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freudiana da religião
Fábio Moreira Vargas
Resumo
O artigo tem o objetivo de apresentar alguns aspectos da crítica freudiana
à religião. Acompanhando, neste tema, as principais ideias do fundador da
psicanálise, procura-se mostrar a articulação entre algumas estruturas do fun-
cionamento do inconsciente e o fazer religioso, trabalhando a analogia feita
por Freud entre a crença religiosa e a ilusão. O tema é longo e de difícil abor-
dagem. Não há condição aqui de aprofundar as principais questões. Resume-
-se a um pequeno percurso pela interpretação do fato religioso elaborada pela
obra de Freud.
Palavras-chave: Psicanálise – Religião – Crença e Ilusão.
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i. Introdução
Às vezes temos a impressão, ao saber de atos cruéis acontecidos na história,
de que os motivos ideais só teriam servido como pretextos para os apites destrutivos;
outras vezes, no caso das atrocidades da Santa Inquisição, por exemplo,
achamos que os motivos ideais se impuseram à consciência
enquanto os destrutivos lhes trouxeram um reforço inconsciente
Freud, Por que a guerra?
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1 A este respeito, para uma boa base teórica inicial, ver GARCIA-ROZA. Introdução à metapsicologia freu-
diana , vol. II. São Paulo: Editora Jorge Zahar, 1996.
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2 Não se esgotam aqui os mecanismos de funcionamento do inconsciente propostos por Freud. Além
dos já citados, podemos encontrar a “condição à figurabilidade”, “a elaboração secundária”, bem como
a “regressão” e a “sobredeterminação”. Esta última, um dos núcleos do debate hermenêutico pós-
-freudiano. A este respeito, para um aprofundamento ver GARCIA-ROZA. Freud e o Inconsciente. Rio de
Janeiro: Editora Jorge Zahar, 2013.
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própria, e que reivindicam que se creia nelas. Visto que informam sobre aquilo que mais nos
importa e mais nos interessa na vida, elas gozam de alta consideração. Quem delas nada sabe é
deveras ignorante; quem as incorporou aos seus conhecimentos pode se considerar enriquecido
Freud, O futuro de uma ilusão.
3 Tema de extrema complexidade e abordagem ampla dentro dos comentários à obra de Freud, aqui,
em linhas superficiais, compreende-se recalcamento como o processo de banir da consciência repre-
sentações que não estejam de acordo com a vida consciente. A moralidade, insistida a nível psíquico pela
instância Super-Eu, pressiona o processo de recalcamento, em que uma representação, manifestação
de um desejo, poderá ser banida do sistema consciente e encontrará lugar de permanência ativa no
inconsciente.
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[...] aquilo que o homem comum entende como sua religião, o sistema de dou-
trinas e promessas que de um lado lhe esclarece os enigmas deste mundo com
invejável perfeição, e de outro lhe garante que uma solícita Providência velará
por sua vida e compensará numa outra existência as eventuais frustrações desta
(FREUD, 2013c, p. 27).
A chave para resolução fora dada. A infantilidade dos eventos religiosos re-
vela justamente a condição anterior a que temos de nos remeter para a aná-
lise. A infância humana está repleta de ilusões que são parte essencial do
nosso amadurecimento. Criaturas completamente dependentes da ajuda
parental, os seres humanos deparam-se com um mundo de frustração ine-
vitável. O processo de adentrar gradativamente a vida adulta coloca-nos
diante da suprema realidade que oprime os desejos mais essenciais. Da
completa visão infantil de tudo querer e de tudo conseguir (onipotência
dos pensamentos) para uma realidade que nos obriga a ceder em nossas
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4 Modo operante do funcionamento psíquico, o princípio de prazer seria a forma como o incons-
ciente buscaria sua satisfação sem levar em conta a realidade para tal. Com o tempo, em contato com
a realidade externa por meio dos órgãos dos sentidos, outro princípio instaura-se para fazer frente
à busca absoluta de prazer, trata-se do princípio de realidade. Assunto de extrema importância na
metapsicologia freudiana, aqui citamos apenas a título de elucidação.
5 Concepção de relevância no edifício teórico da psicanálise, as formulações sobre narcisismo adqui-
rem importância crucial a partir de 1914, ano de mudança da teorização psicanalítica. Por Narcisismo
entende-se o momento em que todas as intenções pulsionais encontram-se voltadas para o próprio
sujeito. O interesse pelo mundo bem como as outras fases, como a objetal, que sucederá a fase narcísica
ainda não teve expressão.
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6 A questão da maternidade também é assunto de ampla importância para análise crítica de Freud.
Embora bem menos trabalhada, é possível encontrar referências do sentimento oceânico que engen-
draria as religiões com o estado infantil quase simbiótico entre o sujeito e sua mãe. Aqui, cabe-nos a
figuração paterna para nossa análise.
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v. Concluindo...
As críticas freudianas da religião levantaram muitas páginas de prós e con-
tras, como se era de esperar. O fato é que, depois da psicanálise, crer, orar
e persuadir-se quanto a outro mundo é uma tarefa muito mais difícil. Se
entregar-se às ilusões não é um caminho favorável à própria vida, ignorar a
complexa estrutura de desejos e subjetividades também não parece ser uma
boa opção. A finitude da vida, já em Freud, revela-se como peça de funda-
mental importância para a própria preciosidade dela. Na raridade da vida,
finita e frustrada, talvez possamos, sem ignorar as causas de nossos compor-
tamentos e neuroses, encontrar uma forma de viver longe das ilusões. Já que
não nos cabe mais a onipotência outrora atribuída a nós mesmos, que se
possa, na finitude do poder e do saber, desfrutar da vida da melhor forma
possível. Os motivos que eram evidentes para justificar a crença podem e
devem, depois do olhar interpretativo do psicanalista, procurar sua forma
e legitimidade muito mais fundo do que supunha uma experiência imediata
entre homem e deus.
Referências bibliográficas
FREUD, Sigmund. A interpretação dos sonhos. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1972.
__________. A transitoriedade. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 2013a.
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