância, tema que será retomado mais adiante, no decorrer deste capítulo. Ao tratar
da questão relativamente a povos não liberais, esclarece o referido autor:
Assevera John Rawls, em defesa de sua tese, que “o direito dos povos não é
etnocêntrico”.322
econômica. Deve-se estar atento à mundialização (ou globalização) no sentido de se evitar a imposição
dos valores e do direito da economia hegemônica. (Ibid., pp. 03- 04) A idéia de universalização dos
direitos humanos estará presente nas categorias de direitos fundamentais apresentadas por Habermas,
calcadas no princípio do Discurso e do conceito de “forma jurídica” estabilizadora das relações sociais.
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 159-160.
326
Esta forma de imposição coincide com o movimento de Reforma do Estado e a adoção do modelo de
Administração Pública gerencial. O modelo jurídico de agências reguladoras e a Lei de Responsabilidade
Fiscal, adotados no Brasil, são exemplos de imposição de leis pelo mercado.
327
DELMAS-MARTY, Mireille. Três desafios para um Direito Mundial. Rio de Janeiro: Ed. Lumen
Juris, 2003, pp. 14-17.
Africana e da Liga Árabe; e “reservas” constantes de tratados que acabam por lhes
retirar toda a essência.
332
DELMAS-MARTY, Mireille. Três desafios para um Direito Mundial. Rio de Janeiro: Ed. Lumen
Juris, 2003, pp. 55-65. As posições defendidas pela autora neste parágrafo, estão em consonância com as
posturas de BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São
Paulo: Ed. Unesp, 2003.
333
Neste ponto, em defesa de uma teoria pós-positivista, nota-se um contato com a teoria discursiva do
direito de Jürgen Habermas e Robert Alexy.
334
DELMAS-MARTY, Mireille. Três desafios para um Direito Mundial. Rio de Janeiro: Ed. Lumen
Juris, 2003, p. 73.
335
Este direito suave é expresso através de diretrizes, objetivos, princípios e políticas públicas,
estabelecidos em legislações finalísticas.
336
DELMAS-MARTY, Mireille. Três desafios para um Direito Mundial. Rio de Janeiro: Ed. Lumen
Juris, 2003, p. 73.
337
DELMAS-MARTY, Mireille. Três desafios para um Direito Mundial. Rio de Janeiro: Ed. Lumen
Juris, 2003, p. 79. Este aspecto será explorado no decorrer desta tese, numa proposta de direito pós-
positivista que confira segurança à sociedade, mas não a segurança positivista calcada unicamente na
validade, e sim um modelo de segurança que atente à legalidade, à eficiência e também à legitimidade
democrática do direito, com a obtenção de decisões racionais e proporcionais. A segurança jurídica passa
a se relacionar com a noção decisão justa, eficiente e correta, e não unicamente com a validade de uma
lei.
“incorporar direitos do homem à razão jurídica.”338 Entende haver uma ampliação dos
poderes do juiz, especialmente no campo do Direito Internacional dos Direitos do
Homem. Identifica um receio por parte dos Estados, como ameaça à sua soberania, da
utilização das margens de interpretação, sendo necessário um juízo de admissibilidade
das queixas contra os Estados, pautado na plausibilidade e na exigência de uma boa
fundamentação.339 A adoção das margens contribui para garantir, pela sua interpretação,
a vocação universal dos direitos do homem: garantia universal, em se tratando de uma
corte universal (ONU), ou regional, em se tratando de corte regional (Europa).
Vislumbra, na utilização das margens, uma trans-dicção do direito pelo juiz, e não uma
transgressão.340
Além dos direitos humanos, universais por sua própria essência, a direito
administrativo, especificamente o que se convencionou denominar de Direito
Regulatório, foi fortemente internacionalizado, “harmonizado”, influenciado pelo
aspecto econômico da globalização. Para que os dólares de investidores aportassem no
Brasil, especialmente a partir de 1995, quando se iniciou um amplo processo de reforma
do Estado decorrente da redefinição de seu papel, que deixa de ser prestador e passa a
ser regulador, necessária a criação de um direito conhecido, previsível e suave –
imposição do “mercado da lei” –, com a definição das competências dos entes
autônomos de regulação – agências reguladoras -, em moldes semelhantes às existentes
em outros países, especialmente, nos Estados Unidos da América.
356
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 67-68.
357
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes
Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p. 67. O autor distingue a existência
individualizada, com as características acima expostas, do auto-empresário. Este tipo é
um desvirtuamento da individualização, com a auto-imposição de um projeto neoliberal,
em que o indivíduo se oprime e se explora, agindo na ilusão de ser dono de uma
autonomia sem limites. Distingue, ainda, individualização de atomização. Atomização é
a perda das tradições, de toda e qualquer propriedade privada, da existência civil ou de
classe. Pessoas desamparadas, sem autoconsciência ou auto-organização. Ocorre em
regiões do mundo onde a modernização niveladora tritura a liberdade. Trata também a
categoria do individualismo altruísta ou egoísmo cooperativo, em que identifica uma
busca pelo convívio social, num intercâmbio entre os mais individualistas e bem
sucedidos, e os mais necessitados, através da prestação de serviços comunitários. O
autor explora a questão da individualização na instituição familiar, com a igualdade da
mulher, e seu reflexo no mercado de trabalho, atingindo a segurança da tradicional
relação familiar, e a segurança do pleno emprego, respectivamente. BECK, Ulrich.
Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 72-82.
358
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 69-71.
359
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 74.
Clareando esta assertiva, “levar vida própria significa lavar uma vida social
e inclusive de modo muito mais consciente que outrora. [...] O social é um efeito
colateral desejável do projeto individual.”360
360
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 75.
361
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 101.
362
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 91.
363
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 101. Na Segunda Modernidade, há o crescimento do Terceiro Setor, que nada tem de
produtivo ou de doméstico, como forma de promoção pública da iniciativa individual. É materialização
do trabalho cidadão, com a revitalização da sociedade civil, onde uma “atividade de baixo para cima cria
sentido, promove a identidade e tem significado para o homem." (Ibid., p. 167)
democracia. Há uma dificuldade em se reconstruir uma coletividade a partir da
autoconsciência e das existências individuais pulverizadas, transplantando a política
para o reconhecimento das chances de desenvolvimento do indivíduo e dos direitos
fundamentais.364
364
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 107-111.
365
ENZENSBERGER, Hans Magnus. Mittelmas und Wahn. Frankfurt: Suhrkamp, 1991, p. 228, apud
BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich; LASH Scott.
Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Ed. Unesp,
1995, p. 53. No caso específico do Brasil, nem a instauração de um Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) para investigar graves denúncias de corrupção nos Correios atingiram o funcionamento da empresa
pública ou índices da economia.
Com bem se percebe, há uma nítida relação do individualismo
institucionalizado e da subpolitização da sociedade com a institucionalização de meios e
procedimentos para a implantação de uma liberdade positiva, nos moldes da liberdade
dos antigos:367 a reflexividade da Modernidade na política significa, desta forma, que
“as áreas clássicas da política simbólica podem ser deslocadas e delegadas à subpolítica
organizada da sociedade.”368 Neste deslocamento há uma busca pela felicidade da
sociedade a ser alcançada não só através das instituições políticas clássicas e suas
liberdades negativas, mas também pela busca de liberdades positivas. Com Zygmunt
Bauman:
366
SCHWENGEL, H. Die zukunft des politischen. Ästhetik und kommunikation, v. 65/66, 1987, p. 18,
apud BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich; LASH Scott.
Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Ed. Unesp,
1995, p. 54.
367
368
BECK, Ulrich. “A reinvenção da política” In: GIDDENS, Anthony; BECK, Ulrich; LASH Scott.
Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna. São Paulo: Ed. Unesp,
1995, p. 55. Neste sentido, a auto-regulação econômica está a cada dia mais tomando o espaço outrora
exclusivo da atuação estatal. MOREIRA, Vital. Auto-regulação profissional e Administração Pública.
Coimbra: Livraria Almedina, 1997. O tema será retomado quando da discussão acerca do modelo de
estado regulador.
369
BAUMAN, Zygmunt. Em busca da política. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000, p. 112. Esta é,
como adiante se verá, a linha central da proposta da ética do discurso, com reflexos na teoria discursiva
do direito e na democracia deliberativa, em que a liberdade positiva – liberdade dos antigos – alia-se à
liberdade negativa – liberdade dos modernos – garantindo, ao mesmo tempo, direitos fundamentais e um
status cívico ativo.
370
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 206.
adquirem uma nova feição, de Estado Regulador371 - unicamente.372 Aponta Ulrich
Beck, como efeito da transnacionalização, um déficit democrático. “O renascimento
transnacional do Estado e da política, assim como a perda da democracia, são, pois, dois
lados da mesma moeda.”373 Na criação de um direito cosmopolita legítimo, é um desafio
solucionar esta contradição de modo satisfatório, devendo-se, na expressão de Mireille
Delmas-Marty já referida, reinventar a democracia.
371
Neste modelo, a intervenção do Estado se dá através da regulação,
modalidade de intervenção econômica consubstanciada em técnicas de
intervenção pública no mercado. Esta intervenção configura um controle
prolongado e localizado exercido por um ente público – em geral, agências
reguladoras - sobre uma atividade à qual a comunidade atribui relevância
social. As expressões “regulador”, “subsidiário”, “prevencionista” e
“securitário” são sinônimas, mas realçam diferentes enfoques em sua
construção: a denominação “regulador” ressalta o modelo de intervenção
econômica mais suave na economia, rejeitando produção econômica de
bens e serviços pelo Estado, e defendendo a prestação de serviços públicos
(e de serviços de interesse público) pelo setor privado; a denominação
“subsidiário” sublinha a participação da sociedade na solução das questões
que lhe afetam; a denominação “prevencionista” destaca a função do
Estado de dar uma resposta satisfatória (eficiente e democrática) aos riscos
globalmente enfrentados pelos Estados.
372
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com
Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p. 218. A União Européia é
apontada à unanimidade pela doutrina como um modelo de Estado
puramente regulador. Neste sentido, observa Marçal Justen Filho que,
“ainda quando se possa imaginar que a União Européia não se configure
propriamente como um Estado – certamente não no sentido clássico do
conceito -, assumiu funções de cunho normativo vinculantes para os
Estados nacionais associados.” JUSTEN FILHO, Marçal. O direito das
agências reguladoras independentes. São Paulo: Dialética, 2002, p. 26.
Reconhece-se, assim, que: “A União Européia, não presta diretamente
serviços públicos, mas é titular de competência reguladora das atividades
econômicas e não-econômicas. É uma estrutura institucional de governo
dotada de competência regulatória.” Henrique Ribeiro. O poder normativo
das agências reguladoras. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 128. É
referência no tema da União Européia a obra A Constituição européia: o
projeto de uma nova teoria constitucional, resultado do Grupo de Pesquisa
sobre Jurisdição Constitucional e Democracia (2003-2004), coordenado por
José Ribas Vieira. Esta obra retrata o novo modelo de constitucionalismo
2.7 Sociedade de risco e economia
378
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 122.
379
O risco não é um objeto, mas sim um “‘constructo’, uma definição social, no qual se deve acreditar
para que ele se torne efetivo e real.” BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa
com Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, p. 123.
380
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 127-128.
institucionais da Primeira Modernidade são insuficientes, havendo o fracasso do Estado
e do Direito.381 Especificamente do Estado liberal do Bem-Estar Social e do direito
racional positivista, com sua suposição de trazer consigo resposta a todas as demandas.
381
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 131.
382
TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e
princípios constitucionais tributários, vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 374. Leciona o autor: “O
princípio do poluidor-pagador se concretiza no direito tributário por intermédio das regras atinentes à
instituição de multas, de taxas ou de contribuições. Para tanto, todavia, torna-se necessária a tipificação
do poluidor, que, do ponto de vista da metodologia jurídica, não é um conceito jurídico, nem mesmo
indeterminado, mas um tipo, existindo, na realidade da sociedade de risco, vem sendo tipificado por leis
recentes, suscetíveis de ulteriores regulamentações tipificadoras e até de atos administrativos
tipificadores, como aconteceu com a legislação da taxa ambiental do IBAMA e da contribuição para o
SAT.” Ibid. pp. 374-375.
383
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 139. Neste ponto figura o Direito Tributário como importante ramo do direito, a ter o
risco como fundamento da hipótese de incidência. Não somente a capacidade contributiva da Primeira
Modernidade, mas também o risco passa a ser fundamento para a tributação. No âmbito da ecologia, é de
ressaltar a importância das ONGs transnacionais, a exemplo do Greenpeace, que se utilizam da opinião
pública para impor importantes concessões em beneficio do meio-ambiente. Nesta atuação, merecem
destaque conferências internacionais sobre o meio ambiente, a exemplo da Rio-92, que fazem com que
problemas ambientais, sendo globais, sejam globalmente reconhecidos, fixando padrões ambientais aos
signatários, estabelecendo uma rede de regulamentações com controles mútuos e mecanismos de coerção.
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, pp. 147-148.
384
Vislumbra Ulrich Beck a possibilidade da sociedade de risco desencadear um processo de aprendizado,
uma politização compatível com processo de cosmopolitização. No campo ambiental, o progresso já é
perceptível, com a consciência global dos riscos e a adoção de acordos e conferências internacionais. No
âmbito econômico, a crise asiática, a Russa e o colapso potencial da América Latina, demonstram o
caminho da catástrofe; outra que vislumbra uma situação em que se tem que decidir
acerca da sobrevivência ou não da espécie.385
descontrole acerca dos rumos da economia global. Tal fato, ainda sem reposta global, já vem sendo
debatido, fazendo com que o globalismo neoliberal fique na defensiva. Tal processo gera uma dialética
entre movimento de cosmopolitização e contramovimento, este enfocando a remoção das identidades
étnicas, a afirmação das identidades militares e estatais, e a emancipação do mundo militar em relação às
formas de Estado, “coisa que leva ao limiar do terrorismo” e exige a atenção de todos. Convém identificar
os inimigos da cosmopolitização. BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com
Johannes Willms. São Paulo: Ed. Unesp, 2003, pp. 199-209. Acerca do terrorismo, ressalta Ulrich Beck,
transcrito por Marli Navarro e Telma Cardoso, que uma percepção “distorcida” dos riscos pode fazer com
que o sujeito, ao invés de ser capaz de identificar os riscos do mundo, passe a ver o mundo como um risco
– em especial, um risco de terror – tornando-se, conseqüentemente, inapto para a ação: “Quem olhar o
mundo como um risco de terror, torna-se incapaz de agir. É esta a primeira armadilha armada pelos
terroristas. A segunda: a manipulação política da percepção do risco de terrorismo desencadeia a
necessidade de segurança, que suprime a liberdade e a democracia. Justamente as coisas que constituem a
superioridade da modernidade. Se nos confrontarmos com a escolha entre liberdade e sobrevivência será
já demasiado tarde, pois a maioria das pessoas escolherá situar-se contra a liberdade. O maior perigo, por
isso, não é o risco, mas a percepção do risco, que liberta fantasias de perigo e antídotos para elas,
roubando dessa maneira à sociedade moderna a sua liberdade de ação” Navarro, Marli B. M. de A.;
Cardoso, Telma A. de O. (2005). Percepção de Risco e cognição: reflexão sobre a sociedade de risco.
Ciências & Cognição; Ano 02, Vol. 06, nov./2005. Disponível em www.cienciasecognicao.org, com
acesso em 26/09/2006.
385
Ulrich Beck identifica o surgimento da sociedade de risco global com o impacto da física nuclear – 06
de agosto de 1945. Dentre as conseqüências políticas da fissão nuclear - atribuindo a tal choque um
esclarecimento e uma reflexão – há a criação de institucionalidades internacionais de proteção ao meio-
ambiente. BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São
Paulo: Ed. Unesp, 2003, p. 153.
386
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 155. Em análise do cenário econômico nacional, a referência a crises mundiais da
economia, que ocorrem do outro lado do mundo, mas que acabam por atingir também o Brasil é
freqüente: “Dado o histórico do período pós-1997, analistas se perguntam se a alta persistente dos
negócios não é o prenúncio de uma nova crise dos emergentes. A grande dúvida é se há uma bolha e se
ela pode estourar e trazer conseqüências negativas como as que se seguiram às crises russa e asiática. Por
enquanto, as previsões são de que 2006 seja muito similar a 2005, com pequena redução do apetite por
papéis de emergentes, mas nada que se compare a uma retração. Pelo contrário, os volumes de negócios e
de fluxo de capitais para os emergentes devem continuar em níveis próximos aos recordes históricos de
2005.” BILLI, Marcelo. País lidera novo boom de papéis emergentes. Folha Online, 05/03/2006.
Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u105687.shtml, com acesso em
06/09/2006.
que a fragilidade nos pagamentos internacionais e a
vulnerabilidade do caixa de um país sempre cobram um preço
altíssimo aos cidadãos residentes, convocados a pagar a conta no
final da crise.387
387
CASTRO, Paulo Rabello. O primeiro dever do Estado. Folha de São Paulo, 23/07/2003. Disponível
em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2307200308.htm, com acesso em 06/09/2006.
388
Em entrevista concedida à Folha de São Paulo, ao economista britânico John Gray foi feita a seguinte
pergunta: “A crise dos tigres asiáticos, que, porém, já parece superada, e a da Rússia vêm exigindo cada
vez mais uma ampla reforma e a institucionalização dos fluxos financeiros. Existe algum mecanismo de
controle em vista?” Respondeu: “Não tenho certeza se a crise asiática terminou. Tanto a China como o
Japão ainda enfrentam problemas não resolvidos de deflação. Até agora a crise teve o efeito positivo de
enfocar o pensamento na necessidade de reformar o sistema financeiro global. Mas não aconteceu nada
realmente significativo. Não há sistemas de prevenção de crises implantados atualmente. No futuro, assim
como no passado, o sistema financeiro internacional reagirá aos fatos adversos por meio do
gerenciamento das crises.” GALISI FILHO, José. Uma nova balança de poderes. Folha de São Paulo,
13/08/2000. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1308200005.htm, com acesso em
06/09/2006.
389
A “Crise Russa” estourou em dezembro de 1998, fazendo com real sofresse uma forte desvalorização
frente ao dólar, e que os juros - Taxa CELIC - chegassem a quase 40% ao ano, em 1999. CRUZ, Ney
Hayashi da. Despesa com juros aumenta no governo Lula. Folha de São Paulo, 01/08/2003. Disponível
em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi0108200302.htm, com acesso em 06/09/2006.
390
John Gray em entrevista: GALISI FILHO, José. Uma nova balança de poderes. Folha de São Paulo,
13/08/2000. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1308200005.htm, com acesso em
06/09/2006.
391
TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário: valores e
princípios constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 246.
392
BECK, Ulrich. Liberdade ou Capitalismo: Ulrich Beck conversa com Johannes Willms. São Paulo: Ed.
Unesp, 2003, p. 157.
Neste quadro pintado pela sociedade e por sua economia do final do século
XX, corretamente identificado pela sociologia de uma sociedade de risco da Segunda
Modernidade, ambivalente, o direito e a política, nos moldes criados no século XVIII e
XIX, não mais atendem aos anseios de segurança e bem ordenança, almejados pelos
construtores do Estado liberal de direito racional positivista elaborado por
representantes eleitos pelo povo. A legalidade não está mais de mãos dadas à
legitimidade, pressuposta no modelo oitocentista. A aplicação cognitivista do direito
posto abstrato a um caso concreto, subsuntivamente, também não atende aos anseios de
eficiência e agilidade impostos pelo mundo globalizado.
393
Atingido é “todo aquele cujos interesses serão afetados pelas prováveis conseqüências provocadas pela
regulamentação de uma prática geral através de normas.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia:
entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2003, p. 142.
394
José Eduardo Faria, semelhantemente a Boaventura de Sousa Santos, já citado, fala em “porosidade”
para permitir, no plano internacional, “a sobreposição, articulação, intersecção e interpenetração de vários
espaços jurídicos misturados.” FARIA, José Eduardo. O direito na economia globalizada. 1. ed. 4ª tir.
São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 155.
395
Um “Estado” (organização política) de exceção permanente fundamentado num “estado” de exceção
(situação excepcional) que se perpetua.
396
No Brasil, é pioneira a tese de José Ribas Vieira, defendida em 1982, que ensejou a obra O
autoritarismo e a nova ordem constitucional do Brasil - Rio de Janeiro: Renovar, 1988. A citada obra
analisa a incorporação constitucional de modalidades de estado de exceção.
397
SAFATLE, Vladimir. Conceitos de Agamben. Folha de São Paulo, 18/09/2005. Disponível em: http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1809200506.htm, com acesso em 04/09/2006.
passa a ser possível em caso uma cidade estar sitiada ou ameaçada militarmente.
Esclarece o referido autor que “a partir de então, vemos um progressivo
desenvolvimento de dispositivos jurídicos semelhantes na Alemanha, Suíça, Itália,
Reino Unido e EUA, que serão aplicados, durante os séculos 19 e 20, em situações
variadas de emergência política ou econômica.”398 Giorgio Agamben, reconhecendo o
estado de exceção como paradigma de governo, observa que a partir da década de 1960,
“conforme uma tendência em ato em todas as democracias ocidentais, a declaração do
estado de exceção é progressivamente substituída por uma generalização sem
precedentes do paradigma da segurança como técnica normal de governo.”399
398
SAFATLE, Vladimir. Conceitos de Agamben. Folha de São Paulo, 18/09/2005. Disponível em: http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1809200505.htm, com acesso em 04/09/2006.
399
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 28
400
Bendersky traça a seguinte biografia do autor: “Oportunismo sempre foi um fato maior na carreira
nacional-socialista de Schmitt, mas igualmente importante foi sua própria crença de que poderia, como o
Kronjurist nazista, estabelecer o quadro constitucional para o Terceiro Reich. Para ele o Nacional-
Socialismo era um movimento precoce que exigia maiores desenvolvimentos de seus fundamentos
teóricos legais e políticos. A sua tentativa de fornecer a fundamentação das linhas de um regime
autoritário tradicional estava predestinada, e ele conseguiu apenas ajudar a consolidar uma ditadura
totalitária .” BENDERSKY, Joseph. Carl Schmitt: theorist for the Reich. New Jersey: Princeton
University Press, 1983, p. 242 apud MACEDO JR., Ronaldo Porto. Carl Schmitt e a fundamentação do
direito. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 37.
401
“A tentativa mais rigorosa de construir uma teoria do estado de exceção é obra de Carl Schmitt,
principalmente no livro sobre a ditadura e naquele, publicado um ano mais tarde, sobre a teologia
política.” AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo
Editorial, 2003, p. 53.
402
“Segundo ele [Carl Schmitt] a norma não pode valer em uma situação de exceção, ou seja, em uma
situação fora da norma, na qual, por princípio, ela não se aplica.” FERREIRA, Bernardo. O risco do
político: crítica ao liberalismo e teoria política no pensamento de Carl Schmitt. Belo Horizonte: UFMG,
2004, p. 100. Traz o autor, a seguinte transcrição de Carl Schmitt, constante da obra Legalidade e
Legitimidade, de 1932: “Nenhuma norma [...] se interpreta ou se aplica, se protege ou se defende a si
mesma; nenhuma validade normativa se faz valer a si mesma; e também não existe – caso não queiramos
nos estender em metáforas e alegorias – nenhuma hierarquia de normas, apenas hierarquias de homens e
de instâncias concretas.” (Ibid, p. 99)
403
SCHMITT, Carl. Politische theologie: vier kapitel sur lehre von der souveränität, p. 13 apud
BERCOVICI, Gilberto. Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de
Janeiro: Azougue Editorial, 2004, p. 65. O título teologia política decorre da postura de Schmitt, que
defende que “todos os conceitos significativos da teoria do Estado são conceitos teológicos
secularizados”, e que o “estado de exceção tem, para o direito, o mesmo significado do milagre para a
teologia.” Ibid. p. 66. Para Schmitt, observa Bercovici, “a soberania do Estado não consiste no monopólio
da coerção ou da dominação, mas da decisão.” Ibid. p. 67.
uma ordem.”404 Leciona Giorgio Agamben que Carl Schmitt vislumbrava nesta fixação
de competência uma ancoragem de sua teoria na ordem jurídica.405
404
BERCOVICI, Gilberto. Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de
Janeiro: Azougue Editorial, 2004, p. 65.
405
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 56. Agamben discorda de Schmitt neste aspecto. Para o autor a exceção não se vincula ao direito,
mas exclusivamente à política: “São falsas todas aquelas doutrinas que tentam vincular diretamente o
estado de exceção ao direito, o que se dá com a teoria da necessidade como fonte jurídica originária, e
com a que vê no estado de exceção o exercício de um direito do Estado à própria defesa ou a restauração
de um originário estado pleromático do direito (os plenos poderes).” Ibid. pp. 78-79.
406
BERCOVICI, Gilberto. Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de
Janeiro: Azougue Editorial, 2004, pp. 65.
407
BERCOVICI, Gilberto. Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de
Janeiro: Azougue Editorial, 2004, pp. 65-66.
408
BERCOVICI, Gilberto. Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de
Janeiro: Azougue Editorial, 2004, p. 66.
409
BERCOVICI, Gilberto. Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de
Janeiro: Azougue Editorial, 2004, p. 66.
410
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 63.
411
BERCOVICI, Gilberto. Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de
Janeiro: Azougue Editorial, 2004, p. 67.
potência e ato estão separados de modo radical”. 412 Introduz uma zona de anomia para
torna possível a normatização efetiva que o fato requer.413
412
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 61.
413
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 58. Em semelhante linha de raciocínio, mas com postura crítica acerca de tal fato, Gilberto
Bercovici analisa este Estado de exceção, que na atualidade é permanente – pela necessidade e urgência
de sempre decidir acerca de algo, especialmente no campo econômico. BERCOVICI, Gilberto.
Constituição e Estado de exceção permanente – atualidade de Weimar. Rio de Janeiro: Azougue
Editorial, 2004.
414
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 105.
415
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 105. Em Nicolau Maquiavel há a defesa da previsão de uma ditadura provisória, para que o
Estado se defenda de fatos extraordinários, reconhecendo que “ordinariamente o ritmo do governo numa
república é muito lento” havendo “sempre a necessidade de realizar consultas”, o que pode gerar uma
“ação do governo perigosamente lenta quando surge um mal inesperado”. Reconhece que “embora as vias
extralegais sejam úteis o seu exemplo é sempre perigoso.” Para reduzir este risco, a legislação da
república deverá prever todos os acidentes (situações excepcionais), com seus remédios extraordinários.
Maquiavel, Nicolau. Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio. Tradução: Sérgio Bath. 4. ed.
Brasília: UNB, 2000, p. 114.
416
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 106.
417
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 107.
Observa Giorgio Agamben, em ponto que é essencial ao tema da tese em
apresentação, que no estudo do estado de exceção, encontrou “inúmeros exemplos de
confusão entre atos do poder executivo e atos do poder legislativo; tal confusão define
[...] uma das características essenciais do estado de exceção.”418 A confusão, identifica o
autor, nasce com a utilização do sintagma “força de lei”, que se refere tanto na doutrina
moderna quanto na antiga, “não à lei, mas àqueles decretos – que têm justamente, como
se diz, força de lei – que o poder executivo pode, em alguns casos – particularmente, no
caso de exceção – promulgar.”419 O conceito “força de lei” define uma separação entre a
forma e a aplicabilidade, “pela qual decretos, disposições e medidas, que não são
formalmente leis, adquirem, entretanto, sua força.”420
418
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 61. E prossegue o autor: “O caso limite dessa confusão é o regime nazista em que, como
Eichmann não cansava de repetir, ‘as palavras do Führer têm força de lei”. Ibid. pp. 60-61.
419
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 60. Nesta linha, há um encontro entre o positivismo de Kelsen e o estado de exceção identificado
por Agamben, muito embora suas teses sejam diametralmente opostas – direito puro versus
predominância política: “Algumas constituições dão a certas autoridades administrativas – chefe de
Estado ou ministros de gabinete, por exemplo – o poder de decretar normas gerais por meio das quais são
elaboradas as cláusulas de um estatuto”. Tais normas gerais, que não são emitidas pelo chamado órgão
legislativo, mas por outro órgão, com base nas normas gerais emitidas pelo legislador, são designadas
como regulamentos. Segundo algumas constituições, certos órgãos administrativos – especialmente o
chefe de Estado, ou os ministros do gabinete na condição de chefes de certos ramos da Administração –
são autorizados, sob circunstâncias extraordinárias, a emitir normas gerais para regulamentar matéria que
ordinariamente deve ser regulamentada pelos órgãos legislativos através de estatutos. A distinção entre
estatutos e regulamentos é, evidentemente, de importância jurídica apenas quando a criação de normas
gerais está, em princípio, reservada a um órgão legislativo. A distinção é especialmente significativa
quando existe um parlamento eleito popularmente e o poder legislativo está, em principio, separado dos
poderes judiciário e executivo. Deixando de lado o direito consuetudinário, as normas jurídicas gerais
devem, então, ter uma forma especial: elas devem ser o conteúdo de decisões parlamentares, essas
decisões às vezes precisam da aprovação do chefe de Estado e às vezes exigem publicação num diário
oficial a fim de obterem força jurídica. Tais exigências constituem a forma de uma lei. Já que qualquer
conteúdo que seja, e não apenas uma norma geral regulando a conduta humana, pode surgir sob essa
forma, tem-se então de distinguir leis num sentido material (normas jurídicas gerais na forma de uma lei),
de lei num sentido formal (qualquer coisa que tem a forma de uma lei). Pode acontecer que uma
declaração sem qualquer significação jurídica seja feita em forma de lei. Existe, então, um conteúdo
juridicamente neutro do processo criador de Direto.” KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do
Estado. Tradução: Luis Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2000, pp. 190-191. A força de lei sem
lei (da exceção) – que se transmuda em forma de lei, para o positivismo de Kelsen - transita por entre as
oposições de ambas as teorias, sem que estas ofereçam uma possibilidade real de controle. O tema será
retomado no Capítulo IV desta tese.
420
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. Tradução: Iraci D. Poleti. São Paulo: Boitempo Editorial,
2003, p. 60. Para Agamben, é “a própria relação entre política e direito que deve ser questionada.
Problema este que a tradição marxista sempre negligenciou por acreditar que o direito, em última
instância, era um instrumento neutro do qual poderíamos nos servir sem problemas. De fato, nossa
concepção de democracia ainda está muito dominada pelo paradigma do Estado de Direito, ou seja, pela
idéia de que podemos estabelecer um quadro constitucional e normativo a partir do qual uma sociedade
justa advém possível. Mas minhas pesquisas me mostraram que o problema fundamental não diz respeito
à Constituição ou à lei; diz respeito ao governo.” Agamben, em: SAFATLE, Vladimir. A política da
profanação: entrevista a Giorgio Agamben. Folha de São Paulo, 18/09/2005. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1809200505.htm, com acesso em 04/09/2006.
Giorgio Agamben compreende o desenvolvimento dos dispositivos de
exceção como manifestação de um processo de generalização dos dispositivos
governamentais de exceção. Tal teoria da generalização do estado de exceção, por um
lado, “procura fornecer o quadro de análise para a tendência contemporânea em criar
situações nas quais a distinção entre estado de guerra e estado de paz seja
impossível.”421 Esta indistinção acaba por transformar o estado de exceção em regra
universal.422 Por outro lado, “a partir desta teoria da centralidade de processos de
suspensão da norma que não equivalem necessariamente à abolição da norma”, Giorgio
Agamben, além de “fornecer uma visão das tendências que atuam na estrutura político-
jurídica contemporânea”, critica a noção de “razão vinculada à crença de que
racionalizar é assegurar a vida por meio da posição de critérios normativos de
justificação intersubjetivamente partilhados.”423
424
Agamben, em: SAFATLE, Vladimir. A política da profanação: entrevista a Giorgio Agamben. Folha
de São Paulo, 18/09/2005. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1809200505.htm,
com acesso em 04/09/2006.
425
Em entrevista, Agamben trata da necessidade de abrir espaço a uma "violência pura" capaz de expor e
de cortar o vínculo entre violência e direito. Nesta idéia de "violência pura", explica o autor, “que o que
está em questão é “a possibilidade de uma ação humana que se situe fora de toda relação com o direito,
ação que não ponha, que não execute ou que não transgrida simplesmente o direito. Trata-se do que os
franciscanos tinham em mente quando, em sua luta contra a hierarquia eclesiástica, reivindicavam a
possibilidade de um uso de coisas que nunca advém direito, que nunca advém propriedade. E talvez
‘política’ seja o nome desta dimensão que se abre a partir de tal perspectiva, o nome de livre uso do
mundo. Mas tal uso não é algo como uma condição natural originária que se trata de restaurar. Ela está
mais perto de algo de novo, algo que é resultado de um corpo-a-corpo com os dispositivos do poder que
procuram subjetivar, no direito, as ações humanas.” SAFATLE, Vladimir. A política da profanação:
entrevista a Giorgio Agamben. Folha de São Paulo, 18/09/2005. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs1809200505.htm, com acesso em 04/09/2006.
426
Habermas, em sua obra, refere-se expressamente à sociologia de Ulrich Beck, fundando sua crítica ao
liberalismo na crise da Modernidade. Há uma inegável aproximação entre a teoria do risco e da teoria
discursiva do direito, como uma resposta legítima à permanente necessidade de decidir. HABERMAS,
Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução: Flávio Beno
Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 176.
427
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 12.
discursiva do direito e da democracia deliberativa como uma resposta viável, de
convivência possível com o risco da Segunda Modernidade. O núcleo da teoria
discursiva do direito, sintetiza Robert Alexy,428 “es um sistema de reglas y princípios
del discurso cuya observância assegura la racionalidad de la argumentación y sus
resultados.”429 O modelo jurídico proposto, de regras/princípios/procedimento é o que
assegura o máximo de aplicação da razão prática,430 sendo preferível a todos os outros
modelos.431 A crise de paradigmas não impede a adoção de uma teoria promissora,
democrática e moralmente correta, que atenda, ao menos aproximativamente,432 ao ideal
da Pós-Modernidade – a convivência com a ambivalência e com a diferença.433
428
Doravante Robert Alexy será referido unicamente como Alexy.
429
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Jorge M. Seña. 2. ed. Barcelona:
Gedisa, 2004, p. 175.
430
Leciona Robert Alexy: “La razón práctica no es de aquellas cosas que pueden ser realizadas sólo
perfectamente o no en estado absoluto. Es realizable aproximativamente y su realización suficiente no
garantiza ninguna corrección definitiva sino tan solo relativa.” ALEXY, Robert. El concepto y validez
del derecho. Tradução: Jorge M. Seña. 2. ed. Barcelona: Gedisa, 2004, p. 177.
431
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Jorge M. Seña. 2. ed. Barcelona:
Gedisa, 2004, p. 174. Por esta razão se propõe a utilização da teoria discursiva do direito para a
conformação do direito regulatório.
432
A teoria do discurso é o sistema de regras e princípios encarregado de assegurar a racionalidade das
argumentações e de seus resultados. “Bajo condiciones reales pueden ser realizadas sólo
aproximativamente.” ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Jorge M. Seña. 2. ed.
Barcelona: Gedisa, 2004, p. 176.
433
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 176-180. Nesta nova fase, o
Estado tem que buscar se precaver de situações de perigo coletivo. Habermas denomina o modelo de
Estado talhado para estes fins de Estado securitário, ou prevencionista.
434
A teoria discursiva do direito será objeto de análise detalhada nos capítulos III e IV desta tese.
435
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 16.
436
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 16.
significa também viver com a diferença, e, mais que tolerar, respeitar a alteridade em
suas preferências.437
437
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 249.
438
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 245.
439
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 245.
440
Contingência, no sentido do texto, significa incerteza sobre se alguma coisa vai acontecer ou não; se
algum aspecto de algo pode ser ou não ser; qualidade do que é eventual ou incerto.
441
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 248.
442
A obra referida é: Contigency, irony and solidarity, p. 86.
443
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 248.
444
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 248.
Este ser gentil, muito mais do que uma finalidade, é o meio de se alcançar o
respeito. O “ser gentil” e a tolerância445 que ele representa, não devem ser tomados
simplesmente como uma forma de tornar a “coexistência suportável e um pouco menos
perigosa.”446 Para que haja a emancipação, oriundo do reconhecimento da contingência
como destino – nesta Segunda Modernidade – “não bastaria evitar a humilhação dos
outros. É preciso, também, respeitá-los – e respeitá-los precisamente na sua alteridade,
nas suas preferências, no seu direito de ter preferências.” 447 É preciso honrar a
estranheza do estranho.
445
Numa versão desdenhosa da tolerância: “Fica-lhe bem ser como é. Que o seja. Só que eu jamais seria
assim.” BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 1999, p. 249.
446
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 248.
447
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 249.
448
JABÉS, Edmond. Un étranger avec, suos le bras, un livre de petit format, p. 112-115 apud BAUMAN,
Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor,
1999, p. 249.
449
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 249. “Chamem isto como quiserem: camaradagem, identificação imaginativa,
empatia; só não podem dizer dessa opção que ela decorre de uma regra ou comando, seja uma injunção da
razão, uma norma empiricamente demonstrada pelo conhecimento que busca a verdade, uma ordem de
Deus ou um preceito legal.” Ibid. p. 249.
450
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 249.
451
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 249.
Este caminho, entretanto, que leva da tolerância à solidariedade,452 é um
caninho indeterminado, sendo ele mesmo contingente. “Viver em contingência”
esclarece Zygmunt Bauman, “significa viver sem uma garantia, apenas com uma certeza
provisória, pragmática, de Pirro, até ordem em contrário, e isso inclui o efeito
emancipatório da solidariedade.”453 Conclui o autor: “A consciência da condição pós-
moderna revela a tolerância como sina. Ela também torna possível – apenas possível – o
longo caminho que leva do fado ao destino, da tolerância à solidariedade.”454
452
Erhard Denninger sustenta que novos ideais expandem e modificam os conceitos tradicionais herdados
da Revolução Francesa, de modo que a fraternidade daria lugar à solidariedade, a igualdade à diversidade
e a liberdade à segurança, e que tal fato ensejaria o reconhecimento de um novo paradigma constitucional.
DENNINGER, Erhard: “Security, Diversity, Solidarity” instead of “Freedom, Equality, Fraternity”. In:
Constellations, Volume 7, n° 4, Oxford: Blackwell Publishers Ltd., 2000. Na mesma edição da revista
Constellations, Jürgen Habermas, em análise à tríade de postulados propostos por Denninger,
reconhecendo a extensão dada a tais postulados, sustenta que não haveria mudança de paradigma
constitucional, que as questões postas pelo autor seriam, em realidade, uma releitura dos mesmos
princípios, influenciada pela identificação da radicalização do processo de modernidade, sob influxo do
reconhecimento do risco: “For decades, Erhard Denninger has been one of the most productive and
astute analysts of the transformation from a liberal to a welfare-state based conception of the
constitution. In his earlier publications, he understood this change as a paradigm shift which, in reaction
to a new societal challenges (first that of classical industry society, and thereafter that of the
postindustrial risk society), realized an objective legal substance that was always implicit in the system of
rights. His current perspective, however, extends a radically different understanding of the constitution to
its principles and basic rights themselves. Denninger wants to ‘expand and modify’ the ideas of freedom,
equality, and fraternity with the postulates of security, diversity, and solidarity [...] The trends which
induce Denninger to introduce an additional triad of basic concepts all still seem to move within the
normative framework of freedom, equality, and fraternity.” HABERMAS, Jürgen. Remarks on Erhard
Denninger’s Triad. In: Constellations, Volume 7, n° 4, Oxford: Blackwell Publishers Ltd., 2000, p.
522/523.
453
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 250.
454
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Tradução: Marcus Penchel. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1999, p. 251.
455
O Republicanismo é uma filosofia política focada na liberdade, que possui seu eixo axiológico na
noção de não-dominação, associada à construção de um Estado livre, configurando, na lição de Quentin
Skinner, “uma comunidade na qual as ações do corpo político são determinadas pela vontade dos
membros como um todo.” Surge na Roma Clássica, sendo repassada aos modernos a liberdade em que os
antigos viviam, em razão de que “nenhuma lei podia ser imposta a eles sem que antes houvesse um
consentimento nas assembléias do povo.” SKINNER, Quentin. Liberdade antes do Liberalismo. Trad.
Raul Fiker. São Paulo: Editora UNESP, 1998, pp. 33-43. O estudo do Liberalismo e do Republicanismo
pode ser aprofundado em: DUARTE, Fernanda; VIEIRA, José Ribas; CAMARGO, Margarida Maria
Lacombe Camargo; e GOMES, Maria Paulina. Os direitos à honra e à imagem pelo Supremo Tribunal
Federal: laboratório de análise jurisprudencial. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, pp. 35-94. A obra
referida resulta de estudos desenvolvidos no Laboratório de Análise Jurisprudencial, do Grupo de
reguladora hierárquica do poder supremo do Estado e da instância reguladora
descentralizada do mercado” - poder administrativo e interesse próprio individual
(dinheiro)456 – “entram a solidariedade e a orientação do bem comum como uma
terceira fonte de integração social.”457 A esfera pública política e a sociedade civil
devem garantir força de integração e autonomia à prática de entendimento dos
cidadãos.458 O direito na sociedade de risco, assegura Habermas, deve assumir “a figura
de ‘programas de relação’, que levam o próprio sistema que está gerando os perigos a
re-orientações na regulação. Desta maneira, o direito funciona como catalisador de
transformações internas.”459 A solidariedade surge indiretamente do direito, que garante
“através da estabilização de expectativas de comportamento, relações simétricas de
reconhecimento recíproco entre titulares abstratos de direitos subjetivos.”460 As formas
de agir comunicativo que se tornam reflexivas – os discursos461 – desempenham um
papel constitutivo na produção e no emprego de normas de direito.
463
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 189.
economia realizada especificamente por atos jurídicos – atos normativos ou contratos –
no âmbito de uma legislação menos densa, mais porosa, com uma proeminente
atividade de edição de normas pelo Poder Executivo.
Partindo da existência de atos de fala que realizam uma ação social – atos
regulativos, em que falar é fazer -, a Teoria do Agir Comunicativo, proposta por
Habermas e adotada por Alexy, preocupa-se em identificar e propor modelos de fala
que produzam resultados mais justos, que promovam o bem comum de todos os
envolvidos no processo de fala, e que sejam pautados pelo critério da correção
normativa.464 Para tanto propõe Habermas uma modalidade de coordenação do processo
de comunicação - atos ilocucionários orientados ao acordo num agir comunicativo forte.
Nesta linha, as pretensões de validez dependem de seu reconhecimento por falante e
ouvinte, buscadas através de razões discursivamente demonstradas ou demonstráveis -
se necessidade houver - através de pretensões de verdade, de sinceridade e de correção
normativa.465
Nicola. Trad. Alfredo Bossi. Dicionário de filosofia. 4. ed. Martins Fontes: São Paulo, 2003, pp. 136-140.
Na tese em exposição, embora as ciências sociais referidas tenham sido utilizadas de forma didática,
numa divisão de campos de conhecimento, não se deve perder de vista que a sociologia do risco põe em
crise os paradigmas destas ciências, e da própria divisão delas, conforma já explicitado no capítulo II.
Nesta linha, esclarecem Marli Navarro e Telma Cardoso: “Esta dimensão vinculada à percepção de risco
carreou o tema para as ciências sociais e para o campo da psicologia social, creditando aos estudos a
importância da polissemia do termo risco, abrindo assim, as possibilidades de abordagens múltiplas e
complementares nas análises de percepção de risco e conseqüentes avaliações, considerando a
configuração de processos mentais identificados com os riscos, incluídos na realidade da construção da
chamada sociedade de risco, na qual vivemos hoje”. Navarro, Marli B. M. de A.; Cardoso, Telma A. de
O. (2005). Percepção de Risco e cognição: reflexão sobre a sociedade de risco. Ciências & Cognição;
Ano 02, Vol. 06, nov./2005. Disponível em www.cienciasecognicao.org, com acesso em 26/09/2006.
Boaventura de Sousa Santos, em reflexão sobre o conhecimento científico social, assevera: “A
hermenêutica da epistemologia é o modo mais adequado de propiciar a transição para uma epistemologia
pragmática. É uma hermenêutica crítica e sociológica porque privilegia, por contrapeso, a reflexão sobre
a verdade social da ciência moderna como meio de questionar um conceito de verdade científica
demasiado estreito, obcecado pela sua organização metódica e pela certeza, e pouco ou nada sensível à
desorganização e à incerteza por ele provocadas na sociedade e nos indivíduos. É com esse olhar que se
deve analisar a seguir a metodologia das ciências sociais.” SANTOS, Boaventura de Souza. Introdução a
uma ciência pós-moderna. 3. ed. Rio de Janeiro: Graal, p. 45, 2000. Acerca da denominação “ciência pós-
moderna”, esclarece o autor: “A época em que vivemos deve ser considerada uma época de transição
entre o paradigma da ciência moderna e um novo paradigma, de cuja emergência se vão acumulando os
sinais, e a que, à falta de melhor designação, chamo ciência pós-moderna.” Ibid, p. 11. Propõe o autor,
como modelo dominante de aplicação do conhecimento científico pós-moderno, a “aplicação edificante”,
em substituição à aplicação técnica do conhecimento. A aplicação edificante possui, dentre suas
características, a seguinte: “Para além de um limite crítico socialmente definível, uma maior participação
numa visão moral e política é melhor que um acréscimo no bem-estar material. O know-how técnico é
imprescindível, mas o sentido do seu uso lhe é conferido pelo know-how ético que, como tal, tem
prioridade na argumentação.” Ibid., p. 159. Vê-se, a um só tempo, uma contraposição à doutrina
utilitarista, com a promoção da participação da sociedade nas escolhas, bem ainda uma prevalência das
ciências sociais sobre as ciências naturais, aquelas como balizadoras das atividades destas.
468
A relevância das ciências sociais no estudo do direito foi demonstrada já no Capítulo II desta tese.
469
ATIENZA, Manuel. El derecho como argumentación. Cátedra Ernesto Garzón Valdés, 2003. Cidade
do México: Distribuciones Fontanamara, 2005, p. 120.
ética normativa em que atos de fala regulativos possam receber o assentimento racional
de todos os envolvidos no processo de comunicação.470
479
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 45.
480
Alexy refere-se à aceitação por Habermas de sua Teoria do Caso Especial em: ALEXY, Robert. Teoria
da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica. Tradução:
Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 308 – posfácio à obra. Habermas cita a
tese de Alexy - que propõe que o discurso jurídico é um caso especial do discurso prático geral – já em:
HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. 2. ed. Tradução: Guido A. de Almeida.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 110-115. Não há, entretanto, a aceitação desta tese por
Habermas: “A tese do caso especial, defendida numa ou noutra versão [Günther ou Alexy], é plausível
sob pontos de vistas heurísticos; porém ela sugere uma falsa subordinação do direito à moral, porque
ainda não está totalmente liberta de conotações do direito natural.” HABERMAS, Jürgen. Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 291. Nesta obra esclarece Habermas que o princípio do discurso,
consubstanciado em princípio democrático, regula “relações interacionais entre pessoas jurídicas que se
entendem como portadoras de direitos.” Desta forma, o discurso jurídico-político, institucionalizado
conforme o direito – que assegura ao mesmo tempo autonomia privada e pública – “é interpretado e
configurado no processo democrático da legislação e em processos da aplicação imparcial do direito.”
Evita-se que “os discursos especializados na fundamentação e aplicação de leis tenham que ser
introduzidos posteriormente, como casos especiais de discursos morais de fundamentação e de aplicação.
(Ibid., p. 291). Os discursos jurídicos são “referidos naturalmente ao direito gerado democraticamente e
institucionalizado juridicamente, na medida em que não se trata do trabalho de reflexão da dogmática
jurídica. Com isso se torna claro [...] que discursos jurídicos [...] não se referem somente a normas
jurídicas, por estarem inseridos no próprio sistema de direitos. Pois, do mesmo modo que os processos
democráticos no âmbito da legislação, assim também as ordens dos processos judiciais no âmbito da
aplicação do direito devem compensar a falibilidade e a certeza da decisão que resultam do fato de que os
pressupostos comunicativos pretensiosos de discursos racionais só podem ser preenchidos
aproximativamente.” (Ibid., p. 292) O tema será retomado no Capítulo IV. Alexy aponta numerosas
objeções acerca de sua tese do Caso Especial, citando, nominalmente, Habermas: “Assim, Jürgen
Habermas fez valer que o discurso jurídico não deveria ser entendido como caso especial do discurso
moral, porque no direito, ao lado de fundamentos morais, também éticos e pragmáticos desempenham um
papel legítimo.” Refutando a crítica, Alexy ratifica seu entendimento, sustentando que entre os três tipos
de fundamentos do discurso jurídico – morais, éticos e pragmáticos – existem não só uma relação de
complemento, mas também de penetração: “Se se pressupõe esse conceito do discurso prático geral, então
é exata a tese do caso especial.” ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso
Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 40.
481
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997.
482
Em Teoría de los derechos fundamentales Alexy dedica as últimas vinte e cinco páginas
especificamente ao tema da argumentação jurídica – discurso jusfundamental - remetendo o leitor à sua
Teoria da argumentação jurídica. Adota a Teoria Discursiva do Direito, expondo sua teoria dos direitos
fundamentais como uma teoria cognitivista, sustentada pela pretensão de correção normativa. Utiliza-se,
inclusive, das regras do discurso jurídico expostos em sua Teoria da Argumentação, a exemplo das regras
sobre a carga de argumentação, e da utilização dos precedentes. Sua Teoria dos Direitos Fundamentais é
uma teoria da argumentação dos direitos fundamentais. (ALEXY, Robert. Teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997,
pp. 529-554).
filósofos do direito,483 destacando-se El concepto y validez del derecho,484 com sua
primeira edição em 1992, em que apresenta uma teoria do direito que une, num modelo
de regras, princípios e procedimentos, as teses propostas em Teoria da argumentação
jurídica e em Teoría de los derechos fundamentales.
Além destes três livros referidos,485 outro estudo de relevo que servirá à
compreensão atual da Teoria do Discurso de Alexy é Epílogo a la teoría de los
derechos fundamentales,486 publicado originalmente em 2002 como uma resposta às
críticas dirigidas à sua teoria, especificamente à questão dos princípios como
mandamentos de otimização, e à racionalidade do método de aplicação proposto – a
proporcionalidade baseada na teoria dos princípios.
483
Um dos críticos de Alexy é Habermas, que aponta falhas na utilização da regra da proporcionalidade
para o alcance de resultados racionais, bem como a substituição de pressupostos comunicativos por um
método de aplicação do direito, proposto em Teoria da argumentação jurídica. As críticas às teorias de
ambos os autores – e destes, entre si - serão expostas no decorrer da apresentação de suas contribuições
para a Teoria Discursiva do Direito e da Democracia Deliberativa.
484
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro
de Estudios Constitucionales, 2004.
485
Quatro livros foram publicados por Robert Alexy, com autoria exclusiva. Além dos três mencionados
anteriormente (Teoria da argumentação jurídica; Teoría de los derechos fundamentales; El concepto y
validez del derecho), publicou ainda Los derechos fundamentales de la Constitución de Estonia, que não
será estudado por fugir ao tema desta tese. O conjunto da obra do autor, entretanto, é muito rico em razão
de sua constante atividade de produção literária, que já conta com outros sete livros em co-autoria, oitenta
e três artigos publicados, e cinco resenhas de livros. A bibliografia do autor consta em: ALEXY, Robert.
Teoría del discurso y derechos constitucionales. Cátedra Ernesto Garzón Valdés – 2004. Tradução:
Pablo Larrañaga; René González de la Vega. Cidade do México: Distribuciones Fontamara, 2005, pp.
109-125. No Brasil foi lançada uma compilação de artigos reunidos e traduzidos por Luís Afonso Heck
sob o sugestivo título de Constitucionalismo discursivo, contando uma esclarecedora apresentação
circunstancia de cada um dos artigos, escrita por Alexy. ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo.
Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.
486
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004. A obra foi publicada originalmente como um artigo
na Revista española de derecho constitucional, ano 22, n. 66, 2002, pp. 13-64.
487
ALEXY, Robert. Teoría del discurso y derechos constitucionales. Cátedra Ernesto Garzón Valdés –
2004. Tradução: Pablo Larrañaga; René González de la Vega. Cidade do México: Distribuciones
Fontamara, 2005.
488
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro
de Estudios Constitucionales, 2004.
racionalidade discursiva, identificando a democracia deliberativa como um esforço para
a instituição do Discurso como meio de tomada pública de decisões.489
No Brasil foi editada sua coletânea mais recente, composta por nove artigos
publicados originalmente entre 1999 e 2005, sob o título Constitucionalismo
discursivo,490 enfrentando questões acerca da pretensão de correção de sua Teoria
Discursiva do Direito e a institucionalização da razão prática em sede constitucional,
mais especificamente, em decisões no âmbito da jurisdição constitucional.491 O centro
da teoria da jurisdição constitucional, assevera o autor nesta obra, está na relação entre o
legislador e o juiz constitucional.492 Reformula alguns pontos acerca da ponderação,
com reflexo nas fórmulas que apresenta.493
489
Alexy, Robert. Ponderación, control de constitucionalidad y representación. In: ALEXY, Robert.
Teoría del discurso y derechos constitucionales. Cátedra Ernesto Garzón Valdés – 2004. Tradução: René
González de la Vega. Cidade do México: Distribuciones Fontamara, 2005, p. 100.
490
Por constitucionalismo discursivo entende-se a institucionalização da razão e da correção no controle
de constitucionalidade das leis. ALEXY, Robert. Teoría del discurso y derechos constitucionales.
Cátedra Ernesto Garzón Valdés – 2004. Tradução: Pablo Larrañaga; René González de la Vega. Cidade
do México: Distribuciones Fontamara, 2005, p. 103.
491
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007.
492
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007, pp. 09-17.
493
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007, p. 131-153.
494
Reconhece o autor a necessidade de institucionalização de um procedimento legislativo do Estado
democrático de direito “definido por un sistema de reglas que, comparado con las alternativa
fácticamente posibles garantiza una medida considerable de racionalidad práctica y, en este sentido, es
justificable dentro del marco del primer procedimiento” – o discurso prático geral. Embora identifique a
raiz para a construção de um modelo discursivo de democracia – a que Habermas denominará de
Democracia Deliberativa – não avança neste ponto. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997,
pp. 531.
495
A vertente jurídica de Alexy é substituída pela democrática, em Habermas. Se em Alexy, a moral e o
direito estão como temas centrais de sua construção, em Habermas estão presentes a moral e o princípio
democrático, como institucionalização da razão discursiva, pautada pelo Princípio do Discurso.
A primeira contribuição na construção de uma Teoria Discursiva do Direito
foi a Teoria do Caso Especial,496 apresentada em Teoria da argumentação jurídica.
Nessa obra, pautada pela identificação e proposição da estrutura lógica dos argumentos
e fundamentação de critérios para a racionalidade do discurso - postura analítico-
normativa -, Alexy desenvolve sua teoria do discurso jurídico.497
496
A tese do Caso Especial é a racionalidade jurídica interpretada pela teoria do discurso. ALEXY,
Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação
jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 308 – posfácio à
obra.
497
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 45.
498
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 47.
499
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 47.
Esta assertiva de Alexy, já na introdução à sua teoria, permite entrever o não acatamento da tese da única
decisão/solução correta, defendida por Dworkin e por Habermas em sua Ética do Discurso, com reflexos
em sua teoria do direito. Para Alexy, como adiante se demonstrará, tal qual o discurso, a aplicação
proporcional de princípios (otimizáveis) também não pretende chegar a uma única solução correta.
500
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 47.
afetados501 e pela questão que necessita de uma solução.502 Assim, as regras do discurso
prático geral devem ser fracas o suficiente para que pessoas com concepções normativas
diferentes possam entrar em acordo quanto a elas, e forte o bastante para que “uma
discussão pautada nelas possa ser qualificada como ‘racional’.”503 As regras, ressalta
Alexy, só podem ser cumpridas aproximativamente, servindo essencialmente a
“pretensão de correção, como critério da correção de enunciados normativos, como
instrumento de crítica de fundamentação não-racionais e também como precisão de um
ideal a que se aspira.”504 É esta vocação para a produção de normas ou de uma
mandamento singular justos que enseja o reconhecimento da serventia da Ética do
Discurso à teoria do direito: “A Teoria do Discurso é, portanto, uma das várias formas
possíveis para a análise desse conceito tão central para a Ciência do Direito.”505
Frise-se que Alexy não é partidário da existência de uma única decisão correta. Sustenta este
posicionamento em toda a sua obra, seja quando apresenta critérios para a aplicação e fundamentação de
regras - Teoria da argumentação jurídica – seja quando trata da aplicação e fundamentação de princípios
- Teoría de los derechos fundamentales.
507
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 208.
508
A incerteza é apontada, genericamente, como sua limitação. ALEXY, Robert. Teoria da argumentação
jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson
Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, pp. 275-276.
509
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, pp.
207-208. Como adiante se demonstrará, em Habermas, a proposta é que o discurso prático seja
institucionalizado e se transmude em discurso democrático deliberativo. Ambos os autores - Habermas e
Alexy - apontam, entretanto, a carência de vinculação do discurso prático do tipo geral.
510
Não se pode olvidar que a teoria do discurso está atrelada à teoria do agir comunicativo. Uma decisão
judicial é um ato de linguagem ilocucionário completo.
511
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 46.
512
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 217.
513
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 274.
discurso prático geral;514 a coincidência parcial com a pretensão de correção,515 a
coincidência estrutural das regras e formas de ambos os discursos,516 e a necessidade da
argumentação prática geral no âmbito da argumentação jurídica.517
514
Em Alexy: “A necessidade do discurso jurídico surge da debilidade das regras e formas do discurso
geral, que definem um procedimento de decisão que em numerosos casos não leva a nenhum resultado e
que, se leva a um resultado, não garante nenhuma segurança definitiva.” Há sempre a possibilidade de
não se alcançar nenhum acordo, e tal fato não pode gerar incertezas jurídicas, sendo necessária a
institucionalização de um “procedimento que limite o campo do possível discursivamente de maneira
mais racional possível.” ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso
racional como teoria da justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São
Paulo: Landy, 2005, p. 275.
515
A pretensão de correção, diferentemente do que ocorre no discurso prático geral, “não se refere à
necessidade absoluta de racionalidade dos enunciados normativos em questão, mas à sua
fundamentabilidade racional no âmbito do ordenamento jurídico vigente.” Observa Alexy que a
racionalidade da argumentação estará sempre relacionada à racionalidade da legislação. ALEXY, Robert.
Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica.
Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 276. Neste ponto, pode-se
compreender por que a legislação, especialmente a textura da lei – maior ou menor densidade normativa –
irá determinar a racionalidade da argumentação que relativamente a ela se produzirá. Este ponto é
essencial à tese que se apresenta.
516
As regras do discurso jurídico, como se demonstrará, são variantes das regras do discurso prático geral,
a começar pela regra da universalidade, que se transmuda na regra de tratamento formalmente igual.
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, pp.
276-277. Não se deve confundir esta noção de tratamento formalmente igual no processo com o núcleo
do princípio da igualdade apresentado na Teoria dos Direitos Fundamentais de Alexy. Nesta obra, o autor
relaciona o princípio da igualdade com a proibição de arbitrariedade no tratamento com igualdade ou
arbitrariedade: se existir razão justificada discursivamente que permita um tratamento desigual, este estará
autorizado. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 381-416.
517
“O fato de a argumentação jurídica depender da argumentação prática geral não significa que seja
idêntica ou que se possa reduzir a ela. A argumentação prática geral necessária do discurso jurídico
ocorre segundo formas especiais e segundo regras especiais e sob condições especiais. Estas formas e
regras especiais levam tanto a uma consolidação como a uma diferenciação da argumentação.” ALEXY,
Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação
jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 279.
518
Esta concepção em três níveis é proposta apenas em El concepto y validez del derecho, publicado em
1992 (ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 161-173). Até então, em Teoría de los derechos
fundamentales, o autor propunha um sistema de direitos em dois níveis apenas – regras e princípios
(ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 115-138). Nesta obra, o autor se refere às bases da
argumentação jusfundamental - pp. 533-554 - afirmando: “El discurso iusfundamental es un
procedimiento argumentativo en el que lo que se trata es de lograr resultados iusfundamentales
correctos sobre la base presentada.” (Ibid. p. 553) Em Teoria da argumentação jurídica o foco do autor
são as regras de direito, e não os princípios. Nesta obra, o autor chega a afirmar que: “O problema da
argumentação a partir de princípios não consiste tanto na justificação dos princípios, mas especialmente
no fato de a norma a ser fundamentada não se seguir em geral diretamente dos princípios. É necessária
uma concreção dos princípios com a ajuda de novos enunciados normativos.” Esta postura é abandonada
determinar algo, deixa a solução muito aberta, pois nem tudo que vale discursivamente,
pode ao mesmo tempo possuir validade juridicamente.519 Reconhecendo que a liberdade
dos argumentos é limitada externamente pelo ordenamento jurídico - formado por leis,
Ciência do Direito, precedentes jurisprudenciais, racionalidade do processo de
argumentação, argumentação empírica e por formas especiais de argumentos
jurídicos520- propõe “como se deve determinar a relação do controle de correção com o
controle de concordância”, levando em conta estas limitações do discurso jurídico.521 O
problema mais importante da tese do Caso Especial concerne ao conteúdo da pretensão
de correção, com a proposta da formação de afirmações jurídicas e de decisões judiciais
“corretas de acordo com a ordem jurídica vigente: isso ocorre se se podem fundamentar
racionalmente levando em conta a lei, o precedente e a dogmática.”522
já em Teoría de los derechos fundamentales, onde adota um método de aplicação dos princípios - a
proporcionalidade – numa linha argumentativa. O tema será retomado ainda neste capítulo.
519
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro
de Estudios Constitucionales, 2004, p. 156.
520
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 227.
521
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 47. O
fato de se considerar, nesta tese, que a atuação administrativa normativa possui natureza mista, não só de
aplicação como também de fundamentação de direito, faz com que se adotem as linhas gerais da
construção de Alexy, voltada para a aplicação, como um elemento a ser considerado no procedimento
democrático-deliberativo de elaboração de normas. A proporcionalidade, como adiante se demonstrará,
pode ser apontada como o mais importante elemento diretor na produção das normas por Agências
Reguladoras, desde que submetido às regras de um discurso efetivo.
522
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, pp.
310-311 – posfácio à obra. A tese de Alexy foi muito combatida, especialmente por considerarem -
especialmente Tugendhat, U. Neumann e C. Braun, referidos pelo autor – que o discurso jurídico não
seria um minus em relação ao discurso prático geral, mas sim um aliud, uma coisa distinta. (Ibid. p. 311)
A teoria do caso especial de Alexy, dirigida especialmente à escolha do método pelos tribunais, oferece
uma teoria argumentativa para lidar com a questão da “incompletude da lei”. Dentre as críticas
apresentadas à teoria, muitas esclarecidas por Alexy em posfácio à Teoria da argumentação jurídica,
têm-se as considerações de Arthur Kaufmann. Reconhecendo a excelência das regras prescritivas de
argumentação e de preferência, esclarece que “a objeção está apenas em estas regras valerem na verdade
para o discurso racional, mas não para o processo jurisdicional.” Para Kaufmann, não há razão para se
conceber o discurso jurídico como um “caso particular” do discurso racional. E explica: “O processo
jurisdicional é preponderantemente um agir estratégico, não comunicativo, visa, em considerável medida,
utilidades, não apenas o conhecimento verdadeiro, pois não está isento de dominação, os participantes
estão vinculados à lei, mesmo a uma lei deficiente, o processo não pode ser continuado até ao infinito ou
mesmo apenas até à exaustão dos argumentos (quando existirá acordo sobre uma tal exaustão?) e termina
mesmo sem consenso, não tem de servir apenas a verdade e justiça, mas também, e antes de mais a paz
jurídica, pelo que a sentenças judiciais, mesmo as injustas, transitam em julgado, o que é totalmente
impossível num discurso racional. Que todos os participantes num processo jurisdicional realmente
‘pretendam argumentar racionalmente’, o que Alexy aponta como essencial na sua teoria do caso
particular, parece-me, à luz da minha experiência judicial, mais do que duvidoso (o arguido pode até
mentir impunemente, alguns processualistas aceitam mesmo que ele tenha um direito à mentira); mas
mesmo assim, isto por si só não tornaria ainda o processo jurisdicional num discurso racional, a não ser
que a palavra ‘racional’ não se reduza a uma categoria totalmente formal, e seja antes compreendida
sobretudo como racionalidade material.” KAUFMANN, Arthur. Filosofia do direito. Tradução: António
Ulisses Cortês. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2004, pp. 134-135. Diferentemente do que afirma
Esclarece Alexy que a teoria do discurso - este ponto é central à tese que
apresenta - deve ser situada no contexto de uma teoria completa do Estado e do
Direito,523 numa trajetória composta por quatro passos: o reconhecimento do caráter
aberto do resultado em qualquer caso de discurso prático real; o que justifica o segundo
passo: a institucionalização de um procedimento para a produção de normas jurídicas –
um “processo de legislação do Estado Democrático de Direito” com “procedimentos de
produção do Direito que realizem na maior medida possível o ideal da racionalidade
discursiva”;524 a necessidade do discurso jurídico (tese do Caso Especial) como forma
de buscar resultados corretos na aplicação do direito, em razão da impossibilidade de a
legislação “determinar, para cada caso, de antemão, precisamente uma solução”; 525 e,
Kaufmann, o agir estratégico das partes no processo é limitado por normas deônticas que reprimem a
litigância de má-fé - no direito processual brasileiro, previstas no Código de Processo Civil (CPC), art.
14-18. Estabelecem deveres de expor o fato conforme a verdade (empírica), de agir com lealdade
processual e boa-fé, de não formular pretensões ou defesas cientes da ausência de fundamentação, de não
produzir provas ou atos processuais desnecessários à obtenção do provimento judicial, de usar o processo
para a consecução de objetivos ilegais e de promover incidentes processuais manifestamente infundados.
Proíbem, ainda, a utilização de expressões injuriosas no processo, determinando, em caso de
desobediência, que sejam riscadas. Embora pouco utilizadas no cotidiano forense, estabelece o CPC a
aplicação de sanções ao litigante de má-fé, consistindo no dever de indenizar à parte contrária os
prejuízos que sofreu, mais os honorários advocatícios e demais despesas que efetuou. Há, como bem se
pode perceber, uma preocupação do processo com a correção normativa. Este não é, como quer
Kaufmann, uma operação agonística, de agir estratégico sem qualquer dever de verdade ou lealdade. O
fato de as partes - e seus procuradores – não se pautarem pela correção normativa pode ensejar punições.
Alexy, no posfácio de sua obra Teoria da argumentação jurídica, responde aos questionamentos dos
críticos, pondo a correção normativa não como um dever processual, mas antes, como uma condição para
a obtenção de uma sentença que lhe seja favorável; a correção, ademais, é restrita, referindo-se à
compatibilidade com a ordem jurídica vigente. Outro ponto que é essencial à sua compreensão, é que a
teoria não é dirigida especificamente às partes no processo, e sim ao juiz. Ainda que as partes ajam
estrategicamente, e que apenas dêem a aparência de buscarem algo normativamente correto – justo – o
juiz deverá pautar-se não pelo agir das partes, mas por critérios de correção – o juiz dirige o processo e
deve reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça – art. 125 do CPC. É pontual Alexy ao
afirmar: “As regras e formas do discurso jurídico constituem, por isso um critério de correção para as
decisões jurídicas.” ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional
como teoria da justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy,
2005, p. 280. Como adiante se demonstrará, há um paralelo entre a atuação das partes no processo
judicial, e os afetados num processo de consulta popular ou de audiência pública numa agência
reguladora; bem como entre o papel do juiz – com sua imparcialidade e dever de correção fundamentado
– e o colegiado que delibera (Diretoria) em agências reguladoras.
523
No Brasil existem obras que tratam especificamente do emprego da racionalidade discursiva à
atividade legislativa e à atividade judicial. A atividade administrativa do Estado, que na atualidade exerce
funções normativas, não foi, até o momento, contemplada com a preocupação dos estudiosos da teoria do
discurso.
524
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 311 –
posfácio à obra. Esta é a linha de investigação de Habermas: uma proposta de racionalidade discursiva
para a produção de normas de direito. Denomina-se esta forma argumentativa de produção de normas de
Democracia Deliberativa.
525
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 311 –
posfácio à obra. Esclarece o autor que discurso jurídico não é uma variante do discurso prático destinado
a preencher lacunas jurídicas, mas sim “um elemento necessário da racionalidade discursiva
realizada.” (Ibid. p. 312)
como quarto passo, a necessidade de institucionalização da forma mais racional possível
do processo judicial.526
526
Neste tópico específico, esclarece Alexy que num processo judicial, a pretensão de correção não é
apenas “uma condição de êxito, mas também uma condição do jogo.” As partes, num processo, não
pedem meramente algo que lhe seja mais vantajoso, mas sim algo que seja justo, correto. E será com o
argumento da correção que esta conseguirá uma decisão favorável. Se o juiz julgar favoravelmente a
alguma parte sem levar em consideração os argumentos de correção e justiça – “outorgo uma vantagem
ao Sr. N porque é para ele que mais favoravelmente me tendi” – “não se trata mais de um debate judicial,
ainda que tudo se desenvolva dentro do âmbito institucional de um sistema judicial.” A argumentação
diante do juiz não só pode, mas “deve ser interpretada no sentido da teoria do discurso.” ALEXY, Robert.
Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica.
Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 314 – posfácio à obra.
527
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 312 –
posfácio à obra.
528
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 280.
529
A justificação interna de uma decisão jurídica, embora não seja objeto de análise nesta tese, merece
algumas considerações, especialmente em sua relação com a justificação externa. As regras e formas de
argumentação da justificação interna referem-se à estrutura formal da argumentação, que “deve seguir-se
logicamente ao menos de uma norma universal, junto a outras proposições.” As premissas utilizadas em
tal procedimento, entretanto, não podem, em regra, ser deduzidas diretamente de nenhuma lei. A
exigência de dedução lógica conduz, desta forma, à necessidade da parte criativa para a aplicação do
direito: “As premissas não extraídas diretamente do direito positivo aparecem explicitamente em toda a
sua extensão. Esse é talvez o aspecto mais importante da exigência de justificação interna. Fundamentar
essas premissas não extraídas diretamente do direito positivo é tarefa da justificação externa.” Outra
questão a ser compreendida é a relação entre fato e norma: esclarece Alexy que “para fundamentar as
regras necessárias para cada nível particular de desenvolvimento [da justificação interna], é preciso entrar
com profundidade tanto nas especificidades dos fatos como nas particularidades da norma. Isso ocorre na
justificação externa, na qual são possíveis todos os argumentos admissíveis no discurso jurídico.”
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, pp.
218-226.
530
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 218.
O autor distingue três grupos de premissas que apresentam variadas inter-
relações na fundamentação de discursos jurídicos:531 regras de direito positivo,
enunciados empíricos, e premissas que não são enunciados empíricos nem regras de
direito positivo.532 As premissas do primeiro grupo se fundamentam em se
demonstrando “sua conformidade com os critérios de validade do ordenamento
jurídico.”533 O autor não defende, entretanto, a adoção da literalidade da lei com a noção
carreada no brocardo medieval In claris cessat interpretatio. Na atualidade, a dogmática
é uníssona quanto à não aplicabilidade da máxima. O que o autor entende por “regras de
direito positivo” é a discussão que envolve a validade da lei, sua vigência, eficácia; ou
ainda a ilegalidade de uma norma baixada pela Administração, por exemplo. Tanto é
assim que a interpretação da lei, como se verá, é uma das formas de justificação externa
que integra a argumentação jurídica, abarcada por sua teoria.
Reconhecendo que a lei escrita nem sempre cumpre sua função de resolver
um problema de forma justa, propõe Alexy que a decisão judicial preencha este espaço
– de forma criativa, inclusive -, segundo critérios de razão prática e concepções gerais
de justiça, consolidadas na coletividade: “O juiz deve atuar sem arbitrariedade; sua
decisão deve ser fundamentada em uma argumentação racional.”545
543
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, pp. 52-53.
544
VIEHWEG, Theodor. Tópica e jurisprudência. Trad. Tércio Sampaio Ferraz Júnior. Brasília:
Departamento de Imprensa Nacional, 1979, p. 107.
545
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 53.
Acerca de sua pretensão de construção de uma metodologia jurídica: “Não é só Viehweg quem considera
necessária a elaboração de uma teoria retórica da argumentação contemporânea amplamente
desenvolvida. Hassemer fala que uma teoria da argumentação jurídica pertence às finalidades mais
urgentes da ciência do direito. Rottleuthner considera que a Ciência do Direito como disciplina
normativa [tem que ser entendida] como teoria da argumentação. Rödig assevera que o juiz não [pode]
decidir ... somente com base na capacidade de extrair logicamente conclusões válidas. Ele deve poder
argumentar racionalmente também quando não há os pressupostos da demonstração lógica. É claro que
tais situações existem, porém, não é claro o método de argumentar ‘racionalmente’ nelas.” (Ibid. p. 53)
546
Para Alexy, apenas quando houver permissão legal poderá o juiz julgar contra o teor da lei.
547
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 312 –
posfácio à obra.
composta por um “direito válido [que] seja racional e justo.”548 As decisões jurídicas,
esclarece Alexy, “pretendem ser corretas enquanto decisões jurídicas.”549 Nesta
hipótese, “o lugar do discurso jurídico na aplicação desta lei [injusta] se restringe tanto
até ser nulo.”550 Não se anula, entretanto, a sua importância: “A racionalidade discursiva
não pode determinar o conteúdo da decisão, mas aponta o motivo de sua incorreção e a
medida de sua crítica.”551 A tese do Caso Especial consiste, quanto à questão da
pretensão da correção, “na incrustação da argumentação jurídica no contexto de uma
racionalidade discursiva que compreende a totalidade do sistema jurídico.”552
548
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 312 –
posfácio à obra.
549
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 313 –
posfácio à obra.
550
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 313 –
posfácio à obra.
551
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 313 –
posfácio à obra. Este ponto parece ter sido reformulado pelo autor em El concepto e validez del derecho
ao adotar o argumento da injustiça (p. 34) em sua concepção de direito: “El derecho es un sistema de
normas que (1) formula una pretensión de corrección, (2) consiste en la totalidad de las normas que
pertenecen a una Constitución en general eficaz y no son extremadamente injustas, como así también en
la totalidad de las normas promulgadas de acuerdo con esta Constitución y que poseen un mínimo de
eficacia social o de probabilidad de eficacia y no son extremadamente injustas y al que (3) pertenecen
los principios y otros argumentos normativos en los que se apoya el procedimiento de de la aplicación
del derecho y/o tiene que apoyarse a fin de satisfacer la pretensión de corrección.” ALEXY, Robert. El
concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 2004, p. 123.
552
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 313 –
posfácio à obra.
553
É este, mutatis mutandi, o objetivo da tese que se apresenta: buscar critérios para fundamentar a
decisão administrativa regulatória exposta em atos normativos, com a promoção da participação popular
para lhe conferir legitimidade, e relacioná-la à questão do controle - popular e judicial - desta decisão,
buscando fornecer meios para tanto.
definição de que: “Uma norma N é correta rigorosamente então, quando N pode ser o
resultado de um procedimento P.”554 Este procedimento do discurso é eminentemente
argumentativo, e não fruto de negociação, sendo definido por regras do discurso que
expressam as condições ideais em que a argumentação deve se dar.555
554
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007, p. 25.
555
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007, p. 26.
556
As formas lógicas são postas por Alexy como um reforço de sua defesa da racionalidade na
argumentação jurídica. Neste sentido: “Ao transcrevê-los na linguagem lógica, o que implicitamente quer
afirmar é que os argumentos jurídicos possuem o condão de racionalidade, tanto que podem ser
transcritos na forma lógica.” GERENBERG, Alice Leal Wolf. “O procedimento discursivo-
argumentativo no interior do espaço público: aproximação do modelo alexiano à democracia deliberativa
habermasiana.” In: MAIA, Antônio Cavalcanti, et alli (Org). Perspectivas atuais da filosofia do direito.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 71.
557
Esclarece Alexy, em sua Teoría de los principios fundamentales que: “La ley, el precedente y la
dogmática constituyen una línea de fuerza dotada de autoridad claramente decreciente.” ALEXY,
Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de
Estudios Constitucionales, 1997, p. 541. Esta ordenação vigora especificamente em sistemas jurídicos que
adotaram o modelo da civil law – como a Alemanha e o Brasil. Leciona René David: “Os países do
continente europeu vão-se orientar para uma nova fórmula de codificação, muito diferente da fórmula das
compilações anteriores. A nova fórmula de codificação conduz-nos ao período moderno da história dos
direitos da família romano-germânica: aquela em que a descoberta e o desenvolvimento do direito vão ser
entregues, principalmente, ao legislador.” DAVID, René, trad. Hermínio A. Carvalho. Os grandes
sistemas do direito contemporâneo. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 64.
558
Embora o autor se refira às seis espécies de regras e formas de argumentos jurídicos, não apresenta
argumentos jurídicos específicos para a racionalidade do processo de argumentação pratica geral e para a
argumentação empírica. Vale-se das regras gerais de argumentação do discurso prático geral.
Relativamente à argumentação empírica, é importante a regra de transição que permite a qualquer falante,
a qualquer tempo, a passagem a um discurso empírico. (Regra 6.1 de Alexy)
1. Deve ser saturada toda forma de argumento que houver entre os Cânones
da interpretação. (Regra J.6 - enumeração de Alexy)
fundamentados, possuindo os argumentos práticos gerais um papel especial. ALEXY, Robert. Teoria da
argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica. Tradução:
Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 268.
560
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 281.
criterio que asume la forma de una regla maestra.”561 Em Alexy, tanto as regras quanto
os princípios pautam-se pela noção de direito como argumentação.
561
DWORKIN, Ronald. Los derechos en serio. Tradução: Marta Guastavino. 1. ed., 2. imp. Barcelona:
Editorial Ariel, 1995, p. 99. Dworkin apresenta nesta obra a figura do Juiz Hércules, um juiz dotado de
habilidade, erudição, paciência e perspicácia sobre-humanas, que aceita que as leis tenham o poder geral
de criar e de extinguir direitos, e que os juízes têm o dever geral de se ajustarem a elas, bem ainda de se
ajustarem aos precedentes jurisprudenciais dos tribunais superiores - Hércules é um hipotético juiz norte-
americano (Ibid., 177). Na solução dos hard cases – casos difíceis – Hércules deverá construir um
esquema de princípios abstratos e concretos que ofereça uma justificação coerente para todos os
precedentes, os princípios, as leis a Constituição. Em razão da magnitude desta tarefa, Dworkin denomina
seu juiz de Hércules – o maior de todos os heróis da mitologia grega, realizador de tarefas cansativas ou
impossíveis. Como não existem Hércules no mundo real, devem-se buscar técnicas de julgamento
(métodos jurídico) que reduzam o número de erros judiciais, baseados na capacidade relativa que
possuem os homens e as mulheres que participam do processo de decisão. Dworkin propõe sua
metodologia de aplicação do direito, na obra referida, utilizando-se do conceito de direitos institucionais
(ou institucionalmente postos), como constituições, leis, e precedentes que veiculam normas e princípios
(Ibid., pp. 171-208). O argumento da falibilidade judicial não impede a construção e a aceitação de uma
metodologia jurídica que pretenda alcançar a correção normativa de uma decisão, tampouco abre espaço
ao ceticismo ético e jurídico, mas, certamente, serve “como oportuno recordatorio, para cualquier juez,
de que bien puede equivocarse en sus juicios políticos y de que, por ende, ha de decidir con humildad los
caos difíciles.” (Ibid., p. 208). Dworkin constrói sua teoria jurídica com lastro no conceito de integridade:
“O direito como integridade, portanto, começa no presente e só se volta para o passado na medida em que
seu enfoque contemporâneo assim o determine. Não pretende recuperar, mesmo para o direito atual, os
ideais ou objetivos práticos dos políticos que primeiro o criaram. Pretende, sim, justificar o que eles
fizeram (às vezes incluindo, como veremos, o que disseram) em uma história geral digna de ser contada
aqui, uma história que traz consigo uma afirmação complexa: a de que a prática atual pode ser organizada
e justificada por princípios suficientemente atraentes para oferecer um futuro honrado. O direito como
integridade deplora o mecanismo do antigo ponto de vista de que ‘lei é lei’, bem como o cinismo do novo
‘realismo’. Considera esses dois pontos de vista como enraizados na mesma falsa dicotomia entre
encontrar e inventar a lei. Quando um juiz declara que um determinado princípio está imbuído no direito,
sua opinião não reflete uma afirmação ingênua sobre os motivos dos estadistas do passado, uma
afirmação que um bom cínico poderia refutar facilmente, mas sim uma proposta interpretativa: o
princípio se ajusta a alguma parte complexa da prática jurídica e a justifica; oferece uma maneira atraente
de ver, na estrutura dessa prática, a coerência do princípio que a integridade requer. O otimismo do direito
é, nesse sentido, conceitual; as declarações do direito são permanentemente construtivas, em virtude de
sua própria natureza.” DWORKIN, Ronald. O império do direito. Tradução: Jefferson Luiz Camargo. São
Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 274. Para Habermas: “O modelo de Dworkin tem precisamente este
sentido: trata-se de um direito positivo, composto de regras e princípios, que assegura, através de uma
jurisprudência discursiva, a integridade de condições de reconhecimento que garantem a cada parceiro do
direito igual respeito e consideração.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e
validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p.
260. Observa Habermas, entretanto, que por Dworkin adotar um núcleo procedimental no princípio da
integridade - “igual direito às liberdades subjetivas de ação fundadas no direito às mesmas liberdades
comunicativas” - sua teoria se sustentaria se abandonasse o princípio monológico carregado na figura do
virtuoso Juiz Hércules - “ideal da personalidade de um juiz, que se distingue pela virtude e pelo acesso
privilegiado à verdade” - e ancorasse, em moldes semelhantes a Häberle, “as exigências ideais à teoria do
direito no ideal político de uma sociedade aberta dos intérpretes da Constituição. HABERMAS, Jürgen.
Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler.
normativa e com especificação de finalidades, que regem e delimitam o poder de
emissão de normas das agências reguladoras.564
Embora Alexy tenha mudado o campo de sua análise – das regras da teoria
geral do direito para as regras e princípios de direitos fundamentais constitucionais –, a
preocupação central do autor continua sendo a mesma: propor um procedimento
metódico de aplicação e de fundamentação de normas de direito em decisões
judiciais.574
norma nueva.” (Ibid., pp. 78-80) Alexy parte destas considerações de Dworkin, e esclarece que princípios
e regras são espécies de normas jurídicas, apontando a característica central dos princípios –
mandamentos de otimização -, propondo como método de aplicação destes a regra da proporcionalidade,
com suas sub-regras, numa vertente argumentativa.
578
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 86. De forma mais completa, é assim que Alexy diferencia
regras e princípios em sua obra Teoría de los derechos fundamentales: “El punto decisivo para la
distinción entre reglas y principios es que los principios son normas que ordenan que algo sea realizado
en la mayor medida posible, dentro de las posibilidades jurídicas y reales existente. Por lo tanto, los
principios son mandatos de optimización, que están caracterizados por el hecho de que pueden ser
cumplidos en diferente grado y que la medida debida de su cumplimiento no sólo depende de las
posibilidades reales sino también de las jurídicas. El ámbito de las posibilidades jurídicas es
determinado por los principios y reglas opuestos. En cambio, las reglas son normas que sólo pueden ser
cumplidas o no. Si una regla es válida, entonces de hacerse exactamente lo que ella exige, ni más ni
menos. Por lo tanto, las reglas contienen determinaciones en el ámbito de lo fáctica y jurídicamente
posible. Esto significa que la diferencia entre reglas e principios es cualitativa y no de grado. Toda
norma es o bien una regla o un principio.” ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales.
Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 86-87.
579
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro
de Estudios Constitucionales, 2004, p. 185.
580
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 88.
581
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 88. São os seguintes critérios, com suas regras: hierárquico
- lex superior derogat lex inferiori; cronológico - lex posterior derogat legi priori; especialidade – lex
specialis derogat legi generali. Na literatura nacional estes critérios são difundidos em diversos manuais
e cursos de Direito Civil ou de Introdução ao Direito – p. ex. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil
brasileiro: 1º Vol. - Teoria geral do direito civil. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2002., pp. 87-88. Estão
previstos, ademais, na Lei de Introdução ao Código Civil – Dec.-Lei 4.657/42 -, arts. 1º-3º. São
interessantes as colocações de Ana Paula de Barcellos acerca do tema conflito de regras. Embora
reconheça que as regras de direito não estejam logicamente sujeitas à regra de ponderação, com isso
protegendo princípios como a segurança jurídica e a previsibilidade, reconhece a autora, que na prática
jurídica – de forma semelhante ao que ocorre na física, onde esquemas intelectuais não conseguem
abarcar com exatidão a realidade – exceções e situações excepcionais a autorizam. Mais especificamente,
as ponderações não são entre os enunciados normativos das regras, “mas sim entre o conjunto de razões e
valores que se acomodam atrás desses enunciados.” BARCELLOS, Ana Paula. Ponderação,
aponta a regra da proporcionalidade, mais especificamente, a sub-regra da ponderação 582
(proporcionalidade em sentido estrito) como meio mais adequado à sua solução.
Apresenta, para tanto, um método de aplicação da proporcionalidade, sistematizando,
inclusive, como adiante se verá, uma regra de colisão e duas regras de ponderação.583
racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 218. Nos exemplos citados
pela autora não há, entretanto, a utilização da regra da proporcionalidade, mas uma ponderação em seu
sentido usual, léxico, de comparação entre benefícios e malefícios com a decisão. A autora apresenta três
modelos de decisão que podem superar uma “situação de grave injustiça no caso concreto”, quando se
teria uma aplicação de regra válida, mas sua incidência provocaria grave injustiça: “(i) em qualquer caso,
a regra deverá ser interpretada de acordo com a eqüidade; que (ii) a regra poderá deixar de ser aplicada na
hipótese de ser possível caracterizar a imprevisão legislativa; e que (iii) uma determinada norma,
produzida pela incidência da regra, poderá ser declarada inconstitucional, ainda que o enunciado da regra
permaneça válido em tese. Fora dessas hipóteses, isto é, caso (afora o uso da eqüidade) não seja razoável
demonstrar a imprevisão legislativa e não se possa sustentar de maneira consistente a
inconstitucionalidade da norma particular, não será legítimo pretender afastar um regra a pretexto de
ponderá-la.” (Ibid., pp. 211-212) A autora explica cada uma das três hipóteses às pp. 220-234, para onde
se remete o leitor. Adota-se, na tese que ora se apresenta, a postura que em caso de conflito de regras,
estas não são ponderáveis. Cabe, entretanto, o seguinte esclarecimento. Nada obsta – como
expressamente reconhece Alexy – que haja ponderação na interpretação das regras, especialmente em se
tratando de conceitos jurídicos indeterminados, diretrizes, objetivos e demais normas de baixa densidade
normativa. Por vezes, a ponderação estará presente na interpretação; outras vezes, por não serem regras
em seu sentido tradicional, equiparados por sua generalidade a princípios, a ponderação surgirá em sua
aplicação. O que é essencial à Teoria da Argumentação (Teoria Discursiva do Direito), e central a esta
tese, é que a ponderação (proporcionalidade em sentido estrito) deverá se pautar por critérios de
racionalidade, seja quando ocorre na margem de ação epistêmica normativa (preponderantemente
interpretação), seja quando ocorre na margem de ação estrutural (preponderantemente aplicação no
espaço de discricionariedade). De todo modo, tanto as regras quanto os princípios, antes de serem
aplicadas, deverão ser corretamente interpretados. Na prática, nem sempre é fácil separar o momento
exato da interpretação e da aplicação, já que o fato jurídico repercute na interpretação da norma, num ir e
vir só terminado com a prolação da decisão. O tema será retomado.
582
Ponderar, no vernáculo: “pon.de.rar vtd (lat ponderare) 1 Pesar no espírito; apreciar maduramente,
examinar com atenção: Antes de tomar uma decisão ponderava bem os prós e os contras. vti e vint 2
Meditar, pensar, refletir: Ponderar nas palavras. Ponderar sobre um tema. "A razão jubilada em discernir
e ponderar" (Latino Coelho, ap Laud. Freire). vtd 3 Alegar, expor, apresentando razões de peso:
Argumentou, ponderando os riscos e desvantagens do negócio. Ponderou à menina os inconvenientes do
namoro prematuro. vtd 4 Ter em atenção; considerar: Queira ponderar a nossa reclamação. Disponível
em http://www2.uol.com.br/michaelis/, com acesso em 25/02/2007.
583
A “Lei de Colisão” em: ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto
Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 94; e as “Leis de ponderação” em:
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 161; e ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 93.
584
Um claro exemplo desta filiação de sua teoria dos princípios à ética do discurso pode ser encontrado
nas normas adscritas de direito fundamental. Estas normas, não escritas mas aditada às que estão escritas,
dependem para seu reconhecimento, de uma “fundamentación iusfundamental correcta. Se para la norma
que se acaba de presentar es posible una fundamentación iusfundamental correcta – algo que aquí se
presupondrá – entonces es una norma de derecho fundamental.” ALEXY, Robert. Teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997,
pp. 97-98. O autor aprofunda o tema às pp. 66-73.
As regras e os princípios são postos como razões para os juízos – emissão
de normas em casos concretos.585 Alexy não abandona, em sua Teoría de los derechos
fundamentales, a tese do Caso Especial delineada em sua Teoria da Argumentação
jurídica: a pretensão de correção, diferentemente do que ocorre no discurso prático
geral, não se refere à necessidade absoluta de racionalidade dos enunciados normativos
em questão, mas à sua fundamentabilidade racional no âmbito do ordenamento jurídico
vigente – com prioridade para as regras e princípios do ordenamento jurídico.
Esclarece o autor, em estudo mais recente, que “a teoria dos princípios não
diz que o catálogo de direitos fundamentais não contém regras; isto é, que ela não
contém definições precisas”.595 A teoria afirma que os direitos fundamentais “enquanto
balizadores de definições precisas definitivas, têm estrutura de regras,596 como também
591
Os enunciados normativos expressam normas de direito fundamental. Alexy os denomina, para uma
maior clareza, de disposições de direito fundamental. Identifica o autor, na Constituição alemã, quais as
disposições de direito fundamental que expressam normas de direito fundamental. Propõe – superando a
definição de critérios materiais e estruturais para a classificação de normas de direito fundamental – a
utilização de critérios formais, apontando para sua forma de positivação. Assim, são fundamentais as
normas constantes no capítulo da Constituição (Lei Fundamental) intitulado “Direitos fundamentais”,
bem ainda as demais disposições satélites que conferem direitos individuais. Os direitos fundamentais são
normas tão importantes que o seu reconhecimento não pode ser deixado à livre disposição das maiorias
parlamentares. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón
Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 63-65. A questão não é de fácil solução.
A dogmática nacional se esforça em identificar quais as matérias que podem ser compreendidas como
direitos fundamentais. As limitações constitucionais ao poder de tributar, dentre elas, o princípio da
anterioridade, foram tomadas pelo Supremo Tribunal Constitucional, em Ação Direta de
Inconstitucionalidade, como direitos fundamentais. Estabelece a Constituição Federal da República do
Brasil, no parágrafo 2º do art. 5º, que: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem
outros decorrentes do regime e dos princípios por ela dotados, ou dos tratados internacionais em que a
República Federativa do Brasil seja parte.” Na prática não é fácil delimitar o que pode ser identificado
como direito fundamental, repercutindo tal categorização na limitação imposta pelo art. 60, §4º, IV da
Constituição Federal, que estabelece a impossibilidade de emenda à Constituição, por se tratarem de
cláusulas pétreas. É o Supremo Tribunal Federal, julgando ações declaratórias de constitucionalidade ou
ações diretas de inconstitucionalidade, que estabelece em cada caso, quais são as disposições
constitucionais compreendidas como cláusulas pétreas da espécie “direitos e garantias individuais”, ao
julgar inconstitucionais as emendas por violação ao art. 60, §4º, IV.
592
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 22-23.
593
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 22.
594
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 104.
595
ALEXY, Robert. Colisão e ponderação como problema fundamental da dogmática dos direitos
fundamentais, mimeo, p. 12. Palestra proferida na Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro, em
10/12/1998.
596
Regras que ensejam a possibilidade de uma fundamentação dedutiva. ALEXY, Robert. Teoría de los
derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios
acentua que o nível de regras precede prima facie ao nível dos princípios. O seu ponto
decisivo é o de que atrás e ao lado das regras existem princípios.”597
conseqüentemente insinuam no fundo uma reserva de juízo em todas as normas constitucionais, do que
com categorias de valores, sistemas de valores e valoração, necessariamente vagas e conducentes a
insinuações ideológicas.” (Ibid. pp. 18-19) Müller considera que a jurisprudência do Tribunal
Constitucional “fornece um quadro sem direção, que professa de modo tão globalizantemente indistinto
quão acrítico ‘métodos’ exegéticos transmitidos pela tradição – e caudatários do positivismo legalista na
sua alegada exclusividade - , mas rompe essas regras em cada caso de seu fracasso prático sem
fundamentar esse desvio.” (ibid., p. 20). A proporcionalidade, para o autor, não seria um novo método de
concreção do direito, mas um desvio pontual da exegese tradicional do positivismo legalista.
605
BverfGE 7, 198, julgado em 15 de janeiro de 1958. Neste feito, o Tribunal Constitucional alemão
manifestou o entendimento de que os direitos constitucionais constituíam uma ordem objetiva de valores,
a serem ponderados no caso concreto. Transcrevendo parcialmente a decisão do Tribunal, esclarece
Alexy que ‘bajo la Ley Fundamental [de Bonn, 1949], las suposiciones y formas de hablar axiológicas
han ingresado en un amplio frente en la jurisprudencia constitucional. Un ponto culminante lo constituye
el fallo Lüth. Por cierto, también en este fallo, el Tribunal Constitucional Federal parte del hecho de que
lo ‘derechos fundamentales están en primera línea destinados a asegurar la esfera de la libertad del
individuo frente a las intervenciones del poder público’ y que, por lo tanto, son ‘derechos de defensa del
ciudadano frente al Estado. Pero, luego agrega: ‘Igualmente correcto es que la Ley Fundamental, que
no quiere ser un ordenamiento valorativamente neutro [...], ha establecido en si sección de derechos
fundamentales también un ordenamiento valorativo objetivo [...] este sistema valorativo, centrado en la
personalidad humana que se desarrolla libremente dentro de la comunidad social, y en su dignidad, tiene
que valer en tanto decisión iusconstitucional básica, para todos los ámbitos del derecho.’ En el
transcurso de la fundamentación de la decisión, el ordenamiento valorativo es calificado de ‘jerarquía
valorativa’ dentro de la cual sería necesario llevar a cabo una ‘ponderación’. ALEXY, Robert. Teoría
de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1997, p. 148. Acerca da importância do caso Lüth na questão dos direitos fundamentais,
leciona Luís Roberto Barroso: “Há razoável consenso de que o marco inicial do processo de
constitucionalização do Direito foi estabelecido na Alemanha. Ali, sob o regime da Lei Fundamental de
1949 e consagrando desenvolvimentos doutrinários que já vinham de mais longe, o Tribunal
Constitucional Federal assentou que os direitos fundamentais, além de sua dimensão subjetiva de
proteção de situações individuais, desempenham uma outra função: a de instituir uma ordem objetiva de
valores. O sistema jurídico deve proteger determinados direitos e valores, não apenas pelo eventual
proveito que possam trazer a uma ou a algumas pessoas, mas pelo interesse geral da sociedade na sua
satisfação. Tais normas constitucionais condicionam a interpretação de todos os ramos do Direito, público
ou privado, e vinculam os Poderes estatais. O primeiro grande precedente na matéria foi o caso Lüth,
julgado em 15 de janeiro de 1958”. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito. BARROSO,
Luís Roberto. “O triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil.” Disponível em:
http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7547, com acesso em 25/10/2006. Como “ensinamentos que
já vinham de mais longe”, referidos por Luís Roberto Barroso, pode-se apontar, na lição de Alexy: “Ya en
la época de la Constitución de Weimar [Weimar, 1919] fueron sostenidas teorías axiológicas de los
derechos fundamentales. Uno de los autores más influyentes fue Rudolf Smend. De acuerdo con una
famosa formulación de Smend, el ‘sentido concreto de un catálogo de derechos fundamentales’ reside en
que pretende ‘normar una serie concreta, de una cierta unidad cerrada, es decir, un sistema de valores o
bienes, un sistema cultural.’ ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto
Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 148.
606
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 120.
Administrativo Federal, Lei n.º 9.784/1999 -, servindo como instrumento de controle
dos atos estatais.610
607
Cabe desde já a advertência que a adequação, sub-regra da regra da proporcionalidade, não se
confunde com o critério de adequação - proposto por Klaus Günther e adotado por Habermas - como
método de aplicação dos princípios - referido acima. Com já explicitado, a diferença entre elas é maior do
que parece à primeira vista. Tampouco a regra da proporcionalidade engloba o critério de adequação de
Günther/Habermas. A regra da proporcionalidade (incluída a sub-regra da adequação) toma os princípios
como mandamentos otimizáveis com estrutura teleológica – relacionada à eficiência e ao Ótimo de Pareto
-, ao passo que o critério da adequação defende uma concepção deontológica de princípios, que
expressam deveres. O critério de adequação é satisfeito pela validade de um juízo (uma decisão judicial)
deduzido de uma norma válida (um princípio), que satisfaz a norma subjacente (um princípio). A norma
adequada seria a única norma correta a ser aplica ao caso. Outro ponto que merece um esclarecimento é a
questão da eficiência da circulação da riqueza em razão da adoção do Ótimo de Pareto como indicador no
alcance das finalidades estabelecidas por normas na Teoria de Alexy. O Ótimo de Pareto, leciona Paulo
Sandroni, é uma “situação em que os recursos de uma economia são alocados de tal maneira que
nenhuma reordenação diferente possa melhorar a situação de qualquer pessoa (ou agente econômico) sem
piorar a situação de qualquer outra. O conceito foi introduzido por Vilfrido Pareto (1848-1923).”
SANDRONI, Paulo. Novíssimo dicionário de economia. 13.ed. São Paulo: Editora Best Seller, 2004, p.
437. Não se confunde com o utilitarismo, outro critério que busca a eficiência na circulação de riquezas:
pelo critério do Ótimo de Pareto, a transferência de bens de quem os valoriza menos para quem os
valoriza mais é “eficiente, numa sociedade, quando alguém fica melhor do que anteriormente com a
mudança de alguma atribuição de bens anterior, sem que ninguém fique pior.” Outro critério, o modelo de
utilidade preconizado por Bentham e Mill, sugere “que as normas devem ser desenhadas de maneira a
gerarem o máximo de bem estar para o maior número de pessoas.” A racionalidade dos agentes, um dos
postulados econômicos, leva à procura da maximização das utilidades e à eficiência na alocação de bens.
SZTAJN, Rachel. “Law and economics”. In: ZYLBERSZTAJN, Decio; SZTAJN, Rachel. Direito e
economia: análise econômica do direito e das organizações. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 76.
608
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 30.
609
O autor caracteriza a proporcionalidade como um postulado, e não como regra. O assunto será
retomado. ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios
jurídicos. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2004, pp. 112-125.
610
ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios
jurídicos. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2004, p. 112. No Brasil, como bem observado por Luís Virgílio
Afonso da Silva, a proporcionalidade, invocada como fundamento para decisões, é constantemente
confundida com critérios de razoabilidade. AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o
razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v. 798, abril, 2002, p. 45. O tema será retomado.
611
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro
de Estudios Constitucionales, 2004.
612
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 169.
Sustenta que a jurisprudência permanente do Tribunal Constitucional
alemão - que exige que para toda restrição de direitos fundamentais se respeitem as sub-
regras de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito – corresponde
aos resultados teóricos acerca da natureza das normas de direitos fundamentais e de sua
teoria dos princípios – estes como mandamentos de otimização.613 Há uma
compatibilização da Teoria dos Princípios614 – inserida na Teoría de los derechos
fundamentales – com a regra da proporcionalidade, sendo mais nítida - e mais explorada
- no campo da sub-regra da proporcionalidade em sentido estrito.
Constitucionales, 2004, p. 160. Refere-se também à seguinte frase sarcástica de Forsthoff: “Forsthoff se
mofa de la concepción según la cual todo el sistema jurídico tan sólo es o debe de ser una concreción de
la Constitución. En este contexto habla de la ‘Constitución como protoorigen jurídico del que todo
surgiría, desde el Código Pernal hasta la ley sobre fabricación de termómetros’.” ALEXY, Robert. El
concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 2004, p. 160. Sinteticamente, legalismo e constitucionalismo opõem-se nos seguintes
pontos: “(1) Norma en vez de valor; (2) subsunción en vez de ponderación; (3) independencia del
derecho ordinario en vez de la omnipresencia de la Constitución; (4) autonomía del legislador
democrático dentro del marco de la constitución en lugar de la omnipotencia judicial apoyada en la
Constitución, sobre todo del Tribunal Constitucional Federal.” ALEXY, Robert. El concepto y validez
del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 160.
A confrontação das teorias demonstra o ponto de tensão entre os princípios materiais constantes da
Constituição e o princípio democrático – que é formal – que atribui ao legislador eleito poderes de
realizar escolhas políticas. Alexy propõe o que denomina de “constitucionalismo moderado”, enfrentando
a questão com o auxílio das concepções de ordem marco e de ordem fundamental, como adiante se verá.
625
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 26-27. Esta concepção também não é acolhida
pela teoria dos princípios de Alexy.
626
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 28. O modelo adotado por Alexy pretende dar
respostas a duas questões: está a Teoria dos Princípios capacitada a estabelecer certas proibições ao
legislador, um marco no sentido de limitar a atuação deste? Outra: é possível fazê-lo sem suprimir todas
as margens de ação legislativa? Responde o autor: “Esto sería posible si la teoría de los principios
estuviera en condiciones de ordenar y prohibir algunas cosas al Legislador, y de no ordenarle ni
prohibirle otras. Si algo no está ordenado ni prohibido, está permitido hacerlo u omitirlo. Si está
permitido hacerlo u omitirlo, es discrecional.” ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 27.
627
Na tradução para o português: “O tribunal constitucional federal fala muito de espaços. A terminologia
é rica. Ao lado da simples palavra ‘espaço’ encontram-se as expressões ‘espaço de estimativa, de
valoração e de configuração’, ‘espaço de apreciação’, ‘espaço de atuação’, ‘espaço de decisão’, ‘espaço
de prognose’, ‘espaço de experiência e de adaptação’, espaço de interpretação’, ‘espaço de avaliação’,
espaço de ponderação’. [...] Se se olha mais rigorosamente, então se encontra a dicotomia decisiva. É a
diferença entre espaços estruturais e espaços epistêmicos ou de conhecimento.” ALEXY, Robert.
Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007,
p. 79.
628
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 28. Em sentido semelhante, no Brasil é corrente a
utilização da expressão “marco” no campo do direito regulatório.
629
A margem de ação cognitiva – denominada também de epistêmica – “nasce dos limites de reconhecer
do que a constituição, por um lado, ordena e proíbe, e, por outro, nem ordena nem proíbe, portanto, libera.
necesario; lo que está prohibido por la Constitución es constitucionalmente imposible y
lo que la Constitución confía a la discrecionalidad del Legislador es tan solo
constitucionalmente posible”.630 O problema da ordem marco é o problema da existência
do constitucionalmente possível.631 Propõe Alexy a compatibilidade de sua teoria dos
princípios como mandamentos de otimização – e da regra de proporcionalidade 632 – com
“el carácter marco de la Constitución”.633 A adoção da regra da proporcionalidade
numa vertente argumentativa é uma proposta de utilização racional de argumentos no
espaço reservado à discricionariedade - dentro da margem de ação estrutural de
[...] Nasce dos limites da capacidade de reconhecer dos limites da constituição.” ALEXY, Robert.
Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007,
pp. 79-80. Noutra obra, esclarece o autor que a margem (de ação cognitiva) aparece quando “son
inciertos los conocimientos acerca de lo que está ordenado, prohibido o confiado a la discrecionalidad
del Legislador por derechos fundamentales.” A incerteza pode recair sobre premissas empíricas ou sobre
premissas normativas. ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução:
Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 82. Como regra de limitação
à margem epistêmica empírica do legislador, propõe Alexy: “Cuanto más intensa sea una intervención en
un derecho fundamental, tanto mayor debe ser la certeza de las premisas que sustentan la intervención.”
Ibid., p. 93. A margem de ação cognitiva normativa atribui ao legislador a competência de determinar
“dentro de un cierto contorno (exactamente el contorno del margen de acción cognitivo) lo que está
ordenado y prohibido y lo que es discrecional, de acuerdo con los derechos fundamentales.” Ibid., p. 98.
Tal margem, esclarece Alexy, deve ser limitada para não por em risco a margem de ação estrutural – e a
vinculação do legislador aos direitos fundamentais. A margem de ação cognitiva normativa é relevante
unicamente quando as premissas carecem de certeza, sendo aceita somente em caso de “inseguridad
normativa”. Ibid., p. 99. O perigo, identificado por Alexy, é que sob o manto da margem de ação
cognitiva normativa – interpretação do texto da Constituição, hermenêutica constitucional – limite-se de
sobremaneira o espaço de discricionariedade – margem de ação estrutural – do legislador, com sérios
danos ao princípio - formal – democrático. Tal fato - a falta de certeza sobre os limites do ponderável -,
reconhece o autor, também derrubaria por terra toda a sua teoria, calcada na proporcionalidade. Ibid., p.
109. Sustenta, entretanto, que a divergência acerca dos limites na margem de ação cognitiva é controlada
e limitada em cada caso, com a consideração da Constituição tomada sistematicamente. A relativa falta de
certeza acerca dos limites materiais dos direitos fundamentais – causada pela divergência acerca da
margem de ação cognitiva normativa – é o “imprescindible tributo que los ideales iusfundamentales
tienen que pagar a cambio del triunfo, nunca suficientemente apreciado, de su institucionalización en el
mundo, tal como es.” Ibid. p. 111. Não é demais lembrar que a proporcionalidade não é uma técnica de
interpretação de normas constitucionais, mas sim um método para a tomada de escolhas – ou decisões -
corretas nos limites trazidos pela Constituição – e pela lei – num modelo de ordem jurídica marco.
630
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 29-30. A metáfora do marco, embora utilizada
“por razones de simplicidad” (ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales.
Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 24) apenas ao
tratar da relação entre Constituição e legislação, é de grande utilidade na compreensão dos limites da
atividade da administração e da jurisdição. O espaço de discricionariedade da Administração para a
edição de normas de direito regulatório estará delimitado pela Constituição e pelas normas constantes de
leis – ou das espécies normativas previstas no artigo 59 da Constituição Federal. Quanto menor a
densidade normativa – da Constituição e das leis -, maior a margem de ação estrutural da Administração
Pública. E, quanto maior a margem de ação estrutural, maior a necessidade de legitimar sua atuação
através da participação discursiva dos atingidos.
631
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 20.
632
Nesta obra o autor refere-se a princípio da proporcionalidade e seus subprincípios – adequação
(idoneidad), necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de
los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 2004, p. 32-81.
ponderação.634 A proporcionalidade, com suas três sub-regras, “definen o que se debe
entenderse por ‘optimización’, de acuerdo con la teoría de los principios.”635 Anote-se
que a discricionariedade atribuída ao legislador, numa ordem marco, possui seu
correlato nas atividades jurisdicionais e administrativas.
633
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 38.
634
Esclarece Alexy que “o espaço estrutural é definido por nada mais que pela ausência de mandamentos
e proibições definitivos. O que a constituição nem ordena bem proíbe, ela libera. [...] Espaços estruturais
iniciam, portanto, rigorosamente ali onde termina a normatividade material definitiva da constituição.
Como o controle judicial-constitucional é exclusivamente controle no critério da constituição, segue
forçosamente que lá, onde se inicia o espaço estrutural, cada controle judicial-constitucional termina.”
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do
Advogado, 2007, p. 79. A margem de ação estrutural do legislador (ou espaço estrutural, na tradução
brasileira) pode referir-se a: fixação de fins (quando as normas de direito fundamental deixam abertas as
razões para a intervenção legislativa ou menciona razões para intervir, sem ordená-la, entretanto); eleição
de meios (quando as normas de direito fundamental proíbem certas intervenções legislativas, ordenam a
execução de algumas condutas positivas e tratam de deveres de proteção – direitos negativos);
ponderação em sentido amplo (quando, em caso de colisão de normas de direito fundamental, estas
devem ser ponderadas buscando-se sua otimização, com a utilização das sub-regras da idoneidade (ou
adequação), necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Nesta ponderação, não há um ponto
máximo de otimização, tampouco uma única resposta correta como resultado). Nestas três hipóteses, há
margem de ação estrutural a ser preenchida discricionariamente pelo legislador. ALEXY, Robert. Epílogo
à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 2004, pp. 31-39; ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís
Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, pp. 80-81. Nestas três hipóteses, há margem de
ação estrutural a ser preenchida discricionariamente pelo legislador.
635
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 38.
636
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 30.
637
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 25.
638
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 20-22.
fundamental cualitativo o sustancial si mediante ella se deciden asuntos fundamentales
para la comunidad. Esto concepto de orden fundamental sí es compatible con el
concepto de orden marco.”639
Esclarece Alexy que, segundo sua teoria dos princípios, uma boa
Constituição deve decidir assuntos fundamentais – e neste sentido ser uma ordem
fundamental – mas, ao mesmo tempo, deixar muitos pontos em aberto - e neste sentido
ser uma ordem marco.640 Alexy propõe o que denomina de “constitucionalismo
moderado.”641 Isto será possível:
O que Alexy busca, com sua Teoria dos Princípios – direitos fundamentais
com estrutura de princípios otimizáveis - é a satisfação destes postulados. Não há, em
Teoría de los derechos fundamentales, um aprofundamento acerca das sub-regras da
adequação e da necessidade.643 Tampouco em Epílogo à la teoría de los derechos
fundamentales estas sub-regras são tratadas analiticamente pelo autor.644 Em sua teoria é
central a questão da ponderação – proporcionalidade em sentido estrito645 -, sustentando
o autor que, em hipótese de colisão entre princípios que se contrapõem na decisão de
um caso concreto posto em juízo, a argumentação fundada na proporcionalidade daria
uma resposta fundamentada racionalmente. Na mesma linha de sua Teoria da
639
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 31.
640
Não é demais esclarecer que Alexy propõe o que denomina de “constitucionalismo moderado” não
como uma teoria da atividade legislativa, mas sim como uma teoria jurídica de controle dos atos
legislativos. A preocupação central de Alexy é, como já mencionado por diversas vezes nesta tese, com a
aplicação do direito por juízes, e, especificamente na questão dos direitos fundamentais, por juízes do
Tribunal Constitucional alemão, em questões de constitucionalidades de leis.
641
ALEXY, Robert. El concepto y validez del derecho. Tradução: Carlos Bernal Pulido. Madrid: Centro
de Estudios Constitucionales, 2004, p. 161.
642
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 31.
643
O autor trata das sub-regras da necessidade e da adequação às pp. 111-115. ALEXY, Robert. Teoría de
los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1997, p. 112. Nesta obra são referidas como máximas.
644
Nesta obra, são denominadas de subprincípios. ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp.
39-48.
645
“La máxima de la proporcionalidad en sentido stricto, es decir, el mandato de ponderación, se sigue
de la relativización con respecto a las posibilidades jurídicas.” Robert. Teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p.
112.
argumentação jurídica, Alexy vale-se de fórmulas lógicas e matemáticas para sustentar
a racionalidade de seu processo de decisão.
646
Nesta tese se adotará as expressões “regra” e “sub-regras” da proporcionalidade. Com já exposto, a
regra da proporcionalidade, bem como as sub-regras da adequação, da necessidade e da ponderação
(proporcionalidade em sentido estrito) não são ponderadas frente a algo diferente. O que se impõe é a
satisfação destas regras sob pena de ilegalidade ou inconstitucionalidade do ato jurídico, seja legislativo,
judicial, ou administrativo. Não são princípios na concepção de Alexy – adotada nesta tese: não são
mandamentos de otimização, mas sim regras para a aplicação de princípios. O próprio autor (Alexy),
embora claramente expresse compreender a proporcionalidade como regra (ALEXY, Robert. Teoría de
los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1997, p. 112 – nota de roda-pé explicativa n.º 84) refere-se, por diversas vezes à
proporcionalidade como máxima ou mesmo como princípio, o que gera uma certa confusão. Em sentido
semelhante do aqui exposto, adotando a proporcionalidade como regra: AFONSO DA SILVA, Luís
Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v. 798, abril, 2002, p. 25. Em
sentido semelhante, excluindo a natureza de princípio em relação à proporcionalidade, Humberto
Bergmann Ávila, que classifica a proporcionalidade como um postulado normativo específico aplicativo,
decorrente do caráter principiológico de normas de direito. ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria dos
princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2004, pp.
112-125.
647
BARROS, Suzana Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das
leis restritivas de direitos fundamentais. 3. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2003, pp. 37-39. Aponta Luís
Virgílio Afonso da Silva ser comum a identificação - errônea - da origem remota da regra de
proporcionalidade já na Carta Magna de 1215 – fonte primeira do princípio da razoabilidade e também da
proporcionalidade: “É de se questionar até mesmo a afirmação de que a regra da razoabilidade tenha
origem neste documento.” AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos
Tribunais, ano 91, v. 798, abril, 2002, p. 29.
partir do já mencionado caso Lüth, de 1958, quando foram fixados seus requisitos –
aqui denominados de sub-regras.648
648
A trajetória da construção da proporcionalidade pode ser encontrada na didática obra de Suzana Toledo
Barros, acima referida. Ressalte-se que a autora confunde proporcionalidade com razoabilidade: “O
princípio da proporcionalidade, a que se faz alusão neste trabalho, como uma construção dogmática dos
alemães, corresponde a nada mais do que o princípio da razoabilidade dos norte-americanos,
desenvolvido mais de meio século antes, sob o clima de maior liberdade dos juízes na criação do direito.”
BARROS, Suzana Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis
restritivas de direitos fundamentais. 3. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2003, p. 59. Toma-se a lição de
Willis Santiago Guerra Filho, ao tratar do “princípio da proporcionalidade”: “Que nossas palavras finais,
então, se dirijam aos que, em nossa Dogmática Jurídica, especialmente no campo do direito público, vêm
confundindo o princípio da proporcionalidade, de origem germânica, com um outro, de origem anglo-
saxônia, aqui denominado, ao que parece por influência argentina, ‘princípio da razoabilidade’, quando,
na própria tradição britânica se fala em ‘princípio da irrazoabilidade’. O princípio da proporcionalidade,
como aqui se procurou evidenciar, não se destina a evitar que absurdos sejam perpetrados na elaboração
do Direito, mas sim que este seja interpretado e aplicado atendendo a um princípio de racionalidade, apto
a determinar qual a melhor dentre as diversas interpretações possíveis, do ponto de vista da promoção
simultânea e equânime do Estado de Direito e da Democracia, com a gama de direitos fundamentais e
valores que lhes são inerentes, sendo esse mesmo compromisso com a racionalidade o principal de toda
teoria, também no campo do Direito.” GUERRA FILHO, Willis Santiago. “Princípio da
proporcionalidade e teoria do direito”. In: GRAU, Eros Roberto, GUERRA FILHO, Willis Santiago
(Orgs.). Direito constitucional: estudos em homenagem a Paulo Bonavides. São Paulo: Malheiros, 2003,
p. 283.
649
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002. Na jurisprudência brasileira do Supremo Tribunal Federal, a decisão proferida no
julgamento do RE 18.331, em 21 de setembro de 1951, é apontada como primeira a acolher o principio da
proporcionalidade. A decisão enfrentava a constitucionalidade da majoração pelo Município de Santos do
imposto de licença incidente sobre cabinas de banho. Nesta decisão assentou o Ministro Orosimbo
Nonato, em passagem histórica de seu voto, que: “O poder de taxar não pode chegar à desmedida do
poder de destruir, uma vez que aquele somente pode ser exercido dentro dos limites que o tornem
compatível com a liberdade de trabalho, de comercio e de indústria e com o direito de propriedade. É um
poder, cujo exercício não pode ir até o abuso, excesso, o desvio, sendo aplicável, ainda aqui a doutrina
fecunda do détournement de pouvoir. Não há que estranhar a invocação dessa doutrina ao propósito da
inconstitucionalidade, quando os julgados têm proclamado que o conflito ente a norma comum e o
preceito da Lei Maior pode se acender não somente considerando a letra do texto, como também e
principalmente, o espírito do dispositivo invocado”. MORAES, Germana de Oliveira, Controle
jurisdicional da administração pública, São Paulo: Dialética, 1999, p. 137; BARROS, Suzana Toledo. O
princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos
fundamentais. 3. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2003, pp. 105-106. A adoção deste posicionamento pelo
Supremo Tribunal Federal resultou na edição das súmulas de jurisprudência de número 70, 323 e 547,
orientadoras na solução de conflitos entre a Fazenda Pública e o Contribuinte no que tange às coerções
praticadas pela Administração fazendária com fito de receber tributos sem se valer do processo de
execução fiscal previsto em lei. Como adiante se demonstrará, a decisão em tela se pauta pela
razoabilidade, e não pela proporcionalidade.
preponderantemente utilizada como instrumento de controle do excesso de poderes
estatais, ganha importância, na atualidade, sua utilização como instrumento contra a
omissão ou insuficiência de poderes estatais – a denominada proibição de
insuficiência.650 Tal possibilidade impede o uso da expressão “vedação ao excesso”
como sinônima de “regra de proporcionalidade”.651
Diferenciam-se tanto por sua origem quanto por sua estrutura. O princípio
da razoabilidade, denominada pelos ingleses de “princípio da irrazoabilidade”,654 surge
concretamente na Inglaterra, “em decisão judicial proferida em 1948.” Leciona Luís
Virgílio Afonso da Silva que o teste da irrazoabilidade, “conhecido teste Wednesbury,
implica tão somente rejeitar atos que sejam excepcionalmente irrazoáveis.” Aponta o
autor a seguinte fórmula: “Se uma decisão [...] é de tal forma irrazoável, que nenhuma
autoridade razoável a tomaria, então pode a Corte intervir.”655 O teste da razoabilidade –
melhor dizendo, da irrazoabilidade – é menos intenso que a da proporcionalidade,
650
Aponta Luís Virgílio Afonso da Silva que a expressão foi utilizada pela primeira vez “ao que tudo
indica” por Claus-Wilhem Canaris em 1984, ganhando importância na jurisprudência alemã a partir da
decisão sobre o aborto exarada no processo BverfGE 88, 203 [245]. AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio.
O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v. 798, abril, 2002, p. 27.
651
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, pp. 26-27.
652
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 28.
653
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 28.
654
GUERRA FILHO, Willis Santiago. “Princípio da proporcionalidade e teoria do direito”. In: GRAU,
Eros Roberto, GUERRA FILHO, Willis Santiago (Orgs.). Direito constitucional: estudos em homenagem
a Paulo Bonavides. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 283. Aponta o autor que a adoção da terminologia
“princípio da razoabilidade” em lugar do original “princípio da irrazoabilidade” deve-se à influência de
tradução argentina (p. 283).
655
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 29.
afastando-se apenas o atos “absurdamente irrazoáveis.”656 Nada impede que um ato
desproporcional não seja considerado irrazoável.657
656
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 29. Esclarece o autor que a diferenciação é confirmada por debate existente na
Inglaterra, acerca dos Human Rights Act de 1998, em que se discute a o papel da regra da
proporcionalidade ao lado da irrazoabilidade, o mesmo a substituição desta pela primeira regra.
657
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista
dos Tribunais, ano 91, v. 798, abril, 2002, p. 30. Aponta o autor a
decisão da Corte Européia de Direitos Humanos Smith and Grady v.
United Kingdom [1999], § 137, como exemplo de decisão que considerou
uma ato jurídico desproporcional, embora razoável. Nada impede,
entretanto, que uma decisão razoável seja tomada por desproporcional.
Para Germana de Oliveira Moraes razoabilidade e proporcionalidade não
se confundem: “O teste da racionalidade envolve a adoção dos critérios
de proporcionalidade – adequação e exigibilidade, enquanto o teste de
razoabilidade, relacionado à questão da proporcionalidade em sentido
estrito, configura um método de obtenção do equilíbrio entre os
interesses em conflito [...]” (MORAES, Germana de Oliveira, Controle
jurisdicional da administração pública, São Paulo: Dialética, 1999, p.
133). Reconhece a autora que o Poder Judiciário usa
indiscriminadamente um princípio por outro, tendo Supremo Tribunal
Federal considerado a proporcionalidade como abrangente da
razoabilidade. (Ibid., p. 134) A postura da autora - ao relacionar
racionalidade a adequação e exigibilidade, e razoabilidade à
proporcionalidade em sentido estrito - mostra o quanto o tema ainda é
polêmico.
658
ÁVILA, Humberto Bergmann. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios
jurídicos. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2004, p. 110.
659
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 30. Leciona o autor referido que a classificação ternária é amplamente majoritária,
sufragando a binária (adequação e necessidade) e a quaternária (adequação, necessidade,
proporcionalidade em sentido estrito e legitimidade dos fins). Ibid. p. 35.
situações em que há uma relação de causalidade entre dois elementos discerníveis:660 um
meio e um fim.661 Debruçando sobre estes elementos, meio e fim, três exames devem ser
feitos:662
versus perigo causado pelo comércio ilegal (trafico). ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los
derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales,
2004, p. 44.
670
Como adiante se demonstrará, a proporcionalidade é de grande serventia na orientação, produção e
controle dos atos administrativos.
671
A sub-regra da adequação, como a da necessidade, destina-se a selecionar os meios para o alcance (ou
fomento) dos fins eleitos em lei ou na Constituição. ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 43.
672
Como esclarece: AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos
Tribunais, ano 91, v. 798, abril, 2002, p. 36.
673
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 41.
674
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 39. Alexy vincula a adequação à busca da
eficiência, expressa no Ótimo de Pareto, já explicitado no corpo desta tese – “una posición pode ser
mejorada sin que otra empeore.” Ibid., p. 41.
675
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 41.
676
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 41.
677
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 38.
um exame absoluto,678 ao passo que aquele é “imprescindivelmente” comparativo.679
Neste exame comparativo, para que seja um meio aceito como necessário, é imperioso
que se faça um cotejo com as medidas alternativas.680
678
Alexy parece discordar desta assertiva. Em Teoría de los derechos fundamentales explica: se o meio
(M1) não é adequado para a consecução do fim (F) exigido por P1, é indiferente para P1 se M1 se realiza
ou não. Se sob certas condições M1 afeta P2 (um princípio colidente), ao tomar os princípios como
mandamentos de otimização com relação às possibilidade fáticas (adequação), M1 estará proibido por P2.
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 114-115. Em Epílogo à la teoría de los derechos
fundamentales, no mesmo sentido, ao tratar da sub-regra da adequação, apresenta como inadequado um
meio que impede a realização de um princípio (P1 – liberdade de exercício profissional), sem que
apresente condições de favorecer outro princípio colidente (P2 - proteção do consumidor). Assevera o
autor, ao analisar decisão do Tribunal Constitucional alemão que julgou inconstitucional a exigência de
prova de conhecimentos comerciais específicos para operar uma máquina de venda automática de
cigarros – similares às de refrigerantes que vemos comumente no Brasil – que “la prueba de
conocimientos comerciales específicos no era idónea para proteger a los consumidores de daños
económicos o de daños para la salud. En consecuencia, esta medida resultaba prohibida por el principio
de idoneidad y vulneraba por tanto el derecho fundamental a la libertad de profesión y oficio.” ALEXY,
Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 40. Em que pese a qualidade dos argumentos de Alexy, a
medida (lei, decisão ou ato administrativo – M1) ao não ser idônea à produção dos fins (F) protegidos por
P1 é, desde já, inadequada. A questão da redução de outro princípio colidente (P2) estará superada,
prejulgada, prejudicada. No caso específico da adequação, o que se tem, em realidade, é uma questão de
maximização de P1. O reconhecimento desta maximização, entretanto, não é incompatível, ou diminui a
densidade da Teoria dos Princípios de Alexy. Esclarece o autor que opta por “simplicidad” pela expressão
“otimização” ao invés de “maximização”. Entende que a primeira definição, mais geral, não cria confusão
em hipótese de aplicação isolada de um princípio de direito fundamental. A expressão “maximização”
seria menos precisa, e necessitaria de uma complementação, já que seria imprópria a idéia de maximizar
princípios que se chocam. Em caso de colisão de princípios, otimizar significa ponderar as possibilidades
jurídicas. Na hipótese de aplicação isolada de um princípio, embora os princípios continuem sendo
definidos como mandatos de otimização, a questão é de maximização, e sua aplicação refere-se apenas às
possibilidades fáticas de seu cumprimento. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales.
Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 91.
679
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 38.
680
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 39.
681
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 42.
confusiones y equivocaciones ‘de una manera igualmente eficaz, pero menos
gravosa’.”682
682
Assim decidiu o Tribunal – BverfGE 53, 135 (146), apud ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los
derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales,
2004, p. 42.
683
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 42-43. Nesta linha, leciona Alexy, a sub-regra da
necessidade é também uma expressão do Ótimo de Pareto.
684
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 114.
685
AFONSO DA SILVA, Luís Virgílio. O proporcional e o razoável. Revista dos Tribunais, ano 91, v.
798, abril, 2002, p. 40.
É bastante elucidador o exemplo – extremo - citado pelo autor: se para o
combate à disseminação da AIDS (síndrome da imunodeficiência adquirida) o Estado
decidisse que, além da obrigatória realização de exame para sua identificação, fossem
todos os infectados (HIV positivos) encarcerados, ter-se-ia a seguinte situação:
Para tanto, Alexy apresenta uma regra de colisão, que denomina de “Lei de
Colisão”: K : se o princípio P1, sob as circunstâncias C, precede o princípio P2 - (P1 P
P2) C – e se de P1 sob as circunstâncias C resulta a conseqüência R, então vale uma
regra que contenha C como pressuposto fático e R como conseqüência jurídica: C → R.
700
Esta regra de colisão é assim formulada por Alexy: “Las condiciones bajo las cuales
un principio precede a otro constituyen el supuesto de hecho de una regla que expresa
696
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 93.
697
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 93.
698
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 101.
699
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 93.
700
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 94. Alexy, tal qual em sua Teoria da argumentação
jurídica, utiliza-se de fórmulas lógicas como meio de demonstrar a racionalidade dos métodos propostos.
la consecuencia jurídica del principio precedente.”701 Dos enunciados condicionados de
preferência seguem-se regras.702
713
A expressão “em regra” deve-se à constatação de Alexy que, por vezes, como adiante se demonstrará,
o peso abstrato dos princípios poderá influenciar no resultado da ponderação. Em seu Epílogo à la teoría
de los derechos fundamentales e em Constitucionalismo discursivo o autor complementa sua “fórmula
peso”, admitindo a influência do peso abstrato dos princípios. Em regra, entretanto, os princípios possuem
pesos abstratos idênticos, o que faz com que se desconsidere esta variável. ALEXY, Robert. Epílogo à la
teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 2004, p. 68; ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso
Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 151.
714
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 161. Alexy, seguindo seu objetivo de demonstrar a
racionalidade de seu método, faz uso de curvas de indiferença, comumente utilizadas nas ciências
econômicas, para demonstrar a relação de substituição de direitos fundamentais. As curvas de indiferença
aclaram as idéias que estão por trás da Lei de Ponderação, mas não oferecem um procedimento definitivo
de decisão: “Sin embargo, la ley de ponderación no es inútil.” ALEXY, Robert. Teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997,
pp. 161-164.
715
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 164.
716
Apenas em Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales a questão dos graus é devidamente
explorada por Alexy. ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução:
Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 59-81. Os graus - leve,
médio e grave - são propostos à p. 60. Observa Alexy que dentre as razões apresentadas em decisões de
ponderação do Tribunal Federal alemão, encontram-se diferentes juízos valorativos: referências a fatos, a
resultados danosos hipotéticos, e a juízos normativos. Tais espécies de juízos são necessárias na
determinação do campo de ação dos conceitos jurídicos indeterminados, “en el ámbito de la
interpretación clásica.” ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto
Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 165. Os conceitos jurídicos
indeterminados (conceitos vagos) devem ser interpretados. As valorações exercem relevante papel na
determinação do campo de ação destes conceitos. Esta interpretação não deixa de ser racional por se
reconhecer a importância da ponderação. Ibid., p. 166.
717
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 52.
718
Estes três passos são também referidos em ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução:
Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 133.
satisfacción del principio contrario justifica la afectación o la no
satisfacción del otro.719
Para aplicar seu método de sopesamento, propõe Alexy uma escala triádica
de graus: leve, médio e grave. Estes graus “formam uma escala que tenta sistematizar
classificações que se encontram tanto na prática cotidiana como na argumentação
jurídica.”725 Exemplifica a possibilidade de seu reconhecimento da seguinte forma:
numa colisão entre a proteção à saúde da população e à liberdade de ofício de profissão,
três medidas podem ser tomadas: a primeira, de intensidade leve, consiste em colocar
advertências sobre os perigos que implica em fumar; a segunda, de intensidade grave,
consiste em proibir todo que qualquer produto que contenha o tabaco; a terceira medida,
intermediária no caso exposto, seria, por exemplo, a proibição de venda de cigarros e
assemelhados por meio de máquinas somada à restrição de sua comercialização a
determinados estabelecimentos – tabacarias. De outro lado, como o conhecimento da
medicina atual assegura que fumar causa câncer, doenças cardíacas e vasculares, o peso
dos fundamentos que justificam uma intervenção é alto, pesando gravemente. Desta
forma, fixada “a intensidade da intervenção como leve e o grau de importância do
fundamento da intervenção como alto, então o resultado é fácil de reconhecer. O
fundamento de intervenção grave justifica a intervenção leve.”726 Sendo mais claro: o
peso elevado (grave) do direito que fundamenta uma intervenção, justifica a afetação
724
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 57. Refere-se Alexy à lei de taxa marginal de
substituição, explicitada em sua Teoría de los derechos fundamentales, decorrente de curva de
indiferença em que x = segurança externa, e y = liberdade de imprensa. Desta curva extrai a seguinte
regra: “Si disminuye la libertad de prensa, se requieren aumentos cada vez mayores de la seguridad
externa, a fin de compensar una disminución aún mayor de la libertad de prensa, y vice versa.” ALEXY,
Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de
Estudios Constitucionales, 1997, p. 162. Os desenhos das curvas de indiferença que não tocam, sequer se
aproximam do ponto O (origem), demonstram que na ponderação de princípios de direitos fundamentais,
por maior que seja a importância de um deles (P2 – segurança externa, por exemplo), o princípio que com
ele colide (P1- liberdade de imprensa, por exemplo) jamais poderá ser restringido ou gravemente afetado.
Há, aplicando-se a Teoria dos Princípios de Alexy, uma proteção - uma barreira corta-fogo - aos direitos
fundamentais. E esta proteção foi posta por Alexy já em sua Teoría de los derechos fundamentales. Em
seu Epílogo Alexy exemplifica e traduz em palavras aquilo que as curvas de indiferença já expressavam –
embora de forma não tão óbvia. Este ponto é essencial à Teoria dos Princípios de Alexy: além de propor
uma fundamentação racional, é asseguradora dos direitos fundamentais. A Lei de Ponderação continua
firme frente às objeções de Habermas.
725
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007, p. 143.
726
ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007, p. 134.
(prejuízo, não realização, não cumprimento) leve de um direito fundamental que com
ele colide no caso concreto.727
Aponta Alexy que: “De esta manera, se forma una escala triádica con los
grados ‘leve’, ‘medio’ e ‘grave’. Nuestro ejemplo muestra que es posible concebir una
ordenación válida de dichos grados.”728 A gradação das intensidades de não satisfação
ou de afetação de um princípio e o grau de importância da satisfação do princípio
colidente são objetos de valoração como leve (reduzido, débil), médio, e grave (elevado,
forte).729 Razões plausíveis – justificadas ou justificáveis730 - respaldam a gradação da
intensidade de intervenção e a importância do princípio contrário.731
727
O exemplo dado por Alexy é um caso manifesto de proporcionalidade da medida adotada pela
Administração alemã – semelhante à postura brasileira: a colocação de advertências em embalagens de
produtos de tabaco acerca do risco de seu consumo.
728
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 51. Rebate críticas afirmando que é possível
conceber uma ordenação válida de graus: “Basta imaginar que alguien catalogara la prohibición de
todos los productos derivados del tabaco como una intervención leve en la libertad de profesión y oficio
y, por el contrario, el deber de colocar advertencias el los paquetes como una intervención intensa. Sería
difícil tomarse en serio estas apreciaciones.” (Ibid.) Assevera Alexy que as intensidades de intervenção e
os graus de importância não podem ser medidos com a ajuda de uma escala cardinal – 0, 1, 2... ALEXY,
Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 66. Em Constitucionalismo discursivo, na tradução de Luís
Afonso Heck, leve, médio e grave são abreviados como l, m e s. Em nome da clareza, optar-se-á pela
abreviação constante de Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales.
729
No exemplo citado: “A gradação das intensidades de não satisfação ou de afetação de um princípio”
dizem respeito às medidas alternativas que afetam o princípio da liberdade de comércio e de ofício
(proibição total do comércio, proibição parcial somada à advertência; e advertências nos maços de
cigarros); “o grau de importância da satisfação do outro princípio (colidente)” que justifica a intervenção
no direito fundamental de liberdade de ofício e de profissão diz respeito à proteção do consumidor,
especialmente de sua saúde. Observa Alexy que as intensidades de intervenção e os graus de importância
não podem ser medidos com a ajuda de uma escala cardinal – 0, 1, 2... ALEXY, Robert. Epílogo à la
teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 2004, p. 66.
730
Na linha da Ética do Discurso.
731
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 57-58.
intervenção no princípio i em um caso concreto732 a ser decidido.733 Expressando de
forma mais concisa: “Ii”.734
746
Alexy refere-se somente à legislação e à jurisdição.
747
Não é o único espaço de discricionariedade do legislador, conforme já explicitado. A margem de ação
estrutural que confere discricionariedade ao legislador pode referir-se à escolha de fins, escolha de meios
e, na ponderação, em hipótese de “empate” – quando a regra da proporcionalidade não oferecer uma
decisão ao conflito de princípios.
748
Isto decorre da formulação de Alexy das curvas de indiferença, explicadas linhas acima.
749
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 93; ALEXY, Robert. Constitucionalismo
discursivo. Tradução: Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 150.
750
Especificamente em BverfGE 50, 290 (332): “La incertidumbre sobre los efectos de una ley en un
futuro incierto no puede eliminar la competencia del Legislador para proferir una ley, aun cuando ésta
sea de gran trascendencia. [...] La falta de certeza por sí misma no puede ser suficiente para
fundamentar la existencia de un margen legislativo para hacer pronósticos, margen que escape al
control de constitucionalidad.” ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales.
Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 91-92. O autor
refere-se ainda, exemplificando a aplicação desta segunda lei de ponderação, à sentença do Tribunal
Constitucional alemão no denominado de Caso Cannabis (BverfGE 90, 145 (181 e ss.) em que julgou
constitucional a proibição de produção e comercialização de produtos derivados de maconha. Neste
processo, o Tribunal ao não estabelecer a verdade das premissas empíricas do legislador, reconhecendo,
ao contrário, a falta de certeza destas, decidiu: “No se dispone de conocimientos científicos fundados que
hablen necesariamente a favor de la corrección una o de otra alternativa.” Admitindo a intervenção no
direito fundamental de liberdade de comércio e de ofício, reconheceu que o legislador dispõe de uma
margem de ação epistêmica do tipo empírica (relacionada ao conhecimento de fatos relevantes no caso
concreto). ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna
Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, pp. 82-84.
751
ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido.
Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 93. Esta regra vigora no âmbito da margem de
ação cognitiva (ou epistêmica) empírica: “En cuanto principios, los derechos fundamentales exigen que
la certeza de las premisas empíricas que sustentan la intervención sea mayor cuanto más intensa sea la
intervención en el derecho.” Ibid., p. 92-93. Na tradução brasileira, é assim enunciada: “Quanto mais
grave uma intervenção em um direito fundamental pesa, tanto maior deve ser a certeza das premissas
apoiadoras da intervenção.” ALEXY, Robert. Constitucionalismo discursivo. Tradução: Luís Afonso
Heck. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 150.
752
Reconhece o autor que em contextos complexos quase nunca se dispõe de conhecimentos empíricos
que expressem uma verdade absoluta. ALEXY, Robert. Epílogo à la teoría de los derechos
fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 2004, p. 90.
que implicam na não-realização de Pi em razão da realização de Pj.753 Para a aplicação
desta segunda regra de ponderação, é recomendada a utilização de uma escala triádica
referente à “segurança da suposição empírica” relativamente a Pi e a Pj.754 Alexy propõe
a utilização dos seguintes graus epistêmicos: “certo ou seguro (g), sustentável ou
plausível (p) e não evidentemente falso (e).”755 Estas variáveis também integram a
“fórmula peso”, refletindo na decisão acerca a proporcionalidade ou não da medida. 756
competência para sufragar o voto. ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução:
Ernesto Garzón Valdés. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, pp. 247-261. Este status
ativo não se confunde, entretanto, com a liberdade dos antigos defendida pela concepção republicana de
Estado. A participação democrática em Jellinek é liberal, de votar e ser votado, e, com isto, repercutir na
delimitação das demais categorias de direitos fundamentais. Habermas, como adiante se demonstrará,
adota o paradigma de cidadania de Marshall.
762
Esta é a razão de alguns críticos – como explicitado linhas acima – entenderem que a teoria de Alexy
não decorre da Ética do Discurso.
763
Marina Velasco conclui, em crítica à regra da proporcionalidade nos moldes propostos por Alexy, que
o juízo de ponderação não pode satisfazer à pretensão de correção em sentido forte (ou seja, moral) que,
para Alexy, todo enunciado jurídico levanta. VELASCO, Marina. “Habermas, Alexy e a razão prática
kantiana.” In: SIEBENEICHLER, Flávio Beno (Org.). Direito, moral, política e religião nas sociedades
pluralistas: entre Apel e Habermas. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2006, p. 36. A conclusão da autora
reforça – como já delineada no decorrer deste capítulo – a necessidade de se promover uma “carga de
legitimidade” na Teoria de Alexy através da institucionalização de procedimentos de participação dos
atingidos na elaboração de normas pela Administração Regulatória, procedimentos estes que deverão se
pautar pela Ética do Discurso.
Capítulo IV – Teoria Discursiva do Direito e Democracia Deliberativa
4.1. Considerações iniciais; 4.2. O direito como mediador entre facticidade e
validade; 4.3. A reconstrução da legitimidade; 4.4. Reconstrução do direito
pela Teoria do Agir Comunicativo; 4.5. Estado de direito e modalidades de
Discurso; 4.6. Administração Pública e crise do Estado de direito: o papel da
esfera pública; 4.7. Democracia Deliberativa.
764
VELASCO, Marina. “Habermas, Alexy e a razão prática kantiana.” In: SIEBENEICHLER, Flávio
Beno (Org.). Direito, moral, política e religião nas sociedades pluralistas: entre Apel e Habermas. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2006, p. 17.
765
“O conteúdo de uma lei só é geral, no sentido de um tratamento materialmente igual, quando expressar
um consenso racional em relação a todos esses tipos de problemas.” HABERMAS, Jürgen. Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 195.
para tanto - a par de discursos de aplicação - de discursos de fundamentação.766 Sua
teoria democrática vai ao encontro de um fenômeno da Segunda Modernidade: o
individualismo institucionalizado767 que diminui a importância e o poder das
coletividades da Primeira Modernidade, tais como grupos religiosos, econômicos,
classes, partidos políticos e sindicatos, em que predominava a adoção de decisões em
bloco. Outro ponto, também referendado pelo autor: a produção do direito pela
administração não pode configurar um estado de exceção permanente.768 A permanente
necessidade de decidir, numa sociedade de risco global, não autoriza o alargamento da
exceção, mas impõe a necessidade de um teoria de produção do direito democrática,
com a participação de todos os afetados em procedimentos institucionalizados para
tanto.
766
O tema será retomado ainda neste capítulo.
767
Estudado no capítulo II desta tese.
768
Tratado no capítulo II desta tese.
769
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 13.
770
Nesta linha de raciocínio, a lição de Tércio Sampaio Ferraz: “O fundamento da legitimidade é sempre
momento de força, que procura justificar, estando, pois, pelo menos implicitamente, referido a uma
fundamentabilidade discursiva, isto é, possibilidade de que a posição normativa (definição da relação
como autoridade/sujeito) seja justificável e defensável quando criticada, devendo-se notar, porém, que
esta referência implícita, por sua vez, não é conseqüência de si própria, mas de uma cosmovisão
garantidora da dominação, numa palavra, ideologia.” FERRAZ, Tércio Sampaio. “A legitimidade
pragmática dos sistemas normativos.” In: MERLE, Jean-Christophe; MOREIRA, Luiz (Orgs). Direito e
legitimidade. São Paulo: Landy, 2003, p. 295
771
HABERMAS, Jürgen. “Direito e Moral” In: Ibid. Direito e democracia: entre facticidade e validade,
Vol. II. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 246. Esta
idéia e posta como um dos princípios do Estado de direito, como adiante se verá.
procedimento discursivo (deliberativo) - eficiente e democrático - de produção de
normas por agências reguladoras.
772
Alexy, Robert. “Ponderación, control de constitucionalidad y representación” In: ALEXY, Robert.
Teoría del discurso y derechos constitucionales. Cátedra Ernesto Garzón Valdés – 2004. Tradução:
Pablo Larrañaga; René González de la Vega. México, D.F.: Distribuciones Fontamara, 2005, p. 100.
773
Aceitabilidade dos argumentos sobre os quais ela apóia sua pretensão de validade. HABERMAS,
Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno
Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 59.
774
Aceitação da ordem jurídica. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e
validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p.
59.
775
Habermas dedica-se ao tema ao identificar a crise do Estado de direito e da separação dos poderes,
caracterizadas pelos amplos poderes normativos reconhecidos à administração contemporânea. O tema
será retomado.
A cada dia há menos contradições entre as teses dos principais autores da
Teoria Discursiva do Direito. Se Habermas defendia como ponto de chegada de seu
processo discursivo uma única resposta correta, atualmente, influenciado por críticas, 776
põe tal questão como um objetivo a ser alcançado, uma “aposta em favor do futuro.” 777
Se Alexy, em sua Teoria do Caso Especial, não diferenciou os discursos em modelos de
fundamentação e de aplicação, na atualidade é expresso ao propor sua teoria à aplicação
judicial das normas de direito.778 De tal maneira, a Teoria Discursiva do Direito vem
ganhando unidade e densidade, fixando seus postulados essenciais, permitindo sua
atuação prática. Não mais como uma proposta distante, de algo idealizado, mas como
uma busca aproximativa de soluções mais justas - corretas - que possam ser igualmente
boas para todos os envolvidos.779 Manuel Atienza780 refere-se à Teoria Discursiva do
Direito aludindo ao “derecho como argumentación”,781 apontando Alexy como autor da
teoria padrão da argumentação, que se ocupa de “aclarar los procesos de interpretación
y aplicación del Derecho y ofrecer una fundamentación al trabajo de los juristas.”782
776
Especialmente as de Thomas McCarthy a quem se refere com distinção: “Thomas McCarthy é um caso
de sorte para mim: na maioria das vezes, tenho a impressão de que ele entende meus textos melhor que eu
mesmo. Ainda que exercendo todo tipo de crítica, ele salvaguarda o que nesse ínterim passei a conhecer e
reconhecer como nossa posição comum e defende-a contra objeções (especialmente por parte de
Foucault, Rorty e dos desconstrutivistas).” HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro: estudos de teoria
política. 2. ed. Tradução: George Sperber et alli. São Paulo: Edições Loyola, 2004, p. 318.
777
Acerca da premissa da “única resposta correta” esclarece Habermas, em “Apêndice a Facticidade e
validação: réplica às comunicações em um simpósio da Cardozo Law School”: “Nesse campo pantanoso,
em que é preciso tomar decisões em prazos determinados, não podemos esperar indefinidamente por
idéias construtivas que nos ocorram de repente. Se estiver correta nossa suposição, diante de tais
situações normativamente insolúveis apenas operaríamos com a premissa (genericamente válida) da
‘resposta correta única’, assim como se fosse uma aposta a descoberto em favor do futuro. Porém, jamais
poderemos abandonar esta premissa, caso não queiramos que o processo democrático, ao perder sua
racionalidade procedimental inerente, perca também sua força legitimadora.” HABERMAS, Jürgen. A
inclusão do outro: estudos de teoria política. 2. ed. Tradução: George Sperber et alli. São Paulo: Edições
Loyola, 2004, p. 337. HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro: estudos de teoria política. 2. ed.
Tradução: George Sperber et alli. São Paulo: Edições Loyola, 2004, p. 305.
778
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, pp.
289-314 – posfácio.
779
O repositório de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é recheado de decisões que se referem à
regra da proporcionalidade. Não há, entretanto, a adoção de uma teoria que abarque suas sub-regras,
sendo a regra da proporcionalidade confundida com critérios de razoabilidade, vedação ao excesso,
adequação e ponderação. O tema foi tratado no capítulo III.
780
Manuel Atienza é ao lado de Isabel Espejo tradutor do alemão para o espanhol de Teoría de la
argumentación jurídica. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997.
781
ATIENZA, Manuel. El derecho como argumentación. Cátedra Ernesto Garzón Valdés, 2003. Cidade
do México: Distribuciones Fontanamara, 2005, pp. 69-70.
782
ATIENZA, Manuel. El derecho como argumentación. Cátedra Ernesto Garzón Valdés, 2003. Cidade
do México: Distribuciones Fontanamara, 2005, pp. 69-70. Esclarece o autor que Alexy se propõe a
abordar os mesmo problemas enfrentados por autores dos tratados de metodologia jurídica. Aponta
Atienza, entretanto, uma diferença: “En mi opinión, la diferencia en el uso que hoy se da a la expresión
‘argumentación jurídica’ frente a la de ‘método jurídico’ radica esencialmente en que la primera tiende
a centrarse en el discurso jurídico justificativo (particularmente, el de los jueces), mientras que ‘método
jurídico’ (por lo menos entendido en sentido amplio) tendría que hacer referencia también a otra serie
Como contra-posturas a serem mitigadas nesta tese, estão algumas propostas
de Habermas e Alexy. Para o primeiro, o discurso será moral ou democrático - o
jurídico refere-se naturalmente ao democrático-,783 ao passo que para o segundo, será
moral ou jurídico, sendo este um caso especial daquele. Em Habermas, o discurso
ocorre para a formação da norma, sendo seu enfoque eminentemente democrático, ao
passo que em Alexy o discurso se dá na fundamentação de uma decisão judicial a ser
justificada e criticada num discurso racional.784 Para Habermas, somente se pode falar
em Discursos efetivos, reais, ao passo que Alexy admite como discursos, operações
mentais levadas a cabo pelo aplicador do direito. A divergência fundamental entre
ambos, esclarece Marina Velasco, se dá “a respeito de como devem ser adequadamente
conceitualizados princípios jurídicos.”785 Para Alexy estes são conceitualizados como
mandamentos de otimização, com estrutura teleológica, e aplicados mediante juízos de
ponderação, com auxílio da regra da proporcionalidade, conforme demonstrado no
capítulo anterior. Habermas, diferentemente, tem a concepção deontológica dos
princípios jurídicos,786 tomando-os como normas que exprimem obrigações, aplicáveis
pelo critério da adequação – por influência de Klaus Günther –, que trata de “encontrar,
entre as normas aplicáveis prima facie, aquela que melhor se ajusta à situação de
aplicação descrita de forma mais exaustiva possível sob todos os pontos de vista
relevantes”.787
de operaciones llevadas a cabo por los juristas profesionales y que no tienen estrictamente (o non sólo)
un carácter argumentativo”. Ibid., p. 70.
783
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 294.
784
ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 554.
785
VELASCO, Marina. “Habermas, Alexy e a razão prática kantiana.” In: SIEBENEICHLER, Flávio
Beno (Org.). Direito, moral, política e religião nas sociedades pluralistas: entre Apel e Habermas. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2006, p. 17.
786
Habermas, na esteira de Dworkin, distingue princípios e regras de objetivos (policies), traçados em leis
finalísticas, e onde predominam os discursos pragmáticos - escolhas de tecnologias e estratégias de ação
para alcance de fins estabelecidos previamente. Günther refere-se - criticamente - à postura de Alexy, que
não diferencia princípios de políticas públicas: “Ao proceder à ponderação, os critérios para a avaliação
do grau de importância dos valores em colisão resultem da respectiva ordem hierárquica existente. O que
isso significa poderá esclarecido pela desistência, sugerida por Alexy, de distinção entre princípios e
alvos políticos estabelecidos, que Dworkin havia introduzido. É verdade que, assim, acerta-se o estado
factual da jurisprudência constitucional, mas também, simultaneamente, adota-se, em seu lugar, a mistura
de princípios imperativos e imperativos funcionais, que caracteriza o sistema administrativo ou
econômico.” GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e
aplicação. Trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 322.
787
VELASCO, Marina. “Habermas, Alexy e a razão prática kantiana.” In: SIEBENEICHLER, Flávio
Beno (Org.). Direito, moral, política e religião nas sociedades pluralistas: entre Apel e Habermas. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2006, p. 31. Para maior clareza do texto, as divergências de Habermas à
teoria de Alexy, objeto do capítulo III, foram postas em notas explicativas, no rodapé das páginas. Neste
capítulo IV, as divergências de Alexy à teoria de Habermas serão, preferencialmente, também por razões
de clareza, postas como notas explicativas.
Este capítulo se ocupará da Teoria Discursiva do Direito e da Democracia
Deliberativa de Habermas, trazendo as contribuições mais relevantes de um de seus
autores mais eminentes, colacionando seus principais postulados aplicáveis ao cerne
desta tese: a produção democrática, através de consulta popular ou de audiência pública,
e normativamente correta de atos administrativos gerais e abstratos (resoluções) por
agências reguladoras. Para tanto, as linhas gerais da teoria de Habermas serão expostas,
enriquecidas por críticas, tomando como ponto de partida os conhecimentos delineados
nos capítulos anteriores.788
788
A presente tese baseia-se em concepções sociológicas, políticas, econômicas, filosóficas e jurídicas
que ensejaram o reconhecimento da Teoria Discursiva do Direito, e de sua correlata Democracia
Deliberativa, como respostas possíveis à normatização no atual estágio da sociedade – de Modernidade
Reflexiva. Muito do que Habermas põe como pilares de sua construção teórica foi tratado, amiúde, nos
capítulos anteriores. Em razão disto, o presente capítulo tende a se restringir à sua contribuição para a
construção da Democracia Deliberativa, servindo-se, na medida do necessário, dos alicerces de sua teoria
jurídica, e da contraposição de teorias conflitantes.
789
Habermas em obra mais recente (original de 1999), acrescenta à sua teoria da racionalidade o elemento
“reflexão”, ressaltando que “a estrutura discursiva cria uma correlação entre as estruturas ramificadas de
racionalidade do saber, do agir e da fala ao, de certo modo, concatenar as raízes proposicionais,
teleológicas e comunicativas.” Ressalta Habermas que: “Nesse modelo de estruturas nucleares
engrenadas umas nas outras, a racionalidade discursiva deve seu privilégio não a uma operação
fundadora, mas a uma operação integradora.” HABERMAS, Jürgen. Verdade e justificação. Tradução:
Milton Camargo Mota. Rio de Janeiro: edições Loyola, 2004, p. 101. A racionalidade comunicativa é o
elemento preponderante na racionalidade discursiva do agir comunicativo forte.
790
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 21.
791
Conforme explicitado linhas atrás, heurística é a capacidade de um sistema fazer inovações positivas
para um determinado fim, para descobrir algo, ou resolver determinado problema.
792
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 21.
Observa Habermas que a teoria da política e do direito, arrastadas para cá e
para lá, entre facticidade793 e validade, decompõem-se em facções que nada têm a ver
uma com a outra. A tensão entre validade – “princípios normativistas que correm o risco
de perder o contato com a realidade social” – e facticidade – “princípios objetivistas,
que deixam fora de foco qualquer aspecto normativo” - serve de advertência para que se
mantenha aberto a:
793
Facticidade é “o que caracteriza a existência como lançada no mundo, ou seja, à mercê dos fatos, ou
no nível dos fatos e entregue ao determinismo dos fatos.” ABBAGNANO, Nicola. Trad. Alfredo Bossi.
Dicionário de filosofia. 4. ed. Martins Fontes: São Paulo, 2003, p. 423.
794
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 23.
795
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 24. Embora a teoria discursiva seja
procedimental, não é puramente procedimental. É também seletiva: é o conteúdo que determinará a
necessidade de um procedimento argumentativo. Os conteúdos serão processados no Discurso. Esclarece
Habermas: “Nas consultas sobre leis e políticas, a questão fundamental: ‘o que devemos fazer?’ modifica-
se conforme o tipo da matéria a ser regulamentada.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre
facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2003, p. 200..
796
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 25.
797
A palavra é utilizada em seu sentido terminológico. Medium, no campo dos estudos da linguagem,
significa meio para a transmissão de uma mensagem; seu plural é media. A tradução para o inglês fornece
mais subsídios à compreensão de seu significado: means by which something is accomplished; means of
expression; e, especialmente, channel of communication.
798
A Teoria do Agir Comunicativo pauta-se pela noção de condição de validade, atendida apenas com a
satisfação das pretensões de verdade, sinceridade e correção normativa.
instituições fortes,799 transfere ao direito produzido democraticamente800 um papel
central na integração social.801 A saída apontada pelo autor à sobrecarga da moral802
como meio de integração social é a “regulamentação normativa de interações
estratégicas”803 sobre as quais os atores se entendem, como forma de unir facticidade a
validade.
799
O individualismo institucionalizado foi tematizado no capítulo II desta tese.
800
Numa democracia radical. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade,
Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 13.
801
Em razão da fundamental posição da democracia em sua teoria do direito, é central em sua obra o
capítulo VII – Política Deliberativa: um conceito procedimental de Democracia - constante em Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 09-56.
802
A relação entre moral e direito é fundamental para a compreensão da Teoria Discursiva do Direito de
Habermas, e será exposta ainda neste capítulo.
803
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 46.
804
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 47.
805
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 47.
806
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 47. Aponta Habermas os direitos
subjetivos privados, talhados para busca estratégica de interesses privados, como o núcleo do direito
moderno.
807
Neste capítulo, norma jurídica.
conseguir impor-se.808 Conclui o autor – essencial à compreensão da tese que se
apresenta – que o direito, por referir-se tanto a facticidade (validez social, fática) quanto
a legitimidade (pretensão ao reconhecimento normativo) “permite aos membros da
comunidade jurídica escolherem entre dois enfoques distintos em relação à mesma
norma: objetivador ou performativo.”809 Para o primeiro (orientado pelo sucesso), a
norma é um empecilho em razão da expectativa de sanção em hipótese de transgressão,
ela limita externamente seu espaço de opções; para o segundo, a norma “amarra sua
‘vontade livre’ através de uma pretensão de validade deontológica”,810 situando-se “no
nível de expectativas obrigatórias de comportamento, em relação às quais se supõe um
acordo racionalmente motivado entre parceiros jurídicos.”811 Não há, entretanto - em
razão do direito subjetivo à assunção estratégica de interesses próprios812 -, como
compelir o cidadão a pautar-se por um agir comunicativo.
815
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 53.
816
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 09.
817
Acerca da política de inclusão feminista, com seus aspectos de liberdade de ação e de autonomia, é
bastante clara a seguinte passagem de Habermas, constante em A inclusão do outro: estudos de teoria
política: “Em lugar da controvérsia sobre ser melhor assegurar a autonomia das pessoas do direito por
meio de liberdades subjetivas para haver concorrência entre indivíduos em particular, ou então mediante
reivindicações de benefícios outorgadas a clientes da burocracia de um Estado de bem-estar social, surge
agora uma concepção jurídica procedimentalista, segundo a qual o processo democrático precisa
assegurar ao mesmo tempo a autonomia privada e a pública: os direitos subjetivos, cuja tarefa é garantir
às mulheres um delineamento autônomo e privado para suas próprias vidas, não podem ser formulados de
modo adequado sem que os próprios envolvidos articulem e fundamentem os aspectos considerados
relevantes para o tratamento igual ou desigual em casos típicos. Só se pode assegurar a autonomia privada
de cidadãos em igualdade de direito quando isso se dá em conjunto com a intensificação de sua
autonomia civil no âmbito do Estado.” HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro: estudos de teoria
política. 2. ed. Tradução: George Sperber et alli. São Paulo: Edições Loyola, 2004, p. 305.
818
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 54. Esclarece Habermas: “Não há
nada mais improvável aos olhos de um sociólogo esclarecido do que as realizações de integração do
direito moderno virem a se alimentar somente ou, em primeira linha, de um acordo normativo já pronto
ou conseguido em fontes da solidariedade.” Ibid., p. 55.
importa preservar é, antes de tudo, a solidariedade social, em vias de degradação, e as
fontes do equilíbrio da natureza, em vias de esgotamento.”819
819
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 189.
820
Leciona Habermas: “O direito positivo serve naturalmente à redução da complexidade social.”
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol.I I. 2. ed. Tradução: Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 55.
821
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 59.
822
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 52.
823
Na linha da Ética do Discurso, em razão da seletividade, é a quebra do equilíbrio normativo que
ensejará a tematização de determinado assunto - a necessidade de um procedimento argumentativo.
824
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 60. Esclarece Habermas que a
formação política da vontade, através de decisões e de leis, será formulada na linguagem do direito. Tal
fato implica no controle das normas produzidas “quando se examina a possibilidade de os novos
programas se encaixarem no sistema jurídico vigente. O legislador político só pode utilizar suas
autorizações de normatização jurídica para a fundamentação de programas de leis compatíveis com o
sistema de direitos e acopláveis ao corpus das leis vigentes. Sob esse aspecto jurídico todas as resoluções
têm que ser submetidas a um exame de coerência.” No Estado de direito - constitucional - estas normas
deverão estar conformes à Constituição, e sujeitas a um controle de compatibilidade por um Tribunal
Constitucional. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed.
Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 210.
825
O alter ego da positividade é sua modificabilidade; e aí repousa o princípio democrático.
(pretensão de aceitabilidade racional).826 Se a positividade é construída com base em
decisões arbitrárias, corre-se o risco de perder seu poder de integração social: a força do
direito é extraída da aliança entre positividade (aceitação) e pretensão de legitimidade
(aceitabilidade). A positividade se serve da facticidade, através da coerção do direito; e
a pretensão de legitimidade atrela-se à aceitabilidade, servindo-se da noção de
autolegislação. Com a união destes elementos – e da modificabilidade das escolhas
democráticas827 -, resgata-se a pretensão de legitimidade das próprias regras, o que as
torna racionalmente aceitáveis.828 O poder político, institucionalizado juridicamente,
impõe politicamente este direito legitimamente produzido.
826
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 60.
827
Em Alexy a tensão entre positividade e modificabilidade é compreendida pela solução do impasse
entre legislação e constitucionalismo. Como se demonstrou, Alexy opera o conceito de
constitucionalismo moderado, conferindo em alguns temas prioridade à Constituição, e em outros temas,
prevalência ao princípio democrático, exercitado pelo legislador infraconstitucional. Habermas não
propõe um modelo de constitucionalismo, mas deixa entrever, pela radical faceta democrática de sua
teoria, que seu constitucionalismo é mais fraco que o defendido por Alexy. Refere-se Habermas à
concepção de Peter Häberle (HÄBERLE Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos
intérpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e “procedimental” da
Constituição. Tradução: Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre. Sergio Fabris Editor, 2002), com seu
ideal político de uma “sociedade aberta dos intérpretes da constituição”, contrapondo-a à figura do Juiz
Hércules de Dworkin, apoiada no ideal da personalidade de um juiz que se distingue pela virtude e pelo
acesso privilegiado à verdade. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade,
Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 277-278).
Habermas identifica na teoria de Häberle linhas do pensamento republicano em sua comunidade de
intérpretes da constituição, uma esfera pública jurídica politizada e crítica (Ibid., p. 347). Aponta o autor
que a teoria de Häberle tem o mérito de chamar a atenção para o nexo interno entre autonomia privada e
pública, mas falha ao sobrecarregar o direito processual (constitucional), “transformando-o no substituto
de uma teoria democrática.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade,
Vol. II. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 150. A
Constituição, para Habermas, é “a instituição de um processo de aprendizagem falível, através do qual
uma sociedade vence, passo a passo, sua natural incapacidade para uma autotematização
normativa.” (Ibid., p. 189) Ressalta o autor que a Constituição, um “projeto de realização do direito”, não
pode ser meramente formal. Importante para esta compreensão a concepção e a relevância dos direitos
fundamentais na teoria de Habermas, a ser tratada ainda neste capítulo.
828
Observa Habermas que a tensão entre facticidade e validade, no âmbito da jurisdição, poder ser
identificado pela “tensão entre o princípio da segurança jurídica e a pretensão de tomar decisões
corretas.” A questão central de que se ocupa a teoria geral do direito, em suas variadas vertentes, é como
garantir simultaneamente segurança jurídica - no sentido de previsibilidade - e correção - no sentido de
justiça. Três caminhos são identificados por Habermas: o da hermenêutica histórica de Gadamer, que
parte de uma pré-compreensão valorativa que estabelece uma relação entre norma e estado de coisas,
inserindo a razão no complexo histórico da tradição; o do realismo jurídico, que, como será explicado
mais adiante, rejeita existência de uma lógica do direito, tomando a decisão jurídica como o resultado de
interesses, enfoques políticos e estruturas da personalidade dos julgadores, anulando a função de
estabilização do direito; o do positivismo jurídico, que, como já explicado nesta tese, ocupado com a
função estabilização do direito, não vincula a legitimidade de decisões jurídicas às tradições éticas. Como
opção a estas teorias, apresenta Habermas sua Teoria Discursiva do Direito, derivada da Ética do
Discurso, com a especificidade dos discursos jurídicos, de aplicação imparcial do direito,
institucionalizados conforme o direito. O tema será retomado. HABERMAS, Jürgen. Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 2003, pp. 245-251.
Além do direito, com suas normas de processos de entendimento, outros
dois meios de integração829 são identificados por Habermas: o dinheiro (poder
econômico) e o poder administrativo (administração pública). Ambos coordenam as
ações de forma objetiva, “como que por trás das costas dos participantes da interação,
portanto não necessariamente através da consciência intencional ou comunicativa.”830 O
direito, observa o autor, está ligado às outras duas fontes de integração:
829
Em Luhmann, como adiante se demonstrará, a economia (ter/não ter dinheiro) e o poder político
(poder/não poder) são subsistemas integrantes do sistema fundamental social, e não meios de integração
social.
830
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 61. Refere-se o autor à mão
invisível do mercado, em Adam Smith.
831
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 62. O mundo da vida é composto
pela interligação de cultura, sociedade e estruturas da personalidade através de uma linguagem
multifuncional. A noção de mundo da vida, integrado, opõe-se à diferenciação de sistemas proposta por
Luhmann, como adiante se demonstrará. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e
validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p.
81.
832
O tema será retomado.
833
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 62.
834
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 62. É exemplo desta imposição a
pressão política das demais forças integradoras no direito, em defesa de determinados interesses – lobby
–, seja através da interação legítima dos atores sociais, seja através da interação criminosa e corruptora
para a obtenção de vantagens ilícitas.
autoprogramação do Estado (poder administrativo) ou ao poder econômico (dinheiro),
tampouco se esta atrelação produz “a necessária lealdade das massas.”835
uma mera ficção. Fernando M. Toller e Gustavo D. Martínez Urrutibèhéty apontam Jerome Frank
(1889-1957) como um dos mais destacados representantes do legal realism norte-americano, “cuyo
núcleo doctrinal es que el Derecho es lo que los jueces crean en sus decisiones, que en tal creación están
menos ligados a derivaciones silogísticas a partir de normas jurídicas que a sus intuiciones políticas e
morales, y que es central la tarea jurídica el predecir la conducta judicial futura. La principal
contribución de Frank a esta corriente es la introdución de la perspectiva psicológica y el desarrollo del
escepticismo fáctico, que conduce a reconocer la falta de certezas en el proceso judicial.” Para Frank –
tese fundamental de sua Law and the modern mind, 1930 – a decisão judicial deve ser abordada a partir
de uma perspectiva psicológica, uma vez que o julgador concorre com uma soma incindível de fatores
que nutrem a decisão final. Este elemento psicológico demonstra o quanto é mítica e irreal a consideração
do direito como algo certo, claro e indubitável, descoberto mediante um processo lógico de subsunção. A
sentença, para Frank, diferentemente do que sustenta a formulação tradicional, não deriva da aplicação de
uma norma a um caso concreto (Norma x Fatos = Sentença), mas sim do resultado de estímulos aplicados
à personalidade (elementos psíquicos) do julgador (Estímulo x Personalidade = Sentença). Neste
arcabouço, os estímulos significam as forças sociais, dentre as quais, as normas jurídicas, TOLLER,
Fernando M.; URRUTIBÈHÉTY, Gustavo D. Martínez. “Jerome Frank”. In: DOMINGO, Rafael. (org)
Juristas universales, vol. 4 – juristas del siglo XX. Barcelona: Marcial Pons, 2004, pp. 191-194. Ao legal
realism a filosofia do direito opõe o legal idealism. Aponta Tony Ward, como as duas maiores escolas do
legal idealism, a denominada Sheffield School, capitaneada por Alan Gewirth, e Teoria Discursiva do
Direito, de Alexy e de Habermas – embora reconheça diferenças marcantes entre estes. WARD, Tony.
“Two school of legal idealism”. In: Ratio Juris, vol. 19, n.º 2, junho de 2006, pp. 127-140. Para uma
escola do direito – uma teoria jurídica - ser considerada idealista, pontua Ward, deve sustentar, num nível
conceitual, uma necessária conexão entre direto (law) e moralidade. A validade do direito depende de seu
mérito moral. Ibid., pp. 128-129. Uma faceta do realismo jurídico - sentença cuja motivação apenas
aparentemente justifica uma decisão tomada de antemão pelo Juiz – pode ser encontrada facilmente nos
processos em que se julgam crimes dolosos contra a vida perante o Tribunal do Júri. Ainda que no
Tribunal do Júri as decisões não estejam, em regra, adstritas a motivação, em termos semelhantes às
demais sentenças de natureza criminal, haja vista a decisão acerca da existência de crime (autoria,
materialidade, tipicidade, ilicitude e culpabilidade) ser tomada pelo Conselho de Sentença – composto por
sete jurados que votam secretamente sim/não – sem o dever ou mesmo a possibilidade de fundamentar os
votos proferidos na Sessão, o Juiz deverá fundamentar os parâmetros utilizados para a fixação da pena –
tanto a pena-base (art. 59 do Código Penal) quanto as causas de aumento e de diminuição da pena
(distribuídas pela parte geral e especial do Código Penal), agravantes e atenuantes (arts. 61 a 67 do
Código Penal), quando não estabelecidas em índices únicos (v.g., causa de aumento que, reconhecida
pelos jurados, determina a duplicação da pena-base - art. 122, parágrafo único, Código Penal). Desta
forma, o Juiz deverá fundamentar por que fixou a pena-base, em algo entre seis e vinte anos (v.g., art.
121, caput) bem ainda o porquê da fixação de causa de diminuição em um percentual entre um sexto a um
terço (v.g., art. 121, § 1.º). Na sistemática recursal do Código de Processo Penal, há a previsão de uma
espécie de recurso denominada “protesto por novo júri” (art. 607 do Código de Processo Penal), privativo
da defesa, cabível sempre que a pena imposta na condenação imposta pelo Tribunal do Júri for igual ou
superior a vinte anos. Ocorre com grande freqüência na prática forense, a condenação por homicídio
qualificado - cuja pena-base pode ser fixada entre doze e trinta anos e agravada por circunstâncias legais
estabelecidas no art. 61 do Código Penal – a penas de dezenove anos e seis meses, ou ainda, dezenove
anos e onze meses. Tais sentenças partem do fim para o começo: em razão da gravidade do crime, que é
hediondo, mas para não gerar o direito a um recurso que invalide a decisão do Tribunal do Júri,
estabelece-se a sentença – o número de anos e meses da condenação – e posteriormente, trata-se de dar
legitimidade a legalidade,839 pressuposta nos sistemas de direito da atualidade. 840 Esta
postura de Habermas é identificada já em A crise de legitimação no capitalismo tardio,
publicado originalmente em 1973, em que assevera que “só a forma legal técnica, a pura
legalidade, não são aptas a garantir o reconhecimento, a longo prazo, se o sistema de
autoridade não puder se legitimar independentemente da forma legal de exercer
autoridade.”841 Aponta que a sociologia jurídica – de Max Weber 842 e Talcott Parsons,843
dentre outros - identifica, na passagem das sociedades tribais para a das grandes
culturas, uma evolução caracterizada por uma forma de organização do Estado em que
“o direito e o poder político formam uma síntese digna de consideração.”844 Nesta
síntese, o Estado torna possível a institucionalização de processos jurisdicionais e de
imposição de direito, e, por seu turno, o Estado constitui-se “na figura de uma
hierarquia de cargos e funções” legitimando-se através da forma jurídica do exercício
uma aparência de motivação à pena fixada, de antemão, pelo Juiz. O “protesto por novo júri”, por
estabelecer, na prática, um teto para as condenações do Tribunal do Júri, está em vias de extinção através
de diversos projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional. A Câmara dos Deputados aprovou, em
março de 2007, o Projeto de Lei n.º 4.203/01, ainda sujeito a aprovação pela Senado Federal. Esta
reforma – como esclarece Luiz Flávio Gomes, “retira do sistema recursal pátrio o protesto por novo júri,
recurso que era privativo da defesa, cujo cabimento se restringia às hipóteses de condenação a uma pena
igual ou superior a vinte anos. Trata-se de uma postura a ser aplaudida, vez que para evitar a interposição
desse recurso, muitas vezes os juízes fixam a pena abaixo desse quantum, mesmo quando evidente que o
indivíduo é merecedor de uma sanção superior.” GOMES, Luiz Flávio. Um novo procedimento para o
Júri. Disponível em: http://www.lfg.blog.br, com acesso em 11/04/2007.
839
MAIA, Antônio Cavalcanti. “Direitos humanos e a teoria do discurso do direito e da democracia.” In:
Albuquerque Mello, Celso; Torres, Ricardo Lobo (Orgs.). Arquivos de direitos humanos. Vol. II. Rio de
Janeiro: Renovar. 2000, p. 11.
840
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 82.
841
HABERMAS, Jürgen. A crise de legitimação no capitalismo tardio. Tradução: Vamirch Chacon. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1980, p. 128.
842
Observa Habermas que na concepção do direito de Weber, em sua sociologia da dominação, as bases
de sua validade são postas de forma cética quanto a valores, e sustenta nas funções que o direito preenche
para a organização e o exercício da dominação legal. O direito moderno “entra a tal ponto num nexo
funcional com a dominação burocrática da instituição estatal racional, que a função racionalmente
integradora, própria do direito, não é levada em conta.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia:
entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2003, p. 102. O sistema de dominação burocrático de Max Weber foi delineado em pelo autor
em: WEBER, Max. Economia e sociedade, v. 1. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1991.
843
Em Parsons o direito moderno juridifica o poder político, “que se realiza sob as limitações estruturais
dos fundamentos racionais da validade do direito moderno, ancorado na sociedade civil, na esfera pública
política e no status de cidadãos.” A moral e o direito funcionam como uma garantia para a realização da
integração social de todas as demais ordens institucionais: “O direito é uma ordem legítima que se tornou
reflexiva com relação ao processo de institucionalização”, e forma o núcleo de um sistema de
comunidade que é a estrutura nuclear da sociedade. A proposta de Parsons difere da de Weber em razão
de uma “evolução social do direito sob o aspecto de sua função própria, da garantia da solidariedade
social, não sob o aspecto da contribuição trazida para a forma de dominação.” HABERMAS, Jürgen.
Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 102-103.
844
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 103.
administrativo do poder.845 Desta forma, pontua Habermas, “o direito sancionado
através do Estado e o poder político exercido conforme o direito promovem-se
mutuamente.”846 Neste nível, formam-se os elementos do sistema de direito:847
845
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 103.
846
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 103.
847
Para Weber, o direito estatal assume feições de um sistema de direito, sendo este parte de um sistema
político. Menos plausível “o passo que Luhmann dá a seguir e que consiste em desmembrar novamente o
direito da política transformando-o num subsistema próprio, independente, ao lado da administração, da
economia, da família, etc.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade,
Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 104.
848
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 103-104. São normas jurídicas
secundárias “as normas de competência, que revestem as instituições do Estado com autorizações, como
também de formas de organização, que determinam procedimentos segundo os quais se criam programas
de leis que são elaboradas na administração ou na justiça.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia:
entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2003, p. 183.
849
As características da Modernidade (Primeira e Segunda) foram expostas no capítulo II desta tese.
Como características básicas da Primeira Modernidade, com suas categorizações sociais: a) sociedades do
Estado nacional; b) sociedades grupais coletivas; c) distinção entre sociedade e natureza, como fonte
inesgotável de recursos; d) e sociedades do trabalho ou do pleno emprego, fruto da dinâmica industrial.
850
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 104.
de direito; e terceiro, através da universalização do status de cidadão,851 juridificando,
potencialmente, todas as relações sociais.852 Neste ponto, esclarece Habermas:
851
Habermas trabalha com a seqüência de aquisição de direitos da concepção da cidadania – com
elementos civil, político e social - proposta por T.H.Marshall. MARSHALL, T. H. Cidadania, classe
social e status. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1967. Leciona Habermas que Marshall defende a tese que
a seqüência - civil, político e social – tornou “possível assegurar e ampliar sucessivamente o status da
cidadãos nas sociedades ocidentais nos últimos dois ou três séculos.” HABERMAS, Jürgen. Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 107.
852
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 104-105.
853
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 105.
854
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 108. A participação popular, além
de promover a legitimidade, é um instrumento para implantar a transparência administrativa. O tema será
retomado.
855
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 105
856
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 108.
857
SIEBENEICHLER, Flávio Beno. “O direito das sociedades pluralistas.” In: SIEBENEICHLER, Flávio
Beno (Org.). Direito, moral, política e religião nas sociedades pluralistas: entre Apel e Habermas. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2006, p. 55.
validade e a legitimidade do direito se lançarmos mão do princípio da razão
comunicativa – procedimental.”858
863
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 111.
864
Conforme já demonstrado, a teoria de Habermas opõe-se diametralmente ao isolamento do direito
como um sistema periférico – dentre outros sistemas fechados – de integração social.
865
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 112.
866
Símbolo em razão de ser um signo convencional, não natural.
867
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 112.
868
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 112.
869
Além do mundo da vida, de onde extrai a força integradora da solidariedade social, recebe influxos do
poder econômico e do poder administrativo, como tratado linhas acima.
dinheiro.”870 Nesta medida, o direito opera como um transformador da relação entre os
sistemas de integração (direito, poder econômico e poder administrativo), o que não
acontece com a moral, limitada que está à esfera do mundo da vida.
870
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 112.
871
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 113.
872
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 114. Três concepções de direito
subjetivo são apresentadas por Habermas: direito subjetivo como vontade (Windscheid); direito subjetivo
como proveito (Ihering); e finalmente direito subjetivo como interesse juridicamente protegido somado à
liberdade de arbítrio (Kelsen). Na teoria deste autor há o desengate do conceito do direito do conceito da
moral, sendo as decisões metódicas do direito que estabelecem o que é ou não direito subjetivo.
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 116-119.
873
Este paradoxo reflete-se na relação entre os direitos fundamentais (legalmente estabelecidos) e a
soberania popular (princípio formal democrático). Aponta Habermas que estas idéias “determinam até
hoje a autocompreensão normativa de Estados de direito democráticos” (HABERMAS, Jürgen. Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 128). Mais ainda: “Os direitos humanos e o princípio da soberania do
povo forma as idéias em cuja luz ainda é possível justificar o direito moderno”. Ibid., p. 133.
O autor identifica a existência de tal paradoxo por dois motivos. Primeiro,
em razão da idêntica estrutura dos direitos de cidadania (políticos, de autonomia) e de
todos os demais direitos subjetivos (civis, de liberdade) que “abrem ao indivíduo esferas
de liberdade de arbítrio”, sustentando que “os direitos políticos também devem poder
ser interpretados como liberdades de ação subjetivas, as quais simplesmente fazem do
comportamento legal um dever”.874 Segundo, porque o processo legislativo democrático
deve se pautar pelas expectativas do bem da comunidade, que por sua vez extrai sua
força legitimadora de um processo de entendimento dos cidadãos sobre sua
convivência.875 A legitimidade dos direitos subjetivos (direitos fundamentais, na
terminologia de Alexy) se esgota na legalidade de uma dominação política, interpretada
em moldes positivistas: “Não se conseguiu esclarecer de onde o direito positivo obtêm
sua legitimidade.”876 A fonte de legitimidade, situada no processo democrático de
legislação, apela para o princípio da soberania popular, que é introduzido, preso que
está à legalidade positivista, sem a preservação do “conteúdo moral independente dos
direitos subjetivos - a proteção da liberdade individual”.877 Do mesmo modo, as
qualidades “lógico-semânticas” das leis gerais – “forma gramatical de mandamentos
universais” – nada dizem sobre a validade das leis.878
Para Habermas – que a partir desta constatação constrói sua teoria do direito
- “o visado nexo interno entre soberania do povo e direitos humanos reside no conteúdo
normativo de um modo de exercício da autonomia política, que é assegurado através da
formação discursiva da opinião e da vontade”.879 Esta formação “só se estabelecerá, se o
874
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 114. É corrente a classificação dos
direitos humanos – tomados muitas vezes como sinônimos de direitos fundamentais, estes efetivamente
previstos em determinada Constituição - em gerações: A primeira geração dos direitos humanos – direitos
de liberdade - engloba os direitos civis e políticos; a segunda geração – direitos de igualdade – assegura a
obtenção de prestações que reduzam a desigualdade social; a terceira geração – de fraternidade ou
solidariedade – relaciona-se aos direitos difusos, coletivos por excelência. Mais recentemente a doutrina
brasileira tem apontado o surgimento dos direitos humanos de quarta geração, referentes à
institucionalização de procedimentos de democracia direta, de direito amplo de informação, e do
pluralismo: “Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima
universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência.”
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 571.
875
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 115.
876
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 122.
877
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 122.
878
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 122.
879
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 137. A teoria democrática de
sistema dos direitos apresentar as condições exatas sob as quais as formas de
comunicação – necessárias para uma legislação política autônoma – podem ser
institucionalizadas juridicamente.”880 Neste modelo, a autonomia privada não pode ser
sobreposta nem subordinada à autonomia política. Esta co-originalidade – os
destinatários são simultaneamente os autores de seus direitos – que identifica a
autolegislação pode ser explicada desta forma pela Teoria do Discurso: “A substância
dos direitos humanos insere-se, então, nas condições formais para a institucionalização
jurídica deste tipo de formação discursiva da opinião e da vontade, na qual a soberania
do povo assume figura jurídica.”881
ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 145. Reconhecendo
esta complementaridade, aponta outra característica: “Normas jurídicas não se encontram no mesmo nível
de abstração que as normas morais.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e
validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p.
193. Na introdução de Direito e democracia: entre facticidade e validade, Habermas anuncia esta sua
perspectiva da relação entre moral e direito, diferente da sustentada na Tanner Lecture proferida em 1986,
em que se baseava numa concepção “por demais normativista” de Karl Otto Apel (Ibid., p. 10). Nesta
palestra, transcrita e apensada ao segundo volume da edição brasileira de Direito e democracia: entre
facticidade e validade, Habermas sustentava: “Quanto mais a moral se interioriza e se torna autônoma,
tanto mais ela se retrai para os domínios privados. Por isso, em todos os domínios de ação onde conflitos,
problemas e matérias sociais em geral exigem uma regulação coercitiva, as normas de direito têm que
absorver as inseguranças que surgiriam, caso ficassem entregues a uma regulação do comportamento
puramente moral.” HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2.
ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 217. As Tanner
Lectures, por sua relevância, são postas como apêndices da edição brasileira, e foram proferidas no
decorrer do ano de 1986, bem anteriores à publicação original de Direito e democracia: entre facticidade
e validade – em 1992. Luiz Moreira, na introdução à edição brasileira da Teoria da argumentação no
direito e na moral: justificação e aplicação de Klaus Günther, identifica esta nova postura de Habermas,
contraposta à do autor da obra prefaciada, que retira a racionalidade de normas jurídicas das normas
morais. Embora Günther e Habermas tenham participado do grupo de pesquisa que culminou com a
publicação de Direito e democracia: entre facticidade e validade, não há uma estreita correspondência
entre as teses dos autores. GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral:
justificação e aplicação. Trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 11. Aponta Habermas que
Günther considera, em moldes semelhantes a Alexy, o discurso jurídico como um caso especial de
discursos moral - mais precisamente, em Günther, “um caso especial do discurso de aplicação moral.”
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 289. A contribuição de Günther à Teoria
Discursiva do Direito será exposta neste capítulo.
883
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 171.
884
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 142.
885
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 142. Cabe a explicitação dos
elementos da definição: “válidas”, o predicado de ações, expressa o sentido de validade normativa – na
linha da Teoria do Agir Comunicativo; “normas de ação”, referem-se às “expectativas de comportamento
generalizadas temporal, social e objetivamente”; “atingido” é “todo aquele cujos interesses serão afetados
pelas prováveis conseqüências provocadas pela regulamentação de uma prática geral através de normas”;
“discurso racional” é “toda a tentativa de entendimento sob pretensões de validade problemáticas, na
medida em que ele se realiza sob condições da comunicação que permitem o movimento livre de temas e
Habermas introduz a especificação do Princípio do Discurso em razão de
seu campo de atuação: Princípio do Discurso como princípio moral, e Princípio do
Discurso como Princípio Democrático. O princípio moral do Discurso - ou
simplesmente, princípio moral - “resulta de uma especificação do princípio geral do
discurso para normas de ação que só podem ser justificadas sob o ponto de vista da
consideração simétrica dos interesses.”886 O princípio democrático do Discurso – ou
simplesmente princípio da democracia – “resulta de uma especificação correspondente
para tais normas de ação que surgem na forma do direito e que podem ser justificadas
com o auxílio de argumentos pragmáticos, ético-políticos e morais – e não apenas com
o auxílio de argumentos morais.”887 Os tipos de argumentos empregados nos discursos
dependem da “lógica do respectivo questionamento.”888
894
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 154.
895
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 155.
896
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 155.
897
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 156. O conceito de liberdade
comunicativa se serve dos conceitos da teoria do agir comunicativo no sentido forte.
898
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 156.
899
Acerca da relação entre o público e o privado, o corte de análise “Republicanismo” constante da obra
Laboratório de análise jurisprudencial: os direitos à intimidade e à vida privada pelo Supremo Tribunal
Federal. CAMARGO, Margarida et. alli. Renovar, prelo.
900
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 156.
O princípio do direito de Kant - derivado de seu imperativo categórico901 -
carrega o peso da legitimação ao dispor que: “É justa toda a ação que por si, ou por sua
máxima, não constitui um obstáculo à conformidade da liberdade de arbítrio de todos
com a liberdade de cada um segundo leis universais.” 902 Para Habermas o núcleo deste
princípio consiste na previsão de iguais liberdades subjetivas: “A liberdade de cada um
deve poder conviver com a igual (gleiche) liberdade de todos, segundo uma lei geral.”
Aponta o autor que somente assim entra em jogo a pretensão de legitimidade do direito
positivo, negligenciada por determinações formais do direito. O direito, partindo desta
constatação de Kant, só se coaduna com a coerção jurídica que assegure “motivos
racionais para a obediência do direito.”903 Nada impede, entretanto, que os destinatários
do direito se neguem a exercer suas liberdades comunicativas e a tomar posição em
relação à pretensão de legitimidade do direito. Num caso concreto, podem abandonar o
enfoque performativo “trocando-o pelo enfoque de um ator que calcula as vantagens e
que decide arbitrariamente. Normas jurídicas devem poder ser seguidas com
discernimento.”904
901
O imperativo categórico de Kant é assim enunciado pelo autor: “Age segundo uma máxima que possa
ao mesmo tempo ter valor de lei geral.” KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. Tradução: Edson
Bini. São Paulo: Ícone, 1993, p. 39.
902
KANT, Immanuel. Doutrina do direito. 2. ed. Tradução: Edson Bini. São Paulo: Ícone, 1993, p. 46.
903
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 157-158.
904
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 158.
905
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 158.
circular, no qual o código do direito e o mecanismo para a produção do
direito legítimo, portanto o princípio da democracia, se constituem de modo
co-originário.906
906
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 158.
907
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 158-159.
908
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 159-160.
909
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 159.
910
Habermas refere-se à “dupla face de Janus” do direito, que se orienta de um lado para seus
destinatários, e de outro lado, para seus autores. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre
facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2003, p. 167. Janus, na mitologia grega, é deus dos portais e transições, dos inícios e dos fins.
É o deus de face dupla - bifronte - que vê o passado e o futuro, o começo e o final, à frente e atrás...
Janeiro deriva de Janus, significando o mês da abertura, da passagem - o mês do ano consagrado a Janus.
autonomia pública e privada de forma inclusiva.911 Para Habermas, não existe nenhum
direito legítimo sem estes direitos fundamentais.912 Este sistema direitos fundamentais913
assegura tanto a autonomia pública quanto a privada, operacionalizando a tensão entre
facticidade e validade - entre positividade e legitimidade. Aponta Habermas:
925
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 204. Este escalonamento de
questões pode ser visto com clareza na contestação da constitucionalidade da Lei de Biossegurança - Lei
n.º 11.105/2005 por Ação Declaratória de Inconstitucionalidade (ADIn n.º 3526) interposta pelo
Procurador Geral da República especificamente no que atine à permissão, para fins de pesquisa ou
terapia, de utilização de “células-tronco embrionárias”, estabelecida no art. 5.º da referida Lei. Em razão
da presença marcante de questionamentos científicos e éticos, o Ministro Relator Carlos Ayres de Britto
designou a primeira audiência pública da história do Supremo Tribunal Federal, com a participação de
especialistas favoráveis e contrários à permissão legal. O que se vislumbra na questão da Lei de
Biossegurança é um conflito - identificado com maestria por Gadamer e delineado com clareza por
Boaventura de Sousa Santos - entre o know how técnico e o know how ético. Para um grupo de cientistas,
a questão técnica prevalece: estabelecidos os fins - a cura através da terapia com células-tronco -, a
questão passa a ser unicamente teleológica - estabelecer os meios para alcançá-los -, dando espaço
unicamente a questões e argumentos pragmáticos - técnicas e estratégias para o alcance dos fins.
Acontece, entretanto, que os valores que justificam as questões pragmáticas podem ser problematizados -
tratamento dos portadores de necessidades especiais ou o direito à vida dos embriões? Neste passo, os
discursos pragmáticos cedem espaço aos discursos éticos de autocompreensão, para a solução de questões
axiológicas graves (com implicações religiosas, inclusive), que estabelecerão os valores que a
comunidade escolheu para si. O julgamento referido é um caso paradigmático desta passagem de
discursos (pragmáticos e éticos), bem como da necessidade do controle jurídico das normas que
envolvem estas questões.
926
“Argumentos são razões que resgatam sob condições do discurso, uma pretensão de validade levantada
através de atos de fala constatativos e regulativos, movendo racionalmente os participantes da
argumentação a aceitar como válidas proposições normativas ou descritivas.” HABERMAS, Jürgen.
Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 280-281.
927
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 200-201.
928
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 202.
As questões éticas surgem quando os valores929 (as máximas estabelecidas)
orientadores das questões pragmáticas tornam-se problemáticos. Neste passo, a questão
“o que devemos fazer?” ultrapassa o horizonte da racionalidade teleológica. Questões
que pedem “decisões axiológicas graves” envolvem uma autocompreensão coletiva em
que os membros de determinada comunidade necessitam esclarecer a “forma de vida
que estão compartilhando” e os “ideais que orientam seus projetos comuns de vida.” 930
Esclarece Habermas que questões como “quem sou eu? quem desejo ser? que tipo de
vida é bom para mim?” postas no singular repetem-se no plural, dando sentido à
identidade do grupo - surge um “nós” que complementa a autocompreensão do “eu”.931
A apropriação de formas de vida e de tradições determina a identidade do cidadão:
“Decisões axiológicas graves resultam da autocompreensão cultural e política de uma
comunidade histórica e se transformam junto com ela.”932 Nos discursos éticos -
também denominados pelo autor de discursos ético-políticos -, “o horizonte de
orientações axiológicas, no qual se colocam essas tarefas de escolha e de realização de
fins, pode ser introduzido no processo da formação racional da vontade pelo caminho de
um auto-entendimento que se apropria das tradições.”933 Nestes discursos se busca
certificar a configuração de valores que a comunidade realmente deseja para si.
939
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 225.
940
“Discursos de auto-entendimento exigem a convivência reflexiva, corajosa e disposta a prender com as
próprias tradições culturais, formadoras da identidade.” Em discursos ético-políticos, “todos os membros
têm que poder tomar parte no discurso, mesmo que os modos sejam diferentes.” HABERMAS, Jürgen.
Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 227.
941
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 225.
942
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 227-228.
943
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 228. O discurso moral que trata de
uma determinada questão tornada problemática em determinado momento, sujeita os argumentos ao teste
de correção moral. Acerca dos argumentos morais, em discursos jurídicos, esclarece Habermas: “O ponto
de vista moral transcende as fronteiras de qualquer comunidade jurídica concreta, introduzindo uma
distância em relação ao etnocentrismo da vizinhança mais próxima.” HABERMAS, Jürgen. Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 228.
eqüitativa de situações de interesses e de preferências dadas.”944 Propõe, numa linha
oposta ao tradicional modelo agregativo,945 o que denomina de modelo deliberativo, 946
em que:
Se faz valer no poder dos discursos públicos que resultam de esferas públicas
autônomas e procedem democraticamente, tomando forma em resoluções de
corporações legislativas politicamente responsáveis, não se sufoca o
pluralismo das convicções e interesses, o qual é liberado e reconhecido em
compromisso e decisões da maioria. A unidade de uma razão inteiramente
procedimentalizada se recolhe, então na estrutura discursiva de comunicações
públicas.949
944
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 228.
945
A distinção entre o modelo agregativo e o modelo deliberativo de democracia será retomada ainda
neste capítulo.
946
É essencial à compreensão da teoria de Habermas a aplicação do modelo deliberativo ao modelo
jurídico institucionalizado de democracia representativa e de democracia participativa.
947
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 228-229.
948
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 229.
949
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 231-232.
950
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 222.
cruzamento, o universo do direito pode se abrir a argumentos pragmáticos, éticos e
morais sem suspender o jogo da argumentação ou “detonar, de outro lado, o código
jurídico.”951 Tais argumentos, insertos no procedimentos jurídico, estão submetidos, em
razão da institucionalização do procedimento, a uma série de limitações (temporais,
sociais, objetivas): formas de participação no processo, distribuição de papéis, leque
temático (objetos do litígio), e fluxo processual (concatenação de atos e preclusão). Um
aspecto essencial do processo jurídico é ressaltado por Habermas: “A obrigatoriedade
social de um resultado obtido conforme o processo, tomada de empréstimo ao direito,
entra no lugar de uma racionalidade procedimental, apenas imanente, isto é, assegurada
somente através da forma da argumentação.”952 A lógica da argumentação, assegura o
autor, “não é silenciada, e sim, colocada a serviço da produção de decisões que têm
força de lei.”953
951
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 222.
952
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 223. Há, como se observa, um
ponto de contato entre o autor e Alexy, que vislumbra a existência de verdadeiros discursos no âmbito de
processos judiciais. O tema foi tratado no capítulo III desta tese.
953
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 223.
954
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 223.
Em sua Teoria Discursiva do Direito, Habermas se afasta da “tese do Caso
Especial”955 por não aceitar “uma falsa subordinação do direito à moral.”956 Se a moral é
complementar ao direito - como tratado linhas acima - a relação que há entre ambos os
discursos (morais e jurídicos) é unicamente de referência. O discurso jurídico não é um
caso especial de argumentação moral ligada ao direito, limitado ao que é moralmente
vigente. Ao invés disso, os discursos jurídicos de aplicação imparcial do direito são
“referidos naturalmente ao direito gerado democraticamente e institucionalizados
juridicamente, na medida em que não se trata de reflexão da dogmática jurídica.”957 Não
se referem unicamente a normas jurídicas, pois devem “compensar a falibilidade e a
certeza da decisão que resultam do fato de que os pressupostos comunicativos
pretensiosos de discursos racionais só podem ser preenchidos aproximativamente.”958
962
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 292.
963
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 295.
964
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 232-240.
965
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004.
966
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 269.
967
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 371.
Observa Habermas que os discursos de fundamentação, em que “normas e
valores podem encontrar o assentimento racionalmente motivado de todos os atingidos”,
partem da assunção da perspectiva de um “nós” que assume “de modo não-coagido e
não-reduzido, as perspectivas da compreensão do mundo e da autocompreensão de
todos os participantes.”968 Como forma reflexiva do agir comunicativo, caracteriza-se
“através de uma reversibilidade completa de todas as perspectivas dos participantes,
liberando a intersubjetividade mais alta da coletividade deliberativa.969 Esclarece Luiz
Moreira que discursos de fundamentação (ou de justificação) referem-se a critérios de
validade expressos “por meio da universalidade do princípio moral, com a qual se
estabelece um sentido recíproco-universal de imparcialidade”,970 alcançando a norma
produzida um assentimento racional de todos os participantes. Aponta Günther que a
versão fraca do Princípio da Universalização - “U” - pode ser compreendida “como uma
regra de argumentação em discursos de fundamentação, que resgatam a pretensão de
validade de uma norma tendo em vista o interesse comum de todos os afetados, sob
condições de um conhecimento restrito a respeitos de possíveis contextos de
aplicação.”971 Discursos de fundamentação devem, “em disposição hipotética, para além
da situação concreta, generalizar uma norma adequada proposta em consonância com o
estágio do nosso conhecimento.”972 Somente após “olhar para todos os lados,
cautelosamente, é que, então, cada um deverá mergulhar mo caso concreto, aqui e
agora.”973
968
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 284.
969
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 284.
970
Moreira, Luiz. “Introdução” In: GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral:
justificação e aplicação. Trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 16.
971
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 78.
972
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 80.
973
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 80. Neste sentido, a transcrição de Habermas apresentada por
Günther: “A validade, requerida para proposições e normas, transcende espaços e tempos, ‘elimina’
espaço e tempo, mas a pretensão é manifestada aqui e agora, em determinados contextos, e aceita ou
rechaçada com conseqüências fáticas.” HABERMAS, Jürgen. Der philosophische disckurs der moderne
[O discurso filosófico da modernidade]. Frankfurt, 1985, p. 375 apud GÜNTHER, Klaus. Teoria da
argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy,
2004, p. 79.
necessita da dimensão de aplicação.”974 Esclarece Günther que a questão da aplicação de
regras indeterminadas procura explicar “como a segurança de expectativas pode tornar-
se possível sob condições de exigüidade de tempo e de conhecimento incompleto.”975
Aponta o autor que é possível a concepção de um discurso de aplicação que transforme
em procedimento “o sentido aplicativo de imparcialidade” e que tenha como tema “a
adequação de uma norma a uma circunstância, em consideração a todos os sinais
característicos da situação de aplicação.”976 Nesta perspectiva, assevera Günther, a
versão forte do Princípio da Universalização - “U” - pode ser compreendida “de modo a
envolver a adequação de uma norma em uma única situação” obrigando o aplicador a
considerar, em cada situação de aplicação, todos os elementos característicos da norma.
Aponta o autor que “somente dessa forma é que ocorre um entrecruzamento dialético,
entre validade geral e contextos concretos.” Ressalta que: “Discursos de aplicação
combinam a pretensão de validade de uma norma com o contexto determinado, dentro
do qual, em dada situação, uma norma é aplicada.”977
974
Moreira, Luiz. “Introdução” In: GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral:
justificação e aplicação. Trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, pp. 16-17.
975
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 391.
976
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, pp. 78-79.
977
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 79.
978
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 284.
979
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 284-285.
perspectivas das partes em determinado procedimento de discurso de aplicação - é
representada “através de um juiz imparcial.980
980
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 285.
981
A assertiva de Luiz Moreira pode ser encontrada na introdução da obra: GÜNTHER, Klaus. Teoria da
argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad. Cláudio Molz. São Paulo: Landy,
2004, p. 17. Conforme já delineado neste capítulo e no capítulo anterior, a adoção por Habermas dos
discursos de aplicação como uma versão forte de universalização, pautada pela noção de adequação de
normas deontológicas, implica no não acatamento da regra da proporcionalidade aplicada a princípios
(direitos fundamentais), proposta por Alexy. Acerca dos bens coletivos - políticas públicas, policies-
expressas em leis finalísticas, não há qualquer vedação da adoção da regra da proporcionalidade para a
solução de questões pragmáticas.
982
Essencial para compreensão a seguinte passagem: “Se uma determinada instituição como a do
legislador tiver decidido antecipadamente a respeito da adequação da norma, ela poderá ser aplicada
como uma regra.” A regra é aplicada com a exclusão de sinais característicos irrelevantes (não previstos
hipoteticamente pela norma), que não se referem aos fatos de uma determinada situação. GÜNTHER,
Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad. Cláudio Molz. São
Paulo: Landy, 2004, pp. 392-393.
983
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 298.
984
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 394.
985
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 395. Conforme já mencionado neste capítulo, a racionalidade
das normas jurídicas em Günther - sua aplicação adequada - decorre diretamente da racionalidade moral -
uma moral pós-convencional. Em Habermas não há derivação, mas sim complementaridade. Tal
discordância, entretanto, não impede Habermas de adotar a noção de “argumentações adequadas” em sua
Teoria Discursiva do Direito.
986
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 395. Jurisprudência no sentido de decisões reiteradas dos
tribunais.
987
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 398.
A aplicação do Direito deve criar espaços, nos quais - in casu - são possíveis
argumentações de adequação que possam apoiar-se em uma multiplicidade
de princípios relevantes. Para relacionar entre si o maior número possível de
aspectos efetivos e normativos de uma situação, deve haver espaços na
própria aplicação do Direito, nos quais também possam ser destacados os
princípios políticos e morais que representam o nível pós-convencional de
argumentação moral. Desse modo, a aplicação de normas, por sua vez, é de
novo “procedimentalizada” e, com isso, novamente vinculada a
argumentações imparciais de adequação.988
988
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 396.
989
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 399.
990
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 400.
991
Vide capítulo III.
992
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 405.
993
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 407.
994
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 411.
995
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 414.
direito “sob o pleito de esgotar todos os aspectos de uma caso que puderem ser
interpretados à luz de princípios.”996 A decisão se pautará não por uma norma isolada,
mas sim por “uma porção de princípios como direitos” que enseja um tratamento igual
em consideração e respeito, constituindo, desta forma, o núcleo da “estrutura de
argumentações de adequação.”997
996
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 414.
997
GÜNTHER, Klaus. Teoria da argumentação no direito e na moral: justificação e aplicação. Trad.
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004, p. 414. Há a construção de uma racionalidade sistêmica na
adoção da adequação, que adota os princípios como mandamentos de dever ser. Percebe-se da leitura de
seus postulados, que a “aplicação como adequação” é muito solta, podendo cair no decisionismo do juiz,
deixando pouca margem de controle de seus atos, ou mesmo de atos de aplicação da administração
pública. Não é de se admirar que Dworkin se valha do juiz Hércules para conhecer todos os princípios
explícitos e implícitos do direito, da lealdade, da justiça... para proferir uma decisão adequada. A regra da
proporcionalidade, como se demonstrou na proposta de Alexy, onde os princípios são postos como
mandamentos de otimização, fornece critérios mais seguros para a aplicação do direito - especialmente de
uma legislação finalística, como a encontrada em campos como o direito econômico e o administrativo.
998
Mais especificamente, processos administrativos em que as decisões possuem destinatários
identificados: os que fizeram parte do processo.
999
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 215.
1000
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 215. Neste ponto parece haver um
contato entre a denomina “representação imparcial do juiz” de Habermas e a “representação
argumentativa” de Alexy. Ambos pautam-se pela noção de imparcialidade que resulta, em última análise,
da observância das regras do discurso.
1001
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 215-216.
1002
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 216. A distinção entre discursos de
aplicação e de fundamentação e a identificação atingidos como partes ou participantes, respectivamente,
demonstra o quanto a questão da produção de um direito regulatório - normas gerais e abstratas emitidas
por agências reguladoras - é ambivalente. Por ora, importa reconhecer, com Habermas, que “estatutos,
ordens, prescrições e medidas que contradizem uma lei” são nulos. Ibid. O tema será retomado.
Os discursos pragmáticos, que disciplinam a atividade administrativa, “são
talhados para a escolha das tecnologias e estratégias apropriadas para a concretização
dos valores e fins existentes na legislação.”1003 Há na separação funcional dos poderes
uma nítida primazia da legislação democrática, ligada ao poder comunicativo como seu
fundamento, tendo no poder administrativo seu executor. A Administração deve estar,
desta forma, “retroligada” ao poder comunicativo.1004 “O poder administrativo só se
regenera a partir do poder comunicativo produzido conjuntamente pelos cidadãos.”1005
1008
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 237.
1009
Como se vê em Alexy, a legislação tem um papel relevante na fixação da argumentação: a
racionalidade da argumentação estará sempre relacionada à racionalidade da legislação. ALEXY, Robert.
Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica.
Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 276.
1010
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 237.
1011
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 238. É modelo de
autoprogramação a administração expertocrática, em que agentes especializados - quer seja pelo
tratamento repetitivo do mesmo problema, quer seja por treinamento apropriado -, membros de autarquias
administrativas, pretendem alcançar resultados que legisladores - generalistas que são - não conseguiriam
alcançar, em termos de eficiência.
1012
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 238.
1013
Em termos: poderes ilimitados de escolha, porém pautados pela Constituição.
1014
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 239.
correspondentes ou através do estabelecimento de processos judiciais ou
parlamentares, de processos da formação de compromissos, etc. 1015
este respeito.
1022
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 173. O autor de refere ao risco de
captura dos entes que regulam a economia, como as agências reguladoras. Adverte que as escolhas
públicas - definição de finalidades - devem ser feitas pelo Poder Legislativo. A fala do autor não se
distancia da prática da administração pública brasileira, com a exposição desta dura realidade em
Comissões Parlamentares de Inquérito na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
1023
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 173. Este ponto específico -
exercício de poder normativo pela administração pública - foi delineado no capítulo I desta tese. Cabe,
neste passo, o registro da postura de Habermas em razão das conseqüências que traz para a adoção de
processos de consulta popular e de audiência pública. A tese que se apresenta se serve de uma
terminologia abrangente, que equipara, na linha proposta por Alexy, políticas públicas a direitos
fundamentais em sua aplicação otimizada: diretrizes/objetivos/princípios.
1024
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 174.
1025
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 174.
A inquietação - identificada por Habermas - surge do vácuo constitucional e
legislativo na normatização da Administração.1026 Por não haver tratamento
constitucional ou legal de determinada matéria administrativa, não há que se falar em
reserva legal; e sem esta, restaria impossibilitado o controle judicial dos atos
administrativos normativos.1027 Nestes espaços, existe uma autoprogramação da
administração, que procede de acordo com máximas ou princípios, como o da
proporcionalidade, ou cláusulas que atenuam as exigência excessivas (razoabilidade) ou
reduzem as medidas suscetíveis de conter injustiças, máximas e cláusulas que não
permitem um tratamento normativamente neutro dos textos legais.1028
1026
No Brasil, embora a Constituição de 1988 seja uma Constituição dirigente, e exista uma enormidade
de leis vigentes, não se tratou ainda de elaborar um marco regulatório que estabeleça regras claras em
setores de infra-estrutura. A constatação de Habermas - acerca do direito alemão - serve para o Brasil, no
campo do Direito Regulatório.
1027
A postura de Habermas, neste ponto, merece esclarecimentos. O fato de inexistir lei acerca de
determinado tema não autoriza a Administração a normatizá-lo. Diferentemente, no espaço deixado pelas
leis de baixa densidade normativa que estabelecem diretrizes/objetivos/princípios os poderes deixados à
administração para a implementação destes comandos é bastante amplo. A constatação de Habermas
aplica-se a esta segunda hipótese.
1028
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 176. Sustenta-se nesta tese que em
normas finalísticas, com a fixação de objetivos (bens coletivos, policies), a racionalidade teleológica da
regra da proporcionalidade cumpre o papel de maximizar o comando legal. Não haveria, portanto,
qualquer desvirtuamento das escolhas (normativas) postas pelo legislador democrático.
1029
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 177.
partidos políticos passam a formar cartéis autônomos, que monopolizam o núcleo do
sistema político, sem se submeterem ao esquema de separação entre os poderes.
1030
Cabe uma nota acerca do que se convencionou denominar de “presidencialismo de coalizão”: Leciona
Filomeno Moraes: “Na verdade, sob a nova ordem constitucional, desenvolveu-se um padrão de
governança que a literatura denomina ‘presidencialismo de coalizão’ (Abranches, 1988 e 2001;
Figueiredo e Limongi, 1999; Santos, 2001), cujo principal eixo de impacto está na relação entre os
Poderes Executivo e Legislativo. E, como afirma Abranches (2001): ‘Por ser presidencialismo, esse
regime de governança reserva à presidência um papel crítico e central, no equilíbrio, gestão e
estabilização da coalizão. O presidente precisa cultivar o apoio popular - o que requer a eficácia de suas
políticas, sobretudo as econômicas - para usar a popularidade como pressão sobre sua coalizão; ter uma
agenda permanentemente cheia, para mobilizar atenção da maioria parlamentar e evitar sua dispersão; ter
uma atitude proativa na coordenação política dessa maioria, para dar-lhe direção e comando.’ A
Constituição Federal dotou o Presidente da República de possibilidades muito grandes de influência na
legislação, de muitos mecanismos de intervenção no processo legislativo. Na verdade, os poderes de
agenda do Presidente da República vão desde a capacidade para editar medidas provisórias com força de
lei, o que permite ao presidente implementar sua agenda, sobretudo de natureza econômica e
administrativa, superando possíveis obstáculos congressuais. Por outro lado, a constante utilização das
medidas e a necessidade de reeditá-las periodicamente para manter sua continuidade normativa acabam
por congestionar a pauta dos trabalhos legislativos, contraindo o tempo destinado ao exame de outras
matérias, possivelmente de origem no próprio Legislativo (Santos, 2000). MORAES, Filomeno.
Executivo e Legislativo no Brasil pós-constituinte. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?
pid=S0102-88392001000400006&script=sci_arttext com acesso em 07/06/2007.
1031
Não autoriza, por exemplo, a adoção de um Estado de Exceção permanente, como esclarecido no
capítulo II desta tese.
1032
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 178.
1033
O que Habermas denomina de Estado prevencionista ou securitário coincide com a proposta de
Ricardo Lobo Torres de Estado Subsidiário (LOBO TORRES, Ricardo. Tratado de direito constitucional
financeiro e tributário: valores e princípios constitucionais tributários. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p.
246), bem ainda com a permanente necessidade de decidir do que se denominou de Estado Regulador -
numa concepção mais ampla, relacionada prioritariamente ao aspecto econômico.
social e a regulação indireta do Estado prevencionista têm que apoiar-se cada
vez mais noutras fontes: no dinheiro e em realizações estruturais, em
informações e conhecimentos de especialistas.1034
Os problemas “são cada vez menos de natureza jurídica”, mas tal fato “não
significa que a correspondente prática de administração se subtraia, cada vez mais às
regulações jurídicas.”1035 Os “novos riscos em matéria de segurança” - a configuração da
sociedade de risco global, inclusive econômicos, como já se demonstrou - agudiza o
velho problema do direito tipificador de todas as hipóteses cujos fatos a estas se
subsumiriam, já identificado no âmbito do Estado do Bem-Estar social. Além da
proteção jurídica individual, surge a necessidade de implantar uma proteção jurídica
coletiva - especialmente, difusa.
1034
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 178-179. A postura ideológica de
Habermas, originariamente marxista, identificada pelo mesmo como socialista, permite entrever sua
filiação ao que se convencionou denominar de esquerda. Reafirme-se que a adoção da Teoria de
Habermas, nesta tese, deve-se à sua proposta de produção de um direito normativamente correto, válido,
legitimado por sua gênese democrática. Não se compartilha da desconfiança que o autor apresenta,
reiteradamente, da ciência e da tecnologia.
1035
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 179.
1036
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 180.
1037
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 182.
“concretista” - de liberdades negativas asseguradas positivamente - “ocultando a
relação interna que existe entre autonomia privada e pública”.1038 No modelo
procedimental, as liberdades positivas são redimensionadas. Habermas ao tratar da
possibilidade de delegação legislativa do Parlamento à Administração, toca no ponto
que é essencial à compreensão da tese que se desenvolve: 1039 se o Parlamento introduz o
que denomina de “direito regulativo, tem que tomar cuidados para compensar, de forma
legítima, a insuficiente força de imposição de que dispõe tal direito na justiça e na
administração.”1040 O paradigma procedimentalista do direito, como já se demonstrou,
“procura proteger, antes de tudo, as condições do procedimento democrático.” 1041 Na
medida em que os programas contidos nas leis dependem de uma concretização que
contribui para desenvolver o direito, “os discursos acerca da aplicação do direito têm
que ser complementados, de modo claro, por elementos dos discursos de
fundamentação. Esses elementos de uma formação quase-legisladora da opinião e da
vontade necessitam certamente de outro tipo de legitimação.”1042 Essencial a formação
discursiva da vontade através de um procedimento democrático - Democracia
Deliberativa.
1038
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 182.
1039
Habermas põe a seguinte questão: Será que o legislador parlamentar pode, através de uma
descentralização de competências legislativas especificadas funcionalmente, desobrigar-se de decisões
que ele mesmo não poderia tomar com suficiente determinação?” HABERMAS, Jürgen. Direito e
democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de
Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 183.
1040
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 183. Daí a necessidade de
institucionalização de procedimentos que garantam a produção legítima de um direito regulatório.
1041
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 183.
1042
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 184.
1043
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 184.
1044
Para Habermas, a participação democrática num modelo de cidadania ativa tem alcance maior que a
publicidade ou a transparência, por estar a serviço de um novo paradigma de direito, e não apenas garantir
no modelo de Estado e de direito liberal -, mas “sim como processos destinados à
legitimação de decisões, eficazes ex ante, os quais, julgados de acordo com seu
conteúdo normativo, substituem atos da legislação ou da jurisdição.”1045 Nestes
processos de legitimação, que devem tomar parte os atingidos, os indivíduos ou grupos
menos favorecidos deverão ser capacitados para que possam, em igualdade de
condições, tematizar seus interesses no processo de decisão do Estado.
1060
Neste sentido: RICHE, Flávio Elias. “Revisitando a deliberação pública.” In: VIEIRA, José Ribas
(Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 04-05.
1061
SOUZA NETO, Cláudio Pereira. Teoria constitucional e democracia deliberativa: um estudo sobre o
papel do direito na garantia das condições para a cooperação na deliberação democrática. Rio de
Janeiro: Renovar, 2006, p. 87.
1062
COHEN, Joshua. “Deliberation and democratic legitimacy.” In: Deliberative democracy: essays on
reason and politics. Cambridge: The Mit Press, 1999, p. 75 apud RICHE, Flávio Elias. “Revisitando a
deliberação pública.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 09.
1063
Informa Filipe Carreira da Silva que foi Joseph Bessette quem cunhou a expressão “democracia
deliberativa”, ainda em 1980. SILVA, Filipe Carreira da. Democracia deliberativa: avaliando seus
limites. Disponível em: www.ces.uc.pt/publicaçoes/oficina/203/203.pdf, com acesso em 22/11/2004.
1064
GHETTI, Pablo Sanches. “Às margens da deliberação: notas sobre uma política deliberativa por vir.”
In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro:
Renovar, 2003, p. 50.
Em apertada síntese, pode-se identificar as linhas mestras do raciocínio de
alguns de seus teóricos: James Bohman adota o que denomina de modelo dialógico,
vislumbrando a possibilidade de parcialidade num processo deliberativo que objetive a
troca de razões para a solução de situações problemáticas que não podem ser resolvidas
sem coordenação e sem cooperação social, sendo o sucesso deliberativo representado
pela efetiva contribuição dos participantes no resultado.1065 Iris Marion Young abraça a
idéia de democracia comunicativa, defendendo o maior grau possível de inclusão,
proporcionando uma efetiva possibilidade de cada membro influenciar no pensamento
dos demais;1066 Chantal Mouffe vê na deliberação o campo de disputas vibrantes e
passionais, em que inimigos se aceitam e se toleram, sendo “amigavelmente inimigos”,
atraindo a atenção dos cidadãos, potencializando a democracia que passa por um
momento de indiferença e de apatia;1067 Gary Remer aponta a deliberação como um
discurso persuasivo e emotivo voltado para o povo, talhado para lidar com um público
inculto cujas paixões são seu motor central, realçando o caráter agonístico da
deliberação, numa disputa para se alcançar maior prestígio na arena pública;1068 Cass
Sustein, reconhecendo a fragmentação da sociedade norte-americana, aponta para a
oitiva de todos os grupos de interesse, dando-lhes a oportunidade de expor suas razões e
argumentos, caracterizando essa democracia heterogênea em razão de sua moralidade
interna, resultante da proteção de uma série de direitos individuais;1069 Stephen Griffin
1065
BOHMAN, James. Public deliberation: pluralism, complexity and democracy. Cambridge: The Mit
Press, 1996; BOHMAN, James. “The coming age of deliberative democracy.” In: The journal of political
philosophy. Vol. 06, n.º 4, 1998; apud RICHE, Flávio Elias. “Revisitando a deliberação pública.” In:
VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar,
2003, pp. 18-24. Interessante notar que Bohman enfraquece o consenso das teorias procedimentais
(Habermas), pondo-o como um “consenso suficiente” para que os participantes dêem continuidade ao
processo de cooperação.
1066
YOUNG, Iris Marion. Comunicação e o outro: além da democracia deliberativa. In: Democracia
hoje: novos desafios para a teoria democrática contemporânea. Brasília: UNB, 2001; Id. Inclusion and
democracy. Oxford: Oxford University Press, 2002; Id. Justice and the politics of difference. Princeton:
Princeton University Press, 1990; apud RICHE, Flávio Elias. “Revisitando a deliberação pública.” In:
VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar,
2003, pp. 25– 30.
1067
MOUFFE, Chantal. “Deconstruction, pragmatism and the politics of democracy.” In: MOUFFE,
Chantal. (Org.) Deconstruction and pragmatism. Londres: Verso, 1999; MOUFFE, Chantal. “Carl
Schmitt and the paradox of liberal democracy.” In: MOUFFE, Chantal. (Org.) The challenge of Carl
Schmitt. Londres: Verso, 1999; MOUFFE, Chantal. The democratic paradox. Londres: Verso, 2000, apud
GHETTI, Pablo Sanches. “Às margens da deliberação: notas sobre uma política deliberativa por vir.” In:
VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar,
2003, pp. 39-43.
1068
REMER, Gary. “Political oratory and conversation. Cicero versus deliberative democracy.” In:
Political Theory, vol. 27, n.º 1, 1999 apud GHETTI, Pablo Sanches. “Às margens da deliberação: notas
sobre uma política deliberativa por vir.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de
constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, pp. 47-50.
1069
SUSTEIN, Cass R. Designing democracy – what constitution do. Oxford: Oxford University Press,
2001 apud VIEIRA, José Ribas. “A estrutura constitucional e a democracia deliberativa: o contexto
vislumbra a responsabilidade do Estado na criação e efetivação dos direitos civis,
reconhecendo a existência de arenas democráticas prontas para decidir em matéria de
direitos, criando e efetivando os direitos, numa democracia de direitos civis; 1070 Joshua
Cohen formula um procedimento ideal de deliberação, apresentado como modelo para
instituições públicas, em que a vida política de uma sociedade seja regulada por fóruns
de deliberação coletiva tendentes a alcançar um consenso racionalmente motivado,
resolvendo-se a questão, na hipótese deste não ser alcançado, com o auxílio da regra da
maioria;1071 Joseph Bessette identifica a Democracia Deliberativa como um processo
racional de decisão coletiva, estabelecido já pela Convenção Constitucional de 1787,
sendo o Congresso o principal local de deliberação dos Estados Unidos da América,
num modelo de democracia representativa;1072 Jon Elster trabalha com as idéias de
racionalidade e de imparcialidade, sem excluir a lógica do voto e da negociação,
apontando a assembléia constituinte como fórum propício para a eleição de propostas
políticas concretas;1073 Seyla Benhabib entende que a racionalidade se apóia no processo
construtivo do discurso, em que as próprias normas sobre o procedimento deliberativo
são objeto de deliberação, dando especial relevo à motivação, à publicidade e ao
reexame das decisões;1074 Carlos Santiago Nino identifica na justificação a dimensão
qualitativa e a garantia da imparcialidade dos atores envolvidos: os direitos são o
resultado do processo democrático garantido por direitos a priori, numa relação de
circularidade que se auto-alimenta.1075
brasileiro.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de
Janeiro: Renovar, 2003, pp. 154-157.
1070
GRIFFIN, Stephen M. “Judicial Supremacy and equal protection in a democracy rights.” In: Journal
of constitutional law. University of Pennsylvania, vol. 4, Jan. 2002, n.º 2 apud VIEIRA, José Ribas. “A
estrutura constitucional e a democracia deliberativa: o contexto brasileiro.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.)
et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, pp. 157-159.
1071
COHEN, Joshua. “Deliberation and democratic legitimacy.” In: HAMLIN, Alan; PETTIT, Philip
(Orgs.). The good polity – normative analysis of the State. Oxford: Blackwell, 1989; apud TORRES,
André de A. “Resenhas.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e
democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, pp. 221-230.
1072
BESSETTE, Joseph. The mild voice of reason: deliberative democracy and American national
government. Chicago: The University of Chicago Press, 1994 apud CORDEIRO, Alexandre Delduque.
“Resenhas.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de
Janeiro: Renovar, 2003, pp. 231-235.
1073
ELSTER, Jon. Deliberative democracy. New York: Cambridge University Press, 1998 apud
PEREIRA, Guilherme; ESPÌRITO, Filomeno. “Resenhas.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas
de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, pp. 236-239.
1074
BENHABIB, Seyla. “Democratic moment and the problem of difference.” In: BENHABIB, Seyla.
Democracy and difference – contesting de boundaries of the political. New Jersey: Princeton University
Press, 1996 apud CALAZANS, Paulo Murilo. “Resenhas.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli. Temas
de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, pp. 240-246.
1075
NINO, Carlos Santiago. The constitution of deliberative democracy. New Haven: Yale University
Press, 1996 apud FERNANDES, Bianca Stamato. “Resenhas.” In: VIEIRA, José Ribas (Org.) et alli.
Temas de constitucionalismo e democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, pp. 253-260.
Leciona Cláudio Pereira de Souza Neto que:
1083
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
p. 185. O autor refere-se a doutrinas abrangentes razoáveis. “Todas as doutrinas razoáveis afirmam tal
sociedade com as suas correspondentes instituições políticas: direitos e liberdades básicos iguais para
todos os cidadãos, incluindo a liberdade de consciência e a liberdade de religião. Por outro lado, as
doutrinas abrangentes que não podem sustentar tal sociedade democrática não são razoáveis.” Ibid., p.
226.
1084
“A teoria da justiça como eqüidade tenta arbitrar entre estas tradições concorrentes, em primeiro lugar
propondo dois princípios de justiça para servirem como guias na efetivação, pelas instituições básicas,
dos valores da liberdade e da igualdade, e depois definindo um ponto de vista segundo o qual esses
princípios aparecem como mais apropriados do que outros para a natureza dos cidadãos de uma
democracia, se eles forem considerados como pessoas livres e iguais.” RAWLS, John. Justiça e
democracia. Tradução: Irene A. Paternot. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 207.
1085
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
p. 185.
1086
RAWLS, John. O direito dos povos. Tradução: Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2004,
pp. 188-189. Esclarece o autor, ao tratar da questão do aborto, que “o liberalismo político não sustenta
que o ideal da razão pública deva sempre levar a uma concordância geral de concepções e que não é uma
falha que isso não aconteça. Os cidadãos aprendem e lucram com o debate e a discussão, e quando seus
argumentos seguem a razão pública eles instruem a cultura política da sociedade e aprofundam sua
compreensão mútua mesmo quando não se pode chegar a um acordo.” Ibid., p. 223.
1087
Neste sentido: SOUZA NETO, Cláudio Pereira. Teoria constitucional e democracia deliberativa: um
estudo sobre o papel do direito na garantia das condições para a cooperação na deliberação
democrática. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 127.
A teoria do direito de Habermas concentra-se na gênese e na legitimação do
direito como decorrentes de uma política legislativa que envolve negociações e formas
de argumentação, sob “condições exigentes, derivadas de processos1088 e
pressupostos1089 da comunicação, onde a razão, que instaura e examina, assume figura
procedimental.”1090 Em sua “sociologia reconstrutiva da democracia” apóia-se na
premissa de que “o modo de operar de um sistema político, constituído pelo Estado de
direito, não pode ser descrito adequadamente, nem mesmo em nível empírico,1091
quando não leva em conta a dimensão de validade do direito e a força legitimadora da
gênese democrática do direito.”1092 A tensão entre facticidade e validade, na democracia,
pode ser expressa pela tensão entre a “autocompreensão normativa” do Estado de direito
e a “facticidade social dos processos políticos”.1093
1088
Escalonamento de atos.
1089
Pressupostos da ética do Discurso, como as situações ideais de fala, ou as regras da argumentação de
Alexy, adotadas por Habermas em sua Ética.
1090
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 09.
1091
Em sua proposta de democracia deliberativa, Habermas rebate as teorias empiristas, cunhadas por
teorias realistas, como a teoria do sistema ou da ação, que reduzem a “impregnação normativa do poder
político” ao poder social. A democracia segue a regra da maioria, que recomenda uma solução “aceitável
para a minoria”, protegida por liberdades fundamentais clássicas, que protegem do risco da perpetuação
de maiorias tirânicas: “A maioria, através do medo de perder seu poder, e a minoria, através da
perspectiva de uma mudança de poder.” A teoria empírica busca fundamentar, em última instância, as
regras de democracia liberal. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade,
Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, pp. 10-17.
1092
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 09.
1093
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 10.
1094
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 18.
1095
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 19.
entendimento e, em última instância, da estrutura da comunicação lingüística
e da ordem insubstituível da socialização comunicativa.1096
1102
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 22.
1103
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 23.
1104
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 23.
1105
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 23.
1106
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 24.
1107
Conforme já esclarecido neste capítulo, este poder comunicativo deriva das liberdades de
comunicação garantidas pelos direitos fundamentais.
1108
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 24.
Leciona Habermas que a chave da concepção procedimentalista da
democracia consiste no fato de que “o processo democrático institucionaliza discursos e
negociações com o auxílio de formas de comunicação às quais devem fundamentar a
suposição da racionalidade para todos os resultados obtidos conforme o processo.”1109 É
a expectativa de uma qualidade racional de seus resultados que confere à política
deliberativa sua força legitimadora.
1114
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 33.
1115
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 33. Como se percebe, o paradigma de
cidadania de Marshall é utilizado por Habermas também na construção da esfera pública - elementos
civil, político e social como formadores da cidadania. Defende Habermas que é preciso capacitar os
cidadãos para ele possam formar seus interesses e discuti-los no processo de decisão do Estado. Ibid., p.
185.
1116
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 33.
1117
Violência doméstica, aborto e pornografia, por exemplo.
1118
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 41.
1119
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 41.
1120
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 41.
persecução de fins coletivos, tapando buracos de outros mecanismos de integração
social, através do medium do direito.1121 Onde os outros meios de integração social
falharam, a política e o direito, filtrados discursivamente, solucionam “o mesmo tipo de
problemas enfrentados pelos sobrecarregados processos sociais que ele substitui.”1122
Tornando mais claro seu pensamento, sintetiza Habermas: “O processo democrático
condiciona a criação do direito legítimo a um tratamento presuntivamente racional de
problemas, cujo modo de interrogação corresponde aos problemas que sempre foram
elaborados de forma quase inconsciente.”1123 Aponta o autor, em razão da necessidade
de coordenação funcional nas atuais sociedades complexas não pode ser suprida por
modelos de divisão de trabalho ou da cooperação entre coletividades ou indivíduos:
“São necessários mecanismos de regulação indireta do sistema administrativo.”1124
1121
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 45.
1122
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 46.
1123
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 47.
1124
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 48.
1125
Refere-se o autor a “uma liberdade que se constitui através da sociedade”. A sociedade não limita,
como no paradigma liberal, a liberdade. HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e
validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 52.
1126
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 53.
1127
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 53.
1128
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 53.
investimento em termos de organização que as comunicações e tomada de decisões
ocupam; as decisões proteladas ou abandonadas em razão da pressão do tempo para a
escolha dos temas e das contribuições dos participantes; a distribuição desigual de
competências e de conhecimento gerada em razão da divisão do trabalho de organização
da produção do saber; as assimetrias inevitáveis no tocante a informações e às chances
desiguais de intervenção, validação e apresentação de mensagens; a distribuição casual
e desigual das capacidades individuais; e as escassas fontes da participação - o tempo de
que cada indivíduo possui é exíguo, a atenção prestada aos temas é episódica, a
disposição e a capacidade de dar contribuições aos temas é pequena, e “existem
enfoques oportunistas, afetos, preconceitos, etc., que prejudicam uma formação racional
da vontade.”1129
1129
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 54.
1130
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 54.
1131
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 54.
1132
A Teoria do Agir Comunicativo é implementada num modelo de argumentação discursiva - Ética do
Discurso -, com o auxílio de regras de uma argumentação ideal.
1133
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 54.
1134
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 55.
Os fluxos comunicacionais da esfera pública somente se transformam em
poder político quando passam através das “comportas do processo democrático e do
sistema político em geral, instaurado na forma de Estado de direito.” 1135 As instituições
do Estado de direito devem compensar as limitações comunicativas, cognitivas e
motivacionais, tornando possível a prática de uma política deliberativa.1136
1135
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 56.
1136
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 56.
Habermas.1137 Não existe a possibilidade, como reconhece Habermas,1138 de fazer uma
separação exata de onde acaba a aplicação de uma norma legislativa, e de onde começa
a fundamentação de uma norma administrativa.1139 Necessário, portanto, que o
procedimento de produção das normas por agências reguladoras especifique os meios de
legitimá-las - os chamados “filtros de legitimação”1140 -, pautando-se pelo atendimento
das finalidades previstas nas leis que delimitam a atuação das agências reguladoras. Por
outro lado, não se pode olvidar a questão da eficiência, implícita na atribuição de
competências reguladoras tendentes ao alcance das finalidades estabelecidas em
políticas públicas.
1137
ENGISCH, Karl. Introdução ao pensamento jurídico. 8. ed. Tradução: J. Baptista Machado. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 205; HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre
facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 2003, p. 182.
1138
Habermas refere-se à necessidade de discursos envolvendo fundamentação e aplicação de normas.
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 184.
1139
Num sentido mais prático, é difícil identificar onde acaba o regular e onde começa o legislar.
1140
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 184.
1141
Como exemplo de projeto teórico desta magnitude: RAWLS, John. Uma teoria da justiça. 2. ed.
Tradução: Almiro Pisetta; Lenita Maria Rímoli Esteves. São Paulo: Martins Fontes, 2002.
concorrentes, mas uma escolha conseqüente para todo aquele que não quer se afastar da
realidade social, mas que não abre mão de conceitos de legitimidade e justiça, inerentes
à idéia do direito.
1142
Estado Prevencionista ou Securitário, como se refere Habermas.
1143
A denominação “Estado Regulador” realça o aspecto econômico deste modelo intervenção.
legitimidade destes atos, já que, em última instância, trazem minudências para o
desempenho da lei? Mais ainda: para que instituir autarquias especiais, com estrutura
onerosa, para exercitar algo que um departamento técnico de um Ministério poderia
fazer a contento? As respostas somente poderão ser dadas tomando-se por base novos
paradigmas sociais, políticos, econômicos, e filosóficos, com grandes repercussões no
direito e na produção democrática do direito. Tais respostas, reafirma-se aqui, devem
satisfazer ao trinômio legalidade, legitimidade e eficiência.
1144
No modelo adotado pela Teoria dos Princípios de Alexy, material-procedimental, alguns assuntos
estão confiados à discricionariedade do legislador, e outras não, existindo condutas ordenadas e condutas
proibidas. Como já explicitado no capítulo III, a margem de ação do legislador, seu espaço de
discricionariedade, encontra-se delimitado pelo marco constitucional. A metáfora do marco significa o
que está ordenado e proibido. O que se confia à discricionariedade do legislador - o que não está
ordenado nem proibido - é aquilo que se encontra no interior do marco. ALEXY, Robert. Epílogo à la
teoría de los derechos fundamentales. Tradução: Carlos Berna Pulido. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 2004, p. 28.
gerais relacionadas ao controle de correção de seus resultados (enunciados normativos
fundamentados), as limitações dos discursos jurídicos relativas ao controle de
concordância, expresso pela exigência da legalidade.1145
1145
Neste sentido, a tese do Caso Especial de Alexy, apresentada no capítulo III desta tese.
(6.) Todo enunciado dogmático deve enfrentar uma
comprovação sistemática, tanto em sentido estrito como em
sentido amplo.
reguladora: legalidade e constitucionalidade. In: Revista tributária e de finanças públicas, n.º 35, ano 8,
novembro-dezembro de 2000, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, pp. 154-155. A
proporcionalidade que pauta a relação entre meios e fins, como já explicitado, reinterpreta a legalidade
por critérios de eficiência. Haverá legalidade se a medida administrativa for proporcional: é legalidade no
sentido de eficiência.
1147
ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da
justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 229.
1148
Neste passo, cabe a transcrição das regras pinçadas por Habermas dentre as regras do discurso prático
geral de Alexy. Habermas, embora adote as regras de transição, não as renumera. Por questão de clareza,
estas regras (6.1 a 6.3) serão renumeradas (4.1 a 4.3) nesta tese.
(1.2) Todo falante que aplicar um predicado F a um objeto a tem
que estar disposto a aplicar F a qualquer outro objeto que se
assemelhe a a sob todos os aspectos relevantes.
1149
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 179.
1150
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 216.
1151
HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. 2. ed. Tradução: Guido A. de
Almeida. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 115.
1152
“Mediante a busca de uma resposta a uma questão prática sob condições de tempo ilimitado,
participação ilimitada e falta de coerção total para gerar uma clareza lingüístico-conceitual completa,
informação empírica completa, capacidade e disposição completa para a troca de papéis e completa
ausência de prejuízos [mais precisamente, preconceitos].” ALEXY, Robert. Teoria da argumentação
jurídica: a teoria do discurso racional como teoria da justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson
Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 298 – Posfácio da obra. Habermas adverte que “são
falíveis nossa reconstrução desse saber pré-teórico e a pretensão de universalidade que a ele associamos.”
HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. 2. ed. Tradução: Guido A. de Almeida.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 120. No mesmo sentido, Alexy, ao tratar dos processo
judiciais, vislumbra a necessidade de institucionalização da forma mais racional possível do processo
judicial. ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica: a teoria do discurso racional como teoria
da justificação jurídica. Tradução: Zilda Hutschinson Schild Silva. 2. ed. São Paulo: Landy, 2005, p. 314
– posfácio à obra.
a ressalva de que não sigam interesses ou preferências próprias - apenas finalidades
coletivas estabelecidas em lei devem ser perseguidas. Na medida em que a implantação
dos programas teleológicos sobrecarrega a Administração regulatória com tarefas
relacionadas ao aprimoramento do direito através de exercício de competência
normativa,1153 a base de legitimação das estruturas administrativas tradicionais não é
mais suficiente para justificar seus atos.
1153
Como já mencionado, a adoção da Teoria Discursiva do Direito não impede o reconhecimento do
escalonamento de normas, com a interposição da norma geral administrativa entre a lei e o ato
administrativo individual.
1154
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 227. O modo que os Diretores das
agências reguladoras participam do discurso é diferente do modo como o cidadão participa, ou mesmo do
modo de como a esfera pública deve influenciar as decisões.
âmbito do direito civil,1155 e do dever de verdade, lealdade e boa-fé processual, no
campo do direito processual civil.1156
1155
Em dois artigos a boa-fé é referida expressamente no Novo Código Civil: Art. 113. Os negócios
jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos e costumes do lugar de sua celebração; e
art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua
execução, os princípios de probidade e de boa-fé.
1156
É expresso o Código de Processo Civil na previsão dos deveres das partes e de seus advogados: art.
14. Compete às partes e aos seus procuradores: I - expor os fatos em juízo conforme a verdade; II -
proceder com lealdade e boa-fé.
1157
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 142.
1158
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 292
regras do discurso, institucionalizadas, balizem a atuação de todos os participantes do
discurso - atingidos e dirigentes das agências reguladoras. A “formação política da
opinião e da vontade” e a “implantação eficiente” devem ser tomadas como
possibilidades complementares de atuação na estrutura social, e não excludentes.1159 As
regras do discurso - jurídico e prático geral - utilizadas num modelo deliberativo,
instrumentalizam a um só tempo a legalidade, a eficiência e a legitimidade.
1159
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 172.
1160
Exemplificando: em processos judiciais nenhuma parte fundamenta um pedido na necessidade de
aumentar seus lucros ou ganhos, ou mesmo, alegando a própria torpeza. Para se conseguir um resultado
favorável, ainda que se haja estrategicamente - ou mesmo de má-fé-, a parte refere-se a noções de justiça
e de correção. Ninguém recorre de uma decisão desfavorável argumentando que seu recurso é meramente
protelatório, ainda que a postura do Tribunal ad quem seja pacificamente contrária à sua pretensão. Daí o
fecho freqüente em petições: “por ser da mais lídima Justiça!”
1161
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. II. 2. ed. Trad. Flávio
Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 45.
No processo de produção de normas das agências reguladoras, pautado pela
deliberação nos moldes procedimentais da Teoria Discursiva do Direito, a relação entre
os processos institucionalizados e as esferas públicas, deve ocorrer em moldes
semelhantes ao proposto por Habermas para a criação de normas do Legislativo.
Adaptando-o para o âmbito das agências reguladoras: instaurado processo
administrativos para a discussão e tomada de decisão acerca de determinado tema,
consubstanciado numa proposta ou minuta de resolução, constituem-se os pontos de
referência para a formação de esferas públicas, delimitadas social e temporalmente, e
para a organização de negociações relativas ao tema. As esferas públicas organizam-se
tendo em vista a solução cooperativa de questões práticas consistentes na justificação da
escolha dos problemas e na decisão entre propostas de solução concorrentes. As
agências reguladoras, em seus processos de deliberação, estruturam-se como um
conjunto de justificação que depende do trabalho institucionalizado em razão de sua
competência, e do “contexto de descoberta” de uma esfera pública, não regulada através
de processos, da qual é titular o público dos cidadãos em geral - a opinião pública.1162 A
opinião pública, difusa por sua essência, deverá poder influenciar o resultado dos
processos decisórios, sendo levada em conta nas deliberações promovidas pelos
participantes do discurso.
faculdade que se atribui a alguém ou a algum órgão para apresentar projetos de lei ao Legislativo; b) fase
constitutiva, em que há ampla discussão e votação sobre matéria nas duas casas do Congresso e
participação do chefe do executivo por meio de sanção ou veto; c) fase complementar, quando ocorre a
promulgação e publicação da lei.
1164
A constatação de Aman e Mayton aplica-se ao processo de elaboração de normas por agências
brasileiras. AMAN JR., Alfred C.; MAYTON, William T., Administrative Law. 2 ed. Saint Paul,
Minnesota: West Group, 2001, p. 39.
1165
AMAN JR., Alfred C.; MAYTON, William T., Administrative Law. 2 ed. Saint Paul, Minnesota:
West Group, 2001, p. 41.
Art. 4.º Serão objeto de consulta pública, previamente à tomada de decisão,
as minutas e propostas de alterações de normas legais, atos normativos e
decisões da Diretoria Colegiada e Conselhos Diretores de interesse geral dos
agentes econômicos, de consumidores ou usuários dos serviços prestados.
§ 1.º O período de consulta pública iniciar-se-á sete dias após a publicação de
despacho motivado no Diário Oficial da União e terá a duração mínima de
trinta dias.
§ 2. As Agências Reguladoras deverão disponibilizar, em local especificado e
em seu sítio na Rede Mundial de Computadores - Internet, em até sete dias
antes de seu início, os estudos, dados e material técnico que foram utilizados
como embasamento para as propostas colocadas em consulta pública.
....................
Art. 5.º As Agências Reguladoras, por decisão colegiada, poderão realizar
audiência pública para formação de juízo e tomada de decisão sobre matéria
considerada relevante.
§ 1.º A abertura do período de audiências públicas será precedida de
despacho motivado publicado no Diário Oficial da União e outros meios de
comunicação, até quinze dias antes de sua realização.
§ 2.º As Agências Reguladoras deverão disponibilizar, em local especificado
e em seu sítio na Internet, em até quinze dias antes de seu início, os estudos,
dados e material técnico que foram utilizados como embasamento para as
propostas colocadas em audiência pública.1166
(b) General notice of proposed rule making shall be published in the Federal
Register, unless persons subject thereto are named and either personally
served or otherwise have actual notice thereof in accordance with law. The
notice shall include:
(1) a statement of the time, place, and nature of public rule making
proceedings;
(2) reference to the legal authority under which the rule is proposed; and
(3) either the terms or substance of the proposed rule or a description of the
subjects and issues involved.1167
1169
AMAN JR., Alfred C.; MAYTON, William T., Administrative Law. 2 ed. Saint Paul, Minnesota:
West Group, 2001, p. 52.
1170
Art. 4,º e 5.º do Projeto de Lei n.º 3.337/2004. Disponível em:
http://www2.camara.gov.br/proposicoes, pesquisado em 17/05/2007.
Estabelece o dispositivo acima transcrito, implicitamente, quem possui
capacidade de participar do processo de elaboração das normas das agências:
representantes de associações constituídas há pelo menos três anos, que incluam entre
suas finalidades a proteção ao consumidor, à ordem econômica ou à livre concorrência.
Tais representantes, em número máximo de três por associação, devem possuir notória
especialização na matéria objeto da consulta pública. Faculta, ainda, o estabelecimento
por norma interna das agências (normas de organização ou regimentos) de “outros
meios de participação de interessados em suas decisões,” incluindo-se a salutar
participação direta dos interessados, ou mesmo de “organizações e associações
legalmente reconhecidas”, mas que não atendam aos critérios do § 4.º do art. 4.º -
“constituídas há pelo menos três anos”. A previsão acerca do custeio das despesas
decorrentes do acompanhamento do processo é exagerada: onera os cofres públicos e
aproxima perigosamente consulente e consultado, aumentando o risco de captura.
Ademais, o processo deverá ser disponibilizado integralmente no site da agência
reguladora.
(c) After notice required by this section, the agency shall give interested
persons an opportunity to participate in the rule making through submission
of written data, views, or arguments with or without opportunity for oral
presentation. After consideration of the relevant matter presented, the agency
shall incorporate in the rules adopted a concise general statement of their
basis and purpose. When rules are required by statute to be made on the
record after opportunity for an agency hearing, sections 556 and 557 of this
title apply instead of this subsection.
1172
Art. 21 do Regulamento da ANEEL, aprovado pelo Decreto º 2.335/1997. A norma positivou o que o
entendimento da doutrina americana contemporânea. AMAN JR., Alfred C.; MAYTON, William T.,
Administrative Law. 2 ed. Saint Paul, Minnesota: West Group, 2001, p. 41; BRUNA, Sérgio Varella.
Agências reguladoras: poder normativo, consulta pública e revisão judicial. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2003, p. 207.
1173
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade, Vol. I. 2. ed. Tradução:
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 216.
A primeira medida, facultada às agências no Projeto, mas tomada como
obrigatória nesta tese, em razão da adoção da Teoria do Agir Comunicativo e da Ética
do Discurso, com suas repercussões no direito e na democracia deliberativa, deve
permitir e promover a inclusão de todos os cidadãos atingidos, a par dos representantes
de grupos de interesses, na qualidade de consultados. Estes poderão se manifestar, em
processos de consulta, por escrito, utilizando-se, inclusive, de meios eletrônicos para
tanto. O processo de consulta é mais indicado que o da audiência pública à configuração
de uma ampla participação por relativizar barreiras de tempo, de espaço e de custos.
Estipulando-se um período de consulta razoável - um período mínimo de trinta dias,
como estabelece o Projeto -, e permitindo-se o encaminhamento das contribuições por
meio eletrônico1174 - como já estabelece a legislação da ANEEL, por exemplo -,
possibilita-se uma ampla participação popular, desincumbindo o interessado de se
locomover à sede de uma Agência, no Distrito Federal, ou a uma Diretoria Regional, em
algumas capitais de estados-membros, para se manifestarem, numa data marcada, sobre
tema de seu interesse.
O aparente tumulto que tal reforço na participação popular sugere poderá ser
controlado pela adoção de súmulas, em moldes semelhantes ao que prevê a Norma de
Organização ANEEL n.º 001/98, art. 21.1176 Mutatis mutandi, as principais contribuições
devem ser consolidadas em súmula específica, configurada num modelo de um relatório
detalhado, mais robusto que o empregado em discursos de aplicação (processos
judiciais de aplicação). Tal relatório servirá de base para a próxima fase - deliberação da
Diretoria da Agência.
1175
AMAN JR., Alfred C.; MAYTON, William T., Administrative Law. 2 ed. Saint Paul, Minnesota:
West Group, 2001, pp. 39-40.
1176
Art. 21. As consultas públicas deverão ter suas principais contribuições consolidadas em súmula
específica, que será divulgada após aprovação pela Diretoria.
1177
Transparência no sentido de publicidade. Como já esclarecido a participação democrática num modelo
de cidadania ativa tem alcance maior que a publicidade ou a transparência, por estar a serviço de um novo
paradigma de direito, e não apenas garantir a atuação satisfatória do paradigma liberal de cidadania.
contribuições dos consultados em site da respectiva Agência. Neste sentido, a previsão
constante do Projeto:
1179
Neste sentido, a previsão geral da Lei n.º 9.784/99.
1180
HABERMAS, Jürgen. Pensamento pós-metafísico. 2. ed. Tradução: Flávio Beno Siebeneichler. Rio
de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002, p. 176.
Deverá cada um dos Diretores da Agência fundamentar, nos termos do
disposto nas regras do discurso elencadas neste capítulo, que a medida que entende ser a
melhor - não necessariamente a única correta -, foi obtida tomando em consideração a)
as regras da argumentação jurídica acerca da aplicação das regras do direito; b) as regras
específicas para a aplicação de diretrizes/objetivos/princípios, consubstanciadas na regra
da proporcionalidade, c) englobadas nesta as sub-regras da adequação, d) da
necessidade e e) da proporcionalidade em sentido estrito, abrangendo esta última sub-
regra a lei de colisão e as denominadas primeira segunda regras da ponderação. Para
satisfação da sub-regra da proporcionalidade em sentido estrito, deverá ponderar
fundamentadamente todos os elementos que repercutem na decisão administrativa, em
especial f) o peso concreto, g) o peso abstrato e o h) grau de certeza empírica acerca da
realização de diretrizes/objetivos/princípios colidentes.
Art. 24. A Diretoria reunir-se-á com a presença de, pelo menos, três
Diretores, entre eles o Diretor-Geral, ou seu substituto legal, e deliberará
com, no mínimo, três votos favoráveis.
§ 1º A votação será a descoberto, devendo cada Diretor apresentar seu voto
fundamentado, oralmente ou por escrito, que constará da ata.
§ 2º O Diretor relator será o primeiro a proferir o voto.
Sustenta que as agências reguladoras não se subtraem a nenhum dos controles exercidos
pelo Executivo e demais poderes sobre as autarquias comuns e demais entes da
Administração Pública indireta. Não são independentes em relação ao Executivo,
sujeitas à supervisão ministerial e à tutela administrativa, competindo ao Presidente da
República a direção superior da Administração Pública.
Sustenta que os atos normativos das agências reguladoras vão além das resoluções,
configurando uma nova espécie de ato administrativo normativo: atos regulatórios
normativos. Na prática das agências reguladoras, entretanto, utiliza-se a denominação
“resolução” ou “resolução normativa”, sempre que destinada à produção de efeitos
externos à Administração e aos seus servidores.
Afirma que os atos normativos das agências reguladoras poderão, dando executoriedade
às políticas públicas escolhidas expressas em leis finalísticas, especificar direitos e
obrigações aos particulares. A estatuição primária, autônoma, continua sendo da lei que
dita diretrizes/objetivos/princípios. Para a concretização destas normas, constantes em
leis de instituição das agências reguladoras no Brasil, necessário o reconhecimento deste
poder.
Define as normas gerais e abstratas das agências reguladoras como atos regulatórios
normativos gerais e abstratos emitidos com fundamento no poder normativo previsto
nas leis de instituição das agências reguladoras para o exercício da discricionariedade
administrativa na aplicação de regras, bem como para a escolha dos meios eficientes
para a implementação de diretrizes/objetivos/princípios expressos em legislação
finalística, que, pautados pela regra da proporcionalidade, especificam direitos e
impõem obrigações a todos os atingidos do setor regulado.
Sustenta que o regulamento pode regrar a atuação das agências em relação a sua
atividade-meio. Não poderá, entretanto, regular um determinado setor cuja competência
regulatória tenha sido atribuída a uma determinada agência reguladora. O poder
regulamentar, no âmbito finalístico das agências, é menor do que a atividade regulatória
normativa das agências. Tampouco as normas gerais e abstratas, editadas por Ministros
de Estado, poderão exercer a regulação de setores reservados às Agências, sob pena de
reconhecimento de invasão de competência. As normas constitucionais que conferem
poder normativo às agências são os arts. 21, XI, 174, e 177, § 2.º, III, e as leis que
instituíram cada uma das dez agências existentes no âmbito Federal.
Afirma que o direito, numa concepção pós-positivista, não pode ficar imune às
transformações ocorridas nas últimas três décadas, negando-se a sofrer os influxos das
demais ciências humanas que com ele intimamente se relacionam. A Teoria Discursiva
do Direito, com seu correlato conceito de Democracia Deliberativa, se distancia a um só
tempo de concepções positivistas e de pós-positivistas conflitantes.
Sustenta que as ciências não podem ser pensadas sem o exame do ambiente social,
econômico, político e cultural em que são produzidas. O tipo de reflexão jurídica até
agora prevalente na formação profissional dos operadores do direito - a dogmática
jurídica -, mostra-se incapaz de interpretar, em termos unicamente jurídicos, fatos
inéditos, bem ainda de projetar, em sua própria linguagem, teorias críticas do direito.
Identifica, nas últimas duas ou três décadas, uma radicalização dos processos de
modernização, que implicam no reconhecimento de um dinamismo de sociedade de
risco. É permanente a necessidade de tomar decisões que tocam a questão da
sobrevivência. Tais perigos da sociedade de riscos ultrapassam as capacidades analíticas
e de prognose dos especialistas e a capacidade de elaboração, ação e reação da
Administração Pública encarregada de prevenir os riscos. O Estado Subsidiário -
Regulador, Prevencionista ou Securitário - é o Estado da sociedade de risco.
Afirma que o campo mais fecundo para a aplicação da teoria dos riscos é o dos fluxos
financeiros globais, em que transações financeiras digitais, em tempo real, podem
erguer países ou levá-los à lona de forma incontrolável.
Identifica Alexy como o primeiro filósofo do direito a propor e a construir uma teoria da
argumentação jurídica lastrada na Ética do Discurso de Habermas: a Tese do Caso
Especial. Alexy constrói sua teoria discursiva com enfoque na fundamentação da
decisão judicial, com fito de lhe conferir legitimidade, relacionando-a à questão do
controle desta decisão, buscando fornecer um método, ou mais precisamente, um
procedimento para tanto.
Aponta que, na teoria de Alexy, o discurso jurídico é um caso especial por ocorrer sob
uma série de condições limitadoras, o que não deve impedir que um enunciado jurídico
seja racionalmente fundamentável. A liberdade dos argumentos é limitada externamente
pelo ordenamento jurídico. As afirmações jurídicas e as decisões judiciais devem ser
corretas de acordo com a ordem jurídica vigente, devendo ser fundamentadas
racionalmente levando em conta a lei, o precedente e a dogmática. Apresenta regras de
justificação externa e formas lógicas de argumentos, agrupando-as em seis espécies
diferentes. Com base nestas regras, sustenta Alexy que se deve proceder a uma
discussão real ou imaginária.
Assevera, com lastro em lições de Habermas, que a positivação do direito moderno, que
resulta da racionalização de suas bases de validade, somente conseguirá estabilizar
expectativas de comportamento numa sociedade pluralista e complexa se mantiver a
pretensão de solidariedade herdada, na forma de uma pretensão de legitimidade
confiável, sendo necessário, pra tanto, necessário o gozo real de um status de cidadão
ativo, através do qual o indivíduo singular pode influir na transformação democrática. O
direito moderno alivia o indivíduo do peso das normas morais.
Afirma, com base nas construções teóricas de Habermas, que o nexo interno entre
soberania do povo e direitos humanos reside no conteúdo normativo de um modo de
exercício da autonomia política, que é assegurado através da formação discursiva da
opinião e da vontade. Neste modelo, a autonomia privada não pode ser sobreposta nem
subordinada à autonomia política.
Afirma que nos discursos promovidos no âmbito das agências reguladoras, em que a
eficiência, entendida como promoção ótima das finalidades estabelecidas em lei, é
exortada, as questões empíricas - questões técnicas e complexas relacionadas ao setor
regulado - ocuparão um posto central dentre as questões práticas gerais. Os discursos -
argumentações institucionalizadas e promovidas por agências reguladoras - são de
aplicação e de fundamentação do direito, devendo pautar-se pela constitucionalidade e
pela legalidade, bem como por critérios democráticos.
Defende que as argumentações devem ser reguladas como forma de reflexão do agir
orientado para o entendimento em atos de fala reguladores (ou regulativos), selado por
razões comuns, configurando uma modalidade forte de entendimento, um acordo no
sentido estrito. A exigência do atendimento das pretensões de verdade, sinceridade e
correção normativa, referidas a algo no mundo objetivo, subjetivo e social,
respectivamente, devem ser institucionalizadas juridicamente, sem qualquer
estranhamento. Assim ocorreu com o dever moral da probidade e da boa-fé, no âmbito
do direito civil, e do dever de verdade, lealdade e boa-fé processual, no campo do
direito processual civil.
Afirma que no processo de produção de normas das agências reguladoras, pautado pela
deliberação nos moldes procedimentais da Teoria Discursiva do Direito, os processos
institucionalizados deverão absorver a opinião e a vontade das esferas públicas. A
opinião pública deverá influenciar o resultado dos processos decisórios, sendo levada
em conta nas deliberações promovidas pelos participantes do discurso.
Propõe que o processo de elaboração de normas por agências reguladoras deve seguir o
modelo de produção legislativa, com a participação de interessados e não de partes
como ocorre no processo judicial. Quatro fases distintas podem ser identificadas: 1)
iniciativa normativa, 2) consulta pública, 3) deliberação, e 4) decisão.
Sustenta que o processo deve ser a) participativo, com a inclusão de representantes dos
grupos de interesse e individualmente de cada cidadão atingido; b) substancialmente
amplo, incluindo-se todos os fatos, detalhes e problemas necessários à discussão, bem
como o direito que delimita o campo da regulação; e c) chegar a resultados
demonstráveis racionalmente, tomando por objetivo a realização de um consenso, com
auxílio das regras do discurso.
Esclarece que a segunda fase, de consulta pública, tem por objetivos obter de subsídios
e informações para o processo decisório; possibilitar o encaminhamento de seus pleitos,
opiniões e sugestões; e identificar todos os aspectos relevantes à matéria. A Agência
Reguladora como modo de promover tais comandos, deverá a) ampliar da base de
consulta e b) estabelecer uma fase de deliberação entre os consultados. Deve permitir e
promover a inclusão de todos os cidadãos atingidos, a par dos representantes de grupos
de interesses, na qualidade de consultados. O processo de consulta é mais indicado que
o da audiência pública à configuração de uma ampla participação por relativizar
barreiras de tempo, de espaço e de custos.
Afirma que para a instauração de uma fase de deliberação entre os consultados, deverá
se franquear o conhecimento de todas as contribuições dos consultados entre si,
facultando-se a contestação de cada uma das argumentações apresentadas por todos,
estipulando-se prazo razoável para tanto. A possibilidade de contestação das
contribuições de participantes do processo de consulta serve de freio à proposição de
medidas ilegais e ineficientes - desproporcionais. A possibilidade de contestação
delimita, ademais, a atuação estratégica de grupos de interesses contrários.
Sustenta que as regras do discurso deverão balizar a argumentação. Nesta, merecerão
destaque especial as questões teleológicas, relacionadas ao alcance das finalidades
estabelecidas em lei, pautando-se pela regra da proporcionalidade. Os consultados não
estão obrigados, protegidos pelos direitos fundamentais (direitos subjetivos) a agirem
comunicativamente. Sua atuação está liberada das condições do agir comunicativo. As
principais contribuições devem ser consolidadas em súmula específica, configurada
num modelo de um relatório detalhado.
Propõe que cada um dos Diretores da Agência deverá fundamentar que a medida que
entende ser a melhor foi obtida levando em consideração a) as regras da argumentação
jurídica acerca da aplicação das regras do direito; b) as regras específicas para a
aplicação de diretrizes/objetivos/princípios, consubstanciadas na regra da
proporcionalidade, c) englobadas nesta as sub-regras da adequação, d) da necessidade e
e) da proporcionalidade em sentido estrito, abrangendo esta última sub-regra a lei de
colisão e as denominadas primeira segunda regras da ponderação.
Liberalismo Republicanismo
Lei como segurança jurídica contra o Lei como positivação da common law:
arbítrio: oposição à monarquia absoluta oposição à monarquia absoluta, mas não à
monarquia limitada
Lei como razão – limitada ao bem público Lei considerada fonte de liberdade
da sociedade
Consentimento relacionado às origens de um Consentimento relacionado à aprovação,
governo legítimo pelos que estarão sujeitos, de cada uma das
leis
Liberdade efetiva Segurança jurídica ou risco potencial
Liberdade com enfoque na proteção contra a Liberdade com enfoque na proteção contra
tirania das maiorias minorias opressoras
Homem livre em face do Estado Homem livre e impossibilidade de ser
explorado por outro
Participação política como direito de todos, Participação política como dever de todos
em proteção dos seus interesses (restrições no exercício da virtude cívica
censitárias)
Representação-mandato Representação no sentido eminente
Voto concebido como preferência – posição Voto concebido como julgamento – busca
utilitarista, de consumidor de uma política do interesse público, da melhor opção para
pública a sociedade: eleitor exerce o controle de
qualidade política
Peso eleitoral dos grupos de pressão Qualidade dos argumentos
ed. Brasília: Editora UNB, 2004; CANTO-SPERBER, Monique (Org). Dicionário de ética e filosofia
moral. São Leopoldo - RS: Editora Unisinos, 2003; LEYDET, Dominique. “Crise da representação: o
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Horizonte: Editora UFMG, 2004; GARGARELLA, Roberto. “El Republicanismo y la filosofia política
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HOLMES, Stephen. Passions and constraint. Chicago: The University of Chicago Press, 1995; e
SKINNER, Quentin. Liberdade antes do Liberalismo. Trad. Raul Fiker. São Paulo: Editora UNESP,
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Segurança jurídica Legalidade e previsibilidade Correção e justiça
Fonte: Adaptação de dois quadros em HABERMAS, Jürgen. Verdade e justificação. Tradução: Milton
Camargo Mota. Rio de Janeiro: edições Loyola, 2004, pp. 125-126.
Orientado às
conseqüências - orientado ao orientado ao acordo em
modos de utilização
entendimento mútuo entendimento mútuo sentido estrito
indireto
expressões de vontade
atos ilocucionários
fora de contextos
completos -
proferimentos perlocuções normativos –
constatativos,
constatativos e
expressivos e regulativos
expressivos
perlocucionárias - metas
perlocucionárias e
ilocucionárias para o
Metas ilocucionárias, com ilocucionárias
alcance das metas
predomínio da última
perlocucionárias
inteligibilidade,
pretensão de verdade, de
apenas inteligibilidade – inteligibilidade,
condições de validade sinceridade e de correção
não necessita verdade, pretensão de verdade e
exigidas normativa em toda
sinceridade ou correção de sinceridade
modalidade de ato de
fala
não exigidas – opiniões
pretensões de verdade postas como valores de exigidas exigidas
verdade
pretensões de
não exigidas exigidas exigidas
sinceridade
pretensões de correção
normativa – consenso não exigidas não exigidas exigidas
axiológico
ilocucionário e
perlocucionário – ilocucionário e
ilocucionário - posse do
condições de sucesso compreensão e crença do perlocucionário - posse
destinatário do
ilocucionário ou destinatário na seriedade do destinatário de
conhecimento de razões
perlocucionário e exeqüibilidade de atos conhecimento de razões
independentes do falante
de fala com base em próprias do falante
razões do autor
Fonte: HABERMAS, Jürgen. Verdade e justificação. Tradução: Milton Camargo Mota. Rio de Janeiro:
edições Loyola, 2004, pp. 99-132; Id. Pensamento pós-metafísico. 2. ed. Tradução: Flávio Beno
Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2002, p. 105-134.
2) Regras da razão:
2) Todo falante deve, se lhe é pedido, fundamentar o que afirma, a não ser que possa dar
razões que justifiquem negar uma fundamentação.
2.1) Quem pode falar, pode tomar parte no discurso.
2.2) a) Todos podem problematizar qualquer asserção.
b) Todos podem introduzir qualquer asserção no discurso.
c) Todos podem expressar suas opiniões, desejos e necessidades.
2.3) A nenhum falante se pode impedir de exercer seus direitos fixados em 2.1 e 2.2,
mediante coerção interna e externa ao discurso.
5) Regras de fundamentação:
5.1) Regras de generalizabilidade.
5.1.1) Quem afirma uma proposição normativa que pressupõe uma regra para a
satisfação dos interesses de outras pessoas, deve poder aceitar as conseqüências
de dita regra também no caso hipotético de ele se encontrar na situação daquelas
pessoas.
5.1.2) As conseqüências de cada regra para a satisfação dos interesses de cada
um devem ser aceitas por todos.
5.1.3) Toda regra deve ser ensinada de forma aberta e geral.
5.2) Argumento genético.
5.2.1) As regras morais que servem de base às concepções morais do falante
devem resistir à comprovação de sua gênese histórico-crítica. Uma regra moral
não resiste a tal comprovação:
a) Se originariamente se pudesse justificar racionalmente, mas perdeu
depois sua justificação, ou;
b) Se originariamente não se pôde justificar racionalmente e não se
podem apresentar também novas razões suficientes.
5.2.2) As regras morais que servem de base às concepções morais do falante
devem resistir à comprovação de sua formação histórica individual. Uma regra
moral não resiste a tal comprovação se se estabeleceu com base apenas em
condições de socialização não justificáveis.
5.3) Devem ser respeitados os limites de realizabilidade faticamente dados.
6) Regras de transição:
6.1) Para qualquer falante e em qualquer momento é possível passar a um discurso
teórico (empírico).
6.2) Para qualquer falante e em qualquer momento é possível passar a um discurso de
análise da linguagem.
6.3) Para qualquer falante e em qualquer momento é possível passar a um discurso de
teoria do discurso.1182
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estabelece as regras e condições de emissão do REAL e os critérios para conversão das
obrigações para o REAL, e dá outras providências. Disponível em :
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relativas ao monopólio do petróleo, institui o Conselho Nacional de Política Energética
e a Agência Nacional do Petróleo e dá outras providências. Disponível em :
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sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e
entidades que menciona e a absorção de suas atividades por organizações sociais, e dá
outras providências. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
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Ministérios, e dá outras providências. Disponível em :
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Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e dá outras providências. Disponível em :
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______. Lei n.º 9.790/99. Dispõe sobre a qualificação de pessoas jurídicas de direito
privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse
Público, institui e disciplina o Termo de Parceria, e dá outras providências.
______. Lei n.º 9.961/00. Cria a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS e dá
outras providências. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
______. Lei n.º 9.984/00. Dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Água - ANA,
entidade federal de implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e de
coordenação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, e dá outras
providências. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
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Reguladoras e dá outras providências. Disponível em :
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______. Lei n.º 10.233/2001 - Dispõe sobre a reestruturação dos transportes aquaviário
e terrestre, cria o Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte, a
Agência Nacional de Transportes Terrestres, a Agência Nacional de Transportes
Aquaviários e o Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes, e dá outras
providências.
______. Lei n.º 10.848/2004. Dispõe sobre a comercialização de energia elétrica, altera
as Leis n.º 5.655, de 20 de maio de 1971, 8.631, de 4 de março de 1993, 9.074, de 7 de
julho de 1995, 9.427, de 26 de dezembro de 1996, 9.478, de 6 de agosto de 1997, 9.648,
de 27 de maio de 1998, 9.991, de 24 de julho de 2000, 10.438, de 26 de abril de 2002, e
dá outras providências. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
______. Lei n.º 11.182/2005 - Cria a Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, e dá
outras providências.
______. Decreto-lei n.º 200/67. Dispõe sôbre a organização da Administração Federal,
estabelece diretrizes para a Reforma Administrativa e dá outras providências.
Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
______. Medida Provisória n.º 45/89. Prorroga a vigência dos dispositivos que hajam
atribuído ou delegado competência normativa aos órgãos que menciona e dá outras
providências. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
______. Medida Provisória n.º 53/89. Prorroga a vigência dos dispositivos que hajam
atribuído ou delegado competência normativa aos órgãos que menciona e dá outras
providências.
______. Medida Provisória n.º 100/89. Prorroga o prazo previsto no art. 1° da Lei n°
7.770, de 11 de maio de 1989. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
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atribuído ou delegado competência normativa aos órgãos que menciona e dá outras
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elétrica, altera as Leis n.º 5.655, de 20 de maio de 1971, 8.631, de 4 de março de 1993,
9.074, de 7 de julho de 1995, 9.427, de 26 de dezembro de 1996, 9.478, de 6 de agosto
de 1997, 9.648, de 27 de maio de 1998, 9.991, de 24 de julho de 2000, 10.438, de 26 de
abril de 2002, e dá outras providências.
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outras providências. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
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outras providências. Disponível em : <http://www.senado.gov.br/legbras/>.
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-ANEEL, autarquia sob regime especial, aprova sua Estrutura Regimental e o Quadro
Demonstrativo dos Cargos em Comissão e Funções de Confiança e dá outras
providências.
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Telecomunicações e dá outras providências. Disponível em :
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autarquia sob regime especial, aprova sua Estrutura Regimental e o Quadro
Demonstrativo dos Cargos em Comissão e Funções de Confiança e dá outras
providências.
______. Decreto n.º 2487/98. Dispõe sobre a qualificação de autarquias e fundações
como Agências Executivas, estabelece critérios e procedimentos para a elaboração,
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reestruturação e de desenvolvimento institucional das entidades qualificadas e dá outras
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