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danidade, pluralidade e terra. A natalidade está massas, muitas das quais resultaram em regimes
associada ao primado da própria política, a ação, totalitários. A sociedade de massas a que se refere
portanto ao pensamento político; a mortalidade, Hannah Arendt cimentou-se com o ascenso da es-
por sua vez, diz respeito ao pensamento metafísi- fera social. Ao tratar desse fenômeno em sua obra,
co. A pluralidade consiste na própria essência da Correia problematiza o que ele aponta como fron-
política, isto é, a tessitura da vida em coletividade teiras inerentes à modernidade, as quais ocupam o
a partir das particularidades e da diversidade que pensamento contemporâneo e estão, a seu modo,
conforma os indivíduos. delineadas nas reflexões arendtianas sobre socieda-
A pluralidade é condição sine in qua non para de, economia e política na modernidade. Embora
a dignidade da política, portanto para a liberdade, Correia não tenha levado em conta o conceito de
dando sentido à vida e à terra. A terra, nesse par- sociedade civil ao promover o diálogo entre Han-
ticular, consiste na relação homem-natureza (phy- nah Arendt e Michel Foucault, com base nele é
sis). Ainda conforme o autor, três acontecimentos possível abstrair a crítica de Arendt ao imperativo
foram determinantes para alterar tal condição, as da dimensão social, a qual poderia, na esteira das
quais ensejaram a modernidade, segundo Han- reflexões arendtianas, sublimar a política e, assim,
nah Arendt: a descoberta da América, a Reforma comprometer seus pilares.
Protestante e a invenção do telescópio. O aspecto A possibilidade de diálogo entre Foucault e
central destacado pelo autor acerca das reflexões Arendt a partir do conceito de sociedade civil do
arendtianas consiste na alienação humana decor- primeiro e da crítica da dimensão social da segun-
rente dos fatores condicionantes da modernidade, da está em que, sem a chamada sociedade civil,
especialmente a racionalidade instaurada pelo pri- não seria possível a emergência de um modelo de
mado da ciência. gestão das populações encetado pelo Estado-nação
Além disso, e valendo-se das comparações moderno, o que o filósofo francês denomina go-
com o cão de Pavlov, Correia mostra que o consu- vernamentalidade, cujo aspecto central consiste
mo – ação por excelência da alienação do homem em uma economia como dispositivo de controle
na modernidade – vem a ser uma espécie de refle- social, de tecnologia de governo. Esta seria ape-
xo condicionante que compromete a autonomia nas uma entre várias possibilidades de um debate
da ação, na medida em que o reduz a uma espé- entre Arendt e Foucault. A propósito das críticas
cie de autômato. Recorre, por seu turno, a vários recebidas por parte dos leitores de Hannah Aren-
autores a fim de imiscuir as reflexões no âmbito dt, Correia perscruta, com acuidade, o seu pensa-
das fronteiras entre economia e política na mo- mento a fim de explorar cada uma delas e expor
dernidade e as contribuições do pensamento de em quais aspectos muitas se apresentam frágeis e,
Hannah Arendt. De Foucault ressalta o assento portanto, insustentáveis.
da razão econômica ao tratar de sua biopolítica, Ao ressaltar a ameaça da instância social sobre
ademais da afirmação do homo oeconomicus. De a política, Arendt não advogava a existência de um
Agamben, a relação entre zoé e bios, ou seja, a po- ideal de política, desprovida de conflitos da ordem
litização da vida, a política da vida, obnubilada material da vida, mas uma política com dignidade,
pela suposta racionalidade de caráter eminente- em que a liberdade fosse o valor supremo. Embo-
mente econômico. O cerne de uma biopolítica e ra Correia não tenha aprofundado essa questão, sua
de uma vida nua, conforme Agamben, residiria obra apresenta-se como um ponto de partida aos que
no animal laborans, contribuição fenomênica do intencionam apreender a crise política e os aspectos
pensamento de Arendt para se conceber a relação psicossociais envolvidos, deflagrada pela primazia do
entre o homem e o mundo. mercado e calcada em um modelo de sociedade em
O desdobramento político desse animal labo- que o individualismo, o consumismo e a derrocada
rans, dada a dissolução das classes, das identida- da esfera pública são traços amiúde evidentes.
des políticas e, portanto, de suas representações e Ainda sobre as interlocuções promovidas por
referenciais, consiste nas chamadas sociedades de Correia, após Foucault e Agamben, o autor traz
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