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Introdução

1 INTRODUÇÃO

A motivação para realizar o presente estudo surgiu após a inserção da


pesquisadora no Curso de Capelania Hospitalar Evangélica organizado pela
Associação Capelania Evangélica Hospitalar (ACEH). Por ser enfermeira com
trinta30 anos de experiência profissional, grande parte dela em situações limite de
gravidade dos pacientes, em ambiente altamente estressante, além de estar há dez10
anos lecionarna docência em Enfermagem em Pronto Socorro, e também por ser
evangélica, esse local peculiar favoreceu-lhe a atuação nessa atividade. A área de
administração também sempre a acompanhou, na implantação e organização de
serviços de emergência, e no curso de pós-graduação senso lato de Enfermagem em
Emergências, que coordena desde o ano de 2006.

Durante a qualificação em capelania hospitalar, surgiu o interesse em saber


como esse serviço se posiciona na organização do trabalho no hospital. A esse
propósito, registre-se que a pesquisadora considera necessária a institucionalização do
Serviço de Capelania Hospitalar como parte de um departamento de assistência
espiritual, como também o reconhecimento da atividade de capelão no Brasil, pois
países de colonização cristã não católica e economicamente desenvolvidos já têm isso
bem definido, oferecendo assistência espiritual beneficiando pacientes, familiares,
equipe de saúde e o serviço de saúde com um todo.

Para tanto, é necessário começar definindo o que é Capelania Hospitalar - uma


prestação de serviço religioso ministrado aos enfermos em hospitais da rede pública
ou privada, garantido por lei federal e leis estaduais, como previsto no inciso VII do
artigo 5º da Constituição Federal Brasileira de 1988: “é assegurada, nos termos da lei,
a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação
coletiva1”. A partir dessa disposição, várias outras legislações foram promulgadas
sobre o mesmo tema.

Em 1999, o Decreto no 44.395 regulamentou a prestação de assistência


religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva de que tratava a Lei no
10.066, de 19982, e a Lei no 9.982 de 20003 dispôs sobre a prestação de assistência
religiosa nas entidades hospitalares públicas e privadas, nos seguintes termos:
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Introdução

Art. 1o Aos religiosos de todas as confissões assegura-se o acesso aos


hospitais da rede pública ou privada, bem como aos estabelecimentos
prisionais civis ou militares, para dar atendimento religioso aos internados,
desde que em comum acordo com estes, ou com seus familiares no caso de
doentes que já não mais estejam no gozo de suas faculdades mentais.
Art. 2o Os religiosos chamados a prestar assistência nas entidades
definidas no art.1o deverão, em suas atividades, acatar as determinações
legais e normas internas de cada instituição hospitalar ou penal, a fim de
não por em risco as condições do paciente ou a segurança do ambiente
hospitalar ou prisional.
Além das várias disposições legais sobre capelania hospitalar que vem atestar
a inclusão desse elemento no cuidado ao doente, pode-se acrescentar que a moderna
assistência à saúde encontra-se em fase de transição e está à procura de novas
possibilidades e caminhos para ampliação do conhecimento sobre o tema. Sabe-se
que a pesquisa científica no campo das ciências da saúde aponta prioritariamente para
as áreas da biologia molecular, genética, farmacoterapia e práticas alternativas, mas
também há reconhecida tendência para o estudo da espiritualidade 4.

Para entender melhor essa atividade, é importante saber como ela começou. O
termo “capelania” foi criado na França, em 1700, porque, em tempos de guerra, o rei
costumava mandar, para os acampamentos militares, uma relíquia dentro de um
oratório, que recebia o nome de “Capela”. Essa capela ficava sob a responsabilidade
do sacerdote, conselheiro dos militares. Em tempos de paz, a capela voltava para o
reino, ainda sob a responsabilidade do sacerdote, que continuava como líder espiritual
do rei, e assim ficou conhecido como capelão. Com o tempo, o serviço de capelania
se estendeu aos parlamentos, colégios, cemitérios e prisões 5.

Na verdade, para que essa atividade de assistência espiritual saísse do senso


comum e se encaminhasse para a assistência e tratamento baseado em evidências,
várias pesquisas cientificas foram realizadas6,7,8,9 constatando que as pessoas que têm
fé e uma religião têm melhor aceitação do tratamento de saúde, da hospitalização e
aumento da imunidade, além de menores índices de depressão e ansiedade,
enfrentando a enfermidade com mais esperança e força, tendo melhor qualidade de
vida e um propósito para viver.

Uma revisão sistemática com meta-análise, envolvendo 42 amostras e mais de


125 mil indivíduos, concluiu que maior envolvimento religioso foi associado com
menor mortalidade. Para Stroppa e Almeida10, “estudos epidemiológicos realizados
nas últimas décadas apontam, de modo consistente, a existência de relação entre
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Introdução

religiosidade e melhores indicadores de saúde”. Relatam também que esses benefícios


parecem estar relacionados a “hábitos de vida, suporte social e capacidade de coping
(conjunto de estratégias utilizadas por uma pessoa para se adaptar a circunstâncias de
vida adversas ou estressantes)”. A vida religiosa dessas pessoas proporciona menor
exposição a situações de risco à saúde, como o fumo, álcool e outras drogas,
comportamento sexual com risco de contaminação e situações de violência física. O
convívio social que esta proporciona também traz vínculos que oferecem maior
suporte em situações de estresse e de doença. Assim, as pessoas religiosas apresentam
maior capacidade de lidar com situações adversas de vida, com a utilização de coping
religioso positivo10.

Moreira Almeida e Lotufo Neto11, em um estudo de revisão de literatura


realizado em 2006, examinaram a relação da religião e /ou espiritualidade com
diversos aspectos da saúde mental e constataram que a maioria das publicações
“aponta para melhores indicadores de saúde mental e adaptação ao estresse em
pessoas que praticam atividades ditas religiosas”. Koening et all12, em artigo de 2000,
denominado “Religião, espiritualidade e medicina, achados e implicações para a
pratica clinica”, concluíram que pessoas que praticam atividades religiosas ou
espirituais são mais saudáveis, mais equilibradas e, portanto, usam menos os serviços
de saúde.

A assistência espiritual ganhou espaço e importância também na atenção aos


pacientes sob cuidados paliativos, por estarem fora de possibilidades terapêuticas. O
cuidado paliativo é a modalidade de assistência que abrange o ser humano além das
dimensões físicas e emocionais como prioridades dos cuidados oferecidos,
reconhecendo a espiritualidade como fonte de grande bem-estar e de qualidade de
vida, ao se aproximar a morte. Acolher esse movimento de transcendência, nesse
momento da existência humana, é um dos alicerces dos cuidados paliativos 4, com o
que também compõe a assistência religiosa.

Corroborando o reconhecimento de que a saúde dos indivíduos é determinada


pela interação de fatores físicos, mentais, sociais e espirituais, a Organização Mundial
de Saúde (OMS)13 já estabeleceu também que o bem-estar espiritual é uma dimensão
do estado de saúde, junto às dimensões biológica, psíquica e social.
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Introdução

Dessa forma, e por essa necessidade, cresce o número de serviços de capelania


hospitalar e capelães nos hospitais brasileiros, cuja missão é oferecer apoio espiritual,
emocional e social aos enfermos, seus cuidadores e profissionais da saúde 14.

Aitken15 explica:

Ao visitar os pacientes, ouvindo-os com paciência, discernimento e amor,


nota-se que as suas maiores dores não são físicas, por maior que seja o
ferimento ou a extensão de seus tumores. Eles sempre confessam ter uma
dor na alma que nenhum medicamento pode aliviar ou curar. Sofrem de
complexo de culpa, de ódio, de desejo de vingança, de solidão, ansiedade,
medo e de muitos outros problemas emocionais e espirituais que causam
suas doenças ou que estão ajudando a complicá-las.

Assim, a capelania hospitalar, ao oferecer essa assistência espiritual ao


paciente, tratando a dor na alma, vem restabelecer essa interação entre espiritualidade
e saúde, influenciando na qualidade e rápida recuperação dos pacientes internados.
Para fazê-lo, no entanto, como qualquer outro serviço profissional, ele precisa estar
instituído formalmente no ambiente hospitalar, posto que este éseja bastante
complexo e, por isso mesmo, bem estruturado. Em outras palavras, é preciso que a
Capelania Hospitalar esteja inserida na estrutura de funcionamento da instituição
hospitalar com atribuições, funções e papéis bem definidos, articulada aos demais
serviços oferecidos, para lograr atingir seus objetivos. Ressalta-se ainda que os
hospitais que contam com esse serviço são melhormais bem conceituados junto à
clientela, por terem a visão do cuidado integral ao paciente, seus familiares e
profissionais da saúde5.

Nessa perspectiva, para atender à definição de papéis sociais e funções que a


instituição hospitalar demanda, é necessário definir os termos religiosidade e
espiritualidade.

De acordo com Saad8, religiosidade e espiritualidade estão relacionados, mas


não são sinônimos.

Religiosidade envolve um sistema de culto e doutrina que é compartilhado


por um grupo e, portanto, tem características comportamentais, sociais,
doutrinárias e valores específicos. Espiritualidade está relacionada com o
transcendente, com questões definitivas sobre o significado e propósito da
vida e com a concepção de que há mais na vida do que aquilo que pode ser
visto ou plenamente entendido.

Do mesmo modo, Peres16 conceitua religião como um sistema organizado de


crenças, práticas, rituais e símbolos projetados para auxiliar a proximidade do
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Introdução

indivíduo com o sagrado e/ou transcendente, e espiritualidade como uma busca


pessoal de respostas sobre o significado da vida e o relacionamento com o sagrado
e/ou transcendente.

De acordo com Koenig et all17, “espiritualidade é uma busca pessoal pela


compreensão das questões últimas acerca da vida, do seu significado e da relação com
o sagrado e o transcendente, podendo ou não conduzir ou originar rituais religiosos e
formação de comunidades”. Já para Hufford 18, “espiritualidade se refere ao domínio
do espírito”, ou seja, à dimensão não material, extra física da existência, que pode ser
expressa por termos como: “Deus ou Deuses, almas, anjos e demônios”.
Habitualmente se refere a “algo invisível e intangível, que é a essência da pessoa”.

Segundo Koenig et all17, religião é “um sistema de crenças, práticas, rituais e


símbolos destinados a facilitar a proximidade com o sagrado e o transcendente -
Deus, força superior ou verdade absoluta. Ainda de acordo com Hufford 18, religião “é
o aspecto institucional da espiritualidade [....] religiões são instituições organizadas
em torno da idéia de espírito [...] O termo religião aqui se refere ao Cristianismo,
Judaísmo, Islamismo, Hinduísmo, Budismo e outras tradições religiosas com suas
diversas vertentes. Religiosidade diz respeito ao nível de envolvimento religioso e o
reflexo desse envolvimento na vida da pessoa, o quanto isso influencia seu cotidiano,
seus hábitos e sua relação com o mundo.

Na Enfermagem, Wanda de Aguiar Horta, enfermeira brasileira visionária,


apresentou a espiritualidade como uma necessidade humana básica para alcançar
melhor qualidade de vida19.

A esse propósito registre-se que, por considerar as experiências místicas e


meditativas como processos mensuráveis e quantificáveis, com base nas evidências
acumuladas na literatura e na prática da assistência a saúde, a OMS, por meio do
grupo Qualidade de Vida, incluiu, em seu instrumento genérico de avaliação desse
aspecto, o domínio Religiosidade, Espiritualidade e Crenças Pessoais, com cem 100
itens13.

Sabe-se que o interesse no estudo do papel da religiosidade, espiritualidade e


práticas psicoterapêuticas em saúde se dá por diferentes razões de natureza
socioeconômica e clínica. Por exemplo, em culturas industrializadas como a
americana, 96% da população acredita em Deus ou em um espírito universal, 75%
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Introdução

reza regularmente, 42% freqüentafrequenta serviços religiosos regularmente, 67% é


membro de algum corpo religioso local, 67% afirma que a religião é muito
importante em suas vidas e 63% acredita que seus médicos deveriam falar com seus
pacientes sobre sua fé espiritual16.

A crescente demanda por esses serviços, nos últimos anos, estimulou a


regularização institucional de serviços de assistência religiosa como componentes da
estrutura administrativa hospitalar, razão pela qual há interesse no estudo desse
fenômeno, cuja atualidade e importância são atestados pela profusão de legislação em
elaboração e em vigência20,21,22,23,24. Como exemplo, cita-se o projeto de Lei Federal
n° 6817/06 de 28 de junho de 200623, que regulamenta a profissão de Capelão Cristão
e o Projeto de Lei Estadual (Ceará) n°89/2008, que dispõe sobre a prestação de
assistência religiosa hospitalar, assim entendida a prestação de assistência religiosa no
âmbito das instituições de saúde das redes pública e privada24.

Entidades não governamentais que militam nessa área também são fontes
relevantes de informação sobre o tema, como se verá a seguir.

1.1 A Associação de Capelania Evangélica Hospitalar

A atividade de Capelania existe nos Estados Unidos desde as primeiras


expedições vindas da Inglaterra, acompanhadas do seu clero, para explorar o Novo
Mundo. Há indícios de que a capelania moderna de cuidado de saúde teve origem em
1920, com o Reverendo Anton Boisen (1876 – 1966), na cidade de Worcester, em
Massachussets25. Boisen foi o primeiro a introduzir estudantes de teologia num
hospital psiquiátrico para treinamento pastoral clínico, o que fazia parte dos trabalhos
regulares do hospital26.

No Brasil, o serviço de capelania teve inicio com a Capelania Militar, também


chamada castrense, para a qual existe uma regulamentação própria 27, segundo a qual,
o capelão militar é um ministro religioso encarregado de prestar assistência religiosa
a alguma corporação militar (Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Militar, Civil, e
Corpo de Bombeiros). A partir da lei 7.672 de 23/9/1988, ficou definido que:
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Introdução

O Serviço de Assistência Religiosa será constituído de Capelães Militares,


selecionados entre sacerdotes, ministros religiosos ou pastores
pertencentes a qualquer religião que não atente contra a disciplina, a moral
e as leis em vigor (Lei 6.923, art. 4º). Cada ministério atentará para que,
no posto inicial de Capelão Militar, seja mantida a devida
proporcionalidade entre os Capelães das diversas regiões e as religiões
professadas na respectiva Força (Lei 6.923, art. 10) 28.

Para assistir os militares brasileiros protestantes, a Capelania Evangélica foi


organizada pela extinta Confederação Evangélica do Brasil, em conjunto com o
governo brasileiro. O primeiro capelão evangélico do Brasil foi o pastor batista João
Filson Soren (1908 - 2002), que atuou na Segunda Guerra Mundial, servindo à Força
Expedicionária Brasileira (FEB) entre 1944 e 1945, recebendo mais de dez
condecorações militares, inclusive a Cruz de Combate de 1ª Classe, a mais alta
honraria do Exército26,28,29.

Hoje, a Capelania Militar Evangélica tem sido exercida nas Forças Armadas e
também nas instituições das polícias civil e militar e no corpo de bombeiros. Nesses
casos, os capelães devem ser formados em capelania e são submetidos a provas em
concursos públicos, sendo contratados e tendo o seu trabalho remunerado 28.

Na área hospitalar, a Capelania Evangélica existe no Brasil há mais de 70


anos, tendo-se iniciado no Hospital Evangélico do Rio de Janeiro, onde o primeiro
capelão foi também o Pastor João Filson Soren, da primeira Igreja Batista carioca14,26.

Em São Paulo, a Capelania Evangélica Hospitalar teve inicio em 1953, no


Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(HCFMUSP)14. As atividades de assistência religiosa do HCFMUSP existem desde a
sua fundação, em 1944. No início, essa assistência era desenvolvida apenas pelo
serviço religioso católico, mais especificamente por padres diocesanos de paróquias
próximas ao HCFMUSP. A capela do hospital foi inaugurada no dia 15 de maio de
1945 e o primeiro capelão foi o Cônego Roque Viggiano, auxiliado pelo padrePe.
Miguel Sanjurjo, que exerceu o ministério no HCFMUSP até 29 de abril de 196027.

Tem-se a impressão de que todo o trabalho de capelania hospitalar


compreendia apenas a participação dos sacerdotes católicos e seus ajudadores leigos.
Tal idéia, naturalmente, vem da constatação de que o país é predominantemente
católico e que, portanto, dispensava outra participação de religiosidade cristã. Mas
um dado imperativo para contraditar essa afirmação é que, na época da fundação da
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Introdução

capelania – em 1952, tendo em vista a necessidade de atender às características


espirituais e religiosas específicas dos pacientes, seus familiares e dos funcionários de
confissão cristã reformada (evangélicos), – as igrejas protestantes tradicionais
indicaram o pastor presbiteriano, da Igreja Presbiteriana Independente, reverendo
Walter Augusto Elmer, como primeiro capelão evangélico do HCFMUSP. A
admissão do reverendo deu-se através de convênio firmado entre o Governo do
Estado de São Paulo e a Confederação Evangélica do Brasil, que representava
corporativamente as igrejas evangélicas brasileiras27.

Foi pastor de reconhecida dedicação e integração aos trabalhos pastorais do


serviço evangélico, o reverendo Atael Fernandes Costa, presbiteriano, que atuou no
HCFMUSP nos anos de 1964 a 1975. Desde a inserção do serviço evangélico nesse
complexo, alguns outros pastores, bacharéis em Teologia devidamente ordenados,
como o pastor Marcos Petriaggi, e o pastor Edson Plaza, ambos da Igreja Batista –
foram seus capelães e contribuíram firmemente para o bem-estar da população
assistida. Também Eleny Vassão de Paula Aitken, leiga da Igreja Presbiteriana do
Brasil, foi capelã do HCFMUSP de 1983 até o ano de 2004, sendo conduzida à
posição de capelã titular em 1993. A ação pastoral foi desenvolvida de maneira a
preservar a liberdade de culto do paciente e demais assistidos, excluindo-se toda e
qualquer preocupação proselitista e respeitando a religião de cada um27.

Vale ressaltar que, nos hospitais evangélicos, sempre houve ênfase no trabalho
de assistência integral. Nesses hospitais, sobretudo nos EUA, foram criados os
consagrados modelos de capelania como os CPEs – Clinical Pastoral Educations.
Também a Bioética nasceu, e em seus primórdios foi desenvolvida, apenas pelas
igrejas evangélicas envolvidas em questões da ética da vida 25,27.

No Brasil, esse trabalho é acompanhado pela Associação de Capelania


Evangélica Hospitalar (ACEH), “uma entidade cristã, religiosa, beneficente e
cultural, que tem como finalidade preparar capelães e visitadores religiosos, e
organizar e reunir capelanias hospitalares, oferecendo-lhes contínuo aprimoramento
em questões de teologia e saúde14”.

Sua fundadora foi Eleny Vassão de Paula Aitken, atual capelã evangélica do
Instituto de Infectologia Emilio Ribas (IIER) e do Hospital do Servidor Público
Estadual (IAMSPE)5 e presidenta da entidade (ACEH).
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Introdução

No dia 6 dezembro de 2001, a ACEH foi formalmente oficializada. A Visão


da ACEH é “ser um serviço que oferece apoio espiritual, emocional e social baseado
na palavra de Deus aos enfermos, seus cuidadores e profissionais da saúde”. Esse
trabalho é realizado através de voluntários evangélicos capacitados, tornando-se
referência para igrejas, autoridades hospitalares e profissionais da saúde. Sua Missão
é “glorificar a Deus através de visitadores e capelães voluntários que agem a partir de
uma estrutura de apoio orgânica e funcional, levando o conforto e o consolo da
palavra de Deus ao enfermo, seus familiares e aos funcionários e profissionais da
saúde, nos hospitais5”.

Para suprir as necessidades sociais dos hospitais, trazendo benefícios para os


mesmos através de empresas e outras entidades que faziam doações em gêneros, foi
fundada a Associação Beneficente de Capelania Evangélica Hospitalar (ABCEH). A
ABCEH teve seu início no dia 26 de junho de 1996, com o nome de Capelania
Evangélica, no HCFMUSP e no IIER, prestando serviço religioso com abrangência
social. Com o passar do tempo, devido ao crescimento do número de capelanias
formadas a partir desta, sua razão social foi alterada para Capelania Hospitalar de São
Paulo. O nome foi novamente alterado para ABCEH, em 22 de setembro de 2005,
devido à “necessidade de se constituir uma entidade específica para o
desenvolvimento da ação social nos hospitais, prestando assistência humanitária
gratuita e amparo social, instalando e mantendo centros de convivência para
atendimento social a pacientes, familiares e profissionais da saúde”. A ABCEH é o
braço social da ACEH, Associação de Capelania Evangélica Hospitalar, que tem
CNPJ próprio e atua na seleção e capacitação dos voluntários e funcionários para a
ABCEH5.

No Brasil, cerca de 130 hospitais com capelães preparados fazem parte da


ACEH. No mundo, a ACEH está presente em 13 países5,14.

Como se vê, o trabalho de capelania hospitalar cresceu e tem crescido, não só


pela formação de capelães, mas também, e principalmente, pela necessidade que os
pacientes internados em hospitais têm de receber consolo e conforto através da
assistência espiritual.

Para entender melhor como a ACEH funciona e está organizada, desenvolveu-


se um tópico a parte, que passa a ser descrito como se segue.
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Introdução

1.2 A Formação do Capelão pela Associação de Capelania Evangélica Hospitalar

A Capelania Evangélica Hospitalar é um serviço de assistência religiosa


prestado por ministro religioso, realizando o ministério de evangelização e consolo e,
trabalhando junto aos profissionais de saúde, visando o atendimento às pessoas que
sofrem, levando conforto em hora de aflição e transmitindo ensinamento bíblico 28.

Tem como objetivo, junto às entidades hospitalares públicas e privadas,


estabelecimentos prisionais civis ou militares, sanatórios e quartéis das Forças
Armadas, prestar, aos internados, atendimento diário diuturnamente leito a leito,
realizar cultos com pacientes, familiares e servidores; fazer aconselhamento bíblico e
estudos bíblicos; oferecer apoio emocional aos familiares; fazer aconselhamento
espiritual dos pacientes terminais; realizar programação especial em datas
comemorativas e proferir palestras para profissionais de saúde e servidores que
voluntariamente manifestarem o desejo de estudar a Bíblia. Isso é feito sem ônus para
a instituição hospitalar ou para o indivíduo/grupos atendidos, como forma de exercer
a função evangelizadora preconizada pela religião 28.

A Capelania Evangélica Hospitalar é muito bem vinda entre os profissionais


de saúde, tanto que, em diversos hospitais, faz parte de Grupo de Humanização,
Equipes de Cuidados Paliativos e de Comitês de Ética em Pesquisa com Seres
Humanos. Também é convidada para ministrar palestras em Faculdades de
Enfermagem, Medicina e Serviço Social, e participa como preletora em Congressos
de Saúde14.

Para Aitken15, o “Capelão Evangélico é um pastor, missionário ou, em casos


especiais, um leigo com larga experiência em capelania hospitalar, que tenha sido
aprovado e credenciado por sua denominação, indicado, nomeado e aceito pela
superintendência do hospital“.

Para estar apto para ser capelão pela ACEH,, os candidatos são capacitados
com treinamentos especiais e, além disso, é preciso aprender a lidar com as emoções
para poder ficar ao lado do paciente e ser capaz de aconselhá-lo e confortá-lo
diariamente. Participar do Seminário de Capelania Hospitalar anualmente oferecido
pela ACEH no Instituto Presbiteriano Mackenzie, é outro pré-requisito. O objetivo do
11
Introdução

curso é informar e despertar pessoas para que façam o curso e treinamento de


capelania hospitalar e, depois, desenvolvam o trabalho de visitação hospitalar. Após
participarem das palestras, as pessoas que se identificam com o ministério preenchem
um dossiê de informações e entregam cartas de referência. Em seguida, são
entrevistadas por pastores e capelães e, depois, são encaminhadas ao Curso de
Capelania Hospitalar Nível I, com duração de 40 horas e treinamento prático
individual, por cerca de 702 horas, nos hospitais. Segue-se o Curso Nível II, quando
são apresentados assuntos como Tanatologia, Pacientes Terminais, Bioética,
Transtornos Psiquiátricos, Atendimento Domiciliar, Aconselhamento em Crises e
Assistência a Adultos e Crianças no Luto. São cerca de 40 horas de curso teórico e 80
horas de prático. Por fim, no Nível III, comde aproximadamente 160 horas de
duração, são ensinados conteúdos específicos para a formação de Capelães
Hospitalares. Então, o aluno deverá entregar um projeto detalhado de Capelania
Hospitalar, para a conclusão do curso14.

O capelão é parte integrante da equipe multidisciplinar de saúde. É uma


pessoa capacitada e sensível às necessidades humanas, disposta a dar ouvidos,
confortar e encorajar, ajudando o enfermo a lutar pela vida com esperança em Deus e
na ciência. Oferece aconselhamento espiritual e apoio emocional tanto ao paciente e
seus familiares, como aos profissionais da saúde, e é importante elo com a
comunidade local2,14.

Além dos capelães, na ACEH existem os visitadores e voluntários, que


trabalham no hospital diariamente, atuando em visitas de apoio solidário leito a leito,
distribuindo literatura bíblica de consolo, realizando acompanhamento pré e pós-
cirúrgico, oferecendo apoio espiritual, aconselhamento bíblico, evangelização e
ministrando cultos voltados para pacientes e profissionais da saúde, além de
desenvolver atividades culturais com pacientes e familiares de crianças
hospitalizadas. Também realizam atividades de assistência social, como distribuição
de roupas, sapatos e cestas básicas14.

De modo similar, para suprir a necessidade de assistência espiritual do


paciente no hospital, o serviço de capelania hospitalar nos EUA e Inglaterra é
realizado pelo capelão, que faz parte da equipe interdisciplinar de assistência ao
paciente, desenvolvendo atividades de apoio espiritual, acompanhando a evolução do
12
Introdução

paciente e também os registros no seu prontuário, e tem estabelecidas suas atribuições


e competências25.

Os capelães devem trabalhar em harmonia com enfermeiros, médicos e outros


profissionais da saúde. É sua função também levar o doente a descobrir seus
problemas espirituais e resolvê-los15.

O enfermeiro faz parte dessa equipe interdisciplinar também e tem


comprometimento de longa data com o tratamento holístico, que abrange a dimensão
biológica, psicológica, social e espiritual. A AACN – American Association of
Colleges of Nurses, nos EUA, por exemplo, recomenda que todos os bacharéis em
enfermagem sejam capazes de avaliar o status espiritual de um paciente e incorporar a
assistência espiritual em suas práticas. As Taxonomias “North American Nursing
Diagnosis Association (NANDA)”, “Nursing Interventions Classification (NIC)” e
“Nursing Outcomes Classification (NOC)”, tratam aspectos da espiritualidade no
planejamento de cuidados de enfermagem como, por exemplo, se nota, nas
enunciações: “risco para sofrimento espiritual” e “disposição para melhoria de bem
estar espiritual30”.

A despeito dessas múltiplas determinações e desse comprometimento, os


enfermeiros freqüentemente relutam em avaliar e tratar as necessidades espirituais
dos pacientes por temerem a sua falta de competência.

Se, por um lado, desenvolver essa competência é importante, por outro, os


enfermeiros também podem tratar as necessidades espirituais dos pacientes através da
cooperação com capelães. Já os capelães podem oferecer assistência espiritual de
profundidade aos pacientes e cuidado espiritual coordenado com a organização de
saúde30, sendo isso até indicador de qualidade de assistência.assistência.
13
Introdução

1.3 A Acreditação de Instituições de Saúde e a Assistência Espiritual

Saindo da visão especifica de hospital e deslocando o foco para a relação


Estado e Igreja, é importante registrar que, no Brasil, ambos foram por muito tempo
tão próximos ao ponto de se confundirem. Com o ideário da República, se instalou o
Estado laico (que não se mistura com a religião), quando não houve mais
oportunidade de participação da Igreja nos assuntos do Estado. Por outro lado, no
nosso país, os espaços de presença católica, que já existiam desde o período colonial,
mantiveram diversas características desse período, o que lhes assegura, ainda hoje,
presença cativa nas instituições sociais como hospitais, por exemplo.

Além dos hospitais, a atuação da capelania pode ser mais ampla; pode ser
exercida nas escolas, presídios, cemitérios, sindicatos, empresas, clubes, creches,
condomínios, e instituições públicas (Câmara de Vereadores ou Prefeitura, por
exemplo)28 mas, no presente estudo, manter-se-á o foco nas instituições de saúde.

Um dado relevante do crescimento da Capelania Hospitalar é que ela começa


a ser valorizada pelos órgãos de acreditação de serviços de saúde devido à sua
influência nas condições de saúde do paciente, o que coloca a assistência espiritual
como um componente de prestação do serviço de saúde.

Para definir o cuidado espiritual profissional nos hospitais, a Joint


Commission on Accreditation of Healthcare Organization (JCAHO), uma
organização privada dos EUA, estabeleceu padrões para a institucionalização da
capelania hospitalar nos serviços de saúde31. Em 2003, essa instituição declarou que o
paciente tem direito fundamental de considerar salvaguardado o cuidado, sua
dignidade pessoal, respeito por sua cultura, e valores espirituais, [recomendando que]
o hospital deverá demonstrar respeito sobre as necessidades do paciente, incluindo a
necessidade do cuidado pastoral ou outros serviços espirituais32.

Assim, apesar do serviço de capelania hospitalar não ser produtor de receitas


hospitalares, pode aumentar a satisfação geral do paciente em relação à instituição,
pelo tratamento espiritual recebido, tornando esse paciente e sua família mais
propensos a recomendar o hospital a outras pessoas. Além do nível de satisfação dos
14
Introdução

pacientes, os hospitais e o sistema de saúde reconhecem os benefícios de oferecerem


bons serviços de capelania hospitalar30.

No presente estudo, pretendeu-se conhecer as circunstâncias sócio históricas


de criação, implantação e instalação da Capelania Evangélica Hospitalar no Instituto
de Infectologia Emilio Ribas (IIER). Esta escolha se deu, entre outras razões, por ser
este o local de atuação da pesquisadora como visitadora da Capelania Hospitalar
Evangélica.

No começo de sua vida profissional e durante grande parte dela, a


pesquisadora preocupou-se com o conforto físico e até emocional do paciente, mas
não enxergava aquilo que os olhos não vêem, não estão preparados, ou não querem
ver - o sofrimento interior, existencial, espiritual. Hoje, o que a incomoda e a comove
vai muito além do desconforto físico: é a falta de consolo espiritual que o profissional
de saúde não sabe e não tem preparo para oferecer e que, se prestado, supre de forma
total e completa essa necessidade única, intrínseca e primordial.

Outra razão para a realização do estudo no IIER é o reconhecimento de que


esse é um hospital onde o atendimento sob regime de internação é procurado pelo
paciente com Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), em busca de
tratamento nas fases mais agudas da doença. Muito embora a terapêutica tenha
evoluído nesse centro de referência, onde a tecnologia do cuidado em saúde mais
avançada permite oferecer o que há de melhor para o paciente, o conforto que, nessa
situação, é parte importante da assistência, não se esgota com o controle da dor física,
porque a dor espiritual se faz presente.

Também o estigma da doença traz dor, por serem, na maioria, pacientes com o
Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) positivo. Apesar de terem, por meio da
ciência, conseguido o prolongamento do tempo de vida, isso não evita a
discriminação e, por vezes, o abandono por familiares e amigos. Alguns enfrentam
dificuldades em conseguir emprego, obter recursos, buscar um sentido para suas vidas
e, ao refletir sobre o que foram e, o que vão deixar, sobrevêm a culpa e o medo, o que
se agrava se não houver alguém para com ele conversar, ouvi-lo, tratá-lo com
misericórdia, atendendo, assim, à necessidade de consolo que os medicamentos não
dão; enfim, “medicar a alma”, que pode trazer a paz verdadeira.
15
Introdução

A estruturação de um serviço que dê provimento a esse tipo de assistência


torna-se quase que obrigatória nesse contexto, e o entendimento de que a Capelania
Hospitalar Evangélica do IIER está assim posicionada, aponta a relevância de tomá-la
como objeto de estudo, até porque não há pesquisas sobre a inserção do serviço de
capelanias hospitalares no Brasil, havendo só relatos históricos sobre capelanias
militares e poucas informações registradas sobre capelanias hospitalares.

No Brasil, apenas 7,3% da população não têm religião 16. Além disso, a
influência do pensamento cristão na cultura latina, bem como a escassez de pesquisas
sobre religiosidade, espiritualidade e saúde com enfoque específico em Capelania
Hospitalar, apontam para a necessidade de investigações científicas mais profundas
nesse campo.
16
Contextualização do objeto de estudo

2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

2.1 História do Instituto de Infectologia Emilio Ribas

O Instituto de Infectologia Emilio Ribas teve papel de protagonista no


combate à AIDS, desde o início, e ainda o desempenhaé nos dias atuais. Parte de sua
história, cujo início remonta ao século XIX, se desenrola juntamente com a da AIDS.

Em outubro de 1881, o Lazareto dos Variolosos, como era chamado o IIER,


naquela época, já estava em atividade. Ele só funcionava durante o período das
epidemias, permanecendo fechado o restante do tempo. Em março de 1888, o
Lazareto da Capital transformou-se em hospital permanente de “isolamento de
contagiados”. Seis anos depois, em 1894, o “Hospital de Isolamento” permaneceu
aberto definitivamente. Nessa época, as moléstias consideradas transmissíveis e de
notificação compulsória eram: febre amarela, febre tifóide, cólera, peste, sarampo,
escarlatina, varíola, difteria e tuberculose 33.

Em 1898, Emilio Ribas foi nomeado diretor do Serviço Sanitário do Estado de


São Paulo, cargo que exerceu até 1917, falecendo em 1925, em São Paulo. Assim, em
1932, o Hospital de Isolamento da Capital, teve seu nome mudado para Hospital de
Isolamento Emilio Ribas, em homenagem ao cientista 33.

Emilio Ribas, cujo referencial estrangeiro eram os centros europeus e os


americanos do Sul e do Norte, foi um médico que se preocupou com o que havia de
mais atual na medicina sanitária e na microbiologia, e em emitir sua opinião a
respeito das polêmicas médicas, durante sua administração do Serviço Sanitário de
São Paulo, no combate da febre amarela34.

Em 1950, o hospital contava com o mesmo quadro de 1938, com três médicos,
além do diretor, e 20 cargos de enfermeiros-práticos, 12 dos quais estavam vagos por
falta de candidatos legalmente habilitados. A falta de recursos era um desafio sério
para o diretor. Nesse mesmo ano, foi aprovado o projeto para construção do novo
prédio que, em 1953, teve seu início, mas este só foi inaugurado em 1967. Durante a
década de 1960, o novo prédio foi sendo gradativamente ocupado e o atendimento foi
ampliado e melhorado33.
17
Contextualização do objeto de estudo

O Hospital de Isolamento foi pioneiro na contratação e formação de


enfermeiras na última década do século XIX. Desde o início, as enfermeiras que lá
trabalharam eram profissionais estrangeiras e laicas. Muitas das ajudantes de
enfermagem assumiram os cargos de enfermeiras depois de anos de treinamento e
prática. Nesse período, essas residiam no hospital e auxiliavam as enfermeiras33.

Em 1967, o hospital contava com apenas uma enfermeira, Dorothee Volckers


Arantes e com quatro auxiliares de enfermagem. As demais funcionárias da equipe
eram enfermeiras-práticas, sem formação acadêmica regular.

No final de 1970, depois de anos funcionando de forma emergencial,


superlotado e com demanda superior às condições consideradas adequadas por conta
da epidemia de meningite,, a instituição pode finalmente voltar à rotina. Isto implicou
em uma readequação administrativa, institucionais. Em 1978, Sebastião André de
Felicei assumiu a direção da instituição e permaneceu no cargo até 1980, quando foi
substituído por Paulo Augusto Ayrosa Galvãoii, que permaneceu no cargo até 1993,
sendo substituído interinamente por Vasco Carvalho Pedroso de Limaiii, no período
de março de 1985 a abril de 198733.

Após o aparecimento dos primeiros casos de AIDS nos EUA em 1981,


quatorze países relataram casos da doença, inclusive o Brasil, um ano depois. Em
1983, foi criado, em São Paulo, o Programa de Controle e Prevenção da AIDS do
Brasil, o primeiro da América Latina. Surgiu também, em São Paulo, o Grupo de
Apoio e Prevenção à AIDS (GAPA), primeira Organização Não-Governamental de
luta contra a AIDS35.

i
Sebastião André de Felice é graduado em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (1970),
tem especialização em Administração Hospitalar pela Faculdade de Saúde Pública da USP (1976), especialização em Alergia
Clínica pela Sociedade Brasileira de Alergia e Imunopatologia (1978), mestrado em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde
Pública da USP (1984), doutorado em Administração Hospitalar pela Faculdade de Saúde Pública da USP (1987). Plataforma
Lattes. Acesso em 28 de nov. de 2011.
ii
Paulo Augusto Ayrosa Galvão Médico foi médico infectologista, diretor do Hospital Emílio Ribas e participou da criação da
Sociedade Brasileira de Infectologia onde ocupou cargos de presidente e vice-presidente em várias gestões. , hHoje é nome de
anfiteatro na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Disponível em
<http://www.sbinfecto.org.br/anexos/Livro%2025%20anos%20SBI_cap%2001.pdf >. Acesso em 29 de nov. de 2011
iii
Vasco Carvalho Pedroso de Lima é graduado em Medicina pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
(1971), especialista em Administração Hospitalar pela Universidade de Ribeirão Preto (1984) e especialista em Medicina
Tropical pela Universidade de São Paulo (1983). Atualmente é Professor Instrutor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa
Casa de São Paulo. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Clínica Médica. Disponível em Plataforma Lattes.
Acesso em 28 de nov. de 2011
18
Contextualização do objeto de estudo

Com a mudança do governo do Estado de São Paulo, o novo Secretário da


Saúde, José Aristodemo Pinottiiv, em 1987, transferiu todas as atividades e recursos
relacionados ao controle da AIDS para o IIER, nomeando, como coordenador, seu
diretor, Paulo Augusto Ayrosa Galvão. Com essa medida, foram deslocados, para o
hospital, a normatização das ações, o atendimento ambulatorial, as atividades de
vigilância epidemiológica, a orientação à população e também a biblioteca e móveis,
assim como recursos humanos33.

A mudança de gestão aconteceu sob tensão política e em um período em que a


AIDS era uma doença nova, que atraia a atenção da mídia, de grupos sociais
organizados, de profissionais da saúde e de partidos políticos. A doença levantava
temas delicados para a sociedade como o homossexualismo e a sexualidade de uma
maneira geral, além da questão do uso de drogas. Foram anos difíceis da história da
AIDS no país33.

No final da década de 1980, uma equipe de saúde mental foi criada no IIER
com a função de diminuir o sofrimento psíquico causado pela doença. Em março de
1988, o IIER contratou sua primeira psicóloga - Heloisa Helena de Araujo Camposv,
que relatou: “no início desse atendimento, os pacientes com AIDS apresentavam
alterações neuropsiquiátricas, com confusão mental, alterações de comportamento, de
humor, hostilidade, agressividade, apatia e depressão”33.

Nesse mesmo ano, houve a criação do primeiro Centro de Orientação e Apoio


Sorológico (COAS) e a fundação do Centro de Referência e Treinamento em AIDS
na capital de São Paulo. Na época, o total de casos de pessoas com AIDS no Brasil
era de 4.53535.

Em 25 de junho de 1991, o hospital passou a denominar-se Instituto de


Infectologia Emilio Ribas (IIER), integrando, ao seu nome, a nova denominação da

iv
José Aristodemo Pinotti foi Secretário da Saúde do Estado de São Paulo,e Secretário da Educação do município de São Paulo.
Era graduado em Medicina pela Universidade de São Paulo (1958) e, especialista em Ginecologia pela Università Di Firenze
(1965). Plataforma Lattes. Acesso em 28 de Nov de 2011.

v
Heloisa Helena de Araujo Campos é graduada em Psicologia pelas Faculdades Metropolitanas Unidas (1984) e especialista em
Magistério do Ensino Superior pela Universidade Paulista (1995). Mestre em Psicologia, Especialista em Psicologia Clínica
Hospitalar e Saúde Pública. Membro Colaborador e Pesquisadora da Organização Mundial de Saúde. Docente e Supervisora do
Programa de Aprimoramento em Psicologia Hospitalar. Docente do curso de pós-graduação e Especialização em Psicologia
Hospitalar da USP, PUC e Universidade São Marcos. Atualmente é Psicóloga do Instituto de Infectologia Emilio
Ribas.Plataforma Lattes. Acesso em 28 de nov. de 2011
19
Contextualização do objeto de estudo

especialidade – infectologia – e se tornando subordinado à Coordenação dos


Institutos de Pesquisa da Secretaria da Saúde33.

Nessa época, foi realizado o I Encontro Nacional de Pessoas Vivendo com


AIDS e o “Lacinho Vermelho” tornou-se símbolo mundial da luta contra AIDS. O
total de casos diagnosticados no Brasil aumentou, passando para 11.80535.

Depois da gestão de Paulo Ayrosa Galvão, no IIER, em 1993, assumiu George


Schultevi, que o gerenciou até o início de 1995. Ele criou o Programa de Treinamento
para Profissionais Multiplicadores, que se tornou modelo, a pedido da Coordenadoria
de DST/AIDS do Ministério da Saúde33.

Guido Levivii, o diretor seguinte, implantou o Centro de Estudos Emilio Ribas


- uma associação sem fins lucrativos que se tornou importante iniciativa para a
captação direta de recursos, com autonomia administrativa da Secretaria da Saúde,
objetivando rapidez na pesquisa e aperfeiçoamento científico dos profissionais33.

O IIER mantém um serviço de cuidados paliativos para pacientes com AIDS


desde 1998, quando uma equipe interdisciplinar foi implantada, reunindo assistentes
sociais, capelães, enfermeiros, fisioterapeutas, médicos, nutricionistas, psicólogos e
terapeutas ocupacionais. A equipe de cuidados paliativos foi a primeira dedicada aos
pacientes com AIDS, na América Latina33. Além das atividades assistenciais, a
equipe interdisciplinar dedica-se às atividades de ensino e pesquisa, sendo
reconhecida pelo Ministério da Saúde, desde 2002, como Centro de Referência em
Cuidados Paliativos35.

vi
George Schulte é graduado em Medicina pela Santa Casa de São Paulo (1968), especialista em Neurocirurgia pela Sociedade
Brasileira de Neurocirurgia e Associação Médica Brasileira (1976), especialista em Infectologia pela Sociedade Brasileira de
Infectologia e Associação Médica Brasileira (1994). Atualmente é mMédico do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.
Plataforma Lattes. Acesso em 28 de Nov de 2011.

vii
Guido Levi foi diretor do IIER é Chefe da Seção de Diagnóstico e Terapêutica do Serviço de Moléstias Infecciosas do Hospital
do Servidor Público do Estado de São Paulo, além de membromembro do Comitê Assessor para Terapia Anti-Retroviral em
Adultos e Adolescentes Infectados pelo HIV. Disponível em
http://www.praticahospitalar.com.br/pratica%2032/paginas/materia%2016-32.html. Acesso em 28 de Nov. de 2011.
20
Contextualização do objeto de estudo

2.2 Situação da Saúde – AIDS: dos anos 1990 ao início do novo milênio

A história da humanidade registra inúmeros eventos catastróficos que, na área


da saúde, englobam a peste negra, que assolou a Europa na Idade Média (matou 45
milhões de pessoas), a gripe espanhola do começo do século XX (matou 21 milhões
de pessoas) e o câncer dos dias atuais, mas nenhuma dessas doenças teve
conseqüências tão devastadoras, social, econômica e politicamente como a AIDS que,
em menos de 20 anos, foi responsável por cerca de 19 milhões de óbitos no mundo
inteiro. Somam-se a esses os quase 34 milhões de portadores vivos do vírus da AIDS
no mundo. Acredita-se que grande parte desse número não sobreviverá, pois vivem
em países sem estrutura suficiente de saúde e economicamente não conseguem prover
tratamento; sendo assim, a soma desses dois números totalizaria 53 milhões de
óbitos36.

A AIDS surgiu no cenário mundial como agravo à saúde, no início dos anos
1980 (embora já viesse ceifando vidas em algumas regiões do continente africano,
desde pelo menos quase duas décadas antes), e trouxe algumas questões que vão
desde o desconhecimento médico sobre os meios de combater a doença, até o
despreparo da rede prestadora de serviços de saúde37.

No início da década de 1980, época da emergência da AIDS no mundo e


também no Brasil, vivia-se, um momento político de transição: a época da abertura
democrática pós- - ditadura. A ocorrência de eleições para governadores, em 1982,
mobilizou a sociedade, que participou em massa, em 1984, do movimento “Diretas
Já”, para eleição presidencial. A instalação da chamada “Nova República”, em 1985,
também contou com grande movimentação popular 37.

Em meados de 1981, a AIDS foi reconhecida nos Estados Unidos como uma
nova doença humana, identificada em um grupo de pacientes adultos do sexo
masculino, homossexual, residente nas cidades de San Francisco e New York35.

Com o surgimento dos primeiros casos de AIDS no Brasil, o Hospital Emilio


Ribas ocupou papel central no enfrentamento da nova doença, formando profissionais
e estabelecendo condutas de trabalho que logo se tornaram referência. O primeiro
paciente com AIDS identificado em São Paulo em junho de 1982, foi internado no
21
Contextualização do objeto de estudo

Emilio Ribas. O conhecimento sobre a doença era recente e eram desconhecidos o


agente etiológico e as formas de transmissão, além de não existirem testes
diagnósticos e tratamento eficaz33.

Mais tarde, começou a se pensar que se tratava de uma doença própria de


homossexuais e só muito tempo depois se chegou à conclusão que a realidade da
AIDS poderia afetar a todos, independente da orientação sexual. Dessa forma, o
desenvolvimento obscuro da doença começou a trazer medo e a conduzir a situações
de discriminação38.

A primeira fase da doença se deu entre 1980 e 1986. A transmissão ocorria


entre homens homossexuais e bissexuais, de escolaridade elevada. Nessa época, 90%
dos pacientes diagnosticados no Estado de São Paulo (predominantemente na cidade
de São Paulo) foram atendidos no IIER. Em 1984, quando milhares de americanos já
haviam contraído a doença, foi finalmente identificado o agente etiológico da AIDS35.

Em 1986, foi aprovado, pelo órgão norte- americano de controle sobre


produtos farmacêuticos (Food and Drug Administration), a primeira droga anti-
retroviral, o AZT (azitromicina), com pequeno impacto sobre a mortalidade geral dos
pacientes doentes35.

Kubler-Ross, médica americana estudiosa desta doença, constatou e


denunciou a maneira desumana como os primeiros doentes tiveram que enfrentá-la.
Em seu livro “Aids: The Ultimate Challenge”, publicado em 1987, descreveu
situações de bebês órfãos contaminados pelo vírus e abandonados em hospitais, e
prisioneiros que não recebiam cuidados de saúde adequados nos Estados Unidos.
Relatou ainda que “as pessoas com diagnóstico definitivo que apresentavam os sinais
de baixa imunidade eram rejeitadas e perdiam suas relações sociais, ficando na
dependência da bondade de alguém que não sentisse repulsa ou constrangimento em
atender às suas necessidades38”.

Os primeiros casos de AIDS em crianças e mulheres foram identificados em


1983 nos Estados Unidos e, somente em 1987, foram descritos no Brasil (São Paulo).
A segunda fase da doença AIDS durou de 1987 a 1991. A transmissão sanguínea,
especialmente entre os usuários de drogas, começava a aumentar. A pandemia
começava a mudar, atingindo o interior do Brasil, acometendo também pessoas com
baixa escolaridade e de pequenas e médias cidades do interior e litoral35.
22
Contextualização do objeto de estudo

Em 1987, em decorrência do Movimento da Reforma Sanitária, num contexto


nacional de crise econômica, crise do padrão de intervenção assistencial vigente e de
redemocratização política, a reorganização do setor saúde culminou com a criação do
Sistema Único Descentralizado de Saúde (SUDS), como passo necessário à
viabilização do Sistema Único de Saúde (SUS), implantado depois37.

No ano seguinte, 1988, foi instituído, pelo Programa Conjunto das Nações
Unidas para a AIDS, o dia 1º de dezembro, como o Dia Mundial de Luta contra a
AIDS35.

A Secretaria do Estado da Saúde de São Paulo - SESSP manteve como sua


atribuição, obedecendo a dispositivos legais federais, a responsabilidade pelas
vigilâncias epidemiológica e sanitária, operacionalizadas pelas várias instâncias do
SUDS. As questões de saúde passaram a ser, legitimamente, do Estado, a partir da
promulgação da nova Constituição Nacional 37, em 1988, que afirmava textualmente
que “a saúde é um direito de todos e um dever do Estado”.

O relacionamento da SESSP - Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo


com o Ministério da Previdência Social não pode avançar na realização de um
trabalho em conjunto devido à grande resistência do INAMPS em ter uma tabela de
pagamento que incluísse a AIDS, que era a principal reivindicação dos hospitais com
esse órgão conveniado37.

Em 1988, em função da enorme carência de leitos para AIDS e após um


episódio da morte de um doente no pátio do IIER, sob a filmagem da televisão, o
secretário da saúde efetivou a definição e quantificação de vagas em todos os
hospitais próprios da SESSP e criou a Central de Vagas de AIDS (C.V.A.), que
começou a operar em vinte e sete de julho de 198837,35.

O número de casos de AIDS crescia rapidamente e havia uma recusa geral de


hospitais e médicos do atendimento aos doentes, o que levou o Conselho Regional de
Medicina de São Paulo (CREMESP) a divulgar, em 1988, um parecer pioneiro sobre
o assunto. O parecer “AIDS e Ética Médica” retomava questões ligadas ao Código de
Ética e fixava condutas, no caso de atendimento de pacientes com AIDS33.

O terceiro Coordenador do Programa de Controle da AIDS da SESSP


desenvolveu uma nova abordagem do controle da hemoterapia e Bancos de Sangue.
23
Contextualização do objeto de estudo

Montou-se um Grupo Especial de Programação (GEPRO) de AIDS de sangue, que


incorporou pessoal de vários hemocentros, de São Paulo e do interior, incluindo
recursos humanos da área da AIDS. Esse grupo normatizou e regularizou os
procedimentos usuais no campo da hemoterapia e incorporou-se à estrutura da
SESSP, com respaldo legal37.

Em 1988, foi criado o Centro de Referencia e Treinamento em AIDS - CRTA,


quando houve o treinamento de pessoal da rede, em larga escala, capacitando, ainda,
muitos profissionais de saúde de outras instituições, além de outros como educadores,
religiosos e líderes comunitários35,37.

Em novembro de 1989, um decreto do governador criou o Conselho Estadual


para assuntos de AIDS, com 25 membros, representantes de várias Secretarias
Estaduais, entre elas a da Saúde, e da sociedade civil, visando à integração do
trabalho em todos os níveis da administração pública com a sociedade37.

A notificação dos casos aumentou cerca de 30 a 40%, depois que começou a


distribuição do AZT pela SESSP, bem como a demanda aos serviços públicos, pois o
doente que fazia tratamento particular foi encaminhado para receber o AZT e este
tinha que estar matriculado nesses serviços. Em 1989, o AZT (zidovudina) era
distribuído pelas Secretarias Estaduais de Saúde e serviços conveniados, e era
comprado pelo Ministério da Saúde, único importador nacional autorizado da
droga35,37.

A década de 1990 começou com otimismo e esperança, no mundo, após o


colapso do comunismo e o fim da Guerra Fria e, apesar da prosperidade e
democracia, a situação da AIDS no mundo era bastante caótica. Estimava-se, à época,
existir um1 milhão de pessoas contaminadas pelo HIV, diminuindo a expectativa de
vida e afetando o crescimento econômico. Além disso, foi uma década de grandes
conquistas no combate à AIDS, depois do emprego do segundo anti-retroviral, a
Didanosina, o aparecimento do terceiro anti-retroviral – Zalcitabina e posteriormente
o coquetel - esquema triplo de anti-retrovirais35.

Em março de 1991, indicado pelo governador recém eleitorecém-eleito, Luis


Antonio Fleury Filho viii, tomou posse o novo Secretário de Saúde, Adib Domingos

viii
Luiz Antonio Fleury Filho, nascido em São José do Rio Preto e criado em Porto Feliz, tornou-se conhecido na capital como
membro do Ministério Público e professor de Direito. Foi chamado, em março de 1987, para assumir a Secretaria da Segurança
24
Contextualização do objeto de estudo

Jateneix, o quarto desde o aparecimento da AIDS como problema de saúde pública no


Estado de São Paulo. Nessa época, a situação era dea falta geral de recursos para
atender às demandas, que piorava gradativamente37.

Nesse período, houve uma resolução do secretário que provocaram o


aumento do número de leitos hospitalares para os doentes de AIDS, tanto na rede
pública como privada, com o estabelecimento de pagamento de um adicional, com
recursos próprios do Estado, à rede hospitalar privada conveniada com o INAMPS37.

Nos anos de 1988 e 1989 contou-se com maior aporte de recursos para as
atividades de controle da AIDS, mas, em meados de 1992, já havia carência de
recursos materiais e humanos porque a quantidade de doentes e as necessidades eram
maiores do que no início da epidemia. Conhecia-se mais a AIDS e, por isso, eram
realizados mais exames auxiliares e esforços terapêuticos; dessa forma, o custo ficava
maior37.

A terceira e última fase da história da doença AIDS vai de 1992 até a primeira
década do século XXI. Ocorreu, nesse período, considerável aumento no número de
casos por exposição heterossexual e a diferença de proporção de casos entre o sexo
masculino e feminino passou a se igualar (feminização da epidemia). A partir de
então, a transmissão por transfusão sanguínea passou a ser controlada35.

Em 1992, na edição especial do PRO-AIM – (Programa de Aprimoramento


das Informações de Mortalidade no Município de São Paulo) a AIDS apareceu em 4º
lugar, suplantando acidentes de trânsito e infarto do miocárdio37.

Pública e daí saiu diretamente para o Governo de São Paulo, eleito pelos votos de 7.480.703 paulistas. Disponível em <
www.fleuryfilho.com.br/este.htm>. Acesso em 28 de nov. de 2011.

ix
Adib Domingos Jatene nasceu a 4 de junho de 1929 em Xapuri, no Acre. Foi graduado em medicina aos 23 anos pela
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Toda a sua pós-graduação foi feita no Brasil, no Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da USP, sob a orientação do Prof. E. J. Zerbini. Com seu pioneirismo, iniciou a cirurgia torácica e
construiu seu primeiro modelo de coração-pulmão artificial. Em 1958, trabalhou como superintendente do Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina da USP e no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia da Secretaria de Estado da Saúde, onde atuava
como cirurgião. Nessa época, organizou um laboratório experimental e de pesquisa, onde desenvolveu e construiu o primeiro
aparelho coração-pulmão artificial do Hospital das Clínicas e que evoluiu para um grande Departamento de Bioengenharia. Tem
também importantes contribuições no campo da cirurgia de revascularização do miocárdio e da cirurgia de cardiopatias
congênitas. Ainda descreveu a técnica de correção de transposição dos grandes vasos da base, conhecida hoje como Operação de
Jatene, a qual tem sido empregada, com sucesso, em vários Serviços de Cirurgia Cardíaca em todo o mundo. Jatene hoje é
membro de 32 Sociedades Científicas de várias regiões do mundo e recebeu 178 títulos e honrarias. Em 1998 foi admitido na
Ordem Nacional do Mérito Científico, na classe Grã-Cruz, tendo seu mérito reconhecido. Foi secretário da Saúde de São Paulo e
Ministro da Saúde. Disponível em <www.nossosaopaulo.com.br/Reg_SP/Barra_Escolha/B_AdibJatene.htm>. Acesso em 28 de
nov. de 2011.
25
Contextualização do objeto de estudo

A partir de 1994, a descoberta de novas drogas anti-retroviraisantirretrovirais,


a padronização de condutas e o importante avanço nos cuidados com adultos e
crianças infectadas pelo HIV levaram a mudanças radicais na progressão clínica da
doença, resultando em menor morbidade e mortalidade. Para atender às necessidades
de natureza estrutural e social que envolve a assistência à AIDS, foram criadas Casas
de Apoio, Centros de Referência, Ambulatórios e Hospitais Dia35.

Em 1996, ficou garantido, no âmbito do SUS, acesso e gratuidade ao


tratamento com anti-retrovirais a todas as pessoas que vivessem com HIV e AIDS,
dentro dos parâmetros técnicos e científicos estabelecidos pelo Ministério da Saúde.
Além disso, foi publicado o primeiro consenso em terapia anti-retroviral e criada a
Rede Nacional de Laboratórios para a realização de exames de carga viral e contagem
de células CD435.

Na primeira década do século XXI surgiram novas tecnologias, e o avanço do


conhecimento científico contribuiu para a diminuição da incidência da AIDS e
redução da mortalidade35. Assim, melhorou o coeficiente de mortalidade por AIDS,
que apresentou tendência à diminuição, desde 1997 até 2004, ano em que o
coeficiente se estabilizou39. Em 2009, o coeficiente de mortalidade por AIDS foi de
6,2 óbitos por 100.000 habitantes40.

Assim, melhorou o coeficiente de mortalidade por AIDS, que apresentou tendência à


diminuição, desde 1997 até 2004, ano em que o coeficiente se estabilizou 39. Em 2009,
o coeficiente de mortalidade por AIDS foi de 6,2 óbitos por 100.000 habitantes40.

Esse desenvolvimento da doença apontou três fases muito bem delimitadas, e


atualmente está em curso a terceira fase, em uma situação relativamente estável.
Independente disso, a AIDS continua sendo uma doença que tem conotações sociais e
implicações religiosas, porque, a despeito de não ser mais uma sentença imediata de
morte, ela contem em si todos os atributos relacionados às doenças crônicas e as
implicações de cuidado com a espiritualidade, que podem ser atendidas pelas
religiões.
26
Contextualização do objeto de estudo

2.3 Breve Histórico das Religiões no Brasil e sua interface com a Saúde

O fenômeno religioso é universal. A experiência e a expressão religiosa estão


presentes e marcam profundamente toda a vida cultural humana. Em todas as partes,
os seres humanos adoram divindades; as liturgias de adoração emanam de fontes
espirituais e psicológicas da sua existência. Ser religioso é inerente à condição
humana6.

A experiência religiosa é única, diferente das vivências do dia a dia, afeta as


percepções centrais sobre si próprio e sobre a vida e pode mudar as noções sobre
quem você é e o sentido ou significado da sua vida. A experiência religiosa é
complexa do ponto de vista psicológico, envolvendo emoções, crenças, atitudes,
valores, comportamentos e ambiente social. Ela transcende essas categorias
psicológicas e dá, ao indivíduo, um sentido de integridade41.

Santos42 faz uma comparação entre o espelho e a sociedade dizendo “a


ciência, o direito à educação, à informação, à religião e à tradição estão entre os mais
importantes espelhos da sociedade. O que eles refletem é o que as sociedades são”.

Já Borenstein, Padilha43 e Pizani44 descrevem a influência da religião nos


hospitais, instituiçõescom “campo fértil para difundir os ideais cristãos, e, [ao mesmo
tempo], uma forma eficiente para alcançar esta meta deera manter o controle tanto
dos assistidos quanto dos trabalhadores”.

No Brasil há liberdade religiosa, várias religiões são professadas e garantidas


pela constituição;, dessta forma, é importante entender um pouco de cada uma delas e
sua interface com a saúde.

Assim, para melhor entendimento e apresentação das diversas religiões e sua


influencia na saúde, utilizou-se a classificação das religiões estabelecida por Levin e
Vanderpool45 denominada de Alston, que dividem as religiões em: sacramentais,
proféticas e místicas.

As religiões sacramentais focalizam o sagrado, expresso ou simbolizado


através de coisas naturais (objetos, lugares, personagens, comida, bebida) e das ações
27
Contextualização do objeto de estudo

e comportamentos humanos. Na vida diária, aquilo que é sagrado, profano e proibido


é expresso pelos tabus e regras (Catolicismo tradicional, Ortodoxo Grego e Russo)41.

Nas proféticas, o sagrado está localizado na expressão verbal humana (A


Palavra Sagrada). As ações, características e ensinamentos de pessoas inspiradas são
capturados em textos sagrados e a resposta esperada é a aceitação (fé e confissão) e a
obediência. Os rituais são centrados no recitar, refletir e no celebrar o significado da
palavra (Judaísmo, Islamismo, Mormonismo, Luteranismo, Calvinismo e
Metodismo)41.

Nas religiões místicas, os exercícios contemplativos com o objetivo de


conseguir a união e identificação com o divino são mais importantes que a doutrina, o
cristicismo ético e os ritos sociais (Religiões orientais)41.

O Brasil tem uma raiz colonizadora religiosa que marcou profundamente a


organização do Estado e, em particular, a organização da assistência à saúde, seja
controlando o ensino, seja exercendo uma função caritativa, mantendo a maioria dos
hospitais sob sua responsabilidade administrativa, principalmente os destinados aos
socialmente excluídos42.

Dessa forma e por ser relevante, entende-se que um breve histórico das
religiões mais freqüentemente praticadas no Brasil será importante para
contextualizar o objeto de estudo da presente pesquisa.

2.3.1 Religiões Sacramentais

Hoje há três ramos principais na Igreja, cada um concentrado em uma área


geográfica diferente. Primeiro a Igreja Católica Romana, que é majoritária no Sul da
Europa e na América Latina, e tem minorias nos Estados Unidos e na África; em
seguida vem a Igreja Ortodoxa, centrada na Grécia e na Europa Oriental e, por fim, as
igrejas protestantes, localizadas sobretudo no Norte da Europa, nos Estados Unidos e
na Austrália46.

A Igreja Católica Romana é a maior de todas as igrejas. Existem cerca de um1


bilhão de cristãos no mundo. Aproximadamente metade deles pertence ao
28
Contextualização do objeto de estudo

catolicismo. Uma das organizações mais fortes e mais rigidamente estruturadas, a


Igreja Católica Romana é governada por leis estabelecidas com precisão. Sua
hierarquia, composta pelo papa, cardeais, bispos e padres, possui grande autoridade
sobre a camada inferior, os leigos46.

A posição proeminente do papa como líder de todos os fiéis se baseia no fato


de que ele é o sucessor do apóstolo Pedro. Em 1870, foi proclamado o dogma da
infalibilidade do papa em questão de fé. Isto não significa que o papa esteja isento de
pecado; ele também deve se confessar regularmente 46. O papa também é chamado de
“doutor supremo de todos os fiéis”, “vigário de Cristo”, “sumo - pontífice e “santo
padre” pelos católicos47 e continua sendo o chefe de um pequeno Estado, o Vaticano,
que tem sua própria moeda, política, estação de rádio, seu próprio correio e corpo
diplomático46.

Existem três grandes autoridades para o ensino da religião católica: a tradição


da igreja, o magistério e as Escrituras Sagradas. Porém, a interpretação dos
magistrados é superior às Escrituras Sagradas. Além desse tripé, a Igreja Católica
possui os livros apócrifosx em sua Bíblia. Estes estão inseridos no Velho Testamento
e são eles: Tobias, Judite, Sabedoria, Eclesiástico, Baruque, 1ª e 2ª de Macabeus, seis
capítulos e dez versículos acrescentados no livro de Ester e dois capítulos de Daniel.
Foi no Concílio de Trento, em 15 de abril de 1546, em sua quarta sessão, que a Igreja
Católica declarou esses livros sagrados. Esses livros não estão no cânon hebraicoxi.
Essa palavra, com o tempo, passou a classificar os livros que são considerados
genuínos e inspirados por Deus; sendo assim, são considerados os livros apócrifos
como não inspirados por Deus47.

Os padres têm autorização especial para pregar a Palavra de Deus e


administrar os sacramentos (considerados manifestações visíveis da graça de Deus).
Elstes devem dedicar sua vida a Deus, à Igreja e à humanidade;. Ppor essa razão, não
podem se casar e constituir família. As mulheres não podem exercer o sacerdócio na
Igreja Católica46.

A Igreja Católica mantém uma série de doutrinas importantes. Das escrituras


fundamentais, as principais são a Bíblia e os três Credos antigos. Os padres da Igreja

x
apócrifos - do grego -apokrupha - coisas ocultas99
xi cânon hebraico - significa “cana” ou “vara de medir”99
29
Contextualização do objeto de estudo

Católica ministram sete sacramentos: o Batismo necessário para a Salvação, pois sem
ele a pessoa está condenada ao inferno; o Crisma, ato de aprofundamento em Cristo,
para todos aqueles que foram batizados; e a Eucaristia, que é a hóstia, crendo que há
uma transubstanciação (alteração da substância), com o objetivo de receberem a
remissão de seus pecados; a Penitência – confissão de pecados e absolvição, que é
dada por Deus e transmitida pelo padre; a Unção dos Enfermos – o padre unge a
pessoa doente na testa e nas mãos para dar força espiritual e consolo durante a
enfermidade, crêem também que este ritual diminui a quantidade de pecados da
pessoa; Santas Ordens - ordenação dos padres e o ato de conferir graça especial e
poder espiritual aos padres, bispos, arcebispos, cardeais e papas; e o Matrimônio –
votos mútuos que fazem os noivos, na presença de um sacerdote e de testemunhas46,
crendo que, quando os sacerdotes realizam seus casamentos, a graça de Deus vem
através dos mesmos47.

Para a Igreja Católica, a Salvação é adquirida de três formas básicas: pela


graça de Deus, pela fé e obras, e pela igreja e seus sacramentos 47.

Descoberto em 1500, conquistado e colonizado pelos portugueses, ao mesmo


tempo em que era catequizado pelos padres jesuítas, o Brasil foi um país oficialmente
católico por quase quatro séculos46.

No período colonial, a Igreja dependia mais do Estado português, que do


papado. O Estado impunha sua orientação à Igreja, totalmente subordinada. Todas as
diretrizes e instruções emanadas do Vaticano chegavam ao Brasil por meio da
administração portuguesa. O catolicismo tornou-se a religião oficial do estado
brasileiro, quando a Coroa portuguesa passou para o imperador Dom Pedro I, em
1822, e só deixou de ser a religião oficial do estado brasileiro no final do século XIX,
quando a monarquia foi substituída pelo regime republicano. Assim, a República,
proclamada em 1889, separou juridicamente a Igreja Católica do Estado nacional, e
este foi, desde então, declarado laico, isto é, religiosamente neutro e isento46.

A liberdade religiosa fez parte da Constituição de 1891, implantando o


respeito a todas as formas de expressão religiosa, a chamada a liberdade de
consciência. Mais de cem anos depois da separação entre o Estado brasileiro e a
Igreja Católica, o Brasil começou a ver os efeitos que a liberdade de expressão
religiosa trouxe para o campo da religiosidade, quando as diferentes religiões se põem
30
Contextualização do objeto de estudo

em livre concorrência, mas o catolicismo continua sendo a religião predominante,


amplamente majoritária e culturalmente hegemônica. Em pesquisas nacionais
realizadas em 2006 e 2007, os católicos eram 64% da população, os evangélicos
pentecostais somavam 17% e os não pentecostais 5%. Espíritas Kardecistas ou
espiritualistas eram 3% e umbandistas 1%. Adeptos do candomblé e de outras
religiões afro-brasileiras não chegavam a 1%, e outras religiões atingiam 3%. Diziam
não ter religião ou ser ateu 7% da população48.

Os católicos romanos acreditam que Cristo é filho de Deus, que nasceu da


Virgem Maria, morreu na cruz e ressuscitou dos mortos. Jesus é a segunda pessoa da
Trindade. A trindade é: Pai, Filho e Espírito Santo. Os católicos observam os dez
mandamentos, vão à igreja para a missa aos domingos, quando recebem a Eucaristia,
devem receber o sacramento da reconciliação pelo menos uma vez ao ano e
contribuem com o sustento da igreja49.

Os católicos crêem que Maria nasceu sem pecado e atribuem, assim, à Maria,
um atributo divino - a impecabilidade. Crêem que no terceiro dia depois da morte de
Maria, quando os apóstolos se reuniram ao redor de sua sepultura, eles a encontraram
vazia pois o. O sagrado corpo fora levado para o paraíso celestial. O próprio Jesus
veio para levá-la até a corte dos céus, para ser recebida, com hinos de triunfo, como a
mãe do divino Senhor47.

A doutrina do Purgatório teve seu início no Concílio de Florença (1439). Lá


foi estabelecida a diferença entre o pecado cometido e a tendência inata para o
pecado, chegando-se à conclusão que o perdão (conseguido através da confissão ao
sacerdote, no sacramento da confissão) acaba com o pecado, mas não acaba com a má
tendência. Há, portanto, a necessidade do purgatório, um lugar intermediário entre o
céu e a terra, onde os fiéis que ainda tenham alguma dívida e a má tendência para o
pecado irão sofrer, até a purificação completa47.

Quando uma pessoa corre risco de morrer, um pregador, ministro, capelão ou


qualquer cristão que esteja disponível, deve fazer o batismo e, no caso de uma
criança, isso deve ser feito com o consentimento dos pais. Entretanto, no caso de uma
pessoa ortodoxa, somente um pastor/padre, pode efetuar o batismo. Se um
pastor/padre ortodoxo não está disponível e um batismo acontece, o pastor/padre deve
ser comunicado após o batismo49.
31
Contextualização do objeto de estudo

No catolicismo tradicional dos séculos passados, os ritos fúnebres de


passagem continham certos elementos de ameaça, pois, apesar da certeza de ser
ressuscitado por Deus, sempre estava presente a culpabilidade humana, com
possibilidade de ressurreição para a condenação, ou seja, para o inferno. A
religiosidade do passado era muito marcada pelo medo de tal destino. A consequência
desses pressupostos teológicos se refletia nos ritos funerários, com preces e pedidos
de perdão pelas culpas e súplicas pela misericórdia de Deus. Mas houve uma
mudança profunda a partir da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II publicado em
1969 em Roma e ligeiramente modificado em 1971 no Brasil, que, como
conseqüência, mudou o nome dos respectivos rituais litúrgicos. A Pastoral dos
moribundos e da morte chegou a ser chamada “Pastoral da Esperança”; a “Extrema
Unção” se chama hoje “Unção dos Enfermos”; e a celebração fúnebre está
começando a ser chamada “A Celebração da Páscoa da Pessoa que Morreu”50.

A Igreja Católica Romana também é contrária à eutanásia e à distanásia xii, não


interferindo no uso de aparelhos respiratórios, máquinas ou medicamentos, mas a
doação de órgãos é uma prática aceitável49.

A igreja ortodoxa também é contra a eutanásiaxiii mas é a favor do uso de


medicamentos que reduzam a dor e o sofrimento. Quando o paciente está morrendo, é
preparado espiritualmente através da confissão e ceia. A família é encorajada a
permanecer ao lado da cama e também amigos próximos. Também se pode convidar
o padre para estar presente e, então, se faz uma oração para que Deus permita que seu
servo vá embora. O padre faz a Extrema Unção usando óleo abençoado. O corpo deve
ser enterrado no solo. Isso inclui um caixão e uma lápide que tenha a imagem de uma
cruz. De acordo com a fé ortodoxa, o corpo é parte fundamental do ser humano, é
templo do Espírito Santo e se espera a ressurreição do morto, não sendo permitidao,
portanto, a cremação. Para os católicos romanos é permitida a cremação e os restos
cremados devem ser trazidos na missa de funeral 49.

xii
Distanásia é um neologismo de origem grega, em que o prefixo grego dys tem o significado de “ato defeituoso”, e “thanatos”
significa morte; portanto, a distanásia significa o prolongamento artificial e sofrido do processo de morrer. O termo também
pode ser empregado como sinônimo de tratamento inútil. Trata-se da intervenção médica que não atinge o objetivo de beneficiar
a pessoa na fase final de vida e que prolonga inútil e sofridamente o processo do morrer, procurando postergar a morte 74.
xiii
Eutanásia - é palavra de origem grega e, significa boa morte (e=boa e tanathos=morte). Eutanásia significa terminar
deliberadamente a vida de alguém que sofre demais ou está condenado a uma morte lenta. ÉÉ a morte piedosa ou suicídio
assistido, verdadeira abreviação da vida83.
32
Contextualização do objeto de estudo

A Igreja Católica Romana também é contrária à eutanásia e à distanásiaxiv, não


interferindo no uso de aparelhos respiratórios, máquinas ou medicamentos. A doação
de órgãos é uma prática aceitável49.

No mundo europeu, fala-se de “obstinação terapêutica”, nos EUA, de


“futilidade médica (medical futility)”. Existem muitos bioeticistas, entre os quais o
espanhol Xavier Gafo que utilizam o termo ortotanásia, para falar da “morte no seu
tempo certo em contraposição à eutanásia”51.

Outro dado relevante é que Católicos Romanos não podem se alimentar de


carne na quarta-feira de Cinzas, sexta de Páscoa e uma hora antes de receber a
Eucaristia. Entretanto, as regras não são tão rígidas, quando se está doente49.

2.3.2 Religiões Proféticas

2.3.2.1 Judaísmo

O termo judaísmo deriva da palavra Judá; e então, os termos judeu e israelita


tornaram-se intercambiáveis. O judaísmo é o berço das mais importantes tradições
religiosas: Cristianismo e Islamismo. Cinco profetas têm importância fundamental:
Abraão, que obedeceu à ordem de deixar tudo e partir para a Terra Prometida,
tornando-se assim Pai do Povo Escolhido: os patriarcas Isaac e Jacó (este pai das 12
tribos de Israel); Moisés, instrumento de aliança feita no Monte Sinai, que introduziu
a lei; e Davi52.

Durante milhares de anos, os judeus esperaram um messias que viria criar um


reino de paz na Terra. As raízes históricas dessa expectativa datam da idade de ouro
de Israel, no reino de Davi, quando os reis eram ungidos ao subir ao trono. A palavra
Messias significa “o ungido”. Desde a época do exilio babilônico, os judeus
alimentam a esperança e a crença de que chegará um Messias, um novo rei saído da

Distanásia é um neologismo de origem grega, em que o prefixo grego dys tem o significado de “ato defeituoso”, e “thanatos”
xiv

significa morte; portanto, a distanásia significa o prolongamento artificial e sofrido do processo de morrer. O termo também
pode ser empregado como sinônimo de tratamento inútil. Trata-se da intervenção médica que não atinge o objetivo de beneficiar
a pessoa na fase final de vida e que prolonga inútil e sofridamente o processo do morrer, procurando postergar a morte 74.
33
Contextualização do objeto de estudo

linhagem de Davi. Esse rei ideal irá restabelecer Israel como uma grande potência, e
seu povo passará a viver em eterna felicidade49.

Desde o começo, o judaísmo foi uma religião revelada e não uma religião
natural ou filosófica. O monoteísmo é o conceito central do judaísmo e, para estes,
não há Deus fora de Yahweh. Sendo a pureza do monoteísmo judaico um selo de
autenticidade de fé, o judaísmo se recusa a adorar a Jesus, não somente devido ao seu
repúdio à doutrina da encarnação, mas também devido à sua resistência desafiadora a
toda e qualquer tentativa de atribuir qualidades e honras divinas a meros mortais52.

Na Torá encontram-se leis, rituais, regras de higiene e leis morais; para os


judeus, as leis fazem parte de uma revelação de aliança com Deus. Como seu povo foi
o escolhido, eles devem observá-las integralmente49,52.

Os Dez Mandamentosxv constituem as leis fundamentais dos judeus, embora


elas sejam muitas vezes vistas como princípios universais destinados a criar e manter
uma sociedade civilizada52.

No Judaísmo Ortodoxoxvi, as mulheres não podem ser rabinas ou cantoras, e


os homens e mulheres não sentam juntos na sinagoga49.

A Cabala é o nome dado ao conhecimento judaico místico, originalmente


transmitido de forma oral. As pessoas andam à procura da perfeição, da santidade e
da autopurificação, como maneiras de chegarem à presença de Deus e o. O
instrumento usado para isso é a Cabala que, naturalmente, incorpora muitas idéias
pagãs no campo dos conceitos, como a adivinhação. A Cabala é usada como a Bíblia
do misticismo52.

xv
Dez Mandamentos é o nome dado ao conjunto de leis que, segundo a Bíblia, teriam sido originalmente escritos por Deus em
tábuas de pedra e entregues ao profeta Moisés (as Tábuas da Lei). As tábuas de pedra originais foram quebradas, de modo que,
segundo Êxodo 34:1, Deus teve de escrever outras. Biblia Êxodo 20:2-17 e Deuteronômio 5:6-21.

xvi
Judaísmo Ortodoxo O Judaísmo é uma crença monoteísta que se apóia em três pilares: na Torá, nas Boas Ações e na
Adoração. Por ser uma religião que supervaloriza a moralidade, grande parte de seus preceitos baseia-se na recomendação de
costumes e comportamentos "retos". O Deus apresentado pelo Judaísmo é uma entidade viva, vibrante, transcendente, onipotente
e justa. Entre os homens, por sua vez, existem laços fraternos, e o dever do ser humano consiste em "praticar a justiça, amar a
misericórdia e caminhar humildemente nas sendas divinas". A prática da religião está presente no dia-a-dia do judeu. Ela se
estende até sua alimentação, que deve ser kosher, ou seja, livre de comidas impuras (certas carnes, como a suína, entre outras
substâncias, não são permitidas). Outro hábito arraigado é a observação do Shabat, o dia do descanso, que se estende do pôr-do-
sol da sexta-feira até o pôr-do-sol do sábado, e que é celebrado com rezas, leituras e liturgias na Sinagoga, o templo judaico. Em
essência, o Judaísmo ensina que a vida é uma dádiva de Deus e, por isso, devemos nos esforçar para fazer dela o melhor
possível, usando todos os talentos que o Criador nos concedeu. As escrituras sagradas, as leis, as profecias e as tradições
judaicas remontam a aproximadamente 3 500 anos de vida espiritual. A Torá, que também é conhecida como Pentateuco,
corresponde aos cinco primeiros livros do Antigo Testamento bíblico (os outros dois são Salmos e Profecias). O Talmud é uma
coleção de leis que inclui o Mishná, compilação em hebraico das leis orais, e o Gemará, comentários dessas leis, feitos pelos
rabinos, em aramaico. Disponível em <www.casadobruxo.com.br/religa/judaismo.htm>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
34
Contextualização do objeto de estudo

O núcleo do judaísmo é a vida na sinagoga, onde não há imagens religiosas


nem objetos no altar, pois as imagens são proibidas. A Arca é a parte mais importante
da sinagoga pois, é ali que se guardam os rolos da Torá, escritas em pergaminhos46.

Desde os três anos de idade, os judeus são incentivados a elevar orações a


52
Deus . Um dos momentos mais importantes na vida de um judeu é o nascimento –
com oito dias os meninos são circuncidados, conforme o mandamento da Torá, e
recebem seu nome em hebraico. As meninas judias recebem seus nomes hebraicos na
sinagoga, geralmente um mês depois de nascerem 49,52.

Os momentos mais importantes na vida de um judeu são: nascimento – com


oito dias os meninos são circuncidados, conforme o mandamento da Torá, e recebem
seu nome em hebraico. As meninas judias recebem seus nomes hebraicos na
sinagoga, geralmente um mês depois de nascerem 49,52.

Aos 13 anos, o menino judeu se torna um Bar Mitsvá, expressão em hebraico


que significa filho do mandamento. O casamento é considerado o modo de vida ideal
por Deus e . Oos judeus têm obrigação de se casar com judias46,52.

Os alimentos que podem ser comidos são chamados Kosher (adequado ou


permitido), conceito baseado na Bíblia46,49,52. A carne só pode provir de animais que
ruminam e têm o casco partido. Sendo assim, se excluem o porco, o camelo, a lebre, o
coelho e outros. Das aves, podem-se comer as não predatórias. Dos peixes e frutos do
mar, são permitidos apenas os que possuem escamas e barbatanas; logo, estão
eliminados polvo, lagostas, mariscos, caranguejos e camarões 46,52.

A carne só pode provir de animais que ruminam e têm o casco partido. Sendo
assim, se excluem o porco, o camelo, a lebre, o coelho e outros. Das aves, podem-se
comer as não predatórias. Dos peixes e frutos do mar, são permitidos apenas os que
possuem escamas e barbatanas; logo, estão eliminados polvo, lagostas, mariscos,
caranguejos e camarões46,52.

Toda comida feita com sangue é proibida, já que a vida está no sangue. É
proibido comer qualquer carne que não tenha sido obtida de um animal abatido
segundo as regras. As frutas e verduras são todas permitidas, bem como a maioria das
bebidas alcoólicas e não alcoólicas, salvo algumas exceções. Além dessas regras, os
judeus não comem derivados do leite e derivados da carne na mesma refeição 46,52.
35
Contextualização do objeto de estudo

Quanto à vida ética, os judeus não possuem uma separação nítida entre a parte
ética e a parte religiosa de sua doutrina. Tudo pertence à lei de Deus. Existem 248
ordens positivas e 365 proibições, totalizandoxvii 613 mandamentos46,52.

Muitos judeus dão o dízimo (10% da renda) para a sinagoga. Para eles, dar
esmolas não é fazer caridade, e sim cumprir o dever de combater a pobreza, baseado
na Palavra de Deus46,52.

As festividades judaicas são: Pessach – páscoa; Shawot – festas das Semanas,


comemorando a ocasião em que a Torá foi dada ao povo no monte Sinai; Sukot –
Festa dos Tabernáculos – se constroem cabanas em memória das tendas onde os
judeus moravam durante a peregrinação no deserto e do cuidado que Deus dedicou a
eles52.

Outras festas que não estão na Torá, mas que existem há muitos anos, são: o
ano novo (Rosh Há-Shaná) celebrado em setembro ou outubro; o dia do perdão (Yom
Kippur) essa é a comemoração mais importante e mais pessoal para os judeus; e a
Festa das Sortes (Purim). Segundo o livro de Ester, da Bíblia, foi o dia do Purim que
Haman, o primeiro-ministro da Pérsia, havia designado para o assassinato por
envenenamento de todos os judeus do reino da Pérsia. A rainha Ester, que era judia,
convocou todos os judeus a jejuar com ela e, assim, evitou o mau decreto 46,52.

Quando a morte ocorre para os judeus ortodoxos em um hospital, a equipe do


hospital deve estender o corpo e os dedos das mãos devem estar abertos. Os fluídos
do corpo devem permanecer dentro do corpo, e todas as roupas de cama e outras
usadas que tiverem sangue do paciente devem ser enterradas junto com ele. Uma
pessoa designada da mesma fé deve limpar o corpo. De acordo com a tradição
judaica, alguém deve ficar com o corpo Shomer (guardião), lendo orações e salmos,
até que o corpo seja colocado no solo49,51.

A cremação é proibida. Os homens são enterrados envolvidos com seu xale de


oração (talit). Não usam flores nem música na cerimônia. São jogadas três pás de
xvii
613 mandamentos: O Judaísmo é uma religião de 613 mandamentos, não uma série de "nisto deves acreditar" e "nisto não
deves acreditar", mas de 613 leis divididas entre "isto deves fazer" e "isto não deves fazer". Exige o cumprimento das 613
mitsvot, preceitos da Torá. O propósito da crença em uma Divindade é assegurar que as mitsvot sejam cumpridas. A crença em
D'us não é a mensagem, mas o meio. Disponível em <www.chabad.org.br/mitsvot/index.html> . Acessado em 28 de nov. de
2011.
36
Contextualização do objeto de estudo

terra sobre o caixão, enquanto se recita: O Senhor dá e o Senhor tira. Bendito seja o
nome do Senhor. Logo no começo do funeral, uma das antigas expressões de luto
judaica realizada, conhecida desde os tempos bíblicos, é a keriá (rasgo), quando os
enlutados rasgam suas roupas na altura do tórax em sinal de grande pesar 51.

O rabino faz um discurso em memória do morto e os filhos homens, ou o


parente mais próximo do sexo masculino, recita uma oração - o Kadish. Após o
funeral, a família fica de luto por uma semana, os parentes mais próximos acendem
uma vela todos os anos e faz-se uma prece especial na data do aniversário da
morte,46,52.

Os judeus não aceitam fazer nenhuma intervenção que apresse a morte mas,
quando a morte é certa, o paciente pode recusar meios de prolongá-la. A lei judaica é
contra a mutilação do corpo, portanto autópsias não são permitidas, somente se
solicitadas pela lei do estado. Um órgão pode ser removido ou doado, mas somente se
a pessoa for atestada morta49.

Há também o costume de se colocar uma pedra sobre o túmulo do falecido.


Esse ato demonstra, simbolicamente, o apreço que as pessoas mantêm pelo falecido, o
que significa que sua memória será cuidadosamente lembrada 49.

Com relação às crenças pós – morte e do além, a partir do Haskalá, o


Iuminismo Judaico ocorrido no século XVIII, grandes transformações ocorreram
entre os judeus ocidentais. Muitos pensadores modernos começaram a rejeitar as
crenças na ressurreição dos mortos e na reencarnação. Somente em círculos ortodoxos
é mantida a crença na ressurreição física dos mortos saindo dos túmulos. Com relação
àá imortalidade da alma, as opiniões também se diversificaram 50.

A luta pela vida não deve acontecer a qualquer preço. Existem sofrimentos
que podem ser evitados. Além disso, o reconhecimento da aproximação da morte e
sua aceitação trazem a oportunidade de reconciliação com Deus, com outras pessoas e
consigo mesmo. Os judeus crêmcreem que, quando podem aceitar a morte como uma
etapa da vida, se valem de sua proximidade para cicatrizar antigas feridas e deixar um
legado moral para as próximas gerações52.
37
Contextualização do objeto de estudo

2.3.2.2 Islamismo

A religião islâmica é hoje a segunda maior religião em número de fiéis no


Brasil, estando à sua frente apenas o Cristianismo (incluem-se aqui Catolicismo
Romano, Ortodoxo e os Protestantes). O Islã possui seguidores em todos os
continentes do mundo52. Islã significa se submeter ao único Deus verdadeiro, Alá 49.

O Islã teve origem na Arábia e ainda hoje está intimamente relacionado à


cultura árabe, entre outras razões, porque o livro sagrado dos mulçumanos, o Corão
ou Alcorão, foi escrito em árabe46.

O Islamismo e o Cristianismo são crenças muito semelhantes em vários


aspectos. Ambos são monoteístas, foram fundados por um indivíduo específico em
um contexto definido e historicamente verificável, são universais, e crêem na
existência de anjos, do céu e do inferno, numa ressurreição futura, e que Deus fez-se
conhecer por meio de uma revelação52.

Deus é chamado de Alá e a sua essência é poder. O Islã, a mais recente das
grandes religiões mundiais, remonta a Maomé, que nasceu em Meca, na Arábia, no
final do século VI, por volta de 570 d. C. Maomé ou Mohammed ensina que existe
um profeta para cada época, começando com Adão e terminando com Maomé. A
tradição islâmica diz que existiram 120 mil profetas46,52.

Para cada profeta foi dado um livro sagrado. Todos se perderam, exceto três:
O da Lei (Torá) dado por Moisés; o dos Salmos (Zabur), dado a David; e os
Evangelhos (Injil), dado a Jesus. Nessa perspectiva, Jesus era apenas mais um
profeta. Maomé é considerado o Selo dos Profetas, o último e o maior deles 52.

Segundo a crença islâmica, o Alcorão é o último livro sagrado dado ao


homem. O Alcorão é eterno, escrito em placas de ouro ao lado do trono de Alá e
recitado a Maomé pelo anjo Gabriel, de acordo com a necessidade 46,52,53.

A salvação da alma se dá pelas obras. As obras de todas as pessoas serão


pesadas numa balança. Se as boas superarem as más, tal pessoa irá para o paraíso 46,52.
Para o mulçumano, haverá um dia final e depois a ressurreição; no último dia, cada
um será julgado. Aqueles que não seguirem as ordens de Deus de misericórdia e
bondade irão para o inferno. Aqueles que tentaram seguir as ordens de Deus serão
38
Contextualização do objeto de estudo

premiados com o paraíso nos céus49. O conceito de paraíso é bem sensual. Há lindas
virgens de olhos negros para cada homem e existem rios, árvores frutíferas e
perfumes52. O inferno é para os não muçulmanos. É um lugar de fogo e tormento
indescritível. A maioria dos mulçumanos aceita a idéia da existência do purgatório. O
pecado imperdoável é associar algo ou alguém a Deus52,54.

Deus (Alá) é absolutamente soberano. Deus não tem nenhuma obrigação


moral, pois isto limitaria seu poder e soberania. Tudo o que acontece é porque Deus
assim quis.

Deus decreta o destino de cada ser humano. Entende-se que isto acontece
numa determinada noite do ano. Deus também é o autor do mal52.

As práticas do Islamismo são: Testemunho ou confissão – Eu testifico que não


existe deus além de Deus, e que Mohammed é o mensageiro de Deus. Recitando isto,
crendo no que se está dizendo, se faz um mulçumano; e Orações formais - são rituais
que devem ser feitos cinco vezes por dia, ao amanhecer, ao meio dia, no meio da
tarde, ao pôr do sol e à noite, em algum momento antes de deitar49,52.

Dar esmolas e fazer caridade também é uma das praticas islâmicas. É preciso
doar porcentagens de suas propriedades, que serão distribuídas para as pessoas
necessitadas46,49.

O mulçumano fFaz jejum num dia: do mês lunar de Ramadan, quando não se
bebe, fuma, não se mantém relações sexuais, do entardecer até o amanhecer.
Financeiramente e fisicamente tem a obrigatoriedade de uma peregrinação (hajj) a
Meca, pelo menos uma vez na vida46,49,52.

Antes de um casal fazer sexo, eles rezam Bismillah “no nome de Deus, o
misericordioso e o que tem compaixão”. Quando uma criança nasce, os pais rezam
em suas orelhas o adhan. Colocam mel nos lábios da criança para que ela seja doce e
boa. Deve ser feita circuncisão em todo menino e isso pode ser feito em qualquer
época. A maioria dos mulçumanos preferem que o bebê seja circuncidado antes de
sair do hospital. As mulheres devem amamentar seus bebês, do nascimento até os
dois anos de idade e, de um modo geral, não podem comer carne de porco ou
produtos derivados de porco49.
39
Contextualização do objeto de estudo

Mesmo hospitalizados, devem rezar cinco vezes por dia. Antes de rezar, o
paciente deve limpar seu corpo, roupas, lavar suas mãos, antebraço, boca, rosto e
molhar o topo da cabeça, orelhas e pés. Os islâmicos entendem que a morte cerebral
significa morte. Espera-se que os mulçumanos cuidem uns dos outros, especialmente
dos mais idosos. Todo o tipo de sofrimento é considerado um teste de Alá49.

Paciência, persistência e esperança devem ser colocadas em prática pela


família e amigos. Quando não há esperança científica para sobrevivência a uma
doença, é permitido que se removam os aparelhos que estejam mantendo aquela
pessoa viva. Eles entendem que o processo natural de morte ajuda a pessoa a cumprir
a vontade de Alá49.

O corpo da pessoa que está morrendo deverá estar virado para Qiblah (a
parede de Meca e a parede em que os mulçumanos põem suas cabeças para orar).
Amigos e entes queridos devem rezar por misericórdia, perdão e para que benções de
Alá sejam dadas às pessoas que estão morrendo. Os amigos devem ler a Surah 36 do
Corão. As pessoas em volta da cama devem falar das misericórdias e perdão de Alá e,
assim, o paciente pode pedir perdão. Depois que a morte acontece, uma pessoa do
mesmo gênero prepara o corpo para o enterro. A cremação é proibida e o enterro deve
ocorrer no mesmo dia da morte, se possível49.

Recomenda-se que os presentes joguem três punhados de terra sobre a tumba,


a partir da cabeça do falecido. Depois do sepultamento, devem orar e suplicar pelo
perdão ao falecido e a aceitação de sua conduta por Alá, porque ele será questionado
a respeito de sua vida. Não é aconselhável expressar emoções de forma exagerada,
pois o excesso de desespero pode significar fraqueza da fé em Deus e a incapacidade
de aceitar os seus desígnios54.

A totalidade da existência humana é dividida, na perspectiva islâmica, em


quatro períodos: vida no útero materno, vida no mundo material após o nascimento,
vida no Barzakh (literalmente istmo) e vida após o julgamento. A morada final virá
após o Dia do Julgamento54.

Além disso, fazem a guerra santa (Jihad). A palavra jihad significa lutar por
Deus. Isto pode ser interpretado como guerra ou qualquer outra forma de luta a favor
de Deus52.
40
Contextualização do objeto de estudo

O Alcorão foi escrito em placas de ouro e é eterno no céu. O Anjo Gabriel se


aproximou de Maomé e lhe disse: “Recite!” Então, Maomé memorizou o que escutou
desste ser angelical e recitou, de memória, tudo que escutou. Conforme ele recitava,
seus companheiros iam escrevendo tudo que escutavam. Segundo o Islã, o Alcorão é
todo-suficiente. Nunca mais haverá outro profeta ou livro sagrado. O Alcorão é a
revelação final52.

Para o mulçumano, a vida terrena é uma só e não haverá uma segunda. Têm
que fazer o bem antes que estejam mortos e, se falharem como mulçumanos nesta
vida, serão os eternos perdedores. O arrependimento, oração, humildade, renúncia,
paciência, caridade, temor a Allah, o criador e esperança, tudo isso é o resultado
imediato da lembrança da morte55.

2.3.2.3 Protestantismo

O cristianismo divide-se em muitas comunidades eclesiásticas, com diferentes


organizações, doutrinas, ordens e atitudes sociais. Pode-se dizer que a Igreja
permaneceu única até 1054, quando se dividiu em duas, católica romana e ortodoxa 46.

No século XVI, ocorreu a Reforma Protestante, quando diversas comunidades


se levantaram em protesto contra certos aspectos da doutrina e da prática da Igreja
Católica46.

No século XVI, uma grande revolução eclesiástica ocorreu na Europa


Ocidental, levando a mudanças consideráveis na esfera religiosa que, durante todo o
período medieval, estivera sob o domínio da Igreja Católica. Essa revolução teve
tanto causas políticas como religiosas. Muitos monarcas estavam insatisfeitos com o
enorme poder que o papa exercia no mundo, ao mesmo tempo queao mesmo tempo
em que muitos teólogos criticavam a doutrina e as práticas da Igreja Católica, sua
atitude para com a fé e seu feitio organizacional46,56.

Foi um monge alemão, Martinho Lutero, o maior responsável por esse conflito
teológico. Ele deu forte destaque à fé e à palavra (a Bíblia), como os elementos mais
significativos. Os reformadores suíços Calvino e Zuínglio defendiam um rompimento
41
Contextualização do objeto de estudo

mais radical com o catolicismo. Davam menos valor ao batismo e à eucaristia do que
os católicos e os luteranos, mas julgavam vital mexer na organização da Igreja.

A igreja é dirigida por representantes eleitos que, juntamente com os


ministros, constituem a Assembleia Geral. Esta é conhecida como presbitério (da
palavra grega, que significa “conselho de anciões”), razão pela qual a igreja
reformada é chamada presbiteriana. Essa igreja logo se tornou a principal seita
protestante em países cujos soberanos não instituíram uma única religião do Estado;
por exemplo, Holanda, Suíça e Escócia46.

Lutero destacou-se como pensador humanista defensor da consulta direta às


fontes bíblicas. Ele foi o primeiro tradutor da Bíblia para o vernáculo. Daí a ênfase
que dava ao conceito da graça, que também foi enfatizado por João Calvino, um dos
inspiradores da importante Confissão de Westminster, a base do protestantismo
presbiteriano e de outras confissões protestantes55,56.

Os protestantes surgiram começando com Martin Lutero (luteranos). Lutero


nascido na Saxônia, estudou Direito por quatro4 anos em umana universidade alemã,
aprofundou-se em filosofia medieval.medieval. Quando estava para iniciar sua futura
carreira profissional, para surpresa de seus pais e amigos, tornou-se monge. No
mosteiro, travou consigo mesmo uma tremenda batalha espiritual, pois estava à
procura da salvação., Ffazia jejuns, flagelações, confessava-se, mas não encontrava a
paz e a segurança de quem esta no caminho de Deus. Como era ardente leitor da
Bíblia, em 1512, tornou-se doutor em teologia. Porém, quando lia a Epístola aos
Romanos, encontrou essas palavras: “O justo viverá por fé’, vislumbrando aquela
verdade que vinha procurando: que a salvação lhe pertencia simplesmente pela
confiança, pela fé em Deus por meio de Jesus Cristo, e não por qualquer obra que ele
próprio realizasse57.

Contra essa verdade e acima dela, pairava o ensino da igreja medieval de que
o homem pode alcançar a salvação pelas obras, pelos sacramentos que a Igreja, que se
dizia divinamente autorizada, prescrevia. Nessa época, estavam sendo vendidas as
indulgências emitidas pelo papa, com o propósito de diminuição das penas do
purgatório, o que ia de encontro com ao que Lutero pensava; então, ele decidiu
enfrentar a Igreja. Nas universidades medievais era costume fixar, em lugares
públicos, a defesa ou o ataque ade certas opiniões. E eEm 31 de outubro de 1517,
42
Contextualização do objeto de estudo

véspera do Dia de Todos os Santos, quando enorme multidão comparecia à Igreja do


Castelo em Wittenberg, Alemanha, Lutero colocou, às portas dessa igreja, as 95 teses
que tratavam do caso das indulgências. Assim, a partir de 1520, os ensinos
reformadores dominaram rapidamente a Alemanha, e o movimento luterano
espalhou-se , como a Rreforma Protestante em toda parte57.

Esses grupos de pessoas acreditavam que somente Deus poderia perdoar os


pecados e os únicos sacramentos seriam o batismo e a santa ceia. Eles não viam a
necessidade de um papa, e consideravam que os padres podiam casar. O batismo é
considerado um sacramento por algumas religiões cristãs e significa a iniciação de
uma pessoa como um cristão. Católicos Romanos, Luteranos e Episcopais batizam as
pessoas quando ainda crianças49.

Com a chegada dos imigrantes estrangeiros, o protestantismo se estabeleceu


no Brasil, iniciando-se pelo sul do país, com nos estados do Rio Grande do Sul e de
Santa Catarina, onde fixou residência, a partir de 1824, um contingente expressivo de
imigrantes alemães que, traziamendo o Luteranismo, um ramo original da Reforma
protestante46.

Em 1904, uma missão luterana de norte-americanos fundou a Igreja


Evangélica Luterana do Brasil ligada ao Sínodo Luterano de Missouri (Estados
Unidos); que, depois da Segunda Guerra Mundial, tornou-se a Igreja Evangélica de
Confissão Luterana no Brasil46.

Os anglicanos e uma parte dos metodistas (que se estabeleceram no interior do


Eestado de São Paulo) também representam casos típicos de protestantismo de
imigração. Os imigrantes anglicanos se estabeleceram a partir de 1810, e procuravam
manter suas tradições, se fechando aos brasileiros, retardando a “nacionalização”
dessas igrejas46.

Outro ramo de protestantismo histórico chegou ao Brasil com as missões: dos


presbiterianos, os metodistas, os batistas e os episcopais, vindos dos Estados Unidos.
Igrejas foram implantadas por missionários com a finalidade de converter brasileiros
à sua religião. Essas missões evangélicas começaram, no Brasil, na segunda metade
do século XIX46.
43
Contextualização do objeto de estudo

Por razões diplomáticas e econômicas, o governo imperial foi obrigado a


diminuir as restrições legais no campo religioso, facilitando a entrada de outras
igrejas cristãs vindas dos países desenvolvidos. No final do século XIX, já estavam
implantadas, no Brasil, todas as denominações clássicas do protestantismo: luteranos,
anglicanos ou episcopais, metodistas, presbiterianos, congregacionais, batistas e
adventistas do sétimo dia46,49.

A linguagem e a simbologia do pentecostes bíblico passaram, a influenciar


cada vez mais as igrejas (holines), nos EUA, após a guerra Civil (1861-1865). A
santidade cristã passou mais e mais a ser entendida em termos do batismo com o
Espírito Santo. Ao mesmo tempo, deu-se ênfase crescente ao Pentecostes e à
importância de resgatar a vitalidade e poder do cristianismo primitivo. Faltava um
último elemento para marcar o início do pentecostalismo propriamente dito: a ligação
entre o batismo do Espírito Santo e a experiência de falar em diferentes línguas
(glossolalia). A partir de Los Angeles, e em especial da cidade de Chicago, o novo
movimento se irradiou por todo o mundo. Uma das idéias centrais foi o desejo de
retornar aos dias dos apóstolos, aos primeiros tempos da igreja primitiva, idealizados
como uma época de maior plenitude cristã. Ligadas a isso estava uma ênfase no poder
do Espírito Santo, manifesto entre os apóstolos por meio de dons, sinais e milagres58.

Na primeira década do século XX, começaram a aparecer as igrejas


pentecostais. Em 1910, foi implantada, no Paraná e em São Paulo, a primeira Igreja
Pentecostal do país, a Congregação Cristã do Brasil. Em 1911, dois missionários
suecos fundaram, em Belém do Pará, a Assembléia de Deus, que logo se espalhou
peloara o país inteiro. Ainda hoje elas são as duas maiores alas do pentecostalismo no
Brasil46.

A cosmovisão pentecostal, com sua ênfase nos dons do Espírito Santo e na


dimensão emocional da fé cristã, também afetou fortemente o catolicismo romano e
as tradições protestantes históricas. Isso ocorreu a partir dos anos de 1950,
inicialmente nos Estados Unidos e depois em outros países, através da chamada
“renovação carismática”. Em muitos casos, esse fenômeno produziu divisões, com o
surgimento de novos grupos cristãos. Outras igrejas absorveram a nova mentalidade,
total ou parcialmente;, assim, não existe uma denominação protestante que não tenha
44
Contextualização do objeto de estudo

sido afetada, em maior ou menor grau, pela teologia e práticas do pentecostalismo,


em especial nas áreas da espiritualidade e do culto 58.

O pentecostalismo cresceu tanto que, no início da década de 1990, 10% dos


brasileiros eram pentecostais, enquanto que os protestantes históricos representavam
3% desses brasileiros. Ultimamente, o movimento pentecostal no Brasil passou a se
diferenciar em dois tipos: os pentecostais “clássicos” e os “neopentecostais” 46.

Os neopentecostais conservam, do pentecostalismo clássico, o estilo de culto


fortemente emocional, voltado para o êxtase, destacando-se a glossolalia, o exorcismo
e o milagre, objetivando sempre resultados concretos que podem ser colocados em
prática de imediato46,58.

As maiores igrejas pentecostais de tipo clássico existentes no Brasil são:


Congregação Cristã do Brasil (1910); Assembléia de Deus (1911); Igreja do
Evangelho Quadrangular (1953); Igreja Pentecostal O Brasil para Cristo (1955-56);
Deus é Amor (1961-62) e Casa da Benção (1964). As igrejas neopentecostais mais
representativas em tamanho e visibilidade no Brasil são: Igreja de Nova Vida (1960);
Comunidade Evangélica Sara Nossa Terra (1976); Igreja Universal do Reino de Deus
(1977); Igreja Internacional da Graça de Deus (1980) e Renascer em Cristo (1986)46.

A Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) é um fenômeno que se estendeu


pela América Latina, nas últimas décadas, enfatizando a teologia da prosperidade e os
ministérios de “libertação”, para libertar pessoas oprimidas por demônios, e da
utilização de objetos que são “ungidos” nos cultos. Vivem sob a liderança de Edir
Macedo, que, por sua vez, havia pertencido a outra denominação neopentecostal, a
Nova Vida, no Rio de Janeiro. Abaixo de Macedo vem um “conselho episcopal
mundial”, ao qual estão subordinados os “lideres estaduais” que, por sua vez,
comandam os “pastores”. A centralização do poder eclesiástico na figura do fundador
é característica das seitas neopentecostais que surgiram nas últimas décadas, como a
IURD59.

Bonfatti60, tentando compreender a IURD de dentro, a partir de seus próprios


valores, concepções ou categorias, vem à tona a existência de três aspectos que
aparecem sempre interligados na experiência religiosa dos fiéis. São eles: a
conversão, o exorcismo e a cura. Para esses fiéis, o conceito de doença adquire um
sentido mais amplo: são problemas físicos, desemprego, problemas familiares,
45
Contextualização do objeto de estudo

drogadição, problemas mentais ou emocionais e pobreza. Todos esses elementos são,


segundo a concepção dessa ta igreja, contrários ao plano que Deus reservou para o
seu fiel.

Os aspectos teológicos que a caracterizam são: a salvação da alma vem


através do esforço humano, bem como a própria manutenção desta salvação; o falar
em línguas estranhas é entendido como evidência necessária do batismo com o
Espírito Santo; as doenças são resultado direto da operação dos espíritos malignos,
sendo que a cura dessas doenças é conseguida através da expulsão desses espíritos, e
a cura divina é um direito adquirido através de Jesus Cristo59,60.

Quanto aos dízimos e ofertas, crêem que, de acordo com o tamanho da fé, a
pessoa faz a oferta. Também iIdentificam a prosperidade financeira como sendo um
sinal evidente das bênçãos de Deus sobre a vida de alguém, e a. A transformação que
Deus opera nas vidas das pessoas é entendida, por exemplo, em termos de cura da
AIDS, cura de paralíticos, restauração de casamentos e sucesso financeiro 59,60.

Faz uso dos elementos mágicos nos cultos e das superstições populares do
Brasil, entre eles o sal grosso (para afastar maus espíritos), a rosa ungida (usada nos
despachos e nas oferendas a Iemanjá), a água fluidificada (usada por credos
espiritualistas a fim de trazer a influência espiritual para o corpo humano), fitas e
pulseiras (semelhantes na sua designação às fitas do chamado Senhor do Bonfim), e o
ramo de arruda usado para afastar coisas más, contra os demônios59.

Utiliza-se da nomenclatura afro-brasileira dos deuses da Umbanda para


dirigir-se aos demônios, identificá-los e eventualmente expulsá-los. “Tranca ruas”,
“pomba gira”, “exus”, “caboclos”, “preto velho”, dentre outros, são nomes
empregados nos cultos de libertação59.

Um fenômeno interessante e muito comum entre os pentecostais, que também


inclui a IURD, é a existência de uma população flutuante de outras igrejas neo
pentecostais, bem como de pessoas ditas atéias, ou de denominações afro-brasileiras,
católicas e espíritas. Essas pessoas procuram a IURD numa dimensão bem utilitarista,
ou até mesmo em caso de desespero, em que “só a Universal pode resolver”. As
pessoas vão a essa igreja buscando a cura de uma doença bem específica, um
emprego, o resgate do marido alcoólatra, e o consolo para o sofrimento da alma.
Assim que essas pessoas obtêm o que desejam, param de freqüentar a IURD60.
46
Contextualização do objeto de estudo

Quanto à dieta, a maioria das religiões protestantes não tem restrição. Os


adventistas do sétimo dia não permitem o uso de tabaco e álcool. Membros da Igreja
dos Santos dos Últimos Dias evitam álcool, chá, café e tabaco, e devem comer carne
regularmente49.

As doações de órgãos e autópsia são permitidas. Quando um tratamento para a


doença não apresenta benefício ou é um fardo, é aceitável que a pessoa suspenda o
tratamento, tendo um processo de morte natural. As decisões cabem ao paciente e à
família. Todas as religiões cristãs estão abertas ao cuidado pastoral e algumas aceitam
a unção antes da morte49.

Quanto aos ritos de passagem, a grande diferença dos protestantes em relação


a outras religiões é que não crêemcreem em reencarnação, já que a próxima vida será
unida a Deus e o corpo também será ressurreto junto com a alma. Creem também na
existência do inferno56.

Para o protestantismo, a morte não é o fim, é o começo, mas o começo da


existência fora do tempo, o que alguns chamam de eternidade. A morte física
continua, porém, não como o fim existencial, mas como uma passagem para a vida
eterna. CrêmCreem que Deus preparou algo muito melhor do que começar tudo neste
mundo de sofrimento e injustiça61 - “nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem
jamais penetrou em coração humano, o que Deus tem preparado para aqueles que o
amam” xviii.

Para resolver o problema do pecado do homem e com isso sua morte, Deus
enviou Seu próprio filho, para morrer em lugar dos homens, e assim ocorreu a morte
da morte, na morte de Cristo. Esta é a posição do protestantismo sobre o fim da vida,
uma posição extraída da Bíblia, cheia de esperança, conforto e convicção de que este
mundo é passageiro e de que o melhor ainda está por vir 61.

“nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano, o que Deus tem preparado para aqueles
xviii

que o amam” - Bíblia: 1 Coríntios, cap.2, v.9.


47
Contextualização do objeto de estudo

2.3.3 Religiões Místicas - Religiões Orientais

2.3.3.1 Hinduísmo

O Hinduísmo não tem fundador, nem credo fixo, nem organização de espécie
alguma. Caracteriza-se como a “religião eterna”, possui grande diversidade e
capacidade de abranger novos modos de pensamento e expressão religiosa 46.

Pode se dizer que o hinduísmo é o nome de várias formas de religião que se


desenvolveram na Índia há quatro4 mil anos atrás. Creem que Brahman é a força
espiritual essencial em que se baseia todo o universo. Todos os seres vivos nascem do
Brahman, vivem nele e, ao morrer, retornam a ele46.

Religião é um modo de vida e não se separa do dia-a-dia. As crenças hindus


incluem a existência de uma alma; a reencarnação da alma várias vezes até alcançar
maturidade; bons atos, ações e as palavras que trazem bom carma e felicidade 49.

O hindu é preocupado em encontrar o seu “Eu Interior”. Suas escrituras


sugerem três passos para alcançar essa realização; 1) escutar, pensar e relembrar, 2)
concentração e 3) meditação49.

Desde o início dessa civilização, sempre houve quatro classificações sociais


em que se enquadra o seu povo: sacerdotes (brâmanes); guerreiros; agricultores,
comerciantes e artesãos, e servos. Porem, à medida que a sociedade indiana se
desenvolveu, as primeiras foram sendo divididas em novas castas. No início do
século XX, havia em torno de 3 mil castas46.

O sistema de castas deu um contexto à vida do indiano. Ser expulso de sua


casta é o pior castigo possível, sendo usado apenas em crimes graves. O nível mais
baixo, no sistema de castas, é o dos “intocáveis” ou “sem casta”, como os criminosos,
lixeiros e os que trabalham curtindo o couro dos animais46.

Existem cinco obrigações que um hindu deve cumprir: adorar diariamente,


participar dos festivais hindus, viver uma vida de trabalho e boa conduta, observar os
sacramentos que marcam as passagens da vida e peregrinar cada ano para o templo
dos santos. Existem deveres, chamados samskars, associados com o nascimento de
uma criança, cujo objetivo é criar uma atmosfera para manter uma vida virtuosa49.
48
Contextualização do objeto de estudo

A vaca é um animal sagrado na Índia e é adorada nas festas religiosas; tornou-


se um símbolo de vida e não é permitido matá-la. Em termos de culto, a vaca é mais
pura do que o brâmane; dessa forma, ao tocá-la, a pessoa está ritualmente limpa. Os
hindus têm outros animais sagrados além da vaca, em especial o macaco, o crocodilo
e a cobra46. Os hindus não comem carne, peixe ou ovos49.

Quando estão doentes, parentes próximos do mesmo sexo assumem o cuidado


diário. O pai ou o filho mais velho tomam todas as decisões, protegendo a saúde do
paciente, mas o assunto poderá ser discutido também em família. Os hindus vivem de
acordo com a lei racional da natureza. São estóicos, por isso tentam agüentar a dor,
mas entendem que a mulher pode expressar sua dor durante o trabalho de parto 49.

No Induísmo, todas as ações de uma vida, e somente elas, formam a base para
a próxima; assim, o carma não é uma punição pelas más ações ou uma recompensa
pelas boas. O carma é uma constante impessoal - como uma lei natural46.

Quanto à morte, os diagnósticos terminais são dados à família e não ao


paciente; esta decidirá o quanto dessa informação o paciente deverá saber. A morte
para os hindus significa a passagem de uma vida para a outra vida, que é determinada
pela forma como a vida que terminou foi vivida. O corpo será lavado geralmente pelo
filho mais velho e, então, cremado49.

Embora a pessoa deva se submeter ao carma que herdou de uma vida anterior,
ela também exerce o livre-arbítrio no âmbito de sua existência atual. Dessa forma, a
pessoa pode sempre melhorar seu carma e, assim, estabelecer fundações para uma
vida melhor, na próxima encarnação46.

Como cumprimento, eles batem as mãos e se curvam até a cintura dizendo


Namaskar ou Namaste, que significa: eu me inclino a Deus e a você; eu te amo e te
respeito, não existe ninguém como você49.

O mantra é uma palavra sagrada, que expressa um relacionamento especial


com Deus. O mantra mais comum é a sílaba OM49.

A multiplicidade do hinduísmo também se manifesta em seu conceito de


Deus. Em sua forma mais filosófica, o conceito hindu de divindade é panteísta. A
divindade não é um ser pessoal, mas uma força, uma energia que permeia tudo: os
49
Contextualização do objeto de estudo

objetos inanimados, as plantas, os animais e os homens. No extremo menos filosófico


do espectro, há um conceito politeísta, que acredita num grande número de deuses46.

2.3.3.2 Budismo

O fundador do budismo foi o filho de um rajá, Sidarta Gautama (560-480 a.


C) que viveu no Nordeste da Índia. Sidarta se transformou num Buda, ou seja, um
“iluminado”: alcançou a percepção de que todo o sofrimento do mundo é causado
pelo desejo. Assim, é apenas suprimindo o desejo que se pode escapar de outras
encarnações46.

Durante sete dias e sete noites, o Buda ficou sentado debaixo de sua árvore da
iluminação. Ganhou, dessa forma, a compreensão de uma realidade que não é
transitória, uma realidade absoluta acima do tempo e do espaço, que no budismo se
chama nirvana, e conseguiu alcançar a salvação para si mesmo46.

Para os Budistas, existem quatro verdades puras: a vida é cheia de sofrimento;


e sofrer vem da avareza, do ódio e da ignorância; pode haver um fim para o
sofrimento; e este vem de oito passos: ter uma visão panorâmica das singularidades
das coisas dentro de sua própria natureza; ter os pensamentos de amor e de não
violência; falar de maneira correta; agir de maneira correta; ter um tipo de trabalho
certo; agir com disciplina e ter motivação correta; estar atento em todas as suas
atitudes e concentrar-se e meditar de maneira correta49.

O budismo cresceu dentro do hinduísmo como um caminho individual para a


salvação. As duas religiões têm muitos conceitos em comum: as doutrinas do
renascimento, do carma e da salvação. A salvação consiste em ser libertado do círculo
vicioso dos renascimentos. O objetivo do budismo, comum acom os outros caminhos
indianos para a salvação, é encontrar a “passagem” por onde se pode atravessar para a
outra margem49.

O Budismo é uma religião flexível e moderada, cujos seguidores têm por


hábito valorizar muito a relação médico-paciente62.

Os budistas celebram muitos rituais, desde o nascimento até a adolescência.


Quanto à alimentação, a maioria deles é vegetariana. O budista pode recusar os
50
Contextualização do objeto de estudo

remédios para dor, desde que eles afetem o estado de alerta da pessoa e da mente,
como também o bem estar espiritual, pois ele pode estar tentando atingir um estado
“positivo” da mente49,62.

A eutanásia pode ou não ser aceita, conforme os preceitos de alguns grupos,


mas o cuidado paliativo a pacientes terminais é sempre bem aceito. È importante
ressaltar que existem vários grupos de budistas, que têm posturas e pareceres que
podem até mesmo ser opostos. O ritual do fim de vida é importante, para os que
morrem para os que vivem: fecha-se um ciclo que, para os últimos, dura 49 dias após
o óbito62.

O mantra (enunciação sagrada) mais comum no budismo tibetano – “Om


Manipadme Hum”, significa: “Ó tu, que tens a jóia no teu lótus”. Para aumentar sua
eficiência, usa-se um rosário de 108 contas46.

De acordo com os ensinamentos budistas, toda vida é sagrada, mas aceitam as


manobras de ressuscitação cardiopulmonar (RCP), pois entendem que alguns
segundos a mais de vida podem levar a pensamentos virtuosos. Quando os
mecanismo de manter a vida, com o uso de respiradores artificiais é aplicado, nos
casos em que não se tenha um bom prognóstico, é permitido que se desligue os
aparelhos. Por outro lado, entendem que as medidas de RCP podem ser violentas e
atrapalhar a paz das pessoas que estão morrendo49.

O nirvana final, que a pessoa atinge quando morre, é irreversível. Por vezes
ele é designado no budismo por um termo especial, parinir-vana, isto é, “extinção
absoluta”, ou “extinção última”46.

A posição para morrer é deitar-se do lado direito, a mão esquerda descansa


sobre a coxa e as pernas ficam esticadas levemente dobradas. Os procedimentos
hospitalares quanto ao preparo do corpo são aceitos. Acreditam que, para evitar
distúrbios de consciência durante a transição de morte para a vida, o corpo das
pessoas deve ser deixado a sós, o quanto for possível, depois da morte. Para os
Budistas, todos os corpos devem ser cremados e isso deve ocorrer três a cinco dias
depois da morte. Um memorial deve ser erigido, usando algumas leituras do livro
budista49,62.
51
Contextualização do objeto de estudo

Os budistas se preocupam especialmente em cuidar dos moribundos, pois a


morte é um momento decisivo em relação ao nascimento; portanto, o objetivo é ter
uma boa morte46.

A doação de órgãos é permitida. É considerado um ato extremamente positivo,


que expressa compaixão, beneficiando os outros. Quando alguém está morrendo,
aqueles que pregam para eles devem tentar passar uma mensagem de esperança,
ajudando-o a encontrar o perdão, e é apropriado relembrar os alvos que alcançaram na
vida e o que eles fizeram bem feito49,62.

No Tibet, o budismo muitas vezes é chamado lamaísmo, do termo lama


(professor ou mestre), nome dado aos líderes espirituais, em geral monges. Ao morrer
um dalai-lama (“oceano de sabedoria”), os sacerdotes buscam uma criança que tenha
sua marca. Depois de vários testes a encontram e ela é consagrada como novo dalai-
lama46.

Todo o processo de finalização da vida é murmurado, orado, abençoado e


invoca-se a presença, a luz e a serenidade dos seres sábios, iluminados e benfazejos -
Budas e Bodisatvas – para que mostrem o caminho da Luz Infinita, Grande Sabedoria
Completa62.

A essa religião podem ser agrupadas também as sociedades teosóficas, as


seitas orientais japonesas como Seicho-No-Ie, Igreja Messiânica Mundial e seitas
provindas do Hinduísmo, como o movimento Hare Krishna. Todas elas são adeptas
do reencarnacionismo52.

2.3.4 Tipo Especial de Comunidade

2.3.4.1 Testemunhas de Jeová

As Testemunhas de Jeová se denominajulgam cristãs, mas permanecem


isoladas de todas as outras congregações cristãs. A maioria das igrejas cristãs as
considera comunidades religiosas dotadas de um elemento cristão.
52
Contextualização do objeto de estudo

O nome de Deus é Jeová, que é o todo poderoso, o conhecedor de tudo, o


Eterno. As testemunhas de Jeová não acreditam na trindade. Jesus é a primeira pessoa
da criação. O Espírito Santo é “uma força ativa de Deus”. Deus, Jesus e o Espírito
Santo são três pessoas distintas46,63.

Satanás é o inimigo de Deus que leva as pessoas a se desviarem de seus


caminhos. O homem é pecador por causa das ações de Adão e Eva. Quando o homem
morre, sua alma morre com ele. Crêem que Deus vai travar uma guerra contra a
humanidade, destruindo todos sobre a terra, exceto os Testemunhasas Testemunhas
de Jeová. O céu é a morada de Deus e de 144.000 pessoas que ganharem acesso ao
céu pois, pois aquelas que não chegarem aos céus, irão irão desaparecer. Não existe
inferno49,63.

Crêem que, com exceção de poucos indivíduos que mantiveram a fé, o


verdadeiro cristianismo desapareceu da terra logo após a morte dos doze apóstolos, e
só foi restaurado quando Charles Taze Russel fundou a Sociedade Torre de Vigia em
1872, crendo eles na vinda de Cristo e em 1914, se tornaram “Os Servos Sábios e
Fiéis”, dizendo que todas as outras igrejas e cristãos são membros da organização de
Ssatanás63.

Em 1872, Charles T. Russel tornou-se agnóstico, revoltouando-se contra o


cristianismo histórico, deixou de adorar a Deus e, buscando outros ensinamentos,
conheceu os escritos de “Ellen White” sobre o adventismo, onde o inferno é a
sepultura63.

As Testemunhas de Jeová acreditam que Deus estabeleceu a Sociedade Torre


de Vigia como seu canal de comunicação para reunir aqueles, dentre toda a
humanidade, que serão salvos. Como agência visível do reino de Deus na terra, essa
organização exerce plena autoridade governamental sobre seus seguidores 63.

As testemunhas de Jeová não comemoram ação de graças, páscoa,


aniversários e outros feriados. O único dia que se deve celebrar é a memória da morte
de Jesus, durante a Páscoa. Devem aprender as doutrinas oficiais, participar de todas
as reuniões da congregação e serem batizadas dentro da fé. Não há nenhuma
cerimônia especial no nascimento, e o batismo ocorre depois de muito estudo, em um
lugar amplo e deve ser feito uma ou duas vezes ao ano49.
53
Contextualização do objeto de estudo

A Bíblia que os Testemunhas de Jeová usam contém uma série de


modificações que sustentam as doutrinas da Torre de Vigia. Suas duas principais
publicações são Sentinela, que é editada em 108 idiomas e Despertai em 61 idiomas.
No Brasil, além das duas revistas, edita livros de orientação em sua própria gráfica63.

A testemunha de Jeová não pode receber transfusão de sangue, deve recusá-la


em toda e qualquer circunstância, mesmo na iminência de morte, tanto de adultos
como de seus próprios filhos. Quanto ao transplante de órgãos, é uma decisão que
cabe à consciência de cada um49,63.

2.3.4.2 Religiões afro-brasileiras: religiões dos orixás

Entre as religiões de matriz não cristã que se desenvolveram no Brasil ao lado


do catolicismo e do protestantismo, há um grupo que se destaca pela posição de
relevância estrutural que ocupa no quadro geral da cultura brasileira: o grupo das
religiões afro-brasileiras. São assim chamadaos por terem origem com dos escravos
traficados da África para o Brasil, mas também porque, até meados do século XX,
funcionavam exclusivamente como ritos de preservação cultural dos diferentes
grupos étnicos negros que compunham a população dos antigos escravos e seus
descendentes46.

Divide-se, no Brasil, em três grupos principais: Candomblé, Umbanda, e


Quinbanda. Bem antes do Kardecismo com o espiritismo ter se iniciado no Brasil, já
existiam os cultos africanos. No Brasil republicano, quando florescia o espiritismo,
surgiu uma nova espécie de culto: a umbanda, com influência espírita e indígena dos
seus tambores e ritmos, cantos e danças. A baixa de um guia caracterizava a sessão.
Nessta sessão, quem cuida ou dirige é o Abalauê, que estabelece a ligação entre o
mundo espiritual e o mundo material. A umbanda pretende fazer o bem e combater o
mal. Numa sessão, os “espíritos“ atacam o corpo do médium, ou cavalo. É uma das
seitas que mais cresce no Brasil63.

O Candomblé acredita na existência da pluralidade de deuses, com diferentes


poderes e funções na vida humana. Os orixás não são divindades moralistas, que
recompensam quem é bom e castigam quem faz o mal;, a sua ênfase é no ritual. Cada
54
Contextualização do objeto de estudo

pessoa pertence a um deus, que é senhor da sua “cabeça”, seu orixá. Desse orixá
hHerda traços de personalidade e tendências de seu comportamento, que podem ser
qualidades, mas também defeitos46.

Como o Candomblé foi trazido da África pelos escravos negros na época do


Brasil colônia, a religião, para comunicação e influência de seus adeptos, usa nomes,
na sua linguagem, relacionados com os santos da Igreja Católica:. Omulú é São
Bento,; Ogum é São José;, Yansã é Santa Barbara,; Xangô é João Batista. Apesar de
usar alguns nomes e linhas da umbanda como caboclo, preto-velho e crianças, o
candomblé acredita que os seus “santos” e “guias” são espíritos da mitologia antiga63.

A pessoa descobre quem é o seu orixá por meio do jogo de búzios, que é uma
forma de atendimento pessoal realizado pelo babalorixá (pai-de-santo) ou da ialorixá
(mãe-de-santo). Todos os orixás, além de terem funções distintas e poderes
específicos, têm também símbolos particulares como roupas, cores dessas roupas e
das contas, canções, bebidas, alimentos e animais sacrificiais próprios46.

Usam ainda entidades que se manifestam como Exus (diabos), praticando o


mal diretamente. Crêem que eles agem assim por indicação de humanos e oferecem
subornos em forma de presentes, ficando comprometidos a tal ponto de só fazerem
algo com o compromisso da outra parte na oferenda, tais como: carne ensangüentada
de galo, galinha, bode, gato e bebidas. O candomblé faz despacho para expulsar ou
exorcizar o Exu, espírito maligno, irresponsável e imoral 63.

A Umbanda surgiu na década de 1920, no Rio de Janeiro, propagando-se nas


décadas de 1930, 1940 por todo Brasil. Apesar de sua origem africana, não ficou
circunscrita apenas aos afro-descendentes, se mostrou multiétnica, com uma forte
presença de caucasianos em seus quadros, mesmo entre os pais-de-santo46.

A Umbanda é uma seita afro-brasileira divulgada mais como um folclore do


que como religião, embora advogue esta última condição. Formada pelo sincretismo
de cultos afros, ameríndios e católicos europeus trazidos pelos portugueses, declara-
se com o objetivo de desfazer os males invocados pela Quimbanda através de Exus.
Evoca os Orixás, seres elementares da natureza, mas evoca também os espíritos dos
negros escravos (pretos-velhos) e os espíritos de índios brasileiros (os caboclos), que
são chamados de guias46,52.
55
Contextualização do objeto de estudo

Os guias são espíritos dose gente mortosa, espíritos não individualizados


como no Kardecismo, mas tipificados, que também “baixam” e “se incorporam” nos
médiuns durante os toques e danças rituais, com a finalidade de orientar
espiritualmente e curar fisicamente os que precisam46.

Por ser explícito e assumido, o politeísmo umbandista se promove como


alternativa legítima de religiosidade popular num país majoritariamente cristão,
formalmente monoteísta. Por outro lado, tem também características espíritas bastante
acentuadas, chegando a constituir uma ala do espiritismo no Brasil, que por muitas
décadas foi conhecida como “baixo espiritismo”46.

Todos esses guias são cultuados como “espíritos de luz”, mas a Uumbanda
também reconhece a existência de espíritos das trevas e os situa nos mais baixos
escalões da evolução espiritual; são os exus, os demônios da mitologia cristã. Os exus
femininos são chamados de pombagiraspomba giras. Os exus e as pombagiraspomba
giras pertencem ao lado oculto da Uumbanda - a Qquimbanda, o lado reprimido
socialmente, que se dedica à magia negra e, que pratica feitiçaria. A Uumbanda torna-
se cada vez mais híbrida, mais sincrética, mais brasileira, incorporando novidades,
como as práticas mágicas e terapêuticas da Nova Era46.

A Quimbanda é uma variação do candomblé, em que se pratica trabalhos para


o bem de um, embora prejudicando um ou vários outros. A variação da Quimbanda
está subdividida em: bruxaria/ magia negra, vodus e oferendas humanas63.

2.3.4.3 Sistema Filosófico Religioso - Espiritismo

O Espiritismo Kardecista consiste num sistema filosófico-religioso cujo eixo


principal é a crença na reencarnação. Essa crença, baseada na milenar doutrina
hinduísta da transmigração das almas, se apóia em dois pilares básicos: a concepção
hinduísta do carma e a possibilidade concreta de comunicação com os mortos,
chamados de “espíritos desencarnados”, que é feita por meio de pessoas
especialmente dotadas para o transe mediúnico, os médiuns, durante uma sessão
espírita (ou sessão de “mesa branca”)46.
56
Contextualização do objeto de estudo

O Kardecismo também é conhecido como “espiritismo de mesa branca”, ou


mesmo “alto espiritismo” (por oposição á Uumbanda, discriminada como “baixo
espiritismo”)46.

A Bíblia é o livro, dentre outros, que traz a história do espiritismo.


Começando pelo Êxodo, ela mostra que os antigos egípcios foram praticantes de
fenômenos espíritas, quando os magos foram chamados pelo faraó para repetir os
milagres operados por Moisés. Quando Moisés apareceu diante desse monarca com a
incumbência de tirar o povo de Israel da escravidão egípcia, os magos repetiram
alguns milagres de Moisés52.

O Kardecismo foi introduzido no Brasil durante a segunda metade do século


XIX. As principais organizações espíritas surgiram por volta de 1870, na Bahia e no
Rio de Janeiro46. A primeira sessão espírita realizada no Brasil ocorreu em Salvador,
Bahia, no dia 17 de setembro de 1865, sob a direção de Luiz Olimpio Teles de
Menezesxix. Este fundou, no mesmo ano, o primeiro centro espírita, com o nome de
Grupo Familiar de Espiritísmo52.

O nome mais conhecido do Espiritismo Kardecista brasileiro é o do médium


Francisco Cândido Xavierxx, mais conhecido como Chico Xavier. Tudo isso faz, do
Brasil, o maior país espírita do mundo. Enquanto a doutrina espírita cresce no Brasil,
ela praticamente desapareceu na França, onde nasceu. O Espiritismo Kardecista, que

xix
Luiz Olimpio Teles de Menezes nasceu Nascido em 26 de julho de 1825, na cidade de Salvador, Bahia, e faleceu em 16 de
março de 1893, na cidade do Rio de Janeiro. Professor, grande defensor da causa espírita, foi tradutor da 13ª edição francesa do
“O Livro dos Espíritos”. Antes o povo não tinha acesso ao Espiritismo pois os livros eram em Francês. Apenas os mais cultos
podiam ler as obras da codificação. Conseguiu que a livraria Garnier fosse autorizada a traduzir para o português todas as obras
de Kardec. No dia 17 de setembro de 1865 , fundou o “Grupo Familiar do Espiritismo” e, no mesmo dia, os membros do Grupo
recém-fundado receberam assinada por “Anjo de Deus”, a primeira página psicográfica de que se tem notícia na Bahia. Em 8 de
março de 1869 publicou o 1º jornal espírita brasileiro, “Eco de Além - Túmulo”. Disponível em
<www.nossolar.org.br/c_menezes.php>. Acesso em 28 de nov. de 2011.

xx
Francisco Cândido Xavier ou Chico Xavier foi o médium mais famoso e estimado, no Brasil e no exterior, e com maior tempo
de atividade mediúnica. Nascido na cidade de Pedro Leopoldo, Minas Gerais, em 2 de Abril de 1910, iniciou-se no Espiritismo
aos 17 anos, quando sua irmã Maria Xavier Pena, doente e desenganada pelos médicos, foi levada até a casa de uma família
espírita. Após uma prece em torno do leito da irmã, da qual participou Chico, ela ficou curada. A partir daí começou a freqüentar
reuniões espíritas. Auxiliado pelo irmão José Cândido Xavier, fundou o Centro Espírita Luiz Gonzaga, em maio de 1927. Em 8
de julho do mesmo ano, psicografou pela primeira vez, recebendo uma mensagem de 17 páginas, de um Espírito Amigo, e que
versava sobre Deveres Espíritas. No final de 1931, conheceu Emmanuel, seu luminoso guia, e a partir daí iniciou-se o que se
pode chamar de "sublime ponte" entre o Céu e a Terra. Sob a sua orientação espiritual, Chico Xavier psicografou milhares de
páginas de instrução, educação e consolo, ditadas por inúmeros eEspíritos, e compiladas em quatrocentos e dois livros, sendo
que o último, chamado "Degraus da Vida", foi publicado em 1996. Muitos deles foram traduzidos para outras línguas, e entre as
quais o inglês, o espanhol e o esperanto. Mesmo doente e em idade avançada, compareceu, sempre que possível, aos sábados à
noite, no Grupo Espírita da Prece, para receber as centenas de pessoas que se comprimiam no local, ansiosas por uma palavra de
carinho, que ele tinha sempre para todos, e por seu gesto de amor, uma característica especial: o beijo terno nas mãos que o
procuravam. Chico Xavier residiu por muitos anos em Uberaba, Minas Gerais, Brasil, falecendo em 30/06/2002, com a idade de
92 anos. Disponível em <www.institutoandreluiz.org/chico_xavier_biografia.html>. Acesso em 28 de nov, de 2011.
57
Contextualização do objeto de estudo

está afiliado à Federação Espírita Brasileira, para quem Allan Kardecxxi é considerado
o Mestre Divino, define como espírita todo aquele que crê nas manifestações dos
espíritas52.

O que caracteriza o espiritismo é sua proposta terapêutica mediúnica por meio


de “passes” para combater todos os tipos de enfermidades e desconforto. O passe é
uma espécie de leve exorcismo, que é dado individualmente por um dirigente ou por
um médium em transe, durante uma sessão espírita, com o objetivo de afastar as
influências negativas, as más vibrações, os “encostos”, e transmitir energia positiva,
que é sempre pensadao como sendo “luz”46.

De acordo com a concepção deísta, Deus teria criado o universo e depois se


retirado dele, deixando-o entregue à ação das leis físicas que, desde então, o
governam como se o universo fosse um grande relógio. Nega também a deidade
absoluta de Jesus Cristo (ele é um médium), o Céu como um lugar de felicidade
eterna, o inferno como lugar de tormento e negam também a existência do diabo e
demônios como realidades espirituais. Os espíritas Nnegam a ressurreição do corpo, a
inspiração divina da Bíblia e a doutrina da Trindade 49.

A noção que o Kardecismo tem de Deus exalta-o como Ser e Fim Supremo, a
meta de perfeição de todo o processo evolutivo dos espíritos. Deus é inacessível aos
homens. Está separado do homem por um abismo intransponível e, mais próximos
dos seres humanos, estão os espíritos desencarnados, para os quais o espiritismo
disponibiliza o principal meio de expiar e aliviar suas obrigações cármicas - a

xxi
Allan Kardec Em 1855, Hippolyte Léon Denizard Rivail, professor francês de aritmética, pesquisador de astronomia e
magnetismo, foi convidado por um amigo seu a ver de perto estas manifestações que ocorriam nos salões da capital francesa.
Rivail era discípulo de Pestalozzi, chamado de pai da Ppedagogia moderna, e casado com Amélie Gabrielle Boudet. Nascido em
3 de outubro de 1804, na cidade de Lyon, já ouvira sobre o assunto das mesas girantes e não entendia bem o que estava
acontecendo. Homem criterioso, Rivail não se deixava levar por modismos e como estudioso do magnetismo humano acreditava
que todos os acontecidos poderiam estar ligados à ação das próprias pessoas envolvidas, e não de uma possível intervenção
espiritual. O professor então participou de algumas sessões e algo começou a intrigá-lo. Percebeu que muitas das respostas
emitidas através daqueles objetos inanimados fugiam do conhecimento cultural e social dos que faziam parte do "espetáculo".
Como os móveis, por si só, não poderiam mover-se, fatalmente havia algum tipo de inteligência invisível atuando sobre os
mesmos, e respondendo aos questionamentos dos presentes. Rivail presenciava a afirmação daqueles que se manifestavam,
dizendo-se almas dos homens que viveram sobre a Terra. Foi então que uma das mensagens foi dirigida ao professor. Um ser
invisível disse-lhe ser um erEspírito chamado Verdade e que ele, Rivail, tinha uma missão a desenvolver, que seria a codificação
de uma nova doutrina . Atento ao dizeres do eEspírito, e depois de muitos questionamentos à entidade, resolveu aceitar a tarefa
que lhe fora incumbida. Através dos eEspíritos, Rivail descobriu que, em uma de suas encarnações anteriores, fora um sacerdote
druida, de nome Allan Kardec. Foi então que resolveu adotar esse pseudônimo durante a codificação da nova doutrina, que viria
a se chamar Doutrina Espírita ou Espiritismo. Kardec assim procedeu para que as pessoas, ao tomarem conhecimento dos novos
ensinamentos espirituais, não os aceitassem por ser ele, um conhecido educador, quem os estivesse divulgando, mas sim, que
todos os que tivessem contato com a boa nova a aceitassem pelo seu teor racional e sua metodologia objetiva, independente de
quem a divulgasse ou a apoiasse. Disponível em <www.espiritismo.org/biokardec.htm>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
58
Contextualização do objeto de estudo

caridade. Ajudar a humanidade é o meio eficaz de expiar as faltas passadas e assim


progredir rumo à perfeição46.

Paralelamente à doutrina da reencarnação, segue-se a doutrina do carma: toda


a falta cometida e todo o mal praticado são uma dívida contraída que deverá ser paga
pelo próprio homem através do arrependimento, expiação (que é o sofrimento) e
reparação (que são as boas obras)52.

O Como o Kardecismo é uma doutrina sincrética na quale, sobre essuma base


estrutural hinduísta, ganha destaque uma inspiração tirada dos Evangelhos: a ética da
caridade., Jesus Cristo é visto como a maior entidade já encarnada, e Kardec
considera seu maior mandamento, o amor ao próximo, a virtude suprema46,64.

A doutrina espírita pode ser sintetizada como sendo a pluralidade de


existências terrestres em direção ao; progresso permanente até a perfeição, entendida
como; conquista da meta final por esforços próprios e definitiva independência do
corpo – espírito puro52.

Graças ao mandamento do amor, os mortais podem contar, em seu processo


de purificação e evolução, com a ajuda e as orações dos espíritos de luz já
desencarnados, sujeitos também eles à norma ética máxima do Kardecismo, a
caridade46.

Como o espiritismo racionaliza a religiosidade, tirando-lhe os parâmetros de


mistério e sagrado, abolindo castas sacerdotais e despindo-a de rituais, isso resulta na
ausência de ritos de passagem para os espíritas. Não se usam velas, nem roupas
especiais, nem qualquer rito, oficiado por alguma autoridade religiosa. Não há objetos
e nem espaços sagrados porque, para o espiritismo, a imanência divina está em toda
parte e em todos os seres humanos64.

Pessini65, apresenta os pontos convergentes mais significativos das religiões,


como o cuidado com a vida, o comportamento ético fundamental, a justa medida, a
centralidade do amor, as figuras éticas exemplares e a definição de um sentido
último..O mesmo autor enfoca também a vivência da saúde como uma “religião” que
revela o fato de que a nossa sociedade é marcada por fragilidades, pois se vive em
uma “sociedade doente”, que afeta o mais intimo da pessoa: a espiritualidade, o
sentido da vida, os valores, as relações interpessoais, a administração da vivência do
59
Contextualização do objeto de estudo

tempo e a vida afetiva emocional. Pode-se dizer também que se vive em uma
“sociedade terapêutica” em que o referencial é sempre a saúde, elevada à categoria de
máximo bem, paradigma da felicidade e sucesso.

Esse fenômeno da “saúde como religião” coincide com outro não menos
importante da “saúde na religião”, a busca da saúde na e através da religião. Nesse
contexto, há também os movimentos e correntes espirituais no âmbito católico e
protestante, que praticam habitualmente as liturgias de cura (missas de cura e oração
para cura)65.

Como se vê, há muitas implicações entre a religião e saúde e, na medida em


que esses conhecimentos são difundidos, a assistência espiritual pode ser oferecida
com mais competência.

A religião e a humanização estão intimamente ligadas, uma vez que


humanização pressupõe o respeito à vida humana. Nesse sentido, uma assistência
humanizada e integral, inclui também a assistência espiritual.

Lacaz66, ao discutir a relação da medicina com a humanização e


espiritualidade, refere que “o homem procura sempre alargar os seus conhecimentos,
pensando que, no domínio das chamadas ciências exatas, está a salvação e o bem
estar da humanidade, mas é preciso, na realidade, espiritualizar a técnica e humanizar
a ciência”.

2.4 A Humanização da Assistência Hospitalar e o Trabalho Voluntário na Instituição


de Saúde

A evolução da tecnologia, aliada à falta de consideração da singularidade das


necessidades do paciente e do profissional, tem empobrecido o relacionamento
interpessoal, bem como a intensa atividade à qual o ser humano se expõe tem
causado, também, a limitação e desvalorização das relações. Essa atitude, no
ambiente hospitalar, tem afetado as relações dos profissionais de saúde com os
pacientes internados.

A humanização das instituições de saúde passa pela humanização da sociedade


como um todo. Não se pode esquecer que uma sociedade violenta, iníqua e
60
Contextualização do objeto de estudo

excludente interfere no contexto das instituições de saúde. Essa humanização em


saúde pressupõe considerar a essência do ser, o respeito à individualidade e a
necessidade da construção de um espaço concreto, nas instituições de saúde, que
legitime o humano das pessoas envolvidas. O pressuposto de todo o processo de
atendimento humanizado é facilitar que a pessoa vulnerável enfrente positivamente os
seus desafios67.

Assim, houve necessidade da criação de um setor específico de humanização,


nas instituições hospitalares, com vistas a melhorar o relacionamento profissional-
paciente, lembrando ao homem que ele é humano e carece de atenção, afeto e
cuidado, no amplo sentido da palavra.

A modernidade é essencialmente caracterizada pela revolução na concepção


do próprio homem. Esse novo homem moderno tornou-se individualista, tendo a
pluralidade como pano de fundo, não só relativizando, mas tornando todas as coisas
superficiais, inclusive as relações humanas68.

Para Mezomo69, a humanização dos hospitais pressupõe e exige que alguns


cuidados sejam adotados, relativos aos seguintes aspectos: o ingresso no hospital
(admissão e internação); as condições materiais de estadia no hospital e as condições
psicológicas ou morais desta estadia. Das condições morais, destacam-se as visitas
aos pacientes; a informação aos familiares, as relações com a equipe hospitalar e o
óbito hospitalar. As aspirações e os anseios básicos do homem são: instinto de
conservação, sentimento de dignidade, necessidade de receber estima e consideração,
desejo de segurança e ânsia pelo sobrenatural.

Em 2000, o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar do


Ministério da Saúde (PNHAH), definiu a humanização como “valor na medida em
que resgata o respeito à vida humana, abrangendo circunstâncias sociais, éticas,
educacionais e psíquicas presentes em todo relacionamento humano 70”.

Corroborando com esses pressupostos, Pessini e Bertachini80 afirmam também


que “humanizar o cuidado é dar qualidade à relação profissional da saúde - paciente.
É acolher as angústias do ser humano diante da fragilidade de corpo, mente e
espírito”. Para tanto, é preciso que o profissional de saúde esteja atento e interessado
em ouvir o paciente, escutando-o de fato, para compreendê-lo na sua singularidade e
nas suas necessidades.
61
Contextualização do objeto de estudo

A humanização do hospital exige que se dê, ao paciente, a melhor chance


possível de cura, o melhor equipamento e a competência da equipe de saúde que ali
trabalha. Humanizar também é dar condições de trabalho a essa equipe, bem como
promover o reconhecimento das suas atividades69.

A melhor chance de cura para o paciente pressupõe atendimento integral à


totalidade das suas necessidades biopsicosocioespirituais. Para tanto, o hospital deve
possuir uma equipe multiprofissional completa, capacitada e integrada, com interesse
voltado para a recuperação e melhor condição possível do paciente, ou, se não houver
possibilidade de recuperação, que seja da manutenção da dignidade no final da vida69.

Quando se pretende promover a humanização dos hospitais, deve-se ter, como


premissas, dois aspectos básicos: “cuidar do usuário” e “cuidar de quem cuida”;
incluindo-se todas as dimensões subjetivas do usuário - psíquicas, familiares,
culturais e sociais e, também, daqueles que mais diretamente prestam-lhes seus
cuidados – os profissionais de saúde, atentando para a qualificação profissional e
proporcionando melhores condições de trabalho e qualidade de vida a esses
profissionais, que os ajudem a enfrentar o desgaste provocado pelo constante contato
com a dor, sofrimento, limites e dificuldades no desempenho de seu trabalho 69.

Uma equipe completa para o atendimento das necessidades do paciente não


pode prescindir de médicos especializados, equipe de enfermagem em quantidade e
qualidade adequada, nutricionista, fisioterapeuta, psicólogos, assistentes sociais e
capelães. Na realidade brasileira, só há equipes com essa estrutura oferecida pelos
hospitais quando estes possuem o Serviço de Cuidados Paliativos, que promoveode
ser observado em um atendimento integral e integrado, que beneficia em muito, tanto
o paciente e família como, também, a equipe de saúde como um todo69.

A doença é sempre um processo de análise, uma rara oportunidade para o


auto-encontro, a intimidade reveladora da própria personalidade, causando a perda de
orgulho, vaidades e ilusões de onipotência66. Isso se agudiza na situação do paciente
em fase terminal da vida.

Uma das necessidades mais importantes, quando o paciente se encontra com


uma doença em fase terminal, é aquela que se refere à sua existência, que responde às
suas maiores indagações como ser humano, que pode lhe dar consolo, paz interior e
62
Contextualização do objeto de estudo

esperança, em meio a uma situação que vai se consolidando inexoravelmente para o


fim da sua existência como ser humano nestse mundo.

Nessa situação, a espiritualidade pode proporcionar crescimento em vários


campos do relacionamento. No campo intrapessoal, consigo mesmo, gerando
esperança, altruísmo e idealismo, alem de dar propósito para a vida e para o
sofrimento. No campo interpessoal, com os outros, gera tolerância, unidade e o senso
de pertencer a um grupo. No campo transpessoal, com um poder supremo, desperta o
amor incondicional, adoração e a crença de não estar só70.

Pessini67 conclui sobre oum cuidado digno dizendo que “há muito a fazer em
termos de operacionalização de políticas públicas relacionadas com a questão, bem
como a necessidade de intervir no aparelho formador de profissionais, para criar uma
nova cultura”.

A assistência à saúde, de maneira geral, inclui a dimensão do ser humano em


todas suas facetas e, de maneira particular, a assistência de enfermagem, com uma
visão holística, inclui a assistência espiritual. Esta, pPor permanecer 24 horas ao lado
do paciente, a Enfermagem vive uma situação peculiar, que se comentará a seguir.

Para Huf71, ”o objetivo da Eenfermagem em prestar assistência integral ao ser


humano implica na necessidade do desenvolvimento de intervenções de enfermagem
na dimensão espiritual”.

Já para Boemer72, a relação com o doente implica necessariamente num fazer


essencial, exigindo, além da competência técnica, capacidade crítica, criativa,
sensibilidade e compromisso. Para a mesma autora, essas concepções fragmentadas e
tecnicistas, em que onde ainda predominam os modelos de ensino tradicionais,
fundamentados apenas na lógica da razão, desvinculados do sentir e do agir, pouco
viabilizam a formação de profissionais críticos, sensíveis e transformadores, enfim,
humanos.

O Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem que norteia as condutas


do enfermeiro no exercício da sua profissão apresenta, como princípios fundamentais,
“o comprometimento com a saúde e a qualidade de vida da pessoa, família e
comunidade, garantindo a integralidade da assistência, respeitando a vida, a dignidade
e os direitos humanos, em todas as suas dimensões” 73.
63
Contextualização do objeto de estudo

Há, porém, dificuldade em oferecer essa assistência, pois os enfermeiros


carecem de formação acadêmica, inclusive para estabelecer interação com os
ministros da religião. Isso é realizado mais pelo relacionamento interpessoal do que
por uma construção de competências intencionalmente desenvolvidas na graduação, o
que remete à necessidade de refletir sobre essas questões em estudos futuros.

Atualmente, o amparo legal para a organização curricular dos cursos de


Graduação em Enfermagem, Resolução CNE/CES no3, de 07 de novembro de 2001,
manteve os conteúdos vinculados às ciências sociais e humanas, como indica o art.6º,
inciso II, “referentes às diversas dimensões da relação indivíduo/sociedade,
contribuindo para a compreensão dos determinantes sociais, culturais,
comportamentais, psicológicos, ecológicos, éticos e legais, nos níveis individuais e
coletivos, do processo saúde/doença” como forma de garantir o cuidado integral na
assistência de enfermagem71. Não obstante, a carga horária dedicada a esse conjunto
de saberes é bastante reduzida, quando as diretrizes são postas em prática.

Na prática profissional, cCom o desenvolvimento da versão beta da


Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (ICNP), constata-se a
aproximação entre religiosidade e espiritualidade, uma vez que a dimensão espiritual
é apresentada como: bem estar espiritual, definido como um tipo de bem estar com
características específicas: imagem mental do ser na relação com o princípio de vida
que permeia o ser por inteiro e que integra e transcende a natureza biológica e
psicossocial do ser. Nessa classificação – ICNP, o sofrimento espiritual é definido
como um tipo de sofrimento com características específicas: rompimento na crença a
respeito da vida, questões a respeito do sentido de vida, associado com
questionamento do sofrimento, separação de vínculos religiosos e culturais, mudanças
no sistema de valores e crenças e, sentimento de intenso sofrimento e cólera contra a
divindade”. Já a e a crença espiritual é definida como um “um tipo de crença com
características específicas: convicção pessoal e disposição de conservar ou abandonar
ações, conservando princípios, opções religiosas e fé religiosa que permeiam,
integram e transcendem as naturezas biológicas e psicossocial do ser”71.

Um dos grandes pensadores da atualidade sobre espiritualidade, fé e o sentido


para a vida, Viktor Frankl74 ,Frankl74, aponta esta como um dos caminhos para chegar
ao sentido da vida: “mesmo uma vítima desamparada, numa situação sem esperança,
64
Contextualização do objeto de estudo

enfrentando um destino que não pode mudar, pode erguer-se acima de si mesma,
crescer para além de si mesma e, assim, mudar-se a si mesma”.

A assistência espiritual em enfermagem não tem sido incluída rotineiramente


no processo/prática de enfermagem. Isso se dá pela dificuldade que a equipe de
enfermagem tem, em distinguir claramente as necessidades espirituais das
psicológicas e a espiritualidade da religiosidade, além da insegurança e do despreparo
da equipe de enfermagem em lidar com conflitos ideológicos, filosófico-existenciais e
de crença religiosa65.

O enfermeiro bem preparado pode e deve identificar as necessidades


espirituais do paciente. Pode fazê-lo por meio da Sistematização da Assistência de
Enfermagem (SAE), levantando, no histórico do paciente, sua religião, sua vida
religiosa e suas necessidades espirituais, e observando atitudes como medo, angústia,
culpa, revolta, tristeza, ou mesmo depressão. Existem vários instrumentos
desenvolvidos para esse fim que podem ser usados nesse levantamento. Feito isso, o
enfermeiro pode prescrever para a equipe de enfermagem sob o seu comando, e para
ele mesmo, realizar, disponibilidade para ouvir o paciente e/ou, em caso de paciente
terminal, estar ao lado deste e de sua família, encorajando-a a se relacionar com o
paciente, expressando seus sentimentos, realizando desejos possíveis dos pacientes e
familiares, facilitando a relação entre o paciente, família e equipe de saúde em
questões bioéticas, favorecendo a aceitação do tratamento, a doação de órgãos e,
quando houver necessidade, solicitar outros profissionais de saúde como psicólogos,
assistentes sociais, ou ainda ministros religiosos e capelães, para que seja oferecida
assistência interdisciplinar.

Pode-se observar que existem vários hospitais brasileiros, principalmente


hospitais públicos, com Serviços de Assistência Religiosa formalmente instituídos.
Alguns têm diversos serviços religiosos, contemplando as religiões mais prevalentes,
como a católica, as evangélicas e espírita, com ministros específicos de cada uma.

Em outros hospitais, principalmente nas instituições particulares, observa-se a


presença de um único ministro religioso que atende todas as necessidades espirituais
dos pacientes. Essa situação parece pouco confortável e eficaz, uma vez que é muito
difícil oferecer assistência espiritual profunda quando a relação se dá entre pessoas
com diferentes valores espirituais.
65
Contextualização do objeto de estudo

É possível, no entanto, uma atitude de acolhimento, no sentido de estar


disponível e presente para ouvir o paciente, e também para identificar suas
necessidades espirituais, encaminhando-as ao ministro religioso específico da sua
religião, se assim o paciente expressar sua vontade.

Nesse sentido, tem se empregado o termo “ecumenismo” para serviços de


assistência religiosa que trabalham juntos, ou equivocadamente, às vezes, o
administrador, por questões de diminuição de custos, tenta contratar um único
ministro de uma religião específica, de preferência a religião prevalente da clientela,
para assumir a assistência de todas as outras. Ora, não é possível prover um serviço
religioso que atenda a todos os credos com um único ministro de uma religião. A
idéia do ecumenismo é que todos os credos são válidos, mas o que direciona a
assistência é a necessidade do paciente.

A palavra “ecumenismo” pode ter vários sentidos ou significados. Ela se


origina da palavra grega oikoumene, formada a partir de duas outras palavras: do
substantivo oikos, que significa casa, habitação, família, descendência, povo; e do
verbo meno, que significa ficar, permanecer, persistir, existir. No século XIX, o termo
ecumenismo indicava um sentido geográfico e universal, mas, depois da Primeira
Guerra Mundial, houve uma “reunião internacional de Igrejas” de cunho ecumênico,
com o objetivo de resolver o problema da paz. Nesse sentido, a palavra “ecumênico”
apresentou uma nova interpretação, que caracterizava uma relação amistosa entre
Igrejas, com o intuito de promover a paz internacional. A partir da Conferência de
Oxford, ocorrida em 1973, o termo “ecumênico” passou a designar, definitivamente,
as relações denominacionais e interdenominacionais de diferentes igrejas. Como
termo, em sua acepção técnica e moderna, significa a totalidade de Igrejas que se
relacionam, embora estando separadas porque representam várias confissões, com o
intuito de representar a universalidade do cristianismo 75.

Mellon76, diretor do Serviço de Capelania do Frederick Mennonita


Community, nos EUA, em seu artigo sobre Aspectos Éticos em um Serviço
Ecumênico, escreve que algumas questões são puramente religiosas ou teológicas,
enquanto outras podem envolver decisões éticas complexas. O capelão tem que ter
uma fundamentação teológica, como ponto de partida para o ministério, deve estar
aberto para a posição de facilitador, e respeitar a fé do paciente, mantendo um
66
Contextualização do objeto de estudo

relacionamento de aceitação e confiança para que o cuidado de clínica pastoral seja


efetivo. O capelão pode ser chamado em qualquer situação, desempenhando o papel
de confortador, mediador, educador, conselheiro e para opinar em situações de cunho
ético.

Já Vassão15 crê na liberdade de crença e culto e no respeito entre as religiões e


os religiosos. Crê na convivência pacífica e respeitosa entre religiosos, mas não em
comungar das mesmas crenças ou em deixar-se desrespeitar ou pressionar por estas.

A princípio, a medicina via o homem sob o aspecto meramente biológico e


orgânico. Com o surgimento de um novo paradigma, que observa o homem
biopsicossocial, para Pessini65, foi introduzida a dimensão espiritual do ser humano
como “um importante componente de trabalho na área de cuidados na saúde”.

Corroborando com essa tendência, destaca-se a relação entre a assistência


espiritual a partir de códigos de ética médica e em alguns documentos internacionais,
como: a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos da Unesco, de
2005; e a declaração sobre os direitos do paciente de 2008 da AMA (Associação
Médica Mundial) que afirma que “o paciente tem o direito de receber ou recusar
conforto espiritual ou moral, incluindo a ajuda de um ministro de sua religião de
escolha”65.

No Brasil, em 2009, o Ministério da Saúde aprovou a Portaria no.1.820, que


dispõe sobre os direitos e deveres dos usuários da saúde nos termos da legislação
vigente (artigo 1º), que passou a se constituir na “Carta dos Direitos dos Usuários da
Saúde”. Nela, o artigo 4º e o seu parágrafo único afirmam65:

”Toda pessoa tem direito ao atendimento humanizado e acolhedor, realizado


por profissionais qualificados, em ambiente limpo, confortável e acessível a
todos. Parágrafo único: ÉÉ direito da pessoa, na rede de serviços de saúde,
ter atendimento humanizado, acolhedor, livre de qualquer discriminação,
restrição ou negação em virtude de idade, raça, cor, etnia, religião,
orientação sexual, identidade de gênero, condições econômicas ou sociais,
estado de saúde....”
Por outro lado, a Joint Commission for the Accreditation of Healthcare
Organization (JCAHO)32 tem proposto a criação de protocolos religiosos espirituais
desde 1969. Uma nova linguagem além da que já existia, sobre religião e
espiritualidade foi incluída nos “Guidelines” sobre opções de dieta, preocupação com
67
Contextualização do objeto de estudo

a dor, resolução de dilemas sobre temas de cuidado de pacientes, temas sobre final de
vida, de tratamento e responsabilidade para a equipe.

Muitos hospitais tem oferecido o Serviço de Capelania através de voluntários


e capelães hospitalares, com suporte financeiro do hospital ou de organizações
religiosas locais. Sabe-se que os hospitais que dão o primeiro passo, com a
contratação de capelães, entendem que seu trabalho colabora com as enfermeiras, os
médicos e outros profissionais de cuidado de saúde32.

Em estudos realizados por Cadge, Freese e Christakis32, em 2008 e publicado


pelo periódico Southern Medical Association, 54% a 64% dos hospitais, no período
estudado, entre 1980 e 2003, tinham um Serviço de Capelania. Entre 1993 a 2003, o
tamanho do hospital, localização e filiação de igreja foram os fatores centrais que
influenciaram na existência do Serviço de Capelania. Pequenos hospitais e aqueles
nas áreas rurais foram os que tiveram menores possibilidades de terem o Serviço de
Capelania. A integração igreja/hospital tornava mais provável que houvesse o Serviço
de Capelania; mas entre 1993 e 2003, a integração igreja/hospital tendeu a diminuir a
existência do Serviço de Capelania. O hospital sem fins lucrativos e com investidor
próprio também facilitou o estabelecimento do Sserviço de Ccapelania. Encontrou-se,
também, uma relação positiva, entre ter um Serviço de Oncologia e um Serviço de
Capelania.

Quanto ao trabalho voluntário, no âmbito internacional, a atuação desse tipo


de ação social foi reconhecida com a decisão da Organização das Nações Unidas
(ONU) que estabeleceu o Ano Internacional do Voluntariado em 200177. No Brasil,
sua regulamentação se deu pela promulgação da Lei no 9.608 em 19/02/98, que
definiu o voluntariado como sendo uma atividade não-remunerada prestada por
alguém a uma entidade pública ou instituição sem fins lucrativos, com objetivos
cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência, dissociada
de qualquer obrigação de natureza trabalhista, previdenciária ou afim, regulamentada
por um termo de adesão estabelecido entre a entidade e o prestador do serviço 78.

Em 1995, a Fundação Abrinq pela Defesa dos Direitos da Criança apresentou


uma definição de voluntario bastante abrangente. “Voluntario é o ator social e agente
de transformação, que presta serviço não remunerado em benefício da comunidade.
Doando seu tempo e conhecimentos, realiza um trabalho gerado pela energia de seu
68
Contextualização do objeto de estudo

impulso solidário e atende, não só às necessidades do próximo, como também aos


imperativos de uma causa. O voluntário atende também suas próprias motivações
pessoais, sejam elas de caráter religioso, cultural, filosófico ou emocional” 79.

Pavão80, escrevendo sobre a religião e o serviço voluntário, estabeleceu que


“este serviço é a manifestação visível e prática da fé no âmbito das religiões, ao
confortar seu semelhante em estado de debilidade”. Apresentou o hospital como um
ambiente multifacetado e que não é bem visto, principalmente para uma sociedade
moderna que cultua a saúde, a beleza e o vigor. Acerca da assistência espiritual no
hospital realizada pelo voluntário, o mesmo autor afirma que este deve conhecer a
linguagem específica e o padrão de comportamento apropriado, bem como as
diferenças e a tolerância e vivência interdisciplinar, no ambiente hospitalar.

O Voluntariado faz parte do Terceiro Setor, que “são todas as instituições sem
fins lucrativos que, a partir do âmbito privado, perseguem propósitos de interesse
público79” 79.

Torna-se importante ressaltar que o Terceiro Setor engloba todas as


instituições filantrópicas de prestação de serviço ligadas à área da saúde, educação,
crianças de rua, bem-estar social e as organizações que defendem direitos de grupos
minoritários, promoção do esporte, cuidado e proteção ao meio ambiente e promoção
da cultura, o que estratifica seu amplo espectro. Essas organizações têm como
principais características: não integrarem o aparelho governamental; não distribuírem
lucros a acionistas ou investidores, nem terem tal finalidade; se autogerenciam e
gozarem de alto grau de autonomia interna e envolverem um número significativo de
participação voluntária. O Terceiro Setor constitui uma grande força econômica pelos
números que apresenta como gerador de empregos, em termos de despesas e de
valores nele aplicados78,79.

Nas pesquisas relacionadas ao Terceiro Setor, têm chamado aà atenção o


aumento do voluntariado corporativo e suas implicações no mundo do trabalho e na
construção de um vínculo maior entre o indivíduo e a sociedade 81.

A profissionalização é um item muito importante na alavancagem do Terceiro


Setor no Brasil e constitui, sem dúvida, um grande desafio. Visa resultados e
produtividade crescente, que é fundamental para o desenvolvimento da entidade
como um todo e para a qualidade do atendimento destinada à clientela, que são os
69
Contextualização do objeto de estudo

benefícios gerados pelos voluntários. Produtividade, nesse contexto, não é definida


como um ganho de mercado ou lucro, mas como a capacidade de aumentar o volume
de atingimento da missão primordial do setor. Dessta forma, qualidade, é definida
como melhoria constante da performance do voluntário; e eficiência e competência
são definidas como a melhor forma de fazer algo com os recursos disponíveis 79.

Considerando o voluntário como uma ajuda a outras pessoas, constitui-se uma


forma de enfrentamento aos agentes estressores daquele que ajuda, ajudando a si
próprio, promovendo distração para seus problemas, aumentando o senso, o valor e o
significado da própria vida78.

No Brasil, o setor de voluntariado tem visado principalmente a caridade, o que


sem dúvida se refletiu e continua se refletindo no benefício da coletividade. A palavra
caridade em latim, caritas e no grego charis, significa graça e gratidão, e indica a
relação do indivíduo com o bem-estar do próximo na comunidade. Ela está presente
em quase todas as religiões, principalmente naquelas que possuem o maior número de
adeptos no Brasil. Somos um país eminentemente católico, que foi colonizado por
jesuítas, responsáveis pela primeira missão do servir, que data de 1534, com a
abertura da primeira Santa Casa de Misericórdia 79.

O hospital e a atividade voluntária possuem uma intrínseca e antiga relação.


Desde sua origem, o hospital contou com a presença de indivíduos que doavam seu
tempo em favor dos doentes e pobres. Na busca incasávelincansável pela cura, o
hospital foi se tornando um ambiente “frio”, que não percebe muitas vezes a pessoa.
Assim, o voluntário hospitalar tem sido visto como uma peça de fundamental
importância no resgate de valores humanísticos81.

NJá na área da saúde, a caridade sempre foi ligada à religião; por isso, grande
parte dos candidatos a voluntários na área da saúde serve em nome de Deus,
impelidos por sua formação religiosa. Quase todas as religiões do mundo, desde a
mais antiga até as mais novas, consideram a caridade como a maior das virtudes.
Esses ensinamentos, ditados por Jesus, Alá e Buda, estão expressos na Bíblia, no
Alcorão e na Torah, dentre outros livros religiosos. As igrejas evangélicas, por serem
de origem cristã, têm, na caridade, um trabalho importante, sendo bastante atuantes
no auxílio aos encarcerados, pobres e doentes mentais. No espiritismo, mais do que
um valor, a caridade é um mandamento e, como tal, demanda recursos tanto pessoais
70
Contextualização do objeto de estudo

como financeiros, seja-nos diversos centros espíritas ou em outras instituições


filantrópicas. A tradição judaica data das mais remotas origens, desde Abraão, “o
primeiro judeu”, que ordenava a seus filhos e sua casa que guardassem o caminho de
Deus para a caridade e a justiça79.

Ao contrário do profissional da saúde, que pode se apoiar na formação e no


aparato técnico, o voluntário pode se ver exposto ao estresse, tornando-se inadequado
e, em casos mais graves, comprometer a assistência ao paciente 78, o que pode ser
minimizado mediante o preparo e a supervisão adequados, o que tem sido
providenciado pelas Organizações Religiosas..

As entidades mais antigas e estruturadas ainda conseguem reduzir os


problemas quanto à falta de compromisso dos voluntários que entram e saem e não
cumprem os horários, pois têm um grau mais apurado de organização, quer pela
experiência, quer pelo tempo de existência e pelo enfoque profissional de seu
gerenciamento. O voluntário tem que saber que, tanto a pessoa assistida como a causa
abraçada, dependem fundamentalmente de seus esforços, e que seu trabalho deve ser
exercido com toda a dedicação79.

O voluntário necessita de capacitação e treinamento permanentes, em especial


no que se refere à atuação junto a portadores de doenças crônicas que necessitam
cuidados especiais e apoio emocional78.

O perfil ideal de um voluntário é que ele seja assíduo, pontual, responsável,


que tenha boa vontade, paciência, prontidão, iniciativa, criatividade, vontade de
mudar, e seja pró-ativo. Ainda alguns fatores importantíssimos devem ser levados em
consideração como: equilíbrio no servir, desprendimento para tolerar aborrecimentos,
obediência à hierarquia, humildade e perseverança79.

Então, como se viu, vários aspectos do cuidado humanizado estão envolvidos


no ambiente hospitalar. Há toda uma ação frente à humanização, que tem uma série
de prescrições que precisam ser obedecidas. Por outro lado, a humanização não pode
prescindir do atendimento das necessidades espirituais, que se manifestam de várias
formas.

Assim, a assistência espiritual pode atender essa necessidade do paciente de


alguma maneira. Para muitas pessoas, essa necessidade está presente, porém, num
71
Contextualização do objeto de estudo

país como o Brasil, em que a liberdade de culto permite a existência de várias


religiões, a assistência espiritual é difícil de ser contemplada, mas, quando o paciente
está internado, sofrendo angústias espirituais, este quer ser atendido na perspectiva
dos seus valores espirituais; portanto, essa é uma questão que deve ser levada em
consideração.

Foi nessa direção que a Capelania Evangélica pode se estabelecer no IIER, na


ocasião em que essa necessidade se manifestou, cabendo indagar como esse serviço
foi implantado.
71
Objetivo

3 OBJETIVO

3.1 Objetivo Geral

Descrever e analisar o processo histórico da criação e instalação do Serviço de


Capelania Hospitalar Evangélica em um hospital público especializado.

3.2 Objetivos Específicos

a) Evidenciar os contornos do contexto histórico-social em que se deu a


criação e implantação do Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar do
Instituto de Infectologia Emílio Ribas;
b) Descrever as atividades desenvolvidas pelo Serviço de Capelania
Evangélica Hospitalar do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, nos primeiros
anos de seu funcionamento;
c) Revelar e explicar os principais movimentos empreendidos pelos atores
sociais envolvidos nos processos de criação e instalação do Serviço de
Capelania Evangélica Hospitalar do Instituto de Infectologia Emílio Ribas; e
d) Delinear o modelo de organização do Serviço de Capelania Evangélica
Hospitalar do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.
72
Método

4 MÉTODO

4.1 Tipo de estudo

Estudo descritivo, de caráter histórico-social, cujo desenvolvimento apoiou-se


ar-se-á na análise de fontes documentais primárias orais e físicas.

O objeto das Ciências Sociais é histórico, dado que as sociedades humanas


existem num determinado espaço, cuja formação social e configurações culturais são
específicas. Elas vivem o presente marcado pelo passado e projetado para o futuro
que em si traz, dialeticamente, as marcas pregressas, numa reconstrução constante do
que está dado e do novo que surge82.

Observa-se que há crescente interesse, na área da saúde e especialmente na


Enfermagem, por estudos históricos, utilizando a análise documental e história oral.

Silva Junior83 destaca “que os dados obtidos nos documentos não trarão, por si
só as respostas às questões da pesquisa. Esses carecem de elaboração intelectual do
pesquisador, com triangulação das informações das outras fontes documentais e da
interpretação dos documentos na base teórica em estudo”.

Para Pope e Mays84 triangulação, envolve:

a comparação dos resultados entre dois ou mais métodos diferentes


de coleta de dados (por exemplo, entrevistas e observação) ou, mais
simplesmente, entre duas ou mais fontes de dados (por exemplo
entrevistas com membros de diferentes grupos de interesse). O
pesquisador procura padrões de convergência para desenvolver ou
corroborar uma interpretação global. A triangulação é geralmente
aceita como um meio de assegurar a abrangência de um conjunto
de achados.

Na presente pesquisa, para análise dos resultados foi utilizada triangulação


comparando a transcriação das entrevistas realizadas com as fontes documentais e
achados da revisão bibliográfica sobre o tematema. .
73
Método

Um estudioso espanhol da metodologia histórica, Julio Arostegui85, ensina:

a análise documental está embutida no processo geral da pesquisa


científica que considera sempre que as fontes equivalem ao campo
geral da observação, na qual hão de ser obtidos os dados. O
agrupamento das evidências documentais é a base empírica
decisiva de qualquer pesquisa e a idoneidade de tal base, sempre
com relação ao tipo de objetivos que a pesquisa pretende atingir, é
a função final da crítica e avaliação das fontes [...] a análise
documental poderia ser definida como o conjunto de princípios e de
operações técnicas que permite estabelecer a fiabilidade e
adequação de certo tipo de informação para o estudo e explicitação
de um determinado processo histórico.

Por outro lado, a história oral, por meio de entrevista gravada, objetiva
preencher os vazios da historiografia deixada pelos documentos. Sua contribuição
tem maior importância em áreas pouco estudadas. Sobre ela, concluem Luchesi e
Lopes86: “fazer história oral tem como base produzir conhecimento científico e não
apenas obter relatos das experiências da vida dos sujeitos”.

Para Carrijo87,

em pesquisas da área de Enfermagem, a história oral é usada de


diversas maneiras. Alguns autores a usam na forma pura, ou seja, o
depoimento do pesquisado é a única fonte de coleta e análise;
outros usam-na de modo híbrido, isto é, com depoimentos
associados a fontes escritas, como, por exemplo, textos
manuscritos, impressos e outros.
A história oral pode ser entendida como método de pesquisa que implica em
realizar entrevistas gravadas com pessoas que podem testemunhar sobre
acontecimentos, conjunturas, instituições, modos de vida ou outros aspectos da
história contemporânea88.

As entrevistas de histórias oraisl são tomadas para a compreensão do passado,


ao lado de documentos escritos, imagens e outros tipos de registro. Caracterizam-se
por serem produzidas a partir de um estímulo, pois o pesquisador procura o
entrevistado e lhe faz perguntas sobre o fato ou a conjuntura que quer investigar 88.

Para Sanna89, que analisa esse método de forma a vê-lo de maneira mais
abrangente, “o uso da História Oral possibilita o conhecimento de um grupo ou de
uma sociedade vista do seu interior, revelando como os depoentes interagem e qual a
lógica da construção de relações naquele contexto”.
74
Método

Assim, considerando a aproximação desejada do objeto do estudo para atingir


os objetivos da pesquisa, empregar-se-á também a história oral como método de
pesquisa.

4.2 Limites temporais

O recorte histórico da presente pesquisa se inicia em 1992, ano do inicio das


atividades da Capelania Evangélica Hospitalar no Instituto de Infectologia Emilio
Ribas (IIER), e vai até o ano de 2004, época da nomeação do padre João Inácio
Mildner como representante, junto à Diretoria Técnica do IIER, das entidades
religiosas que assistem seus pacientes.

O fato de haver uma portaria para designar o padre João Inácio Mildner para
um ser o representante, junto à diretoria técnica do IIER, das entidades religiosas,
formalizou a instituição da Capelania Evangélica Hospitalar no IIER em 2004, uma
vez que, se houvesse apenas uma capelania, não haveria necessidade de nomear-se
um representante de todas as entidades religiosas, configurando a existência formal de
outras entidades com a mesma finalidade, na instituição.

4.3 Local de Estudo

O Instituto de Infectologia Emilio Ribas foi uma das primeiras instituições de


saúde de São Paulo e, desde o início da década de 1980, com o surgimento dos
primeiros casos de pacientes com AIDS, o hospital tem buscado novos
conhecimentos e aperfeiçoamentos, a fim de enfrentar esse novo desafio. Nesse
âmbito, pPossui parcerias com instituições de ensino para a formação e
aperfeiçoamento profissional em infectologia, recebendo estagiários de várias áreas
da saúde90.

O IIER é um hospital porte I91 que possui 200 leitos de internação e 17 leitos
de UTI (Unidade de Terapia Intensiva). O atendimento especializado compreende
várias áreas: cirurgia, neurologia, neurocirurgia, ginecologia, oftalmologia,
otorrinolaringologia, psiquiatria, hematologia e pneumologia infantil. Oferece
serviços tais como Grupo de Atendimento à Gestante com AIDS; Grupo de
75
Método

Tuberculose; Consulta de Sorologia alternativa, realizada por enfermeiros para


pessoas aconselhadas a fazer o exame de HIV; e Cuidados Paliativos90.

Também possui trabalhos voluntários como: Saber Continuado, Leitura


Solidária, Doutores da Alegria, Projeto Carmim, como trabalho de humanização e
Assistência Religiosa, oferecendo assistência psico-espiritual aos pacientes,
familiares e funcionários, através da presença efetiva dos capelães, auxiliares de
capelania ou agentes de pastoral90, que lá atuam desde 1992, razão da escolha da
oinstituição para a realização do presente estudo.

4.4 Fontes

4.4.1 Fontes Primárias

Fonte primária é aquela que teve relação direta com os fatos analisados
existindo um relato ou registro da experiência vivenciada. Transcrições oficiais,
documentos e matérias que reproduzem registros diretos de um acontecimento
constituem-se também em fontes primárias. A fonte primária está relacionada
diretamente com o evento82.

As fontes documentais escritas selecionadas para o presente estudo fornecem


informações sobre movimentos da instituição de saúde referentes à criação e
implantação do Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar. Entre elas estão livros de
atas de reunião, recortes de jornais, boletins informativos, correspondências entre
igrejas, documentos administrativos sobre a capelania hospitalar, leis e decretos.

As fontes orais foram oriundas de entrevistas realizadas com pessoas chave


para a compreensão do tema: dois capelães, um diretor clínico da instituição, um
enfermeiro e uma usuária do serviço que, posteriormente, se tornou secretária da
ACEH, que participaram diretamente da implantação do Serviço de Capelania
Hospitalar Evangélica, no local de estudo. As pessoas entrevistadas desempenharam
papel relevante na estrutura hospitalar e na interação com o objeto de estudo e seus
depoimentos foram obtidos por meio de entrevistas exploratórias..
76
Método

As entrevistas exploratórias têm a função de trazer à luz certos aspectos dos


fenômenos estudados, sobre os quais o pesquisador não teria espontaneamente
pensado por si mesmo. É essencial que a entrevista ocorra de forma aberta e flexível,
e que o pesquisador evite realizar muitas perguntas e abster-se de se manifestar sobre
o conteúdo da entrevista e, do ponto de vista técnico, é indispensável gravá-la. Os
entrevistados devem ser um público a que o estudo diz diretamente respeito, e que,
por sua posição, pela sua ação ou pelas suas responsabilidades, tenham bom
conhecimento do objeto de pesquisa92.

4.4.2 Fontes secundárias

As fontes secundárias são aquelas que não têm relação direta com o
acontecimento registrado, mas se referem a ele e apresentam ampla variação em
relação à proximidade do acontecimento. Na fonte secundária existe pelo menos outra
pessoa que participa da geração da informação82.

As fontes secundárias foram constituídas da literatura científica sobre o


assunto: artigos de periódicos, livros, dissertações e teses que focalizaram o tema
história da instituição de capelanias de forma geral e a implantação da Capelania
Hospitalar Evangélica em foco. Para a pesquisa da literatura científica, foram
utilizados os descritores “Capelania, Serviço Religioso no Hospital”, em bases de
dados referência em saúde, o que resultou em relatório de pesquisa realizada por
Gentil, Guia e Sanna 31, um estudo bibliométrico publicado em 2011.

4.5 Procedimentos Éticos

Seguindo os preceitos éticos da pesquisa científica e atendendo ao disposto na


Rresolução 196/96 do Ministério da Saúde, o projeto de pesquisa foi submetido aos
Comitês de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo e do Instituto de
Infectologia Emilio Ribas e por eles aprovados com os números 1741/09 e 039/2010,
respectivamente, como indicados nos anexos 1 e 2.
77
Método

Aos entrevistados da pesquisa foi entregue o Termo de Consentimento Livre e


Esclarecido (Anexo3), no qual, por meio de suas assinaturas, expressaram sua
concordância em participar do estudo. Este também cumpriu o papel de termo de
doação de direitos autorais, necessidade indicada por Luchesi e Lopes86, como se
pode ver no texto desse documento.

4.6 Coleta de dados

4.6.1 Fontes Orais

A coleta dos dados deu-se a partir de contato prévio pessoal e por telefone, e
os encontros realizaram-se, na maioria, no local de trabalho dos entrevistados, sendo
apenas um deles realizado na residência do entrevistado. A duração do encontro foi
estabelecida de acordo com a disponibilidade e esgotamento do assunto abordado.
Não houve necessidade de um segundo encontro com qualquer dos entrevistados,
para complementar a entrevista, porém, após leitura da transcrição, um entrevistado
solicitou que alguns trechos da entrevista não integrassem a pesquisa, no que o
mesmo foi atendido.

O roteiro de entrevista semi estruturada93 (Anexo 4) foi empregado na


obtenção dos depoimentos, colhidos integralmente pela autora do estudo.

As entrevistas ocorreram entre maio e novembro de 2010, e o trabalho da


legitimação dos depoimentos pelos entrevistados foi concluído no mês de março de
2011. O tempo médio de duração das entrevistas foi de 5049 minutos
aproximadamente.

A gravação foi feita em registro digital e posteriormente transcrita pela


pesquisadora, tendo-se a preocupação com a fidelidade da narração, utilizando-se
sinais gráficos para marcar a interrupção de palavras, frases ou parágrafos, entre
78
Método

outros cuidados. Concluída a narrativa, finalizou-se a coleta de dados com a


transcrição, impressão e rubrica das páginas impressas contendo a transcrição, pelo
narrador, para que este assegurasse, à pesquisadora, que era autor do texto transcrito e
que este conferia com a entrevista concedida.

4.6.3 Fontes Escritas

Os documentos escritos relativos à instalação da Capelania Evangélica


Hospitalar do IIER foram obtidos no acervo do Departamento de Humanização do
IIER. Houve grande dificuldade na obtenção desses documentos, pois, no ano de
2010, o IIER passou por reforma física, o que causou o extravio de documentos
referentes ao Serviço de Capelania do IIER. Nesse mesmo ano, foi criado o
Departamento de Humanização, que ficou responsável pela guarda desses
documentos.

A esse respeito Richardson82 afirma que uma boa análise histórica consiste,
por um lado, na interpretação dos dados existentes e, por outro, no exame dos fatores
que podem ter contribuído para a sobrevivência dessas informações e o
desaparecimento de outras.

Os documentos encontrados estavam em boas condições e foram copiados


eletrostáticamente e certificados como cópia de originais, pela instituição cedente.

O acervo da ACEH também foi consultado, além do acervo do Serviço de


Capelania Evangélica Hospitalar do IIER. Eventualmente, outras fontes documentais
escritas foram obtidas, quando da realização de entrevistas, quando os entrevistados
apresentaram material inédito, sendo incorporadas ao estudo.

Os documentos encontrados estavam em boas condições e foram copiados


eletrostaticamente e certificados como cópia de originais, pela instituição ou pessoa
cedente.

Foram coletados 87 documentos (totalizando 290 paginas copiadas


eletrostaticamente), entre regimentos, convocações, cartas, relatórios, declarações,
boletins, jornais, estatuto e outros, dos quais 31 integraram o presente estudo.
79
Método

4.6.4 Fontes secundárias

Foi realizada a cópia de 64 textos integrais de publicações científicas, cujas


indicações foram capturadas das bases de dados consultadas. A aquisição desses
artigos foi dificultada pela indisponibilidade de mais da metade (46) em território
nacional. Essas 46 publicações tiveram, então, que serem importadas pela Biblioteca
Central da UNIFESP, o que também demandou em torno de um mês de espera.

Foi os EUA o país que mais produziu artigos sobre o tema, (53) 82,81%,
seguido de Canadá e Inglaterra, com (3) 4,8%31.

O periódico “Journal of Pastoral Care & Counseling” foi o que apresentou


maior número de artigos escritos (22), 34,37%, seguido do “Journal of Health Care
Chaplaincy” (8), 12,50%. O “Southem Medical Journal”, com (7) 10,93% citações,
apresenta temática variada, não se concentrando em aspectos espirituais, e ficou em
terceiro lugar entre os veículos de publicação que mais abordaram o tema 31.

Construíram-se classes temáticas a partir da relação intrínseca entre as


palavras-chave. Algumas tinham um conceito bem definido, assim como incidência
representativa. Observou-se que três tinham valor formativo para o exercício da
Capelania; seis apresentavam valor religioso e três espiritual. Cinco remetiam a valor
profissional (de recursos humanos); dois representavam a quem se destina a
Capelania e seis mostravam uma relação com os aspectos organizacionais
desencadeados pela Capelania. Mais quatro termos representavam aplicações ou
processos desencadeados pela prática da Capelania e 14 termos não encontraram seu
lugar nessas relações31.

Observou-se também, pela diversidade de periódicos em que as publicações se


ditribuíramdistribuíram (29), que se trata de um conhecimento de natureza
interdiciplinarinterdisciplinar, pois abrange várias áreas como: administração
hospitalar, organização de serviços, recursos humanos, políticas públicas, ética,
entidades de classe, especialidades de atenção médica e aspectos clínicos e
administrativos de enfermagem31.
80
Método

O Estado de New York, nos EUA, foi o local de origem geográfica de


residência dos autores mais freqüente, com 11 publicações, seguido por
IlinóisIllinois com cinco, Califórnia, com quatro, e Texas, com três publicações31.

4.7 Armazenamento e organização dos dados

Foram organizados dois bancos de dados: um com as informações obtidas na


pesquisa de literatura científica e outro sobre os documentos escritos, identificando-os
quanto a: tipo de documento, data, autoria e resumo do seu conteúdo.

Os bancos de dados foram organizados através de planilhas eletrônicas, com o


uso de ferramenta Microsoft Excel.

Após a leitura dos documentos, de acordo com sua relação com o objeto deo
estudo, foi realizado seu ordenamento em ordem cronológica. Esses foram, então,
armazenados em pasta arquivo, dentro de sacos plásticos individuais, de onde foram
retirados para consulta ao longo da construção dos capítulos da presente tese e
novamente lá armazenados.

4.8 Procedimentos de análise

Os depoimentos orais foram submetidos ao que Meihy94 conceitua como


“transcriação”: a ação que surge da necessidade de reformular a transcrição literal
para torná-la compreensível à leitura. Para esse autor, a transcriação é um processo no
qual se procura corrigir a desigualdade existente entre o código oral e o código
escrito, por meio da retirada de palavras, frases e parágrafos, ou sua alteração
/acréscimo, em busca de que o não literalmente dito seja dito, e o dito seja
compreendido. Como método para a transcriação, Meihy94 estabelece etapas que
foram cumpridas pela pesquisadora, na elaboração do presente trabalho: a transcrição
literal, a primeira textualização, a codificação e a indexação, a segunda textualização
e a conferência e legitimação.
81
Método

A primeira dessas ações, de acordo com Sanna89, é composta pela versão da


palavra falada para a palavra escrita, utilizando-se a gravaçãofita gravada; e esta deve
ser a mais completa e rigorosa possível. A segunda ação se deu pela incorporação de
perguntas à fala do entrevistado, transcrevendo-se cada parágrafo, para a melhor
compreensão. A seguir passou-se à terceira etapa, quando foram agrupados os
parágrafos que se referiam ao mesmo conteúdo, o que colaborou para a passagem da
comunicação sob a forma oral para a lógica da comunicação escrita.

A seguir, com as transcrições validadas pelos narradores, efetuou-se a leitura


das entrevistas, buscando-se eixos norteadores da organização destas. A partir desses
eixos norteadores, foi elaborada uma listagem de temas de cada entrevista que, em
seguida, foram codificadas. Os códigos correspondentes aos temas foram, então,
dispostos em cada parágrafo e frase e estes orientaram o agrupamento dos conteúdos.

De acordo com Pope e Mays84, em algumas situações, pode ser adequado


avaliar a confiabilidade interavaliador da codificação, ao pedir que outro pesquisador,
separadamente, codifique alguns dos dados brutos usando critérios de codificação
previamente acordados. Então, para a validação dos procedimentos de análise,
contou-se com a colaboração de dois pesquisadores, que participaram do processo de
análise em diferentes etapas.

O primeiro deles acompanhou todo o processo de transcrição, comparando as


transcrições literais das entrevistas aos depoimentos construídos por transcriação e
listagem de temas organizados pela pesquisadora, observando se havia omissões,
acréscimos e interpretações equivocadas, no texto composto sob a forma de
depoimento. Com a listagem de temas, observando os critérios de similaridade,
pertinência e equivalência entre eles, construíram-se as categorias temáticas e este
procedimento foi submetido a um segundo pesquisador, para validação.

As 31 fontes documentais escritas tiveram, como tratamento, o fichamento


temático de cada documento e, depois, um tratamento por afinidade de temas (análise
de conteúdo), em busca de diferenças, semelhanças e idiossincrasias que, junto à
análise dos diferentes depoimentos, resultou na descrição da criação e implantação
da Capelania Hospitalar Evangélica em foco. A descrição foi, por fim, pontuada com
a literatura científica pesquisada, para atribuição de sentido ampliado aos aspectos
descritos.
82
Método

4.9 Referencial Teórico-filosófico de Análise

Para o referencial teórico de análise usou-se as proposições de Max Weber,


que são adequadas para o entendimento de estruturas organizacionais complexas,
além da vinculação existente entre os escritos desse autor e o pensamento cristão
protestante e a organização do trabalho, o que permitiu o entendimento do objeto de
estudo.

Historiador, sociólogo, economista e político, Max Weber tratou de problemas


metodológicos sabendo das dificuldades do trabalho efetivo do historiador e do
sociólogo. Sua obra profunda e complexa constitui um momento de compreensão dos
fenômenos históricos e sociais e, ao mesmo tempo, da reflexão sobre o método das
ciências histórico-sociais95.

Para Max Weber, o cientista social deve estar pronto para o reconhecimento
da influência que as formas culturais, como a religião, por exemplo, podem ter sobre
a estrutura econômica. Para ele, a Sociologia é uma ciência que procura compreender
e interpretar o significado da ação social e dar explicações do prosseguimento e efeito
produzido por esta ação. Considera, assim, o indivíduo e suas ações como ponto
chave da investigação, favorecendo a compreensão e a percepção do sentido que a
pessoa atribui à sua conduta95.

Ressalta em seus escritos que, ao tratar da subjetividade, o cientista social não


está fazendo psicologia, e sim afirmando que a “sociedade é fruto de uma inter-
relação de atores sociais, em que as ações de uns são reciprocamente orientadas em
direção às ações dos outros82”. Refere ainda que o indivíduo, como portador de
cultura e de valores socialmente dados, é a “constelação singular 82” que informa
sobre a ação social de seu grupo, tendo-se em conta que o limite de suas informações
é seu próprio valor.

Dessa forma, o comportamento só é ação social quando o ator atribui, à sua


conduta, um significado ou um sentido próprio, e essa conduta se relaciona com o
comportamento de outras pessoas95.
83
Método

Assim, para Weber, na leitura de Minayo82, “a sociologia requer uma


abordagem diferente das ciências da natureza, dentro dos seguintes parâmetros:
realização de pesquisas empíricas, a fim de se construírem dados que consigam
explicar as formulações teóricas; os dados devem derivar do modo de vida dos atores
sociais; os agentes sociais dão significados a seus ambientes, relações e eventos de
forma extremamente variada; e os mesmos agentes podem também descrever,
explicar e justificar suas ações, motivadas por causas tradicionais, sentimentos
afetivos ou por elementos racionais; as realidades só podem ser identificadas na
linguagem significativa da intenção social”.

A orientação, pelos participantes da ação social, e, em particular, da relação


social, se dá pela representação de uma ordem legítima 96.

A ação, em especial a social, e também singularmente a relação social, podem


orientar-se, para o lado de seus participantes, na representação da existência de uma
ordem legítima. A probabilidade de que isso ocorra de fato denomina-se “validade”
da ordem em questão. Validade de uma ordem significa algo mais que uma
regularidade no desenvolvimento da ação social simplesmente determinada pelo
costume ou por uma situação de interesse, significa algo provado e sustentado por
uma autoridade95,97.

Ao “conteúdo de sentido95” de uma relação social, Weber denomina “ordem”,


e esta se estabelece quando a ação se orienta por “máximas” que podem ser
identificadas. Só se pode falar de uma “validade” desta ordem, quando a orientação
realizada por aquelas máximas, tem lugar, porque, em algum grau significativo,
aparecem válidas para a ação; isso significa dizer, como obrigatórias ou como modelo
de conduta95.

Uma ordem sustentada só por motivos racionais de fim é muito mais frágil
que outra que provenha de uma orientação que é mantida unicamente pela força do
costume, que é a forma mais freqüente da atitude íntima. Mas, ainda assim, é mais
frágil comparada com aquela ordem que apareça com o prestígio de ser obrigatória e
modelo, é dizer, com o prestígio da legitimidade95.

A legitimidade de uma ordem pode estar garantida de maneira puramente


íntima, e, nesse caso, pode variar entre puramente afetiva, por entrega sentimental;
racional, direcionada a valores, pela crença em sua validade absoluta, enquanto
84
Método

expressão de valores supremos geradores de deveres (morais, estéticos ou de qualquer


outra forma); e religiosa, pela crença de que, da sua observância, depende a existência
de um bem de salvação. Também a legitimidade da ordem pode estar garantida pela
expectativa de determinadas conseqüências externas, ou seja, por uma situação de
interesse; mas por uma expectativa de um determinado gênero95.

Os que atuam socialmente podem atribuir vigência legítima a uma ordem


determinada: em virtude da tradição - vigência do que sempre existiu; em virtude de
uma crença afetiva (emotiva especialmente) – validade do novo revelado ou do
exemplar; em virtude de uma crença racional com mudança de valores - vigência do
que se tem como absolutamente valioso e em virtude de um estatuto existente, em
cuja legitimidade se crê. Essa legitimidade pode valer como legítima em virtude de
um pacto dos interessados; ou em virtude da imposição – baseada na dominação
julgada legítima de homens sobre homens e da submissão correspondente95.

A validade de uma ordem no mérito de caráter sagrado da tradição é a forma


mais universal e primitiva. O temor a determinados prejuízos mágicos fortaleceu a
inibição psíquica para toda a variação nas formas habituais e inveteradas da conduta;
e os vários interesses, que podem estar vinculados à manutenção da submissão da
ordem vigente, cooperando na direção da sua conservação 95.

Primitivamente, a criação consciente de uma ordem nova deveu-se a oráculos


proféticos ou, pelo menos, se apresentaram como revelações consagradas
profeticamente e tidas como santas. O tipo mais puro de uma validade racional com
mudança de valores é representado pelo direito natural. A forma de legitimidade hoje
mais corrente é a crença na legalidade - a obediência a preceitos jurídicos de estatutos
existentes, segundo os procedimentos usual e formalmente corretos95.

No campo das Ciências Sociais, foi Max Weber quem estabeleceu as bases
teórico-metodológicas da Sociologia Compreensiva. Para ele, a “sociologia exige um
ponto de vista específico, já que os fatos de que se ocupa implicam um gênero de
causação desconhecido das ciências da natureza”. Sua definição passou a ser um
marco para os que consideram, teoricamente, o papel do indivíduo e da sua ação na
construção da realidade82.

Weber também se preocupou muito com a criação de instrumentos


metodológicos que possibilitassem, ao cientista, a investigação dos fenômenos
85
Método

particulares, sem que se perdesse na infinidade disforme dos seus aspectos concretos,
sendo o principal instrumento o “tipo ideal”, o qual cumpriria duas funções: primeiro
a de selecionar explicitamente a dimensão do objeto que veio a ser analisado e,
posteriormente, apresentar essa dimensão de uma maneira pura, sem sutilezas
concretas95.

Weber estava preocupado com a objetividade da investigação. Por isso,


propôs, como instrumento viabilizador da compreensão da realidade social, dois
princípios metodológicos: a neutralidade de valor e a construção do “tipo-ideal”. Os
“tipos-ideais”, pensados pelo autor não existem na realidade, são artifícios,
construções teóricas que permitem ordenar os fenômenos e indicar suas articulações e
sentido, e estão intimamente vinculados à realidade concreta 82.

Estudos compreensivos usando o desenho de “tipo ideal” para análise de um


fenômeno ou de uma situação, para serem operativos, devem sintetizar aqueles sem
os quais o fenômeno não existiria, tornando-o inteligível.

Cabe ao investigador buscar formas de garantir a isenção máxima possível da


intromissão ideológica nos estudos sociais, pelo método e pela técnica. A partir dos
conceitos gerais que dizem respeito ao comportamento do fenômeno social, Weber
sugere que o investigador formule conceitos mediadores, adequados e peculiares,
visando a se aproximar cada vez mais das características concretas dos
acontecimentos históricos e das interações82.

A sociologia de Max Weber se inspira em uma filosofia existencialista, de


forma que a ciência weberiana se define como um esforço destinado a compreender e
a explicar os valores aos quais os homens aderiram e as obras que constituíram. Ele
considera a Sociologia como uma ciência da conduta humana, na medida em que essa
conduta é social95.

Para abordagens qualitativas, em diversas teorias se encontra o peso da


contribuição de Weber. Uma das mais influentes é a fenomenologia sociológica. Esta
é considerada, dentro das Ciências Sociais, a Sociologia da Vida Cotidiana, segundo a
qual, os atos sociais envolvem uma propriedade que não está presente nos outros
setores do universo abarcado pelas ciências naturais: o significado82.
86
Método

Os conceitos de legitimidade, ação social, tipo ideal e ordem, formulados por


Weber, foram empregados na interpretação dos resultados da presente pesquisa.
86
Resultados e Discussão

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Primeiramente serão apresentados os depoimentos que são um produto de


autoria do pesquisador, na medida em que a transcrição da entrevista foi tratada de
maneira a se tornar uma transcriação. Neles é possível apreciar a versão que cada um
dos depoentes deu sobre a criação e implantação da Capelania Evangélica Hospitalar
do IIER.

5.1 Depoimentos

5.1.1 Depoimento da Capelã Titular do Serviço de Capelania Evangélica


Hospitalar do IIER

Eu sempre gostei da área médica. Tenho um tio que é médico cirurgião gastro.
Ele morou muito anos na cidade de Rio Verde em Goiás, ajudou a administrar o
hospital evangélico de lá e depois mudou para Rio Claro, em São Paulo. Pelo menos
duas vezes por ano, eu ia à casa dele, nas festas de aniversário, e adorava ir à
biblioteca dele e ver os livros de medicina, ficar vendo as fotos, lendo algumas coisas.
Eu pensava: é o que eu quero na minha vida, mas isso foi quando eu tinha uns 7 ou 8
anos de idade. Depois, quando eu estava acabando o colegial, o segundo grau, eu
amava Biologia e pensei em fazer Biologia, pensei em fazer Medicina, mas, ao
mesmo tempo, eu gostava de Psicologia, gostava de alguma coisa que lidasse com
pessoas e, aíi, eu comecei a me interessar mais sobre a área médica e pensei: se eu
fizer Medicina, do jeito que eu sou, não vou sair do hospital, não vou ter mais vida
própria, não vou fazer mais nada. Eu quero ter uma família, eu quero poder cuidar
deles; então, acho que não é Medicina. Enfermagem é maravilhoso, mas vou entrar na
mesma, Psicologia, eu não vou poder cuidar da pessoa espiritualmente, vou ficar
limitada e não é isso que eu quero. Daí, um dia, eu ouvi falar em capelania hospitalar,
mas em uma época em que meus filhos eram muito pequenos; então, deixei pra lá.
Nessa época, eu abrigava em casa dois seminaristas do Seminário Presbiteriano José
87
Resultados e Discussão

Manoel da Conceiçãoxxii, por que a minha casa ficava atrás da igreja presbiteriana e
eles dormiam lá nos finais de semana. Um deles, que tinha toda a família no interior,
teve um problema de um pelo encravado no final da coluna e teve que passar por uma
cirurgia, em São Paulo. Quando fui lá visitá-lo, ele estava agoniado porque nunca
havia entrado em um hospital, tinha pavor de hospital e implorou que eu o tirasse de
lá e o levasse para casa. Daí, o médico cirurgião, que era um pastor nosso amigo,
autorizou a alta, desde que eu me comprometesse a cuidar dele em casa. Ele me
ensinou o que teria que fazer e, apesar de estar com três filhos pequenos, eu cuidei
dele por quase um ano. Durante esse tempo, pude observar todas as visitas que
vinham da igreja e perceber quando elas o estavam perturbando, quando ele estava
aflito para mudar de posição na cama e não podia, quando ele queria ir ao banheiro e
tinha gente falando o tempo inteiro e também quando falavam bobagem. Então, eu
comecei a cuidar dele no sentido de protegê-lo também, a dar uma orientada no
pessoal da igreja. Depois, ele assumiu o pastorado e foi para a terra dele, mas esse
tempo foi muito importante para mim, para eu descobrir o que eu queria. Eu me
lembrolembro de que comecei a ler livros nessa área. Eu trabalhava bastante com a
UNES - União Nacional Evangélica da Saúdexxiii, nos cursos e nas palestras.
Freqüentava alguns congressos deles, mas ainda meus filhos eram muito pequenos e
não podia sair de casa para nada. Daí, fiquei grávida de novo. Quando ele estava com
um ano de idade, tínhamos uma empregada maravilhosa, que adorava as crianças. Ela
ficava com os dois menores, eu pegava os dois maiores, levava-os para escola e
ficava no hospital; na volta, eu os pegava na escola novamente. Fui começando
assim, duas vezes por semana, três vezes por semana e fui ampliando o atendimento.
Descobri que havia um curso de capelania hospitalar ministrado pelo capelão do
HCFMUSP que, na época (1980), era o pastor Marcos Petriaggixxiv, que era capelão e
ao mesmo tempo trabalhava como gerente do banco, no hospital. Quando ele saia do
banco, ia atender alguns pacientes, mas era impossível dar conta, em uma, duas horas

xxii
Seminário Presbiteriano "Rev. José Manoel da Conceição" foi implantado em São Paulo em 11 de Fevereiro de 1980, como
extensão do Seminário Presbiteriano do Sul, que foi emancipado pelo Supremo Concílio em Julho de 1982. Disponível em
<http://www.seminariojmc.br>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
xxiii
UNES - União Nacional Evangélica da Saúde é uma missão evangelística, sem cor denominacional ou orientação político
partidária, especializada em todas as atividades que envolvem o campo da saúde física, mental e espiritual. É um braço da igreja
evangélica, que, mesmo orientada por normas, deixa lugar para convicções pessoais. Disponível em <www.unesaude.org.br>.
Acesso em 28 de nov. de 2011.
Marcos Petriaggi – é pPastor há 25 anos da Igreja Batista em Planalto Paulista, situada na Al. dos Guaicanãs 103, em São
xxiv

Paulo/SP, fundada na década de 1960,precisamente em 14 de Julho de 1962. Disponível em < http://ibpp.ws/?page_id=2>.


Acesso em 28 de nov. de 2011
88
Resultados e Discussão

de atendimento, daquele colosso de hospital. Ai eu descobri que já existia um


trabalho aos domingos, com uma escala de igrejas diferentes. Eles iam fazer um
trabalho principalmente dentro da Psiquiatria e começou um culto no Instituto
Central. O curso era oferecido para os seminaristas do último ano de Teologia, duas
tardes por semana, e ele foi introduzindo livros para lermos e o estágio também. Para
que eu pudesse fazer o curso, que ele só dava para os alunos do último ano da
Teologia, eu teria que entrar no Seminário. Então, fui fazer o CTL - Curso de
Treinamento de Líderesxxv, da Palavra da Vida. À medida que fui fazendo o curso de
capelania, fui me dispondo a trabalhar com ele pelo menos duas vezes por semana,
em dois períodos, e ele foi me dando um setor, outro e depois eu pude me envolver
mais. Ele me deu um prédio e, depois, foi me dando outros prédios e me colocou
como assistente dele. Então, eu abria novas extensões da capelania, nos vários prédios
do complexo HCFMUSP. Acabei trabalhando em tempo integral. Durante nove anos,
eu trabalhei como voluntária e, então, o Supremo Concilio da Igreja Presbiteriana do
Brasil – IPBxxvi, que me assumiu como sua Capelã Missionária. Sou a única capelã
oficial no Supremo Concílio. Ainda este ano, em 2010, se tudo der certo, sendo
aprovada e criada a Secretaria de Capelania, poderemos estender mais o trabalho pelo
meio presbiteriano e, talvez, ter mais capelães que a IPB assuma. Então, eu entrei pela
Junta de Missões Nacionaisxxvii, como capelã missionária pela IPB, só que a ajuda que
eles me davam, principalmente quando eu fiquei viúva, com quatro filhos menores,
era muito pouco: 800 reais por mês para tudo. Então, me colocaram dentro do
Mackenziexxviii, para que eu pudesse ter melhores condições. No Mackenzie, o meu

xxv
CTL - Curso de Treinamento de Líderes O CTL começou em 1979, na sede nacional da Palavra da Vida Brasil em Atibaia-
SP. Disponível em <www.pvnorte.com.br/ctl/historia>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
xxvi
Igreja Presbiteriana do Brasil – IPB A Igreja Presbiteriana do Brasil é a mais antiga denominação reformada do país, tendo
sido fundada pelo missionário Ashbel Green Simonton (1833-1867), que aqui chegou em 1859. Mais tarde, ao longo do século
XX20, surgiram outras igrejas congêneres que também se consideram herdeiras da tradição calvinista. São as seguintes, por
ordem cronológica de organização: Igreja Presbiteriana Independente do Brasil (1903), com sede em São Paulo; Igreja
Presbiteriana Conservadora (1940), com sede em São Paulo; Igreja Presbiteriana Fundamentalista (1956), com sede em Recife;
Igreja Presbiteriana Renovada do Brasil (1975), com sede em Arapongas, Paraná, e Igreja Presbiteriana Unida do Brasil (1978),
com sede no Rio de Janeiro. Disponível em <www.ipb.org.br/portal/historia> Acesso em 28 de nov. de 2011.
xxvii
Junta de Missões Nacionais da IPB (JMN), desde 1940, tem como objetivo alcançar o país com o Evangelho de Cristo e
plantar novas igrejas presbiterianas em território nacional. Disponível em <www.ipb.org.br/institucional>. Acesso em 28 de nov.
de 2011.

Mackenzie – fundado em 1870, mantém o compromisso de oferecer formação integral aos seus alunos, não somente na ação
xxviii

pedagógica, mas também no desenvolvimento do cidadão ético que entende a solidariedade como elemento indispensável de seu
dia-a-dia. (Presente hoje em seis cidades brasileiras, São Paulo, Barueri Tamboré,), Campinas, Brasília, Rio de Janeiro e Recife,
proporciona, aos seus mais de 40 mil alunos, a oportunidade de permanecerem na mesma instituição de ensino desde a
Educação Infantil até a Pós-Graduação, em níveis de especialização, mestrado e doutorado, dando ênfase especial à produção de
pesquisas acadêmicas. Disponível em <www.mackenzie.br/dhtm/assessoria_comunicacao/imprensa/institucional.php>. Acesso
em 28 de nov. de 2011.
89
Resultados e Discussão

papel era organizar congressos para a Chancelaria, atender alunos, profissionais e


familiares, funcionários submetidos a cirurgia ou que estivessem internados por
alguma razão, bem como lidar com aconselhamento, em casos de crise complexa. Já
estávamos há sete anos no HCFMUSP fazendo um trabalho de bastante impacto,
quando os Gideões Internacionaisxxix me pediram para ajudá-los a entrar no IIER,
porque eles tinham tentado mas não haviam conseguido entrar, por ser um hospital de
infectologia e quase todas as áreas serem de isolamento. Então, eu solicitei ao Diretor
Técnico, Armando Sambataroxxx, que me autorizou a entrar no IIER porque ele sabia
que eu já tinha experiência no HCFMUSP, para distribuir os Novos Testamentos para
os pacientes, mas os Gideões só poderiam distribuir para os profissionais da saúde e
demais funcionários. Então, eu comecei assim, indo lá no IIER só para fazer um favor
para os Gideões. Ao entregar os Novos Testamentosxxxi, vários pacientes disseram-me
que lá havia muita gente para cuidar do corpo, mas ninguém para cuidar da alma. Eu
não tinha a intenção de começar um trabalho lá porque o HCFMUSP já era muito
grande, mas, diante do pedido de muitos pacientes, principalmente por causa de
alguns pacientes adolescentes que estavam “passando perto do vale da sombra da
morte”, porque naquela época a AIDS era muito recente, 1991, eu aceitei. No
HCFMUSP, eu já havia encontrado um caso de paciente com AIDS. Lá eu estava
sendo preparada pelo Dr. Vicente Amato Netoxxxii, que era o superintendente, por
meio de palestras ministradas por ele e de material teórico que ele me dava
pessoalmente. Por meio desse conhecimento, pude também explicar e dar palestras
sobre AIDS nas igrejas e ajudar na prevenção. Quando entrei no IIER, eu soube que
muitos pacientes ali sofriam de AIDS. Foi um impacto bem forte. Com essa

xxix
Gideões Internacionais é uma Associação Interdenominacional de homens de negócio e profissionais cristãos, membros, em
plena comunhão, de igrejas protestante-evangélicas que têm, como missão, levar as boas novas através do testemunho pessoal e
da distribuição da Palavra de Deus em mais de 190 países ao redor do mundo. Disponível em <www.gideoes.org.br>. Acesso em
28 de nov. de 2011.
xxx
Armando Sambataro é Médico Acumputurista – Consultório na Av. 15 de novembro, 408 – Centro - em Araraquara – SP.
Disponível em <http://cnes.datasus.gov.br/Exibe_Ficha_Estabelecimento.asp?VCo_Unidade=3503206083218>. Acesso em 28
de nov. de 2011.
xxxi
Novo Testamento :a coleção completa dos livros divinamente inspirados que constituem a Bíblia, e chamada de cânon. O
Novo testamento foi escrito pelos discípulos de Jesus Cristo. Eles queriam que outros ouvissem àa respeito da nova vida que é
possível através da morte e ressurreição de Jesus. É dividida em grupos de conteúdos semelhantes, quer pelos assuntos tratados,
quer pelos autores ou pelos objetivos. Em 1676, foi concluída sua tradução que só viria a ser publicada em 1681 na Holanda, por
problemas de revisão. Disponível em <http://virtualbooks.terra.com.br/biblia/novo.htm>. Acesso em 29 de nov. de 2011.
xxxii
Vicente Amato Neto foi Secretário da Saúde, graduado em Medicina pela Universidade de São Paulo (1951), infectologista,
Superintendente do HCFMUSP, e Prof. Titular do FMUSP, atuando principalmente nos seguintes temas: trypanosoma cruzi,
aids, plasmodium berghei, chagas e transfusão de sangue. Plataforma Lattes. Acesso em 28 de nov. de 2011.
90
Resultados e Discussão

experiência, solicitei, ao Dr Armando Sambataro, a possibilidade de iniciar um


Serviço de Capelania Evangélica. Ele entrou em contato com Dr. Paulo Augusto
Ayrosa Galvão, na época o Diretor Geral do IIER. Dr. Paulo Ayrosa era amigo de um
amigo nosso, da Igreja Presbiteriana da Lapa xxxiii e, apesar de ser um ateu confesso,
ele era uma pessoa ética, amorosa, comprometida com o que fazia e tinha paixão por
aquele hospital. Então, ele me propôs que eu poderia entrar sozinha, duas vezes por
semana, no período da tarde, por duas a três horas e, depois de três meses, iria reunir
todas as chefias do hospital e perguntar o que eles tinham achado do meu trabalho. Se
eles colocassem qualquer questão contrária, eu sairia, mas, se eu fosse aprovada por
todos, teria a liberdade para entrar e trazer quem eu quisesse e seria oficializada a
Capelania Evangélica Hospitalar no IIER. Foi assim que aconteceu. Fiquei sozinha
durante todo esse tempo, conquistando pacientes, funcionários e profissionais da
saúde. Trabalhei bastante na UTI nessa época e foi muito especial, muito forte a
experiência ali. Quando eu comecei no IIER, o trabalho religioso estava fechado para
todos os credos porque havia entrado lá um grupo de macumba, que tinha feito
despacho em alguns quartos de pacientes, com travessas com farofa, com chifres, de
pimenta vermelha, com tambores e atabaque. Em seguida, havia entrado um grupo
pentecostal que passara a desenvolver um ritual de expulsão dos demônios. Por essa
razão, o diretor clínico da época, que era o Dr. Ivan Oliveira Castroxxxiv, fechou as
portas para qualquer religioso entrar. Então, foi providencial quando os gideões me
pediram para ir lá porque eu fui visitar como uma paramédica, alguém da área de
saúde mesmo, por isso me autorizaram a entrar. Dr. Paulo Augusto Ayrosa Galvão
oficializou a Capelania Evangélica criando o Serviço de Capelania Evangélica
Hospitalar, me colocando como capelã titular evangélica do hospital, quando passei
pela aceitação de todos os chefes dos setores do IIER. O Serviço de Capelania
Evangélica Hospitalar ficou oficialmente estabelecido como um serviço que se
subordinava diretamente ao diretor do hospital, da mesma forma como acontecia no
HCFMUSP, onde eu respondia diretamente ao superintendente e, pelo estatuto do
xxxiii
Igreja Presbiteriana da Lapa é uma comunidade que adora e glorifica a Deus, pratica, ensina e proclama a Bíblia Sagrada,
forma discípulos e presta serviço ao próximo, como família de Deus. Disponível em <http://www.iplapa.com.br>. Acesso em 28
de nov. de 2011.
xxxiv
Ivan Oliveira Castro foi professor assistente da Escola Paulista de Medicina, da Faculdade de Medicina de Mogi das Cruzes,
titular da Faculdade de Medicina de Taubaté e da Organização Santamarense de Ensino (Osec). Disponível em
<www.sbinfecto.org.br/anexos/boletim_sbi_04_total.pdf>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
91
Resultados e Discussão

hospital, poderia até fazer parte de várias comissões. Foi na época da AIDS que a
Capelania Evangélica começou no IIER. Morria muita gente. Nós perdíamos em
média de nove a 12 pacientes por semana. Era um número muito grande. O paciente
sobrevivia por um ano, um ano e meio, mesmo assim com freqüentes internações por
causa de doenças oportunistas. Então, era comum fazermos amizade, possibilitando
um vínculo profundo com os pacientes e, depois, perdê-los rapidamente, o que nos
causava muita dor. Os próprios profissionais da saúde não agüentavam essa situação,
pois era muito forte e muito pesado para eles também. Eles já haviam vivido
epidemias, mas era uma coisa passageira - dois, três meses e passava, mas a AIDS
veio para ficar. Então, eles tinham que se acostumar com esse novo inimigo. Foi
interessante porque essa situação ofereceu oportunidade para que eu pudesse começar
a treinar alguns médicos do IIER. Começamos um trabalho que se denomina hoje de
“Minutos com Deus”. Mas eu comecei na UTI, com uma enfermeira que era muito
especial, deu-me muita abertura e solicitava também que cuidássemos dos
profissionais de saúde. Eu me sentava com ela na copa, uma ou duas vezes por
semana, lia um pequeno texto bíblico e orava com eles. Eu me lembro que, na época,
havia uma auxiliar de enfermagem, que era mãe de santo, e ela falava: “escutem o
que ela tem para dizer por que é verdade o que ela está dizendo”. Mas ela mesma
sempre ficava de lado e continuava a fazer as suas atividades. Depois foi criado, pelo
governador, o Conselho de AIDS do Estado de São Paulo - CONAIDS, com um
representante de cada Secretaria de Estado, e eles tinham que indicar também um
representante da sociedade civil. A disputa para esse cargo estava entre o meu nome e
o do padre Leo Pessinixxxv e, então, eles me puseram como representante civil do
Conselho, do CONAIDS, do qual participei por volta de quatro anos. A reunião se
dava no IIER, na Casa Rosada. Era discutida ali a política do Estado e éramos
referência para o governador. Então, foi um tempo também muito interessante, pois
nós estávamos sempre aprendendo a cada reunião. Estávamos constantemente tendo
aprimoramento através de vários cursos e palestras: um desses era de pedagogia, com
várias técnicas diferentes de ensino e aprofundamento sobre AIDS. Durante esse
período, fazíamos muitas palestras sobre AIDS nas igrejas, em indústrias e nas

xxxv
Leo Pessini é doutor em Teologia Moral-Bioética em Clinical Pastoral Education and Bioethics, pelo St. Luke's Medical
Center, em Milwaukee, nos EUA. Também é membro da Diretoria da Associação Internacional de Bioética e superintendente da
União Social Camiliana, além de vice-reitor do Centro Universitário São Camilo, em São Paulo. Disponível em
<http://www.revistamissoes.org.br/artigos/ler/id/927>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
92
Resultados e Discussão

escolas. Nessa época, o “Branco Dinamite”, um rapaz que tinha se convertido ao


cristianismo, era usuário de drogas e traficante, ia comigo e com o José Mauro
Marchiorixxxvi, o José Ramos Souza Netoxxxvii, ou o Carlos Henriquexxxviii em cada
palestra, para que eles dessem testemunho, contassem a história deles. Depois de
quatro a cinco meses que o Mauro estava atendendo no IIER, teve uma infecção
ocular. Não sabia o que era. Foi descobrir que era uma toxoplasmose ocular e, aí, fez
todos os testes e descobriu que estava contaminado com o vírus da AIDS. Aí
começou a luta dele. Eu tenho testemunhos gravados, filmes de testemunho dele onde
se percebe que ele ficou totalmente chocado com a situação e começou a fazer
algumas barganhas com Deus. Ele fez o teste em cinco lugares diferentes, esperando
que desse negativo. Uma das trocas que ele ficava fazendo com Deus era: “poxa, mas
antes o Senhor teria razão de me fazer ficar contaminado, agora não, agora eu sou
teu”, como se pudesse evitar as conseqüências. Ele fez um trabalho lindo mesmo. Eu
pude acompanhar todas as fases de desenvolvimento da doença e de enfrentamento
que ele teve. Ele viajou muito comigo para todo o país, dando testemunho em vários
congressos em que eu falei e cursos que eu dei. Ele era um ótimo companheiro e foi
um grande amigo. Era muito interessante. Eu sempre me atualizava com o
Departamento de Educação em Saúde do IIER, com a Ester Aparecida Nogueira
Monteiro Abibixxxix, que era a chefe do setor. Ela me dava às ultimas noticias sobre a
AIDS, emprestando os slides do IIER para que eu pudesse ministrar todas essas
palestras bem embasadas. Depois de responder a muitas perguntas, eles entravam
com o testemunho deles, mostrando quem esse tinham sido,, e o caminho que eles
estavam trilhando e como Deus tinha mudado a realidade deles, pois, apesar de
estarem infectados, correndo risco de vida, tinham uma vida nova, em paz com Deus,
com a certeza de uma vida eterna e qualidade de vida terrena. A transição do pessoal
da Capelania do HCFMUSP para o IIER se deu de forma tranqüila. Eu já tinha

xxxvi
José Mauro Marchiori , fazia parte da equipe da Capelania Evangélica Hospitalar do HCFMUSP e do IIER.
Cadastro da ACEH.

xxxvii
José Ramos Souza Neto, fazia parte da equipe de Capelania Evangélica Hospitalar do HCFMUSP e do IIER. Hoje é
pastor evangélico. Cadastro da ACEH.

xxxviii
Carlos Henrique, fazia parte da equipe de Capelania Evangélica Hospitalar do HCFMUSP e do IIER. Cadastro da
ACEH.

xxxix
Ester Aparecida Nogueira Monteiro Abib, educadora em saúde pública, pedagoga, especialista em saúde
Pública,trabalhava no IIER e em uma das casas de recuperação de drogados96.
93
Resultados e Discussão

experiência de capelania no HCFMUSP e tínhamos também uma equipe treinada. Eu


fazia plantões no IIER e dividia meu tempo com o HCFMUSP também. Ia no período
da manhã para um e à tarde para o outro. Estava lá quase todos os dias. Foi um tempo
muito bom. Dr. Vicente Amato Neto já tinha assumido a direção do HCFMUSP nessa
época. Ele era o papa na área de AIDS no Brasil e, quando eu falei para ele que
estaria assumindo também o IIER, ele falou que achava que eu não ia dar conta,
devido ao tamanho e quantidade de tarefas que já tínhamos no HCFMUSP e também
por haver muitas mortes entre os ao pacientes com AIDS. Eu falei que teria que
treinar mais pessoas, pois a necessidade era gritante e não dava para deixar, não dava
para fechar os olhos. Disse-lhe que ia continuar trabalhando no HCFMUSP e que ia
ter que me dividir muito mais. No HCFMUSP, depois de algum tempo como capelã
assistente do pastor Marco Petriaggi, levei o pastor Edson Plazaxl, da Igreja Batista
em Morro Grandexli. Treinei-o em capelania hospitalar e, como eu não era pastora e
não o sou, e o hospital exigia que fosse um pastor, eu o indique para ocupar o cargo
como capelão titular porque, nessa época, o pastor Marcos já tinha saído e tinha
passado para mim o tempo integral. Daí, passado um ano, o pastor Edson me falou
que achava que eu já era a capelã titular porque eu o havia treinado, eu dirigia todo o
trabalho e ele vinha só duas vezes por semana para responder pelo título. Então, fui
oficialmente colocada como capelã titular, na Capelania Evangélica do HCFMUSP.
O trabalho da Capelania Evangélica lá era interessante porque, como eu tinha total
apoio do superintendente, tudo o que eu planejava fazer, ele autorizava. Foi nessa
época que nós organizamos o primeiro Congresso Nacional sobre AIDS. Ele nos deu
a parceria com a Superintendência e fizemos o evento no Centro de Convenções
Rebouças. Recebemos apoio de várias editoras e da mídia televisiva. Durante quatro
dias, tivemos a nata da medicina, delegados e muitos testemunhos de transformação
de vida de ex-drogados e ex-travestis, abordando o tema: “AIDS há uma esperança –
Mudando hábitos da sociedade para deter o avanço da AIDS”. Eu acho que já
estávamos no IIER há pouco tempo. Mandamos convite para o presidente da
xl
Pastor Edson Plaza – nasceu em São Paulo, nesta Capital; é casado, pai de três filhos eavô de dois netos. Estudou
teologia e foi ordenado nao ministério pastoral em 04 de dezembro de 1966 na Primeira Igreja Batista da Lapa. Há 25
anos, se dedica à Igreja Batista em Morro Grande, onde ocupa a função de pastor titular. Disponível em
<http://www.jusbrasil.com.br/diarios/25346584/dosp-cidade-16-03-2011-pg-97>. Acesso em 28 de nov. de 2011.

xli
Igreja Batista em Morro Grande localizada à Rua Francisco Nunes Siqueira, 306 Morro Grande - São Paulo - SP,
Disponível em <www.ibmorrogrande.blogspot.com>. Acesso dia 28 de nov. de 2011.
94
Resultados e Discussão

república, governador, enfim, muitas pessoas. Nós tivemos 350 pessoas nesse
congresso, tudo coberto pelo HCFMUSP. Foi ótimo e marcou história. Tivemos,
nesse congresso, pessoas que poderiam ter criado grande problema, porque tínhamos,
um responsável pelo Movimento de Defesa dos Direitos Homossexuaisxlii que se
sentou na primeira cadeira, na primeira fileira, em frente ao palco, onde eu ficava.
Depois dele terde ele ter assistido uns dois dias do congresso, veio falar para mim:
“eu não vou fazer escarcéu aqui por tua causa, porque eu te considero muito,
considero o seu trabalho, o que você tem feito, por isso eu não vou abrir a boca”.
Realmente, ele ficou quieto o tempo todo. Então, fiquei no HCFMUSP como capelã
titular 22 anos. Agora faz cinco anos que saímos de lá, em novembro de 2004. A
nossa saída se deu porque foi alterado o estatuto do HCFMUSP, quanto ao
atendimento religioso no hospital, transformando o serviço religioso católico e
evangélico em um só, fazendo uma capelania ecumênica, para todos os credos,
reunidos em um só local. Isso aconteceu quando houve uma mudança de diretoria do
HCFMUSP, saiu o ProfProf. Amato, que tinha bastante proximidade com a Capelania
Evangélica, e entrou outra diretoria que tinha outra visão das coisas. Foram realizados
vários esforços para fazer uma composição, que se revelaram insatisfatórios. Como
eu já estava na Capelania Evangélica do IIER, resolvi deixar a Capelania Evangélica
do HCFMUSP. Nós saímos de lá com sessenta pessoas da capelania, para o IIER e
outros hospitais onde desenvolvíamos este serviço. Na equipe do IIER, alguns destes
tinham AIDS ou eram do grupo de maior risco na época, porque um era homossexual
ou tinha sido homossexual e agora fazia parte de uma igreja batista, onde era ajudante
do pastor; outro tinha sido viciado em drogas e também garoto de programa; outro
tinha sido travesti por sete anos e eu o encontrei quando estava fazendo uma palestra
sobre capelania, numa igreja batista também. Falei da minha grande dificuldade de
falar com os travestis porque um era o nome no prontuário médico e outro era o nome
pelo qual ele queria ser chamado. Faziam parte dessa equipe de capelania o Mauro, o

xlii
Movimento de Defesa dos Direitos Homossexuais - surgiu na Europa, no final do século XX, tendo como principal bandeira a
descriminalização da homossexualidade e o reconhecimento dos direitos civis dos homossexuais. Durante o Nazismo, mais de
300 mil gays foram presos nos campos de concentração, e só depois da Segunda Guerra Mundial que o Movimento
Homossexual começou a se estruturar na Europa e Estados Unidos. 1979 foi um ano chave na História do Movimento Brasileiro
de Homossexuais (MHB), ano de fundação do Jornal Lampião da Esquina e do primeiro grupo gay brasileiro, o Somos/SP,
ambas instituições pioneiras e fundamentais no desenvolvimento dos demais grupos de defesa dos direitos de gays e lésbicas no
país. Assim, em fins de 1979 quando já existiam mais de uma dezena de grupos no eixo Rio São Paulo e Brasília,. oO Lampião e
o Somos de São Paulo, idealizaram a organização de um encontro nacional, o primeiro de uma série de doze, sendo: 6 EBHOs
(Encontro Brasileiro de Homossexuais) 2 prévias para o EBHOs e 4 encontro regionais. Disponível em
<http://lgbtt.blogspot.com/2010/04/historia-do-movimento-lgbt-brasileiro.html.>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
95
Resultados e Discussão

Carlos Henrique mais a Carolinaxliii, que era da Igreja Presbiteriana de Piritubaxliv e


também foi alcançada numa palestra que fui dar lá. Ela havia acabado de descobrir
que estava contaminada porque o marido havia tido um relacionamento extraconjugal
e trazido o vírus para ela, que era dona de casa. Eles haviam se convertido há pouco
tempo e, se não fosse por isso, ela não poderia tê-lo perdoado. Então, os dois eram
pacientes do hospital, mas tinham muita autoridade para falar também de Cristo. Eu
comecei com uma equipe que era composta quase que só com pacientes, depois
entrou o Neto, que ficou conosco como um dos capelães, por dez anos, no IIER. Eu o
conhecia desde adolescente. Ele estava vindo do uso de drogas e de promiscuidade
também. Descobriu que estava com o vírus depois que ele já tinha se convertido,
numa casa de recuperação. Nessa época, nós conhecemos o marido da Lucinéiaxlv[P1]
porque ele estava internado no IIER e por terem duas crianças pequenas. Daí, nós
acompanhamos o marido dela, tanto no IIER como quando no HCFMUSP também,
quando ficou internado. Fomos à casa da Lú várias vezes, tentando ajudar,
principalmente por causa das crianças pequenas, claro e, quando ele faleceu, nós a
acolhemos e pedimos que ela viesse nos ajudar na Capelania, para que nós
pudéssemos também dar uma ajuda financeira a ela. Depois de um ano
aproximadamente, ela se apaixonou pelo Neto. O meu marido e eu fizemos o
casamento deles. Depois de uns quatro a cinco anos, a Lú ficou como secretária na
Capelania do IIER. Hoje [2010] já faz uns 15 anos que ela está conosco. Em dois
anos, a equipe do IIER cresceu rapidamente e, em pouco tempo, tínhamos perto de 50
pessoas, que vinham dos cursos anuais que fazíamos. O período de estágio no
treinamento do Mauro causava um impacto fortíssimo porque ele estava saudável e
muitas pessoas com quem ele falava, que estavam no leito do hospital, diziam para
ele: “você pode falar qualquer coisa aí porque você está muito bem, está super
saudável, pode fazer o que dá na sua cabeça, mas eu estou aqui no fim já, num leito
de hospital, só posso esperar da vida ou esperar de Deus”; então, ele falava: “talvez
um dia eu esteja aí no leito como você, porque eu também estou contaminado com o

xliii
Carolina fazia parte da equipe de Capelania Evangélica Hospitalar do HCFMUSP e IIER. Disponível em
<www.bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/01inv_pesqII2003.pdf>. Acesso dia 28 de nov. de 2011.
xliv
Igreja Presbiteriana de Pirituba está presente no bairro há mais de 40 anos. Desde sua fundação, esta comunidade evangélica
propõe-se a propagar os ensinamentos de Jesus Cristo de forma simples mas impactante, Rua Joaquim de Oliveira Feitas, 2466 –
São Domingos –São Paulo. Disponível em <http://www.ippirituba.com.br/site/a-igreja.html>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
xlv
Lucinéia Ferreira Ramos Souza, faz parte da equipe de capelania evangélica hospitalar, é paciente do IIER. Cadastro da
ACEH.
96
Resultados e Discussão

HIV, agora eu quero falar pra você sobre como Deus curou a minha alma, e Ele
também pode curar doenças, mas a primeira coisa que Ele fez foi me dar uma nova
vida, uma nova visão sobre Ele e mim mesmo, e me dar uma nova razão de viver”.
Eles também tinham trejeitos. Então, fomos trabalhando a vida deles também, para
que eles perdessem os trejeitos, mudando o linguajar deles, e ao mesmo tempo,
lidando com eles, para que eles não caíssem nas cantadas que eles recebiam até
mesmo dos funcionários dos hospitais, porque tinham todas as características gays.
Essa equipe foi a melhor para começar porque eles tinham AIDS, eles eram pacientes
do hospital e tinham autoridade ao falar sobre a esperança que Deus estava lhes dando
a cada dia, quando as pessoas perdiam a esperança. Eles mostravam que a esperança
que Deus havia dado a eles, que não morria com a doença, nem com as dificuldades
que eles estavam enfrentando. A formação para a equipe era ministrada através do
Curso Nível I, mais ou menos o mesmo que nós damos até hoje. Eram quatro dias de
teoria e mais 60 horas de prática. Vinham pessoas do Brasil inteiro. Cada um dos que
estavam conosco passavam por esse treinamento e, depois, passavam a treinar outros
também. No Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar, cada pessoa fazia
atendimento três dias por semana. As igrejas às quais eles pertenciam os mantinham
financeiramente, algumas dando, pelo menos, recursos para o transporte. O hospital
oferecia alimentação para toda a equipe de capelania e disponibilizava uma sala. Nós
tivemos duas salas grandes a princípio, uma na entrada do hospital e outra no prédio
da internação; tínhamos muito espaço e muito apoio dos profissionais da saúde, desde
o começo, principalmente do pessoal da Enfermagem. Logo que eu entrei, no
primeiro dia, a enfermeira encarregada da Eeducação Ccontinuada me levou a cada
posto de enfermagem e foi me apresentando, dizendo que eu tinha acesso a todos os
prontuários médicos e também a todo material de paramentação. O que eu precisasse,
poderia pedir à Enfermagem que eles nos ajudariam em tudo que pudessem. Nosso
relacionamento com a equipe de enfermagem sempre foi muito bom, com as diretoras
de enfermagem, com as enfermeiras da Eeducação Ccontinuada e com auxiliares de
enfermagem. Nós éramos bastante procuradas para compartilhar coisas boas e coisas
ruins porque nos interessávamos pela vida deles. O SCEH se reportava diretamente
ao diretor geral do hospital. Fazíamos relatórios a cada mês e os entregávamos ao
dDiretor do hospital. Participávamos de todas as atividades do hospital com todos os
profissionais da saúde e estávamos muito adaptados a toda a rotina hospitalar. As
97
Resultados e Discussão

atividades que nós realizávamos eram diárias. Fazíamos atendimento aos funcionários
do hospital e toda a programação em datas especiais, com corais. A Superintendência
é quem nos solicitava porque não tinha qualquer serviço católico ou espírita. Era só o
nosso, o evangélico. Dois anos depois que nós entramos no hospital, a Cúria
Metropolitana Católicaxlvi, que também era responsável pela Capelania Católica do
HCFMUSP, colocou lá um padre. Isso aconteceu porque eles viram a influência do
trabalho evangélico, que estava crescendo. A princípio, o padre tentou colocar o
diretor contra nós de todas as formas. Hostilizou-nos muito, mas o diretor nos
conhecia muito bem e ao nosso trabalho, e não deu muita atenção. O diretor era um
médico judeu que tinha saído da Superintendência do Hospital do Servidor Público
do Estado. Era um médico muito querido. Nós fizemos muita amizade e ele nos
ajudou em tudo que ele pode, de todas as formas. Quando os médicos chefes de
setores queriam tomar nossa sala no andar, ele dava a sala dele para eles usarem nesse
período, para que não pegassem nossa sala. A ação dele foi muito importante. Depois,
quando veio o novo diretor do IIER, este fez questão de colocar o nome do padre
oficialmente, publicando, no Diário Oficial, sua designação como responsável pelas
duas capelanias no hospital. Por elas serem de diferentes religiões, tinham salas
separadas, mas, administrativamente, eu respondo a ele, e ele, o padre, responde ao
diretor geral do hospital. Então, todas as programações que nós fazemos, têm que ser
entregues ao padre, tendo sido estabelecido a divisão de espaços na comemoração das
datas especiais que vigora até hoje. Quanto às atividades desenvolvidas, nossas
equipes cobriam todos os andares e atuavam em todos os dias da semana. Em todas as
datas especiais, nós sempre fazíamos alguma coisa especial, como palestras para
profissionais da saúde, cartões e mensagens escritas; tudo que nós fazíamos para o
HCFMUSP, fazíamos também para o IIER. As atividades eram desenvolvidas
fazendo visitação leito a leito nos andares, no ambulatório, no hospital dia e no
necrotério. Uma ocasião houve um pedido de um funcionário porque o clima na sua
unidade estava extremamente pesado e eles não sabiam o que fazer; então, nos

xlvi
Cúria Metropolitana Católica é uma instância que congrega toda a supervisão e administração da Arquidiocese nos seus mais
variados âmbitos, de acordo com o Concílio Vaticano II. Com finalidades pastorais, administrativas e judiciais, a Cúria
assessora o Arcebispo em sua missão de governar. A Cúria Metropolitana se estrutura articulando vários organismos, de forma a
atender às múltiplas exigências do governo pastoral da Arquidiocese: Vigariaria Geral, Chancelaria, Secretaria Geral do
Arcebispado, Tribunal Eclesiástico, Mitra Arquidiocesana, Vicariatos Episcopais Especiais, Regiões Episcopais, Foranias e
Paróquias. Disponível em <www.arquidiocesebh.org.br/site/arquidiocese.php?id=154>. Acesso dia 28 de nov. de 2011.
98
Resultados e Discussão

pediram que fossemos lá e fizéssemos cultos com familiares e com os profissionais.


Fazíamos artesanato com sucata, numa mesinha, no final do corredor de cada andar,
com os pacientes, e com as mães das crianças hospitalizadas que tinham tempo.
Alguns pacientes com déficit motor aprenderam a pintar quadros ali e fizeram disso
sua profissão e se sustentaram, durante muito tempo, através desse aprendizado.
Depois de algum tempo, começamos também a participar da equipe de cuidados
paliativos. O Ministério da Saúde nos oficializou como uma equipe de referência em
cuidados paliativos em AIDS. Começamos a ministrar cursos em várias partes do
país, fazíamos uma sensibilização e depois oferecíamos o curso. O Ministério trazia
os profissionais da saúde de cada hospital, assumindo totalmente o custo deles com
hospedagem, passagem e também remuneravam a equipe de paliativos. Isso
aconteceu durante bastante tempo. Começamos como capelania a ser convidados para
ministrar palestras, principalmente para a equipe de enfermagem. O Serviço de
Educação Continuada começou a fazer escala para que toda Enfermagem pudesse
passar pelas nossas palestras sobre qualidade de vida, culpa, excelência no trabalho,
coisas que eles queriam que nós colocássemos. Em todas essas ocasiões, nós
tínhamos oportunidade de trabalhar o tema pedido e entrar também com a
apresentação do evangelho. Atendemos muitos funcionários em aconselhamento
bíblico porque eles nos procuravam nos corredores, e muitos familiares de pacientes
também. Em várias ocasiões, eu acompanhei pacientes até a casa deles, estabelecendo
um vínculo muito profundo com eles. Eu os acompanhei até o fim e fiz o funeral
deles. Foram laços muito importantes com as famílias. As atividades da capelania
católica são realizadas pelo padre, que faz visitação leito a leito todos os dias.
Algumas pessoas o auxiliam nesse trabalho, o Silvioxlvii, que vem todos os dias, e a
Denise Bonfattixlviii, que está ahá bastante tempo na capelania católica. Existem
algumas pessoas que fazem trabalhos esporadicamente. Um senhor de bastante idade,
de quem não me lembro do nome, fazia um bom trabalho e era muito querido pelos
pacientes. Além da capelania evangélica e católica, existe a capelania espírita, mas
ainda não está oficializada como capelania. Entram lá à noite e dão passes nos
pacientes. Quem responde por isso é a Mirian. Ela está numa situação muito difícil e
xlvii
Silvio M. Ribas Sobrinho. Voluntário, fazia parte da equipe de capelania católica hospitalar do IIER. Cadastro da Capelania
Católica do IIER.
xlviii
Denise Bonfatti voluntária, fazia parte da equipe de capelania católica hospitalar do IIER. Cadastro da Capelania Católica do
IIER.
99
Resultados e Discussão

delicada porque ela é membro de uma igreja católica, mas dirige o trabalho espírita.
Ela tem feito um trabalho espírita lá e começou a fazer “Palavra com afeto”, alguma
coisa assim. Era um trabalho mais social, mas com toda conotação espírita, sem
esconder nada. Depois, ela quis forçar a entrada de uma capelania espírita, mas o
padre, que é o responsável pelas capelanias, como ela é membro de uma igreja
católica, solicitou a ela uma carta do centro espírita, nomeando-a como responsável
no hospital e ela terá que se desligar da igreja católica. Por enquanto, o trabalho
espírita continua acho que uma vez por semana. Eles podem entrar, mas não é
oficializado como um serviço religioso, é como um atendimento. No IIER, eu não
tinha acesso aos prontuários como no HCFMUSP. No HCFMUSP eu tinha acesso a
todos os prontuários de todos os setores, mas só tinha a oportunidade de fazer o
relatório do aconselhamento bíblico, no prontuário da Ppsiquiatria, onde participava
de todas as discussões de caso da equipe na qual eu participava como parte da equipe
multidisciplinar e também das aulas que eram dadas e das sessões de
eletroconvulsoterapia, onde aprendi bastante. Nessa época, logo que eu comecei,
fizemos ótima amizade com o Dr. Armando Sambataro. Ele era um médico agnóstico,
mas era alguém muito atencioso, inteligente, uma mente brilhante e tinha uma
memória fantástica. Ele chegava uma hora antes em um dia da semana, para que
pudéssemos conversar. Então, nós nos tornamos grandes amigos. Ele me ajudou
muito, orientou-me, também, quanto à forma mais adequada de escrever os relatórios
e cartas para a diretoria. No IIER, na área de costura, tínhamos um trabalho com os
funcionários que era muito bem aceito e estávamos aumentando. Depois, com a
chegada do diretor Sebastião André de Felice, ele fechou todo nosso trabalho. Ele
deve ter ficado nessa função cerca perto de oito anos. Quando ele chegou, ouviu o
padre, que fez a mesma coisa que havia tentado fazer da outra vez com Dr. Paulo
Augusto Ayrosa Galvão e, quando eu fui apresentar o nosso trabalho para o Dr.
André, a primeira coisa que ele falou foi que iria revogar o documento assinado por
iniciativa do Dr. Paulo Augusto Ayrosa Galvão e eu não seria mais a capelã titular do
hospital porque eu tinha muita projeção. Ele disse: “eu vou apagar um pouco a sua
imagem aqui dentro”. Nosso trabalho estava bem organizado, eu havia mostrado, para
a Dra. Gloria Brunettixlix, que era a assistente do Dr. André, e ela estava encantada

xlix
Gloria Brunetti assistente do Diretor Clínico do IIER, graduada em Medicina pela Unisa, em 1984. Médica concursada pelo
estado, trabalhou no Centro de Treinamento e Referência AIDS. Estudou em Roma por seis meses e outro semestre em Boston,
nos EUA, especializou-se em doenças infecciosas, mas especificamente em AIDS. Ao voltar para o Brasil, em 1994, novamente
100
Resultados e Discussão

com nosso trabalho. Uma das coisas que nós fazíamos eram bazares. Arrecadávamos
muitas roupas para os funcionários da equipe de saúde e famílias com AIDS,
vendidas a preço baratíssimo. Compravam de tudo lá. Eu me lembro que um dia, eu
estava saindo do IIER e Dr. Guido Levi me falou que havia indicado o meu nome
para fazer parte do Comitê de Ética em Pesquisa do hospital e fez muitos elogios ao
nosso trabalho e à minha pessoa. Daí, comecei a fazer parte do Comitê de Ética. Para
mim era muito difícil porque eles distribuíam as teses dos médicos e eu tinha que
entender de termos médicos e aprovar sozinha aquelas teses em uma semana e eu já
estava com muitas coisas: o HCFMUSP, mais o IIER e abrindo capelanias em outros
hospitais. Depois de quatro anos, eu disse que não tinha mais condição de continuar
no Comitê de Ética em Pesquisa, mas foi interessante observar e fazer parte dele
oficialmente. Outro serviço de que fizemos parte foi o grupo de cuidados paliativos.
Ele foi criado um pouco depois, talvez depois de seis a sete anos de existência e da
capelania implantada no IIER e começou com a Dra. Elisa l que, junto com a Dra.
Heloisa, que era psicóloga do IIER, foi assistir uma palestra do Dr. Marco Túlioli e
gostou muito. Aí, nós organizamos e chamamos mais duas ou três enfermeiras - a
Sandra Helenalii, que estava desde o começo a Cleide, que fez parte algum tempo, a
Elizabeteliii do 4º andar e as assistentes sociais. Eram quatro ou cinco médicos
infectologistas, além da Dra. Elisa e o Dr. Ronaldoliv, especializados em dor. Aí
começamos a atender os pacientes através de pedido de interconsulta de médicos de
cada andar. Nós sempre atuamos ali junto com os profissionais do andar, com toda
abertura também. No começo, a equipe de cuidados paliativos, tinha um grupo maior,

no Emílio Ribas, como médica concursada, atuouando no Pronto Socorro, função que exerce até hoje. Disponível em
<www.versocial.org.br/default.asp?item=CV_gloria>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
l
Elisa Miranda Aires, graduada em Medicina pela Universidade Federal do Ceará (1984) e Mestre em Ciências pelo Programa
de Pós-Graduação da Coordenadoria de Controle de Doenças da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (2002). Atualmente
é médica infectologista da Prefeitura do Município de São Paulo e médica infectologista do Instituto de Infectologia Emilio
Ribas da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Doenças Infecciosas
e Parasitárias, atuando principalmente nos seguintes temas: AIDS, cuidados paliativos, infectologia, dor e HIV. Plataforma
Lattes. Acesso em 28 de nov. de 2011.
li
Marco Túlio Assis Figueiredo, médico, professorprofessor da Disciplina de Cuidados Paliativos da UNIFESP-EPM; Chefe do
Ambulatório de Cuidados Paliativos da UNIFESP-EPM; Sócio fundador da International Association for Hospice and Palliative
Care (USA); São Paulo, SP. Disponível em <direitodoidoso.braslink.com/01/artigo026.htm>. Acesso dia 28 de nov. de 2011.
lii
Sandra Helena enfermeira, participou da Equipe de Cuidados Paliativos do IIER. Recursos Humanos do IIER.
liii
Elizabete enfermeira, participou da Equipe de Cuidados paliativos no IIER. Informação obtida na entrevista da capelã da
Capelania Evangélica Hospitalar do IIER.
liv
Ronaldo da Cruz médico, participou da Equipe de Cuidados Paliativos do IIER., Médico do Programa Cuidados Paliativos do
Instituto de Infectologia Emílio Ribas de São Paulo. Disponível em <www.cremesp.org.br> . Acesso em 28 de nov. de 2011.
101
Resultados e Discussão

de 12 pessoas. Depois, foi diminuindo, principalmente o pessoal de enfermagem


rodou muito ali dentro, porque não tinham quase tempo de estarem presentes nas
reuniões, que aconteciam pela manhã, quase toda quarta feira, com duração de três
horas. Houve muitas saídas, muitas viagens, cursos e nem todos podiam estar
presentes. A parte médica começou com a Dra. Elisa e depois Dr. Ronaldo, Dra.
Sonialv, Dra. Maria Aparecida Guerralvi e outros profissionais: uma terapeuta
ocupacional, uma psicóloga, duas assistentes sociais, uma nutricionista e eu, como
capelã. Depois entrou o Silvio Ribas, da capelania católica. Nós colocamos, como
parte do treinamento de Capelania Evangélica Hospitalar pela ACEH, no Curso Nível
II, a necessidade do aluno ter que fazer parte do grupo de cuidados paliativos, bem
como a visitação no leito desses pacientes. Começamos também, depois de algum
tempo, com a capelã Neidelvii, um trabalho com os profissionais da limpeza. Eu a
orientei como fazer mensagens extremamente curtas, como envolver o pessoal e aí ela
começou e o resultado foi fantástico. Nós conseguimos atender todo o pessoal da
manhã e da tarde, durante toda a semana, mas o pessoal da noite não tinha
atendimento. Daí, o chefe da limpeza nos pediu para que conseguíssemos, de alguma
forma, arranjar um jeito de atender o pessoal que entrava à meia noite e saia às 6 da
manhã. Foi difícil fazer isso porque tínhamos que chegar muito cedo ao hospital.
Levamos também a experiência que tivemos no HCFMUSP com os funcionários da
manutenção, que foi muito positiva. Fazíamos um trabalho chamado “Minutos com
Deus”. Esse trabalho consistia em ler uma passagem bíblica, explicá-la e fazer uma
oração, perguntando se havia algum pedido especial. Chegamos a ter 30 a 40
funcionários participando. No IIER, logo começamos a colher os resultados também,
do projeto “Minutos com Deus”. Dessa forma, podíamos ter um acesso muito mais
rápido e profundo aos profissionais do hospital. A experiência da capelania no
HCFMUSP e no IIER levou o Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar a divulgar
seu trabalho extra muros. Assim, o pediatra dos meus filhos, que era editor da revista
Âmbito Hospitalar, pediu-me para escrever um artigo para a revista e eu escrevi um

lv
Sonia Regina Rocha Miura, médica, participou da equipe de Cuidados Paliativos do IIER, médica do Programa de Cuidados
Paliativos do Instituto de Infectologia Emília Ribas de São Paulo CRM 35545 Inscrito em.21/08/1979. Disponível em
<www.cremesp.org.br> . Acesso em 28 de nov. de 2011.
lvi
Maria Aparecida Guerra, médica, fazia parte da Equipe de Cuidados Paliativos e do Serviço de Epidemiologia do IIER
Informação obtida através da entrevista com a capelã da capelania evangélica.
lvii
Neide Correia Menezes, capelã, fazia parte da equipe de capelania hospitalar evangélica do IIER. Cadastro da ACEH.
102
Resultados e Discussão

texto intitulado “O que fazer quando aparentemente não há mais nada a fazerlviii”
sobre como lidar com os pacientes terminais e ainda dar esperança, dar a eles algum
alívio em meio ao sofrimento. Logo que a revista foi publicada, Dr. Marco Túlio, que
eu não conhecia, entrou em contato comigo e convidou-me para fazer parte da equipe
dele, como responsável pela parte espiritual. Convidou-me para ministrar aulas sobre
tanatologia, sobre pacientes terminais e sobre cuidados paliativos. Daí, nós
começamos a ministrar aulas na Faculdade de Medicina do ABClix, (não sei se o
nome era Anchieta) e tínhamos ali muitos alunos e vários professores também. Foi
muito boa essa atividade. Dr. Marco Túlio já era Prof. Titular da UNIFESP; então, ele
me pediu para ministrar aulas também em um curso que era como matéria eletiva na
área de paliativos, na UNIFESP. Ministrei aulas vários anos, dentro do curso que ele
promoveu. O curso era direcionado para médicos e estudantes de medicina, e foi
aberto também, depois, para a Faculdade de Enfermagem e não sei se Nutrição e
Fisioterapia também. As palestras eram muito bem aceitas, como todo material que
nós levávamos. Outra atividade desenvolvida, a partir da equipe de cuidados
paliativos do hospital, foi dois anos depois que o Serviço de Capelania Evangélica
havia sido implantado. O Ministério da Saúde solicitou que fossemos preparados, por
eles, para ministrarmos cursos sobre cuidados paliativos. Levaram-nos para o Estado
do Rio Grande do Sul, onde fizemos uma semana de curso. A partir daí, o Ministério
da Saúde sempre mandava consultores para nos acompanharem, investindo em nosso
aprimoramento. Vários hospitais criaram os serviços de cuidados paliativos. Depois
de algum tempo, quando nós já tínhamos começado o Serviço de Capelania
Evangélica no Hospital do Servidor Público do Estado, a Dra. Maria Goretilx

“O que fazer quando aparentemente não há mais nada a fazer”, artigoartigo publicado na Revista Âmbito Hospitalar.
lviii

Disponível em <www.solucaoambito.com.br/t1/> . Acesso em 28 de nov. de 2011.


lix
Faculdade de Medicina do ABC, com sede e foro na cidade de Santo André, Estado de São Paulo, foi autorizada a funcionar
pelo Decreto Federal N.64.062, de 5 de fevereiro de 1969 e reconhecida pelo Decreto Federal N.76.850, de 17 de dezembro de
1975, publicado no Diário Oficial da União em 18 de dezembro de 1975. Foi transferida do sistema federal de ensino para o
sistema estadual pelos Pareceres CFE n. 62/83 e CEE n. 1713/83, este último aprovado em 16 de novembro de 1983 e publicado
no Diário Oficial do Estado de São Paulo em 22/11/1983 .É mantida pela Fundação do ABC, à qual compete a administração
funcional, econômica e financeira, tendo sido criada pelas leis ns.2.695 de 24 de maio de 1967 e 2.741 de 10 de julho de 1967 da
Prefeitura de Santo André, n.1.546 de 6 de setembro de 1967, da Prefeitura de São Bernardo do Campo e n.1.584 de 4 de julho
de 1967 e da Prefeitura de São Caetano do Sul, com Registro Público na Comarca de Santo André, sob n.825, de 6 de outubro de
1967, no livro A-2, de Pessoas Jurídicas, à folha 192. Disponível em
<www.fmabc.br/index.php?option=com_content&view=article&id=6&Itemid=18>. Acesso em 28 de nov. de 2011.

lx
Maria Goreti Maciel é graduada em Medicina pela Universidade Federal de Pernambuco (1983) e especialista em Medicina
Geral e Comunitária pela Associação Hospital de Cotia AHC (1986). Atualmente é coordenadora do Programa de Cuidados
Paliativos do Hospital Samaritano São Paulo, Diretora de Serviço de Cuidados Paliativos do Instituto de Assistência Médica ao
103
Resultados e Discussão

responsável pelo serviço, através do Dr. Luizlxi que era o Diretor de Atendimento
Domiciliar do Hospital do Servidor Público Estadual, solicitou-me que indicasse e
preparasse um capelão para integrar a equipe de paliativos de lá. Indiquei a Maria
Lúcialxii, que já tinha sido bem treinada no IIER em cuidados paliativos e com
pacientes terminais. Dessa forma, estávamos levando recursos humanos e experiência
adquirida no IIER, para outros hospitais. De tudo isso, eu acho que tem várias coisas
que eu posso enxergar para minha vida e para a capelania. Para minha vida, primeiro
a dependência total de Deus, em buscar um propósito Dele para mim. Eu sei que me
tornei famosa no HCFMUSP pelo que Deus foi fazendo na vida dos pacientes, na
vida dos profissionais da saúde. Todas as oportunidades que nós tivemos lá, através
das programações musicais mensais, no saguão do hospital, pois o Dr. Amato nos
pedia para fazer programações para o hospital todo. Aliás, pedia para trazer
enfermeiros evangélicos para o hospital, porque eram mais profissionais e cuidavam
melhor dos pacientes. A aceitação da Capelania Evangélica foi pela qualidade do
nosso trabalho, principalmente com o intuito de tornar o nome de Deus conhecido lá
dentro, de glorificar a Deus, através das vidas a que a palavra Dele tivesse acesso. Eu
aprendi muito sobre minha enorme fragilidade, aprendi como os momentos de raiva
podem ser produtivos, principalmente quando é uma ira justa. Aprendi sobre a
riqueza da equipe, a diversidade de dons, talentos e personalidades. A riqueza do
corpo [igreja], de se complementarem e, juntos, formarem realmente uma unidade e
espelharem a Cristo, dentro do hospital. Como nós somos reconhecidos por isso!
Como isso marcou época! É interessante que, hoje mesmo, quando eu vou visitar
alguém da Psiquiatria do HCFMUSP, tenho livre acesso, um ou outro porteiro avisa
que “a capelã está aqui” e entro tranquilamente. Quando saio passando pelo Prédio
dos Ambulatórios, sempre encontro profissionais da saúde ou funcionários que
conheciam nosso trabalho e eles falam: “Ah que bom! Vvocês estão aqui de volta!
Nossa! Nós não temos mais nada aqui. Vocês precisam voltar”. Então, são coisas
gostosas de saber que deixamos, que marcou a história, a vida de pessoas. Aprendi
sobre a fome que as pessoas têm de Deus e que não importa a posição, a cultura, os

Servidor Público Estadual de São Paulo e Diretora/Professora do Instituto Paliar. Tem experiência na área de Medicina da
Família, Cuidados Paliativos e Saúde Pública. Plataforma Lattes. Acesso em 28 de nov. de 2011.
lxi
Luiz Michima graduado em medicina, responsável pelo Serviço de Atendimento Domiciliar do Hospital do Servidor Público
Estadual de SP. Informação obtida através da entrevista com a capelã da capelania evangélica.
lxii
Maria Lúcia Prado Soares, capelã, fazia parte da equipe de capelania evangélica hospitalar do IIER . Cadastro da ACEH.
104
Resultados e Discussão

títulos que elas têm; mas que em todo coração existe um vazio em forma de Deus,
que nós temos, que só é preenchido buscando sabedoria em Deus. Temos acesso a
esse coração e podemos ser usados por Deus, para deixar uma mensagem de vida.
Aprendi a não ter medo de autoridades, pois tive que enfrentar todas, de todos os
tipos. Pude ver que Deus é maior do que qualquer autoridade, e que essas autoridades
são colocadas por Ele por algum tempo e depois são retiradas. Aprendi como temos
que falar com o paciente. Mesmo que estejamos trabalhando há muitos anos nessa
área, cada história de vida é única. Eu só sei que ele quer conhecer a Deus e Deus
precisa me dar meios, sabedoria e táticas para chegar lá. Então, o que descobrimos
sobre o uso da “palavra chave” que o paciente nos dá, é super importante para
responder à necessidade dele, que ele mesmo levantou. Por isso, sabemos que a
mensagem vai ser sempre bem aceita pelo paciente. Aprendi o valor da família,
porque ela sempre me deu apoio e liberdade. Nunca cobrou nada de mim. Mesmo
meus filhos, quando eram pequenos, viveram “capelania” o tempo todo porque eu
não só levava histórias para casa, mas levava pacientes para casa também. Eu os levei
muitas vezes. Levei a turma do “Branco Dinamite”, que ficou por dois anos indo lá
em casa. Depois disso, levei um assassino profissional, que se converteu no hospital,
que pegou meus filhos no colo. Levei gente “da pesada”. Levei bruxa que se
converteu em casa, levei muita gente. Levei um dos nossos capelães, quando teve
tuberculose e estava num estado gravíssimo. Ele morava sozinho em São Paulo, não
tinha para onde ir e não queria ficar hospitalizado de jeito nenhum. Eu o isolei no
quarto debaixo da minha casa. Aprendi com a Enfermagem como fazer toda a
paramentação, todos os cuidados necessários e cuidei dele o tempo todo. Aprendi um
bocado de coisa e continuo aprendendo. Minha casa era e sempre foi a extensão do
hospital. Eu me lembro que, quando começou a ir a turma do Branco Dinamite em
casa, as pessoas falavam: “é doida, vão roubar sua casa!” Já tinham roubado antes!
Dois meses antes de iniciarmos esses encontros, uma quadrilha tinha entrado na casa
e levado tudo, não tinha mais nada de valor para ser roubado. Mas não foram eles. Eu
vou lá ver o Branco essa semana, estou com saudades dele. Ele mora no Parque São
Domingos, na saída da Via Anhanguera. Quantas vezes o Mauro dormiu em casa,
viajou. Travestis foram em casa e dormiram lá também. Eu vejo assim: como Deus
me deu graça e nos protegeu, também deu paciência para os meus filhos e aceitação,
105
Resultados e Discussão

porque eles me dividiram com mil pessoas, milhares de pessoas. Tenho muita história
para contar e eles também!

5.1.2 Depoimento do Padre responsável pela Capelania Católica do Instituto


de Infectologia Emilio Ribas

A capelania surgiu antes de eu vir para o IIER. Antes de mim, era o padre
Thomas Scottlxiii, o padre Leo Pessini e o padre Cristianlxiv que atendiam, a partir do
HCFMUSP. A Capelania Evangélica já existia no HCFMUSP há vinte anos e, no
IIER, a dona Eleny já a tinha implantado, quando eu cheguei aqui. A Capelania
Católica começou desde a fundação da assistência religiosa. Então, a primeira igreja
que tem registro é a igreja da Consolação porque, no final de 1800, era a igreja mais
antiga. Depois foi a Igreja Nossa Senhora de Fátima e, depois, a São Luiz Gonzaga.
Existe um livro histórico das paróquias, registrado nos livros de tombo. A Capelania
Católica foi criada no HCFMUSP há quase 60 anos. Então, a partir dali, o HCFMUSP
assumia a responsabilidade do IIER. Há 21 anos, eu fiz um estágio e vim fazer o
curso de capelania hospitalar. Nessa época, já existia implantada a Capelania
Evangélica coordenada pela Eleny. Eu fiz estágio junto aos padres camilianos no
HCFMUSP e, dali, eu atendia o IIER, no mesmo período de estágio. Aí, eu voltei
para o Rio Grande do Sul. Vim, depois, fazer outro estágio de um ano. Aí, pedi mais
um ano e não me deixaram mais voltar. Estou “fazendo estágio” há 20 anos. Eu me
lembro que a Capelania Evangélica, quando comecei, era muito atuante aqui. Figura
na minha lembrança essa presença marcante dos membros da Capelania Evangélica
dentro da instituição que, por sinal, é muito positiva. Na Capelania Católica, fazemos
uma visita diária, a missa semanal, para levar a eucaristia para o doente, consolo aos
enfermos, a benção e a confissão. Já teve inúmeros casos de batizados de crianças
lxiii
Thomas Scott padre, citado pelo padre da capelania católica como sendo um dos primeiros padres a pertencer a equipe da
capelania católica no IIER.
lxiv
Cristian de Paul de Barchifontaine é graduado em Enfermagem pelo Institut of Nursing Saint Elisabeth de Bergem (1972),
graduado em Filosofia - Seminário de Tournai (1969) e graduado em Teologia - Seminário de Bruxelas (1975). É mestre em
Administração Hospitalar e da Saúde pelo Centro Universitário São Camilo (1989) e doutor em Enfermagem na Universidade
Católica Portuguesa (UCP). Atualmente é membro do Conselho Superior da Associação Nacional de Educação Católica do
Brasil, Superintendente da União Social Camiliana e Reitor do Centro Universitário São Camilo, . Aalém de Vice-Presidente da
Sociedade Brasileira de Bioética de São Paulo. Tem experiência na área de Enfermagem, com ênfase em Enfermagem de Saúde
Pública, atuando principalmente nos seguintes temas: bioética, administração hospitalar, pastoral da saúde, administração.
hospitalar e reabilitação. Plataforma Lattes. Acesso em 28 de nov. de 2011.
106
Resultados e Discussão

graves, ou de adultos que estavam em fase terminal, que pediram o sacramento da


extrema unção dos enfermos. Já teve crismas e já fiz dois casamentos de pacientes
aqui dentro. Na prática, funciona como uma igreja dentro do hospital. A comunidade
lá de fora é solidária com a comunidade dentro do hospital. Então, tudo que se faz lá
fora, se faz aqui. Em relação às festas, a Capelania Católica, assume três projetos:
festa de natal, da páscoa e do dia das crianças. Todas as crianças do hospital, mesmo
as atendidas ambulatoriamente, vem para a festinha e têm direito a trazer um
convidado, para quebrar o preconceito contra o IIER. O hospital sofre muito
preconceito. As outras crianças, mesmo que não sejam pacientes, criam outra visão
do hospital que atinge os familiares que vem acompanhar essas crianças. Esse
trabalho é da Capelania Católica junto com a Associação Viva e Deixe Viver, dos
Contadores de Histórialxv. Juntos, a Capelania Católica e o Voluntariadolxvi assumem
o projeto de dar um kit higiênico para o paciente. Nossos pacientes são muito
carentes, passam muitas necessidades e tem quem venha para o IIER sem esperar
ficar internado. Então, geralmente eles não têm sabonete, não têm pasta de dente e
não tem uma escova de dente. Então, nós juntamos o que cada um tem e fazemos um
kit higiênico que, pelo Comitê de Humanização do hospital, é distribuído aos doentes.
Então, são essas as atividades que temos. Tudo que a diretoria geral ou as diretorias
num grau inferior solicitam às capelanias, elas estão à disposição do hospital. A
Capelania Evangélica também faz alguns eventos: celebram o dia do médico, levam
uma mensagem e celebram o dia da Enfermagem. Mesmo nas datas comemorativas,
sempre levam uma lembrancinha para os doentes também; então, são outras formas
de fazer com que o doente se sinta acolhido no hospital. O trabalho no hospital é mais
desafiador do que fora dele. É muito mais fácil você ter uma comunidade estruturada,
porque ela vai à procura do ministro religioso e ele estabelece os horários. Eu sempre
digo para quem trabalha no hospital: você sabe a hora em que vai entrar, mas não
sabe a hora em que vai sair. Na paróquia, na comunidade, isso não tem. Se eu não
atendo hoje, ele pode ser atendido amanhã. Agora, no hospital, se eu não atendo hoje,
amanhã ele pode não estar mais vivo, ou amanhã ele está em coma, ou amanhã ele

lxv
Contadores de História é uma organização sem fins lucrativos que tem quatorze anos de experiência na gestão de voluntários e
faz uma seleção criteriosa e treinamento com as pessoas que queiram fazer parte do projeto contador de histórias. Disponível em
<http://www.vivaedeixeviver.org.br/>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
Voluntariado – Que é feito sem constrangimento ou coação; espontâneo. Que só age de acordo com a sua própria vontade;
lxvi

caprichoso, voluntarioso. Indivíduo que se alista espontaneamente num exército, ou que se encarrega de uma incumbência à qual
não estava obrigado. Disponível em <www.dicionariodoaurelio.com/Voluntario>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
107
Resultados e Discussão

teve alta. Então, você nunca pode perder o hoje. O momento é o hoje e o amanhã
deixamos para amanhã. Então, ele é mais desafiador. Mas ele é muito gratificante.
Podemos conviver e trabalhar juntos. Nesse sentido, é muito mais gostoso, não é uma
paróquia católica ou uma igreja evangélica: nós estamos juntos convivendo. Hoje, os
hospitais estão mais preocupados com a humanização, pensando de uma forma bem
ampla nesse aspecto de assistência espiritual ao paciente. Vou dar só um exemplo: há
pouco tempo, eu acompanhei um cardeal que foi internado no Hospital São Luiz lxvii.
O professor preferiu fazer lá a cirurgia e, quando eu esperava por ele, um velho
médico do HCFMUSP que agora trabalha lá, me parou e me cumprimentou falando:
“puxa vida, padre, porque a gente não pode ter um serviço no nosso hospital
também?”. Até falaram: “nós precisamos de um capelão aqui”. Hoje, as instituições
sentem que o serviço religioso é parte integrante do trabalho. Não adianta você curar
o resto, pois, muitas vezes, a ferida está no espiritual. Então, eles percebem que o
trabalho em conjunto hoje é um desafio que as igrejas têm que se colocar, preparar
pessoas para esse ministério e não pensar: “Ah, porque o padre está velhinho, o pastor
esta velhinho, então vamos colocá-los no hospital”. Temos que profissionalizar os
ministros religiosos para essa finalidade da ética, da bioética, da humanização, para
que nossa palavra seja uma palavra com autoridade. A Capelania Evangélica foi
sempre muito atuante junto aos profissionais, aos doentes, sempre marcando essa
assistência. Havia sempre pastores agregados, existia outro pasto,r João Hamiltonlxviii,
um pastor bem moreno escuro. Lembro-me dele, do Netto, que também atuava
bastante aqui. Agora a Jenylxix, a Neide, a Oneidalxx são muito atuantes. Nós sempre
tivemos uma visão muito positiva da Capelania Evangélica. Nossa relação é marcada
pela fraternidade porque nosso objetivo não é concorrer. Até podemos dizer que
concorremos no sentido positivo, para prestar a melhor assistência religiosa e humana
ao paciente. Então, nesse sentido, usamos os termos paulinos: nos
rivalizamosrivalizamos-nos pelo bem do paciente. Mas não há uma competição entre
lxvii
Hospital São Luiz foi inauguradoinaugurado em 1938 como uma policlínica, e hoje é uma rede com três
unidades hospitalares, 803 leitos e 14 mil médicos credenciados, estabelecida em São Paulo capital. Disponível
em < http://www.saoluiz.com.br.> Acesso em 28 de nov. de 2011.
lxviii
João Hamilton fazia parte da equipe de capelania evangélica hospitalar do IIER. Cadastro da ACEH.
lxix
Jeny Andrade, capelã fazia parte da equipe de capelania evangélica hospitalar do IIER. Cadastro da ACEH.
lxx
Oneida Green de Almeida fazia parte da capelania evangélica hospitalar. É presidente do Ministério Viúvas
Evangélicas em Missão (VEM) e membro da equipe de Capelães do Inst. de Infectologia Emílio Ribas Disponível
em <www.iceuniao.sites.uol.com.br/capelaniahcusp.htm>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
108
Resultados e Discussão

nós, de quem é melhor: os católicos ou os evangélicos? Não! Nós nos damos aàs
mãos para atender o doente. Esse é o objetivo da capelania e também, em
conseqüência, dar uma assistência aos profissionais da saúde da instituição. Isso, nós,
na espontaneidade e na fraternidade, que eu e o pastor João Garcia Batistalxxi temos, é
uma coisa muito bonita e gratificante. Não temos nenhuma dificuldade na relação
administrativa ou nas relações de comunicação com a Capelania Evangélica. Nós
sempre conversamos, temos um diálogo muito franco e aberto, muito maduro, porque
entendemos que somos irmãos de caminhada e temos uma responsabilidade e, como
queremos o bem da instituição e do doente, se existe alguma coisa, nós conversamos.
Essa experiência bonita que temos aqui, eu aprendi com o pastor Joãolxxii, no
HCFMUSP. Nós dividíamos a tarefa de dar cobertura aos andares do hospital porque
era um departamento muito grande. Com o passar dos anos, cada um pegava dois
pacientes e, no fim, nós nos juntávamos e trocávamos informação. Olha, aquele quer
ir à missa, aquele quer ir ao culto, outro gostaria de receber uma oração, o outro a
eucaristia. Trocávamos informações sobre como todo o hospital estava, quem tinha
sido visitado e cada um ia fazer o trabalho específico da sua confissão religiosa.
Havia também a indicação de um capelão para o outro sobre a visitação de doentes.
Eu venho do Rio Grande do Sul, onde a colonização foi conjunta, católica e
evangélica luterana; então, para mim, foi um choque muito grande quando vim para
São Paulo e vi a idéia de competição entre as duas religiões. No Sul, isso não havia;,
nós sempre trabalhávamos juntos, fazíamos reuniões entre as capelanias, não com
espírito de competição, mas de colaboração, para o bem comum. Acho que, antes de
nós olharmos o que nos separa como igreja, temos que olhar o que nos une. Quando
formos olhar o que nos une, é muito mais do que as mínimas coisas que nos separam.
No Sul, eu não trabalhava como capelão e as igrejas evangélicas só faziam visitação
hospitalar, não existia capelania evangélica hospitalar. Eu acumulava ser padre da

lxxi
João Garcia Batista é graduado em teologia pelo Seminário Bíblico Palavra da Vida e especializado em Aconselhamento
Bíblico pelo NUTRA – Núcleo de Treinamento, Recursos e Aconselhamento Bíblico. Capelão No IIER e CRT em DST/AIDS
de São Paulo. Fez o Ccurso e o treinamento em Capelania Pós-Desastre pela academia do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio
de Janeiro. Atua como capelão na Equipe de Cuidados Paliativos do IIER e na equipe do CRT/DST/AIDS no Atendimento
Domiciliar. Informação obtida no livro: Catástrofes Atuação Multidisciplinar em Emergência, Malagutti W. Ed Martinari 2011.
lxxii
João Domingos Alves Filho é graduado em Teologia. Em abril de 1990, iniciou trabalho de auxílio espiritual no complexo do
Hospital das Clínicas. Disponível em <www.felipegodoy.wordpress.com/2011/08/12/palavras-de-paz/> . Acesso em 28 de nov.
de 2011.
109
Resultados e Discussão

Catedral Santo Ângelolxxiii e do serviço religioso dos hospitais. Mas, quando precisava
de um pastor, eu pegava o telefone e chamava um. Fazíamos mensalmente encontros
de padres e de pastores e, quando um precisava da ajuda do outro na comunidade, nós
nos ajudávamos. Inúmeras vezes eu ia à catedral e emprestava os paramentos dos
religiosos católicos para cultos evangélicos, da Igreja Luterana de Missourilxxiv. Eles
usam paramentos da tradição da igreja católica e da ortodoxa. Então, eles iam pegar
os paramentos da igreja católica. Às vezes, para a confraternização, nós pegávamos
pratos e talheres. Tínhamos um trabalho muito bonito. Então, nesse sentido, o serviço
de capelania mostra que é possível, embora vivendo de formas diferentes, seguirmos
um único Senhor, que é Jesus, podermos ser irmãos porque o amor de Cristo nos une.
Então, nós podemos mostrar isso para o mundo, numa dimensão ecumênica muito
bonita. Quanto aos cursos, tanto a Capelania Evangélica como a católica fazem cursos
de preparação. A agência pastoral, no caso da Capelania Católica, e os auxiliares de
capelania, no caso da Capelania Evangélica, têm um treinamento específico, com as
equipes do Comitê de Controle Infecção Hospitalar (CCIH) do hospital, com o Corpo
Clínico, com a Enfermagem, Nutrição, com a assistente social e com a psicóloga.
Aquilo que é específico da capelania, como o lado religioso, os grupos também têem.
Os dois lados têm um estágio assistido, pois não se faz o curso e não se libera a
pessoa para entrar, sem passar por uma avaliação, um preparo específico. Depois das
visitas, fazemos um feed back com os voluntários, para que eles se sintam maduros
para visitar os doentes. Só no momento em que ele se sente seguro e que “o padrinho
da visita” sentir também confiança, ele tem autonomia para visitar o doente. Em
termos institucionais, o fluxo, a subordinação das capelanias, a partir de 1994 ou
1995, o Dr. Sebastião André de Felice criou uma coordenação do serviço religioso e,
com essa decisão, eu tenho a responsabilidade. Antes disso, era cada um por si. Mas o
Dr. André achou por bem, como havia dificuldade de relacionamento da instituição
com alguns grupos pentecostais, ele achou por bem criar uma coordenação que
lxxiii
Catedral Santo Ângelo, Rua Marques do Herval, 1113 - Santo Ângelo – RS. Disponível em
<www.diocesedesantoangelo.org.br/fale_conosco.aspx>. Acesso em 28 de nov. de 2011
lxxiv
Igreja Luterana de Missouri - O impulso definitivo para que se erguesse um templo de 1906, com a doação de um terreno,
cedido pelos senhores Daniel e Hermann Heydenreich. Em abril do ano seguinte, lançou-se a pedra fundamental do templo, mas
somente no dia 25 de dezembro de 1908 - dezessete anos depois da constituição da Comunidade - foi inaugurada a primeira
"casa" dos luteranos em São Paulo. Localizado na Avenida Rio Branco, o templo - o primeiro em estilo neogótico na capital - foi
chamado inicialmente pelo nome alemão (Stadtkirche), passando a ser conhecido, mais tarde, como Igreja Matriz. Em 1991, foi
"rebatizado" como Igreja Martin Luther. A União Paroquial São Paulo, constituída em 1972, hoje possui dez comunidades, além
de uma vasta rede de entidades diaconais. Disponível em <www.luteranos.com.br/3025/historico.html>. Acesso em 28 de nov.
de 2011.
110
Resultados e Discussão

respondesse para as igrejas, por denominações, e para a direção do hospital, fazendo


uma ponte. Quando envolvia assuntos religiosos, nós nos pronunciávamos. Isso, com
o Dr. David Everson Uiplxxv, continuou. Então, nós temos a coordenação do serviço
religioso e, para ser mais claro, nós temos mais problemas. Então, antes dessa época,
as capelanias se dirigiam diretamente ao diretor, que era o Dr. Paulo Augusto Ayrosa
Galvão, que faleceu. Depois veio o Dr. Guido Levi, que passou para o Dr. George
Schulte, Dr. Vasco Carvalho Pedroso de Lima e, depois, veio Dr. Sebastião André de
Felice e, agora, Dr. David Uip. Eu coordeno o serviço religioso e cada capelania
mantêm sua autonomia. Então, por exemplo, se algum grupo religioso quer prestar
um serviço no hospital, a diretoria vai encaminhar para essa coordenação, para que
seja dado um parecer, se está dentro da lei, de acordo com a Constituição Estadual e
Federal, mas não significa que a Capelania Evangélica está subordinada à Capelania
Católica, nem a católica à evangélica. Nós continuamos com autonomia e mantemos
as identidades. Isso é muito importante, mas, para questões de relacionamento interno
da instituição, fica centralizado num coordenador, que hoje sou eu, mas amanhã pode
ser Eleny Vassão ou pode ser o pastor João Batista Garcia. Todas as crenças
religiosas cristãs e não cristãs, da comunidade judaica, da comunidade mulçumana ou
da hindu, todos se reportam à minha pessoa. Então, automaticamente, a direção
encaminha para mim ou, digamos assim, acontece alguma coisa, como no caso da
Capelania Evangélica, algum grupo evangélico; então, o que eu vou fazer? Eu recebo
e encaminho para a Capelania Evangélica dar seu parecer e eu devolvo de novo, de
acordo com o organograma, para a diretoria do hospital. A direção do hospital tem o
Comitê de Ética e Humanização, no qual a Coordenação do Serviço Religioso tem
cadeira cativa. A instituição entende que o Serviço Religioso humaniza também a
instituição, humaniza o hospital. Essa indicação é feita pelo diretor que, naquela
época, foi o Dr. Sebastião André de Felice, e que o Dr. David Uip manteve. O
Serviço Religioso ainda não consta no organograma do hospital, não é formal. Então,
no nosso caso, usamos o nome da Igreja Católica como nome jurídico, “Mitra
Arquidiocesana de São Paulo Capelania Católica no IIER” e não o nome do IIER.
Não somos “do” porque não constamos no organograma. Estava previsto um novo

lxxv
David Everson Uip é graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina da Fundação Universitária do ABC (1975), Mestre
em Doenças Infecciosas e Parasitárias pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (1989), e Doutor em Doenças
Infecciosas e Parasitárias pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (1993), e Professor Titular da Faculdade de
Medicina do ABC e Diretor Técnico de Serviço do Instituto de Infectologia Emílio Ribas. Disponível em
<http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=P932818>. Acessado em 28 de nov. de 2011.
111
Resultados e Discussão

organograma, aprovado pela Secretaria da Saúde, em que constava a questão do


serviço religioso, mas agora, com o convênio da Faculdade de Medicina da USP e a
Secretaria da Saúde, o organograma parou na Secretaria e está se vendo um novo
organograma. Nós estamos lutando para criar um Serviço Religioso nele. No
momento, só existem a Capelania Evangélica e a Católica formalmente instituídas no
IIER. Recentemente, os espíritas fizeram uma solicitação de implantação de
capelania. Eles fazem parte de um Centro Espírita do Butantã. O pedido está no
Comitê de Humanização, para avaliar a possibilidade de implantação de uma
capelania espírita. O Comitê de Humanização tem poder sobre tudo o que se refere à
humanização do paciente. O Comitê, na prática, aqui no IIER, seria como o senado
do diretor, que vai dar os pareceres para que os diretores decidam acatar ou não. É um
cComitê multiprofissional, inclusive com pessoas não vinculadas ao hospital; até
pacientes participam. Esstes vão dar o parecer para o diretor diante das situações e o
diretor acata ou não. Eu faço parte do Comitê de Ética do hospital e também da
Capelania, assim como o pastor João Batista Garcia, da Capelania Evangélica,
participa da Equipe dos Cuidados Paliativos. Como o hospital entende que as
capelanias trabalham na humanização do hospital, não só com o paciente, mas com os
funcionários, o coordenador do Serviço Religioso participa do Comitê de
Humanização, sendo porta voz do Serviço Religioso, na instituição, junto à direção
do hospital. Ao mesmo tempo, ele traz as informações do Comitê de Humanização
para as capelanias, que estão subordinadas a essa coordenação. Além do serviço
religioso, nós também temos autonomia frente ao Comitê de Ética e de Humanização,
para dirigir assuntos reservados das capelanias, que não interessam a esses Comitês.
Quanto aos pré-requisitos para a abertura de uma nova capelania, é necessário o que a
Constituição Federal exige: que haja uma solicitação, que seja nomeado o capelão
responsável, que ele aceite a legislação do país, que aceite as normas do voluntariado
do hospital e, também, que ele aceite a normatização do serviço religioso que foi
elaborado em conjunto, entre a Capelania Evangélica e a Católica, com os nossos
princípios básicos. Então, uma vez que eles se enquadrem nessas condições,
formalizam essa solicitação ao hospital, para posterior avaliação. O serviço do
voluntariado, como o Serviço Religioso, exige que eles tenham também um
treinamento, um estágio supervisionado, que pertençam a uma instituição que dê
respaldo porque, se der um problema, quem vai responder perante a direção do
112
Resultados e Discussão

hospital? Então, deve ser uma pessoa jurídica, reconhecida pelo governo federal. A
Capelania Evangélica reúne várias denominações que podem trabalhar juntas. Nós
católicos, por exemplo, não teríamos dificuldade se a igreja ortodoxa, ou a igreja
anglicana, quisesse participar conosco, ou outras denominações. Então, para que criar
“N” capelanias e dividir forças? Melhor juntar para prestar um serviço de melhor
qualidade. O fluxo de solicitação do paciente para a visitação de uma capelania ou de
outra funciona assim: o paciente evangélico se dirige à Capelania Evangélica. A
Capelania Evangélica, durante a visitação dos pacientes leito a leito, procura saber se
o paciente quer um ministro religioso, no caso de judeu, muçulmano, hindu ou
espírita. Também a Enfermagem, ou o Serviço Social, me comunica e nós entramos
em contato com a denominação. Se tiver algum membro de alguma igreja externa
para visita, ele tem o direito a visitar aquele paciente e pede isso ao Serviço
Religioso. Ele não tem liberdade para passear no hospital, visitar outros doentes,
mesmo porque, num hospital de infectologia, existem as precauções para se proteger
e proteger o paciente. Então, na nossa prática, o ministro religioso se apresenta em
uma das capelanias e um membro da capelania vai fazer a visita ao doente junto com
o ministro religioso, com toda a liberdade. Esse acompanhamento é para dar
segurança para ele, frente à equipe profissional e também para que ele se proteja de
alguma doença contagiosa de que o paciente possa estar sofrendo. Então, por
exemplo, quando o paciente se interna, ficamos sabendo da denominação da religião
dele através das visitas diárias, pois a visitação da capelania do hospital é livre para
visitar todos os pacientes. A diretoria nos dá toda a liberdade, a não ser quando haja
uma epidemia, como esta que houve da gripe, ou supostas epidemias que poderiam
virar uma pandemia. O serviço de CCIH restringiu as visitas a um representante
católico e um evangélico fixo, para a visita do doente, para não colocar em risco a
equipe toda, porque nós ainda não sabíamos os níveis da dimensão da doença. Mas
depois, quando se viu que não era nada tão grave, se liberou. Quanto a instrumentos
para avaliar a qualidade da assistência prestada pelas capelanias, o próprio retorno do
doente nos dá. Acho que a melhor avaliação que podemos fazer é caminhar aqui no
pátio e ver como os doentes nos param. Nós nem nos lembramos deles, de tantos que
nós atendemos, e eles param e vem nos dar um abraço. Acho que o melhor
termômetro vem do próprio paciente, do retorno que eles dão, até quando não estão
internados. O carinho e a gratidão que eles tem por nós, acho que é a melhor forma de
113
Resultados e Discussão

avaliar a capelania nos hospitais. Nós podemos até fazer uma avaliação com normas
científicas, mas não vai ser tão real, como o que nós podemos ver no dia a dia.
Existem relatórios formais das capelanias quanto ao número de atendimentos. Isso
ainda é interno; cada capelania tem um. Por enquanto, o hospital não cobra um
relatório, mas, num futuro, vai ter. Isso também está sendo estruturado. Nós somos
um hospital-escola e o Ministério da Saúde vai exigir um banco de horas do serviço
voluntário no hospital. Vai ser o próximo passo: que cada voluntário determine um
dia e quantas horas vai doar para a instituição. Fazemos um relatório mensal das
atividades. Graças a Deus, o hospital é bem atendido em termos religiosos. Eu acho
que nem um hospital católico ou evangélico pode se vangloriar de ter duas equipes
tão atuantes, tão presentes com os doentes e com os profissionais de saúde. Não é raro
os profissionais se dirigirem a nós, no campo ético, no campo humano, para pedir a
nossa opinião sobre algo, o que demonstra a confiança que o profissional tem no
serviço religioso do hospital. Com a equipe de saúde, não temos um trabalho
formalizado. Nós passamos conversando, temos liberdade, quando ocorre alguma
questão com o paciente, de dialogar com a equipe multiprofissional. Existe muita
abertura nesse sentido e os profissionais gostam. Isso eu posso dizer com carinho e
com água na boca até: eles gostam da presença do Serviço Religioso. Quando, por um
motivo ou outro, alguns dos que estão na liderança das capelanias estão fora do
hospital por alguns dias, eles sentem a nossa falta e cobram nossa presença e, se eles
estão cobrando, é que sentem falta e, se sentem falta, é porque sentem apoio e
respaldo do Serviço Religioso. Na Capelania Católica, o número de voluntários
trabalhando é de 35 atualmente, distribuídos de segunda a domingo. À noite não há
visitação de pacientes pelas capelanias. A instituição pede que não haja por causa do
repouso dos doentes, por haver menor número de funcionários e por questões de
segurança. Então, para evitar conflitos, que já existiram, mas agora não existem mais,
preconizamos que a visita vá até as 20 horas. Também, depois das 20 horas, o
paciente quer dormir. Ninguém vai fazer culto às três3 horas da manhã, nem deve.
Eu recebi convite de vários hospitais para sair do IIER e trabalhar lá, mas eu não
abandono o IIER. Nós sentimos dificuldade em conseguir padres para atender os
hospitais e acho que as comunidades evangélicas sentem também porque, para nós, é
muito mais cômodo ter uma paróquia, uma comunidade estruturada, do que no
hospital, em que você não a tem. Então, esse também, para nós, é um desafio: os
114
Resultados e Discussão

ministros religiosos saírem das igrejas e irem para o campo missionário nos hospitais,
presídios, ou trabalhar com químico-dependentes. Acho que esse é um novo desfio
para as igrejas: ter que assumir os hospitais como campo missionário. Para mim, o
capelão é um missionário e também um profissional. Eu não separo, pois, no
momento em que eu sou um bom profissional e atuo dentro hospital, estou sendo um
missionário. Só vou conseguir ser um bom profissional quando eu for missionário,
porque eu assumo a missão que Jesus me confiou: “Ide por todo mundo e pregai o
Evangelho”. Não tem como separar as duas porque, de bem intencionado, diz o
ditado popular, o inferno está cheio. Então, temos que unir os dois; a missão e o
profissionalismo, sejam no hospital ou em outros campos.

5.1.3 Depoimento do Médico Diretor Administrativo do Instituto de Infectologia


Emilio Ribas

A Capelania Evangélica foi constituída numa época em que nós estávamos


tendo alguns problemas bastante sérios, na instituição, em relação a interferências no
tratamento da AIDS. Era uma época em que já existiam medicamentos úteis para o
tratamento dos pacientes HIV positivos e era fundamental a adesão desses pacientes,
para que esse tratamento fosse bem sucedido. Nesse sentido, a Capelania Evangélica
foi de grande utilidade na instituição. O começo da AIDS foi em 1984/1985, quando
começou a aumentar o número de casos, mas eu cheguei lá em 1995, quando a
situação já estava sob controle. O IIER, naquele tempo, embora, no papel, tivesse um
número maior de leitos, na verdade tinha cerca de 160 leitos funcionantes. Ele tinha
que ter leitos para meningite, para febre tifóide, para leptospirose e todas as outras
doenças. Então, nós tivemos que limitar o número de leitos para os pacientes com
AIDS para 110; acima disso, tínhamos que, através da Secretaria deo Estado da
Saúde, procurar outros locais, porque lá nós não tínhamos espaço para mais do que
isso e os 110 leitos estavam sempre ocupados. Hoje [2010], a situação é
completamente diferente de 1995. Dois anos depois que a AIDS teve sua explosão, já
estava disponível o tratamento e, em 1996, já começou o tratamento com o
“coquetel”, comumente chamado, mais eficiente. A partir daí, o número de
internações tendeu a diminuir. Não foi uma coisa imediata, claro, porque havia todas
115
Resultados e Discussão

aquelas pessoas que já estavam doentes, mas, com o tempo, passou a diminuir o
número de internações. No Hospital do Servidor Público Estadual, na enfermaria em
que eu trabalho até hoje, nós chegamos a ter praticamente todos os leitos ocupados
com AIDS. Hoje, nós temos três a quatro pacientes, um número que caiu
verticalmente. Os pacientes com AIDS são pacientes ambulatoriais, que vem ao
hospital, recebem o remédio, fazem consulta e vão embora. Mas, naquele tempo,
chegou-se a se fazer convênios com outros hospitais. O governo do Estado de São
Paulo, por exemplo, fez convênio com o Hospital Sorocabanalxxvi para ter leitos de
AIDS. Uma coisa interessante foi que, naquele tempo, existiam 18 casas de apoio
para receber pacientes com AIDS que não tinham onde ficar, não tinham lar e
estavam abandonados. Algumas dessas casas eram para crianças, outras para adultos.
Mas, mesmo com o trabalho da Capelania Evangélica, de vez em quando entrava pelo
hospital um pastor dizendo o seguinte: “Jesus te curou, através de mim você está
curado e não precisa mais tomar remédio”, e isso destruía um trabalho feito por meses
ou anos a fio, para que esse paciente se conscientizasse, tomasse o medicamento e
tudo o mais. Então, nós tínhamos, desde gente séria, seríssima, que estava lá no
hospital para colaborar, para reduzir o sofrimento dos pacientes, para melhorar sua
qualidade de vida, mesmo para aqueles que tinham pouco tempo de vida, melhorar
essa fase final da sua doença ou, para outros, encaminhá-los, ajudá-los a estudar e a se
manterem atualizados, enquanto se mantivessem internados. Tinha junto, ao lado
desses, aqueles que vinham dizer que não precisava mais tomar remédio. A Capelania
Evangélica veio atender, então, mais do que uma utilidade em relação aos pacientes.
Uma delas era trazer esse conforto espiritual, que era tão importante. Além disso,
muitas vezes, o conforto espiritual era associado a um trabalho material mesmo, de
trazer livros, de ajudar com atualização na escola e, ao mesmo tempo, encarreguei a
Eleny Vassão, que era a capelã titular da Capelania Evangélica naquele tempo, de ser,
eu vou usar um termo que eu usava, embora não seja um termo que conste em

Hospital Sorocabanao – Iniciou suas atividades em 1955 na Rua Faustolo, na Lapa. O objetivo do hospital era atender os
lxxvi

funcionários da Ferrovia Paulista S/A – FEPASA. Credenciado pelo Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência
Social – INAMPS –, nos anos 1960, passou a integrar o Sistema Único de Saúde (SUS) tornando-se ao longo dos anos um dos
mais importantes hospitais de atendimento público, encerrou suas atividades em 2010. Disponível em
<http://www.redebrasilatual.com.br/jornais/jba-sao-paulo/zona-oeste/sorocabana-o-hospital-que-naufragou-em-dividas> Acesso
em 28 de nov. de 2011.
116
Resultados e Discussão

nenhum local da história da instituição: ela foi a “triadora oficial”, para mim, das
pessoas que iam ter acesso aos pacientes na área dos evangélicos. Então, quem queria
ter acesso aos pacientes, na área dos evangélicos, tinha que conversar com a Eleny, e
ela podia fazer não só uma triagem, mas também uma avaliação prévia daquele
indivíduo que ia ter acesso aos pacientes, e também um treinamento dessas pessoas
quanto aos isolamentos, como deviam se comportar em termos de vestuário, lavagem
de mãos e também em termos de conhecimento da patologia que os pacientes
apresentavam, para que eles não dissessem nada discordante daquilo que a equipe
médica estava dizendo. Ela teve um resultado muito bom, nesse sentido, por um
longo tempo. Por que eu não digo em definitivo? Porque chegou um momento em
que nós íamos ter uma eleição para governador, veio uma ordem de cima, de que um
pessoal ligado a um dos nossos instrumentos mais poderosos da mídia, que não fazia
parte do grupo dos bem intencionados, que ele devia ter acesso aos pacientes para
prestar assistência religiosa, por ordem do governo. Então isso, naquele momento,
desautorizou a capelania e foi muito desagradável, porque eu sabia que a finalidade
era simplesmente conseguir o apoio dessa rede de comunicações, que era muito
poderosa, para as eleições. Mas, fora esse tipo de situação, o trabalho da capelania foi
sempre muito correto, eficiente e carinhoso. Eu só tenho elogios a fazer ao trabalho
da capelania. A Eleny tem uma liderança muito grande. Consegue aliar firmeza com
doçura; é uma pessoa formidável. Nós tínhamos também outros grupos: os católicos,
representados pelo padre João Mildner, e existiam ainda algumas representações bem
minoritárias, por exemplo, de grupos de cultos afro-brasileiros, uma pessoa que
representava a umbanda e o candomblé. Também uma pessoa formidável que,
sozinha, mantinha 30trinta crianças HIV positivo sem ajuda de ninguém. Mas o
trabalho mais importante, realmente, era o da Capelania Evangélica, sem dúvida, o
trabalho mais poderoso. A Capelania Evangélica se subordinava diretamente à
Diretoria que, no caso, era eu, bem como a Capelania Católica. Mas a Capelania
Católica tinha uma, vamos dizer assim, uma distância muito grande. Enquanto o
trabalho com a Capelania Evangélica foi sempre um trabalho muito solidário,
convergente, infelizmente, com o padre João Mildner, da Capelania Católica, eu tive
muitos problemas. Eu fiquei quase sete anos na direção do IIER e, nesse tempo todo,
tivemos um relacionamento muito distante. Nunca houve um trabalho colaborativo.
Já com a Capelania Evangélica, foi muito mais amistoso e próximo. A Eleny Vassão
117
Resultados e Discussão

e eu conversávamos, trocávamos idéias e fazíamos as coisas muito em conjunto, o


que nunca existiu com a Capelania Católica. Não existiam outras capelanias, além
dessas duas. Existia, por exemplo, quando nós fazíamos atividades. No Dia
Mmundial da AIDS, aquele rapaz que representava os cultos afro - brasileiros pedia
para cantar uma musica na linguagem do grupo dele e cantava muito bem, aliás. Mas
ele era uma pessoa maravilhosa, imagina só, ele cuidar sozinho de 30 crianças. Ele
não tinha condição de deixar aquelas crianças nenhum tempo porque ele tinha que
alimentar as crianças, ele era pai e mãe, era tudo para essas crianças. Então, ele não
tinha condição de ficar freqüentando a instituição, fazendo proselitismo, nada disso.
Ele vinha lá nas festividades e pronto. Mas o trabalho que ele fazia era um trabalho
que, se Deus desse uma nota de 0 a 10, ele tirava 10 em cada momento da vida dele.
A Capelania era um serviço já instituído, mas não formalmente. Na minha época foi
formalizado, não no papel, formalizado na prática esse papel de liderança da
capelania, entre os setores evangélicos que freqüentavam o hospital e queriam ter
acesso aos pacientes. No meu tempo, eu nunca recebi nenhuma carta, nenhum
documento, nada que oficializasse a entrada da Capelania Evangélica no hospital. Na
época de festas, as capelanias tinham seu espaço em relação à instituição. Então, por
exemplo, cada um podia trazer o seu coral, usando basicamente uns 15 a 20 minutos
de tempo para sua apresentação, tanto a Capelania Católica, como a Capelania
Evangélica. Outras religiões, por exemplo, a religião judaica, nunca teve nenhum
contato, nunca teve nenhuma participação. Quanto à assistência espiritual, para um
grande número de pacientes, foi muito importante, extremamente importante. Esse
tipo de assistência mudava um pouquinho o humor da enfermaria porque os pacientes
se sentiam mais dignificados. Mas uma coisa muito importante também é que seja
uma coisa voluntária e não impositiva. O que nós não podíamos permitir é que eles
chegassem lá e obrigassem o paciente a aceitar qualquer tipo de assistência religiosa.
Esse era um trabalho absolutamente voluntário, por parte de quem faz e por parte de
quem recebe. Quem não quisesse receber, ninguém insistia com ele. Pude observar a
melhora do paciente com esse tipo de atendimento. É importante desenvolver essa
atividade num lugar tão difícil e, se tem preconceito, é mais difícil. Hoje é menos,
mas, naquela época, talvez mais, principalmente quando era quarto de isolamento,
pois o isolamento era físico e mental. Sobre o fluxo de atendimento das capelanias, na
verdade eu não posso dizer a intimidade disso, mas normalmente as capelanias iam de
118
Resultados e Discussão

quarto em quarto e ofereciam, se a pessoa queria. Então, quando a pessoa aceitava,


passava a segui-lo com certa freqüência, o que também acontecia com a Ccapelania
Ccatólica. As capelanias tinham salas separadas. A Capelania Evangélica tinha
treinamento, que era feito pela Eleny Vassão e seu grupo. A Capelania Católica era
composta por uma só pessoa, que era o padre João Mildner, que dirigia. Já na
evangélica, tinha um grupo que fazia esse treinamento. Quando eu cheguei ao
hospital, a Capelania Evangélica já estava atuando. O Comitê de Ética foi criado,
naquela ocasião, por mim, que estava vindo da direção do Conselho Regional de
Medicina e achei que tinha que criar o Comitê de Ética no IIER. Existe o Comitê de
Ética Médica e de Ética em Pesquisa, que são dois comitês diferentes. A Capelania
Evangélica fazia parte do Comitê de Ética em Pesquisa. Eu não me lembro bem, mas
acho que tinha algum representante, mas não sei se era a Eleny Vassão. O Brasil foi
talvez o primeiro país do mundo a ter um Ccódigo de Ética em relação ao paciente
HIV positivo. Então, em 1988, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São
Paulo fez um parecer chamado “EticaÉtica médica e AIDSids “. Em 1992, nós
fizemos a complementação desse parecer, por que tinham surgido novos problemas,
além dos que tinham sido analisados primeiro. Posso te dar uma cópia desses
pareceres.

5.1.4 Depoimento da: Enfermeira do Instituto de Infectologia Emilio Ribas

No começo da assistência religiosa, a única coisa que havia, o único religioso


que nós tínhamos era o padre João Mildner. Não havia Capelania Evangélica. A
Capelania Católica era ligada ao HCFMUSP e o padre João Mildner era o
responsável pelo atendimento no IIER. A atividade da Capelania Católica consistia
em visitas quase que diárias aos pacientes nos quartos. Nunca vi o padre João Mildner
anotar o nome do paciente, mas ele sabia quais eram os pacientes graves, o nome
deles e muitas outras coisas a respeito dos pacientes: sobre a vida, a família, porque
era o auge do hospital lotado com AIDS. A Capelania Católica tinha, se não me
engano, duas vezes por semana, uma missa. Se o paciente tivesse condições de se
locomover de forma independente, ou em cadeira de rodas, era levado para assisti-la.
119
Resultados e Discussão

Uma vez ao mês, Dom Paulo Evaristo Arnslxxvii ia celebrar missa lá, que era muito
linda e bastante procurada. Os funcionários gostavam muito. Ele participou do
movimento da AIDS no IIER, no começo, e foi de grande ajuda e apoio espiritual
para os funcionários. Também começaram as visitas quase que diárias de membros da
Capelania Evangélica e havia um grupo grande de voluntários que nós víamos
chegando e saindo, para fazer esse atendimento nos quartos. O trabalho deles
consistia em visitas, no período da tarde, porque, pela manhã, era um horário mais
pesado, pois havia outros cuidados a serem realizados; mesmo assim, a Capelania
Evangélica tinha sempre alguém lá na sala deles e, caso fosse necessário, nós os
chamávamos para atender algum paciente ou atender os familiares. Eles prestavam
assistência espiritual no hospital todo, cobriam todas as unidades de internação e o
Pronto Socorro que, na década 1990, era muito difícil, pela situação da unidade em
relação à AIDS. Possuía uma planta física pequena, apertada, muitos médicos
internos, residentes, pessoal de enfermagem e macas que não cabiam mais nos
corredores. Hoje [2010], esstes corredores estão vazios, os pacientes estão dentro dos
boxes, já como se fossem internados, mas antes não era assim. Havia macas de ponta
a ponta do corredor, que se abria inclusive para dentro do hall de entrada. Isso tornava
muito difícil o atendimento. Não me lembro se havia algum atendimento a
funcionários, mas, se houvesse, não era nada sistematizado para atendê-los. Inclusive,
na época, nós começamos a ter problemas com funcionários: doenças, afastamento
por crise nervosa, etc. Mas o que diferenciava, no meu olhar, o atendimento
evangélico do atendimento da Capelania Católica, é que o padre João Mildner, por ser
homem, levava a coisa mais para o lado da brincadeira com os pacientes. Eu gostava
muito dele, pois ele tinha carisma. Ele entrava, brincava, falava umas bobagens e
alegrava. A Capelania Evangélica já ia para o lado espiritual mesmo. Eu os via
falando da paz, da busca de uma palavra no evangelho, a procura da paz interior,
ofereciam textos bonitos, folhetos para ler; então, havia um atendimento mais

lxxvii
Paulo Evaristo Arns, filho de pequenos agricultores, nasceu em Forquilhinha, interior de Santa CatarinaCatarina, e ordenou-
se padre em 1945. Religioso com formação erudita e ligado ao setor progressista da Igreja, doutorou-se com o mais alto grau
acadêmico -, três "três honorable", em Letras, pela Universidade de Sorbonne, em Paris, na França, com a tese A Técnica do
Livro de São Jerônimo, em 1952. De volta a Petrópolis, trabalhou como professor de Teologia, como jornalista e como vigário
nos subúrbios da cidade. Foi promovido à condição de bispo em 1966. Quatro anos depois, o papa Paulo VI nomeou-o arcebispo
de São Paulo, e, em 1973, cardeal. Pediu demissão do cargo de cardeal-arcebispo em 1998, como determinam as normas da
Igreja. Incentivando a integração entre padres, religiosos e leigos, criou 43 paróquias e apoiou a criação de mais de 2 mil
Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) nas periferias da metrópole. Disponível em <www.netsaber.com.br>. Acesso em 28 de
nov. de 2010.
120
Resultados e Discussão

profundo com relação à questão espiritual. Eu os via atender, falando a respeito da


terminalidade, da morte. O paciente falava: “eu vou morrer!” E eles respondiam: “É,
você vai, todos nós vamos, temos a oportunidade da vida, mas enquanto a morte não
vem, é para isso que você está aqui: para evitá-la e para contorná-la. Vamos fazer tais
e tais coisas”. Então, havia uma proposta para o paciente voltada para a questão
espiritual que trazia sempre muita paz. Às vezes, os pacientes perguntavam: “quando
eles passam?” Nós íamos limpar as gavetas dos criados-mudos, que tinham muita
coisa, e eles diziam para não jogar fora, pois estavam lendo, e colocavam os folhetos
debaixo do travesseiro. Na época, o diretor do IIER era o Dr. Guido Levi, depois
dele, houve uma sucessão de diretores médicos que vinham de fora do hospital, que
começaram a mudar a questão administrativa, mas sempre houve muita permissão
para o atendimento religioso. Eu não posso dizer que não houve porque sempre
houve, como o respeito às diversas crenças. Houve até um treinamento, no necrotério,
para cuidar do corpo, respeitando as religiões, o budista, o mulçumano. Na época da
AIDS, os pacientes morriam muito rapidamente. O padre João Mildner trabalhava no
horário da tarde, que era o horário da visita dos familiares, e nós pedíamos para ele
passar nos quartos dos pacientes para dar a extrema unção, por solicitação das
famílias, do próprio paciente, ou de nós mesmos que, por nossa crença, solicitávamos.
Então, ele dava extrema unção e dava uma benção aos familiares, pois era comum a
família vir para a visita e encontrar o paciente em estado grave, morrendo. A
mortalidade era grande e distribuída por todo o hospital. Em alguns dias, havia quatro
a cinco óbitos por andar, sem contar com o pronto socorro, onde os pacientes
morriam nas macas, porque este, quando chegava ao hospital, já estava muito grave e
os recursos terapêuticos na época eram precários. Nesse processo, as Capelanias tanto
Católica, como Evangélica, sempre foram acionadas. Procuramos muitas vezes pela
Eleny Vassão, da Capelania Evangélica, para pedir um atendimento especial,
personalizado, a pacientes em várias condições. Podíamos solicitar também os
psicólogos, que atendiam um, dois, três andares e/ou pela solicitação da interconsulta,
feita pelo médico. Então, a psicóloga atendia o paciente, fazia uma avaliação,
avaliava se havia risco de suicídio (naquela época nós tínhamos muito medo do
suicídio) para entrar com algum medicamento. A Enfermagem era quem estava mais
perto ou próximao do paciente, pois ficava 24 horas com o paciente. Trabalhávamos
também muito com o Serviço Social, até porque tinham os problemas de ordem social
121
Resultados e Discussão

gravíssimos, de abandono, de exclusão, de não querer levar mais para casa, da


necessidade de procurar casas de apoio. Nessa época, foi também o auge das casas de
apoio. Então, o Serviço Social era muito próximo de nós, e nós chamávamos o
capelão evangélico, quando víamos que havia muito sofrimento de alma mesmo, ou
então, para paciente graves que sabíamos que, em horas ou em alguns dias, iam
morrer. Eu me lembrolembro de que solicitavaei para a Eleny Vassão, que tem todo
um carisma (a pessoa dela é muito bonita e passa muita paz) atender um paciente e
ela imediatamente ia. Ou então, deixávamos recado na sala da capelania. Havia
sintonia entre ela e eu, pois, quando eu solicitava a sua visita, ela sabia que não era
qualquer coisa. Ela atendeu um esse paciente, muitas vezes, que acabou morrendo
lúcido. Eu fiquei muito contente por ele ter tido essa oportunidade de ter esse apoio.
Também havia, aos domingos e parece-me que aos sábados, visita de religiosos de
outras denominações. Havia kardecistas, evangélicos, muitas visitas de pastores e
obreiros de outras religiões evangélicas. Eu fazia muitos plantões de domingo e via
que eles vinham e tinham autorização da administração do hospital, do Dr. Paulo
Augusto Ayrosa Galvão, para visitá-los. Ele era muito generoso, uma pessoa boa. Ele
autorizava o atendimento religioso às famílias, respeitando o que fosse necessário.
Dessa forma, várias religiões podiam entrar. Por ser permitido que várias religiões
entrassem, chegamos a ter problemas sérios com pessoal de Umbanda, de
encontrarmos no quarto objetos como: água, velas e coisas coloridas. Vimos que era
preciso estabelecer limites, até porque a população só visitava o hospital no final de
semana, pois a visita não ocorria todos os dias, como é hoje, era duas vezes por
semana. A visita se dava um dia para os familiares dos pacientes com AIDS e outro
dia para familiares de pacientes que não tinham AIDS. Nós, enfermeiros, achávamos
que era um absurdo separar visita de pacientes com AIDS e não AIDS, que era uma
manifestação de preconceito e achávamos que não devia haver essa separação, que
deveria ser no mesmo dia e no mesmo horário, pois não havia motivo para haver
visita em separado. Estou citando esse fato porque, na visita dos religiosos, era
permitida a entrada deles no quarto e dos familiares não, e nós achávamos que essa
regra não estava certa. Eu acho que foi por volta de 1990 que começou a visita da
Capelania Evangélica do HCFMUSP no IIER. Eu nem sabia se era do HCFMUSP ou
não. O padre João Mildner era do HCFMUSP e, no meu entendimento, a Capelania
Evangélica também. Um dia, recebemos um comunicado da administração, que
122
Resultados e Discussão

haveria, no hospital, no quarto andar, a sala para a Capelania Evangélica e outra


salinha, dentro de uma unidade de internação também, para a Capelania Católica. À
medida que o hospital foi sofrendo mudanças, essas salinhas foram migrando de um
andar para outro, para a cobertura no 9º andar, para o 2º andar, onde ficava a Divisão
da Enfermagem, mas sempre o espaço foi garantido. Eu acho que isso foi uma vitória
para o atendimento espiritual e acredito que, a partir daí, a Capelania Evangélica se
estabeleceu, pois a católica já estava sedimentada. Dr. Paulo Ayrosa nunca abriu mão,
nas festas de final de ano, de solicitar a presença das capelanias. A Capelania Católica
era muito presente. O padre João Mildner sempre circulou muito bem, era muito bem
quisto lá dentro, muito querido pela administração, pelas características dele, eu
acredito. Não sei se o padre João Mildner era ligado ao HCFMUSP. Sei que ele era
um homem muito humilde, uma pessoa muito simples, muito afetivo; uma pessoa
pobre até no jeito de ser e, então, ele foi acolhido, protegido pela Enfermagem e pelos
médicos. Sempre estava disposto a atender até os funcionários; então, isso ajudou
muito. Nunca vi nenhum choque entre as duas capelanias. O padre João Mildner
acolheu muito bem a Capelania Evangélica, até porque ele já convivia com a
Capelania Evangélica no HCFMUSP, com outros capelães lá e conosco também, e, se
houve algum problema, eu não soube. Também eu lembro que a Capelania Católica
tentava não desenvolver atividades no horário que entrasse em choque com a outra
capelania. As duas capelanias entravam em acordo. Eu via o padre João Mildner com
a Eleny Vassão e com outras pessoas da capelania conversando e trocando
informações. Eles se respeitavam e, nas festas de final de ano, passaram a estar
presentes os dois. Quando morria algum funcionário ou médico, as missas ocorriam
até no anfiteatro da Secretaria de Saúde ao lado do IIER e, no ato religioso, quase
sempre estavam o padre João Mildner e alguém da Capelania Evangélica ou a própria
Eleny Vassão. Então, isso também foi um ganho, uma atividade ecumênica muito
bacana. Quando a Capelania Evangélica começou, eu me lembro de algumas visitas
de pessoas ligadas à igreja evangélica aos domingos, levando folhetos, passando
pelos quartos, deixando mensagens. Havia em torno de 240 a 250 leitos ocupados
permanentemente, predominando pacientes com AIDS. Foi quando eu me aproximei
da Capelania Evangélica, até para facilitar o trabalho deles e também para fazermos
parte desse atendimento. Eles deixavam livros e ofereciam material para leitura. Para
aqueles pacientes que não podiam ler, a própria família que estava junto lia, e, aí, eu
123
Resultados e Discussão

fui me aproximando da Eleny Vassão e me encantei com ela. Tivemos um vínculo


muito grande nesse processo, a ponto de que todo aluno que eu acompanhava (nesse
período eu já acompanhava aluno de graduação em Enfermagem da São Camilolxxviii e
depois veio a Universidade Santo Amaro – UNISAlxxix), passava pela Capelania
Evangélica para conhecer o serviço, desde que a Eleny Vassão tivesse
disponibilidade. Ela fazia uma pequena palestrinha de quinze minutos a meia hora, no
próprio andar, para os alunos, mostrando o que era o atendimento da capelania e no
que ele consistia. Durante uns bons anos, ao término de cada grupo, eu pegava, na
Capelania Evangélica, o Novo Testamento, aquele livrinho branco de que ela tinha
várias caixas. Ela me dava oito, dez, e eu fazia uma dedicatória para o aluno,
colocava como uma lembrança da passagem pelo IIER, um presente da Capelania
Evangélica que os alunos levavam. Sabe Deus, quantos livrinhos desses estão por aí
hoje, com a mensagem do hospital, a minha e a presença da capelania. Isso era muito
bom, já fazia parte das minhas atividades de estágio. Eu também pedia para outras
colegas de outras escolas, até do interior, como Fernandópolis e Santos. Eu falava
sobre a existência de um Sserviço de Ccapelania, que tinha um pessoal muito
acessível e que estavam disponíveis, se eles quisessem. No aspecto psicológico, não
havia nada estruturado. Muitas e muitas vezes eu encaminhei, para a Eleny Vassão,
funcionários com distúrbio de comportamento, com choro, com revolta, com
agressividade, funcionários que diziam coisas inadequadas para o paciente. Eles
valorizavam muito o trabalho da Capelania Evangélica. Entre o pessoal de
Enfermagem, havia algumas diferenças. Alguns enfermeiros tinham
comprometimento com o paciente, mas principalmente o nível médio, por exemplo,
que era a maioria, que davam os cuidados, às vezes, achavam até que eles estavam
atrapalhando. Era uma situação complexa, pois já havia um sentimento de rejeição
aos pacientes que tinham AIDS, porque havia um julgamento moral, principalmente

lxxviii
São Camilo - Curso de Graduação em Enfermagem do Ccentro UniversitarioUniversitário São Camilo, conta com corpo
docente qualificado e atualizado, e oferece adequada estrutura para a prática em laboratório e para a realização de estágios em
hospitais de referência da cidade de São Paulo e Unidades Básicas de Saúde. Os alunos também têm a oportunidade de participar
de projetos comunitários e de extensão universitária. O Curso também oferece a oportunidade de intercâmbio com a
Universidade Católica Portuguesa localizada na cidade do Porto - Portugal. Disponível em <www.saocamilo-
sp.br/novo/graduacao/enfermagem.php>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
lxxix
A Universidade Santo Amaro foi fundada em 1968 e possuem atualmente três Campi na cidade de São Paulo, além dos Polos
de Apoio Presencial da Unisa Digital, para oferta de cursos à distância, no Distrito Federal e nos Estados do Alagoas, Bahia,
Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do
Sul, Rondônia e São Paulo. Disponível em <www.unisa.br>. Acesso em 28 de nov. De 2011.
124
Resultados e Discussão

com os pacientes homossexuais e consumidores de drogas. Havia a sobrecarga de


trabalho e muitas pessoas circulando, tumultuando o ambiente de trabalho. Essa
situação tornava desfavorável a aceitação da capelania, como também de outros
profissionais, como a assistente social, os estudantes, etc. Mas, com o passar dos
anos, no caso específico da Capelania Evangélica, ela se firmou, à medida que ela
começou a dar cursos, começou a aparecer e a ter uma equipe bem treinada. Acho
que foi na década de 1990 que ela já estava estabelecida, com uma cara própria, uma
fisionomia própria e com pessoas adaptadas ao perfil do hospital. Isso foi importante.
Eu me lembrolembro de que, no começo, vinham aquelas senhorinhas, muito cheias
de amor para dar, mas totalmente assustadas. Isso realmente gerava um problema para
a Enfermagem, que não tinha tempo para nada e tinha que ficar dando muitas
explicações. Depois, com o tempo, vimos que eles já estavam mais independentes,
tinham mais autonomia e se sentiam mais seguros. Viam um quarto de isolamento
respiratório, já sabiam que significava quarto com paciente grave. Eu acho que o
treinamento ajudou muito, deu mais independência para os próprios componentes da
Capelania Evangélica e não sobrecarregou mais as equipes de enfermagem. Nós
recebíamos também uma mulher budista, uma monja, não tenho certeza, mas ela é
muito famosa, está sempre na televisão. Ela chegou a dar muitas palestras e atendeu
quando havia pacientes diferenciados, que freqüentam o budismo. Eu não cheguei a
participar de nenhum curso da Capelania Evangélica, mas teve um curso em que eu
dei aula, logo no comecinho. Falei sobre biossegurança, precauções universais, tipos
de isolamento, cuidados de enfermagem e contato da Enfermagem com a morte.
Ajudei também a fazer a programação de uma Semana de Enfermagem, com a
participação das capelanias, que falaram sobre o atendimento ao paciente terminal.
Nós não sabíamos cuidar de pacientes jovens em estado terminal, lidar com o luto,
lidar com a família, entender mesmo essa AIDS. Tivemos situações muito difíceis. Eu
me lembrolembro de que, no período noturno, um paciente se suicidou. Nós tivemos
muitos suicídios lá, quando eles ficavam sabendo do diagnóstico de AIDS. Hoje
[2010], entendemos melhor essas perturbações mentais. Eu me lembrolembro de que
nós tivemos muitos afastamentos de funcionários com problemas mentais,
agressividade entre eles e também com pacientes. Hoje temos um quadro bem mais
bonito de se ver, se é que se pode falar isso; morrem muitos pacientes, mas não é
como era, naquelas condições precárias. A vida está prolongada, o “coquetel” está
125
Resultados e Discussão

ajudando, o grau de informação cresceu muito. Depois de 30 anos, as famílias estão


mais calmas e já lidam melhor com a doença. Devagarinho, eu discuti isso muito com
a dona Dorothy, que era autoritária, mas aberta a novas propostas. Esse lado bom,
essa cultura, o grupo de médicos, inclusive enfermeiros, tinham 20 a 30 anos de casa.
A Dorothy, que dirigia a Enfermagem, já tinha 30 anos lá dentro. Foi uma mulher que
lutou em todas as epidemias com grupos de enfermeiras, treinadas no dia a dia. Tinha
uma funcionária do necrotério que tinha histórias e histórias para contar. Eu sempre
passava visita no necrotério, pois morriam muitos pacientes e era um lugar de
respeito. Além de ela me mostrar os corpos na geladeira, ela contava o que acontecia
com as famílias, famílias que tinham abandonado os pacientes, famílias de
homossexuais, de travestis, que vinham com terno e gravata para vesti-los, mas que o
paciente já havia deixado um vestido, que ele queria ser enterrado com ele, pois ele
era uma mulher e não um homem, e ai havia um choque com a família, padres e
pastores. Outros mulçumanos, que queriam colocar o corpo tomando sol lá fora, em
cima de lençóis, tudo isso foi sempre permitido, com o maior respeito às crenças dos
familiares. Nós tivemos muito apoio, de uma criatura muito sensível, excelente
profissional que trabalhava muito bem, não só com a Enfermagem, com os médicos,
inclusive com as capelanias, que era a Heloisa, psicóloga, muito boa, pioneira numa
série de atividades lá dentro. O administrador naquela época era o Dr. Paulo Ayrosa.
Depois, quando ele morreu, ficou Dr. Georoge Schulte, maravilhoso também,
permitia tudo que era para beneficiar o paciente. A família que vinha visitar o
paciente não tinha problema. Se a direção não permitisse, a própria especialidade do
IIER, que é Iinfectologia, tem uma história que vem lá do início do século, do
Oswaldo Cruz, do Chagas, do próprio Emílio Ribas: eles eram muito humanos. O
Emilio Ribas morou dentro da Casa Rosada, para passar visita à noite e olhar os
pacientes graves de difteria. Não havia a especialidade; então, ele treinava os
médicos, ele ensinava cuidando. Então, a Infectologia é uma especialidade que tem
como ciência, na sua origem, a humanização, porque são doenças infectocontagiosas
do povo brasileiro. Os médicos eram sanitaristas, pessoas com visão de saúde pública,
que já tinham certo amor e respeito ao pobre, às pessoas menos favorecidas, já havia
essa cultura no hospital. A AIDS só veio tirar proveito disso. Dr. Paulo Ayrosa era
uma pessoa muito humana, se não foi feito mais, foi porque não se quis ou não se
propôs, mas não por impedimento dele, nunca. A equipe do IIER, médicos inclusive,
126
Resultados e Discussão

e as enfermeiras antigas, era composta por um pessoal muito humanizado, uma gente
que ficou muitos anos sozinha. Eu já havia trabalhado na rede privada hospitalar.
Nessa época, a Enfermagem estava muito desacreditada. Aí, quando voltei a
trabalhar, voltei para o serviço público. Comecei a fazer caridade no hospital público.
Como cursei uma escola pública, esse é o meu retorno social, do que recebi de graça.
Sempre fui idealista! Então, achei que trabalhar em um hospital público era uma
forma de retribuir o que eu recebi de dinheiro do povo, da minha família, de todos e
fui muito feliz lá dentro.

5.1.5 Depoimento da Paciente e Secretária da Capelania Evangélica do Instituto de

Infectologia Emilio Ribas

Eu conheci a Capelania em 1992, como paciente, através desses folhetinhos


que a Capelania deixava no leito dos pacientes. Então, cada vez que eles vinham
visitar o Marcos, que era meu marido, eu os lia. Em 1995, o Marcos veio a falecer,
mas, nesse tempo, eu já tinha bastante vinculo com a Oneida e o Neto, que eram
capelães, e com a Eleny, que é a capelã responsável pela ACEH - Associação de
Capelania de Evangélica Hospitalar, e o pastor João Hamiltom, que tinha muito
contato com eles. Logo que o Marcos faleceu, a Oneida me convidou para trabalhar
na Ssecretaria da Capelania Evangélica do HIER, em agosto de 1995. Quando se
falava do vírus HIV, havia muito preconceito dentro da própria igreja. Os irmãos
tinham medo de pegar, pois era uma doença muito recente. Nós a descobrimos em
1989. Não vou falar que o pastor da nossa igreja não deu apoio porque ele nos apoiou
até financeiramente, mas apoio espiritual, que é estar junto, ele mesmo sabe que
falhou. A Capelania fez esse papel de apoiar, de ajudar, de aconselhar, de orar. Eu
louvo e agradeço muito a Deus pela existência da ACEH. Quando eu conheci a
Capelania, havia várias pessoas como a Carolina, o Mauro, o Carlinhos, o Neto, a
Oneida e a Lúcia Nogueira, que trabalhavam com as crianças, além da Roselainelxxx e
o pastor João Hamiltom. A Lúcia e a Roselaine vieram do HCFMUSP para trabalhar
aqui no Emilio Ribas. Trabalhavam uns dias no HCFMUSP, no Instituto da Criança –

lxxx
Roselaine, fazia parte da equipe da capelania evangélica hospitalar do IIER. Cadstro da ACEH.
127
Resultados e Discussão

ICrlxxxi, e outros dias trabalhavam no IIER, com as crianças também. Participei do


primeiro Curso de Capelania Nível I em 1995, antes de começar a atender. Na época,
a equipe era composta de 25 a 30 pessoas para atender tanto as crianças como os
adultos. Quando a Capelania Evangélica coordenada pela Eleny saiu do HCFMUSP,
vieram algumas pessoas para o IIER e outras decidiram ficar lá, com a outra
Capelania Evangélica. Em termos de mudança de rotina de trabalho, em comparação
com o começo, não teve muita mudança, ela continua a mesma. Saem muitas pessoas
da Capelania, mas entram também, se bem que agora tem entrado bem menos do que
antes. Já passaram muitas pessoas por aqui. Se nós formos listar, meu Deus! Pena que
são poucas as que ficam! É difícil porque muitas pessoas têm emprego e têm
dificuldades financeiras. Hoje, aqui na Capelania, tem mais ou menos 30 pessoas.
Esse número se manteve desde o começo. Quanto aos cursos da Capelania, teve um
em 1994, mas o de que participei foi em 1995. Na realidade, eu participava dos
cursos, eu ia lá, assistia, ajudava, tudo que eles pediam para eu fazer, eu fazia. Mas
fazer o curso regularmente, eu não fiz. Eu participei de todos os cursos, mas
ajudando. Quando eu comecei aqui no IIER, a Capelania já tinha uma sala. Ela
sempre teve sala. A primeira que eu conheci ficava no térreo, onde hoje fazem a
coleta de exame. Era uma sala bem pequenininha, onde só cabia a mesa. Não
tínhamos computador naquela época. Tínhamos um armarinho e um lugar para
guardar as bolsas. Depois, foi mudando. A Capelania estava no quinto andar, no
segundo andar e já ficamos na portaria. O trabalho de visitação aos pacientes era
como é feito hoje. Antes das visitas, sempre fazíamos os devocionais, que é um
momento de leitura bíblica com uma aplicação prática para nossa vida diária. O
pessoal da Capelania visitava meu marido todos os dias. O pastor João Hamiltonm, na
época, dava uma força muito grande. A Oneida e a Eleny também deram uma força
muito grande para ele, na época, bem no começo, quando nós descobrimos a
sorologia positiva. Ele estava bastante abalado, sentia muita culpa de ter passado o
vírus para mim e para o meu filho. Ele sentia muita culpa por isso e a Capelania teve

ICr – Instituto da Criança - foi criado em 2 de julho de 1970 como um Departamento do Hospital das Clínicas da Faculdade
lxxxi

de Medicina da Universidade de São Paulo e iniciou suas atividades no atual endereço à Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 647,
em1976. Anteriormente, a Pediatria estava alocada no edifício do Instituto Central do HC, como uma de suas Divisões. O ICr é
um hospital de grande porte de alta complexidade; com 207 leitos instalados, que presta serviço de assistência à saúde e
especializado, além de constituir importante pólo formador de profissionais de saúde e produtor de pesquisas e inovações
tecnológicas na área da Pediatria. Disponível em <www.anestesiologiausp.com.br/institucional/atuacao/instituto-da-crianca>.
Acesso em 28 de nov. de 2011.
128
Resultados e Discussão

um papel muito importante, no caso dele, de aconselhar, de ajudar. Principalmente no


caso dele, para ele se perdoar. Isso aconteceu uns dias antes de falecer. A Oneida
conversou bastante com ele. Ele não conseguia morrer enquanto não se libertasse da
culpa que ele tinha de ter passado o vírus. Nessa época, ele orou para que Deus tirasse
toda a culpa do seu coração e, só então, sentiu paz no coração. Ele conversou comigo
sobre isso e, depois de alguns dias, veio a falecer. Então, a Capelania teve um papel
muito importante porque ela ia lá, orava conosco, principalmente com ele. Eu
chegava lá, via o quadro dele e corria para a Capelania, porque lá eu podia chorar. Eu
já era cristã naquela época, mas eu não tinha aquele apoio de que eu precisava na
minha igreja. Se não existisse a Capelania, eu sei que Deus iria me dar forças, mas,
com a Capelania, foi diferente. Tem pessoas especiais para tratar com você sobre
aquele assunto, para te ajudar, para te apoiar, para dar uma palavra de consolo, uma
palavra de ânimo. Então, a Capelania tem esse papel muito importante. Por isso eu
acho que tinha que ter capelania em todos os hospitais que existem na face da terra.
Tem que ter capelania porque nós sabemos o quanto sofremos, em um leito de
enfermidade, ou na sua própria casa. Para ajudar com os folhetos, a capelania já
possuía uma parceria com a Sociedade Bíblica e outra editora de que não me lembro
o nome, que dava material também. Tínhamos também uns materiais diferentes tais
como: “Quem se importa comigo”, “Deus compreende” “Milagre do amor”. Era um
material muito bom, que vinha de fora. Depois de alguns anos, eles pararam de editar
esse material e hoje não editam mais. Esses materiais nos ajudavam bastante. Os
funcionários da enfermagem, da manutenção, da limpeza e do laboratório pediram
para que houvesse cultos para eles. Havia também os cultos para os pacientes, que
hoje ocorrem no 5º andar. Os enfermeiros, quem está lá, escuta os cultos. Temos
também liberdade para usarmos a sala dos próprios médicos que, muitas vezes,
assistem aos cultos. No começo, as festas eram feitas assim: as festas infantis eram
realizadas conjuntamente com o padre e com a Capelania Evangélica. Nos últimos
cinco anos, foi dividido. Então, o padre e o voluntariado ficavam com as festas das
crianças do Ambulatório e a Capelania Evangélica ficou com as crianças do andar.
ÉÉ feito no teatro e é dado um presentinho para as crianças. As festas são no dia das
crianças, Nnatal, Ppáscoa, etc. A capelania funcionava praticamente da mesma forma
que hoje. A secretária da manhã revezava com o período da tarde, porque não havia
uma secretária fixa. Quem estava escalada no dia fazia a visita aos pacientes e,
129
Resultados e Discussão

depois, ficava um pouco na Ssecretaria. A Eleny ficava muito aqui nessa época. Ela
ficava aqui e no HCFMUSP, mas ficava bastante tempo no IIER. Na época em que eu
entrei, ela chegava de manhã e fazia o que eu faço até hoje: atendia ao telefone e
carimbava os folhetos. Hoje tem mais coisas para fazer do que antes, mas o
devocional de manhã sempre se fez. PrestavamosPrestávamos assistência religiosa
quando entrava algum paciente que queria conversar, orávamos, conversávamos e
aconselhávamos. Então, praticamente, na sala, o atendimento é o mesmo. A sala da
Capelania abria todos os dias, de segunda a sábado, de manhã e de tarde. Ficou um
bom tempo funcionando as duas capelanias juntas, a do HCFMUSP e do IIER, de
1991 a 2001. Depois veio o pessoal do HCFMUSP e a Eleny fez assim: algumas
pessoas vieram para o IIER e outras foram para o Hospital do Servidor Público
Estaduallxxxii. Nessa época, também tínhamos a Capelania no Instituto da Criança-
ICR e foi dividindo. Tínhamos também o Hospital Pérola Byingtonlxxxiii e o Hospital
Jaraguálxxxiv. Tem um documento que fala que o padre João Mildner fica como
responsável pelas capelanias e que nós ficamos subordinados a ele. Desde o começo,
sempre tivemos crachá. No começo, quando a Eleny, o Neto e a Oneida entraram,
eles tinham o crachá até da Secretaria da Saúde, que era igual ao dos funcionários do

lxxxii
Hospital do Servidor Público Estadual "Francisco Morato de Oliveira". Fundado em 1961 para oferecer atendimento aos
servidores públicos do estado, seus dependentes e agregados, figura hoje entre os maiores do Estado de São Paulo, tanto em
estrutura quanto em modernização de equipamentos, serviços e tratamentos. Contando com mais de 43 diferentes especialidades
médicas, o hospital presta atendimento em todos os níveis de atenção, executando procedimentos desde os mais simples até os
de mais alta complexidade. Disponível em <http://www.iamspe.sp.gov.br>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
lxxxiii
Hospital Pérola Byington - Nascida em 1879, na cidade de Santa Bárbara do Oeste, Pérola Byington foi uma mulher à frente
de seu tempo. Pérola sempre teve um projeto bem delineado de assistência social e uma longa experiência neste setor, adquirida
em trabalhos realizados junto à Cruz Vermelha dos EUA e do Brasil. Nos anos 1920, quando o Estado de São Paulo passava por
grandes mudanças culturais e comerciais, as diferenças sociais começaram a se acentuar, e as taxas de mortalidade,
principalmente infantil, eram altíssimas. Foi nesste contexto, que, em 1930, surgiu a Cruzada Pró-Infância, fundada por Pérola
em parceria com a educadora sanitária Maria Antonieta de Castro. A Cruzada nasceu com o objetivo de coordenar e ampliar os
esforços feitos em prol das crianças e das gestantes, mas com o tempo essa idéia cresceu e o programa da Cruzada incluía uma
grande variedade de atividades. Sempre junto de Maria Antonieta, Pérola Byington criou dispensários com serviços de clínica
geral, higiene infantil e pré-natal; organizou parques e creches; criou bibliotecas infantis e patrocinou a criação de um lactário.
Procurou influenciar autoridades para a execução de programas voltados ao cumprimento dos direitos da mulher e, no Brasil, foi
uma das primeiras a defender a divulgação das causas de mortalidade no parto e pós-parto, com o objetivo de melhorar o pré-
natal. Em 1959, ela inaugurou o Hospital Infantil e Maternidade da Cruzada Pró-infância, onde, além dos atendimentos à
população, eram oferecidos cursos de formação para estagiários acadêmicos. Para manter o funcionamento da Cruzada, Pérola
mobilizou todos que pudessem ajudar: utilizando os meios de comunicação, divulgou os projetos e convocou a população a
participar dos eventos de arrecadação de fundos, e, para manter a qualidade do hospital, conseguiu que profissionais renomados
fizessem os atendimentos., Mmuitas vezes voluntariamente, laboratórios que realizavam os exames gratuitamente e farmácias
que cediam os medicamentos necessários. Pérola Byington foi diretora-geral da Cruzada desde a fundação até a sua morte, em
1963, e seu nome sempre estará associado à história da assistência à infância e maternidade no Brasil. Disponível em
<www.hospitalperola.com.br>. Acesso em 28 de nov. de 2011.

Hospital Jaraguá – hospital que funcionou na Av. Juriti, 73 – Moema SP, atual local de futuros prédios residenciais.
lxxxiv

Disponível em <http://www.lopes.com.br/ficha-imovel-lancamento/lps/agre/sp/sao-
paulo/sul/moema/apartamento/hemisphere/1867>. Acesso em 28 de Nov. de 2011.
130
Resultados e Discussão

IIER. Eles não eram como funcionários porque não eram registrados, mas tinham o
crachá igual. Eles podiam, no máximo até oito pessoas, almoçar no próprio refeitório.
Depois que mudou o diretor, um antes do Dr. Guido Levi, de quem eu não me lembro
olembro do nome, isso mudou. A Capelania era subordinada à Superintendência, que
o era Dr. Guido Levi, na época. Com o tempo, eles nomearam o padre João Mildner
para ser responsável pelas capelanias e, aí, qualquer problema que nós tivéssemos,
tinha que levar para ele e ele levaria para a Diretoria. Essa mudança não causou
nenhuma diferença. As coisas que ele queria resolver, ele chamava a Eleny para
conversar, falava com ela o que seria mudado e ela passava para nós. Eu não vejo
problema com o padre João Mildner. Os visitadores sabem os procedimentos da
visita. Eles têm que respeitar quando estamos visitando algum paciente e nós temos
que respeitá-los da mesma forma. Se nós vamos ao mesmo quarto, temos que esperar
eles saírem para nós podermos entrar. Normalmente não entregávamos nenhum
relatório, pois eles não pediam. Esse ano isso mudou. Um grupo do hospital que está
à frente das capelanias e da humanização veio até nós para saber qual o nosso
trabalho aqui dentro, tanto a Capelania Evangélica, como a Católica e o Voluntariado.
Eles fizeram uma série de perguntas. Aí, eles falaram que iam mudar o nosso crachá.
Eles pediram para nós fazermos um cadastro de todos os voluntários da Capelania,
colocando os dias em que eles vêm, os horários e que setor eles estão visitando esse
ano. Agora eles estão preparando outro crachá, que é igual a um que nós já tivemos.
Agora eles tomaram a frente do grupo de voluntários do hospital. Não que nós
fizéssemos o que queríamos, nós sempre falávamos com o diretor. Por exemplo, se
precisávamos do anfiteatro, fazíamos um requerimento e encaminhávamos para a
divisão científica, para que ela anotasse os dias que nós precisávamos. Eles viam se
estava disponível e esse requerimento era encaminhado para a Diretoria. Eles
avaliavam, viam a possibilidade de usarmos, autorizavam e, daí, voltava para a
Humanização, para eles autorizarem. Eles cobram 100 reais por dia para usar o
anfiteatro e disponibilizam os funcionários para ficarem trabalhando para nós, na área
técnica. O Voluntariado fazia também o trabalho de atendimento leito a leito, mas não
para orientação espiritual, e tem também a Capelania Espírita. Nós não sabemos os
dias em que eles estão aqui. A Capelania Espírita está aqui há muito tempo, mas são
poucas pessoas. Os “Minutos com Deus“ nos setores começaram com o pessoal da
limpeza. A Neide Correa era quem fazia e, aí, algumas pessoas começaram a pedir
131
Resultados e Discussão

alguns momentos de oração antes do trabalho; então, tivemos que pedir autorização
para a Diretoria. Mas teve um tempo que paramos porque houve mudança de diretor,
depois do Dr. Guido, que não queria, porque ele achava que atrapalhava o trabalho.
Aí, os funcionários insistiram para voltar e voltou novamente. Quando a pessoa era
internada, se ela entrava pelo Pronto Socorro, a assistente social conversava com o
paciente, perguntava qual era a religião dele e se ele aceitava visita religiosa. Isso foi
antes. O Serviço Social dá muito apoio para a Capelania. Eles têm uma admiração
muito grande pelo trabalho da Capelania, da visita leito a leito. Eles falam que a
Capelania faz um papel fundamental aqui dentro, que o trabalho da Capelania, tanto
religioso, como social, deveria ter em todos os hospitais. Então, a Capelania é muito
bem vista pelo Serviço Social e também pela Enfermagem. Eles nos admiram.
Algumas vezes, os próprios enfermeiros nos ligam solicitando uma visita e solicitam
também cultos nos setores de internação. Hoje nós não sabemos se tem algum
paciente que não quer ter visita religiosa. A enfermeira do andar, quando vamos
visitar o paciente e pedimos para ver o censo, nos fala se há algum paciente que não
quer visita religiosa. Já aconteceu muitas vezes do paciente solicitar vista nossa para
o padre João e ele nos avisar. Da mesma forma, nós, quando o paciente quer uma
vista dele, também o avisamos. Na Capelania nós temos muito apoio de alguns
diretores. Alguns que passaram aqui tinham ótimo relacionamento com a Eleny,
como o Dr. Guido Levi. Quanto aos relatórios, só fazemos para a ACEH sobre a
literatura utilizada. Na Enfermagem, cada setor tem uma enfermeira. No tempo em
que a Capelania iniciou no IIER, a enfermeira chefe era a Dona Dorothy, que hoje
está aposentada. Ela sempre ajudou a Eleny e sempre conversava com ela. Ela
gostava do nosso trabalho. Havia outras enfermeiras, como a Isabellxxxv da enfermaria
do quinto andar, que também era da Capelania e nos ajudou bastante. Hoje ela não
está mais no hospital. Das psicólogas, a Dra Heloisa também gostava bastante da
Eleny. Houve uma época em que tivemos bastante contato com a Dra. Mara Cristina
S. M. Pappalardo lxxxvi, que era médica, chefe do quarto andar, de pacientes adultos.
Ela ministrou palestras muito boas, inclusive sobre morte. Há alguns cursos que o
lxxxv
Isabel , enfermeira do 5º andar do IIER. Não identificada nas fontes documentais primárias e fontes secundárias consultadas
lxxxvi
Mara Cristina S. M. Pappalardo graduada em medicina pela UMC- Universidade de Mogi das Cruzes), residência médica
no Hospital Emílio Ribas, de 1981 a 1982, especialista em Ddoenças Infecciosas, médica assistente e chefe- substituta da 4a
unidade de internação do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, médica efetiva da Prefeitura, no Centro de Referência em
DST/AIDS de Santo Amaro. <www.bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/01inv_pesqII2003.pdf>. Acesso em 28 de nov. de
2011.
132
Resultados e Discussão

hospital promove e de que a Capelania Evangélica participa, como na área de


paliativos, em que o pastor João participa. Também tem alguns cursos que o Setor de
Humanização nos avisa. Esse ano teve e eles nos avisaram e também para o
voluntariado deles. Tivemos poucos problemas na Capelania. Nós tivemos um
problema com um visitador que veio visitar uma criança, mas esse problema foi
solucionado e, hoje, ele não está mais na capelania. Também já tivemos problemas
com a Igreja Universal do Reino de Deus, porque eles têm o estilo deles de visitar.
Eles não queriam seguir as normas da Capelania Evangélica para visitação que o
hospital colocou; então, até houve um curso de Capelania para eles, que eram mais ou
menos umas 15 pessoas, só que eles não chegaram nem a treinar. Depois que eles
souberamvieram a saber como era, levaram todas as fichas deles embora e não
quiseram mais participar, mas continuaram entrando pela portaria. Eles pediam para
visitar uma pessoa que estava sozinha e subiam e acabavam visitando todos os
pacientes. Daí, isso foi ao conhecimento da Eleny e foi solicitado para eles não
entrarem mais. Também o problema da gripe, ( H1N1) que também foi proibido que
os visitadores visitassem. Eles não poderiam visitar porque a contaminação poderia
ser estava sendo muito grande aqui dentro do hospital. Então, só quem podia visitar
eram os capelães, e não os quartos que tinham pacientes com a gripe. Isso agora.
Dessa forma, ficamos quase um mês sem visitas. O hospital promove vários cursos e
nos convidam. Como o curso na área de que paliativos que o pastor João Batista
participa. Também há alguns cursos que o departamento da humanização nos avisa.
Esse ano já teve um curso do departamento de humanização e também há cursos para
o voluntariado deles. Eles gostam que a Ccapelania Evangélica participe dessa parte.
Vou pegar o papel para você ver.

5.2 Categorias de Análise

Categorias são conceitos classificatórios e constituem-se como termos


carregados de significação, por meio dos quais a realidade é pensada de forma
hierarquizada. O cientista cria sistemas de categoria buscando encontrar unidade na
diversidade e produzir explicações e generalizações82.
133
Resultados e Discussão

Assim, na presente pesquisa, a partir do tratamento analítico já descrito, foram


construídas quatro categorias de descrição: Antecedentes Históricos e Primeiros
Movimentos de Implantação do SCEH; Recursos para a Instalação e Funcionamento
do SCEH; Atividades Desenvolvidas pelo SCEH e Relacionamentos Internos e
Externos do SCEH.

5.2.1 Antecedentes Históricos e Primeiros Movimentos de Implantação do


SCEH

É importante registrar que a Capelania Evangélica do IIER tem uma conexão


histórica com a Capelania Evangélica do HCFMUSP. Na verdade, o HCFMUSP já
prestava assistência religiosa com padres católicos, desde a sua fundação, em 1944,
mas esta só foi oficializada em 15 de maio de 1945 (D1). Oito anos depois, em 1952,
a Capelania Evangélica Hospitalar teve início, tendo servido, como capelães-titulares,
os pastores e Walter Augusto Elmer, Atael Fernando Costa, Marcos Petriaggi, Edson
Plaza e a capelã leiga Eleny Vassão de Paula Cavalcanti (hoje Aitken) (D2).

Em Nota Histórica do Hospital das Clínicas de 13 de abril de 1987, (D1)


consta que a Capelania Católica do HCFMUSP foi oficialmente instalada no dia 15
de maio de 1945. Seus primeiros capelães foram o cônego Roque Viggiano e o padre
Manuel Sanjurjo. Os padres camilianos assumiram a capelania aos 30 de abril de
1960. Desde a abertura do HCFMUSP para a população, passaram por ele 32 padres
católicos capelães, sendo que o padre Geraldo Bogoni foi o capelão que mais tempo
dirigiu a capelania: 14 anos, de 1963 a1977.

Em 1947, o pastor evangélico Walter Augusto Elmer iniciou sozinho seu


trabalho de visitas aos enfermos no HCFMUSP. Ao visitar uma senhora no hospital,
solicitou autorização e iniciou a visitação aos demais enfermos. Alguns anos depois,
seu trabalho passou a ser considerado, pela instituição, como o de capelão evangélico
do HCFMUSP, e sua função passou a ser remunerada. Mas foi só em 24 de dezembro
de 1952 que se deu a promulgação do Decreto no 2.065, criando duas Capelanias
Envangélicas em São Paulo: uma na Penitenciária do Estado e outra no HCFMUSP,
bem como a nomeação daquele pastor para ocupar, em caráter efetivo, o cargo de
134
Resultados e Discussão

capelão (D3). Seu sucessor foi o reverendo Atael Fernando Costa, que serviu no
HCFMUSP até 1975 (D4), tendo sido designado, pelo Conselho, Estadual da
Confederação Evangélica do Brasil, para prestar assistência religiosa no HCFMUSP,
em 25 de novembro de 1964 (D5).

Foi publicado em Boletim do HCFMUSP (D6), em 12 de junho de 1965, o


aviso de que “já se encontrava em funcionamento, no HCFMUSP, regularmente, o
serviço de assistência religiosa evangélica, estabelecendo dia da semana, o horário de
atendimento, o local, o dia dos cultos e horário, e o número do telefone a ser acionado
em casos de urgência”, mas só em três de março de 1966 foi realizado um contrato de
prestação de serviços entre o HCFMUSP e a Confederação Evangélica do Brasil.
Nesse contrato, ficou estabelecido o tipo de atividade - prestação do ministério
religioso aos pacientes evangélicos, internados compreendendo “o conforto espiritual,
instrução religiosa e todas as demais funções próprias da espécie”. O trabalho devia
ser em período integral no hospital, apresentando relatório trimestral com dados
específicos da assistência prestada, e com pagamento mensal como retribuição de
seus serviços (D7). Foi também emitido um comunicado para a portaria, autorizando
permanentemente o reverendo Atael da Costa a entrar no HCFMUSP para assistência
religiosa (D8).

De fato, o documento datado de 27 de setembro de 1965 assim indicava: o


Conselho Estadual da Confederação Evangélica do Brasil, que era um órgão
representativo das Igrejas Evangélicas de São Paulo, consciente de que havia
necessidade de dedicação de mais tempo, do reverendo Atael Fernando Costa como
capelão evangélico no HCFMUSP, solicitou, ao então diretor administrativo, Dr.
Silvio Alves de Barros, que este recebesse parte de seu sustento do HCFMUSP (D9).

Em 3 de março de 1966, foi proposta uma minuta de contrato de prestação de


serviços entre o HCFMUSP e Confederação Evangélica do Brasil, em que o hospital
ficava obrigado a pagar, pelos serviços de capelania evangélica, ao reverendo Atael
Fernando Costa, a quantia de CR$ 100.000 cem mil cruzeiros mensais (D7).

Depois de nove anos realizando atendimento de assistência espiritual, a


Confederação Evangélica do Brasil, em carta ao superintendente do HCFMUSP
135
Resultados e Discussão

Oscar Cesar Leitelxxxvii, veio requerer a reformulação do contrato firmado, bem como
o reajuste do pagamento por prestação de serviço que, no momento, era de CR$
100,00 (cem cruzeiros), em 21 de novembro de 1975lxxxviii (D10).

Em 20 de fevereiro de 1976, o contrato do HCFMUSP com a Confederação


Evangélica do Brasil foi renovado, com o estabelecimento de pagamento mensal
como retribuição aos serviços religiosos prestados aos pacientes evangélicos
internados, no valor de Cr$ 532,80 (cláusula terceira) e que, para efeitos legais, o
valor do contrato era de Cr$ 6.393,60 (cláusula quarta) (D11). Em 7 de maio de 1976,
foi firmado o primeiro contrato do HCFMUSP, representado pelo mesmo
superintendente, com a Cooperativa Camiliana de Promoção Hospitalar Ltda.,
representada pelo seu Diretor Administrativo, padre Augusto Antonio Mezzomo,
destacando três sacerdotes capelães, estabelecendo que forneceria residência e
alimentação, aos sacerdotes capelães em serviço, e comprometia-se a pagar, como
retribuição pelos serviços religiosos prestados, a quantia de Cr$ 7.239,00 (cláusula
sexta), mensais e, para fins legais, o valor de Cr$ 86.868,00 (cláusula sétima), para
assistência e orientação religiosa individual ou grupal aos pacientes e servidores em
geral (D12).

A Confederação Evangélica do Brasil solicitou reajustes nos proventos pagos,


pelo HCFMUSP, ao superintendente Oscar Cesar Leite, em carta datada de 20 de
dezembro de 1976, indicando o nome do reverendo Atael Fernando Costa, na
qualidade de capelão evangélico, a continuar dando assistência espiritual aos
internados do hospital (D13).

Pode- se inferir que a razão dessa solicitação de reajuste de proventos, pela


Confederação Evangélica do Brasil, para o capelão evangélico, foi motivada pela
diferença do valor do pagamento a mais, para a Capelania Católica, para exercerem a
mesma atividade de assistência religiosa no HCFMUSP, em contrato firmado, na data
de 7 de maio de 1976, mas o contrato de prestação de serviço firmado entre o

lxxxvii
Oscar Cesar Leite médico e administrador, foi superintendente do HCFMUSP, 1971 a 1979. Disponível em
<www.hcnet.usp>. Acesso em 11 nov. 2011.

lxxxviii
Naquela época o valor de CR$ 100.000, representava 19% do salário mínimo que era de CR$ 532,80 cruzeiros. Disponível
em <www.debit.com.br/conecamos.php>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
136
Resultados e Discussão

HCFMUSP e a Confederação Evangélica do Brasil, com o reverendo Atael da Costa,


em 1975, não foi renovado (D4).

Em 8 de outubro de 1976, o Secretário de Estado Chefe da Casa Civil,


Péricles Eugênio da Silva Ramoslxxxix, solicitou, à Confederação das Igrejas
Evangélicas do Brasil, que indicasse um representante para prestação de assistência
religiosa nos estabelecimentos de internação coletiva, mas não se sabe qual foi a
resposta (D14).

Em decreto de 1977, o então governador do Estado de São Paulo, Paulo


Egydio Martinsxc, fixou normas que possibilitaram, ao Estado, os meios de melhor
facultar a prestação de assistência religiosa nos estabelecimentos de internação
coletiva (D15).

Posteriormente, o reverendo Marcos Petriaggi passou a ser o capelão


evangélico do HCFMUSP, com o referendum da Capelania Católica. Em 1984, a
senhora Eleny de Paula Cavalcanti passou a atuar como capelã-assistente, exercendo
a função de coordenadora do trabalho evangélico, tendo em vista o capelão titular
estar desenvolvendo atividades em outro setor. Em 1987, o reverendo Marcos
Petriaggi indicou o reverendo Edson Plaza para responder pela Capelania Evangélica
do HCFMUSP.

Péricles Eugênio da Silva Ramos – foi tradutor, poeta, ensaísta, crítico literário e professor. Nasceu em Lorena – SP em
lxxxix

1919 e teve seus primeiros poemas publicados em 1936, no jornal carioca Diário de Notícias. Formou-se em 1943 pela
Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Três anos depois, estreou com o livro Lamentação Floral. Em 1947, fundou, com
Domingos Carvalho da Silva, João Acioli e, Ledo Ivo, entre outros escritores e poetas, a Revista Brasileira de Poesia,
divulgadora dos preceitos estéticos da chamada Geração de 1945. A partir da revista, criou o Clube de Poesia de São Paulo, do
qual foi presidente em 1952 e entre 1958 e 1963. Manteve, por vários anos, sua coluna de crítica literária no Jornal de São Paulo,
no Correio Paulistano e na Folha da Manhã. De 1966 a 1992, lecionou Literatura Portuguesa e Técnica Redatorial na Faculdade
de Comunicação Social Cásper Líbero em São Paulo. Em 1970, foi diretor técnico do Conselho Estadual de Cultura. Participou
da criação do Museu de Arte Sacra de São Paulo, do Museu da Imagem e do Som e do Museu da Casa Brasileira. Recebeu o
prêmio de Poesia concedido pela Associação Paulista de Críticos de Arte em 1988 pelo livro A Noite da Memória. Traduziu
poemas de Byron, Villon, Shakespeare e, Cozzens, entre outros. Organizou várias antologias da poesia brasileira e publicou os
livros de ensaios O Verso Romântico e Outros Ensaios e Do Barroco ao Modernismo. Péricles Eugênio da Silva Ramos faleceu
em São Paulo em 1992. Disponível em <http://www.dicionariodetradutores.ufsc.br/pt/PericlesEugeniodaSilvaRamos.htm#p>.
Acesso em 3 de Dez de 2011.
xc
Paulo Egídio Martins nasceu em São Paulo e, aos dois anos, foi viver em Santos, com os pais. Aos 11, mudou-se para o Rio de
Janeiro, onde realizou seus estudos, formando-se em Engenharia, e casou-se com Lila Byington Egydio Martins. Retornou a São
Paulo aos 25 anos, cidade onde nasceram seus sete filhos, treze netos e uma bisneta. No campo profissional, atuou em
engenharia, administração, indústria, mineração, comércio e comércio exterior. Foi pecuarista e presidente da Itaucorp S.A., do
Grupo Itaú. Paulo Egydio iniciou sua militância política muito cedo, atuando no movimento estudantil universitário da União
Nacional dos Estudantes (UNE). Teve participação no movimento de 31 de março de 1964. Foi ministro da Indústria e
Comércio, membro da Junta Arbitral do Café Solúvel, da Organização Internacional do Café (OIC), na disputa entre Brasil e
Estados Unidos; superintendente do Consórcio de Desenvolvimento do Vale do Paraíba (Codivap); e Governador do Estado de
São Paulo. Disponível em <www.pauloegydio.com.br/site2010/Biografia.aspx>. Acesso em 28 de nov. de 2011.
137
Resultados e Discussão

De forma bastante similar, dois Serviços de Capelania Hospitalar, uma


católica e outra protestante, metodista, na mesma época, foram implantados nos EUA.
Em 1976, no Sant Mary´s Hospital, hospital católico situado no Estado de Illinois, foi
implantado o Departamento de Cuidados Pastorais. Todo o processo de cuidados
pastorais se iniciava com a organização da Secretaria de Assistência ao Clero que,
diariamente, acompanhava as internações e altas dos pacientes, independente de sua
religião, e providenciava a relação dos nomes dos pacientes e a qual paróquia
pertenciam. Após esse suporte, os ministros e padres locais eram direcionados para as
visitas aos pacientes. Existia também o serviço de voluntários, departamento formado
pelaara a capelania que, durante o período noturno, estava disponível nas emergências
e situações de urgência98.

O outro Serviço de Capelania iniciou-se em 1978, num hospital metodista


localizado em Missouri, que oferecia seus serviços de saúde, nos diversos níveis,
baseado nas necessidades dos pacientes, que eram representados, basicamente, pela
população local, principalmente pelos paroquianos. De tempos em tempos, quando
havia disponibilidade de ministros locais trabalharem voluntariamente, era oferecido
o serviço de capelania aos domingos e em situações emergenciais. Foi reconhecido
que esse trabalho não atendia totalmente às necessidades do paciente; sendo assim, a
formulação de um programa de capelania para o hospital se fazia necessária. O
programa escolhido foi o de tempo integral, liderado por profissionais treinados em
capelania, qualificados para o desenvolvimento do programa Clinical Pastoral
Education (CPE). Inicialmente procuraram um diretor para o departamento com
histórico como ministro da congregação e com formação em psicologia ou
aconselhamento. O candidato tinha que passar algum tempo instruindo os
funcionários do hospital quanto à humanização e tratamento com os pacientes99.

Esses dois Serviços de Assistência Religiosa dos EUA, um católico e outro


protestante, demonstram bem que o começo das capelanias, seja no Brasil ou em
ambos os outro paises , teve inicio com a necessidade de visitação dos enfermos nos
hospitais, pelos clérigos.

Quanto à remuneração dos capelães, no HCFMUSP, nessa época, a assistência


religiosa prestada era realizada com ônus para a instituição (D4). Porem, só depois de
onze anos, em 21 de junho de 1998, a situação de remuneração da atividade religiosa
138
Resultados e Discussão

foi legalmente definida pela Lei no 10.066, cujo parágrafo único do artigo 4º
estabeleceu: “A atuação religiosa será feita sem ônus para os cofres públicos” (D16).

Nos EUA, ao contrário, o capelão é remunerado pelo hospital ano qual presta
serviços, sendo que o balizador do salário para o clérigo deve ser o mesmo que o dos
empregados do hospital, comparados os atributos treinamento e experiência. O pastor
hospitalar tem um nível acima da graduação pois, além dos três anos de seminário,
tem um ano de treinamento clínico. Além disso, precisa de certificação nacional,
experiência pastoral no ambiente de paróquia e aprovação denominacional100.

No HCFMUSP, em junho de 1988, o reverendo Edésio Chequer, então


presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, credenciou a
senhora Eleny de Paula Cavalcanti como sua missionária, para exercer o Ministério
de Capelania Hospitalar nesse hospital, em todo o território nacional (D17). Nesse
ínterim, Eleny e o pastor Edson Plaza receberam um “Bip”xci para usarem durante o
período em que atuavam no HCFMUSP, para que fossem facilmente encontrados
(D18). Em 1 de setembro de 1988, o Prof. Dr. Vicente Amato Neto, superintendente
do HCFMUSP, aceitou a indicação do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do
Brasil, para que a Sra. Eleny Vassão atuasse como capelã evangélica titular, no lugar
do reverendo Edson Plaza (D19).

Eleny Vassão foi à primeira mulher a assumir oficialmente, como capelã


titular, em 1988, a Capelania Evangélica do HCFMUSP, mesmo sendo leiga, ou seja,
sem ser pastora, depois de vários pastores exercerem o mesmo cargo, desde o início
do SCEH, no HCFMUSP. Viu-se, na introdução da presente pesquisa, que, em outros
tipos de capelania, como no ambiente militar ou em presídios, os capelães, tanto
evangélicos como católicos, são sempre padres ou pastores e ainda hoje [(2011]), na
Ccapelania Ccatólica, o capelão é um clérigo. Por essa razão, foi um marco, na
história da Capelania Evangélica Hospitalar, a nomeação de uma mulher leiga, como
capelã titular. Essa ação abriu um precedente no campo da Capelania Evangélica,
para que todo voluntário que deseje realizar atendimento espiritual no hospital, depois
xci
BIP ou Pager - aparelho tecnológico dos anos 1980 e 1990. Foram os mais confiáveis e baratos meios de comunicação
portáteis antes da popularização dos celulares. Aparelho patenteado em 1949 por Al Gross, que comercializava os equipamentos
somente para órgãos governamentais. A FCC (órgão que controla e regulariza produtos eletrônicos, nos EUA) só liberou a venda
dos pagers para uso público em 1958. O funcionamento dos primeiros pagers era bem simples. Para enviar uma mensagem, era
preciso ligar para a central de atendimento, informar o código do aparelho e falar o recado para a telefonista. Após isso, um sinal
sonoro era enviado ao bip do usuário, indicando que ele tinha recebido uma nova mensagem. Como os aparelhos não tinham tela
LCD, o dono do bip precisava ligar para a central, informar o código e a senha do pager e, aí sim, a telefonista dava o recado.
Disponível em < http://www.revistavideosom.com.br/blog/?p=299>. Acesso em 3 de Dez de 2011.
139
Resultados e Discussão

doe todo processo de seleção, atendimento de pré-requisitos, como conhecimento e


equilíbrio doutrinário, cursos teóricos e práticos, conhecimento e perfil gerencial,
sejam aprovados como visitadores voluntários, ou indicados como capelãesão
assistentes de uma instituição hospitalar em que a ACEH tem contrato de prestação
de serviço firmado.

A relação dea Eleny do SCEH com o superintendente citado era de total


apoio, e foi nessa época que ela organizou o Primeiro Congresso Nacional sobre
AIDS pelo SCEH. O evento foi realizado no Centro de Convenções Rebouças.
Durante quatro dias, nele palestraram especialistas renomados da medicina e
delegados. Também foram dados muitos testemunhos de transformação de vida, por
usuários de drogas e profissionais do sexo, abordando o tema: “AIDS há uma
esperança- mudando hábitos da sociedade para deter o avanço da AIDS”.

Nesse congresso, estavam presentes os líderes do Movimento de Defesa dos


Direitos Homossexuais, o que, a princípio, deixou Eleny apreensiva, mas, pelo
contrário, houve aceitação e declaração de apoio e consideração, dos dirigentes do
movimento, pelo trabalho da Capelania Evangélica. Foi enviado convite para o
presidente da república, governador e outras autoridades. 350 pessoas participaram do
congresso e todos os custos foram cobertos pelo HCFMUSP.

Desde o início do século XX, sociólogos e antropólogos apontaram uma


contribuição muito importante para o setor saúde, ao demonstrar, por meio de estudos
empíricos, o fato de que a doença, a saúde e a morte não se reduziam a uma evidência
orgânica, natural, objetiva, mas que sua vivência, pelas pessoas e pelos grupos
sociais, estava intimamente relacionada com as características de cada sociedade: a
doença, além de sua configuração biológica, é também uma realidade construída e o
doente, enquanto tal, é um personagem social 82.

Considerando o doente como um personagem social e, no caso da presente


pesquisa, um paciente portador de AIDS, em uma época conturbada, em que a ciência
estava descobrindo o tratamento específico para essa nova doença infecto-contagiosa,
é que se deu a implantação do Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar do IIER,
suprindo uma necessidade premente e real de assistência espiritual.

A Capelania Evangélica do HCFMUSP já existia desde 1952, quando, em


1992, os Gideões Internacionais, que têm como atividade a distribuição de Bíblias em
140
Resultados e Discussão

vários locais como hotéis e hospitais, pediram auxílio à Eleny Vassão, então capelã
titular do HCFMUSP e presidente da ACEH, para distribuir o “Novo Testamento”,
que é parte da Bíblia, no IIER, pois não haviam conseguido entrar lá. Essa situação
foi a porta de entrada para a Capelania Evangélica no IIER, para atender à demanda
de assistência aos pacientes com AIDS.

Assim, a circunstância favorecedora da criação do SCEH foi o ambiente da


AIDS nos primórdios da doença, quando havia muito desespero e dificuldades, que
foram trazendo modificação substancial para o padrão de atendimento de um hospital
que assistia portadores de doenças agudas e infecto contagiosas agudas, para um
hospital que passou a assistir portadores de doenças crônicas.

Essas circunstâncias favoreceram não só a entrada como a permanência e


instalação completa da Capelania Hospitalar Evangélica. A esse respeito pode-se citar
o primeiro depoimento da capelã evangélica, em comparação com o depoimento da
enfermeira, que figuram no presente estudo. Neles é interessante notar que há duas
opiniões diferentes sobre a presença ou não da Capelania Evangélica anteriormente à
Capelania Católica, no IIER, o que só vem demonstrar que a criação do SCEH se deu
de maneira difusa, vindo a ser formalizada posteriormente.

É certo que o SCEH do IIER foi aberto quando ainda o atendimento do SCEH
do HCFMUSP estava em funcionamento. O diretor técnico naquela época era
Armando Sambataro que, a pedido de Eleny Vassão e por conhecer o trabalho dela no
HCFMUSP, autorizou a entrada dos Gideões no IIER, mas eles só poderiam distribuir
o “Novo Testamento” para os funcionários do hospital e, aos pacientes, somente
Eleny os distribuiria. Ao fazê-lo, ela observou que havia necessidade de assistência
espiritual aos pacientes internados. Nessa época, em 1987, a AIDS ainda era
fenômeno recente e havia muitos pacientes infectados solicitando atendimento
espiritual.

Assim, Eleny entrou em contato com Armando para ver a possibilidade de


realizar a atividade de Capelania Hospitalar no IIER, e este entrou em contato com
Paulo Augusto Ayrosa Galvão, que na época era o diretor do IIER. Paulo e Eleny
tinham um amigo em comum, que era da Igreja Presbiteriana da Lapa, da qual ela era
membro, o que facilitou essa articulação.
141
Resultados e Discussão

Eleny, nessa mesma época, estava sendo preparada, no HCFMUSP, peloor


Prof. Dr. Vicente Amato Neto, o superintendente, que era expert em AIDS, para lidar
melhor com esses pacientes. Quando ela o informou que assumiria também o IIER
como capelã, ele verbalizou que ela não ia conseguir, por haver muitas mortes lá. Ela
disse a ele que teria que treinar mais pessoas, pois a necessidade “era gritante e não
dava para deixar, não dava para fechar os olhos”. Ela disse a ele que continuaria com
o SCEH no HCFMUSP também, dividindo seu tempo de forma adequada.

No ano de 1992, Paulo Augusto Ayrosa Galvão, que era o diretor geral do
IIER, propôs para Eleny entrar sozinha, duas vezes por semana, no período da tarde,
por duas a três horas, por um período de três meses, ao final do qual ele iria pedir, às
chefias dos diferentes serviços do hospital, que avaliassem o trabalho dela. Assim, se
houvesse qualquer oposição, ela sairia, mas, se ela fosse aprovada por todos, teria a
liberdade para entrar e trazer quem ela quisesse e seria oficializada a Capelania
Evangélica Hospitalar no IIER.

Foi assim que aconteceu. Ela ficou sozinha durante os três meses,
conquistando pacientes, funcionários dos serviços de apoio administrativo, alunos e
profissionais da saúde, tendo trabalhado principalmente na UTI, até que a Capelania
Evangélica pudesse ser aceita.

É importante registrar que havia um agravante para que a Capelania


Evangélica entrasse no IIER. O trabalho religioso estava suspenso para todos os
credos porque um grupo vinculado a religião afro-descendente tinha realizado
cerimônias em alguns quartos de pacientes, com travessas com farofa com chifres,
pimenta vermelha, com tambores e atabaque. Em seguida, havia entrado um grupo
pentecostal que dizia expulsar demônios. Por essa razão, as portas se fecharam para
qualquer religioso entrar, já que ambos os grupos citados prometiam curar a AIDS e,
com isso, dificultavam a adesão dos pacientes às medidas terapêuticas.

Paulo Augusto Ayrosa Galvão, diretor geral do IIER, oficializou a Capelania


Evangélica criando o Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar, colocando Eleny
como capelã titular, quando ela passou pela aceitação de todos os chefes dos setores
do IIER. A Portaria 002/92 publicada por ele, autorizou, “sem ônus para o Estado, o
ingresso de membros da Capelania Evangélica, sob a responsabilidade da Sra. Eleny
de Paula Cavalcanti, capelã titular, em dependências do IIER, para prestação de
142
Resultados e Discussão

assistência religiosa aos pacientes que o desejassem, a seus familiares e funcionários,


bem como a realização de cultos, palestras e programações especiais”.

A transição de algumas pessoas da equipe da Capelania Evangélica do


HCFMUSP para o IIER se deu de forma tranqüila. Eleny já tinha experiência da
Capelania no HCFMUSP e possuía, também, uma equipe treinada. Ela fazia plantões
no IIER e dividia seu tempo com a Capelania do HCFMUSP, indo no período da
manhã para uma e à tarde para a outra.

Na equipe de assistentes da Capelania Evangélica do HCFMUSP, havia


alguns que tinham AIDS ou eram do grupo de maior risco na época, porque um era
homossexual, outro tinha sido viciado em drogas e também profissional do sexo e o
terceiro tinha sido travesti por sete anos.

Eleny começou no IIER com uma equipe de voluntários vindos do


HCFMUSP, que era composta quase que só por pacientes com HIV positivo, que se
contaminaram antes de se converterem ao Cristianismo. Essa equipe, por essa
característica importante, teve papel fundamental no trabalho da Capelania
Evangélica do IIER, pois podiam falar da paz e esperança que tinham, apesar de
estarem contaminados com o vírus da AIDS, para pacientes na mesma condição.

Nessa época, foi atendido, no IIER, um paciente que tinha AIDS e havia
contaminado sua esposa, com quem tinha dois filhos pequenos. A Capelania
Evangélica os acompanhou até que ele falecesse, oferecendo assistência social para a
família. Quando ele faleceu, a Capelania os acolheu e pediu para que sua mulher os
viesse ajudar nos seus trabalhos, para que também fosse dada uma ajuda financeira à
família. Depois de um ano aproximadamente, ela casou com um dos capelães, que
também se tratava de AIDS, em oficio realizado pelo marido de Eleny, que era pastor.
Depois de cerca de cinco anos, foi designada secretária dna Capelania do IIER, onde
permanece até 2011, totalizando 15 anos de trabalho.

Eleny se atualizava com o Departamento de Educação em Saúde do IIER,


onde lia as últimas notícias sobre a AIDS e recebia material didático para ministrar as
palestras. Depois de responder muitas perguntas, os capelães que tinham AIDS
davam seu testemunho, mostrando quem eles tinham sido, o caminho que estavam
trilhando e como Deus tinha mudado a realidade deles, pois, apesar de estarem
143
Resultados e Discussão

infectados, correndo risco de morrer vida, tinham uma vida nova, em paz com Deus,
com a certeza de vida eterna e qualidade de vida terrena.

A Capelania Evangélica começou no IIER quando, em média, ocorriam dez


óbitos de pacientes por semana. O paciente sobrevivia por cerca de um ano e três
meses, com freqüentes internações por causa de doenças oportunistas, e essa rotina
possibilitava o desenvolvimento de uma relação de amizade entre os capelães e o
paciente, fazendo um vínculo profundo. Porém, como eles morriam nesse ano e meio,
isso causava muita dor ao pessoal da capelania e também aos funcionários. Os
próprios profissionais da saúde tinham dificuldade em conviver com essa realidade e
entre si, pois a situação era muito sofrida para eles também. Eles já haviam vivido
epidemias, mas eram passageiras; já a AIDS, tinha vindo para ficar - então, não havia
outra saída a não ser se acostumar com essa situação, como mencionado no
depoimento da enfermeira entrevistada.

A situação da AIDS ofereceu oportunidade para que Eleny pudesse começar a


treinar alguns médicos do IIER, começando um trabalho que se denomina hoje de
“Minutos com Deus”. Ela começou na UTI, com a colaboração de uma enfermeira
que lhe deu apoio político, solicitando também que cuidasse dos profissionais de
saúde.

Dessa forma, o SCEH não só assistia os pacientes, mas também os


profissionais de saúde do hospital. É interessante observar que, mesmo os
funcionários de outros credos religiosos aceitavam o trabalho que era realizado pelo
SCEH e ainda o incentivavam.

Nos países da Europa, existem diversas formas de organização e


desenvolvimento do Serviço de Capelania Hospitalar, que são formatados por
administração de grupos de fé e religiosos, instituições de cuidado de saúde e
orientados por regulamentação e normas estaduais do cuidado de saúde e emitidos
por associações de capelania. Os Serviços de Capelania Hospitalar são oferecidos por
clérigos e pessoas que possuem treinamento profissional na área de cuidado pastoral.
Essas são autorizadas por suas comunidades religiosas e reconhecidas pelo Sistema
de Cuidado à Saúde, fazendo parte da equipe multidisciplinar101.

Ainda hoje, alguns dos maiores estabelecimento de saúde da União Européia


são de propriedades de instituições religiosas - hospitais, “hostels”, unidades de
144
Resultados e Discussão

cuidados especiais e centros de aconselhamento foram fundados e são dirigidos por


vários grupos religiosos. A pessoa que oferece conjuntamente a dinâmica da cura e da
fé, no ambiente do sistema de saúde, é o capelão. Na União Européia, milhares de
capelães servem no ambiente do cuidado à saúde, oferecendo cuidado espiritual e
orientação essencial para uma boa recuperação dos pacientes e familiares, oferecendo
suporte espiritual também para a equipe de saúde 102.

Em junho de 2002, no sétimo encontro da Europeam Network of Health Care


Chaplaincy (ENHC), de que participaram 40 representantes de igrejas e organizações
de 21 países europeus, foi firmado um documento que atribuiu formalmente, ao
Serviço de Capelania Hospitalar, as responsabilidades de prover os serviços pastorais
em uma variedade de campos no cuidado à saúde, ministrar as necessidades
espirituais, existenciais e religiosas para aqueles que sofrem e para aqueles que
precisam de cuidados pessoais e fé, bem como oferecer recursos culturais e
comunitários101.

Um pouco antes disso, documento enviado ao diretor do Instituto Central do


HCFMUSP, José D´ Elia Filho, em 29 de agosto de 2001, pela Capelania Evangélica,
que era dirigida por Eleny, em resposta a um documento que fora enviado pelo padre
Anísio Baldessin, coordenador da Coordenadoria Administrativa da Capelania do
HCFMUSP à Superintendência do HCFMUSP, e também à Diretoria do IIER (D2),
retratava as dificuldades que a Capelania Evangélica vinha tendo no HCFMUSP, e
que estavam começando a ter repercussões também na Capelania Evangélica do IIER.

A situação evoluiu até a saída de Eleny da Capelania Evangélica, que era por
ela dirigida no HCFMUSP, em 2004. Isso se deu porque foi alterada a estrutura
formal da instituição, quanto ao atendimento religioso, transformando o serviço
religioso católico e evangélico em um só local, fazendo uma capelania ecumênica,
para todos os credos, reunidos em um só local (D29). Isso aconteceu quando houve
mudança de diretoria do HCFMUSP: saiu o ProfProf. Dr. Vicente Amato Neto, que
tinha bastante proximidade com a Capelania Evangélica, e entrou outra diretoria, que
tinha visão diferente sobre esse trabalho. Foram realizados vários esforços para fazer
uma composição, que se revelaram insatisfatórios. Como ela e seu grupo de
aproximadamente 60 pessoas do HCFMUSP que também já integravam a Capelania
145
Resultados e Discussão

Evangélica do IIER, resolveram deixar a Capelania do HCFMUSP, isso fortaleceu a


primeira.

A Portaria de 2004 foi a forma do SCEH do HCFMUSP entrar na ordem


instituída, mas, ao mesmo tempo, isso modificava substancialmente sua condição
anterior. Daí é que se reconhece que há uma legitimação., isso é indiscutível.;
Pporém, dentro da ordem estabelecida, não houveá um lugar específico para a
Capelania Evangélica, então, ela precisou continuar se apoiando na ACEH, que era
um órgão externo, que a sustenta porque lhe provia certa legitimação, uma vez que a
ordem instituída na organização hospitalar não a abrigava, ela ainda a colocava à
margem. Somado a isso, em 3 de fevereiro de 2004, Eleny Vassão foi credenciada
como missionária em São Paulo e em todo o território nacional, pelo Supremo
Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, representado pelo seu presidente,
reverendo Roberto Brasileiro Silva (D21).

É preciso ressaltar que, de acordo com as proposições de Max Weber, os que


atuam socialmente podem atribuir vigência legítima a uma ordem determinada, em
virtude de um pacto dos interessados. É o caso da nova diretoria do HCFMUSP e a
Capelania Católica, que tinham interesse na diminuição do poder da Capelania
Evangélica do HCFMUSP. Isso também pode ocorrer em virtude da imposição, que
ocorreu no caso da mudança de estrutura formal da instituição, quanto ao atendimento
religioso, transformando ambos serviços religiosos -– o católico e o evangélico -
num só, passando os atos religiosos doa segundoa a serem subordinados aoà
primeiroa, fazendo uma capelania ecumênica, para todos os credos, reunidos em um
só local. Tal transformação se deu e em virtude da imposição, – que é baseada na
dominação julgada legítima de homens sobre homens e da submissão correspondente.

Também se pode afirmar que a criação e instalação da Capelania Evangélica


Hospitalar se deu pela ação social, que foi determinante para que os agentes da
capelania conseguissem entrar e se instalar, porque a ação que se fez tinha uma
conotação, do ponto de vista weberiano, estabelecida com o propósito de mudar o
significado das ações de outro agente social, tendo esse significado sido aceito e
assumido e, por conseqüência, efetivamente resultado em novos sentidos de ação em
processo contínuo, para transformar, para mudar, para dar uma resposta, frente a uma
146
Resultados e Discussão

necessidade social legítima, que era o desespero dos pacientes com AIDS e dos que
deles cuidavam.

Assim, por meio das oportunidades, representadas pela necessidade do IIER e


a contração das atividades no HCFMUSP e a intencionalidade dos atores sociais
envolvidos, foi criada a Capelania Evangélica do IIER.

5.2.2 Recursos para a Instalação e Funcionamento do Serviço de Capelania


Evangélica Hospitalar

Alguns voluntários e capelães atuavam simultaneamente no HCFMUSP e no


IIER, no início das atividades do SCEH no IIER. Dessa forma, quando parte da
equipe da Capelania Evangélica se desligou do HCFMUSP para ficar definitivamente
no IIER, já possuía treinamento e tinha experiência de capelania em hospital público,
o que beneficiou o sucesso da instalação da Capelania Evangélica Hospitalar no IIER.
Esse grupo era composto por sessenta integrantes, alguns destes com AIDS, adquirida
de diferentes formas e, na ocasião, todos cristãos evangélicos. Essa característica de
algumas pessoas da equipe de capelania evangélica serem portadoras de AIDS foi
outro fator que veio beneficiar a implantação desse serviço,a capelania evangélica,
facilitando a atividade, em razão da importante identificação entre esses capelães e os
pacientes atendidos.

Com essas pessoas foi possível construir a Capelania Evangélica no IIER,


para prestar a assistência espiritual para os pacientes, em meio à problemática da
AIDS, que era o que se vivenciava no IIER, na época em que a capelania começou a
ser constitruída.

Quando a equipe do SCEH veio do HCFMUSP, Eleny também encaminhou


algumas pessoas para o SCEH do Hospital do Servidor Público Estadual, do Hospital
Pérola Byington e do Hospital Jaraguá. Depois disso, a equipe do SCEH no IIER
agregou novos membros, cresceu rapidamente e, em pouco tempo, já havia mais de
50 pessoas que dela participavam ativamente.
147
Resultados e Discussão

Um dos membros do SCEH ficou sabendo que havia contraído AIDS antes de
ter se convertido à religião protestante, o que resultou em uma época muito difícil
para ele e para a equipe. Seu testemunho apresenta mudança de valores e de vida,
como se pode ver a seguir103:

“...e por mais que tentasse novas motivações prá sair da monotonia, nem dinheiro,
nem sexo, nem drogas, nem viagens poderiam preencher meu vazio interior, minha
insatisfação. Em nome da independência homossexual joguei tudo pela janela... Mas
um dia um carro passou devagar, um rapaz vistoso desceu, esticou o braço para mim
e me deu um folheto, dizendo: “Eu também fui como você, mas Jesus mudou a
minha vida, e pode fazer o mesmo com a sua!”. Bêbado e furioso, expulsei-o aos
berros, gritando palavrões, mas no entorpecimento de minha consciência, guardei o
folheto dentro da bolsinha tira-colo. Naquela noite, dormi mal, e quando acordei, já
era quase meio-dia, e estava morto de fome. Abri a bolsa para procurar algum
dinheiro e achei o folheto, e sem saber bem porque, comecei a ler. Deus tocou o meu
coração de maneira tão profunda que cai de joelhos, chorando, sem saber bem como
falar com Ele. Decidi contar com Ele e descobri que apesar da AIDS, o
homossexualismo, o grande buraco negro da minha vida, tinha solução[...]”
Motivada por uma mudança de valores e de vida, outra paciente do IIER veio
fazer parte da equipe de Capelania Evangélica de forma bastante incomum, como já
comentado anteriormente, vindo a integrar a equipe, exercendo a função de
secretariar do SCEH no IIER e somando mais um recurso humano para o trabalho da
capelania.

Também nos EUA, o Serviço de Capelania Hospitalar entende que, para o


funcionamento eficaz do departamento de cuidado pastoral, é necessário um suporte
adequado de secretaria, admitindo que pequenos grupos possam dividir a secretaria
com outro departamento. Em ambos os casos, uma eficiente secretária pode dar
liberdade para a equipe de cuidado pastoral usar melhor o seu tempo100.

Analisando a composição, o comportamento e a atitude da equipe inicial do


SCEH no IIER, de acordo com o pensamento weberiano, pode-se dizer que esses
atores sociais com AIDS foram agentes que deram significado às diversas relações
sociais e eventos dos quais participaram, indicando e justificando seu comportamento
em relação a si mesmos e aos outros. Nessa disposição, suas ações são consideradas
ação social, no sentido weberiano do termo, determinando o modo como prosseguem.
Sendo esse o significado pretendido, de fato, pelos agentes (esses capelães, em
particular), seus atos são considerados significativos e não puramente reativos.
Assim, a implantação da Capelania Evangélica Hospitalar no IIER pode ser
considerada, pela condição de ser compreendida intelectualmente e pela lógica como
148
Resultados e Discussão

evidência do fenômeno observado e motivadora de uma mudança de valores e de


vida, uma intenção social.

Sobre a desigualdade social, em relação a AIDS, Minayo82 afirma:

“o setor saúde é considerado, na contemporaneidade e no mundo inteiro, como um


dinamizador da economia, pela sua capacidade de produção de bens e serviços e um
campo de geração de novos conhecimentos e absorção de tecnologias. Como direito e
ideal, a saúde é, sobretudo, um bem econômico e cultural em disputa, pois os
avanços científicos e tecnológicos beneficiam desigualmente a humanidade,
evidenciando a relação entre a acumulação de capital e de conhecimento e aumento
das desigualdades sociais e das diferenças do perfil epidemiológico”.
No caso da AIDS, não foi evidenciada desigualdade social entre as pessoas
que contraíram a doença, pois acometeu pessoas de todos os grupos sociais,
independente da situação social. Talvez tenha sido essa a razão do Brasil ter se
destacado tanto quanto aos recursos em todas as áreas disponibilizados à população
contaminada pelo HIV. Aqui se evidencia também outro tipo de recurso que não o
tecnológico, mas o humano. Esses recursos humanos, apesar de aparentemente fáceis
de se obter e preparar para a assistência espiritual, não o são realmente, pois, além de
serem voluntários, requerem vocação, vontade interna, ideal e amor ao próximo.

Interessante observar que a Capelania Evangélica utilizou recursos humanos


com retorno de grande efetividade e eficiência e com custo institucional baixíssimo.
Além disso, ao mesmo tempo em que assistia espiritualmente os pacientes internados,
também atendia e cuidava espiritualmente dos funcionários da instituição.

A noção de chamamento está presente tanto no calvinismo - que propõe o


esforço humano como uma tarefa para toda a vida, dentro de um campo definido de
trabalho - quanto no luteranismo, na idéia de que a eticidade está em servir a Deus,
realizando as obras para as quais é chamado. A esse propósito lembre-se que Lutero
acreditava que, sendo a profissão uma vocação, não se tem o direito de ignorar o
chamado de Deus: deve-se laborar e orar, perseverando na profissão escolhida 131.

Esses recursos humanos foram selecionados e treinados adequadamente para


prestar assistência espiritual, pelo Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar. De
fato, a formação dos voluntários para a Capelania Evangélica Hospitalar do IIER era
realizada nos cursos anuais organizados e oferecidos pela ACEH. O primeiro Curso
Nível I aconteceu em 1995. Sua duração foi de quatro dias de aulas teóricas seguidos
de 60 horas de prática hospitalar supervisionada, ministradas pelos capelães. Antes da
149
Resultados e Discussão

inscrição no curso, porém, os candidatos tinham que trazer três cartas de referência
dos líderes de suas igrejas e passavam também por entrevista com os capelães. Nela,
verificava-se equilíbrio doutrinário, emocional, capacidade de receber ensinamentos e
a vocação para esse ministério.

Depois, havia o Curso Nível II, em que, na parte teórica, era ministrado o
conteúdo sobre noções de psiquiatria, cuidados paliativos, peculiaridade dos pacientes
internados na UTI, pronto socorro e pacientes queimados. Com a experiência
adquirida participando da equipe de cuidados paliativos e a prestação de assistência
espiritual a pacientes fora de possibilidades terapêuticas do IIER, foi possível indicar
uma capelã, que havia sido treinada nessa área, para fazer parte da Equipe de
Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo, o que
equivale a dizer que a Capelania Evangélica do IIER também desempenhava o papel
de formador de recursos humanos, no seu campo de atuação, para outros serviços de
saúde.

O IIER também promovia vários cursos, como o da área de cuidados


paliativos, dos quais o pastor João Batista, da Capelania Evangélica, participou.
Houve um curso especialmente planejado para os visitadores da Igreja Universal do
Reino de Deus porque eles tinham uma forma de visitar os pacientes que ia de
encontro às normas do hospital. Foi um grupo de aproximadamente 15 pessoas que,
ao verem que o conteúdo do curso não condizia com o que eles acreditavam, não
quiseram mais participar. Essa ocorrência corrobora a ideia de que talvez não seja a
melhor escolha pensar na solução de em uma capelania ecumênica como solução..

Na visão da enfermeira entrevistada, o SCEH se firmou quando começou a


ministrar cursos, tornando-se uma equipe mais independente, com mais autonomia e
mais segura acerca de seu papel institucional. Ao ver um quarto com isolamento
respiratório, por exemplo, já sabiam do que se tratava e que o paciente era grave.
Dessa forma, não sobrecarregavam a equipe de enfermagem pedindo informações e
explicações. A enfermeira entrevistada para a presente pesquisa também participou
dos cursos de formação oferecidos pela Capelania Evangélica, palestrando sobre o
conteúdo de biossegurança, ministrando aulas sobre os tipos de isolamento e cuidados
de enfermagem com a morte.
150
Resultados e Discussão

É interessante notar a importância que o padre da capelania católica do IIER


atribui à profissionalização da atividade desempenhada pelo capelão. A sua posição é
que os ministros religiosos se profissionalizem, obtendo conhecimentos sobre ética,
bioética e humanização. Também entende que é um desafio, para as igrejas, enviar
seus ministros religiosos para o campo missionário nos hospitais e presídios, ou
trabalhar com químico-dependentes, entendendo, assim, os hospitais como um campo
missionário. Conclui afirmando que o capelão é um missionário e também um
profissional, postura bastante singular.

Essa preocupação com a profissionalização da atividade desempenhada pelo


capelão está presente já há algum tempo nos EUA. Lá, a experiência da introdução do
Curso de Cuidado Pastoral - CPE (Clinical Pastoral Education) utilizando o hospital
como campo de estágio, como na experiência objeto do presente estudo, deve ser
incluída como parte do planejamento do programa de preparo do capelão
hospitalar104.

Duas são as diretrizes para o preparo desse profissional, no âmbito da


assistência espiritual no campo da saúde: reconhecimento da necessidade de um novo
saber e a identificação das competências a serem usadas na estruturação do cuidado
de saúde em emergência105.

Nos EUA, para a contratação de capelão, são necessários os seguintes


requisitos: estar apto para elaborar o programa de serviços pastorais para pacientes e
funcionários, possuir vasto conhecimento das condições humanas na situação de
hospitalização, possuir bom conhecimento de técnicas de aconselhamento e
habilidades competentes em implantá-las e ter habilidade de apresentar suas
capacidades para outros profissionais da equipe 99.

Os critérios de seleção dos candidatos ao serviço de capelania hospitalar nos


EUA incluem treinamento em três grandes áreas: religião, educação e cuidado de
saúde. O conhecimento em cuidado de saúde é atestado pelo sucesso na conclusão do
treinamento na clinica pastoral, de preferência acreditado pela Association for
Clinical Pastoral Education, pela College of Chaplains, pela National Association of
Catholic Chaplains, pela Chaplaincy Commission, ou pela New York Board of
Rabbis100.
151
Resultados e Discussão

Apesar do treinamento oferecido aos capelães e voluntários da equipe de


Capelania Evangélica pela ACEH, no Brasil, seus recursos humanos não possuem
todos esses pré – requisitos, como nos EUA, pois, na sua grande maioria, são pessoas
leigas com diversas formações profissionais e níveis de escolaridade variados. Além
disso, poucos estudaram teologia ou fizeram curso de aconselhamento bíblico. Para
atender a essa demanda, a ACEH, que é uma entidade que se preocupa em formar
seus componentes, oferece os cursos já descritos em parceria com uma universidade
presbiteriana reconhecida, de projeção nacional e internacional, e tem algumas
prescrições para minimizar essa heterogeneidade e qualificar melhor sua equipe. Para
tanto, realiza ainda cursos livres, na forma de educação continuada, indica livros para
a equipe ler e realiza reuniões com o objetivo de propiciar troca de experiência entre
as capelanias de diversos hospitais, nas especialidades de assistência religiosa para
pacientes em cuidados paliativos, em cuidados intensivos e com crianças. Estimular
os participantes na realização de todos os cursos nível I, II e III, em teologia,
aconselhamento, participação em congressos, com realização de trabalhos científicos,
faz parte também da sua filosofia de aperfeiçoamento para a equipe de capelania.
Como se pode observar, nos EUA existem várias instituições só com a função de
formar capelães, diferentemente da ACEH que, além de preparar e formar sua equipe,
gerencia os serviços de capelania evangélica hospitalar em todos os hospitais em que
estão inseridas no país.

Um projeto interessante, que não tem similar no Brasil, foi desenvolvido, em


1995, pelos supervisores e gerentes do cuidado pastoral no System Health Franciscan
em Tacoma, Washington, denominado “Staff CPE”. Dos doze capelães de três
hospitais que participaram do programa, seis responderam ao convite para ficar meio
período na unidade avançada CPE, designada especificamente para ajudá-los,
definindo as competências para oferecer o cuidado espiritual, na estrutura gerencial
de cuidado. Para serem reproduzidos, programas similares devem ser acreditados pela
“Association for Clinical Pastoral Education (ACPE)” e pela “National Association
of Catolic Chaplain (NACC)”, compostos, no mínimo, de seis horas de investimento
educacional por semana durante cinco meses. Esses programas têm três metas para
seus alunos: oferecer a prevenção e promoção como foco do seu ministério,
enriquecer sua assistência espiritual e desenvolver seu próprio conceito holístico
sobre o processo de doença105. Essa foi uma das formas que os EUA criaram para
152
Resultados e Discussão

formar seus capelães, desenvolvendo suas competências para oferecer o cuidado


pastoral por meio da realização de estágio prático na Clínica de Educação Pastoral.

Essa foi uma das formas que os EUA criaram para formar seus capelães,
desenvolvendo suas competências para oferecer o cuidado pastoral por meio da
realização de estágio prático na Clínica de Educação Pastoral.

No Brasil, não há ainda prescrições de competências definidas legalmente,


exceto as que a ACEH estabeleceu. Também sobre o funcionamento da capelania, há
apenas o que está nos documentos oficiais, tais como o decreto do governador
estabelecendo normas que possibilitem a assistência religiosa, normas quanto à
remuneração dessa atividade, normas para credenciamento dos prestadores de serviço
voluntário e normas e rotinas internas das instituições hospitalares sobre essas
atividades.

A certificação é outro avanço que os capelães, no nosso meio, não possuem;


essa garante a atualização constante do profissional, mantendo padrões adequados de
desempenho das competências e assegurando a qualidade da assistência oferecida.

Já, nos EUA, para ser certificado como capelão profissional, o candidato deve
demonstrar as seguintes qualificações: ter habilidade com a teoria do cuidado
pastoral, articular a teologia para o cuidado espiritual com a teoria da prática pastoral,
incorporar o conhecimento do trabalho das disciplinas de psicologia, sociologia,
práticas e crenças religiosas, na assistência do cuidado pastoral, incorporar a
dimensão emocional e espiritual para o desenvolvimento humano na prática do
cuidado pastoral, incorporar o conhecimento da ética apropriada para o contexto
pastoral e articular o entendimento conceitual para a dinâmica do grupo e ambiente
organizacional106.

Observa-se que os atributos exigidos dos capelães não são só voltados


exclusivamente para habilidades profissionais, mas incluem atributos atitudinais, que
pesariam na sua contratação e seriam exigidos no desempenho de sua atividade.
Dessa forma, pode-se avaliar como deve ser difícil obter esse tipo de profissional,
porque é bastante improvável concentrar todos esses atributos em uma só pessoa,
mesmo sendo religiosa. Elas provavelmente aspiram ser assim, mas isso é só um
desejo e um norte, e não realidade conquistada.
153
Resultados e Discussão

Mais recentemente, sentiu-se ainda a necessidade de aumentar o


conhecimento em dois requisitos: o teológico e o treinamento clinico para a
capelania, bem como avançar na certificação profissional, pois somente garantindo
esses dois aspectos, segundo eles, o paciente e o corpo de acreditação hospitalar
certificariam a competência do serviço de capelania 107.

Já na Inglaterra, uma pesquisa estudou o treinamento oferecido para capelães


hospitalares em diferentes partes do país e descobriu que não exista um padrão único
para o treinamento dos capelães, no âmbito do NHS (National Health Service)108.

Pode-se concluir que, nos EUA, a formação daqueles que trabalham com
capelania se dá por meio de treinamento profissional, promovido pelo seu ministério,
no nível apropriado do seu trabalho. O processo de treinamento inclui educação e
reflexão pastoral e teológica, conhecimento sobre as tarefas do cuidado de saúde,
supervisão clinica, prática e orientação espiritual 101.

Segundo a American Protestant Hospital Association, nos EUA, o capelão é


um profissional que se interessa e assiste espiritualmente a pessoa doente ou
mentalmente perturbada afastada da sociedade porque isso é natural, para ele, por seu
compromisso com Deus e seu companheirismo humano. Ele é uma pessoa treinada no
ministério e tem experiência em situações de vida que permite entender as pessoas e
familiares com necessidades e com problemas profundos. Para realizar essa atividade,
o capelão aprende a conhecer as muitas facetas da instituição, seus métodos, técnicas,
filosofia e serviços, e é também o elo de ligação entre os membros da equipe, da
instituição e dos pacientes e família109.

Uma pesquisa realizada pelos membros da Associação de Capelania


Institucional de Nebraska, também nos EUA, construiu a definição do papel do
capelão, usando, como referencial teórico, Max Weber, desenvolvendo a tipologia do
papel do capelão hospitalar, baseadao na constatação da forma como o capelão se vê,
em três áreas básicas de competência: em primeiro lugar, como conselheiro, em
segundo, como profissional e, em terceiro, como funcionário religioso. Talvez o
achado mais importante desse estudo seja o baixo nível de entendimento que existe
sobre o serviço de capelania e a descrição do papel esperado do capelão110.

Em outra pesquisa, descobriu-se, em um hospital do mesmo país, que o papel


do capelão está bem explicitado, com vários itens tais como: o capelão faz parte da
154
Resultados e Discussão

equipe de tratamento, é treinado para recomendar um caminho ético possível em uma


situação difícil, pode adaptar um ritual ou sacramento, em uma situação de
necessidade especifica do paciente no hospital, é capacitado para mediar crises e
contribuir para o bom relacionamento entre o ministro protestante e o pároco
paroquial, pode ter maior disponibilidade para o paciente, familiares, em situações de
emergência, do que a equipe médica e de enfermagem e auxilia, ainda, na prevenção
do rancor e burnout, dos pacientes, evitando que eles se instalem111.

Os papéis exercidos pelos capelães, nas equipes multidisciplinares, dependem,


normalmente, da forma como os elementos das outras disciplinas valorizam a
capelania. De acordo com Flannelly, Handzo, Smith112, em uma pesquisa realizada
nos EUA sobre a perspectiva dos administradores hospitalares acerca os diversos
papéis da capelania, encontrou-se que o suporte oferecido por parte desses
administradores era um elemento chave na satisfação profissional dos capelães, e que
a fé e a prática religiosa dos administradores podia influenciar no suporte que
ofereciam ao cuidado pastoral, nas instituições de saúde.

Na atuação junto aos membros da equipe multidisciplinar de saúde, na


Europa, os capelães desenvolvem e participam de programas de ensino sobre
cuidados da saúde do profissional, oferecem suporte espiritual, participando de
programas de pesquisa sobre cuidado espiritual, além de assistir e avaliar a
efetividade do Serviço de Capelania Hospitalar. Além disso, atuam como facilitador
no entendimento das necessidades e demandas dos pacientes e cuidadores, no Sistema
de Saúde da Comunidade101.

Foi realizada uma pesquisa nacional nos EUA, em 2005, com diretores de
hospitais, para obter a opinião deles sobre as diversas funções da capelania. O
objetivo da pesquisa foi examinar e comparar as opiniões dos profissionais das
diferentes disciplinas hospitalares, sobre a importância das funções da capelania.
Concluiu-se que os capelães trazem uma perspectiva única para a equipe
interdisciplinar porque eles têm uma maneira diferente de ver o mundo, no que tange
ao sucesso do resultado para o paciente. A visão do capelão sobre a doença do
paciente é mais abrangente, pois é entendida como uma jornada espiritual113.

Nos EUA, os capelães hospitalares se beneficiaram com a interação entre o


cuidado médico e espiritual, pois passaram a ser considerados membros da equipe de
155
Resultados e Discussão

cuidado do paciente e a ter papel representativo nos comitês de revisão e manutenção


da qualidade do cuidado prestado107.

O fato de, no Brasil, o capelão nem sempre ser considerado como um membro
da equipe de saúde faz com que, apesar da assistência espiritual praticada nesses
moldes ser reconhecida como uma ação social legítima, esta não seja ainda
legitimada, ou seja, não está formalizada, está em fase de transição, uma situação
ainda de instalação, ; está operante, mas não está consolidada.

Nos EUA, a maioria dos diretores do departamento de cuidado pastoral são


contratados pelos hospitais; portanto, se tornam seus funcionários e estão vinculados
e subordinados à sua estrutura hierárquica. Esse tipo de vínculo, por um lado é bom,
pois garante o sustento do capelão titular. A outra possibilidade poderia ser a igreja,
ou a denominação a qual pertence, assumi-lo como missionário e prover o seu
sustento. Salienta-se que, ao ter um vínculo contratual ou ser credenciado por uma
associação externa ao hospital, o serviço de assistência espiritual, apesar de estar
sujeito a todas as normas e regulamentações internas do hospital, mantem sua
liberdade doutrinária e a prerrogativa de selecionar e formar seus voluntários e
estabelecer suas atividades; enfim, ter autonomia e não perder sua identidade.

A esse propósito, é importante lembrar que as Capelanias Evangélica e


Católica no IIER sempre foram separadas e cada uma delas tem o seu capelão titular.
O diretor do hospital, porém, indica o Coordenador do Serviço Religioso, que
engloba as duas capelanias.

Já para ser o diretor do Departamento de Cuidado Pastoral nos EUA, o


candidato deve possuir cinco anos de experiência e ter concluído, com sucesso, o
programa de cuidado pastoral. A especificidade da denominação religiosa para o
diretor pode ser indicada pela administração do hospital, porém, a pessoa que é
ecumênica, harmonizada e sensível com sua própria religião, não será uma barreira
para um ministério efetivo, para o paciente e equipe, de todas as crenças 100.

No Brasil, há os dois tipos de vínculos dos serviços ou departamentos de


assistência religiosa com os hospitais. Na maioria das vezes, os hospitais privados
preferem estabelecer vínculo empregatício com o responsável pelo Serviço de
Assistência Religiosa, que se torna mais um serviço oferecido pelo hospital. Em geral
são ecumênicos - uma só pessoa realiza a assistência religiosa a todos os pacientes
156
Resultados e Discussão

que aceitarem ou solicitarem essa assistência. Esse tipo de Serviço de Assistência


Religiosa estabelece uma condição bastante original, uma vez que uma mesma
pessoa, que tem uma religião específica, na qual foi preparada para prestar assistência
espiritual profunda e efetiva, tenha que fazê-lo a pacientes dos mais diversos credos.
Essa condição reduz o trabalho a uma visita com caráter mais social, uma assistência
espiritual superficial e genérica, que demandará, quando solicitado pelo paciente, o
encaminhamento para o líder religioso da religião à qual este pertence.

Nos hospitais públicos, é mais frequente a modalidade de Serviços de


Assistência Espiritual com vínculo contratual com uma entidade social, como é o do
SCEH do IIER.

Como se pode observar no decreto do governador do Estado de São Paulo


datado de 1977 ainda em vigor, os ministros religiosos em atividade de capelania
podiam gozar dos mesmos benefícios dos servidores públicos quanto à higiene
pessoal, alimentação, alojamento e cuidados profiláticos. De fato, em 1977 o então
governador do Estado de São Paulo fixou normas que possibilitou, ao Estado, os
meios de melhor facultar a prestação de assistência religiosa nos estabelecimentos de
internação coletiva. Decretou que a assistência religiosa seria proporcionada sob a
forma de convênio, com as instituições interessadas, que poderiam credenciar pessoas
devidamente habilitadas, mas sem vínculo empregatício com o Estado, podendo
gozar os mesmos benefícios consentidos aos servidores públicos, no que se refere aos
itens de conforto já citados (D15).

O processo seletivo para a contratação do diretor do departamento de cuidado


pastoral de um hospital no Canadá, desde 1995 requer que o individuo tenha o
certificado da Canadian Association of Pastoral Practice and Education Certification
- CAPPE. Os padrões de acreditação do Departamento de Cuidado Pastoral, de
acordo com a “Canadian Council of Health Facilities Accreditation“, estabelecem
critérios específicos, relativos aos objetivos do cuidado pastoral e administrativos. Os
padrões se referem à composição da equipe, recursos necessários, como suprimentos
e equipamentos, e existência de rotinas e procedimentos114.

O tamanho do hospital, em geral, estabelece o tamanho da equipe do


Departamento Pastoral. Para o cuidado crítico no hospital, a American Hospital
Association, sugere um capelão para 50 pacientes. Na verdade, a proporção varia de
157
Resultados e Discussão

acordo com a gravidade do paciente e o número de pacientes crônicos hospitalizados,


com o limite máximo de 350 pacientes para um capelão. Normalmente, o
departamento é pequeno, com menos do que cinco pessoas, mas freqüentemente pode
ser suprido pelo quadro de pastores estudantes voluntários. Devido ao elevado grau
de profissionalização naquele país, nenhum outro departamento hospitalar utiliza
profissionais não assalariados para visitar os pacientes100.

É interessante observar que, nos EUA, muitas enfermeiras administradoras


supervisionam o Departamento de Cuidado Pastoral. A enfermeira administradora
não necessita ter graduação em Teologia, ou ser religiosa, para fazer um bom trabalho
de supervisão de cuidado pastoral; precisa conhecer a necessidade para o cuidado
integral do paciente, incluindo a dimensão espiritual. Além do conhecimento
específico da sua área, ela precisa conhecer a área de valores, decisões bioéticas,
morte e questões pós-morte, referentes à vida e o propósito no sofrimento100.

Outra certificação importante, além da acreditação do profissional de


capelania é a acreditação do Serviço Religioso por uma entidade especializada em
acreditação de instituições de saúde, como a JCAHO. O SCEH do IIER era
credenciado pela Associação de Capelania Evangélica Hospitalar do Brasil, mas não
acreditado. No Brasil, a JCAHO já acredita as instituições hospitalares e está
começando a incluir, entre os seus padrões,iniciando a exigência de haver um serviço
de assistência religiosa., entre os seus padrões.

Nos EUA, foi criado um Comitê de Cuidados Pastorais, em um serviço de


capelania hospitalar, foi criado um Comitê de Cuidados Pastorais,, em que seus
membros reivindicavam e estudavam a estrutura adequada para o crescimento do
serviço, como, por exemplo, a admissão de outro capelão. Entre os anseios do
Comitê, estava obter um serviço de capelania qualificado, com certificação e
supervisão da CPE - Clinical Pastoral Education, que também pudesse atender às
necessidades da comunidade. Fizeram, ainda, algumas recomendações, entre elas a
relevância do capelão pertencer ao corpo eclesiástico da igreja e que tivesse o
certificado da APHA (American Protestant Hospital Association and College of
Chaplains)99.

Uma outra pesquisa realizada sobre avaliação do desempenho da capelania


mostrou como a CHP (Catholic Healthcare Partners) revitaliza sua equipe de
158
Resultados e Discussão

capelães. Para atingir esse objetivo, a CHP desenvolveu um banco de dados que
trouxe os seguintes resultados: servir como um inventário de todos os envolvidos em
cuidado espiritual, ajudar a CHP a achar uma forma de encontrar padrões sistemáticos
para a certificação, assistir na identificação de oportunidades para a educação
continuada e o desenvolvimento profissional dos capelães115.

Assim, nos EUA, diferentemente do Brasil, essa discussão sobre certificação


de competências e habilidades necessárias para exercer a atividade de capelão
hospitalar, já existe há algum tempo.

Além dos recursos humanos, os recursos materiais básicos para o


funcionamento do Serviço de Capelania Evangélica no IIER foram garantidos pelo
hospital. Esse oferecia alimentação para toda a equipe e disponibilizava uma sala para
o SCEH. À medida que o hospital foi sofrendo mudanças, essas salas foram migrando
de um andar para outro, mas sempre o espaço para as capelanias foi garantido. No
começo, a sala da Capelania Evangélica era bem pequena. Cabia a mesa, um pequeno
armário e havia um local para os voluntários colocarem as bolsas; depois, foi
mudando. Também era utilizada a sala dos médicos, para a realização dos cultos.

As capelanias católica e evangélica tinham salas separadas, e o atendimento se


dava até as 20 horas. Desde o começo dos trabalhos da Capelania Evangélica, toda a
equipe possuía um crachá de identificação fornecido pela Secretaria da Saúde, como
se fossem funcionários do hospital, mas, depois da mudança do diretor, passaram
todos a serem tratados como voluntários.

De acordo com a American Protestant Hospital Association, nos EUA, o


serviço pastoral deve ter, também, um espaço adequado, mobiliado, equipado e
abastecido com materiais de escritório. Deve ainda ter: um orçamento equilibrado,
manter registros adequados e consistentes com a política e conduta da instituição e
com as necessidades para a prática pastoral, ter um plano de educação continuada
para a equipe, e finalmente, a instituição de saúde deve ter planos para os serviços
pastorais oferecidos serem revistos e avaliados em intervalos regulares116.

Como se pode ver, as diferenças entre os países que já possuem serviços de


capelania estruturado e a experiência brasileira são marcantes. No caso em estudo,
pode-se constatar que, com a ajuda da ACEH, algum esforço de regulamentação da
159
Resultados e Discussão

atividade tem sido empreendido, porém, a formalização não está presente na sua
dimensão legal.

As ações de padronização da formação, treinamento e supervisão dão


condições de regulamentação, restando a necessidade de legitimação, pelo poder
público e pelos representantes da sociedade civil, que teriam a condição de fazê-lo.

5.2.3 Atividades desenvolvidas pelo SCEH

As atividades desenvolvidas pela Capelania Evangélica do IIER eram


direcionadas especialmente ao consolo espiritual oferecido aos diversos pacientes
internados, em diferentes estágios de doença. Era uma atividade complexa em razão
da diversidade que o paciente apresentava em temos de valores, experiências e
crenças e, principalmente, pelos diferentes significados atribuídos, pelos atores
sociais envolvidosor cada um, à doença e morte.

Essas atividades compreendiam a realização de visitação aos pacientes, nos


diversos setores de internação, ambulatórios, no hospital dia, no necrotério e pronto
socorro, e aconselhamento bíblico aos familiares, mas, no IIER, o SCEH não tinha
acesso ao prontuário do paciente, para fazer as anotações quanto ao atendimento
realizado com os pacientes.

O que diferenciava o atendimento da Capelania Evangélica da Capelania


Católica era que, na última, o padre, além de ministrar os sacramentos, tinha um
relacionamento de amizade com os pacientes, diferente da Capelania Evangélica, que
realizava a assistência espiritual com vínculo social, porém objetivando
primordialmente o consolo espiritual. Seus voluntários falavam de paz, da palavra do
evangelho, oferecendo folhetos para ler; enfim, um atendimento mais profundo com
relação à questão espiritual.

A probabilidade de que a maior parte dos pacientes aceitasse a assistência


espiritual oferecida pela Capelania Evangélica era pequena, pois esses eram, na sua
maioria católicos, e poderiam aceitar só a assistência espiritual vinda da Capelania
Católica. Isso, porém, não ocorreu, pois a Capelania Evangélica utilizou, na sua
prática de assistência espiritual, a ordem legítima de que fala Max Weber, que é
160
Resultados e Discussão

expressa pela validade da ordem em questão, visto que a validade de uma ordem
significa algo mais que uma regularidade no desenvolvimento da ação social,
simplesmente determinada pelo costume.

Havia legitimidade de modo afetivo dessa ordem, de acordo com os


postulados de Weber, quanto à aceitação da assistência espiritual oferecida pelo
SCEH aos pacientes, seus familiares e funcionários, garantida de maneira puramente
íntima, afetiva, por entrega sentimental, racional, derivada de valores geradores de
deveres morais, e religiosa, pela crença de que, de sua observância dependia a
existência de um bem de salvação.

Gibbons, Retsas, Pinikahana117 realizaram uma pesquisa, em um grande


centro médico de referência terciário em Melbourne, na Austrália, sobre as atividades
nas quais o capelão estava engajado no aconselhamento, no cuidado pastoral e
direcionamento espiritual do paciente, identificando oas seguintes: atividades:
promoção de transcendência espiritual atuando na desesperança, raivas, medo e
ansiedade, promovendo esperança e celebração, integridade espiritual, resolvendo
perdas reais, mantendo a identidade intacta, promovendo o ministério de companhia,
para não deixar o paciente só, e atos ministeriais, provendo intervenções pastorais
especializadas.

Já na realidade europeia, as atividades do Serviço de Capelania Hospitalar


eram abrangentes e deviam estar presentes para os pacientes, familiares, pessoas
próximas a eles, visitantes e equipe de saúde. Entre as atividades do serviço estavam:
estimular a reflexão sobre a dimensão existencial e espiritual no sofrimento, doença e
morte; fazê-lo se lembrar da possibilidade de cura e a reconciliação do poder da
religião e fé, esforçar-se para identificar as necessidades espirituais das pessoas em
seus diferentes níveis religiosos e culturais, respeitando todas as crenças, proteger os
pacientes de uma atitude espiritual invasiva ou proselitismo, oferecer cultos
religiosos, rituais e sacramentos, de acordo com a religião tradicional de cada
paciente e ainda envolver-se em programas e discussões relativas aos aspectos
éticos101.

Foi realizada uma pesquisa em New York, em 2008, sobre a visita a pacientes
por capelães e seus familiares, em 13 instituições de cuidado de saúde, de 1994 a
1996. Constatou-se que o atendimento da Capelania, em uma situação grave, tende a
161
Resultados e Discussão

ser menos frequente, porém mais longo do que em situações crônicas. Em média, o
capelão gastou menos tempo com os pacientes que estavam sozinhos, do que com
aqueles que estavam com a família, durante a visita ou nas visitas a familiares
somente118.

Em outro artigo, mas referente à mesma pesquisa, 70 intervenções de capelães


foram registradas. A capelania usava intervenções religiosas/espirituais, sozinha, ou
em conjunto com intervenções gerais, na grande maioria das visitas aos pacientes e
familiares. O resultado documentou o papel único do capelão como membro da
equipe de saúde, e sugeriu que era um desejo, entre os pacientes, em geral, incluindo
aqueles que afirmaram não serem religiosos, receberem esse tipo de cuidado
oferecido pela capelania119.

O atendimento conjunto com a equipe de cuidados paliativos do IIER foi outra


atividade importante desempenhada pelo capelão da Capelania Evangélica. Depois de
algum tempo de atividade no IIER, o SCEH foi convidado a participar da Equipe de
Cuidados Paliativos, nas visitações aos pacientes, e de reuniões periódicas com a
equipe multiprofissional. Inclusive atendimento domiciliar foi realizado para
acompanhar o paciente em regime de cuidados paliativos, até o final da sua vida e,
em alguns casos, por solicitação da família, realizou-se a cerimônia religiosa no
funeral daquela pessoa.

Observou-se, nos depoimentos do capelão católico e da enfermeira


entrevistada para a presente pesquisa, que, aos poucos, o atendimento espiritual foi
sendo reconhecido e valorizado, tanto pelos pacientes como pelos profissionais de
saúde, o que é confirmado pelo convite, ao SCEH, para fazer parte da equipe de
cuidados paliativos do IIER.

Num encontro oficial com a direção da União Européia, em junho de 2005, a


delegação da Europeam Network of Health Care - ENHCC discutiu as dificuldades
da capelania na Europa e a importância do cuidado espiritual na doença. A União
Européia considerou que essa rede contribui também para o diálogo a respeito dos
cuidados paliativos na Europa, destacando a importância do cuidado espiritual nessa
área. Esse evento é tido como um marco, pois estabeleceu oficialmente relações com
outras organizações de capelania nos EUA, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e
Japão102.
162
Resultados e Discussão

Nos EUA, na UTI do Hospital Samaritano “Banner Good”, o programa de


cuidado a pacientes em cuidados paliativos foi considerado inovador, por envolver
profissionais de diversas áreas: médicos, enfermeiros especialistas em cuidados
paliativos, enfermeiras especializadas em dor, enfermeiros da UTI, capelães, serviço
social, farmacêuticos e musico-terapeutas120.

Apesar de não serem todos os hospitais dos EUA, e em menor escala no


Brasil, que possuem uma estrutura de recursos humanos especializada, com uma
equipe interdisciplinar, com capelães na sua composição, para o atendimento de
pacientes em cuidados paliativos, essa equipe, no IIER, funcionava nos mesmos
moldes dos hospitais de fora do país.

Em outro evento em 2006, as 42 organizações de 30 diferentes países que


foram representadas na European Network of Health Care – ENHCC para discutir o
direito do paciente referente à espiritualidade, com base nas orientações da
Organização Mundial de Saúde de 1994, estabeleceu, entre outros itens, que toda
pessoa tem o direito de ser respeitado na sua privacidade, moral, valores culturais,
religião e convicção filosófica, e todo paciente também tem o direito de receber
suporte espiritual e orientações durante todo o tempo de internação. A interpretação
dessa orientação tem causado divergências de entendimento no item referente ao
“direito de ser respeitado na sua privacidade” e “suporte para a orientação espiritual”.
A mesma orientação reconhece que é necessário ter um profissional habilitado e
treinado para o cuidado espiritual (capelão). Entretanto, não raramente, por
regulamentação das instituições de cuidado em saúde, esses profissionais são
proibidos de se aproximarem dos pacientes ou oferecer o suporte espiritual, ou as
orientações que eles necessitam. Em algumas instituições, os capelães não têm
permissão para acessar as informações do prontuário do paciente, impossibilitando
que o cuidado espiritual seja ministrado, em conjunto com o cuidado de saúde e,
portanto, impedindo que o paciente possa ser cuidado e tratado de uma forma
holística. Em outros casos, ainda, quando liberada a assistência, não é permitido, aos
capelães, o uso de qualquer tipo de vestimenta específica ou identificação. Tal atitude
demonstra postura de desrespeito frente à expressão da cultura e valores religiosos.
Os autores concluíram que, muitas vezes, nas políticas de cuidado de saúde, os
administradores hospitalares se empenham tanto em preservar a privacidade do
163
Resultados e Discussão

paciente e familiar, que acabam privando-os de seu direito de receber à assistência


espiritual, que inclusive era tida como terapêutica102.

A capelania na Europa é, portanto, organizada de diversas formas que são


regidas de acordo com a cultura, religião, sociedade e governo de cada país. A
ENHCC está unindo forças para tornar as capelanias nacionais um único corpo,
padronizando a organização e as ações das capelanias européias. Esse esforço esbarra
em dois maiores desafios: o status e reconhecimento profissional do capelão na
comunidade da saúde e a preservação do direito do paciente ao cuidado espiritual,
assim como a indicação do paciente certo para receber o cuidado espiritual. Contudo,
muito embora existam esforços na cooperação entre a comunidade de saúde e os
capelães, mais degraus têm que haver para construir uma ponte firme de comunicação
e colaboração entre os dois. Para a compreensão desses desafios, se faz necessário
entender pontos chaves dessa atividade. Entre os aspectos a serem analisados, está o
fato da religião e o cuidado de saúde, desde os tempos antigos, estarem sempre
interligados, e o fato da organização do serviço ser intimamente dependente da
cultura, religião e características governamentais de cada país da Europa102.

Outro tipo de atividade realizada pela capelania evangélica era desenvolvida


com os profissionais do IIER. A situação que a AIDS trouxe para o IIER, com muitas
mortes, de nove a 12 por semana, desgastava muito os profissionais, que faziam um
vínculo importante com os pacientes, por causa das freqüentes internações e logo os
perdiam. Essa situação tornou evidente a necessidade de se iniciar o atendimento
espiritual dos profissionais de saúde, em uma atividade denominada “Minutos com
Deus”. Esse trabalho consistia em reuniões, nos andares de internação, com quem
estava de plantão naquele dia, com tempo ao redor de sete minutos. Esse mesmo tipo
de trabalho era realizado com os profissionais da limpeza, que eram de empresa
terceirizada. Houve uma época em que a atividade foi proibida por ordem de um
diretor que assumiu a gestão depois de Guido Levi. Ele considerava que esse tipo de
atividade atrapalhava o trabalho, mas, como os funcionários insistiram, a atividade
voltou a ser oferecida a eles.

A equipe do SCEH era muito procurada pelos funcionários do hospital porque


percebiam que a equipe se interessava por suas vidas. Muitas vezes, a enfermeira que
deu depoimento para a presente pesquisa, encaminhou, ao SCEH, funcionários com
164
Resultados e Discussão

distúrbios de comportamento. Havia também palestras ministradas pela equipe do


SCEH para os funcionários, organizadas pelo Serviço de Educação Continuada em
Enfermagem do IIER. Os temas eram sobre qualidade de vida, culpa e excelência no
trabalho, e delas participaram elementos do SCEH, na qualidade de palestrantes.

As festas comemorativas faziam parte também das atividades desenvolvidas


pelas capelanias no IIER e eram realizadas, no início, em conjunto pelas duas
capelanias. Nos últimos anos estudados, as responsabilidades foram divididas. Eram
realizadas programações em datas especiais: dia do médico e da enfermeira, com
corais, programas musicais, palestras para profissionais de saúde, cartões, mensagens
escritas e artesanato com os pacientes e acompanhantes.

O SCEH realizava ainda bazares, com a finalidade de arrecadar roupas para os


funcionários da equipe de saúde e famílias dos pacientes com AIDS. A esse propósito
pode-se afirmar que a miséria, a fome e o desespero que podem advir do fato de o
trabalhador estar doente, sobretudo no caso dos que não recebem os benefícios sociais
instituídos, lhes mostram, na prática, que seu corpo é sua fonte de subsistência e única
estratégia de reprodução. Os sentimentos de desintegração social e o medo de ficar
doente e lhe faltar o reconhecimento que sempre lhe veio por meio do trabalho, lhe
marcam o corpo e o espírito82.

Ainda como atividades meio do SCEH, o trabalho da secretária consistia em


atender aos telefonemas, carimbar os folhetos que eram distribuídos aos pacientes,
mas também desempenhava atividades fim, como ficar à disposição para atender
pessoas que procuravam o SCEH, na sala da capelania, para conversar, aconselhar e
orar com e por elas. Também fazia parte da atividade da secretária, quantificar dados
sobre a literatura utilizada pela ACEH, para subsidiar a elaboração de relatórios.

Para formalizar a atividade desenvolvida pela capelania, foi implantado, pela


Comissão Gerenciadora dos Trabalhos Voluntários do IIER, um Termo de Adesão e
Compromisso de Voluntários, Ficha de Identificação Cadastral e Normas para o
Credenciamento de Prestadores de Serviços Voluntários no IIER, em 1999 (D22).

Constata-se que como o hospital, por ser uma organização muito complexa,
faz uso dos pressupostos do Weber, para burocraticamente funcionar. Nesse sentido
procura prever a ação social, que é intencional e pode ser prevista, e prescreve-lhe
formas de acontecer que permitam ao governo da instituição controlá-la.
165
Resultados e Discussão

No recorte temporal estudado, a assistência espiritual prestada pela Capelania


Evangélica era direcionada principalmente a pacientes com AIDS, atendendo às
peculiaridades do quadro nosológico como este se apresentava na época e seu
significado simbólico.

Minayo82assim define as chamadas doenças-metáforas:

“entende-se que sejam doenças catastróficas, com longa história de desenvolvimento


e de envolvimento com o imaginário social e mobilizem forças que suscitem medo
de extinção na sociedade. Como exemplo dessas doenças , estão a peste nos séculos
XVI e XVII, a tuberculose e a sífilis no século XIX, o câncer no Século XX e a
AIDS na contemporaneidade. [...] Do ponto de vista sociológico, são consideradas
categorias-síntese, porque conseguem criar um consenso a respeito da fonte dos
males na sociedade. Em geral são explicadas como parte das anomalias e catástrofes
sociais ligadas e frutos de transgressões individuais, provocando autojulgamento e
autopunição”.
Explica-se, dessa formaassim, porque, apesar da AIDS ser uma doença menos
prevalente que outras, o estigma que ela desperta, por atingir diretamente todas as
classes sociais, influencia na magnitude das decisões tomadas para seu controle.

Frente a isso pode-se concluir que, de acordo com Max Weber, a Capelania
Evangélica criou condições para o empreendimento de uma ação social, pois só é
ação social quando o ator atribui, à sua conduta, um significado, e esse se relaciona
com o comportamento de outras pessoas95. Assim, ficou evidente que o capelão fez
ação social e a Capelania fez ação no social.

O fluxo de solicitação do paciente para o atendimento espiritual de uma


capelania ou de outra, no IIER, funcionava com demanda livre, ou seja, era realizada
a visitação dos pacientes leito a leito, pelas capelanias, sendo que os pacientes tinham
a liberdade de aceitar ou recusar esse atendimento. Se houvesse solicitação do
paciente por outra denominação religiosa, a capelania que estava atendendo
providenciava o contato do líder religioso solicitado, por meio da comunicação com o
Coordenador do Serviço Religioso que, no caso, era o padre João Mildner.

Quando o paciente entrava pelo Pronto Socorro, a assistente social lhe


perguntava qual era sua religião e se aceitava visita religiosa. Outra forma de
solicitação era possível durante a visita do padre, ao paciente. Se este solicitasse a
visita do capelão evangélico, ele o chamaria e vice versa. O atendimento religioso era
uma atividade voluntária e não impositiva. Era um trabalho absolutamente voluntário,
por parte de quem o fazia e por parte de quem o recebia.
166
Resultados e Discussão

No caso de haver solicitação de visita para um paciente internado pelo líder


espiritual evangélico da igreja à qual este pertencia, o SCEH fazia a triagem,
acompanhando, orientando quanto às normas de biossegurança, normas do hospital e
rituais religiosos permitidos.

A solicitação também podia partir da equipe de saúde, constituída de


enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e médicos. O capelão evangélico era
chamado pela Enfermagem principalmente quando havia muito “sofrimento de alma”,
ou então, para atender pacientes graves que em poucas horas iriam morrer.

Em estudos realizados nos EUA em 2004, por Fogg, Weaver, Flannelly e


Handzo121, 81,74% das enfermeiras solicitavam, aos capelães, para assistirem
espiritualmente os pacientes, em compararelação com aos outros membros da equipe.
Os problemas mais comuns, para os quais os pacientes solicitaram o capelão foram
ansiedade, depressão, e aborto. A taxa de solicitação por paciente, durante o período
estudado, foi de 3,9 por 1000 pacientes internados.

Em outro estudo, uma amostra coletada em três instituições de cuidado de


saúde em New York, referente à documentação da capelania, foi examinada. Os
resultados indicaram que as fontes mais comuns de solicitação do serviço de
capelania foram também aàs enfermeiras, seguidas pelos próprios pacientes, com
poucas solicitações vindas dos médicos e assistentes sociais. O estudo mostrou que a
motivação para os pacientes solicitarem o atendimento de capelania foi o suporte
emocional, espiritual, de saúde, de relacionamento e quando houve mudanças de
diagnóstico e prognóstico. Embora as razões para que as solicitações variassem em
relação à fonte, a maioria dos pacientes o fizeram para obterem o suporte emocional,
seguido das questões espirituais. Os autores discutiram a relação entre a necessidade
de esclarecer o papel do capelão e do restante da equipe de cuidado de saúde 122.

Do ponto de vista legal, o decreto do governo de Estado de São Paulo de


1977, fixou normas também quanto à forma de assistência, que deveria reconhecer a
religião professada pelo paciente, quando da sua internação, e saber se ele pretendia
receber assistência religiosa, tendo estabelecido normas para o credenciamento de
instituições religiosas para prestarem assistência espiritual, nos órgãos de internação
coletiva. Entre essas normas, o texto legal indicava que, para prestar assistência, a
instituição religiosa deveria ser constituída regularmente e assumir o compromisso de
167
Resultados e Discussão

ater-se ao regulamento interno e normas disciplinares da instituição, preservando a


ordem dos serviços internos e vedando–se a prática de atos nocivos à integridade
física ou mental dos internados. A instituição de internamento deveria designar
dependência apropriada à prestação de assistência religiosa, que poderia ser utilizada
em regime de rodízio, caso ocorressem representantes de credos diferentes (D15).

A credencial para assistência religiosa podia ser cassada, por solicitação da


instituição, no caso da inobservância das disposições desse decreto, atuação contrária
à disciplina e à boa ordem dos serviços públicos envolvidos, quando houvesse
desvirtuamento das estritas finalidades a que visa a prestação de assistência religiosa,
observados os preceitos constitucionais de liberdade de consciência e de impedimento
à propaganda de preconceito de natureza religiosa. As instituições religiosas que
mantinham representantes nos estabelecimentos de internamento deveriam
comunicar, aos responsáveis por estes, a cessação da autorização de pessoa
anteriormente designada para prestar assistência religiosa (D15).

Essas normas e rotinas para a assistência religiosa que foram estabelecidas de


forma, tão específicas e de acordo com as características da população brasileira,
orientaram e em muito auxiliaram na organização da prestação da assistência
espiritual, principalmente em uma época tão conturbada e de difícil administração dos
serviços de saúde, como a do início dos tempos da AIDS.

Muitos anos depois, foi promulgada uma Portaria da Coordenadoria da Saúde


da Região Metropolitana da Grande São Paulo, datada de 17 de fevereiro de 2000,
sobre a assistência religiosa a pacientes em hospitais, estabelecendo a necessidade de
credenciamento dos representantes, para a prestação de assistência religiosa aos
pacientes, com prazo de 12 meses para renovação, com carta de apresentação pelo
órgão competente da entidade. Essa legislação estabeleceu, ainda, a necessidade de
criação de normas internas de cada unidade hospitalar, com dias da semana e horários
permitidos para a realização de cerimônias religiosas (D23).

Para avaliar o serviço religioso, a “American Protestant Hospital Association”


APHA e o “College of Chaplains” publicaram um guia de avaliação do Serviço
Pastoral, em 1981, nos EUA. Esse documento teve o propósito de ir ao encontro das
necessidades de administração do cuidado pessoal pastoral, oferecido pelas
instituições. O guia enunciou os princípios gerais dos Serviços de Cuidados Pastorais
168
Resultados e Discussão

para as instituições de saúde, estabelecendo que os hospitais deveriam ter bem


definido por escrito o plano para oferecer o serviço pastoral. Esse plano deveria
contemplar os seguintes itens: programas e condutas, o quantitativo de pessoal
treinado e adequado para prover o cuidado pastoral para a instituição, a qualificação
do diretor do serviço pastoral para implantar e administrar os programas do
departamento e estabelecer políticas e condutas documentadas116.

Num estudo realizado com 600 administradores hospitalares, de hospitais


listados em 1988, pela “American Hospital Association Guide to the Health Field”,
no qual, metade das instituições era sem fins lucrativos e metade era composta de
hospitais gerenciados por cCorporação aAmericana hHospitalar, não se constatou
diferença significativa entre os dois grupos de administradores, sobre a avaliação do
cuidado pastoral. Todos os administradores se preocupavam quanto à qualidade do
cuidado pastoral e quanto ao aspecto do valor do cuidado, o qual é pessoal e difícil de
ser quantificador123.

Outro estudo realizado em 1991, sobre o cuidado pastoral em capelania


hospitalar, versou sobre as diferenças entre católicos e protestantes. Num questionário
para os reclamantes do seguro, se perguntou sobre a avaliação do estado do seu
hospital em termos de cuidado pastoral e serviço social. Os resultados, incluindo a
classificação das necessidades espirituais encontradas, indicou que a família deu mais
importância para a visita do capelão do que o paciente, e os pacientes sentiram mais
necessidade de sacramentos do que a família. Concluiu-se também que os padres
católicos visitavam seus pacientes significativamente menos que os pastores
protestantes. Os pacientes católicos davam importância significativamente maior para
as visitas dos capelães do que os protestantes124.

Uma pesquisa foi realizada por um coordenador de satisfação do paciente em


um hospital com 225 leitos, com um cComitê de cuidados espirituais, para que se
fizesse mudanças efetivas para o aumento dos padrões de satisfação do paciente e
para o reconhecimento da “Press Ganey Associates” – uma agência de consulta de
satisfação. Esse hospital tinha 79 igrejas nas imediações, mas não tinha um capelão
no hospital, e não possuíam vinculação com instituição religiosa. Esse comitê
estabeleceu itens para melhorar o cuidado espiritual para os pacientes, que foram:
conseguir um lugar no hospital para que os ministros visitassem os membros da sua
169
Resultados e Discussão

igreja, providenciar, com os pacientes, uma lista atualizada das suas igrejas,
providenciar bíblias para todos os quartos dos pacientes e bíblias em CD para o
paciente que não pudesse ler, criar e distribuir pequenos folhetos sobre espiritualidade
no hospital. Os empregados do hospital ainda poderiam ir ao quarto do paciente para
orar com eles, se eles solicitassem, e formar um Comitê Consultivo de pastores125.

Os benefícios da capelania, avaliados em seguida, segundo os mesmos


pesquisadores, foram: a interação e confiabilidade com os capelães, a disponibilidade
dos capelães para oferecer uma resposta rápida e em tempo oportuno e o fato de
fazerem parte da equipe interdisciplinar e trabalharem lado ao lado dos funcionários.
Eles geralmente não eram percebidos como parte da hierarquia e as questões
discutidas com eles faziam parte de uma relação particular, individual e de confiança,
permitindo que a equipe se sentisse à vontade em ocasiões mais vulneráveis126.

Quanto aos instrumentos que avaliavam a qualidade da assistência prestada


pelas capelanias no IIER, o padre depoente refere que o próprio paciente dava esse
retorno, por meio de palavras de gratidão e de carinho, que estes tinham por eles, o
que, segundo o padre, era a melhor forma de avaliar o trabalho da capelania católica.
Também havia relatórios formais que as capelanias faziam, indicando o número de
atendimentos, e as atividades realizadas.

Uma experiência interessante foi realizada no período de 2000, quando houve


a reforma no Sistema de Saúde na Austrália e foram aferidos os efeitos dos
programas de capelania nos hospitais. Foi observado que os programas de capelania
hospitalar trouxeram benefícios econômicos para as instituições de saúde, e essas
tiveram seu recurso financeiro bem empregado. O custo do capelão já era baixo pela
qualidade que tinha e trazia beneficio terapêutico para a equipe de saúde, além de ser
um serviço voluntário, portanto, sem custo127.

Para Keegan128, nos EUA, todos os chefes de departamento e os diretores do


departamento de cuidado pastoral devem realizar orçamentos e empreender
negociações para aprovação das fontes de receita e alíquotas de despesas. Depois de
estabelecidas as metas, de acordo com os recursos necessários, quantitativos e
qualitativos, o diretor é capaz de relatar a produção do seu serviço. O maior custo é
relacionado aà manutenção de pessoal, seguido dos suprimentos.
170
Resultados e Discussão

Entre os documentos coletados para a presente pesquisa, foi encontrado um


relatório da ACEH de 2002(D24), que apresentava as atividades desenvolvidas, em
2001 pela Capelania Evangélica do IIER. Esse relatório foi enviado para o
Mapeamento das Iniciativas Humanizadoras e Ações contra a Violência na Saúde,
coordenado pelos Institutos de Pesquisa – CIP, da Secretaria Estadual de Saúde. O
relatório, além de apresentar os objetivos do serviço religioso, informava a quem a
assistência espiritual era oferecida, de que forma, o que se oferecia como
complemento, que eram a assistência social, emocional e recreativa, na área científica
e na área educacional.

O relatório descreveu a população atingida, área geográfica, órgão executor,


que era a ACEH, e parcerias empreendidas com a Sociedade Bíblica do Brasil, o
Instituto Presbiteriano Mackenzie, a Aliança pró Evangelização de Crianças, a
Editora Mundo Cristão e diversas Igrejas. O volume e fonte de recursos, proveio
principalmente da Sociedade Bíblica, com doação de aproximadamente de 6000
exemplares de publicações por mês para o IIER, incluindo Bíblias para adultos e
crianças, doação de R$1050,00 (mil e cinquenta reais) mensais para o sustento de três
secretárias, elaboração e confecção de todo material gráfico para a divulgação dos
cursos e eventos especiais. Do Instituto Presbiteriano Mackenzie, a SCEH recebeu a
doação de 30 cestas básicas mensais, fraldas e leite, por ocasião de trote de calouros
(aproximadamente uma1 tonelada), e pagamento de auditórios especiais para cursos
para os profissionais da saúde (D24).

Esse relatório era bastante abrangente, pois apresentou os resultados dos quase
dez10 anos de SCEH no IIER, que foram: humanização do ambiente hospitalar,
enfrentamento da morte, qualidade de vida, melhor aceitação do tempo de da
hospitalização, redução do tempo de hospitalização, engajamento no tratamento
médico, cooperação com os profissionais da saúde, aprendizado de uma profissão
para os pacientes por meio dos artesanatos, mudança de hábito de vida, valorização
do ser humano e valorização do atendimento hospitalar. Apresentaram ainda, as
dificuldades encontradas em relação à falta de refeições oferecidas pelo IIER, aos
voluntários, bem como a falta do vale transporte, pois se tratava de pessoas de baixa
renda (D24).
171
Resultados e Discussão

Finalmente, esse relatório indicou as perspectivas futuras, que eram: ampliar o


ministério de Capelania Evangélica para outras instituições e grupos, alcançando os
médicos, em seu atendimento diário, ajudando-os a ter melhor estrutura emocional e
espiritual para lidar com a morte, diminuindo seu estresse e aumentando a qualidade
de seu atendimento.

Foi aplicado também pelo SCEH, um questionário nos dias 10 e 11 de junho


de 2002, com 89 entrevistados, sendo 42 pacientes, 14 familiares e 33 funcionários,
que apresentou os seguintes resultados: 85 tinham religião, destes 40 eram católicos,
38 evangélicos, quatro4 se declararam apenas cristãos, um1 budista, um1 do
candomblé e um1 espírita. 54 eram praticantes, 52 com freqüência nos encontros
religiosos de uma vez por semana ou mais. Foram realizadas 43 vistas no leito dos
pacientes e oito8 aconselhamentos a funcionários. 52 responderam que foram
respeitados na sua crença e dois2 não. 39 perceberam melhora em sua saúde por
causa do atendimento espiritual e 68 recomendariam esste atendimento a outro
paciente (D25).

O contexto da espiritualidade na saúde tem recebido crescente atenção das


publicações científicas em periódicos. Dentre essas produções destacam-se as
assinadas por duas organizações de cuidado de saúde muito influentes, a “Joint
Commission on Accreditation of Heathcare Organization (JCAHO)” e a “Press
Ganey Company”, organização que pesquisa a satisfação de paciente. A JCAHO
estabeleceu claramente que o atendimento às necessidades emocionais e espirituais
são importantes para as necessidades físicas e psicológicas. Além disso, esses valores
do paciente podem afetar como ele responde ao cuidado. De acordo com a Press
Ganey, a melhor amostra de avaliação, “é a existência de um relacionamento
significativo entre a satisfação do paciente e a sua necessidade emocional\espiritual”,
o que é vantajoso para o hospital120.

Frente a outros serviços oferecidos pelo hospital aos pacientes, a assistência


espiritual desenvolvida por uma capelania requer principalmente recursos humanos
que, embora qualificados, têm sido obtidos de forma voluntária. Os recursos físicos e
os insumos materiais necessários àá atividade, são diminutos, em comparação com
outros tipos de assistência e, na capelania em foco, no período estudado, foram
ofertados por organizações sociais externas à instituição hospitalar. Assim, pode-se
172
Resultados e Discussão

dizer que a instalação do serviço de capelania evangélica do IIER, não foi


influenciada por restrições de natureza orçamentária, pela própria natureza desses
serviços, pelo apoio que recebeu através da ACEH e pelas disposições legais que a
regularam.

5.2.4 Relacionamento Interno e Externo do SCEH

Essa categoria apresenta a inter-relação de pessoas, serviços e instituições,


internos e externos ao IIER, com quem o SCEH se relacionou para construir seus
alicerces, corroborando Weber, quando afirma que a sociedade é fruto de uma inter-
relação de atores sociais, em que as ações de uns são reciprocamente orientadas em
direção às ações dos outros, considerando o papel do indivíduo e das suas ações na
construção da realidade.

O SCEH subordinava-se diretamente ao diretor geral do IIER, da mesma


forma como acontecia no HCFMUSP, onde o SCEH respondia diretamente ao
superintendente. Pelo estatuto do IIER, o SCEH também poderia fazer parte de várias
comissões. Dois anos depois, da criação do SCEH no IIER, a Cúria Metropolitana
Católica, que também era responsável pela Capelania Católica do HCFMUSP,
indicou o padre João Mildner para ser o capelão católico do IIER. O relacionamento
entre a Capelania Católica e o diretor geral do IIER, naquela época, não era bom. No
início, o padre tentou colocá-lo contra o SCEH, porém, o diretor conhecia o trabalho
da Capelania Evangélica, mantinha bom relacionamento com seus agentes e não
houve nenhuma mudança quanto à estrutura das capelanias.

Em muitos hospitais nos EUA, em 1985, o clérigo de cuidado pastoral se


reportava ao administrador ou a quem estava no nível de vice-presidente. O nível ao
qual o capelão hospitalar se reportava era uma combinação de fatores, mas era,
principalmente, em função da estrutura organizacional interna e da especificidade da
instituição100.

A relação do SCEH, com a diretoria, na pessoa de Guido Levi, foi muito boa.
Foi uma relação de confiança, amistosa e próxima, pois havia reconhecimento da
importância e competência gerencial do SCEH. As duas capelanias, católica e
173
Resultados e Discussão

evangélica, se subordinavam diretamente à diretoria do IIER, porém, na época em


que Guido Levi foi diretor, havia um relacionamento distante, pouco cooperativo e
com muitos problemas, em relação à Capelania Católica.

Apesar de não ter um bom relacionamento com a direção do IIER, a Capelania


Católica sobreviveu no IIER, pois tinha, segundo a teoria de Max Weber, uma
atribuição de vigência legítima de uma ordem que, em virtude da tradição e da
hegemonia da Igreja Católica, a legitimava.

A Capelania Evangélica era um serviço instituído, mas não formalmente, pois


não havia nenhum documento formalizando a prática da assistência religiosa, o que
foi relatado no depoimento da enfermeira entrevistada, que recebeu apenas um
comunicado sobre a disponibilização de duas salas para as capelanias evangélica e
católica.

Na visão dessa enfermeira, o padre João Mildner era muito querido pela
administração e circulava com desenvoltura pelo hospital. Foi acolhido também pela
equipe médica e de enfermagem. Nunca presenciou nenhum desentendimento entre as
capelanias que, aparentemente, tinham bom relacionamento, prova disso que, na
morte de funcionários, as duas capelanias se faziam representar, e isso era visto como
uma forma ecumênica de capelania.

A esse exemplo desse bom relacionamento do representante da Capelania


Católica, pode-se aplicar o que Weber afirma: “a validade de uma ordem, no mérito
de caráter sagrado da tradição, é a forma mais universal e primitiva de legitimidade”.
Assim, o temor a determinados prejuízos decorrentes da presença de outras religiões
fortaleceu a manutenção da ordem vigente, cooperando na direção da conservação do
do Serviço da Capelania Católica e seu representante, ao mesmo tempo em que
estabeleceu a tolerância e aceitação da Capelania Evangélica no IIER, em nome do
ecumenismo.

Quanto ao relacionamento entre as capelanias, católica e evangélica, é


interessante observar que, do ponto de vista do padre da Capelania Católica, a
Capelania Evangélica tinha uma presença marcante e positiva no IIER, tanto com os
profissionais como com os pacientes. Para ele, a convivência entre as capelanias
dentro do hospital era maior do que entre as paróquias católicas e igrejas evangélicas,
pois era uma convivência cotidiana. Também apresentou, em seu depoimento, uma
174
Resultados e Discussão

vivência de relação entre as capelanias católica e evangélica marcada pela


fraternidade, sem nenhuma dificuldade administrativa ou de comunicação,
ressaltando ainda que, se concorrem, é no sentido positivo, para prestar a melhor
assistência ao paciente.

Essa percepção e afirmação é totalmente contrária ao que a depoente da


Capelania Evangélica relatou. Talvez essa impressão seja dos tempos atuais, pois ele
citou um relacionamento fraterno atual com a Capelania Evangélica, que pode estar
se referindo aos capelães atuais do IIER, mas, depois acabou se contradizendo,,
relatando que, ao chegar a São Paulo, sem explicitar se no HCFMUSP ou no IIER,
teve um choque muito grande, vendo a idéia de competição entre as duas religiões.

O relacionamento das Capelanias Católica e Evangélica com a equipe de


saúde do IIER se desenvolveu de forma diferente. No começo da atuação da
Capelania Evangélica no IIER, a diretora de Enfermagem tinha um bom
relacionamento com a capelã Eleny e valorizava o trabalho da Capelania Evangélica,
bem como a psicóloga.

Do ponto de vista da Capelania Evangélica, o relacionamento de seus agentes


com a equipe de enfermagem, desde o início, sempre foi muito bom. No primeiro dia
que Eleny entrou no IIER, foi acompanhada pela enfermeira do Serviço de Educação
Continuada e apresentada à equipe de enfermagem em cada unidade do hospital, em
que informava ter a capelã livre acesso aos prontuários dos pacientes e, também, a
todo material de paramentação necessário para as visitas aos pacientes.

Já a relação da Capelania Evangélica com os funcionários da Enfermagem, do


ponto de vista da enfermeira depoente, era tumultuada, pois os funcionários achavam
que a equipe da capelania atrapalhava o atendimento ao paciente. Nessa avaliação,
tinha que ser considerado que havia preconceito e julgamento moral dos funcionários,
quanto aos pacientes com AIDS, principalmente com os pacientes homossexuais e
consumidores de drogas. Havia também a sobrecarga de trabalho e muitas pessoas
circulando, causando tumulto no ambiente. EDessa forma, essa situação, tornava
desfavorável a aceitação da equipe de capelania, como também de outros
profissionais, como assistentes sociais, além de estudantes de várias áreas
profissionais.
175
Resultados e Discussão

À medida que o tempo foi passando e a equipe de Capelania Evangélica foi


sendo profissionalizada, por meio dos cursos, adaptando-se ao perfil dos pacientes, a
aceitação da equipe de capelania, pela equipe de enfermagem, foi sendo conquistada,
tanto que a enfermeira depoente foi convidada, pela Capelania Evangélica, para
ministrar aula sobre biossegurança, nos cursos que a ACEH oferecia aos voluntários
da capelania. A enfermeira também intermediou a relação da Capelania Evangélica,
com o Serviço de Educação Continuada da Enfermagem, para que esta participasse da
Semana de Enfermagem – evento muito valorizado por esse grupamento profissional,
realizando palestra sobre o atendimento ao paciente terminal.

Muitas vezes, a Enfermagem solicitava a presença da Capelania Evangélica


para realizar um atendimento em situação especial, personalizado, com o paciente em
determinadas condições de saúde: quando havia “sofrimento de “alma”, problemas
espirituais e quando o paciente estava muito grave, com poucas horas de vida.

Na visão do diretor médico entrevistado, Guido Levi, a assistência religiosa


dignificava o paciente, mas tinha que ser um atendimento que o paciente aceitasse
voluntariamente e não de forma impositiva. Isso foi muito importante naquela época
da AIDS, pois havia muito preconceito e o paciente ficava isolado física e
mentalmente. Depois da sua gestão como diretor geral do IIER, os diretores médicos
que o sucederam mudaram algumas condutas administrativas, mas sempre houve
permissão para o atendimento religioso aos pacientes.

Por muitos anos, o modelo prevalente de capelania no cuidado da saúde nos


EUA, foi de uma prática isolada, visitando e orando com pacientes e familiares.
Existia pouca interação entre o processo de cuidado do paciente e a equipe médica.
Nas últimas décadas, tem sido vivenciada uma importante mudança nos papéis dos
ministros de capelania hospitalar. As mudanças no local do atendimento dos
pacientes também ditaram, aos capelães, a adaptação necessária e a expansão de sua
atuação para clinicas, domicílios e outros ambientes. No final da década de 2000,
observou-se que os serviços de capelania acompanharam não só as mudanças do
ambiente de cuidado, mas também a expansão do cuidado holístico e das
necessidades espirituais dos pacientes, como parte a ser considerada na instituição da
terapêutica. Nesse sentido, vários resultados de pesquisas validaram os benefícios do
176
Resultados e Discussão

cuidado pastoral e os capelães usaram a oportunidade para futuras pesquisas,


escrevendo e dialogando com seus colegas, de disciplinas médicas, sobre o tema107.

Por outro lado, em 2008, foi exigido, dos serviços de capelania hospitalar,
uma ampla atuação que permeasse aspectos administrativos como o reconhecimento
da organização da instituição hospitalar, a habilidade de negociação com
administradores, a participação em Comitês de Ética, o envolvimento em programas
de educação para médicos e enfermeiras e a advocacia em departamentos
orçamentários, entre outras funções. O aumento das atividades, bem como o papel e o
lugar que hoje a capelania hospitalar ocupa nos EUA, proporciona grandes benefícios
para aqueles a quem a servem, provendo o cuidado para a família e para a própria
instituição. Esses benefícios incluem: cuidado espiritual competente, diálogo entre o
capelão e o pessoal de saúde e um relacionamento colaborativo entre capelães e
administradores, que possa ajudar a instituição a permanecer focada em sua
missão107.

Observou-se, também, que as dificuldades de relacionamento da Ccapelania


Evangélica com as equipes de saúde, no início da implantação do SCEH, não eram
uma dificuldade experimentadas apenas no Brasil. Nos EUA, a aceitação dos serviços
de capelania também enfrentou dificuldades, com problemas de relacionamento, no
início da sua implantação nos hospitais, mas, depois, com o tempo, os serviços de
capelania hospitalar se estabeleceram107.

O SCEH no IIER se relacionou de várias formas, com quase todos os serviços


internos do IIER. Relacionou-se com o Serviço de Higiene, que era terceirizado, com
o Serviço de Enfermagem, Serviço Médico, Serviço de Nutrição, Serviço Social e
Serviço de Psicologia. O Serviço Social apoiava o trabalho desenvolvido pela
capelania e valorizava o atendimento de assistência espiritual e social que ela
realizava.

Do relacionamento entre os serviços internos do IIER, com o SCEH, houve


dois que se destacaram: o Comitê de Ética em Pesquisa, de que a capelã titular
participou por quatro anos, e a Equipe de Cuidados Paliativos, de que, no início, só o
SCEH participava e, depois, contou também com um representante da Capelania
Católica.
177
Resultados e Discussão

A Equipe Interdisciplinar de Cuidados Paliativos do IIER foi oficializada em


1999 e sua metodologia de trabalho era o atendimento multiprofissional, com
abordagem global a todos os sofrimentos na esfera física, psicossocial e espiritual, ao
paciente e ao cuidador, e reavaliações diárias de pacientes internados e atendimento
semanal de pacientes ambulatoriais129.

Quanto aos cursos, o IIER promoveu vários, pelo Departamento de


Humanização e pela Equipe de Cuidados Paliativos, para os quais sempre
convidavam a Capelania Evangélica a dar sua contribuição.

Desenvolveu-se também uma atividade, a partir da Equipe de Cuidados


Paliativos do IIER, por solicitação do Ministério da Saúde, para que fossem
preparados, por eles, cursos sobre cuidados paliativos, para serem ministrados em
instituições de saúde de outros Estados.

A Equipe de Cuidados Paliativos começou a ministrar cursos em várias partes


do país, sensibilizando as pessoas e depois oferecendo o curso. O Ministério da Saúde
trazia os profissionais da saúde de cada hospital, assumindo totalmente os custos
deles com hospedagem, passagem e também remunerava a equipe.

Eleny, como capelã titular da ACEH do IIER, relacionou-se com várias


instituições dentro e fora do IIER. Uma das instituições de que ela participou, externa
ao IIER, foi o CONAIDS - Conselho para Assuntos da AIDS do Estado de São Paulo,
criado pelo governador, no final de 1989, doa qual Paulo Augusto Ayrosa Galvão era
presidente. Para compor o conselho, era preciso um representante da sociedade civil.
A indicação para este cargo estava entre Eleny e Leo Pessini que, naquela época, era
capelão do HCFMUSP. Eleny foi então indicada para assumir o cargo, ficando nele
por volta de quatro anos103.

Pode-se observar, com a indicação de Eleny para fazer parte do CONAIDS,


que, desde aquela época, já se sentia a necessidade da presença de um capelão, nas
comissões de caráter bioético, principalmente pela formação tão específica que o
capelão tem no campo da antropologia, filosofia e teologia, com ênfase nos
relacionamentos pessoais em situação de crise.

As reuniões se davam no IIER, na Casa Rosada. Era discutida ali a política do


Estado, e os membros do Conselho eram referência para o governador. Eram dados
178
Resultados e Discussão

vários cursos para os componentes do CONAIDS, como de didática, com várias


técnicas diferentes de ensino, e aprofundamento sobre AIDS. Depois de algum
tempo, o Ministério da Saúde oficializou-os como uma equipe de referência em
cuidados paliativos em AIDS.

Outro relacionamento externo da Capelania Evangélica foi com o Hospital do


Servidor Público Estadual, através da sua Equipe de Cuidados Paliativos que, por
solicitação da coordenação médica, pediu ao SCEH a indicação de uma capelã com
experiência no atendimento espiritual a esse tipo de pacientes do IIER, para integrar a
sua equipe. Nessa época, foi indicada uma capelã com experiência nessa área, que lá
permanece atendendo até a atualidade [2011].

Um dos resultados dos relacionamentos externos que o SCEH teve está


documentado em carta enviada ao Diretor do CRT-AIDS, por pacientes e médicos,
datadaos de 13 de março de 2000 (D26), quando, constatando que o IIER havia se
tornado um Centro de Formação de Recursos Humanos na área de Capelania
Evangélica Hospitalar, solicitaram a abertura de serviços análogos no CRT-AIDS.

Mas, apesar dessa estrutura de cursos, muitas pessoas que entravam


precisavam abandonar o voluntariado por dificuldade em conciliar o emprego com o
atendimento na capelania, e também por dificuldades financeiras. Cada pessoa
realizava atividades por um período de três dias na semana. Alguns desses voluntários
eram mantidos financeiramente pelas igrejas às quais pertenciam, que ofereciam, pelo
menos, recursos financeiros para o transporte. Outros não dispunham de qualquer
ajuda.

Essa dificuldade financeira muitas vezes foi um dos grandes impedimentos de


dedicação total dos voluntários e capelães ao SCEH. Por mais que desejassem atuar
na assistência religiosa e tivessem a vocação ministerial para tal atividade, a ação
social tem limites condicionados pelas prioridades relativas às necessidades
essenciais.

Já os recursos materiais próprios da atividade pareciam ser mais fáceis de


obter. Para serem distribuídos aos pacientes atendidos, o SCEH fazia a aquisição de
folhetos com mensagens de consolo e esperança, baseadas na Bíblia, já que a entidade
que o sustentava, a ACEH, possuía uma parceria com a Sociedade Bíblica e outras
editoras. A enfermeira depoente, que além de trabalhar no IIER, lá acompanhava
179
Resultados e Discussão

estágio de alunos de graduação em enfermagem de duas universidades distintas,


promovia o contato das alunas das universidades com a Capelania Evangélica, para
que estas relatassem seu atendimento aos pacientes. Ao final, o SCEH oferecia, a
esses alunos, um exemplar do Novo Testamento.

Mas nem sempre as relações do SCEH com instituições externas ao IIER


foram amistosas. Quando Eleny realizava a função de “triadora oficial” de líderes
evangélicos que visitavam os pacientes no IIER, houve um problema com
determinada denominação evangélica. Ela desempenhava essa função, com ótimos
resultados, quanto ao relacionamento com a Diretoria e outros evangélicos, porém,
houve uma situação política, na época de eleições para o executivo estadual, em que o
governador autorizou diretamente a entrada de líderes religiosos, para atender alguns
pacientes, por solicitação de uma rede de comunicação de massa, por interesse em
conquistar apoio para a eleição, desautorizando tanto a diretoria do IIER, como a
coordenação do SCEH.

Com outras instituições mais próximas do IIER, a influência se fez sentir de


maneira mais rápida e contundente, como na saída do SCEH do HCFMUSP, que teve
impacto direto no SCEH do IIER. Aconteceu que, por mudança do superintendente
do HCFMUSP, que tinha importante relacionamento com a Capelania Evangélica, e a
entrada de outra diretoria, que alterou o estatuto do HCFMUSP, quanto ao
atendimento religioso do hospital, outra visão da estrutura das capelanias se impôs
quanto à estrutura das capelanias. Entendiam que deveria haver só um Serviço de
Atendimento Religioso, em um local para todos os credos, configurando-se, assim,
um Serviço de Atendimento Religioso Ecumênico. Após vários esforços com o
objetivo de realizar uma composição que fosse boa para as capelanias, mas que se
revelaram insatisfatórios, elementos do SCEH do HCFMUSP, saíram de lá e foram
somar-se ao SCEH do IIER.

Assim, em Informativo de 25 de agosto de 2004, o SCEH declarou que, por


motivos alheios à sua vontade, o ministério da equipe do SCEH do HCFMUSP,
composto por 60 voluntários, seria desativado no dia 30 de agosto de 2004, posto que
seus princípios e padrões não se compatibilizavam com a nova estrutura
organizacional instituída a partir da Ordem de Serviço no 25/2004, que reformulava a
180
Resultados e Discussão

prestação de assistência religiosa e dava nova denominação à Capelania do Complexo


HC (D27).

Quando a Diretoria do IIER em que o SCEH havia sido criado mudou, e


entrou Sebastião André de Felice, que passou a ser o diretor geral do IIER, este foi
influenciado novamente pelo padre João Mildner e criou a Coordenação do Serviço
Religioso, designando-o, oficialmente, como Coordenador do Serviço Religioso do
IIER, publicando, no Diário Oficial, essa designação. Administrativamente, a
Capelania Evangélica passou a responder ao padre João Mildner, que era o
coordenador, e este ao diretor geral do hospital. A razão citada pelo padre João
Mildner para a criação da coordenação, foi de que havia dificuldade de
relacionamento do IIER, com alguns grupos pentecostais.

As relações do SCEH com a Ddiretoria do IIER mudaram, com se vê na


Portaria 002/92, que foi revogada por outra Portaria, de no 17/2003, do Diretor
Técnico de Departamento de Saúde do IIER, Sebastião André de Felice, em 14 de
novembro de 2003, estabelecendo que a Capelania Evangélica estava subordinada ao
Coordenador do Serviço Religioso do IIER, padre João Inácio Mildner (D28). Essa
mudança de relações do SCEH com a diretoria do IIER ocorreu na mesma época em
que o SCEH saiu do HCFMUSP.

Na Portaria no 19/2004, pode ser constatada como essa medida foi tomada. O
diretor técnico de Departamento de Saúde do IIER, Sebastião André de Felice, do
IIER, comunicou que “o padre João Inácio Mildner, da Capelania Católica, passou, a
partir da presente data, a ser o representante, junto à Diretoria Técnica, das entidades
religiosas que assistem os pacientes do IIER, devendo, em conjunto com os demais, e
no prazo de 30 dias, apresentarem normas internas e rotinas das citadas atividades
(D29). Sete dias depois, em 24 de março de 2004, o padre João Inácio Mildner
apresentou, ao Diretor Técnico do IIER, as Normas para Assistência Religiosa e as
Normas a serem seguidas pelos Auxiliares das Capelanias no IIER, que vigoram até a
atualidade [(2011]) (D30).

É interessante observar que três meses depois da indicação do padre João


Mildner para Coordenador do Serviço Religioso do IIER, restringindo o acesso direto
do SCEH à diretoria do hospital, no HCFMUSP, houve a reformulação da prestação
de assistência religiosa e, em julho de 2004, foi documentado, no Encarte de Atos
181
Resultados e Discussão

Administrativos do Boletim HCFMUSP, Ordem de Serviço no 25/2004, em que o


superintendente, Dr. José de Camargo Teixeira, determinou nova denominação à
“Capelania do Complexo HC”, alterando-a para “Comitê de Assistência Religiosa” –
CARE (D31), tornando o serviço religioso ecumênico, no sentido de juntar as duas
capelanias, católica, e evangélica.

Assim, tanto num como no outro hospital, a mudança ocorreu de forma a, e


lhes causar perda de identidade de serviço para as capelanias evangélicas, além de
tolher, em parte, sua autonomia. Pode-se inferir, sobre esses acontecimentos, que,
como as instituições hospitalares, HFMUSP e IIER, tinham relação próxima e os
Serviços de Capelania Católica e Evangélica também, as mudanças de política de
funcionamento no HCFMUSP se refletiram diretamente no SCEH do IIER..

Pode-se inferir, sobre esses acontecimentos, que, como as instituições


hospitalares, HFMUSP e IIER, tinham relação próxima e os Serviços de Capelania
Católica e Evangélica também, as mudanças de política de funcionamento no
HCFMUSP se refletiram diretamente no SCEH do IIER.

Weber explica essa forma de acontecimento e relacionamento como o tipo


mais puro de uma validade racional, com mudanças de valores, que é representada
pelo direito natural. A forma de legitimidade hoje mais corrente é a crença na
legalidade, que é traduzida pela obediência a preceitos jurídicos de estatutos vigentes,
segundo os procedimentos usuais e formalmente corretos. Em resumo, por meio de
ato legal se estabeleceu, em ambas as instituições - IIER e HCFMUSP, os limites
para a representação das duas capelanias lá operantes e a supremacia da Capelania
Católica sobre a Evangélica, no IIER.

Os eventosfatos apresentados demonstram a influência das políticas


institucionais, na política da assistência religiosa e os movimentos de resistência
empreendidos. De fato, pode-se afirmar que, apesar da supremacia política da
Capelania Católica, a implantação do Serviço de Capelania Evangélica Hospitalar no
IIER prosseguiu, causando grande impacto nos valores, costumes e crenças, dos
atores sociais envolvidos nesse processo histórico de doze anos de assistência
espiritual no IIER.

Os relacionamentos internos, e sobretudo os externos do SCEH no IIER, e o


vínculo e respaldo administrativo da ACEH, proporcionaram recursos materiais,
182
Resultados e Discussão

humanos, e financeiros, dando visibilidade e colaborando na instalação do SCEH no


IIER.

A ação racional é o cerne do pensamento de Max Weber, em que a


racionalização, vista como o “desencantamento” histórico do mundo, separa a
dimensão religiosa das estruturas morais e legais da ordenação da vida social, que,
observada sobre o aspecto “macro”, manifesta-se na burocratização das formas de
dominação carismáticas e tradicionais e, num enfoque “micro”, indica a noção de
racionalidade da ação individual como o tipo ideal para a compreensão da ação
social130.

Constatou-se também que a utilização do postulado “tipo ideal” de Max


Weber, auxiliou na interpretação dos achados da presente pesquisa, mostrando-se
adequado, na medida em que a sua utilização serve para selecionar e explicitar a
dimensão do objeto que veio a ser analisado – a Capelania Evangélica Hospitalar no
IIER – para depois poder apresentar essa dimensão de maneira pura, preocupando-se
com a objetividade da investigação. Pode-se, assim, construir o tipo ideal de
Capelania Evangélica Hospitalar, vinculada a realidade concreta, como se acabou de
demonstrar.
182
Conclusão

6 CONCLUSÃO

Aqui se elenca, àa guisa de conclusão, uma síntese dos principais achados e


interpretações correspondentes, resultantes da presente pesquisa.

O fato deflagrador da criação do SECH do IIER foi a solicitação dos Gideões


para que o Novo Testamento fosse lá distribuído por uma capelã com experiência no
ambiente hospitalar, o que resultou numa sucessão de acontecimentos que
propiciaram o início desse trabalho.

É preciso reconhecer, no entanto, que a saída de membros do SCEH do


HCFMUSP favoreceu a viabilização da instalação do SCEH no IIER porque os
recursos humanos se deslocaram desse para o último. Além disso, a situação lá
encontrada os motivou a desenvolver o novo serviço e, assim, a conjuntura
desfavorável, em que não havia uma equipe numerosa, disponível e especialmente
preparada quantitativamente e qualitativamente, para enfrentar as circunstâncias tão
difíceis que se apresentavam no IIER, em pouco tempo, foi transformada.

O cenário foi favorável porque eram tempos de AIDS. Essa circunstância fez
com que o SCEH obtivesse sucesso porque respondeu às necessidades sociais
presentes no início da doença e os primeiros esforços para o seu controle. De fato, ao
tempo em que se valorizava a assistência espiritual nos tempos da AIDS, porque, na
verdade, terapeuticamente os resultados não eram muito bons, e não havia muito o
que oferecer, por outro lado, também se reconhecia que valorizar exclusivamente o
lado espiritual poderia levar a enganos que inclusive prejudicariam a aderência do
paciente ao pouco arsenal terapêutico de que se dispunha para oferecer.

As atividades desenvolvidas pelo SCEH tinham todas um propósito vinculado


aos valores morais e às questões espirituais que eram defendidas pelo pensamento
protestante, que orientavam o funcionamento daquela capelania.

O pensamento era de que a doença oferecia uma oportunidade das pessoas


experimentarem a vivência espiritual. Não era um mal só do corpo ou uma desgraça
que havia acometido o doente; essa doença tinha uma dimensão social, que trazia
implicações importantes para a vida do doente e sua família, cabendo, à comunidade,
lhes dar suporte, não só no plano espiritual, mas também emocional e material, o que
183
Conclusão

encerra um suporte social e psicológico, no sentido de fazer com que a pessoa não se
sentisse tão só e desamparada. A ação do SECH se estendeu para esse território
também.

O SCEH orientava seu trabalho na crença de que, apesar da doença ser um


sofrimento, propiciava a vivência de uma experiência espiritual, já que, na leitura
cristã, se Deus permitiu essa doença é porque a pessoa, de alguma forma, precisava
vivenciar essa situação para conquistar o amadurecimento espiritual. Por outro lado,
isso não precisava ser vivido solitariamente.

Assim, as atividades implementadas, todas com objetivos definidos voltados à


assistência espiritual e baseadas nos valores cristãos, abrangeram os pacientes, seus
familiares e profissionais do hospital, atingindo a instituição hospitalar como um
todo.

Essas atividades desenvolvidas pelo SCEH foram estrategicamente


planejadas, tornando-se efetivas e eficazes, promovendo consolo e conforto espiritual
profundo, provocando mudanças de comportamento e ressignificação de valores
permanentes, reposicionando essas pessoas frente às grandes questões existenciais.

A idéia de que a assistência espiritual começava a ser parte da assistência ao


paciente também fez com que o capelão pudesse ser convidado para ser integrante da
Equipe de Cuidados Paliativos, uma outra atividade muito prestigiada e necessária,
que teve repercussões externas.

Pelo seu espectro de abrangência e resultados alcançados, a convivência do


SCEH com outras religiões não foi pacífica. De fato, sendo o hospital uma micro
representação da sociedade, já que é uma instituição social, nele o SCEH teve que se
haver com uma religião dominante e, ao mesmo tempo, num ambiente cultural de
sincretismo religioso. Apesar disso, a Capelania Evangélica prosperou no IIER, não
só porque a carência de assistência espiritual era muito grande, mas porque o que ela
oferecia eram respostas a questões difíceis, uma conversa que poucas pessoas
estavam preparadas para ter, consolo para todos que o quisessem e atendimento
pessoal profundo, não com fórmulas prontas, mas de acordo com as necessidades
encontradas, criando laços de relacionamento e confiança, oferecendo, ao assistido, a
certeza de não estar só.
184
Conclusão

O SCEH fez um vínculo com o paciente de natureza profissional. Ofereceu,


para o paciente, assistência que atendia ao seu sofrimento como um remédio eficaz,
que respoatendia a uma demanda aguda, prestando assistência que as outras religiões
não ofereciam. Por isso, a Capelania Católica se viu na circunstância de aceitar o
SCEH porque ele oferecia o que ninguém mais oferecia, de maneira profissional e
organizada, e do ponto de vista weberiano, uma ação social no sentido de
transformação.

Em especial o paciente com AIDS, que perdia o emprego muito facilmente,


tinha, em algumas das atividades que o SCEH propiciava, uma oportunidade de
prover o seu sustento. Essa ação tinha o objetivo de auxiliar o paciente e seus
familiares, entendendo que a doença não era somente uma experiência espiritual e
social vivida por quem adoecia, mas abrangiapara todos os outros envolvidos.

Também buscava resgatar, através da ação paralela ao trabalho, uma atividade


de natureza utilitária, de produção de bem ou serviço que resultasse em alguma forma
de renda para quem estava desesperado e sem possibilidades de trabalho formal. Essa
ação era útil para a pessoa também, pois, no momento em que ela conseguia realizar
uma “obra”, se sentia reconhecida como parte da sociedade, o que a aproximava da
família e da comunidade a que pertencia.

A ação do SCEH se estendia para além da questão espiritual, abrangendo a


reflexão sobre as questões morais e o julgamento que o paciente fazia dos valores que
o haviam levado a adquirir a doença, além de dar significado para sua vida.

O significado que o pensamento cristão dá para a vida é que esta se vive pelo
trabalho. Esse é também o modo de ajudar seu semelhante. O trabalho tem o objetivo
de honrar a Deus, e honrar a Deus é amar seu próximo. Dessa maneira, a formação
cristã protestante dos capelães foi determinante para o sucesso da instalação do SCEH
no IIER pois, no protestantismo, graças à tradução que Lutero fez do Eclesiastesxcii, a
noção de vocação ganhou o sentido de profissão, ou oficio. A sacralização do
trabalho consolidou o entendimento de que o ofício é um chamado e favoreceu o
autopoliciamento do trabalhador.

xcii
Eclesiastes - Livro do Velho testamento da Bíblia demonstra a futilidade da vida e que o supremo propósito e
significado da vida podem ser encontrados somente no servir a Deus. Disponível em
<http://www.estudosdabiblia.net/d68.htm>. Acesso em 29 de nov. de 2011.
185
Conclusão

Para o calvinismo e o luteranismo131 , o trabalho é um meio, atinge várias


pessoas, inclusive o voluntário que presta assistência espiritual ao paciente no
hospital. Por isso, a ação social de assistir espiritualmente tem uma sustentação
maior, do ponto de vista do pensamento cristão não católico, porque, na visão do
católico, a assistência espiritual tem um aspecto mais caritativo. Essa caridade é feita
com o objetivo de ser bom e merecer o perdão divino. Já para o cristão protestante, a
assistência espiritual é o principal meio de estar no mundo servindo a Deus. O
trabalho, então, tem um valor ético e moral.

Nesse sentido, as atividades do SCEH não eram um fim em si mesmo, eram


um meio de estar no mundo, estar com as pessoas e, assim, servir a Deus. O SECH
realizava essa atividade num contexto em que a vida terrena não era vista separada da
vida divina e isso tinha um significado importante, frente a uma doença que era
sinônimo de sentença de morte no curto prazo.

As celebrações promovidas pelo SCEH faziam sentido porque ofereciam, para


o doente com AIDS, que tinha como expectativa máxima, ter uma morte não muito
dolorosa, a oportunidade de celebrar a vida e incluir a morte nessa concepção de vida,
de forma a dar significado à sua existência.

A formação da equipe do SCEH era regulada. Seus componentes precisavam


realizar os cursos por ela oferecidos, havia critérios para serem admitidos, o trabalho
era controlado, apesar de ser espontâneo, porque é a natureza do seu trabalho, que é
da assistência espiritual depende dessa espontaneidade, mas era um trabalho
profissional e não simplesmente um relacionamento social. Essa estruturação
burocrática, no sentido weberiano, se adequava perfeitamente ao modo de
funcionamento da instituição hospitalar e o papel da Capelania Evangélica ficou
assim emblematicamente representado quando lhe coube selecionar, orientar e
fiscalizar a assistência religiosa prestada por outras denominações evangélicas, ainda
que isso tivesse sido apenas de fato, mas não legalmente instituído.

O trabalho que o SCEH fazia com os membros da equipe de saúde também


mostrava que, na dimensão de consolação, todos são humanos, todos precisam de
consolo espiritual, porque quem cuida sofre. Seus efeitos eram potencializados
quando em contraste com o pouco reconhecimento do trabalho dos funcionários e a
quase total ausência de cuidados com esses profissionais. Tal qual uma guerra era a
186
Conclusão

situação do IIER na época do início da AIDS, e, nessa circunstância, o que se


desejava era que não se parasse para chorar e sim que se trabalhasse.

Assim, contrapondo-se à assistência espiritual tradicional realizada por um


único capelão, que há muitos anos era praticada nos presídios, nos serviços militares e
mesmo nos hospitais, foi criado um serviço de assistência espiritual organizado, com
recursos humanos qualificados e preparados para assistirem espiritualmente pacientes
no ambiente hospitalar, numa proposta inovadora. Pode-se afirmar, nesse sentido, que
a instalação do SCEH, com essa estrutura administrativa e formação de recursos
humanos, em hospitais credenciados pela ACEH, foi um trabalho pioneiro.

O perfil dos valores e crenças dos atores sociais que presenciaram e atuaram
nesse período de instalação do SCEH do IIER influenciou diretamente na condução
das ações para sua instalação e em muito contribuiu para o seu sucesso. Esses atores
sociais não são apenas as pessoas, mas o que elas representam. O diretor do IIER
falou pelos dirigentes e por uma parte da equipe multiprofissional e, por ser judeu,
trouxe os valores do judaísmo; o capelão católico representou o poder da Igreja
Católica e o pensamento cristão naquela vertente; a enfermeira representou o corpo de
funcionários; e os outros atores - paciente, família, ministros de outras religiões e os
capelães evangélicos que estavam presentes nesse meio, completaram o elenco da
história do SCEH do IIER.

Na análise weberiana, as pessoas têm o livre arbítrio. Elas podem escolher, ou


não, implementar a ação social e, no caso em estudo, decidiram fazê-lo.

Curiosamente, o diretor do IIER, na época da instalação do SCEH, tinha


características bastante específicas e peculiares. Era um homem de origem judaica,
que não era religioso, mas conservara os valores morais instituídos pela cultura
judaica, de amor ao próximo. Esses valores tornaram-se visíveis quando demonstrou
sensibilidade ao sofrimento das pessoas e valorizou a necessidade do cuidado
espiritual aliado à assistência clínica, para a efetividade do tratamento do paciente.
Pelo fato do diretor ser de religião judaica, tinha liberdade para decidir sobre a
instalação do SECH sem o constrangimento que teria, se fosse de outra religião cristã.

O capelão católico, responsável pelo Serviço de Capelania Católica no IIER


também sofreu influencia da sua origem e esta se refletiu nas suas atitudes e forma de
relacionamento com os serviços do hospital e com o SCEH. Assim, a história do
187
Conclusão

catolicismo, cujo clero exerce domínio espiritual sobre seus seguidores, por meio de
seus dogmas autoritários e a condenação, como hereges, dos cristãos que não
concordavam ou não se conformavam com eles, influenciaram a maneira como o
capelão se via e suas atitudes, no contexto hospitalar do IIER. Sua relação com a
Diretoria do IIER e o com o SCEH retificou a relação de poder da Igreja Católica
com as autoridades instituídas.

A esse propósito, é preciso lembrar que, na história, era muitas vezes o


ministro da religião católica quem coroava o rei, como no caso de Carlos Magno, que
foi coroado imperador pelo papa Leão III no ano 800 e Oto, que foi também coroado
pelo papa em Roma. Vale registrar ainda que o Santo Império Romano se tornou o
principal poder político da Idade Média, mantendo sua influência por muitos séculos.
Além disso, a autoridade do chefe da igreja, baseado no temor da excomunhão que,
como se cria, significava a morte eterna, contribuiu para a Igreja Católica alcançar
esse status. O papa aparecia, assim, encarnando um poder acima dos reis, pois
representava a lei moral, e esse poder se distribuía ao longo da pirâmide hierárquica
daquela igreja57.

Essa visão totalitária de poder, que a Igreja Católica possui, explica porque
não consegue manter relações simétricas com outros grupos religiosos, porque a
assunção de uma única verdade pressupõe a negação da verdade de todas as outras
igrejas, por mais que se faça o discurso de ecumenismo, já que o princípio é
excludente.

O padre, então, se revelou comprometido com o ideário da Igreja Católica,


quando agiu para assegurar posição de poder superior para o representante de sua
religião. Para criar uma situação de conforto, fez o discurso de ecumenismo, porém,
ao fazê-lo, acabou legitimando o SCEH na medida em que, ao aceitar a posição de
coordenador das capelanias, reconheceu formalmente a existência e, principalmente, a
legitimidade daquele serviço.

Quanto à enfermeira, que tem como objeto do seu trabalho o cuidar, o


depoimento analisado refletiu com clareza essa preocupação. Nele se observou a
valorização de todas as formas de assistência espiritual oferecidas naquela época, em
que a atividade de assistência de enfermagem foi tão importante, mas, ao mesmo
tempo, difícil, por ter que romper barreiras decorrentes de preconceitos, lidar com
188
Conclusão

uma doença nova, pouco conhecida por toda equipe de saúde e que resultava em
muitas mortes. Gerenciar e administrar a assistência de enfermagem nessa situação
foi um grande desafio técnico, emocional e espiritual. Pode ser comparado a uma
situação de guerra, onde as regras não são claras e o caos está instalado, a liderança
está dispersa e cada um age de acordo com suas possibilidades, capacidade e valores.

A enfermeira também teve a preocupação de relatar a importância que a fez


prover, aos alunos de enfermagem cuja prática acompanhava no IIER, o
conhecimento sobre essem a assistência espiritual, pois, na academia, esse aspecto
ainda é pouco abordado.

A história da paciente do IIHER e secretária do SCEH, uma das depoentes da


presente pesquisa, é o retrato fiel dessa devastadora doença e da intensidade do
sofrimento que a AIDS causou e vem causando. Também é o retrato de como, mesmo
nessa situação de degradação física, emocional e espiritual, impondo uma condição
de sofrimento e “morte precoce”, a pessoa pode ser confortada espiritualmente, dando
um significado à sua existência e adquirindo esperança na vida eterna.

Quanto à capelã titular do SCEH do IIER, observou-se que, durante o recorte


temporal do estudo, conviveu com o sofrimento e morte dos pacientes e, ao mesmo
tempo, de elementos da equipe. Nesse cenário, sua experiência e conhecimento,
adquiridos em parte no HCFMUSP, contribuíram substancialmente para que todos os
movimentos, articulações e decisões relativas ao SCEH do IIER fossem habilmente
conduzidos, tanto no âmbito interno, quanto no preparo e coordenação da equipe, se
estendendo às relações com os serviços e estrutura administrativa do IIER. Nela
observaram-se qualidades de liderança, sabedoria estratégica, determinação, coragem,
sensibilidade e chamado vocacional ministerial forte, além de esperança e fé
inabaláveis, postas à prova e comprovadas na prática, a despeito do suporte e apoio
que recebia da ACEH.

O SCEH tinha um modelo estruturado de funcionamento, descrição das


funções e atribuições de seus membros, formas de comunicação definidas, espaço
físico visível e recursos materiais próprios, mas, principalmente, tinha vinculação
institucional com a ACEH, o que lhe dava suporte jurídico e financeiro, além de
representatividade social porque fazia conexão externa com a sociedade. Assim, o
SCEH encontrou um meio de ser socialmente reconhecido, enquanto o IIER não o
189
Conclusão

formalizava. Esse reconhecimento lhe era necessário para conquistar a “legitimação


weberiana” que só lhe viria através da lei, com a regra, porque ainda não estava (e
não está) contemplado no organograma do IIER.

O SCEH fazia relatórios, pleiteava um lugar no organograma e mantinha


conversações com a sociedade por meio da ACEH, que possibilitava sua integração
com grupos externos como o CONAIDS, dentre outros. Era o corpo da igreja,
enquanto pessoas que se relacionavam afetivamente, mas, enquanto objetivamente,
era uma representação da ação social que desenvolvia. Então, a ACEH foi também
um ator social, na medida em que tinha o poder de legitimar um trabalho que ainda
não tinha como ser legitimado dentro da estrutura existente do estabelecimento de
saúde em que se desenvolvia.

Pode-se perceber que os atores sociais envolvidos na criação e instalação do


SCEH do IIER se organizaram de tal maneira que, cada um dando sua resposta, sua
contribuição, tornaram possível esse empreendimento.

Weber afirma que as ciências sociais a nada servem senão para que se possam
conhecer as razões pelas quais as pessoas agem dessa ou daquela forma na sociedade.
Isso equivale a dizer que é tarefa dessas ciências “captar as singularidades” (emoções,
paixões e intimidades), os sentidos subjetivos (imateriais, impalpáveis, e abstratos)
das ações sociais, que são materiais, palpáveis, e objetivas 132.

Nessa direção pode-se concluir que o SCEH do IIER obteve sucesso porque se
ancorou no ideário protestante e assim foi organizado. A sua sustentação se deveu ao
fato de ser estruturado como órgão administrativo. Não foi aceita sem críticas, mas
atendeu a necessidades sentidas em tempos de AIDS e, por isso, foi reconhecido
administrativamente., prova disso é que a direção do IIER lhe concedeu a autoridade
para legitimar outras religiões evangélicas para exercerem papel similar na
instituição.

Havia muitos fatores para que a implantação do SCEH não ocorresse - não era
a religião prevalente entre os pacientes, estava inserida num mundo do sincretismo
religioso, a visão da assistência espiritual no campo da saúde ainda era difusa e não
profissional e havia poucos caminhos que permitiam a entrada desse tipo de ação
voluntária na instituição. Apesar disso, o SCEH obteve êxito e, para isso, uma
conjunção de fatores o favoreceu, dentre os quais estão a natureza do seu trabalho,
190
Conclusão

que era extremamente desejável naquele momento e o modo como esse trabalho foi
organizado e empreendido, numa ação social que respondeu a necessidade social
legítima, e que o serviço logrou atender plenamente.
191
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Expediente Avulso – GG SP-355/88: [Indicação do Deputado Ivan Espíndola de
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Fernando Costa foi designado pelo Conselho Estadual da Confederação Evangélica
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permanente para freqüentar o Hospital.

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Brasil, Brasil). Contrato no08/76: Pelo presente instrumento particular de contrato de
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contratantes...]

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Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil). Termo de Responsabilidade: eu Eleny
de Paula Cavalcanti, Missionária Capelã, me responsabilizo pelo BIP-HC n. 774 a
partir da presente data.

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do H.C. comunicando estar de acordo com a indicação formulado pelo Supremo
Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, para atuar como Capela Evangélica Titular
em lugar do Reverendo Edson Plaza, em 1 de setembro de 1988

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Secretaria de Estado da Saúde, São Paulo, Brasil). Portaria n. 002/92: [O professsor
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da Universidade de São Paulo, Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público
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Coordenação dos Institutos de Pesquisa, São Paulo, Brasil). Mapeamento das
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Sebastião André de Felice, em 14 de novembro de 2003, estabelecendo que a
Capelania Evangélica estivesse subordinado ao Coordenador do Serviço Religioso do
IIER, padre João Inácio Mildner.

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André de Felice, do IIER, comunica que o padre João Inácio Mildner, da Capelania
Católica, passa a partir da presente data ser o representante junto a Diretoria Técnica
das entidades religiosas que assistem os pacientes do IIER, em 17 de março de 2004.

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210
Anexos

9 ANEXOS

ANEXO 1
211
Anexos
212
Anexos

ANEXO 2
213
Anexos

ANEXO 3

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Pesquisa: Criação e Instalação do Serviço de Capelania Hospitalar Evangélica no


Instituto de Infectologia Emilio Ribas. Eu _____________________________,
RG:__________________________,
endereço_________________________________, reconheço que essas informações
estão sendo fornecidas por causa de minha participação voluntária neste estudo, que
visa descrever e analisar o processo histórico da instalação e criação de um serviço de
capelania hospitalar evangélica em um hospital público especializado de grande porte
paulistano.

Para participar do estudo, sei que deverei ser entrevistado (a) a respeito da
implantação da Capelania Hospitalar Evangélica da Associação de Capelania
Hospitalar Evangélica no Instituto de Infectologia Emilio Ribas I.I.E.R. que devem
ser respondidas, de acordo com as situações vivenciadas.

Reconheço que, em momento algum minha participação representa algum tipo


de risco, ou dano, sendo minha privacidade preservada. A participação neste estudo
não evidencia benefícios diretos, porém, ao seu final, os resultados poderão contribuir
com o subsídio para a ampliação do conhecimento sobre o tema respondido.

Em qualquer etapa do estudo, eu terei acesso à pesquisadora responsável para


esclarecimento de eventuais dúvidas, podendo entrar em contato com esta, Profa.
Rosana Chami Gentil que pode ser encontrada à Rua Prof. Enéas de Siqueira Neto
340, Jardim EmbuíasImbuías, UNISA - telefone 5545 8644 ou pelo telefone celular
99757077. Se eu tiver alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa,
poderei fazer contato com o Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) do Instituto de
Infectologia “Emilio Ribas” Av Dr. Arnaldo, 165 – Cerqueira Cesar – São Paulo – SP
– CEP: 01246-900 – Tel: 3896-1406.

Sei que é garantida a liberdade da retirada de meu consentimento a qualquer


momento e que posso deixar de participar do estudo, sem qualquer prejuízo à minha
pessoa.

As informações obtidas serão analisadas em conjunto com outros participantes,


não sendo divulgada qualquernenhuma identificação.

Não haverá despesas pessoais para mim em qualquer fase do estudo. Também
não haverá compensação financeira relacionada à minha participação. Se existir
qualquer despesa adicional, ela será absorvida pelo orçamento da pesquisa. O
pesquisador compromete-se a utilizar os dados coletados para esta pesquisa, para fins
de ensino e pesquisa, divulgando os resultados na forma de publicação científica.
214
Anexos

Porque considero ter sido suficientemente informado (a) a respeito da pesquisa


“Criação e Instalação do Serviço de Capelania Hospitalar Evangélica no Instituto de
Infectologia Emilio Ribas” e porque discuti com a Profa. Rosana Chami Gentil sobre
minha decisão em participar do estudo, tendo ficado claro quais são os propósitos do
estudo, os procedimentos a serem realizados, as garantias de confiabilidade e de
esclarecimentos permanentes e que também minha participação é isenta de despesas,
concordo voluntariamente em participar deste estudo e poderei retirar meu
consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem penalidades ou
prejuízo ou perda de qualquer benefício que eu possa ter adquirido.

________________________ ________________________ _______________

Nome do participante Assinatura do participante Data

________________________ _________________________ _______________

Nome do pesquisador Assinatura do pesquisador Data

________________________ ________________________ _______________

Nome da testemunha Assinatura da testemunha Data

São Paulo, de de 20
215
Anexos

ANEXO 4

ROTEIRO PARA ENTREVISTA SEMI ESTRUTURADA

1. Porque, quando e como foi implantada a Capelania Hospitalar Evangélica da


ACHE no Instituto de Infectologia Emilio Ribas (I.I.E.R.)?

2. Quais as dificuldades enfrentadas durante a implantação e no decorrer do período


em que a ACHE estiveram presentes no I.I.E.R.?

3. Como era o organograma da ACHE?

4. A quem ela se subordinou?

5. Com que Serviços Hospitalares se relacionaram?

6. Quais trabalhos eram realizados?

7. Quanto aos recursos humanos, quem eram os capelães-visitadores, sua formação,


treinamento, supervisão, quantidade, distribuição e remuneração?

8. Como eram distribuídas as atividades dos capelães e visitadores no I.I.E.R.?

9. Como se deu a parceria da ACHE com o I.I.E.R ?

10. Que impacto a ACHE teve no I.I.E.R., em relação à sua estrutura administrativa,
pacientes, familiares e equipe de saúde?

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