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recensão

HERFRIED MÜNKLER
O «Império» Empires

do pós-Imperialismo Cambridge,
Polity Press,
2007, 248 páginas

Ana Margarida Craveiro

A análise política contemporânea está refém de


modas. Os atentados terroristas de 11 de Setembro
de 2001 determinaram a necessidade de definir
categoricamente o papel dos eua no mundo, isto é, a
necessidade de balizar, catalogar, e assim estabelecer
os limites e alcances da acção americana. Se nomear
significa uma apropriação de, então, nenhum dos rótulos
trazidos a debate – unipolaridade, império e hegemonia1
– está inocente. Qualquer um deles traz consigo uma
carga ideológica, um peso normativo sobre o papel dos
eua. Convenientemente, o significado de cada um
poucas vezes ficou suficientemente esclarecido. Os
proponentes de cada conceito pretendiam a introdução
dos seus conceitos no léxico comum, como quase secundarizada pela profusão de refe-
dado adquirido. Por exemplo, Niall rências. Torna-se difícil avaliar – ou clara-
Ferguson – um activo defensor do termo mente identificar, até – a hipótese de
império – dizia que era por de mais evidente Münkler sobre o ressurgimento imperial,
que os eua são um império: se se mexe perdida na constante enumeração e contra-
como um pato, parece um pato e grasna ditório dos diversos autores. É claro, ainda
como um pato, é porque o é2. assim, que Herfried Münkler assume como
Herfried Münkler, professor na Humboldt- metodologia a interpretação da realidade,
Universität (Berlim), traz maior sofisticação e não o seu julgamento, sendo esta uma
ao debate, de um ponto de vista da política das principais críticas a apontar à ortodoxia
comparada. Reúne grande parte dos argu- do estudo dos impérios, mais preocupada
mentos a favor e contra, elaborando uma com a ideologia do império do que com a
extensa crítica política; num certo sentido, adequação do conceito à realidade.
este livro acaba por ser um estado da arte A partir de uma leitura dos impérios ao
sobre impérios, sendo a opinião do autor longo da história, Münkler define três

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pressupostos sobre império na actuali- sentido entender «mundo» como globo,
dade, muito embora o faça inicialmente em qualquer ponto da história. O império
pela negativa: (1) um império não é um romano dominou o mundo – ainda que
Estado, (2) não é uma estrutura hegemó- aos olhos da contemporaneidade seja geo-
nica e (3) nada tem a ver com o imperia- graficamente circunscrito numa região do
lismo do século xix (pp. 4-8). São estas as globo; dominou o seu mundo. A literali-
linhas que guiam a discussão. dade no entendimento, falhando na com-
preensão da elasticidade histórica dos
O DEBATE EM TORNO DO IMPÉRIO conceitos, obsta a uma leitura comparada
A base teórica de Münkler encontra-se dos impérios mundiais, porque não per-
ancorada numa distinção entre teorias mite a criação de categorias de análise
imperialistas, de natureza normativa e teo- gerais. É evidente que hoje em dia só os
rias de império, assentes numa perspectiva eua têm uma capacidade verdadeiramente
descritiva-analítica; o autor defende a global no seu alcance; os anteriores impé-
segunda perspectiva. Bem mais do que rios não dispunham da tecnologia ou do
uma questão semântica, este escudo teó- conhecimento suficientes para tal. A insis-
rico, a par do rigor na definição dos con- tência de autores como Hardt e Negri nesta
ceitos, permite a Münkler fugir à mitologia versão literal de império mundial é tão­
habitual sobre o imperialismo americano. ‑somente um esforço exagerado de ênfase
O mundo académico tem privilegiado as da ambição americana, uma insistência na
teorias imperialistas, impedindo a racio- falsa ideia da omnipotência americana.
nalidade no debate. Desde logo, porque a Mais: é uma máscara para um julgamento
teoria imperialista é sempre teleológica, ideológico sobre a realidade, omitindo os
e, como tal, pouco séria do ponto de vista factos relevantes.
académico: tem sempre o fim do império O mundo de hoje encontra-se unificado:
no horizonte (p. 28), estando o império a o alcance mundial, missão de qualquer
correr para o seu fim, desde que nasce3. império, traduz-se pelo domínio global
Para Herfried Münkler, contudo, um impé- nas suas três dimensões (terra, água e
rio tem pelo menos um ciclo de ascensão espaço). Com base neste pressuposto,
e declínio na sua história, combinado com Herfried Münkler apresenta a tese de que
um alcance geográfico mundial. Um poder a singularidade é uma característica fun-
que experimente um movimento de ascen- damental dos impérios. Quer com isto
são, seguido de uma queda e consequente dizer que não há impérios (plural) em
irrelevância política, soçobrando nessa simultâneo, porque é impossível haver
primeira grande crise, não é um império. dois poderes a controlar o mesmo espaço.
Um império sobrevive a pelo menos um Quanto muito, há estados mais fortes
ciclo de crise, mantendo a sua ambição de (superpotências, por exemplo) em igual-
domínio do mundo. Münkler esclarece dade de circunstâncias, a concorrer por
desta maneira uma das principais confu- uma mesma esfera de influência. A ambi-
sões à volta da missão imperial: não faz ção imperial não se compadece de outras

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ambições: um império é sempre a grada- HEGEMONIA: A SOLUÇÃO?
ção máxima de poder e influência, não Face aos problemas associados ao epíteto
sujeita a partilhas. A coexistência resulta- de império, Herfried Münkler avança com
ria numa guerra total, primeiro pela con- a hipótese do recurso à palavra «hegemo-
quista da esfera de influência do outro, e nia», mais satisfatório por evitar os qua-
depois pela aniquilação desse mesmo dros-referência tradicionais de império.
outro, dado que o simples facto da sua A hegemonia traz consigo um diferente
existência minimiza o poderio imperial a peso histórico, por não necessitar de maior
um nível insustentável. adjectivação, só da própria definição. Na
Chegamos assim à centralidade dos eua análise clássica de Heinrich Tribel, explo-
neste debate, provocada pelo momento rada pelo autor, não havia distinção entre
unipolar, em que os eua são um poder império e hegemonia (pp. 42-43) 6. No
singular (isto é, único e sem rival). Há um entanto, há uma diferença fundamental
ponto prévio a trazer à discussão sobre o entre os dois conceitos, à qual Münkler
hipotético império americano: qualquer atribui a máxima importância: a hegemo-
ideia sobre império hoje nada tem a ver com nia de um Estado afecta a política externa
os impérios de ontem. Como Michael Wal- das outras entidades; já a natureza impe-
zer refere, um império, hoje, será sempre rial de uma entidade política carrega con-
uma entidade pós-moderna4; argumento, sigo a missão de transformação do outro,
aliás, também apresentado por Michael e consequentemente a intervenção na polí-
Ignatieff, que considera a existência de tica interna (p. 44). Citando o autor: o
uma forma de poder imperial numa época hegemon é primus inter pares, incluindo a
pós-moderna, sustentada pelos pilares dos igualdade não só direitos e deveres, mas
direitos humanos, democracia e mercado também capacidades reais e resultados.
livre (p. 150). Uma certeza fica, porém: é Münkler considera que o termo «império»,
impossível falar de império na contempo- neste entendimento, só teria lugar se a
raneidade sem o adjectivar, como Carlos divergência entre a potência central – os
Gaspar ou Michael Walzer referem5. Do eua – e as restantes unidades tornasse
ponto de vista liberal, é o império benigno qualquer noção de igualdade formal uma
– imperialismo liberal. Do ponto de vista ficção insuportável, em termos de catego-
marxista, é o imperialismo informal, da ria (p. 46).
globalização neoliberal como império. Ou A hegemonia assume o conservadorismo
ainda, na visão a partir da periferia, o da ordem vigente, que reproduz padrões
«império por convite», expressão usada por de estabilidade. Conserva a distribuição de
Münkler para salientar esta inesperada poder, dentro de uma igualdade formal de
relação entre centro e periferia, em que a estados, entre os quais há uma ou mais
periferia solicita a intervenção do centro, potências cujo poder é reconhecido pelas
mesmo que sob a forma de uma estrutura restantes entidades políticas como legí-
de dominação, devido aos efeitos estabili- timo. A ordem hegemónica, dada a sua
zadores que produz. legitimidade, resulta de um equilíbrio,

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concorrendo para uma paz internacional manutenção de um império tradicional.
por contrato (p. 82). É, assim, uma ordem A comparação com o império britânico
benévola, e, neste sentido, está próxima torna esta limitação mais clara. Para alguns
da paz democrática tal como foi enunciada historiadores, este teria sido criado «in a fit
por Kant, opondo-se directamente à paz of absence of mind» (p. 8). Ou seja, os
imperial ou paz dos cemitérios. Reconhece ingleses avançaram com a construção de
a pluralidade de estados, e a paz que um império de maneira inconsciente, sem
resulta da ordem estabelecida entre eles estar a vontade política convicta do empre-
(p. 83), apesar da assimetria entre eles. endimento. Nos eua, pelo contrário, Her-
Numa leitura diametralmente oposta, John fried Münkler salienta que qualquer
Mersheimer classifica esta situação de tra- vocação imperial chocaria com o seu pró-
gédia das grandes potências: todos que- prio sistema político, cujos limites e regras
rem a hegemonia, concorrendo entre si impedem a expansão imperial (p. 155). Não
pela primazia na distribuição de poder, e é possível ignorar a ordem interna e seus
o sistema perde-se na máxima instabili- constrangimentos, que desafiam quaisquer
dade (p. 40). Para os defensores da ordem julgamentos de império. A natureza demo-
imperial, só havendo um império, a esta- crática da sua ordem constitucional consa-
bilidade é máxima, na medida em que o gra uma fraqueza que põe em causa a
império impõe ordem e hierarquia. viabilidade do império: qualquer império
Para Herfried Münkler, porém, a classifi- tem de fazer frente a sublevações e guerras
cação dos eua enquanto hegemonia bené- a partir da periferia, que resiste à subjuga-
vola torna-se pouco apropriada, quando ção (p. 129); os eua, porém, enquanto
se relembra que os eua emergiram vito- potência democrática, limitam­‑se no uso
riosos de um prolongado conflito entre da força, têm barreiras institucionais à
grandes poderes. Assim, no seu entender, defesa do imperialismo. Este é o principal
está em causa uma hegemonia com um paradoxo americano, segundo o autor:
potencial de imperialismo, apenas contra- o regime constitucional estabelecido
riado pela ordem legal americana, sensi- ­contraria as acções a que o imperialismo
bilidade da população americana (que, obrigaria. A solução de Münkler para este
como Walzer também intui, provavelmente paradoxo, o chamado «imperialismo demo-
não tem «estômago» para o imperialismo) crático», passaria pela identificação do
ou por astúcia política, que vê os riscos império moderno não enquanto estrutura
destabilizadores de uma política imperia- repressiva e exploradora mas como regime
lista (p. 41). Uma hegemonia é, portanto, que assegura paz e prosperidade; ou seja,
a supremacia limitada por regras. E, como o problema deixaria de existir se o império
diz Andrew Bacevich, a única forma de de hoje tivesse mais características de hege-
supremacia que o regime interno ameri- monia benévola que propriamente de
cano permite (p. 157). império. No entanto, o autor não acredita
Parece, pois, haver acordo em relação à nesta possibilidade. No seu entender, esta
incapacidade americana de criação ou visão de benevolência seria sempre uma

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máscara da estrutura tradicional de domi- tarefa imperial de manutenção da paz sem
nação de uma periferia por um centro assumir o papel imperial (p. 143) – talvez
(p. 130). Imperialismo democrático é, iludindo desta maneira os tais constran-
assim, uma contradição nos termos. gimentos imperiais. No entanto, isto des-
diz determinadas afirmações anteriores de
O RENASCIMENTO IMPERIAL Münkler, nomeadamente na comparação
O esforço de contraditório por parte do com a inconsciência imperial britânica. Na
autor acaba por tornar confusa a sua posi- sua visão, os eua vêm completar o vazio
ção. Depois de concluir que os eua são que ficou entre a perspectiva da ordem
constitucionalmente incompatíveis com mundial governada pela onu e a rede glo-
um império, Münkler acaba por declarar bal económica, respondendo às necessi-
que o renascimento imperial está de facto dades da periferia. Mais, respondendo a
a ter lugar, apesar das tensões e constran- exigências estruturais de estabilidade,
gimentos. A ordem imperial foi alterada: pelos efeitos que tem também no centro.
um poder imperial no século XXI não tem De qualquer maneira, esta tendência – ou
uma natureza territorial, mas controla o tentação – imperial, consciente ou não,
ar e o espaço. Perdeu opções políticas, por está em tensão com o regime democrático,
se manter democrático; mas compensou e ainda não suficientemente estabelecida
essa perda relativa de poder com desen- para que se possa assumir como tal. Os
volvimentos tecnológicos (p. 138). paradoxos a resolver ainda são demasiados
A grande inovação do império americano, para que se possa falar abertamente em
salienta o autor, é que os eua cumprem a nova era imperial.

NO T A S

1 3 5
Cf. GASPAR, Carlos – «O momento Michael Mann, por exemplo, tem Veja-se, por exemplo, o título do artigo
imperial», 2004. (Disponível em http://www. devotado grande parte da sua carreira ao de DAALDER, Ivo, e LINDSAY, James –
ipri.pt/investigadores/artigo. estudo do «império americano», anunciando «American empire, not "If" but "What Kind"».
php?idi=3&ida=37). já a sua prematura morte, enquanto forma In The New York Times, 10 de Maio de
de esquizofrenia política e fantasma 2003.
2
Esta analogia foi avançada pelo ideológico. MANN, Michael F. – Incoherent
6
historiador britânico em debate com Robert Empire. Londres: Verso, 2003. Esta ideia, aliás, é consentânea com o
Kagan, organizado pelo American Enterprise realismo de Henry Kissinger, que também
4
Institute, cujo resumo se encontra disponível Cf. WALZER, Michael – «Is there an considera serem império e hegemonia
em h t t p : / / w w w. a e i . o rg / e v e n t s / American empire?». In Dissent, Outono de sinónimos entre si (p. 42).
filter.,eventID.428/summary.asp. 2003.

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