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TEORIA DA HISTÓRIA DA LITERATURA UFPA

ARTIGO FINAL – PROFA. GERMANA SALES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

LETRAS EXILADAS:
AS HISTÓRIAS QUE A HISTÓRIA AINDA NÃO CONTOU.

Elielson de Souza Figueiredo1 (UFPA)

Resumo:

O presente artigo assinala a necessidade de as Histórias da Literatura Brasileira registrarem


criticamente a produção de escritores, imigrantes ou nascidos no país, que representaram o exílio
de judeus no Brasil durante e após os anos de perseguição nazista em vários países da Europa.
Para evidenciar a relevância desse tema na literatura brasileira contemporânea, foram elencados
alguns contistas, alguns ainda muito pouco investigados pelos historiadores e críticos, tais como
Halina Grymberg e Giselda Leirner.

Palavras-chave: História da Literatura Brasileira; exílio; judeus

INTRODUÇÃO

Tendo discutido algumas das mais citadas Histórias da Literatura Brasileira


publicadas nos séculos XIX e XX pude perceber a predominância de abordagens que privilegiam
autores e obras observadas sob o critério de sua adesão às estéticas que chegaram da Europa para
se incorporarem ao imaginário local acerca da identidade brasileira, embora não se tenha omitido
o vínculo de muitas obras à experiência americana do Homem rural, cujos afetos se moldaram
em grande medida pela relação com a Terra e seus condicionamentos naturais. Contudo, o que os
historiadores da produção literária brasileira tomaram como base metodológica foi o recorte
cronológico linear que tentou traçar uma espécie de evolução geral da Literatura feita nas terras
antes portuguesas e posteriormente declaradas independentes. Tal evolução comumente
delineada como negociação permanente entre inclinações ao gosto europeu e algum sentimento
gradual de pertencimento ao lugar.
Mas esse recorte linear do tempo obrigou muitos historiadores da Literatura ao
método de demonstração por amostragem, ou seja, à eleição de alguns autores e obras
representativos das tendências estéticas predominantes ao longo de décadas inteiras. Isso,
logicamente, implicou num silenciamento que demonstra a fragilidade ou inadequação do

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Elielson FIGUEIREDO. Universidade Federal do Pará (UFPA)
elielson.ppgl@gmail.com
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método, ao mesmo tempo em que sinaliza para a grande produção marginalizada, a saber, aquela
composta por autores e obras que por motivos diversos não foram considerados representativos
das referidas tendências nem tampouco de qualquer contorno mais autônomo da identidade
brasileira em determinado período.
Dito isto, o que proponho é apresentar alguns autores e autoras, entre eles apenas
um já é mais estudado no meio acadêmico, que se ocuparam da representação ficcional da
experiência do exílio vivido no Brasil por imigrantes judeus fugidos e/ou sobreviventes do horror
nazista durante a Segunda Guerra Mundial. Essa ficção ainda pouco estudada dá testemunho de
uma “certa disposição em adaptar-se às condições de um país estrangeiro, disposição que, no
entanto, nem todos os imigrantes tiveram”2. O tema do exílio dos judeus no país se justifica por
ser esse um tema recorrente entre nós, fato que não se pode mais negligenciar como capítulo
recente da nossa história literária, sem o risco de desenharmos um falso perfil da literatura
brasileira.
Ainda é preciso advertir que tratarei de contos extraídos de volumes publicados por
duas escritoras e dois escritores, sendo esta apenas uma coincidência que não tenta abordar as
obras segundo qualquer contraposição entre gêneros autorais. Embora tenha organizado meus
comentários segundo a ordem cronológica em que estes textos foram dados ao público, não
procuro traçar uma linha evolutiva entre eles, apenas ressalto-lhes a recorrência de temas muito
próximos ou, enfim, o mesmo tema sob modos de dizer um tanto diversos. Escolhi obras que tive
a oportunidade de ler, sem julgar-lhes o valor – questão tão subjetiva quanto ideológica em
muitos casos. A escassa publicação de textos voltados para essa experiência migratória,
sobretudo de contos, é a principal causa de aqui aparecerem poucas referências. Ainda assim, a
produção em torno do tema, no Brasil, dá sinais de um crescimento que não podemos continuar
negando. Entre os textos aqui mencionados a seguir, a memória em carne viva de Halina
Grymberg pode ser entendida como “forma de elaborar a própria perplexidade diante da
perseguição desenfreada e do extermínio dos judeus” (KESTLER, 2003. p. 198)

1. TESTEMUNHOS DO EXÍLIO: DIZER A DOR.

Em 1956 Samuel Rawet publicou seus Contos do Imigrante, dos quais os textos
mais pertinentes ao tema do desajuste identitário são também os mais conhecidos. Logo no início
do volume aparece O Profeta, trata-se de uma narrativa daquele momento apreensivo para os

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apud KESTLER, 2003. p. 61
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refugiados da Segunda Guerra Mundial: a chegada em terra estrangeira. Numa linguagem


sincopada em que cada período é curto e surdo, lemos a história de um homem que acabara de
chegar ao Brasil, ao que tudo indica ao Rio de Janeiro, e experimenta algo entre a
impossibilidade de esquecer o passado de dores vividas durante o nazismo e a vontade de se
adaptar a um presente ordinário numa terra onde ninguém dimensiona essa catástrofe.
Vivendo agora em casa de familiares mais próximos é logo enxovalhado por causa
de sua aparência, a barba longa e as roupas severas logo lhe renderão o apelido – profeta – que
também aludia àquele estigma de loucura e radicalismo religioso que fora construído sobre os
judeus por onde passaram durante sua diáspora no pós-guerra. Mais que o deboche havido no
apelido, o riso de todos revela-lhe a pouca ou nenhuma importância de seu passado frente àquela
vida tão ordeira e completa para os que nunca presenciaram o horror dos campos de tortura.
Dizer aquele passado a pessoas tão indiferentes a ele seria “amesquinhá-lo, tirar-lhe a essência
do horror ante uma mesa bem-posta” (RAWET, 1998. p. 25) Fora da casa a um tempo familiar e
hostil o exilado buscava as sinagogas onde fazia as preces do Sabat, certamente ali alguém
saberia o significado daquelas memórias que ele carrega. Contudo, pratica-se ali uma
religiosidade burocrática, uma disciplina que norteia a vida desprezando a possibilidade de a
realidade ser assaltada pelo absurdo. Em O gringuinho o protagonista é um menino que não
suporta mais ir à escola porque não compreende a língua falada no exílio. Mapas pendurados
pelas paredes, textos enormes copiados no quadro negro, para ele traços sem sentido que logo lhe
renderam o apelido de gringuinho burro. O passado que habita a memória do garoto é
reconhecido pela paisagem europeia e pela rotina de acolhimento e histórias colhidas da voz do
avô na casa em que viveu antes do navio. No exílio, como já vimos nos demais contos do
volume, experimenta o vexame na casa dos meninos do bairro e na escola, onde as histórias não
fazem sentido. Aterrorizado por professores e ridicularizado pelos meninos da turma reage com
um empurrão aos desmandos de uma professora, foge, e na volta pra casa pisa o chão úmido do
caminho pensando na neve do passado. O medo das consequências do seu gesto faz-lhe escorrer
pelas pernas um fio de urina, metáfora da desagregação psicológica manifesta fisicamente.
Nas páginas mais recentes da literatura brasileira a condição do exilado judeu figura não
apenas como sofrimento imposto pelo não-judeu que o hostiliza e fustiga. Grande parte desta
condição desajustada deve-se à própria dificuldade de o judeu conciliar suas memórias com o
presente. Noutras palavras, o imigrante sobrevivente é narrado como um Sujeito que não pode
dar à Memória um lugar reservado a ela no passado, bem como não pode dar ao cotidiano a
maior importância que a urgência do presente exige. Em 1994, Roney Cytrynowicz publicou A
vida Secreta dos Relógios e outras histórias para trazer ao público uma pequena série de contos
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muito breves que sugerem a dificuldade de o judeu conviver com suas memórias guardando
delas as devidas proporções de distância em relação ao presente da escrita.
Em relatos como Gás, a abordagem psicanalítica da Memória traumática do judeu alemão
que foi submetido ao horror e sobrevive constantemente atormentado pela presentificação do
passado catastrófico, basta um simples vazamento de gás no interior do apartamento para que
toda histeria sintomática faça o Sr. Mendel reviver o horror do assassinato nas câmaras da morte.
Isso somado à sempre dolorosa dificuldade para dizer em português o que fazia parte de um
conjunto de referências da história e da cultura judaicas, levará à morte por asfixia o velho que
vivia sozinho e nunca recebia visitas. Depois de morto o velho, a atendente da companhia de
abastecimento de gás informou que lembrava de um homem que “falava mal o português e que
repetia sempre a palavra chuvisco”.3(CYTRYNOWICZ, 1994. p. 60)
No conto que dá título ao volume, encontramos as memórias de um neto que revive as
férias na casa do avô cheia de relógios por todos os lados. Já adulto, o menino de então reflete
sobre as motivações do avô para entregar-se ao cuidado das horas e passa a entender aquela
impossibilidade de esquecer representada no descompasso proposital de cada relógio. Outra vez
o tema da temporalidade como dimensão da experiência, como afetividade, memória afetiva cuja
duração varia segundo o evento vivido. O mesmo tema está em Barracão II, mas agora a
encenação da memória da dor é representada por torturador e torturado. Um cirurgião plástico
recebe em sua clínica o velho médico carrasco que o havia dissecado a ele e a um irmão gêmeo
nas dependências do Barracão II de um campo não identificado. Assustado pela coincidência do
encontro, o nazista alega o argumento desprezível de que fizera tudo pela ciência. Em duas
páginas muito sintéticas a narrativa faz círculos que repetem as memórias do cirurgião,
assistimos a uma vertigem somática, o corpo transplantado aos cinco anos recebera ossos e pele
retirados do irmão gêmeo que morrera naquela experiência bizarra. Diante do carrasco
imobilizado, a dúvida entre matá-lo ou deixá-lo viver com o novo rosto, o rosto do irmão morto
que o sobrevivente havia reconstruído no corpo nazista. Ao final, o assassinato do carrasco e o
suicídio com tiros de pistola.
Um momento ainda mais promissor dessa produção ficcional voltada pra o exílio de
judeus no Brasil se pode ver em Mameloshn, memória em carne viva, publicado por Halina
Grynberg em 2004. Narrado em primeira pessoa, o conto gira em torno do núcleo familiar
composto pela narradora e seus pais. Fatos superpostos, avanços e recuos, pausas para
monólogos que investigam as nuances de comportamentos passados, enfim toda a complexidade

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Palavra usada para indicar a pronúncia incompreensível de Auschwitz.
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da condição do imigrante judeu que experimenta: a culpa e a vergonha. Às voltas com as mágoas
da mãe, que viu toda a sua família se dispersar entre vagões de trens que levavam aos campos e à
morte, a narradora reconta histórias que ouviu, culpa-se pelo destino da mãe que, para salvá-la,
acabou vendo morrer a filha mais velha. A vida miserável nos primeiros anos no Brasil, a
tentativa frustrada de chegarem ao Canadá e o frio insuportável vivido na França antes da
tentativa de chegar à América do Norte. Tudo isso somado à obrigação de manter os preceitos da
religião, cumprir rituais, ser fiel a uma ética muito diferente daquela praticada por não-judeus e
manter vivo o idiche. As memórias da narradora são ácidas, dolorosas, e delas podemos destacar
a violência do pai, o modo como ele dispunha do pouco dinheiro que conseguia frequentando
prostitutas e seu desprezo pela filha e pela esposa. Em meio ao vazio existencial, a voz do pai
“ameaçando em [...] palavras incompreensíveis para os meninos do país do futebol, Meshugene
kopf, Doida varrida! Louca, maldita você e a filha que você pariu!” (GRYMBERG, 2004. p. 48)
Entre os que escreveram recentemente sobre as nuances do exílio judeu no Brasil
figura a presença de Giselda Leirner que em 2011 publicou o volume de contos Naufrágios.
Entre a preocupação com a captura de circunstâncias da vida urbana cotidiana e do universo
feminino os textos representam também a perda das utopias históricas nas sociedades ocidentais
contemporâneas. O volume tem poucos contos, de vez que um certo impressionismo dos textos
faz com que à narrativa se ajuntem momentos de sondagem das personagens, entre estas estão
Maria Rita e Rita Maria como protagonistas de O Sacrifício, onde logo de início reconhecemos a
encenação da incomunicabilidade e do estigma impresso no Nome do imigrante:

Por que estes nome? Não foram escolhidos pelo pai, que não conhecia bem a
língua nem os costumes do novo país. Foi no cartório que se deu a confusão.
Seja porque não tinham entendido que as meninas eram gêmeas, seja porque o
oficial que atendeu o aturdido jovem, que não sabia o que fazer com duas filhas,
resolveu por conta própria facilitar o caso (LEIRNER, 2011, p. 79).

A mãe das meninas morre num parto cruento, o pai suicida-se e elas passam a morar com a avó e
a frequentar um colégio que lhes parece hostil. Morta também a avó, elas são separadas, ficando
uma sob a guarda do antigo patrão do pai, a outra num convento. Tomado de desejo por ambas
depois de tê-las visto juntas no jardim de sua mansão, Johannes, o ex-patrão, convence a
superiora do convento a lhe entregar Rita. Depois de alguns dias mantendo-as num quarto,
encarceradas, ordena que fiquem nuas e abusa das duas irmãs. Caindo em sono e embriaguez
após o crime as duas o matam com um corte no pescoço. O corpo vazado em sangue nos remete
ao início da narrativa, quando a mãe se esvai em sangue também após durante o parto. Ambos os
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momentos encenam o sacrifício, seja como oferta exigida em reparação, talvez por uma culpa
sem crime que vitimiza o imigrante judeu, seja como exigência de castigo para o crime cruel.
A morte no olhar é narrado por uma amiga da protagonista que, ao contar o que se passou com
Liuba questiona a impossibilidade de narrar o Outro sem dizer mais a si. Liuba é de uma família
de judeus que fugiu da Alemanha por causa da perseguição nazista, vieram para a América do
Sul trazendo consigo vultosa fortuna, que foi aplicada em terras e florestas, aumentando ainda
mais o imenso capital (idem, p. 48) mas após a morte misteriosa do pai, que para Liuba fora
traído pela esposa e pelo próprio irmão, a protagonista se isola da família. Visitava com
frequência o túmulo do pai num pequeno e antigo cemitério [...] Rezava em hebraico, apesar de
não entender o significado das palavras. Depois rezava novamente em português (idem, p. 49).
Na casa de Liuba há um salão sagrado dedicado a guardar os objetos da cultura e da religiosidade
judaicas, um salão que quase nunca é visitado sequer por ela e poucas vezes pela narradora, lugar
que metaforiza a memória, como o túmulo do pai onde às vezes, em visita, ela sentia como se
pudesse ouvi-lo. Eis um aspecto importante no tema do exílio judeu no Brasil: o passado que
fala, a memória que vive latente, viva e invisível.

CONCLUSÃO
Estou convencido de que a imagem do judeu sobrevivente e exilado no país ainda
merece uma mirada capaz de provocar uma ampliação no horizonte de tudo que se tenta encaixar
no sintagma “Literatura Brasileira”. Ao mesmo tempo, faço notar que, per si, esta produção já se
encontra datada no pós-guerra, sendo a década de 1950 o momento em que se inicia uma
produção mais regular de textos representativos da presença judaica entre nós e assim mantendo-
se regular até hoje, época em que cada vez mais se levantam vozes que desejam uma espécie de
abertura dos arquivos da memória das catástrofes mundiais.

REFERÊNCIAS

[1] CYTRYNOWICZ, Roney. A Vida Secreta dos Relógios e outras histórias. São Paulo: Scritta,
2004.
[2] GRYMBERG, Halina. Mameloshn, memória em carne viva. Rio de Janeiro: Record, 2004.
[3] KESTLER, Izabela Maria Furtado. Exílio e Literatura. Escritores de fala alemã durante a
época do nazismo. São Paulo: Edusp, 2003.
[4] LEIRNER, Giselda. Naufrágios. São Paulo: Ed. 34, 2011.
[5] RAWET, Samuel. Contos do Imigrante. Rio de Janeiro: Ediouro, 1998.
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