Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Beast foi desfigurado em um incêndio, mas ele cobriu sua pele com
tatuagens para garantir que ninguém confundisse suas cicatrizes com
fraqueza. O acidente, além de machucar o seu corpo, danificou a sua alma
e autoestima, então ele se envolveu em um casulo de violência e caos, onde
ninguém pode alcançá-lo.
Até uma noite, quando ele encontra um jovem coberto de sangue na
casa do clube.
Doce, inocente e tão bonito como um anjo caído do céu, Laurent puxa
todas as cordas do coração de Beast. Laurent está tão perdido no mundo
ao seu redor, e é um mistério tão complicado, que Beast não consegue
deixá-lo assim, e ajuda o homem que tenta abrir um caminho pela pedra
que é o coração de Beast.
Em 1805, Laurent não tem família, nem meios, e sua visão está
falhando. Para escapar de uma vida de pobreza, ele usa sua beleza, mas
isso só causa contra-ataque e o leva a uma catástrofe que muda sua vida
para sempre. Ele dá um passo para um abismo e é transportado para o
futuro, pronto para lutar por uma vida que vale a pena viver.
O que ele não espera encontrar no seu caminho é uma parede brutal
e grosseira de músculos tatuados com um lado macio que somente Laurent
é autorizado a tocar. E, no entanto, se Laurent quiser ganhar sua liberdade,
ele pode ter que arrancar o coração do próprio homem que cuidou dele
quando mais importava.
Póssiveis Spoilers:
Temas: Viagem no tempo, escravidão, assassinatos em série, crueldade,
moto clube, estilos de vida alternativos, deficiência, demônios, tatuagens,
escolhas impossíveis, engano, crime, autodescoberta, cura, virgindade,
magia negra, gótico.
Pelo canto do olho, Beast viu seu pai dando beijos e mordendo sua
namorada, Martina, de frente, e em seguida, a garota magra beijou o homem
que a estava tomando por trás. A cerveja tinha um sabor amargo, mas Beast
bebeu mais, mesmo assim, batendo os dentes na garrafa de vidro com tanta
força que ele temeu que quebrasse da força de sua mandíbula flexionada.
1
Uma pessoa que “anda por aí” em um clube de motocicletas e pode estar interessada em participar.
nunca perdia a oportunidade de ser fodido por um cara com um patch2, ele
sempre estava disposto a abrir as pernas nas festas, e até mesmo o terno que
ele usava para trabalhar havia sido deixado em Portland.
Beast poderia facilmente foder o cara, ele tinha apenas que enfiar seu
pau na boca escancarada dele e observar o rubor se espalhar pelo seu rosto,
depois de gozar no peito de Spike. E o pior era que ele tinha apenas que dizer
isso em voz alta para Spike cair de joelhos na frente dele, pronto para receber
seu pau. Beast sabia que o cara já tinha riscado o nome dos outros membros
do Kings of Hell MC de sua listinha, além de enviar olhares sugestivos na
direção de Beast. Mas Beast não era um maldito show de aberração, e não
queria a piedade de alguém, ou ser outro cara na coleção de parceiros sexuais
de Spike.
Ele também não seria um atalho para alguém querendo ser prospecto3.
Uma mão pesada pousou na pele de Beast de forma tão abrupta que ele
mal se impediu de tremer quando os nervos mutilados de seu ombro gritaram
em alarme. Ele sabia quem era antes de seu pai falar.
2
É a costura/emblema que eles usam atrás de seus coletes indicando seu clube, entre outras coisas. Patche(s): no
mundo MC é como sobem as fileiras, “ganhando” o patch.
3
Um Prospecto é um membro em treinamento. Um tipo de "estágio" para se tornar um membro oficial e ganhar seu
patch como tal.
A braguilha de King ainda estava aberta, o que fez Beast imediatamente
olhar para o rosto bonito que sempre o lembrava de sua boa aparência há
muito perdida. Ele costumava ser uma imagem espelhada do seu pai. Pena
que bons genes não tinham chance alguma contra o fogo. Olhar para a forma
máscula de King e suas características marcantes era um lembrete diário de
como Beast poderia ser se não tivesse sido desfigurado em um acidente há
doze anos.
Beast não podia mostrar fraqueza, não após o acidente que deixou seu
corpo um campo minado de dor - mais outra razão pela qual foder
casualmente durante uma festa parecia mais alarmante do que emocionante.
E se eles tocassem em Beast com muita força e o fizessem gritar de dor? E
se eles começassem a falar que o filho do presidente era um fracote que
gritava de dor quando era tocado? O clube era a única família que Beast
tinha. Sua única razão de ser. E ele não poderia colocar sua posição aqui em
perigo, porque King não iria segurá-lo, se ele caísse.
King ergueu as mãos em derrota e riu. — Está bem, está bem. Pelo
menos tome outra cerveja.
Com a música tocando alto e todos precisando gritar para ouvir uns aos
outros, Beast não tinha notado uma briga começando no outro lado da
grande sala, mas dois homens empurrando um ao outro, eventualmente,
chamou a atenção dele e o afastou de King. Um deles era o seu VP4, Davy, o
outro Gyro, um recém-chegado que foi convidado por uma das meninas.
Quase ninguém percebeu o que estava acontecendo, e, no entanto, mesmo
com a banda tocando alto, Beast já estava correndo pelo meio da multidão,
entre as pessoas envolvidas em uma dança de acasalamento que em breve
passaria para os sofás ou para os quartos mais próximos.
— Que porra é essa, afinal? — Gyro gritou e empurrou Davy com força,
e o chapéu favorito de Davy de pêlo de guaxinim caiu. As coisas estavam
prestes a ficarem feias.
Não desta vez. Beast não era responsável por expulsar pessoas novas,
mas em momentos como estes, ele desejava que fosse, para que pudesse lidar
com tudo isso, mesmo que alguns dos seus irmãos carecessem do senso de
responsabilidade exigido para o trabalho, permitindo a entrada de algum
homofóbico na sede do clube. Pelo menos essa briga iria dar-lhe algo para
fazer, em vez do mau humor em que ele estava por não ter conseguido
nenhum tipo de ação por tanto tempo.
4
Vice-presidente.
Joker empurrou a menina que estava em seu colo e levantou, saltando
sobre o banco de trás do sofá de couro, ágil como um acrobata em sua camisa
verde brilhante, que certamente escondia uma coleção de armas que
poderiam ser usadas contra o delinquente que tinha vindo aqui para quebrar
as regras do clube.
— Nós agimos fora da lei. Nós fazemos o que diabos queremos! Você
tem um problema comigo por foder um cara quando eu quiser? Talvez meu
pau deva entrar em sua bunda para lhe mostrar como é, não acha? Quer ser
convertido? — Joker vaiou, empurrando para trás o seu cabelo brilhante e
espetado que tinha ficado ligeiramente despenteado, provavelmente por estar
transando com a garota.
Knight deve ter notado o que Beast estava fazendo, porque seus olhos
se encontraram por uma fração de segundo, e Knight casualmente afastou
seus longos cabelos para trás e deu mais um passo para perto de Gyro.
Inevitavelmente, Gyro virou a arma para ele, mas pelo menos afastou a
atenção de Beast.
Gyro soltou um grito agudo, mas, assim que ele bateu no chão, a arma
disparou seguida de um estrondo.
Beast torceu a mão de Gyro para fazê-lo soltar a arma de fogo, então
deu um soco poderoso que acertou o rosto do cara. O cheiro de enxofre
explodiu inesperadamente em seu rosto, e o salão rompeu em gritos. A
cabeça de Beast se ergueu e, na nuvem pálida de fumaça e pó, ele viu um
homem lutando contra um grande bloco, espalhado pelos escombros. A luz
ambiente iluminava o suficiente do teto, e com o seu coração batendo
furiosamente, Beast notou um grande entalhe na decoração esculpida na
parte de cima - a fonte dos detritos que choveram para o chão em grandes
pedaços, em vez de pequenos.
— Sinto muito! — ele gritou, agora soando lamentável, e com medo por
sua vida. Tarde demais para isso.
King olhou para ele com uma carranca. — A bala desalojou algo no
teto...
Beast pegou a arma caída e puxou Gyro para cima com um único braço.
A confiança do filho da puta derreteu, substituída por um medo tão intenso
que ele estava tremendo e mal conseguia ficar de pé. Pensar que alguém
patético assim era a fonte da dor de Davy era um insulto. Os olhos de Beast
se encontraram com os de King. Entendimento sem palavras passou entre
eles, e King concordou, dando permissão para Beast lidar com Gyro como ele
bem entendesse.
— O que você quer que eu faça? — Jake perguntou, com os olhos azuis
arregalados no rosto jovem, o menino inclusive corou. Ele costumava jogar
futebol na escola, e ele agora parecia tão animado como se tivesse marcado
um touchdown.
— Por favor, eu não queria fazer aquilo! Quero dizer, não queria dizer
nenhuma ofensa! Eu estava muito bêbado!
Beast empurrou o filho da puta para frente, fazendo-o rolar nas escadas
velhas. Ouvir o som do corpo caindo no piso mais abaixo não fez nada para
aliviar a raiva de Beast. Nada poderia tornar isso melhor.
— Você era um convidado aqui. Não podemos tolerar isso. Você não
pode ferir o nosso VP e ir embora. — Beast disse, ao ligar a única lâmpada
que iluminava o pequeno espaço vazio cheirando a mofo e merda de ratos.
Ele desceu as escadas do porão em apenas três passos longos.
O sangue corria rápido nas veias de Beast, e até mesmo quando olhou
diretamente nos olhos inchados do cara, não sentiu nenhum remorso. Gyro
deveria estar feliz de que sairia vivo do clube. Mas isso não significa que ele
poderia deixar Davy aleijado e sair dessa com apenas algumas feridas. Antes
que Gyro pudesse reagir, Beast puxou sua mão direita, a mesma que deu o
tiro no teto, e descansou seu antebraço contra a borda de um bloco de
cimento que estava ao lado. Beast empurrou para baixo usando o bloco como
alavanca, e os ossos quebraram com um rangido doentio. Gyro deu um grito
frenético, e desmaiou.
5
O que ele quis dizer foi que, para se livrar da morte, ele poderia “virar” gay.
Houve algum tipo de “sim, senhor” a partir de onde Beast estava, mas
não esperou para ver se ele entendeu, apenas saiu e subiu as escadas.
Hound se movia como se estivesse seguindo uma trilha clara, mas Beast
não podia cheirar nada além de poeira e umidade. Eles estavam deixando
para trás os gritos e até mesmo o som da ambulância se aproximando, e,
eventualmente, entraram em um corredor tão em desuso, que tinha uma
espessa camada de poeira no chão. Agora mesmo Beast podia ver pegadas
fracas na poeira, e ao lado delas, gotas escuras que poderiam ser de sangue.
— Eu... Eu não estou certo de onde estou — o estranho deu meio passo
para fora da sombra, e para a luz que vinha de fora. Seu sotaque era
nitidamente estrangeiro. Francês talvez?
O garoto tentou se afastar do seu aperto, mas ele não parecia ter
habilidade e força. — N-não. Eu acho que não é meu. Eu não sei. Aqui é o
inferno?
Laurent não tinha certeza se ele estava destinado a uma vida de pecado
ou se o livro irreversivelmente o deixava corado, mas nunca em sua vida ele
olhou para uma senhora e se perguntou como seria compartilhar uma cama
com ela. Em vez disso, ele às vezes se maravilhava com a força dos homens
que trabalhavam no porto, e secretamente admirava os antebraços grossos
revelados pelas mangas arregaçadas, e se perguntava como seria se deitar
nu na cama com um deles. Como seria ter a sensação de mãos masculinas
o tocando de maneiras íntimas, ter um homem em cima dele, pressionando-
o...
Com toda a justiça, Laurent não estava inteiramente certo de como dois
homens poderiam se conectar desta forma, o livro não dava explicações
detalhadas, e dificilmente fornecia muito material de leitura, mas nada tinha
sido o mesmo desde que ele pegou pela primeira vez o livro em suas mãos.
Ele estava ciente das consequências sociais de seus desejos, é claro, e o medo
da descoberta era um que o impedia, e, conforme Laurent cresceu, ele se
convenceu de que não poderia se sacrificar para deitar com um homem.
Possivelmente. Talvez. Provavelmente.
Então, se apenas as faíscas de interesse que ele tinha certeza que sentia
do Sr. Fane fossem reais, Laurent estava prestes a tomar o assunto em suas
próprias mãos e experimentá-los contra a sua pele.
Tentou não abrigar muita esperança, mas a entrega de livros para o Sr.
Fane era mais uma oportunidade para desenvolver uma conexão mais íntima
e pessoal. Ele estava certo que o Sr. Fane gostava dele. Ele, além de visitar a
livraria com frequência para compartilhar seus pensamentos com Laurent,
também havia comprado para Laurent uma cesta das maçãs mais doces após
um encontro casual no mercado. E para lembrar ao Sr. Fane daquela época,
Laurent trouxe duas maçãs para compartilhar com ele. Ele esperava que não
ultrapassasse nenhuma linha com a oferta de tais alimentos escassos a
alguém que provavelmente consumia açúcar e marzipan6 todos os dias, mas
no fundo, Laurent sabia que o Sr. Fane iria apreciar e compreender o gesto.
E comê-los juntos seria como compartilhar um segredo.
6
Marzipã, marzipan ou maçapão é um doce de origem árabe, preparado a partir de uma pasta feita de amêndoas
moídas, açúcar e claras de ovos, que pode ser moldada. Também podem ser adicionadas essências.
causando caos e prisões súbitas quando Laurent deixou sua pátria e foi para
as Américas.
Ele não possuía muito, mas teve a sorte de ser agraciado com um belo
rosto e o cabelo brilhante e saudável. Secretamente, se perguntava se as
longas madeixas, nos braços do homem certo, poderiam fazê-lo passar por
alguém tão dócil como uma mulher, mas essa esperança só era baseada em
sua própria interpretação das coisas, que ele mal compreendia.
Mas ele não podia correr o risco de cair e arruinar não apenas suas
roupas de domingo, mas também os itens que o Sr. Fane lhe pediu para
entregar. Assim, ele perseverou, dizendo a si mesmo que não havia nada a
temer. Lobos eram raros na área, e a luz na mão de Laurent certamente
assustaria todos os predadores. Os homens que pereceram certamente não
possuíam nenhuma mercadoria.
Ele não se atrevia a dizer a ninguém que a cada semana que passava,
as letras estavam ficando mais borradas e os objetos em sua proximidade
pareciam tão claro que às vezes tinha dificuldades em reconhecer as pessoas
que ele não conhecia muito bem. Com os sete anos de seu contrato prestes
a chegar ao fim, e com toda a sua família deixada para trás na França, e que
quase nunca lhe escrevia cartas, sua situação estava além de terrível. Tendo
trabalhado como funcionário de uma livraria a maior parte de sua vida, ele
não tinha outra habilidade. E quão bom seria ter um funcionário que não
poderia escrever, nem ler, ou pior ainda, que acabaria por perder a visão?
Ele sabia que havia métodos para ajudar com as doenças dos olhos,
mas eram métodos e próteses caras, e ele não podia esperar que o Sr.
Barnave, mesmo sendo um bom mestre, pudesse comprar um par para
Laurent, especialmente tão perto do fim do seu contrato. Mencionar isso
poderia negar a Laurent até mesmo a menor chance de encontrar um
emprego em Brecon quando estivesse livre de suas obrigações contratuais.
Não ajudava que os sentimentos de Laurent sobre o assunto estavam ficando
mais sérios a cada dia.
Quando chegou à última das árvores, a casa do Sr. Fane veio à tona
com sua fachada branca, grande o suficiente para ser uma câmara
municipal, e mais dois conjuntos de colunas emolduravam o alpendre, e uma
grande varanda no segundo andar. Era magnífica, e tão bonita a sua
simetria, com uma cerca elegante de pedra e metal.
Uma leve brisa levou o perfume das flores, e ele respirou fundo,
fechando os olhos e simplesmente apreciando a forma como o seu cabelo
longo deslizava contra o seu rosto. Como ele esperava que os dedos do Sr.
Fane fizessem hoje à noite. Era tão tranquilo aqui. Talvez ele fosse autorizado
há passar mais tempo aqui, se ele conseguisse forjar uma estreita amizade
com o Sr. Fane?
Laurent engoliu um grito que quase escapou de seus lábios, mas ele
reconheceu a voz do Sr. Fane a tempo. Ele levantou a lanterna e olhou em
volta, frustrado sobre o quão pobre a sua visão era das coisas mais próximas.
Se o Sr. Fane soubesse disto, será que ele ainda o teria convidado?
— Boa noite, Sr. Fane. — Laurent deu alguns passos na direção da voz.
A luz tocou uma enorme rocha que estava ao lado da linha das árvores
e era alta o suficiente para ter o tamanho da cabeça dos ciclopes lendários.
O corpo gracioso do Sr. Fane estava esticado em um banco delicado, que
estava posicionado de tal forma que, um escultor poderia contemplar esta
maravilhosa prova de desenvolvimento geológico da região.
— Boa noite para você também. Eu espero que você não esteja
excessivamente exausto após toda essa caminhada, mas eu não podia deixar
de apreciar minha chaise esta noite — disse o Sr. Fane, lentamente se
levantando e apoiando o seu longo corpo graciosamente em uma bengala,
mesmo que ele provavelmente não precisasse. Era apenas um sinal de seu
status, assim como as roupas caras e perfeitamente adaptadas que ele
sempre usava.
Agora que o Sr. Fane se aproximou, o rosto que parecia tão simétrico de
longe estava começando a ficar confuso, mas Laurent estava determinado a
não mostrar qualquer preocupação ou hesitação.
Sr. Fane olhou para o chão remexido.
— Ah, isso. Não é nada — ele disse com um largo sorriso. — Você disse
a alguém que não seja o Sr. Barnave onde estava indo hoje à noite?
Se apenas Laurent pudesse fazer o Sr. Fane ver que ele valia tal atenção,
ainda poderia haver um bom futuro na loja para ele. Um emprego dentro da
residência do Sr. Fane, talvez? Laurent não ousaria expressar o desejo de tal
patrocínio incondicional, mas se um homem de riqueza tão vasta como o Sr.
Fane se afeiçoasse a ele, ele poderia certamente ajudar um amigo em tempos
de necessidade? Laurent sabia como tornar-se útil, e podia auxiliar nos
afazeres da casa do Sr. Fane se tivesse a chance.
Sr. Fane inclinou sua cabeça, e estava tão perto de Laurent que ele
poderia cheirar a doçura de sua respiração, e deixou o seu coração galopando
como um garanhão frenético.
Por um momento, Laurent temia que ele não soubesse como agir em
torno dos servos, sem saber a sua posição, que nem era de um convidado e
nem empregado, mas quando entrou na casa, não havia uma única alma
para cumprimentá-los. Sem pensar em como era estranha essa situação,
Laurent achou um alívio, porque ele queria William só para ele, sem a
necessidade de impressionar ninguém, além do seu anfitrião.
Ele quase não registrou o salão elegante suavemente iluminado por sua
humilde lanterna. Os seus tetos altos e esculturas de deuses congelados em
poses sensuais em pequenas alcovas ao longo das paredes davam a casa
uma aparência ainda mais silenciosa. Eles eram divindades gregas, com
atributos, e quando Laurent enfrentou o rosto de Dionísio olhando para ele
a partir de um afresco, se distraiu tanto, que Laurent se esqueceu de estudar
quaisquer outras esculturas. Quando Laurent olhou para a luz e sombra que
era o rosto de William, ele estava completamente hipnotizado.
— Qualquer coisa?
— Bobagem, Laurent. Por que você iria até mesmo dizer algo assim,
doce menino? — William sussurrou, e mesmo este ínfimo e suave som
deslizou pelas paredes altas do corredor.
Laurent engoliu em seco. Ele tinha que andar pelo corredor com base
no que ele podia ver ao longe e lembrar quaisquer obstáculos potenciais. —
Acredito que um homem deve ter uma mente aberta para viver sua vida ao
máximo.
— Eu não quero ser rude, mas onde estão os criados? Eu acredito que
uma casa tão gloriosamente limpa deve ser cuidada por muitos.
Fane ignorou a estátua e andou em linha reta para sua sombra, tocando
os painéis de madeira. Algo clicou, e uma seção da parede se moveu,
revelando uma porta escondida. O ar frio bateu no rosto de Laurent, e
quando o brilho lançado pela lâmpada escapou para o espaço atrás da
entrada secreta, um lance escondido de escadas surgiu, levando para o porão
que se revelou. As paredes estavam curiosamente nuas, muito mundanas
para um homem tão rico quanto William Fane. William trancou as duas
fechaduras na porta, logo que entrou.
— Será que nós o usaremos? Para que servem? — ele olhou para o
corredor com um teto baixo e várias portas de cada lado. Todas as paredes
estavam cobertas de madeira muito bem esculpida, mas não havia outras
decorações, o que fazia o lugar parecer inacabado. Seriam os aposentos
privados de William?
De sua garganta até o seu umbigo, arrepios percorriam para cima e para
baixo o corpo de Laurent. Ele ergueu o saco com livros, abriu e tirou uma
maçã e a apresentou a William, pateticamente tremendo.
Ele era um homem que iria conseguir o que tanto desejava. Ele
mostraria a William suas intenções e queria ser considerado digno da
atenção do homem. — Eu trouxe um presente para você.
— Eu... Eu nunca conheci um homem que... Você vê, isso é muito novo
para mim. — Laurent balbuciava, ficando quente e frio. Tudo estava
acontecendo tão rápido, e sua boca ainda tinha o gosto da maçã que tinha
dado a William. Laurent iria sempre pensar naquele beijo quando comesse
torta de maçã ou até mesmo quando a cheirasse.
Laurent engoliu, sem saber o que fazer com o pedido. Era algo que os
amantes faziam uns para os outros? Seriam amantes?
Ele agarrou a parte inferior da bota e puxou, com firmeza suficiente para
tirá-la sem causar desconforto. O pé com meia surgiu e quase o tocou entre
as pernas, como se esta fosse mais uma maneira de seduzi-lo.
William deu uma risada curta. — Você acha que ele sabe por que eu
queria que você passasse a noite aqui?
— Ah, isso é muito bom. Uma flor para eu arrancar. — William disse,
pedindo para Laurent se levantar segurando o queixo dele delicadamente.
Laurent deu um passo para trás, mas William não soltou a gravata,
segurando Laurent com ela como se o tecido delicado fosse um colar. —
Isso... é o que quero. Muito. Mas eu estou nervoso, e isso está levando o
melhor de mim, e seria muito melhor se tivéssemos a chance de nos conhecer
melhor primeiro, William.
— Eu sei, mas este tipo de conexão é nova para mim. Eu nem tenho
certeza sobre como deve ser essas coisas. — Laurent agarrou o pulso de
William. O doce aroma na sala estava começando a deixá-lo doente. —
Podemos, por favor, nos beijar de novo?
William exalou contra seus lábios, mas não se moveu para tocá-lo. —
Por que você aceitou me cortejar, se você não tinha a intenção de seguir
adiante? Eu não vou ser manipulado dessa forma.
Laurent passou os braços nos ombros fortes de William. Por que ele
estava tão confuso? Ele queria ser tocado por William. Não sonhava em
passar uma noite nos braços de William? Seus membros emaranhados, suas
bocas dançando juntas como se o ar não fosse necessário?
Ele estava sendo bobo. O seu primeiro beijo não tinha virado o mundo
dele de cabeça para baixo? Será que ele não queria ir muito mais além? Será
que ele não queria tocar a pele nua de William? Ele não podia esperar para
sempre, se concordasse em ter o fruto proibido. E quanto tempo sua visão
ainda iria durar? Não havia garantias de que ele ainda poderia atrair um
homem uma vez que seus olhos desistissem de funcionar e ele fosse afogado
na escuridão ao longo da vida. Esta poderia ser sua única chance de
encontrar a felicidade, e ele não deixaria a insegurança levá-lo para longe
dele.
E quando ele olhou para cima, encontrou uma algema de ferro em torno
de seu pulso, e por alguns momentos estava muito chocado para perceber
que a outra extremidade da algema curta estava anexada à estrutura da
cama.
— Isso. Eu pensei que você nunca iria parar a sua teatralidade — disse
William, segurando a outra mão de Laurent.
A falta de funcionários.
— Não, você foi comido por lobos. Minha serva irá se certificar que
alguém encontre os livros na floresta. E o seu casaco manchado de sangue.
Ninguém vai saber que você esteve aqui.
Sua mão ficou tão suada que conseguiu deslizar para fora do aperto de
William, e ele bateu no rosto dele, colocando toda a sua força em um único
golpe desesperado. Ele nem estava pensando em maneiras de escapar ou
lutar mais contra William. Sua mente era um borrão de medo, como se a
doença dos olhos tivessem tomado seus pensamentos também.
Laurent gritou quando ele moveu a palma da mão mais para cima do
objeto e tocou dedos duros, sem vida.
— Não! Por favor! Eu sempre fui gentil com você! — Laurent gritou,
incapaz de compreender que uma criatura tão vil andasse na terra, que ele
fosse um membro admirado da sociedade. E ainda, em seu estado
desesperado, Laurent perguntou-se se havia alguma coisa que poderia salvá-
lo, se havia uma arma escondida em algum lugar para que ele perfurasse o
coração do demônio.
Ele fazia tudo certo. Trabalhava duro e tentava não sentir pena de si
mesmo, apesar da maldição de sua visão falhando. Ele não permitiria que
William fizesse isso com ele. Ele não seria escravizado por este monstro
nojento!
William estava louco. Nunca em sua vida Laurent tinha encontrado esse
tipo de maldade pura e sem remorso. Seria a própria sanidade de Laurent a
sua chave para a segurança, ou ele estava prestes a entrar na espiral de
loucura também? Suas entranhas já estavam torcendo dolorosamente.
Ele avaliou o quão longe a corrente lhe permitiria se mover, e não era
muito.
Será que a coleira tinha espinhos para torturar um homem até que ele
obedecesse? Quem William realmente era? Laurent precisava fazer algo e
rapidamente, antes que esse fogo em suas veias acalmasse. Ele
freneticamente procurou em sua mente todos os indícios, todas as boas
ideias dos livros que ele tinha lido, mas quando William se aproximou
novamente, Laurent ficou de joelhos e mordeu seu braço como um cão
raivoso, e toda a finesse foi esquecida.
Seus dedos roçaram na lâmina que acabou por ser tão afiada como
Laurent tinha imaginado, mas os cortes rasos que sentiu nos dedos não eram
nada em comparação com a dor causada pela falta de ar ou o soco que levou
mais cedo na cabeça. Seus pulmões doíam como se mil agulhas o picassem
todas de uma vez, e sua visão estava embaçada, distorcida e escurecida nas
bordas.
Ele não podia arriscar que a ferida que infligiu fosse uma que William
pudesse se recuperar, e quando seu algoz freneticamente se pôs de joelhos,
Laurent esfaqueou com a tesoura o estômago vulnerável que até agora estava
escondido por uma camisa de linho. O barulho lembrava a Laurent dos sons
produzidos por aves de rapina, e perfurou seus ouvidos quando ele esfaqueou
as duas lâminas na carne mais e mais, mesmo depois que William tombou,
Laurent continuou, e logo depois caiu como uma pedra sobre ele. Sua carne
mutilada estava aberta, substituindo os gritos de William, mas Laurent
continuou, mesmo quando as entranhas começaram a aparecer e a feder.
A casa não estava mais tremendo, e a pessoa que tinha tentado invadir
o quarto momentos atrás não estava fazendo mais tentativas. Certamente,
algum servo teria sentido o chão tremer, mas eles iriam procurar seu mestre
aqui? Poderia ter sido a imaginação frenética de Laurent?
O que ele deveria fazer agora? Seus joelhos estavam fracos, seus dedos
tremiam, e olhou com descrença para a carnificina que tinha causado. Ele
amaldiçoou no momento em que engoliu um pouco de saliva com sangue.
Não estava muito apertado, então havia alguma esperança para ele, e
apesar da sensação de que William tinha de alguma forma o enganado a
acreditar que ele tinha morrido e estava prestes a atacá-lo por trás, Laurent
persistiu. Com cuidado, ele torceu a mão na algema, adicionando um pouco
de saliva como lubrificação. Seu progresso foi lento, mas quanto mais ele se
concentrava na sua tarefa, mais subjugada sua ansiedade se tornava.
Quando chegou ao ponto em que sua mão estava áspera, e a dor em suas
juntas se intensificou, ele não desistiu e continuou, sabendo que a
sobrevivência estava ao seu alcance, ele só tinha que se libertar. Na pior das
hipóteses, iria deslocar o dedo.
E mesmo que não tivesse sido necessário, ele esfolou a pele do lado de
fora de sua mão, mas era um pequeno preço a pagar.
Ele matou um homem. Um homem como o Sr. William Fane. Será que
alguém acreditaria que Laurent estava apenas se defendendo? Eles
certamente viriam a este quarto? Eles também iriam encontrar o braço de
Marcel, e eles não poderiam supor que Laurent trouxe com ele, poderiam?
Laurent cobriu a boca e deslizou pela parede com um soluço. Sua vida
inteira estava sendo destruída por causa de uma coisa que tinha tentado
alcançar, e ele ainda não tinha provado a liberdade de seu contrato na
livraria. Fane nunca se importou com ele, ele era louco e cruel, e estava
atraído apenas pela aparência de Laurent. Certamente, nenhuma das suas
conversas tinha importado para o vilão assassino.
Ele congelou quando seu olhar foi até um tipo de armário, ou um guarda
roupa coberto com um tecido preto e grosso. Ele tinha notado quando entrou,
mas agora via com perfeita clareza, embora as paredes ao lado estivessem
borradas.
Laurent olhou para cima e deu um passo para trás com um grito,
estendendo a arma improvisada, mas a figura à sua frente fez o mesmo. Só
então ele percebeu que ele estava olhando para um espelho. Seu reflexo
estava coberto de sangue além do reconhecimento, mas mesmo com o medo
se torcendo no interior de Laurent, ele ficou chocado com a clareza da
imagem. Ele não tinha visto um desde que ele era uma criança.
Ele olhou fixamente os seus olhos castanhos, que tantas vezes eram
apenas um borrão; os rios de lágrimas em seu rosto manchado de sangue,
ele não sabia que estava chorando, muito sobrecarregado para perceber.
Sua mente estava brincando com ele? Ele estava ficando louco? Ou era
a alma do mal de Fane voltando do além-túmulo para terminar o que o corpo
não poderia?
Laurent estava com medo de olhar para trás, com medo de enfrentar a
criatura desconhecida cuja simples presença fazia sua pele queimar, mas
não havia outra saída, e ele virou-se lentamente.
Laurent engoliu, olhando nos olhos de uma criatura que podia ver com
perfeita clareza.
— Em algum outro lugar? Em algum lugar onde eu possa ser livre? Ser
o mestre do meu próprio destino? — ele sabia agora o que essa criatura era.
— Você é o diabo?
Laurent engoliu em seco. Será que essa criatura iria criticá-lo, ou julgá-
lo por fazer um pedido que os seus contemporâneos iriam considerar
imorais?
— Sim.
Agora vinha a parte mais difícil. — Você não iria fazer algo assim
livremente. O que você quer de mim?
7
A criatura se refere à Beast e King, nomes de estrada dos MCs, mas Laurent não sabe, então está correto traduzir
para o português, pois a princípio não são nomes próprios. King = Rei; Beast = Besta, Fera e etc.
Capítulo Quatro
Laurent
Em um tapete espesso.
Ele olhou para trás, apenas para enfrentar o seu próprio reflexo
embaçado no que era um espelho alto, onde o diabo usou para entrar no
mundo humano.
Ele não estava mais no quarto-porão. O teto era mais alto, e uma janela
grande ao lado de Laurent deixava entrar luz suficiente para que ele
examinasse o quarto, que era tão grande quanto o mercado de Brecon ou um
andar inteiro de um edifício, sem paredes para dividir o espaço. Poderia ter
sido uma câmara usada para armazenamento, mas ele não viu poeira, e os
móveis estavam organizados de forma ordenada.
Ele se virou para observar uma pintura de uma mulher de pele escura
e nua, deitada de costas para o seu pintor, com nenhuma explicação
alegórica para a pele desnudada. Apenas uma mulher bonita envolta no
lençol. Laurent deu um passo para trás, atingido pela audácia de uma arte
sem vergonha e pudor. Talvez este fosse o inferno depois de tudo.
Ele olhou para o lado quando notou algo se mexendo no canto do seu
olho, apenas para detectar outra mulher nua. Esta era definitivamente mais
real, a menos que o inferno tivesse esculturas em movimento. Ela gemeu e
rolou para o lado em uma cama que poderia caber pelo menos cinco pessoas
confortavelmente.
Laurent deu alguns passos em sua direção, chocado pela forma como...
A mulher parecia. Ela era provavelmente mais alta do que ele quando ficasse
em pé.
Seu cabelo tinha uma cor selvagem que, à luz fraca parecia quase tão
azul como sua jaqueta. Será que ela era um súcubo esperando um homem
para seduzir em seus braços e tirar a sua energia?
Na porta atrás do sofá, havia outra pintura, desta vez com uma imagem
crua de um crânio e uma coroa de ossos cruzados debaixo dela. A imagem
estava enquadrada por palavras na parte superior e inferior, e a escrita era
grande o suficiente para Laurent ler: Kings of Hell Moto Club.
Isso fazia sentido. Afinal, a criatura que o enviou para os Kings of Hell,
deveria ter mulheres nuas esperando nos espaços escuros cheio de
parafernália de morte? De uma das prateleiras na parede, um crânio de
cristal verde sorria para ele, uma coroa de ouro firmemente colocada ao lado
de sua cabeça.
8
Novamente um trocadilho com os nomes do personagem King: King of Hell (Rei do inferno).
poderia voltar assim que os soldados fossem embora, uma vez que o perigo
não fosse tão pronunciado como parecia agora. O que quer que este mundo
fosse - se era um dos círculos do inferno ou apenas outro reino, Laurent
estava determinado a sobreviver e cumprir as ordens do diabo.
Ele não podia simplesmente esperar até que o perigo o pegasse, então
forçou as pernas a se moverem. Quando ele passou por outra porta, um
latido vicioso irrompeu atrás dela, fazendo-o cair contra a parede oposta. Ele
engoliu um soluço e virou-se, com medo do animal escondido na sala
trancada. A casa escura estava cheia de horrores escondidos e a mente de
Laurent não estava muito mais clara com o medo florescendo dentro dele.
Quando teve que escolher entre dois caminhos através deste cemitério
de itens abandonados, que estavam cutucando e raspando os seus membros
no mobiliário, ele escolheu o caminho mais empoeirado na esperança de que
algo dentro dele tinha até agora impedido os monstros de encontrá-lo. Ele
acelerou, ignorando todas as dores em seu corpo, deixando para trás o
trabalho e a luta contra a força superior de Fane. O rugido da besta o fez
abrir a porta mais próxima, na esperança de se esconder lá dentro, mas, de
repente, ele foi confrontado com um flash de luz que mudava do vermelho
para o azul alternadamente, como se fosse o caleidoscópio do diabo.
Ele queria ficar longe das cores ofuscantes, e correr de volta para o
corredor e encontrar um esconderijo diferente, mas o latido alto o fez
congelar, em seguida, tropeçou para trás, na direção da janela. Ele olhou ao
redor, mas estava dolorosamente vazio. Nem um único pedaço de madeira
que pudesse usar para se proteger do confronto com a besta. Não havia lugar
para correr.
A besta não lhe deu tempo suficiente para resolver o enigma. Ele deu
um pulo ao ouvir o latido que parecia querer comer Laurent vivo, e tudo o
que ele podia fazer era se afastar até o canto e rezar por um milagre.
— Eu... Eu não tenho certeza de onde estou — ele deu um meio passo
para fora da sombra até a luz fraca vinda de fora.
O monstro rosnou ainda mais ferozmente do que o seu cão com uma
voz rouca como se sua garganta estivesse cheia de agulhas.
O cão enorme foi rápido para ameaçar Laurent também, e assim que ele
rosnou, Laurent voltou para o seu canto com um gemido. Sua cabeça estava
girando, e cada vez que ele olhava para a criatura parecida com um humano,
que poderia ter mais de um metro e oitenta de altura, ele se sentia
completamente indefeso. Ele não entendia por que o demônio o escolheu, de
todos os homens, para enviar a este reino.
E se ele admitisse seu crime? Será que ele seria recompensado por isso
em um lugar onde os crânios faziam parte da decoração? Ele não podia
confessar até ter certeza.
— N-não. Eu não acho que seja meu. Eu não sei. Aqui é o inferno? —
ele perguntou, exasperado quando as enormes mãos do gigante finalmente
se afastaram dele.
Laurent queria falar, mas empurrou seu corpo contra o gigante quando
o cão passou correndo por ele, escovando seu corpo musculoso contra as
pernas de Laurent.
— Eu não ligo para o que você quer dizer. Você está em nossa
propriedade. Você veio até aqui coberto de tanto sangue, que você pode ter
esfolado a pele de alguém! Você deve ficar contente por eu não estourar os
seus miolos. Você não é daqui, certo?
— Tudo bem, tudo bem. Você está parecendo confuso pra caralho.
Bateu com algo na cabeça? Dói? — perguntou o gigante, seguindo o seu cão
em um lance de escadas até chegar a um corredor, semelhante ao primeiro
que Laurent entrou, este era menos confuso e tinha as mesmas lâmpadas
estranhas. Então, novamente, eles estavam andando em um enorme
labirinto, e não ficaria surpreso se eles estivessem realmente andando pelos
corredores para tentar alcançar os quartos que estavam em movimento.
— Você tem médicos aqui? — talvez apenas para consertar aqueles que
foram torturados, apenas para que eles pudessem ser atormentados
novamente.
— Disse que machucou a cabeça. Precisamos ver se ele não está ferido
— disse o gigante, finalmente puxando Laurent para o interior da câmara,
que era bem grande e pouco decorada, com paredes cor de vinho e sofás cinza
de um tipo semelhante como o que Laurent viu na sala do espelho.
O cão enorme andou por todo o cômodo, depois foi até um grande
travesseiro onde descansou depois de fazer vários círculos em torno dele.
Mas era o que estava ao lado de seu ninho de tecido que deixou a boca de
Laurent seca. Havia uma estante tão cheia de livros, que alguns estavam
empilhados em cima dos outros. Seu entusiasmo diminuiu um pouco quando
ele percebeu que se o inferno tinha livros, eles poderiam estar cheio de
páginas vazias, apenas para zombar de quem ousara estender a mão para
pegar um romance e acalmar sua mente.
9
Novamente a confusão devido o nome do King e o significado dele (Rei). Como Laurent não o vê como King e sim
como Rei, decidi manter assim para evitar confusão.
— Ele deve ter. Somente alguém sem juízo na cabeça estaria andando
por aí vestido desse jeito — ele empurrou algo na parede, e uma luz tão
brilhante quanto uma dúzia de velas iluminou o quarto de uma só vez. —
Jesus, foda-se! Ele está coberto de sangue! É como se ele tivesse estado em
uma matança de zumbis ou algo assim!
— Eu não matei ninguém! — Laurent foi rápido em dizer, uma vez que
ele decidiu que era o melhor curso de ação.
O Rei se aproximou e Laurent tentou não fazer uma careta. Ele odiava
o momento em que as expressões faciais das pessoas ficavam fora de foco,
principalmente nos momentos de vulnerabilidade, pois ser capaz de ler sinais
faciais poderia ser uma questão de vida ou morte. — Nós só precisamos saber
o que aconteceu. Não podemos deixá-lo aqui coberto de sangue.
— É só nos dizer, e eu prometo que você vai ficar bem — disse o gigante,
encostado na parede. Laurent deu alguns passos para trás, para a luz
brilhante, assim ele poderia ver seu rosto muito mais claramente. Havia de
fato linhas e fileiras de escrita obscurecendo suas feições em todos os
lugares, exceto nos olhos pálidos, lábios e narinas. Mas havia algo mais sob
a tinta, como se a pele tivesse sido de algum modo retorcida, e mastigada por
um cão feroz, especialmente no lado esquerdo, onde Laurent só agora
percebeu que havia um ouvido faltando. O braço esquerdo do homem
também estava completamente preto, como se estivesse coberto do alcatrão
que tinha derramado para fora do espelho do diabo.
O Rei respirou fundo e deu um passo ainda mais perto dele. — Você
acha que pode mentir para os Kings of Hell, menino? Vou perguntar mais
uma vez. Existe um corpo em algum lugar nas instalações que você quer nos
contar?
— Eu perguntei a ele, e ele não vai dizer. Hound só me levou até ele —
disse o gigante de seu lugar ao lado da porta.
— Por que diabos isso tem que acontecer esta noite, quando temos
policiais e médicos nas instalações? Foda-se — o Rei assobiou e chutou um
balde vazio.
— Vamos ter calma sobre isso. Você sabe que todos estão no nosso
bolso, e não vai ter investigação além dessas instalações. Se alguns
adolescentes já se infiltraram em um dos quartos abandonados, porque ele
não poderia? Talvez alguém o tenha deixado aqui para cobrir seus rastros?
É óbvio que ele deve ter tido algum tipo de traumatismo craniano. Você não
percebe o quão estranho ele fala? — perguntou o gigante.
O Rei suspirou profundamente e agarrou a frente do casaco de Laurent
sem levar em conta que o sangue poderia sujar sua mão.
À primeira fala do Rei, Laurent não estava certo do que ele queria dizer,
mas, em seguida, o gigante pegou algo de trás da calça e puxou um par de
algemas unidas por uma corrente curta, e sua curiosidade se transformou
em terror.
— Cristo... Sua mão está fodida. Como se ele já tivesse sido preso e
tivesse tentado se soltar — o Rei disse, olhando por cima do pulso de Laurent.
O sangue fresco começou a pingar nos dedos de Laurent, onde a crosta mal-
formada fora arrancada na luta. — Esta é uma merda fodida — o Rei circulou
Laurent e se inclinou para olhar o seu rosto. — Escute, criança...
O Rei riu e colocou as mãos nos ombros de Laurent. — Até que nós
possamos descobrir o que aconteceu com você, você não pode sair, mas não
vamos algemá-lo, ok? Acalme-se, e nós não iremos prejudicá-lo.
O gigante gemeu, olhando para o chão sujo. — Mas você vai limpar isso,
porque eu não vou. Agora tire a roupa. Precisamos ver se você está ferido em
qualquer outro lugar.
O Rei concordou e até sorriu. — Tire todo esse sangue de você. Se nada
mais, então vai pelo menos ajudar com o seu cheiro.
— Se ele for, teve algum tipo de colapso. Não podemos ser arrastados
para sua merda. Temos o suficiente no nosso prato agora.
Laurent tirou as botas, já imaginando como ele iria salvar todas as suas
roupas depois de danos tão terríveis. — Meu nome é Laurent Mercier.
O silêncio que se seguiu o fez olhar para cima a partir dos botões de sua
calça que sempre lhe deram um pouco de dificuldade.
O Rei suspirou, mas ele não parecia estar falando com Laurent. — Me
dá um tempo.
Desde que eles não estavam falando dele, Laurent tirou todas as suas
roupas e as colocou em uma pilha na borda da banheira. Pelo menos uma
camada de fluidos corporais estava fora dele, mas ele estava muito consciente
de sua própria nudez, as manchas vermelhas em seu corpo, e o sangue ainda
escorrendo de sua mão.
— Será que... Alguém poderia me providenciar um banho? Ou... Eu...
Quer dizer, eu poderia fazer isso sozinho. Por favor, instrua-me.
— Use qualquer gel que quiser — disse o gigante do lado de fora da tela,
e apontou para uma prateleira de metal contendo várias garrafas. Todas elas
pareciam ser feitas de vidro, mas ao toque, acabou por ser algo
completamente diferente, um tipo de resina, talvez?
Mas algo mudou na atmosfera atrás dele, e antes que ele percebesse, o
Rei abriu a porta, e agarrou o pescoço de Laurent com uma palma maciça.
— Eu apenas pensei que ele poderia sair de sua amnésia. Você sabe,
como quando você assusta alguém com soluços — ele recuou, e assim que
sua mão o soltou, Laurent tropeçou de volta para o chuveiro quente, muito
atordoado para pensar. Algo estava terrivelmente errado, e esse sentimento
torcia todas as suas entranhas. Ele não podia ver bem, mas ele podia sentir
a mentira.
— O quê?
Laurent deu um passo para trás do vidro que estava embaçando tanto
que ele mal podia ver o gigante. Ele passou os dedos sobre a nuca e sentiu
cumes em sua pele que não estavam lá da última vez que ele tocou. Os cumes
pareciam quentes, mas não o queimava. Sua respiração acelerou, e ele se
lembrou de como o diabo o tocou.
O gigante exalou.
— Ah, então agora você não sabe o que é uma toalha? Muito engraçado.
Eu estou tendo um ótimo momento ao lidar com a sua merda. Venha aqui —
acrescentou bruscamente e abriu uma gaveta no armário.
Laurent suspirou. Ele tentou, ele realmente tentou, mas parecia que
nada o que sabia era válido neste... Lugar. Será que não era o inferno? Ele
não entendia nada. Ele estava cauteloso, mas o gigante ainda não o
machucara, então ele deu um passo para mais perto.
Laurent mordeu os lábios para não choramingar. Ele tinha que parar
de pensar no homem como um ser desumano, mesmo que ele fosse
monstruoso. Ele abraçou a toalha com uma mão. Este não era um lugar
normal, o que quer que fosse este clube.
— Eu teria dado meu jeito. — Laurent disse, mas não soou tão
convincente como ele teria desejado. Ele desprezava ser um prisioneiro, mas,
por outro lado, só tinha roupas ensanguentadas, o broche bonito, e nada
mais. Nem uma moeda para a sua alma.
O gigante soltou um rosnado e empurrou mais pano para Laurent. —
Coloque esta roupa. Se você não vai falar, então vai se vestir como um
prisioneiro. Se imagine em roupas laranja.
— Não até que você fale. Não podemos ter um estranho nos espionando.
É apenas a sua escolha.
10
Novamente ele leva pro literal o significado do nome Beast (Besta, fera e etc.).
Laurent voltou a pensar nos latidos furiosos do cão e engoliu
nervosamente. Ele iria encontrar uma maneira de sair. Afinal, ele era muito
mais esperto do que aquele cão.
— Não faça caretas para mim — sibilou seu captor, e Hound deu um
latido alto e aterrorizante. — Não ache que somos moles porque ficamos com
pena de você, seu merdinha. Se eu descobrir algo incriminador, não haverá
lágrimas derramadas que ajudarão você!
Laurent não tinha uma resposta para isso também, porque o que ele
poderia dizer iria contradizer a verdade? Ele estava agora em um lugar onde
não conhecia ninguém, mas mesmo se voltasse para Brecon, ele não tinha
família, nem amigos próximos, e só um empregador que já havia manifestado
o desejo de pagar pelo contrato de outro jovem para substituir Laurent em
sua livraria. Ele iria cuidar de si mesmo neste novo mundo e encontraria
uma maneira de cumprir os desejos do demônio.
Mas quando Laurent se levantou para olhar, agora frustrado que havia
deixado sua lupa no bolso do casaco, algo estava estranho nisso. O papel era
suave como a seda, como as pinturas dos esqueletos que vira no andar de
cima, e, como ele previu, as linhas estavam borradas com os números na
frente de seus olhos.
2017.
Abril de 2017.
Para ser honesto, tinha sido um longo tempo desde que um homem
passou uma noite no quarto de Beast. Um tempo muito longo. Tanto tempo,
que de fato a presença de Laurent estava interferindo com os pensamentos
de Beast, fazendo sua mente ficar na sarjeta mais do que o habitual. Em
situações quando ele deveria se concentrar no problema em questão, e não
sobre um menino que provavelmente agia estranhamente devido a uma lesão
e não deveria exigir muito da inteligência de Beast.
Talvez Beast não devesse tê-lo deixado sozinho depois de tudo? E se
Laurent sofresse algum tipo de hemorragia cerebral enquanto ele estava fora,
e ele iria encontrar o corpo pálido caído no chão quando ele voltasse?
Ele ficava em torno de homens atraentes o tempo todo, então por que
ele não podia se concentrar? Aos trinta dois... Bem, quase trinta e três, ele
não deveria ser governado por seu pênis assim. Então, novamente, ele achava
que não tinha conhecido ninguém remotamente tão atraente como Laurent
em sua vida. Havia uma abundância de pessoas de boa aparência, mas
Laurent tinha o tipo de rosto que você esperaria encontrar em um outdoor.
Com um nariz ligeiramente arrebitado, olhos expressivos e marcantes,
emoldurados por cílios longos e bochechas como maçãs suculentas que
Beast poderia morder esperando nada além de doçura. Ele parecia uma
presença surreal que não se encaixava em seu clube em ruínas, e menos
ainda no apartamento de Beast. Ele bufou quando pensou que Laurent
pudesse ser um fugitivo da masmorra de um magnata da alta moda.
Beast olhou para os seus irmãos, que estavam todos concentrados nele.
— Tenho certeza de que ele está muito triste por Davy ter que deixar o
cargo de VP. — Knight disse dando um tapinha nas costas de Beast. Calor
encheu o rosto de Beast quando ele percebeu que tinha perdido esta parte,
mas, novamente, não era de admirar. Com as pernas de Davy esmagadas
pelo teto caído, a reabilitação levaria muito tempo, mesmo no cenário mais
positivo, onde ele não teria realmente que perder os membros. Davy fazia
parte do clube desde o início. Ele começou com King e seu sargento de armas,
Rev. Ele também era o mais velho de todos eles, e os anos de indulgência e
luta estava alcançando o pobre rapaz. Talvez eles devessem pensar em sua
aposentadoria, mesmo que ninguém desejasse que isso acontecesse dessa
maneira. Ele agora estava nas mãos dos médicos, com sua família, e tudo o
que restava para eles era as notícias.
King ficou em silêncio, o que deu tempo suficiente para Knight dizer. —
Oh, cara! Tão certo. — Ele bateu seu copo com o de Rev. — Ele sempre lida
com a merda quando ela atinge o ventilador. Ele é uma escolha óbvia para
VP. E ele não tem nenhuma outra posição, então não é como se nós
tivéssemos que preencher outro cargo. — O entusiasmo em sua voz fez o
coração de Beast acelerar, mas ele manteve a expressão séria, escutando. Ele
não queria manter suas esperanças como da última vez, quando ele se
ofereceu para se tornar seu Capitão de Estrada, apenas para King nomear
Knight para o cargo.
Pelo tempo que Beast podia se lembrar, seu pai nunca tentou elevá-lo
ou recompensar seus sacrifícios para o clube. E o clube era toda a vida de
Beast, ainda mais desde o acidente, e ver os outros subindo as fileiras
enquanto ele permanecia sem reconhecimento era como um tapa na cara
dele. Lentamente, ele levantou seu olhar para encontrar os olhos azuis de
King.
King ergueu as mãos. — Nós não estamos votando ainda. E ainda tem
Grey na corrida em Nova York, então como fazemos?
Seu membro mais recente, Fox, deu um aceno de cabeça afiado. — Essa
é uma boa ideia. Eu sei que Beast não ocupou oficialmente qualquer outro
posto...
— Mas isso está muito atrasado de qualquer maneira. Ele fez todas as
coisas que poderia ter feito, e de forma excelente, mesmo não tendo o posto.
— Rev disse, fazendo com que a sala ficasse quieta quando ele apertou os
botões de seu indestrutível velho Nokia.
Jake saiu do seu lugar junto à parede onde estivera em pé ereto como
uma flecha. — Se eu pudesse dizer, Beast cuidou de forma eficiente as coisas
hoje.
King bateu com o punho contra a mesa. — E eu acho que você deveria
calar a boca e ir ajudar com os escombros se você não sabe o seu lugar em
uma reunião. Que parte de “apenas um patch recebe a voz” você não
entendeu? Dispensado.
Rev balançou a cabeça para King. — Quem apóia Beast para se tornar
nosso VP? — Ele levantou a mão, e todas as outras pessoas ao redor da mesa
o seguiram, enchendo Beast com tal alegria que ele teve que trabalhar duro
para se manter estóico.
Beast sorriu, embora ele não quisesse admitir o quão feliz ele estava.
Ele iria levantar o tema do clube novamente em breve, mas este esse não era
mais o momento para estragar o humor dos irmãos com conversa séria. —
Vamos.
Capítulo Sete
Laurent
Laurent, ao mesmo tempo amava e odiava as roupas que Beast lhe dera.
Ele odiava sua forma, seu tamanho, e como elas o faziam se sentir pequeno,
mas, novamente, o tecido da calça e a camisa eram tão suaves ao toque, que
ele não podia deixar de apreciar a forma como as roupas o envolviam.
Algumas horas devem ter se passado desde que Beast saiu, e Laurent
não conseguia dormir, suando nos lençóis e constantemente preocupado que
alguém iria abordá-lo enquanto ele dormia e quebrava o seu pescoço. Ele não
podia ouvir os sons, mas o zumbido estranho que pairava no ar e estava
começando a afundar no fundo. Mas Beast provavelmente ainda não tinha
retornado para seu quarto, e apesar do monstro peludo guardando Laurent,
ele precisaria se aliviar, e logo. Não havia penico no quarto, e sem outra
perspectiva à vista, ele decidiu dar um salto de fé.
Laurent riu alto quando pensou em como este ambiente estava cheio de
água disponível gratuitamente em qualquer quantidade desejada. Talvez
houvesse algum limite? Talvez as pessoas trabalhassem bombeando a água
perpetuamente sem nenhum esforço de sua parte? Sua excitação cresceu por
um segundo, mas não havia tempo a perder quando se trata de suas roupas.
Usando o conhecimento adquirido durante o banho mais cedo, ele uniu o
dreno com um item de borracha colocado nesse canto aparentemente para
esse uso, e em seguida, encheu a banheira com um pouco de água. Era
incrível como era fácil preparar um banho completo no futuro!
A água que saia do tubo era morna, mas quando Laurent se moveu em
torno da alavanca, ele trabalhou para deixá-la mais fria, enquanto girava a
outra, aconteceu que a água quente saiu dos tubos. Escolheu a temperatura
mais baixa possível, para não deixar as manchas de sangue em suas peças
de vestuário de forma permanente, e observou o gel com cheiro pinho criar
uma espuma espessa, branca sobre o revestimento. Ele não sabia muito
sobre esses assuntos, mas ele tinha visto a mulher que fazia a lavanderia do
Sr. Barnave no trabalho várias vezes, e ele sabia que as peças de vestuário
deviam mergulhar na água primeiro.
Laurent voltou para o quarto para colocar suas botas, apenas no caso
dele conseguir deixar o quarto de Beast e explorar a área. Talvez, então,
pudesse encontrar alguma alma mais amigável, mas com essa hedionda
calça desproporcional embolada em seus joelhos, ele certamente parecia
ridículo. Pela primeira vez ele estava feliz que não houvesse nenhum espelho
à vista.
Pelo quarto que estava possivelmente sendo guardado pelo cão vicioso.
Só agora Laurent percebeu que todas as coisas que ele fizera desde que
saíra da cama - colocar as botas, procurar uma arma - tinha sido destinadas
a adiar a decisão que poderia custar-lhe a garganta. Ainda doía da tentativa
de Fane de sufocá-lo, mas permanecer como prisioneiro de Beast não era
uma opção. Ele precisava continuar sua missão com uma posição mais
digna.
Ele saiu em uma sala grande banhada com a primeira luz da manhã. A
fraca iluminação tornava tudo ainda mais cinza, mas as primeiras horas
seriam uma vantagem de Laurent. Os saltos de suas botas batiam contra o
chão quando caminhava em frente, para a porta que iria oferecer-lhe a
salvação, mas ele estava apenas a meio caminho quando um rosnado baixo
rasgou o ar e arrepiou a coluna de Laurent, transformando suas pernas em
chumbo. Focado em seu objetivo, Laurent tinha esquecido o ninho de
travesseiros e cobertores escondidos atrás da estante, mas o cão estava lá,
já elevando o seu corpo negro fora da cama.
Laurent correu. Com um grito escapando de seus lábios, ele correu para
a porta com rosnado do cão em seus calcanhares. Ele saltou sobre o sofá e
bateu contra a porta com o impacto. Com um sentimento de vitória, ele
pressionou o mecanismo que deveria abrir a porta, mas em vez de um brilho
verde que apareceu quando Beast mexeu, uma luz vermelha brilhou junto
com um zumbido desagradável, e nada aconteceu. A porta estava trancada,
e o cão estava tão perto que ele podia senti-lo atrás dele.
O latido fez Laurent cambalear para trás, mas Hound não iria deixá-lo
recuperar a compostura. Ele ficou apoiado nas pernas traseiras e empurrou
a frente contra o estômago de Laurent com todo o poder de seus músculos e
peso combinado.
Mas, então, ele colocou o seu peso inteiro em cima de Laurent e colocou
sua cabeça no peito dele, observando-o com os grandes olhos castanhos.
Beast pairava sobre Laurent, olhando para ele com seus olhos claros,
ainda sem pedir para Hound soltá-lo. — Bom. Talvez ele esteja pronto para
falar agora.
Agora que Beast estava aqui, Laurent estava mais confiante em tentar
empurrar a pata do cão, mas ele rapidamente abandonou a ideia quando
Hound franziu a testa e fez um grunhido desagradável. — Por favor, Sr.
Beast, eu não fiz nada de errado. É apenas um mal entendido.
A mulher riu alto e olhou para Beast. — Sr. Beast! Meu Deus! Será que
você pediu para chamá-lo assim?
Knight empurrou o corpo Hound, mas o cão rosnou para ele também.
— Oh, vamos lá, Hound. Eu te conheço desde que era um filhote de cachorro!
11
Em referência aos nomes dos membros do clube em inglês. Knight= Cavaleiro, Beast= Besta, King= Rei.
— Ele está falando estranho — Knight disse, apesar de ter ser a
linguagem dele que continha palavras estranhas e não naturais.
— Não, por favor. Você pode apenas tocá-lo, e você vai sentir o caroço.
— Você sabe onde seus pais moram? Qualquer um que poderia entrar
em contato?
— É tudo um borrão.
— Mas quantos anos tem exatamente? Você não pode ter quarenta, não
é? — Perguntou Laurent, sabendo que quando alguém sugeria uma idade
muito avançada, a outra pessoa provavelmente iria revelar sua verdadeira
idade.
A mulher sacudiu a cabeça. — Deus, você o fez soar como um vovô!
Ela sorriu e acenou para todos eles antes de sair do ambiente, deixando
Laurent com os dois grandes homens monstruosos e um cão igualmente
grande. Depois que ela se foi, Beast recuou e fez um gesto para Laurent
levantar. — Tire sua camisa.
Knight inclinou a cabeça para o lado. — Por que você quer que ele se
dispa? Quer dizer, eu sei o porquê, mas...
Laurent amuou em frustração. Por que ele não entendia se era tão óbvio
para seus anfitriões?
Ele não tinha ideia de como sua pele poderia ser anormalmente quente,
mas os dedos da Beast ao tocá-lo pareciam deixar vestígios escaldantes. Sua
palma era enorme, e não só cobria a nuca de Laurent com facilidade, mas
também se espalhava em seus ombros. Ela também era áspera, com umas
superfícies irregulares e pequenas saliências que se esfregavam contra
Laurent com o toque mais suave.
Tinha acabado antes que ele pudesse se acostumar com sua presença.
Beast xingou em voz alta. — Olha, não é apenas isso, e ele tem sido
mantido em algum lugar pela força. Alguém bateu em sua cabeça e tentou
sufocá-lo. Deve ser algum tipo de... — Sua voz sumiu em um sussurro, e
Laurent não poderia pegar as últimas palavras.
— Eu... — Ele não tinha certeza se deveria mencioná-la, mas era muito
excitante ter uma conexão para deixar passar assim. — Uma pequena cidade
a leste de La Rochelle.
Laurent sorriu para a conexão inesperada que tinha neste novo mundo.
— Posso... Quero dizer, usar... As roupas que a dama Oriental trouxe. Espero
que elas sejam mais adequadas do que estas?
Knight gemeu. — Você morava sob uma rocha? Não use essa palavra!
Ambos, Knight e Beast olharam para ele por um momento mais longo.
Knight bufou e cutucou Beast com o cotovelo. — Olhe para ele, já está
pescando elogios.
Beast ficou em silêncio por um momento, observando seu amigo até que
ele desapareceu de vista. Ele deu mais um passo para perto de Laurent e
inclinou-se para falar no ouvido dele. — Veja. Eu sei que você está
escondendo alguma coisa. Talvez você esteja com medo que alguém venha
atrás de você ou algo assim. Você precisa ficar aqui até que eu saiba o que
está acontecendo, mas nada de ruim vai acontecer com você. Está claro?
Laurent engoliu em seco, surpreso com essa afirmação, e ele olhou para
Beast, que apesar de elevar-se sobre ele, apesar do cão assustador, e a
atitude mal-humorada, parecia estar do lado de Laurent. E Laurent não
precisava ficar aqui de qualquer maneira? Ele deu um aceno lento. Pelo
menos ele não estava sendo solicitado para dar mais repostas.
Beast olhou para ele também, no limite entre borrão e clareza, onde seu
rosto marcado parecia de alguma forma ter suavizado o suficiente para
Laurent ler sua expressão. Foi um momento ímpar de silêncio que deixou
aquecida as bochechas de Laurent por nenhuma razão em tudo.
Laurent lambeu os lábios. A partir do som dele, ele deveria saber. Ele já
gostava dessa ideia. Uma máquina que lavava as roupas, para que as pessoas
não tivessem que fazer. Quão maravilhoso era isso? — Eu sei, eu sei! Eu só...
Eu não tinha certeza se tal máquina poderia lidar com sangue. Você vê, esse
casaco é muito importante para mim.
King riu bem-humorado. — Não? Ela é uma gostosa, não é? Você precisa
conhecer a outra. Ela faz um Martini assassino.
— Sim senhor. Ela foi muito boa. — Também parecia uma prostituta,
mas isso não precisava ser dito. Laurent iria manter a mente aberta sobre
todas as questões relacionadas com o futuro. Afinal, os romanos não usavam
roupas diferentes da dele? Luís XIV não usava uma longa peruca, quando,
um século atrás, o cabelo curto estava na moda? Não fazia uma ou outra
coisa ter mais ou menos moral.
— Tanto quanto eu entendo, você vai ficar aqui por agora, então eu
quero que você se sinta em casa. Beast vai levá-lo para comprar qualquer
coisa que você quiser.
Laurent sorriu, dominado por essa gentileza, mas o homem era um Rei
afinal. — É muito generoso, senhor.
Capítulo Oito
Laurent
— Se seu pai é o Rei, você não deveria ser chamado de Príncipe, e não
de Besta? — Laurent perguntou enquanto eles lentamente passavam através
de um mundo que parecia tão diferente do que Laurent conhecia que parecia
outro reino, e não outro tempo.
Intimidado com o que tinha visto na casa do Kings of Hell, Laurent ficou
aliviado ao ver que nem todos os homens de 2017 eram gigantes como Beast
ou seu pai. Embora alguns tivessem grandes barrigas e se tornaram grandes
em sua própria maneira. Grandes mesmo. Tinha que haver uma abundância
de alimento no futuro, assim como havia água ilimitada no banheiro.
Beast, no entanto, era o homem mais alto que Laurent viu até agora.
Com ombros largos e com o pescoço de um touro, ele tinha um porte
impressionante enquanto andava por entre a multidão que ele facilmente
superava.
Laurent teve que concluir que o que tinha sido uma boa altura para um
homem em seu tempo, nesse poderia ser considerado baixo, especialmente
quando comparado com o volume maciço de seu companheiro. Com altura
de 1.70 ele não se destacava da forma como estava acostumado. E as roupas,
mais adequadas do que as que ele recebeu ontem, o fez sentir-se
extremamente inexpressivo. A calça ainda estava folgada, revelando que ele
era muito pequeno para preencher a roupa, e ele estava inseguro sobre a
forma como os sapatos de tecido macio que recebeu de Nao guinchavam
contra o chão polido quando ele andava. E de Beast, ele recebeu algo que
não o deixou muito feliz. Uma manilha pequena em seu tornozelo, que
poderia explodir e amputar o seu pé se ele tentasse correr e ficasse afastado
mais que meio quilômetro de distância. Era um negócio terrível, então
Laurent tentou não pensar muito sobre isso.
— Oh, meu Deus, você viu isso? — Uma delas sussurrou em voz alta o
suficiente para Laurent ouvi-la.
Ele franziu a testa quando uma das meninas pegou uma coisa
semelhante a que Beast tinha usado para a comunicação com King e a
apontou para Beast. Laurent estava fora do clube, com todas aquelas
pessoas ao redor, mas ele reconheceu que, mesmo em comparação com as
pessoas de seu próprio tempo, Beast se destacava na multidão, e não só
devido à sua altura superior. O que Laurent ainda não tinha certeza era se
as pessoas ficavam impressionadas com Beast, o temiam, ou se divertiam
com ele.
— Por favor, prometa que não vai se afastar de mim mais de meio
quilômetro de propósito. — Laurent falou nervoso com a manilha em seu
tornozelo mais uma vez. Não seria nada fácil se Beast usasse o seu carro.
Beast franziu a testa para ele, e longe o suficiente para Laurent ver sua
expressão, apesar da tinta cobrindo sua pele. — Eu não vou. Agora escolha
algumas roupas.
Oh, esse era um tipo de mercado de roupas usadas. Ele se inclinou e
cheirou uma das mangas de uma camisa. — Elas foram lavadas, não é?
— Essa roupas foram feitas para alguém, correto? Então, elas foram
provavelmente usadas por essa pessoa no passado. — Laurent virou-se para
as prateleiras com roupas e tocou os tecidos, tentando compreendê-los
melhor. Que padrão que uma pessoa contemporânea poderia usar para
escolher roupas nesse tempo? Ele não deseja obter algo que pudesse ser
considerado fora de moda.
12
Membro de uma seita e, posteriormente, denominação protestante surgida no século XVI de uma corrente
moderada de anabatistas holandeses e de outros grupos anabatistas (como os opositores de Zwingli [1484-1531], na Suíça),
caracterizada pela rejeição de autoridade eclesiástica, separação do Estado, não resistência e pacifismo, e conhecida pelas
comunidades fechadas e conservadoras fundadas por imigrantes na América do Norte.
peças de vestuário idênticas sobre a vara de metal e ele selecionou alguns
itens antes de prosseguir para o próximo.
Era um alívio receber este tipo de ajuda, e Laurent sorriu para ele. —
Obrigado. Eu odeio ser um fardo, mas eu odiaria ainda escolher o vestuário
de forma incorreta.
Não demorou muito para Laurent estar carregando com vários itens,
que ele soube agora onde poderia experimentar. Ter alguém para guiá-lo
através desse processo foi um alívio, especialmente com sua visão tão pobre
com a proximidade, mesmo nas luzes brilhantes da loja.
Que também não foi tão fácil, porque quando Beast percebeu que
Laurent não tinha roupa interior, ele disse-lhe para aguardar e ir
experimentando a “calça jeans” e o deixou na grande tenda, só para voltar
dez minutos mais tarde com três caixas, cada uma contendo três pares das
menores roupas íntimas que Laurent já viu. Elas nem sequer chegavam até
o meio das coxas, e abraçavam seu corpo com força, porém, ele se divertiu
com os desenhos coloridos nelas, que variavam de listras a damas, e até
mesmo um padrão de árvores de alguma forma entrelaçadas no tecido ou
pintadas nele.
Era uma sensação estranha se despir na frente de Beast. Ele deve ter
colocado um perfume antes de saírem do clube, porque a tenda estava cheia
com o aroma de citrus e almíscar que lentamente estava se tornando um dos
favoritos de Laurent, assim como uma distração potente. Ele tentou não
olhar na direção de Beast quando tirou suas roupas e, em seguida, colocou
todas as roupas novas, mas ele não podia perder a forma como sua
respiração acelerava quando sentia o olhar de Beast sobre ele. Nudez entre
homens não era razão para alarido em seu próprio tempo, mas ser observado
assim, com Beast completamente imóvel e só respiração suave enchendo o
silêncio, fazia o corpo de Laurent consciente dos olhos azuis seguindo todos
os seus movimentos.
Ele não teve qualquer outra indicação de que Beast estava apenas
fornecendo ajuda a um viajante perdido, mas estar sozinho em um espaço
tão fechado deixava os pensamentos de Laurent vagar. Ele tentou ser
gracioso enquanto lentamente retirava as roupas feias e as dobrava
lentamente. O tecido elástico abraçava agradavelmente a curva de suas
nádegas, bem como seu pau e bolas, e enquanto mudava as roupas, Laurent
se entreteve com o pensamento de que Beast estava apreciando a vista,
apenas por uma questão de seu próprio prazer. Beast era um homem
assustador, mas ele também era um homem de posses e posição, que
provavelmente poderia ter alguém que ele queria. As costas de Laurent se
cobriram de arrepios quando ele imaginou um homem como Beast o
cobiçando. Independentemente de como as coisas terminaram na última vez,
as fantasias eram inofensivas, e era a única expressão de desejo que Laurent
podia permitir-se.
— Por que a música deve ser tão alta? — Laurent perguntou quando
eles entraram em uma loja que lhe agrediu os sentidos com o cheiro de
sabonetes. Era um lugar estranho, com prateleiras coloridas com imagens
de rostos muito pintados, e algumas mulheres estavam aplicando os
produtos nas pessoas em público! Mas ninguém dava muita atenção, então
ele escolheu não olhar tanto, e seguiu Beast em um corredor entre as
estantes cheias de todos os tipos de garrafas e frascos - todos feitos do
material futurista que ele sabia agora ser chamado de plástico.
— Ok, escolha o xampu que você deseja. Você não precisa usar uma
garrafa inteira de cada vez. — Beast disse a ele, ficando para trás.
— Então você não pode ver bem? Você tem hipermetropia13? Por que
você não me disse que precisava de óculos? — Beast perguntou em um tom
que sugeriu que ele estava à beira de perder a paciência.
E pensar que as coisas estavam indo tão bem até agora. Eles estavam
conversando, falando sobre as músicas ressoando nas lojas, sobre as roupas,
sobre o edifício. Sobre o plástico. Beast tinha lhe ensinado tantas coisas
novas, e as pessoas ao seu redor era uma fonte inesgotável de
entretenimento. Agora, porém, Beast iria perceber que Laurent se tornou
alguém inútil, por isso não havia necessidade de investir no ensino de
Laurent, em nada.
— Não, não, eu estou bem. Eu não quero ser um fardo para você, é uma
promessa. É que as letras menores me causam tanta dor. — Laurent só
percebeu que estava apertando a garrafa de plástico quando a tampa abriu,
e uma carga de gel com aroma de rosas expeliu em sua mão.
Laurent suspirou tão profundamente, que ele sentia como seus pulmões
inteiros estivessem desmoronando. E ele não tinha ideia do que fazer com a
garrafa quebrada na mão. — Eu costumo gerenciar...
— Por que você tem que tornar isso tão difícil? Todo mundo sabe que
não é saudável forçar seus olhos assim. — Beast pegou a garrafa da mão de
Laurent e a colocou de volta na prateleira antes de agarrar o ombro de
Laurent e puxando-o para a saída.
— É? — Era algo que “todo mundo sabe'?” Laurent olhou para Beast,
sem lutar contra a atração. Desde o terror de sua doença ser descoberta, um
sentimento de esperança estava começando a florescer. Os meios para poder
ver estariam disponível para ele neste mundo? Talvez eles não fossem tão
caros como costumavam ser em 1805.
13
Problema de visão em que os objetos próximos ficam embaçados.
Beast o levou para uma loja muito brilhante, com vários pequenos
espelhos e filas de óculos pendurados nas paredes - preto, branco, verde,
vermelho, de qualquer forma que pudesse desejar! Não escapou a atenção de
Laurent que atendentes em roupas pretas e brancas pareciam estar
ajudando os clientes, como se estivessem em seu próprio tempo, mas
ninguém se aproximou dele e de Beast enquanto caminhavam até uma das
exposições.
Minutos mais tarde, Laurent e Beast foram levados para uma sala nos
fundos, aonde uma senhora em uma saia justa que chegava até os joelhos e
um casaco branco esperava por eles. Ela era uma espécie de médico, Laurent
percebeu, e apesar do choque de tal novidade, ele preferiu não questionar a
sua perícia. Ela o submeteu a um conjunto de testes humilhantes, que
incluiu a leitura vários números e letras em tamanhos variados a partir de
um quadro na parede, e depois ser examinado com uma máquina que
manteve a cabeça dele imóvel, enquanto a médica lançava luz brilhante em
seus olhos.
Laurent mal podia compreender o que ela estava dizendo enquanto ele
afundava cada vez mais em seu próprio corpo, enquanto o diagnóstico
produzia um espiral de dor. Era como se colocar um nome para sua doença
tornasse o seu destino mais real de alguma forma. A médica explicou algo
sobre a desnutrição ser uma possível causa de alguém em sua idade ter
catarata, mas como é que esse conhecimento possivelmente poderia ajudá-
lo agora? Sua única chance para obter saúde seria completar a tarefa para o
diabo.
Até que uma palavra chamou a sua atenção, e ele abriu os seus olhos
novamente, chocado com o que estava ouvindo.
Ele respirou fundo para afastar a picada de lágrimas em seus olhos. Seu
problema ao longo da vida seria tratado em uma “cirurgia de rotina”. Ele
ainda não tinha notado quando os dedos ásperos da Beast se entrelaçaram
com os dele, mas ele apertou com força assim que percebeu isso.
— Eu gostaria muito disso — ele proferiu para médica que era uma
senhora.
Ela então o levou para uma cadeira especial que estava perto de Beast
e Laurent teve que olhar através de várias lentes que deixaram o seu coração
batendo, porque elas estavam realmente funcionando. Nem todas eram
perfeitas, mas melhoraram sua visão imensamente. No final, eles fizeram
uma escolha entre duas lentes, que estavam mais próximo do ideal, e a
médica disse-lhes para esperar por quinze minutos para pegarem os óculos.
Era isso. Um quarto de hora.
— Eu não quero parecer inútil. Eu não quero acabar nas ruas, cego e
carente. Ninguém me empregaria se soubessem que eu sou um inválido, e
eu não tenho família nenhuma para me apoiar.
— Você tem se Knight for realmente o seu primo. — Beast disse com
uma suave risada.
— Eu duvido disso, mas eu acho que é uma noção que vale à pena
investigar.
— Você não vai ficar cego, por isso não importa, não é? — Beast
perguntou, mantendo a mão na perna de Laurent e gentilmente arrastando
o dedo sobre a pele nua no joelho.
O toque fez Laurent prestar mais atenção, mas ele não tinha certeza do
que fazer com isso. Mas, novamente, se as senhoras andassem por aí com as
pernas nuas à mostra, ele deveria questionar o toque reconfortante? Se Beast
estivesse fazendo isso em um lugar tão público, então não poderia ser fora
do comum, mesmo que para ele tal contato fosse ilícito e proibido. A moral e
o significado por trás dos gestos realmente mudaram, e ele precisava parar
de ver o toque como uma carícia, mesmo que fosse tão bom ser tocado por
um homem, de um jeito que cobria suas costas com gotículas imaginárias de
óleo quente.
— Eu acho que isso não vai acontecer. Uma vez que a minha visão
ficar melhor, eu vou ser capaz de fazer muitas coisas. E eu aprendo muito
rápido, então eu certamente poderei encontrar algum uso para mim.
— Tenho certeza que você vai. Você é muito brilhante, mesmo sendo
meio estranho. — Beast disse parecendo se divertir. As pessoas olhavam para
eles quando passavam, e isso estava deixando Laurent um pouco
desconfortável, mas não havia nada a ser feito sobre Beast se destacando
tanto.
O elogio fez Laurent brilhar com alegria. Se até Beast, que esta manhã
estava determinado a alimentar o seu cachorro com ele, notou que Laurent
tinha qualidades positivas, então suas perspectivas de uma boa vida não
estavam condenadas. — Eu vou aprender a não ser estranho.
Laurent levantou. Ele não tinha sequer percebido que suas mãos
tinham ficado tão suadas enquanto esperavam. — Sim, sim, por favor, vamos
ver! — Ele bufou com o jogo bobo de palavras que ele acidentalmente formou.
Tudo parecia nítido, como se seus olhos fossem totalmente novos. Como
se ele nunca estivesse doente. Como se ele nunca tivesse temido a completa
escuridão. Ele podia ver cada fibra da camisa preta de Beast, mas ele
precisava ver mais do que isso e olhou para o peito musculoso, sobre o
pescoço grosso e tatuado, para o rosto que agora era como um livro para ele
ler, rabiscado em todo lugar. Com letras minúsculas sobre a pele torcida e
mutilada. E entre as fileiras de preto, cinza e a cor pálida da carne de Beast,
havia olhos tão brilhantes que tiraram o fôlego de Laurent. Azul pálido, e
muito humano e nada monstruoso. O verdadeiro eu de Beast estava
observando-o em algum lugar além das cicatrizes, uma pessoa lá no fundo,
cuja orelha não foi arrancada, e que só queria que ele ficasse feliz com os
óculos. Havia tanta antecipação naquele olhar, como se nesse momento nada
importasse para Beast.
Laurent estendeu a mão e arrastou os dedos pela escrita ao longo do
queixo de Beast. Era tão pequeno, e ainda assim ele podia vê-lo tão bem. Só
agora ele percebeu que toda a escrita sobre a pele de Beast era em latim. Sem
pensar, ele leu um pedaço em voz alta. — No meio do caminho da minha
jornada, encontrei-me dentro de uma floresta escura. Porque me perdi no
caminho certo. — Era uma tradução grosseira da passagem que descia pelo
pescoço de Beast, e ainda assim o deixou tão animado. Sob a tinta, o lado
esquerdo do rosto de Beast, que era o mais assustador; tinham as
características que pertenciam a um homem outrora bonito. Laurent agora
entendia por que as pessoas olhavam, mas quando ele olhava nos olhos
inquisitivos que refletiam seu olhar, era difícil para ele não sorrir para o rosto
largo, o nariz forte e as maçãs do rosto pronunciadas. Ele não tinha pêlos
nas sobrancelhas.
Observar Laurent fechar brevemente os olhos por trás dos óculos pretos
deixaram o batimento cardíaco de Beast em um ritmo selvagem, mas quando
o momento de surpresa passou, ele colocou os braços em torno de Laurent
muito lentamente acariciou a cabeça do garoto. Ele tinha o melhor e mais
macio cabelo que Beast já havia tocado e tinha um cheiro de pinho tão
intenso, que Beast sabia que se ele cobrisse o rosto com as mãos, ele poderia
fingir que estava em algum lugar na floresta, segurando um amante.
— Eu vejo tudo. — Laurent disse com um sorriso tão largo que derreteu
algo em Beast e fez se perguntar se esse “tudo” que Laurent disse, significava
as profundezas da alma de Beast. Ele olhou para o peito de Beast e puxou a
gola da camisa de Beast, fazendo um arrepio em seu corpo. — O caminho
para o paraíso começa no inferno — ele leu e traduziu as palavras na pele de
Beast.
Mas o tempo não iria ficar parado esperando Beast ter o seu momento
aquecido. Laurent se afastou e começou a caminhar ao redor da loja com um
olhar de admiração em tudo ao seu redor, um novo mundo novo e excitante,
embora este fosse apenas uma ótica comum em um shopping decadente.
Laurent agradeceu mais uma vez e prometeu retornar. Ele voltou para
Beast com o mais amplo sorriso, e quando eles deixaram a loja, ele sussurrou
animadamente: — Você ouviu isso? Eles terão óculos de toda a coleção de
Ray Ban.
— Não. Não, você está muito bonito... Cada menina está olhando para
você enquanto andamos — ele disse no final, amaldiçoando-se em silêncio
quando ele percebeu que não havia maneira alguma de pegar de volta as
palavras tolas que afastou a atenção de Laurent dele. Será que ele esqueceu
como flertar? Quanto tempo tinha passado? Sim, era isso.
Ele provavelmente iria ser preso, mas ouvir os gemidos Laurent em seus
braços teria valido a pena. — No melhor sentido. Qualquer um teria orgulho
de ser visto com você.
— Se você quiser, podemos fazer algo para nos divertimos depois que
terminarmos as compras.
Laurent virou para andar mais uma vez ombro a ombro com Beast.
Embora fosse mais parecido com o ombro para braço, considerando a
diferença de altura. E Beast gostava disso em Laurent também. Para um
homem tão forte como Beast, Laurent não era um peso pena. Ele seria tão
fácil para foder contra a parede, as pernas longas embrulhadas em torno dos
quadris de Beast. O rio de sujeira que passava pela mente de Beast estava
mudando a cada minuto. Oh, as coisas que ele poderia fazer com Laurent se
tivesse uma chance... Ele não deixaria o garoto fora da sua cama por
semanas.
— Quer fazer alguma coisa primeiro? Você está com fome? — Beast
perguntou, nunca deixando Laurent fora da vista e já com ciúmes de cada
par de olhos que se atrevia a olhá-lo. Se não fosse pela presença de Beast,
ele provavelmente teria sido abordado.
— Onde você morava não tinha televisão? — Ele adivinhou, cada vez
mais convencido de que Laurent estava verdadeiramente perdido e
precisando de ajuda. Ninguém poderia fingir ingenuidade e falta de
conhecimento sobre o mundo moderno tão perfeitamente.
Em pouco tempo, ele iria colocar as mãos sobre a pessoa que fez isso, e
não sobraria quase nada para Hound mastigar depois que Beast terminasse
com ele.
Beast sentiu sua boca seca, e ele olhou para Laurent, de repente duro
como um pedaço de madeira seca. — Bom, certo? — Ele perguntou, no final,
tentando sorrir. Ele só precisava de alguma confirmação de interesse
potencial de Laurent. Isso seria tudo.
O sorriso tímido nos lábios de Laurent fez o coração de Beast saltar uma
batida. Ponto. Sua suposição inicial estava correta. Ele só precisava colocar
mais algum esforço, e essa boca bonita seria sua hoje à noite.
Beast pigarreou. — Oh, são imagens apenas para exibição. Para que as
pessoas possam decidir qual desses... Televisores querem comprar. Mas nós
temos em casa, e se você quiser ver homens se beijando, então você poderá
assim que nós voltarmos. — Laurent também era mais do que bem-vindo em
beijar um homem. Beast estava pronto para ser o cordeiro em sacrifício para
isso.
Houve uma respiração pesada, uma corada, olhos arregalados, mas ele
não se afastou. — Oh — Laurent sufocou no final. Beast mordeu os lábios
e enfiou as mãos nos bolsos enquanto se aproximavam da farmácia
novamente.
Laurent olhou para ele, assim como à senhora, mas seu sorriso pareceu
forçado.
Laurent parou, sugando seus lábios daquele jeito distraído, mas depois
finalmente falou quando a mulher olhou para Beast. — Sim, eu sinto muito
pela inconveniência, mas o meu amigo acabou de me lembrar que eu já estou
envolvido com outra pessoa sobre esse assunto.
Quando ela finalmente se afastou, Beast gemeu de alívio. — Essa foi por
pouco. Você tem alguma fotografia de onde você vem?
— Isso também. Mas você está tão perdido. Alguém precisa ajudá-lo,
certo? — Beast disse decidido a não divulgar a verdade ainda. Ele não podia
deixar de se perguntar o que Laurent realmente pensava dele. Ele era honesto
ou estava procurando obter uma vantagem?
— Eu não vou recusar qualquer ajuda dada, mas eu não desejo que
você me considere inútil. Eu vou aprender rapidamente tudo o que você quer
que eu saiba. — Laurent já disse isso muitas vezes, como se precisasse
repeti-lo por algum motivo.
A verdade era que, apenas vê-lo sorrir era bastante útil para Beast.
Quando Laurent tinha aparecido na noite passada, Beast tinha pensado que
ele seria um incômodo para o clube e ele pessoalmente, mas agora ele estava
dominado pelo encanto natural que Laurent exalava. Pela maneira tola, e
antiquada que ele falava, pelo sotaque francês, os lábios bonitos, o cabelo
macio, e mesmo soando estranho, ele estava redescobrindo o mundo através
dos olhos de Laurent.
Laurent merecia todas as coisas boas que Beast pudesse dar a ele em
agradecimento pela atenção e interesse oferecido sem julgamento. E desde
que ainda era abril, e mais alguns dias iria ficar frio, Beast decidiu que
Laurent precisava de uma jaqueta de couro. E não uma barata. Couro real,
que permitiria que essa pele linda respirasse. Vendo Laurent apreciar a
qualidade do artesanato na loja mais sofisticada que eles visitaram, derreteu
algo que Beast tinha endurecido dentro de si há muito tempo.
Agora que Laurent teria algo quente para vestir, Beast fantasiou levá-lo
para passeios em sua moto. Levá-lo para aquele local à beira do lago, onde
Beast usou muitas vezes, levando seus casos quando ele ainda tinha sexo.
Quando poderia ter qualquer cara que ele queria.
Ele poderia ter esses botões com esta jaqueta? O plástico era melhor do
que o couro? Será que as cores das jaquetas significavam status social? Qual
era a marca considerada requintada? E ele realmente usou a palavra
“requintada”.
E Laurent não era apenas alguém nisso. Beast viu a maneira como o
atendente na loja com as jaquetas olhava para ele, oferecendo uma mistura
potente de conselhos e elogios. No entanto, Laurent saiu da loja com Beast,
e o outro cara foi esquecido, embora ele tivesse um rosto bonito sem
cicatrizes ou tatuagens.
— Cheira tão bom aqui. — Laurent disse sorrindo para Beast quando
eles entraram no restaurante de carnes
— Ouvi dizer que eles têm uma carne muito boa. Mas se você não gosta
disso, eles têm todos os tipos de opções. — Beast foi rápido em acrescentar
quando se aproximavam do lugar onde os clientes poderiam esperar sentados
pelas mesas. Havia uma quantidade razoável de pessoas por todo o
restaurante, mas sendo o intervalo entre o almoço e jantar, não estava muito
lotado também.
Ele queria conversar com Laurent, mas não conseguiu falar quando
uma mulher um pouco mais velha em um terninho espiou atrás de uma
coluna na parte de trás do restaurante. Ele sorriu para ela. Ela sorriu de
volta e se escondeu atrás da divisória. Segundos depois, o atendente voltou
com um sorriso ainda mais largo no rosto. Tudo estava em ordem, parecia.
Pelo menos até as sobrancelhas reunirem-se em uma expressão de desculpas
estudada.
Beast olhou para os olhos que pareciam refletir uma confusão genuína.
Como se Laurent fosse de alguma forma capaz de olhar além da alteridade
de Beast e não entendesse o que aconteceu. Isso por si só estava fazendo o
coração de Beast bater mais rápido. — Não. Não. As pessoas são merdas em
qualquer lugar extravagante. Vamos para outro lugar — ele disse, já sabendo
que eles não comeriam. Ele não podia arriscar outra humilhação como essa
com Laurent por perto.
— Para o meu amigo aqui, não eu. É ele que você foi mal educado. —
Beast disse, ainda bloqueando a escada rolante com seu corpo. Isso. Ele
mostraria a Laurent quão seguro ele estava com Beast!
Beast não estava tendo isso. O filho da puta iria pedir desculpas. Ele
estava tão determinado e focado no desgraçado rude que ele não notou outras
pessoas se aproximando.
Pelo menos eles já estavam na porta, e logo Beast saiu para o sol da
tarde e enfiou as mãos nos bolsos. Apenas outra humilhação na frente de
Laurent. Ele apostou que o garoto de bom grado iria querer ir para casa
agora.
Beast apertou-a com alívio tão poderoso que ele precisou ficar parado
por alguns segundos. Nem tudo estava perdido então. Ele ainda podia fazer
as pazes. — Existe outro lugar. Eu vou lá muitas vezes, e eles são muito
agradáveis — ele disse quando se sentou no carro.
Beast fez uma careta. — Não. Você ouviu. Aqueles desgraçados estavam
apenas esperando por uma desculpa — ele disse saindo da vaga.
Pelo menos a sua comida chinesa favorita não era tão longe, e desde que
ele achava que Laurent nunca teve qualquer experiência nessa culinária, ele
pegaria algumas coisas diferentes para escolher, incluindo lulas fritas.
Ele colocou sua comida em uma das torres antes de subir a escada do
prédio de madeira. Era bem reservado, então não havia chance de que
alguém pudesse vê-los de longe.
Laurent estava bem atrás dele, com aquele delicioso olhar de espanto,
mais uma vez presente em seu rosto. — Se há homens tão altos quanto você,
este lugar é para pessoas com metade do seu tamanho?
Quando Laurent se sentou, ele estava coxa a coxa com Beast. Ele
esfregou a testa com um suspiro profundo. — Claro.
Beast tirou a comida e abriu a aposta mais segura, um caril suave com
frango, antes de dividir os pauzinhos de madeira. Ele pegou um pouco de
arroz e colocou na boca para demonstrar.
Laurent riu com a boca cheia quando ele finalmente conseguiu. Com a
luz do sol laranja inundando o parquinho, sozinho com ele no escorregador
que parecia ser uma casa na árvore, Beast se sentiu como uma criança
novamente. Nem mesmo com toda a presunção dos 20 anos de idade, quando
achava que estava no topo do mundo e pensava que poderia seduzir qualquer
um que ele queria, e nem nos seus quinze anos de idade, quando estava
desesperado para descobrir se sua primeira grande paixão era gay ou não.
— Eu nunca tive nada parecido. — Laurent disse no final, assim que
engoliu o frango.
Algo caiu sobre seu peito e rolou para fora. Beast percebeu que Laurent
tinha deixado cair um bocado, e deixou um rastro pegajoso alaranjado de
molho em seu peito e estômago. — Oops — ele disse tirando um lenço de
papel do saco com comida.
Laurent assentiu, mas pela forma como ele levou tempo para processar
as palavras, Beast achava que ele estava realmente aceitando. — Certa vez,
eu conheci um homem incrivelmente bonito. Quando você olhava para seu
rosto, sua beleza o fazia imaginar que ele era o perfeito cavalheiro. Mas no
fundo, o coração dele tinha tanto mal, que você não iria compreender. As
pessoas estão erradas para julgá-lo por suas cicatrizes.
— Que tal tentar a lula a seguir? — Ele perguntou para distrair Laurent
das memórias dolorosas.
Capítulo DezBeast
Na sede do clube, todo mundo havia voltado aos seus negócios diários.
Ele já tinha recebido informações sobre o prognóstico de Davy, estava melhor
naquela manhã, mas ninguém estava no clima para festejar, embora os
escombros que caíram do teto já tinham sido removidos quando os dois
saíram. A atmosfera estava mais sombria do que o habitual, e apesar de
alguns dos rapazes e prospectos expressando curiosidade em Laurent, fazer
a apresentação não estava na agenda de Beast. Especialmente com o jeans
skinny que Laurent estava usando abraçando sua bunda redonda tão
atraente. Beast faria primeiro a sua reivindicação, e depois iria apresentá-lo,
para que não houvesse dúvidas sobre qual era a posição de Laurent.
Ele não tinha certeza de como agir assim que a porta fosse trancada e
estivessem sozinhos na sala de estar, mas Hound salvou o dia, correndo de
sua cama e empurrando o rosto contra os joelhos de Beast em uma afetuosa
saudação. Knight deve ter o colocado de volta mais cedo.
Ele deveria tomar banho primeiro após um dia inteiro fora de casa?
Então, novamente, ele não tinha certeza de qual protocolo de namoro deveria
seguir depois que Laurent chegou. Além disso, não era melhor fazer feno
enquanto o sol brilhava?
— Então, foi um bom dia para sair, não foi? — Beast perguntou assim
que Hound se encheu com a atenção e voltou para a cama.
Laurent sorriu para ele em resposta, e foi até os sacos de plástico que
haviam depositado no sofá. — Foi o melhor dos dias.
— Você estava flertando comigo o dia todo. Você me tocou, você foi o
primeiro a segurar a minha mão. Você acha que esse é um jogo que pode
jogar? Que eu farei o que você quiser por um pouco de atenção? É claro que
eu só sou bom para isso, não importa o que você diga! — Beast assobiou
amargamente e empurrou sua bota contra o sofá com tanta força que a coisa
se moveu.
Laurent olhou para ele e cruzou os braços sobre o peito enquanto inclina
as costas contra a porta. — É por isso que você estava sendo gentil comigo?
Eu não deveria ter segurado a sua mão? Eu não entendo as regras estão
aqui, mas se você pensou que eu estava enganando você, essa não era a
minha intenção.
Beast apertou suas mãos em punhos, sem saber como lidar com essa
resposta. Apesar da raiva zumbido, ele estava tão profundamente
decepcionado, que desejava reverter tudo o que tinha acontecido mais cedo.
Bem, talvez exceto deixar Laurent com os óculos. Ele precisava, e as coisas
só foram para baixo depois disso de qualquer maneira. Agora que o véu caiu
de seus olhos, ele percebeu o quão tolo foi ao se enganar, pensando que
alguém como ele poderia ter uma chance com alguém tão bonito como
Laurent. Como ele ficou tão consumido por sua própria luxúria em apenas
um dia?
— Não, você não deveria ter. E eu não acredito que você não saiba
muito. Você está mentindo. Assim como você não vai dizer a verdade sobre a
sua presença aqui.
— Tire essa manilha daqui! — Laurent apontou para o pé, mas pegou
de volta os óculos, o que significava que seu grande gesto tinha sido apenas
para se mostrar. Claro, ele era ganancioso para manter tudo o que tinha e
não dava nem um centímetro em troca.
Ele não podia acreditar que suas esperanças foram quebradas tão
impiedosamente. O que Laurent estava pensando quando ele deixou Beast
abraçá-lo? Que eles se tornariam amigos platônicos e trocariam pulseiras de
amizade? Beast era um homem, e ele não ficaria preso no eterno inferno das
bolas azuis. Dada a metade de uma chance, ele estaria transando com a
bunda empinada de Laurent agora, e mostrando ao garoto o que o pênis de
Beast podia ser.
Sua perda.
Beast bateu o punho contra a porta duas vezes, até que os ossos de sua
mão doíam tanto que ele precisou recuar. — Você pode se foder bastardo
ingrato.
A mente de Beast o atormentava com a felicidade que ele poderia ter
experimentado se Laurent tivesse sido doce e flexível, como esteve o dia todo,
e convidasse Beast para entre suas pernas. Era pedir muito? Teria sido
divertido para Laurent também. E agora ele estava imaginando o rosto de
Laurent corado e suado, o cabelo grudado, os lábios se abrindo em êxtase.
Ele bateu na porta mais uma vez e voltou para a sala de estar. Hound
deu um gemido silencioso, mas Beast fez um gesto para que ele ficasse onde
estava.
Seu olhar deslizou sobre o sofá e o único saco plástico que continha
uma camisa que ele havia comprado para si. Onde também estava escondido
os preservativos e lubrificantes. Agora ele queria queimar tudo.
Beast afundou no sofá e esfregou o rosto com as mãos. Ele esperou mais
algumas batidas para pedir seu amigo para entrar. Knight e King eram as
únicas pessoas que conheciam o código de desbloqueio do apartamento de
Beast. Não. Havia também Laurent agora, e Beast precisava alterar o código.
A atmosfera em torno de Beast tinha sido tão adorável que não tinha ocorrido
a ele que as coisas poderiam azedar, e ele não poderia aceitar que Laurent
soubesse como sair tão facilmente.
Knight entrou com um largo sorriso no rosto bonito que atraia ambos
os sexos em igual medida. Beast se perguntou amargamente se a moral e as
convicções de Laurent seriam tão severas se fosse Knight que tentasse entrar
em suas calças. Ele provavelmente teria uma desculpa estúpida depois que
a ação fosse feita, como: “Ah, eu não sabia que chupar pau significava
atração!”
— Ele é gay. — Beast disse assim que fechou porta atrás deles. Não
havia decoração, a menos que um punhado de fotografias e impressões de
fotos históricas penduradas em todas as paredes pudesse ser considerado
como decoração. — Nós não precisamos verificar nada. E eu não o quero
lendo pornografia na minha casa.
— Ele viu homens se beijando na TV e ficou feliz por estar tudo bem.
E...
Besta gemeu. — Não. Eu não quero que ele fique todo excitado e venha
aqui com outro cara. — Apenas o pensamento era tão humilhante que Beast
queria bater a cabeça contra a parede nua atrás dele.
Knight olhou para Beast, e Beast pôde ver as engrenagens movendo-se
sob o cabelo bagunçado. — ... Porque você quer foder com ele primeiro.
Knight coçou o queixo. — Oh, cara... Que idiota. Mas pelo menos você
teve as mãos dadas. Pré-escola? — Ele riu e cutucou o braço de Beast, mas
Beast não estava no humor para piadas à sua custa. Knight pigarreou. —
Talvez você só precise jogar o jogo por um tempo, sabe? Ou mostrar a ele que
você tem opções, deixá-lo com ciúmes.
Beast apertou sua mandíbula com tanta força que seus dentes se
feriram. — Bem, eu não sei. Não tenho opções. Olhe para mim. O que eu
estava pensando tentando chegar perto de um cara assim? Não há ninguém
interessado. Não em mim. Eles o fariam por diversão ou pelos patches. Será
que você quer transar comigo?
Knight gemeu e moveu seu peso. — Isso não é uma pergunta justa. Você
sabe que não é o meu tipo. Você nunca foi. E para que conste, eu sei que não
sou seu. É como... Ew. Somos praticamente irmãos.
Beast levantou as mãos, mas percebendo que ele não sabia o que queria
fazer com elas, ele as abaixou. — Nós tivemos uma conexão. Tivemos um
bom dia. Eu sou tão estúpido.
Beast massageou os olhos com os dedos, tentando mudar seu foco. Ele
não era um bebê chorão, e ele não iria lamentar as coisas que não podia ter.
Ele era um homem de ação.
Mas sob as tábuas velhas, eles encontraram pedras lisas - que deveria
ter sido o piso original. Eles encontraram sujeira e até um esqueleto de rato,
mas no meio da sala havia algo completamente diferente. Os sulcos foram
meticulosamente esculpidos na pedra para formar o estranho sinal em um
círculo duplo de dois metros de diâmetro. E então alguém teve o cuidado de
preencher os sulcos no chão com ferro, deixando para trás o sinal
perturbador que Beast aprendeu de cor desde então.
14
Amish é um grupo religioso cristão anabatista baseado nos Estados Unidos e Canadá. São conhecidos por seus
costumes conservadores, como o uso restrito de equipamentos eletrônicos, inclusive telefones e automóveis.
Dentro do círculo havia uma estrela de dezesseis braços, adornada com
letras curiosas em cada uma das extremidades, afiadas e cheia de um
emaranhado de sinais que vagamente se assemelhavam a um crânio
humano. Era o mesmo símbolo que King carregava em sua nuca, e assim,
Beast e Knight tomaram a decisão de não informá-lo da descoberta. Tudo
parecia muito estranho, e Beast queria encontrar as respostas.
Ele não acreditava exatamente em magia - seria ridículo - mas seu pai
estava escondendo algo. Ele era um membro de um culto? Ou era um símbolo
de uma aliança com uma gangue que ele não queria contar a ninguém para
manter o dinheiro e a conexão para si mesmo?
Beast fez uma careta. — Isso é nojento. Você acha que King lidaria com
esse tipo de merda nas nossas costas? — Seu pai não era nenhum anjo, mas
mesmo Beast achava difícil acreditar que ele iria se envolver nesse tipo de
negócio após o estabelecimento de um MC que representava a liberdade em
todos os sentidos, incluindo a sexual.
Knight olhou para o seu telefone quando ele tocou, e ele gemeu. —
Jesus. É ela. Meia hora, como um relógio. Essa mulher está fazendo minha
cabeça. Eu disse a ela que eu não estou transando com ninguém pelas costas
dela. Que, se eu foder alguém, eu vou avisá-la. Ela disse que estava bem com
um relacionamento aberto, mas não tenho mais certeza se ela sabe o que
isso significa. Eu tenho que ir ou ela vai congelar a minha comida ou alguma
merda assim.
Beast assentiu, fingindo que ele também sentia que o problema com
Jordan era um enorme problema no mundo da abundância sexual de Knight.
Ela era o tipo de mulher que gostava da fantasia de ter um bad boy e seu
estilo de vida, mas não apreciava a realidade dele. Knight estaria melhor com
outra pessoa, mas quem era Beast para julgar? Knight era um menino grande
e poderia tomar suas próprias decisões.
Beast abriu seu caderno na única história que ele continuava voltando.
Uma que estava mais para conto de fadas do que um relato histórico, e nem
sequer ficava claro se era uma lenda nativa ou apenas produto da imaginação
selvagem dos primeiros colonos.
A maioria dos contos de fadas tinha algum tipo de moral, e essa era só...
Essa. O homem nunca disse a ninguém o que o curou, e a única coisa que o
capitão observou foi que os moradores disseram que o homem fez uma
viagem pela floresta a oeste do município de Brecon - que também era a
localização do clube e voltou curado. Com sua nova esposa, ele se mudou
para morar na mesma floresta. Mas a história não para ai. Algumas versões
alegaram que ele fundou uma cidade, alguns que ele atraiu viajantes e fez
sacrifícios de sangue, outra história sugeriu que ele comeu e bebeu como um
monstro, e ainda casou com mais três esposas e viveu até os cem anos de
idade.
O que importava era que era uma história de um homem cujo corpo foi
esmagado, e ele encontrou uma maneira de curar-se num momento em que
a maioria das pessoas não vivia até os seus cinquenta anos. E se houvesse
qualquer tipo de verdade nisso, mesmo que fosse apenas com base em fatos
que a ciência ainda não descobriu, Beast queria encontrar as respostas. Ele
precisava encontrar.
Mais ainda, a cada dia que passava ele via o seu pai de quase sessenta
anos vivendo uma vida de drogas, álcool e inúmeros parceiros sexuais, mas
quase sem rugas.
Capítulo Onze
Laurent
Laurent jazia enrolado no cobertor macio que era tão leve, que parecia
nuvens de algodão, e por dentro, o calor era tão acolhedor que ele não queria
sair de debaixo dele, apesar de já estar acordado por já duas horas.
Mas, assim que ele apagou a luz e deitou na cama com o coração ainda
batendo no peito, enquanto relembrava os acontecimentos do livro em sua
mente, ainda espantado com a facilidade de ler com os novos óculos, a vida
real veio rastejando de volta para agarrá-lo pela garganta. O beijo desastroso
que se seguiu ao dia mais glorioso não o deixava dormir.
Laurent deveria saber que Beast não seria melhor do que Fane. Ele
acorrentou o seu pé e se transformou em um dragão assim que Laurent
hesitou em aceitar os avanços de Beast. Foi o melhor. Ele estava se afogando
neste novo mundo e não precisava sentir afeição por Beast, nada, além disso.
Não importa o quão rápido seu coração se agitou quando os dedos com
cicatrizes de Beast se enrolaram ao redor dos dele ou o quão forte era o seu
braço maciço quando Beast o colocou sobre o ombro de Laurent no
escorregador. Todas essas bagatelas eram ridículas para refletir.
Não foi exatamente esse o erro que ele fez antes? Um homem poderoso
o inundou de atenção e presentes, e o coração de Laurent já começava a se
excitar, embora o tivesse deixado coberto de sangue da última vez. Ele não
seria um alvo novamente, ao se envolver com um homem que poderia quebrá-
lo como um graveto. Se Beast reagiu com fúria quando seu beijo não foi
retribuído, o que ele teria feito se Laurent o beijasse, mas não estivesse
disposto a seguir adiante? Laurent ainda se lembrava de como Fane zombara
de seu nervosismo, como ele chamara Laurent de uma flor para se arrancar.
Laurent olhou para a porta. Não lhe disse para “se foder” ontem? Ele
mal podia acreditar na quantidade de palavras desprezíveis que saía da boca
de Beast toda vez que algo o incomodava, mas parecia que elas eram mais
comumente usadas do que no passado. E ainda assim elas doíam tanto
quando eram arremessadas contra ele.
Mas quando o homem falou atrás da porta, não era a voz de Beast, mas
a de King. — Laurent, você está dormindo?
Ele colocou o livro de lado e deslizou para fora da cama. Seria apropriado
receber a visita de King quando Laurent estava em suas roupas de noite? Ele
provavelmente deveria recebê-lo assim se King escolheu para visitá-lo aqui.
— Por favor, entre — ele disse, inutilmente endireitando sua calça escura
verde xadrez do pijama.
A porta se abriu, e o belo rosto de King surgiu por trás dele. — Por que
você não respondeu a princípio? O meu filho está lhe tratando mal?
Laurent lambeu os lábios, sem saber o que dizer. — Nós poderíamos ter
tido um pouco de discussão ontem. Ele alegou não querer ouvir nada de mim,
então eu escolhi não responder à batida. Eu não quis ser desrespeito com
ele, Sr. King.
Ele seguiu King até a sala de estar, onde várias bandejas estavam na
mesa baixa ao lado do sofá, junto com duas xícaras de café fumegante. O
olhar de Laurent ainda se desviava para a porta trancada que lhe foi
explicitamente informado para não ousar se aproximar. O acesso proibido só
fez aumentar a curiosidade de Laurent.
Laurent recheou sua boca com torradas e ovo, sem saber o que fazer
com o elogio. Ele estava apenas sendo educado. — Assim que isso acontecer,
eu ficarei livre, mas também sem um aliado neste mundo. Existe uma chance
de que eu poderia ficar quando tudo se resolver? Eu, por sua vez, prometo
tornar-me útil.
King ergueu a xícara com um sorriso largo. — Filho! Ouvi dizer que você
teve um pequeno desentendimento com o nosso querido convidado. O que
ele poderia possivelmente ter feito? Basta olhar para ele — ele disse
apontando para Laurent.
A boca de Beast apertou, e ele lentamente fechou a porta atrás dele. —
Seria ótimo se você me dissesse que estava prestes a sair do meu
apartamento.
Os ombros de King ficaram rígidos, e ele se levantou. Ele não era tão
alto quanto seu filho, mas Laurent não ousaria enfrentá-lo de qualquer
maneira. — Eu não preciso me explicar para você. O edifício é enorme, com
potencial de expansão, enormes quartos para realizar festas e concertos. Se
você tivesse alguma imaginação, você iria olhar para o futuro e ver o que
poderia acontecer se todos nós trabalharmos duro!
Os olhos azuis de Beast foram à direção a ele, e ele apontou seu dedo
indicador enorme para ele. — Cale-se. Isso não tem nada a ver com você!
King bufou. — Dê ao garoto uma pausa. Parece que ele é mais esperto
do que você, se ele vê o potencial dessa propriedade. Eu não vou nem
começar com todos os motivos, o que poderia ser convertido em uma área de
lazer no futuro. De jeito nenhum vou me livrar deste lugar para comprar
alguns bunker de concreto fodido em algum lugar.
Beast soltou uma gargalhada e apertou seu punho sobre uma forma
invisível. — Não? Eu vou te dizer. Você pega o pau de um homem, o coloca
em sua boca, e você o chupa — explicou, trazendo sua mão mais perto de
seus lábios e pressionando no interior de sua bochecha com a língua, como
se algo realmente tivesse sido inserido.
Laurent saiu pisando duro para o seu quarto, mas ele podia ouvir Beast
o acompanhamento. Tudo o que podia pensar agora era os lábios de Beast
em torno dele, movendo-se até beijar a ponta. Isso não era nada bom.
— Vista algo adequado. Se King quer que você conheça os outros, então
você está indo. Você tem quinze minutos. — Beast disse de pé na porta
quando Laurent tropeçou em seu quarto.
Laurent tirou a camisa sem mangas que usou para dormir, mas depois
parou, olhando para Beast. — Alguma privacidade, por favor?
— Agora você quer privacidade? Então agora estou proibido de sequer
olhar para você?
Desta vez, até as orelhas de Laurent ficaram quentes. Pensar que Beast
o cobiçara antes, quando Laurent pensou que eram apenas dois homens cuja
nudez não tinha consequências. Ele deu um passo em direção a Beast e,
apesar do tamanho imponente do homem, empurrou seu estômago, tentando
empurrá-lo para fora do quarto. — Eu não sou um pedaço de carne para ser
mastigado.
Beast olhou para o relógio, que estava preso ao seu pulso. — Agora são
dez minutos, então é melhor se apressar ou vou arrastá-lo para baixo de
pijama.
Com a saída de Beast, se vestir foi mais rápido, uma vez que todas as
roupas modernas eram simples e fáceis de colocar, ao ponto de Laurent
considerá-las “simplistas”, mas ele se encaixaria a todo custo. Ele respirou
fundo e saiu, sentindo-se muito mais seguro com a jaqueta de couro, do que
na calça de pijama, que era tão firmemente colada nas pernas, que deixaram
pouco à imaginação. Laurent agora se perguntou se foi por isso que Beast as
escolheu.
Beast estava deitado no sofá com o cão enorme esparramado sobre suas
pernas. Ambos os olhares dispararam em Laurent assim que surgiu no
corredor, vestido e com o cabelo penteado com a nova escova de cabelo. Se
arrumar era muito mais fácil agora que ele realmente podia ver-se no
pequeno espelho redondo que comprou na loja.
Laurent franziu a testa. — Você não tem servos para fazer isso?
— Desde que King permite que você saia do meu quarto, coma na
cozinha. Vocês dois deixaram migalhas por todo o meu sofá. — Beast disse e
chamou Hound, liderando o caminho para a porta.
Laurent passou pela porta que Beast abriu para ele, morrendo de
vontade de conhecer outras pessoas, então ele não estaria preso aos seus
sentimentos conflitantes por Beast.
Hound seguia o seu mestre com a cauda preta abanando. O cão olhava
para trás, na direção de Laurent, como se ele não confiasse nele, mas com o
som da música cada vez mais alto, os três progrediram pelo corredor. Laurent
estava feliz quando eles finalmente passaram por um espelho, como não
havia no apartamento de Beast ele olhou para o reflexo de todo o seu corpo
para se certificar de que de fato estava apresentável.
A superfície do vidro estava ligeiramente curvada, como se o espelho
tivesse uma imperfeição que Laurent não conseguia identificar. Não era que
estivesse deformado; como aqueles da loja com os espelhos que visitou ontem
com Beast, mas mesmo com os óculos firmemente sobre o nariz, o reflexo de
Laurent estava um pouco claro, e sombras escuras escondiam os cantos.
Nada como as superfícies limpas e lisas que ele tinha visto no shopping.
Eles passaram por um corredor diferente que da última vez, mas todas
as passagens pareciam um grande labirinto na mente de Laurent de qualquer
maneira. Todas as paredes estavam com pintura descascando, assim como
a pele no verão, e os corredores de azulejos tinham a aparência suja. Cada
quarto que ele passou, a sensação de desconforto estava crescendo em
Laurent com a visão de cadeiras caídas e quadros quebrados. Era um grande
contraste do apartamento limpo de Beast, que era fresco e cheio de itens que
Laurent poderia apostar serem caros. Devia ser por esse motivo que Beast
não queria morar aqui.
Era a mesma estátua que confundiu Laurent quando ele entrou pela
primeira vez na casa de William Fane. E agora que sabia disso, seu olhar
inevitavelmente se estendeu para detrás do monstro, até os painéis de
madeira descoloridos que traziam traços de mofo, mas ainda escondiam os
segredos da tortura e da morte. Atrás dessa porta escondida Fane o levou
como um cordeiro para o abate.
Ele nem sequer perceber que ele tinha parado até que Beast falou com
ele. — Estranho, né? Estou surpreso que eles não tiraram essa coisa quando
o hospital foi criado aqui. Ver esculturas como esta não poderia ter ajudado
os pacientes — ele disse aproximando-se da monstruosidade, e ele acariciou
seu focinho malformado.
Calafrios percorreram sua coluna quando ele olhou para a porta secreta
que o levou para a câmara de horrores de Fane, mas Beast o cutucou para
seguir ao longo do corredor.
— Oh, King possuiu este edifício desde o início da década de 2000, mas
antes costumava ser uma instituição psiquiátrica. É por isso que há tantos
quartos. É uma dor na bunda, se você me perguntar — ele disse enquanto
passavam pelo o que costumava ser o principal corredor na entrada.
Laurent percebeu que tinha viajado no tempo, mas foi parar no mesmo
lugar, a evidência disso vinha de todas as direções. As portas originais foram
trocadas, mas o painel acima ainda tinha uma decoração adornada com um
relevo representando uma guirlanda de flores. Os nichos nas paredes agora
tinham lâmpadas em vez de estátuas nuas, mas quando Laurent olhou para
cima, o rosto de Dionísio o encarava da mesma forma que tinha quando ele
entrou pela primeira vez na casa com Fane. O afresco estava escuro, a
pintura rachada, e o gesso desmoronou e caiu, deixando buracos em branco
na pintura do bacanal, mas era sem dúvida o mesmo.
A era moderna parecia ter afrescos também, mas eram mais brutos,
feitos em cor escura e vulgar. Enquanto caminhavam pela sala de televisão,
mulheres nuas davam a Laurent sorrisos luxuriosos nas fotos na parede,
onde estavam em travesseiros na frente de um homem de pele vermelha, com
chifres que claramente descrevia o diabo, mas não tinha nada da subtileza e
da graça perigosa da criatura. Este tinha um pau enorme fazendo volume na
frente de sua calça e anéis ligados a seus mamilos. Ele contemplava as
mulheres como a personificação da luxúria infernal.
O antigo Laurent poderia ter olhado para longe, mas não havia nenhum
ponto em evitar tais representações obscenas depois de ter feito um pacto
com o próprio demônio.
Houve uma clara mudança nos aposentos da mansão de Fane até essa
estrutura. Aqui, os pisos eram feitos de algo que parecia uma mistura de
borracha e plástico e rangia sob as solas de suas botas. Os arquitetos não
haviam dado nenhum adorno às paredes, o que fazia com que todos os
cômodos, e até mesmo os corredores, parecessem caixas empilhadas por
conveniência. Ele viu mais dos afrescos perturbadores, imagens mais suaves
e brilhantes de corpos nus e criaturas diabólicas, e as paredes foram
pintadas com uma variedade de cores intensas, a sutileza dos relevos foi
esquecida.
— Nada para ver aqui. — Beast disse em um tom que sugeria que ele
quis dizer exatamente o oposto. Ele acenou com a cabeça em direção a um
balcão dividindo o espaço de outra câmara, que brilhava com metal polido.
— Deixe a bandeja na cozinha e volte.
Agora que Laurent podia ver tudo tão claramente, ele não tinha certeza
se queria. A maioria dos homens era gigante, e eles estavam vestidos de preto
e, a julgar pelas roupas das mulheres, nenhum delas era senhoras
respeitáveis. Mesmo em comparação com as mulheres que Laurent tinha
visto no shopping, a abundância de carne nua em exposição aqui abafou a
sua voz. Seria um bordel?
Escolhendo ser civilizado para não dizer nada que pudesse ser
considerado rude, ele colocou a bandeja sobre a superfície polida na cozinha,
observando Beast andando na direção dos sofás e sendo recebido com
sorrisos e tapinhas nas costas.
Laurent se atreveu a sorrir, aliviado que pelo menos alguém aqui fosse
mais baixo do que ele, mesmo que ela fosse uma mulher. — Obrigado. Beast
me ajudou a escolher.
— King nunca faz nada que não seja sobre ele ser o centro das atenções.
Da última vez ele me levou as compras, nós nos separamos depois de meia
hora, e ele acabou comprando para ele mesmo. Acabei esperando por ele, e
ele chegou atrasado ao cinema. Não são os homens que sempre reclamam
que eles têm de esperar por suas mulheres? Eles demoram tanto como nós.
Nao gemeu e deu um tapinha nas costas de sua amiga. — Você deveria
ter me chamado. Eu queria ver esse filme de qualquer maneira. Você sabe o
quão quente eu fico com Tom Hardy em praticamente qualquer coisa.
15
Em referência de ela estar usando lápis/delineador preto nos olhos.
Só então Laurent percebeu que Nao era a “namorada” de King, que ele
já tinha entendido que significava ser uma espécie de esposa com o mesmo
direito em comum. — É... Eu não quero ser rude, mas eu gostaria de fazer
uma pergunta. É aceitável que um homem saia com outra mulher quando
ele já tem uma namorada?
Nao acenou com a mão com desdém. — Ambas somos amigas do King,
querido.
Nao riu, inclinando-se para trás como se Laurent fosse uma obra de arte
para admirar. — Olhe para os seus olhos. Você está tão confuso, Sweet baby,
mas está tudo bem. Nós concordamos com isso, por isso não é um tipo de
traição.
Laurent engoliu em seco, hesitante sobre o que ela queria dizer, ainda
não querendo parecer irremediavelmente mudo. Ele balançou a cabeça e
caminhou até a caixa com o seu coração batendo mais rápido a cada minuto.
Ele nunca iria aprender sobre este mundo no futuro. Haveria sempre algo
para surpreendê-lo, como agora.
Com o coração na garganta, ele apertou o botão com o número '3' na
frente dele, mas quando nada aconteceu, ele apertou outro, com um
triângulo vermelho, em seguida, um símbolo com ondas, o '3' de novo, que
só acabou com o número '33' aparecendo no visor.
16
Mansplaining. Quando um homem dedica seu tempo para explicar algo óbvio a uma mulher, de forma didática,
como se ela não fosse capaz de entender. O termo é uma junção de — man — (homem) e — explaining — (explicar). Em
atos de mansplaining, um homem acha que sabe mais sobre um tópico do que uma mulher.
Mas como ele deveria usar esse conhecimento em um mundo de tecnologia
a par com magia?
— Vá em frente, Beast, explique para ele — ela disse tão divertida que
teve que limpar uma lágrima de seu olho.
Knight surgiu ao lado dela e pegou a bebida que Martina estava fazendo.
— O que Beast tem de explicar?
Knight sorriu, e mais uma vez Laurent percebeu como ele era agradável,
mesmo que seu queixo fosse desnecessariamente desalinhado, e seu longo
cabelo parecia um emaranhado de ondas penteados pelo vento. — Chili da
Martina? Sim! Foi bom Beast tê-lo ajudado com o micro-ondas, não é?
Laurent olhou para Beast, que estava tão perto, que tudo o que Laurent
podia pensar era a maneira gloriosa que ele cheirava. — S-sim — ele
murmurou.
17
A Origem (no original em inglês, Inception) é um filme de ficção científica lançado em 2010. DiCaprio faz o papel de
Dom Cobb, um ladrão especializado em extrair informações do inconsciente dos seus alvos durante o sonho. Incapaz de visitar
seus filhos, Cobb tem a chance de vê-los em troca de um último trabalho: fazer a inserção, plantar a origem de uma ideia na
mente de um rival de seu cliente.
Com a tigela branca nas mãos e uma bandeja de pratos de plástico,
todos se juntaram aos outros nos sofás. Laurent tentou manter a calma, mas
não havia como negar que todos os olhos estavam sobre ele, e quando Beast
o dirigiu até uma cadeira sem encosto, ele estava contente que pelo menos
ele sabia o que era esperado dele.
Beast rosnou com a boca cheia. Engolindo em seco, ele se inclinou para
trás na cadeira de couro e apertou os olhos. — Prospecto, eu disse que ele
não quer falar.
Joker riu, balançando a cabeça, o que fez com que as fileiras de anéis
que cobriam sua orelha se movessem. Ele pegou um pedaço de papel, o
amassou e o jogou em Beast. — Sempre dispensado. Meu coração sangra.
Laurent o olhou, mas depois uma risada escapou de seus lábios. — Oh,
ele não teria tido tempo para romance, eu lhe garanto.
Como Laurent poderia saber o que era e o que não era de conhecimento
comum, desde que a história claramente revelou que ele era o único que
matou Fane? — Eu... É só um palpite. — Ele mergulhou o pão no chili, que
parecia algum tipo de carne e molho de tomate, mas quando ele o colocou na
boca para mastigar, seus olhos começaram a lacrimejar com o súbito calor
das especiarias em sua língua.
— Veja, eu disse que seria muito picante para ele. — Jake riu, mas não
forneceu qualquer alívio.
— Sim, ele tem sido muito útil. — Laurent murmurou, e era um enorme
eufemismo. Beast estava incitando tantos sentimentos contraditórios dentro
dele, que ele não conseguia se concentrar na coleta de informações que lhe
permitiria influenciar o homem de forma mais eficiente.
Joker deu uma risada curta. — King sabia a quem pedir para cuidar de
você. Apenas a pessoa mais responsável aqui. Se fosse eu, você
provavelmente estaria usando as minhas roupas velhas e comendo cereais.
Nao riu. — Então fale com ele sobre isso em privado. Todo mundo já
ouviu falar sobre a sua gloriosa “linhagem” Francesa pelo menos umas três
vezes.
— Você sabe, eu sei que nós não estamos todos aqui, mas eu queria
falar com vocês sobre o que aconteceu com Davy e buscar ideias de como
impedir que isso aconteça novamente. — Beast disse colocando para baixo a
taça vazia na mesa.
— Ele não mora aqui, então sua opinião pouco importa nesta
discussão. — Beast disse tenso. — Tudo o que eu quero saber é se vocês
poderiam ver um lugar se eu achar algo adequado. Alugar um composto
custaria muito menos do que reformar este lugar.
Uma mulher magra entrou usando um vestido preto que chegava até os
joelhos e sapatos deformados com um salto muito alto e esguio que a fazia
andar de forma deformada e bamba. Seu cabelo dourado girava em ondas
perfeitas enquanto ela jogava a cabeça em uma exibição teatral de frustração.
— Eu fiz o que você pediu e tentei falar com aqueles construtores, mas um
deles continuou entrando no meu espaço pessoal e ficou flertando. Por que
você não encontra outra garota para foder, se for isso que é preciso? Eu
terminei! — Ela disse e se virou, saindo antes que Knight chegasse até ela.
Quando outras pessoas seguiram para fora da sala, Laurent não iria
ficar para trás, a curiosidade já recebendo o melhor dele. Nao estava bem
atrás dele.
— Isso acontece pelo menos uma vez por semana com a Jordan. Eu
gostaria de ter feito pipoca — ela disse, e Laurent sorriu de volta para a piada
que ele não conseguia entender, muito feliz com alguém sendo amigável com
ele.
— Estou indo embora! E não vou voltar desta vez. — Jordan gritou se
afastado em um ritmo dolorosamente lento por causa de seus sapatos altos.
Ela parou e cruzou os braços sobre seu peito volumoso, olhando para
Knight. — O careca. Ele não me meu descanso! Eu disse a eles que poderiam
ir embora. Vocês precisam contratar uma equipe mais profissional.
Jordan abriu os braços. — Sim! Se eles não podem ser respeitosos, eles
precisam ir. Diga alguma coisa, querido! — Ela acrescentou, olhando para
Knight, como se todo esse desempenho só foi destinado para chamar atenção
para ela. E o pior de tudo, parecia estar funcionando.
Só agora ocorreu a Laurent que, pelo que ele estava acontecendo, Knight
provavelmente não estava apaixonado por Beast. O alívio desse pensamento
era ao mesmo tempo agradável e desconcertante.
Knight puxou Jordan para debaixo do braço e ela o abraçou com força.
— Tudo o que posso prometer é que não vou quebrar o nariz dele agora, mas
não vou implorar a eles que voltem.
— Combinado. Que tal você e Jordan saírem para beber algo? — Beast
sugeriu, claramente querendo afastar a namorada histérica de seu amigo.
— Beast, que tal Laurent falar com eles? — Nao perguntou quando os
pombinhos recém-reconciliados desapareceram de vista.
— Bom dia, Sr. Maddock! — Laurent disse com um sorriso largo que
ele esperava que escondesse o quão nervoso estava. Ao viajar no tempo, a
altura média de um homem em 2017 não poderia ser a mesma? Seria pedir
demais?
Laurent não deixou seu sorriso vacilar. — Eu... Eu sou francês. — Isso
seria suficiente?
— Para ser justo, ele ainda não nos ofereceu nem sapos ou caracóis,
então ele está tentando se integrar — disse o homem que ainda não havia
expressado sua opinião sobre o assunto. — E eu poderia comer um pouco de
chili...
— Ok, eu vou me juntar a eles agora e lidar com o resto. — Beast disse,
já fazendo o seu caminho até a porta.
Laurent não pôde suportar que o seu sucesso fosse ignorado, assim ele
o seguiu. Ele conseguiu alcançar Beast no corredor, e os sentimentos dentro
dele se misturaram como água e óleo abruptamente sacudidos. Beast falou
tantas palavras cruéis ontem para ele, e, no entanto, a conexão que haviam
forjado antes parecia algo mais do que um homem tentando ganhar o favor
daquele que ele queria dormir.
— Beast?
Beast parou com os ombros duros, mesmo antes de olhar para trás. —
Hmm?
Laurent engoliu em seco, agora sem saber o que dizer. — Eu... Por favor,
lembre-se de não ficar mais longe do que meio quilômetro...
Beast gemeu. — Sua perna não vai explodir. Esta braçadeira está aí
apenas para que eu saiba onde você está. OK?
Ele levou alguns segundos para se recompor e voltou. Ele sorriu para
ela, e uma vez que nenhum dos homens pareceu considerar as roupas
reveladoras das mulheres impróprias, ele iria tentar seguir o seu exemplo.
— Em que mais eu posso ajudar? O chili vai precisar de mais micro-ondas?
Capítulo Treze Beast
Porque não importava o que Beast tivesse dito, ele ainda gostava de
olhar para os lábios carnudos, os grandes olhos castanhos, e ele estremecia
cada vez que Laurent passava por ele no corredor quando seu cabelo macio
e comprido roçava o braço de Beast.
Era o inferno.
Antes, seu apartamento poderia ser muito solitário, mas agora que ele
tinha o pedaço de doce que não podia chupar no mesmo espaço, era uma
distração constante. Isso tornou o propósito de encontrar um potencial novo
clube uma tarefa quase impossível. Laurent estava fazendo, mesmo que
lentamente, progresso com Hound e ele frequentemente falava com o cão em
francês, como se os dois tivessem segredos de Beast.
Mas toda vez que Beast considerava jogá-lo fora, atribuindo a Laurent
um quarto maior em outra parte do clube, o aliviando da presença incômoda,
ele não conseguia, pois no final do dia, era bom ter alguém além de Hound
ou Knight sentado com ele em sua fortaleza de solidão. Ele até começou a
entender quando Laurent ficava confuso, e ele gostava de ajudá-lo a entender
conceitos modernos. Laurent era fascinado por filmes, mas Beast não o
levaria a merda mentirosa do cinema. Ele ficaria tentado a segurar a mão
dele novamente.
Ter alguém tão desumanamente bonito ao seu redor não era apenas
tortura, mas também tentação. Ainda assim, ele não ousaria tocar no garoto
novamente. Seu ego estava frágil o suficiente depois de sua última tentativa.
Nao sugeriu que Laurent pudesse ser virgem, mas Beast não queria
perguntar ou repetir isso com Laurent, especulando que havia fofocas sobre
sua vida sexual pelas costas dele. Ainda assim, a inocência de Laurent sobre
sexo era estranhamente cativante.
Pelo menos Grey estava de volta de seu emprego em Nova York, o que
significava que todos os Kings finalmente estariam presentes, e ele poderia
levá-los para o complexo de armazéns e garagens que tinha encontrado. E o
aluguel não era alto para o que a propriedade representava. Considerando
que King tinha levado Nao e Martina em um encontro a três, a ocasião não
poderia ter sido melhor.
Ele também queria que Laurent o abraçasse por trás, mesmo que
acabasse sendo outra forma de tortura.
— Não! Não! Está tudo bem! Eu estou bem! — Ele não parecia bem.
Beast deu um passo para trás e olhou para a porta, mas ainda segurava
a mão na madeira fria, como se sua presença pudesse de alguma forma
ajudar Laurent com qualquer problema que estivesse tendo. — O que está
acontecendo?
— Comigo? Nada.
Ah, então, pelo menos, não era nada horrível. — Eu posso tentar não rir
de você.
— Pode entrar.
— Eu não consigo tirá-la. Nao deu para mim e disse que era ótimo para
a pele, e eu segui as instruções, mas... Eu não sei o que fazer. — Os ombros
de Laurent cederam, mas os mamilos cor de rosa estavam escuros em
exposição, o que tornou difícil para Beast se concentrar na camada fosca que
congelou o rosto de Laurent.
Desta vez, Beast riu antes que ele pudesse sequer pensar. Era o
problema mais estranho que ele já tinha ouvido falar desde aquele cara na
sua escola que tentou dar prazer a si mesmo com um aspirador de pó. —
Er... bem? você não deve apenas lavar? — Ele perguntou se aproximando de
Laurent.
Parecia estranho, mas nada para ter medo ou gritar, igual aos homens
nas comédias antigas quando encontravam com suas namoradas nessas
máscaras.
Laurent mudou seu peso com um gemido. — Nao disse que poderia.
Mas valeria a pena e deixaria a pele refrescada e flexível. Agora eu me
questiono se vale realmente à pena, mas é difícil fazer um julgamento
enquanto ainda está em mim.
Ele era surrealmente bonito, como uma criatura fora deste mundo, e a
pior coisa que enfrentava com esse tipo de atração, era que lembrava Beast
de suas próprias falhas nesse respeito.
Laurent respirou fundo mais uma vez e abriu os olhos, com traços de
lágrimas nos longos cílios. Ele franziu a testa e balançou a cabeça. — A
brutalidade desse tratamento está além das palavras! Mas toque! Está tão
suave agora! — Ele agarrou a mão de Beast e a colocou contra sua própria
bochecha.
— Está tudo bem. Talvez apenas coloque um pouco de creme sobre isso
agora. — Beast disse lambendo os lábios quando seu olhar deslizou sobre o
peito suavemente de Laurent. Ele era baixo, e ainda assim tão perfeitamente
proporcionado.
Beast concordou.
Laurent piscou, sem se mexer também. — Sua camisa é tão
intensamente macia. Que tecido é esse? — Ele perguntou e puxou a calça do
pijama.
Beast manteve os olhos no rosto de Laurent, mas isso não ajudou muito,
já que ele recebeu a maravilhosa imagem dos ombros e pescoço de Laurent
se movendo da forma mais erótica possível. Ou então ele pensou. — É...
Algodão penteado. Meus nervos ficaram fodidos durante o incêndio, então eu
não gosto de roupas ásperas ao redor das cicatrizes — ele disse no final. Era
uma coisa boa que suas pernas estivessem em boa forma, ou ele não poderia
usar jeans confortavelmente.
Ele limpou a garganta. Era uma pergunta tão íntima, que ficou surpreso
no início, mas ele não tinha acabado de remover uma máscara facial do rosto
de Laurent? É exigido um grau de intimidade que precisava ser retribuído.
— Eu uso, e deixa minha pele um pouco melhor. E algumas áreas são mais
sensíveis do que outras, isso é tudo.
— Eu não vou. E terei certeza de ter alguém para me ajudar se for usar.
Laurent sorriu para ele e saiu do quarto com as mãos nos bolsos,
parecendo fresco e casual, como se ele não tivesse se chocado contra a vida
de Beast coberto de sangue e usando roupas históricas há apenas duas
semanas. — Bem, você sabe quem chamar se você cometer esse erro.
Beast ainda estava em cima do muro sobre essa coisa toda, sem saber
se Laurent estava flertando ou se era apenas uma piada, porque se fosse, em
seguida, as dores de que ele teria que passar definitivamente não valeria à
pena.
Rev sorriu e colocou seu capacete. — O garoto acha que ele vai dirigir
sua moto?
Knight começou a gargalhar tão alto que Beast quis dar um tapa na
parte de trás de sua cabeça. — Foi o que ele disse.
— Apenas fique se você não está pronto para isso — ele disse e montou
sua moto em um movimento rápido e um pouco agressivo.
Mas então ele sentiu uma presença atrás dele, e momentos depois os
braços finos envolveram sua cintura, e um peito pressionou as costas de
Beast.
Laurent estava tão imóvel, tão imóvel atrás dele, que por um momento
Beast pensou em parar para ver se ele estava bem. Mas ele se inclinou
ligeiramente para frente, e Laurent inclinou-se com ele em vez de ficar duro,
como se tivessem de alguma forma se tornado um só corpo. Os braços finos
apertaram ainda mais quando Beast rugiu sua moto.
A estrada de asfalto estava vazia, mesmo depois de todos terem deixado
os terrenos pertencentes ao clube, e quase não viam carros até chegarem à
periferia de Brecon. Laurent estava agarrado a ele com tanta força que
parecia que ele era outra parte do corpo de Beast. Ele não estava mais tão
tenso também, e foi um pensamento agradável que foi Beast aquele que o fez
se sentir tão seguro. Beast meio que perdeu o contato próximo e estava
ansioso para sentir isso novamente na volta deles para o clube. Ele não
gostava de assustar Laurent, mas sabendo que agora ele era o mestre de
ambas as suas vidas; dava-lhe certa emoção.
King ficaria furioso se soubesse que Beast organizou isso, e ele deixaria
que todos soubessem, mas os Kings of Hell eram homens sensatos. Eles
sabiam o quanto as reformas custariam em um prédio antigo como o clube
atual. Era lógico se mudarem, mesmo que isso exigisse investimento inicial,
já que a manutenção seria muito mais barata e fácil do que os reparos em
grande escala. Inferno, considerando o que aconteceu com o pobre Davy, eles
provavelmente teriam especialistas rastejando por todo o lado, testando a
qualidade da construção e a reforma, o que drenaria os bolsos do clube
mesmo antes que os reparos começarem.
Foi quando eles dirigiram para a esquerda, de volta para a costa, quando
a rua bifurcou em frente a uma igreja branca, que Laurent endureceu um
pouco. No espelho, Beast o viu olhar freneticamente para trás, e deve ter sido
a antiga prefeitura que chamava a atenção dele. Um dos edifícios mais
antigos da região, inalterado desde a sua criação, era de um estilo
arquitetônico ímpar. A forma geral parecia bastante normal, com linhas retas
e grandes janelas do estilo renascentista grego, mas alguém deve ter
considerado isso muito chato. Duas pequenas torres foram adicionadas em
ambos os lados da fachada, pouco mais altas que o telhado, mas cobertas
com cúpulas que se assemelham às das igrejas ortodoxas russas. O produto
final permaneceu controverso até hoje, entretanto, era o orgulho da cidade.
Eles pilotaram ao sol quente ao longo da cerca sólida de metal e por todo
o caminho até o portão que estava aberto. A corretora de imóveis já estava
esperando por eles, parecendo profissional em seu terninho cor de vinho e
saltos pretos.
Beast não iria tão longe ao pensar que ele convenceria seus irmãos, mas
seu coração inchou quando ele percebeu que seus irmãos iriam ver o lugar
com o sol de maio, em vez da chuva que pairou no ar nos últimos meses.
Dias. Quando eles estacionaram todas as suas motos em um semicírculo, em
frente à corretora de imóveis, ela sorriu nervosamente e deu um passo para
trás.
— Boa tarde, Sra. Taube. Espero que estejamos no horário certo — ele
disse concentrando-se nela enquanto seus irmãos se juntavam a ele um por
um.
Ela sorriu um pouco demais, mas assentiu. — Bem na hora. Sou eu que
sempre gosto chegar à propriedade um pouco mais cedo. Estou feliz em ver
que você trouxe toda a sua tripulação com você.
Rev bufou e passou a mão sobre a cabeça careca. — Vamos levar este
show na estrada.
Beast olhou para todos os homens e sorriu. — Estamos interessados.
Nosso clube atual é muito grande para as nossas necessidades, e isso deve
ser um ajuste perfeito. Você pode confirmar que não teríamos problemas com
as festas e reformas? — ele perguntou enquanto ela os levava em direção à
fachada amarela escura dos escritórios.
— Claro. Para alguns de nós, incluindo eu, isso pode ser a nossa casa,
então mantê-la em boa forma é muito importante.
Ao passarem sala após sala, Beast estava contente de ouvir seus irmãos
comentando sobre o uso para o espaço, ideias para pôr paredes extras.
Laurent por outro lado, era um pé no saco, e apesar do passeio emocionante
na garupa de Beast, ele estava começando a se arrepender de trazê-lo com
eles.
Laurent nunca havia agido assim antes. Desde o primeiro dia explosivo,
seu relacionamento com Beast se tornou civilizado e realmente agradável.
Beast não o ajudou a arrancar aquela porra da máscara facial uma hora
atrás? Que diabos era o problema dele agora?
O filho da puta agiu como se fosse burro, como se não tivesse pegado a
dica. Laurent pode ter crescido em algum culto Menonita estranho, mas
Beast notou o quão rápido ele pegava tudo, e como ele calava a boca e ouvia
quando as coisas não estavam claras para ele, então vê-lo agir de uma forma
tão obstrutiva estava fazendo formigas raivosas rastejar nos braços de Beast.
— Não, não. King disse especificamente que queria uma masmorra com
algemas, e uma gaiola para uma garota fingir que era o seu cão. Não culpe o
mensageiro. — Laurent cruzou os braços sobre o peito.
— Err... Eu teria que falar com o meu gerente sobre isso. — A Sra.
Taube disse.
Ele ignorou o lado feio de Laurent por causa de sua beleza? Assim como
Knight fazia com cada namorada consecutiva? Laurent desviou o olhar assim
que seus olhos se encontraram, deixando Beast se perguntando se essa
sabotagem havia sido causada por Laurent e King, mesmo sendo
improváveis, como um bebê foca e um leão.
Beast respirou fundo, movendo o seu peso e rolando seu pescoço sobre
os ombros quando a tensão nas costas tornou-se demais para suportar. —
Hoje. Você está indo embora hoje. Eu não quero falar com você de novo, eu
fui claro? Você arruinou tudo. — Beast chiou no final antes de agarrar o
braço de Laurent e o puxar para longe da parede. Só havia um tanto de tempo
que eles poderiam ficar para trás sem que alguém ficasse impaciente.
Laurent não encontrou os seus olhos, mas ele deve ter entendido o
ponto de Beast, porque não houve mais lamentação, nem desrespeito, e
nenhuma palavra desafiadora. Como um garoto que nem tinha vinte anos
poderia ter chacoalhado Beast desta maneira? Já era hora de parar de
torturar-se com a presença de Laurent em seu apartamento.
Mas vendo Laurent ao lado de sua moto ferveu o sangue de Beast mais
uma vez. Fodido seja se ele achava que Beast desejaria qualquer contato
físico após esta sabotagem.
— Joker, você pode levá-lo? Eu tenho algo para fazer antes de voltar
para o clube.
O olhar magoado no rosto de Laurent não tinha lugar. Ele não foi o
único que foi esfaqueado nas costas.
Pior ainda, ele foi repentinamente privado ao acesso dos livros, porque,
como se viu, nenhuma das outras pessoas que moravam no clube tinha
muito interesse em literatura. Então, às vezes, ele passeava pelo prédio
durante o dia, perguntando-se sobre o propósito de alguns dos itens deixados
para trás pelas pessoas que haviam ocupado aquelas câmaras anos atrás.
Beast não tinha falado com ele desde o modo horrendo como as coisas
tinham se desenvolvido na propriedade que eles foram ver; então Laurent
não ousou perguntar sobre poder ler. Provavelmente só o levaria a outro
argumento que ele não poderia ganhar.
Ele tentou preencher o vazio deixado por Beast, falando com novas
pessoas e tornando-se tão útil quanto humanamente possível. Jordan deixou
algumas das tarefas administrativas que vinha fazendo para o clube, e como
Laurent não era muito bom em trabalhos que não fossem de escritório, ele
entrou no labirinto de informações e documentos do escritório e elaborou um
sistema de arquivamento para todas as contas. A princípio, foi uma tarefa
aparentemente inatingível, mas Laurent gostou do desafio que os
documentos apresentavam.
Nao se tornou a sua amiga mais confiável e explicou muitas coisas novas
para ele, então, quando o telhado da sala de festas foi finalmente consertado,
e chegou à hora de celebrar a nova posição de Beast como vice-presidente do
clube, Laurent confessou a ela que ele esperava atrair um cavalheiro com o
propósito de explorar o desejo. No começo, ela riu dele, mas quando ele ficou
chateado com ela pela zombaria, ela explicou que era apenas o jeito que ele
tinha dito que era engraçado.
Nao o levou para o mesmo shopping que ele visitou com Beast semanas
antes. Ela escolheu o mesmo restautante que Beast originalmente queria
levá-lo, e desta vez conseguir uma mesa não foi problema. A carne de boi
realmente tinha um ótimo sabor, e a fácil disponibilidade de açúcar para café
e sobremesas fez Laurent comer mais do que o necessário. Mas a comida
ainda deixava um sabor amargo em sua boca quando ele se lembrou de como
Beast estava chateado quando ele foi recusado de ter o privilégio de comer
lá.
Nao decidiu que se ele quisesse “transar” - o que significava atividade
sexual geral - então ele precisava de roupa nova e sexy. Isso o confundia, já
que ele achava que as roupas que Beast o ajudara a escolher eram muito
atraentes, mas ele iria aceitar o que era necessário para o empreendimento
e colocaria sua confiança em Nao, já que ela tinha encontros regulares com
homens.
Nao endireitou o seu cabelo com um ferro quente, e tudo o que Laurent
usava se agarrava ao seu corpo como uma segunda pele. O tecido de sua
calça preta era um pouco semelhante ao couro fino e macio, ainda que
ligeiramente esticado, para acomodar cada parte de seu corpo. Todas as
partes. Ele já usou calças justas no passado, mas nenhuma que abraçasse
seu pau tão obscenamente. A melhor coisa que ela comprou para ele era
ainda mais estranha. Ele experimentou em uma loja que vendia toda uma
série de objetos obscenos e onde a própria Nao comprou um vestido curto
feito de borracha para usar na festa.
Ele precisava pedir a Nao que lhe emprestasse um dicionário. Como com
o latim, certamente para memorizar as novas expressões e palavras, e ajudá-
lo a aprendê-las muito mais rápido do que meramente falando.
Era quase meia-noite quando Nao aplicou um pouco de tinta preta nos
olhos de Laurent, insistindo que precisava ficar meio manchado para ficar
bem em um homem, e só então ele foi autorizado a ir com ela participar da
festa. Pelo jeito, o número de convidados era muito superior a qualquer coisa
que Laurent já tinha visto no clube até então. A música estava mais alta. E
até Nao parecia mais animada para a noite do que normalmente ficava.
Era isso. Hoje era a noite que Laurent beijaria um homem novamente.
Talvez mais do que um beijo, já que com tantas pessoas ao redor ele se sentia
seguro o suficiente para tentar a sorte com alguém; e com certeza alguém o
ajudaria se o homem que ele escolhesse se tornasse agressivo. Ele teve com
o diabo uma segunda chance na vida. Uma chance de viver livremente em
um mundo onde ele poderia fazer o que quisesse, e ele não perderia essa
oportunidade. Ele seria o mestre de seu próprio destino.
Foi doloroso escutar King por tanto tempo, e Laurent ficou feliz quando
a música começou de novo. King saiu do palco, acenando para a multidão
enquanto caminhava com um sorriso branco perolado. Nao alcançou-o
empurrando seu corpo esbelto através dos corpos suados. Ela puxou a
cabeça dele pelo colarinho e apertou o rosto contra a orelha dele. Pela
maneira como King se encolheu ela provavelmente estava gritando.
— Uma maravilha! Ha! É por isso que gosto de você Laurent! Você
sempre encontra as palavras certas. — King deu um tapinha nas costas nuas
de Laurent, fazendo Laurent se arrepender da roupa que ele e Nao
escolheram quando os dedos de King permaneceram em sua coluna. — Eu
vou contar um segredo para você. Sabe por que foi um discurso tão bom?
King gemeu meio bêbado, como se estivesse irritado por sua revelação
ter ficado em ouvidos moucos. — Eu consigo tirar sua energia vital quando
ele está chateado, porque todas as barreiras estão para baixo, e ele é perfeito
para isso, porque ele fica de mau humor o tempo todo. Sempre que ele se
machuca, sempre que ele sangra, eu posso comer toda essa energia, como se
fosse uma melancia aberta e eu estou pingando com os sucos.
Os olhos azuis de King brilharam e ele riu tão maliciosamente que uma
parte da cerveja em sua boca escorreu pelo queixo dele. — Ele é tão jovem e
forte, e eu só preciso saber... Vocês dois foderam? Porque desde que você
saiu do quarto dele, eu me sinto como um recém-nascido. Eu não vou ficar
de ressaca depois desta noite.
Laurent gemeu e quis reclamar, mas King sempre saia quando queria e
o fez com o aceno de mão.
Laurent ficou olhando para ele por tempo suficiente para vê-lo puxando
uma mulher alta e magra usando roupas pretas para fora da multidão. A
mulher riu e deu-lhe um beijo assim que viu quem era, e Laurent não podia
mais olhar. Ele tentou não julgar a depravação que observava no clube todos
os dias, já que os tempos e os costumes claramente mudaram, mas ele não
queria ver King de qualquer forma depois das coisas que acabara de ouvir.
— Eu não sou apoio de braço — ele gemeu, mas depois olhou para
cima e encontrou Knight sorrindo para ele amplamente. Ele podia desculpar
Knight por ser intrusivo, já que o homem era tão irresistivelmente
encantador. Ainda assim, ele cruzou os braços sobre o peito enquanto os
pensamentos do terrível pacto de King com o demônio caíam em sua mente
como roupas em uma máquina de lavar roupa.
— Aw, eu não falo com você há algum tempo. Você já deu os parabéns
à Beast? — Knight perguntou, movendo-se para o lugar desocupado por King
momentos atrás.
Para evitar ser tocado tanto quanto possível por estranhos, Laurent se
aproximou da parede, efetivamente circulando o salão, enquanto Nao e outra
mulher dançavam juntas junto ao poste de metal, incitadas por uma
multidão assobiando. Nao subia até o topo, apenas para descansar sua
coluna contra a vara com a cabeça baixa e abaixar as pernas, espalhando-
as obscenamente. A outra mulher deve ter tido inveja de toda aquela atenção,
pois de repente ela arrancou sua camisa, revelando seu peito para todos os
reunidos.
Laurent ficou tão chocado com a exibição que ele esbarrou em alguém.
Depois de um pedido de desculpas profuso, ele finalmente chegou à mesa de
Beast, diminuindo a velocidade como se fosse um pobre chegando para uma
audiência com um rei. Ele nervosamente pegou em sua manga, tentando
ignorar a sensação em seu peito, que o restringia de respirar livremente.
Beast olhou por cima de seu copo, estreitando os olhos quando ele viu
a presença de Laurent. Seus olhares se encontraram, e atingiu Laurent como
uma bala o quanto ele ansiava que Beast o apreciasse. Martina e Jake
olharam para Laurent também, e o último assobiou, mas a opinião deles não
importava em face da careta de Beast.
Jake riu alto. — Oh, cara… sim. Elas são muito sacanas.
— Eu acho que ele não sabe o que isso significa. — Martina disse
acariciando gentilmente o braço de Laurent.
Laurent enraizou no chão com vergonha, e ele agora percebeu por que
ele estava atraindo tantos tapas na bunda de todos ao seu redor. Essa não
tinha sido sua intenção. Seu rosto ficou tão quente que parecia um farol
entre o mar de pessoas ao seu redor.
— Ela disse que eu pareço sexy — ele tentou sem muita energia,
duvidando de si mesmo quando os olhos azuis de Beast perfuraram seu peito
nu. Suas roupas realmente convidavam aos homens a lhe oferecer dinheiro
por prazer?
Martina riu ainda mais e quase engasgou com a bebida alcoólica que
estava tomando. Beast bateu os dedos no copo e alternou entre manter os
olhos na cerveja e olhar para Laurent.
— Tem certeza? — Martina riu e pegou uma nota, acenando para ele.
— Eu vou dar isso para você, se você nos mostrar sua bunda linda.
Ele queria tanto fazer as pazes! Knight o havia preparado para essa falha
em nome de Beast? — Eu tenho que recusar — ele murmurou e saiu
rapidamente, com medo de que a dor nas pálpebras se intensificasse se Beast
lhe desse mais um olhar odioso. Ele veio até a festa se sentindo tão orgulhoso
de sua roupa nova e sexy, mas agora ele queria desaparecer em seu quarto
vazio e frio.
Ele não deveria ter tentado se tornar algo que ele não era. Talvez ele
simplesmente não tivesse nascido para ser sexy? Pelo menos nos dias de
hoje, ele não era um empregado vinculado a um mestre por um contrato que
basicamente significava que o Sr. Barnave o possuía por um período fixo de
tempo.
Bob acabou por ser um sujeito fantástico. Eles logo se mudaram para
um canto sossegado com travesseiros empilhados, onde conversaram sobre
bebidas, o que deixou Laurent com a mente um pouco confusa. Ele
suspeitava que as bebidas contivessem algum tipo de espírito, apenas muito
mais doce do que ele estava acostumado. Bob até trouxe um canudo para ele
beber e, como muitas das coisas favoritas de Laurent em 2017, era feito de
plástico.
Com a festa girando em torno deles, com música alta e com as luzes tão
fracas, Laurent finalmente relaxou, apreciando a proximidade de um corpo
masculino quando Bob pressionou contra ele para sussurrar em seu ouvido
de uma forma que enviou sensações de cócegas por todo o corpo de Laurent.
Laurent riu do frio e das gotas de água que caíam em sua pele. — Talvez
eles sintam que eu não tenho a criação certa.
— Ah, acho que estou apaixonado agora. Seu sotaque parece tão bom...
— Bob disse e se inclinou, esfregando a bochecha contra a de Laurent.
— Você acha que estou brincando, mas nunca conheci ninguém como
você. Eu não conseguia tirar meus olhos de você desde que você entrou, mas
eu acho que estava um pouco tímido para me aproximar de você no início. —
Bob suspirou e lentamente colocou a mão acima do joelho de Laurent.
Bob sorriu. — O que? Por que você diria isso? Eu só queria pedir-lhe
para servir de modelo para mim, mas a conversa está ficando ótima também.
Laurent sorriu para si mesmo e apertou a mão de Bob, cada vez mais
nervoso enquanto saíam para o corredor vazio, onde a música era apenas
um som surdo. — Eu gostaria disso.
Bob não sorriu de volta, seu rosto contorcendo-se brevemente antes que
o enorme punho de Beast colidisse com ele com tanta força que Bob bateu
na parede mais próxima e deslizou para o chão com sangue jorrando sobre
os azulejos cinzentos. Ele gritou, segurando o nariz com uma das mãos e
erguendo a outra na tentativa de se proteger. — Não, por favor! É um mal
entendido, eu juro!
Laurent tentou ficar entre eles, mas Beast o afastou com facilidade. —
Pare de atormentar esse pobre homem! Tudo o que ele queria fazer era me
conhecer melhor! Isso é pecado?
Laurent deu um passo para trás, sem saber no que acreditar. — Isso é
verdade? — Ele sussurrou, olhando para Bob, cujo nariz sangrava até as
gotas caírem chão.
Bob levantou uma mão e segurou a outra no nariz. — Sinto muito por
ter julgado mal as coisas. Eu posso ir embora?
Beast socou a parede com tanta força que seu punho deixou um
amassado na parede, e Bob gritou, protegendo a cabeça. — Você está banido
daqui. Tente voltar, e eu pessoalmente vou quebrar seus braços, seu pedaço
de merda! Pintá-lo como suas garotas francesas... Que piada!
Laurent deu outro passo para trás, mais para dentro das sombras, tão
profundamente envergonhado que doía fisicamente. E o pior era que Bob não
teria sequer que inventar mentiras para ganhar o favor de Laurent. Laurent
teria considerado ficar íntimo com o homem de qualquer maneira. Agora, o
próprio pensamento o repelia. Seria o seu destino ser enganado por todos
que ele escolhia se abrir?
Bob ficou de pé, tendo que se segurar com a ajuda da parede. — Claro,
claro! Vou! Não há necessidade de ficar violento. — Ele riu nervosamente e
uma bolha de sangue explodiu em sua narina.
Beast enfiou as mãos nos bolsos e abriu a boca, sem emitir nenhum
som quando um homem e uma mulher tropeçaram no corredor, ambos
atracados em um beijo agressivo. Laurent e Beast os observaram tentarem
entrar em duas portas antes de achar uma disponível, e o casal correu para
dentro do quarto.
Beast limpou a garganta. — Ele deve ter notado que você não sabe do
que ele estava falando. Ele queria usar você porque você é ingênuo — ele
disse no final.
— Laurent, isso não é um jogo. Esta é sua vida. Você não pode
simplesmente pular nas coisas. Sua vida passada não te preparou para nada
disso. — Beast lambeu os lábios, se aproximando.
Laurent se manteve firme, soltando um suspiro pesado de exasperação.
— Como vou aprender? Eu tenho tanta vontade de tocar um homem, e todas
as minhas tentativas terminam em desastre!
A miséria de Laurent não teria fim. O homem que Laurent tratara com
malícia para seu próprio ganho o resgatou mais uma vez. Ele não poderia
dizer para Beast a verdade, e ainda assim, não importa o quanto ele odiava
o que ele fez na audiência, não havia alternativa. Laurent não podia permitir
que Beast mudasse de moradia até o próximo aniversário. Havia uma meia
verdade que ele pudesse dizer? Uma que não foi sua motivação, mas que
descrevia seus sentimentos?
Ele era escória, e não era merecedor do afeto de Beast, e ainda assim,
ele era egoísta o suficiente para desejá-lo.
Beast estava muito quieto. — Se você gosta de mim, por que você não
disse nada? — Ele perguntou no final.
Laurent esfregou os olhos, apenas alguns segundos depois de perceber
que a tinta negra já havia se espalhado por suas mãos. — Você disse que me
desprezava.
— Eu não moro com ele. Meu bem-estar não depende dele. Ele não tem
autoridade sobre mim. E ele não é tão grande e forte quanto você.
Algo mudou nos olhos de Beast. As íris azuis brilhantes ficaram mais
suaves quando encontraram o olhar de Laurent. Beast o puxou para mais
perto, levando-o pelo corredor e longe do barulho, longe dos quartos onde as
pessoas escapavam para fazer coisas obscenas com estranhos. Os dedos de
Beast eram quentes e convidativos, tão gentis quanto tinham sido no
shopping.
Ele estava tão nervoso, tão focado no homem na sua frente, que ele nem
se preocupou em procurar um interruptor de luz ou olhar para a cama. Tudo
o que ele sabia era que Beast era grande, quente e cheirava como nenhum
outro homem vivo - tanto no passado quanto no presente.
Beast olhou para cima, seus olhos pálidos na luz fraca do lado de fora
quando ele levantou a cabeça para olhar para Laurent. — Isso é menos
assustador? — Ele sussurrou.
Beast exalou, e houve um leve tremor em sua voz quando ele se inclinou
para frente e esfregou o rosto contra o estômago nu de Laurent. Mas foi
quando a boca de Beast se abriu contra o umbigo de Laurent e o provocou
com ar quente que Laurent gemeu, derretendo contra a parede.
Beast olhou para cima quando seus dedos se moveram sobre a frente
da calça de Laurent e o apertou suavemente. Qualquer sangue que ainda
estivesse na cabeça de Laurent escorreu momentaneamente, enchendo seu
pênis tão rapidamente que ele temia que sujasse as novas roupas com sua
semente.
Ele não duraria muito mais com Beast brincando com suas bolas,
passando a outra mão sobre o quadril de Laurent, e fazendo sons de prazer
como se ele fosse o único a ser favorecido. Uma sensação invadiu Laurent
mais rápido, e ele teve que se inclinar para frente e se firmar contra os
ombros de Beast, cauteloso para não os apertar com muita força. Toda vez
que Beast chupava mais forte, um gemido escapava dos lábios de Laurent, e
cada toque provocante nas partes íntimas de seu corpo o fazia tremer com o
lançamento que se aproximava.
18
Trocadilho com o nome dele. Beast: Fera, Besta.
Capítulo Dezesseis Beast
Laurent nunca esteve mais bonito do que era agora, frenético e corado
mesmo depois de gozar. Suas palmas estavam pressionadas contra a pele
das costas de Beast, mas era o jeito que ele continuava puxando Beast para
beijos que eram o mais atraente. Beast não era apenas um meio para um
fim, Laurent não era um cara excitado procurando por uma boca para chupá-
lo. Ele queria abraçar e beijar de uma maneira que Beast esqueceu que era
possível.
Eles ficaram parados por vários segundos até que Beast percebeu que
era sua decisão dar o próximo passo. Ele puxou Laurent para fora do quarto
e para o corredor escuro, em direção às luzes brilhantes do corredor que os
levaria ao apartamento de Beast.
Ele se encaixava tão bem sob o braço de Beast, com seus ombros
graciosos e pele quente que cheirava a manteiga de cacau e algum tipo de
perfume almiscarado. Apesar das inúmeras tentativas, Beast não se atrevia
a falar também, e assim ambos caminharam em silêncio, para longe do
barulho da festa e em direção à privacidade do apartamento de Beast. Como
Hound estava trancado em seu cercado do lado de fora durante a noite, não
havia ninguém para perturbar sua intimidade, e a expectativa construída
pela longa caminhada estava perfurando buracos no crânio de Beast.
Beast olhou para o rosto bonito, e ele sabia, sem sombra de dúvida, que
ele estaria disposto a desistir de festas por um ano apenas para cair entre os
lençóis com Laurent uma única vez.
— Ta brincando né? Você acha que eu prefiro beber cerveja e ouvir Lizzy
gemendo no palco do que ficar sozinho com você? — Beast perguntou,
apertando Laurent com mais força contra ele. O sorriso lentamente se
esticando na boca de Laurent fez o coração de Beast bater mais rápido, e
quando eles se aproximaram da porta que finalmente lhes concederia toda a
privacidade que precisavam, seus músculos ficaram tensos com a pressão
para fazer isso direito. Ele sabia que Laurent gostava dele, mas ele ainda
podia decidir que não queria ir mais longe com isso. Ele poderia querer foder
alguém em questão de dias, e o que Beast faria então?
Beast riu levemente envergonhado por parecer tão tonto, mas ele estava
com Laurent, então talvez isso não fosse errado. — Acho que tive a melhor
surpresa que poderia ter — ele disse puxando Laurent para o quarto escuro.
Ele não se incomodou em procurar o interruptor de luz, porque ele conhecia
sua casa de cor. Ele imediatamente se virou para o corredor que os levaria
ao quarto principal. Seu pau estava tão duro que quase parecia dolorido, mas
ele esperaria e faria o certo esta noite.
Laurent sorriu para ele na escuridão, seguindo sua liderança como se
não houvesse ninguém com quem ele preferisse ficar. Beast podia recordar
em todos os detalhes vívidos como o pênis de Laurent provava na sua boca,
como palpitava contra sua língua e paladar, e como estava desesperado por
Laurent minutos atrás. Na sua idade, Beast já tinha fodido vários caras para
contar, mas para Laurent era tudo um novo começo, o que deixava Beast se
sentindo como se estivesse fazendo algo completamente novo.
Beast se sentiu subitamente sem fôlego e sem saber o que dizer. Ele
estava tão empolgado em colocar as mãos em Laurent que ele esqueceu sobre
as roupas. Ele pretendia devolvê-las a Laurent depois que ele as pegasse, ele
realmente queria, mas sem Laurent aqui para encher a casa de Beast com
conversas, era a única coisa que ele tinha deixado dele. Por mais patético
que fosse... Ele só queria que a proximidade imaginada durasse um pouco
mais.
Beast os rolou devagar, mantendo Laurent perto dele com as duas mãos,
para que ele não caísse no colchão, mas baixasse suavemente para ele, com
todo o cuidado que Beast queria investir nessa... Coisa que estava se
desenvolvendo entre ele e Laurent. — Foram eles que deixaram você com as
pessoas estranhas com quem estava? Você não mantém contato com eles,
não é?
Era uma declaração tão triste que Beast se sentiu obrigado a segurar
Laurent por um momento, roçando os lábios na testa de Laurent para
expressar sua simpatia. — Eu sinto muito. Eu perdi minha mãe, e eu sei que
deve ter sido difícil. — Ele sussurrou.
Laurent riu nervosamente, mas deixou Beast guiar sua mão. A visão era
tão doce que Beast queria lamber Laurent todo. Ele não conseguia se lembrar
de já estar na cama com alguém tão inocente. Porque apesar de suas
declarações de maturidade, Laurent era a pessoa mais natural que Beast
conhecia. Tão completamente diferente da vida que ele e seus irmãos
lideravam como membros do MC Kings of Hell, e ainda assim, de alguma
forma Laurent se encaixava como se ele estivesse destinado a estar aqui para
compensar todo o derramamento de sangue e violência.
Beast riu. — Ok, eu vou primeiro então. É isso que você quer? — Ele
perguntou e puxou a mão de Laurent para frente de sua calça. Apenas a
proximidade dos dedos de Laurent fez sua pele explodir com a sensação.
Beast sorriu, olhando para o pau dele, tatuado com escamas de dragão.
Era uma tatuagem antiga, antes de seu acidente, e agora ele estava em êxtase
por ter alguém para vê-la. Sem pensar, ele puxou a mão de Laurent e fez
seus dedos deslizarem para cima e para baixo, movendo o prepúcio para que
ele deslizasse sobre a cabeça, provocando uma sensação que explodiu por
todo o caminho até o crânio de Beast. Ele imaginou Laurent abaixando-se
para chupar seu pênis, e isso criou uma reação tão forte nele, que o líquido
claro apareceu na fenda, prestes a chuviscar nos dedos de Laurent.
Laurent gemeu e caiu nos cotovelos, o cabelo escuro deslizando por seu
ombro. Deu muita satisfação a Beast vê-lo perder o controle. Isso só o fez
imaginar como Laurent soaria uma vez que Beast realmente transasse com
ele, aquele corpo apertado espremendo o pau de Beast e o ordenhando.
Laurent não era exatamente passivo, mas definitivamente complacente com
suas pernas abertas, fazendo como solicitado e seguindo o exemplo de Beast.
Beast riu e virou Laurent. Ele próprio deslizou os joelhos no chão tão
rapidamente que doeu, mas era um pequeno preço a pagar por colocar o
rosto enterrado entre as coxas abertas de Laurent. Ele o puxou até a beirada
da cama e chupou a pele macia de seu saco, saboreando o suor e a excitação
enquanto se arrastava para baixo, com a intenção de se satisfazer com o
garoto.
Ele ainda estava ofegante depois que o seu orgasmo derreteu seu
cérebro, e quando o pensamento de seu gozo estava na mão e estômago de
Laurent, ele sentiu uma nova pontada de excitação em suas bolas vazias. Só
agora ele realmente sabia o quanto ele sentia falta do sexo. O quanto ele
sentia falta de ter alguém em sua cama, e ser também querido e apreciado
não apenas como um grande líder dentro do clube, um bom amigo e um
homem responsável, mas como um amante digno de tocar e beijar. Ao
permitir que ele ficasse tão perto, Laurent substituiu uma peça dentro de
Beast que tinha sido quebrada há muitos anos.
Laurent rolou até ficar colado ao seu estômago e olhou para Beast para
conversar, e foi mais uma faísca de alegria para Beast. Seu novo amante não
se esquivou de olhar para ele. Corando furiosamente, Laurent cobriu a parte
inferior do rosto com as duas mãos. — Aquilo que você fez com a sua língua?
— Ele sussurrou. — Eu realmente não sei nada sobre aquilo.
As coxas de Beast tremiam dos dois lados de sua cabeça. Sem marcas
de cicatrizes e peludas, eles apertaram e fizeram cócegas na pele nua de
Laurent cada vez que ele chupava mais forte ou torcia os lábios ao redor da
circunferência em sua boca. Antes de vir para cá, ele nunca considerou
colocar a boca no pênis de outro homem, mas o corpo inteiro de Beast tinha
um aroma tão limpo, com apenas um pouco do sabor da noite anterior, que
ele ansiava fisicamente retribuir o favor e oferecer seus lábios em troca do
cuidado mostrado a ele na noite passada.
Beast estava respirando com dificuldade, e toda vez que ele inspirava
profundamente o ar, a cabeça de Laurent era empurrada para cima, apenas
para afundar quando Beast exalava. Mãos fortes acariciavam o cabelo de
Laurent, brincando com os fios gentilmente. Não havia nada desajeitado ou
brutal nas carícias, e Laurent se sentiu sorrindo enquanto acariciava a pele
marcada no estômago de Beast.
Laurent rolou para fora da cama com tanta dignidade quanto pôde, já
que sabia que estava sendo descaradamente ofendido. Ele se esticou na
frente da janela para prolongar o momento.
Beast fechou os olhos e respirou fundo. — Você quer falar com ele ou
quer ficar aqui?
Laurent esfregou o rosto, ciente de que a tinta em volta dos olhos dele
era uma bagunça total. — Está bem. Eu só preciso da minha calça. — Ele se
deu mais dois segundos para reunir seus pensamentos, e então pegou suas
roupas e se vestiu. Beast, por sua vez, parecia não se importar com Knight
vendo sua nudez.
— Você poderia ter deixado uma nota, seu espião sujo. — Beast disse,
puxando Laurent para mais perto e abraçando-o com um braço.
Laurent mordeu os lábios para não sorrir muito. Sim Knight. Nós
fizemos sexo ontem. E hoje. E foi incrível.
Beast acariciou o topo de sua cabeça enquanto Knight olhou entre eles
com diversão. — Boa escolha então. De qualquer forma, eu vou sair e deixar
os dois pombinhos sozinhos.
Beast grunhiu. — Knight, isso pode ficar entre nós três por enquanto?
Laurent pensou se deveria dizer alguma coisa, sua língua coçava, e não
era como se Knight pudesse ficar violento quando Laurent estava sob o braço
de Beast, e sob sua proteção. — Você tem que me desculpar, mas não é você
que se envolve em ações sujas com outras pessoas? Ambos os homens e
mulheres…
Knight revirou os olhos. — Sim, mas ela sabe que não somos exclusivos.
Ela nem consegue se decidir se está bem com isso ou não, e ninguém pode
me dizer para fazer algo que eu nunca concordei.
Knight bufou. — Foda-se. Ela vai ter que lidar com outro pensamento
se você estiver certo. De qualquer forma, estou de folga. Cuide bem do meu
amigo. — Ele disse piscando para Laurent.
O olhar de Beast passou por Laurent, e pela primeira vez ele não tinha
certeza se tinha dito a coisa certa depois de tudo. Knight bateu os dedos
contra a porta e abriu-a, desaparecendo de vista depois de uma palavra de
despedida e deixando Laurent e Beast em um silêncio absoluto.
— Bem, eu não posso te dizer o que você deveria querer para si mesmo
— Beast disse um pouco bruscamente.
Laurent fez uma pausa, pensando um pouco. — Acredito que nada seja
tão valioso quanto à liberdade. — Ele olhou para a porta que Beast sempre
mantinha trancada. Knight era permitido entrar. Laurent agora seria
também? Ele não ousou perguntar ainda.
Beast tomou um copo inteiro de suco. — Eu estou com fome. Você quer
sair e tomar café em algum lugar?
Foi bom para ele ter um pouco de tempo, porque Beast queria ir
alimentar Hound de qualquer maneira, mas a verdade sobre os eventos da
noite passada cutucavam na parte de trás da garganta de Laurent quando
ele falou com Nao. Ela estava muito curiosa para saber se ele conseguiu
encontrar um parceiro, mas ele tentou contar o mínimo de mentiras
possíveis.
Uma vez que ele terminou suas tarefas e desceu as escadas em busca
de Beast, ele se sentiu completamente revigorado e como ele novamente nas
roupas que Beast escolheu para ele na primeira vez que foram fazer compras
juntos. Laurent prendeu seu broche de valor inestimável na lapela de sua
jaqueta de couro, e ficou feliz ao descobrir que esse novo estilo moderno
combinava muito bem com ele.
Ele estava a meio caminho da sala de bilhar quando um homem idoso
tropeçou no corredor, cortando seu caminho. Laurent demorou alguns
segundos para perceber que a massa de cabelos grisalhos e opacos
emaranhados e os ombros curvados pertenciam a ninguém menos que King,
que usava cabelos dourados e brilhantes na última noite.
— Por favor, você pode pintá-lo. Muitos homens fazem isso. — Martina
murmurou recuando quando o homem gemeu, esfregando a testa. — Você
vai ficar doente de novo? Você quer um chá de hortelã? Café? — Ela tentou,
mas King descartou todos os seus esforços com gestos grosseiros e rápidos.
— Sr. King minha bunda! — King sibilou e empurrou Laurent com tanta
força que ele quase caiu no colchão sujo coberto apenas por um lençol que
estava no meio do caminho de qualquer maneira. — Olhe para mim. O que
você fez? — Ele perguntou, o empurrando para trás, e revelando uma
aparência enrugada e sem brilho, e com olhos opacos.
Laurent parou e seu rosto ficou quente. Ele rapidamente puxou a gola
da camiseta, mas não conseguiu esconder as mordidas de amor em seu
pescoço. — Com licença?
— Então, você fode o meu filho para distraí-lo? É isso que você quer
dizer? Ele está pensando em deixar o clube antes de 29 de agosto?
Se King precisava de Beast aqui para o seu aniversário, ele não iria
realmente machucá-lo até então... Iria? Mas, novamente, Laurent ainda não
podia encorajar Beast a sair. Ele precisava pensar em si mesmo e na vida
que lhe foi oferecida em troca de cumprir um contrato que duraria apenas
alguns meses. Ele se recusava a voltar a uma vida de servidão e pobreza, e
pior ainda, a um quarto encharcado de sangue com o corpo de Fane. Em
2017, ele iria trabalhar duro até que ele economizasse para fazer a cirurgia
ocular, e ele ganharia seu próprio dinheiro.
Desde que ele tinha doze anos sempre dependeu de si mesmo. Ele teve
sorte que o Sr. Barnave não era um mestre cruel, porque alguns servos que
ele conhecia eram muito menos afortunados, mas o homem ainda trabalhava
com ele o dia todo, todos os dias. Não importava quão doces fossem os beijos
de Beast, Laurent tinha que confiar em si mesmo quando considerava seu
futuro. Beast fazia seu coração palpitar e seu corpo se contorcer de prazer,
mas tudo precisava ser feito nos termos de Laurent, e ele não comprometeria
o assunto.
— Sim ele está. Mas se você deixar isso em minhas mãos, eu vou
garantir que nada mude nos próximos quatro meses. — Era ainda menos do
que isso agora, e uma vez que o mês de agosto acabasse Laurent estaria livre
para buscar uma vida independente em 2017, com Beast ao seu lado em
quaisquer termos que eles decidissem. — Ele gosta muito de mim.
Ele não conseguiu a paz para limpar sua mente antes de se aventurar
para encontrar Beast, com King amaldiçoando alto em algum lugar no
corredor. A risada despreocupada que veio a seguir fez toda a pele de Laurent
explodir com lembranças tangíveis da noite passada. Ele se levantou
imediatamente e se aproximou da porta aberta.
Laurent correu para fora da câmara fedorenta, ansioso para levar Beast
para longe de King o mais rápido possível. — Pronto — ele anunciou com um
largo sorriso.
Os olhos azuis se iluminaram, fazendo todo o corpo de Laurent doer por
toque, e Beast inclinou a cabeça para indicar a direção da saída principal.
— Desculpe, King, eu vou levar Laurent para ver o oftalmologista. Talvez
pergunte a Nao o que fazer com o seu cabelo. Provavelmente há um pouco de
óleo de coco e canela para isso — ele disse caminhando em uma linha fina
entre zombaria e conselhos. Nao gostava de cosméticos naturais, então ele
também poderia estar falando sério.
— Eu… Hum… Quando você conseguiu fazer isso? Quero dizer, King
me pagou um pouco para ajudar com os documentos que Jordan bagunçou,
mas duvido que tenha recolhido o suficiente para a cirurgia. — O coração
dele tamborilou quando eles entraram na garagem.
— Você acha que ele apena viu o meu sobrenome em algum lugar e é
por isso que ele usou? Porque não há registro de nenhum Laurent Mercier.
— Knight disse, sua voz como o zumbido de uma mosca no ouvido de Beast.
Depois de três gloriosas semanas com Laurent dormindo em seus braços,
por tudo que ele se importava, Laurent poderia ter caído do céu só por ele. E
ele estava aqui para ficar, se Beast tivesse alguma opinião sobre isso.
Ele exalou, tentando manter a calma, porque senão ele perderia com
Knight novamente. Lentamente, ele se inclinou sobre a mesa de sinuca e
arqueou o corpo, observando as bolas e mentalmente planejando suas
trajetórias antes de finalmente fazer um golpe preciso. A bola branca rolou
sobre a mesa, batendo em uma azul. O fôlego de Beast ficou preso quando
ele assistiu à primeira colisão da bola na beirada e depois correu pela
superfície, até o buraco no canto. Ele exalou alto quando caiu.
— Você está pensando demais nisso. Ele não pode ser daqui. Como ele
teria descoberto sobre você? Deve ser uma coincidência. Tem que haver
outras famílias com o mesmo sobrenome que o seu — ele disse, buscando
outra bola para se aproximar, e ele lutou contra o sorriso que se alargava em
seu rosto quando ele pensou quando ele estava aqui ensinando a Laurent
tudo sobre como jogar sinuca. As costas de Laurent se encaixaram tão bem
contra o peito de Beast...
Beast errou o alvo e sibilou exasperado quando a bola branca roçou sua
bola escolhida, girando e quase caindo em um buraco. — Ele é apenas um
garoto. O que ele poderia fazer conosco? Alguém o deixou aqui, e é isso. —
Ele disse bruscamente. Ele não queria mais discutir isso. Laurent tinha
muitos problemas e seu passado era um enigma, mas ele era inteligente e
ansioso por aprender, e Beast queria estar com ele o tempo todo.
— Não, você sabe que grupos grandes chamam muita atenção. Eu não
quero nenhuma merda acontecendo durante essa corrida. A carga é muito
valiosa. — Beast disse, observando seu amigo se esgueirando pela tomada.
Ele não contou a Laurent sobre a longa viagem ainda, não querendo
preocupar o garoto sobre algo que tinha que ser feito de qualquer maneira.
Knight sorriu e apontou para sua virilha. — Quando ele está feliz, estou
feliz.
Beast não estava feliz em ouvir isso. Agora que ele tinha Laurent em sua
vida, era mais fácil julgar Jordan também. Nem todas as pessoas bonitas
precisavam ser completos desperdícios de espaço. Apesar de sua aparência
digna de modelo, Laurent continuava sendo um cara modesto e doce, que
sempre sorria para Beast. Estar com ele mudou muita coisa. Era como se
Beast estivesse reaprendendo lentamente como viver. Não importa o quanto
ele respeitasse e amasse seus irmãos, eles não poderiam lhe dar essa
sensação que ele experimentava com Laurent. Era um tipo completamente
diferente de relacionamento, e não apenas porque envolvia sexo - por mais
glorioso que fosse - mas porque, pela primeira vez em tantos anos, Beast
podia expressar uma parte de si mesmo que permaneceu trancada por muito
tempo.
— Sim, bem, eu não vou negar isso. O outro Sr. Mercier está me dando
muita atenção. — Ele disse deixando o taco na mesa.
Ambos foram para a porta, e Knight bateu no braço de Beast, sem saber
que era um ponto particularmente dolorido quando se tratava das
terminações nervosas queimadas. Beast teve que respirar fundo para ignorar
a dor.
— Não fale sobre ele assim, ou vai parecer que você está transando com
o meu irmãozinho.
Beast bufou. — Eu não sei. Talvez ele seja. Qualquer parente perdido
há muito tempo? — Ele brincou quando entraram na sala comunal com suas
paredes vermelhas. O baixo zumbido do sistema de som sendo ajustado
significava que Lizzy estava por perto. Ele estava sentado na beira do palco
com um caderno, enquanto o baixista da banda trabalhava na eletrônica.
Knight riu alto, parecendo que não tinha nenhum cuidado no mundo
quando acenou para Fox e Joker, que estavam sentados no sofá empurrando
as rodinhas. Felizmente para todos eles, o assunto morreu no momento em
que ambos viram Laurent.
Por um momento, ele estava tão focado nos olhos de Laurent que quase
atropelou a mesa de café, mas felizmente a razão voltou rápido o suficiente,
e ele ajustou seus passos, sentando-se em uma cadeira. — Que livro é esse?
— Ele perguntou, estendendo a mão para a mesa e pegando uma pequena
garrafa de Coca-Cola de uma bandeja de bebidas.
Se ele pudesse justificá-lo, ele apenas não sairia mais de seu quarto e
foderia Laurent o tempo todo. Ele não estava empurrando para o sexo anal,
muito feliz com o que ele estava recebendo até agora, mas considerando o
quanto Laurent gostava de rimming19, Beast tinha certeza que mais cedo ou
mais tarde ele iria deslizar seu pau naquele buraco rosa apertado. Melhor
ainda, ele queria que Laurent lhe pedisse isso.
19
Prática sexual de tocar o ânus do parceiro com a boca, lábios ou a língua.
estava aqui, e ele definitivamente não queria ser constantemente picado
pelas palavras de King. Elas eram educadas o suficiente e não pareceriam
cruéis para o espectador médio, mas Beast reconhecia cada palavra passiva
agressiva por trás delas. — Eu não preciso de uma babá.
Fox colocou os pés sobre a mesa. — Ele está certo. Ele tem mais de
trinta anos. Se ele se queimar, é o problema dele.
King revirou os olhos e abriu uma cerveja. — Não se for eu quem vai ter
que ouvi-lo gemendo sobre isso.
Outra fodida declaração vazia, porque Beast nunca gemeu para King
sobre merda assim. E estaria escuro há algum tempo, então o sol não seria
um problema até de manhã.
Bem, isso pode ter sido o caso algumas semanas atrás, mas agora Beast
tinha alguém que tornara sua vida infinitamente melhor, e ele não precisava
de duas namoradas ou uma fila de carinhas chupando seu pau em festas
para provar sua masculinidade.
— Não, ele é o tipo que sofre em silêncio. — Joker disse fazendo uma
careta e enrijecendo os braços para imitar alguém cuja pele estava tão
queimada do sol que não conseguia se mover.
Até as garotas que estavam na cozinha olharam para eles, atraídas pelo
silêncio atônito.
Joker apertou os olhos. — O que estou olhando? Este é um daqueles
momentos?
Joker olhou para Knight. — Acho que alguém está trabalhando nessa
tomada — ele sussurrou de um jeito propositadamente alto.
Nao saiu da cozinha rapidamente, e agora Beast sentiu que ele era o
espetáculo sobre o qual todo mundo estaria comendo pipoca. Pela primeira
vez, ele não se importou.
20
No Original: “Are You Boyfriends?” No inglês Boyfriends significa namorados, porém aqui o Laurent entende as
palavras separadas. Boys= garotos, Friends= amigos.
Laurent rapidamente balançou a cabeça, fazendo o coração de Beast
afundar. — Nós não somos garotos. Nós somos manfriends21.
Besta piscou, quando Joker começou a rir. Mas ele não queria
envergonhar Laurent, então ele apertou a mão e assentiu. — Sim, somos
manfriends22.
Isso. Um cara como ele poderia ter Laurent. Um lindo e jovem docinho
com lábios que eram o sonho de qualquer um. Beast navegou na conversa
de volta para o que Fox estava procurando em um clube, mas então Laurent
sussurrou em seu ouvido, fazendo cócegas nele com o cabelo macio.
21
No Original: “We are not boys. We are manfriends.” Ele quis dizer que eles não são garotos, e sim homens por isso
o “man”, rsrs. Daí a confusão do Laurent.
22
No Original: “Yes, we are manfriends.” Aqui o Beast entende a confusão do Laurent e confirma, rsrs.
Mas Beast não era um covarde. Ele sempre enfrentou todas as coisas
que a vida jogou nele, então desta vez também seria assim, ele gentilmente
tirou Laurent do seu colo e se levantou.
Eles caminharam pelo curto corredor até a sala de bilhar, e Beast fechou
a porta atrás deles, forçando os ombros a relaxarem. Um pouco do peso saiu
de seu coração quando Laurent sorriu para ele. Talvez a coisa que ele queria
dizer a Beast não fosse algo que acabaria por esmagar seu coração.
— Eu estava pensando…
Beast não tinha ideia do que a conversa anterior tinha sido. Ele apenas
moveu as costas da mão no peito de Laurent, até a virilha, e se inclinou,
observando as pupilas de Laurent se dilatar. — Você quer que eu te penetre?
— Ele perguntou para se certificar de que isso não fosse mais um caso de
falha de comunicação, como muitas antes.
Laurent olhou para cima com um pequeno sorriso e ficou na ponta dos
pés, mas ainda teve que puxar a blusa de Beast para que seus lábios
pudessem se encontrar. Isso nunca ficava velho. Beast sorriu para o beijo e
abraçou Laurent, mas a excitação explosiva fervendo sob sua pele e a súbita
vontade de empurrar Laurent contra a parede e esfregar seu pênis
endurecido contra o garoto fizeram Beast se mover.
Laurent soltou uma gargalhada. — Por que diabos eu iria querer uma
coisa dessas?
Laurent roubou outro beijo sem fôlego e não perdeu tempo ao puxar o
jeans e a cueca de Beast até os joelhos, a outra mão ainda acariciando o
pênis de Beast. Beast mal conseguia se lembrar da última vez em que ele se
sentiu totalmente aceito. Era como se suas cicatrizes não significassem nada
para Laurent, e talvez elas realmente não significassem. Talvez fosse tudo na
cabeça de Beast.
Beast sorriu para Laurent, rolando os dois para mais perto da beira da
cama, para que ele pudesse pegar o lubrificante. Eles estavam usando para
algumas das outras coisas que faziam na cama, então pelo menos ele sabia
que não seria surpreendente para Laurent o toque frio do gel. Ele beijou
Laurent novamente, Beast esfregou seu corpo inteiro contra o seu amante,
nunca desviando o olhar, mesmo assim o toque fez seu pênis se contorcer de
prazer. Ele precisava manter a calma para ao momento apropriado. Mesmo
que seu prazer fosse estragado por ter que se manter em xeque, o prazer de
Laurent viria primeiro esta noite.
Virar Laurent foi um caso rápido, e Beast se empurrou contra ele,
gemendo quando a cabeça de seu pênis traçou brevemente o ânus de Laurent
antes de empurrar para cima e emergir entre suas nádegas. Beast levantou
o corpo ligeiramente para ver aquela vista magnífica novamente.
— Podemos parar?
Beast sabia que ele tinha que recuar, mas todo o seu corpo estava sendo
inundado com um ressentimento tão amargo que ele não tinha certeza do
que fazer sobre isso.
Beast respirou fundo. Claro que era bom mudar de ideia. Claro que era,
mas ele não podia deixar de sentir que havia algo profundamente artificial
em toda a situação. Não parecia que Laurent odiava o que eles estavam
fazendo, ou que algo o assustou. Ele parecia calmo e completamente
tranquilo, como alguém que decidiu escolher outro filme no cinema depois
dos primeiros quinze minutos, porque o atual não era tão divertido quanto
esperava.
— O que você quer que eu diga? — Beast sibilou e rolou para fora da
cama, andando pelo quarto escuro, as mãos firmemente entrelaçadas na
parte de trás do seu pescoço. Ele mal podia respirar, e agora tudo o que
queria era sair e dar uma volta, mas com Laurent se comportando de maneira
tão estranha, ele não queria deixá-lo sozinho também.
Palavras saíram dele, uma após a outra, até que ele não tinha mais ar
nos pulmões e encostou-se ao peitoril da janela para se recuperar. — Porra!
Eu sou tão estúpido!
— Não, Beast...
Laurent olhou para seus pés, e o pior era que a beleza enganosa de seu
corpo e rosto ainda estavam lá para insultar Beast. — Eu sinto muito. Eu
só... Eu conheci um homem antes de conhecer você, que me fez confiar nele.
— Laurent estava ofegante como se ele fosse o verdadeiro injustiçado aqui.
— E ele costumava ser cuidadoso, e até me comprou presentes, e em seguida,
ele...
Beast foi até ele antes que pudesse sequer pensar. Ele empurrou
Laurent na cama e se ajoelhou na frente dele, com ambas as mãos em seu
rosto, quando o luar revelou a umidade escondida nos grandes olhos
castanhos.
Será que ele quase dormiu com alguém que de alguma forma estava
mentalmente instável e não poderia realmente fazer suas próprias escolhas?
Ele gelou até os ossos por sequer pensar nisso. Ele não era esse tipo de
homem. Talvez não fosse inocente, mas ele nunca conscientemente usaria a
desvantagem de alguém assim. Então, novamente, não havia tantas
bandeiras vermelhas que pudessem ter o alertado. Ele não buscou as
respostas?
Beast engoliu em seco, dividido entre exigir que Laurent não mentisse e
realmente obter alguma informação dele. Seu estômago estava enjoado com
cada palavra que saia dessa linda boca. Talvez todos estivessem errados
sobre não fazer perguntas? Parecia completamente provável agora que
houvesse uma família em algum lugar, procurando por seu parente perdido,
e em vez de falarem sobre um jovem amnésico que apareceu com sangue em
cima dele, eles simplesmente varreram tudo para debaixo do tapete. É
verdade, isso era o que os Kings of Hell costumavam fazer quando o problema
surgia, mas a chegada de Laurent tinha sido uma ocorrência de pura pena?
— Eu... Eles estão na França. Mas não mais, é claro. Eles estão muito
longe. Eu precisava contar a alguém, queria te dizer. Se vamos confiar um
no outro, você precisa saber isso. — Laurent mal piscou, e todo o seu rosto
era uma máscara tensa.
Laurent tomou seu tempo para responder a pergunta, o que fez Beast
instantaneamente se perguntar se ele estava procurando algo em sua mente
para responder, ou se estava tentando esconder algo. — Você nunca
percebeu que há algo de errado com os espelhos neste edifício?
Beast engoliu em seco. Os espelhos sempre ficavam escuros no clube,
mas todo mundo sabia disso. Ainda assim, ele acenou com a cabeça,
querendo saber o que estava escondido dentro crânio de Laurent.
— Você claramente não confia em mim. Por que eu iria confiar em você?
— Beast assobiou, mas não soltou das mãos de Laurent.
Laurent bufou como se fosse ele quem tivesse razões para ficar
frustrado. — Como você quer que eu prove isso? As roupas não são
suficientes? Eu poderia dizer-lhe mais de como as pessoas viviam no meu
tempo, mas eu não sei o que é conhecimento comum e o que não é.
— Eu... Eu sei onde ele enterrou Marcel Knowles. Aquele cujo braço
ele... Manteve. — O rosto de Laurent contorceu com desgosto, como se
pudesse sentir o cheiro de carne podre. — Ele era um padeiro, e um bom
homem.
Beast exalou forte, observando Laurent em silêncio. — Não sei nada de
um braço. Onde é que esse cara foi enterrado, então? — Ele perguntou,
tentando manter a calma, apesar da raiva latente sob a pele. E o pior era que
ele não sabia se seus sentimentos eram justificáveis ou não, porque se
Laurent acreditava honestamente em tudo isso, então, como ele seria
culpado por sua conduta?
Beast sabia sobre a rocha. Talvez se ele provasse para Laurent que a
coisa toda tinha acontecido em sua cabeça, Laurent seria capaz de enfrentar
a verdade. Se ele tivesse força suficiente nele para não quebrar a pá com a
raiva impotente.
— Se, como você diz, eles nunca foram encontrados, então... Sim, eu
acredito que vamos encontrar os ossos. Você vai acreditar em mim, então?
Beast contou até dez em sua mente. — E se nós não encontrar nada,
você vai me dizer a verdade ou ir a um psiquiatra comigo?
O 'tap tap tap' dos pés de Laurent o seguiram. Beast não podia acreditar
que eles estavam prestes a cavar o chão no meio da noite. Se eles
encontrassem o corpo que “Fane” matou, com certeza seria uma bagunça
podre, apenas ossos.
Beast só queria acabar com isso. Ele estava com tanta raiva que nem
sequer queria falar mais, constantemente se lembrava de que isso só poderia
ser uma história de alguém que não estava em seu juízo perfeito, ou ele tinha
mentido durante semanas.
Pelo menos eles estavam escondidos além das árvores, o que fez com
que fosse improvável que alguém pudesse observá-los da casa. Ainda assim,
a garoa cobria cada polegada de pele nua de Beast, tornando as articulações
em suas mãos endurecer com frio e nublando seus olhos com a chuva que
batia em seu rosto sempre que o vento mudava de direção. Mas ele não iria
desistir, não importava o quão desconfortável fosse tudo isso.
Beast não tinha ideia de quanto tempo eles estavam cavando, quando
Hound decidiu que nem tudo valia à pena e saiu para se esconder debaixo
de uma árvore, mas Beast não poderia adiar esta tarefa até amanhã. Sem
prova definitiva, ele não seria capaz de sequer olhar nos olhos
traiçoeiramente bonitos dele.
— Por todos os infernos! Eu não consigo ver bem com toda essa chuva.
Você pode descer e dar uma olhada?
Mas Laurent estava tão certo desse lugar em particular. Como se ele
realmente soubesse, não apenas suspeitasse o que poderia estar escondido
além da rocha.
Beast sentiu seu sangue pulsando por todo o corpo, mesmo em sua
garganta, e muito lentamente, ele olhou para Laurent.
— O diabo deixou isso em mim. Ele viu o que eu fiz e concedeu meu
desejo. Eu queria viver em um mundo onde eu pudesse ser livre para me
sustentar, livre para amar um homem. E ele me trouxe até aqui.
Laurent ficou imóvel, mas finalmente olhou para Beast, seu rosto
molhado e enlameado, olhos quase invisíveis através dos óculos. — Não. Mas
ele faz algum pedido ao diabo. Eu não sei exatamente o que é, mas tem algo
a ver com a casa.
O caminho para casa foi longo e miserável. Beast estava tão envolvido
em seus próprios pensamentos que ele não conseguia invocar palavras de
conforto. Sua cabeça girava com o novo conhecimento de que seu pai não era
membro de algum tipo de culto. Ele literalmente fez um pacto com o diabo.
Isso era insano e, no entanto, o corpo que estivera oculto nos últimos
duzentos anos era prova suficiente. Isso era real. Os demônios eram reais, e
isso significava que a magia também era real.
Se Beast conhecesse o diabo, ele poderia pedir a ele para conceder seu
desejo também. Ele poderia ter o seu antigo eu de volta. Ele poderia viver
como uma pessoa normal novamente. Ele poderia ter procurado todas as
informações sobre eventos estranhos ao redor da casa por anos, mas só agora
ocorreu a ele que nunca realmente acreditou que qualquer um dos relatos
fosse verdadeiro. Sua busca era apenas fios que ele agarrava com a ilusão de
esperança que aparentemente estava ao seu alcance.
Laurent estava perdido e com medo de um mundo tão novo para ele.
Era um milagre que Laurent ter se saído tão bem. De repente, ele não parecia
engraçado e ingênuo, mas muito corajoso e um aprendiz rápido com a
maneira como ele entendia os conceitos que tinham que ser tão estranhos
para ele quanto à magia para Beast.
As patas sujas de Hound deixavam manchas de lama na sala de estar,
mas Beast não conseguia se importar. Assim que eles entraram, ele tirou as
roupas encharcadas de Laurent e rapidamente tirou as suas. Apesar do calor
que agora sentia no ar contrastando com a pele úmida e gelada, ele e Laurent
ainda estavam tremendo e precisavam lidar com o frio o mais rápido possível.
Laurent não era louco e ainda queria estar com Beast. Isso era tudo o
que importava.
Por que Beast estava tão ansioso para discutir suas descobertas com
Knight? Por que Laurent não pode entrar na sala secreta quando não fazia
muito tempo que Beast alegou que eles deveriam ser honestos um com o
outro?
Laurent não podia acreditar que uma noite perfeitamente boa tenha se
transformado em um desastre. Ele primeiramente afastou Beast das
conversas sobre a casa, simplesmente porque frustrar tais planos era o seu
trabalho, mas então a sua decisão de distrair Beast para expandir seu
repertório no quarto se transformou em uma avalanche incontrolável de
arrependimentos.
No começo, ele achava que o teste de paciência da Beast era uma boa
ideia. Uma que, de uma vez por todas, proporcionaria a sensação de
segurança e confiança que Laurent precisava para dar seu corpo à Beast e
desfrutar de seu ato de amor sem nenhuma pitada de medo. Nada saiu como
planejado, uma vez que ele colocou sua ideia em movimento. Em sua cabeça
idiota, ele só levou em conta sua própria ansiedade, esquecendo
completamente como suas ações afetariam sua besta forte, mas amorosa.
Então ele teve que explicar para Beast porque estava tão abalado. Uma
coisa levou a outra e aqui estava Laurent. Sozinho, mesmo com a esperança
no coração de que Beast acreditasse nele. Ele parecia sincero ao fazer
perguntas, e não estava desconfiado como no princípio.
Laurent só queria ser mais incluído. Ele desejava ter permissão para
estar com Beast e Knight, não jogado de lado quando Beast encontrasse algo
mais importante para fazer. Agora que Beast sabia da viagem no tempo,
Laurent coçava para falar com ele sobre as coisas que ele tinha sido forçado
a manter em segredo até agora. E, no entanto, Beast não estava lá para ele,
ocupado demais com a nova descoberta.
“Carga” era outro segredo, Beast apenas contava mentiras vagas para
Laurent antes de mudar de assunto, mas Laurent não era um idiota. Ele
sabia que algumas das fontes de renda dos Kings of Hell eram obscuras, na
melhor das hipóteses. Os homens só voltavam alguns dias depois com
pequenos pacotes que todos tratavam com tamanha reverência que poderiam
ser objetos sagrados. Parecia que algumas mulheres sabiam o que realmente
estava acontecendo, mas fingiam que não, então ele seguia o exemplo delas
e evitava o assunto.
Ignorar os segredos parecia tão fácil quando se tratava da sala secreta,
escondendo de Laurent algo de valor pessoal do seu amante.
— Que porra é essa, Knight? Por que você se importa com o que alguns
caras dizem na internet? Ele é outro teórico da conspiração.
Beast estava indo a algum lugar? Esta era a primeira vez que Laurent
ouviu sobre isso.
Ele olhou para o corredor para ter certeza, mas eles estavam de fato
desaparecidos. Por quanto tempo? A porta da sala secreta de Beast foi
deixada aberta, e o coração de Laurent pulou uma batida. Seus pés se
moveram antes que seu cérebro pudesse tomar uma decisão.
Beast teria sido o mesmo homem que ele era hoje, se não fosse pelo
acidente que matou sua mãe? Ele seria mesmo conhecido como “Beast”? Só
agora Laurent percebeu que ele não sabia o verdadeiro nome de Beast. Quão
triste era saber que um homem tão terno, tão bom amigo, fosse conhecido
apenas como um monstro, uma besta.
Ele piscou quando viu seu próprio nome suavemente riscado com um
lápis. Seu próprio ramo havia sido cortado como uma parte podre de uma
árvore, enquanto seu irmão prosperou por gerações, até 2017, até Knight e
sete de seus irmãos, nenhum que Laurent tinha visto em volta do clube,
apesar das pessoas terem famílias, seus próprios de acordo com a árvore de
gerações.
Havia todo tipo de coisas sobre a família Mercier no caderno, que era
dividido em capítulos onde Knight meticulosamente colocava datas, lugares,
bem como histórias e curiosidades. Laurent Mercier tinha uma seção inteira
dedicada a ele.
A página seguinte gritava para ele com listras coloridas sob os elementos
do texto. Ele levou alguns segundos para entender que eram os relatos sobre
o assassinato e o julgamento que se seguiu.
Sua respiração ficou presa quando em outra citação, ele leu uma
anotação de Knight informando que Laurent Mercier havia sido condenado à
forca. Na página seguinte, os nomes de seus três irmãos foram mencionados
no topo. Chegaram a Brecon três anos depois do assassinato de William
Fane, esperando encontrar seu irmão prosperando, mas foram confrontados
com seu crime. Eles nem sequer tinham um túmulo para prestar suas
homenagens, presumivelmente porque o corpo de Laurent havia sido
enterrado em um túmulo sem identificação.
E, no entanto, ele estava aqui. Ele não entendia. Ele era um tipo de
espírito e o diabo deixou seu corpo em 1805?
Beast olhou para ele, sua mão apertando a maçaneta da porta com
força. Ele respirou fundo, como se esperasse que isso o ajudasse de alguma
forma a manter a calma quando até os tendões do pescoço estavam
visivelmente se movendo. Ele parecia um touro prestes a atacar. — O que?
Você o quê? — Ele retrucou.
Beast engoliu em seco, seus braços tão rígidos que parecia doloroso. —
Não é para conversar. Isso é pessoal. Como ousa quebrar minha confiança
assim? Você não me deu o suficiente por uma noite?
Knight suspirou e olhou para os pés, como se quisesse fingir que não
viu o que estava acontecendo.
— Por que você está pesquisando isso? O que você sabe? — Laurent
exigiu sem fôlego, sem vontade de sair ou se desculpar. Ele estava sendo
tratado além da injustiça. E se ele ainda pudesse morrer? Ser sugado de volta
ao passado quando à hora chegasse? — Existe alguma coisa sobre o Laurent
morto com a marca? — Ele perguntou a Knight, esperando que sua própria
família fosse mais cooperativa.
E Laurent não podia deixar isso acontecer. Ainda faltava mais de dois
meses até que Laurent estivesse livre para viver neste mundo, e só depois
que seu acordo fosse finalizado, ele poderia esclarecer Beast sobre isso.
— Você não espera que eu o apoie nisso contra o meu melhor amigo,
não é? — Knight arqueou uma sobrancelha.
— Entre.
Beast olhou para o tratamento e não pôde deixar de se divertir. Ele olhou
para Hound e mandou sem palavras que ele não pulasse na cama quando as
duas patas dianteiras descansaram na beira do colchão. — Deixe-me
adivinhar, você mesmo cozinhou?
— E?
23
Pop-Tarts é um biscoito pré-cozido recheado produzido pela Kellogg.
os meus? — Beast sibilou, ficando imediatamente agitado. — Eu não queria
que você visse nada daquilo. E você explodiu ali como se tivesse algum direito
aos meus pensamentos ou ao meu passado.
Laurent sorriu, mas não olhou para cima, movendo os pés para cima e
apoiando os calcanhares na beira do colchão. — Há muito que não
entendemos sobre isso. Mas você está certo de que talvez eu não devesse ter
entrado em pânico do jeito que eu fiquei. Eu claramente ainda estou vivo,
então eu não poderia ter morrido no passado.
— Deve ser isso. O que é mais importante para mim é que não estou
sozinho nisso e ontem à noite... Senti-me muito sozinho sem você.
Beast sentiu uma sensação estranha e oca se espalhando pelo peito
dele. De repente, ele se lembrou da maneira como Laurent o olhou no
chuveiro ontem à noite quando Beast lhe disse para ir dormir, como se suas
descobertas não o preocupassem. — Sinto muito por ontem também. Eu não
teria encontrado o corpo sem você. Mesmo se eu quisesse falar com Knight
sobre tudo isso, eu não deveria ter te empurrado de lado.
Quando Laurent finalmente olhou para Beast, foi um alívio tão grande
que Beast deu outra mordida no Poptart. — Todos nós cometemos erros,
certo?
Beast deu uma risada aguda, aliviado ao ver que Laurent honestamente
queria fazer as pazes. — Sim. Há algo que me possa dizer sobre o pacto do
meu pai? — Ele perguntou, imaginando se Laurent havia notado as fotos
antigas dele no escritório. Se ele reconheceu o cara bonito na foto como sendo
Beast agora.
— Eu... Ainda está por vir, mas não posso dizer a ninguém o que é
exatamente. Eu estarei livre dele no devido tempo. É uma coisa pequena, na
verdade. Eu acredito que os poderes do diabo são limitados em relação ao
que ele pode oferecer, e eu sou apenas uma engrenagem em seu esquema.
Ele até sugeriu que ele não é o diabo da Bíblia, então talvez ele seja outro
tipo de monstro.
Laurent rastejou sobre a cama até que ele estivesse perto o suficiente
para colocar o braço de Beast sobre seus ombros. — Eu vou, desde que eu
cumpra meus deveres com ele.
Beast lambeu os lábios, seu corpo relaxando imediatamente quando o
calor de Laurent se encaixou contra o dele. — É algo horrível?
Laurent beijou a pele do antebraço de Beast. — Não. Mas King não pode
morrer até determinada data, então não importa o quanto você o odeie, por
favor, mantenha-o em segurança.
Seria possível?
Laurent gemeu. — O que quer que seja esse diabo, ele não deve se
incomodar. Eu duvido que ele pense do jeito que nós pensamos. Incomodaria
você se as árvores o estivessem vigiando?
Falta de eletricidade, ele ainda podia explicar, já que a fiação era uma
merda no prédio, mas isso era estranho.
Ele respirou fundo, mas o ar estava tão seco que deixou sua garganta
parecendo um pergaminho. A base tremeu novamente. E de novo, e desta
vez, rachaduras se abriram, como uma teia no gelo sobre um lago. Beast
olhou para ele, sem muita certeza se estava alucinando ou se era real. Uma
sensação inquietante se curvou em seu estômago, e quando ele notou a
fumaça surgindo de onde a mão de Laurent estava no espelho, ele quase o
puxou de volta.
Uma parte de Beast não acreditava que nada disso aconteceria mesmo
quando eles chegassem aqui, e ainda assim ele estava aqui, tendo que
admitir que os eventos fantásticos sobre os quais Laurent contou a ele eram
reais demais.
A água que estava pingando da pia ficou rosada, e depois uma cor mais
escura apareceu, e ele não queria acreditar.
E então, uma voz veio alta e clara, mesmo que soasse como o produto
de uma artista de música eletrônica enlouquecida, em vez de algo que poderia
ser produzido por cordas vocais. Tinha uma qualidade metálica, como se a
garganta que fazia a voz fosse de aço enferrujado e madeira velha.
Era uma declaração simples, mas antes que Beast pudesse reagir, o
fantasma de longos dedos apareceu no espelho, longas garras rasgando o
vidro e deixando para trás cinco longas cicatrizes na superfície.
Simplesmente achava que ele não fosse digno de seu tempo. Uma
sensação abafada de angústia percorreu Beast, fechando-o. Ele não queria
falar com ninguém ou ver ninguém.
A coisa achou que Beast não tinha nada a oferecer? Que um garoto
como Laurent merecesse mais atenção do que ele?
Beast tinha que sair, para não derramar seu ressentimento em Laurent,
que só tinha feito o que lhe pediu. Não era culpa de Laurent.
— Tudo bem — ele disse sem sequer olhar para o garoto, e saiu do
banheiro, indo direto para a porta do apartamento. Mesmo o gemido de
Hound não o impediria.
Capítulo Vinte e Dois
Laurent
Pelo menos ele tinha Hound, que parou de ser assustador há algum
tempo, e o cheiro de Beast na cama, que parecia grande demais para ele
agora. Ele se angustiou com os acontecimentos no banheiro, imaginando se
deveria ter chamado o diabo em primeiro lugar toda vez que olhava para o
espelho quebrado.
O que ele poderia fazer além de esperar? Ele leu ainda mais livros, fez-
se útil de todas as maneiras possíveis, passou algum tempo com os Kings Of
Hell, suas mulheres, e os prospectos e convidados. Ele trabalhou duro para
se encaixar e ainda não estava nem perto de atingir esse objetivo, mas quanto
mais tempo ele se dedicava a aprender os caminhos das pessoas modernas,
mais ele sentia que havia um lugar para ele em 2017, mesmo que ele fosse
considerado excêntrico. As pessoas aqui pareciam ter uma tolerância pela
excentricidade muito superior à do tempo de Laurent.
Ele não podia simplesmente aceitar que Beast o deixou sem dizer adeus.
Não depois de ele ter saído depois que o diabo se recusou a conceder uma
audiência a Beast. Era dificilmente culpa de Laurent, e machucava
profundamente que Beast parecia ter colocado a culpa nele. Depois de tantos
dias sem ter ouvido a voz de Beast, Laurent começou a pensar que ele era o
único a sentir a perda.
Não sabendo se ele ainda tinha apetite, mesmo sabendo que deveria
comer alguma coisa, ele pairou sem rumo pela cozinha. A maioria das
pessoas que passeavam pelo clube estava fora, passando algum tempo com
suas famílias, o que deixou Laurent meio encalhado. Ele considerou preparar
um lanche para receber Beast em casa, mas isso só o fez se sentir patético.
Ele sabia cozinhar coisas que só precisavam de aquecimento, mas depois de
ver Martina fazer sua mágica e fazer as refeições mais elaboradas do zero, ele
sabia que suas habilidades nesse quesito estavam em falta.
A comida era realmente a única coisa legal que ele poderia fazer para
Beast? Seu amante definitivamente gostava do lado carnal do que se poderia
chamar de relacionamento, mas deixava Laurent desconfortável ao pensar
que a luxúria poderia ser a única coisa boa para ele. A necessidade de
satisfazê-lo tornou-se mais proeminente toda vez que Laurent pensava no vil
modo como King estava usando Beast, mas ele dizia a si mesmo que isso
duraria apenas até o aniversário de Beast. Contar a ele agora custaria à vida
de Laurent.
Ah não.
Sexo público no clube era uma ocorrência que nunca deixava de deixá-
lo desconfortável, não importando quantas vezes ele tropeçava em casais
envolvidos em tais encontros ilícitos. Talvez se ele ficasse quieto atrás dos
armários, por tempo suficiente, Knight e Jordan iriam embora.
— Sim, você quer isso em sua boceta? — Uma pancada ainda mais alta.
— Ou na sua bunda, garota safada? Hã? Diga-me, ou eu vou apenas foder
sua boca e deixar você assim.
Como Laurent se meteu nessa confusão? Tudo o que ele queria era
alguns biscoitos.
Laurent espiou por trás do balcão na hora certa, e viu Knight puxando
Jake para dentro pela janela. Jake gritou quando ele caiu no chão com um
baque surdo. A fivela de Knight abriu o cinto quando ele se aproximou de
Jake, puxando o prospecto. Laurent não trocaria de lugar com Jake agora.
Knight raramente era cruel com Laurent, mas apesar de seu belo rosto, ele
era uma força a ser reconhecida quando se enfurecia.
Knight deu um soco no rosto de Jake com tanta força que Laurent
engasgou e cobriu a boca para atenuar o som.
Ah não!
— Sinto muito, Jordan. — Jake gemeu — mas você sabe que eu sou
gay — ele terminou categoricamente.
Knight observou-o por alguns segundos, mas depois desatou a rir e deu
um tapinha na bochecha de Jake. — Seu pervertido! Só precisava me pedir
para ver o meu pau.
Jordan cruzou os braços sobre o peito, o que nunca era um bom sinal.
— Você está brincando comigo? Eu fico sabendo que você está fodendo, eu
tolero ouvir suas besteiras sobre encontrar um esqueleto antigo, e você está
cancelando nosso encontro hoje à noite porque você prefere olhar malditos
ossos! Esse cara está morto há duzentos anos! Ele pode esperar!
Knight cruzou os braços e moveu seu olhar de Jordan para Jake de uma
maneira tão demonstrativa que teve que ser de propósito. — Prospecto,
encontre-me na sala de bilhar em três horas. Esteja lá.
Um sorriso bobo apareceu no rosto de Jake, mas ele gritou quando
Jordan se levantou e bateu na sua bochecha violentamente. — Não se atreva
a estar lá! — Ela gritou.
Os ombros de Knight relaxaram, mas ele olhou para ela. — Você acabou
de chamar os meus amigos de vadios sujos? E você se acha uma princesa?
Onde estão as câmeras? — Ele perguntou, olhando ao redor. Felizmente, ele
não estava sendo realmente curioso ou teria visto Laurent.
Knight olhou para ela. — Uau. Você é uma vadia. Você tem um rosto
bonito e jóias de ouro que compra a crédito, e isso faz você pensar que você
é muito melhor do que todo mundo aqui? Nao é uma foda muito melhor que
você. Talvez você deva receber algumas aulas. Seja bem vinda em aprender
— ele disse, se afastando antes que ela pudesse acertá-lo com sua pequena
bolsa. — Diga-me uma única coisa que a faça oh-tão-diferente dos outros
'vadios sujos', o que eu não considero, e apenas me mostre um ponto.
— Como você pode dizer isso? Nós passamos por tantas coisas juntos,
e agora você fica assim? No fundo você sabe que sou muito melhor do que
todos esses que moram aqui, mas você não está sendo legal.
Laurent recuou para trás do armário e pôs o rosto nas mãos. Ele nunca
seria livre para sair daqui, e ele definitivamente não queria ouvir a troca
embaraçosa.
— Tudo bem! — Ela gritou. — Você se masturba com seus amigos por
causa de William, se esse for o verdadeiro nome dele, e eu vou encontrar
outro namorado para mim. Um que realmente me trata certo!
— Fodido Cristo! O que você está fazendo aqui? Desde quando você está
ouvindo o nosso quase sexo? — Ainda assim, Knight abriu a geladeira e tirou
uma lata de cerveja.
— Eu… Acho que Beast ainda pode estar com raiva de mim. Você acha
que é por isso que ele não fala comigo?
Isso fez Laurent sorrir. Knight era tão dedicado a preservar a história de
sua família que aqueceu Laurent. Apesar do passar do tempo, um
descendente em 2017 que se preocupava em descobrir mais sobre as
gerações passadas e honrar sua memória. — Eu adoraria descobrir mais. E
quanto a Beast? E a árvore genealógica dele?
Knight encolheu os ombros. — A família de King é finlandesa e alemã
originalmente. Sua mãe era russa e irlandesa. Mas eu acho que ele não esteja
interessado no passado. Você teria que perguntar se você quer saber mais.
Knight sorriu e cutucou Laurent. — Você está com ciúmes, não está? —
Ele disse, mas quando Laurent negou vigorosamente a acusação, Knight
apenas continuou. — Ele começou com as meninas, no clube do pai dele. E
então ele começou a foder os caras também e decidiu que ele gostava muito
mais disso.
Knight suspirou. — Sim. Porra! Tudo foi para baixo depois disso. O
rompimento destruiu Beast. Ele não tinha energia para o sexo no começo,
mas ele simplesmente não procurava. Não que ele não tivesse pessoas
propondo a ele, mas ele se queimou tanto que ele se afastou. Até você chegar.
— Ele disse franzindo o cenho para Laurent, como se estivesse tentando de
alguma forma ler os pensamentos de Laurent.
— Ele é... áspero em torno das bordas. — Laurent disse, mas seu
sorriso foi ampliando-se com a memória de todas as coisas que Beast sabia
fazer na cama.
Ele sabia que algo estava errado antes mesmo de chegar às garagens.
Gray gritava algo sobre chamar um médico, e até mesmo Joker se manteve
sério ao relatar como eles foram perseguidos perto da fronteira do estado.
Laurent estava muito ocupado procurando por Beast para ouvir.
Ele entrou nas garagens e congelou no momento em que viu Beast, sem
seu capacete, sentado em sua moto e respirando muito laboriosamente. Um
fio de sangue escorria da manga de sua jaqueta de couro, juntando-se
lentamente no chão duro do cimento.
Joker agarrou-o com força pelo braço e puxou-o para longe enquanto
Gray gritava algo pelo telefone. Foi a primeira vez que Laurent viu o
motociclista estóico e louro tão agitado. Não havia muitos deles aqui, mas
todos pareciam frenéticos, exceto por Beast, que estava ficando pálido a cada
minuto.
— Ele vai ficar bem. Pegue a carga. — Knight disse, apontando para
vários alforjes, alguns dos quais já estavam no chão. Com todos os outros
perdendo a cabeça - compreensivelmente - foi Knight quem assumiu a
situação, e apesar de parecer insensível, Laurent ficou feliz por permitir que
todos pensassem no bem-estar de Beast.
Jake deu a Beast um olhar preocupado, mas rapidamente fez como lhe
foi dito.
— O doutor vai estar aqui de cinco a dez minutos. Leve Beast para
dentro. Coloque-o em uma mesa alta. Ou no palco mesmo. — Gray disse.
Apesar de acenar com a mão com desdém, Beast ainda colocou muito
do seu peso em Laurent quando ele saiu da moto.
Ele era tão grande e quente, de alguma forma mais quente que o
habitual, e os tremores em seu braço eram tão perceptíveis que Laurent teve
que lutar contra seu próprio tremor de pânico.
Beast deu a ele um sorriso fraco, vacilando quando Laurent não notou
que a porta era muito estreita para os dois e Beast acabou passando o braço
machucado no batente da porta. Ele assobiou alto, endurecendo contra
Laurent, mas então empurrou para dentro, claramente com a intenção de
chegar a algum lugar onde pudesse descansar. — Eu sabia que vocês dois se
divertiriam juntos.
Beast olhou para ele, sorrindo de novo, como se ele não se importasse
com a dor, desde que Laurent declarasse sua afeição tão claramente. Eles
finalmente chegaram à cozinha, e Knight rapidamente tirou tudo do balcão
antes de se abaixar para pegar um pouco de água sanitária no armário. O
líquido de limpeza cheirava horrivelmente, mas aparentemente a limpeza era
mais importante para manter as feridas em bom estado do que qualquer
outra coisa. E considerando quantos idosos havia em 2017, Laurent tinha
certeza de que a medicina moderna estava certa sobre muitas coisas.
— Eu tenho algo para você. — Beast disse e olhou para baixo. — Bolso
interior do meu corte.
Laurent respirou fundo. Ele queria dizer que isso não importava agora.
Que ele não precisava de presentes, mas, como Beast achava importante,
Laurent enfiou a mão no bolso.
— Você não precisava — ele ainda disse, encontrando um item
alongado feito de plástico. Ele lambeu os lábios, olhando para o rosto pálido.
Beast lembrou o quanto ele gostava do material, mas o que poderia ser?
Ele puxou o item, e isso fez com que um cabo bem fechado caísse no
chão. Ele não sabia o que o item era no começo, mas era azul escuro e bonito,
com uma tela pequena e um teclado parecido com o do controle remoto da
TV.
1 Kai
Beast queria ficar longe de tudo, mesmo que apenas por alguns dias, e
ele ficou feliz em descobrir que Laurent também estava ansioso para isso
quando Beast propôs um acampamento. Suas malas estavam prontas, o
tempo estava quente, e Hound seguia Beast animadamente, sabendo que ele
ficaria com a sua matilha também.
— Não se preocupe, pois nós temos comida suficiente para que você
não tenha que caçar seu vagabundo preguiçoso. — Beast disse a seu
cachorro, acariciando o topo de sua cabeça. Hound latiu alto, virando o
focinho para cima para olhar seu mestre antes de pular e girar, como se
esperasse que fosse hora de brincar.
Beast exalou, sorrindo para o seu animal de estimação. — Você vai estar
cansado em breve, eu prometo — ele disse caminhando ao longo da parede e
em direção às garagens. Hound o deixou quando notou algo entre as árvores,
mas Beast sabia que o cachorro viria quando chamado, então ele continuou,
aproximando-se da garagem onde a caminhonete já estava esperando por ele
com Laurent. Ele diminuiu a velocidade quando pedaços de conversa dura
soaram em seus ouvidos.
— O que quer que você esteja fazendo, acalme-se. Eu não estou mais
brincando. Faça o que você tem que fazer, mas pare de interferir comigo! —
King rosnou, fazendo Beast parar em suas trilhas. A voz de raiva estava
saindo de dentro da garagem.
— Isso não é da sua conta. — Laurent se manteve firme, mas ele não
conseguiu por muito tempo, porque King agarrou Laurent pela garganta e
bateu-o contra a parede de cimento da garagem.
Só então Beast soltou King, girando-o para longe com tanta força que
sua garrafa caiu no chão e se espalhou por toda parte. Beast exalou, olhando
para as mãos dele. Ele não pretendia ser tão forte, mas talvez a raiva dele
tivesse o melhor dele. — Que diabos está fazendo? Ele é meu.
King olhou para Laurent e fez Beast querer socar seu próprio pai. —
Sim, você pode chamar assim.
Beast bateu na bochecha dele, sem força, só para constar. — Não toque
nele novamente. Se você tiver algum problema com o comportamento de
Laurent, você deve trazê-lo para mim.
Porque Laurent estava sob a proteção de Beast agora. Ele ainda não
estava usando um colete de propriedade, mas ele iria em breve, de modo que
ninguém ousaria encostar um dedo nele sem a permissão de Beast. Beast
sentiu um arrepio agradável em seu estômago ao pensar em um remendo
nas costas de Laurent, pronunciando para o mundo inteiro que o jovem lindo
que usava era de Beast.
***
Com o cão seguro em uma gaiola na parte de trás, eles foram para a
floresta onde Beast frequentemente passava seus dias de folga, longe das
pessoas olhando para ele, com apenas uma bússola e seu amigo peludo, que
nunca o julgava.
Ele odiava que seu amante guardasse algum grande segredo dele,
escondido à vista de todos e, ainda assim, inacessível. Se pelo menos Beast
não soubesse que o segredo estava lá, ele não sentiria que o relacionamento
deles estava de alguma forma fraturado por dentro.
Beast estava ciente agora de muito mais do que antes. Ele tinha chegado
a um acordo com o fato de que ele estava namorando um viajante do tempo,
que tinha um pacto com o diabo, mas era difícil até mesmo considerar
simplesmente namorar, já que eles viviam juntos. No entanto, os detalhes de
uma das maiores partes da vida de Laurent ainda estavam fora dos limites
para ele.
Eles mal falaram no caminho, e então, uma vez que deixaram para trás
a picape e eles seguiram pela trilha, o silêncio desconfortável tornou-se ainda
mais perceptível, porque a beleza da natureza não era uma desculpa
suficiente para manter a boca fechada. Beast não conseguia parar de pensar
no encontro na garagem. Mesmo durante uma parada ao meio do dia, quando
eles almoçaram na margem de um rio pitoresco, o cérebro de Beast estava
ocupado com o demônio que vivia sob o mesmo teto que eles e as questões
que esse ser escolheu confiar a King e Laurent.
A viagem era sobre fugir de tudo, e ainda assim parecia que quanto mais
eles entravam na floresta, mais difícil era esquecer aquela porra de casa.
O mundo fez uma promessa falsa para ele. Ele estava aqui com um
homem cuja presença trazia tanta alegria em sua vida, e ainda assim a
verdade sobre ele era constantemente negada a Beast. Parecia que os bons
dias podiam terminar a qualquer momento, com Laurent fora antes que ele
pudesse fazer sua segunda cirurgia no olho.
Laurent gemeu e se virou para encarar Beast. Ele segurou seu cabelo
para arejar suas costas suadas, mas isso só lembrava Beast da marca em
sua nuca. — Beast! Não deixe tudo tão triste. Que tal acamparmos aqui? Eu
quero sentir o cheiro do oceano quando eu acordar. — Mesmo com as
manchas de creme no rosto e o nariz enrugado, Laurent era tão bonito que
Beast poderia comê-lo como se fosse um Poptart. O tipo com cobertura rosa.
Laurent olhou por cima do ombro, tendo tempo para responder. — Sim.
Eu gostaria disso. Knight me mostrou fotos, mas não é o mesmo, é?
Era dolorosamente lindo, com grama tão verde que parecia irreal e
montanhas surgindo de trás dos bosques do outro lado do lago. O brilho
laranja e púrpura do pôr do sol acariciava seus picos, e nuvens fofas se
arrastavam pelo céu logo acima. Quando Beast jogou sua mochila na grama,
ele teve um vislumbre do reflexo do adorável horizonte antes que Hound
corresse para a água para matar sua sede com avidez.
Beast endureceu, sem esperar o toque. Ele olhou por cima do ombro,
fixando brevemente os olhos no adorável rosto apenas para ver a familiar
necessidade de atenção que ele viu refletido nos olhos de Laurent durante
todo o dia. Com o sol descendo rapidamente no céu colorido, não teria sido
irracional pedir ajuda, e ainda assim, neste momento, Beast desejou estar
sozinho, e sem ter que enfrentar o homem que guardava tantos segredos dele.
Ele sabia que não estava sendo totalmente justo com Laurent, mas a
situação que ele testemunhou anteriormente foi à prova de que algo estava
definitivamente errado e que as apostas estavam contra Laurent. Como ele
poderia protegê-lo de King sem estar ao lado de Laurent em todos os
momentos? Não seria possível. E o fato de que um ser inumano teve suas
garras afiadas em volta do pescoço de Laurent também não ajudava. Ele
tinha a noção de que ele mesmo poderia suportar tal peso perfeitamente bem,
mas Laurent não tinha a compleição de um lutador, ele era muito doce para
lidar com uma monstruosidade de outro mundo. Beast não queria que ele
fosse tocado pelo fogo do inferno ou marcado por uma marca que parecia tão
perversa na pele de porcelana dele.
Quando a luz se tornou tão escassa que ele começou a forçar os olhos,
de repente Beast percebeu que a visão de Laurent era muito pior do que a
dele, e olhou ao redor, tentando identificar a figura familiar entre as árvores.
Ele chamou o nome de Laurent.
Laurent tomou seu tempo, mas finalmente olhou para Beast. — Você
está bravo comigo?
— Você não vai dar um passeio sozinho. Está escuro. Você vai se perder
na floresta — Beast sibilou, correndo até ele. Ele queria agarrar o braço de
Laurent e levá-lo à força para o acampamento, mas descobriu que não. Por
que ele estava tão zangado de qualquer maneira? Se ele desejava ficar
sozinho a maior parte do dia? Inconscientemente, Laurent queria apenas dar
a Beast o que ele queria.
O coração de Beast batia forte, mas ele seguiu Laurent sem dizer uma
palavra, uma figura magra entre as árvores sombrias. Com o cabelo longo e
ondulado, andando com tanta graça, que ele poderia se passar algum tipo de
espírito natural desta região. Em vez disso, ele era a presa de uma fera, que
não conseguia nem mesmo mantê-lo satisfeito.
— Eu posso ouvir você. Isso é além de injusto. Você mal falou comigo o
dia todo. Essa viagem foi ideia sua, e agora não consigo ficar sozinho?
Laurent olhou para ele. — Eu não sou tão fácil de assustar como você
poderia pensar.
— Eu fiz. E eu vou fazer o que for preciso, porque eu não quero ser
aquele Laurent Mercier que foi condenado a enforcado. Eu matei Fane em
legítima defesa!
Laurent olhou para a tenda não muito longe. — Você nem sempre sabe
tudo. Não foi você quem disse que temos que manter nossos segredos?
Prometo que vou contar a verdade um dia, mas agora não posso. Eu estou
lidando com King.
— Você está? Porque não parecia que estava. Ele tem sido um canhão
solto ultimamente, então quem sabe como ele vai reagir quando ele ficar alto
da próxima vez? — Beast disse, puxando os ombros de Laurent para fazer
seus olhos se encontrarem.
Tudo o que tem Beast recebeu foi um sussurro. — Eu não sei. Eu levo
um dia de cada vez.
— Você pode me prometer, pelo menos, que você não vai embora? Que
você vai ficar? — Ele perguntou, inclinando-se para mais perto e olhando nos
olhos de Laurent enquanto suas mãos subiam pelo pescoço de Laurent para
cobrir seu rosto. Será que ele precisava terminar a frase e dizer comigo, ou o
seu significado estava claro o suficiente? Ele poderia ignorar qualquer coisa
e perdoar tudo se Laurent nunca fosse embora. Se ao menos ele pudesse
estar lá, para que Beast pudesse provar todos os dias que ele era digno de
alguém tão amável.
Laurent enfocou toda a sua atenção em Beast, e ele colocou sua mão
sobre Beast, acariciando sua bochecha com a palma, quando a chuva
começou a ficar mais intensa. — Para ficar neste tempo, preciso cumprir meu
dever. Eu farei tudo o que puder para fazer isso. Mas há algo que posso te
dizer. Quanto mais nos aproximamos, mais perto ficamos e mais intenso é o
nosso ato de... Amor — o rosto de Laurent ficou mais quente contra a palma
de Beast. — E mais irritado King ficará, e será melhor você ficar fora disso.
E eu esperava que essa viagem nos aproximasse ainda mais. Longe do
escrutínio de todos. Sem testes, sem mentiras, só você e eu.
Beast sabia que com Laurent, essa seria a tenda mais aconchegante em
que ele já havia ficado.
Eles se beijaram.
O calor de seu corpo ainda estava distante sob as roupas, mas Beast
queria emendar isso o mais rápido possível. Tirar as camadas molhadas de
Laurent não era nem uma tarefa. Cada centímetro de carne nua era uma
visão bem-vinda no feixe trêmulo da lanterna, e Beast esfregou o rosto contra
a pele úmida, imaginando como era incrível sentir o calor ardente sob uma
camada de água da chuva fria. Ele colocou o mamilo de Laurent em sua boca,
rapidamente puxando os quadris de Laurent para perto dos dele quando o
garoto gemeu com a sensação.
Beast esfregou as palmas das mãos para cima e para baixo nos braços
delgados de Laurent, juntando as mãos quando o beijo inicialmente suave se
tornou mais urgente. — Eu desejo que você nunca saia do meu lado.
— Muito fácil quando você sabe que eu não tenho para onde ir, e que
você é todo o meu mundo. — Laurent brincou com Beast dando uma lambida
em sua bochecha, balançando os quadris sob Beast.
Beast roçou os narizes e abaixou-se para esfregar seus corpos onde eles
ainda estavam cobertos pelo jeans. Ele gemeu quando seu pênis endureceu
contra o de Laurent. Era um prazer simples, e parecia a coisa mais natural
do mundo. — E se você pudesse ir a qualquer lugar que quisesse? — Ele
perguntou incapaz de manter a pergunta apesar de saber o quão carente era.
Seu anseio pela aprovação de Laurent estava crescendo a cada dia que
passavam juntos, e não era apenas por causa da beleza de Laurent, ou
porque ele era o único a olhar para Beast como se ele fosse qualquer outro
homem. Laurent podia realmente ver Beast por dentro.
Ele poderia assumir a liderança a noite toda. Ele seria o primeiro homem
a mostrar a Laurent como pode ser prazeroso levar um pênis para dentro.
Até agora, Laurent provou ser um amante muito flexível, então Beast só podia
esperar uma foda incrível.
O suspiro dele foi música para seus ouvidos. As últimas semanas com
Laurent tinham sido uma festa de foda em si, uma que Beast tinha perdido
profundamente quando ele estava fora com Gray e Joker, mas ele não tinha
realmente penetrado um homem há uns doze anos. A perspectiva de fazer
isso com Laurent estavam fazendo seus músculos formigarem
antecipadamente. Aquele buraco virginal seria tão apertado com o seu pênis,
os gemidos de Laurent seriam roucos e encharcados de luxúria. Beast tinha
fantasiado sobre isso muitas vezes quando lambia aquele buraco rosa.
— Sim. A maneira como eles fizeram nos filmes que assistimos juntos?
— Beast havia apresentado Laurent à pornografia. Nada super hardcore, e
principalmente clipes mostrando o tipo de coisa que eles já estavam fazendo
de qualquer maneira, mas ele também colocou um filme com sexo anal,
observando discretamente a reação de Laurent com o casal na tela. Era isso
que Laurent tinha em mente agora?
Laurent não encontrou seu olhar, mas seu toque na pele de Beast era
constante, como se ele não conseguisse o suficiente. — Sim. E às vezes eu
via pessoas fazendo sexo no clube, e imaginei como seria ter você fazendo
isso comigo. Eu… Eu sinto como se eu pudesse ceder o controle quando você
assume, e eu continuo querendo mais desse sentimento.
Beast não queria apressar as coisas, já que ele já esperara por tanto
tempo, mas seu pau duro fazia com que o exercício de manter a paciência
fosse muito mais difícil. Tudo o que ele queria era ver seu pênis entre as
suculentas metades redondas até que desaparecesse dentro do corpo de
Laurent uma e outra vez. Ele nem percebeu quando a fantasia o levou a
circundar o buraco de Laurent com a ponta do dedo. Laurent gemeu nos
lábios de Beast e arqueou contra ele da maneira mais requintada.
O rosto de Laurent já estava com o glorioso tom corado que sempre fazia
Beast querer que Laurent o chupasse. A obediência de Laurent estava
deixando Beast ainda mais duro. Cada lambida de seus lábios, cada olhar
incerto nos olhos de Beast o fez sentir como se isso fosse especial e vinculante
a Laurent da mesma maneira que Beast já estava enroscado nele.
— Você tem? — Laurent engasgou, como se não fosse óbvio que ele era
o objeto da luxúria constante de Beast. O jeito que ele ficava mexendo nos
dedos fazia o pau de Beast pulsar com a fantasia de como o mesmo
movimento seria ao redor dele.
— Você não tem ideia, mas tudo o que posso pensar é deixar meu
esperma dentro de você.
A tenda estava ficando úmida com a respiração pesada, mas Beast não
se importava. Parecia que eles estavam trancados em um casulo. Laurent
olhou por cima do ombro e puxou o longo cabelo, dando a Beast uma ótima
visão do rosto corado e dos olhos brilhantes na fraca luz amarela da lanterna
que rolou nos sacos de dormir.
Seu belo Laurent estava tão aberto para ele, tão pronto, sua bunda um
show, com o seu buraco todo escorregadio e disponível com a maneira que
Laurent abriu as pernas.
— Está certo. Eu não quero mais ninguém desse jeito — ele sussurrou,
movendo seu quadril para mais perto e esfregando a cabeça do seu pênis
para cima e para baixo no buraco escorregadio, deixando deslizar até o
traseiro de Laurent, apenas para agarrá-lo na base novamente e cutucar o
abrindo mais e mais.
Beast sorriu com o pensamento de que com Laurent tão baixo, ele
poderia facilmente ser capaz de beijar seus lábios, mesmo por trás, uma vez
que seus corpos se conectassem.
Beast não tinha certeza se ele deveria olhar mais para o rosto
perfeitamente angelical, ou o traseiro redondo que ele não podia esperar para
ver em torno de seu pau. Até mesmo ter seu pênis aninhado entre as nádegas
de Laurent era tão fodidamente excitante que ele mal conseguia pensar.
Beast olhou para baixo, para seu pau meio enterrado entre os adoráveis
globos do traseiro de Laurent, mas com Laurent tendo ficado tão quieto, ele
gentilmente deslizou suas mãos até as nádegas de Laurent, respirando
lentamente para distrair-se da sensação entorpecente em torno de sua pele.
— Laurent?
O corpo de seu amante era tão maleável ao toque, tão quente e forte
apesar de seu tamanho. Beast arrastou as mãos por todo o caminho até o
peito de Laurent, pressionando-os contra os mamilos duros, depois esfregou
a carne enrugada lentamente até que Laurent gemeu e se mexeu. O pênis de
Beast amava cada pequeno movimento que Laurent fazia, e parecia que eles
realmente tinham se tornado um.
Beast amava beijá-lo enquanto empurrava seu pênis para dentro e para
fora em um ritmo constante, e que cada um de seus movimentos causavam
um gemido, e um suspiro que Beast podia sentir diretamente em sua boca.
Os dedos de Laurent apertaram o saco de dormir toda vez que Beast o
penetrava profundamente.
Assim que ele tocou o pênis de Laurent, o corpo menor investiu contra
ele. Laurent arqueou a bunda mais alto, empurrando o pênis de Beast e
engolindo tudo em um único empurrão.
Ele daria a seu garoto bonito tudo o que ele queria e muito mais.
Para ele.
Quando Laurent puxou a mão de Beast até os lábios e beijou os nós dos
dedos, Beast queria chorar pelo jeito que seu coração se apertou, e ficar com
tesão sobre o fato de que havia porra naquela mão.
Essa mistura de ternura e atração sexual não era como nada que ele já
tenha sentido antes. Só agora, com Laurent para fazer a comparação, ele
podia ver que havia muito mais atração física do que amor no relacionamento
que partiu seu coração todos aqueles anos atrás.
Livre para buscar uma vida independente em 2017. Não havia dúvida
em sua mente que o MC Kings of Hell iria ser uma grande parte de seu futuro,
por isso, se a maioria dos Kings e seus amigos gostassem de metal, ele não
reclamaria. Haveria algum tipo de música com o nome de plástico? Ele
assumiu que gostaria muito disso. Mas apesar do barulho que deixava seus
ouvidos entorpecidos toda vez que o metal era tocado, ele queria fazer parte
de tudo, mesmo porque, Beast era o vice do clube e Laurent girava em torno
dele como a Terra girava ao redor do sol.
Fox deu um passo para trás, revelando uma jovem debruçada na mesa
e tremendo tanto que a primeira reação de Laurent foi oferecer sua ajuda. Só
então ele notou a poça de vômito entre as mãos dela, e a súbita sensação de
náusea fez com que ele olhasse para Jake, que deu um breve aceno de
cabeça, ansioso como um jovem soldado para receber o elogio de seu general.
— Limpe essa merda e ajude Thalia. Leve-a para algum lugar onde ela
possa dormir. Então volte. Knight perguntou por você.
Para outros, Beast pode não ser o pretendente arrojado que alguém se
apaixonaria, mas Laurent via tudo o que Beast representava. A força que
dava a Laurent, e a emoção quando Beast o levava para o quarto. A
profundidade emocional das citações de Dante em latim salpicavam todo o
corpo de Beast. A ternura das mãos que pareciam ter sido feitas apenas para
infligir violência.
Laurent não estava mais cego e ele tinha visto o suficiente do mundo
para saber que dos dois, ele seria o considerado convencionalmente o
atraente. Mas foi Beast quem segurou a mão de Laurent durante a operação
em seu outro olho, e foi Beast quem explicou esse novo mundo para ele.
Beast sorriu tão amplamente que fez seu rosto queimado parecer um
pouco assimétrico, mas era mais uma peculiaridade de sua aparência que
Laurent aprendera a amar sobre seu homem. Como qualquer outra suposta
imperfeição, era parte dele e o fazia parecer ainda mais bonito.
Beast deu um tapinha no homem com quem ele estava falando nas
costas e fez o seu caminho através do bando de pessoas bêbadas que
dançavam com a música horrenda. Ele nunca desviou o olhar de Laurent
enquanto andava em sua direção através do mar de cabeças.
Pensar que, em 1805, seus sonhos haviam sido tão modestos. Encontrar
um homem com quem ele pudesse ficar de alguma forma, ter um meio de se
sustentar, apesar de sua falta de visão, e de estar livre de sua servidão com
o Sr. Barnave. E agora? Ele tinha muito mais. Ele vivia em um mundo onde
sua afeição por um homem era aceitável. Onde o homem que ele escolheu
cuidava dele profundamente, onde seus olhos tinham sido curados, e onde
ele estava fazendo uma renda modesta.
Mas enquanto eles saíam da pista de dança e passavam por Nao, que
agora estava profundamente envolvida com a boca de seu ruivo, apesar de
ainda ser a namorada de King, Laurent inevitavelmente procurava por seu
homem, preocupado por não gostar muito disso. É verdade, Nao parecia ter
muitos parceiros e não tentava esconder, mas King era o tipo de homem que
sorria para você em um minuto e socava seu nariz no próximo.
Beast olhou entre os dois, uma grande carranca marcando sua testa.
— É isso? Você a está puxando porque ela quer cantar uma música com
Lizzy? Qual é o seu problema?
— O que há de errado em cantar? Você está bem com elas fazendo sexo
com outras pessoas, então por que não isso? — Beast chiou, abrindo seus
grandes braços.
Ele fez uma careta quando Martina jogou um copo inteiro de água no
rosto dele, jogou o copo no chão e saiu correndo, deixando os dois com King,
que revirou os olhos, como se fosse o razoável ali.
— Vê? Uma propriedade do clube, mas não pode nem mostrar respeito
quando necessário.
King sorriu largamente e entrou na luz brilhante, para que ele também
ficasse visível. Como se na sugestão, Lizzy apontou a mão para ele. — Ordens
do King!
Laurent olhou ao redor, sem saber de quem Lizzy poderia estar falando,
mas então, a luz ao redor dele se tornou mais brilhante, e ele pegou Beast
franzindo a testa no palco, um pouco tenso. Lizzy não parecia se preocupar
muito com o olhar assassino e mandou um beijo para Beast antes de voltar
para seus companheiros de banda.
Beast lambeu os lábios, tão inseguro sobre todos vendo como ele estava.
— Isto é para você. Eu fiz isso para se adequar ao seu gosto.
Ele sorriu e o segurou, mas a onda de ternura passando por ele ficou
fria quando ele virou o colete ao redor e viu a escrita bem conhecida.
Propriedade de Beast.
Martina também era uma propriedade, e agora ela não conseguia nem
cantar uma música no palco sem a permissão do homem. Por que Beast lhe
ofereceria isso? Sua intenção era também exercer tal controle sobre Laurent?
Para fazê-lo executar serviços como Jake e impor sua autoridade sobre
Laurent sempre que eles não estivessem de acordo? Será que o tempo que
passaram juntos foi apenas uma oportunidade para atrair Laurent antes que
o verdadeiro relacionamento começasse? Nos termos de Beast?
— Para sempre.
King soltou uma gargalhada que ecoou fracamente antes que a música
subitamente saísse dos alto-falantes com tanta força que Laurent se sentiu
fisicamente atingido por ela.
Ele correu e passou por duas garotas que riram tanto que estavam
praticamente caindo, mas ele realmente não se importava com o bem estar
delas naquele momento. Ele passou pela porta e mergulhou no corredor
luminoso, que ressoou com gemidos altos vindos de trás de uma porta
próxima. Beast estava longe de ser visto, mas quando Laurent se perguntou
o que fazer a seguir, a porta se abriu atrás dele, batendo em sua bunda.
— Esse foi um bom trabalho. Lá estava eu, pensando que você se virou
contra mim, mas suponho que cada um de nós tem pactos que não podem
falar. Aquele grande gole de dor foi excelente, já me sinto cinco anos mais
jovem — ele disse, e na luz brilhante Laurent notou que as pupilas de King
estavam tão largas que faziam seus olhos parecerem muito mais escuros do
que eram. Ele parecia com algumas pessoas que ficavam agitadas nas festas.
Como se ele estivesse tão alto de energia que ele não conseguia mais se
controlar.
— Tudo... Dele...? — Laurent tentou arrancar sua mão, sua mente uma
bagunça crepitante de pensamentos conflitantes.
— Sim. No dia em que ele completar 33, o diabo vai me dar tudo dele.
Serei forte como um jovem, e esse cabelo... — ele puxou uma mecha grisalha
e franziu o cenho — ...provavelmente ficará loiro novamente. Porra! Estou
tão farto de ser um velhote.
Ele estava entorpecido, mas ainda forçou um sorriso para King, para
não parecer o inimigo. — Você terá a vida dele, e o seu desejo de se mudar
não será mais um problema. — Laurent disse, querendo que sua declaração
fosse falsa, mas no fundo soube que era verdade mesmo antes de King
concordar.
Ele deu a King um sorriso trêmulo, apenas para fingir que concordava,
mas depois saiu andando pelo corredor, apesar de suas pernas serem feitas
de chumbo, e seu coração pesava como uma âncora.
Ele não podia acreditar que tinha sido tão estúpido a ponto de não exigir
de King uma resposta sobre seu pacto anterior. Ele nunca assumiu que um
pai sentenciaria seu filho à morte.
Mesmo agora, quando ele podia ver tão bem, a propriedade não era
menos de um labirinto do que tinha sido. Assim como o pacto que ele fez com
o diabo, os corredores foram feitos para prendê-lo. Não dava a ele nenhuma
saída, não importa quanto tempo ele procure por portas.
Aos 33 anos, enquanto Beast estivesse dentro dessas paredes, ele
morreria, sua força vital seria um sacrifício involuntário no altar da ganância
e do egoísmo de King.
Ela parou, olhando para ele antes de seu rosto tenso se suavizar em um
sorriso. — Eu lhe enviarei um convite. E sabe de uma coisa? Estou feliz que
o King tenha se comportado como um idiota. Todos eles parecem tão legais
no começo, mas tudo que eles fazem é mastigar e controlar sua vida. Todos
eles, sem exceção. Eu não posso acreditar que perdi tantos anos da minha
vida com um motociclista.
Laurent deu um passo para trás e suas palavras lhe deram um tapa no
rosto. Ela conhecia King há anos e esta foi a sua conclusão final. King a
tratava como sua propriedade, que era exatamente o que Laurent queria
evitar em sua vida. E, no entanto, ali estava ele, procurando por Beast como
um filhote de cachorro apaixonado.
Martina olhou para os dois casos. — Como você pode ver, depois de
cinco anos com King, é tudo que tenho. Não é um bom negócio, mas ei, ainda
sou jovem o bastante para encontrar um homem que me trate com o respeito
que eu mereço. Chega um momento em que você precisa se colocar em
primeiro lugar, não importa o quanto você ame alguém.
A criatura era apenas uma sombra no início, mas quanto mais tempo
Laurent olhava para seu próprio reflexo, mais ele via o demônio em vez de
seu próprio rosto. Os olhos grandes e simétricos queimavam no rosto negro,
destacando Laurent e fazendo seus pés congelarem no chão.
— Não importa para você o que acontece quando seu acordo comigo for
concluído. Faça o que eu pedi e você terá uma chance de uma vida feliz. Foi
com isso que concordamos. — Disse o demônio com uma voz rouca que soou
como se fosse produzido pela personificação do cascalho.
No espelho, Laurent viu seu próprio rosto novamente, mas não era seu
reflexo. Na visão, ele estava sentado na cama de Fane, ainda com suas
roupas velhas, manchadas de marrom por sangue velho. E Fane estava
deitado de bruços aos seus pés, um emaranhado imóvel de membros vestido
de seda cara e lã fina.
— Mas...
— Ele quer forjar um pacto próprio. Um para mantê-lo como seu para
sempre. Mas eu não preciso dele.
— Ele? Esse é o seu lugar de inquietação eterna. Você sabe onde é isso,
Laurent.
Adega de Fane. Era onde ele costumava matar suas vítimas, então por
que diabos Beast teria escolhido esse lugar?
Teria sido mais fácil simplesmente passar pelos cômodos onde a festa
continuava forte, mas Laurent não queria ver ninguém - muito menos King -
e por isso usou um pequeno corredor que devia ter sido usado anteriormente
por empregados. Estava estranhamente quieto quando ele se aproximou da
escada que o levaria ao abismo que era o porão, quase como se as paredes
antigas magicamente entorpecessem a base barulhenta e o estrondo
agressivo das guitarras elétricas.
Cada passo cuidadoso que ele deu o aproximava da alma de Fane, preso
em algum lugar nesses quartos. Um fantasma poderia machucá-lo? Poderia
envolver seus dedos translúcidos no pescoço de Laurent e apertar até que
Laurent não pudesse mais respirar?
Com apenas o luar atrás das costas iluminando os degraus, ele ainda
notou que algo estava diferente no porão. Havia menos quartos do que em
1805? O corredor estava mais curto? Ou parecia que era mais longo no
passado porque tudo na casa de Fane tinha sido tão grandioso?
Seu coração poderia ter parado por um momento quando ele notou a
silhueta escura enrolada em um dos cantos, e ele freneticamente passou o
olhar ao longo de todas as paredes em busca do rosto aparentemente bonito
de um fantasma.
Fane se foi, mas Beast olhou para cima, e seu rosto se contorceu quando
viu Laurent, mas ele permaneceu sentado em suas coxas.
Laurent não sabia o que dizer ao homem que costumava pensar que só
tinha o melhor interesse de Laurent em mente. Laurent tinha perdido os
sinais de aviso enquanto lentamente se aprisionava nos braços de Beast
todos os dias? E mesmo que os planos de Beast não fossem tão sinistros
quanto os de Fane, ainda era ruim ser tratado como gado, como se não se
pudesse confiar em Laurent para permanecer fiel à Beast por vontade própria
e precisava de uma corrente no pescoço.
11 dias
Beast olhou para a parede nua, como se estivesse coberta de tinta
dourada e os mosaicos. A mancha de vermelho em seu rosto era como uma
pintura de guerra bárbara, mas mesmo na luz branca da lanterna, Beast
parecia excessivamente pálido sob suas tatuagens. Quanto sangue ele
perdeu?
Beast respirou fundo, tão alto que ecoou entre as paredes vazias. —
Seu? Você me rejeitou. O que você quer agora?
Beast ficou de pé, segurando o colete com uma das mãos enquanto se
aproximava de Laurent em passos longos e ameaçadores. Agora que ele se
esticou na luz, Laurent pôde ver o brilho de cortes paralelos nos antebraços
tatuados. Eles não estavam mais sangrando pelo menos. — Liberdade para
fazer o que? Foder alguém melhor quando aparecer?
Beast jogou o colete que ele havia feito para Laurent no chão e agarrou
as bochechas de Laurent. O fedor de sangue transbordou os sentidos de
Laurent, mas ele não ousou desviar o olhar da intensidade no olhar de Beast.
— Eu preciso dele. Eu preciso dele para me dar algo.
Laurent se encolheu, porque ele não precisava saber que essa raiva era
para ele. Ele era a “coisa” que Beast queria ser concedida pelo demônio, e
Laurent não suportava ouvi-la, mas também não se afastaria de Beast. O
desejo de estar perto dele era visceral, mesmo quando ele sentiu o sangue
pegajoso em suas bochechas.
Beast apertou e abriu as mãos tão rigidamente que parecia que seus
dedos poderiam quebrar. — Você vai correr no momento em que outra pessoa
chamar sua atenção, e você não quer se comprometer porque tem medo de
retaliação. Admita.
Laurent esfregou o rosto, frustrado que isso era o que ele tinha que lidar
em cima do que ele descobriu de King e o que o diabo lhe mostrou. — Eu não
farei! Mas também não serei sua propriedade. Eu me recuso.
— Por quê? Por que não? Se você for meu, ninguém te toca. E eu preciso
que você seja meu. — Um músculo do maxilar de Beast pulsou quando ele
cerrou os dentes, seus olhos prendendo Laurent no lugar.
No final, foi Beast quem falou primeiro. — O que você quer então?
— Nada mudou entre nós, Beast. — Laurent respirou fundo pela boca
para evitar chorar. A escolha impossível estava sufocando-o, e ele não podia
compartilhar seu desespero com a pessoa que mais importava. Ele poderia
escolher entre Beast e ele mesmo? Beast não estava tentando justamente
isso? Ele não estava tentando de alguma forma prender Laurent ao seu lado?
A boca de Beast estava meio torta no mais insincero dos sorrisos, e ele
piscou. — Certo. O que quer que você queira. — Mas antes que Laurent
pudesse responder Beast o empurrou de volta até que Laurent estava de pé
contra a parede. Com o rosto enterrado nas dobras da camiseta de Beast, ele
ouviu o rápido batimento cardíaco a poucos centímetros de distância de suas
orelhas. As grandes mãos desceram para o peito de Laurent.
O baixo ronco da voz de Beast poderia muito bem ter sido trovão.
Choveu nas costas de Laurent, e quando a perna entre as coxas de Laurent
encontrou seu ritmo, cada esfregar ficaram carregadas de eletricidade. Beast
empurrou uma das mãos sob a camiseta de Laurent, massageando
avidamente sua carne, como se estivesse preocupado que ele nunca mais
fizesse isso.
Laurent focou todo o seu ser apenas neste momento. Na maneira dura
que Beast passou as mãos pelo peito e pelas costas, no calor que Beast
irradiava e no modo como a coxa pressionava insistentemente contra o pênis
de Laurent. Quanto mais lentas as coisas, mais tempo ele tinha para pensar.
Ele balançou o quadril mais rápido e deixou suas mãos subirem no peito
de Beast. Beast grunhiu, rolando sua bochecha contra o templo de Laurent.
Era como se a ânsia de Laurent tivesse dado permissão a Beast para ir mais
longe, e ele instantaneamente abriu a calça de Laurent, agressivamente
empurrando sua calça jeans. Ele não disse nada, apenas manteve o rosto
perto o suficiente para Laurent ouvir sua respiração rápida, mas não para
realmente vê-lo.
Laurent não tinha certeza de por que ele iria precisar de suas calças
completamente, mas quando Beast as empurrou para baixo, ele não
questionou, e correu para tirar seus tênis. Mesmo quando ele fez isso, ele já
estava desafivelando o cinto de Beast, ansioso para se comunicar sem
palavras, dessa forma, apenas que dois corpos poderiam.
Não havia palavras entre eles, e ele rezou para que eles não tivessem
perdido a capacidade de falar um com o outro, apesar de sua rejeição ter
ferido tanto Beast. A respiração deles era alta na sala vazia, subindo pelas
paredes enquanto se esfregavam um contra o outro, tocando os pênis um do
outro em um ritmo frenético que deixava os dois com fome de mais.
Beast se afastou um pouco, e foi a primeira vez que Laurent pôde olhar
nos olhos dele desde que eles começaram a se tocar. Sua boca estava fina e
tensa, os olhos procurando, como se Beast esperasse que Laurent o atacasse,
e não amá-lo. Isso durou apenas um momento, com Beast rapidamente se
inclinando para frente, com a boca aberta e quente ao lado do pescoço de
Laurent, comendo seu queixo, mordendo, puxando e chupando. Beast
agarrou a mão de Laurent e apertou o lubrificante nele antes de jogar o
pequeno tubo para longe.
Ele cutucou o peito de Beast com a testa, ansioso para pegar o que quer
que fosse dado. O pênis de Beast estava tão quente em sua mão, como se
não houvesse um laço invisível prestes a deslizar em um dos seus pescoços,
e eles estavam prestes a ceder aos seus desejos como sempre faziam.
Os lábios de Laurent doíam por um beijo ainda mais do que seu corpo
doía pelo pênis de Beast, mas seus olhos se encontraram apenas brevemente
antes que Beast enterrasse seu rosto no pescoço de Laurent. Havia uma
urgência em seus movimentos quando ele se abaixou, e, esmagando Laurent
contra a parede, empurrando seu pênis. Um gemido baixo escapou de seus
lábios, vibrando contra a garganta de Laurent quando a espessura grossa
afundou em um ritmo constante.
Beast rosnou e mordeu com tanta força que o fez andar em linha tênue,
separando o prazer da dor, mas quando ele se moveu, Laurent não podia
mais falar, reduzido a gemidos roucos a cada vez que o corpo de seu amante
o arrastava para cima e para baixo na parede com poderosos impulsos. Ele
agora desejava que não tivesse a camiseta para que suas costas sentissem a
dor de esfregar contra o gesso desmoronando ou um prego enferrujado, para
puni-lo por seu pacto com o diabo.
Oh! Como isso era verdade! Ele se aventurou no caminho que o diabo
havia estabelecido para ele tão cheio de esperança, apenas para descobrir
que nada era do jeito que parecia. Os impulsos da Beast eram ásperos,
punitivos, mas Laurent pegou tudo, abraçando Beast firmemente e
esperando que ele não estivesse sufocando seu amado. Ele beijou as palavras
na pele de Beast, e um soluço indefeso deixou sua garganta, apesar de querer
afastá-lo.
Laurent enrolou os joelhos mais perto de seu peito, pronto para que
Beast abrisse seu peito se fosse seu desejo. Ele não podia se importar menos
com a sujeira esfregando na parte de trás de sua camiseta. A necessidade de
estar com Beast era tão visceral que ele não conseguia respirar.
Ele entrou em Laurent, e a maneira como ele se movia, os sons que ele
fazia, estavam perfurando seu caminho através da mente de Laurent e
afastando todo o pensamento coerente. A verdade sobre seu pacto se
dispersou, no desconforto da sujeira que se enterrava em sua pele, no modo
bestial de que seu amante se movia sobre ele. Suas línguas dançavam juntas
mais rápidas a cada momento que passava, até que Laurent estava tão
completamente sem cérebro que ele não percebeu que Beast estava gozando.
A explosão de calor dentro dele, e os rápidos impulsos que o enviaram ao
chão com sua força de repente fizeram com que ele abrisse os olhos e olhasse
para o belo rosto tatuado relaxado em absoluta felicidade.
— A poeira poderia apenas nos cobrir, para que nunca tivéssemos que
sair desta sala? — Ele sussurrou ainda ofegante, mas já inundado de ondas
de tristeza.
Era inútil se ele não pudesse compartilhar seu coração com Beast.
11 dias
Capítulo Vinte e SeisBeast
Havia passado mais de uma semana desde que Laurent rejeitou o colete
de propriedade de Beast, e os sentimentos de Beast sobre o assunto se
acalmaram um pouco. Ele aceitou a decisão de Laurent, e prometeu a si
mesmo não tornar as coisas estranhas e tentou agir como se nada tivesse
acontecido. Mas a verdade era que sim, e os eventos daquela noite haviam
deixado um buraco no meio do peito de Beast, que ficava mais dolorido a
cada dia, como se em vez de curar se infectasse.
O sorriso de Laurent era tão bonito que Beast mal podia acreditar que
estava segurando uma criatura tão bonita em seus braços. — O que você
gostaria de fazer no seu aniversário? Eu sei que é amanhã, mas quero fazer
algo especial apenas para nós. Eu quero que seja o melhor dia.
Talvez ainda não, não este ano, mas em algum momento no futuro
Laurent pretendia deixá-lo, e quando chegasse a hora, Beast sabia que ele
teria que deixá-lo ir. Essa era a realidade disso, e ele não podia mudar isso.
Tudo o que ele podia fazer era tentar não pensar, não perturbar a harmonia
de seu relacionamento enquanto durasse, mas manter uma atitude positiva
era besteira. Ele toda noite sentia essa dor no peito, toda vez que ele não
tinha nada para manter sua mente ocupada.
— Existe algo novo que poderíamos fazer? Ou algo que você amava
quando era criança? — Laurent arrastou os dedos sobre a imagem de um
Lúcifer caindo no peito de Beast.
Beast lambeu os lábios e levou a mão de Laurent aos lábios,
observando-o em silêncio enquanto seu estômago se contorcia. Laurent disse
que queria que fosse o dia de Beast, mas não havia nada que Beast quisesse
mais do que satisfazer seu namorado. Havia algo de tão alegre na excitação
de Laurent cada vez que ele via algo novo que sua vida passada nunca
poderia oferecer a ele, que Beast ficaria feliz em vê-lo se divertindo o dia todo.
— Que tal um parque aquático? Eles têm brinquedos com ondas falsas
e sorvete de abacaxi.
Isso fez Laurent se animar como um gatinho. — Oh, isso soa esplêndido!
E nós poderíamos pegar o último resquício de sol de verão. Como as ondas
são feitas? E o sorvete. Eu adoraria um pouco de sorvete. — Ele beijou Beast
nos lábios. — Há muitas coisas feitas de plástico?
Laurent colocou todo o seu corpo em cima de Beast e fez o próximo beijo
durar mais tempo. Se Beast fechasse os olhos, ele poderia apenas acreditar
que Laurent estaria em sua vida para sempre.
— Vamos, e ver onde este dia nos leva — ele terminou sem um sorriso,
e essa breve expressão fez as sobrancelhas de Beast se levantarem, mas
Laurent estava de pé antes que Beast pudesse perguntar se estava tudo bem.
***
Ele costumava vir aqui muito com o seu ex. Antes que o bastardo o
deixasse.
Beast hesitou, sem ter certeza se ele queria arriscar que a equipe
imediatamente os rotulasse. Talvez fosse melhor ficarem neutros até que
saíssem dos vestiários? — Você nunca sabe o que as pessoas vão pensar. É
complicado — ele disse enquanto entrava na fila de cerca de dez pessoas.
Ele ficou tão perdido em pensamentos que nem notou quando Laurent
comprou seus ingressos. Ele estava com a sua carteira, e era incrivelmente
doce que ele queria gastar o pouco dinheiro que ganhou em algo para Beast.
— Você poderia, por favor, esperar no final da fila? Alguém estará com
você em breve — ela disse, e Beast endireitou suas costas, segurando a mão
de Laurent sem sequer olhar em sua direção.
— Venha.
Laurent apertou-a de volta e foram para onde foram solicitados. Um
sentimento de tristeza já havia feito Beast se arrepender da ideia de vir para
cá. As pessoas eram tão cheias de merdas. Ele não poderia ir a um parque
aquático com o namorado na porra do seu aniversário? Mas se ele explodisse
sobre isso, ele certamente seria preso, e isso seria ainda pior para Laurent.
Eles ficaram parados no final da fila, e não demorou muito para que um
gerente atrapalhado chegasse. Ele era um homem mais velho com um
penteado cinzento e um pouco de barriga. Ele estava suando profusamente
em sua camisa azul de botão.
Laurent ficou na ponta dos pés, como se quisesse parecer mais alto. —
Oh, não, você não entende. Kai pensou sobre isso. Ele trouxe sua roupa de
mergulho e não causaremos nenhum problema, senhor, asseguro-lhe.
A ternura por trás das palavras de Laurent fez Beast desviar o olhar por
alguns segundos, mas ele apertou os dedos de Laurent firmemente. —
Obrigado. Eu gosto delas. Eles impedem as pessoas de terem pena de mim
por causa das cicatrizes. Mas às vezes... Isso é simplesmente insuportável.
— Beast disse e esfregou o rosto com a mão livre.
Beast olhou para Laurent, sem saber o que pensar. — Pode doer — ele
disse suavemente, inclinando-se para beijar a testa de Laurent. Ele afastou
o cabelo comprido e apoiou o queixo sobre a cabeça de Laurent,
aproximando-o.
Beast não conseguiu falar por vários momentos, depois apertou a mão
de Laurent com firmeza e assentiu. Nuvens de tempestade se reuniam no
horizonte de qualquer maneira, então talvez, esse impedimento à entrada do
parque aquático fosse uma coisa boa, afinal de contas.
***
Quando ele olhou para uma cadeira próxima, notou um colete de couro
com remendos de um clube de motoqueiros de New Hampshire. Ele se sentiu
fisicamente doente ao vê-lo. Como se a rejeição de Laurent não tivesse sido
suficiente, e agora precisava ser esfregada mesmo em um lugar que ele
considerava seu refúgio seguro.
Jabba mudou seu corpo corpulento e sorriu, olhando para a sua cliente.
— Feliz?
Beast franziu o cenho e olhou pela janela, não querendo ver a tatuagem
de propriedade feita como uma homenagem a um cara, quando ele não
conseguia nem uma em Laurent. Não deveria incomodá-lo tanto, mas sim.
Abria o corte que mal se fechava em seu coração e cutucava-o com espetos.
A garota riu. — Oh vamos lá. Vocês sempre dizem que casamento é como
prisão, mas não é verdade. Vocês são apenas um monte de reclamões. Isso é
grande para mim. Meu homem finalmente me pediu para ser dele para
sempre.
Mas a garota ficou ainda mais agitada. — Que merda, idiota? O que você
pode saber sobre o meu relacionamento? Vou me casar, não entrar em um
pacto com o diabo.
Beast cruzou os braços sobre o peito, sem saber como desarmar toda
essa situação, mas, enquanto o silêncio prosseguia, ele foi forçado a se
levantar e olhou para Jabba, desculpando-se. — Desculpe, cara, ele não é
daqui.
24
Se ele está drogado/chapado.
Jabba acenou com a mão. — Não se preocupe com isso. Não é como se
ela fosse uma cliente fiel. Eu já vi cenas piores do que isso. O que vamos
fazer por você, hein?
O peso do conhecimento de que Laurent não queria estar com ele porque
ele tinha medo de Beast o manteve de mau humor, não importava o quão
engraçadas fossem as histórias de Jabba. Beast sentia que ele estava
fingindo o bom humor pelo bem de Laurent, mas ele não podia negar que ver
as palavras aparecerem na pele de Laurent no mesmo lugar que as dele, lhe
dava certa emoção, talvez até um compromisso por parte de Laurent.
Laurent atribuiria o mesmo significado a eles que Beast? Qual foi o seu
paraíso e qual foi o seu inferno? Para Beast, as palavras eram uma expressão
de esperança de que depois do inferno que ele passou, ele iria encontrar a
felicidade novamente um dia, que toda a dor que ele passou com a
recuperação após o incêndio valeria algo.
Beast ficou surpreso ao ver quase todas as motos fora da garagem, e até
mesmo alguns dos carros, mas ele optou por não assumir nada e liderou o
caminho pelos corredores vazios. Era estranho ver o clube tão
completamente vazio. Não restava alma alguma na casa, e se alguém tivesse
ficado para trás, provavelmente estava em seu próprio quarto, porque sem
qualquer música ou conversa a ser ouvida, e nem luzes acesas, o vasto prédio
parecia abandonado.
Laurent sorriu de volta, mas então correu para fora do quarto de uma
maneira estranhamente nervosa, o que fez Beast confiante de que ele estava
pronto para um presente de aniversário. Ainda faltavam duas horas para a
meia-noite, então ele estava feliz que Laurent não o estivesse fazendo esperar
mais. Ele pensou na tatuagem na pele de Laurent. Como agora, não importa
o que acontecesse, Laurent teria um pedaço de Beast com ele. Se isso fosse
uma espécie de compromisso por serem namorados e se tornar propriedade
de Beast, Beast poderia aceitar. Claramente, Laurent se importava com ele,
se ele queria comemorá-lo em sua própria carne, então talvez Beast devesse
relaxar e parar de pensar demais em tudo.
— Tudo bem. Esse colete será seu sempre que você estiver pronto para
isso. Eu ainda quero vê-lo usando.
Beast exalou e puxou Laurent para mais perto, onde ele finalmente se
estabeleceu ao lado de Beast no sofá. O cão não se mexeu.
O coração de Beast batia tão rápido que ele podia sentir todo o seu
corpo. Seu pescoço estava apertado, e o único alívio veio na forma de Laurent,
que Beast o puxou para perto, para um abraço apertado.
— Eu estive com tantos caras, mas não quero mais ninguém. Eu quero
você. Eu nunca conheci alguém assim.
— Não deixe que ele tenha sua preciosa vida — as últimas palavras
foram apenas um sussurro, e Laurent pareceu querer falar algo mais, mas
seus lábios se transformaram em fumaça cinza, sua língua entrou em uma
súbita explosão de chamas... E ele se foi.
Ele se foi.
Capítulo Vinte e SeteBeast
Não poderia estar acontecendo. Como era possível que um homem que
ele segurou em seus braços pudesse se dispersar no nada? Ele acordaria de
novo em uma cama vazia, sem Laurent enrolado debaixo do braço? Mas não
importa o quanto Beast tentou não reconhecer o que acabou de acontecer,
suas mãos estavam vazias.
Andar até o banheiro era uma façanha em si, com os músculos trêmulos
e estranhas dores aparecendo do nada. Ele passou pelo quarto de Laurent, e
ver as roupas dobradas na cama fez Beast doer ainda mais. Mesmo quando
Laurent sabia que ele desapareceria, ele ainda tomava o cuidado de deixar
tudo tão limpo e arrumado.
Ele levantou a voz, repetindo a mesma coisa várias vezes, mas a criatura
não respondia. Beast podia praticamente sentir cada tique de um relógio
invisível quando as palavras de Laurent afundaram lentamente. King estava
se alimentando dele. Era a força vital de Beast que o manteve jovem e
saudável. Por mais absurdo que isso soasse, não havia como negar que
quanto mais feliz Beast estava, King pior ficava. Depois de ver Laurent se
transformar em fumaça em seus braços minutos atrás, não havia nada que
Beast descartaria imediatamente como ficção. E então ele acreditou em seu
Laurent. Ele acreditou que King o usava há anos. Que ele propositadamente
deixou Beast desperdiçar sua vida.
Ele deu a seu reflexo mais uma olhada no espelho quebrado e manchado
de sangue.
Se ele morresse esta noite, ele seria incapaz de destruir o ser infernal.
Ele não daria essa satisfação a King; e ele não iria deixar o sacrifício de
Laurent ser desperdiçado. Durante todo esse tempo, Laurent carregava esse
segredo em seu coração, incapaz de compartilhar o fardo. Isso deixou Beast
tão furioso, que apesar de todas as dores que consumiam seu corpo, ele saiu
do banheiro com um rosnado baixo que fez Hound recuar.
Ele estava exausto demais para chorar ou gritar. Ele carregou duas de
suas pistolas, pegou sua faca favorita e saiu de casa com Hound atrás dele,
visivelmente assustado e sem vontade de abandonar seu mestre.
Beast correu com a sua arma pronta para uso, sua cabeça girando tanto
que estava afetando a precisão por trás dos movimentos de Beast. Mas
quando chegou à porta onde o estranho estava, e o trovão sacudiu as paredes
ao redor dele, não havia nenhum sinal de intruso, nenhum traço de sangue
no chão pálido, e nenhum som de passos se afastando para ser ouvido.
A moto com certeza não tinha estado aqui quando ele chegou com
Laurent, e sem uma razão para King ter deixado a máquina à mercê do tempo
horrível, era uma declaração.
Uma provocação.
Beast atirou para ele. Uma vez. Duas vezes. Três vezes. A moto caiu na
lama com um grito doentio de metal ferido, e ele observou sua respiração
superficial e os punhos apertados.
Beast podia sentir seu pulso até em suas gengivas, e ele levantou a
arma, atirando na janela.
Cada passo foi um desafio para as pernas de Beast, que pareciam ter se
transformado em chumbo. Nunca em sua vida ele se sentiu tão fraco. O chão
gritou para ele, e com a mente ficando cada vez mais nublada, quanto mais
subia as escadas ele mal se movia, uma neblina se instalou em seus olhos.
A última vez que ele sentiu algo parecido com isso foi quando ele acordou de
sua cirurgia e a anestesia geral ainda estava presente em suas veias. Ele
queria apenas se enrolar e descansar, mesmo que por pouco tempo, mas
sabia que no momento em que deixasse perder o foco, um momento de
fraqueza se transformaria em inquietação eterna.
O corrimão pareceu afastar seu corpo preto e agora se parecia com uma
cobra, e quando finalmente chegou ao patamar, quase esperou que sibilasse
para ele. Ele não deixaria este edifício diabólico sugar toda a vontade de viver
dele. O sacrifício de Laurent precisava ter significado. Beast prometera
vingança, e ele a soltaria em todos os monstros escondidos nas paredes,
mesmo se isso o matasse.
King exalou em algum lugar acima de Beast. — Eu tenho que dizer que
manter todos esses segredos para mim foi exaustivo. As constantes
discussões com sua mãe sobre por que não podíamos sair daqui, porque eu
não queria que você fosse para a faculdade, blábláblá. Mas eu sempre faço
do meu jeito, e devo dizer que a energia que eu bebi de você na última hora
passada parece ainda mais forte do que depois que sua mãe morreu, e essa
foi requintada, eu posso disser isso.
Foi como um soco no seu estômago, e a bota molhada de Beast deslizou
para fora da borda do degrau, fazendo-o tropeçar e cair com força em um
joelho. Hound gemeu e empurrou seu focinho macio contra o pescoço de
Beast, inconsciente da profundidade do horror que estava se desdobrando
ao redor deles. Beast sabia que King não tinha sido um bom marido para sua
mãe, mas falar de sua morte de forma tão prazerosa estava além de qualquer
coisa que ele poderia ter imaginado.
Tic tic.
— Você é patético. Pensar que houve uma época em que eu estava com
ciúmes de você, que eu me preocupava que meu sol estivesse morrendo
enquanto o seu estava prestes a subir... — A voz de King soava mais aguçada
agora, e Beast demorou a entender que não havia mais nada bloqueando o
som. Ele abriu os olhos e olhou ao longo das escadas girando em torno de
um espaço vazio no meio, todo o caminho até onde a escada fez outra curva
para subir acima da cabeça de Beast. King estava encostado ao corrimão,
mas quando Beast se movia, King também se escondia parcialmente atrás
da madeira velha. O covarde provavelmente ainda estava cauteloso com a
outra arma de Beast.
Ele estendeu a mão, tentando agarrar King, mas quando ele se moveu,
sua outra arma caiu pelas as escadas. Beast olhou para trás, a imagem
capturada por seus olhos não seguindo seus pensamentos rápidos o
suficiente, e ele uivou de desespero quando percebeu o quão longe a arma
estava. Um lance inteiro de escadas abaixo dele.
O relógio ainda estava correndo. Ele não podia perder tempo para
recuperá-la. Não agora, quando King estava tão perto.
— Você? Você tem sorte que o se seu cão consegue amar esse seu rosto
horrível. — King riu, mas deu alguns passos para trás, assustado quando as
pequenas janelas na parte superior da escada se abriram uma a uma,
deixando entrar o vento uivante e a chuva fria.
— Eu até acho que ele deve ter tido algum amor por você, mas também
sabemos que ele era tão idiota quanto uma pedra se escolheu voltar para o
mundo dele, em vez de passar um tempo aconchegante no meu pau.
Especialmente se você considerar que ele havia dado a lealdade dele, e não
te salvou de qualquer maneira. — O sorriso de King se alargou quando ele
olhou para o patamar acima dele, onde uma criatura parecendo um gigante
sem gênero mergulhou no alcatrão. — É por isso, Beast! O diabo precisa de
mim, e nenhuma de suas balas pode me tocar. Eu tenho proteção infernal!
— Sério? — Beast sibilou, dando mais dois passos. Ele ficou surpreso
que o ser malévolo que os observava de cima não lhe causava medo. Apenas
observava Beast e King com um interesse calmo, como se fosse um cientista
e eles - dois ratos em uma gaiola. — Dê-me sua arma então, e nós veremos.
King mais uma vez olhou para a criatura que tinha olhos tão quentes
que pareciam brancos. — Por que não? — Ele puxou sua Magnum para fora
do coldre e jogou a arma pelas escadas. Aterrissou três degraus acima de
Beast, com o cano apontando para a cabeça dele. — Você tem... — ele olhou
para o relógio. — Eu não sei. Trinta segundos?
Ele sincronizou com o seu coração, e quando ele correu para pegar a
arma, cada batida dentro de seu peito soava como um número.
14
13
10
Ele olhou para baixo e, no vazio circular no meio da escada, viu King
pendurado sobre a estátua de gárgula como uma marionete cujas cordas
foram cortadas. Uma das asas da estátua estava caída e a camisa cara e nova
de King estava rasgada. O vermelho brilhante lentamente fazia gráficos entre
os dois chifres gêmeos da estátua que agora emergiam do peito de King.
Nunca em sua vida ele se sentiu tão bem. Ele estava prestes a acreditar
que poderia voar, apesar de toda a miséria ainda em seu coração, ele sufocou
uma risada que não pôde conter.
O monstro diabólico o observou dos poucos degraus acima e não parecia
que estava prestes a vingar a morte de King. Em vez disso, ele inclinou a
cabeça ligeiramente, olhos sem pupila fixandos em Beast.
Beast respirou fundo, com sua mente inundada com imagens de seu
passado, com imagens do futuro que ele sonhara quando jovem, quando
tinha um rosto que fazia todo mundo vibrar de luxúria. Se ele tivesse a
chance de se tornar novamente o homem que ele foi uma vez, sua vida seria
completamente diferente. Ninguém o mandaria embora quando ele
escolhesse patrocinar um negócio, as meninas tirariam fotos secretas dele
na praia, ele deixaria as pessoas inquietas com sua aparência atraente, e
todo mundo iria querer ter um pedaço dele.
Sua mente parou, e com um rubor quente se espalhando pelo peito, ele
olhou para o alfinete preso em seu colete de couro.
Seu coração se apertou de dor, e ele respirou fundo algumas vezes para
se acalmar. — Não. Não é isso o que eu quero. Eu quero Laurent. Devolva-o
para mim. — Ele disse com firmeza, olhando para o demônio com nova
determinação.
— É pegar ou largar. Eu não dou a mínima para o seu acordo com ele.
Você tem que me deixar morar com ele, ou este lugar será abandonado
enquanto permanecer nas mãos da minha família. E eu teria filhos só para
manter este lugar vazio.
O chão parecia ficar mais quente sob os pés de Beast, e Hound deu um
latido de aviso.
— Mas você só vai pegá-lo e nada mais! — Ele rugiu, e Beast estava
desconfiado de não dar um passo para trás no abismo, como seu pai tinha
feito.
— Vá buscá-lo então.
Capítulo Vinte e Oito
Laurent
A espera era pior do que a própria morte, que, por mais horripilante que
fosse, seria um breve acontecimento.
— Você viu o rosto dele? — Um dos homens disse como se Laurent não
estivesse lá para ouvi-lo. — Ele tem alguns hematomas, mas seus lábios
ainda estão gordos. Vou colocá-los em bom uso hoje à noite.
Cada pedaço de Laurent queria atacá-los, gritar que eles não sabiam
onde ele estava, e o que ele precisava fazer, mas mesmo que a morte o
esperasse no final da estrada, ele não o fez. Ele não queria ser espancado
novamente. E se esses homens escolhessem, eles poderiam quebrar cada
osso de seu corpo.
Mas Beast era mais forte, maior, mais rápido, um tipo mais desenvolvido
de ser humano criado com carne e super alimentos servidos em plástico, e
ele desceu sobre o homem como uma harpia faminta por sangue.
Laurent gritou quando Beast virou a cabeça do homem para o lado com
um ruído desagradável que fez todas as articulações do corpo de Laurent
doerem. Quando Beast liberou o corpo flácido, caiu sem vida no chão.
— O que você está fazendo aqui? Você não deveria estar aqui, Beast.
Esta não é a sua hora, você não vai prosperar aqui. E eu serei um fugitivo.
Isso tudo não é como deveria ser. — Ainda assim, Laurent descansou sua
bochecha contra a cabeça de Beast.
— Não. Não, Laurent. Vou te levar de volta. Você está voltando para
casa.
Laurent observou-o, estupefato, mas ainda lhe deu outro beijo. — O que
você quer dizer? Você certamente não pode... Eu não entendo.
Beast beijou sua têmpora, mas foi rápido em cortar a corda ao redor dos
pulsos de Laurent. Seus dedos eram tão gentis quando deslizavam sobre as
manchas escuras nas partes visíveis do corpo de Laurent. Seus olhos azuis
eram brilhantes e inocentes enquanto olhavam para ele. — Só se você vier
para casa comigo. Você vai ficar comigo para sempre? — Ele perguntou à luz
da morte.
Fox sacudiu a cabeça com uma carranca. — Nós também temos essa
merda? Como super poderes ou algo assim?
Beast suspirou. — Eu não tenho nenhum poder. Eu tenho Laurent. E
se você quiser negociar com aquela coisa, faça por conta própria, embora eu
não ache que seja uma ótima ideia — ele disse.
Beast respirou fundo. — Como já disse, não é tudo sobre foder, então
pare de se concentrar nisso como garotos adolescentes. O que isso significa
é que o clube precisa ficar aqui. Nosso futuro está aqui. Nós mantemos festas
e mantemos esse clube como sempre foi planejado. Um lugar para a liberdade
em todos os aspectos. Com o passar do tempo, tenho certeza de que
descobriremos mais sobre essa… Coisa, demônio, o que for, e então
poderemos agir como necessário.
Laurent esfregou o rosto. — Não seria melhor deixar esses corpos para
o seu descanso eterno?
Beast acenou com a mão. — Bem. Nós não temos nenhum carregamento
vindo este mês, e eu precisarei fazer meu próprio acordo com o Sr. Magpie
agora que o King foi embora. Podemos informar as autoridades desses órgãos
nesse meio tempo.
Gray olhou ao redor da mesa. — Com o Davy fora do jogo por um longo
tempo, King está morto… não está na hora de pensar em corrigir o status do
nosso prospecto? Apenas seis de nós estão em funcionamento. Há
simpatizantes, mas isso não é nem perto de ser o mesmo.
— Não.
Fim.
Agradecemos pela Leitura :)