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oculta, não deixando que os homens compreendam sua própria realidade? Uma boa
quantidade dos tratamentos filosóficos da religião, como veremos, consistiram,
fundamentalmente, numa crítica da verdade que essas religiões pretendem ter. Por
último, a filosofia, dada sua pretensão prática, tem que se perguntar necessariamente
pela função da religião na atividade individual, social e histórica dos homens. E,
ademais, tem que tomar uma postura sobre o que o homem, dada a realidade do fato
religioso, tem que fazer ante este fato: se tem que aceitá-lo, defendê-lo, negá-lo,
combatê-lo, persegui-lo... Em outras palavras, há que se perguntar pela atividade
religiosa do homem e pela atividade que se deve seguir respeito à religião.
Evidentemente, descrevemos os conteúdos da filosofia da religião em termos
muito amplos. Isso supõe que dentro da mesma entram disciplinas já clássicas na
filosofia que tradicionalmente receberam denominações distintas. Antigamente, falava-
se de teologia natural e, inclusive, de teodicéia na hora de tratar alguns dos problemas
que vamos tratar aqui. Certamente, boa parte dos esforços e das discussões filosóficas
que dizem respeito à religião centrou-se no problema da demonstração da existência ou
inexistência de Deus. Indubitavelmente, esse problema tem muito a ver com a filosofia
da religião e teremos que entrar necessariamente nele, ainda que seja para ver as
limitações desse tipo de formulações.
a) Justificações naturalistas
b) Justificações subjetivistas
a) A crítica kantiana
Por outra parte, Kant também vai considerar impossível o argumento subjetivista
que Descartes empregava. Uma prova ontológica não é possível porque, no seu modo de
ver, a existência não é um predicado. Ou seja, como vimos no capítulo 4, item 2.4, não
se pode pretender que o ser e o existir se refiram a uma realidade externa, fora de nós;
Se dizemos “Pedro é bom”, “Pedro é poderoso”, “Pedro é inteligente”, podemos
assinalar algum tipo de atividade ou característica real que corresponda à bondade, ao
poder ou à inteligência. Mas se dizemos “existe”, há alguma realidade chamada
existência? “Bom”, “poderoso”, “inteligente” são predicados reais. Em contrapartida,
“existe” não é um predicado real, apenas gramatical. Quando dizemos que uma coisa
existe, não estamos dizendo nada de novo sobre os conteúdos de sua realidade.
Suponhamos que eu estou descrevendo uma realidade qualquer, um homem, por
exemplo. Vou falando de suas qualidades, de sua estatura, de seus caracteres físicos, etc.
Cada um dos predicados que vou nomear vai perfilando e concretizando mais os
conteúdos do objeto que descrevo. Mas, se de repente digo “este homem existe”,
deparo-me como um predicado que não diz nada de novo sobre ele, não determina ou
perfila mais sua realidade. O que o termo “existe” diz é simplesmente que minha
descrição corresponde a um objeto real. Então, na realidade, quando digo que algo
existe, não falo das notas dessa coisa, não acrescento nada de novo a suas qualidades,
mas falo apenas de minha descrição, de que à minha descrição ou o meu pensamento
corresponde algo no mundo real. E isso é tudo.
É por isso que, no argumento de Descartes, não possível passar da perfeição à
existência. Não há dúvida de que o predicado perfeição está necessariamente unido a
todos os outros predicados que equivalem à mesma: bondade, beleza, inteligência,
poder. Dizer de alguém que é perfeito equivale a dizer o mesmo que dizem os outros
predicados equivalentes: estes apenas explicitam mais a idéia de perfeição. Mas a
existência não é um predicado real. Dizer “perfeito” não é o mesmo que dizer “real”.
Pois a existência não acrescenta nada de novo à idéia de Deus. A idéia de Deus é a
mesma, exista ou não exista Deus. A idéia da suma perfeição é a mesma, haja ou não
haja um ser perfeito chamado Deus. Por isso, não se pode incluir a existência dentro da
perfeição. Dito em outras palavras, não se pode passar da idéia de perfeição à afirmação
da existência. No fundo, trata-se de um salto inadmissível da ordem ideal à ordem real.
Deste modo, Kant vai declarar impossível todos os argumentos teóricos sobre a
existência de Deus. Não se pode demonstrar a Deus teoricamente. Em outras palavras,
não há um conhecimento científico de Deus. No máximo, Deus pode ser pensado, pode
ser admitido como uma idéia que me ajuda a colocar meus conhecimentos em ordem.
Mas nunca se pode pretender ter demonstrado de um modo científico a existência de
Deus mediante o mero uso da razão teórica. É possível que Deus exista, mas não é
demonstrável. Agora bem, embora reconhecendo que Deus não é demonstrável pela
razão teórica, Kant vai considerar que se pode mostrar a Deus mediante o uso da razão
prática. A razão humana pode chegar a Deus, pensa Kant, não cientificamente mediante
uma prova rigorosa, mas a partir do uso prático da razão. Isto vai supor, na história da
filosofia, o fim das provas meramente teóricas e o começo da localização do problema
de Deus na realidade prática do homem.
Kant pensa isso do seguinte modo: embora a razão teórica não possa conhecer o
não sensível, a razão prática se encontra em si mesma com um fato: com o dever. À
razão prática se lhe apresenta o imperativo moral de atuar de modo que o critério do
próprio comportamento seja universalmente válido. É o “imperativo categórico” que
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raciocínios filosóficos, mas a partir de sua vida prática real. Por isso, não se pode
abordar o problema da religião mediante formulações meramente racionalista que
excluam, de entrada, toda consideração da vida social e fática do homem.
No fundo, o racionalismo de Kant expressa sua enorme fé na razão pura, típica
de todo idealista. Para ele, a razão, e não a realidade sentida, é o critério último de
verdade ou de falsidade. Basta o mero uso da razão, prescindindo de toda investigação
das religiões reais e das sociedades reais, para decidir, de um modo ou de outro, sobre a
verdade das crenças religiosas. Hoje em dia já não é possível uma fé tão grande na razão
pura como a que se encontra, todavia, em Kant. A razão, sabemos, não proporciona
evidências necessárias, mas é um instrumento humano sumamente frágil. Normalmente,
a razão demonstra mais aquilo que queremos que ela demonstre devido a nossos
interesses práticos. Na realidade, a filosofia da religião kantiana não faz mais que
demonstrar o que Kant e seu tempo já sabiam ou queriam saber de antemão: a
autonomia moral do indivíduo, a crítica das religiões reveladas, a existência de um Deus
meramente racional. Em outras palavras: as concepções religiosas da burguesia ilustrada
daquele tempo.
Isso não tira o valor de Kant, mas nos adverte acerca da necessidade de uma
abordagem mais ampla que a meramente racionalista. No fundo, seja o que for isso que
chamamos Deus, seja a religião verdadeira ou falsa, não podemos investigá-la sem sair
de nossa subjetividade. Antes de tudo, é precisos estudar a religião como um fato real
histórico e humano. É a esse fato histórico que é preciso aplicar nossas reflexões
racionais. Uma razão pura, seja teórica ou prática, não nos levará a decifrar a verdade e
o valor da religião. O uso da razão que trata de modo algum os dados sensíveis e reais
não pode pretender esgotar um fenômeno tão complexo como o fenômeno religioso.
Mais. No caso em que pretendamos ter demonstrado a Deus mediante o puro uso da
razão, haverá que se perguntar se não demonstramos antes a existência de uma idéia ou
de um conceito, mas não de uma realidade. Só se acede a uma realidade, o mais
racionalmente que se queira, pela via da realidade e não mediante um puro uso
particular da razão teórica ou prática.
Dito em outros termos, a filosofia da religião não consiste, em primeiro lugar, na
especulação racionalista sobre as possíveis demonstrações da realidade de Deus. A
filosofia da religião consiste, antes de tudo, em um estudo da religião enquanto
realidade humana, pessoal, social e histórica. Somente a partir desse estudo da realidade
religiosa tal como se manifesta na realidade humana poderemos nos pronunciar
filosoficamente sobre a religião. As vias puramente metafísicas ao estilo das vias
medievais passam por cima do problema filosófico fundamental: a religião como
realidade humana e se limitam a uma conceitualização da natureza com o objetivo de
deduzir Deus a partir da natureza. Mas como temos visto repetidamente, uma natureza
“em si”, separada do homem, é pura abstração. Tampouco vale o recurso de abandonar a
natureza e fechar-se na subjetividade para ensaiar vias puramente racionais. É preciso
partir, antes de tudo, da realidade mesma do fenômeno religioso. Só a partir da análise
deste fenômeno poderemos elaborar uma autêntica filosofia sobre a religião.
última da religião. Quer dizer, em lugar de fazer uma metafísica ou uma prova
racionalista sobre a existência de Deus, trata-se de se dirigir diretamente ao fato
religioso tal como se dá na história dos homens e dos povos.
Alguém pode se perguntar: esta análise da religião como fato não realiza já as
chamadas ciências da religião, às quais nos referimos anteriormente? Qual a diferença
entre a fenomenologia da religião e o estudo histórico, sociológico ou psicológico da
mesma? A história das religiões, a sociologia da religião, a psicologia religiosa não
estudam já o fato religioso de um modo rigoroso e científico? Por que, então, uma nova
disciplina, uma fenomenologia da religião?
a) Fenomenologia e subjetivismo
b) A fenomenologia da religião
aos consolos religiosos, mesmo sem saber, os homens estão protestando contra esse
mundo por ser um mundo incapaz de fazer o homem feliz.
Considerar a religião como expressão de uma alienação social vai levar Marx
muito mais longe do que havia chegado Feuerbach: já não basta criticar a religião nem
que o homem tome consciência de que está sendo alienado e supere sua alienação com
uma mera mudança de consciência. Os problemas não estão apenas na consciência do
homem, mas têm sua raiz nas estruturas sociais. Portanto, Marx colocará seu interesse,
não na religião, mas nessas estruturas econômicas, sociais e políticas que impedem a
realização plena do homem. Já não se trata, portanto, de lutar de um modo parcial contra
a falsa consciência do homem, fazendo propaganda anti-religiosa. Trata-se de lutar
contra as estruturas que tornam a religião necessária. Se é um compensação do homem
oprimido, bastará libertar o homem de suas correntes sócio-econômicas para que a
religião deixe de ser necessária. Quando a sociedade se libertar a religião desaparecerá
porque já não será necessária nenhuma compensação. O problema, dirá Marx, não
reside em tirar a flores (religião) das correntes, mas em romper as correntes tornam as
flores necessárias.
Com isto, consideramos as duas teses sociológicas mais clássicas sobre a
religião: a religião como fator de integração social e a religião como fator de
compensação. Na realidade, a segunda tese não é incompatível com a primeira. Marx
mesmo não apenas considera a religião como compensação, mas também como
expressão “espiritual” da essência de uma sociedade dividida. Para Marx, pode-se, de
certo modo, considerar a religião como fator de integração nas sociedades divididas em
classe. Mas trata-se de uma integração falsa que o único que faz é ocultar a divisão real
dos homens. Quando essa divisão entre exploradores e explorados for superada, a
religião já não será necessária. Contra o que pretende Durkheim (a religião como algo
necessário em toda sociedade), para Marx, a religião é um fenômeno exclusivo de
sociedades divididas em classes. Uma vez superada esta divisão, a verdadeira integração
da sociedade se realizará racionalmente, sem necessidade de recorrer a símbolos e ritos
religiosos.
Mas com isso não esgota o problema da religião. É claro que a sociologia nos
mostra que em muitas sociedades a religião serviu como fator de integração. Também é
claro que muitos homens buscaram na religião uma compensação do sofrimento que a
opressão e a miséria lhes causavam, buscando uma solução e uma libertação espiritual
em outro mundo. O problema da sociologia da religião reside em averiguar se as
funções sociais da religião se esgotam ai. Estas são todas as funções sociais da religião?
Além de dar unidade às sociedades e de compensar o sofrimento, a religião não pode
desempenhar outras funções sociais? Não pode se colocar, por exemplo, a serviço da
libertação real dos homens já neste mundo? São problemas que a sociologia da religião
tem que continuar abordando em seu estudo empírico e científico das distintas
sociedades e das distintas religiões ao longo da história. Pode acontecer que as funções
sociais da religião já não se limitem à funções que ela teve no século XIX. A sociologia
como ciência continua tendo uma tarefa aberta em seu estudo das funções sociais que a
religião realiza.
A tese da religião como fator de integração social parece válida para sociedades
primitivas, nas quais todos os indivíduos participam de umas mesmas crenças. Neste
caso, a religião dá unidade e firmeza ao grupo. Mas essa tese se torna bem menos clara
nas sociedades pluralistas modernas, onde os indivíduos participam de religiões muito
diversas. Em alguns casos, a pluralidade de religiões significa a divisão da sociedade e a
aparição de conflitos entre as mesmas. Em outros casos, a integração se mantém. Por
outra parte, em sociedades muito desintegradas socialmente pode se continuar mantendo
uma unidade religiosa bastante forte como sucede, por exemplo, em sociedades
fortemente religiosas que estão atravessadas por importantes conflitos sociais e
políticos. Isto nos indica que a tese da integração, se bem pode servir para entender o
papel social que a religião tem desempenhado com freqüência na história humana, não
esgota todas as funções que ela pode desempenhar socialmente.
Mas não basta recorrer à tese da religião como fator de compensação social. Há
sociedades, nas quais, tendo sido eliminada a divisão de classes, mantém-se uma forte
religiosidade na maior parte da população. A exploração e o sofrimento podem ter
desaparecido em um grau bem considerável e, no entanto, a religião parece continuar
sendo algo necessário para muitos homens. A experiência e a prática religiosa
sobrevivem e, alguns casos, aumentam sem a alienação sociológica. Por outra parte, em
muitas sociedades atuais se observa que a religião, longe de alienar o homem fazendo
buscar compensações no além, serve, pelo contrário, como uma força que impulsiona
muitos homens religiosos a colocar-se a serviço de importantes transformações sociais.
A religião é um protesto contra este mundo, mas não só um protesto espiritual e
alienado que dá as costas à realidade, mas um protesto efetivo que se compromete com a
mudança das condições vigentes. O compromisso de muitos crentes nas tarefas de
libertação social desmente os que afirmam que a religião é apenas uma compensação
ilusória: pode que tenha sido historicamente, mas não o é sempre necessariamente.
sociais que possa desempenhar historicamente, sua realidade última não seja puramente
sociológica. O equívoco de alguns sociólogos da religião costuma consistir em que,
tendo descoberto uma determinada função que as religiões desempenham em uma
determinada sociedade ou em um conjunto de sociedades, pensem que a religião é essa
função social. Ou seja, converte-se uma explicação parcial em uma explicação absoluta
e última. A sociologia como ciência, dizíamos, pode dar conta de muitas vivências
religiosas individuais e, por isso, pode ser uma explicação das mesmas. Mas pode
suceder que essa explicação seja apenas parcial. A presença das experiências religiosas
em condições sociais muito distintas é uma boa amostra de que a religião, ademais de
sua função social, pode ter uma realidade mais profunda.
Por suposto, isso não invalida a análise sociológica da religião, pois é impossível
uma reflexão filosófica séria sem conhecer quais são as funções que a religião
desempenha. Mas as análises positivas do fenômeno religioso são insuficientes. Como
dissemos em seu momento, a filosofia não se contenta em estudar diversos dados
positivos (neste caso, fatos sociais) e relacioná-los entre si, mas pretende criticá-los. E
isso já é entrar no campo da filosofia. Marx, por exemplo, não se contentou com uma
mera descrição objetiva e sociológica do papel social que a religião desempenha na
sociedade capitalista, mas fez também sua crítica. Isto supõe já uma concepção
filosófica sobre o homem, sobre seu autêntico destino, sobre os possíveis obstáculos
para sua realização. Mas não só a crítica diferencia a filosofia da mera análise
sociológica das funções sociais da religião. À filosofia interessa, ademais, decidir sobre
s tarefas práticas que se realizarão respeito à religião: se esta deve ser protegida, negada,
perseguida, apoiada ou ignorada. E para isso são necessárias reflexões estritamente
filosóficas.
É que para realizar uma crítica e para tomar uma posição prática ante à religião,
a filosofia necessita saber radicalmente em que consiste ultimamente a realidade do
fenômeno religioso. A religião, cumpra as funções que cumpra, não é apenas um
fenômeno social. O religioso, como bem mostra a história, sobrevive para além de suas
funções sociais. A religião não apenas pode desempenhar uma função integradora ou
uma função compensadora, mas pode expressar também uma realidade humana mais
profunda. O fato de que os homens (ao menos o homo sapiens) sejam religiosos desde
sua aparição sobre o planeta (e não desde que há sociedades classistas, como se
pretende às vezes) deve nos levar a perguntar se a religião, ademais de expressar e servir
às estruturas e aos problemas de uma determinada sociedade ou de um determinado tipo
de sociedades, não expressar também algo mais radical do homem. Se a filosofia faz
perguntas radicais e últimas, há de se questionar se realmente o último da religião é sua
função social ou se o fenômeno religioso implica ademais aspectos mais profundos.
Perguntar-se por eles é fazer-se a pergunta filosófica pela realidade da religião.
3. A REALIDADE DA RELIGIÃO
fato humano, mas, antes, como um fato de consciência, como uma experiência
subjetiva. Já vimos em outros capítulos que o ponto de partida da filosofia não é a
subjetividade, mas a interação do homem com o mundo. A religião não é uma mera
experiência subjetiva, mas uma dimensão da atividade prática da humanidade em sua
história. É na interação dialética do homem com o mundo onde se desenvolve o
problema religioso. Por isso, o verdadeiro ponto de partida de uma filosofia não é
propriamente uma fenomenologia da subjetividade, mas uma análise da ação humana.
Se se quer continuar falando de fenomenologia, no sentido de que não se quer dar
propriamente explicações, mas meras descrições dos fatos religiosos, é preciso dizer que
se trata de uma fenomenologia da práxis.
Não se pretende, portanto, começar a filosofia da religião mediante um
raciocínio especulativo. O ponto de partida de toda reflexão filosófica sobre a religião é
o fato religioso. Trata-se de um fato que, sendo humano, não é puramente subjetivo,
mas diz respeito à práxis que inter-relaciona o homem com o mundo em suas dimensões
individuais, sociais e históricas.
concretos e não a nenhuma realidade distinta deles como poderia ser “o Espírito”, “a
História”, etc. Mas a atividade destes homens reais não é meramente individual, ou seja,
não obedece apenas a critérios, aspirações e desejos de um indivíduo isolado da
sociedade. Na realidade, como já vimos, a práxis humana está configurada socialmente.
Desde o nascimento, a atividade sentiente da criança é organizada por um grupo
humano concreto. Daí que seja neste grupo humano onde se vão encontrar umas
possibilidades determinadas e não outras. As possibilidades do homem estão
determinadas socialmente. Não toda sociedade nem todo momento histórico oferece as
mesmas possibilidades. A sociedade tem em cada momento uma determinada
capacidade de dominar a natureza e isto já direciona de um modo muito concreto as
possibilidades de cada homem. Ela favorece determinadas ações, mas impede outras,
pondo, inclusive, limites insuperáveis às mesmas. Não toda atividade é possível em
qualquer sociedade. Por isso, quando se fala de possibilidades não se deve pensar
abstratamente em todo um conjunto ilimitado de atos possíveis para uma subjetividade
toda poderosa, mas nas opções que a história vai tornando real entre as opções viáveis
em cada momento.
Convém cair na conta de que as possibilidades, além de estar configuradas
socialmente, concernem não apenas aos indivíduos, mas à sociedade inteira. Em cada
momento da história se oferecem à sociedade humana distintas possibilidades, cuja
apropriação determina o curso de seu desenvolvimento. O comer ou não uma laranja,
por exemplo, é uma possibilidade socialmente configurada (depende do acesso e da
distribuição desta fruta) que não tem muita importância para as opções que a sociedade
vai tomar globalmente. Mas um determinado sistema econômico ou uma determinada
decisão política podem ser opções que determinam de um modo radical o futuro de uma
sociedade: já não concernem unicamente à vida individual, não são apenas
possibilidades de realização pessoal, mas comprometem de um modo direto a forma que
uma sociedade vai tomar. Evidentemente, as possibilidades que se oferecem à sociedade
não são apropriadas por um sujeito fantasmagórico chamado “sociedade” ou “espírito
objetivo”; são apropriadas por homens reais e concretos. Mas eles se apropriam delas,
não como meros indivíduos, mas como seres sociais. Além do mais, o homem pode agir
não apenas respeito à sua vida individual, mas pode referir-se com sua atividade ao
destino de toda a sociedade. Há atividades que concernem a toda sociedade, pois nelas
se decide a forma concreta como determinada sociedade vai se estruturar no futuro.
Assim, por exemplo, a atividade política tem a ver de um modo muito direto com as
possibilidades de organização social que se oferecem em cada momento da história a
um determinado povo.
Definitivamente, se, como vimos, o homem não é indivíduo abstrato, mas uma
realidade socialmente determinada a se realizar na história, as possibilidades de que
estamos tratando aqui, por mais que tenham sempre uma dimensão individual
irredutível, são também possibilidades sociais e históricas que, em grande medida,
concernem não apenas ao futuro dos indivíduos isoladamente considerados, mas, em um
sentido ou outro, à realização da sociedade humana. Com isso deve ficar claro que as
possibilidades não são o fruto de uma consideração individual e subjetiva do homem; as
possibilidades reais que o homem tem não se deduzem abstratamente das potências que
a natureza humana em geral pode ter, mas de um ser humano que só se auto-constitui
em um meio natural e em um meio social concreto. Mas tampouco se podem deduzir as
possibilidades de um suposto mundo objetivo, separado do homem, como se fosse a
natureza externa que decidisse de uma vez por todas quais são as possibilidades do
gênero humano. Frente a toda consideração parcial, seja subjetivista ou naturalista, há
que se destacar que as possibilidades são o fruto da interação do homem com o mundo
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que o rodeia. Para estudar quais são as possibilidades reais que se oferecem ao homem
na história, não basta considerar seu meio natural; é preciso considerar também as
possibilidades que o homem foi construindo social e historicamente. Definitivamente, as
possibilidades são uma construção da práxis do homem em sua transformação do
mundo real.
b) O poder da realidade
c) A religação à realidade
a) Formulação do problema
absoluto não é total, mas relativo. O homem se sente absoluto ante a realidade, mas
experimenta também que seu caráter de absoluto vem da realidade mesma. Só por sua
abertura ao real, o homem tem uma liberdade concreta. Toda realização sua, toda
liberdade de opção está possibilitada, finalmente, pela realidade. Em toda realização, o
homem está apoderado pela realidade. E isto significa que o homem não é por si mesmo
absoluto. Esse caráter de relativamente absoluto o impulsiona a buscar uma realidade
que seja absolutamente absoluta, que seja de certo modo o fundamento de toda
realização humana, tanto individual quanto social e histórica. Em outras palavras, trata-
se de encontrar o fundamento último da religação que é o que chamamos Deus.
É importante destacar que por “Deus” não entendemos, aqui, o Deus de uma
religião em particular, como pode ser a religião cristã, judaica, mulçumana, etc.
Tampouco nos referimos necessariamente ao Deus do monoteísmo. Por Deus
entendemos simplesmente a realidade absolutamente absoluta, independente de como
cada religião a conceba. É que não nos referimos aqui às religiões historicamente
aparecidas, mas ao fundamento último de toda religião: a religação humana à realidade.
De fato, todas as religiões se referem, de um modo ou de outro, ao fundamento último
do real, a uma realidade absolutamente absoluta que é o fundamento de toda a vida
humana. Que façam isso mediante a representação de um único Deus pessoal ou
mediante uma pluralidade de deuses não nos interessa no momento. O importante é que,
seja a forma que for que se assuma historicamente para se referir a esse fundamento, há
um problema colocado em toda religação: o determinar a realidade profunda de uma
realidade absolutamente absoluta. É o que aqui chamamos Deus.
É mister cair na conta de que esse problema que podemos chamar problema de
Deus não é um problema meramente teórico. A razão que se pergunta pelo fundamento
último do poder do real não é uma razão meramente contemplativa, dedicada a
solucionar uma questão intelectual como quem resolve um problema de matemática.
Como vimos, o ponto de partida do problema, a religação, embora seja um fato, não é
um fato de laboratório. Não se pode estudar a religação como se estuda a realidade
última da luz, pois ela compete à vida humana em sua totalidade. Embora a religação
seja um fato, é um fato que só se dá na vida prática do homem. Por isso, não se pode
resolver o problema que a religação apresenta mais que nessa vida prática.
A religação lança o homem a buscar o fundamento último da realidade
absolutamente absoluta. Mas este lançamento não é um mero desafio intelectual como
pode ser um problema de xadrez. Laçar-se a buscar o fundamento último da realidade a
partir da religação significa lançar-se a realizar a própria vida, a experimentar
radicalmente a realidade que fundamenta toda realização, indagando, nela, seu
fundamento último. A busca de Deus é, antes de tudo, a realização da própria vida a
partir do possível fundamento do real. Tanto para os indivíduos como para os povos,
buscar a Deus significa experimentar profundamente a própria realização, realizar-se
biográfica ou historicamente. A busca de Deus é, antes de tudo, um mergulho na
realidade. E isto só se realiza de um modo prático e histórico. Somente na realização da
própria vida pode-se alcançar a Deus. Um mero raciocínio não demonstrará nenhuma
realidade profunda, mas uma pura idéia.
Isto não quer dizer que não seja necessário um momento intelectual na busca de
Deus. Somente pode encontrar algo o que tem ao menos uma idéia do que busca. Por
isso a razão tem que realizar uma justificação racional, tem que elaborar uma hipótese
sobre o que “poderia ser” isso que se busca. Na realidade, a idéia mesma do que se
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busca ao se perguntar pelo fundamento último da realidade vai marcar distintas rotas. Se
se vai buscar o fundamento último do real a partir de uma idéia atéia do mesmo, a rota
empreendida pela razão será muito distinta de quando se busca este fundamento a partir
de uma idéia teísta ou politeísta do mesmo. Em vista de solucionar o problema de Deus,
a razão pode empreender rotas muito diversas e, por tanto, é natural que os resultados a
que se chegue não sejam sempre os mesmos. Mais. Rotas tão diversas não são
meramente teóricas: são sempre teóricas e práticas ao mesmo tempo. Pois nelas não se
resolvem problemas que não tenham nada a ver com a vida individual ou coletiva. O
problema que a religação apresenta é justamente o problema da realização prática dos
homens. E esta realização pode ser muito distinta se se considera que, em última
instância está fundada em uma realidade absolutamente absoluta ou não.
Evidentemente, pode haver apresentações meramente especulativas do problema
de Deus, nas quais o pensador que trata sobre o tema não se compromete explicitamente
na busca de uma realidade fundamento da vida individual ou social. Alguns dos
enfoques que vimos na primeira parte deste capítulo podem ser perfeitamente um
exemplo desse modo especulativo de tratar o problema de Deus. Pode-se dizer, com
Zubiri, que estes pensadores são expoentes de uma mera voluntad de ideas (vontade de
idéias) e não de uma autentica voluntad de fundamentalidad (vontade de
fundamentalidade). A primeira atitude, no que diz respeito ao problema de Deus, não
leva mais que à demonstração conceitual de um conceito. Mas não à realidade-
fundamento que buscamos. Somente se há uma verdadeira vontade de
fundamentalidade, o homem não se perderá em meras relações de idéias, mas
comprometerá sua própria vida na busca do fundamento da religação. O problema da
religação é um problema da própria vida pessoal ou social e isto significa que toda
busca há de ser uma busca não meramente teórica, mas prática. É na experiência do que
se pode chegar a ser, tanto individual como historicamente, que se pode alcançar o
fundamento da própria realidade.
c) A experiência de Deus
literária são também experiência racional da realidade profunda, embora não possam ser
transformados em experimento científico.
d) A verdade da religião
4. RELIGIÃO E LIBERTAÇÃO
a) O processo de secularização
sociedade democrática, justa, isto é, uma sociedade que se ajusta às novas ideologias de
legitimação. A religião perde seu caráter legitimador da vida social para cedê-lo a
ideologias não religiosas, seculares.
Todo esse processo está unido a uma individualização progressiva da vivência
religiosa. A experiência de Deus passa a ser interpretada cada vez mais como uma
experiência individual que acontece no mais íntimo da consciência à margem de toda
consideração sócio-histórica. Os fenômenos religiosos do Ocidente corroboram esta
individualização progressiva da experiência religiosa. O protestantismo supôs, frente ao
catolicismo, a insistência nos aspectos individuais do religioso: não os cultos externos,
mas a experiência interior individual. Em boa medida, a fenomenologia da religião, à
qual nos referimos acima, expressa cabalmente esta redução do religioso ao vivido na
intimidade da consciência individual. Correlativamente, os fenômenos e expressões
religiosas que envolvem mais diretamente uma dimensão coletiva são considerados
fenômenos não puramente religiosos, tradicionais, supersticiosos, vulgares, etc. As
procissões, os cultos públicos, as expressões coletivas de fé passam a ser cada vez mais
suspeitos de não representar a essência autêntica do religioso. Só é verdadeiramente
religioso, pensa-se, o que se experimenta no interior da consciência. Tudo mais são
ritos, cultos “externos”, mais próximos ao folclore que à realidade verdadeira do divino.
b) Secularização e individualismo
Está claro que este tipo de apologias do individualismo ocidental vai unida a
uma concepção muito particular do que é a razão humana. Segundo estas concepções,
racionalidade é sinônimo de cientificidade, é o racional e o científico. Isto equivale a
dizer que as civilizações mais industrializadas, mais avançadas cientificamente são mais
racionais que as menos industrializadas. Em outras palavras, que todas as crenças não
científicas dos povos da periferia não são mais que crenças irracionais, destinadas a
desaparecer. O avanço da ciência e da técnica seria o prelúdio da extinção do fanatismo,
da superstição, da religião em geral ou, ao menos, da religião como fenômeno social. A
racionalidade ocidental pode permitir a sobrevivência de formas individuais ou intimas
de religiosidade, mas nunca da religião como fenômeno social massivo. No fundo,
como vimos em páginas anteriores (cap. 2), esta idéia do que é a razão humana é muito
discutível.
Na realidade, a razão consiste em uma atividade intelectual que busca o fundo
último das coisas. E isto é algo que, sem dúvida, a ciência faz de forma eficiente e
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realidade. Deste modo, não há uma experiência da vida, de si mesmo, dos demais e do
mundo separada ou independente de Deus. A experiência de Deus não é outra coisa que
a experiência humana de si mesmo, dos demais e do mundo.
Mas o que nos interessa destacar aqui não é apenas o caráter histórico e real da
experiência de Deus, ao qual já nos referimos. O importante agora é cair na conta de que
a experiência de Deus é uma experiência da própria liberdade concreta. Os homens
experimentam a Deus justamente a partir das opções que têm que tomar impelidos por
sua religação à realidade. A experiência humana de Deus é esta experiência histórica da
liberdade. Não se trata de uma liberdade abstrata, mas da liberdade que determina as
possibilidades concretas que se abrem ao homem na história real que vive. A
experiência que os homens e os povos realizam de Deus é, por isso, a experiência do
fundamento de sua religação e, por tanto, do fundamento de sua própria liberdade. Deus
não é fundamentalmente uma realidade que se experimenta na submissão ou na
obediência, mas, antes de tudo, o fundamento historicamente vivido da liberdade
humana, de sua necessária ligação, para realizar sua vida se apropriando das
possibilidades reais que a história concreta lhe oferece.
Esta liberdade tem, evidentemente, muitos aspectos. Pode-se falar, por exemplo,
de uma liberdade-de ataduras e coações que impedem a própria realização e auto-
possessão individual. O homem faz a experiência de sua liberdade na medida em que
passa adquirir uma maior responsabilidade sobre sua própria vida, isto é, na medida em
que experimenta um crescimento das possibilidades de sua própria realização. Pode-se
falar também de uma liberdade-para realizar algo, para se auto-possuir. Na realidade,
não tem muito sentido falar de liberdade-de se não é em função de uma liberdade-para
fazer algo. O mero fato de não estar submetido a coações ou a impedimentos, o mero
fato de ter um grande número de possibilidades não tem grande valor senão porque se
quer fazer algo com essa liberdade assim alcançada. O puro canto à liberdade-de
coações costuma ir unido a um individualismo egoísta que renuncia a todo compromisso
da própria liberdade. A liberdade-para, ao contrário, consiste no futuro dessa liberdade,
nas tarefas que se propõem à liberdade. Embora, evidentemente, não há liberdade-para
se não há prévia liberdade-de. Um homem totalmente escravo de múltiplas coações que
não dispusesse de nenhuma possibilidade real de optar não poderia nunca colocar-se o
compromisso ou o para quê de sua liberdade.
Mas, no fundo, este é um caso altamente hipotético. Na realidade, todo homem,
inclusive o mais escravizado ou submetido, é, em certo sentido, livre. Por ser um animal
de realidades, o homem tem que optar. Em alguns casos, as opções poderão ser muito
limitadas devido às coações externas. Mas o ser humano tem sempre, em alguma
medida, a possibilidade de se libertar das coações, mesmo que custe a própria morte. As
crônicas da conquista relatam, por exemplo, o caso de muitos índios que preferiram o
suicídio à escravidão e a trabalhos forçados. É que mais radicalmente que a liberdade-
de e a liberdade-para, há uma liberdade-na realidade. Pela abertura de sua práxis à
realidade, o homem é sempre livre, mesmo no caso da maior das explorações: nunca
estar definitivamente fechada a possibilidade da rebelião e da libertação. Há uma auto-
possessão do homem a si mesmo, uma pertença da própria vida ao que se determina
com ela que torna o homem no único animal que com todos os limites externos e
internos que se queira se auto-possui como real.
E é justamente esta auto-possessão do homem a raiz de toda experiência de
Deus. Experimentando a própria liberdade concreta, a capacidade de se autodeterminar,
e, ao mesmo tempo, a dependência desta autodeterminação respeito à realidade, é como
o homem experimenta seu caráter relativamente absoluto. E é ai de onde arranca o
poder do real, a possível experiência de Deus. A experiência de Deus é sempre uma
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experiência da própria liberdade. Mas esta experiência não tem porque ser meramente
individual. Há uma experiência social e histórica da própria liberdade. A
autodeterminação não é algo que se limita à auto-possessão de cada indivíduo sobre
cada pessoa. Isto não se dá mais que dentro do marco da sociedade concreta na qual o
homem vive. E esta sociedade, em certo sentido, dispõe de possibilidades para
determinar o curso de sua história. Evidentemente, como vimos, a opção por estas
possibilidades não é independente das opções individuais que tomam os homens que
pertencem a essa sociedade. A sociedade não é um ente abstrato separado dos homens
de carne e osso. Ela tem uma estrutura própria que supera as realidades meramente
individuais e, por isso, tem também umas possibilidades próprias. É na experiência da
apropriação destas possibilidades onde os povos podem fazer sua experiência de Deus.
O povo de Israel, por exemplo, experimentou a Deus ao longo das vicissitudes e das
possibilidades históricas que foram se oferecendo para sua própria realização não só nos
indivíduos concretos (profetas, sacerdotes), mas também de um modo coletivo. No
Antigo Testamento há uma experiência social e histórica de Deus. É a experiência do
Deus de Israel, a experiência de um povo.
Pois bem, esta experiência de Deus que um povo vive é também uma
experiência da própria liberdade. Evidentemente, já não se trata da liberdade individual,
mas da libertação de um povo inteiro. Na medida em que podem optar entre diversas
possibilidades, na medida em que esta opção pode se traduzir em uma libertação de
alienações e dependências para ser os donos de seu próprio destino, os povos fazem
uma experiência de sua própria liberdade e uma experiência do poder do real. Toda vida
social e política é, no fundo, uma experiência da liberdade concreta, uma experiência do
poder do real. Ao experimentar sua própria liberdade, os povos experimentam a Deus.
Um exemplo paradigmático é também o povo de Israel saindo do Egito. O êxodo
consiste justamente na experiência da libertação de um povo como experiência de Deus.
Israel conhece seu Deus como o Deus que liberta o povo, que caminha com ele para sua
liberdade. A autodeterminação de um povo, a libertação de suas correntes e escravidões
é uma experiência privilegiada das dimensões sociais e históricas da experiência de
Deus.
Por isso, não é estranho que nos povos que lutam por sua libertação dificilmente
se possa falar de “crise da religião”, se por crise se entende um ofuscamento das crenças
religiosas ou um fechamento das mesmas na subjetividade. Pelo contrário, na medida
em que os povos fazem a experiência de sua liberdade, na medida em que
experimentam ao menos sua possibilidade de se rebelar contra as correntes que os
oprimem ou, inclusive, rompê-las, fazem uma experiência do poder do real. E é normal
que esta experiência do poder do real, esta experiência da religação e de seu ser
relativamente absoluto se traduza, em geral, em uma experiência religiosa. Mais que de
crise, dever-se-ia falar no terceiro mundo de renovação das tradições religiosas na
medida em que a experiência da liberdade também se renova e se aprofunda. Isto não
obsta para que esta experiência tenha muito de dúvidas, de dificuldades e, inclusive, de
fracassos. Mas na medida em que é uma experiência do poder do real sobre o destino
dos povos, é também uma experiência de Deus tão rica como a mais íntima recôndita
das “vivências” individuais da divindade.
E isto é muito importante para a filosofia da religião. A filosofia da religião,
dizíamos, deve se perguntar pela verdade do fato religioso. Pois bem, como víamos, esta
verdade não era algo que se pudesse demonstrar mediante meros raciocínios
especulativos: uma dedução conceitual nunca demonstrará a Deus, mas a um
determinado conceito de Deus. Este era o equívoco das argumentações clássicas sobre a
verdade do religioso. Ao contrário, dizíamos, a verdade da religião remete a uma
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